excelentÍssimo senhor presidente do supremo …
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FlavioGaldino FelipeBrandão IvanaHarterAlbuquerque RebeccaO.PereiradaSilva CarolinaPfeifferFigueiredoSergioCoelho AdriannaChambôEiger FernandaRochaDavid BeatrizCapanemaYoung MariaVictoriaP.L.MarinsRafaelPimenta PedroMota LuanGomesPeixoto LetíciaWillemannCampanelli ThayssaBohadanaMartinsRodrigoCandidodeOliveira MauroTeixeiradeFaria LucianaBarsottiMachado AmandaGuimarãesTorquetti RafaelLeandroDantasEduardoTakemiKataoka AndréFurquimWerneck JúliaLealDanziger MilenePimentelMoreno LeonardoMucilloMathiaCristinaBiancastelli RaissadeA.LimaPereira PauloF.G.Junqueira ClaudiaTiemiFerreira MônicaFrancoLimaGustavoSalgueiro WallaceCorbo BrunoDuarteSantos CarolinaBuenodeOliveira FelipeL.L.eCastroPerrettiIsabelPicotFrança IsadoraA.R.deAlmeida RobertaIssaMaffei IsabellaBandeiradeMello CarolineRabelloMüllerMarceloAtherino JulianneZanconato JacquesFelipeA.Rubens SávioA.CapraMarinho LuízaM.LimaValleMartaAlves RodrigoSaraivaP.Garcia MichelleSorensenCamilo PaulaO.BarataReis VictoriadeAzevedoT.SilveiraCláudiaMaziteliTrindade VanessaF.F.Rodrigues TomásdeS.GóesM.Costa BrunaVillanovaMachado JoãoPacháPedroC.daVeigaMurgel AlinedaSilvaGomes MarcelaR.SilvaQuintana IsabelaRampiniEsteves GabrielRochaBarreto MariaFláviaJ.F.Macarimi AnaCarolinaS.Gasparine IsabelaAugustaX.dasilva DiogoRezendedeAlmeida
YasminPaiva JorgeLuizdaC.Silva YuriA.daCostaNascimento
EXCELENTÍSSIMOSENHORPRESIDENTEDOSUPREMOTRIBUNALFEDERAL
URGENTE
ASSOCIAÇÃONACIONALDASUNIVERSIDADESPARTICULARES-ANUP,
entidadesemfinseconômicos,constituindo-se,naformadeseusestatutossociais,
como órgãos de representação oficial das universidades particulares brasileiras,
inscritanoCNPJsobonº26.445.429/0001-86,comsedeemBrasília/DF,noSHIS,
QI07,Conjunto09,Casa01,LagoSul,CEP71615-900(“ANUP”)(Doc.1),vem,por
seusadvogados(Doc.2),comfundamentonoart.102,I,´a´daConstituiçãoFederal
enaLeinº9.882/1999,ajuizarapresente
ARGUIÇÃODEDESCUMPRIMENTODEPRECEITOFUNDAMENTAL
COMPEDIDODEMEDIDACAUTELAR
emfacedoconjuntodedecisõesjudiciaisnãotransitadasemjulgado,proferidasem
ações individuais e coletivas, bem como dos conjunto de atos praticados em
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administrativosemcurso,alémdeatoseprojetosdeatosnormativoseditadosnas
últimassemanas,todosestesque,emconjuntoeversandosobreotemadocontrole
de preços no ensino superior privado durante o Plano de Contingência do novo
Coronavírus, têm produzido verdadeiro estado de coisas violador de preceitos
constitucionais,nostermosqueseguem.
I. INTRODUÇÃO
1. Comoépúblicoenotório,oGovernoFederaleosGovernosEstaduais
intensificaram,desdemeadosdemarço,osmecanismosdecontroleecombateao
avanço da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), que variam desde
recomendaçõesdehigieneeregimedequarentenaàpopulaçãoatéaparalisação
compulsóriadeatividadeseconômicasecomerciaisconsideradasnãoessenciais.
2. Nessecontexto,paraamenizarosprejuízoscausadospelapandemiado
novocoronavírus,oSenadoFederalaprovouoDecretoLegislativon°6,de20de
marçode2020,quereconheceestadodecalamidadepúblicanopaís,emrazãoda
pandemiadaCovid-19.Nomesmosentido, váriosEstadosdaFederação também
decretaramestadodecalamidadepúblicapormeiodedecretos.
3. A gravidade da situação levou o Ministério da Educação (“MEC”) a
aprovar,em17demarço,aPortarianº343/2020,dispondosobreasubstituiçãodas
aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de
pandemiadonovoCoronavírus.NostermosdaportariadoMEC,asinstituiçõesde
ensino superior estão autorizadas a, durante a crise da pandemia, suspender os
cursospresenciaisouoferecê-lospormeiodemeiosetecnologiasdeinformaçãoe
comunicação,comoéocasodainternet.
4. Assim,porexemplo,ematençãoàsrecomendaçõesdasautoridadesedo
MinistériodaSaúdeeobservandoodispostonaPortarianº343/2020doMinistério
daEducação,asdiversasinstituiçõesdeensinosuperiorprivadas,quegarantemo
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acessoaomaisaltoníveldeeducaçãoparaparcelasubstancialdosalunosdenível
superiornoBrasil(3emcada4estudantesdenívelsuperiornoBrasil)1,realizaram
substanciaisinvestimentosdemodoaimpedirainterrupçãodaprestaçãodoserviço
públicodeeducação.
5. ValemencionarqueaPortarianº343/2020foisubstituídapelaPortaria
nº345,editadaem19demarçode2020.Posteriormente,pormeiodaPortarianº
473,de12demaiode2020,oMECaindaprorrogou,pormaistrintadias,oprazo
substituiçãodasaulaspresenciaisporaulasemmeiosdigitais.
6. Ocorreque,adespeitodosinvestimentosedamanutençãodosserviços
pelasinstituiçõesdeensinosuperiorprivado,namaioriaabsolutadoscasoscoma
manutençãodocorpodocente,docorpotécnicoeadministrativoeinvariavelmente
resguardada a qualidade do ensino oferecido, fato é que uma série de decisões
judiciais e administrativas, emanadas de órgãos distintos, em ações individuais,
coletivas e processos administrativos, têm pretendido impor às instituições de
ensino superior descontos obrigatórios e lineares nasmensalidades pagas pelos
alunos.
7. Taisdecisõesnãoguardam,contudo,qualqueruniformidade.Defato,há
casosdeacertadoindeferimentodepedidosdereduções;casosemqueasreduções
sãodeterminadasem15%,outrosemqueasreduçõesseimpõemem70%sobreo
valordamensalidade.Háhipótesesemquealgumasinstituiçõesestãoabrangidas
pelas decisões, outras não. O cenário, então, consolida uma situação de absoluta
insegurançajurídica,deviolaçãoàisonomiaederupturadoequilíbriodomercado
emprejuízodecentenasdeinstituiçõesdeensinosuperior.
1 Disponível em <http://portal.mec.gov.br/docman/setembro-2018-pdf/97041-apresentac-a-o-censo-superior-u-ltimo/file>.Acessoem28demaiode2020.
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8. Nãofossesuficiente,somouaessecenárioaediçãodeumaplêiadede
leis,promulgadaspordiversosentesfederativos,queigualmentepretendeaplicar
outrosparâmetrosdecontroledepreçosnosetordeensinosuperiorprivado.Nesse
sentido, o Estado do Ceará editou a Lei Estadual n. 17.208/2020, o Estado do
MaranhãoeditouaLeiEstadualn.11.259/2020,oEstadodoParáeditouaLein.
9.065/2020,oEstadodoRiodeJaneiroeditouaLein.8.864/2020eoEstadodo
MatoGrossoeditoualein.11.150/2020.
9. Trata-se,emtodososcasos,deleisquenãodialogamentresi–cadauma
aplicaumdeterminadopercentualdereduçãodemensalidades(variandode5%,
em algumas hipóteses, a 50%, em outras), valendo-se de critérios distintos
(faturamento,númerodealunosmatriculados,valordamensalidade,modalidade
deensino,entreoutros).Assim,paraalémdaviolaçãoaoprincípiofederativoque
decorre da usurpação da competência da União federal, como será apontado
adiante, cria-se um cenário de absoluta assimetria no sistema, submetendo
entidadessubstancialmentesemelhantesaregrasdistintasdecontroledepreços.
10. Eofatoéque,comoumaboladeneve,cadanovaleiestadualaprovada
faz avançar outros projetos de lei em curso perante os Poderes Legislativos de
diversos entes federativos.Assimé oProjetode Lei n º 142/2020doEstadodo
Amazonas;oProjetodeLeinº64/2020doEstadodoPiauí; oProjetodeLein º
1867/2020doEstadodeGoiás;oProjetodeLeinº23.799/2020doEstadodaBahia;
oProjetodeLeinº85/2020doEstadodoRioGrandedoSul;oProjetodeLeinº
212/2020doEstadodoParaná;oProjetodeLeinº203/2020doEstadodeSão
Paulo;oProjetodeLeinº1746/2020doEstadodeMinasGerais;oProjetodeLein.
43/2020 do Município de Recife; o Projeto de Lei n. 48/2020 do Município de
Muriaée tantosoutros.Cadaum,valedizernovamente, regulandoamatériapor
seusprópriosparâmetros,quenãoencontramfundamentoemanálisestécnicasou
científicas–mastãosomenteemintuiçõesdesconectadasdarealidade.
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11. O cenário indica não só a concretização de uma série de violações a
preceitosfundamentais,comotambémoriscodetaisviolaçõesseintensificarema
cada nova ação coletiva ou individual a cada novo projeto de lei que tramita
livremente – e, em tempos de isolamento social, muitas vezes sem a devida
publicidade e debate com a sociedade. Tudo em violação ao pacto federativo, à
isonomia e segurança jurídica, à livre iniciativa e à livre concorrência, à
proporcionalidadeeaoprincípiodaautonomiauniversitária.
12. O cenário inspira preocupação, porque esse conjunto de decisões
contraditórias e de iniciativas legislativas podem inviabilizar o ensino superior
privadonopaís.
13. Valeregistrarque,namaioriadessesestabelecimentos,amensalidadeé
aúnicafontedereceita.Écertoqueestafonteseráintensamenteimpactadapela
crisedapandemiadaCOVID-19,namedidaemquetornanecessáriae legítimaa
negociação de descontos individuais com alunos que efetivamente sofreram os
impactosdacrise.
14. Defato,asestatísticasapontamqueainadimplêncianoensinosuperior
emSãoPaulocresceuemmaisde70%emabril,emcomparaçãocomoanoanterior.2
Espera-sequeosíndicesdeevasãoeinadimplênciacresçamaindamaisportodoo
país,atingindoinstituiçõesdeensinosuperiorprivadas.Éprecisamenteparaconter
essesíndicesqueaatuaçãoindividual,noâmbitodalivreiniciativaedeacordocom
asnecessidadesparticularesdealunoseinstituiçõesserevelaessencial.Aoimpor
diferentescorteslinearesehorizontais,cadaumelegendoparâmetrosdistintos,as
decisõesjudiciaiseosprojetosdeleiemcursoinviabilizamtalestratégia,alémde
estarem aptos a reduzir ainda mais a principal fonte de recursos para a
2 Disponível em: <https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,inadimplencia-no-ensino-superior-de-sp-cresce-mais-de-70-em-abril,70003274524>.Acessoem28demaiode2020.
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sobrevivência das instituições de ensino e de toda uma cadeia de professores e
funcionáriosquedelasdependem.
15. Assim, nos termos em que estas legislações estão sendo propostas, o
desaguadouronaturaldestesestabelecimentosseráademissãoemmassadosseus
profissionais,começandoporaquelesquedesempenhamatividade-meio,atéchegar
nosprofissionaisdocentes,semqualquergarantiadequeessasprovidênciasserão
suficientesparaimpediroencerramentodassuasatividades.
16. Nessecenário,oimpactonãoserápequeno.Noensinosuperior,comojá
visto,opercentualdeestudantesmatriculadoseminstituiçõesprivadassupera80%
docorpodiscentesuperiornacional.
17. Significadizerquequalquermedidaquefiracomtamanhagravidadeo
equilíbriofinanceirodessesestabelecimentosdeensinotrarácomoconsequências
gravesprejuízosa80%dosestudantesdoensinosuperiorbrasileiroeaosmilhares
deprofissionaisqueserãodispensadosdosseuspostosdetrabalho.
18. Nesse contexto, a Arguente vem propor a presente Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (“ADPF”), baseada nas inúmeras
afrontasapreceitosfundamentaisdaConstituiçãodaRepúblicaFederativadoBrasil
(“CRFB/1988”),para:
a) Reparar a lesão aos preceitos fundamentais a seguir indicados,decorrente do conjunto de decisões judiciais (jurisprudência)proferidas em sede de ações individuais e coletivas, que têmpromovido o controle de preços sobre as parcelas dassemestralidades e anuidades devidas no ensino privado, aplicandodescontos em percentuais variados nos diferentes Estados eMunicípiosdaFederação;e
b) Preveniralesãoaosmesmospreceitosfundamentais,decorrentedapotencialaprovaçãode,pelomenos,10(dez)projetosdeleiseditados
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porEstadoeMunicípiosquepoderãogerarverdadeirocaosnosetorde ensino superior privado, causando assimetrias, demissões equebrasinevitáveis.
19. Estapetiçãoseestruturaemtrêsblocos.
20. No primeiro bloco (item II), são analisadas as questões processuais,
notadamentealegitimidadeativadaArguente,aidentificaçãodosatosobjetodesta
ADPFeocabimentodapresentemedida.Demonstra-seque,lamentavelmente,não
há como impugnar quaisquer dos atos que dão ensejo a esta ADPF demaneira
individual,oumesmocoletiva–detalmodoqueéapenaspormeiodaimpugnação
doconjuntodestesatosrelacionadosentresiquesepodefazercessasaviolaçãoa
preceitosfundamentaisoraapontada.
21. No segundobloco, (itens III, IV eV) trata-se da análise específica dos
preceitosfundamentaisviolados.Paratanto,aborda-se:
a) em primeiro lugar a violação ao princípio federativo. Neste item,demonstra-sequeoconjuntodedecisõesedeprojetosdeleistêmporconsequênciaproduzirumainadmissívelassimetriafáticaejurídicaentreosdiferentesentes,nosetordeensinosuperior.Nãosóisso,osmencionadosprojetosdelei,aoversarsobrematériadecompetêncialegislativaprivativadaUnião,extrapolamosistemaconstitucionalderepartiçãodecompetênciasemafrontaàprópriaFederação.
b) em segundo lugar, a violação ao princípio da isonomia e à livreconcorrência. Istoporque,ao impordiferentescritériosdecontroledepreçosnosetordeensinosuperior,asdiferentesdecisõesjudiciaisestabelecem(eosprojetosdeleiameaçamestabelecer)tratamentosdesiguaisapessoase situaçõesqueseencontramemcondiçõesdeabsolutaigualdade.Nadafundamenta,pois,queumaescolanoRiodeJaneiroestejasujeitaamecanismosdecontroledepreçosdiferentesdaqueles vigentes em uma escola no Espírito Santo. A violação àisonomia,porsuavez,implicaviolaçãotambémàlivreconcorrênciana medida em que as assimetrias criadas pelas decisões e leis
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conflitantes geram benefícios competitivos evidentes paradeterminadosagentesdemercado,emcontraposiçãoaoutros.
c) em terceiro lugar, a violação ao princípio da fundamentação dasdecisõesjudiciaiseaodevidoprocessolegislativo.Issoporqueasériededecisõeseprojetosdeleiquepretendempromoverocontroledepreçosnosetorvemdesacompanhadadequaisquerestudosoudadoscientíficosquejustifiquemaaplicaçãodedescontosoualteraçõesnasformasdepagamentosestabelecidascontratualmente.Trata-se,comoseverá,dedecisõesadotadascombaseemintuições(equivocadas),comoqueoEstadodeDireitoéefetivamenteincompatível.
d) em quarto lugar, a violação ao ato jurídico perfeito e à segurançajurídica.Istoporquetantoasdecisõesjudiciaisquantoaslegislaçõesexistentesouemformaçãobuscamatingirdiretamentecontratosdeensinoexistentesàdatadesuaedição.Significadizer,comisso,quepretendemproduzir efeitos futuros sobre atos jurídicos pretéritos,emviolaçãoaoprincípiodairretroatividadedasleis.Osgrausemqueissosedávariam–desdedecisõesquesepretendemaplicáveisdesdemarço(adespeitodascorrespondentesaçõeshaveremsidoajuizadasmuitotempodepois),atéleiseprojetosdeleisqueretroagemparaatingirnãosóovalordasmensalidades,comotambémbolsaseoutrosbenefícios concedidos por liberalidade pelas instituições de ensinosuperior.
e) ainda, a violação à autonomia universitária, no que diz respeito àsinstituiçõesdeensinosuperior.Issoporque,comoseverá,coroláriodeste princípio estruturante do ensino superior é a própriaautonomia financeira, pedagógica e de gestão das instituições deensino–públicasouprivadas.Aopretenderemimporocontroledepreçosnestasinstituições,asdecisõeseleislocaisinterferemnãosóna capacidade da instituição de planejar e gerir sua receita, mastambém de desenvolver suas atividades pedagógicas – que sãoviabilizadasapenasnoslimitesdosrecursosdisponíveis.
f) adicionalmente,fala-senaviolaçãoaoprincípiodaproporcionalidade,emdecorrênciadaexcessivainterferênciasobreospreçospraticadosnosetordeensinosuperior,promovidapeloconjuntodedecisõesetambémpelosprojetosdeleisapontadosnestaADPF.
