MARTA LOULA DOURADO VIANA
A RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DO
LICENCIADO EM PEDAGOGIA: UM ESTUDO CRÍTICO DA
FORMAÇÃO DO PROFESSOR REFLEXIVO-PESQUISADOR NA
PROPOSTA DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UNEB
São Cristovão – Se
Fevereiro de 2011
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA E PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MARTA LOULA DOURADO VIANA
A RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DO LICENCIADO
EM PEDAGOGIA: UM ESTUDO CRÍTICO DA FORMAÇÃO DO
PROFESSOR REFLEXIVO-PESQUISADOR NA PROPOSTA DO CURSO
DE PEDAGOGIA DA UNEB
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação na Universidade Federal
de Sergipe – UFS, como requisito parcial para
obtenção do título de mestre em educação.
Orientação: Profª. Doutora Solange Lacks
São Cristovão – Se
Fevereiro de 2011
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
V614r
Viana, Marta Loula Dourado
A relação teoria e prática na licenciatura em Pedagogia : um
estudo crítico da formação do professor reflexivo – pesquisador na
proposta do curso de Pedagogia da UNEB / Marta Loula Dourado
Viana. – São Cristóvão, 2011.
212 f. : il.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Núcleo de Pós-
Graduação em Educação, Pró-Reitoria de Pós-Graduação e
Pesquisa, Universidade Federal de Sergipe, 2011.
Orientador: Profª Drª Solange Lacks.
1. Educação. 2. Currículos. 3. Professores – Formação. I. Título.
CDU 378.016
Aos meus queridos pais, Iracy e Odach, pelo
amor incondicional e por nunca medir esforços
para me proporcionar educação.
Ao Cláudio, amor verdadeiro que, apesar dos
desencontros da vida, agora, se concretiza a cada
dia com a beleza e alegria de um sonho se
realizando.
Aos colegas pedagogos (as) e estudantes de
Pedagogia do Brasil que com amor pela educação
buscam transformar a realidade considerando um
instrumento valioso: a ciência.
AGRADECIMENTOS
Ao Cláudio pelas contribuições, pelos momentos de alegrias e muito amor partilhado durante
todo o processo de escrita deste trabalho, e também pela leitura cuidadosa do mesmo.
Aos companheiros do grupo GEPEL pelas contribuições teóricas e amizades construídas ao
longo desta etapa importante que marca nossas vidas.
À orientadora Profª. Dra. Solange Lacks por constituir um espaço na UFS para o estudo da
teoria marxista em tempos de hegemonia das teorias burguesas. Agradeço a oportunidade.
Ao Prof. Dr. Newton Duarte pelo importante estágio de estudos na Disciplina - Educação
Escolar, Trabalho Educativo e Sociedade e no grupo de estudos Marxista em Educação
Escolar na UNESP - Araraquara.
À Ana Carolina G. Marsiglia pela leitura atenciosa deste trabalho e contribuições importantes.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de nível superior – CAPES, pelo apoio
financeiro à pesquisa, sem este apoio seria mais difícil objetivar este trabalho.
Aos colegas da turma 2009 do mestrado em educação da Universidade Federal de Sergipe,
pela união, pelos momentos de diversões e as amizades verdadeiras.
À Universidade do Estado da Bahia, instituição pela qual me formei pedagoga e tenho imenso
afeto, e aos professores da mesma, pela colaboração na pesquisa. Em especial, Lormina
Barreto e Luzeni Carvalho.
À Edna Moreira e Jenneffer, amigas as quais tive a oportunidade de conviver dia a dia em
Aracaju, amigas que me incentivaram a acreditar.
À Marilene Serafim, grande amiga de todos os momentos pela qual tenho imensa admiração e
gratidão pelo incentivo e amizade.
À Maria Oliveira, uma mulher de luta que representa a classe trabalhadora com muita
disposição, um exemplo de superação das dificuldades impostas por uma sociedade desigual.
Aos meus sobrinhos (as) pequeninos (as), uma nova geração, Gabriela, Larissa e Marcos
Henrique, a motivação e a alegria que alaga o meu coração.
Por fim, agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para este estudo e que não
tiveram seus nomes citados.
O conhecimento não existe por si, mas para a prática
dos homens. Quanto mais próximos ele estiver do
conhecimento científico, tanto mais rápido e
plenamente se realizará na atividade dos homens;
quanto mais teórico, tanto mais prático e tanto maior
é a importância que tem para o domínio e a direção
dos processos da natureza. Mas para a realização
prática, o conhecimento deve, em sua evolução,
atingir determinado grau de maturidade, ou seja,
tornar-se não simplesmente teoria, mas ideia
científica.
(Kopnin, 1978, p. 309)
O que se opõe de modo excludente à teoria não é a
prática, mas o ativismo. E o que se opõe de modo
excludente à prática é o verbalismo e não a teoria.
Pois, o ativismo é a „prática‟ sem teoria e o
verbalismo é „teoria‟ sem a prática. Isto é: o
verbalismo é o falar por falar, o blá-blá-blá, o culto
da palavra oca; e o ativismo é a ação pela ação, a
prática cega, o agir sem rumo claro, a prática sem
objetivo. Portanto, o objeto da pedagogia é a práxis
educativa, vale dizer, a unidade teoria-prática.
Dermeval Saviani (2008a)
RESUMO
O objeto de estudo desta pesquisa centra-se na relação teoria e prática na formação do
licenciado em Pedagogia, desenvolvendo um estudo crítico sobre a “teoria do professor
reflexivo-pesquisador” na proposta do curso de Pedagogia da UNEB por meio,
especificamente, dos componentes curriculares Pesquisa e Prática Pedagógica e Pesquisa e
Estágio. Estes se expressam como possibilidades de se efetivar a relação teoria e prática
fazendo o estudante de pedagogia se perceber como potenciais pesquisadores reflexivos das
diferentes práticas educativas. Esta perspectiva do professor reflexivo-pesquisador tem se
justificado na formação inicial de professores como uma inovação por tornar a prática
educativa o principal referencial para a produção do conhecimento, portanto, uma suposta
solução da histórica dicotomia entre teoria e prática na formação do pedagogo. A partir disso,
levantamos o seguinte problema: que concepção de teoria e prática fundamenta a formação
dos licenciados em pedagogia da UNEB e, em que medida, esta concepção apresenta
elementos para a análise e intervenção efetiva sobre a prática educativa com vias a superação
da histórica dicotomia entre teoria e prática? Assim, o objetivo desta pesquisa consiste em
analisar os fundamentos pedagógicos que orientam a concepção de teoria e prática no projeto
pedagógico e proposta curricular de formação de pedagogos da UNEB elaborados entre os
anos 2007-2008, buscando identificar as contradições e as possibilidades superadoras na
perspectiva da pedagogia histórico - crítica. Este estudo baseou-se na pesquisa bibliográfica
e documental a partir da referência do materialismo histórico dialético, tomando para a
análise documental, especificamente: o projeto político pedagógico e proposta curricular da
UNEB, os planos de ensino dos componentes PPP e PE, a Resolução CNE/CP 1/2006 e um
documento da ANFOPE enviado ao conselho nacional em 2004 sobre as DCN para o curso de
Pedagogia. Como resultado tem-se que foram identificadas quatro propostas de formação do
pedagogo: 1) a da ANFOPE na defesa da base comum nacional, na ampliação do trabalho
pedagógico para o âmbito não escolar e a integração numa mesma formação do bacharelado e
licenciatura, 2) a do grupo de Libâneo composto por Garrido e Franco, os quais defendem a
formação do pedagogo pesquisador com base na “teoria do professor reflexivo-pesquisador” e
em favor das especializações como forma de não reduzir a formação do pedagogo a docência,
3) a do Saviani em defesa da formação do professor e do especialista de forma conjugada no
educador, dando ênfase a pedagogia escolar e a necessidade de apropriação do conhecimento
científico, e, por fim, 4) a proposta do CNE homologada em 2006, a qual atende as posições
da ANFOPE determinando a docência como base da formação, ao mesmo tempo em que
amplia a função docente para a educação não escolar, e também a posição do Libâneo,
Garrido e Franco se fundamentando na pedagogia do professor reflexivo-pesquisador.
Identificamos a teoria do professor reflexivo-pesquisador como desdobramento do
escolanovismo de Dewey e Piaget, os quais buscaram a definição da Pedagogia como ciência
da educação na perspectiva interdisciplinar e pluralística com base na epistemologia da
prática. Assim, após a análise da proposta da UNEB concluímos que esta se fundamenta na
pedagogia do professor reflexivo-pesquisador, confirmando nossas hipóteses de que a relação
teoria e prática na formação do pedagogo na UNEB esta sendo entendida ora como mero
campo de aplicação da teoria na prática, ora como campo prático de construção do
conhecimento através da pesquisa sem a necessidade de transcender ao concreto-pensado,
portanto, sob a égide do professor reflexivo-pesquisador não há superação da dicotomia teoria
e prática, pois valoriza a prática em detrimento da apropriação do conhecimento científico.
Palavras-chave: Concepção de teoria e prática, Formação de pedagogo, Teoria do professor
reflexivo-pesquisador e Apropriação do conhecimento científico
ABSTRACT
The object of this research focuses on the relationship between theory and practice in the
formation of the teacher majoring in Education, developing a critical study of the “reflective
teacher-researcher theory” in the prospect of the Education Course at UNEB (Universidade
Estadual da Bahia) specifically through the syllabus components research and Pedagogical
Practice and Research and Training. These express themselves as possibilities of concreting
the relationship between theory and practice making the pedagogy student realize themselves
as potential reflexive researchers to different educational practices. This view of the reflective
teacher-researcher has been justified in initial teacher education as an innovation by making
the "criticism" to the traditional intellectualism and technicality, it points out to make the
educational practice the main reference for the production of knowledge, therefore, a
supposed solution to the historic dichotomy between theory and practice in pedagogy and
teacher formation. From this perspective, we raise the following issue: what conception of
theory and practical bases the training of graduate educational students in the UNEB and, to
what extent, this view has elements for analysis and effective intervention on educational
practice with ways to overcome the historical dichotomy between theory and practice? Thus,
the objective of this research is to examine the pedagogical rationale underlying the design
theory and practice in the syllabus and pedagogical training of teachers at UNEB prepared
between the years 2007-2008, aiming to identify the contradictions and the possibilities to
overcome into the perspective of historical-critical pedagogy. This study was based on
literature research and reference documents from the historical and dialectical
materialism, taking to the analysis of documents, specifically: the political pedagogical
project and the UNEB syllabus, the teaching plans of the PPP and EP components, the CNE /
CP 1 / 2006 and a document ANFOPE sent to the Brazilian National Council in 2004 on the
DCN for the Education Majoring Course. The result is that there are four proposals for
teacher training: 1) the ANFOPE in defense of common national base, the expansion of
educational work into the non-integration in one school and bachelor's degree and, 2) group
composed by Libâneo, Garrido and Franco, who advocate the formation of the teacher-
researcher based on the "theory of reflective teacher-researcher" and in favor of specialization
in order not to reduce the formation of the teacher to teaching, 3) Saviani‟s in defense of
teacher and specialist teacher in the conjugated form, emphasizing the need for pedagogy and
school appropriation of scientific knowledge, and finally, 4) the proposal approved by the
CNE in 2006, which covers the positions of ANFOPE determining teaching as the basis of
training, while it extends the teaching function for non-school education, and also the position
of Libâneo, Franco and Garrido basing themselves on the pedagogy of reflective teacher-
researcher. We identified the theory of reflective teacher-researcher as a consequence of the
New School of Dewey and Piaget, who sought the definition of pedagogy as a science of
education in a pluralistic and interdisciplinary perspective based on an epistemology of
practice, i.e., under the logic of forms. Thus, after examining the proposal of UNEB, we
conclude that it is based on the pedagogy of reflective teacher-researcher, confirming our
hypothesis that the relation between theory and practice in teacher training at UNEB is now
being understood as mere scope of the theory in practice, sometimes as a field of practice of
building knowledge through research without the need to transcend the concrete-thinking,
therefore, contrary to overcome the dichotomy between theory and practice, this training
under the aegis of the reflective teacher-researcher indeed reinforces it, thus it values practice
over the appropriation of scientific knowledge.
Keywords: Conception of theory and practice, Teacher formation, Pedagogy, Theory of
reflective teacher-researcher and Appropriation of scientific knowledge.
LISTA DE SIGLAS
ABE – Associação Brasileira de Educação
ANDE – Associação Nacional de Educação
ANFOPE – Associação Nacional de Formação e Profissionais da Educação
ANL – Aliança Nacional Libertadora
ANPED – Associação Nacional de Pós - graduação e Pesquisa em Educação
CNE – Conselho Nacional de Educação
CP – Conselho Pleno
CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade
DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais
FORUMDIR – Fórum de Diretores
GEPEL – Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação, Esporte e Lazer
IPES – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MEC – Ministério da Educação
PPP – Pesquisa e Prática Pedagógica
PE – Pesquisa e Estágio
SESU – Secretaria de Ensino Superior
UDF – Universidade do Distrito Federal
UNEB – Universidade do Estado da Bahia
UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
USP – Universidade de São Paulo
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Pesquisa e Prática Pedagógica I
QUADRO 2 – Pesquisa e Prática Pedagógica II
QUADRO 3 – Pesquisa e Prática Pedagógica III
QUADRO 4 – Pesquisa e Prática Pedagógica IV
QUADRO 5 – Pesquisa e Estágio I
QUADRO 6 – Pesquisa e Estágio II
QUADRO 7 – Pesquisa e Estágio III
QUADRO 8 – Síntese do Projeto Político Pedagógico da UNEB
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................ 14
2. A RELAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA NA PRODUÇÃO E
APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO NA SOCIEDADE CAPITALISTA.... 25
2.1 O trabalho como atividade fundamental para o desenvolvimento do gênero
humano................................................................................................................... 26
2.2 A divisão social do trabalho no desenvolvimento da sociedade capitalista .......... 32
2.3 A divisão do trabalho na sociedade capitalista e a cisão entre teoria e prática em
relação ao conhecimento científico ....................................................................... 37
2.4 Em busca de elementos da unidade teoria e prática .............................................. 46
2.5 A unidade teoria e prática: a prática como fundamento, fim e critério de verdade
do conhecimento científico.................................................................................... 50
3. A PEDAGOGIA COMO CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO A PARTIR DAS BASES
TEÓRICAS E HISTÓRICAS DA ESCOLA NOVA E SEU DESDOBRAMENTO
NA PEDAGOGIA DO PROFESSOR REFLEXIVO ............................................... 65
3.1 A ascensão e decadência ideológica da burguesia: a base histórica da educação
nova na ordem capitalista ............................................................................................ 66
3.2 A base teórica da Escola Nova e a Pedagogia com ênfase na epistemologia da
prática reflexiva ........................................................................................................... 71
3.2.1 O “pensamento reflexivo” em Dewey: a ênfase na experiência ................. 72
3.2.2 A redefinição da Pedagogia como ciência da educação ............................. 82
3.3 As pedagogias do “aprender a aprender” como renovação da Escola Nova ......... 88
3.4 A pedagogia como ciência da educação e seu respaldo na teoria do professor
reflexivo-pesquisador .................................................................................................. 92
4. A RELAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DO PEDAGOGO
NO BRASIL E O HEGEMÔNICO MOVIMENTO ESCOLANOVISTA ........... 104
4.1 A instituição da formação do pedagogo no espaço acadêmico no Brasil e os
determinantes teórico-históricos do escolanovismo .................................................. 105
4.1.1 A formação de pedagogos na perspectiva da Faculdade Nacional de
Filosofia............................................................................................................... 114
4.1.2 O currículo mínimo do curso de Pedagogia: dicotomia entre o bacharelado e
a licenciatura ...................................................................................................... 118
4.2 A formação do pedagogo especialista: entre a modernização conservadora e as
propostas de formação de pedagogos......................................................................... 122
4.2.1 Propostas de formação do pedagogo e a base comum nacional
............................................................................................................................. 130
4.2.2 A LDB 9.394/1996 e a reivindicação das Diretrizes Curriculares Nacionais
para o curso de Pedagogia ...................................................................................136
4.3 Sobre as DCN do curso de Pedagogia: debates e ambigüidades acerca da formação
do pedagogo .............................................................................................................. 137
4.3.1 O debate sobre as Diretrizes para a formação de pedagogos: continuidade
das posições divergentes .................................................................................... 138
4.3.2 Uma análise das DCN do curso de Pedagogia: a docência com base na
pedagogia do professor reflexivo-pesquisador ................................................... 146
5. A TEORIA E PRÁTICA NA PROPOSTA DE FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS
DA UNEB: UMA ANÁLISE DOS COMPONENTES CURRICULARES
PESQUISA E PRÁTICA PEDAGÓGICA E PESQUISA E ESTÁGIO............. 152
5.1 A teoria e prática na proposta do curso de Pedagogia da UNEB: a pesquisa como
elemento central na formação do licenciado em pedagogia ................................ 153
5.2 Os componentes curriculares PPP e PE: a prática como foco de pesquisa e a
necessidade de apropriação do conhecimento na formação do pedagogo........... 163
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ARTICULADAS ÀS CONTRIBUIÇÕES
SUPERADORAS DA PEDAGOGIA HISTÓRICO – CRÍTICA........................ 170
7. REFERENCIAL ...................................................................................................... 177
8. APÊNDICE .............................................................................................................. 187
Quadro 1 .....................................................................................................................188
Quadro 2 .....................................................................................................................190
Quadro 3 .....................................................................................................................193
Quadro 4 .....................................................................................................................195
Quadro 5 .....................................................................................................................198
Quadro 6 .....................................................................................................................200
Quadro 7 .....................................................................................................................202
Quadro 8 .....................................................................................................................205
9. ANEXOS .................................................................................................................. 207
Proposta Curricular da UNEB (2008).........................................................................208
O sentido da Pedagogia e o papel do pedagogo (Texto de Dermeval Saviani) .........209
Uma estratégia para a reformulação dos cursos de pedagogia e licenciatura: formar o
especialista e o professor no educador........................................................................210
14
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objeto de estudo “a relação teoria e prática na formação do
licenciado em pedagogia”. O interesse por tal objeto surgiu quando estava no período final da
graduação em pedagogia na Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Pois, neste momento
circulavam discussões teóricas e políticas subsidiadas em torno das estratégias de articulação
entre teoria e prática na reelaboração do currículo do curso de Pedagogia da mesma
instituição, na perspectiva de atendimento às Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso
de Pedagogia homologada em 2006. Dessa forma, no mestrado em educação recuperamos
esta discussão, buscando compreender teoricamente o que historicamente já havia sido
detectado como problema fundamental na formação do pedagogo, a dicotomia entre teoria e
prática, traduzida no atual contexto na escassez de aprofundamento teórico e ênfase nas
atividades práticas.
Mais especificamente, a delimitação do objeto de estudo ocorreu do entendimento de
que o problema da identidade do pedagogo em relação: 1) à dificuldade de definição do
campo de atuação prática, revelada em várias reconfigurações do curso de pedagogia; e 2) às
denominadas ciências da educação, por ocupar espaço quase que preponderante nos estudos
na área da educação, está estritamente conectado a dicotomia entre teoria e prática avigorada
pelo predomínio das pedagogias burguesas as quais ora fazem apologia ao verbalismo,
“teoria” sem prática, ora apologia ao ativismo, a “prática” sem teoria.
A “teoria” sem prática revelada a partir da ausência de conhecimentos teóricos
referentes, especificamente, à prática pedagógica, a qual desvalorizada se torna mero campo
de aplicação das teorias de outras áreas das ciências humanas e sociais sem conectividade
com os reais problemas e as necessidades das práticas educativas. E a “prática” sem teoria que
se desenvolve da necessidade de construir o conhecimento considerando a prática, no entanto,
a prática pedagógica sem ultrapassar as fronteiras do campo empírico.
Portanto, este estudo parte da necessidade de estarmos repensando a formação dos
licenciados em pedagogia não apenas pelo momento de reformulação curricular pós – DCN,
mas, principalmente, devido ao esvaziamento teórico na formação docente estabelecido pelo
predomínio das teorias pedagógicas de cunho pragmático e liberal, as quais no atual contexto
supervalorizam as práticas cotidianas e subjetivas no processo de apreensão da realidade
estimulando uma autoformação.
15
A discussão sobre a relação teoria e prática na formação de professores tem ocupado um
espaço de preocupação ao longo dos anos. Uma vez que a separação entre teoria e prática se
configura historicamente definida na divisão social do trabalho com o desenvolvimento da
sociedade capitalista e, portanto, da apropriação privada dos meios de produção pela classe
dominante (MARX, 1998, 2004b; MARKUS, 1974; VAZQUEZ, 2007).
Este espaço de preocupação tem se ampliado a partir da divulgação no atual contexto da
sociedade capitalista de uma diversidade de pedagogias que, segundo Duarte (2003a), assume
novas roupagens de acordo com as formas específicas do capital no tempo e espaço, mas que,
em sua essência, correspondem ao ideário escolanovista. Este ideário que se fundamenta na
concepção pragmática e liberal, a qual circunscreve o pensamento aos limites da utilidade da
ação em defensa da mínima apropriação dos conhecimentos científicos, e que é a expressão da
burguesia industrial em decadência ideológica, para qual a influência iluminista já não
determinava mais os rumos da educação (EIDT, 2009; ARCE, 2001).
Desse modo, este trabalho insere-se num contexto demarcado pelo predomínio das
pedagogias referentes ao ideário escolanovista denominadas pedagogias do “aprender a
aprender” 1 por caracterizarem uma formação pautada numa “constante e infatigável
adaptação à sociedade regida pelo capital” (DUARTE, 2003a, p. 11). Estas pedagogias do
“aprender a aprender” determinam um esvaziamento do conhecimento científico na formação
e no trabalho do professor (FACCI, 2004), nos colocando o desafio da crítica radical 2 e, por
conseguinte, da luta pela superação das imposições da sociedade capitalista.
