UTILIZAÇÃO DA SIMULAÇÃO DENTRO
DO CONTEXTO DA INDÚSTRIA 4.0:
PROPOSTA DE UM SISTEMA CYBER-
FÍSICO VISANDO A REDUÇÃO DE
DESPERDÍCIOS EM UM PROCESSO DE
ABASTECIMENTO DE MATERIAIS DE
UMA INDÚSTRIA AERONÁUTICA
Carlos Henrique dos Santos
José Antonio de Queiroz
Fabiano Leal
Mona Liza Moura de Oliveira
José Hamilton Chaves Gorgulho Júnior
A utilização da simulação como ferramenta de apoio a melhorias vem
sofrendo alterações quanto à sua utilização, sobretudo no contexto da
Indústria 4.0. Modelos de simulação focados em análises pontuais e
que carecem de especialistas dão espaço a modelos com certo grau de
automatização e integrados a diversos sistemas. Tal integração
favorece a atualização constante do modelo a partir das variações do
sistema real, possibilitando tomadas de decisão e, neste caso, a
simulação pode atuar como um sistema cyber-físico, um dos pilares da
Indústria 4.0. Neste contexto, o presente trabalho propõe a utilização
da simulação como um sistema cyber-físico de apoio à tomada de
decisão em um processo de abastecimento de materiais em uma
indústria do ramo aeronáutico. Através da integração da simulação
com os dados do processo real, tal sistema visa otimizar as rotas de
abastecimento de materiais com foco na redução de desperdícios
relacionados à movimentação e transporte de materiais. Nota-se, a
partir da utilização do sistema, uma possível redução de movimentação
e transporte durante a rota de abastecimento na ordem de 20%,
impactando diretamente na produtividade e eficiência do processo,
além de estar diretamente relacionado aos preceitos dos Conceitos
Enxutos.
Palavras-chave: Simulação; Indústria 4.0; Sistemas cyber-físicos.
XXXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO “Os desafios da engenharia de produção para uma gestão inovadora da Logística e Operações”
Santos, São Paulo, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2019.
XXXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“Os desafios da engenharia de produção para uma gestão inovadora da Logística” Santos, São Paulo, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2019.
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1. Introdução
De acordo com Uriarte, Ng e Moris (2018), os modelos de simulação tendem a ser, no
contexto da Indústria 4.0, integrados com os sistemas de informação e gestão e adaptativos de
acordo com o sistema real, auxiliando na tomada de decisão. Neste contexto, os modelos de
simulação podem atuar como sistemas cyber-físicos, uma vez que representam uma versão
virtual do processo que se adapta frente às alterações do ambiente real.
Uriarte, Ng e Moris (2018) ressaltam ainda que a indústria do futuro traz importantes
mudanças nas organizações atuais. Neste contexto, os princípios da filosofia Lean, ou em
português Conceitos Enxutos, também necessitarão de mudanças para se adaptar às
possibilidades trazidas pela Indústria 4.0. Tais princípios visam a redução de desperdícios e a
manutenção de processos mais eficientes e, neste caso, Tortorella e Fettermann (2017) relatam
que a Indústria 4.0 impacta diretamente na implementação da filosofia enxuta, permitindo
algumas facilidades frente as atuais barreiras e ainda criando novos desafios.
Objetiva-se através do presente trabalho demonstrar a aplicabilidade da simulação no
contexto da Indústria 4.0 e para tal, propõe-se a criação de um sistema cyber-físico para
otimização de rotas em uma indústria do ramo aeronáutico. Mais precisamente, o objeto de
estudo escolhido foi um processo de abastecimento de materiais, o qual permite ao colaborador
responsável pela tarefa a escolha de uma, dentre inúmeras rotas de abastecimento possíveis. Tal
cenário sugere desperdícios relacionados à movimentação e transportes desnecessários e dessa
forma, o sistema cyber-físico visa justamente otimizar a tomada de decisão e reduzir tais
desperdícios, convergindo com os objetivos e preceitos dos Conceitos Enxutos.
