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E MAIS ON- LINE Edgard de Assis Carvalho A revogação do antropocentrismo e a aquisição de saberes transversais James Alison: “O perdão antecede o pecado”. A superação de uma visão moralista e chantagista Mario Novello Um pensamento que não recebe ordens Jean Louis Le Moigne Um apelo ao eterno perguntar Pedro Trigo: Teólogos enclausurados na academia. Um desafio IHU Revista do Instuto Humanitas Unisinos Nº 402 - Ano XII - 10/09/2012- ISSN 1981-8769 Edgar Morin e o pensamento complexo

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Edgar Morin e o pensamento complexo -

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  • 1. IHU ON-LINE Revista do Instituto Humanitas Unisinos N 402 - Ano XII - 10/09/2012- ISSN 1981-8769 Edgar Morin e o pensamento complexoJean Louis Le Edgard de Mario NovelloMoigne Assis Carvalho Um pensamento queUm apelo ao eterno A revogao do no recebe ordensperguntar antropocentrismo e a aquisio de saberes transversaisE MAIS Pedro Trigo: James Alison: Telogos enclausurados O perdo antecede o pecado. A superao na academia. Um desafio de uma viso moralista e chantagista
  • 2. Edgar Morin e oEditorial pensamento complexo O pensamento complexo vida mais humana, alm de reencon- mesmo que provisria, aos problemas seguindo as rotas abertas trarmos o sentido em nosso mundo. da humanidade. por Edgar Morin o tema A autonomia dos saberes acon- Um artigo e mais duas entrevis- da revista IHU On-Line tece na relao criativa com outras tas completam a presente edio. desta semana. Pesquisadores e pes- partes, e no atravs do isolamento, Dnis de Moraes, professor do quisadoras de vrias reas do conhe- que atesta miopia e morte, assinala Departamento de Estudos Cultu- cimento contribuem no debate. Larcio Pilz, professor na Unisinos. A rais e Mdia da Universidade Federal A fragmentao dos saberes obs- abertura ao Outro e aos diferentes sa- Fluminense, recorda a trajetria e o taculiza a consolidao do humanis- beres o que alimenta o nosso viver testemunho de Valrio Brittos, re- mo, atesta Edgard de Assis Carvalho, e o desejo pelo saber. centemente falecido, descrevendo-o da Pontifcia Universidade Catlica de Gerson Egas Severo, professor como um missionrio da tica e da So Paulo PUC-SP. A cincia se tor- da Universidade Federal da Frontei- solidariedade. naria menos arrogante e prepotente ra Sul UFFS, examina o legado de James Alison reflete sobre a caso assumisse a unidade indissolvel Morin para compreendermos a mio- doutrina do pecado original luz da entre o sapiens e o demens dos seres pia dos saberes que no dialogam, o Ressurreio de Jesus Cristo, seguin- humanos, assinala. delrio arrogante de tudo conhecer- do as trilhas de Paulo de Tarso e Ren Jean Louis Le Moigne, professor mos, e a falta de sentido num ensino Girard. O telogo ingls busca superar emrito da Universidade Aix-Marseille compartimentalizado. uma viso moralista e chantagista do (Frana), analisa a importncia das Pode parecer dramtico, mas pecado original. obras de Morin em conexo com as realista: a necessidade da transdis- Apostando numa teologia capaz cincias dos sistemas, a engenharia e ciplinaridade aparece mesmo no in- de ler os sinais dos tempos sendo a inteligncia artificial. Todos somos terior de uma cincia como a Fsica, proftica, o telogo jesuta venezue- responsveis pela aventura do conhe- constata o fsico Mario Novello. lano Pedro Trigo, refletindo sobre cimento humano e de suas socieda- Na viso de Angelita Maders, a caminhada da reflexo teolgica des, avalia. Defensora Pblica do Estado do Rio latino-americana, aponta os riscos de Unir conhecimentos, cincias exa- Grande do Sul, o pensamento aberto telogos enclausurados na academia. tas e humanas o objetivo da trans- transdisciplinaridade e o pensamen- A todas e a todos uma tima se- disciplinaridade hoje, afirma o fsico to complexo auxiliam a compreenso mana e uma excelente leitura! romeno Basarab Nicolescu. Saberes do sujeito e o dilogo com outros sa- entrelaados so esperana de uma beres para encontrar uma soluo, www.ihu.unisinos.br IHU Instituto Humanitas REDAO Colaborao: Csar Sanson, Unisinos Andr Langer e Darli Sampaio, Diretor de redao: Incio do Centro de Pesquisa e Apoio Endereo: Av. IHU On-Line a revista semanal Neutzling ([email protected]). aos Trabalhadores - CEPAT, de do Instituto Editora executiva: Graziela Unisinos, 950, Curitiba-PR. Humanitas Unisinos - IHU Wolfart MTB 13159 So Leopoldo/RS. ISSN 1981-8769. ([email protected]). Projeto grfico: Agncia CEP.: 93022-000 IHU On-Line pode ser Redao: Mrcia Junges MTB Experimental de Comunicao Telefone: 51 3591 1122 - ramal 4128. acessada s segundas-feiras, da Unisinos - Agexcom. 9447 (mjunges@unisinos. no stio www.ihu.unisinos.br. Editorao: Rafael Tarcsio E-mail: [email protected]. Sua verso impressa circula s br), Patricia Fachin MTB 13062 ([email protected]) e Thamiris Forneck teras-feiras, a partir das 8h, na Unisinos. Magalhes MTB 0669451 Atualizao diria do stio: Diretor: Prof. Dr. Incio Neutzling. Apoio: Comunidade dos ([email protected]). Incio Neutzling, Patricia Fachin, Gerente Administrativo: Jacinto Jesutas Residncia Conceio. Luana Nyland, Natlia Scholz, Reviso: Isaque Correa Schneider ([email protected]). ([email protected]). Wagner Altes e Mariana Staudt 2
  • 3. ndice Tema de CapaLEIA NESTA EDIO TEMA DE CAPA | Entrevistas 5 Quem Edgar Morin? 5 Ba da IHU On-Line 6 Edgard de Assis Carvalho: A revogao do antropocentrismo e a aquisio de saberes transversais 11 Jean Louis Le Moigne: Um apelo ao eterno perguntar 17 Mario Novello: Um pensamento que no recebe ordens 21 Angelita Maria Maders: Morin e a compreenso do Direito como um sistema 25 Larcio Pilz: Complexidade e pensamento vivo 29 Gerson Egas Severo: A professora imaginria e o descentramento da humanidade 34 Basarab Nicolescu: A incompatibilidade entre transdisciplinaridade e pensamento nico DESTAQUES DA SEMANA 36 LIVRO DA SEMANA: James Alison: O perdo antecede o pecado. A superao de uma viso moralista e chantagista 40 TEOLOGIA PBLICA: Pedro Trigo: Telogos enclausurados na academia. Um desafio 44 COLUNA DO CEPOS: Dnis de Moraes: Valrio Brittos, missionrio da tica e da solidariedade 46 DESTAQUES ON-LINE IHU EM REVISTA 48 Agenda da Semana 50 IHU Reprter: Srgio Trombetta www.ihu.unisinos.br www.ihu.unisinos.br twitter.com/ihu bit.ly/ihufacebook www.ihu.unisinos.br 3
  • 4. Tema de Capa Destaques da Semanawww.ihu.unisinos.br IHU em Revista 4 SO LEOPOLDO, 00 DE XXX DE 0000 | EDIO 000
