hisldorf hist educ bras cap 1 os jesuiÌtas

15
r r r r I J f r cia Eciucas:ao Brasileira: Leituras OFER- "' 1 pi" r ;- :.Iv II Maria Lucia Spedo Hilsdorf JiiFwJUflQtdJ J!ffflfesgt#'fwl . Su0 IJ 1'0 lJu,Do bJbJjil,r6(iCfJde'ft! 6ffl6,tru ~ 1II uito impor(antepara n61. No IUO posino de codastro em IvwW.tbQIIWjnI'fJ~Jns..wn.Jal ex/,Ie um formu/6rio e/etrOnicoquealiliza e joe/lito 0 enviodestos informa~6es. Contamos com sua coIabora~{Jo e antecipadamente ogradecemospareIa. P",d.,,~ Thomson. THOMSON . Australia Mexico Reino Unido Brasil Canada Cingapura Espanha Estados Unidos

Upload: daianerocha

Post on 14-Jan-2016

22 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Hist da educação

TRANSCRIPT

Page 1: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

r

r

r

r

I

J

f

r

cia Eciucas:aoBrasileira:Leituras

OFER-"' 1 pi" r ;-

:.Iv II

Maria Lucia Spedo Hilsdorf

JiiFwJUflQtdJJ!ffflfesgt#'fwl

.Su0 IJ1'0lJu,Do bJbJjil,r6(iCfJde'ft! 6ffl6,tru ~ 1IIuitoimpor(antepara n61. No IUOposinodecodastro emIvwW.tbQIIWjnI'fJ~Jns..wn.Jal ex/,Ie um formu/6rioe/etrOnicoquealiliza e joe/lito 0 enviodestosinforma~6es.Contamos com sua coIabora~{Joe antecipadamenteogradecemospar eIa.

P",d.,,~ Thomson.

THOMSON.Australia Mexico Reino UnidoBrasil Canada Cingapura Espanha EstadosUnidos

Page 2: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Dados Internacionais de Cataloga9ao na Publica9ao (CIP)

(Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Hilsdorf, Maria Lucia SpedoHist6ria da eduCa9aO brasileira:

leituras / Maria Lucia Spedo Hilsdorf.-- Sao Paulo:Pioneira Thomson Learning,2003.

Bibliografia.ISBN 85-221-02~9-6

1. Educa9ao'- Brasil - Hist6ria I.titulo.

"

02-4097 CDD-370.981

Indices para catalogo sistematico:

1. Brasil: Educa9ao : Historia2. Educa9ao brasileira : Historia

370.981370.981

Page 3: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

/

SUMARIO

APres enta~ao VII

Capitulo 1: Os Jesuitas - Catequese e Coloniza~ao 11. Nosso Ponto de Vista 32. Visao Quinhentista de Mundo: Duas Diacronias, Dois Projetos 33. Encontro das Diacronias 54. 0 Lugar da Educa9ao Escolar 6

4.1 0 periodo heroico 64.2 0 periodo de consolida9ao 8

Bibliografia ... 11

Capitulo 2: As Reformas Pombalinas 131. Nosso Ponto de Vista 152. 0 Absolutismo Ilustrado 16

2.1 A Ilustra9ao em Portugal 173. As Reformas Pombalinas da Instru9ao Publica 19

3.1 Os estudos menores :. 193.2 Os estudos maiores 223.3 A ciencia pombalina 22

Bibliografia ... 23

Capitulo 3: A IIustra~ao no Brasil 251. Nosso Ponto de Vista 272. Ideias "Afrancesadas" ... 273. Caminhos da Ilustra9ao no Brasi1 29

3.1 Os alunos 293.2 Os livros 303.3 As sociedades letradas 313.4 Os professores 323.5 A obra joanina 34

Bibliografia 36

Capitulo 4: A Escola Brasileira no Imperio 391. Nosso Ponto de Vista 412. 0 Primeiro Liberalismo 413. 0 Imperio Conservador 454. 0 Segundo Liberalismo 49Bibliografia 53

v

Page 4: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Historia da Educac;oo Brasileira

Capitulo 5: As Iniciativas dos Republicanos 551. Nosso Ponto de Vista 572. Urn Periodo de Transformayoes 573. as Repub1icanos e a Educayao 604. A Esco1aRepub1icana 61

