impactos socioeconÔmicos dos assentamentos … · o semiárido compreende um conjunto de unidades...
TRANSCRIPT
IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS DOS ASSENTAMENTOS RURAIS DA
REFORMA AGRÁRIA NA MACRORREGIÃO DO SEMIÁRIDO PIAUIENSE1
Andréa Maria de Aguiar Rodrigues
Aluna do Curso de Geografia da Universidade Estadual do Piauí-UESPI
Maria Tereza de Alencar
Professora Adjunta do Curso de Geografia da Universidade Estadual do Piauí-UESPI
Coordenadora do NUPERRE
Doutora em Geografia
RESUMO: O presente artigo foi desenvolvido em pesquisa pelo PIBIC/UESPI, em que foi
realizado enfoque na importância dos assentamentos rurais para o desenvolvimento
socioeconômico do semiárido piauiense. O trabalho teve como objetivos: analisar os
impactos socioeconômicos dos assentamentos rurais da Reforma Agrária no espaço rural e
urbano dos territórios de desenvolvimento sustentável do semiárido piauiense; Identificar
as transformações socioespaciais provocadas pelos assentamentos rurais nas pequenas
cidades dos territórios de desenvolvimento; Verificar as alterações nas relações campo-
cidade a partir da implantação dos assentamentos rurais nos territórios de desenvolvimento.
Para alcançar os objetivos proposto, a pesquisa foi realizada através de pesquisa
bibliográfica e direta, com entrevistas com assentados, representantes de órgãos públicos
durante a FERAPI 2009, realizada anualmente em Teresina e documentos obtidos no
INCRA. Desta forma, discutimos as políticas públicas para o campo no Brasil, a
espacialização e caracterização geográfica do Piauí, a relação campo-cidade,
caracterização do semiárido, impactos socioeconômicos, a atuação da FERAPI como meio
de divulgação, produção e atividades desenvolvidas pelos Assentados e Comunidades
Quilombolas do estado do Piauí. Observamos que ainda faltam políticas públicas que
beneficiem principalmente o agricultor familiar, melhorando sua qualidade de vida em
especial os assentamentos no semiárido piauiense que apresenta limitações devido à
irregularidade das chuvas justificando a necessidade de maiores investimentos.
Palavras-chave: Assentamentos Rurais. Campo-Cidade. Semiárido. Agricultor Familiar.
ABSTRACT: This article was developed through a research by PIBIC / UESPI, which
was conducted focusing on the importance of rural settlements to the socioeconomic
development of the piauiense semiarid. The study aimed to analyze the socioeconomic
impacts of rural settlements of agrarian reform in rural and urban areas of sustainable
development of the piauiense semiarid; identify the sociospatial transformations caused by
the settlements in small towns in the territories of development; Check changes in city-
country relationships through the implementation of rural settlements in the territories of
1 Relatório final do PIBIC/UESPI - 2009/2010
2
development. To achieve the objectives proposed, the research was conducted through
literature search and direct interviews with settlers, representatives of public institutions
during FERAPI 2009, held annually in Teresina and documents obtained from INCRA.
Thus, we discuss public policy for the field in Brazil, the spatial and geographic
characterization of Piauí, the city-country relationship, characterization of semiarid,
socioeconomic impacts, the performance of FERAPI as means of divulgation, and
production activities developed by the Settlers and Quilombo Communities of the state of
Piauí. We note that there are still a lack of policies that primarily benefit the family
farmers, improving their quality of life due to the location of settlements in the piauiense
semiarid which has limitations due to irregular rainfall, justifying the need for greater
investment.
Keywords: Rural Settlements. Rural-Urban.Semiarid. Family Farmer.
INTRODUÇÃO
Este trabalho foi desenvolvido em pesquisa pelo PIBIC/UESPI, onde será
ressaltada a importância dos assentamentos rurais para o desenvolvimento socioeconômico
do semiárido piauiense.
Segundo Bergamasco e Norder (1996), assentamentos rurais podem ser definidos
como a criação de novas unidades de produção agrícola, por meio de políticas
governamentais visando o reordenamento do uso da terra, em benefício de trabalhadores
rurais sem terra ou com pouca terra. Desta forma, os assentamentos seria uma política
pública viável para o desenvolvimento do campo no Brasil.
