infância, educação e direitos sociais: castigos aplicados ... · a estratégia ameaçadora das...

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INFâNCIA, EDUCAçãO E DIREITOS SOCIAIS: CASTIGOS APLICADOS àS ÓRFãS DO ASILO DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE CAMPINAS-SP CHILDHOOD, EDUCATION AND SOCIAL RIGHTS: PUNISHMENT USED WITH ORPHANS IN THE ORPHANAGE OF SANTA CASA DE MISERICÓRDIA, CAMPINAS-SP Ana Maria Melo Negrão * Resumo: Este artigo objetiva perquirir quais as repreensões previstas nas propostas educacionais das Irmãs de São José de Chambéry, Asilo da Santa Casa de Misericórdia de Campinas-SP, fundado para amparar centenas de órfãs desvalidas, em razão da epidemia de febre amarela que assolou Campinas em 1889. Por falta de políticas públicas de atendimento, o Asilo de Órfãs configurou-se como uma estratégia de política educativo-social, na elite campineira excludente, integrada pelas categorias sociais dominantes – Igreja, Imprensa e Oligarquia – representando para Campinas o único local de acolhimento às órfãs pobres e, em especial, às negras. As fontes constituem-se, basicamente, pelos documentos do acervo da Santa Casa de Misericórdia, biblioteca do Centro de Memória da Unicamp e, em especial, depoimentos e fotografias de egressas a relatar como eram as traquinagens e os castigos aplicados às órfãs pela Congregação de São José de Chambéry. Palavras-chave: Asilo de Órfãs da Santa Casa de Misericórdia. Crianças desvalidas. Proposta educacional. História oral.

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Page 1: InfâncIa, Educação E dIrEItos socIaIs: castIgos aplIcados ... · A estratégia ameaçadora das Irmãs em colocar uma galinha choca para, através de seu cacarejar, desvendar a

InfâncIa, Educação E dIrEItos socIaIs: castIgos aplIcados às Órfãs do asIlo

da santa casa dE MIsErIcÓrdIa dE caMpInas-sp

chIldhood, EducatIon and socIal rIghts: punIshMEnt usEd wIth orphans

In thE orphanagE of santa casa dE MIsErIcÓrdIa, caMpInas-sp

Ana Maria Melo Negrão*

resumo: Este artigo objetiva perquirir quais as repreensões previstas nas propostas educacionais das Irmãs de São José de Chambéry, Asilo da Santa Casa de Misericórdia de Campinas-SP, fundado para amparar centenas de órfãs desvalidas, em razão da epidemia de febre amarela que assolou Campinas em 1889. Por falta de políticas públicas de atendimento, o Asilo de Órfãs configurou-se como uma estratégia de política educativo-social, na elite campineira excludente, integrada pelas categorias sociais dominantes – Igreja, Imprensa e Oligarquia – representando para Campinas o único local de acolhimento às órfãs pobres e, em especial, às negras. As fontes constituem-se, basicamente, pelos documentos do acervo da Santa Casa de Misericórdia, biblioteca do Centro de Memória da Unicamp e, em especial, depoimentos e fotografias de egressas a relatar como eram as traquinagens e os castigos aplicados às órfãs pela Congregação de São José de Chambéry.

palavras-chave: Asilo de Órfãs da Santa Casa de Misericórdia. Crianças desvalidas. Proposta educacional. História oral.

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abstract: This article aims inquired what the impact of reprehensions received by the Orphan Asylum, Santa Casa de Misericordia de Campinas, under the care and educational proposals of the Sisters of St. Joseph of Chambéry, founded to support hundreds of helpless orphans, because of the epidemic yellow fever struck Campinas in 1889. For lack of public policies on attendance, the Orphan Asylum was configured as a strategy for education and social policy in Campinas exclusive elite, composed of the dominant social categories – Church, Press and Oligarchy – representing the only place to Campinas to host orphaned and poor, especially the niger. The sources were, basically, by the Institucional documents and photographs from the collection of the Santa Casa de Misericordia, library, Memory Center, Unicamp, and in particular, reprehensions received under the aegis of the Congregation of St. Joseph of Chambéry.

Keywords: Orphanage Asylum of Santa Casa de Misericórdia. Very poor childhood. Educational proposal. Oral history.

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INfâNCIA, EdUCAçãO E dIREItOs sOCIAIs: CAstIgOs APlICAdOs às ÓRfãs dO AsIlO dA sANtA CAsA dE MIsERICÓRdIA dE CAMPINAs-sP

Introdução

Este artigo adveio de um viés do doutoramento e pautou-se, em especial, nas falas das egressas do Asilo de Órfãs da Santa Casa de Misericórdia de Campinas-SP, que, em um exercício de memória, reviveram a infância asilada, com o objetivo de verificar os casti-gos aplicados às órfãs, sob a égide da Congregação de São José de Chambéry.

As egressas que, através da memória, relataram situações pito-rescas sobre as traquinagens e consequentes castigos do tempo do Asilo, revivendo momentos da infância, sob o olhar de um novo tempo, capaz de matizar as vivências do passado com as cores do presente.

Rememorar fatos de um passado adormecido por trás da cor-tina do esquecimento propiciou um processo de construção e re-construção da própria história.

