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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO-SENSU EM
EDUCAÇÃO FÍSICA
ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA (ETCC) SOBRE O CÓRTEX MOTOR NA MODULAÇÃO AUTONÔMICA EM PESSOAS COM
LESÃO MEDULAR COM DIFERENTES GRAUS E NÍVEIS DE LESÃO.
Fabiana Tenório Gomes da Silva
NATAL - RN
2014
ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA (ETCC) SOBRE O CÓRTEX MOTOR NA MODULAÇÃO AUTONÔMICA EM PESSOAS COM
LESÃO MEDULAR COM DIFERENTES GRAUS E NÍVEIS DE LESÃO.
FABIANA TENÓRIO GOMES DA SILVA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Educação Física.
ORIENTADOR: Prof. Dr. Paulo Moreira Silva Dantas CO-ORIENTADOR: Prof. Dr. Eryvaldo Sócrates Tabosa do Egito
iii
iv
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO-SENSU EM EDUCAÇÃO FÍSICA
Coordenador do Programa de Pós Graduação em Educação Física:
Prof. Dr. Arnaldo Luis Motatti
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FABIANA TENÓRIO GOMES DA SILVA
ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA (ETCC) SOBRE O CÓRTEX MOTOR NA
MODULAÇÃO AUTONÔMICA EM PESSOAS COM LESÃO MEDULAR COM DIFERENTES GRAUS E NÍVEIS DE LESÃO.
COMISSÃO EXAMINADORA:
___________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Moreira Silva Dantas Universidade Federal do Rio Grande do Norte
___________________________________________________
Prof. Dr. Breno Guilherme de Araújo Tinôco Cabral Universidade Federal do Rio Grande do Norte
___________________________________________________
Prof. Dr. Alair Pedro Ribeiro de Souza e Silva Universidade Federal do Rio de Janeiro
vi
AGRADECIMENTOS
Existem tantas pessoas para agradecer durante toda minha trajetória até o
presente momento que não sei como começar. Desde então, começo minha colcha
de retalhos através do meu princípio, meio e fim que é JESUS CRISTO, onde todas
as coisas iniciam e convergem. O meu grande EU SOU colocou em minha vida
pessoas que tenho admiração, apreço e amor que são meus pais Sebastião
Jerônimo e Mirian Tenório que se esvaziaram, por longos anos, de seus objetivos e
desejos em função de unificá-los aos meus e aos de minha irmã Evelyne Tenório.
Mãe, Pai e Irmã vejo em vocês a minha base, a minha forma de ser e conduzir os
planos de Deus traçados para mim.
Gostaria de agradecer a meu orientador Prof. Dr. Paulo Moreira Silva
Dantas e a meu co-orientador Eryvaldo Sócrates Tabosa do Egito por participarem
de minha vida acadêmica de forma ímpar, mostrando sempre que o homem por
mais inteligente que possa ser, se não for humilde, o seu melhor se perde na
arrogância, pois a humildade é a partemais bela da sabedoria.
Continuando minha colcha de retalhos, agradeço a todos meus voluntários
que participaram da pesquisa, pois reconheço que não foi fácil para nenhum, mas
que a dificuldade não foi parâmetro para desistirem da pesquisa. Agradeço em
particular ao voluntário Gleidson Rodrigo do Amaral Ribeiro que ajudou de forma
ímpar tabulando os dados, fazendo gráficos e tabelas até altas horas da madrugada.
Agradeço aos meus amigos da base de pesquisa AFISA que sempre me
deram força para concluir minha pesquisa em particular Jeferson Tafarel Pereira do
Rêgo, Leônidas de Oliveira Neto e Rafaela Catherine da Silva que ajudaram de
forma miniciosa na construção e excução do projeto de pesquisa e Scheila Mariza
Pinheiro por ajudar enumeras vezes nas construções de minhas apresentações. Da
mesma forma aos meus alunos de iniciação científica Anna Gracielle Ananias,
Ignáci Tobias Diez, Antônio Carlos Queiroz Aquino e Jordan Carlos Silva de
Medeiros.
Por fim, gostaria de agradecer aos meus familiares e amigos pela
compreensão nos momentos em que a dedicação aos estudos foi exclusiva, a todos
que contribuíram direta ou indiretamente para que esse trabalho fosse realizado meu
eterno AGRADECIMENTO.
vii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 14
2. OBJETIVOS .................................................................................................... 18
2.1 GERAL .......................................................................................................... 18
2.2 ESPECÍFICOS .............................................................................................. 18
3. REVISÃO DE LITERATURA .......................................................................... 19
3.1 LESÃO MEDULAR ........................................................................................ 19
3.2 NEUROANATOMIA ..................................................................................... 20
3.3 LESÃO MEDULAR: ALTERAÇÕES PERIFÉRICAS E CENTRAIS.............. 20
3.4 SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO E ALTERAÇÕES APÓS LESÃO
MEDULAR .........................................................................................................
22
3.4.1 CHOQUE NEUROGÊNICO ...................................................................... 23
3.4.2 HIPOTENSÃO ORTOSTÁTICA .............................................................. 23
3.4.3 DISREFLEXIA AUTONÔMICA ................................................................ 24
3.5 O CÉREBRO E O CONTROLE DO SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO . 24
3.6 ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA
(ETCC) .................................................................................................................
25
3.7 ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA
SOBRE O CÓRTEX MOTOR E ALTERAÇÕES NO SISTEMA NERVOSO
AUTONÔMICO ...................................................................................................
27
3.8 VARIABILIDADE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA ......................................... 28
4. MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................ 29
4.1 MODELO DO ESTUDO ................................................................................. 29
4.2 SUJEITOS ..................................................................................................... 29
4.3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS ......................................................... 30
4.4 PROCEDIMENTOS DA ETCC ...................................................................... 31
4.5 AQUISIÇÃO DA RAZÃO LF/HF, LF E HF ........................................................................................................................
32
5. ANÁLISE ESTATÍSTICA ................................................................................ 32
6. RESULTADOS ................................................................................................ 33
7. DISCUSSÃO ...................................................................................................
8. CONCLUSÃO ..................................................................................................
9. AGRADECIMENTOS .......................................................................................
38
40
40
viii
10. COMENTÁRIOS E SUGESTÕES .................................................................
REFERENCIAS .............................................................................................
40
41
ANEXO ................................................................................................................ 46
ix
LISTA DE ABREVIATURAS
LM Lesão medular
ETCC Estimulação transcraniana por corrente contínua
AEM Atividade elétrica muscular
FC Frequência cardíaca
ASIA American Spinal Injury Association
SNA Sistema Nervoso Autonômico
M1 Córtex motor primário
SNS Sistema Nervoso Simpático
SNP Sistema Nervoso Parassimpático
FC Frequência Cardíaca
PET Tomografia por Emissão de Pósitrons
PME Potêncial Motor Evocado
x
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Características dos sujeitos .......................................................... 33
Tabela 2. Descrição dos resultados de acordo com o grau e nível de lesão .. 34
xi
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Classificação das lesões medulares de acordo com o nível
anatômico da lesão. ..................................................................
20
Figura 2. Sistema nervoso periférico autônomo ...................................... 21
Figura 3 Duração dos efeitos da ETCC anódica e catódica ................... 26
Figura 4. Equipamento portátil de ETCC utilizado no estudo e seus
componentes ............................................................................
31
Figura 5. Ilustração da configuração dos eletrodos, ânodo e cátodo,
para aplicação da ETCC...........................................................
32
Figura 6. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre LF/HF nos períodos
antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da
estimulação (PÓS-E)...........................................................
35
Figura 7. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre LF nos períodos
antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da
estimulação (PÓS-E)............................................................
36
Figura 8. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre HF nos períodos
antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da
estimulação (PÓS-E)............................................................
36
xii
RESUMO
ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA (ETCC) SOBRE O CÓRTEX MOTOR NA MODULAÇÃO AUTONÔMICA EM PESSOAS COM
LESÃO MEDULAR COM DIFERENTES GRAUS E NÍVEIS DE LESÃO.
