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Turismo rural em áreas de reforma agrária: O que dizem os assentados rurais do
Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila Moleque, Afonso Bezerra-RN?
Brandão, Pamela de Medeiros1
Brito, Jardeson Rodrigues de2
Gonçalves, Salete3
Resumo:
Esse artigo avalia, sob a ótica dos assentados rurais, as perspectivas para o desenvolvimento do turismo rural no Projeto de Assentamento (PA) Santa Maria Agrovila Moleque do município de Afonso Bezerra, localizado no Sertão Central do Rio Grande do Norte – Brasil. Trata-se um estudo descritivo-exploratório, de natureza quali-quantitativa que adotou como estratégias de pesquisa o estudo de caso e o levantamento (Survey). Avalia-se que o PA Santa Maria Agrovila Moleque possui perspectivas contundentes para o desenvolvimento do Turismo Rural considerando a existência de recursos naturais e culturais que podem ser aproveitados pela atividade turística, bem como de ricas experiências rurais que podem ser vivenciadas pelo turista e/ou visitante. No entanto, evidencia-se a necessidade de promover um conjunto de ações para o desenvolvimento do turismo rural deste assentamento.
Palavras-Chave: Turismo Rural; Agricultura Familiar; Assentamentos Rurais; PA Santa
Maria Agrovila Moleque; Afonso Bezerra.
1 Considerações iniciais
A atividade turística no mundo vem se consolidando como um importante vetor
de desenvolvimento socioeconômico. Dados da Organização Mundial do Turismo (2015: 2)
revelam que um crescente número de destinos internacionais tem aberto ao turismo,
considerando-o um setor chave para seu progresso socioeconômico, especialmente em razão
da criação de postos de trabalho e geração de renda. O mesmo relatório constata que durante
1 Doutora em Administração pela UFBA. Professora nas áreas de Gestão Social e Pública, Programa de Pós-graduação em Gestão Pública da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/Brasil.2 Bacharel em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.3 Doutoranda em Lazer pela UFMG; Bolsista CAPES/PDSE Processo nº 88881.131526/2016-01 na Universidade de Alicante/Espanha; Professora do Departamento de Turismo na UERN/Brasil.
as últimas seis décadas, o turismo tem experimentado uma continua expansão e
diversificação.
Dentro desse cenário de expansão e diversificação, o Instituto de
Desenvolvimento do Turismo Rural - IDESTUR (2016) relata que OMT considera o Turismo
Rural como um segmento de grande potencial, e estima que pelo menos 3% de todos os
turistas do mundo orientam suas viagens para o turismo rural. Relata ainda, baseando-se na
mesma fonte de que o turismo rural apresenta um crescimento anual de aproximadamente 6%.
Esses dados revelam o turismo rural como uma nova tendência global e que por isso novos
produtos turísticos voltados a esse segmento de mercado tendem a serem estruturados.
No Brasil, o diagnóstico apresentado no documento Turismo no Brasil 2011-2014
(MTUR, 2010) registram avanços no setor notoriamente no que se refere à geração de
emprego, fluxos turísticos domésticos e entrada de divisas estrangeiras. E em razão do caráter
dinâmico da atividade turística e das peculiaridades do território nacional, o turismo rural vem
sendo concebido pelos agentes governamentais como um segmento promissor e com
incontestável potencial no país, “capaz de agregar valor a produtos e serviços no meio rural e
contribuir para a conservação do meio ambiente e valorização da ruralidade brasileira”
(MTUR, 2004: 7).
Isso ocorre em função de que o espaço rural vem sofrendo várias mudanças
devido às transformações nas produções agrícolas e pecuárias geradas pelos processos
tecnológicos e pela formação de complexos agroindustriais, contribuindo, dessa forma para
intensificar o uso dos recursos disponível no ambiente e para o surgimento de vários efeitos
sociais, econômicos, culturais e naturais. “Tais transformações apontam para a abertura de um
processo produtivo rural, o qual abre espaço para a consolidação de atividades, como o
turismo, que, embora recente no meio rural brasileiro, vem insurgindo também na agricultura
familiar” (MDA, 2005: 4).
O espaço rural tem se tornado centro de interesse de turistas que se deslocam para
as áreas rurais para vivenciar e experimentar um conjunto de atividades produtivas, bem como
um modo de vida diferente do ritmo urbano (MTUR, 2004). De forma consequente, o turismo
rural desponta como um novo segmento de mercado do turismo no cenário brasileiro, sendo
conceituado pelo Ministério do Turismo - MTUR (2004: 11) como um “conjunto de
atividades turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometido com a produção
agropecuária, agregando valor aos produtos e serviços, resgatando e promovendo o
patrimônio cultural e natural da comunidade”.
Os setores vinculados à agricultura familiar têm pensado na atividade turística
como um meio de inclusão sócio-produtiva, de tal modo que o turismo rural na agricultura
familiar vem ocorrendo em diversas regiões e municípios brasileiros (MDA, 2005: 8). Ao
aliar o turismo rural e a agricultura familiar os assentamentos rurais4 despontam como um
espaço promissor para a prática do turismo rural.
No Brasil existem 9.349 assentamentos agrários, de diversas naturezas e em vários
estágios de implantação ocupando uma área de 88.410.217 milhões de hectares, ou seja,
10,4% do território brasileiro abrigando cerca de 970.000 famílias, equivalente a 5 milhões de
pessoas (EMBRAPA, 2017). Já o estado do Rio Grande do Norte possui 298 assentamentos
rurais, onde nesses assentamentos encontram-se um total de 20.206 famílias assentadas e
juntos a sua área e hectares totalizam 529.523,17, segundo dados do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária - INCRA (2016).
Diante desse contexto e considerando a vocação turística do Rio Grande do Norte,
os assentamentos rurais do estado se apresentam como um novo mercado a ser desenvolvido,
pois abriga as mais diferentes experiências e recursos que podem ser vivenciados pelo turista
e/ou visitante. O desenvolvimento da atividade turística em assentamentos contribui para a
diversificação da oferta turística potiguar, como também vislumbra melhores condições de
vida aos produtores, famílias e comunidades rurais via um modelo de desenvolvimento com
sustentabilidade econômica, social, ambiental e territorial.
