federalismo e política internacional -...
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DBORA FIGUEIREDO MENDONA DO PRADO
FEDERALISMO E POLTICA INTERNACIONAL: OS CONFLITOS ENTRE A UNIO E OS
GOVERNOS ESTADUAIS NOS ESTADOS UNIDOS
Campinas, 2013
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Filosofia e Cincias Humanas
DBORA FIGUEIREDO MENDONA DO PRADO
FEDERALISMO E POLTICA INTERNACIONAL: OS CONFLITOS ENTRE A UNIO E OS
GOVERNOS ESTADUAIS NOS ESTADOS UNIDOS
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE VERSO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA DBORA FIGUEIREDO MENDONA DO PRADO E ORIENTADA PELO PROF. DR. SHIGUENOLI MIYAMOTO
CAMPINAS 2013
Tese apresentada ao Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obteno do Ttulo de Doutora em Cincia Poltica.
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FICHA CATALOGRFICA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS BIBLIOTECA DO INSTITUTO DE
FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS CECLIA MARIA JORGE NICOLAU - CRB 8/338 Ttulo em outro idioma: Federalism and international politics : conflicts between national and state governments in the United States Palavras-chave em ingls: Federalism - United States Supreme courts - United States World politics Economic Sanctions rea de concentrao: Cincia Poltica Titulao: Doutora em Cincia Poltica Banca examinadora: Shiguenoli Miyamoto [Orientador] Tullo Vigevani Janina Onuki Flvio Rocha de Oliveira Andrei Koerner Data de defesa: 19-09-2013
Programa de Ps-Graduao: Cincia Poltica
Prado, Dbora Figueiredo Mendona do, 1983- P882f Federalismo e poltica internacional : os conflitos entre a
Unio e os governos estaduais nos Estados Unidos / Dbora Figueiredo Mendona do Prado. Campinas, SP : [s.n.], 2013.
Orientador: Shiguenoli Miyamoto. Tese (doutorado) Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Cincias Humanas.
1. Federalismo - Estados Unidos. 2. Tribunais supremos - Estados Unidos. 3. Poltica internacional. 4. Sanes econmicas. I. Miyamoto, Shiguenoli,1948-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Cincias Humanas. III. Ttulo.
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Dedico este trabalho ao meu marido e ao nosso beb Elias
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AGRADECIMENTOS
A Deus pela graa e misericrdia que me concede a cada dia. Ao meu marido Filipe Mendona, por todo o seu amor, apoio e companheirismo ao longo destes anos. Obrigada por tudo! Amo voc! Aos meus pais, Sebastio e Valdene, pelo amor, apoio, carinho e por sempre me receberem com um abrao bem apertado. Aos meus irmos David e Daniel por acreditarem em mim e por comemorarem sempre as minhas conquistas. s minhas cunhadas: Aline, Penha, Sara e Luiza e cunhados: Srgio e Alan, obrigada pela amizade e apoio. Um abrao tambm para os meus sobrinhos Tfila, Miguel e Otvio. Um agradecimento especial para minha irm e amiga Denise por todo apoio e amizade. Amo voc! Aos meus sogros Srgio e Alda obrigada pelo apoio, carinho e amor. A todos os amigos e amigas que me apoiaram nestes anos e um agradecimento especial para Ana Paula e Analice. Ao meu orientador Shiguenoli Miyamoto pelo apoio, amizade e importantes conselhos ao longo do mestrado e agora, no doutorado. Muito Obrigada. Ao professor Tullo Vigevani e Andrei Koerner pelas orientaes sempre muito importantes. Aos colegas e amigos Corival e Cristina. A todos os amigos do Programa San Tiago Dantas e da Unicamp e ao amigo Juliano Aragusuku. Ao Instituto de Economia da UFU e aos colegas de instituio, em especial: Haroldo, Marrielle, Armando, Isabela, Lara, Pedro e Marisa. A todos os meus alunos, em especial aos formandos da Primeira Turma de Relaes Internacionais da UFU por fazerem parte da minha vida e por terem me mostrado a cada dia o quanto vale a pena ser professora. Aos amigos e funcionrios do Cedec, do Instituto Nacional de Estudos sobre Estados Unidos (INCT-INEU) e do Programa de Ps-Graduao em Cincia Poltica da Unicamp por todo apoio neste perodo. Giovana e Isabela pelo apoio e amizade neste perodo. E, por fim, Capes, CNPQ, Universidade Estadual de Campinas e Universidade Federal de Uberlndia pelo apoio recebido ao longo deste perodo.
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RESUMO
O objetivo principal desta pesquisa analisar a atuao internacional dos estados norte-
americanos tendo em vista a implementao de sanes econmicas internacionais pelos legislativos estaduais. Estas sanes buscam impactar o bem-estar econmico de um Estado alvo por meio de restries ao comrcio internacional e investimentos com o objetivo de coagir o mesmo a alterar determinado comportamento poltico. No caso das sanes estaduais, so utilizados dois tipos de atividade: 1) a proibio da contratao ou aquisio de bens e servios do governo estadual com empresas que fazem negcios no pas-alvo e 2) o impedimento dos estados ou agncias locais de realizar investimentos pblicos nestas empresas e no pas-alvo. Este tipo de atividade estadual possui um potencial conflituoso uma vez que as sanes estaduais podem gerar conflitos e tenses legais com o governo nacional. O objetivo deste trabalho ser compreender o desenvolvimento destas atividades estaduais e os tensionamentos estabelecidos entre elas e o governo nacional bem como buscar compreender qual tem sido a reao das instituies norte-americanas sobre este processo. Para isto sero discutidas as razes histricas do desenho institucional norte-americano na definio das funes dos governos estaduais e federais e o comportamento do Congresso e da Suprema Corte nesta temtica. Para identificar as principais caractersticas das sanes estaduais este trabalho apresentar o mapeamento das sanes estaduais aplicadas pelos legislativos estaduais no perodo de 1977, data inicial deste tipo de atuao a 2012.
PALAVRAS-CHAVE: Estados Unidos; Federalismo; Legislativos Estaduais; Sanes
Econmicas; Congresso; Suprema Corte.
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ABSTRACT
The main objective of this research is to analyze the international actions of U.S. states, in view of the establishment of foreign policy actions by international economic sanctions developed by state legislatures. It is understood by the application of sanctions measures that seek to reduce the economic welfare of a target state by reducing international trade in order to coerce it to amend certain political behavior. In the case of state sanctions, are used two types of activity: 1) the prohibition in the states of hiring or purchasing goods and services from companies doing business in the target country or through selective divestment laws and 2) preventing states or local agencies to make public investments in these companies. Through this kind of activity states can develop actions contrary to national foreign policy, generating conflict and legal tensions with Washington. Trying to understand this process, this paper aims to map the historical roots of this institutional design, as well as cases of penalties imposed by state legislatures, 1977, start date this type of activity, 2012. It is understood that the analysis of these cases, the Supreme Court and of the actions taken by Congress will contribute to the understanding of the functioning of these institutions in situations of conflicts between states and the federal government on issues of international economic policy. To identify the main features of state sanctions, this work present the mapping of state sanctions imposed by state legislatures from 1977 to 2012.
KEYWORDS: United States, Federalism, State Legislatures; Economic Sanctions;
Supreme Court.
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RSUM
Lobjectif principal de cette recherche est danalyser laction internationale des tats nord-americains travers les sanctions conomiques internationales developpes par les legislatives tatiques. On comprend par le terme de sanction lapplication de mesures qui reduisent le commerce international avec un pays-cibl, pour le contraindre alterer certains comportements politiques. Dans le cas des sanctions tatiques, deux types dactivits sont utilises : 1) linterdiction de contratation ou acquisition de biens et services des entreprises qui ont des affaires dans le pays cibl, travers des lois de desinvestissement selectives et 2) linterdiction des tats ou agences locales de raliser des investissements publiques dans cette entreprise. travers ce type dactivit les gouvernements tatiques peuvent developper des actions contraires la politique nationale externe, engendrant des conflits et tensions juridiques avec Washington. Pour comprendre ce processus, le travail cherchera retracer les racines historiques des institutions politiques des tats- Unis, bien comme le cas des sanctions appliques par les lgislatives tatiques de 1977, date iniciale de ce type dactivit, en 2012. lanalyse de ces cas, des actions adoptes par le congrs et la cour suprme contribueront la comprehenssion du fonctionnement des institutions nord-amricaines en situation de conflits entre gouvernement tatiques et lunion en terme de politique internationale.
MOTS-CLES: tats-Unis, le fdralisme, lgislatures d'tat; sanctions conomiques;
Cour suprme.
