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Os artigos de investigação do Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior Técnico (CEG-IST) destinam-se a divulgar os resultados da investigação realizada pelos seus membros. The working papers of the Centre of Management Studies of IST (CEG-IST) are aimed at making known the results of research undertaken by its members. Pedidos de informação sobre estes artigos, ou relativos a investigação feita pelo Centro devem ser enviados para: Enquiries about this series, or concerning research undertaken within the Centre should be sent to: Presidente do CEG-IST Instituto Superior Técnico Av. Rovisco Pais, 1049-001 Lisboa Portugal e-mail: [email protected] Artigo de Investigação / Working Paper ISSN 1646-2955 Nº 3/2010 Estruturação de Modelos de Análise Multicritério de Problemas de Decisão Pública Carlos A. Bana e Costa e Euro Beinat

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Os artigos de investigação do Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior Técnico (CEG-IST) destinam-se a divulgar os resultados da investigação realizada pelos seus membros. The working papers of the Centre of Management Studies of IST (CEG-IST) are aimed at making known the results of research undertaken by its members. Pedidos de informação sobre estes artigos, ou relativos a investigação feita pelo Centro devem ser enviados para: Enquiries about this series, or concerning research undertaken within the Centre should be sent to: Presidente do CEG-IST Instituto Superior Técnico Av. Rovisco Pais, 1049-001 Lisboa Portugal e-mail: [email protected]

Artigo de Investigação / Working Paper

ISSN 1646-2955

Nº 3/2010

Estruturação de Modelos de Análise

Multicritério de Problemas de Decisão Pública

Carlos A. Bana e Costa e Euro Beinat

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Estruturação de Modelos de Análise Multicritério de Problemas de

Decisão Pública

Carlos A. Bana e Costa e Euro Beinat

1. Introdução

O tema deste trabalho é a estruturação de modelos multicritério de apoio à decisão pública em problemas complexos, e geralmente mal definidos, que envolvem pontos de vista múltiplos. A estruturação adequada permite estabelecer uma linguagem comum de argumentação e discussão das perspectivas e pontos de vista defendidos pelos diversos actores intervenientes, facilitando e estimulando a geração de novas oportunidades de decisão e alternativas de escolha tendentes a ultrapassar divergências de pontos de vista.

Tecnicamente, do processo de estruturação deve resultar uma base operacional bem definida para ajudar o analista a ajudar o decisor e demais actores a identificar os pontos de vista fundamentais e a operacionalizar os critérios para avaliar os impactos das opções e comparar os seus prós e contras. Decomporemos a estruturação em actividades relacionadas com (1) a definição do problema, (2) a estruturação do modelo e (3) a análise dos impactos, isto é, a estimação das consequências da eventual execução de cada uma das opções consideradas.

Na definição do problema, identificam-se as características principais do contexto de decisão, estabelecem-se o âmbito e os limites de análise, identificam-se os actores envolvidos e suas principais motivações e objectivos e tipificam-se as opções potenciais que constituem o ponto de aplicação da análise. O ponto de partida para a interacção com os actores é a questão «qual é o problema?» (cf. Rosenhead, 1996). No fim desta actividade, o analista deve estar «em posição de sugerir e descrever ao decisor os benefícios que uma estratégia analítica terá. A escolha do tipo de estratégia analítica é parte da estruturação do problema» (Buede, 1986).

Muitas vezes, o problema apresenta-se tão mal definido que não é fácil ao analista identificar que tipo de modelo de apoio à decisão deve adoptar. Dever-se-á concentrar na modelação da complexidade decorrente de objectivos múltiplos ou em modelar a incerteza, ou ambas as dimensões? Deve-se criar um modelo para comparar as opções ou para avaliar o valor intrínseco de cada uma delas, ou as duas coisas? Esta última pergunta introduz a questão essencial de saber qual é a «problemática do apoio à decisão» (cf. Bana e Costa, 1993 e 1996). Para muitos autores, o apoio à decisão consiste simplesmente em ajudar o decisor a escolher a melhor de várias opções. Mas, tal como Bernard Roy (1985) salientou, existem outras problemáticas possíveis no apoio à decisão, diferentes da simples escolha, como sejam a priorização de acções potenciais ou a sua alocação a categorias pré-definidas. Inspirado pelas ideias de Roy, Bana e Costa (1996) propôs a distinção entre as duas problemáticas básicas, a avaliação

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comparativa (incluindo a escolha da melhor opção, a escolha de um pequeno número de opções, a escolha sucessiva e a priorização) e a problemática da avaliação intrínseca (incluindo problemas de triagem ou alocação a categorias).

Todas as questões anteriores são importantes para a definição do problema, obtendo-se informação suficiente para escolher o tipo de estratégia analítica. Este artigo concentra-se apenas na estruturação de modelos de análise multicritério de problemas complexos em que a modelação explícita da incerteza não seja um requisito. O texto é uma revisão de parte original em inglês (Bana e Costa e Beinat, 2005). Começa por introduzir o conceito de unidade de política, que generaliza o conceito de actor ou agente de decisão e ajuda a descrever os conflitos em situações típicas de decisão pública. Em seguida, distingue três quadros operacionais: estruturação em grupo, individual e mista. A noção de ponto de vista é então introduzida e as características de uma família coerente de pontos de vista fundamentais serão amplamente discutidas. Define depois o que é um descritor de impactos, distinguindo entre descritores naturais, proxy e construídos, e propor métodos para seleccionar e construir descritores multidimensionais, discutindo boas práticas operacionais de estruturação, designadamente a definição de níveis de referência de valor intrínseco (Bom e Neutro).

2. Unidades de política

Uma unidade de política é uma construção metodológica para generalizar o conceito clássico de agente de decisão e distinguir entre vários níveis de intervenção e/ou escalas espaciais. A unidade política (UP) é definida como um indivíduo ou grupo com uma perspectiva coerente sobre o problema, caracterizada por defender um conjunto específico de pontos de vista e estar interessada num conjunto específico dos impactos, parcial ou totalmente diferentes de outras UP. As UP podem ser decisores institucionais, grupos de interesse, órgãos administrativos ou políticos que representam áreas (por exemplo, nações, regiões, províncias, municípios, freguesias) e assim por diante. Embora sejam muitas vezes o fruto de acordos institucionais decorrentes de uma política e tomada de decisão públicas, para efeitos deste artigo as UP são caracterizadas por uma perspectiva coerente, independentemente da afiliação ou da posição na hierarquia de decisão.

As UP são um conceito muito útil na tomada de decisão pública que envolva o uso do solo e/ou recursos espacialmente distribuídos. Por exemplo, a multiplicidade de actores envolvidos directa e indirectamente em qualquer decisão de política pública cria uma situação em que podem surgir conflitos, que têm, frequentemente, uma dimensão espacial clara: surgem entre os diferentes grupos de interesse em qualquer local, como por exemplo entre utilizadores e não utilizadores de uma nova infra-estrutura de transporte. Também surgem entre dois grupos semelhantes em locais diferentes, por exemplo, entre os utilizadores que serão beneficiários em diferentes graus da nova infra-estrutura, ou, ainda, entre os grupos que sofrem com o ruído originado por um projecto cujo benefício final se concentrará noutro local.

A atractividade de uma política depende do nível espacial em que é avaliada (a dimensão relativa à escala) e do local onde é avaliada (a dimensão relativa à localização). Por exemplo, uma política que faça sentido a nível regional pode ser pouco

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atraente quando os pontos de vista e preocupações nacionais são tidos em conta (ou vice-versa). O conceito de UP permite uma estruturação clara destes diferentes pontos de vista e oferece uma maneira de analisar diferenças e conflitos.

A componente espacial de uma UP tem muitas vezes origem na estrutura hierárquica de espaços geopolíticos. No caso mais simples, as unidades políticas são organizadas hierarquicamente e correspondem às áreas administrativas que têm o poder de decisão para seleccionar, aprovar e executar uma política. Em geral, as UP organizam-se numa rede que combina as relações hierárquicas e outros tipos de coligações e ligações. Além disso, o conjunto das UP também é dinâmico e pode sofrer alterações devido à formação de coligações, ou à exclusão ou inclusão de uma UP, em resultado, por exemplo, de alterações nas opções de política. Na Figura 1 procura-se mostrar várias formas de interacção entre política e tomada de decisão a diferentes níveis espaciais, no caso de grandes infra-estruturas de transporte na Europa (TEN, ver Comissão Europeia, 2004).

Figura 1. Estrutura das unidades de política

UNIÃO EUROPEIA

OUTRAS ORGANIZAÇÕES

EUROPEIAS e G.INT.

GOVERNO NACIONAL

OUTRAS ORGANIZAÇÕES

NACIONAIS e G.INT.

