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ANO 15 - Nº 181 - Dezembro/2007 - ISSN 1676-3661 15 anos EDITORIAL: O COMPLEXO DO ALEMÃO E OUTROS COMPLEXOS O COMPLEXO DO ALEMÃO E OUTROS COMPLEXOS EDITORIAL: O COMPLEXO DO ALEMÃO E OUTROS COMPLEXOS .................... 1 O PROGRAMA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA COM CIDANANIA Pedro Vieira Abramovay e Luiz Guilherme Mendes de Paiva ............ 2 DELITOS SEM BENS JURÍDICOS? Ana Elisa Bechara ................................. 4 A IRRETROATIVIDADE DO NOVO ART. 2º, § 2º, DA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E A APLICAÇÃO DO ART. 112 DA LEP Roberto Delmanto ................................... 6 A INCONSTITUCIONALIDADE DOS EFEITOS (MUITAS VEZES) PERENES RESULTANTES DE UM PROCESSO CRIMINAL Marcel Del Bianco Cestaro .................... 6 PENITENCIÁRIAS - “A QUESTÃO DA LOCALIZAÇÃO II” - A NECESSIDADE DE UMA POLÍTICA ALTERNATIVA Wilson Edson Jorge ............................... 8 O INQUÉRITO POLICIAL É MERA PEÇA INFORMATIVA? Fábio Motta Lopes ............................... 10 DA (NECESSIDADE DE) FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO JUDICIAL QUE RECEBE COMUNICAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE Plínio Leite Nunes ................................. 11 SIGILO BANCÁRIO: APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NO CONFLITO ENTRE PROVA CRIMINAL E PRIVACIDADE Rosimeire Ventura Leite ........................ 13 BUSCA E APREENSÃO DIGITAL: PROVA PENAL ATÍPICA Diego Fajardo Maranha L. de Souza ... 14 A LEI 8.038/90 E O PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL Augusto Jobim do Amaral e Ricardo Jacobsen Gloeckner .................. 16 CADERNO DE JURISPRUDÊNCIA O DIREITO POR QUEM O FAZ RESOLUÇÃO DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL QUE REGULAMENTA A TRANSFERÊNCIA DE PRESOS PARA AS PENITENCIÁRIAS FEDERAIS E DISCIPLINA A EXECUÇÃO PENAL ................... 1129 EMENTAS Supremo Tribunal Federal ................. 1131 Superior Tribunal de Justiça .............. 1132 Tribunais Regionais Federais ............. 1133 Tribunais de Justiça .......................... 1135 A questão da segurança pública esteve em evi- dência durante todo o ano de 2007. Diversos epi- sódios ocorridos no Rio de Janeiro, relacionados ao enfrentamento do crime, bem como o debate público motivado pelo filme “Tropa de Elite”, reclamam uma análise detida, vez que emblemá- ticos para a compreensão do estado da arte das políticas de segurança pública em todo País. Muito nos ensinam as operações especiais nos morros cariocas que consistem em incursões diur- nas, em horários escolares e comerciais, fazendo dos cidadãos que ali vivem vítimas potenciais do fogo cruzado. Em junho, uma mega-operação policial ocorrida no Morro do Alemão vitimou 19 pessoas. Já em outubro, na comunidade da Coréia, uma operação com características seme- lhantes deixou o saldo 16 pessoas mortas, propi- ciando, inclusive, a filmagem da perseguição de um jovem negro, e sua execução sumária por po- liciais que sobrevoavam o local, cenas que foram veiculadas em rede nacional, em horário nobre. Em comum, esses episódios revelam: 1) a ado- ção do método de confronto aberto contra os tra- ficantes de drogas nas intervenções policiais; 2) a acusação recorrente, por parte dos moradores, de que civis não ligados ao tráfico são mortos pelas forças policiais; 3) a divulgação oficial de que to- dos os mortos seriam criminosos; 4) o apoio das autoridades a tais ações, sob a justificativa de que o crime deve ser tratado com pulso firme em prol da garantia da ordem pública. No entanto, a opção pelo confronto aberto con- sagra um método de intervenção policial cujo re- sultado inevitável é a morte de criminosos, mora- dores locais e policiais, autorizando indagar-se por que o desespero e a exposição dos cidadãos pobres que vivem nas áreas de intervenção são tratados como efeitos colaterais de uma guerra, enquanto sabemos que essa mesma batalha, se tra- vada nas áreas em que vive a classe média e classe alta, geraria clamor infindável. Na argumentação do governo carioca, o poder de fogo dos traficantes é muito superior ao dispo- nível às forças de segurança, o que justificaria as incursões periódicas como uma estratégia para reduzir a quantidade de drogas e armas à disposi- ção dos criminosos. Alguns sérios problemas surgem desta opção. O primeiro se refere à própria delimitação do objeto de intervenção, circunscrito às favelas. Se partirmos da constatação de que o armamento pesado utilizado por traficantes não é produzido artesanalmente e que a grande quantidade de dro- gas não é refinada em estabelecimentos locais, concluiremos que a dinâmica que sustenta o trá- fico de drogas não tem origem nesses aglomera- dos urbanos. Apesar da inegável inserção de agen- tes do tráfico nestas áreas, o próprio alvo da inter- venção parece equivocado, na medida em que os grandes fornecedores permanecem com sua es- trutura de distribuição de armamento e drogas inalterada, capaz de abastecer qualquer aglome- rado que não esteja sob intervenção policial. O segundo problema decorre do primeiro. Ao proceder tal delimitação territorial na atuação policial, a Secretaria de Segurança Pública cario- ca transforma as favelas em verdadeiros campos de batalha, ignorando a necessidade de uma pla- nificação estratégica e geo-referenciada, em nome da lógica da guerra, cujo objetivo deixa de ser a proteção dos moradores e a garantia de suas vidas, O problema fica ainda mais complexo quan- do a população brasileira parece cada vez mais receptiva à violência estatal, o que é reforçado pelas repercussões do filme “Tropa de Elite”. Para além do desmantelamento da noção de cidada- nia, a aceitação dessa lógica corrói a própria es- sência do Estado Moderno, vez que confere ao Poder Executivo, no “front de batalha”, a autori- zação para julgar quem é e quem não é o inimi- go, e aplicar sua pena. Já o Poder Judiciário e o Ministério Público tendem a se irrogar equivo- cadamente a função de combater a criminalida- de, olvidando-se de sua função de prover julga- mentos justos, a partir da garantia do cumpri- mento das leis e dos direitos fundamentais. Por fim, o Poder Legislativo, a quem caberia o delinea- mento de uma verdadeira política de segurança pública, se deixa seduzir pelas soluções imedia- tistas voltadas à produção de leis antigarantistas, contribuindo para o esvaziamento do espaço da boa política em prol do espaço da pena. O compromisso do IBCCRIM de defender in- transigentemente o Estado Democrático de Di- reito e as garantias fundamentais impõe que se almeje o aprofundamento do debate, de comple- xidade singular, para que não mais se confundam políticas de segurança pública com polícia, e que se aprimorem as instituições que compõem as for- ças de segurança brasileira bem como as que inte- gram o sistema de justiça. Que o exemplo do Rio de Janeiro, tão longín- quo e tão próximo, nos sirva de combustível para a elevação desse debate, valendo lembrar as atuais palavras de Gilberto Gil e do saudoso Cazuza: “Estranho teu Cristo, Rio Que olha tão longe, além Com os braços sempre abertos, mas sem proteger ninguém.” (1) NOTA NOTA NOTA NOTA NOTA (1) Trecho da letra da canção “Trem para as estrelas”.

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ANO 15 - Nº 181 - Dezembro/2007 - ISSN 1676-3661

15 anos

EDITORIAL:

O COMPLEXO DO ALEMÃO E OUTROS COMPLEXOS

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• EDITORIAL:O COMPLEXO DO ALEMÃOE OUTROS COMPLEXOS .................... 1

• O PROGRAMA NACIONALDE SEGURANÇA PÚBLICACOM CIDANANIA

Pedro Vieira Abramovay eLuiz Guilherme Mendes de Paiva ............ 2

• DELITOS SEM BENS JURÍDICOS?

Ana Elisa Bechara ................................. 4

• A IRRETROATIVIDADE DONOVO ART. 2º, § 2º, DALEI DOS CRIMES HEDIONDOSE A APLICAÇÃO DOART. 112 DA LEP

Roberto Delmanto ................................... 6

• A INCONSTITUCIONALIDADEDOS EFEITOS (MUITAS VEZES)PERENES RESULTANTES DEUM PROCESSO CRIMINAL

Marcel Del Bianco Cestaro .................... 6

• PENITENCIÁRIAS -“A QUESTÃO DA LOCALIZAÇÃO II”- A NECESSIDADE DEUMA POLÍTICA ALTERNATIVA

Wilson Edson Jorge ............................... 8

• O INQUÉRITO POLICIAL É MERAPEÇA INFORMATIVA?

Fábio Motta Lopes ............................... 10

• DA (NECESSIDADE DE)FUNDAMENTAÇÃO DADECISÃO JUDICIAL QUE RECEBECOMUNICAÇÃO DA PRISÃOEM FLAGRANTE

Plínio Leite Nunes ................................. 11

• SIGILO BANCÁRIO:APLICAÇÃO DO PRINCÍPIODA PROPORCIONALIDADENO CONFLITO ENTRE PROVACRIMINAL E PRIVACIDADE

Rosimeire Ventura Leite ........................ 13

• BUSCA E APREENSÃO DIGITAL:PROVA PENAL ATÍPICA

Diego Fajardo Maranha L. de Souza ... 14

• A LEI 8.038/90 E OPRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL

Augusto Jobim do Amaral eRicardo Jacobsen Gloeckner .................. 16

CADERNO DE JURISPRUDÊNCIA

O DIREITO POR QUEM O FAZ

• RESOLUÇÃO DO CONSELHODA JUSTIÇA FEDERAL QUEREGULAMENTA ATRANSFERÊNCIA DE PRESOSPARA AS PENITENCIÁRIASFEDERAIS E DISCIPLINAA EXECUÇÃO PENAL ................... 1129

EMENTAS

• Supremo Tribunal Federal ................. 1131

• Superior Tribunal de Justiça .............. 1132

• Tribunais Regionais Federais ............. 1133

• Tribunais de Justiça .......................... 1135

A questão da segurança pública esteve em evi-dência durante todo o ano de 2007. Diversos epi-sódios ocorridos no Rio de Janeiro, relacionadosao enfrentamento do crime, bem como o debatepúblico motivado pelo filme “Tropa de Elite”,reclamam uma análise detida, vez que emblemá-ticos para a compreensão do estado da arte daspolíticas de segurança pública em todo País.

Muito nos ensinam as operações especiais nosmorros cariocas que consistem em incursões diur-nas, em horários escolares e comerciais, fazendodos cidadãos que ali vivem vítimas potenciais dofogo cruzado. Em junho, uma mega-operaçãopolicial ocorrida no Morro do Alemão vitimou19 pessoas. Já em outubro, na comunidade daCoréia, uma operação com características seme-lhantes deixou o saldo 16 pessoas mortas, propi-ciando, inclusive, a filmagem da perseguição deum jovem negro, e sua execução sumária por po-liciais que sobrevoavam o local, cenas que foramveiculadas em rede nacional, em horário nobre.

Em comum, esses episódios revelam: 1) a ado-ção do método de confronto aberto contra os tra-ficantes de drogas nas intervenções policiais; 2) aacusação recorrente, por parte dos moradores, deque civis não ligados ao tráfico são mortos pelasforças policiais; 3) a divulgação oficial de que to-dos os mortos seriam criminosos; 4) o apoio dasautoridades a tais ações, sob a justificativa de queo crime deve ser tratado com pulso firme em prolda garantia da ordem pública.

No entanto, a opção pelo confronto aberto con-sagra um método de intervenção policial cujo re-sultado inevitável é a morte de criminosos, mora-dores locais e policiais, autorizando indagar-sepor que o desespero e a exposição dos cidadãospobres que vivem nas áreas de intervenção sãotratados como efeitos colaterais de uma guerra,enquanto sabemos que essa mesma batalha, se tra-vada nas áreas em que vive a classe média e classealta, geraria clamor infindável.

Na argumentação do governo carioca, o poderde fogo dos traficantes é muito superior ao dispo-nível às forças de segurança, o que justificaria asincursões periódicas como uma estratégia parareduzir a quantidade de drogas e armas à disposi-ção dos criminosos.

Alguns sérios problemas surgem desta opção.O primeiro se refere à própria delimitação doobjeto de intervenção, circunscrito às favelas. Separtirmos da constatação de que o armamentopesado utilizado por traficantes não é produzidoartesanalmente e que a grande quantidade de dro-gas não é refinada em estabelecimentos locais,concluiremos que a dinâmica que sustenta o trá-fico de drogas não tem origem nesses aglomera-

dos urbanos. Apesar da inegável inserção de agen-tes do tráfico nestas áreas, o próprio alvo da inter-venção parece equivocado, na medida em que osgrandes fornecedores permanecem com sua es-trutura de distribuição de armamento e drogasinalterada, capaz de abastecer qualquer aglome-rado que não esteja sob intervenção policial.

O segundo problema decorre do primeiro. Aoproceder tal delimitação territorial na atuaçãopolicial, a Secretaria de Segurança Pública cario-ca transforma as favelas em verdadeiros camposde batalha, ignorando a necessidade de uma pla-nificação estratégica e geo-referenciada, em nomeda lógica da guerra, cujo objetivo deixa de ser aproteção dos moradores e a garantia de suas vidas,

O problema fica ainda mais complexo quan-do a população brasileira parece cada vez maisreceptiva à violência estatal, o que é reforçadopelas repercussões do filme “Tropa de Elite”. Paraalém do desmantelamento da noção de cidada-nia, a aceitação dessa lógica corrói a própria es-sência do Estado Moderno, vez que confere aoPoder Executivo, no “front de batalha”, a autori-zação para julgar quem é e quem não é o inimi-go, e aplicar sua pena. Já o Poder Judiciário e oMinistério Público tendem a se irrogar equivo-cadamente a função de combater a criminalida-de, olvidando-se de sua função de prover julga-mentos justos, a partir da garantia do cumpri-mento das leis e dos direitos fundamentais. Porfim, o Poder Legislativo, a quem caberia o delinea-mento de uma verdadeira política de segurançapública, se deixa seduzir pelas soluções imedia-tistas voltadas à produção de leis antigarantistas,contribuindo para o esvaziamento do espaço daboa política em prol do espaço da pena.

O compromisso do IBCCRIM de defender in-transigentemente o Estado Democrático de Di-reito e as garantias fundamentais impõe que sealmeje o aprofundamento do debate, de comple-xidade singular, para que não mais se confundampolíticas de segurança pública com polícia, e quese aprimorem as instituições que compõem as for-ças de segurança brasileira bem como as que inte-gram o sistema de justiça.

Que o exemplo do Rio de Janeiro, tão longín-quo e tão próximo, nos sirva de combustível paraa elevação desse debate, valendo lembrar as atuaispalavras de Gilberto Gil e do saudoso Cazuza:

“Estranho teu Cristo, RioQue olha tão longe, alémCom os braços sempre abertos,mas sem proteger ninguém.”(1)

NOTANOTANOTANOTANOTA(1) Trecho da letra da canção “Trem para as estrelas”.

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 20072

Em sua edição de novembro, este Bo-letim publicou o artigo “O ‘novo’ progra-ma nacional de segurança pública”, tecen-do algumas críticas ao Programa Nacio-nal de Segurança Pública com Cidadania- Pronasci, lançado pelo Presidente daRepública em agosto deste ano.

Todo processo de crítica a uma políti-ca pública é importante, seja na fase desua formulação, seja na fase de avaliaçãode seus resultados, seja por meio da pro-posta de mudanças. É por acreditar nissoque o Ministério da Justiça organizoumais de quarenta colóquios, reunindoinúmeros atores sociais —— defensorespúblicos, movimentos de moradia, inte-lectuais, acadêmicos, juízes, promotores,parlamentares e instituições policiais,entre outros, para o processo de formula-ção do Pronasci. As contribuições que seoriginaram nos colóquios foram incorpo-radas, melhorando de forma substantivao projeto apresentado.

É em homenagem a esse espírito crí-tico que se deve, portanto, analisar eponderar algumas das questões levanta-das por ocasião do mencionado artigo,que principia afirmando que o Pronasci“parte de uma premissa parcialmente cor-reta”. Para tanto, vale, de nossa parte,apontar essas premissas para que se pos-sa avaliá-las.

A primeira delas é a de que a violênciano Brasil é um problema complexo, demúltiplas causas e que, portanto, exige so-luções complexas. A segunda é a de quehá experiências de políticas públicas desegurança muito bem sucedidas no Brasile no exterior, e que o Governo Federaldeve multiplicar essas experiências e nãoprocurar soluções miraculosas para en-frentar o problema. A terceira premissa éde que os governos não podem mais ten-tar repartir o problema da violência entreas competências da federação de maneiraestanque: as soluções são locais (e é porisso que falamos sempre nos exemplos desucesso de Bogotá, Nova Iorque, Chica-go e Diadema e não da Colômbia, dosEUA ou do Brasil), mas, como afirma aConstituição, o dever é de todos — devehaver, portanto, um enorme esforço decooperação federativa para se avançar po-sitivamente na questão.

A partir disto é que se deve compreen-der o fato do Pronasci se apresentar com94 ações a serem desenvolvidas pelos

O PROGRAMA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA COM CIDADANIAPedro Vieira Abramovay e Luiz Guilherme Mendes de Paiva

próximos quatro anos. Tais ações não se-rão, evidentemente, impostas ou aplica-das de maneira indistinta em todo o país,mas se trata de um “cardápio” oferecidopelo Governo Federal para a construçãode soluções locais consistentes, pactua-das com os Estados e Municípios.

Dentro desta lógica, o governo se pro-põe a dividir o problema em três frentes:penitenciária, policial e territorial (áreasperiféricas das grandes metrópoles, ondese concentram os maiores índices de vio-lência do país).

