inventÁrio e partilha - do prazo … · monografia apresentada à faculdade de direito da unic...
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GIANNI LAMONACA
INVENTÁRIO E PARTILHA - DO PRAZO
PRESCRICIONAL
CUIABÁ-MT
UNIVERSIDADE DE CUIABÁ - UNIC
FACULDADE DE DIREITO
2007
GIANNI LAMONACA
INVENTÁRIO E PARTILHA - DO PRAZO
PRESCRICIONAL
Monografia apresentada à Faculdade de
Direito da UNIC como exigência parcial
para obtenção do grau de bacharel em
Direito, sob orientação da Professora
Marli Teresinha Deon Sette.
CUIABÁ-MT
UNIVERSIDADE DE CUIABÁ - UNIC
FACULDADE DE DIREITO
2007
UNIC
UNIVERSIDADE DE CUIABÁ
Reitor
Dr. ALTAMIRO BELO GALINDO
Pró-Reitoria Acadêmica
Dr. RUY FAVA
FACULDADE DE DIREITO
Diretor
Dr. ANTONIO ALBERTO SCHOMMER
Dados CIP – Biblioteca Central da UNIC, 2007.
Coordenador da disciplina de Monografia Jurídica
FREDERICO CAPISTRANO DIAS TOMÉ
Professores da Banca:
....................................................
....................................................
....................................................
347.78(08)
Lamonaca, Gianni.
Inventário e partilha - do prazo prescricional. Cuiabá: UNIC –
Departamento de Direito. Cuiabá, 2007. 75p.
Trabalho de conclusão do Curso de Direito, orientado pela Professora
Marli Teresinha Deon Sette, com defesa em Banca Examinadora ocorrida em
dezembro de 2007.
1. INVENTÁRIO. 2. PRAZO PRESCRICIONAL. 3. FAMÍLIA. I. Título.
UNIC – UNIVERSIDADE DE CUIABÁ
INVENTÁRIO E PARTILHA – DO PRAZO
PRESCRICIONAL
GIANNI LAMONACA
BANCA EXAMINADORA
__________________________
Marli Teresinha Deon Sete
Profa. Orientadora:
__________________________
Prof.
__________________________
Prof.
__________________________
Prof.
__________________________
Prof.
Cuiabá, 17 de dezembro de 2007.
Quero dedicar este trabalho à minha
família, por estar sempre do meu lado,
me incentivando e apoiando.
Agradeço, primeiramente, à Deus, pelo
dom da vida.
À minha família, pelo carinho e apoio.
Aos mestres, pelos ensinamentos
indispensáveis.
Aos colegas de curso, pela amizade e
companheirismo.
A todos, que direta ou indiretamente,
colaboraram para alcançar o meu
sucesso.
RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de explanar a respeito do Inventário e Partilha,
especificamente do prazo prescricional, onde será abordado o Direito de família,
sucessões, inventários e partilhas, a herança, o Instituto da Colação no Código
Civil de 2002. Estaremos discutindo as alterações do Novo Código Civil (2002),
bem como as alterações inscritas na Constituição Federal (1988), tendo em vista
expressamente o art. 982 caput do CPC que deu força executiva para o
cumprimento da partilha de imóveis, bastando que seja apresentada à estrutura
da divisão dos bens entabulada e proceder-se-á à sua transcrição nas respectivas
matrículas dos imóveis.
Palavras-chave: Inventário, Prazo Prescricional, Família.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................. 11
CAPÍTULO I
O DIREITO DE FAMÍLIA ............................................................ 14
1.1 CARACTERÍSTICAS .................................................................. 15
1.2 BEM DE FAMÍLIA ...................................................................... 17
CAPÍTULO II
SUCESSÕES, INVENTÁRIO E PARTILHA ....................................... 19
2.1 DIREITO DE FAMÍLIA .............................................................. 19
2.2 DIREITO DAS SUCESSÕES .................................................... 20
2.3 INVENTÁRIO E PARTILHA .................................................... 21
2.4 PRAZO PARA INÍCIO E FIM DO INVENTÁRIO ................ 23
2.5 HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA AMIGÁVEL ................. 25
2.6 CARACTERÍSTICAS DE SAISINE, SUCESSÃO,
DISPOSIÇÃO E ADMINISTRAÇÃO ............................................. 26
2.7 DIREITO HEREDITÁRIO .......................................................... 28
2.8 HERANÇA JACENTE, ACEITAÇÃO, EXCLUSÃO ............ 29
2.9 LEGÍTIMA SUCESSÃO ............................................................. 31
2.10 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA ............................................ 34
2.11 TESTAMENTOS EM ESPÉCIE .............................................. 35
2.12 DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS .......................... 36
2.13 DIREITO DE ACRESCER ENTRE HERDEIROS ............... 37
2.14 DESERDAÇÃO E SUBSTITUIÇÕES .................................... 39
2.15 REVOGAÇÃO, ROMPIMENTO E TESTAMENTEIRO .... 40
CAPÍTULO III
INVENTÁRIOS E PARTILHAS: PRAZO PRESCRICIONAL ....... 42
3.1 PARTILHA AMIGÁVEL NOS AUTOS DE
INVENTÁRIO ..................................................................................... 44
3.2 AÇÃO ANULATÓRIA DE PARTILHA AMIGÁVEL .......... 45
3.3 AÇÃO RESCISÓRIA DE SENTENÇA DE PARTILHA ..... 46
3.4 A NOVA LEI N. 11.441/07 ........................................................ 47
3.5 DIREITO INTERTEMPORAL ................................................... 49
3.6 ARROLAMENTO ........................................................................ 50
3.6.1 PROCEDIMENTO DO ARROLAMENTO SUMÁRIO
(arts. 1032 a 1035/CPC) ..................................................................... 50
3.6.1.1 Inicial ....................................................................................... 50
3.6.1.2 Nomeação do Inventariante .................................................. 50
3.6.1.3 Partilha ou Adjudicação dos Bens ...................................... 51
3.6.1.4 Homologação da Partilha ou da Adjudicação ................... 51
3.7 PROCEDIMENTO DO ARROLAMENTO COMUM (art.
1036/CPC) ............................................................................................ 51
3.7.1 Inicial .......................................................................................... 51
3.7.2 Nomeação do Inventariante ..................................................... 51
3.7.3 Primeiras Declarações .............................................................. 52
3.7.4 Citação dos Interessados .......................................................... 52
3.7.5 Manifestação sobre as Primeiras Declarações...................... 52
3.7.6 Sentença ...................................................................................... 52
CAPÍTULO IV
O INSTITUTO DA COLAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 ...... 54
4.1 NOÇÕES GERAIS ....................................................................... 54
4.2 NATUREZA JURÍDICA ............................................................. 55
4.3 PREVISÃO LEGAL E ABRANGÊNCIA ................................. 56
4.4 OBJETO ......................................................................................... 59
4.5 BENS QUE NÃO ESTÃO SUJEITOS A COLAÇÃO ............ 60
4.6 MOMENTO DA COLAÇÃO ...................................................... 62
4.7 VALOR .......................................................................................... 62
4.8 LEGITIMAÇÃO ........................................................................... 63
4.9 DOAÇÃO INOFICIOSA ............................................................. 67
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................... 69
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................ 71
INTRODUÇÃO
Objetiva-se, com o presente trabalho, proporcionar uma visão
geral das novas e relevantes questões do Direito de Família, em vista
das mudanças ocorridas desde a Constituição Federal de 88, com o
surgimento de novas leis que atendem às mutações econômico-sociais
do mundo contemporâneo, trazendo indisfarçável reflexo nas relações
paterno-filiais. Novos tempos, com formidável evolução legislativa a
exigir constante atualização dos estudiosos da ciência jurídica.
O novo Código Civil (2002) mantém a estrutura básica do
Código de 1916, com a clássica divisão em partes, se enquadrando os
Livros que tratam das matérias específicas - Direito de Família,
Direito das Coisas, Direito das Obrigações e Direito das Sucessões,
entre outros. O Direito de Família é tratado no novo Código,
ocupando os artigos 1.511 a 1.783, com divisão em quatro Títulos
assim nominados: Do Direito Pessoal, Do Direito Patrimonial, Da
União Estável, Da Tutela e Da Curatela.
O novo ordenamento abandona a visão patriarca que inspirou
a elaboração do Código revogado, quando o casamento era a única
forma de constituição da família e nesta imperava a figura do marido,
ficando a mulher em situação submissa e inferiorizada.
A visão atual é bem outra, com ampliação das formas de
constituição do ente familiar e a consagração do princípio da
igualdade de tratamento entre marido e mulher, assim como iguais são
12
todos os filhos, hoje respeitados em sua dignidade de pessoa humana,
independente de sua origem familiar.
Essas importantes mudanças no plano jurídico da família não
vieram somente agora, com o novo Código Civil.
A grande virada se deu com a Constituição Federal de 1988,
que introduziu relevantes mudanças no conceito de família e no
tratamento dispensado a essa instituição considerada a base da
sociedade.
Esse repositório de leis inovadoras certamente passou a
produzir forte impacto no texto arcaico do Código Civil de 1916,
tornando letra morta muitos de seus dispositivos, alguns revogados
expressamente (como os referentes ao antigo desquite), enquanto
outros subsistem no texto escrito como simples referência histórica
em vista de não terem sido recepcionados pela Carta de 88 e serem
incompatíveis com os novos ordenamentos legais (por exemplo, o
capítulo do velho Código referente à odiosa discriminação dos filhos
em legítimos, legitimados e ilegítimos).
Era preciso, portanto, que se atualizasse o texto do Código,
para que deixasse de ser um simples conjunto de normas relativas ao
casamento e outros institutos paralelos, passando efetivamente a
regulamentar o Direito de Família com as concepções atuais de sua
ampliação e respeito às figuras dos seus componentes humanos.
Tendo em vista as inúmeras e importantes inovações trazidas
ao Direito de Família pelo novo Código Civil, sempre lembrando que
muitas delas já constam de leis esparsas, agora incorporadas ao texto
do novo ordenamento, vamos dar destaque explanado a respeito do
Inventário e Partilha, objetivo do nosso tema.
13
A metodologia utilizada será a abordagem da opinião de
autores renomados que discutem o tema, através da pesquisa
bibliográfica em artigos, revistas, jornais, mídia eletrônica em
materiais publicados e disponíveis.
Assim, no capítulo 1 deste trabalho, estaremos abordando o
Direito de Família, suas características e conceitos. No capítulo 2,
explanamos sobre sucessões, Inventário e Partilha e no capítulo 3,
discutimos sobre o prazo prescricional, para, ao final, tecer minhas
considerações.
CAPÍTULO I
O DIREITO DE FAMÍLIA
No direito de família o primeiro aspecto que chama a atenção
é a topologia da tratativa da matéria, depois do direito das coisas e
antes do direito das sucessões. Outrora, no regime do revogado
código, o direito de família iniciava a parte especial. Esta posição, a
atual, é muito mais lógica, de modo que agora pode-se dizer que a
seqüência do código corresponde à seqüência pela qual as matérias
são ministradas nas faculdades de direito.
Alguns tópicos do direito de família sofreram notórias
modificações nos últimos trinta anos, podendo se citar a questão do
divórcio1 e da união estável
2. Outras questões não menos importantes
foram sendo tratadas pela jurisprudência e pela doutrina, que à luz do
texto constitucional de 1988, construíram um sólido esteio para as
soluções apontadas, como é o caso dos filhos ―ilegítimos‖.3
Hodiernamente, também sofreu mudança a relação onde, após
um ano de ruptura da vida conjugal, podem os cônjuges requer a
separação consensual, o que implica na separação de corpos e partilha
1 A Lei nº 6.515/77, que regulamenta o divórcio somente se tornou possível depois de aprovação de emenda
constitucional que gerou acirradas discussões no parlamento. Antes, não ocorria a dissolução do vínculo
matrimonial, mas apenas o chamado ―desquite‖, que era a dissolução da comunhão conjugal, ou seja o
equivalente da separação no sistema atual. 2 A união estável, por outro lado, era uma realidade que não encontrava tratativa legislativa e tal somente se
deu depois que a Constituição Federal assegurou seu reconhecimento (art. 226, § 3º). No entanto, as Leis
nº 8.971/94 e 9.278/96 tratavam somente dos direitos relativos a alimentos e sucessão entre companheiros.