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SUMRIO INTRODUO ......................................................................................................................... 1
O campo de estudo da paradiplomacia .................................................................................. 9
As limitaes dos estudos da paradiplomacia para o caso norte-americano ....................... 14
CAPTULO I: A INAUGURAO DO FEDERALISMO NORTE-AMERICANO: A
FORMAO DA REPBLICA (1776-1787) ........................................................................ 17
1.1 Da Independncia aos Artigos da Confederao ......................................................... 18
1.2 Dos Artigos da Confederao Conveno da Filadlfia: os debates sobre a ampliao dos
poderes do governo nacional ............................................................................................... 23
1.3 A Conveno Constitucional da Filadlfia de 1787 ...................................................... 32
CAPTULO II - O DEBATE CONSTITUCIONAL NA FORMAO DOS ESTADOS
UNIDOS .................................................................................................................................. 51
2.1 Federalistas vs Anti-federalitas (1787-1788) ................................................................. 52
2.2 Consideraes sobre o federalismo norte-americano .................................................... 74
CAPTULO III A CONSTITUIO DOS ESTADOS UNIDOS E O DEBATE SOBRE A
AUTONOMIA E OS PODERES ESTADUAIS NAS RELAES EXTERIORES ............. 79
3.1 Consideraes sobre a Constituio: as clusulas constitucionais e os limites aos estados
.............................................................................................................................................. 80
3.2 Os poderes destinados ao governo nacional na Constituio Federal em temas de poltica
exterior ................................................................................................................................. 90
3.3 O debate constitucional sobre a autonomia dos estados em questes internacionais .... 99
CAPTULO IV: A ATUAO INTERNACIONAL DOS ESTADOS AMERICANOS .... 109
4.1 O envolvimento dos estados na poltica internacional ................................................. 109
4.1.1 A participao dos estados visando a promoo do comrcio e investimentos .... 114
4.1.2 Aes estaduais e a busca por influncia na conduo poltica externa nacional 121
4.1.3 A atividade internacional dos legislativos estaduais ............................................. 122
4.2 As sanes econmicas estaduais ............................................................................. 130
CAPTULO V - O POSICIONAMENTO DA SUPREMA CORTE SOBRE A ATUAO
INTERNACIONAL DOS ESTADOS ................................................................................... 151
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5.1 As decises da Suprema Corte sobre aes envolvendo a participao internacional dos
estados ................................................................................................................................ 151
5.2 As sanes estaduais e o posicionamento da Suprema Corte: o caso Massachusetts Burma
Law .................................................................................................................................... 167
CAPTULO VI - O CONGRESSO E A ATUAO INTERNACIONAL DOS ESTADOS189
6.1 O Congresso e a regulao das aes internacionais estaduais .................................. 189
6.2 As sanes estaduais e a atuao do Congresso norte-americano ............................... 197
CONSIDERAES FINAIS................................................................................................. 224
ANEXO 1: LEIS DO CONGRESSO QUE REGULAM AS SANES ECONMICAS
ESTADUAIS ......................................................................................................................... 233
ANEXO 3: PROJETOS DE LEI APRESENTADOS NO CONGRESSO ENVOLVENDO
SANES AO IR ............................................................................................................... 259
ANEXO 4: PROJETOS DE LEI E RESOLUES APRESENTADAS NO CONGRESSO
ENVOLVENDO SANES FRICA DO SUL .............................................................. 262
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................................... 274
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NDICE DE TABELAS
Tabela 1: Delegados da Conveno Constitucional de 1787 ................................................... 31
Tabela 2: Principais Caractersticas do Plano Virgnia para o governo federal ...................... 36
Tabela 3: Estimativa da populao dos estados em 1787 ........................................................ 37
Tabela 4: Principais Caractersticas do Plano New Jersey para o governo nacional ............... 41
Tabela 5: Grande Compromisso ou Connecticut Compromise ............................................... 46
Tabela 6: O crescimento das legislaes internacionais, 1991-2002 ..................................... 123
Tabela 7: Legislaes estaduais relacionadas imigrao (2005-2011) ............................... 123
Tabela 8: Sanes econmicas estaduais (1977-1994) .......................................................... 133
Tabela 9: Sanes estaduais por estado / pas alvo (1977-1994) ........................................... 135
Tabela 10: Sanes estaduais por alvos (1977-2012) ............................................................ 137
Tabela 11: Sano estadual contra Instituies Privadas ....................................................... 138
Tabela 12: Sanes por estado (1977-2012) .......................................................................... 140
Tabela 13: Peso econmico dos estados e as sanes ............................................................ 142
Tabela 14: Sanes Estaduais e partidos politicos ................................................................. 144
Tabela 15: Sanes estaduais por Alvo e Partido Poltico ..................................................... 145
Tabela 16: Potenciais efeitos das sanes econmicas unilaterais aplicadas pelos estados .. 148
Tabela 17: Sanes aplicadas pelos governos estaduais a Burma (1995-1998) .................... 169
Tabela 18: Sanes estaduais a Burma .................................................................................. 170
Tabela 20: Projetos de lei no Congresso para regular sanes estaduais (1986-2013) ......... 204
Tabela 21: Nmero total de sanes estaduais por ano (1977-2012) .................................... 204
Tabela 22: Total das propostas regulatrias de sanes econmicas estaduais e locais por tema
(2000-2013)............................................................................................................................ 205
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Tabela 23: Propostas de regulaes no Congresso por pas-alvo (1986-2013) ..................... 206
Tabela 24: Sanes econmicas por pas-alvo e perodo ....................................................... 207
Tabela 25: Sanes estaduais Sudo (2005-2007) ................................................................. 208
Tabela 26: Sanes Estaduais (Ir 2005-2009) ................................................................... 209
Tabela 27: Sanes Econmicas Estaduais contra o Ir ........................................................ 216
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NDICE DE FIGURAS
Figura 1: Evoluo das Sanes estaduais (1977-2012) ........................................................ 132
Figura 2: Sanes por estado (1977-2012) ............................................................................ 141
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INTRODUO
Nos Estados Unidos, as aes internacionais dos governos estaduais so marcadas em
alguns momentos por conflitos e tenses com o governo federal. Ao tratar do tema, o governo
federal, sob a presidncia de Clinton apresentou em 1997 um documento que reflete estas
tenses demonstrando a preocupao do governo com este tipo de atividade. O documento busca
reforar o papel do governo nacional na conduo das relaes internacionais e traz tona as
preocupaes do governo sobre a atividade internacional dos estados. O texto Destaca que
while States may speak out on matters of foreign policy, the ultimate authority to act on behalf
of the United States, and each of its States, in the international arena resides with the President
and Congress alone (William J. Clinton, The White House, 1997)1. Nesta declarao o governo
enfatiza tambm os problemas que este tipo de atividade pode acarretar ao afirmar que the
national governments ability to exercise that authority effectively, expeditiously, and flexibly
may be undermined when States pursue their own foreign-policy objectives in their own
ways (idem, Grifo nosso).
Os apontamentos feitso neste document refletem as tenses entre o governo nacional e os
governos estaduais vinculadas a um tipo especfico de atividade internacional: a aplicao de
sanes econmicas estaduais. Este tipo de medida teve seu incio no final da dcada de 1970 e
tem como principal objetivo alterar o comportamento poltico dos pases-alvos. A aplicao de
leis estaduais com sanes econmicas determina dois tipos de proibio que afetam: a) a
contratao ou aquisio de bens e servios de agncias do governo estadual com empresas que
tenham relacionamento comercial com o pas-alvo da medida e 2) os investimentos de agncias
estaduais a empresas que tenham relacionamento com o pas-alvo. Uma variao desta ltima
atuao ocorre por polticas de desinvestimentos dos fundos de penso pblicos a indivduos ou
empresas que tenham negcios com o pas-alvo.
A primeira sano estadual foi aplicada pelo estado de Wisconsin em maio de 1977 e
determinava a proibio de investimentos dos fundos estaduais para empresas que faziam 1 Documento enviado pela Casa Branca Corte de Apelao dos Estados Unidos no dia 20 de maio de 1997.
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negcios com a frica do Sul. Durante a dcada de 1980, como veremos, outros estados
aplicaram sanes frica do Sul motivados pelo movimento anti-apartheid. Neste perodo
inicial, as sanes econmicas estaduais eram direcionadas a pases denunciados por violaes
aos direitos humanos.
Entrentato, no perodo recente, outras tendncias so identificadas. Alm das sanes
envolvendo denncias contra os direitos humanos, observamos que a partir de 2000 foram
apresentados projetos de lei que sancionavam pases considerados terroristas (ou
patrocinadores do terrorismo) e pases suspeitos de desenvolverem tecnologias para a
construo de armas de destruio em massa, superando o nmero de propostas que tratam da
temtica dos direitos humanos. Chama a ateno o nmero de projetos de lei estaduais voltados
para a aplicao de sanes contra o Ir, tema importante para a poltica externa nacional. A
anlise emprica desta pesquisa demonstrou que as propostas enviadas pelos estados e que
tiveram como alvo o Ir superaram em nmero o total de projetos de lei enviados pelo Congresso
estabelecendo sanes econmicas quele pas. Entre 2001 a 2012 foram identificados um total
de 96 propostas nos legislativos estaduais sobre o tema enquanto no Congresso o nmero total de
propostas foi de 57 (39 apresentadas pela House of Representatives e 18 pelo Senado2).
Como veremos, a participao dos governos estaduais por meio das sanes econmicas
uma prtica que gera preocupaes e tambm conflitos com a poltica externa desempenhada
pelo governo nacional reforando os argumentos descritos no documento enviado pelo governo
norte-americano na dcada de 1990. Um exemplo foi a sano aplicada por Massachusetts em
1996. A medida criava mecanismos impeditivos para a realizao do comrcio e aplicao de
investimentos estaduais a empresas que comercializassem com Burma devido s denncias de
violao dos direitos humanos naquele pas. Sua aplicao prejudicou a conduo da poltica
externa nacional e contribuiu para o aumento de sanes estaduais semelhantes a estas por outros
estados e governos locais.
As consequncias desta sano estadual para o governo nacional envolveram tanto
dificuldades na conduo da poltica externa nacional, uma vez que a postura adotada pelo
estado tensionava com a estratgia adotada pela poltica externa nacional, como tambm
constrangimentos polticos com parceiros comerciais e aliados dos Estados Unidos que
questionaram a lei estadual na Organizao Mundial do Comrcio (OMC). Este caso foi levado
2 Ver Anexo III
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ao rgo de Soluo de Controvrsias da organizao e discutido tambm na Suprema Corte que
tratou pela primeira vez das discusses envolvendo a aplicao de sanes econmicas estaduais.