Autor: FABIANA TENÓRIO GOMES DA SILVA
Orientador: Prof. Dr. PAULO MOREIRA SILVA DANTAS
Introdução: Estimulação transcraniana por corrente continua (ETCC) tem sido usada em estudos voltados para o tratamento da dor periférica crônica em pessoas com lesão medular (LM), mas seus efeitos sobre o sistema nervoso autonômico (SNA) nestes indivíduos são inexistentes e, portanto a necessidade de estudos é de fundamental importância, pois estes indivíduos apresentam desbalanço autonômico, e sua intensidade é dependente do grau e nível da lesão. Objetivo: Investigar se a ETCC sobre o córtex motor primário irá modular o controle do SNA em pessoas com LM e se estas alterações são dependentes do grau e nível de lesão. Métodos: Estudo randomizado, placebo controlado, aplicou ETCC anódica ou sham sobre o córtex motor primário (M1), bilateralmente, com o eletrodo de referência sendo colocado na protuberância occipital. Dezenove sujeitos (lesão incompleta baixa (n=7), completa baixa (n=9) e completa alta (n=3)) visitaram o laboratório três vezes e receberam ETCC ativa ou sham por 13min. A variabilidade da frequência cardíaca (VFC) foi medida antes, durante e pós-estimulação. A VFC foi calculada usando a analise espectral batimento a batimento dos intervalos derivados das ondas r-r. Resultados: A ETCC modulou o sistema nervoso autonômico de forma divergente nos grupos analisados. Nos indivíduos com LM completa alta a ETCC não alterou a VFC. Para os indivíduos com LM incompleta baixa a ETCC alterou a VFC no sentido de aumentar o simpático e reduzir o parassimpático e para os indivíduos com LM completa baixa a ETCC reduziu o simpático e aumentou o parassimpático. Conclusão: O presente estudo observou que a ETCC anódica aplicada sobre o córtex motor primário de forma bilateral, conseguiu modular o balanço do SNA em pessoas com lesão medular e este efeito é dependente do grau e nível de lesão. Palavras-chave: Estimulação Transcraniana; Sistema nervoso autonômico; Variabilidade da frequência cardíaca; Lesão medular.
xiii
ABSTRACT
EFFECT OF ANODAL TRANSCRANIAL DIRECT CURRENT STIMULATION ON
MOVEMENT CONTROL IN PARA-POWERLIFTERS
Author: JEFERSON TAFAREL PEREIRA DO RÊGO
Supervisor: Prof. Dr. HENIO FERREIRA DE MIRANDA
Introduction: Transcranial Direct Current Stimulation (tDCS) has been used in studies for the treatment of chronic pain, but their effects on the autonomic nervous system (ANS) are non-existent. Therefore, the need for studies is of fundamental importance, as these individuals have autonomic imbalance and the intensity of this is dependent on the degree and level of injury. Objective: We investigated the effect of tDCS on the ANS in people with spinal cord injury (SCI) with different degrees and levels of injury. Methods: Randomized, placebo-controlled, double-blind, applied anodal tDCS or sham on the primary motor cortex (M1), bilaterally. The subjects (lower incomplete injury, n = 7; lower complete injury, n = 9; and high complete thoracic injury, n = 3) visited the laboratory three times and received active or sham tDCS for 13min. The heart rate variability (HRV) was measured before, during and after stimulation and analyzed the variables LF, HF and LF / HF. Results: The tDCS modulated the ANS in different ways among the groups. In individuals with SCI high complete thoracic the tDCS did not change the HRV. However, for individuals with SCI low incomplete, tDCS changed the HRV in order to increase sympathetic (LF, p = 0.046) and reduced parasympathetic (HF, p = 0.046). For individuals SCI low complete to tDCS changed the HRV reduction sympathetic (LF, p = 0.017) and increased parasympathetic (HF, p = 0.017). Conclusions: The present study suggests that anodal tDCS applied on the motor cortex bilaterally could modulate the ANS balance in people with spinal cord injury and that this effect is dependent on the degree and level of injury. key words: Transcranial stimulation; Autonomic nervous system; Heart rate variability; Spinal cord injury.
14
1. INTRODUÇÃO
Após a lesão medular (LM) existem alterações fisiológicas que repercutem no
cotidiano destes indivíduos, tais como: aumento do nível de fadiga, hipotensão com
mudanças de decúbito e aumento de fatores que podem desencadear síndrome
metabólica. Atualmente, estudos com pessoas com LM com o objetivo voltado para
melhora na qualidade de vida destes indivíduos são escassos. Desde então a busca
por novas técnicas que gerem resultados positivos no dia a dia desta população são
objetivos de estudo de diversos grupos de pesquisas.
Visando melhorar a qualidade de vida de pessoas com deficiência física e o
aumento do rendimento de paratletas, foi criado em 2011 um projeto de extensão na
universidade federal do Rio Grande do Norte (UFRN), núcleo interdisciplinar para
pessoa com deficiência (NIPED), que consiste no sincretismo de intervenções e
avaliações realizadas por profissionais como fisioterapeutas, educadores físicos,
nutricionistas e psicólogos, prestadas a população.
Em 2012 iniciou-se dentro do NIPED os estudos específicos com lesão medular
(LM), e na busca de sanar alguns questionamentos, observou-se que estudar
apenas alterações em nível periférico, não eram suficientes, desde então, o estudo
do cérebro se tornou a base necessária para nossas inquietações. Dentro desta
perspectiva observou-se que pessoas com LM apresentam diversas alterações
como atrofia cortical de áreas diretamente relacionadas ao movimento como o córtex
motor primário e a área motora suplementar, assim como o trato corticoespinhal(1), e
que este fator interferia diretamente em suas respostas eletromiográficas(2).
Para observar se a estimulação do córtex motor primário, área cortical
responsável pela liberação descendente do movimento, que em indivíduos com LM
é atrofiada, iria interferir na atividade elétrica muscular, chegou-se ao consenso de
analisar os efeitos de uma técnica, que atualmente está sendo utilizada na
reabilitação de pessoas com LM com dor periférica crônica e para o aumento de
rendimento em atletas sem deficiência física que é a estimulação transcraniana por
corrente contínua (ETCC), sobre a atividade elétrica muscular (AEM).
De acordo com a literatura, a ETCC tem mostrado efeito positivo, aumentando a
AEM em contrações isométricas voluntárias máximas(3) em pessoas sem deficiência
física. Desde então, na tentativa de observar se a ETCC iria alterar algum padrão
15
elétrico muscular em um tipo de teste que se aproximasse ao máximo de suas
habilidades diárias, optou-se por um teste dinâmico. Nos estudos iniciais,
analisamos os efeitos da ETCC sobre a atividade eletromiográfica (EMG) e
tolerância ao exercício em indivíduos com LM ativos e sedentários, nossos
resultados mostraram que a ETCC não alterou a EMG nem a tolerância ao exercício
de forma significativa, mas melhorou o tempo de exercício por mais de 1 minutos
para alguns indivíduos.
Nosso próximo passo foi analisar o efeito da ETCC sobre uma variável de
fundamental importância para indivíduos com LM, que foi a variabilidade da
frequência cardíaca (VFC), pois estudos com o uso da ETCC em pessoas com LM
são escassos e pesquisas sobre seus efeitos na VFC só existem em pessoas sem
lesão medular, o que não reflete dados semelhantes, devido aos indivíduos com LM
apresentarem diversas alterações centrais e periféricas, e saber como estas
alterações ocorrem e como funciona o controle do sistema cardiovascular, é de
fundamental importância.
O controle do sistema cardiovascular é realizado, em parte, pelo sistema nervoso
autônomo (SNA), o qual fornece nervos aferentes e eferentes ao coração, na forma
de terminações simpáticas e parassimpáticas. Estas agem no coração de forma
antagônica refletindo diretamente na frequência cardíaca(4). O sistema nervoso
simpático tem o papel de aumentar a frequência cardíaca (FC), a contratilidade
miocárdica, a resistência vascular periférica e a pressão sanguínea, por induzir
vasoconstrição. Já o sistema nervoso parassimpático tem o papel de diminuir a FC(5)
e seus efeitos são amplamente apreciados devido a sua ação anti-arrítmica que é
clinicamente relevante a uma série de estados patológicos(6) e de lesões sobre o
sistema nervoso central, como lesão medular (LM)(7).
O trauma raqui-medular leva o paciente a complicações neurológicas graves
e incapacitantes sob o ponto de vista sensitivo, motor, e neuro-vegetativo abaixo do
local comprometido(5). Existem também disfunções no SNA, pois o controle da FC e
da pressão arterial dependem da atividade dos centros supra-espinhais e sua
comunicação com as vias descendentes e na LM estas vias são interrompidas,
tornando os circuitos da coluna vertebral incapazes de gerar atividade simpática.
Estes fatores geram no paciente bradicardia reflexa, hipotensão ortostática e perda
da flutuação diurna da pressão arterial(5), redução da VFC(8). Esses resultados
sugerem um aumento no controle do sistema nervoso parassimpático e uma
16
diminuição do sistema nervoso simpático em indivíduos lesionados na condição de
repouso.
