Ética prática

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  • 8/19/2019 Ética prática

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    Ética prática

    Faustino Vaz

    Escola Secundária de Manuel Laranjeira, Espinho

    1. Da infância à maturidade

     A tica prática uma disciplina recente. É apenas no in!cio dos

    anos setenta "ue lan#ada a primeira re$ista e pu%licada a

    primeira antolo&ia de tica prática. 'a altura, estes sinais de

    $ida n(o transformaram su%itamente esta disciplina numapossi%ilidade acadmica sria. 'o entanto, errado pensar

    "ue a tica prática n(o fa) parte de uma lon&a tradi#(o.

    *il+sofos &re&os e romanos discutiram como ha$emos de $i$er

    e morrer de maneira muito concreta. *il+sofos medie$ais

    tentaram sa%er se errado matar em "ual"uer circunstância,

    "ual a tica do a%orto e "uando a &uerra justificá$el. umedefendeu o suic!dio num dos seus ensaios. -ant, por sua $e),

    escre$eu so%re como alcan#ar a pa) perptua e discutiu os

    de$eres em rela#(o aos animais. Mais tarde, os fil+sofos

    utilitaristas do sculo / dedicaram0se seriamente à discuss(o

    de pro%lemas como a li%erdade de epress(o e a

    discrimina#(o seual.

     As dcadas de sessenta e setenta foram, sem d2$ida, um

    tempo prop!cio ao ressur&imento da tica prática. 'os anos

    sessenta, a uni$ersidade n(o escapa aos de%ates intensos "ue

    percorrem a cultura popular. '(o dif!cil adi$inhar os temas

    "ue anda$am no ar "ue se respira$a. A 3uerra do 4ietname, a

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    discrimina#(o racial e seual, o a%orto e a de&rada#(o do

    am%iente n(o deia$am indiferente a uni$ersidade. Dada a sua

    importância, sentia0se a necessidade de uma discuss(o

    ri&orosa destas "uest5es. Muitos desconfia$am

    do pedigree filos+fico da tica prática. Mas a $erdade "ue

    nin&um se atre$ia a ne&ar a atrac#(o "ue eercia so%re a sala

    de aula.

    '(o eram estes os 2nicos factores "ue torna$am o tempo

    prop!cio. Al&umas mudan#as si&nificati$as na filosofia

    concorreram tam%m para a afirma#(o da tica prática. 6s

    fil+sofos deiaram de se restrin&ir à análise da lin&ua&em

    moral. 7á n(o interessa$a apenas sa%er "ual o sentido dos

    termos morais ou as condi#5es de $erdade dos ju!)os morais,

    se "ue as há. A metatica deia$a assim de ocupar toda a

    tica filosoficamente sria. E, da o%scuridade, reemer&ia a

    tica normati$a. Esta mudan#a foi &eral, o "ue lhe deu mais

    impacto8 os fil+sofos passaram a ter uma concep#(o mais

    a%erta da sua acti$idade do "ue nos anos "uarenta e

    cin"uenta.

    Este conteto &erou no$as epectati$as em rela#(o aos

    fil+sofos morais. Alm da análise da lin&ua&em moral,

    espera$a0se "ue apresentassem teorias normati$as. '(o

    %asta$a apenas di)er "ue sentido tinham os termos 9%em9 ou

    9certo9, por eemplo. Era tam%m preciso di)er "ue ac#5es

    esta$am certas e o "ue era fa)er o %em. De um modo &eral,

    estas teorias procura$am di)er "ue ac#5es de$eriam ser

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    renunciaram a "ual"uer distin#(o r!&ida entre os tr=s n!$eis de

    discuss(o tica. /ndirectamente, a discuss(o de tica prática

    pode le$ar a mudan#as nas teorias metaticas so%re o sentido

    dos termos morais e a nature)a dos ju!)os morais. 6 campo da

    tica está hoje unificado. A tica prática parece ter os ps %em

    assentes nos cursos de filosofia. A confirmá0lo está o facto de

    os melhores departamentos de filosofia no mundo de l!n&ua

    in&lesa serem %ons ou ecelentes em tica prática.