Este trabalho apresenta primeiramente uma revisão bibliográfica acerca da Indústria 4.0,
com ênfase nos sistemas cyber-físicos, bem como do papel simulação e dos Conceitos Enxutos
neste âmbito. Posteriormente, é descrito o método empregado para realização do trabalho,
seguido da aplicação do mesmo em um objeto de estudo real e, finalmente, é apresentada uma
conclusão acerca da utilização da simulação como sistema cyber-físico no ambiente da Indústria
4.0.
2. Revisão Bibliográfica
2.1. Indústria 4.0 e sistemas cyber-físicos
O termo Indústria 4.0 descreve a integração de todas as divisões de negócio e cadeia de
agregação de valor com ajuda da digitalização (RODIC, 2017). Para Uriarte, Ng e Moris (2018),
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as três mais relevantes características produtivas da Indústria 4.0 são: capacidade de lidar com
sistemas cada vez mais complexos, capacidade de inovação e, por fim, flexibilidade. Segundo
os autores, neste contexto, o termo “Virtualização” passa a ser um dos conceitos predominantes
no âmbito da Indústria 4.0 e este refere-se à uma cópia virtual do sistema físico, compondo o
sistema cyber-físico.
Os sistemas cyber-físicos podem ser entendidos como mecanismos onde o ambiente
físico e o ambiente virtual são intimamente conectados e ambos interagem entre si de forma a
compartilhar e trocar informações. Neste caso, os diversos sistemas de um processo são
conectados e possibilitam a comunicação através de entradas e saídas de dados, as quais
permitem interação entre o ambiente físico e uma resposta do modelo digital correspondente
através de algoritmos e processamento computacional (ZHONG et al., 2017). Ainda para os
autores, o sistema cyber-físico é capaz de monitorar o sistema real e auxiliar na tomada de
decisão em cooperação com humanos, maquinas, sensores, dentre outros.
2.2. Simulação e seu papel como sistema cyber-físico para apoio à tomada decisão
Banks (1998) apresenta a simulação como sendo um processo de imitação de sistemas
reais, o qual envolve a criação de uma história baseada nestes, seguida pela criação de
inferências acerca das suas características. Segundo o autor, a ferramenta é capaz de descrever
e analisar o comportamento de sistemas, bem como responder questões acerca de suas
características. Rodic (2017) ressalta que a simulação se consolidou nos mais diversos setores
nas últimas décadas, contribuindo para redução de custos em processos, desenvolvimento de
produtos, aumento da qualidade de produtos e serviços, dentre outras contribuições. Entretanto,
o autor relata que a simulação deve sofrer modificações no contexto da indústria moderna.
Diferente de trabalhos passados, onde a simulação era utilizada em análises pontuais e
com escopo e períodos limitados, há agora uma tendência crescente de uma simulação
envolvendo diversas áreas integradas para tomada de decisão. Além disso, modelos pontuais e
de difícil interpretação carecem ser substituídos por modelos controlados por interfaces
amigáveis e integrados com os diversos sistemas de uma operação (RODIC, 2017). Portanto,
nota-se que modelos de simulação passam a agir como cópias virtuais dos sistemas reais,
concordando com Uriarte, Ng e Moris (2018), os quais destacam que a simulação possui grande
importância no contexto de sistemas cyber-físicos, sendo capaz de desempenhar tal papel.
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2.4. Conceitos Enxutos no contexto da Indústria 4.0
Segundo Ohno (1997), o foco do Lean, ou em português Conceitos Enxutos, é a
eliminação ou minimização dos desperdícios, que pode ser definido como toda e qualquer
atividade que não agrega valor aos clientes ou usuários, mas que adiciona custo ao produto.
Hines e Taylor (2000) segregam as atividades das empresas em três grupos: atividades que
agregam valor aos clientes, atividades que não agregam valor aos clientes, mas que são
necessárias e, por fim, atividades que não agregam valor aos clientes e que não são necessárias,
os chamados desperdícios puros. Ainda sobre os desperdícios, Ohno (1997) os classifica em
sete grupos. São eles: Superprodução, Estoque, Espera, Transporte, Movimentação,
Processamento ineficiente ou desnecessário e, por fim, Itens Defeituosos.