Nessa direção, ao desenvolvimento do turismo rural na agricultura familiar em
assentamentos rurais no Rio Grande do Norte apresenta-se como uma alternativa para a
melhoria das condições de vida dos territórios caracterizados por um lado pela
vulnerabilidade socioeconômica, mas por outro pela potencialidade turística. Dentre os
municípios potiguares, encontra-se o município de Afonso Bezerra localizado no Sertão
Central Potiguar. Nesse município existem quatro assentamentos rurais, a saber: PA Alto da
Felicidade; PA Progresso, PA Paraíso II; e PA Santa Maria. Juntos abrigam 767 famílias
assentadas.
O Projeto de Assentamento de Santa Maria é composto por três agrovilas: a
Agrovila Tabuleiro Alto, Agrovila Olho D´Agua e Agrovila Moleque totalizando 5.133
hectares com capacidade de 206 famílias assentadas, onde residem 204 famílias (INCRA,
2016). Desses se destaca o Projeto de Assentamento de Santa Maria Agrovila Moleque
localizado a 22 km de distância de Afonso Bezerra, município no estado do Rio Grande do 4 Assentamento rural é um conjunto de unidades agrícolas independentes entre si, instaladas pelo INCRA, na qual os trabalhadores rurais residem e trabalham especialmente na agricultura familiar (INCRA, 2016).
Norte (Brasil). Trata-se de uma região detentora de inúmeros recursos naturais e culturais que
podem ser aproveitados pela atividade turística.
Com esse intuito, este artigo5 avalia, sob a ótica dos assentados rurais, as
perspectivas para o desenvolvimento do turismo rural no Projeto de Assentamento Santa
Maria Agrovila Moleque do município de Afonso Bezerra, localizado no Sertão Central do
Rio Grande do Norte – Brasil. Para tanto, traçou perfil dos assentados rurais; avaliou a
infraestrutura e os recursos do assentamento na perspectiva dos assentados rurais; verificou a
percepção dos assentados rurais sobre a inserção do turismo no assentamento; e mensurou o
grau de aceitação da presença de turistas pelos assentados rurais.
De acordo com esses objetivos e baseando-se nas definições categóricas de Gil
(2008) se classifica como sendo de natureza exploratória e descritiva. Utilizou como
estratégia de pesquisa o estudo de caso (Yin, 2001) e a estratégia de levantamento (Survey). O
universo da pesquisa é composto pelo Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila
Moleque localizado no município de Afonso Bezerra-RN.
O PA Santa Maria Agrovila Moleque, atualmente comporta 96 casas onde moram
96 famílias de agricultores e agricultoras rurais. Para a coleta de dados, adotou-se inicialmente
a proposta de realizar um censo, de modo que todas as famílias assentadas pudessem ser
investigadas. Nesse sentido, todas as casas do referido assentamento foram visitadas entre os
dias 28 a 31 de maio de 2016. Dessas, 44 (quarenta e quatro) estavam fechadas no momento
das visitas e 2 (duas) famílias recusaram-se a responder. Dessa forma a amostra da pesquisa
compreendeu um total de 50 casas/famílias investigadas. Em cada casa foi aplicado um
formulário, composto por perguntas abertas e fechadas. Além da realização das entrevistas
casa-a-casa, também foi aplicada a observação como técnica de coleta de dados com o intuito
de descrever as condições infraestruturais do assentamento.
Após o período de aplicação do formulário de pesquisa, os dados foram
sistematizados em um banco de dados do googledocs. Os dados coletados nas perguntas
fechadas foram tratados por meio da estatística descritiva básica que mensurou as respostas
em frequências absolutas e relativas; e expressos em gráficos. A maioria das respostas das
perguntas abertas foram inicialmente categorizadas e posteriormente também tratadas
estatisticamente. Para outras respostas decorrentes de perguntas abertas aplicou-se o método
5 Esse artigo apresenta os resultados do projeto de pesquisa “Turismo rural, economia solidária e agricultura familiar em assentamentos de reforma agrária no município de Afonso Bezerra/RN”, desenvolvido no âmbito do Programa de Iniciação Científica da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFRN (PROPESQ/UFRN).
descritivo-funcionalista. Por fim, os dados foram interpretados à luz dos propósitos do estudo
e das teorias referenciais adotadas.
2 Turismo rural na agricultura familiar
O turismo, para Fratucci (2000: 123) é “um fenômeno complexo, composto por
um elenco relativamente grande de componentes que se relacionam e inter-relacionam
constante e simultaneamente, dentro de uma lógica que inclui muitas incertezas e
casualidades”. Por isso esse autor, concebe o turismo como um “momento de encontro de
alteridades, onde é possível a troca de experiências socioculturais e do enriquecimento
pessoal, tanto do turista como do anfitrião” (Fratucci, 2000: 130).
Baseando-se nessas concepções, Brandão (2010) distingue a atividade turística do
turismo, entendendo esse como um fenômeno múltiplo de caráter socioeconômico e cultural
que se expressa em práticas sociais coletivas geradora de atividades econômicas, mas não só.
Na mesma linha Moesch (2002: 9) conceitua o turismo como “uma combinação complexa de
inter-relacionamentos entre produção e serviços, em cuja composição integram-se uma prática
social”. Panosso Netto (2007) complementa esses conceitos, defendendo que o turismo está
intimamente relacionado à busca da experiência humana fora do seu lugar de experiência
cotidiana.
Dada à diversidade e pluralidade das experiências turística, o mercado do turismo
pode ser segmentado, conforme define o MTUR (2010), por critérios demanda e de oferta.
Nos critérios de demanda envolvem fatores geográficos, demográficos, socioeconômicos,
psicográficos, padrões de comportamento, padrões de consumo e predisposição do
consumidor. Já os critérios de oferta estão relacionados a certas caraterísticas comuns em um
território, tais como: (1) Aspectos e características comuns (geográficas, históricas,
arquitetônicas, urbanísticas, sociais); (2) Atividades, práticas e tradições comuns (esportivas,
agropecuárias, de pesca, manifestações culturais, manifestações de fé); e (3) Serviços e
infraestrutura comuns (serviços públicos, meios de hospedagem e de lazer).
Considerando essas características e as peculiaridades das regiões brasileiras o
MTUR (2010) define onze segmentos turísticos prioritários para o desenvolvimento do
turismo no país, a saber: turismo cultural, turismo rural, turismo de pesca, turismo de
aventura, ecoturismo, turismo náutico, turismo de sol e praia, turismo de estudos e
intercâmbios, turismo de esportes, turismo de negócios e eventos, e turismo de saúde.