Diante da ampliação da fome e da miséria, do desemprego, do inchaço dos centros
urbanos e das reduzidas taxas de crescimento econômico, os assentamentos rurais
representam uma importante iniciativa no sentido de gerar empregos diretos e indiretos a
baixo custo e para estabelecer um modelo de desenvolvimento agrícola em bases sociais
mais igualitárias.
O espaço estudado é a Macrorregião do Semiárido piauiense que é composta por
quatro Territórios de Desenvolvimento, 11 Aglomerados, que por sua vez agrupam 89
municípios, todos no Estado do Piauí, a maioria possui população de até 10 mil habitantes.
O semiárido compreende um conjunto de unidades geoambientais, com ocorrência
de diferentes tipos de vegetação com o predomínio do bioma Caatinga. A vegetação é uma
expressão do clima, bem como de outros fatores geoambientais representados pelo relevo,
pelo material de origem e pelos organismos, todos esses elementos se constituíram durante
um longo processo histórico e atualmente continuam interagindo entre si, resultando na
determinação de seu quadro natural.
3
Neste trabalho, serão enfatizadas as políticas públicas para o campo no Brasil, a
espacialização e caracterização geográfica do Piauí, a relação campo-cidade,
caracterização do semiárido, impactos socioeconômicos, a atuação da FERAPI como meio
de divulgação, produção e atividades desenvolvidas pelos Assentados e Comunidades
Quilombolas do estado do Piauí.
Este trabalho tem como objetivos: analisar os impactos socioeconômicos dos
assentamentos rurais da Reforma Agrária no espaço rural e urbano dos territórios de
desenvolvimento sustentável do semiárido piauiense; Identificar as transformações
socioespaciais provocadas pelos assentamentos rurais nas pequenas cidades dos territórios
de desenvolvimento; Verificar as alterações nas relações campo-cidade a partir da
implantação dos assentamentos rurais nos territórios de desenvolvimento. Para alcançar os
objetivos proposto, a pesquisa foi realizada através de pesquisa bibliográfica e direta, com
entrevistas com assentados, representantes de órgãos públicos durante a FERAPI 2009,
realizada anualmente em Teresina e documentos obtidos no INCRA.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
1. Assentamentos Rurais: Política Pública para o campo no Brasil
Na história brasileira se deu pouca importância às questões agrária, poucos
governos criaram medidas que solucionasse o problema da concentração de terras no País.
Devido a isso nos anos de 1950 e 1960 surgem os movimentos sociais que pressionaram o
governo a tomar medidas que beneficiasse o agricultor familiar. A grande maioria dos
movimentos estavam ligados ao Partido Comunista Brasileiro.
Um dos movimentos de maior expressão nos anos de 1950 foram as Ligas
Camponesas. Os conflitos no campo aumentaram, manifestando-se em vários estados
brasileiros apesar da repressão, porém muitos deles aliaram-se aos setores urbanos e
políticos para ganhar força. Esse foi o caso de Pernambuco, com a Liga Camponesa da
Galiléia e do Rio Grande do Sul, que conseguiram a desapropriação de 25 mil hectares
próxima a Pelotas que posteriormente se tornou uma das regiões mais rica e produtiva do
país.
Em 1964, com a ditadura militar, foi elaborada o Estatuto da Terra, que
implementava os projetos de colonização em áreas de fronteira agrícola. Com os projetos
4
as grandes empresas agropecuaristas se instalaram com incentivos do governo, porém os
pequenos proprietários ganhavam a terra e não tinham condições de mantê-la o que os
levavam a desistir. Com essas medidas o governo Militar de fato queria afastar os
movimentos sociais, porém a luta pela posse da terra continuou crescendo em todo país.
Ainda no Governo Militar houve um grande investimento em barragens, o que
levou a desapropriação de vários agricultores, pois essas regiões se localizavam em áreas
férteis. Porém não havia por parte dos governantes uma preocupação social, havia uma
preocupação apenas econômica. Por isso muitos desses agricultores passaram anos para ser
reassentados e só depois de se organizarem em sindicatos e lutarem por seus direitos é que
conseguiram seus objetivos.