Nas últimas décadas a formação de professores tem sido fundamentada nas pedagogias
do “aprender a aprender”, dentre elas, na pedagogia do professor reflexivo com a intenção de
formar no professor o pesquisador permanente das práticas educativas. Este paradigma do
professor reflexivo-pesquisador tem se justificado no espaço acadêmico como uma inovação
por fazer a “crítica” ao intelectualismo acadêmico e ao tecnicismo, e por tomar a prática
educativa como o principal referencial para a produção do conhecimento, portanto, uma
suposta “dissolução” do histórico problema da separação entre teoria e prática, considerando
que nas formas clássicas da educação se tinha “muita teoria e pouca prática”.
1 “Pedagogias do aprender a aprender” denominadas por Newton Duarte (2003a) as quais integram a Pedagogia
das competências, pedagogia do professor reflexivo, pedagogia de projetos, construtivismo e a pedagogia
multiculturalista. 2 A crítica em Marx é uma crítica radical, que tem como centro, como raiz o homem; crítica que responde a uma
necessidade radical, “ser radical – diz Marx – é atacar o problema pela raiz. E a raiz para o homem é o próprio
homem” (apud VÁZQUEZ, 2007, p. 117). Portanto, não se trata aqui da crítica como mera crítica do real, e sim,
a crítica como condicionada pela necessidade de uma mudança da realidade.
16
Esta perspectiva do professor reflexivo ou professor pesquisador tem seu fundamento na
Escola Nova (DUARTE, 2007; FACCI, 2004; EIDT, 2009), a qual vem acompanhando o
curso de Pedagogia no Brasil desde a sua instituição no espaço acadêmico no final dos anos
1930. Pois, como afirma Saviani (2008a, p. 97), a difusão das ideias novas coincide com o
advento da pedagogia no espaço acadêmico, sendo o curso de Pedagogia, em grande parte,
tributário dessa difusão. Dessa forma, o curso de Pedagogia apresenta como problema
fundamental a tradicional dicotomia entre teoria e prática (SAVIANI, 2007).
Apesar de no final da década de 1970, a Pedagogia Histórico-Crítica começar a ser
construída no sentido de superar a dicotomia entre teoria e prática, este problema continua
persistindo na formação do pedagogo. A Pedagogia Histórico-Crítica é uma teoria pedagógica
crítica3 de base marxista que busca formular teoricamente possibilidades de intervenção na
prática educativa de forma a torná-la o ponto de partida e chegada para que a teoria
pedagógica possa se estruturar a partir e em função da prática educativa.
Em relação à Pedagogia Histórico-Crítica, Duarte (1999, p. 09) avalia que tem existido
“uma lacuna entre as contribuições que ela tem em áreas como Filosofia da Educação,
História da Educação e Sociologia da Educação e a construção de propostas pedagógicas
concretas que incorporem essas contribuições”. Para ele, este problema teve origem nas
polêmicas travadas pelos educadores; uma contra a neutralidade política, ao que hoje se
tornou senso comum afirmar a educação como um ato político, outra em relação ao crítico-
reprodutivismo4 (idem, p. 09-10). Nesse sentido, Duarte (1999) ainda afirma que houve um
desenvolvimento lento da Pedagogia Histórico - Crítica o que possibilitou certo avanço de
correntes pedagógicas não fundamentadas na concepção histórico-social e, em consequência
disso, a ausência de um corpo teórico mediador entre o âmbito dos fundamentos da educação
e o âmbito dos estudos sobre a prática educativa.
No que se refere à tendência crítica da educação, Brzezinski (1996, p. 43) afirma que
tanto a tradição liberal, tecnicista da educação, quanto a tendência crítica reduziram a
Pedagogia “a uma área profissionalizante, descomprometida com a produção do
3 Segundo Duarte (1999, p. 08), denomina teorias educacionais críticas todas aquelas que, partindo da visão de
que a sociedade atual se estrutura sobre as relações de dominação, preconizam a necessidade de superação desta
sociedade. Embora apresentarem esse ponto em comum, existem grandes e fundamentais pontos de divergências
em relação ao papel da educação em sua reprodução e sobre a contribuição dela para a superação das relações de
dominação, por exemplo, as teorias crítico-reprodutivistas que não apresentam proposta pedagógica na medida
em que, para elas, a ação pedagógica não poderia deixar de reproduzir as relações de dominação. 4 Teorias crítico reprodutivista denominada por Saviani (2005, p. 258) pelo entendimento de que são teorias
efetivamente críticas, mas que chegam invariavelmente à conclusão de que a função da educação consiste na
reprodução da sociedade em que se insere. Além disso, “se propõem a explicar o fenômeno educativo, sem a
pretensão de orientar a prática pedagógica. Podemos dizer que são teorias sobre educação e não teorias da
educação” (2005, p. 258, grifos do autor).
17
conhecimento, isto é, descartou-se a elaboração da teoria para enfatizar a prática, [...] o
engajamento prático na organização coletiva”.
Nesse sentido, Saviani (2008a; 2008b) explicita o quanto o curso de Pedagogia no
Brasil sempre esteve atrelado ao pensamento da concepção pragmática e escolanovista, a qual
dificultou a compreensão da Pedagogia como ciência teórica e prática da educação, ou seja,
de uma definição do curso de Pedagogia no Brasil. Assim, na década de 1990 se travava um
debate nacional de reivindicação por uma definição do curso de Pedagogia por meio das
Diretrizes Curriculares Nacionais, sendo entre os anos 2005 e 2006 homologados, pelo
Conselho Nacional da Educação, os Pareceres do CNE/CP n. 5/2005 e n. 3/2006, e, por fim, a
Resolução CNE/CP n. 1/2006, os quais determinaram a formação do pedagogo com base na
docência, “definindo” o campo de atuação profissional e o papel das ciências da educação.
Mas, qual o conceito de docência hegemônico nas propostas? A docência do professor
reflexivo-pesquisador como solução da histórica dicotomia entre teoria e prática?
Depois da homologação das Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Pedagogia
em 2006, o Ministério da Educação por meio da Secretaria de Educação Superior – SESU
orientou as Instituições pertencentes ao Sistema Federal de Ensino Superior a cumprirem as
Diretrizes Curriculares Nacionais, assim, as faculdades de educação de todo país deveria
realizar nova reformulação curricular do curso de Pedagogia.
Dessa forma, a Universidade do Estado da Bahia – UNEB elaborou novo projeto e
proposta curricular a partir de alguns elementos norteadores, dentre eles: a pesquisa como
elemento constitutivo da formação para a práxis pedagógica e, com efeito, a
indissociabilidade entre teoria e prática (UNEB, 2008, p. 37). No projeto5 do curso de
Pedagogia da UNEB esta tentativa de indissociabilidade entre teoria e prática se expressa nos
componentes curriculares: Pesquisa e Prática Pedagógica e Pesquisa e Estágio, como
possibilidade do estudante de Pedagogia se perceber como potencias pesquisadores das
diferentes práticas educacionais no sentido de transformar a realidade (idem, p. 70-72).
Diante disso, levantamos o seguinte problema de pesquisa por meio da questão: que
concepção de teoria e prática fundamenta a formação dos licenciados em pedagogia da
5 Projeto referente a todos os Campi da UNEB que oferece o curso de Pedagogia, com exceção do Campus I,
com sede em Salvador, e do Campus III em Juazeiro, devido às divergências de ideias no processo de construção
curricular estes Campi não adotaram o projeto de 2008 (Informação da Pró-reitoria de graduação). Contudo, é
necessário esclarecer que o projeto em questão, o qual será analisado é o referido acima no texto, embora o
Projeto do Campus I seja também visitado, já que utilizam a proposta de 2004 que, inclusive, já ofereciam os
componentes PPP e PE, e até mesmo para compreendermos como é possível a existência de dois projetos ou
mais “distintos” de um determinado curso numa mesma Universidade. O Projeto que pretendemos analisar tem
como elementos norteadores: a indissociação da teoria e prática, a prática da interdisciplinaridade, a pesquisa na
formação para a práxis pedagógica, consideração das especificidades, etc.
18
UNEB e, em que medida, esta concepção apresenta elementos para a análise e
intervenção efetiva sobre a prática educativa com vias a superação da histórica
dicotomia entre teoria e prática?
Vale ressaltar que a intenção de pesquisa na Universidade do Estado da Bahia – UNEB
se deve ao fato desta ser uma das maiores instituições de Ensino Superior, uma das
instituições responsável pela formação de pedagogos em todo o Estado, possuindo vinte
quatro campi espalhados por toda Bahia, sendo que doze campi ofertam vagas para o curso de
Pedagogia. Além disso, por ser a universidade a qual me formei pedagoga, e que durante a
minha formação já se discutia problemas relacionados ao esvaziamento teórico, o que me
motivou a acompanhar o processo de discussão das DCN e de algumas das reformulações
curriculares do curso de Pedagogia da referente instituição em 2004 e 2007.
Então, para problematizar, ainda mais a questão-problema, perguntamos: 1) as
proposições teóricas que fundamentam a relação teoria e prática no currículo de formação de
pedagogos da UNEB apontam para o esvaziamento ou para um aprofundamento do
conhecimento científico na formação? 2) a tendência da formação sobre a base da pedagogia
do professor reflexivo ou professor pesquisador, tendo por base a filosofia pragmática, conduz
a que entendimento da relação teoria e prática no âmbito da educação? 3) quais as
conseqüências desta opção para a formação do Pedagogo diante das relações sociais de
exploração e da crise da função social da escola em suas formas clássicas? 4) Quais as
contribuições da pedagogia histórico – crítica para a superação da separação teoria e prática?
Nossa hipótese é a de que os fundamentos da pedagogia do professor reflexivo-
pesquisador na orientação das Diretrizes Curriculares Nacionais são assimilados pela UNEB
como uma real possibilidade de solução da dicotomia teoria e prática; a qual distende a
compreender a relação teoria e prática como: de um lado, a construção do conhecimento
científico na experiência empírica ou mera descrição do fenômeno; de outro lado, devido ao
objetivo interdisciplinar no sentido de utilizar as contribuições das disciplinas, direcionarem
estas contribuições à mera aplicação, isto é, justaposição da teoria na pesquisa e na prática
pedagógica, sem estabelecer relação desta com os reais problemas e necessidades educativas
numa sociedade regida pelo capital, sem analisar os limites e as possibilidades que esta
sociedade estabelece.
Desta hipótese, tomaremos como objetivo central desta pesquisa a análise dos
fundamentos pedagógicos que orientam a concepção de teoria e prática no projeto
pedagógico e proposta curricular de formação de Pedagogos da UNEB elaborados entre
19
os anos 2007-2008, buscando as suas contradições e as possibilidades superadoras na
perspectiva da pedagogia histórico - crítica.
E no sentido de alcançar os propósitos da pesquisa, desdobramos os seguintes objetivos
específicos: 1) Investigar a dicotomia entre teoria e prática no processo de desenvolvimento
da sociedade capitalista, bem como a unidade teoria e prática na acepção marxista; 2) Analisar
as bases históricas e teóricas da Escola Nova, sua renovação nas pedagogias do “aprender a
aprender”, especificamente na pedagogia do professor reflexivo-pesquisador, e suas
influências na definição da pedagogia como ciência da educação com base na epistemologia
da prática; 3) Evidenciar a dicotomia entre teoria e prática no curso de Pedagogia a partir dos
determinantes sócio-históricos, das pedagogias hegemônicas6 e das políticas oficiais que
demarcaram reconfiguração na formação do pedagogo; 4) Analisar na proposta de formação
de pedagogos da UNEB, e mais especificamente na análise dos componentes PPP e PE, a
concepção de teoria e prática conferida, a partir dos seus objetivos, metodologias, conteúdo e
referenciais bibliográficos expostos nos planos de ensinos dos mencionados componentes; e
5) Buscar as contribuições da pedagogia histórico - crítica para a superação da dicotomia
entre teoria e prática, bem como para a definição da Pedagogia e da formação dos licenciados
em pedagogia.
O projeto pedagógico e a proposta curricular caracterizam uma objetivação, isto é, um
produto da atividade teórica e prática; prática na medida em que foi construída pelos docentes,
no sentido de delinear um conjunto de atos, portanto, uma ação mediata; teórica na medida em
que esta ação é consciente, deliberada, resultado de um processo de discussões teóricas as
quais buscaram fundamentar e orientar as práticas pedagógicas de acordo fins. Como afirma
Marx, o produto não pode existir em si e por si, mas sim como resultado da atividade dos
sujeitos, como objetivação dos próprios sujeitos.
A prática como atividade que é, implica também uma relação na qual o
objeto só existe como produto real da atividade prática, real, sensível. [...]
Nela o objeto não pode ser captado como meramente contemplado, como
objeto que existe em si e por si, à margem ou posição abstrata com respeito
ao sujeito; há de ser captado subjetivamente, isto é, como objetivação do
sujeito (MARX apud VAZQUEZ, 2007, p. 92).
6 Para Gramsci, o conceito de hegemonia caracteriza o domínio cultural- ideológico de uma determinada classe
sobre as outras. As formas históricas da hegemonia variam conforme a natureza das forças sociais que a
exercem. Para ele, o conceito de hegemonia representa “a supremacia de um grupo social que se manifesta de
dois modos: como domínio e como direção intelectual e moral. Um grupo social pode e, aliás, deve ser dirigente
já antes de conquistar o poder governamental; depois, quando exerce o poder e mesmo se o mantém fortemente
nas mãos, torna-se dominante, mas deve continuar a ser também „dirigente‟ (GRAMSCI, 2002, p. 62-63,
parágrafo 24).
20
Dessa assertiva, o projeto político-pedagógico e a proposta curricular representam
uma totalidade de acordo com um determinado contexto e grupo de sujeitos, além do mais
possuem uma riqueza de informações que se podem interpretar e analisar de forma mediata.
Embora seja o resultado de um processo de discussões teóricas, estes documentos estão
condicionados, expressa à materialização das ideias dominantes, que agora objetivadas estão
sendo desenvolvidas em outra etapa que é a prática pedagógica do professor em sala de aula.
Porém, não se trata de dois planos distintos que se unem, mas de dois aspectos intimamente
entrelaçados de um mesmo processo que é a própria atividade subjetiva e objetiva do
professor.
O desdobramento da proposta curricular do curso de Pedagogia da UNEB corresponde,
através das intervenções práticas dos sujeitos, a outra etapa que gera novas objetivações, pois
o produto não é acabado e imutável; possui uma dinâmica em relação aos fins traçados os
quais no desdobrar da prática docente pode reiterar ou modificá-los, porém modificá-los não
completamente porque os objetivos que se quer atingir são inseparáveis da prática subjetiva-
individual do professor em aula, esta que se ajusta mutuamente em maior ou menor proporção
ao produto objetivo, real, neste caso, ao projeto e a proposta curricular.
Os planos de trabalho dos professores fazem parte deste desdobramento. Por isso,
também tomaremos para a análise a fim de identificar os objetivos, os conteúdos e
metodologias; os planos de trabalho referente aos Componentes: Pesquisa e Prática
pedagógica e Pesquisa e Estágio, estes visto que se anuncia, na proposta curricular da UNEB,
como base para a produção científica no campo pedagógico em vista a transformação da
realidade, portanto, uma possibilidade de articulação entre teoria e prática.
No entanto, vale ressaltar que não nos interessa neste trabalho verificarmos na prática
docente pós-proposta curricular se a teoria está sendo aplicada ou não na prática cotidiana dos
docentes da UNEB, não se trata de verificarmos se existe resistência ou de capturar as
perspectivas dos docentes e estudantes em relação à teoria e prática estabelecida, mas sim de
analisar os fundamentos pedagógicos da concepção de teoria e prática atribuída na proposta
curricular do curso de Pedagogia da UNEB de modo, portanto, mediato.
Interessa-nos saber quais referenciais fundamentam a relação teoria e prática. A partir
disso, como se organizam os conteúdos e as atividades dos componentes mencionados, e na
proposta curricular de acordo as bases teóricas, para poder compreender se o projeto do curso
possibilita ou não a apropriação do conhecimento científico no campo pedagógico numa
perspectiva histórica superadora.
21
Sobre o método de pesquisa
Para desenvolver este trabalho de pesquisa, no sentido de encontrar os nexos, as
relações e contradições impostas à formação do pedagogo no atual contexto contemporâneo,
optamos por trabalhar numa perspectiva crítica, utilizando um método que considere o
movimento do real e das possibilidades de apreensão do objeto de estudo nas dimensões
teóricas e práticas, ou seja, que passe do empírico ao concreto; portanto, o método
materialista dialético histórico7.
A perspectiva do método escolhido se refere à visão materialista na qual as ideias são
resultados da relação do homem com a natureza e dos homens entre si. Ao contrário da visão
idealista de abordagens eclética, pluralista, empiricista da realidade, a visão materialista
dialético histórico busca as necessidades e as contradições na vida em sociedade, como afirma
Marx (1998, p. 27) “não é a consciência que determina a vida, mas a vida é que determina a
consciência”.
O pesquisador que se propõe a realizar uma pesquisa com base no método materialista
dialético histórico implica mais do que optar por um método de pesquisa. Pois, segundo
Frigotto (2001, p. 74-83), o materialismo dialético histórico, além de um método de pesquisa
científica, é uma práxis8, unidade entre teoria e prática no sentido de uma transformação da
realidade; e também uma postura, isto é, uma concepção de mundo.
Assim, a escolha do método baseia-se naquele que melhor permite o desvendamento da
realidade aparente, isto é, para além do fenômeno no sentido da elaboração do conhecimento
que busca na crítica radical a compreensão da realidade como síntese de múltiplas
determinações; a apropriação da realidade concreta, nos permitindo sair de uma interpretação
caótica em direção do concreto pensado, de visão sintética da realidade.
O concreto é a unidade do diverso, por isso, “aparece no pensamento como processo da
síntese, como resultado, não como ponto de partida, embora seja o verdadeiro ponto de
partida” (MARX, 2007, p. 256), o concreto é o ponto de partida e chegada, o concreto como
7 “O marxismo dispensa a adoção das abordagens qualitativas na legitimação da cientificidade de seus métodos
de investigação, pois dispõe de uma epistemologia suficientemente elaborada para o fazer científico: a
epistemologia materialista histórico dialética” (MARTINS, s/d, p. 02). Pois, segundo a autora, ao fato de conferir
tamanha importância ao mundo empírico, os modelos qualitativos acabam por preterir a análise empírica
fetichizada da sociedade capitalista, aprisionando o pesquisador ao mundo empírico, ao imediato. A autora
ressalta ainda que as mediações históricas para a construção do conhecimento só podem ser reconhecida à luz
das abstrações do pensamento (idem, p. 09). 8 “Inclinamo-nos pelo termo práxis para designar a atividade consciente objetiva, sem que, por outro lado, seja
concebida como caráter estritamente utilitário que se infere do significado do prático na linguagem comum”
(VÁZQUEZ, 2007, p. 28).
22
ponto de partida possui uma visão sincrética, confusa da realidade, que ao passar pelas
abstrações se torna o concreto pensado, uma visão clara e objetiva da realidade.
O conhecimento não se produz, portanto, a partir de um simples reflexo do
fenômeno, tal como este aparece para o homem; o conhecimento tem que
desvendar, no fenômeno, aquilo que lhe é constitutivo e que é em princípio
obscuro; o método para a produção desse conhecimento assume, assim, um
caráter fundamental: deve permitir tal desvendamento, deve permitir que se
descubra por trás da aparência o fenômeno tal como é realmente, e mais, o
que determina, inclusive, que ele apareça da forma como o faz (ANDERY e
SÉRIO, 2001, p. 413).
Desse modo, utilizaremos a categoria da totalidade; apreensão dos fenômenos que são
externos ao ser humano a partir das relações e conexões em busca do movimento do real. A
“totalidade concreta, como totalidade de pensamento, como uma concreção de pensamento, é,
na realidade, produto do pensar, do conceber; [...] é elaboração da intuição e da representação
em conceitos” (MARX, 2007, p.257).
Os elementos particulares constitutivos de uma relação só podem se tornar
compreensíveis se analisados dentro de uma totalidade. A compreensão
dessa totalidade, por outro lado, não pode prescindir da análise de suas
partes e da análise de como se relacionam nesse todo. Quaisquer desses dois
aspectos implicariam, se desprezados, uma necessária apreensão inadequada
do real. [...] Obviamente, o desvendar de um fenômeno inserido numa
totalidade é tarefa que não se cumpre simplesmente. Implica um longo
trabalho de investigação que passa pela análise do fenômeno e de suas
determinações para; a partir dessa análise, se recompor o fenômeno, agora,
já descobertas essas determinações. Nesse processo, o sujeito do
conhecimento parte do concreto e, com sua análise, reconstrói o fenômeno
no pensamento, descobrindo suas determinações e, portanto, reconstruindo-o
como fenômeno abstrato; torna-se, então, necessário reinseri-lo em sua
realidade e em sua totalidade, reproduzindo-o como concreto, um concreto
que, agora, é um produto do trabalho do conhecimento humano e, portanto,
um concreto pensado (ANDERY; SÉRO, 2001, p. 418-419)
No processo de apreensão da realidade através das suas múltiplas determinações, as
contradições ficam latentes, porque o movimento do real em si é contraditório, por isso, outra
categoria fundamental do método que utilizaremos é a contradição. Cheptulin (1982) afirma
que a contradição indica que existe um embate permanente entre as ideologias e as utopias na
sociedade entre as classes que a compõem; a “luta dos contrários”.
Portanto, o materialismo H-D “busca é descobrir a contradição contida nos fenômenos,
seus elementos antagônicos e o movimento que leva à sua solução, à negação da negação”
(ANDERY; SÉRIO, 2001, p. 411), assim sendo, quando há contradição, há possibilidade de
superação. Segundo Gramsci (1991, p. 47) “a possibilidade não é a realidade, mas é também
23
ela, uma realidade: que o homem possa ou não possa fazer determinada coisa, isto tem
importância na valorização daquilo que realmente se faz”.