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g) por fim, fala-se na impossibilidade de que o controle de preços jádeterminadooudecorrentede futurasdecisõesouatosnormativosincidasobreinstituiçõesquemantiveramsuasatividadespormeiodetecnologias da informação e às instituições que não reduziram ocalendárioacadêmico.
22. Noúltimobloco(itensVIeVII),demonstra-seapresençadosrequisitos
autorizadoresdaconcessãodamedidacautelarparadeterminarasuspensãodas
decisõesliminaresoudefinitivasquetenhamaplicadodescontosoudeoutraforma
alterado o pagamento devido em contratos de ensino, em ações individuais ou
coletivas que tenham como fundamento as medidas de isolamento social, a
superveniênciadoCOVID-19ouasuspensãodasatividadesdeensino,bemcomoa
suspensão dos processos judiciais e legislativos em curso sobre este tema, até
ulteriordecisãodestee.STF.
II. QUESTÕESPROCESSUAIS:LEGITIMIDADE,
OBJETOECABIMENTODESTAADPF
a. LEGITIMIDADEATIVADAREQUERENTE
23. Não há dúvida de que a Associação Nacional das Universidades
Particulares(ANUP)temlegitimidadeparaproposituradestaADPF.Afinal,trata-se
de entidade sem fins econômicos, constituindo-se, na forma de seus estatutos
sociais, como órgãos de representação oficial das universidades particulares
brasileiras(Doc.1).
24. Nestesentido,éevidenciadaaindaaestritavinculaçãoentreosobjetivos
institucionais da ANUP, como entidade representativa das universidades
particulares brasileiras, e objeto desta ADPF – que se volta contra atos que
interferemdiretamentenoscontratosfirmadosporestasinstituições.Comefeito,
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tanto a jurisprudência impugnada nesta medida, quanto os atos normativos
potenciais aqui indicadosvoltam-sediretamente contraas instituiçõesdeensino
superior – categoria plenamente representada pela associação, que conta com
associadosem24estadosdaFederação(Doc.3).
25. ConvémdestacarquenãoéaprimeiravezqueaANUPcompareceao
debate jurisdicional perante esta Corte para tratar de questões extremamente
relevantes para o ensino superior privado brasileiro. Com efeito, a Requerente
ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.462, impugnando Lei
Estadualnº7.202/2016,doEstadodoRiodeJaneiro,queproibiuacobrançadetaxa
derepetência,taxasobredisciplinaeletivaetaxadeprovaporpartedasinstituições
particularesdeensinosuperior,ocasiãoemque foi reconhecidasua legitimidade
ativanaproposituradeaçõescomoapresenteADPF.
26. Assim,considerandoodispostonoart.2º,incisoI3daLeinº9.882/1999
enoart.2º,incisoIX4daLeinº9.868/1999,éinequívocaalegitimidadedaANUP
paraproposituradestademanda.
b. OBJETODESTAARGUIÇÃODE
DESCUMPRIMENTODEPRECEITOFUNDAMENTAL.
O recorrente, que numa das salas perdeu a causa, teriaganhado (com os mesmos argumentos) se tivesse sidojulgadonasalaaolado.Quandosaiuaocorredor,ondeasportasdas salas seabremumaao ladodaoutra, estavaestupefato com essa diferença, inexplicável para umprofano;enaturalmente,descontavaemseuadvogado:–Estáclaroqueosenhorerrounadefesa…
3Art.2º.Podemproporargüiçãodedescumprimentodepreceitofundamental:I-oslegitimadosparaaaçãodiretadeinconstitucionalidade4Art.2º.Podemproporaaçãodiretade inconstitucionalidade: (…) IX - confederaçãosindicalouentidadedeclassedeâmbitonacional.
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–Não–replicouoadvogado-,erreifoideporta.5
27. ApresenteADPFsevolta,primeiramente,contrainterpretaçãojudicial
revelada em um conjunto de decisões judiciais proferidas por diferentes juízos
vinculadosàpluralidadedeTribunaisdeJustiçaestaduais,segundoaqualcaberiaa
aplicaçãodemedidasdecontroledepreçosnosetordeensinosuperiorprivadoem
razãodasmedidasdeisolamentosocialdeterminadasporEstadoseMunicípios.
28. Note-sequenãosetrata,aqui,dedecisõesjudiciaisquegenericamente
versam sobre relações contratuais no setor de ensino superior. Fala-se
especificamente nas decisões tomadas em ações coletivas e individuais que têm
como causa de pedir remota asmedidas de isolamento social determinadas por
EstadoseMunicípiosquelevaramàsuspensãodasatividadespresenciaisdeensino.
29. Veja-seque,nesteaspecto,apresenteADPFsevoltacontraatosjudiciais
difusos,sendoinviáveleineficienteaindicaçãodetodasasdezenasdedecisõesque
vêm aplicando a mencionada tese jurídica. Nada obstante, para fins de
exemplificação e para demonstrar que a questão revela clara divergência entre
diversosórgãos,cumpretecerbrevesconsideraçõesacercadealgunsdosdiversos
julgadosque,atítuloexemplificativo,sãoaquijuntadoscomoprovadaviolaçãoaos
preceitosfundamentais(Doc.4).
30. Nocampodasações coletivas, cite-sea títuloexemplificativoasações
ajuizadasperanteosTribunaisdeJustiçadosEstadosdeAlagoas,deMinasGerais,
doRiodeJaneiroedaBahia.
5CALAMANDREI,Piero.Eles,osjuízes,vistorporumadvogado.2.ed.SãoPaulo:EditoraWMFMartinsFontes,2015,p.102.
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31. EmAlagoas, aDefensoriaPúblicadoEstado ajuizou ação civil pública
buscandoacondenaçãodasociedadeIREPSociedadedeEnsinoSuperior,Médioe
FundamentalLTDA.asercompelidaareduzirem30%ovalorlíquidodasparcelas
de semestralidade e anuidade devidas por seus alunos enquanto durarem as
medidas de isolamento social que impedem o desenvolvimento de atividades
presenciais.Opedidochegaaseraumentadopara50%nocasodeestudantesde
cursosquetenhamdisciplinasteóricasepráticas6.
32. Em Minas Gerais, a União Estadual dos Estudantes de Minas Gerais
(“UEE-MG”)ajuizouaçãocivilpúblicaemdesfavordecincoinstituiçõesprivadasde
ensinosuperior7,postulandoaconcessãodedescontosobreasparcelasdevidasa
títulodecontraprestaçãodosserviçoseducacionaisprestados.
33. NoRiodeJaneiro,aDefensoriaPúblicaeoProconestaduaisajuizaram
medidascoletivasemfacedeoutrainstituiçãodeensinosuperior(IES),aSociedade
deEnsinoSuperiorEstáciodeSáLtda.,requerendotambémocontroledepreços
mediantedecisãojudicial,reduzindo-seasprestaçõesdevidaspelosestudantesem
30%,alémderequereremdiversasoutrasprovidências8.
34. AindanoRiodeJaneiro,aDefensoriaPúblicatambémajuizouaçãocivil
públicaemfacedaUniversidadedoGrandeRio,daUniversidadeVeigadeAlmeida
edaFaculdadeSouzaMarques,postulando,maisumavez,odeferimentodopedido
liminar para impor controle de preços sobre as parcelas das semestralidades
devidasaestasinstituições9.
6Processon.07114887620208020001,emtrâmiteperantea4ªVaraCíveldaCapitaldoEstadodeAlagoas.7 São elas (i) Centro Universitário do Triângulo – UNITRI, (ii) Faculdade ESAMC Uberlândia,(iii)FaculdadePresidenteAntônioCarlosdeUberlândia, (iv)FaculdadeUberlandensedeNúcleosIntegradosdeEnsino,ServiçoSocialeAprendizageme(v)UniversidadedeUberaba.8Processosn.0095651-56.2020.8.19.0001e0094469-35.2020.8.19.0001,emtrâmiteperantea3ªVaraEmpresarialdaCapitaldoTribunaldeJustiçadoEstadodoRiodeJaneiro.9Processon.0095579-69.2020.8.19.0001,emtrâmiteperantea3ªVaraEmpresarialdaCapitaldoTribunaldeJustiçadoEstadodoRiodeJaneiro.
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35. NaBahia,emsededeprocedimentodetutelaantecipadarequeridaem
caráter antecedente à ação civil pública, ajuizado contra a Faculdade Santo
Agostinhoeoutras,oMinistérioPúblicoEstadualrequereuareduçãode30%do
valor das mensalidades de todos os cursos de graduação e de pós-graduação
ministrados, lato sensu ou stricto sensu, independente da forma de contratação
inicial(presencialouensinoadistância),mantendo-seonovovalordascobranças
enquantodurarapandemiadonovocoronavírus.
36. E em cada uma destas ações civis públicas, aqui citadas
exemplificativamente,osrespectivosjuízoschegaramaconclusõesdiametralmente
opostasousubstancialmentedistintas.
37. De fato, apenas oMM. Juízo da 10ª Vara de Relações de Consumo da
Comarca de Salvador concluiu, acertadamente, pelo descabimento damedida de
controledepreçosrequerida.
38. O MM. Juízo da 4ª Vara Cível de Maceió, por outro lado, chegou à
conclusãooposta.Naquelecaso,ojuízonãosódeterminoumedidadecontrolede
preços,comotambémasimpôsempatamarabsolutamentedesproporcional.Nos
termosdadecisão,aindanãotransitadaemjulgado,ainstituiçãodeensinodeveria
reduzirasparcelasdasemestralidadedevidapor seusestudantesempercentual
que varia entre 30% e 50%, incluindo alunos beneficiários de bolsas ou outros
benefíciosestudantis.
39. Aseuturno,oMM.Juízoda3ªVaraEmpresarialdoRiodeJaneiroadotou
soluçãodiversa.Aplicoudescontosnovalorde15%àsmensalidadespraticadaspor
quatroinstituiçõesdeensinosuperior.
40. TantonoRiodeJaneiro,quantoemAlagoas,taisdecisões–comosepode
verificar – aplicaram os descontos de maneira linear, independentemente de
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demonstraçãoespecíficadereduçãodecustosoudarealnecessidadeeconômico-
financeiradeestudanteseresponsáveis.
41. JáoMM. Juízoda10ªVaraCíveldaComarcadeUberlândiapreferiua
soluçãosalomômica:deumlado,deferiuopedidodeapresentaçãodasplanilhasde
custosdasIES,elaboradasparaoanoletivode2020,bemcomodasplanilhasde
cálculo e dos comprovantes relativos aos gastos com a eventual implantação de
sistemastecnológicosnecessáriosparareadequaçãoparamodalidadedeensinoa
distância;deoutrolado,indeferiuopedidodereduçãolinearde33,33%(1/3)dos
valoresdasmensalidades.
42. Aquestãonãoselimitaaessasseisaçõescivispúblicas,citadasatítulo
meramente exemplificativo. No âmbito de ações individuais, também, diversos
juízosespalhadospeloBrasiltêmdeterminadomedidasdíspares–havendomuitas
vezesdivergênciasatémesmoentreestudantesvinculadosàmesmainstituiçãode
ensinosuperior.
43. Assim,porexemplo,noestadodoRiodeJaneiro,dezenasdeliminares
foramdeferidasemfavordeestudantesdamesmainstituiçãodeensinoecombase
nosmesmos–eequivocados,valedestacar–fundamentosjurídicos.Dessaforma,
estudantesdemedicinadedeterminadaIESobtiveramliminaresquevãode15%a
70%,adespeitodeestaremrigorosamentenamesmasituaçãojurídica.
44. Nomesmosentido,oPoderJudiciáriobaianoconcedeuliminar,impondo
desconto na ordem de 50% sobre os valores devidos à instituição de ensino
superior10,patamaridênticoaofoiestabelecidopeloPoderJudiciáriopaulista11.
10Processonº8004593-58.2020.8.05.0150,emtrâmiteperantea1ªVaradosFeitosRelativosàsRelaçõesdeConsumo,Cíveis,ComerciaiseRegistroPúblicodoForodeLauroFreitasdoEstadodaBahia.11Processonº1000594-51.2020.8.26.0210,emtrâmiteperantea1ªVaradoForodaComarcadeGuaíradoEstadodeSãoPaulo.
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45. Por outro lado, a demonstrar a absoluta incerteza jurídica que paira
sobre a temática, diversos juízos indeferiram, acertadamente, o pedido liminar
formulado, reconhecendoquea suspensãodasatividadespresenciaisdecorrede
fatodopríncipe,sendocertoqueumaparceladasinstituiçõesmanteveseupleno
funcionamento pormeio de tecnologias da informações, enquanto outra parcela
garantiuareposiçãodasaulasquenãoestãosendolecionadasnesseperíodo,sem
qualquerprejuízoparaocalendárioacadêmico.
46. Nalinhadesseraciocínio,menciona-seasdecisõesdoPoderJudiciário
mato grossense que indeferiram as liminares requeridas pelos estudantes, ao
argumentodeque,apósapandemia,aIESdeveráreporasaulas,destacandoainda
aNotaTécnican°14/2020publicadapeloMinistériodaJustiçaeSegurançaPública
junto à Secretaria Nacional do Consumidor e por entender que não foram
preenchidososrequisitoslegaisparaconcessão.
47. Note-se que a proliferação de uma interpretação jurisprudencial
equivocada viola a própria segurança jurídica, namedida emque indivíduos em
idêntica situação jurídica obtêm provimentos jurisdicionais absolutamente
díspares.O caso remonta à clássica narrativa dePieroCalamandrei, em “Eles, os
juízes,vistosporumadvogado”,transcritanaepígrafedesteitem.
48. Defato,emcadaportaaberta,umanovadecisãoliminarédescobertae
cadaqualpartedepremissasabsolutamentedistintas,sejaparadeferirouindeferir
o pedido formulado, gerando gravíssima insegurança jurídica, não só para as
instituiçõesdeensinosuperior,masparaosprópriosestudantes.
49. Valedizerque,apesardasdezenasdedecisõesacostadasàessainicial,a
questãoaindaéverdadeiramenteembrionária.Afinal,outrasaçõescivispúblicase
açõesindividuaisforamajuizadassemquenelassetenha,atéomomento,proferido
decisõesliminares(Doc.5).Eésobesteaspectoqueserevelaoinegávelcabimento
dapresenteADPF.
16
50. Istoporqueaindaquesejapossívelàsdiferentesinstituiçõesdeensino
superiorrecorreremnobojodecadaprocessoindividualoucoletivo,nãoexistem
mecanismosaptosasanaremagravelesãoapreceitosfundamentaisquedecorreda
interpretação coletiva e difusa adotada pelos tribunais. Afinal, cristaliza-se entre
diversosjuízosadescabidatesedequeépossívelpromoverocontroledepreçosno
setor de ensino superior, de maneira linear e a despeito de os diversos
estabelecimentosmanteremaprestaçãodeseusserviços.
51. A situação, portanto, é idêntica àquela enfrentadapor este e. STFpor
ocasião do julgamento da ADPF n. 324/DF. Naquela hipótese, tratava-se de
impugnarumconjuntodedecisõesproferidaspelaJustiçadoTrabalho,demaneira
difusa, e que representavam uma indevida interpretação violadora de preceitos
fundamentaisdaConstituiçãoFederal.Confira-se,porsuaclareza,ovotodoExmo.
MinistroRobertoBarrosonaquelaocasião:
14.Ainépcianãoseverifica.AArguentenãoseinsurgecontradecisõesespecíficasque transitaram em julgado ou contra a Súmula 331 do TST especificamente.Tampoucodeixoude individualizar o objetoda ação.Tal objeto emuito claro.AADPFvolta-secontraoconjuntodedecisõesqueexpressaainterpretaçãodaJustiçado Trabalho acerca dos limites e condições aplicáveis a terceirização. Essainterpretaçãoencontra-seexplicitadanaSúmula331doTSTe,ainda,emumamploconjunto de julgados que a aplicam, muitas vezes, de forma conflitante e/ouimprevisível.Taisjulgadosforamanexadosaoprocessopelarequerente.15.Ainicialindica,commuitaclareza,asrazõespelasquais,emseuentendimento,osaludidosacórdãosviolamosprincípiosdalegalidade,dalivreiniciativaedalivreconcorrência, além de não ensejarem previsibilidade mínima do direito outratamentoisonômicoentreosjurisdicionados.16.E_ perfeitamenteviávelajuizarumaADPFcontraentendimentoouinterpretaçãojurisprudencial.12
12STF,ADIn.324/DF,rel.MinistroRobertoBarroso,TribunalPleno,j.em30.08.2018.
17
52. Evidenciado,nesteprimeiroponto,oobjetodapresenteADPF.Masofato
é que a violação a preceitos fundamentais temextrapolado atémesmoo âmbito
judicial.
53. Defato,emsegundo lugar,apresenteADPFvolta-se tambémcontraa
interpretação decorrente de um conjunto de decisões e atos administrativos
proferidos por diversos órgãos de fiscalização das relações mantidas entre
estudantes e instituições de ensino, com o objetivo de compelir a imposição de
desconto e, em alguns casos, até mesmo sancionar as instituições que ousam
questionareventuaisimposiçõesinconstitucionais,que,atítuloexemplificativo,são
aquijuntadascomoprovadaviolaçãoaospreceitosfundamentais(Doc.6).
54. Nesse sentido, diversos órgãos de proteção e defesa do consumidor
espalhadospelopaísvêminstaurandoprocessosadministrativos,aplicandomultas
às instituições e compelindo-as a reduzir cobrança realizada a título de
contraprestação pelos serviços educacionais prestados durante o período de
suspensãodasatividadespresenciais.
55. Trata-se,maisumavez,deumconjuntoinúmerodedecisõesqueaplicam
interpretaçãoequivocadanosentidodeque,emrazãodasmedidasdeisolamento
social – impostas pelo Poder Público, e não pelas instituições privadas – os
estabelecimentosdeensinodeveriamnãosósuportarasconsequênciasgravesda
crise(comoporexemplooaumentosubstancialdosníveisdeinadimplência),como
tambémdescontos adicionais que reduzemdemaneira aindamais drástica suas
receitas.
