index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the festival of collect-ivities held...

64

Upload: others

Post on 28-Feb-2021

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)
Page 2: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)
Page 3: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 3

Index

Editorial

Cineclubismo

XV Encontro Nacional

de Cineclubes

Cineclube de Torres Novas

Perspectivas

do Cineclubismo Galego,

Pasado, Presente e Futuro

Cineclubismo, propriedade

e novas tecnologias no Brasil

Paulo Emílio Sales Gomes

História

O Cine Galego

Comentário

Diversidade e contradição

Alice, de Marco Martins

Dois veteranos

Quarteto Bergman

O gosto da decadência

Entrevista

Gaijin – Ama-me como sou

Festival

FIKE 2005 – O Cinema de curta

duração volta a Évora

Ensaio

Apocalypse Now:

A insanidade, a Imoralidade,

a Absurdez da Guerra

Memória

Pequena Memória

de José Vieira Marques

Leituras

Editorial

Film Societies

15th Portuguese Meeting

of Film Societies

Torres Novas Film Society

Perspectives

about Galician film-societies,

Past, Present and Future

Film societies, property

and new technologies in Brazil

Paulo Emílio Sales Gomes

History

The Galician Cinema

Commentary

Diversity and contradiction

Alice, by Marco Martins

Two Pros

Bergman Quartet

A taste for decadence

Interview

Gaijin – Love me the way I am

Festival

FIKE 2005 – Short Film Festival

back in Évora

Essay

Apocalypse Now

Insanity, Immorality,

the Absurdity of War

Memory

Reminiscences

of José Vieira Marques

Book Reviews

Edição e PropriedadeRua de S.ta Catarina,730 - 2° Tras.4000-446 Porto Portugal

Tel/Fax - (351) 22 200 02 53 E-mail: [email protected] € 2,50 (Cineclubes € 2,00)Registo na DGCS nº 109120 Depósito Legal n° 88347/95

Os textos assinados são da res-ponsabilidade dos autores, os res-tantes do Director

Revista nº 35Outubro • Novembro • Dezem-bro de 2006Órgão da Federação Portuguesade Cineclubes

Director Honorário: Henrique Alves CostaDirector: João Paulo Macedo

Direcção Executiva e Coordena-ção da Edição: Paulo MartinsDirecção Gráfica: Margarida Vilarde MacedoRevisão: Manuel Montenegro,Patrícia GilvaiaSecretariado: Cristina Silva

Textos: Ana Paula Margarido de AzevedoAnxo SantomilArtur Guilherme de CarvalhoCarlos Melo FerreiraDaniel RibasFelipe MacedoFilipe LopesJoão Paulo MacedoLuis MirandaNuno GuedelhaDirecção do Cineclube de TorresNovas

Fotos:Capa: Goodbye, Dragon Inn, de TsaiMing-Liang, cortesia Atalanta FilmesAtalanta FilmesFIKEHector Films (Piers Thompson)Madragoa FilmesUgly Duckling Films (Winnie Li)Cineclube do BarreiroRestantes fotos: Direitos Reservados

Agradecimentos:José António Cunha, Patrícia Gilvaia

Pré-Impressão e Impressão:Green Book Artes Gráficas, Lda.R. Dr. Eduardo Santos Silva, 261Tiragem: 1000 exemplares

Publicação apoiada por:

ICAM - Instituto do Cinema Ministério da CulturaAudiovisual e Multimédia

Sumário Index

4

5

6

8

15

19

22

26

30

32

36

40

43

48

52

60

62

Page 4: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 4

editorial

Editorial

Oportunidadesas instituições – como na nossa vida pessoal –perdemos, por vezes, oportunidades únicas.

Se no nosso caso pessoal os principais, mas nemsempre únicos afectados, somos nós próprios, já nocaso das instituições a situação muda de figura e po-demos condicionar não só o presente do qual parti-cipamos, como o futuro da própria instituição.

Vem isto a propósito de algumas reflexões im-portantes que urge fazer no seio do Cinema emPortugal mas também no seio de cada um dos Ci-neclubes.

No que diz respeito ao Cinema Português, mu-dou-se a legislação e espera-se para breve a publica-ção dos Regulamentos que irão permitir a sua exe-cução. Talvez um excelente momento para preve-nir algumas práticas que, ao longo dos anos, se fo-ram instituindo sem que daí resultasse qualquermelhoria significativa do panorama cinematográfi-co nacional.

No que concerne aos Cineclubes (entenda-secomo o conjunto dos Cineclubes reunidos numaFederação), o desenvolvimento de projectos e acti-vidades multilaterais espera por melhores dias. Ob-viamente que a sede de alguns desses projectos de-verá ser a Federação, cuja Direcção se tem mantidofiel ao propósito de cooperar e aberta ao lançamen-to de desafios.

Aproveitando as oportunidades que poderãosurgir nos próximos tempos, diversificar e consoli-dar o conjunto de actividades que desenvolvemos éo desafio e a tarefa a desempenhar. Mas tal passa poruma cooperação que nem sempre tem existido.

Criar uma rede próxima de colaboração e infor-mação foi um desafio que nos lançamos, agora espe-ram-se os contributos que darão corpo a essa rede.

Não devemos perder a oportunidade.

João Paulo MacedoPresidente da FPCC

Tradução: Branca Sampaio

NEditorial

Unique Opportunitiese often miss unique opportunities both in our pri-vate and in our professional lives. While in our

private lives the damage is mainly personal, in our pro-fessional lives the present and even the future of the in-stitution can be compromised.

With this I intend to rouse the Portuguese cinema-tographers and film society members to bring into dis-cussion important cinema issues.

As far as Portuguese cinema is concerned, new lawshave been passed that will certainly help prevent somelong-time procedures that have never brought much im-provement to national cinematography.

As for film societies, little has been done for the de-velopment of projects and of multiple activities. Some ofthose projects have obviously to be directed by the Fed-eration of Film Societies, whose management has beenfaithfully cooperating and openly accepting new chal-lenges.

In order to seize the oncoming opportunities, wehave to face a new challenge and mission: to diversifyand strengthen the amount of activities our film societieshave to offer. However, this depends on a full coopera-tion that has not always been wholly there.

Film societies have been given a new challenge: tobuild a neat cooperation and information network. Nowwe only have to wait for the outcome of this network.

We shouldn’t miss this opportunity.

W

Page 5: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 5

cineclubismo

ecorreu de 30 de Março a 2 de Abril, repartidopor Vila Nova da Barquinha e Torres Novas, o

XV Encontro Nacional de Cineclubes. Este encontrofoi uma organização conjunta da Federação Portu-guesa de Cineclubes (FPCC) e do Cineclube de Tor-res Novas, contando com o apoio das Câmaras loca-is e saldou-se de acordo com os participantes comoum excelente espaço de discussão.

Participaram no encontro 14 Cineclubes e repre-sentantes das Câmaras Municipais de Benavente e deVila Nova da Barquinha, que enriqueceram o seminá-rio “CINECLUBES E AUTARQUIAS – Novos Desafios”.Aqui se discutiram as melhores formas de os Cineclu-bes divulgarem o cinema em parceria com os municí-

pios, o que acaba por ser umamais valia para ambas as partese um enriquecimento da cultu-ra promovida pelas autarquias.

No seminário “ICAM e CINE-CLUBES – Que Relação?”, quecontou com a presença de um re-presentante do ICAM, Drª MariaManuel Lopes Ribeiro, os Cine-clubes deram a conhecer àquelainstituição as suas sugestões paraum melhor relacionamento, espe-cialmente no âmbito da Rede Al-ternativa de Exibição, salientan-do-se a importância de uma inter-ligação da FPCC com o ICAM

para que ocorra essa melhoria.No último dia do Encontro, foi apresentada a pági-

na de Internet da FPCC (www.fpcc.pt) e como podemos cineclubes utilizá-la para divulgar as suas activida-des. Em seguida, fez-se a apresentação da Revista Cine-ma, debatendo-se os seus critérios editoriais e algumasalterações a introduzir no próximo número. Por fim,apresentou-se o projecto APORDOC para o Documen-tário em colaboração com a FPCC, que permitirá aos ci-neclubes exibir documentários com maior frequência.

É de salientar o contributo que a Câmara de VilaNova da Barquinha deu ao encontro, nomeadamen-te com a oferta das refeições e a disponibilização deum funcionário que apoiou todas as iniciativas quedecorreram no Centro Cultural daquela vila.

D

Nuno Guedelha (Director), João Paulo Macedo (Director) e António Canelas (Presidente da assembleia geral)

he 15th Portuguese Meeting of Film Societies took pla-ce from March 30th to April 2nd, in Vila Nova da Bar-

quinha and Torres Novas. This Meeting was organized by thePortuguese Federation of Film Societies (FPCC) and the FilmSociety of Torres Novas, and was sponsored by the Municipali-ties of Vila Nova da Barquinha and Torres Novas. According tothose who participated, it was an excellent space of debate.

Fourteen Film Societies participated in the Meeting,and also representatives of the Town Councils of Bena-vente and Vila Nova da Barquinha, who enriched the se-minar “FILM SOCIETIES AND MUNICIPALITIES - NewChallenges”. Here were discussed the better ways forFilm Societies to promote cinema working together withMunicipalities, which eventually is good for both partiesand improves the culture encouraged by the latter.

At the seminar “ICAM and FILM SOCIETIES – WhatRelationship?”, in which a representative of the ICAM (Por-tuguese Institute for Cinema, Audiovisuals and Multime-dia), Dr. Maria Manuel Lopes Ribeiro, was present, the FilmSocieties gave to that institution some suggestions to im-prove their relationship, specially about the AlternativeFilm Exhibition Network, emphasizing the importance ofan interconnection between the FPCC and the ICAM, sothat improvement may happen.

On the last day of the Meeting, the Website of the FPCCwas made known to the Film Societies (www.fpcc.pt) and theylearnt how to use it to promote their activities. After that, themagazine Cinema was presented, its editorial criteria were dis-cussed, as well as some changes to me made in the next num-ber. Finally, the project APORDOC for Documentary, that hasthe collaboration of the FPCC, was introduced, which will ena-ble the Film Societies to exhibit documentaries more frequently.

One must emphasize the contribution that the TownCouncil of Vila Nova da Barquinha gave to this Meeting,namely by offering the meals, and sending a council em-ployee to support all the initiatives that took place in theArts Centre of that town.

T

XV Encontro Nacional de Cineclubes

15th Portuguese Meeting of Film SocietiesTexto: Nuno Guedelha

Tradução: Marta Silva

Page 6: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 6

cineclubismo

“Mais do que máquinas, precisamos de humanidade” – Charles Chaplin

ais um ano de actividade. Com o país absorvi-do numa crise profunda, mantemos bem vivo

este projecto de resistência cultural.Também nesta casa se luta contra o défice. O dé-

fice da participação cívica e da intervenção culturalque cada vez mais nos assalta. Estamos aqui para ocombater. Entre os “reality shows” e outros futebóis,contem com o nosso pequenino contributo para odesenvolvimento da sociedade por via da acção al-ternativa e cultural.

É por isso que, no ano passado, homenageámoso poeta torrejano José Alberto Marques, realizámosuma noite de leitura poesia e música com as partici-pações de Carlos Alberto Moniz, Sérgio Ribeiro,Amélia Maia e Eduardo Bento. É por isso que iniciá-mos as actividades de um núcleo de bonsais, realizá-mos exposições de fotografia e pintura e, entre todasestas actividades, claro, tivemos CINEMA.

Exibimos cinema na nossa sede, no AuditórioMunicipal da Barquinha, em Constância, em Alpiar-ça, na feira do livro do NERSANT e colaborámoscom a Festa das Colectividades realizada pelaUCATN.

Foi com orgulho também que vimos a “nossa”curta-metragem Carta ao Ópio, seleccionada para o“Caminhos” de Coimbra e para o “FIKE” em Évora.

M

“More than machinery we need humanity” – Charles Chaplin

nother working year. To help resist the crisis thatis taking over the country we keep this cultural

project alive.We’re also fighting against the deficit: the growing

deficit of civic and cultural participation. You can counton our small contribution to help develop society via al-ternative and cultural activities.

That’s why, the previous year, our Film Society heldinitiatives like honouring José Alberto Marques, a poetfrom Torres Novas, promoting a poetry reading and mu-sic session by Carlos Alberto Moniz, Sérgio Ribeiro, Am-élia Maia and Eduardo Bento, starting a workshop onthe art of growing bonsais, exhibiting photography andpaintings and, obviously, projecting films.

We screened films at Auditório Municipal da Bar-quinha, in Constância, Alpiarça, and at the NERSANTbook fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN.

We were proud to have our short film Carta aoÓpio (Letter to Opium) nominated for the short film fes-tivals of Coimbra (Caminhos) and Évora (FIKE).

… And we had the Virgínia! The Torres NovasFilm Society (CTN) has had the opportunity to use theroom of the newly rebuilt Teatro Virgínia. We had thetime of our lives in the “old” Cine Teatro Virgínia, be-longing to the bank Montepio Nossa Senhora da Naz-aré that kindly supported all our work. Under the proto-col signed by the CTN and the City Hall of Torres Novas,we are now a “resident” association at the Virgínia,

A

Cineclube de Torres Novas(Torres Novas Film Society)

Tradução: Branca Sampaio

Page 7: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 7

cineclubismo

…E tivemos o VIRGÍNIA! Muitos anos depois, oCine-Clube de Torres Novas voltou a exibir cinemano agora renovado Teatro Virgínia. Muitas das me-lhores páginas do Cine-Clube foram escritas no “an-tigo” Cine Teatro Virgínia, propriedade do MontepioNossa Senhora da Nazaré que muito colaborou con-nosco. Mediante o protocolo assinado entre o Cine-Clube e o município de Torres Novas, somos uma as-sociação “residente” no renovado Virgínia e, por viadisso, demos um salto de qualidade nas nossas pro-jecções. Com a vantagem de os nossos sócios com asquotas em dia beneficiarem de preços especiais!

Queremos mais sócios, mais participação. Porenquanto vamos continuar as nossas actividades noVirgínia e, procuraremos colocar em todas elas anossa garantia de qualidade.

É por isso que convidamos os nossos sócios e to-dos aqueles que gostam de cinema: este ano passempor nós no Virgínia!

which led to the improvement in the quality of our filmprojections and to the creation of special prices for ourassociate members who commit to their annual contri-butions.

We want more associates and more participation.For now, we’ll keep doing our work at the Virgínia, try-ing to keep up with the quality people expect from us.

That’s why we invite all our associate members andall cinema fans to come and visit us at the Virgínia.

Page 8: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 8

cineclubismo

IntroduccionComo introducción a esta intervención pode-

mos utilizar as palabras do noso apreciado AlvesCosta, cando alá polo lonxano 1949 andaba na for-mación do Cineclub do Porto e que dicía: “estas en-tidades pretenden criar unha cultura cinematográfi-ca que dé, polo menos, a unha parte daqueles quevan áo cinema, o discernimento necesario para sepa-rar o trigo da palla e recoñecer, por sí sós, as cualida-des ou defectos dos filmes que corren polos ecráns.Aspiro, ainda, a proporcionar, a todos os que amanverdadeiramente o cine-arte, os medios para apren-der a coñecelo mellor ao apreciar, ao tomar contac-to consciente co Cinema serio de varias épocas, dife-rentes estilos, diversos autores e variados xéneros”.

Como todos sabemos, os cineclubes naceron enFrancia a finais dos anos 10, froito das preocupaciónsde Ricciotto Canudo e de Louis Delluc por dar cartade actividade artística ao cinema, ó que as élites deParís tiñan polo xeral como espectáculo popular deínfima calidade, malia os esforzos que sociedades deproducción como Film d’Art fixeron por xunguir ex-presividade artística e rendemento comercial. Logo,os clubs de cine constituiron na década de 1920 unviveiro de actividade cinematográfica innovadora:proxeccións de filmes, tanto franceses como estran-xeiros, rexeitados ou arredados da distribución co-mercial; un medio de expresión, semellante á litera-tura e á pintura; creación dun público adicto, paraquén había que facer filmes de ruptura. A actitude

IntroductionTo introduce this communication we can use the ad-

mirable Alves Costas’s words when, about the year of1949, he attended the Cineclube do Porto training,and said: “this entities want to create a cinematograp-hic culture which gives , at least to some of those who goto the cinema, the necessary discernment to choosebetween good and bad quality and recognize by them-selves, the qualities and faults of the films which appearon the screens. I also aspire to offer, to all who really lovecine-art, the means to learn to know it better ; enjoyingand dealing ,in a conscient way, with serious Cinema ofdifferent times, styles and genres”.

As we all know, film societies were born in France bythe end of the XXth century first decade, as a result ofRicciotto Canudo and Louis Delluc´s preoccupations tomake cinema an artistic activity. In a general way, theelite of Paris thought it to be a low quality popular show, despite the efforts that production societies as Filmd’Art had done to gether artistic expression and com-mercial profits. So, film-societies created in the 20’s a li-vely and innovative cinematographic activity: projecti-ons of French and foreign films which were rejected orwithdrew from commercial circuits; a form of expressionsimilar to literature or painting; creation of a devotedpublic to whom it was necessary to produce rupturefims.. This attitude crossed frontiers in Central Europeand English language countries as well as in latin coun-tries.

Perspectivas do Cineclubismo Galego, Pasado, Presente e Futuro

Perspectives about Galician film-societiesPast, Present and Future

Comunicação realizada por Anxo Santomil Secretario da FCCG (Federación de Cineclubes de Galicia) no Encontro Nacional de Cineclubes, Viseu 2005

Tradução: Filipa Guerreiro

Page 9: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 9

cineclubismo

traspasou as fronteiras, tanto cara Centroeuropa epaíses de fala inglesa como cara ós países latinos.

En España foi precisamente Luis Buñuel quen naResidencia Universitaria de Estudiantes de Madridorganizou, en 1925, proxeccións á maneira dun cineclu-be. Tres anos despois, co patrocinio da revista La gacetaliteraria ten a súa primeira sesión o cineclub Español.

Os Primeiros Cine Clubs en GaliciaSen embargo, en Galicia non é ata 1950 cando

empezan a xurdir os primeiros cineclubes, aínda quecon anterioridade, na primeira metade dos anos 30,houbera programacións máis ou menos organizadasen diversas cidades por parte dos chamados “Comi-tés de cooperación intelectual”. De maneira semel-lante ó que sucedía noutros sitios, houbo en Galiciacineclubes que podemos chamar “proletarios”, e quedivulgaron filmes soviéticos, entre outros, coa finali-dade de concienciación política traducindo ó territo-rio galego pautas de acción experimentadas polos co-mités do “Proletkult” que viñan intervindo na URSS.

Despois da guerra civil hai un baleiro na hisroriados cineclubs en Galicia de case quince anos. En Ma-drid, e noutras cidades de España, sobre todo en cida-des con universidade, van aparecendo agrupacións óabeiro de organismos culturais, relixiosos ou ben for-macións políticas gobernamentais de ideoloxía falan-xista, maiormente, e a imitación do que aconteceranas universidades italianas durante o fascismo. Todosterán que superar atrancos censores moi diversos, undeles a limitación do fondo cinematográfico disponi-ble para poder ser empregado nas súas sesións.

Na metade dos anos 50 xurde en Santiago unhafederación cos cineclubs que empezaban a existir endiversos lugares de Galicia. Sen embargo, o aconte-cemento máis importante prodúcese no ano 1954cando se pon en marcha o cine club Pontevedra. Assúas primeiras sesións son filmes franceses de tipocultural e sesións especiais adicadas ó cinema portu-gués coa presentación de filmes como Nazaré, deLeitao Barros, e Douro, Faina fluvial de Manuel deOliveira. Estos primeiros contactos co cinema por-tugués viñan dados polas estreitas relacións que oscineclubs galegos empezaban a manter cos cineclu-bes de Portugal, sobre todo co Cineclube do Portoé máis concretamente co seu presidente Alves Costa.

A finais dos anos sesenta, cando os universita-rios galegos entraron nas loitas do tardofranquismoa xeira dos cineclubes de Santiago mudou substanci-

In Spain it was precisely Luís Buñuel who, at the Re-sidencia Universitaria de Estudiantes de Madridorganized, in 1925, film-society-like projections. Threeyears later with the financial support of the magazine Lagaceta literaria he has his first session at the cineclubEspañol.

The first film-societies in GaliciaHowever, it’s only in 1950 that the first film-societi-

es appear in Galicia, even if in the first half of the 30’sthere was, in several cities, a more or less organized pro-gramming by the so-called “Intellectual CooperationCommittees”. Similarly to what happened in other coun-tries, Galicia had some “proletarian” film-societieswhich divulged soviet films among others with politicalconsciousness aims, bringing to the Galician territoryaction mouldes experimented by the “Proletkult” com-mittees which had been intervening in the USSR.

After the civil war there is a 15 years old emptinessin the Galician film-societies history. In Madrid as inother Spanish cities, essentially the ones with universiti-es, some groups start to appear near cultural and religi-ous organizations or even fascist governemental politi-cal formations, immitating what had happend in italianuniversities during the fascism. All will have to overcome

O jovem Luis Buñuel, pioneiro do cineclubismo em Espanha

Page 10: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 10

cineclubismo

almente. En 1974 eran feitos usuais as presentaciónse coloquios. Os cambios políticos da segunda meta-de dos 70 trouxeron na década seguinte, paradóxi-camente, o declive destas sesións que, durante untempo, seguiron gracias á labor divulgativa dos ser-vicios de extension cultural da Universidade deSantiago, co funcionamento regular dunha Aula decine ata 1992, e o cine club Carlos Varela Veiga.

O Cineclubismo e o Cine GalegoNa cidade de Ourense aparece na Escola Univer-

sitaria de Profesorado o Cine Club Padre Feijooque nos primeiros anos comenza ca organización dasXornadas de Cine de Ourense, acontecemento soci-ocultural na Galicia dos anos 70 que se convertiría,ata o ano 1978, nunha mostra anual das carencias eposibilidades do que daquela se chamaba “cine dasnacionalidades”: definición do seu contido, o seucompromiso político, emprego ou non do formatosestándar, as canles de exhibición, etc. . Desenvólven-se nun clima de falta de libertades democráticas, cen-sura e nulo apoio oficial á cultura galega.

Estas Xornadas de Cine en Ourense ao longo dassúas ediccións tiveron como principal argumento a si-tuación do cine marxinal mantendo, como asegurabanos seus manifestos, a política de resistencia levada acabo na Galicia para manter a súa realidade históricacomo nacionalidade socio-cultural e que serviron comoxustificación para a xuntanza de tódalas nacionalida-des e rexións do Estado español, potenciando a realida-de plurinacional. Co slogan “O pobo non é mudo”concretou a definición de “Cines nacionais” no que bá-sicamente estaba referido ás producións realizadas noPaís Basco, Cataluña e Galicia. Consistía en dar cuño ó“Cine alternativo”, conferindo a este conceito a súa ra-zón de ser determinada polo contexto onde se orixina.

O Cine Club Padre Feijoo convírtese así no ca-talizador principal dos dabates de carácter político ecinematográfico galego nos que participan non sóaqueles que se encontran implicadas no incipientecine galego senón tamén os movimentos intelectu-ais e asociativos. O cine galego comenza a dar osseus primeiros pasos nos grandes formatos, 16 e 35mm. afírmanse nas súas primeiras sinais de identi-dade supoñendo unha manifestación máis do proce-so de afirmación que vive a cultura galega nas pos-trimerías do réxime franquista. Curiosamente, aaprobación da Constitución democrática marcará oinicio do refluxo do movemento reivindicativo do

several critical bounds, as the limits of the available ci-nematographic fund to be used in their sessions.

In the middle of the 50’s the film-societies whichstarted to appear in Galicia created a federation in San-tiago. However the most important event is in 1954 withthe first steps of the Pontvedra fim-society. Its first ses-sions are cultural French films and special sessions de-dicated to the Portuguese cinema, it presented filmssuch as: Leitão de Barros’s Nazaré and Douro or Ma-nuel de Oliveira’s Faina Fluvial. These early contactswith Portuguese cinema were possible due to the closerelationship which Galician film-societies had startedwith Portuguese film-societies, mainly with the Cineclu-be do Porto and namely with its president Alves Costa.

