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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE ENFERMAGEM
CURSO DE GRADUAÇÃO EM ANÁLISE DE SISTEMAS E SERVIÇOS DE SAÚDE – BACHARELADO
EM SAÚDE COLETIVA
RELATÓRIO DE PESQUISA
Incorporação da tecnologia de linhas de cuidado
na Saúde Suplementar: análise multicêntrica de
experiências no ciclo mãe-bebê e em saúde mental
nas Regiões Norte e Sul do Brasil a partir de
marcadores selecionados
Projeto na modalidade de Auxílio à Pesquisa,
Processo nº 402690/2007-9, Edital MCT-
CNPq/ANS n° 25/2007.
Alcindo Antônio Ferla
Coordenador do Projeto
Porto Alegre, julho de 2010.
RESUMO
A Saúde Suplementar é o componente do sistema de saúde brasileiro formado por empresas
de planos e seguros privados de saúde, que são responsáveis pela cobertura parcial das
necessidades de atenção à saúde de aproximadamente 25% da população. Estudos anteriores,
desenvolvidos pela rede científica de pesquisa e produção tecnológica envolvida no presente
estudo, demonstram a oportunidade singular de aprofundar análises acerca da noção de linhas
de cuidado, compreendidas como tecnologia de gestão da assistência capaz de produzir
padrões avançados e crescentes de integralidade. A integralidade, como diretriz legal e como
idéia força tem contribuído para a análise e para a produção de inovações no sistema de saúde
brasileiro. Este relatório de pesquisa apresenta resultados do projeto aprovado no Edital MCT
– CNPq / ANS n° 25/2007 – Seleção pública de propostas para apoio às atividades de fomento
à pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação em Saúde Suplementar, na modalidade
de Apoio Integrado a Projetos de Pesquisa. Insere-se no Programa de Qualificação da Saúde
Suplementar, especificamente na iniciativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar de
construir uma Rede de Centros Colaboradores que permita buscar apoio para o
desenvolvimento das ações de qualificação institucional, realização e divulgação de estudos
analíticos e pesquisas, articulação entre instituições nacionais e internacionais envolvidas com
a produção teórica e o desenvolvimento da educação permanente em saúde. O projeto teve
como objetivo identificar e analisar tecnologias de cuidado em saúde ao ciclo mãe-bebê e em
saúde mental na saúde suplementar nas Regiões Norte e Sul do Brasil, a partir da tecnologia de
linhas de cuidado. Foi desenvolvido por meio de uma rede científica envolvendo instituições
de ensino e pesquisa. Duas abordagens metodológicas principais foram utilizadas para a
consecução do objetivo proposto: uma transversal, por meio da análise de dados secundários
e de uma pesquisa com dirigentes de operadoras, prestadores hospitalar, médico obstetra,
médico pediatra e médico psiquiatra, bem como com usuários da saúde mental e do ciclo mãe-
bebê, e outra com estudos multicêntricos integrados sobre as modelagens tecnoassistenciais
adotadas em diferentes contextos da saúde suplementar nas duas regiões em estudo. Na
primeira abordagem, foi utilizada versão adaptada da metodologia desenvolvida em projeto
anterior, denominada de análise de cenários da saúde suplementar. O aprofundamento da
análise que o projeto desenvolveu, foi feito por triangulação de estudos em diferentes
realidades regionais, em particular em Estados das Regiões Sul e Norte, bem como com a
aplicação de alguns instrumentos comuns ao projeto como um todo. A triangulação, no
desenho da abordagem analítica desta pesquisa, considerou que a diversidade e a
heterogeneidade de contextos têm capacidade de “falsear” evidências que foram ou são
construídas somente pela posição linear de uma observação. O relatório é composto por cinco
capítulos, com a seguinte distribuição: um capítulo introdutório, com uma síntese da
construção teórica realizada; um capítulo de notas metodológicas, que inclui a apresentação
dos principais resultados da pesquisa; um capítulo com a análise descritiva do cenário e das
políticas desenvolvidas pelas operadoras de planos e seguros privados de saúde, buscando
caracterizar questões relevantes para compreender as modelagens tecnoassistenciais
adotadas e, portanto, para embasar a análise do estágio de incorporação das linhas de cuidado
nos diferentes cenários analisados; um capítulo com estudos integrados sobre o cuidado na
3
saúde suplementar no ciclo mãe-bebê; e um capítulo com estudos integrados sobre o cuidado
em saúde mental oferecido por planos e seguros privados de saúde. Em linhas gerais, conclui-
se que ainda é tênue a incorporação da modelagem tecnoassistencial estudada e que as
principais iniciativas parecem decorrer das políticas de indução da ANS. Os principais
marcadores utilizados foram a ampliação e diversificação de ofertas, como assistência
farmacêutica, internação domiciliar e outras modalidades assistenciais inovadoras, além da
operação em rede de serviços e a atuação em equipes multiprofissionais. O mix público e
privado no itinerário assistencial mostrou-se, também, um marcador qualificado para essa
análise, na medida em que decorre, em grande medida, da busca de cuidado mais integral por
parte dos usuários e, em alguns casos, parece estimulado pelas operadoras e regulado por
prestadores, em particular no caso da saúde mental. A gestão do cuidado, nesses casos,
parece estar sob responsabilidade dos próprios beneficiários e seus familiares e reivindicar,
para sua qualificação, maior articulação entre as ofertas dos subsistemas suplementar e
público de serviços de saúde. Entre as recomendações da pesquisa, está o fortalecimento das
iniciativas de indução da ANS, em particular a ampliação do acesso a produtos e serviços e a
diversificação de ofertas assistenciais. Também está proposta a utilização de mecanismos de
indução que operem mais efetivamente no plano micropolítico, como iniciativas de educação
permanente, e a maior integração com os dispositivos de gestão do Sistema Único de Saúde
(SUS).
PALAVRAS-CHAVE: Linhas de cuidado, Saúde Suplementar, Integralidade em saúde, Saúde da
Mulher e da Criança, Saúde Mental, Regulação em saúde.
Lista de Tabelas
TABELA 3.1 Pessoas que tiveram atendimento de saúde nas duas últimas semanas, por tipo de serviço onde foi atendido (em mil pessoas)
TABELA 3.2 Taxas de cobertura assistencial da população em geral e em mulheres em idade fértil por planos e seguros privados de saúde no Brasil, Regiões e UF, dezembro de 2009.
TABELA 3.3 Distribuição de beneficiários segundo a modalidade da operadora, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2005/2009
TABELA 3.4 Distribuição de beneficiários segundo a segmentação do plano, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2009
TABELA 3.5 Distribuição de beneficiários segundo a modalidade de contratação, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2009
TABELA 3.6 Auto-avaliação do estado de saúde da população residente, segundo a situação de cobertura assistencial por plano e seguro privado de saúde, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2003 e 2008 (em mil pessoas).
TABELA 3.7 Pessoas com atendimento de saúde no SUS nas duas últimas semanas exclusive cujo principal atendimento recebido foi marcação de consulta, segundo situação de cobertura de plano de saúde, 2003 e 2008.
TABELA 3.8 Avaliação do atendimento recebido por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) por pessoas com cobertura assistencial por planos e seguros privados de saúde em atendimento de saúde nas duas últimas semanas, 2003 e 2008.
TABELA 3.9 Avaliação do atendimento recebido por meio de planos e seguros privados de saúde por beneficiários em atendimento de saúde nas duas últimas semanas, 2003 e 2008.
TABELA 3.10 Situação de pagamento complementar por atendimento recebido por meio de planos e seguros privados de saúde por pessoas beneficiárias em atendimento de saúde nas duas últimas semanas, 2003 e 2008.
TABELA 3.11 Pessoas que estiveram internadas nos últimos doze meses, por número de internações e atendimento através de plano de saúde.
TABELA 4.1 Evolução das condições de nascimento no Brasil, Região Sul, Estado do Rio Grande do Sul e Município de Caxias do Sul, 2000/2008
Tabela 4.2 CARACTERÍSTICAS DOS NASCIMENTOS NA CIDADE DE CAXIAS DO SUL
Tabela 4.3 Avaliação da qualidade da assistência prestada segundo os profissionais. Tabela 4.4. Natureza das atividades desenvolvidas pelo Enfermeiro da Unidade de
Obstetrícia, segundo o vínculo dos sujeitos
TABELA 5.1 Mortalidade proporcional (%) por transtornos mentais e comportamentais (CID 10 – Capítulo V) no Brasil e Regiões Norte e Sul, 2000/2007.
TABELA 5.2 Mortalidade proporcional (%) por suicídio (CID 10 – Capítulo XX – Código X60-X84) no Brasil e Regiões Norte e Sul, 2000/2007.
TABELA 5.3 Capacidade instalada de leitos psiquiátricos e leitos de hospital dia para tratamento em saúde mental no sistema público e privado de serviços, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2009.
TABELA 5.4 Características dos sujeitos da pesquisa
Lista de Gráficos
GRÁFICO 3.1 Taxas de cobertura assistencial da população em geral e em mulheres em idade fértil por planos e seguros privados de saúde no Brasil e Regiões, dezembro de 2009.
GRÁFICO 3.2 Taxas de cobertura assistencial por planos e seguros privados de saúde por faixa etária detalhada e sexo, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2009.
GRÁFICO 3.3 Série histórica de taxas de cobertura assistencial por planos e seguros
5
privados de saúde, Brasil e Regiões, 2005/2009 Gráfico 3.4 Número de vínculos segundo a modalidade da operadora, Brasil, 2000/2009 GRÁFICO 3.5 Comparativo da participação das diferentes modalidades de operadoras na
cobertura assistencial de beneficiários de planos e seguros privados de saúde, Brasil, dezembro de 2009.
GRÁFICO 3.6 Auto-avaliação do estado de saúde da população residente, segundo cobertura por plano e seguro privado de saúde, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2008
GRÁFICO 3.7 Comparativo de situação da cobertura assistencial da população com
atendimento recente no Brasil e Regiões Sul e Norte, 2008
Gráfico 4.1 Número de consultas pré-natal da população de nascidos vivos de
baixo peso na cidade de Caxias do Sul, dos hospitais pesquisados.
Gráfico 4.1 Tempo de Atuação na Área de Obstetrícia
Gráfico 4.2 Faixa etária dos sujeitos, segundo sua vinculação.
Lista de quadro
QUADRO 5.1 Formas que os enfermeiros utilizam para identificar usuários em sofrimento psíquico
QUADRO 5.2 Condutas e ações implementadas pelos profissionais frente ao usuário em sofrimento psíquico
Quadro 5.3 Itinerário terapêutico percorrido pelo usuário portador de transtornos psíquicos
Quadro 5.4 Concepção de Integralidade pelos enfermeiros Quadro 5.5 Percepção sobre o atendimento integral às necessidades dos usuários
portadores de transtornos psíquicos
SUMÁRIO
1 - INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................ 9
1.1. O cuidado, suas políticas e suas texturas: constituindo expressão às lógicas que governam sua gestão ..................................................................................................................................................................... 16
1.2 - Linhas de cuidado como tecnologias emergentes para a organização da atenção à saúde ........................................................................................................................................................................................... 18
1.3 - Atenção ao ciclo mãe-bebê e a Saúde Suplementar .......................................................................... 19
1.4. Atenção em saúde mental e a saúde suplementar ............................................................................... 20
1.5. A tecnologia de linhas de cuidado no cotidiano dos serviços: aproximações com as evidências do campo empírico ............................................................................................................................. 21
2. NOTAS METODOLÓGICAS ...................................................................................................................................... 27
2.1. Coleta e análise de dados ............................................................................................................................... 28
2.2. Aspectos éticos ................................................................................................................................................... 35
2.3. Principais resultados da pesquisa .............................................................................................................. 36
2.4. Equipe da pesquisa ........................................................................................................................................... 37
3. LINHAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL E NO CICLO MÃE-BEBÊ: ABORDAGENS NA SAÚDE SUPLEMENTAR ................................................................................................................................................................ 43
3.1. Capacidade instalada e questões relativas ao acesso ao sistema de serviços de saúde ...... 44
3.2. Cobertura assistencial por Planos e Seguros Privados de Saúde .................................................. 46
3.3 – Caracterização da demanda nas linhas de cuidado em estudo .................................................... 58
3.4 – As políticas de atenção ao ciclo mãe-bebê e em saúde mental na Saúde Suplementar: perspectivas de operadoras e prestadores ..................................................................................................... 67
3.4.1 – Estratégias de regulação das operadoras e ofertas assistenciais: as políticas de cuidado ampliam e diversificam efetivamente as ofertas assistenciais? ...................................... 68
3.4.2 – Reestruturação produtiva e integralidade na saúde suplementar: as mudanças alteram a modelagem tecnoassistencial (ou: as linhas de cuidado estão sendo incorporadas)? ...................................................................................................................................................... 73
4. A ATENÇÃO AO CICLO MÃE-BEBÊ: QUESTÕES PARA A ANÁLISE DO CUIDADO A PARTIR DE “CASOS MARCADORES” ................................................................................................................................................ 80
4.1. Gestação de Alto Risco: mix público e privado e políticas de cuidado no cotidiano dos serviços .......................................................................................................................................................................... 82
4.1.1. O campo empírico: hospitais dos sistemas de serviços público e suplementar ............. 84
7
4.2. A construção de práticas humanizadoras na atenção ao ciclo mãe-Bebê: monólogos e diálogos no cotidiano de um centro obstétrico ........................................................................................... 100
4.2.1. A micropolítica do cuidado em ato: trabalhadores e usuários no cotidiano de um serviço de saúde de atenção ao parto e puerpério ............................................................................... 103
4.2.2. A humanização no cotidiano: desafio, mais que um fato ....................................................... 106
4.3. O cuidado integral no cotidiano do serviço: dialogando com os saberes e práticas das mães sobre a amamentação no puerpério imediato ................................................................................. 108
4.3.1. A amamentação no contexto das políticas de atenção integral ao ciclo mãe-bebê ..... 110
4.3.2. O diálogo entre saberes em uma situação concreta: orientações sobre a amamentação em situação de internação em ambiente de UTI ................................................................................... 111
4.4. O atendimento pediátrico e obstétrico: ruídos na relação profissional e usuário como marcador do mix público e privado ................................................................................................................. 117
5. A ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL: POLÍTICAS E PRÁTICAS DE CUIDADO DA SAÚDE SUPLEMENTAR EM CONTEXTOS LOCAIS .......................................................................................................... 121
5.1. A saúde mental e suas políticas: cenários nas regiões em estudo .............................................. 123
5.2. atenção integral em saúde mental e inovações tecnoassistenciais: o mix público e privado como estratégia de gestão do cuidado ............................................................................................................ 134
5.2.1. Características do mix público e privado no desenho dos itinerários de cuidado dos usuários .................................................................................................................................................................. 136
5.3. O cuidado em saúde mental como percurso em rede: a configuração do sistema de serviços como marcador de integralidade .................................................................................................... 147
5.3.1. O percurso assistencial na perspectiva dos diferentes atores: a linha de cuidados como construção simbólica e de fluxos assistenciais .......................................................................... 150
5.3 – Integralidade em saúde mental e os desafios aos processos de trabalho no interior de serviços: a micropolítica em ato ........................................................................................................................ 164
5.3.1 – A identificação do usuário em sofrimento psíquico na atenção básica ......................... 165
5.3.2 – Condutas e ações no primeiro contato com o usuário em sofrimento psíquico ........ 168
5.3.3 – Itinerário terapêutico do usuário portador de transtornos psíquicos: percorrendo barreiras na integração entre profissionais e serviços ...................................................................... 173
5.3.4 – Concepção de Integralidade: motivações para o cuidado ................................................... 175
5.3.5 - Percepção sobre o atendimento integral às necessidades dos usuários portadores de transtornos psíquicos ....................................................................................................................................... 177
5.4 – É possível a integralidade da atenção sem a integração do sistema de saúde? Desafios para a gestão locorregional ................................................................................................................................. 181
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................................... 186
ANEXOS ............................................................................................................................................................................. 203
8
ANEXO 1: Parecer CEP ........................................................................................................................................... 204
ANEXO 2: Questionário para Dirigentes das Operadoras ....................................................................... 206
ANEXO 3: Questionário para Prestadores ..................................................................................................... 213
ANEXO 4: Roteiro de entrevista da Linha de cuidado: Saúde Mental ................................................ 217
ANEXO 5: Roteiro de entrevista da Linha de cuidado: Mãe-Bebê ....................................................... 219
ANEXO 6: Formulário de Acompanhamento e Avaliação do Projeto ................................................. 222
1 - INTRODUÇÃO
Este relatório de pesquisa tem como objetivo apresentar resultados do projeto aprovado no Edital
MCT – CNPq / ANS n° 25/2007 – “Seleção pública de propostas para apoio às atividades de fomento à
pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação em Saúde Suplementar”, na modalidade de Apoio
Integrado a Projetos de Pesquisa.
O projeto se localiza no que tem sido chamado de “formação de políticas” (Menicucci, 2007), no
caso, a formação da política pública de saúde brasileira, tomando o aspecto da implementação, em
particular no âmbito de um conceito fundamental da sua formulação, a diretriz constitucional da
integralidade da assistência. Diversos estudos têm se ocupado de demonstrar a construção de
sentidos ao conceito de integralidade e sua capacidade analítica e propositiva para avançar no
sentido da qualidade da atenção e promoção de saúde da população. O mesmo se pode dizer da
construção teórica para a análise de práticas de saúde (não apenas de assistência à saúde) e a
identificação de modelagens tecnoassistenciais. Essas associações demonstram uma construção
lógica que permite tomar o cotidiano da atenção à saúde na relação entre os componentes “público”
e “privado” como um campo empírico para analisar a implementação da política de saúde e a
organização do sistema de saúde no Brasil. No caso desta pesquisa, a ênfase foi dada à incorporação
de tecnologias de linhas de cuidado na atenção à saúde oferecida por meio de planos e seguros
privados na saúde mental e no ciclo mãe-bebê. As mudanças nas modelagens tecnoassistenciais em
direção à novos padrões de integralidade é movimento verificado nas políticas de saúde vigentes no
Brasil e têm sido propostas em sucessivos esforços normativos da ANS.
Neste aspecto, o referencial analítico também tomou o campo da micropolítica do trabalho em
saúde (Merhy, 2002) para propor uma metodologia de análise do cuidado na saúde suplementar. De
forma similar a outros estudos, destaca aspectos da microrregulação, tomando as práticas de
cuidado no cotidiano dos serviços como reveladoras e, ao mesmo tempo, engendradoras de
configurações às políticas de saúde. De forma singular, propõe um enfoque que triangula diferentes
abordagens tomando o território de cuidados como espaço de articulação entre essas diferentes
abordagens.
A Saúde Suplementar é o componente do sistema de saúde brasileiro formado por empresas de
planos e seguros privados de saúde, que são responsáveis pela cobertura parcial das necessidades de
atenção à saúde de aproximadamente 25% da população. Estudos anteriores, desenvolvidos pela
rede científica de pesquisa e produção tecnológica envolvida no presente estudo, demonstram a
oportunidade singular de aprofundar análises acerca da noção de linhas de cuidado, compreendidas
como tecnologia de gestão da assistência capaz de produzir padrões avançados e crescentes de
integralidade (Ceccim & Ferla, 2006; Ferla & Cols., 2009a). O formato de estudo multicêntrico
10
integrado nas Regiões Norte e Sul do Brasil permitiu identificar padrões para a incorporação da
tecnologia em estudo. A rede científica referida vem participando da estratégia das Redes de Centros
Colaboradores da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)1, desde seu lançamento.
A comparação do mercado da Saúde Suplementar nas Regiões Norte e Sul apresenta um primeiro
conjunto de evidências sobre a oportunidade de analisar comparativamente características do
cuidado produzido neste segmento. A Região Sul, com aproximadamente 22% da população coberta
por planos e seguros privados de saúde, e a Região Norte, com aproximadamente 9%, representam
os extremos de cobertura no país, excetuada a Região Sudeste, que já foi objeto de diversos estudos
e cuja cobertura assistencial já está bastante caracterizada. As diferenças regionais no sistema de
saúde e nas políticas de desenvolvimento econômico e social, em particular no âmbito da Amazônia,
vêm sendo objeto de pesquisa de participantes da rede científica (Oliveira, 2005). Outro aspecto
relativo à cobertura assistencial é relativo à distribuição dos beneficiários pelas diferentes
modalidades de operadora. No Brasil, a cobertura é concentrada em empresas de Medicina de
Grupo, Cooperativas Médicas e de Autogestão. Entretanto, mesmo considerando que essas três
modalidades também são mais relevantes para as duas regiões recortadas, as taxas de cobertura
entre elas têm variações expressivas nos três agrupamentos territoriais destacados, ou seja, o Brasil
como um todo e as Regiões Norte e Sul (Ferla & Cols., 2009a).
A pesquisa aprofundou as análises da relação entre os componentes público e privado suplementar
na configuração das políticas de cuidado no país, por meio do estudo da incorporação da tecnologia
de linhas de cuidado na atenção ao ciclo mãe-bebê e à saúde mental, bem como para o
desenvolvimento de metodologias para a análise e o acompanhamento deste processo. O conceito
de tecnologia que vem sendo utilizado pela rede científica é originário das produções de Merhy
(2002), que tipifica diferentes naturezas tecnológicas para o cuidado em saúde, a partir da análise
dos processos de trabalho em que este é produzido. A relação entre a gestão das tecnologias de
diferentes naturezas e a característica de integralidade do cuidado já está construída, no plano
analítico, por outros estudos (Ceccim & Ferla, 2006), inclusive pelo autor dessa abordagem de análise
(Merhy, 2006).
O aprofundamento da análise que o projeto desenvolveu, foi feito por triangulação de estudos em
diferentes realidades regionais, em particular em Estados das Regiões Sul e Norte, bem como com a
aplicação de alguns instrumentos comuns ao projeto como um todo. A triangulação, no desenho da
abordagem analítica desta pesquisa, considerou que a diversidade e a heterogeneidade de contextos
têm capacidade de “falsear” evidências que foram ou são construídas somente pela posição linear de
uma observação. Aprofundar as questões teóricas da relação entre os componentes do sistema de
saúde brasileiro, do desenvolvimento e da incorporação de tecnologias assistenciais, da
diversificação de ofertas em distintas realidades e da busca de evidências de padrões ampliados de
integralidade é a oportunidade utilizada pelo estudo. Além de descrever práticas de atenção que
caracterizam as políticas institucionais em implementação no sistema de saúde, a busca de linhas de
1 A política de estímulo à pesquisa e produção de conhecimentos sobre a Saúde Suplementar, para além dos
aspectos econômico-financeiros e à caracterização de nichos de mercado das operadoras, foi desenvolvida intensamente no período de 2005 a 2007, com realização de eventos regionais e estaduais, com cooperação técnica e financeira com instituições e múltiplos grupos de pesquisas em todo o país e com Editais de fomento por meio de cooperação entre o CNPq e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
11
cuidado considera situações marcadoras, como a assistência farmacêutica, a atenção domiciliar e
outras ofertas assistenciais inovadoras, ações substantivas de promoção e proteção à saúde e outras.
No decorrer da pesquisa identificou-se que o próprio mix público e privado operou como situação
marcadora, uma vez que também demonstrou capacidade de representar a satisfação de
necessidades em saúde dos usuários e dispositivo de gestão do itinerário de cuidado.
Tratou-se de buscar uma caracterização das práticas de cuidado e de gestão do cuidado na Saúde
Suplementar que permitisse identificar evidências das políticas de cuidado com que este segmento
opera e, assim, constituir condições analíticas, no campo de produções da integralidade em saúde,
analisar por comparação o componente público e a política de cuidado que se implementa no
sistema de saúde brasileiro como um todo.
Tomamos aqui uma idéia utilizada por Menicucci (2007) de que a formação de uma política é
constituída no âmbito de um processo de formulação, implementação e avaliação. Os resultados da
implementação podem, dada a autonomia desta etapa em relação à formulação, diferir inclusive em
conteúdo e concepção originais da política. No contexto deste projeto, está em questão a diretriz
constitucional do sistema de saúde da integralidade da atenção, que configura uma disposição
central da política de saúde formulada e que, portanto, deveria abranger os componentes público e
privado do sistema nacional de saúde. Como no estudo anterior (Ferla & Cols., 2009a), considerou-se
um marco de análise em que se compreende a diretriz constitucional de unicidade do sistema de
saúde como a subordinação de práticas, serviços, redes e subsistemas à gestão única do Sistema
Único de Saúde (SUS). A unicidade do sistema de saúde está dada por um conjunto de normas,
valores e diretrizes legais que respondem ao conceito da relevância pública das ações e serviços. Essa
definição constitucional atribui ao Poder Público a função de regulação, fiscalização e controle das
ações e serviços de saúde como desdobramento da função atribuída ao Estado de garantir o direito à
saúde, em seu sentido ampliado, às pessoas e coletividades. Não se trata de desconsiderar a ressalva
de que a integração entre os diferentes componentes dos sistemas de saúde e, mais
especificamente, dos sistemas de serviços de saúde, é fundamental para a definição das capacidades
de resposta dos mesmos em termos de capacidade de resposta e eficiência, como faz a literatura
para constituir o foco na unicidade de entidade que realiza as funções e/ou a cobertura de toda a
população (OPAS, 2007). Tampouco de desconsiderar que as práticas no interior do sistema de saúde
revelam fraturas com o conceito de unicidade. Ao contrário, se trata de deslocar o foco da natureza e
do número das entidades para um plano de análise que põe em questão o grau de integração e o
tipo de interações que se estabelecem entre as diferentes entidades para compor tanto um sistema
de saúde (foco na gestão, na atenção e na participação) quanto um sistema de serviços de saúde
(foco na atenção). Assim, as práticas concretas no interior do sistema são postas em evidência para a
análise.
Optou-se, operacionalmente, por tomar os conceitos de “sistema de saúde” e “sistema de serviços
de saúde” pelo vértice que os diferencia: a abrangência e a natureza das ações. Enquanto o objetivo
precípuo do segundo é a prestação de ações de promoção, prevenção, tratamento e reabilitação, o
primeiro se ocuparia do desempenho de um conjunto mais amplo de funções, entre as quais a
provisão de serviços, as diferentes ações de regulação na área da saúde, a abertura de canais e
instâncias político-sociais, a fiscalização de tecnologias e processos, a vigilância em saúde, a
produção de insumos relevantes à saúde pública, a incidência sobre a educação de profissionais e a
formação profissional de segmentos de trabalhadores. É importante observar que a expressão
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“sistema de saúde” tem uma abrangência maior que o “sistema de serviços de saúde” e não se
confunde com o “setor saúde”, que é o campo de expressão dos sistemas de saúde e das políticas
que são emanadas no seu interior. Os diferentes sistemas de saúde de um país, por exemplo, operam
no interior e compõem o setor da saúde.
Assim, o sistema de saúde brasileiro, único em termos de definição legal, de valores gerais de
configuração e de organização participativa da tomada de decisões, é misto no sentido de estruturas
e funções que compõem o componente assistencial. Temos, na assistência, um mix de três
subsistemas: um subsistema público, responsável por prover o componente público do sistema de
serviços de saúde destinado a toda a população e por órgãos e instituições que exercem a gestão do
sistema nacional de saúde e as funções que dela decorrem, inclusive pela garantia de acesso às
políticas, ações e serviços que caracterizam o direito à saúde das pessoas definido na Constituição
brasileira e a regulação de todas as ações e serviços; um subsistema suplementar, responsável por
prover a parte do sistema de serviços privados operada por meio de planos e seguros privados de
saúde e destinada aos seus beneficiários, devendo implementar normas e dispositivos de
regulamentação feitos pelo sistema de saúde; e um subsistema privado absoluto, que mantém ações
e serviços para a parcela da população que compra diretamente esses serviços (desembolso direto –
“out of pocket”) e responde às normas sanitárias e outras normas de regulamentação emitidas pelo
sistema de saúde. Por rigor científico, deve-se apontar a existência, ainda, dos sistemas informais e
populares, que não apenas reduzem a pressão sobre os sistemas profissionais público, suplementar e
privado absoluto, como integram e complementam de maneira espontânea, sem regulação, e do
qual nenhuma população do mundo deixa de fazer uso.
A abordagem do “público” e do “privado” na saúde não é uma particularidade do Brasil e tampouco
de emergência recente. Braga & Góes de Paula (1981) apontam o surgimento do capitalismo e, mais
especificamente, o avanço do capitalismo e seus conflitos, como a emergência dessas abordagens
nas reflexões sobre a saúde, em particular a partir das ciências econômicas e políticas. No Brasil,
Bahia (2005) inventariou padrões tensos, com continuidades e rupturas, de convivência entre ambos
desde o surgimento dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP) e, mais fortemente, desde sua
unificação em 1967, onde se verifica o início de um marcado patrocínio da expansão da assistência
privada com recursos públicos. Os estudos nessa área, normalmente, têm recorte econômico estão
embasados na caracterização das operadoras e do mercado em que atuam (ANS, 2005), não
refletindo os modelos e conceitos que envolvem a prática clínica ou projetos cuidadores. Flávia Rossi
e Maria Alice Lima colocam que “o grande compromisso e desafio de quem gerencia o cuidado é o de
utilizar as relações enquanto tecnologia”, o que edificaria o cotidiano, “por intermédio da construção
mútua entre os sujeitos”, dando sustentação “à satisfação das necessidades dos indivíduos”,
valorizando trabalhadores e usuários “como potentes para intervirem na concretização do cuidado”
(Rossi & Lima, 2005, p. 305).
Entretanto, esses recortes não esgotam o necessário aprofundamento teórico e empírico da Saúde
Suplementar para compreender essas tensões e as tendências do sistema de saúde no país. Quer
pelo fato de que os efeitos das políticas econômicas e sociais produzem cisões na sociedade com
bolsões de pobreza e restrição de acesso a bens e serviços, inclusive na saúde; quer pelo fato de que
o sistema de saúde, em seus componentes “público” e “privado”, oferece distintos modos de acesso
aos serviços de saúde; ou ainda porque as demandas por saúde vêm sendo configuradas como
direitos pela população e por instituições governamentais e da sociedade civil. O fato é que há uma
13
pressão visível por uma regulação2 com maior capacidade de ordenar a oferta de ações e serviços de
saúde a partir de certos valores e de certas diretrizes que garantam maior acesso e maior qualidade
na resposta dos mesmos, situação que freqüentemente opõe interesses que facilmente se
configuram na polaridade “público” e “privado”.
Para Paz, Santos e Eidt, “conhecer a vulnerabilidade de grupos populacionais possibilita mobilizar
profissionais e população civil, por meio de um processo educativo construtivista, para
transformações sociais”. Segundo as autoras, “tais transformações devem ser alicerçadas nas
relações intersetoriais e na ação comunicativa entre os sujeitos sociais”. Dessa forma, defendem que
“assim, acredita-se na importância de diferentes formas de enfrentamento”, não apenas assistenciais
ou de terapêutica clínica e reabilitadora, “mas também na implementação de políticas públicas e de
ações de prevenção de doenças, bem como promoção de saúde da população de forma integral e
resolutiva” (Paz, Santos & Eidt, 2006, p. 342).
Segundo Aciole (2006, p. 23), a saúde vem se tornando um dos setores em que se configura uma luta
de caráter estratégico “entre o que constitui interesse público e iniciativa privada, portanto entre
interesses sociais antagônicos, espaço real de ação e disputa de projetos de diferentes estratos
sociais, por eles gestados e/ou a eles dirigidos”. A análise mais detalhada e a compreensão mais fina
dessas tensões e da dinâmica dos atores com atuação nesse cenário de interface entre o público e o
privado – fortemente marcado no país pela Saúde Suplementar – auxilia na proposição de
mecanismos mais efetivos para ordenar o cuidado oferecido à população, já que o desenho da
modelagem assistencial inclui a mediação de diferentes saberes e do poder de intervenção de
diferentes atores, como mostra a literatura (Merhy, 2002; ANS, 2005). As abordagens analíticas sobre
esse tema vêm tomando uma configuração muito singular há alguns anos, em parte marcada pela
vitalidade analítica da Saúde Coletiva. Associando enfoques mais clássicos, como o tema do mercado
da saúde, e, mais recentes, como a organização dos processos de trabalho e as práticas de cuidado, o
“estado da arte” atual da abordagem do tema conta com apoio em ferramentas de análise mais
potentes, que permitem avançar da tensão de forças polares cunhadas ideologicamente para um
conjunto de particularidades colocadas nas práticas cotidianas, com tensões e contradições, com
efeitos concretos na atenção à saúde das pessoas, com disputas no âmbito da micropolítica dos
processos de trabalho3.
Essa transposição, entretanto, não se caracteriza como inédita, no sentido de uma situação
nova/original, mas como inovação, no sentido de uma combinação singular de ferramentas de
2 O conceito de regulação aqui utilizado, a exemplo de outros estudos (ANS, 2005), não se restringe às
dimensões política e econômica, relativa às políticas governamentais e aos movimentos de mercado, mas abrange as práticas de cuidado e as relações entre os diferentes atores, que constitui a dimensão micropolítica do cuidado (Merhy, 2002).
3 A “micropolítica dos processos de trabalho” diz respeito às características das relações que se estabelecem
entre os diferentes atores na organização do cuidado, que não são explicáveis completamente pelo conhecimento estruturado e pela técnica ou pelas normas e diretrizes que organizam os serviços. Essa dimensão é caracterizada pelo que Merhy (2002) denomina por “tecnologias leves”, que se expressam em ato no momento do encontro entre os diferentes atores que protagonizam o cotidiano do sistema de saúde. Essas tecnologias são configuradas por diferentes forças: os interesses desses sujeitos, sua configuração subjetiva e expectativa de autonomia e autogoverno, mas também por estratégias de reconfiguração do trabalho que buscam a maximização da sua capacidade produtiva e a otimização econômica e física das ações de cuidado.
14
análise e de liberdade de produção, com efeitos importantes na qualidade do cuidado oferecido à
população, inclusive no reconhecimento de trajetórias assistenciais que combinam o “público” e o
“privado” de forma bastante particular. De certa forma, trata-se de explorar um plano de análises
que se tornou possível a partir da vertente sócio-histórica de estudo das relações entre o Estado e as
instituições de saúde e dos efeitos concretos dessas relações com o cotidiano da vida das pessoas.
Dessa vertente, que tem na produção de Madel Luz4 profícuo exemplo, nasce a constatação do
caráter histórico e social das práticas de saúde e das instituições de saúde e, portanto, de outras
dimensões de análise das políticas de saúde que transcendem a burocracia estatal e a tecnocracia
biomédica.
É algo recente, por exemplo, a proposição de análise do setor da saúde não como mercado, mas
como arena de interesses, que permite analisar o setor não com a lógica de uma organização típica,
mas como um espaço onde práticas disputam sentidos no cotidiano, com forte expressão no cuidado
oferecido à população. Autores que analisam o trabalho em saúde na dimensão micropolítica, com
destaque para Emerson Merhy, Túlio Franco, Luiz Cecílio, Gastão Campos, Laura Fewerwerker,
Giovani Aciole, Ricardo Ceccim, Alcindo Ferla e outros, contribuem para essa vertente (Cecílio, 1997;
Merhy, 2002; Merhy, Magalhães Jr., Rimoli, Franco & Bueno, 2003; Ceccim, 2005; Aciole, 2006;
Campos, 2006; Akerman & Feuerwerker, 2006; Ferla, 2007). Da mesma forma, as análises da
dimensão das práticas de integralidade contribuem para qualificar e humanizar o setor (Pinheiro &
Mattos, 2001; Pinheiro, Ferla & Silva Jr., 2004; Camargo Jr., 2004; Merhy, 2005; Merhy, 2006;
Pinheiro, Ferla & Mattos, 2006). As análises sobre as relações entre os profissionais e as tensões
corporativas também se somam à configuração deste campo analítico (Ceccim, 2004; Carvalho &
Ceccim, 2005; Franco & Merhy, 2005; Carvalho & Ceccim, 2006). Por fim, estudos acerca da
humanização, do acolhimento e da ampliação da capacidade de respostas da clínica e do cuidado
também têm contribuição relevante nessa vertente (Lacerda & Valla, 2004; Mattos, 2004, Ferla,
2004; Ceccim & Capozzolo, 2004; Carvalho & Cunha, 2006; Ceccim & Ferla, 2006; Moreira, 2002;
Ferla, 2007).
No contexto dessas produções e com base nas ferramentas de análise apresentadas por esses
autores, pesquisa relativa à Saúde Suplementar no Sul do Brasil, analisou a configuração dos cenários
em que se produz o cuidado e a dinâmica de atores que atuam nesse componente do sistema
nacional de saúde, em particular o efeito dessas dinâmicas na configuração da atenção à saúde da
população (Ferla & Clauss, 2007). A pesquisa foi desenvolvida no contexto de um projeto de maior
envergadura (Ceccim, 2007), por uma rede regional de instituições da estratégia da Rede de Centros
Colaboradores da ANS, com marcado protagonismo na Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e
Universidade de Caxias do Sul (UCS). Como seguimento à análise realizada na Região Sul do Brasil, foi
construída a oportunidade de desenvolver estudo comparativo nos cenários das Regiões Sul e Norte,
por meio de projeto que está em desenvolvimento, apoiado pelo Edital MCT-CNPq/ANS nº 46/2006
(Projeto “Saúde Suplementar nas Regiões Norte e Sul: estudos multicêntricos integrados sobre
modelagem assistencial e integralidade do cuidado”). Esses estudos, mesmo que com resultados
4 São significativas para o sentido de inovação que se quer representar pelo destaque à autora, as pesquisas
sobre as instituições médicas no Brasil, realizadas a partir de meados da década de 1970, e sobre racionalidades médicas, a partir da década seguinte (Luz, 1979; 1988; 2005; 2007). Essas abordagens tiveram grande contribuição para a construção teórico-metodológica da Saúde Coletiva no Brasil e na América Latina.
15
ainda preliminares, vem destacando uma rica heterogeneidade de situações, potencialmente capaz
de explicitar tendências e evidências de modelagens tecnoassistenciais na Saúde Suplementar e
também no componente público do sistema de saúde brasileiro.
Os cenários da Saúde Suplementar descritos nessas pesquisas apontavam a necessidade e a
oportunidade de ampliar estudos e análises. Essa necessidade vem sendo respondida, em parte, pela
atual política da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de qualificação institucional,
realização e divulgação de estudos e pesquisas e articulação interinstitucional para a produção
teórica e desenvolvimento da educação permanente em saúde, priorizando a construção e a
consolidação de um conceito de saúde suplementar que, para além da concepção curativa, incorpore
as ações de promoção à saúde, prevenção de doenças, proteção da cidadania e implementação
integral do Sistema Único de Saúde, inclusive em seu componente de regulação de Estado sobre o
subsistema privado-suplementar.
O Programa de Qualificação da Saúde Suplementar, de iniciativa recente da ANS, tem o objetivo de
construir uma Rede de Centros Colaboradores que permita buscar apoio para o desenvolvimento das
ações de qualificação institucional, realização e divulgação de estudos analíticos e pesquisas,
articulação entre instituições nacionais e internacionais envolvidas com a produção teórica e o
desenvolvimento da educação permanente em saúde.
No âmbito desta política, nas Regiões Sul e Norte foram constituídas redes regionais para a produção
de conhecimentos e tecnologias para a política de regulação que, em parte, respondem às demandas
colocadas pela análise anterior. O estudo que está sendo proposto, neste projeto, amplia o escopo
das análises iniciadas no segundo semestre de 2006 nas duas regiões, associando os conhecimentos
produzidos e o processo de análise. Além de ampliar e aprofundar o conhecimento que já está sendo
sistematizado, as atividades propostas, neste projeto, buscam ampliar a integração entre as
instituições, fortalecendo o conceito da Rede de Centros Colaboradores, principalmente por meio do
intercâmbio técnico e científico entre os participantes.
Há um conjunto de mudanças na organização de políticas de cuidado que se evidencia no cotidiano
dos serviços de saúde, em particular no plano das práticas de cuidado, com grande potencialidade de
operar como marcador de transformações significativas na produção de cuidado em si, na formação
dos profissionais, na construção de redes de atenção à saúde envolvendo serviços e população
usuária, os diferentes serviços e os diferentes componentes do sistema de saúde brasileiro. Em
produção anterior, se denominou de “movimentos” ou “nomadismos” da clínica e da gestão o
processo de buscar evidências na ciência moderna - mas também no cotidiano das práticas de saúde,
nos diferentes saberes que organizam e dão sentido à vida e no modo em si de “andar a vida” - para
orientar a organização do sistema de saúde e as práticas de cuidado, situação que se verifica no
cotidiano dos serviços de saúde nesta etapa de implementação da política de saúde inscrita na
Constituição Federal (Ferla, 2007). Tal processo coloca em evidência o tema da gestão do cuidado,
não mais apenas uma aplicação “fixa” e linear do conhecimento biomédico, mas uma permanente
síntese entre conhecimentos, saberes, condições objetivas e subjetivas no contexto concreto do
cuidado e de cada uma das práticas que o constituem. Nesse contexto, passam a fazer sentido certas
texturas do processo de cuidado em si e dos seus resultados, ou seja, se destaca uma dimensão
estética do cuidado (Ferla, 2007) que fala do estágio de implementação das políticas, conforme
definido anteriormente. A tecnologia de linhas de cuidado, em oposição à orientação programática
16
ou do “embasamento em evidências científicas”, busca produzir visibilidade nas lógicas que dão
suporte à gestão do cuidado partindo do compromisso ético com a vida, com a produção de maior
qualidade e autonomia para o viver (Ceccim & Ferla, 2006), ou seja, do processo do cuidado em si,
mais do que em orientações teóricas ou normativas que pretendem configurá-lo. O movimento
analítico que esse deslocamento das bases/referências das políticas de cuidado e de gestão para as
práticas no seu cotidiano procura operar é o de identificar certos padrões que sejam reveladores das
políticas que se constituem efetivamente no cotidiano.
O texto que se segue procurou contextualizar brevemente a tecnologia de linhas de cuidado como
estratégia de uma modelagem tecnoassistencial embasada na integralidade da atenção, assim como
especificamente as questões que envolvem o cuidado no ciclo mãe-bebê e na saúde mental e as
lógicas de gestão do mesmo.
1.1. O CUIDADO, SUAS POLÍTICAS E SUAS TEXTURAS: CONSTITUINDO EXPRESSÃO
ÀS LÓGICAS QUE GOVERNAM SUA GESTÃO
Os estudos que buscam compreender as políticas que configuram o cuidado oferecido aos indivíduos
e coletividades no contexto dos sistemas oficiais de saúde têm procurado analisar as questões a esse
respeito em, pelo menos, duas grandes vertentes. Mesmo sem uma grande precisão conceitual, para
o objetivo dessa revisão será suficiente identificar uma vertente que busca o referencial da análise na
idéia do progresso5 da ciência biomédica, nas condições de oferta e acesso a esses serviços e nos
resultados previstos/potenciais desse processo. Para a finalidade de diferenciação, essa vertente
ilustra a lógica que foi identificada por Michel Foucault na origem da medicina moderna e
denominada de “medicalização da saúde” (Foucault, 1989), buscando destacar não somente o
movimento de ordenamento disciplinar das práticas de saúde, como a forma precisa de articular a
medicina com o Estado para constituir os sistemas de saúde modernos e identificar certas lógicas de
atuação da “engrenagem” do sistema de saúde. Nessa vertente, utilizando uma imagem para
exemplificar a idéia central que precisa ser destacada, o campo das práticas seria um campo apenas
de verificação de idéias, modelos ou teorias, uma vez que nesse padrão de racionalidade “somente a
razão pode agir como mediadora válida entre o sensível e o inteligível”, ou seja, o que não é redutível
à razão não pode ser considerado como verdade (Pinheiro & Luz, 2007, pág. 12). No campo das
práticas de cuidado, da formação de capacidades profissionais e das políticas, alguns paradigmas de
pensamento com base nessa lógica freqüentaram a etapa contemporânea da história da saúde
5 O conceito de progresso aqui pretende destacar não apenas a idéia de um movimento constante da
humanidade e, em particular, da ciência biomédica, como também uma direcionalidade definida, para um ideal de bem-estar ou felicidade. Algo similar à idéia de “fé no progresso” (Bobbio, Matteucci & Pasquino, 2000), para destacar a orientação por um “objetivo desejável”. Madel Luz (1988), em seus estudos sobre as racionalidades médicas, e em revisão conjunta com Roseni Pinheiro (Pinheiro & Luz, 2007), associa o que é chamado de motivação por “modelos ideais” no planejamento da saúde, mas também no cuidado, à racionalidade moderna (“científica”) e à racionalidade biomédica. Nesse padrão de motivação, produzir e aplicar verdades no contexto da razão científica moderna seria mais importante do que a abertura às evidências do cotidiano, ou seja, a veracidade propriamente dita do conhecimento que se aplica.
17
pública: o “embasamento em evidências científicas”, a “protocolização” do cuidado, os modelos de
planejamento e programação, o controle dos riscos, entre outros. Trata-se de dispositivos visíveis nas
políticas para a formação de perfis profissionais na gestão do cuidado e de serviços e sistemas de
saúde que pretendem ter capacidade real ou potencial de ordenar as práticas no sentido e na
direção de um padrão considerado ideal de condutas profissionais e do funcionamento dos
serviços/sistemas. Ora com base na técnica e no conhecimento biomédico, ora com base na técnica e
no conhecimento administrativo-financeiro, ora com um mix entre essa díade, esses paradigmas
buscaram configurar práticas assistenciais e de gestão e políticas públicas. Essa vertente compartilha
com uma tendência clássica verificada na análise das políticas públicas, inclusive na saúde, de
constituir-se centralmente sobre a formulação e a configuração das políticas, em detrimento da
etapa de implementação (Menicucci, 2007).
Os estudos de Madel Luz sobre as instituições médicas no Brasil e sobre racionalidades médicas (Luz,
1979; 2004; 2005; 2007) atualizaram o referencial foucaultiano, ampliaram a abordagem teórico-
metodológica-conceitual e construíram condições para análises com outra potencialidade no
contexto das realidades brasileira e latino-americana. Trata-se de um movimento de pôr em questão
as práticas em si, sejam elas de produção e uso do conhecimento, de condução de políticas e
programas, da gestão governamental ou da interface entre atores. Desloca-se o foco, onde as
práticas tornam-se marcadoras de relações entre o saber e o fazer. Uma primeira constatação desses
estudos aponta uma abissal distância entre as políticas governamentais e as práticas cotidianas no
interior dos serviços de saúde (Luz, 1979). A potência analítica desse movimento não se esgota em
tal constatação, uma vez que ela abre à reflexão a questão dos processos de decisão e, portanto, põe
em evidência o campo das práticas e sua relação com o contexto onde se desenvolvem. Parte
significativa da produção teórica atual sobre integralidade em saúde emerge dessas produções. Do
ponto de vista da organização do cuidado e da gestão na saúde, essa vertente colocará questões
relativas aos efeitos das práticas e das políticas institucionais no cotidiano.
Buscando, novamente, a analogia ao campo da análise das políticas públicas, essa vertente
compartilha da tendência algo mais contemporânea de compreender o caráter processual da
formação dessas políticas, buscando a centralidade aos problemas de implementação e
considerando o ciclo formulação, implementação e avaliação (Menicucci, 2007).
Ao se constituir o âmbito das práticas como espaço de análise (e não apenas de verificação de
modelos) abre-se uma forte vertente de produção de conhecimentos sobre a formação de políticas.
No caso específico das políticas de saúde, Merhy (1992) constituiu a expressão “modelagens
tecnoassistenciais” para ampliar o foco de análise dos diferentes atores e forças que intervêm no
cotidiano de sua implementação. No escopo dessa expressão, estaria a observação dos modos como
a produção de ações e serviços de saúde é ordenada e como se expressam os arranjos de saber e de
poder nos espaços do cuidado. Assim, essa abordagem permite uma análise que articula as práticas
de gestão e atenção no cotidiano dos serviços, a relação entre os diferentes atores que protagonizam
o cotidiano do sistema de saúde, as condições desse protagonismo, as bases normativas e técnicas
que embasam o gerenciamento e a regulação dos processos de trabalho e os enunciados dos
programas e das políticas de saúde.
18
1.2 - LINHAS DE CUIDADO COMO TECNOLOGIAS EMERGENTES PARA A
ORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE
A linha de cuidado é uma tecnologia de organização da atenção com formulação recente no âmbito
da analítica da integralidade, em particular nos estudos voltados para as práticas cotidianas no
interior dos serviços e nos estudos que buscam caracterizar e analisar o cuidado como processo de
trabalho (Ceccim & Ferla, 2006). A vertente analítica que vem desenvolvendo esses estudos está
vinculada ao esforço ético, técnico e político de formulações para a inovação das modelagens
tecnoassistenciais do cuidado no sistema de saúde, em todos os seus componentes.
Na Saúde Suplementar, o termo “linha de cuidado” foi utilizado pela primeira vez em pesquisas feitas
nos anos de 2005 e 2006, cujos resultados fazem uma contextualização geral dos planos e fornecem
um panorama do mercado atual, descrevendo e analisando estratégias de microrregulação junto aos
prestadores médicos e hospitalares e como se articulam com o conteúdo das políticas de
ordenamento do setor (ANS, 2005). Essas estratégias se caracterizam pelo direcionamento da
clientela, disciplinamento das práticas e pela racionalização do consumo a partir da lógica
econômica.
Os resultados dessas pesquisas descrevem evidências de uma similaridade muito grande no cuidado
oferecido na Saúde Suplementar com as demais práticas de cuidado do sistema de saúde: uma
assistência embasada no consumo de procedimentos, na lógica dos interesses de consumo e
racionalização de gastos do mercado, com uma base de cuidados enfocando quase que
exclusivamente a dimensão biológica das doenças e, particularmente, na fragmentação das ações,
com déficits visíveis na gestão de um cuidado centrado no usuário que o demanda (ANS, 2006). Entre
as diretrizes apontadas naquelas pesquisas para a reorganização da modelagem assistencial estavam
a integralidade do cuidado, a produção de vínculo e a responsabilização, como estratégias capazes de
impactar a micropolítica dos processos de trabalho, os efeitos desse processo na organização da
assistência à saúde e os desenhos institucionais para a oferta de ações e serviços (ANS, 2006).
Aquelas pesquisas foram patrocinadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, órgão de
regulação do sistema de saúde brasileiro para o sub-setor dos planos e seguros privados de saúde,
com o objetivo de subsidiar a formulação de políticas para a qualificação do setor.
Visando uma aproximação do cotidiano da produção de saúde no sistema de saúde, essas pesquisas
buscaram analisar a construção de linhas de cuidado entendidas como a articulação ou a facilitação
do acesso ao conjunto de serviços ambulatoriais ou hospitalares, bem como aos cuidados de
especialistas médicos ou de outros profissionais de saúde (psicólogo, fisioterapeuta, enfermeiro ou
outros) e às tecnologias de diagnóstico e tratamento capazes de contribuir para a integralidade do
cuidado que necessitem as pessoas. Esse tema é objeto de estudos e análises recentes sobre
inovações da modelagem das respostas do sistema de saúde à diretriz e ao direito de atenção
integral, conforme apontado em trabalho de revisão da literatura (Ceccim & Ferla, 2006).
Em pesquisa sobre a incorporação de inovações assistenciais nas políticas e práticas do sistema de
saúde, Ceccim & Ferla (2006) propuseram uma definição operacional, que se adequa à construção de
um modelo de análise para essa tecnologia, a partir do cotidiano da atenção. Para esses autores,
uma linha de cuidado seria um processo desencadeado por uma demanda por cuidado, por práticas
19
cuidadoras (capazes de responder às necessidades dos indivíduos e/ou grupos que demandam
cuidados), pela oferta de projetos terapêuticos singulares, pelo acesso a uma rede de serviços
configurada como malha de cuidados progressivos, pela organização da gestão e da atenção com
base no princípio da integralidade, por uma regulação (incluindo os âmbitos de macrorregulação e de
microrregulação) da atenção cuidadora e pelo resultado do cuidado produzindo qualidade de vida e
autonomia do indivíduo e/ou grupo (Ceccim & Ferla, 2006). Em cada um desses componentes
operativos da linha de cuidados, articulam-se vetores de força de questões técnicas e normativas,
relativas à sua configuração como ferramentas das políticas de saúde em vigor ou em
implementação, e questões relativas à dimensão micropolítica do trabalho, relativas aos diferentes
dispositivos constituídos no âmbito das relações entre os sujeitos nas cenas de cuidado, de gestão,
de educação e de participação setorial. Componentes operativos, ferramentas e dispositivos podem
tornar-se, portanto, marcadores analíticos das políticas e práticas de cuidado no cotidiano de
sistemas, redes e serviços de saúde. O modelo de análise assim enunciado demonstra a potência da
conexão das linhas de cuidado escolhidas para a construção de conhecimentos sobre o estágio atual
de implementação de políticas de cuidado no cotidiano do sistema de saúde e a força analítica dos
marcadores escolhidos: entre outros a assistência farmacêutica, a atenção domiciliar e a promoção e
proteção da saúde.
Esses marcadores antecipam outros marcadores que serão construídos no processo da pesquisa e
envolvem o acesso a ações, serviços e insumos; o acesso a práticas de cuidado que têm potencial de
tensionar o modelo tecnoassistencial biomédico vigente e a associação de ações de diferentes
naturezas tecnológicas, que têm grande potencial de construir padrões ampliados de integralidade.
1.3 - ATENÇÃO AO CICLO MÃE-BEBÊ E A SAÚDE SUPLEMENTAR
O chamado ciclo mãe-bebê busca identificar um conjunto de eventos que marcam o período que a
linguagem biomédica denomina de gravidez, parto e puerpério em suas demandas por cuidado.
Entretanto, para a vertente que caracteriza esse período como componente do ciclo vital, além da
dimensão biológica, há eventos de natureza social, política e, mesmo, subjetiva, que devem compor
a capacidade de escuta e a resposta clínica. Essas dimensões configuram o território no qual os
serviços e profissionais que pretendem uma atuação em linha de cuidado devem buscar evidências
do que constitui o conjunto de necessidades dos indivíduos ou grupos sob cuidado.
Especificamente em relação ao cuidado ao ciclo mãe-bebê, há problemas que permanecem em
aberto mesmo na lógica biomédica, como é o caso da gravidez na adolescência, do aborto, da
prematuridade, das taxas de cesareana, dos índices de mortalidade materna e outras situações
evidentes por dados registrados direta ou indiretamente nos sistemas de informação em saúde e
resistentes às práticas comuns nos serviços. Embora estudos demonstrem a redução na taxa de
natalidade, permanece elevado o número de nascimentos em algumas regiões e a busca por serviços
de saúde materno-infantil ainda ocupa espaços importantes na atenção à saúde. O cenário brasileiro
relacionado ao ciclo mãe-bebê traz dados relevantes no que se refere à gestação na adolescência. De
20
acordo com dados de 20086, no ano de 2008, na Região Norte, 27% dos nascidos vivos foram de
mães adolescentes e 38% dos partos foram cesáreos; já na Região Sul esses índices foram de 18%
para partos em mães adolescentes e 55% de partos cesáreos; no Brasil, 20% de partos em mães
adolescentes e 48,5% de partos cesáreos; tal diferença serve para refletirmos sobre a necessidade de
analisar em profundidade as tecnologias de cuidado e não apenas referir genericamente as
condições sócio-econômicas dessas regiões.
A organização da atenção a esse ciclo como linha de cuidado busca construir escuta às diferentes
necessidades expressas, ofertas de ações e serviços diversificadas em acordo com as necessidades
identificadas e embasadas em políticas de cuidado pautadas pela integralidade.
1.4. ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL E A SAÚDE SUPLEMENTAR
Estima-se que 3% da população necessitem cuidados contínuos em saúde mental, em função de
transtornos severos e persistentes (psicoses, neuroses graves, transtornos de humor graves e
deficiência mental com grave dificuldade de adaptação, entre outros). A magnitude do problema (no
Brasil, cerca de 5 milhões de pessoas) exige uma rede de cuidados densa, diversificada e efetiva.
Cerca de 10 a 12% da população, que não sofre transtornos severos, precisa de cuidado em saúde
mental, na forma de consulta médico-psicológica, aconselhamento, grupos de orientação e outras
formas de abordagem.
O início do processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil é contemporâneo da eclosão do “movimento
sanitário”, nos anos 1970, em favor da mudança dos modelos de atenção e gestão nas práticas de
saúde, defesa da saúde coletiva, eqüidade na oferta dos serviços e protagonismo dos trabalhadores e
usuários dos serviços de saúde nos processos de gestão e produção de tecnologias de cuidado.
Tradicionalmente, a organização do trabalho em saúde mental se embasa em um modelo de atenção
que toma como matriz uma compreensão orgânica de saúde-doença, que se concretiza em práticas
assistenciais de intervenção focalizadas na sintomatologia e tendo como recurso, quase que
exclusivamente, os hospitais psiquiátricos e a medicalização. A desinstitucionalização e a efetiva
reintegração das pessoas com transtornos mentais graves e persistentes na sociedade são tarefas às
quais o SUS vem se dedicando com especial empenho nos últimos anos. A demanda por essas
modalidades de atenção cresce e, ao mesmo tempo, cresce a tensão de interesses no âmbito da
sociedade. Atualmente, uma grande diversidade de serviços compõe a rede especializada em saúde
mental e um esforço relevante vem sendo feito pelos gestores de políticas de saúde, por
profissionais do setor e outros atores para integrar a rede de cuidados especializada à atenção básica
e aos demais serviços do sistema público de saúde. Independente do componente do sistema de
6Dados disponíveis nos Cadernos de Informação em Saúde, do Datasus:
http://tabnet.datasus.gov.br/tabdata/cadernos/cadernosmap.htm?saude=http%3A%2F%2Ftabnet.datasus.gov
.br%2Ftabdata%2Fcadernos%2Fcadernosmap.htm&botaook=OK&obj=http%3A%2F%2Ftabnet.datasus.gov.br%
2Ftabdata%2Fcadernos%2Fcadernosmap.htm.
21
serviços, a superação do modelo manicomial é um desafio do setor saúde e também da assistência
social, dos direitos humanos e está na agenda da sociedade como um todo.
Lopes e Silva colocam que “o processo saúde-doença é resultante das situações de vida dos
indivíduos e coletivos e que essas situações são construídas nas relações que se estabelecem na
sociedade”, alertando que um processo saúde-doença é sempre histórico e passível de ser
apreendido, bem como é parte importante do ideário constitutivo das práticas de consultório (Lopes
& Silva, 2004). Essa afirmação fortalece a necessidade de não apenas analisar, mas também induzir
mudanças nas práticas de cuidado na saúde suplementar.
Em relação à Saúde Suplementar, estudos anteriores da rede científica que desenvolveu o projeto
demonstraram que os beneficiários de planos de saúde migram em busca de atenção na rede
substitutiva no componente público, o que pode indicar uma opção por um serviço diferenciado
(Ferla & Cols., 2007). A concepção de uma linha de cuidado, no caso da saúde mental, incluiria o
acesso, o vínculo e a resolutividade em serviços de diferentes naturezas, o pleno acesso à assistência
farmacêutica e a disponibilidade de ações de promoção e prevenção à saúde.
Ao fluir pela linha de cuidado da saúde mental, o usuário tem intensificados seu projeto terapêutico
individual e não simplesmente o seu encaminhamento de menor à maior tecnicalidade da atenção.
As práticas e estratégias no enfrentamento de problemas cotidianos, sobretudo em relação à
procura de cuidados em saúde, serão analisadas segundo “itinerários terapêuticos” percorridos
(Gerhardt, 2006). O tema das relações entre itinerários terapêuticos e usuários, demonstra a
capacidade em se mobilizar recursos e criar tecnologias de cuidado, mesmo diante de limites nas
ofertas assistenciais dos serviços.
1.5. A TECNOLOGIA DE LINHAS DE CUIDADO NO COTIDIANO DOS
SERVIÇOS: APROXIMAÇÕES COM AS EVIDÊNCIAS DO CAMPO EMPÍRICO
O estudo das políticas e práticas de cuidado no ciclo mãe-bebê e na saúde mental nas operadoras de
planos e seguros de saúde nas Regiões Sul e Norte demonstrou-se um desafio produtivo para a
análise da integralidade. A abordagem descritiva, que compõem a escolha de apresentação deste
relatório, apresenta parte importante dos resultados.
Um primeiro destaque que precisa ser registrado aqui é relativo à modalidade de produção em rede,
que, por um lado, gerou um enorme desafio para gerir as diferentes iniciativas, em particular as
dinâmicas próprias das diferentes instituições e os diferentes tempos dos sujeitos envolvidos,
principalmente considerando-se a distância física e a natureza das atividades cotidianas
desenvolvidas pelos mesmos. Por outro lado, agregou uma densidade e uma abrangência à pesquisa
que não teria sido possível apenas com o projeto de pesquisa em si, mesmo que tivesse previsão de
bolsas de pesquisa e outros dispositivos que permitem gerenciar com mais efetividade o trabalho de
pesquisa e que não estavam disponíveis no Edital ao qual o projeto foi apresentado. O grande
envolvimento de pesquisadores e auxiliares (mais de 60) e instituições (aproximadamente 20), assim
como o volume de trabalhos associados são indicadores da relevância da pesquisa para a produção e
22
consolidação do conhecimento nas duas Regiões. Outros indicadores da produção estão no segundo
capítulo do relatório, que apresenta questões associadas ao percurso metodológico e às realizações
da pesquisa.
Em relação aos conhecimentos produzidos, a descrição dos principais achados parece ser necessária.
Conforme se verifica no terceiro capítulo, a metodologia de análise das políticas e tecnologias de
cuidado na Saúde Suplementar incluiu a identificação e a caracterização das ofertas assistenciais
neste segmento. O recurso analítico da caracterização mais geral de cobertura assistencial,
capacidade física e tecnológica, composição da força de trabalho e distribuição física de recursos
assistenciais operou como uma série de marcadores avaliativos, considerados como elementos
interpretativos com grande capacidade de falseamento/adensamento de evidências, quando postos
a triangular com outras fontes de dados, em particular com os caos apresentados nos capítulos
subsequentes. A questão central do capítulo não foi a caracterização de séries, mas a produção de
recursos analíticos do contexto atual com capacidade de prospecção. No marco analítico da
pesquisa, a caracterização do cenário operou como dispositivo de triangulação para a construção de
conhecimentos úteis à compreensão das práticas tecnoassistenciais. Nesse contexto, o terceiro
capítulo traz uma síntese de dados de fontes secundárias e de entrevistas com dirigentes das
operadoras de planos e seguros privados de saúde, assim como prestadores de serviço das mesmas.
Os dados apresentados neste item têm, predominantemente, origem em fontes secundárias. Trata-
se do tratamento singular para a pesquisa de dados das grandes bases nacionais gerenciadas pelo
Departamento de Informação e Informática do SUS (Datasus), das bases de dados específicas da
saúde suplementar gerenciadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e de dados
censitários e pesquisas conduzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em
particular a Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS) e a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD). Os dados analisados demonstram uma mudança importante e progressiva na
estruturação dos sistemas de serviços de saúde, tanto público como privado, nos últimos anos, e que
coincide com a orientação das políticas nacionais, ao menos no sentido de uma grande ampliação e
diversificação da atenção ambulatorial, bem como a demanda social por esses serviços, em particular
quando se analisa o perfil das ações desenvolvidas.
Um primeiro grupo de constatações possíveis com os indicadores desta camada da análise mostra
uma evolução da rede física do sistema de serviços de saúde no Brasil, que se articula com um
crescimento nos atendimentos oferecidos à população, situação que é válida para os planos e
seguros privados de saúde, mas, particularmente, para o sistema público. Essa ampliação se articula
com uma diversificação de ofertas, também associadas predominantemente às políticas públicas,
situação que dialoga mais diretamente com o objeto de investigação específico da pesquisa. Como
resultado, uma ampliação importante no atendimento em serviços de saúde que operam em rede de
atenção. Essa característica, entre outros efeitos, permitiu compreender os itinerários híbridos
também como escolha dos beneficiários de planos e seguros privados para a satisfação das suas
necessidades de saúde.
Em relação à saúde suplementar, identificou-se nos últimos anos um aumento da cobertura, maior
nas Regiões com menores taxas, e em operadoras que melhor se adéquam à reorganização do setor
que vem sendo induzida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Especificamente em relação
às duas linhas de cuidado que estão sendo pesquisadas, há aumento da oferta de serviços e
diversificação de modalidades de atendimento no escopo das mudanças recentes. O contexto atual é
mais favorável nas regiões mais densamente povoadas e nos grandes municípios, com limites
23
importantes nos municípios de menor porte e regiões com maior rarefação populacional. A tensão
entre regulação econômica e regulação pela lógica da integralidade mostra-se, nos cenários em
análise, ainda favorável à primeira. O maior crescimento no segmento de planos e seguros privados
de saúde se dá nas operadoras de maior participação no mercado e em planos coletivos, com maior
estabilidade econômica. Tal cenário sugere a capacidade operacional das operadoras em avanços
com maior velocidade em direção às diretrizes do sistema de saúde brasileiro, em particular aos
conceitos de integralidade e equidade. As evidências de que os itinerários terapêuticos dos
beneficiários de planos e seguros privados de saúde incluem, de forma significativa, hibridizações
com os serviços públicos de saúde levanta preocupações de duas ordens. Uma delas em relação à
questão da equidade, uma vez que o acesso à assistência inicial é sabidamente mais fácil para os
beneficiários de planos e seguros privados de saúde. A segunda é em relação à qualidade do cuidado,
situação que as formulações acerca da integralidade do cuidado constituem um bom plano de
análise. A simples oferta de ações isoladas e procedimentos assistenciais não garante a integralidade
e parece oportuno que as políticas em relação à saúde suplementar e aos serviços públicos tenham
maior diálogo para uma regulação com base em políticas de cuidado integral, superando o informado
caráter dual do sistema de saúde, que parece extasiar a formulação de estratégias comuns de
regulação do cuidado.
Entrevistas com dirigentes de operadoras e prestadores de serviço auxiliaram na caracterização das
políticas de cuidado e das tendências em relação à integralidade, desse crescimento e diversificação
de ações em relação à saúde suplementar. Houve uma visível ampliação de ações de promoção e
proteção à saúde na oferta assistencial da saúde suplementar que, por si só, já refere um avanço em
direção à integralidade no contexto da assistência à saúde, uma vez que demonstra que as
operadoras estão incluindo nas suas ofertas assistenciais atividades coletivas de atenção a saúde das
populações seguradas. Por outro lado, quando se analisa com mais cuidado as características dessas
ofertas, percebe-se que as operadoras ainda desenvolvem ações voltadas predominantemente à
redução do consumo de procedimentos. É provável que, com esse objetivo, ou ao menos com uma
tensão configurada pela lógica do custo entre regulação econômica e o cuidado, as ações que
compõem propriamente a atividade de promoção da saúde por meio de grupos ainda tenha o
escopo predominante da educação para a saúde, objetivando centralmente disciplinar práticas e
modos de vida. Ou seja, que compartilhem com o modelo biomédico uma leitura da produção da
saúde que, ao fim e ao cabo, culpabilizem o indivíduo e o seu grupo social e fragmentem as ações de
enfrentamento. Essa diversificação, a serviço de uma lógica econômica de regulação pelas
operadoras, parece voltada à redução do acesso a procedimentos de maior densidade assistencial e
também, tendo em vista a restrita abrangência em termos de beneficiários atendidos, à divulgação
comercial de sua carteira de ofertas.
Há uma tensão visível entre a diversificação de ofertas assistenciais pelas operadoras de planos e
seguros privados de saúde e as lógicas de regulação do acesso e, ao que parece, essa iniciativa ainda
está em fase de absorção pelas mesmas. Portanto, se é verdade que compõem a agenda nas políticas
de atenção das operadoras, também parece ser verdade que é pelo fato de estar no foco da
regulamentação da ANS e, igualmente, na produção cultural contemporânea sobre a qualidade do
cuidado em saúde. Por outro lado, as limitações de oferta parecem ser explicadas pela condição
experimental das mesmas nas operadoras.
Entre as alternativas destacadas pela informação sobre diversificação das ofertas nos planos e
seguros privados de saúde, a assistência domiciliar foi o serviço mais freqüente, seguido de
assistência farmacêutica, transporte pré-hospitalar e o hospital dia para atividades de saúde mental.
Esses dados sinalizam para a ampliação de modalidades assistências aos beneficiários. Todas essas
ofertas não estão disponíveis para o conjunto dos beneficiários e dependem de acordo entre
24
operadoras e beneficiários e, sendo assim, é insuficiente para caracterizas as ofertas ampliadas e
diversificadas como linhas de cuidado.
Na análise das evidências produzidas com base nas falas das operadoras e dos prestadores de
serviço, é inevitável concluir que há um processo de reestruturação produtiva em curso, que é visível
nos territórios assistenciais estudados, mas ele parece estar sendo controlado pelas lógicas do
modelo biomédico hegemônico e do capital, com atenuamento importante da lógica da
integralidade. Dito de outro modo, a reestruturação produtiva em curso não parece ter capacidade
de mudar significativamente a modelagem tecnoassistencial vigente.
Quando se analisa a assistência farmacêutica, em que as ofertas na saúde suplementar restringem-se
de forma muito importante, essa conclusão é fortalecida. A política de cuidados operada aponta essa
área como um grande obstáculo à integralidade, seja pelas limitações financeiras de acesso a
medicamentos necessários para os beneficiários sob cuidados na saúde suplementar, seja pelo fato
de que têm um componente educativo que confirma o uso pouco racional de medicamentos pela
população em geral. Por outro lado, o acesso a medicamentos sem custos adicionais é um
argumento freqüente dos usuários da atenção no ciclo mãe-bebê e em saúde mental que operam
itinerários híbridos entre serviços da saúde suplementar e serviços do sistema público de saúde, seja
pelo acesso em si, seja por impossibilidade financeira de sua aquisição direta.
O quarto capítulo do relatório de pesquisa apresenta alguns estudos que compõem a base empírica
da pesquisa em relação às modelagens tecnoassistenciais no ciclo mãe-bebê na saúde suplementar,
que operam como “estudos multicêntricos integradores”. Eles confirmam e dão densidade aos
achados do capítulo anterior. Os estudos escolhidos para compor este capítulo aprofundam aspectos
destacados nas análises anteriores desta pesquisa e compõem o que se denominou de “casos
marcadores”, focando práticas e evidências do cotidiano. O primeiro desses estudos traz à análise a
atenção de pré-natal na gestação de alto risco e ajuda a compreender a relação entre o cuidado e a
racionalidade biomédica, em particular o uso de recursos tecnológicos de alta sofisticação e maior
custo. O segundo estudo aprofunda-se na análise do cuidado no momento do parto, tendo o
conceito de humanização das políticas de saúde nacionais como analisador. O terceiro estudo,
realizado com mães usuárias da UTI Neonatal em um serviço privado, também se utiliza das
diretrizes assistenciais e políticas em relação à amamentação e busca verificar sua implantação numa
situação assistencial extrema (a internação em UTI Neonatal) e busca evidências das orientações
recebidas no pré-natal, da articulação entre os serviços, das ofertas assistenciais disponibilizadas e de
práticas de integralidade nos fluxos assistenciais público e privado. As características semelhantes e
diferentes na assistência pública e privada suplementar, também nesse estudo, contribuem para a
compreensão das políticas de cuidado ofertadas e, em particular, da natureza das tecnologias que
operam no cuidado. O quarto estudo escolhido para compor o relatório analisa o vínculo entre
profissionais médicos pediatras e usuárias de serviços do subsistema público de serviços e de planos
e seguros privados, buscando compreender variáveis que facilitam e dificultam o estabelecimento de
interações mais fortes, marcadoras de integralidade do cuidado. No conjunto dos estudos que
compõem o quarto capítulo, identifica-se fortemente a diversidade assistencial ampliada e a
possibilidade de acesso no serviço público como motivação para a implementação de itinerários
terapêuticos híbridos entre os dois componentes do sistema de saúde por beneficiários da saúde
suplementar. A dimensão micropolítica do cuidado opera a gestão desses itinerários híbridos, em
particular a busca pelo próprio usuário, com base na capacidade individual de construir
possibilidades de acesso, ou a indicação de profissionais de saúde, inclusive quando vinculados aos
planos e seguros privados de saúde. Entretanto, no ciclo mãe-bebê, a possibilidade de acessar
25
serviços públicos pelos beneficiários de planos e seguros privados de saúde é percebida pelos
profissionais médicos como associada ao nível econômico e cultural diminuído dos usuários, ao
contrário do cuidado em saúde mental, onde a inexistência objetiva de ofertas assistenciais dilatadas
na saúde suplementar é uma explicação mais relevante, como se verificou nos estudos relatados no
quinto capítulo e é, inclusive, motivada pelos prestadores de serviço das operadoras.
No quinto capítulo do relatório descrevem-se alguns estudos que compuseram a abordagem de
estudos integradores em saúde mental, conforme previsto na metodologia descrita. No caso
específico da atenção em saúde mental, os estudos integradores tiveram importância ainda maior no
marco de análise, tendo em vista as transformações nas normas de atendimento emitidas pela
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para o atendimento específico, publicadas durante o
período da pesquisa e que incidiram fortemente sobre problemas que eram considerados centrais na
análise da integralidade do cuidado. Esse capítulo é composto por estudos que aprofundaram
aspectos específicos que emergiram durante as etapas iniciais da pesquisa com os quais se
pretendeu ampliar a compreensão das políticas e práticas de cuidado vigentes no cotidiano da saúde
suplementar. O primeiro desses estudos compõe esforço para compreender a configuração de um
sistema locorregional de saúde nos aspectos da gestão setorial e da rede de atenção à saúde mental.