56. Soma-se,ainda,àsinterpretaçõesjudicialeadministrativaobjetodesta
ADPF,tambémainterpretaçãoquevemsedesenvolvendonoâmbitodospoderes
legislativosestaduaisemunicipaisdesdeoiníciodacrisedoCOVID-19.
18
57. Defato,emterceirolugar,estaADPFtambémbuscapreveniralesãoa
preceitosfundamentaisqueserácausadapelaseventuaisepossíveisaprovaçõesde
umamultiplicidadeincontáveldeprojetosdeleitendentesaaplicarigualmedidade
controledepreçossobreasinstituiçõesdeensinosuperior.
58. Nãoseignora,aesterespeito,aposturadedeferênciaadotadaporeste
e.STFnocontroledeprojetosdelei.Trata-sedeposturanecessáriaeessencialpara
assegurarofuncionamentodosprocessosdemocráticosdesenvolvidosnoâmbito
dasinstituiçõesrepresentativas.
59. Ocasosobanálise,noentanto,apresentainequívocaespecificidade.Isto
porque, em pouco menos de três meses, surgiram mais do que 50 (cinquenta)
projetosdeleiderapidíssimotramiteperanteAssembleiasLegislativaseCâmaras
Municipais,muitosdosquaisvieramaserinclusiveaprovados.
60. Há, de fato, diversos projetos de lei municipais e estaduais com tais
objetivosquetramitamperantediferentesassembleiaslegislativas–aexemplodo
ProjetodeLeinº142/2020doEstadodoAmazonas;doProjetodeLeinº64/2020
doEstadodoPiauí;doProjetodeLeinº1867/2020doEstadodeGoiás;doProjeto
deLeinº23.799/2020doEstadodaBahia;doProjetodeLeinº85/2020doEstado
doRioGrandedoSul;doProjetodeLeinº212/2020doEstadodoParaná;doProjeto
deLeinº203/2020doEstadodeSãoPaulo;doProjetodeLeinº1746/2020do
EstadodeMinasGerais;doProjetodeLein.43/2020doMunicípiodeRecife;edo
ProjetodeLein.48/2020doMunicípiodeMuriaé(Doc.7).
61. Significadizerque,danoiteparaodia,osestabelecimentosdeensinoem
diversosEstadoseMunicípiosdafederaçãoseviramobrigadosnãosóasujeitar-se
adecisõesjudiciaisconflitantes,comotambémalegislaçõesqueapontamcadauma
emumsentidoespecífico.
19
62. Seindividualmentetaisatospodemviraser impugnadospormeiode
ADI ou ADPF própria, fato é que tais medidas individualizadas não permitem
apreciarocenáriodeinconstitucionalidadeestruturalesistêmicaquesedesenha.
Defato,jáforamajuizadasperanteestae.Cortenadamenosque4(quatro)açõesde
controletendoporobjetoleisjáaprovadaspelosEstados.Seestee.STFnãotomar
umamedidadeimediatasuspensãodosprocessoslegislativos,nospróximosdias
espera-sequeaomenos10(dez)projetosseconvertamemlei.Trata-sedemais10
(10)açõesdecontrolequedeverãoserajuizadas.Eaconsequência?Ainafastável
lesãoapreceitosfundamentais.
63. Afinal,mesmoqueadoteprocedimentocéleredejulgamento,atendência
édeque,atéaprolaçãomesmodedecisãoliminarnobojodeprocessosespecíficos,
aslegislaçõesestaduaisemunicipaisproduzirãoseusefeitos.Ocontroledepreços
será efetivado, multas serão aplicadas. A posterior declaração de
inconstitucionalidadedestasleis–hojeprojetos–nãoserásuficienteparasanaros
preceitosfundamentaisjáviolados.Afinal,nãohaverámeiosadequadospelosquais
osestabelecimentosdeensinopoderãosevoltarcontraseusestudantes,cobrando-
lhes os valores indevidamente descontados por força das legislações enfim
aprovadas.
64. Neste sentido, o objeto desta ADPF não são os projetos de lei
propriamenteditos,mas simaprevençãodeumverdadeiro cenário estrutural e
sistêmicodeinconstitucionalidade(ouumestadodecoisasinconstitucional,como
reconhecidoporestee.STFporocasiãodo julgamentocautelarnaADPFn.347)
causadopelaeventualaprovaçãodetaisprojetosdelei.
65. Feita,então,aexposiçãoinicialacercadosobjetosdestaADPF,passa-se
àanálisedosrequisitosespecíficosparaseucabimento,demodoquenãorestem
dúvidasacercadoacertonoempregodestamedida.
20
c. CABIMENTODAPRESENTEARGUIÇÃODE
DESCUMPRIMENTODEPRECEITOFUNDAMENTAL
66. O cenário fático relativo à imposição por órgãos judiciais, Estados e
Municípiosdedescontossobreovalordasmensalidadespagasporestudantesda
rede privada de ensino é absolutamente incompatível com a Constituição da
República. Nesse contexto, a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental,previstanoart.102,§1°,daCRFB/1988,eregulamentadapelaLein°
9.882/1999,éaaçãovocacionadaparaoenfrentamentodaquestão.
67. Como se sabe, a ADPF é amedida própria para controle de atos dos
PoderesPúblicosqueimportememlesãoouameaçaapreceitosfundamentaisda
Constituição,desdequenãohajaoutromeioeficazparasanaralesividade.Dessa
forma,paraoseucabimento,éessencialqueestejampresentesosrequisitoslegais
deadmissibilidade,asaber:(i)apresençadelesãoouameaçadelesãoapreceito
fundamental,(ii)causadaporatodoPoderPúblico,e(iii)a inexistênciadeoutro
instrumentoaptoasanaressalesãoouameaça(subsidiariedade).
68. Tais pressupostos estão plenamente configurados no presente caso.
Senão,vejamos.
i) Lesãoeameaçadelesãoapreceitosfundamentais
69. NemaConstituiçãonemaLein°9.882/1999definiramquaispreceitos
constitucionaissãofundamentais.Nadaobstante,hásólidoconsensodoutrináriono
sentidodeque,nessacategoria,figuramosfundamentoseobjetivosdaRepública,
bemcomoosprincípiosedireitosfundamentais13.
13Confira-se,portodos:(i)MENDES,GilmarFerreira;BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014,p.1267-1269;(ii)BARROSO,LuísRoberto.Ocontrolede constitucionalidadenodireitobrasileiro:Exposição sistemáticadadoutrinae análise críticadajurisprudência.SãoPaulo:Saraiva,2012,p.562-563.
21
70. Além disso, na esteira da jurisprudência desta Corte, compete ao
SupremoTribunalFederal(“STF”)ojuízoacercadoquesehádecompreender,no
sistemaconstitucionalbrasileiro,comopreceitofundamental.Nessatoadaenoque
aqui interessa, esta Corte reconhece a qualidade de preceito fundamental aos
princípiosprotegidosporcláusulapétreabemcomoàsdisposiçõesqueconfiram
densidadenormativaousignificadoespecíficoaumdessesprincípios14.
71. Nopresentecaso,a lesividadedecorrenteda interpretação judicialea
ameaça de lesão decorrente da pluralidade de projetos de leis estaduais e
municipais dizem respeito a diversos preceitos fundamentais, quais sejam (1) o
princípio federativo; (2) o princípio da isonomia e da livre concorrência; (3) o
princípiodafundamentaçãodasdecisõesjudiciais;(4)odevidoprocessolegislativo;
(5) a proteção ao ato jurídico perfeito e à segurança jurídica; (6) a autonomia
universitária;e(7)oprincípiodaproporcionalidade.
72. Muitoemboranãohajadefiniçãoobjetivaquantoaoreferidoconceito,
não há qualquer dúvida que as violações ao pacto federativo constituem efetiva
lesão a preceito fundamental, tendo em vista que se trata de matéria inserida
expressamentenoroldecláusulaspétreasdoordenamentojurídico,nostermosdo
art.60,§4ºincisoI15daCRFB/1988.
73. Na linha desse raciocínio, esta Corte admitiu, em diversas ocasiões, a
propositura de ADPF para impugnar ato normativo violador da repartição de
14Assim:STF.ADPFnº388.Relator:Min.GilmarMendes.TribunalPleno.Julgamentoem09.03.2016.DJem29.07.2016.15Art.60.AConstituiçãopoderáseremendadamedianteproposta:§4ºNãoseráobjetodedeliberaçãoapropostadeemendatendenteaabolir:I-aformafederativadeEstado
22
competênciaslegislativas,tendoemvistaqueamatériaestádiretamenteassociada
aoprincípiofederativo,amplamenteadmitidocomopreceitofundamental16.
74. Domesmomodo, não existemdúvidas quanto à natureza de preceito
fundamental do princípio da livre iniciativa (art. 1º, inciso IV, CRFB/1988), da
isonomia(art.5º,caput,CRFB/1988),doatojurídicoperfeitoedasegurançajurídica
(art. 5º, incisoXXXVI, CRFB/1988).Afinal, trata-sedenormas jurídicasprevistas
expressamentenoroldosprincípiosegarantiasfundamentais,respectivamentee
que,noâmbitodaordemsocialdaconstituição,seconcretizamtambémnaabertura
daeducaçãoàlivreiniciativa(art.209,CRFB/1988).Nãoésemrazão,aliás,queeste
e.SupremoTribunalFederal,emacórdãolavradopeloExmo.Min.EdsonFachin,já
admitiu a ADPF proposta com fundamento em violação ao princípio da livre
iniciativa17.
75. Omesmo se diz quanto ao princípio da proporcionalidade. Conforme
noticiamoExmo.Min.GilmarMendesePauloGustavoBranco,trata-sedeprincípio
que tem como típicamanifestação o excesso de poder legislativo, que se revela
mediantecontraditoriedade,incongruênciaeirrazoabilidadeouinadequaçãoentre
meiosefins18.
76. Nessa quadra, o princípio da proporcionalidade é considerado como
elemento integranteoucláusula implícitadosdireitos fundamentais,motivopelo
qualeventuaisatosdoPoderPúblicoqueviolemoreferidoprincípioconstituem
atoslesivosapreceitofundamental.
16Veja-se:(i)STF.ADPFnº235.Relator:Min.LuizFux.TribunalPleno.Julgamentoem14.08.2019.DJ em 30.08.2019; (ii) STF. ADPF nº 337/MA. Relator: Min. Marco Aurélio. Tribunal Pleno.Julgamentoem17.10.2018.DJem26.06.2019;(iii)STF.ADPFnº514/SP.Relator:Min.EdsonFachin.TribunalPlano.Julgamentoem11.10.2018.DJem30.11.2018;e(iv)STF.ADPFnº316/DF.Relator:Des.MarcoAurélio.TribunalPleno.Julgamentoem25.09.2014.DJem01.12.2014.17Confira-se:(i)STF.ADPFnº109/SP.Relator:Des.EdsonFachin.TribunalPleno.Julgamentoem30.11.2017.18MENDES,GilmarFerreira;BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014,p.225.
23
77. Ébemverdadequeaautonomiauniversitárianãoestáexpressamente
previstanoroldeprincípiosedireitosfundamentais.Todavia,issonãolheretiraa
condiçãodegarantiainstitucionalfundamental19oudeprincípiosetorialdaordem
social20.
78. Tratando-se,pois,deverdadeiropreceito fundamentaleconsiderando
que a autonomia universitária contribui para garantir a densidadenormativa ao
direitosocialàeducação(art.6º,caput,CRFB/1988),impõe-seoreconhecimentode
quealesividadeaesseprincípiodáensejoaocontroledeconstitucionalidadepela
viadapresenteADPF.
ii) AtodoPoderPúblico.
79. Deacordocomoart.1ºdaLein°9.882/1999,osatosquepodemser
objetodeADPFsãotodosaquelesemanadosdoPoderPúblico,aí incluídososde
naturezanormativa,administrativaoujudicial.
80. Como já se viu, esta ADPF se volta contra (1) interpretação
jurisprudencial decorrente de uma pluralidade difusa de atos judiciais que tem
determinado mecanismos de controle de preços no setor de ensino; (2)
19 Veja-se: “Também fora do rol dos direitos e garantias fundamentais (Título II) podem serlocalizadasgarantias institucionais, taiscomoagarantiadeumsistemadeseguridadesocial (art.194), da família (art. 226), bem como da autonomia das universidades (art. 207), apenas paramencionarosexemplosmaistípicos.Ressalte-sequealgunsdessesinstitutospodematémesmoserconsideradosgarantias institucionais fundamentais,emfacedaaberturamaterialpropiciadapeloart.5º,§2º,daConstituição”(MENDES,GilmarFerreira;BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014,p.620).20Confira-se:“Princípiossetoriaisouespeciaissãoaquelesquepresidemumespecíficoconjuntodenormas afetas a determinado tema, capítulo ou título da Constituição. Eles se irradiamlimitadamente,masnoseuâmbitodeatuaçãosãosupremos.Háprincípiossetoriaistributários,comoodaanterioridadeda leique instituaouaumente tributo;daAdministraçãoPública, comoosdamoralidadeeimpessoalidade;daordemeconômica,comoodalivreconcorrência;edaordemsocial,comoodaautonomiauniversitária,emmeioamuitosoutros”(BARROSO,LuísRoberto.Cursodedireitoconstitucionalcontemporâneo:Osconceitosfundamentaiseaconstruçãodonovomodelo.7.ed.SãoPaulo:Saraiva,2018,p.198).
24
interpretaçãoadministrativaqueseverificaapartirdeatosdeentidadeseórgãos
administrativosconsistentesnaaplicaçãodemultaseoutrassançõesemrazãoda
nãoaplicaçãododescontoinconstitucionalmenteimpostoàinstituiçõesdeensino
superiore(3)ameaçadelesãoaospreceitosfundamentaisindicados,emrazãoda
provávelaprovaçãodeumaplêiadedeprojetoslegislativosquevemencontrando
rápidotrâmiteperanteosórgãoslegislativosestaduaisemunicipais.
81. Nãohádúvidas,portanto,dequeparafinsdecabimentodestamedida
estácaracterizadoo“atodoPoderPúblico”aquealudeoart.1º,caput,daLeinº
9.882/9921. Afinal, em todos os casos se está diante de atos normativos,
administrativos e judiciais emanados de órgãos públicos, que efetiva ou
potencialmentepromovemagravelesãoaospreceitosfundamentaisapontados.
iii) Subsidiariedade
82. NãosóestãocaracterizadasalesividadeeoatodoPoderPúblico,como
igualmentepresente,nocaso,orequisitodasubsidiariedadeaplicávelàADPF.
83. A doutrina e a jurisprudência convergem no entendimento de que o
pressuposto da subsidiariedade da ADPF (art. 4º, § 1º, Lei n° 9.882/1999) se
configura sempre que inexistirem outros instrumentos, na esfera da jurisdição
constitucional concentrada, aptos ao enfrentamento da questão constitucional
suscitada.Nessesentido,decidiuesteSTF:
21Aexpressãonãoestárestritaaosatosnormativos,englobandotambémosatosadministrativos.Poressarazão,oExmo.MinistroLuísRobertoBarroso,emsededoutrinária,ensinaqueareferidaação“serácabívelcontraqualquermanifestaçãodevontadedoPoderPúblico,dequalquerdostrêsPoderes”(BARROSO,LuísRoberto.Temasdedireitoconstitucional.2.ed.RiodeJaneiro:Renovar:2009,tomo2,p.412).Namesmalinha,MirnaCiancieGregóriaAssagradeAlmeidaafirmamque“qualquer ato do Poder Público poderá ser objeto da arguição autônoma, seja ele de caráternormativo, seja de caráter administrativo comissivo ou omissivo, seja da administração públicadireta,sejadaindireta”(CIANCI,Mirna;ALMEIDA,GregórioAssagrade.Direitoprocessualdocontroledeconstitucionalidade.SãoPaulo:Saraiva,2011,p.222)
25
Princípiodasubsidiariedade(art.4º,§1º,daLeinº9.882/99):inexistênciadeoutromeioeficazdesanaralesão,compreendidonocontextodaordemconstitucional global, como aquele apto a solver a controvérsiaconstitucionalrelevantedeformaampla,geraleimediata.22
84. Trata-seprecisamentedahipótesesobanálise.Senão,vejamos.
85. Em primeiro lugar, é certo que as decisões indicadas como
representativas da intepretação judicial violadora de preceitos fundamentais
poderiam ser atacadas por meio de recursos individualizados. Esse mecanismo
processual, no entanto, seria insuficiente para sanar a violação apontada. Em
primeirolugar,porquesemanterãoasassimetriaseassoluçõesdiversas,noâmbito
de cada processo individual ou coletivo. Em segundo lugar, e mais importante,
porqueoquesebuscanessaADPFnãoéareversãodeumaououtradecisão–oua
adequação de umou outro percentual. Não se trata, aqui, de usar a ADPF como
sucedâneorecursal,esimdeimpugnarespecificamenteumainterpretaçãojudicial
queviolasistemáticaeestruturalmenteospreceitosfundamentaisaquiapontados.
Trata-se de situação idêntica aquela apreciada por este e. STF por ocasião do
julgamentodajámencionadaADPF324/DF.E,paraestahipótese,nãohádefato
qualquer meio – recursal ou de controle concentrado – que seja apto a sanar
adequadamenteasviolaçõesapontadas.