    >. A nature)a da tica prática

     Ad"uirida a maturidade, a tica prática re2ne as "ualidades da

    %oa filosofia. É clara, informada e cuidadosa na ar&umenta#(o.

     Acima de tudo, prefere afirma#5es sujeitas a restri#5es a

    &randes proclama#5es. A discuss(o do a%orto disso um

    eemplo. 6s melhores ensaios so%re este pro%lema n(o fa)emafirma#5es fortes pr+0$ida ou pr+0escolha.

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    ?. A discuss(o em tica prática

    ?.1. A importância moderada das intui#5es

     As intui#5es t=m al&uma importância em tica prática. É "uase

    irresist!$el o recurso a intui#5es morais para testar respostas

    aos mais di$ersos pro%lemas. Mas essa importância n(o de$e

    ser ea&erada. As intui#5es n(o podem ser usadas como

    testes às nossas respostas e teorias. /sso seria fa)er delas a

    2ltima pala$ra so%re a $erdadeira resposta à justi#a econ+mica,

    ao estatuto dos animais n(o humanos, à li%erdade de

    epress(o ou ao suic!dio medicamente assistido. '(o há

    d2$ida "ue o procedimento seria fácil e c+modo, mas pouco

    fiá$el. @om efeito, nin&um intui a $erdadeira resposta para

    pro%lemas t(o dif!ceis.

    Mesmo remo$idos os 9factores estranhos9 "ue as influenciam,

    as intui#5es de$em ser usadas com cuidado. @omo

    ferramentas epistmicas, o seu papel limitado. Em $e) de

    aceites como as principais ra)5es a fa$or de uma posi#(o, as

    intui#5es de$em apenas ser usadas como eemplos para

    eplicar essa posi#(o. 6 ajustamento rec!proco entre intui#5es

    e teorias 0 o e"uil!%rio reflectido 0 tem a $irtude de tornar

    saliente a necessidade de um conhecimento emp!rico mais

    se&uro e de teorias mais cuidadosas. ;oda$ia, n(o tem a

    capacidade de produ)ir respostas para pro%lemas de tica

    prática.

    ?.>. A importância central do conhecimento emp!rico

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    m conhecimento emp!rico s+lido essencial a uma %oa

    discuss(o de "uest5es ticas. Alm de essencial, o

    conhecimento emp!rico influencia decisi$amente essa

    discuss(o. 6 facto de as respostas filos+ficas dependerem

    desse conhecimento hoje reconhecido sem pro%lemas pelos

    especialistas em tica prática.

    6 conhecimento emp!rico decisi$o por duas ra)5es. Em

    primeiro lu&ar, n(o %asta "ue a tica prática di&a "ue ac#5es

    correctas as pessoas e as estruturas institucionais t=m à sua

    disposi#(o. :ara "ue seja seriamente discutida, tam%m

    preciso "ue o fa#a de maneira informati$a. /sto s+ acontece se

    for poss!$el sa%er "uando e de "ue modo uma certa resposta a

    um pro%lema rele$ante para os indi$!duos e as institui#5es.

     Al&uns eemplos podem ser 2teis8 1B no caso de n(o seconhecer as circunstâncias e factores da po%re)a e da fome,

    n(o poss!$el apresentar uma resposta tica informati$a para

    o pro%lema da justi#a econ+micaC >B no caso de n(o se

    conhecer a eficácia dos actuais meios de controlo dos cidad(os

    pelos Estados, n(o poss!$el apresentar uma resposta tica

    informati$a para o pro%lema da pri$acidadeC ?B no caso de n(o

    se conhecer as causas e circunstâncias do sofrimento animal,

    n(o poss!$el apresentar uma resposta tica informati$a para

    o pro%lema do estatuto moral dos animais.

    Em se&undo lu&ar, o conhecimento emp!rico influencia a tica

    prática de duas maneiras. :or um lado, dá conte2do aos

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    princ!pios morais. Sem conte2do emp!rico s+lido, os princ!pios

    morais arriscam0se a n(o passar de proclama#5es respeitá$eis.