Trata-se de uma abordagem centrada em entrevistas com usuários de serviços substitutivos de
atenção à saúde mental na rede pública e que detinham a condição concomitante de beneficiários de
planos e seguros privados de saúde, com o objetivo de compreender o mix público e privado no
itinerário terapêutico dos mesmos, ou seja, a natureza propriamente dita desse mix na construção
dos itinerários de cuidado. O segundo estudo foi desenvolvido para compreender a perspectiva dos
diferentes atores que estão vinculados a um sistema locorregional de atenção à saúde mental em
relação ao cuidado oferecido na rede assistencial. No caso deste estudo, interessou compreender a
mediação das perspectivas desses atores na concepção e na utilização de fluxos assistenciais da rede
de serviços de saúde mental. O terceiro estudo buscou compreender a construção de práticas de
cuidado em saúde mental em serviços operando em rede de cuidados e em serviços isolados. Esse
estudo permitiu avançar na caracterização da hipótese explicativa formulada no decorrer da
pesquisa de que a linha de cuidado em saúde mental se compõe de forma consistente a partir da
gestão do cuidado em serviços de saúde com capacidade de vínculo assistencial com o usuário,
independendo de sua vinculação aos planos e seguros privados.
Por fim, uma abordagem mais específica em relação à gestão do sistema de saúde e seus
componentes assistenciais. Buscou-se aprofundar junto a gestores de um sistema regional de saúde
a compreensão sobre o funcionamento e as políticas de regulação dos diferentes componentes desse
sistema, inclusive a saúde suplementar. A pesquisa, entre outros aspectos, mostrou um grande
déficit na descentralização das políticas de regulação do subsistema suplementar de saúde, que
ajuda a explicar a dualidade operacional que se verifica no cuidado nos dois componentes de serviço
do sistema de saúde brasileiro. E mostrou claramente a percepção de deficiências para a gestão
efetiva do sistema e a regulação da equidade e da integralidade nos sistemas locorregionais.
Os estudos apresentados, que compõem o marco de análise da pesquisa geral, ampliam a
compreensão e demonstram a capacidade da metodologia desenvolvida de ampliar a capacidade de
inteligência para os diferentes níveis de gestão do sistema de saúde. Em linhas gerais, os achados
permitem concluir que ainda é tênue a incorporação de modelagens tecnoassistencial voltadas à
integralidade, em particular as linhas de cuidado, e que as principais iniciativas existentes parecem
26
decorrer das políticas de indução da ANS. Os principais marcadores utilizados foram a ampliação e
diversificação de ofertas, como assistência farmacêutica, internação domiciliar e outras modalidades
assistenciais inovadoras, além da operação em rede de serviços e a atuação em equipes
multiprofissionais. Eles dão evidências de uma reestruturação produtiva em curso, com efeitos
visíveis na ampliação e diversificação de ofertas, mas com baixo efeito no desenho de processos de
trabalho ordenados com base em lógicas de cuidado integral. Por um lado, confirmam a importância
das políticas de indução desenvolvidas pela ANS para ampliação e diversificação das ofertas,
indicando seu aprofundamento. Por outro lado, alertam que as lógicas econômica e biomédica
tendem a seqüestrar esses processos de mudança, indicando também dispositivos de regulação
micropolítica, que incidam na educação permanente de profissionais, na mobilização de imaginários
sociais e na produção de capacidades inventivas nos serviços e redes da saúde suplementar.
O mix público e privado no itinerário assistencial mostrou-se, também, um marcador qualificado para
essa análise, na medida em que decorre, em grande medida, da busca de cuidado mais integral por
parte dos usuários e, em alguns casos, parece estimulado pelas operadoras e regulado por
prestadores, em particular no caso da saúde mental. A gestão do cuidado, nesses casos, parece estar
sob responsabilidade dos próprios beneficiários e seus familiares e reivindicar, para sua qualificação,
maior articulação entre as ofertas dos subsistemas suplementar e público de serviços de saúde.
Entre as recomendações da pesquisa, está o fortalecimento das iniciativas de indução da ANS, em
particular a ampliação do acesso a produtos e serviços e a diversificação de ofertas assistenciais.
Também está proposta a utilização de mecanismos de indução que operem mais efetivamente no
plano micropolítico, como iniciativas de educação permanente voltadas para a integralidade do
cuidado e o trabalho em equipe e a desconstrução de imaginários que localizam a prática liberal e a
gestão corporativa do cuidado como marcadores de qualidade do trabalho em saúde. A criação em
maior escala de serviços de atenção básica que se responsabilizem pela gestão do cuidado dos
beneficiários e pelo trânsito dos mesmos na rede assistencial de que necessitem também parece
indicada.
A pesquisa avança no sentido dos estudos mais clássicos na área, que apontam dicotomias
estruturantes nos dois componentes do sistema de saúde brasileiro, demonstrando que no plano das
práticas de cuidado, há hibridismos e reações cruzadas que requerem maior regulação do público,
inclusive em relação às ofertas do setor suplementar. Assim, parece indicada maior integração com
os dispositivos de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) no sentindo de construir a assistência em
planos e seguros privados de saúde de fato em ação suplementar, com capacidade de influenciar as
práticas de cuidado no interior do sistema nacional de saúde em direção à descentralização, à
integralidade e à participação da sociedade e dos indivíduos na sua organização. Em particular, essa
iniciativa parece ter potência de integralidade nas experiências locorregionais que já avançam nessa
direção, inclusive para a invenção de novas tecnologias de regulação do cuidado.
2. NOTAS METODOLÓGICAS
O projeto “Incorporação da tecnologia de linhas de cuidado na Saúde Suplementar: análise
multicêntrica de experiências no ciclo mãe-bebê e em saúde mental nas Regiões Norte e Sul do Brasil
a partir de marcadores selecionados” foi aprovado pelo Edital MCT‐CNPq/ANS n° 25/2007 na
modalidade de Auxílio à Pesquisa (Processo nº 402690/2007-9).
A pesquisa teve, como objetivo geral, “Identificar e analisar tecnologias de cuidado em saúde ao ciclo
mãe-bebê e em saúde mental na saúde suplementar nas Regiões Norte e Sul do Brasil, a partir da
tecnologia de linhas de cuidado” e, como objetivos específicos, os seguintes:
a) Identificar e analisar as ofertas de cuidado de diferentes operadoras no ciclo mãe-bebê e na
saúde mental, particularmente no que se refere à assistência farmacêutica, à atenção
domiciliar e à promoção e prevenção.
b) Analisar eventos significativos de políticas de cuidado nas trajetórias assistenciais concretas
de indivíduos vinculados a planos e seguros privados de saúde de diferentes modalidades em
ambas as regiões.
c) Caracterizar interfaces entre os componentes público e privado do sistema de saúde na
atenção ao ciclo mãe-bebê e na saúde mental.
d) Construir padrões de oferta e de itinerários em diferentes modalidades de planos e seguros e
nas diferentes regiões em estudo.
e) Desenvolver tecnologia de análise e acompanhamento da incorporação da tecnologia de
linhas de cuidado na Saúde Suplementar, incluindo indicadores de interface entre os
componentes público e privado do sistema de saúde.
Conforme previsto no projeto aprovado, a pesquisa teve desenho que incluiu estudos multicêntricos
realizados nas Regiões Norte e Sul do Brasil que, com diferentes abordagens metodológicas, tivessem
capacidade de responder ao objetivo geral do projeto. Foi desenvolvida com base no conceito de
rede científica, envolvendo atores em diferentes localizações institucionais nas duas Regiões em
estudo, e em outras regiões do país.
Os objetivos previstos inicialmente foram alcançados e estão descritos no presente relatório. As
metas de resultado também foram alcançadas e superadas, conforme se descreverá a seguir. Além
de suprir os objetivos e metas, a pesquisa demonstrou capacidade de avanço conceitual na análise
de linhas de cuidado e no estudo das práticas de cuidado na saúde suplementar, como já se
descreveu na introdução deste relatório. Além disso, resultados parciais foram disseminados em
diversas atividades científicas e da gestão do sistema de saúde, assim como na formação de
trabalhadores de saúde e com atuação nas políticas públicas.
28
2.1. COLETA E ANÁLISE DE DADOS
Foram coletados e analisados, dados referentes às ofertas assistenciais de diferentes operadoras
com cobertura assistencial expressiva nas duas regiões e às trajetórias assistenciais de usuários nas
duas áreas de ênfase, a atenção ao ciclo mãe-bebê a em saúde mental, buscando evidências da
construção da integralidade, especificamente quanto à construção de modelagens tecnoassistenciais,
configuradas como linhas de cuidado. A coleta e a análise dos dados utilizaram diferentes técnicas:
Dados secundários: foram utilizados os dados dos sistemas de informação em saúde, em
particular as bases de dados da Saúde Suplementar, disponibilizados pela ANS. Dados
epidemiológicos, demográficos, sócio-econômicos, de morbi-mortalidade, de capacidade
instalada, de produção e de cobertura assistencial dos serviços vinculados ao sistema público
e os dados de recursos físicos e financeiros foram obtidos junto às bases gerenciadas pelo
Datasus e demais órgãos do Ministério da Saúde. Os dados relativos à Saúde Suplementar, de
capacidade instalada, cobertura assistencial, oferta de produtos e serviços nas áreas de
ênfase selecionadas, operadoras e prestadores de serviço foram obtidos junto às bases de
dados públicos da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Também foram utilizadas as
bases de dados de cobertura assistencial, oferta de ações e serviços e regulação na saúde
suplementar produzidos em pesquisas anteriores nas duas regiões. Bases de dados de
pesquisas anteriores foram revisadas para nova leitura das informações coletadas,
utilizando-os para análises em profundidade sobre o cuidado nas duas situações
identificadas, em particular aqueles com capacidade de gerar evidências em relação ao
cuidado ao ciclo mãe-bebê e à saúde mental. Também foram utilizadas as bases de dados da
Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS) do IBGE, dos anos de 1980 a 2002 e, do anos
de 2005, inclusive com os microdados, que permitiram agregações inéditas para essa
pesquisa. Também do IBGE, dados da página eletrônica e microdados da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios – Suplemento Saúde, de 2008. As principais bases de dados
utilizadas foram as seguintes:
Sistema de Informações de Beneficiários (SIB): Sistema gerenciado pela ANS, a
partir de informações enviadas mensalmente pelas operadoras de planos
privados de saúde com dados de vínculos de beneficiários aos planos, incluindo a
movimentação de inclusão, alteração e cancelamento desses vínculos. Como a
unidade de coleta é o vínculo do beneficiário, aquele que possuir mais de um
plano constará no sistema tantas vezes quantos forem os vínculos que possuir
com planos privados de assistência à saúde.
Sistema de Cadastro de Operadoras (Cadop): Sistema de cadastramento e
controle dos registros das operadoras de planos privados de saúde, também
gerenciado pela ANS. É constituído por dados sobre as operadoras, tais como:
registro, CNPJ, endereço, natureza, classificação, modalidade, representantes,
administradores, composição de capital e tipos de taxas.
Sistema de Registro de Produtos (RPS): Sistema de cadastramento de registro
de planos privados de assistência à saúde gerenciado e mantido pela ANS, com
dados de todos os planos privados de saúde registrados na ANS, inclusive os
estabelecimentos de saúde que compõem suas redes credenciadas. A partir do
29
ano de 2007, o RPS contém dados do Sistema de Cadastro de Planos Antigos
(SCPA).
Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM): Gerenciado pelo
Departamento de Informática do SUS (DATASUS), é um sistema implantado em
1977 e entrou em vigor nacionalmente em 1979, permite a obtenção regular de
dados sobre mortalidade. O documento básico é a Declaração de Óbito (DO). A
codificação da causa básica do óbito depende do conhecimento de um
especialista e, para apoiar esse processo, foi desenvolvido o Sistema de Seleção
de Causa Básica (SCB).
Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc): também gerenciado pelo
Datasus, foi implantado oficialmente a partir de 1990 com o objetivo de coletar
dados sobre nascimentos, em todo território nacional, e fornecer dados sobre
natalidade para todos os níveis do sistema de Saúde. O documento de entrada
do sistema é a Declaração de Nascido Vivo (DN), padronizada em todo o país.
Para a pesquisa, além das bases nacionais e disponibilizadas pelo Datasus, foram
obtidas bases complementares junto às secretarias de saúde dos serviços
analisados com maior detalhamento.
Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (Cnes): sistema informatizado
para captação de informações de todos os estabelecimentos de Saúde existentes
no País, prestadores de serviços do SUS ou não, de todas as esferas e naturezas
de organização. É gerenciado pelo Datasus e formado por uma base cadastral
que permite operacionalizar os diversos sistemas de informações em saúde.
Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA/SUS): O SIA/SUS é um conjunto de
programas de processamento de dados, criados conforme as normas do
Ministério da Saúde, destinados a auxiliar a operacionalização, controle e gestão
do atendimento ambulatorial do SUS, realizado pelas secretarias municipais em
gestão Plena e Pab, e pelas secretarias estaduais. O documento básico é o
Boletim de Produção Ambulatorial (BPA), preenchido mensalmente pelas
unidades ambulatoriais, o qual contém dados sobre o número de atendimentos
realizados por tipo de procedimento e, dependendo deste, por grupo
populacional. É gerenciado pela Secretaria de Assistência à Saúde (SAS). A
atualização e disponibilização dos dados se dá mensalmente, após o
processamento do mês no Datasus.
Sistema de Informações Hospitalares (SIH SUS): formado por programas de
processamento de dados destinado a auxiliar a operacionalização, o controle e a
gestão do atendimento hospitalar do SUS realizados pelas secretarias municipais,
em gestão plena municipal, e pelas secretarias estaduais. É gerenciado pela
Secretaria de Atenção à Saúde (SAS), do Ministério da Saúde (MS) e suas
informações estão disponíveis na página do Datasus, cobrindo em torno de 70%
das internações realizadas no país. Seu documento básico é a Autorização de
Internação Hospitalar (AIH). Inicialmente produzido para controlar e fiscalizar as
internações hospitalares, é principalmente um instrumento para pagamentos.
Bases de dados do Censo Demográfico (1980, 1991 e 2000), da Contagem
Populacional (1996) e projeções intercensitárias (1981 a 2009): os dados dos
Censos Populacionais realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
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Estatística (IBGE) estão disponíveis no site do próprio instituto e também no site
do Datasus, que realiza projeções intercensitárias, disponibilizando dados
populacionais dos municípios brasileiros, por faixa etária e sexo, situação de
residência e outras variáveis. Os dados utilizados na pesquisa foram obtidos no
site do Datasus.
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): contem dados do
inquérito populacional realizado pelo IBGE, no sistema de pesquisas domiciliares,
que foi implantado progressivamente no Brasil a partir de 1967. Tem como
finalidade a produção de informações básicas para o estudo do desenvolvimento
socioeconômico do País. A PNAD é realizada anualmente, investigando, de forma
permanente, os temas habitação, rendimento e trabalho, associados a aspectos
demográfico e educacional e, com periodicidade variável, por meio de pesquisas
suplementares, outros assuntos de caráter demográfico, social e econômico.
Desde 1998, a cada cinco anos, é incluído o Suplemento de Saúde. O desenho
amostral desse inquérito prevê a representatividade dos dados para a população
brasileira e se constitui na mais ampla fonte de informação de saúde disponível
no país. O Suplemento tem dados de 1998, 2003 e 2008 e permite o
conhecimento de questões relativas à saúde pública, como morbidade, auto-
avaliação da saúde, limitação de atividades, cobertura dos planos de saúde,
gastos com saúde privada, procura por atendimento, uso de medicamentos e
exames complementares e acesso a serviço de saúde. Foram utilizados dados das
publicações do IBGE e microdados disponíveis em CD.
Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS): realizada regularmente pelo
IBGE, é uma pesquisa de caráter censitário que coleta e analisa variáveis de
capacidade instalada, força de trabalho e produção realizada por todos os
estabelecimentos de saúde existentes no País que prestam assistência à saúde
individual ou coletiva, públicos ou privados, com ou sem fins lucrativos, em
regime ambulatorial ou de internação, com o objetivo básico de revelar o perfil
da capacidade instalada e da oferta de serviços de saúde no Brasil. A série
histórica inclui dados do período de 1976 a 2005. Os dados de 1976 a 1999 foram
obtidos em publicações físicas de divulgação dos resultados editadas pelo IBGE.
Os dados de 2002 e 2005 foram obtidos junto à página eletrônica do IBGE. Parte
das análises realizadas foi feita com a base completa dos microdados da Pesquisa
AMS, obtida junto ao Instituto, que permitiram agregações inéditas para a
pesquisa.
o Os dados das bases secundárias foram utilizados principalmente para a camada inicial de
análise da pesquisa, que fez uma primeira aproximação com o cenário da saúde
suplementar nas duas Regiões e em estudos multicêntricos integradores em relação às
práticas de cuidado em serviços vinculados a planos e seguros privados de saúde e ao
subsistema público de serviços. Os resultados dessas análises estão distribuídos pelos
três últimos capítulos deste relatório.
Entrevistas: Foram coletados dados primários para a pesquisa, por meio de entrevistas com
informantes-chave nas regiões selecionadas. Os informantes foram selecionados por
diferentes critérios, que serão apresentados com mais detalhe nos itens relativos a cada uma
31
das abordagens e os instrumentos de coleta de dados estão em anexos deste relatório. As
entrevistas foram a principal estratégia para a caracterização geral do cuidado na saúde
suplementar nas duas Regiões, quando foram entrevistados dirigentes de operadoras,
prestadores de serviço hospitalares, médicos pediatras, obstetras e psiquiatras. Os
instrumentos de pesquisa foram desenvolvidos com base na experiência realizada na Região
Sudeste e publicados em livro pela ANS (2005), tendo sido realizadas pequenas adaptações,
para não perder a capacidade de comparação. O terceiro capítulo deste relatório apresenta
os principais resultados desta estratégia de coleta de dados. Para a caracterização do
cuidado nas linhas selecionadas, foram entrevistados usuários dos serviços da saúde
suplementar e públicos, quando o mix dos diferentes subsistemas de serviços se mostrou útil
para compreender a dinâmica do cuidado. Os estudos multicêntricos integradores, com
aprofundamento de questões em contextos locorregionais, também utilizaram diferentes
abordagens e incluíram entrevistas com atores de diferentes localizações no sistema de
saúde, tanto nos componentes público quanto privado. As entrevistas foram gravadas em
áudio e transcritas.
Questionários: em alguns estudos multicêntricos integradores foram aplicados questionários,
conforme se descreve no relatório, com caracterização mais detalhada do contexto em que
se desenvolveram.
Grupo Focal: Em algumas situações, como na abordagem de psicólogos na saúde
suplementar e em estudos multicêntricos integradores, a técnica de grupo focal foi utilizada
pelos pesquisadores, com questões norteadoras que aprofundaram e/ou complementaram
as análises da pesquisa.
Análise documental: Foram coletados e analisados documentos relativos à saúde
suplementar nas duas regiões e no país como um todo, em particular aqueles relativos à
regulação e a oferta assistencial na saúde suplementar.
Oficinas temáticas: para a complementação de dados e, principalmente, para a análise de
dados, foi utilizado o recurso de oficinas temáticas, inclusive com convidados externos à rede
científica que operacionalizou a pesquisa.
Registros de observação: As diversas atividades dos pesquisadores foram acompanhadas
pelo registro de impressões e observações em cadernos de campo. Algumas dessas
atividades também foram registradas em fotografias. As atividades coletivas (oficinas,
reuniões técnicas e seminários de pesquisa) foram registradas em áudio, vídeo e/ou imagens
fotográficas.
As fases de coleta e análise dos dados foram realizadas por etapas ao longo do projeto, tendo
direcionado as etapas subseqüentes a partir das evidências identificadas em cada uma delas. A
distância e o custo dos deslocamentos entre os pesquisadores das diferentes regiões e instituições
impediu maior abrangência nas oficinas entre pesquisadores, sendo que foi utilizado o recurso de
reuniões técnicas entre coordenadores de diferentes iniciativas da pesquisa para a complementação
das expectativas de cada etapa. Também foram utilizados recursos de comunicação e informação
para reuniões virtuais e discussões temáticas. O relatório apresenta a descrição sumária das
questões relevantes associadas a cada etapa prevista inicialmente no projeto de pesquisa.
1ª Etapa: análise geral do cenário:
32
Constituiu-se pela análise exploratória das informações e dados secundários sobre os
sistemas de saúde das duas regiões e sobre o mercado da Saúde Suplementar, sobre as
políticas de cuidado no ciclo mãe-bebê e na saúde mental, pela análise exploratória dos
dados de pesquisas anteriores, pela análise documental e pela primeira etapa de revisão da
bibliografia.
Nesta etapa da pesquisa foram analisados os sistemas de informação disponíveis
e desenvolvidas diversas técnicas de análise e de associação entre os dados
obtidos. Os principais mecanismos de associação foram o recorte territorial dos
dados e a agregação pelas principais características do cuidado oferecido pelas
operadoras, constituindo-se planos de análise em cada Região, entre as duas
Regiões em estudo e com as demais Regiões e o país como um todo. Foram
coletados e analisados dados de cobertura assistencial, relevância das
operadoras, perfil de morbi-mortalidade e utilização de serviços nos
componentes público e privado. Nesta etapa foram acessados microdados sobre
as operadoras e beneficiários (dados não identificados) da saúde suplementar
nas duas regiões em análise, fornecidos pela ANS, com os quais foram planejadas
as entrevistas que compõem a segunda etapa da pesquisa. As operadoras foram
classificadas por abrangência regional, cobertura populacional e natureza. Para a
abordagem das linhas de cuidado, foram definidas estratégias complementares
nas duas Regiões, buscando mobilizar estudos específicos, por meio da inserção
em atividades de ensino, seja em trabalhos de conclusão de curso ou em
dissertações.
o Um problema relevante desta etapa da pesquisa foi a inexistência de informações
confiáveis de caracterização da rede assistencial e de utilização dos serviços da saúde
suplementar nas bases de dados consultadas, assim como a exigüidade dos dados de
morbi-mortalidade. O problema foi parcialmente resolvido com o acesso aos microdados
da Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS) do IBGE realizada no ano de 2005, já
no segundo semestre de 2008, e do Suplemento Saúde da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios de 2003 e, posteriormente, complementados com dados de 2008.
Até o acesso aos microdados, essas variáveis foram sendo analisadas com os dados das
tabelas publicadas pelo IBGE, bem como em dados de outros estudos localizados.
o Os dados coletados foram agregados em gráficos, tabelas e mapas, sendo comparados
internamente a cada região, entre as regiões em estudo, com cada região em estudo e a
soma das demais regiões do país e com dados médios do país como um todo. Os estudos
integradores, na medida em que foram sendo realizados, somaram dados e evidências
para a análise mais geral.
o Durante a etapa, foi utilizada uma tecnologia de análise da situação da saúde
suplementar, com a agregação de municípios segundo o porte populacional. Essa
tecnologia já havia sido utilizada anteriormente por pesquisadores da rede científica com
outras bases de dados (OLIVEIRA, 2006; PINTO, 2006; PINTO & SORANS, 2008) e foi
adaptada para a utilização com a base da Pesquisa AMS. Aplicada nos microdados dessa
pesquisa, constituiu-se em uso inédito para análise de capacidade instalada de serviços
33
(estabelecimentos, leitos e equipamentos), distribuição de trabalhadores da saúde e uso
de serviços de saúde. Também foi desenvolvida uma metodologia de integração de
dados com base nas informações tratadas da PNAD. Com base na experiência adquirida
na pesquisa anterior, foram sendo realizados e disseminados estudos de caracterização
do cuidado oferecido e construídas abordagens de análise das linhas de cuidado.
o Para os dados demográficos e epidemiológicos, também foram utilizados indicadores
com tecnologias já desenvolvidas pelo Datasus e pela Rede Interagencial de Informações
para a Saúde (RIPSA), como as publicações: Cadernos de Informações de Saúde e
Indicadores e Dados Básicos (IDB).
o O marco analítico construído na pesquisa anterior, denominado “análise de cenários da
saúde suplementar” (Ferla & Cols., 2009a), foi utilizado como metodologia de análise
nesta pesquisa, auxiliando na associação entre dados de diferentes fontes e informações
sobre o cuidado no ciclo mãe-bebê e em saúde mental.
o Esta etapa foi finalizada com uma oficina de validação das análises realizadas e do marco
operacional e analítico proposto, realizada em Belém do Pará. O marco analítico foi
iniciado na oficina e complementado posteriormente. Para o desenvolvimento desta
etapa também foram realizadas reuniões técnicas dos pesquisadores responsáveis pelas
diferentes bases operacionais. Na medida em que novos dados foram sendo agregados,
as reuniões da rede científica consolidaram as análises, inclusive com a revisão dos dados
já trabalhados.
o Para este relatório, os dados utilizados foram atualizados com as últimas versões
disponíveis das bases ou com as versões mais adequadas aos indicadores e dados
disponíveis.
2ª Etapa: análise em profundidade da realidade da oferta de ações e serviços da Saúde Suplementar
e do componente público do sistema de saúde nas duas linhas de cuidado selecionadas nas duas
regiões:
Constituiu-se por estudos em profundidade dos mecanismos de macro e microrregulação nas
duas linhas de cuidado selecionadas praticados pelas operadoras e pelos prestadores,
selecionados intencionalmente de acordo com o volume de beneficiários e atendimentos,
com a modalidade e natureza de operadoras e serviços e com a oferta de procedimentos em
linhas de cuidado a serem definidas na primeira etapa. Foram entrevistados dirigentes de 20
operadoras, 17 prestadores hospitalares, 17 obstetras, 19 pediatras e 12 psiquiatras. O ponto
de saturação foi obtido antes da finalização das entrevistas. As entrevistas com usuários dos
serviços inicialmente envolveram 20 usuários em cada uma das duas linhas de cuidado,
divididos entre as duas bases de pesquisa, procurando contemplar a maior diversidade de
situações de demanda. Uma abordagem complementar, com profissionais psicólogos, foi
realizada em 2009, após a divulgação das informações de mudanças na cobertura assistencial
na saúde mental, envolvendo 18 profissionais. Essas abordagens de análise foram
complementadas com os estudos integrados.
34
Também incluiu a realização de estudos integradores em diferentes cenários, que ampliaram
significativamente o envolvimento de sujeitos da pesquisa. O caráter multicêntrico
integrador foi conferido pela capacidade de diálogo dos sub-projetos com as abordagens
aplicadas na pesquisa geral e pela capacidade de aprofundar questões mais pontuais do
estudo que está sendo relatado. Os dados de participação serão descritos no contexto de
cada um dos estudos escolhidos para ilustrar as abordagens de análise.
A fase de análise dos dados das entrevistas constituiu-se na aplicação de técnicas de
categorização empírica, organização das categorias construídas, validação por contato pelos
diferentes participantes do projeto, pela triangulação entre diferentes métodos e fontes de
coleta e pela comparação com os cenários em que se desenvolveu o projeto.
o O tratamento dos dados de análise comuns às duas regiões consistiu na
transcrição das entrevistas e digitação no sistema web desenvolvido para isso, a
agregação dos dados em eixos de análise: diversificação das ofertas assistenciais,
estratégias de regulação, uso de sistemas de informação pelas operadoras,
cuidado ao beneficiário, informações ao beneficiário, mecanismos de avaliação
da qualidade da assistência e percepção sobre mudanças na regulamentação do
setor.
o Os dados coletados foram agregados, por similaridade temática, em eixos de
análise e, para a primeira camada de análise, foram construídos gráficos e
tabelas para facilitar sua visualização. A análise descritiva procurou triangular os
dados obtidos com evidências da análise dos cenários e com referências da
bibliografia, conforme o modelo proposto no projeto.
Para facilitar a sistematização e a análise dos dados obtidos por meio dos questionários, foi
desenvolvida e utilizada uma aplicação com suporte na web (SIQUEST 2007), disponibilizada
para todas as bases da pesquisa. Essa aplicação desenvolvida para que fossem alimentados
os questionários e realizadas as análises preliminares dos dados através de relatórios
previamente definidos. Com a identificação de sua utilidade na organização da produção
sobre saúde suplementar pela rede científica que envolveu-se na pesquisa, foi incorporada
como uma estação especializada no Observatório de Tecnologias de Informação e
Comunicação em Sistemas e Serviços de Saúde (Otics)7, que passará a disseminar os
conhecimentos produzidos e dar suporte tecnológico às atividades da rede.
3ª Etapa: finalização da etapa de campo e sistematização dos achados da pesquisa
Esta etapa foi utilizada para a conclusão das atividades de campo e integração dos
achados desta etapa. Além disso, constituiu-se pela atualização dos dados analisados nas
7 O Observatório tem sítio na internet (www.otics.org) e usa tecnologias de informação e comunicação para
suporte à gestão e ao ensino na saúde, com disseminação de informações e conhecimentos e o suporte à
pesquisa e ao ensino, por meio da oferta de tecnologias e metodologias de análise e intercomunicabilidade.
35
etapas anteriores, por decorrência da divulgação de dados secundários de pesquisa do
IBGE de grande relevância para as análises feitas nesta pesquisa.
A análise dos dados constituiu-se pela aplicação de técnicas de categorização empírica,
organização das categorias construídas, validação por contato pelos diferentes
participantes do projeto, pela triangulação entre diferentes métodos e fontes de coleta e
pela comparação com os cenários em que se desenvolve o projeto. Conforme o previsto,
foi operada em rede científica.
É relevante assinalar que esta etapa estava prevista para o período do 18º ao 21º meses,
no cronograma apresentado ao Edital. Entretanto, com o prazo de vigência formal
menor, essa etapa sofreu percalços de reprogramação. Este fato associou-se à mudança
de vínculo do Coordenador do Projeto, que, durante a finalização do mesmo,
desvinculou-se da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e vinculou-se à Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com mudanças significativas na lógica de apoio à
pesquisa, mas com um período de ajustes que precisou ser absorvido pelo planejamento
desta pesquisa.
Esta etapa será finalizada com uma oficina entre os pesquisadores das duas Regiões para
validação dos achados produzidos e para o planejamento do relatório final e das
publicações, que foi realizada em duas etapas: em Porto Alegre e Belém.
4ª Etapa: preparação das publicações e do relatório final da pesquisa
Finalização do relatório final da pesquisa e dos materiais para publicação.
2.2. ASPECTOS ÉTICOS
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Caxias do Sul
(CEP/UCS), que atuou como o primeiro centro de pesquisa por meio do Parecer CEP/UCS nº
053/2008, de 29 de maio de 2008. O Parecer de aprovação foi enviado aos demais centros da
pesquisa. Todos os participantes firmaram o respectivo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os resultados divulgados mantêm o sigilo acerca da identificação dos sujeitos da pesquisa e das
entidades às quais estavam vinculados por ocasião da realização do projeto.
36
2.3. PRINCIPAIS RESULTADOS DA PESQUISA
O projeto previa resultados em dois âmbitos: o avanço no conhecimento sobre a temática da
incorporação de tecnologias de cuidado embasadas na integralidade na saúde suplementar e o
fortalecimento da rede de pesquisas sobre esse tema nas duas Regiões.
Em relação ao primeiro aspecto, ele está bem ilustrado pelo próprio relatório, que demonstra uma
ampliação da compreensão das linhas de cuidado e sua incorporação na saúde suplementar e da
capacidade de intervenção no âmbito da regulação em saúde suplementar nas Regiões Norte e Sul.
Além da indicação do próprio relatório, a produção informada pelos pesquisadores participantes do
projeto nos seus respectivos currículos demonstra o volume de produção desencadeada pelo projeto
no decorrer do seu período de vigência e que, por certo, permanecerão gerando efeitos na rede de
pesquisas. Em relação a esse aspecto é preciso informar que o período de maturação de parte dos
resultados da pesquisa, quando envolvem produções de mestrado e doutorado, é maior do que o
período previsto para a realização da mesma. Portanto, a disseminação científica, iniciada com a
finalização do relatório, se seguirá no decorrer dos próximos meses. De toda forma, foram concluídos
na rede científica e sob orientação dos pesquisadores principais, durante o período da pesquisa e
com temáticas associadas à mesma: 18 Trabalhos de Conclusão de Curso de Graduação, 23 Trabalhos
de Conclusão de Curso de Especialização, 04 dissertações de mestrado e 02 teses de doutorado.
Estão em andamento mais 04 dissertações de mestrado.
Considerando apenas os dados contidos na base Lattes do coordenador do projeto, em que esteve
diretamente envolvido, vê-se que estão associados ao projeto: 06 artigos publicados em periódicos,
08 capítulos de livros, 22 trabalhos apresentados em congressos nacionais e internacionais com
resumos publicados, além de organização de eventos, outras produções, orientações de estudantes
de graduação e pós-graduação. Em relação à organização de eventos de grande relevância, inclui-se
o 8º e o 9º Congresso da Rede Unida, o II Fórum Latino-Americano de Educação na Saúde, o I Fórum
Latino-Americano de Gestores da Atenção Básica/Primária em Saúde e o I Fórum Latino-Americano
de Participação Social em Saúde e Políticas Públicas. Nesses eventos, os temas da integralidade e
linhas de cuidado na Saúde Suplementar, das relações público e privado na saúde e, especificamente,
resultados parciais da pesquisa foram abordados.
Também compõe os resultados do projeto a atuação em rede científica de atores e instituições das
Regiões Norte e Sul, que se ampliou e fortaleceu com as atividades desenvolvidas. O número de
pesquisadores e apoiadores que compõe a pesquisa, com diversidade de formações e localizações
institucionais, é bem ilustrativo dessa abrangência. A atuação do coordenador do projeto como
professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Social da UFPA é
indicativa desse fortalecimento.
O desenvolvimento da metodologia de análise de cenários da saúde suplementar, conforme descrita
no projeto, é, igualmente, um resultado importante. É necessário ressaltar também a
permeabilidade da pesquisa em atividades de ensino, em particular de disciplinas ofertadas nos
diversos cursos de graduação e pós-graduação em que estão envolvidos os pesquisadores.
37
Por fim, é preciso registrar que, durante a realização da fase final do projeto, o coordenador
desvinculou-se da universidade de origem (UCS) e se vinculou à UFRGS, mais precisamente no Curso
de Bacharelado em Saúde Coletiva, coordenando uma Unidade de Produção Pedagógica que tem,
como campo temático, a organização dos sistemas de saúde e, em especial, no quarto semestre do
curso, o componente suplementar. A potência dos conhecimentos produzidos não somente se
amplia e se fortalece, mas adquire nova potência para a formação de profissionais.
2.4. EQUIPE DA PESQUISA
o Coordenador Geral:
o Alcindo Antônio Ferla: médico; doutor em educação e saúde; professor adjunto da
UFRGS no Curso de Bacharelado em Saúde Coletiva e professor colaborador no
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Social da UFPA.
o Vice-Coordenador Geral:
o Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira: Psicólogo. Doutor em Saúde Pública, Professor
Adjunto da Universidade Federal do Pará. Durante o período da pesquisa foi Diretor
dos Hospitais Betina Ferro e Barros Barreto, ambos da UFPA, assim como Secretário
Adjunto da Secretaria de Estado da Saúde.
o Pesquisadores I:
o Aline Triches Dani: Enfermeira, atuou inicialmente como auxiliar de pesquisa na base
UCS e posteriormente como pesquisadora associada na base GHC.
o Álvaro Fraga Moreira Benevenuto Jr.: Jornalista; Mestre em Comunicação; Doutor
em Ciências da Comunicação; Professor Adjunto do Centro de Ciências Humanas e
Comunicação da Universidade de Caxias do Sul. Atuou como coordenador da análise
da mídia.
o Amanda Pereira de Carvalho Cruz: psicóloga, mestranda em Psicologia na UFPA.
o Ana de Fátima Moraes Brito: Assistente Social, Sanitarista, pesquisadora associada da
base norte da pesquisa (UFPA) e Secretária Executiva do Projeto.
o Andrea Cristina Lovatto: psicóloga, mestranda em Psicologia na UFPA.
o Arianne Carolina de Melo Araújo: psicóloga, mestranda em Psicologia na UFPA.
o Diana Coeli Paes de Moraes: pedagoga, especialista em gestão do trabalho,
mestranda em Psicologia na UFPA.
o Dora Lúcia Leidens Corrêa de Oliveira: enfermeira, doutora em educação,
pesquisadora da base UFRGS.
38
o Fernanda Peixoto Cordova: enfermeira, mestre em enfermagem (UFRGS), realizou
pesquisa empírica na base da pesquisa UFRGS.
o Janice Dornelles de Castro: Economista, Doutora em Saúde Coletiva, Professora
Adjunta (UFRGS).
o Josie Rodrigues Vieira: Psicóloga, Mestranda em Psicologia Social (UFPA). Durante a
fase inicial da pesquisa atuou como bolsista de IC no projeto.
o Leyla Maria Portela Coimbra Thomé: Jornalista, Mestre em Comunicação, Professora
da Universidade de Caxias do Sul.
o Lillian Daisy Gonçalves Wolff: Enfermeira, especialista em administração e gerência
de serviços de saúde, doutora em engenharia de produção, professora da
Universidade Federal do Paraná.
o Lisiane Bôer Possa: fisioterapeuta, especialista em saúde pública, mestre em
sociologia, professora e assessora no Grupo Hospitalar Conceição (GHC).
Coordenadora da base GHC da pesquisa.
o Luciane Silva Ramos: enfermeira, sanitarista, mestre em enfermagem, pesquisadora
colaboradora da UFSM e atua na Secretaria Municipal de Saúde de Santa Maria.
o Luiz Felipe Pinto: Estatístico, Doutor em Saúde Pública, Professor Adjunto na UFRGS.
o Marcellus Antonio Motta Prado de Negreiros: Médico, Mestre em Saúde Coletiva,
Professora da UFAC.
o Margarete Isoton De David: Enfermeira, Especialista em Saúde Individual e Coletiva e
em Gestão de Serviços de Saúde, Mestre em Saúde Coletiva, Professora do Centro de
Ciências Biológicas e da Saúde da UCS.
o Mariana Bertol Leal: Administradora de Sistemas e Serviços de Saúde, Mestre em
Saúde Coletiva. Pesquisadora associada à base GHC.
o Marta Fert: Enfermeira, Mestre em Saúde Coletiva, Coordenadora de Ensino do GHC.
o Marta Vaccari Batista: Enfermeira, Mestre em Epidemiologia, Professora Adjunta do
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade de Caxias do Sul.
o Nilva Lúcia Rech Stédile: Enfermeira, Doutora em Saúde Coletiva, Professora Titular
da Universidade de Caxias do Sul, coordenadora da base UCS do projeto de pesquisa.
o Paulo Félix de Almeida Penna: Farmacêutico-Bioquímico, atuando na área de saúde
suplementar, pesquisador associado à base UFPA.
o Ricardo Burg Ceccim: Enfermeiro, Doutor em Psicologia Clínica, Professor do
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS, Coordenador do
EducaSaúde/UFRGS.
o Rodrigo Pinheiro Silveira: Médico, Especialista em Medicina Geral e Comunitária,
Mestre em Medicina. Professor da Universidade Federal do Acre (UFAC).
o Sandro Sedrez dos Reis: Médico, com atuação na saúde suplementar, coordenador
da base da pesquisa em Santa Catarina.
39
o Sueli Goi Barrios: enfermeira, sanitarista, mestre em enfermagem, pesquisadora
colaboradora na UFSM e na SES/RS.
o Vanderléia Laodete Pulga Daron: filósofa, doutoranda em Educação (UFRGS) e
professora na Escola GHC.
o Pesquisadores II:
o Aline Kerber: socióloga, desenvolveu estudo que compõem a base empírica da
pesquisa na UFRGS.
o Andrei Garziera Valério: Médico, autou como auxiliar de pesquisa na base UCS.
o Angela Flach: enfermeira, Secretaria Municipal de Saúde de Santa Maria.
o Ariane Caroline Lazzari: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Camila Catarina Vaccari: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Cláudio Cezar Monteiro dos Santos Júnior: Programador, Coordenador do serviço de
informática do Hospital Barros Barreto (UFPA), pesquisador associado da base norte
da pesquisa.
o Diego Stuani: enfermeiro, atuou na Base UCS do projeto, desenvolveu estudo
multicêntrico.
o Diogo Cordeiro: Enfermeiro. Durante a pesquisa atuou como bolsista voluntário de
IC. Atuou na base UCS da pesquisa.
o Elisete Mariane Neumann: Enfermeira, Especialista em Saúde Pública e Antropologia
Social, Mestre em Saúde Pública, Professora do Centro de Ciências Biológicas e da
Saúde da Universidade de Caxias do Sul.
o Elizabete Bertele: Assistente Social, Especialista em Sociologia do Trabalho e Mestre
em Serviço Social, Professora dos Centros de Ciências Biológicas e da Saúde e de
Ciências Humanas e Comunicação da UCS.
o Ellen Regina Pedroso: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Flávia Raquel Rossi: Enfermeira; Especialista em Saúde Pública, Administração
Hospitalar e Administração de Serviços de Saúde; Mestre em Saúde Pública;
Professora do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade de Caxias do
Sul.
o Geovanne Garbin: Enfermeira, estudante de graduação no período da pesquisa.
Atuou como auxiliar de pesquisa e pesquisadora associada na base UCS.
o Gizele Antoniazzi. Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
40
o Ismaelino Souto Aragão Júnior: Programador, Coordenador do Serviço de Informática
do Hospital Barros Barreto (UFPA), pesquisador associado da base norte da pesquisa.
o Juliana Loffego Encarnação: Mestrado em Ciências da Informação. Professora do
Departamento de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Acre
(UFAC).
o Juliana Rodrigues: Enfermeira, estudante de graduação no período da pesquisa.
Atuou como auxiliar de pesquisa e pesquisadora associada na base UCS.
o Kátia Mendanha: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
o Leonardo Vieira Targa: Médico, Especialista em Medicina Geral e Comunitária,
Professor do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade de Caxias do
Sul.
o Lisiane Besutti: Assistente Social, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial na
base UCS.
o Loriane Gava: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
o Márcia Maria Schiavi Provin: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase
inicial e como pesquisadora associada à base UCS.
o Maria Berra de Mello: Enfermeira, Professora da UCS.
o Maria Ignez Estades Bertelli: Médica, Especialista em Terapia Intensiva e
Epidemiologia, Professora do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da
Universidade de Caxias do Sul.
o Maria Salete Bertotto: Enfermeira, Professora da UCS.
o Maurício Moraes: Médico, Especialista em Medicina Geral e Comunitária, Professor
da Universidade Católica de Pelotas e Universidade Federal de Pelotas, Mestrando
em Educação e Saúde.
o Naiane Melissa Dartora Santos: Médica, Especialista em Medicina Geral e
Comunitária e em Medicina de Família, Mestre em Educação e Saúde, Professora da
Universidade de Caxias do Sul.
o Osvaldo de Souza Leal Jr.: Médico, Mestre em Medicina, Professor da Universidade
Federal do Acre (UFAC).
o Tanara Leonardelli Michielin: Enfermeira, Mestre em Enfermagem, Professora do
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade de Caxias do Sul.
o Estudantes em iniciação científica:
o Aline Triches Dani: Enfermeira, atuou inicialmente como auxiliar de pesquisa na base
UCS e posteriormente como pesquisadora associada na base GHC.
41
o Andrei Garziera Valério: Médico, autou como auxiliar de IC no projeto de pesquisa na
base UCS.
o Ariane Caroline Lazzari: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Camila Catarina Vaccari: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Daniela Trevisan: estudante de graduação em fisioterapia na UCS. Bolsista de IC na
base UCS.
o Diogo Cordeiro: Enfermeiro. Durante a pesquisa atuou como auxiliar de pesquisa IC.
Desenvolveu sub-projeto com imaginários na graduação. Atuou na base UCS da
pesquisa.
o Eliana de Jesus da Costa de Souza: estudante de psicologia (UFPA) e bolsista de IC no
projeto.
o Ellen Regina Pedroso: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e
como pesquisadora associada à base UCS.
o Gizele Antoniazzi. Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
o Guilherme Souza Müller: estudante do Bacharelado em Saúde Coletiva da UFRGS,
atuou como bolsista no projeto.
o Hérico Rocha Craveiro: estudante de medicina (UFAC) e bolsista de IC no projeto.
o Janete Reos: cientista social, doutoranda em Sociologia (UFRGS).
o Joice Stopassoli: estudante da UFSC, atuou como auxiliar de IC na pesquisa.
o Josie Rodrigues Vieira: Psicóloga, Mestranda em Psicologia Social (UFPA). Durante a
fase inicial da pesquisa atuou como bolsista de IC no projeto.
o Juliana Rodrigues: Enfermeira, estudante de graduação no período da pesquisa.
Atuou como auxiliar de pesquisa e pesquisadora associada na base UCS.
o Kátia Mendanha: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
o Lisiane Besutti: Assistente Social, atuou como auxiliar pesquisa na fase inicial na base
UCS.
o Loriane Gava: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase inicial e como
pesquisadora associada à base UCS.
o Marcela Acioli de Nazaré: estudante de psicologia (UFPA) e bolsista de IC no projeto.
o Marcela Jansen da Silva: estudante de comunicação (UFAC) e bolsista de IC no
projeto.
o Márcia Maria Schiavi Provin: Enfermeira, atuou como auxiliar de pesquisa na fase
inicial e como pesquisadora associada à base UCS.
42
o Raissa Barbieri Ballejo Canto: estudante do Bacharelado em Saúde Coletiva da
UFRGS, atuou como bolsista no projeto.
o Roberto Anderson Dornelles: estudante de comunicação (UCS), auxiliar de pesquisa
na base UCS.
o Vinícius Lemos Postali: estudante de farmácia (UCS), atuou como auxiliar de pesquisa
na base UCS.
o Vinícius Moreira Lagoas: estudante de medicina (UFAC) e bolsista de IC no projeto.
o Apoio Técnico:
o Cristiane Alves Montenegro.
o Ana de Fátima Moraes Brito.
o Renan Lobo.
o Marília Gonçalves Wolff.
o Daniel Klug.
o Consultoria:
o O desenvolvimento do projeto contou com consultoria de Madel Luz, Emerson
Merhy, Laura Feuerwerker, Giovanni Aciole, Soraya Côrtes e Maria de Lourdes
Drachler, a quem agradecemos.
3. LINHAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL E NO CICLO MÃE-BEBÊ:
ABORDAGENS NA SAÚDE SUPLEMENTAR
Este capítulo do relatório de pesquisa apresenta uma análise mais geral e comparada da atenção à
saúde oferecida no ciclo mãe-bebê e em saúde mental nas duas regiões em estudo. Ele compõe a
primeira aproximação analítica da incorporação da tecnologia de linhas de cuidado na saúde
suplementar nas regiões Norte e Sul do Brasil. Como se informou anteriormente, o marco analítico é
composto pelos estudos de integralidade, com ênfase na dimensão micropolítica do trabalho, de
onde se formula o conceito de linhas de cuidado.
O capítulo está composto por quatro partes. A primeira delas recupera parcialmente a análise que
compõe a metodologia adotada em estudo anterior sobre os cenários da saúde suplementar,
buscando uma contextualização para a abordagem tecnoassistencial das linhas de cuidado. A
caracterização do cenário opera como dispositivo de triangulação para a construção de
conhecimentos úteis à compreensão das práticas tecnoassistenciais na Saúde Suplementar. Mais do
que técnica de pesquisa, o uso de dados de diferentes origens para a análise da saúde suplementar
constitui tecnologia de caracterização do contexto, que supre a inexistência de dados confiáveis e
suficientes sobre diversos aspectos relevantes para a aproximação com as modelagens
tecnoassistenciais vigentes no cotidiano do sistema de serviços de saúde.
Uma segunda parte busca caracterizar o cenário da atenção à saúde nas duas regiões, com dados
secundários, particularizando a análise em situações com maior capacidade de descrever as práticas
de cuidado no ciclo mãe-bebê e em saúde mental e suas modelagens tecnoassistenciais.
Na terceira parte do capítulo, são analisados indicadores que caracterizam demandas aos sistemas
de serviços das duas Regiões, em particular a auto-avaliação da situação de saúde, o tipo de
atendimento utilizado e a avaliação dos atendimentos recebidos, tanto no componente público
quanto na saúde suplementar.
Por fim, estão sistematizadas e analisadas informações coletadas por meio de entrevistas com
operadoras e prestadores de serviço que atuam na saúde suplementar nas linhas de cuidado em
estudo.
Esses recortes se justificam não apenas por uma caracterização geral dos cenários da saúde
suplementar nas duas Regiões, mas, particularmente, auxiliam na caracterização das hibridizações
entre serviços públicos e privados no itinerário assistencial dos beneficiários dos dois segmentos
assistenciais em estudo, uma vez que a relevância dessa característica se mostrou maior do que o
esperado.
44
3.1. CAPACIDADE INSTALADA E QUESTÕES RELATIVAS AO ACESSO AO SISTEMA DE SERVIÇOS DE SAÚDE
Conforme já proposto em iniciativas anteriores (Ferla & Cols., 2009a), a metodologia de análise das
políticas e tecnologias de cuidado na Saúde Suplementar inclui a identificação e a caracterização das
ofertas assistenciais. Embora não se trate de uma pesquisa de cunho eminentemente quantitativo, o
recurso analítico da caracterização mais geral de cobertura assistencial, capacidade física e
tecnológica, composição da força de trabalho e distribuição física de recursos assistenciais opera
como uma série de marcadores avaliativos, considerados como elementos interpretativos com
grande capacidade de falseamento/adensamento de evidências, quando postos a triangular com
outras fontes de dados. A questão central aqui não é a caracterização de séries, mas a produção de
recursos analíticos do contexto atual com capacidade de prospecção. No marco analítico da
pesquisa, a caracterização do cenário opera como dispositivo de triangulação para a construção de
conhecimentos úteis para a compreensão das práticas tecnoassistenciais na Saúde Suplementar.
Também é preciso destacar que a metodologia prevê a associação de dados de diferentes naturezas
por meio da combinação locorregional dos mesmos, conforme já descrito em outras oportunidades
(Pinto, 2006; Ferla & Cols., 2009a, 2009b). Tal recurso metodológico supre lacuna importante,
principalmente no caso da Saúde Suplementar, de inexistência de dados para aspectos relevantes do
estudo desse subsistema de serviços.
Nesse contexto, este capítulo do Relatório de Pesquisa pretende contribuir transversalmente com o
objetivo geral e os cinco objetivos específicos que o projeto de pesquisa propunha. Trata-se de uma
análise descritiva que não tentará preservar a temporalidade de sua construção durante a
implementação do projeto, senão apresentar parte dos achados, como recurso ilustrativo da
produção realizada. Traz uma síntese das tentativas realizadas no período, com dados atualizados,
relativos às situações destacadas nas etapas subseqüentes da pesquisa, que reivindicaram maior
densidade de análise. Como se viu, a produção em rede científica, mesmo gerando resultados
heterogêneos em cada “nódulo”, tem a potência de somar capacidade interpretativa pelo recurso da
própria heterogeneidade. E, no caso das políticas e práticas de cuidado de planos e seguros privados
de saúde, há fortes evidências de situações extremas nos dois contextos analisados: as Regiões Sul e
Norte, que ampliam a relevância do conhecimento produzido em rede nos dois cenários.
Os dados apresentados neste item têm, predominantemente, origem em fontes secundárias. Trata-
se do tratamento de dados das grandes bases nacionais gerenciadas pelo Departamento de
Informação e Informática do SUS (Datasus), das bases de dados específicas da saúde suplementar
gerenciadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e de dados censitários e pesquisas
conduzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em particular a Pesquisa de
Assistência Médico-Sanitária (AMS) e a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).
A AMS é uma pesquisa censitária realizada junto aos estabelecimentos de saúde que oferece dados e
bases para o cálculo de indicadores relacionados à capacidade física, tecnológica e força de trabalho
dos sistemas locorregionais de serviços de saúde, inclusive da relação entre os componentes público
45
e privado do sistema nacional de serviços de saúde, de uso pouco freqüente em análises para o
suporte à gestão e à organização do cuidado8. Compõe a tradição governamental de sistematização
de dados e indicadores de saúde já a partir da primeira metade do Século XX. É gerenciada pelo IBGE
desde 1975. Tem como objetivo básico “revelar o perfil da capacidade instalada e da oferta de
serviços de saúde no Brasil Foram utilizados” (IBGE, 2006). Foram utilizados coeficientes
disponibilizados nas publicações física e microdados disponibilizados em mídia eletrônica. Na versão
final deste relatório foram utilizados dados da Edição 2008 e anteriores para comparações históricas.
Para as análises de capacidade instalada de serviços e distribuição da força de trabalho, também
foram utilizados dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), gerenciado pelo
Datasus e com dados disponíveis para consulta no sítio do mesmo (www.datasus.gov.br). Embora
com menor abrangência nos serviços de saúde não vinculados ao Sistema Único de Saúde, os dados
desta base vêm sendo qualificados nos últimos anos, tendo a atualização regular como uma das
principais vantagens. Foram utilizados dados de dezembro de 2009.
A PNAD, por sua vez, é uma pesquisa realizada periodicamente em domicílios, por amostragem, que
investiga características socioeconômicas de caráter permanente e de periodicidade variável, de
acordo com as necessidades de estudos do desenvolvimento econômico do país. É parte do sistema
de pesquisas domiciliares, implantado progressivamente a partir de 1967. Foram utilizados
coeficientes e tabelas disponíveis no Suplemento Acesso e Utilização de Serviços de Saúde 2003-
2008, além de microdados e edições anteriores para análises de indicadores não disponíveis nas
tabelas básicas e para análises históricas.
8 Uma descrição mais detalhada das potencialidades e limites da utilização de dados e indicadores da Pesquisa
AMS pode ser obtida em outros estudos, como em Ferla & Cols. (2009a), em Viacava & Bahia (2002), em Pinto (2006) e em Oliveira (2008).
46
3.2. COBERTURA ASSISTENCIAL POR PLANOS E SEGUROS PRIVADOS DE SAÚDE
O atendimento de saúde segue uma lógica semelhante entre as Regiões Norte, Sul e o País como um
todo. A PNAD revela que, tanto em 2003 como em 2008, o tipo de serviço como maior procura foram
as unidades de saúde de atenção básica ou especializada, que combinam simultaneamente os
postos, centros de saúde e consultórios particulares de profissionais de saúde como médicos e
odontólogos, concentrando cerca de 70% dos casos na Região Norte e 80% na Região Sul. Essa
afirmação necessita uma breve contextualização histórica, na medida em que a rede assistencial no
país sofreu grandes transformações, principalmente após o início da implementação do SUS, período
em que houve grande expansão dos serviços ambulatoriais, principalmente no sistema público. Há,
portanto, uma transformação recente no acolhimento das demandas dos usuários pelos serviços de
saúde que mobiliza os itinerários assistenciais.
A Tabela 3.1 também auxilia na configuração de uma conclusão da pesquisa: o perfil da oferta
assistencial de um determinado território geográfico configura o perfil das demandas atendidas nos
serviços de saúde. Em que pese a coadjuvância de outros fatores explicativos que transcendem a
pesquisa, o volume significativamente maior de atendimentos em serviços de urgência/emergência
na Região Norte têm como explicação forte a menor oferta de serviços, de forma geral, e de serviços
ambulatoriais nos subsistemas público e privado de saúde nessa Região. Essa conclusão se reforça
em estudos anteriores, onde se analisou com maior profundidade as ofertas assistenciais das redes
pública e privada de serviços de saúde nas diferentes regiões, incluindo um recorte de análise por
porte populacional dos municípios. Uma das conclusões daquele estudo, que se reforça na pesquisa
atual, é que há menor oferta de serviços de saúde, de forma geral, e de serviços especializados, de
forma particular, nos municípios de menor porte populacional, independente de sua localização em
locorregiões mais populosas ou em vazios demográficos. Essa constatação é particularmente
verdadeira em relação aos serviços privados, incluindo o segmento de planos e seguros privados de
saúde.
Identificar um padrão de consumo de bens e serviços de saúde fortemente condicionado pela oferta
tem dupla relevância para a pesquisa que se relata neste documento: a escassez de ofertas da saúde
suplementar, que é particularmente aguda em localidades com menor concentração populacional,
permite identificar uma demanda que desafia a integralidade; a oferta de ações e serviços públicos,
utilizados no itinerário de cuidados também por beneficiários de planos e seguros privados de saúde,
permite acesso a serviços com diversidade assistencial maior. Ou seja, para o acesso físico ou para
itinerários que respondam mais adequadamente à idéia da integralidade em saúde, a rede de
serviços públicos parece ser uma alternativa que compõe a modelagem tecnoassistencial de planos e
seguros privados de saúde, predominantemente em municípios de menor porte populacional e para
ações cuja configuração esteja mais avançada em termos de diversidade de ofertas no sistema
público, como é o caso, ver-se-á adiante, da atenção em saúde mental e no ciclo mãe-bebê.
47
TABELA 3.1 - PESSOAS QUE TIVERAM ATENDIMENTO DE SAÚDE NAS DUAS ÚLTIMAS SEMANAS, POR TIPO DE SERVIÇO ONDE FOI ATENDIDO (EM MIL PESSOAS)
BRASIL E
REGIÃO TIPO DE SERVIÇO ONDE FOI ATENDIDO
EM 1000 PESSOAS (%)
2003 2008 2003 2008
No
rte
Posto ou centro de saúde 585 802 47,0 48,6
Consultório particular de médico, odontologista ou de outros profissionais de saúde 218 337 17,5 20,4
Ambulatório ou consultório de empresa ou sindicato ou de clínica, pronto-socorro ou emergência ou hospital 378 443 30,4 26,8
Farmácia, laboratório ou clínica para exames complementares e outros 63 68 5,1 4,1
Total 1.244 1.650 100,0 100,0
Sul
Posto ou centro de saúde 1.697 1.854 41,0 42,5
Consultório particular de médico, odontologista ou de outros profissionais de saúde 1.374 1.605 33,2 36,8
Ambulatório ou consultório de empresa ou sindicato ou de clínica, pronto-socorro ou emergência ou hospital 900 783 21,7 18,0
Farmácia, laboratório ou clínica para exames complementares e outros 173 118 4,2 2,7
Total 4.144 4.359 100,0 100,0
Bra
sil
Posto ou centro de saúde 9.840 11.069 39,1 41,2
Consultório particular de médico, odontologista ou de outros profissionais de saúde 6.842 8.742 27,2 32,5
Ambulatório ou consultório de empresa ou sindicato ou de clínica, pronto-socorro ou emergência ou hospital 7.624 6.360 30,3 23,7
Farmácia, laboratório ou clínica para exames complementares e outros 837 696 3,3 2,6
Total 25.143 26.867 100,0 100,0
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2003 2 2008. Disponivel em http:www.sidra.ibge.gov.br. Os dados desta tabela foram reponderados pelo peso definido pela Contagem da População de 2007.
Um último recorte da análise dos dados da Tabela 3.1 mostra, nos dois anos escolhidos, uma
ampliação significativa do acesso a serviços ambulatoriais públicos e privados, suficiente para
impactar, de forma significativa, o perfil de acesso, com redução proporcional de serviços de
urgência e emergência e farmácias e laboratórios isolados.
A análise de indicadores de cobertura assistencial busca caracterizar o cenário da demanda e associa
os dois eixos assistenciais em estudo (saúde mental e ciclo mãe-bebê) para otimizar a apresentação
do relatório. A partir dos dados de população total, população feminina em idade fértil (10 a 49
anos), população de beneficiários de planos e seguros privados de saúde e segmentos etários de
48
população se produzem taxas de cobertura assistencial, em complementação aos dados disponíveis
para tabulação no próprio site da Agência Nacional de Saúde Suplementar.
O Gráfico 3.1 apresenta os dados de taxas de cobertura assistencial da população geral e do
segmento de mulheres em idade fértil em planos de assistência médica.
GRÁFICO 3.1 – Taxas de cobertura assistencial da população em geral e em mulheres em idade
fértil por planos e seguros privados de saúde no Brasil e Regiões, dezembro de 2009.
FONTE: Tabnet/ANS. Obs. Considerado o endereço do beneficiário. As informações sobre o endereço podem conter
indevidamente dados da empresa contratante do plano coletivo.
Como se verifica no Gráfico 3.1, os planos e seguros privados de saúde têm um número de vínculos
de pouco mais de 1/5 da população, sendo aproximadamente um ponto percentual maior no
segmento de mulheres com idade entre 10 e 49 anos. Uma ressalva é necessária aqui, pois que as
bases de dados não apresentam como unidade de análise a população vinculada e sim o vínculo à
Saúde Suplementar, fazendo com que se deva supor que o total de população beneficiária seja
menor do que os números apresentados de vínculos. Uma mesma pessoa vinculada a mais de um
plano de saúde terá tantos registros quantos forem seus vínculos. Por outro lado, para a análise do
mix público e privado, um vínculo com planos e seguros privados de saúde não pressupõe a não
utilização de serviços do componente público ou privado puro do sistema de saúde (Ferla & Cols.,
2009a). Como se verá nos próximos capítulos, itinerários de cuidado com um mix de serviços públicos
e privados é algo comum e, mais do que isso, bastante significativo para a análise das modelagens
tecnoassistenciais vigentes.
A análise mais minuciosa dos cenários da Saúde Suplementar nas Regiões Norte e Sul aloca para a
base empírica uma situação já prevista previamente: trata-se das duas Regiões com extremos de
taxas de cobertura populacional, quando isolada a Região Sudeste, que parece conter o maior
número de impurezas no endereço residencial do beneficiário. Essa constatação faz pensar nas
0
5
10
15
20
25
30
35
40
Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste
Brasil
9,1 9,9
34,7
21,7
14,5
22,4
9,610,9
36,6
23,3
15
23,6
Geral Mulheres em idade fértil
49
possibilidades de identificar variações qualitativamente relevantes também nas demais camadas da
análise que se fez nessa pesquisa, o que, evidentemente, necessitará de aprofundamento em
estudos posteriores, com outras abordagens metodológicas.
Em relação à distribuição dos beneficiários por local de residência, base para o cálculo das taxas de
cobertura, a Agência Nacional de Saúde Suplementar ressalta que há uma imprecisão nos dados
registrados pelas operadoras, que, por vezes, informam o endereço da empresa contratante do
plano, ao invés do endereço do beneficiário. Essa ressalva parece ter impacto, nas análises de
cobertura por Região, principalmente para operadoras das modalidades de Empresa Especializada
em Saúde e Medicina de Grupo, que têm a informação de beneficiários concentrada na Região
Sudeste, e as operadoras de Autogestão, nas quais há concentração de beneficiários nas Regiões
Centro-Oeste e Sudeste, como se verá adiante. Nas demais Regiões, o efeito é mais diluído, na
medida em que deixarão de constar os beneficiários informados indevidamente como residentes em
outras Regiões. Como se verá no seguimento do relatório, ainda que com essa imprecisão apontada,
eles têm boa capacidade de informar a análise. Para detalhar ainda mais a análise, a Tabela 3.2
apresenta as taxas por UF.
Como se pode verificar na Tabela 3.2, em relação às taxas gerais de cobertura, a Região Norte não
somente têm os indicadores médios mais baixos, mas também as menores taxas de cobertura nos
seus Estados, a exceção do Maranhão e do Piauí, na Região Nordeste. Os picos de cobertura da
Região estão nos Estados do Amazonas, do Amapá e do Pará, com variações importantes em relação
aos demais Estados. Por sua vez, a Região Sul apresenta maior uniformidade nas taxas individuais de
cobertura, que também estão próximas à média de cobertura do país como um todo.
Ainda com relação às diferenças na dificuldade de acesso aos serviços da saúde suplementar, a
análise das taxas de cobertura da população nas Capitais e no interior dos estados e regiões tem
resultados interessantes. No Brasil como um todo, as maiores taxas estão nas Capitais, sendo de
pouco mais do que o dobro as coberturas nas capitais (40,1% da população) do que no interior
(16,9% da população). Novamente é útil lembrar os indicadores apresentados no estudo anterior
(Ferla & Cols., 2009a), que identificou uma densidade de serviços em capitais e regiões
metropolitanas substantivamente maior do que nos municípios de menor porte populacional, o que,
em uma análise de correlação, permite inferir que a população beneficiária residente em municípios
menores e em regiões menos densamente povoadas tem significativamente maior dificuldade de
acessar serviços vinculados a planos e seguros privados de saúde. Na Região Sul, a distância entre as
coberturas é muito próxima da média nacional, com taxas de 46,7% nas Capitais e 17,8% no interior.
Na Região Norte a distância entre os dois indicadores de cobertura é o dobro da verificada na média
nacional, alcançando 21,2% nas capitais e 3,7% no interior dos estados. Amazonas, Roraima e Acre
são os Estados em que há maior distância entre os dois cenários.
50
TABELA 3.2 - Taxas de cobertura assistencial da população em geral e em
mulheres em idade fértil por planos e seguros privados de saúde no Brasil, Regiões e UF, dezembro de 2009.
Região/UF Geral Mulheres em idade
fértil
Região Norte 9,1 9,6
Rondônia 8,5 9,0
Acre 6,2 6,6
Amazonas 11,5 12,2
Roraima 5,6 6,6
Pará 9,1 9,5
Amapá 10,0 10,8
Tocantins 5,5 6,0
Região Nordeste 9,9 10,9
Maranhão 4,7 4,9
Piauí 5,5 5,8
Ceará 11,0 13,1
Rio Grande do Norte 15,1 17,0
Paraíba 8,5 8,6
Pernambuco 14,3 15,5
Alagoas 8,9 9,7
Sergipe 11,7 12,1
Bahia 9,2 9,7
Região Sudeste 34,7 36,6
Minas Gerais 22,1 23,0
Espírito Santo 29,3 30,8
Rio de Janeiro 34,2 34,7
São Paulo 41,5 44,2
Região Sul 21,7 23,3
Paraná 20,8 22,0
Santa Catarina 22,2 23,4
Rio Grande do Sul 22,3 24,4
Região Centro Oeste 14,5 15,0
Mato Grosso do Sul 15,1 15,5
Mato Grosso 10,7 11,5
Goiás 12,3 12,8
Distrito Federal 23,5 23,1
Total 22,4 23,6
FONTE: Tabnet/ANS. Obs. Considerado o endereço do beneficiário. As informações sobre o endereço
podem conter indevidamente dados da empresa contratante do plano coletivo.
As taxas de cobertura no segmento de mulheres em idade fértil são superiores às taxas médias de
cobertura por decorrência de que nas faixas economicamente ativas da população as taxas tendem a
ser maiores em ambos os sexos e que, com o avanço das faixas etárias, há predomínio da população
feminina na população como um todo. As taxas de ocupação tendem a ser menores em mulheres em
51
todas as Regiões (IBGE, 2008), mas a cobertura assistencial, nesse caso, será o somatório da condição
de titular e da condição de dependente. Além disso, é provável que a cultura de cuidado em saúde,
mais estruturada nas mulheres, também gere um valor simbólico diferenciado da vinculação a planos
e seguros privados de saúde, gerando maior procura.
GRÁFICO 3.2 – Taxas de cobertura assistencial por planos e seguros privados de saúde por faixa
etária detalhada e sexo, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2009.
FONTE: Tabnet/ANS e Tabnet/Datasus.
Como se pode verificar no Gráfico 3.2 as maiores taxas de cobertura são verificadas na Região Sul, na
faixa etária de 30 a 39 anos, em ambos os sexos, e na população feminina na faixa etária de 20 a 29
anos. As menores taxas são verificadas na Região Norte, nas faixas etárias de 10 a 19 anos, em ambos
os sexos.
A cobertura assistencial por planos e seguros privados de saúde no país tem uma tendência de
crescimento nos últimos anos. Em dezembro de 2005, a Agência Nacional de Saúde Suplementar
registrava um total de 35,1 milhões de beneficiários (vínculos), que cresceu para 42,9 milhões em
dezembro de 2009, o que representa uma variação positiva de 22% em quatro anos. Esse
crescimento foi diferenciado em relação às Regiões, sendo de 51,5% na Região Norte, que teve o
maior crescimento no período, a 16,7% na Região Centro-Oeste, com o menor crescimento no
período.
O Gráfico 3.3 apresenta as variações de taxas de cobertura no período para as cinco Regiões do país
e para a taxa geral de cobertura por planos e seguros privados de saúde, considerando os dados de
assistência médica.
0
5
10
15
20
25
30
Até 1 ano 1 a 4 anos
5 a 9 anos
10 a 14 anos
15 a 19 anos
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 a 69 anos
70 a 79 anos
80 anos ou mais
Total
Norte (Feminino) Norte (Masculino) Sul (Feminino) Sul (Masculino) Brasil
52
GRÁFICO 3.3 – Série histórica de taxas de cobertura assistencial por planos e seguros privados de
saúde, Brasil e Regiões, 2005/2009
FONTE: Tabnet/ANS e Tabnet/Datasus. Obs.: Excetuando-se a cobertura por planos na modalidade exclusivamente
odontológicos.
No caso do crescimento das taxas de cobertura assistencial, as Regiões Norte e Sul, diferentemente
da análise da situação da cobertura em si, associam-se com os extremos de crescimento. A variação
positiva da cobertura na Região Norte foi de aproximadamente 51% e na Região Sul de
aproximadamente 30%. Somadas as duas regiões, houve um incremento no período de
aproximadamente dois milhões de beneficiários.
O crescimento e a distribuição do número de beneficiários nas diferentes Regiões variam de acordo
com a natureza das operadoras. A natureza das operadoras de planos e seguros privados de saúde
diz respeito à tipologia de classificação das mesmas segundo o seu estatuto jurídico. Essa é uma
informação disponível no Sistema de Cadastro de Operadoras (CADOP), que também contém outras
informações sobre as operadoras de planos e seguros privados de saúde. De acordo com a ANS, a
definição das modalidades de classificação das operadoras é a seguinte9:
As operadoras são classificadas, conforme seu estatuto jurídico, nas seguintes modalidades:
Autogestão: empresa que opera planos de assistência à saúde destinados,
exclusivamente, a empregados ativos, aposentados, pensionistas ou ex-
empregados, de uma ou mais empresas ou, ainda, a participantes e dependentes
de associações de pessoas físicas ou jurídicas, fundações, sindicatos, entidades de
classes profissionais ou assemelhados e seus dependentes.
Cooperativa médica: sociedade sem fim lucrativo, conforme o disposto na Lei nº
5.764, de 16 de dezembro de 1971.
9 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Informações em Saúde Suplementar: nota técnica –
operadoras com registro ativo. Disponível em: http://anstabnet.ans.gov.br/notas_operadora.htm. Acesso em 30/03/2010.
0
5
10
15
20
25
30
35
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste
Total
2005
2006
2007
2008
2009
53
Cooperativa odontológica: sociedade sem fim lucrativo, conforme o disposto na
Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que opera, exclusivamente, planos
odontológicos. Essa modalidade de operadora não compõe o escopo de análise
desta pesquisa.
Filantropia: entidade sem fins lucrativos que opera planos privados de assistência
à saúde, sendo certificada como entidade filantrópica junto ao Conselho Nacional
de Assistência Social (CNAS), e declarada de utilidade pública pelo Ministério da
Justiça e pelos órgãos dos governos estaduais e municipais.
Administradora: empresa que apenas administra planos de assistência à saúde,
que são financiados por outra operadora. Uma administradora não assume o risco
decorrente da operação desses planos e não possui rede própria, credenciada ou
referenciada de serviços médico-hospitalares ou odontológicos. Por não
possuírem beneficiários, a operadora classificada como administradora está
dispensada do envio das informações sobre beneficiários (seus dados são
classificados como inconsistentes) e, portanto, não estão disponíveis para a
análise do perfil de cobertura.
Seguradora especializada em saúde: sociedade seguradora autorizada a operar
planos de saúde, desde que esteja constituída como seguradora especializada
nesse tipo de seguro, devendo seu estatuto social vedar a atuação em quaisquer
outros ramos ou modalidades.
Medicina de grupo: demais empresas ou entidades que operam planos de saúde.
Analisando o crescimento da cobertura assistencial pelas diferentes modalidades de operadoras,
como nos permite ver o Gráfico 3.4 e a Tabela 3.3, percebe-se uma tendência de maior aceleração
das Cooperativas Médicas nos três cenários territoriais analisados, principalmente na Região Norte,
onde detém o maior número de vínculos. No Brasil e na Região Sul, com taxas de crescimento muito
próximas, seguem-se as Seguradoras e Filantropias, estas substituídas pelas Medicinas de Grupo na
Região Norte. Embora com crescimento positivo em todas as modalidades de operadoras, a
tendência apontada pela série histórica é de consolidação das Cooperativas e Medicinas de Grupo na
liderança do setor.
Gráfico 3.4 – Número de vínculos segundo a modalidade da operadora, Brasil, 2000/2009
FONTE: dados do Sistema Tabnet/ANS. Consideradas somente operadoras de assistência médica com beneficiários.
-
2.000.000
4.000.000
6.000.000
8.000.000
10.000.000
12.000.000
14.000.000
16.000.000
18.000.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Autogestão Cooperativa Médica Filantropia
Medicina de Grupo Seguradora Especializada em Saúde
54
TABELA 3.3 – Distribuição de beneficiários segundo a modalidade da operadora, Brasil e Regiões
Norte e Sul, 2005/2009
FONTE: dados do Sistema Tabnet/ANS. Consideradas somente operadoras de assistência médica com beneficiários.
Conforme se verifica no Gráfico 3.5, o segmento de planos e seguros privados de saúde no Brasil é
composto predominantemente por Empresas de Medicina de Grupo, com 38% dos vínculos, e
Cooperativas Médicas, com 35% dos vínculos. Empresas da modalidade Autogestões e Seguradoras
Especializadas detêm 12% dos vínculos e as Filantropias têm 3% dos vínculos, tomando dados de
dezembro de 2009.
GRÁFICO 3.5 – Comparativo da participação das diferentes modalidades de operadoras na
cobertura assistencial de beneficiários de planos e seguros privados de saúde, Brasil, dezembro de
2009.
FONTE: dados do Sistema Tabnet/ANS. Consideradas somente operadoras de assistência médica com
beneficiários.