Os anos de 1980 foram marcados pelo inicio da redemocratização brasileira, com a
organização do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) que se empenharam para
que novos assentamentos fossem criados. Por parte do governo surgiram vários projetos
que serviria como símbolo da democracia que beneficiaria várias famílias que aguardavam
pela reforma agrária. Em 1986, foi elaborado o I Plano Nacional de Reforma Agrária
(PNRA), que ajudaria na execução de vários projetos de assentamentos.
No governo Sarney (1985 a 1989) o INCRA elaborou uma proposta inicial de
destinar 15 milhões de hectares para o assentamento de 1,4 milhão de famílias assentadas.
Collor (1990 a 1991), Itamar (1992 a 1993) e Fernando Henrique (1994 a 2002)
elaboraram metas pouco ousadas e que mais uma vez não foram atingidas deixando para os
próximos governantes a tarefa de programas mais efetivos para reforma agrária, que até o
governo atual, 2010, não foi realizado, apesar da elaboração do II PRNA.
1.1 Assentamentos Rurais e o Piauí: espacialização e caracterização geográfica
A economia piauiense e sua organização espacial desenvolveram-se a partir da
pecuária extensiva, implantada pela colonização portuguesa na segunda metade do século
XVII. As fazendas piauienses eram unidades produtivas auto-suficientes, localizadas em
extensos latifúndios, em que era praticada, ao lado da pecuária, uma agricultura de
subsistência destinada ao auto-consumo de suas escassas populações. O gado era exportado
para as zonas canavieiras – litoral nordestino – e de mineração – Minas Gerais, além do
Ceará e Maranhão. (REBÊLO, 2006). Desta forma, o processo de formação do espaço
5
piauiense ocorreu em função da espacialização das fazendas de gado caracterizando o
espaço geográfico piauiense.
A distribuição espacial dos assentamentos pelo Estado reconhecidos pelo INCRA,
os quais totalizam 290, se concentra em dois territórios: Cocais e Entre Rios, na região
Norte (Figura 1). Tais concentrações são resultados de uma maior atuação dos Movimentos
Sociais, principalmente da FETAG, FETRAF e MPA, que vêm desenvolvendo um trabalho
mais intenso nessas regiões, bem como da existência de grandes áreas sem a devida
utilização pelos proprietários, o que, aliado à presença de trabalhadores rurais sem terra na
região, provocaram intervenções do INCRA, culminando com desapropriações (PRRA-PI,
2003/2010, p.20).
Figura 1. Projeto de Assentamentos no Estado do Piauí Fonte: INCRA/PI (2009).
6
Nos demais territórios observam-se a existência de assentamentos da Reforma
Agrária, mas em quantidade bem menor que os mencionados. Vale ressaltar que os
territórios: Vale do Canindé e Vale do Rio Guaribas, são aqueles que menos detêm
assentamentos, algo diretamente vinculado à questão fundiária dessa região, formada, na
maioria, por minifúndios, além de não contar com uma forte atuação dos Movimentos
Sociais, devido à baixa demanda dos seus trabalhadores rurais da área localizada no semi-
árido piauiense (PRRA- PI, 2003/2010, p.20).
Desta forma, pode-se constatar que o número de assentamentos rurais no semiárido
é bastante reduzido, tão quanto o número de famílias assentadas como mostra a tabela 1
contendo os quatro territórios de desenvolvimento do semiárido piauiense.
Tabela 1: Tipos de projetos e números de famílias assentadas nos projetos de
Reforma Agrária-Macrorregião do semi-árido piauiense – 1999 a 2007.
TERRITÓRIO Nº DE
ASSENTAMENTOS ÁREA (ha)
Nº FAMÍLIAS
ASSENTADAS
TIPOS DE
PROJETOS
Vale do Sambito 10 19.956,5645 597 Assentamento
federal
Vale do Rio Guaribas 07 34.812,4321 662 Assentamento
federal/ casulo
Vale do Canindé 10 12.468,7915 360 Assentamento
federal/estadual
Serra da Capivara 06 76.187,5706 637 Assentamento
estadual/casulo
Fonte: Alencar (2010).