Para Cheptulin (1982) realidade e possibilidade são duas categorias importantes que
indica o já realizado e o em potencial para se realizar. Portanto, acreditamos ser necessário
pontuar de uma direção à outra: da crítica do modo de produção capitalista e sua forma que
determina a formação de pedagogos no atual contexto; em direção de uma afirmativa, a partir
de estudos já traçados da Pedagogia como campo teórico e prático da educação, as
possibilidades de transformação da realidade educacional e social através da apropriação do
conhecimento no sentido da ação, isto é, da práxis revolucionária9.
Do ponto de vista do materialismo dialético histórico, Cheptulin (1982, p. 341) enfatiza
a transformação da possibilidade em realidade, possibilidades que tem diferentes aspectos e
determinados alcances na prática, portanto, possibilidades concretas e abstratas.
Uma possibilidade concreta é a possibilidade para cuja realização pode ser
reunida, no momento presente, as condições correspondentes; a
possibilidade abstrata é uma possibilidade para cuja realização não há, no
momento presente, condições necessárias. Para que esta última se realize, a
formação material que a contém deve transpor vários estágios de
desenvolvimento. (CHEPTULIN, 1982, p. 342).
Além das categorias metodológicas já traçadas, precisamos definir as categorias de
conteúdo a qual se refere ao particular, ao material bibliográfico levantado relacionado ao
objeto de pesquisa em questão. Kuenzer (1998, p. 64-66) diferencia estes dois tipos de
categorias: as categorias metodológicas – as categorias do próprio método dialético histórico,
as quais deverão dar suporte à relação pesquisador-objeto de pesquisa durante todo o
desenrolar do trabalho, iluminando todos os procedimentos; e as categorias de conteúdo –
enquanto particular, é expressão do universal aplicada ao particular. São recortes
particulares10
que são sempre definidos a partir do objeto e da finalidade da investigação.
A partir disso, elencamos as seguintes categorias de conteúdo: a concepção da formação
de pedagogos e concepção de teoria e prática, as quais não são compreendidas de maneira
isolada e são definidas a partir dos objetivos traçados.
9 Vázquez afirma que a práxis revolucionária é entendida Por Lênin a partir de Marx e Engels como a unidade
entre teoria e prática, entre socialismo e ciência. “A práxis revolucionária exige a superação do ponto de vista
natural, imediato, adotado pela consciência comum do proletário. Daí a necessidade - determinada ao mesmo
tempo por motivos teóricos – práticos – de contrapor uma clara compreensão práxis à concepção ingênua ou
espontânea dela” (2007 p. 30-31) 10
“A tensão entre o singular e universal se manifesta na configuração particular do fenômeno: o específico
(singular) e o geral (universal) não podem ser compreendidos de modo isolado e por si mesmos” (MARTINS,
s/d, p. 12).
24
Este estudo caracteriza-se bibliográfico e documental 11
, tomando como fontes para o
desenvolvimento da pesquisa os referenciais teóricos e os documentos oficiais. Segundo
Minayo (1999, p. 97-98) a pesquisa bibliográfica busca vários pontos de vista, dos diferentes
ângulos do problema que permitam estabelecer definições, conexões e mediações, enfatiza,
ainda, que numa pesquisa bibliográfica devemos destacar as categorias centrais, os conceitos,
os pressupostos teóricos e as razões práticas que subjazem aos trabalhos que consultamos. Os
documentos são também pontos de vista, porém, em relação à política se torna um ponto de
vista dominante, que corresponde à objetivação de um plano que será colocado em ação.
Além dos documentos referentes ao campo da pesquisa, o Projeto Político Pedagógico
e a Proposta Curricular do curso de Pedagogia da UNEB e os Planos de trabalho dos
professores das disciplinas Pesquisa e Prática Pedagógica e Pesquisa e Estágio. São os
documentos oficiais que serão utilizados na pesquisa: Resolução CNE/CP n. 01 e 02 de
2002; Resolução CNE/CP n. 01/2006; LDB 9394/1996; um documento da ANFOPE
relacionado às Diretrizes Curriculares enviado ao CNE em 2004; a escolha da ANFOPE
baseou-se na sua trajetória história de discussão e na capacidade de articular apoio a suas
propostas.
Diante disso, estruturamos o trabalho em quatro capítulos: o primeiro discute a
dicotomia teoria e prática na sociedade capitalista como resultado do processo de divisão do
trabalho e apropriação privada do conhecimento, bem como a unidade teoria e prática na
perspectiva marxista; no segundo, as análises históricas e teóricas da Escola Nova e seus
desdobramentos na pedagogia do professor pesquisador ou reflexivo, em busca de elementos
que influenciaram a concepção da Pedagogia como ciência da educação com base na
epistemologia da prática.
No terceiro capítulo, discutiremos a dicotomia da teoria e prática no curso de
Pedagogia, a partir dos determinantes sócio-históricos, dos fundamentos das pedagogias
hegemônicas traduzidas como extensão do escolanovismo da década 1930 e das políticas
oficiais que demarcaram reconfigurações na formação de pedagogos nos diferentes contextos.
E, por fim, o quarto capítulo, sobre o curso de Pedagogia da UNEB, uma análise da
concepção de teoria e prática estabelecida no projeto político pedagógico, proposta curricular
e nos planos de trabalho dos professores das disciplinas específicas, PPP e PE, as quais
correspondem ao anúncio da efetividade da relação indissociável entre teoria e prática.
11
A pesquisa documental é muito próxima da pesquisa bibliográfica. O elemento diferenciador está na natureza
das fontes: a pesquisa bibliográfica remete para as contribuições de diferentes autores sobre o tema, atentando
para as fontes secundárias, enquanto a pesquisa documental recorre a materiais que ainda não receberam
tratamento analítico, ou seja, fontes primárias (ALMEIDA; GUINDANI; SÁ-SILVA, 2009, p. 05).
25
2. A RELAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA NA PRODUÇÃO E APROPRIAÇÃO DO
CONHECIMENTO NA SOCIEDADE CAPITALISTA
Mas se procurásseis concluir disso que se pode ser
comunista sem ter assimilado o tesouro de
conhecimentos acumulados pela humanidade,
cometeríeis um erro grosseiro. Seria errado pensar
que basta saber as palavras de ordem comunistas,
as conclusões da ciência comunista, sem adquirir a
soma de conhecimentos dos quais o comunismo é
conseqüência.
Lenine.
Este capítulo tem por objetivo analisar o processo de dicotomia entre teoria e prática
estabelecida pela divisão social do trabalho na constituição da sociedade capitalista, bem
como sua unidade específica em relação à atividade humana; por isso, também pretendemos
abordar a acepção marxista a qual busca unidade teoria-prática no sentido da transformação
da sociedade regida pelo capital (MARX, 1998).
Segundo Markus (1974b, p. 83), divisão do trabalho significa a divisão e distribuição do
trabalho social total entre os indivíduos. A divisão do trabalho só se produz quando alcançado
um determinado estágio de desenvolvimento das forças produtivas. No período da “pré-
história”, contudo, a divisão social do trabalho nasce e existe só na forma de divisão social
espontânea do trabalho. Portanto, procuraremos analisar a divisão social do trabalho a partir
do processo de desenvolvimento até a consolidação da sociedade capitalista.
Em outras palavras, este capítulo procura demonstrar tanto a divisão social do trabalho
na sociedade capitalista que gera dicotomia entre teoria e prática e a apropriação privada do
conhecimento, quanto à posição teórica marxista que fundamenta nossas análises, colocando-
a como alternativa superadora e contra a ofensiva das concepções burguesas predominantes.
Assim, antes de iniciarmos a discussão da problemática dicotomia entre teoria e prática
gerada pela divisão social do trabalho no processo de desenvolvimento da sociedade
capitalista, bem como, a partir das contradições identificadas também examinar os elementos
da unidade teórica e prática que possibilitam a sua superação, pretendemos compreender
mediante o duplo sentido do trabalho em Marx, a concepção do trabalho como categoria
fundamental para o desenvolvimento do gênero humano.
26
2.1 O Trabalho como Atividade Fundamental para o Desenvolvimento do Gênero
Humano
Para Marx (2004b, p. 211), o trabalho tem um duplo sentido: se na sociedade capitalista
o trabalho se encontra dividido, por outro lado, o trabalho indica a atividade do homem, é “o
processo em que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu
intercâmbio material com a natureza [...] atuando assim sobre a natureza externa e
modificando-a, ao mesmo tempo em que modifica sua própria natureza”. Portanto, é a partir
desse sentido positivo ontológico do trabalho em Marx que nos esforçaremos na compreensão
do significado do trabalho12
como categoria fundamental para o desenvolvimento do homem.
O trabalho criou o próprio homem e também a sua consciência. O trabalho é a base da
transformação material da natureza, todavia, “é o alargamento do domínio do consciente ao
qual conduz necessariamente o desenvolvimento do trabalho” (LEONTIEV, 1978, p. 102).
Foram três elementos que conjuntamente constituíram as condições principais para o
desenvolvimento do trabalho: 1) com o trabalho o homem foi se desenvolvendo
organicamente, isto possibilitou à execução de operações complexas do trabalho; 2)
igualmente ao aparecimento do trabalho, com efeito, o viver em grupo, o apresentar formas
suficientemente desenvolvidas de vida em comum; e 3) a existência de formas muito
desenvolvidas de reflexo da realidade (a consciência) nos representantes superiores do mundo
animal (LEONTIEV, 1978, p. 73-74).
Estes elementos preconizaram a possibilidade de alargamento do domínio do
consciente. Isso significa que o trabalho não modifica apenas a estrutura geral da atividade
humana, o conteúdo da atividade e do objeto que se produz na atividade também sofre
transformações qualitativas no processo de trabalho. Pois, com o surgimento dos instrumentos
de trabalho, que são os objetos com os quais se realiza uma ação, aparece o conteúdo do
objeto que corresponde a sua natureza biofísica e social; deste modo, para o fabrico deste
instrumento faz-se necessário a apropriação13
desse conteúdo. Contudo, o resultado real que
se quer obter existe primeiro idealmente, como produto da consciência, uma antecipação do
objeto na consciência, porém isso não significa que o resultado obtido seja uma duplicação
12
Não se trata de uma categoria que ambicionamos discutir em profundidade, dadas algumas polêmicas no atual
contexto, colocadas por Ivo Tonet, Sérgio Lessa, etc., com base nos estudos em Lukács. O referido grupo
questiona o trabalho como princípio educativo, bem como divergem da defesa de considerar a educação um
trabalho. 13
Para Leontiev (1978, p. 270) apropriação é “um processo de reprodução, nas propriedades do indivíduo, das
propriedades e aptidões historicamente formadas da espécie humana”.
27
real do modelo ideal, ao imprimir do ideal ao real o resultado real assemelha-se ao ideal, mas
nunca é idêntico (VAZQUEZ, 2007, p. 221).
Assim, os objetos e os conteúdos se expandem incessantemente de forma qualitativa e
quantitativa, surgindo novas formas de fabricação e novos objetos e conteúdos. O conteúdo do
objeto concreto está nas formas de fabricação e de uso nas atividades e relações de trabalho,
por isso, o conteúdo também é um produto da atividade humana, o fim consciente que precisa
ser apropriado.
Este resultado possui um conteúdo objetivo, portanto, a apropriação não somente do
objeto, mas também dos meios de fabricação e do uso do objeto, isto é, as propriedades físicas
e sociais dos instrumentos. São elementos dos instrumentos: 1) o instrumento não é apenas
um objeto de propriedades físicas determinadas, é também um objeto social, possui certo
modo de emprego no trabalho coletivo; e 2) o instrumento não responde ao único fim de uma
ação concreta, o mesmo instrumento pode responder a diferentes fins, sendo, portanto,
portador de abstração e generalização consciente e racional (LEONTIEV, 1978, p. 81-82).
Ainda sobre o instrumento, Duarte (2001) menciona a passagem do objeto enquanto
estritamente natural para uma função social a partir do domínio em si do objeto:
Um instrumento é não apenas algo que o homem utiliza em sua ação, mas
algo que passa a ter uma função que não possuía como objeto estritamente
natural, uma função cuja significação é dada pela atividade social. O
instrumento é, portanto, de início, um conjunto de elementos puramente
naturais, resultantes de forças da natureza, que, ao passar pela transformação
resultante da atividade humana, adquire o significado objetivo de constituir-
se em meio para o alcance de determinadas finalidades no interior da prática
social. O homem cria novo significado para o objeto. Mas essa criação não
se realiza de forma arbitrária. Em primeiro lugar porque o homem precisa
conhecer a natureza do objeto para poder adequá-lo às suas finalidades. Para
que o objeto possa ser transformado e inserido na “lógica” da atividade
humana, é preciso que o homem se aproprie de sua “lógica” natural. Em
segundo lugar, a transformação de um objeto em instrumento não pode ser
arbitrária porque um objeto só pode ser considerado um instrumento quando
possui uma função no interior da prática social. Isso é válido mesmo para o
caso de certas invenções cujo uso só se torna possível tempos após sua
criação, na medida em que, naquele momento, ainda não existiam as
condições para que a prática social incorporasse a invenção (DUARTE,
2006, p. 153).
Em outras palavras, os instrumentos e a atividade de trabalho do homem são mediações
para a satisfação das necessidades; primeiro as necessidades fisiológicas (comer, beber, etc.),
depois outras necessidades que surgem no âmbito das relações sociais. Isso faz com que o
homem se destaque da natureza pela sua distinção em relação aos outros animais, pois o
homem se apropria da natureza em si para adequá-la às suas atividades e necessidades criando
28
instrumentos que, na história, o homem atribui significação social incorporando-os na sua
atividade prática. Dessa forma, o trabalho sob sua forma exclusivamente humana alarga o
consciente; este fator torna o homem diferente dos outros animais, pois, como afirma Marx:
Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera
mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior
arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de
transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um
resultado que já existia idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não
transforma apenas o material sobre o qual opera; ele imprime ao material o
projeto que tinha conscientemente em mira, o qual constituiu a lei
determinante do seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade
(MARX, 2004b, p. 212).
O homem se destaca da natureza, mas não se separa porque a mudança orgânica do
homem permite a realização de operações cada vez mais complexas antes não lhe permitida,
isso não significa que a realização dessas operações seja resultado da mudança orgânica, ao
contrário, esta mudança orgânica é resultado do desenvolvimento humano (gênero humano)
por meio de sua atividade de trabalho. Por isso, “o homem não se faz homem naturalmente;
ele não nasce sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar, avaliar,
agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é preciso aprender, o que
implica o trabalho educativo” que se refere à transmissão do saber historicamente produzido,
o saber objetivo (SAVIANI, 2005c, p. 07).
Segundo Duarte (1999), gênero humano corresponde a humanização, relação do homem
com a natureza no sentido de apropriação da mesma para transformá-la de forma a adequá-la
ao homem, ao mesmo tempo em que o homem se faz homem, ou seja, ser humano que produz
objetivações. Estas objetivações não se acumulam no organismo, nem são transmitidas pela
herança genética. Isso não significa que o processo biológico tenha cessado, pois a herança
genética transmite as características da espécie humana, mas as características históricas e
sociais só podem ser transmitidas através das objetivações. Portanto, o gênero humano é
produto das objetivações da atividade dos homens ao longo da história.
As mediações (instrumentos e atividade de trabalho) e as objetivações (produto da
atividade) possuem diversos níveis que variam de acordo com a complexidade do trabalho e
do conhecimento sobre a realidade, pois o homem se encontra no processo de humanização,
de produção de si mesmo, e o homem só se manifesta como ser humano, gênero humano, na
medida em que objetiva suas forças essenciais. Pois, os instrumentos incorporam a atividade
do homem; isto é, o homem transfere para os instrumentos sua atividade, se objetiva nos
instrumentos, assim, com a ampliação do universo de necessidades se expandem as atividades
29
humanas e suas objetivações que historicamente vão se tornando mais complexas, vão
elevando o nível das mediações enquanto processo da atividade e das objetivações (resultados
das atividades).
A consciência do resultado efetivo, prático e social, da atividade passa a mediatizar o
agir do homem, pois a utilização dos instrumentos ou objetos pressupõe que se tenha
consciência do objeto da e na ação fazendo com que o homem se aproprie das propriedades e
das funções do objeto, ou seja, incorporação do conteúdo concreto, histórico e objetivo gerado
pela experiência humana desenvolvida na ação, no agir do homem.
Então, a consciência do fim de uma ação de trabalho supõe o reflexo do objeto, isto é, o
conhecimento do objeto em si mesmo e da sua função social. Mas, o homem não vê o objeto
tal como se reflete. O reflexo do objeto, tal como aparece na consciência, não depende apenas
da natureza do objeto e do nível das necessidades e da atividade social, depende também da
consciência humana, em parte natural e em parte social, isto é, depende do quanto que a
consciência humana tenha se desenvolvido, a sensibilidade do homem diante ao que existe no
mundo em si mesmo e para si (DUARTE, 1999).
O fim da consciência é assimilar o conteúdo do objeto resultado da ação, pois o
instrumento é fabricado e é também conservado pelo homem devido às necessidades, por isso,
se trata de um objeto social. E isso se tornou possível com a transmissão dos conteúdos dos
objetos de geração em geração, como forma de garantir a sobrevivência, sendo esta a
condição para continuidade do desenvolvimento humano. “Cada geração precisa se apropriar
das objetivações resultantes da atividade das gerações passadas. A apropriação da significação
social de uma objetivação é um processo de inserção na continuidade da história das
gerações” (DUARTE, 2001, p. 157).
Dessa forma, o trabalho no sentido ontológico “é uma atividade que se dirige para a
satisfação da necessidade não de um modo imediato, mas através de uma mediação”
(MARKUS, 1974, p. 51), isto é, o trabalho não apenas assegura a existência física do homem,
mas reproduz as características fundamentais acumuladas social e historicamente pela
humanidade. Portanto, o trabalho é mediação entre o homem e a natureza e dos homens entre
si, no e pelo qual o homem se apropria da natureza para adequá-la às suas necessidades e para
se objetivar nela, de modo a tornar a natureza humanizada.
As objetivações (materiais e não materiais) que são os resultados, os produtos da
atividade humana de trabalho, que precisam ser apropriadas para que as faculdades do homem
possam se desenvolver e, desta feita, novas necessidades surgirem, se expandindo
incessantemente as objetivações, pela modificação de sua forma natural e pela criação de
30
novas objetivações de caráter social, mudando não apenas os objetos, as atividades e o
conteúdo, mas também o próprio homem. Sem objetivações não há instrumentos e criações,
não há mundo humano, pois as objetivações são as transferências do que estar no indivíduo
para as propriedades do objeto.
Os homens constroem suas capacidades à medida que conquistam as
objetivações humanas, desenvolvendo-se por meio destas aquisições que se
generalizam e ampliam as possibilidades de novas apropriações e
objetivações. O autêntico desenvolvimento do homem constitui uma
consolidação, um progresso e o resultado de suas capacidades e aptidões
(MARTINS, 2004, p. 92).
Assim, a objetivação implica antes uma apropriação, pois os objetos se apresentam ao
homem como realidade objetiva, histórica e que, por isso, independente do indivíduo,
possibilitando “paralelamente ao desenvolvimento do trabalho, desenvolver-se igualmente a
consciência” (MARKUS, 1974, p. 86), esta que é determinada pela vida material existente.
Pois, os objetos naturais (não extraídos totalmente de sua lógica natural) são transformados
em instrumentos que, por sua vez, tem função de servir a determinados objetivos, cujo
resultado da atividade social produz conhecimento. O conhecimento se torna também um
instrumento e precisa ser apropriado, incorporado à consciência e a atividade de trabalho.
Para que uma ação seja executada, é preciso que aquele que a execute capte
em sua consciência a relação entre o objetivo ou objeto da ação e o motivo
da atividade [...] A essa relação entre o motivo da atividade e o objetivo da
ação, Leontiev (1978) chama de sentido. Toda ação é captada e dirigida pela
consciência, através de uma relação entre o sentido e o significado. O
significado de uma ação é formado pelo seu conteúdo concreto, pelas
operações através das quais ela se realiza pelo seu objetivo, isto é, por aquilo
que deve resultar dessa ação (DUARTE, 1999, p. 86).
Antes da execução de determinada ação, precisa compreender a decomposição da ação
no fato de que o agir do homem passa a ser mediatizado pela consciência das relações entre os
fins da ação e o motivo da atividade, isto é, do sentido e da relação entre sentido e significado.
No que se refere ao sentido, Leontiev (1978) diz que os objetos produzidos pela atividade
humana devem aparecer à consciência na qualidade de motivos; manifesta-se na consciência
como imagem, como necessidade, estímulo e fim da ação. É a consciência do motivo da ação.
No caso, o conhecimento como fim consciente de uma ação, pode ser estimulado por um
motivo que responde à necessidade, mas a transformação deste fim em motivo é também
criação de uma necessidade nova, de uma necessidade de conhecimento, o que implica o
nascimento de motivos superiores e a evolução das necessidades. O homem possui a
necessidade de se apropriar do já produzido historicamente.
31
A relação entre sentido e significado está na significação que é captada pela consciência
através do conhecimento, isto é, do conteúdo concreto formado pelas operações realizadas,
efetivas. Sendo as significações as generalizações da realidade “que é cristalizada e fixada
num vetor sensível [...]. É a forma ideal, espiritual da cristalização da experiência e da prática
social humana” (LEONTIEV, 1978, p. 94). Por exemplo, a ciência é um sistema de
significações, pertence ao mundo dos fenômenos objetivamente histórico.
A Significação é a forma sob a qual um homem assimila a experiência humana
generalizada e refletida. As significações não têm existência fora dos cérebros humanos
concretos. A significação mediatiza o reflexo do mundo pelo homem na medida em que ele
tem consciência deste, isto é, na medida em que seu reflexo do mundo se apóia na experiência
da prática e a integra. Por fim, a significação é o reflexo generalizado da realidade elaborada
pela humanidade e fixado sob a forma de conceitos, de um saber, ou mesmo de um saber-
fazer (LEONTIEV, 1978, p. 94-96).
Por conseguinte, com o desenvolvimento humano social, entendemos que o agir do
homem passa a ser mediado pela consciência, pois, toda ação passa a ser orientada por um fim
consciente. A atividade humana é, portanto, atividade que se orienta conforme fins e estes só
existem através do homem, como produto de sua consciência. O fim prefigura aqui o
resultado de uma atividade real, prática, que já não é pura atividade da consciência
(VAZQUEZ, 2007, p. 223).