Região Modalidade 2005 2006 2007 2008 2009 Variação %
Autogestão 5.185.290 5.207.720 5.218.509 5.253.843 5.238.087 1,02
Cooperativa Médica 10.799.566 11.874.219 12.928.791 13.956.714 15.097.452 39,80
Filantropia 1.137.100 1.214.075 1.327.914 1.377.443 1.405.038 23,56
Medicina de Grupo 13.934.915 14.647.729 15.019.541 15.432.466 16.086.730 15,44
Seguradora Especializada em Saúde 4.055.468 3.982.983 4.283.707 4.852.452 5.029.565 24,02
Total 35.112.339 36.926.726 38.778.462 40.872.918 42.856.872 22,06
Autogestão 216.587 219.997 223.088 228.503 236.443 9,17
Cooperativa Médica 410.871 513.485 605.778 659.951 715.715 74,19
Filantropia 37.670 40.738 42.720 44.231 44.900 19,19
Medicina de Grupo 192.573 212.595 253.822 266.933 296.100 53,76
Seguradora Especializada em Saúde 61.658 63.447 81.936 97.817 99.572 61,49
Total 919.359 1.050.262 1.207.344 1.297.435 1.392.730 51,49
Autogestão 701.643 708.941 733.331 781.011 786.755 12,13
Cooperativa Médica 2.153.447 2.474.508 2.729.432 2.979.553 3.244.019 50,64
Filantropia 218.445 272.261 306.842 292.247 260.466 19,24
Medicina de Grupo 1.181.482 1.228.608 1.237.005 1.229.940 1.387.642 17,45
Seguradora Especializada em Saúde 279.750 274.828 286.991 334.701 333.480 19,21
Total 4.534.767 4.959.146 5.293.601 5.617.452 6.012.362 32,58
BRASIL
NORTE
SUL
38%
35%
12%
12%
3%
Medicina de Grupo
Cooperativa Médica
Autogestão
Seguradora Especializada em Saúde
Filantropia
55
Quando analisados os vínculos com a saúde suplementar em relação ao tipo de cobertura assistencial
dos planos aos quais se referem, constata-se um grande predomínio de planos hospitalares e
ambulatoriais, com 72% de participação. A cobertura assistencial se refere ao conjunto de ações e
serviços a que o beneficiário pode dispor pela contratação de um plano e seguro privado de saúde.
Dede a Lei Federal nº 9.656/98, é obrigatória a explicitação nos contratos da cobertura assistencial a
que se refere cada vínculo. Em relação a esse aspecto, a legislação prevê que um plano de saúde
pode oferecer a cobertura integral do Plano de Referência, que é um padrão mínimo de cobertura
estabelecido pela ANS, ou por segmento (ambulatorial, hospitalar, hospitalar com obstetrícia ou
odontológico). Podem ser comercializados pelas Operadoras planos com coberturas e características
superiores às do Plano Referência, como aqueles com diferentes condições de acomodação ou com
cobertura para procedimentos não obrigatórios. A Tabela 3.4 demonstra a distribuição de vínculos
segundo a segmentação do plano. Verifica-se que aproximadamente 88% dos vínculos contemplam
uma cobertura ampliada de atendimentos hospitalares e ambulatoriais, incluindo planos de
referência, o que, certamente, responde à política de qualificação do setor implementada pela ANS
nos últimos anos.
TABELA 3.4 – Distribuição de beneficiários segundo a segmentação do plano, Brasil e Regiões Norte
e Sul, 2009
FONTE: dados do Sistema Tabnet/ANS. Consideradas somente operadoras de assistência médica com beneficiários.
As segmentações listadas anteriormente oferecem as seguintes coberturas assistenciais10:
Referência: plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva ou similar, quando necessária a internação hospitalar.
Ambulatorial: cobertura de consultas médicas em clínicas básicas e especializadas; cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais.
Hospitalar: cobertura de internações hospitalares, admitindo-se a exclusão dos procedimentos obstétricos; cobertura de internações hospitalares em centro de terapia intensiva ou similar; cobertura de despesas referentes a honorários médicos, serviços gerais de enfermagem e
10 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Informações em Saúde Suplementar: nota técnica – planos registrados e
cadastrados. Disponível em: http://www.ans.gov.br/anstabnet/anstabnet/notas_planos_registros_cadastros.htm. Acesso
em 30/03/2010.
Regiao/UF Ambulatorial Hospitalar Hospitalar e
Ambulatorial Referência Não Informado Total
Região Norte 11.339 33.502 1.091.301 171.472 85.116 1.392.730
..Rondônia 4.152 4.652 103.727 3.458 12.182 128.171
..Acre 326 3.768 36.019 917 2.009 43.039
..Amazonas 3.414 4.774 260.061 111.384 9.798 389.431
..Roraima 116 8 20.644 408 2.476 23.652
..Pará 2.071 19.926 559.719 42.539 50.664 674.919
..Amapá 791 54 51.840 7.602 2.320 62.607
..Tocantins 469 320 59.291 5.164 5.667 70.911
Região Sul 740.562 166.898 3.970.182 913.784 220.936 6.012.362
..Paraná 65.168 45.648 1.710.937 347.218 54.793 2.223.764
..Santa Catarina 121.934 33.672 735.417 428.500 37.391 1.356.914
..Rio Grande do Sul 553.460 87.578 1.523.828 138.066 128.752 2.431.684
BRASIL 2.188.194 705.171 31.796.839 6.049.254 2.117.414 42.856.872
56
alimentação; cobertura de exames complementares indispensáveis para o controle da evolução da doença e elucidação diagnóstica, fornecimento de medicamentos, anestésicos, gases medicinais, transfusões e sessões de quimioterapia e radioterapia, conforme prescrição do médico assistente, realizados ou ministrados durante o período de internação hospitalar; cobertura de toda e qualquer taxa, incluindo materiais utilizados e remoção do paciente para outro estabelecimento hospitalar; cobertura de despesas de acompanhante, no caso de pacientes menores de dezoito anos.
Obstetrícia: cobertura de procedimentos relativos ao pré-natal e assistência ao parto; ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, ou de seu dependente, durante os primeiros trinta dias após o parto; inscrição assegurada ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, como dependente, isento do cumprimento dos períodos de carência, desde que a inscrição ocorra no prazo máximo de trinta dias do nascimento ou da adoção.
Odontológico: cobertura de consultas e exames auxiliares ou complementares; cobertura de procedimentos preventivos, de dentística e endodontia; cobertura de cirurgias orais menores, assim consideradas as realizadas em ambiente ambulatorial e sem anestesia geral.
Não informado: segmentações de planos contratados antes da vigência da Lei nº 9.656/98 que não foram informadas no SIB pelas operadoras.
Além da normatização acerca dos padrões de cobertura assistencial, com a tipologia apresentada
acima, a legislação normatiza também as formas de contratação, reconhecendo diferenças entre os
contatos negociados por um indivíduo isoladamente, para cobertura própria e da família, e planos
negociados por grupos maiores de pessoas, como empresas, por exemplo. A Tabela 3.5 apresenta a
distribuição dos vínculos de beneficiários segundo a modalidade de contratação. Verifica-se que
aproximadamente 56% dos vínculos são contratados por meio de empresas.
TABELA 3.5 – Distribuição de beneficiários segundo a modalidade de contratação, Brasil e Regiões
Norte e Sul, 2009
FONTE: dados do Sistema Tabnet/ANS. Consideradas somente operadoras de assistência médica com beneficiários.
A definição dos planos em relação à forma de contratação, citada anteriormente, é a seguinte11
11 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Informações em Saúde Suplementar: nota técnica – planos registrados e
cadastrados. Disponível em: http://www.ans.gov.br/anstabnet/anstabnet/notas_planos_registros_cadastros.htm. Acesso
em 30/03/2010.
Regiao/UFIndividual ou
Familiar
Coletivo
Empresarial
Coletivo por
adesão
Coletivo não
identificado
Não
InformadoTotal
Região Norte 413.466 774.900 115.907 304 88.153 1.392.730
..Rondônia 31.713 68.130 16.155 1 12.172 128.171
..Acre 9.564 20.462 11.337 - 1.676 43.039
..Amazonas 72.096 293.852 13.410 264 9.809 389.431
..Roraima 5.587 8.466 7.121 1 2.477 23.652
..Pará 261.486 302.278 60.324 3 50.828 674.919
..Amapá 22.715 34.095 2.151 1 3.645 62.607
..Tocantins 10.305 47.617 5.409 34 7.546 70.911
Região Sul 1.086.165 3.344.324 1.349.990 6.824 225.059 6.012.362
..Paraná 576.197 1.211.523 380.984 192 54.868 2.223.764
..Santa Catarina 167.378 828.945 319.981 1.595 39.015 1.356.914
..Rio Grande do Sul 342.590 1.303.856 649.025 5.037 131.176 2.431.684
Brasil 9.233.467 23.924.259 7.488.180 45.589 2.165.377 42.856.872
57
Individual ou familiar: Contrato assinado entre um indivíduo e uma Operadora de planos de saúde para assistência à saúde do titular do plano (individual) ou do titular e de seus dependentes (familiar).
Coletivo com patrocinador: Planos contratados por pessoa jurídica com mensalidade total ou parcialmente paga à operadora pela pessoa jurídica contratante. Inclui também os contratos mantidos por autogestão em que o beneficiário paga parcialmente a mensalidade.
Coletivo sem patrocinador: Planos contratados por pessoa jurídica com mensalidade integralmente paga pelo beneficiário diretamente à operadora.
Um primeiro grupo de constatações possíveis como os indicadores desta camada da análise mostra
uma evolução da rede física do sistema de serviços de saúde no Brasil, que se articula com um
crescimento nos atendimentos oferecidos à população, situação que é válida para os planos e
seguros privados de saúde mas, particularmente, para o sistema público. Essa ampliação se articula
com uma diversificação de ofertas, também associadas predominantemente às políticas públicas,
situação que dialoga mais diretamente com o objeto de investigação específico da pesquisa. Como
resultado, uma ampliação importante no atendimento em serviços de saúde que operam em rede de
atenção.
Em relação à saúde suplementar, vê-se nos últimos anos um aumento da cobertura, maior nas
Regiões com menores taxas, e em operadoras que melhor se adéquam à reorganização do setor que
vem sendo induzida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Especificamente em relação às
duas linhas de cuidado que estão sendo pesquisadas, há aumento da oferta de serviços e
diversificação de modalidades de atendimento no escopo das mudanças recentes. O contexto atual é
mais favorável nas regiões mais densamente povoadas e nos grandes municípios, com limites
importantes nos municípios de menor porte e regiões com maior rarefação populacional. A tensão
entre regulação econômica e regulação pela lógica da integralidade mostra-se, nos cenários em
análise, ainda favorável à primeira. O maior crescimento no segmento de planos e seguros privados
de saúde se dá nas operadoras de maior participação no mercado e em planos coletivos, com maior
estabilidade econômica. Tal cenário sugere a capacidade operacional das operadoras em avanços
com maior velocidade em direção às diretrizes do sistema de saúde brasileiro, em particular aos
conceitos de integralidade e equidade. As evidências de que os itinerários terapêuticos dos
beneficiários de planos e seguros privados de saúde incluem, de forma significativa, hibridizações
com os serviços públicos de saúde levanta preocupações de duas ordens. Uma delas em relação à
questão da equidade, uma vez que o acesso à assistência inicial é sabidamente mais fácil para os
beneficiários de planos e seguros privados de saúde. A segunda é em relação à qualidade do cuidado,
situação que as formulações acerca da integralidade do cuidado constituem um bom plano de
análise. A simples oferta de ações isoladas e procedimentos assistenciais não garante a integralidade
e parece oportuno que as políticas em relação à saúde suplementar e aos serviços públicos tenham
maior diálogo para uma regulação com base em políticas de cuidado integral.
Para seguir nessa direção, entretanto, torna-se necessário compreender um pouco melhor as
demandas que são formuladas aos sistemas de serviço, em particular com indicadores que permitam
avaliar a qualidade percebida da saúde e dos serviços recebidos, bem como padrões de consumo. É o
que pretende o próximo item.
58
3.3 – CARACTERIZAÇÃO DA DEMANDA NAS LINHAS DE CUIDADO EM ESTUDO
Tendo em vista a relevância da avaliação da situação de saúde para a análise da incorporação de
linhas de cuidado, conforme já foi descrito, buscou-se uma aproximação com essa variável a partir de
informações secundárias de diferentes fontes. A amostragem do campo empírico traz uma
aproximação mais particular de determinados contextos assistenciais, mas avaliou-se a necessidade
de usar evidências mais gerais, com uma escala mais ampla. Nesse contexto, a Pesquisa Nacional por
Amostragem de Domicílios (PNAD) do IBGE apresentou-se como potencialmente útil. Inicialmente, os
dados relativos à auto-avaliação do estado de saúde da pesquisa do ano de 2008 foram agrupados
segundo a Região de residência dos entrevistados, conforme se verifica no Gráfico 3.6.
GRÁFICO 3.6 – Auto-avaliação do estado de saúde da população residente, segundo cobertura por plano e seguro privado de saúde, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2008
Fonte: PNAD/IBGE, dados tratados pela pesquisa.
Verifica-se uma situação próxima nos três cenários analisados, em relação à auto-avaliação da
situação de saúde, tanto entre beneficiários de planos e seguros privados de saúde quanto da
população não vinculada à saúde suplementar. Em relação à avaliação “muito bom”,
aproximadamente 75% dos não beneficiários incluem-se nesta categoria nos três cenários, sendo
que no segmento de beneficiários de planos e seguros privados a oscilação vai de aproximadamente
80,5% na Região Norte a 83% no Brasil e Região Sul. Pequenas variações, sempre com tendência mais
favorável à população coberta por planos e seguros privados de saúde, são verificadas nas demais
situações. Além de dados muito próximos, chama a atenção o fato de que a percepção do estado de
saúde da população parece variar de acordo com a facilidade de acesso aos serviços, conforme
variação identificada no item anterior.
0 20 40 60 80 100
Com Plano
Sem Plano
Com Plano
Sem Plano
Com Plano
Sem Plano
Bra
sil
Reg
ião
No
rte
Reg
ião
Su
l
83,37
75,14
80,51
74,69
82,98
75,11
14,42
20,5
17,18
21,18
14,72
20,31
2,21
4,36
2,31
4,13
2,3
4,58
Ruim e muito ruim
Regular
Muito bom
59
TABELA 3.6 – Auto-avaliação do estado de saúde da população residente, segundo a situação de cobertura assistencial por plano e seguro privado de saúde, Brasil e Regiões Norte e Sul, 2003 e
2008 (em mil pessoas).
Fonte: PNAD/IBGE, dados tratados pela pesquisa.
2003 % 2008 %
Muito bom e bom 138.251 78,58 146.786 77,27
Regular 31.647 17,99 35.948 18,92
Ruim e muito ruim 6.028 3,43 7.219 3,80
Sem declaração 14 0,01 - -
Total Brasil 175.940 100 189.953 100
Muito bom e bom 102.142 76,86 105.780 75,15
Regular 25.565 19,24 28.855 20,50
Ruim e muito ruim 5.183 3,90 6.131 4,36
Sem declaração 12 0,01 - -
Total não cobertos 132.902 100 140.766 100
Muito bom e bom 36.107 83,90 41.006 83,37
Regular 6.082 14,13 7.093 14,42
Ruim e muito ruim 845 1,96 1.088 2,21
Sem declaração 2 0,00 - -
Total cobertos 43.036 100 49.187 100
Muito bom e bom 2 100 -
Regular - -
Ruim e muito ruim - -
Sem declaração - -
Total sem declaração 2 100 - 100
Muito bom e bom 7.859 76,49 11.565 75,46
Regular 2.069 20,14 3.166 20,66
Ruim e muito ruim 343 3,34 596 3,89
Sem declaração 3 0,03 - -
Total Região Norte 10.274 100 15.327 100
Muito bom e bom 6.616 75,98 9.929 74,69
Regular 1.782 20,47 2.816 21,18
Ruim e muito ruim 306 3,51 549 4,13
Sem declaração 3 0,03 - -
Total não cobertos na Região 8.707 100 13.294 100
Muito bom e bom 1.243 79,32 1.636 80,51
Regular 287 18,32 349 17,18
Ruim e muito ruim 37 2,36 47 2,31
Sem declaração - - - -
Total cobertos na Região 1.567 100 2.032 100
Muito bom e bom - -
Regular - -
Ruim e muito ruim - -
Sem declaração - -
Total sem declaração na Região - -
Muito bom e bom 20.871 79,37 21.349 77,47
Regular 4.588 17,45 5.133 18,63
Ruim e muito ruim 834 3,17 1.074 3,90
Sem declaração 2 0,01 - -
Total Região Sul 26.295 100 27.556 100
Muito bom e bom 14.682 77,38 14.487 75,11
Regular 3.602 18,98 3.917 20,31
Ruim e muito ruim 688 3,63 883 4,58
Sem declaração 2 0,01 - -
Total não cobertos na Região 18.974 100 19.287 100
Muito bom e bom 6.189 84,54 6.862 82,98
Regular 986 13,47 1.217 14,72
Ruim e muito ruim 146 1,99 190 2,30
Sem declaração - - - -
Total cobertos na Região 7.321 8.269
Muito bom e bom - -
Regular - -
Ruim e muito ruim - -
Sem declaração - -
Total sem declaração na Região - -
Auto-avaliação do estado de
saúde
Cobertura de plano
de saúde
Brasil e
Região
Ano
Total
Brasil
Não cobertos
Cobertos
Não cobertos
Cobertos
Sem declaração
Sem declaração
Norte
Total
Não cobertos
Cobertos
Sem declaração
Sul
Total
60
A Tabela 3.6 apresenta dados abertos relativos à auto-avaliação da situação de saúde da população
nos anos de 2003 e 2008, também de acordo com dados da PNAD/IBGE. Verifica-se que a auto-
avaliação do estado de saúde da população teve pequena oscilação nos dois anos da série, com uma
discreta migração de população com avaliação de “muito bom” e “bom” para “regular” no período,
exceto para a população coberta por planos e seguros privados de saúde na Região Norte, onde
houve incremento percentual de pessoas com melhor avaliação da situação de saúde. Há um padrão
nas respostas em todos os cenários e períodos que indica uma avaliação mais favorável na população
coberta por planos e seguros privados de saúde, principalmente no Brasil como um todo e na Região
Sul. Essa variação também é verdadeira para a Região Norte, embora a diferença entre os extremos
seja pouco menor.
Esses dados chamam a atenção, para efeitos da análise da política de cuidado na Saúde Suplementar,
por duas questões. A primeira delas é que a distância entre a auto-avaliação da situação de saúde da
população assistida por planos e seguros privados de saúde e a população não coberta tem uma
oscilação, no ano de 2008, de algo em torno de oito pontos percentuais no Brasil e na Região Sul e
aproximadamente seis pontos percentuais na Região Norte. Em segundo lugar, essa oscilação
cresceu no período analisado, tendo sido de algo em torno de sete pontos percentuais no Brasil e na
Região Sul no ano de 2003, e em torno de três pontos percentuais na Região Norte. Esse crescimento
provavelmente esteja relacionado com o fato de que a percepção da população sobre o sistema de
saúde tem apresentado níveis de insatisfação muito grandes, assim como com um crescimento da
expectativa de consumo de produtos e serviços nessa área. De toda forma, parece necessário
apontar aqui que há uma auto-avaliação que apresenta índices significativamente mais desfavoráveis
na população que não é coberta por planos e seguros privados de saúde, mas, mesmo na população
coberta, há crescimento do percentual de pessoas que têm avaliação menos favorável no período
analisado. O que parece indicar que, no período, o sistema de serviços de saúde, tanto público
quanto privado, não conseguiu suprir as necessidades percebidas pela população. Não há aqui a
expectativa de uma discussão mais aprofundada sobre os condicionantes e determinantes da auto-
avaliação. Apenas o registro de uma relação entre a auto-avaliação da situação de saúde e a
demanda por consumo de procedimentos.
Ainda com dados da PNAD, pode-se avançar um pouco mais na caracterização da demanda por
serviços na Saúde Suplementar. A pesquisa incluiu dados sobre atendimentos recentes (nas duas
semanas que a antecederam) e a caracterização do vínculo da pessoa a planos e seguros de saúde
(Gráfico 3.7). Foram identificadas aproximadamente 27 mil pessoas nessa condição e a distribuição
das mesmas segundo a situação de cobertura por planos e seguros privados de saúde está muito
próxima das taxas de cobertura apresentadas anteriormente. Como se verifica no gráfico a seguir,
aproximadamente 26% das pessoas com atendimentos recentes estavam cobertas por planos e
seguros privados de saúde no Brasil como um todo e na Região Sul e 15% na Região Norte.
Considerando, como já se identificou em pesquisa anterior (Ferla & Cols., 2009a), que a população
coberta por planos e seguros privados de saúde acessa mais freqüentemente os serviços de saúde, os
dados da PNAD estão muito próximos da cobertura assistencial calculada com base no percentual de
vínculos com a saúde suplementar. Aqui, outra associação parece se estabelecer: o acesso a
produtos e serviços de saúde está relacionado positivamente à auto-avaliação do estado de saúde
das pessoas.
61
GRÁFICO 3.7 – Comparativo de situação da cobertura assistencial da população com atendimento
recente no Brasil e Regiões Sul e Norte, 2008.
Fonte: PNAD/IBGE, com dados tratados pela pesquisa.
A tendência de maior consumo de procedimentos entre os beneficiários de planos e seguros
privados de saúde é identificada no volume per capita diferenciado de procedimentos consumidos,
no volume proporcionalmente maior de procedimentos recentes, mas também – e essa variável é
mais relevante para a análise que se constitui no objeto da pesquisa – pelo volume de procedimentos
na rede pública consumidos pela população beneficiária. Essa variável está caracterizada a seguir.
A Tabela 3.7 apresenta dados relativos aos atendimentos recebidos pelo SUS segundo a situação de
cobertura de planos de saúde. Entre 2003 e 2008, observa-se grande importância do SUS na Região
Norte, isto é, mesmo entre aqueles que possuem planos de saúde, cerca de 20% utilizam com
freqüência o SUS para atendimento de saúde.
Também é relevante considerar que aproximadamente 15% dos atendimentos recentes de beneficiários de planos e seguros privados de saúde foram feitos no SUS na Região Sul e 13% no Brasil como um todo. Sabe-se que atendimentos de urgência/emergência e com maior densidade tecnológica e custo são mais facilmente acessados por meio do sistema público de serviços, em conseqüência da não oferta no sistema suplementar ou mesmo por decorrência dos mecanismos de regulação do acesso estabelecidos pelas operadoras. No contexto da pesquisa, identificou-se que parte da explicação geral é efetivamente verdadeira e aplicável: medicamentos e procedimentos de grande densidade tecnológica, procedimentos em planos com previsão de co-pagamento – particularmente quando de uso freqüente/continuado, são, de fato, argumentos para o mix público e privado no itinerário assistencial dos beneficiários. Entretanto, chamou a atenção que a diversidade de ofertas assistenciais e a política de cuidados foram referidos pelos beneficiários que participaram da pesquisa como critérios de escolha. Os dados da PNAD sobre a avaliação dos atendimentos recebidos auxiliam a abordar essa questão de forma mais densa, conforme se verifica a seguir.
26,22 15,19
26,13
73,78 84,81
73,87
-
20,00
40,00
60,00
80,00
100,00
120,00
Brasil Região Norte Região Sul
Sem Plano
Com Plano
62
TABELA 3.7 - Pessoas com atendimento de saúde no SUS nas duas últimas semanas exclusive cujo principal atendimento recebido foi marcação de consulta, segundo situação de cobertura de plano de saúde, 2003 e 2008.
Fonte: PNAD/IBGE, com dados tratados pela pesquisa.
Conforme se verifica na Tabela 3.8, dentre as pessoas que são atendidas pelo SUS e que possuem
planos de saúde a avaliação do atendimento é “muito boa” ou “boa” para a grande maioria dos
usuários. Esse padrão de respostas se afirma no período analisado, onde se identifica um aumento
de avaliações positivas para os atendimentos por meio do SUS entre os beneficiários da saúde
suplementar. Na Região Norte, com menor oferta assistencial em todos os componentes do sistema
de serviços de saúde, aproximadamente 81% dos beneficiários de planos aprovaram o atendimento
recebido pelo SUS, taxa que alcança 88% na Região Sul e 84% no Brasil. As taxas de reprovação,
consideradas as respostas “ruim e muito ruim”, também têm crescimento, alcançando 3,5% no
Brasil, 4,8% na Região Norte e 2,5% na Região Sul. Considerando essas taxas e o contexto assinalado
anteriormente, é razoável supor que parte da demanda de beneficiários de planos e seguros privados
de saúde também procure o SUS por avaliá-lo positivamente. Aqui é importante assinalar que a
2003 % 2008 %
Sim 14.304 57,31 15.076 56,47
Não 10.132 40,60 11.508 43,10
Não sabe e sem declaração 521 2,09 115 0,43
Total geral 24.957 100 26.699 100
Sim 1.038 12,23 1.250 13,45
Não 7.373 86,85 8.032 86,43
Não sabe e sem declaração 78 0,92 11 0,12
Total com cobertura 8.489 100 9.293 100
Sim 13.266 80,56 13.826 79,43
Não 2.758 16,75 3.476 19,97
Não sabe e sem declaração 443 2,69 104 0,60
Total sem cobertura 16.467 100 17.406 100
Sim 821 66,59 1.093 66,73
Não 380 30,82 522 31,87
Não sabe e sem declaração 32 2,60 23 1,40
Total da Região 1.233 100 1.638 100
Sim 51 19,32 62 19,02
Não 211 79,92 263 80,67
Não sabe e sem declaração 2 0,76 1 0,31
Total cobertura na Região 264 100 326 100
Sim 769 79,52 1.032 78,60
Não 169 17,48 259 19,73
Não sabe e sem declaração 29 3,00 22 1,68
Total sem cobertura na Região 967 100 1.313 100
Sim 2.205 53,57 2.318 53,47
Não 1.880 45,68 2.009 46,34
Não sabe e sem declaração 31 0,75 8 0,18
Total na Região 4.116 100 4.335 100
Sim 203 13,41 236 14,67
Não 1.302 86,00 1.371 85,21
Não sabe e sem declaração 9 0,59 2 0,12
Total cobertura na Região 1.514 100 1.609 100
Sim 2.002 76,94 2.083 76,36
Não 578 22,21 639 23,42
Não sabe e sem declaração 22 0,85 6 0,22
Total sem cobertura na Região 2.602 100 2.728 100
Sul
Total
Tem
Não tem
Norte
Total
Tem
Não tem
Brasil
Total
Tem
Não tem
Brasil e
Região
Cobertura de
plano de saúdeAtendimento através do SUS
Ano
63
dificuldade de acesso tem sido apontada como a principal causa de avaliações negativas do SUS
entre seus usuários.
TABELA 3.8 – Avaliação do atendimento recebido por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) por pessoas com cobertura assistencial por planos e seguros privados de saúde em atendimento de saúde nas duas últimas semanas, 2003 e 2008.
Fonte: PNAD/IBGE, com dados tratados pela pesquisa. Exclusive cujo principal atendimento recebido foi marcação de consulta
TABELA 3.9 – Avaliação do atendimento recebido por meio de planos e seguros privados de saúde
por beneficiários em atendimento de saúde nas duas últimas semanas, 2003 e 2008.
Fonte: PNAD/IBGE, com dados tratados pela pesquisa. Exclusive cujo principal atendimento recebido foi marcação de consulta
2003 % 2008 %
Muito bom e bom 874 84,20 1.050 84,00
Regular 132 12,72 156 12,48
Ruim e muito ruim 32 3,08 44 3,52
1.038 100 1.250 100
Muito bom e bom 40 78,43 50 80,65
Regular 10 19,61 9 14,52
Ruim e muito ruim 1 1,96 3 4,84
51 100 62 100
Muito bom e bom 171 84,24 207 87,71
Regular 26 12,81 23 9,75
Ruim e muito ruim 6 2,96 6 2,54
Sem declaração - - - -
203 100 236 100
Sul
Brasil e Região Avaliação do atendimentoAno
Brasil
Norte
2003 % 2008 %
Muito bom e bom 6.102 94,30 6.356 94,16
Regular 327 5,05 323 4,79
Ruim e muito ruim 41 0,63 71 1,05
Total geral 6.470 100 6.750 100
Muito bom e bom 172 91,98 216 93,91
Regular 14 7,49 11 4,78
Ruim e muito ruim 1 0,53 3 1,30
187 100 230 100
Muito bom e bom 1.063 96,11 1.052 95,81
Regular 41 3,71 38 3,46
Ruim e muito ruim 2 0,18 8 0,73
1.106 100 1.098 100
Sul
Brasil e
RegiãoAvaliação do atendimento
Ano
Brasil
Norte
64
De acordo com os dados sintetizados na Tabela 3.9, os atendimentos recebidos nos serviços de saúde
por meio de planos e seguros privados também têm altas taxas de aprovação, oscilando em torno de
94% a 95% nos três cenários geográficos. As taxas de reprovação, com tendência crescente no
período analisado, oscilam de 0,7% na Região Sul a 1,3% na Região Norte, tendo 1% de “ruim e muito
ruim” no Brasil como um todo. Assim, para a hipótese levantada anteriormente de opção dos
beneficiários de planos e seguros privados por atendimento no SUS, como explicação para o mix no
itinerário assistencial, será preciso buscar outras explicações que não a reprovação do atendimento
na Saúde Suplementar.
Entre as explicações para o mix assistencial público e privado, identifica-se que o co-pagamento está
presente em média em um em cada quatro beneficiários de planos de saúde no País, com destaque
para a Região Sul, local em que esta participação atinge quase 40% (Tabela 3.8).
TABELA 3.10 – Situação de pagamento complementar por atendimento recebido por meio de
planos e seguros privados de saúde por pessoas beneficiárias em atendimento de saúde nas duas
últimas semanas, 2003 e 2008.
Fonte: PNAD/IBGE, com dados tratados pela pesquisa. Exclusive cujo principal atendimento recebido foi marcação de consulta.
2003 % 2008 %
Sim 1.758 20,71 2.258 24,30
Não 6.731 79,29 7.035 75,70
Sem declaração - - - -
8.489 100 9.293 100
Sim 39 14,72 45 13,80
Não 226 85,28 281 86,20
Sem declaração - - - -
265 100 326 100
Sim 185 14,78 242 18,21
Não 1.067 85,22 1.087 81,79
Sem declaração - - - -
1.252 100 1.329 100
Sim 818 16,71 1.155 21,26
Não 4.077 83,29 4.278 78,74
Sem declaração - - - -
4.895 100 5.433 100
Sim 532 35,14 602 37,44
Não 982 64,86 1.006 62,56
Sem declaração - - - -
1.514 100 1.608 100
Sim 184 32,74 215 35,95
Não 378 67,26 383 64,05
Sem declaração - - - -
562 100 598 100
Pagamento pelo
atendimento
Brasil e
Região
Ano
Brasil
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-
Oeste
65
A Tabela 3.10 apresenta indicadores relevantes para compreender a hibridização público/privado nos
itinerários terapêuticos dos beneficiários de planos e seguros privados de saúde nas duas Regiões. As
menores taxas de co-pagamento no Brasil estão entre os beneficiários da Região Norte, alcançando
aproximadamente 14% dos atendimentos. Nessa Região, como já se descreveu anteriormente, há
menor rede de serviços, com menor densidade tecnológica nas suas ofertas e menores taxas de
cobertura por planos e seguros privados de saúde. As maiores taxas do país são identificadas na
Região Sul, com aproximadamente 37%, que tem maior capacidade instalada, tanto do ponto de
vista físico quanto tecnológico, bem como um perfil de população com maior poder aquisitivo
quando comparada com a Região Norte. Esses dados, combinados com o uso mais freqüente do co-
pagamento como dispositivo de modulação de consumo, segundo as próprias operadoras,
demonstra a existência de uma regulação fortemente mediada por lógicas financeiras nas políticas
de cuidado de operadoras de planos e seguros privados de saúde. Ante a soma de evidências, essa
afirmação é possível mesmo diante da ausência de informações sobre o co-pagamento na tipologia
de modalidades de planos nas bases de dados da ANS, que impede a proposição de um indicador
mais geral, ponderado pelo tipo de operadora e por região, por exemplo. De toda forma, o
mecanismo de co-pagamento parece merecer maior destaque nas políticas de macrorregulação da
ANS, uma vez que se mostra como uma explicação relevante para o mix de procedimentos na rede
pública e, portanto, se constitui num importante limitador de acesso a modalidades de assistência
necessárias ao cuidado dos beneficiários de planos e seguros privados de saúde. Aqui, uma dupla
relevância do co-pagamento de procedimentos na saúde suplementar: como tensão com a idéia da
integralidade da atenção para os beneficiários de planos e seguros privados de saúde, quando limita
efetivamente o consumo de procedimentos necessários, que são buscados na rede pública; como
tensão com a idéia de equidade no sistema de saúde como um todo, quando pressiona beneficiários
de planos e seguros privados de saúde, com maior acesso ao diagnóstico de seus problemas de
saúde, ao consumo de procedimentos complementares na rede pública para suprir suas
necessidades de saúde. A análise do consumo de internações entre beneficiários de planos e seguros
privados e de usuários da rede SUS provavelmente amplie a compreensão sobre essa questão.
Como último recorte da análise neste item, foram sistematizados dados a respeito de internações
hospitalares no Brasil constantes na PNAD/IBGE. Essa base de dados permite uma análise comparada
de uso de serviços por usuários da saúde suplementar e da rede pública de serviços de saúde. A
Tabela 3.11 apresenta dados coletados no inquérito de 2003 e de 2008.
Como se verifica, há um padrão de consumo de internações hospitalares maior entre os beneficiários
da Saúde Suplementar. As internações proporcionais de beneficiários da saúde são
aproximadamente quatro pontos percentuais mais elevadas do que as taxas de cobertura nas
Regiões Sul e Norte e a aproximadamente três pontos no caso do Brasil como um todo. Em relação
ao número de internações realizadas nos últimos 12 meses, verifica-se um padrão de valores
levemente maior entre os não beneficiários de planos e seguros privados de saúde, tendência similar
aos dados de auto-avaliação da situação de saúde já descritos. É preciso considerar aqui que, pelo
menos em parte, os valores de atendimento por meio de planos para os beneficiários podem estar
subestimados, uma vez que parte dos seus atendimentos podem ter sido realizados na rede SUS,
conforme já se verificou. Ou seja, é possível supor que os beneficiários de planos e seguros privados
de saúde consumam proporcionalmente mais internações hospitalares, mesmo considerando que
sua auto-avaliação da situação de saúde seja melhor do que dos demais brasileiros.
66
TABELA 3.11 - Pessoas que estiveram internadas nos últimos doze meses, por número de
internações e atendimento através de plano de saúde.
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Os dados desta tabela foram reponderados pelo peso definido
pela Contagem da População de 2007.
Nº % Nº %
1 internação 2.413 80,70 2.686 80,35
2 ou mais internações 574 19,20 657 19,65
Sem declaração 3 0,10 - -
Total planos 2.990 100 3.343 100
1 internação 7.358 78,76 7.933 78,00
2 ou mais internações 1.984 21,24 2.237 22,00
Sem declaração - - - -
Total sem planos 9.342 100 10.170 100
1 internação 1 -
2 ou mais internações 1 -
Sem declaração - -
Total sem declaração 2 -
1 internação 95 78,51 116 77,33
2 ou mais internações 26 21,49 34 22,67
Sem declaração - - - -
Total planos 121 100 150 100
1 internação 545 80,38 804 78,36
2 ou mais internações 133 19,62 222 21,64
Sem declaração - - - -
Total sem planos 678 100 1.026 100
1 internação - -
2 ou mais internações 1 -
Sem declaração - -
Total sem declaração
1 internação 417 79,13 431 78,22
2 ou mais internações 110 20,87 120 21,78
Sem declaração - - - -
Total planos 527 100 551 100
1 internação 1.165 76,70 1.202 77,45
2 ou mais internações 354 23,30 350 22,55
Sem declaração - - - -
Total sem planos 1.519 100 1.552 100
1 internação - -
2 ou mais internações - -
Sem declaração - -
Total sem declaração
Número de internações
Ano
Brasil
Sim
Não
Sem declaração
Brasil e
Região
Atendimento através
de plano de saúde2003 2008
Sim
Não
Sem declaração
Sim
Não
Sem declaração
Norte
Sul
67
3.4 – AS POLÍTICAS DE ATENÇÃO AO CICLO MÃE-BEBÊ E EM SAÚDE MENTAL NA SAÚDE SUPLEMENTAR: PERSPECTIVAS DE OPERADORAS E PRESTADORES
As práticas de saúde contemporâneas atravessam uma importante transformação, em boa medida,
conduzidas pelas políticas produzidas no interior dos sistemas de saúde. No sistema de saúde
brasileiro, políticas específicas buscam alcançar mudanças não apenas no sistema público de
serviços, senão também na atenção ofertada por planos e seguros privados de saúde. A Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS) implementa, desde 2005, o Programa de Qualificação que
busca induzir efeitos na modelagem tecnoassistencial vigente, inclusive pela incorporação de ações
de promoção e prevenção, além do alargamento das ofertas assistenciais disponibilizadas aos
beneficiários com tecnologias assistenciais de diferentes naturezas.
Em contraste com seu expressivo desenvolvimento científico e tecnológico, as práticas em saúde
vêm encontrando sérias limitações para responder efetivamente às complexas necessidades de
saúde de indivíduos e populações. Propostas de integralidade no cuidado tem se difundido como
estratégia de organização das práticas de atenção à saúde, mas ainda com pouca capacidade de
ocuparem lugar central no trabalho de cuidado. Esse diagnóstico é válido também para a saúde
suplementar, que, muitas vezes tem a lógica biomédica que permeia a atenção somada a uma lógica
de regulação que toma a idéia do evento/sinistralidade, descontextualizando os modos de andar a
vida dos sujeitos que adoecem, tornando ainda mais fragmentadas, desconexas e verticais as práticas
assistenciais. De acordo com Malta & Cols. (2004), “mesmo quando se investe em atividades de
promoção e prevenção, esse componente entra mais como produto de marketing do que como
diretriz assistencial, visando de fato ao cuidado à saúde” (pág. 437).
As mudanças dos modos de produzir o cuidado e organizar as práticas de atenção, de gestão, de
educação e participação no interior dos sistemas, redes e serviços de saúde caracterizam processos
de reestruturação produtiva (Merhy, 2002). Esse termo designa os efeitos da incorporação
tecnológica em saúde, mas designa também mudanças nos processos de trabalho, sobretudo nas
dimensões micropolíticas, o que não implica em rupturas com o modelo biomédico (Merhy & Franco,
2006). Ou seja, as mudanças nas diretrizes políticas e práticas de atenção, que nem sempre têm
vetores de força coincidentes, podem não agregar integralidade ao cuidado e manterem-se
centradas em técnicas e procedimentos.
Uma estratégia metodológica de compreender o momento atual das políticas de atenção na saúde
suplementar, como se registrou no capítulo anterior, foi por meio de entrevistas semi-estruturadas
com dirigentes de operadoras, prestadores hospitalares e prestadores médicos. Neste item se fará
uma descrição, ainda que breve e sem esgotar os dados empíricos coletados e as análises já feitas,
dos achados com base nessa estratégia metodológica da pesquisa.
68
3.4.1 – ESTRATÉGIAS DE REGULAÇÃO DAS OPERADORAS E OFERTAS ASSISTENCIAIS: AS
POLÍTICAS DE CUIDADO AMPLIAM E DIVERSIFICAM EFETIVAMENTE AS OFERTAS
ASSISTENCIAIS?
Observado um movimento das operadoras neste sentido, no entanto, concentram-se ainda nas
principais causas de morbidade e ou maior número de atendimentos pela operadora. Buscando
identificar a oferta assistencial em promoção e prevenção realizado pela saúde suplementar o
Gráfico 3.8 apresenta os dados informados pelas operadoras pesquisadas a cerca da realização de
atividades de promoção e prevenção a saúde na forma de acompanhamento de grupos especiais.
GRÁFICO 3.8 – Oferta de grupos especiais informados pelas operadoras nas Regiões Norte, Sul e total
Fonte: Dados primários da pesquisa
No campo assistencial das linhas de cuidado em estudo, a maior freqüência de grupos informados
pelas operadoras foi de pré-natal (04 operadoras na Região Norte e 02 operadoras na Região Sul), de
puericultura (04 operadoras na Região Norte e 02 operadoras na Região Sul). Nenhuma operadora
informou a existência de grupos em saúde mental. É possível afirmar que as políticas de indução
implementadas pela ANS vêm surtindo efeitos, ao menos no que concerne à oferta de atividades
dessa natureza. Essa possibilidade esta proposta atualmente por meio da Instrução Normativa
Conjunta nº 002/2010, das Diretorias de Normas e Habilitação das Operadoras (DIOPE) e de Normas
e Habilitação dos Produtos (DIPRO) da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Essa norma
estabelece que as operadoras que desenvolvem ou pretendam desenvolver programas de promoção
da saúde e prevenção de riscos e doenças podem cadastrá-los na Agência para efeitos de oferta aos
beneficiários e de regulação econômica. Segundo a Instrução Normativa, são pré-requisitos mínimos
para a aprovação desses programas:
a) cobertura mínima pelo programa de vinte por cento da população-alvo;
b) elaboração de estratégia de identificação e ingresso da população-alvo no
programa;
7
5
12
7
1
8
14
6
20
0
5
10
15
20
25
Sim
Não
TOTAL
69
c) sistema de informação estruturado, utilizado para registro e acompanhamento
da população beneficiada pelo programa;
d) utilização de indicadores para o monitoramento de processos e resultados dos
programas, baseado em referências bibliográficas;
e) elaboração de um “Plano de Ação” para o programa e suas referências
bibliográficas;
f) designação de um coordenador para o referido programa; e
g) atuação de equipe multiprofissional nas atividades propostas pelo programa.
Independente do grau de implementação e de outras características dos programas, é importante
registrar que a simples existência dos mesmos já refere um avanço no contexto da assistência à
saúde, uma vez que demonstram que as operadoras estão incluindo nas suas ofertas assistenciais
atividades coletivas de atenção a saúde das populações seguradas. Por outro lado, quando se analisa
com mais cuidado as características dessas ofertas, percebe-se que os grupos, por exemplo, são
ofertados predominantemente para os portadores de patologias mais comuns (com maior escala de
consumo de procedimentos) e para os grupos populacionais mais expostos a riscos, como as pessoas
idosas. Esses dados sinalizam que as operadoras ainda desenvolvem ações que reduzem o uso de
serviços da população de maior risco de morbidade, ou seja, idosos e portadores de doenças crônicas
reconhecidamente populações e agravos que aumentam o uso de serviços de saúde. Não há uma
crítica ao objetivo em si, mas é provável que, com esse objetivo, ou ao menos com uma tensão
configurada pela lógica do custo entre regulação econômica e o cuidado, as ações que compõem
propriamente a atividade de promoção da saúde por meio de grupos ainda tenha o escopo
predominante da educação para a saúde, focando disciplinar práticas e modos de vida. Ou seja,
compartilhem com o modelo biomédico uma leitura da produção da saúde que, ao fim e ao cabo,
culpabilizam o indivíduo e o seu grupo social e fragmentam as ações de enfrentamento. O enfoque
que se espera de ações de promoção da saúde, conforme já aponta a Política Nacional de Promoção
da Saúde do Ministério da Saúde é que
(...) as intervenções em saúde ampliem seu escopo, tomando como objeto os problemas e necessidades de saúde e seus determinantes e condicionantes de modo que a organização da atenção e do cuidado envolva, ao mesmo tempo, as ações e serviços que operem sobre os efeitos do adoecer e àqueles que visem o espaço para além dos muros das unidades de saúde e do sistema de saúde, incidindo sobre as condições de vida e favorecendo a ampliação de escolhas saudáveis por parte dos sujeitos e coletividades no território onde vivem e trabalham. (Brasil, 2008, pág. 7/8)
Vê-se que há uma construção pedagógica nas ações promocionais, com base nesse enfoque, que
inclui a compreensão dos modos de vida de indivíduos e das coletividades das quais fazem parte e a
construção de novos modos de andar a vida, nos quais tenham mais qualidade e autonomia. Há uma
forte evidência de que não é essa a concepção predominante nos grupos ofertados pelas operadoras
que se constitui pelo seguinte: diversos beneficiários informam desconhecer essa modalidade de
oferta e, quando avaliam que lhes será benéfica, a buscam no sistema público de serviços; muitos
profissionais das linhas de cuidado em estudo desconhecem essa possibilidade e, portanto, não têm
alternativa de propor aos usuários dos seus serviços um itinerário terapêutico que a inclua, ao menos
por dentro do sistema de serviços dos planos. Mais do que isso, no percurso assistencial de parte
significativa dos usuários dos serviços de saúde mental, foram os próprios prestadores médicos de
planos e seguros privados de saúde que os referiram a modalidades ampliadas de atenção.
70
Há uma tensão visível entre a diversificação de ofertas assistenciais pelas operadoras de planos e
seguros privados de saúde e as lógicas de regulação do acesso e, ao que parece, essa iniciativa ainda
está em fase de absorção pelas mesmas. Portanto, se é verdade que compõem a agenda nas políticas
de atenção das operadoras, também parece ser verdade que é pelo fato de estar no foco da
regulamentação da ANS e, igualmente, na produção cultural contemporânea sobre a qualidade do
cuidado em saúde.
Quando se analisa o contexto das demais ofertas assistências que se somam aos grupos de
promoção e/ou educativos na ampliação do perfil de ações colocadas nos cardápios das operadoras,
essa constatação parece fortalecer-se. Com interesse para a análise do cuidado desta pesquisa,
também foram identificados a internação domiciliar, a assistência farmacêutica e o hospital-dia. A
assistência domiciliar foi informada por 08 (57%) operadoras na Região Norte e 05 (83%) operadoras
na Região Sul. A existência de programas de assistência farmacêutica foi informada por 06 (43%)
operadoras na Região Norte e 03 (50%) operadoras na Região Sul. O recurso de hospital-dia para a
atenção à saúde mental foi informado por 04 (29%) operadoras na Região Norte e 03 (50%)
operadoras na Região Sul.
Entre as alternativas destacadas, a assistência domiciliar foi o serviço mais freqüente, seguido de
assistência farmacêutica, transporte pré-hospitalar e o lugar hospital dia para atividades de saúde
mental. Esses dados sinalizam para a ampliação de modalidades assistências aos beneficiários. Todas
essas ofertas não estão disponíveis para o conjunto dos beneficiários e dependem de acordo entre
operadoras e beneficiários.
Entre os critérios para a oferta do serviço de assistência domiciliar, a ANS estabelece a necessidade
de indicação do médico assistente, a concordância do beneficiário e/ou seu responsável, assim como
condições objetivas no domicílio para acomodar essa ação, e o cumprimento das disposições da RDC
ANVISA nº 11/2006, que regulamenta este tipo de assistência. Assim, quando se tratar de alternativa
à internação hospitalar, a atenção domiciliar (homecare) oferecida pelas operadoras deverá cumprir
as disposições da Lei nº 9.656/98 para os planos de segmentação hospitalar, e, portanto, incluir os
medicamentos, honorários profissionais do médico assistente e da equipe multiprofissional indicada,
além de materiais e insumos de cuidado e dos equipamentos de suporte, deverão ser cobertos pela
operadora.
Em relação à assistência domiciliar, trata-se de um termo genérico que pode designar a internação
domiciliar propriamente dita, o apoio a cuidados domiciliários e visitas domiciliares, em arranjos
tecnoassistenciais bastante distintos entre si (Franco & Cols., 2007). Segundo a ANS12, na saúde
suplementar
(...) a atenção ou assistência domiciliar (homecare) vem sendo oferecida como alternativa à internação hospitalar, em especial para casos crônicos e de alta demanda aos serviços emergenciais, tendo em vista a redução de custos que representa para as operadoras e o maior conforto - desde que a residência possa acomodar a estrutura necessária para tal assistência - e segurança - inclusive pela redução de ocorrência de infecções por germes hospitalares resistentes - para os pacientes e familiares.
Como se pode verificar, a idéia de uma atenção substitutiva e, portanto, de uma modelagem
tecnoassistencial distinta da abordagem tradicional, aparece com força na definição dessa oferta.
12 De acordo com o tema “Assistência domiciliar (homecare) na saúde suplementar”. Disponível na internet:
http://www.ans.gov.br/main.jsp?lumPageId=8A958865269F2D960126ADCB843435EB.
71
Entretanto, mesmo em se tratando de internação domiciliar, aparentemente, na análise de situações
concretas onde ela se realiza, demonstra que a transição entre a atenção centrada no modelo
biomédico hegemônico e as novas modelagens tecnoassistenciais não se verifica, havendo uma
tensão entre situações contraditórias que representam ambos os pólos dessa construção (Franco &
Cols., 2007; Franco & Merhy, 2008). Além dessa tensão, também parece ter força relevante na
existência da alternativa de internação domiciliar no rol de ações de cuidado oferecidas pelas
operadoras o fato de que, progressivamente, se desenvolvem variações na cultura de cuidados em
saúde onde o acesso a abordagens assistenciais diferenciadas passa a ter um valor em si e, portanto,
a divulgação da sua existência no cardápio de ofertas de cada operadora produz uma visibilidade
estratégica que responde a pressões de mercado (Malta & Cols., 2005). A diferença entre as ofertas
da atenção domiciliar nas duas regiões pode fortalecer a hipótese de uma aposta na lógica de
mercado. Mais do que isso, o fato de que os prestadores de serviço (hospitais e médicos,
principalmente) desconhecem, em sua grande parte, a existência dessa modalidade também parece
apontar nessa direção.
Ou seja, parece provável que, conforme já identificado por outros autores, o processo de
reestruturação produtiva atual esteja sendo controlado pelas lógicas do modelo biomédico
hegemônico e do capital, com atenuamento importante da lógica da integralidade. Dito de outro
modo, a reestruturação produtiva em curso não parece ter capacidade de mudar significativamente
a modelagem tecnoassistencial vigente. Dois estudos recentes sobre políticas e práticas de cuidado
na saúde suplementar fortalecem essa constatação. Em relação à atenção ao idoso, Veras & Cols.
(2008) constataram que as operadoras de planos e seguros privados de saúde incorporaram a
preocupação com mudanças nas ofertas assistenciais nos seus discursos, ampliaram ofertas e
diversificaram serviços, entretanto, as ofertas mais compatíveis com as diretrizes políticas e
científicas sobre a saúde do idoso estão restritas a pequenos grupos de indivíduos, limitam-se às
ofertas de menor custo para a operadoras, não incluem a educação dos profissionais envolvidos e
parecem objetivar predominantemente a redução dos custos e a divulgação da existência dessas
modalidades para a promoção institucional das operadoras. Utilizando focos e abordagens distintas,
Franco e Merhy (2008) analisaram um caso diferenciado de incorporação de um Programa de
Internação Domiciliar por uma operadora de medicina de grupo, identificando a diversificação de
aspectos de infra-estrutura e logística de suporte ao programa, principalmente na rede própria da
operadora, e de apoio diagnóstico e terapêutico, entretanto com uma visível tensão entre as lógicas
de redução de custos da operadora e das necessidades dos beneficiários. Por outro lado, no que se
refere aos processos de trabalho, as inovações em termos de diversificação de profissionais e
cenários de cuidado expressam uma tensão entre a lógica instrumental de condução do projeto
terapêutico – mais familiar ao modelo hegemônico de cuidado e aos protocolos de organização de
práticas e controle de custos da operadora – e uma lógica mais acolhedora, reivindicada pela
micropolítica das relações entre os profissionais, beneficiários e familiares.
Provavelmente, as questões relativas à assistência farmacêutica ilustrem ainda mais claramente as
questões levantadas pela análise da oferta de cuidados domiciliares pelas operadoras. As
informações sobre a assistência farmacêutica estão apresentadas no Gráfico 3.9 e na Tabela 3.12.
72
GRÁFICO 3.9 - Oferta de benefícios farmacêuticos informados pelas operadoras nas Regiões Norte e Sul, em números absolutos e percentuais.
Fonte: Dados primários da pesquisa
Como se pode verificar no Gráfico acima, metade das operadoras da Região Norte e 83% das
operadoras da Região Sul informam ofertar alguma modalidade de benefício farmacêutico para seus
associados. O acesso a medicamentos e insumos farmacêuticos é um nó crítico no sistema de saúde
brasileiro, sendo responsável pelo principal componente de desembolso direto de pagamento no
sistema. Além da reduzida oferta de medicamentos sem custos nos sistemas de serviços, a cultura de
consumo direto de medicamentos também auxilia a explicação desses dados. Entretanto, quando se
analisa as ofertas no interior dos sistemas de serviço, ele se torna um marcador relevante da
integralidade, uma vez que a restrição de acesso pelo custo e seu impacto nos orçamentos das
pessoas e das famílias é importante e pode limitar o cuidado. No caso em análise, verifica-se uma
tendência de oferta de alguma modalidade de benefício farmacêutico na maior parte das
operadoras, sendo que isso é particularmente verdadeiro na Região Sul. As disputas de mercado
sejam provavelmente explicação suficiente para caracterizar a diferença entre as regiões, uma vez
que a maior cobertura na Região Sul torna a população que pode ter acesso aos planos e seguros
privados de saúde mais criteriosa para analisar os pacotes de benefícios ofertados. Como se verifica
na Tabela 3.12, esses benefícios não têm uma grande capacidade de dialogar com a garantia de
acesso a medicamentos.
TABELA 3.12 - Tipologia dos benefícios farmacêutico ofertados pelas operadoras nas Regiões Norte e Sul, em número absoluto e percentuais.
Fonte: Dados primários da pesquisa
7
5
12
7
1
8
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
NORTE SUL TOTAL
Não
Sim
Nº % (Op.) Nº % (Op.) Nº % (Resp.)
Desconto em farmácia credenciada 4 28,6 3 50,0 7 53,8
Reembolso parcial 3 21,4 0 - 3 23,1
Aquisição em rede própria 0 - 2 33,3 2 15,4
Aquisição a preço de custo 1 7,1 0 - 1 7,7
Reembolso total 0 - 0 - 0 -
TOTAL 14 100,0 6 100 13 100
FORMA DO BENEFÍCIONORTE SUL TOTAL
73
Como se pode verificar, a principal modalidade de benefício é o desconto para a compra em rede de
farmácias credenciadas das operadoras (53,8%) ou mesmo na rede própria (23,1%). O benefício de
reembolso parcial (23,1%) foi referido na Região Norte, assim como uma operadora na Região Norte
informou o benefício de compra pelo preço de custo dos medicamentos. Nenhuma operadora referiu
o benefício do reembolso total ou a doação de medicamentos aos beneficiários. Esses dados
sinalizam para ação das operadoras no sentido de ofertar aos usuários alguma alternativa de oferta
de serviços em a assistência farmacêutica, particularmente a oferta de descontos na aquisição. As
estratégias, no entanto, apontam para de associação de negócios das operadoras com redes de
vendas de medicamentos que ofertem descontos aos usuários quando da compra, sendo o acesso a
assistência farmacêutica responsabilidade do beneficiário. Essa estratégia de promoção é bastante
usual no mercado final de medicamentos, e os “convênios” de desconto são utilizados pelas
operadoras, por órgãos de classe e sindicatos, por empresas jornalísticas, por agremiações
esportivas, entre outros. Essas estratégias de facilitação do acesso, pouco impactam no acesso aos
medicamentos e, mais do que isso, pouco oferecem em relação à educação para o consumo racional
de medicamentos.
O marcador analítico da assistência farmacêutica, como se verificou acima, não dá evidências de uma
política de cuidados voltada às linhas de cuidado na saúde suplementar e aponta essa área como um
grande obstáculo à integralidade, seja pelas limitações financeiras de acesso a medicamentos
necessários para os beneficiários sob cuidados na saúde suplementar, seja pelo fato de que têm um
componente educativo que confirma o uso pouco racional de medicamentos pela população em
geral. Por outro lado, o acesso a medicamentos sem custos adicionais é um argumento freqüente dos
usuários da atenção no ciclo mãe-bebê e em saúde mental que operam itinerários híbridos entre
serviços da saúde suplementar e serviços do sistema público de saúde. O principal limitador de uma
mudança importante nas políticas das operadoras é, provavelmente, o custo dos medicamentos.
3.4.2 – REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E INTEGRALIDADE NA SAÚDE SUPLEMENTAR: AS
MUDANÇAS ALTERAM A MODELAGEM TECNOASSISTENCIAL (OU: AS LINHAS DE CUIDADO
ESTÃO SENDO INCORPORADAS)?
Como se verificou na primeira parte deste item, há visíveis mudanças na organização do cuidado na
saúde suplementar, associadas às mudanças na regulamentação da área e às políticas do sistema de
saúde como um todo. A ampliação e diversificação do acesso a ações e serviços é um fato na
contemporaneidade e isso gera uma reestruturação produtiva relevante no campo das práticas.
Entretanto, a pergunta que permanece é relativa à modelagens assistenciais mais compatíveis com a
integralidade e, em particular, sobre a incorporação de linhas de cuidado.
Permanecemos com a potência desta parte do campo empírico, ou seja, a informação sobre as
políticas em vigência pelas operadoras de planos e seguros privados de saúde nas Regiões Sul e
Norte. Ou seja, trata-se de analisar as políticas e práticas de macrorregulação, evidenciando aspectos
da microrregulação apenas na produção discursiva dos sujeitos.
No ciclo de cuidados mãe-bebê, foram solicitadas informações às operadoras e aos obstetras acerca
da existência de programas de acompanhamento das gestantes de alto risco, conforme sintetizam as
tabelas a seguir.
74
TABELA 3.13 – Existência de programas de acompanhamento das gestantes de alto risco
informados pelas operadoras
ACOMPANHAMENTO DAS GESTANTES DE ALTO
RISCO
NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 2 14,3 1 16,7 3 15,0
Não 12 85,7 5 83,3 17 85,0
TOTAL 14 100,0 6 100,0 20 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
TABELA 3.14 – Conhecimento pelos obstetras de programas de acompanhamento das gestantes de
alto risco das operadoras
CONHECIMENTO DOS PROGRAMAS DE
ACOMPANHAMENTO
NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 4 36,4 4 66,7 8 47,1
Não 7 63,6 2 33,3 9 52,9
TOTAL 11 100,0 6 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa. Considerado o número de sujeitos e não de vínculos.
Conforme se verifica, apenas 15% das operadoras informam ter implantados programas de
acompanhamento às gestações de alto risco. Merece destaque uma operadora do segmento de
autogestão que tem resposta positiva nas duas Regiões. A maior parte das operadoras não tem
programas estruturados e implantados, delegando a gestão do cuidado neste segmento à iniciativa
das próprias gestantes e/ou aos obstetras. É informação relevante também o fato de que o
conhecimento sobre a existência dos programas por parte dos obstetras não tem coincidência com a
sua vinculação com as operadoras. Os profissionais associados à operadora de autogestão assinalada
conhecem o programa informado e alguns participam dele. Em relação aos demais vínculos com
outras operadoras, se verifica um padrão de respostas positivas que parece confundir a existência de
um programa estruturado com a permissão da operadora de consumir procedimentos em maior
volume e diversidade quando se trata de uma gestação de alto risco. Ou seja, no protocolo de
autorização prévia e nos mecanismos de auditoria dos procedimentos realizados, a evidência
documentada pelo obstetra de gestação de alto risco constitui argumento para a dilatação do padrão
médio de consumo de procedimentos na atenção à gestante. Em relação às respostas positivas,
verifica-se que são mais coincidentes com as operadoras as respostas dos profissionais vinculados
diretamente às mesmas. Esse dado fortalece a evidência de que as inovações assistenciais recentes
ainda são experimentais e dirigidas a um grupo pequeno de beneficiários, sendo utilizadas
predominantemente para fins de análise das próprias operadoras e de divulgação da sua carteira de
procedimentos.
Por outro lado, em relação aos procedimentos comuns na atenção de pré-natal, verifica-se uma
dilatação importante nas ofertas das operadoras. A Tabela abaixo descreve as respostas dos
dirigentes das operadoras em relação à regularidade de consultas em obstetrícia permitidas nos
sistemas de regulação das operadoras. Verifica-se que a maior parte das operadoras permite um
volume de consultas suficiente para, por exemplo, garantir um pré-natal com o número de consultas
recomendado na literatura. As duas operadoras que informam períodos maiores de intervalo entre
uma consulta e outra caracterizam o atendimento nas frações desse período como relativo à
interconsulta, também prevista nos planos.
75
TABELA 3.15 - Tempo médio previsto pelas operadoras para agendamento de consulta obstétrica
TEMPO MÉDIO DE
AGENDAMENTO
NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Menos de 15 dias 2 14,3 3 50,0 5 27,8
De 15 a 30 dias 10 71,4 3 50,0 13 72,2
De 30 a 60 dias 2 14,3 0 0,0 0 0,0
Mais de 60 dias 0 0,0 0 0,0 0 0,0
TOTAL 14 100,0 6 100,0 18 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
A análise da abrangência das ofertas de cuidado incluídas na consulta de pré-natal, que é realizada
pelos profissionais de obstetrícia, buscou verificar eventuais déficits com relação à atuação
uniprofissional na atenção. A capacidade explicativa das respostas dos obstetras evidentemente não
permite analisar a qualidade das atividades realizadas, apenas uma aproximação em relação ao
conceito de cuidado que está sendo operado. Conforme descreve a tabela a seguir, há um foco
dilatado de atividades de orientação ofertadas pelo conjunto dos profissionais entrevistados,
ressaltando-se que nenhum dos participantes deixou de informar atividades adicionais à rotina de
procedimentos obstétricos.
TABELA 3.16 - Atividades comumente desenvolvidas pelos obstetras, segundo os mesmos
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Orientação quanto à dieta 4 14,3 4 16,0 8 15,1
Orientações quanto a exercícios físicos 4 14,3 4 16,0 8 15,1
Instruções quanto a hábitos saudáveis 4 14,3 4 16,0 8 15,1
Orientações sobre amamentação e cuidados ao bebê 4 14,3 4 16,0 8 15,1
Planejamento familiar 4 14,3 4 16,0 8 15,1
Sexualidade e sexo na gravidez 4 14,3 3 12,0 7 13,2
Outras 4 14,3 2 8,0 6 11,3
TOTAL 28 100,0 25 100,0 53 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
TABELA 3.17 - Serviços ofertados para apoio ao atendimento ambulatorial obstetrícia segundo os
obstetras.
SERVIÇOS OFERTADOS NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Interconsultas 11 29,7 1 6,7 12 23,1
Serviços de Apoio Diagnóstico e Terapia 11 29,7 5 33,3 16 30,8
Cirurgia Ambulatorial 9 24,3 5 33,3 14 26,9
Hospital-Dia 6 16,2 4 26,7 10 19,2
Outro 0 0,0 0 0,0 0 0,0
TOTAL 37 100,0 15 100,0 52 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa. Considerado o número de respostas válidas.
76
Como se verifica na tabela acima, entre os recursos de apoio ao atendimento em obstetrícia para os
profissionais médicos, os mais freqüentemente identificados pelos mesmos são as interconsultas e o
apoio diagnóstico e terapêutico. Cirurgias ambulatoriais são menos freqüentes nas informações dos
obstetras na Região Norte e mais freqüentes na Região Sul, assim como a alternativa de hospital-dia.
As diferenças inter-regionais provavelmente decorrem da variação da capacidade instalada dos
serviços e confirmam a hipótese já formulada e descrita em diversos momentos do relatório de que a
capacidade física e tecnológica impacta o cuidado oferecido pela dificuldade objetiva de acesso, mas
também por não pertencer ao universo de recursos reconhecidos pelos profissionais que operam
diretamente o cuidado. Ainda em relação às informações da tabela, chama a atenção o fato de que
os obstetras de ambas as regiões não identificam alguns recursos de apoio que foram informados
pelas operadoras, como grupos, atenção domiciliar e benefícios farmacêuticos, por exemplo.
Aproximadamente 30% das operadoras entrevistadas informou ter grupos de pré-natal e 15% de
puericultura, 65% programas de assistência domiciliar e 45% programas de assistência farmacêutica.
Uma forte hipótese para interpretar essa diferença nas informações é uma divergência entre os
mecanismos de macro e microrregulação das operadoras, que fortalece a fragmentação das ações.
Parece haver certa inconsistência da política de cuidado informada pela operadora ao público e aos
profissionais vinculados o que, de toda forma, gera uma evidência importante de que não são ações
articuladas para o cuidado. A oferta de ações que ampliam o leque de ofertas parecem ser ainda
incipientes e, provavelmente, sejam uma resposta recente à política de qualificação da saúde
suplementar implementada progressivamente pela ANS.
Ainda com o intuito de investigar a configuração de ações de gestão voltadas para compor uma linha
de cuidado, vale a pena analisar a resposta dos prestadores hospitalares em relação à utilização de
recursos com maior densidade tecnológica. Ainda na atenção ao ciclo mãe-bebê, solicitou-se aos
prestadores hospitalares as modalidades de planejamento de uso de leitos de UTI Neonatal para
partos com gestantes de alto risco. As respostas estão tabuladas na tabela a seguir e demonstram
que também para esses recursos não há a configuração de uma linha de cuidado como definição da
política de cuidado oferecida aos beneficiários de planos e seguros privados de saúde nas duas
Regiões em estudo.
TABELA 3.18 - Acesso planejado a leitos de UTI Neonatal para partos de gestante de alto risco, de
acordo com os prestadores hospitalares
PLANEJAMENTO DE ACESSO NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim, é possível planejar com antecedência na rede
própria/credenciada 7 100,0 1 50,0 8 88,9
Não é possível garantir o acesso com antecedência,
pois as vagas são utilizadas em função da
disponibilidade do momento 0 0,0 1 50,0 1 11,1
TOTAL 7 100,0 2 100,0 9 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa. Consideradas apenas as respostas válidas.
Como se verifica, o planejamento antecipado do uso de leitos de UTI Neonatal para partos em
gestantes de alto risco é uma possibilidade assistencial oferecida mais freqüentemente pelos
prestadores hospitalares na Região Norte. Aqui é importante registrar que 09 hospitais da Região
Norte e os 05 hospitais da Região Sul possuíam leitos de UTI Neonatal por ocasião da pesquisa.
Embora parte dos hospitais não tenha registrado respostas válidas para essa questão, é bastante
provável que a situação dos mesmos esteja mais bem representada pela segunda alternativa, uma
77
vez que também para os dirigentes das operadoras o uso desse serviço é uma oferta assistencial que
se associa ao parto apenas pela sua disponibilidade objetiva, não sendo associada por outro
mecanismo que não a demanda do médico assistente aprovada pela operadora.
O acesso a leitos de UTI Neonatal para partos de gestações de alto risco é recomendação da política
nacional e fortemente indicado em virtude da possibilidade de complicações associadas aos mesmos.
Entretanto, no caso da atenção ao parto na rede vinculada aos planos e seguros privados de saúde
que compõem a amostragem desta pesquisa, os mecanismos de regulação do acesso parecem estar
predominantemente vinculados ao controle das operadoras e dos médicos assistentes.
Outro marcador avaliativo investigado da incorporação de novas abordagens do cuidado ao ciclo
mãe-bebê foi o alojamento conjunto. Aproximadamente 67% dos hospitais da Região Norte e apenas
40% dos hospitais da Região Sul informaram a existência desse serviço, que é recomendado como
dispositivo para humanização da assistência ao parto e ao puerpério nas políticas oficiais.
TABELA 3.19 – Existência de alojamento conjunto, segundo os prestadores hospitalares
ALOJAMENTO CONJUNTO NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 8 66,7 2 40,0 10 58,8
Não 3 25,0 1 20,0 4 23,5
Branco/Nulo 1 8,3 2 40,0 3 17,6
TOTAL 12 100,0 5 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
No mesmo sentido, os dirigentes hospitalares foram inquiridos acerca da existência de programas
mãe-canguru ou similares, indicados para a humanização do cuidado ao bebê. Verifica-se que esse
dispositivo é ainda menos freqüente nos hospitais vinculados à saúde suplementar. Chama a atenção
nas duas tabelas, o fato de que essas modalidades parecem desconhecidas para alguns dirigentes,
que não as associam ao cuidado de pré-natal.
TABELA 3.20 – Existência de Programa Mãe-Canguru ou similar, segundo os prestadores
hospitalares
PROGRAMA MÃE-CANGURU NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 4 33,3 1 20,0 5 29,4
Não 4 33,3 2 40,0 6 35,3
Branco/Nulo 4 33,3 2 40,0 6 35,3
TOTAL 12 100,0 5 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
Em relação às ofertas assistenciais para o cuidado no ciclo mãe-bebê, há fortes evidências na
pesquisa realizada que confirmam os dados já tratados anteriormente, que apontam uma
incorporação limitada de atividades assistenciais, restritas em termos de número de beneficiários,
capazes de representar uma reestruturação produtiva no setor, mas com pouca potência para
demonstrar uma efetiva mudança na modelagem tecnoassistencial adotada.
78
Buscou-se avançar um pouco mais na análise dos dispositivos de gestão do cuidado oferecidos ao
ciclo mãe-bebê na saúde suplementar. Esses mecanismos dizem respeito à fluxos integrados de
cuidado e mecanismos de regulação cuidadora, no referencial de análise adotado.
Na tabela abaixo, verifica-se que aproximadamente 60% das operadoras, a maior parte delas
localizada na Região Norte, tem mecanismos de identificação para posterior acompanhamento de
beneficiários que utilizam os serviços de emergência.
TABELA 3.21 – Existência de mecanismo de identificação do beneficiário atendido em serviço de
emergência para o seu acompanhamento futuro (follow up), segundo os obstetras
MECANISMOS DE IDENTIFICAÇÃO DO BENEFICIÁRIO NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 7 63,6 3 50,0 10 58,8
Não 4 36,4 3 50,0 7 41,2
TOTAL 11 100,0 6 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
Em relação ao acompanhamento de egressos nas internações hospitalares, verifica-se que 67% das
operadoras na Região Sul e 100% das operadoras da Região Norte têm esses mecanismos, na opinião
dos obstetras, conforme a tabela abaixo.
TABELA 3.22 – Existência de mecanismos de acompanhamento aos egressos de internações
hospitalares na operadora, segundo os obstetras
ACOMPANHAMENTO NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 11 100,0 4 66,7 15 88,2
Não 0 0,0 2 33,3 2 11,8
TOTAL 11 100,0 6 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
TABELA 3.23 - Conhecimento do prestador obstetra sobre número total de beneficiários
portadores de hipertensão arterial
CONHECIMENTO DO NÚMERO DE PORTADORES DE
HIPERTENSÃO
NORTE SUL TOTAL
Nº % Nº % Nº %
Sim 8 72,7 2 33,3 10 58,8
Não 3 27,3 4 66,7 7 41,2
Nulo 0 0,0 0 0,0 0 0,0
TOTAL 11 100,0 6 100,0 17 100,0
Fonte: Dados primários da pesquisa.
Quando se busca analisar a existência de indicadores confiáveis para o planejamento do cuidado,
verifica-se que para a maior parte dos obstetras da Região Norte e pouco mais de 30% da Região Sul
esses mecanismos existem, sendo que parte desses profissionais descreveu os prontuários
79
profissionais como a base desses dados. Para os profissionais vinculados diretamente às operadoras,
a existência de prontuários eletrônicos integrados confirma adequadamente essa afirmação, mas
para os prestadores com vínculo indireto essa afirmação parece referir-se apenas a uma fonte
potencialmente disponível ou a dados de utilização do próprio obstetra, exclusivamente relativos aos
beneficiários sob seus cuidados.
4. A ATENÇÃO AO CICLO MÃE-BEBÊ: QUESTÕES PARA A ANÁLISE DO CUIDADO
A PARTIR DE “CASOS MARCADORES”
Este capítulo do relatório de pesquisa apresenta alguns estudos que compõem a base empírica da
pesquisa em relação às modelagens tecnoassistenciais que operam o cuidado no ciclo mãe-bebê na
saúde suplementar. Esses estudos funcionam como “estudos multicêntricos integradores” no marco
analítico da pesquisa, conforme metodologia já utilizada em pesquisa anterior (FERLA & Cols.,
2009a).
Os estudos escolhidos para comporem este capítulo aprofundam aspectos destacados nas análises
anteriores desta pesquisa e compõem o que se denominou de “casos marcadores”, focando práticas
e evidências do cotidiano. O primeiro desses estudos traz à análise a atenção de pré-natal na
gestação de alto risco e ajuda compreender a relação entre o cuidado e a racionalidade biomédica,
em particular o uso de recursos tecnológicos de alta sofisticação. O mix entre público e privado,
marcador transversal em toda a pesquisa, ajuda a compreender diferenças e semelhanças nas
políticas de cuidado em ambos os componentes do sistema de saúde, na pesquisa são representados
por 02 serviços, um vinculado ao sistema público e outro ao sistema suplementar. A análise é
operada, nesse estudo, levando em conta o perfil físico e tecnológico dos serviços, a organização do
trabalho, a diversidade da oferta assistencial oferecida, indicadores de saúde disponibilizados e a
opinião de trabalhadores vinculados a cada um dos serviços sobre os aspectos relevantes para
compreender o cuidado oferecido nos serviços, em articulação com as disposições das políticas e
diretrizes assistenciais para a gestação de alto risco.
O segundo estudo aprofunda-se na análise do cuidado no momento do parto, tendo o conceito de
humanização das políticas de saúde nacionais como analisador. O marco analítico inclui uma breve
revisão de aspectos históricos da atenção ao parto, de políticas contemporâneas e com entrevistas
com trabalhadores e usuários e observação de um contexto concreto de um centro obstétrico de
referência regional que, mesmo vinculado ao sistema público de serviços, também atende a usuárias
vinculadas a planos e seguros privados de saúde. Os aspectos da análise incluem a organização do
trabalho, as práticas de cuidado, as ofertas assistenciais, as relações entre os profissionais e com as
usuárias e familiares, bem como a incorporação de abordagens das políticas de humanização da
gestão e da atenção.