A partir dos dados acima, verifica-se a necessidade de políticas públicas mais
efetivas para essa região, promovendo o desenvolvimento socioeconômico do semiárido
piauiense, através da redistribuição de terras e implantação de acompanhamento das
famílias assentadas, no sentido de acesso a água, energia, habitação, saúde, crédito,
acompanhamento técnico, entre outros.
1.2 Relação Campo-Cidade
O campo e a cidade estão interligados, pois um dependente do outro em suas
relações de produção. Sobre este aspecto Alencar (2010, p.50) afirma
7
O urbano é produto e condição, contudo ele não se efetiva isoladamente do rural
e nem de outros espaços urbanos. Nas relações entre o urbano e o rural se
cristaliza a produção, no sentido lefebvreano, de coisas e obras, idéias e
ideologias, de ilusões e verdades, de linguagem, de representações e de relações
sociais. Um só pode ser compreendido em suas relações com o outro, pois um
está no outro, só vem a ser pelo outro, numa relação complementar
dialeticamente definida (ALENCAR, 2010, p. 50).
Existem aqueles que acreditam que o campo será englobado pela cidade, na
realidade esses espaços possuem uma relação complementar e de interdependência, em que
cada um desempenha sua função sem anular a função do outro. Desta forma, o espaço rural
não desaparecerá, pelo contrário terá sua função ampliada.
Os assentamentos rurais contribuem de forma significativa na relação campo-
cidade, pois ajudam no desenvolvimento tanto do campo como dos pequenos municípios.
Os assentados tanto repassam seus produtos para localidades próximas como consomem
produtos das cidades vizinhas, sendo que muitos municípios do semiárido piauiense são
pouco desenvolvido, consequentemente, serão beneficiados com geração de renda e
crescimento econômico.
1.3 Caracterização do semiárido piauiense
O semiárido caracteriza-se pelo clima seco com índices pluviométricos anuais de
900 ou 800 até 400 mm (num deslocamento de leste para oeste), com distribuição de
chuvas concentradas em 3 ou 4 meses do ano (dezembro a abril). O período seco se
estende por 8 ou 9 meses do ano em virtude da presença da massa de ar tropical atlântica
que chega ao Piauí sem umidade.
Durante o dia as temperaturas são elevadas, ficando as máximas entre 30º e 36º C,
porém as noites são geralmente frias, com temperaturas mínimas entre 16º e 19º C. Isso
ocorre, principalmente, porque os níveis de umidade relativa do ar são baixos.
A geologia do território é composta pelo afloramento das seguintes formações:
Embasamento Cristalinos, solos geralmente rasos, apresentando baixa capacidade de
infiltração, alto escoamento superficial e reduzida drenagem natural; Formação Serra
Grande, Pimenteiras e Cabeças.
O aqüífero Serra Grande forma o principal sistema de abastecimento de água
subterrânea do Território, com potencial para o artesianismo, variando de fraca, na região
de embasamento cristalino, a forte, nas demais regiões. Apesar de tanta água subterrânea,
8
os períodos de seca castigam a população, acaba com a agropecuária e outras criações
dificultando o processo de desenvolvimento e de sobrevivência da população.
Em seguida, observe o mapa da macrorregião do semiárido piauiense (Figura 2),
com seus respectivos territórios de desenvolvimento.
Figura 2: Mapa dos Territórios da Macrorregião do semiárido piauiense
Fonte: CODEVASF/ PLANAP – SÍNTESE EXECUTIVA USO DA TERRA (2006).
9
2. Impactos Socioeconômicos dos Assentamentos Rurais da Reforma Agrária na
Macrorregião do Semiárido Piauiense.
2.1 A FERAPI e os assentamentos rurais
Pensando num melhor desenvolvimento do campo, foi criado a Feira Piauiense de
Produtos da Reforma Agrária e Comunidades Quilombolas (FERAPI), que acontece todos
os anos na Praça Pedro II e Central de Artesanato Mestre Dezinho, em Teresina desde
2004. O projeto é símbolo da luta de agricultores da reforma agrária que idealizaram ver
seus produtos em praça pública, se tornando também lugar de encontros, manifestações
culturais e debates.