Dentre esses, para efeito desse estudo destaca-se o turismo rural. Para MTUR
(2004) o Turismo Rural é um segmento relativamente novo e que no Brasil está se
expandindo, tendo seu crescimento explicado por duas razões: a necessidade que o produtor
tem em diversificar sua fonte de renda e agregar valor aos seus produtos, e a vontade dos
moradores urbanos reencontrarem suas raízes, conviverem com a natureza, com os modos de
vida, com as tradições, costumes e com a forma de produção da população do interior.
De acordo com a Organização Mundial do Turismo (2001), o turismo rural refere-
se às atividades que são realizadas no campo, seguindo os costumes e as tradições vividas em
ambientes distantes das cidades e áreas industrializadas, tais como povoados e sítios. No
ponto de vista de Santana (2000), o turismo rural pode ser pensado como um produto ou
como uma forma de consumo, sendo o turismo rural considerado como um motor e uma
consequência dessa mudança natural. Nesse caso, o espaço rural deixa de ser único e
exclusivamente um espaço de produção agrária e passa a se converter num espaço de
consumo, ou seja, o espaço rural passa a elaborar novas formas de produção (paisagens,
ruralidade, tranquilidade, raízes, identificações, patrimônio cultural e natural) para sua
reprodução socioeconômica.
Beni (2003: 429), define turismo rural como “Denominação dada ao
deslocamento de pessoas a espaços rurais, em roteiros programados ou espontâneos, com ou
sem pernoite, para a fruição dos cenários e instalações rurícolas (...)”. Já o Ministério do
Turismo, define turismo rural sendo “o conjunto de atividades turísticas desenvolvidas no
meio rural, comprometido com a produção agropecuária, agregando valor a produtos e
serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade”. (MTUR,
2003: 11).
Diante da amplitude e heterogeneidades das iniciativas turísticas realizadas no
meio rural, o MTUR (2008) distingue três variações de turismo que ocorre no Espaço Rural:
Turismo Rural; Agroturismo; e Turismo Rural na Agricultura Familiar. Sendo o conceito de
Turismo Rural anteriormente discutido.
O Agroturismo de acordo com o MTUR (2008: 21) refere-se:
As atividades internas à propriedade que geram ocupações complementares às atividades agrícolas, as quais continuam a fazer parte do cotidiano da propriedade, em menor ou maior intensidade. Devem ser entendidas como parte de um processo de agregação de serviços e bens não-materiais existentes nas propriedades rurais (paisagem, ar puro etc.) a partir do ‘tempo livre’ das famílias agrícolas, com eventuais contratações de mão-de-obra externa.
Já o Turismo Rural na Agricultura Familiar, segundo o MTUR (2008: 21) trata-se
da:Atividade turística que ocorre no âmbito da unidade de produção dos agricultores familiares que mantêm as atividades econômicas típicas da agricultura familiar, dispostos a valorizar, respeitar e compartilhar seu modo de vida, o patrimônio cultural e natural, ofertando produtos e serviços de qualidade e proporcionando bem-estar aos envolvidos.
Essas variações ocorrem em um espaço comum e fazem parte de um mesmo
conceito, o Turismo Rural. As diversas áreas de atividades turísticas rurais superpostas,
representadas na figura acima, denotam na perspectiva do Ministério do Turismo (2008) a
abrangência do turismo no espaço rural, considerando que esse engloba uma multiplicidade de
atividades turísticas desenvolvidas na área rural. Ao mesmo tempo em que cada uma delas
possui características e aspectos específicos inerentes a cada tipo de turismo implementado.
O turismo rural na agricultura familiar é entendido como:
A atividade turística que ocorre na unidade de produção dos agricultores familiares que mantêm as atividades econômicas típicas da agricultura familiar, dispostos a valorizar, respeitar e compartilhar seu modo de vida, o patrimônio cultural de natural, ofertando produtos e serviços de qualidade e proporcionando bem estar aos envolvidos. (MTUR, 2004: 7).
Para Viegas e Raye (2010), as atividades não-agrícolas conquistam cada vez mais
o espaço entre os agricultores familiares, tendo em vista que a agricultura tradicional não é
mais suficiente para garantir a sobrevivência das famílias. Desse modo, o campo está sendo
visto como um destino potencial para a implantação da atividade turística que envolve
variados usos e significados, que respeita às tradições, oferece trabalho digno, bem como uma
relação direta e amorosa com a terra e a natureza, tornando-se um sinônimo de morada com
simplicidade.
O conjunto das atividades que constituem o turismo rural tem como cenário
principal as unidades produtivas, englobando atividades de lazer, de produção e
comercialização de artesanatos e produtos agropecuários, bem com serviços turísticos
diferenciados (MDA, 2005).
As atividades de lazer encontram-se associadas com o conjunto de práticas que
caracterizam o meio rural, tais como: pescas; cavalgadas; caminhadas; banhos em rios, dentre
outras atividades lúdicas que estejam relacionadas com a cultura local, a exemplo das
manifestações folclóricas e danças. Outra característica dessas atividades é o seu caráter
educativo voltado para a conservação e preservação dos recursos naturais e culturais por parte
dos turistas e da própria comunidade (MDA, 2005).
A oferta de produtos para o turismo rural refere-se tanto os produtos de produção
animal quanto vegetal que estejam relacionados à cultura local e as características históricas e
geográficas do território. De tal modo que o próprio processo de produção se constitui como
um elemento de atratividade para os turistas, sendo ofertado em formas de demonstrações,
explicações e vivências das técnicas utilizadas (MDA, 2005).
Quanto aos serviços turísticos no ambiente rural destacam-se principalmente
aqueles destinados a hospedagem e a alimentação dos visitantes. Cabe ressaltar que tais
serviços devem estar em acordo com as peculiaridades do turismo rural. Isso significa que nos
serviços de alimentação a gastronomia local e os aspectos culturais são condições
constitutivas; e que os serviços de hospedagens são caracterizados pela rusticidade do
ambiente rural e hospitalidade familiar (MDA, 2005).