Quanto às identidades das entrevistadas, foram utilizadas ape-nas as iniciais, mas muitas delas sem tiram-se muito à vontade para contar as suas travessuras, com muitas risada e humor, fazendo um escorço histórico e criticando as rígidas regras das freiras.

O Asilo de Órfãs supriu a ausência de políticas públicas de aten-dimento a meninas desprotegidas e configurou-se, na elite cam-pineira excludente, integrada pelas categorias sociais dominantes – Igreja, Imprensa e Oligarquia – o único local de inclusão às órfãs pobres e, em especial, às negras, excluídas da maioria das institui-ções de ensino.

O Asilo configurou-se como uma estratégia emergente educati-vo-social, para acolher as órfãs desvalidas, impedindo-as de men-digarem ou prostituírem-se.

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Lapa (1995, p. 224-225) referindo-se ao Asilo de Órfãs, declara que subjacente à filantropia, o trabalho tinha conotação escravi-zadora:

Por trás, portanto, do aparato filantrópico, por todos ce-lebrados, estavam objetivos bem racionais e práticos, pró-prios de uma sociedade capitalista, capaz de transformar o Asilo numa escola de treinamento e formação de emprega-das domésticas e futuras e laboriosas esposas de operários produtivos. [...] A rotina da vida em comum no Asilo era absorvida pelo trabalho chamado doméstico, que se distri-buía entre os cuidados com a roupa, ao arranjos da cama e mesa, cabendo-lhes lavar a roupa, engomar, consertar, costurar. Todos os serviços ligados à cozinha, banheiros, etc também cabiam às órfãs, sob a superintendência das irmãs.

trabalho pesado na infância

Uma das órfãs, Ci, contou como era o dia a dia dos serviços que elas deveriam cumprir, sob pena de não o fazerem, serem re-preendidas.

Ci.: Tinha limpeza de sala de aula, porque a parte do colé-gio não tinha funcionário, só tinha lavadeira e cozinheira. Então, essa parte de limpeza, de faxina, era tudo a gente que fazia, tudo dividido. Então, uma turminha era prá limpar o banheiro, outra turminha era prá varrer a sala de aula, outra turminha era prá limpar o dormitório, outra turminha limpava os banheiros de cima. Só as internas

Traumas que transcendem a infância.

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M.H.: Nas férias, ficava sozinha no Orfanato, pois meu pai precisava trabalhar. Fui internada no orfanato porque mi-nha mãe teria morrido. Na verdade, ela o abandonara, fu-gindo com minha irmãzinha de dois anos. Só soube disso mais tarde com 21 anos, quando no dia de meu casamento em 1959, minha mãe apareceu na Igreja. Foi um susto, pois ela que era morta, de repente surgiu viva. Imagine como foi minha lua de mel, em que eu só pensava na minha mãe que apareceu no dia do meu casamento. Mais tarde, tive contato com minha irmã e soube que minha mãe tivera outros fi-lhos com seu companheiro. Como soube do meu casamen-to, quis me ver, por isso, sem me avisar, surgiu na igreja. Não dá para descrever a sensação que tive. Nunca soube porque ela abandonara meu pai, e quando quis conversar com ela sobre isso, minha irmã impediu, pois ela estava muito doente com câncer. Nunca me libertei disso, até fiz terapia, tive bons empregos, mas meu casamento fracassou e sou infeliz.

Por esse relato, transparece a fraude na internação de M.H. pelo descumprimento da condição imprescindível de ser órfã, e no ato de admissão ter de apresentar atestado de óbito, nos termos re-gimentais. Como teria conseguido seu pai interná-la? A angústia jamais deixou M.H. cujas sequelas do súbito aparecimento da mãe que a abandonara nunca foram superadas.

Enfim, ela foi penalizada pela vida, uma vez que foi preterida pela irmã menor e, embora, seu pai a amasse muito, não teve outra alternativa a não ser interná-la no Asilo, mesmo com pais vivos.

E a presença da mãe que ressurge no dia do casamento em vez de ser um presente, foi um novo castigo psicológico, do qual ela jamais se libertou.

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traquinagens reprimendas na tradicional procissão

As procissões de 15 de agosto, eram tradicionais por ser o dia da Padroeira, Nossa Senhora da Boa Morte, e o dia da fundação do Asilo em 1890, e as órfãs em fila, no meio da rua, espiritualiza-vam o ambiente externo.

As órfãs, em posição de anjos, eram usadas para condoer a alma e o coração de quem as via passar, e depois da procissão que percorria as ruas do centro da cidade, chegavam, às mancheias, os legados, os donativos tanto em dinheiro como em espécie.

Figura 1 – Procissão de 15 de Agosto

Fonte: Acervo De Biasi.

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As órfãs, vestidas de anjo, conotavam signo de inocência e pu-reza, relevante ao catolicismo, pois a vestimenta, com batas bran-cas e imensas asas, as coroas de flores, as mãos postas a percorrer as ruas da cidade, eram eficazes estratégias para angariar donativos e legados.

Embora a procissão de 15 de agosto fosse a data mais solene da Santa Casa, como demonstração pública de fé e homenagem à padroeira, não faltava alguma travessura das internas.

