entre o gatilho e os laÇos de amizade: uma análise de recepção sobre a representação social da...
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Este trabalho teve o objetivo de analisar a maneira com que jovens da rede pública de ensino constroem as representações sociais da periferia de Belém, a partir da influência midiática de videoclipes que utilizaram como cenário esses espaços. O primeiro vídeo utilizado na pesquisa chama-se Devorados e foi gravado na comunidade Vila da Barca, no bairro do Telégrafo, pela banda Madame Saatan, já o segundo denominado Matinha do Cruzeiro é uma produção do Coletivo Rádio Cipó e foi rodado na comunidade Álvaro Adolfo, situada na Pedreira. O aporte teórico empregado nessa monografia foram os autores Serge Moscovici, Jodelet e Abric e, além disso, os conceitos de cidade e periferia de Milton Santos que possibilitaram alcançar o objetivo da pesquisa, o de verificar e analisar as representações sociais engendradas pelos jovens sobre Belém do Pará.TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
ALINE MERIANE DO CARMO DE FREITAS
ENTRE O GATILHO E OS LAÇOS DE AMIZADE: uma análise de
recepção sobre a Representação Social da Periferia de Belém.
BELÉM
2011
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
ALINE MERIANE DO CARMO DE FREITAS
ENTRE O GATILHO E OS LAÇOS DE AMIZADE: uma análise de
recepção sobre a Representação Social da Periferia de Belém.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Comunicação Social, habilitação em
Jornalismo, na Universidade Federal do Pará.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Fonseca de Castro.
BELÉM
2011
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
_________________________________________________________________
_____
305
F866p Freitas, Aline Meriane do Carmo de
Entre o gatilho e os laços de amizade: uma análise de recepção sobre a
representação social da periferia de Belém / Aline Meriane do Carmo de
Freitas. - 2011.
85 f.: il.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) -- Faculdade de
Comunicação Social, Universidade Federal do Pará, 2011.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Fonseca de Castro.
1. Periferia. 2. Representações Sociais. 3. Videoclipe. 4. Juventude. 5.
Cidade. I. Castro, Fábio Fonseca de, orient. II. Título.
______________________________________________________________________
ALINE MERIANE DO CARMO DE FREITAS
ENTRE O GATILHO E OS LAÇOS DE AMIZADE: uma análise de
recepção sobre a Representação Social da Periferia de Belém.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Comunicação Social, habilitação em
Jornalismo, na Universidade Federal do Pará.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Fonseca de Castro.
Aprovado em:
Conceito:
Banca examinadora:
______________________________________
Orientador: Prof. Dr. Fábio Fonseca de Castro
______________________________________
Professor
______________________________________
Professor
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos moradores das periferias
brasileiras, em especial aos jovens, que são as
principais vítimas dos pormenores de se habitar
espaços ausentes de infraestrutura adequada.
AGRADECIMENTOS
Ao Rei dos reis e Senhor dos senhores seja toda honra, glória e louvor. A
Yeshua Hamashia meus agradecimentos por mais um ciclo que se encerra na minha
vida e pela certeza de que um novo tempo começa, a partir da defesa deste trabalho. À
Deus pela oportunidade de estudar em uma das maiores universidades públicas desse
país, algo ainda restrito em nossos dias. Ao amigo Espírito Santo que me guardou, me
livrou e esteve comigo durante todos os dias desse curso e que em meio às lutas e crises
não me deixou desistir. Obrigada papai do céu pela convicção de que o melhor de Deus
ainda estar por vir.
Aos maravilhosos pais Walmir e Rosemeire Freitas que me ensinaram tudo que
eu sei hoje e que mesmo não tendo a oportunidade de cursar uma universidade quando
jovens lutaram contra todas as dificuldades para que eu chegasse até aqui. São por
vocês, meus pais, o esforço e a dedicação empregados para terminar essa monografia.
Meus amores, eu tenho muito orgulho da história de vida de cada um e sou muito grata
por terem me amado, educado, protegido, mas também por terem sido sábios e me
disciplinado quando foi preciso, isso fez com que eu não me perdesse em meio a tantas
“ofertas” do mundo. Amo vocês! E saibam que eu sou muito feliz, porque a minha casa
é um pedacinho do céu.
À minha irmã Amanda Freitas que sempre será minha caçulinha amada
independente da sua idade. Maninha, eu te amo e agradeço os conselhos, as piadas, o
ombro amigo e principalmente por ser mãe da pessoinha mais importante do mundo pra
mim, a minha sobrinha Sofia Freitas que com um sorriso no rosto e fazendo um coração
com as mãozinhas me alegra diariamente. Escuta-la dizer: “Titia, eu te amo!” é um das
minhas maiores felicidades. Amo!
Aos meus avós maternos Carlos Alberto e Maria de Lourdes do Carmo e aos
paternos Aristotes e Filomena Freitas que eu ainda tenho o privilégio de conviver e
escutar sábios conselhos. Aos meus tios e primos o agradecimento pela torcida e por
desejarem meu sucesso tanto quanto os seus.
Ao Fernando Garcia um dos homens mais admiráveis que eu conheço pelo
companheirismo, cumplicidade, parceria e atenção, várias vezes suportando as
inconstâncias de humor que se tornaram bem mais acentuadas nessa fase. Nanando, a
você meus sinceros agradecimentos e que independente da real distância existente entre
nós, hoje, será sempre lembrado como o meu Último Romance. Para nós fica a
pergunta: “Ah, será que o tempo tem tempo pra amar? Ou só me quer tão só?”. Amo-te,
Garcia.
Ao grande amigo Paulo Dias, pela cumplicidade e por ser o irmão que eu não
tenho. À amiga Camila Barreto que chegou tão sem querer na minha vida e que se
tornou essencial. Às minhas colegas de turma Paula Catarina e Killzy Lucena com quem
compartilhei momentos importantes na graduação e que hoje mesmo morando em outro
estado posso continuar contando, né Killzy? Á Cecília Meirelles pela amizade que já
rompeu a barreira do tempo e a melhor amiga Maryellen Reis pela amizade que cresce
na distância e que se faz presente nem que seja por uma mídia social.
Á professora Rosaly Brito e Scarleth O‟Hara pelo profissionalismo e amor com
que educam. Saibam que o meu desejo em seguir a carreira acadêmica é estimulado
pelo exemplo de “fessoras” como vocês, comprometidas com a educação superior desse
país. Ao meu orientador Fábio Castro, pela paciência em orientar este trabalho e por
estar sempre disponível em me ajudar, mesmo diante de uma agenda lotada. Obrigada
pelas orientações fundamentais na produção desta monografia.
“O Que os novos movimentos sociais e minorias - as
etnias e as raças, as mulheres, os jovens, ou os
homossexuais - demandam, não é tanto ser
representados, mas sim reconhecidos; fazerem-se
visíveis em sua diferença”.
Jesús Martín Barbero.
RESUMO
Este trabalho teve o objetivo de analisar a maneira com que jovens da rede pública de
ensino constroem as representações sociais da periferia de Belém, a partir da influência
midiática de videoclipes que utilizaram como cenário esses espaços. O primeiro vídeo
utilizado na pesquisa chama-se Devorados e foi gravado na comunidade Vila da Barca,
no bairro do Telégrafo, pela banda Madame Saatan, já o segundo denominado Matinha
do Cruzeiro é uma produção do Coletivo Rádio Cipó e foi rodado na comunidade
Álvaro Adolfo, situada na Pedreira. O aporte teórico empregado nessa monografia
foram os autores Serge Moscovici, Jodelet e Abric e, além disso, os conceitos de cidade
e periferia de Milton Santos que possibilitaram alcançar o objetivo da pesquisa, o de
verificar e analisar as representações sociais engendradas pelos jovens sobre Belém do
Pará.
Palavras-chave: Periferia, Representações Sociais, Videoclipes, Juventude, Cidade.
ABSTRACT
This coursework had the goal of analyze the way young people of public schools build
the social representation of Belém‟s outskirt, due to the media influence of music videos
that used these spaces as setting. The first video used in the research is
called Devorados and was filmed in the community of Vila da Barca, neighborhood
of Telégrafo, by the band Madame Saatan; on the other hand, the second one,
called Matinha do Cruzeiro is a production of Coletivo Rádio Cipó and was shooted in
the community of Álvaro Adolfo, located in Pedreira. The theoretical support in this
monograph was the authors Serge Moscovici, Jodelet e Abric and, furthermore, the
concepts of city and outskirt of Milton Santos, which made possible to reach the
objective of the research, to verify and analyze the social representations engendered by
young people about Belém do Pará.
KEYWORDS: Outskirt, Social representation, Music videos, Young, City.
LISTA DE SIGLAS
CF Constituição Federal
CRC Coletivo Rádio Cipó
ECS Escola Camilo Salgado
ESF Escola Serra Freire
FACOM Faculdade de Comunicação
MPB Música Popular Brasileira
MS Madame Saatan
NC Núcleo Central
MTV Music Television.
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
RC Representações coletivas.
RS Representações Sociais
SEDUC Secretaria de Educação do Estado do Pará
TAS Teoria da Agenda Setting
TRC Teoria das Representações Coletivas
TRS Teoria das Representações Sociais
TNC Teoria do Núcleo Central
UFPA Universidade Federal do Pará
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
LISTA DE ILUSTRAÇÕES.
Imagem 1- Loja de produtos de luxo Paris n‟América e a direita a foto da Avenida
Presidente Vargas (15 de Agosto) no início do séc. XX. 37
Imagem 2 – Ilustração sobre a periferia de Belém 48
Imagem 3 – Ilustração sobre a periferia de Belém 51
Imagem 4 – Ilustração sobre a periferia de Belém 56
Imagem 5 – Ilustração sobre a periferia de Belém 58
Imagem 6 – Ilustração sobre a periferia de Belém 60
Imagem 7 – Ilustração sobre a periferia de Belém 61
Organograma 1 - O Campo de Estudos da Representação Social 24
Organograma 2- As Representações Sociais no Contexto da Teia de Significados
Construídos pelo Homem ao Longo da História. 26
Gráfico 1 - Quanto à escola 43
Gráfico 2 - Quanto ao sexo 44
Gráfico 3- Quanto à idade 45
Gráfico 4- Quanto ao tempo de permanência na instituição de ensino 45
Gráfico 5- Quanto ao bairro 46
Gráfico 6- Em relação ao bairro de sua residência e a periferia 50
Gráfico 7- Em relação o bairro que sua escola está localizada e a periferia 52
Gráfico 8 – Em relação a identificação com os videoclipes 53
Gráfico 9- Quanto a avaliação dos videoclipes 54
Gráfico 10 - Quanto à representação de periferia 55
Gráfico 11- Quanto ao parecer sobre os videoclipes 57
Gráfico 12- Definição de periferia 59
Gráfico 13 - Representações Sociais de periferia 62
Gráfico 14 – Quanto ao acesso às informações 62
Gráfico 15- Sobre o ritmo musical que mais representa a periferia 64
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA ............................................................................................................. V
AGRADECIMENTOS ................................................................................................ VI
RESUMO ....................................................................................................................... IX
ABSTRACT .................................................................................................................... X
LISTA DE SIGLAS ..................................................................................................... XI
LISTA DE ILUSTRAÇÕES. ...................................................................................... XII
SUMÁRIO ..................................................................................................................... 13
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 14
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................... 16
2.1 – QUESTÕES DE PARTIDA .................................................................................. 16
2.2 – JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 16
2.3 – OBJETIVOS .......................................................................................................... 17
2.3.1 – Objetivos Gerais ............................................................................................... 17
2.3.2 – Objetivos Específicos ........................................................................................ 17
2.4 – METODOLOGIA .................................................................................................. 18
2.5 – HIPÓTESES .......................................................................................................... 19
2.6 – DELIMITAÇÕES DO ESTUDO .......................................................................... 19
3 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS .............................................................................. 20
3.1 DO SENSO COMUM À CIÊNCIA ......................................................................... 24
3.2 TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL (TNC) ............................................................ 30
4 O QUE É PERIFERIA? ............................................................................................ 33
4.1 A PERIFERIA NA CIDADE DE BELÉM .............................................................. 34
5 O LUGAR DA PESQUISA DE CAMPO ................................................................ 38
5.1 INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES: ...................................................................... 38
5.2 AS BANDAS: MADAME SAATAN E COLETIVO RÁDIO CIPÓ. ..................... 40
5.3 A MÍDIA: VIDEOCLIPES ...................................................................................... 40
5.4 A IMPORTÂNCIA DOS DESENHOS PARA PESQUISA. ................................... 41
5.5 APRESENTAÇÕES DOS SUJEITOS DA PESQUISA: ALUNOS ...................... 41
6 ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA PERIFERIA DE BELÉM
...................................................................................................................................... 46
6.1 QUEM É O MORADOR DA PERIFERIA? .......................................................... 46
6.2 O QUE É PERIFERIA? .......................................................................................... 56
6.3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: O NÚCLEO CENTRAL. .......................... 63
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 66
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 68
1- QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA DE CAMPO .............................................. 73
2- VIDEOCLIPES UTILIZADOS NA MOSTRA AUDIOVISUAL .......................... 76
DEVORADOS (MADAME SAATAN) ..................................................................... 76
MATINHA DO CRUZEIRO (COLETIVO RÁDIO CIPÓ) ........................................ 77
3 – LETRAS SUGERIDAS PELOS ESTUDANTES DURANTE A PESQUISA...... 78
NEGRO DRAMA (MC RACIONAIS) ........................................................................ 78
VERMELHÃO FAIXA DE GAZA (MC ORELHA) .................................................. 79
DEPOIMENTO DE UM VICIADO (REALIDADE CRUEL) .................................... 81
14
1 INTRODUÇÃO
A possibilidade de ouvir a voz daqueles que não têm espaço na grande mídia
para expressar seus anseios, angústias e perspectivas são o diferencial da pesquisa de
campo, seja ela de cunho quantitativo ou qualitativo. Este trabalho utilizou-se dos dois
instrumentais com o intuito de elaborar a presente monografia, requisito para obtenção
do diploma de comunicação social, habilitação em jornalismo.
Através de questionários e entrevistas desenvolveu-se o trabalho de campo, uma
vez que apesar da pesquisa de cunho quantitativo ter abrangência limitada por
apresentar um roteiro pré-definido, ela foi fundamental na reunião dos dados estatísticos
que legitima esse estudo. A entrevista individual por ser um método que permite maior
liberdade entre o pesquisador e seus entrevistados, já que não há um roteiro definido e
sim perguntas motivadoras pensadas com a finalidade de estimular a discussão
contribuiu de forma significativa para perceber as entrelinhas das entrevistas.
Outro fator relevante que justifica a utilização das entrevistas é a própria
percepção do observador de um olhar, um gesto, um sorriso, tudo se torna relevante. A
sensibilidade do pesquisador ao semblante do observado no momento da entrevista,
também, foi um material interessante para o desenvolvimento desse estudo. Por esse
motivo, optou-se pelos dois métodos, a fim de que eles desempenhassem a função
complementar e tornassem a pesquisa mais abrangente e interessante.
Este trabalho por entender a importância desse espaço, teve o objetivo de
analisar a maneira com que jovens do terceiro ano do Ensino Médio de duas escolas
públicas de Belém, veem a periferia da sua cidade, a partir da mostra audiovisual de
dois videoclipes que utilizaram como locais de filmagens bairros da periferia.
O objetivo dessa monografia foi verificar e analisar as representações sociais
produzidas pelos jovens de diferentes instituições escolares sobre a temática em
questão, a periferia de Belém. Estar mais próximo dessa realidade é um fator
preponderante para a maneira que a percebem? E os discursos dos jovens sobre o tema
se cruzam? Na tentativa de responder esses questionamentos foram selecionadas duas
escolas de Belém que atendem públicos diferentes e possuem o terceiro ano do ensino
médio. Como referencial teórico utilizou–se a Teoria das Representações Sociais de
Moscovici, complementado por Jodelet e Abric, além de uma discussão sobre cidade e a
formação das periferias de Belém.
15
O capítulo 1 desta pesquisa apresenta uma introdução sobre a TRS, além de
discorrer sobre as características das periferias brasileiras.
No capítulo 2 é encontrada a descrição da metodologia utilizada em que são
apresentadas as questões de partida, a justificativa para escolha do tema, as hipóteses a
serem testadas, os objetivos gerais e específicos do trabalho, e a delimitação de estudo.
