infecções do trato urinário

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INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO Conceito: definida como a presença de microorganismo patogênico detectado na urina, na uretra, na bexiga, no rim ou na próstata. Classificação: Infecções do trato urinário baixo: cistites, uretrites e prostatites. Infecções do trato urinário alto: pielonefrites e abcessos perinefréticos. ITU sintomática ITU assintomática ITU Complicada: associadas a anormalidades estruturais ou funcionais do trato urinário e dos rins. Ex: HPB, litíase, estenose da junção uretero-piélica, bexiga neurogênica, refluxo vesico ureteral, nefrocalcinose, divertículos vesicais. ITU não complicada: quando ocorrem na ausência de causas anatômicas ou de outros fatores predisponentes. Epidemiologia: infecção bacteriana mais comum na espécie humana, representando cerca de 5% das consultas ambulatoriais em hospital geral. Mais prevalentes em crianças de até 6 anos Mulheres (uretra mais curta e proximidade com o introito vaginal) jovens com vida sexual ativa Idosos Na infância, até o 1 ano, é mais comum no sexo masculino A prevalência de ITU aumenta com a idade. A partir da quinta e sexta década de vida a presença de prostatismo torna o homem mais suscetível a desenvolver ITU. Etiologia: O espectro de organismos causadores de ITU varia de acordo com a síndrome clínica. Na cistite simples aguda, os agentes Lívia Rioja ITU - Módulo de AC2 Página 1

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Page 1: Infecções do trato urinário

INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO

Conceito: definida como a presença de microorganismo patogênico detectado na urina, na uretra, na bexiga, no rim ou na próstata.

Classificação:

Infecções do trato urinário baixo: cistites, uretrites e prostatites. Infecções do trato urinário alto: pielonefrites e abcessos perinefréticos.

ITU sintomática ITU assintomática

ITU Complicada: associadas a anormalidades estruturais ou funcionais do trato urinário e dos rins. Ex: HPB, litíase, estenose da junção uretero-piélica, bexiga neurogênica, refluxo vesico ureteral, nefrocalcinose, divertículos vesicais.

ITU não complicada: quando ocorrem na ausência de causas anatômicas ou de outros fatores predisponentes.

Epidemiologia: infecção bacteriana mais comum na espécie humana, representando cerca de 5% das consultas ambulatoriais em hospital geral.

Mais prevalentes em crianças de até 6 anos Mulheres (uretra mais curta e proximidade com o introito vaginal) jovens com vida sexual

ativa Idosos

Na infância, até o 1 ano, é mais comum no sexo masculino A prevalência de ITU aumenta com a idade. A partir da quinta e sexta década de vida a presença de prostatismo torna o homem mais

suscetível a desenvolver ITU.

Etiologia: O espectro de organismos causadores de ITU varia de acordo com a síndrome clínica. Na cistite simples aguda, os agentes etiológicos são altamente previsíveis: E. coli representa 75 a 90% dos isolados; Staphylococcus saprophyticus corresponde a 5 a 15% dos isolados (particularmente em mulheres jovens); e espécies de Klebsiella, espécies de Proteus, enterococos e espécies de Citrobacter, entre outros organismos, correspondem a 5 a 10% dos isolados. O espectro de agentes causadores de pielonefrite sem complicação, embora menos estudado, é similar ao espectro das causas de cistite aguda. Nos casos de ITU com complicação, E. coli continua sendo o organismo predominante, Contudo outros bastonetes gram-negativos, como as espécies de Klebsiella, Proteus, Citrobacter, Acinetobacter e Morganella, além de Pseudomonas aeruginosa, também são isolados com frequência. As bactérias gram-positivas, com menor importância, como enterococos, S. aureus e S. epidermidis, e também as leveduras são patógenos igualmente importantes na ITU complicada.

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Fisiopatologia: As bactérias podem estabelecer infecção no trato urinário ao se deslocarem da uretra para a bexiga e, então, seguirem até o ureter e deste para o rim. Entretanto, a introdução de bactérias na bexiga não inevitavelmente leva à infecção contínua. Exemplificando, as bactérias frequentemente entram na bexiga após o intercurso sexual, porém a micção normal e os mecanismos de defesa inatos atuantes na bexiga do hospedeiro eliminam estes organismos. A superfície mucosa da bexiga apresenta propriedades antibacterianas que eliminam alguns organismos, provavelmente por meio da captura de muco e resposta de leucócitos polimorfonucleares.