  • 5. Tema de CapaQuem Edgar Morin? Edgar Morin nasceu em Pa- Filho nico, seu pai, Vidal Nahoum, alternativa concepo de paradig-ris, no dia 8 de julho de 1921. um era um comerciante originrio de ma encontrada em Thomas Kuhn.antroplogo, socilogo e filsofo Salnica. Sua me, Luna Beressi, fa- Seu primeiro livro traduzido para ofrancs, judeu de origem sefardita. leceu quando ele tinha 10 anos. Ateu portugus O cinema ou o homemPesquisador emrito do Centre Na- declarado, descreve-se como um imaginrio, em 1958.tional de la Recherche Scientifique. neomarrano. Morin afirma que diante dosFormado em Direito, Histria e Geo- A principal obra de Edgar Morin problemas complexos que as socie-grafia, realizou estudos em filosofia, a constituda por seis volumes, La dades contemporneas hoje enfren-sociologia e epistemologia. autor mthode (em portugus, O Mto- tam, apenas estudos de carter in-de mais de trinta livros, entre eles: O do). Foi escrita durante trs dcadas ter e politransdisciplinar poderiammtodo (6 volumes), Introduo ao e meia. Trata-se de uma das maiores resultar em anlises satisfatrias depensamento complexo, Cincia com obras de epistemologia disponvel. tais complexidades. Afinal escreveconscincia e Os sete saberes neces- Morin inicia os primeiros escritos de , de que serviriam todos os sabe-srios para a educao do futuro. da obra em 1973, com a publicao res parciais seno para formar umaDurante a Segunda Guerra Mundial, do livro O paradigma perdido: a na- configurao que responda a nossasparticipou da Resistncia Francesa. tureza humana, uma transformao expectativas, nossos desejos, nossasconsiderado um dos principais pen- epistemolgica por questionar o fe- interrogaes cognitivas?sadores contemporneos e um dos chamento ideolgico e paradigmtico Disponvel em: http://migre.me/principais tericos da complexidade. das cincias, alm de apresentar uma aBgaN.O Mtodo em portugusO Mtodo 1 A Natureza da Natureza (Europa Amrica: Portugal 1987. Porto Alegre: Sulina, 2003)O Mtodo 2 A vida da vida (Europa Amrica, 1999. Sulina, 2001)O Mtodo 3 O Conhecimento do Conhecimento (Europa Amrica, 1996. Sulina, 2002)O Mtodo 4 As ideias: habitat, vida, costumes, organizao (Sulina, 2002. Europa Amrica, 2002)O Mtodo 5 A humanidade da humanidade: a identidade humana (Sulina, 2003. Europa Amrica, 2003) www.ihu.unisinos.brO Mtodo 6 A tica (Europa Amrica, 2005. Sulina, 2005)Ba da IHU On-LineConfira a edio da IHU On-Line que trata sobre tema congneres aos de Edgar Morin: O ser humano como sujeito social na Teoria dos sistemas, auto-organizao e caos. Edio 142, de 23-05-2005, dispo- nvel em http://bit.ly/jkjCb6EDIO 402 | SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 5
  • 6. Tema de Capa A revogao do antropocentrismo e a aquisio de saberes transversais Fragmentao dos saberes obstaculiza a consolidao do humanismo, frisa Edgard de Assis Carvalho. A cincia se tornaria menos arrogante e prepotente caso assumisse a unidade indissolvel entre o sapiens e o demens dos seres humanos Por Mrcia Junges O antropocentrismo colocou os Edgard de Assis Carvalho graduado em humanos em nvel superior a Cincias Sociais pela Universidade de So todas as espcies vivas. Pulses Paulo USP, doutor em Antropologia pela incontidas o levam a destruir o que tem e v Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de pela frente. De nada adiantou sabermos que a Rio Claro, ps-doutor pela Ecole des Hautes Terra no era o centro do universo, que a evo- tudes e Sciences Sociales (EHESS), na Frana, luo um processo descontnuo, que somos e livre docente pela Universidade Estadual irremediavelmente regidos pelo inconsciente. Paulista Jlio de Mesquita Filho Unesp. Achamos, tambm, que somos nicos seres professor titular de Antropologia na Pontifcia de cultura. A ponderao de Edgard de As- Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP, sis Carvalho, em entrevista exclusiva concedi- coordenador do comit de tica em pesqui- da por e-mail IHU On-Line. Em seu ponto de sa e coordenador do Ncleo de Estudos da vista, revogar o antropocentrismo crucial Complexidade Complexus da PUC-SP e para a concretizao da poltica de civilizao representante brasileiro da Ctedra Itineran- proposta por Edgar Morin. E acrescenta: a te Unesco Edgar Morin Ciuem. um dos aquisio de saberes transversais a base que autores de Cultura e pensamento complexo deve reger a reforma do ensino e da educa- (Natal: EDUFRN, 2009). De suas obras, des- o. A religao, portanto, no soluo para tacamos: tica, solidariedade e complexida- nada, mas desafio constante a ser posto em de (So Paulo: Palas Athena, 1998) e Edgar prtica nas escolas do ensino fundamental, Morin: em busca dos fundamentos perdidos. mdio e superior. A fragmentao que hoje Textos sobre o marxismo (Porto Alegre: Edi- domina os campos do saber impede a conso- tora Sulina, 2002). www.ihu.unisinos.br lidao do humanismo. Confira a entrevista. IHU On-Line Qual a maior in- seu primeiro livro publicado em 1946. tar um avano nas conquistas sociais. tuio de Edgar Morin em seu pen- Em O ano zero da Alemanha1, sob os O ano de 1989 que sinalizou para samento? Em que as aspectos reside escombros do final da Segunda Guerra Eric Hobsbawm2 o final do sculo XX sua atualidade? Mundial, ele imagina que a Alemanha Edgard de Assis Carvalho No poderia vir a ser um exemplo para o 2 Eric Hobsbawm: historiador marxista se trata apenas de intuio, mas de mundo. Dividida entre as potncias do sculo XX. Autor de inmeros livros, um trabalho sistemtico de pesquisa, que saram vencedoras da Guerra, a entre os quais A era dos extremos (So interpretao, criatividade. Com mais Alemanha socialista poderia represen- Paulo: Companhia das Letras, 1995), A era do capital (Rio de Janeiro: Paz e de 60 livros publicados, aos 91 anos, Terra, 1982), A era das revolues (Rio Edgar Morin hoje um dos maiores de Janeiro: Paz e Terra, 1982), A era dos pensadores vivos. Judeu sefardita, 1 LAn zro de lAllemagne (La Cit imprios (Rio de Janeiro: Paz e Terra, Universelle, Paris, 1946). (Nota da IHU 1988), Bandidos (Rio de Janeiro: Forense membro da resistncia francesa, teve On-Line) Universitria, 1976) e sua autobiografia, 6 SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 | EDIO 402
  • 7. incumbiu-se de demonstrar que essa A importncia noologias, ou seja, esses circuitos de Tema de Capabipartio ficara invivel no contexto ideias que organizam as percepespoltico-econmico da modernidadeque varreu os socialismos da face da de Edgar Morin do sujeito. Os sistemas de ideias que conformam as teorias e conceitos de-Terra. Importante frisar, porm, quea semente da complexidade j estava no pode ser vem ser abertos, biodegradveis, ja- mais eternos e fixos. Funcionam comol, mesmo que ele fosse muito jovem operadores de organizao do mundoe no tivesse ainda passado pelas resumida aos da vida.trs reorganizaes gentico-cogni- O volume cinco A humanidadetivas que iriam marcar sua trajetria seis volumes da humanidade: a identidade humanaacadmica. (Sulina, 2003. Europa Amrica, 2003) de O mtodo, estabelece uma relao crtica com o IHU On-Line Nesse contexto, conceito de identidade e adverte con-qual a importncia dos seis volumes publicados tra os sentidos do relativismo que node O mtodo? consegue enxergar alm das fronteiras Edgard de Assis Carvalho A im-portncia de Edgar Morin no pode de modo