O capítulo 3 aborda os fundamentos teóricos da TRS, tendo como base os
processos de Ancoragem e Objetivação empregados com a finalidade de explicar a
apropriação popular de um objeto, ideia ou valor até torná-la senso comum.
O capítulo 4 faz uma abordagem sobre o conceito de periferia discutido na
presente pesquisa e contextualiza a origem das periferias de Belém. Além de uma
explanação sobre a dinâmica das periferias de Belém.
O capítulo 5 aborda uma explanação sobre os sujeitos desta pesquisa (alunos),
objeto midiático (videoclipes) e as escolas participantes.
O capítulo 6 evidencia os dados sistematizados acerca da pesquisa de campo,
através dos resultados obtidos por meio dos questionários, das entrevistas em
profundidade e da interpretação dos desenhos.
O capítulo 7 discute o cerne da pesquisa de campo, através da teoria do núcleo
central (TNC) tendo como aporte teórico Abric.
16
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este trabalho teve o objetivo de analisar a maneira com que os concluintes do
terceiro ano do ensino médio, de duas escolas públicas de Belém, veem a periferia da
cidade. Tendo como base as representações sociais apresentadas em dois produtos
audiovisuais que utilizaram como cenário esses espaços: Devorados da banda Madame
Saatan foi gravado na Vila da Barca antes do programa de aceleração do crescimento
(PAC) que urbanizou o espaço, na época o lugar ainda era constituído de palafitas, já o
segundo trabalhado é do Núcleo de Mídias Digitais Coletivo Rádio Cipó de nome
Matinha do Cruzeiro, este videoclipe foi produzido na comunidade Álvaro Adolfo, no
bairro da Pedreira.
A partir da mostra audiovisual, seguida das respostas obtidas nos questionários,
desejou-se discorrer sobre a concepção individual e coletiva de periferia que o público-
alvo da pesquisa possui, além de analisar a opinião desses atores sociais em relação à
representação social de Periferia apresentada nos dois produtos.
2.1 – QUESTÕES DE PARTIDA
Quais são as Representações Sociais, acerca da periferia de Belém, engendradas
pelos alunos concluintes do Ensino Médio?
Como os videoclipes utilizados na mostra audiovisual contribuíram para a
formulação das Representações Sociais pelos estudantes supracitados?
As Representações Sociais de periferia são semelhantes, apesar dos fatores que
distinguem os alunos de diferentes classes sociais como: escolas, faixas etárias e
localidades?
2.2 – JUSTIFICATIVA
A explosão demográfica nas grandes cidades teve início com o processo de
industrialização que impulsionou a migração campo-cidade. As cidades se tornaram um
atrativo para quem almejava melhores condições de trabalho e moradia, muito embora a
falta de preparo para receber o grande contingente migratório, a ausência de condições
fundamentais para o exercício da cidadania e a ineficácia de políticas públicas para o
setor habitacional tornou este cenário desfavorável, fazendo com que as cidades
brasileiras passassem a ter espaços segregados – as periferias.
17
Por este leque de motivos, discutir periferia é um assunto atual, complexo,
amplo e rico em possibilidades de abordagem, já que estas são regiões importantes,
tanto em aspectos socioeconômicos quanto ambientais e culturais para o país. Outro
fator que impulsionou a escolha da temática foi a explosão de produções audiovisuais
no Brasil que, nos últimos anos, estão investindo ostensivamente em produtos que
mostrem a realidade das periferias. Isso está ocorrendo não por uma concessão dos
grandes centros ou dos veículos de comunicação, mas porque a periferia vem
conquistando seu espaço, à medida que está organizada na busca por melhores
condições de vida ou mesmo pelo destaque que vem sendo dado para a já consolidada e
nomeada, segundo Vianna (2006) “indústria do entretenimento popular”. Tal evidência
aumentou o interesse pessoal por uma pesquisa de Representação Social.
Nesse contexto, a Teoria das Representações Sociais (TRS) proposta por Serge
Moscovici (1981) e complementada por Jodelet (1984) e Abric (1998) se tornaram
imprescindíveis para a análise de práticas do cotidiano, principalmente urbanas. Ao
sugerir os instrumentos de Ancoragem e Objetivação Moscovici, propõe o entendimento
da maneira que é constituído o senso comum, fato que inspirou o desenvolvimento deste
trabalho, após a leitura do livro “O conhecimento no cotidiano – as Representações
Sociais na perspectiva da psicologia social”, organizado por Spink (1993).
Apurar cientificamente a maneira como é enraizado o senso comum entre grupos
sociais, interpretá-los e analisá-los de modo que os comportamentos dos mesmos
possam ser compreendidos são fatores importantes para a área de Comunicação Social,
já que a mesma estuda a relação comunicativa homem-sociedade-mídia. Por este
motivo, o presente trabalho vem a contribuir com a pesquisa do curso de Jornalismo da
Universidade Federal do Pará, que está fundamentado no tripé ensino, pesquisa e
extensão, cumprindo seu papel de Responsabilidade Social – gerar integração entre o
saber científico e o popular.
2.3 – OBJETIVOS
2.3.1 – Objetivos Gerais
Analisar a RS de periferia apresentada por alunos do último ano do Ensino
Médio, a partir da mostra de videoclipes gravados em comunidades da periferia de
Belém.
2.3.2 – Objetivos Específicos
18
Apresentar os fundamentos teóricos da RS;
Explanar sobre a dinâmica das periferias de Belém;
Evidenciar a RS de Periferia, demonstrada por alunos do último ano do Ensino
Médio; e
2.4 – METODOLOGIA
Concordando com Morin (2001, p.126), “devemos interrogar a ciência na sua
história, no seu desenvolvimento, no seu devir; sob todos os ângulos possíveis”. Isto
implica dizer que em se tratando da Teoria das Representações Sociais (TRS), um
objeto de estudo amplo e complexo, que precisa ser analisado por várias perspectivas, se
obteve sucesso ao fazer o método qualitativo e quantitativo caminharem juntos,
enriquecendo o trabalho.
Este trabalho teve como principal objetivo verificar as representações sociais
existentes acerca da periferia de Belém, tendo como base entrevistas de campo
estruturadas e semiestruturadas, desenvolvidas com jovens do último ano do ensino
médio de duas escolas da cidade, além de pesquisa bibliográfica. Optou-se pela TRS
como referencial teórico devido esta possibilitar o acesso às práticas sociais cotidianas
ocorridas principalmente em solo urbano.
No que diz respeito à técnica de coletas de dados escolheu-se tanto o método
quantitativo quanto o qualitativo. Para isso, 100 estudantes de duas escoas públicas de
Belém: Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Camilo Salgado, localizada no
Jurunas e a Escola Estadual Maria Antonieta Serra Freire, no distrito de Icoaraci,
responderam aos questionários, sendo que 12 deles, escolhidos de forma aleatória,
também participaram de uma entrevista em profundidade. O método qualitativo foi
utilizado pela flexibilidade de não se estar preocupado em apenas quantificar os dados,
mas sim em fazer uma análise descritiva e exploratória que possibilite maior liberdade e
atenção dispensada a cada entrevistado. O que importa não é apenas o que é dito pela
pessoa, mas também a maneira com que ela se expressa.
A pesquisa de campo ocorreu no período da manhã ou da tarde, com
consentimento dos diretores das instituições e dos professores que estavam ministrando
as disciplinas no momento. Dessa forma, a primeira fase do trabalho teve início com a
apresentação dos videoclipes seguida da aplicação dos questionários, os quais possuíam
16 questões sendo nove objetivas e sete subjetivas sobre o tema da pesquisa. Já para
19
segunda etapa foram marcados locais, datas e horas de acordo com a disponibilidade de
cada entrevistado.
2.5 – HIPÓTESES
A abordagem dos videoclipes influencia na concepção de periferia;
A RS de periferia é a mesma independente dos fatores externos a que os alunos
estão submetidos;
A definição de periferia está intimamente ligada a dois fatores: ausência de
urbanização e a distância do centro.
2.6 – DELIMITAÇÕES DO ESTUDO
O presente trabalho se destina a analisar de forma qualitativa e quantitativa a RS
de periferia, a partir da percepção dos alunos concluintes do Ensino Médio de duas
escolas públicas da cidade de Belém, através da mostra audiovisual e, na sequência, da
aplicação de questionários. Por este motivo, não é escopo desta pesquisa avaliar RS
positivas e negativas, e sim interpretar os dados existentes.
20
3 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Para analisar a maneira com que os jovens de Belém representam a periferia de
sua cidade optou-se pela utilização da TRS, de Serge Moscovici (1961) como aporte
teórico. Nesse sentido iniciou-se o trabalho pelo conceito que originou as discussões
sobre as representações, trata-se da noção de representações coletivas (TRC) de Émile
Durkheim (1970).
O autor foi o responsável por conceituar as RC como a gênese do fato social. De
acordo com este fato social1 é: “toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer
sobre o indivíduo uma coerção exterior, que é geral na extensão de uma sociedade dada,
apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais que
possa ter”. (DURKHEIM, 1966, p.12).
Segundo o teórico, a sociedade não é, apenas, uma junção da totalidade de
indivíduos, mas é constituída de múltiplas consciências individuais que independentes
não conseguiriam elaborar uma representação coletiva, já que cada sujeito é parte
fundamental na formação de uma mentalidade de grupo, isto é, a colaboração individual
é indispensável na elaboração de um pensamento social e, portanto, nos diferentes
modos de pensar, ser, estar e (re) apresentar o mundo.
As RC são uma tentativa de entender fenômenos sociais, como a religião, a
ciência e a cultura que aglutinam diferentes indivíduos em um mesmo grupo e ainda
assim, mantém as pessoas unidas por um ideal. “As representações coletivas são o
produto de uma imensa cooperação que se estende não apenas no espaço, mas no
tempo: para fazê-las uma multidão de espíritos diversos, associaram, misturaram,
combinaram suas ideias e sentimentos, longas séries de gerações acumularam aqui sua
experiência e saber”. (DURKHEIM, P.216, 1970). Nesse sentido, reduzir as RC ao
conceito das representações individuais é suprimir sua amplitude.
Para Durkheim (1970), existe uma distinção radical entre o pensamento
individual, objeto de responsabilidade da psicologia e o pensamento social estudado
pela sociologia. Ele aponta inúmeras discordâncias em relação às proposições de Serge
Moscovici no que tange a TRS presente na obra La psychanalyse, son image et son
1 O fato social tem como características básicas a autonomia, exterioridade e a coercitividade, atributos
que possibilitam o entendimento de que o pensamento coletivo é externo e impõe-se ás pessoas,
independente das suas vontades, podendo ter maior ou menor poder de coerção.
21
public (1961, 1976), principalmente, no que diz respeito a abordagem dada ao tema.
Durkheim propunha uma separação sociológica e psicológica para explicar a
existência de dois níveis de fenômenos: os individuais e coletivos, seus estudos
mostraram que os indivíduos sempre estarão atuando sob a égide de uma ideologia
dominante como, por exemplo, das instituições religiosas e da família, enquanto que
Moscovici preocupou-se em analisar como o conhecimento é socialmente produzido e
em que instante ele se torna uma prática social, isto é, senso comum, uma vez que para
o autor, as Representações sociais são uma “forma sociológica de Psicologia Social”.
(FARR, 1995, p. 31).
Para Moscovici, o estudo da TRS permitiu um entendimento mais amplo da vida
em sociedade do que já discutia, anteriormente, as representações coletivas, uma vez
que as RS têm como base a maneira que os homens se (re) apresentam, tanto enquanto
cópia da realidade quanto na interpretação cotidiana da vivência em grupo, ou seja, a
maneira que percebem o fato de ser e estar no mundo independente de fatores sociais,
culturais, políticos e das condições socioeconômicas.
A TRS encontra-se sob o domínio da psicologia social, uma ciência híbrida e
intermediária, que se preocupa em entender a relação entre dois mundos: o individual e
o coletivo. Essa ciência funciona como uma espécie de mediadora entre a sociologia que
trabalha fenômenos coletivos e a própria psicologia que tem como objeto de estudo a
subjetividade individual.
As RS apesar de serem complexas e de utilizarem ferramentas distintas vêm, nos
últimos anos, sendo objeto de estudo de muitos pesquisadores nas diversas áreas do
conhecimento. Isso ocorre devido o caráter transdisciplinar da TRS, isto é, das suas
múltiplas dimensões e possibilidades de estudo voltadas para análise da prática
cotidiana do viver em grupo.
Segundo Aurélio (2003), o substantivo representação remete tanto a um ato ou
efeito de representar (se) quanto à coisa que se representa, além da própria reprodução
daquilo que se pensa e o conteúdo concreto apreendido pelos sentidos, imaginação,
memória ou pensamento que somado ao adjetivo social assume vários significados a
começar pelo mais notório deles, os grupos sociais. Para Moscovici (1976, p.26), a
justificativa para esta denominação é devido essa área ser “uma modalidade de
conhecimento particular que tem por função a elaboração de comportamentos e a
comunicação entre indivíduos”.
22
De acordo com Moscovici, o conceito das RS é de difícil definição e isso ocorre
devido sua posição intermediária entre a sociologia e a psicologia. Nesse sentido, o
exercício de observação da realidade é uma possibilidade na tentativa de melhor
compreender essa área, uma vez que:
As representações sociais são entidades quase tangíveis. Elas circulam,
cruzam-se e se cristalizam incessantemente, através de uma fala, um gesto,
um encontro, em nosso universo do cotidiano. A maioria das relações sociais
estabelecidas, os objetos produzidos ou consumidos, as comunicações
trocadas, delas estão impregnados. Sabemos que as representações sociais
correspondem, por um lado, à substância simbólica que entra na elaboração e,
por outro, à prática que produz a dita substância, tal como a ciência ou os
mitos correspondem a uma prática científica e mítica. (MOSCOVICI, 1978,
p.41).
Desse modo, discutir acerca das RS é considerar as representações cotidianas
elaboradas pelos diferentes grupos sociais, nos diversos meios em que estão inseridos.
O autor propõe, ainda, uma estrutura clássica visando explicar a TRS,
No real, a estrutura de cada representação nos aparece desdobrada; ela tem
duas faces tão pouco dissociáveis quanto à frente e o verso de uma folha de
papel: a face figurativa e a face simbólica. Nós escrevemos que:
Representação figura , entendendo por isso que ela faz compreender
Significação
em toda figura um sentido e em todo sentido uma figura. (MOSCOVICI,
1976, p.63).
Com esse esquema o autor procurou analisar o caráter figurativo e simbólico das
RS, elementos que não podem ser analisados de maneira separada ou distinta, por serem
fundamentais na compreensão desse campo. Spink (1993) também criou um esquema
visando explicar e ilustrar os principais sujeitos e objetos da TRS. A autora criou um
gráfico adaptado da obra de Jodelet (1989a) que destaca, de um lado, o processo de
construção das RS tendo como base a contribuição do pensamento individual-coletivo
dos múltiplos sujeitos e do outro, a interpretação dos objetos sociais que juntamente
com os símbolos expressam a tentativa de entender a maneira com que são produzidas
as RS, isto é, o modo pelo qual elas são criadas, deixando de ser um objeto estranho ao
grupo social para se tornar uma prática cotidiana.
Organograma 1 - O Campo de Estudos da Representação Social
23
Sujeito
Forma de
Conhecimento
Representação
Construção Interpretação
Expressão Simbolização
Fonte: SPINK, Mary. The Concept of Social Representations in Social Psychology. Cad. Saúde Públ., Rio
de Janeiro, 9 (3): 300-308, jul/sep, 1993 apud adaptado Jodelet (1989a).
Moscovici (1961) propõe, ainda, inúmeros questionamentos acerca da expressão
representações sociais. Por exemplo, quais os parâmetros que definem se uma
representação é ou não social? Quais os valores que precisam ser respeitados para
adequar a representação a um grupo social? Por não ter respostas para tais perguntas o
teórico optou pela alternativa de analisar os processos de produção das representações,
isto é, de que forma elas são produzidas na sociedade? Diante dessa indagação ele
levantou a hipótese de que para se qualificar como RS é necessário ser engendrada no
seio da coletividade e mais do que isso é preciso perceber as causas que a produzem.