4.1 Rangel Pestana, educador repub1icano em Sao Paulo 634.2 A Grande Reforma da decada de 1890 65

Bib1iografia 67

Capitulo 6: As Outras Escolas da Primeira Republica 691. Nosso Ponto de Vista 712. as Traba1hadores e a Educayao Esco1ar 72

2.1 as socialist as 722.2 as 1ibertarios 732.3 as comunistas ... 762.4 a movimento negro 772.5 A esco1ada rua 78

3. as Pioneiros da Esco1aNova e os Cat6licos 793.1 Ensino naciona1ista 84

Bib1iografia ... ... ... ... 85

Capitulo 7: A Era Vargas 891. Nosso Ponto de Vista 912. A Revo1uyaode 1930 92

2.1 a pape1da Igreja e das foryas armadas 932.2 a significado da Revo1uyaopara a esco1abrasi1eira 94

3. a Estado Novo 983.1 A nova educayao 993.2 As "Leis Orgiinicas" 101

Bib1iografia ......... ...:......... 103

Capitulo 8: A Escola Brasileira na Republica Populista 1051. Nosso Ponto de Vista 1072. A Redemocratizayao de 1946 e 0 Legis1ativo 108

2.1 A LDB de 1961 1102.2 Urn estudo de caso: 0 Legis1ativo paulista 111

3. Popu1ismo: entre a Politica Raciona1ista e a C1iente1ista 112Bib1iografia ...... 116

Capitulo 9: Da Ditadura Militar aos Nossos Dias 1191. Nosso Ponto de Vista 1212. Politica Desenvo1vimentista e Governo Mi1itar 121

2.1 A teoria do "capital humano" e os programas internacionais de ajudaa educayao 123

2.2 As reformas educacionais de 1968e 1971 1253. A(s) "Decada(s) Perdida(s)" 1274. A Esco1aBrasi1eira Hoje 130Bib1iografia 134

VI

Page 5: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

,Os ~ESUITAS -CATEQUESE E COLONIZA<;AO

Igreja de Sao Sebastiao e 0 Co/agio dos Jesuitas. no Morro do Castelo, Rio de Janeiro.

--

Page 6: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

05 .JEsUITAs -CATEQUEsE E COLONlZA9AO

1. Nosso Ponto de Vista

A bibliografia tradicional aborda a atuac;:ao dos jesuitas em uma vertente positiva,destacando 0 jesuitismo civilizador: vai da decada de 30, com a obra do padre Serafim

Leite, ate a de 60, englobando os que seguem esse historiador oficial da Companhia deJesus, como Fernando de Azevedo, e os autores que se apoiam em ambos, inclusive a

volumosa produc;:aoque apareceu por ocasiao do IV Centemirio de Sao Paulo nos anos50. A bibliografia das decadas de 70 e 80 tern uma vertente mais critica e negativa,mostrando 0 jesuitismo guerreiro. Muitos dos seus autores apareceram no interior da

propria Igreja, como R~olando Azzi e Eduardo Hoornaert. Outros vieram de diferentescampos do conhecimento, em particular das ciencias sociais, como 0 antropologoLuiz Felipe Baeta Neves.

Hoje os estudos adotam uma posic;:aomais equilibrada e procuram ver os jesuitas

como homens de seu tempo. Esta e a linha que vamos seguir. Recorrendo a conceitos dediversos campos de conhecimento, vamos construir uma "visao quinhentista de mundo"

para poder ver a atuac;:aodos jesuitas a partir do seu proprio tempo historico.

2. Visao Quinhentista de Mundo: Duas Diacronias,Dois Projetos

o primeiro conceito e 0 de "cristandade", ou orbis christian us, usado por Jose Mariade Paiva e Luiz Koshiba; significa que na primeira metade do seculo XVI, em Por-tugal, Igreja e Estado estao unidos por interesses comuns, que saDainda medievais(tardo-medievais, como diz Alfredo Bosi). Nobreza e clero querem defender a estru-tura social tripartite e hierarquizada - os que lutam, os que rezam e os que trabalham- definida pelos teologos do seculo XII, e manter seus privilegios, aceitando as res-tric;:oesda Igreja a acumulac;:aode capital e a livre produc;:aoe livre contratac;:aodaforc;:ade trabalho praticadas pela burguesia. Essa hierarquia configura uma ordenac;:ao

3

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 7: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Historia da Educa~ao Brasileira

estarnental da sociedade, com grupos fechados, definidos por direitos de sangue, ouseja, urna ordern senhorial, em que ainda predorninarn os valores medievais da fee da honra pela posse e dominio politicos, sem explorayao do lucro.1A alianya daaristocracia da espada com 0 clero e que controla 0 poder, "faz" a Coroa portuguesa,sem adrnitir "novos s6cios", ou seja, os rnercadores burgueses, os quais, por seu lado,pressionam para fazer valer os modernos interesses economicos do lucro.

