educacao e cultura midiatica volume i

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  • Educao e Cultura Miditica

    Volume I

  • Universidade do Estado da Bahia - UNEB

    Lourisvaldo Valentim da SilvaReitor

    Maria Nadja Nunes BittencourtDiretora da Editora

    Conselho Editorial

    Delcele Mascarenhas QueirozJos Cludio Rocha

    Josemar Rodrigues de SouzaMrcia Rios da SilvaMaria Edesina Aguiar

    Mnica Moreira de Oliveira TorresWilson Roberto de Mattos

    Yara Dulce Bandeira Atade

    Suplentes

    Kiyoko Abe SandesLiana Gonalves Pontes Sodr

    Lynn Rosalina Gama AlvesRonalda Barreto Silva

  • Maria Olvia de Matos Oliveira

    Lucila Pesce

    (Organizadoras)

    Educao e Cultura Miditica

    Volume I

    EDUNEB

    Salvador

    2012

  • 2010 Editora da UNEBProibida a reproduo total ou parcial por qualquer meio de impresso, em forma idntica,

    resumida ou modificada, em Lngua Portuguesa ou qualquer outro idioma.Depsito Legal na Biblioteca Nacional

    Impresso no Brasil em 2012.

    Ficha Tcnica

    Coordenao EditorialRicardo Baroud

    Coordenao de Design e CapaSidney Silva

    Projeto Grfico, Editorao, Normalizao e RevisoGraja Grfica e Encadernadora

    Ficha Catalogrfica - Sistema de Bibliotecas da UNEB

    Editora da Universidade do Estado da Bahia - EDUNEBRua Silveira Martins, 2555 - Cabula

    41150-000 - Salvador - BahiaFone: + 55 71 3117-5342

    [email protected]

    Educao e cultura miditica / Organizado por Maria Olivia de Matos Oliveira; Lucila Pesce. Salvador: EDUNEB, 2012. 218p. v. 1.

    ISBN: 978-85-7887-122-2.

    Inclui referncias. 1. Educao - Inovaes tecnolgicas. 2. Inovaes educacionais. 3. Tecnologia educacional. I. Oliveira, Olvia de Matos. II. Pesce, Lucila.

    CDD: 371.334

  • Prefcio

    A cultura miditica e os desafios para a educao

    At perto do final do sculo XIX, o territrio da cultura nas sociedades ocidentais fazia-se compreender na oposio entre cultura erudita e superior, de um lado, e cultura popular, de outro. Trata-se de uma oposio decorrente do desenvolvimento da sociedade capitalista e da formao da burguesia, expressando a dominao desta classe, identificada com a cultura de elite, sobre a cultura popular de origem camponesa e proletria. Isso significa que a cultura erudita, prpria das classes dominantes no impedia a existncia de sistemas culturais populares, tais como o folclore rural, enfim, a existncia de produtos culturais especficos capazes de dar expresso a experincias coletivas dotadas de um imaginrio social prprio.

    De meados do sculo XIX em diante, como fruto da industrializao, da exploso demogrfica, do xodo rural e do surgimento do telgrafo, da fotografia e da presena do jornal, a oposio precedente entre cultura de elite e popular passou a sofrer fundas alteraes. A esse binmio veio se somar um novo tipo de cultura, a emergente cultura de massas e os mecanismos de um fenmeno inteiramente distinto, a industrializao da cultura. Com isso, deixaram de persistir as situaes de produo daquilo que to redondamente era chamado de cultura erudita versus cultura popular. Embora os padres culturais tradicionais tenham continuado a existir, eles foram se tornando cada vez menos dominantes diante dos modos de produo cultural que operam de acordo com a lgica da industrializao da cultura.

  • O que eram apenas prenncios da cultura de massas no jornal, no cinema e na publicidade veio alcanar o seu clmax, em meados do sculo XX, nos processos de comunicao radiofnicos e televisivos. Foi nessa poca que se deu a exploso da cultura pop, quando o papel desempenhado pela dimenso da cultura nas formaes sociais foi se tornando cada vez mais proeminente. Essa proeminncia intensificou-se nos anos 1980 com o advento da cultura das mdias, ou seja, uma cultura na qual emergiram a mquina xrox, o controle remoto, a TV a cabo, o vdeo cassete e outros equipamentos que comearam a permitir ao receptor alguma escolha no tipo de entretenimento ou informao que deseja receber.

    Impacto similar, na antiga oposio entre cultura erudita e popular, que fora provocado pela cultura de massas, esta passou a sofrer frente ao advento da cultura das mdias, visto que os pequenos dispositivos, aparentemente inofensivos, introduzidos por esta ltima, foram minando a hegemonia da cultura de massas. A segmentao do pblico, a possibilidade aberta para que o indivduo possa escolher informao e entretenimento ao seu gosto e repertrio que so prprias da cultura das mdias, uma cultura do disponvel comearam a preparar a sensibilidade do receptor para o surgimento da revoluo digital, das redes planetrias de comunicao e da cibercultura nos anos 1990. Alm de provocar uma inflao ainda maior no papel desempenhado pela dimenso cultural no todo social, a cibercultura inaugurou a intensa dinmica das conexes que torna o acesso informao e ao conhecimento um bem ao alcance de uns poucos cliques no computador.

    Ora, o que importa reter nessa sequncia acelerada e ininterrupta de transformaes socioculturais que os diferentes tipos de formaes culturais popular, erudita, massiva, das mdias e digital criam ambientes cognitivos, perceptivos e sensrios que lhes so prprios. Esses ambientes vo se misturando e coexistindo, pois um novo ambiente no leva os

  • precedentes ao desaparecimento. em funo disso que a cultura em que hoje vivemos complexa, densa, intrincada, hbrida e multifacetada. No apresenta mais nada que possa lembrar a mera e simples oposio entre cultura popular e cultura erudita que era prpria da sociedade pr-massa, do incio do sculo XIX.

    As consequncias que essas condies culturais cada vez mais hipercomplexas trazem para a educao no so poucas. O que fica evidente, na passagem de uma formao cultural para a outra, o crescimento e diversificao da produo de informaes e o acesso a elas que se amplifica cada vez mais. Que os processos de aprendizagem no so mais privilgio da formao escolar parece ser evidncia que a cultura digital tornou incontestvel. Os meios de massa jornal, rdio, televiso j trazem notcias, entretenimento e informaes para dentro de nossas casas com a mesma facilidade com que chegam a luz e a gua. Os equipamentos tpicos da cultura das mdias vdeo, TV por assinatura, xerox etc. permitem que escolhas individuais se efetuem diante de uma pletora de opes.

    Agora, com as mdias digitais, notcias, informaes, entretenimento, jogos, comunicao multilateral, veiculadas em redes fixas e mveis, podem ser acessadas, em qualquer momento, de qualquer lugar para qualquer outro lugar. Isso provoca transformaes radicais nos modos de se informar, aprender, conhecer, nas prticas de lazer e de socializao. No so poucos os autores que tm defendido a ideia de que a inteligncia humana hoje se encontra expandida em uma inteligncia coletiva, de carter planetrio que palpita e estala em ritmo exponencial.

    Embora desde o final do sculo XIX, tenha havido uma escalada crescente da penetrao das mdias na existncia individual e social, no mundo pr-digital, ainda era possvel se perceber uma diferenciao ntida entre os espaos de vida e das funes que neles so desempenhadas,

  • tais como o espao da escola, do trabalho, do lazer, o espao do lar, dos encontros sociais. Agora, na cultura digital, espaos e funes tendem a se misturar. Eles se interpenetram e se complementam inelutavelmente de modo que tem se tornado cada vez mais difcil separar e discernir as funes que cabem a cada espao.

    Levando em considerao apenas o que diz respeito educao, preciso levar em conta que os dispositivos digitais, especialmente aqueles de carter mvel, esto propiciando novas formas de aprendizagem, ou seja, aprendizagem ubqua, a qualquer tempo, de qualquer lugar, que ocorre ao sabor das circunstncias no movimento vertente da vida. Diante disso, como estabelecer distines precisas entre aprendizagem formal, planejada, sistematizada, organizada, de um lado, e aprendizagem informal, contingente, descontnua, catica e ubqua, de outro? Como conceber novas formas de ensino que possibilitem o intercmbio dessas duas formas? Como incorporar a informao descontnua e fragmentria que prpria das redes, no contnuo e cumulativo que prprio do saber protegido pela memria? Essas questes so apenas pequenas pontas do imenso iceberg dos desafios que hoje se apresentam aos educadores. Vem da o grande valor dos dois volumes da coletnea que aqui se apresenta, voltada para uma mirade de reflexes sobre a educao frente cultura miditica. Por isso mesmo, aqui o leitor s ter a ganhar, pois a leitura desses livros j um passo significativo na direo de um debate que no pode ser adiado.

    Lucia Santaella

  • Apresentao 13

    PArTE I: CUlTUrA MIdITICA

    Mdia, Educao e Cidadania 19

    Osvaldo Biz

    Comunicao, Multimeios e Educao: programas educacionais em pauta 47

    Adriana Rocha Bruno e Ana Maria Di Grado Hessel

    Mundos Virtuais, Games e Simulaes em Educao: alternativas ao design instrucional 69

    Joo Mattar

    Processo Educativo e Incluso Sciodigital na EJA: uma proposio 97

    Adriana dos Santos Marmori Lima

    PArTE II: ForMAo On-line

    Formao Online de Educadores: uma proposta dialgica 121

    Lucila Pesce

    Sumrio

  • Formao docente e Aprendizagens Online: reflexes sobre curriculo 145

    Maria Olivia Matos Oliveira

    Sala de Aula Virtual: novos lugares e novas duraes para o ensinar e o aprender na contemporaneidade 169

    Daniel Mill, Nara Dias Brito e Aparecida Ribeiro Silva

    A Comunicao na Era do Prncipe Eletrnico: a EAd como desafio poltico e pedaggico 193

    Eliana Romo e Csar Nunes

    Sobre os Autores 213

  • 13

    Apresentao

    Caro leitor, o primeiro volume da coletnea que ora apresentamos rene pesquisadores de distintas universidades brasileiras e trata de dois temas instigantes da sociedade contempornea: cultura miditica e processos de formao desenvolvidos nos ambientes digitais.

    Os artigos que compem a primeira parte deste livro Cultura Miditica revelam, na polissemia das vozes dos autores, uma unicidade nas reflexes sobre como a mdia se torna presente em todos os aspectos da vida cotidiana e como o discurso miditico participa do processo histrico de construo da identidade dos sujeitos, nas interaes sociais, afirmando ou negando a nossa condio de cidados.