Para Moscovici saber como é originada a TRS é importante,
Para qualificar uma representação de social não basta definir o “agente” que a
produz. Tampouco nos mostra, ficou agora claro, em que se ela distingue de
outros sistemas que são igualmente coletivos. Saber “quem” produz esses
sistemas é menos instrutivo do que saber “por que” se produzem. Em outras
palavras, para se poder apreender o sentido do qualificativo social é
preferível enfatizar a função a que ele corresponde do que as circunstâncias e
as entidades que reflete. Esta lhe é própria, na medida em que a representação
contribui exclusivamente para os processos de formação de condutas e de
orientação das comunidades sociais. (MOSCOVICI, 1976, p.76-77)
Isto implica dizer que, para o teórico, o objetivo desse estudo é analisar a maneira
pelo qual são engendradas as representações em detrimento de quem as criou, o qual é
um ponto importante, mas não é o essencial, já que o cerne da TRS é a apropriação
Prático
Objeto
24
popular de um objeto, idéia ou valor a fim de torná-lo consenso. Nesse sentido,
Moscovici propõe interpretar esse processo de consolidação de um objeto transformado
em prática social entre grupos.
3.1 DO SENSO COMUM À CIÊNCIA
O imaginário social é imbuído de conteúdos históricos e, portanto, estruturas
figurando como força-motriz das mudanças sociais. Sendo assim, para existir RS é
necessário que haja vida em sociedade e, além disso, a reprodução de um pensamento já
consolidado em um determinado campo2 que é estruturado por um habitus3. Este pode
ser qualquer ambiente ou ocasião em que ocorra o encontro de pessoas bastando que
para isso exista comunicação.
Para Jodelet (1984, p.36), senso comum significa a materialização de estruturas
sociais abstratas, isto é, a subjetividade posta em prática. A definição proposta pela
autora é consenso entre os pesquisadores. Para esta “RS é uma maneira de se
compartilhar conhecimento socialmente elaborado, a partir de um ponto de vista prático
tendo em vista a construção de uma realidade comum a um grupo social, o já falado
Senso Comum.” Nesse sentido, a teórica propõe,
O conceito de Representação Social designa uma forma específica de
conhecimento, o saber do senso comum, cujos conteúdos manifestam a
operação de processos generativos e funcionais socialmente marcados. Mais
amplamente, designa uma forma de pensamento social. As Representações
sociais são modalidades de pensamento prático orientadas para comunicação,
a compreensão e o domínio do ambiente social, material e ideal. Enquanto
tais, elas apresentam características específicas no plano da organização dos
conteúdos, das operações mentais e da lógica. A marcação social dos
conteúdos ou dos processos de representação refere-se às condições e aos
contextos nos quais emergem as representações, às comunidades pelas quais
elas circulam as funções que elas servem na interação com o mundo e com os
outros. (Id. 1984, pp.361-2).
Assim, portanto, Jodelet procurou conceituar a TRS tendo como base o senso
comum, a partir da explicação dos fatores que possibilitam a construção dessa teoria,
2 Pierre Bourdieu propôs o conceito de Campo como sendo um espaço social em que o indivíduo vai
exercitar o habitus adquirido perante o convívio em sociedade. O que implica dizer que em determinado
campo um ator social pode ter maior ou menor influência e isso pode mudar dependendo do acúmulo de
capital que ele possui e que deve ser o capital correspondente ao campo. Existem diversos tipos de
capital, como: financeiro, simbólico, cultural, comercial, etc.
3 Para Bourdieu é o Habitus que fundamenta a reprodução social, já que ele é formado a partir do
convívio do indivíduo em sociedade. A ação das forças sociais e a estrutura interna do campo social em
que os indivíduos estão inseridos influenciam o seu habitus. Para o autor o indivíduo não consegue pensar
racionalmente o tempo inteiro, sendo influenciado pelos diferentes capitais e agentes sociais.
25
como o diálogo entre diferentes atores sociais ocorridos diariamente e em diversos
meios, já que são estes os responsáveis pela construção das representações. No
organograma 2 é apresentada por Spink (1993) uma estrutura a fim de ilustrar a maneira
pela qual são construídas as RS.
Para a autora, as RS são formadas a partir da junção de conteúdos maleáveis e,
portanto, mais sujeitos à mudança e outros permanentes ou sólidos que estão
cristalizados, logo são mais difíceis de serem modificados. No topo da pirâmide está o
imaginário social que é constituído pela apropriação popular da ciência tornada senso
comum, ele é mais rígido, uma vez que sofre poucas modificações e que depende,
diretamente, da transformação de determinadas práticas sociais. Na segunda plataforma
está a epistéme, isto é, a ciência que origina o habitus e o sistema de normas reguladoras
das diferentes sociedades, já na base da pirâmide consta a ciência que contribui para
gerar o senso comum, sendo que a soma de ambos sustentam as práticas sociais.
Organograma 2- As Representações Sociais no Contexto da Teia de Significados
Construídos pelo Homem ao Longo da História.
Imaginário
Social
Epistéme
Meta-Sistema
de Normas Habitus
Ciência Senso comum
Fonte: Spink (1993)
As RS são um campo de estudo importante e estruturado tanto quanto o saber
científico, já que as mesmas esclarecem e interpretam práticas cotidianas e processos de
interação social. Estas não possuem conceitos claramente definidos, devido sua origem
ser simbólica e como tal, utilizar as já mencionadas práticas sociais, fato que torna o
conhecimento sobre o assunto marcadamente diverso e empírico.
26
A TRS é um campo de estudo que surge de discussões cotidianas sobre as mais
diversas temáticas, as quais obedecem a uma hierarquização de fatos respeitando alguns
critérios, como a atualidade da notícia, a polêmica ocasionada pela informação, o
interesse que ela provoca nas pessoas, além do grau de conhecimento que cada
indivíduo possui sobre o tema. De acordo com esses pontos um assunto passa ou não a
ser pertinente para as rodas de diálogo e isso independe do local de encontro do grupo,
podendo ser a fila do banco, mas também a parada de ônibus, durante as refeições, as
praças e bares, salões de beleza, nos jogos de bilhar ou ainda após a “pelada” do fim de
semana.
As representações sociais são, também, transmitidas entre as gerações e
fortalecidas pela memória coletivo-familiar, à medida que a sociedade é levada a
recorrer, constantemente, às suas tradições para realizar escolhas e opinar sobre
determinados assuntos, ainda que não o faça de forma consciente. O respeito à vivência
(subjetividade) dos indivíduos, seus conhecimentos religiosos, acadêmicos e sua própria
história de vida é uma constante na análise das RS.
Ao sentar em uma mesa de bar e iniciar uma discussão sobre pena de morte e
diminuição da maioridade penal no Brasil, provavelmente, existirão diversas opiniões
sobre o assunto, alguns irão defender outros discordar, mas independente de qual seja a
atitude tomada pelos indivíduos a sua exposição falará muito ao seu respeito e sobre
suas origens.
Cada cidadão recebe influências diretas do meio em que está inserido, como: a
família, religião, escola, bairro e cultura. Uma família cristã que more na área nobre da
cidade tende a olhar a pena de morte de uma forma, talvez, diferenciada do indivíduo
que é ateu e residente em um bairro violento. Isso ocorre, porque o indivíduo é um ser
pensante, mas que recebe fortes influências externas como, por exemplo, o poder
exercido pela instituição familiar desde o nascimento até o último dia de vida do ser
humano.
Essa é a gênese das RS que para Psicossociologia, não considera o indivíduo um
mero reprodutor de informação, crenças, ideologias prontas e definidas historicamente,
mas sim seres pensantes que produzem e comunicam suas ideias, seus posicionamentos
e opiniões, são, portanto, os mentores de suas próprias representações. Para Moscovici,
“Representar uma coisa (...) não é, com efeito, simplesmente duplicá-la, repeti-la; é
reconstituí-la, retocá-la, modificar-lhe o texto. A comunicação que se estabelece entre o
27
conceito e a percepção, um penetrando no outro, transformando a substância concreta
comum, criam a impressão de „realismo‟”. (Op.cit., pp.56-7).
Moscovici (1961) propôs a existência de um sistema de pensamento divido em
duas classes diferentes, o universo consensual e o reificado. Enquanto o último
corresponde ao pensamento rebuscado, formal, erudito, objetivo e metodológico das
ciências em geral, o primeiro está relacionado ao surgimento de práticas sociais tendo
como base a simplicidade das relações humanas e do convívio com o outro. É por isso
que o senso comum está enquadrado nesta abordagem do cotidiano.
Os universos reificados, a sociedade se vê como um sistema com diferentes
papéis e categorias, cujos ocupantes não são igualmente autorizados para
representá-la e falar em seu nome. O grau de participação é determinado
exclusivamente pelo nível de qualificação. (...) Há um comportamento
próprio para cada circunstância, um estilo adequado para fazer afirmações em
cada ocasião e, claro, informações adequadas para determinados contextos.
Nos universos consensuais, a sociedade se vê como um grupo feito de
indivíduos que são de igual valor e irredutíveis. Nessa perspectiva, cada
indivíduo é livre para se comportar como um “amador” e um “observador”
curioso, (...) que manifesta suas opiniões, apresenta suas teorias e tem uma
resposta para todos os problemas (A arte da conversação) cria gradualmente
núcleos de estabilidade e maneiras habituais de fazer coisas, uma
comunidade de significados entre aqueles que participam dela.
(MOSCOVICI, 1981, p. 186-7).
O teórico defende ainda que o universo reificado não é, contudo contrário às
realidades consensuais, já que os dois se entrelaçam no momento em que as RS são
originadas pelo primeiro. Conforme Moscovici e Hewstone (1986, p.544), o senso
comum é compreendido como “um corpo de conhecimentos produzidos
espontaneamente pelos membros de um grupo e fundado na tradição e no consenso”.
Para Moscovici o universo consensual é conceituado da seguinte maneira:
O propósito de todas as representações é o de transformar algo não familiar,
ou a própria não familiaridade, em familiar (...) O que eu quero dizer é que os
universos consensuais são lugares onde todos querem se sentir em casa, a
salvo de qualquer risco de atrito ou disputa. Tudo o que é aí dito e feito
apenas confirma crenças e interpretações adquiridas, corrobora mais do que
contradiz a tradição. (...) No todo, a dinâmica dos relacionamentos é uma
dinâmica de familiarização, onde objetos, indivíduos e eventos são
percebidos e compreendidos em relação a encontros ou paradigmas prévios.
Como resultado, a memória prevalece sobre a dedução, o passado sobre o
presente, a resposta sobre o estímulo, às imagens sobre a “realidade”.
(MOSCOVICI, 1984, pp.23-4).
Por esse motivo, o universo consensual está presente no saber cotidiano, isto é,
ele emerge nas relações entre diferentes indivíduos e tem a função de transformar o
universo reificado, ou seja, o não familiar em algo familiar e, portanto, em universo
28
consensual. Os meios de comunicação são uma importante ferramenta neste processo, já
que são fundamentais no processo de divulgação da ciência devido a vários fatores,
como: o alcance e a influência que exercem na construção da opinião pública, a função
social que desempenham - divulgar saberes científicos, noticiar fatos importantes
ocorridos diariamente e que despertam o interesse das pessoas, como também, entreter e
orientar. Atributos que legitimam e atribuem prestígio à mídia.
As notícias veiculadas afetam diretamente o cotidiano da população, fato
ratificado pelas conversas interpessoais, constantemente, pautadas pela imprensa e isso
ocorre, entre outros motivos, devido à massificação da informação, a hierarquização das
notícias e à própria importância atribuída às matérias pelos veículos que, respeitando a
lógica capitalista de atender a demanda de público, os interesses dos proprietários dos
grupos de comunicação, a audiência e o interesse social, decidem o que, onde, quando e
de que forma será transmitido.
O fato dos veículos midiáticos se interessarem mais por determinadas matérias
em detrimento de outras, faz com que o universo reificado se entrelace com o saber
consensual, à medida que os assuntos presentes na tela de um computador, no jornal
impresso, nos programas radiofônicos ou nas imagens da TV chegam até as discussões
nas ruas, casas, famílias, salões de beleza e bares. A realidade passa a ser
representada/contada pela edição dos meios de comunicação de massa. Inúmeras vezes
a maneira como as notícias são contadas e editadas pelos veículos de comunicação não
representam o fato na sua essência. A estereotipação é um dos vários problemas
enfrentados pelas minorias sociais do país, como os moradores das periferias que são
massivamente mostrados em matérias retratando a violência.
A função social da grande mídia, o prestígio e o alcance já mencionados
anteriormente, fazem dela a principal fonte de informação de uma parcela significativa
da população brasileira. Ainda hoje é comum encontrar pessoas que acreditam
integralmente em tudo que é dito na TV; para estas, o que dizem o Jornal Nacional ou o
Domingo Espetacular é senso comum e, portanto, deve ser respeitado. Isso ocorre
devido à credibilidade que esses programas possuem no Brasil. Apesar de terem sido
mencionados jornais de, apenas, duas emissoras, o primeiro da Rede Globo e o outro da
Rede Record o fato se repete nas demais.
O enorme alcance desses veículos de comunicação de massa, também, pode ser
prejudicial à sociedade no instante em que boa parte do público não tem acesso à
29
totalidade da notícia, as quais inúmeras vezes são incompletas, apelativas, tendenciosas
e estereotipadas. O próprio tratamento e a edição dispensados às matérias quando
prioriza a audiência em detrimento do interesse social, contribui negativamente para
difundir preconceito e a discriminação no país.
Para explicar o processo pelo qual são elaboradas as RS, Moscovici tomou como
base a proposta de teóricos da psicologia, entre os quais Piaget, Lévy-Bruhl e Freud.
Para eles, é interessante analisar o funcionamento do raciocínio das crianças, já que elas
reproduzem esquemas mentais já alocados e naturalizados em seu cérebro que são
usados para comunicar e materializar as suas representações mentais.
Moscovici organizou tais fundamentos apresentando dois processos
fundamentais para a elaboração das representações sociais: ancoragem e objetivação,
responsáveis por tornar familiar o desconhecido. Para ele (1984a, p.30), faz-se
necessário classificar e nomear os objetos sociais pela necessidade de naturalizar o
inexplicado: “coisas que não são classificadas nem denominadas são estranhas, não
existentes e ao mesmo tempo ameaçadoras”.
As RS têm como princípio básico tornar familiar algo não familiar, como já foi
mencionado anteriormente, essa finalidade de incorporar o novo à realidade consensual
é o pilar de sustentação desse campo, já que a matéria-prima para elaboração do senso
comum é converter o que é estranho e desconhecido em práticas sociais que passem a
ser consenso na sociedade. A busca por entender, explicar, analisar o diferente,
contribui de forma positiva para estimular as pessoas a novas descobertas, as quais
seriam antes impensadas se não existisse a “tensão” com o que não é natural. Percebe-se
a importância atribuída por Moscovici ao processo de familiarização lendo o trecho
abaixo:
O processo social no conjunto é um processo de familiarização pelo qual os
objetos e os indivíduos vêm a ser compreendidos e distinguidos na base de
modelos ou encontros anteriores. A predominância do passado sobre o
presente, da resposta sobre o estímulo, da imagem sobre a realidade tem
como única razão fazer com que ninguém ache nada de novo sob o sol. A
familiaridade constitui ao mesmo tempo um estado das relações no grupo e
uma norma de julgamento de tudo o que acontece. (Id. 1961, p.26)
Isto implica dizer que com a finalidade de naturalizar o que lhe é estranho o
autor propôs a ancoragem, por entendê-la como um processo cognitivo que visa inserir
ideias, valores e princípios em determinado grupo, isto é, aquela idéia já moldada o
indivíduo utiliza para enraizar objetos e sua representação em meio a um cenário, com a
30
finalidade de subtrair o estranhamento causado pelo que está obscuro, a fim de retirá-lo
do “anonimato perturbador”.
Ao admitir a possibilidade de se compreender novas perspectivas de vida e a
compartilhá-las com base nos conhecimentos e valores incorporados e já tidos como
consenso, estimula-se a produção das representações e evita-se que as pessoas cessem a
busca por explicar o “anormal”.
Para completar o processo o teórico propõe a objetivação que segundo ele
consiste em materializar e naturalizar, isto é, tornar real um conceito que também pode
ser uma idéia ou um valor antes abstrato. De acordo com Moscovici (1961, p.111)
objetivar é: “reabsorver um excesso de significado materializando-as (e adotando assim
certa distância a seu respeito). É também transplantar para o nível de observação o que
era apenas inferência ou símbolo”, este é o instante em que os esquemas figurativos
passam a ser correntes na sociedade tornando-se, então, a representação social.
