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APOSTILA DE CRIMINOLOGIA Versão 2.0 em 15-11-2003 PROF. EVANDRO ANDRADE DA SILVA www.direitopenal.cjb.net e-mail: [email protected] [email protected] [email protected] Programa de Criminologia – Universidade Estácio de Sá Tipo Curso: 11 - GRADUAÇÃO Curso:1 - DIREITO Versão Programa Disciplina: 1 Vigência: 1/1/1999 Até o momento EMENTA: Conceito. Evolução histórica. Teorias Criminologia e Direito. Política Criminal. Criminologia e Ciências afins. Estatística criminal. Investigação criminológica. Delinqüência infanto-juvenil. Criminalidade feminina. Sistemática penal. Estudo da conduta criminosa. Vitimologia. Fatores criminológicos e soluções. Constituição e sistemática penal. Realidade prisional brasileira. OBJETIVOS: 1. Estudar o indivíduo criminoso, a natureza da sua personalidade e os fatores criminógenas. 2. Analisar a criminalidade e sua nocividade social. 3. Conhecer e propor meios capazes de prevenir a incidência e a reincidência no crime e a recuperação do delinqüente. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO: Unidade 1 - CONCEITO, EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TEORIAS Unidade 2 - CRIMINOLOGIA E DIREITO Unidade 3 - Criminalidade e ciência afins Unidade 4 - POLÍTICA CRIMINAL E ESTATÍSTICA CRIMINAL Unidade 5 - DETERMINISMO CRIMINAL Unidade 6 - INVESTIGAÇÃO CRIMINOLÓGICA Unidade 7 - DELINQÜÊNCIA INFANTO-JUVENIL E CRIMINALIDADE FEMININA Unidade 8 - CONDUTA CRIMINOSA E VITIMOLOGIA Unidade 9 - SISTEMÁTICA PENAL E REALIDADE PRISIONAL Unidade 10 - FATORES CRIMINÓGENOS E SOLUÇÕES Unidade 11 - A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A SISTEMÁTICA PENAL 1

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APOSTILA DE CRIMINOLOGIAVersão 2.0 em 15-11-2003

PROF. EVANDRO ANDRADE DA SILVAwww.direitopenal.cjb.nete-mail: [email protected]

[email protected]@mail.com

Programa de Criminologia – Universidade Estácio de SáTipo Curso: 11 - GRADUAÇÃO Curso:1 - DIREITOVersão Programa Disciplina: 1 Vigência: 1/1/1999 Até o momentoEMENTA:Conceito. Evolução histórica. Teorias Criminologia e Direito. PolíticaCriminal. Criminologia e Ciências afins. Estatística criminal. Investigação criminológica. Delinqüência infanto-juvenil. Criminalidade feminina. Sistemática penal. Estudo da conduta criminosa. Vitimologia.Fatores criminológicos e soluções. Constituição e sistemática penal.Realidade prisional brasileira.OBJETIVOS:1. Estudar o indivíduo criminoso, a natureza da sua personalidade eos fatores criminógenas.2. Analisar a criminalidade e sua nocividade social.3. Conhecer e propor meios capazes de prevenir a incidência e a reincidência no crime e a recuperação do delinqüente.CONTEÚDO PROGRAMÁTICO:Unidade 1 - CONCEITO, EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TEORIASUnidade 2 - CRIMINOLOGIA E DIREITOUnidade 3 - Criminalidade e ciência afinsUnidade 4 - POLÍTICA CRIMINAL E ESTATÍSTICA CRIMINALUnidade 5 - DETERMINISMO CRIMINALUnidade 6 - INVESTIGAÇÃO CRIMINOLÓGICAUnidade 7 - DELINQÜÊNCIA INFANTO-JUVENIL E CRIMINALIDADE FEMININAUnidade 8 - CONDUTA CRIMINOSA E VITIMOLOGIAUnidade 9 - SISTEMÁTICA PENAL E REALIDADE PRISIONALUnidade 10 - FATORES CRIMINÓGENOS E SOLUÇÕESUnidade 11 - A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A SISTEMÁTICA PENAL

Conceito de Criminologia

A palavra Criminologia foi empregada pela primeira vez em 1883, por Topinard, e aplicada deforma universal por Rafael Garofalo, em sua obra "Criminologia".

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Para denominar essa matéria que é a "ciência do delito como conduta", a história aplicou vários vocábulos, como "antropologia criminal", "biologia criminal", "endocrinologia criminal", "reflexologia criminal".

Foi Lombroso quem deu início sistemático a antropologia criminal, precedido anteriormente por João Batista Della Porta (1540/1615) Kaspar Lavater (1741/1801) e Francisco Gall (1758/1828).

Tendo em vista a aproximação de várias classes do conhecimento, englobando o saber criminológico e os diferentes âmbitos da realidade que devem ser analisados para compreender o fenômeno da delinqüência, define-se Criminologia como "ciência empírica e interdisciplinar", que se ocupa da circunstância da esfera humana e social, relacionadas com o surgimento, a comissão ou omissão do crime, assim como o tratamento dos violadores da lei.

Jiménez de Asúa:

"A criminologia é a ciência causal-explicativa composta de quatro ramos (antropologia criminal, psicologia criminal, sociologia criminal e penologia) e distinta das ciências jurídico-repressivas (direito penal, direito processual penal e política criminal), da ciência da investigação criminal (compreendendo política criminal, medicina legal, penologia, psiquiatria forense, polícia judiciária científica, criminalística, psicologia judiciária e estatística criminal)". 1

É lícito afirmar que, como ciência unitária e interdisciplinar que é, a Criminologia se interliga às ciências humanas. De fato, a Biologia, a Psicologia e a Psicanálise são instrumentos essenciais à Criminologia Clínica,

Por outro lado e como já foi explanado, a Criminologia igualmente se relaciona com as ciências criminais: o Direito Penal lhe delimita o objeto; o Direito Processual Penal inquire a ocorrência do ato criminal e se interessa pelo exame da personalidade do delinqüente; o Direito Penitenciário, através de seus laboratórios de Biotipologia, regula o programa de ressocialização; a Medicina Legal, a Polícia Judiciária e "a Policiologia colaboram na investigação científica da materialidade do fato criminoso.

1 Tratado de Derecho Penal, Buenos Aires, 1950, tomo I, p. 75.

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A classificação de Luis Jimenez de Asúa

É bem de ver que os três elementos relacionados ao fenômeno penal - o crime, o delinqüente e a pena - constituem o centro das preocupações das ciências penais no seu todo, ou seja, a denominada Enciclopédia das Ciências Penais, ciências que assim são agrupadas e classificadas por Luis Jimenez de Asúa: a) Ciências Histórico-Filosóficas: História do Direito Penal, Filosofia do Direito Penal e Direito Penal Comparado; b) Ciências Causal-Explicativas: Criminologia, Antropologia Criminal, Sociologia Criminal, Biologia Criminal, Psicologia Criminal e Psicanálise Criminal; c) Ciências Jurídico-Repressivas: Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Penitenciário; d) Ciências Auxiliares e de Pesquisa: Penologia, Política Criminal, Medicina Legal, Psiquiatria Forense, Polícia Judiciária Científica, Criminalística, Psicologia Judiciária e Estatística Criminal.

Ramos e atribuições da Criminologia

Importante salientar, ainda uma vez, a natureza científica da Criminologia e sua autonomia. É ciência autônoma porque possui um objeto perfeitamente delimitado: os fatos objetivos da prática do crime e luta contra o delito. Sua esfera de ação, além disso, é demarcada pl universo normativo do Direito.

Orlando Soares em sua obra , “Curso de Criminologia” disserta que a delinqüência é composta de quatro fenômenos que são: o crime, o delinqüente, a pena e a vítima.

A propósito, de assinalar que, em reunião internacional da Unesco, em Londres, logrou-se desmembrar a Criminologia em dois ramos: Criminologia Geral e a Criminologia Clínica. Desse conclave participaram criminólogos do mais alto nível e, dentre eles, Pinatel, Kinber, Wolfgang, Sellin e o brasileiro Leonídio Ribeiro. Esse desmembramento, do consenso da Unesco, inclusive foi acolhido por Lopez-Rey e pelo ilustre médico e professor italiano Franco Ferracuti.

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Para o sociólogo norte-americano Martin E. Wolfgang e para o psicólogo italiano Franco Ferracuti, a Criminologia se desdobra em Criminologia Sociológica e Criminologia Clínica. A Criminologia Sociológica compreende o magistério e a investigação com base na Sociologia. A Criminologia Clínica se manifesta por via da aplicação dos conhecimentos criminológicos e do estudo dos problemas forenses e penitenciários, consistindo, em síntese, na aplicação integrada e conjunta do saber criminológico e técnico para solução de casos particulares, com fins de diagnóstico e terapêutica.As disciplinas preconizadas por Wolfgang e Ferracuti seriam de dois tipos: a) disciplinas fundamentais ou ciências criminológicas: Biologia Criminal, Psicologia Criminal, Sociologia Criminal, Penologia e Criminologia propriamente dita; b) ciências anexas e Medicina Legal, Psicologia Judiciária e Polícia Científica.2

Pontifica do explicitado, por sua objetividade e abrangência, a divisão adotada pela Unesco, ou seja: Criminologia Geral e Criminologia Clínica, competindo à primeira a comparação e sistematização dos resultados obtidos nas diversas ciências criminológicas e estudando, a partir desse momento, o criminoso, o crime e a criminalidade. O crime sendo considerado consoante a situação do ato criminoso, sua forma, os fatores da infração e a dinâmica de determinados delitos. O criminoso sendo analisado segundo a disposição hereditária, o biótipo, o transtorno mental e o mundo circundante. A criminalidade sendo encarada em razão de suas tendências, dos tipos criminosos e da violência empregada.

Como bem esclarecem Wolfgang e Ferracuti, a Criminologia Clínica consiste no approche interdisciplinar no caso individual, com a contribuição dos princípios e métodos das ciências criminológicas. Oobjetivo desse enfoque interdisciplinar é estudar a personalidade do de-linqüente para estabelecer o diagnóstico criminológico e a prognose so-cial, com proposta do plano de ressocialização do criminoso. Em outras palavras: aplicar os princípios e métodos das criminologias especializadas, comportando as seguintes etapas: exame, diagnóstico, prognóstico e tratamento. O grande mérito do exame criminológico é aquele de ensejar o conhecimento integral do homem delinqüente, sem o que não se aplicará uma justiça eficaz e apropriada, restando mero critério de valo-rização político-jurídica.A Criminologia Clínica consiste na aplicação pragmática do conhecimento teórico da Criminologia Geral, sem que isto desvirtue o caráter autônomo daquela, conquanto intimamente ligadas ambas as criminologias. Além 2 Criminologia Integrada – Newton Fernandes e Valter Fernandes – Ed. Revista dos Tribunais

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do mais, a pesquisa científica tem como ponto de partida a Clínica Criminológica. Clínico e pesquisador se completam no progresso científico da Criminologia.

De lembrar que é a Criminologia Geral que sistematiza os resultados das criminologias especializadas e os dados da prática criminológica. O caso particular demanda um estudo interdisciplinar, com supedâneo nas ciências criminológicas e na experiência clínica dos centros de observação e estabelecimentos de reeducação do delinqüente. A observação científica é um dos métodos da Criminologia Clínica, seguida de interpretação no caso de diagnóstico criminológico, ainda que na fase de execução do tratamento reeducativo, antes, portanto, da classificação penitenciária ou início do programa de reeducação do delinqüente.

Para Pinatel, e também para Carrol, a futura Criminologia sairá da elaboração e sistematização da prática criminológica. Tem-se a Criminologia Clínica como o traço de união entre a Criminologia propriamente dita e a Penologia. A Criminologia Clínica, em última instância, tem por finalidade o estudo da personalidade do delinqüente e o seu tratamento. Dissente, por conseqüência, da Psiquiatria Criminal, que se restringe à perícia psiquiátrica e à avaliação da responsabilidade criminal. No plano científico, na verdade, a Criminologia Clínica principia onde finda a Psiquiatria Médico-Legal, melhor dizendo, onde se abandona o domínio patológico.

A rigor, o estudo da Criminologia Clínica deverá absorver sua interdisciplinariedade e também os seguintes temas: Penologia, Direito Penitenciário, exame médico-psicológico e social do delinqüente, classificação penitenciária e plano de tratamento reeducativo do preso, espécies de tratamento (institucional em semi-liberdade etc.), métodos de trabalho reeducativo (pedagógicos, psicológicos, psiquiátricos, socioló-gicos) execução do processo de cura reeducativo (labor nos centros de observação, nas casas de reeducação, nos nosocômios de custódia e as-sistência psiquiátrica etc.).

Embora voltada para a reeducação do delinqüente e sua reinserção social, a Criminologia Clínica igualmente contribui para a prevenção da criminalidade e para a extirpação das condições criminógenas da sociedade através de pesquisas junto à coletividade e notadamente em bairros miseráveis e favelas.

Compete, enfim, à Criminologia, servindo-se do método, científico, o estudo do criminoso e do crime, como acontecimentos sociais que são,

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provindos de múltiplas causas internas e externas. Minudenciando a conceituação, o criminologista Orlando Soares indica, com descortino, que a Criminologia é ciência que pesquisa: as causas e concausas da criminalidade; as causas da periculosidade preparatória da criminalidade; as manifestações e os efeitos da criminalidade e da periculosidade preparatória da criminalidade; a política a opor, assistencialmente à etiologia da criminalidade e à periculosidade preparatória da criminalidade.

É asserção pacífica que a Criminologia tem objeto independente e determinado. Sendo uma ciência realista e não normativa, a Criminologia tem como objeto a dimensão naturalística do evento criminoso.

O criminólogo absolutamente não poderá ser observador passivo da sucessão criminal. Não. Ele terá que ser um participante ativo, seja como cidadão, seja como pesquisador, contribuindo com seu know-how de co-nhecimentos na abordagem e perquirição do fenômeno criminal.Utilizar-se-á, o criminologista, da experimentação direta e indireta. Por via da experimentação direta, alcançada por intermédio de dados propiciados pelos sistemas penitenciários, ele terá elementos de valia para indagar, verticalmente, a transição do homem normal ao homem delinqüente. Concernentemente à experimentação indireta, ela será desenvolvida com o estudo dos fatos anormais naturalmente sucedidos. Aqui, como ensina Roberto Lyra, o criminólogo não poderá olvidar que "o crime é um fato social de conseqüências jurídicas e não um fato jurídico de aspectos sociais". Terá que saber o criminologista, por outro lado, que os fatos sociais são processos de interação que envolvem as pessoas, os grupos coletivos e as heranças sociais, não havendo critérios infalíveis para diferenciar o homem que poderá delinqüir daquele que não poderá delinqüir. Comporta, por oportuno, a afirmativa de Gabriel Tarde que "nenhum de nós pode se gabar de não ser um criminoso nato relativamente a um estado social determinado, passado, futuro ou possí-vel". A idéia do crime, verdadeiramente, é inata no homem, talvez pre-existindo à sua própria consciência.

A Criminologia é a ciência que estuda o fenômeno criminal, a vítima, as determinantes endógenas, que isolada ou cumulativamente atuam sobre a pessoa e a conduta do delinqüente, e os meios labor-terapêuticos ou pedagógicos de reintegrá-lo ao grupamento social.

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Diferenças entre Direito Penal

e Criminologia

O Direito Penal sendo uma ciência normativa; é a ciência da repressão social ao crime, através de regras punitivas que ele mesmo elabora. O seu objeto, portanto, é o crime como um ente jurídico, e como tal, passível de suas sanções. A Criminologia é uma ciência causal-explicativa, tem por objeto a incumbência de não só se preocupar com o crime, mas também de conhecer o criminoso, montando esquemas de combate à criminalidade.

A CRIMINOLOGIA NA HISTÓRIA - A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CRIMINOLOGIA

Condutas que outrora eram atos normais e obrigatórios dos costumes da época, com o tempo se tornaram crimes, e condutas que outrora eram crime, se tornaram fatos normais, conforme vejamos a seguir:

Salienta Lombroso que a mesma dificuldade que se apresenta no es-tudo do crime, dentre os animais em geral, observa-se em relação aos seres humanos primitivos.

Certas práticas, mais tarde consideradas delituosas, eram, por assim dizer, a regra geral; todavia, algumas dessas práticas confundem-se em suas origens com ações menos criminosas.

Tais práticas, nos diversos idiomas, em sua origem, revelam. que não há uma diferença nítida entre ação e crime, surgindo logo depois a idéia de pecado, ou seja, desobediência aos deuses.

Todas as línguas convergem no sentido de nos apresentar a rapina e o assassinato como a primeira fonte da propriedade, aliás, um dos aspectos do darwinismo social, como veremos oportunamente.

Algumas práticas comuns entre os selvagens foram criminalizadas no curso da civilização, como, por exemplo, o aborto. Em certas épocas, a es-cassez de alimentos, as dificuldades de vida e outros fatores constituíram motivos, entre os primitivos, para a prática do abortamento.

O aborto premeditado, desconhecido dos outros animais, foi comum entre os selvagens, tanto nas primitivas tribos orientais, como na América, através de expedientes rústicos, tais como, pancadas redobradas no ventre.

Contemporaneamente, algumas tribos aborígenes brasileiras

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conservam a prática do aborto da forma acima referida (in Direitos Huma-nos na Amazônia, publicação do Inst. dos Ad. Brasileiros, ps. 226 e 227, RJ,1997).

As mesmas causas do aborto tornaram freqüente o infanticídio, entre os primitivos; sacrificava-se aquele que vinha logo após o primogênito ou o segundo, e de preferência as meninas, como ocorria na Austrália e na Melanésia.

Na Índia, do Ceilão ao Himalaia, infanticídio é consagrado pela religião.No Japão e na China, segundo Marco Pólo, o infanticídio era uma forma

de reduzir o crescimento populacional. Da mesma maneira, na América e na África.

Em algumas tribos da África Meridional, após o infanticídio a criança era utilizada como isca para pegar leões; em certas regiões da Austrália matavam-se as crianças e sua gordura era utilizada em anzóis, para as pescarias.

Na América, dentre os tasmaiano, pele-vermelha e esquimó, a morte da mãe era motivo para o infanticídio, porque o costume queria que as crianças fossem enterradas com ela.

Havia outras causas para o infanticídio entre os primitivos: os preconceitos, por exemplo, como a aversão aos gêmeos, encarados como prova da infidelidade da mulher, pois entendia-se que o homem só podia produzir um filho de cada vez (Lombroso, O HOMEM CRIMINOSO, pgs. 30 e segs.)

Na África, quando as mulheres não podiam criar seus filhos, desesperadas pela fome, jogavam-nos no rio.

O dever de assassinar os pais idosos, com mais de 70 anos, conser-vou-se, por transmissão hereditária, como um ato de piedade, mesmo sem necessidade, e às vezes, por acreditar-se que as qualidades e virtudes do sacrificado se transmitiriam aos descendentes.

Algumas vezes ocorriam sepultamentos em vida; as vítimas achavam o fato natural e elas próprias pediam a morte, caminhando deliberadamente em direção à cova onde deviam repousar em definitivo, ou deixadas em abandono.

A religião ensinava que se entrava na vida futura no mesmo estadoem que se estava para deixar a Terra.

O hábito de matar os velhos e os doentes foi praticado na Europa,Ásia, África e América.

Além do assassinato dos velhos e doentes, ocorriam homicídios de crianças, mulheres e homens sadios, seja por motivos religiosos, seja por instintos ferozes.

Às vezes, por ira, as disputas conjugais acabavam pelo assassinato da mulher; o marido, após matá-la, comia o seu coração com um guisado de

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cabra.

As concepções lombrosianas, inspiradas na teoria de Darwin, sobre a criminalidade dentre os animais:

Em síntese, no tocante à comparação entre o equivalente daquilo que se considera crime, entre os homens, e certas ocorrências em relação às plantas, Lombroso invocou as observações de Darwin e outros naturalistas:As plantas insetívoras (que comem insetos), cometendo assim verdadeiros assassinatos deles, atraindo-os por meio duma secreção viscosa, para em seguida os devorar, como meio de se nutrir.

Outras plantas caçam os insetos à semelhança da maneira como os pescadores preparam armadilhas para os peixes.

Essas práticas sobressaem com muito mais evidência em relação ao mundo animal, na ânsia de nutrição, por meio do sacrificio das outras espécies, e, algumas vezes, através do canibalismo, quando então o ser humano, assim como outros animais, devoram os da mesma espécie, não só levados por fome, como também por outras motivações, tais como a ira.

Por sua vez, Ferri distinguiu, só para o assassinato, várias motivações entre os animais em geral.

Certos animais, por exemplo, da mesma espécie, vivem em comum, mas os mais fortes devoram os mais fracos; isso é comum dentre os peixes.

É freqüente não só o canibalismo dentre os animais, como o infanticí-dio e o parricídio, desmentindo-se assim os devaneios sobre o amor maternal e filial entre eles.

A fêmea do crocodilo, às vezes, come seus filhotes, que não sabemnadar.As abelhas defendem furiosamente as colmeias, onde armazenam omel, produto do seu labor.

Há roedores - a fêmea do rato, por exemplo - que devoram seus filhotes, quando molestados.

A fêmea do sagüi, às vezes, come a cabeça do filhote, ou esmaga-o contra uma árvore, quando cansada de carregá-lo.

Dentre os gatos, as lebres, os coelhos, alguns comem seus filhotes.O canibalismo e o parricídio são encontrados dentre as raposas, cujos

filhotes se entredevoram, freqüentemente, e às vezes devoram a própria mãe.

Certa perversidade, rebeldia e antipatia aparecem em animais com de formações cranianas, determinando maus instintos e práticas criminosas.

A velhice toma os animais desconfiados, teimosos, perigosos, agres-

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sivos, por isso são expulsos pelos companheiros e então, no isolamento, tomam-se mais perversos.A fúria, a ira e a raiva são comuns em certos animais, que matam seussemelhantes, sem nenhum motivo, violando os hábitos da maioria.

Ocorrem também delitos passionais, por paixões exacerbadas, sobre tudo pelo amor, pela cobiça, pelo ódio.

Dentre as aves e os pássaros, às vezes, o macho destrói o próprio ni-nho, num acesso de fúria; aves domésticas atacam o ser humano.

Durante o cio, as fêmeas, dentre certos animais, tomam-se furiosas.Observou-se que um casal de cegonhas fazia o ninho em um

vilarejo;um dia, quando o macho estava caçando, um outro mais jovem veio cortejar a fêmea. Primeiro, ele foi rejeitado, depois tolerado, finalmente acolhido. Posteriormente, os dois adúlteros voaram uma manhã para o prado, onde o marido caçava rãs, e o mataram a bicadas.

Entre as cegonhas, o macho leva muito a sério o amor conjugal; quan-do as pessoas, por divertimento, colocam ovos de galinha em seu ninho, o macho, ao ver aquele insólito produto, se enfurece e entrega a "esposa às outras cegonhas, que a dilaceram”.

Têm sido observadas certas práticas, entre as formigas, semelhantes à violência sexual, por parte dos machos adultos contra os menores, assim como entre certas aves.

Algumas vacas substituem o touro junto às companheiras, da mesma forma que entre algumas galinhas.

Ocorrem, também, práticas sexuais dentre animais de diferentes es-pécies, à semelhança da bestialidade, em relação ao ser humano.

Às vezes, as cegonhas massacram os filhotes das companheiras, sob os olhos de suas próprias mães; outras matam os membros do bando que no momento da imigração se recusam ou não conseguem segui-las.

Dentre bois e cavalos selvagens é comum um macho enfurecer-se contra o outro, para conseguir a supremacia sobre as fêmeas.

Há animais domésticos que têm o hábito de furtar objetos dos bolsos de quem os acariciam.

Certos cães domésticos devoram aves ou carneiros, dissimulando eapagando os vestígios de seu gesto.

As bebidas alcoólicas produzem nos animais sintomas semelhantes aos que ocorrem com os homens: tomam-nos irritáveis, tontos e param de

trabalhar, passando sem escrúpulos, à pilhagem e ao latrocínio.O consumo da carne, dentre os carnívoros, toma-os ferozes.Embora sejam poucos os animais, dentre os gatos, cachorros, elefan-

tes, cavalos, que se mostram brigões, indomáveis, assassinos, isso, porém, tanto quanto dentre os seres humanos, repugna aos demais.

A premeditação e a emboscada são comuns nas práticas criminosas dentre os animais.

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Os cinocéfalos (gênero de macacos de cabeça semelhante à do cão) são perfeitos ladrões. Quando vão saquear uma plantação, colocam uma sentinela, para que dê o alarme, no momento em que o homem se aproxima. Esta sentinela deve ficar muito atenta, porque sabe que se falhar, seus companheiros lhe infligirão a pena de morte (Lombroso, O Homem Criminoso, ps. 4 a 25).

É importante para uma ciência que tenha um objeto e um método, exame de seu conteúdo histórico. Na filosofia grega concebia-se a infração contrário a coisa pública, e o delinqüente responsável por sua ação, deveria sofrer uma pena como elemento pedagógico.

Na Idade Média, mais precisamente no começo do século XVII, a filosofia e a teologia influenciavam o Direito Penal, havendo uma enorme confusão entre delito e pecado, delinqüente e pecador.

No Código de Hamurabi, no século XVI e XVII a.c., tínhamos já as responsabilidades distintas entre delinqüente rico e delinqüente pobre.