no de raa, sexo, religio. A identidade nunca pura, pelo simples fato de queser resumida aos seis volumes de Omtodo, publicados de modo no se- sequencial ordens individuais, sociais e csmicas esto em constante interao, e nemquencial no perodo 1977-2004. Suaobra dividida em macrotemas: m- no perodo sempre de modo harmnico. Por ve- zes so antagnicas e contraditrias.todo, pensamento complexo, trindadehumana, tetralogia pedaggica, era 1977-2004 Finalmente o volume seis A tica (Europa Amrica, 2005. Sulina, 2005)planetria, tempo presente, pensa- ilustra as contradies contempor-mento poltico, caminho, voz, dirios, neas que cercam a tica individual ecolquios. H tambm um site oficial destacar algumas ideias nucleares a tica da polis. preciso redefinir odo Centre Edgar Morin na internet: dessa fascinante hexalogia. O volume pensamento da tica e a tica do pen-www.iiac.cnrs.fr, em que a bibliografia um A natureza da natureza (Europa samento. Qualquer ato tico uma re-completa encontrada. Esses temas Amrica: Portugal 1987. Porto Alegre: ligao com o mesmo e o outro, com ase entrecruzam a todo tempo. H, Sulina, 2003) estabelece a dialogia comunidade, a humanidade, o cosmo.porm, algo que deve ser enfatizado. entre ordem e desordem que marca aSem a leitura dos seis volumes, qual- passagem das leis da natureza natu- IHU On-Line Para Edgar Morin,quer leitor no conseguir estabele- reza das leis. A unidade complexa da somos sapiens e demens concomitan-cer as conexes necessrias para a natureza contm relaes entre todo e temente. Como conviver com essecompreenso das bases, dos funda- partes, emergncias e reorganizaes lado oculto (e inegvel) da nossa exis-mentos, das propostas que cercam o de padres organizatrios aleatrios. tncia como apontara Nietzsche aopensamento do autor. Se voc l, por A natureza no regida unicamente formular o conceito de tragdia?exemplo, Meu caminho, livro de en- por relaes de causa e efeito e, em si Edgard de Assis Carvalho Notrevistas concedidas a Djnane Kareh mesma, no portadora de uma fina- considero uma concomitncia, masTager, o prprio Morin se incumbe lidade estabelecida a priori. uma convivncia. Como toda convi-de revelar que a totalidade da obra O volume dois A vida da vida vncia, a do sapiens e a do demensconstitui um mosaico de interligaes (Europa Amrica, 1999. Sulina, 2001) simultaneamente oposta e com-e interconexes entre vrias reas do penetra a fundo na ecologia, pelo plementar. De um lado, temos o ladosaber, e no apenas do ocidental. Da simples fato de que os ecossistemas sistemtico das regulaes cotidianasresultam as crticas, incompreenses e so sistemas vivos que, a todo tempo, e dos padres culturais que prescre- www.ihu.unisinos.brressentimentos que os intelectuais e integram a organizao biolgica na vem nossa vida cotidiana; de outrono s os brasileiros dirigem ao con- ordem csmica. O volume trs O Co- o descomedimento, a loucura, a hi-junto de suas ideias. nhecimento do Conhecimento (Europa bris que costumam ser recalcados Amrica, 1996. Sulina, 2002) abran- para os subterrneos da mente e do IHU On-Line O que destacaria ge o processo do conhecimento e a corpo. Assumir a dialogia necessriaem cada um deles como fundamento abertura bioantropossociolgica e o entre oposio e complementarida-para compreendermos sua obra? ponto de partida para a anlise do ina- de implica reconhecer que somos Edgard de Assis Carvalho A res- cabamento humano. Conhecer com- sempre seres da falta e que, por isso,posta demandaria uma anlise mais putar, e essa computao tecida pelo aprendemos a priorizar um lado emaprofundada que excede os limites entrelaamento dos itinerrios racio- detrimento do outro. Conviver simul-de uma entrevista. possvel, porm, nal-lgico-dedutivo e simblico-mti- taneamente com essas duas facetas co-imaginrio. O volume quatro As requer o abandono do antropocen- ideias: habitat, vida, costumes, organi- trismo e o reconhecimento de que Tempos Interessantes: uma vida no sculo zao (Sulina, 2002. Europa Amrica, somos, como afirmou Michel Cass, XX (So Paulo: Companhia das Letras, 2002).(Nota da IHU On-Line) 2002) incursiona pelas noosferas e filhos do Cu, seres da impermann-EDIO 402 | SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 7
  • 8. cia, insignificantes diante do mistrio Nietzsche um mos que, em si mesma, a tcnica noTema de Capa e da incerteza da vida. Nietzsche um boa nem m. Seus efeitos dependem dos interlocutores de Edgar Morin e, certamente, O nascimento da trag- dos interlocutores de ecopolticas postas em prtica pelo conjunto da sociedade civil. A revoga- dia (So Paulo: Companhia das Letras, 1992), de 1872, mesmo que no o cite de Edgar Morin o do antropocentrismo , portanto, crucial para a concretizao da poltica constantemente, faz parte de suas ba- de civilizao proposta por Edgar Mo- ses interpretativas. Nesse ensaio per- e, certamente, rin. Em Rumo ao abismo (Rio de Janei- turbador Nietzsche expe a relao ro: Bertrand Brasil, 2007), por exem- entre o apolneo e o dionisaco. E no O nascimento plo, publicado em 2007, encontramos faz isso para ser aplicado ao teatro ou explicitados os fundamentos da crise a msica, mas a todas as expresses da tragdia, de da mundializao. Se as mdias pro- do humano. O que ele mostra como duziram e difundiram produtos cultu- duas noes aparentemente opostas 1872, mesmo rais os mais diferenciados, o acesso podem ser complementares. A rigor, cultura permanece elitizado. A cultura todos somos, ao mesmo tempo, apo- lneos e dionisacos. E aqui reside nos- que no o cite dita de massa no se democratizou. Pelo contrrio, criou iluses, fantas- sa tragdia contempornea. Sob a luz da razo, da tcnica, existem sombras constantemente, mas, desejos mimticos que nunca se realizam. Seria preciso perceber que que precisam ser identificadas. faz parte de a humanidade , ao mesmo tempo, una e mltipla. Diversidades culturais IHU On-Line Tomando em con- siderao o pensamento de Edgar suas bases deveriam dialogar entre si, pois todas elas se inserem na mesma identida- Morin, como se manifestam o homo sapiens e o demens? interpretativas de terrena. A sociedade-mundo tem diante de si o desafio de enfrentar o Edgard de Assis Carvalho No terror-mundo que se dissemina por se trata de uma manifestao, mas de toda parte. uma condio imanente dos homens sitado a Terra, em vez de viver sim- em geral. Est presente em humanos bioticamente com ela? IHU On-Line Podemos pensar de todos os tempos e lugares. O sa- Edgard de Assis Carvalho A pre- esse comportamento antropocntri- piens apolneo, o demens dionisaco. servao e a sustentabilidade da Terra co a partir da ecologia da ao? Como Nos tempos lquidos de hoje, o sapiens so metas prioritrias diante da idade seria essa anlise? o legitimador da razo contempor- de ferro planetria em que nos en- Edgard de Assis Carvalho A eco- nea, comandada pelo quadrimotor contramos. Sustentabilidade implica logia da ao um dos deflagradores