3.2 TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL (TNC)
Com o objetivo de complementar a TRS Abric desenvolveu a Teoria do Núcleo
Central (TNC) em 1976, apresentando a hipótese de que toda Representação Social é
constituída por um núcleo central destinado a organizar e gerar sentido às
representações e por elementos periféricos que permitem maior flexibilidade ao
processo. De acordo com o autor o núcleo central “é determinado pela natureza do
objeto representado e também pela relação que o sujeito/grupo mantém com este”
(ABRIC, 1994, p.83).
De acordo com o teórico, as RS são organizadas da seguinte maneira:
A organização de uma representação apresenta uma característica particular:
não apenas os elementos de representação são hierarquizados, mas, além
disso, toda representação é organizada em torno de um núcleo central,
constituído de um ou de alguns elementos que dão a representação o seu
significado (ABRIC, 1994a, p.19)
Para o autor, essa compreensão é importante visando entender a relação
existente entre representações e comportamento. Abric (1994a, p.73) defende a
necessidade de analisar o assunto por ser este essencial para o entendimento da RS, “o
núcleo central é um subconjunto das representações, composto por um ou alguns
elementos cuja ausência desestruturaria a representação ou lhe daria uma significação
completamente diferente.”
31
De acordo com o teórico, o NC está relacionado à memória coletiva e por esse
motivo torna as representações estáveis, duradouras e resistentes, enquanto que os
elementos periféricos estão relacionados ao pensamento individual, originado da
vivência de cada um e, portanto, funcionam como “para-choques”, conceito de Flament
(2001), devido possuir flexibilidade e facilidade de adaptar-se a elementos e
experiências novas.
São os elementos periféricos que protegem e conservam o núcleo central; logo,
defendem a força das RS que podem ser dividas em fracas e fortes. Como
representações fortes têm-se aquelas bem estruturadas e plenas de fazer sentido,
enquanto que as fracas são menos organizadas e ainda não estão completamente
consolidadas no grupo.
Abric afirma que o núcleo central e os elementos periféricos não são estagnados:
O sistema central é, portanto, estável, coerente, consensual e historicamente
definido. O sistema periférico, por sua vez, constitui o complemento
indispensável do sistema central, do qual ele depende. Isso porque, se o
sistema central é essencialmente normativo, o sistema periférico, por sua vez,
é funcional. Isto quer dizer que é graças a ele que a representação pode se
ancorar na realidade do momento. (Abric, 1989, apud Sá, 1998 p.4)
Essa percepção torna-se fundamental no instante em que se busca transformar
determinadas representações por acreditar que elas sejam prejudiciais ao
desenvolvimento de práticas sociais alternativas (ABRIC, 1994). Assim a TNC busca
perceber a maneira que as representações sociais são construídas tendo como base o
núcleo central e dessa forma, complementar as proposições de Moscovici.
Abric propôs ainda a verificação da seguinte hipótese geral: “o comportamento
dos sujeitos ou grupos não são determinados pelas características objetivas da situação,
mas pela representação dessa situação” (Abric, 1989, apud Sá, 1998 p.54).
De acordo com ele (1994a), existem quatro funções fundamentais para
manutenção das RS: (1) Funções de saber que visam explicar a realidade (2) Funções
identitárias que são importantes para definir a identidade de um grupo (3) Funções de
orientação, as quais objetivam direcionar as práticas sociais e a (4) Funções
justificatórias.
O campo de estudo das RS ainda é recente, ele acaba de completar 50 anos.
Durante os 10 primeiros anos ele foi pouco difundido e aceito pelos pesquisadores, a
TRS recebeu duras críticas em vários aspectos, entre eles, sobre a falta de clareza em se
tratando de conceito, para esses Moscovici (1987, p.514) respondeu: “vários autores me
32
recriminam por ser vago e me recusar a definir o significado das representações sociais.
Poderia citar vários textos de Bacon e Freud que sustentariam o valor de minha posição,
mas minha recusa também representa um modo de assumir posição contra uma
tendência de dar definições fáceis”. O autor afirmou, ainda, não saber aonde chegariam
os estudos sobre o tema, mas fez projeções esperançosas.
33
4 O QUE É PERIFERIA?
Segundo o dicionário Aurélio (2001), periferia é em uma cidade a região mais
afastada do centro urbano em geral carente de infraestrutura e serviços urbanos e que
abriga os setores de baixa renda da população, hoje essa definição se tornou simplista,
uma vez que as cidades possuem vários centros. De acordo com Barros (2011) o termo
periferia diz respeito a lugares e sujeitos objetos de abandono das políticas públicas. “A
grande maioria das favelas está na zona sul, na zona leste, mas estão na periferia do
ponto de vista econômico”. Para Santos, morar na periferia é ser duplamente
sentenciado à pobreza:
A pobreza gerada pelo modelo econômico, segmentador do mercado de
trabalho e das classes sociais, superpõe-se a pobreza gerada pelo modo
territorial. Este, afinal, determina quem deve ser mais ou menos pobre
somente por morar neste ou naquele lugar. Onde os bens sociais existem
apenas na forma mercantil, reduz-se o número dos que potencialmente lhes
têm acesso, os quais se tornam ainda mais pobres por terem de pagar o que,
em condições democráticas normais, teria de lhes ser entregue gratuitamente
pelo poder público. (SANTOS, 2007, p.143-144).
Isso implica dizer que a noção de cidadania está intimamente atrelada ao
território, uma vez que para ser um cidadão integral se faz necessário a garantia dos
direitos expressos na Constituição Federal de 1988, no Art.3º que diz: I - Construir uma
sociedade livre, justa e solidária; II- garantir o desenvolvimento nacional; III- erradicar
a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV-
Promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Entretanto, o Brasil, nação capitalista e com grandes disparidades entre os mais
ricos e os mais pobres, se vê diante de desafios permanentes de gerir seus conflitos
sociais. Grupos politicamente dominantes beneficiados com grande parte das ações
desenvolvidas pelo Estado, o qual apesar de constitucionalmente possuir como
fundamentos a soberania, a cidadania e a dignidade da pessoa humana (artigo 1º CF
1988 incisos I, II, III) não vem, na prática, se efetivando como uma entidade acima dos
grupos sociais.
Fator preponderante para gerar um embate de interesses, uma vez que as
minorias dominantes não abrem mão de seus objetivos econômicos e principalmente,
dos políticos ocasionando uma série de problemas para o país, como por exemplo, o
34
histórico impasse para a efetivação da reforma agrária ou mesmo a real crise
habitacional, empecilhos que o Estado tem tentado resolver ao longo de décadas.
4.1 A PERIFERIA NA CIDADE DE BELÉM
A realidade habitacional da cidade Belém não é diferente das demais capitais
brasileiras, já que a ocupação é um retrato da disputa de território entre diferentes
classes sociais. Belém foi fundada em 12 de janeiro de 1616 e desenvolveu-se a partir
do leito do rio até meados do século XVIII, sendo sua ocupação inicial às margens do
Rio Guamá e da Baía do Guajará. Os primeiros bairros da capital paraense são a Cidade
Velha e a Campina. Somente após a segunda metade do século XIX é que a apropriação
do território passou a se interiorizar e a caminhar em direção aos rios e igarapés levando
à apropriação, primeiramente, dos terrenos mais altos. De acordo com Cruz (1994), as
áreas mais baixas passaram a ser utilizadas nas atividades agropastoris com a criação de
fazendas, vacarias, sítios e rocinhas.
É no contexto de Belle Époque, das reformas urbanas que ocorriam na Europa,
no desenvolvimento da economia do látex na Amazônia, juntamente com o fato de
Belém ter se tornado o principal porto de escoamento da borracha, produto conhecido
no mercado internacional como o “Ouro Branco”, que surgiu à necessidade de
modernizar a cidade. No período de 1887-1911 a capital passou por intensas reformas
urbanas e por medidas excludentes que prejudicaram a população de baixa renda, como
é o caso da política de remoção dos cortiços (casas habitadas pelas classes de menor
poder aquisitivo) das regiões centrais da cidade em direção a áreas periféricas, visando
combater a feiura e a falta de higiene, sinônimos de atraso para o governo da época.
Apesar das intervenções urbanas terem sido planejadas ainda no governo de
Jerônimo Coelho, foi a partir do Intendente Antônio Lemos que ocorreram as mudanças
mais significativas no espaço urbano de Belém. Para Lemos, era necessário que a cidade
passasse por um processo de embelezamento e medidas enérgicas eram fundamentais
para trazer progresso à região. Em 1901 foi criado o Código de Polícia Municipal que
tinha como um dos principais objetivos controlar as autoconstruções.
De acordo com Oliveira, as autoconstruções consistem em:
Obra sem apoio técnico, de baixa qualidade, que gera desperdício de
material, obriga chefes de famílias a sacrificarem dias de folga em canteiro
improvisados, além de favorecer ocupação de áreas irregulares - sem falar
nos danos à economia formal. Há o predomínio de casas semiconstruídas ou
construídas com material de baixa qualidade e geralmente simboliza um
35
espaço de segregação sócio espacial em locais Periferizados, alagados, fonte
de uma mão-de-obra de baixo poder de compra. Ainda hoje a autoconstrução
é muito exercida no Brasil - a prática responde por quase 80% da produção
anual de unidades. (OLIVEIRA, 2008).
Através do código de postura o governo combateu estas habitações visando
modernizar a cidade. Para isso, determinou desde questões técnicas que precisavam ser
obedecidas pelos moradores, até a proibição de materiais como a palha e a argila.
Após a retirada esses cidadãos passaram a ocupar, principalmente, as áreas de
baixadas que por serem regiões alagadas e abaixo da linha do mar eram locais
impróprios para construir habitações. A ocupação desses espaços funcionou como uma
alternativa para população que, sem ter outro local para habitar, se sujeitou à ausência
de uma política ampla que visasse não somente a mudança do território, mas também a
transformação nas práticas de vida. A política desenvolvida pelo Estado não foi
acompanhada da infraestrutura necessária para que os moradores pudessem morar com
dignidade.
As periferias reproduziram as mesmas condições anteriores, uma vez que os
problemas decorrentes do abandono estatal se repetiram, como: a favelização, a
violência, o desemprego, a informalidade, doenças endêmicas e de pele, entre tantos
outros por menores a que foram e ainda hoje são vítimas os moradores de periferia.
Além disso, houve a degradação dos recursos naturais em virtude da ocupação do leito
dos igarapés. Por outro lado, nas áreas centrais houve uma intensa intervenção do poder
público favorecendo o surgimento de hotéis, magazines, lojas, teatros e restaurantes.
Fenômeno que ocasionou disparidades na reprodução do espaço urbano de Belém.
Figura 3- Imagem da Loja de produtos de luxo Paris n‟América e à direita a foto da
Avenida Presidente Vargas (15 de Agosto) no início do séc. XX.
36
Fonte: http://parahistorico.blogspot.com/2009/02/belle-epoque-e-era-lemos.html
As áreas nobres passaram por um intenso processo de urbanização e por causa
desses benefícios se tornaram valorizadas economicamente. Após o processo de
remoção e valorização dos terrenos surgiu, em Belém, um mercado de imóveis
destinados a alugar e/ou vender lotes de terra. Fato que beneficiou as classes de maior
poder aquisitivo que se apropriaram das regiões centrais, principalmente, dos bairros do
Umarizal, Nazaré e do entorno da Avenida Doca de Souza Franco. Este episódio
transformou significativamente o cenário da metrópole paraense.
De acordo com ABELÉM (1986) nos anos 60 houve o crescimento populacional
na cidade de Belém impulsionado entre outros fatores pelo êxodo rural, isto é, a
migração campo – cidade que gerou inchaço na capital paraense. Para suprir essa
demanda houve a multiplicação das vilas e passagens nos terrenos não alagados, fato
que extinguiu várias árvores da cidade, além do aumento de palafitas em locais que
recebiam os esgotos das áreas altas e a ocupação de indústrias e conjuntos habitacionais.
A partir dos anos 70 a cidade sofreu mudanças mais latentes, como o processo
de desorganização e de reorganização do espaço urbano. As ocupações das áreas de
baixada começam a representar problemas para o setor imobiliário e para o Estado.
Segundo Cruz (1994, p. 53): “O setor imobiliário terá problemas com a população
habitante das periferias e/ ou baixadas porque na medida em que a cidade se expande
suas áreas vão valorizando e, portanto, sendo disputadas com mais intensidade”.
Já na década de oitenta e noventa a cidade se expandiu em direção a áreas
distantes ocupando as regiões vizinhas ao que é hoje o Entroncamento, em dois eixos
37
principais: um em direção ao Distrito de Icoaraci pelas Avenidas Augusto Montenegro e
Tavares Bastos e o segundo rumo à Ananindeua. Outro caminho também utilizado foi a
Rodovia Arthur Bernardes. Essas vias empurraram a população de baixa renda para
lugares cada vez mais distantes dos bairros centrais.
Em 2002, o governo do Estado do Pará retomou o discurso modernizador de
Lemos ao propor o embelezamento da cidade, através de uma política de reformas,
principalmente, nos edifícios históricos e culturais localizados no centro. É o caso do
projeto que revitalizou a Estação das Docas - esse espaço antes da intervenção apenas
fazia parte da região portuária da cidade e hoje, nove anos após sua inauguração é um
importante ponto turístico.
Essa ação estatal teve como base o projeto arquitetônico do Puerto Madero, de
Buenos Aires, e objetivou fortalecer a imagem de cidade ribeirinha e Amazônia. As
obras faziam parte de um projeto de marketing urbano para Belém que visava estimular
o turismo e os investimentos na região, ainda hoje, a indústria hoteleira regional utiliza
o slogan de Belém como capital da Amazônia.
Atualmente a cidade de Belém vivencia um processo de crescimento horizontal,
principalmente, ao longo da Avenida Augusto Montenegro em direção ao Distrito de
Icoaraci. Esta via representa hoje um dos espaços de maior circulação de pessoas e
veículos, além de ser o principal acesso a condomínios fechados, supermercados,
faculdades, clubes, lojas e até um shopping que será inaugurado em 2012. Nota-se que é
crescente a urbanização no entorno da avenida e por isso é comum encontrar quem a
chame de canteiro de obras.
Se antes esse espaço representava um território habitado pelas classes de menor
poder aquisitivo devido, entre outros motivos, o preço mais acessível dos terrenos, hoje,
a grande valorização de alguns trechos da avenida faz com que os imóveis estejam
sendo comercializados pelos mesmos preços dos bairros centrais. Fato que provoca,
novamente, a expulsão da população de baixa renda para territórios ainda mais
longínquos.
38
5 O LUGAR DA PESQUISA DE CAMPO
O lugar escolhido para o desenvolvimento da pesquisa de campo foi o ambiente
escolar, mais especificamente a sala de aula, por ser este um espaço importante no
desenvolvimento de relações coletivas entre diferentes sujeitos sociais. Mesmo sendo
um lugar rico, várias vezes ele passa despercebido, e muitas das suas potencialidades
ficam subjugadas a um segundo plano: o de preparar o aluno para o mercado de trabalho
ou para ter acesso ao ensino superior. Para Cardoso (2006), a sala de aula é um espaço
singular para ser observado.
A sala de aula é um desses espaços. Lugar de encontro de diferentes sujeitos,
ela é palco no qual se apresentam diferentes expressões sociais, de vida e do
cotidiano. Palco que revela expectativas daqueles que o habitam. Alunos e
professores. Sujeitos que transitam entre a formalidade do universo
institucional escolar e a informalidade dos universos do cotidiano local (do
bairro, da região na qual vivem) e global (expressa pelas mídias). Universos
que podem ser criadores de mecanismos de controle, indução, reprodução, ou
mesmo de reflexão e libertação do pensamento. (CARDOSO, p.13, 2006).
A escola tem, portanto, um importante papel social na formação individual e
coletiva e por isso é um interessante objeto de estudo para diversas áreas do
conhecimento, uma vez que ela permite, ao pesquisador, analisar a maneira que se
processam as RS.
Visando este objetivo foram escolhidas duas instituições de ensino para
subsidiar o trabalho: a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professora
Maria Antonieta Serra Freire e a também Escola Estadual Professor Camilo Salgado.
5.1 INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES:
5.1.1 A escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professora Maria
Antonieta Serra Freire (SF)
A escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professora Maria Antonieta
Serra Freire (SF) foi fundada em 28 de abril de 1982 e está localizada no Distrito de
Icoaraci, na Avenida Contorno Sul, s/n, distante 14 km das áreas centrais de Belém. A
escola possui uma estrutura física de grande porte, mas que ainda está deteriorada,
mesmo após um ciclo de reformas implementadas pela atual diretoria, a qual é
coordenada pela professora Ojeci Valente.