Já no que se refere aos Conceitos Enxutos no contexto da Indústria 4.0, para Uriarte, Ng
e Moris (2018), a filosofia enxuta continuará sendo fator chave para alcançar maiores
eficiências por parte das companhias. Além disso, para os autores, as soluções disponíveis
através da evolução da Indústria 4.0 vão auxiliar na implementação dos Conceitos Enxutos e
sanar dificuldades encontradas atualmente. Tortorella e Fetterman (2017) complementam que
os Conceitos Enxutos tomam o papel de pré-requisito para a utilização das tecnologias no
ambiente de manufatura, ressaltando seu papel no contexto da indústria 4.0.
3. Método De Pesquisa
O presente trabalho utilizará o método de Modelagem e Simulação, onde basicamente
manipula-se variáveis e seus níveis em um modelo matemático ou computacional (MARTINS,
2018).
3.1. Objeto de estudo
O objeto de estudo deste trabalho é um processo de abastecimento de peças de uma
indústria do ramo aeronáutico. Tal processo é composto por quatro linhas produtivas
localizadas em diferentes pontos da planta e que possuem demandas independentes. Cada linha
conta com um estoque intermediário no local, chamado de posto kanban. Na medida em que
tais materiais são consumidos, deve haver o abastecimento periódico dos mesmos. Neste
contexto, a escolha da melhor rota de abastecimento está relacionada muitas vezes à experiência
do colaborador e não se pode afirmar que a rota escolhida é, de fato, a escolha mais eficiente.
Através da simulação como ferramenta diária de auxílio à tomada de decisão, atuando como
um sistema cyber-físico, objetiva-se reduzir desperdícios relacionados à movimentação e
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transporte de materiais, tornando o processo de abastecimento mais enxuto. A figura 1 ilustra a
localização dos postos kanban presentes na planta, objeto deste estudo:
Figura 1- Ilustração da planta produtiva objeto deste estudo
Fonte: elaborado pelos próprios autores
3.2. Proposta de um método para condução do projeto de simulação como sistema cyber-
físico
Há diversos trabalhos na literatura que abordam métodos de condução de projetos de
simulação. Levando em conta o nível de detalhe abordado pelo método, utilizou-se como base
o proposto por Montevechi et al. (2010). A primeira fase do método é chamada de Concepção
e como resultado da mesma têm-se o modelo conceitual do objeto de estudo. Já a segunda fase
é chamada de Implementação e o resultado desta fase é o modelo operacional, o qual pode ser
utilizado para experimentos e análises futuras na última fase, chamada de Análise.
Porém, antes de aplicar o método, algumas modificações são necessárias de forma a
adequá-lo ao cenário atual de utilização da simulação. Neste contexto, Uriarte, Ng e Moris
(2018) ressaltam que a simulação deixa de ser uma ferramenta de análises pontuais e isoladas
para se conectar e integrar com diversos dados e fontes para suporte à tomada de decisões. Já
Rodic (2017) relata o fato de que modelos de simulação que requerem o auxílio de especialistas
em simulação tendem a ser substituídos por modelos os quais podem ser operados por qualquer
usuário, sem a necessidade de conhecimento prévio do modelo e do software. Levando em
consideração o contexto relatado, algumas modificações foram realizadas em cada uma das
Planta produtiva
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fases, conforme descreve o quadro 1. Além disso, a figura 2 apresenta o método proposto com
todas as etapas presentes em cada uma das fases.
Quadro 1- Modificações realizadas no método proposto por Montevechi et al. (2010)
Fonte: elaborado pelos próprios autores
Fase Modificação
I- Concepção
Esta fase não sofreu alterações quanto suas etapas.
Entretanto, é proposta uma nova nomenclatura para a fase,
objetivando uma melhor representação quanto às atividades
pertencentes à mesma. Dessa forma, a primeira fase do
método passa a se chamar Modelagem Conceitual.
II- Implementação
Propõe-se a criação de duas etapas que irão auxiliar na
integração do modelo de simulação com o sistema real,
chamadas de Definição dos dados de atualização do modelo
e das respostas desejadas e Estruturação da interface com
o processo real. A fase também teve alteração quanto à sua
nomenclatura, passando a se chamar Modelagem
Computacional.