cincia/tcnica/indstria/estado que garantir para as geraes futuras uma desse processo. Em primeiro lugar, conduz os processos da globaliza- destinao democrtica digna que seria necessrio desfazer a separao o. Sabemos que, de um lado, eles acabe de vez com as desigualdades e entre homem e natureza, introduzida pregam a uniformizao e, de outro, isso contraditrio com polticas de- no pensamento moderno, pelo menos geram processos crescentes de exclu- senvolvimentistas baseadas numa su- desde Descartes4. O antropocentrismo so, intolerncias, racismos. O demens posta superioridade da tecnocincia. considera que a via racional no a A perspectiva estadocntrica precisa nica forma de acesso realidade. ser reequacionada em prol de rela- disponvel para download em http:// migre.me/uNtv, e 187, de 3-07-2006, Por vezes, a via imaginal acessa essa es sociais equitativas e equnimes. intitulada Ser e tempo. A desconstruo mesma realidade com certo despudor A destruio sistemtica dos ecossis- da metafsica, que pode ser acessado e liberdade. Por isso as artes em ge- temas tem a ver com a suposta supe- em http://migre.me/uNtC. Confira, www.ihu.unisinos.br ainda, o n 12 do Cadernos IHU Em ral so elementos fundamentais de rioridade do homem que acredita na Formao intitulado Martin Heidegger. compreenso do mundo. Para Edgar dominao da natureza como fonte A desconstruo da metafsica, que pode Morin, o cinema, a literatura, as artes de progresso. Desde Heidegger3, sabe- ser acessado em http://migre.me/uNtL. Confira, tambm, a entrevista concedida so desdobramentos da representa- por Ernildo Stein edio 328 da revista o e, como tal, devem ser necessa- 3 Martin Heidegger (1889-1976): IHU On-Line, de 10-05-2010, disponvel filsofo alemo. Sua obra mxima O em http://migre.me/FC8R, intitulada O riamente includas nas interpretaes ser e o tempo (1927). A problemtica biologismo radical de Nietzsche no pode que fazemos a nosso prprio respeito. heideggeriana ampliada em Que ser minimizado, na qual discute ideias de A cincia ficaria menos arrogante e metafsica? (1929), Cartas sobre sua conferncia A crtica de Heidegger o humanismo (1947), Introduo ao biologismo de Nietzsche e a questo prepotente se admitisse esse fato e metafsica (1953). Sobre Heidegger, a IHU da biopoltica, parte integrante do Ciclo percebesse que o sapiens e o demens On-Line publicou na edio 139, de 2-05- de Estudos Filosofias da diferena - Pr- constituem uma unidade indissolvel. 2005, o artigo O pensamento jurdico- evento do XI Simpsio Internacional poltico de Heidegger e Carl Schmitt. IHU: O (des)governo biopoltico da vida A fascinao por noes fundadoras do humana. (Nota da IHU On-Line) IHU On-Line A partir do cenrio nazismo, disponvel para download em 4 Ren Descartes (1596-1650): filsofo, http://migre.me/uNtf. Sobre Heidegger, fsico e matemtico francs. Notabilizou-se de devastao da natureza, correto confira as edies 185, de 19-06-2006, sobretudo pelo seu trabalho revolucionrio concluir que o ser humano tem para- intitulada O sculo de Heidegger, da Filosofia, tendo tambm sido famoso 8 SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 | EDIO 402
  • 9. colocou os humanos em nvel supe- A cincia ficaria na teoria da complexidade de Morin. Tema de Caparior a todas as espcies vivas. Pulses Acredita que a religao dos saberesincontidas o levam a destruir o quetem e v pela frente. De nada adian- menos arrogante pode tornar mais pacfica e ressignifi- car a existncia das pessoas? Edgard de Assis Carvalho Atou sabermos que a terra no era ocentro do universo, que a evoluo e prepotente se Teoria Geral dos Sistemas e o pen- um processo descontnuo, que so- samento complexo so complemen-mos irremediavelmente regidos pelo admitisse esse tares. No podem ser igualados. Ainconsciente. Achamos, tambm, que existncia humana pacfica, to pro-somos nicos seres de cultura. Morin fato e percebesse clamada desde Kant8 a respeito da pazrefere-se vrias vezes ao conceito de perptua, requer um trabalho siste-cultura, considerando-o um conceito- que o sapiens mtico no nvel das ideias. As noosfe--armadilha. Contaminado pelo carte- ras e as noologias esto a para seremsianismo, esfacelou-se em dualidades: e o demens retrabalhadas a todo tempo. A religa-cultura erudita/cultura popular, cultu- o dos saberes uma base cognitivara cientfica/cultura das humanidades,essas ltimas responsveis pela conso- constituem e afetiva a ser aplicada em todos os nveis da formao escolares. A aqui-lidao da fragmentao universitria.Patrimnio universal, a cultura tem uma unidade sio de saberes transversais a base que deve reger a reforma do ensinopadres, prescries, normas, mastambm resistncias, zonas obscuras indissolvel e da educao. A religao, portanto, no soluo para nada, mas desafiodifceis de serem decifradas. A cultura constante a ser posto em prtica nasno apenas uma fbrica da ordem. admitssemos esse fato, nossa supos- escolas do ensino fundamental, m- igualmente desordem, interao, re- ta arrogncia poderia ser minimizada. dio e superior. A fragmentao queorganizao. A moderna etologia de- Passaramos a ser coparticipantes de hoje domina os campos do saber im-monstra que primatas no humanos nossa aventura hominescente. pede a consolidao do humanismo.conseguem estabelecer polticas do uma reserva de poder de reas dis-bem-viver baseadas em estratgias de IHU On-Line Diz-se que no um- ciplinares que se contentam com ava-paz e tica. A cultura no mais nos- bral da academia de Plato6 havia um liaes quantitativas e produtivismosso privilgio. Trata-se, talvez, de uma conselho de que s entrasse ali quem classificatrios. A pergunta que deve-quarta ferida narcsica que seria acres- soubesse geometria. Esse conselho ria ser dirigida aos avaliadores nome-centada formulao de Freud5. Se tem sua verso moderna na teoria ados pelo aparato de Estado quem geral dos sistemas de Bertalanffy7 e ir avali-los. Essas comisses consa- por ser o inventor do sistema de gram a fragmentao e, com isso, so coordenadas cartesiano, que influenciou empecilhos construo do conheci- o desenvolvimento do clculo moderno. disponvel para consulta no link http:// Descartes, por vezes chamado o fundador migre.me/s8jc. A edio 207, de 04-12- da filosofia e matemtica modernas, 2006, tem como tema de capa Freud e 8 Immanuel Kant (1724-1804): filsofo inspirou os seus contemporneos e a religio, disponvel para download em prussiano, considerado como o ltimo geraes de filsofos. Na opinio de http://migre.me/s8jF. A edio 16 dos grande filsofo dos princpios da era alguns comentadores, ele iniciou a Cadernos IHU em formao tem como moderna, representante do Iluminismo, formao daquilo a que hoje se chama de ttulo Quer entender a modernidade? indiscutivelmente um dos seus pensadores racionalismo continental (supostamente Freud explica, disponvel para download mais influentes da Filosofia. Kant teve um em oposio escola que predominava em http://migre.me/s8jU. (Nota da IHU grande impacto no Romantismo alemo nas ilhas britnicas, o empirismo), posio On-Line) e nas filosofias idealistas do sculo XIX, filosfica dos sculos XVII e XVIII na Europa. 