By the end of the 60’s , when the Galician universi-tary students enter the tardofranquismo1 fights, thecompetences of the Santiago film-societies have comple-tely changed. In 1974 the usual presentations and col-loquys still took place. Paradoxically, the political ex-changes of the late 70’s brought in the following deca-de, the decadance of these sessions which, for sometime, continued due to the divulging work of the Uni-versidade de Santigo cultural extention services withthe regular functioning of a cinema class until 1992,and the Cine Club Carlos Varela Veiga.

The film-society activity and theGalician Cinema

In the city of Ourense at the Escola Universitariade Profesorado apears the Cine Club Padre Feijoowhich in the first years starts to organize the Xornadasde Cine de Ourense, a socio-cultural event in Galiciaduring the 70’s which would become until 1978, an an-nual exhibition of needs and possibilities called “cinedas nacionalidades” : its contents and political com-promise definiton, standard formats use (or not) , theways of exhibition, etc. These develop without democra-tic freedoom , censorship and null support to the Galici-an culture.

During its sessions the Xornadas de Cine de Ou-rense have had as main argument the cinema marginalsituation, keeping , as its manifests guarantee, the Gali-cian resistence policy in order to maintain its historicalreality as a socio-cultural nation which justifyed the uni-on of all Spanhish State regions, as a way to promotethe plurinacional reality. With the slogan “The peolpleisn’t mute” the definition of “Cines Nacionais” was

1 franquismo – political regime of General Franco in Spain

Page 11: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 11

cineclubismo

cinema galego celebrándose por última vez as Xor-nadas das Nacionalidades e Rexións en Ourense,que morrerán agobiadas polas débedas e a falta deapoio oficial. Perdíase así a principal plataforma delanzamento e debate do cine en Galicia.

Sen embargo, a partir de eiquí empezan a xurdiras semanas de cine organizadas por cineclubs en dife-rentes cidades galegas iniciando unha tendencia decrecemento das actividades de difusión cinematográ-fica mentras que, paralelamente, decrece a presenciado cine galego nos medios de comunicación e a súaincidencia na cultura galega. Os realizadores e técni-cos do cinema dos anos setenta buscan a profesiona-lización creando productoras do soporte videográfico.

O ano 1984 representa o primeiro cambio cualita-tivo no sector audiovisual en Galicia dende a décadados setenta: o novo equipo da Dirección Xeral de Cul-tura da Xunta de Galicia, formado e pertenecente nasúa gran maior parte ó movemento cineclubista e cine-matográfico, elabora e pon en marcha o primeiro pro-xecto de política audiovisual para Galicia, creando in-fraestructuras como o Arquivo de Imaxe, subvencio-nando produccións en 35 mm e vídeo profesional, po-tenciando a investigación, introducindo a imaxe noscentros de ensino e apoiando iniciativas de difusióncomo a Filmoteca de Galicia as I Xornadas de Cine eVideo en Galicia no Carballiñoamais doutras manifestacións au-diovisuais.

Unha explosión de activida-des de todo tipo fan concebir es-peranzas de normalización entreos afecccionados e os novos pro-fesionais. Paralelamente, o vídeogalego acada prestixio e éxitonos festivais do estado español ena crítica especializada.

Neste ano 1984, despois dedesaparecidas as Xornadas deCine de Ourense, o cine clubCarballiño, que nacera no ano1969, comenza a organizar asXornadas de Cine e Video en Ga-licia, as XOCIVIGA convirtíndo-se no dinamizador cultural máissalientable con repercusións cine-matográficas en Galicia. Estasxornadas acolleron foros de dis-cusión cinematográfica, promo-

rendered concrete as referring to Basque, Catalan andGalician productions. It was about making a differencein the “Alternative Cinema” giving this concept its realsense determined by its original context.

The Cine Club Padre Feijoo becomes thus thecatalyser of the Galician political and cinematographicdebates where the intellectual and associative mouve-ments participate, together with those directly involvedin the incipient Galician cinema; This takes its firststeps in large formats, 16 and 35mm. Its first identitysigns are supposed to be another manifestation of theaffirmation process which the Galician culture lives inthe late years of the franquista administration. Stran-gely, the democratic Constituion approval will mark thebegining of the reflux in Galician cinema protest mou-vement. The Xornadas das Nacionalidades e Re-xións will take place for the last time in Ourense, theywere suffocated by debts and lack of official support.This way the main launch and debat platform to theGalician cinema, was lost.

However, from now on film-societies start to organi-ze cinema weeks in different Galician cities thus increa-sing the activities of cinematographic diffusion , while ,at the same time the presence of the Galician cinema inthe media and its incidence in the Galician culture is de-creasing. Directors and technicians of the 70’s cinemalook for a professinal certification creating videographicsupport producers.

The year of 1984 represents the first quality changein the Galician audiovisual sector since the 70’s: the newteam of the Dirección Xeral de Cultura da Xunta

de Galicia, whose most membersbelong to the film-society and cine-matographic mouvement , elabora-tes and starts the first Galician pro-ject of audiovisual policy, creatinginfra-structures as the Arquivo deImaxe, financing 35mm producti-ons and professional video, increa-sing reseach , introducing image inschools and supporting diffusioninitiatives as the Filmoteca deGalicia and theI Xornadas deCine e Video en Galicia in Car-balliño besides other audiovisualmanifestations.

The explosion of these assortedactivities allows the cinema enthu-siasts and professionas to feed the

Page 12: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 12

cineclubismo

veron e recuperaron filmes gale-gos, editaron publicacións relaci-onadas coa imaxe e producironexposicións fotográficas e cine-matográficas. Por impulso de his-toriadores tan renombradoscomo Joaquim Romaguera, nasXOCIVIGA sentáronse as basespara a creación da Asociación dehistoriadores cinematográficosdo Estado Español ó igual que sepromove a creación da Escola deImaxe de Galicia, o Centro Ga-lego das Artes da Imaxe, asocia-cións de profesionais cinemato-gráficos, etc..

A Federacion deCineclubes de Galicia

Por estas datas créase a Fede-ración de Cineclubes de Galiciae con ela inícianse os encontrosanuais dos cineclubs galego-por-tugueses. Terán unha sucesión continuada a través daComisión Luso-Galaica para a Cooperación Cine-matográfica e Cineclubista que no ano 1988 foi cre-ada na cidade de Viana do Castelo. Abríase un canleimportante de desenvolvemento de proxectos con-xuntos que permitiu coñecer en ámbolos dous paisesas cinematografías e as diferentes tendencias audiovi-suais que se viñan producindo a cada lado da frontei-ra e que permañecían absolutamente ignoradas.

Os anos oitenta son os momentos máis impor-tantes e máis dinámicos do movemento cineclubis-ta en Galicia. Baixo a coordenación da Federación,increméntanse as actividades de difusión cinemato-gráfica a través de semans de cine en diferentes pun-tos da xeografía galega mentras que, por outra parte,desenvólvense experiencias interesantes relaciona-das co cine no ensino, talleres de formación, deba-tes, publicacións e unha rede de proxeccións itine-rantes, tendo unha presencia importante e esencialno proceso de normalización audiovisual que se cre-ara dende os organismos públicos.

Sen embargo a dimisión de Luis Alvarez Pousacomo Director Xeral de Cultura viría a poñer o findas ilusións nacidas. As iniciativas relacionadas coaimaxe sofen unha regresión ata a disolución do Ar-quivo da Imaxe.

hope for normalization. Simulta-neously, the Galician video gatherscredit and success in the SpanhishState festival and among the spe-cialized critics.

In 1984, after the Xornadasde Cine de Ourense ended, Car-balliño film-society, whcich wasborn in 1969, begins to organizethe Xornadas de Cine e Videoen Galicia, the XOCIVIGA beco-ming the most important culturaldriving force with cinematographiceffects in Galicia. This event welco-med cinematographic disscussionforuns, promoted and recoveredGalician films, edited image-rela-ted publications and producted

photo and cinematographic exihibitions. By the hand ofrenowed historicians such as Joaquim Romaguera, atthe XOCIVIGA the basis to the create a Cinematograp-hic Historicians of the Spanish Estate Association weresettled as the creation of the Escola de Imaxe de Ga-licia, Cebtro Galego de Artes da Imaxe, and otherassociations of cinamatographic professinals were en-couraged to go on.

The Film-society Federation of GaliciaBy this time the Federación de Cineclubes de

Galicia is created and with it the annual encounters ofGalician- Portuguese film-societies. Theses will have acontinued succession through the Comisión Luso-Ga-laica para a Cooperación Cinematográfica e Ci-neclubista which was born in 1988 in Viana do Caste-lo. An important way was now opened to the develop-ment of common projects which let know in both coun-tries different cinematographies and audiovisual trendswhose production was totally ignored until then.

The 80’s are the most important and dynamic yearsof film-society mouvement in Galicia. Under the Federa-tion management the cinematographic diffusion activi-ties increase through cinema weeks in several geoprap-hic points in Galicia; while, on the other hand, interes-ting experiences related with cinema learning, work-shops, debates, edition and a itinerant projections chaintake place. These measures have an important and es-sential presence in the audiovisual normalization pro-cess which will be created within public organisms.

However, Luís Alvarez Pousa’s resignation as Secre-

Page 13: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 13

cineclubismo

Mentres tanto a Federación de cineclubes de Ga-licia toma parte activa no control da Confederaciónde Cineclubes do Estado Español xunto ca Federa-ción Catalana e Andaluza. Póñense en marcha expe-riencias inovadoras que se pretenden trasladar ámesma Federación Internacional de Cineclubs axeito de alternativas para o futuro e que son plante-xadas nos congresos internacionais que se organizaprimeiro en Barcelona e logo en Sevilla nos anos1990 e 1992 respectivamente.

Unha destas experiencias era a creación dunhaempresa de servicios e distribución de filmes tendoen conta os máis de 500 puntos de exhibición querepresentaban naquel momento os cineclubes entodo o territorio español. A falta dunha axeitada xes-tión administrativa dificilmente controlable polasmesmas federacións periféricas, pois a oficina atopá-base en Madrid, fixo que rematara en fracaso e osproblemas financieiros que ocasionou truncou tódo-los proxectos deseñados arrastrando consigo a unhacrise irrecuperable da propia Confederación de Ci-neclubes do Estado Español.

O Declive dos Cine Clubs GalegosCos anos noventa empeza o declive dos cineclubes

galegos chegando á situación actual de claro estanca-mento e no que se vislumbra un futuro desalentador.

As causas son moi diversas, pero podemos desta-car o feito de que os cineclubes quedaron orfos daque-les dirixentes de certa preparación intelectual con cla-ra orientación dos seus obxetivos e con evidente capa-cidade de dinamismo e ideas. A gran maior parte de-les pasaran a formar parte da estructura profesional eempresarial do sector audiovisual véndose os novosdirixentes absolutamente desamparados e sen os ele-mentos básicos para desenvolver un proxecto alterna-tivo atraínte, pasando os cine clubs da axitación polí-tica e cultural a cumplir unha función substitutoriada exhibición cinematográfica ou, noutros casos, con-virtíndose en meros competidores das sas comerciais.

Hoxendía, por exemplo, non sería posible ato-par un cine club en Galicia que poidera asumir pro-xectos equivalentes ós que veñen desenvolvendo oscine clubs de Portugal. Neste momento é impensa-ble contar con encontros como os de Viana e Avan-ca, festivais como o Fike de Évora, ou Caminhos doCinema Português de Coimbra, ou mesmo as Jorna-das de Cinema e Audiovisual de Fafe.

Outros factores determinantes son as crises con-

tary General of culture puts an end to all illusions. Initi-aves related to image decay until the dissolution of theArquivo da Imaxe.

Meanwhile, the Galician society-film Federation be-comes an active part in the managenmet of the Confe-dération de Cineclubes do EstadoEspañol togetherwith the Catalan and Andalusian federation. Innovativeexperiences start, intending to join the InternationalFederation of Film Societies as future alternativeswhich were presented at the international congresses or-ganized, firstly in Barcelona and then in Sevilla, in 1990and 1992.

One of these experiences was the creation of a filmdistribution company bearing in mind the more the 500exhibition points which represented at the time the film-societies in spanish territory. The lack of an organizedadministrative management hardly controllable by thesame peripheric federations, as the office was in Madrid,surely would end up failling and the economical pro-blems it caused made all the projects impraticable andconducted the Confederación de Cineclubes do Es-tado Español to an irrecoverable crisis.

The decadence of the Galician film-societies

In the 90’s the decadence of the galician film-socie-ties starts until it reaches present stagnant situationwhich allows us to foresee a discouraging future. Thereare several causes but we can underline the fact the film-societies lack intellectually prepared directors , with aclear orientation to their objectives and an evidentdymanic and creative capacity. Most of them now inte-grate the professional and bussiness structure of the au-diovisual sector. The new directors feel completely aban-doned and wtthout the basic elements to build an alter-native and attractive project. So, the cultural and politi-cal disturbance film-societies play now a substitute role,which is not the film exhibition, or are merely competewith commercial cinemas.

Nowadays, for instance, it wouldn’t be possible tofind in Galicia a film-society with the capacity to assu-me projects similar to those developed in Portugal. Atthe moment it´s impossible to find encounters such asthose from Viana and Avanca, festivals as the Fikkein Évora, or Caminhos do Cinema Português inCoimbra, or even the Jornadas de Cinema Audiovi-sual in Fafe.

Other determinant factors are the continued crisis ofthe exhibiton rooms, the abundance of cultural offers,

Page 14: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 14

cineclubismo

tinuadas das sás de exhibición, a abundancia deofertas culturais, a incidencia das últimas tecnoloxí-as e, sobre todo, a crise do modelo asociativo.

O cineclubismo que apostara sempre pola funci-ón cultural atribuída ó cine, atópase agora mesmoobrigado a unha radical transformación que amplíeos seus obxetivos, sin renunciar aos que viñeronxustificando a súa existencia.

Ofrecendo unha proposta de razonamentos po-sibilistas, lonxe de utopías, deben plantexarse conaudacia a articulación dun modelo de cine club concarácter integral e máis ambicioso comenzando cuncambio das actuais circunstancias e de modelos dexestión pois, moitas das veces o fracaso ven dadopola escasa cualificación e a falla de imaxinación dosdirixentes. Debe darse prioridade á coordinación cosdiversos niveis das Administracións Públicas, quedeben implicarse sen reservas, para acadar:

• a recuperación de salas e espacios debi-damente equipados

• promocións de campañas de extensióne fomento do cinema.

• acceso ós materiais das filmotecas públicas.• e marcar como obxetivo final, unha rede

de salas públicas polivalentes, a travésdas cales o cine e o audiovisual, coa di-versidade de manifestacións culturais,artísticas e cívicas, poidan chegar a tódo-los sectores da poboación urbana e rural.

O cineclubismo aínda pode conquistar o seu pa-pel social de intermediario,que non de “marchante”.Terá que renunciar aos vel-los e temerosos esquemaspropios de catequesis naque se exteriorizaban osactos de fe nos deuses darelixión cinematográfica,para defender o cine noseu papel de vangarda dastendencias estéticas e ideo-lóxicas, na súa función decreador de novos lengua-xes aptos para unha comu-nicación gozosa con esenovo “espectador”, casiidentificado co home donoso tempo. En definitivao cineclubismo non podelimitarse ó simple “exhibi-cionismo” da súa pretendi-da pureza cultural.

the new technologies incidence and, above all, the crisisof the associative model.

The film-society activity which has always believedin Cinema’s cultural role, is now forced to a radicaltransformation which enlarges its objectives withoutdenying its pre-existence.

Offering a proposal with rational argumentation,far from utopia, they should cleverly suggest the articu-lation of a film-society model with more ambitious andcomplete features. It should start with the change of thepresent circumstances and management models, as thefailure is often a result of the directors’ little qualificati-on and imagination. Coordination with several levels ofPublic Administration must be prior. They must be fullyinvloved to get:

• The recovering of duly equiped spaces.• Campaigns to promote and increase cinema.• Access to public film collections.• And to mark as final objective a chain of

polyvalent public spaces through which cine-ma and audiovisual could reach severalranks of urban and rural population

The film-society activity still can conquer his role associal intermediate and not as a marchand . It’ll haveto reject the old and fearful catechesis schemes in which

autos-da-fé were exteriorizedin the cinematographic reli-gion gods; in order to defendits role as vanguard cinemaof aesthetic and ideologicaltrends. Its function will be tocreate new languages into aprofitable communicationwith this new “viewer”, al-most indentifyed with thenowadays man. Defenitelythe film-society activity can’tbe reduced to the simple “ex-hibitionim” of its intendedcultural pureness.

Page 15: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 15

cineclubismo

cineclubismo brasileiro tem quase 80 anos, semarcamos sua trajetória a partir do Chaplin

Club, que atuou no Rio de Janeiro a partir de 1928. Mastem mais idade se consideramos as práticas de AdhemarGonzaga, Pedro Lima e outros, que faziam “expedições”organizadas ao Cinema Íris, seguidas de debates sobre osfilmes, isso também na velha capital, desde 1916.

De lá pra cá, o movimento alternativo ao cine-ma comercial viveu peristáltico – um pouco como opróprio cinema brasileiro que o anima – com mo-mentos de expansão e outros de contratura.

O mais importante desses refluxos foi a desestrutu-ração ocorrida no final dos anos 80. Um movimentoque chegara a ter 600 entidades filiadas ao seu organis-mo nacional, o Conselho Nacional de Cineclubes –CNC, e que havia alimentado (através da Dinafilme,distribuidora de filmes ligada ao CNC) cerca de 2.000pontos de exibição em todo o país, em resistência à di-tadura militar, não foi capaz de suportar a onda da glo-balização neoliberal. Ao longo dos anos 90 todas as or-ganizações de caráter cineclubista foram desaparecen-do até, num certo momento,não restar mais nenhuma.

Paradoxalmente, tudoisso ocorreu quando a intro-dução de novas tecnologias –inicialmente o VHS, depois oDVD e a Internet – aponta-vam para uma grande facilita-ção da atividade cineclubista,eliminando a complicada(comparativamente) operaçãoem 16 ou 35mm e agilizandoenormemente a comunicaçãoentre regiões e entidades. Naverdade, esta aparente contra-dição revela justamente opeso dos paradigmas ideológi-cos na organização das insti-tuições culturais.

O

ilm societies in Brazil are almost 80 years old, thefirst being the Chaplin Club, in Rio, dating back

to 1928. But if we consider Adhemar Gonzaga’s andPedro Lima’s organized “expeditions” to the CinemaÍris, in Rio, in 1916, followed by debates over the films,then they are even older.

Since then the alternative movement to commercialcinema has had an unstable life (a bit like the Braziliancinema itself), having moments of expansion and othersof regression.

The main moment of decline was the gradual dis-mantlement of film societies which took place at the endof the 80s. In order to resist the military dictatorship, theNational Federation of Film Societies – CNC hadreached 600 affiliated societies, and had had films

screened in over 2000 cinemarooms all over the country(through their distributor, Dina-filme), but it was unable to copewith the neoliberal globaliza-tion. Through the 90s all filmsocieties came to extinction.

Paradoxically, it all hap-pened when the introduction ofnew technologies – first VHS,

P

Cineclubismo, propriedadee novas tecnologias no Brasil

Film societies, property and new technologies in Brazil

Texto: Felipe MacedoTradução: Branca Sampaio

Adhemar Gonzaga

Page 16: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 16

cineclubismo

Desprovidos de uma motivação mais clara, coma queda da ditadura os militantes do cineclubismovoltaram-se para outras formas de participação polí-tica e social, especialmente nos partidos políticos.Com o desmoronamento da utopia comunista as or-ganizações populares perdem impulso, cedendo lu-gar a estruturas inspiradas no modelo neoliberal,privadas ou simplesmente comerciais. A política cul-tural do Estado passa do fomento direto, por fundospúblicos, para a renúncia fiscal, transferindo a orien-tação da aplicação dos recursos para as empresas pri-vadas: os subsídios à cultura dirigem-se, então, paraas formas consagradas e lucrativas (que, a rigor, nãonecessitam de estímulo) ou para ações de fidelizaçãode marcas e produtos.

Os cineclubes, que se definiam como núcleos deorganização do público ou da comunidade, estrutu-rados sob formas democrático-participativas e semfins lucrativos, tornam-se empreendimentos priva-dos de indivíduos ou grupos reduzidos de acionistas.De fato, entre os cinco maiores exibidores comerci-ais brasileiros estão duas empresas originadas de ci-neclubes e dessa política de incentivo privatista.

Outra mudança fundamental na legislação, nomesmo sentido de privatização da ação cultural, masde alcance mundial, está mais intimamente ligada àevolução dos formatos: trata-se da cabal proibiçãode atividades públicas com cinema. Marcadamentecom o desenvolvimento dos mercados caseiros deVHS e DVD, ao longo dos anos 90 e já neste século,as grandes empresas de Hollywood introduziram leisque proíbem a exibição pública de filmes nesses su-portes. Se antes se assegurava a fermentação culturalfora dos “mercados” estritamente lucrativos – isto é,junto aos mais de 70% que não dispõem de recursospara ir ao cinema – através da diferenciação legal en-tre exibição comercial e exibição sem fins lucrativos,com a imposição do novo modelo substituiu-se oconceito legal (ou cultural) pelo do formato, criandouma reserva de mercado que, na prática, exclui amaior parte da população.

Esses aspectos legais são corolários pontuais,mas nem por isso menos importantes, da grandeapropriação indébita dos trustes estadunidenses so-bre a propriedade intelectual de toda a produção cul-tural. Como consagra a própria Carta das NaçõesUnidas, a justa salvaguarda dos direitos de autor nãopode impedir a livre circulação, a reprodução conti-nuada e a democratização da cultura, essencial para

then DVD and the Internet – seemed to point a way tofacilitate their work: they could substitute the complicat-ed use of the 16mm or 35mm format and could makecommunication between states and societies faster. Infact, this apparent contradiction shows the importanceof ideological paradigms in organising cultural institu-tions.

Lacking a truer motivation, after the fall of the dic-tatorial regime, fans of film societies turned to otherforms of political and social participation, especially topolitical parties. With the fall of the communist utopiapopular organisations lost their strength and gave wayto private or commercial neoliberal ones. The state poli-cy changed from public investment to fiscal refusal –subsidies started being granted to private enterprises forprofitable cultural events and campaigns to promotetrade and products.

Film societies that were used to working as non-profit-making community associations, with a demo-cratic participated leadership, became private enterpris-es. In fact, two private enterprises come out of film soci-eties and of the new subsidy policy are among the mainfive Brazilian commercial cinemas.

Another important legal change, but on a worldscale, was introduced with the banning of projectingfilms at public gatherings. The development of VHS andDVD from the 90s onwards made Hollywood mega-en-terprises introduce laws to ban the public screening offilms on those supports. In the past, non-profitable cul-tural events were promoted (more than 70% of viewerscouldn’t afford to go to the cinema) and laws werepassed that made a difference between the projection offilms in theatres and the non-profit-making projection offilms; nowadays, the cultural concept has been takenover by the digital format concept which excludes agreat part of the population.

These legal procedures are the result of undue ap-propriation of intellectual property of all cultural produc-tion by state trusts. As the United Nations Treaty states,although the author’s copyright has to be safeguarded,it can’t block the free circulation, the reproduction andthe democratization of cultural productions, essential tothe development of communities. To achieve this, theUNO has established different deadlines (to protect theauthor’s rights) before which works of art must becomepublic domain, for everybody’s fulfilment. If it wasn’t so,Bach, Rembrandt, Shakespeare and Buster Keaton couldonly be enjoyed by those who could afford it. And that’swhat Hollywood is trying to do by replacing the “au-

Page 17: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 17

cineclubismo

o desenvolvimento dos povos. Para isso a ONU defi-niu diferentes prazos (que resguardam o usufruto doautor) para que as obras artísticas tornem-se domí-nio público, assegurando sua fruição generalizada.Não fosse assim, Bach, Rembrandt, Shakespeare eBuster Keaton só poderiam ser conhecidos por quempudesse pagar por esse acesso. Eternamente. E é oque Holywood está tentando fazer, transformando“direito de autor” em “direito de propriedade indus-trial” e, mais recentemente, prorrogando de formaunilateral esse “direito” (de 50 para 90 anos).