Os critérios estabelecidos nessa legislação foram utilizados para aferir-se sua caracterização para todos os
fins. A matéria somente voltou a atenção específica no novo código 3 Pasme-se, somente com o advento da CF/88 a discriminação entre filhos legítimos e ilegítimos foi abolida.
15
de bens, pondo termo aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca
e regime de bens.
Muitas expectativas foram depositadas no novo código, e o
fato de ter preponderantemente codificado o que já constava da
legislação extravagante ou da jurisprudência gerou alguma frustração.
1.1 Características
A perda da importância do casamento na sociedade moderna
é uma realidade irrecusável, sem que, contudo, se possa afirmar que
tenha perdido toda sua projeção. Mas o certo é que os fatores morais e
culturais que tornavam o casamento praticamente uma regra muito se
esmaeceram.
Ao início dos dispositivos legais, já observamos uma
mudança no código vigente em relação ao anterior, pois não principia
diretamente pelo trato das formalidades da habilitação.
O artigo 1.511 determina que o casamento implica comunhão
plena de vida com base na igualdade de direitos de deveres dos
cônjuges.4 A menção à igualdade de direitos e deveres representa uma
mudança de paradigma na tratativa do casamento pelo direito civil, e
reflete o princípio da igualdade consagrado no artigo 5, caput, e
inciso I, do texto constitucional. O revogado código ainda espelhava
uma época em que era cultivado culturalmente um injustificável ranço
de desigualdade no tratamento das mulheres. Tinha-se a idéia do
4 Embora de fundo mais acadêmico do que prático, subsiste o embate entre as teorias contratualista e
institucionalista na definição do casamento. O Código civil evitou uma definição da natureza do instituto.
16
cônjuge varão como o chefe, o ―cabeça‖ da família. Ora, o texto
constitucional é bastante claro em vedar qualquer espécie de
discriminação em relação ao sexo, ressalvadas as decorrentes de
critérios relativos ao desempenho de certas funções profissionais.5
Realmente não havia mais espaço para tratamento diverso entre os
papéis dos cônjuges.
Foi banida a distinção entre os direitos do homem e da
mulher em relação ao patrimônio. Desta forma, as faculdades do
artigo 1.6426 e as limitações do artigo 1.647
7 incidem para ambos os
cônjuges.
A atual sistemática antecipa-se a plena capacidade civil da
pessoa humana, dos 21 anos para 18 anos de idade. Nesse sentido a
disposição do artigo 5º do novo Código Civil, trazendo importantes
reflexos para o campo do Direito de Família, como nas situações de
autorização paterna para o casamento, sujeição ao pátrio poder, que
passa a denominar-se "poder familiar", cessação da tutela, cessação
do direito a alimentos etc. Sob essa mesma ótica da antecipação da
capacidade, reduz-se para 16 anos de idade o limite para emancipação
dos filhos por outorga paterna (artigo 5º, parágrafo único, inciso I), e
iguala-se também em 16 anos a idade do homem e da mulher para fins
de capacitação nupcial (artigo 1.517 do novo CC).
5 Como ocorre, por exemplo, com certas funções da atividade militar. 6 ―Art. 1.642.-Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: I -
praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua profissão, com
as limitações estabelecida no inciso I do art. 1.647; II - administrar os bens próprios; III - desobrigar ou
reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu consentimento ou sem
suprimento judicial; V - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval,
realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos incisos III e IV do art. 1.647; V - reivindicar
os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que
provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato
por mais de cinco anos; VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.‖ 7 ―Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro,
exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - pleitear,
como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval; IV - fazer doação, não sendo
remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.‖
17
1.2 Bem de família
O regramento do denominado bem de família também é mais
completo no vigente código, com diversas novidades.
Não somente os chefes da família, mas os cônjuges ou
terceiro poderão instituir o bem de família, sendo neste último caso a
eficácia do ato, seja doação ou cláusula testamentária, condicionada à
aceitação dos cônjuges. Quando instituído pelos cônjuges, deverão ser
observadas as regras da impenhorabilidade, não podendo o valor do
bem exceder um terço do patrimônio líquido.
O bem de família poderá ser edificação, com os respectivos
acessórios e pertences, urbano ou rural, o qual será destinado à
moradia familiar. Pode também corresponder a valores mobiliários
destinados à conservação do imóvel ou sustento da família, e neste
caso não poderão exceder ao valor do bem imóvel, facultando-se ao
instituidor designar instituição para administrá-los.
Qualquer que seja a hipótese, a instituição deverá passar pelo
registro respectivo no Cartório de Registro de Imóveis. A
administração compete, salvo disposição em contrário, a ambos os
cônjuges, e a dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de
família. Sua extinção poderá se dar a requerimento dos interessados,
por ordem judicial, com ou sem sub-rogação em outros, em caso de
impossibilidade de sua manutenção, ouvido o Ministério Público. A
alienação ou destinação diversa de bens imobiliários ou mobiliários
que se constituem em bem de família está condicionada ao
consentimento dos interessados ou representantes legais, com oitiva
do Ministério Público.
18
A extinção também se dará pela morte dos cônjuges ou
maioridade dos filhos, competindo, no primeiro caso, a administração
ao filho mais velho ou tutor. No caso de morte de um cônjuge, se o
bem for o único, o remanescente poderá pedir a extinção.
A impossibilidade de execução acarretada pela instituição do
bem de família não se estende aos tributos relativos ao prédio,
devendo ser determinada a sub-rogação em caso de saldo.
CAPÍTULO II
SUCESSÕES, INVENTÁRIO E PARTILHA
2.1 Direito de família
Todos sabemos da importância do ordenamento civil
brasileiro, agora remodelado pela Lei 10.406, de 10 de janeiro de
2002, em vigor desde 11 de janeiro deste ano, trazendo grandes
mudanças que exigem estudo, reflexão e debates para sua
compreensão e natural aperfeiçoamento.
A Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 — Código de
Processo Civil, altera seus dispositivos, possibilitando a realização de
inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por
via administrativa.
Assim, o Congresso Nacional decreta:
―Art. 1º Os Arts. 982 e 983 da Lei nº
5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código
de Processo Civil, passam a vigorar com
a seguinte redação:
Art. 982. Havendo testamento ou
interessado incapaz, proceder-se-á ao
inventário judicial; se todos forem
capazes e concordes, poderá fazer-se o
inventário e a partilha por escritura
20
pública, a qual constituirá título hábil
para o registro imobiliário.‖8
2.2 Direito das Sucessões
Vamos analisar o Direito das Sucessões e suas disposições
gerais, com os lineamentos básicos das espécies de transmissão dos
bens, vocação hereditária, formalidades para cessão da herança,
posição sucessória do companheiro e a ordem da vocação hereditária
na sucessão legítima.
Quando se pensa em morte, em desaparecimento de alguém,
logo vem um sentimento de irreparável tristeza e dor pela perda,
especialmente quando se trata de um ente querido. De outro lado,
porém, a morte traz como que uma continuidade da vida do extinto
no que se refere aos seus bens, que de imediato se transmitem aos
sucessores legítimos ou testamentários. Essa transmissão dá-se na
forma determinada pelo autor da herança, se deixou testamento ou
codicilo como ato de última vontade. Ficam os sobrevivos, portanto,
sujeitos à vontade dos mortos no que tange ao recebimento de seu
patrimônio. Há como que uma imortalidade do titular dos bens, no
aspecto de direcionar sua posse, de transmiti-lo a certas pessoas e
sob certas condições, o que bem demonstra a importância do direito
sucessório.
O Direito das Sucessões tem fundamento na Constituição
Federal, artigo 5º, inciso XXX, que consagra o direito de herança.
Trata-se, portanto, de direito fundamental, que não pode ser negado
pela legislação infra-constitucional.
8 RANS, Maurício (Deputado). Revista Consultor Jurídico, 30 de novembro de 2006.
21
A matéria é tratada no Livro V do vigente Código Civil,
entre os artigos 1.784 a 2.027, compreendendo os títulos:
Disposições Gerais, Sucessão Legítima, Sucessão Testamentária,
Inventário e Partilha.
Na esfera processual, aplicam-se as normas do Código de
Processo Civil, artigos 982 a 1.045.
Como já vimos, o direito das sucessões começa no artigo
1.784 e vai até o artigo 2.027 do Código Civil, compreendendo quatro
títulos, a saber: sucessão em geral, sucessão legítima, sucessão
testamentária, e inventário e partilha. A estrutura básica do direito
sucessório foi mantida nos termos do que constava do revogado
código. As poucas modificações pontuais são importantes, no entanto.
É preciso não olvidar que o direito sucessório é uma das áreas do
direito civil onde é mais sensível o peso da consolidação histórica dos
institutos. A redobrada cautela que é recomendada no que tange à
transmissão da propriedade do acervo e negócios de última disposição
também conduz a seara sucessória a um natural engessamento. Esta
percepção é imprescindível para a correta avaliação das opções do
código civil relativamente a esta matéria.
2.3 Inventário e partilha
Sob a denominação genérica de inventário encontramos três
formas de procedimento, quais sejam, o inventário propriamente dito,
que ocorre quando há herdeiros incapazes ou houver litígio; o
arrolamento, que se dá quando todas as partes são capazes e há
22
acordo; e o arrolamento sumário, ou adjudicação, que tem vez quando
não há necessidade de partilha.
O regramento destes procedimentos encontra-se no CPC,
artigos 982 a 1.045.9 Qualquer que seja o procedimento, o escopo é
um só, proceder a liquidação do acervo patrimonial e por fim à
situação de condomínio forçado que normalmente se instaura.
Na disciplina dos sonegados, as modificações são somente de
topologia de dispositivos. Já no que diz respeito ao pagamento das
dívidas, sequer houve mudanças de redação.10
Nas colações, porém, o
código vigente é bem mais claro que o anterior. Inclui a menção da
legítima do cônjuge (art. 2003, parágrafo único), e determina de
forma direta que os bens colacionados são computados na parte
disponível, não acrescendo à parte indisponível.
Na dispensa de colação não mais é mencionado o dote, visto
que este regime foi extinto. Os bens doados a herdeiros que na época
do ato não seriam herdeiros necessários presumem-se imputados na
parte disponível. Sendo várias as doações em datas diversas e sendo o
caso de redução, diante do fato de que a doação excede a legítima
mais a quota disponível, a redução inicia pela última doação.
Quanto ao tratamento da partilha (relativo ao inventário e
partilha), o artigo 2.014 permite ao testador efetuar a indicação dos
bens que comporão os quinhões, respeitados os valores destes em
relação às cotas. A possibilidade de partilha em vida pelo ascendente
foi mantida. Na garantia dos quinhões, nada foi alterado. Já no que
diz com anulidade da partilha, foi estabelecido o prazo de um ano,
9 Na comissio del credere, o comissário responde solidariamente para com o comitente juntamente com as
pessoas com quem contratou. 10 Embora não o diga, a lei civil é curial que em caso de culpa exclusiva do transportado, possa a
indenização ser reduzida ou mesmo suprimida.
23
assim como os motivos de anulação (defeitos que invalidam em geral
os negócios) eram declinados (art. 1.805 do revogado código). Mas
agora não é mais sobre ―nulidade‖, mas anulação, abarcando a
nulidade e a anulabilidade.
Esclarecemos que se tratam de alterações de Leu que entrou
em vigor em 05/01/2007.
2.4 Prazo para início e fim do inventário
Inventário judicial se dá por meio de um processo com o
propósito de se relacionar os bens deixados pelo
falecido/inventariado, partilhando-os e distribuindo aos sucessores
após a quitação das dívidas deixadas pelo de cujus. Não será
necessária a abertura do processo de inventário judicial se presentes
as partes, maiores, concordarem previamente com a partilha amigável
(CC, art. 2.015), levada ao juízo simplesmente para sua homologação
(CPC, art.1.031); e também quando existir apenas herdeiro único,
adjudicando-se os bens (CPC, art.1.031 § 1º).
O caput do art.983 tem nova redação e foi revogado o
anterior parágrafo único do CPC pelo art. 5º da Lei n. 11.441/07. A
novidade é que agora estão pontualmente fixados os prazos para o
início e o fim do inventário judicial.