GOVERNO REGIONAL

A

GOVERNO REGIONAL

B

OUTRAS ORGANIZAÇÕES

REGIONAIS e GR.INT. OTHER REGIONAL

GOVERNO LOCAL

1

GOVERNO LOCAL

2

GOVERNO LOCAL

3

OUTRAS ORGANIZAÇÕES LOCAIS e GR.INT.

Nível supranacional

Nível nacional

Nível regional

Nível local

A estrutura apresentada na Figura 1 ilustra um sistema em que existem órgãos políticos que podem tomar decisões em quatro níveis: supranacional (União Europeia), nacional, regional e local. Estas UP podem incluir os órgãos governamentais eleitos em cada nível e, em paralelo, outras entidades representativas que estão envolvidas quer directamente no processo de tomada de decisão, quer tendo influência sobre a decisão tomada. Podem ser órgãos de planeamento ou consultivos. Cada um desses níveis políticos tomará decisões sobre a política de transportes ou projectos para a sua própria área de responsabilidade. Nalguns casos, os órgãos têm os seus poderes limitados por órgãos de outros níveis, por exemplo, o governo local normalmente opera dentro de um quadro legal determinado pelo governo nacional e a maioria das decisões políticas operacionais de transportes são tomadas a nível nacional e não a nível da UE, segundo o princípio da subsidiariedade.

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3. Quadros operacionais de estruturação

A estruturação é um processo interactivo de construção de um modelo mais ou menos formal de representação e integração de elementos de natureza objectiva, como as características factuais do problema, e elementos de natureza subjectiva, como os objectivos que explicitam os sistemas de valores dos actores são explicitados. Esta estrutura pode ser construída quer para todas as UP em simultâneo, quer para cada UP separadamente. A esturuturação em grupo (EG) é um exercício colectivo em que as UP interagem na construção de um modelo comum em que compartilham os mesmos pontos de vista fundamentais (ver 20.5). Em contraste, na estruturação individual (EI) cada UP expressa os seus pontos de vista independentemente das outras UP. Em ambos os casos, no entanto, uma análise multicritério passará pela estimativa dos impactos de cada opção em cada UP. Por sua vez, o modelo de avaliação da atractividade (ou valor) destes impactos, a ser construído numa segunda fase, também poderá ser comum a todas as UP ou específico para cada UP. Na avaliação em grupo (AG) todas as unidades utilizam os mesmos juízos de valor para avaliar os impactos. Na avaliação individual (AI) cada UP desenvolve o seu próprio modelo de avaliação, que poderá ser parcial ou totalmente diferente do dos outros. Assim, três quadros operacionais realistas podem ser diferenciados:

• Quadro de grupo: estruturação e avaliação em grupo. O modelo de análise e avaliação é partilhado por todas as UP. As divergências de pontos de vista, juízos de valor, etc. entre UP devem ser resolvidas durante a construção interactiva do modelo. A falha na resolução de divergências levaria a uma interrupção do processo; enquanto que, estando ultrapassadas, só poderão surgir conflitos entre as UP quando os impactos não forem os mesmos em todas as UP;

• Quadro individual: estruturação e avaliação individuais. O modelo de análise e avaliação é independente para cada UP, podendo ser parcial ou totalmente diferentes dos modelos de outras UP. Os conflitos entre UP podem ser causados por divergências nas componentes dos modelos ou nos impactos;

• Quadro misto: estruturação em grupo e avaliação individual. As UP estruturam o problema conjuntamente mas utilizam modelos de avaliação separados, isto é, os juízos de valor para a avaliação dos impactos das opções são expressos ao nível de cada UP. As discordâncias de pontos de vistas são resolvidas durante o processo de estruturação. Os conflitos podem surgir quando as UP são afectadas por impactos diferentes, ou por divergências nos juízos de valor subjacentes aos modelos de avaliação.

Quando diversas UP estão envolvidas na análise de opções de política e os pontos de vista de cada UP são estruturados individualmente, o exercício de estruturação é repetido para cada uma das UP.

Sendo a estruturação uma mistura de arte e ciência, é fácil entender por que há diferenças significativas, bem como muitas ideias em comum, entre as várias abordagens propostas na literatura multicritério – ver, por exemplo, Keeney e Raiffa (1976), Saaty (1980), Von Winterfeldt e Edwards (1986), (Bana e Costa, 1992 e 1993),

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Keeney (1992) e Roy (1996). Basicamente, existem dois tipos principais de estratégias de estruturação de modelos de análise multicritério. O mais comum consiste em começar por definir um conjunto de opções e, em seguida, analisar as características dessas opções para encontrar aquelas que são relevantes do ponto de vista das UP – designadas «características activas» em (Bana e Costa, 1993), em oposição aos atributos «passivos» que não têm qualquer impacto sobre os sistemas de valor dos actores. Por outro lado, pode-se começar por encontrar os objectivos fundamentais que as UP querem alcançar e, em seguida, criar opções para alcançá-los. A primeira é uma estratégia «focada nas alternativas» (Keeney, 1992) enquanto a segunda «centrada nos valores» (alternative-focused thinking versus value focused thinking). Ralph L. Keeney argumenta em favor desta última abordagem que: The primitive notion for a decision problem should be values and not alternatives. If, in fact, we begin with values, we might not even think of situations as decision problems, but rather as decision opportunities (Keeney, 1988, p. 466).

No âmbito da análise multicritério de políticas públicas, consideramos como mais adequada uma estratégia de estruturação centrada nos valores. De facto, uma política deve ser encarada como um meio para atingir os objectivos e, portanto, é difícil conceber que as opções de política possam ser definidas antes da decisão sobre o que deverão atingir. Neste sentido, a escolha de uma política entre as várias opções é uma oportunidade de decisão, ao invés de um problema de decisão.

4. A noção de ponto de vista

Uma vez definido o problema, a actividade de apoio à decisão centrar-se-á na estruturação dos pontos de vista segundo os quais se pretende analisar os impactos e a atractividade das opções. Os pontos de vista emergem durante a discussão com os actores quer sob a forma de metas e objectivos, quer como características activas e consequências esperadas das opções. Todos são aspectos ou factores relevantes para a análise, que designaremos por «pontos de vista» (PV) a partir do momento em que o seu significado seja bem definido e percebido por todos, para evitar ambiguidades e equívocos (Bana e Costa, 1993). Esta noção de PV é coerente com o conceito de value dimension de Von Winterfeldt e Edwards (1986) e, em certa medida, também corresponde à definição comum ampla de «objectivo» de Keeney e Raiffa (1976) e Keeney (1992). No entanto, mesmo se um objectivo declarado por um actor é obviamente um PV desse actor, há muitos tipos de PV que não surgem ou não são realmente declarados como objectivos. Todos os PV contribuem para tornar explícito o sistema de valores dos actores, mas um PV nem sempre corresponde a um directamente a um objectivo.

Os objectivos dos actores e as características das opções têm papéis diferentes mas complementares no processo de estruturação de um modelo multicritério. Por exemplo, um dos principais argumentos contra o projecto de transporte ferroviário Betuweroute (ver Beinat e Van Drunen, 1998) é que os custos eram superiores aos benefícios que o projecto iria produzir. Contudo, os «custos» não eram um PV para todas as UP. Enquanto as autoridades nacionais, que arcavam com os custos do projecto, queriam minimizar os custos, os municípios envolvidos na decisão sobre qual o traçado a adoptar poderiam ignorar os custos. Assim, minimizar os custos é um objectivo declarado das

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autoridades nacionais, mas não um PV de todos os municípios, já que os custos são para eles uma característica do projecto «não activa» (Bana e Costa, 1993) porque não interferem com os seus sistemas de valores.

O papel do facilitador durante o processo de interactivo de estruturação consiste em, progressivamente, estimular a reflexão dos actores para:

• Fazer emergir todos os tipos de PV, clarificar o seu significado e analisar por que razão e para que fim são relevantes, de modo a

• chegar a uma definição comum de uma família coerente de pontos de vista fundamentais (PVF) e

• definir descritores dos impactos potenciais das opções, para tornar os PVF operacionais para avaliar a atractividade das opções.

5. Definição de uma família de pontos de vista fundamentais

Perante situações mal definidas e complexas, envolvendo diversos actores e com muitas questões a ser abordadas, a construção de mapas cognitivos ou causais facilita a estruturação dos PV (Eden and Ackermann 1998 e 2001; Bryson et al. 2004; Eden 2004), diferenciando entre meios e fins e estabelecendo relações entre eles, até se identificar um conjunto final de PVF (ver aplicações recentes em Bana e Costa et al. 2006 e 2010).