86. Em segundo lugar, é certo ainda que inexiste em nosso ordenamento
jurídico um mecanismo processual específico pelo qual se possa conter a
proliferaçãodeprojetosdeleismultitudinários,capazesdeabalarcompletamente
um setor econômico, tornando-o inviável e ineficiente, gerando ainda uma crise
econômicasemprecedentesparaoensinoparticularnoBrasil.Afinal,seosEstados
eMunicípiosinsistememlegislaçõesdecurtoprazo,cujosefeitosserãoirreversíveis
apesardesuasinconstitucionalidadesmanifestas,restaráàsinstituiçõesdeensino
22STF.ADPFn°33.Relator:Min.GilmarMendes.TribunalPleno.Julgamentoem07.12.2005.DJem27.10.2006.
26
sesujeitaremàabsurdalegislação,emdetrimentodamanutençãodoempregoeda
atividadeeconômica.
87. Veja-se, por fim, que o reconhecimento da violação de preceitos
fundamentaisquantoaapenasumentresconjuntosdeatos,apesarderelevante,é
absolutamente insuficiente para dar solução constitucionalmente adequada à
questão. Afinal, impedir a atuação inconstitucional por parte de órgãos de
fiscalizaçãonão impediráaproliferaçãodemedidas judiciaisdifusasa impediro
mínimodecoerêncianosistema–assimcomooinversoéigualmenteverdadeiro.
88. Da mesma forma, impedir a perpetuação da interpretação judicial e
administrativavioladoradospreceitosaseguirapontadosperdeseuefeitose,com
aaprovaçãodeleisestaduaisemunicipaisbaseadasnessaexatainterpretação,tais
órgãos voltarem a agir com fundamento (indevido) nestes atos legislativos
supervenientes.
89.
90. Dessemodo,incontestequeseestádiantedeato(s)dePoderPúblicoe
que não há outro meio processual adequado para impugná-lo, satisfazendo-se,
portanto,orequisitodasubsidiariedade.
91. À luz destes fundamentos, está demonstrado o preenchimento dos
requisitosnecessáriosparaocabimentodapresentearguiçãodedescumprimento
depreceitofundamentale,porisso,deveserconhecidaporestaCorte.
III. VIOLAÇÕESAPRECEITOSFUNDAMENTAIS
a. VIOLAÇÕESAOPACTOFEDERATIVO:ASSIMETRIASFÁTICASEJURÍDICASEVIOLAÇÃOÀ
REPARTIÇÃOCONSTITUCIONALDECOMPETÊNCIASFEDERATIVAS.
27
92. OmodelodeorganizaçãodoEstadobrasileiroadotadopelaCRFB/1988
assumiucomoformadeestadoofederalismo.Trata-sedematériaquefoiinserida
no roldecláusulaspétreasdoordenamento jurídico,nos termosdoart.60,§4º
incisoI23daCRFB/1988,demaneiratalqueostraçosgeraisquedefinemessaforma
estatalconstituemlimitesaoprópriopoderconstituintederivado.
93. Dentreessestraçosgeraisquepodemserapontadoscomotípicosdessa
formaestatal,destacam-seasoberaniadoEstadoFederal,aautonomiadosEstados-
membros, a existência de uma Constituição Federal, a inexistência de direito de
secessãoearepartiçãodecompetênciasprevistasconstitucionalmente24.
94. Nessesentido,PauloGustavoGonetBrancoapontaque“oEstadoFederal
expressaummododeserdoEstado(daísedizerqueéumaformadeEstado)emque
se divisa uma organização descentralizada, tanto administrativa quanto
politicamente,erigidasobreumarepartiçãodecompetênciasentreogovernocentral
e os locais, consagrada na Constituição Federal, em que os Estados federados
participamdasdeliberaçõesdaUnião,semdispordodireitoderecessão”(g.n.)25.
95. No caso sob análise, o conjunto de decisões judiciais, de um lado, e a
existênciademúltiplosprojetosdeleiemsentidosopostos,deoutro,violamdois
importantesconteúdosdopactofederativoconstitucional:oprincípiodasimetria
ou isonomia entre os entes federativos e o próprio sistema constitucional de
repartiçãodecompetências.
96. Comrelaçãoàsimetria,ocenáriofoiexpostonoscapítulosanteriores.De
fato, semqueEstadoseMunicípiospossuamqualquerparticularidadeespecífica,
23Art.60.AConstituiçãopoderáseremendadamedianteproposta:§4ºNãoseráobjetodedeliberaçãoapropostadeemendatendenteaabolir:I-aformafederativadeEstado24Confira-se,nessesentido:DALLARI,DalmodeAbreu.ElementosdeteoriageraldoEstado.32.ed.SãoPaulo:Saraiva,2013,p.254-256.25MENDES,GilmarFerreira.BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014,p.806.
28
diferentes decisões judiciais têm aplicado diferentesmecanismos de controle de
preço.Significadizerque,noEstadodoRiodeJaneiro,porforçadedecisãotomada
emaçãocivilpública,vigeumareduçãocompulsóriadepreçosopatamarde15%.
NoAlagoas,essareduçãosedáem30%.EmSantaCatarina,adequadamentenão
ocorreu.
97. A situação é ainda mais escancarada quando se somam ao cenário,
também, as decisões proferidas em ações individuais. Assim, no mesmo Rio de
Janeiro em que vige a redução compulsória no patamar de 15% sobre o valor
mensalidades,háestudantesqueobtémdescontosadicionaisde30%,40%,50%ou
atémais. Não hámais uniformidade, não hámais segurança, não hámais regra.
Alunosemsituaçõesjuridicamenteidênticassãotratadosdemaneirasemelhante
porqueentraramporumaououtraportajudicial.Prejudicando,emúltimaanálise,
aqueles estudantes que não têm acesso ao Poder Judiciário e que efetivamente
requereriam alguma atenção especial das instituições que – sem margem para
negociação–nãopoderãoatendê-lossemcomprometersuaprópriamanutenção.
98. Ainda,porforçadosprojetosdeleiemcurso,oquadrodeassimetrias
tendeasemultiplicarportantosquantossãoosEstadoseMunicípiosbrasileiros,
tornandoverdadeiramente impossívelnãosóquegruposdeensinodesenvolvam
suas atividades em diferentes entes federativos, como também gerando para
estabelecimentos de ensino individuais o ônus financeiro e administrativo de
identificação adequada das diferentes normativas de preços que podem incidir
sobresi(decisãojudicial,leimunicipal,leiestadual).
99. Ofatoéque,paraalémdoproblemadaassimetria,osprojetosdeleiem
específico produzem evidente ameaça de violação ao sistema constitucional de
repartiçãodecompetênciasqueconstitui,naspalavrasdeJoséAfonsodaSilva,“o
29
fulcrodoEstadofederal”26,nãoestandosujeitoapropostadeemendaconstitucional
tendente a aboli-lo, tampouco a iniciativas legislativas estaduais ou municipais
propensasaignorá-lo.
100. Nesse cenário, , conforme já destacou o Exmo.Ministro Alexandre de
Moraes,oprincípiogeralquenorteiaarepartiçãodecompetênciaentreosentes
componentes do Estado Federal brasileiro é o princípio da predominância do
interesse27, segundo o qual as matérias pertinentes ao interesse nacional serão
atribuídasàUnião,aopassoqueasmatériasrelacionadasaosinteressesregionais
oulocaisficarãosobacompetênciadosentesdescentralizados.
101. A própria Constituição Federal, portanto, presumindo para algumas
matérias a presença do princípio da predominância do interesse, estabeleceu, a
priori,diversascompetênciasparacadaumdosentesfederativose,apartirdessas
opções, pode ora acentuarmaior centralização de poder na União, ora permitir
maiordescentralizaçãonosEstados-membroseMunicípios.
102. Partindo dessa premissa, o art. 22 da CRFB/1988 estabelece o rol de
matériascujacompetêncialegislativaéprivativadaUnião.NostermosdoincisoI
dodispositivo, competeprivativamenteàUnião legislar sobredireito civil, oque
inclui,naturalmente,todasasquestõesreferentesacontratos.
103. Adespeitodisso,emflagranteusurpaçãodecompetêncialegislativada
União, diversos Estados eMunicípios insistem em dar continuidade ao processo
legislativo de projetos que pretendem impor descontos obrigatórios ou
26SILVA,JoséAfonsoda.Cursodedireitoconstitucionalpositivo.36.ed.SãoPaulo:Malheiros,2013,p.102.27 STF. AgR no RE nº 1.247.930. Relator: Min. Alexandre de Moraes. 1ª Turma. Julgamento em13.03.2020.DJem23.03.2020.Nomesmosentido:STF.ADInº4.615.Relator:Min.RobertoBarroso.TribunalPleno.Julgamentoem20.09.2019.DJem25.10.2019.
30
modificaçõesnasformasdecobrançadasmensalidadesdasinstituiçõesdeensino
particular,aexemplodoProjetodeLein.2.197/2020doEstadodoRiodeJaneiro.
104. Primeira razão: a contraprestação paga às instituições privadas de
ensino superior é matéria contratual inserida no âmbito do direito civil, cuja
competêncialegislativaéprivativadaUnião,conformemencionadoanteriormente.
105. Nãoésemmotivo,aliás,queédeiniciativadaUniãoaLeinº9.870/1999,
quedispõesobre–eesgotao temado–valor totaldasanuidadesnoensino.De
acordocomoart.1ºdareferidaLei,“ovalordasanuidadesoudassemestralidades
escolaresdoensinopré-escolar,fundamental,médioesuperior,serácontratado,nos
termosdestaLei,noatodamatrículaoudasuarenovação,entreoestabelecimentode
ensinoeoaluno,opaidoalunoouoresponsável”.
106. Na linha desse raciocínio, esta Eg. Corte reconheceu a
inconstitucionalidadeformal,porvíciodeiniciativa,daLeinº670/1994doDistrito
Federal,quetratavadacobrançadasanuidadesescolares.Confira-se,poroportuno,
aementadojulgadoeumtrechodovotolavradopeloMin.CezarPeluzo:
INCONSTITUCIONALIDADE. Ação Direta. Lei nº 670, de 02 de março de1994,doDistritoFederal.Cobrançadeanuidadesescolares.Naturezadasnormasqueversamsobrecontraprestaçãodeserviçoseducacionais.Temaprópriodecontratos.DireitoCivil.UsurpaçãodecompetênciaprivativadaUnião.Ofensaaoart.22,I,daCF.Vícioformalcaracterizado.Açãojulgadaprocedente.Precedente.ÉinconstitucionalnormadoEstadooudoDistritoFederal sobre obrigações ou outros aspectos típicos de contratos deprestaçãodeserviçosescolaresoueducacionais.
[Trecho do voto]: Nítida, portanto, a impossibilidade constitucional dequalquer Estado ou o Distrito Federal editar normas sobre obrigações,contraprestaçõesououtrosaspectostípicosdecontratosdeprestaçãodeserviçosescolaresoueducacionais,queissoimplica,claramente,legislarem
31
matéria de direito civil, reservada à competência daUnião (art. 22, I, daConstituiçãodaRepública)(g.n.).28
107. Em outra ocasião, esta Corte entendeu que a Lei nº 10.989/93 de
Pernambuco,quedispunhasobreadatadevencimentodasmensalidadesescolares,
tambémincorriaemvíciodeinconstitucionalidadeformal,porusurparcompetência
privativadaUniãoparalegislarsobredireitocivil29.
108. Veja-se que a própria Comissão de Justiça e Redação da Câmara dos
VereadoresdoRiodeJaneiroreconheceuqueoProjetodeLeinº1744/2020,que
“dispõesobreareduçãoproporcionaldasmensalidadesdaredeprivadadeensinono
municípiodoriode janeiro,duranteoplanodecontingênciadonovocoronavírus,
covid-19,edáoutrasprovidências”,“invadematériaPrivativadaUnião,comoprevêo
Art.22,incisoIdaConstituiçãoFederal,pois,tratasedeDireitoCivil”30,motivopelo
qualopinoupelainconstitucionalidadedareferidainciativalegislativa(Doc.8).
109. Sendo assim, os alunos e as instituições de ensino superior, por
imperativolegal,sevinculampormeiodecontratos,emquesãoestabelecidos,por
força do artigo 1º da Lei Federal nº 9.870/1999, os termos e as condições de
cobrança e pagamento da contraprestação pecuniária devida pelos serviços
educacionais fornecidos pelas instituições. Neste sentido, é certo concluir que o
descontoobrigatórioimpostoaosetoreducacionalprivadopelosdiversosprojetos
de lei em curso, caso aprovados, versam sobre matéria contratual inserida no
âmbitododireitocivil,queé,comosesabe,dacompetêncialegislativaprivativada
União.
28STF.ADInº1.042.Relator:Min.CezarPeluzo.TribunalPleno.Julgamentoem12.08.2009.DJem05.11.2009.29 STF. ADI nº 1.007. Relator:Min. ErosGrau. Tribunal Pleno. Julgamento em31.08.2005.DJ em24.02.2006.30 Disponível em: <https://mail.camara.rj.gov.br/APL/Legislativos/scpro1720.nsf/f6d54a9bf09ac233032579de006bfef6/c04e35a38b6647bf0325853d0059085c?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1>.Acessoem28demaiode2020.
32
110. Asegundarazãoconsistenaextrapolaçãodacompetênciaconcorrente
paralegislarsobredireitodoconsumidoreeducação.
111. De fato, o art. 24daCRBF/1988estabeleceque compete àUnião, aos
EstadoseaoDistritoFederallegislarconcorrentementesobreconsumo(incisoV)e
educação(incisoIX).Noâmbitodalegislaçãoconcorrente,acompetênciadaUnião
é limitada ao estabelecimentodenormasgerais, oquenão exclui a competência
suplementardosentesfederativos.Poroutrolado,inexistindoleifederal,osentes
poderãoexerceracompetêncialegislativaplena,paraatenderasuaspeculiaridades,
sendocertoqueasuperveniênciadeleifederalsuspendeaeficáciadaleiestadual,
noquelheforcontrário.
112. Apesardeseramplaacompetêncialegislativaconcorrenteemmatéria
de defesa do consumidor, ainda assim restará violado o artigo 22, inciso I, da
CRFB/1988 se a norma estadual, a pretexto de editar normas consumeristas,
adentrar em matéria contratual afeta ao ramo do direito civil/contratual da
competêncialegislativaexclusivadaUnião.
113. ConformejáreconheceuoExmo.Min.RobertoBarroso,“pormaisampla
queseja,acompetêncialegislativaconcorrenteemmatériadedefesadoconsumidor
(CF/88,art.24,VeVIII)nãoautorizaosEstados-membrosaeditaremnormasacerca
derelaçõescontratuais,umavezqueessaatribuiçãoestáinseridanacompetênciada
UniãoFederalparalegislarsobredireitocivil(CF/88,art.22,I)”.31
114. Domesmomodo, não se ignora a competência concorrente dos entes
federativos para legislar sobre educação. Nessa esteira, a Suprema Corte já
reconheceuaconstitucionalidadedeleidistritalquedeterminouaofertadeensino
31STF.ADInº4.701.Relator.Min.RobertoBarroso.TribunalPleno.Julgamentoem13.08.2014.DJem25.08.2014.
33
dalínguaespanholaaosalunosdaredepúblicadodistritofederal32,edeleiestadual
deSantaCatarinaquefixouonúmeromáximodealunosemsaladeaula,noafãde
viabilizaroadequadoaproveitamentodosestudantes33.
115. Note-se, contudo,que taismatériasemnadaseassemelhamaoobjeto
dosprojetosdeleiaquesefazreferência.Elastrataram,efetivamente,dotemada
educaçãoemseuconteúdo:ouseja,nosmecanismosdeprestaçãodoserviçopúblico
deeducação.
116. Os diversos projetos estaduais emunicipais, por sua vez, pretendem,
pelocontrário,regularaaplicaçãodeumdescontosobreaprestaçãodeumserviço
que, por acaso, está relacionado à educação. Não se trata de legislação sobre
educaçãoouensino,masapenasetãosomentedelegislaçãosobrecontratos.
117. Emcasosimilaraeste,oargumentodequealegislaçãolocalforaeditada
com fundamento na competência concorrente para legislar sobre educação não
convenceuestaCorte,queanalisoudetidamenteamatériaeconcluiupelausurpação
decompetênciaprivativadaUniãoparalegislarsobredireitocivil34.
118. De fato, conforme observa Alonso Freire, a competência concorrente
suplementar dos estados sobre questões associadas a serviços prestados por
estabelecimentosdeensinoélimitadaaserviçossecundárioseacessórios,cobrança
32STF.ADInº3.669.Relator:Min.CármenLúcia.TribunalPleno.Julgamentoem18.06.2007.DJem28.06.2007.33 STF. ADI nº 4.060. Relator: Min. Luiz Fux. Tribunal Pleno. Julgamento em 25.02.2015. DJ em30.04.2015.34Veja-se:“Nãovislumbro,notextonormativo, legislaçãosobreeducaçãoouensino.Ospreceitostratamtão-somentedaestipulaçãodedatadovencimentodasmensalidadesescolares,matériadedireitocontratual.ALein.10.989doEstadodePernambuco,tornoarepetir,nadadispõearespeitodaquela matéria” (STF. ADI nº 1.007. Relator: Min. Eros Grau. Tribunal Pleno. Julgamento em31.08.2005.DJem24.02.2006).
34
pararealizaçãodeprovasdesegundachamada,finaiseequivalentes35.Exatamente
porissoqueestaeg.Cortereconheceuaconstitucionalidadedeleifluminenseque
proibiu a cobrança de taxa de repetência, taxa sobre disciplina eletiva e taxa de
provaporpartedasinstituiçõesparticularesdeensinosuperior36.