O enfrentamento do caos penitenciá-rio brasileiro sempre foi uma pauta ex-clusiva dos defensores de Direitos Hu-manos (e esta ótica não pode nunca dei-xar a centralidade do problema), masnão se pode olvidar que, desde o proces-so de super-encarceramento vivido peloBrasil ao longo dos anos 90, ele tambémse tornou uma questão de Segurança Pú-blica. O presídio hoje não apenas deixade promover a ressocialização do ape-nado, mas é, sobretudo, um elementocriminógeno. As organizações crimino-sas controlam boa parte de nosso siste-ma penitenciário e recrutam para suasfileiras presos que muitas vezes comete-ram delitos menos graves, fazendo comque os presídios se tornem centros dacriminalidade no Brasil.

Se a abolição da pena privativa de li-berdade ainda é uma utopia, o problemado cárcere permanece como uma questãoa ser resolvida. Afinal, a melhoria dascondições dos presídios é alvo de repúdiopor setores conservadores da sociedade,mas deveria ser defendida como meta aser perseguida por um Estado democráti-co e social. Assim, um programa de segu-rança pública que se pretenda sério nãopode deixar de priorizar a questão peni-tenciária, desde que com um enfoque di-ferente do mero aprofundamento destemodelo de construções de verdadeirosdepósitos de gente que só têm feito agra-var o problema.

O Pronasci traz a idéia de remodelar osistema, passando pela construção demais de 30 mil vagas em unidades espe-ciais. Essas unidades, voltadas para jo-vens de 18 a 24 anos e também para mu-lheres (a meta é zerar o déficit de vagasem presídios femininos), terão um forteenfoque educacional, com salas de aula,biblioteca, salas de computação e locais

para prática esportiva, de maneira a cum-prir o preceito do artigo 3º da Lei de Exe-cução Penal, que assegura ao condenadotodos os direitos não atingidos pela sen-tença ou pela lei.

O Ministério da Justiça tem consciên-cia que, mesmo reformulando o paradig-ma penitenciário no Brasil, é fundamen-tal um esforço para que se inverta a lógicade aprisionamento que predomina atual-mente, encarcerando, sobretudo proviso-riamente, pessoas que não deveriam estarpresas. Metade da população carceráriabrasileira é composta por presos provisó-rios. Muitos deles aguardam uma conde-nação a uma pena alternativa. Como for-ma de lidar com esta situação absurda, ogoverno federal está empenhado na apro-vação do Projeto de Lei nº 4.208, de 2001,que estabelece uma série de medidas cau-telares alternativas à prisão e limita a pos-sibilidade de prisão preventiva a crimescom pena máxima acima de 4 anos.

Aliás, não se trata de um projeto isola-do. Faz parte de uma profunda reformado Código de Processo Penal, tambémtratada de forma prioritária pelo Pronas-ci. Pode-se, ante ao limitado espaço, di-zer que a reforma pretende adequar o Có-digo de 1941 à realidade constitucional de1988, conferindo maior agilidade ao pro-cesso e respeitando as garantias do con-traditório e da ampla defesa.

A segunda frente de atuação do Pro-nasci é policial. Felizmente, já há consen-so entre os especialistas em segurança pú-blica sobre a necessidade de se ter umapolítica específica para as polícias. OPrograma apresenta uma série de medi-das nesta área, sendo a principal delas oBolsa-Formação, cujo objetivo inicial erao de estabelecer um piso salarial para po-liciais (para ilustrar o problema, bastadizer que há alguns Estados do país nosquais o salário dos policiais é de cerca deR$ 800,00, com as óbvias conseqüênciassobre a eficiência e motivação dos servi-dores). A oposição da maior parte dos go-vernadores, aliada à necessidade de seconstruir um programa nacional de for-mação de policiais — condição para quese permita uma mudança estrutural daspolícias no país —, levaram ao desenhoatual do programa, que concederá bolsasde até R$ 450,00 para policiais e agentespenitenciários que freqüentarem cursosde formação certificados pela SecretariaO

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 3

(FUNDADO EM 14.10.92)

DIRETORIA DA GESTÃO 2007/2008

DIRETORIA EXECUTIVA

PRESIDENTE: Alberto Silva Franco

1ª VICE-PRESIDENTE: Sérgio Mazina Martins

2º VICE-PRESIDENTE: Theodomiro Dias Neto

1º SECRETÁRI0: Carlos Alberto Pires Mendes

2ª SECRETÁRIA: Paula Bajer FernandesMartins da Costa

1º TESOUREIRO: Ivan Martins Motta

2ª TESOUREIRA: Silvia Helena Furtado Martins

CONSELHO CONSULTIVO:

Carlos Vico MañasMarcio BártoliMarco Antonio Rodrigues NahumMaurício Zanoide de MoraesTatiana Viggiani Bicudo

COORDENADORES-CHEFES:

BIBLIOTECA: Sergio Salomão Shecaira

BOLETIM: Carina Quito

CURSOS: Cristiano Avila Maronna

COMUNICAÇÕES: Renato Sérgio de Lima

ESTUDOS E PROJETOS LEGISLATIVOS:Guilherme Madeira Dezem

INICIAÇÃO CIENTÍFICA: Camila Akemi Perruso

INTERNET: Heloisa Estellita

NÚCLEO DE PESQUISAS: Jacqueline Sinhoretto

PÓS-GRADUAÇÃO: Helena Regina Lobo da Costa

RELAÇÕES INTERNACIONAIS: Marcos AlexandreCoelho Zilli

Representantes do IBCCRIMjunto ao Olapoc:Flávia D’Urso,Glauber CallegariRenata Flores Tybiriçá

REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIASCRIMINAIS: Juliana Garcia Belloque

COMISSÕES:

Presidentes:

CÓDIGO PENAL: Mariângela Gama deMagalhães Gomes

CONVÊNIOS: André Augusto Mendes Machado

HISTÓRIA: Roberto Mauricio Genofre

JUSTIÇA E SEGURANÇA: Renato CamposPinto de Vitto

MEIO AMBIENTE: Adilson Paulo Prudente doAmaral

MESAS DE ESTUDOS E DEBATES: PauloSérgio de Oliveira

MONOGRAFIAS: Andrei Koemer

NÚCLEO DE JURISPRUDÊNCIA: Rui Stoco

POLÍTICA NACIONAL DE DROGAS: Mauridesde Melo Ribeiro

SEMINÁRIO INTERNACIONAL: Carlos VicoMañas

SISTEMA PRISIONAL: Alessandra Teixeira

BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 3

Nacional de Segurança Pública.Ainda com relação à questão policial, o

Executivo encaminhou outros três projetosde lei que alteram os marcos legais nestaárea. O Projeto de Lei nº 1.937/07 regulamen-ta o § 7º do art. 144 da Constituição Federal,constituindo em lei o Sistema Único de Se-gurança Pública, construído ao longo de todagestão do ministro Márcio Thomaz Bastos eque vem sendo muito bem sucedido ao pos-sibilitar um trabalho integrado entre as insti-tuições policiais federais e estaduais. O Pro-jeto de Lei nº 1.949/07 estabelece a Lei Geraldas Polícias Civis, com o objetivo de final-mente estabelecer uma lei nacional que pa-dronize a atividade das polícias judiciáriasestaduais. E, finalmente, o Projeto de Lei nº1.952/07, que cria um novo regime discipli-nar para a Polícia Federal e que pretende serum modelo de legislação para o enfrentamen-to da corrupção policial.

Por fim, aquilo que vem causando maiorpolêmica no Programa: o foco territorial nasáreas periféricas das 11 regiões metropolita-nas mais violentas do país. Há uma clara de-sinformação no debate ao se atribuir ao Pro-grama a criação de projetos sociais. Deve-sedeixar bem claro: todos os projetos do Pronascisão projetos de segurança pública.

O que o Programa faz é reconhecer quenenhuma política de segurança pode ser apli-cada em comunidades nas quais os direitosbásicos dos cidadãos não são respeitados (ounem reconhecidos) pelo próprio Estado.Partindo desse princípio, considerou-se queo Governo Federal deve concentrar progra-mas sociais nas áreas em que será focada apolítica de segurança. Para isso, além da co-incidência de áreas beneficiadas pelos pro-gramas de urbanização do PAC e as áreas doPronasci, o Ministério da Justiça fará desta-que orçamentário para que outros ministéri-os possam investir nessas áreas, além das pre-visões iniciais. Assim, o Ministério da Cul-tura construirá novos pontos de cultura, oMinistério da Educação abrirá mais vagasnos programas de Educação de Jovens eAdultos, o Ministério da Saúde aumentará onúmero de equipes de agentes de saúde. Essalógica se estende a todos os ministérios par-ceiros, e assim se explica a presença de toda aárea social do governo. Afinal, as políticassociais são de competência dessas pastas, epor elas serão aplicadas.

É fundamental esclarecer que o Programanão se coaduna com a lógica de defesa de in-vestimentos sociais em áreas periféricascomo mera política de redução da violência.É essa lógica que defende que a construçãoda Sala Julio Prestes, no centro de São Paulo,é política de cultura, enquanto a construção

de um teatro no Capão Redondo é política desegurança. O Pronasci parte da premissa in-versa: para que se possa realizar uma políticade segurança focada em áreas de periferia, énecessário que o Estado cumpra o seu papelde reconhecimento da cidadania daquelas co-munidades, implementando políticas verda-deiramente emancipatórias. Isso não é polí-tica de segurança, mas é seu pressuposto.

Nesse sentido, há de se destacar a cria-ção de três programas de segurança pública— o Mulheres da Paz, inspirado nas promo-toras legais populares; o Protejo, que identi-fica jovens a um passo da cooptação pelacriminalidade organizada; e o Reservista-Cidadão, que busca atrair os jovens recémsaídos do serviço militar obrigatório, dis-putados pelo tráfico por seus conhecimen-tos bélicos. Tais programas, apesar da pre-visão de bolsas, não têm por objetivo o au-mento de renda de seus beneficiários, masviabilizar a criação de uma rede comunitá-ria que possa ampliar os espaços de resolu-ção não violenta de conflitos.

Há uma série de outros pontos que podemser mencionados: o forte enfoque de gênero,a contratação da Fundação Getúlio Vargaspara a avaliação e monitoramento indepen-dente do Programa, o apoio aos projetos delei sobre remissão por estudo, organizaçõescriminosas, lavagem de dinheiro e Defenso-ria Pública. Também se poderia chamar aatenção para o fato de que o Pronasci impul-siona um debate sobre segurança pública quenão passa pelo aumento da abrangência docontrole penal, pela elevação de penas oupela redução de garantias individuais.

Acreditamos, no entanto, que o que foicolocado até agora permite que o ProgramaNacional de Segurança Pública com Cida-dania seja discutido sobre bases concretas.O Ministério da Justiça tem plena consciên-cia de que este é, necessariamente, um pro-grama em construção e que, assim, serámoldado durante sua implementação. Paraisso, devemos nos colocar absolutamentepermeáveis ao debate público. Só não abri-remos mão da confiança irrestrita na possi-bilidade de se construir um país mais segu-ro com respeito integral aos Direitos Hu-manos e no caminho — determinado pelanossa Constituição — de uma sociedade li-vre, justa e solidária.

Pedro Vieira AbramovayAdvogado, atualmente ocupa a Secretaria de Assuntos

Legislativos do Ministério da Justiça

Luiz Guilherme Mendes de PaivaAdvogado, mestre em Direito Penal pela USP, é chefe de

gabinete da Secretaria de Assuntos Legislativos doMinistério da Justiça

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 20074

DELITOS SEM BENS JURÍDICOS?Ana Elisa Bechara

A teoria do bem jurídico e o modelo decrime como ofensa a um dado bem jurídi-co afirmaram-se, ao longo do tempo, comocritérios de delimitação não só da matériade incriminação, como dos próprios con-tornos da respectiva tutela. Essa herançado Iluminismo refuta modelos de estadoautoritários, permitindo-nos afirmar a le-gitimidade do Direito Penal no EstadoDemocrático de Direito.

A par de referida constatação quanto àfunção de delimitação da noção de bemjurídico, são conhecidos os impactos tra-zidos pela denominada sociedade de riscono âmbito jurídico-penal, em especial noque se refere à antecipação da tutela de bensjurídicos supra-individuais de cunho eco-nômico, ambiental, tecnológico ou de con-sumo, por meio da tipificação crescente decrimes de perigo abstrato, mormente sobforma de crimes de cumulação e de meradesobediência.

Adotou-se, assim, uma técnica legis-lativa assumidamente casuística, que ten-de a considerar o Direito Penal cada vezmais como instrumento de controle aces-sório ao Direito Administrativo. Nessalinha, os tipos penais assemelham-se, nasua forma, às normas de intervenção daAdministração Pública, distanciando-sedos requisitos clássicos da generalidadee da abstração. As normas penais trans-formam-se em instrumentos de adminis-tração de situações particulares, de“emergências” concretas.

Nesse Estado de prevenção dos riscossociais, que conflita diretamente com oDireito Penal do fato, expande-se a esferade discricionariedade das próprias decisõesjudiciais, que assumem caráter programá-tico e político semelhante às leis.(1) Damesma forma, ganha corpo o questiona-mento sobre a configuração do bem jurídi-co, que perde sua densidade. Chega-se adiscutir, na atualidade, a própria importân-cia do conceito de bem jurídico na confi-guração do injusto e, assim, no estabeleci-mento da função do Direito Penal. Diantedesse processo de evolução (ou involução)da Ciência Penal, indaga-se se seria, ainda,de se vedar a incriminação de condutas paraa proteção de algo que não bens jurídicos.Em outras palavras: há delitos sem bensjurídico-penais?

Uma análise detida da legislação penalatual demonstra que, de fato, essa opção decriminalização existe e vem sendo adotadade forma crescente.

Luís Greco noticiou a “moda” alemã derefutar o conceito político-criminal debem jurídico.(2) Para tanto, menciona o

autor, a título de exemplo, os maus-tratospraticados contra animais domésticos (art.32 da Lei Federal n. 9.605/98). Ante a im-possibilidade de identificação do bem ju-rídico tutelado pela norma, haveria, no en-tender de Claus Roxin, três alternativas:afastar a tutela penal do fato; expandir oconceito de bem jurídico para compreen-der também a situação concreta (o que di-lataria excessivamente o conceito de bemjurídico, a ponto de permitir a incrimina-ção de outras situações, de cunho exclusi-vamente ético, moral ou religioso, como ohomossexualismo); ou reconhecer exce-ções à idéia de bem jurídico como objetonecessário da incriminação em casos deespecial fragilidade ou sentimento socialenvolvido (denominados delitos de com-portamento).(3)

A última alternativa, à qual parece ade-rir Roxin, soa perigosa, antes de tudo por-que prescinde da verificação de lesividadee, assim, do próprio referencial da pessoahumana, revelando caráter exclusivamen-te funcional sistêmico. Admitir delitos sembens jurídicos acaba por levar à aceitaçãode um Direito Penal não mais vinculado àproteção subsidiária de bens jurídicos, oque implicaria a consideração funcionalis-ta de Jakobs da missão do Direito Penalenquanto instrumento de proteção da vi-gência da norma.

Toda sociedade é um sistema concre-to de relações entre pessoas, e não, comopretende o funcionalismo sistêmico, sim-plesmente um sistema de regras de com-portamento alçadas a um nível superior.As normas de conduta são, antes de tudo,produto das relações interpessoais huma-nas. E reside justamente aí a origem dosbens jurídicos. Assim, a tarefa de deter-minação de merecimento de proteçãopenal haverá de se desenvolver a partirda superação de discursos ideológicos,analisando-se a realidade do objeto a serprotegido e sua compatibilidade com oEstado Democrático de Direito, e, por-tanto, com a satisfação direta ou indiretade uma necessidade humana.(4)

Assim, o sistema normativo haverá deestar a serviço de algo distinto de si mes-mo: haverá de relacionar-se ao mundo fá-tico. Os indivíduos reais são a causa dosvalores e eles devem refletir seus efeitosnas normas.(5)

A esse ponto, deve-se diferenciar a no-ção de bem jurídico da noção de função,que encerra atividades administrativas doEstado, referentes ao controle sobre deter-minado setor da vida ou de seu próprio or-ganismo. A função não existe por si mes-

ma, sendo caracterizada pela instrumenta-lidade e dependência de uma relação e desuas variáveis. Dessa forma, funções nãotêm caráter de universalidade, sendo sub-metidas a critérios de oportunidade. Bemjurídico é um valor vinculado direta ou in-diretamente à pessoa humana. Mas não ésó. É preciso que esse valor apresente subs-tancialidade, de modo a fundamentar umprocedimento de demonstração de que te-nha sido lesado ou posto em perigo. E, jus-tamente por isso, o bem jurídico penal de-sempenha uma função de validade e eficá-cia da norma.(6) A inserção da lesão ou pe-rigo de lesão a um bem jurídico como pres-suposto da incriminação torna, desde logo,incompatível com um Direito Penal demo-crático a elevação de uma função do Esta-do à categoria de seu objeto de proteçãopenal.(7) E a experiência histórica nos mos-tra que a negação do conceito do bem jurí-dico, ou sua formalização desprovida deconteúdo valorativo, permitem o exercícioabusivo e autoritário do ius puniendi peloEstado, trazendo prejuízos à própria con-dição humana.

Ora, o conceito de Estado Democráticode Direito não se resume à instituição for-mal da divisão de poderes, implicando maisdo que mero Estado de legalidade. Referi-do modelo deve corporificar em si a prote-ção da liberdade e do desenvolvimento pes-soal e político dos cidadãos e a moderaçãoe juridicidade de todo o exercício do poderpúblico.(8) Daí deduz-se que a norma pe-nal apenas é justificável na medida da suanecessidade à proteção das condições devida de uma sociedade estruturada sobre abase da liberdade e da dignidade humana.

A despeito de todo o exposto, são indis-cutíveis as dificuldades práticas vivencia-das pelo operador do Direito Penal no con-texto atual de insegurança social, no qualse demanda ao Estado a adoção de medi-das de controle cada vez mais exacerbadas,ao menos de forma aparente. Contudo, taissoluções não parecem estar — antes detudo, porque se verifica que concretamen-te não possuem eficácia — na conversãoautomática de normas administrativas emtipos penais. O Direito Penal não se prestaa servir de instrumento exclusivo de ga-rantia de funções da Administração.