O objetivo geral da FERAPI é dar visibilidade para a sociedade dos resultados das
ações de reforma agrária, bem como da importância econômica e social das
potencialidades produtivas e culturais dos agricultores e agricultoras familiares das
comunidades de assentamentos, quilombolas, acampamentos, áreas atingidas por barragens
e agroextrativistas, para o desenvolvimento dos territórios rurais piauienses.
A primeira edição da FERAPI se deu entre os dias 24 a 27 de agosto de 2004, a
partir daí todos os anos foi realizada a feira. A cada ano foram abordadas várias temáticas
como: Comércio e Consumo Solidários, Cultura e Identidade, Sementes: Cultivos e
Culturas, Policultura e Educação no contexto da Reforma Agrária e das Comunidades
Quilombolas, atraindo milhares de visitantes.
Em 2009 ocorreu à sexta edição da FERAPI entre os dias 22 a 25 de Setembro com
o tema “Reforma Agrária, Meio Ambiente e Modos de vida”, foram realizadas palestras
sobre o tema e discussão sobre a diversidade cultural como direito, titulação de territórios
tradicionalmente ocupados e políticas públicas para a agricultura familiar de modo amplo.
A sexta edição contou com 600 participantes, sendo 457 assentamentos de reforma
agrária implantados ou reconhecidos pelo INCRA/PI, sendo 166 do Instituto de Terras do
Piauí - INTERPI; aproximadamente 150 comunidades quilombolas, sendo cinco tituladas e
45 em processo de regularização fundiária, 552 assentamentos do Projeto Crédito
Fundiário - PCF, situados nos territórios piauienses Vale do Guaribas, Carnaubais, Serra da
Capivara, Cocais e Vale do Canindé, integrantes do Programas Territórios da Cidadania,
como também populações de comunidades rurais agroextrativistas e extrativista que
10
produzem num contexto marcado pela diversidade, que vai desde o modo que vivenciam o
cotidiano, realizam suas práticas produtivas, comercializam, expressam as simbologias da
vida comunitária, seja na produção, na relação com o meio ambiente.
A FERAPI tem beneficiado os assentamentos rurais, pois a feira expõe o melhor do
artesanato, da culinária e manifestações culturais do público da reforma agrária (Fotos 1 e
2). Desta forma, seus produtos, seus objetivos se tornam reconhecidos pela sociedade.
Foto 1: Trabalhos artesanais Fonte: Rodrigues (2010).
Foto 2: Trabalhos artesanais
Fonte: Rodrigues (2010).
11
O evento foi realizado pelo Movimento dos Trabalhadores/as Sem-Terra (MST),
Movimento das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, Federação dos
Trabalhadores/as na Agricultura do Estado do Piauí- FETAG/PI e Cáritas. Teve como
patrocinadores: INCRA/MDA, CONAB, BNB, PDHC, ICMBIO, GOVERNO DO
ESTADO DO PIAUI: EMATER, INTERPI, FUNDAC, PCF, SASC, SEDUC, SDR,
CCOM, Prefeitura de Teresina.
2.2 Assentamentos Rurais: Desenvolvimento socioeconômico no campo e ampliação
das relações campo-cidade.
Com o êxodo rural nos anos de 1960, muitos agricultores expulsos dos latifúndios
se tornariam em bóias-frias, favelados, indigentes, operários sem maior qualificação
profissional. Diante disso nos anos de 1980 surgem os acampados e assentados com
propósito de fixarem-se ao campo e fugirem da fome e da miséria.
Bergamasco e Norder (1996, p.68), afirmam que:
A prioridade ao combate à fome têm estimulado a retomada de concepções que
reconhecem a validade das formas tradicionais de organização do trabalho na
agricultura familiar. Na lógica camponesa, a produção de alimentos para o
abastecimento do grupo familiar e a comercialização do excedente no mercado,
seja por intermediários, pela criação de cooperativas ou constituição de um
pequeno comercio varejista, em muitos casos têm se constituído no ponto de
partida para o estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento agrícola,
mais intensivo em capital e tecnologia, ao mesmo isento dos perversos efeitos
sociais da agricultura patronal e latifundiária, que historicamente concentrou
renda e poder político em nosso país. (BERGAMASCO; NORDER, 1996, p.68)
Dessa forma, os assentamentos rurais serviriam tanto para abastecer os próprios
agricultores, como o mercado de consumo interno, ou seja, o problema da fome e da
miséria seria resolvido para muitos. Porém, não basta apenas dar a terra ao agricultor é
necessário investir em infra-estrutura, educação, créditos, assistência técnica, água,
energia, comercialização viável e etc.