    :or eemplo, o conhecimento da importância psicol+&ica da

    autonomia fornece apoio à resposta para o pro%lema da

    pri$acidade se&undo a "ual as pessoas t=m direitos "ue n(o

    s(o ne&ociá$eis.

    :or outro, asse&ura "ue a posi#(o defendida n(o um refleo

    inconsciente do status "uo moral. @om efeito, se n(o

    conhecermos as circunstâncias, factores, causas e efeitos de

    um certo pro%lema, n(o seremos capa)es de a$aliar

    racionalmente as práticas correntes. 'esse caso, a defesa do

    status "uo, ainda "ue inconsciente, torna0se mais pro$á$el. Em

    &eral, o conhecimento e a eperi=ncia com%atem o preconceito

    e o e&o!smo, le$ando0nos a repensar as respostas morais

    comuns. 6s nossos alunos, infeli)mente, por $e)es compro$am

    a necessidade de al&um conhecimento de economia, das

    estruturas sociais, da psicolo&ia humana e das institui#5es

    pol!ticas.

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    correcta para um pro%lema de tica prática deri$aria de uma

    teoria normati$a em conjun#(o com a descri#(o das

    circunstâncias efecti$as. A deli%era#(o produ)ida no n!$el da

    tica prática estaria dependente da correc#(o da teoria

    normati$a. 'esse caso, a teoria normati$a ditaria a ac#(o

    apropriada a respeito de uma "uest(o prática.

     A epress(o 9Ética aplicada9 n(o su&ere apenas "ue a tica

    prática estaria dependente da tica normati$a. Su&ere tam%m

    "ue a tica normati$a seria independente da tica prática. /sto

    "uer di)er "ue a correc#(o de uma teoria normati$a n(o tem a

    $er com a solu#(o "ue apresenta para um pro%lema de tica

    prática. 'o entanto, pensar desta maneira hoje $isto como

    implaus!$el. @om efeito, se tal solu#(o contra0intuiti$a ou

    empiricamente du$idosa, a teoria normati$a sujeita a

    correc#5es ou simplesmente a%andonada.

     A rela#(o entre tica normati$a e tica prática , portanto, de

    interdepend=ncia. Mais uma $e), al&uns eemplos podem ser

    2teis8 uma solu#(o conse"uencialista para o suic!dio

    medicamente assistido pode ser eplicada por intui#5es morais

    %ásicas e apoiada por um conhecimento emp!rico s+lido do

    pro%lemaC mas uma solu#(o conse"uencialista para o

    pro%lema da justi#a econ+mica pode enfrentar srios

    pro%lemas à lu) das intui#5es morais e do conhecimento

    emp!rico rele$ante. ma solu#(o deontol+&ica para o pro%lema

    da li%erdade de epress(o pode ter a seu fa$or as intui#5es e o

    conhecimento emp!ricoC mas uma solu#(o i&ualmente

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    deontol+&ica para o pro%lema da justi#a retri%uti$a pode n(o ter 

    a mesma sorte.

    Eemplos destes mostram "ue a refle(o ao n!$el da tica

    prática tem implica#5es srias ao n!$el da tica normati$a.

    'este sentido, um erro admitir "ue a teoria e a prática

    condu)em a refle5es separadas. :or um lado, uma teoria

    normati$a, se "uer ser plaus!$el, terá de entender como pode

    ser desen$ol$ida perante pro%lemas práticos. :or outro, se a

    tica prática "uer ser uma refle(o sria e cuidada aca%ará por

    ter necessidade de se apoiar numa teoria normati$a mais &eral.

    Dada a sua importância, $eremos a se&uir este 2ltimo aspecto

    da tica prática.