Isso não significa afirmar que o DireitoPenal não possa estar também voltado à pro-teção da vigência da norma. Referido fimsoa legítimo, mas continua a ser inferior ecomplementar à finalidade maior de tutelasubsidiária de bens jurídicos,(9) que estãoínsitos nas normas por representarem inte-resses suscetíveis de universalização.(10)D

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 5

EDITAL DE CONVOCAÇÃOSão convocados os associados do INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS

CRIMINAIS – IBCCRIM, a se reunirem em Assembléia Geral Ordinária eExtraordinária, a realizar-se no dia 13/12/2007, às 10:00 horas em primeiraconvocação, se houver quórum, ou às 10:30 horas em segunda convocaçãocom qualquer número de associados, na sede social do Instituto, na Rua XI deAgosto, 52, 2º andar, Centro, São Paulo/SP, a fim de deliberarem sobre a seguinteOrdem do Dia:

Assembléia Geral Ordinária e Extraordinária1) Alteração do Estatuto Social nos pontos que seguem:

a) alteração do ar tigo 2º para melhor adequação da descrição dasfinalidades do Instituto;

b) permissão de abertura de filial, sucursal ou agência;c) extinção do Conselho Fiscal;d) adequação da situação das pessoas jurídicas colaboradoras do Instituto;e) demais alterações para fins de melhor organização dos artigos do

Estatuto.2) Aprovação de contas do Instituto;3) Apresentação de relatório de atividades desenvolvidas no ano de 2007;4) Apresentação de propostas de atividades a serem desenvolvidas em 2008;5) Deliberação sobre outros assuntos de interesse do Instituto.

São Paulo, novembro de 2007.

Alberto Silva FrancoDiretor Presidente

COORDENADORES REGIONAIS:

1ª REGIÃO (AP, MA e PA):João Guilherme Lages Mendes

2ª REGIÃO (AC, AM e RR):Fabíola Monteconrado Ghidalevich

3ª REGIÃO (PI, CE e RN):Patrícia de Sá Leitão e Leão

4ª REGIÃO (PB, PE e AL):Oswaldo Trigueiro Filho

5ª REGIÃO (BA e SE):Wellington Cesar Lima e Silva

6ª REGIÃO (RJ e ES):Márcio Barandier

7ª REGIÃO (DF, GO e TO):Pierpaolo Bottini

8ª REGIÃO (MG):Felipe Martins Pinto

9ª REGIÃO (MT, MS e RO):Francisco Afonso Jawsnicker

10ª REGIÃO (SP):Ricardo Guinalz

11ª REGIÃO (PR):Jacinto Nelson de Miranda Coutinho

12ª REGIÃO (RS e SC):Rafael Braude Canterji

BOLETIM IBCCRIM- ISSN 1676-3661 -

COORDENADORA-CHEFE:Carina Quito

COORDENADORES ADJUNTOS:Andre Pires de Andrade Kehdi,Caroline Braun, Cecília Tripodi,Eleonora Rangel Nacif, Fabiana Zanatta Vianae Renato Stanziola Vieira

“A relação completa dos colaboradores doBoletim do IBCCRIM encontra-se em nos-so site.”

DIAGRAMAÇÃO, COMPOSIÇÃO,MONTAGEM E FOTOLITO:Ameruso Artes GráficasTel./Fax (11) 6215-3596E-mail: [email protected]

IMPRESSÃO: Ativa/M - Tel. (11) 6602-3344

“O Boletim do IBCCRIM circula exclusiva-mente entre os associados e membros deentidades conveniadas.”“As opiniões expressas nos artigos publica-dos responsabilizam apenas seus autores enão representam, necessariamente, a opi-nião deste Instituto.”

TIRAGEM: 15.000 exemplares

CORRESPONDÊNCIA IBCCRIMRua Onze de Agosto, 52 - 2º andarCEP 01018-010 - S. Paulo - SPTel.: (11) 3105-4607 (tronco-chave)

ATENDIMENTO DIGITALSeções:Administrativo Financeiro ......................... 2Comunicação e Eventos .......................... 3Biblioteca ................................................. 4Diretoria/Presidência ................................ 5Internet .................................................... 6Secretaria ................................................ 7Núcleo de Pesquisas ............................... 8www.ibccrim.org.brE-mail: [email protected] e

[email protected]

BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 5

Assim, mesmo diante do desenvolvi-mento social atual e das tentações voltadasa novas incriminações, a existência de umbem jurídico e a demonstração de sua le-são ou colocação em perigo constituem,ainda, pressupostos indeclináveis do injus-to penal. De forma mais direta: o bem jurí-dico ainda é irrenunciável, como núcleonegativo e crítico do Direito Penal, confe-rindo-lhe sua missão.

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS

(1) BARATTA, Alessandro. “Funções instrumentais e sim-bólicas do direito penal. Lineamentos de uma teoria dobem jurídico”, Revista Brasileira de Ciências Crimi-nais, Ano 2, n. 5 – jan. 1994, p. 12.

(2) “Princípio da ofensividade e crimes de perigo abstra-to”, Revista Brasileira de Ciências Criminais, Ano12, n. 49, julho-agosto 2004, pp. 97 e ss.

(3) GRECO, Luís. Princípio da Ofensividade..., ob. cit., p.109.

(4) HORMAZÁBAL MALARÉE, Hernán. Bien Jurídico y Es-tado Social y Democrático de Derecho (El Objeto Prote-gido por la Norma Pena). Barcelona: PPU, 1991, p. 161.

(5) MIR PUIG, Santiago. “Limites del normativismo enderecho penal”, Revista Brasileira de Ciências Cri-minais, Ano 15, n. 64, 2007, p. 215.

(6) TAVARES, Juarez. Teoria do Injusto Penal. 2ª ed., BeloHorizonte: Del Rey, 2002, pp. 205 e ss. No mesmo

sentido, v. Luigi FERRAJOLI. Derecho y Razón. 2ª ed.,trad. André Ibeñez, Alfonso Ruiz Miguel, Juan CarlosBayón Mohino, Juan Tarradillos Basoco e RocioCantarero Bandrés. Madrid: Trotta, 1997, p. 467.

(7) MATA BARRANCO, Norberto; MATA BARRANCO,Ignácio. “La figura de la autorización en la lesión debienes jurídico-penales de caráter supraindividual”, in:Dogmática y Lei Penal. Livro em homenagem a EnriqueBacigalupo. Jacobo López Barja Quiroga e José Mi-guel Zugaldía Espinar (coord.). Tomo I. Madrid: Mar-cial Pons, 2004, p. 487.

(8) RUDOLPHI, Hans-Joachim. “Los diferentes aspectosdel concepto de bien jurídico”, trad. Enrique Bacigalu-po. Nuevo Pensamiento Penal. Revista de Derecho yCiencias Penales. Ano 04, ns. 5 a 8. Buenos Aires:Depalma, 1975, pp. 329-347.

(9) Nesse sentido, conforme esclarece Rafael AlcácerGuirao, “o que permite ao cidadão participar das rela-ções sociais e desenvolver livremente os seus fins pes-soais é a efetiva existência desses bens e não a meraconfiança na continuidade dessa existência. É o fato deestar vivo e não a confiança em que continuará vivo”.“Proteção de bens jurídicos ou proteção da vigência doordenamento jurídico?”, Revista Portuguesa de CiênciaCriminal, Ano 15, n. 4, out/2005, p. 554

(10) CAMARGO, Antonio Luís Chaves. Imputação Objetivae Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Cultural Paulista,2001, p. 126.

Ana Elisa BecharaDoutora em Direito Penal pela USP

e advogada criminalista

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 20076

A IRRETROATIVIDADE DO NOVO ART. 2º, § 2º, DALEI DOS CRIMES HEDIONDOS E A APLICAÇÃO DO ART. 112 DA LEPRoberto Delmanto

O art. 33, § 2º, do Código Penal, comredação dada pela reforma de 84 (Lei nº7.209 daquele ano), prevê que “as penas pri-vativas de liberdade deverão ser executadas emforma progressiva”.

O art. 112 da LEP (Lei nº 7.210/84) dis-põe, a seu turno, que caberá “a transferên-cia para regime menos rigoroso” quando ocondenado, atendidos outros requisitos le-gais, “tiver cumprido ao menos um sexto dapena no regime anterior”.

Com o advento da Lei dos Crimes He-diondos (Lei nº 8.072/90), passou-se a proi-bir a progressão de regime para os delitosnela elencados, preceituando o art. 2º, § 1º,que a sua pena “será cumprida integralmen-te em regime fechado”.

Após longo debate doutrinário e juris-prudencial sobreveio o histórico julga-mento , em 23.02.06, do HC nº 82.959-7/SP pelo Pleno do STF que, por maioria devotos, em v. acórdão relatado pelo ínclitomin. Marco Aurélio, decidiu pela incons-titucionalidade do referido art. 2º, § 1º, daLei nº 8.072/90.

No mesmo aresto, a Excelsa Corte, àunanimidade, “explicitou que a declaraçãoincidental de inconstitucionalidade do preceitolegal em questão não gerará conseqüênciasjurídicas com relação às penas já extintas nes-ta data, pois esta decisão plenária envolve,unicamente, o afastamento do óbice represen-tado pela norma ora declarada inconstitu-cional” (p. 727 e última do acórdão). Gera-

rá, portanto, conseqüências jurídicas paraas penas até então não extintas.

Como reação a essa decisão, sobreveiomenos de um ano depois, em 28.03.07, aLei nº 11.464, que deu nova redação aos §§1º e 2º da Lei nº 8.072/90, estabelecendo,quanto aos crimes hediondos e aos a elesequiparados, que sua pena “será cumpridainicialmente em regime fechado” (§ 1º) e que“a progressão de regime ... dar-se-á após ocumprimento de 2/5 (dois quintos) da penase o apenado for primário, e de 3/5 (três quin-tos), se reincidente”.

Em face dessa alteração legislativa, oColendo Superior Tribunal de Justiça, em v.aresto da sua 5ª Turma, no julgamento doREsp. nº 939.817/SP, ocorrido em 19 de ju-nho último, relatado pelo eminente min.Gilson Dipp, aplicou o novo art. 2º, § 1º, daLei nº 8.072/90 para fato anterior a 29.03.07,data da publicação e entrada em vigor daLei nº 11.464, ressaltando que “a questão res-tou dirimida para estabelecer o regime inicial-mente fechado de cumprimento de penas” paraos crimes hediondos. Reconheceu, portan-to, a retroatividade de lei penal mais benéfi-ca (novo art. 2º, § 1º), não abordando o ares-to a questão do novel art. 2º, § 2º.

Quanto a este, entendemos que, para fa-tos anteriores a 29.03.07, o przazo para pro-gressão de regime dos crimes hediondos eequiparados deverá ser aquele previsto peloart. 112 da LEP, qual seja, o de 1/6 (um sex-to), não fazendo esse dispositivo distinção

entre condenados primários e reinciden-tes. Isto, tratando-se de processos com pe-nas ainda não extintas até 23.02.06, confor-me explicitado pelo Pleno do STF no ares-to citado, já que, obviamente, para penasextintas não há que se falar em progressãode regime.

Com efeito, se a inconstitucionalidadedo antigo § 1º do art. 2º da Lei dos CrimesHediondos foi declarada, o dispositivo aser aplicado para os fatos ocorridos antesde 29.03.07, data da entrada em vigor Lei nº11.464, haverá de ser, necessariamente, o doart. 112 da LEP.

Caso contrário, estar-se-ia dando efeitoretroativo a um dispositivo penal maléfico(novo § 2º do art. 2º da Lei dos CrimesHediondos), o que é expressamente veda-do pelo nosso ordenamento jurídico, tantoa nível constitucional (CF, art. 5º, XL)quanto ordinário (CP, arts. 1º c/c 2º, pará-grafo único).

Nesse sentido, bem decidiu o EgrégioTribunal de Justiça do Rio Grande do Sulno julgamento do Agr. Exec. 700119978907,ao assentar, quanto à Lei nº 11.467/07, que“tratando-se de lei mais gravosa, resta man-tido o prazo comum do art. 112 da Lei de Exe-cução Penal, ou seja, 1/6”, conforme acór-dão citado no Boletim IBCCRIM de agos-to de 2007, p. 1.112.

Roberto DelmantoAdvogado criminalistaA

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A INCONSTITUCIONALIDADE DOS EFEITOS (MUITAS VEZES)PERENES RESULTANTES DE UM PROCESSO CRIMINALMarcel Del Bianco Cestaro

Para falar do assunto, podemos citarcomo exemplo, entre outros, a Lei Mu-nicipal nº 7.369/69, que versa sobre o ser-viço de transporte de passageiros pormeio de táxi na cidade de São Paulo, dis-pondo que esta atividade somente pode-rá ser exercida mediante prévia e expres-sa autorização da prefeitura, a qual ou-torgará ao interessado Termo de Permis-são e Alvará de Estacionamento. Ocorreque o artigo 5º da Lei 7.329/69, em seuparágrafo único, alínea “a”, veda ao con-denado pela prática de crime doloso apossibilidade de se inscrever no Cadas-tro Municipal de Empresas de Táxis, edeste modo, cria impedimento para queeste possa participar, na qualidade de só-cio, de empresa com esta destinação so-cial. No mesmo sentido, o artigo 9º, § 1º,

alínea “a”, da citada lei, faz a mesma exi-gência para que o motorista profissionalconsiga realizar sua inscrição no Cadas-tro Municipal de Condutores de Táxis.

Em conseqüência disto, comparecemà Defensoria Pública, diariamente, mui-tas pessoas que não conseguem obter oalvará para atuar no ramo de transporteindividual de passageiros em razão domencionado óbice legal, ainda que játenham cumprido a pena imposta hámuito tempo, tendo em vista que a lei nãoestabelece um prazo dentro do qual acondenação por crime doloso impediriaa obtenção da inscrição.

É inconteste que tais dispositivos vio-lam diretamente princípios estabelecidosna Constituição Federal, sendo constadosvícios de natureza formal e material.

I - Da inconstitucionalidade formalA Constituição Federal brasileira, ao

adotar como forma de Estado o federalis-mo, conferiu às pessoas políticas autono-mia para exercerem atividades adminis-trativa, legislativa e tributária. Todavia,esta autonomia não é absoluta, pois cadaentidade deve atuar dentro dos limites desua competência. O critério utilizado paraa repartição de competências é estabele-cido pela Constituição Federal de acordocom o âmbito de abrangência da matéria.

Deste modo, cumpre à União disporsobre as matérias e questões em que hajapredominância do interesse geral nos ter-mos do artigo 22, da Constituição Fede-ral. Dentre tais matérias, está a compe-tência privativa da União para legislar so-bre Direito Penal.(1) Assim, cumpre priva-A

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tivamente à União legislar sobre matériapenal, competência esta que abrange todoo conjunto de medidas que disciplinam odireito de punir do Estado, seja definindocondutas criminosas e impondo uma san-ção, seja dispondo sobre os limites e apli-cação das normas incriminadoras.

Ocorre que a Lei Municipal 7.329/69,ao impedir que o cidadão condenado porcrime doloso possa explorar a atividadede transporte de passageiros por meio detáxi, está extrapolando a esfera de compe-tência atribuída aos municípios,(2) umavez que tal impedimento nada mais é doque verdadeiro efeito secundário da con-denação, e como tal integra o conceito denorma penal.

A norma penal pode ser vista sob doisaspectos: o sentido estrito e o sentido am-plo. Pelo primeiro, são aquelas que defi-nem os tipos penais e cominam as respec-tivas sanções. Já no sentido amplo, nor-mas penais são aquelas que possuem con-teúdo explicativo, fornecendo princípiosgerais para aplicação das penas como, porexemplo, os dispositivos referentes à fixa-ção da reprimenda, ou então, aquelas quenão consideram como ilícitos ou isentamde pena o autor de fatos aparentementetípicos. É, portanto, nesta categoria que seenquadram os dispositivos acima mencio-nados, os quais são de competência priva-tiva da União.

Ao vedar a inscrição no Cadastro Mu-nicipal de Condutores de Táxis para osjá condenados por crime doloso, a leimunicipal cria verdadeiro efeito secun-dário da condenação, como os previstosnos artigos 91 e 92, do Código Penal. As-sim, o condenado por crime doloso, alémde ter de cumprir a pena prevista no tipopenal em que foi incurso, terá de se sub-meter às restrições impostas pelos men-cionados artigos da Lei Penal, como, porexemplo, perder, em favor da União, oproduto do crime. Ainda, de acordo coma Lei 7.329/69, não poderá, nunca mais,ser taxista na cidade de São Paulo, já quea lei é municipal.

Patente ser um efeito secundário dacondenação, o que evidencia o caráter pe-nal da norma e sua conseqüente inconsti-tucionalidade, por ofender competênciaprivativa da União, já que estamos diantede uma lei municipal, que, inadvertida-mente, acabou por tratar de matéria pe-nal, ainda que de forma indireta, restrin-gindo direitos, de forma perene, do con-denado por crime doloso.

Importante salientar que o princípiodo devido procedimento legislativo é co-rolário do princípio da legalidade, um dospilares do ordenamento jurídico pátrio.Por conseguinte, a lei elaborada em desa-cordo com os ditames do procedimento

legislativo estabelecido na ConstituiçãoFederal, seja porque desrespeitou deter-minado quorum de aprovação, seja por-que versou sobre matéria de competênciade outra pessoa política, como ocorre nocaso em estudo, já é, desde sua elabora-ção, inconstitucional.

II - Da inconstitucionalidade materialAlém de formalmente inconstitucio-

nal, a Lei Municipal nº 7.329/69 tambémviola as garantias expostas na Constitui-ção Federal, na medida em que ofende osprincípios da hu-manidade, da cul-pabilidade e daisonomia.

Pelo princípioda humanidade,qualquer ato nor-mativo que tragaem seu bojo dis-positivos de natu-reza penal deveatentar para aidéia de humani-zação das penascriminais, o quesignifica dizer quea lei não poderápunir qualquerpessoa além dos limites da razoabilida-de. Seguindo este raciocínio, o legisladorconstituinte, no artigo 5º, inciso XLVII,vedou a aplicação de penas que ofendama dignidade humana, dentre elas a de ca-ráter perpétuo. Desta forma, constituiviolação à Constituição Federal tododispositivo penal que estenda determi-nado efeito da pena de forma permanen-te, ad aeternum.