Infelizmente, nem todos os assentamentos rurais contam com políticas públicas e
sociais, com a construção de estradas, casas próprias, postos de saúde, saneamento básico,
escolas e energia elétrica. Muitos não conseguem modernizar sua produção, adquirir novos
equipamentos se tornando inviável competir com grandes empresas agropecuaristas.
12
Existem ainda os que conseguem produzir uma boa safra, porém com as
dificuldades de comercialização tem seus produtos estragados ou mesmo passam seus
produtos a comerciantes atravessadores que aproveitam para lucrar muito mais que o
próprio agricultor.
Além dessas dificuldades, o semiárido encontra problemas como os períodos de
estiagem, condicionando sua produção para apenas os períodos chuvosos. Isso poderia ser
resolvido através de créditos para instalação de sistema de irrigação e de abastecimento de
água.
Outras necessidades dos assentamentos são as máquinas, que muitas vezes
precisam ser alugadas, como no caso, do assentamento Lisboa (município de São João do
Piauí), a falta de estradas que liguem os assentamentos aos municípios vizinhos. Essa
problemática se dá principalmente pela dificuldade de acesso ao crédito e falta de
investimento do governo na infra-estrutura dos assentamentos.
Apesar de tantas dificuldades os assentamentos tem conseguido produzir para o
consumo interno e venda nas feiras das cidades, por exemplo, o assentamento Novo
Zabelê com cerca de 70 famílias, eles produzem feijão, abóbora e o caju que é usado na
produção de rapadura, doce e cajuína, criam cabras que usam para produzir queijo e
requeijão; no artesanato confeccionam sabonetes, bordados em panos de prato e bijuterias.
Em geral, tudo que é produzido pelo assentamento é usado para consumo próprio e o
excedente é vendido nas feiras de São Raimundo Nonato.
O assentamento Lisboa (município de São João do Piauí), com 260 famílias
assentadas, onde realizam trabalhos artesanais, na pecuária criam caprinos, ovinos, na
agricultura no período chuvoso plantam feijão, milho, melancias, também produzem mel
de abelha.
O assentamento tem contribuído para o desenvolvimento do Território e dos
municípios de São Raimundo Nonato e São João do Piauí que teve o seu mercado
consumidor ampliado, pois os assentados procuram mercadorias como roupas, calçados,
acessórios em geral e alimentos extra. Isso contribui para intensificação nas relações
campo-cidade, fortalecendo o comércio nas pequenas cidades.
O assentamento lagoa do cajueiro, município de Bocaina, possui 150 famílias
assentadas e documentadas pelo INCRA organizada em uma Associação. A Associação
possui: 1 trator, 1 caminhão para o escoamento da produção para as cidades de Picos e
13
Santo Antonio de Lisboa e transporte dos associados para a cidade de Bocaina.
Infelizmente, o acesso é através de estrada carroçal dificultando os transportes de produtos.
A Associação foi fundada em 1989 para organização e assentamento dos
agricultores que já trabalhavam e ocupavam a terra e buscavam a posse da terra. A área do
assentamento é de 5 mil hectares, sendo que cada família tem direito a 25 hectares .
A produção agrícola não é suficiente para o abastecimento do assentamento, pois
mesmo produtos como feijão, milho, goma e farinha que são produzidos pelos assentados
são comprados na cidade para o consumo das famílias. Os produtos mais cultivados são;
caju, feijão, mandioca e milho. A criação de animais é realizada para abastecimento da
família e venda para suprir necessidades imediatas. Predomina mais a criação de pequenos
animais (ovinos, suínos e galináceos) além de uma reduzida criação de bovinos. Existe a
comercialização dos produtos entre os próprios assentados e a maior parte da renda é
proveniente da agricultura. Alguns trabalham com diaristas no próprio assentamento.