39
O SF é uma das maiores e mais importantes escolas do Distrito. Ela possui
cinco turmas do 3º ano do ensino médio regular, das quais, duas participaram da
pesquisa de campo, estas foram escolhidas por uma questão de acessibilidade a
instituição e para que a pesquisa pudesse ser realizada no mesmo horário, o turno da
tarde, em ambas as escolas. A instituição tem 23124 alunos matriculados divididos nos
turnos da manhã, tarde e noite. As turmas, de acordo com os dados da SEDUC,
deveriam ter 40 alunos por sala, mas essa estatística não foi confirmada, já que a
somatória dos alunos entrevistados nas duas turmas do SF foi de 60 estudantes.
Para realização da atividade marcou-se uma conversa inicial com a diretora da
escola, a qual se mostrou bastante solícita e disse que os alunos gostavam de trabalhos
semelhantes ao da pesquisa. Nesse primeiro momento foi entregue o ofício assinado
pelo diretor da Faculdade de Comunicação5 solicitando a utilização do espaço e
equipamento de vídeo para realização da mostra audiovisual. A escola disponibilizou
notebook, data show e caixa acústica e a atividade ocorreu no auditório.
5.1.2 Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professor Camilo Salgado
A escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio professora Camilo Salgado,
está localizada na Avenida Roberto Camelier, n°823, no bairro do Jurunas. A frente da
unidade está à diretora Maria Cortes. De acordo com as informações da SEDUC, a
instituição possui 1762 alunos regularmente matriculados, divididos nos três turnos de
funcionamento (manhã, tarde e noite). Segundo a Secretaria a instituição possui oito
turmas do 3º ano do Ensino Médio, com 40 alunos cada uma, mas ao desenvolver a
pesquisa obteve-se que a soma de questionários respondidos, em duas turmas, foram de
40 entrevistas.
A instituição é uma das escolas mais conhecidas do bairro e tem uma estrutura
física avaliada como boa em relação às demais. Para mostra audiovisual foi solicitado o
empréstimo de equipamento de vídeo mediante ofício entregue a direção, a qual
disponibilizou seu DVD e TV. A pesquisa foi realizada no auditório, o qual é um dos
poucos locais refrigerados da unidade e ocorreu sem maiores problemas.
4 Informações retiradas do site da Secretaria de Educação do Estado do Pará (SEDUC).
5 Na época da pesquisa a FACOM contava com um diretor interino, o professor Ronaldo Guerra.
40
5.2 AS BANDAS: MADAME SAATAN E COLETIVO RÁDIO CIPÓ.
A banda Madame Saatan foi criada em 2003, em Belém do Pará, e atualmente
reside em São Paulo. O grupo se define como alternativo e diz tocar um som que é uma
mistura de heavy-metal com letras em português, ao som de música brasileira que vai
do Lundú até a Música Popular Brasileira (MPB). O primeiro videoclipe gravado pelo
grupo foi Devorados que teve como cenário a comunidade Vila da Barca, na época, o
local era constituído de palafitas, 50 pessoas trabalharam na produção do vídeo que foi
exibido em várias emissoras, como: a MTV, o Multishow, e a Rede Globo.
O núcleo de produção de mídia sonora e vídeo arte Coletivo Rádio Cipó, teve
início em 2004 quando um grupo de amigos se uniu para fazer produção sonora e
gráfica, anos mais tarde eles decidiram organizar tudo no disco: “Formigando nas
calçadas do Brasil”, este trabalho foi 90% produzido em estúdio caseiro. O trabalho é
uma homenagem à Comunidade Álvaro Adolfo, localizada na Pedreira, por ser este o
espaço em que o grupo organizava oficinas de percussão e ritmos eletrônicos. Em 2005,
o grupo gravou o DVD de nome EletroFunkDubSocial que tem como proposta ser um
documentário com depoimentos e videoclipes, entre eles, Matinha do Cruzeiro, um dos
produtos apresentados na mostra audiovisual organizada pela presente pesquisa.
5.3 A MÍDIA: VIDEOCLIPES
Objetivando fazer com que o público-alvo tivesse um objeto midiático para
analisar visando confirmar ou não a hipótese inicial desta monografia, a de que a mídia
influencia na constituição das representações sociais, foram escolhidos dois videoclipes
de bandas paraenses que se autodefendem como integrantes do mercado independente
de Belém.
A opção por clipes se deu pelo caráter rápido desse tipo de produção, já que ele é
a versão filmada de uma música e, portanto, um curta-metragem. Esta foi a melhor
estratégia encontrada para que se conseguisse adentrar no ambiente escolar sem
prejudicar o andamento das aulas. Com essa ferramenta os estudantes perderam o
mínimo de aula possível e o objetivo da pesquisa foi alcançado, o de fazer com que eles
participassem e respondessem os questionários.
Os videoclipes selecionados (Devorados e Matinha do Cruzeiro) foram
escolhidos por serem trabalhos conceituais, gravados em cenários cotidianos e que
pretendem ser muito mais que a ilustração de uma canção, propõe a representação de
41
um tema, nesse caso: da periferia. Esses produtos tornaram-se interessantes por
possuírem um enfoque de documentário. Devorados, foi dirigido pela cineasta paraense
Priscila Brasil.
5.4 A IMPORTÂNCIA DOS DESENHOS PARA A PESQUISA
A psicologia é a ciência que utiliza a técnica dos desenhos como instrumental de
análise seja em clínicas, no trabalho ou ainda nas escolas. Isso ocorre porque os
desenhos do examinado representam seu modo de interpretar dada situação, ou seja, de
exteriorizá-la, eles são usados tanto para avaliar um candidato nos processos seletivos
das empresas, como também em clínicas.
Os desenhos produzidos pelos estudantes são, portanto, uma interessante
ferramenta a ser analisada, uma vez que eles constituem não uma representação fiel da
realidade, mas a interpretação por parte da população da pesquisa sobre o lugar em
vivem. A maneira pela qual percebem e interpretam o tema periferia será observado nos
desenhos.
Para a análise foram selecionados 12 trabalhos, escolhidos por respeitarem o
quesito legibilidade e possuírem elementos comuns nos demais trabalhos. Dos 100
estudantes, 90 produziram um desenho que representasse, a seu ver, a periferia de
Belém. Ao observar os desenhos notou-se que as abordagens eram principalmente: (1)
violência, (2) Infraestrutura inadequada (3) momentos de lazer entre grupos e (4)
concentração populacional.
5.5 APRESENTAÇÕES DOS SUJEITOS DA PESQUISA: ALUNOS
O questionário elaborado para pesquisa de campo teve início com perguntas de
caráter pessoal, como sexo, escola, idade e bairro, ao fazê-lo, obtiveram-se os seguintes
resultados: dos 100 estudantes entrevistados, 80% são do sexo feminino e 20% do
masculino.
A interpretação desses dados pode ser explicada, entre outros motivos, pela
elevada taxa de evasão escolar, principalmente, no que tange a EEEFM Professor
Camilo Salgado (CS) que de uma totalidade de 80 alunos matriculados em duas turmas
do terceiro ano do médio tinham frequentando cerca de 50 alunos, sendo que em dias de
42
provas esse número alcançava seu maior índice; nos demais menos alunos assistiam às
aulas, segundo os relatos dos professores e alunos6.
No dia da pesquisa na CS estiveram presentes, somando as duas turmas, 40
alunos, o que justifica o fato do número de estudantes da EEEFM Maria Antonieta Serra
Freire (SF) ter sido maior, já que dos 80 alunos matriculados 60 participaram da
pesquisa. Esta escola também enfrenta a mesma dificuldade, no que tange ao abandono
do ano letivo, mas em menor proporção.
Gráfico 1 – Evasão escolar
Fonte: Dados da Pesquisa
Os entrevistados disseram que são os homens os mais suscetíveis a abandonar os
estudos precocemente, em virtude da necessidade de começarem a trabalhar e ter em
que ajudar na renda da família ou ainda sustentarem sozinhos a sua casa. Entre as
mulheres, constatou-se que a evasão escolar é menor, mas ocorre por ser necessário
ajudar a complementar a renda dos pais, ter que se auto-sustentar ou ainda por uma
gravidez indesejada. De acordo com a informação passada pelos jovens, várias colegas
largaram os estudos por causa de uma gestação.
Com este resultado a inferência que foi feita é de que a evasão escolar ainda é
um problema. O desafio de fazer com que o aluno permaneça na sala de aula parece
estar longe de ser superado e isso ocorre por vários motivos, como: a estrutura
inadequada das escolas, o número reduzido de instituições, fato que não supre a real
demanda da comunidade fazendo a distância casa-escola ser mais um empecilho, além
disso, um ensino distante da realidade do aluno. São fatores citados por eles como
pontos que não colaboram para a sua permanência na escola.
6 A pesquisa foi realizada no período de janeiro a fevereiro de 2011.
43
Gráfico 2 - Quanto ao sexo
Fonte: Dados da pesquisa
No que diz respeito à idade do público-alvo foram propostas quatro
possibilidades de escolha: (1)15-17; (2)18-20; (3) 21-23; (4) Outras. Qual? Com essa
informação conseguiu-se identificar qual a faixa etária da maioria dos entrevistados e
sua incidência em porcentagem, ao analisar os questionários verificou-se que a idade
mais abrangente assinalada pelos jovens compreende o intervalo 2 seguido da
frequência 1, mas também, ainda que em menor proporção, foi escolhido o número 3 e o
4. Aos que marcaram a alternativa 4 foi proposto que dissessem qual a sua idade e com
essas repostas encontraram-se concluintes de até 30 anos de idade.
O resultado obtido mostrou que o público-alvo da pesquisa tem de 15 a 30 anos.
Como justificativa para essa disparidade defende-se os motivos já citados
anteriormente, como a evasão escolar, ocasionada pela gravidez na adolescência, a
exigência de ter que trabalhar mais cedo para se auto-sustentar e ainda o ingresso tardio
nas instituições de ensino.
Gráfico 3- Quanto à idade
Fonte: Dados da Pesquisa
44
Em relação à pergunta sobre o tempo em que o aluno estuda na respectiva
escola, obteve-se o resultado de que a maior parte dos participantes está inseridas no
intervalo de tempo de 1 a 3 anos (47%), já os demais estudam na mesma escola de 4 a 6
anos (28%) e de 7 a 9 anos são (25%), como análise percebeu-se que boa parte dos 25%
que disseram frequentar a mesma unidade de ensino estudam, sobretudo, no SF.
Enquanto que a maior parte dos estudantes do CS marcaram a primeira opção.
Essa estatística pode estar atrelada ao fato do Distrito de Icoaraci e Outeiro
estarem mais distantes do centro, ter poucas escolas de grande porte, isto é, com mais de
2.000 alunos e que disponibilizem vagas da 5º série do ensino fundamental ao 3º ano do
Ensino Médio, além da própria organização da instituição e sua “localização geográfica
privilegiada”.
Para vários estudantes o SF é bem localizado e por isso é um lugar bom de
estudar. Esse relato pode explicar a opção destes e de suas famílias por permanecerem
na mesma escola durante mais tempo, já no CS o intervalo de 1-3 anos, talvez, ocorra
com freqüência pela poucas vagas oferecidas anualmente, partindo da hipótese de que
os jovens só conseguiram se matricular na instituição para cursar o Ensino Médio.
Vários estudantes também disseram gostar de estudar no CS, apesar de não ser essa a
instituição dos seus sonhos.
Gráfico 4 - Quanto ao tempo de permanência na instituição de ensino
Fonte: Dados da Pesquisa
No que diz respeito ao bairro, o público da pesquisa mora principalmente no
Distrito de Icoaraci 52 alunos, e isso mostra que a maioria dos estudantes residem
próximo à escola, nesse caso ao SF. O segundo bairro mais citado é o Jurunas com 28 e
a Condor 11 pessoas, também foram citados o bairro da Batista Campos 1, conhecido
por ser um dos bairros nobres de Belém, além do Tapanã 3 estudantes e a Ilha de
45
Caratateua, conhecida como Distrito do Outeiro 5. Nota-se que dos bairros citados
apenas Batista Campos é tido como área nobre da cidade, os outros são conhecidos por
constituírem a periferia de Belém. O bairro do Tapanã, o distrito de Icoaraci e Outeiro
foram citados, principalmente, em relação à distância que os separa da capital do
Estado.
Gráfico 5 - Quanto ao bairro
Fonte: Dados da Pesquisa
46
6 ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA PERIFERIA DE BELÉM.
Ao interpretar os dados da pesquisa de campo podem-se constatar diferentes
representações sociais, as quais serão apresentadas ao longo desse capítulo. Esses dados
foram obtidos por meio da aplicação de questionários, dos desenhos elaborados pelos
estudantes, das músicas e palavras destacadas, além da entrevista em profundidade
realizada com os jovens. Para apresentar os resultados, optou-se pela estratégia de
classificá-los em cinco temas, tomando como base o conteúdo das entrevistas e do
referencial teórico: (A) Conceitos e definições sobre periferia; (B) Violência; (C)
Concentração populacional (D) Infraestrutura deficiente (E) União entre vizinhos.
6.1 QUEM É O MORADOR DA PERIFERIA?
Uma das representações mais fortemente presentes nos discursos dos alunos é a
infraestrutura deficiente nas áreas de periferia. Ao serem questionados sobre a
localização do seu bairro constituir ou não a periferia 63 pessoas responderam
positivamente à indagação, 29 disseram não fazer parte e 8 estudantes deixaram em
branco. Nas entrevistas em profundidade, percebeu-se que a opinião sobre morar ou não
na periferia estava diretamente ligada à infraestrutura do lugar e ao sentimento de
pertença em relação ao bairro, já que para alguns alunos residir nessas áreas não os faz
se identificar com o local:
A- Onde eu moro não é bem periferia, apesar de ser um bairro conhecido
como periferia eu considero bem tranquilo. Um lugar que não tem muito
roubo, assalto, não é feio, dá para se viver. Não me considero um jovem da
periferia, porque não me vejo nesse estilo “amalandrado”. Minha mãe diz
que tenho tudo como pobre, mas sempre dá para ter mais. (Trecho da
entrevista com jovem).
A- Moro na periferia, mas não me considero da periferia, pelo fato de
pensar diferente, de conhecer outras coisas. Eu tenho uma visão diferente
da maioria das pessoas daqui. (Trecho da entrevista com jovem).
Isso implica dizer que habitar ou não esses espaços, está para além de fixar
residência em determinado território. Para os jovens citados, significa se sentir
pertencente ao bairro, isto é, se identificar com o lugar. Outro ponto que se pode
destacar é a agilidade com que os estudantes dos bairros do Jurunas, Condor e Tapanã
responderam a pergunta e isso talvez tenha ocorrido pelo fato dessas áreas serem alvos
diários de notícias, inúmeras delas relacionadas: (B) Violência, (C) Concentração
populacional e (D) Infraestrutura.
47
Imagem 2 – Ilustração sobre a periferia de Belém
Fonte: Dados da pesquisa
Essa hipótese lembra a teoria da Agenda Setting, a qual trabalha a mídia como a
responsável por pautar os assuntos que serão discutidos nas rodas de conversa e, além
disso, como responsável pela propagação de ideias cristalizadas. Para os alunos,
periferia é:
B- Um lugar abandonado, o Estado não faz nada por ela. São bairros sem
segurança, onde reina a violência e as pessoas têm medo, quem manda na
periferia são os bandidos, não a polícia. (Trecho da entrevista com jovem).
D - Pra mim periferia é um lugar feio, que mora muita gente, é sujo, pobre e
as casas são construídas de forma precária e em regiões perigosas. As pessoas
que moram ali ficam vulneráveis a várias coisas, como a fúria da natureza.
Vi, na televisão, os desmoronamentos no Rio de Janeiro. Famílias que
perderam tudo, porque as casas foram feitas nos morros, aqui em Belém elas
sempre alagam quando chove. (Trecho da entrevista com jovem).
48
As respostas possibilitaram perceber que os estereótipos reproduzidos pela
mídia influenciaram na opinião dos jovens, uma vez que a multiplicação de ideias e
valores, como também dos elementos mencionados acima contribuíram para que a
maioria dos entrevistados, residentes nestes bairros, dissessem morar na periferia. É o
que Moscovici conceitua como senso comum, isto é, uma verdade compartilhada nesse
caso, a ideia tornada consenso é a periferia como o lugar da ausência, um espaço sem
infraestrutura de qualidade, violento e de elevada concentração populacional.