Der.: Na procissão eu ia de uniforme branco e sapato preto e as meninas me chamavam de ‘pomba de perninha preta’. Aí eu não queria ir na procissão. Um dia na classe, a freira estava mandando todo mundo parar de conversar e disse: ‘Quem der um pio não vai sair na procissão.’ Eu, lá no fundo da sala falei: ‘Piu!’ e aí fiquei de castigo até a procissão ter-minar. Mas costumava sair de anjo e sempre usava vestido cor-de-rosa.

A personalidade de Der era muito forte e ela ficou marcada por isso, pois não se intimidava, era insolente para a época e destoava da submissão e medo dos castigos aplicados quando se infringiam as normas disciplinares.

A maioria sujeitava-se às regras, embora o verdadeiro rosto de alguma criança deixasse de ser o da coletividade, deixando cair a máscara da obediência irrestrita, tanto mais tempestuosa ou irre-verente fosse a sua peraltice e reação.

Travessuras, traquinagens permearam o cotidiano da institui-ção (LEFÈBVRE, 1958), como marcas fortes da memória e de-monstraram reações infantis à política educacional das Irmãs, de amoldar todas as órfãs a uma formação padronizada, homogênea, reiterada pelo relato de R.G.

R.G.: Aplicavam castigo nas mais levadas, mas não era as-

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sim uma coisa exagerada. Quando as freiras queriam as-sim descobrir alguma travessura, alguma malvadeza que as meninas faziam, sabe o que elas faziam? Pegavam uma galinha que estava chocando e punham dentro de um ces-to. Me recordo que as freiras fizeram isso, na época da pro-cissão, uma vez que a C.P. e a Dru. brigaram e uma picou o vestido da outra com uma tesoura ficando um monte de pano em tiras. Aí as freiras queriam saber quem fez aquilo e arrumaram a tal da galinha para a gente passar a mão nela. A história era assim: Cada uma passava a mão na ga-linha. Se a galinha cacarejasse foi aquela que aprontou. Na vez da C.P., a galinha fez có-có-có. Foi você mesmo, disse a freira. Aí C.P. começou a chorar e as freiras chamaram o pai dela.

A estratégia ameaçadora das Irmãs em colocar uma galinha choca para, através de seu cacarejar, desvendar a autora da traqui-nagem de deixar em tiras o vestido da colega revelou um aspecto psicológico do medo. Ao que parece, a autora da travessura dei-xou transbordar o seu nervosismo na força incontrolada para pas-sar a mão na galinha. Para castigar uma menina, a galinha choca aliou-se ao processo punitivo. O que teria levado C.P. a ter tido tal explosão de revolta a ponto de picar o vestido de Dru.?

Interpretação de foto das órfãs, ressaltando o castigo

Uma foto datada de 1919, com as órfãs dispostas de forma em degraus, retratava as meninas de bom comportamento, a ostenta-rem ao redor do pescoço, na missa de domingo – uma fitinha ver-melha, como prêmio, enquanto as outras eram rotuladas de terem ferido a disciplina.

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figura 2 – grupo de Órfãs do asilo da santa casa de Misericórdia (1919)

Fonte: Acervo de Maria Luiza Pinto de Moura.

Indubitavelmente, as fotos possuem uma linguagem, e essa foto das órfãs, em especial, pela decodificação fornece elementos de in-terpretação de práticas educativas, a foto de grupo de órfãs permi-tiu analisar a ordem, a disciplina rígida, o silêncio e o ficar imóvel, tendo como pano de fundo a porta de entrada do Asilo de Órfãs já numa trajetória de vinte e nove anos.

Tudo na fotografia, estava rigorosamente nos moldes preceitua-dos naquela época de início de século. Em pé, no último plano, na sétima fila, sobressaem as Filhas de Maria1, mulheres mais adultas, com suas largas fitas e medalha sobre o peito, detendo o controle do grupo e representado o poder.

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Quanto ao dia da semana em que foi tirada a foto, pelo traje das crianças, botas, vestidos de gola marinheiro sobre a qual algumas ostentavam as fitinhas vermelhas – símbolo do bom comporta-mento semanal –, infere-se que fora feita em um domingo, antes ou depois da missas, pois era na missa dos domingos que elas exi-biam a obediência às regras.

É de se notar que não há órfãs negras ocupando a primeira e segunda fila, estando posicionadas, de preferência, próximas às extremidades das demais filas, diluídas no grupo.

Fotografar em domingo, contrapondo meninas com fitinhas vermelhas ao redor do pescoço ao lado das que não as receberam, revela que as meninas que se comportaram mal deveriam postar--se na primeira fileira. Seria esse o motivo de semblantes tão tris-tonhos? Não se nota qualquer sorriso em qualquer rosto, porém semblantes sérios, tristes, o que não é o usual em crianças, cujo sorriso fluiu espontaneamente.

Importa ressaltar que essa foto é discriminadora, grita as dife-renças entre boas e más meninas, uma vez que a fitinha era sím-bolo de representação de cumprimento dos deveres, e atitudes sem deslizes ou peraltices infantis.