    No primeiro parte do volume, de acordo com Osvaldo Biz, no seu texto Mdia, Educao e Cidadania, diante da exposio dos sujeitos aos meios de comunicao de massa, h necessidade de uma educao crtica para as mdias, pois a construo da cidadania envolve a descoberta de que devemos nos tornar sujeitos da histria e no meros objetos de manipulao.

    Adriana Bruno e Ana Hessel chamam a ateno para a necessidade de trabalhar temas que integrem a Educao e a Comunicao. E o fazem com o relato analtico de propostas de programas educacionais, em diferentes mdias, que vm sendo desenvolvidas por ambas as pesquisadoras desde 2005.

    No contexto da cultura miditica, Mundos virtuais, games e simulaes so elementos essenciais da cultura miditica, conforme adverte

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    Joo Mattar. A partir dessa premissa, o autor explora os usos pedaggicos de mundos virtuais (em especial, o Second Life), games e simulaes, apresentando o estado da arte do debate terico e analisando algumas experincias prticas.

    A seu turno, Adriana Marmori Lima reflete sobre o processo educativo e a incluso sociodigital na educao de jovens e adultos, procedendo a uma imerso na trajetria de vida pessoal e profissional dos educadores. Ao faz-lo abre possibilidades de articulao entre o aprender o mundo das letras e o aprender o mundo digital e a cultura miditica nos processos de EJA.

    O conjunto das reflexes inerentes aos captulos que compem a primeira parte do livro busca, portanto, discutir a importncia de se conhecer o poder da mdia no cotidiano das pessoas, para a partilha conjunta de significados e compreenso crtica da contemporaneidade.

    Para apresentar a segunda parte do livro Formao Online julgamos pertinente iniciar com a questo formulada por Eliana Romo e Csar Nunes: Como possvel a comunicao num contexto em que o contato presencial no condio para a relao educativa? Os referidos autores partem da premissa de que educao comunicao e buscam, atravs do desenvolvimento do texto, sadas alternativas para a superao do impasse de uma educao a distncia para uma educao sem distncia. Consideram a importncia do desenvolvimento da autonomia intelectual dos sujeitos aprendentes, a partir de intervenes pedaggicas que possibilitem espaos de expresso, participao e criatividade.

    Na segunda parte do volume os textos voltam-se para os distintos aspectos inerentes formao veiculada nos dispositivos e interfaces digitais. As reflexes sobre as novas linguagens audiovisuais demandam dos docentes uma nova viso paradigmtica capaz de ressignificar as atuais

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    prticas educacionais, em sintonia com as emergncias dos sujeitos que participam das atuais organizaes societrias.

    Tambm so abordadas questes relacionadas docncia, no contexto da cultura miditica.

    Lucila Pesce relata uma pesquisa em desenvolvimento sobre formao de educadores no e para o contexto digital, cujos princpios e pressupostos terico-metodolgicos coadunam-se com a perspectiva dialgica.

    Ao discorrer sobre os limites e as possibilidades da formao de professores em cursos a distncia, Maria Olvia Matos Oliveira pontua, no captulo de sua autoria, questes relativas ao currculo dos cursos online, aprofundando reflexes sobre temporalidade e sua relao com as aprendizagens significativas.

    Questes relativas educao veiculada nos dispositivos e interfaces digitais, como a fragilidade das interaes entre a equipe conceptora e os tutores, o pouco investimento institucional no processo de formao continuada de professores para o exerccio da mediao a distncia e problemas quanto adequao dos tempos nas aprendizagens online so discutidos ao longo das nossas pginas, sobretudo nas linhas assinadas por Maria Olvia Matos Oliveira e Lucila Pesce. A guisa de inconcluso em um campo de trabalho e pesquisa em ebulio, no atual momento histrico apontamos ao leitor os questionamentos expressos nas interrogaes dos autores de um dos textos Daniel Mill, Nara Brito e Aparecida Silva: Como uma sala de aula se configura? Quais os tempos e espaos de uma (sala de) aula? Que mudanas conceituais as tecnologias digitais trouxeram para a aula e para a sala de aula?

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    Para compreender as concepes de aula e sala de aula na contemporaneidade preciso, antes de tudo, entender aspectos relacionados sala de aula presencial, bem como entender algumas atitudes docentes e da escola, que revelam resistncia em reconhecer a inevitvel insero dos estudantes na cultura digital.

    Nessa mirade de reflexes finalizamos a apresentao do primeiro volume da coletnea por ns organizada. Ao faz-lo, apontamos mais dvidas que certezas, mais interrogativas que afirmativas, porque as questes pendentes podero ser esclarecidas ou aprofundadas, na interlocuo de voc, leitor, junto a cada um dos autores da presente obra.

    Maria Olvia Matos Oliveira

    Lucila Pesce

  • PARTE I

    CULTURA MIDITICA

  • 19

    Mdia, Educao e Cidadania

    Osvaldo Biz(PUC-RGS)

    A - MdIA

    o que se entende por Comunicao

    O processo da comunicao inicia com o emissor, que pr-

    determina o processo, a mensagem. Mas o elemento que d sentido concreto mensagem o receptor. Havendo a percepo do sentido entre o emissor e o receptor, acontece a interpretao correta da mensagem e a, sim, possvel falar em comunicao, ou seja, compartilhar, tornar comum a todos, interagir com as pessoas e com o mundo. As ferramentas utilizadas para tal fim so as mais variadas.

    Como afirma Bowditch e Buono (1992, p. 81), a comunicao existe quando h troca de informaes entre o transmissor e o receptor e h percepo do significado entre os indivduos envolvidos. Sem essa ao recproca no existe comunicao, apenas difuso do noticirio a partir do emissor. Trata-se de informao, mas no comunicao. Uma comunicao excelente aquela conhecida como simtrica, ou seja, de duas mos. Temos, ento, os elementos bsicos: um emissor, uma mensagem, um receptor e uma interpretao da mensagem.

    A compreenso da importncia dos meios de comunicao e sua influncia no cotidiano das pessoas parte da discusso de quatro

  • 20

    proposies (GUARESCHI; BIZ, 2009). A primeira afirmativa a seguinte: a comunicao, hoje, constri a realidade. Aqui a palavra realidade significa o que existe, o que tem valor, o que tem respostas, o que legitima e d densidade significativa ao nosso cotidiano. Ou seja, algo passa a existir, ou no, se as mdias, no caso em foco, rdio, televiso e jornal, comentam ou mostram imagens.

    A segunda afirmativa complemento da primeira: a mdia no s afirma o que existe, como decide o que no existe, em vista do seu silncio.

    A terceira afirmativa que os donos dos veculos de comunicao controlam a pauta da discusso. Se um fato que aconteceu no for comunicado ou comentado sinal de que no existiu. Por consequncia, os ouvintes de rdio, os telespectadores, os leitores de jornal deixaram de tomar conhecimento de sua existncia.

    Para Marcondes Filho (2004, p. 7)

    [...] apesar do volume imenso de aparelhos postos nossa disposio, televiso, internet, telefone celular, aparelhos de transmisso de fax, teles etc. a vida de cada um ainda uma caixinha fechada, um universo oculto, um mundo trancado.

    E, por fim, nesses tempos da era da informtica, da internet, mas de modo especial do meio miditico mais popular que a televiso, ela ocupa muito do tempo de uma parcela imensa de crianas e jovens, calculada entre quatro e cinco horas dirias. Normalmente so retratadas como parte de um nicho do mercado consumidor e no como seres humanos com direitos especficos.

    No Brasil, as crianas recebem mensagens para adquirir brinquedos e cobram de seus pais a aquisio dos mesmos. No Canad, por exemplo,

  • 21

    antes e durante a apresentao de programas infantis proibido fazer publicidade. Tudo isso bastante complexo. Da a necessidade de uma viso abrangente das mensagens que nos chegam atravs dos veculos eletrnicos, ou seja, rdio e televiso.

    Nosso texto, alm de explicar o surgimento do jornal, rdio e televiso no Brasil, quer oferecer elementos que possam colaborar para uma anlise mais crtica da realidade apresentada, ou seja, como algo acabado, pronto, invarivel, desenraizado do passado. Ora, informaes descontextualizadas privam o leitor de uma compreenso maior dos acontecimentos.

    Sabedores de quo poderosa a mdia em nossa vida cotidiana, estud-la significa entender o mundo, utilizando nossa capacidade de crtica e decifrao para compreender sempre mais do que aquilo que lemos, vemos e ouvimos e compartilhar seus significados (SILVERSTONE, 2002).

    Agora, preciso ter cuidado. O senso de anlise no nasce automaticamente. uma tarefa diria de aprendizagem. Vai crescendo medida que descobrimos a importncia do como os noticirios dizem as coisas, em detrimento do que eles afirmam.

    Ter uma viso de conjunto, contextualizar as informaes, ligar as partes ao todo poderia ser um meio eficaz para a formao de um esprito crtico. Uma reflexo sobre mdia inerente a todas as pessoas que afirmam e reafirmam sua cidadania, j que mdia est presente em todos os aspectos de nossa vida cotidiana.

    Frente s mdias (jornal, rdio e televiso), podemos ter uma postura de ingenuidade ou de supervalorizao, encarando-as como simples entretenimento, ocupao das horas de ociosidade, ou uma crena total nas

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    informaes. fundamental, porm, no ignor-las, bem como premente aprofundar um olhar crtico sobre as mesmas.

    A falta de contextualizao, o realce a acontecimentos menores em detrimento dos principais que so esvaziados, constitui-se em esquemas de manipulao pelos proprietrios das mdias. Com esse procedimento, certos noticiosos no geram polmica, mas pura conformidade ao que mostrado. Ora, a moeda mais forte desse milnio a informao. Quem a detm possui o poder.

    Entender o funcionamento da mdia eletrnica

    Para realizar a funo de anlise crtica preciso ter algumas informaes. A primeirssima saber que a mdia eletrnica rdio e televiso resulta de concesses feitas pelo Governo, por um perodo limite, necessitando de renovao quando esgotados os prazos, de 10 anos para estaes de rdio e 15 para os canais de televiso.

    O que significa obter uma concesso? Em outras palavras, significa ter uma licena para usar o que no seu. Na verdade, o povo o verdadeiro dono das frequncias dos canais. Mas a explorao destinada a um pequeno grupo de empresrios. Em vista de uma legislao que no muda, que j dura 47 anos, sempre as mesmas pessoas so beneficiadas por novas concesses. De acordo com Comparato (2000, p. 193),

    [...] deve-se partir do princpio fundamental de que a comunicao social, numa sociedade democrtica, matria de interesse pblico, isto , pertinente ao povo, no podendo, portanto, admitir nenhuma forma direta ou indireta de controle particular sobre os meios de comunicao de massa.

  • 23

    O que se est exigindo o cumprimento da Constituio Brasileira de 1988, que em seu artigo 220, pargrafo 5, prescreve: Os meios de comunicao social no podem direta ou indiretamente ser objeto de monoplio ou oligoplio.