Outro cenário em que ocorrem as atividades do turismo rural são os arredores da
unidade familiar, ou seja, atividades que não estão diretamente relacionadas aos agricultores,
mas que podem beneficiá-los na prática da atividade turística, como por exemplo, através dos
atrativos naturais e culturais presentes nos seus territórios (MDA, 2005).
A Rede TRAF (2003 apud MDA, 2005: 8) considera como território:
Um espaço físico geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como ambiente, economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente, por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial.
Nesse sentido, os assentamentos rurais se apresentam como um dos espaços rurais
que desenvolvem atividades que permitem o desenvolvimento do turismo rural por meio da
oferta de novos produtos ou serviços. Para Souza e Hespanhol:
[...] a própria experiência de vida (por exemplo, a vida no assentamento), o saber fazer expresso por meio dos alimentos produzidos (doces caseiros, queijos, pães etc), do artesanato (cestos, bordados manuais etc.) e a própria lida no campo, poderiam se constituir em possibilidades para que os assentados tivessem o turismo como uma alternativa de renda nos assentamentos pesquisados. (Souza e Hespanhol, 2010: 13).
Os assentamentos de reforma agrária apresentam, para Marques e Santos (2007)
potenciais turísticos intrínsecos, quer seja relacionados aos patrimônios naturais ou culturais.
Quantos ao patrimônio natural os autores exemplificam as paisagens e as belezas cênicas
encontradas nos assentamentos de reforma agrária e quanto aos culturais os autores citam os
costumes, saberes e as tradições populares das famílias assentadas.
3 Resultado da pesquisa
3.1 Projeto de Assentamento de Santa Maria Agrovila Moleque–Afonso Bezerra/RN
O Projeto de Assentamento de Santa Maria foi criado em 20 de novembro de
1995, sendo composto por três agrovilas: a Agrovila Tabuleiro Alto, Agrovila Olho D´Agua e
Agrovila Moleque totalizando 5.133 hectares com capacidade de 206 famílias assentadas,
onde residem 204 famílias (INCRA, 2016). De acordo com o INCRA (2016) trata-se de um
assentamento em consolidação.
O Projeto de Assentamento de Santa Maria Agrovila Moleque está localizado a 22
km de distância de Afonso Bezerra, município no estado do Rio Grande do Norte (Brasil),
localizado na microrregião de Angicos; e a 188 km da capital do Rio Grande do Norte, Natal,
fazendo limites com as seguintes cidades: Alto do Rodrigues (norte), Pedro Avelino (leste),
Açu (oeste), Angicos e Ipanguaçu (sul).
A área do Projeto de Assentamento de Santa Maria Agrovila Moleque encontra-se
dividida em 96 lotes nos quais residem neles 96 famílias e 16 agregados. As famílias
assentadas trabalham na agricultura com culturas irrigadas e de sequeiro6, destacando-se como
produtor e exportador de melão da região do Sertão Central; e na pecuária. Além disso, alguns
moradores do assentamento produzem doces, bolos, costuram e fazem artesanatos, produtos
estes que podem ser usados para complementar sua renda mensal.
Destaca-se na região pelo seu potencial hídrico, abastecendo várias comunidades e
municípios próximos, e beneficiando a agricultura. Segundo Dantas (2015), no assentamento
existe um poço da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (CAERN) que
retira água do lençol freático distribuindo para a zona urbana de Afonso Bezerra e mais oito
municípios através de uma adutora. A água é armazenada em um reservatório com capacidade
de 500 mil litros e os assentados rurais não pagam pelo seu consumo. Além disso, nas
proximidades do Assentamento há um Riacho da Gangorra que também beneficia o
desenvolvimento da agricultura na região, como também permite a realização de pesca de
subsistência.
6 Agricultura de sequeiro é uma técnica agrícola para cultivar terrenos onde a pluviosidade é diminuta.
A água é considerada pelos assentados como a maior riqueza que eles possuem,
não só pela quantidade de água produzida, bem como a qualidade da mesma, onde de acordo
com alguns assentados que moram no assentamento, diariamente no poço da CAERN são
abastecidos 65 carros pipas de água, onde são distribuídos pelos municípios vizinhos e na
cidade de Afonso Bezerra.
De acordo com dados do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio
Ambiente - IDEMA (2008) a vegetação predominante na região é caatinga hipoxerófila
(catingueira, angico, baraúna, juazeiro, marmeleiro, mandacaru e arueira) e a caatinga
hiperxerófila (jurema preta, mufumbu, faveleiro, marmeleira, xique-xique e facheiro).
Quanto à infraestrutura, o Assentamento apresenta oferta básica implantada pelo
INCRA de forma direta e em parceria com outros entes governamentais. Possui estradas
vicinais que ligam o assentamento a outras comunidades próximas e a sede do município de
Afonso Bezerra. Essas estradas de acesso como também as ruas do assentamento não dispõem
de asfalto estando em condições regulares de tráfego.
Além disso, não existem linhas regulares de transporte público coletivo. O
transporte para acesso ao assentamento e deslocamento dos assentados é realizado por moto-
táxi, veículos (carros e motos) privados locados e próprios. Os estudantes contam com o
ônibus escolar fornecido pela Prefeitura Municipal de Afonso Bezerra. O assentamento possui
redes de eletrificação rural e sistema de abastecimento de água para todas as casas. Existem
poços de extração de água e caixas de águas coletivas.
O PA Santa Maria Agrovila Moleque não possui sistemas de esgotamento
sanitário básico, nem coleta de lixo regular. O assentamento possui um aterro sanitário
construído, mas que não se encontra em funcionamento; o lixo doméstico costuma ser
descartado de forma indevida na natureza ou ser incinerado pelos moradores. Essa realidade
denota que ainda há muito a ser feito para que se proporcionem as condições físicas
necessárias para o desenvolvimento sustentável dos assentamentos. Faz-se importante notar
que a oferta de infraestrutura básica é uma das ações necessárias inclusive para estimular o
processo produtivo das comunidades que residem nos assentamentos e da população local do
entorno.
No que se refere a equipamentos públicos, o assentamento possui uma escola de
ensino fundamental, a Escola Municipal Santa Maria, construída em parceria com a Prefeitura
Municipal de Afonso Bezerra, o Banco Mundial e o INCRA. Trata-se de uma escola
referência da comunidade diante das atividades que são desenvolvidas no e para o
assentamento. Essa escola é uma das parceiras da incubadora OASIS7 da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte no desenvolvimento de ações extensionistas, em destaque o
Projeto Intervivência Universitária que atua na formação de agentes de desenvolvimento
comunitário, sob a perspectiva do empreendedorismo social e protagonismo juvenil.