O envolvimento dos estados no cenrio internacional por meio deste tipo de atividade
impe desafios s instituies norte-americanas e traz tona um elemento caracterstico do
federalismo norte-americano: o relacionamento ora conflituoso, ora cooperativo entre estados e
governo federal. A anlise deste tipo de atividade internacional revela elementos importantes
para a compreenso das relaes intergovernamentias nos Estados Unidos que so marcadas por
um modelo federalista prprio que mantm um relacionamento dual e cooperativo entre os
estados e o governo federal. Por considerar a relevncia deste tema, o objetivo desta pesquisa
ser compreender esta modalidade de atuao internacional dos governos estaduais norte-
americanos.
Os posicionamentos da literatura especializada sobre os limites para a atuao dos
governos estaduais na poltica internacional no so consensuais. Enquanto parte da literatura
defende a exclusividade do governo nacional na poltica exterior em temas como o comrcio
internacional, outra corrente enfatiza que os limites para a atuao internacional dos estados no
esto totalmente definidos. No entendimento desta segunda corrente terica, a estrutura
constitucional norte-americana permitiria o envolvimento destes atores no cenrio internacional.
Para compreender este debate ser necessrio considerar as razes histricas do
federalismo norte-americano que inaugurou um novo modelo de federalismo com a promulgao
e a ratificao da Constituio dos Estados Unidos em 1789. Isto porque, o debate sobre a
autonomia dos estados e do governo federal histrico e definidor do desenho institucional do
pas.
H no senso comum um mito fundador a respeito da formao dos Estados Unidos,
apresentando um cenrio marcado pela convergncia de ideias e interesses entre os fundadores
que desconsidera os embates estabelecidos naquele perodo. Neste entendimento, a formao dos
Estados Unidos e a promulgao da Constituio norte-americana contaram com o apoio da
ampla maioria dos estados, crticos do modelo da Confederao e favorveis centralizao da
autoridade para o governo nacional. A construo deste mito fundador acompanha desde as
anlises sobre a Revoluo norte-americana passando pela Declarao de Independncia at os
debates da Conveno Constitucional que formulou a proposta da nova Constituio do pas em
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17873. E esta percepo de unidade e harmonia de ideias e interesses dos estados norte-
americanos desde a sua fundao tm um impacto significativo para a compreenso do
relacionamento entre os estados e o governo nacional na poltica norte-americana. Utilizando as
palavras de Zinn (2010:93) still, the mythology around the Founding Fathers persists. Este tipo
de entendimento dificulta a compreenso das tenses estabelecidas entre estes atores e que fazem
parte da histria e da essncia do modelo federalista adotado no pas.
Ao considerarmos as discusses envolvendo a fundao da repblica norte-americana,
relativamente conhecido os posicionamentos dos Federalistas na defesa da unificao das treze
colnicas com o estabelecimento de um governo nacional com maior autoridade. Contudo, pouco
se discute sobre a importante atuao dos Antifederalistas neste processo. A reviso da
Confederao norte-americana para o estabelecimento de uma federao foi marcada pelos
embates entre os defensores da centralizao, os Federalistas, e os que questionavam a ameaa
autonomia dos estados e a usurpao de seus poderes por um governo central, conhecidos como
os Antifederalistas. Estas clivagens so parte da histria da fundao dos Estados Unidos e do
desenho institucional estabelecido pela Constituio norte-americana . Os princpios da
autonomia dos estados foram incorporados Constituio norte-americana que estabeleceu
mecanismos de compartilhamento de poderes (os concurrent powers) entre o governo federal
e o estadual garantindo a supremacia do governo nacional ao mesmo tempo em que reconhecia a
autonomia dos estados garantindo a atuao forte dos governos estaduais na conduo da vida
domstica e conforme veremos, em alguns aspectos da vida internacional.
Desta maneira, a formao dos Estados Unidos resultado das reflexes realizadas no
final do sculo XVIII e que mantm um papel determinante na vida poltica norte-americana
contempornea. Como argumenta Cornell (1999), enquanto os Federalistas definiram a estrutura
do governo norte-americano, os princpios e ideias dos Antifederalistas continuam a definir o
esprito da poltica norte-americana. Com o estudo destes processos ser possvel identificar os
princpios norteadores do federalismo norte-americano e da formao do desenho institucional
deste pas, to diverso daquele estabelecido no caso brasileiro.
3 O debate sobre os mitos envolvendo a fundao dos Estados Unidos podem ser identificados na obra Founding Myths: stories that hide our patriotic past de Ray (2010); Inventing American: Jeffersons Declaration of Independence de Garry Wills (2002); Globalisation, Democracy and Terrorism de Eric Hobsbawn (2008); A peoples history of the United States: 1492 to present de Howard Zinn (2010) e The American Founding de Frank W. Fox (2003).
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Aps o estudo das caractersticas do federalismo norte-americano e do debate
constitucional sobre o papel dos estados na poltica internacional, ser apresentado um
mapeamento das sanes econmicas estaduais no perodo de 1977 a 2012. Posteriormente, a
anlise se voltar para a compreenso do comportamento das instituies norte-americanas no
tratamento deste tipo de atividade estadual.
Para compreender este processo, buscaremos analisar qual tem sido a reao e/ou
posicionamento dos outros branches (Congresso e Suprema Corte) sobre este tipo de atividade.
O estudo do papel da Suprema Corte estar voltado para a anlise da interpretao da Suprema
Corte na definio do papel dos governos federal e estadual na poltica exterior. Tal anlise se
justifica porque funo desta instituio determinar a constitucionalidade ou a
inconstitucionalidade das leis federais e estaduais luz das interpretaes da Constituio
Federal bem como a competncia constitucional dos entes federados. Como destaca Drake et al,
the Supreme Court has served as a legal 'arbiter of the federal system' when claims and
counterclaims of state and national powers conflict (Drake et al, 1999). A anlise do
comportamento do Congresso tambm ser necessria uma vez que esta instituio responsvel
por regular a atuao internacional dos estados, conforme determinado no texto constitucional.
Assim, buscaremos nesta pesquisa compreender como o Congresso e as Supremas Cortes reagem
a este tipo de atividade e qual tem sido o posicionamento destas instituies ao tratar das sanes
estaduais.
Algumas hipteses sero discutidas nesta pesquisa. Primeiramente, entendemos que as
tenses estabelecidas entre os estados e o governo nacional nos casos de aplicao das sanes
econmicas fazem parte do desenho institucional norte-americano que se caracteriza por
perodos de cooperao e competio entre estes dois atores. Assim, partimos da hiptese de que
os conflitos entre estados e governo federal em assuntos de poltica internacional correspondem
ao prprio modelo federalista norte-americano e s suas especificidades. Buscaremos comprovar
esta hiptese com o estudo aprofundado da formao do federalismo norte-americano,
identificando as tenses estabelecidas entre os estados e o governo nacional na definio de suas
funes e competncias e a construo de um modelo federativo que em alguns momentos
conflituoso e em outros cooperativo.
Ao considerarmos o papel da Suprema Corte e o seu comportamento tendo em vista as
sanes econmicas estaduais, trabalha-se nesta pesquisa com a hiptese de tendncia da Corte
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pela centralizao do poder e garantia da exclusividade do governo nacional em assuntos de
poltica internacional. Tal posicionamento adotado para evitar uma balcanizao da poltica
externa nacional. Assim, a reafirmao da supremacia do governo nacional manteria uma
unicidade no tratamento das questes internacionais pelos Estados Unidos.
No caso atuao do Congresso sobre as sanes estaduais, questionamos a afirmao de
que o mesmo tem se mantido em silncio diante deste tipo de atividade. Partimos da hiptese de
que o Congresso tem reagido diante de alguns casos de sanes estaduais, mas que as aes da
instituio esto voltadas mais para o reconhecimento das aes estaduais do que pela proibio
das mesmas. Isto porque as sanes estaduais tm sido aplicadas independentemente do
consentimento explcito desta instituio. Alm disto, as aes do Congresso so posteriores s
sanes.
O estudo destas questes contribuir para a compreenso das tenses entre o governo
federal e estadual em temas de poltica internacional considerando que o foco desta pesquisa ser
a anlise dos casos envolvendo a aplicao das sanes econmicas as quais possuem este
carter potencialmente conflituoso.
Ao considerarmos o estudo sobre a participao governos estaduais como atores na
poltica internacional importante ressaltar que o campo de estudos das relaes internacionais
que se dedica a esta temtica recente e est relacionado s mudanas do sistema internacional
no ps-guerra fria e intensificao do processo de globalizao4. Ao tratar deste perodo a
literatura de relaes internacionais reconhece o estabelecimento de processos que marcaram
alteraes significativas na dinmica internacional. A compreenso destas mudanas deve levar
em conta as alteraes qualitativas nas esferas econmicas e polticas do sistema internacional
que modificaram os padres de atividade, interao e exerccio de poder (Archibugi et al, 1998).
Como resultado destas dinmicas, observou-se um crescente interesse na compreenso do
envolvimento internacional de novos atores nas relaes internacionais, dentre eles os governos
subnacionais.
Atravs do envolvimento direto no cenrio internacional, os governos subnacionais
buscam a realizao de seus interesses e a reduo dos impactos negativos da globalizao. Ao
tratar deste tipo de atuao, Fry (2005:120) destaca que in an era of globalization, sub-state 4 Entende-se por globalizao a [...] intensificao de relaes sociais mundiais que unem
localidades distantes de tal modo que os acontecimentos locais so condicionados por eventos que acontecem a muitas milhas de distncia e vice versa (Giddens, 1991).