Embora a fotografia seja datada e paralisada em 1919, não é uma imagem neutra. Por trás de seu aspecto mudo e silencioso, esta fo-tografia fala, explode numa linguagem semiótica, prenhe de repre-sentações, permitindo uma leitura ampla dos significados que de implícitos, vão se desfraldando, revelando-se à superfície explícita.

Além da preocupação com a divisão de planos, tanto na hori-zontalidade, como na verticalidade, estão presentes as represen-tações de padronização; de unidade (BAUDELOT; ESTABLET, 1975); de ausência de sorriso para uma infância submissa, de dis-ciplina, de segregação da órfã negra, de respeito advindo do traje

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discreto e com mangas compridas, nada deixando entrever do cor-po à exceção do rosto, como preceituavam os termos regimentais.

Os depoimentos abaixo da órfã T.G., que sentia pena de quem não ganhava a fitinha, e de Der., a qual jamais merecera a fitinha vermelha, subsidiaram a decodificação da fotografia, em relação ao significado disciplinador da fitinha, e quanto ao dia em que foi tirada, conforme elucida Dubois (1999, p. 26), quando diz que “[...] subsiste na imagem fotográfica um sentimento de realidade incontornável do qual não conseguimos nos livrar, apesar da cons-ciência de todos os códigos que estão em jogo e que se combina-ram para sua elaboração.”

Der.: […] uma das meninas mais velhas ficava com um ca-derninho marcando quem fazia alguma coisa errada e eu sempre tinha um monte de cruzinhas. Quem não tinha cruzinha ganhava fita vermelha de bom comportamento. Um dia entregaram uma fitinha para mim, talvez por terem esquecido de marcar as cruzinhas. Aí fui na missa de Do-mingo com a fita, e bem no meio da missa, a Irmã Virgilina percebeu, foi lá e tirou a fita.

T.G.: Alguma que estava sem fita ficava lá no fim da fila chorando. Eu tinha dó daquelas meninas sem fita, na missa do domingo. Ah! Tinha aquela pretinha, a M.T., levada da breca que dava em todo mundo. E ela nunca levava fita por-que batia nos outros.

A fala de der demonstra, explicitamente, a forma como as freiras cultivavam a deduração, ao colocarem as meninas mais velhas com o caderno na mão para aplicar as fatídicas cruzinhas. Ademais, ela sofreu grande constrangimento pelo fato de a irmã, publicamente, durante a missa, arrancar-lhe do pescoço a fitinhas colocada por en-gano. Sem dúvida uma atitude educacional questionável.

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Pelas representações do castigo na infância que ficaram na me-mória, muitas órfãs evocaram o grande salão nobre, imponente, com seus janelões de madeira, emoldurados com belas cortinas, suntuoso lustre, mesa longa rodeada de cadeiras, tantas quantas necessárias para as reuniões da Irmandade, da Provedoria, e fes-tividades.

Lr.M.: Era aquele salão onde ficavam aquelas pessoas que tinham morrido... O salão nobre! E aquela que falar qual-quer coisa vai para o salão nobre, dizia a freira. E cada uma que ia lá de castigo, contava que viu o quadro mexendo. Era fantasia! Era aquela coisa de medo!

M.H.: Senti medo de ficar de castigo, no escuro, no salão dos retratos antigos. As meninas maiores diziam que saía fogo dos olhos e das bocas das pessoas dos retratos. De tanto medo fazíamos “xixi” na calcinha e não ousávamos abrir os janelões. Qualquer arte e ficávamos presas ali; por-que não guardávamos o silêncio nas refeições ou no servi-ço diário.

Der.: Fui de castigo no salão nobre, com as portas e janelas fechadas, no escuro. Como estava com medo, resolvi abrir as portas e janelas. Uma das freiras viu a janela e a porta abertas e correu nas classes avisar que o inspetor estava lá, porque só abriam o salão na visita do inspetor. As freiras começaram a ensaiar as crianças: “Boa tarde, senhor inspe-tor” e uma se lembrou de tirar-me do castigo por causa da presença do inspetor. Descobriram que não havia inspetor nenhum e eu, a Der. que tinha aberto as janelas.

Paradoxalmente, no lugar onde se davam as reuniões da be-nemerência também se inculcava o medo, o terror, E daí as vozes mudas pela morte e os olhos abertos pela mão dos pintores, cria-vam vida à criança trancafiada naquele cárcere. McLaren (1992, p. 234-235) reitera que o castigo escolar às crianças, “[...] freqüen-

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temente funcionava num nível simbólico para dar ao estudante uma antecipação do que pode ser esperado pelos imprudentes que transgridem as regras [...]” e, ainda com “[...] uso do constrangi-mento tomava a forma de reprimendas para diminuí-lo, esvazian-do seu senso de segurança ou identidade.”

Para as órfãs, o salão representava o espaço da punição, levando ao não controle esfincteriano – “De tanto medo fazíamos ‘xixi’ na calcinha e não ousávamos abrir os janelões”. As pessoas reprodu-zidas nos retratos, aos olhos das órfãs, até se mexiam, cujo medo, hoje, transmuda-se em fantasia – “E cada um que ia lá falava que viu o quadro mexendo... Era fantasia!!”.