119. Aindaqueseentendaqueoatonormativoimpugnadotratadedireitodo
consumidoredeeducação,oqueseadmitepeloprincípiodaeventualidade,fatoé
queacompetênciaconcorrentedosentesfederativosparalegislaremnashipóteses
previstasnoart.24daCRFB/1988pressupõeaexistênciadesingularidaderegional
que justifique a adequação da norma geral à situação específica da comunidade
local,sendoaindavedadoaosEstados“desbordaroscontinenteseosconteúdosdas
normasgeraisfixadaspelolegisladornacional”37.
120. Não se vê, ainda, quaisquer especificidades regionais ou locais que
legitimem a intervenção dos legisladores estaduais e municipais em relação ao
pagamentointegraldasmensalidadesdevidaspelosalunospeloserviçoprivadode
educação prestado. Pelo contrário, as circunstâncias que justificaram a iniciativa
legislativa estão longe de ser uma peculiaridade de uma ou outra comunidade.
Trata-se de uma pandemia que alcançou todos os estados brasileiros e cujos
impactossãoinclusiveobjetodeanálisedoCongressoNacional.
121. Aameaçadeseagravaroestadodeassimetria,aliás,éevidente.Tome-
secomoexemploaleicearense,objetodaADIn.6.432:naquelalegislaçãoestadual,
impõe-sedescontode15%a50%sobreasmensalidades,servindoofaturamento
anualdainstituiçãocomoparâmetrodeeventualreduçãodospercentuais.Jáalei
35FREIRE,Alonso.“Osestadospodemlegislarsobredescontosemmensalidadesescolares?”.Jota,30demaio de 2020. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/os-estados-podem-legislar-sobre-descontos-em-mensalidades-escolares-30052020#_ftnref5>.Acessoem01dejunhode2020.36STF.ADInº5.462.Relator:Min.AlexandredeMoraes.TribunalPleno.Julgamentoem11.10.2018.DJem26.10.2018.37STF.ADInº3.669.Relatora:Min.CármenLúcia.TribunalPleno.Julgamentoem18.06.2007.DJem29.06.2007.
35
paraensenº9.065/2020, recentemente aprovadae sancionada, impõedescontos
mínimosde10%a30%,variandoopercentualdeacordocomascaracterísticasda
instituição.Proliferando-seleisdestetipoentreosEstadoseMunicípios,noentanto,
é evidenteo risco tratamentosdiametralmenteopostos sobre amatéria, criando
assimetrias de direito e de fato quenão se justificamà luz de peculiaridades ou
interesseslocais.
122. De fato, a legislação em comento não revela qualquer particularidade
regional que pudesse atrair a competência legislativa remanescente dos Estados
(art. 25, §1º, CRFB/1988) ouMunicípios e servir de base para sua tentativa de
intervençãonasinstituiçõesprivadasdeensinosuperior.Pelocontrário,aexistência
demúltiplosprojetoseditadospordiferentesEstadoseMunicípiossobreo tema
apenascomprovaocaráternacionaldaquestão–eoriscoevidentedetratamentos
assimétricosentrediferentesentesfederativos.
123. Nessecontextodeintensaproduçãolegislativasobreotema,opróprio
PrefeitodeJuizdeForareconheceuqueprojetosdeleiscomprevisãodedescontos
em mensalidades em instituições de ensino são inconstitucionais por vício de
competência,motivopeloqualvetouoProjetodeLeinº30/2020,quedeuorigemà
Leioraimpugnada.Confira-seumtrechodasrazõesdoveto(Doc.9):
Esclarece-sequeocontratodeprestaçãodeserviçoseducacionaisregula,entre outras questões, o pagamento das mensalidades escolares comocontraprestação ao serviço contratado. As mensalidades escolaresconstituemumaespéciedeparcelamentodefinidoemcontrato,demodoaviabilizar uma prestação de serviço semestral ou anual. O pagamentocorresponde a uma prestação de serviço que ocorrera ao longo do ano.Assim como suas obrigações, esse contrato e matéria de Direito Civil e,portanto,deacordocomoquedispõeaConstituiçãoFederalemseuartigo22,incisoI,acompetênciaparalegislarsobreoassuntoeprivativadaUnião.Portanto, constata-se que, o tema atinente a mensalidade escolar versasobredireitoobrigacional,portanto,denaturezacontratual,temaafetoaoDireitoCivil.ApesardehaverumacompetênciaconcorrencialentreaUnião,o Estado e o Distrito Federal para tratar de educação e direito do
36
consumidor,diferentemente,aquestãodepagamentodamensalidadedizrespeitonãoapolíticaeducacionalnemadireitosconsumeristas,massimaocontratoparticularentreoparticulareaescola.EamatériadecontratoseumamatériadeDireitoCivil,cujacompetêncialegislativaeexclusivadaUnião.
124. Logo, também pelos motivos adicionais acima aludidos, resta
evidenciadaaviolaçãoaosistemaconstitucionalderepartiçãodecompetências.
125. A isso se soma, ainda, terceira razão, que decorre da indevida
intervençãodeEstadoseMunicípiosnoSistemaFederaldeEnsino.
126. Conformemencionado,osdiversosprojetosdeleitambémimpõemos
descontos sobre as mensalidades devidas às Instituições Privadas de Ensino
Superior,queintegramoSistemaFederaldeEnsino,comoseextraidoart.1638da
LeideDiretrizeseBasesdaEducaçãoNacional.Nessesentido,portratardesistema
de educação sujeito à regulação e supervisão federal, caberia exclusivamente à
Uniãotratardotema.
127. Registre-sequeasujeiçãodasInstituiçõesPrivadasdeEnsinoSuperior
ao Sistema Federal de Ensino e a inconstitucionalidade de norma estadual que
indevidamenteinterferenoseufuncionamentojáforamreconhecidasporestaCorte
Supremano julgamentodaADInº2.501,derelatoriadoExmo.MinistroJoaquim
Barbosa,39bemcomonaADInº3.757,queexcluiuasentidadesdeensinosuperior
privado da incidência de legislação editada pelo Estado do Paraná, em vista de
integraremosistemafederaldequetratamosartigos209e211daConstituiçãoc/c
osartigos16e17daLein.9.394/1996-
38Art.16.Osistemafederaldeensinocompreende:I-asinstituiçõesdeensinomantidaspelaUnião;II-asinstituiçõesdeeducaçãosuperiorcriadasemantidaspelainiciativaprivada;III-osórgãosfederaisdeeducação.39STF.ADInº2.501.Relator:Min.JoaquimBarbosa.TribunalPleno.Julgamentoem04.09.2008.DJem18.12.2008.
37
128. Assim,tambémsobesseaspecto,osprojetosdeleiemtramiteperante
assembleiaslegislativasecâmarasmunicipaisevidenciamclaraameaçaaoprincípio
federativo,interferindoindevidamentenoSistemaFederaldeEnsino,extrapolando
acompetênciaconcorrenteprevistanoart.24,incisoIXdaCRFB/1988paralegislar
sobrematériaeducacional.
b. VIOLAÇÃOAODEVIDOPROCESSOLEGISLATIVOEAODEVERDEFUNDAMENTAÇÃO:AUSÊNCIADE
ANÁLISETÉCNICAOUCIENTÍFICAPARAADOÇÃODOSPARÂMETROSDECISÓRIOSOUNORMATIVOS.
129. Emrelação à ausênciade fundamentação, quenemosprojetosde lei,
nem as decisões tomadas em ações individuais e coletivas trazem qualquer
fundamentoparaospercentuaisapontados.Nãoháindicaçãodequalquerestudo
empírico que tenha concluído que os referidos descontos são proporcionais à
suposta redução de custos dos estabelecimentos de ensino superior. Trata-se
apenas e tão somente de “achismos” oumeros intuicionismos a respeito de um
percentualquedeveserimpostoàsinstituiçõesdeensinosuperior.
130. Bastaverquediferentesleiseprojetoslegislativosindicampercentuais
absolutamente distintos. Nesta linha, por exemplo, a Lei Estadual nº 17.208 do
EstadodoCeará,impugnadanaADIn.6.423,estabeleceudescontoscompletamente
diversos–eigualmentearbitrários-quevariamentre15%e50%adependerdo
níveldeensinoeindependentementedonúmerodealunosmatriculadosemcada
instituição.Porsuavez,aLeiEstadualnº11.694/2020,doEstadodaParaíba,prevê
descontosquevariamde10%a30%,utilizandocomocritérioonúmerodealunos.
131. Oquadroéomesmoquantoaosjámencionadosprojetosdeleiemcurso,
semfalarnosem-númerodeprojetosdeleismunicipaisversandosobreamesma
matéria,aexemplodoPLn.43/2020doMunicípiodeRecifeedoProjetodeLein.
48/2020doMunicípiodeMuriaé.
38
132. Trata-se de iniciativas legislativas que distribuem descontos sem
qualquerfundamentoconcreto,motivopeloqualsãotãodistintasemconteúdose
proporções.
133. Já as decisões judiciais prolatadas em ações individuais e coletivas
aplicampercentuaisde15%,30%,50%,nuncaindicandoparâmetrostécnicospara
chegaratalconclusão.
134. Em quaisquer dos percentuais adotados, o fato é que a proposta de
descontoslineares,caracterizadopelomesmopercentualaplicadoindistintamente
atodososalunos,ignoraumasériedecircunstânciasrelevantes,valendodestacar
aomenosquatro.
135. Emprimeiro lugar,destaca-seque, emmédia, asmaioresdespesasde
instituiçõesdeensinosereferemapessoal,chegandoa70%doscustos.Dessemodo,
o corte de até 50% determinado por certas decisões judiciais praticamente
comprometetudooquenãoforpagamentodeprofessores.
136. Em segundo lugar, as decisões abrangem especificamente o ensino
superior, também atingido pelos mencionados projetos de lei. Com isso, suas
determinações alcançam centenas de instituições espalhadas por diferentes
localidades,comportesdistintosecomlogísticaspróprias,deformaqueodesconto
linearafetadesproporcionalmenteentidadesdiversasedemonstraaviolaçãoaum
devidoprocedimentodeelaboraçãonormativa.
137. Em terceiro lugar, o desconto linear impede que as instituições
estabeleçammecanismosespecíficosparaaproteçãodeestudantesemsituaçãode
vulnerabilidadedecorrentedapandemiadaCOVID-19,namedidaemquebeneficia
tanto aqueles afetados pela crise quanto os não afetados, impedindo qualquer
margemfinanceiraparaa instituiçãoresguardarosalunosvulneráveis.Comisso,
39
beneficiam-secom10%,30%ouatémesmo50%dedescontoosalunosquenão
precisariam de nenhum abatimento, enquanto aqueles que necessitam de um
descontoemmaior escala são taxativamentealcançadospelomesmopercentual.
Ignora-se,portanto,amaiscomezinhadasliçõesclássicassobreigualdadematerial.
138. Emquarto lugar,note-sequeosdiversosprojetosde leiemcursonão
suprem tais vícios de fundamentação nemmesmo no âmbito de seus processos
legislativos.Pelocontrário,osprojetostramitam,nocontextodeisolamentosocial,
semefetivaparticipaçãodapopulaçãoeemtemporecorde,semquenenhumdado
efetivamenteaponteoacertonopercentualdefinido.
139. Essa extrema brevidade do processo legislativo, com mínima
transparênciaeparticipaçãosocialrevelaevidenteviolaçãoàquiloqueAnaPaulade
Barcellosidentificoucomoumdireitodifusoaodevidoprocedimentonaelaboração
normativa. Conforme afirma a professora titular de Direito Constitucional da
UniversidadedoEstadodoRiodeJaneiro,“odireitoaumdevidoprocedimentona
elaboração normativa constitui uma incidência específica do direito de acesso à
informaçãoedocorrelatodeverdepublicidadeprevistosconstitucionalmente”.40
Nenhumadessasinformaçõesestiveramouestão,contudo,disponíveis.
140. Valedizerqueatransparênciaquesedeveexigirdosatosnormativos–
equefaltouaoprocessoquedeuorigemàleioraimpugnada–consistenodireitoà
consulta e participação ativa e equilibrada dos diversos setores da sociedade
afetadospelanormaaserelaborada.Apresençadegrupossociaiserepresentantes
declassesnasinstânciasdecisóriaséumacaracterísticadasnaçõesdemocráticas
que reforça as instituições e amplia a cidadania. Nesse sentido, a abertura à
participaçãonoProcessoLegislativopromoveamelhoriadaqualidadedalegislação
porincluirnosdebatesasimpressõestrazidaspelosdestinatáriosdamesma.
40BARCELLOS,AnaPaulade.Direitosfundamentaisedireitoàjustificativa:devidoprocedimentonaelaboraçãonormativa.BeloHorizonte:Fórum,2016,p.254.
40
141. Assim,GustavoBinenbojmdestacaque“quantomaiorograudeefetiva
participação social (direta ou indireta) no processo de deliberação que resultou a
decisão,menosintensodeveserograudecontrolejudicial”.Paraoautor,ograude
consensodemocrático obtidona aprovaçãodas leis tambémdeve ser levado em
contaparaograudecontrolejudicialdaqueleatolegislativo41.
142. Emlinhasemelhante,DanielSarmentoeClaudioPereiradeSouzaNeto
afirmam que a falta de legitimidade democrática é um primeiro e relevante
elementoadesqualificar apresunçãode constitucionalidadedeatosnormativos.
Como sustentam os autores, é relevante verificar, entre outros elementos, a
“existênciadeefetivaparticipaçãopopularnaelaboraçãodanorma”42,detalmodo
queaausênciadetalparticipação–comonocasodaleifluminenseobjetodestaADI
–desconstituiaconstitucionalidadepresumidadalei.
143. Incasu,ograudeconsensodemocráticoobtidoémínimo.Ainda,nãose
identificaafundamentaçãoadequadadasdecisõesjudiciais–édizer,nãoépossível
verificarosparâmetrosobjetivosquelevamaadoçãodeumououtropatamarde
controle de preços. Apenas se afirma a tese genérica de que o isolamento social
permite a redução de preços – o que em absoluto não procede, pelas razões já
expostas.
144. Porestarazão,confia-sequeestádemonstrada,aindaaesterespeito,a
violaçãoaospreceitosfundamentaisapontados.
41BINENBOJM,Gustavo.Umateoriadodireitoadministrativo.2.ed.RiodeJaneiro:Renovar.2008.p.240.42 SOUZA NETO, Claudio Pereira; SARMENTO, Daniel. Notas sobre jurisdição constitucional edemocracia:aquestãoda ‘últimapalavra’ealgunsparâmetrosdeautocontenção judicial.RevistaQuaestioIuris,vol.06,n.2.
41
c. VIOLAÇÃOÀLIVREINICIATIVAEAOATOJURÍDICOPERFEITO
145. Soma-se à violação ao princípio federativo, anteriormente exposta, a
violaçãoaindaaopreceitofundamentaldalivreiniciativa,insculpidonoartigo1º,
inciso IV e no artigo 170 da Constituição de 1988. Como apontado pelo Exmo.
MinistroGilmarMendes,alivreiniciativafigura,inclusive,comolimiteàexpansão
dacompetênciadosEstadosemmatériadeproteçãoaoconsumidor.Detalforma
que esta competência “cessa de ser exercida validamente se interferir
irrazoavelmentecomalivreiniciativa”43.
146. Oprincípiodalivreiniciativa,comojáafirmadoporestae.Corte,consiste
emumdosfundamentosdaRepúblicaedaordemeconômicaconstitucional.Trata-
se, nas palavras do saudoso professor Diogo de Figueiredo44, de princípio geral
atinenteàordemeconômica,dosquaisderivamprincípiosepreceitosespecíficos
deconteúdoeconômicoexpostosnoartigo170daCartaMagna.
147. Assim,a livre iniciativaconsagradapelaConstituiçãoFederaldeveser
protegidaàluz(i)dasoberanianacional,(ii)dapropriedadeprivada,(iii)dafunção
social da propriedade, (iv) da livre concorrência, (v) da defesa do consumidor,
(vi)da reduçãodasdesigualdades, (vii) dabuscapeloplenoemprego, e (viii) do
favorecimentoàsempresasdepequenoporte.
148. Lembre-se,ainda,quealivreiniciativaproduzseusefeitostambémno
campoespecíficodaordemsocialconstitucional.Defato,aoestabelecer,noartigo
209,aaberturadaeducaçãoàlivreiniciativa,aConstituiçãode1988estendeueste
preceito fundamental às instituições de ensino superior privado. E a norma
43STF.ADInº451.Relator:Min.RobertoBarroso.TribunalPleno.Julgamentoem01.08.2017.DJem08.03.2018.44MOREIRANETO,DiogodeFigueiredo;ROCHA,HenriqueBastos.Liberdadeeconomicaesançoesadministrativas nas reorganizaçoes societarias.RevistaBrasileira deDireito Público –RBDP, BeloHorizonte,ano12,n.44,p.23-41,jan./mar.2014.
42
constitucional, neste aspecto, estabeleceu tão-somente duas condicionantes à
atuação destas entidades: o cumprimento das normas gerais de educação e a
autorizaçãoeavaliaçãodaqualidadedoPoderPúblico.
149. Veja-se que a única intervenção possível do Estado, no âmbito da
educaçãoprivada,dizrespeitoaoestabelecimentodasdiretrizeseducacionaiseda
fiscalizaçãodasentidades.Emnenhumamedidasepodefalar,portanto,emcontrole
depreços,comopretendidopelalegislaçãoaquiimpugnada.