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governments in several federations have decided that they must be actively engaged in the
international sector in order to protect the interests of their local constituents.
As motivaes para a participao internacional destes atores so variadas e envolvem
questes de ordem econmica, poltica e social (Hocking, 1999; Keating, 2004). No campo
econmico podemos citar a busca de inverses, capital para seus produtos e tecnologia para a
modernizao de sua produo. As motivaes polticas esto relacionadas a atividades voltadas
para o maior reconhecimento e legitimao de determinadas regies, maior participao nos
processos que tero impacto no nvel local e regional (como os processos de integrao regional)
e ainda iniciativas voltadas para a promoo dos prprios lderes regionais no ambiente
internacional. No caso das motivaes culturais, os governos subnacionais buscam estreitar suas
relaes com governos situados em outros pases os quais possuem identidades culturais
semelhantes, como por exemplo, atravs do irmanamento5 entre cidades (Keating, 2004). Apesar
de reconhecer que as motivaes para a atuao internacional so variadas, h um consenso na
literatura de que as questes de ordem econmica, envolvendo a promoo do comrcio e a
busca por investimentos so centrais e correspondem aos principais objetivos da atividade
internacional destes atores (Michelmann, 2007; Keating, 2004; Fry, 1998)
A literatura das relaes internacionais que trata da participao de novos atores no
cenrio internacional possui limitaes para compreender a insero dos atores subnacionais
neste cenrio. Embora haja um reconhecimento de que o sistema internacional contemporneo
marcado por uma composio variada de atores, h dificuldades para categorizar a atuao dos
governos locais e estaduais como atores internacionais, pois como destaca Hocking (2004:87)
estes so atores complexos que no se enquadram facilmente nas taxonomias em geral aceitas
pela literatura que trata de relaes internacionais (Hocking, 2004:87).
Ao buscar delinear as caractersticas do sistema internacional no ps-Guerra Fria
Keohane e Nye (2001) consideram o estabelecimento de novos canais de articulao entre os
atores por meio do conceito de interdependncia complexa em um cenrio marcado pelo
aprofundamento de estruturas de redes e interaes entre os diversos atores internacionais, com a
existncia de mltiplos canais de ligao entre sociedades. Entre os canais citados pelos autores
temos as relaes interestatais, transnacionais e transgovernamentais. Eles representariam,
5 O irmanamento entre cidades se refere formao de cidades-irms que estabelecem vnculos envolvendo a cooperao entre cidades que possuem uma identidade comum.
8
respectivamente, os canais formais estabelecidos pelas elites governamentais, os canais informais
entre as elites no-governamentais e os canais estabelecidos pelas organizaes transnacionais,
representadas pelas corporaes multinacionais e pelos bancos (Keohane e Nye, 2001). Embora
esta nova conceituao apresente outras categorias de atores internacionais elas no tratam da
participao internacional de governos locais e estaduais.
Outra categoria utilizada para definir a natureza dos novos atores que atuam no cenrio
internacional foi formulada por Rosenau (1990). Rosenau analisa o sistema internacional atravs
de duas esferas de atuao: a das relaes interestatais (sob o predomnio, portanto, dos Estados)
e das relaes transnacionais; ou seja, a das relaes entre atores no-estatais em um cenrio de
multidimensionalidade de poder. Reconhecendo que o novo cenrio internacional est marcado
por um sistema de poder multicntrico, o autor apresenta a composio de diversas coletividades
livres de soberania, os sovereignty-free, que atuam fora da lgica estadocntrica em um mundo
tradicionalmente marcado pelos atores sovereignty-bound. A primeira categoria corresponde
atuao dos governos centrais e que exercem a soberania em territrio definido. Os atores
sovereignty-free, seriam aqueles que no possuem obrigao formal de atuar na poltica exterior
de possuir uma agenda predeterminada concentrando-se em objetivos mais delimitados e
concretos (Salomn, 2009). Nesta categoria, estariam includas as corporaes multinacionais, os
grupos tnicos, as burocracias e os partidos polticos. Apesar dos avanos, esta distino possui
limitaes quando o objetivo estudar o envolvimento dos atores subnacionais. Embora os
governos subnacionais utilizem instrumentos de atuao internacional semelhantes aos aplicados
pelos atores livres de soberania no podem ser considerados livres de soberania porque possuem
vnculos com o governo nacional. Contudo, eles tambm no podem ser considerados
soverignty-bound porque ao atuar internacionalmente para a realizao de seus interesses,
buscam uma insero mais autnoma ao governo central. Sendo assim, eles no se enquadrariam
nas categorias descritas pelo autor. Desta maneira possvel concluir que a literatura das
relaes internacionais possui limites para analisar a atuao dos atores subnacionais no cenrio
exterior (Hocking, 2004; Salomn, 2007; Miklos, 2010).
Ao reconhecer as dificuldades na categorizao da atividade destes atores no cenrio
internacional, observou-se a partir da dcada de 1980, a emergncia de um novo campo de
estudo nas relaes internacionais para tratar desse tipo de fenmeno e que passou a ser
amplamente conhecido como o estudo da paradiplomacia.
9
O campo de estudo da paradiplomacia
As obras de Soldatos (1990), Feldman e Feldman (1990), Duchacek (1984, 1990) so
pioneiras na formulao deste novo marco terico. Inicialmente, o termo utilizado para designar
a atividade internacional de atores subnacionais foi cunhada por Duchacek ao desenvolver o
conceito sub-national microdiplomacy (1984). Posteriormente, Soldatos apresentou o conceito
da paradiplomacia para se referir a direct international activity by sub-national actors (federated
units, regions, urban communities, cities) supporting, complementing, correcting, duplicating or
challenging the nation-statesdiplomacy (Soldatos, 1990: 17). Este conceito foi incorporado aos
trabalhos subsequentes de Duchacek (Aguirre, 1999; Geldenhuys, 1998) por entender que o
prefixo para indicates the use of diplomacy outside the traditional nation-state framework
(Soldatos, 1993:46).
A adoo do termo paradiplomacia por Duchacek est provavelmente relacionada
subdiviso que o autor elabora para compreender a relao entre as aes subnacionais e os
Estados nacionais. Ao analisar o relacionamento deste tipo de atividade com o governo central,
observa-se o desenvolvimento de aes subnacionais voltadas para uma futura secesso destas
regies com o governo central. Nestes casos, Duchacek desenvolve o termo protodiplomacia
para se referir conduo das relaes internacionais de um governo no-central com o objetivo
de estabelecer um Estado soberano. Como observa o autor, this is in contrast to paradiplomatic
activities abroad, primarily concerned with economic, social, and cultural issues. Protodiplomacy
represents diplomatic preparatory work for a future secession and for the international diplomatic
recognition of such an occurrence (Duchacek, 1988: 22 apud Aguirre, 1999: 190).
H autores, contudo, que contestam a utilizao do termo paradiplomacia, apresentando
alternativas a ele. Hocking (1993), por exemplo, apresenta o conceito multilayered diplomacy
approach, ou diplomacia multicamadas. Para o autor, o termo paradiplomacia deve ser
substitudo pela adoo de um enfoque analtico mais amplo que considere a participao de
governos no-centrais na poltica internacional de forma cooperativa, no segmentativa. As
10
categorias elaboradas por Duchacek (paradiplomacia e protodiplomacia) enfatizariam, segundo
Hocking (1993), a separao destas aes com a poltica nacional. Para ele, isso reforaria uma
imagem de conflito entre os governos centrais e as regies no ambiente internacional,
contribuindo, com isso, para o estabelecimento de tenses entre essas esferas do federalismo. Por
considerar que tais aes oferecem um padro de cooperao entre as autoridades polticas, o
termo multilayered diplomacy seria o mais adequado, pois the NCGs actually are fully
international actors, even if as complex and plural as the state to which they belong.
(Hocking, 1993:201).
Ao discutir esse termo, Aguirre (1999) destaca que a participao de governos no-
centrais (NCGs) na atividade internacional no deve ser entendida como anormal, paralela ou
como uma forma de diplomacia. Segundo o autor, the international involvement of NCGs could
much more properly be labeled postdiplomatic, because it is a process that moves beyond the
nation-state, that is, beyond diplomacy (Aguirre, 1999:205).
No Brasil, outras terminologias so utilizadas como alternativas ao conceito da
paradiplomacia. Para Rodrigues (2004) o termo que melhor define a ao internacional de entes
federativos brasileiros poltica externa federativa, entendida como a estratgia prpria de
um estado ou municpio, desenvolvida no mbito de sua autonomia, visando a sua insero
internacional de forma individual ou coletiva (Rodrigues, 2004:40). Boga (2002) utiliza o
termo diplomacia federativa para definir a ao externa de unidades federativas constituindo
um novo modelo de diplomacia, segundo o autor esta ao esta condicionada s necessidades do
poder central e vem a complementar os governos centrais na identificao de novas
oportunidades internacionais voltadas para a cooperao, o comrcio, atrao de investimentos e
novas tecnologias. Entretanto, a utilizao do termo diplomacia para tratar da atuao
subnacional controverso. Isto se deve ao fato de que este termo , tradicionalmente,
relacionado atuao dos Estados em suas relaes polticas, econmicas e comerciais, portanto,
direta e exclusivamente vinculadas s relaes internacionais entre Estados-Nao (Rodrigues,
2004).