Existem muitas formas de avaliar o controle neural do coração e atualmente a
variabilidade da frequência cardíaca (VFC) vem sendo utilizada como uma
ferramenta simples, eficaz e não invasiva, para avaliar as flutuações que ocorrem
em períodos curtos ou prolongados entre os batimentos(9). A VFC está relacionada à
variação do ritmo cardíaco, medido pelo tempo transcorrido entre duas ondas R
consecutivas do eletrocardiograma e pelo monitor cardíaco (intervalo R-R). Um
aumento na VFC representa uma maior atividade do sistema nervoso
parassimpático (SNP) e menor da atividade do sistema nervoso simpático (SNS).
Inversamente, uma maior atividade do SNS, representada por uma menor VFC,
estaria relacionada a um maior índice de morbidade e mortalidade(10).
Atualmente técnicas de reabilitação, como a estimulação transcraniana por
corrente contínua (ETCC), são utilizadas com o objetivo de reduzir os efeitos
negativos gerados pela plasticidade cerebral pós-trauma como a inibição inter-
hemisférica e função motora em pacientes pós-avc(11) e dor periférica crônica pós-
lesão medular(12). A ETCC tem ganhado espaço nas pesquisas por ser uma técnica
simples, de fácil manuseio, mais acessível, indolor, não invasiva, sem efeitos
colaterais e por influenciar a excitabilidade cortical(13).
No uso da ETCC existem diversas configurações para colocar os eletrodos no
escalpo, entretanto, na maior parte das pesquisas para dor periférica crônica em
pessoas com LM, o eletrodo ativo é colocado no córtex motor de forma unilateral e o
de referencia no supraorbital o que poderia inibir o córtex pré-frontal medial e reduzir
o controle sobre o sistema nervoso simpático causando simpatoexcitação e assim
reduzir a VFC, o que não é positivo para esta população que já apresenta uma VFC
reduzida e propensão em desenvolver doenças cardíacas e coronarianas.
Embora a aplicação da ETCC em pessoas com LM tenha mostrando
resultados positivos para o tratamento da dor periférica crônica, pouco se sabe se
esta técnica altera a função do SNA nestes indivíduos, pois em pessoas sem
deficiência física a ETCC sobre o córtex motor primário modula o SNA no sentido de
aumento simpático(14), mostrando a necessidade de estudos que analisem os efeitos
da ETCC sobre a VFC em pessoas com LM, para assim, a técnica ser usada de
forma que não apresente riscos aos indivíduos que recebem tal intervenção.
Portanto o problema do presente estudo centra-se na investigação sobre a possível
17
ação da ETCC sobre o córtex motor primário interferindo sobre o controle
autonômico de repouso em indivíduos com lesão medular e se estas alterações são
dependentes do grau e nível de lesão.
18
2. OBJETIVOS
2.1 GERAL
Verificar se a ETCC vai conseguir modular o controle autonômico cardíaco de
repouso em indivíduos com LM que apresentam diferentes graus e níveis de lesão.
2.2 ESPECÍFICOS
Identificar a ação da ETCC sobre o controle autonômico cardíaco no repouso
através da VFC em indivíduos com LM;
Verificar se a ação da ETCC sobre o controle autonômico cardíaco é
dependente do grau e nível de lesão.
Observar os períodos que a ETCC gerou diferença significativa em relação ao
tempo inicial antes da aplicação da ETCC.
Identificar se o tempo que a ETCC gerou alguma alteração significativa é
divergente entre os diferentes graus e níveis de lesão.
19
3. REVISÃO DA LITERATURA
3.1 LESÃO MEDULAR
Lesão medular é um dano à rede neural responsável pela transmissão,
coordenação sensorial e motora, bem como o controle autonômico dos órgãos(15).
Atualmente no Brasil existem cerca de 130 mil pessoas com LM(16), e estimasse que
6 mil novos casos acontecessem por ano(17), sendo caracterizado como o problema
de saúde pública. De acordo com as médias, a incidência de pessoas com LM é
mais expressiva nos adultos jovens, do sexo masculino, solteiros e residentes em
áreas urbanas(18).
A causa predominante constitui-se em virtude de algum tipo de trauma,
infecção, isquemia, compressão por hematoma, tumor, ou ainda, por doença
congênita ou degenerativa, podendo levar a um comprometimento na transmissão
dos impulsos nervosos, gerando alterações variadas na sensibilidade e no controle
motor voluntário e involuntário(19). É importante ressaltar que a etiologia da LM não
implica nas diferenças no quadro da lesão; entre as diversas etiologias há um
compartilhamento semelhante de alterações, consequentes do tipo de lesão –
parcial/incompleta ou total/completa – e da altura da lesão – quanto mais cranial
(alta) a lesão, mais graves são as consequências e comprometimentos.
A classificação proposta pela American Spinal Injury Association(20) vem se
destacando atualmente na literatura como uma importante (talvez a melhor)
ferramenta dentre os principais parâmetros para classificar o indivíduo com LM. A
ASIA(20) classifica em dois tipos de lesões: completa (nenhum impulso nervoso
aferente ou eferente consegue ser enviado às regiões inervadas abaixo do local
da lesão, devido ao total comprometimento das estruturas internas da medula
espinhal); ou incompleta (algumas fibras nervosas são mantidas e, assim, uma
porção dos impulsos nervosos é transmitida).
Conforme a conceituação da ASIA(20), a Tetraplegia refere-se à redução ou
perda da função motora e/ou sensorial no segmento cervical da medula espinhal,
resultando na diminuição das funções tanto dos membros superiores como dos
membros inferiores. A Paraplegia refere-se à redução ou perda da
função motora e/ou sensorial nos segmentos torácico e lombar da medula espinhal
abaixo da LM.
20
Figura 1. Classificação das LM de acordo com o nível anatômico da lesão. Fonte – Adaptado de
Saint Lukes Health, 2009.
3.2 NEUROANATOMIA
A medula espinhal está localizada no canal medular da coluna vertebral e é a
via de condução dos estímulos motores e sensitivos entre o encéfalo e os órgãos
periféricos efetores. Em sua parte externa é encontrada a substância a substância
branca, que contém os tratos longitudinais e sua área central é constituída por a
substância cinzenta, formada por corpos celulares de neurônios espinhais(21).
A medula espinhal mede aproximadamente 42 a 45 cm no adulto do sexo
masculino. Em continuidade com o bulbo, seu limite anatômico cranial é o forame
magno no osso occipital, e o caudal, geralmente, na 2a vértebra lombar (L2)(22). A
medula espinhal faz conexão com 31 pares de nervos espinhais, sendo 8 pares
cervicais, 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais e normalmente 1 coccígeo(19).
A medula recebe impulsos parassimpáticos e simpáticos que são realizados
por diversos neurônios. O estímulo parassimpático é realizado por neurônios
localizados nas regiões tronco-cefálicas e sacrais. Já os estímulos simpáticos são
realizados por neurônios localizados nos segmentos da medula da primeira vértebra
torácica (T1) a segunda vértebra lombar (L2). Estes estímulos se originam via
cerebral e são conduzidos aos órgãos efetores.
21
Figura 2. Sistema nervoso periférico autônomo. Fonte: Adaptado de Machado, 2000.
Estudos revelam que existem áreas cerebrais que são responsáveis pelo
controle do sistema nervoso autonômico (SNA) como a insula(23), o córtex pré-frontal
medial(24), e o córtex motor primário(14) e estas quando estimuladas, inibidas ou
lesionadas alteram o controle autonômico.
3.3 LESÃO MEDULAR: ALTERAÇÕES PERIFÉRICAS E CENTRAIS
Após a LM, ocorrem diversas alterações tanto em nível periférico como em
nível central que normalmente afetam o paciente em sua capacidade funcional e de
realizar as tarefas simples em seu cotidiano, podendo assim, aumentar o risco de
doenças como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas. A intensidade com que
estas alterações ocorrem, dependerá do grau e nível da lesão, com indivíduos com
lesão mais alta, apresentando efeitos mais expressivos(25).
Algumas das alterações em nível periférico que ocorrem pós LM são redução
da área de secção transversa da fibra muscular(26), aumento da porcentagem de
gordura intra-muscular(27), aumento da insulinemia(27), redução de proteínas
responsáveis pelo controle iônico muscular como Na+K+ ATPase(28), aumento da
excitabilidade do trato corticoespinhal resultando em um maior potencial motor
22
evocado nas musculaturas preservadas destes indivíduos(29) além das alterações
hormonais.