    .1. A tica prática e a necessidade de uma teorianormati$a

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    Esta a$alia#(o cr!tica das cren#as morais fa)0se, em &eral, a

    partir de "uest5es práticas. Assim, "uando se procede a uma

    refle(o sria, clara, informada e sistemática acerca de

    "uest5es como o a%orto, a fome ou a de&rada#(o am%iental,

    de tica prática "ue se trata. Esta refle(o condu) a discuss5es

    de n!$el mais ele$ado. Discutir o pro%lema particular do a%orto

    n(o se limita a uma discuss(o prática. :ara justificar uma certa

    op#(o perante o a%orto necessário reflectir so%re o estatuto

    moral do feto. Esta refle(o implica "ue se identifi"ue umprinc!pio normati$o &eral, "ue mais n(o do "ue um critrio

    moral rele$ante para decidir nos mais $ariados casos, e n(o s+

    no caso do a%orto. 6 mesmo acontece "uando se discute o

    pro%lema da justi#a econ+mica, ou "ual"uer outro pro%lema de

    tica prática. Sa%er se uma distri%ui#(o i&ualitária do

    rendimento a melhor solu#(o para o pro%lema implica, entreoutras coisas, ter um critrio moral &eral "ue permita sa%er "ue

    importância moral tem a i&ualdade.

    /sto "uer di)er "ue a tica prática está comprometida com

    teorias ticas de n!$el mais ele$ado. Essas teorias ticas

    esta%elecem princ!pios normati$os &erais. É com %ase nestesprinc!pios "ue, em 2ltima instância, s(o justificadas decis5es

    práticas. Esta necessidade de teoria tenta primariamente e$itar

    tr=s erros comuns nas deli%era#5es práticas.

    .>. ;r=s erros comuns nas deli%era#5es práticas "ueuma teoria normati$a pode tentar e$itar 

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    sar princ!pios ticos inconsistentes o primeiro erro comum

    "ue uma %oa teoria tica tenta e$itar. A consist=ncia um

    re"uisito da moralidade. Se al&um defende, ao mesmo tempo,

    "ue a li%erdade de epress(o implica tolerar o erro e "ue

    de$erá ha$er uma comiss(o do Estado "ue 9purifi"ue9 a

    informa#(o jornal!stica de erros e imprecis5es, essa pessoa

    n(o está a ser consistente. :or essa ra)(o, a posi#(o "ue

    defende terá de ser rejeitada, ou ent(o su%stancialmente

    alterada.

    6 se&undo erro a e$itar consiste na adop#(o de uma teoria

    tica incorrecta. A moralidade n(o ei&e apenas consist=ncia.

    ma teoria tica correcta tam%m uma das suas condi#5es

    necessárias. Sem uma teoria tica correcta n(o poss!$el

    captar as propriedades morais rele$antes das ac#5es. Deste

    modo, a capacidade de formular ju!)os morais s+lidos fica

    seriamente comprometida. ;er princ!pios normati$os correctos

    ter critrios "ue determinam o "ue moralmente rele$ante.

    '(o %asta ser consistente e ter uma %oa teoria tica. m

    terceiro erro comum consiste em aplicar mal uma teoria

    consistente e %oa. /sto acontece por"ue n(o se está

    suficientemente informado acerca das alternati$as poss!$eisC

    ou por"ue n(o se está suficientemente atento aos interesses e

    necessidades dos en$ol$idos na ac#(oC ou por"ue n(o se está

    suficientemente moti$ado para suportar as complica#5es "ue o

     ju!)o moral apropriado acarretaC ou por"ue n(o se tem as

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    compet=ncias pessoais e $er%ais para aplicar ade"uadamente

    a teoria.

    Estes erros mostram a necessidade de ter uma %oa teoria

    normati$a "uando se deli%era acerca de "uest5es práticas.

    Mas, se pode tentar e$itar estes erros, uma %oa teoria n(o

    pode tentar e$itar o desacordo. '(o esse o seu papel.

    .?. 6 "ue uma teoria normati$a n(o pode tentar e$itar 

     Apesar de 2til, uma %oa teoria normati$a n(o tem, nem pode

    ter, o papel de e$itar o desacordo. Diferentes pessoas podem

    ter ra)5es s+lidas para defender diferentes teorias normati$as.