A atuayao dosjesuitas no seculo XVI deve ser olhada tambem a luz do conceitode "missao", trabalhado por Baeta Neves e Hoornaert, que permite inserir osjesuitas nadiacronia da Igreja. Hojepercebemos a necessidade de considerar duas diacronias: a dacolonizayao, com 0 seu projeto invasor, e a da Igreja, com seu projeto missionario.

Ou seja, e irnportante considerar que osjesuitas sao a ordernreligiosaexemplardoseculo XVI, marcado por uma aguda consciencia da dirnensao social e ativa da Igreja.Diferentemente das ordens monasticas medievais que erarn receptivas, acolhedoras,passivas em relayao aos novos adeptos, e com suas unidades autonomas (os rnosteirose abadias) representavarn na Igreja a forya dos poderes locais os jesuitas sao ativos,missionarios, vao ao encontro de novos fieis, fazern catequese e se poem a serviyo doPapado, para reforyar a centralizayao institucional e a unidade doutrinaria da IgrejaCat6lica, que estavam sendo definidas no Concilio de Trento (1545-63). Os jesuitasatuam imbuidosde uma missao, de urn projeto claramente inscrito na diacroniada Igre-ja: rnanter e propagar a fe cat6lica em uma fase em que ela e contestada pela Reforma,pelas religioes orientais e dos povos do Novo Mundo, mas tambern internamente.2

Baeta Neves usa ainda 0 conceito antropol6gico de "semelhanya" para entendera atuayao dosjesuitas no enquadrarnento da mentalidade quinhentista. Para esse autoros membros da Cornpanhia de Jesus tern urn cornportamento que procura apagar asdiferem;as entre os homens, porque sao as semelhanyas que refletem a unidade dacriayao divina. Ora, apagar as diferenyase 0 mesmo que negar a alteridade, a existenciado Outro. Os jesuitas querem tornar 0 outro, 0 nao-cristao - sejaindigena,sejainfielou herege -, em cristao, para tornar os homens 0 mais possivel iguais. Dai as praticasdo jesuita missionario e catequista de:

o discurso "universalista", na expressao de Hoornaert, discurso que des-conhece fronteiras, 0 Outro, discurso que e invasivo, violento, guerreiro;

o sujei~ao do indio as normas e rnentalidades do branco, inclusive a suainseryao no trabalho organizado. Mas e importante lembrar, como 0 fazKoshiba, que sujeiyaonao e escravidao.A primeira e atitude ainda medieval,

Segundo Koshiba, "cristandade" e fala religiosa que recolhe uma inten"ao politica de uniao Igreja-Estado.

Entre 1548e 1604sairam para 0 Brasi128expedi,,6es de jesuitas. Mas vale lembrar que os jesuitas chegam ao Brasil

em 1549; na India (Goa), em 1556; na FI6rida, em 1567; no Peru, em 1568; no Mexico, em 1576; na Argentina, em1586; e no Paraguai, em 1588.

4

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 8: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Capitulo 1: Os Jesuitas - Catequese e ColonizaC;ao

do mundo medieval, senhorial, apresentada pelo jesuita e pela Coroa. Asegunda e a atitude do colono: implica lucro, e moderna. Sujeitar implicareconhecimento de uma margem de liberdade espiritual ao indio - 0 PapaPaulo III havia decretado pela bula Sublimis Deus, de 1537,que os indiostern alma - necessaria para a catequese, que seria invalida se os indiosfossem considerados "feras" ou "coisas";3

o crias;aoda Aldeia, que e 0 espas;ofisico e mentalestruturadosegundoal6gica e a racionalidade do branco para substituir as aldeias indigenas e suasformas culturais, como meio de garantir a total semelhans;a entre homensbrancos e indios. 0 estudo da Aldeia como forma de dominas;ao cultural