Não existe condições exatas de fornecer algo sistematicamente pronto antes do início da escola clássica, pois o que em realidade havia eram trabalhos esparsos.

A expressão Criminologia teria sido usada pela primeira vez pelo antropólogo francês Topinard, em 1883. Em 1885, Rafael Garofalo, apresenta uma obra científica A Criminologia.

A base fundamental do pensamento iluminista foi a partir do reconhecimento do estado natural. No estado natural, os homens gozam de igual liberdade e se perdem pelo contrato social, que fazem ganhar sua liberdade civil e a propriedade de tudo que possuem.

O delinqüente que se coloca contra o contrato social é um traidor e, portanto, é expungido do mesmo.

Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, é quem melhor coloca o problema do delito e da pena. Adotam os iluministas posição crítica a respeito das coisas existentes e também respeito ao Estado e sua estrutura.

A Escola Clássica considera a pena um mal que deva eliminar outro mal. Para a Escola Carrariana, todos os homens são iguais, livres e racionais. Por tal fato, a pena é eminentemente retribucionista, e seu fundamento está em ter o homem conspurcado o social.

Nos positivistas, apesar de terem afrontado claramente os clássicos, encontramos correntes utilitárias, além do racionalismo e do cientificismo.

Foi em 1876, aproximadamente um século após o livro de Beccaria, que tivemos a primeira edição do Homem Criminoso, de Cesare Lombroso.

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Tínhamos aí as ciências do homem e a contribuição das Origens das espécies, 1859, de Darwin, e Descendentes do homem, 1871.

Foi Comte quem destacou a importância social da ciência, e com tal significação, da sociedade social. Tudo isso implica a contradição de todo pensamento iluminista, cujo alicerce é a metafísica. Como veremos adiante, o nascimento do positivismo exerceu influência extraordinária não só na Criminologia, como também no Direito Penal.

ESCOLAS CRIMINOLÓGICAS

1.1) ESCOLA CLÁSSICAPara esta escola, a responsabilidade penal do criminosobaseia-se em sua responsabilidade moral, e se sustenta pelolivre arbítrio, que é inerente ao ser humano.Para os clássicos, o livre arbítrio existe em todos os homenspsiquicamente desenvolvidos e sãos. Possuindo tal faculdadepodem escolher entre motivos diversos e contraditórios e sãomoralmente responsáveis por terem a vontade livre e imperadora. O criminoso é totalmente responsável porque tem a responsabilidade moral, e é moralmente responsável porque possui o livre arbítrio.

Cesare Bonesana, Marquês de BeccariaNasceu em Milão, em 1738 e faleceu em 1794. Educou-seno Colégio dos Jesuítas, na cidade de Parma, tendo como cole-gas Diderot e Voltaire, abastecendo-se intelectualmente doambiente da Revolução Francesa.Revolta-se contra as arbitrariedades da justiça da época.Em 1764, aos 27 anos, apresenta a obra "Dos delitos e daspenas". Por temer a Corte, seu trabalho foi impresso em Livorno.Destacam-se entre os postulados fundamentais de Beccaria:

a) somente as leis podem fixar as penas para os crimes;b) somente os magistrados poderão julgar os delinqüentes;

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c) a atrocidade se opõe ao bem público;d) os juizes não podem interpretar as leis penais;

e) deverá existir proporção entre os delitos e as penas;f) a finalidade das penas não é atormentar o culpado, mas

impedir que agrida de novo a sociedade e, por conseqüência,destruir a todos;

g) as acusações não devem ser secretas;h) a tortura do acusado durante o processo é uma ignomínia;i) o réu não deve ser considerado culpado antes da sentença

condenatória;j) não se deve exigir do réu o juramento;k) a prisão preventiva não é sanção, mas apenas o meio de

assegurar à pessoa do presumível culpado e, portanto, deve sera mais leve possível;

l) as penas devem ser iguais para todas as pessoas;m) o roubo é filho da miséria e do desespero;n) as penas devem ser moderadas;o) a sociedade não tem direito de aplicar a pena de morte;p) as penas não serão justas se a sociedade não houver empre-

gado meios de prevenir os delitos;q) a prevenção dos delitos é muito mais útil que a repressão

penal.Beccaria ainda afirmava que "o indulto" é o fruto da imperfeição da lei, ou da falta de compreensão das penas.

Francesco CarraraO mestre de Pisa, que foi, sem dúvida alguma, o artífice da

escola clássica, afirmava:"O homem deve ser submetido às leis penais por sua natureza moral;

em conseqüência, ninguém pode ser socialmente responsável pelo ato praticado se moralmente irresponsável." 3

"A imputabilidade moral é indispensável para a imputabilidade social".Garrara publicou Programma de derecho criminal, surgindo dois princípios:3 Programma de derecho criminal: parte general, vi I, p. 9, Bogotá, Temis, 1988.

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a) que o principal objetivo do direito criminal é prevenir osabusos por parte da autoridade;b) que o crime não é uma entidade de fato, mas de direito.O crime é a violação de um direito, dessa maneira escreveuGarrara:"Acreditei ter achado essa forma sacramental; e pareceuque dela emanavam uma a uma todas as grandes verdadesque o direito penal dos povos cultos já reconheceu e proclamou nas cátedras e no foro, expressei dizendo - o delito nãoé um ente de fato, mas um ente jurídico. Com tal proposiçãose abririam espontaneamente as portas de todo o direito criminal, em virtude de uma ordem lógica e impreterível.E esse foi o meu programa"42.

1.2) ESCOLA POSITIVAA escola antropológica é baseada no determinismo psicológico, inaceitando o livre arbítrio e expungindo a responsabilidade moral dos indivíduos.O homem está sujeito a lei da causalidade e seus atos sãoconseqüências internas e externas, que dão diretriz à vontade.

Cesare LombrosoNasceu em Verona, em 6 de novembro de 1835, descendente pelo lado paterno de judeus-espanhóis, expulsos de pátriapêlos Reis Católicos, em 1492.

Rafael GarofaloNasceu em 1852, vindo a falecer em 1934. Publicou o livroCriminologia em 1884, foi Ministro da Corte de Apelação deNápoles. Iniciando-se do Criminoso nato, de Lombroso, imaginou que houvesse sempre um delito em qualquer lugar ou época.Do prisma do grande jurista, o ponto de partida seria sociológico.Apesar de renunciar a uma universalidade absoluta da moral, determina alguns instintos morais que fazem parte da espécie humana.

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Classificou os delinqüentes segundo as descrições feitas porFedor Mijailovich Dostoievski nas obras: O idiota, Crime ecastigo, A Casa dos mortos, Os irmãos karamazov.Dessa maneira, destacou:a) os que agridem os sentimentos de piedade (assassinos);b) os que agridem os sentimentos de probidade, (ladrões),c) os que infringem ambos sentimentos, como os assaltantes e os criminosos;d) os cínicos, que cometem os crimes sexuais.

2.1) ESCOLA ECLÉTICA OU CRÍTICAOs seguidores dessa escola definem o conceito de crime conforme a

escola positiva ou fazem uma reprodução da escolaclássica.

Franz Von Liszt em seu Tratado de Direito Penal Alemão,afirma:"é o injusto contra o qual o Estado comina pena, e o injusto,quer se trate de delito do direito civil, quer se trate do injustocriminal, isto é, do crime, é a ação culposa e contrária aodireito." 4

Examinando-se essa definição, temos os seguintes caracteres:1. O delito é sempre um ato humano, portanto, uma atuaçãovoluntária transcendente ao mundo exterior.2. O delito é também um ato contrário ao direito, um atoformal, que ataca um mandato de proibição de ordem jurídica,implicando materialmente numa lesão ou perigo.3. O delito é, finalmente, um ato culpável; melhor afirmando: um ato doloso ou culposo de um indivíduo responsável.O penalista alemão entende o delito como entidade jurídica.Segundo Turati, o crime teria como elemento principal asmás condições econômicas da sociedade, e a miséria o fatorprimordial da existência da criminalidade.4 António Moniz Sodré de Aragão - As Três Escolas Penais, 3" ed.. Saraiva, SãoPaulo, 1928, pp. 139-140.

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Tarde explica como causa do crime, as causas sociais complexas.Alexander Lacassagne afirmou:

"O meio social é o caldo de cultura da criminalidade; omicróbio é o criminoso, um elemento que não tem importância, senão no dia em que acha o caldo que o faça fermentar. As sociedades têm os criminosos que merecem." 5

2.2) A Terceira escolaSão fundamentos da terceira escola:

1. O direito penal deveria permanecer como ciência independente, separando-se do pensamento de Lombroso, que pretendia incluí-lo na criminologia.2. O grande número de causas do delito não é exclusivo daconstituição criminal do indivíduo, adotando-se a teoria daescola francesa, que invoca o sujeito predisposto, o que irá tornar-se em delinqüente no momento em que o meio se tornarfavorável.3. É necessário o trabalho conjunto de penalistas e sociólogos para atingir as reformas sociais que melhorem as condiçõesde vida do povo, dessa forma aceitando-se os princípios daescola francesa (exógenos).4. A pena é como uma coação psicológica sobre os indivíduos, examinando-a no plano de imputáveis ou inimputáveis.Entre aqueles que organizaram a terceira escola temos Car-nevale e Bernardino Alimena .

2.3) Escola neoclássicaOs positivistas atacaram os clássicos, pois estes consideravam o crime apenas uma abstração, descuidando-se dos criminosos. As circunstâncias de idade, sexo, surdo-mudez, estadosmórbidos, coação, reincidência, tornavam nesses criminosos,variados, os matizes da inocência ou culpabilidade.

5 António Moniz Sodré de Aragão - As Três Escolas Penais, 3' ed.. Saraiva, SãoPaulo, 1928, p. 147.

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2.4) Escola neopositiva

O ilícito jurídico do crime tem um autor que é o ser humano, ou seja, o criminoso, que não pode ser desprezado e suprimido.

Deve-se estudar e entender o criminoso, mas acima de tudo devemos ser cuidadosos e atentos na proteção da sociedade, não sendo injustos e impiedosos.

Entre os neopositivistas deve-se abrir espaço para os neo-antropologistas. A antropologia criminal lombrosiana seria diferencial. A antropologia de Saldafía é integral e trata antes da deformação, da ruína do indivíduo, como efeito inicial do vício e do crime, e ao mesmo tempo, como causa de sua continuidade.

Mendes Correia, por sua vez, é antropologista e gênio, repele a antropologia criminal convencido da atipia dos criminosos por serem inclassificáveis.

A antropologia física ou psíquica é o que interessa no estudo do delinqüente, embora tenhamos outra que estabelece as relações do físico com o moral, ou seja, a antropologia criminal.

2.5) Escola espiritualista

Embasa-se na Escola Clássica. Regressa ao livre arbítrio,que foi impulsionado pela negação do criminoso nato.

Encontramos em tal escola Luchini, Vidal e Mayer.

2.6) Escola neo-espiritualista

Colocou-se como meio termo entre o livre arbítrio e o determinismo. Propunha que se é certo que o homem tem liberdade, esta não existe no sentido amplo, mas com limitações determinadas pelo meio ambiente, reduzindo essa liberdade à convivência social. Era defendida por L. Proal O crime e a pena, e o alemão De Baets.

2.7) Escola dogmática sociológica, biossociológica de Von Liszt

Pela teoria de Von Liszt, o homem é o centro de seus estudos. Esta Escola propôs a independência do Direito Penal, entretanto, por aceitar os princípios da Escola Positiva (delito como fato natural e social, admitindo as causas endógenas e exógenas) e os da Escola Clássica (delito como

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ente jurídico e o livre arbítrio), veio a se tornar eclética.Define o delito com um fato biossocial e ambiental, mas examinado axiologicamente como ente jurídico. A pena, apesar de ser uma grande preocupação para essa escola, não é um fim em si mesma, mas um meio. Aceita a multa, a prisão condicional, a pena correcional e também a absolutória.

O ESTUDO DA DELINQÜÊNCIA DEPOIS DE EN RICO FERRI

O continuador da escola de Ferri, Felipo Grispigni (1884-1955), destacou na Sociologia criminal, o estudo da delinqüência como fenômeno social e, portanto, como fenômeno de massa.

Elementos gerais da delinqüênciaAs formas de delinqüência dependem das condições de vida de um

povo, sua religião, seus costumes, sua história e o seu progresso.

Aqueles que alcançam grande desenvolvimento são tementes de uma guerra nuclear.

A tecnologia de ponta acarreta um enfraquecimento de valores morais, como a prostituição. Destacamos, desde logo, a República Norte Americana, em que os delitos se alteraram para uma atividade mais organizada, como os crimes do colarinho branco. .

Na Inglaterra, Alemanha, Itália, França, o crescimento da delinqüência juvenil é um fato que se agrega a sua desorganização social. Da mesma maneira, vamos encontrar essa extensão da delinqüência na Suécia, que, em face de uma concepção ultra materialista, impregnada do socialismo, traz resultados bastante cinzentos e funestos para aquela coletividade.

O que nos chama a atenção nos países ultra desenvolvidos é a delinqüência oculta que se eleva de forma geométrica.

Fatores geográficos da delinqüênciaAs variações de tempo consagram determinados delitos nos

países frios e nos países quentes.Os fatores geográficos já haviam chamado a atenção de Quételet, e da

mesma forma afirmados por Ferri, que em levantamentos, confirmaram a predominância dos delitos contra a pessoa nas regiões equatoriais.

Manteve-se em primeiro lugar nas regiões frias, os crimes contra a

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propriedade.

Fatores ecológicos: cidade e campoO criminologista Denis Szabo, demonstrou a relação entre a

delinqüência e o meio urbano, demonstrou que a delinqüência no meio urbano foi mais reduzida no século XIX.

Os resultados encontrados por Szabo devem ser levados em conta de uma forma relativa, e aplicados com grande cuidado, devido as oscilações das relações sociais.

Fatores econômicos

Cesar Herrero Herrero afirma em seu livro Los delitos económicos, que "tanto o direito penal como a criminologia tem como parte de seu objeto o conceito de delito.

O Direito Penal olha através de uma ótica normativa, a criminologia trata de uma dimensão de maior amplitude".

Continua Herrero afirmando que "haverá delito econômico quando se trata de uma conduta típica, antijurídica, imputável, culpável e punível, sob as luzes de uma Lei pertencente ao direito econômico"48.

Niggemeier define delito econômico: "como as infrações penais que se cometem explorando o prestígio econômico ou social, mediante o abuso das formas e as possibilidades de configurar os contratos que o direito vigente oferece, ou abusando dos usos e das razões de vida econômica, embasados em alta confiança, infrações penais que, de acordo com a forma que se cometem e as repercussões que têm, são idôneas para perturbar ou colocar em perigo, acima do prejuízo dos particulares, a vida e a ordem econômica" 6.

EVOLUÇÃO DA CRIMINOLOGIA

A sistematização científica da Criminologia constitui esforço recente, abrangendo inclusive o estudo de sua evolução, segundo o critério de divisão em períodos históricos ou fases, como o fez Israel Drapkin (Manual de Criminologia, pp. 9-69).

6 Francisco Alonso Pérez - Introducción ao Estudio de Ia Criminología, EditorialReus, Madrid, 1999, p. 296.

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Precursores da Criminologia na Grécia

Na antiga Grécia, a mitologia está repleta de condutas delituosas: ho-micídios, roubos, violações. Zeus, por exemplo, o pai dos deuses, pode ser considerado aquilo que Lombroso qualificou de "criminoso-nato"; ApoIo é homossexual; Poseidão, deus do mar, é outro maníaco sexual; Vênus é mentirosa, cruel e adúltera; Hermes, um criminoso precoce, e assim por diante.Dentre os pensadores gregos, que se destacaram no estudo dos problemas criminais, encontramos algumas idéias precursoras.Arquimedes (287-212 a.c.), grande fisico e matemático, figura como o precursor da Criminalista, das perícias e exames criminais.

Considera-se Hipócrates o iniciador da corrente biologista da Crimi-nologia, cujas particularidades examinamos noutra parte da presente obra.Por sua vez, Platão (427-347 a.c.) é considerado o precursor das correntes sociológiocas da Criminologia; assinalava que o crime é produto do meio ambiente; a miséria é um fator criminógeno, pois produz vadios e in-divíduos sórdidos; o ouro é causa de muitos delitos, porquanto a cobiça égerada pela abundância, que consegue apoderar-se da alma enlouquecida pelo desejo.

Precursores da Criminologia em Roma

Em Roma, Sêneca (c. 4 a.C.-65 d.C.) é considerado o criminólogo de maior destaque; em sua análise sobre a ira, ele a considera como motor básico do crime, por isso que a sociedade está sempre em luta fratricida.

Sobre os aspectos das causas econômicas, como causa da criminali-dade, não existe nada em Roma, salvo uma polêmica entre os que a consideravam um fenômeno social e os estóicos e epicuristas, que exaltavam a pobreza, fonte da felicidade e a força moral dos homens, pois entendiam que a riqueza os entorpecia e corrompia.

os chamados "doutores da Igreja" e escolásticos não se ocuparam do problema da criminalidade, até que o monge Tomás de Aquino (1226-1274) sustentou algumas idéias próprias a respeito. Na Summa contra gentiles afirma que a pobreza é em geral uma ocasião de roubo. Na Summa Theologica, defende o furto famélico, e, sob certos aspectos, idéias socialistas.Por sua vez, o monge Agostinho, embora vivesse no período de 354 a 430 d.C., é considerado um pensador medieval; para ele, a pena de talião "é a

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justiça dos injustos". Sustentava que a pena deve significar uma ameaça e um exemplo. Deve ser também u'a medida de defesa social, mas, principalmente, contribuir para a regeneração do culpado.

Da mesma fonna, a Astrologia - conhecida desde a Antigüidade, entre os chineses, hindus, egípcios e os maias -, sustentava que o comporta-mento se rege pelos atos e seus movimentos, influenciando assim a conduta delituosa humana.

Aliás, desde a mais remota Antigüidade, a mitologia, a religião e Astrologia estavam intimamente ligadas, servindo hoje de meios auxiliares para diversas ciências. A Astrologia, por exemplo, é considerada vestíbulo da Astronomia. .

A Demonologia, por sua vez, estudava a situação dos indivíduos lou-cos, sujeitos a ataques de toda ordem, considerando-os possuídos pelos demônios, o que permitiu inomináveis crueldades e torturas, sob o manto de abusos da religião. Quando os algozes e torturadores dos tribunais da Inquisição supliciavam o suspeito de heresia, faziam-no na finne e fanática convicção de que, quebrantando as forças fisicas da vítima, estavam com isso enfraquecendo as resistências dos demônios, os quais supostamente dominavam os suplicados.

Assim, a Demonologia, tentando estabelecer a relação entre o corpo e a alma humana - o orgânico e o psíquico -, preocupa-se com a "natureza e as qualidades dos demônios"; ela tem antecedentes muito antigos, como na religião do Irã, onde se adorava um deus bom (Ormuz) e um mau (Ahra-Mani).

Renascimento e a Criminologia

O Renascimento, como se sabe, constituiu um renascer cultural, sus-tentado pelos próprios humanistas dos séculos XIV, XV e XVI.

Em oposição aos que consideravam as "trevas medievais", os huma-nistas exaltaram os novos tempos, em que ressurgem as Letras e as Artes: Petraca orgulha-se de haver feito renascer os estudos clássicos, por muitos séculos esquecidos; Boccaccio atribui a Dante o ressurgimento da poesia e a Giotto, o renascer da pintura, e assim por diante.

Entre os filósofos e pensadores dos séculos XVI e XVII, relativamente à Criminologia, destacou-se Thomas Morus (1478-1535), que foi chanceler de Henrique VIII.

Em sua obra Utopia Morus descreve a enorn1e onda de criminalidade

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que assolava a Inglaterra, na época em que ele viveu, época essa marcada pela truculência oficial, com a aplicação sumária da pena de morte. Aliás, o próprio Morus acabou sendo decapitado por determinação de Henrique VIII.

A Utopia representa a primeira crítica, fundamentada, ao regime bur-guês em ascensão e uma análise profunda das particularidades inerentes ao feudalismo em decadência.

A primeira parte da obra é o espelho fiel das injustiças e misérias da sociedade feudal; é, em particular, o martirológico do povo inglês sobre o reinado de Henrique VIII, um tirano avarento. Eram, porém, várias as cau-sas da opressão e sofrimento do povo: a nobreza e o clero possuíam a maior parte do solo e das riquezas públicas; estes bens permaneciam estéreis, enquanto a fome atormentava a população.

Além disso, nessa época, os grandes senhores mantinham na multidão de vassalos, seja por amor ao fausto, seja para - como polícia particular, capangas - assegurar a impunidade dos crimes praticados pelos seus amos, ou ainda para utilizar ditos vassalos como instrumentos de violência contra os habitantes da vila. Essa vassalagem era o terror do camponês e dos trabalhadores em geral.Por outro lado, o comércio e a indústria na Inglaterra não tinham muita expansão antes das descobertas de Vasco da Gama e Colombo. Assim, as gerações se. sucediam sem finalidade, sem trabalho, sem pão. A agricultura estava em ruínas, desde que a nascente indústria da lã, prometendo lucros espantosos, fez com que terras imensas fossem transformadas em pastagens para carneiros. Em conseqüência disto, u'a multidão de camponeses viu-se reduzida à miséria, provocando a multiplicação da mendicidade, vagabundagem, roubos e assassínios.

Período da Antropologia Criminal (1876-1890)

Paralelamente ao desenvolvimento das Escolas de Direito Penal sur-giram diversas teorias, que constituíram as bases da sistematização científica da Criminologia, no século XIX.

Sob certo aspecto, as discussões estiveram centradas, em parte, no enfoque filosófico acerca do binômio livre arbítrio e determinismo, em relação às condutas delituosas do ser humano, e de outro lado na questão antropológica, no ativismo.

Malgrado a vulnerabilidade de suas teorias, acerca do criminoso-nato, Cesar Lombroso (1835-1909) desenvolveu uma série de estudos e pesquisas, que polarizaram as atenções do mundo científico de então, quando, em 1876, ele publica o seu momentoso livro o Homem

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Delinqüente, onde aborda, inclusive, aspectos relacionados à criminalidade em geral, dentre as diversas espécies animais, como vimos anteriormente.

Dentre os fundadores da Escola Positiva, em Direito Penal, considera-se Lombroso o antropólogo, Garofalo o jurista e Ferri o sociólogo.

Incontestavelmente, Lombroso teve o mérito de contribuir para a sis-tematização científica da Antropologia Criminal, com o que desviou a atenção do fato criminoso - até então a preocupação máxima dos crimina-listas - abrindo o caminho para o surgimento da Escola Positiva, em oposi-ção à Escola Clássica.

Período da Sociologia Criminal (1890-1905)

Este período evolutivo da Criminologia se confunde com o nome de scola Francesa ou de Lyon, ou das teorias do meio ambiente. Estas teorias compreendem todas as concepções sociais e ambientais que se levantaram contra as concepções lombrosianas, as quais se centravam na idéia de que s fatores endógenos, ou seja individuais, predominavam na conduta do indivíduo, como decorrência do atavismo, resultando no criminoso-nato.

Para a Escola Francesa, ao contrário, eram os fatores exógenos, isto é, ambientais, os mais importantes em relação à conduta do indivíduo, levando-o ao crime, em determinadas circunstâncias.

Para essas teorias contribuíram as idéias de Augusto Comte(798-1857), os estudos de Quetelet, Emílio Ducpétiot (1804-1868).

Período da Política Criminal ou Fase Eclética (de 1905 às Tendências Atuais das Teorias Criminológicas)

Esse período se caracteriza por uma espécie de trégua na discussão inflamada, resultante do entrechoque de idéias entre as teorias francesas e italianas, sobre as teorias lombrosianas.

Surgiram três Escolas:1) A Terza Scuola2) A Escola Espiritualista3) A Escola de Política Criminal

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Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica. Propostas ou Programas de erradicação da miséria. Cestas básicas

A Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica engloba diferentes matizes ou vertentes, originários todos, direta ou indiretamente, da fonte comum: a Escola Positiva.

Para a Criminologia Tradicional ou Clássica há, fundamentalmente, certos comportamentos humanos considerados maus, em si, apenados em virtudes de normas que são, supostamente, produto de um consenso coletivo, segundo as concepções da democracia burguesa, o liberalismo político-econômico.Em suma, a Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica se revela estacionária, imobilista. Não atenta para o fundamental: a permanente crise crônica do sistema capitalista, decorrente dos antagonismos e contradições insuperáveis, inerentes ao próprio sistema.

CRIMINALIDADE E CIÊNCIAS AFINS

O termo enciclopédia se aplica a qualquer obra que abranja todos os ramos do conhecimento.

Nesse sentido, destacaram-se os cognominados enciclopedistas fran-ceses, elaboradores da teoria do liberalismo (século XVIII), que serviu de fundamento ao advento do Estado liberal, após a Revolução Francesa (1789).