    /sto condu) a um desacordo nos critrios para determinar o

    "ue moralmente rele$ante nas ac#5es. :ode ainda ha$er

    desacordo por"ue, apesar de defenderem as mesmas teorias,

    diferentes pessoas interpretam ou aplicam de maneira diferente

    os seus critrios morais. 'ada tem de estranho ou du$idoso

    "ue duas pessoas i&ualmente decentes e racionais, ainda "ue

    partilhem a mesma teoria normati$a, che&uem a conclus5es

    diferentes so%re as caracter!sticas morais de uma ac#(o. Assim

    como nada tem de estranho ou du$idoso "ue duas pessoas

    i&ualmente decentes e racionais, ainda "ue perfilhem teorias

    diferentes, che&uem às mesmas conclus5es so%re as

    caracter!sticas morais de uma ac#(o. :or eemplo, um

    defensor de uma tica deontol+&ica e um defensor de uma

    tica conse"uencialista podem ter a mesma posi#(o so%re a

    ac#(o afirmati$a e dois defensores de uma tica deontol+&icapodem ter posi#5es diferentes.

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    Este facto tem duas $irtudes. Em primeiro lu&ar, relem%ra "ue

    as deli%era#5es práticas n(o s(o o resultado da aplica#(o

    mecânica de uma teoria normati$a &eral em conjun#(o com as

    circunstâncias da ac#(oC neste sentido, as teorias normati$as

    n(o determinam eactamente como cada um irá a$aliar uma

    "uest(o particular de tica prática. Em se&undo lu&ar, su%linha

    a necessidade de a$alia#(o permanente das escolhas e ra)5es

    de cada um dos interlocutores no de%ate cr!tico. *eli)mente, as

    "uest5es de tica prática n(o permitem duas coisas8 n(opermitem decidir com certe)a "ue ac#(o a melhor, mas

    tam%m n(o permitem di)er "ue $ale tudo. /sso seria ficar

    refm de uma concep#(o forte de conhecimento se&undo a

    "ual uma cren#a $erdadeira justificada s+ conhecimento se

    for infal!$el. *eli)mente, a situa#(o outra. 'a $erdade,

    poss!$el sa%er com relati$a se&uran#a "ue ju!)os morais s(oimplaus!$eis, ou "ue teorias normati$as s(o fracas. So%retudo

    em tica prática, o de%ate cr!tico n(o oferece certe)as. Em

    troca, oferece a possi%ilidade de sa%er "ue teorias e ju!)os

    resistiram melhor a uma a$alia#(o ri&orosa dos seus mritos.

    . 6 mapa da tica prática

    .1. A emer&=ncia de su%disciplinas dentro da ticaprática

    É, pelo menos, francamente dif!cil encontrar al&um "ue

    domine todo o campo da tica prática. Em &eral, a"ueles "ue

    tra%alham em tica prática s(o especialistas numa das suas

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    su%disciplinas. A emer&=ncia destas especialidades um sinal

    claro de maturidade profissional.

     As especialidades mais fortes s(o a tica mdica Fa&ora mais

    conhecida como %ioticaB, a tica empresarial e a tica

    am%iental. Mas há outras especialidades no$as em

    crescimentoC o caso da tica jornal!stica, da tica le&al e da

    tica da in$esti&a#(o. /sto reflecte uma tend=ncia &eral para o

    desen$ol$imento de ticas profissionais.

     A prolifera#(o de especialidades comporta riscos. m deles,

    tal$e) o mais srio, o de pensar "ue um pro%lema de tica

    am%iental pode ser satisfatoriamente resol$ido i&norando a sua

    rela#(o com pro%lemas de áreas diferentes. Este risco

    contradit+rio com o reconhecimento de "ue n(o há uma

    distin#(o r!&ida entre os tr=s n!$eis de refle(o tica.

    .>. 3randes áreas da tica prática

     A maturidade profissional de uma disciplina tam%m se

    manifesta numa or&ani)a#(o cuidadosa das suas áreas de

    refle(o. Esta or&ani)a#(o depende de ra)5es epistmicas e

    didácticas, como se $erá facilmente. Em todo o caso, n(o estáisenta de al&uma ar%itrariedade.