foi feito, no caso tupi (0 aldeamento), por Baeta Neves; no caso guarani (as

redus;oes), por Maxime Haubert e Clovis Lugon.4

3. Encontro das Diacronias

Entao podemos dizer que os jesuitas chegam ao Brasil em meados do seculo XVIpara realizar a premissa medieval do primado da fe defendida pela Igreja e pela Coroaportuguesa, a qual sobrepoe os interesses politico-religiosos aos interesses economi-cos do lucro. Em outras palavras, querer a manutens;ao do orbis christianus explicaa mentalidade e as praticas da Coroa portuguesa e da Igreja nos meados do seculoXVI, quando, associadas, enviam jesuitas e governadores para "tomar posse e povoara nova terra e converter os gentios" e organizar 0 trabalho da populas;aolocal. A as;aodos inacianos deve ser vista, na sua origem, em termos pre-burgueses: trata-se, comolembra Koshiba, de povoamento e nao de colonizas;ao.Colonizas;aoacontece quandoa "cristandade" e rompida, com 0 predominio dos valores economicos do lucro mer-cantil sobre os valores politico-religiosos da posse, ou seja, quando os cristaos-novosque realizavam 0 trMico escravo chegam ao poder, controlando a Coroa portuguesa einstalando 0 escravismo, a ordem social dos senhores e escravos - 0 mundo moderno,enfim -, subvertendo 0 sentido do povoamento, separando as esferas do religioso edo economico. 0 32governador-geral, Mem de Sa, e quem promove a expansao doslatiflindios escravistas e monocultores (cana-de-as;ucar),como representante da fors;ado capital mercantil obtido com 0 trMiconegreiro. Entao podemos dizer que 0 Brasiltorna-se colonia ao redor de 1570.

Os escravos africanos sac considerados coisas ("pec;as"); por essa razao e que 0 trafico negreiro desarticulara 0ponto de vista do jesulta sobre 0 negro. Koshiba lembra que, no seculo XVII, 0 padre Vieira aceita a escravidaoafricana como oportunidade de expiac;aodos pecados dos cativos e 0 jesuita Antonil escreve, nao sobre osofrimentodo trabalhador escravo, mas sobre 0 "martfrio da cana" (A. Bosi diz: sobre as "Iagrimas da mercadoria").

Um classico estudo dos aldeamentos paulistas do ponto de vista da geografia foi escrito por P. Petrone, em 1965.

5

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 9: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Hist6rio do Educot;oo Brasileira

Uma das conseqiiencias dessa interpreta9ao de Koshiba e permitir entender 0subseqiiente engajamento do projeto missionario e apostolico do jesuita no projetocolonial. Ao redor de 1570 as duas diacronias, da missao e da coloniza9ao, vao seencontrar e entrecruzar. Esse engajamento acaba transformando os proprios jesuitas:se nao aceitavam a escraviza9ao dos indigenas, lutando contra 0 projeto de "prea9ao"dos colonos, como diz Bosi, acabam por participar do mundo colonial escravista,tornando-se eles proprios agentes colonizadores. Os jesuitas que faziam a defesa dosnativos diante dos interesses predatorios dos colonos, e eram por isso muito influentesno "mundo dos indigenas", ficam desarticulados perante 0 tnlfico negreiro e 0 africanoque ja chega escravizado; perdem sua posi9ao de lideran9a e deixam de ser influentesno "mundo dos engenhos", no qual se tornam mais urn dos colonos proprietariosde escravos. Nesse sentido os jesuitas tambem foram colonizados (e nao somentecolonizadores). Hoornaert chega inclusive a dizer que nesse processo eles foraminstrumentalizados, vitimas da Coroa colonialista, depois de 1570.Assim os jesuitasforam marcantes na IJifase do catolicismo brasileiro, 0 "catolicismo mameluco", masnao no catolicismo praticado na civiliza9ao do a9ucar.

4. 0 Lugarda Educa~ao Escolar

Ao reexaminar as etapas do processo de encontro entre as duas diacronias, vimos queeste passa pela atua9ao dos jesuitas como socializadores e educadores da popula9ao.Portanto 0 tema deve ser recolocado tambem a Historia da Educa9ao. Pela discussaoapresentada anteriormente, a explica9ao tradicional do jesuita como viabilizador daexplora9ao economica da colonia pelo apaziguamento do indigena e fundador decolegios para filhos de indios e brancos desde a sua chegada ao Brasil, em mar90 de1549,ja nao satisfaz, pois e generica e nao da conta da complexidade da questao. Urncaminho possivel para enfrenta-la seja, talvez, distinguir, como 0 faz Luis Alves deMattos, duas grandes fases na atua9ao dos jesuitas: 0 periodo "heroico" (1549-70)e 0periodo de consolida9ao ou expansao (1570-1759),0 primeiro marcado pelas carac-teristicas missionarias genuinas (heroicas, ou apostolicas) e 0 segundo, pelo "mundodos colegios"; ou ainda, como proponho em trabalho conjunto com Maria Apareci-da Custodio, tres estrategias diferenciadas de atua9ao jesuitica que os missionariosavan9am sucessivamente, quando a anterior mostra-se problematica.