    Enquanto no chegam as mudanas na legislao, urge criticar e denunciar os monoplios existentes na comunicao. A mdia eletrnica contorce-se dentro de um crculo vicioso frreo, que precisa ser rompido, se quisermos pensar em democracia e cidadania.

    Esta intrincada situao da mdia nacional fica bem esclarecida com a afirmativa de Thompson (1995, p. 327): A liberdade est ameaada no apenas pelo exerccio do poder do Estado, mas tambm pelo crescimento desenfreado das organizaes da mdia no campo privado.

    A pergunta que a descrio deste quadro suscita a seguinte: onde fica a pluralidade de informaes, o contraditrio, a diversidade de opinies, o direito de dizer sua palavra, principalmente na linha do telejornalismo, que constitui a principal fonte de informao?

    As notcias repassadas para a maioria dos brasileiros de uma forma sinttica podem ser comparadas como um fast food, um drops, uma cesta bsica. E pior: esta postura pode ser observada na maioria dos canais abertos.

    Da a necessidade de uma educao para a mdia, para desconstruir suas mensagens veiculadas pelos meios de comunicao. O mundo pior do que a mdia diz naquilo que ela no diz: na desigualdade, na injustia, na indiferena do servio pblico.

    Jornalista no apenas transmissor, mas verdadeiro construtor de contedos. De uma mesma informao possvel apresentar resultados

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    totalmente diferentes. Depende de quem d forma a essa informao. Ele deve localizar as contradies, os interesses que os proprietrios defendem, uma vez que sempre h algo para ser descoberto.

    E o receptor deve deixar de lado a ideia de ser um mero leitor ou espectador. fcil concluir, ento, que no existe uma mdia impressa ou eletrnica independente, neutra, apartidria, em que o leitor sua razo de ser, como gostam de lembrar, continuamente, os seus proprietrios. De acordo com Hohenberg (1981, p. 29),

    [...] o mero processo de decidir publicar uma matria ou suprimi-la um exerccio de opinio do editor. Se a matria vai levar uma manchete grande ou pequena, se ser colocada na primeira pgina, no meio de anncios de precisa-se, , igualmente, no o resultado de qualquer processo objetivo, porm de uma escolha editorial, opinativa.

    Editar uma notcia escolher e, essa escolha j uma tomada de posio. O destinatrio precisa ter uma viso abrangente das mensagens que a ele chegam. S assim h de crescer seu discernimento, o que lhe possibilitar uma interpretao crtica. A postura crtica do receptor oferece condies de localizar as contradies, os interesses que os proprietrios da mdia defendem.

    Morin (2001) o autor da Teoria da Complexidade, entendida como aquilo que tecido junto, ou seja, existe um elo interdependente entre as partes e o todo, o todo e as partes. Para este socilogo francs, compreender significa ligar os conhecimentos.

    Caso contrrio, viveremos rodeados por um cipoal de informaes onde no haver tempo para meditar sobre a primeira notcia, simplesmente porque j foi substituda por outra. Morin (1986) diz que estamos rodeados

  • 25

    de sub e super informaes. O excesso abafa a informao, dificultando o discernimento sobre o que est acontecendo.

    A caminhada do monoplio da mdia brasileira

    Os servios da radiodifuso so regulamentados atravs do Cdigo Nacional de Comunicaes, criado em 1962. No mesmo ano fundada a Associao Brasileira de Emissoras de Rdio e Televiso (ABERT), para defender os interesses dos donos desses veculos.

    Este Cdigo sofre alteraes a partir do regime militar (1964-1985), quando, em 1967, a legislao estabelece que nenhuma entidade ou pessoa pode ter participao em mais de dez emissoras de televiso em todo o pas, das quais cinco, no mximo, devem ser em VHF. Esta legislao abriu brecha para burlar tal determinao. O registro comeou a ser feito em nome de empresas diferentes e em nome de vrios membros da famlia.

    Isso explica por que no Brasil alguns grupos familiares concentram toda a comunicao do setor de rdio e televiso, que abrange o territrio nacional. Famlia Roberto Marinho: Rede Globo Rio, com incio em 26 de abril de 1965. Possui tambm: televiso paga, jornal O Globo, estaes de rdio, revistas, agncia de notcias, gravadora, televiso a cabo, telefonia celular, provedores de internet, grfica.

    Famlia Joo Saad: Rede Bandeirante de Televiso inicia em 13 de maio de 1967 e dispe de estaes de rdio. O esplio da Rede Tupi, aps

  • 26

    sua falncia foi distribuda entre a Famlia Abravanel (Slvio Santos), que criou o Sistema Brasileiro de Televiso (SBT), e Adolf Bloch, que inaugurou a Televiso Manchete, que tambm entrou em falncia. Em 1999, 15 de novembro, Amilcare Dallevo Jnior fica com a falida Televiso Manchete, sob novo nome: Rede TV. Edir Macedo, compra a Rede Record, que se transforma em Rede Nacional, dispondo de estaes de rdio e televiso e mais jornais, revistas, com filiais no exterior.

    Nelson Tanure comprou e edita o centenrio Jornal do Brasil, a Gazeta Mercantil (que fechou em 2009), e dono do canal Jornal do Brasil de Televiso (JBTV), antiga Central Nacional de Televiso (CNT), do Paran, pertencente famlia Martinez.

    Existem tambm grupos regionais, repetidores dos grandes canais: Famlia Sirotsky, que comanda a Rede Brasil Sul de Comunicaes (RBS), mantendo o controle miditico do Rio Grande do Sul atravs de repetidoras de televiso e estaes de rdio. Alm disso, proprietria de quatro jornais dirios: Zero Hora (Porto Alegre), O Pioneiro (Caxias do Sul), Dirio Gacho (Porto Alegre) e Dirio de Santa Maria (Santa Maria). Em Santa Catarina dispe de repetidoras da RBS e mais quatro jornais: Dirio Catarinense (Florianpolis), o Estado de Santa Catarina (Blumenau), A Notcia (Joinvile) e Hora de Santa Catarina (Municpios da Grande Florianpolis)1.

    A Famlia Daou, com influncia no Acre, Amap, Rondnia, e Roraima. A Famlia Jereissati, presente no Cear, Alagoas, Pernambuco. A Famlia Zahran, no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A Famlia Jaime

    1 O Ministrio Pblico Federal de Santa Catarina, atravs de uma ao pblica, pede que o Grupo RBS abra mo de um dos seus quatro jornais dirios que circulam no Estado de Santa Catarina e escolha apenas duas, entre as seis emissoras da RBS TV regional. Ainda esse ano podemos ter uma sentena. Porque essa ao tem instruo, ela se prova, acredita o Procurador da Repblica Federal de Santa Catarina, Celso Trs (REVISTA ADVERSO, Porto Alegre, n. 162, p. 9, jun. 2009).

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    Cmara: Gois, Distrito Federal e Tocantins. Famlia Mesquita: Jornal o Estado de So Paulo e Rdio Eldorado. Jos Sarney dispe de canal de Televiso, estaes de rdio AM e FM, alm de jornal no Estado do Maranho.

    Mais algumas Famlias: Rmulo Mairana (Estado do Par); Albano Franco (Sergipe); Fernando Collor (Alagoas); Alves (Rio Grande do Norte); Calisto Lobo (Piau); Antonio Carlos Magalhes, na Bahia (canal de televiso, rdio, jornal).

    Muitas dessas famlias ocupam posies polticas nos seus Estados e em Braslia. Em resumo, noventa por cento da mdia brasileira controlada por grupos familiares. Esta realidade est em perfeita contradio com o Artigo 220 da Constituio, pargrafo quinto: Os meios de comunicao social no podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monoplio ou oligoplio.

    H riscos na formao destas corporaes?

    A formao de redes vai beneficiar o sistema capitalista, uma vez que ser possvel vender os bens produzidos em nvel nacional. Servir, e muito, para alavancar o perodo do denominado milagre brasileiro (1968-1972), quando h um forte crescimento do Produto Interno Bruto, sem, em contrapartida, uma distribuio de renda. A elite a beneficiada. Alm disto, um pas todo interligado permite que o regime militar esteja informado sobre todos os acontecimentos internos. A transmisso da

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    Copa do Mundo, em 1970, diretamente do Mxico, serviria como smbolo mximo da integrao nacional.

    Haveria algum inconveniente com a presena destas corporaes? A formao deste monoplio e suas redes facilitam a transmisso de uma mesma imagem, um mesmo e nico som e, principalmente, impossibilitam a multiplicidade de informaes. Uma nica voz percorre todo o pas. No h pluralidade e, como consequncia, uma limitao no sentido da democracia, uma vez que parte inerente dela o direito informao correta.

    Observa muito bem o socilogo portugus Boaventura de Souza Santos2 quando escreve:

    Quem tem poder para difundir notcias, tem poder para manter segredos e difundir silncios. Tem poder para decidir se o seu interesse mais bem servido por notcias ou por silncio. Podemos concluir, pois, que uma parte do que de importante ocorre no mundo, ocorre em segredo e em silncio, fora do alcance dos cidados.

    A influncia destas corporaes enorme. O ex-ministro das Comunicaes, Srgio Motta, na Presidncia de Fernando Henrique Cardoso, percebeu esta realidade, em entrevista revista Veja3: No acho que a estrutura das comunicaes que temos no Brasil seja justa, a mais adequada.

    2 Folha de S. Paulo, So Paulo, 15 mar. 1998. Caderno A, p. 2.

    3 Revista Veja, 23 jul. 1997. Pginas Amarelas.

  • 29

    A questo da democratizao

    No Brasil, a entrega de canais de rdio e televiso funciona na base de concesses. O governo quem os distribui. No caso do rdio, o perodo de concesso de 10 anos e para um canal de televiso 15 anos. Normalmente, a permisso renovada. Para evitar qualquer surpresa, inevitvel que exista um comprometimento destas famlias com o poder concedente.

    O que deve ser constatado que se trata de servio pblico. O povo dono destes servios, que so repassados para algumas famlias. A mdia eletrnica precisa ser democratizada. E isto significa dizer que deveria existir o direito de antena, ou seja, o direito de reclamar, de contra-atacar, de produzir programas a serem veiculados pelas redes. Aqui deveria estar presente o poder do Estado, para garantir espao de transmisso e o acesso aos meios tcnicos de produo.

    A moeda mais forte deste milnio a informao. Segue-se, ento: quem a detm, possuidor de poder. Por isso mesmo preciso ampliar o universo de discusso, ainda mais que a maioria da populao permanece sem o direito de se fazer ouvir. A constatao de Ramonet (1998, p. 72):

    Grupos mais poderosos que os Estados esto aambarcando o bem mais precioso das democracias: A informao. Ser que vo impor sua lei no mundo inteiro ou, pelo contrrio, abrir uma nova rea de liberdade para os cidados?