     Assim, as &randes áreas de refle(o e seus temas s(o as

    se&uintes8

    • 4ida e morte Feutanásia, a%orto, animais, pena de morte e

    &uerraB

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    • 4ida pessoal Ffam!lia e tecnolo&ia reproduti$a, seualidade,

    amor e $irtudesB

    • Li%erdade e i&ualdade Fli%erdade de epress(o e reli&i(o,

    pri$acidade, multiculturalismo, paternalismo le&al, justi#a

    econ+mica, justi#a inter&eracional, puni#(o, discrimina#(o

    seual e de &nero, discrimina#(o racial, ac#(o afirmati$a,

    defici=ncia e responsa%ilidade empresarialB

    7usti#a e rela#5es internacionais Fimi&ra#(o, autonomianacional, justi#a econ+mica internacional, am%iente e fomeB

    .?. :ro%lemas de tica prática

    @omo sa%emos, as &randes áreas de refle(o da tica prática

    est(o sujeitas a op#5es moralmente rele$antes. Sa%er "ual a

    melhor op#(o le$anta pro%lemas espec!ficos. Estes pro%lemass(o considerados can+nicos. 'enhuma antolo&ia de tica

    prática respeitada os i&nora. /remos a&ora formular al&uns

    desses pro%lemas.

    • Eutanásia: De$em as pessoas, especialmente a"uelas "ue

    sofrem terri$elmente de doen#as terminais, ter o poder de pGr

    termo às suas $idasH 'o caso de terem, será "ue podem

    apressar as suas mortes apenas atra$s da recusa de

    tratamento mdico, ou tam%m atra$s de medidas acti$asH

    'o caso de poderem tomar medidas acti$as, será "ue podem

    pedir a assist=ncia de outrosH A "uem podem pedir

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    assist=ncia8 Ao marido ou mulherH A ami&os !ntimosH A

    mdicosH

    • Aborto: Será o a%orto moralmente correctoH Ainda "ue seja

    moralmente incorrecto, será "ue moralmente permiss!$elH

    Será "ue o direito de a%ortar pode apoiar0se no direito da m(e

    à autonomia, ou em outro direito "ue possa terH

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    &uerra tem justifica#(o, "ue limites há para o modo como

    condu)idaH Ser(o estes limites à sua condu#(o uma condi#(o

    necessária de uma &uerra justaH 6u será "ue há justifica#(o

    para i&norar estes limites "uando sur&em situa#5es etremasH

    • Família e tecnologia reprodutiva: 6 "ue de$em as crian#as

    crescidas aos seus paisH ;=m os pais o%ri&a#5es especiais

    em rela#(o aos seus filhosH 6u, dito de outro modo, t=m os

    pais o%ri&a#5es em rela#(o aos seus filhos "ue n(o t=m em

    rela#(o a outras crian#as, ou às crian#as em &eralH Será a

    m(e de alu&uer parte da fam!liaH Será "ue o alu&uer,

    especialmente se contratual ou comercial, trata os %e%s

    como %ens, ne&ando desse modo al&uns $alores da rela#(o

    pai0filhoH @onstituiria uma s+ pessoa e a sua descend=ncia

    clonada uma fam!liaH Admitindo "ue os pais n(o "uerem ter

    mais filhos, o "ue de$e ser feito com os +$ulos fertili)ados

    ecedentesH Será o em%ri(o ecedente o e"ui$alente moral a

    san&ue ou ca%eloH 6u terá o estatuto moral de uma pessoaH

    a$erá al&uma diferen#a moral entre o em%ri(o "ue reside

    num recipiente de la%orat+rio e o em%ri(o "ue reside num

    2teroH

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    or&anismo passa a eistirH

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    "ue podemos di)er pu%licamenteH Será le&!timo restrin&ir a

    li%erdade de epress(o apenas "uando essa li%erdade

    claramente causa dano a outrosH Se sim, "uando "ue a

    li%erdade de epress(o causa dano a outrosH :oderá a

    li%erdade de epress(o ser $iolada com %ase em

    considera#5es de utilidade socialH É a li%erdade de epress(o

    uma fun#(o na %alan#a de custos e %enef!ciosH Será "ue o

    mesmo acontece com a li%erdade de reli&i(oH De$erá a

    li%erdade de reli&i(o ser encarada como uma li%erdade %ásicaindependente "ue merece protec#(o especialH 6u de$erá

    antes ser encarada como uma forma de li%erdade de

    consci=ncia tal como muitas doutrinas secularesH

    • Privacidade: ;er(o as $árias formas de pri$acidade um $alor

    positi$oH

  • 8/19/2019 Ética prática

    20/22

    • Fome: ;eremos a o%ri&a#(o de fa)er mais do "ue n(o causar

    dano a estran&eirosH De$eremos alimentar as crian#as "ue

    passam fome no Iuanda ou promo$er o desen$ol$imento

    econ+mico do Sene&alH Se sim, "uanto de$eremos n+s

    ajudar, e em "ue circunstânciasH

    • !usti"a econ#mica internacional:

  • 8/19/2019 Ética prática

    21/22

    :arece0nos "ue esta uma amostra se&ura da fascinante

    ri"ue)a dos de%ates "ue s(o condu)idos na disciplina de tica

    prática. De se&uida, iremos comparar o mapa da tica prática

    aca%ado de tra#ar com o ponto da unidade // do pro&rama de

    filosofia do ensino secundário.

    K. A tica prática no ensino secundário

    /nfeli)mente, o pro&rama do ensino secundário i&nora dcadas

    de tra%alho e de%ate entre fil+sofos especiali)ados em tica

    prática. 6 ponto 9;emasJpro%lemas do mundo contemporâneo9

    n(o enuncia "ual"uer pro%lema can+nico de tica prática. E,

    "uanto a temas, apenas o primeiro, o terceiro e o "uinto se

    aproimam de temas de tica prática, o "ue pouco. :or isso,

    o pro&rama eprime uma a%orda&em claramente limitada da

    tica prática.

     A fascinante ri"ue)a do de%ate em tica prática assim

    i&norada no "ue o pro&rama eplicitamente enuncia. 'o

    entanto, poss!$el, feli)mente, tratar "ual"uer pro%lema

    &enu!no de tica prática no "ue o pro&rama n(o enuncia.

     Assim, a indica#(o 9outros9, "ue aparece no fim da lista de

    temas, permite "ue cada professor tenha a li%erdade de tratar a

    seu &osto este ponto do pro&rama. A situa#(o actual re$ela "ue

    há cada $e) mais materiais "ue respeitam os pro%lemas e

    de%ates de tica prática. Mas esse um mrito do tra%alho

    indi$idual dos professores, e n(o do pro&rama.

  • 8/19/2019 Ética prática

    22/22

     Apesar desta melhoria, o "ue há para fa)er imenso. A

    realidade da edi#(o nacional está muito distante da

    eu%erância da tica prática. A $erdade "ue n(o há "ual"uer

    antolo&ia &eral de tica prática em l!n&ua portu&uesa. á

    apenas uma ecelente antolo&ia de tica do a%orto. :or

    en"uanto, teremos de ser n+s a fa)er o tra%alho "ue os

    editores consideram demasiado arriscado. ;radu)indo e

    adaptando ensaios e li#5es so%re os pro%lemas de tica

    prática. Seria uma pena "ue &rande parte dos interessantespro%lemas desta disciplina continuasse ausente da discuss(o

    com os nossos alunos.

    Faustino Vaz

    ffs$a)&mail.com

    Iefer=ncias3al$(o, :edro For&.B, A Ética do Aborto, Lis%oa8 Dinali$ro, >.

    onderich, ;ed Fed.B, The Oxford Companion to Philosophy, 6ford8 6ford ni$ersitN:ress, 1OO.

    La*ollette, u&h For&.B, Ethics in Practice, Londres8 PlacQRell, >>, >. ed.

    La*ollette, u&h Fed.B, The Oxford Handbook of Pratical Ethics, 6ford8 6fordni$ersitN :ress, >?.

    Iachels, 7ames, Elementos de Filosofia oral, Lis%oa8 3radi$a, >

    Sin&er, :eter Fed.B, A Companion to Ethics, Londres8 PlacQRell, 1OO1.

    Sin&er, :eter, Ética Pr!tica, Lis%oa8 3radi$a, >>, >. ed.

    @omunica#(o apresentada no .T Encontro 'acional de :rofessores de *ilosofia da Sociedade:ortu&uesa de *ilosofia F1 de Setem%ro de >UB

    mailto:[email protected]:[email protected]