Dessa forma, podemos afirmar que a consciência é um produto social e histórico, e
apresenta-se como elaboração de fins e de conhecimento em íntima unidade, isto é, unidade
teoria e prática, pois a relação entre pensamento e ação requer a mediação dos fins
conscientes que o homem propõe; requer um conhecimento dos objetos, meios e instrumentos
para transformar a realidade na atividade prática a qual o homem age sobre uma matéria que
existe independentemente de sua consciência, sobre a realidade objetiva (idem, p. 224-225).
As operações de trabalho que se formaram inicialmente no decurso de uma
simples adaptação às condições exteriores conhecem uma nova gênese:
quando o fim de uma ação entra numa segunda ação, enquanto condições da
sua realização, ela transforma-se em meio de realização da segunda ação, por
outras palavras, torna-se operação consciente. Isso acarreta um alargamento
considerável da esfera do consciente. Compreender-se-á facilmente toda a
importância deste fato para o desenvolvimento ulterior da atividade humana
(LEONTIEV, 1978, p. 105).
Conforme a afirmação acima, entendemos que para uma atividade consciente o
conhecimento acumulado produzido pela humanidade se torna um meio imprescindível, se
32
tornando este mesmo uma condição para a realização de novas atividades práticas,
principalmente, para que novos conhecimentos sejam produzidos de acordo com o
alargamento da consciência. Isto é, atividade teórica e prática indissociada e mútua (relação
dialética, recíproca) como fundamental para o desenvolvimento humano.
O trabalho como atividade teórica e prática, é indissolúvel de uma consciência que
projeta ou modela idealmente, e de uma mão que realiza ou plasma o projetado em uma
matéria. O produto dessa atividade é a culminação de uma atividade consciente do produtor e,
portanto, o objeto produzido expressa o homem que o produziu (VAZQUEZ, 2007, p. 279).
Segundo Leontiev (1978, p. 120) a consciência passou por duas transformações: uma
engendrada pelo desenvolvimento da divisão social do trabalho que constituiu um isolamento
da atividade intelectual e teórica; outra se refere à mudança da estrutura interna, como
consequência das condições da sociedade de classes desenvolvida que resulta na alienação do
homem, sua própria atividade deixa de ser para ele o que é verdadeiramente. Este processo de
divisão do trabalho no desenvolvimento da sociedade capitalista que procuraremos abordar de
forma a compreender a relação específica entre teoria e prática, bem como sua separação por
meio das concepções burguesas idealista do conhecimento.
2.2 A Divisão Social do Trabalho no Desenvolvimento da Sociedade Capitalista
No item anterior, discutimos o sentido do trabalho como processo fundamental para o
desenvolvimento do ser humano. O trabalho como atividade humana que permite os homens
se relacionarem entre si, com o objeto e com o reflexo do objeto em sua consciência, o que,
com efeito, possibilitou o desenvolvimento da consciência, das faculdades e capacidades do
homem pensar a realidade e desenvolver suas atividades por meio da transformação da
natureza e de si mesmo. Neste momento, procuraremos explicitar como o trabalho foi
desenvolvendo seu sentido negativo no processo de consolidação da sociedade capitalista.
A sociedade capitalista se solidifica na densa produção de mercadorias e de mais-valia
(trabalho excedente) em detrimento do trabalho humano, ou seja, sobre a exploração do
trabalho assalariado pelos detentores dos meios de produção. A divisão do trabalho na sua
forma historicamente mais definida, isto é, trabalho material versus trabalho intelectual,
possibilitou o aumento da produtividade e do acúmulo de capital, consequentemente, o
avanço do sistema capitalista de acordo com o seu processo histórico-ideológico de
universalização.
33
Para Marx (1998, p. 27-28) “divisão do trabalho e propriedade privada são expressões
idênticas – na primeira se anuncia, em relação à atividade, aquilo que na segunda é anunciado
em relação ao produto dessa atividade”, ou seja, a divisão do trabalho é determinada pela
propriedade privada ao mesmo tempo em que determina a desigual apropriação do produto do
trabalho. Em decorrência da divisão do trabalho e da propriedade privada na sua manifestação
mais desenvolvida e universal, o trabalhador privado dos meios e da produção não se
reconhece no produto e sua própria ação se torna uma força estranha e hostil, tornando o
trabalho para ele apenas uma questão de sobrevivência; um trabalho alienado.
Segundo Marx (1998), antes de se chegar à indústria moderna, isto é, da consolidação
do sistema capitalista no século XVIII e, portanto, da divisão do trabalho na forma mais
dilatada, a propriedade passou por estágios que começa nas corporações, depois, passando da
manufatura até a grande indústria. Assim, distingue que nas corporações as relações
patriarcais entre os companheiros e o mestre subsistiam, ao passo que na manufatura estas
relações foram substituídas por relações monetárias entre o trabalhador e o capitalista, e com a
criação da grande indústria, o maquinário suscitou a divisão social do trabalho no formato
exclusivamente unilateral.
As corporações foram responsáveis pela aglomeração dos indivíduos sob um mesmo
espaço para a conversão da matéria-prima em produto comercial, sendo o ponto de partida
para o desenvolvimento das condições de produção e transformação da propriedade em
capital comercial ou industrial. Nas corporações o mestre artesão era independente e seus
companheiros aprendiam a produzir em sua totalidade para um mercado pequeno e estável; os
trabalhadores eram os donos tanto da matéria-prima quanto das ferramentas que utilizavam.
Este agrupamento de indivíduos antes isolados já indicava no período feudal o
desenvolvimento da sociedade de classes, isso pode ser constatado a partir da produção de
instrumentos rudimentares e do modo de trabalho nas corporações de ofícios, pois a
ampliação das atividades artesanais associada ao grau de acumulação da produção possibilitou
o crescimento de uma atividade mercantil que está na origem da constituição do capital
(SAVIANI, s/d, p. 03).
Dessa forma, estava surgindo uma classe particular dedicada ao comércio, os burgueses,
estes que se unia na cidade contra a nobreza feudal para se defender. “A extensão do comércio
e o estabelecimento das comunicações levaram cada cidade a conhecer outras cidades que
tinha feito triunfar os mesmos interesses, lutando contra os mesmos inimigos” (MARX, 1998,
p. 60). Dada as condições de vida de cada burguês e dos interesses comuns, os burgueses se
34
constituíam em classe na medida em que a propriedade existente era convertida em capital
comercial ou industrial.
Uma classe na medida em que deve travar uma luta em comum contra outra
classe; [...] por sua vez, independente em relação aos indivíduos, [...] de
maneira que estes têm suas condições de vida estabelecidas
antecipadamente, recebe de sua classe, já delineada, sua posição de vida e ao
mesmo tempo seu desenvolvimento social; são subordinados à sua classe. É
o mesmo fenômeno da subordinação dos indivíduos isolados à divisão do
trabalho (MARX, 1998, p. 61).
Podemos afirmar que a divisão do trabalho entre cidades formadas pelos indivíduos
burgueses leva ao nascimento de uma nova forma de propriedade - a manufatura, que
possibilitou a relação de concorrência entre as cidades, ocasionando uma mudança das
relações de trabalhado. Além disso, a manufatura contou com o início da formação de uma
ideologia dominante, isto é, um conjunto de ideias sobre a realidade; um poder político que
avalizavam os interesses econômicos da classe dominante em constituição, já condicionados
pela divisão do trabalho (MARX, 1998, p. 18-20).
Segundo Marx (2004b, p. 391), a manufatura adquire a forma clássica da cooperação
fundada na divisão do trabalho, se originando de dois modos: quando indivíduos de ofícios
diversos e independentes são concentrados numa oficina, sob o comando do mesmo
capitalista, por cujas mãos têm de passar um produto até seu acabamento final, e quando,
progressivamente, a manufatura se transforma num sistema que divide as produções em suas
diversas operações especializadas em que a totalidade do produto se dar na destacada união
dos trabalhadores, no trabalho coletivo.
No início da manufatura o trabalhador produz a mercadoria por inteiro; o trabalhador
incorpora a produção de mercadoria ao mesmo tempo em que o produto se ajusta as suas
condições, mas as circunstâncias externas de extensão do comércio e, portanto, o
fornecimento de uma quantidade cada vez maior de mercadorias num determinado prazo, leva
o capitalista a utilizar meios diferentes de produção, revelando, gradualmente, as vantagens da
sistemática divisão do trabalho em relação à elevação da produção em menos tempo; eleva-se
a força produtiva do trabalho.
O poder social, isto é, a força produtiva multiplicada que nasce da
cooperação dos diversos indivíduos, condicionada pela divisão do trabalho,
não aparece a esses indivíduos como sendo sua própria força conjugada,
porque essa própria cooperação não é voluntária, mas sim natural; ela lhes
aparece, ao contrário, como uma força estranha, situada fora deles, que não
sabem de onde ela vem nem para onde vai, que, portanto, não podem mais
35
dominar e que, inversamente, percorre agora uma serie particular de fases e
de estágios de desenvolvimento, tão independente da vontade e da marcha da
humanidade, que na verdade é ela que dirige essa vontade e essa marcha da
humanidade (MARX, 1998, p. 30).
Esta força produtiva aparece aos trabalhadores como algo totalmente alheio a eles
próprios, como força desconhecida que está fora de sua ação no trabalho, perdendo, dessa
maneira, a dimensão do que seu trabalho é capaz e o sentido de seu trabalho se reduz na
satisfação das necessidades imediatas. O trabalhador perde o sentido de sua atividade, porque
ele produz independentemente de sua vontade e sim de acordo a demanda do capitalista,
sendo também desapropriado do significado de sua ação, isto é, do resultado, das objetivações
(materiais e não-materiais), do conteúdo concreto que é formado do instrumento de sua ação.
Assim, a divisão do trabalho de acordo com a especialização de uma determinada
operação na produção de uma mercadoria, passava a impedir a participação do trabalhador na
totalidade do processo até chegar ao produto final. Gradativamente, o trabalhador se
distanciava de suas condições subjetivas referente ao sentido de seu trabalho e do produto
resultante da sua ação, passando a ser atalhado de se desenvolver na sua atividade enquanto
ser humano, este que é transformado em simples membro de um mecanismo, do qual se
constituía uma classe, a classe trabalhadora.
A manufatura produz realmente a virtuosidade do trabalhador mutilado, ao
reproduzir e levar sistematicamente ao extremo, dentro da oficina, a
especialização natural dos ofícios que encontra na sociedade. Por outro lado,
sua ação de transformar o trabalho parcial em profissão eterna de um ser
humano corresponde à tendência de sociedades antigas de tornar hereditários
os ofícios, petrificá-los em castas ou, então, ossificá-los em corporações,
quando determinadas condições históricas produzia no indivíduo uma
tendência a variar, incompatível com o sistema de castas (MARX, 2004b, p.
394).
Dessa forma, um trabalhador tem suas possibilidades de elevar-se podadas pela
limitação de seu trabalho explorado pelos capitalistas, o trabalhado assalariado passa a ter
uma função, única e limitada, por toda vida; “depois de desenvolver, até atingir sua
virtuosidade, uma única especialidade limitada, sacrificando a capacidade total de trabalho do
ser humano, põe-se a manufatura a transformar numa especialidade a ausência de qualquer
formação” (MARX, 2004b, p. 405).
Mas, a manufatura não podia apoderar-se da produção social em sua extensão; seu
estreito fundamento técnico ao atingir certo estágio de desenvolvimento, entrou em conflito
com as necessidades de produção que ela mesma criou, produzindo, por sua vez, máquinas
(MARX, 2004, p. 424), pois o mercado necessitava de maior quantidade de produto e o
36
trabalhador com seus limites físicos, por mais horas de trabalho dedicadas, não conseguia
atender aos anseios do capital comercial.
Assim, a circulação de produtos que, conseqüentemente, permitiu a concentração do
comércio e da manufatura, a centralização rápida de capitais e a subordinação da ciência da
natureza ao capital, foram a força motriz que provocou a criação da grande indústria. A
manufatura e a grande indústria desenvolveram as forças produtivas, porém em detrimento do
trabalhado humano; o trabalhador desprovido da produção, enquanto outra classe se
apropriava do trabalho alheio e se enriquecia tanto material quando intelectualmente.
Tais forças produtivas alcançavam com a propriedade privada um
desenvolvimento exclusivamente unilateral, tornaram-se, em sua maior
parte, forças destrutivas [...] a grande indústria criou uma classe cujos
interesses são os mesmos em todas as nações e para qual a nacionalidade já
está abolida, uma classe que realmente se desvencilhou do mundo antigo e
que ao mesmo tempo a ele se opõe – não só as relações com o capitalista se
tornaram insuportáveis para o operário, mas também seu próprio trabalho
(MARX, 1998, p. 72).
Embora para se garantir enquanto classe detentora da produção material e intelectual, a
burguesia dar uma forma universal. Esta universalidade não significava a apropriação da
produção pela classe trabalhadora, ao contrário, os interesses universalizados, os quais fazem
valer e nos quais se resume toda a sociedade de uma época sob a forma de organização que os
burgueses dão a si mesmo por necessidade, são para assegurar reciprocamente sua
propriedade e os seus interesses (MARX, 1998, p. 74).
Uma universalização em relação apenas à dominação, produção e ao consumo, apenas
exclusivamente relacionada à unilateralidade do trabalhador; pois, com o “desenvolvimento
universal das forças produtivas é possível estabelecer um intercâmbio universal entre os
homens, e assim ele gera o fenômeno da massa „privada de propriedade‟ simultaneamente em
todos os povos” (idem, p. 31).
A divisão manufatureira do trabalho opõe-lhe as forças intelectuais do
processo material de produção como propriedade de outrem e como poder
que os domina. Esse processo de dissociação começa com a cooperação
simples, em que o capitalista representa, diante do trabalhador isolado, a
unidade e a vontade do trabalhador coletivo. Esse processo desenvolve-se na
manufatura, que mutila o trabalhador, reduzindo-o a uma fração de si
mesmo, e completa-se na indústria moderna, que faz da ciência uma força
produtiva independente do trabalho, recrutando-a para servir ao capital
(MARX, 2004b, p. 416).
Marx (2004b) afirma que a produção especializada das operações na manufatura faz
desaparecer o princípio individual, subjetivo, do trabalhador, porque o parcelamento da
37
atividade impede o trabalhador se objetivar no produto, sua atividade torna independente de
sua vontade, o que gera a necessidade de desqualificação do trabalho humano.
Com o surgimento da máquina na indústria moderna há uma mudança fundamental que
torna o trabalhador essencialmente objetivo, no sentido de se adequar ao processo do sistema
fabril, ao contrário do que acontecia na manufatura, a qual o trabalhador se adequava ao
mesmo tempo em que o processo também se adequava ao trabalhador. Inclusive, este foi o
problema enfrentado pelos capitalistas, pois o limite físico, orgânico, do homem limitava a
produtividade de seu trabalho e, portanto, o acúmulo de capital.
Este período da máquina na indústria estabelece o início da consolidação do modo de
produção capitalista junto à consolidação também de duas classes: a burguesia e a classe
trabalhadora. Segundo Ponce (2003, p. 135), a burguesia se desenvolveu graças a dois
aspectos principais: 1) não eram suficientes o desenvolvimento do comércio e o alargamento
quase mundial do mercado. Era preciso, além disso, que exércitos compactos de trabalhadores
livres fossem recrutados para oferecer seus braços à burguesia (surgindo estes trabalhadores
livres no final do século XV e início do XVI); e 2) quando a produção de mercadorias – isto é,
a produção destinada à troca e não ao comércio interno – alcançou determinado nível, nova
forma de apropriação surgiu no mundo, a forma de apropriação que Marx chamou de
„capitalista‟.
Então, com o estabelecimento do comércio mundial e com o aparecimento das massas
trabalhadoras que vendiam sua força de trabalho, surgiram os alicerces de um novo regime,
um regime em que o capitalista dá ao trabalhador muito menos do que o valor do objeto
produzido, o regime da sociedade capitalista (idem, ibidem).
2.3 A Divisão do Trabalho na Sociedade Capitalista e a Cisão entre Teoria e Prática em
Relação ao Conhecimento Científico
A invenção da máquina longe de amenizar o trabalho árduo e diário, determinava um
ritmo de trabalho, sendo ela mesma responsável pela qualidade do produto, em que na
produção mecanizada o trabalhador passava a perder completamente o controle do processo
de seu trabalho, tendo de trabalhar para si mesmo e para produzir mais-valia, ou seja, riqueza
gerada pelo trabalho excedente, não pago ao trabalhador pelo capitalista.
Dessa forma, a maquinaria se torna “um meio poderoso para aumentar a produtividade
do trabalho, isto é, para diminuir o tempo de trabalho necessário à produção de uma
38
mercadoria [...] e criar novos motivos para aguçar-lhe a cobiça por trabalho alheio” (MARX,
2004b, p. 460), o trabalho como incremento da riqueza material.
Enquanto a divisão do trabalho eleva a força produtiva do trabalho, a riqueza
e o aprimoramento da sociedade, ela empobrece o trabalhador até a condição
de máquina. Enquanto o trabalho suscita o acúmulo de capitais e, com isso, o
progressivo bem-estar da sociedade, a divisão do trabalho mantém o
trabalhador sempre mais dependente do capitalista (MARX, 2004a, p. 29).
Na maquinofatura, “a separação entre as forças intelectuais do processo de produção e o
trabalho manual, e a transformação delas em poderes de domínio do capital sobre o trabalho
se tornam uma realidade consumada” (MARX, 2004b, p. 483); é na consolidação da
sociedade capitalista que a divisão do trabalho ganha sua forma mais perversa de degradação
do trabalho humano, a exploração do trabalho na forma mais brutal.
A divisão do trabalho na manufatura e na indústria moderna prejudicou o
desenvolvimento intelectual das massas em relação à compreensão da
realidade para além das esferas da vida cotidiana. As relações sociais
estabelecidas nestas etapas históricas promoveram um processo de limitação
do desenvolvimento intelectual dos trabalhadores por apartá-lo do
conhecimento teórico, da perspectiva da construção de uma cultura
intelectual universal, portanto, das possibilidades de análise e atuação na
realidade natural e histórico-social em sua profundidade [...] Portanto, a
prosperidade do capitalista e sua manufatura se fundamentam à custa da
ignorância e decadência dos trabalhadores (FÉLIX, 2010, p. 07).
Apesar da forma nefasta de exploração do trabalho assalariado, graças à especialidade
do trabalhador, foi possível o desenvolvimento da ciência e da técnica, não mais sob a forma
limitada e estreita das primeiras etapas de produção material, mas “vinculada à necessidade de
construir os primeiros instrumentos de trabalho, assim como às exigências das primeiras
práticas produtivas” (VÁZQUEZ, 2007, p. 244), a ciência se coloca a serviço da produção
capitalista no sentido de atender as exigências práticas sob a égide da classe dominante.
[...] À medida que a ciência foi se desenvolvendo cada vez mais relacionada
à produção, ela foi mudando suas características, a atividade científica foi se
organizando formalmente, tornando-se uma profissão reconhecida, e, por
outro lado, a ciência foi perdendo sua independência, passando a atender os
interesses da produção e de uma classe detentora dos meios de produção
(PEREIRA; GIOIA, 2001, p. 293).
De acordo com o desenvolvimento das forças produtivas, vão aumentando às exigências
que se apresentam à ciência, que só adquirem grande amplitude e um caráter rigoroso na
época moderna, quando se incrementa na produção material em estreita conexão com o
nascimento e ascensão de uma nova classe, a burguesia, esta interessada em transformar a
39
natureza (VÁZQUEZ, 2007, p. 245). Antes da Revolução Industrial, a ciência não se
relacionava diretamente com as atividades produtivas e nem era necessária ao
desenvolvimento técnico, tão somente com a Revolução Industrial que houve um grandioso
aumento das atividades científicas, colocando a ciência a serviço da burguesia.
À medida que o capitalismo avança, porém, geram-se problemas que, cada
vez mais, lançam desafios à ciência e cada vez mais ela é necessária para
respondê-los. A Revolução Industrial levou a um grandioso aumento da
atividade científica. Ao final do período, não só conhecimentos técnicos são
dependentes do desenvolvimento científico, como este está profundamente
inter-relacionado à produção [...] A ciência iria, cada vez mais, ser colocada
a serviço da modificação da natureza. A partir do século XVIII, a ciência
dedicou-se à solução dos problemas produtivos e foi sendo gradativamente
enfatizada (PEREIRA; GIOIA, 2001, p. 292).
Segundo Alves (2007, p. 281), no capitalismo a ciência se tornou reprodutora da
propriedade privada, isso se deve da extração de mais-valia em sua forma relativa (quantidade
de produto em menos tempo, sem redução do tempo de trabalho do trabalhador); pois, o
capital possibilita o desenvolvimento da ciência como meio mais eficaz de estender os limites
do trabalho, da sua produtividade para além das fronteiras dadas pela figura física viva do
trabalhador, estas que eram entraves para o seu desenvolvimento na manufatura.
A ciência se tornou uma força produtiva, por isso, existe um considerável acúmulo da
produção científica na sociedade capitalista. A produção intelectual nas mãos da classe
dominante constituiu uma condição necessária do progresso imposto pelo capital, embora a
produção científica em detrimento do trabalho humano. A classe dominante detém os meios
de produção material e não-material, negando a apropriação da produção intelectual pela
classe subalterna, sendo suas ideias a expressão da relação de dominação. Afirma Marx:
A classe que dispõe dos meios da produção material dispõe também dos
meios da produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles aos
quais são negados os meios de produção intelectual está submetido também
à classe dominante. Os pensamentos dominantes nada mais são do que a
expressão ideal das relações materiais dominantes; [...] na medida em que
dominam como classe e determinam uma época histórica em toda a sua
extensão (MARX, 1998, p. 48).