Uma definio extensiva do termo paradiplomacia que comumente utilizada pela
literatura, dada por No Cornago ao defini-lo como o engajamento de governos no-centrais
nas relaes internacionais mediante o estabelecimento de contatos permanentes ou ad doc com
entidades estrangeiras pblicas ou privadas, com o fim de promover questes socioeconmicas e
11
culturais, assim como qualquer outra dimenso externa de suas competncias constitucionais
(Cornago, 1999:40). Em trabalho publicado posteriormente, o autor buscou apresentar um termo
que pudesse conciliar as vrias denominaes utilizadas para a atividade subnacional ao sugerir o
conceito de diplomacia sub-estatal: in order to avoid possible terminological disputes, sub-state
diplomacy can perhaps be a more appropriate denomination for a reality that is becoming
commonplace in the daily policy-making processes of many local and regional governments
throughout the world and is increasingly accepted by the diplomatic system itself (Cornago
2010:13). A proposta se justifica porque, segundo o autor, esta falta de preciso conceitual
complica de forma significativa os esforos de sistematizao das pesquisas sobre o tema: This
conceptual ambiguity poses a serious challenge for positivist approaches to empirical research,
but it has quite different implications for interpretive social sciences (Cornago, 2010:13).
Assim, apesar das crticas ao conceito, o termo paradiplomacia ganhou espao no debate
acadmico e passou a ser incorporado por grande parte da literatura relacionada ao tema.
H no debate sobre a atividade internacional de governos estaduais e locais preocupaes
sobre as consequncias destas atuaes para a conduo da poltica externa nacional. Entre os
temas mais sensveis est o questionamento legal deste tipo de atuao, posto que grande parte
das Constituies Federais delegam poderes exclusivos ao governo federal em assuntos de
poltica externa.
A discusso sobre a possibilidade de conflitos entre os atores subnacionais e o governo
nacional so variadas. Ao tratar dos possveis conflitos entre a atividade subnacional e governo
central, Kincaid (1990) reconhece a possibilidade de conflitos entre estes atores, mas ressalta
que, apesar dessa possibilidade, os casos de ameaa concreta so raros. Fry (1990), em
contrapartida, reconhece a possibilidade de conflitos e apresenta preocupao sobre este tipo de
atividade. Duchacek (1990), ao considerar os conflitos entre o governo nacional e os atores
subnacionais formulou o conceito da protodiplomacia para tratar de atividades de cunho
separatista e que buscam, portanto, a separao com o governo nacional. Ao discutir as
atividades destes atores Soldatos (1990) enfatiza que este tipo de atuao deve ser entendido
como uma oportunidade, no como possibilidade de conflito, por corresponderem a aes a
assuntos de low politics e que no geram constrangimentos ao governo central.
O posicionamento de Keating (1998) sobre as caractersticas da ao subnacional
corrobora com o posicionamento destes autores, pois para ele a atividade internacional de
12
governos subnacionais no prejudica a poltica externa dos Estados. Segundo o autor, os
governos subnacionais atuam no cenrio externo com uma estratgia que podemos definir como
lgica de stop and go. Neste modelo, identifica-se ativismo em questes relacionadas s
temticas de cooperao tcnica, emprstimos, investimentos, convnios tecnolgicos, etc.
vinculados a questes locais, marcados por objetivos especficos e que no permanecem no
longo prazo. Por no responder a estratgias definidas, mas s necessidades dos governos
subnacionais sobre uma determinada questo6, este tipo de atividade gera pouca preocupao
para os Estados.
Ao analisar as percepes dos Estados sobre este tipo de atividade, Miklos (2010) destaca
que a possibilidade de conflitos marcou uma preocupao inicial entre os autores, mas que j foi
superada. Ao mapear os debates sobre a percepo dos autores sobre a possibilidade de conflito
com o Estado, a autora refora que embora esta tenha sido uma preocupao inicial, os Estados
passaram a compreender a atuao paradiplomtica como uma atividade complementar e no
prejudicial conduo da poltica externa nacional. A prpria definio do termo paradiplomacia
refora esta percepo. A aceitao de tais atividades pelos Estados nacionais pode ser observada
pelas medidas adotadas visando a institucionalizao deste processo, o que viabiliza o argumento
de superao da desconfiana (Blanes, 2009, Vigevani 2004; Stuart, 2002).
O mapeamento da literatura sobre o tema demonstra tambm que os estudos sobre a
possibilidade de aes conflituosas entre unidades subnacionais e Estados so situaes raras e
esto restritas ao debate envolvendo atividades que buscam a total separao e autonomia do
governo central, vinculados aos movimentos de secesso.
Para este tipo de atividade utiliza-se a definio proposta por Duchacek e que foi
incorporada pela literatura, na qual: protodiplomacy refers to initiatives and activities of a non-
central government abroad that graft a more or less separatist message on to its economic,
social, and cultural links with foreign nations (Duchacek,1990:17). Enquanto a paradiplomacia
considerada como uma atividade normal, dependendo do grau de autonomia dado ao governo
6 Neste sentido, o autor destaca que a diplomacia regional no busca representar interesses gerais
nem realizar uma cobertura completa de temas, na medida em que las regiones no tienen gobiernos soberanos capaces de imponer su definicin de inters nacional y perseguirlo de una forma coherente y unificada. Las regiones son entidades complejas que contienen una multiplicidad de grupos, que pueden compartir intereses comunes en algunas reas pero estar abruptamente divididas en otras (Keating, 2001:39).
13
subnacional, a protodiplomacia is often seem as illegitimate or at least dangerous for the
integrity of the state (Keating, 1999).
As aes subnacionais no cenrio exterior estariam, desta maneira, subdividas pela
literatura em dois principais grupos: as aes paradiplomticas e as aes protodiplomticas.
A protodiplomacia se caracteriza fundamentalmente pelo estabelecimento de aes
subnacionais voltadas para a segmentao e a independncia com relao ao Estado a que esto
subordinados. Um exemplo tradicional apresentado pela literatura refere-se ao caso da provncia
Quebec que analisado nos trabalhos de Aldecoa e Keating (1999), Vengroff e Rich (2004),
dentre outros. Por objetivar a independncia da regio, estas aes so ento marcadas pelo
conflito com a poltica externa nacional. J a atuao dos atores subnacionais por meio da
paradiplomacia no gera conflitos e se referem a atividades complementares e paralelas ao
governo nacional.
Como discutido, a principal motivao para a participao internacional dos governos
subnacioanis econmica. A promoo comercial, a busca por investimentos e a captura de
novos recursos internacionais so estimulados pelos governos nacionais que observam com bons
olhos este tipo de atividade. Em alguns Estados constitucionais observou-se inclusive a reforma
constitucional visando a institucionalizao destas aes, como o caso da reforma
constitucional na Argentina e no Mxico (Paikin, 2006; Schiavon, 2004).
Contudo, quando analisamos a atuao internacional dos governos estaduais nos Estados
Unidos possvel identificar um cenrio diverso. Embora sejam identificadas aes
complementares ao governo nacional, observamos o desenvolvimento de aes internacionais
especficas. A aplicao de sanes econmicas estaduais possui um carter potencialmente
conflituoso e no se qualifica nas duas categorias apresentadas pela literatura porque no
correspondem a aes paradiplomticas e tambm no podem ser caracterizadas como aes
protodiplomticas. Ao considerarmos a natureza deste tipo de atuao no caso norte-americano
faz-se necessrio ponderar se os debates tericos da literatura especializada contribuem para a
compreenso das atividades internacionais desenvolvidas neste pas.
14
As limitaes dos estudos da paradiplomacia para o caso norte-americano
O conceito de paradiplomacia foi estabelecido para indicar a participao de outros atores
estatais, que no o Estado nacional, na ao internacional. Conforme observado, desde a dcada
de 1980, a formulao conceitual vem se afirmando, estimulada pela necessidade em
compreender este processo. Os governos subnacionais norte-americanos, seguindo o
determinante central apresentado pela literatura da paradiplomacia passaram a buscar na
atividade internacional a realizao de objetivos econmicos, principalmente voltados para a
promoo comercial e investimentos. Como veremos, o envolvimento internacional dos
governos estaduais esteve, sobretudo relacionado s restries de recursos e maior transferncia
de responsabilidades para os governos estaduais. Estas aes se caracterizam por atividades
complementares ao posicionamento do governo no mbito internacional e que no geram
constrangimentos para o governo federal.
Contudo, ao considerarmos o envolvimento dos governos estaduais por meio da aplicao
de sanes econmicas identificamos que este tipo de atividade evidencia o potencial de conflito
com o governo nacional.
Este tipo de atuao apresenta um desafio conceitual uma vez que a atuao dos estados
via sanes contraria a definio cunhada por Soldatos (1993) para caracterizar as aes
paradiplomticas desenvolvidas pelos atores subnacionais. Na definio de Soldatos, as aes
paradiplomticas esto vinculadas soberania estatal e no buscam uma atuao autnoma da
poltica externa federal. Tendo em vista a natureza e as motivaes distintas destas aes
identificadas nos estados norte-americanos, conclumos que o conceito paradiplomacia
insuficiente para caracterizar e definir integralmente as atividades internacionais desenvolvidas
pelos estados norte-americanos.
Para a literatura contempornea sobre o tema, as aes marcadas por conflitos entre o
governo nacional e atores subnacionais dizem respeito a atividades muito especficas
relacionadas aspiraes nacionalistas de entes sub-nacionais que buscam o reconhecimento e a
legitimao de determinadas regies (Colacrai, 2005). Como vimos, o termo protodiplomacia
utilizado e se destina a classificar diplomatic preparatory work for a future secession and for the
international diplomatic recognition of such an occurrence (Duchacek, 1988: 22). A utilizao
15
deste conceito tambm no adequado para definir a participao dos estados norte-americanos
por meio de sanes econmicas internacionais, pois a natureza destas atividades so distintas.