O terceiro estudo, realizado com 15 mães usuárias de UTI Neonatal em um serviço privado, também
utiliza-se das diretrizes assistenciais e políticas em relação à amamentação e busca verificar sua
implantação numa situação assistencial extrema (a internação em UTI Neonatal) e busca evidências
81
das orientações recebidas no pré-natal, da articulação entre os serviços, das ofertas assistenciais
disponibilizadas e de práticas de integralidade nos fluxos assistenciais público e privado. As
características semelhantes e diferentes na assistência pública e privada suplementar, também nesse
estudo, contribuem para a compreensão das políticas de cuidado ofertadas e, em particular, da
natureza das tecnologias que operam no cuidado.
Por fim, o quarto estudo escolhido para compor o relatório analisa o vínculo entre profissionais
médicos pediatras e usuárias de serviços do subsistema público de serviços e de planos e seguros
privados, buscando compreender variáveis que facilitam e dificultam o estabelecimento de
interações mais fortes, marcadoras de integralidade do cuidado. Foram entrevistados médicos
pediatras e mães, de ambos os componentes do sistema de serviços, tendo sido identificada uma
preocupante fragilidade não somente na construção de vínculos de cuidado, mas, também, uma
divergência significativa na própria compreensão do vínculo e das condições em que se desenvolve.
82
4.1. GESTAÇÃO DE ALTO RISCO: MIX PÚBLICO E PRIVADO E POLÍTICAS DE
CUIDADO NO COTIDIANO DOS SERVIÇOS13
A organização do trabalho no cotidiano dos serviços da saúde suplementar é um dos planos de
análise do estágio de incorporação da tecnologia de linhas de cuidado no desenho tecnoassistencial
dos mesmos. A primeira parte deste capítulo relata o uso de uma metodologia de análise da
interface entre as políticas e as práticas de cuidado oferecidas em duas instituições hospitalares na
região da Serra Gaúcha, uma vinculada ao sistema público de serviços de saúde e outra à rede
assistencial da saúde suplementar. Compõe parte do que se apresenta como metodologias de análise
e acompanhamento da integralidade no cotidiano dos serviços. Mais do que os resultados, interessa
aqui demonstrar a capacidade de análise das modelagens tecnoassistenciais dos serviços e redes de
saúde que têm o uso de evidências do cotidiano obtidas a partir de diferentes fontes, tratadas por
meio da triangulação. O marco inicial da aproximação é tomado da ciência política que informa uma
articulação apenas parcial entre o desenho de uma política e sua implementação (Menicucci, 2007),
recomendando seu acompanhamento contínuo, assim como as formulações de Madel Luz (Pinheiro
& Luz, 2007), que apontam o plano das práticas cotidianas como capazes de evidenciar os níveis de
integralidade. Além disso, também se toma a articulação feita por Merhy (2002) entre as naturezas
das tecnologias de cuidado em saúde e o trabalho em saúde. Por fim, o conceito de “escuta
pedagógica” (Ceccim, 2004) utilizado neste caso, não diretamente para o cuidado de pessoas, mas
para a organização de sistemas, redes e serviços de saúde. Aqui, a escuta pedagógica, que é voltada
aos “ruídos” (Merhy & cols., 1997) no processo assistencial na saúde suplementar, opera como um
dispositivo gestor da “caixa de ferramentas”, produzindo inteligência acerca das modelagens
tecnoassistenciais (Ferla & cols., 2009b). Pretende-se identificar a capacidade de organizar-se de
acordo com as evidências do cotidiano; ou seja, toma-se a capacidade de escuta e aprendizagem, no
caso a ação de gestão sobre fluxos e processos prévios, como marcador da natureza da regulação
que se estabelece no cotidiano desses serviços.
Para a análise dos processos de trabalho realizados no interior dos serviços com vistas à aproximação
analítica dos desenhos tecnoassistenciais foram utilizados dados secundários de sistemas de
informação disponíveis nas instituições estudadas e nas bases de dados do Sistema Único de Saúde
(SUS), em particular do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) e do Sistema de Informações
sobre Nascidos Vivos (SINASC); documentos e registros; assim como a entrevista com profissionais
que compõem as equipes multiprofissionais dos dois serviços.
A assistência adequada às gestações de alto risco é um tema com relevância crescente na atualidade.
Em média, 15% do total de mulheres grávidas apresentam alto risco de complicações e o cuidado
adequado envolve a visão global tanto da mulher quanto do concepto, por meio de uma equipe
multiprofissional e uma organização do cuidado marcada pela idéia da integralidade (MADI &
MORAES, 2004). A assistência em gestão de lato risco é um marcador qualificado para a análise da
13 Este item foi produzido com base em pesquisa empírica realizada por Ariane Caroline Lazari (2008), com
orientação de Alcindo A. Ferla e Margarete Isoton De David.
83
modelagem tecnoassistencial, uma vez que oferece ao olhar analítico diversas tensões, como em
relação às diferentes naturezas de tecnologias envolvidas ou às diferentes lógicas para operar o
cuidado, que podem explicitar ruídos nos processos de trabalho. Trata-se não de uma análise com
perspectiva panorâmica, mas que busca profundidade em situações peculiares. Em termos
metodológicos, aproxima-se do que Merhy & Cols. (1997) propõem com o conceito de “ruídos nos
processos de trabalho” para o cuidado.
Algumas situações que envolvem o cuidado prestado no momento do parto também precisam ser
apontadas para caracterizar situações de risco e que estão associadas, portanto, a marcadores de
necessidade para a organização da assistência a essa condição da vida. A taxa de cesarianas é um
exemplo. No nosso meio, esse problema é expressivo. No Hospital Público de Caxias do Sul,
verificam-se taxas elevadas de partos cesáreos, que ocorrem em aproximadamente de 36% do total
de partos realizados. Uma taxa elevada para um hospital que deveria seguir as recomendações da
política nacional de saúde, embasada na Organização Mundial da Saúde, que apregoa a redução do
uso excessivo de tecnologia ou a aplicação de tecnologia com elevada sofisticação e um número
máximo de 15% do total de partos por cesariana (Ministério da Saúde, 2006). No caso específico do
Hospital Público, parte da explicação da taxa de cesarianas pode estar na própria organização do
Sistema de Saúde na Região da Serra Gaúcha. O hospital em questão é o serviço de referência a 48
municípios vizinhos e é um dos poucos hospitais que tem estrutura de UTI-Neonatal e UTI-Adulto,
podendo assim atender às gestantes e aos neonatos que correm risco de vida. O procedimento da
cesariana está mais associado à gestação de risco, onde a necessidade de controle de questões como
o tempo, a viabilidade do feto e a própria saúde da mãe, entre outros motivos, justificam sua
utilização. Também está associado a certos modos de organização do trabalho e a lógicas estranhas à
integralidade, quando a escolha está naturalizada no imaginário de uma suposta segurança associada
à sofisticação tecnológica. Nesse caso, provavelmente, se daria a naturalização da decisão pelo
procedimento da cesariana em decorrência da freqüência em que ela é tecnicamente justificada,
gerando um ciclo vicioso que a torna um procedimento naturalmente adequado ao nascimento, a
todos os nascimentos. Há que se ressaltar que o serviço em questão é referência para a formação de
profissionais de saúde e, portanto, fortemente capaz de gerar modelos de atuação profissional.
Como previsto no manual de pré-natal do Ministério da Saúde, as taxas de mortalidade materna e
fetal continuam sendo problemas de saúde pública e estão relacionadas às taxas de cesarianas e
outros marcadores de qualidade da assistência de pré-natal, ao parto e ao puerpério. Do total de
mortes em crianças menores de um ano, 52% ocorre no período neonatal, sendo que grande parte
delas está associada à atenção dispensada ao ciclo mãe-bebê (Ministério da Saúde, 2006).
De acordo com a literatura e com a Campanha do Ministério da Saúde voltada para o incentivo do
parto normal, parece possível supor que a implantação dessa natureza de procedimentos poderia
diminuir ou minimizar os agravos maternos e fetais nas gestações de alto risco, bem como dar
suporte emocional e técnico para suprir as necessidades apresentadas nesse período da vida das
mulheres gestantes, seus familiares e, mesmo, do filho. Trata-se, aqui, de pôr em questão o
imaginário que naturaliza procedimentos tecnológicos como equivalentes ao cuidado em saúde.
Para o Ministério da Saúde (2006) gestação de alto risco é “aquela na qual a vida ou saúde da mãe
e/ou do feto e/ou do recém-nascido, têm maiores chances de serem atingidas que a média da
população considerada”. Sendo a gestação um fenômeno fisiológico e, por isso mesmo, sua evolução
84
se dá na maior parte dos casos sem intercorrências, mas há uma pequena parcela de gestantes que,
por terem características especificas, ou por sofrerem algum agravo, apresentam maiores
probabilidades de evolução desfavorável, tanto para o feto como para a mãe (Ministério da Saúde,
2000). O monitoramento adequado das condições da mãe e do bebê, durante o pré-natal, a
identificação precoce das condições associadas ao risco e seu manuseio e a gestão adequada do
cuidado dispensado à gestação estão associados ao sucesso do pré-natal, inclusive com a redução
das intervenções tecnológicas (Ministério da Saúde, 2000).
Segundo o Ministério da Saúde (2000) a tipologia de fatores que constituem risco para a gestação
inclui características individuais e condições sócio-demográficas desfavoráveis, condições ambientais
desfavoráveis, a história clínica e reprodutiva anterior e doenças obstétricas na gestação atual. Esses
fatores articulam-se a componentes emocionais, representando um desafio grande para ser
enfrentando pela equipe multidisciplinar (Ministério da Saúde, 2000). É o conjunto desses fatores
que precisam ser acompanhados durante a atenção do pré-natal.
A literatura especializada aponta que atividades educativas, o aumento na freqüência de visitas pré-
natal e intervenções selecionadas e de caráter profilático têm capacidade de reduzir essa condição
de risco (SILVA, 1998). Trata-se de um trabalho em equipe articulado, com os serviços de saúde
operando no sentido de fazer a gestão do cuidado da gestante e do concepto, assim como do seu
grupo familiar. Mais do que isso, trata-se, como afirma Merhy (2002) da gestão do cuidado centrada
na relação entre o usuário e os profissionais e governada por tecnologias relacionais.
4.1.1. O CAMPO EMPÍRICO: HOSPITAIS DOS SISTEMAS DE SERVIÇOS PÚBLICO E
SUPLEMENTAR
A apresentação e a discussão dos achados desta etapa da pesquisa serão feitas em três eixos,
coincidentes com as principais estratégias de coleta de dados informadas na descrição da
metodologia: caracterização dos serviços em estudo, perfil dos nascidos vivos em partos ocorridos
em Caxias do Sul pela análise dos dados secundários de nascidos vivos e análise dos questionários
aplicados aos profissionais envolvidos diretamente no cuidado no cotidiano de ambas as instituições.
4.1.1.1. CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS
O Hospital Público é uma das principais referências na atenção ao parto para o Sistema Único de
Saúde (SUS) e é composto de 267 leitos, atendendo às especialidades de Obstetrícia/Ginecologia,
Neonatologia, Pediatria, Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Urgência, bem como os serviços de:
Oncologia, Hemodiálise, Radiologia, Ecografia, Tomografia, Mamografia, Recreação Infantil,
Anatomia Patológica, Eletroencefalograma, Endoscopia, Fibrobroncoscopia, Banco de Olhos, Análises
Clínicas, Colonoscopia, Ecocardiografia, Agência Transfusional e demais serviços de apoio, dirigidas
exclusivamente aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). É uma instituição de referência
85
regional, prestando atendimento aos municípios da 5ª Coordenadoria de Saúde do Estado do Rio
Grande do Sul. O Programa de Gestantes de Alto Risco é realizado em um serviço específico, que
possui uma área física composta por 2 consultórios, um com equipamento para realização de MAP,
mesa ginecológica e o outro é um consultório com aparelho sonar apenas para consultas do
acompanhamento da medicina fetal. Uma enfermaria que possui 03 leitos e 05 poltronas, dois
banheiros, televisão, esteira elétrica. Esse serviço recebe usuárias com suspeita de risco no
acompanhamento de pré-natal, encaminhadas pela rede assistencial básica ou o sistema de
regulação do acesso de municípios vizinhos. Esse acompanhamento é feito durante toda a gestação e
em alguns casos, dependendo da patologia em questão, as mulheres permanecem em
acompanhamento ou são encaminhadas a outras especialidades como endocrinologia e cardiologia,
diretamente pelo serviço.
A equipe multidisciplinar é composta por médicos responsáveis pelo programa, além de residentes
de medicina, nutricionistas, psicologia, técnicos de enfermagem que permanecem em tempo integral
no serviço e enfermeiras que dão suporte a alguns procedimentos.
Além da internação, o serviço oferece a modalidade de internação dia, no período das 07:00h às
17:30h. As usuárias recebem alimentação, controle da glicemia capilar, verificação da pressão
arterial, medicações quando necessário, avaliação física, psicológica, nutricional, caminhadas na
esteira elétrica, atividades de artesanato, assistem televisão, trocam experiências.
Esse hospital desenvolve um trabalho amplo e multiprofissional com as gestantes de alto risco,
dando ênfase na prevenção dos agravos gestacionais e melhorando as condições de nascimento dos
fetos, bem como incentivando o aleitamento materno como sendo hospital Amigo da Criança.
O Hospital Privado é um dos mais conceituados serviços de assistência médica e hospitalar da região
e é vinculado a uma operadora da modalidade de cooperativa médica. Dispõe de 120 leitos que
garantem o atendimento nas mais diversas especialidades médicas.
Operando com recursos tecnológicos avançados, atendendo às constantes necessidades de
atualização da área da saúde e contando com o auxílio dos serviços de apoio como a Nutrição,
Higiene, Lavanderia e Manutenção, o Hospital Saúde realiza em média 800 cirurgias por mês, 700
internações, 4.000 atendimentos ambulatoriais e 90 nascimentos.
O Hospital Privado abriga 20 leitos de UTI adulto e infantil, Centro Cirúrgico com 11 salas totalmente
equipadas para a realização dos mais diversos procedimentos cirúrgicos e 6 leitos individuais no
Pronto Atendimento. Além disso, conta com os serviços de diagnósticos no próprio ambiente
hospitalar, o que proporciona maior agilidade e conforto aos pacientes. Possui o Programa Gaúcho
de Qualidade e Produtividade e Sistema ISO 9001:2000.
As gestantes que necessitam tratamento são internadas na Maternidade onde recebem atendimento
médico e de enfermagem. Essas pacientes têm alta hospitalar e mantém acompanhamento no
consultório médico, passando a ter a assistência do mesmo, ou são encaminhados para o Centro
Obstétrico para interromper a gestação por parto normal ou cesariana.
Para o efeito da análise que se pretende aqui, ambos os serviços têm porte de referência no
respectivo sistema de serviços de saúde em que atuam. O hospital público tem maior escala de
produção de maior densidade tecnológica e maior abrangência territorial, estando vinculado ao
86
sistema regional de regulação do acesso. No caso da assistência à gestação de risco, articula-se
formalmente com a rede básica e com os demais serviços de referência especializada. Embora
articulando-se com a rede assistencial básica do sistema público de serviços, não oferece suporte à
atenção domiciliar, mesmo tendo como modalidade alternativa aos procedimentos de internação,
consultas e exames o hospital-dia. O volume de atendimentos prestados, a reconhecida experiência
dos profissionais que atuam nesse serviço – que opera como hospital de ensino para uma instituição
comunitária de grande porte na Região – e a vinculação de profissionais nos dois serviços faz com
que, com alguma freqüência, usuárias do hospital privado sejam redirecionadas para
acompanhamento nesse serviço. Vê-se que a capacidade instalada, a diversidade assistencial, o
reconhecimento da qualidade técnica da assistência prestada, a dupla vinculação dos profissionais e,
por certo, questões econômicas de acesso e custo de procedimentos produzem articulações
público/privado na assistência à gestação de alto risco. Também é relevante destacar o
reconhecimento assistencial com o título de Hospital Amigo da Criança. O hospital privado, por sua
vez, tem reconhecimento em programas de acreditação empresarial.
4.1.1.2. OS INDICADORES DE SAÚDE E A INTELIGÊNCIA PARA O MONITORAMENTO DO
CUIDADO
O uso de indicadores para a análise do contexto empírico escolhido foi um grande desafio, uma vez
que os dados disponíveis ou estavam desatualizados ou excessivamente fragmentados. Utilizando
algumas referências metodológicas da literatura em Saúde Coletiva, optou-se por uma abordagem
similar à Estimativa Rápida (Acúrcio, Santos & Ferreira, 1998; Piovesan & Cols., 2005), com o suposto
de que o território locorregional é uma aproximação integrativa de diferentes bases de dados (Pinto,
2006) quando o interesse é a produção de conhecimentos para ampliar a capacidade de atuação em
contextos determinados (Ferla & Cols., 2009b). Nesse caso, a produção de conhecimentos pretende
ampliar a compreensão sobre a organização do trabalho e dos serviços e das lógicas que governam o
cuidado na saúde suplementar, permitindo novos padrões de inteligência para o contexto da análise
da incorporação de linhas de cuidado no ciclo mãe-bebê.
A primeira e predominante base de dados utilizada foi o Sistema de Informações sobre Nascidos
Vivos (SINASC), que registra as características mais importantes, como sexo, local onde ocorreu o
nascimento, tipo de parto e peso ao nascer, entre outras. Essa base de dados é alimentada pelas
Secretarias de Saúde e seus dados são disponibilizados pelo DATASUS. No caso dos dados
apresentados neste item, a origem dos dados do SINASC é o sítio eletrônico do DATASUS, mas
também dados preliminares obtidos junto à Equipe de Epidemiologia da Secretaria Municipal de
Saúde e de registros nos próprios serviços. Os marcadores de análise foram os fatores de risco para a
gestação, o perfil dos nascimentos e dados específicos de cada serviço analisado.
Entre os anos de 1996 e 2000, no Brasil, a taxa geral de bebês com menos de 2500g ao nascer,
diminuiu em 1,8%. Em outras regiões como o Centro-oeste e Nordeste, a ocorrência de baixo peso ao
nascer mostra uma tendência discreta de redução. A Região Sudeste apresenta as maiores taxas,
chegando a 8,5% em 2000. Na Região Sul, as crianças de baixo peso, aumentou de 7,7% em 1996
para 8,1% em 2000 (BONIATTI, 2006).
87
Como se registrou anteriormente, a ocorrência de partos caracterizados como de baixo peso (≤2,5Kg)
é uma situação relativamente freqüente e é um dos marcadores de risco da gestação e do parto,
demandando cuidados mais intensivos e específicos dos profissionais, no momento do parto e no
período pós-parto. Considerando os dados de 2000 a 2005, o percentual de baixo peso ao nascer
teve valores médios de 8% no Brasil, de 8,5% na Região Sul, de 10,8% no Estado do Rio Grande do Sul
e de 12,35% em Caxias do Sul (Ministério da Saúde, 2008).
Em Caxias do Sul, nos anos 1996 a 2004, 10,7% dos nascidos vivos apresentou baixo peso. De acordo
com estudo de Boniatti (2007), onde foram coletados dados de nascidos vivos no período de julho a
setembro de 2006, foram identificados 1.447 nascimentos, sendo 157 de recém-nascidos de baixo
peso, totalizando um percentual de 10,8%. Desses, 75 ocorreram no SUS e 81 no sistema privado de
saúde (BONIATTI, 2007).
Estudos comparativos realizados com base em dados secundários mostram uma série histórica das
condições de nascimento no Brasil, Região Sul, Rio Grande do Sul e Caxias do Sul, conforme
demonstra a tabela a seguir.
TABELA 4.1. EVOLUÇÃO DAS CONDIÇÕES DE NASCIMENTO NO BRASIL, REGIÃO SUL,
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL, 2000/2008
Fonte: Tabnet/Datasus.
A Tabela mostra uma redução importante e praticamente linear das taxas de natalidade em todos os
cenários analisados, assim como do percentual de gestações em mães adolescentes, exceto na faixa
inicial de 10 a 14 anos. Também uma tendência de crescimento nas taxas de prematuridade,
Território Indicador 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Taxa Bruta de Natalidade 18,9 18,1 17,5 17,2 16,9 16,5 15,8 15,3 15,4
% com prematuridade 6,8 6,4 6,4 6,4 6,5 6,6 6,7 6,7 6,7
% de partos cesáreos 38,0 38,3 38,8 40,1 41,8 43,3 45,1 46,6 48,5
% de mães de 10-19 anos 23,5 23,4 22,7 22,2 21,9 21,8 21,5 21,1 20,4
% de mães de 10-14 anos 0,9 0,9 0,9 0,9 0,9 0,9 0,9 1,0 1,0
% com baixo peso ao nascer 7,7 8,0 8,1 8,3 8,2 8,1 8,2 8,2 8,3
Taxa Bruta de Natalidade 18,0 16,3 15,8 15,0 15,1 14,5 13,9 13,1 13,5
% com prematuridade 7,1 6,8 6,9 7,2 7,3 7,3 7,6 7,7 7,9
% de partos cesáreos 42,2 43,3 44,1 46,0 48,2 49,8 51,3 52,8 54,6
% de mães de 10-19 anos 21,3 21,1 20,5 19,8 19,5 19,5 19,3 18,9 18,4
% de mães de 10-14 anos 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8
% com baixo peso ao nascer 8,1 8,5 8,6 8,9 8,6 8,5 8,5 8,7 8,7
Taxa Bruta de Natalidade 17,3 15,6 14,9 14,2 14,4 13,6 12,9 12,0 12,5
% com prematuridade 7,8 7,6 7,9 8,4 8,5 8,7 8,9 9,0 9,2
% de partos cesáreos 41,0 42,1 43,2 44,8 47,2 49,1 50,5 52,0 53,7
% de mães de 10-19 anos 20,3 20,2 19,7 19,1 18,5 18,7 18,4 17,8 17,4
% de mães de 10-14 anos 0,9 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8 0,8
% com baixo peso ao nascer 8,8 9,0 9,4 9,5 9,3 9,1 9,1 9,3 9,5
Taxa Bruta de Natalidade 16,4 15,3 15,1 14,7 15,0 14,5 14,1 13,7 14,5
% com prematuridade 8,5 8,7 8,8 9,9 9,9 11,1 10,3 11,6 11,6
% de partos cesáreos 58,0 58,9 57,8 58,4 60,6 62,3 63,4 64,3 64,8
% de mães de 10-19 anos 17,2 16,4 17,3 16,2 16,1 15,7 15,9 14,5 14,0
% de mães de 10-14 anos 0,7 0,6 0,7 0,6 0,5 0,6 0,8 0,7 0,6
% com baixo peso ao nascer 10,4 11,3 11,4 11,1 10,4 11,0 11,3 10,9 11,1
CAXIAS DO
SUL
BRASIL
REGIÃO
SUL
RIO
GRANDE
DO SUL
88
principalmente na Região Sul, no Estado do Rio Grande do Sul e no município de Caxias do Sul. Essa
tendência parece acompanhar o crescimento na taxa de partos cesáreos e de crianças com baixo
peso ao nascer. A incorporação de novos recursos tecnológicos e a expansão na cobertura
assistencial em serviços de saúde não teve capacidade de contrapor às condições de emergência
desses indicadores; talvez até tenha contribuído para isso. Aqui está o que se poderia chamar como
condição marcadora da modelagem tecnoassistencial dos serviços e redes de atenção à saúde. Aqui
lembramos mais uma vez das análises de Merhy (2002), que traz a lembrança do trabalho vivo, as
relações entre os profissionais da área da saúde e os usuários do serviço de saúde público ou
privado, onde o que mais importa não é apenas um exame sofisticado, mas uma simples fala, escuta
e interpretações gerando respeito, compromisso, confiabilidade e esperança um no outro, criando o
vínculo. A utilização sistemática da referência às tecnologias leves se deve ao fato de que a
disponibilidade de equipamentos e de conhecimentos estruturados (tecnologias duras e leve-duras)
não ter capacidade de explicar o comportamento dos dados, chamando a atenção situações que
parecem estar associadas à atuação dos profissionais que gerem o cuidado. Uma das hipóteses que
se pode levantar diante de tais resultados é que há um predomínio da oferta de procedimentos, ao
tipo do modelo biomédico, com visível déficit de integralidade. É de se ressaltar que esses índices são
calculados tendo como base o município de residência da mãe e não o local onde os procedimentos
são realizados.
A cidade de Caxias do Sul apresenta o maior índice de nascimentos por parto cesáreo entre os quatro
cenários em estudo. Esse aumento pode ser explicado, em parte, por Caxias do Sul constituir-se em
referência em gestação de risco para os municípios vizinhos, tendo maior oferta de procedimentos
de maior adensamento tecnológico e, portanto, tornando seu consumo mais facilitado. Entretanto,
ainda como sede de referência em gestação de alto risco, o índice não se justifica, sendo necessário
buscar argumentos na cultura e na “micropolítica do trabalho em saúde”, como classificado o
conjunto de interesses e poderes que compõem o cenário do cuidado (MERHY, 2002). Nosso modelo
assistencial está caracterizado pela lógica biomédica, que muitas vezes toma a decisão dos diferentes
profissionais e subjuga outras lógicas para a organização do cuidado. Somente com base numa
cultura da sociedade e dos serviços de saúde subjugada por essa lógica é que se compreende a
utilização de taxas de partos cesáreos tão elevados, considerando as conseqüências que essa
modalidade traz para a saúde da mãe e do bebê, além de custos ao sistema de saúde.
89
TABELA 4.2. CARACTERÍSTICAS DOS NASCIMENTOS NA CIDADE DE CAXIAS DO SUL
Características em Estudo Total de Nascidos
Vivos Total de Nascidos
Vivos de Baixo Peso %
H. Privados 2.475 270 10,91 H. Público/Privados 2.130 205 9,62 Hospital Privado pesquisado 785 87 11,08 Hospital Público pesquisado 1.098 149 13,57 Domicilio 16 4 25,00 Total hospitais pesquisados 1.883 236 12,53 Total Geral 5.719 628 10,98
Fonte: SMS – Vigilância Epidemiológica – SINASC, 2007.
Os dados que merecem uma maior atenção são os do Hospital Privado Pesquisa e do Hospital Público
Pesquisado, onde foram coletadas as informações dos profissionais que atuam na área da obstetrícia
Segundo o Serviço de Vigilância Epidemiológica do Município de Caxias do Sul, tivemos em 2007 o
total de 5719 nascidos vivos na cidade de Caxias do Sul, sendo que destes, 10,98% são de baixo peso
(<2500g), representando índice alto comparado ao índice nacional e ao das demais regiões.
Observados esses dados mais recentes, podemos notar que o número de nascidos vivos de baixo
peso teve um aumento de 0,1% no ano de 2007 comparando com os dos meses pesquisados por
Boniatti (2007) em 2006 e 0,28% se comparado com anos anteriores entre 1996 e 2000.
De acordo com Remoaldo (2002), as mulheres que não recebem acompanhamento pré-natal estão
três vezes mais expostas a terem bebês com menos de 2500g. Com esses dados levantados foi com
que a OMS desde há muito tempo tem e vem insistindo que a mortalidade materna e perinatal
dependem essencialmente dos cuidados de saúde prestados à gravidez, à mãe e ao parto, apenas
isso garantirá a saúde integral das crianças. E ao mesmo tempo em que a mortalidade infantil é
apontada como um dos indicadores socioeconômico, a mortalidade para baixo peso pode ser
considerada como reflexo de saúde da mulher e da qualidade dos cuidados durante a gravidez e no
período perinatal. Todas essas influências são verdadeiras para os países em desenvolvimento de
acordo com a OMS (BONIATTI, 2006).
90
GRÁFICO 4.1. NÚMERO DE CONSULTAS PRÉ-NATAL DA POPULAÇÃO DE NASCIDOS VIVOS
DE BAIXO PESO NA CIDADE DE CAXIAS DO SUL, DOS HOSPITAIS PESQUISADOS.
Fonte: SMS – Vigilância Epidemiológica – SINASC, 2007.
Esse gráfico nos apresenta que 91,95% dos nascimentos de baixo peso tiveram mais de 7 consultas
de pré-natal, realizadas, na área privada, apenas pelo profissional médico. Já na saúde pública
apenas 38,25% foram acima de 7 consultas de pré-natal, normalmente em Unidades Básicas com
mais de um profissional envolvido. Aqui é importante destacar um achado de outro componente da
pesquisa: parte das mulheres beneficiárias de planos e seguros privados de saúde da Serra Gaúcha
utiliza serviços de ambos os subsistemas, público e privado suplementar. O destaque aqui,
considerando a opinião das usuárias que compõem o mix, é para a agilidade e o conforto na
utilização da saúde suplementar para consumir procedimentos de consulta obstétrica e de exames
complementares, em particular o ultrason, e para a diversidade de procedimentos disponívies no
subsistema público de serviços, em particula atividades de grupo e consulta de enfermagem.
Com os dados apresentados, vimos que com o aumento da aplicação de tecnologias sofisticadas, os
percentuais de nascimentos de baixo peso não sofreram redução tanto em nível nacional quanto
regional no período analisado. Nos hospitais pesquisados, e também através dos dados da Secretaria
Municipal de Saúde, nota-se que as políticas aplicadas para reduzir esses índices não estão sendo
eficazes. Uma melhor estratégia poderá ser desenvolvida, talvez através das tecnologias simples do
cuidado e da atenção dos profissionais da área da saúde. Mais do que isso, para efeitos da pesquisa
que se está levando a cabo, parece haver maior facilidade de consumo de procedimentos com
alguma densidade tecnológica na assistência prestada aos planos e seguros privados de saúde e uma
desconexão entre as políticas de cuidado ambulatorial no pré-natal e no parto no sistema público de
serviços de saúde.
De toda forma, os indicadores põem em suspeição o desafio da integralidade na assistência ao ciclo
mãe-bebê e, portanto, um déficit importante na transição tecnológica para uma modelagem mais
voltada às necessidades do usuário. Ou seja, quer no subsistema público, quer no subsistema privado
0
20
40
60
80
100
120
140
160
H. Público H. Privado Total
nenhuma
1 a 3 vezes
4 a 6 vezes
7 a mais
Ignorado
91,95%
38,25%
91
de serviços, parece estar evidenciada uma política de cuidados restrita ao consumo de
procedimentos assistenciais, com baixa aderência às políticas assistenciais propostas pelo sistema de
saúde. Essas evidências chamam à análise os processos de trabalho, de forma intensiva os aspectos
micropolíticos, associados às relações que se estabelecem entre os atores que atuam nas cenas de
cuidado.
4.1.1.3. O PROCESSO DE TRABALHO VISTO POR DENTRO: OPINIÕES E PERCEPÇÕES DOS
TRABALHADORES DAS EQUIPES DE ATENÇÃO AO CICLO MÃE-BEBÊ
Como se afirmou anteriormente, a pesquisa buscou aprofundar a análise em relação à organização
dos processos de trabalho, partindo da associação feita por Merhy (2002) em relação à natureza das
tecnologias utilizadas no cuidado e a modelagem tecnoassistencial adotada em serviços, redes e
sistemas. Para essa camada da análise, optou-se por um questionário semi-estruturado aplicado a
profissionais e usuárias. Nas duas instituições que autorizaram o estudo, foram respondidos 17
questionários, sendo que 5 foram do Hospital Privado, 9 foram no Hospital Público e 2 por
profissionais que trabalham nas duas instituições. Dentre os 17 entrevistados, 8 são técnicos de
enfermagem, 3 são enfermeiros e 6 são médicos. Entre os sujeitos, 16 participantes mulheres e 1
participante homem. Historicamente a ação de cuidado foi concebida como feminina e produto das
qualidades naturais das mulheres, fortalecendo atributos e coerência ao exercício na sociedade com
relação ao trabalho na saúde (LOPES, 2005) e essa constituição parece representar esse fenômeno.
Em relação ao tempo de atuação na área de obstetrícia, o gráfico abaixo mostra um predomínio nos
dois hospitais o intervalo de 1 a 5 anos. No hospital privado temos um profissional participante da
pesquisa com mais de 10 anos e no hospital público dois participantes com menos de um ano. A
circulação de trabalhadores, por outro lado, mostra-se um recurso comum de organização do custo
com a força de trabalho, principalmente, como é o caso, em localidades com oferta de profissionais
recém egressos das universidades. A pressão pelo ingresso rápido no mundo do trabalho faz com que
os profissionais secundarizem variáveis como salário e condições de trabalho ao aceitarem vínculos
formais com os serviços. Além disso, a fragilidade de vínculos facilita o seu desligamento.
92
GRÁFICO 4.3. TEMPO DE ATUAÇÃO NA ÁREA DE OBSTETRÍCIA
Fonte: Questionário para os profissionais da área de obstétrica, 2008.
Para Ferreira (2008), o tempo de atuação profissional não é mais relevante que atualizações
constantes, mas sabemos que a prática profissional, tanto nos procedimentos técnicos, quanto nas
relações humanas é de extrema importância para a qualificação do trabalho em saúde, que é um
trabalho vivo em ato (MERHY, 2002). No caso do sistema de saúde brasileiro, a política de gestão do
trabalho e da educação na saúde aposta na educação permanente, colada ao mundo do trabalho,
onde a reflexão contínua sobre o fazer e os problemas do cotidiano resultam na produção de
conhecimentos válidos para a qualificação do trabalho em saúde (Ceccim & Ferla, 2009).
Além do tempo de atuação profissional, o instrumento de coleta de dados buscou identificar a idade
dos sujeitos. O Gráfico 9 apresenta a distribuição dessa variável em faixas etárias.
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
H Público
pesquisado
H.Privado
pesquisado
Ambos
< 1 ano
1 a 5 anos
6 a 10 anos
> 10 anos
93
GRÁFICO 4.4. FAIXA ETÁRIA DOS SUJEITOS, SEGUNDO SUA VINCULAÇÃO.
Fonte: Dados da pesquisa.
Os profissionais pesquisados estão concentrados na faixa de 25 a 30 anos, principalmente no hospital
público. Uma segunda faixa de concentração é na faixa de 41 a 50 anos, com quatro profissionais.
Aqui, parece haver uma diferença que pode evidenciar uma característica da política de gestão do
trabalho das duas instituições. O hospital público parece recrutar, para esse ambiente,
predominantemente profissionais recém-egressos da graduação, principalmente aqueles que já
atuavam na área, enquanto no hospital privado a experiência profissional pode ser mais importante.
Experiência prévia e atualização, pela formação profissional, parecem ser boas explicações para a
atuação em um ambiente com alto gradiente de tecnologias sofisticadas e com grande incorporação
de novos recursos tecnológicos. Mas o objetivo principal desses dados não foi a formulação de
hipóteses sobre a política de gestão do trabalho, mas a contextualização das respostas às perguntas
mais específicas sobre a gestação de alto risco, como se apresenta na seqüência.
A questão que estava em investigação era acerca do reconhecimento dos atores envolvidos no
cotidiano do cuidado em relação às condições de realização do próprio trabalho. Interrogar os
trabalhadores acerca do reconhecimento das especificidades da atenção à gestação de alto risco
pareceu um bom dispositivo de aproximação com essa questão. Dos 17 entrevistados, 04 pessoas
responderam que o serviço onde trabalham não possui programa de gestação de alto risco. Daqueles
que responderam sim, 01 diz que o âmbito do programa de gestação de alto risco é a nível
ambulatorial, 03 dizem que é a nível hospitalar e 09 responderam ser nos dois níveis de atenção. As
quatro pessoas que responderam que o serviço onde trabalham não possui atendimento de gestação
de alto risco, trabalham no serviço privado. Os demais profissionais reconhecem que sua instituição é
referencia de gestação de alto risco para os demais serviços públicos. O cotidiano do trabalho parece
estar organizado a partir da oferta de procedimentos, onde a variável predominante parece ser a
capacidade de consumo do próprio usuário. Como se pode organizar um cuidado integral à saúde no
ciclo mãe-bebê sem o reconhecimento das especificidades em que se dá o cuidado no caso de
gestações de maior risco? Como se gerencia o trabalho para esse cuidado, se os próprios
0
1
2
3
4
5
6
25 a 30
anos
31 a 40
anos
41 a 50
anos
>50 anos Sem
resposta
H Público pesquisado
H.Privado pesquisado
Ambos
94
trabalhadores desconhecem características relevantes da natureza do que o serviço oferece ao
sistema de serviços de saúde a que está vinculado? Como essa questão poderia relacionar-se ao
consumo abusivo de procedimentos de maior densidade tecnológica, como as cesarianas, por
exemplo? O que esse contexto diz da qualidade da atenção prestada aos usuários?
Quando questionados sobre a qualidade da assistência prestada na instituição, obtivemos índices
positivos nas duas instituições, evidenciados pelas falas dos entrevistados.
TABELA 4.3. AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DA ASSISTÊNCIA PRESTADA SEGUNDO OS
PROFISSIONAIS.
QUALIDADE DA
ASSISTÊNCIA IDÉIAS PREDOMINANTES RESPOSTAS
Excelente/Ótima
O Hospital é referência aos municípios vizinhos / Têm disponíveis
muitos recursos para diagnóstico e tratamento 6
Muito Boa
só que parece que elas não prestam muito atenção no que lhes é
passado, pois.....engravidam novamente
as gestantes têm acompanhamento c/ equipe multiprofissional
3
6
Bom
dentro da medida do que é fornecido pela rede pública 3
Outras resposta
Esse atendimento é limitado dando-se quando a paciente
apresenta eclampsia no pré-parto ou durante a gestação
quando necessita de tratamento hospitalar
1
Fonte: dados primários da pesquisa.
Sem a pretensão de um maior aprofundamento, interessa aqui destacar a construção argumentativa:
o reconhecimento externo, configurando uma situação de referência especializada, e a
disponibilidade de recursos tecnológicos de maior densidade são os principais argumentos que
marcam a excelência do serviço na opinião dos trabalhadores. A existência de equipes
multiprofissionais é marcadora de boa qualidade assistencial, mesmo quando posta em oposição ao
resultado do cuidado: a situação de saúde do usuário. Uma síntese dessas opiniões parece indicar
que há um imaginário típico da atenção no modelo biomédico em forte vigência na percepção desses
trabalhadores em relação ao seu trabalho. O cotidiano do serviço público parece indicar, ainda que
discretamente, maior vinculação com outros serviços. Considerando-se que há uma grande
capacidade de autogoverno no trabalho em saúde (Merhy, 2002) e supondo que esse imaginário
opera como motivador no cotidiano, conforme aponta a literatura (Ceccim & Cols., 2009), é possível
prever que a dimensão micropolítica da gestão do cuidado seja um dificultador importante para
mudanças nas práticas de cuidado e para a implementação de políticas voltadas para a incorporação
de novas modelagens tecnoassistenciais no cotidiano dos serviços.
Quando questionados sobre fatores que impedem uma melhor assistência às gestações de alto risco,
a maioria dos entrevistados diz que o que são fatores econômicos e falta de incentivo público. Tanto
para as instituições privadas quanto públicas, os investimentos na área da obstetrícia são
insuficientes, na percepção dos trabalhadores. Essa opinião parece coincidir parcialmente com as
estimativas oficiais. Do total de mortes em crianças menores de um ano, 52% ocorre no período
95
neonatal, sendo que grande parte delas está associada à atenção dispensada à gestação, ao parto e
ao puerpério (Ministério da Saúde, 2006), que objeto de expansão tanto da rede básica de atenção
quanto dos serviços de referência especializada no sistema público de serviços.
Entretanto, é relevante destacar que, além de questões estruturais e externas aos serviços, os
sujeitos também avaliam com alguma freqüência que há problemas no âmbito dos trabalhadores
(falta de qualificação ou interesse). Nesse momento da análise, nos encontramos novamente com as
hipóteses formuladas na interpretação dos dados secundários, apresentados anteriormente. Sendo
trabalho dependente intensivamente dos trabalhadores, essa é uma lacuna importante, não
somente pela formação técnica, mas pela sensibilidade às necessidades de saúde que se expressam
no cuidado às gestantes de alto risco.
Para avançar um pouco mais na compreensão dos sujeitos sobre a organização do cuidado ao ciclo
mãe-bebê, tendo o alto risco como situação marcadora, os sujeitos foram solicitados a opinar sobre a
natureza de serviços em que um profissional enfermeiro poderia atuar nesse cuidado. O objetivo era
avançar na percepção de uma linha de cuidados, com articulação entre os diferentes serviços e com
diferentes tecnologias assistenciais. A escolha pelo exemplo do profissional de enfermagem
procurava criar uma linha de fuga à natureza exclusivamente assistencial do cuidado e também para
uma reflexão específica da atuação desse profissional. Também pelo fato de ter sido apontada como
área de distinção entre os dois subsistemas na abordagem feita com as usuárias na atenção de pré-
natal.
Segundo os sujeitos, há contribuições expressivas na inserção dos enfermeiros na atenção hospitalar
e na atenção ambulatorial. Oito profissionais, que atuam no serviço público e em ambos (público e
privado) avaliam a relevância da atuação também no ambiente ambulatorial, ampliando a rede de
serviços em que a atenção possa ser oferecida e, aparentemente, também o intervalo de ações que
podem ser ofertadas a uma gestante com risco gestacional. Sete profissionais (dois que atuam no
serviço público e cinco que atuam no serviço privado) avaliam que a relevância maior da atuação do
enfermeiro no âmbito hospitalar. Por fim, dois profissionais, com atuação no serviço público, avaliam
que a relevância maior está na atuação do enfermeiro no ambiente ambulatorial.
O cotidiano do trabalho é alimentado e alimenta imaginários. Para os profissionais que trabalham na
instituição privada, que atua de forma isolada de outros serviços, a atuação predominante do
enfermeiro é no âmbito hospitalar quando se trata do cuidado às gestantes em condição de risco. O
contexto das falas destaca as condições associadas ao risco, numa transposição que parece tornar a
própria gravidez e a gestante numa doença. Vê-se que o cotidiano do trabalho não tem potência de
estranhar o imaginário e esse constitui-se no limite do que é possível. Um dos sujeitos complementa
a afirmação, ilustrando o contexto apresentado acima: "Esse atendimento [do enfermeiro em uma
situação de gestação de risco] é limitado, dando-se quando a paciente apresenta eclampsia no pré-
parto ou durante a gestação quando necessita de tratamento hospitalar".
Para os profissionais que atuam no serviço público, o enfermeiro aparece nos dois níveis de atenção
à saúde da gestante de alto risco, caracterizada bem pela fala “...a assistência prestada no dia da
consulta é resolutiva...”. Essa fala é do profissional enfermeiro que trabalha no hospital-dia. Essa
resposta parece estar mais embasada na idéia da atuação em rede de serviços e em equipe de
profissionais, assim como na idéia de integralidade da atenção.
96
Uma das hipóteses que poderia ser formulada para explicar a diferença no padrão de respostas dos
profissionais que atuam no serviço público e no serviço privado é a maior atuação em rede que se
verifica nos serviços vinculados ao componente público do sistema de saúde, tornando essa uma
percepção mais presente no cotidiano dos trabalhadores.
As diferenças nas respostas dos profissionais que atuam no serviço público e no serviço privado não
se restrigem ao âmbito de atuação dos enfermeiros na assistência à gestação de alto risco. Ao
contrário, elas se aprofundam na análise da natureza das atividades que caracteriza a atuação desses
profissionais, como se verifica na Tabela 4.
TABELA 4.4. NATUREZA DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO ENFERMEIRO DA
UNIDADE DE OBSTETRÍCIA, SEGUNDO O VÍNCULO DOS SUJEITOS
Atividade
H. Público
H. Privado
Ambos
Total
Assistência 5 5 2 12
Educação em Saúde 3 1 2 6
Gerenciamento 6 4 4 14
Pesquisa 1 1
Fonte: Dados da pesquisa.
Notamos que na maioria das respostas, encontramos o enfermeiro, sob a ótica dos entrevistados,
com atividades voltadas para o gerenciamento. Com freqüência um pouco menores, estão listadas as
atividades desenvolvidas na assistência direta ao cliente. A enfermagem também deveria atuar na
área da pesquisa, sistematizando e divulgando seus registros, suas avaliações e suas condutas,
visando sempre atualizações e melhorias no cuidados, mas esta é uma atividade pouco citada pelos
entrevistados. A educação e a pesquisa aparecem nos destaques realizados por profissionais
vinculados ao serviço público. Uma hipótese para explicar essa diferença é a maior atuação dos
profissionais com esse vínculo em atividades dessa natureza.
Os dados citados anteriormente de nascimentos de baixo peso e prematuridade são indicadores de
que a pesquisa e a educação em enfermagem obstétrica podem e devem ser inseridos no dia a dia
dos profissionais dessa área, sendo uma nova estratégia de melhoria, utilizando apenas as
tecnologias de cuidado humanizado, onde o profissional se torna a referencia do usuário, gerando
com isso confiabilidade e criando vinculo, sem custos extras para as instituições.
Os entrevistados foram questionados também sobre sua avaliação acerca da importância da
presença do enfermeiro na equipe multiprofissional. Houve unanimidade nas respostas sobre ser
indispensável a atuação do enfermeiro na assistência à gestante de alto risco, variando apenas a
construção discursiva para justificar tal opinião. Essas variações alocam maior densidade à análise da
importância do enfermeiro no cuidado nesta área.
O conteúdo das respostas permitiu a criação de algumas categorias de análise, como se verá a seguir:
97
Importância relacionada à complexidade do serviço:
Para alguns sujeitos, a importância da atuação do enfermeiro é descrita pela densidade tecnológica e
complexidade assistencial da área. O profissional enfermeiro tem conhecimentos necessários para
atuar diretamente na prevenção dos agravos das gestações de alto risco, pois, como traz o manual
do Ministério da Saúde (2008), qualquer profissional de nível superior tem a responsabilidade de
zelar pela saúde das gestantes. Enfatizado pela importante fala:
“devido o grau de complexidade do serviço é de suma importância a
presença do enfermeiro” (E1).
Importância relacionada à formação técnica do enfermeiro:
A natureza da formação do enfermeiro, que inclui conhecimento técnico relevante e domínio de
diversas tecnologias, é o argumento central para o reconhecimento da importância do enfermeiro na
atenção à gestante de alto risco. Um dos sujeitos destaca como segue o papel do enfermeiro com
base nesse argumento:
“na ausência do médico, a mesma irá avaliar e detectar os riscos que a
mesma corre” (E17)
Veja que apenas na ausência do profissional médico é que o profissional enfermeiro irá atuar. Talvez
seria interessante se os dois profissionais pudessem interagir com a mesma paciente num mesmo
momento, discutindo as melhores condutas em prol do bem estar da gestante e não como ocorre
muitas vezes, de acordo com a agenda pessoal ou mesmo profissional dos prestadores de serviço.
Importância relacionada a habilidades de gerenciamento:
Para alguns sujeitos, a habilidade específica de gerenciamento de recursos e do cuidado, que
compõe a formação do enfermeiro, é destacada para justificar a importância da atuação na área. De
fato, o enfermeiro é quem gerencia os materiais, é quem organiza o setor, é quem fica a maior parte
do tempo junto ao usuário. Essas capacidades são lembradas pelos profissionais que participaram da
pesquisa.
“...gerenciamento do setor e orientações aos pacientes.” (E5).
No caso do cuidado com as gestantes de alto risco, essa habilidade parece destacada, uma vez que os
ambientes onde são recebidas nos serviços incluem maior sofisticação tecnológica e diversidade de
recursos para o cuidado.
Importância relacionada ao envolvimento dos profissionais:
A necessidade de um envolvimento mais expressivo é o argumento utilizado por um dos sujeitos para
destacar a importância da atuação do enfermeiro na equipe de cuidado à gestante de alto risco. Essa
resposta nos reporta à organização do trabalho e das equipes nos serviços de saúde, à distribuição
98
das tarefas e ao reconhecimento diferenciado dos poderes e interesses de cada profissional. No
trabalho em saúde, ainda é predominante o imaginário que destaca o domínio da técnica e a
sofisticação dos conhecimentos que embasam a formação. Nesta categoria de respostas, parece
estar sendo evocada a análise do cuidado que faz Merhy (1997), onde a base do cuidado seriam as
relações que se estabelecem entre os profissionais da equipe e o envolvimento destes com os
usuários dos serviços, que pode criar vínculos importantíssimos para o cuidado e para o tratamento.
“...se ela tiver participação mais ativa...” (E9)
Importância relacionada ao treinamento dos profissionais:
Além de habilidades relacionadas ao domínio de conhecimentos e técnicas, alguns sujeitos
reconhecem no enfermeiro capacidades para a educação em saúde dos profissionais da equipe. Em
se tratando de ambiente com grande incorporação de novas tecnologias e novos conhecimentos, a
formação é considerada importante pelos sujeitos. Como nos diz L’Abbate (2004), as capacitações
dos profissionais da área da saúde devem conter informações para construir sujeitos autônomos e
críticos e explanando que a ética deve estar contida nas praticas técnicas e nas políticas com os
demais profissionais. Enfatizando com a fala a seguir:
“Com programas de treinamento aos técnicos na área da obstetrícia...”
Importância de incorporar especialidades:
O cuidado em saúde requer conhecimentos interdisciplinares e capacidades multiprofissionais em
decorrência da complexidade que é o trabalho de cuidar de pessoas. Essa parece ser a formulação
que embasa as falas dos sujeitos que foram agregadas nessa categoria de análise. Para esses sujeitos,
incorporar especialidades, a fim de melhorar ou aprimorar os diagnósticos e as intervenções a serem
prescritas para cada situação em particular, de unir os pensamentos e não manter as condutas
centradas apenas em um único problema.
“o ideal de atendimento às gestantes seria com especialistas de várias
áreas durante os rounds (cardiologista, endócrino...).”
A atuação em equipe multiprofissional, com atuação compartilhada, implica em compartilhar
olhares, conhecimentos e análises, como parece afirmar o sujeito que formulou a intervenção acima.
Importância submetida à melhora na infra-estrutura:
Para um sujeito, a importância da presença do enfermeiro está associada à qualificação da infra-
estrutura do próprio serviço. Lembramos novamente que o usuário não reclama da estrutura e nem
da tecnologia aplicada, sente-se desconfortado quando não é tratado bem pelos profissionais que
participam de seu cuidado. (MERHY, 2002).
99
“Caso o hospital fornecesse um espaço maior para atender um número maior de gestantes e também se houvesse uma maior integração entre os serviços de nutrição, psiquiatria, demais áreas médicas, psicologia...” (E6)
Importância de mudar rotinas pré-estabelecidas:
Um dos sujeitos descreve uma situação expressiva para a análise: a atuação individual e voltada para
o consumo de procedimentos, típica do modelo biomédico vigente. A enfermeira do serviço privado
informa que os processos de trabalho estão pouco porosos à atuação em equipe em algumas
instituições, onde o núcleo cuidador não se impõe frente às condutas corporativas.
“Acredito que não, pois no serviço privado a paciente vem encaminhada do consultório médico e com plano de ação/conduta prescrito e pronto para ser executado.” (E13).
Relações de dominação que se estabelecem com vários profissionais são próprias de processos
assistenciais onde o cuidado com o usuário não é a lógica central de atuação (MERHY, 2002).
Através da analise dos dados coletados observamos que o profissional enfermeiro tem papel
importante e fundamental na obstetrícia, que é reconhecido quase que de forma unânime entre os
sujeitos participantes da pesquisa. A categorização das falas nos mostra que a enfermagem possui
boa qualificação em sua prática e no gerenciamento do cuidado. Também trazem a importância do
treinamento da equipe de saúde, mas não reconhecem a Educação em Saúde como uma pratica que
é executada atualmente.
Nitidamente o hospital público tem o profissional enfermeiro inserido nos cuidados as gestações de
alto risco, podendo estar atuando diretamente na prevenção dos agravos das gestações de alto risco,
mas que os profissionais ainda questionam a estrutura, a qualificação e um maior numero de
profissionais envolvidos. O hospital privado está totalmente voltado para a atenção hospitalar, e sob
o lógica da visão médica, onde o profissional enfermeiro atua apenas na atenção direta, sem
participar da discussão de condutas.
Sob uma lógica racional poderíamos dizer que a participação de várias especialidades profissionais na
prevenção dos agravos das gestações de alto risco seriam opções para tentar diminuir as taxas
elevadas de nascimentos de baixo peso e prematuridade.
100
4.2. A CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS HUMANIZADORAS NA ATENÇÃO AO CICLO
MÃE-BEBÊ: MONÓLOGOS E DIÁLOGOS NO COTIDIANO DE UM CENTRO
OBSTÉTRICO14
O cuidado com a saúde é um trabalho complexo, uma vez que implica na compreensão da dimensão
subjetiva da existência e na resposta a um amplo conjunto de necessidades que
condicionam/determinam a saúde e o trabalho de cuidar. As condições de saúde e, de forma geral,
da própria vida, são multideterminadas, fluidas e submetidas a contextos bastante particulares.
Cecílio e Matsumoto (2006) propõem uma taxonomia de necessidades de saúde que ilustram a
complexidade do trabalho de cuidar. Para os autores, as necessidades de saúde incluem: a
necessidade de boas condições de vida; de acesso a todas as tecnologias que possam melhorar e
prolongar a vida; de vínculo com um profissional ou uma equipe; de autonomia e autocuidado na
escolha e construção do modo de “andar a vida”.
Contemporaneamente, os paradigmas que embasam o cuidado estão em rápidos processos de
mudança. A aceitação da necessidade de um cuidado integral e humanizado ilustra essas mudanças.
O trabalho desenvolvido em Centro Obstétrico (CO) é muito dinâmico e complexo, e,
aparentemente, os profissionais respondem de forma impessoal no trato com a puérpera, sendo
imprescindível uma mudança nesse sentido. Embora essencialmente humano, o cuidado foi
profundamente tecnificado, sendo, muitas vezes, considerado apenas como a aplicação de técnicas.
A expressão humanização do cuidado pretende resgatar aspectos da relação entre as pessoas, do
respeito à subjetividade e da busca de autonomia e saúde na atenção à saúde. A política de
humanização, proposta pelo Ministério da Saúde (2003), que pretende resgatar outras dimensões do
cuidado para além das técnicas assistenciais, é uma evidência nesse sentido.
Os modelos de atenção ao parto que se constituíram no Brasil ao longo dos últimos dois séculos não
diferem dos registros históricos dos processos que ocorreram em outros países ocidentais. Até as
primeiras décadas do século XX, as mulheres em geral tinham seus filhos no domicílio com a ajuda de
outras mulheres, as quais eram conhecidas como ‘parteiras práticas’. A partir do final do século XIX,
no Brasil, vários/as profissionais da saúde fizeram parte da atenção ao parto e ao nascimento, entre
eles/as: parteiras enfermeiras obstetrizes, enfermeiras generalistas e médicos. Conforme Ana
Cristina d’Andretta Tanaka (1995) e Márcia Lúcia Mott (2002), no final do século XIX e início do
século XX, foram travadas inúmeras disputas na França e Inglaterra entre os médicos e as obstetrizes
pela assistência ao parto. Gradativamente, a categoria médica foi ganhando espaço. Com menos
intensidade, o mesmo processo ocorreu no Brasil. Associado à dimensão corporativa, mudanças no
ritual e no espaço físico para a ocorrência do parto também foram sendo constituídas nesse período,
sendo o nascimento transferido, quase que totalmente, para o ambiente hospitalar e submetido aos
rituais institucionais. Esses aspectos da mudança estão bastante associados entre si, como se verifica
nas resistências corporativas e institucionais à criação de casas de parto natural, por exemplo.
14 Texto produzido com base no trabalho “Cuidado humanizado no centro obstétrico na perspectiva de usuárias
e profissionais”, de autoria da Enfermeira Juliana Rodrigues, realizado sob orientação do Prof. Alcindo A. Ferla.
101
As diferentes histórias sobre o processo de institucionalização do parto registram que, naquela
época, nos países ocidentais, a presença de médico só era permitida quando a parturiente corria
risco de vida e precisava ser submetida à embriotomia (fragmentação do feto), então considerada
uma forma de preservar a vida da mulher. No Brasil, com o ingresso do profissional médico na
obstetrícia, em meados do século XX (na Europa, isso ocorreu antes), essa categoria profissional
paulatinamente foi assumindo o controle do processo de atenção à saúde das mulheres no período
reprodutivo. Como conseqüência, as atividades de atenção ao parto, antes às mesmas eram
realizadas por parteiras práticas, obstetrizes e enfermeiras, foram sendo substituídas e até mesmo
limitadas e proibidas. Nesse contexto, também o processo de reprodução foi sendo ressignificado.
Passou de uma experiência pertencente à esfera subjetiva, privada e familiar para um processo
essencialmente médico/técnico e hospitalar (DUTRA, 2005).
Após o advento da Segunda Guerra Mundial (década de 1940), intensificou-se a institucionalização e
medicalização do parto como forma de reduzir a mortalidade materna e infantil (TANAKA, 1995). No
Brasil, a institucionalização do parto foi provavelmente à primeira ação de saúde pública dirigida à
mulher. Segundo o Ministério da Saúde:
No Brasil, a saúde da mulher foi incorporada às Políticas Nacionais de Saúde nas primeiras décadas do século XX, sendo limitada, nesse período, às demandas relativas à gravidez e ao parto. Os programas materno-infantis elaborados nas décadas de 30, 50 e 70 traduziam uma visão restrita sobre a mulher, baseada em sua especificidade biológica e no papel social de mãe e responsável pelo lar, pela criação, pela educação e pelo cuidado com a saúde dos filhos e demais familiares (Brasil, 2004, p. 15).
Nos anos 60 foram reduzidos drasticamente os partos domiciliares. Nesse mesmo período, o
Governo Federal propiciou, por meio de recursos subsidiados, a construção e expansão da rede
hospitalar pública e privada. Essa necessidade foi ainda fortalecida com a criação do Instituto
Nacional de Previdência Social (INPS). Assim, o Estado assumiu a cobertura previdenciária para a
população rural e urbana de forma reguladora e autoritária. Privilegiou o modelo biomédico
(individual e assistencialista) em detrimento do modelo sanitarista e orientou os serviços de saúde
para o setor privado (Ministério da Saúde, 2002).
Portanto, até os anos 70, a preocupação com a saúde materna restringiu-se à assistência ao parto.
Com o advento das novas tecnologias, da medicalização e da institucionalização do parto,
desenvolveu-se a necessidade de parir sob a ótica desse modelo. Este foi gradualmente incorporado
à cultura, tendo substituído os conhecimentos acumulados das parteiras, obstetrizes e enfermeiras
no processo de parturição. As experiências do parto domiciliar, especialmente em centros urbanos,
foram então gradativamente substituídas por práticas com predominância das tecnologias duras. É
necessário registrar que, em regiões rurais, o parto domiciliar se manteve até as duas últimas
décadas. (DUTRA, 2005.).
Segundo Tanaka (1995),
A incorporação do parto institucional não foi acompanhada, em nosso meio, de uma política de saúde que facilitasse a absorção dessa nova demanda nem diretrizes visando à integração, à regionalização e à hierarquização dos serviços de saúde para fazer frente a esse novo procedimento (p. 37).
102
Enfatizou-se, pois, a necessidade do parto hospitalar sem condições para absorver à demanda dela
decorrente. Nos anos 70 e 80, o parto hospitalar com tecnologias e rituais médicos e com domínio
predominante de cesáreas passou a caracterizar o modo de nascer. A política do INPS não
comportava a oferta de leitos para suprir a demanda.
Ao contextualizar-se o atendimento ao parto e ao nascimento, faz-se necessário articulá-lo também à
conjuntura econômica para tentarmos entender o quanto esta atravessava e atravessa os interesses
políticos e ideológicos que se manifestam nos modelos assistenciais. Também é necessário resgatar a
grande contribuição do movimento feminista para as discussões, tensionamentos e avanços nas
políticas públicas de saúde materno-infantil no Brasil.
Para situar a relação entre o feminismo e o tema em questão, Dagmar Meyer (2003) descreve o
movimento feminista como dividido em duas ondas. No Brasil, a primeira onda caracteriza-se pelo
movimento sufragista, que teve seu início com a Proclamação da República em 1890. Nesse período,
as mulheres lutaram pela igualdade civil e política. Essa onda finalizou com a conquista do direito ao
voto na Constituição de 1934. É bom recordar que, nesse momento histórico, após a Segunda Guerra
Mundial, se acelerou o desenvolvimento industrial, o êxodo rural e, conseqüentemente, a
urbanização. Paralelamente a essas mudanças econômicas, políticas e culturais, a mulher ingressou
no mercado de trabalho. Na área das ciências médicas, intensificaram-se os investimentos em
pesquisas para medicalização e controle de fecundidade. É nessa época que a institucionalização do
parto se efetivou. Os cenários modificaram-se rapidamente. A mulher, a quem antes se atribuía
como função primordial à maternidade e a educação dos/as filhos/as, deslocou-se para outras
atividades em busca de profissionalização; esse deslocamento foi, de certa forma, facilitado com o
controle da fecundidade pelo uso de contraceptivos (DUTRA, 2005).
Mas há, na história da atenção à saúde da mulher e também especificamente na atenção ao parto,
um movimento que não foi científico ou técnico, mas político: a apropriação do tema da saúde pelo
movimento feminista. De acordo com Meyer (2003), verificou-se uma ampliação da ação do
movimento feminista nos países ocidentais entre os anos 60 e 70 do século XX. Para a autora, no
Brasil, essa segunda onda está ligada “*...+ à eclosão de movimentos de oposição aos governos da
ditadura militar e, depois, aos movimentos de redemocratização da sociedade brasileira, no início
dos anos 80” (p. 12). Nesse período histórico, delimita-se uma mudança de ‘olhar’ para as questões
relacionadas às mulheres, pois se investiu na produção de conhecimentos para: “[...] não só
denunciar, mas, sobretudo, compreender e explicar a subordinação social e a invisibilidade política a
que as mulheres tinham sido historicamente submetidas” (MEYER, 2003, p. 13).
No campo da saúde, o movimento feminista brasileiro criticou severamente o modelo de assistência
reducionista, verticalizado e fragmentado que, em muitas situações, não contemplava as
necessidades biológicas das mulheres. Nessa década, os partos já aconteciam de forma
institucionalizada, e, como já foi dito, a demanda era maior do que as condições de atendimento
oferecidas (DUTRA, 2005).
O movimento feminista, com atuação importante na área da saúde, conseguiu acessar e introduzir
na discussão da política nacional não só a questão da assistência à saúde, mas também as questões
relacionadas às desigualdades de condições de vida entre homens e mulheres, como a dupla jornada
de trabalho, atividades domésticas, educação dos/as filhos/as e trabalho em empresa/fábrica. Essa
intervenção foi significativa em relação ao cuidado e é contemporânea a mudanças que vem
103
ocorrendo na organização de técnicas e práticas de cuidado. Esse cenário de mudanças responde à
idéia da humanização na saúde.
O contexto histórico e social da atenção à mulher e à criança apresenta-se como particularmente
potente para a análise de mudanças na modelagem tecnoassistencial, uma vez que constituído nessa
complexidade técnico-política. Para efeitos da aproximação analítica que se pretendeu com o
trabalho empírico realizado neste recorte da pesquisa, interessou aprofundar duas dimensões da
análise das práticas de cuidado no interior de serviços de saúde que compõe o campo de verificação
da humanização e da integralidade: as relações que se estabelecem entre os profissionais que atuam
no cuidado e a capacidade de escuta do usuário. Por capacidade de escuta, pretende-se uma
aproximação com o conceito de “escuta pedagógica” (Ceccim, 2009), ou seja, com uma escuta capaz
de reconstruir a prática clínica. Aqui, está em evidência a capacidade dos profissionais de exercerem
a alteridade com o usuário em intensidade suficiente para nomadizar a clínica (Ferla, 2007). Trata-se
do uso de tecnologias de natureza leve (Merhy, 2002), voltadas para uma transição da lógica de
cuidado, hegemonicamente centrada na técnica e no conhecimento estruturado, para centrá-la no
usuário e suas necessidades. A qualidade e a intensidade das relações entre os trabalhadores da
equipe e com os usuários constituiriam marcadores da transição das lógicas de cuidado. Trata-se de
uma aproximação analítica com o plano micropolítico do trabalho em saúde, que compõem o campo
referencial do desenho tecnoassistencial por linhas de cuidado (Ceccim & Ferla, 2006) e está em
destaque a natureza da regulação que se estabelece.
O trabalho empírico foi realizado com usuárias internadas no Centro Obstétrico de um hospital de
porte médio e referência regional, além de trabalhadores que compõem o corpo funcional do
serviço. Trata-se de um serviço vinculado ao sistema público de serviços de saúde, mas gerenciado
por uma entidade privada e, devido à condição de referência especializada, recebe igualmente
usuários de planos e seguros privados de saúde. Foram realizadas 09 entrevistas com diferentes
profissionais e 08 com usuárias do serviço. O desenho da análise voltou-se à compreensão das
vivências relatadas e pelas percepções acerca do cuidado humanizado dos trabalhadores e das
mulheres hospitalizadas.
4.2.1. A micropolítica do cuidado em ato: trabalhadores e usuários no cotidiano de um
serviço de saúde de atenção ao parto e puerpério
O trabalho empírico da pesquisa, que buscou compreender aspectos micropolíticos do cuidado no
centro obstétrico e suas implicações para a humanização do cuidado, envolveu nove trabalhadores
de saúde, sendo sete do grupo de enfermagem (cinco técnicos e dois enfermeiros) e dois médicos.
Em relação ao perfil desses sujeitos, a quase totalidade (08) é do sexo masculino e a grande maioria
(08) com idade na faixa dos 20 a 30 anos. O tempo médio de atuação no serviço dos trabalhadores
teve maior concentração nos períodos de um a cinco anos (04) e de mais de cinco anos, tratando-se,
portanto, de um perfil com relativa experiência no serviço. São profissionais jovens, com formação
técnica recentemente concluída ou em andamento. Essa característica é importante para o estudo,
na medida em que as novas diretrizes para a integralidade e humanização do cuidada no ciclo mãe-
104
bebê estão sendo disseminadas muito recentemente e, como hipótese, estão mais fortemente
constituídas nos profissionais mais recentemente egressos da graduação.
Em relação às mulheres usuárias dos serviços, trata-se de cinco com idade na faixa de 30 a 39 anos,
duas na faixa de 20 a 29 anos e uma na faixa de 14 a 19 anos. Metade delas informou a situação de
gravidez não planejada para a gestação atual.
O primeiro eixo de análise foi relativo às concepções sobre o cuidado humanizado. As opiniões
acerca da humanização coletadas dos profissionais entrecruzam idéias em relação às ofertas de
cuidado possíveis de colocar à disposição das usuárias, sobre a satisfação profissional no trabalho,
sobre o trabalho em equipes e outras questões relacionadas à organização do trabalho no Centro
Obstétrico. A maior parte das usuárias não fez referência ao conceito de humanização, mas,
conforme o previsto, teve grande capacidade de ilustrar sentidos pragmáticos para o mesmo.
O conceito de ambiência, similar àquele adotado pela Política Nacional de Humanização (2009), é
identificado como se fosse a própria humanização. Segundo um dos trabalhadores, humanização é
(...) oferecer um ambiente tranqüilo, para que a paciente e seus familiares sintam-
se bem dentro hospital, favorecendo em todo o processo do trabalho de parto.
Deixando-a mais confiante e também tranqüila, podendo tirar todas as dúvidas, e
que ela possa deixar o hospital mais esclarecida.
O conceito destaca a vivência do ambiente pelo usuário como a base do sentido da expressão,
transcendendo-o do sentido físico. Entretanto, no que se refere às vivências do ambiente pelos
profissionais, o que mais freqüentemente constitui a fala dos sujeitos é da sua inadequação. Há uma
visível prática discursiva de responsabilização da estrutura física e tecnológica por parte significativa
dos limites do cuidado oferecido às mulheres, seus bebês e aos familiares. Há, portanto, um claro
desencontro em relação às opiniões de profissionais e usuárias sobre a importância das condições
físicas e tecnológicas para a qualidade do cuidado percebido.
A atenção, no sentido da prontidão às necessidades do usuário conforme percebidas pelos
trabalhadores, também compõe o sentido da humanização para alguns trabalhadores. Assim,
expressões como “olhar o paciente como um todo”, “compreender as necessidades das puérperas”,
“ajudar as pacientes”, entre outras, são utilizadas como a tradução da sua compreensão de
humanização. Algumas falas aproximam-se da idéia de produção de vínculo, embora bastante
marcada pela idéia do vínculo como uma concessão/dádiva do trabalhador.
Entretanto, quando as falas são provocadas à aproximação com a organização do trabalho, em
particular com os aspectos da gestão do trabalho, há um grande distanciamento da idéia da
humanização como a articulação entre modos de gerir o trabalho e modos de produzir saúde. Os
distanciamentos são mais pronunciados no que diz respeito às lógicas que atuam na organização do
trabalho na equipe e à composição da equipe em relação à demanda.
A equipe do Centro Obstétrico parece, por vezes, atuar mais como “agrupamento de trabalhadores”
do que como “processo coletivo integrado”, ou como “equipe agrupamento” e não como “equipe
integração” para utilizar expressões já caracterizadas por Peduzzi (2001). Algumas tensões relatadas
ilustram bem essa afirmação. O trabalho é coordenado pelos profissionais médicos, que determinam
o que deve ser feito, normatizam a seqüência do trabalho e tomam as decisões, muitas vezes sem a
105
escuta aos demais membros da equipe. Há trabalho prescrito, que se sobrepõe às condições
objetivas para sua execução e à construção compartilhada de iniciativas para o cuidado. O mesmo
ocorre em relação aos profissionais de enfermagem, onde a hierarquia técnica se sobrepõe aos
saberes do contato direto com os usuários.
A comunicação não é somente vertical em relação aos trabalhadores, mas aos próprios usuários.
Segundo parte dos trabalhadores da equipe, muitas vezes os médicos só informam à paciente e,
eventualmente, aos familiares as condutas que serão tomadas, não explicam o porquê esta conduta
e não discutem alternativas. A realização de cesarianas é utilizada como um exemplo. A maioria das
cesarianas é realizada com a justificativa do sofrimento fetal, situação que é apresentada
normalmente pela explicação do risco ao bebê. O efeito dessa informação tem baixa capacidade de
tranqüilizar a gestante e os familiares, gerando sobrecarga nos demais membros da equipe. Embora
se trate de uma instituição de referência à gestação de risco, é necessário aqui lembrar os altos
índices de partos cesáreos que acontecem nos serviços de saúde do Município, conforme já se
demonstrou pelos indicadores na parte inicial deste capítulo. O ruído em relação à comunicação,
parece referir-se, na verdade, ao predomínio de lógicas privadas (interesses e convicções técnicas
dos profissionais) e/ou de tecnologias duras na organização do cuidado, ambas estranhas à
integralidade e à organização de linhas de cuidado.
Outro ruído importante também é relativo à organização do trabalho, mas sua expressão mais visível
não aparece no plano das relações entre os trabalhadores. Trata-se de um recurso de gestão do
trabalho que Merhy (2002) destaca como marcador de uma transição tecnológica na organização do
trabalho, que incide sobre a autonomia do conjunto dos trabalhadores: a crescente protocolização
do cuidado, onde as normas e as condutas não são apenas modos de organizar o trabalho, senão que
estão por sobre as capacidades individuais e coletivas de gerir os processos de trabalho. Na fala dos
sujeitos, a protocolização, por vezes, parece coincidir com a decisão médica, mas, nesse caso, apenas
compartilha com o modo mais freqüente da decisão clínica, que é o embasamento das condutas nas
evidências científicas e na lógica de escala do uso dos recursos. O que está em destaque aqui não é o
uso de conhecimentos científicos para orientar as condutas clínicas, mas o suposto de que todos os
problemas existentes no cotidiano dos serviços são fortemente estruturados de forma tal que pode
responder positivamente aos arranjos já estruturados de conhecimentos e às técnicas ou mesmo que
a eficiência no uso dos recursos físicos e financeiros e a otimização de recursos técnicos respondem
ao direito de atenção à saúde, por exemplo.
O trabalho humanizado supõe um trabalho em equipe integrada, com a construção compartilhada de
ações e do projeto terapêutico singular do usuário, que participa de sua elaboração. O cuidado
humanizado supõe a gestão do projeto terapêutico com base nas necessidades ampliadas dos
usuários.
Nesse contexto, parece que mais inteligível o silêncio das puérperas para o questionamento em
relação à humanização do parto. Ao ser indagada sobre cuidado humanizado, uma das participantes
parece ter aceito o desafio:
Hoje em dia esse tipo de cuidado é muito difícil, as pessoas não trabalham mais calmas, não tem mais paciência em cuidar. Acho que cuidado humanizado é cuidar com amor, carinho e muita paciência. As enfermeiras que trabalham aqui devem gostar, elas são calmas até. Me disseram que agente não podia gritar que as enfermeiras brigavam muito com nós.
106
É provável que o silêncio predominante sobre os sentimentos da humanização do parto também
tenha um pouco dessa sensação de que há um procedimento mecânico e normalizado na atenção a
ser oferecida no Centro Obstétrico, como nos demais serviços de saúde. Assim, um cuidado efetuoso,
responsável e vinculado seria muito difícil e os imaginários povoados de receios (“as enfermeiras
brigam com quem grita!”).
Além do aspecto da organização do trabalho, buscou-se aprofundar o sentido da participação no
projeto terapêutico. Em relação ao trabalho de enfermagem, Dutra (2005) afirma que é muito
comum as trabalhadoras desenvolverem apenas tarefas, isto é, cumprirem uma obrigação de
trabalho, apenas como atividade de remuneração e a sobrevivência. A máxima de “cada um fazendo
a sua parte” ilustra bem essa lógica.
O processo de cuidar envolve transformação de ambos, pessoa sob cuidado e cuidadores. O cuidado
traz satisfação ao paciente, alívio da dor, conforto, tranqüilidade, bem-estar, entre outros. A
cuidadora traz satisfação, sensação de dever cumprido, realização, aumento da auto-estima, prazer e
humanismo. Se as condições do meio ambiente não forem adequadas, pode ocorrer insatisfação e a
profissão torna-se fonte de frustração. (WALDOW, 1999).