Existem diversos hormônios que são alterados pós-lesão, dentre eles as
catecolaminas são o maior foco em estudos. Um estudo recente(30) analisou a
relação entre a liberação de adrenalina plasmática com a quantidade oxidada de
ácido graxo de baixa densidade (LDL) pós-exercício físico, e comparou indivíduos
com LM com indivíduos sem LM. Seus resultados mostraram que durante o
exercício existiu aumento de catecolaminas para ambos os grupos, só que de forma
bem menos expressiva para os indivíduos com LM. Já para a quantidade de LDL
oxidada, não foi observado aumento em indivíduos com LM divergindo dos
indivíduos sem LM que apresentaram aumento significativo. O que pode mostrar a
importante relação da adrenalina para redução de LDL.
Estudos(31, 32) que analisam a concentração de catecolaminas no repouso de
indivíduos com LM e que dividem por grau e nível de lesão, mostram resultados
interessantes, pois indivíduos com paraplegia com a lesão mais baixa apresentam
níveis de adrenalina e noradrenalina mais altos que os indivíduos com paraplegia
com lesão mais alta e indivíduos sem LM, e esta diferença é ainda mais expressiva
quando comparada com tetraplégicos. Estes fatores devem ser levados em
consideração em estudos que analisem disfunção autonômica em indivíduos com
LM.
Estudos com lesados medulares também mostram alterações em nível
central(33), como a hipotrofia(1) do córtex motor primário (M1), redução de fluxo
sanguíneo cerebral(34) e uma área de representação cortical dos membros
superiores maior quando comparados com indivíduos sem lesão medular(29),
mostrando que após a LM existe plasticidade, e esta deve ser levada em conta tanto
em nível de reabilitação, em estágio agudo, como também crônico, pois muitos
destes fatores estão relacionados e divergem de acordo com o tipo, grau e altura da
lesão(34), assim como a capacidade plástica cerebral de cada indivíduo(1).
3.4 SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO E ALTERAÇÕES APÓS LESÃO
MEDULAR
O SNA é composto pelo sistema nervoso simpático (SNS) e pelo
parassimpático (SNP). É responsável por controlar múltiplas funções através de vias
23
complexas, simpáticas e parassimpáticas, com funções regulatórias opostas. O SNS
tem o papel de aumentar a frequência cardíaca (FC), a contratilidade miocárdica, a
resistência vascular periférica e a pressão sanguínea, por induzir vasoconstrição. Já
o sistema nervoso parassimpático tem o papel de diminuir a FC(5) e seus efeitos são
amplamente apreciados devido a sua ação anti-arrítmica que é clinicamente
relevante a uma série de estados patológicos(6) e de lesões sobre o sistema nervoso
central, como LM(7).
Após a LM alguns eventos são reconhecidos como disfunções autonômicas
como o choque neurogênico, a disfunção cardiovascular (hipotensão ortostática) e a
disreflexia autonômica.
3.4.1 CHOQUE NEUROGÊNICO
Logo após a LM ocorre uma estimulação simpática elevada e uma atividade
parassimpática reflexa, que geralmente dura cerca de 3-4 minutos, provocando uma
resposta hipertensiva inicial que é condicionada pela grande libertação de
catecolaminas da supra-renal e é caracterizado como choque neurogênico.
Os efeitos gerados pelo choque neurogênico traduz-se em uma tensão
arterial sistólica inferior a 90mmHg (medida em decúbito dorsal), bradicardia, e
temperatura da pele mais elevada. Seu tratamento implica na correção da
hipotensão e bradicardia, dependendo da gravidade das disfunções cardíaca e
vasomotor(35). E seu tempo de duração é dividido em quatro fases: arreflexia ou
hiporreflexia (0-24 horas); reversão inicial com aparecimento de reflexos (1-3 dias);
hiperreflexia inicial (4 dias - 1 mês) e espasticidade (1-12 meses)(36).
3.4.2 HIPOTENSÃO ORTOSTÁTICA
A hipotensão ortostática é caracterizada por uma diminuição ≥ a 20mmHg na
pressão sistólica e/ou ≥ a 10mmHg diastólica, que geralmente ocorre com uma
média de 3 minutos após a mudança da posição de decúbito para a posição
ortostática, independentemente de ser ou não sintomática(37). Os sintomas são
tonturas e/ou vertigem, cefaleias, fadiga, hipersudorese, náusea, palidez e até
mesmo perda de consciência. Na maioria dos doentes existe uma adaptação
24
progressiva, ao longo do tempo, com diminuição da frequência e gravidade dos
episódios(38).
3.4.3 DISREFLEXIA AUTONÔMICA
Disreflexia autonômica é uma hipertensão episódica que apresenta risco de
vida e se desenvolve em 50-90% das pessoas com tetraplegia ou paraplegia alta(39).
Durante a disreflexia, existe um aumento da pressão arterial que é induzida por
estímulos sensoriais, na medula espinhal, abaixo do nível da lesão, causando
debilitantes dores de cabeça, sudação, convulsões, derrames e até mesmo a morte.
Esta hipertensão pode ser iniciada por procedimentos diários de rotina, tais como a
distensão da bexiga, falta de evacuação intestinal, objetos que causem efeitos
nociceptivos e até mesmo ficar por muito tempo em uma mesma posição(40).
Os mecanismos que são desencadeados para ocorrer a Disreflexia
autônomica, que são considerados incluem a regulação alta dos receptores
vasculares de catecolaminas, aumento da liberação de catecolaminas neural,
diminuição da recaptação pré-sináptica de catecolaminas, perda do reflexo
barorreceptor e perda de inputs inibitórios via bulbo espinhal(41).
3.5 O CÉREBRO E O CONTROLE DO SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO
Embora o sistema cardiovascular seja capaz de manter o fluxo sanguíneo e a
função cardíaca na ausência de estímulos provenientes do sistema nervoso central,
as vias neurais que estão conectadas ao SNA, permitem um controle mais
sincronizado e rápido, quando comparada aos fatores hormonais(42), buscando
manter a homeostasia nas diversas condições diárias dos indivíduos.
É de conhecimento que centros autonômicos cerebrais recebem informações
aferentes sobre os estados autônomos periféricos (43). Assim, áreas do cérebro que
fornecem a integração eferente coordenam as respostas para o controle
autonômico(44). Estudos experimentais têm ajudado a identificar os componentes da
"rede autonômica central" e têm melhorado a nossa compreensão das relações
funcionais entre os centros corticais e subcorticais do controle autonômico
cardiovascular(43).
25
Uma pesquisa(45) realizada com neuroimagem funcional utilizando tomografia
por emissão de pósitrons (PET) em humanos, analisou a pressão arterial média e a
freqüência cardíaca, durante exercício isométrico e tarefas de stress mental e
concluiram que as respostas neurais em regiões cerebrais distintas acompanham
excitação cardiovascular periférica, pois o exercício e as tarefas de stress mental
aumentaram as variáveis analisadas, como também aumentaram o nível de
excitação em áreas cerebrais específicas como o córtex cingulado anterior , córtex
pré-frontal ventromedial e hipocampo córtex pré-frontal medial, cingulado anterior,
lobo temporal medial e ínsula.
Um estudo(46) utilizando PET analisou pressão arterial, variabilidade da
frequência cardíaca e catecolaminas plasmáticas e sua relação com duas áreas
cerebrais, núcleo caudado e o córtex motor primário em indivíduos saudáveis, com
estímulos visuais diferentes, durante o repouso. Seus resultados mostram
correlação negativa entre o aumento do metabolismo da glicose no núcleo caudado
e catecolaminas plasmáticas e frequência cardíaca. Entretanto, houve uma
correlação positiva entre catecolaminas plasmáticas e ativação do córtex motor
primário.
3.6 ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA (ETCC)
O uso da corrente elétrica por pesquisadores teve inicio com a descoberta de
que descargas elétricas geradas por peixes elétricos colocados em contato com a
cabeça de pacientes, desencadeavam efeitos positivos como alivio imediato da dor
de cabeça. Com os avanços tecnológicos, novas técnicas não invasivas para
modular a função cerebral vêm sendo desenvolvidas, dentre as quais se destaca a
ETCC, que tem sido cada vez mais utilizada no âmbito da pesquisa e da prática
clínica para alterar o estado funcional do cérebro humano (47-49).