Dentre esses enciclopedistas notabilizaram-se D'Alembert, Diderot, Buffon, Hume, Montesquieu, Rousseau e Helvetius, que procuraram, antes de tudo, "a distinção entre a justiça divina e a justiça humana, pugnando pela soberania popular contra o absolutismo medieval, pelos direitos e ga-rantias individuais contra o Estado totalitário do Direito divino" (cf. Rober-to Lyra, Novíssimas Escolas Penais, ps. 5 a 8).Essa época foi considerada o período humanitário do Direito Penal, a partir da publicação da obra de Cesar Bonecasa (1738-1794), marquês de Beccaria, nascido na Itália, trabalho esse intitulado Tratado dos Delitos e das Penas, quando o autor contava 26 anos de idade, por volta de 1764; modestamente, ele afirmou que escreveu dita obra sob a inspiração dos enciclopedistas franceses.

Seja como for, acentua Enrico Ferri, nem os romanos, com sua extra-ordinária intuição para os fenômenos jurídicos - intuição essa consubstan-ciada no acervo notável que legaram à posteridade no campo do Direito

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Civil-, nem os juristas da Idade Média lograram estruturar uma teoria ci-entífica em matéria criminal, como sistema filosófico (La Sociologia Cri-minelle, ps. 2 e 3).

Daí afirma-se que os romanos foram gigantes em matéria de DireitoCivil, porém, pigmeus no tocante ao Direito Penal.

As disciplinas que compõem a Enciclopédia das Ciências Penais

Partindo do quadro e da esquematização formulados por Luis Jiménez de Asúa, com relação à classificação das ciências penais - a Enciclopédia das ciências penais -, em seu Tratado de Derecho Penal (Tomo I, p. 92), diversos autores têm elaborado variantes dessa classificação, com ligeiras modificações de somenos importância, quanto ao agrupamento e na-tureza dessas ciências (Luis Rodrigues Manzanera- Criminologia, pp. 58, 82 e segs.).

Essas ciências - como conjunto enciclopédico - podem ser agrupadas e classificadas, segundo a sua natureza, da seguinte forma:

Ciências histórico-filosóficas História do Direito Penal Filosofia do Direito Penal Direito Penal Comparado

Ciências causal-explicativas Antropologia Criminal Biologia Criminal Psicologia Criminal

Antropologia é a ciência do homem, como ser social e animal.A Antropologia se divide em dois amplos campos de estudo: um se refere à forma física do homem, o outro a seu comportamento aprendido. Chamam-se, respectivamente, Antropologia Física e Antropologia Cultural.

A Antropologia Criminal baseia-se nos princípios gerais da Antropologia, Psicologia, Patologia, Psiquiatria, Biologia, Anatomia, Eugenia, Embriologia e Biotipologia.

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A Biologia Criminal é a ciência que trata dos seres vivos ou organismos, suas origens, natureza e evolução.

Psicologia Criminal é o ramo da Psicologia que estuda as manifestações psíquicas, através do estudo e da classificação dos processos psíquicos do homem delinqüente.

Psicanálise Criminal é o ramo da Psicanálise que se dedica ao estudo da personalidade do delinqüente, partindo das angústias e dos complexos de culpa que o afligem, levando-o à procura da bebida, da droga, enveredando pelos caminhos do crime, para a solução dos seus problemas íntimos.

Sociologia Criminal é a ciência que estuda o fenômeno criminal do ponto de vista da influência do meio social sobre a conduta humana criminosa.

(ESTRESSE)TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO

terrorismo, guerra, violência pessoal, seqüestro, etc.

O medo pode matar, e isso não é nenhuma novidade na medicina. A ansiedade, que é a versão civilizada do medo, também mata. Os atos de violência, em qualquer de suas formas, desde violência coletiva, como é o caso da guerra, dos atentados, das violações de direitos, etc, até a violência individualizada, como são os assaltos, os estupros, a tortura, etc. podem ser comparados à uma espécie de câncer da alma.

As vítimas diretas ou indiretas (familiares, testemunhas, etc) da violência correm um risco de desenvolverem algum transtorno emocional em torno de 60%, enquanto a porcentagem da população geral tem este mesmo risco reduzido a 20%.

As Vítimas do Terrorismo e Transtornos Mentais.

Carmem Leal, Presidente da Sociedade Espanhola de Psiquiatria, reconhece que as situações catastróficas como aquelas ocorridas no World Trade Center, podem aumentar muito a incidência do Transtorno de Estresse Pós-traumático. Alerta que nem todo o mundo está sofrendo do Transtorno de Estresse Pós-traumático. Estar angustiado, ansioso ou “nervoso”, estar reagindo emocionalmente de uma maneira algo estranha

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por alguns dias não significa ter, obrigatoriamente, Transtorno de Estresse Pós-traumático”.

Algumas observações têm constatado que só um terço das pessoas expostas a estas situações traumáticas, não apenas às situações que envolvam terroristas, mas também as catástrofes naturais, acidentes viários e, inclusive, a violência doméstica, tem probabilidades de apresentar o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (Shalev, 1992). Outras pesquisas chegam a 54% (Weisaeth, 1989).

Sabe-se hoje, serem muito freqüentes as seqüelas psico-traumáticas nas pessoas afetadas por atentados terroristas. Shalev (1992) encontra 33% de Transtorno de Estresse Pós-Traumático em vítimas civis israelitas. Medina et al. cita outros autores, como, por exemplo, Loughrey, que encontra 23% de Transtorno de Estresse Pós-Traumático em 499 vítimas do terrorismo em Irlanda do Norte, Abenhaim, com incidência de 18 % de Transtorno de Estresse Pós-Traumático em 354 vítimas de 21 atentados produzidos na França de 1982 a 1987 e, finalmente, Weisaeth, para quem a incidência do Transtorno de Estresse Pós-Traumático chega a 54% em vítimas do terrorismo e da tortura.

O diagnóstico do Transtorno por Estresse Pós-Traumático baseia-se nos seguintes sintomas básicos: 

1. Atitude psíquica de reviver o trauma, através de sonhos e de pensamentos durante a vigília;

2. Comportamento de evitação persistente de qualquer coisa que lembre o trauma e embotamento da resposta a esses indicadores;

Estado afetivo hiperexitado persistentemente.

Do ponto de vista clínico, é bem possível que os Transtornos Fóbicos dominem o quadro, como veremos abaixo, apresentando medo exagerado e sofrível para sair de casa ou para freqüentar lugares públicos se a vivência foi bomba, incêndio ou coisa assim. Também são freqüentes as Depressões persistentes com autodepreciação e sentimentos de ser uma carga para os demais. 

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Quadro Clínico do Transtorno por Estresse Pós-TraumáticoSintomas %

1. Tensão no corpo 95

2. Mal estar em situações que recordam o trauma 90

3. Sentimentos depressivos 90

4. Freqüentes mudanças de humor 90

5. Dificuldades para conciliar ou manter o sono 88

6. Sobressaltos com ruídos ou movimentos imprevistos 88

7. Se irrita ou enfada com mais facilidade 82

8. Tendência ao isolamento dos demais 81

9. Sonhos desagradáveis ou pesadelos sobre o acidente 69

10. Sentimentos de culpa, auto-acusações 39

Seja devido a Depressão, seja pelo próprio Transtorno por Estresse Pós-Traumático, o paciente sente seu futuro desolador, turvo, e sem perspectivas. Depois da experiência traumática, a pessoa com Transtorno por Estresse Pós-Traumático mantém um nível de hiperatividade e hipervigilância crônica, com reação exagerada aos estímulos (sobressaltos, sustos) e descontrole emocional, tendendo ora à irritabilidade, ora ao choro.

Todos esses estudos sugerem que, de fato, é provável que alguns tipos de eventos sejam mais traumáticos que outros e produzam taxas e gravidades diferentes de Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Outra observação importante nesses trabalhos é que o Transtorno de Estresse Pós-Traumático que aparece nas vítimas da violência terrorista não tem preferência em relação ao sexo, sendo acometidos de igual maneira tanto homens como mulheres diante dos atentados sobre a população civil.

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O CIDADÃO COMUM E O SEU DIREITO À LEGITIMA DEFESA

Para os defensores do desarmamento, as armas são como coisas vivas com vontade própria. Eles descrevem armas como se elas tivessem braços, pernas e vontade própria. Eles falam sobre "armas roubando lojas "; e "armas matando pessoas". Para usar o "pensamento" dessa nova classe de defensores dos grupos anti-armas, e para usar as palavras como eles usam, deveríamos acreditar que carros vão a bares, ficam bêbados e então correm para matar pessoas. Como "motoristas bêbados não matam pessoas, carros matam pessoas"; Deverá acreditar que martelos e madeiras constroem casas por vontade própria. Como "pessoas não constroem casas, martelos e madeiras constroem por vontade própria". Para essa classe, cada arma é realmente algum tipo de Exterminador, e quando ninguém está olhando, crescem braços e pernas nas armas e elas saem dos armários para matar pessoas. Todos acham que o controle das armas será a solução para todos os problemas. Quando o "controle das armas" chegar, não haverá mais roubos de carros, acabarão os assaltos , não haverá mais crimes, cessarão os nascimentos ilegítimos, todos os traficantes desaparecerão e o mundo será bom. Muitos deles pensam que animais são mais importantes que pessoas. Eles se preocupam mais em proteger animais do que proteger pessoas. (1)

OBS: Mesmo no Brasil, matar animais silvestres é um crime inafiançável , enquanto que o agressor poderá responder em liberdade se matar uma pessoa.

Serão as armas a causa da violência? Menor número de armas será igual a menor número de crimes? Muitas opiniões tem surgido, a maioria movida por fatores pessoais na qual a pessoa coloca o seu próprio sofrimento ou histórias que ouviu contar.

Automóveis matam mais do que qualquer outro meio violento .Atropelamentos matam 30 por dia.No ano de 1995 , 25.513 brasileiros morreram por acidentes de transito. Os alvos principais foram os pedestres (43,3% - 11052) seguidos por condutores (34.3% - 8754) e por passageiros (22,4% - 5.707) .Entre 1965 e 1973, na Guerra do Vietnã, um dos mais encarniçados combates deste século, morreram 45.941 soldados americanos. A média foi de 5.104 baixas por ano - pouco menos da metade dos 11.052 brasileiros fulminados por atropelamentos. Não estamos falando dos que ficaram

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inválidos, e nem dos custos desses atropelamentos.Em Porto Alegre, de janeiro a agosto de 1996, 52 pedestres morreram atropelados. (2)

Na BR-386 com 445 Km de extensão, temos os seguintes dados:

- Uma pessoa morre a cada 3,5 dias ; - Uma pessoa fica ferida a cada 10 horas ; - A cada 6 horas ocorre um acidente ; - O custo com atendimento médico - hospitalar a acidentados em

estradas federais no país custa cerca de US$ 22 milhões por ano.(19)

Na BR-290 com 725,6 Km, temos os seguintes dados:

- Uma pessoa morre a cada 6 dias; - Uma pessoa fica ferida a cada 11 horas; - A cada 5 horas ocorre um acidente; - Um acidente custa uma média de US$ 27 mil à União, incluídos

neste valor gastos com patrulheiros e danos à carga, principalmente quando são tóxicas. (20)

Será que as causas foram os veículos? Ou será que as causas foram as pessoas imprudentes, irresponsáveis ou as leis que não são cumpridas e que levam as pessoas a confiarem na impunidade; o desrespeito à vida dos outros; a falta de educação e de princípios morais; ou seja muitas podem ser as causas, mas certamente não foram os meios. Pois, qualquer automóvel parado na garagem, não sai sozinho para atropelar alguém.

Estatística Canadense :

O numero de mortes ocasionadas por carros no Canadá em 1991 foi de 3882. O numero de mortes ocasionadas por armas de fogo em 1990 no Canadá foi de 66.O custo do seguro mostra que armas de fogo são consideravelmente menos perigosas que automóveis. A National Firearms Association oferece um seguro de $2.000.000,00 por apenas $4,75 por ano. O seguro de um automóvel varia de $400 a $2000 por ano. Todos as taxas de seguro estão baseadas em estudos atuariais sobre riscos e histórias de acidentes.

Carros versus Armas de fogo:

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- Você não necessita uma licença de motorista para comprar um carro (ou gasolina)

- Você não necessita referencias para comprar um carro. - Você não necessita se submeter a uma ficha policial para comprar

um carro. - Você não necessita justificar a compra de um carro. - Você não necessita ser membro de uma Associação ou Clube para

ter um carro. - Você não necessita guardar o seu carro trancado em uma garagem

fechada. - Você pode ter quantos carros você desejar. (32)

Muitas manchetes de jornal nos chamam a atenção, demonstrando que o numero de mortes por outros meios, que não as armas de fogo, são em grande número:

- "Preso o homem que matou com a pá " (21) - "Bebeu e matou com faca... " (22) - "Menor esfaqueia marceneiro " (23) - "Família é assassinada a facadas " (24)

Mutatis mutantis, com as armas de fogo ocorre o mesmo . Nenhuma arma por livre vontade mata alguém. Todos estão cansados de ouvir, mas poucos param para pensar numa frase que diz: Armas por si só não matam pessoas, pessoas matam pessoas. O Papa João Paulo II declarou: "Quem mata é o homem, não a sua espada ou seus mísseis".O cardeal-arcebisbo, de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, defendeu um maior numero de policiais nas ruas, com mais armas. (25)Portanto não é tirando os meios que resolve o fato. Mesmo porque , o dia em que as "armas forem considerados fora da lei , somente os fora da lei terão armas".Desarmar a população? Que população? A que paga impostos e mantém o Governo? A que deseja ordem e progresso como diz em nossa bandeira? Ou a população de assaltantes, criminosos, marginais que proliferam, transformando o País num caos e colocando o trabalhador honesto numa prisão albergue , da qual ele pode sair pela manhã para trabalhar e voltar logo para casa e ficar trancado entre grades e portões de ferro. Conforme estatísticas do Departamento de Armas, Munições e explosivos ( DAME ), de Porto Alegre, nos últimos 3 anos, das pessoas

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com porte de arma, somente duas se envolveram em confrontos, sendo que uma foi legitima defesa e a outra foi o chamado disparo acidental. Portanto, os tiroteios que ocorrem estão sendo realizados por marginais e por armas clandestinas, pois sabemos que o numero de armas clandestinas é muito maior que o numero de armas legais.O contrabando ocorre em grande escala.

No Fantástico, foi mostrado a venda de armas clandestinas (desde metralhadoras até fuzis de assalto) numa favela do Rio de Janeiro. Porque não desarmar esses marginais?Porque querer tirar do cidadão de bem o seu legítimo direito de defesa? O Estado não possui condições de dar proteção ao cidadão que paga impostos para ter segurança. Seria o caso de perguntar se isso não estaria incluso no código do consumidor, no qual o cidadão está pagando por um serviço que não está tendo. E mesmo assim o Estado que deveria por lei proteger o cidadão, ainda deseja colocá-lo frente a frente com o marginal, e ainda por cima desarmado?Se o Estado não pode devolver a vida, não tem o direito de tirá-la. E está tirando quando nega a legitima defesa ao cidadão.A Policia não é onipresente, isto é, não pode estar presente o tempo todo em todo o lugar. Normalmente ela chega após o fato ocorrido.

Podemos ter certeza de que se fosse realizado um plebiscito para sabermos a opinião da população sobre o desarmamento, todos os marginais votariam a favor, pois assim o "trabalho" deles ficaria mais fácil, uma vez que somente eles teriam armas.

Existe uma questão crucial nas leis sobre controle de armas. Qual o seu verdadeiro efeito?Mais vidas serão salvas ou perdidas? Elas deterão o crime ou o encorajarão? Para providenciar uma resposta mais empírica, foi realizado um estudo sobre uma lei de controle de armas, - a permissão para o porte de arma oculta, ou seja -sem ser visível.Trinta e um Estados Americanos deram aos seus cidadãos o direito de portar armas caso não possuíssem ficha criminal ou historia de doença mental. O professor John R. Lott Jr., ( University of Chicago Law School) juntamente com David Mustard ( graduado em economia pela University of Chicago), analisaram as estatísticas criminais do FBI num total de 3.054 Condados Americanos entre 1977 e 1992. Os achados foram

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dramáticos.O estudo mostrou que os Estados reduziram os assassinatos em 8,5%, os estupros em 5%; os assaltos à mão armada em 7% e os roubos com armas em 3%. Se esses Estados tivessem aprovado essa lei antes, teriam evitado 1570 assassinatos, 4.177 estupros; 60000 assaltos à mão armada e 12000 roubos.

Para ser mais simples : "Os criminosos respondem racionalmente a tratamento intimidatório." (John R. Lott Jr e David Mustard)

Preocupados com a real escalada da violência, logo ao inicio dos anos 80, políticos e autoridades ( tanto anti quanto pró-armas) autorizaram o Departamento de Justiça Norte Americano a entabular uma pesquisa nacional entre os criminosos, tentando descobrir-se como eles pensavam sobre os diversos aspectos ligados direta e indiretamente ao teor de suas "atividades".

Segundo o professor John Lott Jr e David Mustard, o fato de pessoas portarem armas ocultas mantém os criminosos incertos quanto as suas vitimas pois não sabem se estão armadas ou não. A possibilidade de qualquer um poder estar carregando uma arma torna o ataque menos atrativo. Os estudos mostraram que enquanto alguns criminosos evitam crimes potencialmente violentos após a lei do porte de arma discreto, eles não necessariamente abandonam a vida criminal. Alguns dirigem-se para crimes no qual o risco de confronto com uma vítima armada é menor. De fato, enquanto a diminuição de crimes violentos contra vitimas portando armas diminui, crimes contra a propriedade aumentam. (ex. Roubo de automóveis ou maquinas de vender). Isto certamente é uma substituição que a sociedade pode tolerar.

Numa enquete com mais de 3.000 policiais em resposta a uma pesquisa realizada pela associação beneficente da Policia da Georgia, mais de 90 % dos policiais disseram que leis para o controle de armas não ajuda o trabalho policial, porque essas leis são dirigidas aos cidadãos honestos, ao invés dos criminosos. A comunidade policial da Georgia também afirmou que eles sentem que o proprietário de uma arma legalizada procura aprimorar-se na educação com armas, treinamento e segurança. Os oficiais foram unânimes em suas convicções de que leis limitando a posse de armas pune cidadãos honestos, enquanto criminosos são deixados livres para obter armas ilegais. Os comentários retornaram com algumas sugestões incluídas :

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- "Controle de armas ? Não ! Punição aos infratores? Sim! (não aos cidadãos de bem)."

- "Eu acredito que as leis existentes necessitam ser reforçadas com punições mais duras e os crimes cometidos com qualquer arma, deveriam também ser punidos em toda a extensão da lei".

- " Cidadãos honestos devem receber os direitos dados pela Constituição. Um policial não tem nada a temer de um cidadão honesto."

- "O problema que nós estamos enfrentando são pobreza e drogas, não armas. O Governo Americano deveria se preocupar mais com segurança do transito, câncer, AIDS e álcool, os quais matam muito mais pessoas a cada ano". (6)

Vitimas de violência geralmente são pessoas fisicamente mais fracas. Permitindo uma mulher (habilitada) portar uma arma para sua defesa, faz uma grande diferença quando abordada por um marginal. Armas são um grande equalizador entre o fraco e o agressor. Um estudo sobre 300.000 portes de arma emitidos entre primeiro de outubro de 1987 e 31 de dezembro de 1995, na Florida - USA, mostrou que somente 5 agressões armadas envolvendo essas pessoas foram cometidos nesse período e nenhum dessas agressões resultou em morte.

Alguns perguntam: "Discussões de transito entre pessoas armadas pode resultar em morte ?"Em 31 Estados americanos, sendo que alguns permitem o porte de arma há décadas, existe somente um relato de incidente armado (no Texas), no qual a arma foi usada após um acidente de carro. Mesmo neste caso, o júri achou que o uso foi em legitima defesa - o proprietário da arma estava sendo surrado pelo outro motorista. (John Lott Jr e Davis Mustard).

Na mesma pesquisa dos Drs. Wright e Rossi, entrevistando 6.000 Sheriffs e oficiais policiais até o nível administrativo, sobre como eles viam as armas em poder dos civis.

- Mais de 76 % dos policiais entrevistados declararam que o uso de uma arma por cidadãos ao defender uma pessoa, ou sua família, era algo muito eficaz;

- Mais de 86 % deles declaram que, caso não estivesse trabalhando no cumprimento da Lei, teria uma arma para sua proteção .

Estudos realizados na Florida, Oregon, Montana, Mississipi e Pennsylvania demonstraram que pessoas que são bons cidadãos e que desejam se submeter ao processo do porte de arma não transformam-se

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de uma hora para outra em psicopatas assassinos quando recebem a permissão para portar armas.

Dois terços de todos os homicídios canadenses não envolvem armas de fogo. Estrangulamentos, facadas e surras contribuíram para a maioria dos homicídios.

Álcool e drogas estiveram presentes em 50% de todos os homicídios em 1991. Historicamente o álcool tem sido estimado como o fator de maior contribuição em 2 de cada 3 homicídios no Canadá.

Armas de fogo representam menos de 2% de todas as causas de mortes no Canadá.Raios mataram mais canadenses em 1987 do que proprietários legais de armas. No Canadá, entre 1961 e 1990, menos de 1% de todos os homicídios envolveram armas de fogo legalmente registradas.

Canada - Causas de mortes –1992Homens Mulheres Total Causas de mortes

39290 36921 76211 Doenças Circulatórias30481 25167 55648 Todos os tipos de câncer9411 7252 16663 Doenças Respiratórias3774 3450 7224 Doenças Digestivas1559 2034 3593 Distúrbios Mentais2376 1061 3437 Colisão de Veículos1932 727 2659 Suicídio sem Armas de fogo985 1153 2138 Quedas Acidentais991 59 1050 Suicídio com armas de fogo309 176 485 Homicídio sem armas de fogo167 108 275 Homicídio sem arma de fogo ou branca

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178 69 247 Homicídio com arma de fogo - Antes de 1968, quando qualquer um podia legalmente adquirir

qualquer arma, nossas taxas de crimes eram a metade do que tem sido desde 1974. Comparando dois períodos de 20 anos, um onde uma pessoa podia legalmente possuir qualquer arma, e outro com "leis restritivas "- , de 1974 a 1993, a taxa de homicídio no canadá foi 2,4 assassinatos por 100.000 pessoas e de 1946 a 1965 foi cerca de 1.1 por 100.000.

O numero de armas é um sintoma e não uma causa. Se armas produzissem assassinatos, então Suíça, Israel e Noruega deveriam ter taxas semelhantes aos EEUU, visto possuírem um grande numero de armas. A lei Canadense de controle de armas foi efetivada em 1978.

- Taxa de aumento de crimes violentos no Canadá entre 1977 e 1991: 89%

- Taxa de aumento de crimes violentos nos EEUU entre 1977 e 1991: 58%.

Na ausência de armas de fogo, os criminosos acham outros meios ou outros tipos armas. Nenhuma lei em nenhuma cidade, estado ou nação, reduziu o crime violento ou diminuiu as taxas em comparação com outras jurisdições sem essas leis.

OS QUATRO ELEMENTOS RELACIONADOS AO FENÔMENO CRIMINAL: DO CRIME, DO DELINQÜENTE, DAS PENAS E DA VÍTIMA

Elementos do fenômeno criminal

Consideram-se elementos do fenômeno criminal os componentes deste, ou seja, o crime, o criminoso, a pena e a vítima.

Historicamente, a Escola Clássica do Direito Penal (em que se destacou Francesco Carrara, Itália, 1805-1888) considerava elementos clássicos dessa ciência penal o crime e a pena, enfatizando assim esses dois aspectos do fenômeno criminal, ou seja, a gravidade do fato, consistente na violação da norma dessa natureza, com a conseqüente sanção imposta pelo poder competente do Estado.

Esse entendimento orientou as codificações penais surgi das no século XIX, como no caso do nosso Código Criminal de 1830.

Aliás, a denominação Código Criminal- em lugar de Código Penaldemonstra, por si só, a ênfase atribuída ao elemento crime; na atualidade, alguns penalistas ainda preferem essa terminologia.

Mais tarde, porém, a Escola Positiva (em que se destacaram Lombroso e Ferri) começou a chamar a atenção sobre o delinqüente, como ser vivo e efetivo, aparecendo assim como o "protagonista da justiça penal", como o apresentou Ferri, considerando-o em sua "personalidade individual, em sua identidade biológica e em

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sua realidade como ser profundamente dependente do meio social em que vive".Daí a oportunidade da afirmação de Gabriel Tarde:"Nenhum de nós pode se gabar de não ser um criminoso-nato, relativamente a um estado social determinado, passado, futuro ou possível."

A partir daí, o delinqüente passou a ter um papel destacado no Direito Penal, suscitando a atenção dos criminólogos, filósofos, sociólogos, penalistas e outros, no sentido do esforço de elaboração de normas legislativas específicas, pertinentes ao sujeito ativo da infração penal, figurando assim como terceiro elemento do fenômeno criminal.

Nesse sentido, surgiram as normas inscritas nos Códigos Penais, como aquelas referentes à individualização da pena, periculosidade, aplicação de medida de segurança, como ressaltamos noutro trabalho (Comentários ao Código Penal, Parte Geral, p. 46).

O quarto elemento do fenômeno criminalContemporaneamente, a vítima, sujeito passivo da infração penal, foi classificada

como o quarto elemento do fenômeno criminal, pelos motivos que indicaremos, noutra parte da presente obra ao tratar das peculiaridade e da situação daquela.

Em suma, os quatro elementos acima elencados constituem o centro das preocupações das ciências penais, sob as diferentes angulações, próprias de cada uma delas, como veremos oportunamente.