Para ilustrar esse processo, tome-se como exemplo o caso da rede rodoviária da Região de Lisboa (ver Bana e Costa, 2001). Convidaram-se vários especialistas para um workshop a fim de discutir os PVF a considerar na formulação e avaliação das opções de investimento na rede rodoviária regional. Os participantes foram «escolhidos com a preocupação de assegurar que as várias perspectivas sobre o problema estivessem representadas. O processo de estruturação ajuda a criar uma nova perspectiva colectiva a partir dos diferentes PV, em que todos os PVF devem estar incluídos, sob pena das recomendações do grupo poderem vir a ser rejeitadas por um actor influente que sinta que o grupo não considerou alguns factores cruciais» (Phillips, 1990). Para estimular o debate e fazer emergir novos PV, os especialistas foram confrontados com perguntas como: «Porquê ou para quê é importante esse PV?”. Ou: «Como pode esse objectivo ser alcançado?» (ver Keeney, 1992). O processo de estruturação foi desenvolvido num quadro sócio-técnico interactivo de conferências de decisão (Decision Conferencing, ver Phillips e Bana e Costa, 2007) durante o qual foram identificadas várias cadeias e coligações de PV que ajudaram a destacar os PVF partilhados pelo grupo.

Um «ponto de vista fundamental» (PVF) é um PV individual, ou um conjunto de PV, nos termos do qual os actores concordam em que sejam analisados os impactos e avaliada a atractividade das opções, independentemente dos impactos noutros PV (Bana e Costa, 1992). Cada PVF corresponderá a um critério de avaliação no modelo multicritério. Os impactos em termos dos vários PVF podem ser organizados numa tabela de impactos, para o que é necessário que se verifiquem duas condições:

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• É possível descrever, quantitativa ou qualitativamente, os impactos plausíveis em termos de cada PVF, no contexto específico em análise;

• É possível estimar, com mais ou menos certeza, o impacto de cada opção em cada PVF.

A primeira condição cumpre-se ao associar a cada PVF um descritor de impactos. É por não respeitar esta condição que os PV de âmbito muito largo, como melhoria da qualidade de vida ou impacto ambiental, não devem ser tomado como PVF. Seguindo (Keeney e Raiffa, 1976), chamamos-lhes «áreas de interesse ou preocupação» (areas of concern). O mesmo se aplica a objectivos estratégicos genéricos, tais como: «proteger e melhorar o ambiente natural e construído», «contribuir para uma economia eficiente», «apoiar o crescimento económico sustentável nos locais apropriados» (ver DETR, 2000). Já a segunda condição implica que, por definição, um PVF deve ser «mensurável» e «operacional» no contexto em que as opções serão avaliadas (ver Keeney, 1992).

No caso acima referido, relativo à rede rodoviária da Região de Lisboa, numa reflexão sobre como se poderia alcançar o PV amplo de melhorar a qualidade da rede rodoviária regional, emergiram os PV de melhorar a acessibilidade e melhorar a conectividade da rede, um exemplo de procedimento top-down. Para atingir esses objectivos, devem ser construídas novas estradas (o que torna claro que as opções são meios para atingir fins). Ao pensar sobre as características desses projectos rodoviários, surgiu uma nova área de preocupação: os impactos ambientais, um exemplo de procedimento bottom-up. Esta foi posteriormente decomposta em alguns PV mais específicos, tais como poluição sonora, poluição do ar, bacias hidrográficas e efeitos do uso da terra (top-down). E assim por diante, numa mistura de procedimentos top-down e bottom-up (cf. Buede, 1986; Von Winterfeldt e Edwards, 1986).

Para que a avaliação das opções se possa basear numa comparação dos seus impactos em cada um dos PVF, estes devem ser eixos de avaliação independentes, o que só será possível se as opções puderem ser comparadas por um PVF independentemente dos seus impactos em qualquer dos outros PVF. Esta condição de independência ordinal nas preferências é muitas vezes uma hipótese de trabalho aceitável. No entanto, se o objectivo da avaliação for não só hierarquizar as opções, ou seja, não só analisar se entre cada duas opções uma é mais atractiva do que outra, mas também medir se a diferença de atractividade entre elas é pequena ou grande, então um PVF deve respeitar a propriedade mais estrita de independência entre as diferenças de atractividade (ou valor). Esta condição de independência cardinal é necessária para a construção de um modelo aditivo de avaliação multicritério e é uma das razões pelas quais, muitas vezes, alguns PV devem ser agrupados para formar um PVF único (ver exemplo e explicação detalhada em Bana e Costa et al., 1998).

Consideremos o caso dos impactos ambientais (ver Beinat, 1997). Collins e Glysson (1980) afirmam que entre a maioria dos indicadores ambientais verifica-se a condição de independência ordinal mútua: preferimos sempre menos poluição a mais poluição, menos ruído a mais ruído, menor degradação a maior degradação e assim por diante, independentemente dos outros aspectos. Já assim não será para a independência cardinal. Consideremos a escolha entre traçados rodoviários alternativos que causam diferentes níveis de poluição do ar. O PV efeitos na saúde devido às emissões tóxicas

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pode ser decomposto em concentrações de diversos produtos químicos. A questão é se qualquer um destes PV elementares pode ou não ser tomado como um eixo de avaliação independente. Suponhamos, por simplicidade, que só estão envolvidas duas substâncias. A resposta depende da forma como as duas substâncias químicas interagem. Normalmente são identificados três tipos de interacções: aditividade (o efeito combinado é a soma dos efeitos), o antagonismo (o efeito combinado é menor do que a soma) e sinergismo (o efeito combinado é maior do que a soma). Algumas substâncias só apresentam um comportamento particularmente perigoso na presença de outras substâncias. No caso do «smog fotoquímico», por exemplo, os gases residuais produzidos pelos automóveis, sistemas de aquecimento e indústrias interagem com o oxigénio sob a influência da luz solar. O resultado é a produção de substâncias extremamente irritantes, como o ozono, que afecta o sistema respiratório. São conhecidos vários outros casos de sinergismo (ver, entre outros, Ariëns et al., 1976; Moriarty, 1990; Kraak et al., 1993). No entanto, também é possível que a presença simultânea de diferentes substâncias resulte num efeito global menor (ver Ariëns et al., 1976). Moriarty (1990; ver também Beinat, 1997) mostra que, no caso dos efeitos adversos do ácido clorídrico (HCl) e do dióxido de enxofre (SO2) sobre a fotossíntese das plantas, os efeitos individuais do HCl dependem da concentração de SO2, e vice-versa.

Outro exemplo é a comparação de projectos de vias de transportes em termos de poluição sonora, considerando os PV nível máximo de ruído durante a noite e nível médio de ruído durante todo o dia. Estes PV são ordinalmente independentes um do outro: qualquer que seja o ruído médio, um nível máximo baixo durante a noite é sempre preferível (e vice-versa). A independência cardinal, pelo contrário, não é obedecida. A diferença de atractividade entre dois níveis máximos à noite dependente do nível médio de ruído durante todo o dia, porque as pessoas podem ser mais tolerantes a um aumento do nível máximo de ruído à noite quando o nível médio durante todo o dia for baixo. Mas, o efeito desse mesmo aumento à noite pode ser ampliado quando as pessoas já estão a sofrer de uma poluição sonora média alta durante todo o dia. Portanto, esses dois PV não podem ser tomados como dois PVF, devendo ser combinados num só, mas a combinação não deve ser aditiva!

É importante salientar que as condições de independência discutidas acima referem-se aos juízos de atractividade ou valor, isto é, às preferências e não a relações físicas ou estatísticas entre os PV. Ignorar essa distinção é um erro de análise bastante comum. Por exemplo, os custos e a segurança de uma infra-estrutura rodoviária podem ser tomados como dois PVF, mesmo que sejam correlacionados estatisticamente, no sentido de que maior segurança geralmente requer maiores investimentos. Como Von Winterfeldt e Edwards (1986, p. 43) dizem, «podemos ignorar correlações […], a não ser que estas indiquem redundância».

A independência preferencial cardinal garante que a atractividade das opções pode ser avaliada separadamente em cada PVF. Isto é, que o conjunto dos PVF é decomponível. Mas, ele deve também ser consensual, exaustivo, não redundante e o mais conciso possível. Keeney (1992, secção 3.5) e Belton e Stewart (2002, secção 3.4.2) oferecem discussões complementares interessantes sobre as propriedades desejáveis para um conjunto PVF, que lhe dão o estatuto de «família coerente de critérios» (Roy, 1996).