Na prática cotidiana dos serviços de saúde, o acolhimento e a humanização podem ser percebidos
por meio de atitudes e ações evidenciadas na relação diária estabelecida entre profissionais e
usuários (as) dos serviços, a exemplo da forma cordial do atendimento, com os profissionais se
apresentando, chamando pelo nome, informando sobre condutas e procedimentos, escutando e
valorizando o que é dito pelas pessoas, garantindo a privacidade, incentivando a presença do(a)
acompanhante, entre outras. (Ministério da Saúde, 2005).
Entretanto, a humanização e a integralidade não são atributos verificáveis apenas num contato
pontual com os serviços de saúde. Assim como o vínculo, são processuais e construídos. A atenção de
pré-natal é um momento privilegiado para discutir e esclarecer questões que são únicas para cada
mulher e seu parceiro, aparecendo de forma individualizada, até mesmo para quem já teve outros
filhos. Temas como a sexualidade, poderão suscitar dúvidas ou necessidade de esclarecimentos.
Também para antecipar situações a serem vivenciadas no momento do parto, despertar a
curiosidade da mulher e produzir ações de tranqüilidade e esclarecimento. A humanização e a
integralidade são melhor verificadas no trabalho em rede, onde a integração entre os serviços, com
fluxos fluidos e estratégias de comunicação intensiva entre os profissionais. As respostas obtidas na
pesquisa sugerem que esse fluxo entre os serviços não está ocorrendo e que há, portanto, déficits de
acolhimento e integralidade ainda marcados no atendimento à gestante.
4.2.2. A humanização no cotidiano: desafio, mais que um fato
A humanização é um tema recente e muito debatido na avaliação do cuidado em saúde. No entanto,
é muito mencionado o cuidado como técnica e, muitas vezes, as técnicas e os procedimentos
constituem-se na característica mais marcante do cuidado. Os procedimentos técnicos são atividades
desenvolvidas pelos profissionais da área da saúde com objetivos de diagnóstico e/ ou de tratamento
do cliente/paciente. São relevantes para o cuidado. Para além da técnica, a relação entre as pessoas,
em particular entre o cuidador e o sujeito que demanda cuidados, é a “alma” das práticas de
107
cuidado. O cuidado humanizado demanda uma atitude de cuidar (BOFF, 2004) e também a ativação
de capacidades específicas, entre as quais a de estabelecer relações de cuidado (WALDOFF E LOPES,
2005).
Esta pesquisa teve finalidade de identificar e analisar a construção da humanização no cotidiano de
um serviço especializado em obstetrícia, junto a um hospital de médio porte na Serra Gaúcha, que
também opera como hospital de ensino e, portanto, que reproduz modelos de atuação profissional.
A principal conclusão que se pode construir a partir dos achados da pesquisa é que a implementação
das diretrizes da humanização na assistência ao parto ainda é predominantemente um desafio para
os serviços, redes e sistemas de saúde, tanto de natureza pública quanto em planos e seguros
privados de saúde. Também para os profissionais envolvidos.
Enquanto o conceito de ambiência, que é utilizado no âmbito da política de humanização, aparece de
forma próxima ao sentido que lhe é atribuído pela mesma na concepção dos profissionais vinculados
ao serviço, os principais déficits localizam-se no âmbito da micropolítica do trabalho, na concepção
de cuidado e na configuração em rede de serviços.
Em relação à micropolítica do trabalho, os aspectos relacionais e coletivos da organização do
trabalho no interior dos serviços são, com alguma freqüência, tornados problemas técnicos, de
domínio corporativo ou submetidos à protocolização. A gestão do trabalho fica transposta do
domínio político e da relação entre os atores para uma questão de domínio da administração e da
epidemiologia clínica, bem como para as lógicas corporativo-profissionais. Os coletivos de
trabalhadores atuam, em muitos momentos, como “equipe agregação” e não como “equipe
integração” e verifica-se uma tensão entre as demandas percebidas no cotidiano do trabalho e
normas técnico-administrativas e protocolos assistenciais, com claros déficits em relação à
possibilidade de uma clínica ampliada, da construção e oferta de projetos terapêuticos singulares e a
co-gestão dos processos de trabalho.
Em relação à concepção do cuidado, verifica-se um predomínio importante da lógica biomédica não
apenas na decisão de procedimentos, mas também à patologização da gestação, que se verificou na
modernidade ocidental principalmente nos Séculos XIX e XX, retirando-lhe os aspectos simbólicos e
afetivos e tornando-a apenas um fato médico. Embora com alguns avanços na proposição de um
cuidado mais assentado na idéia de vínculo e acolhimento, essas parecem ser características
associadas predominantemente à dádiva dos serviços e à empatia de alguns profissionais e não parte
constitutiva da clínica.
Por fim, e relacionado com os déficits listados acima, a inexistência e/ou fragilidade de vínculos entre
os serviços para formar redes de atenção, com integração e fluxos intensivos de comunicação,
também é uma característica marcante na qualidade do atendimento ofertado ao ciclo mãe-bebê.
108
4.3. O CUIDADO INTEGRAL NO COTIDIANO DO SERVIÇO: DIALOGANDO COM OS
SABERES E PRÁTICAS DAS MÃES SOBRE A AMAMENTAÇÃO NO PUERPÉRIO
IMEDIATO15
Algumas questões relativas ao cuidado integral ao ciclo mãe-bebê incluem predominantemente
ações de cunho não assistencial. Entre essas, as orientações sobre a amamentação. Desde o final dos
anos 40, quando o desmame precoce tornou-se epidêmico na maioria dos países, observou-se uma
lenta e gradual preocupação, em todo o mundo, pela volta ao hábito de amamentar. (CORRÊA,
1995). A Organização Mundial da Saúde (1996) recomenda amamentação exclusiva durante os seis
primeiros meses da criança. Essa recomendação foi adotada a partir de março de 2001 e foi
embasada numa revisão sistemática da literatura sobre duração ótima do aleitamento materno
exclusivo. Essa revisão mostrou que a amamentação exclusiva, nos seis meses preconizados, traz
benefícios para a mãe e para o seu filho, sem qualquer prejuízo ao crescimento físico e psíquico da
criança (GIUGLIANI, 2002). Entretanto, é preciso que constitua parte das ações de cuidado, na
medida em que a tendência do amamentar como comportamento natural foi afetada pela
tecnificação do cuidado e pela construção simbólica de sua substituição por produtos
industrializados, com forte participação do sistema de saúde.
A amamentação, do ponto de vista nutricional, é capaz de suprir todas as necessidades alimentares
da criança durante os seis primeiros meses de vida. Através do ato de amamentação é estabelecida
uma profunda relação entre a mãe e a criança, determinada por um processo de interação e
transação proporcionadas por fortes estímulos sensoriais, auditivos, táteis, visuais e emocionais.
Além desses aspectos, a amamentação, como método, pode ser considerada tecnicamente natural,
de fácil aprendizagem, higiênica e prática, economicamente barata, praticamente isenta de custos
(SANTOS, 2000).
Segundo Giugliani (2002) o ato de amamentar protege contra infecções que podem causar diarréia e
doenças respiratórias, síndrome da morte súbita do lactente, diabetes insulinodependente e doenças
alérgicas. Ainda, contribui para estancar o sangramento pós-parto e o risco de anemia e protege
contra o câncer de mama e ovário. Além disso, reduz o risco de contaminação pelo uso de
mamadeiras. São inúmeros os benefícios que a prática do aleitamento materno oferece, tanto para o
crescimento e desenvolvimento de lactentes, como para a mãe e a família, do ponto de vista
biológico e psicossocial. Porém, mesmo diante de tantos benefícios, a prática da amamentação ainda
está muito aquém do esperado.
15 Item produzido com base no trabalho “Aleitamento materno: estudo de saberes, práticas e orientações
sobre a amamentação com filhos internados em ambiente de UTI Neonatal em uma instituição de referência na serra gaúcha”, de autoria da Enfermeira Loriane Gava, realizado sob orientação do Prof. Alcindo A. Ferla.
109
Segre (2002) salienta que os conhecimentos básicos sobre amamentação constituem um direito
humano e precisam ser estimulados por meio de educação. É necessário que amamentação seja um
hábito cultural e, para tanto, torna-se fundamental informar, prevenir e sensibilizar a todos. É um
processo que envolve conquista social, política e transformação do cotidiano, no qual é modificado o
significado da amamentação para mulher e para a sociedade. A educação muda comportamentos,
efetivando o hábito de amamentar na população em geral.
Diante disso, e em consonância com as orientações da Organização Mundial da Saúde (1996), o Brasil
vem desenvolvendo múltiplas ações no sentido de garantir a prática do aleitamento materno. Dentre
essas ações está a iniciativa “Hospital Amigo da Criança”, que visa modificar as rotinas hospitalares
inadequadas para a prática da amamentação. O objetivo principal desta iniciativa é mobilizar
profissionais de saúde e demais funcionários de hospitais e maternidades para promover mudanças
de condutas e rotinas que visem à prevenção do desmame precoce (ARAÚJO, 2002).
Em virtude desta crescente preocupação com a amamentação, visível em iniciativas como o Hospital
Amigo da Criança, surgem dúvidas e curiosidades com relação à dinâmica do trabalho realizado pelos
profissionais junto às mães e recém-nascidos, assim como, sobre a adesão e o entendimento das
mães com relação às orientações recebidas. Estas dúvidas e curiosidades podem ser traduzidas em
algumas questões, entre elas: o que as mães apreenderam sobre a amamentação? De que forma
estão utilizando esses conhecimentos? Quais foram as dificuldades que encontraram no momento da
amamentação? Quais os profissionais que se envolveram nas orientações enquanto estavam
internadas no hospital? Como se organizam as práticas de cuidado no interior de serviços públicos e
privados de saúde?
Diante do exposto, este estudo tem por objetivo: conhecer os saberes e práticas de puérperas em
um Hospital Amigo da Criança, de natureza privada, com clientela mista de usuários dos sistemas
público e privado de saúde, relativo às orientações recebidas sobre aleitamento materno. Para
compreender qual a natureza da articulação entre o cuidado oferecido e os saberes e práticas das
mães com seus bebês internados na Unidade Neonatal, foram entrevistadas 15 mães durante o
período da internação, assim como feitas observações nos cenários de cuidado e análise documental.
Conhecer e descrever estes saberes e práticas torna-se relevante a partir do momento que pode
demonstrar o funcionamento do serviço, evidenciando a forma de como os profissionais trabalham e
incentivam o aleitamento materno e como as mães colocam em prática as orientações recebidas
sobre amamentação. Trata-se de analisar a natureza da relação entre profissionais e usuários e
identificar se, no cotidiano do trabalho, são utilizadas tecnologias de natureza leve (Merhy, 2002) e
se a gestão do cuidado se faz no sentido de construir linhas de cuidado. No contexto desta pesquisa,
as orientações sobre a amamentação e o diálogo com saberes e práticas das mulheres têm a
potência analítica de uma aproximação ao cuidado integral, constituindo evidência de uma
modelagem tecnoassistencial sugestiva de uma linha de cuidado. Trata-se de analisar as práticas de
cuidado num contexto de assistência de maior densidade tecnológica, como o ambiente da UTI, em
que a tensão entre procedimentos tecnológicos e práticas de cuidado pode oferecer evidências
importantes para a análise.
110
4.3.1. A AMAMENTAÇÃO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS DE ATENÇÃO INTEGRAL AO CICLO
MÃE-BEBÊ
A política de saúde da criança no Brasil tem priorizado, dentre outras, as ações de promoção,
proteção e apoio ao aleitamento materno, como estratégica fundamental para a redução da
mortalidade infantil no país e para melhoria da qualidade de saúde das crianças brasileiras. A
situação do Brasil com relação ao aleitamento materno justifica a preocupação e a intervenção de
órgãos públicos e da iniciativa privada com relação à campanha de incentivo à amamentação.
Conforme dados fornecidos pelo Ministério da Saúde (2001) em pesquisa realizada em 1999, a
prevalência de aleitamento materno exclusivo no país até 30 dias de vida é de 53,1%; de 31 a 60 dias
de vida é de 41,4%; de 61 à 90 dias de vida é de 30,6% e de 91 à 120 dias de vida é de 21,6%, de 121
à 150 dias de vida é de 14,7% e 151 a 180 dias de vida está em torno de 9,7%. Esses dados
demonstram o pequeno número de crianças que são alimentadas exclusivamente no seio até os seis
meses de vida, o que reforça a necessidade de incentivo e fortalecimento na sociedade na
importância e dos benefícios da amamentação.
De acordo com o Ministério da Saúde (2001), o aleitamento materno exclusivo é recomendado por
um período de seis meses. Posteriormente, a criança deve receber alimentos complementares,
estendendo a amamentação por pelo menos dois anos, desde que a mãe e a criança o desejem e
tenham condições para tal. O principal argumento contra a introdução precoce de alimentos
diferentes do leite materno é o aumento da morbi-mortalidade, especialmente em locais com
condições precárias de higiene. O consumo precoce desses alimentos diminui a ingestão do leite
materno e conseqüentemente a oferta de fatores de proteção contra infecções existentes no
mesmo. Entretanto o desejo materno de amamentar ou não deve ser compreendido e respeitado.
Apesar dos benefícios do aleitamento, deve-se aceitar a escolha, informada e consciente, da mãe
pela não amamentação (BRASIL, 2001). O direito da mãe não amamentar deve ser respeitado. A
equipe de saúde, deve estar capacitada para trabalhar com as mesmas, sem nenhum preconceito
auxiliando nos cuidados com a criança e estimulando o vínculo entre mãe e bebê. Também é
desejável que compreendam as reais motivações para essa escolha e, eventualmente, auxiliem na
revisão da mesma.
Conforme Giugliano (2002), o aleitamento materno exclusivo oferece a vantagem adicional de
diminuir os custos das famílias, dos estabelecimentos de saúde e da sociedade em geral, ao eliminar
os gastos com leites artificiais e mamadeiras e ao reduzir os episódios de doença nas crianças e,
como conseqüências, as faltas ao trabalho dos pais por doenças da criança. A promoção do
aleitamento materno, em especial do aleitamento materno exclusivo, é considerada uma das
estratégias de saúde de maior custo-benefício. A necessidade social dessa ação, para além dos
benefícios da amamentação em si, é a revisão da cultura midiática criada desde a metade do Século
passado, quando a idéia do desmame precoce foi construída com base no interesse da indústria de
laticínios e associada à idéia da emancipação feminina (Ministério da Saúde, 2001).
A gestação é o período mais adequado para educar as mães sobre as vantagens da amamentação
exclusiva, já que neste momento as mulheres estão muito sensíveis a aprender o necessário para
111
fazer o melhor para os seus filhos. Estudos têm mostrado que as mães que recebem orientação
durante o pré-natal amamentam por mais tempo.
A assistência ao parto tem um impacto direto sobre a recuperação da mãe e o início bem sucedido
da amamentação. A OMS (1996), estabeleceu 16 recomendações sobre a “tecnologia apropriada
para a atenção ao parto” que favorecem uma participação mais ativa da mulher na tomada de
decisões relacionadas com este momento.
Entre os aspectos destas recomendações que tem direta relação com a amamentação destacam-se
os seguintes: - não se justifica uma incidência de cesáreas maior que 10-15% - deve-se evitar a
indução do parto por razões médicas e o uso de drogas que não se requeiram especificamente para
corrigir ou prevenir complicações do parto; - deve-se permitir à mulher eleger a posição durante o
trabalho de parto e o parto; o recém-nato sadio deve ser entregue de imediato à sua mãe quando as
condições de ambos o permitem; deve-se promover o começo imediato da amamentação, inclusive
durante a sua permanência na sala de parto. Os dois últimos itens foram enfatizados numa
declaração conjunta OMS/UNICEF em 1989, onde se definiram “Os dez passos para uma
amamentação com êxito que formam a base da iniciativa dos Hospitais Amigos da Criança” (OMS,
1996).
Todos os estabelecimentos que oferecem serviços obstétricos e cuidados a recém-nascidos deveriam
cumprir os 10 passos para o sucesso do Aleitamento Materno (“Proteção, Promoção e Apoio ao
Aleitamento Materno – o papel especial dos serviços materno-infantis”. Uma declaração conjunta
OMS/UNICEF de 1989). Segundo Lowdermilk et al (2002), o sucesso da amamentação depende do
bem estar da mulher, de como se sente a respeito de si própria e da sua situação de vida. O
momento da gestação e do parto é um momento importante para fortalecer vínculos de
familiaridade da mulher com sua rede social, inclusive com o pai da criança, se esse for o caso. Sendo
uma situação que interfere no cuidado, deve ser considerada no planejamento da atenção a ser
oferecida por ocasião do pré-natal, do parto e do puerpério.
4.3.2. O DIÁLOGO ENTRE SABERES EM UMA SITUAÇÃO CONCRETA: ORIENTAÇÕES SOBRE A
AMAMENTAÇÃO EM SITUAÇÃO DE INTERNAÇÃO EM AMBIENTE DE UTI
Os sujeitos da pesquisa foram 15 mulheres, cinco das quais com idade inferior a 20 anos, quatro com
idades no intervalo de 20 a 30 anos, cinco com idades entre 30 a 40 anos e uma no intervalo de 40 a
50 anos. Essa distribuição coincide com a faixa etária de maior incidência de gestação e que
concentram as taxas de natalidade.
Entre todos os períodos do ciclo vital, a gestação é um dos mais decisivos e singulares. Quando a
mulher se torna grávida, todas as experiências do seu passado reúnem-se com as do presente, para
lançar os alicerces de uma nova vida cujo potencial por sua vez, influencia o bem estar de gerações
futuras. Conforme dados do Ministério da Saúde (2001), atualmente a mulher está optando cada vez
mais tarde optando por ser mãe, a fim de se estabelecer profissionalmente e financeiramente. Essa
tendência é verificada na amostra, com um terço das mulheres na faixa entre 30 e 40 anos e uma na
112
faixa dos 40 a 50 anos. Em relação à situação conjugal, doze mulheres eram casadas e duas em
relações conjugais estáveis. Uma das participantes relatou ser solteira e não viver conjugalmente
com o pai da criança ou outra figura conjugal. A situação conjugal é um fator importante para o
planejamento de ações de incentivo à amamentação, uma vez que o envolvimento do cônjuge ou
companheiro é um apoio fundamental, tanto do ponto de vista emocional quanto no apoio objetivo
à organização do modo de vida que inclua a criança e suas necessidades (Maldonado, 2005).
Outro dado relevante do perfil dos sujeitos da pesquisa é o fato de que para sete mulheres tratava-se
do primeiro filho, cinco mulheres tinham outro filho anterior e três mulheres tinham dois ou mais
filhos. O número de filhos é um fator muitas vezes determinante na amamentação. Muitas vezes
mães que na primeira gestação tiveram dificuldade em amamentar, insegurança, na segunda
gestação demonstraram mais interesse e dedicação no momento de amamentar.
4.3.2.1. A ATENÇÃO RECEBIDA NO PRÉ-NATAL, PARTO E PUERPÉRIO E AS EVIDÊNCIAS DE
INTEGRALIDADE EM CONTEXTOS CONCRETOS DE CUIDADO
O pré-natal é o acompanhamento realizado pela equipe multiprofissional que visa cuidar da saúde da
mulher e do seu bebê até que ocorra o parto. Esta assistência reduz a mortalidade materna e
perinatal (Brasil, 2001). No grupo participante da pesquisa, mais da metade (10) havia realizado um
número de oito ou mais consultas de pré-natal e quatro no intervalo entre 04 e 07 consultas. A OMS
(1996) recomenda para o pré-natal ideal um número mínimo de 06 consultas, e, em caso de gestação
de alto risco, a atenção dispensada à gestante seria a critério do médico. A assistência pré-natal
possui resultado decisivo no resultado da gestação. Na ausência, a mortalidade perinatal é cinco
vezes superior àquela encontrada nas clínicas de atendimento pré-natal regular (Ministério da Saúde,
2005). Durante o pré-natal são detectadas as gestantes de alto risco e medidas profiláticas e
terapêuticas são empregadas, objetivando o controle de quadros patológicos que representam risco
materno e fetal.
Para o sucesso da assistência de pré-natal, são necessários: a participação da equipe
multiprofissional/ interdisciplinar, um cuidado pré-natal precoce e a garantia da assistência de
qualidade ao longo da gestação. O vínculo referido pelas mulheres foi com o profissional médico
(obstetra) e com o serviço hospitalar. Questionadas sobre a participação em grupos ou outras
modalidades de atenção exceto a consulta médica e os exames complementares, onze mulheres
afirmaram que não tiveram acesso a esses serviços. Foi nesse segmento que foram identificadas
maiores dúvidas em relação à amamentação. As mães que haviam participado dos grupos de
gestantes apresentavam menos dúvidas no que se dizia respeito à amamentação. As explicações
para a não participação em grupos de gestantes foi o desconhecimento, a não oferta pelo
profissional que atendeu o pré-natal e, para uma das mulheres, o desinteresse.
O grupo de gestantes tem a finalidade de prepará-las para o manejo correto da lactação, visando
com isso facilitar o processo de amamentação e solucionar os futuros problemas que possam surgir.
Esse objetivo é percebido pelas mulheres que participaram de grupos. Uma delas informa que
participou do grupo de gestantes quando do nascimento do primeiro filho [com pré-natal realizado
no sistema público de serviços de saúde], reportando que achou a experiência “muito legal, eles me
113
ajudaram muito, fiquei um pouco mais tranqüila para amamentar, na segunda gestação foi bem mais
fácil”. Outra participante informa que, quando engravidou, procurou o grupo de gestantes na
Unidade Básica próxima de sua casa, para ajudá-la com a experiência, já que estava em situação de
“marinheiro de primeira viagem”. Para Gomes (2003), os grupos visam realizar encontros educativos
a todas as gestantes e seus parceiros, tendo a finalidade de abordar diversos temas relevantes à
gestação, o parto e o pós-parto, e, sobretudo, constituir superfícies para a formação de vínculo com
a rede de serviços que fará o atendimento. É desejável que pelo menos um destes encontros será
destinado ao assunto aleitamento materno e seu manejo. O mesmo autor (Gomes, 2003) ressalta
que as informações abordadas no grupo de gestante, antigamente eram repassadas pelos médicos
durante as consultas realizadas no pré-natal. Como se verificava a necessidade de enfatizar temas
relevantes como o aleitamento materno e seu manejo incentivando a retomar a prática do ato de
amamentar, surgiram os grupos de apoio ou também conhecidos como grupos de gestantes.
Também é preciso destacar que a dilatação no que se concebe como um cuidado integral ao ciclo
mãe-bebê vem exigindo a ampliação das ofertas assistenciais nesse segmento de cuidados.
O grupo de gestantes visa ajudar a facilitar as experiências sobre o aleitamento materno, enfatiza o
seu manejo correto, de modo esclarecedor sobre as possíveis dificuldades que possam surgir no
decorrer do processo de amamentação (King, 1994). Ao realizarem esses encontros, com um meio
facilitador de experiências no processo de amamentar, as gestantes podem descobrir que não há
uma única forma de realizar a amamentação, mas sim diferentes formas que possam atingir os
mesmos resultados. No entanto, cabe à puérpera identificar qual técnica se adapte melhor a ela e ao
seu bebê, com finalidade de proporcionar maior satisfação para ambos, tornado assim o ato de
amamentar um momento prazeroso, de troca de afeto entre mãe e filho. A fala a seguir evidencia a
importância da orientação dada à gestante para o manejo da lactação na produção de melhores
condições para a mãe estabelecer o processo da amamentação:
O grupo de gestantes é fundamental para o sucesso da amamentação, pois é nele que serão
trabalhadas as ações educativas referentes ao aleitamento materno, seu manejo correto, pois como
já foi refererido, a mulher tem a capacidade biológica para amamentar, porém seu conhecimento
não é nato e sim adquirido e, portanto, pode ser aprendido. Este aprendizado ocorre durante os
grupos de gestantes.
Entretanto, a cultura de atividades de grupo não é tecnologia cotidiana no cuidado em saúde e
tampouco pertence ao imaginário vigente no cuidado ao ciclo mãe-bebê. Em particular, na
assistência ofertada à gestante beneficiária de planos e seguros privados de saúde. A assistência ao
pré-natal restringe-se, na maior parte das vezes, ao consumo de consultas com obstetras e o acesso
a exames complementares. Na amostragem realizada por ocasião do estudo, o acesso à atividade de
grupo deu-se exclusivamente pela procura da própria gestante, em uma iniciativa que produziu um
mix assistencial entre os sistemas público e privado de serviços de saúde. O acesso a essas
modalidades de atenção foi decorrente do protagonismo exercido pelas próprias gestantes na gestão
do seu cuidado. Não se constituiu, portanto, em oferta do serviço e não pode ser colocado como
marcador da existência de linha de cuidado na prática assistencial adotada. Entretanto, parece
necessário constatar uma apropriação relevante da organização dos sistemas de serviço pelos
usuários, o que embasa um maior empoderamento no desenho de trajetórias assistenciais mais
próximas da idéia da integralidade e em desenhos tecnoassistenciais mais compatíveis com linhas de
cuidado.
114
Essas hipóteses são fortalecidas com outro indicador construído a partir do contexto das mulheres
que participaram do estudo. Um total de 13 entre as 15 mulheres participantes foi submetida a parto
cesáreo, o que constitui uma taxa de 87%. Como não se trata de uma amostragem estatisticamente
significativa, a importância de apresentar a taxa é pela capacidade de diálogo com os valores
apresentados na sessão anterior, com indicadores gerais para os territórios locorregionais em que se
desenvolveu essa parte da pesquisa. Segundo a Organização Mundial da Saúde (1996) o parto
cesáreo retarda o aleitamento materno, pois a mãe vai demorar mais tempo para ter o primeiro
contato com o bebê, assim como pode trazer outras conseqüências relevantes para a recuperação da
mãe e o desenvolvimento da criança. O grande número de contatos com o profissional obstetra que
as mulheres participantes da entrevista teve não foi suficiente para ampliar o protagonismo na
escolha do método do parto, referido como uma decisão técnica do profissional que as atendeu,
respaldada na condição de risco que gerou a necessidade de internação em ambiente de UTI16.
Especificamente em relação às orientações sobre a amamentação no decorrer das entrevistas
constatou-se que as puérperas tiveram dificuldades no manejo da lactação. A amamentação é
biologicamente determinada, porém socialmente condicionada (Vinha, 1987). O processo que na
teoria se diz fácil e natural, mas a sua prática pode ser um pouco mais complicada, isso ocorre
porque é um processo de aprendizagem e como todo o processo de aprendizagem tem suas
dificuldades. Um bom exemplo dessa dificuldade é o manuseio dos bicos dos seios, que até então
não tinham funções biológicas mais expressivas na vida da mulher. Com o nascimento do seu filho
vê-se usando várias vezes ao dia, tornando-os mais sensíveis, doloridos e propensos ao surgimento
de fissuras (SANTOS, 2000).
O conhecimento sobre o aleitamento materno que as puérperas adquirem no período gestacional é
de fundamental relevância, pois é um fator crucial para implementação do aleitamento materno,
fazendo com que esta prática seja um sucesso ou não.
Cabe aos profissionais da área da saúde, principalmente à equipe de enfermagem, que tem maior
contato direto, incentivar as gestantes para participarem dos grupos de gestantes oferecidos nas
Unidades Básicas de Saúde, a fim de suprir as dificuldades que as puérperas possam apresentar no
momento de estabelecer o processo de amamentação.
A formação de vínculo com a rede de serviços é fundamental para fortalecer o cuidado, em particular
considerando o fato de que o bebê que nasce nem sempre responde à idealização que é feita dele. A
mulher, ao ficar grávida, jamais imagina que possam acontecer imprevistos na gestação ou até
mesmo com o bebê. A perda da imagem do filho perfeito, construída durante a gravidez, e que, após
o nascer mostra-se totalmente diferente é totalmente inesperada, por isso no processo de aceitação
da família, a mãe necessita de apoio emocional e dos profissionais da área de saúde para superar as
etapas que virão para, com isso, formar e fortalecer o vínculo entre mãe e filho. (Freitas, 2001).
O mesmo autor, afirma que a amamentação pode não acontecer em situações totalmente
imprevistas. Em crianças prematuras, por exemplo, existe uma série de fatores que devem ser
16 No momento da pesquisa de campo, não foi objetivo analisar o contexto da internação e buscar explicações
em relação à situação do nascimento e dos motivos para a internação em ambiente de UTI. A observação direta permitiu supor tratar-se de situações de baixo peso e prematuridade, mas tampouco foram investigadas em profundidade as condições em que se deu o atendimento ao parto.
115
avaliados para que se inicie com a oferta de leite materno. Entre outras situações, por exemplo,
crianças prematuras podem apresentar transtornos de sucção decorrentes da imaturidade. No caso
de crianças com má formação congênita, com problemas neurológicos, ou até mesmo por seqüelas
neurológicas, alterações anatômicas devido a má formação congênita que podem alterar o padrão de
sucção e deglutição.
Em algumas situações a amamentação deixa de ser possível não por falha no processo de
amamentar, mas sim devido às dificuldades apresentadas pela criança, não sendo de
responsabilidade da mãe o fato do aleitamento materno ser interrompido ou, até mesmo, nem
estabelecido. O depoimento de uma mãe ilustra essa condição: “meu bebê nasceu antes do tempo,
está tendo dificuldade para mamar [...] mamou muito tempo pela sonda”. Para poder ajudar a mãe a
contornar essas dificuldades, faz-se necessário a presença de uma equipe multiprofissional. O
profissional que está em contato direto com essa puérpera é o enfermeiro, podendo atuar auxiliando
essa mãe no manejo da lactação, pois conhece o paciente em sua totalidade, com isso sabe escolher
a maneira mais adequada de abordar, incentivando o comprometimento entre o paciente e o seu
cuidador (Araújo, 2002). A importância de uma equipe multiprofissional, operando efetivamente
como equipe integração (Peduzzi, 2000) pode operar como um dispositivo de cuidado, como ilustra
esse depoimento: “achei que não ia conseguir amamentar meu filho, por ser prematuro [...], mas as
enfermeiras lá do hospital foram bem atenciosas e tiveram muita paciência [...] que me ajudou a
conseguir dar o peito. Custou, mas consegui”.
As gestantes necessitam de um suporte profissional que as auxiliem na condução e no manejo do
aleitamento materno. É importante que se ressalte que o processo de aleitamento materno não é
somente um conjunto de técnicas, mas um fenômeno que ocorre naturalmente, porém a habilidade
que se requer para que isso ocorra pode ser ensinada e adquirida.
A importância da qualidade das orientações recebidas no pré-natal não se esgota no tempo da
internação, mas segue após a alta hospitalar. As gestantes que, durante o pré-natal, tiveram
oportunidade de participar do grupo de gestante, provavelmente tiveram a informação dos
benefícios e malefícios do uso de bicos e mamadeiras. Para que a amamentação tenha sucesso é
necessário que a gestante deva receber apoio durante todo o período gestacional e envolver a rede
de apoio familiar e social.
O sucesso da amamentação depende de uma série de fatores, alguns dos quais contribuem para que
isso ocorra vínculo mãe-bebê, como o preparo adequado, o apoio familiar e principalmente a
atenção dos profissionais da saúde.
Todo o processo de amamentação inicia com a confirmação da gravidez. A partir desse momento a
mulher passa a realizar o pré-natal, que visa prestar um serviço de qualidade desde o seu início.
Como conseqüência, percebe-se que a gestante está ciente da importância desse acompanhamento
feito durante o pré-natal.
A pesquisa permitiu observar que apesar do esclarecimento das mães sobre a importância do
aleitamento materno, ainda existe uma dificuldade em amamentar crianças que necessitam de
internação. As equipes de saúde devem continuar orientando, esclarecendo dúvidas e
acompanhando as mães quanto à importância do aleitamento materno.
116
Umas das ações educativas realizadas por uma equipe de multiprofissionais que vem a somar ao pré-
natal é o grupo de gestantes. Esses grupos visam esclarecer as dúvidas mais freqüentes das gestantes
sobre o período gestacional, o parto e o pós-parto. Mas o mais importante nestes encontros é o
incentivo ao aleitamento materno, seu manejo e em como resolver as possíveis dificuldades que
possam surgir, assim como a produção de vínculo não apenas com os profissionais, mas com os
serviços que comporão a rede de cuidados a ser utilizada.
Uma equipe de profissionais preparados e capacitados a multiplicar aspectos sobre os processos da
lactação tem e pode influenciar a comunidade onde está inserida e aumentar a incidência da
amamentação. Os profissionais da saúde têm o compromisso de promover o aleitamento materno,
sensibilizando e incentivando as puérperas a continuarem amamentando seus filhos mesmo que
surjam obstáculos. Em que pesem evidências fortes de que mesmo o cuidado oferecido nos serviços
públicos está distante do preconizado nas políticas oficiais de atenção ao ciclo mãe-bebê, a pesquisa
permitiu identificar que a assistência oferecida em planos e seguros privados de saúde apresenta
dificuldades adicionais, que têm influência no processo de cuidado. A escassez na diversificação de
ofertas assistenciais, com reduzidas oportunidades de contato com equipes multiprofissionais,
modalidades inovadoras de atenção (grupos, por exemplo) e a incorporação do conceito de atenção
integral parecem ser mais marcantes dos limites da saúde suplementar. Entretanto, há coincidências
importantes nos serviços públicos e privados que falam de uma ainda muito incipiente incorporação
de modalidades tecnoassistenciais mais voltadas à integralidade, como as tecnologias de linhas de
cuidado: a gestão dos processos de trabalho e a natureza das tecnologias utilizadas para compor o
cuidado. A dimensão micropolítica das práticas, de forma predominante, ainda está muito marcada
pelo modelo biomédico hegemônico, em ambos os componentes do sistema de saúde brasileiro. E
esta constatação reivindica ações mais fortes de microrregulação do cuidado.
O próximo item provavelmente deixará mais evidente essa necessidade.
117
4.4. O ATENDIMENTO PEDIÁTRICO E OBSTÉTRICO: RUÍDOS NA RELAÇÃO
PROFISSIONAL E USUÁRIO COMO MARCADOR DO MIX PÚBLICO E PRIVADO1718
O vínculo profissional e usuários tem sido considerado questão central para avaliar a qualidade da
atenção à saúde. Essa expressão pode significar, ao mesmo tempo, diferentes combinações de
singularização do atendimento, a humanização, o consentimento e o protagonismo do usuário
(Caprara & Franco, 1999). No caso do referencial de análise da pesquisa, o vínculo diz da estética do
cuidado, na medida em que pode permitir o nomadismo da clínica (da técnica para tecnologia de
cuidado) por meio de uma escuta mais intensa das condições de vida e saúde dos usuários (Ferla,
2007). Ou seja, um vínculo mais intenso no âmbito do cuidado pode permitir não apenas a
identificação de sinais e sintomas de doenças reais ou potenciais, mas também as condições do
andar a vida, que interferem não somente na produção da doença, senão também na promoção da
saúde. Compreende-se aqui a promoção num sentido de potência de saúde e não apenas como
gestão do risco de doenças.
Para caracterizar o vínculo e variáveis que interferem na qualidade desse vínculo, uma das etapas da
pesquisa (Kerber, 2009) realizou entrevistas semidirigidas (Quivy, 1995), com cinco pediatras com
atendimento em consultórios e ambulatórios públicos e privados e cinco mães que buscam
atendimento para seus filhos em serviços públicos e no subsistema suplementar. A amostragem foi
constituída com base na técnica de “bola de neve”, com indicações coletadas entre os próprios
entrevistados.
Analisar questões relativas ao cuidado à criança, na avaliação da absorção da tecnologia de linhas de
cuidado, inclui operar com uma hipótese muito freqüente nos estudos da sociologia do trabalho: a
pediatria, como especialidade médica, foi uma área mais preservada no processo de fragmentação
disciplinar no interior da medicina e, por isso, preservaria uma condição diferenciada de vínculo e
humanização. Há um conjunto de transposições que embasam essa hipótese, que inclui: a associação
entre especialização do conhecimento e tecnificação da prática; entre a objetualização do corpo por
olhares progressivamente mais especializados e a despersonalização do cuidado; entre níveis
crescentes de abstração na especialização do conhecimento e a complexidade da organização do
trabalho de cuidado; entre outros. A integralidade, assim como a qualidade do cuidado percebida
pelo usuário, depende de um conjunto complexo de articulações, conforme nos propõem Cecílio &
Merhy (2007)
O cuidado, de forma idealizada, recebido/vivido pelo paciente, é o somatório de
um grande número de pequenos cuidados parciais que vão se complementando,
17 Item produzido com base no trabalho “A relação entre pediatras e mães usuárias do SUS e do convênio”, de
autoria da Socióloga Aline de Oliveira Kerber, realizado sob orientação da Profa. Soraya M. V. Côrtes.
18 Item produzido com base na dissertação “Do Pré-natal ao Parto: estudo das trajetórias terapêuticas
percorridas por um grupo de mulheres usuárias do subsetor suplementar de assistência à saúde” de autoria da Enfermeira Fernanda Peixoto Cordova, realizada sob orientação da Profª. Drª. Dora Lúcia Leidens Corrêa de Oliveira.
118
de maneira mais ou menos consciente e negociada, entre os vários cuidadores que
circulam e produzem a vida [dos serviços de saúde]. Assim, uma complexa trama
de atos, procedimentos, fluxos, rotinas e saberes, num processo dialético de
complementação, mas também de disputa, compõe o que entendemos como
cuidado em saúde. A maior ou menor integralidade da atenção recebida resulta,
em boa medida, da forma como se articulam as práticas dos trabalhadores. (pág.
200)
Para Carapinheiro (1998), a articulação entre atos médicos, no contexto atual de crescente
racionalização das práticas no interior dos hospitais e outros serviços de saúde fortemente
tecnologizados, é um grande desafio para o cuidado. Esse contexto é caracterizado, de acordo com a
autora, pela decomposição do ato médico em inúmeros atos de diagnóstico e terapia, realizados
inclusive por outros profissionais, sejam especialistas médicos distintos ou mesmo profissionais de
outras profissões. Essa fragmentação decorre de questões relativas ao mundo do conhecimento, pela
subespecialização disciplinar, e ao mundo do trabalho, pela fragmentação dos atos e dos
mecanismos de controle e regulação. Uma forma específica de coordenação do cuidado (Merhy &
Cecílio, 2002), como a que denominamos de linha de cuidado neste trabalho, implica em um
processo regulatório, em particular no trabalho gerencial, que articule de forma mais ou menos
precisa, o conjunto diversificado, especializado e fragmentado de atos de atenção à saúde. Para a
análise de variáveis relacionadas a essa equação, foi importante analisar o cuidado em pediatria.
A questão de análise colocada aqui é que o estudo do cuidado em pediatria poderia oferecer um
cenário em que o distanciamento entre profissionais e usuários não estivesse marcado com a
radicalidade que parece estar em outras especialidades médicas, em particular nos serviços de maior
densidade tecnológica.
O achado da pesquisa mais marcante para a análise desta pesquisa foi um consenso entre médicos e
usuárias acerca do distanciamento como característica da relação entre ambos. De certa forma, esse
achado atualiza as pesquisas acerca da especialização do trabalho médico que apontavam, já nas
décadas de 70 e 80 do século passado, uma sistemática de valorização do trabalho especializado no
interior da medicina, que colocava relações de dominação exercidas pela autoridade do saber na
relação entre profissionais médicos e com os demais atores do cuidado (Schraiber, 1989),
construídas desde a formação dos alunos e em fina sintonia com o próprio mercado de trabalho
(Donnangelo, 1975).
A construção explicativa desse distanciamento é distinta na opinião de médicos e usuárias. Enquanto
para os médicos a principal explicação para o distanciamento, que revela dificuldades na formação
de vínculos, é a distância social entre ambos, para as usuárias a explicação mais freqüentemente
utilizada é relativa às características do local do atendimento. Essas construções são mediadas por
opiniões sobre os componentes público e privado do subsistema de serviços de saúde. Para os
médicos, mesmo entre os beneficiários de planos e seguros privados de saúde, graças à ampliação do
acesso produzida por planos coletivos nas empresas, a dificuldade de vínculo é predominantemente
cultural e de capacidade de consumo, uma vez que os usuários de menor poder aquisitivo teriam
níveis de escolaridade menores – e, portanto, na sua construção explicativa, menor capacidade de
compreensão da gramática da clínica e, em particular, da terapêutica – e menor capacidade de
adquirir produtos e serviços prescritos. Para as usuárias, os serviços ambulatoriais e os atendimentos
de emergência públicos têm características desfavoráveis ao atendimento, como filas, rotatividade
de profissionais, superlotação, deficiência de infra-estrutura. Entretanto, como observa Kerber
119
(2009), a imagem construída por essas usuárias não parece advir de experiências próprias anteriores
com os serviços públicos, uma vez que as participantes do estudo o utilizaram muito pouco, mas de
um imaginário coletivo de desqualificação da atenção ofertada nos serviços públicos. Essa
provavelmente é a principal explicação da diferença identificada nas entrevistas de usuários do
serviços públicos na linha mãe-bebê e em saúde mental descritos anteriormente, que fazem uso de
ambos os serviços. Além do assujeitamento ao imaginário coletivo, é preciso destacar diferenças
relevantes em relação à organização do sistema de saúde nos cenários das duas abordagens.
Também é interessante verificar que as usuárias participantes desta pesquisa afirmam preferir o
atendimento médico por meio dos serviços de emergência de hospitais, tanto privados como
públicos. Para as mães, na emergência dos hospitais, em particular quando o atendimento é obtido
por meio de planos e seguros privados de saúde, o atendimento ofertado é classificado como
resolutivo e seguro, e a principal referência é a sofisticação tecnológica do ambiente hospitalar e o
período integral de funcionamento, que não coincide com o horário de trabalho. O principal
argumento para o atendimento público é a gratuidade, seguido dos vínculos estabelecidos com os
demais profissionais (não médicos) e da diversificação de ofertas assistenciais. Para os médicos, essa
conduta é classificada como imediatista e associada a deficiências culturais na população mais pobre,
que não buscaria atendimento precoce e se mobilizaria apenas quando a situação de saúde da
criança alcança maior gravidade, além de denunciar que essa postura é uma estratégia de gestão do
tempo das mães.
A compreensão mais adequada para essas questões parece estar na organização do trabalho no
interior dos serviços. O atendimento por meio de planos e seguros privados de saúde é considerado
mais confortável pelas usuárias pela possibilidade de marcação de horários, por uma disponibilidade
maior dos profissionais médicos para o atendimento e para a escuta, pela possibilidade de escolha
do profissional que fará o atendimento, pela qualidade dos registros dos atendimentos anteriores e
pela possibilidade percebida de interferir nos encaminhamentos propostos. Para os profissionais
médicos, a organização do processo de trabalho nos serviços públicos é um problema, que se agrava
pelo que consideram como baixo nível cultural dos usuários. Mas é relevante ressaltar que na
construção explicativa do contexto nos serviços públicos os médicos parecem não exercer
protagonismo mais acentuado, exceto pelo fato de afirmarem que envolvem-se menos com o
atendimento e com a própria organização do trabalho por decisão motivada pelas próprias condições
objetivas em torno das quais o trabalho se organiza. No consultório privado, entretanto, a
abordagem dos médicos é mais ampla e a demonstração de maior interesse no usuário é justificada
pelo pagamento direto (co-pagamento) e indireto (taxa do convênio), pelo investimento no retorno
do usuário em outras oportunidades e pelo fato de que, quando o atendimento é melhor avaliado, o
usuário pode referir o profissional a outros usuários. Mas os próprios profissionais reconhecem que
as modalidades de regulação do acesso dos planos e seguros privados de saúde são mais efetivas
para viabilizar o retorno dos usuários do que o esforço em tornar o atendimento agradável e
resolutivo. Estar vinculado aos melhores planos, estar localizado entre as primeiras indicações do
plano para sua especialidade, ter um consultório bem localizado e dispor de boas condições de
logística são variáveis mais fortes de melhor desempenho na iniciativa privada.
O resultado da pesquisa aponta que a hipótese de melhor qualidade do vínculo no atendimento
pediátrico não tem o poder explicativo que se previa inicialmente. Existem condições objetivas nos
serviços vinculados a planos e seguros privados e ao subsistema público de assistência que mobilizam
120
a avaliação de médicos e usuários, alguns dos quais altamente sensíveis de estratégias de regulação
de acesso e de qualidade, mas há um destaque na dimensão micropolítica do trabalho, onde a
relação entre profissionais e usuários é moldada pelo jogo de interesses e necessidades de cada um,
mas que também inclui a relação dos diferentes profissionais (trabalho em equipe integrada, tensões
corporativas, jogos de interesse privado, distintas lógicas de organização do trabalho e concepções
de cuidado) e destes com normas, rotinas e políticas que buscam organizar os fluxos assistenciais e
as práticas de atenção no interior dos serviços.
Outra não é a conclusão quando se analisa itinerários terapêuticos de mulheres na atenção ao pré-
natal e ao parto (Córdova, 2009). Parte da pesquisa buscou conhecer as trajetórias terapêuticas de
mulheres usuárias de planos ou seguros de saúde no contexto da atenção ao pré-natal e ao parto e,
analisar as ações de cuidado que constituíram estas trajetórias, do préperspectiva do referencial da
integralidade e da promoção da saúde. O estudo, de cunho exploratório-descritivo, foi desenvolvido
numa perspectiva qualitativa. Os sujeitos da pesquisa foram onze mulheres que tiveram seu pré-
natal realizado no subsetor suplementar. Na análise da atenção ao pré-natal e ao parto a noção de
integralidade e de promoção da saúde ganha importância, na medida em que agregam elementos
tais como acesso, acolhimento, vínculo, responsabilização, autonomia e educação em saúde,
considerados como marcadores de qualidade e resolutividade na atenção em saúde. Na análise dos
dados, observo que no âmbito da atenção ao pré-natal e ao parto, as mulheres percorreram
trajetórias terapêuticas com elevada especialização em relação ao grande número de exames e
procedimentos realizados. Nas consultas de pré-natal apareceram poucos espaços destinados à
escuta e ao diálogo, havendo predomínio de ações intervencionistas ao invés de ações de educação
em saúde. Nas experiências das mulheres entrevistadas o desfecho das trajetórias terapêuticas
percorridas no pré-natal foi o parto cesáreo. A análise dos dados sugere que as mulheres pouco
participaram dos processos de escolhas dos exames e do tipo de parto de que foram sujeitos,
possivelmente porque houve poucos espaços para a discussão e problematização das circunstâncias
que resultaram na indicação médica destes procedimentos. Neste sentido, os dados sugerem uma
falta de autonomia das mulheres que são atendidas pelo subsetor suplementar no âmbito da
atenção ao pré-natal e ao parto. Estes resultados indicam que, neste contexto, o cuidado é
fragmentado, medicalizado e biologicista. Neste sentido, considerada a sua necessária aproximação
dos princípios do SUS e, mais especificamente do referencial da integralidade e da promoção da
saúde, é possível argumentar que a atenção pré-natal e ao parto realizada no contexto do subsetor
suplementar precisa melhorar sua qualidade.
5. A ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL: POLÍTICAS E PRÁTICAS DE CUIDADO DA SAÚDE SUPLEMENTAR EM CONTEXTOS
LOCAIS
A descrição do cenário da saúde mental nas duas Regiões em estudo buscou registrar alguns
dados que não foram utilizados no Capítulo 3 e tem o objetivo de adotar neste estudo a
metodologia de análise de cenários utilizada em estudos anteriores (Ferla & Cols, 2009a;
2009b). Neste capítulo, assim como no anterior, pretende-se descrever alguns estudos que
compuseram a abordagem de estudos integradores, conforme previsto na metodologia
descrita.
No caso específico da atenção em saúde mental, os estudos integradores tiveram importância
ainda maior no marco de análise, tendo em vista as transformações nas normas de
atendimento emitidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para o atendimento
específico, publicadas durante o período da pesquisa.
Esse capítulo é composto por estudos que buscaram aprofundamento em temas específicos
que emergiram durante as etapas iniciais da pesquisa e que se mostraram real ou
potencialmente capazes de ampliar a compreensão das políticas e práticas de cuidado vigentes
no cotidiano da saúde suplementar.
O primeiro desses estudos compõe esforço articulado com as dissertações de mestrado de
Sueli Goi Barrios (2009) e Luciane Silva Ramos (2009) para compreender a configuração de um
sistema locorregional de saúde nos aspectos da gestão setorial e da rede de atenção à saúde
mental. Trata-se de uma abordagem centrada em entrevistas com usuários de serviços
substitutivos de atenção à saúde mental e que detinham a condição concomitante de
beneficiários de planos e seguros privados de saúde, com o objetivo de compreender o mix
público e privado no itinerário terapêutico dos mesmos, ou seja, a natureza propriamente dita
desse mix no construção dos itinerários de cuidado. Foram entrevistados 10 (dez) usuários de
serviços substitutivos em um município da Região Centro do Estado do Rio Grande do Sul.
O segundo estudo, que utiliza roteiro de entrevistas similar ao estudo anterior, foi utilizado
para compreender a perspectiva dos diferentes atores que estão vinculados a um sistema
locorregional de atenção à saúde mental em relação ao cuidado oferecido na rede de
122
cuidados. No caso deste estudo, interessou compreender a mediação das perspectivas desses
atores na concepção e na mediação de fluxos assistenciais da rede de serviços de saúde
mental. Foram entrevistados 16 sujeitos em diferentes serviços.
O terceiro estudo buscou compreender a construção de práticas de cuidado em saúde mental
em serviços operando em rede de cuidados e em serviços isolados. Foram entrevistados
enfermeiros com atuação na Estratégia de Saúde da Família e enfermeiros com atuação em
serviços que operam de forma tradicional, o que permitiu indentificar importantes diferenças
na compreensão de cuidado, vínculo, acolhimento e, mesmo, da própria gestão do cuidado,
tanto em questões associadas à dimensão micropolítica quanto nas questões organizacionais
dos serviços. Esse estudo permitiu avançar na caracterização da hipótese explicativa formulada
no decorrer da pesquisa de que a linha de cuidado em saúde mental se compõe de forma
consistente a partir da gestão do cuidado em serviços de saúde com capacidade de vínculo
assistencial com o usuário.
Por fim, uma abordagem mais específica em relação à gestão do sistema de saúde e seus
componentes assistenciais. De forma articulada à Dissertação de Mestrado de Sueli Goi Barrios
(2009), buscou-se aprofundar junto a gestores de um sistema regional de saúde a
compreensão sobre o funcionamento e as políticas de regulação dos diferentes componentes
desse sistema, inclusive a saúde suplementar. A abordagem da pesquisa, entre outros
aspectos, mostrou um grande déficit na descentralização das políticas de regulação do
subsistema suplementar de saúde, que ajuda a explicar a dualidade operacional que se verifica
no cuidado nos dois componentes de serviço do sistema de saúde brasileiro.
Os estudos apresentados, que compõem o marco de análise da pesquisa geral, ampliam a
compreensão e demonstram a capacidade da metodologia desenvolvida de ampliar a
capacidade de inteligência para os diferentes níveis de gestão do sistema de saúde.
123
5.1. A SAÚDE MENTAL E SUAS POLÍTICAS: CENÁRIOS NAS REGIÕES EM
ESTUDO
A atenção à saúde mental vem passando por grandes transformações, em particular no que se
refere às políticas assistenciais desenhadas. Essas transformações decorrem, ao mesmo
tempo, de mudanças culturais em relação ao atendimento à doença mental e da ampliação e
diversificação das ofertas assistenciais no sistema de saúde, particularmente no contexto da
superação do modelo asilar (Brasil, 2005).
No Brasil, o tratamento das pessoas com sofrimento psíquico vinha sendo, historicamente
organizado através de um modelo vinculado ao asilamento e afastamento das pessoas do
convívio social, representado por longas internações em manicômios, com abordagem
farmacológica e total descaso relacionado aos aspectos psicossociais e de cidadania das
pessoas. Esse modelo instituído estava presente tanto no sistema público de saúde como no
sistema privado, em total descompasso com os princípios da reforma sanitária e psiquiátrica,
defendidos pelos militantes do movimento da luta antimanicomial. Desde o final da década de
1970, com a crise do modelo assistencial centrado no hospital psiquiátrico e com a eclosão dos
esforços de movimentos sociais pela afirmação de direitos dos doentes, desencadeou-se o que
é denominado de Movimento de Reforma Psiquiátrica e que transcende o que foi alcançado
com leis e normas e as mudanças nas políticas e serviços de saúde. Conforme aponta o
documento apresentado pelo Ministério da Saúde à Conferência Regional de Reforma dos
Serviços de Saúde Mental
A Reforma Psiquiátrica é processo político e social complexo, composto de atores, instituições e forças de diferentes origens, e que incide em territórios diversos, nos governos federal, estadual e municipal, nas universidades, no mercado dos serviços de saúde, nos conselhos profissionais, nas associações de pessoas com transtornos mentais e de seus familiares, nos movimentos sociais, e nos territórios do imaginário social e da opinião pública. Compreendida como um conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais que o processo da Reforma Psiquiátrica avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios. (Brasil, 2005, pág. 06)
A assistência psiquiátrica pública na década de 90 foi marcada por uma política de redução dos
leitos hospitalares localizados nos hospitais psiquiátricos tradicionais e pela implantação
concomitante de recursos terapêuticos substitutivos do aparelho manicomial (Ribeiro, 2003).
A indução à criação de uma ampla rede de serviços substitutivos e a articulação desta aos
demais serviços, assim como a integração do cuidado em saúde mental às demais ações de
saúde na rede de atenção são estratégias centrais da política atual. O Ministério da Saúde
estima que 30% dos leitos existentes na rede hospitalar estão ocupados por pacientes que
poderiam viver em comunidade, caso pudessem ter acesso ao suporte clínico, social e
econômico necessários (Brasil, 2003).
Dentro da concepção jurídica institucional vigente no país, a saúde é considerada como um
bem essencial e de relevância pública, o que significa que a responsabilidade pela formulação
de políticas de saúde e seu respectivo controle são responsabilidade de governo. Considera-se
124
que no Brasil coexiste um sistema de serviços saúde composto por um mix público-privado,
cujas diretrizes devem ser únicas, o que significa dizer que estas devem estar condicionadas à
atuação reguladora do Estado, como apregoa a Constituição Federal (Brasil, 1988). Essa
premissa permite constituir este estudo da incorporação da linha de cuidado em planos e
seguros privados de saúde no âmbito das análises da implementação da política de saúde
mental no país. Assim, a formulação de políticas desenvolvidas pela ANS deve estar alicerçada
nas diretrizes da Lei Nº 10.216/01, que dispõe sobre os direitos das pessoas portadoras de
transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, da qual é possível
destacar a ênfase da convivência comunitária e da atenção extra-hospitalar para pacientes
com distúrbios mentais. E as práticas no interior de serviços, redes e sistemas vinculados aos
planos e seguros privados de saúde devem traduzir diretrizes e princípios das políticas
nacionais.
Nesse sentido, as diretrizes no setor suplementar brasileiro devem estar em consonância com
as diretrizes estabelecidas pela política de saúde mental do Ministério da Saúde,
fundamentadas em quatro pontos: a) garantia dos direitos civis dos portadores de transtornos
mentais; b) descentralização da rede de cuidados em saúde mental; c) proteção dos pacientes
em tratamento nos hospitais psiquiátricos; d) desenvolvimento de uma rede de serviços
diversificada, extra-hospitalar de base comunitária e territorial (Brasil, 2001). Isto significa que
após a aprovação da lei nº10216/01, (Brasil, 2001) se estabeleceu no país uma ampla reforma
psiquiátrica, onde todo o serviço de atenção à saúde quer tenham caráter público, ou privado,
está obrigado legalmente a cumprir as normas estabelecidas pela referida lei. A partir de
então, os principais objetivos da política de saúde mental do Ministério da Saúde tem buscado:
a redução progressiva dos leitos psiquiátricos; a qualificação, expansão e fortalecimento da
rede extra-hospitalar; inclusão de ações de saúde mental na atenção básica e implementação
de diretrizes de atenção integral aos usuários de álcool e drogas (BRASIL, 2008)
Ainda, segundo o Ministério da Saúde, 3% da população geral sofrem com transtornos mentais
severos e persistentes; 6% apresentam transtornos psiquiátricos graves decorrentes do uso de
álcool e outras drogas; 12% da população necessitam de algum atendimento em Saúde
Mental, seja ele contínuo ou eventual (BRASIL, 2008). Esses dados dão a dimensão da
realidade epidemiológica encontrada no Brasil e da complexidade do tema, que por sua vez
envolve não apenas o setor saúde, mas também outros setores da sociedade, como: educação,
emprego, assistência social, justiça entre outros.
Se considerarmos os dados de óbito, em que o Sistema de Informações de Mortalidade (SIM)
tem boa cobertura, embora melhor na Região Sul do que na Região Norte, podemos identificar
nas Tabelas 5.1 e 5.2 a distribuição das taxas nas duas regiões em estudo e no Brasil como um
todo. As taxas de mortalidade proporcional por transtornos mentais (5.1) e suicídio (5.2)
mostram-se estáveis no período de 2000 a 2007, com um pequeno aumento nominal de casos,
que acompanha o crescimento populacional. No período analisado foram aproximadamente
130,5 mil óbitos associados a essas causas.
125
TABELA 5.1 – Mortalidade proporcional (%) por transtornos mentais e comportamentais (CID 10 – Capítulo V) no Brasil e Regiões Norte e Sul, 2000/2007.
Fonte: SIM, Tabnet/Datasus. Dados tratados pela pesquisa. Obs.: considerando apenas os óbitos por causas definidas.
TABELA 5.2 – Mortalidade proporcional (%) por suicídio (CID 10 – Capítulo XX – Código X60-X84) no Brasil e Regiões Norte e Sul, 2000/2007.
Fonte: SIM, Tabnet/Datasus. Dados tratados pela pesquisa. Obs.: considerando apenas os óbitos por causas definidas.
2001
Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef.
Região Norte 127 0,4 152 0,4 172 0,4 176 0,4 191 0,4 188 0,4 270 0,6 279 0,6 1.555 0,5
.. Rondônia 12 0,2 29 0,6 20 0,4 27 0,5 27 0,5 17 0,3 26 0,5 31 0,6 189 0,4
.. Acre 13 0,7 13 0,7 19 1,0 13 0,7 20 1,1 29 1,1 34 1,3 38 1,5 179 1,1
.. Amazonas 39 0,5 27 0,3 36 0,5 41 0,5 44 0,5 40 0,5 47 0,5 60 0,6 334 0,5
.. Roraima 3 0,2 5 0,4 6 0,5 6 0,5 7 0,5 3 0,2 4 0,3 5 0,4 39 0,4
.. Pará 32 0,2 48 0,3 51 0,3 50 0,3 55 0,3 53 0,3 97 0,4 89 0,4 475 0,3
.. Amapá 3 0,2 9 0,5 6 0,3 4 0,2 3 0,2 3 0,2 7 0,5 5 0,3 40 0,3
.. Tocantins 25 0,7 21 0,5 34 0,8 35 0,8 35 0,7 43 0,9 55 1,1 51 0,9 299 0,8
Região Sul 1.073 0,8 1.178 0,8 1.185 0,8 1.256 0,9 1.413 0,9 1.405 0,9 1.444 0,9 1.685 1,1 10.639 0,9
.. Paraná 475 0,9 494 0,9 469 0,9 478 0,9 579 1,0 551 1,0 604 1,0 619 1,1 4.269 1,0
.. Santa Catarina 154 0,6 216 0,9 222 0,9 218 0,8 240 0,9 232 0,8 254 0,9 280 1,0 1.816 0,8
.. Rio Grande do Sul 444 0,7 468 0,7 494 0,8 560 0,8 594 0,9 622 0,9 586 0,9 786 1,1 4.554 0,8
Brasil 6.139 0,8 6.655 0,8 7.011 0,8 7.356 0,8 8.158 0,9 8.931 1,0 10.256 1,1 10.948 1,1 65.454 0,9
Região/UF2000 No Período2002 2003 2004 2005 2006 2007
Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef. Óbitos Coef.
Região Norte 372 1,0 439 1,1 393 1,0 437 1,1 447 1,0 476 1,1 478 1,0 542 1,1 3.584 1,0
.. Rondônia 76 1,6 76 1,4 44 0,8 53 1,0 63 1,1 64 1,1 62 1,1 42 0,8 480 1,1
.. Acre 27 1,5 29 1,6 22 1,2 26 1,4 26 1,4 19 0,7 25 1,0 35 1,3 209 1,2
.. Amazonas 77 1,0 94 1,2 81 1,0 92 1,2 98 1,2 91 1,0 100 1,1 130 1,3 763 1,1
.. Roraima 22 1,8 17 1,5 19 1,6 20 1,6 27 2,1 27 2,0 34 2,4 43 3,0 209 2,0
.. Pará 116 0,7 146 0,8 140 0,8 137 0,7 136 0,7 166 0,8 160 0,7 180 0,8 1.181 0,8
.. Amapá 16 1,1 30 1,8 37 2,1 37 2,3 38 2,3 41 2,7 25 1,6 27 1,7 251 2,0
.. Tocantins 38 1,1 47 1,2 50 1,2 72 1,6 59 1,2 68 1,4 72 1,5 85 1,6 491 1,4
Região Sul 2.034 1,4 2.162 1,5 2.047 1,4 2.033 1,4 2.151 1,4 2.196 1,5 2.131 1,4 2.185 1,4 16.939 1,4
.. Paraná 586 1,1 664 1,3 579 1,1 593 1,1 678 1,2 669 1,2 594 1,0 629 1,1 4.992 1,1
.. Santa Catarina 426 1,7 463 1,9 437 1,7 405 1,5 422 1,5 449 1,6 384 1,4 455 1,6 3.441 1,6
.. Rio Grande do Sul 1.022 1,6 1.035 1,6 1.031 1,6 1.035 1,6 1.051 1,5 1.078 1,6 1.153 1,7 1.101 1,5 8.506 1,6
Brasil 6.780 0,8 7.738 0,9 7.726 0,9 7.861 0,9 8.017 0,9 8.550 0,9 8.639 0,9 8.868 0,9 64.179 0,9
2006 2007 No PeríodoRegião/UF
2000 2001 2002 2003 2004 2005
126
Como se verifica, as taxas de óbito por transtornos mentais e suicídio são maiores na Região
Sul, comparativamente à Região Norte, situação que também é identificada por outros estudos
(Lovisi & Cols., 2009). No caso do suicídio, as taxas de ambas as Regiões são maiores do que a
taxa média nacional, inclusive. A análise da distribuição das causas selecionadas também
chama a atenção. No caso de transtornos mentais, os Estados do Acre e Tocantins têm taxas
significativamente maiores do que os demais estados da Região Norte, seno que a variação
entre os estados na Região Sul é muito próxima à média. Em relação ao suicídio, novamente as
maiores variações estão localizadas na Região Norte, com um destaque para os Estados de
Roraima, Amapá e Tocantins. Na Região Sul, Santa Catarina e Rio Grande do Sul têm taxas mais
elevadas do que a média da Região. É preciso destacar que há evidências de problemas de
subnotificação tanto de transtornos mentais quanto de suicídios nas declarações de óbito
(Lovisi & Cols., 2009), em particular na Região Norte, onde os dados de outros sistemas de
informação também têm qualidade inferior (Ripsa, 2002).
Os indicadores epidemiológicos apresentam apenas uma das faces da problemática da atenção
à saúde mental nas Regiões em estudo. Outra face é identificada quando se analisam os dados
de capacidade instalada de serviços. A Tabela 5.3 apresenta dados de capacidade instalada de
leitos psiquiátricos e leitos de hospital/dia em saúde mental dos sistemas de saúde nas
Regiões Sul e Norte e no Brasil, separando o vínculo com os sistemas público e privado de
serviços.
TABELA 5.3 – Capacidade instalada de leitos psiquiátricos e leitos de hospital dia para
tratamento em saúde mental no sistema público e privado de serviços , Brasil e Regiões Norte
e Sul, 2009.
Fonte: CNES, Tabnet/Datasus. Dados tratados pela pesquisa. Considerado como referência o mês 12/2009.
Verifica-se que a Região Sul concentra 14% dos leitos psiquiátricos e 25% dos leitos de
hospital/dia do país, enquanto que esses serviços são bastante escassos na Região Norte, onde
os leitos de hospital/dia estão concentrados no Estado do Pará. Da capacidade física analisada,
em todos os cenários há maior concentração no sistema público de serviços. Considerando os
SUSNÃO
SUSTOTAL SUS
NÃO
SUSTOTAL
Região Norte 578 62 640 5 2 7
.. Rondônia 35 5 40 - - -
.. Acre 74 1 75 - - -
.. Amazonas 127 2 129 - - -
.. Roraima 12 - 12 - - -
.. Pará 142 44 186 5 2 7
.. Amapá 16 - 16 - - -
.. Tocantins 172 10 182 - - -
Região Sul 5.678 1.875 7.553 626 64 690
.. Paraná 2.623 673 3.296 489 51 540
.. Santa Catarina 1.126 301 1.427 60 13 73
.. Rio Grande do Sul 1.929 901 2.830 77 - 77
Total 42.458 10.765 53.223 2.229 511 2.740
Região/UF
LEITO PSIQUIÁTRICOS LEITOS HOSPITAL/DIA
127
leitos psiquiátricos, a distribuição de leitos não vinculados ao SUS é de 20,2% no Brasil, de
24,8% na Região Sul e de 9,7% na Região Norte. Em relação aos leitos de hospital/dia, 18,7%
estão no sistema privado no Brasil, 9,3% na Região Sul e 28,6% na Região Norte. Se
considerarmos que há uma tendência de maior utilização de serviços no subsistema privado, a
análise da capacidade instalada nos permite inferir que há menor cobertura desses serviços na
população coberta por planos e seguros privados de saúde, o que ajuda a compreender a
utilização dos serviços especializados em saúde mental no componente público por pessoas
beneficiárias da saúde suplementar, conforme se verificará adiante.
Quando se analisa a disponibilidade de outros serviços da rede de saúde mental, a diferença
em relação aos componentes público e privado aumenta ainda mais. Não há oferta de Centros
de Atenção Psicossocial (CAPS) na saúde suplementar nas duas Regiões e a taxa de cobertura
populacional por essa modalidade de serviços é de 63% para o Brasil como um todo, 82% para
a Região Sul e 38% para a Região Norte (Brasil, 2010).
Na perspectiva de responsabilidade compartilhada entre os dois componentes do sistema de
serviços de saúde faz-se necessário, portanto, que não só o sistema público de saúde, como
também a saúde suplementar, através das operadoras de seguros e planos privados tomem
iniciativas no sentido de ampliar ações e serviços para sua clientela.
Para Malta Et. Al. (2004) um dos mecanismos utilizados pelas operadoras para conter os gastos
é o da microrregulação, através da criação de protocolos e fluxos que dificultam as solicitações
de procedimentos, o co-pagamento, dentre outros, desconsiderando as necessidades dos
usuários numa nítida fragmentação do cuidado, que se torna centrada na lógica da demanda e
da oferta daquilo que foi contatado, enxergando a saúde como mercadoria e não um bem,
colocando-se na contra-mao da política de saúde estabelecida pela própria agencia
reguladora.
Segundo dados do IBGE (2006), cerca de 21% da população brasileira necessita ou vai
necessitar de atenção e atendimento em algum serviço de saúde mental (BRASIL,2008). Essa
situação aponta para necessidade de organização da assistência em saúde mental. Como
enuncia a OMS (2001), o cuidado em saúde mental “pede uma combinação equilibrada de três
ingredientes fundamentais: Farmacoterapia, Psicoterapia e Reabilitação Psicossocial”.
Um dos obstáculos à implementação de uma atenção adequada à saúde mental é relativa à
capacidade instalada
A lei nº 9656/98 que dispõe sobre os planos privados de assistência à saúde e dá outras
providências, cria a obrigatoriedade do atendimento, pelos planos privados de assistência à
saúde, a todas as doenças e problemas relacionados à saúde constantes da Classificação
Internacional de Doenças (CID), da OMS. Também veda a possibilidade de impedimento de
participação de qualquer indivíduo nos planos privados de assistência à saúde em razão de
idade e/ou de ser portador de alguma doença ou lesão.
A regulamentação da contratação e prestação de serviços de atenção em saúde mental, no
setor de saúde suplementar, está expressa nas Resoluções do Conselho de Saúde
Suplementar. A resolução de Número 11 de 1998 (CONSU, 1998) determina a obrigatoriedade
de tratamento de todos os transtornos psiquiátricos codificados no CID X, considerando a
importância da adoção de medidas que evitem a estigmatização e a institucionalização aos
portadores de transtornos mentais.
128
Mais recentemente a Resolução nº 211 de janeiro de 2010, prevê a ampliação de cobertura,
organização de fluxos e linhas de cuidado, através da priorização do atendimento
ambulatorial, e hospital-dia, deixando a internação psiquiátrica como último recurso
terapêutico. Indica ainda que o cuidado deva ser prestado por equipe multiprofissional, de
forma integral, utilizando a epidemiologia para monitoramento da qualidade das ações e
gestão em saúde, estabelecendo a incorporação de ações de promoção da saúde e prevenção
de doenças como estratégias de cuidado.
Para organização dessa assistência, a saúde suplementar classifica os transtornos mentais em
categorias, quais sejam: transtornos mentais graves e persistentes; transtornos psiquiátricos
decorrentes do uso de álcool e drogas; transtornos depressivos, ansiosos e alimentares;
atenção à saúde mental da criança e adolescente e atenção à saúde mental do idoso para as
quais propõe linhas de cuidado que produzam saúde através do desencadeamento de
diferentes ações em diversos níveis de atenção para cada uma das cinco linhas de cuidado
estabelecidas. (ANS, 2008, p. 16)
Linhas de cuidado, entendida como “modelos matriciais de organização da atenção à saúde
que visam à integralidade do cuidado e conjuguem ações de promoção, vigilância, prevenção e
assistência, voltadas para as especificidades de grupos ou necessidades individuais, permitindo
a condução dos pacientes pelas possibilidades de diagnóstico e terapêutica em todos os níveis
de atenção, com visão global das condições de vida” (ANS, 2008). Segundo Malta et al, 2005,
espera-se que ocorra na linha de cuidado um caminhar do usuário que seja seguro e tranqüilo
garantindo a qualidade da assistência.
Transtornos mentais graves e persistentes
Como previsto no manual da ANS, as diretrizes assistenciais em saúde mental tem como
prioridade a linha de cuidado dos portadores de transtornos mentais graves e persistentes,
levando em conta que os transtornos psicóticos significam um drama pessoal na vida do
individuo, quer seja pelo caráter estigmatizante e sofrimento que provoca, como também pela
sua prevalência. (OMS, 2004)
A ANS, através de um levantamento junto as operadoras de planos de saúde, identificou que
durante o ano de 2007, das causas de internações psiquiátricas, 45% foram decorrentes de
psicoses e neuroses graves, ou seja, este grupo foi responsável por praticamente a metade
dos casos de internação psiquiátrica na saúde suplementar demonstrando a importância desse
grupo de patologias. (ANS, 2008)
As pessoas acometidas com esse transtorno têm uma especificidade que requer um conjunto
de necessidades muito complexas que não se resumem ao controle da sintomatologia. Estas
necessidades envolvem a sua integração na sociedade e o desempenho de papeis sociais de
forma adequada.
De acordo com Ribeiro (2003), a Reabilitação Psicossocial tem se desenvolvido de forma
flexível, como uma estratégia fundamental no enfrentamento terapêutico dos distúrbios
severos e persistentes. Em conjunto com as terapias farmacológicas e psicoterápicas, tem
utilizado ainda, intervenções técnicas de outros campos, com interfaces significativas com as
políticas sociais fora do setor saúde.
Nesse sentido, para enfrentar as exigências da vida cotidiana e melhorar a qualidade de vida
dessas pessoas, faz-se necessário um sistema de saúde articulado em rede, com equipe
129
multidisciplinar composta por profissionais com diferentes formações que atuem através de
uma abordagem psicossocial menos farmacológica e hospitalocêntrica e desenvolvendo ações
que permitam a produção de um maior grau de autonomia do usuário com seu modo de andar
e estar no mundo (MERHY, 2004)
Transtornos mentais decorrentes do uso de álcool e outras drogas.
O consumo de substâncias psicoativas está presente em cerca de 10% das populações urbanas
de todo o mundo (BRASIL, 2003) tomando proporções relevantes não só individuais, como
sociais e de saúde coletiva. Estudos têm demonstrado que o uso do álcool e do tabaco tem
importante prevalência por serem drogas consideradas lícitas, de fácil acesso e aceitação pela
sociedade, trazendo conseqüências importantes para saúde das pessoas. (BRASIL, 2003)
Os dados identificados pela ANS e citados anteriormente sobre as causas de internações
psiquiátricas no ano de 2007, sugerem que a maioria delas, em torno de 55% seja
principalmente decorrente do uso de álcool e drogas, apontando para um importante
problema de saúde pública ( ANS, 2008)
A saúde suplementar frente a essa importante demanda aposta na mudança na lógica
assistencial, através do planejamento de ações de atenção integral, tal qual a política do
Ministério da Saúde para os usuários de Álcool e outras Drogas (BRASIL, 2003), ou seja, na
política de redução de danos, onde a abstinência não pode ser o único objetivo a ser
alcançado, entendendo que ao tratar de vidas humanas, trata-se de singularidades e
diferentes possibilidades de escolhas, portanto, as práticas de saúde devem considerar esta
diversidade (BRASIL, 2003, p. 24).
A política pública da redução de danos, referida no documento do Ministério da Saúde,
aparece com maior destaque que em anos anteriores. Esta abordagem opõe-se à visão
tradicional de redução da oferta e está construída sobre dois argumentos: 1) é impossível uma
sociedade completamente sem drogas; 2) a guerra às drogas contraria os princípios éticos e
direitos civis das pessoas, ferindo o direito à liberdade do uso do corpo e da mente (MORAES,
2008).