Conforme visto, a proibição de exerceratividade profissional em razão da práticade crime doloso constitui efeito secundá-rio da condenação e, como tal, deve inci-dir dentro de um determinado limite tem-poral a ser fixado de acordo com a culpa-bilidade do agente.

Os efeitos da condenação previstos nosartigos 91 e 92 do Código Penal não sãoperenes, já que, ou possuem um fim em simesmos, se esgotando com a sanção ex-posta (v.g. perda dos instrumentos do cri-me, produto ou qualquer valor advindo daprática criminosa), ou podem cessar pormeio da reabilitação criminal, conformepossibilita o artigo 93, parágrafo único, doCódigo Penal.

Todavia, a lei municipal em comentonão estipulou o período de tempo no quala condenação por crime doloso continua-ria surtindo efeitos, ao contrário do quefez o Código Penal. Tal circunstânciaconstitui flagrante inconstitucionalidade,pois atribui caráter perpétuo aos efeitos

da pena, fazendo com que um condenadopor crime doloso seja impedido pelo res-to de sua vida de exercer a profissão detaxista na cidade de São Paulo.

A lei municipal em comento desrespei-ta a Constituição e estigmatiza o conde-nado, indo contra a sistemática previstana Lei de Execução Penal, que, em seuartigo 202, determina que, após cumpridaou extinta a pena, não se fornecerá qual-quer notícia sobre a condenação, salvo parainstruir processo pela prática de nova infra-ção. Assim, cumprida a reprimenda, devem

também cessar osefeitos secundá-rios da condena-ção, entre eles avedação impostapela lei municipal.

Além disso, écerto que nenhu-ma pessoa deve serdiscriminada porcondutas anterio-res, ainda maisquando a ativida-de profissionalpretendida nãoguardar nenhumarelação com o cri-me anteriormente

cometido. Trata-se do princípio da culpa-bilidade, do qual se extrai que a censurapenal deve ser aplicada diante de um fatoconcreto e não em razão da personalidadedo agente. Os efeitos da condenação nãodevem acompanhar uma pessoa por todasua vida, mas devem atingi-la somente naexata medida de sua culpabilidade, aten-dendo assim, à verdadeira função da pena.Nestes termos, possibilitar ao indivíduocondenado por certo crime a chance de sereinserir na sociedade é dever do Estadoem respeito ao Regime Democrático deDireito.(3)

III - A questão do sigilo dos dadosIII - do Sistema do IIRGD

Em que pese o já mencionado artigo202 da Lei de Execução Penal determinaro sigilo automático dos dados relativos aprocessos nos quais as penas aplicadas jáforam extintas, a prática no Estado de SãoPaulo mostra que, muitas vezes, o dispo-sitivo legal é desrespeitado. Primeiro,porque o sigilo dos dados, na maioria dasvezes, não é feito automaticamente comomanda lei, mas depende de provocação dointeressado, gerando um procedimentoque pode demandar longa espera. Segun-do, porque mesmo com o sigilo já forma-lizado, não há controle sobre a freqüenteviolação de tais dados por empregadorese agências de empregos.

Mencionada situação constitui flagran-

É certo que nenhuma pessoa deveser discriminada por condutas

anteriores, ainda mais quando aatividade profissional pretendida não

guardar nenhuma relação com ocrime anteriormente cometido. Trata-se do princípio da culpabilidade, doqual se extrai que a censura penaldeve ser aplicada diante de um fato

concreto e não em razão dapersonalidade do agente.

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 20078

te violação aos direitos fundamentais dosentenciado que já cumpriu sua pena in-tegralmente, eis que perfaz verdadeiroefeito secundário perene da pena aplica-da. Em outras palavras, o cidadão que jáfoi condenado em um processo penal noEstado de São Paulo encontra sérias difi-culdades para obter o sigilo dos dados doprocesso que ostentou depois de ter extin-ta sua punibilidade. Quando conseguerealizar tal feito, ainda sim, percebe queseus eventuais empregadores têm acessoaos dados que deveriam ser sigilosos, difi-cultando sobremaneira a obtenção deuma ocupação e o conseqüente retorno aoconvívio social.

Tendo em vista esta inaceitável situa-ção, o Egrégio Superior Tribunal de Justi-ça tem determinado a exclusão definitivados dados de processos criminais nosquais o réu foi absolvido ou teve extintasua punibilidade, sem anterior condena-ção.(4) Isto porque, tanto o revogado artigo748, do Código de Processo Penal, quantoo artigo 202, da Lei de Execução Penal,não impedem a exclusão desses registrospelo singelo fato de mencionados artigoslegais tratarem do sigilo de dados no casode cumprimento ou extinção da pena, ouseja, quando efetivamente houve conde-nação. A exclusão dos dados, mais do quenão violar os dispositivos legais do Códi-

go de Processo Penal e da Lei de Execu-ção Penal, dá eficácia plena ao princípioconstitucional do estado de inocência.Por outro lado, a negativa de alguns juízesem proceder desta maneira sob o argu-mento de respeito à lei processual penal,acaba por violar de maneira frontal oprincípio constitucional mencionado,sendo tal decisão, além de ilegal, incons-titucional e em total dissonância comque se espera de uma prestação jurisdi-cional efetiva, que pacifique a sociedadee possibilite a plena efetividade dos di-reitos fundamentais do cidadão.

A exclusão dos dados nos casos aquitratados é a única maneira daquele quenão foi condenado em um processo penaldeixar de ser estigmatizado em virtude dealgo que não cometeu. Nem se diga que osigilo dos dados do processo impede talconstrangimento, eis que a prática temdemonstrado, a cada dia — e isso é notó-rio —, que os empregadores acabam ten-do acesso aos dados sigilosos, o que, por sisó, exclui muitas chances de emprego.

Quanto àqueles que foram condena-dos, mas já cumpriram a pena impostapelo Estado, não se pode proceder damesma maneira, tendo em vista a exigên-cia do já citado artigo 202, da Lei de Exe-cução Penal. Por outro lado, não se podeadmitir que uma passagem criminal iso-

lada, cuja sanção imposta pelo Estado jáfoi cumprida, se torne um óbice eterno eintransponível, impedindo o recomeço deuma vida em sociedade. Assim, para seefetivar a proteção dos direitos funda-mentais do cidadão, não se pode negar apossibilidade de eventual exclusão de da-dos quando for patente e provada a viola-ção ao sigilo, prestigiando-se, nesse pas-so, as normas constitucionais que infor-mam o restante do ordenamento jurídico,cabendo ao aplicador da lei sempre lhesconferir a devida efetividade.

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS

(1) Artigo 22, inciso I, da Constituição Federal.(2) Artigo 30 da Constituição Federal.(3) Nesse sentido, merece destaque o disposto no ar-

tigo 5º, n. 6, da Convenção Americana sobre Direi-tos Humanos, da qual o Brasil é signatário: “Aspenas privativas de liberdade devem ter por finali-dade essencial a reforma e a readaptação socialdos condenados.”

(4) “Recurso Ordinário em Mandado de Segurança.Inquérito Policial arquivado. Absolvição. Processopenal. Cancelamento de registro na folha de ante-cedentes. Possibilidade. Recurso Provido” (Recur-so em Mandado de Segurança nº 15.634-SP, rel.min. Hamilton Carvalhido).

Marcel Del Bianco CestaroDefensor Público atuante na 9ª Vara Criminal do Fórum

Central e membro colaborador do Núcleo de SituaçãoCarcerária da Defensoria Pública de São Paulo

PENITENCIÁRIAS – “A QUESTÃO DA LOCALIZAÇÃO II”- A NECESSIDADE DE UMA POLÍTICA ALTERNATIVAWilson Edson Jorge

Tivemos a oportunidade de abordar oassunto acima no Boletim nº 120, ano 10,Novembro de 2002. Nele procuramos de-monstrar que a política de localização daspenitenciárias praticada pelos governosdo Estado de São Paulo apresentava insu-ficiências em vários exemplos, basica-mente: por localizar as penitenciáriaslonge da origem dos presos, dificultandoos contatos com sua família; por não teruma política de terras adequada às de-mandas das instalações do Estado, op-tando por terrenos pouco adequados masde sua propriedade; por depender de pre-feitos, principalmente nas localizaçõesno interior do Estado, na cessão de terre-nos destinados aos edifícios prisionais,muitas vezes em áreas inadequadas; porse sujeitar a pressões, atualmente ocor-rendo na grande maioria dos municípios,contra a localização de presídios em seusterritórios.

A necessidade de voltar a esse assunto(por isso o II do título) nos parece im-portante pelo recente anúncio do gover-nador José Serra (v. o jornal O Estado de

S.Paulo, 15/10/07, p. C1) da implantaçãode 44 novos presídios até o ano de 2010,com capacidade para 30 mil detentos. Dasinformações na reportagem, ressaltam-se:“Um dos principais desafios será convenceros prefeitos receberem as unidades” e, con-traditoriamente: “Muitas vezes os terrenoscedidos ficavam em lugares impróprios, o quelevava o governo a ser alvo de ações na Justi-ça e a gastar mais na construção.”

É importante assinalar que entre asquatro regiões citadas na reportagemcomo as mais problemáticas pelos défi-cits atuais de vagas, três são muito próxi-mas ou ligadas à Região Metropolitanade São Paulo: Carapicuíba-Cotia, Cam-pinas-Indaiatuba, Votorantim. Ressalta-se também na reportagem a declaraçãodo secretário Antonio Ferreira Pinto deque “... a idéia é regionalizar o sistema paraque o preso fique em unidades perto da fa-mília” e que o Estado em vez de esperar acessão de lotes, pretende desapropriarterrenos. “São locais próximos de redes elé-tricas, de água, esgoto, sem grandes necessi-dades de terraplenagem.”

O que se pode depreender daquelas de-clarações envolvendo a política de edifi-cações prisionais é que o Estado de SãoPaulo irá implantar uma quantidade im-pressionante, mas necessária, de novospresídios, face ao déficit crescente de va-gas, mas sem nenhuma alternativa maisampla para a política de implantação quepossa ser contraposta e avaliada face àatual, que termina por ser bastante casuís-tica. Segundo aquela reportagem acimacitada, as novidades, bem-vindas, são queo Governo do Estado pretende não maisaceitar terrenos inadequados dos prefei-tos, passando a adotar uma política deaquisição de terrenos melhor localizadose que irá atender às demandas regionaiscom a implantação de novos presídios naspróprias regiões, o que parece algo de ab-soluto bom senso. Porém, observa-se queo secretário, ao caracterizar os terrenos aserem desapropriados, salienta que osmesmos deverão estar providos de redeselétricas, de água, esgoto, sem grande ne-cessidade de terraplenagem. Ora, tais ter-renos, devidamente equipados com infra-P

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estrutura, só existem em cidades, o queimplicará em custos de desapropriação al-tos, comparados, por exemplo, a terrenosrurais, em princípio sem aquelas infra-es-truturas. Voltaremos a essa alternativa.

Não se fala na reportagem citada dosdéficits em vagas prisionais da RegiãoMetropolitana de São Paulo que contémpraticamente metade da população doEstado. Não se fala também em uma po-lítica de localização para o futuro, a mé-dio e longo prazo, já que entram atual-mente 6 mil presos no sistema prisionaldo Estado.

Diante de tal quadro, onde fica explí-cita uma política de localização sem al-ternativas que pudessem indicar solu-ções mais vantajosas, consideramos im-portante apresentar uma alternativa comsolução de localização diferenciada emais vantajosa para enfrentar os proble-mas crescentes ou que vêm permeandoas políticas de localização do setor pre-sidiário, praticadas pelos progressivosGovernos do Estado.

Essa proposta alternativa de localiza-ção se baseia nas seguintes premissas:• Adotar a concentração e não a disper-

são de edifícios prisionais pelo territó-rio do Estado. Essa concentração favo-rece amplamente uma política de gran-de porte como a do Governo do Esta-do, que implica na implantação de 44novos estabelecimentos em prazo ra-zoavelmente curto.

• O território da Região Metropolitana deSão Paulo não oferece mais terrenosadequados ou suficientes para satisfa-zer seus déficits atuais e futuras deman-das de novas vagas penitenciárias, tantopelos altos custos dos terrenos, comopela predominância de altas declivida-des que caracterizam as áreas ainda nãourbanizadas — o que implica em novose vultosos custos para sua adequação fí-sica às edificações. A alternativa de so-luções verticais, ocupando terrenos me-nores, precisaria de uma avaliação cri-teriosa que ainda não foi feita.

• Os custos de terrenos urbanos adequa-dos às penitenciárias não só serão altos,como terão valores crescentes. Qual-quer política de implantação a longoprazo que precise ser concebida desdejá exige a criação de uma reserva de ter-renos, de forma que seu custo não se tor-ne proibitivo, com as valorizações cres-centes, inclusive por efeito da ação dopróprio Estado, no caso, construindonovas penitenciárias.Isso considerado, a proposta alternati-

va de localização dos presídios tem asprincipais seguintes características:• A implantação concentrada de presí-

dios, contiguamente, favorecendo eco-nomias de escala e de aglomeração ad-

vindas dessa concentração, isto é, cons-truindo uma série de presídios e seusserviços, de forma planejada, em umamesma área contínua fisicamente.

• A localização desses complexos peni-tenciários próximos das áreas urbanasde onde procederão os presos a elesdestinados e os funcionários do com-plexo. Essa proximidade pode signifi-car de 1 a 1,5 horas de viagem do localao centro das aglomerações urbanasconsideradas.

• Os terrenos a serem desapropriados, de-vidamente selecionados, estarão emáreas hoje rurais, mas favoráveis em re-lação aos custos de implantação, acessi-bilidade a rodovias regionais, topogra-fia favorável, proximidades de redes deenergia, dispo-nibilidade deágua (de super-fície ou subter-râneas).

• É fundamentalum estudo ini-cial que selecio-ne áreas adequa-das e que compa-re os custos dei m p l a n t a ç ã ocom a alternati-va de terrenosurbanos, consi-derando os cus-tos de desapro-priação, de im-plantação (in-clusive os custosde infra-estrutura). No caso da alternati-va concentradora, será importante calcu-lar os custos das penitenciárias ou dasedificações prisionais sucessivas, pois oscustos unitários diminuirão nas unida-des seguintes pelas economias de aglo-meração e de escala que incidirão nocomplexo.

• Serviços a serem implantados, comopor exemplo, o tratamento de esgotosque tem sido um elemento crítico paraa aprovação dos órgãos ambientais, po-derá estar equacionado para o conjun-to de penitenciárias do complexo, comuma implantação modular, progressi-va. A aprovação do conjunto de módu-los seria global, liberando as implanta-ções seguintes da repetição do proces-so de aprovação.

• Os grupos de residências que estão obri-gatoriamente vinculadas a cada peniten-ciária, do diretor mais outros funcioná-rios de funções estratégicas, poderãoconstituir conjuntos maiores, viabili-zando a implantação de serviços e faci-lidades a seus habitantes.

• Os contingentes da Polícia Militartambém poderão estar agregados, em

parte, garantindo melhores condiçõesde segurança para cada unidade prisio-nal do complexo.

• Itens onerosos como muralhas ou ou-tros separadores físicos de segurançapoderão ser comuns a duas unidades, fa-cilitando a implantação e diminuindoseus custos.

• O custo de implantação do canteiro deobras, caso seja localizado em área estra-tégica, diminuirá sensivelmente a partirda implantação progressiva das peniten-ciárias.A proposta alternativa de localização de

penitenciárias, ou seja, da localização con-centrada, será fundamental para a soluçãodos déficits de vagas na Região Metropolita-na de São Paulo e suas cercanias. Insistimos

que, para esse caso,não será possíveluma solução queprocure resolvercaso a caso a im-plantação daquelesedifícios, o que le-varia a um desgastesuperior em recur-sos e em logística.

Por outro lado,a decisão do Go-verno do Estadoem realizar inves-timentos maciçospara o setor leva-rá a uma maximi-zação das vanta-gens da alternati-va de localização

concentrada, pois os módulos implanta-dos a curto e médio prazo possibilitarãoa obtenção, sem maiores delongas, da-quelas vantagens. O complexo próximoà Região Metropolitana de São Paulo po-derá abrigar, pelo menos, 20 penitenciá-rias, ou poder-se-á optar por dois com-plexos menores. O número de penitenci-árias por complexo dependerá da consi-deração de outras variáveis, porém seuporte deve ser pensado para um númeropróximo daquele citado.

De qualquer forma, consideramosfundamental que haja um posicionamen-to desse Governo em face de alternativasde localização como essa que apresenta-mos como condição de aprimoramentoda política penitenciária. Isso não signi-ficará atrasos nem maiores investimen-tos, mas a chance de uma nova contribui-ção e resultados mais favoráveis para en-frentar os imensos problemas envolvidosna área prisional.

Wilson Edson JorgeProfessor titular do Departamento de Projeto da FAU

da USP. Pesquisador e autor de projetos prisionaispara o Estado de São Paulo.

A proposta alternativa de localizaçãode penitenciárias, ou seja, dalocalização concentrada, será

fundamental para a solução dosdéficits de vagas na Região

Metropolitana de São Paulo e suascercanias. Insistimos que, para essecaso, não será possível uma soluçãoque procure resolver caso a caso a

implantação daqueles edifícios, o quelevaria a um desgaste superior em

recursos e em logística.

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O INQUÉRITO POLICIAL É MERA PEÇA INFORMATIVA?Fábio Motta Lopes

Parte da doutrina tem sustentado que oinquérito policial, apesar de estar carrega-do de provas que são definitivas,(1) não pas-sa de mera peça informativa,(2) linha quetambém vem sendo adotada pela jurispru-dência.(3) Não obstante, trata-se de “crençainfundada”,(4) conforme se passa a mostrar.