Além disso, a urina com pH baixo ou osmolaridade baixa demais, elevada concentração de ureia ou alto conteúdo de ácido orgânico inibe o crescimento bacteriano. A micção anormal, um volume de urina residual significativo, ou ambos promovem a infecção verdadeira. Há ainda fatores adquiridos e fatores intrínsecos do hospedeiro, bem como fatores de virulência bacteriana(determinadap pela capacidade de adesão da bactéria á camada mucosa ou camada urotelial), que aumentam a probabilidade de desenvolvimento de ITU.

As bactérias também podem ganhar acesso ao trato urinário pela corrente sanguínea. Entretanto, a disseminação hematológica contribui para menos de 2% dos casos de ITU comprovada e geralmente resulta de bacteremia causada por organismos relativamente virulentos, como Salmonella e S. aureus. As infecções hematógenas podem produzir abscessos focais ou áreas de pielonefrite junto ao rim e resultar em culturas de urina positivas.

Virulência bacteriana: A virulência bacteriana e, por conseguinte, a adesão bacteriana ao trato urinário, depende da produção de substâncias ou da presença de algumas estruturas, como:

Flagelo, ou antígeno “H” (responsáveis pela motilidade); Produção de hemolisina (que induz a formação de poros na membrana celular); Produção de aerobactina (responsável pela aquisição de ferro); Produção de urease (levando à formação de amonium e alcalinização da urina, promovendo a

precipitação de fosfato, carbonato e magnésio e, assim, a formação do cálculo de estruvita); Cápsula, ou antígeno “K” (conferindo resistência à fagocitose); e polissacarídeos, ou antígeno “O”

(determinantes antigênicos). Fímbrias, ou pili, são responsáveis pela interação entre adesinas bacterianas e componentes da

célula epitelial, garantindo uma ligação irreversível entre essas células. As fímbrias podem ser de dois tipos: tipo I, ou manose-sensíveis, que se ligam à manose ou à proteína de Tamm-Horsfall, e tipo II, ou manose-resistentes, que se ligam ao digalactosídeo P, determinante de grupo sanguíneo importante na susceptibilidade populacional à infecção.

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Condições predisponentes do hospedeiro: Uretra feminina é susceptível a colonização por bacilos gram-negativos, devido a sua

proximidade com o ânus, tamanho mais curto e sua terminação próxima ao introito vaginal. Uso de geleia espermicida altera o pH e a flora do introito vaginal. Em homens a prostatite e obstrução ureteral por HPB são fatores que predispõe á

bacteriúria. Intercurso anal esta associada a maior probabilidade de cistite em homens. Gestantes ( geralmente assintomáticas) – devido a posição da bexiga, aumento da

capacidade vesical devido à redução do tônus vesical, relaxamento da musculatura lisa da bexiga.

Obstrução do trato urinário - litíase, tumor, estenose ou hipertrofia prostática, pode resultar em estase urinária, aumento da proliferação bacteriana e distensão vesical.

Bexiga neurogênica Imobilização Refluxo vesico ureteral Cateterização urinária - recomendada a troca de cateteres pelo menos a cada 21 dias. O

risco de bacteremia por microorganismos gram-negativos nesses pacientes é aumentado e proporcional ao tempo de cateterização.

Quadro clínico:

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Cistite: também denominada infecção de trato urinário baixo. Caracteriza-se por disúria, geralmente associada à polaciúria, urgência miccional, dor em região suprapúbica e hematúria. Normalmente não está associada a outros sintomas sistêmicos em adultos, com exceção dos idosos, que podem apresentar febre ou hipotermia e alterações do nível de consciência.

Pielonefrite: Pacientes com pielonefrite podem apresentar manifestações clínicas que variam de leves a relativamente graves – desde febre baixa com lombalgia ou dor junto ao ângulo costovertebral até febre, calafrios com tremores, náusea, vômitos e dor no quadril. Os sintomas geralmente são de manifestação inicial aguda e podem ou não estar associados a sintomas de cistite. O achado primário do exame físico é a sensibilidade no ângulo costovertebral à palpação profunda (sensibilidade à punho-percussão ou sinal de Giordano são equivalentes). A taquicardia pode acompanhar a febre. A piúria e a bacteriúria em geral são demonstráveis por microscopia da urina e coloração de Gram. A bacteremia pode agravar o curso da pielonefrite, todavia os pacientes com pielonefrite raramente apresentam uma bacteremia associada a sequelas mais graves de infecção gram-negativa (isto é, deflagração dos sistemas do complemento, coagulação e cininas), que pode levar ao choque séptico, coagulação intravascular disseminada ou ambas. Quando há choque ou coagulação intravascular disseminada, a possibilidade de obstrução deve ser considerada.