Assim sendo, a submissão da classe trabalhadora está condicionado pela divisão do
trabalho, trabalho material versus trabalho intelectual, divisão entre teoria e prática, entre
trabalho e ciência; enquanto a classe dominante detém o poder material e intelectual, o
trabalhador se empobrece em seu trabalho manual limitado, determinado e abstrato, no qual
40
ele é mutilado e, portanto, impossibilitado de se desenvolver, de apropriar toda a produção
social historicamente acumulada pela humanidade para se objetivar.
No século XVIII quando a burguesia se consolidou como classe dominante14
, seu
“anseio” diante as condições históricas dadas era de uma ciência especulativa sob uma base
idealista, assinalando o sujeito como ser abstrato à margem da história, pois a burguesia para
se manter enquanto classe dominante detentora da produção material e não material, buscava
evitar as apropriações das objetivações históricas pela classe trabalhadora. Desse modo, há
uma cisão entre a ciência, que determina a primazia pela atividade espiritual, teórica, e o
trabalho que se caracteriza como uma mera atividade manual, física, desprovida do
movimento lógico.
Na sociedade da propriedade privada e da alienação, existe um nítido
contraste e um abismo profundo entre teoria e práxis, entre sensibilidade e
pensamento; a consciência imediata prático-sensível é submetida às mais
grosseira necessidades físicas, bem como à alienação de todas as
necessidades, ou seja, à necessidade de posse; o resultado disso é que o
objeto perde para essa consciência a sua essência específica e a sua riqueza
natural, tornando-se apenas, enquanto objeto dela, um meio para a satisfação
dessas necessidades. O pensamento abstrato, por seu turno, separa-se da
natureza e da atividade humana, contrapondo-se a elas como algo estranho; e
tal fato, na verdade, sucede não apenas com pensamento “falso”,
especulativo, mas também com a ciência natural, que expressa a relação
teórica do homem com a natureza [...] (MARKUS, 1974, p. 41-42).
O autor nos expõe a cisão entre a ciência natural e a atividade humana (trabalho
humano) na sociedade capitalista para ratificar que a separação entre pensamento e
sensibilidade afeta as possibilidades de desenvolvimento do homem em sua atividade de
trabalho a qual reduz sua consciência ao prático na imediaticidade de satisfazer suas
grosseiras necessidades físicas. Com esta cisão entre pensamento e sensibilidade o homem
perde o conteúdo histórico, não se apropriando da atividade humana historicamente
acumulada, por sua vez, não se objetivando nela.
Dessa forma, apesar da ciência natural, enquanto produto da atividade humana sobre a
natureza, ter se desenvolvido bastante devido à condição do processo industrial, sua
constituição sob a égide do pensamento abstrato idealista o separa da natureza e da atividade
humana. Isto é, o pensamento abstrato separa-se do histórico e objetivo embora a ciência
natural estivesse sempre vinculada a uma unidade específica entre ciência e produção, entre
14
Uma consolidação como classe dominante oriunda do processo revolucionário burguês expresso nas
revoluções Inglesa, Francesa e industrial no século XVIII. Com base nas doutrinas liberais, a burguesia se
estrutura, estruturando ao mesmo tempo o Estado, a forma de organização da sociedade mais eficaz no sentido
de garantir os interesses da classe dominante – a burguesia. Assim, Estado é o Estado da classe dominante, são
as idéias dominantes de cada época.
41
teoria e prática, “tão estreita que embora tenha a produção se convertido em vigorosa fonte de
seu desenvolvimento, o enorme incremento das forças produtivas de nosso século seria
inconcebível sem o correspondente progresso científico” (VÁZQUEZ, 2007, p. 248).
Então, apesar da unidade específica entre ciência e produção oferecer um conhecimento
vasto e verídico sobre a natureza, decerto esta ciência se constituiu sob uma forma alienada, o
que Markus (1974, p. 42), baseando-se em Marx, ressalta ser a ciência natural ao mesmo
tempo materialista e idealista, “materialista na medida em que, opondo-se à filosofia, não é
capaz de captar o caráter de totalidade [...] E é idealista porque, tendo se separado das
necessidades, da atividade e da sensibilidade humana, é estranha à autoconsciência do
indivíduo empírico [...]”.
Podemos dizer materialista no sentido do indivíduo entender a anterioridade da natureza
com relação ao pensamento, uma dependência da matéria e transformação da mesma em
produto humano, mas que na forma fragmentada como o trabalho no sistema produtivo se
encontra é incapaz de estabelecer conexões das partes de modo a reconstituí-las numa
totalidade; e idealista na medida em que o indivíduo tem diante de si seu produto, mas não se
reconhecendo nele, parecendo-lhe estranho, como algo supra-humano e misterioso.
Assim, a ciência natural tanto quanto a filosofia sob uma orientação abstrata idealista e
da neutralidade científica, não consideram as relações do homem com a natureza ao conceber
estas relações como algo esotérico (misterioso e supra-humano), ou seja, desconsideram as
relações de trabalho e sua exploração, desconsideram as condições histórico-objetivas e a
ciência a serviço do capital e, portanto, de uma determinada classe social, a classe dominante,
estabelecendo uma separação entre o homem e a natureza, entre o homem e a sociedade.
Segundo Vázquez (2007, p. 128), Marx chega ao termo da relação entre homem e
natureza, afirmando não existir uma verdadeira ciência, teoria, que desconsidere esta relação;
e, por conseguinte, não lhe interessa uma ciência à margem da atividade prática do homem,
este seria o caráter antropológico da natureza e do conhecimento, caráter em e pela prática.
Nesse sentido, não pode na ciência a separação entre homem e natureza, entre homem e
sociedade.
Não pode haver, para Marx, uma ciência natural e uma ciência do homem,
separadas, porque a relação do homem com a natureza firma-se na indústria,
isto é, na sua atividade vital, produtiva (ou melhor, na atividade produtora da
vida) e esta é, ao mesmo tempo, uma história natural e uma história humana.
Não há, portanto, uma interrupção entre o homem e a natureza [...] sua
atividade produtiva, é uma atividade, de modo livre, consciente e voluntário,
para transformá-la e, nela, transformar a si mesmo (MONACORDA, 1996,
p. 109).
42
Marx (2004) buscava através de uma ciência do homem uma verdadeira unidade entre
teoria e prática, para que esta prática pudesse se enriquecer continuamente e assimilar os
resultados desse desenvolvimento da produção e da ciência. No entanto, para Marx, importava
o sentido antropológico das ciências naturais não somente por sua influência prática na vida
humana, mas, justamente, na medida em que o homem adquire consciência de que a natureza,
não é senão uma natureza humanizada; a natureza é homem (natureza humanizada) e, como
ser humano natural, é também natureza (VÁZQUEZ, 2007, p. 131-132).
A “antropologia” de Marx não é, pois, uma manifestação exterior a analise
histórico-social do homem, nem um afastamento abstrato da história, mas a
abstração da história. Definindo o homem como um ser social e consciente
que trabalha, Marx evoca as características e leis fundamentais e
permanentes do conjunto corrente das atividades humanas, da totalidade
prática da vida social [...] O homem é uma criatura natural universal no
sentido de que é potencialmente capaz de transformar todos os fenômenos
naturais circundantes em objetos de suas necessidades ou sua atividade e,
pelo desenvolvimento de novas faculdades, de adaptar essa atividade a um
círculo cada vez mais amplo de leis naturais. Ele é capaz, de maneira
crescente, de transformar essas leis em princípios de sua própria atividade e,
conseqüentemente, de modificar cada vez mais profundamente seu meio
sempre mais extenso, no ato mesmo em que toma posse, de maneira material
e espiritual cada vez mais variada, dos objetos e fenômenos do mundo que o
engloba (MARKUS, 1974, p. 92-93).
Este sentido em Marx significa a capacidade do homem apropriar e transformar a
natureza de acordo com as suas necessidades ou atividades, ao tempo em que desenvolve
novas faculdades, portanto, novas necessidades, sendo capaz de desenvolver atividades
teóricas e práticas, na medida em que através dessas atividades também se faz homem,
enquanto ser histórico-social e genérico. Ressalta-se que embora o processo de humanização
da natureza, o homem não se aparta dela, pois, como já dissemos antes, para que o homem
pudesse se desenvolver foi imperativo o desenvolvimento biológico.
No processo de interação prática do sujeito com o objeto realiza-se
permanentemente o processo de transformação do subjetivo no objetivo e do
objetivo no subjetivo. As ideias, teorias e práticas humanas objetivam-se,
tornam-se realidade objetiva, já existente independente da criação do sujeito.
Por outro lado, os objetos da realidade objetiva são apropriados pelo homem,
humanizados, tornam-se seqüência, esforço e prolongamento dos órgãos
naturais do homem (KOPNIN, 1972, p. 77).
Apesar desse caráter antropológico genérico dos objetos humanizados estes que são
objetivados pelas teorias e práticas humanas, as ciências naturais e antropológicas se mantém
divididas entre atividades teóricas e atividades práticas. Pois, a ciência, enquanto força
43
produtiva, adequada ao capital, acaba por subsumir-se às determinações do próprio modo de
produção capitalista. Assim sendo, assume para si a forma social de ser da mercadoria,
obedecendo à lógica da alienação, que transformam as diversas condições do processo de
produção, mesmo aquelas ideais, em componentes do capital (ALVES, 2007, p. 278).
Portanto, a ciência no modo de produção capitalista é alienada e alienadora. Alienada na
medida em que a ciência enquanto produto do gênero humano se constitui sob uma esfera
independente, estranha e contraposta ao indivíduo; e alienadora na medida em que o processo
resulta na não efetivação da objetivação e apropriação da ciência de forma consciente, social,
livre e universal. Então, a alienação se origina e se desenvolve nas relações sociais de
dominação, e corresponde a “uma ruptura na qual a evolução da humanidade se destaca da
evolução do indivíduo” (MARKUS, 1974, p. 99).
A alienação não tem origem na consciência, não resulta do fato de que essa
consciência tenha se objetivado nos produtos históricos da atividade social,
mas sim do fato de que esses produtos, essas forças essenciais objetivas,
tornem-se alienadas e alienadoras em determinadas condições históricas, e
façam dos indivíduos, homens alienados perante as objetivações [...] É
verdade que a alienação tem origem objetiva, mas não decorre da
objetividade das forças essenciais humanas, e sim do fato de que a
objetivação e apropriação dessas forças ocorram sob relações de dominação
(DUARTE, 1999, p. 72).
Podemos concluir que a “alienação é sempre uma forma de relação, objetiva e
subjetiva, com algum elemento do ser humano, com alguma objetivação do gênero humano”
(idem, p. 97). Por isso, para superar a alienação não pode haver um pensamento abstrato de
um apelo à idealidade da natureza em oposição às atividades humano-sociais. Pois, a divisão
do trabalho que gera a separação entre ciência e trabalho, entre pensamento e sensibilidade,
entre teoria e prática, aliena o indivíduo de sua própria atividade, porque sua atividade e o
produto dela se tornam algo alegórico, tão exterior ao indivíduo que o mesmo é incapaz de se
reconhecer nas objetivações (materiais e não materiais) do gênero humano.
A alienação também se manifesta na esfera da consciência social, entre
outros pelo fato de que, em consequência da ruptura e do antagonismo entre
trabalho manual e o trabalho intelectual, a consciência empírica e cotidiana
dos indivíduos se destaca sempre mais da evolução do pensamento de toda a
humanidade, da ciência, tornando-se prisioneira de representações
fetichistas, desnaturando a realidade, enquanto no nível da consciência do
conjunto da sociedade se elaboram as “ideologias” como reflexos
deformados da realidade [...] decorre que a alienação é um dos elementos e
características desse processo histórico de conjunto e desse período histórico
que, sob outras formas, pode-se caracterizar pelas categorias da divisão do
trabalho e da propriedade privada (MARKUS, 1974, p. 97).
44
Assim, a divisão do trabalho, a propriedade privada e a alienação são categorias
históricas recíprocas, e estão numa relação que determina para Marx (1998, p. 81) dois fatos:
1) as forças produtivas se apresentam como completamente independentes e desligadas dos
indivíduos, como um mundo à parte, ao lado dos indivíduos; as forças produtivas assumiram
uma espécie de forma objetiva e não mais para esses indivíduos suas próprias forças; os
indivíduos não se reconhecem na produção da vida material; e 2) Os indivíduos são obrigados
a se apropriar da totalidade das forças produtivas, não somente para chegar a manifestação de
si, mas antes de tudo para garantir sua existência. Contudo, a apropriação das forças
produtivas é apenas em si mesma, portanto, uma apropriação limitada, pois com a apropriação
da totalidade das forças produtivas pelos indivíduos a propriedade privada dos meios de
produção seria abolida.
Então, mesmo na época moderna na qual o trabalhador tem ferramentas do trabalho
como um sistema complexo e uma vasta produção científica, sua apropriação é das
objetivações em si, apresentando uma contradição: a não combinação da formação do
indivíduo de acordo com as bases de produção da vida material, ou seja, o mercado exige
trabalhadores extremamente capacitados para atuarem no sistema complexo de produção, ao
mesmo tempo em que não pode possibilitar as objetivações para si (ao que se referem às
ciências, artes, filosofia, etc.), apenas uma capacidade operacional, uma especialidade
desenvolvida na esfera do cotidiano, isto é, de seu trabalho limitado e abstrato.
DUARTE (1999, p. 155), afirma que “apropriação é um processo amplo que engloba
desde atividades coletivas de apropriação das obras humanas que se apresentam sob a forma
alienada da propriedade privada, até a formação dos sentidos e sentimentos humanos” e que
objetivação (material e não-material) compreende a três traços principais: 1) encarna
genericidade humana, enquanto síntese da atividade humana, um sistema de referências
externas para a atividade; 2) como um sistema de referências para a sua atividade o indivíduo
se coloca no próprio curso da história; e 3) para que o resultado da atividade humana seja uma
objetivação, é necessário que a atividade sintetizada nesse resultado seja também apropriada
pelo indivíduo, e que todo objetivar-se necessita antes de apropriação (idem, p. 135).
No entanto, existe a apropriação das objetivações em si que se refere ao cotidiano,
síntese da atividade social humana, e das objetivações para si referente ao não-cotidiano:
artes, filosofia, ciência, moral, etc., isto é, elevação da genericidade humana ao nível da
relação consciente. Porém, “não existe nenhuma sociedade que não possua a esfera das
objetivações genéricas em si [...] no caso das objetivações para si, da genericidade para si,
45
esta começa a se constituir somente a partir de certo nível de desenvolvimento histórico-
social” (idem, p. 136).
A formação do homem deveria se basear na mediação entre a esfera cotidiana (onde se
apropria das genericidade em si) e a não-cotidiana da vida social, isto é, das objetivações
genéricas para si (DUARTE, 1999). Mas, na forma social do sistema capitalista são geradas
limitações no que se refere às apropriações das objetivações para si, seja pelas formas
alienadas, mesmo em se tratando de objetivações para si, seja pela negação da possibilidade
de apropriação das objetivações para si.
A burguesia, diante o sistema complexo da grande indústria, até “defendia a instrução
para povo, porque no novo sistema fabril uma educação elementar era necessária ao operário,
mas, defendia diferentes tipos de instruções para diferentes tipos de operários” (PEREIRA;
GIOIA, 2001, p. 284). As classes mais pobres deveriam receber menos instrução e mais
treinamento em atividades manuais, enquanto que a burguesia deveria receber uma educação
de qualidade para formar os novos dirigentes da sociedade capitalista.
A burguesia não podia recusar instrução ao povo, na mesma medida em que
o fizeram a Antiguidade e o Feudalismo. As máquinas complicadas que a
indústria criava não podia se eficazmente dirigidas pelo saber miserável de
um servo ou de um escravo [...] A livre concorrência exigia uma
modificação constante das técnicas de produção e uma necessidade
permanente de invenções (PONCE, 2003, p. 145-146).
Assim, o capitalismo favorece o trabalho científico, mediante escolas técnicas e
laboratórios de altos estudos como uma questão vital. Todavia, a burguesia reservava para os
seus próprios filhos outras formas de educação em que as ciências ocupavam um lugar
discreto, enquanto nas outras escolas a orientação era francamente prática e impregnada de
intenção utilitária (PONCE, 2003, p. 146-147).
Por milênios, portanto, na sociedade dividida em classes pela divisão do
trabalho, entre a formação das classes dominantes e preparação profissional
dos produtores pertencentes às classes subalternas [...] existiu um hiato
profundo, uma separação absoluta, não apenas no sentido de que as duas
organizações não tinham qualquer ponto de contato entre si, mas também no
sentido de que não compartilhavam princípios, conteúdos e métodos entre as
duas diferentes formações. A primeira compreendia a educação para as artes
imediatas do domínio – armas e políticas para alguns e, para outros, as
ciências teórica [...] a segunda compreendia as várias atividades manuais e
um mínimo de noções a elas intimamente ligadas (MANACORDA, 1996, p.
120).
46
A separação entre o trabalho manual e o trabalho intelectual, traduz uma oposição entre
teoria e prática na formação do indivíduo. Como o autor afirma, para as classes pobres era
conveniente uma educação com atividades manuais, pragmáticas, e um mínimo de noções
básicas ligadas a imediaticidade da demanda do sistema produtivo em vigor; e para as classes
superiores, nas quais pretender-se-ia formar os futuros dirigentes, a educação baseada no
domínio de armas e políticas para alguns e para outros as ciências teóricas.
Então, enquanto a humanidade produz uma grandiosa abundância de conhecimento
científico correspondente às objetivações para si, a uma elevação do nível de consciência, os
indivíduos da classe subalterna permanecem nas objetivações em si, prisioneiros de um
mundo empírico fetichizado, no seu cotidiano, no praticismo das sínteses das atividades
alienadas e alienantes pelas relações sociais de dominação na sociedade capitalista. Portanto,
não é suficiente a existência do conhecimento científico, sistematizado, se faz necessário
viabilizar a transmissão/apropriação dos conhecimentos científicos pela classe desfavorecida
historicamente.
2.4 Em Busca de Elementos da Unidade Teoria e Prática
Anteriormente discutimos o quanto ciência e produção estão especificamente como uma
unidade teórica e prática, mas que universalmente formalizada pelo capital não se cumpre esta
unidade específica sem uma contradição, qual seja: “ao mesmo tempo em que coloca a ciência
à disposição da produção da vida e da riqueza, o faz na forma da alienação [...] de sua coação
a uma relação negativa para com as suas próprias condições de atividade” (ALVES, 2007, p.
280). Assim, a ciência se torna integrada ao capital este que a solicita transformando sua
inovação na reprodução da propriedade privada.
Mas, para Alves (idem, p. 284), ao mesmo tempo em que circunscrevem a produção ao
terreno da alienação, põem, na necessária incorporação das produções a exigência e as
condições de superação das formas alienadas de sociabilidade. Manacorda (1996, p. 63-64), já
destacava esta possibilidade de superação quando se referia a separação entre ciência e
trabalho:
A propriedade privada dos meios coletivos de produção, que é apropriação
de trabalho alheio, tem significado, também, apropriação privada da ciência
e sua separação do trabalho; esta tem mesmo negado o preexistente vínculo
entre ciência e ação, próprio da limitada produção artesanal, mas criou por
sua vez as condições para a sua própria superação. Torna inevitável a
recuperação de uma identidade entre ciência e trabalho; e tal recuperação
não pode realizar-se a não ser como reapropriação da ciência por parte de
todos os indivíduos no processo coletivo da produção moderna.
47
O autor propõe como forma de contribuir na superação da sociedade capitalista a
reapropriação da ciência, isto é, do conhecimento teórico-científico até então historicamente
acumulado pela humanidade através das objetivações para si; pois, tão-somente assim seria
possível garantir as condições de superação da propriedade privada, divisão do trabalho e
alienação.
Entretanto, quais as reais possibilidades de apropriação das objetivações para si pelo
indivíduo numa sociedade limitada regida pelo capital o qual determina o processo de
separação entre teoria e prática? Seria possível estabelecer unidade entre teoria e prática na
sociedade regia pelo capital, ou isso tão-somente seria possível no outro tipo de sociabilidade?
Markus (1974, p. 43) diz:
Com a superação da alienação, o comunismo transforma a ciência e a
sensibilidade abstrata em ciência e sensibilidade humanas. A ciência não
mais será uma esfera independente, estranha e contraposta ao indivíduo;
originando-se da consciência sensível e da necessidade, ela retornará a essas
duas fontes, enriquecendo-as. A sua independência será tão-somente um
momento relativo e transitório da unidade de pensamento e sensibilidade.
Essa última, ademais, perde sua limitada qualidade prático-egoísta: visto
que, com o desenvolvimento da produção e da ciência (e, portanto, da
verdadeira práxis característica da espécie humana), a sensibilidade se
enriquece continuamente, assimila os resultados desse desenvolvimento,
aprende a ver, a escutar, etc., “humanamente”, isto é, “naturalmente”, em
vista disso será precisamente a intuição a tornar-se capaz – graças a essa
mediação histórica – de compreender imediatamente o objeto na plenitude
das determinações que lhe são próprias, em suas qualidades específicas e, ao
mesmo tempo, em suas conexões com a totalidade, além de tornar-se capaz
de captar em sua unidade (MARKUS, 1974, p. 43, grifo original).
A citação anterior nos reporta a possibilidade de buscar a unidade teoria e prática no
atual momento da sociedade capitalista como forma de transição; pois, no comunismo15
a
ciência não seria mais independente da produção da vida material, não havendo, portanto,
necessidade de buscar esta unidade de pensamento e sensibilidade, de teoria e prática. Sendo
o próprio comunismo a superação das dicotomias de teoria e prática, este processo de unidade
será naturalizado. Sendo a busca por unidade teórica e prática na concepção marxista vista
como parte do processo de superação do capitalismo, pois, não é possível superar plenamente
os problemas e as limitações sem a superação do capital.
15
Comunismo “distingue-se de todos os movimentos que o antecederam até agora pelo fato de subverter as bases
de todas as relações de produção e de trocas anteriores e de, pela primeira vez, tratar conscientemente todas as
condições naturais até agora, de despojá-las do seu caráter natural e submetê-las ao poder dos indivíduos
reunidos” (MARX, 1998, p. 87).