Existe no inquérito policial, efetivamen-te, instrução criminal, provisória ou defi-nitiva. Do contrário, questiona Pitombo,não haveria como justificar o recebimentoou a rejeição da acusação, as buscas eapreensões, as perícias e os atos decisóriosde arquivamento do procedimento.(5)

Sabidamente, as provas colhidas na eta-pa preliminar, se não confirmadas em juí-zo, sob o crivo do contraditório e da ampladefesa, não devem servir de base a umacondenação. A unilateralidade das investi-gações realizadas pela Polícia Judiciária nãopermite uma decisão condenatória ampa-rada, unicamente, no inquérito policial.(6)

Na prática, contudo, os atos realizadosnessa fase podem possuir relevância na fu-tura relação processual, principalmenteporque, em muitos casos, influenciam, sub-jetivamente, o magistrado que julgará.

Adverte Gomes Filho que “não se temnotícia de decisão excluindo peremptoriamentea possibilidade de utilização dos elementos doinquérito como prova, mesmo no plenário doJúri”.(7)

Coutinho, aliás, vai além e afirma que,diariamente, réus são condenados no Bra-sil “a partir de juízos formados com base naprova do inquérito policial”.(8) Como ex-plica Lopes Júnior, ainda está em voga “con-denar com base na prova judicial cotejada coma do inquérito policial”.(9)

No caso específico do Tribunal do Júri,os jurados decidem com base em qualquerelemento que esteja inserido nos autos, tan-to do processo, quanto do inquérito poli-cial, inclusive.(10)

É em razão dessas circunstâncias queGomes Filho apregoa a impossibilidade dautilização dos dados colhidos na fase pre-liminar como prova ou, ao menos, a fixa-ção de requisitos mínimos para que pos-sam ser admitidos na formação do conven-cimento do juiz.(11)

Ao analisar o sistema argentino, Edwar-ds leciona que “el sumario de prevención esde capital importancia para la suerte procesaldel imputado, ya que allí se compilan la ma-yoría de los elementos de convicción, queservirán de fundamento a la acusación, conun control judicial mínimo y con una escasaparticipación de la defensa”.(12)

É sabido que a maioria das provas queservem para lastrear a acusação é colhida

durante o inquérito policial. Assim, o ex-pediente também acaba delimitando o queserá discutido em juízo, não se avançandodurante a instrução criminal, em regra,além daquilo que restou colhido na etapapreliminar, circunstância que, por si só,evidencia a sua importância.

Em suma, a quase totalidade das denún-cias oferecidas pelo MP é baseada em in-quéritos policiais. Em virtude disso, afir-ma Guimarães Júnior que, “no fim das con-tas, é a Polícia Judiciária, e não o MinistérioPúblico, quem mais influencia as causas quechegam às VarasCriminais e aos Tri-bunais”.(13)

Como se nãobastasse, uma pes-soa investigadapode ser atingidaem seus direitos(pessoais e reais)logo que a PolíciaJudiciária instauraum inquérito policial.(14) A investigaçãocriminal, ensina Prado, “representa, por sisó, uma espécie de poder capaz de afetar gra-vemente o patrimônio de direitos da pessoainvestigada”.(15)

Mas isso não é tudo. Mesmo que não serestrinja a liberdade de locomoção do in-vestigado ou que não seja imposta qual-quer outra medida restritiva de direitos fun-damentais (violabilidade de domicílio, in-terceptação telefônica, quebra de sigilo dedados, financeiros e fiscais, bloqueio decontas bancárias, seqüestro de bens etc.), asimples instauração de uma investigaçãocriminal lhe gera angústia e lhe impõe orótulo de criminoso no meio social em quevive, ainda que se demonstre, posterior-mente, que não estava envolvido na infra-ção penal sob apuração.

É em virtude desses fatores que tambémdeve incidir na fase preliminar o sistemade controle das atividades processuais (frei-os e contrapesos), a ser exercido por advo-gados (na defesa dos direitos fundamentaisdos investigados), pelo Poder Judiciário(no controle da legalidade dos atos de po-lícia judiciária e na autorização de medi-das cautelares) e pelo Ministério Público(no exercício do controle externo da ativi-dade policial).

Dessa maneira, em respeito ao status dig-nitatis dos investigados e às garantias míni-mas que devem ser estendidas aos que sãosubmetidos a uma investigação criminal,deve-se afastar a idéia de que o inquéritopolicial não passa de um “mero ato admi-nistrativo”.(16) Afinal, respeitar a dignidade

humana não gera óbice a um trabalho deinvestigação eficiente.(17)

Na realidade, trata-se de procedimentocarregado de significação, especialmentequanto às provas produzidas em carátercautelar e em definitivo, como, v.g., os exa-mes de corpo de delitos, que atrelam o “jul-gamento do meritum causae”.(18) Além dasperícias, as apreensões e as vistorias tam-bém são exemplos de atos de instrução nãoprovisórios, ainda que realizados na fasepreliminar.(19)

Traz-se à colação a lição de Jardim, porbem destacar aimportância da in-vestigação crimi-nal: “O inquéritopolicial, além defornecer justa causaà acusação penal,destina-se à apura-ção das infraçõespenais com todas assuas circunstâncias

e desempenha em nosso sistema processual umafunção da maior relevância, pois permite aotitular da ação fazer uma imputação indivi-dualizada e certa, evitando-se processos pre-maturos e absolutamente infundados.”(20)

Semelhante é, ademais, a posição deGomes Filho, que afirma que o inquéritopolicial não serve somente para propiciaruma denúncia ou uma queixa. Possui o pro-cedimento, igualmente, finalidades deter-minantes para o juízo de admissibilidadeda acusação, para a adoção de medidas cau-telares e pode servir de subsídio para a con-denação, desde que haja confirmação dasprovas indiciárias na instrução judicial, oupara a absolvição do acusado.(21)

Assim, à luz do exposto, deve ser revistaa posição que afirma que o inquérito poli-cial não passa de “simples peça de informa-ção”. Talvez a investigação criminal até sejamera peça informativa, mas apenas paraaqueles que não figurem como suspeitosda prática de uma infração penal. Para osinvestigados, certamente, ela não o é. Emalguns casos, aliás, basta que se tenha umhomônimo na lista de investigados para severificar a força de uma investigação cri-minal e a importância que se deve dar àfase pré-processual.(22)

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS

(1) Nesse sentido: TOVO, Paulo Cláudio. “Democratiza-ção do Inquérito Policial”. Estudos de Direito Proces-sual Penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999,p. 200.

(2) TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática deProcesso Penal. 18ª ed., Saraiva: São Paulo, 1996,O

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Talvez a investigação criminal até sejamera peça informativa, mas apenaspara aqueles que não figurem comosuspeitos da prática de uma infração

penal. Para os investigados,certamente, ela não o é.

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 11

p. 3. Do mesmo autor, ainda: Processo Penal. 25ªed., São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1, p. 199.

(3) STF, HC 68.041/RJ, rel. min. Sydney Sanches, DJUde 22.02.91; STF, HC 73.037/RJ, rel. min. CarlosVelloso, DJU de 21.06.96; STF, HC 77.770/SC, rel.min. Néri da Silveira, DJU de 03.03.00; STF, RE136.239/SP, rel. min. Celso de Mello, DJU de14.08.92; STJ, HC 60.702/SP, rel. min. Gilson Dipp,DJU de 18.12.06; STJ, HC 64.616/PR, rel. min. Lau-rita Vaz, DJU de 11.12.06; STJ, HC 55.500/PR, rel.min. Felix Fischer, DJU de 20.11.06; STJ, HC 50.692/RJ, rel. min. Hamilton Carvalhido, DJU de 04.09.06.

(4) Expressão usada por SAAD, Marta. “Exercício doDireito de Defesa no Inquérito Policial”. Boletim doIBCCRIM, São Paulo, nº 166, set. 2006, p. 6. Arespeito do assunto, a própria autora (SAAD, O Di-reito de Defesa no Inquérito Policial. São Paulo: RT,2004, p. 164) afirma que não existem apenas atosde investigação no inquérito policial, “mas tambématos de instrução, visto que servem ao convenci-mento do juiz”.

(5) PITOMBO, Sérgio Marcos de Moraes. “A PolíciaJudiciária e as Regras Orientadoras do ProcessoPenal”. In: A Polícia à Luz do Direito. São Paulo: RT,1991, p. 39. Do mesmo autor, na mesma esteira eafirmando que seria “simplificar, ao excesso, a rea-lidade sensível” dizer-se que o inquérito policial é“mera” peça de informação: Inquérito Policial: NovasTendências. Belém: CEJUP, 1986, pp. 16 e 21.

(6) Nesse sentido: STF, HC 67.917/RJ, rel. min. Sepúlve-da Pertence, DJU 05.03.93, p. 2.897; STF, RE 69.904/SP, rel. min. Barros Monteiro, RTJ nº 59, p. 789.

(7) GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Direito à Provano Processo Penal. São Paulo: RT, 1997, pp. 144-5, nota 34.

(8) COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. “O Sigilodo Inquérito Policial e os Advogados”, Revista Brasi-leira de Ciências Criminais, São Paulo, nº 18, abr.-jun. 1997, p. 131.

(9) LOPES JÚNIOR, Aury Celso Lima. Sistemas de In-vestigação Preliminar no Processo Penal. 4ª ed., Riode Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 234.

(10) LOPES JÚNIOR, op. cit., p. 235.(11) GOMES FILHO, op. cit., p. 145-6. Na mesma li-

nha: TOVO, Paulo Cláudio. “O inquérito policialem sua verdadeira dimensão”. In: Estudos de Di-reito Processual Penal. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 1995, v. I, p. 150; LOPES JÚNIOR, op.cit., pp. 234-7.

(12) EDWARDS, Carlos Enrique. El Defensor Técnicoen la Prevención Policial. Buenos Aires: ASTREA,1992, p. 138.

(13) GUIMARÃES JÚNIOR, João Lopes. “Dominus Li-tis?”. Boletim do IBCCRIM, São Paulo, nº 65, abr.1998, p. 11.

(14) HADDAD, Carlos Henrique Borlido. “O Novo Inter-rogatório”. Revista da AJURIS, Porto Alegre, nº 99,set. 2005, p. 51.

(15) PRADO, Geraldo. Sistema Acusatório. A Conformi-dade Constitucional das Leis Processuais Penais.3ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 132.

(16) Na linha de que o inquérito policial é um procedi-mento com alta importância: KOERNER, Andrei;MELHEM, Célia Soibelman; SCHILLING, Flávia.

“A Garantia dos Direitos Fundamentais no Proces-so Penal: A implementação do controle do inquéritopolicial pelo Ministério Público do Estado de SãoPaulo”. Revista Brasileira de Ciências Criminais,São Paulo, nº 28, out.-dez. 1999, p. 266; PÊCEGO,Antônio José F. de S. “Polícia Judiciária: Persecu-ção Penal, Defesa e Sigilo”. Boletim do IBCCRIM,São Paulo, nº 88, mar. 2000, p. 9.

(17) PINTO, Adilson José Vieira. “O Inquérito Policial àluz dos Direitos e Garantias Individuais da Consti-tuição Federal de 1988”. Revista Brasileira de Ciên-cias Criminais, São Paulo, nº 27, p. 253.

(18) TUCCI, Rogério Lauria. “A Polícia Civil e o Projetode Código de Processo Penal”. In: A Polícia à Luzdo Direito. São Paulo: RT, 1991, p. 107.

(19) QUEIJO, Maria Elizabeth. “Principais Instituiçõesdo Processo Penal Brasileiro e Elaboração Legisla-tiva de Novo Código de Processo Penal: InquéritoPolicial”. Revista dos Tribunais, São Paulo, nº 697,nov. 1993, p. 271.

(20) JARDIM, Afranio Silva. Direito Processual Penal.6ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 45.

(21) GOMES FILHO, op. cit., p. 144.(22) Vide, por exemplo, recente situação envolvendo,

injustamente, ministro da Suprema Corte.

Fábio Motta LopesMestrando em Direito pela Ulbra, especialista em

Direito Penal e Processo Penal, professor de DireitoPenal da Unisinos, professor da Academia de Polícia

do RS e delegado de Polícia no RS.

DA (NECESSIDADE DE) FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO JUDICIALQUE RECEBE COMUNICAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTEPlínio Leite Nunes

Já se foi o tempo em que decisões judi-ciais imotivadas e desprovidas de válida econvincente fundamentação eram admi-tidas pela ordem jurídica. Felizmente, noatual estágio da ciência jurídica e da pró-pria ciência jurídico-penal contemporâ-neas isso já não se mostra possível. NoBrasil, há inclusive disposição expressaquanto à obrigatoriedade da fundamenta-ção de todas as decisões emanadas do Po-der Judiciário, sob pena de nulidade. É oque se extrai, com efeito, do comando doart. 93, IX da Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil, que estabelece demodo incisivo que “todos os julgamentos dosórgãos do Poder Judiciário serão públicos efundamentadas todas as decisões, sob pena denulidade (...)”. Trata-se, com efeito, do su-blime princípio da necessidade de moti-vação das decisões judiciais.

Neste sentido, pode-se aqui invocar umsem-número de razões que justificam elegitimam o direito, reservado ao acusa-do, e o dever, imposto aos órgãos jurisdi-cionais, de que toda decisão deve ser ra-cionalmente motivada. Em primeiro lu-gar, porque o jurisdicionado tem direito asaber “como” e “por que” chegou o ma-gistrado a esta ou aquela conclusão, inde-pendentemente de que lhe seja favorávelou não. Depois, para que possa impugnar,se entender injustiçado, os fundamentos

da decisão na instância Superior, comoexpressão do princípio do duplo grau dejurisdição. Também para que possa sabero porquê de sua tese, eventualmente le-vantada, ter sido rechaçada. Por fim,como forma de o jurisdicionado e a pró-pria sociedade fiscalizarem a atividadejurisdicional.

Como acentua Aury Lopes Júnior,(1) “amotivação serve para o controle da raciona-lidade da decisão judicial. Não se trata degastar folhas e folhas para demonstrar erudi-ção jurídica (e jurisprudencial) ou discutirobviedades. O mais importante é explicar oporquê da decisão, o que o levou a tal conclu-são (...)”. Na mesma esteira, aliás, é a con-clusão de Luigi Ferrajoli,(2) para quem “amotivação permite a fundação e o controledas decisões seja de direito, por violação da leiou defeito de interpretação ou subsunção, sejade fato, por defeito ou insuficiência de provasou por explicação inadequada do nexo entreo convencimento e provas”. Mais adianteprossegue o mestre italiano: “Ao mesmotempo, enquanto assegura o controle da lega-lidade e do nexo entre o convencimento eprovas, a motivação carrega também o valor‘endoprocessual’ de garantia de defesa e o va-lor ‘extraprocessual’ de garantia de publici-dade. E pode ser, portanto, considerado oprincipal parâmetro tanto da legitimaçãointerna ou jurídica quanto da externa ou de-

mocrática da função judiciária.”Apesar disso, tem-se visto — com certa

perplexidade — a relativização do princí-pio da motivação das decisões judiciais,que segundo a própria Constituição Fe-deral deve ser comum e aplicável a todosos provimentos que emanem dos órgãosque prestam tutela jurisdicional. Dita fle-xibilização ao dever de fundamentaçãotem sido aplicada, como produto de umaverdadeira “epidemia jurisdicional”, àsdecisões que recebem a comunicação daprisão em flagrante. De fato, não são pou-cos os casos em que os magistrados se li-mitam a simplesmente “tomar ciência” daprisão do autuado e, sem nenhuma alusãoà conveniência de se lhe manter a custó-dia provisória, restringem-se a consignar:“aguarde-se o inquérito”.

Essa prática, infelizmente, tem sidobastante comum no cotidiano forense, in-clusive avalizada por inúmeras decisõesdos tribunais brasileiros. Tem-se argu-mentado, nesse sentido, que o ato que re-cebe a comunicação não tem caráter deci-sório, posição com a qual, no entanto, ecom o devido respeito das opiniões emcontrário, não concordamos.

Dúvida não há que a simples existênciade um processo criminal, por si só, já ésuficiente a caracterizar situação de cons-trangimento ao acusado. Também não seD

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pode negar que, na atualidade, as institui-ções públicas encontram-se sobrecarrega-das sem que, em contrapartida, estejamdotadas das condições necessárias paraconduzir e concluir satisfatórias investi-gações, elaborar peças denunciativas pro-vidas com um mínimo de conteúdo fáti-co-jurídico suficiente à garantia do con-traditório e ampla defesa etc. etc. Acres-ça-se a este quadro — que já não é dosmelhores — a sobrenatural quantidade dedemandas que hoje abarrotam as estantesdo Judiciário, o que faz com que mesmoos mais devotados magistrados não consi-gam, embora assim fosse desejável, deter-se com o tempo necessário ao exame deinúmeras e inúmeras peças flagranciaisque se lhes chegam diariamente.

Não obstante, certo é que a deficiênciaestrutural da máquina estatal não pode,sob nenhuma hipótese, justificar a práticahoje freqüente de se manter a prisão emflagrante mediante despachos desprovidosde um mínimo de conteúdo jurídico ten-dente a justificar a necessidade da custó-dia provisória do autuado, até então sim-ples autuado.

Para nós, inclusive com o apoio no queincisivamente estabelece o art. 93, IX, daCarta Republicana, deve sim o magistra-do, ao receber a comunicação do auto deprisão em flagrante de um cidadão, fun-damentar, de modo adequado e convin-cente, a necessidade de se lhe manter acustódia provisória. Aliás, não haveriarazão para exigir-se, na Constituição Fe-deral, a necessidade da comunicação daprisão em flagrante ser imediatamente en-caminhada à autoridade judicial (CF/88,art. LXII).