Conta ainda com duas igrejas, sendo uma Igreja Católica e a outra Igreja
Assembleia de Deus. Não existe no assentamento posto de saúde, porém são realizadas
consultas médicas mensalmente. Havendo a urgência de atendimentos os assentados se
deslocam para Hospital e Maternidade Dr. Teodulo Avelino e outras unidades de saúde em
Afonso Bezerra.
O Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila Moleque possui dois telefones,
porém os mesmos encontram-se quebrados, com isso os assentados optam por aparelhos
celulares (sinal fraco da operadora TIM) e pelo telefone rural, que é uma espécie de telefone
fixo utilizado geralmente pela comunidade para manter a comunicação com os parentes e
amigos de outros assentamentos e cidades vizinhas.
3.2 Perfil dos Assentados Rurais Entrevistados
Os assentados rurais do Projeto de Assentamento de Santa Maria Agrovila
Moleque, entrevistados nesse estudo, são em sua maioria formada por mulheres, conformando
um percentual de 72%, e por uma parcela de homens 28 %. Onde a quantidade de mulheres
entrevistadas deve-se ao fato que nos dias e horários de realização das entrevistas, os homens
encontravam-se exercendo suas atividades no campo. Com relação à faixa etária, 42% dos
entrevistados possuem uma faixa etária entre 36 a 50 anos, 26% entre 26 a 35 anos, 22% com
idades entre 51 a 65, 6% entre 18 a 25 anos e por fim 4% com idade acima de 65 anos.
Tratando-se do estado civil, no Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila Moleque 48%
são casados, 28% são solteiros e 24% estão englobados na opção outros, onde dentro desta
opção, todos responderam ser amasiados.
No referente ao grau de instrução dos assentados rurais, foi obtido um resultado
variado. Da maioria dos questionados, 34% possui o Ensino Fundamental I, ou seja,
estudaram do 1º ao 5º ano, enquanto 30% afirmaram ter o Ensino Médio, 16% possui o
Ensino Fundamental II, o equivalente ao ensino do 6º ao 9º ano. Quanto aos assentados que 7 Fundada em 2006, a Organização de Aprendizagens e Saberes em Iniciativas Solidárias (OASISI) é uma incubadora de empreendimentos populares coletivos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. Desenvolve ações integradas de ensino, pesquisa e extensão junto a jovens estudantes da agricultura familiar, preparando-os politica e tecnicamente para o trabalho coletivo, a partir de projetos de intervenção voluntária de interesse público, em comunidades e escolas da rede pública de ensino.
não possui uma instrução formal, 12% afirmaram não possuir instrução, 4% possuem outros
cursos, sendo estes o curso de Magistério e a Educação de Jovens e Adultos-EJA. Quanto ao
Ensino Superior, 2% responderam possuir formação superior, sendo mais preciso em Gestão
de Cooperativas e também 2% afirmaram possuir uma Pós-Graduação.
A maioria dos assentados entrevistados 66% são agricultores, seguido das donas
de casa, onde possuem um percentual de 14%. Já os aposentados/pensionistas, representam
um percentual de 6%, seguido dos funcionários públicos, representando um percentual de 4%,
professores, sendo representados por 4% dos assentados entrevistados, estudantes, onde
totalizam um percentual de 4% e dos entrevistados 2% são microempreendedor individual.
Segundo a pesquisa realizada no Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila
Moleque 2% dos assentados entrevistados moram menos de 01 ano no assentamento, 8%
moram no assentamento entre 01 a 05 anos; 16% de 06 a 10 anos; 14% de 11 a 15; 58% de 16
a 20 anos; 2% acima de 20 anos. Considerando que o PA Santa Maria Agrovila Moleque foi
implantado há 21 anos, tem-se que a maioria dos assentados reside no assentamento desde a
sua criação. E apenas uma porcentagem pequena (cerca de 10%) passou a residir no
assentamento nos últimos cinco anos. Supõe-se que se trata em sua maioria de parentes que
passaram a morar com familiares assentados rurais após a concessão das casas.
De acordo com a pesquisa realizada no Projeto de Assentamento Santa Maria
Agrovila Moleque, 12% dos assentados rurais entrevistados exercem atividade econômica
remunerada, enquanto 88% não possuem atividade econômica remunerada, sobrevivendo
assim, boa parte deles da agricultura, das plantações e criação de bovinos. Dos que exercem
atividade econômica destaca-se as funções de Auxiliar de Serviços Gerais (ASG), auxiliar de
secretária, digitador, professoras, inclusive algumas dessas funções são exercidas na escola do
assentamento.
Ainda de acordo com a pesquisa, 36% dos assentados entrevistados realizam
algum tipo de produção caseira para consumo ou venda. As principais produções caseiras são:
doces, bolos, tortas, costuras e artesanatos, produção leite, criação de aves (galinhas e
codornas). Desses, aproximadamente 61 % comercializam seus produtos na feira de Afonso
Bezerra e Mossoró, bem como no próprio assentamento. A comercialização desses produtos
complementa a renda mensal familiar das famílias que não possuem renda fixa e são
contempladas pelos programas sociais do governo federal, como o programa Bolsa Família e
o Seguro Safra.
A renda familiar mensal dos assentados varia, ficando da seguinte forma: 24% dos
assentados possuem renda de até um salário mínimo, estando incluso as famílias que são
beneficiadas dos programas sociais, 64% possui renda de um salário mínimo, 4% possuindo
renda de dois salários mínimos e um total de 4% dos assentados possuindo uma renda de três
salários mínimos ou acima.
Já com relação ao grau de dependência dessa renda, 70% dos entrevistados
possuem entre 1 e 4 pessoas dependentes diretamente da renda, outros 26% dos entrevistados
possuem entre 5 a 9 pessoas que usufruem da renda e um percentual de 4% dos assentados,
afirmando que cerca de 10 a 14 pessoas são dependentes da renda mensal.
A participação em atividades cooperadas e associativas é notória na comunidade.