O processo de inventário e partilha deverá iniciar dentro de
60 (sessenta) dias, significa dizer, distribuído perante o juízo
competente, a contar da abertura da sucessão, que se dá a partir da
data do óbito do inventariado.
24
E seu prazo de tramitação é de 12 (doze) meses contados a
partir da data da distribuição. Portanto, analisando o dispositivo sob a
ótica da reforma processual buscando a celeridade do judiciário, tem-
se que o prazo, agora dobrado (o anterior era de 06 meses), teve o
intuito de fazer que se cumpra. Todavia, em caso de retardamento na
condução do processo pelo inventariante não poderá ocorrer a
extinção do processo com base no art.267 incisos II e III do CPC
(regra geral), pois o mesmo codex instrumental civil prevê que nestas
hipóteses o juiz terá é de remover o inventariante, ex-vi art.995, II
(regra especial), mas não proferir sentença extintiva.
Inadmissível considerar a lei letra morta para cumprimento
do prazo de 12 (doze) meses. Mas para atingir esse desiderato, as
partes, os advogados, as secretarias judiciais, os juízes e os
promotores de justiça devem estudar a matéria e se aparelhar para
juntos, cada um dentro de suas funções, cumprir esse prazo que é a
regra geral para ultimar o inventário.11
O STF considerou
constitucional a multa fiscal prevista por leis estaduais pelo
retardamento aos prazos de início e encerramento do inventário
judicial12
.
A exceção será a prorrogação desse prazo que ficará a cargo
de decisão proferida pelo juiz de ofício ou a requerimento de parte.
Advirta-se que o pedido de dilação do prazo conterá justificativas
plausíveis. E por seu turno, a decisão que prorrogar haverá de ser
fundamentada e de antemão estipular um novo prazo para o
encerramento do inventário dentro da realidade apresentada nos autos.
Segundo Rosely Sayão, melhor será se o juiz nessa decisão pontue as
11
TEPEDINO, Gustavo; SCHREIBER, Anderson. Minorias no direito civil brasileiro. RTDC – Revista
Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, ano 3, v. 10, p. 135-155, abr./jun. 2002. p. 17. 12 SAYÃO, Rosely. A família não foi destruída. Ela mudou. Época, Rio de Janeiro, 19 jan. 2002. p. 35.
25
pendências e ordene a sua satisfação pelos responsáveis, sob pena de
remoção do inventariante por não dar ao inventário andamento regular
(CPC, art.995, II).13
2.5 Homologação da Partilha Amigável
O art.1031 caput do CPC foi alterado apenas na menção do
art. 2015 do novo Código Civil (Lei n. 10.406 de 10.01.2002) em
substituição à do art.1773 do revogado Código Civil de 1916, in
verbis:
―Art.1.031. A partilha amigável,
celebrada entre partes capazes, nos
termos do art. 2.015 da Lei n. 10.406, de
10 de janeiro de 2002 - Código Civil,
será homologada de plano pelo juiz,
mediante a prova da quitação dos
tributos relativos aos bens do espólio e
às suas rendas, com observância dos
arts.1.032 a 1.035 desta Lei.‖14
O art.1.031 do CPC trata da opção concedida aos herdeiros
capazes que unanimemente acordes e quites com os tributos relativos
aos bens do espólio e às suas rendas, buscam a chancela judicial para
que a partilha amigavelmente estabelecida seja homologada por
sentença, constituindo-se em um título executivo judicial (CPC, art.
13 Idem, p.36. 14
NERY JÚNIOR, Nelson. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante, 2ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 99.
26
475-N, VII). Necessário que antes da apresentação em juízo para a
homologação ocorra prévia divisão amigável do monte líquido entre
os sucessores do de cujus pelas 03 (três) formas previstas no art.
2.015 do Código Civil: por escritura pública; por termo nos autos do
inventário e por escrito particular.
A petição inicial será instruída com os documentos
reveladores da opção de composição da partilha dos capazes (CC,
art.2.015), a prova da propriedade do de cujus, da quitação dos
tributos relativos aos bens partilhados e às suas rendas (CPC, art.
1.031 caput fine), atendendo, ainda, às exigências do art.282 do CPC.
2.6 Características de Saisine, sucessão, disposição e
administração
O código vigente manteve o princípio da saisine como
orientador na transmissão do patrimônio. Cuida-se de um princípio
cuja origem remonta o direito medieval, e que tem por corolário a
imediata passagem da propriedade do acervo patrimonial do de cujus
para os herdeiros legítimos e testamentários.15
O dispositivo do artigo
1.784 menciona que aberta a sucessão, transmite-se a herança. A
sucessão tem-se por aberta no exato instante da morte do de cujus. É o
último domicílio do autor da herança que determina o foro
competente para a sucessão.
O código não mais fala em capacidade para suceder, mas
apenas refere que a lei que regula a sucessão e a legitimação é a lei 15 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso de Processo Civil Avançado. 5ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, p. 219.
27
vigente ao tempo da abertura. A utilização do termo capacidade no
revogado código era em verdade atécnica. O termo capacidade tem
uma significação precisa no âmbito do direito, e a capacidade civil
não é requisito para suceder, pois não se cuida de um negócio
jurídico.
A possibilidade de disposição testamentária, na presença de
herdeiros necessários, continua limitada a metade do acervo.
A união estável foi incluída no âmbito do direito sucessório.
Os bens nos quais sucede o companheiro são somente os adquiridos
na constância da união a título oneroso. O quinhão dependerá da
qualidade dos parentes com quem concorre e do grau de parentesco.
Ser-lhe-á deferida toda a herança se não houver parentes sucessíveis.
Concorrendo com filhos comuns, tem direito a cota equivalente a
destes, e se com filhos somente do de cujus, terá direito a metade da
cota a que estes couber. Com outros parentes, terá direito a um terço
do acervo (art. 1.790).
Aberta a sucessão, cria-se condomínio quanto ao acervo, em
hipótese de condomínio legal ou forçado, que somente finda pela
partilha ou pela cessão integral da herança.
O direito à sucessão aberta16
é cessível, tendo o co-herdeiro
preferência em relação a terceiros, preferência esta que pode ser
exercida até 180 dias após o negócio se a cessão a terceiro não lhe foi
comunicada. A preferência pode ser exercida por um ou mais co-
herdeiros. Esta cessão não pode ser feita considerando-se bem
singular, e tem como instrumento a escritura pública de cessão de
direitos hereditários.
16
NERY JÚNIOR, Nelson. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante, 2ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 353.
28
O inventário dever ser instaurado até trinta dias após a morte
do inventariado, mas esta regra raramente é observada. A legitimidade
para requerer a abertura de inventário vem regulada pelos artigos 987
a 989 do CPC, cumprindo salientar que é um dos poucos casos nos
quais o juiz pode atuar oficiosamente, excepcionando o princípio da
demanda. Dentre os indicados na lei processual civil estão os
credores, o síndico da falência e o Ministério Público, em caso de
herdeiros incapazes.17
A administração do acervo até que se ultime a partilha é em
regra levada a efeito pelo inventariante, e antes que este preste
compromisso, sucessivamente pelas pessoas elencadas no artigo 1.797
que são: o cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo
da abertura da sucessão; o herdeiro que estiver na posse e
administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao
mais velho; o testamenteiro; a pessoa de confiança do juiz, na falta ou
escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de
ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz.
2.7 Direito hereditário
Os dispositivos do revogado código que tratam das regras
afins aos artigos 1.798 a 1.803 do C.C. vigente tinham uma redação
que não observava a melhor técnica, pois era utilizada a terminologia
―capacidade‖, de forma equivocada ou ao menos pouco precisa.
17 Disponível em: http://www.jus.com.br e http://www.ufsm.br/direito. Acesso: 12.01.2007.
29
O novo texto fala de legitimados, e aponta as pessoas
nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão que é
o da morte do inventariado e em caso de sucessão testamentária
podem ser beneficiadas pessoas jurídicas, existentes ou a serem
constituídas a partir da própria disposição, e filhos ainda não
concebidos de pessoas determinadas e vivas por ocasião da abertura
da sucessão.
Neste último caso, ou seja, do filho ainda não concebido de
terceiro, os bens da herança ficarão sob administração de curador, em
regra, o provável ascendente do herdeiro que irá nascer, ou então
qualquer das pessoas indicadas no artigo 1.775, aplicando-se as
disposições pertinentes à curatela de incapazes. Mas a eficácia das
disposições fica condicionada a que o nascimento se dê até dois anos
depois de aberta a sucessão, sob pena de os bens reverterem aos
herdeiros legítimos.
O rol dos que não podem ser nomeados herdeiros ou
legatários foi mantido, mas a concubina pode ser beneficiada se o
inventariado estava separado de fato a mais de cinco anos sem culpa
sua. Vale lembrar que o termo concubino não define as situações de
união estável.
2.8 Herança Jacente, aceitação, exclusão
Embora a transmissão do patrimônio aos sucessores se dê de
forma automática, fica condicionada a uma ação resolutiva,
materializada na renúncia. A aceitação é a regra, e por isso mesmo
30
pode ser expressa ou tácita. A aceitação expressa deve constar de
declaração escrita e a tácita resulta da prática de atos próprios da
condição de herdeiro, afastada a cessão pura e simples aos demais
herdeiros. A renúncia continua a requerer instrumento público ou
termo judicial.
O código inova ao permitir que, chamado por mais de um
título o herdeiro, possa ele livremente deliberar sobre os quinhões que
aceita ou renuncia. Esta possibilidade, quando da concomitância de
legado e herança, já existia no revogado código e foi mantida (artigo
1.808).
No caso de falecimento de herdeiro antes da aceitação, os
seus herdeiros poderão recusar ou aceitar a herança. O renunciante,
por outro lado, como já ocorria no revogado código, não transmite seu
direito a seus sucessores, os quais somente receberão por direito
próprio na ausência de herdeiros da classe anterior, sejam inexistentes
ou igualmente renunciantes.
A aceitação e a renúncia são hoje irretratáveis (art. 1.812) No
regime do revogado código, a aceitação era retratável (art. 1.590). Foi
mantida a possibilidade de os credores aceitarem herança em nome do
renunciante com autorização judicial e limitada aos débitos do
inventariado.
A nomenclatura que antes referia ―dos que não podem
suceder‖, agora menciona ―dos excluídos da sucessão‖. No inciso I,
foram acrescidos os que incorrerem em homicídio consumado ou
tentado contra o cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente da
pessoa de cuja sucessão se tratar. No inciso II, relativo à calúnia em
juízo ou crime contra a honra, foram incluídos o cônjuge e o
companheiro como vítimas. A exclusão carece de ação cujo prazo
31
decadencial é de quatro anos. Os efeitos continuam pessoais, não se
transmitindo a pecha aos herdeiros do excluído. Havendo disposição
testamentária quando já era conhecida a causa de exclusão, o excluído
poderá suceder no limite da disposição respectiva.
No direito romano, a acepção existente sobre a herança
jacente (hereditas jacens)18
era um tanto diverso, pois esta ocorria
entre o momento da morte e o momento da aceitação, quando a
herança era considerada um acervo patrimonial dotado de
personalidade jurídica, visto que não havia a saisine. Podem os
credores postular o recebimento de dívidas através do montante da
herança jacente ou vacante, sendo que esta última ocorre após cinco
anos sem herdeiros.
2.9 Legítima Sucessão
Dentro desta epígrafe, trataremos da ordem de vocação
hereditária, dos herdeiros necessários e do direito de representação.
Na ordem de vocação hereditária há uma significativa
alteração, que se materializa na inserção do cônjuge sobrevivente
como herdeiro necessário, em concorrência com os ascendentes se o
casamento era regido pelos regimes da separação convencional,
comunhão parcial e participação final nos aqüestos. Não será, porém
herdeiro se o regime for de separação obrigatória ou comunhão
universal e estiver concorrendo com descendentes. Caso o regime seja
18 TEPEDINO, Gustavo; SCHREIBER, Anderson. Minorias no direit o civil brasileiro. RTDC –
Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, ano 3, v. 10, p. 135 -155, abr./jun. 2002.
32
de comunhão parcial e o autor da herança não deixar bens
particulares, igualmente não será herdeiro.