No que diz respeito aos desenhos, a maioria dos entrevistados também
representou estas temáticas como, por exemplo, nas ilustrações na página anterior. A
primeira imagem faz referência à elevada taxa de natalidade da população de baixa
renda, isto é, a alta concentração populacional nas periferias de Belém que na ausência
de uma infraestrutura adequada está sujeita a ação de roedores e, portanto, a
leptospirose. Já o segundo trabalho aborda a questão da violência, em que um dos
garotos apresenta uma fisionomia agressiva e uma faca na mão, contrastando com o
rapaz que está de costas e com a cabeça inclinada. Este parece olhar para o alto, talvez,
uma representação da morte enquanto encontro com um ser superior, Deus.
Já para os estudantes que disseram não ser da periferia observou-se que esta foi a
resposta, principalmente, dos residentes no Distrito de Icoaraci e Outeiro e isso pode ter
acontecido, entre outros fatores, devido a distância geográfica do centro da cidade até
esses bairros, o que possibilita terem uma logística diferenciada e certa autonomia no
que diz respeito à infraestrutura comercial. Outro ponto importante que foi verificado é
que mesmo dentro dos distritos as pessoas responderam tendo como base a
infraestrutura ao redor da sua casa.
Por exemplo, em Icoaraci, os estudantes que moravam próximo à orla da praia
do Cruzeiro inferiram que não estão na periferia, enquanto que os residentes em áreas
próximas a ocupações não planejadas e ao rio Paracuri I e II disseram morar na
periferia. Essa diversidade de opinião ou mesmo a atitude de preferir não opinar, mostra
o conflito existente para se definir o que é ou não a periferia de uma cidade. Notou-se
que os questionários sem respostas eram de alunos residentes nesses bairros.
Gráfico 6 - Em relação ao bairro de sua residência e a periferia
49
Fonte: Dados da Pesquisa
Ao serem questionados sobre a localização das suas escolas se elas estão ou não
na periferia percebeu-se, também, a existência de um conflito, no que tange à definição
do que é estar ou não na periferia. Ao ser perguntado sobre o assunto (58) alunos
responderam sim, para eles sua escola está localizada na periferia, (36) disseram não e
(6) estudantes deixaram em branco, pediu-se ainda que justificassem suas respostas,
alguns o fizeram, outros não.
Aos que responderam negativamente, utilizaram como justificativa a qualidade
da infraestrutura do lugar. D -“minha escola não faz parte da periferia porque ela se
encontra em uma rua bem diferente, a rua é pavimentada”, para esse aluno estar ou não
na periferia depende em grande medida da infraestrutura que o local apresenta já outros
disseram que a escola faz parte por ser um lugar que tem muitas casas e elas são todas
próximas, para esses indivíduos a representação feita está intimamente ligada à estrutura
inadequada e à alta concentração populacional.
Esses temas foram bastante relatados nos desenhos dos estudantes como nas
ilustrações abaixo, em que a primeira retrata a concentração populacional e a violência.
Este tema foi representado pela figura de dois jovens que do alto da laje simbolizam um
traficante que atira, devido o não pagamento de uma dívida. Esse ato ocorre enquanto o
devedor brinca de papagaio, uma alusão à infância/juventude roubada, já a segunda cena
são várias casas no alto de um morro com uma criança ou jovem empinando papagaio.
Essa imagem é uma representação muito presente no videoclipe Devorados e talvez isso
explique os inúmeros desenhos contendo esses elementos.
Imagem 3 – Ilustração sobre a periferia de Belém
50
Fonte: Dados da pesquisa
Para alguns estudantes a resposta que melhor define se sua escola está ou não
na periferia é : A-“É periferia porque fica no Jurunas e Jurunas é periferia”. Esse aluno
acredita que basta ele dizer o nome do bairro para que o termo seja auto-explicativo.
Para o aluno este nome já apresenta carga simbólica e uma imagem consolidada na
cabeça das pessoas, tal qual na sua mente, uma vez que a opinião dele é a mesma
reproduzida pela mídia, isto é, os estereótipos difundidos lagarmente pelos veículos de
comunicação e já discutidos anteriormente, exercem forte influência na definição do que
é estudar ou não em um bairro de periferia.
Gráfico 7- Em relação o bairro que sua escola está localizada e a periferia
51
Fonte: Dados da Pesquisa
A questão de número oito propôs aos alunos que respondessem se existe
identificação entre eles e o que foi mostrado nos dois videoclipes. O resultado alcançado
é que a maioria dos entrevistados 58 pessoas não se reconhecem nos vídeos, entre
outros motivos, por não concordarem com o exposto, já que eles vivem uma realidade
diferente da mostrada: B- “na localidade que eu moro é um conjunto habitacional e lá
não existe muita violência”.
Outro ponto relatado pelos alunos é que por não morarem em palafitas ou em
vilas, não se identificam com os trabalhos que foram gravados em localidades do
gênero. Devorados foi gravado na Vila da Barca, antes do PAC, em que as habitações
eram do tipo palafitas e o vídeo Matinha do Cruzeiro em vilas, ao redor do canal de
mesmo nome, além disso foi justificada a não identificação pelo fato de existirem
lugares e situações bem piores do que foi mostrado. Esta resposta teve como justifcativa
que, para o estudante, o seu bairro sofre com vários problemas não retratados pelas
produções.
Já para os (36) alunos que responderam sim, o dia-a-dia dos moradores se parece
com o seu, justificaram dizendo que existe identificação com o exposto, já que estes
vivem em uma realidade semelhante à proposta pelas bandas, e para eles os problemas
enfrentados pelos moradores desses bairros são resultados do abandono do poder
público. Quanto aos que não responderam foram 6 alunos que talvez não tenham
entendido a proposta.
A representações sociais reproduzidas aqui estão ligadas à diversidade e
complexidade das áreas de periferias que, para a maior parte dos estudantes, não foi
mostrada. Para os entrevistados, os videoclipes estigmatizaram as comunidades
mostrando repetidamente o que falta, o que não tem nesses locais ou a real violência,
52
mas não retrataram ás manifestações culturais, de resistência, a organização popular e
ação dos centros comunitários. De acordo com Souza, a periferia é diversa:
Outra forma possível de perceber-se a periferia passa pelo reconhecimento de
que os seus habitantes desenvolvem formas ativas e contrastantes para
enfrentarem suas dificuldades do dia-a-dia, de acordo com suas trajetórias
pessoais e coletivas, as características socioculturais e geográficas do seu
território e a postura assumida pelas suas lideranças e pelas instituições
locais, dentre outras variáveis. Naturalmente, a superação dos evidentes
limites presentes nas condições de vida dos habitantes da periferia é uma
necessidade, a ser encarada pelos poderes públicos e pelos setores sociais
identificados com a democracia e a justiça social. (SOUZA, 2005).
Nesse sentido, os videoclipes não abordaram o cotidiano dos moradores, as
dificuldades enfrentadas por eles e a maneira que se organizam na luta por melhores
condições de vida. Outro ponto citado como uma característica da periferia é a união
entre vizinhos.
Gráfico 8 – Em relação à identificação com os videoclipes
Fonte: Dados da Pesquisa
A pergunta de número nove diz respeito à avaliação que os jovem fizeram sobre
os videoclipes, o objetivo era saber o que pensavam os estudantes sobre a maneira que
as bandas representaram a periferia de Belém. A opção selecionada pela maioria 57
pessoas foi a palavra bastante; para estes, o vídeo representa bem o tema 24 pessoas
acharam que representa pouco e justificam dizendo que a abordagem feita pela banda
trabalha apenas os problemas das periferias, principalmente, a questão da violência
deixando de contemplar, por exemplo, a riqueza cultural do lugar. Para 19 alunos a
palavra que mais se adequa é fielmente pelo fato dos produtos transmitirem fidelidade
ao cotidiano das periferias, apesar de ter sido sugerida pela pesquisa a palavra não 0
nenhum entrevistado a escolheu.
53
Gráfico 9- Quanto a avaliação dos videoclipes
Fonte: Dados da Pesquisa
Como na questão anterior (24) pessoas haviam dito que os videoclipes
representavam pouco a realidade, perguntou-se na questão 10 sobre a maneira que
deveria ser abordado o tema, os resultados encontrados discorrem sobre a necessidade
de abordar pontos como, o clima amistoso entre vizinhos:
E- na periferia todo mundo se conhece é um lugar bom de viver porque aqui
a gente aprende mesmo a viver, a respeitar as diferenças, eu gosto dos meus
vizinhos e acho legal morar aqui. (Trecho da entrevista com jovem)
E- Existem vantagens de se morar na periferia porque aqui temos
acessibilidade com os vizinhos, conversamos com eles. Se acontecer alguma
coisa na tua casa eles te ajudam, tem muitas periferias que ficam próximas
aos centros. A periferia tem de tudo, pessoas classes média alta, baixa e que
acabam morando na periferia por opção ou falta dela. (Trecho da entrevista
com jovem).
Isso implica dizer, que para os entrevistados a periferia, também, representa um
lugar de povo alegre e unido e que os vizinhos convivem bem. Os alunos disseram,
ainda que os videoclipes não representaram a complexa logística do crime e os
diferentes contextos sociais das periferias de Belém, de acordo com eles existem
periferias mais estruturadas do que outras, uma vez que elas não são homogêneas, pelo
contrário, periferia é sinônimo de diferentes realidades e um videoclipe que se propõe
abordar o tema precisa mostrar isso. Essas foram às representações mais encontradas
para a questão.
Gráfico 10 - Quanto à representação de periferia
54
Fonte: Dados da Pesquisa
O espaço destinado para que os alunos escrevessem sua opinião sobre os
videoclipes foi a questão 11, que, por ser uma questão aberta, possibilitou múltiplas
respostas. No gráfico abaixo foram colocadas as de maior incidência, mas é importante
lembrar que não são os únicos entendimentos por parte dos entrevistados.
As respostas avaliativas do produto resultaram nas seguintes representações:
48% acharam o vídeo uma representação fiel da realidade, 14% relataram que o vídeo
mostra bastante a criminalidade que acontece diariamente nas periferias; para 11% o
que mais foi mostrado é a estrutura inadequada das periferias brasileiras com a
presença de habitações do tipo palafitas e casebres, a ausência de saneamento básico de
qualidade, além da falta de oportunidade e de cidadania.
Para 10% os vídeos são interessantes ou muitos interessantes, de boa
musicalidade e foi bem gravado, eles também gostaram da iniciativa de se gravar nas
comunidades. 8% estão divididos entre os que não responderam e aqueles que acharam
os vídeos reducionistas, pelo fato de eles mostrarem apenas um lado das periferias, o
negativo, uma vez que para estes a periferia tem muito mais a ser mostrado:
A- Periferia é uma comunidade onde moram pessoas bem simples, humildes
e que têm diversos problemas como à criminalidade. A violência
normalmente se concentra nas periferias de qualquer cidade, mas ela,
também, tem coisas boas como o surgimento de cantores, jogadores de
futebol, atores, uma cultura da periferia. (Trecho da entrevista com
jovem).
O que disse o estudante acima é consenso para 8% dos entrevistados, os quais
disseram que faltou, no vídeo, mostrar a cultura da periferia. 6% acham que o vídeo
mostrou o descaso do poder público com as periferias. Os estudantes também citaram,
em menor proporção, outras percepções que não estavam no trabalho como o medo da
violência ocasionado pela inexistência de policiamento, o que torna a periferia um lugar
triste.
55
Os desenhos também abordaram a questão da infraestrutura precária nas
periferias, como nos exemplos abaixo que representam as palafitas construídas sobre os
rios de Belém, habitações feitas de madeira e que sinalizam risco a saúde da população.
Nas imagens também é retratada uma mulher lavando roupa no giral, uma espécie de
tanque feito de madeira, destinado a ser um espaço para que as pessoas lavem roupas e
louças. No segundo desenho são mostradas crianças brincando de bola e empinando
pipa o que sugere a interação entre os vizinhos e a precariedade a que estão expostos os
habitantes desses locais.
Imagem 4 – Ilustração sobre a periferia de Belém
Gráfico 11- Quanto ao parecer sobre os videoclipes.
56
Fonte: Dados da Pesquisa
6.2 O QUE É PERIFERIA?
Para verificação da representação de periferia que os jovens possuem
individualmente e coletivamente foi proposta a questão 12, a qual também tem estrutura
aberta, propositalmente, visando possibilitar uma maior liberdade de expressão aos
estudantes. Verificou-se que para 21% dos jovens, a definição de periferia é de um lugar
violento e com alto índice de criminalidade, esse dado se repetiu nos desenhos
elaborados, em que a maioria retratou assaltos, mortes e tiroteios.
Para 19%, a periferia é representada como moradia de pessoas de baixa renda,
15% disseram que ela é sinônimo de ausência de infraestrutura adequada. Já para 14% é
um bairro pobre, o que não está atrelado, apenas, ao poder aquisitivo dos moradores,
mas também à estrutura do lugar, 8% disseram que ela é a forma mais latente de
exclusão social dentro de uma cidade, já 7% afirmaram que essas comunidades são
resultados da ausência do poder público, 6% definen periferia pela elevada concentração
populacional, 5% falaram em insegurança, não só no que tange à violência, mas ao fato
de habitar regiões insalubres e a estar exposto, diariamente, a várias doenças endêmicas
e de pele.
Para 5%, periferia é representada como um lugar que possui: áreas de
prostituição, famílias desestruturadas, principalmente em relação ao abandono de
crianças, população de maioria negra, de baixa escolaridade, com uma elevada taxa de
desempregados ou de subempregos e que por conta disso têm poucas opções de lazer.
Eles também disseram que periferia é um lugar onde os habitantes não tem a sua
cidadania completa, justamente, por não terem princípios básicos para se viver com
qualidade como estrutura, segurança, moradia, entre outros, os jovens disseram ainda
que periferia é um lugar popular e distante das regiões centrais, mas que apesar de ter
57
todos esses problemas enumerados acima “ não é só roubo, mortes e drogas” trecho
retirado do questionário dos estudante.
A-O governo praticamente não faz nada pela periferia, só gasta o dinheiro do
povo. Acho que as pessoas daqui têm que fazer tudo sozinha para conseguir
vencer na vida, tomar iniciativa e ir em busca do que quer, porque o estado só
olha pra cá em época de eleição. (Trecho da entrevista com jovem).
Imagem 5 – Ilustração sobre a periferia de Belém
Fonte: Dados da pesquisa
Os alunos falaram ainda sobre o processo de familiaridade existente nas
periferias. As comunidades constituem uma família: “ nas periferia teu vizinho é mais
irmão do que teus próprios parentes, o vínculo que nós temos com nossos colegas de rua
é bem legal, minha família não é daqui e eu moro há 18 anos na mesma rua, os meus
amigos de lá são mais próximos de mim que meus próprios parentes”. Segundo outro
entrevistado, na periferia se você precisar de um pouco de açúcar ou de um ombro
amigo você consegue encontrar:
58
E- Existem vantagens de se morar na periferia porque aqui temos
acessibilidade com os vizinhos, conversamos com eles. Se acontecer alguma
coisa na tua casa eles te ajudam, tem muitas periferias que ficam próximas
aos centros. A periferia tem de tudo, pessoas classes média alta, baixa e que
acabam morando na periferia por opção ou falta dela. (Trecho da entrevista
com jovem).
Gráfico 12- Definição de periferia
Fonte: Dados da Pesquisa
Após a definição do que é ou não periferia foi solicitado aos estudantes que
respondessem acerca da representação social que possuem sobre o tema. Os resultados
obtidos aqui, em muitos pontos se cruzam com as definições propostas na questão 12,
como consequência obteve-se que para 26% ao falar de periferia a imagem que logo é
formada em seu cérebro é a de violência, 12% pensam em traficantes e na logística do
tráfico de drogas, 9% se sentem inseguros logo de imediato, fatores que justificam os
inúmeros desenhos retratando o assunto.
Imagem 6 – Ilustração sobre a periferia de Belém
59
Fonte: Dados da pesquisa
22% falaram da infraestrutura precária relatando, principalmente, a questão da
sujeira no lugar, 15% pensam imediatamente em um bairro pobre, 7% falaram da falta
de oportunidade e discriminação sofridas pelos moradores da periferia.