150. Neste sentido, o Exmo. Ministro Presidente desta e. Corte tem
reconhecido,emreiteradasdecisõestomadasnocontextodocoronavírus,quenão
cabeaoPoderPúblicoprivilegiarumououtrosetoreconômicoemdetrimentodos
demais.Confira-se:
Nãoseignoraqueasituaçãodepandemia,oravivenciada,impôsdrásticasalteraçõesnarotinadetodos,atingindoanormalidadedofuncionamentodemuitasempresasedopróprioEstado,emsuasdiversasáreasdeatuação.Mas,exatamenteemfunçãodagravidadedasituação,exige-seatomadademedidascoordenadasevoltadasaobemcomum,nãosepodendoprivilegiardeterminadosegmentodaatividadeeconômica,emdetrimentodeoutro,oumesmodopróprioEstado,aquemincumbe,precipuamente,combaterosnefastosefeitosdecorrentesdessapandemia.Assim, não cabe ao Poder Judiciário decidir quem deve ou não pagarimpostos, ou mesmo quais políticas públicas devem ser adotadas,substituindo-seaosgestoresresponsáveispelaconduçãodosdestinosdoEstado,nestemomento.45
151. No âmbito do Poder Executivo, a Secretaria Nacional do Consumidor
(Senacon),órgãodoMinistériodaJustiça,editounotatécnicaemqueseposicionou
contra descontos lineares, como propõe a lei em comento. Na avaliação da
secretaria,descontosdevemseravaliadoscasoacaso,levandoemconsideraçãoas
peculiaridadesdecadaestudanteedecadainstituiçãodeensino(Doc.10).
45STF.MCnaSTPn.193.Relator:Min.PresidenteDiasToffoli,decisãoproferidaem05.05.2020.DJem06.05.2020.
43
152. Posteriormente, em 08.05.2020, a SecretariaNacional do Consumidor
voltouatratardotema,pormeiodaNotaTécnicanº26/2020,reiterandoque“não
érecomendávelaadoçãodecritérioslinearesdedescontosdemensalidades,aplicáveis
indistintamenteparatodasasinstituiçõesdeensino,bemcomoderegrasgeraisque
prevejamrepassedeeventuaisreduçõesdecustosoperacionaispelasinstituiçõesde
ensino,sobpenadecomprometeracontinuidadedaprestaçãodoserviçoporpartede
algumasinstituiçõesdeensinoe/ouaqualidadedoserviçoprestado”(Doc.11)46.
153. No mesmo sentido é a Nota Técnica nº 17/2020 do Conselho
AdministrativodeDefesaEconômica–CADE,tambémvinculadoaoMinistérioda
Justiça. Ao avaliar potenciais efeitos da imposição de descontos percentuais em
contratosdeprestaçãodeserviçoseducacionais,oCADEdestacouqueessetipode
interferência pode gerar mais efeitos maléficos do que benéficos, como, por
exemplo, desemprego e redução de salários de professores, dificuldade de
realocação desses profissionais, diminuição da demanda agregada e redução da
arrecadaçãodeimpostos(Doc.12)47.
46 Disponível em: <https://www.novo.justica.gov.br/news/coronavirus-senacon-emite-nova-nota-tecnica-com-orientacoes-complementares-sobre-relacao-entre-consumidores-e-instituicoes-educacionais/sei_mj-nota-tecnica_escolas.pdf>.47“Nestecenário,osPoderesExecutivo,LegislativoeJudiciáriosãosensíveisaestetipodesituaçãoebuscam,àsvezes,demaneiraproativa,aliviarosefeitosdacriseaoscidadãosbrasileiros,buscando,em determinadas situações, soluções que passam por interferir nos contratos e na economia demaneirageral,paraprotegerosbrasileiros.Noentanto,emquepeseestetipodeinterferênciapossaserbemintencionada,épossívelque,adependerdecomosefaçaainterferência,sejamgeradosmaisefeitosmaléficosdoquebenéficos,queprecisamser,pelomenos,considerados.Abaixoestãoalgunsefeitospotenciais,sobaperspectivaeconômica,quemerecemserconsideradospeloslegisladorespátriosedecisoresemgeral,quandoocorrerodebatedestetipodeinterferêncianasmensalidadesescolares,quaissejam:Desemprego ou menores salários: Professores, também, precisam se manter em tempos depandemiae,também,sãoconsumidores.Diminuiramensalidadeescolaremtemposdepandemiapode significar, na situaçãomais otimista, a diminuição de custos ou a redução temporária dossaláriosdealgunsprofessores,mas,emumcenáriomaispessimista,podeocorrerafalênciadeváriasinstituiçõesdeensinoe,porconsequência,umcenáriopiordopontodevistasocial,tantodurantecomoapósapandemia;Dificuldadederealocação:Casoexistadesemprego,dificilmente,osprofessoresconseguirãoumempregoalternativoemépocadeisolamentosocial,ondeademandajáestábaixaeainteraçãosocial,necessáriaparaumaatividadedeensino,diminui.Talpodesignificardopontodevistapessoal,porsisó,umasituaçãoextremamentedifícil;
44
154. Ratificandotalposicionamento,oMinistérioPúblicoFederal,pormeio
deNotaPública, condenouveementementea imposiçãodedescontos linearesàs
instituiçõesdeensinoprivadas,destacandoquetaismedidas“devemconsideraras
especificidades dos serviços de ensino ofertados, a situação financeira, o porte e o
quantitativo de alunos de cada instituição de ensino”. Assim, o MPF orientou a
realizaçãodeuma“análiseequitativaqueconsidere,porumlado,aquantidadede
alunosporunidadefamiliareaeventualperdaderendabrutadafamíliae,deoutro,
os esforços empregados pela instituição para se manter a qualidade do serviço
prestadopormeiovirtual”(Doc.13).
155. Veja-se que ao permitir a imposição indiscriminada sobre todas as
instituiçõesdeensinoparticularesdereduçõesdesproporcionaisnovalordesuas
mensalidades, o conjuntodedecisõesobjetodestaADPFvioladiretamente estes
diversosconteúdosdalivreiniciativaresguardadapelaConstituição.Nãoédiferente
aconclusãoqueseextraiacercadaameaçadelesãoaomesmopreceito,decorrente
dosprojetosdeleiconjuntamenteconsiderados,emtrâmiteperanteoslegislativos
estaduaisemunicipais.
156. Emprimeirolugar,restavioladaaproteçãoàpropriedadeprivada.Isto
porque,sedeumladosetratadereduçãocompulsórianamensalidadepreviamente
estabelecida no contrato de ensino, por outro nenhuma norma ou decisão tem
previstoqualquerindenizaçãooucontraprestaçãoadequadaàsinstituições.
Outros efeitos macroeconômicos: Além de um desemprego persistente, com dificuldade derealocaçãonomercadodetrabalho,noâmbitomacro,pode-segerarumadiminuiçãodademandaagregada,diminuiçãodaarrecadaçãode impostose,por conseguinte,diminuiçãoatémesmodascondiçõesdoEstadogeriroorçamentoreferenteàsaúdepública.Especialistassustentamqueseestabelecimentos privados falirem, é possível que a rede pública seja obrigada a absorver osreferidosalunos,aumentando,também,oorçamentopúblicocomeducação;Efeitosconcorrenciais:Dopontodevistaconcorrencial,casoexistamempresasquetenhamsidolevadasàfalência,épossívelqueexistaaconcentraçãodomercado(peladiminuiçãodonúmerodeplayersexistentes)(...)”.Disponívelem<http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/publicacoes-dee/nota-tecnica-17.pdf>,acessadoem28demaiode2020.
45
157. Significadizerque,mantidoomesmoserviço,prestadodeformaremota
–semimplicarmudançanamodalidadedeensino–,as instituiçõespassamaser
compelidas a suportar ônus econômico substancial, na maior parte dos casos,
superioràsuamargemderesultado,oque inviabilizaaoperaçãodeensinocom
consequênciasgravíssimasparaasociedade.Trata-se,assim,deefetivahipótesede
desapropriaçãosem indenização,vedadanos termosdoartigo5º, incisoXXIVda
ConstituiçãoFederal.
158. Nessalinha,nãosepodeignorarasviolaçõesaatosjurídicosperfeitos.
Afinal, aopretenderemproduzir efeitosnão só sobrenovos contratosde ensino,
como também sobre aqueles já existentes, estes atos judiciais e legislativos
concebemdeumaultra-atividadeinconcebívelsoboprismadasegurançajurídica.
159. Trata-sedachamadaretroatividademínimaounormal,quandoaleiou
atonormativonovoatingeosefeitosdosatosaelesanteriores,produzidosapósa
dataemquevêmaentraremvigor.NaliçãodoExmo.MinistroGilmarMendes,“seria
ocasoseleinovaviesseaestabelecerprazomínimomaislongoparaarrendamento
ruralemandasseaplicaresseprazoaoscontratosemcursonomomentodoiníciode
vigênciaou,ainda,sealeinovaviessereduziromáximodataxalegaldejurosese
declarasseaplicávelaosjurosdoscontratosdemútuoemcursonomomentodoseu
iníciodevigência,relativamenteaosjurosqueviessemavencernofuturo”48.
160. Nessesentido,nojulgamentodaMedidaCautelarnaADIn.1.081,estee.
Supremo Tribunal Federal houve por bem suspender medida provisória que
pretendiadisporsobreosaspectoseconômicosdecontratosdeensinojávigentesà
época.49
48MENDES,GilmarFerreira;BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014,p.380.49STF.ADIn.1.081.RelatorMin.FranciscoRezek.Julgamentoem22dejunhode1994.
46
161. No Recurso Extraordinário nº 188.366, de relatoria do Min. Moreira
Alves,emquesediscutiaaconstitucionalidadedeleisfederaisquedispunhamsobre
preçosdemensalidadesnoensino,estaCortedestacouaindaqueasleisqueafetam
osefeitosfuturosdecontratoscelebradosanteriormentesãoretroativas,afetando
a causa, que é um fato anterior no passado. Com base nesse raciocínio, foi
reconhecidaainconstitucionalidadedosatosnormativos,aoargumentodeviolarem
aproteçãodoatojurídicoperfeito50.
162. Da mesma maneira, o Exmo. Min. Celso de Mello consignou que “a
incidênciaimediatadaleinovasobreosefeitosfuturosdeumcontratopreexistente,
precisamenteporafetaraprópriacausageradoradoajustenegocial, reveste-sede
caráterretroativo(retroatividadeinjustadegraumínimo),achando-sedesautorizada
pela cláusula constitucional que tutela a intangibilidade das situações jurídicas
definitivamenteconsolidadas”51.
163. Emsegundolugar,restavioladooconteúdoespecíficodalivreiniciativa
na educação. Isto porque, enquanto de um lado o artigo 209 faculta à iniciativa
privadaatuarnocampodoensino,poroutrooartigo208estabelececlaramenteas
hipótesesdeatuaçãodoEstadonestaseara.EoEstadonãoestáautorizado,repise-
50Veja-se:“Recursoextraordinário.Mensalidadeescolar.Atualizaçãocombaseemcontrato. -Emnossosistemajurídico,aregradequealeinovanãoprejudicaráodireitoadquirido,oatojurídicoperfeitoeacoisajulgada,porestarinseridanotextodaCartaMagna(art.5º,XXXVI),temcaráterconstitucional, impedindo, portanto, que a legislação infraconstitucional, aindaquandodeordempública,retroajaparaalcançarodireitoadquirido,oatojurídicoperfeitoouacoisajulgada,ouqueoJuizaapliqueretroativamente.Earetroaçãoocorreaindaquandosepretendeaplicardeimediatoaleinovaparaalcançarosefeitosfuturosdefatospassadosqueseconsubstanciememqualquerdasreferidaslimitações,poisaindanessecasoháretroatividade-aretroatividademínima-,umavezqueseacausadoefeitoéodireitoadquirido,acoisajulgada,ouoatojurídicoperfeito,modificando-seseus efeitos por força da lei nova, altera-se essa causa que constitucionalmente é infensa a talalteração.Essaorientação,queéfirmenestaCorte,nãofoiobservadapeloacórdãorecorridoquedeterminou a aplicação das Leis 8.030 e 8.039, ambas de 1990, aos efeitos posteriores a elasdecorrentesdecontratocelebradoemoutubrode1.989,prejudicando,assim,atojurídicoperfeito.Recursoextraordinárioconhecidoeprovido”(STF.REnº188.366.Relator:Min.MoreiraAlves.1ªTurma.Julgamentoem19.10.1999.DJem19.11.1999).51STF.AgRnoAInº363.159.Relator:Min.CelsodeMello.2ªTurma.Julgamentoem16.08.2005.DJem03.02.2006.
47
se,nempeloartigo208,nempeloartigo209,aefetivarqualquerformadecontrole
depreços.
164. Em terceiro lugar, é evidente a violação à livre concorrência. Como
lecionouoExmo.MinistroRobertoBarroso,alivreconcorrência“significaliberdade
de fixação dos preços e do lucro, como regra geral”52. Disto decorre que cabe às
próprias instituiçõesdeensinoregularseussistemasdepreçodeacordocomos
incentivosdomercado.
165. Veja-se que o conjunto de decisões e projetos de lei em comento não
buscamatuarnoâmbitodasexcepcionalíssimassituaçõesemqueaintervençãodo
Estado sobre os preços demercado poderia ser eventualmente legítima. Não se
busca,pois,conteraumentossubstanciaisemmensalidades,prevenirmonopólios
oureaquecerumdeterminadosetoreconômico.
166. De fato, não se pode ignorar que, em antigo julgado, esta e. Corte
convalidou a Lei nº 8.039/1990, que dispunha sobre critérios de reajuste das
mensalidadesdeensino.Note-sequeocasoésubstancialmentedistintodapresente
hipótese.
167. Primeiramenteporquesetratava,comosevê,delegislaçãofederal–de
quenãodecorria,portanto,ainconstitucionalidadeformalapontadaanteriormente.
Maisdoque isso, note-seque a legislação em comento, editada emmomentode
notória crise inflacionária, buscava limitar o reajuste abusivo de mensalidades
escolares.
52BARROSO,LuísRoberto.Estadoelivre-iniciativanaexperiênciaconstitucionalbrasileira.RevistaBrasileiradeDireitoPúblico–RBDP,BeloHorizonte,BeloHorizonte,ano12,n.45,p.9-19,abr./jun.2014.
48
168. Tanto os projetos de lei quanto as decisões objeto desta ADPF, no
entanto,nãotratamde limitarreajustesnasmensalidadesobjetodecontratosde
ensino.Oqueelaspretendem,naverdade,érealizarumareduçãodemensalidades
estabelecidas em atos jurídicos perfeitos e regularmente pagas como
contraprestaçãodosserviçosprestadospelas instituições.Nãoporoutrarazão,a
hipóteseanalisadaporestee.STFporocasiãodojulgamentodaADInº319/DFé
substancialmentedistintadapresente,nãocabendodesta formachegaràmesma
conclusãoqueaquelaadotadaporestae.Corteemmomentotãosensíveldenossa
aindanovademocracia.
169. De fato, a situação aqui não é de excepcional legitimação de tamanha
intervençãoincisivadoEstadosobreapropriedadeealivreiniciativa.Oqueosatos
impugnadosbuscamé interferir emummercadoque funciona regularmente em
todooterritórionacional.Mercadoestenoqualatuamdiversosagenteseconômicos
quetêmenvidadoesforçospara,porexemplo,nostermosdaPortarianº343/2020
doMEC,manteraprestaçãodoserviçoeoacessoaoensinosuperior,semperdade
qualidade e sem nenhum indício de tentativas de aumentos abusivos nas
mensalidadespraticadas.
170. Como bem expressou o Exmo. Ministro Roberto Barroso, em lição
doutrinária,ocontroledepreços,noBrasil,éumadas“tentaçõespermanentes,que
levamdiretoparaoinferno”53.Trata-se,ainda,naspalavrasdoprofessorDiogode
Figueiredo, de medida proibida pela Constituição de 1988, após ter sido tão
“largamenteutilizadanoautoritarismoeconômicoduranteváriasdécadasnestePaís,
mas tão prejudicial à competição, tão incompatível com uma política de
desenvolvimento(...),tãoperigosapelasdistorçõesquegera...”.54
53BARROSO,LuísRoberto.Estadoelivre-iniciativanaexperiênciaconstitucionalbrasileira.RevistaBrasileiradeDireitoPúblico–RBDP,BeloHorizonte,BeloHorizonte,ano12,n.45,p.9-19,abr./jun.2014.54MOREIRANETO,DiogodeFigueiredo.OrdemeconômicaedesenvolvimentonaConstituiçãode1988.RiodeJaneiro:Apec,1989.
49
171. E,defato,sobo–datamaximavenia–demagógicodisfarcedadefesado
consumidor, tanto as decisões quanto os projetos legislativos põem em risco a
própria manutenção do serviço. As instituições não poderão se manter. Os
estudantesnãopoderãoestudar.Ojogoédeperde-perde,emumcenárionoqualas
perdasjásãoincontáveis.
172. Nessalinha,sequersepodedizerquetaisdecisõespromovemqualquer
defesadoconsumidor.Pelo contrário, a consequênciapráticada legislaçãoedos
projetosdeleiétornarinsustentávelaprestaçãodosserviçoseducacionaisdurante
apandemiae,mesmoapósacrise,emdetrimentodosprópriosestudantes.
173. Não só isso, o impacto negativo dos atos impugnados também se faz
sentir à luz do ideal de promoção do pleno emprego, que deve reger a leitura
constitucionalmenteadequadadoprincípiodalivreiniciativa.
174. Note-seque,naformadaPortarianº343/2020doMEC,asinstituições
quenãooptaremporsuspenderasaulasduranteoperíododepandemia,podem
seguirprestandooserviçoeducacionalpormeiodigital.
175. Significa dizer que parcela substancial das instituições mantém a
estruturadeprestaçãodoserviçodeensino–preservandomilharesdeempregos
de professores, técnicos administrativos e pessoal especializado nos sistemas de
telecomunicaçõesempregadosparaamanutençãodasatividades.