6 Plato (427-347 a. C.): filsofo tendo esta faceta idealista sido um ponto (Nota da IHU On-Line) ateniense. Criador de sistemas filosficos de partida para Hegel. Kant estabeleceu 5 Sigmund Freud (1856-1939): influentes at hoje, como a Teoria das uma distino entre os fenmenos e a www.ihu.unisinos.br neurologista e fundador da Psicanlise. Idias e a Dialtica. Discpulo de Scrates, coisa-em-si (que chamou noumenon), Interessou-se, inicialmente, pela histeria Plato foi mestre de Aristteles. Entre isto , entre o que nos aparece e o que e, tendo como mtodo a hipnose, suas obras, destacam-se A Repblica e o existiria em si mesmo. A coisa-em-si estudava pessoas que apresentavam Fdon. Sobre Plato, confira e entrevista no poderia, segundo Kant, ser objeto esse quadro. Mais tarde, interessado As implicaes ticas da cosmologia de de conhecimento cientfico, como at pelo inconsciente e pelas pulses, foi Plato, concedida pelo filsofo Prof. Dr. ento pretendera a metafsica clssica. A influenciado por Charcot e Leibniz, Marcelo Perine edio 194 da revista cincia se restringiria, assim, ao mundo abandonando a hipnose em favor da IHU On-Line, de 04-09-2006,disponvel dos fenmenos, e seria constituda associao livre. Estes elementos em http://migre.me/uNq3. Leia, pelas formas a priori da sensibilidade tornaram-se bases da Psicanlise. Freud, tambm, a edio 294 da Revista IHU On- (espao e tempo) e pelas categorias do alm de ter sido um grande cientista e Line, de 25-05-2009, intitulada Plato. A entendimento. A IHU On-Line nmero escritor, realizou, assim como Darwin totalidade em movimento, disponvel em 93, de 22-03-2004, dedicou sua matria e Coprnico, uma revoluo no mbito http://migre.me/uNqj. (Nota da IHU On- de capa vida e obra do pensador com humano: a idia de que somos movidos Line) o ttulo Kant: razo, liberdade e tica, pelo inconsciente. Freud, suas teorias e 7 Karl Ludwig von Bertalanffy (1901- disponvel para download em http:// o tratamento com seus pacientes foram 1972): bilogo criador da Teoria geral dos migre.me/uNrH. Tambm sobre Kant foi controversos na Viena do sculo XIX, sistemas. Cidado austraco, desenvolveu publicado este ano o Cadernos IHU em e continuam muito debatidos hoje. A a maior parte do seu trabalho cientfico formao nmero 2, intitulado Emmanuel edio 179 da IHU On-Line, de 08-05- nos Estados Unidos da Amrica. autor Kant - Razo, liberdade, lgica e tica, 2006, dedicou-lhe o tema de capa sob o de Teoria Geral dos Sistemas (Petrpolis: que pode ser acessado em http://migre. ttulo Sigmund Freud. Mestre da suspeita, Vozes, 1968). (Nota da IHU On-Line) me/uNrU. (Nota da IHU On-Line)EDIO 402 | SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 9
  • 10. mento pertinente, alis um dos sabe- A preservao e da racionalizao. A desrazo estTema de Capa res propostos por Edgar Morin. diante de ns e integr-la ao nvel dos IHU On-Line Como os sete sa- e a susten- saberes sistematizados algo priorit- rio e inadivel. Uma nova concepo beres podem se fazer presentes para as pessoas nos dias de hoje? Qual tabilidade da de mundo exige que a esperana se converta em meta prioritria. Sem ela, a grande esperana que nasce a par- instalam-se o conformismo e a ade- tir de uma nova concepo de vida e Terra so metas so s prticas convencionais. Com relacionalidade? ela podem-se construir vias para o fu- Edgard de Assis Carvalho A prioritrias diante turo da humanidade desencadeadas proposta dos sete saberes as ce- por amplas reformas do pensamento, gueiras do conhecimento: o erro e a da idade de ferro da educao, da sociedade, da vida. iluso, o conhecimento pertinente, a Esse o propsito do ltimo livro de condio humana, a identidade terre- planetria em que Edgar Morin A via para o futuro da na, as incertezas, a compreenso, ti- humanidade. ca do gnero humano tem a ver com algo mais profundo. Foi um desafio nos encontramos IHU On-Line Gostaria de proposto a Edgar Morin pelo ministro acrescentar alguns aspectos no da educao nacional da Frana, em questionados? 1999, no final segundo mandato de na IX tese sobre Feuerbach12, alis Edgard de Assis Carvalho Como Franois Mitterand. A proposta visa- sempre referida por Morin, deve ser explicitei anteriormente, a complexi- va prioritariamente o ensino mdio. o fio condutor de qualquer iniciativa dade no deve ser vista como soluo Em sucessivas reunies preparatrias reformadora. O pensamento comple- para os males do mundo, mas como e entrevistas imprensa, Edgar Mo- xo no pensa contra Marx, mas com desafio constante a ser posto em rin sempre enfatizava que os saberes Marx. necessrio retomar os fun- prtica na vida social em seu conjun- no deveriam ser concebidos como damentos perdidos, saturar a noo to em prol de um mundo mais justo, disciplinas. Eles so deflagradores de de homem genrico com emoo e equitativo e tico, e isso no nvel do uma cosmoviso capaz de religar de- descomedimento. indivduo, da sociedade e da espcie. finitivamente a cultura cientfica e a Somos seres dotados de razo, Recentemente, Morin publicou um cultura das humanidades. Essa neces- mas no podemos nos deixar domi- pequeno livro O Caminho da espe- sidade j havia sido explicitada por nar pelos atratores do racionalismo rana (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, Charles Snow9 em 1957. Em As duas 2012), escrito com Stphane Hessel13. culturas10, Snow enftico ao afir- nico representante vivo dentre os mar que qualquer sistema social que historiador e revolucionrio alemo, um signatrios da Declarao Universal pensasse a si mesmo com sabedoria dos pensadores que exerceram maior do Direitos do Homem, Hessel, hoje influncia sobre o pensamento social deveria empenhar-se na busca dessa e sobre os destinos da humanidade no com 93 anos, notabilizou-se em 2011 juno, no por justaposio, mas por sculo XX. Marx foi estudado no Ciclo pela publicao de um pequeno livro transversalidade. Talvez por isso o de Estudos Repensando os Clssicos Indignai-vos no qual conclama as da Economia. A edio nmero 41 dos projeto da reforma do ensino mdio Cadernos IHU Ideias, de autoria de Leda novas geraes a se revoltarem con- no tenha dado certo. Foram grandes Maria Paulani tem como ttulo A (anti) tra o desmando generalizado instala- os protestos sindicais. Restou uma re- filosofia de Karl Marx, disponvel em do no mundo. Em O caminho da espe- http://migre.me/s7lq. Tambm sobre serva de memria para ser redefinida o autor, confira a edio nmero 278 da rana, ambos reiteram que o objetivo nas escolas empenhadas numa edu- IHU On-Line, de 20-10-2008, intitulada que pregam implica a denncia do cao planetria. No Brasil, em 2010, A financeirizao do mundo e sua crise. curso perverso da poltica insensata Uma leitura a partir de Marx, disponvel ocorreu em Fortaleza uma