O paradoxo de que novas tecnologias facilitado-ras acabam se transformando em elementos de con-centração e controle ainda tem um capítulo mais de-cisivo, que deverá ser escrito no decorrer dos próxi-mos meses: trata-se da distribuição de filmes eletro-nicamente, via satélite.

O Brasil já desenvolveu um sistema próprio paraesse tipo de distribuição. Hollywood está em vias depromulgar sua decisão quanto ao sistema que iráadotar. Uma decisão baseada na necessidade deadaptar um circuito exibidor nacional de cerca de30.000 salas, mas também para impedir a reprodu-ção ilegal dos filmes e assegurar um controle aindamaior (agora será possível controlar cada sessão in-dividual, em cada sala, em todo o circuito integradoao sistema) de toda a operação. Além disso, esse sis-tema deverá se “universalizar”, isto é, impor-se sobre

thor’s copyright” by “industrial property copyright” and,more recently, by postponing this “right” (from 50 to 90years).

The paradox of new technologies turning intomeans of control will be the subject of a more importantchapter, which will be written in the next months: it willdeal with the electronic distribution of films, via satellite.

Brazil has already developed its own system for thiskind of distribution. Hollywood is on the verge of an-nouncing its decision on the system it will adopt. Its de-cision will be based on the need to adapt the nationalcinema rooms (around 30 000), but also on the need toavoid the illegal reproduction of films and to guaranteea tighter control over the whole operation (with this de-cision it will be possible to control every cinema session,in every room). Besides, this system must become univer-sal, i.e. overcome all other models, so that the Californi-an industry can assure and extend its supremacy. It’svery likely that the developed Brazilian model will be dis-

Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha

Page 18: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 18

cineclubismo

qualquer outro modelo, garantindo e ampliando asupremacia da indústria californiana. É mais queprovável que o avançado modelo brasileiro seja des-cartado, por incompatível, nesse processo.

Mas, felizmente, o paradoxo não pára aí. De cer-ta forma parece que a tecnologia digital traz dentrode si um germe – um vírus? – de rebeldia, altamentecontagioso e que escapa a todas as terapias, de re-pressão e controle, com que se tenta isolá-lo e des-truí-lo. Assim, frequentemente, pequeninas muta-ções introduzidas em gigantescos esquemas de res-trição de acesso são capazes de desestruturá-los: osmonopólios de distribuição de música no Brasil, porexemplo, estão celeremente rumando para a obso-lescência, devido à facilidade de prensagem e repro-dução dos CDs e ao surgimento de incontáveis estru-turas independentes que atraem até os compositorese intérpretes mais consagrados. As facilidades de co-municação digital, igualmente, estão destruindo asformas tradicionais de controle das mídias – como ochamado “jabá”, um tipo de suborno que as grava-doras pagam às rádios para tocarem exclusivamentesuas músicas.

E assim o cinema digital levou ao surgimento,ou ressurgimento, de um novo tipo de cineclube noBrasil. Com o barateamento e a generalização dapossibilidade de filmar, grupos de realizadores sur-gem por toda parte e passam a se organizar para exi-bir seus filmes. Criam, em certa medida, seu própriopúblico, e de maneira independente, “marginal”, ouseja, criam cineclubes.

A isso deve se acrescentar que a repressão à exi-bição de filmes americanos também leva esses exibi-dores – e públicos – alternativos a buscarem filmesque não sofrem esse tipo de controle ou cujos reali-zadores estão à mão para autorizar sua exibição.

Dessa forma está renascendo um movimento ci-neclubista, baseado na exibição de filmes não roliu-deanos, com destaque para o cinema brasileiro e ocurta metragem. E no formato de DVD, muito maisbarato, sob todos os aspectos, e adaptável à realida-de brasileira.

E quem garante que, depois que Hollywood im-plantar um sistema sofisticadíssimo de compressão eenvio de filmes, não vai surgir um hacker de 12 anoscom um sistema que permite que você baixe essesfilmes em casa em alguns minutos? Eu diria que ébem provável.

charged in this process. Fortunately, the paradox doesn’tstop there. Digital technology seems to have created ahighly contagious germ of rebellion untreatable via re-pression or control, which are the means used to try toisolate and destroy it. Therefore, small mutations intro-duced in huge areas to restrict the access are often ableto dismantle them: the monopoly of music distributionin Brazil is getting obsolete given the easiness of repro-ducing CDs and of the creation of independent mecha-nisms that attract even the most revered musicians. Thefast pace of digital communication is also destroying themedia’s traditional forms of control – like the so-called“jabá”, the bribes recording companies pay radio sta-tions to reproduce their songs exclusively.

Therefore digital cinema has led to the (re)appear-ance of a new concept of film society in Brazil. As film-ing has become cheap and widespread, groups of direct-ors spring up from everywhere and get organised to proj-ect their work. They create their own audience – inde-pendent and alternative –, i.e. they create film societies.

Besides, repressing the projection of American filmsmakes these alternative film societies and audience turnto films free from that kind of control or whose directorscan allow their projection.

So film societies are facing a revival, which consistsof screening Brazilian films and short films. DVD isused, which is cheaper and fits best the Brazilian reality.

And who knows if, after Hollywood has stipulated asophisticated system of understanding and sendingmovies, a 12-year-old hacker won’t find a way of allow-ing us to download such films at home in a few seconds?I’d say it’s the most likely thing to happen.

Page 19: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 19

cineclubismo

uando convidado a escrever um artigo para arevista Cinema, e sabendo que esta seria uma

edição especial sobre o cinema brasileiro, logo meveio a cabeça o intelectual e crítico de cinema PauloEmílio Sales Gomes (1916-1977), a figura mais impor-tante para a memória cinematografia nacional. Omaior responsável pela preservação da história do ci-nema brasileiro, pelo seu desenvolvimento e pela suacrítica. Por isso mesmo, dedicarei poucas linhas sobrefilmes e movimentos relacionados ao cinema brasilei-ro propriamente dito, para escrever sobre um perso-nagem cujas obras são indispensáveis para que possa-mos estudar a trajetória deste cinema desprezado e es-quecido por muitos. Sem as obras de Paulo Emílio oestudo do cinema brasileiro seria elusivo como vácuo.

Paulo Emílio participou de um tempo que demo-rei a descobrir, mas hoje consumo de forma voraz. In-tegrante de inolvidável e culta geração com espíritode atualização herdado do Modernismo, se tornou nodecorrer de sua vida o maior crítico do cinema brasi-leiro, precursor das posições independentes da es-querda brasileira, professor de história do cinema bra-sileiro e fundador da cinemateca brasileira. Sua traje-tória intelectual é uma das mais veneradas do país.

Com dezenove anos Paulo Emílio era membroda Juventude Comunista paulistana. O jovem estu-

Q

s this special edition of Cinema magazine is de-dicated to Brazilian cinema, it came to my mind

Paulo Emílio Sales Gomes (1916-1977), the leading in-tellectual and critic of the Brazilian cinematography. Hewas responsible for the preservation of the history of Bra-zilian cinema, for its expansion and for critical writings.I therefore shall dedicate only a few lines to Brazilianfilms and aesthetic movements and shall mainly focusmy attention on Paulo Emílio Sales Gomes, whose writ-ten work is essential for the understanding of the historyof national cinema, so long forgotten and despised. Wi-thout his work, it would be really difficult to understandBrazilian cinema.

Paulo Emílio lived at a time I used to know nothingabout, but that I voraciously study today. Belonging toan unforgettable learned generation who owned an ea-ger spirit inherited from Modernism, he became the gre-atest critic of Brazilian cinema, a forerunner of the inde-pendent opinions of the Brazilian left wing, a teacher ofthe history of Brazilian cinema, and one of the foundersof the Brazilian Cinematheque. He’s one of the mostadmired national intellectuals.

At the age of 19 he was a member of the YoungCommunist League of São Paulo. The young student wasarrested for being involved with this political movement.He was notorious for being an activist at the ANL (Nati-onal Liberating Union) conventions and for having hisarticles published in left-wing newspapers, e.g. Van-

A

Paulo Emílio Sales GomesTexto: Daniel RibasTradução: Branca Sampaio

Page 20: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 20

cineclubismo

dante preso na onda de repressão ao movimento co-munista era conhecido pela polícia por suas partici-pações políticas nos comícios da ANL (Aliança Naci-onal Libertadora) e pelos artigos publicados nos pe-riódicos de esquerda como Vanguarda estudantil, Aplatéia e no jornal Correio paulistano. A política levouPaulo Emílio para a prisão e dela para o auto-exílio.

Paulo Emílio viveu dois anos em Paris, entre1937 e 1939, período que pode ser consideradocomo um processo de profunda reorientação políti-ca e de uma estimulante descoberta do cinema comoarte moderna que encontrou nos filmes de Renoir enos movimentos culturais e políticos que eclodiamem Paris. Paulo Emílio procurava tirar todo o provei-to do efervescente clima político e cultural que agi-tava a cidade.

Seu retorno ao Brasil aconteceu no início da se-gunda guerra mundial, quando fundou o Clube deCinema levando o cineclube para a Faculdade de Fi-losofia, Ciências e Letras da USP (Universidade deSão Paulo). O local virou um centro de estudos e de-bates fiel ao espírito formador que marcou estas ini-ciativas desde o Chaplin Club e o cinema mudo. Oambiente era freqüentado por outros grandes críti-cos, cineastas, intelectuais e os que posteriormenteviriam a ser cineastas de renome do cinema nacio-nal. No entanto, logo foi fechado pelo Departamen-to de Imprensa e Propaganda – DIP – do EstadoNovo (ditadura brasileira imposta em 1937 pelo en-tão presidente Getúlio Vargas, que alegava a existên-cia de um plano comunista para a tomada do poderconhecido como Plano Cohen).

A política e o cinema ocupavam um vasto lugarna realidade de Paulo Emílio que, em 1941, fundoucom outros intelectuais contemporâneos a revistacultural Clima, de cuja concepção foi peça chave, es-crevendo diversos artigos críticos sobre cinema, po-lítica, literatura, teatro e artes plásticas. Em 1946Paulo Emílio viajou rumo ao cinema, na Paris dopós-guerra, período de extrema importância paraseu aperfeiçoamento político e intelectual, pois lá seligou a intelectuais de esquerda e sobretudo aos es-tudos de cinema. Conhecendo e observando o cine-ma brasileiro e consumindo as fontes de cinema eu-ropéias, Paulo Emílio retornou ao Brasil dez anos de-pois sabendo da necessidade de se criar um arquivode filmes no Brasil, pois até aquela época o país jáhavia perdido grande parte do seu acervo devido àmá conservação, incêndios e principalmente a gran-

guarda Estudantil, A Plateia and Correio Paulista.He was arrested and then went into exile because of po-litics.

Paulo Emílio has lived in Paris for two years, from1937 to 1939, and during this period he discovered anew political course. He also found out that cinema wasa stimulating modern art by watching Renoir’s films andthe cultural and political movements erupting in Paris.He tried to take the most out of this political and cultu-ral ebullition.

He returned to Brazil at the beginning of the SecondWorld War. He founded the Cinema Club and broughtfilm societies into the Faculty of Philosophy, Science andHumanities from University of São Paulo (USP). This filmsociety became a study and discussion club, respectingthe original principles of these institutions, from theChaplin Club to the mute cinema. Important critics, di-rectors and intellectuals of the time showed up at theclub. However, soon it was closed down by the Press andPropaganda Department – DIP – from Estado Novo(Brazilian dictatorship established in 1937 by the presi-dent Getúlio Vargas, who worried about the existence ofa Communist conspiracy – known as Plan Cohen – totake over power).

Politics and cinema played an important part inPaulo Emílio’s life. In 1941, he played the key role in thecreation of the cultural magazine Clima, in which hepublished reviews about cinema, politics, literature, the-atre and art. In 1946 he travelled to Paris where he star-ted a period of political and intellectual self develop-ment: he hang up with left-wing intellectuals and cine-ma experts. He studied Brazilian cinema and got acqua-inted with European cinema, and returned to Brazil tenyears later. By then he was already aware of the need ofcreating a national film archive, since Brazil had alreadylost much of its film production because of bad preserva-tion, fire and the lack of interest for the country’s past.As he ironically stated, this situation “shows the will ofthe Brazilian people to escape the spell of underdevelop-ment and misery. The lack of interest led to both the mis-treatment of national archives and the impossibility ofcreating a cinematheque. This situation makes the workof historians difficult, especially of those that deal withunimportant issues” (quoted from Cinema: Trajetóriano Subdesenvolvimento).

Paulo Emílio believed that a film archive would playa fundamental role in the development of cinema stu-dies in Brazil because it would allow all kinds of researchwork and the creation of a national memory. Therefore,

Page 21: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 21

cineclubismo

de falta de interesse do próprio país pelo seu passa-do. Uma situação que, segundo ele diz ironicamenteem seu livro “Cinema: Trajetória no subdesenvolvi-mento, “exprime a vontade do brasileiro de escaparde uma maldição de atraso e miséria. O descaso peloque existiu, explica, não só o abandono em que seencontram os arquivos nacionais, mas até a impos-sibilidade de se criar uma cinemateca. Essa situaçãodificulta o trabalho do historiador, particularmenteo que se dedica a causas sem importância.”

Com o pensamento de que a criação de um ar-quivo de filmes seria imprescindível para evoluir osestudos do cinema no Brasil, viabilizando pesquisasde todo tipo e a constituição de uma memória naci-onal, Paulo Emílio inaugura em 1956 a CinematecaBrasileira, uma das primeiras instituições de arqui-vos de filmes a se filiar à FIAF – Fédération Interna-tionale des Archives du Film – e uma das maioresfornecedoras de filmes para o cineclubismo nacionale principalmente de São Paulo em diversas épocas dasua história. Com isso o trabalho de pesquisa e res-gate do cinema brasileiro deram um grande salto nadécada de 60, quando se fundem o esforço pela con-quista de um acervo com o trabalho universitárioafirmando a Cinemateca como centro formador depesquisadores em São Paulo.

A iniciativa levou Paulo Emílio em 1964 a parti-cipar da criação do primeiro curso de cinema brasi-leiro como uma extensão do clube de cinema à Uni-versidade de Brasília, onde passaram grandes nomesdo cinema brasileiro. Em 1966, seu antigo parceiroda revista Clima, Antônio Cândido, o convida paraorientar teses na USP, dando vida à pesquisa cinema-tográfica antes que esta formalize o cinema como es-fera acadêmica, o que acontece somente em 1968,quando Paulo Emílio começa a lecionar história docinema brasileiro, demonstrando claro apoio aos di-retores do Cinema Novo.

O esforço de Paulo Emílio Salles Gomes, certa-mente o primeiro grande historiador e pensador docinema brasileiro, para a valorização do cinema na-cional se firma categoricamente quando seu traba-lho ganha lugar na universidade e, com isso, o quese delineara no Clube de Cinema se torna realidade.A organização de manifestações cinematográficas e aconfirmação da idéia da necessidade de conservaçãodos filmes pelos arquivos trouxeram um novo mo-delo de atuação e pensamento para o Brasil.

he established the Brazilian Cinemateque in 1956,one of the first film archives to become associated to theFIAF – Fédération Internationale des Archives du Film –,and one of the main film societies distributor, mainly inSan Paulo over the years. This helped to increase cinemaresearch during the 60s: that’s when the attempt to cre-ate a film collection merged with university work and theCinematheque became a formation centre for resear-chers in San Paulo.

Paulo Emílio was one of the founding fathers of theBrazilian cinema course at the University of Brasília. In1966, his former colleague at the Clima magazine, An-tônio Cândido, invites him to direct academic dissertati-ons at USP. Cinema becomes a part of academic studiesin 1968 when Paulo Emílio starts teaching History ofBrazilian Cinema, making clear his support to the direc-tors of the New Cinema.

Paulo Emílio’s effort in promoting national cinemabecomes decisive when he starts working at the university,which turns the principles that had been outlined at theCinema Club into reality. Organizing cinema demonstra-tions and preserving films in archives have started a who-le new way of working and thinking in Brazil.

Page 22: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 22

história

Audiovisual galego sufriu unha importantetransformación ao longo destes últimos años.

De ser unha actividade de poucos e entregados aman-tes da cinematografía que historicamente iniciou asúa andaina en 1897, pasou a converterse nunca acti-vidade nomeada sector estratéxico, que comeza a co-ñecerse fóra das nosas fronteiras e que ten por diantea posibilidade de converterse nunha importante in-dustria da nosa Autonomía. Pero máis aló dos feitoseconómicos, a verdadeira importancia da creaciónaudiovisual é a súa implicación no mantemento eevolución da cultura do noso país. A importancia dofenómeno audiovisual é hoxe incuestionábel. Os paí-ses desenvolvidos atópanse flotando nunha socieda-de de consumo da imaxe en que o producto audiovi-sual ou multimedia cobra unha importancia de pri-meira orde na transmisión de coñecementos.

Desde o punto de vista do cinema comercial te-mos que saltar ata o ano 1989 para asistir á proxecci-ón das tres primeiras longametraxes galegas de ficci-ón realizadas en formato profesional por vez primei-ra en sesenta anos. Polo camiño, ben é certo, queda-ron diversas actividades cinematográficas que teñenmoito que ver co noso tema, como as desenvolvidasno eido do cinema afeccionado dos anos 60 e 70.

Estos tres primeiros filmes: Sempre Xonxa deChano Piñeiro, Continental de Xavier Vilaverde eUrxa de Carlos Piñeiro e Alfredo García Pinal, tive-ron a particularidade de contar con producción ínte-gramente galega, feito que non volvería a ocorrercos filmes que se realizarían no futuro.

A decepción causada polo resultado comercialdestas primeriras obras producíu un impasse de catroanos. A partir de 1993 a producción increméntase

Ohe Galician audiovisual as suffered an importanttransformation in the last years. From a few and

devoted cinematographic lovers’ activity, which histori-cally started to walk in 1897, it became a strategic activ-ity which begins to be known outside Galicia and h somegreat perspectives to constitute an important industry ofour Autonomia. But besides the economical aspects, thereal importance of audiovisual creation is its influence inmaitaining and developing the Galician culture. The im-portance of the audiovisual phenomenon is nowadays in-questionable. Developed countries face an image con-sume society where the audiovisual product assumes theprime importance in knowdlege transmission.

From the commercial cinema point of view, we haveto go back to 1989 to watch the projection of the threefirst full-length Galician ficton films , directed in profes-sional format for the first time in 60 years. However,along the way there were several cinematographic activ-ities much related with this theme, as those developed inthe cinema aficionado of the 60’s and 70’s.

These three first films : Chano Piñeiro’s Sempre Xonxa, Xavier Vilaverde’s Continental and Carlos Piñeiro and Al-fredo Garcia Pinal’s Urxa have an entirely Galician produc-tion, that wouldn’t happen again with future films.

The deception caused by the commercial result ofthese first works created a four-year impass. After 1993production increased significantly : few productions areentirely Galician, others are co-productions with statecompanies or even mere participations via Televisiónde Galicia in films shot there.

Since 1991 Galician producers , produced or partici-pated in 36 full-lenght films , 26 of which betweet 1997and 2002, period where the Galician cinema seems tohave also benefited from the raise in Spanish productionas a consequence of the digital-platforms great develop-ment. The productiom model is exemplifyed with thestudy of ten full-length films produced in 2001 and 2002.

Lately there was a constant growth in the number ofproductions. The trends seem to be about 10% of Span-

T

O Cine GalegoThe Galician Cinema

Comunicação realizada por Anxo Santomil Secretario da FCCG (Federación de Cineclubes de Galicia) no Encontro Nacional de Cineclubes, Viseu 2005

Tradução: Filipa Guerreiro

Page 23: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 23

história

significativamente: algunhas produccións, as me-nos, son filmes íntegramente galegas, noutros casos,son coproduccións con empresas estatais ou ben me-ras participacións vía Televisión de Galicia en pelí-culas rodadas en Galicia.

Dende 1991 as productoras galegas produciron ouparticiparon nun total de 36 longametraxes, 26 das ca-les cabe encadralas entre os anos 1997 e 2002, períodono que o cine galego parece terse beneficiado taméndo aumento da producción española como consecuen-cia da irrupción das plataformas dixitais. O modelo deproducción queda exemplificado co estudio das dezlongametraxes producidas nos anos 2001 e 2002.

Estes últimos anos foron de constante crece-mento no número de produccións. A tendenciaachéganos ó 10% da producción española, consta-tando non só un incremento na producción senóntamén na calidade da mesma, como así se recoñecenos diversos premios acadados en festivais e certá-menes nacionais e internacionais.

As produccións con participación de empresas gale-gas correron unha sorte un tanto dispar no mercado in-terior destacando os filmes Os Luns ó Sol de FernandoLeón e A Língua das Bolboretas de José Luis Cuerda,con 1.602.946 espectadores a primeira e 1.181.470 a se-gunda, que foran rodadas íntegramente en Galicia e conparticipación minoritaria de empresas galegas. Estos tí-tulos superarían con moito a recadación obtida polo res-to da producción na que merece un lugar destacado OBosque Animado, longametraxe de animación en 3Dproducida por Dygra Films e dirigxida por Manolo Gó-mez e Angel Cruz e que alcanzou máis de 500.000 espec-tadores e unha recaudación de case 2 millóns de euros.

O presuposto medio das longametraxes galegas éde 2.400.000 euros, algo inferior ó dos filmes españo-les. Pódese afirmar que os presupostos da produccióngalega encóntranse entre os valores medios da cine-matografía epañola. A participación das empresas ga-legas nas produccións alcanza case o 50% mentrasque a das productoras é do 41%. A gran mayor partecontan con subvencións á producción da Conselleríade Cultura, Comunicación Social e Turismo, outraspor parte do Instituto Cinematográfico das ArtesAudiovisuais, adicadas ós novos realizadores, e asprocedente de Ibermedia, Euroimages, Universida-des e algúns concellos onde se localizan as rodaxes.

En canto á tipoloxía das obras, non se pode falardun grupo homogéneo. Si, en cambio, aparece algunhasimilitude na parcela correspondente ás empresas pro-

ish production; we can verify that production is not onlyincreasing but also getting better, as it’s confirmed by theseveral prizes won at national and international festivals.

Productions with the Galician companies participa-tion has a rather different luck in the internal market. Tounderline Fernando Leóm’s Os Lund ó Sol, and José LuisCuerda’s A Língua das Bolboletas with 1.602.964 and1.181.470 viewers respectively, which were totally shot inGalicia and with the minoritary participation of Galiciancompanies. These titles largely surpassed the profits offurther production where films such as O Bosque Ani-mado deserves to be mentioned. It is a full-lenght 3D an-imation film, produced by Dygra Films and directed byManolo Gómez and Angel Cruz, and reached more tha500.000 viwers wih a 2 million euros profit.

The average budget about Galician full-length filmsis 2.400.000 euros, somehow inferior to Spanhish films.Is’s possible to say that Galician productions budget is inthe average values of Spanhish cinematography. TheGalician companies participation in the productionsreaches almost 50% while the producers’ is about 41%.Most of them count on production subventions from theConsellería de Cultura , Comunicación Social eTurismo, others from the Instituto Cinematográficodas Artes Adiovisuais given to new directors, andthose from the Ibermedia,Euroimages, universitiesand some regions where the shooting is made.

Regarding the work tipology we can´t talk about ahomogeneous group. Even if, there is a certain similari-ty corresponding to production companies. They apply apolicy which tends to diversify the risks keeping with asector where the uncertainty about the production suc-cess or failure is high. Other common point betweenthese companies is the presence of financial institutionsin their shareholder group. This is very important re-garding the european difficult situation created by theTV operator crisis.