Em concorrência com os ascendentes do autor da herança, no
entanto, será sempre o cônjuge sobrevivente herdeiro necessário, nos
termos do artigo 1.829, inciso II, do C.C.
Mas para ostentar a condição de herdeiro necessário, mister
que o cônjuge, ao tempo da morte do outro, não estivesse
judicialmente separado ou separado de fato a mais de dois anos. Este
prazo de dois anos, porém, pode ser desconsiderado se o postulante à
herança prova que a culpa pela impossibilidade de vida comum não é
sua.
No caso de concorrência com descendentes, ao cônjuge será
deferida cota igual a estes, e se for genitor dos descendentes do autor
da herança, sua parte não poderá ser inferior a um quarto. No caso de
concurso com os ascendentes do autor, o cônjuge terá direito a um
terço da herança, fração que passa para metade se o ascendente for um
só ou se não for de primeiro grau. Somente na ausência de cônjuge
sobrevivente é que serão chamados os colaterais, e somente até o
quarto grau.
Observa-se assim, que os herdeiros necessários hoje são os
descendentes, os ascendentes e o cônjuge. O cônjuge concorre com as
duas categorias, mas os ascendentes somente são chamados se não
houver descendentes. Os herdeiros têm direito, por sucessão legal, à
legítima, que corresponde à metade dos bens da herança.
No cálculo da legítima foi mantido o princípio de que os bens
colacionados acrescem somente a legítima No regime anterior, a
colação dos bens doados anteriormente era adicionada a metade dos
bens existentes depois de abatidas dívidas e despesas de funeral,
33
conforme preconizava o artigo 1.722, parágrafo único do C.C.
revogado.
Exemplificando, se o autor da herança tinha 50 de patrimônio
e 10 de dívidas e despesas, feito o abate, sobraria 40. Este total seria
dividido em dois. Se tivesse feito antes da morte doações sujeitas a
colação em valor de 30, este seria somado ao resultado da metade de
40 dividido por dois, totalizando a legítima 50 e a parte disponível 20.
Isto decorre do fato de que o citado parágrafo único mandava acrescer
os bens sujeitos à colação à metade dos bens que então possuía o
testador após pagamento das dívidas e despesas. Em síntese, a
legítima é antes separada para depois acrescer-se os bens sujeitos à
colação.
Guinada diametralmente oposta observa-se no que tange as
cláusulas de impenhorabilidade, inalienabilidade,
incomunicabilidade e conversão dos bens da legítima. No regime do
artigo 1.723 do revogado código, restrição alguma havia à
possibilidade de o autor da herança livremente instituir a
incomunicabilidade, inalienabilidade (temporária ou vitalícia e que
não impedia a transmissão mortis causa, fosse legítima ou
testamentaria), administração pela mulher e conversão em outras
espécies de bens.
No diploma vigente, cláusula relativa a administração pela
mulher deixou de ter sentido, já que os cônjuges ostentam direitos
iguais de administração em relação ao patrimônio comum e têm
plena disponibilidade em relação ao patrimônio exclusivo.
A estipulação de inalienabilidade, impenhorabilidade e
incomunicabilidade somente é admissível se houver justa causa
34
declarada no testamento (art. 1.848).19
O parágrafo primeiro do
mesmo artigo expressamente veda a determinação do testador
estabelecendo a conversão dos bens da legítima em outros de espécie
diversa, o que somente poderá se dar com autorização judicial para
alienação e posterior sub-rogação.20
No direito de representação não
houve alteração.
2.10 Sucessão testamentária
A sucessão testamentária tem esteio nas disposições de
última vontade, vertidas em testamento ou codicilo. Pode conter
disposições patrimoniais ou não, sendo que no primeiro caso é
ressalvada a legítima, que não poderá ser objeto de testamento.
O testamento é ato personalíssimo, vale dizer, não comporta
a utilização de mandatário, e está sujeito a modificação a qualquer
tempo antes da morte do testador, sem que as disposições anteriores
impliquem qualquer limitação em relação às novas.
A capacidade para o ato de disposição de última vontade
segue a regra geral do código, mencionando o artigo 1.860, ainda,
19 Apelação Cível nº 169152000 - Ac nº 0343082001 (Ação Originária - Nulidade de Escritura Pública), 1ª
Câmara Cível do TJMA, São Luís, Relª. Maria Dulce Soares Clementino, Rev. Militão Vasconcelos
Gomes. j. 26.03.2001, Publ. 09.04.2001; Apelação Cível nº 2002.004007-1, 1ª Turma Cível do TJMS,
Bonito, Rel. Des. Atapoã da Costa Feliz. j. 27.08.2002, un.; Apelação Cível nº 0094385100, Acórdão
6316, 6ª Câmara Cível do TJPR, Curitiba, Rel. Des. Leonardo Lustosa. j. 07.03.2001; Embargos
Infringentes nº 70001643683, 3º Grupo de Câmaras Cíveis do TJRS, Ijuí, Rel. Des. Carlos Alberto Álvaro
de Oliveira. j. 02.03.2001; Apelação Cível nº 112.791-4, 9ª Câmara de Direito Privado do TJSP, Rel. Des.
Evaldo Veríssimo. j. 20.02.2001, un. 20 Recurso Especial nº 436010/SP (2002/0059113-1), 4ª Turma do STJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar. j.
24.09.2002, DJ 18.11.2002, p. 227; Recurso Especial nº 74135/RS, 4ª Turma do STJ, Rel. Min. Aldir
Passarinho Júnior. j. 07.11.2000, Publ. DJU 11.12.2000, p. 205; Apelação Cível nº 0303647-1/2000, 2ª
Câmara Cível do TAMG, Juiz de Fora, Rel. Juiz Nilson Reis. j. 31.10.2000, unânime.
35
aqueles que não tiverem pleno discernimento. O maior de dezesseis
anos pode testar, sem necessidade de assistência de responsável. A
capacidade é aferida no momento do ato, estando indene de
considerações ulteriores, seja para invalidar o que validamente foi
estabelecido, seja para validar atos de incapaz.
Continuam defesos os testamentos conjuntivos, sejam
simultâneos,21
recíprocos22
ou correspectivos.23
2.11 Testamentos em espécie
O código vigente contempla seis espécies de testamentos
mais o codicilo. As formas ordinárias são o público, o cerrado e o
particular. As formas especiais são o aéreo, o marítimo e o militar.
No testamento público, foram reduzidas as formalidades. O
número de testemunhas foi reduzido de cinco para duas. Há expressa
menção à possibilidade de que o testador faça consulta a minuta,
notas ou apontamentos.24
Não mais foi repetida disposição do teor da
que constava do artigo 1.634, segundo a qual o oficial deveria
certificar, sob pena de nulidade, a observância de todas as
formalidades. Efetivamente tratava-se de um excesso de formalismo
que a nada conduzia.
21 Consoante já assentou o STJ: "Embora presente a divergência doutrinária e jurisprudencial sobre se nula
ou anulável a venda de ascendente para descendente, nos termos do art. 1.132 do Código Civil, o certo é
que a disciplina do novo Código, no art. 496, prestigiou a corrente que considera anulável o negócio..."
(Recurso Especial nº 407123/RS (2002/0008996-0), 3ª Turma do STJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes
Direito. j. 26.06.2003, DJU 01.09.2003, p. 278). 22 Trata-se da ação que visa a complementação da área. 23 É a ação que visa o abatimento no preço em vista da área vendida ser menor. 24 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 3ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 798.
36
No testamento cerrado, também houve redução do número de
testemunhas de cinco para duas. Poderá ele agora, ser confeccionado
por meio mecânico (e eletrônico, embora não o diga a lei),
condicionado, nesta hipótese, à numeração e autenticação de todas as
páginas com assinatura (não rubrica).
No testamento particular as testemunhas foram reduzidas de
cinco para três (art. 1.876, § 1º). O meio mecânico (e o eletrônico) de
escrita é admitido, mas neste último caso, não poderá conter rasuras
ou espaços em branco.
Quanto aos codicilos, nada foi alterado. Nos testamentos
especiais, foi acrescido o testamento aeronáutico. No testamento
marítimo foi suprimida a menção ao escrivão de bordo, permanecendo
somente o comandante. Quanto às testemunhas, que são duas, não são
preferencialmente passageiros, como antes mencionava o revogado
código. A forma a ser utilizadas será a do testamento público ou
cerrado. O testamento aeronáutico é feito perante pessoa designada
pelo comandante da aeronave, observadas as disposições do
testamento marítimo. As invalidades específicas e motivação de
caducidade formam mantidas nos mesmos termos do revogado C.C.
Também foi mantida integralmente a disciplina do testamento militar.
2.12 Das disposições testamentárias
Nas disposições testamentárias notamos poucas
modificações. Nas causas de nulidade, foi inserido o inciso V, que se
reporta às pessoas mencionadas nos artigos 1.801 e 1.802.25
25 DINIZ, Maria Helena.. Op. Cit., p.799.
37
O artigo 1.909 diz anuláveis as disposições decorrentes de
erro, dolo ou coação. Qualquer negócio nestas condições seria
passível de anulação. O prazo para pleitear-se é de quatro anos,
contados do conhecimento do interessado. Quando houver
interligação entre as disposições, de modo que a existência de uma
esteja associada a outra ou outras, a nulidade se comunica, não de
forma direta, mas como elemento que suprime uma condição de
eficácia de outra disposição.
Na cláusula de inalienabilidade houve modificação. Primeiro,
o artigo 1.910, caput, estabelece que a inalienabilidade decorre de ato
de liberalidade implica, ipso facto, impenhorabilidade e
incomunicabilidade. Segundo, as hipóteses de alienação, precedida de
autorização judicial, passam a ser a desapropriação e a venda por
conveniência do donatário, estipulando-se para a hipótese a sub-
rogação no produto.26
A temática da redução das disposições testamentárias, em
vista de sua adequação diante da parte disponível, foi integralmente
mantida em conformidade ao que preconizavam os artigos 1.726 a
1.728 do revogado código, com alterações de disposições ou
distribuição apenas.27
2.13 Direito de acrescer entre herdeiros
No que tange aos legados, além de algumas mudanças de
redação, observamos pequenas mudanças de conteúdo em alguns
26 Por força do art. 4º do Decreto nº 22.626/33 e da Súmula nº 121/STF, a capitalização de juros era vedada,
salvo expressa previsão legal, como ocorre, ad exemplum, nas cédulas de crédito rural e industrial. 27 DINIZ, Maria Helena. Op. Cit., p. 801.
38
temas específicos. É o caso do legado de coisa alheia, que, segundo o
código revogado, era nulo se a coisa legada não fosse do testador no
momento da abertura da sucessão. Consoante o artigo 1.912, a sanção
é a ineficácia. O artigo 1.916 passa a trabalhar com o conceito de
ineficácia quando o legado existir em quantidade inferior. O diploma
revogado equivocadamente mencionava o termo valer, confundindo os
planos da validade e eficácia.
Nos efeitos dos legados, a redação do código vigente é mais
clara, mas a estruturação é a mesma, ou seja, a estipulação do legado
transfere desde a abertura da sucessão a propriedade da coisa legada,
carecendo, porém, o legatário de pedir sua imissão na posse. O direito
de petição da posse não poderá ser exercido enquanto se litigue sobre
o testamento ou pendente condição ou termo.28
Igualmente pertencem
aos legatários os frutos desde a abertura da sucessão.
A execução dos legados pode ser procedida pelos herdeiros,
e, não os havendo, pelos próprios legatários, na proporção do que
herdaram. As hipóteses de caducidade foram mantidas nos exatos
termos do que preconizava o artigo 1.708 do revogado código.
No direito de acrescer, a redação do artigo 1.941 condensa a
redação dos artigos 1.710 e 1.712 do revogado código, de modo que
na impossibilidade de aceitação ou frente à renúncia do herdeiro, seu
quinhão passará aos demais herdeiros instituídos pela mesma
disposição testamentária, salvo o direito de eventual substituto. Não
28 Ad exemplum, cita-se o Recurso Extraordinário nº 344585/RS, 1ª Turma do STF, Rel. Min. Moreira Alves.
j. 25.06.2002, unânime, DJU 13.09.2002, p. 85, com a seguinte ementa: "Alienação fiduciária em garantia.