Embora se reconhea que estas aes estaduais geram conflitos legais e constrangimentos ao
governo nacional seu objetivo no a independncia das regies e o rompimento com o
federalismo americano. Sendo assim, o ativismo poltico dos estados americanos se difere
daquele apresentado pelo conceito da protodiplomacia.
O estudo da paradiplomacia apresentou importantes avanos no tratamento da atividade
internacional de atores subnacionais ao analisar a natureza, motivaes e caractersticas deste
tipo de atividade. Entretanto, este campo de estudo possui limitaes importantes quando se
considera o objetivo desta pesquisa que compreender o potencial conflituoso entre as aes
internacionais dos estados norte-americanos com o governo nacional tendo em vista o
estabelecimento de sanes econmicas.
Ao reconhecermos esta dificuldade terica foi necessria a busca de um novo campo de
estudos que pudesse contribuir para a compreenso do caso norte-americano. Neste sentido,
optou-se nesta pesquisa pelo aprofundamento da literatura que trata do federalismo e do
constitucionalismo norte-americano. A anlise destes debates contribuiu fundamentalmente para
responder aos questionamentos desta pesquisa sobre a atuao internacional dos governos
estaduais e as razes histricas das tenses entre estados e governo nacional em temas de poltica
internacional.
16
17
CAPTULO I: A INAUGURAO DO FEDERALISMO NORTE-AMERICANO: A FORMAO DA REPBLICA (1776-1787)
possvel descrever as interaes entre os estados e o governo federal no campo da
poltica internacional como marcadas tanto pela cooperao quanto pelo conflito. Como
veremos, este padro de relacionamento possui caractersticas tanto do federalismo dual quanto
do federalismo cooperativo. Ao analisar este processo Sager (1998) destaca que na arena
internacional o modelo de relacionamento intergovernamental complexo e nele o conflict and
cooperation can and do exist simultaneously (Sager, 1998:301). E afirma que cooperation
exists side-by-side with conflictual federalism on issues such as trade sanctions and potencial
preemption of state laws (idem).
As tenses identificadas entre os estados e o governo federal no campo da poltica
internacional possuem razes histricas que solidificaram a construo deste desenho
institucional especfico. Para compreender como a formao deste modelo de federalismo
estabeleceu este tipo de interao no campo da poltica internacional, faz-se necessrio analisar
as origens deste processo. Para isto, este captulo analisar a fundao da Repblica norte-
americana desde o perodo da Confederao de Estados at a construo do novo modelo de
federalismo, conhecido como Federalismo Moderno (Anderson, 2009).
O modelo de Confederao de estados foi estabelecido logo aps a independncia das
treze colnias. Esta forma de organizao reflete, sobretudo, as preocupaes em manter sua
independncia e a soberania evitando a subordinao a um governo desptico como aconteceu
durante o domnio da Gr-Bretanha. Contudo, este formato de confederao tinha muitas
fragilidades o que contribuiu para as discusses voltadas para uma reformulao de seus artigos
visando o fortalecimento do governo nacional.
Este captulo buscar analisar os embates relacionados a este processo, as crticas ao
modelo de Confederao e as discusses concernentes a uma maior centralizao de poder sob a
coordenao de um governo central. Para isto sero considerados o perodo anterior da
18
Confederao de estados at a consolidao do processo de reviso dos Artigos atravs da
Conveno Constitucional da Filadlfia em 1787.
1.1 Da Independncia aos Artigos da Confederao
Aps o desmembramento com o governo britnico foi designado um Comit no Segundo
Congresso Continental em 1776 para elaborar a declarao de independncia. Nesta reunio,
presidida pelo delegado da Virgnia Richard Lee, reafirmou-se independncia das colnias e
discutiu-se a necessidade de se formar um novo projeto constitucional para os treze estados.
Antes mesmo da Declarao de independncia possvel observar outros projetos que
buscavam fortalecer a unio das colnias. A primeira proposta foi apresentada por William Penn
em 1698 e estabelecia a criao de reunies regulares entre os deputados das colnias, presididas
por um representante indicado pelo rei, e que teriam por objetivo solucionar os conflitos entre
elas, tais como disputas comerciais, a proteo contra inimigos comuns e a cooperao em
assuntos envolvendo fugitivos da justia (Jensen, 1940). O mesmo tema foi discutido
posteriormente no Albany Congress, em 1754 quando outras propostas foram apresentadas,
sendo o principal projeto conhecido como Galloway Plan de 1774. Esta proposta continha uma
especificidade porque continha motivaes polticas para as colnias que iam alm de uma unio
voltada para a segurana comum. A proposta possua uma aspirao poltica voltada para a
constituio de um parlamento americano que poderia atuar no parlamento britnico com poder
de veto.
Contudo, tais projetos de unificao se diferem fundamentalmente da proposta
apresentada no Segundo Congresso Continental em 1776, pois nesta reunio as discusses
voltadas para a construo de uma Unio entre os treze estados tiveram um novo formato e um
novo contexto histrico. Nas palavras de Jensen (1940:109): all the earlier plans of union
contemplated, from necessity if not desire, the superior authority of the British government.
Independence, nominal if not actual, placed before the electorate of the thirteen states the task of
disposition of the political authority which had been wielded by Great Bretain.
A reunio de 1776 reafirmou primeiramente que United Colonies are, and of right ought
to be, free and independent States, that they are absolved from all allegiance to the British
19
Crown, and that all political connection between them and the State of Great Britain is, and
ought to be, totally dissolved (Richard Lee apud Feinberg, 2002:10-11). Em um segundo
momento discutiu-se a formao do novo governo com a constituio de um Comit que props,
ainda em 1776, a adoo de uma Confederao de Estados por meio da ratificao dos Artigos
da Confederao (Feinberg, 2002).
Os delegados concordaram com o projeto ao determinar que um plano para uma
Confederao deveria ser apresentado e enviado a cada estado para sua apreciao (Feinberg,
2002). Desta maneira, em 1778 os artigos foram enviados s delegaes estaduais, como
descreve Elliot:
On the 26th of June, 1778, the form of a ratification of the articles of confederation was adopted, and it was ordered that the whole should be engrossed on parchment, with a view that the same should be signed by delegates in virtue of the powers furnished by the several states (Elliot, 1836:97-98)
Embora a literatura considere formalmente que os Artigos da Confederao tiveram
incio em 1781, Farrand (1913) tem um posicionamento distinto ao destacar que, na prtica, a
experincia da confederao teve incio com a independncia do pas e a formao do comit que
elaborou este novo formato de governo.
O sistema de Confederao adotado neste perodo possui diferenas fundamentais se
compararmos com o modelo federalista proposto na Constituio de 1787 e adotado
posteriormente. Ao destacar as diferenas da confederao, Jensen (1940:109) destaca que: the
fundamental difference between the Articles of Confederation and the Constituion of 1787 lies in
the apportionment of power between the states and the central government. In the first the
balance of power was given to the states and in the second to the central government. Este
documento reconhece a necessidade de unificao entre os treze estados, mas mantm a
independncia dos mesmos ao determinar que o governo federal no poderia interferir nos
assuntos individuais de cada estado. Assim, o objetivo dos artigos foi criar um modelo que
mantivesse a soberania e independncia de cada estado ao mesmo tempo em que garantia a
segurana dos mesmos contra possveis ameaas externas. Ao tratar do tema o artigo III do
20
documento prev como principal funo da federao a garantia da segurana dos estados,
binding themselves to assist each other, against all force offered to, or attacks made upon them,
or any of them, on account of religion, sovereignty, trade, or any other pretense whatever (Art.
III, Articles of Confederation7, 1781).
No sistema de federao, o Estado Nao possui atributos de soberania sendo que o
governo geral (ou nacional) tem autoridade para governar diretamente os indivduos. Sobre os
atributos do governo nacional neste modelo Kincaid (2011:xxiii) destaca under the US
Constitution, the federal government can tax fine, arrest and regulate individuals, and also
conscript citizens into military service, whereas the former confederal government could not
exercise those powers.
J o sistema de confederao no se estabelece um governo nacional exercendo soberania
sobre as demais unidades. Este modelo pode ser conhecido como uma aliana voluntria entre
estados independentes que administram assuntos e preocupaes comuns entre os membros
(Kincaid, 2011). Isto porque, apesar da unificao, os estados mantm sua soberania e
independncia. Nos Artigos da Confederao a garantia da manuteno da soberania dos treze
estados foi descrita no artigo II ao prever que: Each state retains its sovereignty, freedom, and
independence, and every power, jurisdiction, and right, which is not by this Confederation
expressly delegated to the United States, in Congress assembled (Art. II, Articles of
Confederation, 1781).
A ratificao dos Artigos da Confederao estabeleceu um modelo de forte limitao ao
governo nacional, mantendo a soberania dos treze estados. O receio em se estabelecer um
governo nacional centralizado foi reflexo do processo de independncia e das preocupaes
envolvendo uma possvel subordinao das ex-colnias a um novo governo com poderes
despticos. Como analisa Feinberg (2002), neste perodo, os estados no buscavam trocar o
controle de um governo central por outro. Sendo assim, the colonies, on the verge of
independence from the British Emprire, would find a confederation more acceptable than a
complete union (Feinberg, 2002:12). A Declarao de Independncia, assinada em 4 de julho
de 1776, sinaliza tambm este aspecto ao nomear cada uma das ex-colnicas como unidas,
porm sendo livres e independentes: 7 Articles of Confederation Perpetual Union between the States of New hampshire, Massachusetts-bay, Rodeisland and Providence Plantations, Connecticut, New York, New Jersey, Pennsylvania, Delaware, Maryland, Virginia, North Carolina, South Carolina and Georgia, 1781.