Galicia is now aware of the great opportunities theaudiovisual offers as strategic industrial sector. It is

Continental de Xavier Vilaverde

Page 24: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 24

história

ductoras. Aplican unha política tendente a diversificarriscos acorde cun sector onde a incerteza sobre o éxito ouo fracaso dunha producción é elevada. Outro punto encomún entre estas empresas é a presencia de instituciónsfinancieiras no seu accionarado, de vital importanciatendo en conta a difícil situación que se aventura nocontexto europeo coa crise dos operadores de televisión.

Galicia tomou conciencia das grandes oportuni-dades que ofrece o audiovisual como sector industri-al estratéxico, instrumentalizado polo mesmo Parla-mento Galego a través da nova Lei do Audiovisual einiciativas como a creación do Consorcio do Au-diovisual, do Cluster do Audiovisual e a Film Co-mission de Galicia.

O impacto da tecnoloxía dixital está cambiandopor completo o panorama audiovisual mundial. Es-tes cambios estanse sucedendo a unha velocidadevertixinosa e a supervivencia dos productores decontidos depende, en gran medida, da súa capacida-de de adaptación ás novas ferramentas tecnolóxicas:a dixitalización dos medios de almacenamento, achegada da alta definición, a comercialización enDVD ou as novas redes de distribución da sinal (ca-ble, TV dixital ou vía satélite), etc..

Nestes momentos Galicia está nunha posición deventaxa, sobretodo no campo da animación 3D, ondese dan claras oportunidades de converterse nun dospoucos centros de producción de Europa. Conta casfactorías máis importantes de animación 3D en Espa-ña, como poden ser Dygra e Bren Entertainment, e,ademais, con programas formativos do máis alto ni-vel: o Master de Creación e Comunicación Dixital, oII Ciclo Cinedixital e Animación, o Cartoon Futuree Mundos Dixitais, co obxetivo, ademais, de promo-ve-las coproduccións de series de animación e facili-tar acordos financieiros dentro da industria de anima-ción europea convocando a máis de 800 profesionaisda animación e da televisión de máis de 20 países.

Estamos ante un sector rendible a longo plazo,pois precisa de 4 a 6 anos de amortización dunhaproducción), que precisa xerar habilidades en moi-tas fontes: innovación tecnolóxica, formar equiposaltamente especializado, talento artístico e narrati-vo, marcadotécnia e promoción, así como amplíocoñecemento do mercado internacional.

O futuro do audiovisual abre todo un campo de tra-ballo si, como se ven anunciando, se consolida o pro-xecto de creación de catro canles autonómicas de televi-sión e ostenta de carácter local, nas que o 60% da pro-

managed by the Galician Parliament through the Audio-visual Law and initiatives as the creation of the Consor-tio do Audiovisual, Cluster do Audiovusual andthe Film Comission de Galicia.

The digital technology impact is completely chang-ing the worldwide audiovisual scenary. These changesare happening at great speed , and the producers sur-vival depends mainly on their capacity to adopt the newtechnological tools: downloads of register means, the ar-rival of high definition, DVD sales ou new sinal distribu-tion chains (cable, digital TV or satellite).

Today Galicia is in advantage , mainly in what con-cerns the 3D animation, there are clear chances thatGalicia becomes one of the biggest production centers inEurope. It owns the most important 3D animation facto-ries in Spain as Dygra and Bren Entertainment, be-sides the high level training programs as: Master deCreatión e Comunicación Dixital, the II CicloCinedixital e Animación, the Cartoon Future andthe Mundos Dixitais, aiming above all promotting co-productions of animation series and open the doors to fi-nancial agreements within the European animation in-dustry inviting more than 800 animation and televisionprofessionals from more than 20 countries.

We are before a long term profitable sector, as sev-eral years are needed to see the results. It’s necessary tocreate the most assorted abilities: technological innova-tion, high specialized working teams, artistic and narra-tive talent, marketing and promotion, as well as a wideknowdlege about the international market.

The audiovisual future will open a wide workingfield if, as it is being announced, the project to createfour TV channels in the Galician Autonomia and 80 lo-cal ones, really moves along. In these channels 60% ofthe transmitted programs will be self production as it be-came public after the meeting of the Consello Aseordo Audiovisual de Galicia when he exposed the char-acteristics of the licence adjudication.

It’ll seem contradictory, but the Galician cinemashould have conquered an industrial maturity whichdoesn’t show neither in some special characteristics norin film quality. Revealing most of the vices the Spanhishproduction acummulated throught the last years, Gali-cian cinema , except for some concrete and meritoriousexamples, is prejudiced by the absence of a specific filmmodel or at least , some director, who, due to his criticaland/or commercial repercussion , could be a genera-tional reference. When it isn’t possible to create ex-nihilthe national filmic imaginary, the remaing solution is to

Page 25: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 25

história

ducción que se vai emitir será deprodución propia, segundo se fixopúblico tras a reunión do ConselloAsesor do Audiovisual de Galiciaao avanzar as características das ad-xudicación das licenzas.

Parecerá contraditorio, pero ocine producido en Galicia poidaque alcanzase unha certa madurezindustrial que non se ve correspon-dida por unhas características dife-renciais nin pola calidade das súaspelículas. Acusando boa parte dosvicios que a produción españolafoi acumulando ao longo dos últi-mos tempos, o cine galego, máisalá dalgúns concretos e moi meritorios productos,vese lastrado pola ausencia dun modelo fílmico espe-cífico ou, tan sequera, dalgún director que, grazas ásúa repercusión crítica e/ou comercial, servise de refe-rente xeracional. Cando non é posible edificar danada todo un imaxinario fílmico “nacional”, queda asolución conxuntural de aferrarse a algún autor. E ocine galego nos seus case vinte anos de historia con-temporánea pouco máis achegou ca personaxes (pelí-culas) na busca dun autor que non acaba de chegar.

Como conclusión, a tan traída e levada crise docine español –se é que talcousa, verdadeiramente,existe– semella non ir connosco. O ano 2003 rema-taba e unha das últimas entregas de “Novas” da pá-xina web da AGAPI, Asociación Galega de Producto-res Independentes, levaba como encabezamento: “Ocine galego vive un dos seus mellores momentos”.

Con anterioridade, en novembro de 2002, a revis-ta dixital máis coñecida da Comunidade, Vieiros, inclu-ía un dosier titulado “O audiovisual galego agora. Pintanouros”, ateigado de cifras impensábeis para a cativa in-dustria autóctona hai poucos anos e no que se preten-día enterrar definitivamente o vello e “estéril” debateentre ‘cine galego’ ou ‘cine en Galicia’, do cal aparen-temente a meirande parte dos actuais profesionais ga-legos consultados (desde produtores a técnicos, pasan-do por directores e realizadores) non quere saber nada:o importante é que se dea o segundo. Pero, malia todo,si que existe un feixe de cineastas que, ademais de fa-cer cine en Galicia, pretende facer cine galego.

“stick” to an author. The Galician cinema in its almost20 year of contemporary history has only reached char-acters (films) searching for an author who never arrives.

Finally, the come-and-go crisis of spanish cinema –if it really exists – seems not to come with us. By the endof 2003 and one of the last deliveries of “Novas” of theAGAPI, Associación Galega de Produtores Inde-pendentes web page, had as headline. “The Galiciancinema is living one of its best moments”.

Before, in November 2002, the Community bestknown digital magazine, Vieiros, included a dossiercalled: “The Galician Audiovisual now. It’s a miracle”,full of unthinkable numbers to the captive autochthonindustry some years ago, and where it was intended tobury at once the old and “sterile” debate between “Gali-cian cinema” and “cinema in Galicia”, about which ap-parently most of the consulted Galician professionals(producers, technicians and directors) don’t even care:the important thing is that the seconds one happens.However, I know that there is a group of cinematogra-phers who, wants to make Galician cinema more thancinema in Galicia.

Os Luns ó Sol de Fernando León

Page 26: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 26

comentário

ma nova vaga de cineastas brasileiros tememergido nos últimos tempos no contexto in-

ternacional. Autores de filmes que misturam o ladoartístico com o lado comercial, estes realizadores fize-ram uma transição entre o cinema nacional e projec-tos internacionais (liderados por produções america-nas ou inglesas). Estes projectos têm em comum umaforte imagem publicitária, quer na fotografia (o quenos dá a ver imagens muito trabalhadas visualmen-te), quer na montagem (em sequências de transiçãoque pouco têm a ver com a narrativa e que fazemlembrar sequências televisivas). Os dois autores maissignificativos desta vaga são Walter Salles (autor deCentral do Brasil e Abril Despedaçado – no Brasil – e Di-ário de Che Guevara e Águas Passadas) e FernandoMeirelles (autor de Cidade de Deus e O Fiel Jardineiro).

Multi-premiados em festivais por todo o mundo(incluindo os principais: Veneza, Berlim e Cannes),estiveram também às portas dos Óscares, quer comos seus filmes, quer até como realizadores (Meirellesesteve nomeado por Cidade de Deus). Ou seja, dentroda diversidade do cinema brasileiro, estes autores ca-tapultaram-se para a cena internacional. Natural-

U

ately, new Brazilian directors have been latelyemerging on .the international scale. They are

known for making arty films, and have gone from direct-ing national movies to international projects (Americanand British productions). These projects aim to have fullaudience, and therefore photography (elaborate images)and editing (sequences that have nothing to do with theplot and remind us of TV sequences) are carefully han-dled. The two most important pieces of work by the newdirectors are: by Walter Salles - Central do Brasil (Cen-tral Station), Abril Despedaçado (Behind the Sun), TheMotorcycle Diaries and Águas Passadas (Dark Wa-ter), and by Fernando Meirelles - Cidade de Deus (Cityof god) and O Fiel Jardineiro (The Constant Gardener).

Both have won prizes all over the world (includingVenice, Berlin and Cannes) and have been nominated forthe Oscar for best foreign film and best director. Thismeans that these directors have become known interna-tionally. They have obviously been invited for multination-al projects, which makes the financial investment lighter.Nevertheless, although the new Brazilian directors havebrought fresh air into the American film industry, theyhave also aroused some problems within cinematographicidentity, and this is the big question to take into account.

It is important to notice that Brazilian films com-pletely lose their cinematographic identity when turnedinto other films. And by completely I mean a kind ofcinematographic schizophrenia. This is, if these filmsmaintain typical directors’ features, they deal with com-

L

Diversidade e contradição(a esquizofrenia dos realizadores brasileiros em produções internacionais)

Diversity andcontradiction

(Schizophrenia in Brazilian international productions)

Texto: Daniel RibasTradução: Branca Sampaio

Page 27: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 27

comentário

mente, começaram a ser convidados para projectosmultinacionais (onde a montagem financeira se tor-na bem mais simples). Contudo, se esta aberturanova aos cineastas brasileiros foi capaz de trazer san-gue fresco a estas produções (nomeadamente para omercado americano), essa nova realidade traz tam-bém alguns problemas de identidade cinematográfi-ca. E esse é o lado mais interessante para analisar.

Aquilo que importa notar na transposição dosfilmes brasileiros destes autores (no que de erradoessa expressão possa ter, vista por um português)para os outros filmes, é pois a perda de uma identi-dade cinematográfica total. E uso a expressão total,porque, nestes casos, faz sentido falar numa certa es-quizofrenia cinematográfica. Isto é, se, por um lado,os filmes têm detalhes característicos dos autores,eles são radicalmente diferentes (no tema, na narra-tiva, etc.) dos projectos que lhes interessavam (istoé, os seus projectos pessoais que executaram no Bra-sil). Parecendo talvez demasiado maniqueísta, a ver-dade é que estes filmes assentam numa contradição:uma narrativa e um tom totalmente diferentes daperspectiva cinematográfica. Claro que o sucesso ounão dos filmes difere de projecto para projecto, masinteressa aqui olhar de perto dois casos exemplares:Águas Passadas, de Walter Salles e O Fiel Jardineiro, deFernando Meirelles.

No primeiro caso, sendo Águas Passadas um fil-me profundamente repetitivo, há uma certa formacomo Walter Salles resolveu filmar a cidade e, sobre-tudo, o prédio protagonista: com contrastes belíssi-mos (que fazem lembrar um qualquer filme sobre a

pletely different plots and subjects from the ones thatused to interest their directors in Brazil. Although I mayseem excessively manichaeist, these films are truly basedon a contradiction: the plot is completely different fromthe cinematographic perspective. Success obviously de-pends on the particular project, but, at this point, it iswise to take a closer look at Águas Passadas, by WalterSalles, and O Fiel Jardineiro, by Fernando Meirelles.

Although Águas Passadas is a deeply repetitive film,Walter Salles decided to shoot the city and, especially, themain building resorting to beautiful contrasts (which re-mind us of any film relating to Brazilia’s architecture, theutopic city) of dark brown shades that perfectly representthe nostalgic characters. Furthermore, there are somebeautiful air frames of the housing (the city looks as if itwas deserted, it becomes frightening). Therefore, photogra-phy is the saddest and deepest part of Águas Passadas.When we get over the initial shock (Salles making a… hor-ror movie!) we understand the permanent contradiction: anindependent Brazilian director shooting a film in a studio.

Fernando Meirelles Walter Salles

Page 28: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 28

comentário

arquitectura da cidade-utopia:Brasília), um castanho-escuro quenos dá o tom certo para esta nos-talgia latente de todos os persona-gens. E depois, há alguns planosaéreos do complexo habitacionalmuito bem filmados (parece que acidade ficou deserta: isto é, ficouassustadora). Assim, a fotografiacomeça e acaba por ser a partemais triste e profunda de ÁguasPassadas. Passado o susto inicial(Salles num filme de… terror!),compreende-se bem esta contra-dição latente: um projecto de es-túdio liderado por um realizadorindependente e brasileiro.

Por outro lado (mas ajudando também no es-quema), em O Fiel Jardineiro encontramos o mesmopressuposto: sendo uma adaptação de um romancehomónimo de John Le Carré, à partida, analisandoapenas os nomes, parecia significar que o universode realizador e escritor nada teriam a ver. Talvez porisso Meirelles tenha sido escolhido. E o filme nãopodia ser menos contraditório. A narrativa é uma tí-

O Fiel Jardineiro is based on the same assumption.As it is based on a novel by John Le Carré it seems as ifthe Weltanschauung of the director and the novelist havenothing in common. And here may lay the reason forhaving chosen Meirelles to shoot it. The film is highlycontradictory. The plot is typical of Le Carré: a Britishdiplomat has just heard about his wife’s death, duringtheir stay in Africa. Meirelles deals with two opposite lev-els: a conspiracy plot and, simultaneously, a documenta-ry of Africa. He uses the technique of advertisement (thecontrasting colour, the frenzy editing) that usually grantsproximity and drama to the scenes (sometimes thescenes are out of focus to represent the ruin of the civil-ized world). This is a strange world (this could only be Af-rica seen by a foreigner), which is immediately differentfrom what we get in Cidade de Deus (which is a moreauthentic world, in the sense that it is within the plot).

Cidade de Deus

O Fiel Jardineiro

Page 29: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 29

comentário

pica narrativa Le Carré: um diplomata inglês acabade saber da morte da sua mulher, durante a estadiade ambos em África. O que parece resultar são doisníveis contrastantes: a forma como Meirelles filmauma narrativa de conspiração, dando, ao mesmotempo, um lado documental de África. É rodadocomo um spot publicitário (a cor contrastada, amontagem frenética – que talvez seja mesmo dema-siado frenética, tal é a ânsia de fazer cortes), o quepor vezes dá proximidade e dramatismo às cenas (háalturas em que o realizador usa o desfoque, na exac-ta medida em que o mundo civilizado parece ruir aseus pés). Este é um mundo estranho (esta África deO Fiel Jardineiro só pode ser uma África de um estran-geiro), o que ressalta, de imediato, uma diferençacom Cidade de Deus (que era muito mais autêntico,no sentido de estar dentro da narrativa).

E é aí que parece estar o con-fronto principal entre duas dimen-sões: a narrativa e a imagem. Masesse confronto, até certo ponto, épositivo. É uma forma diferente (eaí a mais-valia de um cineasta bra-sileiro), de encarar uma narrativapadronizada (parece que o ante-projecto dos cineastas brasileirosse chama Steven Soderbergh, o ci-neasta mais visível deste novo cine-ma). Mas é também aí que reside oseu principal problema: este não éum filme dos realizadores, massim um filme que os realizadoresfilmaram (exactamente como seprocessa na publicidade). Há ummundo que separa o Brasil (o ce-nário de Cidade de Deus e Centraldo Brasil) de Londres e Nova Ior-que (de onde vêm todas as perso-nagens significativas destes fil-mes). Na sua diversidade e contra-dição, estes são filmes que come-çam a apontar alguns dos novoscaminhos do cinema comercial. Oexótico dos cineastas brasileirosparece ter “pegado”.

This is where the main confrontation between theplot and the image lies, although it is a positive one. It’sa different way of looking at a standardized plot (StevenSoderbergh, the well-known filmmaker of this new cine-ma, seems to be the model for the Brazilian directors).But this is also where we find the main failure: it’s not afilm by the director, but a film directed by him (exactlythe way it works in advertising). There is a whole worldseparating Brazil (the scenery for Cidade de Deus andCentral do Brasil) from London and New York (fromwhere the main characters from these films stem). Usingdiversity and contradiction, these films start to point outnew techniques of commercial cinema. The exotic fea-tures of the new Brazilian cinema seem to have stuck.

Foto

:Raf

y ©

200

5 To

uchs

tone

Pic

ture

s. A

ll rig

hts

rese

rved

.

Central do Brasil

Águas Passadas

Page 30: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 30

comentário

um espaço urbano impessoal um homemcaminha, mal se distinguindo sob os con-

tornos de um fundo azul-escuro e cinzento. A chuvacai ininterrupta, monótona.

Neste espaço diluído de solidão escreve-se o de-sespero de um pai em busca da filha desaparecida. Oseu empenho obsessivo leva-o desde a simples colo-cação de cartazes nos pára-brisas dos carros e nasmontras das lojas até a montar uma pequena rede devídeo-vigilância em onze locais distintos da cidade.A sua rotina diária consiste em substituir cassetes, le-var o material filmado para casa e esperar que, nomeio da passagem anónima de milhares de pessoasse esconda o passo da sua filha.

N

man is walking along the streets of an imper-sonal city, and he can hardly be distin-

guished from the dark blue and grey environment. Therain is continually falling.

This lonesome place is the scenery for a desperate fa-ther looking for his missing daughter. He’s so focused onfinding her that he goes from simply sticking posters onwindscreens and display windows, to implementing a fullvideo spy-ware system across the city. His daily routineconsists of picking up the videocassettes and watchingthe films carefully, in the hope of getting a glimpse of hischild among the thousands of unknown passers-by.

A

AliceMarco Martins

Texto: Artur Guilherme de CarvalhoTradução: Branca Sampaio

deby

Page 31: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

O filme (exclusivamente sobrea ausência e os seus efeitos corrosi-vos) surpreende pela lucidez narra-tiva, pela sobriedade da montageme pela contenção dos actores. Maisdo que o desenvolvimento de umtema, a realização consiste numlento e asfixiante casulo que se vaiconstruindo em torno do especta-dor, casulo esse sem princípio nemfim. Uma asfixia permanente. Amorte, com toda a carga trágica edolorosa que encerra, tem um fim,resolve-se no tempo. A ausência épermanente, deixa-nos suspensosentre a esperança e a paranóia deum pesadelo do qual nunca conse-guimos acordar. A mãe não resistee tenta o suicídio. Os actores nãorepresentam, deixando-se flutuarnuma atmosfera de terror, amassa-dos pelo fantasma do absurdo e daimpossibilidade.

Baseado numa história verí-dica, Alice é um retrato dos nos-sos dias. Uma imagem onde ascrianças desaparecem de formainexplicável e onde parece quenem tudo é feito para as encon-trar. Infelizmente uma situaçãoque começa a ser demasiadamen-te rotineira nas nossas vidas.Atrás do desaparecimento deuma criança há uma família des-troçada, irremediavelmente per-dida no seu sofrimento.

O desespero de Alice é aatmosfera e o pulsar impessoal dacidade escura, onde está sempre achover, percorrida por um formi-gueiro permanente de gente anó-nima e solitária. Filme de emoçõesfortes, o estado de espírito sobre-põe-se a qualquer unidade de tem-po ou narrativa, enchendo porcompleto todo o espaço fílmico,residindo aí toda a magia e toda agenialidade deste filme. Fabuloso,diria eu, tratando-se de uma obrade estreia do jovem realizador...

CINEMA | 31

comentário

Alice (a film that deals exclu-sively with absence and its corrosiveside effects) strikes us because of theverisimilar plot and the sober edit-ing and cast. The director doesn’tactually deal with a subject, whathe does is weave a slow and asphyx-iating web around the viewer - anever ending web and a permanentasphyxiation. The tragic and pain-ful death has an end, one that isdealt with time. Absence is con-stant, leaving us between hope andparanoia of a nightmare fromwhich we can never awake. Alice’smother tries suicide. The actors donot perform; they let themselvesfloat in an atmosphere of terror,panic-stricken by the absurd andthe impossible.

Based on a true story, Aliceshows us the times we’re living in: atime when children go strangelymissing and when not everything isdone to help find them. Unfortu-nately, this is a situation that keepshappening in our everyday lives. Amissing child brings about devasta-tion in a family and they remaincompletely lost in their deep sorrow.

Despair is displayed in the filmthrough the impersonal dark city,through the permanent rain andthrough the thousands of lonelyanonymous people walking aroundthe streets. Alice arouses strongfeelings in us. And it’s those feelingsthat are responsible for the film se-quence as well as for its whole mag-ic and originality. I dare say it’s afabulous film, since it is the firstfrom this young director…

Page 32: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

comentário

Dois veteranosTwo Pros

Texto: Carlos Melo FerreiraTradução: Branca Sampaio

idney Pollack e André Téchiné contam-se ac-tualmente entre os cineastas veteranos do ci-

nema americano e do cinema francês, respectiva-mente, com prestígio mais sólido. Do primeiro estre-ou este ano A Intérprete (The Interpreter) de 2005, dosegundo Os Tempos Que Mudam (Les Temps QuiChangent), de 2004.

Sabe-se como Pollack, um dos cineastas mais in-teressantes dos anos sessenta, tem feito poucos fil-

S

idney Pollack (USA) and André Téchiné (France)are two of the most renowned filmmakers of our

times. Pollack released The Interpreter in 2005, andTéchiné released Les Temps Qui Changent in 2004.

Pollack is one of the best directors of the 60s, and al-though he has barely released any films in recent times(namely seven from 1980 to 2000), he continues to work asa film producer. The Interpreter recreates thrillers in its ownway, much alike Hitchcock’s North by Northwest. It is wide-

S

Page 33: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 33

comentário

mes em tempos recentes (sete desde 1980 até ao finaldo século XX). Mas sabe-se também que ele não temestado parado noutras actividades ligadas ao cinema,nomeadamente como produtor. O seu A Intérpretedistingue-se por recriar com segurança o filme de sus-pense com um estilo próprio, que inclui a sacrossan-ta referência hitchcockiana, neste caso a Intriga Inter-nacional (North by Northwest). Na verdade, sabe-secomo Hitchcock teve que reconstituir em estúdio, ecom particular felicidade, a sede das Nações Unidas,em Nova Iorque, para uma das sequências fulcrais doseu filme. Ora Sidney Pollack obteve, pela primeira,vez autorização para filmar nas instalações da sede daONU um filme que, no essencial, aí decorre.