    No artigo 224 do Captulo V da Constituio, que trata da Comunicao Social, est escrito: Para os efeitos do disposto neste captulo,

  • 30

    o Congresso Nacional instituir como seu rgo auxiliar, o Conselho de Comunicao Social, na forma da lei. Passaram-se anos da aprovao da chamada Constituio Cidad para que acontecesse a regulamentao deste Conselho. Em dezembro de 1991 foi aprovada a lei N 8.398 que constituiu o Conselho de Comunicao Social, com 13 integrantes: quatro representantes dos empresrios, quatro dos trabalhadores e cinco da sociedade civil. Passaram-se mais alguns anos at que os membros do Conselho fossem empossados. As restries partiam do prprio governo, dos polticos e dos proprietrios das redes de rdio e televiso. Sem uma mdia democrtica, como podemos falar em soberania popular?

    Para o jornalista Daniel Herz (1994, p. 9)4:

    O Conselho surge como primeiro espao institucional para o debate da comunicao no Brasil, superando a relao direta e exclusiva entre o Executivo e o empresariado e criando uma instituio que pode se voltar para o equacionamento dos conflitos, busca do consenso e superao do atraso da sociedade civil sobre as questes da comunicao.

    Nos ltimos dois anos (2008 e 2009), no aconteceu nenhuma reunio desta Comisso. Por que esta focalizao nas mdias? Pergunta Gonnet (2004, p. 51):

    Porque elas no refletem a realidade. Elas a codificam. As mensagens miditicas no so neutras. Alm de informar sobre o mundo, as mdias apresentam maneiras de perceb-lo e de o compreender. Este papel das mdias nos fora a

    4 Jornal Mundo Jovem, Porto Alegre, ab. 1994, p. 9.

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    revisar a opinio corrente segundo a qual a nica funo das mdias informar ou divertir.

    Novas tecnologias e a Comunicao

    A Internet comercial completa 15 anos no Brasil com um grande desafio pela frente. Segundo o Massachusetts Institute of Technology (MIT) em 2015 haver 1 trilho de aparelhos conectados o tempo todo. So fatos marcantes: 1969, nasce a Arpanet, embrio da Internet. Em 1991, o cientista Tim Berners-Lee cria a World Wide Web (WWW) sistema de documentos interligados pela Internet que so acessados por meio de navegadores. No ano de 1995, temos o incio da Internet comercial no Brasil. J em 2010, a Internet entra na fase das redes sociais, com ferramentas como Twitter, Facebook, Orkut, blogs, ganhando notoriedade. a chamada internet social, de comunidades5. Temos, ento, uma nova realidade em termos de comunicao.

    De acordo com Volton6, as tcnicas aproximam os homens e a sociedade, tornando mais visvel as diferenas culturais, sociais e religiosas e, aumentam as dificuldades de inter-compreenso. Afirma: As mquinas podem ser on line, os indivduos e as sociedades no o sero jamais. Estreitam-se as distncias geogrficas e crescem as distncias culturais.

    De um lado, as informaes esto em toda a parte, de outro, constata-se que falta muito para acontecer uma intercompreenso. A existncia de milhes de aparelhos de comunicao significa mais comunicao? Fica sempre a mesma pergunta: O que comunicao? Qual a viso de sociedade daqueles que possuem os veculos de comunicao? preciso, na viso de

    5 MONTE, Fabiana. Internet faz 15 anos e enfrenta novos desafios. Jornal Brasil Econmico, 25 maio 2010.

    6 Revista Famecos, p. 7-18, dez. 2002. [EXCERTOS]

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    Volton7, [...] utilizar o esprito crtico no dia-a-dia em relao aos ideais de comunicao e a realidade das indstrias de comunicao. No vivemos com a internet na era das solides interativas?.

    A comunicao s tcnica? Volton (2003, p. 31) observa que:

    [...] qualquer reflexo torna-se suspeita, toda crtica descabida. Nesse contexto desprovido de debate e de controvrsia, a menor manifestao de ceticismo identificada com o medo de mudanas e de progresso. Isso explica a defasagem considervel que se estabeleceu h meio sculo entre a extraordinria rapidez das mudanas relativas comunicao e o inexpressivo nmero de reflexes e anlises, outras que no apologias.

    Vive-se uma era de graus de persuaso e manipulao, alguns mais visveis, outros mascarados. De acordo com Roiz (1992, p. 6) [...] possvel afirmar que o elemento persuasivo est colado ao discurso como a pele ao corpo. muito difcil rastrearmos as organizaes discursivas que escapem persuaso. De fato, as campanhas de persuaso so mais aceitas entre indivduos que j comungam com as ideias apresentadas ou que esto predispostos para os temas apresentados.

    Na manipulao, alerta Berrio (1983, p. 78)

    [...] que existe a vontade expressa de mover-se no terreno da ambiguidade ou da mentira porque se perseguem determinados objetivos, eticamente condenveis, aos que se subordinam e tambm, naturalmente, o auditrio, o qual se converte em objeto em lugar de sujeito.

    7 Ibidem

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    Muitas das crianas so submetidas ao mundo adulto, metralhadas por questes que no fazem parte do universo infantil. De acordo com a psicloga Rosely Sayo8

    [...] crianas no so pequenos adultos. Vrias consequncias de tantos estmulos levam a perda precoce da infncia: depresso, medo da violncia e consequente dificuldade para conseguir autonomia compatvel com a idade, dificuldade de aprender, acmulo de informaes que no se transformam em conhecimento, e, claro, a erotizao precoce que provoca super excitao abeira do incontrolvel.

    A Internet uma resposta s novas formas de acumulao de capital. uma evoluo em vista das necessidades econmicas do sistema capitalista. Mas o que a maioria da populao sem dinheiro, sem cultura, sem propriedade vai fazer com a Internet? Estamos, de novo, frente economia poltica com caractersticas burguesas, ou seja, a uma nova excluso, agora, digital. Para Schwarts (2000, p. 2)

    [...] o maior risco, com a disseminao de redes de informao e comunicao, o de se observar apenas a reproduo dos padres de embotamento poltico e de passividade intelectual que predominaram na era do rdio e da televiso. A excluso digital no de ficar sem computador ou telefone celular. continuarmos incapazes de pensar, de criar e de organizar novas formas, mais justas e dinmicas de produo e distribuio de riqueza simblica e material.

    Concluso

    8 Folha de S.Paulo, So Paulo, 31 mar. 2005. Folha Equilbrio, p. 21.

  • 34

    Frente mdia, podemos ter uma postura de ingenuidade, de supervalorizao, encarando-a como simples entretenimento e ocupao na ociosidade. No entanto, a posio mais inteligente e, na verdade, um imperativo, desenvolver um senso crtico, conscientes de que a mdia e a Internet servem como matrias de discusso, uma vez que elas refletem o poder dominante, a realidade social, econmica e poltica do pas e, por isso mesmo, preciso modificar o modo como as encaramos. Ainda mais que no caso da televiso, ela representa para uma imensa maioria da populao a nica fonte de informao.

    B - EdUCAo

    o Papel do Professor

    Ao longo da histria da educao, assim como tambm nas revolues industriais (FRANCHI, 1995), mudou a funo do professor. Na histria clssica e medieval, a classe dominante estudava nas escolas paroquiais e monacais. Os pobres se educavam trabalhando. O professor era o produtor de conhecimentos, e como tal falava a seus discpulos.

    Quando surgem as Universidades, o professor torna-se mediador entre os produtores de conhecimento, locados nas Universidades, e a grande massa de aprendizes. Contedos e instrumentos so selecionados pelas Universidades e repassados. S que esses ensinamentos no podem ser absorvidos cegamente.

    Hoje, em vista das velozes mudanas no campo do saber, o professor deve buscar incessantemente a atualizao, o aprender a aprender. O que hoje a ltima palavra das pesquisas pode estar superado logo mais adiante.

  • 35

    No que diz respeito Educao, entendida como um processo permanente, ela no pode parar no ensino, ou seja, na pura instruo. Nesta funo, os meios de comunicao esto muitos anos luz nossa frente. A informao est disponvel em toda a parte.

    A aprendizagem, sintetizada em receber a informao e memoriz-la, tambm nada representa em termos de mudana. Infelizmente, em muitos lugares a escola que temos. Trata-se de um processo alienante. A contribuio mais importante que podemos oferecer aos nossos alunos ensinar a pensar.

    Um processo educativo envolve a produo do conhecimento, que no uma necessidade s dos cursos de ps-graduao. um meio essencial, para avanar, intervir, e melhor agir. De acordo com Barthes (1996, p. 47), [...] h uma idade em que se ensina o que se sabe; mas vem em seguida outra, em que se ensina o que no se sabe: isso se chama pesquisa.

    Em contraposio a uma educao alienante, devemos trabalhar pela libertao (PADIM et al., 1987), que deve ser criadora, antecipando o novo tipo de sociedade que queremos, aprofundando a conscincia da dignidade do ser humano, aberta ao dilogo, e respeitando as peculiaridades locais e nacionais. Diz Guareschi et al. (2000, p. 79):

    [...] nossa concepo de ser humano que ele uma pessoa = relao, isto , ele no nem um indivduo, algum que um e no tem nada a ver com os outros, como o compreende a filosofia liberal; nem uma pea de uma mquina, algum que no passa de um nmero, de uma parte de um todo, onde o que realmente vale o todo, a instituio, a organizao do Estado, o partido. O ser humano, como o compreendemos, o resultado dos milhes de relaes que o vo construindo, e atravs das quais ele vai continuamente se transformando.

  • 36

    O contedo deve ser considerado um meio e no um fim. Professor e aluno devem se exercitar em descobrir o que est oculto nos livros, jornais, revistas, ou seja, as marcas, as pegadas, os traos deixados, e ler tambm as entrelinhas, o texto pelo contexto. Os alunos precisam saber como aquilo que estudam tem a ver com o que vivem. Brand (2001, p. 5)9 afirma que

    [...] a escola precisa organizar-se em torno de poucos, mas significativos eixos temticos, em torno dos quais giram as atenes na busca de contedos necessrios. Eixos que no podem estar alheios num projeto poltico pedaggico da escola hoje: o cotidiano, educao para uma cidadania efetiva, a construo de uma prtica dialgica e a afirmao incondicional da dignidade humana. [...] A escola necessria a escola da e para a vida.

    A questo est em priorizar a educao em vez da instruo, a vida em relao ao mercado, embora, muitas vezes, pais e alunos pressionem pelo mercado, mais do que pela vida. importante a educao para conseguir emprego hoje; questiona-se se condio suficiente. No dizer de Demo (1997, p. 90),

    [...] o problema est em encontrar um termo mdio entre a expectativa de mercado, inevitvel para as pessoas ganharem a vida, e a competncia humana, que deve poder se opor ao mercado, privilegiando o objetivo e a tica da cidadania sobre a produtividade econmica.