Prisão civil. Esta Corte, por seu Plenário (HC 72.131), firmou o entendimento de que, em face da Carta
Magna de 1988, persiste a constitucionalidade da prisão civil do depositário infiel em se tratando de
alienação fiduciária em garantia, bem como de que o Pacto de São José da Costa Rica, além de não poder
contrapor-se à permissão do artigo 5º, LXVII, da mesma Constituição, não derrogou, por ser norma
infraconstitucional geral, as normas infraconstitucionais especiais sobre prisão civil do depositário infiel.
Esse entendimento voltou a ser reafirmado, também por decisão do Plenário, quando do julgamento do RE
206.482. Dessa orientação divergiu o acórdão recorrido. Recurso extraordinário conhecido e provido".
39
operado o direito de acrescer, a cota é deferida aos herdeiros
legítimos.
Particularidade inserida pelo artigo 1.945 reside no fato de
que o beneficiário do direito de acrescer não pode repudiar o
acréscimo separadamente da herança ou legado, salvo se presentes
encargos no acréscimo, quando então, uma vez recusado, será
deferido a quem o encargo foi instituído.
2.14 Deserdação e substituições
Qualificam-se as substituições em vulgares e recíprocas,
encampando expressamente conceitos assinalados pela doutrina. A
substituição vulgar se dá quando um herdeiro ou legatário é
estipulado para suceder no lugar de outro, que não quer ou não pode
aceitar a herança ou legado. Na substituição recíproca, dois ou mais
herdeiros ou legatários são estabelecidos como substitutos uns dos
outros.
Já a substituição fideicomissária é uma espécie de
propriedade restrita e resolúvel na qual um herdeiro ou legatário
recebe a herança ou legado com condição de transmissão a terceira
pessoa (o fideicomissário) por ocasião de sua morte (dele, o
fiduciário). Inovando, o artigo 1.952 determina que a substituição
fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao
tempo da morte do testador. Ao mesmo tempo, o parágrafo único do
mesmo artigo diz que se ao tempo da morte do testador já houver
40
nascido o fideicomissário adquirirá ele a propriedade, convertendo-se
o fideicomisso em usufruto em benefício do fiduciário.
Também estabelece disciplina diversa do código anterior o
artigo 1.950 que estipula que salvo disposição em contrário do
testador, se o fiduciário renunciar a herança ou o legado, defere-se ao
fideicomissário o poder de aceitar. Foram mantidas a vedação de
fideicomisso de segundo grau e a validade da instituição em caso de
nulidade da substituição, que não comporta, então, o encargo
resolutório.
Na deserdação, as causas foram mantidas como já previam os
artigos 1.744 e 1.745 do revogado código (art. 1.962 e 1.963), mas foi
inserido o prazo de quatro anos para a prova da causa de deserdação,
que deve ser declinada no testamento. A redação do artigo 1.742 do
revogado código é melhor do que a do artigo 1.964 do atual. Esta
última dá a impressão de que pode haver outras formas de deserdação
além do testamento.29
Obviamente que se estamos falando em prova da causa, há
necessidade de processo judicial.
2.15 Revogação, rompimento e testamenteiro
A tratativa da revogação e rompimento do testamento
alterou-se pouco, com pequenas mudanças de redação. A revogação
29 Posição vista, verbi gratia, no Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 11758/SP (2001/0099260-0), 3ª
Turma do STJ, Rel. Min. Castro Filho. j. 18.09.2001, Publ. DJU 29.10.2001, p. 199, cuja ementa é a
seguinte: "Recurso de habeas corpus. intempestividade. constrangimento ilegal - apreciação de ofício.
prisão civil. alienação fiduciária. - Intempestivo é o recurso interposto após o qüinqüídio previsto pelo art.
30 da Lei nº 8.038/90. II - O constrangimento ilegal à liberdade é apreciável de ofício, sendo irrelevante o
trânsito em julgado da sentença ou do acórdão (art. 30 da Lei 8.038/90 e 203, II, do RISTJ). III - Segundo
o entendimento do STJ, não cabe a prisão civil do devedor que descumpre contrato garantido por
alienação fiduciária (Corte Especial, ERESSP 149.518). Recurso não conhecido. De ofício, ordem
concedida."
41
continua a poder ser parcial ou total, persistindo o testamento anterior
em caso de revogação parcial ou de inexistência de cláusula
revogatória expressa.
Também continua a operar a revogação levada a efeito por
testamento válido que venha a caducar por exclusão, incapacidade ou
renúncia.
A ruptura igualmente continua a realizar-se na
superveniência de herdeiro necessário ou na ignorância de sua
existência, mas não tem vez se não foi ultrapassada a metade
disponível e o testador não contempla herdeiros necessários de que
tem conhecimento ou que sejam excluídos.
Quanto ao testamenteiro, o prazo para cumprimento do
testamento e prestação de contas é de cento e oitenta dias, prorrogável
em caso de necessidade. A execução do testamento, em falta de
determinação de testamenteiro, cabe aos cônjuges, e não mais ao
―cabeça do casal‖.30
30 Esta é uma modalidade que tem grande penetração no comércio de veículos, buscando-se evitar que o
alienante, pessoa física ou jurídica que tem como atividade negocial a venda de veículos tenha de fazer
múltiplas transferências administrativas quando da compra e venda.
CAPÍTULO III
INVENTÁRIOS E PARTILHAS: PRAZO PRESCRICIONAL
Chama-se espólio o conjunto dos bens que constitui a
herança, desde a morte do de cujus até a partilha.
O inventário constitui processo contencioso, ainda que as
partes sejam capazes e estejam de acordo (CPC, art. 982). A partilha,
porém, entre maiores e capazes, pode constituir procedimento de
jurisdição voluntária, com homologação judicial da vontade dos
interessados (CPC, arts. 1.029 e 1.031; Código Civil, art. 2.015).
Há adjudicação, em vez de partilha, no caso de herdeiro
único. Há transmissão da herança, falecendo um dos herdeiros, antes
da partilha.31
Dispensa de inventário (CPC, art. 1.037 c/c Lei
6.858/1980)32
, também chamado de inventário negativo, embora sem
31 MARCATO, Antônio Carlos. Procedimentos especiais. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. p.
123-162. 32 LEI Nº 6.858, DE 24 DE NOVEMBRO DE 1980 Dispõe sobre o pagamento, aos dependentes ou sucessores, de valores não
recebidos em vida pelos respectivos titulares. Art 1º Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das
contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos, em vida
pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da
legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial,
independentemente de inventário ou arrolamento. § 1º As quotas atribuídas a menores ficarão depositadas em caderneta de
poupança, rendendo juros e correção monetária, e só serão disponíveis após o menor completar 18 (dezoito) anos, salvo autorização
do Juiz para aquisição de imóvel destinado à residência do menor e de sua família ou para dispêndio necessário à subsistência e
educação do menor. § 2º Inexistindo dependentes ou sucessores, os valores de que trata este artigo reverterão em favor,
respectivamente, do Fundo de Previdência e Assistência Social, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou do Fundo de
Participação PIS-PASEP, conforme se tratar de quantias devidas pelo empregador ou de contas de FGTS e do Fundo PIS-PASEP.
Art 2º O disposto nesta Lei se aplica às restituições relativas ao imposto de renda e outros tributos, recolhidos por pessoa física, e, não
existindo outros bens sujeitos a inventário, aos saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento de
valor até 500 (quinhentas) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional. Parágrafo único. Na hipótese de inexistirem dependentes
sucessores do titular, os valores referidos neste artigo reverterão em favor do Fundo de Previdência e Assistência Social. Art 3º. Esta
Lei entrará em vigor na data de sua publicação. Art 4º Revogam-se as disposições em contrário.
43
previsão legal, é adotado, quando necessário, em casos como o de
viúvo que deseje contrair novas núpcias (Código Civil, art. 1.523, I),
ou de herdeiro que receie responsabilidade além das forças da herança
(Código Civil, art. 1.792).
O prazo para a abertura e ultimação do inventário e partilha é
de 60 dias e 12 meses, respectivamente (CPC, art. 983). É de multa a
sanção para a inobservância desses prazos. Sendo esta de 10% da
abertura e 20% se ultrapassar o prazo de ultimação, sob o imposto
mortis causa. ―Não é inconstitucional a multa instituída pelo Estado-
membro, como sanção pelo retardamento do início ou da ultimação
do inventário‖ (Súmula 542 do STF).
Questões de alta indagação. Entendem-se como tais as que
demandam a produção de prova oral. Não são decididas no inventário,
mas em processo próprio (CPC, art. 984).
Compete ao administrador provisório a administração da
herança, até que o inventariante preste o respectivo compromisso
(Código Civil, art. 1.797). Este quando intimado da nomeação, deve
prestar o respectivo compromisso, no prazo de 5 dias (CPC, art. 991),
incumbindo-lhe, desde então, a administração do espólio (CPC, art.
991, II). O inventariante pode ser removido, nos casos do ar tigo 995
do CPC.
Prestação do compromisso de inventariante (CPC, art. 990,
parágrafo único). Primeiras declarações (CPC, art. 993). Citação dos
interessados (CPC, art. 999). Possível impugnação das primeiras
declarações, no prazo comum de dez dias (CPC, art. 1.000).
Nomeação de perito para avaliar os bens do espólio, não
havendo na comarca avaliador judicial (CPC, art. 1.003); dispensa-se
a avaliação no caso do art. 1.007 do CPC. Entregue o laudo, vista às
partes, pelo prazo de 10 dias (CPC, art. 1.009). Aceito o laudo ou
44
resolvidas as impugnações, seguem-se as declarações finais (CPC, art.
1.012). Cálculo do imposto (CPC, art. 1.012).
Vista às partes e à Fazenda Pública (CPC, art. 1.013).
Julgamento do cálculo (CPC, art. 1.013). Procedimento da partilha
(judicial). Vista às partes, pelo prazo de dez dias, para formularem
seus pedidos de quinhão (CPC, art. 1.002).
Despacho de deliberação da partilha e determinação, ao
partidor, para organizar o esboço da partilha (CPC, art. 1.023).
3.1 Partilha amigável nos autos de inventário
Sendo capazes todos os herdeiros, é possível partilha
amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou
escrito particular, (Código Civil, art. 2.015).
O juiz homologa a partilha, seguindo-se, após seu trânsito em
julgado, a entrega, aos herdeiros, dos formais de partilha (CPC, art.
1.027). Havendo um único herdeiro, expede-se carta de adjudicação.
Na petição inicial os herdeiros indicam o inventariante, declaram os
títulos dos herdeiros e os bens do espólio, com o valor respectivo
(CPC, art. 1.032), bem como o quinhão de cada herdeiro.
Independentemente de termo de compromisso pelo inventariante33
e
de avaliação, paga a taxa judiciária e o imposto de transmissão, e
juntas aos autos as negativas fiscais, o juiz homologa a partilha.
Segue-se a entrega dos formais de partilha aos herdeiros, ou da carta
de adjudicação, havendo um único herdeiro.
33 MARCATO, Antônio Carlos. Op. cit., p.149.
45
3.2 Ação anulatória de partilha amigável
A partilha amigável tem a natureza de negócio jurídico,
sendo, por isso mesmo, anulável nos mesmos casos em que o são os
negócios jurídicos em geral, ou seja, nos casos de erro substancial,
dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores. A ação
anulatória de partilha amigável sujeita-se ao prazo decadencial de 1
ano (Código Civil, art. 2.027).
Quanto ao relativamente incapaz, conta-se o prazo do dia em
que cessar sua incapacidade. Assim dispõe o CPC (art. 1.029,
parágrafo único, inciso III), sem, contudo, fazer distinção entre o
relativamente e o absolutamente incapaz). É bem de ver, porém, que
negócio jurídico celebrado por absolutamente incapaz não é anulável,
mas nulo.