III- Análise
Foram criadas três novas etapas, as quais substituem as etapas
propostas por Montevechi et al. (2010). Uma vez que a
simulação passa a refletir o sistema real e se adaptar quanto
às suas mudanças, torna-se necessário um método que
viabilize a utilização constante da ferramenta. Foram criadas,
portanto, três novas etapas, chamas de Definição dos
cenários a serem testados, Execução periódica dos
cenários e Análises e Tomadas de decisão. Além disso, a
terceira fase do método também terá mudanças quanto à
nomenclatura, passando a se chamar Modelagem
Operacional.
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Figura 2- Proposta de alteração do método para condução de projetos de simulação
Fonte: Adaptado de Montevechi et al. (2010)
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4. Aplicação
4.1. Modelagem conceitual
4.1.1. Objetivos e definição do sistema
O objetivo do projeto consiste em avaliar a utilização da simulação como ferramenta
diária de auxílio à tomada de decisão, atuando como um sistema cyber-físico. De forma a
representar o objeto de estudo, será construído um modelo de Simulação a Eventos Discretos
(SED), o qual permitirá simular todas as possíveis rotas de abastecimento em função da
demanda de cada posto kanban. Dessa forma, torna-se possível a tomada de decisão baseando-
se nos resultados do modelo, interferindo novamente no processo real e fechando o ciclo. A
figura 3 ilustra de maneira simplificada tal proposta.
Figura 3- Síntese da proposta de utilização da simulação integrada ao processo real
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.1.2. Construção do modelo conceitual
Chwif e Medina (2015) ressaltam que, a partir de uma abstração do processo real, deve-
se partir para uma técnica adequada para representação de modelos de simulação. Para a
modelagem conceitual, utilizou-se da técnica de modelagem IDEF-SIM, desenvolvida por Leal
(2008). O modelo conceitual que representa o processo Abastecimento de kanbans, principal
atividade do processo em estudo, é apresentado na figura 4:
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Figura 4 – Modelo conceitual do processo (Abastecimento de kanbans)
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.1.3. Validação do modelo conceitual
De acordo com Sargent (2013), a validação do modelo conceitual objetiva assegurar que
as teorias e inferências acerca do modelo estão corretas. Para a validação, foi utilizada,
primeiramente, a técnica de Passos Estruturados, onde o modelo foi apresentado a dois
pesquisadores, os quais dominam o processo de modelagem. Em seguida, o modelo foi então
submetido à técnica de Face-a-Face, onde um especialista do processo avaliou o modelo
conceitual.
4.1.4. Documentação do modelo conceitual
Conforme ressaltam Leal et al. (2008), a técnica IDEF-SIM, utilizada no mapeamento
conceitual, contribui inclusive para a documentação do modelo, facilitando o entendimento do
mesmo. Neste contexto, a fase de documentação do modelo conceitual foi realizada.
4.1.5. Modelagem dos dados de entrada
Antes de partir para a modelagem dos dados, deve-se primeiramente definir quais os
dados de entrada do modelo. Observa-se a existência de três parâmetros de entrada a serem
abastecidos no modelo. São eles os tempos TC Picking e TC Pagamento, bem como a
velocidade V Deslocamento com que o operador se movimenta na operação. O parâmetro TC
Pagamento foi considerado como determinístico, não sendo tratado na modelagem de dados.
O processo de modelagem dos dados pode ser dividido em três etapas: (1) Coleta de dados, (2)
Tratamento de dados e (3) Inferência Chwif e Medina (2015). As distribuições de ambos os
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parâmetros, V Deslocamento e TC Picking, foram associadas a distribuições normais, com um
nível de confiança de 95%, conforme ilustra a tabela 1.
Tabela 1 – Inferência estatística para os parâmetros
Parâmetro Distribuição associada
TC Picking [s] N(176,1 ; 26,77)
V Deslocamento [m/s] N(1,10 ; 0,26)
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.2. Modelagem computacional
4.2.1. Construção do modelo computacional
Rodic (2017) ressalta, dentre outros fatores, a alta resolução gráfica do modelo
computacional, o alto nível de detalhamento e o baixo nível de abstração como pontos
essenciais para a adequação da simulação no cenário da Indústria 4.0. Optou-se pela utilização
do software FlexSim® parar a construção do modelo e a figura 5 ilustra o mesmo em vistas 2D
e 3D.