Correta, neste sentido, a orientação deAury Lopes Jr.(3) ao tratar especificamen-te da natureza processual da prisão em fla-grante. Bem o lembra o renomado pro-cessualista que “uma vez efetivada a prisãoem flagrante, com a conseqüente lavraturado auto respectivo, a peça policial será envia-da ao juiz competente. Esse juiz, à luz dodisposto no art. 310 do CPP, deverá decidir sehomologa ou não a prisão em flagrante. As-sim o julgador atua de forma sucessiva, emdois momentos: 1º momento: analisa o as-pecto formal da prisão em flagrante, sua le-galidade ou ilegalidade. Se legal, homologa;se ilegal, deverá relaxá-la. 2º momento: ho-mologando a prisão em flagrante, deverá,sempre, enfrentar a necessidade ou não daprisão preventiva. Se necessária e cabível,poderá decretá-la (desde que tenha sido pos-tulada sua decretação). Do contrário, deveráconceder a liberdade provisória, nos termosdo art. 310, caput ou parágrafo único (con-forme o caso). Em qualquer caso, a decisãodeverá ser motivada”. Assim, também, oentendimento de Afrânio Silva Jardim(4)

ao sustentar que “a prisão em flagrante so-

mente poderá subsistir se ficar constatada, emdecisão fundamentada, a existência dos re-quisitos do art. 312 sem o que a sua manuten-ção será desnecessária e, por conseguinte ar-bitrária e ilegal.” No mais, acresce o doutojurista: “Diante do que se viu, sustentamosque a nova regra jurídica (Lei 6.416/77 queintroduziu o parágrafo único ao art. 310, doCPP) criou mais que uma simples faculdadepara o órgão jurisdicional, vez que passou ater o acusado o direito subjetivo processual dever sua prisão mantida ou não através de de-cisão fundamentada.”

Em uma palavra: verifica-se que o en-tendimento que mais se concilia aos pro-pósitos da moder-na ciência jurídi-co-penal é o deque, na sempreautorizada liçãode Banacloche Pa-lao, o flagrante —ou la detención im-putativa — não éuma medida cau-telar pessoal, massim pré-cautelar,no sentido de quenão se dirige a ga-rantir o resultadofinal do processo,mas apenas desti-na-se a colocar odetido à disposi-ção do juiz paraque adote ou não uma verdadeira medidacautelar.(5)

Sem embargo, consoante iterativa ju-risprudência do C. Supremo TribunalFederal, a custódia cautelar do imputa-do, exceção em nosso ordenamento jurí-dico, apenas pode ser decretada (oumantida) quando fundada em elemen-tos concretos, objetivos e atuais que de-monstrem, de forma cristalina, a presen-ça dos pressupostos autorizadores daprisão preventiva, constantes do art. 312,do CPP. É neste sentido, aliás, a orienta-ção firmada pelo Pretório Excelso nojulgamento do HC 80.719/SP, relator oeminente ministro Celso de Mello, DJ28-09-2001, bem como no do HC 84.662/BA, relator o ministro Eros Grau, DJ de22.10.2004.

Ao que tudo indica, nesse contexto, éque a tendência atual no Superior Tribu-nal de Justiça, sobretudo no âmbito de sua6ª Turma, é a de reafirmar não só a obriga-ção da motivação das decisões judiciais,aí incluindo-se a decisão que recebe a co-municação do flagrante, como, também, aexigência de que a imposição ou manu-tenção de uma prisão cautelar deva res-paldar-se em algumas das hipóteses hos-pedadas no art. 312, do CPP. De conferir-se, neste caso, o precedente firmado no

HC nº 40761/SP, 6ª Turma, relator o mi-nistro Nilson Naves, DJ de 22.05.2006.Na espécie, a Corte firmou orientação nosentido de que “sendo lícito ao juiz, no casode prisão em flagrante, conceder ao réu li-berdade provisória (CPP, art. 310, parágra-fo único), o seu ato, seja ele qual for, nãoprescindirá de fundamentação. Desse modo,‘Tratando-se de ato (negativo) sem suficien-te fundamentação, é de se reconhecer, daí,que o paciente sofre a coação ensejadora dohabeas corpus’”.

Por tudo isso, e particularmente consi-derando que, hoje, o réu já não é maisconsiderado como mero objeto do pro-

cesso, e sim titularde direitos e obri-gações, e que den-tre os direitos quea lei (leia-se:Constituição Fe-deral) lhe confereno âmbito da es-trutura dialéticado processo pe-nal-judicial está ode exigir — sem-pre — a larga am-plitude da garan-tia constitucionalda motivação dasdecisões judiciais,especialmente da-quelas que gravamo direito à liberda-

de individual, no âmbito do processo que,por definição constitucional, deve ser oresultado da conjunção das garantias docontraditório e da ampla defesa, somospela obrigatoriedade de que a decisãoque recebe a comunicação do flagranteseja efetivamente motivada, seja para ofim de apresentar elementos que justifi-quem a custódia preventiva do autuado,seja para conceder-lhe a liberdade pro-visória, como prevê o art. 310, parágrafoúnico, do Código de Processo Penal.

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS

(1) LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao ProcessoPenal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 254.

(2) FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Ga-rantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,2004, p. 498.

(3) Cf. JR., Aury Lopes. Introdução Crítica ao Proces-so Penal. Ob. cit., p. 216.

(4) Cf. JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Pe-nal. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 252.

(5) Cf. PALAO, Banacloche. Lecciones sobre elProceso Penal. Trad. Santiago Sentis Melendo. T.II. Buenos Aires, 1950, p. 77.

Plínio Leite NunesAdvogado criminalista e pós-graduado

em Ciências Criminais pelaUniversidade Católica de Pernambuco

Hoje, o réu já não é mais consideradocomo mero objeto do processo, e simtitular de direitos e obrigações, e quedentre os direitos que a lei (leia-se:Constituição Federal) lhe confere no

âmbito da estrutura dialética doprocesso penal-judicial, está o de

exigir — sempre — a largaamplitude da garantia constitucionalda motivação das decisões judiciais,especialmente daquelas que gravam

o direito à liberdade individual.

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 13

SIGILO BANCÁRIO: APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADENO CONFLITO ENTRE PROVA CRIMINAL E PRIVACIDADERosimeire Ventura Leite

O sigilo bancário insere-se no sistemade normas de proteção à privacidade doindivíduo, tendo como fundamento maisdistante a própria idéia de personalidade.O objetivo é resguardar as informaçõespessoais daqueles que utilizam os servi-ços das instituições financeiras ou equi-paradas, protegendo-os contra revelaçõesindevidas. No entanto, a quebra do sigilobancário, não raro, é instrumento impres-cindível para uma persecução penal efi-ciente, sobretudo em crimes mais graves,de repercussão internacional, represen-tando, pois, um importante meio de ob-tenção de prova. Convém, assim, anali-sarmos o problema da possível colisãoentre a privacidade protegida pelo sigilobancário e o interesse na produção daprova no processo penal.

O tema do sigilo exige, a todo tempo, oenfrentamento de conflitos de interessesque inevitavelmente surgem nos relacio-namentos humanos e jurídicos, notada-mente quando se reconhece a Constitui-ção como um texto aberto, composto nãosó por regras, mas também por princípios.De fato, a admissão do caráter principio-lógico do texto constitucional favorece oaparecimento de colisões entre princí-pios ou valores de idêntica hierarquia eque incidem sobre um mesmo caso con-creto, trazendo dificuldades para a atua-ção do intérprete.

Para Robert Alexy, a colisão de prin-cípios não se soluciona no âmbito da va-lidade, mas sim da verificação de qualdos princípios tem mais peso na situa-ção concreta e sob determinadas condi-ções. Observa-se, desse modo, uma “re-lação de precedência condicionada”,pela qual são identificadas as condiçõesque permitem a preferência a um dosprincípios. Por outro lado, caso as cir-cunstâncias fossem outras, a soluçãotambém poderia ser diversa.(1)

Em relação ao sigilo bancário, o pro-blema das colisões se aplica plenamente.Com efeito, através do sigilo, procura-sepreservar determinadas informações quedizem respeito à privacidade do indiví-duo, a aspectos de sua vida que, emboranão se circunscrevam ao núcleo mais fe-chado de sua intimidade, também nãopodem ser do conhecimento amplo deterceiros. Ocorre, porém, que, em deter-minados momentos, esta proteção podecolidir com outros interesses, sejam deoutra pessoa, da sociedade ou do Estado.

A idéia de proporcionalidade teveaplicação inicialmente no Direito Admi-S

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Com o princípio daproporcionalidade, pode-se obter

uma decisão mais justa, tendosempre em vista o equilíbrio entre aeficiência do processo e as garantiasdo indivíduo, o que é imprescindíveldiante da dignidade dos valores que

o processo penal abriga e quedevem ser reforçados, sobretudo,

em tempos de crise.

nistrativo, transpondo-se em seguida parao Direito Constitucional, onde obteve es-pecial utilidade no âmbito dos direitos egarantias fundamentais,(2) fornecendosubsídios para que não haja limitaçõesarbitrárias à liberdade individual.

Embora não esteja expressamenteprevisto na Constituição Federal Brasi-leira de 1988, encontra o referido princí-pio fundamento no art. 5º, § 2º, do textoconstitucional, pelo qual “os direitos e ga-rantias expressos nesta Constituição nãoexcluem outros de-correntes do regimee dos princípios porela adotados”.

Quanto ao seuconteúdo, o prin-cípio da propor-cionalidade sesubdivide em trêssubprincípios: aadequação, a ne-cessidade e a pro-po rc iona l i d adeem sentido estrito.Pelo subprincípioda adequação, exa-mina-se a idoneidade e a aptidão da me-dida restritiva para atingir a finalidadepretendida. Já a necessidade, também cha-mada de princípio da exigibilidade, im-plica a consideração de que a medida sejaa mais eficaz e a menos onerosa dentre asalternativas disponíveis. A restrição, por-tanto, deve ser indispensável, abrangendoum juízo de menor ônus possível. Porfim, quanto à proporcionalidade em sentidoestrito, corresponde à verificação do equi-líbrio entre a medida e o objetivo preten-dido. Nesse sentido, destaca Suzana deToledo Barros que “o princípio da propor-cionalidade stricto sensu, complementandoos princípios da adequação e da necessidade,é de suma importância para indicar se o meioutilizado encontra-se em razoável propor-ção com o fim perseguido”.(3)

Para Antonio Scarance Fernandes, ci-tando a doutrina de Nicolas Gonzalez-Cuellar Serrano, o princípio da propor-cionalidade abrange pressupostos, requi-sitos intrínsecos e extrínsecos. Os pressu-postos seriam a legalidade e a justificaçãoteleológica, ou seja, qualquer medida res-tritiva deve ter por fundamento uma pre-visão legal, além de objetivar a concreti-zação de valores presentes na ordemconstitucional. No que tange aos requisi-tos intrínsecos, a restrição à garantia exi-ge que se demonstre a adequação, a ne-

cessidade e a ponderação dos interessesem conflito, o que corresponde aos trêssubprincípios já analisados. No mais, osrequisitos extrínsecos referem-se à judi-cialidade e à motivação, de maneira que arestrição deve partir de um órgão jurisdi-cional e ser motivada.(4)

Desta breve análise, constata-se que,diante das dificuldades em conciliar sigi-lo financeiro e prova no processo penal, oprincípio da proporcionalidade revela-secomo um importante instrumento de so-

lução nestes casosde colisão de in-teresses. Trata-sede uma constru-ção jurídica queauxilia o julgadora lidar com ac o m p l e x i d a d ecrescente das de-mandas que lhesão apresentadase com os obstácu-los impostos pelaprópria legisla-ção, que, muitasvezes, apresenta

conceitos abertos e resguarda valores po-tencialmente conflitantes.

O sigilo bancário não pode tornar-seum obstáculo intransponível para a ob-tenção da prova, o que seria privilegiardemasiadamente os interesses do indiví-duo em detrimento da sociedade. Por ou-tro lado, a busca da verdade tem igual-mente os seus limites, sob pena de se con-ceder ao Estado poderes muito amplos.Nesse contexto, o entendimento doutri-nário e jurisprudencial majoritário pro-paga o sigilo financeiro como relativo,podendo ser quebrado quando presenteso fundamento legal e as razões suficientespara a medida, a qual deve ser excepcio-nal e motivada.

Observando-se a idéia da proporcio-nalidade, é necessário ainda que a quebrado sigilo atenda aos subprincípios da ade-quação, da necessidade e da proporcio-nalidade em sentido estrito, além dospressupostos e demais requisitos acimaexplicitados.

Assim, com o princípio da proporcio-nalidade, pode-se obter uma decisão maisjusta, tendo sempre em vista o equilíbrioentre a eficiência do processo e as garan-tias do indivíduo, o que é imprescindíveldiante da dignidade dos valores que oprocesso penal abriga e que devem ser re-forçados, sobretudo, em tempos de crise.

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 200714

BUSCA E APREENSÃO DIGITAL: PROVA PENAL ATÍPICADiego Fajardo Maranha Leão de Souza

A sofisticada criminalidade do séculoXXI utiliza-se da vanguarda tecnológicapara o cometimento de crimes. Em con-traponto à delinqüência de massas, tradi-cional e violenta, a criminalidade organi-zada, em especial nos crimes econômicose por meio eletrônico, conta com recur-sos de tecnologia da informação de últi-ma geração para os atos de preparação eexecução de delitos e a preservação de seuproduto.(1) É nesse cenário que se antevêum novo método de obtenção de prova, abusca e apreensão digital, instrumentaljurídico que permitirá a colheita de dadosarmazenados em mídias informatizadassem a necessidade de apreensão de seusuporte físico, com ganhos tanto para oimputado quanto para o procedimento deinvestigação criminal.(2)

A prova penal, em sistemas de origemromano-germânica como o brasileiro, é onúcleo de todo o sistema processual e tempor função a busca da verdade. Diga-severdade real, processual, histórica, atingí-vel ou consensual, fato é que a verdadedeve sempre ser tida como norte do pro-cedimento penal, fim do qual a jurisdiçãodeve tentar se aproximar no maior graupossível.(3) E, tecnicamente, a prova reali-za esse escopo através da “demonstração daverdade ou falsidade de um enunciado fac-tual”,(4) uma vez que “provar um fato não émais que uma elipse, uma forma de dizerprovar a hipótese de que os fatos tenham sesucedido” de determinada maneira.(5)

No delineamento do procedimentoprobatório, os códigos de processo penalhistoricamente têm optado por dois dife-rentes caminhos: ou estabelecem a regrada taxatividade dos meios de prova e deobtenção de prova, restringindo o mate-rial a ser levado a juízo estritamente àque-les previstos em lei, ou permitem plenaliberdade probatória, autorizando a pro-dução de quaisquer provas sem previsão

de procedimento específico, respeitadasas limitações constitucionais. O equilí-brio, no entanto, só é atingido quando semescla um regime de meios de prova ta-xativos à possibilidade de serem utiliza-dos outros meios não previstos pelo legis-lador, de acordo com certos parâmetros,tal como foi a solução adotada pelo Códi-go de Processo Penal italiano de 1988.(6)

As provas atípicas surgem em antago-nismo às provas típicas. Estas são todos osmeios de produção e obtenção de provacatalogados e regi-dos por lei, en-quanto as provasatípicas ou inomi-nadas sequer fo-ram cogitadas pelolegislador, nãotendo sido, de ou-tro lado, expressaou tacitamente ve-dadas.(7)

O Código deProcesso Penalbrasileiro apenastangencia o temadas provas atípi-cas. Em seu art.155, dispõe que so-mente quanto aoestado das pessoasserão “observadasas restrições à prova estabelecidas na lei ci-vil”. O Código de Processo Civil, aplica-do por analogia com base no art. 3º doCPP, enfrenta de maneira mais clara aquestão, aceitando as provas “ainda quenão especificadas neste código”.(8) O Códigode Processo Penal Militar admite de modoainda mais evidente a possibilidade dasprovas atípicas.(9) De parte da doutrina,registre-se por todos que “há consenso deque também não vigora no campo penal umsistema rígido de taxatividade dos meios de

prova, sendo admitida a produção de provasnão disciplinadas em lei, desde que obedeci-das determinadas restrições”.(10)

A prova atípica deve ser distinguida daprova irritual, que se verifica quando a le-gislação prevê um determinado procedi-mento para o meio de prova que, por al-guma razão, não é observado. Nesse caso,trata-se de irregularidade no próprio pro-cedimento probatório, não se admitindoque a violação de um rito seja sanada comrecurso ao conceito de prova atípica.

Deve-se verificara subsistência doelemento de pro-va de acordo comas regras gerais denulidades do pró-prio Código.

A prova atípicatambém não seconfunde com aprova anômala.Nesse caso, tem-se um meio deprova típico sen-do utilizado paraatingir uma fina-lidade própria deoutro meio deprova típico, ver-dadeira truffadelle etichette.(11)

São provas típicas, dentre outras, a pro-va documental, o testemunho, o reconhe-cimento de pessoas e a prova pericial. Éprova irritual, por exemplo, a perícia assi-nada por apenas um perito oficial. A provaanômala mais conhecida é a juntada dedeclarações escritas colhidas unilateral-mente pela parte, sob o pretexto de provadocumental, para atingir o fim clássico deuma prova testemunhal. E provas atípicasseriam todas as demais que não vêm refe-ridas pelo ordenamento, como a gravaçãoB

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estabelecem a regra da taxatividadedos meios de prova e de obtenção deprova, restringindo o material a serlevado a juízo estritamente àquelesprevistos em lei, ou permitem plenaliberdade probatória, autorizando aprodução de quaisquer provas semprevisão de procedimento específico,

respeitadas as limitaçõesconstitucionais.

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(1) Nas palavras do jurista alemão, “esta situaciónno es solucionada declarando que uno de ambosprincipios no es válido y eliminándolo del sistemajurídico. Tampoco se la soluciona introduciendouna excepción en uno de los principios de formatal que en todos los casos futuros este principiotenga que ser considerado como una reglasatisfecha o no. La solución de la colisión consis-te más bien en que, teniendo en cuenta lascircunstancias del caso, se establece entre losprincipios una relación de precedencia condicio-nada” (ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos

Fundamentales. Trad. Ernesto Garzón Valdés.Madrid: Centro de Estudios Políticos e Constitu-cionales, 2001, pp. 91-92).

(2)Observa Paulo Bonavides que “a vinculação doprincípio da proporcionalidade ao Direito Consti-tucional ocorre por via dos direitos fundamen-tais. É aí que ele ganha extrema importância eaufere um prestígio e difusão tão larga quantooutros princípios cardeais e afins, nomeadamen-te o princípio da igualdade” (BONAVIDES, Pau-lo. Curso de Direito Constitucional. 18ª ed. atu-alizada, São Paulo: Malheiros, 2006, p. 395.