Pitoresco o depoimento de Der., que representava um com-portamento liberto das repressões, pois abriu as janelas, insurgiu--se contra o proibido, burlando as freiras, que providenciaram o cumprimento aos inspetores, que deveriam estar chegando, com – “Boa tarde, senhor inspetor” e uma delas se lembrou de tirar-me do castigo por causa da presença do inspetor.” Eram rotineiras as insubordinações de Der. Decorre daí o conflito entre a rotina di-ária do Asilo e o ideal que as freiras tentavam simular à inspeção escolar, corroborando para se desenhar a atuação da congregação, com ênfase na disciplina rígida, na pedagogia do medo, na religião que castiga, na castração da sexualidade. Tudo isso gera o cultivo de um “hábitus”, conforme Bourdieu e Passeron (1992, p. 44):

A ação pedagógica (AP) implica o trabalho pedagógico (TP) como trabalho de inculcação que deve durar o bas-tante para produzir uma formação durável; isto é, um há-bitus como produto da interiorização dos princípios de um arbitrário cultural capaz de perpetuar-se após a cessação da AP e por isso se perpetuar nas práticas dos princípios interiorizados.

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refeitório e a cozinha: ...comer em silêncio... olhar no prato... ouvidos na leitura...

No piso inferior ficavam, além das salas de aula, o refeitório e a cozinha. As refeições eram feiras em silêncio absoluto, enquanto alguém lia a vida de um santo.

Cel.: Para ensinar boas maneiras, as freiras falavam umas quadrinhas:

“Eu comi ontem no almoço A azeitona de uma empadaDepois botei o caroçoSobre a toalha engomada

Mas a mamãe logo veio com carinhoE me disse:“O osso, o caroço, o espinhoPoe-se no cantinho do prato.”

Mas o meu pratoÉ redondo,Meu pratoNão tem cantinho.”

A.O.: No refeitório, as meninas viram que a Irmã E. ia bater na N.V., gritaram e ela acabou fugindo. Me lembro um dia, quem aprontou foi a Der. pegou o prato cheio de comida e jogou no chão do refeitório. Às vezes a comida era ruim ou as crianças não queriam comer. Comi pão com pimen-ta para matar a fome, porque recusei a comida que estava ruim. Expulsa da aula de bordado, fui pra cozinha, onde a freira achara uma ninhada de ratos. Peguei os ratos e da escada, mostrava pras outras crianças que ficavam rindo.

M.L.P.B.: Eram 2 refeitórios: o nosso limpo, simples e a so-bremesa era fruta – abil, cereja, e outra; e o refeitório das Irmãs, onde jantavam depois de nós. A irmã Esc., depois

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do jantar dela, me chamava do meu cantinho para me dar a sobremesa que ela deixava de comer. Era um gesto de cari-nho do qual eu me lembro com muita gratidão e conto para minha família.

Lr.M.: Quando cheguei eu estava quase morrendo, né? A comida era boa, de manhã era café com leite, pão fresqui-nho... não me lembro se tinha margarina ou manteiga, o café era bem reforçado, comia à vontade, podia repetir o café, tudo com fartura, o almoço tinha carne boa todos os dias, legumes da época.

R.G., I.G., T.G.: Tinha que comer, mas elas experimenta-vam, se estava ruim elas mandavam de volta, sem sal... A alimentação não era ruim. Era uma boa alimentação: arroz, feijão, carne, verdura, leite, aquelas latonas. O leite era a coi-sa mais deliciosa. Podia beber à vontade. O bule era dessa altura assim, uma coisa exagerada... Aquele café gostoso.

Enquanto para a primeira informante, a lembrança do refeitó-rio remete à aprendizagem de bons costumes nas refeições, para a segunda direciona-se à qualidade ruim da comida – “Um dia comi pão com pimenta para matar a fome, porque recusei a comida que estava ruim,[...] fui para a cozinha, onde a freira achara uma ni-nhada de ratos. Peguei os ratos e, da escada, mostrava pras outras crianças que ficavam rindo” – inclusive lembrança compartilhada com situações vivenciadas por outras – “quem aprontou foi a Der. Pegou o prato cheio de comida e jogou no chão do refeitório” – e para a penúltima, a representação era oposta à da segunda, fartura e boa comida – “podia repetir o café, tudo com fartura, o almoço também tinha carne boa todos os dias, legumes da época”.

A atitude de Der. ao jogar a comida no chão, naquele contexto de disciplina rígida, foi, certamente, uma ousadia, pois insurgiu-se de forma agressiva, o que lhe deve ter valido uma boa reprimenda.

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Inferimos, no entanto, a não subserviência daquela criança traves-sa e mesmo insolência, para a época.

Em depoimento Der posterior à entrevista, resolveu escrever a história de sua vida, relatando que “[...] gostava muito do orfanato da Santa Casa porque fazia muita travessura e não tinha medo das Irmãs. Nunca ganhava a fitinha vermelha de bom comporta-mento.” E ainda parece ter orgulho em contar: “Cheguei a tomar umas chineladas da Irmã c. que fui parar na enfermaria. Quando saí, fui atrás da Irmã cantando chinelo vai, chinelo vem, chinelo de freira não mata ninguém.” Provavelmente, diante de mais essa irreverência de Der., a Irmã nada fez, porque o regimento proibia castigos corporais, e as chineladas devem ter sido de tal força que a menina precisou de cuidados de enfermaria, talvez gerando di-ficuldades à Irmã. Porém, nada intimidava Der.