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A concisão, ou minimalidade do modelo, é importante para evitar a tentação comum de incluir tudo no modelo, e não apenas o que é essencial para efeitos de análise aos olhos das UP envolvidas. Como apontado por Hobbs e Meier (2000), a «poluição de informação» (a geração de uma quantidade tal de dados sobre o desempenho das alternativas em numerosos critérios que a informação não pode ser digerida pelas partes interessadas)» é uma fraqueza de muitas análises multicritérios. A redundância leva a double counting, tendo como consequência a sobrevalorização de alguns PV. Por outro lado, o modelo deve ser exaustivo, mas isto só se aplica aos PVF, o que pode, até certo ponto, agir contra a concisão, mas evita o risco de deixar de fora PVF de uma determinada UP – o que contradiz o desejo de consenso. Por fim, deve sublinhar-se que, em muitas circunstâncias, é difícil avaliar os impactos das opções sobre determinados PVF. No entanto, isso não justifica a sua exclusão do modelo. É sempre melhor construir um modelo completo, mesmo que alguns impactos sejam avaliados apenas de forma grosseira, simplesmente porque um modelo incompleto pode levar a conclusões enganadoras.

A Tabela 1 mostra a família de sete PVF utilizados no caso já referido da rede rodoviária da Região de Lisboa , agrupados em áreas de interesse. Esta família foi considerada decomponível para efeitos de avaliação das opções e identificada como consensual, ou seja, colectivamente (nível regional) e individualmente (nível local) compartilhada pelos municípios. Note-se que os custos de construção não foram tomados com um PVF, o que pode parecer uma contradição com a exigência de exaustividade. Mas a não consideração dos custos justifica-se porque as opções em avaliação são pacotes de projectos rodoviários que foram definidos de tal forma que todos os pacotes têm custos totais semelhantes, perto do orçamento disponível. No entanto, isto não impede uma distribuição desigual dos investimentos entre as UP (os municípios), o que iria contradizer a consensualidade, pelo que essa preocupação de equidade foi mais tarde considerada numa análise de conflitos (ver Bana e Costa, 2001).

Tabela 1. Representação tabular de uma família de pontos de vista fundamentais

Áreas de interesse Pontos de vista fundamentais

Transporte Acessibilidade Conectividade

Ambiente Poluição sonora Poluição do ar Uso do solo urbano Uso do solo não urbano

Desenvolvimento urbano

Potencial de desenvolvimento urbano

O resultado principal deste processo de estruturação é a definição da família dos PVF. Em vez de uma representação tabular como na Tabela 1, é comum, em problemas complexos, organizar as áreas de preocupação ou interesse e os PVF numa estrutura arborescente, muitas vezes referida como árvore de valores.

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As árvores de valores permitem visualizar os vários níveis de especificação dos PV. É por isso que muitas vezes são alternativamente chamadas de «hierarquias» (ver Brownlow e Watson, 1987 e Saaty, 1980) embora para nós esta designação pressuponha a existência de algum tipo de subordinação entre PV de diferentes níveis, o que não pode estar presente de todo, podendo aparecer PVF em qualquer nível da árvore, uns mais acima, outros mais abaixo. Em alguns contextos de avaliação, pode ser útil organizar a árvore em dois ramos, um de custos outro de benefícios, ou eventualmente incluir um terceiro referente a riscos. Entretanto, quando se pretende destacar apenas os PVF, cada um deles aparecerá então no fim de um ramo que começa no nó inicial e, eventualmente, passa por diversos nós intermédios da árvore, como no exemplo na Figura 2 relativa a uma avaliação multicritério de medidas de controle de cheias (ver Bana e Costa et al. , 2004). Noutros casos, a árvore pode ser estruturada com a finalidade de dar uma visão detalhada de todos os PV, e então PVF podem aparecer em qualquer nível, ou seja, não necessariamente somente associados a nós na base da árvore.

Figura 2. Exemplo de uma árvore de PVF

AvaliaçãoMulti-

Critério deMedidas deControlo de

Cheias

ComponenteEconómica

ComponenteNão-

Económica

ComponenteAmbiental

Fauna eFlora

Água

Solo

Paisagem

ComponenteTécnica

ComponenteSocial

Interesse para a conservação da natureza

Integração urbanística

Valorização da paisagem

Área de solo agrícola

Contaminação do solo

Tempo de alagamento da zona ribeirinha

Risco de obstrução por sedimentação

Qualidade da água superficial após uma cheia

Nível Piezométrico do aquífero

Qualidade da água subterrânea

Complexidade da intervenção

Complexidade da manutenção

Nível de protecção face à cheia

Percepção do risco de cheia

Efeito sobre o tecido social

Efeito sobre a saúde pública

PV1

PV2

PV3

PV4

PV5

PV6

PV7

PV8

PV9

PV10

PV11

PV12

PV13

PV14

PV15

PV16

A família dos PVF pode servir de ponto de partida para se proceder a uma avaliação directa de opções, como por exemplo na abordagem SMART (cf. Von Winterfeldt e Edwards, 1986; Edwards e Barron, 1994). Mas a transparência dos resultados é limitada. Uma análise multicritério pode ser conduzida em dois contextos básicos diferentes: no primeiro, uma única UP procura tomar uma decisão que não exige justificação a outras UP. Neste caso, a decisão pode não precisar de uma justificação substancial e a pontuação directa de opções pode ser suficiente. Isto contrasta com o contexto em que a decisão deve ser tomada por uma UP em nome de várias UP que não estão directamente envolvidas no processo de avaliação, ou por várias UP colectivamente. Nesses casos, a justificação da avaliação das opções deve ser claramente documentada e deve-se

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demonstrar que cada PVF foi devidamente considerado e como. Isto requer o uso de modelos muito mais completos, «mesmo quando estes podem ser menos eficientes, e/ou impor estruturas (de preferências, por exemplo) que não podem ser estritamente justificáveis empiricamente» (Bana e Costa et al., 1997). Por isso, mesmo que seja muitas vezes uma tarefa difícil, a definição de descritores de impactos plausíveis nos PVF contribui decisivamente para avaliações bem informadas, justificadas e transparentes.

6. Noção de descritores de impactos

Um «descritor de impactos» é um conjunto ordenado constituído por níveis de impacto plausíveis, segundo um dado PVF, que:

• Mede (quantitativa ou qualitativamente) em que medida o PVF é satisfeito;

• Descreve, o mais objectivamente possível, os impactos das opções no PVF. Quanto mais objectivamente os impactos são descritos, mais bem compreendido (menos ambíguo) e, portanto, mais bem aceite (menos controverso) será o modelo de avaliação;

• Estabelece um domínio de plausibilidade para os impactos (de um nível mais atraente para um nível menos atraente), definido por eliminação de níveis de impacto (ou opções) que não são admissíveis ou estão fora de contexto. Dependendo de a estruturação ser individual ou em grupo, o domínio de plausibilidade poder ser definido para cada UP ou para todas em conjunto;

• Verifica a independência ordinal do PVF correspondente. Se for detectada alguma dependência, é necessário reestruturar a família de PV.

Um descritor tem a estrutura de uma escala ordinal de preferência (Roy, 1996, § 8.1.2.1), que pode ser contínua ou discreta. O sentido da preferência é muitas vezes inerente ao descritor, como, por exemplo, quando se avalia o ganho em acessibilidade com a construção de uma nova estrada, através da redução do tempo de viagem médio de uma região. Conflitos entre UP podem, contudo, surgir quando, para umas é melhor mais impacto do que menos, e, ao contrário, menos impacto é melhor para outras. Por exemplo, pode ser desejável minimizar o número de estações numa linha ferroviária de alta velocidade, a fim de maximizar a velocidade entre as cidades principais, mas tal entra em conflito com os interesses de maximização dos benefícios locais (ver Vickerman e Norman, 1999).

Associar um descritor a um PVF é muitas vezes uma questão de escolher qual das várias características (activas) das opções é o mais adequado para medir os impactos num dado contexto específico. Por exemplo, os impactos em termos de acessibilidade devem ser medidos numa escala absoluta (tempo ou distância) ou numa escala relativa (desvio de um valor de referência ou uma percentagem)? Incluir no modelo, não apenas um, mas várias características que são, na realidade, descritores alternativos do mesmo PVF; é um erro comum que introduz redundância no modelo. Frequentemente, a discussão entre descritores alternativos revela novos PV, o que pode levar a redefinir o PVF em

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questão ou até mesmo a reestruturar a família de PVF. A estruturação é, de facto, um processo de aprendizagem recursivo, entre PV, PVF e descritores.

É útil distinguir entre descritores directos e indirectos, podendo existir mais de um descritor possível de um mesmo PVF, de ambos os tipos (ver Brownlow e Watson, 1987):

• Os níveis de um descritor directo, ou natural, medem directamente efeitos, como o número de pessoas afectadas por doenças respiratórias;

• Os níveis de um descritor indirecto, ou proxy, indicam causas mais do que efeitos, como os graus de concentração de poluentes atmosféricos que causam doenças respiratórias.