4.1 0 periodo her6ico

o missionarismoheroico significava,para os primeirosjesuitas, viver nas aldeiascom os indios e adotar seus costumes,segundouma visao do indio como "igual",isto e, sem reconhecera existenciade diferentesculturas indigenas,nomeando-os

6

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 10: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Capftulo 1: Os Jesuftas - Catequese e Coloniza<;ao

pelo coletivo "gentio" e desconsiderando a diferen~a deles em rela~ao aos brancos.Essa representa~ao os convencia de que os indios eram "papel em branco", isto e,registravam sem resistencias os ensinamentos dos Evangelhos e da cultura portuguesa.Nessa fase a divulga~ao da doutrina crista - a catequese - se fazia por contato econvencimento, forma tradicional de aproxima~ao, com visitas, "sauda~oes lacri-mosas", mimicas, discursos, presentes. Implicava alian~as com os chefes indigenase a utiliza~ao de interpretes mamelucos, os "lingua", 5 para os contatos ocasionais,mantidos nas visitas, ou mais permanentes, quando os jesuitas moravam com eles.

Hi adapta~ao e permeabilidade nos comportamentos de ambas as partes, tantono pIano material das condi~oes concretas de vida quanto no pIano simbOlicodos ritose mitos, mas tambem ambigiiidades e simula~ao da parte dos nativos, como mostrouHector Bruit. Osjesuitas logo come~ama identificaressas formas de resistencia entre osindios, levando a mudan~a na representa~aodos indigenas, vistos agora pelos jesuitascomo "feras bravas", "boca infernal" (antropofagos), "maliciosos" (seres racionais),ou seja, com 0 reconhecimento (mas nao a aceita~ao) da alteridade indigena, do indiocomo 0 Outro. Os padres percebem que a catequese "ensaiada nas naus", segundo osmodelos de aproxima~ao e convencimento que eles ja desenvolviam na Europa parareconquistar os hereges, nao funciona, nao da resultados permanentes, ou seja, ela naoresulta em acultura~ao e conversao. Sera necessano inverter as prioridades: primeirotransformar ou suprimir a cultura indigena, para depois ensinar a doutrina.

Os jesuitas alteram, entao, suas praticas. Come~am a ser experimentados osaldeamentos de adultos e os recolhimentos de crian~as, ou seja, as missoes come~ama ser organizadas segundo formas institucionais, ao que parece ao mesmo tempo naBahia e Sao Vicente, por volta de 1552-53, por iniciativa do padre Nobrega e com 0apoio da Coroa. Na correspondencia do periodo as "casas de meninos" ja aparecemcitadas como urna promessa de exito missionario, mais consistente que 0 trabalhocom os adultos por contato e convencimento. A proposta de Nobrega para elas previaurn programa de atividades que incluia 0 aprendizado oral do portugues e do contar,do cantar, do tocar flauta e outros instrumentos musicais, do catecismo e da doutrinacrista, alem de praticas asceticas; em seguida, ler e escrever portugues e gramaticalatina para os postulantes a Companhia e ensino profissional artesanal e agricola nasoficinas para os demais. Essa programa~ao com enfase na oralidade e que provavel-mente continuou sendo praticada nos seculos seguintes com as crian~as recolhidasnos aldeamentos. Sabemos que nas redu~oes dos "7 Povos das Missoes" nio haviaensino de tecnicas de leitura e escrita, a nao ser para alguns dos aldeados.

Recolhimentos ou "casas de meninos" e aldeamentos tinham, segundo L.A. deMattos, uma base juridico-administrativa, as confrarias, com bens proprios (terra,

Entre as inacianos que dominavam a lingua foram notaveis Aspicuelta Navarro. Antonio Rodrigues e Pera Correia.