Baseando-se num argumento sólido e utilizandodois grandes actores, Sean Penn e Nicole Kidman,em “piloto automático”, o cineasta cria um filme decomplot com atentado no fim (outra referência aHitchcock, desta vez a O Homem Que Sabia Demais(The man Who Knew Too Much), que teve duas ver-sões, uma inglesa nos anos trinta, outra americananos anos cinquenta) em que, com um estilo sóbrio eseguro, desenvolve a trama narrativa em paralelocom a relação entre os dois protagonistas, ele polí-cia, traumatizado pela muito recente morte da mu-lher, ela intérprete nas Nações Unidas com um pas-sado ligado a África. O que pensomerecer atenção neste filme é a or-ganização da narrativa, que assu-me as ramificações necessárias so-bre um tema de grande actualida-de centrado num país africanoimaginário mas bem imaginado,sobre as quais se desdobram as re-ferências familiares da protagonis-ta, juntamente com a alquimiaque se cria entre os protagonistassem que, com o suporte da planifi-cação e da realização, isso aparen-te exigir muito dos actores.

Em tempos de banalização dothriller e do filme de conspiração(et pour cause...), A Intérprete recor-da-nos como este tipo de filme foidos que mais contribuíram para oprestígio do melhor cinema ameri-cano. Sidney Pollack tem, inclusi-vamente, filmes deste género nasua filmografia, como Os Três Diasdo Condor (Three Days of the Con-

ly known that Hitchcock had to, in the studio, recreate theheadquarters of the United Nations, in New York, for one ofthe key sequences of his film. However, and for the first time,Pollack was allowed to shoot a film in the UNO building.

Based on an impressive script and performed by twogreat actors, Sean Penn and Nicole Kidman, The Inter-preter deals with intrigue and ends with assault (a refer-ence to Hitchcock’s The Man Who Knew Too Much,which had an English version in the 30s, and an Ameri-can one in the 50s). The plot shows the relationship be-tween the two leading characters: he plays a cop, emo-tionally disturbed by the recent death of his wife, and sheplays a United Nations interpreter, whose past is connect-ed with Africa. The plot takes place in a fictitious but wellimagined African country, and is structured in such a wayas to handle the complexity of a very up-to-date subject,interwoven with the interpreter’s family references and theaffinity that develops between the two main characters.

Thrillers have become common, but The Interpret-er reminds us of how this kind of film has contributed tothe reputation of American cinema. Sidney Pollack hasdirected other thrillers before, like Three Days of theCondor and The Yakusa, both in 1975, but in The In-terpreter he gives his best and is successful. There aresome great moments of terror, anguish and fear, but it isnear the end that, with a splendid relentless mise enscène, everything suits the purpose.

Pollack has always been appreciated as a director,and his latest film proves he is one of the greatest inAmerican cinema.

Page 34: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 34

comentário

dor) e Yakusa, ambos de 1975, e aqui não se poupa aesforços para fazer obra pessoal, o que, no caso dele,significa por regra singularmente acima da média. Ofilme tem momentos de terror excelentes, em queangústia e medo invadem o ecrã, mas é na sequên-cia final, que todo o filme prepara, que tudo se con-juga e ganha sentido com base numa mise en scèneimpecável e implacável. Se o cineasta, com filmesmelhores que outros como toda a gente, sempre foialguém merecedor da nossa melhor atenção, o seuúltimo filme confirma-o como um veterano de pri-meira linha dentro do cinema americano.

Diferente é o caso de Os tempos que mudam, deAndré Téchiné, cineasta apreciado nos anos setentado século passado pelo seu não academismo. Depoisde Juncos Silvestres (Les Roseaux Sauvages), de 1994,o prestígio do cineasta entrou em declínio e em per-da dos favores da crítica, a meu ver imerecidamente.Ora o seu mais recente filme, em que junta um parmítico do cinema francês, Gérard Depardieu e Ca-therine Deneuve, lançado por François Truffaut emO Último Metro (Le Dernier Métro), de 1980, temtudo, incluindo os actores, para agradar. Uma narra-tiva fantomática e vagamente truffauldiana (nestecaso a referência é A Mulher do Lado – La Femme d’àCotê) que gira em volta da procura de uma segundaoportunidade para um amor passado, uma realiza-ção segura e evocativa, a criação de um clima obses-sivo. A crítica, tanto em França como em Portugal,rendeu-se de novo a Téchiné.

Por mim, que prezo o cineasta e a maioria dosseus filmes, mesmo os menos considerados, julgoque paira sobre este Os Tempos Que Mudam um equí-voco. O que resultava em A Mulher do Lado por ser

This is not the case of Les Temps qui Changent, byAndré Téchiné, a filmmaker admired in the 70s due tohis non-engagement to academia.

After the release of Les Roseaux Sauvages (WildReeds), in 1994, his reputation and the favours of thecritics have declined, and unjustly so. His latest film haseverything to please, including the main actors, GérardDepardieu and Catherine Deneuve, the legendary couplefeatured together for the first time in François Truffaut’sLe Dernier Métro (The Last Metro) (1980). Les Tempsqui Changent is a fictitious Truffault-like plot (referringback to La Femme d’à Côté _ Woman Next Door) thatdeals with the quest for a second opportunity to live alove affair of the past. It is an evocative film that createsa climate of obsession. This time the critics, both inFrance and Portugal, have approved his work.

As for me, who am someone that appreciates Té-chiné and most of his films, I think that Les Temps QuiChangent is overrated. Whereas La Femme d’à Côté issuccessful because everything happens by chance, in LesTemps Qui Changent Antoine, in Tangier, intentional-ly seeks for his lost and mythical Cécile, who is now mar-ried to a doctor and has a son. The main drawback inhis film is the option for an excess of sentimentalism,rather than a balance between sentiment and nimble-ness. I think this is the result of a huge self-compliance,of an enormous facileness, and of a great compromisewith the audience’s preferences, which can be proved bythe obvious happy ending.

Sidney Pollack dirige Nicole Kidman em A Intérprete

Page 35: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 35

comentário

fruto do acaso ocorre neste filme por obediência aum propósito voluntário de Antoine, que busca emTânger essa mítica e perdida Cécile, agora casadacom um médico de quem tem um filho. Onde ascoisas claudicam é no tom sentimentalão que o ci-neasta imprime ao seu filme, carregando as tintasem vez de, como noutros filmes, assumir uma fron-teira delicada entre sentimentalismo e leveza. Como maior respeito que André Téchiné me merece, oequívoco deste filme surge-me como resultado deuma enorme auto-complacência, de um grande faci-litismo, de uma enorme transigência com o gosto dopúblico, o que um final descaradamente feliz acen-tua por não implicar uma escolha, antes impô-la.

Finalmente academicista, como vinha dizendo acrítica, o autor aproveita-se da narrativa e dos acto-res para fazer um filme de prestígio e para grandesaudiências em prejuízo do rigor narrativo e fílmicoque o caracteriza no seu melhor. Recuperado pelacrítica, pelo público e pela distribuidora (valha-nosisso!) pelas razões menos nobilitantes, André Téchi-né não deixa de ser, por causa deste filme, o grandecineasta que é, mas faz pairar uma sombra, a do ro-mance cor-de-rosa, sobre a sua obra, que a meu ver eraperfeitamente evitável e até agora tinha, melhor oupior, habilmente evitado.

Embora se possam detectarcontinuidades temáticas e estéti-cas entre este Os Tempos Que Mu-dam e os filmes anteriores do au-tor, e não é isso que está em cau-sa, o tom que ele imprime ao fil-me é que o torna deslocado, desfa-sado, no limite falhado. Tudo,como se costuma dizer, com asmelhores intenções. A prova deque isto acontece poderá ser en-contrada em que nunca vemosAntoine, só Gérard Depardieu,nunca vemos Cécile, só CatherineDeneuve. O que até se conformacom os intuitos do cineasta, masfaz o filme girar em pura perda.

E como não manifestar prefe-rência, para terminar, pelo esboçode inverosímil com mcguffin de foraem A Intérprete, que o coloca do ladode Hitchcock, e desgosto pelo excesso de plausibilidadede ficção de Os Tempos Que Mudam contra o acaso im-plausível mas real, que o coloca contra Truffaut?

Téchiné has finally become engaged to academia,as the critics had long been warning about. He takes ad-vantage of the plot and the actors in order to make afilm for a big audience and disregards the quality of hisusual filming. Although André Téchiné has regained thefavours of the critics, of the public and (thank God!) ofthe distributor for the less dignifying reasons, he is still agreat filmmaker. However, this film casts a shadow overhis career that could easily have been avoided.

Although there are certain thematic and aestheticlinks between all of his films, it is the way he handles LesTemps qui Changent that makes it a failure. Take, forinstance, the fact that Antoine and Cécile are neverthere, only Gérard Depardieu and Catherine Deneuveare. In spite of this being Téchiné’s aim, the film isharmed by it.

To sum up, I’d rather have the improbable Hitch-cock-like fiction of The Interpreter, than the excess ofplausibility of fiction of Les Temps qui Changent,which is opposed to Truffaut’s improbable but real fic-tion of La Femme d’à Côté.

Catherine Deneuve e Gérard Dépardieu em Os tempos que mudam

Page 36: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 36

comentário

QuartetoBergman

BergmanQuartet

Texto: Carlos Melo FerreiraTradução: Filipa Guerreiro

Page 37: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 37

comentário

rrumado por muitos como uma antiguidade,que terá encerrado carreira e obra cinemato-

gráfica com Fanny e Alexandre, de 1982, quando mui-to com Depois do Ensaio, de 1984, Ingmar Bergmanregressou com Saraband, de 2003, Quem faz estascontas simplistas esquece não só os trabalhos que en-tretanto fez para a televisão como a escrita a que en-tretanto também se dedicou, nomeadamente os ar-gumentos para cinema que vieram a se realizados poroutros (por exemplo, Infidelidade, de Liv Ullmann, de2000). Mas quem com estas contas arrumou o cine-asta sueco fê-las também a partir do anúncio feitopor ele próprio de que o filme de 1982 seria o seu úl-timo filme. No entanto, há que reconhecer quequem até ao início dos anos oitenta do século passa-do fez no cinema aquilo que Bergman fez estava nopleníssimo direito de dizer o que então disse, comoagora estava no pleníssimo direito de o desdizer.

Embora Marianne (Liv Ullmann) e Johan (Er-land Josephson) fossem os protagonistas de Cenas daVida Conjugal, de 1974, igualmente, como Saraband,feito para a televisão, e que teve mesmo uma versãotelevisiva de seis episódios de sessenta minutos cadae uma versão mais curta para cinema, nada nos pro-va que o presente filme seja uma continuação do an-terior, embora não só os nomes dos personagenscomo os actores sugiram uma qualquer ligação (maseste filme liga-se, no fim de contas, com toda a obrado autor).

Marianne, que faz para o espectador o prólogo eo epílogo com base em fotografias da família, vai vi-sitar Johan, com quem foi casada, muitos anos de-pois, no seu retiro no campo. Um filho dele, Henrik(Börje Ahlstedt), e a filha deste, Karin (Julia Dufveni-us), cuja mãe, Anna, morreu dois anos antes, vivemnas proximidades. Ora vai ser entre estes quatro per-sonagens que o filme se desenrola, com a constanterecordação de Anna e o encontro no epílogo de Ma-rianne com Martha, a filha catatónica, que se revelafundamental. Ingmar Bergman constrói as nove ce-nas do filme com base nos encontros entre essesquatro personagens, segundo as combinatórias pos-síveis entre eles. Assim, do encontro inicial ao en-contro final do antigo casal, percorremos as relaçõesde cada um dos dois com os mais novos: de Johan

A

ut aside by many people as an antiquity who clo-sed his cinematographic work and career with

Fanny and Alexander, 1982, at most with After theRehearsal ,1984, Ingmar Bergman returned with Sara-band, 2003. Those who make this simplistic accountsforget, not only the TV works that meanwhile he hasdone, but the writing to which he has also devoted him-self, namely the cinema arguments which were later di-rected by others (for instance, Liv Ullmann’s Faithless,2000). But those who put him aside with this accountsdid it also based in the anouncement himself made thatthe 1982 film would be his last. However, we must ad-mit that who, until the beginning of 80’s of the last cen-tury, did for cinema what Bergman did was in the fullright to say what he said as now he was in the full rightto take it back.

Even though Marianne (Liv Ullmann) and John (Er-land Josephson) were the protagonists of Scenes froma Marriage (1974) as well as in Saraband, made forTV, which even has a six episode TV version of sixty mi-nutes each, nothing proves that this film is a continua-tion of the previous one. Even if the actors as the charac-ter’s names suggest some kind of connection (but whatthis film reflects after all is the author’s work).

Marianne, who makes to the viewer the prologue andthe epilogue based on family photos, will visit Johan , towhom she was married, many years later, in his contry re-sort. A son of his, Henrik (Börje Ahlstedt) and his daugh-ter Karin (Julia Dufvenius), whose mother, Anna, died twoyears ago, live nearby. The action will take place betweenthese four characters, with Anna’s constant memory andMartha’s , the catatonic encounter with Marianne in theepilogue, which proves to be fundamental. IngmarBergman builds the nine scenes of the film based on theencounters between those four characters, according tothe possible combinatories between them. Thus, from the

P

Liv Ullmann e Erland Josephson

Page 38: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 38

comentário

com o filho, que despreza e que acabará por tentar osuicídio; de Johan com a neta, de quem gosta mui-to; de Henrik com a filha, que ama; de Mariannecom Karin; de Marianne com Henrik, sendo que osencontros entre pai e filha e entre as duas mulheresse repetem.

A ordem de cada uma das cenas não é, obvia-mente, arbitrária, e propicia que acompanhemos atentativa de autonomização de Karin; a tentativafrustrada de autonomização de Henrik em relação aopai e de definição sua do futuro da filha; a aproxima-ção entre Karin e Marianne, muito centrada na mãeda primeira (na segunda cena entre ambas presenteatravés de uma carta, escrita ao marido do hospital);o esboço de aproximação entre Marianne e Henrik,na igreja, em cujo final ela fica só com Deus e com asua fé (a imagem d’Ele); as incidências flutuantes doreencontro de Marianne com Johan.

Na obra de Bergman há duas constantes, entremuitas outras, que não se excluem mutuamente, em-bora uma prevaleça em certos filmes, a outra predo-mine noutros, mas que por vezes se juntam: a figurade Deus e a música. Em Saraband elas estão ambaspresentes, em Henrik e Karin a música, em Mariannee Johan as alusões a Deus e a sugestão musical, emtom de apaziguamento (ainda não) final (ela tem 63anos, ele 86). Além destas, duas outras constantesatravessam também a obra do cineasta: os actores e,em especial, as actrizes, e o grande-plano. Não tenhodúvidas de que este filme, de um erotismo por vezessurpreendente entre pai e filha, entre avô e neta, tra-ça dos mais perfeitos, porque completos, retratos fe-mininos da obra do autor, ligando gerações diferen-tes, relações diferentes, problemáticas diferentes, pre-sente, passado e futuro, e procede a uma das mais su-blimes utilizações do grande-plano não só na obradele como em toda a história do cinema.

Claro que há outras constantes na obra deBergman, como o casal, pais e filhos, que aqui estãopresentes também, mas se para aquelas chamei em es-pecial a atenção foi porque, para além de alguns fil-mes iniciais que não esqueço, de Sonata de Outono, de1978, e do caso especial de A Flauta Mágica, de 1975,este é o filme em que a criação musical, via interpre-tação instrumental, está presente na obra dele, e por-

first to the last old couple’s encounter, we go through therelationships each of them has with the younger ones: Jo-han with the son he despises who will end up trying sui-cide; Johan with his beloved granddaughter; Henrik withhis beloved daughter; Marianne with Karin; Mariannewith Henrik. The encounters between father and daugh-ter and between the two women repeat.

The order of the scenes isn’t, obviously, arbitrary,and allows us to follow Karin’s autonomization; Henrik’sautonomization frustrated try towards his father andalso to define his daughter’s future; the approximationbetween Karin and Marianne, much too centered in Ka-rin’s mother (present in the second scene between themthrough a letter written to her husband at the hospital);the first approach between Marianne and Henrik, at thechurch, where in the end she stays alone with God andher faith (His image) ; the flooting incidences of Marian-ne and Johan’s encounter.

In Bergman’s work there are two constants, amongmany others, which don’t mutually exclude each other,even though there’s one prevailing over the other in cer-tain films, with others it’s quite the opposite. But some-times they join: the figure of God and music. In Sara-band they are both present, in Henrik and Karin, the mu-sic; in Marianne and Johan, the alusions to God and themusical suggestion, with a tone of a (not yet) final paci-fication (she is 63, he is 86). Adding to these, there areother two constants that also get through the cinemato-grapher’s work: the actors, specially the actresses, andthe grand-close. I have no doubts this film, sometimeswith an amazing erotism between father and daughter,grandfather and grandaughter, draws one of the mostperfect, as complete, feminine portraits of this author’swork, connecting different generations, different pro-

Page 39: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 39

comentário

que este é o filme em que, também por causa da mú-sica (J. S. Bach, obviamente, mas também AntonBruckner, Johannes Brahms, Alban Berg e Paul Hinde-mith), a presença de Deus é mais clara e naturalmen-te aceite (e a referência a Soren Kierkegaard corrobora-o), embora surja como um derivado e não como um(o) problema central, como sucedera na trilogia for-mada por Em Busca da Verdade (1961), Luz de Inverno(1962) e O Silêncio (1963), que fora dos pontos mais al-tos da obra do cineasta. Em qualquer caso, e pelo me-nos em Saraband, Deus é um ponto de chegada paraalguns, não um ponto de partida, o que é perfeita-mente consistente com a obra anterior do autor. Eporque os actores e (especialmente) as actrizes (e nãoos esqueço a eles, não), os personagens masculinos e(especialmente) os personagens femininos (contandoa ausente e a doente) são fabulosos e o uso do grande-plano superlativo, ele, grande-plano, que é para o ci-neasta, de há muito, o traço distintivo do cinema.

E há também o uso do “fora-de-campo”, emque Bergman neste filme se excede, não só (emboraseja muito importante) na famosa sequência na flo-resta (morte e ressurreição, como já foi referido pelacrítica mais esclarecida), durante o flash-back de Ka-rin, mas do prólogo aoepílogo (por exemplo,quem está do quartolado, o lado da câma-ra, no início e no fim?)e durante as nove ce-nas, ao ponto de po-dermos dizer que Sara-band está para IngmarBergman como Gertrud(1964) esteve para CarlTh. Dreyer tambémpor este motivo, paraalém de todos os ou-tros, temáticos, queme surgem como evi-dentes.

blems, different relationships, present, past and futu-re,and proceeds to one of the most impressive grand-clo-se uses, not only in his work as in all cinema history.

Surely there are other constants in Bergman’s work,as the couple, parents and children, who are also presenthere, but I mentioned those particular ones because, be-sides some specific initial films I don’t forget, AutumnSonata,1978, and the special case of Magic Flute ,1975, this is the film where musical creation, throughinstrumental interpretation, shows in his work, and be-cause this is the film where, also due to music (J. S. Bach,obiviously, but also Anton Bruckner, Johannes Brahams,Alban Berg and Paul Hindemith) God’s presence is clea-rer and naturally accepted (and the reference to Soren Ki-erkegaard confirms it), even though it appears as a dire-ved and not as the central problem as had happened inthe trilogy formed by Through a Glass, Darkly (1961),Winter Light (1962) and Silence (1963) which was oneof the best moments in this cinematographer’s career.Anyway, at least in Saraband, God is, to some people, apoint of arrival and not a point of departure, which is per-fectly consistent with the author’s previous work. And be-cause the actors (specially) the actresses (I really don’tforget the men), the male characters and (specially) thefemale characters are wonderful and the gran-close useis superlative; that grand-close, which is to the cinemato-grapher, from long ago, the cinema distinctive feature.

And there is also the “offside”, where Bergman ex-ceeds himself in this film, not only (although very impor-tant) in the famous forest sequency (deadth ans resur-rection, as it was already referred by the critique), duringKarin’s flash-back, but from the prologue to the epilogue(for instance , who is in the fourth side, the side of the

camera, at the beginnigand at the end?) and du-ring the nine scenes, in away we can say Sara-band is to IngridBergman as Gertrud(1964) was to Carl Th.Dreyer by the same rea-son, besides all the the-matic ones which seemself-evident to me.

Julia Dufvenius

Page 40: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 40

comentário

sai Ming-Liang é um desses cineastas orien-tais, no caso de Taiwan, que têm muito para

dizer em filmes, os quais raramente chegam até nós.Neste caso tem-nos valido, mais uma vez, a Cinema-teca Portuguesa, que desde 2001 nos tem permitidoficarmos a conhecer todos os seus ainda escassos fil-mes (a sua primeira longa-metragem data de 1992),o que nos permite afirmar que ele é, sem dúvida, ummestre, um novo mestre, do tratamento do tempono cinema, como o seu mais recente filme, AdeusDragon Inn (Goodbye, Dragon Inn), de 2003, cabal-mente confirma.

O tema é conhecido: os últimos dias de uma an-tiga e vasta sala de cinema. Por aí passaram PeterBogdanovich – A Última Sessão (The Last PictureShow) de 1971 – ou Giuseppe Tornatore – CinemaParaíso (Nuovo Cinema Paradiso), de 1989 –, masisso não impede que vejamos neste filme, como quepela primeira vez, o fim de uma época e, com ele, ofim de um certo tipo de filmes (neste caso, de kung-fu). Na verdade, Tsai Ming-Liang transforma o seufilme num belíssimo momento de cinema, nostálgi-co, é certo, decadente, é verdade, mas daí retira osmelhores resultados. Ora vejamos.

O filme que está a ser projectado na sala em cau-sa, Dragon Inn, um filme de kung-fu tradicional, épraticamente a única fonte sonora deste filme. Sãoos seus diálogos que nós ouvimos a maior parte dotempo, não os dos escassos e silenciosos frequenta-dores da sala, sejam eles cinéfilos ou não – mas aten-ção às escassíssimas falas deles. E então é toda a arteda câmara de Tsai Ming-Liang, os longos travellingspelos corredores e pela sala, que como que revestemuma função temporal: a de fixar naquele derradeiromomento toda a história daquela sala, toda a histó-ria dos filmes e dos espectadores que por ela passa-ram. Fixar o que já lá não está através da filmagemdo que lá está agora: o vazio, a decadência que pre-

T

rom Taiwan, Tsai Ming-Liang is an Oriental film-maker who has a lot to share via his movies,

which we seldom get the chance to see. In this respect,the Cinemateca Portuguesa is to be praised for, since2001, it has given us the opportunity to see all his films(he directed his first feature film in 1992). Moreover, wecan argue that he is, undoubtedly, an expert at usingtime in his films, as can be proved by his latest film,Goodbye, Dragon Inn (2003).

It deals with a well-known subject: the last days ofan old and huge cinema room. Although Peter Bogdan-ovich (The Last Picture Show, 1971) and Giuseppe Tor-natore (Nuovo Cinema Paradiso, 1989) have dealtwith this theme before, Goodbye, Dragon Inn treatsthe end of an era and, consequently, the end of kung-fufilms masterly. Tsai Ming-Liang has made an amazingfilm, bringing out the best in it through the weaving ofnostalgic and decadent moments. Let’s see how heachieves this.

The sound source of this film is simply a traditionalkung-fu film, Dragon Inn, that is being shown at thecinema room. Mostly we listen to its dialogues and notto those from the scarce and silent audience – but be-ware their rare statements. That’s when Tsai Ming-Liangshows the way he masters the camera: the long voyagesaround the room play a part in time effect – they aremeant to capture the whole history of that room, of allthe films that have been shown there and of all the au-dience that have been there. The past is captured byshooting the present: i.e., the void and the decadencethat anticipates the end.

The scarce characters play a double part: they playtheir own dazed selves, and they represent those thathave been there before and only phantom-like subsist.

Goodbye, Dragon Inn shows a taste for decadenceas well as a huge love for cinema. It also displays TsaiMing-Liang’s technical knowledge, for instance, he useslong timed sequences, as Orson Welles or Alain Resnais

F

O gosto da decadênciaA taste for decadence

Texto: Carlos Melo FerreiraTradução: Branca Sampaio

Page 41: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)
Page 42: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 42

comentário

cede o fim. As escassas personagens deste filme va-lem por si próprias, como que assombradas no pre-sente, e valem por quem representam, quem ali es-teve e agora só fantomaticamente aí subsiste.