confern- atual. Se ela permanecer intocada, www.ihu.unisinos.br para download em http://migre.me/ cia internacional presidida por Morin. s7lF. Leia, igualmente, a entrevista que desastres irreversveis adviro. Os saberes foram reiterados como Marx: os homens no so o que A salvao pblica de que necessita- pensam e desejam, mas o que fazem, prioritrios e o congresso lanou um concedida por Pedro de Alcntara mos requer revolta, esperana, de- manifesto que foi institucionalmente Figueira edio 327 da revista IHU terminao em prol de uma poltica divulgado. preciso, porm, ter em On-Line, de 03-05-2010, disponvel de civilizao que abarque todos os para download em http://migre.me/ mente que reforma da educao s Dt7Q. (Nota da IHU On-Line) domnios da vida. ocorrer a partir da reforma dos edu- 12 Ludwig Feuerbach (1804-1872): cadores. Essa a formulao de Marx11 filsofo alemo, reconhecido pela influncia que seu pensamento exerce 13 Stphane Frdric Hessel (1917): sobre Karl Marx. Abandona os estudos de diplomata, embaixador, combatente da 9 Charles Percy Snow (1905-1980): fsico Teologia para tornar-se aluno de Hegel, resistncia francesa e agente da Bureau e romancista ingls. (Nota da IHU On- durante dois anos, em Berlim. De acordo Central de Renseignements et dAction Line) com sua filosofia, a religio uma forma (o servio de inteligncia da Frana). The Two Cultures (London: Cambridge de alienao que projeta os conceitos Nascido como alemo, Stphane obteve University Press, 1959). (Nota da IHU On- do ideal humano em um ser supremo. a nacionalidade francesa em 1937. Ele Line) autor de A essncia do cristianismo (2. participou da elaborao da Declarao 11 Karl Heinrich Marx (1818-1883): ed. So Paulo: Papirus, 1997). (Nota da Universal dos Direitos Humanos de 1948. filsofo, cientista social, economista, IHU On-Line) (Nota da IHU On-Line) 10 SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 | EDIO 402
  • 11. Tema de CapaUm apelo ao eterno perguntarJean Louis Le Moigne analisa a importncia das obras de Edgar Morin emconexo com as cincias dos sistemas, a engenharia e a inteligncia artificial.Todos somos responsveis pela aventura do conhecimento humano e desuas sociedades, avaliaPor Mrcia Junges | Traduo: Vanise Dresch D e acordo com o engenheiro francs epistemolgico exigente. Fazendo isso, Morin Jean Louis Le Moigne, a complexi- esforou-se, junto com outros obviamente, dade est vinculada tanto ao global para documentar, argumentar e ilustrar essas como ao local. No devemos reduzi-la glo- questes. balidade. Na mecnica celeste, j se conside- Jean Louis Le Moigne nasceu em 1931, ra o problema da gravitao atrativa de trs em Casablanca, formou-se em Engenharia corpos (trs somente!) como muito comple- na Universidade de Harvard (EUA), trabalhou xo, no sentido de potencialmente imprevis- entre 1956 e 1971, no grupo Shell francs e vel na prtica. Ele discute, tambm, a auto- lecciona, desde 1971, na Universidade Aix- -organizao e a Teoria Geral dos Sistemas, -Marseille (Frana) onde atualmente pro- de Bertallanfy: para adquirir autonomia fessor emrito. presidente do Programa e, portanto, auto-organizar-se, um sistema Europeu de Modelizao da Complexidade deve ser aberto, estar em interao efetiva e vice-presidente da Associao Para o Pen- com seus ambientes, que ele transforma e samento Complexo APC. Publicou mais de que o transformam. Analisando o legado de uma centena de artigos e cerca de duas de- Morin, Le Moigne pontua que as disciplinas zenas de livros, alguns dos quais, escritos em cientficas no podem mais definir-se por um colaborao com autores to importantes nico objeto de conhecimento, estritamen- como Edgar Morin ou Herbert Simon, entre os te delimitado e tido como um dado da Natu- quais Les systmes dinformation dans les or- reza: elas devem ser entendidas tambm e ganisations (1973), Les systmes de dcision primeiramente por seu projeto de conheci- dans les organisations, (1973) La thorie du mento, conscientemente formulado pelo es- systme gnral, thorie de la modlisation prito humano, atravs do qual interligam-se (1977); La modlisation des systmes com- a experincia do corpo e a compreenso do plexes (1990), Sciences de lintelligence, scien- mundo. E ressalta: a contribuio mais de- ces de lartificiel (1986) com Edgar Morin; cisiva da obra de Edgar Morin nesse sentido Science et conscience de la complexit (1984); foi o apelo permanente dirigido a todos os Lintelligence de la complexit (1999). www.ihu.unisinos.br cientistas para que nunca deixassem de fazer Confira a entrevista. essas perguntas e praticassem esse trabalho IHU On-Line A partir da teoria Edgar Morin fala mais precisamente to, a expresso cincia dos sistemasda complexidade de Edgar Morin, do paradigma da complexidade: O complexos surge, em nossas univer-qual o nexo que une as cincias dos paradigma no explica, ele permite sidades, a partir de 1985, reunindosistemas, a engenharia e a intelign- a compreenso. Do mesmo modo, subdisciplinas da cincia da regula-cia artificial? a expresso cincia de sistemas o (ciberntica de primeira ordem), Jean Louis Le Moigne Em pri- inadequada, no sentido de que todas da informtica, da inteligncia arti-meiro lugar, precisamos estar atentos as disciplinas cientficas podem tam- ficial e da matemtica dos sistemas escolha das palavras: a complexi- bm ser consideradas cincias dos dinmicos lineares e no lineares.dade no uma teoria no sentido da sistemas, de modo que a expresso porm, como cincia autnoma, elateoria da gravitao ou da evoluo. no designa nenhuma delas. Por cer- se esqueceu de alicerar ou arrai-EDIO 402 | SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 11
  • 12. gar seus prprios fundamentos... tar e conceber unidades complexas, finir a inteligncia artificial, a qual eleTema de Capa O trabalho preliminar ainda est por constitudas por inter-relaes orga- preferia ter denominado simulao ser feito: conceber os objetos como nizacionais entre elementos, aes ou funcional dos processos cognitivos. sistemas. outras unidades complexas. A cin- Uma simulao computacional (por Foi a esta empreitada que se de- cia dos sistemas torna-se, por assim programao de heursticas que dis- dicou Edgar Morin a partir de 1970, dizer, a cincia da modelizao e da pem de sistemas de memorizao) a partir de sua experincia como so- concepo sistmica (como e por um pode muitas vezes possibilitar uma cilogo e antroplogo, mas principal- sistema em geral). Antes organizado e interpretao plausvel de compor- mente desde o seu encontro com a fechado, o conceito de sistema passa tamentos observveis de um sujeito obra de H. Von Foerster1 e, em par- ento a organizar e a organizar-se. Em dotado de um projeto e exposto a ticular, o artigo seminal deste autor, vez de ser a palavra-mestra da totali- variaes de seu ambiente externo. de 1959, intitulado Os sistemas au- dade (holismo), ele se torna a raiz da Nesse sentido, a inteligncia artifi- to-organizadores