A propósito, convencionalmente, o termo penalista serve para designar o estudioso, professor, tratadista de Direito Penal, enquanto o vocábulo criminalista se aplica ao causídico, advogado que se dedica às causas criminais, cujo sucesso profissional costuma proporcionar-lhe larga fama.

Conceito de Crimonogênese

A Criminogênese é o capítulo da Criminologia que estuda os mecanismos de natureza biológica, psicológica e social, através dos quais se engendram e desencadeiam os comportamentos delituosos.

Trata-se, portanto, dum esforço que requer concorrência interdisciplinar, de natureza sociológica, econômica, filosófica, política, médica, psicológica para a conceituação da Criminogênese.Sob esse aspecto, o psicológico, por exemplo, entrega-se à tarefa de compreender o crime e descobrir por motivação: "Estudos psicanalíticos modernos vieram comprovar que o delinqüente e aquele que jamais infringiu a lei não são diferentes morfologicamente no sentido de Lombroso. São diversos na maneira de dominar os impulsos anti-sociais, presentes nos criminosos e nos que não o são. Dessa forma, o delinqüente realiza no plano real os próprios impulsos anti-sociais inconscientes. Já o indivíduo socialmente adaptado tem maiores possibilidades em reconhecer que a realização daqueles impulsos redundará em seu próprio prejuízo e no da comunidade" (Luiz Ângelo Dourado -Raízes Neuróticas do Crime, p. 15).

Por sua vez, o político, o criminólogo, o sociólogo, e assim por diante, nas suas respectivas áreas de conhecimento, enfocarão a questão criminal, buscando a pesquisa de suas causas, bem como os meios de sua prevenção e modos de tratamento do criminoso, e assim por diante, contribuindo para o aprimoramento da

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Criminogênese, como lembramos alhures (Criminologia, ps. 127 e segs.).

A dinâmica do delito e o itinerário do crime (iter-criminis). As variáveis

Segundo os princípios tradicionais de Direito Penal, o delito apresenta regularmente o chamado iter-criminis (itinerário do crime), o qual é iniciado pela simples cogitação impunível (nuda cogitatio), seguindo-se a preparação (conatus remotus) só punível quando em si constitui ilícito penal; adiante a execução (conatus proximus) e a consumação (meta opta ta).

Nesse contexto, apresenta-se a seguinte indagação, formulada por Mezger: o delito é um produto da disposição e da índole genuína do delinqüente e do meio ambiente, ou seja, uma resultante dos fatores endógenos e exógenos?Em outras palavras, como se desenvolve a dinâmica do delito? Discussões acaloradas e intermináveis se desencadearam a respeito, istoé, sobre a relação recíproca de ambos os tipos de causas e sobre o predomínio das causas internas - as denominadas Teorias da disposição - e das causas externas - as denominadas Teorias do meio - no advento de delito.

Hoje, de acordo com a concepção da dinâmica do delito, tanto as causas pertinentes à disposição, como ao meio não são realidades unívocas, homogêneas, admitindo-se outras formas de interpretação do fenômeno delituoso, eis que umas disposições influem sobre as outras, das mais diferentes maneiras.

Há, por exemplo, disposições natas e predisposições, em função das disposição herdada ou disposição germinal; disposição adquirida ou personalidade do sujeito, em deternlÍnado momento.

Em suma, há concorrência duma série de aspectos, englobando causas e fatores, que culminam com o. desencadeamento do delito (Mezger, Criminologia, ps. 249 e segs.).

Assim, pode verificar-se a ocorrência duma série de causas e fatores criminógenos, propícios à prática delituosa, mas a interveniência ou incidência de outros aspectos ou circunstâncias - as chamadas variáveis - acabam influindo no sentido de impedir a conduta anti-social, fazendo com que os freios inibitórios prevaleçam, ou seja, ocorra o predomínio daquilo que Benigno Di Tullio denominou forças crimino-repelentes, contra as forças crimino-impelentes (Tratado de Antropologia Criminal, ps. 13 e 209).

O tema em apreço enseja a polêmica jurídico-penal acerca da condição, causa e concausa do crime, como fato humano, como veremos em seguida.

Polêmica jurídico-penal acerca da condição, causa e concausa do crime, como fato humano

Sem pretender aprofundar a apreciação do tema em apreço, vale, todavia, ressaltar a opinião de Nélson Hungria a respeito:

"(...) o crime, no seu aspecto .objetivo, é umfato humano, compreendendo dois momentos: uma ação (voluntário movimento corpóreo) ou omissão (voluntária abstenção de movimento corpóreo) e um resultado (evento de dano ou de perigo)".

Entre "esses dois momentos deve existir, condicionando a imputatio facto, uma relação de causa e efeito".

A controvérsia jurídica gira em tomo de saber quando a ação ou omissão tem o suficiente relevo de causa; e nessa indagação pululam as teorias, que podem ser

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classificadas em dois grupos:a) teorias que não vêem diferença entre condição e causa;b) teorias que diferenciam causa e condição, buscando estabelecer critérios para

dentre as condições destacar a causa (Comentários ao Código Penal, voI. I, tomo lI, ps. 57 e segs.).

Concluiu Hungria, sustentando nada importa que haja cooperado outra força causal, pois não existe diferença entre causa e concausa, entre causa e condição, entre causa e ocasião, equivalendo-se em sua eficiência causal todas as forças, que concorrem para o resultado, pois o sistema do nosso Código Penal é constmído sobre a teoria da equivalência das condições: não distingue entre condição e causa." Causa é toda conditio sine qua non" (ob. e loco cits.).Por sua vez, preleciona Aníbal Bruno: "o resultado é o termo final de uma cadeia de condições sucessivas ou concomitantes. O homem que concorre com uma dessas condições sob a fonna de ação ou omissão reputa-se ter produzido o resultado desde que sem ela este não pudesse ocorrer" (Direito Penal, I, tomo 1°, ps. 304, 305, 321 e 322).

De acordo com Giulio Battaglini, concausa é o antecedente que dispõe apenas de efiç;iência parcial, vale dizer, de per si só insuficiente (Direi-to Penal, 1° voI., p. 216).

O tema relaciona-se ao disposto no art. 13, § § 1 ° e 2°, a a c, do Código Penal, como ressaltamos noutro trabalho (Comentários ao Código Penal, Parte Geral, ps. 79 e segs.).

Classificação geral dos crimes

A classificação geral dos crimes, ou seja, o crime apreciado quanto à sua gravidade, moral idade, objeto, materialidade, do ponto de vista teórico, baseia-se nas características da ação, nos efeitos que integram o fato, no bem jurídico protegido, número e qualidade dos sujeitos considerados em cada caso e muitas outras circunstâncias que dão lugar a uma série de classificações: figura de dano, de perigo, materiais, de pura atividade, unissubsistentes, comuns, especiais.

O estudo dessas classificações contribui para a sistematização dos diversos títulos: delitos de comissão e de omissão; dolosos e culposos (Sebastian Soler - Derecho Penal Argentino, I, p. 221).

Esta classificação geral, entretanto, não deve ser confundida com a classificação dos crimes em espécie, constante da Parte Especial dos Códigos Penais, que nasceu duma necessidade prática, sendo que, com o tempo, estabeleceram-se detem1inados princípios para a sua elaboração e sistematização (Carrara - Programa de Derecho Criminal, Parte Geral, voI. I, ps. 109 e segs.).

A classificação geral dos crimes tem sido tratada pelos diferentes autores de maneira não muito uniforme, como ressaltamos noutro trabalho (Comentários ao Código Penal - Parte Geral, ps. 51 e segs.). Apresentamos a classificação que segue, como expressão eclética das teorias a respeito dessa matéria:

Quanto à previsão legal, segundo a gravidade (crime e contravenção)

a) sistema tripartido: baseado na divisão crime, delito e contravenção, como o sistema adotado na França;

b) sistema bipartido: baseado na divisão crime e contravenção, comoo sistema adotado na Itália, Brasil;

c) sistema unitário: não comporta as divisões acima previstas, como o

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sistema adotado na Argentina, México, e extinta URSS.

Quanto à intenção

a) dolosos: quando o agente quer o resultado ou assume o risco de produzi-lo;b) preterdolosos ou preterintencionais: quando há dolo no antecedente (crime

principal) e culpa no conseqüente (crime acessório), como no furto ou roubo (crime principal) e receptação (crime acessório);

c) culposos: quando há culpa stricto sensu.

Quanto à materialidade

a) simples: modalidade que não apresenta elementos acidentais, como o homicídio simples;

b) materiais ou de resultado: são os que se tomam perfeitos com a positivação do resultado, como característico do tipo legal, com a inequívoca lesão do bem jurídico protegido, como no caso do furto da coisa comum, na violação do domicílio, a extorsão mediante seqüestro;

c) de lesão ou dano: aqueles que só se consideram consumados, quando ocorre, no mais das vezes, uma lesão efetiva de um bem ou interesse penalmente tutelado; neles o dolo é de dano, por exemplo, a calúnia, a difamação, a injúria, o constrangimento ilegal;

d) de perigo: aqueles em que não é necessário que ocorra um dano efetivo e concreto, bastando a simples existência da ação criminosa, como o fato de ter em depósito substância entorpecente, ilegalmente;

e) instantâneos: aqueles em a atividade delituosa termina no momento preciso em que o seu efeito se produz, como no furto, nas ofensas físicas;

f) permanentes ou contínuos: aqueles em que o ato deles constitutivos não sofre interrupção, permanecendo o agente em estado de criminalidade ou de violação ininterrupta da lei penal; em tais casos, a consumação se protrai ou interrompe, dependendo da vontade do agente, ou de flagrante, como o cárcere privado, a ocultação de menor. É claro que, se o agente se livrar do flagrante, nem por isso estará isento de responsabilidade criminal, a ser apurada através de inquérito criminal e subseqüente ação penal;

g) instantâneos de efeitos permanentes: aqueles cuja atividade delituosa se configura em determinado ato, cujos efeitos perduram, como a bigamia;

h) complexos: quando uma infração penal envolve outra, distinta, alheia à intenção do agente, como a morte da pessoa visada e ferimento de outra; ,

i) continuados ou sucessivos: aqueles em que o autor pratica vários atos sucessivos e conexos, materialmente distintos, com uma só intenção e resolução dolosa, como o agente que furta dum mesmo porta-talheres, várias peças, em dias diferentes, dentro de breve espaço de tempo;

j) transeuntes: aqueles que não deixam vestígios, como a injúria verbal, a violação de domicílio;

1) não transeuntes: aqueles que deixam vestígios, como o homicídio, a lesão corporal;

m) privilegiados: aqueles cometidos em virtude de relevante valor social ou moral (delictum privilegiatum ou delictum exceptum), como o homicídio privilegiado; o crime

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consistente em receber de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, e a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade;

n) qualificados: aqueles que se revestem duma forma mais grave, em virtude de ocorrerem circunstâncias que assim o qualificam, como o homicídio qualificado, o aborto qualificado;

o) distanciados: aqueles cuja ação e o resultado se separam no tempo ou espaço, como a sonegação ou destruição de correspondência, a extorsão, a extorsão mediante seqüestro;

p) formais: quando a intenção do agente se presume do seu próprio ato, que se reputa consumado independentemente do resultado que possa produzir, como a falsificação de moeda, seja ou não posta em circulação;

q) putativos ou imaginários: aqueles em que o agente considera erroneamente que sua conduta constitui crime, quando, na verdade não é, como no caso em que alguém pensa ter alvejado certa pessoa, quando na verdade foi outrem que o fez;

.'r) putativos por obra do agente provocador: quando, de forma insidiosa, uma

pessoa provoca o agente, levando-o a praticar o crime, ao J?esmo tempo que adota providências com a finalidade de evitar a consumação do mesmo; são os casos de flagrante preparado;

s) de sangue: aqueles cuja execução causa derramamento de sangue, com o emprego de arma de fogo, instrumento perfurocortante;

t) hediondos: aqueles que se revestem das características dos qualificados e de sangue.

Quanto ao sujeito

a) comuns: quando há violação do preceito penal, imposto indistintamente a todos, praticado por qualquer indivíduo. Por oposição a crime especial, de mão morta;

b) próprios: diz-se daqueles que só podem ser praticados por determinada categoria de pessoas, pressupondo no agente qualidade pessoal e particular condição jurídica, como os crimes falimentares, que só podem ser praticados pelo devedor comerciante; os crimes praticados por funcionários públicos;

c) de mão própria: aqueles em que todos os elementos do tipo penal devem ser realizados pessoalmente pelo agente, sendo assim impossível a figura do concurso de agentes. São semelhantes aos delitos próprios, pois também aqui apenas as pessoas tipicamente referidas podem ser autoras. Todavia, nos delitos próprios é possível a participação de terceiro, enquanto nos delitos de mão própria tal não acontece. Assim, são delitos próprios e simultaneamente de mão própria o infanticídio, o abandono ou exposição de infante, causa honoris, o peculato;

d) unissubjetivos ou individuais: aqueles em que a totalidade dos atos típicos podem ser praticados por um único autor, como a injúria verbal;

e) plurissubjetivos ou coletivos: aqueles em que são dois ou mais os autores, distinguindo-se, porém, duas subdivisões, ou seja, os unilaterais ou convergentes ou de conduta convergente, nos quais as várias participações se orientam em um mesmo sentido, como no crime de quadrilha ou bando, e os bilaterais ou plurilaterais em que as várias participações são contrapostas, como no caso de rixa;

f) de mão morta: aqueles que só podem ser praticados pela pessoa indicada, em função do próprio tipo, como no caso do adultério, do abandono material;

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g) funcionais: aqueles cometidos por quem se acha investido de um oficio, ou função pública, quando no exercício desta e relativamente a esta, como os crimes praticados por funcionários públicos;

h) especiais: aqueles que exigem como elemento integrativo uma qualidade ou condição especial do agente, como no caso dos crimes funcionais, falimentares, militares;

i) multitudinários ou coletivos: aqueles que são praticados por multidão em tumulto, contra pessoas ou coisas, por ocasião de manifestações públicas, greves;

j) bilaterais: aqueles para cuja consumação se exige o encontro de vontades de dois agentes, como a receptação;

1) habituais: os que são praticados seguidamente pelo mesmo autor, com a mesma uniformidade e o mesmo objetivo, como a falsa identidade, o exercício ilegal da profissão de médico, dentista, advogado;

m) passionais: aqueles em que o agente é impulsionado por uma paixão ou emoção violenta e irreprimível: o ciúme, um amor egoístico ou contrariado, um ultraje à honra.

Quanto ao objeto

a) contra a coisa pública: embora no Direito Penal atual e divisão clássica do direito romano - delicta publica e delicta privata - não tenha a mesma importância, consideram-se crimes contra a coisa pública aqueles que afetam determinados bens ou interesses eminentemente de ordem pública, tais como os crimes contra a incolumidade pública, contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos, contra a saúde pública;

b) contra a coisa privada: aqueles que afetam exclusivamente os bens ou pessoas privados, subdivididos em crimes de ação pública e de ação privada;

c) contra a economia popular: aqueles que resultam em lesão de economia popular, previstos em legislação especial;

d) políticos: aqueles que têm feição exclusivamente política; na prática, hoje, não mais existe essa modalidade, pois, o político está ligado ao social, ao econômico;

e) político-sociais: a distinção entre crime político e crime político-social provém do Projeto do Código Penal de Ferri (Itália, 1921). "Antes do surto da grande indústria e do socialismo, que é fruto seu, os crimes que visavam à organização social tinham feição exclusivamente política. Esta, porém, passou para o segundo plano. A estrutura econômica é que é hoje principalmente atacada. A característica específica da delinqüência político-social é ser marcada pelo selo da mais incontestável abnegação, do altruísmo mais puro e idealístico." (Virgílio de Sá Pereira).

f) militares ou castrenses: aqueles próprios, praticados por militares, contra a hierarquia, a ordem jurídica, o dever, a segurança, a subordinação ou disciplina militares, previstos na legislação militar;

g) crimes de guerra: aqueles que violam os princípios e as leis. Que reguIam a guerra, praticados por militar ou assemelhado que é: participar de um conflito armado;

h) falimentares: aqueles praticados pelos comerciantes, cuja falência é considerada fraudulenta;

i) principais: aqueles que antecedem necessariamente outros, sem o que estes não podem existir, como o roubo (principal) em relação à receptação (acessório);

j) acessórios: aqueles que exigem um outro como principal e dos quais são dependentes, como o assassínio a fim de assegurar a prática do roubo, a violação de

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domicílio igualmente com o fito de roubo;1) sexuais: aqueles praticados para satisfazer o impulso erótico ou tendências

libidinosas;m) de lesa-pátria: os crimes de alta traição, quando atentam contra a segurança e

a soberania nacionais, por meio de inteligência com potências inimigas, durante o estado de guerra ou greve convulsão social;

n) pluriofensivos: são aqueles que ofendem a mais de um bem jurídico tutelado pela lei penal, como o roubo.

Quanto à conduta

a) comissivo: também chamados de ação; caracterizam-se por umfacere, ou seja, a prática de atos positivos, contrários à lei penal, como o furto, o estupro;

b) omissivos: consistem em um non facere, ou seja, em deixar de fazer o que a lei penal obriga, como o abandono material;

c) comissivos por omissão ou omissivos impróprios: consistem em produzir, por meio de uma omissão um resultado definido na lei como crime; no caso, a omissão é em si mesma incriminada, pois o que caracteriza a responsabilidade penal é ter o agente faltado a um dever jurídico de agir para impedir o resultado, como o caso da mãe que, por privar o filho, recém-nascido, de alimentação, deixa-o morrer;

d) comissivos e omissivos: também chamados delitos de conduta mista, pois se expressam necessariamente em duas formas, isto é, positiva e negativa, ambas cooperantes, como o parto suposto (comportamento comissivo no ato de apresentar o filho de outrem a registro e omissivo na ocultação da filiação verdadeira);

e) necessários: aqueles que são praticados em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito;

f) de ímpeto: também chamado ex impetu, caracterizam-se pelo desígnio delituoso instantâneo ou repentino, motivado por cólera, paixão ou terror, sem preceder deliberação, determinação ou raciocínio, ou seja, per moto imprevisto.

Quanto ao processo executivo

a) em grau de tentativa: diz-se crime tentado quando iniciada a execução o crime não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente;

b) consumados: o crime é consumado quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

c) frustrados: "quando exaurida a ação o agente não logra obter o resultado perseguido; a ação pode exaurir-se antes da total realização típica (tentativa perfeita), coincidir com o momento consumativo, ou então ir além deste, mas sem determinar nova realização típica, e.g., homicídio em que a vítima recebe 11 facadas, morrendo da primeira; neste exato momento temos o tipo consumado, porém a ação vai exaurir-se em momento posterior."

d) imperfeitos ou tentativa perfeita: aqueles que não foram consumados por ter sido interrompidos, ou mal executados, ou, ainda, porque era inidôneo e o meio empregado pelo agente. São também chamados crimes falhos ou frustrados;

e) perfeitos (delictum pefeito): aqueles que se revestem de todos os elementos imprescindíveis à sua existência real, e em cuja execução, até sua consumação, a

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intenção direta do agente foi inteiramente satisfeita.

Quanto ao concurso de agentes

a) conexos: são aqueles praticados -1) ao mesmo tempo, por diversas pessoas reunidas; 2) em conseqüência de um pacto previamente estabelecido, embora o delito seja perpetrado em diferentes tempos e lugares; 3) como meio de execução de outros, ou como expediente para procurar a impunidade; 4) quanto têm com outra infração uma estreita interdependência, ou nexo de tal natureza que se torna impossível apreciá-Ios isoladamente, cindindo a prova;

b) de concurso facultativo ou simplesmente co-autoria: são os crimes em que a participação de dois ou mais agentes não constitui elemento fundamental para configuração do delito;c) de concurso necessário: são os crimes que exigem para a sua configuração o concurso de duas ou mais pessoas, quer dizer, a própria descrição típica exige o concurso, como nos crimes coletivos (caso da quadrilha OU bando) ou nos bilaterais, sendo que nestes uma das pessoas pode não ser culpável, como nos crimes de adultério e bigamia.

Quanto aos atos que compõem a execução

a) unissubsistentes: são aqueles cuja execução se compõe de um só ato, o 'qual coincide com a consumação, não admitindo assim a tentativa, podendo-se citar o perigo de contágio venéreo, a omissão de socorro, vilipêndio de cadáver.

b) plurissubsistentes: são aqueles cuja execução se compõe de vários atos ou fases sucessivos, no tempo ou no espaço, como os crimes distanciados ou a distância, de que são exemplos, a sonegação ou destruição de correspondência, a extorsão, a extorsão mediante seqüestro.

Quanto à persecussão criminal

a) de ação penal pública;b) de ação penal condicionada; c) de ação penal privada.(Giuseppe Maggiore - Derecho Penal, voI. I, ps. 295 e segs.; João Mestieri - Teoria Elementar do Direito Criminal, Tom. I, ps. 189 e segs.; Orlando Mara de Barros - Dicionário de Classificação de Crimes, ps. 14 e segs.; Roberto Lyra - Direito Penal Normativo, p. 96).

Classificação dos crimes em espécie

Como salientamos anteriormente, a classificação dos crimes em espécie decorre duma necessidade prática de sistematização, não só para o estudo da natureza dos mesmos, bem como para a sua codificação, observando-se algumas variações termino lógicas nos Códigos Penais dos diferentes países, quanto às classes e subc1asses daqueles.

Daí a denominação adotada pelos Códigos Penais, ou seja, Parte Especial, que

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estabelece a classificação dos crimes em espécie, compreendendo-se como espécies as partes do gênero, sendo que este abrange várias daquelas, conforme os critérios jurídicos, políticos, filosóficos, sociológicos e econômicos, adotados pelo legislador.Nessa ordem de idéias, o Código Penal (1940) estabeleceu, em sua Parte Especial, a seqüência de Títulos em que classifica os crimes em espé cie, com os respectivas rubricas, a saber: Titulo I - Dos Crimes Contra a Pessoa (arts. 121 a 154); Titulo II - Dos Crimes Contra o Patrimônio (arts. 155 a 183); Título III - Dos Crimes Contra a Propriedade Imaterial (arts. 184 a 196); Título IV - Dos Crimes Contra a Organização do Trabalho (arts. 197 a 207); Título V - Dos Crimes Contra o Sentimento Religioso e Contra o Respeito aos Mortos (arts. 208 a 212); Título VI - Dos Crimes Contra os Costumes (arts. 213 a 234); Título VII - Dos Crimes Contra a Família (arts. 235 a 249); Título VIII - Dos Crimes Contra a Incolumidade Pública (arts. 250 a 285); Título IX - Dos Crimes Contra a Paz Pública (arts. 286 a 288); Título X - Dos Crimes Contra a Fé Pública (arts. 289 a 311); Título XI - Dos Crimes Contra a Administração Pública (arts. 312 a 359).

Cabe ressaltar que, além dessas espécies de crimes, existem outras, constantes da legislação penal extravagante, ou seja, previstas em leis específicas, elencando determinados tipos penais, em decorrência do processo de desenvolvimento político, econômico e social.

Haja vista, dentre outros textos legais, a Lei n° 4.898, de 09.12.1965Regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal, nos casos de abuso de autoridade; Lei n° 5.726, de 29.10.1971 - Dispõe sobre medidas preventivas e repressivas ao tráfico e uso de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência fisica ou psíquica, e dá outras providências; Lei n° 8.072, de 25.07.1990, com alterações introduzi das pelas Lei n° 8.930, de 06.09.1994 e Lei n° 9.695, de 20.08.1998, dispondo sobre os crimes hediondos; Lei n° 9.455, de 07.04.1997 - Define os crimes de tortura.

Com efeito, a miséria e a pobreza não constituem causas ou fatores de-terminantes, fatais, para que o indivíduo se tome delinqüente, bandido, assaltante, narcotraficante, haja vista que, se assim fosse, a maioria da população mundial enveredaria por essas práticas delituosas, posto que dita maioria é carente, excluída, de acordo com as estatísticas existentes a respeito.

Por outro lado, era de se esperar que, dentre as pessoas pertencentes às famílias abastadas, e que recebem esmerada educação, jamais ocorressem desvios de comportamento, práticas criminosas; entretanto, isso não se verifica, pois muitas delas cometem não só delitos típicos do "colarinhobranco", como também infração penais comuns, ou seja, aquelas que os juristas burgueses e pequenos-burgueses consideram peculiares às "classes subalternas" da sociedade, isto é, o proletariado.

A Patologia Social. Neuroses. Socioses. Forças crimino-impelentes

Como assinala J. Alves Garcia, Patologia é a Ciência dos processos mórbidos, de suas causas, das alterações estruturais ou funcionais do organismo, e da sua evolução. Todo processo patológico resulta da interação de causas endógenas e externas, às quais se contrapõem as defesas do organismo. Todo processo passa pelo clímax e atinge a fase crítica ou crise. Esta termina pela resolução, pela cura ou restabelecimento da homeostase (estado de equilíbrio), por estado enfermiço

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permanente, ou pela morte (Psicopatologia Forense, ps. 157 e segs.).Por analogia, prossegue o referido autor, chama-se Patologia Social ao estudo das

desorganizações ou desarmonias internas da sociedade, somadas às pressões externas. Então, o grupo intui o anormal, acusa o sentimento da mudança brusca da estrutura social, do conflito de culturas, das transformações, ou do ritmo acelerado da evolução histórica.