Há alguma coisa de gosto pela decadência nesteAdeus Dragon Inn, mas há igualmente um imensoamor pelo cinema e um enorme saber na composi-ção visual (e sonora) do filme, com os seus longosplanos-sequência temporalizados, como em OrsonWelles ou em Alain Resnais. Exactamente aqui que-ria chegar: Tsai Ming-Liang é um dos maiores cine-astas actuais porque, fiel a uma temática e a um es-tilo próprios, mantém pontos de contacto com al-gum do melhor cinema e alguns dos melhores cine-astas de todos os tempos.

Ao filmar a morte de um cinema, ele reinventao cinema em imagens e em sons para quem quiserver o seu filme, lento e desesperado, mas pelo qualpassam alguns dos melhores momentos de cinema aque nos foi dado assistir nos últimos tempos. O quequererá, no mínimo, dizer que, ao filmar a morte docinema, o cineasta o mantém vivo e prolonga pelosmelhores e mais cinematográficos motivos: ao fil-mar um cinema praticamente deserto ele reinventaa arte cinematográfica no seu melhor, como quepara nos assegurar e tranquilizar sobre o futuro dela.O que faz sem a menor cedência, sem a menor tran-sigência a um gosto comum e vulgar, o que diz bemdo mérito absoluto deste filme.

did. What I mean is, Tsai Ming-Liang is one the best di-rectors of our time because besides handling his ownthematic and stylistic devices, he also establishes a con-nection with some of the best films and best filmmakersof all times.

By shooting the death of a cinema room, cinema isreinvented in images and sounds in Dragon Inn, a slowand desperate movie, but one of the best in the historyof cinematography. By shooting the death of cinema,Tsai Ming-Liang keeps it alive. By shooting an almostempty cinema room he recreates the best of cinemato-graphic art, thus we are reassured of its survival. And hedoes so, without giving in to a vulgar and ordinary taste,which shows the quality of his cinematographic work.

Tsai Ming-Liang

Page 43: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 43

entrevista

a história da imigração entre o Brasil e o Japãoainda faltam muitos capítulos por concluir.

Ao filmar Gaijin – Ama-me como sou, a realizadora Ti-zuka Yamazaki apenas faz contar um deles.

Em Gaijin2, Tizuka retoma a história de Titoe(Kyoko Tsukamoto), cuja trajetória é mostrada emGaijin – Caminhos da Liberdade, longa que a consa-grou na década de 80. A batyan (avó) Titoe, mãe deShinobu, chegou ao Brasil em 1908, início da imi-gração japonesa naquele país, a fim de enriquecer eretornar à terra do sol nascente cinco anos mais tar-de, o que não acontece. A família dela vai sofrer osreveses das diferenças culturais.

Após a crise que atingiu o Brasil, na década de90, com o Plano Collor, Gabriel, marido de Yoko, in-terpretado pelo cubano Jorge Perugorria, segue parao Japão, em busca de trabalho.

Filho de agricultores também decadentes porconta de uma forte geada que abalou os negócios dafamília, ele vai tentar recuperar o que perdeu com oconfisco efetivado pelo governo brasileiro na época,mas é surpreendido com o terremoto que devastouKobe, em 1995.

Com a notícia de seu suposto desaparecimento,Maria (Tamlyn Tomita), segue com sua filha Yoko

D

he history of Japanese immigration to Brazil is farfrom complete. Gaijin – Ama-me como sou, by Ti-

zuka Yamazaki, is just a chapter of that long untold history.Gaijin2 (meaning “foreigner”) gets back to the sto-

ry of Titoe (Kyoko Tsukamoto), whose path had beendescribed in Gaijin – Caminhos da Liberdade (Gaijin -Roads to Freedom), Tizuka’s greatest feature film of the80s. Titoe’s batyan (grandmother), Shinobu’s mother,arrived in Brazil in 1908, when Japanese immigrationbegan, to make lots of money and return to her home-land five years later, which she never did. Her family willsuffer the misfortunes of cultural differences.

After the Collorgate scandal that stoke Brazil in the90s, Gabriel, Yoko’s husband, played by the Cuban Jor-ge Perugorria, heads to Japan looking for work.

He’s the son of farmers that went bankrupt becauseof a sharp frost. He will try to regain the property the go-vernment confiscated, but he’s overcome by the earth-quake that devastated Kobe in 1995.

Maria (Tamlyn Tomita) flies with Yoko (Lissa Diniz)to Japan looking for Gabriel, who is supposedly missing.This is the plot of Gaijin1, which won Tizuka four kikitosat the Gramado Festival 2005 (RS): Best Feature Film,Best Director, Best Supporting Actress and Best Music.

Gaijin2 chronicles the saga of the dekasseguis (Bra-

T

Gaijin Ama-me como souLove me the way I am

Texto: Ana Paula Margarido de AzevedoTradução: Branca Sampaio

Page 44: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 44

entrevista

(Lissa Diniz) para o Japão à procura do marido des-ta, o que dá o mote ao filme premiado com quatrokikitos na edição 2005 do Festival de Gramado (RS):melhor filme, melhor direção, melhor atriz coadju-vante e melhor música.

O segundo Gaijin (estrangeiro, em português)mostra a saga de imigrantes brasileiros – os chama-dos dekasseguis – trabalhando no Japão e tenta di-mensionar a relação cultural entre naturais dos doispaíses por meio de mais uma história de amor.

Shinobu segue a tradição japonesa ao casar-secom um compatriota e não concorda com o casamen-to da filha, Maria, com Gabriel. Também ela regressaao Japão para trabalhar como dekassegui e ajudar suafamília a contornar as dificuldades financeiras.

O filme revela-se paradoxal. Gaijin2 é complexosem ser, entretanto, pretensioso. Para a imprensabrasileira, a continuação de Caminhos da Liberdadenão chega a ser uma obra de arte, embora premiado.As personagens, conforme a crítica, são pouco den-sas e o espectador, mesmo o mais astuto, apercebe-seassistindo uma mini-série global – daquelas de “vejaamanhã cenas do próximo capítulo”, apesar de tersido lançado 25 anos após o primeiro.

Para além de alguns problemas de áudio, tam-bém diagnosticados pela crítica brasileira, o elenco,no entanto, tem boas interpretações.

A realizadora Tizuka Yamazaki teria sido maisconvincente no primeiro filme, que conquistou 43prêmios nacionais e internacionais, ente eles cincokikitos? Não é o caso. A própria Tizuka diz que nãoquis fazer um filme intimista.

“Eu podia ter mudado, fazer um filme intimista.Mas o épico foi o que nos propusemos a fazer.”

O drama de 130 minutos exigiu a locação em vá-rias cidades brasileiras do norte do Paraná, Minas Ge-rais e Tocantins, além da cidade japonesa de Kobe ecustou 10,6 milhões de reais. O filme está em cartazno Brasil desde o início de setembro. Sua estréia acon-tece num momento em que o Brasil se esforça paraque os cerca de 270 mil nipo-brasileiros que traba-lham no Japão tenham melhores condições de vida.Até que o longa-metragem chegue a Portugal, o con-solo é passar uma vista d’olhos em cenas disponíveisno site oficial do longa: http://www.gaijin2.com.br.

zilian immigrants) who work in Japan, and tries to inter-pret the cultural links between the natives of both coun-tries by means of a love story.

Shinobu follows the Japanese tradition and marriesa compatriot; she therefore doesn’t approve of Maria’smarriage to Gabriel. She also goes back to Japan to workas a dekassegui to help her family overcome their finan-cial problems.

The film is nonetheless paradoxical. It is complexbut not pretentious. Although Gaijin2 was a prize-win-ning film, the Brazilian press doesn’t think of it as amasterpiece. The critics state that the characters lackconsistency, and even the sharpest audience feel they’rewatching a mini-series – in spite of the 25 years perme-ating both films.

There are some audio failures, as noticed by thepress, but the cast does a good job.

Could Tizuka Yamazaki have been more convincing inher first film, which was awarded 43 national and interna-tional prizes, among them five kikitos? That’s not it. Ti-zuka herself says she didn’t want to make an inward film.

“I could’ve changed it and made an inward film,but we had set our minds on making an epic.”

The 130-minute-long film was shot in several citiesfrom northern Paraná, Minas Gerais and Tocantins, aswell as Kobe (Japan), and cost 10.6 million Brazilian re-ais. The film is on at cinemas since the beginning of Sep-tember. It was released at a time when Brazil is strivingto help the 270 thousand Nipo-Brazilians who work inJapan have better living conditions. While Gaijin2 isn’treleased in Portugal, you better watch the trailer availa-ble at the official site: www.gaijin2.com.br.

This is the interview granted by Tizuka Yamazaki.

You have worked with great directors, likeGlauber Rocha. How do you feel about the Bra-zilian press labelling your film as a mini-seri-es and the characters as lacking consistency?That’s what only a few critics say. They can’t make the

Page 45: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 45

entrevista

Leia, a seguir, entrevista com a realizadora Ti-zuka Yamazaki.

Trabalhou com grandes cineastas, como Glau-ber Rocha. Como reage às críticas da imprensabrasileira de que o filme tem estigma de mini-série e os personagens são pouco densos?Isso é o que dizem alguns poucos críticos. Não sa-bem diferenciar uma mini-série de TV para o cine-ma. Se as personagens são pouco densas, a platéianão sairia das salas emocionada e agradecida poreu ter feito o filme. Não compactuo com os críticosque sequer sabem o que é cinema. Nunca puseramos pés num set de filmagem.

Quando finalizou Gaijin – Caminhos da Liber-dade, já tinha em mente uma continuidade?Na época eu pensava em uma trilogia. O primeiro, achegada dos imigrantes no começo do séc. XX quefoi o Gaijin – Caminhos da Liberdade, o segundo fil-me seria sobre a segunda Guerra Mundial com a his-tória dos imigrantes dos países do eixo – Japão, Ale-manha e Itália – e a segregação no Brasil e o tercei-ro da trilogia seria os descendentes no Brasil con-temporâneo. Mas tendo fisionomia japonesa eu nãoqueria correr o risco de virar a “cineasta japonesaespecialista em assuntos japoneses”. Esqueci o proje-to e fui fazer outros filmes.Só em 1996, chamada por Kyoko Tsukamoto, a atrizdo primeiro Gaijin, fui ao Japão conhecer as cidadesindustriais alimentadas pelos trabalhadores tempo-rários chamados dekasseguis. A sua maioria era com-posta de brasileiros, descendentes de japoneses, queacuados com a péssima situação econômica brasilei-ra dos anos 90, foram ao Japão em busca de condi-ções melhores de trabalho e sobrevivência.

Como foi a concepção de Gaijin2?Gaijin – Ama-me como sou nasceu desta viagem ao Ja-pão. Voltei com a intenção de fazer um filme sobreestes brasileiros que estavam enviando ao Brasil 2 bi-lhões e meio de dólares, decorrentes da poupançaque faziam. No decorrer da realização do roteiro, fuipercebendo a necessidade de abordar assuntos dopassado, na tentativa de esclarecer a verdadeira ra-

difference between a TV mini-series and a movie. If thecharacters lacked consistency, the audience wouldn’tfeel moved and grateful for this film. I don’t accept thecriticism from those who don’t even know what cinemais. They have never stepped into a filming set.

After releasing Gaijin1, did you already havea sequel in mind?At the time I was thinking of a trilogy. The first one – thearrival of the immigrants at the beginning of the 19th

century (Gaijin1); the second one – the story of the im-migrants from Japan, Germany and Italy during the Se-cond World War and their segregation in Brazil; thethird one – the story of their offspring in contemporaryBrazil. But as I am a Nipo-Brazilian, I didn’t want totake the risk of becoming the “Japanese director acqua-inted with Japanese affairs”, so I dropped the projectand made other films.In 1996 Kyoko Tsukamoto, the leading actress in Gaijin1,invited me to go to Japan and visit the industrial cities thatthrived on the dekasseguis – the temporary labourers. Mostof them were Brazilians, descendants from Japanese immi-grants, who had suffered the consequences of the Brazilianeconomic crisis of the 90s and decided to go to Japan ho-ping to improve their working and living conditions.

How did you come up with Gaijin2?This visit to Japan was the origin to Gaijin2. I came backwilling to make a film about these Brazilians that weresending 2.5 billion dollars from their savings. As the filmwas being directed, I realised there was a need of han-dling some issues related to the past so that their truemotivation for emigrating could be understood.This film dealing with 100 years of the history of Brazilis directed according to Japanese descendants perspecti-ve. While Gaijin1 is a male epic dealing with war andblood, Gaijin2 is a female epic that deals with peace,union and life.

Tizuka Yamazaki

Page 46: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 46

entrevista

zão da emigração destes brasileiros.Foi assim que nasceu o épico de 100 anos de históriado Brasil a partir de uma visão dos descendentes dejaponeses no país. Ao contrário do épico masculinoque trata de guerra e sangue, Gaijin – Ama-me comosou é um épico feminino, que fala de paz, união, vida.

A escolha de atores estrangeiros, como Peru-gorria, foi intencional?Em princípio eu queria um ator brasileiro. Os atoresprotagonistas desta faixa etária estavam ocupadoscom novelas e outros filmes. Sendo assim, como euprecisava de um latino, fui buscar um que fosse maispróximo do espírito brasileiro. Um cubano! Jorge Pe-rugorria, que eu conhecia de filmes como Guantana-mera, Morango e Chocolate, foi um presente para o fil-me. A Tamlyn Tomita, atriz de filmes como Come Seethe Paradise, do Alan Parker, ou A Mulher Prometidae Karate Kid II, foi a melhor opção para o papel, jáque temos aqui poucos atores profissionais.

Did you intentionally choose foreign actors,like Perugorria?At the beginning I wanted a Brazilian actor but the ac-tors belonging to this age group were shooting soap ope-ras and other films. So, as I needed a Latin American, Ilooked for someone who was closer to the Brazilian spi-rit: a Cuban! I already knew Jorge Perugorria from filmslike Guantanamera and Morango e Chocolate, and hewas a real find. Tamlyn Tomita, who featured in ComeSee the Paradise, by Alan Parker, or The Picture Brideand Karate Kid II, proved to be the best choice for the le-ading female role, since there is a lack of professionalactors in Brazil.

Was it easier to direct Gaijin2 than Gaijin1?Gaijin1 was my first feature film, and I had to face all theobstacles that any debut director faces. The plot was verysimple: it handled the problem of the Japanese arrivingin Brazil, in the beginning of the 20th century, to work incoffee plantations. They did slave work and dreamed ofgoing back home. Gaijin2 shows the complex emotionsof their offspring who live in-between two different cultu-res. What is good for a Brazilian isn’t necessarily goodfor a Japanese. The Japanese offspring learnt to getadapted and, despite the pressure to make them believethey’re Japanese, they are typical Westerners. The dekas-segui have had a deep impact on this revelation.

Were you expecting to be awarded in Grama-do Festival? What’s the difference between

Page 47: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 47

entrevista

Foi mais fácil a realização de“Ama-me como sou” que “Ca-minhos da Liberdade”?Gaijin – Caminhos da Liberdade foimeu primeiro filme, portanto, tiveas dificuldades de quem está estre-ando como diretora. O assuntoera muito simples. Tratava-se doimpacto de japoneses chegandoao Brasil do começo do séc. XXpara trabalhar nos cafezais prati-camente como escravos, com o so-nho de voltar em cinco anos à suaterra natal. O Gaijin – Ama-mecomo sou apresenta a complexida-de das emoções dos descendentesque vivem na linha cruzada deduas culturas de valores opostos. Tudo que é bompara o brasileiro não é considerado bom para o japo-nês. Entre esse fogo cruzado, os descendentes japo-neses vão se adaptando, se miscigenando e, apesarde serem educados para acreditar que são japoneses,se descobrem muito ocidentais. O Japão, neste even-to dekassegui, contribuiu profundamente para estarevelação.

Ficou surpresa com a premiação em Grama-do? Qual a reação entre vencer em 2005 evencer em 80 o Festival, já que o Brasil viveépoca histórica distinta, não mais sob o re-gime militar?Pela composição do jurado achamos que não ganha-ríamos, por isso tivemos a surpresa agradável. Comoo primeiro prêmio a gente nunca esquece, o segun-do veio sem tanto impacto. De qualquer forma, eletambém está sendo muito querido!

Já tem em mente o próximo filme? Paraquando será lançado?Estamos começando a captação do filme Ave Carua-na, que trata da vida de uma pajé da Ilha do Marajó,chamada Zeneida Lima. É grande conhecedora dosmistérios da floresta amazônica, da cura através deervas e energias da lua, das água, dos minerais.

Quando Gaijin2 estará disponível em Portugal?Espero imensamente que os portugueses possam teracesso ao filme brevemente!

winning the prize in 2005 and 1980, sinceBrazil is no longer living under a military re-gime?We weren’t expecting a prize because of the members ofthe jury; therefore it was a nice surprise. The first time weare awarded is unforgettable, so this second prize didn’tquite have the same impact. Nonetheless, we were reallypleased by it.

Are you already planning a new film? Whenwill it come out?We’re starting a new film, Ave Caruana, which dealswith the life of a pajé named Zeneida Lima, who lives atMarajó Island. She masters the mysteries of the Amazonforest, the cure through herbs and the energy from themoon, the water and minerals.

When will Gaijin2 be released in Portugal?I sincerely hope that the film will be released as soon aspossible in Portugal!

Page 48: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 48

festival

FIKE 2005O Cinema de curta duração volta a Évora

Short Film Festival back in ÉvoraFilipe Lopes

Tradução: Branca Sampaio

Waverley

Cashback Der Beste

Page 49: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

IKE 2005 was a big success and Páteo do Cine-ma (SOIR Joaquim António de Aguiar) and the

University of Évora Film Society did a great job onceagain.

FIKE 2005 – the fifth edition of Évora InternationalShort Film Festival – which took place from 18th to 26th

November in Évora, has had one of the best lists of se-lected short films of the previous year. During a weekover a hundred films were screened in this short film fes-tival which gave us the opportunity to watch a great va-riety of films. Nevertheless, I’d like to stress some keymoments of this festival.• On Friday, November 18th, the festival opening sessionwas held at the Soror Mariana Auditorium where“The Fifth Step” was for the first time screened in Portu-gal. It was shot in Évora and dozens of citizens played apart in it and this way helped materialize Donna Ma-bey’s, Josephine Reynolds’ and Mariana Conde’s project,the three of them students at the International FilmSchool of Wales. The 18-minute-long film uses pleasanttravellings, and has a nice photography and an excellentediting. It deserved the enthusiastic applause of the fullhouse audience.• On Monday, November 21st, took place the first nightof the brilliant documentary Sisters in Law, by FlorenceAyisi and Kim Loginoto. It handles the issue of domesticviolence in Cameroon and won the prize Art et Essaiand Special Mention EUROPE CINEMA at the CannesFilm Festival 2005.

F

CINEMA | 49

The Fifth Step

Sisters in Law

festival

ma vez mais o Páteo do Cinema (SOIR Joa-quim António de Aguiar) e o Cineclube da

Universidade de Évora estão de parabéns. O FIKE2005 foi um sucesso.

A quinta edição do FIKE – Festival Internacionalde Curtas-metragens de Évora – que decorreu entreos dias 18 e 26 de Novembro de 2005 na capital doAlto Alentejo, teve, como já começa a ser um hábitoanual, uma das melhores programações de curtas-metragens de todas as que foram mostradas ao pú-blico português no ano transacto. Parece-me redun-dante dizer que se puderam ver filmes para todos osgostos, porque com os oito dias de competição de-corridos e a mais de uma centena de filmes projecta-dos em sessões competitivas, era natural que assimfosse. No entanto, gostaria de destacar, além da pro-gramação propriamente dita, alguns momentos:• Na sexta-feira, dia 18, correspondente à aberturaoficial, o Auditório Soror Mariana vestiu-se de galapara receber a primeira projecção em Portugal de“The Fifth Step”, ficção rodada inteiramente nesta ci-dade e que mobilizou larguíssimas dezenas de habi-tantes locais (e não só) para que fosse possível que oprojecto homónimo, de três alunas – Donna Mabey,Josephine Reynolds e Mariana Conde – do Internaci-onal Film School of Wales (do País de Gales, como senota pelo nome da escola), se transformasse em maisdo que isso. O resultado final, com cerca de dezoitominutos, bons movimentos de câmara, uma bastan-te razoável fotografia e uma óptima montagem, é, defacto, muito interessante e mereceu uma prolongadaovação de uma sala completamente lotada, reacção aque não deve ser alheio, também, o facto de muitosdos que nele colaboraram se encontrarem na sala.•A estreia absoluta em Portugal, na segunda-feira,dia 21, do magnífico documentário Sisters in Law, deFlorence Ayisi e Kim Loginoto, que aborda, dizendode uma forma simplista, a problemática da violênciadoméstica nos Camarões e que foi vencedor do Pré-mio Art et Essai e Menção Especial EUROPA CINEMAno Festival de Cannes 2005.•De segunda a sexta-feira, entre as 9h30-17h30, de-senrolaram-se vários workshops para crianças, nos qua-is Henrique Espírito Santo, um dos mais antigos e pro-fícuos produtores do cinema português de sempre, ex-plicou às crianças “Como se faz um filme”, dedicandotempo e espaço para exemplificar o que fazem as maissignificativas profissões ligadas à feitura de um filme,assumindo cada uma dessas crianças um papel activoe participante na exemplificação. As crianças adora-ram a experiência e o prestigiado formador vê-se queestá no cinema, hoje, como sempre – com paixão.•Durante a semana foram realizadas várias mostras,com natural destaque para a Mostra de Animação Por-

U

Page 50: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 50

festival

tuguesa, na qual se puderam ver alguns projectos decursos/disciplinas de animação (CITEN/Fundação Ca-louste Gulbenkian e ESAD/Caldas da Rainha) da res-ponsabilidade de Fernando Galrito, que também apre-sentou alguns trabalhos da sua produtora, a ÂnimoLeve. Mas houve espaço para curtas-metragens gale-gas, da New York Film Academy (delegação de Londres)e do Centro Sperimentale di Cinematografia, de Itália.•Aproveitando a presença de David Pope (directorpedagógico da New York Film Academy do Reino Uni-do) no júri do FIKE, o sábado, dia 26, contou comuma extraordinária e muito participada “MasterClass” dada pelo próprio e intitulada “Training andProfessional Development for Directors”. Com umdiscurso fácil, que rapidamente cativou a audiência,Pope conduziu uma sessão que seria digna de um lo-cal como a Aula Magna, por exemplo, com esta com-pletamente lotada, o que só me levou a lamentarque a mesma não se tivesse realizado numa salamuito maior, na qual coubesse muito mais gente.

Quanto aos filmes que passaram em competiçãoe, apesar de 2005 não ter sido, propriamente, um anode magnífica “colheita” cinematográfica ao nível decurtas, o conjunto de obras apresentado, seleccionadode entre mais de 1300, com proveniências muito di-versas de um universo onde se contavam cerca de 90países, foi muitíssimo boa, se o comparamos com ou-tros certames que existem em Portugal, mas não atin-giu (e creio que muito dificilmente isso seria possível)a qualidade de excelência vista na edição de 2004. Dequalquer modo, foram muitos e bons os filmes quecompetiram nas mais variadas secções e géneros, ondeestavam inseridos documentários, ficções e animaçõese, embora cada uma das pessoas que assistiu às sessõescompetitivas (quase sempre cheias, por sinal) tenhauma opinião própria sobre os melhores, pessoalmenteacho que a escolha do júri, constituído pelos já referi-dos Florence Ayisi, David Pope, Henrique Espírito San-to e Fernando Galrito, a que se devem juntar AkramFarid (realizador egípcio e professor do Instituto de Ci-nema do Cairo), Fabrizio Ferrari (realizador e funda-dor do Festival de Cinema Inde-pendente de Roma) e Christina Zu-lauf (realizadora e fotógrafa suíça,que já ganhou vários prémios noFIKE em edições anteriores), foiequilibrada. Com esta diversidade,este empenho e esta qualidade,uma certeza fica, para mim, eviden-te: este festival merece mais do queos 5000 euros que lhe foram atribu-ídos pelo ICAM.