A ETCC é uma técnica de neuromodulação não-invasiva(50) que é utilizada
para estimulação cortical através de correntes elétricas aplicadas de forma contínua,
com o intuito de aumentar ou inibir a excitabilidade da membrana cortical. As
correntes elétricas aplicadas pela ETCC são divididas em anódica, responsável pelo
aumento da excitabilidade cortical, facilitando o potencial de ação pela redução do
limiar excitatório da membrana e catódica, que está relacionada à inibição do
26
estimulo elétrico no córtex agindo na hiperpolarização da membrana, o que aumenta
o limiar excitatório (51) as correntes anódicas têm o potencial de despolarizar
Os efeitos da ETCC são dependentes de alguns fatores como(51) duração,
intensidade da corrente e polaridade do eletrodo. De acordo com Nitsche e Paulus
que testaram diferentes protocolos de ETCC sobre o potencial motor evocado
(PME), com intensidades de 0,2 e 1,0 mA e tempos de estimulação de 1 e 5 min,
respectivamente, observaram que ETCC anódica com duração de 5 min aumentou a
excitabilidade cortical, incrementando a amplitude do potencial motor evocado em
torno de 40% após a estimulação, enquanto a catódica provocou uma redução de
30% do PME, ou seja, existe uma interdependência entre a polaridade (Figura 2) e o
PME (ânodo estimula e cátodo inibe o PME), bem como a intensidade-dependência
para a corrente anódica (quanto maior a intensidade, maior o PME e repercussão do
efeito pós-estimulação).
Posteriormente foi realizado um outro estudo, observando o efeito da ETCC
em diferentes tempos de estimulação e com dobro da intensidade, analisando os
efeitos da ETCC no decorrer de até 2h pós-estimulação. Foi possível observar que a
ETCC aplicada por 9 min. em uma intensidade de 2mA, gera alterações na
excitabilidade que persiste por uma hora ou mais(49).
Figura 3: Duração dos efeitos da ETCC anódica e catódica. Fonte: Nitsche e Paulus (2000)
Tecnicamente, a ETCC consiste no posicionamento de dois eletrodos de
borracha, envoltos com esponjas embebecidas em meio líquido salino, com o
objetivo de evitar o contato direto com a pele do voluntário, porém permitindo a
27
condução elétrica e reduzindo os riscos de reações indesejáveis(52). A corrente
aplicada durante a ETCC varia entre 0,4 e 2,0mA, aplicada no escalpo em um
período de 3 a 20 minutos, geralmente. Os eletrodos são posicionados de acordo
com o objetivo da aplicação. Caso o intuito seja aumentar a excitabilidade da
membrana cortical, o ânodo é colocado sobre a região objetivada e o cátodo, ou
eletrodo de referência, sobre outra região que não gere influência sobre a primeira.
Se o objetivo for reduzir a excitabilidade do córtex, os eletrodos devem ser
posicionados de forma contrária.
Para a aplicação da ETCC, utiliza-se um equipamento portátil, como o
mostrado na Figura 3, que possui capacidade de transmitir estímulos elétricos
constantes com amperagem máxima de 5mA. O equipamento é constituído por dois
eletrodos (ânodo e cátodo), potenciômetro (componente que permite o controle de
intensidade da corrente) e três baterias de 9V cada. Construído de modo
previamente programado para permitir intervenções simuladas, o aparelho possui
um interruptor na parte traseira que possibilita interromper a passagem de corrente
elétrica aos eletrodos. Porém, é mantida a exibição dos parâmetros de estimulação
ao longo da intervenção. Isto faz com que seja possível a realização de estudos com
grupos controle, a partir da aplicação de estímulos placebo (53).
3.7 ESTIMULAÇÃO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTÍNUA SOBRE O CÓRTEX MOTOR E ALTERAÇÕES NO SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO
Estudos que analisem os efeitos da ETCC no SNA, quando aplicada sobre o
córtex motor primário, são escassos e seus resultados apresentam divergências.
Alguns relatam alterações no sentido de aumento simpático e outros não mostram
alterações, embora o córtex motor primário esteja ligado a vias de controle
autonômico(54), pois o córtex motor apresenta projeções na medula ventrolateral e
esta envia projeções para o núcleo intermediolateral espinhal, onde os neurônios
pré-ganglionares controladores coração e vasos sanguíneos (segmento T2) e da
medula adrenal (segmento T8) são encontrados(54).
Um estudo(55) realizado com indivíduos saudáveis, analisando pressão
sanguínea, temperatura corporal, variabilidade da frequência cardíaca e
concentração plasmática de cortisol, antes e pós 20min de ETCC sobre M1(lado
dominante), mostrou que a ETCC apresentou resultados semelhantes para as
condições sham e anódica para as diferenças encontradas entre os períodos antes e
28
pós ETCC para as variáveis temperatura corporal e concentração de cortisol. Para
as variáveis pressão arterial, variabilidade da frequência cardíaca e ventilação, não
foram encontradas diferenças nem entre os períodos, nem entre as condições sham
e anódica.
Em contra partida, um recente estudo(14) que analisou o efeito da ETCC sobre
o SNA em indivíduos saudáveis, observou que a ETCC anódica aumentou a razão
LF/HF durante e após a estimulação, quando comparada a catódica e sham.
Embora as configurações dos eletrodos, córtex motor primário (hemisfério cerebral
esquerdo) e supraorbital, intensidade da corrente (1mA) e tempo de estimulação
(15min.) tenham sido divergentes dos nossos, talvez o tempo de 13min. com uma
intensidade mais elevada (2mA) sejam suficientes para modular a atividade do SNA
em indivíduos com LM, entretanto não sabemos o tempo que este efeito perdura.
Outro fator que devemos levar em consideração é a configuração dos
eletrodos, pois atualmente a maior parte dos estudos que analisam o efeito da ETCC
sobre o SNA colocam o eletrodo de referência na região supraorbital, podendo
chegar a inibir o córtex pré-frontal medial, e esta área esta relacionada ao controle
do SNA e sua inibição pode gerar aumento de ativação simpática, o que deixa parte
destes estudos inconclusivos(14).
3.8 VARIABILIDADE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA
A variabilidade da frequência cardíaca (VFC) é modulada pela ação do sistema
nervoso autonômico, por isto desperta grande interesse do ponto de vista clínico,
pela caracterização de doenças e lesão que podem influenciar o controle do sistema
nervoso autonômico sobre os batimentos cardíacos, interferindo na variabilidade da
frequência cardíaca. O aumento da variabilidade da frequência cardíaca revela a
diminuição de mortalidade em ambos os gêneros(10).
A mensuração da VFC é um método que nos permite analisar o controle neural
cardíaco durante períodos curtos ou prolongados, em diversas condições fisiológicas
(durante o sono, monitoramento de 24 horas, repouso, exercício físico e bloqueio
farmacológico), patológicas e sobre efeito de intervenções(56-58), apresentando a
vantagem de possibilitar uma avaliação não invasiva e seletiva da função
autonômica, além de ser um recurso metodológico de grande simplicidade e fácil
aplicação(59).
29
O eletrocardiograma (ECG), conversores analógicos e cardiofrequencímetros são
os principais instrumentos utilizados para obtenção de índices que possibilitam a
análise da VFC. Dentre esses dispositivos os cardiofrequencímetros vem se
destacando devido a sua fácil aplicação, natureza não invasiva e a possibilidade do
seu uso em estudos de campo e durante a prática desportiva permitindo assim
registros da VFC com segurança e praticidade fora do ambiente ambulatorial(60).
A VFC pode ser analisada através de dois métodos: pelo cálculo de índices
baseado em operações estatísticas dos intervalos R-R (domínio do tempo) e pela
análise espectral de intervalos R-R ordenados (domínio da frequência). As análises
podem ser realizadas em segmentos curtos - 0,5 a 30 minutos - ou em gravações
mais longa de 24 horas(61).
As medidas do domínio da frequência são derivadas da análise do espectro de
potência que apresenta a distribuição da densidade em função da frequência2. Esta
análise decompõe a FC em seus componentes causadores, apresentando-os de
acordo com a frequência com que alteram a FC. E, além da quantidade de
variabilidade, também mostra as bandas de frequência das oscilações do ritmo
cardíaco1.
São destacadas duas faixas de frequências distintas: 1) alta frequência (0,15 a
0,40 Hz), elas são devidas à modulação vagal atuante sobre o nódulo sinoatrial(62) e
2) baixa frequência (0,04 a 0,15 Hz) elas expressam a intensidade da modulação
simpática sobre o coração(63). Os componentes de alta e baixa frequência são assim
chamados devido ao fato do nervo vago e o sistema simpático enviarem,
respectivamente, uma maior ou menor frequência de impulsos sobre o nodo
sinusal(63).
4. MATERIAIS E MÉTODOS
4.1 MODELO DO ESTUDO
O presente estudo caracteriza-se como sendo de medidas repetidas,
randomizado com desenho cruzado, placebo controlado e duplo cego. Desta forma,
todos os sujeitos passaram por todas as condições de estimulação e a controle(64).