A crise histórico-social ocorre quando, por um conjunto de circunstâncias, a situação anteriormente aceitável, toma-se daí em diante intolerável, seja por fatores sociais, religiosos, políticos, econômicos, ou estes simultaneamente.

Ora, as psicoses e as neuroses têm origem em desregulações ou lesões do sistema nervoso ou do organismo, sendo certo que a vida psíquica resulta do jogo perpétuo das influências exteriores ou ambientais e das condições internas. "Nenhum fenômeno mental, normal ou patológico, pode ser eXclusivamente endógeno, mas também nenhuma influência exógena tem a sua eficácia característica se não encontra um organismo preparado. Convencionou-se, por isso, ,dizer que certas afecções mentais são predominantemente endógenas, enquanto outras não sobretudo exógenas".

Partindo desses princípios, o referido autor chama socioses aos distúrbios psíquicos ou orgânicos que resultam, predominantemente, das transformações bruscas das estruturas sociais e culturais.

Em suma, esse quadro social constitui uma força crimino-impelente,conceituada noutra parte da presente obra.

Assim, o quadro social contemporâneo, em escala internacional, revela bruscas alterações em sua estrutura sócio-cultural, com profundo reflexo com relação às doenças mentais e orgânicas, a saber:

a) Aumento do infarto do miocárdio e do alcoolismo femininos, depois que as mulheres foram expostas às mesmas tensões emocionais a que estão sujeitos os homens, na luta pela sobrevivência e afirmação social;

b) Agravação da alcoolomania, sob a forma de Delirium tremens, devido às vivências da solidão e da desesperança; carências alimentares;

c) Transformação da psicose maníaco-depressiva, com a quase desaparição das grandes crises de excitação, a maior incidência da síndrome melancólica, sob várias formas e graus;

d) Transformações dos delírios esquizofrênicos, de tipo místico-religioso e cosmogênico, em delírios hipocondríacos, técnicos, cósmicos e astranáuticos;

e) Redução dos sistemas mentais das psicoses e neuroses, e maior incidência de fenômenos psicossomáticos, ou organoneuróticos;

f) Aumento extraordinário, em âmbito mundial, das toxicomanias, sobretudo, nos jovens.

Diante desse quadro, conclui que existe uma relação direta entre o progresso tecnológico e o desenvolvimento da agressividade humana, invocando a opinião de Arnold Toynbee: "O processo atual, em aceleração desordenada da tecnologia, aumentou agora em grau alarmante a brecha as camadas consciente e inconsciente da psique humana" (Psicopatologia Forense, ps. 463,465,481 e 482).

Exacerbação das contradições sociais e seus reflexos sobre a violência generalizada

O fato é que os desdobramentos do processo de evolução capitalista, em escala internacional, a sua interação com os fenômenos político, jurídico, sociológico intensificaram de tal forma a exploração do trabalho, que exacerbaram ao máximo as

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contradições sociais e a luta de classes, aumentando as desigualdades e injustiças sociais, a miséria, a fome, em contraste com o luxo e a ostentação duns poucos, que monopolizam a terra, os gêneros alimentícios, os medicamentos. Considere-se ainda os que exploram o tráfico de drogas, de armas, mulheres, e de menores - tudo isso mantido graças à operação de regimes políticos autoritários, de índole militar -, de tal modo que, como num plano inclinado, a sociedade capitalista chegou ao ponto em que se encontra, ou seja, aquilo que alguns chamam de síndrome da violência, que outra coisa não é senão uma situação próxima duma convulsão social de proporções incalculáveis, com um desfecho imprevisível, assumindo, em certos casos - como no Brasil -, aspectos de verdadeira guerra civil, ou zona fronteiriça dela.

Efetivamente, como salienta Israel Drapkin, a civilização ocidental, com as suas gigantescas cidade e a enorme concentração demográfica, está tomando o homem neurótico. Esse modelo de civilização produziu um tipo humano fisico e organicamente mal dotado, propenso à enxaqueca, à calvície, ao nervosismo, à frigidez sexual na mulher e à impotência no homem (Manual de Criminologia, ps. 151 e 152).

Acresce que o homem traz em si um curioso paradoxo: a primitividade do seu esqueleto e do seu organismo - ou seja, o conjunto de condições biopsicológicas - impõem-lhe um ônus inferiorizante, pois a patologia humana é a mais fértil e variada de toda a narrativa viva: nenhum outro animal é mais vulnerável (J. Alves Garcia - ob. cit., p. 470).

A desnutrição, a fome e a violência estrutural da sociedade capitalista, em concomitância com a criminalidade

A desnutrição, por sua vez, pode acarretar graves conseqüências. Em Menores e Loucos afirmou Tobias Barreto: "O homem é o que come". George Guilhermet asseverou: "Sem ir até a dizer com Brillat Savarin - dize-me o que comes e dir-te-ei quem és - a alimentação exerce influência fisiológica, psicológica e social" (apud Roberto Lyra Novíssimas Escolas Penais, ps. 13 e 176).

Num livro candente - Geopolítica da Fome - escreve Josué de Castro: "Fustigado pela necessidade imperiosa de comer, o homem esfomeado pode exibir a mais desconcertante conduta mental. Seu comportamento transforma-se como o de qualquer outro animal submetido aos efeitos da fome." E lembra que cerca de 2/3 da humanidade vive sob regime de fome crônica, subnutrida, contando-se dentre milhões de criaturas as que têm morrido em conseqüência desse flagelo, pois, sinistramente, conforme o adágio popular: A mesa do pobre é escassa mas o leito da miséria é fecundo (ob. cit., ps. 6, 34, 60 e 95).

Nunca é demais recordar a célebre decisão absolutória, proferida pelo tribunal francês de Chateau- Thierry, presidido pelo juiz Magnaud, magistrado que passou à posteridade como o "bom juiz", ocasião em que foi absolvida a inditosa Luiza Menard, num caso de furto famélico, por ter-se apropriado dum pão, pois se encontrava com fome, sem trabalho e dinheiro, tendo a seu cargo um filho, como lembramos alhures (Justiça e Criminalidade, ps. 79 e segs.).

As doenças mentais, por exemplo - uma porta larga para os desvios de conduta, especialmente de natureza criminosa -, têm múltiplas causas, a começar pelas carências alimentares, desde o período de gestação, agravando-se naturalmente com a subnutrição nos primeiros anos de vida, como lembramos noutro trabalho (Extinção das Prisões e dos Hospitais Psiquiátricos, p. 140).

A propósito, como observou Antônio Alfredo Fernandes, de "um contingente pré-

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escolar de 22 milhões e 500 mil crianças, apenas 20% recebem assistência das áreas de saúde e nutrição; 70% são subnutridas e desnutridas, com as células nervosas do cérebro irremediavelmente afetadas", sugerindo inclusive a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara Federal para investigar o assunto e criar uma legislação para a área pré-escolar, "única saída para que o Brasil deixe de ser um país de não inteligentes" (Jornal do Brasil, 14.04.78).

Ora, em tais casos, a tendência é no sentido de que essas crianças, se sobreviverem, constituirão no futuro, como adultos, débeis mentais, imprestáveis para o trabalho útil e fecundo, enfim; um peso social morto.

Observa Hans von Hentig, com lógica irretorquível: já que três-quartos de todos os crimes são crimes contra a propriedade, torna-se clara a importância da condição econômica individual. Muitos outros crimes são causados indiretamente por dificuldades econômicas, pois a fome, o frio, ou a vida dos cortiços não melhoram o controle dos nossos atos (Crime, Causes and Conditions, p. 96).

Daí a advertência de von Liszí: "A influência das circunstâncias sociais e, sobretudo, econômicas sobre a vida dos indivíduos começa muito tempo antes do seu nascimento.

Remediai as circunstâncias econômicas desfavoráveis e salvareis, ao mesmo tempo, o futuro das novas gerações.

É, pois, evidente que as circunstâncias sociais e, especialmente, econômicas determinam a marcha da criminalidade" (apud Roberto Lyra Novíssimas Escolas Penais, p. 171).

Por seu turno, a violência estrutural e institucional dos regimes políticos autoritários, ditatoriais, ao impor um modelo econômico elitista, no interesse das multinacionais - com o objetivo de privilegiar uns poucos, com salários principescos, a fim de que constituam a clientela consumidora de produtos supérfluos - acabam gerando desigualdades sociais e injustiças escandalosas, provocando agitação social, greves, descontentamento e inconformismo generalizado, situação essa que é aproveitada pelas forças conservadoras e dominantes da sociedade, para justificar o desencadeamento da repressão político-social, aplicação de medidas de exceção, decretação de estado de sítio, suspensão dos direitos e garantias constitucionais, como ocorreu no Brasil, pós-1964.

Daí por que, acerca do chamado crime político-social, salientou Crispigni que as maiores conquistas no sentido do aprimoramento das instituições democráticas terem sido alcançadas justamente por essa espécie de crimes.

Não se pode ignorar que a queda das tiranias, a abolição da servidão da gleba, a igualdade civil e política, os direitos do homem, a melhoria das condições de vida do proletariado etc. não teriam sido possíveis sem o ímpeto dos crimes político-sociais (apud Nélson Hungria - Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 1 °, p. 185).

Características próprias da violência no meio urbano e no rural

No tocante ao proletariado urbano brasileiro, submetido à violência permanente do modo de produção capitalista, estima-se o seu número em 12.500.000 de trabalhadores, enquanto o proletariado rural, submetido a essa violência estrutural, é estimado em 4,9 milhões, ou seja, 1/3 da forma de trabalho agrícola, segundo dados da década de 1980.

Na área rural, devem ser acrescentados os assalariados temporários, chamados

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"bóias-frias", trabalhadores rurais esses que vivem nas periferias dos centros urbanos, sendo que a sua integração nos processos produtivos é eventual, ocorrendo somente nas épocas de maior atividade agrícola (geralmente nas colheitas), e que correspondem à categoria mais aniquilada da classe trabalhadora brasileira, atingindo, aproximadamente, 10 milhões de pessoas; esses trabalhadores estão, ainda, sujeitos à expropriação por parte dos intermediários ou contratadores dos serviços, junto aos empresários agrícolas, intermediários esses cuja alcunha - "gatos" - bem identifica a sua ação rapinante (Juarez Cirino - ob. cit., ps. 92 e 93).

Cumpre salientar que as alterações desordenadas no meio rural, a substituição das culturas agrícolas, de subsistência, pela criação intensiva de gado, destinado à exportação, provocam, dentre outras conseqüências, o êxodo rural, isto é, a migração do homem do campo em direção às cidades, onde se espera melhor sorte, para não acabar morrendo de fome; mas no meio urbano há .outras adversidades, tais como dificuldade em dispor do solo, para construção de moradia, até mesmo na zona de favelas, já supercongestionada, sem falar .na falta de ocupação, escolaridade, assistência médica, condições mínimas de higiene e alimentação., O fato é que são crescentes os índices de violência no Brasil, como assinalou o

senador Geraldo Cândido, bastando citar o fato de que no primeiro trimestre de 1999 registraram-se 23 mil homicídios no País, o que permite estimar que esse número deverá ultrapassar 50 mil por ano, futuramente.

Tal fato pode ser comparado com o que ocorre na Colômbia, em conseqüência da guerra civil nesse país (Jornal do Senado, 08.06.2001, p. 5).

O gigantismo das cidades como fator criminógeno. Favelização

Em resumo, todo um elenco de dificuldades angustiantes, faz com que grande número de pessoas acabe buscando refúgio sob viadutos, nas galerias de edifícios e embaixo de marquises, constituindo os chamados "dormidores de rua", sem teto, encontrados nas grandes cidades, onde perambulam durante o dia, fazendo pequenos biscates, com minguados ganhos, caminho esse que leva fatalmente à prática criminosa, inclusive por parte dos menores, que vivem sob essas condições de existência, como lembramos noutro trabalho (Causas da Criminalidade e Fatores Criminógenos, ps. 52 e segs.).

Ademais, os políticos demagogos têm objetivos exclusivamente eleitoreiros, imediatistas, tais como a criação dos chamados "currais eleitorais", urbanos e rurais, consistentes na concentração de eleitores em determinadas áreas, na condição de "clientela cativa", favorecida com algumas construções, especialmente habitacionais.

Daí, por exemplo, a absurda substituição de favelas em áreas impróprias - mangues e alagadiços -, compostas de barracos construí dos com pedaços de folha de zinco e papelão, por outras habitações de alvenaria, como foi o caso da denominada "favela da maré", às margens da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, ao longo da via expressa Linha Vermelha, área essa cuja fetidez e insalubridade atingem limites insuportáveis, devido sobretudo ao fato de a região constituir um desaguadouro de esgotos, com elevados índices de poluição.

Acontece que ali é uma região de intenso trânsito rodoviário, despertando assim os olhares daqueles que circulam, em automóveis e ônibus, podendo desse modo revelar admiração por aquelas novas construções, obra de determinado político, sem

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considerar as inconveniências acima apontadas.Ora, o que o bom senso e a coerência recomendavam era um entrosamento entre

os governos municipais, estaduais e federal, no sentido de construções habitacionais, prioritariamente, em áreas rurais, próximas aos centros urbanos, de modo que as mesmas se destinassem ao cultivo de hortigranjeiros e criação de animais de pequeno porte, destinados à alimentação, quer dos moradores desses conjuntos, quer para efeito de venda a terceiros.

Em suma, a construção de conjuntos habitacionais, destinados a populações carentes, nos moldes acima expostos, agrava a problemática do congestionamento e superpopulação urbana, ou seja, o chamado gigantismo das cidades, um dos fatores criminógenos, como ressaltamos noutros trabalhos ("O gigantismo das cidades como fator criminógeno", in Rev. do Curso de Direito da UF de Uberlândia, voI. 17, 1988; Incorporações Imobiliárias e Condomínio de Apartamentos, ps. 15 e segs.).

Com efeito, boa parte da população de alguns desses conjuntos habitacionais se compõe de adolescentes, jovens ,que não têm ocupação nem habilitação profissional, não dispondo de renda própria, mas, sobretudo devido à promiscuidade em que vivem, mantêm relações sexuais precoces, procriando numerosos seres humanos, débeis, doentios, com insuficiência de peso, com sombrias perspectivas de vida.

Além disso, no bojo desse contingente humano, principalmente por causa da ociosidade, alastram-se as práticas delituosas, ramificações do narcotráfico, do tráfico de armas, prostituição, e assim por diante, típicas do lumpemproletariado.

O lumpemproletariado como subproduto da violência capitalista

Na terminologia marxista, o vocábulo lumpemproletariado se aplica às camadas sociais sem consciência política e de classe, entregando-se à prática de contravenções penais e crimes, ou seja, jogatina, furtos, assaltos, seqüestros, tráfico de armas, narcotráfico, usufruindo vantagem do comércio sexual, como "garotas e garotos de programa", e assim por diante, trilhando o caminho escabroso da criminalidade, o qual dificilmente oferece retorno.Em suma, a maior parte desse contingente humano constitui o que tradicionalmente se considera a canalha, malta, corja da sociedade, che gando a essa condição em conseqüência de diversas causas e fatores criminógenos, de natureza biológica, genética, psicológica, sociológica, e outros, como ressaltamos noutra parte da presente obra, ao tratar das diversas concepções acerca do delinqüente, como explica o darwinismo social.

Concluindo o lumpemproletariado é um subproduto da violência capitalista.

O abuso de poder do ponto de vista da criminalidade econômico-financeira .

Em sentido genérico, a expressão abuso de poder equivale a abuso de autoridade, isto é, o uso imoderado ou exorbitante do poder público, por parte de um dos seus agentes, quando no exercício das funções próprias do seu cargo, situação essa que, no Brasil, é disciplinada pela Lei n° 4.898, de 09.12.1965, que regulou o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal, nos casos de abuso de autoridade, disposições legais essas que, aliás, jamais tiveram qualquer eficácia, em face do autoritarismo político reinante, que, pela sua própria natureza, violenta de maneira permanente a legalidade democrática.

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Entretanto, para efeito de estudos criminológicos, mais precisamente, no esforço da construção da Teoria Crítica do Controle Social na América Latina, a expressão abuso de poder assume conotações particulares e específicas, como veremos adiante.

De fato, as concepções tradicionais acerca da idéia de poder têm sido objeto de várias considerações, nos últimos anos, sobretudo após a Reunião Inter-regional de Expertos das Nações Unidas sobre "Delitos e Delinqüentes fora do Alcance da Lei", em Nova Iorque, em 1979, como salienta Lola Aniyar de Castro (La Realidad Contra Los Mitos, Maracaibo, 1982).

Por sua vez, o poder opera em vários níveis ou esferas; há centros de poder político, como assembléias, administração, exército, polícia, magistratura, municípios, partidos políticos, assim como existem também centros de poder econômico e centros de poder ideológico.

Daí, "todo abuso de poder forma parte do mesmo exercício do poder que se encontra dentro de uma formação social determinada, e obedece aos seus mecanismos" (Lola Aniyar - ob. cit., ps. 127 a 133).Nesse contexto, ao versar sobre o tema Direito Penal Econômico e Direito Penal dos Negócios, salientou Heleno Fragoso que, no Brasil, o Direito Penal tem sido amargo privilégio dos pobres e desfavorecidos, que povoam nossas prisões horríveis e que constituem a clientela do sistema. A estrutura geral de nosso direito punitivo, em todos os seus mecanismos de aplicação, deixa inteiramente acima da lei os que têm poder econômico ou político, pois estes se livram com facilidade, pela corrupção e pelo tráfico de influência (Rev. de Direito Penal e Criminologia, ps. 122 a 129, Forense, n° 33).

O tráfico de influência e a impunidade das multinacionais ou transnacionais

A América Latina se caracteriza, como se afirmou na Conferência de Puebla, por uma escandalosa distância crescente entre pobres e ricos e a desumana pobreza de extensas faixas da população. Há fome e desnutrição, salários aviltados, desemprego e subemprego, enfermidade crônicas, analfabetismo, mortalidade infantil, falta de morada adequada, injustiça nas relações internacionais, especialmente nas transações comerciais, situações de neocolonialismo econômico e cultural, por vezes tão cruel como o colonialismo político.

Nosso direito tem permanecido fiel à regra segundo a qual a responsabilidade criminal é pessoal e subjetiva. As pessoas jurídicas não podem cometer crimes. Segundo Brícola, no entanto, num estudo luminoso, essa regra não tem valor ontológico e é apenas expressão da força das leis do poder econômico. Se se pretende permanecer fiel à regra da responsabilidade penal subjetiva, é indispensável prever, para as pessoas jurídicas, sanções administrativas comparáveis às sanções penais.

Constitui um dos fatos mais destacados do mundo contemporâneo a evolução fantástica das empresas transnacionais, que operam largamente na América Latina. Convém, assim, examinar em que medida é necessária e possível a repressão penal dos abusos cometidos por essas sociedades. Os atos de corrupção realizados em Lockheed na Itália, na Holanda e no Japão, que alcançaram repercussão internacional, são apenas um dos exemplos de ações delituosas. Sugere-se a elaboração pelos órgãos internacionais de códigos de conduta, que regulem a atividade dessas empresas, embora os seus efeitos sejam bem limitados (Rev. de Direito Penal e Criminologia, Forense, n° 33, ps. 122 a 129).As imunidades diplomáticas, como vimos, têm servido de disfarce para um sem-

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número de crimes, relacionados ao tráfico de drogas, armas, aliciamento de mercenários, espionagem industrial e comercial, corrupção, suborno. Nesse sentido, tornou-se particularmente escandaloso o episódio ocorrido, por longo período, na embaixada brasileira na França, em que o seu titular recebeu a alcunha de "embaixador dez por cento", pelo fato de perceber esse percentual, em decorrência dos negócios realizados pelo seu país, fato esse denunciado pelo célebre Relatório Saraiva, jamais, porém, divulgado ou apurado em suas últimas conseqüências, apesar de iniciativas, nesse sentido, na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Evidentemente, dispomos de instrumentos legais que reprimem os crimes de natureza econômico-financeira, como a Lei n° 1.521, de 26.12.1951 (Altera dispositivos da legislação vigente sobre crimes contra a economia popular), bem como órgãos específicos, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), criado pela Lei n° 4.137, de10.09.1962 (Regula a repressão ao abuso do Poder Econômico), instrumentos esses, porém, que se revelaram inócuos, sobretudo pós-1964, a partir de quando as multinacionais impuseram o seu alvedrio à economia nacional. A propósito, oferecemos a Indicação de n° 61/84, ao Instituto dos Advogados Brasileiros, apresentando projeto de lei que modifica a composição do CADE, para nele incluir representante dos advogados e de outros segmentos de nossa sociedade, proposta essa rejeitada.

O frenesi ou delírio da era do automóvel. Motocicleta

o fenômeno, que denominamosfrenesi do automóvel, por exemplo, éum caso típico de fator criminógeno.

Observe-se que falamos emfrenesi do automóvel, uma vez que, é lógico, o automóvel, por si só, não constitui fator criminógeno.

Entretanto, afigura-se como fator criminógeno o modelo econômico elitista, baseado na ênfase da produção e propagação do consumo do automóvel, como privilégio duns poucos, em detrimento dos interesses coletivos, devido à destinação de recursos públicos para esse esforço de produção, através de incentivos fiscais, remessa de lucros para o exterior,juros, royalties, provocando com isso o agravamento do endividamento externo, exigindo em conseqüência a exportação de gêneros alimentícios essenciais ao consumo da população - como, no caso do Brasil: café, soja, feijão, arroz, milho, carnes, frangos, frutas -, deixando aqui mesas vazias e bocas famintas.Em resumo, esse conjunto de fatos assume o aspecto de fator criminógeno, pois daí resultam injustiças e tensões sociais, elevação dos índices de acidentes de trânsito, sobretudo devido ao mal uso do automóvel, com numerosas vítimas, mortas, com deformação fisica, invalidez, sem falar nas neuroses urbanas, em conseqüência do ruído aterrador e da insegurança coletiva, provocada pelo próprio ritmo de velocidade desses veículos, pa norama esse que se pretende justificar em vão, sob a inconsistente alegação de "preço do progresso", como lembramos noutro trabalho (Causas da Criminalidade e Fatores Criminógenos, ps. 69 e segs.).

Em geral, nos países subdesenvolvidos, submetidos a regimes políticos autoritários, de exceção, o povo não dispõe de liberdade política para organizar-se em sindicatos atuantes, associações de defesa do consumidor e outros órgãos de proteção da comunidade (J. M. Othon Sidou - Proteção ao Consumidor, Rio, 1977; Nina Ribeiro -

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O Que Podemos Fazer, Brasília, 1978; Ester Kefauver - Em Poucas Mãos - O Poder de Monopólio na América do Norte, Rio, 1967).

Sob esse aspecto o Brasil se encontra completamente desprovido, à mercê do alvedrio das multinacionais, que controlam os principais setores de nossa economia: alimentos, medicamentos, transportes, tratamento da saúde, poder publicitário e de marketing (Mercadologia), através dos meios de comunicação social, a denominada mídia, que introjetam nos cidadãos a concepção segundo a qual quem não possui automóvel é infeliz. Haja vista que numa pesquisa realizada nos EUA, acerca do significado individual do automóvel, muitos dos entrevistados declararam que "amam os seus veículos" e "conversam com eles", enquanto outros revelaram que o "automóvel está acima da própria família, mulher e filhos" (cf. Central Brasileira de Notícias - CBN, 09.02.2002).

O mesmo se pode dizer em relação a motocicletas, sendo que alguns tipos das mesmas poluem dez vezes mais do que os automóveis.

Os descalabros no trânsito de veículos rodoviários. Automóvel: símbolo de desabaladas corridas. Criminalidade típica

No setor de trânsito, por exemplo, grassam a insegurança e impunidade, a começar pela inexistência dum mínimo de requisitos nos automóveis aqui produzidos e que circulam em nossas cidades e rodovias, Basta dizer que esses veículos não dispõem de padrões de segurança que os habilitem a circular em países da Europa, nos EUA e Japão, como ficou apurado por ocasião dos trabalhos realizados pela Câmara dos Deputados, em Brasília (Nina Ribeiro - Em Defesa do Consumidor, Brasília, 1974).

Somos perenes recordistas mundiais em acidente de trânsito e parece haver certo orgulho disso no subconsciente de muitos, pois sustenta-se que tal fato representa o "preço do progresso", quer dizer, sinal de que somos um país em desenvolvimento, na senda da prosperidade.

As multinacionais da indústria automobilística, do petróleo, do seguro de acidentes e do tratamento da saúde se sentem à vontade no Brasil, pois representamos um pasto fértil para as suas lucrativas e crescentes atividades.

A fraude, corrupção, permissividade e complacência da legislação e dos órgãos do trânsito, bem como a tolerância da justiça penal, se harmonizam e satisfazem ao status quo existente, deixando satisfeitas as multinacionais, que nos bastidores manobram eficientemente no sentido de que não ocorram mudanças.

De acordo com os dados coligidos por Genoveva Miranda, enquanto em São Paulo, em 1980, ocorreram 15.193 atropelamentos, ou seja, cerca de 40 por dia, em 1981 se verificaram cerca de 26 mil acidentes dessa espécie, o que dá u'a média de um a cada 22 minutos.