7

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 11: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Hist6rio do Educo<;ao Brosileiro

gado, escravos), e dirigentes locais (ele fala ate em "estrutura democnitica de gestao").Podemos pensar que, com essa organizac;:ao,as confrarias escapavam ao controle cen-tralizado da ordem jesuitica na Europa6,e por essa razao tenham sido desautorizadase suprimidas em meados da decada de 50. Essa medida explicaria 0 comec;:ode urnadecada de crise nos trabalhos missionarios dos jesuitas visivel na correspondenciade 1555 a 1565. De fato, 0 trabalho com os meninos indios nos moldes propostospor Nobrega foi desencorajado pela Companhia segundo a posic;:aode pauperizac;:aofranciscanizante dos novos dirigentes Luis de Gra e Diogo Mirao, os quais, depois damorte de Inacio de Loyola em 1556, reorientaram a Companhia para aceitar apenaso encargo espiritual da confissao das crianc;:ase nao mais 0 seu sustento nos recolhi-mentos, que dependia da posse de bens materiais.

Tambem 0 pIano dos aldeamentos e recolhimento significavaurn amargo sucessopara os jesuitas, pois, se implicava sedentarizac;:aoe aceitac;:aode habitos de trabalhopelos nativos, transformava-os em alvos da disputa dos colonos, que tinham urnprojetode preac;:aoe escravizac;:ao.Para escapar dos jesuitas e dos colonos, tribos inteirasfugiam para 0 interior, despovoando os recolhimentos e aldeamentos e interrompendoo trabalho catequetico. Para os indios 0 resultado permanente das praticas de homo-geneizac;:aoda Aldeia foi a perda da sua identidade cultural e 0 desaparecimento oua marginalizac;:ao,como mostram os estudos dessas populac;:oesvencidas realizadospor Florestan Fernandes e Hector Bruit.

Por outro lado, na Europa, a propria Companhia de Jesus estava se decidindopelo trabalho em instituic;:oesescolares, ou seja, em colegios de ensino secundano euniversidades: em Coimbra, por exemplo, 0 Colegio das Artes hurnanisticas, prepa-ratorio para a Universidade, passou a ser controlado pelos jesuitas desde 1555.

Desse conjunto de fatores resulta que, quando 0 trabalho missionario se rearti-culou por volta dos fins da decada de 60, os jesuitas abrem urna terceira frente deatividades: os coh~giospara os filhos dos colonos.

4.2 0 periodode consolida~ao

Instalados nas principais vilas da colonia os colegios foram viabilizados porque, emtroca dessa tarefa de educar os meninos brancos, a Coroa, ja dominada pela burguesiamercantil, ofereceu para 0 sustento da ac;:aomissionaria nessas instituic;:oes0 recursoda redizima, uma taxa que era arrecadada (geralmente em especie, ou seja, ac;:ucar)sobre 10% das dizimas que recolhia. No seculo XVI os primeiros "padroes de redizi-ma" foram aplicados as casas da Bahia (1564),Rio de Janeiro (1568)e Olinda (1576),

Hoornaert considera que a causa da nao-aceitacao dessa autogestao de N6brega esta ligada ao direito de padroado

da Ordem de Cristo, fundada em 1420, e que, desde 1442, fora encarregada pela Coroa de financiar as atividades da

Igreja, provendo os cargos eclesiasticos e ficando com os recursos dos dizimos pagos.

8

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 12: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Capftulo 1: Os Jesuftas - Catequese e Coloniza<;ao

transformando-as, entao, em colegios para oferecer gratuitamente ensino secundariode humanidades, como se fazia na Europa, para a clientela letrada. Juridicamente oscolegios deveriam receber alunos a titulo de atividade missiomiria, estando abertos atodos, mas, na pnitica, assumindo a ruptura da colonia, os jesuitas ficavam apenas comos alunos brancos, recusando os mesti«os, mamelucos e indios, com a justificativa deque seu proposito era formar os padres da Companhia.