Partilha amigável nula. É nula a partilha nos casos do artigo
166 do Código Civil. A nulidade pode ser decretada por ação própria,
ou incidentemente, a requerimento de qualquer interessado ou do
Ministério Público (Código Civil, art. 168). O negócio jurídico nulo
não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do
tempo (Código Civil, art. 169).34
34 MARCATO, Antônio Carlos. Op. cit. Sustenta, a meu ver equivocadamente, o cabimento de ação
rescisória, no caso de partilha amigável celebrada por absolutamente incapaz. Haveria, então,
convalidação do ato pelo decurso do prazo para a propositura dessa ação, o que não se compatibiliza, a
meu ver, com a natureza do negócio jurídico celebrado, que é nulo, e não apenas anulável (ou rescindível).
46
3.3 Ação rescisória de sentença de partilha
Julgada a partilha por sentença, cabe ação rescisória, no
prazo de 2 anos, nos casos do artigo 1.030, do CPC. Supõe-se, no caso
do inciso III, que o herdeiro preterido tenha sido parte no processo.
A sentença proferida em processo de inventário e partilha
não é oponível ao herdeiro que nele não foi parte. Assim, as ações
cumuladas, de investigação de paternidade e de petição de herança,
julgadas procedentes, acarretam, ipso jure, a nulidade da partilha
anteriormente realizada, salvo se, nos termos da Súmula 149 do
STF35
, decorreu o prazo prescricional para a propositura da ação de
petição de herança, que é de 10 anos, nos termos do artigo 205 do
Código Civil.
―Se o herdeiro não participou do
inventário, parte nele não foi; logo,
contra ele não há coisa julgada. E,
inexistindo coisa julgada em relação a
ele, não se pode cogitar de ação
rescisória. Em tal situação, própria é a
‘ação de petição de herança’ ou ‘de
nulidade’, com prescrição em vinte
anos.‖36
Decidiu o Superior Tribunal que Justiça que, julgada
procedente ação de investigação de paternidade, cumulada com
petição de herança, disso resulta, automaticamente, a nulidade da
partilha realizada sem a presença e participação do autor vitorioso,
executando-se a decisão por meio de simples retificação de partilha,
35 É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança. 36 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Ação Rescisória: Apontamentos. Ajuris, Porto Alegre, (46): 212-35,
jul. 89.
47
uma vez que a sentença homologatória de partilha não faz coisa
julgada em relação ao herdeiro não convocado ao processo de
inventário.
Com apoio em lição de Humberto Theodoro Júnior, o mesmo
afirmou que, havendo anteriormente sido contemplados na partilha
vários herdeiros ou sendo vários os bens componentes da herança
partilhada, a sentença da petitio hereditatis será cumprida mediante
reabertura do processo sucessório, para que toda a universalidade seja
devolvida ao monte que, por sua vez, se submeterá novamente a toda
a tramitação do inventário e partilha, já agora com a presença e
participação do herdeiro vitorioso na ação de vindicação da cota ideal
da herança comum.37
Para a renovação do procedimento sucessório, não há
necessidade de ajuizar-se uma ação especial para anular a sentença
que homologou a partilha anterior já que proferida sem a presença do
herdeiro real, jamais produziu contra ele a res iudicata.38
3.4 A nova Lei n. 11.441/07
Foi publicada no dia 5 de janeiro de 2007, já entrando em
vigor nesta data, a Lei n. 11.441/07, que traz inovações na realização
de inventários, partilhas, separações consensuais e divórcios
consensuais.
A partir dessa nova lei, inventários, partilhas, separações e
divórcios consensuais, podem ser feitos administrativamente, desde
37 THEODORO, Humberto. Op. cit., p. 245. 38 BRASÍLIA, STJ. 4ª Turma, Recurso Especial nº 16.137-0-SP, Ministro Sálvio de Figueiredo, relator,
21.2.95. RSTJ - v. 74 - Outubro 1995 - Ano 7 - p.204.
48
que observadas as condições expressas na nova lei. O inventário e a
partilha poderão ser feitos administrativamente se não houver
testamento e os interessados forem capazes e estiverem concordes
(nova redação do art. 982, CPC).
Já a separação e o divórcio consensuais exigem que não haja
filhos menores ou incapazes, além de deverem ser observados os
requisitos legais quanto aos prazos (art. 1.124-A, acrescido pela lei ao
CPC). Não será necessária a homologação judicial da escritura de
separação ou de divórcio.
A nova lei exige a participação do advogado nos atos
tratados por ela que ainda não sejam praticados no Poder Judiciário.
Parece que a questão dos honorários advocatícios deve ficar
inalterada.
Ainda é possível escolher o processo judicial de separação
consensual ou de divórcio consensual, mesmo presentes as condições
previstas na nova lei. O Poder Judiciário pauta-se, ao prestar o serviço
da jurisdição, pelos princípios da necessidade e da adequação. Se uma
questão pode ser resolvida administrativamente, já não é necessária a
prestação jurisdicional. E a nova lei veio adequar algumas situações
nela previstas em outro âmbito, diverso do âmbito judicial.
Os procedimentos vão tornar mais simples e menos onerosos a
partilha amigável de herança, por exemplo. A lei aprovada vai contribuir
para a redução do número de processos enviados ao Judiciário, abrindo
espaço para resolução de reais conflitos. Ao mesmo tempo o prevê-se um
mecanismo rápido, seguro e eficiente para a regularização de situações em
que não existe conflito entre as partes.
49
A lei aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça é
parte do "Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e
Republicano", documento firmado entre os representantes dos três
poderes e que contém as principais propostas e diretrizes destinadas à
melhoria do sistema de Justiça brasileiro.
3.5 Direito intertemporal
O art.4º da Lei n. 11.441/07 estabeleceu sua vigência a partir
da data da sua publicação, ocorrida em 05.01.2007.
Assim, desde 05.01.2007 os interessados têm à disposição a
possibilidade de proceder por meio de escritura pública extrajudicial o
inventário, separação e divórcio consensuais, se adequados às normas
da Lei n. 11.441/07.
Os interessados em condições de utilizar as premissas da
novel legislação, mas que estejam em curso processo judicial
pendente para alcançar idêntico propósito, terão de primeiramente
obter sentença homologatória de desistência deste processo sem
julgamento do mérito (CPC, art. 267, VIII). Transitada em julgado a
sentença homologatória da desistência, por não ter emergido qualquer
efeito jurídico, possível aos interessados buscarem seus intentos por
meio da escritura pública.
50
3.6 Arrolamento
O arrolamento é um procedimento simplificado do inventário
e partilha. É admissível nos seguintes casos:
a) os herdeiros optam pela partilha amigável - Arrolamento
Sumário; ou
b) o valor dos bens do espólio é igual ou inferior a 2.000 OTNs
(Obrigações do Tesouro Nacional) – Arrolamento Comum.
3.6.1 Procedimento do arrolamento sumário (arts. 1032 a
1035/CPC)
3.6.1.1 Inicial
Os herdeiros apresentarão a inicial instruída com certidão de
óbito e do comprovante de recolhimento das custas.
3.6.1.2 Nomeação do Inventariante
Os próprios herdeiros indicarão o inventariante, que estará
dispensado de prestar compromisso. A Fazenda Pública e o Ministério
Público serão cientificados.
51
3.6.1.3 Partilha ou Adjudicação dos Bens
Após a nomeação do inventariante, será apresentada a
partilha amigável ou o pedido de adjudicação dos bens quando houver
um único herdeiro.
3.6.1.4 Homologação da Partilha ou da Adjudicação
Provada a quitação dos tributos, deverá o juiz homologar a
partilha ou a adjudicação, mandando expedir-se o formal ou carta e,
em seguida, o arquivamento dos autos.
3.7 Procedimento do arrolamento comum (art. 1036/CPC)
3.7.1 Inicial
A petição inicial deverá preencher os requisitos do art. 993
do Código de Processo Civil e instruída com a certidão de óbito e
comprovante de recolhimento das custas.
3.7.2 Nomeação do Inventariante
O inventariante será nomeado dentre as pessoas indicadas no
art. 990 do CPC, dispensado o compromisso.
52
3.7.3 Primeiras Declarações
O inventariante apresentará suas declarações no prazo de 20
dias, contados da nomeação. As primeiras declarações versarão sobre
o valor dos bens do espólio, o plano de partilha e, se houver, inclusão
de herdeiro.
3.7.4 Citação dos Interessados
Os interessados serão citados e o Ministério Público e a
Fazenda Pública intimados para manifestarem sobre as declarações.
3.7.5 Manifestação sobre as Primeiras Declarações
Impugnada a estimativa do valor dos bens do espólio, deverá
o juiz nomear avaliador para que apresente laudo no prazo de 10 dias.
Se na impugnação das primeiras declarações as partes apresentarem
questões de alta indignação, o juiz remeterá os interessados às vias
ordinárias (Ex.: impugnação do plano de partilha, pagamento de
dívidas, inclusão de herdeiros).
3.7.6 Sentença
Provada a quitação dos tributos, deverá o juiz proferir
53
sentença, julgando a partilha ou a adjudicação e determinará, após
trânsito em julgado, a expedição do formal de part ilha ou carta de
adjudicação; arquivando-se em seguida os autos. DN.
3.8 Disposições finais e transitórias
Sempre que ocorrem transições legislativas envolvendo
códigos, há o estabelecimento do que se chama direito inter -temporal.
Estas disposições têm por finalidade regular a transição entre os
códigos, disciplinando as relações jurídicas concebidas em um regime
e destinadas a surtir seus efeitos na seguinte.
O artigo 2.028 inicia por tratar dos prazos, determinando que
quando houver redução pelo código vigente, valerá o estabelecido no
código revogado. Igual condição ocorrerá quando, embora não
reduzido o prazo, na data da entrada em vigor do novo código já tenha
transcorrido mais da metade do prazo.
Os regimes de bens do código anterior continuam a regular
os casamentos na sua vigência celebrados (art. 2.039), princípio que é
seguido também no tocante a sucessões abertas antes do novo código
no que pertine à vocação hereditária. Mas no caso da cláusula de
inalienabilidade, cuja utilização é restringida pelo artigo 1.848, se a
sucessão foi aberta até um ano da vigência do novo código, aplicar -
se-á este dispositivo, podendo o testador declinar neste prazo a justa
causa lá mencionada (art. 2.042).
CAPÍTULO IV
O INSTITUTO DA COLAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
4.1 Noções Gerais
O procedimento por meio do qual os herdeiros necessários
restituem à herança os bens que receberam em vida do de cujus denomina-se
colação.
Nosso ordenamento não afastou, com a edição do Código Civil de
2002, o princípio da igualdade dos quinhões hereditários o qual vem expresso
através do artigo 1846.39
Conforme ensina Maria Beatriz Perez Câmara:
"Neste sentido, presume-se que as doações e
vantagens feitas em vida pelo ascendente aos
seus herdeiros necessários são antecipações
das respectivas quotas hereditárias, ou seja,
adiantamento das legítimas, que devem
reverter ao acervo.‖40
Já nos primórdios do direito romano a colattio tinha por
fundamento a busca da igualdade social. Segundo Zeno Veloso, há parecer
generalizado entre a doutrina no sentido de que a colação se baseia na
39 Artigo 1846 CCB – Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança,
constituindo a legítima. 40 GUIARONI, Regina e outros. Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2004, p. 335.
55
vontade presumida do de cujus de não estabelecer uma desigualdade
sucessória.41
O étimo colação é proveniente do latim co + latio, que significa
ajuntamento, encontro, do supino collatum do verbo conferre (reunir, trazer,
ajuntar, agregar).42
Ney de Mello Almada arrola como requisitos do instituto: a)
doação feita pelo de cujus em favor dos descendentes; 1) ostentar o
descendente tal qualidade no momento da abertura da sucessão; 2) defender a
liberalidade a igualdade das legítimas; 3) concorrer à herança pluralidade de
descendentes do mesmo grau; 4) não ter havido dispensa pelo doador.43
4.2 Natureza jurídica
Almada refere que três correntes se apresentam quanto a natureza
jurídica da colação:
"A primeira, devida a Cicu, entrevê um estado
de sujeição do colacionante; outra, divisa na
colação uma obrigação (Goyena Copello); há
quem identifique no instituto uma carga
(Messineo); finalmente, uma situação jurídica
(Barbero)."44
A colação é uma obrigação exigível legalmente entre os herdeiros
necessários, quer dizer daqueles que tenham uma porção hereditária garantida
pela lei e da qual o autor da herança não pode privá-los, senão através de
deserdação.