D- Eu represento a periferia como um local que falta saneamento, segurança,
poder público e moradia de qualidade. O abandono dessas regiões dificulta a
vida de quem mora aqui. Muitos moradores reclamam da estrutura
inadequada. Meu pai diz que volta toda noite cansado do trabalho e tem que
pegar ônibus cheio, correndo o risco de ser assaltado, porque quando chega
aqui perto de casa não tem policiamento. (Trecho da entrevistada com os
jovens).
Para muitos alunos a representação social mais forte é a elevada concentração
populacional e as habitações construídas de forma precária. Para 6% outras imagens
vêm à mente ao falar em periferia, como: pessoas batalhadoras que lutam contra as
adversidades do dia-a-dia, moradores passando necessidades, pobreza em larga escala,
indivíduos de baixa escolaridade e gente precisando de ajuda em todos os sentidos que
vai do campo econômico ao social.
60
Imagem 7 – Ilustração sobre a periferia de Belém
Fonte: Dados da pesquisa
Outro ponto mencionado é a oposição existente entre as áreas nobres e ricas em
oposição à pobreza das periferias, falou-se em contradições sociais ocorrendo em uma
mesma Rua de Belém, a qual pode ter seu início na Batista Campos, região nobre e o
fim no Jurunas, considerado periferia. Alguns estudantes disseram lembrar
imediatamente de alguns bairros ao lerem a palavra periferia e decidiram enumerá-los:
Jurunas, Guamá, Bengui e Terra Firme foram os sugeridos por eles.
Gráfico 13 - Representações Sociais de periferia.
61
Fonte: Dados da Pesquisa
A questão 14 questionava o acesso à informação sobre o tema visando investigar
se notícias, matérias, reportagens, músicas, videoclipes e produções culturais sobre a
periferia são encontrados facilmente pelos estudantes. Conseguiu-se com essa pesquisa
o presente resultado: 42 pessoas até acham material sobre o assunto, mas isso não
ocorre sempre, já 30 jovens disseram encontrar com facilidade e de forma frequente
essas produções, enquanto que 28 alunos confessaram ter dificuldade para encontrá-los,
como interpretação deduziu-se que apesar do “boom” dos últimos anos de programas,
séries, novelas, músicas entre outras produções retratando e trabalhando as periferias
brasileiras ainda não se tem essa produção acessível e democratizada, já que muito do
que é produzido se restringe à televisão, a canais a cabo ou na internet, poucos
estudantes disseram ter computador em casa e os que têm não possuem acesso à internet
banda larga na residência.
Gráfico 14 – Quanto ao acesso às informações
Fonte: Dados da Pesquisa
A questão de número 15 foi proposta objetivando relacionar o tema de estudo
periferia a músicas, bandas e ritmos musicais. O desejo de investigar quais ritmos
62
representam a periferia para os jovens fez com que essa pergunta fizesse parte da
pesquisa de campo.
Os dados obtidos são intrigantes, uma vez que o ritmo mais conhecido em
Belém é o Melody, mas para o público da pesquisa é o Rap e o Hip Hop, citado 37
vezes, o que melhor representar a periferia. O Melody juntamente com o Tecnobrega
ficou em segundo lugar sendo mencionado por 25 pessoas, 21 alunos não lembraram
nenhuma música e 16 falaram que para eles o ritmo que melhor representa a periferia é
o Funk, seguido de 5 pessoas que responderam música gospel, 5 também citaram o rock
e 3 referiram-se ao Carimbó, enquanto que apenas uma pessoa ao Calypso.
Entre as bandas, cantores e músicas mais citadas estão o Mc Racionais, que foi
escolhido por 15 pessoas, para os estudantes todas as músicas do grupo representam
bem o que é ser da periferia, merecendo destaque à canção Negro Drama. A banda
Realidade Cruel também foi lembrada pelos alunos com a música Depoimento de um
viciado, outra canção recorrente foi Faixa de Gaza do Mc Orelha.
Essas músicas contribuíram para confirmar as estatísticas sobre as
representações sociais apresentadas até aqui, a de que os jovens tem a periferia como
lugar de violência, insegurança, tráfico e criminalidade. No que tange ao ritmo Melody
foi bastante citada à música Declaração Super Pop, a qual tem como tema as festas de
aparelhagem. Percebe-se que este é um dos principais espaços de lazer dos jovens da
periferia. Outros cantores lembrados foram: Legião Urbana (Música Urbana), Pitty
(Teto de Vidro), Cássia Eller (Partido alto), Nilson Chaves (Belém, Pará, Brasil) e as
bandas CPM22, Katrina, entre outras. No que diz respeito à música gospel estão:
Fernandinho (Separando seus profetas), Rosas de Saron (Anjos da Rua), Apocalipse 16
(Muita Treta) e Padre Fábio de Melo (Anjos do Resgate).
Gráfico 15- Sobre o ritmo musical que mais representa a periferia
63
Fonte: Dados da Pesquisa
6.3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: O NÚCLEO CENTRAL.
Através dos instrumentais utilizados na pesquisa de campo, obteve-se como
resultado desta monografia que as representações sociais engendradas pelos jovens
estão constituídas, de forma hierarquizada, em torno de um núcleo central nos moldes
que Abric propõe. Nesse sentido, constatou-se que o Núcleo Central do presente
trabalho e que atribui significado a RS de periferia é a exclusão social.
A partir das respostas foi possível interpretar que, para os alunos, a
criminalidade, juntamente com a infraestrutura inadequada e a concentração
populacional, são os elementos periféricos responsáveis por sustentar e proteger esse
NC, assegurando a sua rigidez. Esses problemas favorecem o latente processo de
exclusão social a que estão sujeitos os moradores da periferia. De acordo com a
pesquisa é senso comum entre os entrevistados que os habitantes desses espaços não
têm seus direitos respeitados e por morarem nesses locais são discriminados tanto pelo
poder público que ignora as suas reais necessidades, quanto pelos cidadãos de outros
bairros que os rotulam como pobres, marginais e oriundos dos lugares “do me róba”,
uma gíria utilizada pelos estudantes em alusão ao estereótipo recebido por esses
moradores.
No discurso dos jovens percebeu-se que uma das representações mais
fortemente presentes é o desequilíbrio no que tange à intervenção estatal no centro e na
periferia. A partir da interpretação dos dados conclui-se que o uso do espaço na cidade
de Belém ainda encontra-se dividido, entre regiões que apresentam elevada
infraestrutura e intensa intervenção do poder público contrastando com locais de
abandono e de ausência de políticas públicas, esses espaços convivem diariamente com
64
a miséria, a insegurança e a exclusão social o que, segundo os sujeitos desta pesquisa, é
o caso das periferias.
A ínfima ação do poder público nestas áreas é o principal responsável segundo
os informantes, pelas elevadas taxas de criminalidade e, ainda pela proliferação de
doenças em virtude da ausência de um saneamento básico adequado que, combinado a
forte concentração populacional, descumpre um direito inerente ao ser humano, a
moradia de qualidade.
Nesse sentido é senso comum entre os alunos que a exclusão social da periferia é
resultado de se ter um governo que não cumpre integralmente o seu papel. Segundo os
jovens existe a necessidade de o Estado promover ações para melhorar as condições de
vida da população, como por exemplo, investindo em medidas que priorizem a
urbanização e regularização das terras, a diminuição da segregação espacial e o déficit
habitacional, isto é, a quantidade de cidadãos sem moradia própria e/ou que residem em
locais inadequados.
Segundo Santos, um cidadão só pode ter a sua dignidade por completo mediante
o território que habita,
Quantos habitantes, no Brasil, são cidadãos? Quantos nem sequer sabem que
não o são? O simples nascer investe o indivíduo de soma inalienável de
direitos, apenas pelo fato de ingressar na sociedade humana. Viver, torna-se
um ser no mundo, é assumir, com os demais uma herança moral, que faz de
cada qual um portador de prerrogativas sociais. Direito a um teto, à comida, à
educação, à saúde, à proteção contra o frio, a chuva, as intempéries; direito ao
trabalho, à justiça, à liberdade e a uma existência digna. O discurso das
liberdades humanas e dos direitos seus garantidores é, certamente, ainda mais
vasto. Tantas vezes proclamado e repetido, tantas vezes menosprezado. É
isso, justamente, o que faz a diferença entre a retórica e o fato. O respeito ao
indivíduo é a consagração da cidadania [...]. (SANTOS, 2007 p. 19).
Dessa forma, a noção de território e cidadania está intimamente ligada ao local
de habitação e circulação, isto é, a maneira com que o cidadão se apropria e utiliza esse
espaço é um fator que contribui para a leitura da sociedade. Portanto, ao se discutir a
questão da exclusão social como representação da periferia de Belém, implica dizer que
para os estudantes a habitação é uma necessidade básica do ser humano, de modo que
toda família demanda morar com qualidade e é justamente por isso que este é um dos
elementos preponderantes para que se tenha um cidadão completo e integral a que se
refere Milton Santos no trecho acima.
A representação da periferia como sendo um ambiente desfavorável para se
viver é consenso entre os jovens. A maioria dos estudantes que moravam nesses bairros
65
revelou o desejo de residir nas áreas centrais, para eles, isso representaria uma ascensão
social. Apesar dessa vontade e dos pormenores desses espaços, os sujeitos da pesquisa
também conseguiram representar positivamente a periferia pela sua população, estes
disseram que nesses locais reside um povo hospitaleiro e que laços de amizade são
construídos entre os moradores. Esta RS é consenso entre os estudantes, mesmo entre
aqueles que declararam não morar na periferia ou que disseram não se identificar com
os habitantes do lugar. Eles citaram as brincadeiras de ruas entre vizinhos, um
comportamento comum nesses bairros e que dificilmente encontra-se em condomínios
fechados, por exemplo.
Essa representação dicotomizada da periferia como um espaço ruim e ao mesmo
tempo bom possibilita a interpretação de que para os sujeitos desta pesquisa é a
exclusão social que sustenta a representação negativa engendrada sobre a periferia.
Nesse sentido, percebeu-se o olhar de estranhamento e certa dificuldade por parte dos
estudantes, para responder ao questionamento sobre o lado positivo de se morar nesse
espaço. Acredita-se que isso tenha ocorrido pela representação do tema ter,
principalmente, como foco os problemas sociais, uma vez que essas representações
negativas por serem cotidianamente reproduzidas e por estarem já consolidadas na
mente dos alunos dificultaram a sua desconstrução.
Essas RS cristalizadas sobre a periferia de Belém também se refletiram nas
músicas propostas pelos estudantes, os quais na maioria das vezes sugeriram letras que
discutem as mazelas sociais a que estão expostos os moradores da periferia,
principalmente, no que tange a violência, discriminação, tráfico de drogas, roupas de
marcas, tipos de habitações, entre outros. Através das letras percebe-se o interesse das
bandas em mostrar o cotidiano desses espaços, além de propor reflexões sobre as
diferenças existentes entre as classes sociais no país, como também o luxo, a riqueza e o
poder trazidos pelo tráfico de drogas às pessoas que se envolvem com essa atividade. As
músicas relatadas pelos jovens sobre a RS da periferia de Belém mostram, mais uma
vez, a exclusão social a que estão sujeitos os seus moradores.
66
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As meninas pulando corda e jogando amarelinha, fechadas no pátio da
escola, se separam da rua por uma muralha de verdade, alta, inexpugnável; já
a fronteira entre um bairro popular e um bairro chique pode ser uma rua, uma
ponte, ou simplesmente, não ser nada muito aparente, mas somente uma
imagem, um ponto, uma esquina [...] (ROLNIK, 1988, p.41).
A cidade do século XXI é desigual por excelência. Nela uma parcela
significativa da população vive em condições subumanas, cidadãos para quem o estado
não chega. Homens, mulheres, jovens, crianças e idosos segregados espacialmente. Na
contemporaneidade, basta uma volta na cidade para observar os lugares que,
hierarquicamente, as diferentes classes sociais ocupam. São bairros diferenciados pelo
crescimento e qualidade de vida em que as pessoas de maior poder aquisitivo residem
nas melhores habitações, enquanto que para a população de baixa renda sobram as áreas
mais afastadas do centro e com menor atuação estatal.
Essa segregação espacial é prejudicial tanto do ponto de vista das desigualdades
sociais quanto do enfraquecimento das relações sociais e da tolerância ao diferente. Os
muros, as cercas elétricas e as grades que protegem os que podem pagar por
condomínios fechados contribuem de forma negativa para aumentar a barreira entre os
diferentes sujeitos e a estimular o processo de exclusão social daqueles que não
possuem permissão para usufruir desses espaços exclusivos.
Hoje, para ter acesso à casa própria se faz necessário o pagamento de juros,
taxas administrativas e de crédito além de seguros, exigências que muitos brasileiros
não atendem pela inexistência de uma renda fixa. Esses fatores se tornam um entrave
que impedem a aquisição de um imóvel por parte da população de baixa renda, restando
a estes a ocupação de áreas impróprias para a moradia, as periferias.
Os impactos ocasionados pelos espaços exclusivos no interior das cidades podem
ser variados, os mais notórios, são: a segregação e exclusão social e espacial, a perda da
vida pública, a privatização do espaço público e o enfraquecimento do estado em função
da privatização dos serviços públicos. Esses problemas contribuem para reprodução de
estereótipos, discriminação e, principalmente, para violência no interior das cidades.
Através da pesquisa de campo pode-se concluir que os videoclipes utilizados na
mostra audiovisual influenciaram, diretamente, na concepção de periferia engendrada
pelos jovens. De maneira que alguns elementos destacados nos vídeos foram
transformados em ilustrações representativas da periferia de Belém, como por exemplo,
67
o ato de empinar pipa nas lajes ou o jogo de futebol nas pontes. Os videoclipes que
focavam, principalmente, temáticas como a violência, concentração populacional e a
segregação espacial foram reproduzidos pelos jovens durante todo o processo da
pesquisa de campo, dessa forma confirma-se a primeira hipótese proposta nesse
trabalho, a de que os produtos midiáticos influenciam na construção das representações
sociais sobre a periferia de Belém.
A segunda hipótese proposta por este trabalho também foi validada, a de que
independente dos diferentes fatores externos a que os alunos estão sujeitos como, classe
social, escola, família e bairro a representação da periferia de Belém é a mesma. Para os
jovens esse ambiente é um espaço socialmente excluído e, portanto, é a exclusão social
o núcleo central dessa RS.
A terceira hipótese apresentada foi a de que as RS analisadas, estão intimamente
ligadas a dois elementos centrais. O primeiro deles é a ausência de uma urbanização
adequada, item esse que foi confirmado durante a pesquisa de campo, já o segundo
elemento proposto seria a distância geográfica entre centro e periferia que apesar de ter
sido lembrado pelos jovens, não figura como elemento central da RS. Portanto, essa
hipótese foi parcialmente confirmada, já que se observou a constituição dessas RS, a
partir de três elementos centrais: concentração populacional, criminalidade e
infraestrutura inadequada, as quais juntas constituem o processo cristalizado de
exclusão social a que estão submetidos os moradores da periferia de Belém.
68
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da modernização. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2009. 590 p., p. 267-274.
VIANNA, Hermano. Central da Periferia. Disponível em:
http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYN0-5273-253057,00.html.
Acesso em: 13 de Maio de 2011.
Docas, Estação. Disponível em: http://parahistorico.blogspot.com/2009/02/belle-
epoque-e-era-lemos.html . Acesso em:13 de Maio de 2011.
BELÉM, Prefeitura. Disponível em: http://www.belem.pa.gov.br/. Acesso em: 13 de
Maio de 2011.
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ANEXOS
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
ALINE MERIANE DO CARMO DE FREITAS
CONCLUINTE DE JORNALISMO
1- QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA DE CAMPO (TCC)
Este questionário foi elaborado com o intuito de reunir os dados necessários para a
validação da pesquisa de conclusão do curso de Comunicação Social- Habilitação em
Jornalismo, da Universidade Federal do Pará, cujo título é: De que periferia está se
falando? Uma análise sobre a Representação Social de Periferia, em Madame Saatan e
Coletivo Rádio Cipó, a partir da percepção de estudantes do terceiro ano do ensino
médio.
Para as perguntas abaixo, assinale com um (X), a alternativa que mais se adequa a
sua resposta.
1. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino
2. Qual sua idade?
( ) 15 – 17 anos ( ) 18-20 anos ( ) 21-23 anos ( ) Outra. Qual?
3. Qual o bairro que você mora?
4. Ele faz parte da Periferia de Belém?
( ) Sim ( ) Não
5. Qual sua escola?
( ) Escola EEFM Camilo Salgado ( ) Escola EEFM Maria Antonieta Serra Freire
6. Você estuda há quanto tempo nessa escola?
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( ) 1- 3 anos ( ) 4 – 6 anos ( ) 7- 9 anos ( ) A única escola em que estudei
7. Para você, o bairro em que sua escola está inserida faz parte da periferia?
( ) Sim ( ) Não. Por quê?