Transtornos depressivos, ansiosos e alimentares
Segundo dados da ABP de 2006 os atendimentos em saúde mental decorrentes dessa
patologia, tem crescido significativamente, atingindo 12% da população brasileira. Apesar
desse grupo não necessitar de internações, demandam acompanhamento em serviços extra-
hospitalares
Assim como a depressão, os transtornos ansiosos estão entre os mais relevantes em diversos
países e culturas. Eles manifestam-se, por exemplo, através da fobia social, distúrbio do
estresse pós-traumático e transtorno do pânico. Segundo alguns autores muitos transtornos
ansiosos se iniciam ainda na infância e adolescência - fases de vida de risco para tais patologias
(MAJCHER & POLLACK, 1996 apud WHO, 2004b).
Os transtornos alimentares apresentam-se como um conjunto de condições clínicas, cujas
principais patologias são a anorexia nervosa, e a bulimia nervosa prevalentes na população
adolescente e de adultos jovens do sexo feminino. A anorexia tem início geralmente entre os
14 e os 18 anos de idade, enquanto a bulimia é mais comum iniciar-se na transição entre
adolescência e a vida adulta.
130
Embora tanto a incidência quanto a prevalência destes transtornos seja baixa, as
consequências podem ser graves. Em geral, de 25% a 33% dos casos de anorexia e da bulimia
(25 a 33%) evoluem para condições crônicas. É comum a presença de comorbidades com o
abuso de substâncias psicoativas, depressão e ansiedade. Esses transtornos ocorrem
principalmente entre atletas do sexo feminino, bailarinas e modelos. (PHELPS & WILCZENSKI,
1993 apud WHO, 2004b).
Saúde Mental de Crianças e Adolescentes.
Os dados da Organização Mundial da saúde estimam que 20% de crianças e adolescentes
sofrem com problemas ou transtornos mentais. (OMS, 2005). Pesquisa realizada em 2002 pela
ABP em parceria com o IBOPE (ABP, 2008), com entrevistas em 142 municípios brasileiros,
estimou a prevalência dos transtornos mentais mais comuns na infância e na adolescência (6 a
17 anos), com variação de 2,8% a 8,7% de sintomas dos principais transtornos mentais com
significância clínica. Informação relevante é que aproximadamente 40% dos jovens que
necessitaram tratamento não o obtiveram e, dos que obtiveram a grande parte foi por meio
do sistema público de serviços de saúde. Destaque no cenário pesquisado é que 60% dos
jovens com sintomas de transtornos por uso de substâncias químicas não obtiveram
tratamento, 30% deles teve atendimento no sistema público e 10% por meio de planos e
seguros privados e por desembolso direto de recursos.
A política do Ministério da Saúde para promover a melhoria nesse campo, é necessário
desenvolver um conjunto de ações de promoção da saúde e prevenção de riscos e doenças,
que considere os aspectos epidemiológicos, sociais, culturais, ecológicos e psicológicos deste
segmento populacional (BRASIL, 2006).
É importante enfatizar o papel crucial da promoção da saúde mental na infância e
adolescência, assim como a construção de uma rede de cuidados e tratamento afinada às reais
necessidades desta população. Importam nas ações de promoção da saúde mental, a redução
dos impactos dos fatores de risco e o reforço dos fatores de proteção, na família, nas escolas,
nos serviços de saúde em geral e na comunidade. (ANS, 2008)
É fato que todas as pessoas portadoras de transtornos mentais sofrem com discriminações.
Entretanto, as crianças e adolescentes sofrem ainda mais pela menor capacidade que possuem
de autoproteção, portanto, podem assumir mais facilmente rótulos inadequados e negativos.
(OMS, 2005).
Nessa perspectiva, estabelecer intervenções precoces voltadas para a atenção em saúde
mental de crianças e adolescentes parece ser uma excelente oportunidade para a prevenção
em saúde mental como um todo, uma vez que segundo KIM-COHEN e col., (2003) um
importante percentual de transtornos mentais em adultos têm o seu início nas fases pré-
mórbidas na infância e adolescência. A pesquisa realizada pelos autores acima demonstraram
que entre os adultos portadores de transtornos mentais, de 25% a 60% dos casos tinham
história de distúrbio de conduta na infância e/ou adolescência, o que os levou a concluir que
muitos transtornos em adultos poderiam ser reenquadrados como extensões de transtornos
na juventude.
Assim, de acordo com orientações da ANS, as ações e serviços privados destinados à atenção a
crianças e adolescentes com transtornos mentais, devem levar em conta os princípios que vêm
orientando no país a política pública de saúde mental para essa população, ou seja, consultas
131
por especialistas, leitos de suporte, serviços-dia para casos de maior complexidade, serviços
residenciais terapêuticos entre outros.
Ainda segundo as diretrizes do Ministério da Saúde para atenção à saúde mental da infância e
adolescência (BRASIL, 2005) esta deve ser implementada a com base em uma rede de serviços,
que garanta os princípios preconizados pela reformulação do modelo de atenção à saúde
mental implementada no Brasil, expressos na Lei 10.216/01, assim como os preceitos do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Saúde Mental de Idosos.
A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) define envelhecimento como “um processo
seqüencial, individual, acumulativo, irreversível, universal, não patológico, de deterioração de
um organismo maduro, próprio a todos os membros de uma espécie, de maneira que o tempo
o torne menos capaz de fazer frente ao estresse do meio-ambiente e, portanto, aumente sua
possibilidade de morte” (OPAS/OMS, 2005).
Segundo dados da OMS, em 2025, existirá um total de aproximadamente 1,2 bilhões de
pessoas com mais de 60 anos, sendo 80% nos países em desenvolvimento. Até 2025, o Brasil
será o sexto país do mundo em número de idosos (OPAS/OMS, 2005). O mais relevante, no
contexto do envelhecimento populacional no Brasil e nos demais países da América Latina, é
que se trata de um fenômeno muito agudo, com pouca contribuição do sistema de saúde para
o aumento da qualidade de vida na população idosa (Ferla & Cols., 2007; Pessoa & Cols.,
2010).
Diante dos dados apresentados, coloca-se como grande desafio na atenção à pessoa idosa,
para o sistema de serviços de saúde tanto público quanto privado, contribuir para que, apesar
das progressivas limitações, o idoso possa redescobrir possibilidades de viver sua própria vida
com a máxima autonomia e qualidade possíveis (Pessoa & Cols., 2010). Para tanto é
imprescindível que se considere o contexto familiar e social, tendo em vista que as dificuldades
destas pessoas estão mais relacionadas aos aspectos culturais que as desvaloriza e limita
(BRASIL, 2007).
Com o aumento da expectativa de vida e do número de pessoas acima de 65 anos de idade no
Brasil, o tratamento das condições clínicas e psiquiátricas dos idosos tem adquirido maior
importância, pois é significativo o aumento progressivo da prevalência de transtornos
demenciais, principalmente a doença de Alzheimer e a depressão (ABP, 2006).
A depressão em idosos tem sido considerada como um dos quatro gigantes da geriatria, sendo
os outros três a demência, quedas e infecções. Além dos quadros de agitação e agressividade,
a dependência para atividades de vida diária nos idosos é a principal causa de
institucionalização, contribuindo para o aumento dos gastos públicos e da família com saúde.
Todos esses fatores demonstram a necessidade da estruturação de estratégias específicas para
a atenção à saúde mental do idoso (ABP, 2006).
Especialmente para a assistência ao idoso torna-se imprescindível uma equipe de profissionais
que incluam médicos, psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, enfermeiros,
assistentes sociais, musicoterapeutas, entre outros (ABP, 2006).
Dados do Ministério da Saúde apontam que a depressão é a doença psiquiátrica que mais
comumente leva ao suicídio, sendo os idosos o grupo etário que, com mais freqüência, se
132
suicida. Costumam utilizar os meios mais letais, ainda que não se devam ignorar os chamados
suicídios passivos (abandono de tratamento e recusa alimentar) (BRASIL,2006).
Os sintomas depressivos podem ser confundidos com o envelhecimento, portanto, a equipe de
saúde deve estar atenta para a identificação dos sintomas, pois se os profissionais
considerarem como parte normal do processo de envelhecimento, o diagnóstico passará
despercebido. Cerca de 50 a 60% dos casos não são detectados, tornando a depressão
subdiagnosticada e subtratada nesta faixa etária.
...
Diante da complexidade do tema da saúde mental, a ANS com o objetivo de induzir à mudança
do modelo de atenção a saúde, traz como estratégia a adoção de práticas cuidadoras e
integrais, através da implantação de programas de promoção de saúde e prevenção de
doenças, com objetivo de reduzir a incidência, prevalência e recorrência dos transtornos
mentais, no sentido de prevenir ou até de impedir recorrências diminuindo assim o impacto da
doença sobre as pessoas, família e a sociedade (ANS, 2008).
Nessa direção, Malta ET AL (2004) enfatizam que embora ainda não seja uma prática comum,
as operadoras podem e devem ser gestoras da saúde dos seus beneficiários estabelecendo
ações cuidadoras, que impliquem não só a promoção, mas também a garantia do acesso e a
qualidade da assistência ofertada.
Para que se estabeleça uma nova lógica de cuidado, a ANS, através de suas diretrizes e
resoluções, aponta para as operadoras de seguros e planos privados a necessidade (ou é
obrigatoriedade?) da implantação de programas e ações específicas para cada uma das
categorias elencadas anteriormente, de modo a evitar internações repetidas e abandono de
tratamento, de modo a proporcionar melhoria na qualidade de vida e das relações familiares
desses usuários, como também estimular sua reinserção social (ANS, 2008). Dentre as ações
previstas, estão: Construir um sistema de informações em saúde mental, a fim de monitorar e
avaliar a atenção prestada; Contar com equipe multidisciplinar; Implantar grupos educativos e
de apoio a familiares; além de grupos terapêuticos e operativos com pacientes; implantar
grupos de terapia ocupacional e ou arteterapia; instituir programaçoes culturais e de lazer;
Implantar Emergências psiquiátricas em hospitais gerais, serviços ambulatoriais e de atenção
diária; estabelecer processos de educação em saúde para toda a população beneficiaria;
capacitar recursos humanos; criar vínculos com outros setores da sociedade; estimular, a
reinserção do paciente e família na sociedade; Instituir o acolhimento e manter a continuidade
da assistência através de linhas de cuidado; Implantar internação e assistência domiciliar,
entre outras ações.
Percebe-se que as diretrizes elencadas no documento da ANS trazem à tona a necessidade de
discussão do atual modelo de atenção a saúde mental praticado pelo setor privado, baseados
nos princípios contidos na lei nº 10216/01 e preceitos do movimento da reforma psiquiátrica
brasileira, resgatando a cidadania e garantindo a reinclusão social dos portadores de
transtornos mentais (ANS, 2008)
É importante que essa discussão perpasse, desde o estabelecimento das coberturas
obrigatórias, passando pela organização dos fluxos assistenciais, de modo organizado em
linhas de cuidado, com a devida co- responsabilização dos profissionais, na organização de
uma política de atenção à saúde mental que rompa com o modelo de cuidado fragmentado,
133
centrado no profissional médico psiquiatra e vinculado a internação e medicalização do
sujeito.
O setor suplementar deve buscar novos paradigmas para a atenção à saúde mental que
incluam o respeito aos direitos e à cidadania do portador de transtorno mental, a redução da
atenção hospitalar, a utilização de equipes multidisciplinares e abordagem psicossocial em
todos os níveis de atenção, de maneira que se estabeleça um modo de cuidar pautado pelo
respeito à liberdade, autonomia e singularidades dos sujeitos.
134
5.2. ATENÇÃO INTEGRAL EM SAÚDE MENTAL E INOVAÇÕES
TECNOASSISTENCIAIS: O MIX PÚBLICO E PRIVADO COMO ESTRATÉGIA DE
GESTÃO DO CUIDADO
No contexto das propostas formuladas mais recentemente em relação à atenção à saúde para
o sistema de saúde brasileiro, a pesquisa buscou analisar as práticas em contextos concretos,
conforme já indicavam os objetivos do projeto de pesquisa. O tema do cuidado em saúde
mental mobiliza a rede de pesquisadores que esteve envolvida na pesquisa há algum tempo,
inclusive em atividades acadêmicas junto ao Mestrado em Psicologia da Universidade Federal
do Pará. As mudanças significativas na dimensão normativa do cuidado em saúde mental na
saúde suplementar que ocorreram durante o período da pesquisa tornaram, de certa forma,
obsoleta a abordagem inicial, de análise do cuidado tendo o profissional médico psiquiatra
como perspectiva central para o estudo da gestão desse cuidado.
Durante as oficinas de análise dos dados ocorridas após a primeira etapa do trabalho de
campo surgiu a necessidade de complementar a análise com estudos em maior profundidade e
com foco recolocado, agora especificamente sobre aspectos da gestão do cuidado. Essa
necessidade foi tornada visível, de forma mais inconteste, na produção da dissertação de
mestrado de Luciane Silva Ramos (2009), que analisou o cuidado oferecido na rede assistencial
de um município de grande porte na região central do Rio Grande do Sul sob a perspectiva da
gestão do sistema de saúde e dos dispositivos de articulação entre as diferentes iniciativas. O
foco estava na gestão do sistema e das redes, mas chamou a atenção para a gestão do
cuidado, muito particularmente para um marcador analítico que já acompanhava a pesquisa
desde seu início: o mix público e privado. Não na perspectiva mais geral, de uma discussão
teórica sobre as políticas de saúde brasileiras, a suposta dualidade em relação à natureza
formal dos serviços, mas do mix como uma estratégia de gestão do cuidado tecida no
cotidiano dos itinerários terapêuticos dos usuários, seja pelos próprios ou pelos profissionais
que os atendem. Na pesquisa citada, chamou a atenção dos pesquisadores, na etapa de
campo, o volume de usuários beneficiários de planos e seguros privados de saúde em
atendimento nos serviços da rede substitutiva em saúde mental do componente público do
sistema de serviços de saúde.
Esta etapa da pesquisa recorreu aos usuários que materializavam o mix público e privado, em
busca de evidências de modelagens tecnoassistenciais nas políticas e práticas adotadas. A
partir deste caso, em particular, o mix público e privado passa a ser, mais do que uma
constatação da interface entre os dois subsistemas de serviços, um marcador avaliativo
qualificado. Essa migração se deu em virtude da capacidade das situações relatadas de
constituir, elas mesmas, traduções de certos desenhos tecnoassistenciais que operam na
gestão do cuidado. A temática da integralidade do cuidado modulou essa transição, de um
referencial ideológico-normativo para um político-operacional.
Para dar conseqüência a essa abordagem, foram entrevistados 10 (dez) usuários dos serviços
da rede substitutiva pública que se identificaram como beneficiários de planos e seguros
135
privados de saúde, com um roteiro semi-estruturado (ANEXO 1). As principais características
do perfil desses sujeitos estão sistematizadas na Tabela 5.4.
TABELA 5.4 - Características dos sujeitos da pesquisa
Fonte: Dados primários da pesquisa
Como se pode identificar na tabela, trata-se de um conjunto de usuários com idade
predominantemente na faixa da população economicamente ativa, do sexo masculino, com
faixas de renda distribuídas nos principais estratos da população, com escolaridade maior do
que a média para a região, com ocupações em profissões de certa relevância e estabilidade
social e aposentados e pensionistas. Os problemas de saúde do grupo, que traduzem os
problemas de saúde mental de maior relevância assistencial, foram o uso abusivo de álcool e
drogas e outros transtornos. Metade do grupo constituiu-se de beneficiários de planos na
modalidade de autogestão e metade de cooperativas médicas.
Características Nº %
Faixa etária
De 31-40 anos 4 40%
De 41-50 anos 3 30%
De 51-60 anos 1 10%
Mais de 61 anos 2 20%
Sexo
Mascul ino 8 80%
Feminino 2 20%
Renda
< 1 sa lário 4 40%
1-3 sa lários mínimos 3 30%
4 e mais sa lários 3 30%
Escolaridade
1º grau incompleto 1 10%
1º grau completo 1 10%
2º grau incompleto 2 20%
2º grau completo 4 40%
Superior incompleto 1 10%
Superior completo 1 10%
Agravo relacionado
Álcool e drogas 5 50%
Transtorno mental 5 50%
Profissão
Comerciário aposentado 1 10%
Sem profissão/ocupação 3 30%
Pol icia l civi l aposentado 1 10%
Balcofarmacis ta 1 10%
Professora 1 10%
Servidor públ ico aposentado 2 20%
Empresário 1 10%
Plano de Saúde
Autogesão 5 50%Cooperativa médica 5 50%
136
As entrevistas foram analisadas com base em técnicas de análise temática e as principais
categorias de análise estão listadas no item seguinte.
5.2.1. CARACTERÍSTICAS DO MIX PÚBLICO E PRIVADO NO DESENHO DOS ITINERÁRIOS
DE CUIDADO DOS USUÁRIOS
Como se registrou anteriormente, a composição de um grupo de sujeitos para a pesquisa cujas
características de inclusão considerassem a condição de interface entre os dois componentes
do sistema de serviços foi intencional. O objetivo aqui foi de compreender a interface não
como contradição do sistema, mas como parte integrante do itinerário assistencial, qualificada
para gerar evidências sobre a gestão do cuidado. Essa aproximação analítica foi requerida por
sua capacidade de constituir pensamentos sobre a dimensão prática das modelagens
tecnoassistenciais constituídas nesse campo.
Diversidade da oferta de serviços:
Uma situação comumente referida por beneficiários de planos e seguros privados de saúde
para a utilização do sistema públicos de serviços é relativa à diversidade de oferta de serviços,
que é maior no componente público. Algumas variações verificadas em cada base empírica da
pesquisa permitem supor, embora sem possibilidade metodológica de confirmar essa
associação, que a capacidade instalada do sistema público de serviços seja uma variável
relevante para explicar esse contexto. Segundo um dos sujeitos
Aqui é o lugar onde recebo o tratamento mais completo. Tenho atendimento aqui no CAPS e nos postos perto de casa, tenho no [hospital universitário], mais exames e medicamento. O que oferece mais serviços é o municipal, aquele do SUS. (E1)
Em relação ao cuidado em saúde mental, a oferta de outros serviços para além da consulta
(com psiquiatra ou psicólogo) e da internação, é referida com grande freqüência pelos
usuários e familiares para explicar a utilização dos sistemas de serviço públicos e vinculados
aos planos e seguros privados de saúde. A existência e o acesso à rede substitutiva e o acesso a
medicamentos específicos são fortes motivadores da utilização de serviços públicos pelos
beneficiários de planos e seguros privados de saúde.
Para o meu problema do álcool e drogas eu tenho tudo no CAPS, psicólogo, psiquiatra, clinico geral, reuniões de grupo, etc. É ótimo, ele me oferece mais coisas, por exemplo, comida, eu almoço todos os dias no CAPS, e ganho café da tarde, faço esporte, jogo vôlei e faço aeróbica com professor de educação física. Enquanto estou aqui não estou usando drogas, o serviço me ajuda para isso. Além disso, participo dos grupos que tem aqui no CAPS.(E2)
No CAPS, temos atendimento de prevenção, grupos, medicamentos, conscientização, amizade (E5)
137
Observa-se nas falas dos entrevistados, que embora possuam plano privado de saúde, é no
serviço público em questão que encontram as ações diferenciadas na produção da saúde, as
quais operam tecnologias voltadas para a produção do cuidado, apostando em novas relações
entre trabalhadores e usuários, tentando construir embora ainda com certa fragilidade, um
devir para os serviços de saúde, centrado nos usuários e suas necessidades e estabelecendo
um contraponto à crise vivida pela saúde (MALTA et al,2008). O cenário descrito pelo
conteúdo das entrevistas é muito sugestivo de uma modelagem tecnoassistencial embasada
na integralidade da atenção. Esse conteúdo é próximo do que se verificou, na mesma
abordagem, no ciclo mãe-bebê. No caso do cuidado ao ciclo mãe-bebê, a consulta obstétrica e
a agilidade dos exames complementares, com destaque para a ecografia, são atributos
reconhecidos pelos beneficiários na saúde suplementar. Entretanto, o acesso a atividades de
grupo, a consulta de enfermagem, o acesso a medicamentos e o contato com outros
profissionais da equipe dos serviços são considerações associadas à utilização, pelos
beneficiários, dos serviços do sistema público.
Pala além da dimensão física e organizacional dos serviços, relativa às ofertas tecnológicas e
aos modos de acesso, argumentos relativos à natureza do cuidado são utilizados com
freqüência.
O que importa é ter empatia com o profissional, ela pegou bem meu problema e eu me sinto fortalecida, com ânimo (E9)
Eu me sinto tão bem depois que saio daqui (referindo-se ao CAPS), a gente pega uma afinidade com eles. (E3)
As manifestações dos entrevistados trazem outra perspectiva na abordagem do cuidado, o
qual parece não se esgotar nos procedimentos técnicos dos profissionais, mas sim naquilo que
Merhy (2002) chama de tecnologias leves, do plano das relações, do trabalho vivo em ato,
onde o que parece mais importante são as possibilidades de produção de momentos criativos,
carregados de subjetividade e singularidades, presentes através da escuta, do vínculo, do
acolhimento, os quais são fatores determinantes para um projeto terapêutico cuidador em
saúde mental.
Contato com outros profissionais:
O campo que abrange o cuidado em saúde mental vem obtendo importantes avanços
vinculados ao SUS com estratégias diversas e abordagens multiprofissionais, no entanto ainda
está muito fragmentado na atenção em saúde suplementar, como se pode constatar a partir
dos achados empíricos desta pesquisa, centrada basicamente na resposta clínica medicalizada
e com pouco suporte de rede que de fato dê respostas as necessidades das pessoas de forma
mais integral.
O acesso ao trabalho de uma diversidade maior de profissionais voltados ao cuidado é uma
referência freqüente dos usuários para a utilização do sistema de serviços públicos mesmo na
condição de beneficiário de serviços privados de saúde. A construção argumentativa inclui
principalmente elementos de natureza corporativo/profissional, quando se faz referência aos
núcleos específicos de competência formal, e relativos à dimensão interpessoal do cuidado. A
maioria dos entrevistados reconhece mais intensamente, a limitação do modelo tradicional
predominante, vinculado ao atendimento individual e medico no setor privado:
138
Na condição de beneficiário de serviço privado, tenho só o atendimento profissional tradicional, bitolado, do tipo consulta médica (E3)
No entanto, quando a possibilidade de contato com diferentes trabalhadores propiciada por
alguns serviços fortalece a probabilidade da formação de vínculos e a sensação de
acolhimento. Trata-se, portanto, de uma construção que destaca, ao mesmo tempo, o caráter
multiprofissional do trabalho em saúde e uma dimensão relevante da integralidade.
Acho importante ter todas as profissões disponíveis. É muito forte a ligação da gente, cria-se vínculo com eles. Esse vínculo eu tenho com os profissionais que atendem pelo SUS. (E3)
No caso da saúde mental, a consulta e os demais atendimentos com médicos psiquiatras,
principal ato profissional referido pelos beneficiários, é ampliada com atendimentos pelas
equipes dos serviços substitutivos, que é um argumento freqüente dos usuários de serviços
públicos mesmo na condição de beneficiários de planos e seguros privados de saúde. No caso
do cuidado ao ciclo mãe-bebê, como já se descreveu, há similaridade com a situação
encontrada na saúde mental, no caso da diversificação de profissionais. Em ambos os casos,
entretanto, chama a atenção o baixo protagonismo que parecem exercer, no cuidado regular
aos usuários, profissionais vinculados a outros serviços, como se percebe através da fala desse
entrevistado:
Eu vou consultar com eles [médicos do plano privado] uma vez ao ano, então a gente conversa o trivial. Se tenho que tomar uma medicação, ele prescreve e diz como tem que tomar e pronto, terminou. (E3)
Gostaria de ter em todos os serviços, Terapeutas ocupacionais, atividades grupais, dialogo, pátio monte de coisas assim todos os dias que passassem o tempo entendeu? (E7)
Em que pese o perfil dos entrevistados incluir predominantemente pessoas já vinculadas aos
serviços especializados (tanto na saúde mental como na obstetrícia), observa-se que o mix
público-privado parece operar como dispositivo diante das dificuldades de cobertura dos
planos de saúde para outras modalidades de atenção. Alguns doentes recorreram ao SUS para
receber cuidados de profissionais não médicos, na busca de intervenções articuladas e
cuidadoras que se aproximem da atenção integral e não apenas vinculada ao ato prescritivo do
médico que produz o procedimento, sem considerar as determinações do processo saúde-
doença, com pouca eficácia na assistência prestada.
Nesse sentido, um aspecto importante abordado por Malta & Cols. (2004) dizem da
necessidade de se construir propostas alternativas de modelagem dos serviços de saúde
incorporando outros campos de saberes e práticas em saúde, configurando outras formas de
organização da assistência anti-hegemônicas.
Autores como Dalla Vecchia e Martins (2009) enfatizam que existe uma tendência dos
profissionais, principalmente os médicos a se aferrar ao núcleo específico de sua competência
profissional, reforçada por um pré-julgamento de que a complexidade dos cuidados à saúde
mental não autoriza outros profissionais a desenvolver ações eficazes neste campo, entretanto
observou-se, que os usuários têm buscado serviços onde existe uma diversidade maior de
profissionais, cujas práticas no cotidiano de seus processos de trabalho utilizem mais as
tecnologias leves implicadas com o cuidado integral.
139
Início da doença e suas conexões com o cuidado em saúde
Uma categoria de análise que merece destaque diz respeito ao inicio da doença e o momento
de contato com o sistema formal de cuidado em saúde. Um número significativo de
entrevistados refere o inicio dos sintomas ainda na infância e ou adolescência, entretanto, a
busca pela avaliação destes, na maioria dos casos não se deu no mesmo período. É possível
supor que embora freqüentassem os serviços de saúde, públicos ou privados, os profissionais
de saúde de maneira geral têm grande dificuldade para perceber sinais que indicam algum
transtorno ou dificuldade emocional, fato que contribui para efetuar o diagnóstico
tardiamente e mesmo para realizar acompanhamento adequado. No caso do uso de álcool e
drogas, alguns entrevistados referiram ter iniciado o uso na escola que freqüentavam.
Foi com 14 anos quando fui para o colégio [x]. Saí de casa e fui para o colégio, onde foi minha perdição. Comecei a usar drogas no colégio. (E2)
Eu tive um envolvimento com drogas desde que eu tinha uns 14 ou 15 anos
Entretanto, também outras doenças e agravos relativos à saúde mental têm origem
precocemente e podem não ser identificados pelo serviço de saúde:
Tudo começou quando eu tinha um ano de vida. Tive a primeira crise, quando foi minha primeira internação aos 11 anos, comecei a piorar e foi evoluindo, evoluindo. (E6)
A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2005) estima que 20% de crianças e adolescentes
sofrem com problemas ou transtornos mentais. Os achados desse estudo são similares aos
encontrados por Kim-Cohen e Cols. (2003) segundo os quais um importante percentual de
problemas mentais em adultos tem o seu início na infância e adolescência. A pesquisa
realizada por esses autores demonstrara que entre os adultos portadores de transtornos
mentais, de 25% a 60% dos casos tinham história de distúrbio de conduta na infância e/ou
adolescência, o que os levou a concluir que muitos transtornos em adultos poderiam ser
reenquadrados como extensões de transtornos na juventude.
Desde pequeno minha mãe fala que tanto eu, quanto meu irmão, apresentava problemas e no colégio isso apareceu mais forte. Eu não conseguia me concentrar e tinha muita dificuldade de aprender (E10)
O uso do álcool e do tabaco tem importante prevalência por serem drogas consideradas lícitas,
de fácil acesso e aceitação pela sociedade. Alguns relatos trazem a influencia de padrões
sociais, vínculo com grupos de amigos, companheirismo durante a adolescência e tipo de
atividade profissional, como fatores que contribuíram e facilitaram o uso gradual e progressivo
do álcool, que aos poucos foi tornando-se rotineiro, abusivo e dependente.
Comecei a trabalhar muito cedo e junto com representantes de laboratório, fazendo festas, bebendo e do álcool passei a fumar maconha e tomar boletas e foi indo e foi evoluindo, isso há trinta anos. (E4)
Eu comecei a tomar meus aperitivos com 20 anos, eu não era de beber muito, gostava de tomar uns uisquezinhos, uma caipirinha, mas aos poucos fui aumentando (E1)
Quando eu tinha 17 anos, começaram meus problemas. (E7)
Eu fiz esse da disritmia quando eu tinha 13/14 anos. (E8)
140
A relevância analítica desta categoria empírica para a compreensão das modelagens
tecnoassistenciais vigentes no cotidiano dos serviços tem duas naturezas distintas. Em
primeiro lugar por referir a dificuldade dos serviços em identificar precocemente sinais e
sintomas em saúde mental, certamente verdadeira para o sistema como um todo, mas,
também seguramente, como um problema que está destacado na agenda dos serviços
públicos e, nos serviços vinculados à saúde suplementar e de desembolso direto, dependendo
predominantemente da sensibilidade do profissional acessado para o cuidado. Em segundo
lugar por reivindicar uma atuação sistêmica, que transcende o domínio de um profissional, de
um serviço e, mesmo, do sistema de serviços de saúde. O cuidado integral, nesse caso, requer
uma conexão em rede multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial. Mas parece oportuno
registrar que, diante da repercussão dessas doenças na vida das pessoas e diante da
singularidade do cuidado em saúde, não parece ser útil a transposição dessas ações para fora
do âmbito do cuidado possível no contexto de práticas profissionais ou mesmo de serviços de
saúde. Conforme já se registrou em outro estudo, essas dimensões precisam pertencer à
estética do cuidado se pretendemos falar de um cuidado integral (Ferla, 2007).
O caminhar do sujeito na busca do cuidado: construindo itinerários em ato
O uso combinado dos serviços públicos e da assistência suplementar aparece no cuidado a
saúde mental, assim como o acesso a serviços e tecnologias de diferentes naturezas. Diversos
arranjos se estabelecem no cotidiano assistencial dos usuários quando procuram superar
lacunas do acesso e da integralidade da atenção através de suas próprias escolhas, caminhos
ou estratégias. O que reforça estudos que apontam a não existência de linhas de cuidado, de
fluxos estabelecidos pelos serviços de saúde, deixando muitas vezes a busca do cuidado na
responsabilidade do próprio usuário ou de alguém que vivenciou situação semelhante. O
protagonismo do usuário, necessário muitas vezes para viabilizar o acesso ao cuidado e não
apenas para configurar estéticas de cuidado mais adequadas, aparece como categoria
empírica na análise dos percursos terapêuticos, como se verifica em alguns depoimentos.
No serviço do CAPS, que é pertinho de casa, quando a prefeitura alugou a casa eu fui e quem eu sabia que tinha o mesmo problema eu dizia para ir ali também. (E5)
No CAPS AD eu fui por mim mesmo, eu achava que era alcoólatra e o médico me disse que era mesmo. (E7)
E lá no grupo dos Alcoólicos Anônimos – AA, um senhor me encaminhou para o CAPS.(E4)
Há uma forte evidência de protagonismo na gestão do cuidado que não está localizado na
dimensão instituída do sistema de saúde e tampouco nos profissionais e serviços. Não cala a
pergunta sobre como esses problemas passaram invisíveis ao cuidado ofertado nos
atendimentos regulares feitos na saúde suplementar por esses sujeitos e tampouco sobre a
incapacidade de torná-los visíveis do sistema de cuidado, uma vez que a boa habilidade clínica
inclui a pesquisa de problemas ou riscos que precisam ser objeto da atenção à saúde. Mas, nos
casos ilustrados acima, é ainda mais forte a pergunta sobre o lugar ocupado pelos próprios
indivíduos – usuários e redes sociais - na gestão do cuidado em saúde mental. A atenção aos
usuários com distúrbios de uso de álcool e outras drogas parece um “caso marcador” da
política de cuidados oferecida na saúde suplementar. Por certo também no sistema público,
141
mas que, neste caso, apresenta uma diversidade de ofertas que amplia o gradiente de
integralidade oferecido.
Aspecto presente nesse estudo aponta que o reconhecimento do alcoolismo enquanto
problema, e a busca do cuidado, como também a motivação para o tratamento se deu após o
surgimento de doenças secundárias associadas e acidentes devido ao uso da droga. Essa
constatação fala da capacidade dos serviços de saúde de identificar não apenas evidências de
risco ou sinais e sintomas de doenças, também de ampliar a clínica que embasa o cuidado para
questões relativas à promoção da saúde, nestes casos, em particular, a prevenção secundária.
O problema de saúde que me fez procurar atendimento foi diabete e hipertensão. A diabete como uma doença lenta e progressiva, quando vê estoura, mas agora me sinto muito bem. (E1)
Em 1995 fiquei em coma devido a um acidente. (E2)
O problema relativo à saúde mental se torna visível e objeto de cuidado apenas após
constituir-se em um problema secundário, mais reconhecido na dimensão biológica. E é esse
problema secundário que, por assim dizer, dá legitimidade à procura de recursos assistenciais
que fogem das ofertas rotineiras.
Outro ponto que dá clareza à compreensão do itinerário no mix público privado na assistência
a saúde dos usuários de saúde mental, onde de novo se vislumbra um modelo de atenção
preponderante nos planos privados, fortemente vinculados a lógica individual e da psiquiatria,
cujo recurso disponível para o cuidado das pessoas, é a consulta e o hospital. Quando esse
recurso tecnológico se esgota e torna-se ineficiente para a continuidade do cuidado, a opção é
produzir uma interface com modalidades assistenciais ampliadas disponíveis no serviço
público, a procura de outros profissionais e atividades terapêuticas, nesse caso para o CAPS.
Nota-se aqui uma percepção negativa sobre a hospitalização psiquiátrica e a relação de
violência estabelecida na instituição.
Sim, já tive hospitalizado quatro vezes, para tentar parar de usar maconha. Fui hospitalizado pela [Cooperativa Médica] e de lá me mandaram para o CAPS porque lá não tem serviço como esse daqui. Lá é horrível, a gente fica trancado, é horrível. (E2)
O itinerário em busca de cuidados, identificado com maior freqüência nesse estudo, foi
construído por dificuldades a partir do relacionamento com a família. Foram os familiares que
ao não suportarem a dor e o sofrimento de todos, buscaram assistência com especialista,
particularmente com médico psiquiatra através do pagamento direto da consulta ou por meio
de seu plano privado, o qual fez o diagnostico e o encaminhamento para o hospital.
Começava a surgir dificuldades dentro da família, dificuldades comigo também, não de saúde, mas de que eu tinha que ficar afastado, até que esposa diz: olha se tu continuares assim vamos tomar outra atitude. Então conversamos, e combinamos de procurar um médico. Achamos o médico psiquiatra, paguei a consulta, depois fui parar no hospital.
Esquizofrenia Paranóide, eu agredia meus pais, e ligaram para meus dois médicos de Santa Maria que resolveram me internar, passei dois meses e depois me levaram para uma clinica de repouso
A partir daí minha mãe me levou ao psiquiatra, porque meu pai, como funcionário estadual tinha IPE e daí seguiu me levando nas consultas e
142
tomando remédio, até porque ouvia vozes e tinha mania de perseguição, aí fui ao hospital.
Importante destacar a relação do trabalho com o processo de adoecimento das pessoas, e aqui
chama a atenção para as instituições militares. Nos três casos citados ocorreu uma ruptura da
vida cotidiana dos sujeitos e perda de seus papeis na sociedade.
No quartel, na Base Aérea eu comecei a consultar porque comecei a pensar mais rápido que o normal, eu comecei ver psicoses, ficar atrapalhado e um monte de coisas que eu não sei te dizer agora.
Eu tava trabalhando na brigada militar, trabalhei 17 anos lá, aí nesse tempo eu fui perseguido, ameaçado, me deixavam sozinho nas ocorrências, e depois disso fui sendo internado até parar aqui.
A depressão começou a se apresentar com oito anos de casada, eu tinha um filho e tinha muita responsabilidade no trabalho, numa das maiores empresas de SM, era grande a minha responsabilidade pela empresa e aí comecei a ter problemas no meu relacionamento familiar, eu viajava muito e começou a ficar lacunas na família e depois de 23 anos de serviço eu fui demitida. Foi a 1ª grande crise de depressão, associou o meu problema de relacionamento conjugal com o meu trabalho.
Chama a atenção nesse caminhar dos sujeitos em busca do cuidado é de que eles não
procuram um modelo de atenção previamente estabelecido, mas sim o lugar que a própria
sociedade em seu imaginário tem como de cuidado para os transtornos mentais. Nesse
sentido, pesquisa realizada por Mângia e Sutaki (2008) refere que a busca pelas internações
nos hospitais, embora sendo referidas como local onde se estabelecem relações de certa
forma violentas, a instituição é referendada e legitimada pela sociedade para cuidar de
pessoas acometidas por algum transtorno mental.
A possibilidade de escolha dos sujeitos e a forma de tratamento, como se percebeu, de modo
geral se deram após experimentação de opções oferecidas pelo seu contexto social. Em geral
os usuários chegaram aos CAPS por encaminhamento próprio, do profissional médico, de
outros serviços, na perspectiva de receberem atendimento de outros profissionais, de grupos
terapêuticos etc. não oferecido pelo setor privado, mas em nenhum caso se percebeu a
presença de uma linha de cuidado em saúde mental implicada com a responsabilização pela
atenção integral, sem que ocorra a interrupção e a segmentação do cuidado.
O cuidado em conexões com redes informais: a saúde mental e as redes sociais
A maioria dos sujeitos entrevistados, apesar de serem usuários dos serviços de saúde
reconhecidos socialmente como formais, nesse caso, de planos e seguros privados de saúde,
como também do sistema de serviços públicos, referem à fé, a espiritualidade, como aspecto
importante, explicitado através da busca de diferentes seitas religiosas como componente
terapêutico importante na sua recuperação. Para alguns, esses espaços servem de suporte,
apoio espiritual refletindo em melhora na sua condição de saúde. Percebeu-se também uma
migração da religião que freqüentavam para outra, principalmente para o espiritismo, que
parece dar força e conferir um novo sentido na busca do tratamento:
Eu sempre fui católico, porém de uns trinta anos para cá eu me tornei espírita, Alan Kardec. Isso me ajudou muito. (E1)
143
Eu sempre fui católica, mas agora sou espírita kardecista, foi uma religião que veio ao meu encontro e me ajudou nesses momentos mais difíceis, me deu suporte espiritual, ajudou bastante. (E5)
As falas corroboram com achados encontrados na literatura, que referem ser comum os
pacientes da saúde mental procurarem mais de uma religião em busca de tratamento e cura. A
religião se constitui como espaço de inclusão social, de acolhimento e escuta.
Percebeu-se nesse estudo que em muitas situações isso se deu em decorrência de uma lacuna
no processo formal de saúde mental, onde os profissionais encontram-se fortemente
vinculados a um modo tradicional não cuidador e integral, mas sim limitados aos aspectos
biologicistas, descontextualizado do social e espiritual, e do uso das tecnologias leves, como
escuta, diálogo, solidariedade, afeto, etc.
Fato que chama a atenção refere-se a certo “preconceito” em relação a algumas seitas
religiosas, principalmente quando vinculadas a arrecadação de dinheiro, mas que em
determinado momento foram acessadas como recurso terapêutico.
Minha mãe estava até em batuqueiro me levou, fui em tudo. Eu freqüentei diversas igrejas para tentar resolver meu problema. Eu até me decepcionei com a Igreja Assembléia de Deus, porque só pensam em dólares e tirar dinheiro do pessoal. (E4)
Entretanto, o que ficou evidenciado é a importância que os espaços informais, principalmente
os religiosos desempenham na vida das pessoas, pois de todos os entrevistados 70% deles
referiram em algum momento de sua trajetória, ter sido levado, às vezes até como último
recurso terapêutico, e o quanto os auxiliou a minimizar o sofrimento, a dor que os transtornos
mentais causam a si próprio e aos seus familiares e amigos, portanto reconhecer as lacunas
dos serviços formais em saúde contribui para pensar cuidados no âmbito da espiritualidade, os
quais poderão ser compartilhados e em rede, na perspectiva da atenção integral em saúde
mental.
A regulação do mix público e privado feita pelo próprio profissional
Observa-se na saúde mental, como de resto em outras áreas, que o procedimento de menor
custo, como é o caso da consulta e exames diagnósticos, pertencem com certa naturalidade ao
plano de saúde e os demais, de maior custo ou complexidade assistencial, ficam por conta do
serviço público, prática incorporada no cotidiano do processo de trabalho do profissional
médico.
Um dado relevante evidenciado nessa pesquisa refere-se ao modo como tem sido regulado o
acesso dos usuários aos serviços públicos de saúde mental, onde um número significativo dos
entrevistados, após consultarem com médico do plano privado, foram encaminhados pelo
próprio profissional para continuidade do tratamento com a equipe do CAPS na rede SUS.
eu consultava com o psiquiatra, comecei a me tratar com ele pela [Cooperativa Médica], de 15 em 15 dias eu ia até lá, aí quando eu vi ele me deu 15 dias de internação e disse: depois tu continuas o tratamento no CAPS. Mandou uma carta para a Drª fulana e eu continuei fazendo o tratamento aqui no CAPS. (E1)
144
O Dr. Fulano é que disse para eu vir para esse serviço. Vim para cá em 2005. Eu fazia as consultas pela [Cooperativa Médica] e o resto do tratamento fazia no CAPS. (E2)
Sim, cheguei aqui encaminhado por um médico de consultório particular. (E3)
Segundo relato dos usuários o fato de serem encaminhados pelo médico para os serviços
públicos se dá pela inexistência de outras atividades terapêuticas, de grupo etc., com
cobertura do plano privado, bem como pela impossibilidade de acessar o mesmo profissional
por repetidas vezes. Funciona como uma espécie de complementação de tratamento. Esse
fato torna-se indutor de conduta que comprometem o vinculo e conseqüentemente uma
atitude cuidadora. Entretanto, o encaminhamento médico, que funciona como um mecanismo
de regulação, tem servido no imaginário do usuário, como uma espécie de responsabilidade
profissional pela continuidade do seu cuidado. Nos estudos da micropolítica do trabalho em
saúde a captura do cuidado por lógicas e interesses privados já é um fato demonstrado
(Merhy, 2002; ANS, 2005). Mas aqui parece emergir também outra textura: um dispositivo de
fortalecimento da integralidade do cuidado, não de um profissional ou serviço, mas de certo
gradiente de integralidade que se compõe no mix público e privado, neste caso. Analisando o
fato em si, mais do que a conduta do profissional que também busca reconhecimento no
trabalho pela ação de regulação por sobre fluxos e procedimentos de gestão do sistema, a
conduta do profissional viabiliza um upgrade no cuidado disponível na saúde suplementar que
precisa ter visibilidade nesta análise. É o fato de não ter cobertura assistencial adequada para
as situações de saúde mental nos planos e seguros privados de saúde que faz com que o
“encaminhamento”, mesmo informal do ponto de vista dos procedimentos requeridos pelo
sistema – mas personalizado, do ponto de vista de um fluxo de informação que circula por
relações pessoais entre os atores do cuidado – tenha vigência. Para além do efeito no
itinerário assistencial dos usuários, esse link entre os dois sistemas de serviço parece
reivindicar o conceito de unicidade do sistema e procedimentos para que a relação entre
ambos não seja prejudicial ao também dispositivo ético do sistema único de equidade. Mas, de
toda forma, esse achado da pesquisa também parece requerer um novo plano de pensamento
para propor mecanismos de regulação da atenção, mais embasados na idéia de integralidade
do cuidado.
Mecanismos financeiros de regulação do cuidado: o co-pagamento e o valor da
contribuição como dispositivos de restrição do acesso
A co-participação como a parte paga pelos beneficiários à operadora de planos de assistência à
saúde, referente à realização de procedimentos são mecanismos de regulação que possibilitam
a redução de custos assistenciais e, conseqüentemente, pela participação financeira do
beneficiário nas despesas e indiretamente, pela redução do risco moral representado pela
sobre utilização dos serviços.
Para Santos e Mehry (2006), a regulação é entendida como a capacidade de intervir nos
processos de prestação de serviços, alterando ou orientando a sua execução.
O que se percebe através das falas dos entrevistados que o uso do plano privado na saúde
mental está mais relacionado às consultas médicas, procedimento de acesso mais facilitado,
no entanto, o que tem acontecido sido recorrente é o fato dos usuários, após terem
145
estabelecido certo vínculo com o profissional de saúde, acabam por se descredenciar do
convênio, deixando o usuário com a responsabilidade por procurar outro profissional
conveniado e reiniciar o vínculo, ou mesmo pagar para o atendimento particular.
Eles (os médicos) sempre dizem que saíram do plano privado. A consulta agora é 100 reais e para os clientes do seguro privado, o médico cobra 50 reais. Assim, é trabalhar só para pagar médicos e remédios (E5)
No plano de saúde da [Cooperativa Médica] que eu tenho, os médicos [na cidade onde busco atendimento] não atendem mais e tinha que pagar tudo particular. (E9)
Outro fator relevante que funciona como mecanismo de regulação do acesso é o custo para
manutenção do plano e as oscilações do poder aquisitivo dos beneficiários. A redução da
capacidade financeira em mantê-lo, principalmente após a aposentadoria, tem resultado na
migração para o atendimento nos serviços públicos de saúde mental.
Pela [Cooperativa Médica] eu pagava 20% do valor das consultas. Tenho que pagar 300 reais por uma diária, porque ele não cobre à diária, quando vou agora nem digo que tenho esse plano, vou pelo SUS mesmo. (E1)
A consulta era 150 reais. Eu não tive mais condições de manter o tratamento pelo plano (E9)
Eu tenho [Cooperativa Médica], inclusive fui internado no hospital do plano, mas como completei 60 anos, dobrou minha mensalidade e a minha esposa fez também 60 anos e teria que pagar o dobro também, eu teria que pagar 800 reais para o plano B deles para ter direito a quarto semi-privativo, 20% nas consultas e 20% nos exames, então larguei. (E1)
As oscilações de vinculação de emprego e manutenção da renda dos beneficiários dos planos e
seguros privados aparecem também como um mecanismo importante de regulação do acesso
as ações e serviços de saúde mental. Alguns referem que o pagamento de parte dos
procedimentos interfere no orçamento familiar.
Nunca procurei psiquiatra pelo plano porque para ser atendido por esses planos de saúde a gente tem que pagar um pouco da consulta também, sai uma parte de dinheiro e para quem está desempregado é difícil. (E4)
Sinto falta da medicação que tenho que tomar constantemente e é bem cara, porque gasto uns trezentos comigo, mais com minha filha, somando vai dar uns seiscentos reais e o ordenado da gente vira em nada. (E5)
A consulta era 150,00. Eu não tive mais condições de manter esse tratamento foi aí que ele [o médico que me atendia] tirou férias e procurei outro médico. (E9)
Como se verifica, a regulação financeira do acesso é um recurso que interfere negativamente
na obtenção de cuidados mais integrais na saúde suplementar e é, ao mesmo tempo, um dos
principais motivos para buscar atendimento fora dos serviços da saúde suplementar. Essa
regulação financeira do acesso se dá por várias formas: o co-pagamento, a sobrecarga no
pagamento da contribuição às operadoras, a soma desses pagamentos com os gastos com
medicamentos e outros insumos, os gastos com outros profissionais para a atenção a
problemas associados e/ou concomitantes, isso tudo num contexto em que a própria doença
restringe a capacidade de trabalho e de renda.
146
A regulação financeira, definitivamente, não compõe o que se denomina de regulação
cuidadora na construção epistemológica da modelagem tecnoassistencial por linhas de
cuidado. Do ponto de vista prático, ela parece estranha também ao direito de acesso à saúde
dos indivíduos. Mas aqui, no contexto da produção de conhecimentos sobre os percursos
assistenciais dos indivíduos, ela aparece como um dos principais motivos de procura de
serviços públicos por beneficiários de planos e seguros privados de saúde.
147
5.3. O CUIDADO EM SAÚDE MENTAL COMO PERCURSO EM REDE: A CONFIGURAÇÃO DO SISTEMA DE SERVIÇOS COMO MARCADOR DE
INTEGRALIDADE
As abordagens iniciais da pesquisa fortaleceram progressivamente a idéia de que uma das
variáveis que configuram o padrão atual do mix público e privado no cuidado em saúde mental
e no ciclo mãe-bebê tinha, entre outras explicações, a diversidade de ofertas e a organização
de fluxos de percurso como explicações fortes. A camada da pesquisa que é apresentada a
seguir procurou seguir essa hipótese, aprofundando a análise em um sistema concreto, com
relevância regional.
Para tanto, foi desenhado um plano de análise que incluiu a descrição mais minuciosa do
sistema de serviços de saúde disponível, a observação de práticas no interior desse sistema e,
em particular, na rede de atenção à saúde mental, e a entrevista com diferentes sujeitos que
compõem esse cenário. Os dados são apresentados na seqüencia.
A realidade no município de Caxias do Sul não é diferente dos demais municípios do país, no
que concerne à assistência em saúde mental. Por longos anos, as ações para a área
restringiram-se às internações psiquiátricas, uma vez que, o município é sede de um hospital
psiquiátrico19 desde a década de 70. Atualmente o hospital dispõe de 200 leitos SUS, sendo 90
leitos destinados aos usuários do município.
A inexistência de serviços substitutivos à internação psiquiátrica no município propiciou a
institucionalização de usuários em instituições de longa permanência. Mudou-se o espaço
físico – do hospital para instituições de longa permanência – mas não se transformou a
assistência ao portador de transtorno mental. Essas instituições não são locais adequados para
prestar atendimento aos portadores de transtorno mental, pois estão estruturadas para
atender as necessidades e especificidades físicas e orgânicas do segmento social idoso.
Levantam-se como hipóteses para as famílias buscarem essa forma de assistência: a ausência
de espaços terapêuticos, a necessidade de inserção no mercado de trabalho para garantir a
sobrevivência, restando pouco tempo para cuidar dos membros da família, e a falta de
condições objetivas e subjetivas para o desenvolvimento de habilidades no cuidado e atenção
integrais a estes usuários. Esses fatores contribuem para que as famílias sintam-se incapazes
de prestar a assistência necessária ao portador de transtorno mental. Outro fator relevante
refere-se ao Estado, que historicamente isentou-se de ações nessa área, não criando políticas
sociais públicas de suporte social, tais como a de assistência social, habitação, trabalho e
geração de renda às famílias.
19 Este hospital é particular e atende aos usuários do SUS de diversos municípios do Estado do Rio Grande do Sul. Em 2003 o número de leitos era de 420, tendo a progressiva diminuição dos leitos conforme a portaria do Ministério da Saúde nº. 52 e 53 /2004.
148
O município de Caxias do Sul, a partir de 2006, vem construindo a rede de serviços de saúde
mental articulando os três níveis de assistência (atenção primária, serviços especializados e
rede hospitalar) composta por ações na atenção básica, ambulatórios de saúde mental, CAPS,
SRT e rede hospital. Segundo dados fornecidos pelo Departamento de Saúde Mental da
Secretaria Municipal de Saúde (2007) atualmente são prestados 5.500 atendimento mês nos
diferentes serviços de saúde mental. A rede de saúde mental do município de Caxias do Sul é
formada pelos seguintes serviços:
Na Atenção Básica:
A atenção primária à saúde mental organiza-se através da incorporação de novos profissionais
às equipes de saúde – especificamente psicólogos, assistentes sociais e psiquiatras – com a
finalidade de construir, junto com a equipe local, ações de prevenção e promoção, além do
acompanhamento e monitoramento dos egressos de internações psiquiátricas. Destaca-se que
a prioridade para alocação dos novos recursos humanos são as regiões de cobertura do
Programa Saúde da Família, tendo em vista que os princípios e diretrizes da estratégia se
assemelham aos da Política de Saúde Mental.
Pronto Atendimento 24h em Saúde Mental: Serviço de referência para atendimento das
situações de urgência e emergência em saúde mental. Este processo de trabalho está
organizado no Pronto Atendimento Geral 24h do município, uma vez que as intercorrências
em saúde mental são necessidades em saúde que precisam ser acolhidas por uma equipe de
saúde e não apenas pela psiquiatria.
Nos Serviços Especializados:
Ambulatórios:
O CAIS Mental – Centro de Atenção Integral em Saúde Mental - se caracteriza por ser um
ambulatório de saúde mental que presta atendimento psiquiátrico individual e atendimento
psicológico para crianças e adolescentes. O acesso dos usuários se dá pelo encaminhamento
das UBS, pelos serviços secundários (P. A. 24H e CES) pelo nível terciário (rede de hospitalar) e
pela demanda espontânea.
Outro serviço ambulatorial da rede assistencial em saúde mental é o APOIAR – Ambulatório de
Atendimento às Crianças e Adolescentes Vítimas de Maus – Tratos - que atende crianças e
adolescentes vítimas de maus tratos físicos, sexuais, psicológicos e negligências e seus
familiares através de abordagens individuais e coletivas visando à prevenção e tratamento
destes usuários. O acesso dos usuários é através do Conselho Tutelar, Fórum pelas Varas da
Infância e Família.
CAPS – Centros de Atenção Psicossocial
Conforme determinação do Ministério da Saúde “os CAPS assumem um papel estratégico na
organização da rede comunitária de cuidados” (BRASIL, 2004, p.12). Assume a
responsabilidade no direcionamento local das políticas e programas de Saúde Mental através
do desenvolvimento de projetos terapêuticos e comunitários, assessoramento aos demais
serviços da rede de saúde. No município encontramos a seguinte rede de Caps:
O CAPSi presta atendimento à crianças e adolescentes com transtorno mental grave como psicose na infância e adolescência, transtornos invasivos do desenvolvimento, neuroses graves. O acesso dos usuários ao serviço é através da rede de saúde, rede sócio-assistencial, rede-educacional e demanda espontânea.
149
O CAPS Cidadania atende adultos maiores de dezoito anos de ambos os sexos que apresentam transtorno mental grave e persistente. O acesso é através da rede de saúde, rede sócio-assistencial e demanda espontânea.
O CAPS Reviver presta atendimento às crianças, adolescentes e adultos com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas. O acesso é através da rede de saúde, rede sócio-assistencial, rede-educacional, rede sócio-jurídica, demanda espontânea.
SRT – Serviço Residencial Terapêutico
O Serviço Residencial Terapêutico acolhe usuários com histórico de longo tempo de
institucionalização, tanto em casas de longa permanência como em hospitais. O acesso é
através do CAPS Cidadania e/ou Processos de Interdição realizados pelo Ministério Público,
Vigilância Sanitária e Departamento de Saúde Mental em instituições der longa permanência.
Rede Hospitalar:
A rede hospitalar do município é composta por instituições conveniada e alguns leitos em
hospitais gerais. O número de leitos em Hospital Geral não ultrapassa a 10 leitos, sendo 6
destinados à crianças e adolescentes e 4 leitos são destinados aos idosos. Leitos conveniados
em Hospital Geral em Porto Alegre para desintoxicação de usuários de drogas ilícitas: 16 leitos.
Leitos em Hospital Psiquiátrico: 90 leitos. Percebe-se que o município ainda apresenta
dificuldades em deslocar a assistência hospitalar do hospital psiquiátrico para o hospital geral,
tendo em vista o número de leitos oferecidos nas duas modalidades de internação. Salienta-se
ainda o número inexpressivo de leitos gerais no próprio município e a “compra de leitos“ em
Porto Alegre para desintoxicação.
Diante do exposto, conclui-se que a rede de atenção em saúde mental do município de Caxias
do Sul envolve desde a assistência primária, partindo para níveis de maior complexidade,
tendo como desafio a construção de um novo modelo tecnoassistencial baseado na atenção e
cuidados integrais. Com o intuito de contribuir com a construção de prática integrais nos
propusemos a verificar sob a ótica dos envolvidos – gestores, profissionais, usuários,
familiares, representantes do ministério púbico, controle social – se a rede de serviços de
saúde mental consegue responder às necessidades em saúde da população demandatária de
ações e serviços de saúde mental e que itinerários terapêuticos/linhas de cuidado são
construídos e re-construídos nos diferentes modos de andar a vida buscando identificar e
construir tecnologias avaliativas de assistência que terão impacto direto na gestão e atenção à
saúde.
150
5.3.1. O PERCURSO ASSISTENCIAL NA PERSPECTIVA DOS DIFERENTES ATORES: A LINHA DE CUIDADOS COMO CONSTRUÇÃO SIMBÓLICA E DE FLUXOS
ASSISTENCIAIS
Linha de cuidado implica em processos e práticas de cuidado que incluam indivíduos em uma
rede de cuidados progressivos. Ao se investigar a linha de cuidado percorrida pelos indivíduos
se questionam: as práticas concretas, as políticas e as normas de gestão dos serviços e o
entendimento que os próprios indivíduos possuem em relação ao seu cuidado (CECCIM &
FERLA, 2006). A apropriação desta dinâmica permite conhecimentos úteis para a organização
do cuidado avaliando o sistema de saúde por meio das linhas de cuidado.
Esta avaliação do sistema de saúde foi baseada na forma como se efetiva no cotidiano dos
serviços o encontro entre profissional e usuário e nas normas que organizam o cotidiano
destes serviços colocando-as como foco de problematização para a construção de linhas de
cuidado que tenham como eixo a afirmação da vida. Nesta forma de pesquisa o que se busca é
analisar e evidenciar as práticas de integralidade e indicadores para a produção de tecnologias
avaliativas capazes de reorganizar a gestão e a atenção em saúde.
Este estudo se desenvolveu na esfera microssocial, através do mapeamento das experiências
dos usuários nos serviços de saúde mental e a produção de autonomia e de sensação de
cuidado nestes usuários e da analise da democratização dos processos de trabalho. Ao se
definir a linha de cuidado como o eixo de avaliação da integralidade do cuidado existe à
necessidade de um redirecionamento permanente do processo de trabalho, pois cada
indivíduo compreende uma subjetividade que deve encontrar acolhida dentro do projeto
terapêutico.
Acesso aos serviços de saúde mental:
Segundo Benedetto Saraceno diretor do Departamento da Saúde Mental da OMS, o conceito
de acessibilidade é sistematizado através da geografia (local, fluxo viário, barreiras físicas);
turnos de funcionamento (serviço único ou integrado) e menu de programas (assistência,
reinserção, lazer, hospitalidade e trabalho). Assim, estes serviços devem se inserir em uma
determinada cultura, em território definido, com seus problemas e suas potencialidades, arena
onde as crises devem ser enfrentadas, resultado que são, geralmente de fatores dos individuo,
de sua família, eventualmente de seu trabalho, e seguramente de seu meio social (ALVES,
2001, p. 170-171).
Portanto, o acesso está diretamente relacionado à forma como a população que necessita do
atendimento em saúde consegue se inserir em uma rede de cuidados em saúde. Este acesso
refere-se à própria localização do serviço, a sua área física e o processo de trabalho dentro do
serviço que acaba por estabelecer regras de funcionamento que por vezes se tornam
impeditivas da inclusão de novos usuários e novas demandas. A fala do usuário ilustra este
fato:
151
Eu tive dificuldades de conseguir ajuda, a unidade básica de saúde (rede
básica) não conseguiu me ajudar no tratamento da minha dependência
química (usuário do serviço Caps A.D.)
A expressão de que sua procura por ajuda não foi acolhida na atenção básica reforça que as
equipes de saúde não estão preparadas ou dispostas a acolher alguns tipos específicos de
demanda por parte dos usuários. É necessário que os profissionais da saúde compreendam
conforme nos diz Ruben Araújo de Mattos (2005), que no contexto atual do SUS, a
continuidade da luta pelo direito à saúde implica a defesa articulada das medidas que
melhorem a qualidade de vida e que assegurem o acesso às ações e serviços de saúde que
sejam necessários. Quer dizer, garantir o acesso dos usuários às ações de saúde, ofertando
múltiplas opções tecnológicas para enfrentar os seus distintos problemas (MERHY, 1997).
Estes impeditivos do acesso muitas vezes ocorrem porque os profissionais de saúde têm uma
visão fragmentada dos seus usuários. Este fato se deve a fixação dos profissionais em
determinadas etapas do projeto terapêutico com uma conseqüente alienação da finalidade do
trabalho. De acordo com Ceccim e Capozzolo deste fato surge a tendência dos profissionais
não se responsabilizarem pelo objetivo final de suas intervenções. Assim, se estabelece uma
relação bastante burocratizada com o saber e com a prática profissional, que se restringe aos
atos profissionais fragmentados, desaparecendo o outro da atenção à saúde, a própria
atenção integral e a possibilidade da humanização da prestação da clinica (CECCIM &
CAPOZZOLO, 2004, p. 354).
A seguinte fala de um usuário do serviço de atenção básica ilustra esta questão:
O primeiro lugar que fui atendida foi o posto de Saúde. Depois fui para a
consulta com o psiquiatra, mas não gostei. Hoje eu me sinto bem num grupo
que freqüento de entre-amigos. Quando estou com problemas é lá que eu
vou. Este grupo já existe há mais de 10 anos. (usuária do serviço de unidade
básica de saúde).
Esse exemplo nos mostra que mesmo acessando serviços e tendo contato com profissionais
tecnicamente qualificados, muitas vezes o usuário não encontra acolhida para a sua
necessidade e acaba por procurar outro serviço na rede social que possa ajudá-lo no seu
“andar a vida”.
Os grupos de entre-ajuda ou de promoção em saúde acabam tornando-se espaços de
convivência e de construção da subjetivação dos indivíduos conforme refere Barros, eles
tornam-se possibilidades de sair do foco do individualismo para tornarem-se espaço de
legitimação da identidade no coletivo, sem porém, perder a individualidade, demarcando um
lugar de reconstrução de novas redes singulares de diferenciação.
O grupo não tem relação com a vida privada dos indivíduos que se reúnem
em determinado espaço, por um certo tempo, para cumprir certos objetivos.
Ele é (ou pode ser) um dispositivo quando trata de intensificar em cada fala,
som, gesto, o que tais componentes acionam das instituições
(sociais/históricas) e de como nelas constroem novas redes singulares de
diferenciação. (BARROS, 1998, p. 153)
Os profissionais do serviço de cuidado necessitam dar-se conta que os sujeitos em sofrimentos
muitas vezes apresentam necessidade que atravessam diversos campos e diferentes áreas.
Assim a equipe de saúde deve segundo Alves, (2005, p. 227) deslocar seu olhar da doença para
152
o conjunto de fatores que envolvem seu “andar a vida”. Deste modo o cuidado abarca a
construção de projetos de vida, em contraposição ao reducionismo de uma intervenção
voltada para a remissão de sintomas. Para poder realizar este deslocamento de olhar uma
premissa importante é “ver” cada situação dentro da sua singularidade e entender que o
objetivo, ao lidar com as pessoas, é propiciar a maior autonomia possível. Neste entendimento
ainda segundo Alves (2005, pág. 228), o conceito de cura se apresenta “fora de foco”, pois este
conceito reflete um determinismo da medicina biológica, retrata a idéia de uma intervenção
sobre algo que esta funcionando de forma errada, restituindo seu funcionamento adequado.
Os usuários chegam até o serviço de saúde de diferentes formas, as portas-de-entrada acabam
se diversificando de acordo com cada situação e cada usuário e sua subjetividade. Os seguintes
exemplos ilustram isso:
Comecei o meu atendimento no plano de saúde, depois acabei indo para um
serviço filantrópico e agora sou acompanhada na unidade básica de saúde.
(usuária da UBS).
O primeiro lugar que procurei ajuda foi na Emergência do Hospital, de lá fui
encaminhado para a internação no hospital psiquiátrico, depois que tive alta
fui para o Ambulatório de Saúde Mental. Foi quando um familiar me falou
do Caps Cidadania e eu resolvi procurar o serviço, hoje só acompanho no
Caps Cidadania. (usuário do Caps Cidadania)
Assim, é necessária uma reflexão que envolva não só uma avaliação relacionada à garantia de
acesso através do número de porta-de-entrada, mas também uma análise da qualidade destas
portas-de-entrada, pois a questão do acesso não está mais restrita aos usuários terem
cobertura de serviços. Os exemplos citados mostram que os usuários chegaram aos serviços,
mas não ficaram no serviço do primeiro atendimento, tiveram que procurar outros locais, para
se sentirem atendidos em suas necessidades. Teixeira (2003, p. 92) nos chama atenção deste
fato ao afirmar que cada vez mais o acesso depende intimamente do tipo de modelo de
atenção operante nos locais de atendimento, a discussão sobre o acolhimento, a problemática
da qualidade do acesso e da recepção dos usuários nos serviços, assinala a migração do foco
de tensionamento para a relação com o outro que ai se estabelece, esta temática nos serviços
de saúde vem requalificando a discussão a respeito do problema do acesso e da recepção dos
usuários nos serviços de saúde.
A respeito do acolhimento nos serviços Silva Junior, Merhy e Carvalho (2003), dizem que:
Procurando enfrentar o tema do acolhimento dos usuários nos
estabelecimentos de saúde e tentando construir um agir cumpliciado do
trabalhador com a vida individual e coletiva do usuário, estimula-se um
conjunto de reflexões teóricas que permitem construir um modo competente
de realizar a mudança de um modelo de atenção corporativo centrado para
um usuário centrado. Os usuários, de modo geral, não reclamam de falta de
conhecimento tecnológico no seu atendimento, mas da falta de interesse e
de responsabilização dos serviços. Sentem-se, assim, inseguros,
desinformados, desamparados, desprotegidos, desrespeitados e
desprezados (1998, p.104).
Na realidade, há uma dificuldade dos profissionais de saúde em lidar com
sofrimentos; preferem lidar com doença, na qual a racionalidade da
biomedicina estabelece referencia e pontos de intervenção sobre as “lesões”
e “disfunções” detectadas p. 122-123).
153
A descrição de uma mãe no cuidado com o seu filho ilustra essa questão:
Quando cheguei em Caxias do Sul achei que tinha poucos serviços de
atendimento para acompanhar o meu filho. Encaminharam ele para o
Psiquiatra e para o Neurologista, mas o acompanhamento não foi bom. Ele
foi piorando... as coisas só começaram a melhorar quando a Escola de
Educação Especial encaminhou meu filho para o Caps i, só aí eu comecei a
gostar do atendimento” (mãe de usuário do Caps i).
Assim, muitas vezes no cuidado em saúde mental o desafio é o aumento do poder contratual
do usuário, da possibilidade de ampliar seu potencial de trocas sociais. Os serviços devem
conseguir por meio de sua escuta e do seu reconhecimento, assegurar passagem na existência
individual e desenvolver a autodeterminação das pessoas (CECCIM & CAPOZZOLO, 2004,
p.371). Sendo assim, o respeito à singularidade é premissa fundamental. A equipe de cuidado
e o serviço precisam estar prontos para acompanhar a trajetória do sujeito em sofrimento,
sem compartimentalizá-lo por especificidades de demanda ou “repassa-lo” ao se deparar com
a complexidade das questões (ALVES, 2005, p.229).
Configuração do cuidado: escuta, acolhimento e autonomia do usuário
Segundo Alves (2005), os profissionais de saúde devem utilizar outros paradigmas relacionados
com a atenção de portadores de transtornos mentais, substituindo a palavra “tratar”, que
sempre pressupõe uma nomeação diagnóstica, por “cuidar”, termo mais adequado que
incorpora vários problemas a serem superados, negando critérios habituais de seleção e/ou
exclusão (ALVES, 2005, p 167-168). Quando o profissional se dispõe a estabelecer uma
interação com o usuário baseado no cuidado, existe um respeito mútuo e consequentemente
um estímulo ao desenvolvimento de autonomia. A seguinte fala ilustra este aspecto de
sensação de cuidado:
Eu me sinto muito bem aqui no Caps. Me sinto cuidada, atendida. As
pessoas se importam comigo. Gosto muito de participar das oficinas. Eu me
sinto muito bem participando. Posso escolher de qual oficina quero
participar e ainda tenho a possibilidade de depois ter alguma renda com o
que aprendi na oficina. (usuária do Caps Cidadania).
Mas como se dá o processo do adoecer? Assim é necessário primeiramente considerar a
dimensão subjetiva do indivíduo que sofre e por esse motivo acessa os serviços de saúde.
Refere Venâncio (2001 p.89):
No que diz respeito à dimensão propriamente individual do adoecimento, a
locução saúde mental vem reatualizar a idéia de que o indivíduo possui uma
dimensão intrapessoal – sua subjetividade – que deve ser compreendida em
seus próprios termos. A possibilidade de tal compreensão por sua vez,
implicada pela concepção de que não só o chamado doente mental, mas
todos os indivíduos possuem uma dimensão subjetiva, são, portanto
possivelmente, comunicantes entre si. Uma idéia que pode parecer hoje
óbvia ou “natural”, mas que deve ser compreendida em toda a sua
complexidade, se atentarmos para o fato de que ela atualiza de modo
radical o imaginário moderno do homem sobre si mesmo. Pela consideração
do tema da subjetividade, o campo da saúde mental reinvoca a possibilidade
154
de compreensão do doente mental reinscrevendo toda a positividade do
valor-Indivíduo. Doença mental e subjetividade se cruzam na idéia de que há
um cuidado a ser dispensado ao sofrimento psíquico: sofrimento justificado
legitimamente muitas vezes pelas chamadas “condições objetivas” de vida
mas que na atenção para com a dimensão individual aparece remetida à
construção intra-pessoal do indivíduo, representado paradigmaticamente
enquanto sujeito.
Assim, entende-se que as necessidades de saúde têm um componente de natureza subjetiva e
individual, o que significa admitir, explicitamente, o valor e as implicações decorrentes deste
valor: o individual (CECÍLIO, 2006, p. 38).
A reflexão que envolve os profissionais então deve ser no sentido de entender e dar acolhidas
às diferentes e diversas formas de adoecimento de acordo com as singularidades que
envolvem cada usuário do serviço. Alves (2001, p. 170) aponta isso quando afirma que é
necessária uma compreensão de que o que deve ser cuidado é o individuo e seus problemas e
não somente o seu diagnóstico, e sob esta lógica de trabalho fica determinado um olhar
“integral” da situação que envolve cada usuário.
O seguinte relato ilustra esta acolhida:
Uma vez o remédio que eu tomava ficou em falta e eu não tinha como
comprar. Mas era importante que eu não ficasse sem a medicação. Eu tinha
medo de ter uma recaída. Então a médica que me acompanha trocou o
remédio por outro que eu podia ganhar pelo SUS para que eu continuasse o
tratamento (usuário do Caps A.D.).
Naquele momento, o mais importante para este usuário era não ficar sem a sua medicação,
pelo medo de ter uma recaída, esta angustia teve acolhida dentro da equipe que fazia seu
acompanhamento, que encontrou uma forma de tranqüilizá-lo fornecendo uma medicação
que pudesse substituir a que ele vinha utilizando. Segundo Mattos (2005) a análise das nossas
justificativas para a recomendação deste ou daquele procedimento para um sujeito concreto é
um dos componentes do permanente exercício reflexivo, uma reflexão sobre práticas
concretas (MATTOS, 2005, p.44). É necessário que todos os profissionais envolvidos com o
cuidado em saúde possam realizar este exercício reflexivo permanentemente, pois as
situações com que se deparam têm particularidades e os usuários subjetividades diferentes.
Não basta ouvir o usuário é preciso escutar o que ele está nos dizendo pois sua fala é um
pedido de auxílio, conforme refere Leitão:
Escutar refere imediatamente a fala e a sua raiz latina vincula o escutado ao
ato de ouvir e de montar guarda; situação em que o escutado, cumprindo o
ofício de sentinela, vigia os sons provenientes de um campo diferente de seu
próprio (Jorge Sauri, apud: LEITÃO, 1995, p.47)
Os usuários percebem quando o que esta sendo feito por eles é mais do que só medicalizar,
quando à possibilidade de que cada necessidade individual tenha um espaço e tomam isso
para si, de acordo com o exemplo abaixo:
Eu participo das oficinas porque eu sei que só o remédio não cura. A gente
tem que fazer a nossa parte, a gente tem que se ajudar (usuária do Caps
Cidadania).
155
Por outro lado há que se considerar também o significado de cuidado. Leonardo Boff (1999,
p.33) refere-se ao cuidado dizendo:
O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais que um
ato; é uma atitude. Portanto abrange mais que um momento de atenção, de
zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de
responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.
Este sentimento de ser cuidado é de forma singular descrito por alguns usuários:
Eu me sinto bem aqui, acho que eu sou bem tratado... Sinto como se
estivesse em casa. (usuário do Caps A.D).
Eu me sinto cuidado quando estou em lugares com outras pessoas. Por isso
participo de grupos que tem aqui na comunidade e gosto de estar com
pessoas da minha família. (usuária do serviço de unidade básica de saúde).
Por isso ao se falar de cuidado e de subjetividade é necessário falar em humanização da
atenção e desenvolvimento de vinculo e autonomia. Ceccim e Capozzolo (2004, p. 368)
afirmam que:
A integralidade e a humanização da atenção à saúde supõem, entre outros
aspectos, a ampliação e o desenvolvimento da dimensão cuidadora no
trabalho dos profissionais para que se tornem mais capazes de incluir
historias de vida, familiares e culturais que acompanham os processos de
adoecimento e de buscar informação em ambientes de saúde; mais
responsáveis pelos projetos terapêuticos entabulados na busca da cura
(responsabilidade com os resultados das praticas de atenção exercidas) e
mais dedicadas ao desenvolvimento da autonomia dos usuários das ações e
dos serviços de saúde, aceitando e/ou tornando os usuários ativos na
produção do seu estado de saúde.
Muitas vezes os usuários mesmo em atendimento em um determinado serviço não sabem
como lidar com suas limitações, a sua autonomia fica “presa” as regras dos serviços ou a
comportamentos que são esperados dele enquanto usuário, é possível verificar isso no trecho
de fala transcrito a seguir:
“Teve uma vez que eu tive uma recaída, fiquei com vergonha de voltar para
cá para ser novamente atendido. Minha esposa é que foi até a FAS buscar
ajuda, eles me encaminharam para a Emergência e de lá fui para o
Hospital. Foi quando eles ligaram para minha casa, ligaram aqui do Caps
para saber de mim, ai eu voltei para continuar o meu acompanhamento
aqui, foi muito bom voltar para ser acompanhado aqui” (usuário do Caps
A.D.).