Alguns autores consideram que uma «escala natural é uma escala que é de uso geral, com uma interpretação comum a todos» (Kirkwood, 1997, p. 24) e que, portanto, pode ser directa ou indirecta. O uso de descritores proxy é muito comum (ver Fischer et al., 1987). Por exemplo, Briassoulis (1995) listou e classificou 210 critérios ambientais usados para a localização de instalações industriais. Cerca de 80% destes critérios parecem ser proxies seleccionados pela sua mensurabilidade e clareza. Os descritores próximos de causas (por exemplo, as emissões e as concentrações ambientais) são relativamente fáceis de medir, devido à acessibilidade do meio a ser medido (por exemplo, água, ar, solo) e ao conhecimento do fenómeno que determina as emissões (por exemplo, um processo de combustão). A medição de impactos por descritores próximos de causas é mais confiável, relativamente precisa e menos controversa do que a medição por descritores próximos de efeitos. Apesar disso, muitas vezes, a relação entre o indicador medido e o PVF não é clara, misturando-se os dados factuais e com juízos de valor, tornando nomeadamente difícil a distinção entre responsabilidade técnica e política. Uma discussão detalhada sobre a utilização de descritores naturais e proxy pode ser encontrada em (Bana e Costa e Beinat, 2005).

Por vezes, não é possível encontrar um descritor directo ou indirecto de um PFV, dada a sua natureza intrinsecamente subjectiva (imagem, por exemplo), ou por motivos de falta de informação (ver Haasstrup, 1994). ou porque o PVF é um conjunto de vários PV elementares inter-relacionados ou dimensões de valor que são dependentes de julgamentos. Consideremos, por exemplo, o PVF «melhoria da acessibilidade». No caso da rede viária da região de Lisboa, ela foi medida directamente pela percentagem de diminuição do tempo médio de viagem, quer ao nível municipal quer ao nível da região. Contudo, noutros contextos, esse descritor pode ser inadequado, por várias razões: 1) não existem as condições técnicas necessárias para medir o tempo médio de viagem com tanta precisão, ou 2) a melhoria da acessibilidade é na verdade um conjunto de vários PV, como a dispersão geográfica dos benefícios, a contribuição para a eliminação dos engarrafamentos existentes, o grau em que a concretização dos objectivos de planeamento é favorecido, etc. Nesses casos, deve-se desenvolver um descritor construído dentro do contexto específico.

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7. Descritores construídos

Os descritores construídos podem ser caracterizados pelo número de PV envolvidos, distinguindo-se descritores unidimensionais e multidimensionais, e pelo modo como os seus níveis de impacto são descritos: pictoricamente (descritor pictórico), verbalmente (escala qualitativa) ou numericamente (índices e fórmulas). É frequente distinguir os seguintes tipos de descritores construídos, exemplificados na Tabela 2:

Tabela 2. Exemplos de descritores construídos

Tipo Contexto PVF Descritor Escala qualitativa unidimensional

Avaliação de sítios para uma central eléctrica (Keeney, 1992)

Atitudes públicas

Apoio explícito: Nenhuma UP se opõe à central e pelo menos uma UP manifestou apoio explícito. Neutralidade: Todas as UP são indiferentes. Controvérsia: Uma ou mais UP opõem-se embora nenhuma através de acções organizadas de oposição explícita. Outras UP são neutros ou manifestam apoio. Oposição explícita: Exactamente uma UP desenvolve acções organizadas de oposição explícita. As outras UP apoiam, são neutras ou opõem-se mas passivamente. Forte oposição explícita: Duas ou mais UP desenvolvem acções organizadas de oposição explícita.

Descritor pictórico

Avaliação das consequências de trabalhos num rio no Chile (ver Nardini, 1998, pp. 212-215)

Os impactos visuais devidos à diminuição do volume de água de uma cascata.

Pior ............................................................................ Melhor

Escala bidimensional formada por todas as combinações plausíveis de dois aspectos interligados

Construção de uma nova linha ferroviária para o porto de Lisboa (adaptado de Bana e Costa et al., 2001).

Efeitos sobre o serviço rodoviário para o porto durante a construção de uma nova linha.

Muito bom: É possível dividir a construção da nova linha em secções, mantendo a antiga linha em operação. Bom: É possível dividir a construção em duas secções apenas, mantendo a antiga linha em operação. Neutro: É impossível dividir a construção mantendo em operação a antiga linha. Mau: É impossível manter em operação a antiga linha durante a construção da nova linha.

• Escalas qualitativas unidimensionais: conjuntos finitos de descrições verbais de impactos unidimensionais plausíveis;

• Descritores pictóricos: conjuntos finitos de representações visuais de impactos de referência;

• Descritores multidimensionais: conjuntos de níveis de impacto multidimensionais que descrevem cenários plausíveis. É útil distinguir entre escalas multidimensionais (discretas) e índices. As primeiras são construídas por

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meio de descrições individuais de cada um dos seus níveis de impacto multidimensionais, enquanto os últimos são definidos de forma exaustiva por uma fórmula que combina várias dimensões analiticamente.

8.1. Escalas qualitativas unidimensionais

O caso mais simples de escala qualitativa é um descritor dicotómico, isto é, que distinga apenas dois níveis de impacto. Tais como sim e não, em contextos nos quais o PVF consiste apenas em apreciar se determinas condições se verificam ou não. Ou, apoio, ou a favor (nível mais atractivo) ou oposição, ou contra (nível menos atractivo), quando o que importa é levar em conta o comportamento de uma determinada UP face a cada opção, como por exemplo, a consistência de traçados rodoviários alternativos com as estratégias de desenvolvimento local.

Em geral, porém, há que definir níveis intermédios entre os dois extremos. Não é raro encontrar estudos de avaliação de impactos que usam escalas com vários níveis qualitativas, como muito bom, bom, aceitável, mau, muito mau, sem qualquer descrição objectiva dos níveis. Ou, mesmo, uma escala como nenhum impacto, impacto pequeno, impacto grande, sem descrição clara do que diferencia um impacto grande de um impacto menor. Tais definições ambíguas ou inexistentes dos níveis de impacto pecam por falta de objectividade e, portanto, não contribuem para a transparência na avaliação e na tomada de decisão, nem tão pouco para esclarecer eventuais divergências sobre a atractividade relativa entre opções. A ambiguidade deve ser o mais possível evitada quando se constroem descritores, embora isso possa ser difícil nos casos em que a informação é escassa. O analista pode nesses casos pedir aos actores exemplos do que consideram boas e más opções, em termos do PVF a ser descrito, ou exemplos de impacto maiores e menores, e, em seguida, suscitar uma discussão sobre as várias respostas, a fim de encontrar descrições verbais (ou pelo menos pictóricas) de diferentes níveis de impacto.

Outro exemplo comum de construção ambígua de um descritor é quando se tomam como níveis de impacto intervalos definidos numa escala contínua. Por exemplo, consideremos novamente o ponto de vista fundamental «acessibilidade» (ver Bana e Costa, 2001) ao qual foi associado o descritor contínuo «diminuir o tempo médio de viagem (em percentagem do tempo médio de viagem actual)», que varia entre um impacto mínimo plausível de -5% e um melhor impacto plausível de 20%. Um erro seria usar, em vez deste descritor, um conjunto de níveis definidos por intervalos, como, por exemplo, mau: -5% a 0%, aceitável: 0% a 5%, bom: 5% a 10%, muito bom: 10% a 15% e excelente: 15% a 20%.

8.2. Descritores pictóricos

Quando as descrições verbais são difíceis, ou tidas como difíceis de entender, podem ser usadas representações visuais dos impactos, tais como esboços, desenhos, fotografias (ou partes seleccionadas destas – ver Krischer, 1976), vídeos, simulações de computador, etc. A sua finalidade principal é transmitir uma representação realista contextual dos impactos esperados, de modo a que estes possam ser analisados e

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comparados. Este é um passo necessário para assegurar que os actores envolvidos na avaliação percebem o significado de um descritor de impacto e possam relacioná-lo aos seus sistemas de valores. Wenstøp e Seip (2001) abordam esta associação e ligam a necessidade, na tomada de decisão, de valores bem fundamentados à capacidade de os descritores provocarem emoções. Segundo Damásio (1994), os actores ligam emoções a fenómenos neurofisiológicos que parecem ser marcadores importantes da fundamentação das crenças e dos valores. Para desencadear uma emoção, no entanto, é frequentemente necessário trabalhar a forma do descritor para que ele possa ser entendido, contextualizado e assimilado. Nos casos em que os descritores numéricos ou textuais são insuficientes, as imagens, animações e outras formas de multimédia podem contribuir para melhorar a compreensão do significado do PVF.