Banhos

Nos banhos comunitários, transparecem a repressão e a com-plexidade da higiene corporal, ao lado de sensações gostosas, e as representações por elas construídas para iluminar a apreensão daquele contexto.

Ci.: Os banhos? Tinha uma sauna enorme, uma espécie de ducha como um esguicho. Era um cano e fazia um arco como se fosse a costela da gente. Então entrava lá, abria, água quente e fria, molhava inteirinha. Cada uma tinha uma camisola de banho, decotadinha e sem manguinha. A gente molhava, entravam 5 ou 6 ali naquele arco, saía e ia se ensaboar, em rodízio. Enfiava a mãozinha por den-tro para se lavar com sabonetinho. Banho! duas vezes por semana, porque não tinha espaço. Se faltasse água no hos-

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pital, a gente tomava banho frio no tanque, maior que essa sala. As freiras eram conservadoras. Para vestir não podia mostrar o joelho. Um pudor exageradíssimo! Irmã Aurélia, avançada para a época, falou: ‘Vocês vão tomar banho. Tem que lavar o lugar que faz xixi’, foi fogo! Desabou o Colégio! Acho que nós rimos quase uma semana...

R.G., I.G., T.G.: (três irmãs partilhando a fala). O banho, naquele tancão, parecia uma piscina. Ai, que gostoso! To-mávamos banho de camisolão, ninguém podia ver nada. Era uma pureza tremenda. E quando ia ficando mocinha, tomava separado, no arco para não manchar a água com sangue. Nós trocávamos de roupa e ninguém via o corpo uma da outra. Puxávamos o lençol por cima da cabeça, e nos trocávamos... E a camisola molhada a gente tirava sem mostrar o corpo.

T.J.C.: Na sala, a Irmã falava: ‘Quem vai tomar banho na ducha?’ Algumas levantavam a mão e saíam. Não entendia nada, só depois soube que meninas menstruadas não entra-vam na tina, no tancão, para não manchar a água, por isso iam para a ducha. Os tancões nos outros dias eram usados para lavar roupa. Quando não tomávamos banho, às vezes, tínhamos que mostrar o fundo da calcinha para a freira ver se estávamos limpas, pois tínhamos que ter asseio, saber se limpar bem com papel... não sei que papel. Acho que era jornal, não me lembro se tinham papel higiênico.

Pela fala das meninas, o banho era adstrito a rígidas regras para coibir o gozo da água em contato com o corpo, vez que uma cami-sola neutralizava o tato, a dimensão sensorial. Nos ensinamentos relacionados à violência simbólica de Bourdieu e Passeron (1992), e a camisola de banho era um signo que transmitia mensagens de re-cato e pudor, com o fim de moldar o comportamento da órfã, refre-ando-lhe os instintos maléficos à moral cristã e aos bons costumes. Essa forma de inculcar dominação nem sempre era percebida pela

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órfã. Todavia, em contraponto, o banho era também um momento de prazer, com se percebe, claramente, pelo enunciado – “O banho, naquele tancão, parecia uma piscina Ai, que gostoso!” A expressão “Ai, que gostoso!” está carregada de agradável lembrança a ponto de igualar o tancão a uma piscina, onde o grupo se divertia, sentia o contato da água, enfim era um momento de asseio e lazer.

O asseio corporal ficava relegado a um sabonetinho, discreta-mente esfregado no corpo, coberto pela camisola, e como declara uma das meninas, ocorria duas vezes por semana. Em todas as falas há representação do impedimento de visualizar o corpo. Até para se enxugar e vestir-se, havia rituais reprimindo qualquer pra-zer tanto em tocar com em vislumbrar o corpo. O camisolão, além de estratégia para não ver o corpo, favorecia o hábito de saber vestir-se com pudor, mediante adequados movimentos gestuais: “É de um pudor, que não podia ver nada.” Inferimos que a memó-ria de todas do grupo remetem às mesmas evocações.

A fala das três irmãs – “Era uma pureza tremenda” – deixa en-trever que na educação institucional abdicava-se do corpo como se ele não fizesse parte da estrutura ontológica do ser humano, reprimindo-se o autoconhecimento do corpo, para não macular as virtudes da alma. Como a congregação estava sob os auspícios do ideal ultramontano e das orientações rígidas do Ratio Studio-rum, das Máximas de Perfeição, conhecer o corpo poderia estar comprometendo esse ideal.

Pelo relato de t.J.c., “ter que mostrar o fundo da calcinha para a freira ver o asseio”, evoca uma situação arbitrária de constran-gimento, ou repercussões de hábitos franceses de utilizar poucos banhos semanais.