qs colegios de ensino secundario ofereciam 0 pIano de estudos definido no do-cumento Ratio Studiorum, de 1599,acompanhando a programa«ao dos demais estabe-lecimentos dirigidos pela Companhia de Jesus em outras partes do mundo, segundo ospadroes humanistico-tridentinos dos seculos XVI e XVIJ.7Urn colegio jesuita mo-delar abrangia aulas de gramatica latina, humanidades, retorica e filosofia,em uma gra-da<;aode estudos que, se cumprida integralmente, depois de oito ou nove anos defreqiiencia, levaria it forma<;aodo letrado.8Para Laerte R. de Carvalho os autores lidosnos colegios da colonia em fins do seculo XVI eram os mesmos do Colegio de Evora:obras de Cicero, Cesar, Ovidio, Quinto Curcio e Seneca, a Eneida de Virgilio, a Arteda Gramatica Latina do padre Manuel Alvares a Arte da Retorica do padre CiprianoSoares. No entanto, sabemos que esse curriculo era dado de forma intermitente, de-pendendo da existencia ou nao de padres-mestres e alunos no colegio; e se os alunosque vinham para esses colegios nao sabiam ainda reconhecer os caracteres latinos -pois 0 tupi era a lingua falada no cotidiano de todas as capitanias - abria-se tambemuma aula ou classe de ensino de leitura, de escrita e de contas em portugues.

L. A. de Mattos diz que, nessa fase de atua«ao nos colegios, 0 jesuita estavadesligado da realidade social brasileira, com perda do carater missionario apostolico,heroico e aceita<;aodo papel de assistencia aos colonos, papel que era desvalorizadopelos proprios inacianos nos primeiros anos, nos "tempos heroicos": na correspon-dencia das primeiras decadas, os missionarios rejeitavam 0 "viver em poltronas",isto e, confinados nos colegios. Pode-se dizer que a Companhia passara a funcionarsegundo padroes culturais e pedagogicos supranacionais, que inseriam os meninosda colonia no mundo ocidental e, reciprocamente, punham em circula«ao, aqui, asrepresenta<;oese praticas educacionais e culturais do alem-mar.

Baeta Neves tambem estudou as formas de domina<;aocultural praticadas pelosjesuitas nos colegios e percebeu que, em compara<;ao com as formas culturais daAldeia, havia ainda mais rigidez e impermeabilidade: nos colegios, para aculturar seusalunos brancos, os jesuitas usavam as formas da tradi«ao, da repeti«ao, da disciplinarigorosa com castigos fisicos, da reclusao, da repressao e da exclusao.

Ct. Hilsdort (1998).

E acrescida da teologia, a do padre da Companhia.

9

Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Fábio Júnior
Underline
Page 13: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Historio do Educo<;ao Brasileira

A expansao desses co16giosnos s6culos XVII e XVIII pode ser percebida no quadro

a segUlr:

CapitaniasItamaracaPara

Pernambuco

Maranhao

PiauiParalbado Norte

Ceara

Bahia

llheus

Porto Seguro

Esplrito Santo

Rio de Janeiro

S. Vicente

Minas Gerais

S. Pedro do RioGrande

Colonia doSacramento

Coh!gios em 1585*

Q COh3gioem Olinda(aulas de ler e escrever+ gramatica)

Q Coh3gio em Salvador(aulas de ler + escrever +contar + gramatica latina +humanidades + ret6rica

. + filosofia + Ii.;:oes de casos+ teologia)

Q Casa (aulas de lere escrever)

Q Casa (aulasde ler e escrever)

Q Casa (aulasde ler e escrever)

Q Coh3gio (aulasde ler + escrever + gramaticalatina + casos de consci~ncia)

Q Casa de S. Vicente/Santos

(aulas de ler e escrever)Q Casa de Piratininga

Coleglos em 1759**

Q Coh3gio"Santo Alexandre"em Belem

Q Seminario em VigiaQ Colegio "N. Sra. do 6" em Recife

[J Colegio "N. Sra. da Luz" em S. Luis[J Seminario[J Casa-colegio em Alcantara[J Seminario

[J Colegio[J Seminario

[J Seminario em Aquiras[J Casa-resid~ncia em Paupina

[J Colegio "Todos os Santos" emSalvador

[J Seminario em Cachoeiro[J Noviciado em Jiquitiba

[J Casa-colegio

[J Casa

[J Colegio "S. Tiago" em Vit6ria

[J Colegio "S. Sebastiao"

[J Colegio "SoMiguel" em Santos[J Casa em S. Vicente'[J Colegio "Sto. Inacio"gem Sao Paulo[J Casa em Mariana[J Seminario em Mariana

[J Colegio em paranagua[J Colegio em Desterro[J Casa-colegio

.Fonte: Anchieta ("lnforrna96es", in CARTAS) .. Fonte: R. Wrege (1993)

Este estabelecimento teve suas atividades suspensas em 13/7/1640, quando os colonos invadem-no devido ao interdito

do lrafico de indios com penas can6nicas, decidido pelo Papa Urbano VIII, e expulsam os cinco padres (Nicolau Botelho,

Antonio Ferreira, Antonio de Mariz, Mateus Aguiar e Lourenyo Vaz) e quatro irmaos (Domingos Alves, Pucui, Antonio

Gonyalves e Lourenyo Rodrigues) que ai estavam. Os jesuitas voltam em 1653. Mas, a despeilo do que se costuma

dizer, na maior parte da sua trajet6ria ele funcionou como uma "casa de meninos", e nao como um coh§gio completo. E

como se vi!, nem se chamava Sao Paulo...