Figura 5 – Vistas 2D e 3D do modelo computacional criado através do software FlexSim®
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.2.2. Verificação do modelo computacional
Para Chwif e Medina (2015), a etapa de verificação do modelo pode ser entendida como
uma análise do modelo computacional de acordo com a lógica imposta pelo modelo conceitual.
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A verificação do modelo computacional foi realizada através de duas técnicas de verificação
sugeridas pelos autores: Implementação modular, a qual se baseia na construção e teste do
modelo em partes e Animação gráfica, onde procura-se identificar e corrigir erros através do
acompanhamento visual da simulação.
4.2.3. Definição dos dados de atualização do modelo e das respostas desejadas
Espera-se que o modelo seja alterado no decorrer do tempo, a partir das alterações
ocorridas no processo real, permitindo que a simulação seja utilizada como ferramenta diária
de auxílio à tomada de decisão. Porém, antes de estabelecer a comunicação entre ambas as
partes, deve-se definir basicamente duas questões principais: quais informações o modelo
computacional precisa para se adaptar ao mundo real e quais informações o processo real
precisa, após executada a simulação. A demanda por materiais em cada posto kanban foi
escolhida como sendo a informação necessária para haver a atualização do modelo de
simulação. Já quanto à resposta necessária para o processo real, definiu-se como sendo a rota
de abastecimento mais eficiente. Neste caso, leva-se em conta a distância percorrida pelo
operador responsável pelo abastecimento, bem como a quantidade de materiais abastecidos no
período.
4.2.4. Estruturação da interface com o processo real
Para a criação da interface de integração, optou-se pela utilização de uma Dashboard
de controle e gestão, a qual foi construída a partir do software Microsoft Excel®. Diversos
outros trabalhos ilustram a utilização de sistemas intermediários para permitir a integração entre
o modelo de simulação e processos reais (RODIC e KANDUC, 2015; BARLAS E HEAVY,
2016; RODIC, 2017). A dashboard funciona, inicialmente, como um banco de dados,
importando as demandas de materiais de relatórios oriundos do sistema ERP da operação. Em
seguida, permite a atualização e simulação do modelo virtual. Por último, a dashboard permite
a obtenção dos resultados oriundos da simulação, possibilitando a tomada de decisão. A figura
6 ilustra a dashboard criada, seguida da explicação de seus elementos principais.
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Figura 6 – Dashboard de interface entre o processo real e o modelo de simulação
Fonte: elaborado pelos próprios autores
I. Botões de controle da dashboard: através destes botões, o usuário interage com o
sistema.
II. Painel de rotas: após a exportação dos resultados da simulação, a dashboard irá
apresentar as três melhores rotas que o modelo de simulação encontrou.
III. Gráficos de comparação: a dashboard apresenta os gráficos de comparação das rotas.
IV. Mapa de rota: indica qual a ordem de abastecimento dos postos kanban de maneira
interativa e de fácil interpretação para o colaborador responsável pelo abastecimento.
Finalmente, a figura 7 ilustra o fluxo de dados e informações desde o processo real,
passando pelo modelo de simulação e retornando à operação através de tomada de decisão.