(3)BARROS, Suzana de Toledo. O Princípio daProporcionalidade e o Controle de Constitu-

cionalidade das Leis Restrit ivas de DireitosFundamenta is . B ras í l i a : B ras í l i a Jur íd ica ,1996, p. 80.

(4) SCARANCE FERNANDES, Antonio. Processo Pe-nal Constitucional. 4ª ed., São Paulo: Revista dosTribunais, 2005, pp. 56-59.

Rosimeire Ventura LeiteDoutoranda em Direito Processual, juízade Direito (TJPB), professora (UEPB) e

integrante do grupo de pesquisa “Eficiência eGarantismo no Processo Penal”, coordenado pelo

prof. Antônio Scarance Fernandes (USP)

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BOLETIM IBCCRIM - ANO 15 - Nº 181 - DEZEMBRO - 2007 15

entre presentes realizada por particular, oreconhecimento fotográfico ou o “apon-tamento em audiência”.(12)

A busca e a apreensão são meios de ob-tenção de prova típicos que visam a pre-servar a fonte de prova para que, posteri-ormente, venha a ser introduzida no pro-cesso e possa ser valorada pelo órgão ju-risdicional. O rito trazido pelo artigo 240 eseguintes do Código de Processo Penal ébastante específico: haverá busca domici-liar ou pessoal como fim de localizar eapreender a pessoaou coisa constantedo rol legal, deacordo com osprocedimentos aliprevistos.

Ocorre que, emtempo presente, écada vez mais roti-neiro presenciaroperações policiais em que dezenas decomputadores são apreendidos apenascom o escopo de serem capturados os da-dos armazenados em seus discos rígidos.Em se tratando de grupos organizados,criminalidade econômica e financeira oudelitos virtuais, como a propagação depornografia infantil, é factível que dadosda mais alta importância para a constitui-ção do quadro probatório estejam arma-zenados remotamente, em servidores si-tuados em outras cidades, estados ou atémesmo países. Esses dados estariam dis-poníveis apenas nos breves momentos emque acessados pelo investigado, sendoquaisquer vestígios locais eliminadosimediatamente, o que tornaria inócua abusca e apreensão tradicional. Numa ati-vidade de ação controlada, também pode-ria ser de interesse do órgão de investiga-ção ter acesso aos dados do crime sem queo investigado percebesse, fazendo coletaperiódica de informações à distância, pormeio de acesso virtual, até o melhor mo-mento do ponto de vista da formação daprova. Do lado do imputado, uma buscadigital permitiria que continuasse de pos-se de sua estrutura de informática, já quea apreensão prolongada de computadorese milhares e arquivos pode inviabilizar ir-reversivelmente a atividade econômica deuma empresa.

Tecnologia para a concretização dabusca e apreensão digital existe e está àdisposição dos órgãos de investigação.Sob o aspecto jurídico, verifica-se que novelho continente já existe uma Convençãosobre o Cibercrime, aprovada em Budapes-

te, em 23.11.2001, prevendo expressamen-te a busca e apreensão de dados informá-ticos armazenados em sistemas ou, alter-nativamente, do suporte físico que os con-tenha. Além disso, prevê-se a possibilida-de de recolhimento em tempo real dos da-dos relativos ao tráfego virtual, o que per-mite superação de óbices de Direito In-ternacional, já que a interceptação ocor-reria na rede de telecomunicações do paísinvestigante e asseguraria o material pro-

batório que pode-ria ser ocultadoem servidores re-motos. Em estágiotambém avança-do nessa área, osEstados Unidospossuem uma di-visão deCybercrime, vin-culada ao Depar-tamento de Justi-

ça, encarregada da investigação de crimesque utilizam meios eletrônicos.(13)

O Código de Processo Penal brasilei-ro, datado de 1941, está mais de meio sé-culo distante dessa nova realidade. Abusca e apreensão tradicional, como vis-to, não é capaz de assegurar o melhor re-sultado em se tratando de provas ou cri-mes cometidos por meio eletrônico. Aabertura trazida pelas provas atípicas,perfeitamente compatíveis com nossosistema processual, é o caminho indis-pensável para que, mediante circunstan-ciada autorização judicial, os órgãos en-carregados da investigação criminalempreendam buscas e apreensões digi-tais de maneira a reprimir delitos pou-co visíveis, mas altamente nocivos aosinteresses da sociedade. Uma legislaçãoespecífica para esse procedimento, bemcomo diretrizes genéricas para as pro-vas atípicas positivadas no Código deProcesso Penal, seriam novidades ex-pressivas no projeto de modernização dalegislação processual.

Conclui-se que a flexibilidade trazidapelas provas atípicas é um importante fa-tor de eficiência do processo penal. Comovaticina Ennio Amodio, quem sabe assimteremos no futuro “um homogêneo equilí-brio entre liberdade e legalidade da prova demaneira a satisfazer a exigência do garantis-mo juntamente com o interesse do pleno es-clarecimento dos fatos delituosos”.(14)

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS(1) A dicotomia entre criminalidade de massas e crimi-

nalidade organizada é explorada por Winfried Has-

semer, “Segurança Pública no Estado de Direito”, inRevista Brasileira de Ciências Criminais, nº 5,jan./mar. 1994, pp. 55-69.

(2) Diante da delimitação do estudo proposto, parte-seda premissa de que é constitucionalmente legítima alimitação do direito individual à tutela da privacidadee dos dados diante de ordem judicial devidamentefundamentada, com base no princípio da proporcio-nalidade. Entende-se que a Constituição Federal nãoalberga direitos absolutos, sendo possível ao PoderJudiciário afastar pontualmente determinados direi-tos fundamentais no caso de um direito contrapostopreponderante. A medida sugerida, com base nesseponto de partida, não violaria, pois, o art. 5º, XII, daConstituição Federal.

(3) LARONGA, Antonio. Le Prove Atipiche nel ProcessoPenale. Milano: Cedam, 2002, p. 2.

(4) TARUFFO, Michele. “Conoscenza scientifica e de-cisione giudiziaria: profili generali”, in: Decisione Giudi-ziaria e Verità Scientifica. Milano: Giuffrè, 2005, p. 11.

(5) GASCÓN ABELLÁN, Marina. Los Hechos en el Dere-cho. Bases Argumentales de la Prueba. Madrid:Marcial Pons, 1999, p. 83.

(6) CPP, art. 189. “Prova não disciplinada pela lei. 1.Quando se postula uma prova não disciplinada pelalei, o juiz pode aceitá-la caso seja idônea a assegu-rar o acertamento dos fatos e não prejudique a liber-dade moral da pessoa. O juiz decide sobre a admis-são, ouvidas as partes quanto à modalidade de pro-dução da prova” (tradução livre).

(7) GOMES FILHO, Antonio Magalhães. “Notas sobre aterminologia da prova (reflexos no processo penalbrasileiro)”, in: Estudos em Homenagem à Profes-sora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: Ed. DPJ,2005, p. 314.

(8) Código de Processo Civil, art. 332. “Todos os meioslegais, bem como os moralmente legítimos, aindaque não especificados neste Código, são hábeis paraprovar a verdade dos fatos, em que se funda a açãoou a defesa.”

(9) Código de Processo Penal Militar, ar t. 295. “É ad-missível, nos termos deste Código, qualquer espéciede prova, desde que não atente contra a moral, asaúde ou a segurança individual ou coletiva, ou con-tra a hierarquia ou a disciplina militares.”

(10) BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. “Provasatípicas e provas anômalas: inadmissibilidade dasubstituição da prova testemunhal pela juntada dedeclarações escritas de quem poderia ser testemu-nha”, in: Estudos em Homenagem à Professora AdaPellegrini Grinover. São Paulo: Ed. DPJ, 2005, p. 344.

(11) TONINI, Paolo. La Prova Penale. Milano: Cedam,2000, p. 95.

(12) Nos dois últimos casos, há divergência se nãoseria hipótese de prova irritual por desrespeito aoart. 226 do Código de Processo Penal. Também éimportante destacar outras classificações mais es-pecíficas, como a prova típica por analogia, queseria aquela trazida pelo Código, mas que adotaprocedimento de um outro meio de prova, como oé o caso do reconhecimento de objeto ou coisa, ea prova típica meramente referida, em que a legis-lação apenas nomeia o meio de prova ou obtençãode prova sem trazer quaisquer normas procedi-mentais, do que são exemplos a reprodução simu-lada dos fatos (art. 7º, CPP) e a infiltração policial(art. 2º, V, Lei 9.034/95).

(13) http://www.cybercrime.gov/(14) AMODIO, Ennio. “Libero convincimento e tassatività

dei mezzi di prova: un approccio comparativo”, in:Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale. Mila-no: Giuffrè, 1999, p.9.

Diego Fajardo Maranha Leão de SouzaProcurador federal em São Paulo, mestrando em

Direito Processual Penal pela USP e integrante doprojeto de pesquisa Eficiência e Garantismo noprocesso penal, coordenado pelo prof. Antonio

Scarance Fernandes (USP)

O Código de Processo Penalbrasileiro, datado de 1941, está maisde meio século distante dessa nova

realidade. A busca e apreensãotradicional, como visto, não é capazde assegurar o melhor resultado em

se tratando de provas ou crimescometidos por meio eletrônico.

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A LEI 8.038/90 E O PRINCÍPIO DO JUIZ NATURALAugusto Jobim do Amaral e Ricardo Jacobsen Gloeckner

1. O então Inquérito 2245:1. estado da questão

Este pequeno artigo tem a intenção desuscitar algumas questões de caráter pro-cessual penal, com o recente julgamentode cerca de 40 réus, alguns deputados esenadores, realizado pelo STF em açãooriginária. Fato que ficou conhecido peloescândalo gerado por uma extensa malhade corrupção que atingiu o governo Lula,conhecido como “mensalão”, como bati-zou a mídia.

Há pouco tempo, o STF julgou o rece-bimento de uma denúncia, oferecida peloprocurador-geral da República, compos-ta de inúmeros fatos criminosos imputa-dos a uma pluralidade de réus como, porexemplo, crimes de peculato, formaçãode quadrilha, corrupção ativa e passiva,supostamente cometidos por figuras derepercussão central no atual governo, no-meadamente José Dirceu (ex-ministrochefe da Casa Civil), Luiz Gushiken (Se-cretaria de Comunicação), AndersonAdauto (Secretaria de Transportes), Ro-berto Jefferson (deputado cassado), o em-presário Marcos Valério de Souza, o pu-blicitário Duda Mendonça, o ex-presi-dente do PT, José Genuíno, o ex-tesou-reiro do PT, Delúbio Soares dentre ou-tros. Após uma série de discussões e dedebates, o STF acabou por receber a de-núncia contra grande parte dos réus peloscrimes narrados na denúncia.

Encerrados os debates, o ministro re-lator Joaquim Barbosa assegurou que,uma vez publicado o acórdão de recebi-mento da denúncia, serão expedidas car-tas de ordem, a fim de realização das dili-gências instrutórias. Esse é o breve relatodo evento.

2. O princípio do juiz natural2. e a Lei 8.038/90:2. incompatibilidades lógicas

Como é cediço, o princípio do juiz na-tural, elencado na Constituição da Repú-blica no art. 5º, LII, que assevera: “nin-guém será processado nem sentenciado senãopela autoridade competente”, trata de umadas garantias mais elementares do indiví-duo. Tal garantia é a de que, primeira-mente, não haverá tribunal de exceção.Essa é a face mais visível do princípio dojuiz natural. No entanto, não esgota a suaextensão semântica. O juiz natural dacausa é aquele expressamente determina-do por uma norma do ordenamento, an-teriormente ao fato criminoso. A existên-cia de uma autoridade a quem incumbe ojulgamento, de forma prévia ao cometi-

mento do ilícito penal, determina a fixa-ção de uma competência, entendida des-de Manzini como a “medida da jurisdi-ção”. A competência ou o “poder de dizero direito”, dentro de uma determinadaesfera, por vezes territorial, por vezes re-lativa à matéria passível de julgamento, éuma condição de validade dos atos jurí-dicos processuais realizados no curso daação penal e, inclusive, mesmo da fase deinvestigação preliminar.

É através da afirmação do princípio do“juiz natural” ou do “juiz legal” que seprocura sancionar, de forma expressa, se-gundo Figueiredo Dias, o “direito funda-mental do cidadão a que uma causa seja jul-gada por um tribunal previsto como compe-tente por lei anterior, e não ad hoc criado outido como competente”.(1) Os atos judiciaisque não obedecerem à competência pro-cessual poderão (leia-se deverão) ser de-clarados como inválidos. Em outras pa-lavras, a desobediência ao disposto nesseartigo constitucional acarretará a nulida-de dos atos, deixando estes de gerar efei-tos. No entanto, seriam apenas os atos de-cisórios nulos? Os atos instrutórios po-deriam ser enquadrados no âmbito nor-mativo da norma do art. 5º, LIII da CR?

Evidentemente, apesar de expressa-mente não haver a previsão de que os atosinstrutórios seriam uma dimensão doprincípio do juiz natural, a instrução doprocesso e todos os seus atos são, semsombra de dúvidas, abarcados pelo prin-cípio invocado. É importante destacarainda que grande parte da doutrina, am-parada no princípio da instrumentalida-de das formas, prescreve que todos os atosprocessuais que puderem ser salvos deve-rão os ser de alguma maneira.

Trata-se, evidentemente, de um prin-cípio (o da instrumentalidade das for-mas) arraigado numa concepção civilís-tica de processo. A teoria das nulidades,em matéria penal, necessita se separardos conceitos absolutamente inadequa-dos como distinção entre nulidade abso-luta e relativa, demonstração de prejuí-zo por parte do réu (pas de nullité sansgrieff), taxatividade (pas de nullité sanstexte) e convalidação do ato defeituoso(instrumentalidade das formas). Tam-bém é necessário, se se quiser fazer jusao sistema constitucional de garantias,abandonar da mesma forma que os itensanteriores, a concepção da nulidade co-mo sanção processual (inapropriada-mente trasladada do Code de 1804) ouainda, como uma tentativa de manuten-ção do atual sistema, com novas másca-

ras, denominado de tipo constitucional.De qualquer sorte, entendido o proces-

so penal, assevera Fazzalari, como proce-dimento em contraditório,(2) ou ainda,desde Ferrajoli, diante do princípio daestrita legalidade em matéria proces-sual,(3) as cartas de ordem a serem expedi-das pelo STF desafiariam o princípio dojuiz natural? Dispõe o art. 9º, § 1º da Lei8.038/90 que “O relator poderá delegar arealização do interrogatório ou de outro atoda instrução ao juiz ou membro do Tribunalcom competência territorial no local decumprimento da carta de ordem”. Da mes-ma forma, o Regimento Interno do STFem seu artigo 239 e § 1º: “Art. 239: A ins-trução do processo obedecerá, no que couber,ao procedimento comum do Código de Pro-cesso Penal. § 1º O relator poderá delegar ointerrogatório do réu e qualquer dos atos deinstrução a juiz ou membro de outro Tribu-nal, que tenha competência territorial nolocal onde devam ser produzidos.” É consti-tucionalmente aceitável que o relator deum processo originário no STF, corte desuprema tutelada constitucional, possadelegar sua competência (de cognição-instrução, por suposto, de julgamento)?Tal dispositivo, à luz do princípio do juiznatural, seria legítimo?

E não se diga que oportunamente seestá a levantar tal óbice simplesmentepara “safar X ou Y”, em favor de umapseudodemagógica impunidade, de qual-quer acusação e atravancar o processo emsua desabalada busca de eficiência (anti-garantista, por óbvio!) ou quiçá na suabusca pela “verdade dos fatos”. Por certo,tal assunto de ressonância (inter)nacionalapenas ajuda a trazer, uma vez mais, à luza chaga de nosso processo penal brasilei-ro, que teima em ser permeado pela forçanormativa da constituição (Hesse).(4)

À evidência, percebe-se que se se en-tender os atos instrutórios regidos à luzdo princípio do juiz natural, essa delega-bilidade do ato, via carta de ordem, é nomínimo, ilegítima. Inválida e viciada,portanto. Esse procedimento cria uma es-pécie de sistema sui generis de sistemaprocessual, que fica entre o sistema esca-lonado e o sistema de juiz único. De re-gra, nos sistemas escalonados, existe umjuiz de instrução responsável pela produ-ção da prova bem como pela admissibili-dade da acusação, com o reenvio da peçaacusatória para julgamento na fase oral(juicio oral), como é conhecido nos siste-mas de língua espanhola.

Nos sistemas de juizado único, um de-terminado juiz é responsável pela admis-A

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sibilidade da acusação, pela coleta daprova e pelo julgamento. No procedi-mento de ação penal originária peranteos tribunais superiores, especialmente àvista da manifestação do STF, que moda-lidade de sistema se verifica? Veja-se aque ponto se pode chegar: o tribunal su-perior julga a admissibilidade da acusa-ção; uma vez recebida, determina a ór-gãos inferiores que sejam responsáveispela coleta da prova. Percebe-se que osjuízes de hierarquia inferior não podemquestionar a ordem, nem se impor con-trariamente ao recebimento da denúncia.Como se trata de “cartas de ordem”, ape-nas recebem e executam as ordens do tri-bunal superior. Uma vez encerrada a ins-trução, devem enviar o expediente ao tri-bunal superior para julgamento. O ma-gistrado, isento de algum contato com aprova, leia-se testemunhas e até mesmo ointerrogatório do réu, poderá passar a jul-gar alguém que quiçá apenas verá o rostonas páginas de qualquer periódico.

No julgamento perante o tribunal,onde não existe o duplo grau de jurisdi-ção no que tange ao mérito (cabendo ape-nas os recursos especial e extraordiná-rio), o acusado não possui garantia algu-ma com relação ao exame da prova porparte do tribunal. Frise-se, talvez esteja-mos falando aqui não em ausência de du-plo grau, mas, talvez, de ausência de cog-nição mesma quanto à matéria de prova,se considerarmos que ela virá pronta aorelator. Um dos pontos da proposta dereforma do sistema processual brasileiroé a extinção dos julgamentos de mérito,na modalidade devolutiva, por parte dostribunais. Juiz que instrui acaba ficandomais próximo da prova, dizem os defen-sores desta corrente. No caso em tela, otribunal superior não instrui o processo,apenas julga depois de produzida a prova.Mas os juízes ou tribunais inferiores nãodetêm a legitimidade para o exame daadmissibilidade da acusação. Um sistemahíbrido, que fica a meio caminho do juiza-do de instrução e do juizado único é a con-seqüência do art. 9º, § 1º da Lei 9.038/90.