e seu ambiente. complexidade. cial torna-se uma ferramenta de ex- Para adquirir autonomia e, portanto, Assim sendo, as novas cincias plorao de situaes possveis e de auto-organizar-se, um sistema deve da engenharia, cincias de concepo elaboraes de estratgias de aes ser aberto, estar em interao efetiva ou do artificial, como dir H. Simon prximas concebveis, sem, contudo, com seus ambientes, que ele transfor- (1969), podem ser entendidas como impor a escolha da deciso certa. ma e que o transformam. cincias fundamentais, e no mais Os possveis nem sempre so os de- A partir desse apelo a um pen- como disciplinas de aplicao, servas sejveis nas decises de comporta- samento aberto (e no mais fechado, das cincias de anlise, ditas exatas mento humano, que, na prtica, so como implicavam os quatro preceitos (reducionistas, causalistas, fecha- muitas vezes multicritrios, critrios fundadores do Discurso do mtodo, das em torno de um objeto passivo). raramente hierarquizados de manei- de Ren Descartes, 1637), Morin mo- Tornam-se tambm, sobretudo elas, ra uniforme. biliza todos os recursos oferecidos responsveis por sua prpria crtica pelas novas disciplinas que se desen- epistemolgica interna. Perspectiva transhumanista volveram desde a institucionalizao A inteligncia artificial torna-se Essas consideraes metodo- da ciberntica (cincia da regulao uma dessas novas cincias da enge- lgicas requerem, evidentemente, interativa e da comunicao entre or- nharia, fontes de heursticas explo- um exerccio permanente de crtica dem desejada e desordem percebida), ratrias nos campos das cincias da epistemolgica. Devemos nos inter- das cincias da informao, da com- computao, que se revelaro muitas rogar aqui sobre a leviandade desses putao, da cognio etc. O conceito vezes poderosas para orientar infe- questionamentos tico-epistmicos rgido de estrutura no permitia con- rncias nas cincias da cognio, da quando se observam desvios cientifi- siderar nem dar conta da mirade de biologia computacional, da lingustica cistas tais como aqueles desenvolvi- interaes entre ordem e desordem computacional, etc. dos na perspectiva transumanista (ou que cada um de ns observa nas ati- ps-humanista) de uma humanidade vidades humanas. Fazia-se necessrio IHU On-Line O desenvolvimen- transformada pelas tcnicas compu- restaurar o conceito de organizao, to da inteligncia artificial foi not- tacionais, que deveriam permitir me- entendendo-o em sua complexidade: vel nos ltimos anos. De que modo lhorar as caractersticas fsicas e men- Unitas multiplex. esta rea do conhecimento humano tais dos seres humanos (a partir de pode contribuir para o avano da trabalhos contemporneos sobre as Crtica epistemolgica interna compreenso interligada do conhe- tcnicas informticas da vida artificial, A partir dessa base paradigmti- cimento, da prpria vida e de suas da concepo artificial, da engenharia ca, a complexidade de base, o concei- possibilidades? artificial, trabalhos raramente atentos to de sistema, ou unidade complexa Jean Louis Le Moigne Talvez eu s questes ideolgicas). Ser que po- organizada, surge como um conceito- possa responder com uma observa- demos estabelecer definitivamente os www.ihu.unisinos.br -piloto resultante das interaes entre o de Paul Valry2 em seus Cahiers, a critrios de uma melhora certa e uni- um observador/conceptor e o univer- qual bem anterior ao surgimento da versal da espcie humana? so fenomenal; ele permite represen- expresso inteligncia artificial (MIT, 1956): Ns compreendemos melhor Inteligncia artificial 1 Heinz Von Foerster (1911-2002): os viventes medida que inventamos Resta que as tcnicas da inteli- bilogo austraco e um dos arquitetos da e construmos mquinas (Cahiers XIII, gncia artificial so tcnicas de simu- ciberntica, chamado por Edgar Morin 617, 1929). lao informtica. Enquanto tais, elas como Scrates ciberntico, fundou a Biociberntica para estudar os fenmenos Foi este argumento que H. Si- levam ao exame fenomenolgico de biolgicos a partir dessa nova matriz. mon enfatizou, j em 1969, para de- comportamentos observveis, suge- Concebeu o processo de vida como sistema fechado para informao e aberto para a rindo hipteses heursticas program- energia, destacando o papel da interao 2 Ambroise-Paul-Toussaint-Jules Valry veis a fim de propor inferncias que e da auto-organizao. Na esteira dos (1871-1945): filsofo, escritor e poeta autorizam compreenses funcionais estudos de Von Foerster, surgiu a teoria francs da escola simbolista cujos escritos de Maturana & Varela e o conceito de incluem interesses em matemtica, plausveis dos fenmenos considera- Autopoiesis. (Nota da IHU On-Line) filosofia e msica. (Nota da IHU On-Line) dos. Se algumas dessas simulaes pa- 12 SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 | EDIO 402
  • 13. ramtricas levam a comportamentos Vivemos hoje Sem dvida, foi o desenvolvimen- Tema de Capatidos como desejveis em contextos to do positivismo segundo Augustepredefinidos, elas permitiro ento arealizao efetiva de robs e prteses a crise dessa Comte6 que garantiu a longa sobrevi- vncia do paradigma da epistemolo-que podem cumprir essas mesmasfunes no mesmo contexto, prestan- renovao de gia cartesiana que observamos ainda hoje. E. Morin (1991) o nomeia odo ateno nos efeitos ditos pleiotr- grande paradigma do Ocidente ou opicos. O processador concebido para nossos paradigmas paradigma da cincia clssica. No en-cumprir essa funo pode revelar-se tanto, devemos lembrar que, j ema posteriori capaz de exercer outras de referncia 1934, G. Bachelard7 conclui Le nouvelfunes no antecipadas no caso de esprit scientifique8 com um apelo amodificaes s vezes mnimas do uma epistemologia no cartesiana,contexto, sejam elas exgenas ou en- cartesianos do Discurso do mtodo que ia desenvolver-se e organizar-sedgenas, provocadas por efeitos de (1637): independncia do objeto e nos desenvolvimentos das novas ci-autoaprendizagem. do sujeito, fundamento do postulado ncias, dentro do paradigma da com- Lembremo-nos aqui do prin- fundador de objetividade dita cientfi- plexidade que E. Morin nos apresentacpio de Jean Piaget3: Um sistema ca; modelizao analtica por reduo nos seis tomos de O mtodo.inteligente pode e deve construir e a elementos tidos como simples e evi-memorizar os traos de seu prprio Pensamento aberto dentes; determinismo universal porcomportamento. Este princpio nos Doravante, o desafio deixa de cadeias causais lineares; fechamentolembra que a inteligncia no pri- ser defensivo, contra um pensamento absoluto dos modelos que implicammeiramente um processador, mas fechado, o reducionismo e o determi- contagens exaustivas. Esses preceitos,um processo que s pode ser com- nismo integrista. Torna-se construtivo, essencialmente derivados dos trspreendido e desenvolvido em intera- a favor de um pensamento aberto: axiomas formais do silogismo perfeitoes, que, por sua vez, so auto-eco- O pensamento complexo