4.2 SUJEITOS
30
Dezenove indivíduos (32,47±8,07 anos; 62,12±13,83 Kg) de ambos os sexos
(3 mulheres e 16 homens), com lesão medular crônica (16,92±11,74 anos), dos
quais 7 apresentando lesão baixa incompleta em nível T12 - L1, 9 com lesão baixa
completa a nível T11 e T12 e 3 com lesão alta completa entre C4 e T6, destros
(inventário de dominância lateral de edimburgo(65)), foram informados dos
procedimentos e riscos antes de assinarem o termo de consentimento livre e
esclarecido. Os critérios de inclusão foram a não existência de lesão cerebral,
diabetes, doenças cardíacas de alto risco e não apresentar peças metálicas. Além
disso, cada voluntário foi instruído a não se alimentar até 3h antes do teste, não
realizar atividade física vigorosa, fazer a ingestão de álcool e alimentos que
contivessem cafeína, usar drogas ou nicotina e fazer atividades de stress mental
elevado por muito tempo, durante um período de 24h antes dos testes. O laboratório
apresentava temperatura e umidade do ar ideais para realização da pesquisa e
isolamento acústico para evitar qualquer alteração de estimulo auditivo nos
voluntários. Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética local (750.887). Todos os
participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
4.3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS
Na primeira visita ao laboratório, cada indivíduo respondeu a uma anamnese
que continha questões sobre tempo, tipo e grau da lesão, histórico pessoal de
doenças crônicas degenerativas e para pesagem. Posteriormente foi explicado como
seria realizada a pesquisa.
Nas visitas seguintes ao chegar ao laboratório cada indivíduo ficou em
repouso por 10min em uma maca, para analise da VFC, antes de começar a
condição experimental – ETCC anódica ou sham (ver procedimentos ETCC) – por
13 min, que foi realizada com indivíduo sentado na cadeira de rodas. Logo após a
estimulação, passou mais 10minutos na maca para uma nova analise da VFC. A FC
e a VFC foram gravadas em toda a extensão do experimento.
Todas as condições da pesquisa foram realizadas em um mesmo horário para
evitar os efeitos de alterações do ciclo circadiano e com um intervalo de no mínimo
72hrs entre cada sessão, para não ocasionar o efeito carry-over(66). As sessões
foram randomizadas e de forma duplo-cego. A partir dos dados obtidos nos testes, a
31
razão LF/HF, LF e HF foram calculados através dos 5minutos finais de cada
condição de repouso na maca e durante toda a condição de ETCC (13 minutos).
4.4 Procedimentos da ETCC A corrente elétrica foi aplicada por um aparelho portátil que é constituído por 4
componentes principais: eletrodos (ânodo e cátodo com área de 35cm2 ou 36 cm2)
amperímetro (medidor de intensidade de corrente elétrica), potenciômetro
(componente que permite a manipulação da intensidade da corrente) e 3 baterias
(9v) para gerar a corrente aplicada. Os eletrodos serão envoltos em uma esponja
umedecida com solução salina (150Mm NaCL). Ver figura 4.
Figura 4: equipamento portátil de ETCC utilizado no estudo e seus componentes
Foi utilizado o sistema internacional EEG 10-20 para posicionamento dos
eletrodos que foram colocados na região Cz (área do córtex motor primário (M1)),
onde o anodo foi colocado bi-lateralmente com 4,5cm no hemisfério esquerdo e 4,5
cm no direito. O eletrodo de referência foi colocado na protuberância occipital, com o
objetivo de evitar efeitos inibitórios sobre a área supra-orbital contra-lateral (Fp2)(14),
o que poderia alterar os resultados da VFC. Ver figura 5.
Foi utilizada uma corrente elétrica constante de 2 mA aplicada durante 13min
com os 30seg iniciais e finais foi realizado a rampa (aumento e redução gradativos
da corrente ate chegar aos 2mA (inicial) e 0mA (final)). Para a condição de farsa, os
eletrodos foram colocados nas mesmas posições que utilizamos na anódica, no
entanto, o estimulador foi desligado após 30 s de estimulação(53).
32
Figura 5. Ilustração da configuração dos eletrodos, ânodo e cátodo, para aplicação da ETCC.
4.5 AQUISIÇÃO DA RAZÃO LF/HF, LF E HF
A VFC foi gravada por um monitor cardíaco (polar®RS 800CX). O resultado do
intervalo r-r foi passado para o computador através do software polar protrainer 5
(polar®RS 800CX). As variáveis LF/HF, HF e LF foram calculadas utilizando os
5minutos finais dos 10minutos de repouso na maca (antes e pós etcc) e 13min
durante toda a estimulação pelo software Kubios HRV.
5. ANÁLISE ESTATÍSTICA
Para análise estatística, inicialmente foi realizado um teste não
paramétrico Shapiro wilk para observar o comportamento da distribuição de dados.
Em seguida foi utilizada a estatística descritiva não paramétrica com os valores de
tendência central (mediana). Como análise inferencial da variabilidade da frequência
cardíaca utilizou-se o teste de Friedman para comparar as condições pré, durante e
pós ETCC e wilcoxon entre dois períodos de intervenção, ambos considerando, para
o teste de hipótese, o p-valor < 0,05, ou seja, mais de 95% de probabilidade de não
se cometer o erro do tipo I.
33
6. RESULTADOS
A Caracterização da amostra pode ser observada na tabela 1 e a descrição dos nossos resultados podem ser vistos na tabela 2. TABELA 1. Características dos sujeitos (n=19)
Nº. Idade Sexo Peso Medicações Tempo de lesão
Causas da lesão
Nível da lesão
1 24 F 63,4 Dor 10 PARASITA LBI
2 24 F 64,4 - 24 MIELOME LBC
3 26 F 54,3 - 26 MIELOME LBC
4 23 M 60,9 - 23 POLIOMIE LBI
5 23 M 54 AU 2 TRAUMA LAC
6 25 M 65,3 - 7 TRAUMA LBC
7 27 M 46,5 AU 27 MIELOME LBC
8 30 M 46,3 - 17 TRAUMA LBI
9 30 M 47,5 - 17 TRAUMA LBI
10 31 M 68,4 TDM/AUC/C/I 16 TRAUMA LBC
11 31 M 60,3 - 31 MIELOME LBC
12 34 M 73,5 AUC 2,5 TUMOR LBC
13 35 M 48,8 - 27 POLIO LBI
14 36 M 51,8 RM 14 TRAUMA LAC
15 38 M 74 AU 9 TRAUMA LAC
16 41 M 89 AH/AU 1,5 TRAUMA LBI
17 41 M 89,1 AU 1,5 TRAUMA LBI
18 46 M 44,9 - 44,9 POLIO LBC
19 51 M 78 - 19 TRAUMA LBC
AH= anti-hipertensivo, Dor = para dor aguda e crônica, TDM= tratamento de doenças musculares, C= corticoide, I= imunossupressor, AU= antiespasmódico urinário, AUC= antiulceroso, RM= relaxante muscular, MIELOME= mielomeningocele, PC= paralisia cerebral, POLIO= poliomielite, LBC= lesão baixa completa, LAC= lesão alta completa, LBI= lesão baixa incompleta.
34
Tabela 02. Descrição dos resultados de acordo com o grau e nível de (Wilcoxon test, *§¥p<0,05, n.u. – Unidades normalizadas). Anodal - Before
(LF_HF)
Anodal - During
(LF_HF)
Anodal - After
(LF_HF)
Sham - Before
(LF_HF)
Sham - During
(LF_HF)
Sham - After
(LF_HF)
Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max
COMPLETE
HIGH
1,4 0,7 8,9 1,8 0,4 3,2 2,2 0,8 10,6 3,0 0,8 6,4 1,3 0,4 3,7 2,0 0,5 4,0
INCOMPLETE
LOW
3,0* 0,7 6,9 2,2 1,6 7,2 3,5* 1,4 10,5 4,0 1,6 9,6 3,1 0,7 8,5 3,0 0,6 11,7
COMPLETE LOW 3,5*§ 1,5 8,7 1,8§ 0,5 2,6 2,6* 1,2 6,9 3,1 1,2 7,1 1,8 0,9 4,0 3,1 0,8 7,5
Anodal - Before
(LF)
Anodal - During (LF) Anodal - After (LF) Sham - Before (LF) Sham - During (LF) Sham - After (LF)
Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max
COMPLETE
HIGH
58,9 41,2 89,9 69,4 28,0 93,6 68,5 43,1 91,4 73,4 44,4 86,4 56,1 28,3 78,9 66,6 34,4 79,9
INCOMPLETE
LOW
74,6* 10,1 58,8 68,0 6,4 72,0 76,3* 8,6 56,9 79,2 13,6 61,0 75,4 21,1 71,7 73,8 20,1 65,6
COMPLETE LOW 74,7 39,4 87,3 66,9¥ 61,6 89,5 71,2¥ 58,7 91,3 75,5 62,1 90,5 67,3 42,5 89,5 75,2 38,0 92,1
Anodal - Before (HF) Anodal - During
(HF)
Anodal - After (HF) Sham - Before (HF) Sham - During (HF) Sham - After (HF)
Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max Med Min Max
COMPLETE
HIGH
41,1 10,1 58,8 30,6 6,4 72,0 31,5 8,6 56,9 26,6 13,6 61,0 43,9 21,1 71,7 33,4 20,1 65,6
INCOMPLETE
LOW
25,4* 12,7 60,6 32,1 10,5 38,4 23,7* 8,7 41,3 27,2 13,6 95,0 24,4 13,6 95,0 26,3 10,5 57,5
COMPLETE LOW 25,3 10,3 39,7 33,1¥ 5,6 65,2 28,8¥ 6,1 45,1 24,6 12,3 45,0 32,7 7,4 52,6 24,8 11,8 56,3
Bold indicates significant differences between pairs (* before and after; § Before and during; ¥ During and after).