176. Ocorreque,sedeumladomantém-seaprestaçãodoserviçoobjetodo
contratodeensino,deoutroaimposiçãodedescontoartificialimpactadiretamente
asustentabilidadedaatividadeprestadapelasinstituições.Sendoamensalidadea
principalfontederecursosdasinstituições,nãohácomodeixardeconcluirquesua
redução em patamar substancial de até 50%, consequência necessária para a
50
manutençãodasatividadesserá,porcerto,ocortededespesas–entreasquais,por
certo,aquelasrelativasaopessoalcontratado.
177. É de se concluir, pois, que a interpretação extraída do conjunto de
decisões objeto desta ADPF, bem como o conjunto de projetos legislativos em
comentovãodeencontroàlivreiniciativa,tambémsobaperspectivadoobjetivode
promoção do emprego. Muito pelo contrário, o acirramento do desemprego é
consequênciaprováveldaslegislaçõesdessanatureza.
d. VIOLAÇÃOÀPROPORCIONALIDADE
178. Deve-se destacar, ainda, a manifesta violação ao princípio da
proporcionalidade decorrente da interpretação judicial extraída do conjunto de
decisõesimpugnadas,bemcomodosprojetosdeleidequetrataestaADPF.
179. Comoassentadonadoutrinaenajurisprudênciadestee.STF,oprincípio
da proporcionalidade exige do legislador que, ao interferir em princípios
constitucionais–taiscomoospreceitosfundamentaisaquiindicados–devaatender
51
àsmáximasdeadequação,necessidadeeproporcionalidadeemsentidoestrito55-56-57.
180. Ocorrequeosatosemcomentonão sobrevivemanenhumdos testes
decorrentesdamáximadaproporcionalidade.
181. Em primeiro lugar, falham em apresentar a devida adequação lógica
entremeiosefins.Sabe-seque,nessaetapa,busca-seanalisarseamedidalegislativa
temopotencialdeatingirofimpretendido.Comosevê,oobjetivodosatosobjeto
destaADPFé,atodaevidência,resguardardireitosdosestudantes,nacondiçãode
consumidores.
55 Confira-se: “Em resumo, o princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade permite aoJudiciárioinvalidaratoslegislativosouadministrativosquando:(a)nãohajaadequaçãoentreofimperseguidoeoinstrumentoempregado;(b)amedidanãosejaexigívelounecessária,havendomeioalternativoparachegaraomesmoresultadocommenorônusaumdireitoindividual(vedaçãodoexcesso);(c)nãohajaproporcionalidadeemsentidoestrito,ouseja,oqueseperdecomamedidaédemaiorrelevodoqueaquiloqueseganha.Nessaavaliação,omagistradodeveterocuidadodenãoinvalidarescolhasadministrativassituadasnoespectrodoaceitável,impondoseusprópriosjuízosdeconveniênciaeoportunidade.NãocabeaoJudiciárioimporarealizaçãodasmelhorespolíticas,em sua própria visão, mas tão somente o bloqueio de opções que sejam manifestamenteincompatíveis com a ordem constitucional. O princípio também funciona como um critério deponderaçãoentreproposiçõesconstitucionaisqueestabeleçamtensõesentresiouqueentrememrotadecolisão”(BARROSO,LuísRoberto.Cursodedireitoconstitucionalcontemporâneo:osconceitosfundamentaiseaconstruçãodonovomodelo.7.ed.SãoPaulo:Saraiva,2018,p.158-159).56Comfundamentonaviolaçãoaoprincípiodaproporcionalidade,oSTFjulgouprocedenteaADInº855parasuspenderaLei10.248/93,doestadodoParaná,quedeterminavaaobrigatoriedadedapresençadoconsumidornomomentodapesagemdebotijõescomercializadospelasdistribuidorasdeGásLiquefeitodePetróleo(GLP),quandodasuavendaousubstituição(STF.ADIn855.Relator:Min. OctavioGallotti. Relator paraAcórdão:Min. GilmarMendes. Tribunal Pleno. Julgamento em06.03.2008).57Tambémfoireconhecidaainconstitucionalidade,porviolaçãoaoprincípiodaproporcionalidade,deleiestadualquedeterminavaaobrigatoriedadedeprestaçãodoserviçodeempacotamentoemsupermercados:“Poroutrolado,aLeinº2.130/1993,doEstadodoRiodeJaneiro,padecedevíciomaterial.Issoporquearestriçãoaoprincípiodalivreiniciativa,protegidopeloart.170,caput,daConstituição,apretextodeprotegerosconsumidores,nãoatendeaoprincípiodaproporcionalidade,nassuastrêsdimensões:(i)adequação;(ii)necessidade;e(iii)proporcionalidadeemsentidoestrito.Aprovidênciaimpostapelaleiestadualéinadequadaporqueasimplespresençadeumempacotadoremsupermercadosnãoéumamedidaqueaumenteaproteçãodosdireitosdoconsumidor,massimuma mera conveniência em benefício dos eventuais clientes. Trata-se também de medidadesnecessária, pois a obrigação de contratar um empregado ou um fornecedor de mão-de-obraexclusivamentecomessafinalidadepoderiaserfacilmentesubstituídaporumprocessomecânico.Porfim,assançõesimpostasrevelamadesproporcionalidadeemsentidoestrito,eisquecapazesdeverdadeiramentefalirumsupermercadodepequenooumédioporte”(STF.ADInº907.Relator:Min.AlexandredeMoraes.Relatorp/Acórdão:Min.RobertoBarroso.Tribunal Pleno. Julgamento em01.08.2017.DJem23.11.2017).
52
182. Ocorreque, como jávisto, ao imporoarbitráriodescontodeaté50%
sobreasmensalidadescobradaspelasinstituiçõesprivadas,osatospõememrisco
aprópriapossibilidadedesemanteraprestaçãodoserviço.Um“jogo”de“perde-
perde”,comojáindicadoanteriormente.
183. Com efeito, a medida gera grandes dificuldades financeiras aos
estabelecimentos de ensino, que possivelmente encerrarão suas atividades
empresariais em razão da insustentabilidade econômica. Trata-se de solução
legislativa que prejudica não somente os proprietários desses estabelecimentos,
mais os milhares de alunos do ensino superior privado no Brasil, além de
profissionaisqueserãodesempregadosemdecorrênciadessasmedidas.
184. Tampoucosepodefalarnamedidacomonecessária.Sabe-sequeoteste
de necessidade impõe a análise da existência de medidas menos gravosas,
igualmentecapazesdepromoverosobjetivospretendidospelalegislação.Trata-se
deumimperativodevedaçãodoexcesso.
185. Ocorreque,aimposiçãodedescontosemqualquercontraprestaçãoàs
instituiçõesdeensinogeramedidaabsolutamenteexcessivaedesnecessária.
186. Mais que isso, a própria previsão de desconto desacompanhada de
qualquerjustificaçãomínimaqueindiqueasrazõespelasquaisestepatamar–enão
outros–éadequadoparaapromoçãodosobjetivosdalegislaçãoindicaquesetrata
demedidaexcessiva.
187. Por fim, e não menos importante, as medidas sob análise tampouco
podem ser reputadas proporcionais em sentido estrito. Como sabido, a
proporcionalidadeemsentidoestritoexigeumcotejoentreosdiversosprincípios
em jogo,de formaaensejaraanálise–em linhasgerais– sobre seas restrições
53
impostas a um princípio constitucional são compensadas pela promoção do
princípiocontraposto.Nãoéocaso.
188. Com efeito, não se pode falar em efetiva promoção do direito do
consumidor, pelas razões expostas adiante. Falta aos atos impugnados, afinal,
sequer a demonstração de que suas premissas empíricas – a necessidade, por
exemplo,dodescontonopatamarestabelecidopelalei–sãoadequadas.Tudoindica
quenão–aoimporemsubstancialreduçãodasmensalidades,osatosinviabilizama
atividade educacional, gerando perda de empregos e de oportunidades para
milharesdeestudantes.
189. Deoutro lado,arestriçãoà livre iniciativa,aoato jurídicoperfeitoeà
autonomiauniversitáriarevelam-seemgrauextremo.Osatosimpugnados,afinal,
pretendemimporefetivocontroledepreços,incidindosobrecontratosjáexistentes
e impedindo que centenas de instituições de ensino possam definir suas
necessidades financeiras e alcançá-las para desenvolver seus objetivos
institucionais.
190. Alémdisso,nãoháproporcionalidadenosdescontospropostos,diante
da manutenção dos serviços educacionais. Registre-se que há diversos
estabelecimentosquemantêmasatividadesnos limitesdoqueéautorizadopelo
PoderPúblicoduranteapandemia, sendocertoqueocalendárioacadêmicoserá
adequado e as aulas repostas para assegurar o cumprimento da carga horária
mínimaanual,nostermosdaMedidaProvisórian.934/2020.Demodoque,mesmo
nasinstituiçõesemqueasaulasestãosuspensas,aatividadenãoestáinterrompida
enãohádesequilíbrionarelaçãoentreasinstituiçõesealunos.
191. Veja-se,aesterespeito,queoConselhoNacionaldeEducação,pormeio
darespostaaoOfício008/2020de12demarçode2020,afirmouqueasinstituições
deensinodeverãocumprirocalendárioacadêmico–aindaqueessecalendário,em
razão da COVID-19, não coincida com o ano civil. Trata-se da mesma solução
54
aplicadaàépocadapandemiadoGrupoH1N1,porocasiãodaelaboraçãodoParecer
CNE/CEB/0010/2009. Tratando do tema, ainda, a recente Medida Provisória n.
934/2020 expressamente dispôs acerca da obrigatoriedade do cumprimento da
cargahoráriamínimaanualestabelecidanaLeideDiretrizeseBases(“LDB”),ainda
que excepcionalmente tais horas sejam distribuídas em número de dias letivos
diversodaqueleestabelecidonaLDB.
192. Valenotar,aesterespeito,queamensalidadeescolarnãoremunerao
correspondente mês de aula. Nos termos do artigo 1º da Lei n. 9.870/1999, os
serviços de ensino prestados por entidades privadas no nível superior são
remuneradospormeiodeanuidadesousemestralidades.Tão-somenteparafacilitar
o pagamento destas anuidades ou semestralidades por diversas famílias, a
legislaçãopossibilitaquesejamfracionadasemparcelasmensais.
193. Nesse sentido, ao pagar a mensalidade escolar, um aluno está tão-
somentepagandoparceladaquelaanuidadeousemestralidade–que,porsuavez,
correspondeaoserviçodeensinoreferenteaumanoouumsemestre.Ora,como
visto, tais serviços seguirão sendo prestados pelas entidades de nível superior
impedidas, em razão da pandemia COVID-19, de oferecer as aulas normalmente.
Tudo seguindoosditames regulatóriosdoMinistériodaEducação, comadevida
adequaçãodocalendárioacadêmico.
194. Não haverá perda ou prejuízo. Haverá apenas, se necessário, o
oferecimentoposteriordasaulasjácontratadasequenãopossamserministradas
emrazãodasmedidasdeisolamento(comoalgumasespéciesdeaulaspráticas).É
por esta razão que os atos em comento, ao imporem desconto de mensalidade
quando, na prática, o ensino seguirá sendo regular e integralmente prestado,
acabam por gerar efetivo “empobrecimento sem causa”, absolutamente
desproporcional,contraasinstituiçõesdeensinoprivadas.
55
195. Frise-se:algumasatividadespodemestarsuspensas,masasinstituições
não estão paradas! A maciça maioria mantém as aulas, outras já planejam as
reposições devidas e, em todos os casos, professores seguem empregados,
fornecedoresseguemsendopagosetodacomunidadeseguesendoindiretamente
sustentadaporestasinstituições.
196. Nãoporoutra razão, tambémaviolação àproporcionalidade impõea
procedênciadapresenteADPF.
e. VIOLAÇÃOÀAUTONOMIAUNIVERSITÁRIA
197. Porfim,note-sequeincideaindavedaçãoconstitucionalespecíficacom
relação à imposição de redução de mensalidades devidas no âmbito do ensino
superiorprivado.
198. Comefeito,apesardesituadonoTítuloVIIIdaConstituiçãode1988,a
centralidadedoprincípioda autonomiauniversitária (art. 207,CRFB/88)parao
direito social à educação vem sendo reconhecida pela doutrinamais autorizada.
Trata-se, como lecionam o Exmo. Ministro Gilmar Mendes e o professor Paulo
GustavoGonet,deprincípioquerevela“garantiainstitucionalfundamental,emface
daaberturamaterialpropiciadapeloart.5º,§2º,daConstituição”.58
199. Em sentido semelhante, o Exmo. Ministro Roberto Barroso, em lição
doutrinária, aponta que o princípio da autonomia universitária consiste em
princípiosetorialdaordemsocial,presidindo“umespecíficoconjuntodenormas
afetas”aotemadaeducação.59
58MENDES,GilmarFerreira;BRANCO,PauloGustavoGonet.Cursodedireitoconstitucional.9.ed.SãoPaulo:Saraiva,2014.p.620)59 BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitosfundamentaiseaconstruçãodonovomodelo.7.ed.SãoPaulo:Saraiva,2018,p.198.
56
200. AnnaCândidadaCunhaFerrazexpõedemaneirapristinaarelevânciado
princípioemnossaestruturaconstitucional:
“Inscrito na Constituição Federal, o princípio da autonomia universitáriatem uma dimensão fundamentadora, integrativa, diretiva e limitativaprópria,oquesignificadizerqueénaprópriaConstituiçãoFederal:a)queseradicaofundamentodoinstituto;b)queédelaqueseextraisuaforçaintegrativa em todo o sistema federativo do País; c) que a ConstituiçãoFederalpreordenaainterpretaçãoquesepossadaraoinstituto;d)queoslimitesquesepodemoporàautonomiauniversitáriatêmcomosedeúnicaa própria Constituição Federal; e) que o princípio da autonomiauniversitária, como princípio constitucional, deve ser interpretado emharmonia – mas no mesmo nível – com os demais princípiosconstitucionais”60
201. Nãotemsidooutrooentendimentodestae.Corte,quereiteradamente
temafirmadoa centralidadedoprincípioda autonomiauniversitária61. Éo caso,
assim,doparadigmáticojulgadodaADPFn.186,emqueaautonomiauniversitária
foisuscitadacomoumdosprincípiosaconvalidaraspolíticasdeaçõesafirmativas
emfavordapopulaçãonegra.
202. Nessa linha,estae.Corte temafirmadoqueaautonomiauniversitária
impede,comrelaçãoàsuniversidades,o“exercíciodetutelaouindevidaingerência
no âmago próprio das suas funções, assegurando à universidade a
discricionariedade de dispor ou propor (legislativamente) sobre sua estrutura e
funcionamentoadministrativo,bemcomosobresuasatividadespedagógicas”.62
203. Vê-seque,porforçadoartigo207daConstituiçãode1988,aautonomia
universitária se desdobra em diversas vertentes. Fala-se, assim, na autonomia
60FERRAZ,AnnaCândidadaCunha.Aautonomiauniversitárianaconstituiçãode1988.Revistadedireitoadministrativo,RiodeJaneiro,n.215,jan.-mar./1999,p.123.61 STF. ADI 4406. Relatora: Des. RosaWeber. Tribunal Pleno. Julgamento em 18.10.2019. DJ em04.11.2019.62STF.ADInº3.792.Relator:Min.DiasToffoli.TribunalPleno.Julgamentoem22.09.2016.DJemde01.08.2017.
57
disciplinar, na autonomia administrativa, na autonomia didático-científica e na
autonomiadegestãofinanceiraepatrimonial.63
204. Éprecisamentenestaúltimaperspectiva–financeiraepatrimonial–que
osatosemcomentoviolamfrontalmenteopreceitofundamentalsobanálise.Como
apontouoExmo.MinistroCelsodeMelo,porocasiãodojulgamentodaADIn.51,a
autonomia financeira“outorgaàUniversidadeodireitodegerireaplicarosseus
própriosbenserecursos,emfunçãodeobjetivosdidáticos,científicoseculturaisjá
programados”.
205. É certo que, tratando-se de instituições de ensino públicas, esta
autonomiafinanceirapermiteàsuniversidadessevaleremdosrecursosprevistos
no orçamento aprovado pelo correspondente Poder Legislativo para livremente
alocá-los de acordo com os objetivos institucionais da instituição. No caso de
instituiçõesprivadas,noentanto,aquestãoassumefeiçõesmaisprofundas.
206. Isto porque as instituições privadas, para financiar seus objetivos
institucionaisdepesquisa, extensãoe ensino,dependemdireta e exclusivamente
dasmensalidadespagasporseusestudantesouresponsáveisfinanceiros.Significa
quearegradaautonomia financeira, tratando-sede instituiçõesprivadas,nãose
limitaàpossibilidadedegestãodosrecursospelasentidadesdeensinosuperior.
Poisnãoháautonomianagestãoderecursos,senãohárecursosaseremgeridos.
207. E, precisamente, ao impor substancial corte nas mensalidades pagas
pelos estudantes, a consequência dos atos objeto desta ADPF é restringir
substancialmente a possibilidade de livre desenvolvimento das finalidades
institucionaisdedezenasdeinstituiçõesdeensinosuperior.
63BASTOS,CelsoRibeiro;MARTINS,IvesGandra.ComentáriosàConstituiçãodoBrasil.Imprenta:SãoPaulo,Saraiva,2004,p.487.
58
208. Necessário ressaltar que, ao impor a redução de até 50% sobre as
mensalidadesdeinstituiçõesprivadas,nãoháalternativaparaosestabelecimentos
de ensino senão sacrificar uma entre as atividades desenvolvidas em seu seio –
ensino,extensãooupesquisa–,ousubstancialmenteafetá-las.
209. Énestesentidoque,tambémàluzdaviolaçãoaopreceitofundamental
autonomiauniversitária,coroláriododireitoàeducação,apresenteADPFmerece
serjulgadaprocedente.