48
Então, se torna viável e necessária a busca por unidade teórica e prática em direção do
processo de superação da sociedade regida pelo capital, para que esta unidade se efetive a
apropriação do conhecimento científico acumulado pela humanidade se torna imperativo e
também uma grande luta a ser travada, pois a “atividade teórica proporciona um
conhecimento indispensável para transformar a realidade, ou traçar fins que antecipam
idealmente sua transformação” (VAZQUEZ, 2007, p. 233). Além disso, fica impossível uma
unidade entre teoria e prática sem a apropriação do conhecimento acumulado historicamente.
Markus (1974, p. 89-91), enfatiza que a realidade está condicionada historicamente, mas
que será esta a situação histórica concreta que determinará a medida na qual o homem poderá
operar uma escolha livre e consciente, dentro de certos limites, entre as possibilidades
socialmente obtidas. “Mesmo numa época da maior generalização da alienação, e por mais
estreitos que sejam os limites entre os quais ele está colocado, o homem cria ele mesmo sua
vida”, pois o homem não se “submete” simplesmente à história, ele está no “eterno
movimento do vir-a-ser”.
A atividade teórica por si não transforma a realidade, mas contribui incessantemente
para a sua transformação; a sua assimilação pelos que hão de suscitar essa transformação
através das práticas efetivas é imprescindível.
A teoria em si, como em qualquer outro caso não transforma o mundo. Pode
contribuir para sua transformação, mas para isso tem de sair de si mesma e,
em primeiro lugar, tem de ser assimilada pelos que hão de suscitar, com seus
atos reais, efetivos, essa transformação. Entre a teoria e a atividade prática
transformadora se insere um trabalho de educação das consciências, de
organização dos meios materiais e planos concretos de ação; tudo isso como
passo indispensável para desenvolver ações reais, efetivas. Nesse sentido,
uma teoria é prática quando materializa, por meio de uma série de
mediações, o que antes só existia idealmente, como conhecimento da
realidade ou antecipação de sua transformação (VAZQUEZ, 2007, p. 235-
236).
Nesse sentido, a atividade teórica e atividade prática são uma unidade na qual não se
torna possível se a teoria não se realizar na prática, por outro lado, com o isolamento da
prática não há conhecimento, porque a prática não é exterior ao conhecimento, está intrínseca
na medida em que ela faz parte do conhecer, por isso, não se trata de uma prática que articule
o conhecimento, ela está no processo do conhecimento, é prática empírica e, ao mesmo
tempo, prática concreta, a primeira corresponde ao caótico, ao passo que na prática concreta
as abstrações teóricas permitem desvelar a realidade, indo além da prática imediata e
individual.
49
Segundo Vázquez (2007, p. 215), baseando-se na concepção de Lênin sobre a práxis16
, a
teoria se tornando prática permite despertar consciências, pois, “o conhecimento surge da
prática, a ela serve, ao mesmo tempo, em que a própria prática é parte necessária e
indissolúvel”. A partir disso, entendemos que a apropriação das objetivações para si, isto é,
dos conhecimentos científicos, filosóficos, artísticos etc., pode contribuir grandiosamente para
a transformação da realidade, na medida em que se torna parte da prática do indivíduo o
conhecimento em suas formas mais desenvolvidas permitindo despertar consciências.
Assim, a apropriação do conhecimento se torna uma luta a ser travada, sendo esta a
grande contribuição que a educação escolar pode dar ao processo coletivo de superação da
sociedade regida pelo capital (DUARTE, 2006, p. 98). A apropriação corresponde à atividade
mental (cognição e afetividade) e a atividade material, seria a transferência das propriedades
do objeto para a consciência do indivíduo, pois, “a consciência não é realidade senão a
consciência da prática existente, e sua orientação ou intencionalidade objectual advém
igualmente do caráter material desta prática” (MARKUS, 1974).
A inserção social do homem dá-se pela apropriação das objetivações
existentes, e apenas por esta via se torna possível para ele objetivar-se como
ser genérico. Ao se objetivar como ser genérico, o homem desenvolve suas
capacidades, suas habilidades, seus sentidos, enfim, as propriedades que lhe
confere a condição de ser humano (MARTINS, 2007, p. 48).
A partir dessa condição do ser humano, novas objetivações surgirão como resultante da
atividade de suas relações com o produto da história. Portanto, a apropriação é condição
fundamental para que a humanidade continue se desenvolvendo. A apropriação do
conhecimento pela classe subalterna, este que, como vimos anteriormente, foi apropriado de
forma privada pela classe que detém o poder material na sociedade capitalista, corresponde à
apropriação do que lhe foi negado historicamente, como forma de impedir o desenvolvimento
da totalidade das forças essenciais pelos indivíduos dessa classe.
A apropriação universal da riqueza intelectual produzida em meio às
profundas contradições geradas pelas relações sociais capitalistas é parte
necessária do processo de socialização dos bens de produção, sem o qual não
pode haver superação do capitalismo (DUARTE, 2006, p. 96).
16
Práxis ocupa lugar central na filosofia que se concebe a si mesma não só como interpretação do mundo, mas
também como elemento do processo de sua transformação. A concepção de Marx da práxis, não é, em suma, um
retorno, mas sim um avanço; é uma superação, no sentido dialético de negar e absorver tanto o materialismo
tradicional como o idealismo, o que implica, por sua vez, a tese de que não só o primeiro como também o
segundo contribuíram essencialmente para o surgimento do marxismo. Práxis não como mera atividade da
consciência, mas sim também material do homem social (VAZQUEZ, 2007).
50
Se não há apropriação das objetivações históricas referente ao conhecimento em suas
formas mais avançadas, a consequência é o esvaziamento, o empobrecimento do indivíduo em
si mesmo e de sua atividade prática. Não podendo, portanto, objetivar-se na atividade, porque
a apropriação é antecedente a objetivação, e, com efeito, sua atividade prática se torna cada
vez mais alheia, o indivíduo perde o controle consciente de si mesmo e das coisas, resultando
em alienação: ruptura entre o enriquecimento da humanidade e o indivíduo, ou seja, a
humanidade se desenvolve enquanto que o indivíduo não acompanha tal desenvolvimento.
Segundo Martins (2007, p. 137), “apenas à medida que os indivíduos puderem retornar
para si o controle consciente das transformações das circunstâncias e de si mesmo, estarão a
caminho da necessária prática revolucionária, condição essencial na superação da alienação”.
E a consciência do indivíduo se desenvolve na medida em que ele apreende a realidade,
quanto mais se aproximar da realidade pondo em relação suas impressões com os significados
socialmente já elaborados, mais consciente estará dessa realidade.
A realidade encerra a materialidade histórica dos processos de produção e
reprodução das existências dos homens. O conhecimento sobre ela é, por
conseqüência, apenas um meio através do qual a consciência, assimilando-a,
a reproduz intelectualmente. Deste modo, a atividade teórica por si mesma
em nada altera a existência concreta do fenômeno. Esta alteração apenas se
revela possível quando a atividade teórica orienta a intervenção prática
transformadora da realidade (MARTINS, s/d, p. 11).
A atividade teórica e atividade prática são indissociáveis e recíprocas, isto é, a atividade
teórica é a consciência da atividade prática humana esta última enriquece a atividade teórica
que se realiza na prática transformando a realidade. Embora, como discutiremos no próximo
capítulo, na atual sociedade capitalista existir uma defesa da atividade teórica e atividade
prática como simultâneas; como atividades que se desenvolvem ao mesmo tempo. Isso se
aproxima da concepção pragmática, por determinar uma estima pela imediaticidade e,
portanto, da atividade estritamente útil. Como afirma Marx (1983, p. 271), “toda ciência seria
supérflua se a forma de aparecimento e a essência das coisas coincidissem imediatamente”.
2.5 A Unidade Teoria e Prática: A Prática como Fundamento, Fim e Critério de
Verdade do Conhecimento Científico
Neste item, pretendemos compreender na acepção marxista especificamente a unidade
teoria e prática na construção do conhecimento científico sobre a realidade, tomando a
categoria da prática; o conceito de prática como práxis que se apresenta como atividade
51
material, transformadora e adequada a fins, que se consigna de uma correspondência teórica,
objetiva, histórica e universal (MARTINS, 2007).
O homem para garantir suas condições de existência passava a produzir sua própria
vida, diferentemente dos outros animais que se adaptam à natureza, o homem adapta a
natureza a si, transformando-a para atender as suas necessidades, ao mesmo tempo em que
transforma a si mesmo, isso significa que o homem não nasce homem, mas se forma homem;
esta formação se dá através do trabalho, por isso, o processo educativo coincide com o
processo de trabalho (atividade humana vital).
Os conhecimentos do homem existiram inicialmente sob a forma de experiência
empírica (observação da natureza e da vida social), esta experiência era passada de geração a
geração. Segundo Saviani (2007a), antes da sociedade de classes, a educação coincidia com o
próprio processo de existência, ou seja, no próprio ato de viver os homens se educavam e
educavam as novas gerações, a transmissão se dava de forma espontânea. Assim, os homens
na sociedade primitiva se apropriavam coletivamente dos meios de produção da existência.
Mas o desenvolvimento da produção conduziu à divisão do trabalho e a propriedade privada
dos meios de produção que, por conseguinte, provocou também uma divisão na educação,
penetrando-se a separação entre educação e trabalho (SAVIANI, 2007a, p. 155). A educação
escolar passava a sistematizar o acúmulo histórico de conhecimento elaborado enquanto que o
trabalho se reduzia à mera atividade prática, físico-manual.
Com o desenvolvimento da sociedade capitalista, na época moderna a concepção de
conhecimento se destacava como um sistema teórico com certa defesa de um conhecimento
na esfera independente da vida material conforme leis internas; o conhecimento científico
passava a ser formulado de acordo com as exigências de um sistema obrigatório (de métodos,
conceitos, etc.), operando na ciência interessada em avançar ela própria como um sistema de
conhecimento. Isso, sem dúvidas, possibilitou a produção científica qualitativamente. “A
escola existe, pois, para propiciar a aquisição dos instrumentos que possibilitam o acesso ao
saber elaborado (ciência)” (SAVIANI, 2005c, p.15).
As apropriações das objetivações pelos homens podem ocorrer de forma espontânea na
sociedade. No entanto, com o advento da escola moderna a educação escolar com o
desenvolvimento do trabalho educativo, se torna o meio de selecionar dentre as objetivações
do gênero humano o que é essencialmente humano 17
para o desenvolvimento do homem de
17
O conceito de essência humana seleciona e sintetiza dentre as possibilidades geradas pelo processo de
desenvolvimento do gênero humano, aquelas cuja realização é vista como a mais humanizadora pela concepção
histórico-social. O conceito de essência humana expressa, portanto, uma direção do processo histórico de
52
forma a reproduzir, transmitir em cada indivíduo singular a humanidade produzida social e
historicamente pelo conjunto dos homens (SAVIANI, 2008a, p. 13).
Em relação ao trabalho educativo18
, Duarte (2003, p. 34-35) desdobra a conceituação do
Saviani afirmando que este produz nos indivíduos singulares a humanidade, com a finalidade
de cada indivíduo singular se apropriar da humanidade produzida, dos elementos da cultura
aqueles essenciais para o desenvolvimento humano. “Portanto, a referência fundamental é
justamente o quanto o gênero humano conseguiu desenvolver-se ao longo do processo
histórico de sua objetivação”, não existindo uma “essência humana independente da atividade
histórica dos seres humanos, da mesma forma que a humanidade não está imediatamente dada
nos indivíduos singulares”.
Em suma, o trabalho educativo “situa-se em uma perspectiva que supera a opção entre a
essência humana abstrata e a existência empírica” (DUARTE, 2003, p. 36). O trabalho
educativo formulado por Saviani busca na diversidade das objetivações do gênero humano o
que é essencial para que o indivíduo singular possa apropriar e, consequentemente,
desenvolver a generecidade humana, de forma a não considerar a essência humana como mera
cultura abstrata, estática, última e pragmática, mas na perspectiva da lógica dialética, a qual
considera o concreto, o histórico-objetivo, o movimento e a dinâmica das objetivações
humanas.
A ciência é originaria do desenvolvimento da capacidade humana a partir de uma
unidade específica entre teoria e prática, mas que com o desenvolvimento da sociedade
capitalista, por meio da divisão do trabalho, o conhecimento produzido se destacava da
atividade prática, separação entre pensamento e trabalho. Entretanto, Kopnin (1972, p. 39)
chama a atenção para a relação não independente entre pensamento e trabalho:
humanização, o que equivale a dizer que esse conceito traduz um posicionamento sobre o que se entende por ser
humano, por humanização (DUARTE, 1999, p. 69). Em suma, podemos dizer que de tudo que o ser humano
produz sócio-historicamente (gênero humano) a essência humana corresponde aquilo que lhe é mais
humanizadora, isto é, o essencial refere-se ao fato que entre as forças (materiais e não materiais) que o homem
vai produzindo, algumas se tornam essenciais, embora algumas forças não estivessem presentes em toda a
história, mesmo em se tratando de uma força recente como, por exemplo, a ciência, esta se torna essencial para o
ser humano. As forças essenciais têm níveis diferentes; às vezes estão no cotidiano e podem ser apropriadas de
forma espontânea, outras vezes não, portanto, faz-se necessária a transmissão intencional das forças essenciais,
neste caso, a transmissão intencional se torna ela mesma em uma força essencial para a humanidade avançar.
Enquanto o gênero humano é a totalidade das relações sociais e da cultura que envolve a atividade do homem
que reúne não apenas características positivas, mas também negativas que precisam ser superadas, a essência
humana seleciona e sintetiza nessa totalidade o que historicamente corresponde ao que é mais essencial no
sentido humanizador. 18
O trabalho educativo é considerado um trabalho não-material, embora se diferenciar de um trabalho não-
material, pois, neste o produto se separa do produtor, ou seja, a produção e o consumo se dão em tempos
distantes. No trabalho educativo o produto não se separa do produtor, a aula que é produzida pelo professor é
consumida pelo aluno, ao mesmo tempo em que é produzida (SAVIANI, 2008a).
53
O pensamento surge à base do trabalho e, em certo sentido, é análogo ao
trabalho: repete-o de maneira original. Em realidade, o trabalho pressupõe
um objeto da natureza que deve ser substituído para que ele atenda às
necessidades do homem; os instrumentos, com os quais o homem atua sobre
o objeto; a atividade do homem, que põe em movimento seus instrumentos.
O pensamento tem objeto, ao qual está dirigido com a finalidade de concebê-
lo; os instrumentos da atividade reflexiva na forma de propriedades captadas
e fenômenos lógicos da atividade objetiva e fixados nos conceitos; a própria
atividade reflexiva, que conduz o homem a novos conceitos e teorias.
O que o autor quer salientar é que o pensamento19
possibilitou o desenvolvimento do
domínio consciente, do refletir consciente sobre a realidade de forma integrada às condições
concretas, os meios e os modos de ação. Este desenvolvimento da consciência também
conduz ao desenvolvimento do trabalho. Assim, por meio do trabalho, enquanto atividade
teórica e prática, o homem produz novos conceitos e teorias, produz conhecimento.
Dessa forma, podemos dizer que o conhecimento “vai se desenvolvendo de conteúdo
em conteúdo [...]. O resultado contém seu próprio começo e o desenvolvimento desse começo
foi se enriquecendo com uma nova determinação” (VAZQUEZ, 2007, p. 206). Lênin
acrescenta:
O conhecimento é a aproximação eterna, infinita, do pensamento ao objeto.
O reflexo da natureza no pensamento do homem deve ser entendido não “de
forma inerte”, não “de forma abstrata”, não carente de movimento, não
carente de contradições, mas no eterno processo do movimento, no
surgimento das contradições e de sua solução (LENIN apud
VAZQUEZ, 2007, p. 206).
O conhecimento é o reflexo da realidade, mas a citação acima ressalta que não se trata
de um reflexo passivo, ou reflexo no espelho, “o conhecimento é um processo mediante o
qual se transforma os dados empíricos iniciais em um sistema de conceitos (nível teórico),
portanto, uma atividade cognoscitiva criadora” (VAZQUEZ, 2007, p. 207). Assim, o
conhecimento não é algo imediato, no nível das sensações, mas um resultado que se alcança
na fase do pensamento, por uma série de operações abstratas que não estão desvinculadas da
prática, porque a atividade prática do homem é orientada de acordo um fim consciente.
A imagem consciente, a representação, o conceito têm uma base sensível.
Todavia, o reflexo consciente da realidade não se limita ao sentido sensível
que dele se tem. Já a simples percepção de um objeto não a reflete apenas
como possuindo uma forma, uma cor, etc., mas também como tendo uma
19
Leontiev (1978, p. 84), diz que o pensamento é “o processo de reflexo consciente da realidade, nas suas
propriedades, ligações e relações objetivas, incluindo mesmo os objetos inacessíveis à percepção sensível
imediata. O homem, por exemplo, não percebe os raios ultravioletas, mas nem por isso desconhece a sua
existência e suas propriedades. Que torna possível este conhecimento? Ele é possível por via de mediações. É
esta a via que é a via do pensamento”.
54
significação objetiva e estável determinada, como, por exemplo, alimento,
instrumento etc. Por conseqüência, deve existir uma forma particular de
reflexo consciente da realidade, qualitativamente diferente da forma sensível
imediata do reflexo psíquico próprios dos animais (LEONTIEV, 1978, p. 85)
O conhecimento não é um reflexo simples imediato nem total; é um processo feito de
uma série de abstrações, da formação e desenvolvimento de conceitos, isto é, atividade teórica
que é reflexo ativo ou reprodução conceitual do objeto constitui o conhecimento vinculado
necessariamente a prática (VAZQUEZ, 2007).
Segundo Kopnin, o “reflexo da realidade não se identifica no sentido da cópia mecânica
com a própria realidade, pois nem o reflexo é a realidade nem ela é o seu reflexo, existindo
entre eles certa forma de ligação pela qual, e ao mesmo tempo, ambos se opõem e coincidem”
(apud MARTINS, 2007, p. 63). Pois, como discutido no primeiro item, a consciência define-
se como um sistema de conhecimentos que se formam na medida em que o homem apreende
a realidade objetiva, uma realidade independente do indivíduo, mas que o mesmo põe em
relação a esta realidade objetiva suas impressões de acordo com os significados elaborados
socialmente.
Entretanto, a correlação entre a consciência social e a consciência individual não se
sobrepõe uma a outra, depende das condições concretas da própria vida do indivíduo, das
apropriações das objetivações para si, isto é, a apropriação das objetivações para si pelo
indivíduo lhe possibilita uma elevação à genericidade humana, a partir disso um
reconhecimento de si mesmo enquanto gênero humano bem como de suas singularidades, sua
individualidade, podendo assim o indivíduo se objetivar (transferir o que estar no indivíduo
para as propriedades do objeto).
Numa definição sintética, “o conhecimento, como elemento indispensável e premissa da
atitude prática do homem para com o mundo, é um processo de criação das ideias, dirigidas a
um fim que refletem com perfeição a realidade objetiva sob as formas de sua atividade”
(KOPNIN, 1972, p. 25). O autor completa afirmando que a objetividade do conteúdo da
atividade prática “é demonstrada no processo de concretização dos resultados dos
pensamentos teóricos, [...] quando o mundo criado pela cabeça do homem transforma-se no
mundo real” (idem, p. 44).
O conhecimento tem sua base na atividade prática do homem que fornece o objeto, e o
conhecimento fornece a ideia do objeto e o meio prático de consegui-lo, o conhecimento
expressa a assimilação do objeto pelo homem da mesma forma que o homem organiza o
conhecimento para produzir na prática o mundo das coisas (KOPNIN, 1972), isto é unidade
teoria e prática, numa relação recíproca a prática fundamenta e enriquece a teoria, e a teoria
55
plasmada transforma a realidade objetiva, por que embora seja uma realidade independente do
indivíduo, este pode operar sobre a realidade de modo consciente, claro que de acordo com as
condições históricas e subjetivas de sua relação com o mundo.
Na afirmação, “os filósofos limitam-se a interpretar o mundo de distintos modos: do que
se trata é de transformá-lo”, Marx enfatiza a prática revolucionária como transformação da
sociedade e “se refere ao papel decisivo da prática na solução de problemas teóricos, [...] sua
solução não pode ser apenas, de modo algum, um problema de conhecimento, mas uma tarefa
real, de vida” (VAZQUEZ, 2007, p. 133). O conhecimento não pode se limitar a
contemplação ou interpretação, pois o conhecimento “é conhecer os objetos que se integram
na relação entre o homem e o mundo que se estabelece graças à atividade prática humana”
(idem, p. 144).
A prática é fundamento e limite do conhecer e do objeto humanizado que,
como produto da ação, é objeto do conhecimento. Fora desse fundamento ou
para além desse limite está a natureza exterior que ainda não é objeto da
atividade prática e que, enquanto permanecer em sua existência imediata,
vem a ser uma coisa em si exterior ao homem, destinada a converter-se em
objeto da práxis humana e, portanto, em objeto do conhecimento
(VAZQUEZ, 2007, p. 144).
A atividade real, prática, é adequada a fins, portanto, a ação transformadora da realidade
tem um caráter teleológico, o conhecimento teórico cumpre a função prática de elevar o
caráter racional para a prática poder avançar e também na unidade íntima com ela a teoria
poder servir a transformação da realidade. Portanto, são três características do conhecimento:
1) o conhecimento como processo de desenvolvimento humano; 2) o conhecimento como
atividade do sujeito; e 3) o conhecimento inclui a prática.
Assim, podemos dizer que a prática não é uma atividade meramente subjetiva, o mundo
objetivo ao determiná-la faz dela uma forma objetiva. Com o isolamento da prática não há
conhecimento, pois o conhecimento é ideia realizada, efetiva e prática do sujeito.