8. Você se identifica com o lugar mostrado nos videoclipes?
( ) Sim ( ) Não. Por quê?
9. Você acha que os videoclipes representam o que é periferia?
( ) Não ( ) Pouco ( ) Bastante ( ) Fielmente
10. Se não representam, como deveria ser?
11. Qual a sua opinião sobre os dois videoclipes?
12. Para você, o que é perifeira?
13. Quando você escuta falar na Periferia da cidade, o que de imediato lhe vem à
cabeça?
14. Você consegue achar com facilidade músicas e videoclipes que mostrem a
periferia?
( ) Sim ( ) Não ( ) Às vezes
15. Quando se fala na Periferia de Belém, de qual música você lembra?
16. Cite 5 palavras que representam a periferia de Belém
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17. Faça um desenho sobre a periferia de Belém
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2- VIDEOCLIPES UTILIZADOS NA MOSTRA AUDIOVISUAL
DEVORADOS
Madame Saatan
A noite acordam e são devorados
Eles os mesmo, as ruas, as horas
Sentem o que acham que existe
Por que temem e não descobrem
Desespero, ordem das almas insones
Fingem e costumam estar
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes
A noite acordam e são devorados
Eles os mesmo, as ruas, as horas
Sentem o que acham que existe
Por que temem e não descobrem
Desespero, ordem das almas insones
Fingem e costumam estar
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes
E então histórias em sombras de glórias
Não dizem nada
E então histórias em sombras de glórias
Fingem e costumam estar.
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes
Dormindo nos braços da estátua
Com folhas nos dentes.
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MATINHA DO CRUZEIRO
Coletivo Rádio Cipó
Estava voltando pra casa meio de toca passando pelo canal da matinha é claro.
Avistei uma bela morena cabocla, cafuza, marajoara ela chegou pra mim e falou Brasil
Queres mais, queres mais... Tem de cinco, tem dez, tem de quinze, tem vinte.
Tem quanto você quiser estou de passagem e de bobeira no Brasil onde a vida não vale
mais nada, pois é esquema de corrupção braba.
Quem entra não sai quem sai, sai com a boca furada de bala formigando na calçada
Como é que é difícil perceber que é assim que a vida vai que é assim que a vida flui,
Dont you hi, dont you hein, don't you know poderia ser pior diga que já fui só te digo
Ruy. Fui.
Fui malandro consciente tocava em várias boates e vinha o gringo com olhares sinistros
atrás do jimi night.
Esse esquema sempre funcionou só que muitos que pensam que sabem não sabem do
terço a metade.
Esquema de corrupção braba quem entra não sai quem sai, sai com a boca furada de
bala formigando na calçada.
Misteriosas pedradas atemorizam o conjunto residencial na matinha é claro
Enquanto membros do nafta discutem na Arábia quem rouba tem a mão cortada
É aí Brasil você vê solução quem entra não sai quem sai, sai com a boca furada de bala
formigando.
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3 – LETRAS SUGERIDAS PELOS ESTUDANTES DURANTE A PESQUISA.
NEGRO DRAMA (Mc Racionais)
Negro drama, entre o sucesso e a lama, dinheiro, problemas, inveja, luxo, fama.
Negro drama, cabelo crespo e a pele escura, a ferida, a chaga, a procura da cura.
Negro drama tenta ver e não vê nada, a não ser uma estrela, longe meio ofuscada.
Sente o drama, o preço, a cobrança, no amor, no ódio, a insana vingança.
Negro drama, eu sei quem trama e quem tá comigo o trauma que eu carrego,
Pra não ser mais um preto fodido. O drama da cadeia e favela, túmulo, sangue,
Sirene, choros e vela. Passageiro do Brasil, São Paulo, agonia que sobrevive
Em meia as zorras e covardias, periferias, vielas e cortiços, você deve tá pensando,
O que você tem a ver com isso, desde o início, por ouro e prata, olha quem morre,
Então veja você quem mata, recebe o mérito, a farda que pratica o mal, me ver
Pobre, preso ou morto, já é cultural. Histórias, registros, escritos não é conto nem
fábula, Lenda ou mito, não foi sempre dito, Que preto não tem vez, Então olha o castelo
e não, foi você quem fez cuzão, eu sou irmão, dos meus trutas de batalha, eu era a carne,
Agora sou a própria navalha, tim..tim...Um brinde pra mim sou exemplo, de vitórias,
Trajetos e glórias. O dinheiro tira um homem da miséria, mas não pode arrancar,
De dentro dele, a favela, são poucos que entram em campo pra vencer,
A alma guarda, o que a mente tenta esquecer, olho pra trás, vejo a estrada que eu trilhei,
Mó cota quem teve lado a lado e quem só fico na bota fases e várias etapas do quem é
quem, dos manos e das minas fraca. Hum ...Negro drama de estilo pra ser e se for,
Tem que ser se temer é milho. Entre o gatilho e a tempestade, sempre a provar,
Que sou homem e não covarde. Que Deus me guarde, pois eu sei, que ele não é neutro,
Vigia os rico, mas ama os que vem do gueto, eu visto preto, por dentro e por fora,
Guerreiro, poeta entre o tempo e a memória. Hora, nessa história, vejo o dólar,
E vários quilates, falo pro mano, que não morra, e também não mate, o tic tac,
Não espera veja o ponteiro, essa estrada é venenosa, e cheia de morteiro, pesadelo,
Hum, é um elogio, pra quem vive na guerra, a paz nunca existiu, num clima quente,
A minha gente sua frio, vi um pretinho, seu caderno era um fuzil.
Um fuzil, Negro drama. Crime, futebol, música, caraio, eu também não consegui fugi
disso aí. Eu so mais um. Forrest gump é mato, eu prefiro conta uma história real,
Vô conta a minha....Daria um filme, uma negra e uma criança nos braços,
Solitária na floresta, de concreto e aço, veja, olha outra vez, o rosto na multidão,
A multidão é um monstro, sem rosto e coração, hey, são paulo, terra de arranha-céu,
A garoa rasga a carne, é a torre de babel, família brasileira, dois contra o mundo,
Mãe solteira, de um promissor vagabundo, luz, câmera e ação
Gravando a cena vai, um bastardo Mais um filho pardo, sem pai,
Ei, senhor de engenho, eu sei bem quem você é, sozinho, cê num guenta,
Sozinho, cê num entra a pé, cê disse que era bom e a favela ouviu, lá
Também tem Whisky, red bull, tênis nike e fuzil, admito, seu carro é bonito,
É, eu não sei fazê, internet, videocassete, o carro loco, Atrasado,
Eu tô um pouco sim, tô, eu acho só que tem que seu jogo é sujo,
E eu não me encaixo, eu sô problema de montão, de carnaval a carnaval, eu vim da
selva, sou leão, sou demais pro seu quintal, problema com escola,
Eu tenho mil, mil fita, inacreditável, mas seu filho me imita, no meio de vocês, ele é o
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mais esperto, ginga e fala gíria, gíria não, dialeto esse não é mais seu, Hó, subiu,
Entrei pelo seu rádio, tomei, cê nem viu, nóis é isso ou aquilo, o quê? Cê não dizia,
Seu filho quer ser preto, Rhá, que irônia, cola o pôster do 2Pac ai, que tal, que cê diz,
sente o negro drama, vai, tenta ser feliz, ei bacana, quem te fez tão bom assim,
O que cê deu, o que cê faz, o que cê fez por mim? Eu recebi seu tic, quer dizer kit, de
esgoto a céu aberto, e parede madeirite, de vergonha eu não morri, to firmão,
Eis me aqui, Você não, se não passa, quando o mar vermelho abrir,
Eu sou o mano homem duro, do gueto, brow, obá, aquele louco, que não pode errar,
aquele que você odeia, amar nesse instante, pele parda, Ouço funk e de onde vem,
Os diamantes, da lama, valeu mãe, negro drama, drama, drama. Aê, na época dos
barracos de pau lá na pedreira onde vocês tavam? O que vocês deram por mim? O que
vocês fizeram por mim ? Agora tá de olho no dinheiro que eu ganho, agora tá de olho
no carro que eu dirijo demorou, eu quero é mais eu quero até sua alma aí, o rap me fez
ser o que sou Ice Blue, Edy Rock e Klj, e toda a família e toda geração que faz o rap a
geração que revolucionou a geração que vai revolucionar anos 90, século 21
É desse jeito aê, você sai do gueto, mas o gueto nunca sai de você, morou irmão?
Você tá dirigindo um carro o mundo todo tá de olho em você, morou?
Sabe por quê? Pela sua origem, morou irmão? É desse jeito que você vive é o negro
drama eu não li, eu não assisti eu vivo o negro drama, eu sou o negro drama
Eu sou o fruto do negro drama aí dona Ana, sem palavras, a senhora é uma rainha,
rainha, mas aê se tiver que voltar pra favela eu vou voltar de cabeça erguida
Porque assim é que é renascendo das cinzas firme e forte, guerreiro de fé
Vagabundo nato!
VERMELHÃO FAIXA DE GAZA (Mc Orelha)
Na faixa de gaza, só homem bomba,
Na guerra é tudo ou nada,
Várias titânio no pente,
Colete a prova de bala,
Nós desce pra pista pra fazer o assalto,
Mais ta fechadão no doze,Se eu to de rolé 600 bolado,
Perfume importado pistola no Couto,
Mulher ouro e poder,
Lutando que se conquista,
Nós não precisa de credito,
Nós paga tudo a vista,
É ECKO, LACOSTE, é peça da OAKLEY,
Várias camisas de time,
Quem ta de fora até pensa que é mole viver do crime,
Nós planta HUMILDADE, pra colher poder,
A recompensa vem logo após,
Não somos fora da lei,
Porque a lei quem faz é nós,
Nós é o CERTO pelo CERTO,
Não aceita covardia,
Não é qualquer um que chega e ganha moral de cria,
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Consideração se tem,
Pra quem age na pureza,
Pra quem ta mandado o papo é reto
Bota as peça na mesa,
Quantos amigos eu vi,
Ir morar com Deus no céu,
Sem tempo de se despedir,
Mais fazendo o seu papel,
Por isso eu vô manda,
Por isso eu vô manda assim,
Comando vermelho RL até o fim,
É vermelhão desde pequenininho,
Só menor bolado nas favela do baixinho
Não dá, não dá, não dá não
Por isso eu mando assim,
Comando vermelho RL até o fim,
É vermelhão desde pequenininho,
Só menor bolado nas favela do baixinho
Nóis ta que ta heim, caralho!
Na faixa de gaza, só homem bomba,
Na guerra é tudo ou nada,
Várias titânio no pente,
Colete a prova de bala,
Nós desce pra pista pra fazer o assalto,
Mais ta fechadão no doze,
Se eu to de rolé 600 bolado,
Perfume importado pistola no Couto,
Mulher ouro e poder,
Lutando que se conquista,
Nós não precisa de credito,
Nós paga tudo a vista,
É ECKO, LACOSTE, é peça da OAKLEY,
Várias camisas de time,
Quem esta de fora até pensa que é mole viver do crime,
Nós planta HUMILDADE, pra colher poder,
A recompensa vem logo após,
Não somos fora da lei,
Porque a lei quem faz é nós,
Nós é o CERTO pelo CERTO,
Não aceita covardia,
Não é qualquer um que chega e ganha moral de cria,
Consideração se tem,
Pra quem age na pureza,
Pra quem ta amando o papo é reto
Bota as peça na mesa,
Quantos amigos eu vi,
Ir morar com Deus no céu,
Sem tempo de se despedir,
Mais fazendo o seu papel,
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Por isso eu vô manda,
Por isso eu vô manda assim,
Comando vermelho RL até o fim,
É vermelhão desde pequenininho,
Só menor bolado nas favelas do baixinho
Não dá, não dá, não dá não
Por isso eu mando assim,
Comando vermelho RL até o fim,
É vermelhão desde pequenininho,
Só menor bolado nas favelas do baixinho
DEPOIMENTO DE UM VICIADO (Realidade Cruel)
São 2 da manhã e eu de calça e blusa
O tempo frio, do céu cai chuva/
Eu sou sozinho parceiro e é foda
Com meu destino ninguém mais se importa
Chegar, ao ponto que eu cheguei é lamentável
Estado físico inacreditável eu sinto crise
Eu sinto convulsão, é muito triste o meu estado sangue bom
30 quilos mais magro vai vendo
O resultado é pura essência do veneno
O vício tira a calma, a cabreragem me acelera
O demônio rouba a alma, o inferno me seqüestra
Cadê a luz que vem lá do céu
Cadê jesus pra julgar mais este réu
Tenho vontade de morrer constantemente
O descontrole da mente me deixa impaciente e é foda
Eu saio que nem louco pela rua
Único mano é o cano na cintura
Eu preferia ta falando de amor
Falando das crianças e não da minha dor
Mas eu sou o espelho da agonia de um homem
Sem identidade, caráter, sem nome
Sem Mercedes, Audi ou Mitsubish
Consumidor da praga do apocalipse
Tão jovem sem esperança de vida
Tão novo e já suicida
São 2 da manhã e faz chuva
O pesadelo ainda continua...
Um dia frio
Um bom lugar pra ler um livro
E o pensamento lá em você
Eu sem você não vivo (depoimento de um viciado)
Eu comecei de forma curiosa
Um cigarro de maconha não era droga
Era o que todo mundo me falava
Experimentei nem eu mesmo acreditava
Primeira vez, outra sensação
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Segunda vez mó barato ilusão
Mundo dos sonhos, me sinto mais leve
Enquanto isso meus neurônios fervem
Sentia fome, sentia a viagem inteira
Observava de longe as paisagens
A fumaça me deixava cada vez mais louco
Sem perceber eu já era o próprio demônio
Segundo passo, veio a cocaína
Morava com a minha mãe, me lembro da minha mina feliz
Cheirava comigo sem parar
2 loucos 24 horas no ar
Parei com estudo, perdi até o trampo
Ganhei o mundo e uma desilusão e tanto
Perdi a minha própria mãe, que trauma!
Morreu de desgosto por minha causa
Nem assim eu consegui parar vich!
Só a morte pode me libertar
Eu roubava pra sobreviver ou melhor
Pra manter o vício e não morrer, que dó
Suicídio lento era o processo
Eu nunca fui estrela, eu nunca fui sucesso
Contaminado HIV positivo
Qual a diferença do inimigo pro perigo
Aí, são 2 da manhã e faz chuva
Pesadelo ainda continua
Continua ladrão, o pesadelo ainda continua...
Um dia frio
Um bom lugar pra ler um livro
E o pensamento lá em você
Eu sem você não vivo (depoimento de um viciado)
Amigo, aí , eu falei esta palavra
Me desculpa foi erro, não pega nada
Eu nunca tive amigo nessa porra
Só prejuízo na vida de ponta a ponta
Mas quem vai se importar, eu sou apenas mais um
Aidético viciado, infelizmente comum
Mais um entre mil ou um milhão ladrão
Escravo desta triste detenção
Eu não sou Rafael e nem a Vera Fischer
A minha história parceiro é mais triste
Eu nunca engoli escova de cabelo
Mas já matei pelo crack e por dinheiro
Puta que pariu, o inferno me chama
Quem sabe lá eu consigo a fama ou o drama
Ou a lama de fogo eterno
Condenado a escuridão do inferno
Hoje, eu sou louco de intensa coragem
Com o ferro a favor do crack
Não sei se a malandragem é minisérie ou história
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Mais sei, que a carreira parceiro é sem glória
Vou tentar não matar mais ninguém
Chega de ser refém, eu preciso é do bem
Vou entregar a Deus a minha vida
Vou acreditar nas palavras da bíblia
Arrependido de todos os pecados
Ter conseguido escapar do diabo
Espero que a minha história sirva de exemplo
Pra quem tá começando, parceiro como eu comecei
Que se afaste das drogas enquanto é tempo
Pra não provar do veneno que eu provei
É embaçado sangue bom, vai por mim
Tudo nesta vida tem um fim
São 2 da manhã faz chuva
Eu vou orar pela minha alma e pela sua
É madrugada faz chuva
Eu vou orar pela minha alma e pela sua...
Um dia frio
Um bom lugar pra ler um livro
E o pensamento lá em você
Eu sem você não vivo.