54% dos assentados do PA Santa Maria Agrovila Moleque já fizeram parte de cooperativas ou
associações. No entanto, a quase totalidade (98%) dos assentados entrevistados eram
associados e apenas 2% participavam ativamente em funções de gestão dessas organizações,
como por exemplo, a função de tesoureiro. Já 46% dos assentados responderam nunca ter
participado de alguma cooperativa ou associação.
A baixa participação ativa nas associações e cooperativas pode ser resultado de
dois motivos. O primeiro relativo às dificuldades no processo organizativo de desses
empreendimentos autogestionários em assentamentos rurais da reforma agrária; e o segundo
inerente a disponibilidade de tempo e interesse dos próprios assentados para o exercício de
funções administrativas dessas organizações.
A participação em cooperativas, associações e outros empreendimentos dessa
natureza sejam na forma de associados ou na sua gestão se reveste de fundamental
importância para o fortalecimento do processo de desenvolvimento emancipatório e autônomo
dos assentamentos, bem como se apresenta como uma alternativa para a ampliação da
participação das famílias assentadas no desenvolvimento de atividades econômicas. Além
disso, a participação nessas organizações pode contribuir para intensificar a distribuição e
comercialização dos produtos caseiros produzidos pelas famílias aumentando a renda mensal.
E assim sendo, promover um processo de dinamização da economia local e redução da
dependência de programas sociais.
A maioria dos assentados rurais entrevistados, 72% são beneficiários de algum
programa social, sendo estes o programa Bolsa Família, o programa Seguro Safra e o Salário
Maternidade. Já 28% dos interrogados responderam que nunca foram beneficiados com
programas do governo, embora a própria inserção nos assentamentos já evidencia a
participação nos programas de reforma agrária. Atualmente 52% dos assentados rurais do PA
Santa Maria Agrovila Moleque estão sendo beneficiados com programas do governo federal,
como o programa Bolsa Família e o programa Seguro Safra. Enquanto isso, 48% dos
assentados responderam que não são beneficiários de nenhum programa do governo federal.
Comparando os dados com a questão anterior, pode-se aludir que 20% dos
assentados deixaram de receber as transferências diretas de renda do governo federal por meio
de programas sociais. Esses dados podem denotar que os núcleos familiares aumentaram sua
renda per capita e deixaram de se enquadrar na atual faixa de pagamento do benefício.
Revelando assim que os assentados rurais do PA Santa Maria Agrovila Moleque têm passado
por um processo de emancipação econômica e financeira.
Por outro lado, a existência de mais da metade de famílias que ainda dependem de
transferências de renda do governo federal alerta para a necessidade de fomento a práticas
empreendedoras vinculadas a outras atividades econômicas além da agricultura e da pecuária.
Uma dessas alternativas que parecem ser viáveis é a produção agropecuária e artesã associada
ao turismo rural e base comunitária.
3.3 Avaliação da Infraestrutura e Recursos do Assentamento Santa Maria Agrovila
Moleque.
A infraestrutura e os recursos presentes em uma localidade são elementos
indispensáveis tanto para a qualidade de vida da população local, quanto para o
desenvolvimento da atividade turística. Pensando nisso, solicitou-se que os assentados rurais
avaliassem a infraestrutura e os recursos naturais e culturais do PA Santa Maria Agrovila
Moleque.
Nesse quesito de infraestrutura foram avaliados aspectos relativos a
Comunicações (correios, telefones e internet), Sinalização urbana, Segurança Pública,
Limpeza Pública, Saúde Pública, Educação Pública, Transporte Coletivo, Vias de acesso,
Água/Abastecimento, Qualidade do ar, Coleta de lixo, Opções de lazer e entretenimento.
Obtendo-se os seguintes resultados expressos no Quadro 01.
Quadro 01: Avaliação das infraestruturas do PA Santa Maria Agrovila Moleque.
Fonte: Dados da Pesquisa (2016).
Observa-se inicialmente que no Quadro 01 que itens de infraestrutura como
correios e sinalização urbana são, na perspectiva dos assentados, inexistentes no
assentamento. As correspondências são recolhidas pelos assentados na sede dos correios de
Afonso Bezerra, e as contas de energia elétrica são entregues nas casas pelos funcionários da
Companhia Energética do Rio Grande do Norte (COSERN). A ausência de sinalização urbana
é um considerado um fator que prejudica o acesso ao assentamento por eventuais visitantes.
Chama-se atenção ainda para os itens de telefones públicos (42%), Internet (30%),
segurança pública (70%), limpeza pública (76%), Transporte Coletivo (52%), Coleta de Lixo
(78%) e Opções de Lazer e Entretenimento (74%), cuja oferta não é percebida pela
comunidade em altas porcentagens. E quando percebidas foram avaliadas no geral entre
péssimo e regular. A não percepção desses serviços é justificada pela ausência em si ou pela
não utilização pelos assentados. A internet, por exemplo, embora existente em algumas casas
e na escola não é ofertada para toda a comunidade. O transporte público coletivo é inexistente,
mas os que avaliaram consideram o transporte realizado por carros de lotação e moto-táxi.
Os únicos itens bem avaliados pelos assentados foram: água/abastecimento e a
qualidade do ar, que são elementos que não dependem tanto de infraestrutura físicas. No
entanto, cabe ressaltar que a ausência de coleta e tratamento de lixos na comunidade tem
resultado na incineração dos mesmos de forma que a qualidade do ar tende a ser prejudicada
em curto período temporal.
Esse resultado mostra-se preocupante, pois revela a necessidade de maiores
investimentos para a promoção da melhoria de infraestrutura básica nos assentamentos. Não
basta dar casa e terra, é preciso dar condições dignas de vida aos assentados rurais por meio
da oferta de infraestrutura física adequada, bem como garantir o acesso a serviços de saúde e
de educação de qualidade, caso contrário à eficiência das políticas públicas de reforma agrária
são afetadas, dado que pode implicar na não permanência do agricultor e suas famílias no
assentamento. Além disso, opções de lazer e entretenimento são fundamentais para a
sociabilidade e interação das famílias assentadas, tanto para as crianças, jovens e adultos.
A precariedade da infraestrutura do assentamento, especialmente quanto à coleta
de lixo, apresenta-se como prejudicial tanto para o meio ambiente quanto para a saúde dos
assentados rurais. Ademais os impactos ambientais causados pelo descarte indevido do lixo
põem em risco a perda de atratividade dos recursos naturais presentes no assentamento;
afetam o sentimento de pertença e valorização do local; e contribuem para a criação de
imagem negativa do destino.