35
Lesão alta completa
Para todas as variáveis (LF/HF, LF e HF) não existiu diferenças significativas
entre os períodos analisados.
Lesão baixa incompleta
Foi observado diferença significativa apenas na condição anódica nas
variáveis LF/HF entre os períodos antes e pós-estimulação (p=0,046) e durante e
pós-estimulação (p=0,046), para LF no período antes e pós-estimulação (p=0,046) e
para HF no período antes e pós-estiulação (p=0,046). Ver figuras 6,7 e 8.
Lesão baixa completa
Observamos diferenças significativas apenas na condição anódica na variável
LF/HF entre os períodos antes e durante (p=0,042) e durante e pós (p=0,018), para
LF entre os períodos durante e pós (p=0,017) e HF durante e pós (0,017). Ver figuras
6,7 e 8.
FIGURA 6. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre LF/HF nos períodos antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da estimulação (PÓS-E).
*
* €
€
§
§
¥
¥
36
FIGURA 7. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre LF nos períodos antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da estimulação (PÓS-E).
FIGURA 8. Efeitos da ETCC sham e anódica sobre HF nos períodos antes (PRÉ-E), durante (DURANTE-E) e depois da estimulação (PÓS-E).
7. DISCUSSÃO
Nosso estudo analisou o efeito da ETCC aplicada sobre o córtex motor primário,
nos dois hemisférios cerebrais, sobre variabilidade da frequência cardíaca em
indivíduos com LM que apresentam diferentes graus e níveis de lesão, e observamos
¥
¥
* *
* *
¥
¥
37
que a ETCC modula o sistema nervoso autonômico de forma divergente nos grupos
analisados. Nos indivíduos com LM completa alta a ETCC não alterou a VFC de
forma significativa. Para os indivíduos com LM incompleta baixa a ETCC alterou a
VFC no sentido de aumentar o simpático e reduzir o parassimpático e para os
indivíduos com LM completa baixa a ETCC não apresentou diferenças significativas
entre as condições inicial e final, mas apresentou alteração, embora não significativa,
no sentido de reduzir o simpático e aumentar parassimpático.
Talvez a diferença entre os efeitos da ETCC entre os indivíduos com LM baixa,
possam ser devido à quantidade de adrenalina possivelmente ser mais elevada nos
indivíduos com LM completa baixa(32), devido este fator está diretamente relacionado
ao grau de desnervação simpática, pois após destruição de um nervo simpático, o
órgão inervado se torna bem mais sensível à adrenalina, devido ao aumento de
receptores adrenérgicos(67). Desde então, os indivíduos com lesão baixa completa
apresentam hipersensibilidade adrenérgica, em nível das adrenais, portanto até
mesmo um pequeno estímulo simpático, pode causar uma alta liberação de
adrenalina em nível sistêmico, e a ETCC possa ter gerado um efeito rebote durante
sua aplicação, reduzindo o estímulo simpático e aumentando o parassimpático, mas
posteriormente voltando a seus níveis anteriores.
Embora clancy (2014)(14) tenha observado que a ativação do córtex motor
primário em indivíduos saudáveis tenha apresentado aumento de estímulo simpático,
um estudo(55) anteriormente realizado, pode mostrar um possível efeito rebote da
ETCC, pois na análise de cortisol 20min pós ETCC anódica gerou redução dos níveis
séricos quando comparados ao período antes da estimulação, caracterizando
possivelmente redução do nível de stress. Outro fator interessante é a atuação da
ETCC na modulação das supra-renais, mostrando que existe modulação sistêmica e
não só local como a cardíaca.
Nossos resultados mostraram que a ETCC aumentou o estímulo simpático para o
grupo com LM incompleta baixa, mas não para o grupo com LM completa alta, talvez
estes dados revelem que a ETCC não seja capaz de modular o SNA quando a
inervação simpática na região cardíaca é reduzida. Também é de conhecimento, que
indivíduos com LM baixa apresentam uma quantidade de adrenalina mais elevada do
que indivíduos com lesão alta e indivíduos sem LM(32), talvez devido à preservação
38
da atividade das adrenais, o que talvez possa justificar o aumento simpático, gerado
pela ETCC, neste grupo.
Outro fator que talvez possa explicar a inexistência de alteração no SNA gerado
pela ETCC nos indivíduos com lesão alta, é que embora a liberação dos hormônios
produzidos pelas supra-renais não necessitem de estímulos neuronais diretos,
devido a existência de barorreceptores nas células renais apresentarem a
capacidade de sentir pequenas alterações no fluxo sanguíneo renal e transmitir esta
informação para as supra-renais, dando a capacidade de se autorregular, existe a
necessidade de alterações em outras vísceras para que ocorra este mecanismo(67).
Estas vísceras necessitam de estimulo neuronal direto para serem ativadas,
divergindo das supra-renais, e portanto, a presença de inervação simpática se torna
essencial para um bom funcionamento sistêmico, mas em indivíduos com LM alta
estas inervações não estão mais preservadas e o estímulo para liberação de
adrenalina e noradrenalina, pelas supra-renais estão reduzidos.
Estudos com animais (68, 69), relatam que o córtex motor apresenta projeções na
medula ventrolateral e esta envia projeções para o núcleo intermediolateral espinhal,
onde os neurônios pré-ganglionares controladores coração e vasos sanguíneos
(segmento T2) e da medula adrenal (segmento T8) são encontrados. Recente
estudo(14) com estimulação cerebral não invasiva em humanos revela participação de
M1 na ativação simpática, mostrando aumento simpático pós-estimulo elétrico. Como
estimulamos M1 de forma bilateral, talvez os indivíduos com LM incompleta
pudessem apresentar inervações sobre as adrenais e ter ocasionado estímulo
simpático, gerado via córtex motor, através da ETCC, divergindo assim, dos
indivíduos que com LM completa baixa, que não apresentavam as terminações
nervosas preservadas e, portanto não aconteceu o mesmo efeito.
Como observado em nossos achados, à resposta da ETCC apresentou
divergências de acordo com o grau e nível da lesão, este fator pode está também
relacionado ao grau de atrofia em áreas corticais(70) e fluxo sanguíneo cerebral
reduzido(34) em M1, pois estes fatores estão relacionados com a gravidade da lesão.
Sendo assim, a ETCC não conseguiria modular o SNA em indivíduos com LM alta
completa, cuja gravidade da lesão é mais acentuada, apresentando maior atrofia e
menor fluxo sanguíneo cerebral.
39
Embora estudos(14, 34, 68) mostrem que o córtex motor está envolvido em ajustes
cardiovasculares associados com a atividade motora somática, por apresentar
ligações funcionais com a medula ventrolateral, uma região do tronco cerebral
criticamente envolvida no controle da pressão sanguínea e na regulação dos níveis
de catecolaminas no plasma, os resultados de estudos com ETCC estimulando o
córtex motor e seus efeitos sobre o SNA são divergentes.
Um estudo(55) realizado com indivíduos saudáveis mostrou que a ETCC sobre
córtex motor, aplicada unilateralmente, apresentou resultados semelhantes para as
condições sham e anódica para as diferenças encontradas entre os períodos antes e
pós ETCC nas variáveis temperatura da pele e cortisol. Para as variáveis pressão
arterial, variabilidade da frequência cardíaca e ventilação não foram encontradas
diferenças significativas entre os períodos, nem entre as condições sham e anódica.