um pen- segundo Aristteles4, no apresentam-organizadoras. Podemos concluir samento que interliga, escreveu E. um carter de evidncia universal.com uma famosa expresso de desse Morin em 1976: O nico mtodo que No surpreendente que elespensador: A inteligncia no inicia adotei foi tentar captar as ligaes no tenham sido considerados a ni-nem pelo autoconhecimento, nem mveis. Interligar, sempre interligar, ca garantia de todas as verdades cien-pelo conhecimento das coisas como era um mtodo mais rico, mesmo no tficas nos sculos anteriores. J emtais, e sim pelo conhecimento de sua nvel terico, do que as teorias blin- 1708, G. B. Vico5 publicou, na Univer-interao, e, orientando-se simul- dadas, sob invlucro epistemolgico sidade de Npoles, um discurso expli-taneamente para os dois polos des- e lgico, metodologicamente aptas a citamente alternativo, O discurso dosa interao, ela organiza o mundo enfrentar tudo, exceto, claro, a com- mtodo dos estudos de nosso tempo,organizando-se a si mesma (Piaget, plexidade do real. destacando as deficincias do reducio-1937). Sem dar ateno a essa recur- assumindo essa relao crti- nismo analtico e insistindo na riquezasividade constitutiva da inteligncia, ca fundadora da legitimao antro- dessa faculdade da mente humana deser que podemos falar apropriada- poltica dos conhecimentos a serem relacionar, sempre relacionar emmente de inteligncia artificial? ensinados e acionados, que renovam vez de separar primeiro. constantemente a cincia, sempre en- IHU On-Line Nesse sentido, gajada na aventura do conhecimento 4 Aristteles de Estagira (384 a.C. como o desenvolvimento transdis- 322 a.C.): filsofo nascido na Calcdica, humano, que uma efetiva inter e trans-ciplinar das cincias pode fornecer Estagira, um dos maiores pensadores disciplinaridade pode desenvolver-se. de todos os tempos. Suas reflexes As disciplinas cientficas no podemoutra compreenso sobre a irreduti- filosficas por um lado originais e porbilidade dos modelos analticos, cau- outro reformuladoras da tradio grega mais definir-se por um nico objeto de www.ihu.unisinos.brsalistas, deterministas e simples? acabaram por configurar um modo de conhecimento, estritamente delimita- pensar que se estenderia por sculos. Jean Louis Le Moigne A ques- Prestou inigualveis contribuies parato nos convida expressamente a vol- o pensamento humano, destacando-se 6 Augusto Comte (1798-1857): filsofo etar ao enunciado dos quatro preceitos nos campos da tica, poltica, fsica, pensador social francs. Fundou a escola metafsica, lgica, psicologia, poesia, filosfica conhecida como positivismo e retrica, zoologia, biologia, histria criou um conceito de cincia social a que 3 Jean Piaget (1896-1980): psiclogo, natural e outras reas de conhecimento. deu o nome de sociologia. O positivismo epistemlogo e educador suo, professor considerado, por muitos, o filsofo que comteano afirma que a verdade da de psicologia na Universidade de Genebra mais influenciou o pensamento ocidental. cincia indiscutvel e demonstrvel de 1929 a 1954, conhecido principalmente (Nota da IHU On-Line) universalmente. (Nota da IHU On-Line) por organizar o desenvolvimento cognitivo 5 Giambattista Vico ou Giovanni Battista 7 Gaston Bachelard (1884-1962): filsofo e em uma srie de estgios. Escreveu Vico (1668-1744): filsofo italiano. poeta francs que estudou sucessivamente inmeras obras, das quais citamos Discerniu a explosiva mistura da razo as cincias e a filosofia. Seu pensamento Tratado de Psicologia Experimental: A com a mecnica e ofereceu uma nova est focado principalmente em questes inteligncia (Rio de Janeiro: Forense, v. cincia que poderia trazer as mais altas referentes filosofia da cincia. (Nota da 7, 1969) e A construo do real na criana percepes da Renascena para dentro da IHU On-Line) (Rio de Janeiro: Zahar, 1970). (Nota da metodologia dos primeiros investigadores 8 O novo esprito cientfico (Lisboa: IHU On-Line) modernos. (Nota da IHU On-Line) Editora 70, 1996). (Nota da IHU On-Line)EDIO 402 | SO LEOPOLDO, 10 DE SETEMBRO DE 2012 13
  • 14. do e tido como um dado da natureza: formalmente admissvel, H. von Foers- emergncia autoeco-organizacional,Tema de Capa elas devem ser entendidas tambm ter introduziu no pensamento cientfi- o que levou E. Morin a desenvolver o e primeiramente por seu projeto de co uma ideia muito renovadora: para paradigma da complexidade a partir conhecimento, conscientemente for- que um sistema possa evoluir aumen- do esquema de referncia de O mto- mulado pelo esprito humano, atravs tando sua riqueza organizacional do, aquele da autoeco-reorganizao. do qual interligam-se a experincia do (emergncia de novos comportamen- Tornava-se assim possvel renovar a corpo e a compreenso do mundo (cf. tos no pr-programados), ele preci- modelizao dos sistemas complexos O paradigma corpo, esprito, mundo, sa ser ativo em seu ambiente, rece- passando da modelizao ciberntica dir P. Valry). bendo no s os inputs programados e holstica inicial, fechada (autorre- Vivemos hoje a crise dessa reno- ou ordenados, mas tambm o rudo, gulao do processador caixa-preta), vao de nossos paradigmas de refe- a priori aleatrio, no programado, modelizao sistmica aberta (fun- rncia. Precisamos fazer do ideal de desordenado, que seguidamente os cionamento e evoluo teleolgica e complexidade da cincia contempor- acompanha. Potencialmente, em cer- contextualizada). nea aquele da restaurao da solida- tas condies plausveis (um mnimo Caberia aqui completar a inter- riedade entre todos os fenmenos, de redundncias na organizao ini- pretao operatria do paradigma da lembrou G. Bachelard. No mais sepa- cial), essa desordem imprevista pode, autoeco-reorganizao pelos desen- rar o fazer e o compreender significa contudo, suscitar a emergncia inter- volvimentos importantes introduzidos tambm entender que o cientista tor- na de novos comportamentos, im- por Morin acerca da interao recur- na-se cego sem os culos do cidado. previstos, que se manifestaro na ati- siva dos processos organizacionais e A aventura do conhecimento humano vidade da organizao dentro de seu dos processos informacionais que eles entrelaa-se constantemente com a ambiente. Desenvolve-se assim uma formam e que os transformam recur- aventura das sociedades humanas: recurso dita morfodinmica: agindo sivamente. A concepo dos sistemas todos ns somos responsveis por ela. cinematicamente sobre seu ambiente de informao encontra a um pla- que ento ela transforma, a organi- no diretor que permite evitar que as IHU On-Line O que a auto- zao transformada ela mesma. A restries prprias das tecnologias da -eco-organizao dos fenmenos regulao ciberntica de primeira or- informao e da comunicao prejudi- complexos? Em que aspectos o co- dem engendra uma recurso cibern- quem a qualidade potencial das inte- nhecimento dessa complexidade re- tica de segunda ordem. raes poiticas entre os dois proces- sulta numa outra compreenso tanto