41 VELOSO, Zeno. Comentários ao Código Civil – vol 21, São Paulo, 2003, p. 406. 42 FERREIRA, Pinto. Inventário, Partilha e Ações de Herança. 2ed. São Paulo. p. 83. 43 ALMADA, Ney de Mello. Direito das Sucessões. São Paulo: Brasiliense, 2001, v.2. p. 367. 44 Idem, p. 368.
56
Presume, historicamente, duas finalidades:
- a presunção de vontade do autor da herança de não beneficiar a mais,
- a igualdade entre todos os herdeiros necessários.
É, enfim, a devolução, pelos herdeiros necessários, ao acervo
hereditário dos bens recebidos por doação, quando ainda em vida, do autor da
herança, para inclusão na partilha, a fim de que esta se realize dentro da
maior igualdade possível.
4.3 Previsão legal e abrangência
O instituto da colação vinha definido pelo artigo 1786 do Código
Civil de 1916 como sendo:
"O ato mediante o qual o co-herdeiro, para
assegurar a igualdade das legítimas dos
demais, devolve à massa hereditária, em
espécie ou em valor, as doações ou dotes com
que foi contemplado pelo autor da herança".45
Conforme ensina Arnaldo Rizzardo, não se objetiva encontrar
aquilo que poderia dispor o falecido. Não se leva à colação, em outras
palavras, unicamente aquilo que excedeu o montante disponível, mas tudo o
que constituiu objeto de doação.46
No entanto, com a previsão contida no artigo 544 do Código Civil
em vigor, a abrangência do instituto restou alterada, alcançando, agora, o
45 ALMADA, Ney de Mello. Op. cit., p. 371. 46 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Aide, 1996, p. 629
57
cônjuge quando este se apresenta na qualidade de concorrente (artigo 1832
CC).47
Ora, o referido artigo considera como antecipação da legítima
(adiantamento de herança) além das doações de ascendentes para
descendentes, ainda, as doações de um cônjuge ao outro. No direito anterior,
o adiantamento da legitima restringia-se somente as doações de pais para
filhos.
Entende-se que outra não foi a intenção do legislador, pelo que se
pode extrair da leitura dos artigos 544 e 200348
, em estabelecer a obrigação
do cônjuge de conferir os bens recebidos por adiantamento de herança. O
Projeto de Lei nº 6960/2002, apresentado pelo Deputado Ricardo Fiuzza
prevê, expressamente, a obrigação de colacionar os bens recebidos em
doação de seu consorte.
Assim, não se pode aceitar a interpretação realizada no sentido de
que em não havendo determinação expressa de que o cônjuge deva colacionar
esteja o mesmo dispensado de fazê-lo, isto porque o instituto exige a dispensa
expressa. Ademais, se o cônjuge é herdeiro necessário e se recebeu doação
em vida, concorrendo com outros herdeiros necessários deverá,
obrigatoriamente, colacionar sob pena de, em não o fazendo, ferir o princípio
maior do instituto da colação qual seja, o da maior igualdade da legítima dos
herdeiros necessários.
O resultado da colação sempre importará em aumento na parte
correspondente a legítima, isto é, a conferência por parte dos herdeiros
47 Artigo1832 CCB – Em concorrência com os descendentes (artigo 1829, inciso I) caberá ao cônjuge
quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior a quarta parte da
herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer. 48 Artigo 544 CCB. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa
adiantamento do que lhes cabe por herança.
Artigo 2003 CCB. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida neste Código, as legítimas dos
descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo do falecimento do
doador, já não possuírem os bens doados.
Parágrafo único. Se, computados os valores das doações feitas em adiantamento de legítima, não houver no
acervo bens suficientes para igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge, os bens assim doados serão
conferidos em espécie, ou quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valor ao tempo da liberalidade.
58
necessários não importará aumento da herança e sim, apenas da legítima dos
herdeiros necessários.
Como bem assevera Maximiliano:
"A colação não traz o bem para o espólio,
nem aumenta a parte disponível do testador.
As liberalidades já feitas em vida constituem
negócios jurídicos perfeitos e que já
produziram seus efeitos legais. Por
conseguinte, os frutos dos bens doados não
são objeto de colação, pertencem ao
donatário."49
Que, por certeza, não deverá restituir tais valores ao monte.
Cabe, ainda, ser destacado o fato de que em não sendo aumentada
a parte disponível, não poderão os eventuais credores, seja do "de cujus", seja
do espólio, exercer qualquer pretensão quanto ao referido bem colacionado.
Conforme já salientado, a doação é negócio jurídico perfeito, de eficácia
imediata. Logo, não pertence tal bem ao acervo e não poderá nele ser
computado. A doação deverá "voltar" apenas para a efetiva composição da
legítima. Assim, se o falecido na data da abertura não possuía herança para
deixar a seus herdeiros, mas, no entanto, havia doado um bem a um de seus
filhos, tal valor deverá ser conferido apenas para que os herdeiros necessários
concorrentes possam dividir de igual forma a legítima sem prejuízo a
qualquer deles. Logo, como não há um aumento da parte disponível, como
não há herança, os credores não poderão exercer qualquer pretensão quanto
aos valores trazidos pelo herdeiro beneficiado em vida.
O código atual retrocede, quando copia os dispositivos contidos
no Código de 1916 sem atentar ao fato de que o artigo 1014 – parágrafo
49 MAXIMILIANO, Carlos. Direito das Sucessões. 2ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1987. p.388.
59
único do CPC50
de 1973, preocupando-se em efetivamente atingir o fim do
instituto, previu que o valor trazido a colação fosse àquele atribuído ao bem
quando da abertura da sucessão. E, em momento posterior, o próprio STF
entendeu que além de ser o valor o da abertura da sucessão deveria ser
corrigido monetariamente à data do inventário.
4.4 Objeto
É considerado objeto da colação o valor das doações51
que o
herdeiro necessário tenha recebido, em vida, do autor da herança (artigo
2002).52
Há, na doutrina, quem apresente distinção entre atos a título gratuito
e liberalidades (Serpa Lopes).53
Entendendo que nas liberalidades existe,
necessariamente, a translatividade de um bem ou de um direito real sobre um
bem, configurando-se o enriquecimento do donatário e o empobrecimento do
doador.
Assim, em nosso ordenamento são colacionáveis doações feitas
(conforme artigo 2002 pelos ascendentes aos descendentes) aos herdeiros
necessários (deverá ser inclusa a figura do cônjuge), as dívidas pagas pelo
autor da herança, as doações indiretas ou simuladas. As quantias adiantadas
para que o descendente adquira coisas (cumprindo seja colacionado apenas a
soma, e não os bens com ela adquiridos), os rendimentos de bens do pai
desfrutados pelo filho; somas não módicas, dadas de presente; perdas e danos
pagos pelo pai como responsável pelos atos do menor, ou quaisquer
50 Artigo 1014 CPC. 51 A doação pura e simples implica em uma atribuição patrimonial de bens, imóveis ou móveis, corpóreos ou
incorpóreos, ou vantagens patrimonialmente válidas. – Artigo 538 CCB – Considera-se doação o contrato
em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. 52 Artigo 2002 CCB – Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados,
para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam sob pena de sonegação. 53 LOPES, Serpa. Curso de Direito Civil. V.3, p. 385.
60
indenizações ou multas; dinheiro posto a juros pelo pai em nome dos filhos;
pagamento consciente de uma soma não devida ao legitimário; pagamento de
débitos ou fianças ou avais do filho; quitação ou entrega de título de dívida
contraída pelo filho para com o pai; remissão de dívida.54
No entanto, o que se faz de difícil realização prática é a prova por
parte daquele herdeiro que pretenda exigir a colação de tais doações
"indiretas". Não nos parece crível que fique, o pretenso herdeiro, ao logo de
uma vida, realizando apontes daquilo que, para exemplificar de forma mais
esclarecedora, seu irmão tenha recebido do pai, de forma isolada, e que este
entenda, então passível de exigir futura conferência à legítima. Por isto, por
inúmeras vezes, na realidade, a legítima parece ter alcançado a situação de
igualdade, mas esta não traduz a realidade.
Em sendo nula a doação, mas estando o bem, dela objeto, na
posse do donatário, entender-se-á não excluída a colação, com a
peculiaridade de que, uma vez desconstituída judicialmente a liberalidade,
todo o seu objeto volta ao patrimônio sucessível.
4.5 Bens que não estão sujeitos a colação
A dispensa jamais poderá ser presumida, devendo em cada caso
restar expressa através ou da escritura de doação ou por testamento. A lei
prevê que restarão dispensados da colação os bens que o testador determine
saiam de sua metade disponível. Não poderão, contudo, excedê-la,
computado o seu valor ao tempo da doação. Nestes casos, nada poderá ser
alegado pelos herdeiros concorrentes.
54 ALMADA, Ney de Mello. Direito das Sucessões. São Paulo:. Brasiliense, 2001, v 2, p. 376.
61
Existem, por outro lado, os casos de exclusão legal, previstos no
artigo 2.010 CCB55
afastando a obrigatoriedade quanto aos gastos ordinários
dos descendentes com o ascendente, enquanto menor, na sua educação,
estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval e despesas
de casamento e livramento em processo-crime, de que tenha sido absolvido o
menor.
Tais gastos devem ser entendidos como aqueles inerentes ao pleno
exercício do poder familiar, sendo insuscetíveis de serem considerados como
antecipação de herança.
Afasta a lei, também, as doações remuneratórias em troca de
serviços prestados por não constituírem liberalidades.
As benfeitorias e acessões restam excluídas da necessidade de
conferência, sendo imputadas, ao donatário, igualmente, as perdas e danos
que os bens sofrerem.
Os frutos também não poderão ser objeto da colação sob pena de
enriquecimento por parte daqueles que não contribuiram para que tais frutos
fossem gerados. Ademais, as legitimas somente se atualizam com a morte do
‗de cujus‘.
Não se pode deixar de referir que pecúlios ou seguros de vida não
poderão ser incluídos no objeto da colação, pois não se trata de herança e,
portanto, não são regulados pelas normas de direito sucessório a elas não se
submetendo.
Se houver o perecimento do bem, logicamente sem culpa do
donatário, caso em que a conferência ainda se faria obrigatória, é certo que a
obrigação não persiste porque para o dono também a coisa pereceu.
55 Artigo 2010 CCB - Não virão a colação os gastos ordinários do ascendentes com o descendente, enquanto
menor, na educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval, assim como as
despesas de casamento, ou as feitas no interesse de defesa em processo crime.
62
4.6 Momento da colação
Em sendo a colação uma obrigação legal daquele que se viu
beneficiado com a doação antecipatória, deverá fazê-lo, espontaneamente,
sob pena de ser compelido por meio da competente ação de sonegados (artigo
1992 CCB).56
Isto deverá ocorrer no primeiro momento em que se lhe tornar
possível a manifestação sobre as primeiras declarações (CPC 1014/1000).57
Silenciando o donatário, qualquer herdeiro necessário concorrente poderá
interpelá-lo a fazer.
Conforme bem refere Ney de Mello Almada falta ao
inventariante, que não é herdeiro, legitimidade para exigir a colação uma vez
que "não se inclui essa iniciativa entre seus deveres funcionais, salvo no
tocante aos herdeiros renunciantes, ausente ou excluídos."58
4.7 Valor
A lei civil anterior, em seu artigo 1792, previa que a avaliação
devia remontar à época da data da doação. Já o parágrafo único do artigo
1014 do Código de Processo Civil determina que o cálculo se faça pelo valor
que tiverem os bens ao tempo da abertura da sucessão.
Em obra que analisava o sistema anterior, Arnaldo Rizzardo faz
referência à posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal ao analisar a
56 Artigo 1992 CCB - O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando
estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os
deva levar, ou que deixa de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia. 57 Artigo 1014 CPC – No prazo estabelecido no art. 1000, o herdeiro obrigado à colação conferirá por termo
nos autos os bens que recebeu ou, se já os não possuir, trar-lhe-á o valor.
Parágrafo único – Os bens que devem ser conferidos na partilha, assim como as acessões e benfeitorias que
o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão. 58 19 ALMADA, Ney de Mello. Op. cit., p. 380.