Diagnóstico: Todos os pacientes com quadro clínico de ITU devem ter seu diagnóstico confirmado por meio da análise da urina e da cultura, com exceção de mulheres jovens com leucocitúria confirmada por fitas reagentes ou análise de sedimento urinário, nas quais normalmente não é necessária a realização de culturas.

Exames:

Amostra da urina: Método padrão de referencia para diagnostico de ITU é a coleta de amostra de urina estéril. A sensibilidade do teste é maior com a primeira urina do dia – mais concentrada e contem mais bactérias devido ao tempo de sua multiplicação. Assim que colher enviar diretamente ao laboratório, ou caso não seja possível, armazenar no refrigerador a 4ºC para evitar o crescimento bacteriano.

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Medidas para reduzir o grau de contaminação por bactérias:o Desinfecção do meato uretral e mucosa adjacente com solução anti séptica não

espumosa e posteriormente seca com gaze ou swab stéril.o Redução do contato do jato urinário com a mucosa, afastando os grandes lábios

em mulheres e retirando o prepúcio em homenso Utilização do jato médio urinárioo Descartando a urina do jato inicial

Fitas reagentes (dipstick): detectam esterase leucocitária, indicativa de leucocituria significativa e nitrito, tem baixo custo e praticamente afastam a presença de infecção quando negativas. Entretanto paciente com fita reagente negativa e na suspeita de ITU devem ser submetidas a analise de sedimento e/ou cultura.

Sedimento urinário: a presença de leucocitúria significativa NÃO é diagnostica de ITU, pode ter origem não infecciosa. É importante lembrar como causas de piúria estéril a presença de leucorréia em mulheres, que pode interferir na contagem de leucócitos, e a contaminação da amostra com anti-sépticos, interferindo no crescimento bacteriano. Quando as causas mais comuns de piúria estéril sintomática (síndrome uretral) forem descartadas, devem ser investigados organismos atípicos ou de crescimento lento, como Chlamydia, Ureaplasma urealyticum ou Mycobacteria, ou abscessos renais sem drenagem para trato urinário. A presença de bactérias é freqüente, mas precisa ser confirmada por cultura urinária.

Urocultura: Bacteriúria assintomática é definida como a presença de bacteriúria significativa na ausência de sintomatologia. Para diferenciação com contaminação da amostra em mulheres, são necessárias duas uroculturas em que a mesma bactéria foi isolada em contagens superiores a 105 colônias/mL ou uma urocultura colhida após sondagem intermitente em que uma bactéria foi isolada em contagens superiores a 102 colônias/mL. Para homens, uma urocultura com uma bactéria isolada em contagens superiores a 105 colônias/mL é significativa. Em pacientes com catéteres vesicais de demora, recomenda-se, sempre que possível, a coleta da amostra de urina após a troca do cateter. Quando não é possível a remoção e/ou a troca do cateter, a amostra não deve ser coletada do saco coletor.

As indicações de cultura urinária em mulheres jovens são: Sintomas atípicos, Suspeita de infecção complicada, Falência terapêutica inicial e Sintomas que recorrem em menos de um mês após o tratamento de uma ITU.

Outros exames: Dosagem de PCR Dosagem de enzimas tubulares Imunoflorescencia do sedimento urinário ACB (antibody-coated bactéria)- indica comprometimento urotelial.

Exames de imagem: indicados em casos de suspeitas ou diagnostico de ITU complicada ou recorrente, para identificação de anormalidades predisponentes.

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Ultrassonografia: identificação de cálculos e repercussões no trato urinário.

Tomografia computadorizada: raramento indicada na investigação de ITU, utilizada para descartar abcesso perinefrético e tem maior sensibilidade na identificação de cálculos.

Uretrocistografia miccional: não é indicada na avaliação de ITU em adultos, com exceção de ITU recorrente em paciente transplantado renal, para afastar o RVU ao rim transplantado. Em crianças < 2 anos é o padrão de referencia para diagnostico de RVU, e indicada juntamente com a urografia excretora, pra investigação de ITU recorrente.