Assim, de acordo com o princípio dojuiz natural, poderiam ser reputados váli-dos os atos judiciais delegados e depois(re)introduzidos mais adiante, na fase dejulgamento? Os atos judiciais, para con-servar a validade, não apenas devem serjulgados pela autoridade competente,mas processados perante ela. Levado emconta que uma das características da ju-risdição é a indelegabilidade, transpor-tando-se tal circunstância para o concei-to de competência, é constatável o nítidodescompasso da Lei 9.038/90.

A ação penal originária, de competên-cia dos tribunais superiores, possui junto

ao seu procedimento, um certo objetivo,que é oferecer determinadas garantias aoacusado. No momento em que se admitea delegação de atos instrutórios à instân-cia inferior, tais garantias restam solapa-das. Frise-se que a “inteligência” do dis-positivo alhures exposto, alavanca umpesado déficit cognitivo, motor essencialpara que se produza o procedimento emcontraditório, medida esta que se dá, nãoraro, em regimes de urgência ou em acor-do com o princí-pio da eficiência,que aporta emsede constitucio-nal, movido peloestablishment neo-liberal. Enfim,mais uma ode aosmeios eficientes(Hayek).(5)

A “delegaçãode atos indelegá-veis”, que porcerto não é outracoisa senão umaviolação dos atosprocessuais a serpraticados, já quesomente perante aautoridade com-petente é que se poderá falar em condi-ções específicas de validade da sentença.A decisão, que brota de um processo noqual a instrução se dá perante um juizdestituído do poder-dizer (isto é, com re-ferência ao juizado de instrução, sem averificabilidade da procedência da de-núncia, em momento instrutor próprio),soma-se a uma futura decisão de mérito,na qual o primado das hipóteses sobre osfatos, enunciada por Cordero(6) em bom ealto tom, desde há muito, confirma a re-gra. As provas a ser produzidas, diante deum juiz monocrático, no mérito, poucoou nada significam. Isso porque o julga-mento em pauta se encontra revestido,impregnado pelo imaginário jurídico deque o que é rápido e eficiente é o melhor.

Se examinarmos a genealogia do prin-cípio do juiz natural, veremos que da his-tória desta fórmula surgem três idéias: re-serva legislativa relativa à competência,órgãos que constituam um sistema legal-mente definido, e instituídos com ante-rioridade ao fato.(7) Não basta que seja or-dinário o juízo (pertencentes a uma tipo-logia legalmente constituída), mas ressal-te-se que é proibida qualquer expressãoeufemística, que vá adjetivar a jurisdição,apenas como embuste a sua função laten-temente excepcional.

Nem mesmo o automatismo de certaspráticas ou cláusulas (cartas de ordem?)pode sacar o magistrado naturalmente

constituído pela lei do confronto com acausa examinada, não menos diz o art. 8nº 1 do Pacto de São José da Costa Rica:“Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com asdevidas garantias (...), por um juiz compe-tente, independente e imparcial, estabeleci-do anteriormente por lei, na apuração dequalquer acusação formulada contra ela(...)” (g.n.). Na esteira de Maier, indubi-tável a decorrência proibitiva elementarde que juízos (cortes ou magistrados sin-

gulares) legal-mente determina-dos competentes aexercer a jurisdi-ção (consistenteem matéria penalna comprovação— positiva ou ne-gativa — do deli-to) possam avocarou delegar dissi-muladamente suaatribuição.(8)

De nenhumaforma se querobstar ortodoxa-mente que possahaver práticas ro-tineiras de delega-ções, oitivas de

testemunhas por carta precatória ou ro-gatória, por simples lógica processual. Oque se está a opor é a maneira escorreita,como se quer que um ato de defesa pri-mordial (o interrogatório, ou mesmoqualquer “outro ato de instrução”, comorefere a lei) possa ser feito longe das vis-tas do julgador da causa. Óbice posto, nomesmo sentido, de forma muito seme-lhante, pela mesma corte ao chamado in-terrogatório on-line (por videoconferên-cia) no último dia 14 de agosto em deci-são histórica de relatoria do ministro Ce-zar Peluso (HC 88.914). Vez mais se inda-ga: poderá se aceitar que o interrogatório(natureza clara de manifestação do exer-cício de defesa, mormente com as altera-ções da Lei 10.792/2003, única oportuni-dade não raro na qual o interrogado sedirige diretamente àquele que decidirásobre sua responsabilidade, ou seja, to-mará decisão da mais profunda importân-cia) ou mesmo qualquer outro ato deinstrução possa ser alijado de formacorriqueira ao juiz do caso penal a umajurisdição que não tem a mesma com-petência material?

Não bastasse o catálogo, imenso em-bora não taxativo, de gravames e flexi-bilizações garantísticas no jogo proces-sual, possibilidade estabelecida pelodiploma legal até então em comento, éde sinalizar que problemas podem ad-vir de um incidente processual qual-

De nenhuma forma se quer obstarortodoxamente que possa haverpráticas rotineiras de delegações,oitivas de testemunhas por carta

precatória ou rogatória, por simpleslógica processual. O que se está a

opor é a maneira escorreita, como sequer que um ato de defesa

primordial (o interrogatório, oumesmo qualquer “outro ato deinstrução”, como refere a lei)

possa ser feito longe das vistasdo julgador da causa.

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quer, ocorrido durante a instrução.Provas ilícitas, seqüestro de bens e outras espéci-

es de constrições, quando suscitadas, poderão gerara necessidade de revisão pelo Supremo Tribunal Fe-deral novamente. De duas uma: se admitindo o “re-curso” para o STF, vai por água abaixo a justificati-va da delegação de cartas de ordem, vez que o possí-vel trâmite pode causar ainda maiores delongas doque o seu julgamento diretamente perante o tribu-nal originariamente competente; ou, de outro lado,negar o recurso seria ampliar, inclusive delegar, aojuiz de primeira instância, o poder-dever de ser o“guardião” da Constituição, como a tradição jurí-dica denomina o STF. Esta última alternativa é in-concebível. O STF estaria delegando, além da suacompetência, o exame constitucional de questõesincidentais. Assim, a possibilidade de recurso aoSTF, pela infringência de algum dispositivo cons-titucional, pelo juiz a quem foi delegada a instru-ção, verifica-se insofismável para que ao menos seatenuem tais práticas delegatórias.

Vê-se um claro problema, como quer Roxin, decompetência móvel,(9) com grave déficit de legali-dade, de mínima previsibilidade no que tange aopilar do devido processo legal e principalmente aodireito de defesa do acusado. E se existe a necessi-dade de um regime de competência legal relativa-mente detalhado, esta razão se dá justamente paraque a cada fato punível esteja previsto um órgão dedecisão judicial determinado, no qual não fiquequalquer possibilidade de que a pessoa do juiz pos-sa eleger arbitrariamente quando ela se dá, segundocritérios nem um pouco objetivos.

NOTASNOTASNOTASNOTASNOTAS

(1) DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. Clássi-cos Jurídicos. 1ª ed. 1974. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p.322.

(2) FAZZALARI, Elio. Istituzioni di Diritto Processuale. Padova: CE-DAM, 1994, pp. 85-86.

(3) FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoria del Garantismo Pe-nal. Tradução de Perfecto Andrés Ibáñez et.al. Madrid: Trotta,1995, pp. 537-548.

(4) HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Traduçãode Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor,1991, p. 9.

(5) Vide a matriz do referencial neoliberal HAYEK, Friedrich A.Direito, Legislação e Liberdade. Tradução Anna MariaCapovilla. São Paulo: Visão, 1985, pp. 52-53.

(6) CORDERO, Franco. Guida alla Procedura Penale. Torino: Utet,1986, p. 51.

(7) CORDERO, Franco. Procedura Penale. Torino: Guiffrè, 2003, p.114.

(8) MAIER, Julio B.J. Derecho Procesal Penal. Tomo I – Funda-mentos. 2ª ed., 3ª reimpr., Buenos Aires: Editores del Puer tos.r.l., pp. 763-774.

(9) ROXIN, Claus. Derecho Procesal Penal. Tradução da 25ª edi-ção alemã de Gabriela E. Córdoba e Daniel R. Pastor. Revisa-da por Julio B.J. Maier. 1ª ed., 2ª reimpr., Buenos Aires:Editores del Puer to s.r.l., 2003, p. 31.

Augusto Jobim do AmaralAdvogado, especialista e mestre em Ciências Criminais (PUC/RS),

doutorando em Altos Estudos Contemporâneos (Coimbra)e professor da UCS e da Ulbra

Ricardo Jacobsen GloecknerAdvogado, especialista e mestre em Ciências Criminais (PUC/RS),

doutorando em Direito (UFPR)e professor do IPA/IMECA

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PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU IBCCRIMAPROVADA POR UNANIMIDADE PELO MECO Diário Oficial da União publicou, na quarta-feira, dia 14 de novembro de 2007, adecisão unânime, exarada pelo Ministério da Educação, favorável ao credenciamentodo curso de pós-graduação lato sensu do IBCCRIM em Criminologia.As informações sobre o curso, bem como oferta de matérias, cronograma, inscrição eavaliação serão publicadas no site www.ibccrim.org.br, conforme orientação daComissão de Pós-graduação do IBCCRIM.

NO AR: TV IBCCRIM!Preparada mesmo para as conexões de banda larga com baixa taxa de transferência,a TV IBCCRIM entrou no ar no dia 1º de novembro pelo portal www.ibccrim.org.bre, por meio dela, você já pode acessar de onde quiser, em qualquer horário e segundosuas próprias disponibilidades, todas as produções de vídeo do IBCCRIM, que trazemconsigo o desafio de produzir Ciências Criminais de modo crítico e pluralista,integrando idéias e conhecimentos, democratizando e simplificando o estudointerdisciplinar em um ambiente digital, com o padrão de qualidade das publicaçõesdo IBCCRIM que você já conhece.Já estão no ar os programas Faces da Violência com os temas Meninos de Rua eInsegurança Pública e Diálogos IBCCRIM, com aulas de Carlos Vico Manãs eAlberto Silva Franco, abordando “A idéia de Intervenção Penal Mínima”e “A idéia de Crimes Hediondos”, respectivamente. Os DVDs destas aulas tambémestão disponíveis para empréstimo na Biblioteca. Fique atento à programação.Acesse www.ibccrim.org.br e conheça mais sobre a nova TV IBCCRIM!

LEIA NA REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIASCRIMINAIS Nº 68 – SETEMBRO-OUTUBRO/2007• A Incidência do Crime de Frustração à Legislação Trabalhista como

Instrumento de Terror ao Empresariado - Eduardo Reale Ferrari• Aborto Inseguro: É Necessário Reduzir Riscos - José Henrique

Rodrigues Torres• Domínio por Organización. Estado de la Discusión - Kai Ambos• El Derecho Penal “Moderno”: Sobre la Necesaria Legitimidad de las

Intervenciones Penales - Raúl Pariona Arana• ¿Responsabilidad Penal de los Directivos de Empresa em Virtud de su Domínio de la

Organización? Algunas Consideraciones Críticas - Carlos Gómez-Jara Díez• Decisão Proferida por Justiça Incompetente: Nulidade ou Inexistência? - Danielle

Souza de Andrade e Silva• Aspectos Controvertidos sobre o Instituto da Prisão Preventiva - Diogo Tebet da

Cruz• A Recepção do Positivismo Criminológico no Brasil - João Paulo de Aguiar Sampaio

Souza• Uma Análise sobre a Crise na Segurança Pública de Maio de 2006 - Paulo de

Mesquita Neto e Fernando Salla• A Suspensão do Prazo Prescricional no Art. 366 do CPP e suas Limitações

Constitucionais: Crítica ao Recurso Extraordinário 460.971-1/RS - Mariângela Gamade Magalhães Gomes

ASSINATURA RBCCRIM 2008Associados IBCCRIM têm desconto de 30% na assinatura anual da RBCCRIM,o que corresponde a uma economia de R$ 180,00 para a aquisição das ediçõesde 2008. Sócios do Instituto pagam R$ 420,00 já com desconto, podendo estevalor ser parcelado em até 5 X no car tão ou cheque. Para assinar antecipadamenteos volumes nº 70 a 75 da edição 2008, ligue: (11) 3105-4607, ramal 125 ou,envie um e-mail para [email protected]. Para conhecer índices e adquiriredições anteriores, consulte a área da revista no site do IBCCRIM.Assinaturas internacionais podem ser feitas pelos telefones (55-11) 5183-5377 e5183-5205 ou pelo e-mail: [email protected].

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Entidadesque assinamo Boletim: AMAZONAS

• Ministério Públicodo Amazonas

CEARÁ• Associação Cearense

de Magistrados• Associação Cearense

do Ministério Público DISTRITO FEDERAL

• Associação dosMagistrados do DistritoFederal e Territórios -Amagis/DF

• Defensores Públicos doDistrito Federal - ADEPDF

GOIÁS• Associação dos

Magistrados do Estadode Goiás - Asmego

MATO GROSSO DO SUL• Associação dos

Defensores Públicosde Mato Grosso do Sul

• Associação dosDelegados de Polícia deMato Grosso do Sul -Adepol/MS

• Sindicato dos DefensoresPúblicos do Mato Grossodo Sul

MINAS GERAIS• Curso A. Carvalho

Sociedade Ltda.- Belo Horizonte

• Instituto de Ensino,Pesquisa e Atividades deExtensão em Direito Ltda.- Praetorium

• Sindicato dosDelegados de PolíciaFederal em Minas Gerais- SINDFPF-MG

PARÁ• Associação do Ministério

Público do Estadodo Pará

PARANÁ• Associação dos

Delegados de Políciado Estado do Paraná

RIO GRANDE DO SUL• Associação dos

Delegados de Políciado Rio Grande do Sul -ASDEP/RS

SÃO PAULO• Associação dos

Delegados de Políciado Estado de São Paulo- ADPESP

• Associação Nacional dosDelegados de PolíciaFederal - Rg. SP - ADPF

• Associação Paulista deMagistrados - Apamagis

• Ordem dos Advogadosdo Brasil - OAB/SP

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VISÕES DE POLÍTICA CRIMINAL ENTRE OPERADORESDA JUSTIÇA CRIMINAL DE SÃO PAULOO IBCCRIM, através do seu Núcleo de Pesquisa, apresentou no 13º Seminário Internacional a pesquisa“Visões de política criminal entre operadores da justiça criminal de São Paulo”.Acesse a seção Estudos e Pesquisas do portal www.ibccrim.org.br e conheça o relatório preliminar clicando no linkPesquisas Atuais do Núcleo de pesquisas.

QUARTA-FEIRA, SEMPRE ÀS ONZE DA MANHÃ, É O FÓRUM QUE VEM ATÉ VOCÊ!Par ticipe do Fórum IBCCRIM, um espaço de discussões estritamente acadêmicas e científicas,acessível pelo por tal www.ibccrim.org.br, sempre às quartas-feiras, das 11h00 às 12h00 (horário de Brasília).Confira na íntegra todas as perguntas respondidas por Maurício Zanóide de Moraes (Provas Ilícitas),Édson Luís Baldan (O Delegado e a Justiça Criminal), Tatiana Bicudo (O Ministério Público e a Justiça Criminal)e Alvino Augusto de Sá (Reintegração Social do Condenado).

Próxima Programação:Dia: 05 de dezembro de 2007Encontro com: Sergio Salomão Shecaira - Ex-presidente do IBCCRIM (gestão 1997-1998), atual presidente doConselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e professor titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP.Conversa sobre: Direito Penal Juvenil

Dia: 12 de dezembro de 2007Encontro com: Luciano Anderson de Souza - Mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da USP; coordenadorde Pós-Graduação da Escola Superior de Advocacia da OAB/SP; coordenador-adjunto do Departamento de Cursos doIBCCRIM; autor do livro “Expansão do Direito Penal e Globalização”, publicado pela Editora Quartier Latin).Conversa sobre: Direito Penal e Globalização

Dia: 19 de dezembro de 2007Encontro com: Luis Fernando Camargo de Barros Vidal - Juiz de Direito em São Paulo.Conversa sobre: A Função Política do Tribunal do Júri

Dia: 16 de janeiro de 2008Encontro com: Alberto Silva Franco - Presidente do IBCCRIM (gestão 2007 e 2008)Conversa sobre: Crimes Hediondos

Dia: 23 de janeiro de 2008Encontro com: Theodomiro Dias Neto - Vice-presidente do IBCCRIM (gestão 2007 e 2008), advogado em São Paulo,professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (São Paulo), mestre pela Universidade de Wisconsin (EUA)e doutor pela Universidade de Sarre (Alemanha)Conversa sobre: Segurança Pública

Dia: 30 de janeiro de 2008Encontro com: Maria Thereza Rocha de Assis Moura - Professora doutora de Processo Penal na Faculdade de Direitoda USP e ministra do STJConversa sobre: Direito de Execução Penal

Dia: 13 de fevereiro de 2008Encontro com: Gustavo Badaró - Mestre e doutor em Processo Penal; professor de Processo Penal da Faculdade deDireito da USP; advogado Criminalista em São PauloConversa sobre: Prova por Videoconferência

Importante: Não haverá Fórum nos dias 26 de dezembro de 2007, 02 e 09 de janeiro de 2008 e 06 de fevereiro(quarta-feira de cinzas) de 2008.

MAIS COMODIDADE PARA PAGAR A SUA CONTRIBUIÇÃO ASSOCIATIVADébito automático no Unibanco. Associados do IBCCRIM, que já contavam com a facilidade de fazer sua contribuiçãoassociativa através de débito automático nos bancos Bradesco, Itaú, Nossa Caixa Nosso Banco e Banco do Brasil,agora têm a opção de fazê-la também no Unibanco.Para alterar a sua forma de pagamento para débito em conta, entre em contato com o Departamento Financeiropelo telefone (11) 3105-4607, ramal 141, ou envie um e-mail para [email protected]

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