Um estudo(14) recente que analisou o efeito da ETCC sobre o SNA em indivíduos
saudáveis, corrobora com os nossos resultados, pois observou que a ETCC anódica
aumentou a razão LF/HF durante e após a estimulação, quando comparada a
catódica e sham. Embora as configurações dos eletrodos, córtex motor primário
(hemisfério cerebral esquerdo) e supraorbital, intensidade da corrente (1mA) e tempo
de estimulação (15min.) tenham sido divergentes dos nossos, talvez o tempo de
13min. com uma intensidade mais elevada (2mA) sejam suficientes para modular a
atividade do SNA em indivíduos com LM baixa, entretanto não sabemos o tempo
que este efeito perdura.
Outro fator importante a ser analisado é a configuração como os eletrodos são
colocados no escalpo do indivíduo, pois a maior parte dos estudos o eletrodo de
referência é colocado no supraorbital, e estudos relatam que o córtex pré-frontal
medial está relacionado com o controle autonômico simpático, e a colocação do
eletrodo de referência na região supraorbital, pode reduzir a ativação do córtex pré-
frontal medial e aumentar o estímulo simpático(14). Nosso estudo anula esta
possibilidade, pois colocamos o eletrodo de referência na protuberância occipital,
desde então, podemos analisar o efeito da ETCC sobre M1.
Nossos resultados trazem dados importantes para futuras intervenções com o uso
da ETCC em pessoas com LM, pois estes indivíduos apresentam uma variabilidade
da FC reduzida e como observado, os indivíduos com LM incompleta baixa
40
apresentaram aumento simpático, efeito considerado bastante positivo para estes
indivíduos que praticamente não apresentam alterações diurnas em sua FC, desde
então, o uso da ETCC poderia reduzir alguns sintomas como redução de fluxo
sanguíneo cerebral, tonturas e fadiga antecipada. Já para os indivíduos com LM
completa baixa a ETCC, dependendo da intensidade e tempo que será aplicada, não
seria indicada, pois reduz a ativação simpática, o que poderia reduzir ainda mais a
variabilidade da FC nestes indivíduos. Já para os indivíduos com LM completa alta, a
ETCC por não apresentar alterações, apresenta-se mais segura para a aplicação
com outros fins, como tratamento da dor periférica crônica pós-lesão.
8. CONCLUSÃO
O presente estudo mostrou evidencias de que a etcc anódica aplicada sobre o
cortex motor de forma bilateral, conseguiu modular o balanço do SNA em pessoas
com lesão medular e este efeito é dependente do grau e nível de lesão. Os
indivíduos com LM completa alta não apresentaram alterações com a aplicação da
ETCC. Já os indivíduos com LM baixa incompleta e completa, apresentaram
alterações autonômicas, e estas foram divergentes. Os individuos com LM baixa
incompleta apresentaram aumento simpático e redução parassimpática, já os
indivíduos com LM baixa completa, apresentaram redução do simpático e aumento
do parassimpático.
9. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todos os integrantes da base de pesquisa em atividade física
e saúde (AFISA) e do laboratório do movimento humano (LABMOV) da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte.
10. COMENTÁRIOS E SUGESTÕES GERAIS
Esse estudo trouxe questionamentos pertinentes sobre fatores positivos dos
efeitos da ETCC anódica aplicada sobre o córtex motor. Um deles é sobre a duração
dos efeitos após aplicação da ETCC, pois dependendo do tempo que perdure o
41
efeito da estimulação, seria interessante a analise da dosagem/dia para ser aplicada
em indivíduos com LM, já que os mesmos apresentam uma variabilidade da FC
bastante reduzida e a ETCC pode aumentá-la. Outro fator importante é que não
temos conhecimento dos efeitos que a ETCC pode gerar nestes indivíduos em nível
cortical, quando usado cronicamente, desde então observamos a necessidade de
mais estudos.
Outro ponto interessante é quanto à montagem dos eletrodos, que podem
aplicar corrente elétrica bilateral ou unilateral sobre o córtex motor. Ao que temos
conhecimento, nenhum estudo comparou o efeito de diferentes montagens para
estimulação no córtex motor em indivíduos com LM. A existência de estudos mais
aprofundados que analisem o efeito da ETCC dependendo do grau e nível da lesão
também se torna fundamental.
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46
ANEXO
ANEXO 1
47
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE
Esclarecimentos
Este é um convite para você participar da pesquisa intitulada “Estimulação Transcraniana por
Corrente Contínua (ETCC) altera a tolerância ao exercício em pessoas com lesão medular?´´ que tem
como pesquisador responsável Fabiana Tenório Gomes da Silva.
O objetivo dessa pesquisa é verificar se a estimulação transcraniana por corrente contínua,
que é uma tecnica de estimulação cerebral não invasiva e indolor, irá modificar o tempo de exercício.
O motivo que nos leva a fazer este estudo é a existência de poucas pesquisas que utilizem a
ETCC visando melhoras na aptidão física de pessoas com lesão medular, pois estes indivíduos
apresentam alterações em nível cerebral e muscular e estas podem reduzir a tolerância ao exercício.
Caso decida aceitar o convite, você será submetido(a) ao(s) seguinte(s) procedimentos: (1)
Familiarização com os equipamentos e escala utilizada; (2) Testes de esforço máximo no
cicloergômetro; (3) através de um sorteio, você será submetido (em dias diferentes) a uma sessão de
estimulação cerebral anódica (estimulação verdadeira) ou placebo (estimulação falsa), com duração
de 13 (treze) minutos e com 48-72h de intervalo entre elas; (4) ao decorrer dos testes máximos, que
você fará até a exaustão, serão coletados frequência cardíaca, em intervalos pré-estabelecido irá nos
informar sobre a percepção do esforço (como você está se sentindo) e antes e pós teste será
coletado uma pequena quantidade de sangue para análise da glicemia. As sessões experimentais
serão realizadas em uma sala especialmente preparada (com pouco barulho e baixa luminosidade).
O Projeto não apresenta riscos significativos para os participantes, pois todos os artigos
científicos, até hoje, não relatam a existência de efeitos colaterais devido à aplicação da estimulação,
mostrando que a técnica é segura, talvez você possa sentir um leve formigamento na região de
colocação dos eletrodos e leve dor de cabeça. Você também pode sentir uma leve sensação de fadiga
durante a realização dos experimentos. O benefício provável da pesquisa, caso a nossa hipótese seja
confirmada, é a melhoria da sua função cerebral e periférica durante a prática de exercício físico
associado à ETCC, o que será um avanço tanto em nível de reabilitação aguda como crônica, pois o
exercício físico em pessoas com lesão medular, em sua maioria, é desencorajado devido a não
aguentarem muito tempo de exercício, levando-os a desistência. Além disso, você pode contribuir
para o entendimento da influência do cérebro humano durante a prática de exercício físico em
indivíduos com lesão medular.
Em caso de algum problema que você possa ter, relacionado com a pesquisa, você terá
direito a assistência gratuita que será prestada (pela UFRN e de responsabilidade da pesquisadora
Fabiana Tenório Gomes da Silva).
Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando para (Fabiana
Tenório Gomes da Silva, 9143-1590).
48
Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer fase
da pesquisa, sem nenhum prejuízo para você.
Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas em
congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de nenhum dado que possa lhe
identificar.
Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa em local
seguro e por um período de 5 anos.
Se você tiver algum gasto pela sua participação nessa pesquisa, ele será assumido pelo
pesquisador e reembolsado para você.
Se você sofrer algum dano comprovadamente decorrente desta pesquisa, você será
indenizado.
Qualquer dúvida sobre a ética dessa pesquisa você deverá ligar para o Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, telefone 3215-3135.
Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com o pesquisador
responsável (Fabiana Tenório Gomes da Silva).
Consentimento Livre e Esclarecido
Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os dados serão
coletados nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios que ela trará para
mim e ter ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar da pesquisa (Estimulação
Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC) altera a tolerância ao exercício em pessoas com lesão
medular?), e autorizo a divulgação das informações por mim fornecidas em congressos e/ou
publicações científicas desde que nenhum dado possa me identificar.
Natal , , 2014
Assinatura do participante da pesquisa
Declaração do pesquisador responsável
Como pesquisador responsável pelo estudo (Estimulação Transcraniana por Corrente
Contínua (ETCC) altera a tolerância ao exercício em pessoas com lesão medular?), declaro que
Impressão datiloscópica do
participante
49
assumo a inteira responsabilidade de cumprir fielmente os procedimentos metodologicamente e
direitos que foram esclarecidos e assegurados ao participante desse estudo, assim como manter sigilo
e confidencialidade sobre a identidade do mesmo.
Declaro ainda estar ciente que na inobservância do compromisso ora assumido estarei
infringindo as normas e diretrizes propostas pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde –
CNS, que regulamenta as pesquisas envolvendo o ser humano.
Natal , , 2014.
Assinatura do pesquisador responsável
50
ANEXO 2
51
Liberação do comitê de ética