Segundo Alves e Guljor (2001) ao se lançar mão do conceito de liberdade, imediatamente nos
reportamos ao respeito às diferenças e esse cuidado implica investir na capacidade do sujeito
para operar suas próprias escolhas, seu potencial de estabelecer suas próprias normatizações
pautadas em sua história e de forma singularizada. Quer dizer poder aceitar as limitações dos
sujeitos envolvidos neste processo, mais investir esforços na recuperação e manutenção da
sua saúde.
Trata-se de uma “arte” humanizar as relações garantindo o cuidado e como conseqüência à
reorientação do modelo assistencial conforme refere Dimenstein:
156
Para a construção de novos sujeitos e práticas em saúde, o cuidado é
imprescindível, pois revela a mudança de concepção no que se refere ao
campo do cuidar. Nosso eixo de sustentação é pensar o cuidado como
”techné” (arte para os gregos), ou seja, tomar o cuidado como técnica de
vida. Tal perspectiva tem implicações importantes, pois trata-se de um
processo de produção de novas subjetividades entre os profissionais e
usuários dos serviços de saúde, subjetividade entendida como a maneira
particular de cada um sentir, ver e estar no mundo. Esses atores devem ser
reconhecidos como cartógrafos, segundo Guattari e Rolnik (1986),
personagens que incitam a criação de modos singulares de existência, de
enlace socail, de produção de desejo e a ruptura (desterrritorialização) com
as formas de subjetividades dominantes que produzem as relações sociais e
o satus quo (as fábricas de subjetividades serializadas).
Olhando deste ângulo há que se considerar que, o cuidado pressupõe diferentes variáveis, que
garantam essa atitude abrangendo mais que um momento de atenção. Há que se considerar, o
vínculo que pode surgir, a partir desta atitude que “ocupar-se” do outro, envolvendo-se com
sua história de vida e responsabilizando-se por este cuidado. Em saúde pública o que primeiro
garante esse vínculo é o acolhimento oferecido pelo serviço. Segundo Cecílio, a idéia do
vinculo prende-se tanto à busca de maior eficácia (aumento do percentual de curas), como à
noção que valoriza a construção de espaços propícios à produção de sujeitos autônomos:
profissionais e usuários. Ou seja, só há vínculo entre dois sujeitos quando se exige que o
paciente assuma a condição de sujeito que fala e julga, sem o que não se estabelecerão
relações profissional/usuário adequadas (CAMPOS apud CECILIO, 1994, p.53) (CECÍLIO, 2006,
p.45). Portanto à medida que se favorece a autonomia e responsabilização dos usuários
também se está construindo um vínculo. Esta possibilidade de expressão por parte dos
usuários como um direito de ter sentimentos e concordar ou não como é conduzida à situação
pode ser exemplificada pelos seguintes trechos:
Eu não concordei com a última internação do meu filho. Na verdade não
resolveu nada. Ele estava em crise e resolveram internar para ajustar a
medicação. O resultado foi que ele saiu pior do que internou e eu falei isso
para a médica que acompanha ele. (mãe de usuário do Caps I).
Uma coisa que eu acho que prejudica o acompanhamento do meu filho é
que quando ele se acostuma com a equipe que está cuidando dele os
profissionais vão embora. Eu não entendo, porque daí temos que começar
tudo de novo com outras pessoas. Isso é ruim. (mãe de usuário do Caps I).
Há que se considerar ainda dentro desta categoria um referencial importante na atenção em
saúde mental que é a rede de apoio que se estabelece garantindo assim uma forma mais
ampla e sustentável de cuidado. Jonas Melmanm (2006 p.86) refere em seu livro: Família e
Doença Mental que os limites da rede que sustenta um indivíduo na sociedade não se
restringe apenas à família, mas vai além, incluindo relações interpessoais significativas do
sujeito como: a família, amigos, relações de trabalho, de estudo, comunidade, vínculos
coletivos, sociais e políticos.
Assim, pode-se definir a rede social de sustentação (Social Network) como a
soma de todas as relações que um indivíduo percebe como importantes ou
diferenciadas da massa anônima da sociedade. Essa rede corresponde a um
nicho interpessoal, uma microecologia na qual a pessoa desenvolve um
modo particular de expressão da sua singularidade (SLUSKI, 1997, p.42).
157
É necessário recuperar estratégias que permitam contemplar o conhecimento de tecnologias
relacionais e ao mesmo tempo oferecer oportunidade de vivencia permanente dessas
abordagens (Silva Jr, Merhy e Carvalho, 2003 p. 125).
Diversidades terapêuticas
A legislação que legitima a atenção e o cuidado em Saúde Mental preconiza modelos
alternativos, centrados na comunidade e dentro das redes sociais do usuário. Aponta uma
revisão crítica do papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico indicando
recursos, cuidados, e tratamentos substitutivos, propiciando a permanência no seu meio
comunitário, conforme já referendado no início do presente trabalho. Porém, isso, não basta
para mudar as práticas do cotidiano e a cultura que se construiu em torno do cuidado em
saúde mental ao longo dos anos.
Faz-se nossas as palavras de Basaglia (apud ROSA, 2003, p. 67 )
estamos apenas bastante conscientes de que não é suficiente a simples
criação de serviços. A qualidade da mudança só pode ser garantida, se os
novos serviços são acompanhados por uma radical transformação no que
seria uma sociedade voltada para o cuidado (caring society) que é
responsável por aqueles em necessidade. Então, e só então, os direitos do
cidadão à proteção em saúde se tornará realmente um fato, e não
meramente palavras.
Partindo de uma concepção de cuidado que coloca em evidência o sujeito que sofre, os
serviços de saúde devem estar ancorados em intervenções que potencializam a “ invenção da
vida “ e a “ produção das vida “. A inclusão social é o aspecto inovador dessa proposta “
...rompe com o modelo biológico, clínico e psicológico. Não se trata de fazer terapias
individuais e sim das relações sociais, culturais, artísticas e de lazer“. (CFESS, 2005).
Em outras palavras, estimular práticas cotidianas que visualizam a possibilidade de criar e
desejar transitando de uma posição objetal para uma posição de sujeito, visto na sua
totalidade, valorizando seus aspectos saudáveis como patrimônios que devem ser fortalecidos
para o enfrentamento da realidade. (BOURDIEU apud Faleiros,1999). Os usuários entrevistados
percebem as práticas de cuidado cotidianas de alguns serviços de saúde mental da seguinte
forma:
“o Caps tem atendimento individual com a psicóloga e musicoterapia” (CAPS
I)
“O tratamento é interdisciplinar não é só medicação”. (Caps Cidadania)
Nesta última fala surge a questão da práxis interdisciplinar que possibilita a diversidade no
atendimento, é necessário desierarquizar a relação entre as diferentes áreas, como define
Etges: “A interdisciplinariedade é o princípio da máxima exploração das potencialidades de
cada ciência, da compreensão e exploração de seus limites, mas acima de tudo, é o princípio
da diversidade e da criatividade.” Etges Apud Rodrigues, (1998:157).
Podemos dizer que mais do que um conceito, técnica ou instrumento, a interdisciplinaridade é
uma postura profissional que permite transitar no espaço da diferença desvelando as diversas
possibilidades que a realidade pode apresentar. Assim, a construção do saber do profissional
158
que tem como horizonte a intervenção, realiza um movimento tríplice que é de crítica, de
construção de um conhecimento “novo” e de uma nova síntese no plano de conhecimento e
da ação. Esse movimento vai do particular em direção ao universal e retorna ao particular, às
ações localizadas em outro nível de reflexão (BAPTISTA, 1998:119).
No plano de ações dos Centros de Atenção Psicossocial-CAPS cada usuário tem um Projeto
Terapêutico Individual (PTI), isto é, um conjunto de atendimentos que respeite a
particularidade, personalize o atendimento de cada pessoa no serviço e fora dele e proponha
atividades durante a permanência diária na unidade, segundo as necessidades do indivíduo.
Na fala da entrevistada do CAPS Cidadania podemos verificar a importância dessa diversidade
de atividades:
“O serviço tem equipe, oferece medicação, psicoterapia, assistente social,
nutricionista e enfermeira”
“Quando falta no serviço algum atendimento, somos encaminhados para
outros profissionais e/ou serviços: dentista, aparelho auditivo. Tudo isso é
reivindicado na assembléia mensal dos usuários.”
Para dar conta das necessidades singulares de cada usuário é fundamental a diversificação de
programas, já que, com um menu diversificado e variado de possibilidades, reduz-se muito a
tentação da seleção. Aqui os maiores problemas são além da forte influencia do modelo
tradicional de cuidado, a grande dificuldade dos profissionais de renunciarem a “um” papel
especifico, afinal são especialistas, e compartilhar saberes é exercício continuo e muito difícil
(ALVES, 2001 p. 172). A superação desta pratica e compartilhar saberes e trabalhar de fato em
equipe multiprofissional tem sido a marca do cuidar nos serviços comunitários de saúde
mental.
O trabalho em equipe força uma proximidade maior com os problemas a serem resolvidos,
humaniza esses problemas, que passam a ser problemas de vida e não patologias segundo a
racionalidade médico-hegemônica. Para que o trabalho em saúde seja resolutivo quanto à
saúde das pessoas, em realidades de vida/vividas, são necessárias discussões e planificações
em equipe, ações conjuntas e conjugadas, avaliações coletivas de impacto e reuniões regulares
entre os profissionais (CECCIM & CAPOZZOLO, 2004, p. 365-366).
Outro aspecto a ser considerado na fala da usuária são os espaços de participação existentes
no Caps e que incidem nos processos de trabalho do Caps. O trabalho em equipe deve
considerar as discussões e deliberações que emanam dos espaços coletivos e incorporá-los nas
planificações e ações cotidianas, pois esse novo paradigma,
insere a saúde mental no campo da conquista e reinvenção da cidadania,
que passa pelos tradicionais direitos civis, políticos e sociais, mas implicando
em uma luta mais específica pelo reconhecimento de direitos particulares
dos usuários dos serviços de saúde mental e seus familiares. Em última
instância, trata-se uma cidadania especial a ser inventada, marcada pela
diferença colocada pela experiência da loucura e da desrazão, e que,
portanto, não pode ser identificada com a concepção convencional
associada ao indivíduo racional, livre e autônomo. (VASCONCELOS, 2003, p,
57)
O usuário e familiares dos serviços de saúde mental constroem itinerários terapêuticos que
traduzem diferentes culturas, crenças, formas de cuidados que ultrapassam as concepções
159
convencionais como se pôde verificar nas entrevistadas vinculadas às Unidades Básicas de
Saúde.
Participo de grupos da igreja, da UBS, atividades físicas aqui na comunidade.
O grupo da igreja terminou e nós continuamos nos encontrando,
mantivemos o grupo.
Nessa fala, pode-se constatar que o usuário busca construir itinerários terapêuticos que lhes
garantam atenção integral em suas necessidades em saúde. Evidencia-se a responsabilização
do usuário no seu próprio cuidado e na sua participação em grupos favorecendo o convívio
entre diferentes pessoas possibilitando as identificações em situações e experiências em
comum, e com isso a aceitação e o respeito fundamentais na legitimação do outro enquanto
sujeito.
Pertencer a um grupo permite que os usuários percebam-se acolhidos como são e assim,
passem a se aceitar internalizando que são seres únicos Ao perceber-se acolhido, tende a
internalisar o sentimento resignificando seu papel nessa relação. Esta transformação
significativa do grupo exige algum tempo e dedicação. Dessa forma, o trabalho grupal constrói
com os pacientes o sentimento de “pertença”, que é quando o paciente consegue transitar da
1ª pessoa do singular para a 1ª do plural, ou seja, sente-se fazendo parte do grupo, passando
do estágio do “eu” para o “nós”. O que pode ser verificado na entrevista do usuário:
“O meu me chefe visitou, me deu apoio e disse que garante a vaga após eu
acabar o tratamento”. ( Caps AD. );
Outro aspecto importante é a busca religiosa verificada na fala dos usuários do CAPS AD, CAPS
I e Atenção Básica, embora cada um deles tenha tido experiências e acolhidas diferentes. O
usuário do Caps AD refere ter sido excluído como demonstra a seguinte fala:
“Procurei a Assembléia de Deus e fui destratado, o pastor verbalizou que
lugar de vagabundo não é na igreja” (Caps AD.);
Já para a usuária do CAPS i, quando inferida relatou:
Já gastei muito dinheiro em lugares que não eram bons, hoje eu vou no
Centro Espírita, mas não conto para os psiquiatras porque eles não
acreditam. Eu vou toda semana e dou água fluidificada para ele, as vezes
ele se acalma e a equipe não entende porque. ( Caps i )
Segundo Silva Junior, Et Ali (2005, p. 122) “A dificuldade de ouvir as demandas dos pacientes e
de tratá-los como outro sujeito, com desejos, crenças e temores, tem sido causa de muitos
fracassos na relação entre trabalhadores de saúde e população”. O grande desafio das equipes
de saúde é reconhecer que os indivíduos produzem necessidades específicas que devem ser
ouvidas e respeitadas e que nem sempre estas necessidades serão satisfeitas apenas com as
tecnologias disponibilizadas pelos serviços de saúde. O usuário incorpora no seu itinerário
terapêutico os recursos terapêuticos que traduzem os diferentes “modos de andar a vida”.
Ainda segundo Silva Junior, et ali (2005, p. 122) “As equipes de saúde exploram pouco os
espaços relacionados com os usuários como espaço terapêutico e pouco conhecem sobre
outras tecnologias que oferecem apoio psicológico, vivências alternativas e ações que
desloquem o eixo terapêutico da correção de “disfuncionalidades” biomecânicas para o
fortalecimento da auto-estima, dos espaços afetivos, da autonomia e da vida saudável” (2005,
p. 124).
160
Conhecimento da rede de saúde mental e controle social
Na área da saúde, o Controle Social é um direito conquistado, que advém do capítulo da saúde
da Constituição Federal de 1988, mas precisamente do princípio “participação popular“.
Segundo Bravo (2006, p. 83) a categoria controle social, historicamente, foi entendida com
controle do estado e empresariado sobre as massas. É a partir dessa concepção que quase
sempre o controle social é usado na sociologia clássica, ou seja, no seu sentido coercitivo sobre
a população. Porém, o sentido de controle social inscrito na Constituição é o da participação
da população no sentido de elaborar, implementar e fiscalizar as políticas sociais.5
Os Conselhos de Saúde são um dos mecanismos de controle social, compostos por usuários,
gestores, prestadores públicos e privados e trabalhadores de saúde têm a finalidade de
discutir, elaborar e fiscalizar a política de saúde em cada esfera de governo. Com isso, busca-se
a democratização da relação entre estado e sociedade civil por meio da introdução de novos
sujeitos políticos.
Coutinho (1992) afirma que
é somente por meio da articulação entre mecanismos de representação
indireta com os organismos populares de democracia de base que os
elementos de uma nova concepção de democracia e cidadania podem surgir
e tomar corpo. Explicita que é a partir dessa articulação que as classes
subalternas podem participar ativamente do poder político, influenciando
nas decisões... essa articulação pode permitir o predomínio da vontade geral
e a conservação do pluralismo. (in Bravo: 2006 p. 84).
Para que esses novos atores sociais possam de fato ocupar espaços na arena política, é
condição conhecer os modelos de organização dos serviços de saúde pois estes geram uma
cadeia de atos que geram um conjunto de práticas em saúde e é sobre elas que os
conselheiros são chamados para discutir e deliberar. A fala da Conselheira do Conselho Local
de Saúde nos aponta algumas reflexões nesta direção:
Eu sou Conselheira há 6 anos e o que eu ouço falar e sei de pessoas que eu
conheço é que no P/A 24 h lá fica centrado “sedação” e há demora no
atendimento. Se precisa internar vai para Ana Rech às vezes demora para
internar. No particular há alguns poucos neurologistas e psicólogos, mas as
pessoas não têm dinheiro para pagar. Lá também dão bastante remédio e
internam.
A fala remete a um imaginário inicial com a predominância de um modelo hegemônico e de
referência, o da assistência tradicional/hospitalocêntrica, precedida de atendimentos de
urgência/emergência do Pronto Atendimento 24 hs e/ou de atendimentos centrados
meramente em consultas médicas e de psicólogos. Segundo Alves e Guljor(2004), este modo
de intervenção tem como respaldo teórico o paradigma racionalista problema-solução, sendo
o objeto do cuidado a “doença mental”.
Mas, além da crítica ao modelo hegemônico, a Conselheira não faz referência a conhecer os
CAPS da cidade, nem mesmo os atendimentos em saúde mental realizados pelas equipes de
Saúde da Família e/ou da Atenção Básica, como preconizado pela Política Nacional de Saúde
Mental e da Política Municipal nesta área.
161
No entanto, é importante frisar que a mesma faz críticas a este modelo na medida em que
questiona suas abordagens, com expressões como “lá fica centrado na sedação” e “há demora
no atendimento”, tanto no espaço hospitalar quanto do serviço de urgência e emergência do
setor público. Também considera que os atendimentos de saúde mental dos serviços de saúde
suplementar são falhos, na medida que poucos tem acesso aos mesmos, por questões
financeiras, por falta de profissionais, pois há apenas alguns poucos “neurologistas” e
psicólogos disponíveis, e igualmente critica o modelo de abordagem centrada na
medicalização e no encaminhamento a internações hospitalares. Também não faz referências
a outros tipos de atendimentos do setor da saúde suplementar da cidade. Pode-se levantar
como hipóteses que não há acesso às informações e/ou que os mesmos inexistam.
Segundo Lancetti e Amaranti (apud CAMPOS et al, 2006, p 615),
fazer Saúde Mental hoje é uma tarefa que compete a todos os profissionais
de saúde: médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, dentistas,
Agentes Comunitários de saúde, assistentes sociais, terapeutas
ocupacionais, fonoaudiólogos, psicopedagogos e psicólogos.... o hospital
psiquiátrico já não é mais o centro de atenção da assistência.... o hábitat
privilegiado para o tratamento de pessoas com sofrimento mental,
drogaditos, violentados e pessoas que sofrem de angústia profunda e
intensas ansiedades é o bairro, as famílias e as comunidades, e logicamente,
as unidades de saúde encravados nos territórios onde as pessoas existem.
Os autores chamam a atenção para o fato de parte significativa da população sofrer de algum
distúrbio psíquico, 3% com gravidade. Porém, muitos destes nem sequer vão ou tem acesso
aos serviços de saúde mental. Salientam que as vezes a forma de intervenção das Equipes de
Saúde da Família são mais incisivas, tem maior poder vinculador e tem potencial de operar
mudanças maiores que as do CAPS e, certamente, maiores que as dos Hospital Psiquiátrico.
Havendo a necessidade de maior associação e trabalho integrado entre os CAPS, as equipes
volantes de saúde mental e as equipes de Saúde da Família.
Destaca-se outro aspecto importante mencionado pela representante do Controle Social do
nível local:
‘A saúde de maneira geral melhorou bastante nos últimos 8 anos. Fico
sabendo das notícias pelo jornal, rádio, e se tenho alguma reclamação faço
através deles... “
A fala aponta para as mudanças ocorridas na área da saúde da cidade nos últimos 8 anos,
período que coincide com uma administração municipal popular, com perfil democrático e
participativo, que elencou o setor saúde como uma de suas prioridades de gestão. Neste
período houve mudanças significativas no processo de municipalização plena da saúde, e, na
área da saúde mental iniciou-se o processo de organização de uma Rede de suporte de Saúde
Mental, substitutivo aos modelos tradicionais e em concordância aos dispositivos da Reforma
Psiquiátrica e da Política Nacional de Saúde Mental. Percebe-se, no entanto que apesar dos
avanços significativos nesta área, é necessário avançar no sentido de dar maior visibilidade a
este processo, de forma que toda população e, em especial, os que representam o Controle
Social tenham acesso as informações de saúde e do funcionamento dos serviços públicos
municipais que foram implementados na cidade, tais como diversos CAPS, o Residencial
Terapêutico, Emergência em Saúde Mental, incorporação de novos profissionais as equipes de
saúde na atenção básica.
162
A conselheira refere que fica sabendo das informações da saúde pelos meios de comunicação
social da cidade (imprensa escrita e falada como, rádio, jornal) e se tem alguma reclamação
também tem acessado estes meios. Esta visão torna-se preocupante a partir do momento em
que a representante da comunidade, legalmente instituída há vários anos (6 anos como
conselheira) para exercer o controle social nos processos de gestão da saúde em nível local,
parece não ter-se apropriado dos processos de mudança na área da saúde mental em curso no
município em estudo. De igual forma poderíamos pensar em falhas no processo de
comunicação entre os serviços e os fóruns de controle social local, havendo pouca visibilidade
dos programas e/ou falha no acesso às informações de saúde.
Considera-se esta questão do acesso às informações de extrema importância para a prática do
controle social, uma vez que as mesmas servem de subsídio para o conselheiro poder deliberar
sobre o planejamento e implementação de políticas públicas de saúde em todos os níveis, em
especial, na saúde mental. Conforme Cecílio (1999, p.30) “para exercer o controle social sobre
alguma coisa, é necessário que se tenha um bom conhecimento sobre o objeto que se
pretende controlar. E isso, na saúde, nem sempre é tarefa fácil”.
Quanto aos depoimentos da entrevistada representante dos usuários do Conselho Municipal
de Saúde da cidade, em contraposição a outra conselheira, percebe-se apropriação e acesso a
informações quanto a Política Municipal de Saúde Mental e amplo conhecimento sobre a Rede
de Serviços da cidade, citando CAPS, Residencial Terapêutico, conforme podemos constatar na
seguinte fala:
“O que funciona hoje bem na área da saúde é a saúde mental. Temos Caps,
Residencial Terapêutico, atendimento no Pronto Atendimento 24h.
atendimento para pessoa viciadas. Os profissionais são muito
comprometidos, procuram fazer de tudo para não internar. O que ainda
tem de problema na saúde mental é na área da criança que no privado eu
acho que está melhor. No particular eles ficam centrados no psiquiatra,
psicólogo, e só medicam” .
Apresenta como nó crítico da rede pública o atendimento na área infantil. Pode-se levantar
como hipótese a relação que estabelece entre o privado e o público é que neste último não se
internam crianças em unidades psiquiátricas fechadas, como é na rede pública, permanecem
em unidades pediátricas em hospitais gerais. O atendimento hospitalar para crianças e
adolescentes portadores de transtornos mentais disponível hoje na rede SUS fere além dos
princípios da Reforma Psiquiátrica os do próprio ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente,
ao permitir que crianças e adolescentes permaneçam por longos períodos internados sem a
presença de familiares e/ou responsáveis.
No que se refere ao atendimento em saúde mental na saúde suplementar e privada,
igualmente tece críticas na abordagem centrada na doença, no tratamento medicamentoso e
na internação hospitalar, como já mencionado anteriormente.
Diante da análise preliminar de fragmentos das falas, é possível constatar que é de
fundamental importância ampliar o acesso às informações de saúde entre os serviços e os
conselheiros de saúde, inclusive possibilitando capacitação e educação permanente em saúde
sobre as questões de saúde mental, para que haja maior compreensão por parte dos
conselheiros, representantes de usuários sobre o processo da Reforma Psiquiátrica, Política
Nacional de Saúde Mental, Política Municipal de Saúde Mental, composição da rede,
propostas, impactos na assistência, de forma que os mesmos possam cumprir com seu papel
163
efetivo de controle social e de decidir participativamente sobre o processo de gestão e de
cuidado da saúde em nível local e municipal. Também é possível verificar nos depoimentos
críticas ao modelo hospitalar e da necessidade de ampliação de serviços substitutivos também
na saúde suplementar, de forma a garantir alguns princípios básicos como a
interdisciplinaridade, a integralidade e a intersetorialidade na construção de “Linhas de
Cuidado” efetivamente acolhedoras, humanizadas, comprometidas, resolutivas. Também
chama a atenção para a necessidade de ampliar o acesso dos usuários, no que se refere a
saúde mental na atenção básica, em especial, na estratégia da Saúde da Família, o que nos
depoimentos fica evidente, pois nenhum dos conselheiros fez referência a possibilidade deste
atendimento, dando a entender que o mesmo não está sendo realizado, ou ainda não está
sendo percebido como um cuidado possível de ser realizado também neste nível de atenção.
164
5.3 – INTEGRALIDADE EM SAÚDE MENTAL E OS DESAFIOS AOS PROCESSOS DE TRABALHO NO INTERIOR DE SERVIÇOS: A
MICROPOLÍTICA EM ATO20
O estudo da integralidade no Brasil tem se tem tornado muito importante no sentido de
refletir e nortear as práticas de saúde atuais. A integralidade em saúde vem sendo colocada
desde a década de 80 como questão orientadora nas políticas governamentais, em programas
de intervenção e em todo discurso do movimento sanitário. Primeiro, foi pensada em termos
de uma articulação entre aparatos institucionais prestadores de serviços, como a integração
entre os setores público e privado na produção dos cuidados de assistência médica, ou entre
os sub-setores de saúde pública e de medicina previdenciária, no interior do próprio setor
público de serviços. Depois, foi pensada como um problema de gerência dos serviços (Kell,
2004). Mais atualmente, envolve também os processos de trabalho e as dimensões
micropolíticas do cuidado (Merhy, 2002; Ferla, 2007), com grandes repercussões nas políticas
de formação de profissionais para o setor saúde (Ceccim, 2004). Integralidade é muito mais do
que uma diretriz definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira de luta” (Mattos, 2001)
dos atores de saúde. Ela fala de um conjunto de valores pelos quais vale lutar, pois se
relacionam a um ideal de uma sociedade mais justa e mais solidária. Deve, também, constituir
um conjunto de premissas inerentes às ações de planejamento, execução e avaliação em
saúde.
A prática de saúde mental ao longo da história traz consigo inúmeras ponderações e
questionamentos acerca da integralidade. A partir da introdução da reflexão sobre
integralidade, tem-se intensificado as discussões quanto à pertinência das práticas
tradicionalmente abordadas em Saúde Mental. A reforma psiquiátrica foi um avanço no
sentido de ampliar o cuidado aos portadores de sofrimento psíquico, buscando conceitos
como atenção multiprofissional, projetos terapêuticos singulares, trabalho em equipe, entre
outros (BRASIL, 2008).
A proposta do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004) é que a Saúde Mental seja organizada a
partir dos Centros de Atenção Psicossociais (CAPS), considerando que estes centros estejam
em contato com os outros serviços territorializados da rede, construindo em conjunto as novas
formas de cuidado, com diversidade de ofertas assistenciais para as diversidades de
demandas.
A abordagem da saúde mental na atenção primária é de enorme importância, uma vez que os
profissionais da Atenção Básica se deparam diariamente com problemas de saúde mental.
Leva-se em conta que, pela proximidade com as famílias e as comunidades, essas equipes têm
um contato direto com diversos problemas nesta área, como o uso abusivo de álcool, drogas e
demais formas de transtornos psíquicos.
20 Item produzido com base no trabalho “Integralidade e saúde mental: a visão do enfermeiro da
atenção básica”, de autoria do Enfermeiro Diego Stuani, realizado sob orientação da Profa. Dra. Nilva
Lucia Rech Stedile e da Profa. MS. Margarete Isoton De David.
165
Percebendo que, muitas vezes, as equipes não se encontram preparadas para lidar com o
tema, o Ministério da Saúde (Brasil, 2005) tem estimulado a expansão de diretrizes que
incluam a dimensão subjetiva dos usuários nas ações da atenção básica, como uma forma de
“responsabilização em relação à produção da saúde, à busca da eficácia das práticas e à
promoção de equidade, da integralidade e da cidadania num sentido mais amplo” (p. 34).
Busca criar uma rede de cuidados em Saúde Mental que se estruture a partir da Atenção
Básica, obedecendo ao modelo de redes de cuidado de base territorial e buscando o
estabelecimento de vínculos e acolhimento. Aqui tem destaque um aspecto que se investiga
na pesquisa, que é o efeito no cuidado aos portadores de sofrimento psíquico da atuação em
redes de serviços com abordagem multiprofissional. Busca-se compreender o quanto essas
variáveis compõem uma estética do cuidado mais próxima à idéia da integralidade (Ferla,
2007) em resposta a políticas de atenção que não estejam centradas no modelo biomédico.
Inserido nessa realidade, surge o papel do enfermeiro como promotor e articulador do
cuidado em saúde. O conceito de integralidade nos serviços de Saúde Mental é inovador. As
práticas não giram mais em torno da patologia, mas sim em torno da necessidade do sujeito, o
que vem ao encontro dos processos de formação dos enfermeiros que, historicamente,
assumem a visão holística do homem como aquela capaz de orientar a execução dos cuidados
de Enfermagem. Para marcar a atuação de uma equipe multiprofissional, optou-se pelo estudo
do cuidado de enfermagem, que não tem visibilidade específica na atenção tradicional e que,
nesta medida, poderia destacar outros aspectos de pouca visibilidade no cuidado.
No escopo da pesquisa sobre linhas de cuidado em saúde mental na Saúde Suplementar, esta
abordagem de análise decorreu de uma questão que reivindicou aprofundamento,
relativamente a ganhos de integralidade no cuidado em rede articulada com a atenção básica.
É sabido que a atuação na Estratégia de Saúde da Família busca vincular os usuários de um
determinado território e oferecer ações de atenção à saúde que incluem a vigilância às
situações de vida e riscos de doenças e agravos. Como o ciclo de cuidados para beneficiários
de planos e seguros privados de saúde inicia-se com a procura por atendimento, buscou-se
analisar em que condições o usuário da atenção à saúde mental encontra o cuidado no sistema
público de serviços de saúde. Essa abordagem complementa o primeiro estudo integrador
relatado neste documento, uma vez que objetiva analisar as condições em que o usuário é
identificado no cotidiano. Foram entrevistados seis profissionais de enfermagem em duas
unidades básicas de saúde, uma com a estratégia de saúde da família implantada e outra não.
Aqui interessou saber se é possível uma linha de cuidados antes do diagnóstico médico. Os
resultados estão relatados a seguir.
5.3.1 – A IDENTIFICAÇÃO DO USUÁRIO EM SOFRIMENTO PSÍQUICO NA ATENÇÃO BÁSICA
Este item traça um paralelo entre as principais falas dos participantes sobre maneira de
identificação dos usuários que procuram os serviços de saúde e estão em sofrimento psíquico.
O Quadro 5.1 está dividido em quatro categorias: comportamento e sintomas do usuário;
conhecimento prévio sobre o usuário; o usuário é quem se identifica; encaminhamento pelos
Agentes Comunitários de Saúde (ACS).
166
Na primeira categoria é trazida a questão da identificação dos usuários através do seu
comportamento, com sinais e sintomas. Esta forma de reconhecer o paciente com transtorno
mental é bem significante nas falas, uma vez que é expressa por cinco entre seis enfermeiras
entrevistadas. Um aspecto relevante é trazido por todos profissionais que atuam em unidades
com Estratégia Saúde da Família: a questão da fala do usuário. Isso revela que há uma maior
preocupação, por parte destes profissionais, em entender aqueles que procuram por
assistência nos serviços de saúde. É provável que isto decorra do entendimento da
importância do acolhimento e neste, de escuta cuidadosa do indivíduo. Para ter efeito
terapêutico, esta escuta é acompanhada da observação, do sentir, do perceber.
QUADRO 5.1 - Formas que os enfermeiros utilizam para identificar usuários em sofrimento
psíquico
CATEGORIA EMPÍRICA SEM ESF COM ESF
COMPORTAMENTO E SINTOMAS DO USUÁRIO
“... normalmente se tu notar qualquer coisa comportamental... Muitas vezes ele vem querendo a receita ou querendo o psiquiatra ou a assistente social ou psicólogo.” (Enf. A) “... a gente identifica o paciente pelas próprias atitudes dele e pela forma que ele se manifesta...” (Enf. B)
“Normalmente é pela fala, e a maioria deles traz uma fala carregada de emotividade, emoção. E os sintomas que ele apresenta.” (Enf. D) “Dependendo do grau de estabilidade da pessoa a gente pode identificar um tipo de sofrimento psíquico dela. Angústia, depressão. Observar o que eles nos dizem (...). E aqueles casos mais clássicos, etilismo, transtornos bi-polar. Têm outros com síndrome do pânico.” (Enf. E) “Ou eles falam demais, ou falam de menos...” (Enf. F)
CONHECIMENTO PRÉVIO SOBRE O USUÁRIO
“... mesmo porque tu conhece a maioria dos teus usuários”. (Enf. B) “Os nossos daqui já são conhecidos da equipe toda há longo tempo. Então a gente já sabe daquele paciente que está em tratamento... Os nossos, a gente conhece bem.” (Enf. C)
“A população, enfim, a gente conhece. Mais ou menos a gente já sabe aqueles que são da saúde mental, que freqüentam os CAPS. Mais ou menos a gente sabe quem são eles...” (Enf. F)
O USUÁRIO É QUEM SE IDENTIFICA
“Geralmente é aquele paciente que te procura para uma conversa separada, te relacionando um problema... geralmente não é aquele paciente que fica ali na fila esperando. Ele já chega te procurando” (Enf. C)
“Muitas vezes a gente percebe pelos retornos muitos freqüentes. (...) É o fato de ele vir com muita freqüência na unidade em busca de muitas coisas, com muitos sintomas diferentes.” (Enf. D) “normalmente esses pacientes não são aqueles que vêm numa consulta eletiva. Eles vêm numa consulta de pronto atendimento. Aí a gente consegue detectar...” (Enf. D)
ENCAMINHAMENTO PELO ACS
“Quem nos tem trazido muito são os ACS.” (Enf. E) “O ACS traz muita demanda para nós, também (...). Então a gente identifica isso aí assim: através da visão do agente de saúde...” (Enf. F)
Fonte: Stuani, 2010.
Transtornos mentais comuns são caracterizados por sintomas como: insônia, fadiga,
irritabilidade, esquecimento, dificuldade de concentração e queixas somáticas, são os mais
167
encontrados na comunidade. (Melo, 2002). Esses sintomas clássicos são muito comuns em
nossa sociedade. Hoje em dia, não é incomum grande parte das pessoas apresentarem algum
tipo de sofrimento psíquico. Quando apresentarem algum sofrimento maior, irão procurar
algum serviço de saúde. O primeiro contato quando acontece com serviços da atenção básica,
pode anteceder ao agravamento da situação clínica, como parecem nos informar os sujeitos da
pesquisa e há necessidade de habilidades comunicacionais para os profissionais. Para Bleger
(1989), a comunicação inclui todo intercâmbio de mensagens e transmissões de significações
entre pessoas ou grupos, tendo como elemento de primeira magnitude, a linguagem. Esta é
uma conduta que expressa idéias, sentidos e ações, tendo valor concreto e simbólico a um só
tempo, sendo, por sua vez, estimulante da conduta (resposta) do outro, com quem interage o
primeiro. Smeltzer & Bare (2006) dizem que, nos serviços de saúde, deve-se ficar vigilante em
relação ao paciente que se preocupa excessivamente, demonstra deterioração no
desempenho emocional, social ou ocupacional. As estratégias de cuidado enfatizam as
maneiras do paciente para verbalizar os sentimentos e medos e para identificar as fontes de
ansiedade. Assim sendo, o sentido da linguagem na identificação do paciente em sofrimento
psíquico remete à idéia de pôr-se na figura do outro, tentar compreender o que o outro quer
dizer. Em última análise, remete a criar fluxos intensos de na comunicação com o portador de
sofrimento psíquico.
Na segunda categoria, metade dos enfermeiros entrevistados relata que a maioria dos
pacientes com transtornos mentais são conhecidos por toda a equipe. O fato de ter
conhecimento prévio dos usuários pode referir que, com aqueles pacientes, existe algum tipo
de vínculo. Porém quando a enfermeira “C” traz a fala: “os nossos são conhecidos há longo
tempo. Então já sabemos daqueles que estão em tratamento...” pode mascarar situações,
correndo o risco de passar despercebidos outros usuários, que por ocasiões procuram o
atendimento da unidade e estão em sofrimento psíquico, uma vez que aqueles que são os
chamados “psiquiátricos” já são conhecidos a longo tempo. Isto também pode passar uma
falsa idéia de que é fácil identificar o sofrimento psíquico. Aqui parece estar uma evidência
forte de que o cuidado em rede, não apenas para os portadores de sofrimento psíquico em
tratamento, traz vantagens em termos de integralidade do cuidado.
Na terceira categoria, têm-se como maneiras de identificar o usuário em transtorno psíquico o
fato de ser o usuário quem se identifica e solicita por atendimento. Há o relato também de que
estes não são aqueles que esperam e agendam uma consulta. Muitos deles já chegam numa
consulta de urgência, de Pronto Atendimento. Esta maneira de identificação também pode
encobertar situações e casos existentes, uma vez que não é o profissional que identifica, mas
sim, a própria pessoa que solicita ajuda.
Na última categoria, presente nos diálogos com as enfermeiras que atuam em unidade com a
Estratégia Saúde da Família, têm-se a ação dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) que
ajudam a identificar os pacientes em transtornos psíquicos. Para Silva (2005), o agente
comunitário de saúde (ACS) tem um papel singular, ao se constituir em “elo de ligação” entre a
comunidade e o serviço de saúde, atuando de forma condizente com atitudes e valores
requeridos pelas situações de trabalho, realizando ações de apoio em orientação,
acompanhamento e educação em saúde, visando, sobretudo, a promoção da qualidade de
vida e o bem-estar da população.
A inserção do ACS no contexto da atenção Básica está pautada na representação de vínculo e
no elo na relação serviço-comunidade, o que o torna também um potente “mediador” de
tensões da população, por atender as inúmeras demandas de saúde. Então, a figura do agente
168
de saúde, nas unidades que possuem a ESF, é sem dúvida um fator relevante na identificação
dos usuários com transtornos mentais. São os agentes aqueles que estão mais próximos das
inúmeras situações nas comunidades em tempo real. As pessoas já possuem certo vínculo com
o agente de saúde. Eles têm livre acesso nas casas para identificar e instigar aqueles que estão
em sofrimento. Assim, o profissional enfermeiro que estiver na unidade de saúde deve estar
atento para acolher a demanda do ACS e ser capaz de exercer trabalhos extramuros com os
pacientes que estão em sofrimento psíquico. Parece evidente que se amplia a integralidade
em saúde quando a “porta de entrada” do cuidado amplia seu olhar para o cotidiano dos
sujeitos, quando os processos de trabalho são sensíveis à idéia mesma do cuidado integral à
saúde. Práticas cuidadoras e ações e serviços em malha progressiva de cuidados, como se viu,
são conceitos que pertencem à gramática das linhas de cuidado. Analisar com maior
profundidade as práticas que se seguem ao acolhimento pode ampliar a compreensão acerca
do cuidado, como se verá adiante.
5.3.2 – CONDUTAS E AÇÕES NO PRIMEIRO CONTATO COM O USUÁRIO EM SOFRIMENTO PSÍQUICO
Este eixo de análise traz as principais falas a respeito das condutas e ações adotadas pelos
enfermeiros frente aos portadores de transtornos psíquicos que procuram o serviço de
atenção primária à saúde. Deu-se a divisão em sete categorias: acolhimento;
encaminhamento; compartilhamento de informações com outros profissionais; envolvimento
da família; acompanhamento com ACS e visitas domiciliares (VD); atividades grupais; auxílio
fora da rede de apoio.
QUADRO 5.2 - Condutas e ações implementadas pelos profissionais frente ao usuário em
sofrimento psíquico
CATEGORIA SEM ESF COM ESF
ACOLHIMENTO “... a gente chama para uma sala para conversar melhor. A gente costuma olhar nos olhos e prestar atenção no que ele está nos dizendo.” (Enf. A) “O princípio da conduta é escutar. Além de escutar, tu tens que identificar qual é o motivo daquele sofrimento que ele está passando. Escutar ele e os próprios familiares...” (Enf. B) “A gente procura ter uma conversa, fazer um acolhimento. A gente vê então qual é a necessidade dele.” (Enf. C) “... aqueles que não esperam, que chegam agitados, a gente têm que puxar eles para o ladinho, conversar. Tenta-se identificar o que está lhe perturbando.” (Enf. C)
“Nós trabalhamos com acolhimento a todos os usuários. Nós procuramos estabelecer um vínculo, conhecer esse usuário.” (Enf. D) “Tem que escutar, olhar nos olhos da pessoa e entender também a linguagem não verbal... Então tem que ter um olhar para o que não é dito. Assim, se identifica a necessidade do usuário.” (Enf. E) “Se tenta identificar qual é a necessidade do sujeito (...). Primeiro a gente faz um acolhimento e vê a real necessidade, ou a real dificuldade desse usuário. O que ele está necessitando no momento pra tentar resolver a primeira coisa que está mais prejudicando ele (...). Mas no momento, a gente sempre ouve, acolhe.” (Enf. F)
169
ENCAMINHAMENTO “... então tu direciona o atendimento, faz o encaminhamento que for necessário... A gente liga e marca uma consulta. Dois casos que eu encaminhei para o estagiário de psicologia (...) teve um caso que é um paciente com esquizofrenia e que ele estava querendo cometer suicídio, e tal, então a gente encaminhou para o pronto atendimento...” (Enf. A) “O que a gente consegue ter uma pequena solução do problema é ou uma consulta médica ou um encaminhamento para um serviço.” (Enf. B) “Ou se encaminha... e da parte da enfermagem a gente tenta fazer o que está ao nosso alcance, com conversa, com apoio. Entramos em contato, naquele dia, com o CAIS mental” (Enf. C) “Nós aqui nos centramos no médico. Até porque todos os encaminhamentos são feitos pelo médico. Então a gente centra isso na figura do médico.” (Enf. B)
“A partir do acolhimento se dá um encaminhamento direcionado.” (Enf. D) “Em outras situações nós temos que acionar a rede.” (Enf. E) “A gente tem encaminhamentos, ou encaminha pra assistente social, ou para o médico, ou encaminha direto para o CAIS mental, ou a gente encaminha pra grupos, pra oficinas.” (Enf. F)
AUXÍLIO FORA DA REDE DE APOIO
“... sempre que possível tenta identificar quem são as pessoas que melhor podem ajudar a resolver. Solicitamos apoio de sogras em casos de sofrimento de puérperas. (...) as vezes até do pastor da igreja(...) se fala também com o pessoal das empresas, em relação ao trabalho...” (Enf. E)
ENVOLVER A FAMÍLIA “Escutar ele e os próprios familiares e tentar ter uma resolutividade, um encaminhamento” (Enf. B) “Quando eles chegam aqui mais exaltados a gente já relaciona com a família, já se chama um familiar.” (Enf. C)
“A gente tenta abranger os membros da família. Ver o que eles conhecem, o que eles sabem fazer e o que eles podem ajudar.”(Enf. E)
ATIVIDADES GRUPAIS “... já tivemos um grupo mensal de saúde mental. Mas a gente percebeu que eles são bem difíceis de se adaptarem ao grupo, de participar, né.” (Enf. C)
“Tem-se a tentativa de implementar grupo dentro dessa área aqui na unidade...” (Enf. D “Nós vamos começar aqui na unidade o grupo de saúde mental pra tentar aliviar o mais que a gente consegue do sofrimento das pessoas.” (Enf. E)
ACOMPANHAMENTO COM ACS E VD
“... a gente vai, avalia, acompanha, tem os ACS. A gente pede para fazer um acompanhamento mais seguido... nós fazemos visitas nas casas.” (Enf. E) “E peço para a ACS: Como é mesmo lá na casa? Vamos fazer uma visita?” (Enf. E) “... então nós fazemos a visita domiciliar” (Enf. F) “A gente pede pra agente de saúde:
aquela senhora, tu vai visitar ela mais
seguido. Qualquer alteração tu
encaminha para nós...” (Enf. F)
“... daí a ACS conversou comigo. Eu fiz várias visitas com a paciente (...) então estamos monitorando ela...” (Enf. F)
Fonte: Stuani, 2010.
170
Na primeira categoria desse eixo de análise, observa-se que todas as enfermeiras citaram o
acolhimento como uma ação em saúde mental. Porém, é notável uma diferença no modo que
as enfermeiras de ESF concebem “acolhimento” daquelas que atuam em unidades sem a
Estratégia. As segundas citam o acolhimento, aparentemente, como modo de identificar
apenas a necessidade de momento, numa espécie de triagem. A enfermeira “C” retrata isso ao
dizer: “aqueles que não esperam, que chegam agitados, a gente têm que puxar eles para o
ladinho, conversar. Tenta-se identificar o que está lhe perturbando”. Então, vê-se que a
preocupação é com a necessidade momentânea. Diferentemente, a enfermeira “E”, atuante
em unidade com ESF, traz a fala: “Nós trabalhamos com acolhimento a todos os usuários. Nós
procuramos estabelecer um vínculo, conhecer esse usuário”. Nota-se que há uma sensibilidade
por parte desta profissional em estabelecer um elo entre acolhimento e vínculo. A enfermeira
“F”, que também trabalha com a Estratégia, cita, inclusive, a percepção da linguagem não
verbal destes pacientes como estratégia para identificar estes usuários: “Se tenta identificar
através da linguagem não verbal qual é a necessidade do sujeito”. Tal ação é indispensável no
sentido de identificar os sofrimentos psíquicos das pessoas que procuram os serviços de
saúde.
Acolher é dar acolhida, admitir, aceitar, dar ouvidos, dar crédito a, agasalhar, receber, atender,
admitir (Ferreira, 1975). O acolhimento como ato ou efeito de acolher expressa, em suas várias
definições, uma ação de aproximação, um “estar com” e um “estar perto de”, ou seja, uma
atitude de inclusão. De acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2006), o acolhimento não é
um espaço ou um local, mas uma postura ética: não pressupõe hora ou profissional específico
para fazê-lo, implica compartilhamento de saberes, angústias e invenções, tomando para si a
responsabilidade de “abrigar e agasalhar” outrem em suas demandas, com responsabilidade e
resolutividade sinalizada pelo caso em questão. Deve-se, assim, desassociar acolhimento de
triagem. O acolhimento não se constitui como uma etapa do processo, mas como ação que
deve ocorrer em todos os locais e momentos do serviço de saúde, não havendo profissional
específico para fazê-lo. O que está em questão para o acolhimento não é a otimização das
agendas dos profissionais na unidade de saúde e o uso de técnicas de gestão do trabalho não é
o enfoque predominante do mesmo, mas a ampliação do cuidado e o uso de tecnologias de
escuta e construção de co-responsabilidade.
Acerca da questão do vínculo, Cecílio (2001) ressalta a importância de criarem-se vínculos
efetivos entre cada usuário e uma equipe e/ou um profissional. Vínculos estes, enquanto
referência e relação de confiança. Seria como o rosto do “sistema” de saúde para o usuário.
Deve-se ter em mente que, neste sentido, o vínculo muito mais do que adscrição a um serviço
ou a inscrição a um programa, significa o estabelecimento de uma relação contínua. Dar-se-ia,
assim, um encontro de subjetividades voltadas para o cuidado.
Para o mesmo autor, quando alguém procura um serviço de saúde, está trazendo uma “cesta
de necessidades de saúde” (Cecílio, 2001) e caberia à equipe ter sensibilidade e preparo para
decodificar e saber atender da melhor maneira possível essas necessidades, as vezes explícitas,
outras implícitas. Assim, o usuário que procura o serviço e está em sofrimento psíquico deve
encontrar um lugar com profissionais que estejam prontos a escutar, entender e atender suas
necessidades de saúde, criando sempre relações de co-responsabilidade do serviço.
Na segunda categoria de análise, têm-se os encaminhamentos como conduta tomada pelos
profissionais enfermeiros frente ao usuário em sofrimento psíquico. Observa-se uma
significativa diferença na quantidade de vezes que aparece esta ação entre os profissionais. Os
enfermeiros que não dispõem da Estratégia, valem-se muito mais dos encaminhamentos e, no
171
que cabe à tradução do conteúdo das falas, o encaminhamento parece ser a ação que produz
o encaixe do atendimento com a assistência. Essas falas parecem dizer de um baixo
protagonismo dos demais profissionais no cuidado, uma vez que parecem remeter à
centralidade do trabalho médico especializado na assistência em saúde mental.
Está presente também em algumas falas e, subentendido em outras, a questão da
dependência dos encaminhamentos feitos pelo profissional médico. A enfermeira “B” quando
diz: “Nós aqui nos centramos no médico. Até porque todos os encaminhamentos são feitos
pelo médico...” ilustra claramente esta idéia. Isto quer dizer que, por mais que algum
profissional que não seja a figura do médico, seja ele enfermeiro, psicólogo ou assistente social
identificar a necessidade de um encaminhamento diferenciado a algum serviço especializado,
dependerá, necessariamente, da avaliação e do parecer médico. Esta idéia de dependência da
prescrição médica para os encaminhamentos dificulta a resolutividade dos processos em
saúde mental, uma vez que, mais profissionais são capacitados para tal diagnóstico e para a
ação de encaminhar. Esta centralidade é incoerente com a idéia de trabalho interdisciplinar e
gera visíveis déficits no que se refere à integralidade.
Os encaminhamentos a serviços de referência em saúde mental devem ser reavaliados. Deve-
se ter em mente a noção de Apoio Matricial na resolução dos problemas em saúde mental.
Entende-se por Apoio Matricial como sendo um arranjo institucional criado para promover
uma interlocução entre os equipamentos de saúde mental, como por exemplo, os CAPS e as
UBS, numa tentativa de organizar o serviço e o processo de trabalho, de modo a tornar
horizontais as especialidades e estas permearem todo o campo das equipes de saúde. Destaca-
se assim, a tentativa de resolução nas necessidades na atenção básica. Dimenstein et al. (2005)
consideram que a inserção da saúde mental nesse nível de atenção é estratégia importante
para a reorganização da atenção à saúde, na medida em que rompe dicotomias como
saúde/saúde mental, exigindo a produção de práticas dentro do princípio da integralidade,
inibindo a fragmentação e a parcialização do cuidado.
Na tentativa de resolução dos problemas dos usuários em sofrimento psíquico, a enfermeira
“B”, atuante em UBS com ESF, quando diz: “Solicitamos apoio de sogras em casos de
sofrimento de puérperas.(...)as vezes até do pastor da igreja(...)se fala também com o pessoal
das empresas, em relação ao trabalho...” mostra evolução no seu processo de lidar com as
situações desafiadoras. A atitude de buscar auxilio fora da rede de apoio institucionalizada,
fazendo trabalhos extramuros, no sentido de dar resolutividade às situações, significa
comprometer-se com o usuário e suas necessidades.
Na outra categoria para análise aparece a família como um fator relevante a ser considerado
ao se lidar com saúde mental. Presente na metade das falas, a questão familiar do portador de
transtornos psíquicos é muito relevante na hora de se tratar das necessidades a serem
resolvidas.
Segundo Melman (2002), a doença significa mais do que um conjunto de sintomas. Possui
outras representações de ordem simbólica, moral, social ou psicológica para o doente e a
família. A família demonstra necessidade de conhecimento sobre a doença, de seus sintomas e
efeitos, passando a enfrentar a doença com mais segurança e menos sofrimento. Venetikides
et al. (2001) diz que o maior desafio deste modo de oferecer o cuidado é o de desenvolver
tanto na equipe quanto na família, uma aliança terapêutica que promova ajuda mútua no
enfrentamento dos problemas trazidos pela situação/sofrimento.
172
Não se pode desvincular o indivíduo do meio em que vive, uma vez que a família, como grupo,
previne, tolera e corrige problemas de saúde. Desse modo, não se pode separar a doença e o
sofrimento do contexto familiar e por ser um elemento tão imprescindível, a família deve ser
compreendida como uma aliada da equipe de saúde para o usuário adquirir confiança e, assim,
investir em seu projeto terapêutico. Assim, parece ser difícil cuidar da família do ser portador
de doença mental, sem ter uma compreensão prévia do significado de vivenciar esta doença.
Nos serviços de saúde e estratégias em Saúde Mental, a família deve ser considerada como
fator indispensável no sentido de cuidar e atender estes usuários em suas necessidades.
A quinta categoria que se formou para discussão foi a questão da formação de grupos de
saúde mental nas unidades de saúde. Têm-se duas situações: a primeira é a tentativa e a
proposta por parte de duas enfermeiras de ESF de fazer em seus locais de atuação, grupos de
saúde mental. A segunda situação é o relato da enfermeira “C” que já teve na unidade de
saúde o grupo, porém sem sucesso. Quando essa profissional relata da dificuldade dos
usuários em se adaptarem ao grupo com a fala: “a gente percebeu que eles são bem difíceis de
se adaptarem ao grupo, de participar” percebe-se uma falta de entusiasmo e preparo em lidar
com tais situações.
A criação de novas formas de intervenção sobre a doença mental está em consonância com os
pressupostos da Reforma Psiquiátrica Brasileira, contrapondo-se aos princípios do paradigma
da psiquiatria clássica. Barros et al. (2001) propõem a forma de pensar o trabalho em grupo
em saúde mental, compreendendo como dispositivos que têm condições de habitar um
regime de enunciação, no qual as atividades clínico-terapêuticas e as oficinas produtivas
formem um espaço indissociável de mútuo engendramento, onde a dimensão de cidadania e
política estejam presentes.
Um grupo de socialização poderia dar conta dos problemas de comunicação, exclusão e
estigmatização vivenciados por estas pessoas. Dessa forma, o espaço seria um meio utilizado
para estimular o exercício da comunicação, possibilitando o estabelecimento de vínculos e a
reinserção social desses indivíduos. Muito mais do que espaços propícios e falta de recursos
disponíveis na atenção primária de saúde, faz-se necessário a idéia de trabalhos de ordem
grupal em saúde mental. Assim, não é dever dos freqüentadores dos serviços em sofrimento
mental “se adaptarem ao grupo”. Este sentimento deve, sim, ser vivenciado pelos dos
profissionais em relação aos usuários.
A última categoria a ser analisada neste eixo é o acompanhamento dos usuários em saúde
mental através da visita domiciliar e o trabalho com os ACS. Tal ação só pôde ser visualizada
em unidades com ESF, uma vez que é uma das propostas da Estratégia. As enfermeiras
demonstraram muita confiança no trabalho do agente de saúde, e até, em alguns momentos,
uma certa dependência desse trabalho. Parece haver, efetivamente, uma aposta no trabalho
em equipe, assim como a percepção de que a ação multiprofissional integrada qualifica o
cuidado.
173
5.3.3 – ITINERÁRIO TERAPÊUTICO DO USUÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNOS PSÍQUICOS: PERCORRENDO BARREIRAS NA INTEGRAÇÃO ENTRE PROFISSIONAIS
E SERVIÇOS
O próximo eixo a ser analisado é quanto ao fluxo percorrido pelo usuário de saúde mental para
ter sua necessidade atendida. Faz-se um paralelo entre os diálogos com os enfermeiros acerca
deste itinerário.
Quadro 5.3 - Itinerário terapêutico percorrido pelo usuário portador de transtornos
psíquicos
CATEGORIA SEM ESF COM ESF
FLUXO NA REDE DE APOIO
“E se a coisa for muito grave a gente encaminha para o pronto atendimento. Pra psicólogo a gente tem encaminhado o adulto pra UCS e a criança a gente deixa numa lista de espera para o CAIS mental. (...) se ele precisar de um psiquiatra, nós vamos marcar via central de marcação de consulta...” (Enf. A) “Se o paciente procura a atenção básica, ele vai passar pela consulta médica, e ele vai ser encaminhado ou para o CAIS mental ou para os CAPS, que são os atendimentos pra esse tipo de transtornos. Aí nós fazemos a marcação pra essa consulta.” (Enf. B) “... Se é uma urgência, vai para o Pronto Atendimento (...). Se é uma coisa mais leve, passa com o clínico geral (...) aquele que chega com alguma urgência, a gente tem o Pronto Atendimento, ou acesso direto lá com o CAIS mental (...). Se são consultas comuns a gente encaminha pra clínica de convergência” (Enf. C)
“A gente conta com os serviços de apoio, os serviços externos. Nós temos os CAPS, nós temos a psiquiatria...” (Enf. D) “... a rede de assistência a saúde mental que temos: os CAPS, a clínica de convergência, o atendimento psiquiátrico. (...) Pode ser que ele precise de uma desintoxicação. Aí se encaminha para os devidos lugares, os CAPS. Às vezes se encaminha também para o PA 24h. Dependendo da situação, tem que acionar o conselho tutelar junto.” (Enf. E) “Aquele que está em casa tendo um surto, eu não vou dizer para o familiar trazer aqui na UBS. É outro fluxo que a gente faz. Junto com o SAMU, junto com a Brigada Militar, com o PA 24h. Então tu vai ligar pro PA, vai descrever a situação... entramos também em contato com o CAIS mental pra agendar consultas com o médico psiquiatra (...). O fluxo dos outros pacientes que já estão vinculados aos CAPS a gente liga pra lá e re-agenda. O paciente que vem do hospital já vai ser encaminhado pro CAPS. A gente então só reforça pra que eles vão” (Enf. F)
FLUXO NA UBS “... quem está na recepção vai atendendo e vai resolvendo o problema do usuário, tá? Se ela percebe qualquer coisa ela passa ou para mim, que sou a enfermeira e coordenadora da unidade, ou para a assistente social. Se a assistente social não está, a gente marca um horário.” (Enf. A)
“Se é uma situação que tu pode administrar que tu pode ir conversando, daí a gente passa para nosso clínico. Passa pra assistente social fazer uma orientação também.” (Enf. F)
Fonte: Stuani, 2010.
174
Observa-se nas falas trazidas pelos enfermeiros, tanto nos que atuam em unidades com ESF
como naqueles sem a Estratégia, que eles têm conhecimento do fluxo institucionalizado pelo
Município, percorrido pelo usuário de saúde mental na rede. É evidente que as falas trazem
um apelo grande aos encaminhamentos feitos. Estes encaminhamentos parecem ser, por
vezes, rígidos. A noção de referência, ou seja, o encaminhamento ao setor “referência” na
rede de apoio é resgatado. Além disso, não se observa a volta deste usuário ao serviço
primário de atenção, ou seja, não se tem uma “contra-referência” deste paciente, explícitas
nas falas. A marca do itinerário parece ser barreiras e obstáculos para o percurso do usuário.
São necessários novos fluxos e novas possibilidades de vinculação de usuários nas várias portas
de entrada do “sistema” de saúde e, mais do que isso, uma reconceitualização do que seja
“serviço de referencia”. Então, muitas vezes, a “referência” de que o paciente necessita é um
atendimento ambulatorial vinculante, que dê conta de suas necessidades atuais. Cecílio (2001)
defende que é necessário pensar o “sistema” de saúde menos como “pirâmide” de serviços
racionalmente organizados de forma hierarquizada e mais como uma rede com múltiplas
entradas, múltiplos fluxos. Para cuja construção as representações e necessidades individuais
são muito importantes. Há um desafio substantivo de articulação entre serviços, para que
operem em malha de cuidados progressivos.
Nesta mesma linha de pensamento e ampliando a perspectiva de organização, alguns autores,
como Ceccim et al. (2005) propõem a radicalização das propostas de gestão democrática, no
sentido de privilegiar o cuidado e a construção da integralidade na saúde como direito de
cidadania, devendo o setor público garanti-los. Estes autores rompem, então, com a proposta
de hierarquização tradicional de redes baseadas na disponibilidade de tecnologias duras e
leve-duras e visualizam a rede numa perspectiva circular, com múltiplas entradas, conforme
necessidades dos usuários, onde se asseguram todas as possibilidades de satisfação das
necessidades por meio do desenho de fluxos, conformando uma “malha de cuidados
ininterruptos”, organizados de forma progressiva.
Em uma rede como malha não há maior e menor, anterior e posterior, início e fim. O que
existe é o tramado, só há meio “entre nós”, ligação e conexões. (Ceccim et al, 2005) Tenta-se,
por fim, romper com a lógica hierarquizada de “esferas de governo” e “níveis de atenção” e
introduz-se a necessidades de “pactos coletivos”. Nesses pactos renovados periodicamente,
gestores e trabalhadores de saúde se comprometem, através de seus processos de trabalho,
como o desenvolvimento de uma malha de cuidados ininterruptos.
Cecílio (2001), ainda vai chamar de “integralidade ampliada” a articulação em rede,
institucional, intencional, processual que, tendo como epicentro cada serviço de saúde, se
articulam em fluxo e circuitos, a partir das necessidades reais das pessoas – a integralidade no
“micro” refletida no “macro”; pensar a organização do “macro” que resulte em maior
possibilidade de integralidade no “micro”. Ou seja, deve-se ter em mente que cada pessoa,
com suas múltiplas e singulares necessidades, seja sempre o foco, o objeto, a razão de ser de
cada serviço de saúde e do “sistema” de saúde.
Ao final, os enfermeiros devem ter noção de que são partes integrantes desse processo de
cuidado do paciente. No percurso percorrido pelo usuário, muito mais do que fluxos e
sistemas institucionalizados, é consideravelmente fundamental o papel e o empenho de cada
profissional de saúde, em especial dos enfermeiros, no engajamento e no comprometimento
com suas necessidades e suas histórias de vida. A postura pessoal pode mudar as práticas de
175
saúde coletiva, de um modo especial, dos usuários em sofrimento mental, que, muitas vezes,
percorrem pelos mais variados serviços de saúde, sem ter suas necessidades atendidas.
5.3.4 – CONCEPÇÃO DE INTEGRALIDADE: MOTIVAÇÕES PARA O CUIDADO
Tem-se a seguir as principais falas dos enfermeiros que remetem às concepções de
integralidade.Na primeira categoria que se formou para análise, tem-se a idéia de
integralidade com foco no sujeito. Observa-se que quatro enfermeiros, dois de cada coluna,
pontuaram a questão do usuário e suas necessidades como conceito de integralidade. É
notável nas manifestações, um apelo à visão holística do ser, não concebendo o sujeito em
partes, atendendo a pessoa como um todo.
Quadro 5.4: Concepção de Integralidade pelos enfermeiros
CATEGORIA SEM ESF COM ESF
INTEGRALIDADE RELACIONADA AO SUJEITO
“... tem que ver o paciente como um todo. Ele na sua forma integral. Não só a parte física, mas a psíquica, emocional. Até a questão às vezes espiritual. Tem que apoiar, orientar...a integralidade entra toda a questão familiar, de relacionamento, sabe?”(Enf. A) “É ver como um todo. Que não são só medicação que eles usam, o médico que eles vão... que eles têm outras necessidades. A gente, as vezes, tem que entender eles numa forma geral, que não é só aquele estado psíquico deles.” (Enf. C)
“É ver esse usuário como um ser que tem várias necessidades e poder interagir com elas.” (Enf. D) “Você precisa ver esse usuário como um ser que está inserido numa comunidade, numa sociedade. (...) Tu tem que olhar para ele e não para a doença dele.” (Enf. D) “É atender o paciente no seu todo, sabe, verificar todas as necessidades do paciente e tentar resolver, solucionar seus problemas, principalmente os mais pontuais. Não seccionar as coisas.” (Enf. F) “Tu não pode ver aquele paciente da saúde mental só com transtorno mental. Ele pode ter outras necessidades que tu vai ter que atender. E junto com esse tratamento verificar outras necessidades que ele possa ter.” (Enf. F)
INTEGRALIDADE ENTRE OS SERVIÇOS
“Os serviços têm que ter um mínimo de elo entre eles para que o paciente, ou o usuário ou o serviço ocorra de modo adequado. Que haja uma conexão entre os serviços e entre os profissionais para que um problema seja resolvido.” (Enf. B)
“A integralidade tem que nortear tudo que temos que ofertar para ele em termos de atendimento, de serviços.” (Enf. D)
Fonte: Stuani, 2010.
De acordo com Boff (2004), holismo não significa a soma das partes, mas a captação da
totalidade orgânica, una e diversa em suas partes, sempre articuladas entre si, dentro da
totalidade e constituindo esta totalidade. Entende-se por holismo, então, a visão abrangente
do ser humano, ou seja, considerando-o um ser composto de corpo, mente e espírito
176
integrados e interdependentes, e não apenas uma máquina formada de peças e partes, como
no discurso da biomedicina. A fala da enfermeira “A” ilustra bem esta definição: “... não é só a
parte física, mas a psíquica, emocional. Até a questão, às vezes, espiritual. Tem que apoiar
orientar...”.
A questão da integralidade voltada para a pessoa é defendida por Mattos (2001). Segundo o
autor, a postura do profissional que se recusa a reconhecer que todo paciente que busca seu
auxílio é bem mais do que um aparelho ou sistema biológico com lesões e disfunções, e que se
nega a fazer qualquer coisa a mais além de tentar, com os recursos tecnológicos disponíveis,
silenciar o sofrimento supostamente provocado por aquela lesão ou disfunção, é
absolutamente inaceitável. Assim, não é possível que os profissionais de saúde se detenham
apenas nas manifestações expressas pelos usuários. A capacidade de um profissional que se
depara com algum sofrimento manifestado verbalmente do usuário e consegue aproveitar o
encontro e a ocasião para instigar fatores de risco para outras doenças ou sofrimentos que não
estejam sendo expressos no momento, ilustra um dos sentidos de integralidade voltado para o
sujeito.
A noção de integralidade voltada à pessoa deve ser percebida como um conjunto de noções
pertinentes a uma assistência livre de reducionismo, com uma visão abrangente do ser
humano, tratando não somente como seres doentes, mas como pessoas dotadas de
sentimentos, desejos e aflições. Então, ao tratar dos pacientes que procuram os serviços de
saúde em sofrimento psíquico, o enfermeiro deve ter em mente que as ações e práticas não se
reduzem apenas na tentativa de abolir o sofrimento gerado por uma doença, ou à perspectiva
de evitar tal sofrimento. Há a necessidade, sim, de buscar compreender o conjunto de ações e
de serviços de saúde que este usuário necessita para ter suas necessidades visualizadas e
atendidas como um todo.
A segunda categoria para análise, relacionado ao conceito de integralidade por parte dos
profissionais enfermeiros, refere-se à integralidade entre os serviços. Esta noção de relação
entre os serviços de saúde está presente em dois diálogos com as enfermeiras. Estas falas
revelam a necessidade de co-relação entre os níveis de assistências para garantir o cuidado
dos pacientes em transtornos psíquicos.
De acordo com Pinho (2006), integralidade é também ter acesso a todos os níveis de
complexidade, ter acesso à tecnologia necessária naquele dado momento, independente de
qual. A tecnologia deve relacionar-se ao cuidado propriamente dito, ao vínculo, à escuta, ao
acolhimento, ao saber científico, às clínicas médicas, aos equipamentos e exames modernos
que trabalham com precisão. A fala da enfermeira “D” retrata claramente isso: “A
integralidade tem que nortear tudo que temos que ofertar para ele em termos de
atendimento, de serviços, né". Se por um lado o avanço tecnológico tem trazido mais rapidez e
precisão a exames e equipamentos e cura para algumas doenças, por outro lado levou ao
afastamento entre o profissional de saúde e o usuário, o que vem interferir no alcance da
integralidade. Então, a tecnologia deve se aproximar do cuidado do ser humano como um
todo.
Mattos (2001) defende que haja uma certa “horizontalizarão” dos programas de saúde
anteriormente tidos como verticais. Para o autor, por exemplo, parece inadmissível que um
homem diabético, com tuberculose e hérnia inguinal tenha que dar entrada em três pontos
distintos do sistema de saúde para ter encaminhada a resolução de seus problemas. Assim, as
unidades deveriam pensar suas práticas sobre o horizonte da população que é atendida, com
177
suas necessidades e não no ponto de vista da inserção específica num ou outro programa pré-
estabelecido.
Alves (2001) trabalha com a idéia de que a integralidade voltada à organização dos serviços
lida necessariamente com os seguintes conceitos: inclusão, exclusão, seleção e cobertura. Para
exemplificar seu ponto de vista, o autor cita o caso do paciente que é psicótico e, além disso,
está em cadeira de rodas. Este, conseqüentemente não tem possibilidade de acompanhar os
diversos programas existentes nos ambulatórios porque, em geral, esses ambientes têm
escadas ou não têm banheiros adaptados, pois, afinal, é um serviço para psicótico. A idéia de
seleção e exclusão é clara. Se de um lado, inclui-se o usuário num programa de saúde devido a
uma necessidade apresentada, de outro, pratica-se exclusão, em função das demais
necessidades que este possa apresentar.
Os serviços de saúde devem estar organizados para realizar uma apreensão das necessidades
da população que atendem. Não é aceitável que estes serviços estejam exclusivamente
organizados para responder às doenças de uma população. A integralidade se apresenta como
um modo de organizar os serviços, sempre aberto, a assimilar uma necessidade não
contemplada na organização anteriormente dada.
Assim, a integralidade emerge como um princípio de organização contínua do processo de
trabalho nos serviços de saúde, que se caracterizaria pela busca também contínua de ampliar
as possibilidades de identificação das necessidades de certo grupo populacional.
Ao final, conclui-se que há diversas formas de conceber a integralidade nas ações e políticas de
saúde, uma vez que não se tem um conceito definitivo para o termo, conforme debate
resgatado pelos autores no referencial (pág.15). Os enfermeiros, ao longo dos diálogos,
trouxeram dois sentidos para a integralidade: uma focalizada no sujeito e outra nas relações
entre os serviços. As motivações de cuidado com base na integralidade mostram grande
capacidade de qualificar a atenção às pessoas e mobilizar os processos de trabalho na direção
das políticas de saúde atuais.
5.3.5 - PERCEPÇÃO SOBRE O ATENDIMENTO INTEGRAL ÀS NECESSIDADES DOS USUÁRIOS PORTADORES DE TRANSTORNOS PSÍQUICOS
No último eixo de análise, forma-se um quadro com os principais fragmentos de diálogos dos
enfermeiros acerca do atendimento integral às necessidades dos usuários portadores de
transtornos psíquicos, num todo. Deu-se a divisão em duas categorias: não atende as
necessidades e atende parcialmente as necessidades.
178
Quadro 5.5: Percepção sobre o atendimento integral às necessidades dos usuários
portadores de transtornos psíquicos
CATEGORIA SEM ESF COM ESF
NÃO ATENDE AS NECESSIDADES
“Eu acho que nós ainda estamos muito falhos. A gente ainda não dá a atenção necessária para a pessoa.” (Enf. A) “Às vezes tu não dá conta das necessidades que eles trazem. Porque tu tem um fluxo na rede e tu tem que obedecer este fluxo. (...) Porque nós não temos urgência para acessar o serviço, por exemplo o CAIS mental, clínica de convergência...nem para marcar via central de marcações de consultas.” (Enf. A) “Eu acho que o caminho da saúde está indo a passos curtos. O paciente teria que ter um suporte psicológico, ele teria que ter um suporte psiquiátrico, ele teria que ter, uma ajuda de outros profissionais e de outros setores pra ter sua necessidade mais realizada.” (Enf. B) “Eu acho que a gente está iniciando uma caminhada na parte da saúde mental. (...) Parece que eu sozinha não consigo. Parece que a gente sempre precisa de um suporte. E talvez esse suporte esteja em falta pra nós na rede básica, sabe. E falta uma via pra essa integralidade que a gente falou antes. Vai lá o médico atende, prescreve uma medicação cada vez mais pesada. E às vezes não é isso que a pessoa precisa. Ela precisa de uma conversa, uma terapia, de uma coisa diferente nesse sentido. E isso a gente não tá atendendo. Com toda certeza. Eu acho que eles não têm nenhum suporte nesse sentido.” (Enf. C)
“O atendimento ainda é muito fragmentado. É basicamente visado na consulta e na medicação.” (Enf. D) “Nossa realidade está um pouco assim, focado na doença. Aí se forma um centro de consultas, que oferece a consulta e a medicação.” (Enf. D) “A gente tenta auxiliar, mas, assim, tem diversos problemas que as pessoas ficam com problemas de mais difícil solução, principalmente a drogadição com crack. Aí se fica amarrado.” (Enf. E) “O que nos faltaria aqui seria ou uma maior capacitação nossa, né.” (Enf. E) “O paciente que só freqüenta o especialista, que troca sua receita a cada seis meses, que não se vincula a nada, a nenhum serviço, a nenhuma oficina, a nenhum grupo, eu acho que ele não tem sua necessidade resolvida. Ele só tem o uso da medicação... as outras necessidades, principalmente, assim, na área social, eu acho que não são atendidas. (Enf. F)
ATENDE PARCIALMENTE AS NECESSIDADES
“Se atende mais é a questão da necessidade do momento, da emergência né. Mas na integralidade, em todas suas necessidades não se consegue.” (Enf. A) “Os encaminhamentos até se dão. Mas dependendo do tipo de encaminhamento é um pouco demorado também.” (Enf. A) “Na realidade ele não tem todas suas necessidades atendidas. Ele pode ter sua necessidade atendida numa primeira abordagem.” (Enf.B) “Eles têm talvez o suporte da urgência pra onde você manda, do SAMU, da consulta, ou de conseguir a receita.” (Enf. C)
“Tem alguma coisa que já se conseguiu, mas ainda é muito pouco (...). Tem que ampliar os outros serviços. Eu vejo que os serviços de CAPS são muito bons para esses usuários. Então eu acho que o CAPS é uma metodologia de atendimento ideal. E que deveria ser ampliado na nossa rede.” (Enf. D) “Eu acho que o paciente que vai para o CAPS Cidadania, é um paciente que está muito bem atendido em todos os seus aspectos (...). Aquele que está vinculado, que participa, que consegue fazer alguma atividade extra-domicilio, eu acho que eles são mais bem atendidos.” (Enf. F)
Fonte: Stuani, 2010.
179
Na primeira categoria as enfermeiras trazem falas que remetem ao não atendimento integral
dos usuários que procuram os serviços de saúde e sofrem de transtornos psíquicos. Em todas
as profissionais foi observado expressões de que o atendimento que se tem não é o ideal e
que ainda falta muito a ser trabalhado no campo de saúde mental. Nesse sentido, não há
diferença substancial entre os profissionais que atuam com a ESF daqueles que trabalham sem
a Estratégia. Foi notado, nas entrevistas, demonstrações de que há um despreparo, tanto a
nível institucional, de rede como a nível individual, de formação.