IV. INCONSTITUCIONALIDADEDODESCONTOAPLICÁVELÀS
MENSALIDADESDEVIDASÀSINSTITUIÇÕESQUEMANTIVERAMSUAS
ATIVIDADESPORMEIODETECNOLOGIASDAINFORMAÇÃO
210. Ainda que se entenda, em remotíssima hipótese, que seriam
constitucionaisosatossobanálise,deve-seteceraomenosumarelevantedistinção
entreasmúltiplasrealidadesexistentes.
211. Istoporque,sedeumladoháinstituiçõesimpedidas,peloPoderPúblico,
defuncionarplenamente–oque,repita-se,nãosignificaqueasaulaseatividades
nãoserãorespostasaofimdapandemia–deoutrohádiversasinstituiçõesdeensino
superiorqueseguemfornecendooserviçoeducacional,pormeiodemecanismosde
tecnologiadainformação(emtermosgerais,pelainternet).
212. Nessalinha,valedestacarapermissãoregulatóriacontidanaPortarianº
343/2020 doMinistério da Educação, que permitiu amodalidade de ensino por
meiodetecnologiasdainformaçãonoscursospresenciaisdeensinosuperior.Não
setrata,lembre-sedemudançanoserviçooudeconversãodoensinopresencialem
ensino a distância. As aulas seguem sendo oferecidas nos horários pré-
determinados,comcontemporaneidadenaexposiçãopeloprofessoreparticipação
59
dos alunos, com perguntas e respostas ao vivo – enfim, com o regular
prosseguimentodavidaacadêmica,pelosmeiosdigitais.
213. Assim é que, mesmo na hipótese remota de se entender possível a
reduçãodamensalidadeimpostajudicialmenteouporleiestadualoumunicipal,não
sepodeafastaroreconhecimentodeque,aomenoscomrelaçãoàsinstituiçõesde
ensinosuperiorqueaderiramaodispostonaPortarian.343/2020doMinistérioda
Educaçãoedeoutrosatos regulatórios subsequentes, eque seguemprestandoo
serviço por meios digitais, há manifesta inconstitucionalidade na imposição de
descontos.
214. Veja-se:oserviçoseguesendoprestado,osprofessoresseguemdando
aulas,aatividadeadministrativanãopara.Nãohácomoafirmarqueumaredução
da mensalidade, nessa hipótese, violaria ainda mais gravemente os preceitos
fundamentaisacimaexpostos.
215. Nesse sentido, confia-se que mesmo na hipótese de se rejeitar a
inconstitucionalidade in totumda legislação objeto desta demanda, esta e. Corte
haveráporbemjulgarparcialmenteprocedenteapresenteADPF,paraafastarda
incidência das decisões judiciais concessivas de redução de mensalidade e de
eventuais leismunicipais e estaduais aprovadas neste sentido as instituições de
ensinosuperiorqueaderiramàPortarian.343/2020doMinistériodaEducaçãoou
que, respeitando os atos regulatórios vigentes, seguiram prestando o serviço de
ensinopormeiosdigitaisduranteasmedidasdeisolamentosocial.
V. INCONSTITUCIONALIDADEDODESCONTOAPLICÁVELÀS
MENSALIDADESDEVIDASÀSINSTITUIÇÕESQUENÃOREDUZIREMO
CALENDÁRIOACADÊMICO.
216. Por fim, na remotíssima hipótese de se entender não ser o caso de
reconhecer a procedência total desta ADPF, não se pode ignorar o fato de que
60
diversas instituiçõesde ensino superior quenão estejamna situação expostano
itemanterior–ouseja,quenãoestejamprestandooserviçodeeducaçãopormeio
detecnologiasdeinformação–aindaassimmanterãoocalendárioacadêmico,nos
termosdaLeideDiretrizeseBases.
217. E, como já apontado nesta petição, as mensalidades devidas às
instituições privadas de ensino superior nada mais são que fração da
contraprestaçãovinculadaaoensinoprestado.Nos termosdoartigo1ºdaLeinº
9.870/1999,àsinstituiçõesdeensinosuperiorprivadassãodevidasanuidadesou
semestralidades–quepodemserparceladaspeloresponsávelfinanceiro.
218. Ora, é certo que, diante das medidas de isolamento social, algumas
instituições – por suas características específicas – podem ser efetivamente
impossibilitadasdemantersuasatividadesparcialouintegralmente.Masissonão
significa qualquer redução no serviço. Afinal, as instituições de ensino superior
seguemnormasregulatóriasemitidaspeloMinistériodaEducaçãoouprevistasem
leiestabelecendocargashoráriasmínimasparadiversoscursoseníveisdeensino.
219. Forçoso concluir, nessa linha, que esta ADPF merece ser julgada
parcialmente procedente para declarar-se que as instituições que não venham a
reduzirocalendárioacadêmicodeaulasanuaisesemestrais,nostermosdaLeide
DiretrizeseBasesedosatosregulatóriosemanadosdoMinistériodaEducação,não
podem sofrer a incidência de decisões judiciais concessivas de descontos em
mensalidades,e igualmentenãopodemestarsujeitasaeventuais leisestaduaise
municipaispromovendotaismedidas.
VI. MEDIDACAUTELARNECESSÁRIA
220. Por todo exposto, resta evidenciado o fumus boni iuris – é dizer, a
relevância jurídica e a verossimilhança do direito apresentado – na presente
demanda.Fatoéque,associadoa isso,aeficáciadasdiversasdecisões judiciaise
61
administrativas, bem como o risco de aprovação de projetos legislativos que
tornarão compulsória a redução de mensalidades produzem ainda efeitos
severamentegravesedeimpossívelreparaçãoàsociedade.
221. Comefeito,opretendidotabelamentoinconstitucionaldepreçostempor
efeito reduzir artificial e drasticamente a receita de dezenas de instituições de
ensino superior privado. Diante do contexto de crise atual, associado ainda aos
efeitos futuros e desconhecidos da crise, é certo que tal redução forçada de
mensalidades poderá causar uma ainda mais acentuada crise nas próprias
instituições de ensino superior, gerando (1) cortes de posições de trabalho, (2)
reduçãonaqualidadedaprestaçãodoserviçopúblicoeducacional,e,oqueémais
grave, (3)a impossibilidadeeconômicadesequersemantero funcionamentode
instituiçõesdeensinodiversas.
222. Diante deste cenário, dois grupos de medidas liminares tornam-se
necessárias.
223. Primeiramente, com relação aos atos jurisdicionais impugnados nesta
ADPF, revela-se essencial suspender os efeitos de decisões judiciais e
administrativas que tenham aplicado quaisquer descontos às parcelas de
semestralidades e anuidades devidas às instituições de ensino superior, por
decorrênciadosplanosdecontingênciadonovocoronavírus.Igualmenteessencial,
ainda,suspenderasaçõesindividuaisecoletivasqueversemsobreaimposiçãode
taisdescontos,atéulteriordecisãodestee.STF.
224. Subsidiariamente,nahipótesedea suspensão in totumdasdecisõese
processos judiciais e administrativos não parecer adequada a esta e. Corte, é
essencialquesejadeterminadaasuspensãoaomenoscomrelaçãoàsinstituições
deensinosuperiorprivadoquetenhammantidoaprestaçãodoserviçodeensino
pormeiodetecnologiadacomunicação–nostermosdaPortarianº343/2020do
62
MEC, garantindo-se assim o regular acesso à educação pelos estudantes e a
manutençãodaatividadedasinstituições.
225. Também subsidiariamente, na hipótese de a suspensão in totum das
decisões e processos judiciais e administrativos não parecer adequada a esta e.
Corte,éessencialquesejadeterminadaasuspensãodeseusefeitoscomrelaçãoàs
instituições de ensino superior privadas que não venham a reduzir o calendário
acadêmicodeaulasanuaisesemestraisnostermosdaLeideDiretrizeseBasese
dosatosregulatóriosemanadosdoMinistériodaEducação,inclusivepormeiode
tecnologiasdainformação.
226. Em segundo lugar, com relação ao caráter preventivo desta ADPF, é
igualmente essencial que esta e. Corte igualmente determine a suspensão dos
processos legislativos em curso perante assembleias legislativas e câmaras
municipais e que versem sobre projetos de lei tendentes a aplicar a redução de
parcelasdasemestralidadeouanuidadedevidasàsinstituiçõesdeensinosuperior
navigênciadeplanosdecontingênciadonovocoronavírus.
227. Subsidiariamente, caso este e. STF entenda pela impossibilidade de
suspensãodosprocessoslegislativosemcurso,pugna-separaquesejamsuspensos
osefeitosdoseventuaisatosnormativosproduzidosapartirdetaisprocessoseque
disponhamem igual sentidoacercada reduçãonasmensalidadescobradaspelas
instituiçõesdeensinoprivadas,atéulteriorjulgamentoporestae.Corte.
VII. CONCLUSÃOEPEDIDOS.
228. Por todo o exposto, a Arguente requer, em sede cautelar e diante da
extremaurgênciaeiminênciaderiscodelesãograve,queesteExmo.Relator,nos
termosdoartigo5º,§1ºdaLein.9.882/99,determine,adreferendumdoPlenário
destee.Corte:
63
a. a suspensãodosefeitosdedecisões judiciais e administrativasquetenhamaplicadoquaisquerdescontosàsparcelasdesemestralidadese anuidades devidas às instituições de ensino superior, pordecorrênciadosplanosdecontingênciadonovocoronavírus;
b. a suspensão das ações individuais e coletivas, bem como dosprocessos administrativos que versem sobre a imposição de taisdescontosnoensinosuperior,atéulteriordecisãodestee.STF;
c. subsidiariamente,nahipótesedeasuspensãointotumdasdecisõeseprocessos judiciais e administrativos não parecer adequada, asuspensão de seus efeitos com relação às instituições de ensinosuperior privado que tenham mantido a prestação do serviço deensino por meio de tecnologia da comunicação – nos termos daPortarianº343/2020doMEC,garantindo-seassimoregularacessoàeducação pelos estudantes e a manutenção da atividade dasinstituições.
d. Tambémsubsidiariamente,nahipótesedeasuspensãointotumdasdecisões e processos judiciais e administrativos não pareceradequada,asuspensãodeseusefeitoscomrelaçãoàsinstituiçõesdeensino superior privadas que não venham a reduzir o calendárioacadêmico de aulas anuais e semestrais nos termos da Lei deDiretrizeseBasesedosatosregulatóriosemanadosdoMinistériodaEducação,inclusivepormeiodetecnologiasdainformação.
e. adicionalmente e ainda em sede cautelar, que se determine asuspensãodosprocessos legislativosemcursoperanteassembleiaslegislativas e câmarasmunicipaisqueversemsobreprojetosde leitendentesaaplicarareduçãooumodificaçãonacobrançadeparcelasdasemestralidadeouanuidadedevidasàsinstituiçõesdeensinonavigênciadeplanosdecontingênciadonovocoronavírus.
f. Subsidiariamente,casoseentendapelaimpossibilidadedesuspensãodosprocessoslegislativosemcurso,quesejamsuspensososefeitosdoseventuaisatosnormativosproduzidosapartirdetaisprocessosequedisponhamemigualsentidoacercadareduçãonasmensalidadescobradaspelasinstituiçõesdeensinosuperiorprivadas,atéulteriorjulgamentoporestae.Corte.
64
229. Em sede de julgamento definitivo, requer-se inicialmente a oitiva dos
Tribunais de Justiça dosEstados, especialmentedeAlagoas, Bahia,MinasGerais,
MatoGrossodoSul,MatoGrosso,RiodeJaneiroeSãoPaulo;daCâmaraMunicipale
daPrefeiturasdosMunicípiosdeRecifeedeMuriaé,dasAssembleiasLegislativase
dosGovernadoresdosEstadosdoAmazonas,doPiauí,deGoiás,daBahia,doRio
GrandedoSul,doParaná,deSãoPauloedeMinasGerais,responsáveispelosatos
impugnados, bem como do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da
República.
230. Ainda, requer-se a intimação do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica–CADE,paraquesemanifestenestaADPFacercadosimpactosnegativos
daspolíticasdecontroledepreçossobreosistemabrasileirodelivreconcorrência,
nostermosdoartigo6º,§1ºdaLein.9.882/99.
231. Ao fim, requer-se seja julgada procedente a presente ADPF, para ver
reconhecidaaviolaçãoaospreceitosfundamentaisindicadosnestainicial,para:
a. Quesejadeclaradaaviolaçãoapreceitosfundamentais,quaissejam,(1) o princípio federativo; (2) o princípio da isonomia e da livreconcorrência; (3) o princípio da fundamentação das decisõesjudiciais; (4) o devido processo legislativo; (5) a proteção ao atojurídicoperfeitoeàsegurançajurídica;(6)aautonomiauniversitária;e (7) o princípio da proporcionalidade, em decorrência dainterpretação judicial extraída do conjunto de atos judiciais eadministrativosobjetodestaADPF,quepermiteouimpõeareduçãocompulsóriadeparcelasdasemestralidadeouanuidadedevidasaosestabelecimentos de ensino superior, na vigência dos planos decontingênciadonovocoronavíruseemdecorrênciadasmedidasdeisolamentosocialdeterminadaspelaUnião,EstadoseMunicípios.
b. Quesejadeclaradaaviolaçãoapreceitosfundamentais,quaissejam,(1) o princípio federativo; (2) o princípio da isonomia e da livreconcorrência; (3) o princípio da fundamentação das decisõesjudiciais; (4) o devido processo legislativo; (5) a proteção ao atojurídicoperfeitoeàsegurançajurídica;(6)aautonomiauniversitária;
65
e(7)oprincípiodaproporcionalidade,emdecorrênciadosprojetosde lei tendentes a impor reduções compulsórias sobre parcelas dasemestralidadeouanuidadedevidasaosestabelecimentosdeensinosuperior,navigênciadosplanosdecontingênciadonovocoronavíruseemdecorrênciadasmedidasdeisolamentosocialdeterminadaspelaUnião,EstadoseMunicípios.
c. Que seja fixada tese jurídica que, concessa venia, é proposta nos
seguintes termos: “É inconstitucional a imposição, por ato judicial,administrativo ou legislativo, de redução de mensalidades,semestralidades ou anuidades devidas às instituições de ensinosuperior privadas em razão das medidas de isolamento social esuspensão de aulas determinadas no âmbito do combate ao novocoronavírus”.
232. Subsidiariamente, caso se entenda não ser hipótese de declaração de
procedência totaldospedidosora formulados, requer-seseja julgadaprocedente
estaADPFparaafastarosefeitosdedecisões judiciaiseadministrativas,alémde
eventuaisatosnormativosoriundosdoprojetosdeleijáapontadoscomrelaçãoàs
instituiçõesdeensinosuperiorprivadoquetenhammantidoaprestaçãodoserviço
de ensino por meio de tecnologia da comunicação – nos termos da Portaria nº
343/2020doMECoudaregulaçãovigente;bemcomoàsinstituiçõesdeensinoque
não venham a reduzir o calendário acadêmico de aulas anuais e semestrais nos
termosdaLeideDiretrizeseBasesedosatosregulatóriosemanadosdoMinistério
daEducação,inclusivepormeiodetecnologiasdainformação.
233. Nahipótesedeacolhimentodopedidosubsidiáriosupra,quesejafixada
tese jurídica que, concessa venia, é proposta nos seguintes termos: “É
inconstitucional a imposição de redução sobre as mensalidades devidas às
instituições de ensino superior privadas que, durante asmedidas de isolamento
socialdecorrentesdapandemiadaCOVID-19,mantiveramaprestaçãodoserviçode
ensino pormeio de tecnologia da comunicação ou que não venham a reduzir o
calendárioacadêmicodeaulasanuaisesemestraisnostermosdaLeideDiretrizes
eBasesedosatosregulatóriosemanadosdoMinistériodaEducação”.
66
234. Por fim, requer-se a juntada dos instrumentos de procuração e
substabelecimento anexos (Doc. 2), bem como que sejam todas as intimações
realizadas em nome de Flavio Galdino eWallace Corbo, advogados inscritos na
OAB/RJ,respectivamente,sobosnº94.605e186.442.
Nestestermos,Pedemdeferimento.
RiodeJaneiro,2dejulhode2020.
FLAVIOGALDINOOAB/RJn.94.605
FELIPEBRANDÃOOAB/RJN.163.343
WALLACECORBOOAB/RJn.186.442
FERNANDADAVIDOAB/RJn.201.982
JORGELUISDACOSTASILVAOAB/RJn.230.048
67
RELAÇÃODEDOCUMENTOS
Doc.1 AtosconstitutivosdaANUP
Doc.2 Procuraçãoesubstabelecimentos
Doc.3 RelaçãodeassociadosdaANUP
Doc.4 Decisões judiciais que tratam de redução das prestações devidas às
instituiçõesprivadasdeensinonoperíododapandemiadocoronavírus
Doc.5 Levantamentodemonstrativodacontrovérsiajurisprudencial
Doc.6 Decisões proferidas em processos administrativos que tratam de
reduçãodasprestaçõesdevidasàs instituiçõesprivadasdeensinono
períododapandemiadocoronavírus
Doc.7 Projetosdeleiquedispõemsobreareduçãodasprestaçõesdevidasàs
instituiçõesprivadasdeensinonoperíododapandemiadocoronavírus
Doc.8 Relatório da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro sobre a
inconstitucionalidadedoProjetodeLeinº1744/2020
Doc.9 VetodoPrefeitodeJuizdeFora/MGaoProjetodeLeinº30/2020
Doc.10 NotaTécnicanº14/2020/CGEMM/DPDC/SENACON/MJ
Doc.11 NotaTécnicanº26/2020/CGEMM/DPDC/SENACON/MJ
Doc.12 NotaTécnicadoConselhoAdministrativodeDefesaEconômica–CADE
Doc.13 NotaPública3ªCCRnº1,de12demaiode2020