21
Ns, por conseguinte, representantes dos Estados Unidos da Amrica, reunidos em Congresso geral, apelando para o Juiz Supremo do mundo pela rectido das nossas intenes, em nome e por autoridade do bom povo destas colnias, publicamos e declaramos solenemente: que estas colnias unidas so e de direito tm de ser Estados livres e independentes; que esto desobrigados de qualquer vassalagem para com a Coroa Britnica, e que todo vnculo poltico entre elas e a Gr-Bretanha est e deve ficar totalmente dissolvido; e que, como Estados Livres e Independentes, tm inteiro poder para declarar a guerra, concluir a paz, contrair alianas, estabelecer comrcio e praticar todos os actos e aces a que tm direito os estados independentes (Declarao de independncia dos Estados Unidos da Amrica, 1776)
O modelo de confederao pareceu o mais adequado e prximo do modelo que j
vigorava durante o Congresso Continental. Feinberg (2002:12-13) analisa este processo
apresentando tambm as dificuldades em se transferir a soberania e autoridade a um governo
nacional considerando o vnculo muito forte da populao com o poder local:
[...] they (the states) would welcome a confederation because it would not be much different for the workings of the now familiar Second Continental Congress. Also, the people were not yet ready to think of themselves as Americans and support a central government. Their loyalties were much more local; they were Marylanders, New Yorkers, and Pennsylvanians, for example. These were just some of the obstacles that made it difficult to unit the states. As a result, the plan of confederation developed by the Continental Congress was piecemeal and haphazard and took several yeras to win acceptance by the states.
Mesmo a proposta de uma confederao de estados, com limitaes significativas ao
poder central e manuteno da soberania dos estados, enfrentou dificuldades para a sua
ratificao naquele perodo. Ao analisar o processo de ratificao, que perdurou por trs anos e
meio, Cogliano (2013:103) destaca que a ratificao no foi um assunto simples, pois, the
legislatures of each of the states considered the document critically. Entretanto, apesar das
preocupaes sobre artigos especficos at julho de 1778 dez dos treze estados haviam aprovado
22
o documento. Os estados que concordaram com todos os termos da proposta foram New
Hampshire, New York, Virginia e North Carolina. J os estados de Massachusetts, Rhode Island,
Connecticut, Nova Jersey, Pensilvania, Maryland, Delaware e Carolina do Sul propuseram
alteraes, adies e emendas que foram rejeitadas posteriormente pelo Congresso (Feinberg,
2002). As dificuldades para a ratificao do acordo foram identificadas nos estados de Nova
Jersey, Delaware e Maryland. A oposio destes estados aos Artigos estava relacionada s falhas
do texto que criava um domnio nacional nas terras do oeste (Cogliano, 2013). Sobre o processo
nestes trs estados, Nova Jersey e Delaware cederam aos protestos dos demais estados e
ratificaram a proposta em 1779. O encerramento do processo se deu 1781 com a ratificao de
Maryland.
As dificuldades na manuteno do modelo de Confederao se mantiveram mesmo com a
ratificao de todos os estados. Isto se explica quando observamos que Aprpria estrutura da
Confederao mantinha poderes extremamente limitados ao governo nacional o que acabou
gerando problemas significativos para o relacionamento entre os estados na nova Unio. A
escolha desta nova estrutura de governo pode ser explicada pela desconfiana dos estados em
formar um governo nacional forte. Outro elemento diz respeito forte identificao da populao
norte-americana com suas colnias individualmente o que contribuiu para a construo de um
modelo baseado em governos estaduais fortes em detrimento a uma centralizao por parte do
governo nacional.
No decorrer dos anos este processo apresentou fragilidades importantes. Podemos afirmar
que a principal causa dos problemas enfrentados pela confederao foi a ausncia de um governo
nacional com poderes de regulao sobre as atividades estaduais. Como consequncia, os estados
passaram a enfrentar dificuldades no campo econmico, poltico e institucional. No prximo
item buscaremos analisar as principais fragilidades dos Artigos da Confederao que
contriburam para as iniciativas voltadas para a reformulao deste modelo na Conveno
Constitucional de 1787.
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1.2 Dos Artigos da Confederao Conveno da Filadlfia: os debates sobre a ampliao dos
poderes do governo nacional
Como vimos, a ratificao do modelo de confederao de estados foi resultado das
negociaes entre os treze estados logo aps a independncia. Neste momento o receio pela
centralizao do poder em um governo nacional forte contribuiu para o desenvolvimento de um
sistema de federao limitado. O principal objetivo dos estados era manter a coordenao entre
eles no formato j aplicado pelas reunies do Congresso Continental. Mesmo em seu perodo
inicial, as fragilidades deste modelo j eram de conhecimento na poca. Ao tartar do tema
Feinberg (2002:26) destaca que a confederao was far from a perfect document, but as
Cornelius Harnett of North Carolina stated, 'it is the best Confederacy that could be formed
especially when we consider the number of states, their different Interests, Customs, etc".
As principais dificuldades da Confederao podem ser agrupadas em trs principais
limitaes: 1) ao poder central; 2) na regulao do comrcio e 3) na estrutura institucional.
Como j destacado, o poder do governo nacional era extremamente limitado. Na
Confederao o Congresso, ou Congresso de estados como foi denominado, exercia o papel
mais importante correspondendo ao principal rgo do governo nacional e tinha como principal
responsabilidade a garantia da segurana externa dos estados membros. No documento da
confederao, o artigo IX apresenta como principais funes do Congresso o poder exclusivo de
determinar a guerra ou a paz e de estabelecer tratados e alianas. Nesse modelo cada estado
possua igual peso, voto nico e a delegao estadual era composta por dois a sete membros que
seriam apontados anualmente pelos legislativos estaduais.
Limitaes significativas foram estabelecidas ao poder do Congresso o que dificultava a
coordenao deste rgo federal sobre as aes estaduais bem como a aplicao de suas
decises. O artigo X dos Artigos da Confederao determinava que as decises do Congresso
precisariam contar com uma ampla maioria para a aprovao. Neste formato, as decises do
Congresso deveriam ser aprovadas por pelo menos nove estados, ou seja, 2/3 do total como
descrito abaixo:
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The Committee of the States, or any nine of them, shall be authorized to execute, in the recess of Congress, such of the powers of Congress as the United States in Congress assembled, by the consent of the nine States, shall from time to time think expedient to vest them with; provided that no power be delegated to the said Committee, for the exercise of which, by the Articles of Confederation, the voice of nine States in the Congress of the United States assembled be requisite (Article X, Articles of Confederation, 1781)
Embora o artigo IX tenha enumerado a capacidade do governo nacional para conduzir a
poltica exterior e estabelecer tratados e alianas com os outros Estados, os Artigos no
estabeleceram um representante do executivo. A ausncia de uma figura representativa dos
Estados Unidos dificultava a conduo das relaes exteriores e o relacionamento dos Estados
Unidos com as outras naes.
Quanto atuao do Congresso na regulao das atividades estaduais, o artigo VI da
Confederao determinava algumas limitaes aos estados no campo das relaes exteriores,
condicionando a realizao de certas atividades aprovao do Congresso. Pelo documento, os
estados estavam ento proibidos de:
without the consent of the United States in Congress assembled, shall send any embassy to, or receive any embassy from, or enter into any conference, agreement, alliance or treaty with any King, Prince or State [...] No two or more States shall enter into any treaty, confederation or alliance whatever between them, without the consent of the United States in Congress assembled, specifying accurately the purposes for which the same is to be entered into, and how long it shall continue. No State shall lay any imposts or duties, which may interfere with any stipulations in treaties, entered into by the United States in Congress assembled, with any King, Prince or State, in pursuance of any treaties already proposed by Congress, to the courts of France and Spain. No State shall engage in any war without the consent of the United States in Congress assembled, unless such State be actually invaded by enemies, or shall have received certain advice of a resolution being formed by some nation of Indians to invade such State, and the danger is so imminent as not to admit of a delay till the United States in Congress assembled can be consulted [...] (Article VI, Articles of Confederation, 1781)
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Entretanto, na falta de um representante do executivo para tratar das relaes exteriores,
os estados atuavam individualmente no cenrio exterior. Este cenrio gerou um cenrio mais
conflituoso entre os estados, sobretudo no campo do comrcio exterior. Outra consequncia da
ausncia de uma autoridade representativa do governo nacional foi o enfraquecimento militar da
Unio. Ao tratar das ameaas enfrentadas pelos estados norte-americanos neste perodo Caldwell
et al (1993) destacam as dificuldades no relacionamento com a Gr-Bretanha e Espanha, alm
das ameaas com a pirataria martima:
Britain continued to occupy its territories in the Great Lakes region, in open violation the Treaty of Paris, which ended the Revolutionary War. British occupation interfered with Americans who sought to develop the NOrthwest Territory. The Spanish refused to grant Americanas navigation rights on parts of Mississippi River. Meanwhile, the Barbary pirates were attacking American shipping in the Mediterranean Sea (Caldewell et al, 1993:72)
Apesar das dificuldades no relacionamento exterior, alguns estados tinham seus prprios
exrcitos e marinha, mas no havia uma coordenao central que pudesse proteger os estados da
Unio de uma possvel ameaa externa.