Urografia excretora: não deve ser realizada na fase aguda da ITU, pelo risco da nefrotoxicidade pelo contraste associado a sua baixa sensibilidade. Pode fornecerdados na investigação de ITU complicada, como duplicidade calicial, estenose de JUP, adequação do esvaziamento vesical, presença de cálculos e hidronefrose. É importante salientar que a ultra-sonografia também pode auxiliar na maior parte desses diagnósticos.

Cintilografia com DMSA: indicada na fase aguda de ITU em crianças por auxiliar no diagnóstico diferencial com pielonefrite.

Cistoscopia: indicada em pacientes idosos e transplantados renais com ITU recorrente e hematúria, para afastar a presença de neoplasia de bexiga. Deve ser realizada com urina estéril e/ou após profilaxia antibiótica.

Tratamento: Cistites: estudos mostram que esquema com amoxacilina-clavulonato são menos eficazes

que quinolonas. Espera-se a melhora da sintomatologia após 48hrs após inicio da terapeutica correta, caso esta não ocorre, considera-se a realização de novas culturas e de exames de imagem, como a ultrassonografia ou TC.

***Em pacientes com catéteres vesicais de demora, recomenda- se, além da antibioticoterapia guiada por culturas e antibiogramas, a remoção do cateter de demora e a realização de cateterização intermitente até resolução da infecção, ou troca por um novo cateter vesical de demora. Caso seja necessário iniciar tratamento antimicrobiano empírico antes do resultado das culturas, este deve ser baseado no resultado do exame degram da urina, uroculturas prévias do paciente e/ou susceptibilidade antimicrobiana nosocomial em pacientes internados.

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Candidíase: terapia empírica com fluconazol (200mg VI, ao dia, após dose de ataque de 400mg) até identificação final do fungo.

Pielonefrites:

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Caso não se verifique melhora clínica após 72 horas de antibioticoterapia adequada, deve-se realizar exame de imagem para afastar uropatia obstrutiva ou presença de abscessos renaisou perirrenais. Sugere-se que a terapia antimicrobiana dure 14 dias, ou naqueles pacientes com resposta clínica mais lenta, 21 dias.

Não se recomenda a realização de culturas urinárias após término do tratamento, a não ser em pacientes que apresentem recorrência dos sintomas dentro de duas semanas. Caso seja isolado o mesmo agente, com a mesma susceptibilidade, sugere-se a realização de ultra-sonografia ou tomografia computadorizada para avaliar a presença de cálculos ou uropatia obstrutiva. Pacientes com pielonefrite complicada geralmente devem ser hospitalizados. Devido à grande variedade de condições associadas, amplo espectro de agentes etiológicos possíveis e presença freqüente de resistência bacteriana múltipla é difícil a generalização da escolha terapêutica empírica inicial.

Obs: gestantes: Em gestantes, inicia-se terapia parenteral empírica com ceftriaxone ou gentamicina.Deve-se repetir a urocultura após 1 a 2 semanas do término do tratamento.

Obs: Sugere-se não tratar pacientes com bexiga neurogênica ou com catéteres vesicais de demora e urocultura positiva, mas assintomáticos.

Bacteriúria assintomática: presença de bactéria na cultura quantitativa ou microscopia em pacientes sem sinais e sintomas de ITU.

Diagnostico: o Mulheres assintomáticas com 2 uroculturas positivas com o mesmo agente com mais

de 105 UFCo Homens assintomáticos com 1 urocultura com > de 105 UFCo Homens ou mulheres assintomáticos com urocultura coletada por meio de sonda de

alívio com mais de 10² UFC.

Tratamento: o Gestanteso Pacientes que vão ser submetidos a ressecção prostática transureteral ou

procedimentos com previsão de sangramento da mucosa vesical.o Alguns casos em crianças com RVU

Caso clínico:

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1. Mulher de 49 anos, sem antecedentes prévios, vai ao consultório com queixa de disúria e polaciúria, sem febre. (Você suspeita de uma provável cistite)

Você coleta cultura? Pode tratar empiricamente, não é necessário fazer exame. Mas se não for o 1º episódio tem que fazer. Tratar com ciprofloxacina ou sulfa.

2. E se fosse um homem, você coleta culturas? Se for homem, sempre tem que coletar exame. Tratar com quinolona somente.

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