Algumas observações se fazem necessárias. A enfermeira “A” traz a expressão: “estamos
muito falhos” remetendo a um sentido de que há erros e faltas. Enquanto isso a enfermeira
“D” traz uma fala mais amadurecida: “ainda é muito fragmentado”. Esta noção de
fragmentação remete a um despreparo em nível de organização. Esta mesma enfermeira ainda
completa o sentido dizendo que “forma-se um centro de consultas, que oferece consulta e
medicação”. Carvalho et al (2008) dizem que existe uma certa impessoalidade, tendo a visão
restrita do paciente e a despersonalização dos atendimentos, o que limita o paciente a um
diagnóstico ou a um número de prontuário e gera uma fragmentação do atendimento, a
tecnificação dos atos e a superespecialização, em detrimento das relações humanas. Então,
deve-se evitar essa impessoalidade dos atendimentos. Os usuários não podem ser concebidos
e, às vezes, até identificados como “aquele da Saúde Mental”. Há a necessidade, sim, de uma
maior aproximação nas relações com estas pessoas que procuram e que necessitam do
atendimento dito humanizado.
Outro ponto a ser considerado é a falta de suporte oferecido aos serviços de Atenção Básica
para tratar da saúde mental dos seus usuários. A enfermeira “C” é muito pontual na sua fala
em relação a isso: “Parece que eu sozinha não consigo. Parece que a gente sempre precisa de
um suporte. E talvez esse suporte esteja em falta pra nós na rede básica, sabe.” A enfermeira
“E” também reforça esta idéia: “O que nos faltaria aqui seria ou uma maior capacitação
nossa.” Casé (2001) afirma que a ausência do oferecimento de políticas municipais de saúde
mental, e também a falta de treinamento para as equipes, poderá levar esta demanda ao
atendimento terciário (internação hospitalar nos manicômios). Esta solução restringe a
liberdade de ir e vir das pessoas portadoras de transtornos mentais e se apresenta contra a
reforma psiquiátrica, que visa o atendimento na comunidade. Assim, muito deve ser feito no
sentido de evitar os encaminhamentos aos níveis “especializados” de atenção. É evidente que
deve haver uma maior capacitação dos profissionais a nível primário de atenção em relação
aos portadores de transtornos psíquicos. Estes profissionais devem se sentir preparados e
capacitados para atender as necessidades destas pessoas.
Num segundo momento, puderam-se identificar algumas falas das enfermeiras que denotam
para um atendimento parcial das necessidades. Foi observado, porém, diferenças nas
percepções das profissionais que atuam nos serviços sem ESF daquelas que estão inseridas em
locais com a Estratégia. Enquanto as primeiras concebem como “facilidade” aquela primeira
abordagem, ou seja, o atendimento de emergência, de Pronto Atendimento, as segundas
demonstram uma evolução e vêem a proposta dos CAPS como sendo uma estratégia a ser
seguida e ampliada no município. Entretanto todas são unânimes em dizer que os usuários
portadores de transtornos psíquicos não têm suas necessidades atendidas num todo.
Em relação ao atendimento de emergência em saúde mental os autores Stuart e Laraia (2001)
dizem que a intervenção na crise é uma estratégia de cuidado breve, com tempo limitado e
focalizado. Deste modo, o propósito dessa ação não é fazer uma terapia em profundidade,
180
mas resolver imediatamente uma situação crítica, impedindo a sua progressão para evitar
danos maiores ao paciente e às demais pessoas envolvidas. Às vezes estes atendimentos se
fazem necessários, porém não podem ser o foco. Assim sendo, o atendimento de urgência e
emergência não pode ser o que de melhor podemos oferecer aos usuários de saúde mental.
Qualquer serviço de saúde que se focalize nesse tipo de abordagem, contraria os princípios da
Reforma Psiquiátrica. Deve haver outras maneiras de se lidar com as situações. Quanto mais se
puderem resolver as situações a nível primário, melhor será o vínculo deste usuário com o
serviço.
Um aspecto relevante citado nas entrevistas pelas enfermeiras de ESF é o papel dos CAPS do
tratamento dos portadores de transtornos psíquicos. De acordo com Onoko-Campos et al.
(2006), os CAPS se configuram como serviços comunitários ambulatoriais e regionalizados nos
quais os pacientes deverão receber consultas médicas, atendimentos terapêuticos individuais
e/ou grupais, podendo participar de ateliês abertos, de atividades lúdicas e recreativas
promovidas pelos profissionais do serviço, de maneira mais ou menos intensiva e articuladas
em torno de um projeto terapêutico individualizado, voltado para o tratamento e a
reabilitação psicossocial. Devem também haver iniciativas extensivas aos familiares e às
questões de ordem social presentes no cotidiano dos usuários. A enfermeira “F” ao relatar
que: “aquele que está vinculado, que participa e que consegue fazer alguma atividade extra-
domicilio, eu acho que eles são mais bem atendidos”, consegue perceber os benefícios desses
Centros.
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2004), orienta ainda que estes serviços devem ser substitutivos
e não complementares ao hospital psiquiátrico. Então os CAPS não devem servir de apoio ao
tratamento, mas devem, sim, ser o modelo de assistência a ser prestado, em substituição ao
sistema hospitalar. A enfermeira “D”, ao dizer: “o CAPS é uma metodologia de atendimento
ideal” percebe a importância desta proposta no tratamento desses usuários.
Assim, a idéia da formação dos CAPS deve ser ampliada na rede de apoio ao portador de
transtornos mentais. A enfermeira “D” traz em sua fala que o atendimento e a quantidade dos
centros “deveria ser ampliado na nossa rede”. Isso demanda que ainda há muito a ser
planejado e executado em ralação aos serviços de saúde mental. Somente com a idéia de (re)
inserção destas pessoas no convívio familiar e social será possível pensar em prestar um
cuidado humanizado e talvez dar traços à dita integralidade nas políticas e ações em Saúde
Mental.
Os resultados e a análise dos mesmos permitem algumas discussões. Na questão de
identificação do usuário em sofrimento psíquico, deve-se dar mais atenção à linguagem não
verbal destas pessoas, além da criação de vínculo destas com os serviços de saúde. O papel
integrador do ACS deve ser ressaltado. Houve, também, ao longo dos diálogos, um grande
apelo aos encaminhamentos para os serviços de referências, o que demonstra a necessidade
de uma horizontalização das políticas de saúde. Não se tem uma definição única e definitiva
para integralidade. Muito há de se debater em relação aos sentidos e concepções do termo, de
forma a tornar ideais as práticas de saúde. Convém salientar que os dados denunciam a
premência de uma maior formação e capacitação dos profissionais da Atenção Básica acerca
da Saúde Mental. Deve-se ter em mente a noção de Apoio Matricial na resolução dos
problemas destes usuários. Visualiza-se a proposta dos CAPS como tratamento ideal às
pessoas com doenças psíquicas, em substituição ao modelo manicomial. Por fim, percebe-se
que os princípios da ESF muito tem a ajudar, no sentido de tornar integral a abordagem da
Saúde Mental na Atenção Básica.
181
5.4 – É POSSÍVEL A INTEGRALIDADE DA ATENÇÃO SEM A INTEGRAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE? DESAFIOS PARA A GESTÃO LOCORREGIONAL
No itinerário da pesquisa sobre modelagens tecnoassistenciais na saúde suplementar, com
vistas à análise da incorporação de linhas de cuidado, foi questão recorrente a articulação
entre o sistema público de serviços de saúde e a saúde suplementar. Nas análises mais gerais,
os dados da PNAD/IBGE e da AMS/IBGE ilustravam o mix assistencial de forma inconteste, para
além das análises de configuração mais ideológica que preenchem certa linha de produção de
conhecimentos e que ocupam parcela da disseminação científica no campo da Saúde Coletiva.
Nos estudos de campo, a hibridização dos itinerários assistenciais também chamou a atenção
dos pesquisadores pelo depoimento dos beneficiários, assim como certa construção
argumentativa verificada em diretores de operadoras e veículos de mídia, parte dela já
relatada e analisada em pesquisa anterior como evidência de uma política de interfaces
setorial (Ferla & Cols., 2009a).
Assim, optou-se pela escuta da gestão locorregional do sistema de saúde, uma vez que a
descentralização da gestão é uma dimensão estratégica e uma diretriz da organização do
sistema nacional. A construção cognitiva que se pretendeu fazer buscou fugir da idéia já
constituída nas análises prévias que parte de uma dicotomia de base ideológica entre o público
e o privado, uma vez que se a busca de evidências já assume de antemão esse filtro a
identificação de pontos de divergência entre os dois subsistemas é achado, de certa forma,
que já pertence à dimensão tautológica da pesquisa. Nesse momento da gestão da pesquisa,
assumiu-se que o mix público e privado nos itinerários assistenciais constituía-se num
marcador analítico da incorporação das linhas de cuidado e, portanto, capaz de revelar outras
evidências para a análise pretendida que não fossem redundância das formulações prévias.
Foram entrevistados 12 gestores locorregionais que atuam num Colegiado de Gestão Regional
(COGERE) da Região Centro do Estado do Rio Grande do Sul. O COGERE, como se sabe, é um
dispositivo estratégico previsto no Pacto pela Saúde para a consolidação da regionalização do
sistema de saúde no país. Essas entrevistas aconteceram no escopo da pesquisa que embasou
a dissertação de mestrado de Sueli Barrios (2009) sobre a gestão regional e a organização de
redes de cuidado.
O primeiro achado da análise das pesquisas é que o mix público e privado nos sistemas
locorregionais é percebido pelos gestores, mas não como um problema predominantemente
ideológico, como nas análises acadêmicas, mas pragmático, que pertence ao cotidiano dos
gestores, dos usuários e dos profissionais; portanto, que constitui o sistema de saúde e desafia
os gestores. Nessa condição, apresenta texturas bastante interessantes para a análise das
modelagens tecnoassistenciais e, particularmente, para o desenho de propostas de gestão do
cuidado mais embasadas na idéia da integralidade. Parte das opiniões expressas pelos gestores
recolocam a dualidade dos sistemas, como bem caracterizada na literatura, mas esses registros
não compõem o escopo da análise que se apresenta neste relatório. Buscou-se, ao contrário,
sistematizar idéias que tivessem a capacidade de inovar o contexto da análise, surpreendendo
182
o pensamento sobre essa questão. As categorias empíricas nas quais foram sistematizadas as
opiniões, que seguem na construção do texto, priorizaram idéias que procuram criar outros
focos de compreensão e atuação no cenário da gestão na saúde.
Um primeiro plano da caracterização dessa questão se refere à indisponibilidade de
informações confiáveis sobre a saúde suplementar para subsidiar o planejamento e a gestão
dos sistemas locorregionais. Os gestores do Sistema Único de Saúde referem a falta de dados
confiáveis sobre atendimentos realizados por planos e seguros privados de saúde para
estabelecer parâmetros mais próximos às necessidades da população. Como se sabe, o
planejamento na saúde, particularmente em relação à assistência, é constituído por
indicadores de séries históricas de consumo de procedimentos no componente público e é a
partir desses dados que são feitas projeções de consumo e que se desenha a regionalização da
assistência. A ausência de dados sobre os procedimentos consumidos na saúde suplementar
impede a qualificação desses parâmetros e, mesmo, a variação de cobertura e de padrões de
consumo fazem com que os beneficiários de planos e seguros privados de saúde sejam uma
parcela desconhecida, mas presente, nos sistemas locorregionais de saúde. Também é
apontado pelos gestores a inexistência e a necessidade de dados de capacidade instalada e
produção de procedimentos nos serviços vinculados aos subsistemas público e privado de
serviços para fortalecer a regulação pública, conforme determina a Constituição. A
reivindicação de dados de melhor qualidade explicita uma posição positiva de gestão da
assistência vinculada a esse componente do sistema nacional de saúde que, embora também
marcada por uma certa idéia de antagonismo, é fortemente constituída pela idéia de
complementaridade: há usos objetivamente dos serviços do subsistema público por
beneficiários de planos e, por outro lado, o melhor conhecimento dos padrões de consumo e
de capacidade instalada poderia contribuir para aumentar a capacidade sistêmica de gestão
sobre os serviços, independentemente de onde se exerce essa gestão. O exemplo do uso mais
racional de equipamentos e tecnologias com maior densidade tecnológica é usado
freqüentemente para ilustrar as vantagens de maior integração entre os serviços vinculados a
planos e seguros privados de saúde e os serviços do sistema público.
Como se vê, a idéia de complementaridade entre os componentes do sistema de serviços faz
forte referência a um sistema único em termos de gestão, o que desloca, inclusive, a
compreensão da gestão como ação institucional localizada em certos espaços instituídos e a
coloca como força de regulação do sistema. O segundo plano de caracterização da perspectiva
dos gestores locorregionais do mix público e privado provavelmente explique melhor essa
formulação. Ele se refere especificamente à articulação entre ações de cuidado para ampliar e
otimizar a oferta de serviços. Segundo os gestores, o segmento da saúde suplementar é uma
“caixa preta” para os gestores locorregionais, seja em relação à regulação com base nas
políticas para o setor, seja em relação à microrregulação. Para esses atores, a rede
hierarquizada e regionalizada incluiria os serviços privados, sejam vinculados ao sistema
público, sejam vinculados aos planos e seguros privados de saúde. A organização de redes de
cuidado também inclui a ação dos profissionais, que resistem à regulação do trabalho e as
interfaces com planos e seguros privados de saúde operam como “válvulas de escape”, sendo
recomendável, na sua perspectiva, ações combinadas de microrregulação do trabalho. Assim,
os usuários de planos e seguros privados de saúde geram demandas ao sistema público de
serviços, sem que este consiga planejar e regular essas demandas, principalmente sob a
perspectiva do cuidado integral e essa lacuna alcança um poder de disfuncionar também o
componente público, na medida em que certas “forças” de regulação prática das ações e
serviços, atuariam igualmente na saúde suplementar e na saúde pública. O exemplo mais
utilizado é a regulação que fazem os profissionais médicos de agendas de especialistas com
183
menor oferta e, mesmo, de procedimentos de apoio diagnóstico e terapêutico com menor
disponibilidade locorregional. Essa pressão corporativa agiria igualmente sobre dirigentes de
ambos os componentes do sistema de saúde e atingiria parte dos usuários de ambos que não
dispõe de recursos para complementar os custos definidos pelos próprios profissionais e/ou
serviços a que estejam vinculados.
Nessa perspectiva, a construção argumentativa dos gestores parece apontar a necessidade do
fortalecimento da capacidade locorregional de regulação das ações e serviços de saúde,
compreendida como a capacidade de modulação das ofertas assistenciais em resposta às
necessidades de saúde de pessoas em um determinado território. Para os sujeitos, o
planejamento de ações em rede progressiva de cuidados incluiria interfaces com o conjunto
das ações e dos serviços num determinado território e essa é uma responsabilidade dos
gestores do sistema de saúde. A regulação da incorporação de tecnologias e a vigilância sobre
os serviços, embasadas na integralidade do cuidado, pressupõem capacidade da gestão do
sistema locorregional de saúde. A gestão financeira da saúde deve incluir o conhecimento da
realidade do sistema locorregional de saúde, assim como a articulação de fontes, sendo o
custeio do sistema suplementar de serviços uma variável estratégica, tendo em vista o
imaginário social que se constitui sobre esse componente, em particular em relação a parcelas
dos trabalhadores em saúde. Os exemplos para ilustrar essa construção giram em torno de
problemas nos fluxos assistenciais, em particular no acesso a ações com maior densidade
tecnológica e menor oferta, que geram desassistência para usuários do sistema público e
também para os beneficiários de planos e seguros privados de saúde, como indica parte do
mix público e privado nos itinerários assistenciais desses indivíduos. Os exames de apoio ao
diagnóstico são utilizados como exemplo da baixa integração entre os componentes do
sistema de saúde que geram demoras demasiadas, algumas vezes irreversíveis, para o cuidado.
Além disso, nos itinerários que absorvem combinações público/privado, os fluxos de
referenciamento são informais ou inexistentes, gerando sobrecargas no sistema como um
todo e déficits de qualidade na atenção.
A gestão do trabalho e da educação parece estar indicada nessa construção como
potencialidades para o fortalecimento dos sistemas locorregionais e da integralidade da
atenção em contextos de maior articulação entre os componentes público e suplementar do
sistema de serviços de saúde. Os “ruídos” nos itinerários de cuidado dos usuários aparecem
como como dispositivos de educação permanente de profissionais e serviços de ambos os
componentes do sistema de serviços.
Para os sujeitos participantes da pesquisa, a responsabilidade da gestão do sistema de saúde,
que inclui um protagonismo forte na regulação do sistema de serviços de saúde, é atribuição
de secretários de saúde e deve ser operacionalizada, em parte, por meio dos mecanismos
existentes de planejamento, controle e avaliação. Daí a primeira aproximação referir-se à
disponibilidade e qualidade das informações disponíveis sobre a saúde suplementar.
Entretanto, parte dessa responsabilidade é exercida por meio da negociação, no cotidiano do
território, “por quem conhece a realidade do município”, como afirmou um dos gestores. Essa
parece ser, ainda, uma alternativa pouco explorada pelas políticas de qualificação da saúde
suplementar implementadas pela ANS. Nesse curto período de existência da Agência, marcado
por inequívocos avanços na defesa dos interesses dos usuários e na organização dos serviços, a
184
diretriz constitucional de descentralização, assim como a de participação social, parecem ainda
pouco exploradas como dispositivos de avançar na direção da integralidade da atenção.
O cuidado integral, que é objetivo de modelagens tecnoassistenciais por linhas de cuidado,
parece mesmo menos embasado na natureza jurídica dos serviços. Em que pese a dimensão
micropolítica das práticas de gestão e de atenção ser mobilizada por interesses e imaginários
que se articulam com a institucionalidade e com as articulações de poder associadas à defesa
de corporações profissionais e de serviços, o pertencimento institucional diz pouco das
práticas cuidadoras que se estabelecem ou não no seu interior, da qualidade e da intensidade
das redes que articulam diferentes ações e serviços, do comprometimento com a qualidade do
andar a vida dos usuários sob cuidado, da busca de maior autonomia para o usuário e seu
grupo social, do vínculo e da resolutividade com que profissionais e serviços se envolvem com
o usuário.
O mérito da abordagem feita com os gestores foi o de abrir o pensamento, mais do que
contribuir com a pretensão de domínio sobre o tema. Ela, por certo, reivindica mais esforços
de pesquisa e da gestão, mais tem a potencialidade de fortalecer a idéia de que o mix no
itinerário assistencial é, antes de uma dualidade, um marcador qualificado do cuidado
oferecido e da ainda baixa capacidade de gestão “sistêmica” das instituições governamentais.
185
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ANEXOS
204
ANEXO 1: PARECER CEP
205
206
ANEXO 2: QUESTIONÁRIO PARA DIRIGENTES DAS OPERADORAS
Operadoras médicas
Dados de identificação da operadora Nome da operadora: Cidade / UF: Classificação: Nome e cargo do interlocutor: Responsável técnico:
Modelo de regulação da utilização
1) Quais os mecanismos de regulação dos serviços assistenciais para utilização dos seus serviços assistenciais? ( ) Autorização prévia (utilização dos serviços assistenciais condicionada à autorização) ( ) Porta de entrada (ex.: médico generalista) ( ) Direcionamento (utilização direcionada de prestador) ( ) Hierarquização da Rede (encaminhamento por grau de complexidade) ( ) Co-participação (parte efetivamente paga pelo consumidor referente à realização do procedimento) ( ) Fator moderador ( )Franquia (valor estabelecido no contrato até o qual a operadora não tem responsabilidade de cobertura) ( ) Não pratica ( ) Outros Quais? ___________________________________________________ 2) A operadora possui Central de Atendimento ao Cliente (Call Center, 0800)? ( ) Sim ( ) Não 3) Vocês se associam a alguma administradora de plano para realizar procedimentos administrativos? ( ) Não ( ) Sim Especificar________________________________________________ 4) Há associação com capital estrangeiro? ( ) Não ( ) Sim Especificar________________________________________________ 5) Numere de 1 a 4 os critérios utilizados para o credenciamento dos prestadores empresariais: ( ) Disponibilidade do profissional no mercado ( ) Reputação no mercado ( ) Grau de especialização ( ) Necessidade de diferentes produtos pela operadora ( ) Indicações pessoais ( ) Outros Especificar________________________________________________ 6) Numere de 1 a 4 os critérios utilizados para o credenciamento dos prestadores empresariais: ( ) Disponibilidade do serviço no mercado ( ) Preço ( ) Reputação no mercado ( ) Incorporação de tecnologia ( ) Necessidade de diferenciação dos produtos em função dos diferentes tipos de planos ( ) Outros Especificar________________________________________________
207
7) Numere de 1 a 5, em ordem de prioridade, os critérios que o atendente usa para referenciar os beneficiários para os prestadores: ( ) Escolha do beneficiário ( ) Localização geográfica ( ) Tipo de plano ( ) Custo do prestador ( ) Gravidade do problema ( ) Encaminhamento por outro profissional ( ) Prestador de maior procura pelos beneficiários ( ) Outro Citar_____________________________________________________ 8) Em situações de Urgência e Emergência, a operadora utiliza algum mecanismo de regulação dessa utilização? ( ) Sim Qual?____________________________________________________ ( ) Não 9) A operadora possui algum instrumento (manual de normas e procedimentos, material publicitário) para informar como os beneficiários devem proceder nos atendimentos de consultas, realização de exames, internações e urgência/emergência? ( ) Manual de normas ( ) Manual de procedimentos ( ) Site/internet ( ) Call Center ( ) Outros Quais?___________________________________________________ 10) A operadora faz acompanhamento de alguns grupos de patologias (case management), e/ou de beneficiários, como medida da regulação da utilização dos serviços assistenciais? ( ) Não ( ) Sim Especifique os grupos de patologias:___________________________ 11) Em caso afirmativo, como é feito esse acompanhamento?_________________ 12) Como se dá o acesso aos exames de investigação fetal (ultra-som, Doppler, cardiotocografia fetal)? ( ) Liberação conforme solicitação médica ( ) Autorização prévia ( ) Liberação conforme protocolo ( ) Co-pagamento ( ) Outros Especificar_______________________________________________ 13) Existe necessidade de autorização prévia para a internação do recém-nascido para o CTI neonatal? ( ) Sim ( ) Não 14) Para a utilização de UTI neonatal: ( ) O RN pode utilizar o código da mãe ( ) É feito um código provisório para o RN ( ) Não há necessidade de utilização de código, o uso de serviço é automático nesses casos ( ) Há necessidade de co-pagamento conforme o número de dias de internação na UTI ( ) Outro Especificar________________________________________________ 15) Para a realização de ressonância nuclear magnética, o beneficiário necessita de : ( ) Liberação conforme solicitação médica ( ) Autorização prévia ( ) Co-pagamento ( ) Protocolo
208
( ) Auditoria médica ( ) Outro Especificar________________________________________________ 16) Definida pelo médico a necessidade de internação em urgência cardiológica, qual o fluxo para a sua obtenção junto à rede hospitalar? ( ) O próprio beneficiário busca o hospital ( ) O médico interna o beneficiário no hospital geral de sua escolha ( ) Autorização prévia ( ) Outra Especificar________________________________________________ 17) A operadora estabelece algum critério específico para cirurgias eletivas? ( ) Não ( ) Sim Especificar________________________________________________ 18) Os protocolos clínicos são utilizados? ( ) Sim ( ) Não 19) Caso existam protocolos, estes se referem a: ( pode ser marcada mais de uma opção) ( ) Orientação da conduta médica ( ) Definição do tipo de procedimentos autorizados ( ) Definição do número de procedimentos autorizados ( ) Definição do fluxo/referenciamento do beneficiário ( ) Outro Especificar________________________________________________ 20) Se é necessário um procedimento que não consta do protocolo clínico, ou se excede o número previsto pelo mesmo, a conduta adotada é: ( ) Não Autorização ( ) Autorização prévia ( ) Autorização após análise do médico auditor ( ) Co-pagamento ( ) Outro Especificar________________________________________________ 21) Existem divergências (médicas, administrativas e financeiras) com os prestadores, em relação aos procedimentos realizados? ( ) Sim ( ) Não 22) Em caso afirmativo, quais são as causas mais freqüentes? ( ) Volume de procedimentos que ultrapassa o limite estabelecido ( ) Procedimentos fora do protocolo ou da cobertura do plano ( ) Ausência de autorização prévia da operadora ( ) Teto financeiro ( ) Outro Especificar________________________________________________ 23) Existe sistema de informação na operadora? ( ) Sim ( ) Não 24)Caso exista, qual o tipo? ( ) Cadastro da clientela ( ) Prontuário eletrônico ( ) Cartão de saúde ( ) Registros epidemiológicos ( ) Outro Especificar________________________________________________
209
Modelo de Gerenciamento do Cuidado
25) Os serviços assistenciais do segmento ambulatorial são oferecidos através de: ( ) Rede própria ( ) Rede credenciada ( ) Livre escolha 26) Os serviços assistenciais do segmento hospitalar são oferecidos através de: ( ) Rede própria ( ) Rede credenciada ( ) Livre escolha 27) O apoio diagnóstico terapêutico é do tipo: ( ) Rede própria ( ) Rede credenciada ( ) Livre escolha 28) Existe acompanhamento das gestantes de alto risco? ( ) Sim, existe protocolo para orientação e encaminhamento ( ) Não, a conduta é do médico assistente Exemplificar: _________________________________________________________ 29) A operadora oferta leito de UTI à gestante de alto risco em caso de necessidade? ( ) Sim ( ) Não 30) Como é feita a internação do recém-nascido em UTI neonatal, quando necessário? ( ) A equipe do hospital onde nasceu o recém-nascido faz o contato diretamente com o CTI de referência e define pela internação e transferência ( ) A equipe do hospital onde nasceu o recém-nascido faz o contato com a operadora, que define pela internação 31) No caso de beneficiário atendido em serviços de emergência cardiológica, existe algum mecanismo de identificação e controle desse beneficiário, visando ao seu acompanhamento futuro? ( ) Não ( ) Sim Em caso afirmativo, como é realizado?__________________________________ 32 Existe procedimento de acompanhamento para grupos especiais visando práticas de promoção/prevenção à saúde? ( ) Sim ( ) Não 33) Caso exista, assinale quais os grupos: ( ) Oncologia ( ) Idosos ( ) Hipertensão arterial ( ) Adolescentes ( ) Pré-natal ( ) Puericultura ( ) Diabetes ( ) Outros Especificar________________________________________________ 34) Que outros benefícios, além da cobertura mínima obrigatória da Lei 9.656, a operadora oferece? ( ) Hospital/dia para atividades de atenção ao paciente mental ( ) Programa de assistência farmacêutica
210
( ) Assistência domiciliar ( ) Transporte pré-hospitalar ( ) Transporte aéreo ( ) Cobertura em viagem internacional ( ) Outros Especificar________________________________________________ 35) Existe programa de benefício farmacêutico? ( ) Sim ( ) Não 36) Em caso afirmativo, esse se dá por: ( ) Aquisição em rede própria ( ) Reembolso total ( ) Reembolso parcial ( ) Desconto em farmácia credenciada ( ) Aquisição a preço de custo 37) Existe algum programa de monitoramento da assistência farmacêutica? ( ) Sim ( ) Não 38) Em caso afirmativo, marque a alternativa que melhor se adéqua: ( ) Orientação e monitoramento do uso ( ) Software que monitora a interação medicamentosa ( ) Outros Especificar________________________________________________ 39) No caso de participação do beneficiário no custeio do medicamento, como este se dá? ( ) Até 20% ( ) De 21% a 40% ( ) Acima de 40% 40) Com quais tipos de informações a empresa trabalha: ( ) Cadastro da clientela ( ) Sistema de custos ( ) Prontuário eletrônico ( ) Sistema de informações gerenciais ( ) Cartão de saúde ( ) Registros epidemiológicos ( ) Outros Especificar________________________________________________ 41) Existe algum mecanismo de comunicação ou contato da operadora com o beneficiário? ( ) Sim ( ) Não 42) Em caso afirmativo, esse contato se dá através de: ( ) Ouvidoria ( ) Serviço de atendimento telefônico ( ) Boletim informativo ( ) Assembléia geral de beneficiários ( ) Envio de extrato de utilização ( ) Pesquisa de satisfação dos usuários ( ) Conselhos ( ) Outros Especificar_______________________________________________ 43) A operadora exige controle externo periódico de qualidade do laboratório? ( ) Sim ( ) Não
211
44) Em caso afirmativo, citar quais os indicadores de qualidade mais freqüentemente valorizados pela operadora. 45) Quais as políticas que a sua operadora tem para regular a qualidade dos serviços prestados? 46)Quais as políticas desenvolvidas pela operadora para o promoção à saúde? 47) Quais os mecanismos de regulação junto aos médicos que solicitam exames acima da média? 48)Quais são as principais prestadoras? ENTREVISTA COMPLEMENTAR – OPERADORAS:
I Nivel diretivo geral
Questões
1- Como é a estrutura organizacional da operadora?
2- Quais os planos de saúde ofertados?
3- O senhor avalia que a partir dos serviços oferecidos nos planos de saúde se tem conseguido alcançar a integralidade na assistência?
4- Quais os mecanismos utilizados para a introdução e agregação de novas tecnologias e procedimentos?
5- Quais as formas de avaliação da eficácia de agregação de novas tecnologias?
6- Qual a interface com o SUS? É possível articular parcerias?
7- O que leva os usuários dos planos de saúde da operadora a procurarem o SUS? Existem casos dessa natureza na sua operadora?
8- Quais as mudanças que o processo de regulamentação do setor pela Lei nº 9.656/98 acarretou na operadora?
II- Gerência de Regulação
Questões
1- Como é a estrutura organizacional da sua área de responsabilidade e quais os objetivos?
2- Como são negociados os preços dos serviços pela operadora (medicamentos, materiais, diárias e cirurgias eletivas)?
3- Como são feitas as autorizações para consultas, procedimentos diagnósticos e terapêuticos e internações? E os procedimentos/exames de alto custo?
4- Quais os mecanismos de regulação dos prestadores próprios e contratados?
5- Quais os mecanismos de regulação junto aos médicos e odontólogos que solicitam exames ou outros procedimentos acima da média?
6- Como está organizado o sistema de auditoria médica e odontológica?
7- Como está organizado o Call Center? Qual a interface que possui com a área de regulação?
8- Os protocolos clínicos são utilizados como orientação da operadora? Com quais objetivos?
212
9- Quais as políticas que a operadora possui para regular a qualidade dos serviços prestados? Por exemplo, no caso do laboratório, a operadora exige periodicamente o controle externo de qualidade?
10- O senhor avalia que a partir dos serviços oferecidos nos planos de saúde se tem conseguido alcançar a integralidade na assistência?
11- Quanto aos usuários, existem formas de estes regularem ativamente os serviços contratados?
12- Existem muitos casos de ressarcimento ao SUS?
13- Que mudanças o processo de regulamentação do setor (Lei nº 9.656/ 98) acarretou para a operadora?
III- Gerência Assistencial ou Promoção à Saúde
Questões
1- Como é a estrutura organizacional da sua área de responsabilidade e quais os objetivos?
2- Que produtos a sua gerência oferta?
3- Quais os critérios para organização da rede (preocupação com garantia da oferta a todas as faixas etárias, apoio diagnóstico/terapêutico e os diversos recursos tecnológicos existentes)? Plano odontológico só empresarial dental e a partir de 50 segurados? E para indivíduos e famílias?
4- Solicitar uma caracterização qualitativa e quantitativa da rede assistencial. Limites para utilização do reembolso.
5- Quais as políticas e as atividades de promoção à saúde da operadora, especialmente nas linhas de cuidado materno-infantil, cardiovascular e odontológica?
6- Os protocolos clínicos são utilizados como orientação da operadora? Com quais objetivos?
7- Como vocês definem pela introdução de novas tecnologias e procedimentos? Existe avaliação da eficácia de agregação destas?
8- Quais as políticas que a operadora possui para regular a qualidade dos serviços prestados? Por exemplo, no caso do laboratório, a operadora exige periodicamente o controle externo de qualidade?
9- O senhor avalia que a partir dos serviços oferecidos nos planos de saúde se tem conseguido alcançar a integralidade na assistência?
10- Qual a interface com o SUS? É possível articular parcerias?
11- O que leva os usuários dos planos de saúde da operadora a procurarem o SUS? Existem casos dessa natureza na operadora?
12- Quais as formas de avaliação da satisfação dos usuários dos planos de saúde? Existem reclamações? De que natureza?
13- Que mudanças o processo de regulamentação do setor (Lei nº 9.656/ 98) acarretou para a operadora?
Nome do entrevistador: Local: Data:
ANEXO 3: QUESTIONÁRIO PARA PRESTADORES
Instrumento de Coleta de Dados
Prestador Hospitalar Dados de Identificação: Nome do Prestador: Endereço: Telefone: e-mail: CNPJ/CPF: Caracterização do hospital: [ ]Geral [ ]Maternidade [ ]Cardiológico Cidade / UF: Responsável Técnico: Modelo de regulação da utilização: 1) O prestador pertence à rede própria ou é credenciado pela operadora?
� Rede própria � Credenciado � Especificar a quais operadoras está credenciado:
2) O hospital já foi cadastrado no Cadastro Nacional de Estabelecimentos?
� Sim � Não 3) Este serviço é credenciado ao SUS?
� Sim � Não 4) Número total de leitos do hospital: _____________________________________________________ 5) Número de leitos por especialidade:
� Obstétricos e ginecológicos _____________________ � Clínica _____________________ � Pediatria _____________________ � Cirurgia _____________________ � CTI _____________________ � Outros _____________________
6) Número de leitos credenciados pelo SUS: ____________________________________________ 7) Número de leitos contratados ou credenciados pelas operadoras: ________ 8) Quais serviços são ofertados para apoio à internação?
� Interconsultas � Serviços de Apoio Diagnóstico e Terapia � Centro Cirúrgico � CTI ou similar � Hemodinâmica � Hemoterapia � Hemodiálise � Quimioterapia � Radioterapia � Centro Obstétrico � Neonatologia
214
� Hospital/dia � Outros Especificar_____________________________________________
9) O acesso às internações ocorre através de:
� Encaminhamento do médico de outros serviços da operadora � Encaminhamento do médico do próprio hospital � Encaminhamento realizado pela própria operadora � Outro Especificar ____________________________________________
10) Qual o procedimento para proceder à internação eletiva?
� O hospital solicita autorização prévia � O usuário traz da operadora a autorização para internação
11) Para internação de urgência, o hospital solicita autorização prévia?
� Sim � Não 12) Existe pagamento de internação por “pacote”?
� Sim � Não 13) Em caso afirmativo, em qual procedimento?
� Parto normal � Parto cesáreo � Angioplastia � Outros Especificar _______________________________________
14) Nos casos de urgência e impossibilidade de autorização prévia da operadora (atendimentos realizados à noite, nos fins de semana e feriados), qual o mecanismo utilizado para garantir a internação?
� Há necessidade de autorização prévia, portanto não se atende; � Há facilidade de acesso, inclusive nos fins de semana e feriados, exceto para os procedimentos de média e alta complexidade que possuem regras específicas de autorização � Não necessita de autorização prévia � Outros Especificar___________________________________________
15) Necessita de algum tipo de autorização da operadora para uso do suporte diagnóstico necessário ao atendimento de urgência/emergência?
� Sim � Não Em que situações?___________________________________________ 16) A transferência do paciente internado para leito de CTI ocorre através de:
� Liberação conforme solicitação do médico assistente � Autorização prévia da operadora � Outro Especificar_____________________________________________
17) O acesso ao leito de CTI em outro prestador ocorre através:
� De indicação do médico, que faz o contato, define pela internação e transferência para o CTI � Da operadora que define a internação � Outro Especificar _______________________________________________
18) Há algum tipo de solicitação prevista para assistência de cuidados intensivos?
� Sim � Não 19) Caso exista, especifique:
� Protocolo definindo critérios para atendimento � Renovação de autorização para permanência no CTI
215
� Outro Especificar____________________________________________ 20) Quando o paciente tem indicação cirúrgica eletiva, a autorização para a realização da cirurgia ocorre através de:
� Liberação conforme solicitação do médico assistente � Autorização prévia da operadora � Outro Especificar___________________________________________________
21) Indicada a cirurgia eletiva (por exemplo, a histerectomia), é possível a sua realização em quanto tempo?
� Até 7 dias � 7 a 15 dias � Mais de 15 dias por necessidade de agendamento prévio do bloco ou espera da autorização da operadora � Outro Especificar______________________________________________
22) Como ocorre o acesso às vagas hospitalares para o atendimento ao parto?
� Encaminhamento do obstetra que acompanha a gestante no pré-natal com guia previamente autorizada � Encaminhamento pela operadora ao serviço de especialidade � É responsabilidade do beneficiário a busca de vagas disponíveis na rede própria ou credenciada � Existe uma central de vagas na operadora que providencia a vaga � Outro Especificar______________________________________________
23) Existe planejamento do acesso da gestante de alto risco aos leitos de CTI?
� Sim, é possível planejar com antecedência na rede própria/credenciada. � Não é possível garantir o acesso com antecedência, pois as vagas são utilizadas em função da disponibilidade do momento � Outro. Especificar___________________________________________________
24) O acesso à internação do recém-nascido em UTI neonatal ocorre através de:
� Liberação conforme solicitação do médico assistente � Autorização prévia da operadora � Outro Especificar____________________________________________________
25) O acesso à internação do recém-nascido em UTI neonatal de outro prestador ocorre através:
� Da indicação do médico, que faz o contato, define pela internação e transferência para o CTI � Da operadora que define a internação � Outro Especificar________________________________________________
26) Definida pelo médico a necessidade de internação em urgência cardiológica, qual o fluxo para a sua obtenção junto à rede hospitalar?
� O beneficiário busca um hospital credenciado � O médico interna o beneficiário no hospital de sua escolha � Indica o hospital credenciado � Outro Especificar_________________________________________________
27) Como ocorre o acesso para o uso de stents?
� Liberação conforme solicitação do médico assistente � Autorização prévia da operadora � Outros Especificar_____________________________________________________
28) A liberação da cirurgia de revascularização e implantação de stent ocorre através de:
� Indicação do médico assistente
216
� Protocolo de sociedade médica de cirurgia vascular � Protocolo próprio Especificar______________________________________
29) Como se dá a autorização para a utilização de prótese ortopédica de materiais importados nacionalizados (por exemplo, cabeça de fêmur)?
� Protocolo � Indicação médica � Autorização mediante auditoria � Não há cobertura
217
ANEXO 4: ROTEIRO DE ENTREVISTA DA LINHA DE CUIDADO: SAÚDE MENTAL
A) USUÁRIO/FAMILIAR:
1) Dados de identificação
Qual o problema de saúde que lhe fez procurar atendimento: Idade: Sexo: Local de entrevista: Escolaridade: Profissão / ocupação: Renda familiar: Capacidade Civil:
2) Como e quando começou o seu problema de saúde?
3) Descreva o que aconteceu desde que o problema começou.
1- O que você fez desde que o problema, ou situação que precisasse de cuidados de
saúde, começou?
2- Que recursos/ serviços ou opiniões/ orientações você procurou e/ou recebeu
(incluir serviços profissionais públicos ou privados, ambulatórios ou hospitais
procurados; religiosos curandeiros, ou outros; pessoas amigas ou familiares)
6- Qual foi o local em que você se sentiu melhor cuidado?
7- Quais são as pessoas de referência que você conta quando não está bem?
3- Como você teve acesso a esses serviços? (descrever os procedimentos realizados, do
tipo marcação de consulta, conversa com profissionais e/ou outras pessoas, ministério
público, etc.)
4- Houve necessidade de pagar para receber todo ou parte do atendimento? (lembrar
medicamentos, pagamentos “por fora” etc.,. lembrar de investigar se usuário ou não
de plano e seguro privado, quando utilizou um e outro e qual a opinião sobre o
atendimento recebido em uma e outra situação.
5- Além dos serviços de saúde, você acessou outros recursos para resolver o seu
problema (benzedeiras, rezadeiras, candomblé, igreja, etc.)?
4) Atualmente em que serviço de saúde você é acompanhado?
218
a) Como você é atendido? (recepção, acolhimento...).
b) Descreva a terapêutica que foi recomendada e se você a seguiu ou não e por quê?
5) O que falta no serviço de saúde para o seu cuidado.
6) Impressões do entrevistador (como foi o acesso aos serviços que você necessitou, foi fácil,
difícil? Percepção da qualidade técnica do cuidado, percepção vinculo/longitudinalidade,
percepção da resolutividade).
B) GESTORES, PROFISSIONAIS, REPRESENTANTES MINISTÉRIO PÚBLICO E CONTROLE SOCIAL.
1) Dados de identificação
Idade:
Escolaridade:
Profissão:
Função: ( ) Controle Social ( ) Ministério Público ( ) Gestor ( ) Profissionais
2) O que você entende por Saúde Mental?
3) Descreva a assistência à saúde em saúde mental no município( público e privado ): Enfocar
o acesso, linhas de cuidado, qualidade da assistência, nós críticos, política municipal x política
nacional; serviços ofertados; vínculo/longitudinalidade; resolutividade; satisfação dos usuários;
4) Elenque pontos fortes e fracos da assistência em saúde mental e quais as ações e resultados
decorrentes destes.
5) Como você (a partir da sua experiência) avalia a assistência em saúde mental. Justificar a
resposta.
6) Impressões do entrevistador. (conhecimento da assistência em saúde mental, acesso aos
serviços, Percepção da qualidade técnica do cuidado, percepção vinculo/longitudinalidade,
percepção da resolutividade)
219
ANEXO 5: ROTEIRO DE ENTREVISTA DA LINHA DE CUIDADO: MÃE-BEBÊ
A) USUÁRIAS:
1 ) Dados de identificação
Idade: Local de entrevista: Escolaridade: Profissão / ocupação: Renda familiar: Estado Civil: Problemas de saúde: Filhos: Pré-natal: ( ) baixo risco ( ) alto risco
2 ) Como e quando você descobriu que estava grávida?
3) Descreva o que aconteceu desde este momento até após o nascimento:
- Que serviços procurou; quais profissionais lhe atenderam; recebeu informações/orientações
( públicos ou privados, ambulatórios ou hospitais procurados; contato com religiosos,
curandeiros, ou outros; pessoas amigas ou familiares)
- Qual foi o local em que você se sentiu melhor cuidada?
- Quais são as pessoas de referência que você procura para esclarecimentos, conversar e
quando não está se sentindo bem?
- Como você teve acesso a esses serviços? (descrever os procedimentos realizados, exames, o
tipo marcação de consulta, conversa com profissionais e/ou outras pessoas, ministério público,
intercorrências, etc)
- Houve necessidade de pagar para receber todo ou parte do atendimento? (lembrar
medicamentos, pagamentos “por fora” etc.,. lembrar de investigar se usuário ou não de plano
e seguro privado, quando utilizou um e outro e qual a opinião sobre o atendimento recebido
em uma e outra situação.
4 ) Atualmente em que serviço de saúde você é acompanhado?
220
a) Como você é atendido? (recepção, acolhimento...).
b) Descreva a conduta que foi recomendada e se você a seguiu ou não e por quê?
5 ) O que falta no serviço de saúde para o seu cuidado.
6) Destaque momentos que marcaram sua gestação. Comente sobre suas expectativas iniciais
até este momento.
7) Durante o pré-natal houve momentos de orientação quanto às modificações ocorridas
durante a gestação; escolha do tipo e local do parto; direito de ter acompanhante no
momento do nascimento; cuidados com o bebê; aleitamento materno, etc
8) Como foi o momento do nascimento: acesso, profissionais que atenderam; tipo de parto,
local, presença ou não do acompanhante; teve intercorrências.
9) Como foi o retorno do hospital (orientações e consulta no puerpério).
10) Impressões do entrevistador (como foi o acesso aos serviços que você necessitou, foi fácil,
difícil? Percepção da qualidade técnica do cuidado, percepção vinculo/longitudinalidade,
percepção da resolutividade)
B) GESTORES, PROFISSIONAIS, REPRESENTANTES MINISTÉRIO PÚBLICO E CONTROLE SOCIAL.
1) Dados de identificação
Idade:
Escolaridade:
Profissão / ocupação:
Função/categoria:
2) Descreva a assistência à saúde na área materno-infantil no município (público e privado):
Enfocar o acesso, linhas de cuidado, qualidade da assistência, nós críticos, política municipal x
política nacional; serviços ofertados; vínculo/longitudinalidade; resolutividade; satisfação dos
usuários;
221
3) Elenque pontos fortes e fracos da assistência na área materno-infantil e quais as ações e
resultados decorrentes destes.
4) Como você avalia a assistência na área materno-infantil. Justificar a resposta.
5) Impressões do entrevistador (conhecimento da assistência na área materno-infantil, acesso
aos serviços, Percepção da qualidade técnica do cuidado, percepção vínculo/longitudinalidade,
percepção da resolutividade).
222
ANEXO 6: FORMULÁRIO DE ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO DO PROJETO
Formulário do Coordenador
IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO:
Coordenador: Alcindo Antônio Ferla
Título:
Incorporação da tecnologia de linhas de cuidado na Saúde
Suplementar: análise multicêntrica de experiências no ciclo mãe-
bebê e em saúde mental nas Regiões Norte e Sul do Brasil a
partir de marcadores selecionados
Processo (nº no formato 999999/9999-9): Processo nº 402690/2007-9
Instituição Executora:
Universidade de Caxias do Sul / Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (Obs.: projeto desenvolvido em rede
multicêntrica, com mudança na vinculação institucional do
coordenador durante a vigência do projeto)
Vigência do Projeto: 24 meses
Data liberação recursos (dd/mm/aaaa): 27/02/2008
Nº do Edital (xx/2005): Edital MCT‐CNPq/ANS n° 25/2007
EXECUÇÃO DO PROJETO:
1. Ocorreu alteração dos objetivos propostos/aprovados? ( ) SIM (X) NÃO
1.1. Caso SIM, comentar:
223
2. Quais os objetivos propostos e os objetivos alcançados?
2.1. Justifique
Os objetivos do projeto foram alcançados.
Objetivo Geral:
Identificar e analisar tecnologias de cuidado em saúde ao ciclo mãe-bebê e em saúde mental na saúde
suplementar nas Regiões Norte e Sul do Brasil, a partir da tecnologia de linhas de cuidado.
Objetivos específicos:
a) Identificar e analisar as ofertas de cuidado de diferentes operadoras no ciclo mãe-bebê e na saúde
mental, particularmente no que se refere à assistência farmacêutica, à atenção domiciliar e à promoção e
prevenção.
b) Analisar eventos significativos de políticas de cuidado nas trajetórias assistenciais concretas de
indivíduos vinculados a planos e seguros privados de saúde de diferentes modalidades em ambas as
regiões.
c) Caracterizar interfaces entre os componentes público e privado do sistema de saúde na atenção ao ciclo
mãe-bebê e na saúde mental.
d) Construir padrões de oferta e de itinerários em diferentes modalidades de planos e seguros e nas
diferentes regiões em estudo.
e) Desenvolver tecnologia de análise e acompanhamento da incorporação da tecnologia de linhas de
cuidado na Saúde Suplementar, incluindo indicadores de interface entre os componentes público e
privado do sistema de saúde.
3. Indique a taxa percentual (0 –100) de sucesso do projeto (objetivos alcançados/objetivos propostos) em relação ao cronograma da proposta:
3.1. Justifique
Os objetivos propostos foram alcançados plenamente, entretanto, com atraso no cronograma. Estima-se uma taxa de 90% de objetivos alcançados no prazo de vigência do projeto. Inicialmente, mudanças institucionais, inclusive do Coordenador do Projeto, alteraram as condições previstas no plano original, implicando na reorganização de estratégias de pesquisa e de institucionalização do projeto. Na seqüência, as normas institucionais das diferentes organizações envolvidas obrigaram a rever estratégias e o ordenamento das etapas. Na segunda metade da execução, constatou-se uma divergência de prazos entre o cronograma aprovado e a vigência contratada, que alterou as estratégias de execução. Por fim, o tempo de maturação de teses e dissertações, que transcende o período de vigência do projeto, posterga a visibilização de parte da produção de conhecimentos realizada. Não incluso na relação objetivos e cronograma, a prestação de contas, considerando os fluxos das diferentes instituições – no caso dos equipamentos – trouxe um atraso adicional.
4. Houve interação com outra (as) instituição(ões)? (X) SIM ( ) NÃO
4.1. Estava previsto inicialmente no projeto? (X) SIM ( ) NÃO
4.1.1. Caso SIM, Indique as instituições participantes e quais são os indicadores da cooperação (análise de material, publicações, apresentações em eventos científicos etc.):
224
Nome da Instituição: Indicador da Cooperação
Universidade de Caxias do Sul / Universidade Federal do Rio Grande do Sul Gestão do projeto e resultados em todas as fases
Universidade Federal do Pará Gestão do projeto na Região e resultados em todas as fases
Universidade Federal do Acre, Universidade Federal do Paraná, Universidade Federal de Santa Catarina, Grupo Hospitalar Conceição, Universidade Federal de Santa Maria, Hospital Universitário João de Barros Barreto, Secretaria de Estado da Saúde do Pará, Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul, Secretaria de Estado da Saúde do Acre, Universidade de Santa Cruz do Sul, Centro Universitário Metodista, Universidade Católica de Pelotas, Universidade Estadual do Pará, Fundação Oswaldo Cruz, Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul, Fundação Médica do Rio Grande do Sul, Hospital Universitário Betina Ferro, Cassi, Secretaria Municipal de Saúde de Novo Hamburgo, Secretaria Municipal de Saúde de Caxias do Sul, Rede Unida, ANS.
Análise do material, seminários e oficinas, apresentação em eventos, manutenção de ambiente na internet, cooperação técnica e operacional.
4.2. Como você avalia a qualidade da interação?
A qualidade da interação com a maior parte das instituições foi muito boa, incluindo a liberação de pesquisadores e apoiadores, a cooperação técnica e operacional para as diferentes fases e atividades da pesquisa, entre outras. Algumas mudanças de vínculo de pesquisadores e apoiadores da pesquisa e de direção institucional produziram atenuamento pontual ou definitivo na interação em algumas e a ativação da interação em outras.
5. As etapas previstas foram cumpridas? (X) SIM ( ) NÃO
5.1. Justifique
As etapas previstas foram integralmente cumpridas. Alguns resultados que ampliam as metas iniciais ainda estão
em fase de conclusão, como é o caso de dissertações de mestrado e teses de doutorado iniciadas e em andamento.
Há resultados não previstos inicialmente, como a inclusão do campo temático da saúde suplementar em disciplina
do curso de Bacharelado em Saúde Coletiva da UFRGS e a criação de estação Especializada em Saúde
Suplementar no Observatório de Tecnologias de Informação e Comunicação em Sistemas e Serviços de Saúde –
OTICSSS (www.otics.org).
6. Relacione os fatores positivos e negativos e como eles tem contribuído ou dificultado na execução do projeto:
Fatores positivos:
A aposta no trabalho em rede científica, que foi efetivada com ganhos de qualidade na pesquisa, com ampliação das condições de sustentabilidade da linha de pesquisa e com ampliação da abrangência prevista inicialmente.
O envolvimento das instituições parceiras e dos pesquisadores e colaboradores.
A adesão à pesquisa por parte de algumas operadoras, que facilitaram a pesquisa e permitiram a devolução dos dados em atividades com os trabalhadores da mesma.
O desafio do objeto em si, que mobiliza formulações científicas sob outras perspectivas há alguns anos mas que tem pouca produção em relação às políticas de cuidado.
A dinâmica dos Centros Colaboradores da ANS e a constituição prévia da rede científica nas regiões em estudo.
A formalização da cooperação em Centros Colaboradores, que agilizou os processos de instituicionalização da pesquisa em parte das instituições envolvidas.
O caráter interdisciplinar e interinstitucional da rede científica.
225
Fatores negativos:
A aposta no trabalho em rede científica, que desafiou intermitentemente a condução do projeto.
As mudanças de vínculo e de direção de pesquisadores e instituições da composição inicial da rede científica, que gerou descontinuidades e atrasos.
A inexistência de bolsas de pesquisa e apoio técnico no projeto, que dificultou a aderência ao cronograma e às atividades previstas inicialmente.
A distância física e o custo dos deslocamentos entre as bases da pesquisa e as instituições que compuseram a rede científica.
O desencontro entre o período de execução previsto no projeto e a vigência contratada do projeto que, descoberto somente no final do prazo, gerou certo transtorno no cumprimento do cronograma e requereu a solicitação de ampliação do prazo.
A recusa e/ou a demora de resposta por parte de algumas operadoras em participar da pesquisa.
As normas e fluxos institucionais de formalização do projeto e da pesquisa, não apenas nas instituições pesquisadas, mas também nas instituições de vínculo da equipe.
6.1. Indique as dificuldades observadas na execução do projeto SIM NÃO
6.1.1. Atraso na contratação do Projeto ( ) (X)
6.1.2. Atraso na indicação de bolsistas ( ) (X)
6.1.3. Necessidade de reestruturação de metas (X) ( )
6.1.4. Manutenção de equipamentos (X) ( )
6.1.5. Aquisição de material de consumo ( ) (X)
6.1.6. Atraso na liberação de recursos (X) ( )
6.1.7. Atraso na importação de equipamentos ( ) (X)
6.1.8 Evasão de pessoal técnico (X) ( )
6.1.9. Reestruturação orçamentária (X) ( )
6.1.10. Outras. Indique:
Mudanças de vínculo dos pesquisadores, inclusive do coordenador do projeto;
Mudanças na gestão das instituições envolvidas;
Indisponibilidade de dados e de sistemas de informação confiáveis;
Inexistência de bolsas de pesquisa para fixar pesquisadores e apoiadores no projeto e no cumprimento das metas;
Distância física entre as bases de pesquisa;
Custo de passagens aéreas para as atividades e para o encontro entre os pesquisadores;
Divergência no prazo de execução do projeto aprovado e na contratação, gerando efeito na finalização do projeto e solicitação de prorrogação de prazo de vigência.
Mudança relevante na regulamentação em relação à saúde suplementar efetivada no período da pesquisa, com impacto no objeto da pesquisa e demandando mudança nas estratégias previstas inicialmente.
7. Houve alteração na equipe inicial de pesquisadores/técnicos? (X) SIM ( ) NÃO
226
7.1. Caso SIM, quais os motivos e o que representou tal alteração em relação aos objetivos originais?
Como já se registrou, mudanças de vínculo institucional, inexistência de bolsas e mudanças nas direções e políticas institucionais para o ensino e a pesquisa alteraram a composição da equipe, vinculada predominantemente por adesão individual ao projeto. Não houve alteração em relação aos objetivos, apenas representaram dificuldade operacional para o alcance dos objetivos, reorganização das estratégias planejadas e, na fase final, em atraso na conclusão do projeto.
8. O projeto recebeu recursos de outras fontes? (X) SIM ( ) NÃO
8.1. Caso SIM, indicar as fontes:
Houve apoio de infra-estrutura, dispensa de horas de pesquisa e bolsas de iniciação científica e de mestrado nas instituições participantes, além de CAPES E CNPq.
EXECUÇÃO FINANCEIRA
Recursos Liberados (R$)
(9.999,99)
Data de Liberação
(dd/mm/aaaa)
Recursos Gastos (R$)
(9.999,99)
Saldo (R$)
(9.999,99)
Posição em:
(dd/mm/aaaa)
127.883,00 27/02/2008 127.447,94 435,06 30/07/2010
PERSPECTIVAS DE IMPACTO DO PROJETO
Avalie as perspectivas de impacto do projeto para cada um dos quesitos abaixo, dando notas de
1 (nenhuma contribuição) a 5 (alta contribuição). Marque NA quando o quesito não se aplicar
ao projeto
A – CIENTÍFICO NA 1 2 3 4 5
A.1- Geração de novos conhecimentos X
A.2- Geração de avanço/inovação experimental X
A.3-Geração de conhecimento passível de difusão X
A.4- Formação e capacitação de recursos humanos X
A.5- Formação de novos grupos e centros de pesquisa X
227
Justificativas:
Parte dos conhecimentos produzidos confirma estudos anteriores e os atualiza para as linhas de
cuidado em estudo;
Parte dos conhecimentos produzidos pode orientar a configuração das políticas de regulação
para o setor;
O conhecimento produzido é passível de disseminação, contando já com artigos e capítulos
encaminhados para publicação;
O projeto de pesquisa esteve articulado fortemente com programas de mestrado, especialização
e graduação;
A pesquisa fortaleceu a articulação entre a UFRGS e UFPA, criando uma linha de pesquisa no
Mestrado em Psicologia, além do fortalecimento institucional dos grupos de pesquisadores das
demais instituições.
B – TECNOLÓGICO NA 1 2 3 4 5
B.1- Geração de novas tecnologias X
B.2- Otimização de processos de produção X
B.3- Possibilidades de obtenção de patentes X
B.4- Agregação de vantagens competitivas ao setor X
B.5- Introdução de novos métodos de gestão tecnológica X
B.6- Transferência tecnológica para o setor X
Justificativas:
A pesquisa contribuiu com a qualificação de metodologias de pesquisa em saúde suplementar
já iniciadas em pesquisa anterior;
Os resultados da pesquisa podem contribuir com a qualificação dos processos de trabalho no
interior dos serviços e do subsistema de saúde suplementar;
NA;
A qualificação da atenção à saúde na direção da integralidade, conforme escopo da pesquisa, é
marcador de qualidade da atenção em planos e seguros privados de saúde, de acordo com os
resultados da pesquisa;
A gestão do cuidado na saúde suplementar, de forma específica, e na área mais geral, com base
em lógicas de integralidade tem contribuições importantes nos resultados da pesquisa em
termos de conhecimento e em termos de formação de trabalhadores e pesquisadores;
Parte dos resultados já foi apropriada por operadora na modalidade de autogestão, em
seminários realizados nas duas regiões; a cooperação com a ANS atravessou o projeto de
pesquisa e pretende se ampliar com a estratégia dos Centros Colaboradores.
228
C - SOBRE O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) NA 1 2 3 4 5
C.1- Subsidio ao aperfeiçoamento da Política Nacional de
Saúde X
C.2- Contribuição para a avaliação de Modelo de Atenção X
C.3- Apropriação/Incorporação dos resultados pelos Serviços X
C.4- Melhoria da Gestão, Organização e Qualidade dos
Serviços X
C.5- Redução da morbi-mortalidade relacionada ao agravo
estudado X
C.6- Redução dos custos de atendimento X
C.7- Aumento da cobertura dos Serviços X
C.8 Incorporação de tecnologias e novos processos de atenção X
C.9 Desenvolvimento e aplicação de protocolos clínicos X
C.10. Melhoria da relação Custo-efetividade de tecnologias X
Justificativas:
As contribuições da pesquisa em relação à integralidade na atenção e na gestão fortalecem as
diretrizes atuais e, portanto, tem potencial de aperfeiçoamento se houver maior interface entre
a produção de conhecimentos e a gestão.
Metodologias avaliativas em integralidade da atenção têm contribuições relevantes no desenho
metodológico da pesquisa e nas estratégias utilizadas;
Práticas de atenção, de gestão do cuidado e de avaliação têm potencial de absorção dos
conhecimentos produzidos, mas é necessário ampliar a interface entre a produção e
conhecimentos os serviços de saúde; parte dos resultados já foi objeto de atividades de ensino
com trabalhadores do SUS;
A melhoria da gestão, da organização dos serviços e da qualidade das ações é objeto direto da
pesquisa e a mesma apresenta sugestões e recomendações que permitem supor movimentos
nesse sentido;
A incorporação de linhas de cuidado permite supor melhoria nos indicadores de morbi-
mortalidade e, principalmente, na qualidade de vida dos usuários nos dois cilcos de cuidado;
NA. O estudo não enfocou a redução de custos e tampouco realizou análise econômica nos
serviços, embora seja possível supor que a otimização na hibridização entre os serviços
públicos e da saúde suplementar possa gerar redução de custos por procedimentos realizados
em duplicidade;
É possível supor que a incorporação de linhas de cuidado aumentem a cobertura dos serviços,
embora essa situação somente possa ser alcançada com outras mudanças na gestão, na oferta
de serviços e na regulação dos dois componentes do sistema de serviços de saúde, o que têm
algumas indicações na pesquisa;
A mudança de processos de atenção à saúde no ciclo mãe-bebê e em saúde mental está
indicada nos resultados da pesquisa em diferentes questões; a incorporação dessas indicações
parece demandar outras ações, para além da divulgação dos resultados;
A pesquisa apontou uma direção distinta da lógica de protocolos clínicos, mas entende-se que
229
os resultados possam contribuir para a qualificação no desenho dos protocolos e nas estratégias
para incorporação dos protocolos nos serviços;
A pesquisa não incluiu abordagens de natureza econômica, mas estima-se que os resultados
possam contribuir nessa direção pela qualificação do cuidado.
D - ECONÔMICO / SOCIAL NA 1 2 3 4 5
D.1- Melhoria da qualidade de vida da população X
D.2- Insumos para políticas públicas X
D.3- Redução das desigualdades sociais X
D.4- Redução das importações X
D.5- Agregação de valor a produtos e processos X
D.6- Geração de empregos X
D.7- Desenvolvimento regional X
Justificativas:
Sabe-se que a qualidade dos serviços tem efeitos na qualidade de vida da população e,
portanto, pode-se supor que os resultados da pesquisa e as metodologias desenvolvidas
contribuam parcialmente com esse objetivo;
A pesquisa pode contribuir para a análise de implantação das políticas e para o
monitoramento/avaliação das mesmas;
Considerando que as iniqüidades de acesso a serviços de saúde constituem-se em parte das
desigualdades sociais, os resultados da pesquisa geraram conhecimentos úteis para diminuir as
diferenças injustas de acesso aos serviços, em particular aos serviços de maior densidade
tecnológica nos serviços de saúde;
NA. Muito embora o desenvolvimento de tecnologias de integralidade na atenção seja
produção com mais ênfase no país;
Com base em dados da própria pesquisa e em outras fontes, é possível supor que o aumento da
integralidade na gestão e na organização da atenção é fator de valorização do cuidado;
A qualificação do cuidado no sentido das linhas de cuidado implica em ampliação da oferta de
serviços e diversificação de modalidades assistenciais, o que permite supor ampliação e
diversificação de postos de trabalho e qualificação da gestão do trabalho em saúde;
A pesquisa indica a necessidade de ampliação da capacidade de análise das potencialidades e
necessidades locorregionais para a organização de ações e serviços e, considerando-se que o
complexo produtivo da saúde tem impactos no desenvolvimento regional, é possível supor que
os resultados também tenham efeitos nesse sentido.
E - INDUSTRIAL / COMERCIAL NA 1 2 3 4 5
230
E.1- Criação de novas empresas no setor X
E.2- Sustentabilidade das empresas do setor X
E.3- Lançamento de novos produtos X
E.4- Redução dos custos de produção no setor X
E.5- Melhoria da qualidade de produtos X
E.6- Criação de novos mercados X
E.7- Redução de barreiras técnicas X
:Justificativas
O escopo da pesquisa e os resultados alcançados não tem impacto nos quesitos E1, E4, E5 e
E6.
Em relação aos quesitos E2, E3 e E5, as ofertas assistenciais com maior gradiente de
integralidade têm evidências na pesquisa e em outras fontes de ser fator de escolha por parte
dos beneficiários o que permite supor as contribuições da mesma para a qualificação dos
serviços e das empresas e da oferta de novos produtos. Além disso, a política que qualificação
que vem sendo implementada pela ANS, que compartilha dos referenciais de cuidado
utilizados na pesquisa, já tem efeitos visíveis na reorganização do setor da saúde suplementar.
F– AMBIENTAL NA 1 2 3 4 5
F.1- Racionalização do uso de matérias primas X
F.2- Redução do consumo energético X
F.3- Redução da geração de resíduos X
Comentários:
O escopo e os resultados da pesquisa não têm impacto ambiental nos quesitos assinalados.
RESULTADOS
O CNPq o DECIT poderão a qualquer momento solicitar a comprovação dos indicadores de
resultados informados abaixo.
Esclarecimentos a respeito dos indicadores:
231
Indicadores são resultados concretos alcançados pelo projeto, expressos de forma quantitativa.
Indicadores tecnológicos são produtos, processos acabados ou aperfeiçoados – com redução de
custos, redução de impactos ambientais, geração de renda ou agregação de valor – incluindo
aqueles com potencial obtenção de patente.
Indicadores científicos são representados por publicações de divulgação do meio da pesquisa,
como livros, artigos em periódicos e resumos em congressos científicos, e também o resultado
de capacitação de recursos humanos no meio acadêmico, como teses, dissertações e
monografias.
Como forma de avaliar o impacto do projeto na cadeia do conhecimento tecnológico, solicita-se
indicar o produto, processo gerado, o segmento da sociedade diretamente beneficiado –
produtores rurais, pescadores, assentados, comunidades – e as ações de
transferência/difusão/construção do conhecimento junto ao público-alvo.
Matriz de Indicadores de Resultados Quantidade
Indicadores Previstos* Alcançados*
Seminários de apresentação dos resultados para o gestor e
outros 4 12
Incorporação dos resultados 0 0
Inovação Tecnológica:
Produtos 0 0
Processos 0 0
Procedimentos 0 0
Serviços 0 0
Difusão Tecnológica 0 0
Transferência de Tecnologias 0 0
Novas Empresas em atividade 0 0
Artigos Científicos Publicados 3 3
Depósito de patentes 0 0
Livros publicados 0 1
Capítulo de livros publicados 3 5
Resumos publicados 10 12
232
Cartilhas/Folders 0 0
Apresentações em congressos/simpósios/encontros 10 18
Tese de Doutorado 1 1
Dissertação de Mestrado 3 4*
Monografia de Graduação 3 12
Treinamentos realizados 0 0
Pessoas Capacitadas 20 120
Empregos Gerados 0 0
Criação/ampliação e modernização de laboratórios 0 0
* Indicar apenas em números absolutos ( 0 para não previsto/não alcançado)
Para os indicadores abaixo, indique nome ou número de referência para cada item (nome aluno, nº patente, CNPJ empresa, DOI, Título do curso ou treinamento, etc)
Indicadores Complemento
Depósito de Patentes
Novas Empresas em Atividade
Artigos Científicos Publicados
Livros ou Capítulos Publicados
Resumos Publicados
Tese de Doutorado
Dissertação de Mestrado
Monografia de Graduação
Cursos Realizados
Treinamentos Realizados (cursos, workshops)
RESULTADOS DO PROJETO
Matriz de Indicadores de Impacto dos Resultados
233
Indicador Unidade (nº, m2, etc)
SITUAÇÃO INICIAL
SITUAÇÃO ESPERADA
SITUAÇÃO ALCANÇADA
Devem ser apresentados indicadores que demonstrem resultados práticos e aplicáveis do projeto. Ex: número de famílias atendidas, média de peso da população infantil assistida e outros.
CONCLUSÃO
Apresentar a avaliação final resumida do desempenho do projeto, com perspectivas e desafios para o futuro, enfatizando os impactos do projeto na saúde (Máximo de 500 palavras).
A pesquisa superou as expectativas iniciais em termos de resultados e alcançou os objetivos
previstos. Teve como objetivo identificar e analisar tecnologias de cuidado em saúde ao ciclo
mãe-bebê e em saúde mental na saúde suplementar nas Regiões Norte e Sul do Brasil, a partir
da tecnologia de linhas de cuidado. Foi desenvolvido por meio de uma rede científica
envolvendo instituições de ensino e pesquisa. Duas abordagens metodológicas principais foram
utilizadas para a consecução do objetivo proposto: uma transversal, por meio da análise de
dados secundários e de uma pesquisa com diferentes atores da saúde suplementar e outra com
estudos multicêntricos integrados sobre as modelagens tecnoassistenciais adotadas em
diferentes contextos nas duas regiões em estudo. Na primeira abordagem, foi utilizada versão
adaptada da metodologia de análise de cenários da saúde suplementar. O aprofundamento da
análise foi feito por triangulação de estudos em diferentes realidades regionais, bem como com
a aplicação de instrumentos comuns ao projeto como um todo. A triangulação, no desenho da
abordagem analítica desta pesquisa, considerou que a diversidade e a heterogeneidade de
contextos têm capacidade de “falsear” evidências que foram ou são construídas somente pela
posição linear de uma observação, o que foi fortalecido ao final. Em linhas gerais, conclui-se
que ainda é tênue a incorporação da modelagem tecnoassistencial estudada e que as principais
iniciativas parecem decorrer das políticas de indução da ANS e terem, como resultado,
basicamente um processo de reestruturação produtiva com ampliação e diversificação de
ofertas, mas com uma lógica ainda instrumental de gestão e baixa articulação. Os principais
marcadores utilizados foram a ampliação e diversificação de ofertas, como assistência
farmacêutica, internação domiciliar e outras modalidades assistenciais inovadoras, além da
operação em rede de serviços e a atuação em equipes multiprofissionais. O mix público e
privado no itinerário assistencial mostrou-se, também, um marcador qualificado para essa
análise, na medida em que decorre, em grande medida, da busca de cuidado mais integral por
parte dos usuários e, em alguns casos, parece estimulado pelas operadoras e regulado por
prestadores, em particular no caso da saúde mental. A gestão do cuidado, nesses casos, parece
estar sob responsabilidade dos próprios beneficiários e seus familiares e reivindicar, para sua
qualificação, maior articulação entre as ofertas dos subsistemas suplementar e público de
234
serviços de saúde. Entre as recomendações da pesquisa, está o fortalecimento das iniciativas de
indução da ANS, em particular a ampliação do acesso a produtos e serviços e a diversificação
de ofertas assistenciais. Também está proposta a utilização de mecanismos de indução que
operem mais efetivamente no plano micropolítico, como iniciativas de educação permanente, e
a maior integração com os dispositivos de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS). As
mudanças nas políticas de regulação da ANS no escopo do Projeto de Qualificação, além de
possíveis iniciativas de regulação assistencial com maior articulação com os gestores do SUS,
estimulam a rede científica à continuidade dos estudos e o fortalecimento da estratégia dos
Centros Colaboradores, inclusive com a produção e manutenção de ambiente virtual para
intercâmbio.
TEXTO PARA LEIGOS
Criar um texto para leigos acerca do projeto contemplados os impactos e reflexos na saúde da população brasileira (máximo de 01 página).
A Saúde Suplementar é o componente do sistema de saúde brasileiro formado por empresas de
planos e seguros privados de saúde, que são responsáveis pela cobertura das necessidades de
atenção à saúde de aproximadamente 25% da população. Estudos anteriores, desenvolvidos pela
rede científica de pesquisa e produção tecnológica envolvida no presente estudo, demonstram a
oportunidade singular de aprofundar análises acerca da noção de linhas de cuidado,
compreendidas como tecnologia de gestão da assistência capaz de produzir padrões avançados e
crescentes de integralidade. A integralidade, como diretriz legal e como idéia força tem
contribuído para a análise e para a produção de inovações no sistema de saúde brasileiro. Este
relatório de pesquisa apresenta resultados do projeto aprovado no Edital MCT – CNPq / ANS n°
25/2007. Insere-se no Programa de Qualificação da Saúde Suplementar, especificamente na
iniciativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar de construir uma Rede de Centros
Colaboradores para apoiar o desenvolvimento das ações de qualificação institucional, realização
e divulgação de estudos analíticos e pesquisas, articulação entre instituições nacionais e
internacionais envolvidas com a produção teórica e o desenvolvimento da educação permanente
em saúde. O projeto teve como objetivo identificar e analisar tecnologias de cuidado em saúde
ao ciclo mãe-bebê e em saúde mental na saúde suplementar nas Regiões Norte e Sul do Brasil, a
partir da tecnologia de linhas de cuidado. Foi desenvolvido por meio de uma rede científica
envolvendo instituições de ensino e pesquisa, com duas abordagens metodológicas principais:
uma transversal, por meio da análise de dados secundários e de pesquisa com dirigentes de
operadoras, prestadores hospitalar, médico obstetra, médico pediatra e médico psiquiatra, e
outra com estudos multicêntricos integrados sobre as modelagens tecnoassistenciais adotadas
em diferentes contextos da saúde suplementar nas duas regiões em estudo. Na primeira
abordagem, foi utilizada versão adaptada da metodologia desenvolvida em projeto anterior,
denominada de análise de cenários. O aprofundamento da análise foi feito por meio de estudos
em diferentes realidades regionais, bem como com a aplicação de alguns instrumentos comuns.
A triangulação, no desenho da abordagem analítica desta pesquisa, considerou que a diversidade
e a heterogeneidade de contextos têm capacidade de “falsear” evidências que foram ou são
construídas somente pela posição linear de uma observação. Em linhas gerais, conclui-se que
ainda é tênue a incorporação da modelagem tecnoassistencial estudada e que as principais
iniciativas parecem decorrer das políticas de indução da ANS. Os principais marcadores
utilizados foram a ampliação e diversificação de ofertas, como assistência farmacêutica,
internação domiciliar e outras modalidades assistenciais inovadoras, além da operação em rede
235
de serviços e a atuação em equipes multiprofissionais. O mix público e privado no itinerário
assistencial mostrou-se, também, um marcador qualificado para essa análise, na medida em que
decorre, em grande medida, da busca de cuidado mais integral por parte dos usuários e, em
alguns casos, parece estimulado pelas operadoras e regulado por prestadores, em particular no
caso da saúde mental. A gestão do cuidado, nesses casos, parece estar sob responsabilidade dos
próprios beneficiários e seus familiares e reivindicar, para sua qualificação, maior articulação
entre as ofertas dos subsistemas suplementar e público de serviços de saúde. Entre as
recomendações da pesquisa, está o fortalecimento das iniciativas de indução da ANS, em
particular a ampliação do acesso a produtos e serviços e a diversificação de ofertas assistenciais.
Também está proposta a utilização de mecanismos de indução que operem mais efetivamente no
plano micropolítico, como iniciativas de educação permanente, e a maior integração com os
dispositivos de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS).
OBSERVAÇÕES
A produção informada inclui dissertações em andamento em estágio de pós-qualificação.