Outro problema da Confederao decorrente das limitaes ao governo nacional diz
respeito ausncia de tribunais de jurisdio administradas pelo governo nacional. Ao tratar do
tema, o artigo IV da Confederao determinava que full faith and credit shall be given in each
of these States to the records, acts, and judicial proceedings of the courts and magistrates of
every other State (Articles of Confederation, 1781). Assim, todo o poder judicirio era
controlado pelos governos estaduais e estes poderiam, com a utilizao do artigo IV, proibir as
aes federais que jugassem necessrias. Alm disto, na ausncia de um sistema de cortes
federais os estados ou indviduos no eram constrangidos a cumprir as determinaes do governo
nacional uma vez que tal instituio no possua mecanismos que pudessem exigir a aplicao de
suas decises. Desta maneira, por no pussuir mecanismos que obrigassem os estados a cumprir
com suas decises, a posio do governo nacional por meio da atuao do Congresso tornava-se
um pouco mais que recomendaes (Farrand, 1913).
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Outras limitaes importantes dos Artigos da Confederao esto relacionadas s
questes econmicas. No sistema de confederao o governo central no tinha o poder para
regular o comrcio, impor tarifas e impostos aos estados. Contudo, os artigos da Confederao
restringiam a capacidade dos estados de intervir de forma unilateral no comrcio exterior com
tarifas e regulaes. A respeito das regulaes de impostos e tarifas a outros pases o artigo VI
determinava que No State shall lay any imposts or duties, which may interfere with any
stipulations in treaties, entered into by the United States in Congress assembled, with any King,
Prince or State, in pursuance of any treaties already proposed by Congress, to the courts of
France and Spain (Article VI, Articles of Confederation and Perpetual Union, 1781). O artigo
IX procurava tambm impedir o estabelecimento de tributos e deveres a outras naes sem
aprovao do Congresso:
States shall be restrained from imposing such imposts and duties on foreigners, as their own people are subjected to, or from prohibiting the exportation or importation of any species of goods or commodities whatsoever [...] of granting letters of marque and reprisal in times of peace -- appointing courts for the trial of piracies and felonies commited on the high seas and establishing courts for receiving and determining finally appeals in all cases of captures, provided that no member of Congress shall be appointed a judge of any of the said courts (Article IX, Articles of Confederation and Perpetual Union,1781)
Mesmo com estas limitaes o Congresso no possua mecanismos que constrangessem
os estados a cumprir com suas decises. E, como resultado, os governos estaduais passaram a
agir unilateralmente estabelecendo acordos de comrcio de forma bilateral. Como exemplo de
atividade autnoma estadual o caso de Virginia e Maryland que estabeleceram um acordo de
navegao e cooperao com Pensilvnia e Delaware (Farrand, 1913). Estas aes eram
inconstitucionais, pois os Artigos da Confederao especificavam que todos os acordos deveriam
receber o consentimento do Congresso. O aumento deste tipo de atividade pelos estados foi
observado no perodo em que a unio entre eles contra uma possvel ameaa do governo
Britnico no era mais necessria. Assim, os objetivos individuais dos estados passaram a falar
mais alto:
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Its inadequacy had become more and more evident as the war for independence had continued and the strain of the struggle had grown harder to endure. As long as the war was in progress, the states had held together through sheer necessity; but as soon as the war was over, the selfishness of the individual states was asserting itself and the union was in danger of disintegration (Farrand, 1913:1-2)
Mas, a principal dificuldade do governo nacional neste perodo esteve relacionada
obteno de fundos para o governo nacional. O artigo VIII determinava que o tesouro nacional
shall be supplied by the several States in proportion to the value of all land within each State,
granted or surveyed for any person, as such land and the buildings and improvements thereon
shall be estimated according to such mode as the United States in Congress assembled, shall
from time to time direct and appoint (Article VIII, Articles of Confederation and Perpetual
Union, 1781). Caberia, portanto, ao Congresso determinar a quantia necessria e cada estado
dividiria os custos.
Entretanto, por no existir um mecanismo de controle pelo Congresso os estados
contribuam de acordo com o seu prprio entendimento o que enfraquecia ainda mais o governo
nacional. Os problemas relacionados arrecadao federal se agravaram mais com a dvida
adquirida pelo governo na guerra de independncia e com as dificuldades dos estados, tambm
endivididados, em transferir recursos Unio:
Because of the war, Congress had been forced to undertake costly expenditures in order to secure American independence. Whithout the power to tax, Congress issued paper money and promissory notes which, predicated as they were on the survival of the United States, proved to be a very unstable and increasingly depreciated currency. Because Congress could not tax, it relied on the states to meet requisitions in order to pay for the war. Unfortunataly, the various states, which did have the authority to tax their citizens, faced similar financial problemas, accumulating their own war debts while issuing their own currencies which undermined the Continental currency and contributed to the overall financial instability fo the new states (Cogliano, 2013:104)
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A dificuldade financeira era to sria que em 1781, aps a ratificao dos artigos da
Confederao, o Congresso apresentou uma emenda que autorizava a cobrana de 5% de
imposto devido sobre as importaes e sobre mercadorias especficas. Os doze estados
concordaram. Contudo, outra fraqueza na confederao foi revelada neste momento. A incluso
de emendas aos Artigos s poderia ser estabelecida com a aprovao de todos os treze estados.
Com a recusa de Rhode Island, houve um bloqueio desta medida.
O Congresso realizou outras solicitaes para contribuies anuais dos estados que mais
uma vez foram descumpridas. Em 1786, o Congresso fez outro apelo para que os estados
contribussem com o governo. Neste momento, o nico estado que no concordou com a deciso
foi Nova Iorque e, mais uma vez, a sinalizao positiva dos demais estados foi bloqueada
(Farrand, 1913). As dificuldades financeiras se agravaram ao ponto do governo dos Estados
Unidos suspenderem em 1786 o pagamento de seus emprstimos Frana, Espanha e Holanda
(Cogliano, 2013).
Alm destas dificuldades, o modelo estabelecido pelos Artigos da Confederao possua
limitaes institucionais importantes que prejudicavam a reformulao deste modelo. O artigo
XIII determinava que: [...] the Articles of this Confederation shall be inviolably observed by
every State, and the Union shall be perpetual; nor shall any alteration at any time hereafter be
made in any of them; unless such alteration be agreed to in a Congress of the United States, and
be afterwards confirmed by the legislatures of every State (Article XIII, Articles of
Confederation, 1781). Sendo assim, uma alterao no texto constitucional somente poderia ser
adotada se obtivesse a aprovao de todos os estados, o que dificultava ainda mais a
reformulao do modelo para lidar com as dificuldades enfrentadas pelo Congresso.
Outro motivo de crtica Confederao diz respeito a outro aspecto de sua estrutura
institucional. O artigo V determinava que cada estado tinha direito a um voto nas decises
adotadas pelo governo nacional na Assemblia do Congresso. Esta estrutura gerou muitas
crticas, sobretudo nos denominados large states que correspondiam aos estados com o maior
nmero de habitantes. Estes estados questionavam o sistema de voto igualitrio e defendiam a
proporcionalidade dos votos no Congresso considerando que havia uma diferena significativa
no nmero de habitantes entre os estados. Este tema foi amplamente discutido, como veremos,
na Conveno Constitucional de 1787. Os embates entre os chamados large states e os small
states tiveram como resultado a apresentao de duas propostas distintas para a federao.
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Aprofundaremos estas discusses e propostas posteriormente. Aqui vale ressaltar que o modelo
institucional de voto igualitrio tambm foi alvo de crticas por alguns estados da confederao.
As dificuldades em solucionar o problema financeiro enfrentado pelo governo nacional
com a aplicao de emendas constitucionais e as tenses entre os estados envolvendo questes
comerciais dificultavam a manuteno deste sistema. Foi ento neste contexto que os estados
passaram a discutir a realizao de uma Conveno Geral que objetivasse a reforma dos Artigos
da Confederao (Siemers, 2004).
Ao analisar o incio das negociaes, Cogliano (2013) destaca que a causa mais imediata
para a avaliao do modelo da Confederao de estados foi a disputa entre os estados da Virgnia
e Maryland sobre a navegao do Rio Potomac. Os desacordos mtuos entre os estados no era
incomuns na dcada de 1780 e a capacidade limitada do governo nacional dificultavam sua
atuao como rbitro destas questes. Thomas Madison, ento membro da assemblia estadual
da Virginia atuou como articulador das negociaes. As discusses avanaram inclusive na
busca por uma coopperao entre os estados inclusive em questes de poltica financeira e
alfandegria com a solicitao de incluso da Pennsylvania no acordo.
Ao participar destas negociaes, Madison viu a oportunidade de se estabelecer uma
cooperao interestatal no tema por meio de uma reforma constitucional. Na sequncia destes
acontecimentos Madison ento apresentou uma proposta na assemblia estadual para a realizao
de uma Conveno nacional a ser realizada em Annapolis, Maryland, em 1786 para discutir
mecanismos de regulao comercial entre os estados (Cogliano, 2013:114). O projeto foi
aprovado em janeiro de 1786 pelo legislativo que apontou cinco delegados para participar da
reunio com os demais estados (Vile, 2005). O objetivo da Conveno era revisar os Artigos da
Confederao, sobretudo no que se refere s relaes comerciais entre os treze estados. O
documento aprovado pelo estado da Virgnia apresentava como objetivos da Conveno:
"to take into consideration the trade of the United States; to examine the relative situations and trade of the said States; to consider how far a uniform system in their commercial regulations may be necessary to their common interest and their permanent harmony; and to report to the several States, such an act relative to this great object, as, when unanimously ratified by them, will enable the United States in Congress, effectually to provide for the same" (Saturday, January 21, 1786. Journal of the House of Delegates of the State of Virginia, 1828:153)
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A Conveno de Annapolis contou com a participao de doze delegados de apenas cindo
estados: Nova Jersey, Nova Iorque, Pensilvnia, Delaware e Virginia (Vile, 2005). Alexander