I
II
III
Rank rotas 1ª parada 2ª parada 3ª parada 4ª parada
Total de
entregas
[linhas]
Distância
percorrida
[m]
Tempo
estimado
[min]
1ª melhor rota kanban 2 kanban 1 kanban 3 kanban 4 7 605,8 33,3
2ª melhor rota kanban 4 kanban 3 kanban 1 kanban 2 7 667,2 34,2
3ª melhor rota kanban 1 kanban 3 kanban 4 kanban 2 7 764,4 35,7
Dashboard Rotas MELHOR ROTA
7 7 7
1ª melhor rota 2ª melhor rota 3ª melhor rota
To
tal d
e e
ntr
ega
s Entregas [linhas]
605,8 667,2764,4
1ª melhor rota 2ª melhor rota 3ª melhor rota
Dis
tân
cia
pe
rco
rrid
a
Distância [m]
2º
1º
3º
4º
Atualizar dados
Gerar rotaSimular
33,3
34,2
35,7
1ª melhor rota 2ª melhor rota 3ª melhor rota
Te
mp
o e
stim
ad
o Tempo [min]
IV
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Figura 7 – Fluxo de dados e informações entre o sistema real e o modelo de simulação
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.2.5. Validação do modelo computacional
Para a validação do modelo computacional, optou-se pelo procedimento Qualitativo
Formal, onde ferramentas estatísticas auxiliam na determinação da validade operacional
(CHWIF E MEDINA, 2015). O parâmetro de validação escolhido foi o Tempo de
abastecimento unitário (Tu). Para obtenção do Tu, dividiu-se o tempo total de cada rodada de
abastecimento pelo total de materiais abastecidos na mesma. A fim de se comparar os dados
reais da operação com os resultados de um certo número de réplicas do modelo, optou-se pela
escolha do teste ANOVA. O modelo de simulação foi pré-programado para simular 17 réplicas
em cada uma das rodadas, de forma a fornecer a precisão de um minuto e o nível de confiança
de 95%. A figura 8 apresenta o gráfico de comparação entre os dados reais e do modelo de
simulação, bem como o resultado do teste ANOVA. Com o valor P, igual 0,584 e maior que
5%, pode-se afirmar com um nível de confiança de 95% que não foi possível comprovar alguma
diferença significativa entre os dados reais e os dados da simulação, validando o modelo
(MONTGOMERY E RUNGER, 2012).
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Figura 8 – Comparação entre os dados reais e as réplicas da simulação
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.3.Modelagem operacional
4.3.1. Definição dos cenários a serem testados
Os cenários a serem testados foram definidos levando-se em conta as respostas
desejadas do modelo. O software, após testar os cenários, classifica cada uma das possíveis
rotas em um ranking, onde a melhor rota é aquela que apresenta o melhor resultado combinando
as variáveis de resposta Distância percorrida e Volume abastecido. Os resultados do software
são gravados em um banco de dados com extensão “.CSV”, permitindo a posterior importação
destes pela dashboard de controle e gestão.
4.3.2. Execução periódica dos cenários
No contexto da utilização da simulação dentro do contexto da Indústria 4.0, a execução
periódica do modelo passa a ser um dos pilares da integração entre os sistemas virtual e real.
Dessa forma, o modelo de simulação deve ser executado em períodos de tempo pré-
determinados de maneira a representar o processo real em suas características principais. Xu et
al. (2018) ressaltam justamente o fato de que os sistemas cyber-físicos possuem este papel,
onde, a partir de uma conexão com o mundo real, os mesmos alteram seu comportamento frente
T17
abas
tecim
ento
[mod
elo]
T16
abas
tecim
ento
[mod
elo]
T15
abas
tecim
ento
[mode
lo]
T14
abas
tecim
ento
[mod
elo]
T13
abas
tecim
ento
[mod
elo]
T12
abas
tecim
ento
[mode
lo]
T11 ab
aste
cimen
to [m
odelo]
T10
abast
ecim
ento
[mod
elo]
T9 a
baste
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to [m
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]
T8 a
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ecim
ento
[mod
elo]
T7 a
bastec
imen
to [m
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T6 a
bastec
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to [m
odelo]
T5 a
bastec
imen
to [m
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T4 a
baste
cimen
to [m
odelo
]
T3 a
bastec
imen
to [m
odelo]
T2 abas
tecim
ento
[mod
elo]
T1 ab
aste
cimen
to [m
odelo]
T ab
aste
cimen
to [R
eal]
400
350
300
250
200
Data
Boxplot of T abastecime; T1 abastecim; ...
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às variações do processo. Quanto ao objeto de estudo deste trabalho, o processo de
abastecimento de materiais é executado durante toda a jornada diária de trabalho e, ao finalizar
uma rota de abastecimento, o processo recomeça, havendo uma nova tomada de decisão. Dessa
forma, a cada término de rota de abastecimento o modelo de simulação será atualizado e
executado, se espelhando ao processo real.