Um exemplo de um descritor pictórico é mostrado na terceira linha da Tabela 2. Neste caso, a cascata representa o elemento de paisagem singular mais atraente de uma área de recreio. Os trabalhos no curso de água previstos a montante têm o efeito de modificar o fluxo da água, reduzindo assim a sua intensidade e, indirectamente, a qualidade visual das cascatas. O descritor pictórico foi usado para simular diferentes níveis de impacto que correspondem aos fluxos de água possíveis e a opções de projecto diferentes. Através da simulação de computador, criou-se a aparência cascata para nove cenários de referência, que vão desde o status quo (cenário preferido) até ao pior cenário, que corresponde a uma mudança radical no fluxo de água e à perda virtual da cascata. Os impactos de cada uma das alternativas previstas puderam então ser associados a um dos nove cenários. Desta forma, foi possível comparar os impactos visuais das diferentes alternativas.

Wenstøp e Carlsen (1998) descrevem uma abordagem semelhante para avaliar projectos de desenvolvimento de energia hidroeléctrica, em que se empregaram vídeos para facilitar a avaliação, representando os efeitos de diferentes cenários de desenvolvimento. «As gravações de vídeo da paisagem existente, com os seus rios e cascatas, foram feitas a partir de um helicóptero. Um artista editou o vídeo para mostrar que aspecto a paisagem teria após o desenvolvimento. O vídeo foi apresentado aos painéis de peritos antes do processo de ponderação e a impressão dos moderadores que conduziram a sessão foi de que o vídeo ajudou bastante na criação de emoções em torno das decisões sobre trade-off» (Wenstøp e Seip, 2001).

A simulação de vídeo foi amplamente utilizada para comparar as opções disponíveis para proteger Veneza das águas altas (ver Collegio di Esperti Internazionali, 1998). As três principais opções disponíveis são: o fecho da lagoa com comportas móveis para barrar as marés altas; a introdução de modificações morfológicas na lagoa para atrasar a propagação das marés; e o levantamento dos pavimentos da cidade para reduzir os danos das marés. Estas soluções têm impactos que são mais fáceis de compreender se representados visualmente. Os impactos na paisagem das comportas móveis, por exemplo, foram simulados através da computação gráfica de uma variedade de perspectivas e de cenários operacionais para facilitar a avaliação da mudança no panorama relativamente ao status quo (ver Collegio di Esperti Internazionali, 1998). De forma semelhante, os filmes de simulação que mostram a propagação das marés na lagoa sob o efeito das medidas de protecção ajudaram a transmitir as diferentes capacidades de protecção da água. Isso facilitou a comparação dos níveis atingidos na cidade no pico das marés, a duração da inundação, as áreas afectadas pela maré alta,

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etc., transmitindo um sentimento e uma percepção concreta do significado de implementar uma solução em vez de outra.

Note-se que as representações visuais podem ser utilizadas para complementar quer as escalas unidimensionais, quer as multidimensionais, ou vice-versa. Além disso, também podem ser usadas várias opções de referência já existentes e conhecidas para tornar mais reais as descrições dos vários níveis de um ponto de vista fundamental. Keeney (1992, p. 109) apresenta e discute outros exemplos de descritores pictóricos.

8.3. Escalas multidimensionais

Para introduzir a discussão sobre as escalas multidimensionais, consideremos o PVF efeitos sobre o serviço de transporte ferroviário para o porto durante a construção da nova linha, descrito na última linha da Tabela 2. Os níveis (bidimensionais) do descritor construído são todas as combinações plausíveis dos impactos nos dois PV elementares que formam esse PVF: a possibilidade de separar a construção da nova linha em secções e a possibilidade de manter a antiga linha ferroviária em operação durante a construção da nova linha. O primeiro foi descrito pelo número de secções em que a construção poderia ser dividida: três, duas ou zero secções. O segundo foi descrito dicotomicamente: Sim, é possível manter em funcionamento a antiga linha, durante a construção» ou Não, não é possível manter em funcionamento a antiga linha, durante a construção. Por que não foram os dois PV tomados cada um deles como um PVF ? Porque, dividir a construção em secções era tecnicamente irrelevante se, ao mesmo tempo, não fosse possível manter a antiga linha em funcionamento. Assim, o nível menos atraente do descritor do PVF foi definido simplesmente como é impossível manter em funcionamento a antiga linha (durante a construção da nova). Ou, dito de outra forma, como mostra a Tabela 3, três das combinações possíveis dos níveis dos dois PV foram consideradas indiferentes (igualmente atractivas) em termos dos seus efeitos sobre o serviço ferroviário durante a construção.

Tabela 3. Construção de uma escala bidimensional por uma tabela de duas entradas

É possível manter em operação a antiga linha durante a construção?

SIM NÃO

Número de secções da linha em que a construção

pode ser dividida:

3 secções (SIM; 3 secções) efeito muito bom

(NÃO; 3 secções) ou

2 secções (SIM; 2 secções) efeito bom

(NÃO; 2 secções) ou

0 secções (SIM; 0 secções) efeito neutro

(NÃO; 0 secções) efeito mau

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Isto revela claramente que, embora a preocupação com a manutenção da antiga linha em operação seja independente da preocupação com a separação da construção (porque o sim é sempre melhor do que o não, independentemente de ser possível ou não dividir a construção), o segundo PV depende do primeiro (porque dividir em três partes é melhor do que dividir em duas, o que é melhor do que nenhuma quando é possível manter a antiga linha em funcionamento, mas três, duas e zero secções são indiferentes se não for possível manter a antiga linha em funcionamento). Vale a pena notar que uma soma ponderada de pontuações atribuídas separadamente aos diferentes níveis de cada um dos dois PV não reproduz a ordenação dos níveis do descritor construído, que decorre de uma estrutura de preferências lexicográfica entre os dois PV.

Uma tabela de duas entradas, como a Tabela 3, facilita muito a construção de uma escala bidimensional. Desenvolvimentos alternativos são tabelas de perfis e esquemas arborescentes (ver Tabela 4 e Figura 3, respectivamente). Cada célula na tabela de duas entradas, ou cada caminho na árvore ou cada linha na tabela de perfis, corresponde a uma combinação particular de níveis (um e apenas um nível de cada dimensão por perfil). Ao contrário de uma tabela com dois PV, os esquemas em árvore e as tabelas de perfis podem ser usados para facilitar a construção de escalas multidimensionais que combinem mais de dois PV. A vantagem de desenvolver uma escala multidimensional, com o apoio de uma tabela de perfis, é que esta facilita a eliminação de linhas correspondentes aos perfis inviáveis, fundir linhas correspondentes a perfis indiferentes e reordenar as linhas pela atractividade relativa dos níveis de impacto.

Tabela 4. Desenvolvimento tabular de uma escala qualitativa bidimensional

Efeitos sobre o serviços ferroviário para o porto durante a construção da nova linha É possível manter em

operação a antiga linha durante a construção?

A construção pode ser separada em quantas secções? Níveis

SIM NÃO 3 secções 2 secções 0 secções

Perfil 1 SIM 3 secções Efeito muito bom

Perfil 2 SIM 2 secções Efeito bom Perfil 3 SIM 0 secções Efeito neutro Perfil 4 NÃO 3 secções

Efeito mau Perfil 5 NÃO 2 secções Perfil 6 NÃO 0 secções

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Figura 3. Esquema arborescente de construção de perfis multidimensionais

A Tabela 5 resume as etapas básicas de um procedimento sistemático para a construção de um descritor multidimensional para um PVF que agregue vários PV interligados.

Tabela 5. Procedimento para desenvolver uma escala construída multidimensional

Passos básicos

O que fazer Comentários

Passo 1 Definir um conjunto discreto de níveis de impacto em termos de cada uma das dimensões componentes.

Isto requer que dimensões quantitativas contínuas sejam discretizadas.

Passo 2 Estabelecer todas as combinações possíveis dos níveis das várias dimensões.

O desenvolvimento de todas as combinações multidimensionais possíveis pode chamar-se «desenho factorial» (cf. Barron e Person, 1979), que pode ser facilitado usando tabelas ou árvores.

Passo 3 Eliminar as combinações não exequíveis (não plausíveis).

Passo 4 Comparar as combinações exequíveis e agrupar as que sejam julgadas indiferentes; cada grupo de perfis forma o mesmo nível de impacto plausível do descritor do PVF (se for conveniente, dar um rótulo a cada nível);

Ordenar os níveis de impactos plausíveis por ordem decrescente de atractividade relativa no PVF.

Isto requer comparações holísticas de perfis multidimensionais, que podem envolver um esforço cognitivo considerável, que pode ser facilitado usando um procedimento de comparação aos pares.

Deve-se identificar claramente os níveis multidimensionais mais e menos atractivos.