63
matéria, entendendo que a avaliação deva ser àquela ao tempo da abertura da
sucessão devendo os valores serem corrigidos desde então.59
Nelson Nery acosta Enunciado aprovado na Jornada de Direito
Civil promovida pelo centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça
Federal sob os auspícios do STJ, a de nº 119 que dispõe:
"Para evitar o enriquecimento sem causa, a
colação será efetuada com base no valor da
época da doação, nos termos do caput do
2004, exclusivamente na hipótese em que o
bem doado não mais pertença ao patrimônio
do donatário. Se ao contrário, o bem ainda
integrar seu patrimônio, a colação se fará
com base no valor do bem na época da
abertura da sucessão, nos termos do artigo
1014, de modo a preservar a quantia que
efetivamente integrará a legitima quando esta
se constitui, ou seja, na datas do óbito
(Resultado da interpretação sistemática do
CC 2003 e §§, juntamente com o CC 1832 e
844)."60
4.8 Legitimação
Só podem exigir a colação aqueles que dela se beneficiarem, isto
é, aqueles que possam sofrer um decréscimo em sua legitima em face um
concorrente seu ter recebido a mais quando ainda em vida do autor da
herança.
59 RIZZARDO, Arnaldo. Op. cit., p. 640. 60 NERY JR., Nelson. Op. cit., p. 842.
64
Um neto que tenha recebido uma doação do avô não restará
obrigado a colacionar quando da abertura da sucessão daquele se filhos do
falecido existirem, pois com eles não estará concorrendo. No entanto, se não
existirem filhos para herdar, se forem todos pré-mortos e existirem outros
descendentes, também, filhos de outros filhos, neste caso obrigar-se-á aquele
neto beneficiado anteriormente a colacionar para atingir a igualdade da
legítima, isto é, todos chamados a suceder, na qualidade de herdeiros
necessários, deverão receber a herança de forma igualitária eis que sucedem a
título universal.
Caso que não pode deixar de ser abordado é aquele em que os
netos venham a suceder ao avô em representação ao pai, quando então,
necessariamente deverão colacionar, mesmo que sequer tenham
conhecimento sobre a doação que seu pai tenha recebido, isto para que não se
veja ferido o princípio de que os representantes nunca podem receber a mais
do que receberia o representado.
Deverão, igualmente conferir, tanto o renunciante quanto o
excluído da sucessão na parte que exceder, aquela que efetivamente poderiam
receber.
Outro ponto que merece destaque é o de que com a nova
disposição contida no artigo 54461
do CCB, o cônjuge, herdeiro necessário,
quando concorrente, tanto poderá ser compelido a colacionar, bem como
poderá exigir a colação.
Zeno Veloso citando José de Oliveira Ascensão, com propriedade
destaca o fato de se apresentar nossa legislação em idêntica situação ao
Código Civil Português, que pela reforma de 1977 transformou o cônjuge em
herdeiro legitimário (necessário) e fê-lo concorrer com ascendentes e com
61 Artigo 544 CCB - A doação de ascendentes a descendente, ou de um cônjuge a outro, importa
adiantamento do que lhe caiba por herança.
65
descendentes, mas não alterou o artigo 2014 e seguintes que limitam a
colação aos descendentes.62
Após longa incursão sobre o tema acaba por trazer como acertada
a posição adotada pelo Código Civil de Macau, de 1999, que resultou de
compromissos assumidos por Portugal e China e supriu a lacuna existente em
seu modelo, e diferentemente do artigo 2012, I, do Código lusitano, edita no
artigo 1945, I: "os descendentes e o cônjuge sobrevivo que pretendam entrar
na sucessão, respectivamente, do ascendente e do cônjuge devem restituir à
massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes
foram doados pelo falecido: esta restituição tem o nome de colação". Neste
sentido é que entendemos ser ilógica a exclusão do cônjuge da
obrigatoriedade de colacionar. Só se pode aceitar a redação do artigo 2002
como demonstração de um esquecimento do legislador que alterou o artigo
544 e não lhe deu aplicação direta ao artigo 2002. Não seria lógico que o
cônjuge tivesse as doações que lhe forem feitas pelo outro cônjuge como
antecipação da herança sem que isto tivesse algum reflexo em dita herança. A
previsão é corolário lógico, somente se recebe como antecipação aquilo que
se deve colacionar no futuro.
Assim, imagine-se a seguinte hipótese:
"A" casado com "B" tem três filhos deste casamento: 1, 2 e 3.
Separado de "B", "A" casa-se, novamente, com "C" pelo regime de
comunhão parcial de bens. Quando do falecimento de "A", "C", terá direito
de exigir que venham a colação bens que porventura "A" tenha doado em
vida aos filhos 1, 2 e 3, eis que na qualidade de herdeiro necessário
concorrente tem, como os demais, direito a ver uma legítima o mais
igualitária possível.
Carlos Maximiliano refere que enquadram-se no rol daqueles que
devem colacionar, também, os cessionários e qualquer adquirente da herança 62 23 VELOSO, Zeno. Comentários ao Código Civil. v 21. São Paulo, 2003, p.410.
66
havida por descendentes pois ficam subrogados nos direitos e sujeitos às
obrigações deste; são compelidos à colação e podem reclamá-la dos
sucessores legítimos do defunto.63
José Luiz Gavião de Almeida assevera que: o real interesse na
colação só existe quando há concorrência. Assim, entende que apenas alguns
cônjuges estão obrigados a colacionar. Conclui o tema aduzindo que:
"Se a intenção foi a de beneficiar o cônjuge
em maior amplitude quando concorrente com
ascendentes do falecido, a obrigatoriedade de
sempre trazer a colação as doações recebidas
parece apontar para caminho diametralmente
oposto. Em qualquer regime de bens, o
cônjuge que recebe doação é obrigado a levá-
la a colação quando concorre com ascendente
do autor da herança. Mas quando concorre
com descendente do de cujus, momento em
que estes deveriam ser mais bem amparados,
tanto que nem sempre o cônjuge participa da
sucessão, este nem sempre está obrigado à
colação. Embora tenha recebido parcela
considerável da herança, por exemplo
cinqüenta por cento dos bens do falecido
aquele que era casado pelo regime da
comunhão universal, e que por isso não
participa da herança, não leva a colação, os
bens doados, com evidente prejuízo a prole. O
cônjuge, nesse caso, pode não receber a
legítima; a doação, então deveria ser
reputada adiantamento dela,.embora muito
superior ao que recolheria a título de
legítima, fica aparentemente regular. Assim
se concorresse com ascendentes do falecido,
seria obrigado à colação e, com isso, os
63 MAXIMILIANO, CarlosOp. Cit, p. 749.
67
citados ascendentes veriam sua quota
melhorada.‖64
Em que pese os fundamentos adotados pelo ilustre doutrinador,
não se pode concordar com tais assertivas. Em primeiro porque não há que se
falar em colação entre ascendentes, notadamente, entre ascendentes e
cônjuge.
Em segundo, porque não se pode visualizar um prejuízo a prole
como refere o autor quando não se verificar concorrência, caso em que o
cônjuge não estaria obrigado a colacionar. Ora, se não está a concorrer com
os descendentes, sejam comuns ou só do autor da herança, não restará, por
óbvio, obrigado a conferir, até mesmo porque nesta hipótese (da não
concorrência em face do regime de bens adotado pelo casamento) não terá
direito a herança e sim, apenas, a meação. Assim, não haverá que se falar em
igualdade das legítimas.
Por fim, é de se consignar que tal instituto somente terá
aplicabilidade na sucessão legítima, pois na testamentária não se poderá
buscar igualdade, eis que essa modalidade atende exclusivamente à vontade
do autor da herança. E, se tal disposição de vontade ultrapassar a parte que o
mesmo, efetivamente poderia dispor, não caberá a exigência de colação e
sim, por meio da competente ação, requerer a redução das disposições
testamentárias.
4.9 Doação inoficiosa
A doação inoficiosa ocorre quando a disposição do doador
ultrapassa o valor que pode ser doado atingindo, desse modo, a legítima dos
herdeiros.
64 25 ALMEIDA, José Luiz Gavião de. Código Civil Comentado. São Paulo: Atlas,, 2003. v.18, p. 57.
68
A doação que exceder a parte, no momento da liberalidade, de que
o doador poderia dispor em testamento também é nula.
A nulidade atinge ao que ultrapassar o valor doável.
Assim cita o Código Civil: ―Art. 2007. São sujeitas à redução as
doações em que se apurar excesso quanto ao que o doador poderia dispor,
no momento da liberalidade‖.65
A legitimidade ad causam para pleitear a decretação da nulidade
da doação é do próprio doador quando em vida, e após o falecimento do
mesmo, de seus herdeiros necessários. O prazo prescricional para a ação de
redução de doação inoficiosa é de 20 anos.
Com efeito, vem completar o Código de Processo Civil:
―Art. 1.015. O herdeiro que renunciou à
herança ou o que dela foi excluído não se
exime, pelo fato da renúncia ou da exclusão,
de conferir, para o efeito de repor a parte
inoficiosa, as liberalidades que houve do
doador.
§ 1º E lícito ao donatário escolher, dos bens
doados, tantos quantos bastem para perfazer
a legítima e a metade disponível, entrando na
partilha o excedente para ser dividido entre
os demais herdeiros.
§ 2º Se a parte inoficiosa da doação recair
sobre bem imóvel, que não comporte divisão
cômoda, o juiz determinará que sobre ela se
proceda entre os herdeiros à licitação; o
donatário poderá concorrer na licitação e, em
igualdade de condições, preferirá aos
herdeiros.‖66
65 NERY JÚNIOR, Nelson. Op. cit., p. 499. 66 SILVA, Ovídio Baptista da. Op. cit., p. 198.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O homem deixa de ser apenas o sujeito de direitos nas
relações jurídicas nas quais tradicionalmente os bens de cunho
patrimonial integram o objeto das negociações, para ser também a
finalidade da tutela jurídica. O bem da vida almejado é a própria
higidez física e mental da espécie humana e a proteção de valores
meta ou extra patrimoniais é o alvo do ordenamento jurídico.
Com o advento da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 houve uma definitiva mudança de paradigma jurídico e
se antes o Código Civil assumia papel nuclear, abre-se espaço para a
instalação de microssistemas que se permeiam e encontram-se em
perfeita harmonia com o fundamento de validade da Carta Magna
consistente na realização do ser humano e busca do bem estar social.
Neste trabalho, o tema proposto foi o inventário e partilha,
dando ênfase ao prazo prescricional. No capítulo 1, abordamos o
Direito de Família, suas características e bens de família. No capítulo
2, discutimos as sucessões, inventário e partilha, buscando conhecer a
opinião dos diversos autores que discutem a respeito da partilha. No
capítulo 3, abordamos o prazo prescricional da partilha, ações
anulatório e rescisória, bem como a Lei n. 11.441/07. No capítulo 4,
buscou-se discutir o Instituto da Colação no Código Civil de 2002,
demonstrando a finalidade que vem se apresentando desde os tempos da
antiga Roma, isto é, atingir a igualdade da legítima dos herdeiros necessários
mesmo que retroagindo e buscando atos praticados quando ainda em vida
70
pelo autor da herança que não tenha, de modo expresso, evitado a
aplicabilidade da previsão legislativa.
Por evidente equívoco, há forte corrente no sentido de que a
colação somente se operaria naqueles casos em que as doações
ultrapassassem a parte da qual poderia o autor da herança dispor. No entanto,
resta evidenciado exatamente ao contrário, todas as liberalidades com que a
pessoa, de cuja sucessão se trata, tenha direta ou indiretamente gratificado o
herdeiro ou aquele a quem o herdeiro representa deverá colacionar, as
quantias com que os pais acabam por solver, de forma gratuita, as dívidas de
filhos, presentes em dinheiro, etc., devendo tudo isto ser excluído da legítima
a que este herdeiro fará jus para atingir a real finalidade do instituto já
referida, "a máxima igualdade da legítima dos herdeiros necessários".
Por oportuno, abordou-se, também a doação inoficiosa, que
complementa, assim, nossa discussão.
Não foi nossa intenção esgotar o assunto sobre inventário e
partilha, mas colaborar para o melhor entendimento do instituto
estabelecido no novo Código Civil e suas alterações.
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