Por outro lado, dados do Programa de Redução de Acidentes - com a sugestiva sigla Pare -, vinculado ao Ministério dos Transportes, indicam que, em nível nacional, cerca de 350 mil pessoas são acidentadas anualmente no trânsito rodoviário, sendo que do total de acidentados, aproximadamente 40 mil correspondem a casos fatais (cf. pronunciamento do senador Mauro Miranda, in Jornal do Senado, 16.08.2001, p. 10).

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Os técnicos afirmam que em 1981 chegaram a 34 bilhões de cruzeiros os custos de socorro e hospitalização das vítimas. Segundo eles, um em cada 4 atropelados tinha mais de 50 anos.

Em grande parte, tudo isso se deve ao sistema de aprovação de novos motoristas. De acordo com o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg, são muitas as facilidades para obtenção de carteira de habilitação no Brasil: "Aqui, para ser considerado apto, basta ter visão razoável, provar que não é analfabeto, conhecer os sinais de trânsito e colocar o carro em movimento. E pronto! Depois de algumas ladeiras, a carta."

Uma das sugestões do psicólogo é a aplicação de testes psicotécnicos para todos, a cada 3 anos, e o uso de eletroencefalograma nos exames, para eliminar motoristas com problemas mentais.

Outra sugestão do referido especialista diz respeito à falta de condições de trabalho dos motoristas profissionais: excesso de carga horária, alto nível de ruído e calor. Tudo isso, mais os longos turnos - em média de 12 a 14 horas - provoca a fadiga, uma das causas dos acidentes.

Em 1973, por exemplo, de acordo com estatísticas oficiais, apurou-se que 12% dos motoristas de ônibus apresentavam disritmia, e todos dirigiam mais de 12 horas por dia, transportando u'a média de cem pessoas por viagem. Dois anos mais tarde, uma pesquisa também oficial constatou que 15% dos motoristas de uma empresa particular eram portadores de sífilis e verminose. Isso, quando não tinham problemas de hipertensão arterial e surdez, como lembramos alhures (Criminologia, ps. 115 e segs.).

Os acidentes no trânsito, em virtude de os motoristas dirigirem alcoolizados. Bandidos do volante

Por outro lado, os países mais desenvolvidos possuem leis severas, no que diz respeito aos motoristas que tenham tomado bebidas alcoólicas. Na Alemanha, por exemplo, é considerada como infração grave e embriaguez no volante. Bastam 2 copos de cerveja, apenas, para que o motorista seja considerado alcoolizado e, no caso, a medida tomada é a cassação imediata e, na maioria das vezes, definitiva, da carteira de motorista.

No Brasil, há um misto de sentimentalismo e escrúpulo, no que diz respeito à cassação da carteira de habilitação, ora sob a alegação de que isso representaria a perda do emprego, ora sob o fundamento de que o trânsito implica num risco razoável. Com isso, um mesmo infrator ocasiona sucessivos desastres, causando lesões corporais e morte, e enquanto responde aos processos, continua de posse de duas carteira, sem ser molestado, ensejando novos desastres, provocados pelos que denominamos "bandidos do volante" (Comentários ao Código de Processo Civil, art. 275, vol. I).

O emprego do álcool, como combustível automobilístico, trouxe novos complicadores em relação à poluição ambiental, como veremos adiante, ao que se soma ao fato de o motorista dirigir embriagado. É que, de acordo com a estimativa duma Delegacia Especializada em Acidentes de Trânsito, cerca de metade dos motoristas paulistanos, homens e mulheres, dirigem seus carros em estado de embriaguez.

Conforme uma pesquisa realizada no Brasil, intitulada "A Influência do Etanol nas

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Atividades Psicomotoras Envolvidas no Ato de Dirigir Veículos", constatou-se que o álcool é rapidamente absorvido pelo aparelho gastrintestinal- cerca de 90% - em uma hora. Sua solubilidade alta na água permite a passagem rápida por qualquer membrana humana e, uma vez diluído no sangue, entra imediatamente em contato com o cérebro. A princípio a pessoa entra num estado de excitação e, logo após, vem a depressão, quando, segundo Kalant, ocorre "uma diminuição da reação de alerta e a atividade dos centros regulatórios autônomos adquire um padrão bastante aproximado do estado de sono". Ou seja, começou a surgir os sintomas do sono, com a perda da capacidade de concentração e dispersão dos sentidos.

São os seguintes os distúrbios causados pela ingestão excessiva de bebidas alcoólicas: visuais, sonolência patológica, reflexos retardados, hipoglicemia severa e disritmias epileptiformes, na crise de abstinência de álcool.Diante desse quadro é que se pode avaliar a extensão da impostoria e o descabido regozijo da fala ministerial, ou seja, o teor dos discursos pro nunciados por ocasião da solenidade de comemoração do alcance da meta de produção de 10,7 bilhões de litros de álcool e da comercialização do milionésimo veículo a álcool, no Brasil (Publicação da Comissão Executiva Nacional do Álcool- Secretaria Executiva, Brasília, 19.09.1983).

O que se escamoteou, nessa ocasião, foi a verdade acerca da poluição causada ao meio ambiente, principalmente com o lançamento do vinhoto (resíduo da cana-de-açúcar, com elevado teor tóxico) em nossos rios, ocasionando a destruição da fauna aquática, com igual reflexo nos oceanos; o agravamento da dívida externa, pois essas empresas automobilísticas remeterão, com esse aumento de produção de veículos, mais dividendos, juros e royalties para as suas matrizes no exterior, e assim por diante, resultando mais esfomeação e miséria para as camadas sociais carentes de nosso povo.

Em Israel, por exemplo, no que diz respeito à severidade das leis de trânsito, há um critério para a perda da carteira de habilitação: basta que o motorista some 8 pontos em inftações cometidas. Para o excesso de velocidade a punição é 1 mês sem licença. Andar sem seguro são 8 pontos - e um juiz decide o tempo de cassação. O motorista surpreendido sem documentos tem o prazo de 24 horas para apresentá-los. Sendo alguém que estava suspenso, temporariamente, a perda é às vezes duplicada de 1 para 3 anos.

Quanto ao Brasil, com o advento do Código de Trânsito Brasileiro (Lei n° 9.503, de 23.09.1997), adotaram-se regras similares.

Na Itália, no caso de grave responsabilidade pessoal em acidente de trânsito com vítimas fatais, a carteira pode ser cassada, provisoriamente, até uma decisão judicial (Vida e Saúde, SP, 1984).

Enquanto se observa esse quadro, em relação ao transporte individual, o setor de transportes coletivos de tração elétrica, como convém ao Brasil, se encontra em completo abandono. .

No capítulo intitulado O Delírio do Automóvel, do livro que publicou, o engenheiro Renê Fernandes Schoppa demonstra, com argumentos e fatos irrespondíveis, o absurdo da política de expansão da indústria automobilística, mesmo em relação aos EUA, acarretando um elevado custo social, com a aplicação de recursos em planos viários elitistas, para facilitar o transporte individual, poluição ambiental, e danos à saúde pública (Para Onde Caminham Nossas Ferrovias? ps. 87 e segs.).

O consumismo como fator criminógeno

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Por sua vez, o consumismo representa outro decisivo fator criminógeno, na sociedade capitalista.

Como é notório, os chamados estímulos publicitários da sociedade capitalista têm como único objetivo o lucro individual, sem que importem os meios empregados e as conseqüências que daí possam advir.

Cria-se, assim, uma sensação artificial de progresso e fantasias, através do intenso sugestionamento do público, no sentido de consumo dos bens produzidos e oferecidos, através dos meios de comunicação social, produtos esses tantas vezes supérfluos e nocivos à saúde, sem qualquer controle por parte das autoridades públicas, quer se trate de alimentos, medicamentos, cosméticos e outros artigos, como, por exemplo, a publicidade insidiosa em torno do cigarro e das bebidas alcoólicas.

Nesse contexto, até o abundante oferecimento nos supermercados gera ânsia de adquirir o supérfluo; quando muitas vezes não é possível realizar esse desejo, então é estimulada a prática de furtos, comO lembra Hans von Hentig (El Delito, voI. III, p. 43).

Partindo dessa linha de raciocínio, chega-se à conclusão de que a atual síndrome de violência, característica da sociedade capitalista em geral, sobretudo no tocante à criminalidade patrimonial, não representa outra coisa senão a resultante generalizada da maciça publicidade em tomo do consumismo, que transborda pelos meios de comunicação. Ora, com a recessão econômica, desemprego e carestia dominantes, sob o capitalismo, não se poderia esperar outra reação coletiva, que se observa: o incontrolável número de furtos, assaltos, seqüestros, sem falar nas práticas estelionatárias.

A fabricação de armas, seu tráfico e as polícias particulares, como fatores de violência e criminalidade

Some-se a isso o fenômeno do tráfico de armas de fogo, a propagação de sua fabricação e venda; a existência de polícias particulares, firmas de segurança bancária, cujo pessoal, em sua maioria, é recrutado dentre as camadas mais carentes da população, sendo freqüente o extravio de seu armamento, inclusive o de armas de grosso calibre, consideradas de uso privativo das Forças Armadas.

Lembram muitos observadores que o ano de 1968, no Brasil, representou o momento de transição entre o crime habilidoso para o violento, porque foi justamente nesse ano que o nefando "Esquadrão da Morte" começou a atuar, institucionalizando a violência, sugestionando assim igual atuação violenta por parte dos criminosos em geral, mostrando-lhes que o assalto à mão armada é muito mais proveitoso e eficaz, sendo a surpresa um importante elemento para o êxito do assalto, como lembra Nélson Pizzotti Mendes (Criminologia, ps. 320 e 323).

Em seu livro Agressão e Violência no Mundo Moderno, assim se manifesta o autor norte-americano Friedrich Hackker: "Como compreender que um mesmo ato, quando cometido por um é autorizado e legítimo, e quando cometido por outro, proibido e repreensível?"

A propósito, observe-se a marcha das discussões, travadas no Senado Federal, durante o ano de 2000, acerca da proibição e da regulamentação do porte de arma do fogo, quando então vieram à tona argumentos patéticos a respeito, contrários à proibição em exame (Jornal do Senado).

Aliás, é bastante significativo o fato de o ex-presidente estadunidense Ronald Reagan, apesar de baleado no pulmão, no atentado que sofreu no dia 30 de março de 1981, ter-se recusado a adotar qualquer medida, em relação ao controle de venda de

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armas de fogo a particulares, nos EUA.É evidente que a fabricação e o comércio dessas armas representam um bilionário

negócio, além de expandir o crime organizado.

A "DELINQÜÊNCIA JUVENIL"

A problemática da inimputabilidade penal em face da idade

o emprego da expressão delinqüência juvenil tem suscitado interminável discussão teórica, quanto à impropriedade técnica dessa terminologia.

A discussão está centrada no conceito analítico do delito, que, como se sabe, consiste na ação ou omissão típica, antijurídica e culpável.

Ora, sustenta-se, desde que inexista um, dentre os três elementos, integrantes do conceito analítico do delito - tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade -, não se configura a hipótese de prática delituosa.

No caso, o cerne da questão gira em torno da culpabilidade, que constitui o elemento subjetivo do delito, isto é, o nexo moral que liga o agente ao fato criminoso que lhe é imputado.

Na linha desse raciocínio, a culpabilidade pressupõe a imputabilidade, ou seja, a capacidade moral atribuída ao homem, pelo fato que lhe é imputado - imputatio facti -, como sua obra e a forma dessa imputação - dolo ou culpa -, imputatio juris, isto é, a atribuição de um fato a um indivíduo para fazê-Io sofrer as conseqüências e torná-Io responsável por isso.

Em outras palavras, o imputável é o penalmente responsável; o inimputável é o irresponsável.

Em geral, os Códigos Penais não definem a imputabilidade, mas estabelecem as condições de inimputabilidade, ou seja, as dirimentes, como é o caso de nosso Código Penal de 1940, em cujos artigos 22 a 24 adotou o chamado critério biopsicológico normativo, segundo o qual o agente é isento de pena ou esta é reduzida, em determinadas circunstâncias, que o próprio Código prevê.

. Nos casos concretos, isto é, quando houver dúvida sobre a integridade mental do agente, este será submetido a exame médico-legal, de natureza psiquiátrica, na forma prevista pelo artigo 149, do Código de Processo Penal de 1941.

Adotou o legislador de nosso Código Penal de 1940 o princípio da chamada responsabilidade moral, que se baseia na consciência e vontade do agente, responsabilidade essa sobre a qual a pena deve atuar, para a realização de sua finalidade inerente à sua natureza aflitiva, expiatória, retributiva e também tendente a plasmar uma nova consciência no delinqüente.

Conceito de responsabilidade ou imputabilidade penal

Segundo Nélson Hungria, o Código Penal de 1940, não dá uma definição positiva

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da responsabilidade, sob o ponto de vista jurídico-penal, limitando-se a declarar os casos em que esta se considera excluída, assim se expressando: "Por dedução a contrario do texto legal, verifica-se que a responsabilidade pressupõe no agente, contemporaneamente à ação ou omissão, a capacidade de entender o caráter criminoso do fato e a capacidade de .

determinar-se de acordo com esse entendimento. Pode, então, definir-se a responsabilidade como a existência dos pressupostos psíquicos pelos quais alguém é chamado a responder penalmente pelo crime que praticou. Segundo um critério tradicional, que o Código rejeitou, haveria que distinguir entre responsabilidade e imputabilidade, significando esta a capacidade de direito penal ou abstrata condição psíquica da punibi1idade, enquanto. aquela designaria a obrigação de responder penalmente in concreto ou de sofrer a pena por um fato determinado, pressupostos da imputabilidade. A distinção é bizantina e inútil. Responsabilidade e imputabilidade representam conceitos que de tal modo se entrosam, que são equivalentes, podendo, I,com idêntico sentido, ser consideradas in abstrato ou in concreto, a priori ou a posteriori. Na terminologia jurídica, ambos os vocábulos podem ser indiferentemente empregados, para exprimir tanto a capacidade penal in generis, quanto a obrigação de responder penalmente pelo fato concreto, pois uma e outra são aspectos da mesma noção" (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, p. 314).

Entretanto, esse entendimento não é pacífico, do ponto de vista teórico, dele discordando, por exemplo, Aníbal Bruno (Direito Penal, I, Tomo U, p. 27), José Frederico Marques (cf. Euclides Custódio da Silveira, in Notas ao Direito Penal, 10 voI., p. 242), autores esses que distinguem responsabilidade e imputabilidade.

Capacidade de entendimento ético-jurídico do agente do delito

Como se sabe, segundo a sistemática adotada pelo nosso Código Penal de 1940, a responsabilidade só deixa de existir quando inteiramente suprimidas no agente, ao tempo da ação ou omissão, a capacidade de entendimento ético-jurídico ou a capacidade de adequada determinação da vontade ou de autogoverno. Tal supressão, porém, está indeclinavelmente condicionada a certas causas biológicas: "doença mental", "desenvolvimento mental incompleto ou retardado" e "embriaguez fortuita e completa". Foi, assim, adotado o método chamado misto ou biopsicológico, devendo notar-se, entretanto, que o Código faz uma exceção a essa regra quando trata dos menores de 18 anos, pois, nesta hipótese a causa biológica (imaturidade) basta, por si só, irrestritamente, sem qualquer indagação psicológica, para excluir a responsabilidade penal, como sustenta Nélson Hungria (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, ps. 314 e segs.).

As reações psíquicas do embrião e do feto e seus reflexos no comportamento futuro do ser humano

Na realidade, o critério adotado pelo nosso Código Penal de 1940 tem origens e explicações de natureza psicológicas, eis que, qualquer que seja o momento em que surpreendemos o germe humano, desde a sua fecundação, até adquirir o caráter de embrião (aos dez dias) ou de feto (aos dois meses), nele podem obter-se experimentalmente dois tipos de reação: locais e globais, reações essas que, progressivamente, adquirem um caráter unitário e intelectual, base das reações

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psíquicas, cujo aparecimento se dá incontestavelmente pelo sexto mês do desenvolvimento intra-uterino, coincidindo com a viabilidade do feto. Em suma, há portanto uma psicologia pré-natal (Emilia Mira y Lopez)

Daí os efeitos nocivos, nos casos das gestantes que rejeitam a maternidade, isto é, não desejam procriar, maldizem o feto, que se encontra em suas entranhas, utilizam-se de substâncias para tentar abortar, por não disporem de recursos financeiros para realizar o aborto, por meio de um médico.

Após a passagem migratória do feto para o mundo exterior, inicia-se a / Ievolução extra-uterina do recém-nascido, que atravessa diversas fases, até atingir a primeira e segunda infâncias, daí passando à adolescência (do latim adolescere, que significa crescer), que constitui um breve espaço de tempo, que precede a puberdade, correspondendo aproximadamente ao período entre os 11 e os 13 anos nas meninas e os 12 e 14 anos nos meninos. Nesse período, como ressalta Emilio Mira y Lopez, observam-se, a par de notáveis transformações anatômicas e psicológicas, alterações de conduta e mudanças morfológicas sensíveis. É o momento evolutivo do chamado "estirón", ou seja, de um crescimento estatural acelerado.

À medida que a Psicologia vai progredindo, acentua-se a importância do estudo da problemática existencial dos adolescentes, ampliando-se a duração admitida para esse período, até compreender não somente a puberdade, mais também grande parte da juventude, isto é, o segundo decênio da vida. De sorte que, já não é a adolescência intercalada entre a meninice e a puberdade, mas sim entre a meninice e a maioridade, variando em conseqüência os critérios legislativos de cada país, no tocante à concessão dos direito sociais e responsabilidade civil e penal do indivíduo (Psicologia Evolutiva da Criança e do Adolescente, ps. 23, 24 e 157).

Reflexos da problemática capitalista sobre o comportamento da criança e do adolescente

Como é notório, o sistema capitalista vive inexoravelmente sujeito a crises cíc1icas, crises essas de natureza complexa, isto é, social, política, econômica, familiar, devido a diversas causas e múltiplos fatores, inerentes ao próprio capitalismo, e que se manifestam através do desemprego, recessão, especulação desenfreada, fome, miséria, impunidade da corrupção administrativa, ambição de lucros, utilização nociva dos meios de comunicação social (rádio, televisão, filmes, jornais, revistas, escritos e impressos pornográficos), exploração sexual, erotização, tráfico de drogas e de armas, bem como numerosos outros aspectos.

Ora, tudo isso se reflete sobre a estrutura familiar, sobre o comportamento humano, a moralidade pública, os costumes. Em conseqüência disso: "A sociedade familiar decai. Crianças de oito, dez e doze anos se dedicam à prostituição na Inglaterra. Jamais presenciei um comércio de sexo infantil como agora", disse Arthur Nixon, delegado à Reunião Anual da Associação Britânica de Diretores de Colégio em 1981.

Hungria sentenciou: "O delinqüente juvenil é, na grande maioria dos casos, um corolário do menor socialmente abandonado, e a sociedade, perdendo-o e procurando, no mesmo passo, reabilitá-Io para a vida, resgata o que é, em elevada proporção, sua própria culpa" (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, ps. 353 e 354).

Note-se que a Lei n° 8.069/1990, assim considera e distingue a criança do adolescente, para os efeitos legais.

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"Art. 2° - Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade."

Cabe lembrar que a adolescência é o período de vida caracterizado por amplas e profundas modificações psicossomáticas, em que se completa o desenvolvimento morfológico-funcional do ser humano.

Durante essa fase da existência humana, definem-se os caracteres sexuais secundários, avivam-se os processos intelectuais, a sensibilidade, e toda uma nova problemática, de ordem biopsicológica, sócio-cultural e político-econômica, situação essa que repercute na esfera jurídica, daí por exemplo o fato de que aos dezoito anos completos o indivíduo está sujeito à convocação para efeito de prestação do serviço militar, direito de voto e ser votado (arts. 14, § 1°, I, e 143, da Constituição de 1988), assim como o homem contrair matrimônio, mediante consentimento dos pais ou de representante legal (arts. 183, XII, e 185 e segs. do Código Civil de 1916).

Quanto à mulher, pode a mesma consorciar-se após completar dezesseis anos, observadas as formalidades para o consentimento, acima referidas.

Terminologia adequada acerca dos desvios de comportamento da criança e do adolescente

A expressão delinqüência juvenil foi usada pela primeira vez na Inglaterra, em 1815, por ocasião do julgamento de cinco meninos de 8 a 12 anos de idade.

Atualmente, essa expressão tem suscitado várias críticas, como assinalamos acima, sendo empregada com diferentes sentidos, conforme a opinião dos autores, para exprimir os seguintes conceitos, principalmente:

a) a delinqüência juvenil compreende os comportamentos anti-sociais praticados por menores e que sejam tipificados nas leis penais;

b) a delinqüência juvenil não deve ser encarada sob uma perspectiva meramente jurídica, devendo incluir também os comportamentos anormais, irregulares ou indesejáveis;

c) a delinqüência juvenil abrange, além do que foi assinalado nas teorias anteriores, aqueles menores que, por força de certas circunstâncias ou condutas, necessitam de reeducação, cuidado, proteção.Das três posições acima, a mais aceita é a primeira.Salienta ainda César Barros Leal que, por ocasião do Segundo Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Delito e Tratame_to do Delinqüente, realizado em Londres, em 1960, foi aprovada recomendação no sentido de que o significado da expressão delinqüência juvenil deve restringir-se o mais possível às infrações do Direito Penal.

Em muitos países confunde-se delinqüência juvenil com inadaptação, cujo conceito não apenas compreende menores autores de infrações penais, como também retardados, neuróticos, desequilibrados, abandonados, órfãos, vagabundos etc. (A Delinqüência Juvenil: Seus Fatores Exógenos e Prevenção, ps. 43 e segs.).

Aliás, o. Segundo Seminário dos Estados Árabes sobre Prevenção e Tratamento do Delinqüente, realizado sob os auspícios das Nações Unidas, em Copenhague, em 1959,jáhavia concluído que os termos delinqüência e inadaptação não são equivalentes, pois, os dois problemas são diversos, eis que a delinqüência de menores abrange somente os atos que, pratiCados por adultos, seriam considerados delitos.

Por sua vez, o Seminário Latino-Americano sobre Prevenção do Delito e

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Tratamento do Delinqüente, realizado no Rio de Janeiro, em 1953, embora concluísse que a expressão delinqüência juvenil "era tecnicamente inadequada" ("por não reunir os elementos essenciais do conceito doutrinário do delito"), reconheceu, contudo, que pela inexistência de expressões substitutivas apropriadas, poderia continuar a ser utilizada.

Casas dos desvios de comportamento da criança e do adolescente. As associações em bandos para fins criminosos

Da mesma forma que em relação aos adultos, diversas causa,s - endógenas e exógenas - influem sobre a conduta delituosa do menor.

Essas causas podem ser de natureza genética, psicológica, patológica, econômica, sociológica, familiar.

As condições de vida miseráveis dos pais, fome, subnutrição, alcoolismo, consumo de drogas, falta de condições mínimas de higiene, ausência de qualquer exame pré-natal e hábito de fumar da gestante, enfermidades crônicas e outros aspectos, marcam a vida do novo ser antes do seu nascimento.

No período de zero a sete anos, em que a criança mais necessita de assistência sanitária e de nutrição, ocorrendo a falta desta, os neurônios (células nervosas com os seus prolongamentos) do menor serão fatalmente atingidos, e o trabalho de recuperação, mesmo usando-se os mais sofisticados métodos, não surte efeito, como salientou Antônio Alfredo Fernandes (Jornal do Brasil, 14.04.1978).

Segundo o relatório da FAO (Organização para a Alimentação e Agricultura, órgão da ONU), divulgado em 1978, o consumo médio de calorias nos países ricos subiu para 3.380, contra 2 mil calorias consumidas em média nos países subdesenvolvidos.

Essas disparidades, segundo a F AO, provocam males, sob um duplo aspecto, isto é, tanto ocasionam doenças por subnutrição como pelo consumo excessivo de alimentos ou a adoção de dietas inadequadas nos países ricos.

Está fora de dúvida, porém, que os males resultantes da fome são des-proporcionalmente maiores para os pobres, até porque estas condições lhes são impostas, como conseqüência das desigualdades internacionais e da exploração exercida pelas potências imperialistas, através do controle de preço, açambarcamento e distribuição de alimentos, nos diversos países capitalistas.

A subnutrição não é apenas um mal em si: todos os anos cem mil crianças ficam cegas por causa daquela; 40% das mulheres adultas dos países subdesenvolvidos são anêmicas.

Na América Latina, mais da metade das mortes entre as crianças de menos de dois anos é atribuída a alimentação deficiente.

De acordo com as previsões de luan Pablo Terra, consultor da UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), se persistirem as condições atuais na América Latina, morrerão nos próximos 20 anos, cerca de 30 milhões de crianças e outras tantas sofrerão desnutrição grave (Rev. Bras. de Ciênc. Jurídicas, n° 1, ps. 76 e segs.).Na década de 1980, a UNICEF divulgou um relatório específico acerca da situação da criança no Brasil, registrando elevados índices de mortalidade infantil, devido, entre outras causas, à falta de assistência pré-natal e cuidados médicos, durante o parto; dito relatório salientou também aspectos relacionados à deficiência mental da criança, em razão da subnutrição das mães, bem como do próprio menor, nos primeiros meses de vida, com a conseqüente atrofia das células cerebrais, insuficiência de peso, propensão a doenças etc. (Jornal Nacional, Brasília, 07.06.1984).