A atividade prática humana é propriamente tal quando ultrapassa esse lado
subjetivo, ideal ou, mais exatamente, quando o sujeito prático transforma
algo material, exterior a ele, e o subjetivo se integra assim em um processo
objetivo. [...] A atividade do sujeito prático nos é oferecida nessa dupla
vertente: por um lado é subjetiva enquanto atividade de sua consciência,
mas, em um sentido mais restrito, é um processo objetivo na medida em que
os atos ou operações que executa sobre uma dada matéria que existe
independentemente de sua consciência, de seus atos psíquicos, podem ser
comprovados inclusive objetivamente por outros sujeitos (VAZQUEZ, 2007,
p. 262).
56
A prática é parte integrante do conhecimento, pois a teoria não é exterior à prática. O
conhecimento surge da prática, a ela serve ao mesmo tempo em que a própria prática é parte
necessária e indissolúvel. O que caracteriza a atividade prática é a ação sobre uma matéria de
caráter objetivo dos meios com que se atua e do resultado, e a atividade teórica caracteriza-se
por somente existir em relação à prática, já que nela encontra seu fundamento, seus fins e
critério de verdade. O conhecimento é um meio de assimilação prática da realidade.
O pensamento empírico, derivado direto da atividade sensorial do homem
sobre os objetos da realidade é, indiscutivelmente, a forma primária de
pensamento, levando ao conhecimento do imediato da realidade, isto é, ao
conhecimento da realidade em suas manifestações exteriores. Pautando-se
em princípios da lógica formal, o conhecimento empírico é absolutamente
racional, revelando aspectos do objeto que se expressam pela categoria da
existência presente, a exemplo de quantidade, qualidade, propriedade,
medida, classe etc.
Diferentemente, o pensamento teórico apreende o objeto em suas relações
internas e leis que regem o seu movimento, compreensíveis por meio de
elaborações racionais dos dados dispostos pelo conhecimento empírico. Sua
forma lógica é constituída pelo sistema de abstrações que explica o objeto,
isto é, pelos conceitos, visando reproduzir o seu processo de transformação.
Ultrapassando os limites do que é dado pela experiência, a racionalidade
teórica não é simplesmente a forma ordenada (definidora, caracterizadora,
classificatória, etc.) de expressão da experiência, mas sim o recurso, a
ferramenta por meio da qual apreende-se um novo conteúdo, não passível de
observação imediata do aparente (ABRANTES; MARTINS, 2007, p. 316).
Dessa forma, entendemos que não se pode permanecer no empírico, no conhecimento
imediato da realidade, faz-se necessário elevar-se por meio do pensamento teórico. Então, “a
construção do pensamento se daria, pois, da seguinte forma: parte-se do empírico, passa pelo
abstrato e chega ao concreto. [...] O concreto não é o ponto de partida, mas o ponto de
chegada do conhecimento. E, no entanto, o concreto é também ponto de partida” (SAVIANI,
2004, p.04). O autor complementa dizendo ser o concreto ponto de partida o real e o concreto
ponto de chagada, o pensado, sendo o empírico e o abstrato processo do conhecimento, da
apropriação do concreto no pensamento.
O conhecimento teórico é prenhe de conteúdos empíricos, que, por sua vez,
se configuram como conhecimento verdadeiramente humano, por suas
mediações teórico-abstratas. Esta é a síntese representativa da concepção
materialista de práxis. Se, por um lado, as abstrações, os conceitos se
distanciam do objeto, por outro lado, nada há mais apto para se aproximar da
sua essencialidade, uma vez que o verdadeiro conhecimento não nos é dado
pela contemplação viva ou pelo contato imediato. Por exemplo, o código
genético (concreto pensado) jamais será apreendido imediatamente pela
observação do sangue (concreto aparente); no entanto, o homem tornou-se
capaz de conhecê-lo por meio do pensamento abstrato, ao distanciar-se
temporariamente do concreto aparente, que, perdendo sua concretude
57
superficial, adquire outro modo de existência: a existência como abstração.
Esta, por sua vez, alcança outro nível de concretude representada por teses
teóricas, equações, ideografias etc. que, em toda sua abstração e abrangência,
se aplicam e guiam a prática concreta sustentada por tais conhecimentos
(ABRANTES; MARTINS, 2007, p. 317-318).
O empírico não é o concreto, pois o concreto é histórico, possui totalidade e se revela na
e pela atividade teórica e prática. Permanecer no empírico é tomar a experiência prática como
única realidade possível, caracterizando um esvaziamento teórico da atividade. O
“pensamento é uma “prática” que permite superar o imediato e as “facilidades” do empírico,
[...]. Sintetiza contradições entre distintos conhecimentos produzidos e se impõe como
resultado de uma luta de posições entre diferentes pensamentos que se negam ou que se
afirmam” (ABRANTES; MARTINS, 2007, p. 319).
A atividade teórica proporciona um conhecimento indispensável para transformar a
realidade, mas é certo reafirmar que a atividade teórica por si não transforma o mundo, ela
transforma nossa visão ou concepção do mundo, mas não o modifica diretamente. Assim
como a prática isolada ou em um sentido utilitário também não transforma, não podemos nos
dobrar facilmente aos ditames de uma prática esvaziada de teoria. Pois, a utilidade prática no
pragmatismo deduz que o verdadeiro se reduz ao útil e a teoria como justificação e não como
esclarecimento e guia de uma práxis, que por sua vez, fundamenta e enriquece (VAZQUEZ,
2007, p. 241). Eis aqui uma diferença essencial entre utilidade ou função prático-social do
conhecimento no marxismo e a utilidade no pragmatismo:
É evidente que quando o marxismo fala da utilidade ou função prático-social
da ciência, coloca-se em um plano muito diferente, pois não se trata da
utilidade nesse sentido estritamente egoísta, mas sim da utilidade social. O
conhecimento verdadeiro é útil na medida em que, com base nele o homem
pode transformar a realidade. O verdadeiro implica uma reprodução
espiritual da realidade, reprodução que não é reflexo inerte, mas sim um
processo ativo que Marx definiu como ascensão do abstrato ao concreto em
e pelo pensamento, e estreita vinculação com a prática social. O
conhecimento é útil na medida em que é verdadeiro, e não verdadeiro por
que é útil, como sustenta o pragmatismo (VAZQUEZ, 2007, p. 243).
No início da produção material humana, como vimos anteriormente, o conhecimento
empírico era o suficiente para atender as necessidades do homem, este conhecimento está
associado a uma prática limitada. Com o desenvolvimento do homem e surgimento dos
primeiros instrumentos de trabalho, assim como o surgimento das primeiras práticas
produtivas e desenvolvimento das forças produtivas, foi-se aumentando as exigências em
relação ao conhecimento, a ciência, que ganha amplitude na época moderna.
58
A necessidade de responder às exigências da produção contribuiu poderosamente para o
desenvolvimento da ciência. No atual contexto, a produção continua determinando novas
necessidades que se manifestam em um enriquecimento incessante da teoria, da ciência. “Ao
chegar a sociedade a certo grau de desenvolvimento, a produção não só determina a ciência,
como esta integra na própria produção” (VAZQUEZ, 2007, p. 249), contendo uma específica
relação entre teoria e prática, ao mesmo tempo em que, como também explicitamos acima,
determina a cisão entre teoria e prática, por meio da filosofia idealista de construção do
conhecimento com base na separação entre consciência e ação, na não integração da prática
como fundamento e fim do conhecimento.
A prática determina a teoria não só como sua fonte – prática que amplia com
suas exigências o horizonte de problemas e solução da teoria, mas também
com fim – como antecipação ideal de uma prática que ainda não existe,
demonstra, por sua vez, que as relações entre teoria e prática não podem ser
vistos de um modo simplista ou mecânico, a saber: como se toda teoria se
baseasse de um modo direto e imediato na prática (VAZQUEZ, 2007, p.
256).
Mas a prática não só funciona como fundamento e fim da teoria, mas também como
critério de verdade. Entretanto, “não pode extrair a conclusão de que a teoria e a prática se
identifiquem, ou de que a atividade teórica se transforme automaticamente em prática. Impede
chegar a essa conclusão o fato de que a prática não fala por si mesma” (VAZQUEZ, 2007, p.
259). O critério de verdade da teoria não se verifica de modo imediato no campo empírico,
embora a prática tenha primazia em relação à teoria, esta primazia não pode dissolver a teoria
na prática e nem a prática na teoria, isto é, não significa que a prática sempre se torna teórica,
tampouco que a prática dilui a teoria, por manter relações de unidade e não de identidade,
uma unidade que pressupõe não idêntica, mas de mútua independência.
Segundo Vázquez (2007), a teoria pode ter uma autonomia em relação à prática, porém
uma autonomia relativa, uma vez que a prática é fundamento, fim e critério de verdade. Esta
autonomia se torna indispensável para que a teoria sirva à prática, já que a teoria não se dá de
modo imediato, direto e simultâneo com a prática. Assim, Kopnin (1978, p. 170-171) reafirma
e também faz uma ressalva em relação à autonomia do pensamento:
O pensamento está ligado à prática e é por esta condicionado, mas em seu
movimento ele é relativamente autônomo e pode afastar-se da prática. Esse
afastamento do pensamento em relação à prática pode ter duplo sentido. Em
alguns casos leva o pensamento a divorciar-se da prática, quando o
pensamento se encerra em si mesmo e considera seu movimento como sendo
absolutamente autônomo e independente do mundo objetivo e da atividade
prática. Noutros casos, o afastamento do pensamento da prática imediata é
59
até necessário para servir mais plena e efetivamente às necessidades da
própria prática. O pensamento pode atuar ativamente sobre a prática só
quando está vinculado ao mundo objetivo com base na lógica interna do seu
desenvolvimento; então ele chegará a resultados que abrem amplas
perspectivas de desenvolvimento da prática e são muito promissores.
O pensamento só pode atuar ativamente quando o conceito de prática se torna práxis,
isto é, quando a prática tem correspondência essencialmente com a teoria, com a realidade
objetiva, histórica e universal. Esta correspondência não é espontânea nem imediata com a
atividade prática individual. Não é o indivíduo quem determina a realidade objetiva, esta
existe de forma independente dele, o indivíduo precisa se apropriar desta realidade objetiva,
histórica e universal para se reconhecer enquanto ser humano e sujeito singular se tornando
sujeito capaz de transferir o que estar em si para o objeto, para esta realidade.
O conhecimento só pode ser verdadeiro quando incorpora conteúdo objetivo em relação
à prática humano-social, por que o pensamento não se movimenta em relação às opiniões e
noções puramente subjetiva, mas no campo do desenvolvimento do conteúdo objetivo, “o
nível da prática humana depende do grau de desenvolvimento do sujeito, mas ela é
condicionada por um tipo preciso de realidade objetiva, a medida e as formas sob as quais esta
se inseriu e determinou a atividade do sujeito” (KOPNIN, 1978, p. 169).
Dessa forma, a prática tem caráter dialético, na mediada em que a prática do indivíduo é
determinada por uma realidade objetiva, mas a depender do grau de desenvolvimento do
indivíduo este pode interferir na realidade objetiva de forma transformadora ou não
transformadora; além disso, a prática pode ser absoluta e relativa ao mesmo tempo: absoluta
conforme a objetividade e relativa no sentido de que não se pode confirmar ou rejeitar
inteiramente nenhuma espécie de concepção humana (LENIN apud KOPNIN, 1978, p. 171).
A atividade prática humana é propriamente tal quando ultrapassa esse lado
subjetivo, ideal ou, mais exatamente, quando o sujeito prático transforma
algo material, exterior a ele, e o subjetivo se integra assim em um processo
objetivo. [...] A atividade do sujeito prático nos é oferecida nessa dupla
vertente: por um lado é subjetiva enquanto atividade de sua consciência,
mas, em um sentido mais restrito, é um processo objetivo na medida em que
os atos ou operações que executa sobre uma dada matéria que existe
independentemente de sua consciência, de seus atos psíquicos, podem ser
comprovados inclusive objetivamente por outros sujeitos (VAZQUEZ, 2007,
p. 262).
Segundo Kopnin (1978, p. 169), a teoria por si não transforma, mas a prática em si
altera, pois, “a prática é unidade do sujeito com o objeto, é ativa por forma e concreto-
sensorial por conteúdo e resultados”. Então, toda prática seja social ou individual, ela em si
60
produz mudanças, produz resultados, mesmo que estes não sejam no sentido transformador. A
prática muda o objeto. A teoria só transforma quando plasmada, realizada na prática.
Com efeito, para Marx o critério de verdade não é uma questão teórica, mas prática:
A questão de saber se cabe ao pensamento humano uma verdade objetiva
não é uma questão teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve
demonstrar a verdade, isto é, realidade e o poder, o caráter terreno de seu
pensamento. A disputa sobre a realidade ou não-realidade do pensamento
isolado da práxis - é uma questão puramente escolástica. (Tese II, MARX e
ENGELS, 1996, p. 12 – grifos no original).
O critério de verdade está na prática, mas aqui também se apresenta outra diferença
essencial em relação ao pragmatismo:
A prática que Marx tem em mente é algo que não coincide com o objetivo
individual em que se verifica a validade de um pensamento, que é a posição
característica de certo pragmatismo. Marx fala, no entanto, de modificar o
mundo, isto é, de uma atividade na qual a sociedade humana está fortemente
empenhada e que representa de certa maneira, todo o processo da sua
história: apropriar-se da natureza de modo universal, consciente e voluntário,
modificá-la e, ao modificar a natureza e seu próprio comportamento em
relação a ela, modificar a si próprio, como homem. Esta alusão ao caráter
não individualista, mas social e “genericamente” humano do pensamento de
Marx é o quanto basta para distinguir claramente da tese pragmática. Para
Marx, não se trata apenas de coincidência de uma determinada hipótese da
análise, entre pensamento e um determinado resultado prático, mas,
sobretudo, de não fazer do pensamento uma “ideologia”, isto é, um
pensamento alienado; verificar a validade de um pensamento no plano
genericamente humano e social, como capacidade de transformar a natureza
e a sociedade e não apenas perseguir objetivos imediatos (MANACORDA,
1996, p. 126-127).
Vázquez (2007, p. 242) acrescenta que não se trata da eficácia da teoria na prática, pois
o critério de verdade para o pragmatismo é o êxito, a eficácia da ação prática do homem
entendida como prática individual. “Para o marxismo é a prática, mas concebida como
atividade material, transformadora e social. Enquanto que para o pragmatista o êxito revela a
verdade [...] Para o marxista a correspondência ou não de um pensamento com a realidade”.
Portanto, a prática social pressupõe domínios teóricos e práticos e, assim
sendo, quando o sujeito do conhecimento empreende um pensamento sobre a
realidade, tendo em vista nela intervir, a qualidade de sua intervenção estará
na dependência dos domínios conceituais que lhe estão disponibilizados, ou
seja, o pensamento (como expressão da capacidade de conhecer) não é um
bem espontâneo que se ativa automaticamente quando um indivíduo é
exposto à realidade. Ele se desenvolve como conquista do ser social, em
processos de ensino, cujo acervo resulta da história humana objetivada como
riqueza pela ação práxica dos indivíduos que se apropriam dessas conquistas
históricas. O indivíduo que pensa a realidade e sobre ela age, somente pode
fazê-lo por meio da apropriação das conquistas históricas objetivadas. A este
61
indivíduo não é suficiente experimentá-la nos seu aspecto imediato e
empírico; para ele, é fundamental apropriar-se dos resultados daquilo que o
ser humano produziu de sistemas explicativos sobre a realidade, no recorte
do que almeja conhecer e nas relações destes aspectos com questões mais
gerais da sociedade e do desenvolvimento histórico do ser humano.
Desse modo, temos como fundamental a formação do sujeito do pensamento
nos moldes do pensamento teórico que pressupõe a unidade contraditória
entre teoria e prática, entre o abstrato e o concreto, entre o conhecimento
empírico e o teórico. Quando afirmamos a unidade contraditória entre estes
pólos distintos, não estamos pressupondo uma harmonia tranqüila entre eles,
mas sim tensão e luta. As teorias, por exemplo, se desenvolvem no sentido
de explicar a realidade, mas a realidade, em seu movimento, impõe desafios
à teoria, apontando demandas que ela ainda não necessariamente possa
contemplar, ou seja, a relação teoria – prática supõe tensões e movimentos
contínuos (ABRANTES; MARTINS, 2007, p. 319-320).
Em suma, para o desenvolvimento de uma prática social transformadora se torna
indispensável a apropriação do conhecimento acumulado socialmente pela humanidade, no
sentido de qualificar a intervenção prática do homem sobre a realidade. Pois, como os autores
destacam utilizando como imagem o “mergulho” necessário na prática, um indivíduo imerso
na realidade imediata sem apoio dos conceitos que sintetiza a experiência histórica do ser
humano, corre o risco de se afogar numa imensidão de informações caóticas ou, no melhor
dos casos, realizar avanços lentos e insignificantes à custa de muito se debater, como aquele
que não foi ensinado a nadar e é atirado na água (idem, ibidem).
É claro que, como a citação acima nos esclarece esta relação teórica e prática não se dá
harmoniosamente, pressupõe uma unidade contraditória entre o empírico e o concreto, o
subjetivo e o objetivo. Entretanto, as contradições subjetivas em relação às dificuldades de
apreensão da realidade, não podem ser confundidas com as contradições da realidade objetiva.
O pensamento deve resolver estas contradições entre o sujeito e o objeto, nesse sentido, o
Kopnin diz:
A subjetividade do pensamento, por sua vez, é contraditória e desempenha
duplo papel no desenvolvimento deste. Por um lado, a existência do
subjetivo no conteúdo do pensamento é uma prova do seu caráter ilusório, da
unilateralidade, falta de plenitude. Neste sentido, cada passo no movimento
do pensamento representa a eliminação do subjetivo em seu conteúdo. Por
outro lado, porém, essa limpeza se realiza por meio da mesma interferência
subjetiva, ativa do sujeito, do lançamento, por este, de novas construções
teóricas que exigem demonstração, verificação (KOPNIN, 1978, p. 179).
Esta unidade contraditória da relação sujeito e objeto consideram a necessidade de
apropriação do conhecimento social e historicamente acumulado pela humanidade para o
desenvolvimento do pensamento, pois, para se produzir um novo conhecimento, esta
apropriação é primordial, assim como para uma interferência qualitativa na realidade objetiva.
62
Principalmente, no que se refere à construção do conhecimento, para o pensamento refletir o
objeto com todas as suas contradições internas, isto é, contradições relacionadas tão-somente
ao objeto em si, e não ao sujeito.
Diante a produção do novo conhecimento, consideramos importante destacar que o
homem tem sua característica criadora em relação ao mundo, esta criação corresponde às
exigências e necessidades práticas, de sua atividade prática no sentido de satisfazê-las. Então,
assim sendo, o homem não sente necessidade de criar o tempo inteiro, tão-somente sentirá
quando novas necessidades surgirem. Como Vázquez (2007, p. 267) afirma, “o homem não
vive em um constante estado criador [...]. Repete, portanto, enquanto não se vê obrigado a
criar. Porém, criar é para ele a primeira e mais vital necessidade humana, por que só criando,
transforma o mundo”.
Conforme a criação, as objetivações e as apropriações para criar novas objetivações, a
geração de uma realidade humana se torna cada vez mais enriquecida por novas forças, novas
capacidades e novas necessidades humanas. Porém, a objetivação e apropriação não aparecem
somente quando o ser humano cria algo absolutamente novo, a repetição da produção de um
objeto já existente é também um processo tanto de objetivação quanto de apropriação.
Objetivação e apropriação enquanto processos de reprodução de uma realidade existente não
se separam absolutamente da objetivação e apropriação enquanto geração do novo. Vale
ressaltar que a relação entre objetivação e apropriação enquanto dinâmica da atividade vital
humana geradora do processo histórico não pode ser reduzida ao processo de produção e
utilização de instrumentos (DUARTE, 1999, p. 36-37).
Entretanto, o desenvolvimento da sociedade capitalista coincide com a elevação da
produtividade, a multiplicação de produtos, os interesses desta sociedade exigiam não a
produção de artigos únicos, mas sim a produção em série e massiva que só se tornou possível
com a máquina e mecanização da produção, determinando uma atividade de trabalho não
criativa ou criadora. Essa atividade repetitiva obsessivamente implica a destruição da unidade
da consciência (que projeta) e da mão (que realiza) (VAZQUEZ, 2007).
No atual contexto da sociedade capitalista as atividades adaptativas e repetitivas
continuam. Porém, as exigências são de uma atividade criativa na qual o trabalhador possa
estar colaborando com a empresa, assim como, através dessa atividade criativa possam criar
novos produtos, novos conhecimentos, não para atender necessidade práticas humanas
essenciais, e sim o mercado interno de produtos supérfluos. Este mercado cria a necessidade
no indivíduo de consumir, criando um fetiche da mercadoria, alienação. Mas, as condições
para se desenvolver uma atividade criativa não lhe são dadas, ou dadas de forma desigual
63
conforme a divisão de classes, pois desenvolver a consciência da práxis nos indivíduos se
torna uma ameaça para a sociedade regida pelo capital. Por que, como afirma Vázquez:
A consciência não só se projeta, se plasma, como se sabe a si mesmo como
consciência projetada, plasmada, ou, o que dá no mesmo, sabe que a
atividade que rege as modalidades do processo prático é sua, e que, além
isso, é uma atividade procurada ou desejada por ela. A essa consciência que
se volta sobre si mesma, e sobre a atividade material em que se plasma,
podemos denominá-la consciência da práxis (VAZQUEZ, 2007, p. 293).
O autor fala de uma autoconsciência. Para Martins (2004), a autoconsciência implica,
para além do conhecimento sobre si, o conhecimento sobre si em suas intersecções com o
mundo circundante, pelo qual o indivíduo se reconhece na realidade mais ampla na mesma
medida em que a reconhece em si, permitindo ao homem a efetivação de sua essência como
um ser que trabalha de forma consciente, universal e livre. Dessa forma, a sociedade
capitalista em suas formas alienadas e alienantes de produção da vida material e não material
não possibilita o desenvolvimento da consciência práxica ou autoconsciência.
Assim, as ideias surgem de acordo com as circunstâncias concretas. No entanto, as
ideias podem ser expressas de forma falsa, deformadas ou ilusórias, neste caso, relacionadas
aos interesses de reprodução das formas de dominação e alienação na sociedade capitalista.