A baixa percepção sobre a existência de recursos naturais e culturais também é
preocupante. 90% dos assentados afirmaram que no Projeto de Assentamento Santa Maria
Santa Maria Agrovila Moleque não possui nenhum tipo de recursos que podem ser
considerados atrativos turístico. Entre os apenas 10 % que percebem a existência de recursos,
4% citaram as danças, músicas e peças teatrais realizadas nas igrejas, escolas e festividades
locais; 4% citaram as belezas naturais, como as hortas, os açudes e as plantações de melão; e
2% citaram a vaquejada do assentamento como atrativo responsável por reunir pessoas de
várias localidades e cidades vizinhas.
Dos que percebem a existência de atrativos, a sua grande maioria 80% já
utilizaram desses recursos, seja com alta (40%) ou baixa frequência (40%). E apenas 20%
nunca os utilizaram dos recursos nem participaram de atividades culturais como as danças,
musicais, peças teatrais e eventos mesmo sabendo de sua existência.
Essa baixa percepção sobre a existência de recursos naturais e culturais pode ser
explicada pelo fato de que esses recursos estão incorporados no cotidiano dos indivíduos
sendo considerados elementos corriqueiros/despercebidos e sem atratividade. Nesse sentido,
faz-se importante fomentar atividades que possam ampliar essa percepção, haja vista que o
assentamento possui recursos de potencial atratividade turística. Uma alternativa para isso
seria o desenvolvimentos de atividades que levem aos assentados perceberem e utilizarem
desses recursos em momentos de lazer e entretenimento.
3.4 Percepção dos assentados rurais sobre a inserção do turismo nos assentamentos
rurais
De acordo com os assentados rurais do Projeto de Assentamento Santa Maria
Agrovila Moleque, não são desenvolvidas nenhuma atividade ou ação voltada para o turismo
rural, bem como nunca participaram de programas, treinamentos e reuniões que fosse
realizada pela Secretaria de Turismo de Afonso Bezerra-RN, ou de outros órgãos responsáveis
por fazer palestras ou cursos relacionados à área, nem sequer trabalhou ou trabalha em alguma
atividade turística.
Porém, apesar de todos nunca terem participado de algum tipo de curso voltado
para a área do turismo, 63% dos assentados demonstram interesse de participar de programas,
treinamentos e reuniões acerca do turismo, pois os mesmo dizem que o turismo pode ser
muito interessante e importante para o desenvolvimento de uma comunidade, fazendo com
que eles entendam um pouco mais sobre o que é o turismo rural. Os 37% que responderam
não possuir interesse em participar alegam que já trabalham, com isso não teria tempo para
participar dos eventos que fossem realizados e também alegam que não participam pelo fato
de acreditar que o turismo não tem com o que contribuir para o assentamento.
É importante notar que no Assentamento atualmente não existe nenhuma
atividade turística estruturada sendo desenvolvida nem nenhum equipamento turístico em
funcionamento, tais como pousadas, clubes, restaurantes, receptivos. No entanto, o
assentamento é frequentemente visitado por pessoas de outras cidades que vem visitar seus
parentes e amigos pernoitando nas residências dos assentados e desenvolvendo atividades de
lazer e recreação. Essa prática pode ser considerada como uma atividade turística mesmo que
informal e os visitantes como turistas em potencial.
Tal como afirma a grande maioria dos entrevistados, 88% revelaram receber
visitas de familiares ou amigos de outras cidades. 46% dos assentados afirmaram receber
familiares ou amigos de outras cidades mais de 7 vezes, enquanto 18% dos assentados dizem
receber anualmente seus familiares ou amigos entre 1 a 2 vezes, seguidos respectivamente de
14% e 10%, os assentados que recebem seus familiares e amigos entre 3 a 4 vezes, e entre 5 a
6 vezes no ano. Já 12% dos assentados do Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila
Moleque disseram nunca ter recebido visitas de familiares e amigos de outras cidades.
Os visitantes que costumam ir ao Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila
Moleque vão com intuito de visitar seus familiares, fazer trilhas ecológicas e pescar, visitar os
amigos, ir para a igreja, ver os lotes e as plantações de melão, fazer churrascos, divertir-se e
praticar esportes no campo de futebol e como se trata de um ambiente rural e calmo, alguns
vão à busca de desopilar. Essas atividades podem ser segmentadas em modalidade de turismo
rural, turismo ecológico, turismo de esporte, turismo de aventura, turismo de pesca e
ecoturismo revelando as potencialidades para introdução da atividade turística no
assentamento. Além disso, vislumbra-se a possibilidade de desenvolvimento do turismo de
estudos e intercâmbios, pois de forma regular o assentamento tem recebido estudantes e
professores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte para a realização de atividades
de pesquisa e extensão universitária.
Faz-se importante notar que a ausência de equipamentos turísticos no
Assentamento não impede o desenvolvimento da atividade turística, pois novas modalidades
alternativas podem ser implementadas, como por exemplo, a hospedagem nas residências dos
assentados rurais, tais como já ocorre em experiências em outros assentamentos que
desenvolvem alguma modalidade do turismo.
Nesse sentido, tem-se que 62% dos entrevistados afirmaram aceitar hospedar
turistas em sua residência e 38% são contrários. Com relação aos 62% que foram a favor de
hospedar os turistas em sua residência justificaram que seria de grande importância para o
assentamento, pois se trata de um meio de conseguir renda extra e gerar desenvolvimento,
pelo fato de que um turista poderia atrair mais pessoas ao local e com isso o assentamento
passaria a ser mais frequentado, sendo mais frequentado será investido em estruturas para a a
sua melhoria, bem como geração de renda e criação de empregos. Já o resultado contrário se
obteve pelo fato de que os assentados se sentiriam amedrontados, pois não conheceriam a
pessoa na qual iam hospedar na sua residência, bem como essa prática poderia mudar o estilo
de vida da família, tendo ela que adaptar-se a outro estilo, para satisfazer a necessidade dos
turistas.
No geral apesar de não visualizarem recursos suficientes para atrair turistas, a
grande maioria dos entrevistados acredita que o turismo possui algum grau de importância
para o assentamento. Dentre os entrevistados, 50% consideram importante e 26% consideram
muito importante à presença da atividade turística no assentamento, reforçando que a
atividade turística poderá trazer um maior desenvolvimento, bem como geração de renda para
a população. Já 16% dos assentados acham pouco importante e 8% dos assentados afirmam
que a atividade turística não possui nenhuma importância para o assentamento pelo fato de
que o turismo não tem nada de bom para oferecer ao assentamento.