• From Monday to Friday, from 9.30 am. to 5.30 pm.,several workshops for children were held by HenriqueEspírito Santo, one of the oldest and most important pro-ducers of Portuguese cinema ever. He explained to thechildren “How to Make a Film”: he made a film industrydemonstration, in which each child played a worker. Thechildren loved this experience and the producer proved hestill has the same passion for cinema as before.• During the week Portuguese Animation films werescreened. We had the chance to see some films directedby students from CITEN/Calouste Gulbenkian Founda-tion and ESAD (Arts and Design Academy)/Caldas daRainha, and films produced by Fernando Galrito’s pro-duction company Ânimo Leve. At night we could seeGalician short films, from the New York Film Academy(London delegation) and from the Centro Sperimen-tale di Cinematografia (Italy).• On Saturday, November 26th, David Pope (Director ofEducation for New York Film Academy UK), also a mem-ber of the jury, led a successful Master Class on “Trainingand Professional Development for Directors”. His fluentspeech captivated the audience and would make this classworthy of a bigger place, like Aula Magna.

Although 2005 wasn’t an exceptionally great year,the films on competition, selected from a range of nearly1300, from about 90 different countries, were really goodif compared to other short film festivals held in Portugal,but they didn’t quite match the excellence of the 2004edition. Anyway, there were great films among documen-taries, fiction and animation. Although everyone mayhave had his/her own opinion about the films shown, Ithink the jury, formed by Florence Ayisi, David Pope,Henrique Espírito Santo, Fernando Galrito, Akram Farid

(Egyptian director and teacher at theEgypt High Cinema Institute), Fab-rizio Ferrari (director and RIFF/RomaIndependent Film Festival founder)and Christina Zulauf (Swiss directorand photographer, received severalawards in previous FIKE editions)made wise decisions. The diversity,engagement and quality seen in thisfestival make it clear that it deservesfar more than the 5000 euros fromthe ICAM/Institute of Cinema, Audi-ovisual and Multimedia.

Page 51: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 51

festival

Palmarés AwardsMELHOR CURTA-METRAGEM

EUROPEIA

BEST EUROPEAN SHORT FILM

Der Beste, de by Arne Jysch & Rasmus

Borowski – 2004 – Alemanha Germany

Menção Especial

Special Mention

Manden Der Blandet Andet Var En

Sko (The Man Who Was a Shoe -

Among Other Things), de by Jonas

Arnby – 2004 – Dinamarca Denmark

PRÉMIO KODAK: MELHOR CUR-

TA-METRAGEM PORTUGUESA

KODAK AWARD: BEST PORTU-

GUESE SHORT FILM

Uma Noite ao Acaso, de by Victor

Candeias – 2005 – Portugal

PRÉMIO CIDADE DE ÉVORA

MELHOR FILME DE EXPRES-

SÃO LUSÓFONA

ÉVORA AWARD FOR BEST PORTU-

GUESE EXPRESSION SHORT FILM

A Dama da Lapa, de by Joana Toste

– 2004 – Portugal

COMPETIÇÃO ESPECIAL

SPECIAL COMPETITION

Who Buried Paul McCartney?, de by

Wouter Van Opdorp – 2005 – Ho-

landa Netherlands

Agricultural Report

MELHOR FICÇÃO

BEST FICTION

Waverley, de by Piers Thompson –

2005 – Reino Unido United Kingdom

Menção Especial

Special Mention

Cashback, de by Sean Ellis – 2004 –

Reino Unido United Kingdom

MELHOR DOCUMENTÁRIO

BEST DOCUMENTARY

Last Man Standing, de by Sasha

Djurkovic – 2005 – Reino Unido

United Kingdom

MELHOR ANIMAÇÃO

BEST ANIMATION

Bek (Beak), de by Lucette Braune –

2004 – Holanda Netherlands

Menção Especial

Special Mention

Little Things, de by Daniel Greaves –

2004 – Reino Unido United Kingdom

CURTÍSSIMA (até 5 minutos)

SUPER SHORT (up to 5 minutes

running time)

Le Baiser, de by Stéfan Le Lay –

2005 – França France

Menção Especial

Special Mention

Agricultural Report, de by Melina Syd-

ney Padua – 2004 – Irlanda Ireland

FEDERAÇÃO INTERNACIONAL

DE CINECLUBES:

PRÉMIO DOM QUIXOTE

INTERNATIONAL FEDERATION

OF FILM SOCIETIES:

DON QUIJOTE AWARD

Júri constituído por

Jury made up of

Torbjørn Grav (Noruega Norway),

Inês Sofia Freitas (Portugal) e and

Stenåke Hedström (Suécia Sweden)

Manden Der Blandet Andet Var En

Sko (The Man Who Was a Shoe -

Among Other Things), de by Jonas

Arnby – 2004 – Dinamarca Denmark

Menção Especial

Special Mention

Last Man Standing, de by Sasha Djurkovic

– 2005 – Reino Unido United Kingdom

PRÉMIO DA ORGANIZAÇÃO

ORGANIZATION AWARD

Antik, de by Báthory Orsolya –

2004 – Hungria Hungary

PRÉMIO DO PÚBLICO

AUDIENCE AWARD

Cashback, de by Sean Ellis – 2004 –

Reino Unido United Kingdom

Bek

Last Man Standing

Page 52: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 52

ensaio

Apocalypse NowA insanidade, a Imoralidade, a Absurdez da Guerra

Insanity, Immorality, the Absurdity of WarTexto: Luis Miranda

Tradução: Branca Sampaio

Page 53: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 53

ensaio

horror… o horror”, estas são as palavras sussur-radas por Kurtz à hora em que morre, enterran-

do no seu ser moribundo a assumpção da imoralidadeque constitui a não distinção entre o acto de matar e,digamos, o de comer ou caminhar. Essas palavras são aaceitação da desumanidade não enquanto o oposto dahumanidade, mas como parte integrante dela, despoja-da do conceito moral, logo mais pura, pelo menos é as-sim que Kurtz a entende. Ecos da guerra, da loucura as-sassina, do deslocamento físico e moral, da distensãopsicológica, do auto-aniquilamento ético. De uma for-ma clara, este é o tema sobre que “Apocalypse Now” sedebruça. Realizado em 1979 por Francis Ford Coppolla,e tendo como pano de fundo a guerra do Vietnam, con-ta a história de como um capitão, Willard, é incumbi-do, por altas patentes, de assassinar um oficial do seupróprio exército, Kurtz, devido ao modo como ele jánão acata ordens e pelo facto de ter criado um exércitopróprio, o qual opera sem qualquer noção de decênciamoral. É geralmente reconhecida como a mais perfeitaleitura da guerra alguma vez feita para o grande ecrã.Obra-prima suprema, neste filme podemos distinguirdois planos distintos: o da guerra que retrata, a suaconstrução, parafernália, prossecução e consumação e oplano da obra fílmica enquanto produção, que tambémenvolveu uma arquitectura logística e tecnológica quenão se coadunou com o simples do local onde foi pro-duzida. Assim, tanto a guerra, Vietnam, como o filme,“Apocalypse Now”, enquanto tentativas de subjugaçãotecnológica sobre o intacto da natureza falharam es-trondosamente. Não conseguiram vencer o que em siparecia inferior, porque simplificado. Nem os EUA pu-deram destruir um exército de guerrilheiros, nem comtodo o seu sofisticado armamento, nem Coppolla con-seguiu fazer sobrepôr a técnica e a tecnologia cinemato-gráfica sobre os furacões e as doenças. De uma coisa, noentanto, se ficou certo. Perante a Natureza, o Homemnada é. Uma outra coisa acontece quando falamos dequando o Homem se define a si mesmo defrontandoem termos simples a sua natureza humana. O que éisso, a natureza humana? O que é que a caracteriza?Progride, adapta-se, supera-se? Está nessa mesma natu-reza o impulso para fazer a guerra, para matar? Essa éprecisamente a questão central de “Apocalypse Now”, ada definição, ou melhor dito, da indefinição da nature-za humana. Por tornar a questão relevante, por não lheprocurar responder, como se tal fosse possível, por sónos dar a ver – o visual e o sonoro são tudo neste filme- esta obra assume-se como pensamento filosófico acer-ca do Homem. Nela, o Homem é o centro, vêm ao de

“O

he horror… the horror”, these are the words whis-pered by Kurtz in his dying hour, burying in his

inner being the assumption of the immorality of not be-ing able to distinguish between killing and eating orwalking. The whispered words are the acceptance of in-humanity. But not as the opposite of humanity, rather asa part of it, without any moral value attached to it,therefore a pure concept, at least that’s how Kurtz seesit. “Apocalypse Now” deals with war, with assassinationfrenzy, with physical and moral displacement, with psy-chological disruption and with ethical self-mutilation. Itwas directed in 1979 by Francis Ford Coppolla, and ittakes place during the Vietnam War. Captain Willard issent to Vietnam in order to kill Kurtz, an American armyofficer, because he no longer takes orders and has evenformed his own army, which operates without any senseof moral decency. “Apocalypse Now” is often seen as themost perfect representation of war ever done for the bigscreen. It is a true masterpiece, and two different levelscan be distinguished in it: the level of war (its concep-tion, paraphernalia, goings-on and completion); and thelevel of the film itself (with all the logistics and technol-ogy that were required but did not fit the humble scen-ery). Therefore, the attempt to submit the intact naturethrough the technology of both the Vietnam War andthe film were a failure. Neither were they able to van-quish what seemed inferior because of its simplicity, norcould the sophisticated US army destroy a guerrillagroup, nor was Coppolla able to impose cinematograph-ic technology over tornados and diseases. But somethingis certain: nature is far stronger than humanity. Butsomething different happens when Man has to face hisown human nature. What is meant by human nature?What does it stand for? Does it progress, or rather adaptitself or overcome itself? This attempt to define humannature is precisely the main subject dealt with in “Apoc-alypse Now”. And because it deals with this overwhelm-ing question and does not try to answer it, but ratheruses the visual and sound effects to bring it to us, thisfilm can be seen as a philosophical essay about human-ity. The human being, with his reflections, and his vainattempt to take control over Life, Nature, and Technolo-gy, is the key concept of the film.

Enhancing the human character required specialhandling of the visual and sound effects, in order tomake us realize the real horror that man experiences.Cinema becomes Art: colour and sound in this film areboth dualistic, which at the same time separates and ag-glutinates the horror shown to us as well as the magicway in which it is brought to us. In this impressionistic

“T

Page 54: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 54

ensaio

de cima as suas reflexões, as suas tentativas de contro-lar a Vida, a Natureza, a Tecnologia. Não o conseguin-do, no entanto.

Ao pôr o fulcro no homem, é toda uma questão deimagem e som que se supõe. Os planos, os sons, a luz,são formas de fazer entender o horror que o homem ex-periencia. O mecanismo do Cinema torna-se em algoque adquire superlativo acrescimento. Torna-se Arte. Ascores e os sons deste filme são dualistas, essa dualidadesendo a que diferencia mas ao mesmo tempo aglutinao horrendo que se quer mostrar e o modo mágico comisso é dado a ver. O horror mistura-se com o surreal,num filme impressionista, algo que se torna por demaisevidente no final da narrativa. Algumas das imagensparecem pintadas, o verde irreal das folhas das árvores,a misterioso do nevoeiro, o psicadélico dos flares. Aquitoca-se numa questão interessante. Por vezes, “Apo-calypse Now” é como um sonho. As personagens ficamsuspensas. Não há mais realidade. Só o sentir. A emoçãotoma o lugar da razão. Esses são os efeitos da guerra.Coppolla mostra-nos a degradação em que o homemvai caindo, através do modo como os soldados se rela-cionam com o que os rodeia. Tomemos como exemploa sequência inicial, uma excelente utilização de ima-gem e som.

Nessa, o que vemos primeiramente é uma floresta,árvores alinhadas, calmas, silenciosas. A Natureza. Co-meçamos então a ouvir um hélicoptero, mas um quenos soa arrastado, apercebemo-nos que passa efectiva-mente um helicóptero por nós, mas em slow motion, àmesma velocidade se levanta o fumo amarelo dos flares.A música inicia-se, “The End”, dos Doors. A floresta ver-de e fria irrompe nume explosão de napalm laranja equente. A música continua em crescendo, um travellingà direita, mais hélicopteros voando graciosamente. Éentão que surge sobreposta a esta imagem um grandeplano de Willard, um capitão olhando uma ventoínhaa rodar no tecto, esta lembrando-lhe do que ele tantafalta sente. E, assim, vão-se mostrando num mesmoplano imagens da guerra e imagens de Willard, alguémque precisa dela para sobreviver. Nesta sequência, Cop-pola dá o tom para o filme: está não será uma experiên-cia usual, estamos prestes a iniciar uma viagem para odesconhecido da mente humana. E porque é que estasequência se nos afigura tão surreal e onírica? Devidoao magnífico uso da montagem, fundindo a câmaralenta e a sobreposição de imagens e uma fotografia re-quintada, o que cria uma ligação entre o que vemos e oque sente e pensa Willard. Ele pensa na guerra. Nós “ve-mos” os seus pensamentos. O modo como a sequência

film, the horror and the surreal get clearly mixed up atthe end of the plot. Some frames look like they werehand-painted: the unreal shades of green of the leaves,the mysterious shades of fog, the psychedelic shades ofthe flares. Hence, “Apocalypse Now” looks just like adream sometimes. The characters become suspended,there’s no reality anymore and only feelings subsist,emotion takes over reason, and these are the effects ofwar. By showing us the way the soldiers deal with whatsurrounds them, Coppolla shows us the degradation ofman. Let’s take for instance the opening sequence andthe excellent use of sound and image in it.

At the beginning there’s a forest, with calm, silenttrees lined up – that’s nature. Then we hear the sound ofa helicopter – we actually see a helicopter in slow motionand then the yellow smoke of flares. And that’s whenThe Doors start singing “The End”. The explosion of or-ange napalm takes over the cold green forest. The musiccontinues in a crescendo, we travel slightly to the rightside, and see more helicopters flying gracefully. That’swhen we get a full plan of Willard looking at the spin-ning around of the fan on the ceiling, and it remindshim of all that he misses. The images of Willard and theimages of war, which he needs to survive, keep being su-perposed on the same frame. So we get the notion thatthis won’t be an ordinary experience, we’re just about tobegin a trip into the unknown realms of the humanmind. Why does this film sequence look so surreal andoneiric? Because of the magnificent work of editing -mixing the slow motion camera, the superposition of im-ages and the high quality photography, which leads to alink between what we see and what Willard feels andthinks. He thinks about war; we capture his thoughts.The use of music from the fifties turns the war into anepic. War is like an opera, like a show, like a play, andthis can be seen throughout the film. Coppolla’s moviescan be interpreted as audiovisual operas, bringing to-gether a lot from different forms of art. That turns“Apocalypse Now” into a work of art. Magnificence is itsaim, it is what arouses the question of the ability of thehuman mind to create a world out of fantasy, a worldthat is able to impress us through the use of art evenwhen dealing with a war situation.

This leads us to the film sequence of the raid upona Vietnamese village. This is an interesting part especial-ly because the air-attack is accompanied by Wagner’sValkyries. This village is attacked just to allow the cap-tain of the air platoon, Coronel Kilgore, to surf on thesea. A psychological strain is put upon the Vietnamesewhen Wagner’s music is reproduced through the loud-

Page 55: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 55

ensaio

está montada, a utilização de música contemporâneados tempos retratados criam uma epicização da guerra.A guerra é como uma ópera, é uma encenação, um tea-tro, e isso é-nos mostrado ao longo do filme. A ideia doCinema como ópera audiovisual é uma que perpassaem todos os filmes de Coppolla. Importante é essa con-dição. Aglutina ao cinema muito dessas formas artísti-cas. E isso torna “Apocalypse Now” numa obra de Arte.A dimensão do magnífico é uma das razões da sua exis-tência. O que nos faria perguntar acerca dessa capacida-de que a imaginação humana demonstra, essa que lhepermite criar um mundo tão específico, vindo da fanta-sia, o qual, mesmo nas alturas em que se acomete a des-filar sobre uma situação tão real quanto a guerra, nãodeixa, no entanto, de nos assombrar com aqueles mo-dos tão subliminares de impressão artística.

O que nos leva a falar acerca de uma outra sequên-cia. Esta é a sequência do ataque à aldeia vietnamita. Oque é interessante nela é o modo como se adequa ummovimento de ópera, “A Cavalgada das Valquírias”, aodecorrer de um ataque aéreo. Aqui temos uma situaçãodantesca, um ataque sem outra razão de existir que nãoseja a de permitir que o Coronel Kilgore, o comandan-te do batalhão aerotransportado (e a pretexto da neces-sidade de levar o barco de Willard a um ponto de ondeele possa continuar a subir o rio), possa surfar junto àpraia dessa aldeia. O que significa que tem de a limparde inimigos. Entra o conceito da guerra psicológica, oqual consiste em utilizar a música de Wagner, emitida apartir de altifalantes colocados nos helicópteros, comoforma de assustar os vietnamitas. Imagine-se um solda-do prestes a atacar, ouvindo a “Cavalgada das Valquíri-as”. Por si só, faria a guerra. Nós, enquanto espectado-res, somos assaltados pela espectacularidade da sequên-cia, pelo modo como a música vai galopando epica-mente, tal como os helicópteros vão avançando pelocéu, graciosos como que num bailado, alinhados em si-metria, voando em sincronia. A forma como os planosestão montados, rapidamente, alude à urgência daguerra, de como ela é implacavelmente célere, nummomento dispara-se, num outro pode-se morrer. Todauma confusão se insinua nos planos, repletos de heli-cópteros no ar e de pessoas correndo em terra. É o con-fuso da guerra, a qual, captada pela câmara, se tornagrandiosa. O que aliás já se notara numa anterior se-quência, na qual Willard, ao passar por uma câmara,fica estático, olhando para ela, não sabendo o que fazer,mesmo quando à sua volta se ouve o trovoar das bom-bas a caírem. O realizador (Francis Ford Coppola numpequeno papel) diz-lhe “... Passem pela câmara! Façam

speakers of the helicopters: the image of a soldier listen-ing to the Valkyries on the verge of attacking would beenough to make the war. The viewer is caught by themagnificence of the sequence and by the intensity of themusic. In the meantime, the synchronised helicopterskeep flying symmetrically as if they were dancing. Theediting shows the urgency of war, its capacity of beingextremely quick and its ability of turning one from thekiller into the victim in just a few seconds. The confusionof war, transmitted by the amount of helicopters flyingand people running around, can make it look like a hugeevent. And this had already happened before in the film,when Willard freezes in front of a camera, looking at it,not knowing what to do even when all around there’snothing but the noise of bombs dropping. As the direct-or, Francis Ford Coppolla tells him: “… Just keep walk-ing! Pretend you’re in a war!” As if they weren’t right inthe middle of one! Coppolla’s words prove that theslaughtering of war is denied and the creation of it is as-sumed. He is Coppolla, both inside and outside the film.Showing a camera device doesn’t fit with the creation ofa particular vision of war. But at the same time Coppol-la builds his own vision of war – “Apocalypse Now”.Which vision of war is the truest? To what extent doesCoppolla’s vision of war mislead us as far as the se-quence of the air raid is concerned? There’s only sym-

Page 56: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 56

ensaio

como se estivessem na guerra!...”. Como se não estives-sem bem no meio dela. A negação da guerra enquantomatança realmente verificável e a sua afirmação comoalgo que se pode construir e encenar encontra-se bemmarcada nas palavras do realizador. Ele é Coppola, tan-to dentro do filme como fora dele. Essa chamada deatenção irónica para o dispositivo fílmico arremete con-tra o arquitectar, através da imagem, de uma visão daguerra, a qual não é verdadeira. Mas, ao mesmo tempo,Coppola constrói a sua, o filme “Apocalypse Now”.Qual delas é a mais verdadeira? Falamos aqui de visõesda guerra, e isso é importante. Daí a sequência do ata-que de helicópteros. Até que ponto o próprio Coppollanos engana com a sua visão da guerra, pelo menos noque toca a esta sequência específica? Tudo é beleza si-métrica, é a construção da bela imagem cinematográfi-ca, os helicópteros voando que nem cisnes, lançando osmisseís que cortam os céus em belíssimas cores. A ima-gética e a sonoridade cinematográfica causando assom-bro aos nossos sentidos. Mas falamos aqui ao nível daconstrução da imagem e do som. A um nível mais pro-fundo, a visão que Coppola partilha connosco é umaque a mostra como um estado em que o absurdo estásempre presente. À medida que o filme avança, são-nosdados a aperceber os pensamentos e as impressões queas personagens vão experimentando ao longo da via-gem. O desespero que lhes vai crescendo na alma estábem assinalado nos gritos que o “Chefe” solta, após terfugido de um tigre que o perseguia na floresta. Do queessa personagem fala é do deteriorar e posterior destru-ição das vidas que deveriam ter seguido um outro rumoque não o da guerra. A desumanização, o alheamentoda realidade, o congelamento de qualquer valor de mo-ralidade são as características que abundam nas perso-nagens. O que se torna visível na altura em que matamtodos os ocupantes de uma sampana, uma família intei-ra, isto porque uma mulher quis proteger um cachorri-nho. Disparam eles do nada, os nervos à flor da pele, avida alheia não lhes interessa. Quando Willard disparaà cabeça da mulher moribunda, ele não sente nada,mas os outros sim. Há uma diferença fundamental.Willard é um homem da guerra e para a guerra, os ou-tros foram arrastados para ela. Se os outros mataram foiporque nisso viram a hipótese de fuga mental, matar

metrical beauty – the cinematographic photography,helicopters flying swanlike and missiles colourfully cross-ing the sky. The construction of the visual and the soundeffects astound us, but Coppolla shares a vision of thepermanent absurdity of war with us. During the film, weshare in the thoughts and opinions that the charactersexperience along the journey. The despair that’s growinginside of them is perceptible in the “Big Boss” cries, aft-er being chased by a tiger in the forest. This characterrepresents the decadence and destruction of lives thatshouldn’t have followed the path of war. All the charac-ters share in the lack of humanity, alienation from real-ity and the disappearance of all moral values, which isvisible when they kill the whole family travelling in asampan just because a woman wanted to protect herpuppy. They just shoot, nervously, and the strangers’lives don’t matter to them. When Willard shoots the dy-ing woman in the head he doesn’t feel anything, but theothers do. And that’s because Willard is a war-mademan and the others were dragged into it: Willard’s com-panions kill as a means of mental escape, they kill toavoid being killed, they kill because that’s what they’rethere for or because despair makes them do it; on theother hand, Willard kills because something gets in hisway and he has to get rid of it to continue his journey.This means the absence of human piety and compassionsince those innocent people were killed because they justhappened to cross some lunatic soldiers’ way. And that’sexactly where the absurdity and stupidity of war lies.

The lack of moral sense and the mental destructionbecome more and more perceptible as their journey ad-vances. And when the American army arrives at their far-thest military post, they face total despair. In completedarkness, the boat reaches a bridge completely illuminat-ed by rockets and machine-gun fire, it all looks like fire-works. But the screams remind us that we’re in the mid-dle of a savage battle. Willard steps out of the boat to getsome information and only the lightening of explosions il-luminate him. In this nightmarish place there’s nothingbut darkness - of the soul and of the body. Lights and pho-

Page 57: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 57

ensaio

para não ser morto, matar para perguntar depois, matarporque é para fazer isso que eles estão ali, matar porqueo desespero o dita; por outro lado Willard mata porquese encontra perante um fait-divers que tem de resolverpara que a sua missão possa prosseguir. É a anulação dapiedade e da compaixão humana. Vidas inocentes sãoassim terminadas sem nada terem feito para que issoacontecesse, a não ser o azar de terem encontrado umbando de soldados lunáticos. E aqui, caro leitor, residea absurdez e a estupidez da guerra, que elimina a sensa-tez e a probidade.