Foram construídas pelo projeto do INCRA 150 casas com banheiros para as 150
famílias assentadas. No assentamento já existem atividades comerciais e não-agrícolas
como: bares, clube, e pequenos comércios. Alguns assentados não produzem na terra e
90% possuem aposentadoria rural.
Como infra-estrutura básica o assentamento possui energia elétrica, uma escola de
primeira a quarta série do ensino fundamental, água encanada proveniente de poço tubular,
prédio sede da associação e uma quadra esportiva em construção. A partir do ensino
fundamental maior e do ensino médio as crianças e adolescentes se deslocam diariamente
para estudar na cidade de Bocaina usando uma D-20, o carro da associação e automóveis
de alguns assentados.
As maiores dificuldades relatadas pelos assentados são:
1. Está há mais de dois anos sem receber os recursos para construção das cisternas e
reestruturação das casas;
2. Burocracia na liberação de recursos;
3. Falta de assistência e acompanhamento do INCRA;
4. A energia da CEPISA está irregular (não faz leitura e cobra qualquer valor, foi
colocado energia comercial para funcionamento dos poços e está muito caro); já foi
solicitado a CEPISA para regular o valor da energia e mudança para rural;
5. Acesso ao Projeto Semiárido;
6. Difícil acesso para escoamento da produção.
14
Desta forma, os assentamentos rurais tem favorecido o desenvolvimento do campo,
dando oportunidade aos trabalhadores de emprego e renda, porém é necessário políticas
públicas mais efetivas que garanta a fixação do agricultor à terra.
Em 2003, foi elaborado o II Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) que
apresenta várias propostas de mudança para estrutura agrária brasileira. Dentre elas
promover a geração de emprego e renda, ocupação do território, garantir a segurança
alimentar, preservar as tradições culturais e o meio ambiente, impulsionar a economia local
e o desenvolvimento regional.
O PNRA reconhece a diversidade social e cultural da população rural e as
especificidades vinculadas às relações de gênero, geração, raça e etnia que exigem
abordagens próprias para a superação de toda forma de desigualdade. Reconhece os
direitos territoriais das comunidades rurais tradicionais, suas características econômicas e
culturais, valorizando seu conhecimento e os saberes tradicionais na promoção do
etnodesenvolvimento (II PNRA, 2003, p. 8).
Muitas destas propostas não tem se concretizado, existe ainda grandes
desigualdades regionais, falta de investimentos, projetos que se aplique a realidade dos
assentados dentre outras. Desta forma, o poder público precisa ampliar suas metas para
cumprir seus objetivos e promover o desenvolvimento socioeconômico do campo.
CONCLUSÕES
No processo histórico brasileiro e piauiense nota-se que a concentração de terras e a
falta de políticas públicas que beneficiasse principalmente o pequeno agricultor foram e é
uma realidade. No entanto, através das mudanças já ocorridas verifica-se que os
assentamentos rurais melhoraram a vida de muitos agricultores familiar. Desta forma,
solucionou o problema da fome para muitos trabalhadores, além de impulsionar o
desenvolvimento socioeconômico de muitas regiões.
Cada sub-região piauiense possui assentamentos rurais com características próprias
e com dificuldades distintas. Desta forma, o semiárido apresenta limitações devido à falta
de chuvas e o seu acúmulo, daí a necessidade de maiores investimentos na infra-estrutura,
bem como de facilidades ao acesso ao crédito e qualificação profissional que possibilite a
qualidade da produção, diante de seus limites naturais.
15
Diante disso, o número de assentamentos é bastante reduzido se comparando com
as demais, isso se dá principalmente pela a falta de incentivos para a fixação do agricultor
nessa sub-região.
Os assentamentos rurais tem sido divulgados através da FERAPI, como também
seus produtos cultura e modo de vida, milhares de pessoas que visitam o evento tomam
conhecimento de sua importância para os trabalhadores rurais e desenvolvimento
socioeconômico.
Apesar das dificuldades, os assentamentos rurais tem se desenvolvido
socioeconomicamente, promovendo também o crescimento de cidades vizinhas através das
feiras e da ampliação do mercado consumidor.
REFERÊNCIAS
ABREU, Irlane Gonçalves de. et al. Semi-árido piauiense: delimitação e regionalização.