Pela fala de ci.: “Irmã Aurélia, avançada para a época, falou: ‘Vocês vão tomar banho. Tem que lavar o lugar que faz xixi’, foi

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fogo! (risadas) Desabou o Colégio!” desabrocha uma Irmã pro-gressista, sinal de contraste naquele contexto repressor, a tal ponto que a sua fala “lavar o lugar que faz xixi” foi inusitada e quebrou o arcabouço de vedação de toque na genitália. Podemos nos valer de Lefèbvre (1972)2 que preceitua serem as escolas consideradas centros moleculares de poder, onde se processam essas relações de poder. Deriva desses centros a possibilidade de revolução, uma vez que na instituição, em havendo as relações de poder, existe a possibilidade de questioná-las, refazê-las, como fez a Irmã A.

representações da sala de aula

Muitas lembranças das salas de aula emergiram nas histórias vi-vidas, algumas boas, outras ruins. No térreo, havia seis salas de au-las: quatro para as externas e duas separadas para as internas, o que demonstrava discriminação. As salas eram amplas e com bancos, usadas também para estudos, onde o silêncio tinha de ser absolu-to, cabendo à freira acompanhante vigiar, na esteira de Foucault (1999). Cada classe tinha sua professora. Com o passar do tempo, as alunas internas e externas passaram a ter aulas juntas, tendo sido os bancos substituídos por carteiras individuais. Relembran-do o ambiente de ensino, reconstruíam as entrevistadas o cotidia-no da sala de aula e algumas situações merecedoras de destaque.

Lr.M.: As matérias eram português, matemática, geografia, história, religião. Caligrafia, nossa! com aquela letra bem estreitinha. Naquele tempo usávamos os dois tipos de ca-dernos, os livros de leitura, tudo encapado, impecável, os lápis bem apontadinhos, sem derrubar uma sujeirinha no chão. Era muito rigoroso.

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M.L.P.B.: No 4o. ano, a Irmã escalou-me pra ajudá-la nas aulas do 1o. ano, na cartilha. A Diretora chamou meu pai e pediu para eu ir para o convento, estava certo até meu dote. Meu pai não deixou, pois eu estava ali por contingência, não para ser freira.

Ci.: Ah, estudar Ciências? Qualquer coisa a freira mandava virar a página. No catecismo, fiquei uma semana de castigo porque me atrevi a perguntar: – Nossa Senhora foi virgem antes e depois do parto? O que era ‘parto’? A freira não res-pondeu e fiquei de castigo, sem poder falar com ninguém. A gente estudava Ciências: Cabeça, tronco e membros! não podia falar de ‘figado’, do ‘coração’, de mais nada, vira a folha.

Cel.: Da Irmã Esc. guardo lembrança traumatizante. Tinha 11 anos quando ela mandou-me esperar na sala de aula e começou a falar-me sobre sexo, menstruação, homem: ‘Você não é mais inocente! Vai ficar grávida, sua barriga vai crescer, tem que fugir de homem!!!’ Fiquei amedronta-da e nem tinha menstruado ainda. Um dia, no bonde, um homem encostou em mim e eu chorava de medo de ficar grávida. Ninguém entendia porque chorava tanto! Desco-bri depois que a Irmã Esc. falou aquilo para mim, por vin-gança. Eu tinha me revoltado por perder um passeio para ensaiar no coro com as Irmãs Bas. e Esc.

Os depoimentos das órfãs são exemplos de como a sala de aula era espaço de ação pedagógica com inculcação de elementos da violência simbólica e dominação, como preceituam Bourdieu e Passeron (1992) com evocações, em que a memória trazia à tona situações triviais mescladas com traumas.

Os relatos de Cel. e de Ci. estão envoltos em repressão da sexu-alidade, chegando a freira aterrorizar Cel. com a possibilidade de uma gravidez, levando-a a um sentimento de medo injustificado. Talvez a repressão sexual da própria freira gerasse seu comporta-mento inadequado. Mais grave a reação ao questionamento de Ci.

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sobre “parto”. Supõe-se que a formação jesuítica das Irmãs, tendo que abdicar do corpo e da sexualidade, exigia uma pedagogia que inspirasse o desapreço absoluto pelo sexo, pela carne, pela mater-nidade, pelo corpo. Portanto, infere-se que as aulas de Ciências representavam um grande perigo e poderiam conduzir as órfãs a lascívias, portanto, a solução era – “virar a página”.

Uma lembrança muito traumatizante contextualizando a sala de aula, demonstrando absoluta inabilidade para amparar e educar órfãs, emerge do relato de uma das entrevistadas:

En.:: Um dia, uma órfã grandona, a Lor. fez xixi na cama e o colchão era de palha. Daí, a Irmã Nat. obrigou a menina humilhada e chorando a carregar nas costas o colchão até a classe; quando acabou a aula, levou o colchão de volta para o dormitório. Quando alguém andava no corredor de len-çol enrolado na cabeça era porque tinha feito xixi na cama.

Injustificáveis aplicações de castigo, medo e humilhação sobre o fato de “fazer xixi” e ter de carregar o colchão úmido nas costas ou caminhar com a cabeça embrulhada no lençol molhado de uri-na. Essas relações de poder perpassavam, segundo Bourdieu e Pas-seron (1992), técnicas pedagógicas em que as freiras impunham penitências humilhantes para o controle esfincteriano, expondo as órfãs a situações vexatórias e de fraqueza para que atingissem o autocontrole da função de micção.