Passo 5 Fazer uma descrição clara de cada nível de impacto plausível, tão detalhada quanto for apropriado e tão objectiva quanto possível.

Se apropriado, usar representações pictóricas ou referir opções existentes para tornar mais real cada descrição.

Em quantas secções a construção pode ser dividida?

NÃO

SIM

Em quantas secções a construção pode ser dividida?

É possível manter a linha antiga em operação durante a construção?

3

0

(Sim, 3 secções)

(Sim, 2 secções)

(Sim, 0 secções)

Muito bom

Bbom

3

2

0

(Não, 3 secções)

(Não, 2 secções)

(Não, 0 secções)

Neutro

Mau

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Quando pelo menos um desses PV é descrito por uma escala quantitativa contínua, só se poderá desenvolver o passo 1 depois de dividir a escala contínua num número finito de intervalos e tomar os limites desses intervalos (não os intervalos) como níveis de referência que podem então ser combinados com os níveis de outras dimensões. Considere-se novamente o caso da nova ligação ferroviária ao porto de Lisboa e o PVF analisado anteriormente. Numa fase inicial, ao invés do número de secções de linha, os especialistas pensaram em termos do comprimento médio das secções em que a construção pode ser dividida, entre 200 e 600 metros (que era a extensão completa do mais comprido layout alternativo para a nova linha, o que corresponde à impossibilidade de qualquer seccionamento da construção). Bissectando o intervalo de 200 a 600 metros, obter-se-iam três níveis de referência de comprimento médio, 200 metros, 400 metros e 600 metros, combináveis com a possibilidade ou impossibilidade de manter a antiga linha em funcionamento. Na verdade, isso não foi feito porque mais tarde descobriu-se que o sentido da preferência no comprimento da linha (quanto menor melhor) só poderia ser estabelecido para um determinado número de secções em que a construção poderia ser dividida. Finalmente, note-se que não é uma condição necessária tomar níveis de referência consecutivos equidistantes; em alguns contextos, é mais adequado tomar referências conhecidas, como, por exemplo, quando os limites de concentração de diversos poluentes são combinados (ver Beinat, 1997).

Na prática, o número de PV que formam um PVF e o número de níveis de cada um deles são frequentemente incompatíveis com uma análise exaustiva de todos os perfis de impacto possíveis, por exemplo, com quatro dimensões descritas por quatro níveis podem formar-se 256 perfis! A solução é desenvolver um descritor multidimensional com base em apenas alguns perfis de impacto de referência, significativamente distintos em termos de atractividade relativa e formados por combinações viáveis de impactos nos diversos PV. Existem várias formas possíveis de reduzir o número de combinações: considerar apenas um pequeno número de impactos de referência nos diversos PV e, em seguida, formar todas as combinações destes e/ou aplicar um procedimento para seleccionar apenas algumas combinações de entre muitas possíveis.

Num estudo sobre os PV a considerar na comparação de localizações alternativas para o novo aeroporto (NA) internacional de Lisboa (Bana e Costa e Corrêa, 1999), um dos PVF identificados foi a consonância com as estratégias de desenvolvimento local, que integra quatro PV (ver Tabela 6), cada um deles descrito por descrito por dois níveis de impacto de referência (o passo 1 do procedimento na Tabela 5), dando origem aos 16 perfis na Tabela 7 (passo 2).

Seis perfis (sombreados na Tabela 7) foram considerados irrealistas e foram eliminadas (passo 3). Os restantes dez perfis foram comparados aos pares (passo 4), dois pares de perfis foram considerados igualmente atractivos e portanto cada par corresponde a um só nível de impacto multidimensional (passo 4). A ordenação daí resultante permitiu definir uma escala construída de oito níveis, de L8 (nível mais atractivo) a L1 (nível menos atractivo), como é descrito na Tabela 8 (passo 5).

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Tabela 6. Dimensões da consonância com estratégias de desenvolvimento local e respectivos níveis de impacto de referência

Dimensões Níveis de impacto de referência

Concordância com o perfil de desenvolvimento municipal

Concordância: a implantação no NA não contraria, ou permite concretizar, os objectivos do Plano Directo Municipal (PDM) ao nível da especialização funcional e económica existente ou prevista.

Discordância: Caso contrário.

Compatibilidade com o ordenamento definido nos PMOT (Planos Municipais de Ordenamento do Território)

Compatível: mesmo não sendo o uso previsto pelos PMOT para a área em questão, a implantação do NA é compatível com o uso previsto, ou seja, não é impedida pelos usos confinantes e é admissível a alteração do uso do solo previsto nos PDM por forma a acomodar o NA.

Incompatível: Caso contrário.

Efeitos sobre as dinâmicas demográficas

Positivo: o crescimento demográfico induzido pelo NA contribuirá para a afirmação ou consolidação de uma tendência positiva de alteração do ritmo demográfico que se verifica no Concelho. Isto é, inverte uma tendência para a desertificação ou o envelhecimento da população; consolida ou acelera o preenchimento de espaços urbanos ou urbanizáveis expectantes; ou contribui para a aceleração do ritmo de crescimento da população do Concelho, caso isso tenha sido definido como objectivo do PDM.

Negativo: a alteração populacional induzida pelo NA surge como uma clara inversão à desejável tendência de crescimento demográfico do Concelho - tal como definido no PDM -, ou contribui para agravar situações existentes de sobre-ocupação do espaço.

Potencial de acolhimento urbano e industrial

Existente: a estrutura urbana existente tem capacidade para absorver o crescimento induzido pelo NA - os limiares das infra-estruturas previstas no PDM não são ultrapassados; existe uma rede urbana suficientemente desenvolvida, bem como áreas industriais disponíveis na proximidade da localização do NA.

Inexistente: Caso contrário.

Tabela 7. Construção tabular de uma escala construída dos níveis de impacto de referência nas quarto dimensões do PVF «consonância com as estratégias de desenvolvimento local»

Consonância com as estratégias de desenvolvimento local

Dimensões Passo 1)

Níveis de referência Passo 2)

Perfis multidimensionais

Perfis de desenvolvimento municipais

Concordo A A A A A A A A

Discordo D D D D D D D D

Compatibilidade do uso do solo

Compatível C C C C C C C C

Incompatível I I I I I I I I

Efeitos nas tendências demográficas

Positivo + + + + + + + +

Negativo – – – – – – – –

Potencial de infra-estruturas

Existente E E E E E E E E

Inexistente N N N N N N N N

Passo 4) Níveis de impacto multidimensionais L8

Passo 3)

L7

Passo 3)

L6

L5

L3

L2

L5

L4

L2

L1

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Tabela 8. Descritor construído multidimensional de «consonância com as estratégias de desenvolvimento local»

Níveis Descrição

L8 O NA está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L7 O NA está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura não é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L6 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L5 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura não é compatível com o uso previsto nos PMOT.

Ou

O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) não absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L4 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria positivamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) não absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura não é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L3 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria negativamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L2 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria negativamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura não é compatível com o uso previsto nos PMOT.

Ou

O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria negativamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) não absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura é compatível com o uso previsto nos PMOT.

L1 O NA não está em consonância com o perfil de desenvolvimento dos municípios, contraria negativamente a dinâmica demográfica, a capacidade instalada (urbana e industrial) não absorve o crescimento induzido pelo NA e a implantação da infra-estrutura não é compatível com o uso previsto nos PMOT.

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Os dez perfis de impacto multidimensionais que não foram eliminados no passo 3 (ver Tabela 7) foram comparados em pares no passo 4. A principal limitação associada à comparação de perfis completos é sobrecarga de informação (ver Miller, 1956). Devido à complexidade da tarefa, o avaliador pode ser levado a concentrar-se nas características para ele mais relevantes ou adoptar regras de decisão simples, como a ordenação lexicográfica (Kerstholt, 1992), o que pode enviesar a ordenação final. Para evitar que tal aconteça, Bana e Costa e Beinat (2005) sugerem que se utilize um procedimento de comparação dos perfis, recorrendo ao software M-MACBETH (www.m-macbeth.com) para testar a consistência das comparações que vão sendo efectuadas.

8.4. Utilização de regras na construção de escalas multidimensionais

Mesmo que o número de níveis de referência de cada PV seja pequeno, pode acontecer que o número total de combinações seja muito elevado, tornando-se irrealista ou indesejável definir todas as combinações possíveis e seguir o procedimento sugerido na Tabela 5.

Nesses casos, pode ser interessante adoptar uma abordagem que consiste em considerar dois PV elementares de cada vez (ver Green e Srinivassan, 1978) e gerar perfis que difiram apenas nesses dois PV, mantendo todas os restantes PV a níveis fixos. O problema desta abordagem é que ela requer que cada par de PV seja preferencialmente independente dos restantes. Essa situação está longe de ser a mais comum. Além disso, se a condição de independência se verificar, então por que não tomar como fundamental cada um dos PV?