Ora, esse conjunto de causas e fatores enseja inexoravelmente a formação de

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crianças deficientes e futuros adultos débeis mentais, por conseguinte, uma porta larga para os desvios de comportamento, inclusive condutas delituosas, tomando tais seres humanos um peso morto, uma carga inútil e nociva ao meio social em que vivem. Paradoxalmente, esse mesmo meio social - através de seus órgãos punitivos - acaba de liquidá-Ios, moral e fisicamente, nos seus estabelecimentos prisionais: as mundialmente conhecidas "casas de horrores".

Fatores criminógenos que atuam sobre a criança e o adolescente. Bandos juvenis

Quanto aos fatores criminógenos, de natureza exógena, relacionados ao meio social, aos aspectos psicológicos e psiquiátricos, que atuam negativamente sobre a criança e o adolescente, destacam os autores os seguintes:a) disciplina mais rígida ou descontínua da parte do pai; b) supervisão não adequada da parte da mãe;c) pai delinqüente e hostil;d) mãe indiferente e hostil;e) família sem coesão;f) desejo marcante de afirmação pessoal na sociedade; g) atitude marcante de desprezo e desafio;h) marcante destrutividade;i) aventureirismo;j) instabilidade emotiva;1) procedentes familiares de vício ou delinqüência; m) falta de ocupação;n) influências extrafamiliares, más companhias;o) famílias numerosas com problemas econômicos etc.Segundo estudos realizados na extinta Alemanha Federal, cerca de metade das crianças estava crescendo em meio a um ambiente em que devem contar, a cada instante, com uma surra ou bofetada, ou seja, hábitos violentos por parte dos pais.

O relatório publicado a respeito informa que grande número de ocorrências permaneciam ocultas, pois havia interesse em disfarçá-Ias, dificultando-se as sindicâncias. Apesar disso, suponha-se como realista a cifra de 15.000 a 18.000 casos anuais de maus tratos fisicos a crianças, com reflexos negativos sobre a sua personalidade, conduta e reação emotiva TribunaIAlemQ., agosto, 1982).

No Brasil, embora não existam estudos a respeito, há indícios do mesmo fenômeno, resultando inclusive, em alguns casos, fraturas em crianças, sob o disfarce de quedas, acidentes.

No que tange às associações em bandos juvenis, elas existem de forma mais estruturada e em maior número nos EUA, onde, por coincidência, é também maior o índice de crime organizado (organized crime), embora ditas associações sejam universalmente conhecidas, inclusive no Brasil, como salientamos noutra parte deste trabalho.

As denominações dessas associações variam nos diferentes países, a saber: gamberros (Espanha), vitelloni (Itália), teddy-boys (Inglaterra), blousons noirs (França), Halbstarker (Alemanha), nosem (Holanda), anderujmer (Dinamarca), pasek (Tchecoslováquia), hooligans (URSS e Polônia), pavitos (Venezuela), zazous (África), bodgies (Austrália), taizo-zoke (Japão) e Tai-Pao (China), como assinala César Barros Leal (ob. cit., p. 39).

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No Brasil, inexistem estudos específicos, a respeito das associações em bandos juvenis, com o objetivo de práticas delituosas; contudo, são flagrantes e exuberantes os indícios e provas, quanto a existência desses bandos, sendo os menores denominados, individualmente, de "trombadinhas" (São Paulo) e "pivetes" (Rio de Janeiro).

Mutatis mutandis, da mesma forma que em relação aos adultos, existem cifras douradas (em relação aos menores pertencentes às classes sociais privilegiadas), cifras negras (práticas delituosas não detectadas, ou que escapam ao controle oficial) e as práticas delituosas reprimidas, em conformidade com a legislação aplicável em cada país.

Imaturidade penal

Estabeleceu o art. 23, do nosso Código Penal de 1940 que, os menores de dezoito anos são penalmente irresponsáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial, preceito esse reproduzido no art. 228 da Constituição de 1988.. A legislação especial em causa consistiu em diplomas legais específicos, que se

sucederam até a vigência da Lei n° 8.069, de 13.07.1990-Estatuto da Criança e do Adolescente -, que dispõe, dentre outras medidas, sobre a assistência, proteção, vigilância, vida e saúde dos mesmos.

Como se vê, pelos princípios acima expostos, a imaturidade individual e individual-sociai"do psiquismo das crianças e adolescentes constitui causa de exclusão ou atenuação da imputabilidade, matéria essa que tem recebido as soluções mais diversas através dos tempos: a equiparação penal do menor ao adulto, a exclusão da pena para as primeiras idades, ou a sua atenuação subordinada ou não ao critério dos discemimentos. "Hoje, o pensamento fundamental em referência à chamada criminalidade dos menores, é que ela não constitui matéria do Direito punitivo, mas de um regime tutelar" (AníbalBruno - Direito Penal, I, Tomo 2°, ps. 163 e segs.).

Critérios legislativos distintos sobre a incapacidade civil e penal dos menores de dezoito anos. A "malícia supre a idade"

A incapacidade do indivíduo, segundo a lei civil, é de fato, e não de direito, quer dizer, as pessoas consideradas incapazes, II-° sentido jurídico, têm direitos, mas não os podem exercer, ou então, não 10 podem fazer de modo absoluto (art. 5°, I a IV, do Código Civil de 1916, ou relativamente a certo número de atos (art. 6°, I a III, do referido Código).

Todavia, isso implica dizer, dentre outros aspectos, que a incapacidade civil não isenta o agente incapaz, quanto à obrigação de reparação do dano por ele causado, o que ocorre por intermédio de seu representante legal (arts. 84 e 1.521, I e II, do predito Código), como decorrência do princípio da responsabilidade por fato de terceiro, como lembramos noutro trabalho (Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro, ps. 271 e segs.).

Nesse sentido, preleciona Clóvis Beviláqua, ao comentar o art. 155 do mencionado Código, que dispõe sobre a obrigação de o menor, entre dezesseis e vinte e um anos, responder pelo seu ato, quando agir deso1amente, assim se manifestando:

"A malícia supre a idade malitia supplet octatem. O menor que, do10samente, esconde a sua idade consegue convencer a outrem, de que é capaz, não pode invocar, depois a proteção da lei em favor de sua debilidade mental. A malícia não deve

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aproveitar a ninguém, diz outro brocardo, nem, ainda, aos menores" (Código Civil, p. 340, vol. I, 1956).

Versando sobre o tema, salienta Ga1dino Siqueira que, "no homem a noção do justo surge mais cedo do que a noção do útil", aduzindo o seguinte:

"A lei civil mesmo tem em tanta conta este fato de observação, que declara o menor responsável pelos seus delitos ou quase-delitos civis, ainda que lhe seja permitido anular suas obrigações convencionais, desde que prove ter sido lesado.

Daí por que a maioridade penal é fixada antes da maioridade civil nasdiferentes legislações" (cf. Direito Penal Brasileiro, p. 354, vaI. I, 1932).

Contudo, cumpre lembrar que a experiência legislativa brasileira adotou, no passado, o critério de responsabilidade penal aquém dos dezoito anos, como veremos adiante.

Experiência legislativa brasileira, acerca da responsabilidade penal, em função da idade. Critério meramente presuntivo

o nosso Código Penal de 1890 estabeleceu em seu art. 27, que não são criminosos, dentre outros, os menores de nove anos completos, e os maiores de nove e menores de 14, "que obrarem sem discemimento" (§§ 1° e 2°).

Por sua vez, o art. 30, do mesmo diploma legal, dispôs que "os maiores de nove anos e menores de 14, qlie tiverem obrado com discemimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, contanto que o recolhimento não exceda à idade de 17 anos".

Comentando o citado art. 27, do Código Penal brasileiro de 1890, salientou Oscar de Macedo Soares que o critério de idade, adotado pelo Códi. go Criminal do Império (1830) e pelo referido Código de 1890, teve como fonte de inspiração o direito romano, que distinguia as três classes: infantes (até os 7 anos), impuberes (dos 7 aos 14 anos), minores (dos 14 aos 18 ou aos 21 anos).

Em suma, segundo o referido Código, em se tratando de menores de 9 a 14 anos, que obrarem sem discernimento, a irresponsabilidade é plena; quanto àqueles, da mesma idade, que obrarem com discernimento, a irresponsabilidade é semiplena, e por isso determinava o Código fossem recolhidos a estabelecimentos industriais, disciplinares, pelo tempo que o juiz determinasse, contanto que dito recolhimento não excedesse a idade de 17 anos (Código Penal da República dos Estados Unidos do Brasil, 3a ed., p. 34).

Por seu turno, a Consolidação das Leis Penais (Decreto n° 22.213, de 14.12.1933), que vigorou até a entrada em vigor do Código Penal de 1940, dispôs em seu art. 27 que não são criminosos, dentre outros, os menores de 14 anos (§ 1°), enquanto o art. 30, do mesmo diploma punitivo, estabeleceu que "os menores de 18 anos, abandonados e delinqüentes, ficam submetidos ao regime estabelecido pelo Decreto n° l7.943-A, de 12.10.1927" (Código de Menores). .

Versando sobre a matéria, escreveu Francisco Pereira de Bulhões Carvalho, que em relação aos menores infratores da lei penal de 14 a 18 anos, o Código de Menores, de 1927, determinou "um verdadeiro sistema penal próprio, isto é, aplicação de sanção penal relativamente indeterminada, correspondente à prática do delito e a ser cumprida em reformatório ou estabelecimento anexo a penitenciária de adulto" (Di-reito do Menor, p. 34).

O fato é que a fixação da idade, para efeito de responsabilidade penal, varia de

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acordo com os Código Penais dos diversos países, atendendo naturalmente a critérios relacionados às tradições jurídicas, condições sociais, situação econômica e outros, variando a idade de 14 a 21 anos, como veremos oportunamente.

Por sua vez, o legislador de 1940 não cuidou da maior ou menor precocidade psíquica dos menores de dezoito anos: "declarou-os por presunção absoluta, desprovidos das condições da responsabilidade penal, isto é, o entendimento ético-jurídico e a faculdade de auto governo" (cf. Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, art. 23, vol. I, tomo 2°, 1955).

Em outras palavras, em virtude de mera presunção legal, de natureza biopsicológica, os menores de dezoito anos são considerados imaturos, situação essa que basta, por si só, irrestritamente, sem qualquer indagação psicológica, para excluir a responsabilidade penal, deixando-os "fora do Direito Penal (00')' sujeitos apenas à pedagogia corretiva de legislação especial" (cf. Exposição de Motivos ao Código Penal de 1940, n° 19, infine).

Por seu turno, a Lei n° 7.209, de 11.07.1984, que alterou dispositivos do Código Penal de 1940, manteve o mesmo critério sobre a inimputabilidade penal dos menores de dezoito anos (art. 27 da Parte Geral).

Em outras palavras, não foram levados em conta os fundamentos de ordem psicológica, concementes ao discernimento e inteligência, para efeito da fixação da idade para a responsabilidade penal, como veremos adiante.

Discernimento e inteligência em função da idade do ser humano

Como seres humanos, embora com tenra idade, as crianças são também suscetíveis de degenerescência, seja por fatores ou causas hereditárias, genéticas, biológicas, sociais, econômicas, psicológicas, familiares, que podem exercer influência maléfica sobre aquelas, a ponto de transformá-Ias em verdadeiros monstros, entes perversos, insensíveis, cruéis, torpes, assassinos, sangüinários.

Daí a expressão criança-monstro, cujos casos concretos são conhecidos desde a Antigüidade, constituindo objeto de estudos psiquiátricos (cr. Philip Solomon e Vemon D. Patch, Manual de Psiquiatria, ps.530 e segs.; Arthur Ramos, A Criança Problema, ps. 31 e segs.).

Seja como for, o tema em apreço relaciona-se à problemática de natureza psicológica, concemente ao discemimento e inteligência, que devem servir de fundamento para a fixação da idade de responsabilidade penal.

Em síntese, discernimento é a faculdade que tem o indivíduo de distinguir perfeitamente os atos que pratica, assim como calcular os seus efeitos.

Por sua vez, J. Alves Garcia assim conceitua a inteligência:"Chamamos inteligência ao conjunto constituído por todos os dons,

talentos ou instrumentos que nos permitem adaptar às circunstâncias e desencumbir das tarefas que nos propõe a existência.

Enquanto o desenvolvimento do corpo se opera até aos 20 ou mais anos, o da inteligênCia detém-se aos 15 anos, ou mais geralmente nos 13 'ij anos, após o que crescem a experiência e a educação, somente" (Psicopatologia Forense, ps. 91 e segs.).

Concluindo, a problemática em apreço está intimamente relacionada ao fator decisivo à afirmação individual, ou seja, o quociente da inteligência (QI) focalizado noutra parte da presente obra.

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Agora, a problemática da inteligência interessa como fundamento e critério para a fixação da idade, para efeito de responsabilidade penal do indivíduo, como veremos adiante.

Cabe lembrar ainda que, de acordo com os estudos sobre o assunto, o menor ou maior quociente de inteligência, assim como o fenômeno do indi-" víduo superdotado não resultam da hereditariedade, constituindo sim características individuais, da mesma forma, por exemplo, como os dotes vocais, a bela voz, o talento artístico.

Direito Comparado acerca da fixação da idade para efeito de responsabilidade civil

De acordo com os dados coligidos por César Barros Leal, a idade fixada para efeito de responsabilidade penal, nos diversos países, dentre outros selecionados, é a seguinte: Haiti - 14 anos; Índia, Paquistão, Honduras, EI Salvador, Iraque-15 anos; Birmânia, Filipinas, Ceilão, Hong-Rong, Bélgica, Nicarágua, Israel- 16 anos; Malásia, Polônia, Grécia, Costa Rica - 17 anos; Brasil, Tailândia, Áustria, Luxemburgo, Dinamarca, Finlândia, França, Suíça, Iugoslávia, Peru, Uruguai, Turquia - 18 anos; EUA - há variação de critérios nos diversos Estados-Membros da Federação, entre 16,17,18,19 e 21 anos (ob. e loco cits.).

Percentualmente, a variação de idade, nos diferentes países, é a seguinte: 14 anos (0,5%),15 anos (8,0%),16 anos (13,0%),17 anos (19,0%), 18 anos (55,0%), 19 anos (0,5%) e 21 anos (4,0%).

Fundamento psicológico para afixação da idade, para efeito de responsabilidade penal, aos quatorze anos

Como vimos anteriormente, de acordo com Nélson Hungria, nosso legislador não "cuidou da maior ou menor precocidade psíquica" dos menores de dezoito anos, simplesmente "declarou-os por presunção absoluta, desprovidos das condições da responsabilidade penal, isto é, o entendimento ético-jurídico e a faculdade de auto governo" (Comentários ao Código Penal, art. 23, voI. 2°, 1955).

Acontece que, de acordo com os estudos e as conclusões da Psicologia, o desenvolvimento da inteligência no indivíduo se desenrola até aos 15 anos, ou mais geralmente aos 13 Y2 anos, após o que conta somente o crescimento da experiência e da educação (cf. J. Alves Garcia, Psicopatologia Forense, ps. 91 e 93).

Quer dizer, aos 15 anos o indivíduo já se encontra com suficientes discernimento e inteligência para se desencumbir das tarefas lhe propõe a existência, inclusive o entendimento ético-jurídico, a faculdade de autogoverno, enfim a capacidade para entendimento acerca dos atos ilícitos penais.

Em face das considerações acima expostas e da realidade brasileira, toma-se imperiosa a reflexão acerca da fixação da idade em quatorze anos, para efeito de responsabilidade penal, como ressaltamos na Indicação n° 187/1995, oferecida ao Instituto dos Advogados Brasileiros.

Isso se justifica em face da incontrolável violência, por parte dos menores de 15 anos no Brasil, e dos elevados indices de infrações penais por eles praticadas; por outro lado, os mesmos competem ombro a ombro, em matéria de ferocidade, com os delinqüentes adultos, no que diz respeito aos sangrentos motins e rebeliões, ocorridos nos estabelecimentos correcionais, conforme o noticiário divulgado pelos meios de comunicação social, freqüentemente, resultando daí várias mortes.

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CRIMINALIDADE FEMININA E MASCULINA

Da criminalidade sexual. Erotização ou sexismo. Contágio venéreo

Considera-se criminalidade sexual o conjunto de ações anti-sociais,praticadas para satisfazer o impulso erótico ou as tendências libidinosas do

indivíduo. .A propósito, observa Nélson Hungria:"A disciplina jurídica de satisfação da libido ou apetite sexual, reclama, como condição precípua, a faculdade de livre escolha ou livre consentimento nas relações sexuais" (Comentários ao Código Penal, voI. VIII, p. 111).

Desse modo, do ponto de vista jurídico-penal, considera-se liberdade sexual "a liberdade de disposição do próprio corpo no tocante aos fins sexuais", cuja violação consiste em vencer, mediante violência (fisica ou moral)"ou iludir, mediante fraude, a oposição da vítima (idem, ibidem).

Daí as diversas modalidades delituosas dessa espécie, COITO prevê o Código Penal, sob o título de crimes contra os costumes, a saber: crimes contra a liberdade sexual; sedução e corrupção de menores; rapto; lenocínio e tráfico de mulheres; ultraje público ao pudor (arts. 213 e segs.), como lembramos alhures (Sexologia Forense, ps. 144 e segs.).

Cabe ressaltar a influência deletéria, exercida sobretudo pela televisão, quanto à exaltação da erotização, ou seja, o chamado sexismo, como fator criminógeno, como lembramos alhures (Comentários à Constituição da República Federativa do Brasil, lIa edição).

Por outro lado, sob o título de periclitação da vida e da saúde prevê o art. 130 do Código Penal a figura delituosa consistente em perigo de contágio venéreo, ou seja, as denominadas Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST).

A propósito, a Corte de Justiça de Los Angeles condenou o espólio do ator Rock Hudson, ao pagamento da importância de US$ 14,5 milhões de dólares (NCz$ 14,5 milhões), em favor do ex-amante dele, Marc Christian, com quem conviveu durante cerca de dois anos, a partir de 1982. Em 1984, o relacionamento entre eles começou a deteriorar-se porque Marc revelou ao seu amante, que se prostituíra com outro indivíduo. Diante da iminência de um rompimento, o amante de Hudson ameaçou revelar publicamente o homossexualismo do galã, arruinando assim sua máscula reputação, construí da ao longo de muitos beijos, trocados com mocinhas, nas telas dos cinemas.

Os membros do júri daquela Corte norte-americana entenderam que Marc Christian "sofreu um choque emocional", porque, até pouco antes da morte de Hudson (1985), ignorava ser este portador de AIDS, sujeitando-o, assim, ao perigo de contágio (O Globo, 17.02.1989).

Por outro lado, em 1987, na Califómia (EUA), o cidadão Joseph Markowski foi denunciado, por tentativa de homicídio, por ter doado sangue, mediante pagamento, sendo portador de AIDS, além do fato de manter relações sexuais com cinco pessoas. Surgiu então a polêmica, acerca da violação do princípio da reserva legal, visto que não há lei penal específica sobre a matéria, em que se pudesse amparar tal imputação penal (Fantásti co,19.07.l987).Quid juris, em face dos princípios jurídicos brasileiros?

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Versando sobre o ressarcimento, José de Aguiar Dias não deixa dúvida acerca do caráter ilícito e do dever de indenizar, no caso de transmissão de doença venérea, em face dos princípios que regem o ordenamento jurídico pátrio, nessa esfera (Da Responsabilidade Civil, voI. lI, p. 445).Recorrendo-se à opinião de Nélson Hungria, verifica-se que nosso Código Penal de 1940 não previu "a hipótese de superveniência da morte da vítima, conseqüente ao efetivo contágio. Como resolver tal hipótese? Se o agente procedeu com dolo de perigo ou dolo de dano, o fato ser-lhe-á imputado a título de "lesão corporal seguida de morte" ou "homicídio preterintencional" (art. 129, § 1°). Se o antecedente, porém, era simplesmente culposo, responderá por homicídio culposo (art. 121, § 3°)" (Comentários ao Código Penal, voI. V, p. 396).

Até que ponto a falta de condições higiênicas essenciais, a promiscuidade sexual, debilitamento orgânico, estresse e outros aspectos, são responsáveis pelos elevados índices de incidência da AIDS, nos diversos países?

Segundo dados divulgados pela Organização Mundial de Saúde, a China, por exemplo, com mais de um bilhão de habitantes, não registrava casos de AIDS, salvo os de 13 estrangeiros, lá residentes, que se encontravam então sob tratamento, hospitalizados (Jornal do Brasil, 02.03.1988).

A criminalidade passional. Sadismo. Masoquismo. Sadomasoquismo

Do latim passionalis, de passis (paixão), passional é o vocábulo empregado na terminologia jurídica, especialmente no Direito Penal para designar o que se faz por uma exaltação ou irreflexão, ciúmes ou amor ofendido, desencadeando emoções, violências, como ressaltamos alhures (Sexologia Forense, ps. 175 e segs.).

Para Aftânio Peixoto, paixão é a "emoção crônica", em tempo, por prolongada, e aguda em manifestação, por violenta".

Segundo Nélson Hungria, emoção é um estado de ânimo ou de consciência caracterizado por um viva excitação do sentimento. É uma forte e transitória perturbação da afetividade, a que estão ligadas certas variações somáticas ou modificações particulares das funções da vida orgânica (pulsar precipite do coração, alterações térmicas, aumento da irrigação cerebral, aceleração do ritmo respiratório, alterações vasomotoras, intensa palidez ou intenso rubor, tremores, fenômenos musculares, alteração das secreções, suor, lágrimas e outras manifestações.

Há certa diferença entre emoção e paixão, embora esta seja originária daquela. Kant dizia que a emoção é como "uma torrente que rompe o dique da continência", enquanto a paixão é o "charco que cava o próprio leito, infiltrando-se, paulatinamente, no solo".

Conclui Hungria: "Pode dizer-se que a paixão é a emoção que protrai no tempo, incubando-se, introvertendo-se, criando um estado contínuo e duradouro de perturbação afetiva em torno de uma idéia fixa, de um pensamento obsidente. A emoção dá e passa; a paixão permanece, alimentando-se de si própria" (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tom. 2°, ps. 360 a 363).

O Código Penal de 1940 não transigiu, no terreno da responsabilidade penal, com os emotivos ou passionais, que não exorbitam da Psicologia normal.

Ao contrário, o Código Penal de 1890 ensejou escandalosas absolvições, sobretudo no âmbito do Tribunal do Júri, em face da norma estabelecida no art. 27, que consideravam não ser criminosos: "Os que se acharem em estado de completa

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privação de sentidos e de inteligência no ato de cometer o crime", como lembramos alhures (Comentários ao Código Penal, ps. 125 e segs.).

Para Léon Rabinowicz, há um aspecto do amor sexual que é bastante característico: o ódio que o acompanha. "Entre os dois amorosos só existe a carne: nenhuma ternura, nenhum sentimento os retém, além do prazer carnal; por isso, entre dois momentos de desejo, o ódio mistura-se com a volúpia".

Em suma, o crime passional culmina com a paixão homicida, enquanto osuicídio é um sucedâneo do crime passional (O Crime Passional, ps. 60,95 e 142).

O interesse que a humanidade sente pelo homicídio, escreve Hans vonHentig, reside no fato de que o matar ou ser morto fere suas fibras mais íntimas.

Embora, muitas vezes, sejam ignorados os motivos dos homicídios, a Estatística Criminal tem que limitar-se a uma casuística desses motivos, assim agrupados: por lucros; para encobrir outras ações ou crime; por conflito; de natureza sexual.

O chamado homicídio sádico, por exemplo, comporta numerosas variantes, envolvendo ódio, mistério, sangue, erotismo, crueldade e homossexualismo. Certo médico introduziu na vagina e no reto de sua amante, "vaselina, goma e estrofantina, sendo que esta queima". Desesperada, a vítima procurou uma clínica, onde foi atendida, cujo clínico de plantão diagnosticou apenas: "forte estado de excitação". Pouco depois, falecia a vítima (Estudos de Psicologia Criminal, voI. lI, ps. 9 e segs.).

Nesse contexto se inserem sadismo (preversão sexual em que a satisfação erótica advém da prática de atos de violência ou crueldade), o masoquismo (preversão sexual em que a pessoa só tem prazer ao ser maltratada física e moralmente) e o sadomasoquismo (preversão sexual que consiste na conjugação do sadismo e do masoquismo), podendo em consqüência resultar lesões corporais ou morte, temas esses que abordamos noutro trabalho (Sexologia Forense, ps. 140 e segs.).

A criminalidade passional em face da eloqüência forense

Os arquivos judiciários, nos diferentes países, estão repletos de casos, relacionados à violência sexual, crime passional, duplo suicídio, homicídio seguido de suicídio frustrado, e outros, envoltos em sensacionalismo, que lograram escandalosas absolvições, nos Tribunais do Júri, daí afinnar-se que um dos vícios da instituição do júri resulta da influência da oratório sobre os jurados, quer dizer, os jurados decidem segundo a eloqüência, fantasia e astúcia dos defensores, como lembramos alhures (Curso de Direito Processual Penal, ps. 315 e 316).

Por sua vez, Enrique Ferri, que foi um gigante da oratória forense, obteve retumbantes vitórias nos Tribunais do Júri, em memoráveis defesas penais, obras-primas de literatura jurídica, em que o romanesco se confunde com as construções legais, do maior rigor científico.