4.3.3. Análises e tomadas de decisão
As análises e tomadas de decisão serão realizadas ao termino de cada rodada de
abastecimento de materiais. Dessa forma, ao iniciar um novo abastecimento, o operador
responsável pela atividade terá acesso à rota mais eficiente a ser seguida. A figura 9 localiza a
tomada de decisão através da simulação no processo de abastecimento.
Figura 9 – Tomada de decisão através da simulação
Fonte: elaborado pelos próprios autores
4.3.4. Considerações finais
Para fins de comparação entre a eficiência do processo antes e depois de se implementar
o sistema cyber-físico para otimizar as rotas de abastecimento, pôde-se realizar algumas
análises. Foram coletados dados de doze rodadas de abastecimento de materiais com o objetivo
de comparar as possíveis rotas que o operador poderia seguir para realizar o abastecimento,
bem como destacar e o ganho obtido a partir da simulação como sistema cyber-físico. A figura
10 ilustra a comparação entre a rota otimizada e as demais rotas possíveis, em termos da
distância média percorrida, bem como o teste de hipóteses do tipo 2-sample t que compara as
distâncias médias percorridas. Com o valor P, igual 0,00 e menor que 5%, pode-se afirmar com
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um nível de confiança de 95% que há uma redução estatisticamente significativa entre
distâncias percorridas nas demais rotas possíveis e a rota otimizada (MONTGOMERY E
RUNGER, 2012).
Figura 10 – Comparação entre as distâncias percorridas na pior rota possível vs. rota otimizada
Fonte: elaborado pelos próprios autores
Nota-se que há um potencial de redução de cerca de 20% na distância média percorrida
pelo operador durante o abastecimento de materiais. Na comparação realizada, a rota otimizada
forneceu uma média de 563,9 metros frente à uma média de 710,7 metros nas demais rotas
possíveis. Além da redução dos desperdícios relacionados à movimentação e transporte de
materiais, destaca-se a possibilidade de utilizar o tempo economizado para outras atividades
agregadoras de valor, fato estes que vão de encontro aos preceitos dos Conceitos Enxutos.
5. Conclusões
Com o advento da Indústria 4.0, observa-se uma necessidade crescente de adaptação por
parte de ferramentas e conceitos já consagrados, de forma a permitir sua aplicação nos
processos e operações atuais. Em um cenário onde a competitividade e o grau de complexidade
estão cada vez maiores, necessita-se recorrer a sistemas e ferramentas integradas para auxílio à
tomada de decisão, tornando-a mais eficiente e assertiva.
Rota otimizadaDemais rotas
850
800
750
700
650
600
550
Data
Boxplot of Demais rotas; Rota otimizada
Média = 710,7 m
Média = 563,9 m
XXXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“Os desafios da engenharia de produção para uma gestão inovadora da Logística” Santos, São Paulo, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2019.
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Neste contexto, este trabalho foi desenvolvido visando a utilização da simulação como
sistema cyber-físico, um dos pilares da Indústria 4.0, tornando a tomada de decisão mais
eficiente e alinhada aos Conceitos Enxutos. O objeto de estudo trata-se de um processo de
abastecimento de materiais de uma indústria aeronáutica e, como resultado, obteve-se um
sistema virtual que é influenciado pelo processo real e capaz de otimizar a tomada de decisão.
Tal sistema contribuiu para a redução de desperdícios relacionados à movimentação e transporte
de materiais, impactando em cerca de 20% das distancias percorridas na operação, além de
possibilitar o direcionamento do tempo economizado para outras atividades agregadoras de
valor. Destaca-se a aplicabilidade da simulação como uma ferramenta capaz de se adaptar às
novas tendências e necessidades, se mostrando compatível com os preceitos da indústria
moderna. Para trabalhos futuros, sugere-se novas aplicações da simulação como sistemas cyber-
físicos, de forma a se verificar sua aplicabilidade em outros cenários industriais e até mesmo
no setor de serviços.
6. Agradecimentos
Os autores agradecem à FAPEMIG, à CAPES, ao CNPq e à empresa objeto de estudo
pelo apoio e suporte ao longo da pesquisa.
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