O reconhecimento da importância do turismo para o assentamento é um fator
relevante, pois pressupõe uma aceitabilidade da inserção dessa atividade. Outro fator refere-se
à recomendação do assentamento pelos moradores para a visitação turística. 94% dos
assentados recomendariam PA Santa Maria Agrovila Moleque para visitação turística
indicando a plantações (melão, melancia e tomates), os açudes, o centro de vivência, a escola,
o parque de vaquejada, a igreja, a área de irrigação, a reserva ambiental, a criação de animais
(codornas, galinhas e bovinos) e os lotes como locais a serem visitados.
Além disso, citaram a qualidade da água como uma das maiores riquezas naturais
do assentamento que poderia ser usufruídas pelos visitantes. Os 6% dos assentados que não
recomendaria a visitação justificaram sua resposta dizendo que o assentamento não possui
nada de importante a ser mostrado.
Esse resultado a primeira vista apresenta-se como contraditório em relação à baixa
percepção de recursos atrativos para os turistas, conforme discutido anteriormente. No
entanto, acredita-se que no decorrer das entrevistas os assentados possam ter refletido sobre a
questão do turismo de modo a reconhecerem elementos a serem vivenciados e
experimentados pelos turistas.
3.5 Grau de aceitação da presença de turistas pelos assentados rurais
A aceitação e a aprovação do turismo pelos assentados são imprescindíveis para o
desenvolvimento do setor, pois causa uma influência direta no tratamento dado ao
turista/visitante. Nesse aspecto, Magalhães (2002 apud CARVALHO, 2010: 483) afirma:
“[...] à medida que a comunidade vai se sentindo envolvida, torna-se mais motivada em
relação a sua participação no processo de desenvolvimento do turismo, o que pode levar ao
surgimento do senso de responsabilidade de ser guardião dos patrimônios natural, histórico e
cultural da localidade”.
Diante do exposto, pode-se concluir que a integração dos assentados é de suma
importância para o desenvolvimento do turismo no ambiente receptor, onde a aceitação e a
aprovação do turismo por parte dos assentados rurais do Projeto de Assentamento Santa Maria
Agrovila Moleque viabilizará possíveis projetos do setor no assentamento, desse modo,
trazendo impactos positivos diretos aos assentados, como um aumento da renda, difusão e
dinamismo cultural, melhoria da infraestrutura básica, dentre outros.
O grau de aceitação da presença de turistas ou visitantes pela população local é
um dos principais fatores a serem considerados antes de se pensar em desenvolver a atividade
turística em uma localidade. A aceitação do turismo pela comunidade influencia não apenas a
relação harmoniosa entre os turistas e a comunidade, mas também influencia de forma
incisiva no processo de elaboração do Planejamento Turístico, bem como a implementação de
projetos e ações.
No PA Santa Maria Agrovila Moleque, verificou-se que 52% dos assentados
rurais são extremamente favoráveis à presença de turistas ou visitantes no assentamento, onde
os assentados dizem que os turistas ou visitantes podem contribuir para o avanço do
assentamento, avanço esse tanto na parte estrutural quanto na parte da geração de renda e na
troca de experiências entre os turistas e os moradores do assentamento.
Tem-se ainda que 36% dos assentados não são nem a favor nem contra a presença
dos turistas no assentamento; e junto com os 6% dos assentados que possui pouca oposição à
presença de turistas no PA Santa Maria Agrovila Moleque, justificaram suas respostas
dizendo que o turismo não pode acrescentar em nada no assentamento e que para eles pouco
importa a presença de turistas no assentamento, já que o mesmo não possui nada de atrativo a
oferecer. Verificou-se que 6% dos assentados são pouco favoráveis à presença de turistas ou
visitantes, pois apesar de ser pouco favoráveis, os mesmo acreditam que o turismo não tem
uma grande importância para que possa tornar o assentamento mais desenvolvido. E ninguém
se manifestou como sendo extremamente contrário.
4 Considerações finais
Esse artigo objetivou avaliar as perspectivas para o desenvolvimento do turismo
rural no Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila Moleque do município de Afonso
Bezerra-RN sob a ótica dos assentados rurais. De acordo com a pesquisa realizada, pode-se
concluir que o Projeto de Assentamento Santa Maria Agrovila Moleque possui perspectivas
contundentes para o desenvolvimento do Turismo Rural considerando a existência de recursos
naturais e culturais que podem ser aproveitados pela atividade turística, bem como de ricas
experiências rurais que podem ser vivenciadas pelo turista e/ou visitante.
As expectativas de desenvolvimento do turismo rural no PA Santa Maria Agrovila
Moleque respaldam-se ainda no grau de aceitação e aprovação do turismo pelos assentados.
Tem-se que mesmo sem reconhecer a potencialidade turística do Assentamento, os assentados
rurais apresentam um grau de aceitação ao desenvolvimento do turismo considerado
satisfatório, não tendo ninguém que se se manifestou como extremamente desfavorável.
No entanto, chama atenção a existência de parte significativa de assentados que
não são nem a favor nem contra a presença dos turistas no assentamento. Esse resultado
denota alerta para a necessidade de desenvolver ações informativas sobre o turismo no
assentamento para que os assentados passassem a reconhecer a potencialidade turística do seu
território, bem como de seus possíveis efeitos para a melhoria das condições de vida dos
agricultores e agricultoras rurais a partir da produção agropecuária e artesã associada ao
turismo. Nesse intuito, as cooperativas e de organizações associativas da sociedade civil
exercem um papel fundamental para estimular a produção e comercialização de produtos
produzidos no assentamento via práticas do turismo rural.
Mesmo diante de um cenário promissor fica evidente a necessidade de
desenvolver um conjunto de ações estratégicas direcionadas tanto para a melhoria da
infraestrutura básica, criação de equipamentos turísticos e de estruturação da oferta turística
do assentamento, como também ações de gestão e planejamento turístico que englobem o
município de Afonso Bezerra e demais assentamentos da região, considerando que atividade
turística não ocorre de forma isolada e desconectada com o território de seu entorno.
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