    9 BRAND, Turio. Boletim da Associao Catlica. Rio Grande do Sul: AECRS, 2001.

  • 37

    A escola deve fugir daquela qualidade apregoada pelo neoliberalismo que visa preparao da mo-de-obra para o mercado e a proclamao de sua excelncia, visando sempre satisfao do cliente.

    o Pedaggico e o Poltico

    A competncia de um professor na sala de aula no se mede somente pelo domnio que tem sobre sua matria. H o lado da formao poltica, do seu engajamento e de seus alunos na luta pela superao das injustias, que so intrnsecas ao capitalismo.

    Trata-se, ento, de tornar o pedaggico mais poltico, sem medo do outro discurso que defende a neutralidade da escola, para que tudo permanea como est. Ao problematizar o conhecimento, o professor torna-se junto com seus alunos mais crtico, tornando o poltico mais pedaggico.

    Paulo Freire insistia que o primeiro livro a ser lido o da realidade. Para este educador, ler mundo e ler palavra, implicava em reescrever o mundo. Em outras palavras transform-lo. No plano social, Gadotti (1991, p. 70) afirma que:

    [...] ato pedaggico desvelar as contradies existentes, evidenci-las com vistas sua superao. O educador, nesse sentido, no o que cria as contradies e os conflitos. Ele apenas os revela, isto , tira os homens da inconscincia. Educar passa a ser essencialmente conscientizar. Conscientizar sobre o nada? No. Sobre a realidade social e individual do educando. Formar a conscincia crtica de si mesmo e da sociedade.

  • 38

    A educao deve girar ao redor de alguns eixos. Um deles, de acordo com Candau et al. (1995), o cotidiano, significando o desenvolvimento da pedagogia do espanto e da indignao e no da resignao.

    O socilogo portugus, Boaventura de Souza Santos refora este aspecto, ao afirmar em palestra, promovida pela Secretaria Municipal de Educao de Porto Alegre: Assistimos ao sofrimento humano e sequer perdemos o sono. necessrio recuperar a capacidade de espanto e indignao dos indivduos, levando para as salas de aula imagens que despertem paixo e emoo10.

    O professor e gegrafo Milton Santos, de renome internacional, em conferncia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), segue na mesma linha ao insistir que no a inteligncia que empurra os homens, mas a emoo.

    obrigao de o professor possibilitar ao menos uma reflexo sobre o que est acontecendo no processo social global. Ainda no cotidiano poderia ser includa a pedagogia da admirao e da mstica pela vida, justia e liberdade. De acordo com Assmann (1998, p. 23), [...] somente educadores entusiasmados com seu papel na sociedade conseguem uma opinio pblica favorvel aos seus reclamos.

    Vamos restaurar, ento, a nossa autoestima. Enquanto nos considerarmos heris ou sacerdotes, a sociedade nunca se interessar por ns. Somos profissionais. Cobramos reconhecimento, respeito e salrio.

    Um segundo eixo diz respeito a promover a educao para a cidadania, voltada para organizao e radicalizao dos movimentos populares contra qualquer tipo de subordinao e explorao. A maior parte do nosso povo vive nas trevas, no conhece seus direitos e nem sabe

    10 Jornal Zero Hora, Porto Alegre, 2 jul. 1996. p. 51.

  • 39

    onde busc-los. A populao no sabe o que est acontecendo e nem ao menos sabe que no sabe, de acordo com o linguista norte-americano Noam Chomsky.

    Ao proferir sua aula inaugural da cadeira de Semiologia Literria, no Colgio de Frana, a 7 de janeiro de 1977, Barthes (1996, p. 46) afirmou, entre outras tantas prolas: [...] se quero viver, devo esquecer que meu corpo histrico, devo lanar-me na iluso de que sou contemporneo dos jovens corpos presentes e no de meu prprio corpo passado. Em sntese: periodicamente devo renascer, fazer-me mais jovem do que sou.

    A questo no tanto saber o que estamos fazendo. A pergunta mais importante diz respeito quilo que no fizemos. Deste modo, construiremos uma proposta, sem a qual no existe um processo educativo.

    Segundo Gonnet (2004, p. 41), [...] desde o dia em que os professores, jornalistas e pais se perguntaram por que no se utiliza o noticirio e suas imagens para interessar s crianas, a problemtica das mdias na educao estava colocada. Ora, esta questo to velha quanto s prprias mdias.

    Althusser (1985, p. 80) elogia os professores, que, em condies assustadoras de trabalho, se voltam contra a ideologia, contra o sistema, com as poucas armas que podem encontrar na histria e no saber que ensinam. So uma espcie de heris. que estes heris no separam educao da sociedade, da economia, das mudanas tecnolgicas, no interior das quais ela se desenvolve.

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    C - A CoNSTrUo dA CIdAdANIA

    No Novo Dicionrio do Aurlio: CIDADO entendido como o indivduo no gozo dos direitos civis e polticos de um Estado ou no seu desempenho para com este. CIDADANIA: qualidade ou estado de cidado.

    A construo da cidadania passa pela discusso do papel exercido pelos Meios de Comunicao Social. Da sua importncia em conhec-los e discuti-los.

    Quem pode tirar o Brasil das dificuldades de todo gnero em que se encontra no o governo, a cidadania. E cidadania , antes de tudo, o exerccio de crtica permanente, de exigncia crescente. S esse cerco que submete os governos s aspiraes de um pas11.

    A cidadania um processo de luta e conquista. Precisamos ento aprender a falar, a reclamar, exigir nossos direitos. Duas palavras do historiador Capistrano de Abreu resumem bem nossa postura de brasileiro: Povo Capado, Sangrado, e Ribeiro (1994) no seu livro A Identidade do Brasileiro acrescenta: e Festeiro. Ainda vivenciamos a cultura do silncio.

    A construo da cidadania passa pela discusso do papel exercido pelos meios de comunicao social. Agora, se o professor nem cidado (tambm em vista dos salrios) como fica a construo da cidadania?

    O exerccio da cidadania depende da informao, por isso, ela precisa ser correta, honesta; momento importante para que a mdia, em vez de vender um candidato, trabalhe em favor da cidadania, auxiliando na educao poltica da sociedade.

    A participao poltica decorre fundamentalmente de trs elementos (BIZ; PEDROSO, 1978, p. 13): 1) Primeiro a percepo da importncia dos

    11 Folha de S.Paulo, 31 dez. 1998. Caderno 1, p. 8.

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    fenmenos polticos pelos cidados; 2) O interesse em conhec-los e discuti-los, e 3) A vontade de interferir na sociedade, isto , para que as decises polticas reflitam os interesses da maioria da populao. Esta participao pode ser de intensidade, frequncia e abrangncias variveis. Qualquer que seja sua natureza ou forma contribui para a democracia.

    Formas de Participao Poltica: Associao de Moradores, Escola (alunos, pais, professores, funcionrios), Sindicatos, Partidos Polticos, Defesa dos Direitos Humanos, Defesa do Consumidor, Defesa do Meio Ambiente, Defesa de Minorias tnicas e Religiosas.

    Afora estas formas de participao, a Constituio12 atual fornece aos cidados e s entidades da sociedade civil um conjunto de instrumentos jurdicos para que eles possam, diretamente, fazer cumprir os preceitos constitucionais: Mandado de Segurana Coletivo; Mandado de Injuno, Habeas Data, Ao Popular, Iniciativa Popular.

    Independentemente do nvel de participao de cada indivduo, o fato de estar engajado numa agremiao, lutando por uma causa que ultrapasse o seu interesse individual (embora o inclua), reduz a passividade, elimina a apatia geral da sociedade.

    Indivduos lutando por seus direitos so indivduos que os conhecem seus direitos e tambm seus deveres. Portanto, no so passveis de manipulao, ou dominao. Indivduos conscientes e participantes sentem-se como parte da sociedade verdadeiros cidados que ajudam a definir as regras da sociedade e lutam para que elas sejam cumpridas e aperfeioadas.

    Enfim, tornam-se capazes de controlar os governantes e no serem controlados pelos mesmos. Alertamos, entretanto, que a construo de uma

    12 Constituio de 1988, Ttulo II, Captulo I, Item LXX ao LXXIII e Artigo 61, 2.

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    sociedade verdadeiramente democrtica inclui dupla dimenso: a poltica que diz respeito participao nas decises e as socioeconmicas que dizem respeito participao na riqueza gerada pelo trabalho de todos. Se a sntese entre estas duas dimenses no se completar, usufruir do processo democrtico ser apenas privilgio de poucos.

    Para Pedro Demo (1992, p. 17), [...] cidadania um processo histrico de conquista popular, atravs do qual a sociedade adquire progressivamente condies de tornar-se sujeito histrico, consciente e organizado, com capacidade de conceber e efetivar projeto prprio.

    A construo da cidadania propiciar a todos a descoberta da importncia de se tornar sujeito da histria e no objeto de manipulao. Isso significa dizer que o conceito de cidadania extrapola, e muito, aquela ideia de votar no dia das eleies, pagar os impostos devidos. Essa viso de uma pobreza extrema.

    Ao longo da histria, a populao conseguiu uma srie de direitos: eles resultaram das lutas de sculos, de muitas pessoas que nos antecederam. No dependeram de concesses por parte do Estado.

    1689 - Carta dos Direitos, promulgada pelo Parlamento Ingls. Direito vida. liberdade, propriedade e justia.

    1776 - Independncia dos Estados Unidos da Amrica. Acrescenta Carta Inglesa, o direito felicidade.

    1789 - Revoluo Francesa. Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado. Resistncia opresso, liberdade de imprensa, liberdade religiosa.

    1948 - O.N.U. Declarao Universal dos Direitos do Homem. Direito vida, liberdade (pensamento, opinio, expresso, reunio, associao, participao poltica), segurana, ao trabalho, repouso, lazer.

  • 43

    1976 - Declarao Universal dos Povos (Argel). Direito de:

    governar independentemente,

    ser respeitado em sua identidade nacional e cultural,

    participar do progresso cientfico e tecnolgico,

    no imposio de uma cultura estrangeira.

    Para Silverstone (2003, p. 58),

    A cidadania no sculo XXI requer um grau de conhecimento que at agora poucos de ns tm. Requer do indivduo que saiba ler os produtos da mdia e que seja capaz de questionar suas estratgias. Isso envolveria capacidades que vo alm do que foi considerado alfabetizao em massa na poca da mdia impressa.

    Para ser cidado no basta ter certido de nascimento, pagar impostos, obedecer leis, votar. Faz parte da cidadania exigir direitos e assumir deveres. Descobrir a relevncia da cidadania, no aguardando a concesso de polticos e governantes.