A defesa, por exemplo, de Carlos Cienfuegos, assassino da condessa Hamilton, mereceu o título de Amor e Morte, uma apaixonante leitura, para os que se encantam com as obras de espírito.

À certa altura, desse belo texto literário, assim se expressa o autor: "Estamos perante um caso de homicídio, seguido de suicídio frustrado, em seguida ao amplexo de amor, depois da febre e do frenesi que produzem, no momento fugitivo da volúpia, o esquecimento da dor que atormenta, do destino inelutável".

E adiante: "Por amor se bate na pessoa amada, e até, por vezes, esta gosta de ser batida. Mas pessoas menos cultas como regra geral, nas pessoas intelectualmente mais elevadas como fenômeno ocasional e patológico - o amor, em vez de diminuir,

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aumenta com as sevícias e os maus-tratos, e assim, as misérias do masoquismo levam às violências do sadismo, que são as doenças do amor e a sua gangrena."Prossegue:

"O amor nasceu com a violência. Nas florestas da humanidade primitiva, o macho impunha-se, violentamente, à fêmea esquiva e possuía-a pela força. E só a lenta e tormentosa elevação moral, de geração para geração, do Oriente místico até a Grécia bela, até a poderosa Roma, conseguiu purificar e imprimir uma certa delicadeza ao sentimento do amor, no qual, porém, palpita sempre, bem viva, a recordação nostálgica da violência primitiva" (Discursos de Defesa, ps. 12 e 22).Sob a ótica fascinante da arte, do canto e da literatura, escreve Ferri:

"A Cavalheira Rusticana passou do fraco êxito do conto aos triunfosdum drama onde se sucedem rapidamente, em cenas emocionantes, o abandono da amorosa, o adultério, o duelo de morte, onde um marido vinga a sua honra e um amante paga com a vida a vileza do abandono e a sua boa sorte, onde enfim, os principais personagens são criminosos passionais.

E o triunfo toma-se uma apoteose universal da arte italiana quando Mascagni empresta a essas paixões, mas ou menos criminosas, a mágica beleza da sua música nervosa é inspirada" (Os Criminosos na Arte e na Literatura, p. 86).

A prostituição masculina e feminina como fator criminógeno

o panorama legal, nos dias atuais, com relação à prostituição feminina revela o seguinte quadro, nos diferentes países capitalistas:

a) proibicionismo: a prostituição era considerada um delito na extintaURSS, países do leste europeu, EUA, países escandinavos);

b) abolicionismo: não há qualquer restrição à atividade prostitucional(Brasil, Itália, Índia, Japão);

c) regulamentarismo: as prostitutas devem ser inscritas, submetidas com maior ou menor rigor a medidas condicionantes de sua atividade (Tailândia, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Equador, Venezuela, Peru, Uruguai).

Segundo o testemunho de Jean-Gabriel Mancini, há tanta prostituição nos países que a proíbem quanto nos que a permitem.

O fato é que, para certas mulheres, dificilmente outra atividade além da prostitucional-lhes renderia tantos ganhos, como o declarou uma delas,

perante um magistrado francês, que a processava criminalmente (Waldir de Abreu - O Submundo da Prostituição, Vadiagem, Jogo-da-Bicho, ps. 17 a 38).

A prostituição masculina, nos diversos países capitalistas, grassa largamente, tanto para satisfazer à lascívia feminina como masculina, de homossexuais ativos e passivos; nos EUA, por exemplo, são impressos catálogos, com endereço, telefone e demais indicações, acerca da prostituição masculina, constituindo um rendoso negócio.

Antes do desmoronamento ou desmascaramento do denominado socialismo real na extinta URSS, as autoridades soviéticas alegavam que o incremento do turismo de estrangeiros havia provocado o aparecimento da prostituição naquele país, versão essa desacreditada, após estudos e pesquisas divulgados a respeito.

A prostituição, como fator criminógeno, pode decorrer ou conduzir ao vício por drogas, alcoolismo, chantagens, assaltos, escândalo, adultério, estando intimamente ligada ao crime organizado.

Tanto a prostituta, ou prostituto, como o cliente podem ser infectados por doenças

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venéreas, mas estas estão atualmente mais difundidas pelo amor livre, homossexualismo e adultério do que pela própria prostituição (Philip Solomon e Vernon D. Path - Manual de Psiquiatria, ps. 301 e 302).

A matéria comporta vários enfoques, como lembramos noutro trabalho (Direito Penal - O Crime - O Processo - As Penas, ps. 109 e segs.).

Efeitos do propalado liberacionismo sexual

Segundo Wilhelm Reich, na URSS, após a Revolução Socialista (1917), a legislação soviética simplesmente riscou a velha cláusula tzarista sobre o homossexualismo, que castigava a atividade homossexual, com pesadas penas de privação de liberdade.

Com esse ato, o governo soviético deu um largo passo no sentido da liberalização do movimento sexual-político, em relação à Europa ocidental e América, partindo do princípio segundo o qual a homossexualidade, quer seja concebida como inata, quer como resultado duma inibição do desenvolvimento psicossomático, é uma atividade que não prejudica a ninguém.

Tais concepções geraram certa tolerância em relação às práticas homossexuais, de tal forma que estas se propagaram em diversas camadas sociais, na juventude, no seio das Forças Armadas, inclusive no meio operário. .

Por volta de 1925, no Turquestão, foi criada uma cláusula adicional ao Código Penal da extinta União Soviética, que já previa penalidades pesadas para os homossexuais. Surgiram espionagens e delações, desprezo por parte dos comitês do Partido Comunista inclusive expurgos.

Em 1934, foi publicado um diploma legal assinado por Kalinin, declarando que as relações sexuais entre homens eram consideradas como "crime social", com penas de cinco a oito anos.

Entrementes, na Alemanha praticava-se em larga escala o homossexualismo, envolvendo figuras de proa do nazismo; até Hitler caiu sob suspeita de práticas homossexuais.

A imprensa soviética encetou então vigorosa campanha contra a ho-mossexualidade, considerando-a "um fenômeno de desnaturação da burguesia fascista", segundo o lema: "Exterminai os homossexuais e o fascismo desaparecerá".

Por sua vez, Wilhelm Reich formula interessante concepção acerca do que denominou de "economia sexual", ou seja, aquilo que diz respeito à maneira de regulação da energia sexual, isto é, a economia das energias sexuais do indivíduo, a maneira pela qual o ser humano manobra a sua energia biológica, quanta energia ele represa e quanta ele descarrega organasticamente. Os fatores que influem nessa regulação são de natureza sociológica, psicológica e biológica, que devem ser objeto de estudo e sistematização científica, em relação às práticas e manifestações humanas (A Revolução Sexual, ps. 245a315).

A propósito, a República Popular da China, nos dias atuais, com uma população de cerca de 1 bilhão de habitantes, obrigada que foi a estabelecer um rigoroso controle populacional, está enfrentando sérios problemas de ordem sexual, ocorrendo ali numerosos casos de violência dessa natureza, e estupros, com severas punições.

A criminalidade feminina. Aspectos psicossomáticos de natureza darwinística. A mulher como instrumento de troca. O cérebro feminino

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A questão da criminalidade feminina tem suscitado uma série de debates, em tomo dos quais aparecem curiosos aspectos de natureza histórica, romântica, preconceituosa, discriminatória, sentimental, psicológica, fantasiosa que precisam ser examinados, sob o ângulo cientifico, para que daí se tirem conclusões práticas sobre o tema.

Nessa linha de raciocínio, a Psicologia desenvolve esforços no sentido da distinguir aspectos peculiares, relativos à conduta delituosa masculina e feminina.

Num trabalho notável, polêmico, com profundo teor científico, publicado no Brasil, em 1894, pela Imprensa da Casa da Moeda, sob.os auspícios do Governo da República, lembra Tito Lívio de Castro que os primeiros seres humanos - homem e mulher - apareceram como os outros animais em geral, isto é, feras; à medida que se desenvolveu a inteligência humana, a par de outros fatores, passou a haver predomínio masculino, sobretudo devido à força física deste.

Por outro lado, o tipo de atividade, os exercícios físicos, a luta pela sobrevivência e outros aspectos fizeram com que o tipo masculino passasse por mais variadas transformações e adaptações cerebrais que o feminino.

Daí, sustenta, "a maior evolução cerebral é um caráter perfeitamente distintivo em relação ao sexo; caracteriza quase tanto o sexo masculino, como as glândulas mamárias o sexo feminino".

Em outras palavras, o autor parte do princípio segundo o qual, com base em numerosas observações, o volume do crânio feminino é inferior ao masculino.

Salienta ainda que a mulher, pelo seu todo orgânico, se aproxima mais da criança do que do homem, porquanto ela é menos cérebro do que este.Histórica, política, econômica e sociologicamente, isso se deve, principalmente, ao fato de que as tarefas executadas pela mulher, o seu esforço pela sobrevivência, a sua participação na vida comunitária enfim, a sua ati vidade cerebral e a sua própria alimentação foram inferiores, em quantidade e qualidade, em relação ao homem.

Lembra que, segundo a crença popular, a mulher é mais coração do que cérebro; isso, porém, é equívoco, pois o músculo cardíaco não se contrai mais rapidamente e de modo mais enérgico; não é maior, não é mais ativo, não se altera mais por excesso dinâmico na mulher do que no homem.

Todos os órgãos do corpo humano estão em relação íntima com o cérebro, por meio de seus filetes de comunicação nervosa; domina, assim, o princípio da simpatia no organismo, não havendo antipatias, sendo o cérebro o órgão da cenestesia, e, portanto, da personalidade.

Conclui então que o homem é cerebral, a criança e a mulher são medulares, pois o homem possui mais cérebro, enquanto a mulher e a criança possuem mais medula espinhal (parte do sistema nervoso central (parte do sistema nervoso central contida na coluna vertebral).

Nesse contexto, o tipo de desenvolvimento social, de civilização, as relações de produção e os costumes fizeram da mulher um instrumento de troca, um ser semelhante ao escravo, podendo ser praticado o homicídio contra ela, impunemente, dentre alguns povos.

Ela podia ser emprestada a um amigo, aliado ou estrangeiro; em alguns casos, onde se praticava a antropofagia (como no Egito antigo), ela servia de alimento.Dentre alguns povos, o cavalo e o cão tinham maior valor que a mulher. Entre outros, que admitiam a poligamia, o adultério da mulher eraconsiderado um roubo, porque ela era propriedade do marido.

Durante a longa evolução humana, a mulher não foi mais do que objeto do homem, em função das concepções políticas, econômicas, filosóficas, jurídicas,

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religiosas e demais instituições dominantes.A organização familiar, patriarcal, se resumia à noção de "grupo de escravos de

um mesmo senhor ou co-escravidão", e não "simpatias de consangüinidade", como atualmente.

Em resumo, a mulher pouco precisou do cérebro, pouco serviu-se dele, por isso não se desenvolveu cerebralmente. A biologia nos ensina o mecanismo das atrofias por inanição.

Daí resulta que a mulher tem um cérebro e uma psique infantil, porque e só porque foi submetida a uma existência que, pelas próprias contingências, buscou esse resultado.

A instituição da escravidão e da família não são apenas análogas, e sim idênticas, provindo do direito de conquista, sendo o escravo e a mulher submetidos, como parte venci da e mais fraca, ao jugo do mais forte.

Assim, o cérebro da mulher não foi criado "para" ser o que tem sido e somente isso. Podemos dizer que a sua organização cerebral está de acordo com o tipo de civilização existente, as necessidades e aspirações femininas verificadas até agora, com ilimitadas possibilidades de transformação, conclui Tito Lívio de Castro (A Mulher e a Sociogenia).

Como se vê, trata-se duma visão acerca da mulher, afinada com os fundamentos do darwinismo social.

A publicidade enganosa sobre a mulher na sociedade capitalista. Peculiaridades somáticas: menstruação e puerpério

Nos dias atuais, sob pretextos estéticos, a publicidade capitalista continua insistindo na recomendação, acerca de regimes alimentares especiais para as mulheres, objetivando a pouca ingestão de alimentos, para que assim elas mantenham a esbelteza, cintura fina, porte esguio, daí resultando a languidez, pouca resistência fisica, desinteresse pelos exercícios, como ocorre há milênios, embora sob outra motivação.

Podemos concluir que o tipo de organização social ainda existente sob o capitalismo -, de predomínio masculino, centrado nas diversas esferas do poder, isto é, do ponto de vista econômico, jurídico, cultural, ideológico, com arraigadas tradições de ascendência masculina, não quer a evolução mental da mulher, por vários motivos, dentre eles, o mais forte: porque o estado atual da mulher é o mais conveniente ao regime vigorante, às concepções econômicas, políticas, jurídicas, religiosas, filosóficas e assim por diante, que mantêm os privilégios de classe e o elitismo dominantes. Daí por que se procura confundir e sabotar o movimento pela emancipação da mulher, apresentando-o como algo ridículo, fútil, como se fosse uma iniciativa de lésbicas (embora possa haver segmentos desse movimento, com essas tendências), algo semelhante aos propósitos e manifestações dos homossexuais, com os seus desfiles e demonstrações escandalosos.

Seja como for, a ilusória luta pela conquista do socialismo abriu novas e amplas perspectivas para o movimento feminino e a emancipação da mulher.Na verdade, a emancipação da mulher só se toma possível quando ela pode participar em grande escala, em escala social, da produção, e quando o trabalho doméstico lhe toma apenas um tempo insignificante. Esta condição só pode ser alcançada com a grande indústria moderna, que não apenas permite o trabalho da mulher em grande escala, mas até o exige, e tende cada vez mais a transformar o trabalho doméstico

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privado em uma indústria pú blica (através não só das grandes empresas industriais mas também da organização de creches, restaurantes, lavanderias, indústrias alimentícias).

Desse modo, a luta pela sobrevivência e o crescente desenvolvimento capitalista impeliram a mulher à participação direta na produção social, através da grande indústria mecanizada, que acelerou o processo de ascensão e independência das operárias, ampliando-Ihes as perspectivas e criando novas condições de existência, infinitamente superiores ao confinamento patriarcal e artesanal, pré-capitalista (Lênin - O Socialismo e a Emancipação da Mulher, Rio, 1956).

Por outro lado, como observa Alexandra Kollontai, a monogamia, o amor livre, as uniões temporárias e a própria liberdade opcional de ser mãe solteira, sem que isso seja necessário unir-se ao homem pelo casamento, são formas de existência que coexistirão no futuro, pois, afinal, a mulher passou a ver no prazer, na variação sexual descomprometida, como o homem, a maneira válida e espontânea de se satisfazer; o mais deve constituir-se de trabalho e êxito profissional. De resto, o amor e o prazer sexual não são tudo na vida (A Nova Mulher e a Moral Sexual, ps. 69 e segs.).

São curiosos, no entanto, certos aspectos legais, com relação ao comportamento psicossomático feminino.

O Código Penal cubano, por exemplo, prevê a hipótese de que a menstruação possa representar um fator de agressividade feminina, nos crimes contra a pessoa, constituindo assim uma atenuante da pena.

Por outro lado, o estado puerperal, segundo o Código Penal brasileiro, de 1940, pode determinar a alteração do psiquismo da mulher normal, ensejando situações, teoricamente consideradas como "transitória conturbação da consciência", ou "loucura emotiva", cabendo ao juiz invocar o parecer dos peritos-médicos, a fim de que estes informem se a infanticida, ainda que isenta de taras psicopáticas, francas ou latentes, teve a contribuir para o seu ato criminoso as desordens fisicas e psíquicas derivadas do parto (Nélson Hungria - Comentários ao Código Penal, art. 123, vol. V, ps. 233 e segs.).

Dados comparativos acerca dos índices de criminalidade feminina

De acordo com dados coligidos por Israel Drapkin Senderey, os índices de criminalidade feminina aumentam à medida que aumenta a participação da mulher na vida social, política e econômica do país em que vive.

Assim, comparativamente, são os seguintes os percentuais de criminalidade feminina, entre países selecionados:

Argélia 4% Itália 9% Bélgica 13% Alemanha 15% França 17% Inglaterra 24%

Segundo o mesmo autor, tem-se utilizado o critério estatístico para estudar a influência do sexo na crimina1idade, critério esse que não é aceito unanimemente pelos especialistas do assunto, pois a Estatística serve para demonstrar que cada qual tem razão, dependendo do ângulo de observação.

De acordo com o critério estatístico, existe um axioma no sentido de que a criminalidade feminina é extraordinariamente menor do que a do homem. As estatísticas nos revelam que a sexta parte dos crimes cometidos, o são pelas mulheres e o resto pelos homens, o que é muito relativo.

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Conclui o referido autor: "Isto ocorre com a crimina1idade em geral, não obstante, se começarmos a observar particularmente os diversos delitos, veremos que esta apreciação varia fundamentalmente, pois a delinqüência feminina irá aumentando até chegar ao delito especificamente próprio da mulher, como no infanticídio, o aborto, o 'furto caseiro' etc." (Manual de Criminologia, ps. 159 e 161).

Afirma-se que larga faixa de delitos praticados pela mulher permanece nas chamadas cifras negras, isto é, escapam à percepção penal, quer pelas dificuldades de reunir provas, quer para se evitar o escândalo.

Nos prostíbulos dos EUA, por exemplo, se furta grande quantidade de dinheiro, sem que se leve o fato ao conhecimento da polícia, salvo casos excepcionais (Hans von Hentig - Estudios de Psicología Criminal, I, Hurto - Robo com fuerza en Ias cosas - Robo com violencia o intimidación, p. 40).

Muitos furtos e roubos se desenrolam através da provocação de cenas e escândalos, desmaios, rixas para desviar a atenção dos presentes e possibilitar a prática criminosa.

Há também freqüentes enredos amorosos, familiares, matrimoniais, cenas de escândalos, adultérios forjados, cartas comprometedoras, que propiciam lucrativas chantagens (ob. cit., voI. m, p. 23).

Certos momentos, atos e cerimônias constituem verdadeiros convites ou estímulos aos ladrões, como, por exemplo, a coroação da rainha da Inglaterra, em 1953, que reuniu em Londres a aristocracia britânica, com suas requintadas jóias, para esplendor da solenidade (ob. cit., voI. I, p. 65).

9.8. A mulher e a criminalidade passional

Freqüentemente, nos crimes passionais, o assassinato se mescla com o sadomasoquismo. Há casos de cônjuges, marido ou mulher, ou de amantes, que logo após liquidarem o seu par, muitas vezes de maneira brutal, recebem de imediato cartas com temas declarações amorosas e propostas matrimoniais, de missivistas desconhecidos, demonstrando com isso sensibilidade e admiração, pelo autor ou autora de homicídio (Hans Von Hentig, ob. cit., voI. lI, ps. 9 e segs.).

Segundo León Rabinowicz, a mulher traída nem sempre se vinga sobre o marido ou sobre a sua cúmplice. Com freqüência perdoa, por vezes suicida-se de desespero, quando se vê abandonada para sempre, mas quando toma a decisão de se vingar, a sua vingança é atroz. É um traço característico da psicologia da mulher. Exasperada, passa a ser um monstro de ferocidade, que só respira vingança e só pensa em submeter a sua vítima aos mais atrozes sofrimentos.

O mesmo autor, citando Paul Bourget, agrupa três tipos de mulheres que se vingam: a envenenadora, que se vinga friamente, demoradamente; a revolverizadora, felina, de nervos desarranjados (O Crime Passional, ps. 134 a 151).

Como decorrência da atividade, é mundialmente conhecida a atuação das chamadas "gateiras" (autores de furtos) ,nos hotéis, onde exercem as funções de faxineiras, arrumadeiras, copeiras.

A prostituição feminina constitui um dos mais graves fatores criminógenos, propiciando escândalos, fraudes, corrupção, ameaças, furtos, roubos, agressões fisicas, morte, transmissão de moléstias venéreas e outras práticas criminosas. Há países, como vimos, em que a prostituição écrimlnalizada e penalmente reprimida; outros a liberam ou regulamentam. Em qualquer caso, ela representa um elo com a criminalidade.

Evidentemente, o quadro, com os seus diferentes aspectos, acima descritos, não

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esgota a problemática em tomo da criminalidade feminina.Tal quadro retrata apenas as contingências, isto é, as condições adversas, os

preconceitos, enfim, toda uma estrutura sócio-político-econômica obscurantista, com a incidência de numerosos fatores criminógenos, tipicamente característicos do capitalismo, influenciando negativamente a conduta feminina, direcionando mesmo o sentido de certas práticas delituosas, imputadas à mulher, ao fazê-Ia crer, por exemplo, que a sua plástica, seus atributos fisicos são tudo, ou quase isso, para a obtenção de sucesso na vida.

Naturalmente, sob uma nova ordem social, sem a influência negativa desse conjunto de fatores, acima examinados, a conduta feminina terá outro sentido a direção, pois até então, como afirmou Afrânio Peixoto, a civilização fez da mulher máquina de prazer: a mulher vadia, a cavalo de corrida, os gatos peludos e os cãezinhos de luxo; e, somente numa sociedade onde todos trabalhem e sejam remunerados apenas pelo seu trabalho, não haverá tempo a perder, nem riqueza a acumular, e assim:

"O homem amará a mulher, simplesmente, decentemente, sem luxo, sem punhal, sem perversões, sem morfina, sem revólveres, sem adultérios, sem profanações, sem crimes passionais. Será uma função da vida, como as outras (...)" (Criminologia, p. 121).

Enfoque histórico-sociológico acerca da criminalidade feminina

Lembra Julita Lemgruber que, quando se discutem temas, acerca dos índices de criminalidade, meios de combater a violência, situação penitenciária:, as pessoas parecem visualizar antes o homem criminoso, o homem preso, enquanto que a figura da mulher criminosa e da presidiária não costuma preocupar tanto, ou sequer vir à baila, embora a questão tenha a sua especificidade.

Nesse contexto, é significativo o fato de os dados relacionados à distribuição de inquéritos policiais ou processos criminais, não indicarem os protagonistas dos mesmos, isto é, se são homens ou mulheres.

Contudo, tomando-se o ano de 1976 como ponto de referência, observa-se que na época havia no Rio de Janeiro 310 mulheres e 8.511 homens, recolhidos nos diversos estabelecimentos prisionais do Sistema Penitenciário, seja cumprindo pena ou aguardando julgamento, o que então significava uma proporção de 3,5% mulheres e 96,5% homens para o total de detentos.

Considerando-se, em termos totais, a distribuição da população masculina e da feminina na época, verifica-se uma flagrante discrepância, em matéria de percentuais sobre criminalidade, ou seja, para uma população de 5.249.000 homens e 5.455.000 mulheres (isto é, 49% homens e 51% mulheres), a proporção de 3,5% mulheres e 96,5% homens, respectivamente, acima indicada, causa impressão ( Criminalidade Feminina, in Rev. da OAB-RJ, Ano VI, voI. VIII, 1980, ps. 28 e segs.).

Para Lombroso, as mulheres seriam organicamente mais conservadoras do que os homens, devido sobretudo à imobilidade do óvulo, comparada à mobilidade do espermatozóide; mais passivas, tenderiam menos ao crime do que os homens.

Por seu turno, Freud entendia que o crime feminino representa uma rebelião contra o natural papel biológico da mulher e evidencia um "complexo de masculinidade".

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Entretanto, em 1950, Otto Pollack surge com uma nova idéia: a mulher é tão criminosa quanto o homem; a diferença nas taxas de criminalidade reflete, tão-somente, o fato de que os crimes cometidos por mulheres são em geral menos detectáveis do que aqueles cometidos por homens. Ademais, mesmo quando descobertos, os crimes femininos são menos freqüentemente relatados às autoridades e, quando relatados, há menor chance de que as mulheres sejam levadas a tribunais e consideradas culpadas, não oferecendo, porém, o mencionado autor, dados estatísticos confiáveis, para a comprovação de suas assertivas.

Estudos mais recentes, entretanto, trouxeram à baixa fatores sócio-estruturais, com argumentos e dados plausíveis.

Em geral, sustenta-se que as mulheres cometem menos crimes porque o seu estilo de vida apresenta-Ihes menos oportunidades para delinqüir: mais afeitas às lides domésticas e menos expostas às pressões econômicas, já que a responsabilidade pela obtenção de recursos necessários à manutenção da família tende a recair mais sobre os homens, as mulheres estão menos sujeitas ao crime. Além disso, verificou-se também que na faixa de idade em que, hipoteticamente, as mulheres estariam ocupadas com os cuidados de seus filhos menores, há menor incidência na prática de delitos.

Nessa ordem de idéias, as análises das tendências verificadas nas taxas de criminalidade nos últimos anos parecem indicar que, à medida que há maior participação feminina na força de trabalho e maior igualdade juridico-política entre os sexos, a participação da mulher nas estatísticas criminais tende a crescer. Nos Estados Unidos, por exemplo, entre 1960 e 1972, o número de detenções para mulheres aumentou três vezes mais rapidamente do que para os homens. No Canadá, essas detenções duplicaram, num período de nove anos. Na Índia, o número de presidiárias quadruplicou entre 1962 e 1965. No Brasil, entre 1957 e 1971, as condenações de mulheres cresceram duas vezes mais rapidamente do que as de homens, e, paralelamente, a participação da mulher brasileira na população economicamente ativa passa de 14,7% em 1950, para 17,9% em 1960, e finalmente, 21,0% em 1970 (Julita Lemgruber - ob. e 10c. cits., ps. 30 e 31).

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