Uma alternativa seria a de optar por um «esquema fraccionado» (ver, entre outros, Cochran e Cox, 1957; Winer et al., 1991), como o «desenho ortogonal» (Currim e Sarin, 1983 e 1984). Cada nível de cada PV é combinado com qualquer outro nível de outro PV apenas uma única vez. Imagine-se um conjunto de quatro PV, cada um descrito por três níveis (ver exemplo em Barron e Person, 1979). A aplicação do desenho ortogonal conduz a nove perfis de referência de um total de 81 (= 34). O problema da utilização deste procedimento, como um passo inicial na construção de um descritor multidimensional, é que nada garante que um número significativo das combinações seleccionadas não seja irrealista.

O que pode o analista fazer nesses casos? Um procedimento interessante é estabelecer indirectamente alguns níveis de impacto multidimensional de referência, isto é, definidos por algumas regras empíricas. Existem dois tipos básicos de regras: compensatórias e não compensatórias.

Vamos tomar como exemplo a construção de uma escala de «qualidade de vida» apresentado por Belton e Stewart (2002, p. 130), a partir de seis PV, clima, nível de vida, facilidade de adaptação à cultura, qualidade da vida social e cultural, qualidade do ambiente (ruído, poluição, etc.) e considerações de segurança (nível de criminalidade, etc.), «cada um dos quais classificado como: desfavorável, aceitável ou favorável». Ao invés de analisar exaustivamente as 36 combinações possíveis, foi utilizada uma mistura (ad hoc) de regras compensatórias e não compensatórias para definir a seguinte escala de cinco níveis (do mais para o menos atractivo): «Todos os PV no nível favorável; perfil melhor do que um perfil com todos os PV no nível aceitável; todos os PV no nível

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aceitável ou, quanto muito, um PV no nível desfavorável pode ser compensado por outro PV no nível favorável; Perfil pior do que um perfil com todos os PV no nível aceitável; nenhum PV no nível favorável e três ou mais PV no nível desfavorável».

Note-se que isso não é equivalente a estabelecer um sistema de pontuação arbitrário, por exemplo, atribuir o valor 1, 0 e -1 a cada nível de referência e somar as pontuações. No entanto, o problema é que o descritor multidimensional assim construído não possui necessariamente uma das características fundamentais que uma escala qualitativa deve ter: ser «justificável» (Belton e Stewart, 2002, p. 129).

Um passo nessa direcção é começar por definir regras claras de combinação de níveis entre PV, como na «técnica dos determinantes» sugerido por Bana e Costa et al. (2002), que consiste na aplicação sequencial de regras como:

• estabelecer dois níveis de referência, «satisfatório (+)» e «neutro (0)», em cada um dos PV;

• classificar cada PV como «determinante» (D), «importante» (I) ou «secundário» (S). Um PV será «determinante» se um impacto negativo (pior do que neutro) nesse PV for condição necessária e suficiente para uma opção ser considerada negativa (pior do que neutra) (o que significa que um PV determinante tem uma natureza não compensatória);

• definir um nível «bom» do descritor, por exemplo: todos os PV determinantes e a maioria dos PV importantes estão a níveis satisfatórios; definir um nível «neutro», por exemplo: a maioria dos PV determinantes e importantes estão a níveis neutros e nenhum PV está a um nível pior que neutro;

• definir pelo menos mais dois níveis: um nível melhor do que «bom» (por exemplo, todas as dimensões determinantes e importantes estão a níveis satisfatórios e nenhum PV secundário está a um nível pior que neutro) e um nível pior do que neutro (por exemplo, pelo menos um PV está a um nível pior que neutro). Naturalmente, podem definir-se outros níveis intermédios quando for apropriado.

8.5. Índices

Um índice é uma combinação analítica de duas ou mais variáveis quantitativas. Existe uma vasta literatura sobre índices, especialmente nos domínios da gestão e da protecção do ambiente (ver Ott, 1978; Beinat et al., 1994; Beinat, 1997). Os índices são um compromisso entre precisão científica e informação concisa (Gilbert e Feenstra, 1994).

Como exemplo, refiram-se os índices de qualidade do ar (IQA) para medir e reportar a qualidade do ar nas zonas urbanas, considerando todos os poluentes (ver U.S. Environmental Protection Agency, 1999) e Babcock e Nagda, 1972). Outro exemplo é descrever o PVF empregabilidade pelo índice NEEC = ¼. EDC + NEEAC, em que NEEC significa número equivalente de empregos criados, EDC significa empregos durante a construção e NEEAC significa número esperado de empregos após a construção, no contexto da construção de uma nova infra-estrutura. A fórmula mostra

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que foi definido um trade-off de 1 para 4 entre os dois tipos de postos de trabalho. Outro exemplo, no contexto de avaliação das medidas para proteger Veneza das marés altas (Collegio di alta Esperti Internazionali, 1998), é medir a frequência de inundações em Veneza pelo número de vezes por ano que o pico da maré na lagoa de Veneza sobe 100 cm acima do nível de referência no local Punta della Salute, em Veneza. O nível 100 é razoável, mas arbitrário, e qualquer outro nível entre 90 e 130 pode ser usado, já que a maior parte das inundações está dentro desses limites.

Uma discussão interessante sobre este tipo de descritor construído é oferecida por Bouyssou (1990), em torno da medição do impacto do ruído da construção de um novo aeroporto sobre a população vizinha. O autor discute várias decisões que têm de ser tomadas na construção de um descritor adequado e apresenta várias fórmulas com diferentes níveis de complexidade que podem ser adoptadas, dependendo das hipóteses feitas sobre a noção do que define um vizinho, da consideração da distância à infra-estrutura ou aos corredores aéreos, do prazo para a avaliação de impacto, da variação esperada na população afectada no período estudado, da evolução da tecnologia das aeronaves em termos de ruído, etc.

No Reino Unido, o procedimento oficial custo-benefício para a avaliação dos investimentos em transportes foi ampliado em 1998 com a introdução da abordagem NATA (New Approach to Appraisal), que introduziu cinco grandes PV relativos a ambiente, segurança, economia, acessibilidade e integração, cada um deles com PVF descritos por índices e descritores qualitativos. Embora não se proceda a análise multicritério formal, elabora-se um quadro-resumo de análise que é uma forma transparente de resumir toda a informação disponível (ver Vickerman, 2000).

8.6. Definição de dois níveis de referência: bom e neutro

Identificar um nível «neutro» (um nível de impacto que não é nem atractivo nem repulsivo) no descritor de cada PVF permite realçar os prós e contras de cada opção analisando simplesmente se os seus impactos são mais ou menos atractivos do que os níveis neutros nos vários PVF. Outra referência intrínseca útil é o «perfil bom», formado por níveis de impacto considerados com bons nos vários PVF.

Como referido por Bana e Costa et al. (2002, ver também Bana e Costa et al., 2003), existem pelo menos mais três razões para recomendar a identificação de dois níveis de referência («bom» e «neutro») de valor intrínseco no descritor de cada PVF:

• O esforço necessário para identificar os níveis de referência, bom e neutro, contribui significativamente para melhorar a inteligibilidade do PVF. Uma coisa é dizer que uma opção é melhor que a outra num PVF, por exemplo em preço, outra completamente diferente é especificar o que se entende por um bom preço ou por preço neutro;

• Uma definição explícita de dois níveis de referência, bom e neutro, torna possível objectivar a noção de atractividade intrínseca de cada opção, classificando-as como:

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o Opção muito atractiva, quando é pelo menos tão atractiva quanto o perfil bom em todos os PVF;

o Opção atractiva, se é pelo menos tão atractiva como o perfil neutro em todos os PVF, mas menos atractiva do que o perfil bom em todos os PVF;

o Opção não atractiva, se é menos atractiva do que o perfil neutro em todos os PVF.

A definição dos níveis de referência bom e neutro permite determinar de forma explícita o valor intrínseco global de cada opção, o que permite evitar escolher uma opção inadequada, por ser a melhor de um conjunto de opções não atractivas.

• Definir os dois níveis de referência bom e neutro permite a utilização de um processo de ponderação dos PVF que é simultaneamente válido no quadro teórico da aplicação de um modelo de agregação aditivo e evita as armadilhas dos procedimentos de ponderação clássicos.

9. Conclusão

Neste artigo procurou-se oferecer uma visão geral sobre a estruturação de PV, com ênfase na construção de descritores. Em muitas análises multicritérios, esta é a actividade mais importante, que muitas vezes engloba toda a justificação e validade da avaliação de opções, se os PVF das partes envolvidas forem identificados e descritos de uma forma clara e compreensível.

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