    Trata-se de uma exigncia crescente. Deste modo no h mais espao para salvadores da ptria, ou seja, a crena de que a libertao depende somente dos detentores do poder.

    Ser cidado significa preparar-se para revelar as contradies existentes na sociedade; acostumar-se ao exerccio da crtica permanente. Ser cidado ter a histria em suas mos.

    Comunicao, Educao, Cidadania no so realidades excludentes para aqueles que, em especial, se dedicam ao magistrio. Elas devem ser

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    cotidianamente construdas, uma vez que so dinmicas e necessitam de contnuos aperfeioamentos. Faz parte dessa construo o permanente questionamento, de forma a atingir milhes de brasileiros que ainda vivem nas trevas em relao a essas trs realidades.

    Esse nosso Brasil, como o vemos hoje, em que poucos tomam parte da riqueza, foi feito por um grupo de homens. No , portanto, uma ordem que no pode ser mudada. Ao contrrio, professores e alunos devero investigar, indagar, procurar as causas dessas injustias, que os impedem de serem cidados.

    Nesse momento estaro, alunos e professores, desenvolvendo a conscincia crtica que os levar a alterar o projeto que beneficia poucos brasileiros. Essa a funo primordial da educao. A misso primeira do professor no tanto repassar informaes. Outros meios podem fazer esta tarefa com mais desenvoltura e rapidez.

    Sua misso como professor-educador trabalhar no sentido de ajudar o alunado a compreender o mundo que nos rodeia; em suma: a desenvolver o esprito crtico. E, nessa misso, continuamos insubstituveis. Esse o nosso grande valor. E no h projeto, vindo de cima, que nos inibir.

    Concluso

    O exerccio da cidadania feito em conjunto com outras pessoas. No adianta s denunciar, reclamar. O exerccio da cidadania amplo. preciso associar-se aos grupos que lutam em defesa da conservao do Planeta para mudar os rumos de uma sociedade predadora, consumista. A cidadania Global ou Planetria est ligada ecologia, sobrevivncia do nosso Planeta Terra e, por uma deduo muito simples, continuao da existncia de bilhes de seres humanos, da prpria flora e fauna.

  • 45

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  • 46

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    VOLTON, Dominique. Internet e depois?: Uma teoria crtica das novas mdias. Porto Alegre: Sulina, 2003.

  • 47

    Comunicao, Multimeios e Educao: programas educacionais em pauta

    Adriana Rocha Bruno (UFJF)

    Ana Maria Di Grado Hessel(PUC-SP)

    Introduo

    A ao docente do educador, em tempos de cibercultura e cultura das mdias, tem contribudo de forma singular para uma articulao entre as reas do conhecimento. Nesse sentido, professores da rea de educao so integrados a cursos diversos como corresponsveis pelas discusses e ampliao dos campos de atuao para as profisses emergentes.

    Neste cenrio, o presente texto apresenta as experincias de duas educadoras e pesquisadoras da pedagogia que tm em seu percurso a atuao em reas multidisciplinares, tais como a Educao online e, no caso especfico, o curso de Comunicao e Multimeios da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP).

    Estas aes materializam a integrao de reas do conhecimento para a formao do homem contemporneo. Para alm da integrao de mdias,

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    to presente no contexto social atual, h se que articular aes de docncia e pesquisa que oxigenem e de fato promovam o imbricamento de profissionais e de campos de conhecimento, respeitando suas especificidades.

    Para Marques de Melo (2003) o campo da comunicao compreende cinco reas: Artes, Humanidades (incluindo a interface com a Pedagogia), Tecnologias, Cincias Sociais e Conhecimento Midialgico. A associao de reas e o hibridismo marcante do sculo XXI exigem a dinamicidade que as mdias possibilitam. Coexistem a cultura de massa e a cultura de mdias e, neste cenrio, h que se formarem profissionais plurais. Singulares em espaos de multiplicidades, no sentido deleuziano (BRUNO, 2010).

    No primeiro semestre de 2005, iniciamos um trabalho como docentes junto aos alunos do curso de Comunicao e Multimeios da PUCSP, na disciplina Novas Tecnologias e Educao (NTE). Desenvolvida em quatro semestres, buscava estudar o contexto imbricado das reas da comunicao e educao e todos os seus desdobramentos, tais como as abordagens cognitivas, os processos de conhecimento que justificam o uso de tecnologias, a anlise das mdias na ao de difusora do conhecimento, o debate sobre os limites e possibilidades para a atuao do profissional nas reas de comunicao social e da educao etc. Em sntese, a disciplina oferecia elementos para a compreenso das mltiplas possibilidades da transmisso do saber e da cultura que so veiculadas atravs de instncias de comunicao e no se reduzem s instituies educacionais.

    A partir de 2006, o curso passou por uma significativa reforma curricular. A consolidao da identidade do profissional da rea de comunicao e multimeios foi amplamente debatida por todo corpo docente e discente do curso, culminando com uma proposta de reorientao curricular. Essa reformulao resultou na proposio de duas disciplinas assumidas pelos departamentos da Faculdade de Educao da

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    PUCSP, ofertadas em dois semestres da nova matriz curricular, a qual foi introduzida em 2009: Metodologia de pesquisa para TCC e Tecnologias para a Aprendizagem.

    A proposta do curso voltou-se para a formao de um profissional cujo diferencial est na competncia de integrao de mdias. No h inteno de formar o especialista, mas o profissional que possua viso sistmica e integrada de reas e que desenvolva olhar crtico e criativos para a sociedade contempornea. No se trata de incorporar uma disciplina a um pblico especfico, tendo em vista a ampla rea de atuao que esses temas envolvem, mas promover aos futuros profissionais de Comunicao e Multimeios as possibilidades para uma formao contextualizada e coerente com os avanos tecnolgicos, com a formao humanstica e com os campos emergentes no mercado.

    Tem-se em vista a formao de um profissional pronto para atuar (criar, produzir, dirigir) em novos meios comunicacionais e culturais e, por conseguinte, vinculado expanso da tecnologia e dos meios de comunicao. (LEOTTE et al., 2006, p. 33).

    Este texto tem por objetivo relatar e discutir as experincias docentes e discentes por ocasio do desenvolvimento dos programas das disciplinas Novas Tecnologias e Educao (NTE) e Tecnologias para a aprendizagem, no curso de Comunicao e Multimeios da PUCSP.

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    Flexibilizao Curricular

    O mote que reza que preciso articular teoria e prtica se apresenta cotidianamente nos discursos, textos e documentos educacionais. Mas o que vem a ser isso?

    De origem grega, a palavra teoria (therein) significa observar, assistir ou especular. compreendida tambm como um olhar privilegiado prximo a Deus, ou seja, um olhar superior.

    A palavra prtica (praktik), tambm origina-se do grego prxis e significa agir, negociar, fazer algo em favor de si mesmo. Designa, desde Plato, alm da ao imanente pela qual o sujeito o indivduo vivencia o padro rotineiro do ethos, tambm a possibilidade de transform-lo, em virtude da finalidade de um bem-agir ou um bem-fazer (SODR, 2000).

    Integrar estes dois aspectos no ethos educativo tem sido o grande desafio de todos os educadores e projetos pedaggicos.

    Na realidade, associamos a teoria com o saber (conhecer) e a prtica com o fazer. Valorizamos em demasia o conhecimento, em forma de contedo e de informaes e intencionamos que ele se evidencie na prtica do aluno. Percebemos a prtica como uma demonstrao de que o aluno sabe o contedo, pois conseguiu coloc-lo em ao. Neste sentido, grande parte das aulas oferecidas nos cursos de graduao ainda est baseada em dois dos quatro pilares propostos por Delors (1999): aprender a conhecer (com nfase no saber) e aprender a fazer. Os demais pilares (aprender a viver junto e aprender a ser) so colocados em segundo plano, como algo menor, sem importncia.

    Revela-se, assim, um modelo curricular engessado e pautado na rigidez do conteudismo e da racionalidade tcnico-cientfica instrumental.

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    Este modelo estimula o acmulo de informaes, a fragmentao dos conhecimentos e das prticas educativas e a ciso do espao e tempo pedaggicos e do prprio indivduo, criando o imprio do individualismo e da centralizao do saber no professor.

    O modelo curricular educacional subjacente s prticas docentes dessa natureza torna-se inconsistente, visto que as prticas educacionais e a articulao terico-prtica, to desejada por todos, prescindem da integrao desses quatro pilares.

    Historicamente o currculo no tem sido concebido em sua dimenso complexa. Em verdade, o currculo no neutro e possui papel social: 1) na produo de sujeitos dotados de classe, raa e gnero; 2) na expresso, representao ou reflexo de interesses sociais determinados, e 3) na produo de identidades e subjetividades sociais (GOODSON, 1995).

    A construo de um currculo voltado para uma classificao social discriminatria pode incorrer no erro de favorecer uma classe em detrimento da outra e, ainda criar a iluso de solucionar problemas, ser democrtico etc. Portanto, a concepo de currculo adotada no universo educacional vai promover a incluso ou a excluso social, perpetuando, neste segundo caso, o guarda-chuva hegemnico (APPLE, 2000) que finge nos abrigar, mas nos sufoca, legitimando a poltica das desigualdades.

    Um dos modelos mais usuais adotados pelas instituies educacionais ainda tem suas bases no que Goodson (1995) definiu como pr-ativo. Tal modelo compreende o conhecimento como algo externo ao indivduo, dado pela sociedade, e que deve ser por todos incorporado.

    Hoje, sabemos que o currculo deve ser concebido numa linha emancipatria, a qual significa participao, autonomia, responsabilidade coletiva, criatividade, organizao, planejamento e dialogicidade.

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    O conhecimento emancipatrio , portanto, aquele capaz de reconhecer a igualdade na diferena do outro, integrando, desse modo, os pilares aprender a viver junto e aprender a ser aos outros dois, aprender a conhecer e aprender a fazer, privilegiados pelos sistemas educacionais.

    Diante deste cenrio impe-se a necessidade prtica de um currculo flexvel, que evidencie as transformaes pelas quais todos esto vivendo.

    Compreendendo a importncia da articulao e da integrao destes conhecimentos para a qualidade do Curso de Comunicao de Multimeios, a disciplina NTE assumiu o compromisso de integrar os pressupostos da emancipao, com o propsito de colaborar para a construo de um currculo flexvel.

    Por sua proposta flexvel, uma disciplina em constante construo. Sabemos que pelo processo recursivo de construo-desconstruo-reconstruo, no sentido espiralado, que o currculo flexvel e emancipatrio se mantm slido em seus propsitos de coerncia, no-engessamento e interdisciplinaridade.

    Neste contexto, cabe-nos a clareza do significado da palavra interdisciplinar e o que este conceito envolve.