Corroboram com a reflexão as palavras de Dolto (1998, p. 128):

A enurese é sem dúvida uma linguagem. O xixi na cama é corrente nas crianças da ASE (Assistência Social à Infân-cia). Há acolhimento que [...] seja por não levarem a sério o problema, seja por recorrerem a receitas que podem ser terríveis. Cito duas ou três que me parecem especialmen-te sádicas: fazem a criança dormir sem cobertor e no chão

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para que sinta frio quando urina, ou fazem um nó aperta-do em torno do pênis para impedi-la de urinar; ou ainda, obrigam a criança a usar sempre o mesmo pijama e o mes-mo lençol, para o mau cheiro a incomode.

Reconstruir os percursos sociais nas dimensões profissionais e familiares abrange situações e pontos de referência pelos quais pas-saram as entrevistadas: o fim do tempo de asilada, descontinuidade de estudo, ingresso no mundo do trabalho dentro ou fora de casa, mudanças de emprego, moradia, casamento, nascimento de crian-ças, interrupção das atividades de trabalho fora, ascensão social...

As recordações das egressas colocam de novo no coração sua fase de criança e de asilo, o qual elas denominam “escola ou colé-gio”, as colegas, as freiras, em que o tempo não se baliza por dias, meses, anos, mas pelo que foi significativo na reconstrução de um passado, que por vezes se presentifica, com repercussões de ex-trema relevância para a condição de casada, de dona de casa, de profissional, de doméstica... Fernandes, R.S. (2002, p. 82), ao pes-quisar as Memórias de Menina, expõe que:

A possibilidade de evocar imagens significativas vivencia-das no passado e de relacioná-las com o que é vivenciado no tempo atual revela um processo de ressignificação das vivências, tanto das passadas como das presentes e futuras, ou seja, do que se viveu, do que se vive, do que se procura manter ou viver futuramente.

repercussões da vida infantil na Instituição total

Reativar a memória das egressas, com foco no passado, para descobrir como foram seus caminhos de vida pós-instituição, tor-

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nou-se uma categoria para reconstruir trajetória não-linear, com seus condicionamentos, seus silêncios, suas amnésias, apropriação de sentimentos de alegria, suas integrações, momentos de repres-são ou de medo que povoavam o orfanato.

A decodificação dos relatos das egressas, sob a visão da vida adulta, em cotejo com as diferenças e as semelhanças, permitiu inferir que a memória se transmuda em história de vida com as repercussões em seus destinos, pelo tempo em que permaneceram no Asilo de Órfãs.

As análises de Kenski (1995, p. 109) ensinam-nos que:

As vozes, que atuam na recuperação da memória, vêm mostrar a interferência de muitos outros fatores no mo-mento do relato. O primeiro é a seletividade da memória. A memória é seletiva e envolve, não apenas lembranças, mas também silêncios e esquecimentos. O que é narrado é, pra-ticamente, uma reconceituação do passado de acordo com o momento presente. As pessoas não têm, em suas memó-rias, uma visão fixa, estática, cristalizada dos acontecimen-tos que ocorreram no passado. Pelo contrário, existem múl-tiplas possibilidades de construir-se uma versão do passado e transmiti-la oralmente de acordo com as necessidades do presente. É nesse momento, o da narrativa de uma versão do passado, que as lembranças deixam de ser memórias para tornarem-se histórias.

Com lábios trêmulos e olhos marejados, as recordações das egressas fizeram aflorar a condição de criança de asilo, as colegas, as freiras, momentos de repressão ou de medo que povoavam o orfanato, em um tempo não balizado por dias, meses, anos, mas pelo que foi significativo na reconstrução de um passado, por ve-zes presentificado, com repercussões de extrema relevância para seus destinos.

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As entrevistadas rememoraram os tempos de criança, as brin-cadeiras, as travessuras, os medos do castigo, as aulas, as missas, a capela, o coral, as procissões de 15 de agosto. Momentos de maior sofrimento, talvez por envolverem motivos mais complexos e traumáticos, foram silenciados, salvaguardando fatos da vida que, talvez, não desejassem exteriorizar. As reflexões de Pollak (1989, p. 8) iluminam-nos quanto aos silêncios e aos “não-ditos”:

[...] existem nas lembranças de uns e de outros, zonas de sombra, silêncios, não-ditos. As fronteiras desses silêncios e “não-ditos” com o esquecimento definitivo e o reprimido inconsciente não são evidentemente estanques e estão em perpétuo deslocamento.

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Notas

* Doutora pela Faculdade de Educação/Unicamp, pesquisadora do CMU; Professora de Sociologia Jurídica da PUC-Campinas e coordenadora do Curso de Direito/UNISAL/Campus Liceu Salesiano/Campinas. E-mail: <[email protected]>.1 As Filhas de Maria pertenciam a um grupo da Igreja que primava pelo cultivo de valores evangélicos, muita pureza, castidade, oração e espiritualidade.2 Lefèbvre, na sua obra La vida cotidiana en el mundo moderno (Madri: Alianza, 1972), propõe uma nova conceituação de revolução, que ocorre, no cotidiano, quando se quebram amarras, preconceitos, tradições, podendo partir de uma única pessoa, como sinal de contraste, e motivando as demais.