10

Page 14: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Capitulo 1: as Jesuitas - Catequese e Coloniza<;ao

Bibliografia

Aa.Vv. Cartas jesuiticas. 3 vols. Belo Horizonte/Silo Paulo: Itatiaia/ Edusp,1988.

ALVES DE MATTOS, L. Primardios da educa~iio no Brasil: 0periodo heraico.Rio de Janeiro: Aurora, 1958.

BAETA NEVES, L. F. 0 combate dos soldados de Cristo na terra dospapagaios.Rio de Janeiro: Forense-Universibiria, 1978.

BOSI, Alfredo. "As Flechas Opostas do Sagrado". Dialhica da coloniza~iio. SiloPaulo: Companhia das Letras, 1992.

BRUIT, Hector H. "Derrota e Simula9ilo: os indios e a Conquista da America".D.O. Leitura, 11(out. 1992): 4-7.

CARVALHO, L. R. de. "A9iloMissiomiria e Educa9ilo". Holanda, S.B. de (org.).Histaria geral da civiliza~iio brasileira, v. 1.Silo Paulo: Difel, 1960.

CHATEAU, 1. (org.). Os gran des pedagogistas. SiloPaulo: Nacional, 1978.

cusT6mo, M. Ap. e HILSDORF, M. L. "0 Colegio dos Jesuitas de Silo Paulo:que niloera Colegio nem se chamava SiloPaulo". Revista do Instituto de EstudosBrasileiros-USp, 39 (1996): 169-180.

FERLINI, V. L. A. A civiliza~iio do a~ucar: seculos XVI a XVIII. 4aed. SiloPaulo: Brasiliense, 1987.

FULLOP-MOLLER, R. Os santos que abalaram 0 mundo. 7aed. Rio de Janeiro:Jose Olympio, 1968.

HANSEN, 1. A. "0 Nu e a Luz: Cartas jesuiticas do Brasil-Nobrega, 1549-58".Revista do Instituto de Estudos Brasileiros-USp, 38 (1995): 87-120.

HAUBERT, M. indios ejesuitas no tempo das missoes. Silo Paulo: Companhiadas Letras/Circulo do Livro, 1990.

HILSDORF, M. L. S. Pensando a educa~iio nos tempos modernos. Silo Paulo:Edusp, 1998.

KOSHIBA, L. "Sobre a origem da coloniza9ilo do Brasil". Textos 2. Araraquara:FCL-Unesp, 1990.

LUGON, Cl. A Republica "comunista" cristii dos guaranis (1610-1768). 3aed.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

MESGRAVIS, Laima. 0 Brasil nos primeiros seculos. Silo Paulo: Contexto,1989.

MONTEIRO, 1.Negros da terra. Silo Paulo: Companhia das Letras, 1994.

11

Page 15: HISLDORF Hist Educ Bras Cap 1 Os JesuiÌtas

Historio do Educo<;Cio Brasileiro

PAIVA, 1.M. de. Colonizar;iioe catequese. SiloPaulo: Cortez e Autores Associa-dos, 1982.

PETRONE, P. Aldeamentos paulistas. Silo Paulo: Edusp, 1995.

PRIORE, M. Del. "0 papel branco, a infancia e osjesuitas na colonia". Priore, M.Del (org.). Historia da crianr;ano Brasil. Silo Paulo: Contexto, 1996.

RAMINELLI, R. "Eva Tupinamba". Priore, M. del (org.). Historia das mulheresno Brasil. S. Paulo: Ed. Unesp/Contexto, 1997.

SERAFIM LEITE, Pe. Historia da Companhia de Jesus no Brasil. Lisboa/Rio deJaneiro: Portug:Uia/Civ.Brasileira, 1938-50.

WREGE, Rachel S. ':4 Educar;iioEscolar Jesuitica no Brasil-Colania: uma lei-

tura da obra de Serafim Leite". Campinas: FE/Unicamp, 1993.

12