    Interdisciplinaridade vem de Inter (entre) e disciplinas (regras), ou seja, o que est entre as regras. Devemos compreender que a Inter contm a disciplina e, portanto, tem origem na disciplinaridade, uma vez que prope outra forma de trabalhar com as disciplinas, respeitando as especificidades de cada rea do conhecimento, integrando-as, desfragmentando-as e buscando uma dimenso complementar a isto, no sentido de descobrir elementos que estejam alm destas regras.

    A concepo de interdisciplinaridade remete-nos ao fio tnue que permeia o nosso conhecimento e consequentemente o nosso ser. Por isso,

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    ser interdisciplinar diferente de estar ou fazer um trabalho e nome-lo de interdisciplinar. Tornar-se interdisciplinar mudar posturas, quebrar paradigmas, permitir-se e perceber-se complexo, inacabado como diria Paulo Freire, em construo contnua, pela articulao entre o tempo cronolgico (Chrnos) e o tempo cairolgico (Kairs tempo vivido).

    Tecnologias para a aprendizagem: construo de uma rea de estudo e pesquisa

    As disciplinas organizam os saberes no campo do conhecimento humano e viabilizam o funcionamento estrutural de um curso de forma vertical e horizontal. Entretanto compreendemos que esse conhecimento no fragmentado nem esttico.

    O currculo pode ser organizado no s em torno de disciplinas, como costuma ser feito, mas de ncleos que ultrapassam os limites das disciplinas, centrados em temas, problemas, tpicos, instituies, perodos histricos, espaos geogrficos, grupos humanos, idias etc. (SANTOM, 1998, p. 25).

    O excerto de Santom (1998) explicita claramente o que queremos dizer, elencando as possibilidades de um projeto curricular flexvel, numa abordagem interdisciplinar. Acrescentaramos aos itens destacados o trabalho por projeto, foco central da nossa proposta de disciplina.

    Embora o conhecimento tenha como caracterstica a hipertextualidade, as disciplinas so tratadas de forma linear em grande parte dos cursos de graduao. O Curso de Comunicao e Multimeios se prope a transcender essa estrutura e romper com a concepo funcionalista, por

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    meio de um currculo interdisciplinar, pautado no apenas no dilogo entre as disciplinas, mas na possibilidade do avano de nossas prticas no sentido de uma transversalidade, interpenetrao e transformao dos saberes.

    A dimenso sistmica garantida pela dinmica no-linear oferecida no curso, que concebe dois eixos integrados e complementares (vertical e horizontalmente), que viabilizam o imbricamento das demais dimenses previstas no curso e tambm nas disciplinas da rea de educao.

    Tal estrutura tem em vista uma educao de qualidade, que apresente uma aproximao da realidade socioeducacional da comunidade e oferea, ao futuro profissional, as oportunidades de vivenciar situaes motivadoras atravs de projetos interdisciplinares. O uso de cases ou de cenrios que reproduzam e viabilizem experincias terico-prticas, na resoluo coletiva de problemas, so estratgias utilizadas para desenvolver o pensamento crtico e potencializar o interesse pela pesquisa, para despertar um novo olhar sobre a avaliao do processo ensino-aprendizagem, bem como para orientar a escolha e a uso de diferentes mdias.

    Uma estrutura curricular espiralada compreende a tessitura entre a teoria e a prtica, o contexto, a diversidade e a plasticidade. Estamos numa rea em constante mutao, uma vez que emergem com muita rapidez novas mdias. O novo que se apresenta deve ser incorporado ao curso, de modo a garantir fluidez e atualizao constantes na formao do profissional da Comunicao.

    As transformaes decorrentes desse processo de reestruturao do curso e das reas que o compem caracterizam a identidade do curso e o sentido educacional dos saberes do profissional que se deseja formar:

    abertura ao novo;

    produo de conhecimento e de servios;

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    captao, criao e inovao de produtos;

    viso e prticas interdisciplinares;

    gesto de projetos e processos;

    desenvolvimento de pesquisa;

    formao de profissionais multidisciplinares.

    O nome da disciplina Tecnologias para a aprendizagem espelha tais mudanas, e os trabalhos agora se voltam para o uso e a produo de mdias destinadas a segmentos educativos, bem como estudos sobre os fundamentos epistemolgicos e abordagens do processo educacional em ambientes de aprendizagem contemporneos.

    O profissional da rea de Comunicao e Multimeios deve ter, como explicitado no Projeto Pedaggico para o Curso de Comunicao e Multimeios proposto pela reorganizao curricular em 2006, uma formao sistmica e baseada num contexto scio-tecnolgico em que as mudanas so rpidas e profundas.

    A flexibilidade foi o diferencial proposto para o Curso, de modo a atender s demandas sociais emergentes. Desse modo, a disciplina da rea educacional, Tecnologias para a aprendizagem, prope-se a trabalhar temas que integrem a Educao e a Comunicao para uma sociedade multimiditica. Os temas desenvolvidos nessa disciplina apresentam-se como fundamentais para a formao do profissional da rea de Comunicao e Multimeios, por promover a reflexo sobre reas nobres de atuao para esses profissionais, como a Educao a Distncia e o desenvolvimento de Programas Educacionais, reas de estudo e pesquisa, bem como de atuao da educao.

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    Composta por mltiplas reas do conhecimento, a disciplina em questo desenvolve estudos terico-prticos sobre design instrucional, objetos de aprendizagem, anlise, desenvolvimento e produo de programas educacionais e de ambientes de aprendizagem online (Educao a Distncia), cujo escopo de estudo e atuao so abarcados pelo campo da educao e podem ser trabalhados por profissionais dessa rea.

    No se trata de incorporar uma disciplina a um pblico especfico, tendo em vista a ampla rea de atuao que esses temas envolvem, mas promover aos futuros profissionais de Comunicao e Multimeios possibilidades para uma formao contextualizada e coerente com os avanos tecnolgicos, com a formao humanstica e com os campos emergentes no mercado.

    o projeto programas educacionais: docncia e pesquisa como campos de estudo e produo

    As mudanas socioeconmicas e culturais decorrentes do mundo atual, associadas plasticidade social e aprendizagem (BRUNO, 2010) na rea de multimeios, suscita uma ampliao do universo cultural e profissional para todos os envolvidos neste processo.

    Diante desse cenrio, a disciplina Tecnologias para a aprendizagem tem realizado, desde o ano de 2005 (ainda NTE) propostas que articulam teoria e prtica, como o caso do Projeto: Programas educacionais, foco principal do presente texto.

    A resistncia dos alunos do curso em relao s disciplinas da rea da Educao anunciavam que aquele ano de 2005 no seria fcil. A coordenao do curso j havia preparado a professora que acabara de

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    assumir a disciplina de NTE sobre tal situao, na esperana de que algo pudesse ser feito de modo a atenuar os possveis conflitos. De fato, estudos e abordagens educacionais pouco ou nada significavam para aqueles alunos que se viam imersos num cenrio multimiditico, frtil em aes voltadas para o cinema, produo de vdeos, trabalho com web, arte e tecnologia, leituras e produes imagticas, dentre outros atrativos que o curso apresentava.

    Os primeiros contatos, entre a docente da rea educacional e os alunos do curso, se pautaram na busca de uma nova identidade para a disciplina e identificao do contexto dos alunos, seus desejos, suas possibilidades e habilidades. Como inserir os estudos da rea da educao neste cenrio, de modo a envolver os alunos e ressignificar os conhecimentos das reas envolvidas?

    Deste estudo, surgiu o projeto de trabalharmos com o desenvolvimento de Programas educacionais, por meio das mdias disponveis, com vistas ao processo de convergncia. A convergncia de mdias no contexto educacional e nos processos de formao deve ser compreendida como possibilidade de relao e de aprendizagem. Quando pensamos nas relaes estabelecidas no mbito educacional, devemos tambm refletir que so relaes intersubjetivas, que imbricam pontos da interpessoalidade e da interprofissionalidade e isso significa que o investimento na formao de todos os envolvidos neste processo deve se dar de forma contnua, ao longo do processo.

    A busca pela comunicao indica tentativas de construir comunidades, estabelecer relaes, socializar informaes e, nesse sentido, as tecnologias e as mdias contribuem para a criao de redes interdependentes (PALLOF; PRATT, 2002). Isto quer dizer que a necessidade de conexo com o outro motiva a criao de vnculos, de

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    contato, e influencia no desenvolvimento de aes interativas que, por sua vez, alimentam a necessidade de comunicao. luz destas premissas, o projeto de Programas educacionais foi colaborativamente se constituindo.

    Alem disso, cabe elucidar que este projeto assumiu o desafio de desenvolver um olhar crtico sobre a produo de simulacros potencializados pelas mdias, como a TV e mais recentemente a Internet, tais como apontados por Chau (2006).

    Na prtica, em sala de aula, os alunos se dividiram em grupos para o planejamento e desenvolvimento de um projeto piloto. O pblico alvo poderia contemplar qualquer faixa etria, qualquer mdia (web, vdeo, rdio, material impresso etc) e qualquer tema, desde que o foco, educativo ou educacional, fosse atendido. Os alunos acolheram prontamente a proposta e passamos a trabalhar, durante as aulas, contedos que subsidiassem o desenvolvimento do projeto. Mais do que uma atividade para uma disciplina, os alunos compreenderam que estavam construindo portflios para sua vida profissional e, quanto mais se dedicassem, melhores seriam os resultados e a veiculao deste trabalho para o seu futuro. Estudos sobre a aprendizagem de crianas, jovens e adultos foram trabalhados com o objetivo de colher minimamente elementos que ajudassem na proposta de atividades, linguagens e as mdias, estudo de cores, interesse, brincadeiras, abordagem temtica etc. Os estudos de Belloni (2001), Chau (2006), Demo (2001), Napolitano (2003), Pfromm Netto (1999), dentre outros, fomentaram estas discusses. Tambm foram realizadas anlises de alguns programas educacionais realizados para TV, vdeos educacionais, games, jogos etc.

    Aps este perodo de estudos, cada grupo foi orientado a apresentar um Projeto escrito sobre o Programa a ser desenvolvido. A elaborao do projeto foi realizada no decorrer de duas aulas, nas quais cada grupo

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    discutia as ideias com os membros e com a professora. A palavra de ordem foi transgredir. Isso porque as anlises de programas educativos evidenciaram a carncia existente em grande parte destes, especialmente no que diz respeito utilizao de abordagens e linguagens mais dinmicas, hipertextuais e interativas.