Carta CEPRO, Teresina, Piauí, Vol. 18, N. 1, p. 162-183, jan / jun / 2000.
ALBUQUERQUE, Francisco José Batista de. et al. As Políticas Públicas e os Projetos de
Assentamento. Estudos de Psicologia. João Pessoa: s.e., 2004. p. 81 – 88.
ALENCAR, Maria Tereza de. Pronaf como Instrumento de Atuação do Estado no
Espaço Rural do Semiárido Piauiense. Tese de Doutorado, Universidade Federal de
Sergipe. São Cristóvão, 2010.
ANDRADE, Manuel Correia de. Nordeste: A Reforma Agrária ainda é necessária?
Recife: Caderno Guararapes 2, 1981.
BRASIL. Lei nº 4504 de 30 de novembro de 1964. Estatuto da Terra: Completo e
atualizado até 1990. Rio de Janeiro: Gráfica Auriverde Ltda, 1990.
_______. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO. INSTITUTO
NACIONAL DE COLONIAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA. II Plano Nacional de
Reforma Agrária – Paz, Produção e Qualidade de vida no meio rural. Brasília, 2003.
______. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Subsídios à elaboração da Agenda 21
Brasileira. Agricultura Sustentável. Brasília: IBAMA, 2000.
BRASIL. COMPANHIA DE DESENVOLVIIMENTO DO VALE DO RIO SÃO
FRANCISCO E DO PARNAÍBA. Plano de Ação para o Desenvolvimento Integrado da
bacia do Rio Parnaíba. Síntese Executiva: Território Vale do Rio Sambito. Brasília
(DF): TODA Desenho & Artes, 2006. v. 05.
16
________. COMPANHIA DE DESENVOLVIIMENTO DO VALE DO RIO SÃO
FRANCISCO E DO PARNAÍBA. Plano de Ação para o Desenvolvimento Integrado da
bacia do Rio Parnaíba. Síntese Executiva: Território Vale do Rio Guaribas. Brasília
(DF): TODA Desenho & Artes, 2006. v. 06.
________. COMPANHIA DE DESENVOLVIIMENTO DO VALE DO RIO SÃO
FRANCISCO E DO PARNAÍBA. Plano de Ação para o Desenvolvimento Integrado da
bacia do Rio Parnaíba. Síntese Executiva: Território Vale do Rio Canindé. Brasília
(DF): TODA Desenho & Artes, 2006. v. 07.
_________. COMPANHIA DE DESENVOLVIIMENTO DO VALE DO RIO SÃO
FRANCISCO E DO PARNAÍBA. Plano de Ação para o Desenvolvimento Integrado da
bacia do Rio Parnaíba. Síntese Executiva: Território Serra da Capivara. Brasília (DF):
TODA Desenho & Artes, 2006. v. 08.
MARTINS, José de Souza. A Reforma Agrária e os Limites da Democracia na “Nova
República”. São Paulo: Hucitec, 1996.
MEDEIROS, Leonildes Servolo de. Reforma Agrária no Brasil: história e atualidade
da luta pela terra. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2003. Coleção Brasil
Urgente.
MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E ABASTECIMENTO – MA. Manual Operacional
do PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar).
Brasília, 1996.
MOREIRA, Ruy. Formação do Espaço Agrário Brasileiro. São Paulo: Brasiliense, 1990.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A Agricultura Camponesa no Brasil. São Paulo:
Contexto, 1991.
PIAUÍ. INSTITUTO DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRAÁRIA – INCRA. Plano
de Reforma agrária do Estado do Piauí. 2003 / 2010. Teresina, 2005.
______. SECRETARIA DE PLANEJAMENTO – SEPLAN. Territórios de
Desenvolvimento para o Planejamento do Piauí. Teresina, 2005.
REBÊLO, Emília Maria de Carvalho Gonçalves. Processo de Organização Político-
Administrativo do Espaço do Piauí. Teresina: UFPI, 2003. (Mimeografado)
______. Meso e Microrregiões do Piauí. Teresina, UFPI, 2003. (Mimeografado)
SANTOS, Milton. Metamorfoses do Espaço Habitado. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 1994.