À medida que se vai subindo o rio, a percepção dafalta de sentido moral e da destruição mental vai-se tor-nando cada vez mais pungente. E, aquando da chegadado exército americano ao posto mais avançado, o deses-pero que encontram é total. No meio da completa escu-ridão nocturna, o barco aproxima-se de uma ponte,toda ela iluminada como se fosse um divertimento defeira, de cada um dos lados rockets e rajadas de metra-lhadora silvam pelo ar, como se fossem foguetes cele-brando uma qualquer festa. No entanto, os gritos de-senganam. Estamos no meio de uma selvática batalha.Willard desce do barco, vai colher informações. E, porentre a escuridão que tem de atravessar, só por vezes éele iluminado pelos clarões das explosões. Num espaçoonírico, de pesadelo, é claro, só existe isso mesmo: es-curidão, escuridão da alma e do corpo. A fotografia e ailuminação tomam nesta sequência um papel impor-tante. A luz só revela as faces a metade e durante pou-cos segundos, o que vemos são espectros perdidos numlimbo, suspensos num pesadelo que não termina, sofu-cando-os pouco a pouco, aproximando-os cada vezmais da morte física, de espírito morto eles já estão. Asubexposição das faces, dos corpos e dos cenário alu-dem a um local não bem distinguível; esta guerra pode-ria ser uma outra, o que interessa ali ver é a degradaçãoda sanidade. Willard procura o comandante da unida-de, mas ele não existe, está morto. A autoridade já nãoé exercida, os soldados disparam indiscriminadamentecontra vozes que vêm do outro lado do rio, é a decom-posição da humanidade. Coppola cria aqui uma se-quência terrífica, de sombras e e fantasmas. Nada pare-ce existir realmente, a não ser um inferno, onde as per-sonagens estão morrendo lenta e horrorosamente.Quando as informações acabam por chegar, através deum correio, este diz a Willard que ele está no fim domundo. Sim. Mas o que espera Willard ainda é pior doque ele vê ali. Quando o barco parte, soldados lançam-se à água, suplicando pela salvação, longe daquele lugarhorrendo. Não é aquele barco que os tirará de lá.

tography play an important part in this sequence. Only apart of the face is shown and only for a few seconds. Andwhat we see are spectres lost in a kind of limbo, suspend-ed in an endless nightmare, which slowly suffocates them,taking them closer and closer to physical death becausethe spirit is dead already. The underexposure of faces,bodies and scenery make them difficult to be distin-guished. Therefore this could be some other war, becausewhat really matters is the degradation of sanity. Willardgoes looking for the captain of the unit but he’s alreadydead. Authority is lacking, soldiers shoot at randomagainst voices heard from the other bank of the river –that’s the dissolution of humanity. Coppolla creates a hor-rific sequence of shadows and phantoms. Nothing seemsto really exist except for a hell where people are slowly andhorribly dying. When a courier finally brings in news, hetells Willard that he’s living at the end of the world. Butwhat awaits Willard is even worse than what he’s just

faced. When the boat leaves, soldiers throw themselvesinto the water, beg for salvation and to be taken awayfrom that horrible place, but that particular boat will notbe their rescuer. The boat journey continues down thewinding river and passed the dark green forest, and it’sgetting closer and closer to Kurtz’s pagan hut. This film isbased on vision, sound and psyche. As their journey pur-sues, the frames are only partially illuminated. The scen-ery visible at daylight, the cold blue light of the deep for-est and the orange yellowish colour of the faces half light-ed make up a set of light and colour that works different-ly from what could be expected. Vittorio Storaro’s photog-raphy is especially important in “Apocalypse Now” be-cause it is essential to make an impression on the viewer’s

Page 58: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

ensaio

A viagem prossegue, o rio que serpenteia pela flo-resta verde escura aproxima-se cada vez mais de um lu-gar profano, o covil de Kurtz. De episódio em episódio,Coppola vai construíndo um filme de impressões visu-ais, sonoras e psicológicas. Sendo um processo em di-recção à escuridão, cada vez mais os planos vão sendoiluminados de forma a encerrarem a luz numa parte doenquadramento. Desde as grandes vistas carregadas deluz diurna à coloração fria e azul da floresta profunda eao laranja e amarelo com que as faces são iluminadas ametade, nota-se ao longo do filme um arco de luz e corque funciona de uma forma inversa ao que se deveriaesperar. A fotografia de Vittorio Storaro é um suportefundamental de “Apocalypse Now”. Por ela tambémpassa a criação de um filme para a mente, para a im-pressão. Três quartos do filme são a cores frias, azuis everdes e, ao longo da viagem, essas vão dando lugar aosrosas do flares até que, chegados ao esconderijo deKurtz, a primazia acaba por ser dada, nos últimos minu-tos do filme, ao laranja e vermelho, cores bem maisquentes. Quando poderia ter sido ao contrário. O quesó aumenta o mistério, a sensação de onírico. Voltare-mos à questão da iluminação mais tarde. Falemos da vi-agem. Ela é também, e disso temos vindo a falar, umaviagem da mente, da sanidade à loucura, da vida à mor-te, da vastidão ao enclausuramento, da luz à escuridão.Não só de Willard, não só dos que o acompanham, nãosó do espectador. É o apocalipse do humano, é um ca-minho em que se transforma o complexo em simples.No fim só restam as emoções, as palavras, o olhar. Aguerra passa a ser secundária, a dormência instilada pe-las drogas, o precurso alucinado, levam o Homem aoInício, esse em que era matar ou morrer. A suspensão daética humana está no fim da viagem, ela e o rio tornam-se um só, no desconhecido está a incivilização, o termi-nar da construção humana, fica o homem glorificadocomo deus, Kurtz, mitificado pelo sangue, acima de to-dos porque decidiu suspender a sua própria humanida-de. Chegados lá, Willard e os dois soldados sobreviven-tes entram num mundo para lá da realidade. Verdadei-ramente. Eles atingem o âmago da irrealidade. São rece-bidos em silêncio pelos “montanheses” de Kurtz, os na-tivos que, pintados de branco (dando à parte final dofilme um carácter antropológico) afastam as suas cano-as e os deixam passar. E o rio não sobe mais, tantoquanto se percebe é à nascente do rio que chegam. É olocal do começo, os nativos são primitivos, vivem omito e praticam o rito. A sua arte é repleta de magiasimbólica. É um local silencioso, um templo aos deuses,um santuário do paganismo. É o confronto final entre

mind. Three quarters of the film are filmed in cold colours,like blue and green, but along the journey these coloursgive way to the pink flares, and when they arrive at Kurtz’shiding place warm colours like orange and red play a ma-jor role. This play of colours could’ve been different, but inthis way the sensation of mystery and dream is more in-tense. We’ll get back to the question of light but right nowlet’s consider the journey – which is also Willard’s, hismates’ and the viewer’s journey of the mind, from sanityinto madness, from life into death, from openness into en-closure, from light into darkness. It’s mankind’s apoca-lypse, it’s the way to turn complexity into simplicity. At theend there’s nothing but emotion, words and visions. Warbecomes accessory. Drug inflicted numbness and halluci-nation bring man back to the beginning, when everythinggoes back to killing or being killed. The suspension of hu-man ethics is at the end of the journey. The journey andthe river become one, and incivility lies in the unknown.Kurtz is glorified as a god; he’s high above everyone elsebecause he chose to suspend his own humanity. WhenWillard and the two surviving soldiers arrive, they do en-ter a world beyond reality – the kernel of unreality. Theyare hosted by Kurtz’s “mountaineers”, these are nativesdied in white who now push their canoes aside to let themthrough (giving the film an anthropological feature). Itseems as if they have just arrived at the river spring. It’sthe genesis, the natives are primitive and live by the mythand the rites. Their art is full of symbolic magic. It’s a si-lent place, a temple to the gods, a sanctuary to paganism.It’s the final battle between two opposite visions of humanlife: one highly technological and mechanical, and anoth-er built on mythical and religious beliefs. The big questionis the human condition, how it can go astray and be in-terpreted. Kurtz chose insanity. Moral values don’t meananything to him anymore, and therefore he wants to getto that state of consciousness where the will commands –the will to kill, to let live, to die. While Willard and thearmy generals who want Kurtz dead see his sanctuary asan insane and haunted place, Kurtz sees it only as theplace to have his condition of man freed from moral con-straints glorified. The film becomes even more oneiricnow. The temple aisles are sparsely illuminated. Kurtzhimself is just a shadow among shadows. The perceptionof Kurtz’s body in the darkness makes the place look atthe same time relaxing and terrific. His words spring upfrom dark spots, a weak light reveals his face, and he ex-plains what the Apocalypse means to him. The death ofhumanity as a sinful act has no meaning to him since kill-ing is as simple and natural as talking. But what he real-ly wants is to die and therefore he lets Willard linger to

CINEMA | 58

Page 59: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 59

ensaio

duas visões antagónicas da vida humana: uma altamen-te tecnologizada e mecanizada e uma outra simples e decontornos mítico-religiosos. A grande questão que se le-vanta é, como já referimos atrás, a da condição huma-na e de como ela se pode transviar e interpretar. Kurtzescolheu a insanidade, para ele a moral já não quer di-zer nada, pretende ele chegar àquele estado de consci-ência em que tudo é simplesmente vontade. Vontadede matar, de deixar viver, de querer morrer. Se o seusantuário é um lugar insano e amaldiçoado aos olhosde Willard e dos generais que o incumbiram de matarKurtz, para este é tão só um local de glorificação da suanova condição, livre dos constrangimentos morais. Acarga onírica toma então proporções ainda mais notó-rias. Os corredores do templo são iluminados de formaa se perceber só alguma luminosidade num de restocompletamente escuro ambiente. O próprio Kurtz é sóvislumbrado, por entre as sombras, ele é igualmenteuma sombra. Percebido na penumbra. A criação de umambiente ao mesmo tempo relaxante e terrífico passapelo esconder do corpo de Kurtz. As suas palavras vêmdos cantos obscuros, uma nesga de luz revela a sua face,ele explica o que é para si o Apocalipse. A morte da Hu-manidade enquanto constituição do acto pecaminoso.Para ele, não há necessidade de tal. Matar é tão simplese natural como falar. Mas o que ele quer mesmo é mor-rer. Por isso ele deixa que Willard vagueie à vontadepelo seu templo. Na sequência mais memorável do fil-me, Willard cumpre a sua missão. Enquanto que no ex-terior os nativos sacrificam um boi. Num ambientenocturno, repleto de vermelhos e laranjas, fumos e dan-ças, magia simbólica e rito, Kurtz aparece uma últimavez aos seus. Uma forma, tendo atrás de si uma forte luzlaranja, a força, o desprendimento, um deus. Poucotempo depois, Willard mata-o a golpes de catana, àmesma hora em que os golpes estão também a ser des-feridos no boi. E ainda a música dos Doors acompanhaesta sequência feita de luz e sombra, cores quentes, umamontagem paralela, sacrifício e paganismo. Kurtz estálivre, fica somente o seu testamento escrito a vermelho.“...Matem-nos a todos...”. Os nativos estão prestes a fa-zerem de Willard o seu novo deus. O silêncio perpassa.Curvam-se perante o novo senhor. Mas o que ele queré sair dali. O que faz. Deixa para trás a desumanidade,tendo lá também perdido alguma da sua humanidade.O apocalipse é isso mesmo. A perda do humano. É dis-so que o filme fala. E a guerra é uma forma de se perdero humano que carregamos em nós. Ao fim e ao cabo, éuma reflexão acerca dos limites do próprio Homem.

and fro in his temple. In the most memorable sequence ofthe film, Willard fulfils his mission. While the natives sac-rifice a bull, Kurtz makes his last appearance in a darkplace filled up with red and orange colours, smoke anddances, and symbolic magic and rites. Behind him there’sa strong orange light, and he becomes the strength, thedetached being, and a god. Shortly after, Willard strikeshim with the cutlass while the natives are killing the bull.And it’s the music by The Doors that is still heard in thissequence made of light and shadow, of warm colours, ofsacrifice and paganism. Kurtz is free, only his will writtenin red remains. “Kill them all…” The natives are on theverge of turning Willard into their new god. There’s si-lence. They bow before their new lord. But what he wantsis to get out of there, which he does. He leaves inhuman-ity behind, but not before leaving some of his humanityalso. That’s what the apocalypse is all about – losing oursense of being human. That’s what the film is all about –the war is a way of losing our human characteristics. Allin all, the film reflects upon the limits of mankind.

Page 60: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

Pequena Memória de Reminiscences of

José Vieira MarquesTexto: André de Oliveira e SousaTradução: Branca Sampaio

CINEMA | 60

memória

onheci o José Vieira Marques em 1969, era euainda estudante e tinha acabado de criar com

outros amigos o Círculo Universitário de Cinema doPorto. Um deles era o arquitecto Fernando Condes-so, sócio nº1 do Cineclube do Porto e seu Presidenteda Assembleia Geral, que me falou conhecer um sa-cerdote católico, o padre Zé, que dava uns cursosmuito interessantes sobre cinema, sob a designaçãogenérica de Encontros de Imagem e Som. Como oCírculo de Cinema investia muito na formação, re-solvemos participar num encontro desses realizadoaqui perto, mais precisamente na Casa de Cursos deCristandade de Cortegaça.

O meu encontro com o Dr. José Vieira Marques,que além de padre (na altura ainda em plenitude defunções) era licenciado, salvo o erro, em ciências his-tórico-filosóficas, foi o início de uma longa amizadeque se manteve até este infeliz desfecho.

Permitam-me um rápido parêntesis para referirque não poderia deixar de corresponder ao convitedo meu amigo João Crespo para alinhavar umas li-nhas sobre o Vieira Marques, dada a muita conside-ração que tenho por ambos, apesar de estar a prepa-rar, de colaboração com o cineclube de Fafe e a edi-tora Labirinto, um trabalho mais desenvolvido sobreo mesmo e a animação cultural que incluirá váriosdepoimentos. É que, quanto a mim, José Vieira Mar-ques representou uma espécie em vias de extinçãoque importa não deixar esquecer. Ele gostava daqui-lo que fazia e fazia aquilo que gostava, sem se preo-cupar se isso lhe dava ou não lucro, e não dava. Eraa negação de qualquer oportunismo, oportunismoque hoje triunfa por todo o lado, incluindo as mani-festações culturais. Quando programava um filmepara o Festival da Figueira da Foz, que fundou e diri-giu durante mais de 30 anos, não se interrogava seele teria público mas se era um filme que merecia ser

C

first met José Vieira Marques in 1969, when I wasstill a student and had just founded the Círculo

Universitário de Cinema do Porto (Porto UniversityFilm Club) with some friends. One of them was the ar-chitect Fernando Condesso, the number 1 associate ofthe Porto Film Society and chairman of the General As-sembly. He told me about a Catholic clergyman, the pri-est Zé, who led some interesting courses on cinema, theso-called Encontros de Imagem e Som (Image andSound Meetings). As our Film Club promoted learning,we decided to take part in a course held at the Casa deCursos de Cristandade de Cortegaça (CortegaçaChristian Course Centre).

Besides being a priest, José Vieira Marques wasawarded a Master of Studies degree in Social Science.From the moment we met onwards we have started along-life friendship which only a dramatic event couldhave put an end to.

Let me just mention that I couldn’t refuse João Cres-po’s invitation to write a few lines on Vieira Marques be-cause of the deep esteem I have for both of them. Never-theless, together with the Fafe Film Society I’m workingon a more detailed written treatment of the subject to beedited by Labirinto. As far as I’m concerned, José Viei-ra Marques represents an endangered species that hasto be preserved. He loved what he did and he did whathe loved, without worrying about the profits. He refusedopportunism which nowadays dominates society, inclu-ding cultural life. When he scheduled a film to be scree-ned at the Figueira da Foz Film Festival, which he has

I

Page 61: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 61

memória

visto e discutido. Graças à sua perspicácia e elevadacultura, podemos ver na Figueira da Foz filmes quenão passavam em mais lado nenhum no nosso país.Ele deu-nos a conhecer a obra do maior cineasta eu-ropeu vivo, Theo Angelopoulos, incluindo a sua mo-numental “Viagem dos Comediantes”, muito antesde alguns filmes deste serem distribuídos comercial-mente no nosso país, como veio a acontecer com “OPasso Suspenso da Cegonha”, “O Olhar de Ulisses”,“A Eternidade e um Dia”. Para só citar um caso.

Também foi por ele, no tal encontro de Cortega-ça, que eu soube que no extremo norte da Europa, naSuécia, tinha surgido outro grande cineasta, Bö Wi-derberg. Vieira Marques tinha acabado de regressar deParis (era colaborador da Fédération de Loisirs et Cul-ture), onde tinha visto “Adalen 31”, e contou: Vi umfilme em que os espectadores se levantavam das cadeirasem comunhão com as imagens do ecrã. Referindo-se àemoção dramática que Widerberg soube comunicar àcena em que os operários levantam os companheirosabatidos e avançam com eles sobre a polícia.

Vieira Marques sempre foi um progressista, na au-têntica acepção do termo, mas nunca abdicou da suaindependência que defendia ferozmente em relação aqualquer formação partidária. Isso não o impediu decolaborar com o MFA nas campanhas de dinamizaçãocultural. Também pouco tinha de santo, embora a suadedicação à cultura cinematográfica tivesse algo deespírito de missão. Só que às vezes não compreendiaque outros poderiam pensar de modo diverso e que-rer seguir o seu próprio caminho. Não quero, no en-tanto, agora falar sobre isso, dado o sentido de home-nagem que quis imprimir a estas breves linhas.

Mas não foi só o seu festival que o ocupou, Viei-ra Marques revelou-se sempre disponível para daracções de formação nos cineclubes e a sua vastíssimabagagem cultural, humor e espírito crítico, deleita-ram muitos dos que nelas participaram.

Contactámos, pela última vez, no passado Na-tal. Telefonou-me para desejar Boas Festas e, na lon-ga conversa que se seguiu, falou da saúde mas tam-bém nos projectos. Ainda não tinha desistido de re-activar o Festival, e devo dizer que essa utopia tam-bém me animou. Mas era de facto uma utopia. E épena, porque o festival do Vieira Marques, e doutrosque com ele dedicadamente colaboraram, deixouum vazio que mais nenhum outro certame foi capazde ocupar. Mas esse vazio é também um desafio paratodos nós.

Porto, Agosto de 2006

founded and run for over 30 years, he didn’t care if itwould be a top rated film but only if it was a film worthwatching. Due to his keen discernment and erudition,the Figueira da Foz Film Festival projects films that can’tbe seen anywhere else in the country. He introduced tous the work of the greatest living European filmmaker,Theo Angelopoulos, including his brilliant The Travel-ling Players, long before his films were distributed com-mercially in Portugal, as has happened with The Sus-pended Step of the Stork, The Look of Ulysses andEternity and a Day.

During that course held at the Cortegaça Christi-an Course Centre, I also learned from him that ano-ther great filmmaker had emerged in Sweden, Bö Wi-derberg. Vieira Marques had just arrived from Paris (hewas a member of the Fédération de Loisirs et Culture),where he had watched Adalen 31, and he said: I’vewatched a film during which the audience got upfrom their chairs in partaking in the screen images.He was referring to the dramatic emotion communica-ted by Widerberg during the scene in which labourerspick up their dead companions and march up withthem to the police.

Vieira Marques has always been a progressivist. Al-though he has never given in on his independence,which he ferociously defended against any political com-mitment, he took part in the MFA cultural activities. Hewas no saint in spite of the fact that his dedication to ci-nematography could be interpreted as a calling. Al-though he didn’t sometimes understand that peoplehave to follow their own paths, this is an article aimedat paying him a tribute.

Besides focusing on his festival, he was always wil-ling to give lectures on cinema. His knowledge, his sen-se of humour and his criticism have granted him lots ofadmirers.

Last Christmas we talked for the last time. He calledto wish me a merry Christmas. He talked about his he-alth but also about his projects. He hadn’t given up yetthe idea of promoting the festival and I was also cheeredup by that utopian project. But that was it: a utopia. Andit’s a shame because this festival, belonging to VieiraMarques and others who have dedicated their energy toit, has left a void unfulfilled up till now. And that void hasto be a challenge to all of us.

Porto, August 2006

Page 62: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

CINEMA | 62

leituras

Acompanhando aedição do DVD de OndeJaz o Teu Sorriso, o muitoaclamado documentáriorealizado por Pedro Cos-ta para o ARTE sobreJean-Marie Straub e Da-nièle Huillet, a Assírio &Alvim editou um peque-no livro contendo algu-mas perspectivas sobre ofilme.

Uma das pérolas destelivro é incluir, como pri-meiro capítulo, os diálo-gos magistrais que o filmedocumenta. Um exemploclaro dessa beleza das pa-lavras está na discussãocentral do filme:

“JMS: Acho que é inú-til procurar uma soluçãointermédia. É como em de-mocracia, não vale nada.Se queremos esse tal sorri-so, precisamos de fotogra-mas em que ele olha fixa-mente para o outro e temvontade de lhe dizer: «nãoacredito em si».

DH: Isso não tem pésnem cabeça! Não há sorri-so nenhum. O que há équalquer coisa nos olhos,mas não se vê bem!

JMS: Sim, mas tem deser ver nascer, não pode co-meçar aí, assim não se vê.Tem de se ver nascer!”

Para além disso, o li-

vro apresenta algumasleituras sobre o filme:Thierry Lounas faz umpequeno historial doprocesso do documentá-rio (por exemplo, as difi-culdades iniciais para osrealizadores aceitarem oprojecto); Jacques Ranci-ère faz uma análise aométodo de Pedro Costa(comparando Onde Jaz oTeu Sorriso com No Quar-to da Vanda) e Bénard daCosta fala de uma certaimpossibilidade em per-ceber o segredo oculto,esse “onde jaz o sorriso?”que Pedro Costa procurano seu filme.

The editor Assírio &Alvim has published asmall book on Pedro Cos-ta’s acclaimed documen-tary about Jean-MarieStraub and Danièle Huil-let, entitled Onde Jaz oTeu Sorriso? The film wasdirected for the ARTEchannel and has just beenreleased on DVD.

The first chapter con-tains one of the most im-

portant parts of the book:the brilliant dialogues. Anexample of the beauty ofwords lies in the main dis-cussion of the film:

“JMS: I think it’s use-less to look for a middlingsolution. It’s just like in ademocracy, it isn’t worthanything. If we want thatkind of smile, we need aphotogram in which onestares at the other and ishoping to tell him: «Idon’t believe you».

DH: There’s no sensein that! There’s no smileat all. There’s just some-thing about that look, butI’m not quite sure what!

JMS: Yes, but youhave to see it spring up, itcan’t start there, it can’tbe seen that way. Youhave to see it spring up!”

Besides that, the bookpresents some personalperspectives on the film:Thierry Lounas talks aboutthe making of the docu-

mentary (for instance, theobstacles the directors hadto overcome to accept thisproject); Jacques Rancièreanalyses Pedro Costa’stechnique (he comparesOnde Jaz o Teu Sorriso?to No Quarto de Vanda –In Vanda’s Room), andBénard da Costa considersthe impossibility of under-standing the veiled secret,the place “where the smilelies” that Pedro Costa islooking for in his film.

LeiturasBook Reviews

Texto: Daniel RibasTradução: Branca Sampaio

COSTA, Pedro

Onde Jaz o Teu Sorriso?

(Lisboa: Assírio & Alvim,

2004). (livro+DVD)

COSTA, Pedro

Onde Jaz o Teu Sorriso?

(Where does Your Smile

Lie?)

(Lisboa: Assírio & Alvim,

2004). (book+DVD)

Page 63: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)
Page 64: Index [] · 2007. 1. 10. · book fair, and we participated in the Festival of Collect-ivities held by UCATN. We were proud to have our short film Carta ao Ópio (Letter to Opium)

Ima

gem

: Cin

eclu

be d

o B

arr

eiro

Ima

gem

: Cin

eclu

be d

o B

arr

eiro