    Questes emergiram neste processo coletivo de estudo e produo, tais como: Ser que criana gosta de ouvir rdio? Por que no temos programas de rdio infantil? Hoje em dia, crianas e jovens escutam histrias sem que a imagem esteja associada? Como pensar num programa de rdio, interativo para crianas? Como desenvolver esquetes educativos sem dar lio de moral? Programa de culinria educativo? Como dar feedbacks em jogos educativos na web? Podemos fazer um vdeo sobre como fazer vdeo? Jogo de tabuleiro educativo s pode ter matria de escola?

    Estas perguntas ilustram parte do processo de construo do projeto e resultaram em discusses que foram essenciais para o desenvolvimento dos prottipos dos Programas Educativos.

    Os projetos escritos foram apreciados pelos colegas e pela professora com o objetivo de contribuir para a melhoria de cada proposta. Os alunos, mais experientes em relao na rea da comunicao e das mdias trabalhadas na disciplina, teciam consideraes e apresentavam sugestes do ponto de vista da comunicao, e a professora fazia a anlise do ponto de vista educacional.

    Por fim, cada grupo se organizou para o desenvolvimento do produto, ou seja, um projeto piloto. Foi agendada uma data para apresentao dos prottipos e o resultado foi muito satisfatrio.

    Durante os trs primeiros anos foram realizados programas nas seguintes mdias: 13 em vdeos/DVD; 12 via rdio/podcast; oito para web;

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    trs como material impresso e seis tipos jogos de tabuleiro. Para efeito de ilustrao, elencamos alguns destes projetos:

    a. Videos-documentrios, como por exemplo, reciclagem de lixo urbano documentado em 8 min e 34, a partir de visitas a aterros sanitrios; entrevistas com catadores de lixo reciclveis que encontram nesta atividade o sustento de suas famlias; visitas a espaos como a Oficina Escola Cooparte (So Paulo) que conta com vinte moradores de rua que desenvolvem obras de arte a partir de material reciclvel; cooperativas em condomnios; alm de dados sobre os processos de reciclagem no Brasil e na cidade de So Paulo e com proposies para a melhoria das condies de vida nas cidades com a reciclagem.

    b. Esquetes de udio como sobre Campanha de conscincia ambiental, que trouxe quatro quadros, nonsense, com situaes inusitadas que transgridem os formatos tradicionais de desenvolver campanhas publicitrias, com temas como chuva cida.

    c. Programa de rdio para o pblico infantil, como o viajando na maionese, que trazia em sua programao a contao de histrias infantis com a participao (via e-mail ou telefone) dos ouvintes mirins para a sua finalizao; alm de brincadeiras, dicas, msica e curiosidades.

    d. Jogos na Web, como a viagem planetria de um extraterrestre que, perdido em nosso planeta precisa da ajuda das crianas para consertar sua nave construda com materiais reciclveis.

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    Alguns dos prottipos foram concebidos por meio de links com os trabalhos de concluso de curso dos alunos e, nestes casos, as aulas de NTE auxiliaram tanto no desenvolvimento dos produtos para tais trabalhos, quanto na anlise destes.

    Ao longo dos anos, os projetos foram incorporando melhorias estticas e funcionais. Houve a demanda de grupos de alunos para o desenvolvimento de jogos de tabuleiro. A cada nova turma, eram apresentados os trabalhos desenvolvidos pelos colegas de turmas anteriores. O desejo de superao surgiu como fator decisivo para a criao de bons programas.

    Em 2009, a disciplina NTE incorporou algumas inovaes, com a introduo dos estudos das midias emergentes na web 2.0. O uso de materiais pedaggicos destinados a segmentos educativos, em especial aos ambientes virtuais de aprendizagem, surgiu como uma nova demanda de produo no mercado de design educacional. A dinmica interativa das redes sociais na web 2.0, no tocante distribuio, produo e consumo de conhecimento propicia a disseminao dos materiais hipermediticos. Ao tratar sobre a cibercultura, Lvy (1999), anuncia uma mutao contempornea da relao com o saber e ressalta que, devido velocidade de apario e de renovao dos saberes e do saber-fazer, trabalhar significa cada vez mais aprender, transmitir saberes e produzir conhecimento. A construo de novos modelos do espao dos conhecimentos surge naturalmente na web 2,0. Ao invs de uma representao em escalas lineares e paralelas, em pirmides estruturadas por nveis, organizadas pela noo de pr-requisitos e convergindo para saberes superiores, estamos privilegiando a imagem de espaos de conhecimento emergentes, abertos, contnuos, em fluxos no lineares, reorganizando-se em funo dos objetivos ou dos contextos, nos quais cada indivduo ocupa uma posio singular e evolutiva.

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    Na implementao do novo currculo no curso de Comunicao e Multimeios, a disciplina denominada Tecnologias para a aprendizagem passou a focar a produo de vdeos educativos para a web, que pudessem ser divulgados no site distributivo de servios Youtube1.

    Habitar a rede (Web) nos faz retomar Lvy (1999). Se para este autor o ciberespao o espao de comunicao aberto pela interconexo mundial dos computadores e das memrias dos computadores (Ibid., p. 92) e o virtual multiplica as oportunidades de atualizao do real, os espaos de navegao na web se apresentam como possibilidades de caada ou pilhagem. A primeira (caada) nos coloca nos trilhos rpidos, rumo ao procurado. A segunda (pilhagem), assim como Alice (do pas das maravilhas), nos indica que quando no sabemos qual rumo tomar, a procura (ou o caminho), a busca pode se apresentar por meio de descaminhos.

    Em todos os casos, a navegao pode se dar por meios (mdias) diversas, como nos apresenta o autor, e que j so conhecidas por muitos de ns. As redes, neste ciberespao e na cibercultura se enlaam em configuraes no mais lineares, mas plurais todos/todos. essa a dinmica desejada para o desenvolvimento do Projeto e do curso.

    Os objetivos do curso adequaram-se reorientao curricular e passaram a destacar: a utilizao e desenvolvimento das mdias como instrumentos de acesso, transformao e produo do conhecimento; o reconhecimento do potencial das mdias e dos materiais educativos no processo de aprendizagem; a anlise e produo de materiais educativos fundamentados no conhecimento sobre educao e comunicao.

    Uma dinmica terico/prtica imprimiu uma tnica estratgica para a disciplina, desenvolvida por meio de estudos de referenciais tericos e de atividades de criao dos vdeos educativos.

    1 .

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    Os temas abordados em aula priorizaram o conhecimento sobre as modalidades de vdeo, diferenciando-se segundo os objetivos de uso. Os textos de Ferrs (1996), Moran (2002) e Hessel (2004), nos auxiliaram na definio e planejamento de alguns tipos de vdeo, os quais foram sintetizados nas seguintes categorias: Vdeo sensibilizao - utilizado para introduzir ou finalizar um tema, para provocar a reflexo sobre uma questo etc, assumindo um motivador ou conclusivo; Vdeo simulao - empregado para auxiliar na compreenso de temas densos ou abstratos, bem como para apresentarsituaes que no podem ser vivenciadas ou visualizadas; Vdeo documentrio - apropriado para abordar um tema em detalhes, transmitir informaes e fatos contextualizados, pois amplia a viso da realidade e permite a reflexo; Vdeo entrevista - adequado para apresentar pensamentos, trajetrias e trabalhos de pessoas, bem como para apresentar as diferentes posies sobre um assunto em evidncia; Vdeo ilustrao - empregado para exemplificar um fato, uma situao, um conceito, uma rotina, uma habilidade ou at mesmo uma sequncia de procedimentos; Vdeo interativo - utilizado em circunstncias nas quais o espectador pode opinar sobre a sequncia do vdeo, pode participar na construo do enredo ao escolher um roteiro alternativo; Vdeo avaliao, tambm denominado de vdeo-espelho - apropriado para captar a ao de pessoas ou grupos de pessoas, a qual ser analisada e avaliada pelos prprios figurantes.

    A produo dos vdeos teve incio com uma fase de planejamento. Os alunos se reuniram em grupos e definiram os temas. Um briefing2 foi desenvolvido para cada vdeo, o que permitiu aos alunos experimentarem

    2 O briefing um conjunto de informaes, uma coleta de dados passadas em uma reunio para o desenvolvimento de um trabalho, documento, sendo muito utilizadas em Administrao, Relaes Pblicas e na Publicidade. O briefing deve criar um roteiro de ao para criar a soluo que o cliente procura, como mapear o problema, e com estas pistas, ter idias para criar solues. (Disponvel em: . Acesso em: 8 maio 2010).

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    a dinmica do processo de especificao do produto e validao do mesmo, junto a um cliente fictcio.

    A primeira providncia exigiu uma pesquisa cuidadosa, ou seja, um levantamento das informaes relevantes, tais como a escolha do contedo, as demandas de aprendizagem, a profundidade do tema, a abordagem, a linguagem. O pblico alvo foi considerado no tocante faixa etria, escolaridade, ao interesse cultural e procedncia cultural. Esses elementos foram considerados na definio dos objetivos de cada produto, os quais atenderam determinada necessidade cognitiva, valorao de alguma atitude ou ao desenvolvimento de certas habilidades. Outras especificaes complementaram o plano, tais como a durao do vdeo, a definio das tcnicas e dos processos de trabalho, escolha de software de produo e edio etc. Foram estabelecidos um cronograma e a distribuio de tarefas. Por fim, o roteiro foi preparado, com a descrio da sequncia das aes do vdeo, as imagens, a trilha sonora etc.

    Os planos foram divulgados entre os alunos da classe atravs de um frum criado para tal funo, na plataforma Moodle da PUCSP. Tal estratgia motivou a turma para uma ao colaborativa e integrada de troca de ideias e materiais. Todo o processo de planejamento ficou registrado cumulativamente, refletindo o carter reconstrutivo da produo de um material miditico.

    Um canal3 do Youtube foi criado para reunir os vdeos produzidos pelos alunos. Alm de divulgar os trabalhos na web, o site de servio de publicao e distribuio de vdeos proporciona a possibilidade de compartilhamento com usurios em diferentes espaos e distintos

    3 A URL do canal criado no ano de 2009: ; A URL do canal criado no ano de 2010: .

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    tempos, pois nessa rede interativa todos assumem papeis de produtores e consumidores de conhecimento.

    etapa de produo seguiu-se uma etapa de avaliao. Cada grupo preparou um registro dos percursos de produo, dando nfase aos aspectos mais significativos do processo. Tais observaes foram postadas em frum com o fim de facilitar a divulgao e promover um debate avaliativo.

    Os depoimentos dos alunos revelaram situaes e desafios que surgiram durante a produo dos vdeos. Em sua maioria, esses relatos tratam do processo criativo, das providncias para alcanar um resultado harmnico, no que dia respeito congruncia e complementaridade da imagem, som e texto. Em algumas circunstncias, os alunos tiveram que lidar com aspectos tcnicos tais como: a reorganizao do tempo em funo dos contratempos; autorizaes e direitos autorais; com a escolha e uso de novos