Noutro sentido, as ideias podem ser realizadas numa práxis intencional dos homens enquanto
sujeito histórico, isto é, sujeitos criadores de sua própria história a partir da sua atuação de
acordo com os limites de uma estrutura que fixam relações de independência com outros
membros da sociedade.
A transformação da realidade histórica e social tem como base o conhecimento das leis
fundamentais que rege o objeto, as estruturas sociais. No curso da relação teoria e prática
leva-se em conta a legalidade do objeto de sua ação para poder desarticulá-lo e submetê-lo, é
“onde o marxismo mostra seu valor prático, justamente pelo seu caráter científico”
(VAZQUEZ, 2007, p. 395). Portanto, “a prática é fonte, impulso e sanção da teoria” (MARX,
1998, p. 32).
Portanto, a unidade da teoria e prática compreende-se numa forma dialética, do
movimento dinâmico da prática social, e dos indivíduos como produtos e produtores de sua
história, portanto, trata-se de uma dialética histórica da filosofia da práxis.
[...] entendo-a como um conceito sintético que articula teoria e prática. Em
outros termos, vejo a filosofia da práxis como uma prática fundamentada
teoricamente. Se a teoria desvinculada da prática se configura como
contemplação, a prática desvinculada da teoria é puro espontaneísmo. É o
64
fazer pelo fazer. Se o idealismo é aquela concepção que estabelece o
primado da teoria sobre a prática, de tal modo que ela se dissolve na teoria, o
pragmatismo fará o contrário, estabelecendo o primado da prática. Já a
filosofia da práxis tal como Gramsci chamava o marxismo, é justamente a
teoria que está empenhada em articular a teoria e a prática. Unificando-as na
prática. É um movimento prioritariamente prático, mas que se fundamenta
teoricamente. Alimenta-se da teoria para estabelecer o sentido, para dar
direção à prática. Então a prática tem primado sobre a teoria, na medida em
que é originante. A teoria é derivada. Isso significa que a prática é, ao
mesmo tempo, fundamento, critério de verdade e finalidade da teoria. A
prática, para desenvolver-se e produzir suas conseqüências, necessita da
teoria e precisa ser por ela iluminada (SAVIANI, 2005c, p.141-142).
Como vimos nos itens anteriores, o processo de divisão do trabalho, divisão entre o
trabalho material e o trabalho intelectual, condiciona a divisão da sociedade em classes, a
apropriação privada do conhecimento e a separação entre teoria e prática, determinando uma
cisão entre a atividade humana e os produtos desta, determinando também um tipo de
educação para a classe subalterna baseada nas atividades manuais e abstratas; e outro tipo de
educação para a classe dominante fundada nas apropriações das ciências para formar os
dirigentes da sociedade.
É certo que a divisão do trabalho na sociedade capitalista tornou possível a produção e
acúmulo do conhecimento científico, mas que atrelada ao capital e, portanto, as suas formas
alienadas
de produção e apropriação, geram consequências negativas em relação à
compreensão da realidade e à socialização do conhecimento. No entanto, vale ressaltar, que
mesmo se tratando de configurações alienadas de produção e apropriação da ciência na
sociedade capitalista, defendemos como uma das formas de contribuir na luta por outra
sociabilidade a apropriação da ciência por meio da educação formalizada, na qual a produção
da humanidade historicamente acumulada está sistematizada.
Então, a luta para que a classe trabalhadora se aproprie da ciência por meio da educação
formal, representa no atual contexto uma luta contra as imposições da sociedade capitalista. É
desta posição que partimos na continuidade de nossas análises neste trabalho, pois, como
Lênin em sua citação no início do capítulo enfatiza, faz-se necessária a assimilação do tesouro
de conhecimentos acumulados pela humanidade, a soma de conhecimentos dos quais o
comunismo é consequência. Assim é que se possibilita a unidade teórica e prática, por que
não há esta unidade sem que se tenha apropriado do conhecimento acumulado historicamente.
65
3. A PEDAGOGIA COMO CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO A PARTIR DAS BASES TEÓRICAS -
HISTÓRICAS DA ESCOLA NOVA E SEU DESDOBRAMENTO NA PEDAGOGIA DO
PROFESSOR REFLEXIVO
Anteriormente discutimos o processo de desenvolvimento da sociedade capitalista com
base na divisão social do trabalho, na consolidação da classe burguesa e a, conseqüente,
apropriação privada dos meios de produção que gerou separação entre teoria e prática na
produção do conhecimento, bem como, a separação entre ciência e trabalho, entre educação e
trabalho, destinando um tipo de educação para as classes subalternas baseada na atividade
manual, abstrata e cotidiana de sua vida prática e outra educação para a classe burguesa em
que as ciências ocupam lugar de destaque.
Na Pedagogia a oposição entre teoria e prática manifesta-se por meio de duas grandes
correntes pedagógicas a tradicional e a nova, também com as demais teorias pedagógicas
oriundas da pedagogia nova, a primeira centra-se na “teoria”, no verbalismo e intelectualismo,
na teoria sem prática; a segunda na “prática”, ou melhor, no ativismo, na prática sem teoria.
Assim, as referentes pedagogias hegemônicas se traduzem em termos da lógica formal20
a
qual na oposição teoria e prática uma exclui a outra (SAVIANI, 2008a, p. 122).
Nesse capítulo pretendemos discutir as bases teóricas e históricas da pedagogia nova,
do movimento da Escola Nova, bem como, sua renovação nas pedagogias contemporâneas do
“aprender a aprender” com a ênfase na atual pedagogia do professor reflexivo-pesquisador e
suas repercussões na compreensão da Pedagogia como ciência da educação fundamentada na
epistemologia da prática. Discutir o escolanovismo devido o seu predomínio até os dias atuais
sob novas roupagens e, principalmente, por sua forte influência no curso de Pedagogia.
20
Para Novack (2005), a lógica formal é a forma acabada, última e imutável. As ideias dominantes da classe
dominante sobre a ciência lógica são hoje as ideias da lógica formal rebaixada ao nível do bom senso; o bom
senso como método de pensamento e guia de ação. Para o autor, são três leis básicas da lógica formal: a primeira
e a mais importante é a lei da identidade. O conteúdo essencial da identidade da lógica formal “uma coisa é
sempre igual a si mesma” é equivalente a assegurar que sob qualquer condição permanece única e mesma. Se
uma coisa é sempre e sob qualquer condição igual ou idêntica a si mesma, não pode ser nunca desigual ou
diferente de si mesma; a segunda lei é a da contradição que constitui o elemento essencial da primeira. A lei da
contradição significa a exclusão da diferença na essência das coisas e no pensamento, ex: um assalariado não
pode ser um não-assalariado; terceira lei é da exclusão, que é uma combinação das duas primeiras leis e surge
logicamente delas. Cada vez que duas proposições ou estado de coisas opostas se enfrentam não pode ser ambos
corretos ou falsos (2006 p.25-26). Saviani (2005c, p. 81) complementa afirmando que a lógica formal é a lógica
das formas, abstrata, enquanto que a lógica dialética em Marx, que passa pela lógica formal indo além, é a lógica
concreta dos conteúdos, mas não podemos “confundir conteúdos concretos com conteúdos empíricos. Os
conteúdos empíricos manifestam-se na experiência imediata. Os conteúdos concretos são captados em suas
múltiplas relações, o que só pode ocorrer pela mediação do abstrato”, a lógica dialética é histórica e concreta.
66
Para tanto, a partir do processo de ascensão e consolidação da burguesia como classe no
poder e, por conseguinte, da divulgação de uma nova abordagem filosófica e educacional em
contraposição a pedagogia tradicional, tomaremos para a discussão a literatura do precursor
do movimento da Escola Nova no século XX, John Dewey, a qual propõe um novo modelo de
educação, com ênfase na utilidade prática do conhecimento e no “pensamento reflexivo”.
Além de discutir a dilatação do escolanovismo nas pedagogias contemporâneas do “aprender
a aprender”, em específico, a pedagogia do professor reflexivo-pesquisador divulgada no
campo da formação de professores na contemporaneidade por estudiosos, entre outros, como
António Nóvoa, Zeichner, Pérez Gomes, e Philippe Perrenoud.
3.1 A ascensão e Decadência Ideológica da Burguesia: a Base Histórica da Educação
Nova na Ordem Capitalista
A burguesia em ascensão entre os séculos XVI e XVII, período caracterizado pelo
capitalismo comercial, somente se consolidou como classe no poder no século XVIII por
meio das Revoluções, Industrial e Francesa. A Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra
caracterizava-se pela substituição das ferramentas por máquinas no sistema fabril de produção
e, também, pelo notável avanço tecnológico, o que possibilitou o aumento da produção
associado ao aprofundamento da divisão e exploração do trabalho.
A despeito de todo o avanço industrial conseguido pela Inglaterra no final do
século XVIII, a classe burguesa francesa não podia expandir-se a fim de
conquistar mercados internacionais, e, tampouco, possuía o poder político
em suas mãos, em virtude da vigência do regime feudal. Era necessário,
então, romper com os privilégios da nobreza, sobretudo no que se refere ao
seu poder vitalício e, inaugurar, em definitivo, a livre exploração do trabalho
pelo capitalista (EIDT, 2009, p. 126).
Nesse período, a burguesia francesa no processo de ascensão se apresentava como
classe revolucionária, unindo-se ao povo para derrubar a monarquia francesa. O povo
vivenciava a miséria da crise econômica e, portanto, unir-se a burguesia que defendia a
igualdade dos homens seria supostamente a única possibilidade de mudança da situação de
sofrimento alastrada pela desigualdade social. Assim, a burguesia levou o ideário iluminista
de Liberdade, Igualdade e Fraternidade até as últimas conseqüências, em defesa “do direito de
educação de todos os seres humanos, pois até então apenas os nobres tinham este privilégio”
(EIDT, 2009, p. 126).
67
Então, a burguesia se apresentava como classe revolucionária se fundamentando na
filosófica da essência em defesa da pedagogia da essência, ou seja, na pedagogia tradicional.
Para Suchodolski (2002, p. 19), a pedagogia da essência se caracteriza pela sua ligação às
tradições racionalistas, à concepção do homem como “ser pensante”, a qual foi utilizada pela
burguesia para erguer críticas a educação medieval ao tempo em que inspirou o surgimento de
alguns indícios, embora ainda modestos, de uma nova concepção filosófica e pedagogia com
base nos direitos e necessidades da criança, a pedagogia da existência ou pedagogia nova.
[...] vem a ocorrer na época moderna, com a ruptura do modo de produção
feudal e a gestação do modo de produção capitalista. Nesse momento, a
burguesia, classe em ascensão, vai se manifestar como uma classe
revolucionária, e, enquanto classe revolucionária, vai advogar a filosofia da
essência como um suporte para a defesa da igualdade dos homens como um
todo e é justamente a partir daí que ela aciona as críticas à nobreza e ao
clero. Em outros termos: a dominação da nobreza e do clero era uma
dominação não-natural, não-essencial, mas social e acidental, portanto,
histórica. Vejam que toda postura revolucionária é uma postura
essencialmente histórica, é uma postura que se coloca na direção do
desenvolvimento da história. Naquele momento, a burguesia se colocava na
direção do desenvolvimento da história e seus interesses coincidiam com os
interesses do novo, com interesses da transformação; e é nesse sentido que a
filosofia da essência, que vai ter depois como conseqüência a pedagogia da
essência, vai fazer uma defesa intransigente da igualdade essencial dos
homens (SAVIANI, 2006, p. 38-39).
Entretanto, a aliança da burguesia com a classe trabalhadora foi interrompida devido às
mudanças de interesses da burguesia que consolidada no poder fazia manigâncias para que
pudesse permanecer no poder político e econômico.
A aliança entre os pobres e a burguesia era uma aliança essencialmente
contraditória, prenha de conflitos inevitáveis. Isso não deixava de se refletir
no campo das ideias. A liberdade, a igualdade e fraternidade erigidas em
princípio da Revolução Francesa não significavam o compromisso com uma
real igualdade entre todos os homens. [...] A Revolução Francesa foi um
processo complexo, longo, no qual muitas lutas se misturavam e a burguesia,
a partir de certo momento, passou a temer que as classes baixas, isto é, o
proletariado e os camponeses, se rebelassem de forma incontrolável não
apenas contra a nobreza, mas também contra ela própria, a classe burguesa.
Era preciso pôr fim aos levantes populares, pôr fim à Revolução, antes que
ela fosse longe demais (ARCE, 2001, p. 27).
Dessa forma, a burguesia passava de classe revolucionária para classe conservadora.
Assim, se antes de sua consolidação enquanto classe no poder no final do século XVIII, a
burguesia se fundamentava na pedagogia da essência ou tradicional como forma de combate
contra o regime feudal, agora consolidada, a burguesia já no início do século XIX começava
incorporar a escola universal, gratuita e obrigatória, como instrumento de consolidação da
68
ordem democrática, contestando a pedagogia da essência em defesa agora da pedagogia da
existência ou pedagogia nova (SAVIANI, 2006, p. 43).
Quando a burguesia se estabelece no poder muda seus interesses e, neste sentido, era
preciso negar aquela concepção de mundo e de homem como produtor de sua própria história
a qual se colocava contra a “eterna”, “divina” e “vitalícia” ordem feudal (ARCE, 2001). Isso
aconteceu porque os interesses da burguesia não caminhavam em direção da socialização da
produção material e intelectual, mas da perpetuação da sociedade capitalista. Assim, se
caracteriza uma “decadência ideológica da burguesia” 21
, a qual passa a negar a história,
entendendo que a pedagogia da essência já não lhe serviria mais, propondo a pedagogia da
existência (SAVIANI, 2006, p. 40).
A educação nova baseada na pedagogia da existência procurava encarar as perspectivas
da pedagogia partindo do ponto de vista do curso presente da vida do indivíduo, “propunha-se
a identificar a educação ao processo espontâneo do crescimento e acreditava que o
desenvolvimento seria tanto mais satisfatório quanto maior fosse o cuidado prestado à vida
cotidiana do indivíduo” (SUCHODOLSKI, 2002, p. 91). Assim,
[...] a burguesia decadente distorceu toda a tradição literária estabelecida no
período revolucionário da burguesia em ascensão. [...] Se a princípio vemos
a burguesia lutando contra a religião e qualquer tipo de irracionalismo, após
ascender ao poder e com medo de que as Revoluções populares alcançassem
êxito, a veremos operar um retrocesso ideológico (ARCE, 2001, p. 45).
Diante do não interesse da burguesia pela transformação da sociedade capitalista, Arce
(2001, p. 32) destaca um detalhe importante: a ameaça comunista que rondava a vida dos
burgueses; Marx e Engels lançavam o “Manifesto do Partido Comunista” escrito no início do século
XIX, no qual os autores chamavam “a atenção do proletariado para o real papel da classe burguesa que
vinha com as suas conquistas oprimindo e acentuando o antagonismo entre classes sociais, reduzindo a
vida dos trabalhadores a pobreza, miséria e exploração”. Portanto, o papel da classe burguesa como
classe revolucionária chegava ao fim, a burguesia se tornava classe conservadora da ordem capitalista.
Com efeito, a pedagogia da existência vai ter este caráter reacionário, isto é,
vai contrapor-se ao movimento de liberdade da humanidade em seu
conjunto, vai legitimar as desigualdades, legitimar a dominação, legitimar a
sujeição, legitimar os privilégios. Nesse contexto, a pedagogia da essência
não deixa de ter um papel revolucionário, pois, ao defender a igualdade
essencial entre os homens, continua sendo a bandeira que caminha na
direção da eliminação daqueles privilégios que impedem a realização de
parcela considerável dos homens. Entretanto, neste momento, não é a
21
Termo denominado por Luckás para caracterizar o processo de tomada de poder político pela burguesia e o seu
deslocamento para a oposição central da luta de classes entre burguesia e o proletariado (ARCE, 2001).
69
burguesia que assume o papel revolucionário, como assumira no início dos
tempos modernos. Nesse momento, a classe revolucionária é outra: não é
mais a burguesia, é exatamente aquela classe que a burguesia explora
(SAVIANI, 2006, p. 41).
Na metade do século XVIII e início do XIX já iniciava o movimento da educação nova
com ideias que vieram desenvolver-se enquanto movimento de forma mais sólida no final do
século XIX e início do século XX, com o movimento da Escola Nova. Mas, podemos
identificar as características da Escola Nova: espontaneidade, natureza humana empírica,
educação como redentora etc., já preconizada nas ideias isoladas de alguns pedagogos, tais
como: Rousseau, Pestalozzi e Frobel. Assim, a educação na consolidação da sociedade
capitalista e da burguesia no poder se torna uma forma de dominação da burguesia da situação
revolucionária da época.
Passa, então, a exercer para as classes mais pobres nada mais do que um
mero papel ideológico, diz-se que ela pode garantir uma vida melhor, mas ao
mesmo tempo com ela impede-se o indivíduo de se apropriar dos
conhecimentos produzidos pela humanidade, sendo estes reduzidas ao que
realmente poder útil a este indivíduo em sua vida cotidiana, sem se
questionar o caráter profundamente alienado e alienante da cotidianidade
capitalista (ARCE, 2001, p. 185).
Como a autora afirma, a burguesia passava a defender o acesso à educação como
garantia da superação da situação de exploração e miséria da classe trabalhadora, no entanto,
não eram disponibilizadas as condições para superar, pois, não interessava mais a burguesia a
verdade, mas, o processo de mistificação da sociedade para sua manutenção no poder.
Assim, no caso da pedagogia da existência e da essência, a burguesia
constrói os argumentos que defendem a pedagogia da existência contra a
pedagogia da essência, pintando esta última como algo tipicamente
medieval. Nesse sentido, ela deixa de assumir a pedagogia da essência como
uma construção própria (SAVIANI, 2006, p. 42).
Em defesa da educação nova a burguesia começava a destilar severas críticas à
pedagogia tradicional, principalmente, com o surgimento da ciência moderna, que para a
burguesia os métodos tradicionais possuíam um “caráter pré-científico, e mesmo
anticientífico, ou seja, dogmático”. E, portanto, os métodos novos se proclamaram científico,
“proclamaram-se instrumento de introdução da ciência na atividade educativa” (SAVIANI,
2006, p. 42-43). Em resumo, Duarte (1998) afirma que:
O conflito entre as pedagogias da essência e as pedagogias da existência,
traduzido de forma esquemática, é um conflito entre educar guiado por um
ideal abstrato de ser humano, por uma essência humana a-histórica e educar
70
para a realização dos objetivos imanentemente surgidos na vida de cada
pessoa, na sua existência. [...] analisamos esse tema sob a ótica do conceito
de alienação enquanto distanciamento e conflito entre as forças essenciais
humanas, que vão sendo objetivadas em níveis cada vez mais elevados, e as
condições concretas da existência da maioria dos indivíduos humanos
(DUARTE, 1998, p. 04).
O autor enfatiza que tanto na pedagogia da essência quanto na pedagogia da existência
apresenta-se um distanciamento e conflito entre as forças essenciais que a humanidade produz
de forma cada vez mais elevada e a não condição concreta dos indivíduos de se apropriarem
dessas forças essenciais para se inserir no processo histórico de desenvolvimento humano;
assim, tanto numa quanto noutra gera alienação, portanto, a não possibilidade do indivíduo
avançar o quanto mais é possível, pois as condições concretas de sua existência não lhe
permitem.
Em outras palavras, o conflito entre essas duas grandes correntes filosóficas
sobre o ser humano tem como fundamento objetivo social, o processo
histórico de alienação dos indivíduos perante o gênero humano objetivado. O
conflito entre essência e existência, assim, concebido, é o conflito entre as
possibilidades objetivamente existentes, portanto reais, de desenvolvimento
de todos os seres humanos e a existência empírica, igualmente real, de cada
pessoa (DUARTE, 1999, p. 204).
Eidt (2009, p. 130) ressalta que um dos produtos do processo de decadência ideológica
da burguesia em relação à pedagogia da existência, ou seja, da pedagogia nova, é o
pragmatismo, filosofia que subsidia a produção da teoria de Dewey, Piaget e dos autores
contemporâneos defensores do ideário do “aprender a aprender”, o qual é extensão do
escolanovismo; a autora acrescenta que no esteio do pragmatismo está o irracionalismo e a
negação do conhecimento verdadeiro.
Dessa forma, o movimento da Escola Nova no século XX teve como principal
representante John Dewey, pragmatista que propôs a ideia da “construção do conhecimento”
ao invés da transmissão dos conhecimentos produzidos e acumulados pela humanidade. O
movimento da Escola Nova torna-se abrangente a partir da difusão do modelo pragmático de
fábrica na educação, como forma de garantir uma educação para o trabalhador com base no
controle da disciplina e do conhecimento do operário (EIDT, 2009, p. 132). Assim, a Escola
Nova assinalou consequências negativas, provocando a despreocupação com a transmissão de
conhecimentos, rebaixando o nível do ensino às camadas populares, as quais muito
frequentemente têm na escola o único meio de acesso ao conhecimento elaborado (SAVIANI,
2006, p. 10).
71
3.2 A Base Teórica da Escola Nova e a Pedagogia com Ênfase na Epistemologia da
Prática Reflexiva
O movimento da Escola Nova deriva-se das ideias de John Dewey, as quais têm “base
material fornecida pela chamada segunda revolução industrial” entre o final do século XIX e
início do século XX (EIDT, 2009, p. 131). No século XX a economia afirma o capitalismo
monopolista por meio das tensões imperialistas, da política do bem-estar social e da sociedade
emergente baseadas no consumo e no crescimento da classe média, mas, também reafirma na
renovação do sistema produtivo, passando da centralidade da indústria para a dos serviços
(CAMBI, 1999, p. 509). É sobre estas bases da sociedade que a pedagogia deweyana foi
amplamente aceita no sentido da formação do novo homem para a nova sociedade industrial
e, mais tarde, renovada nas pedagogias contemporâneas do “aprender a aprender”.
Em geral, a pedagogia de Dewey caracteriza-se: 1. Como inspirada no
pragmatismo [...] de modo tal que o fazer do educando se torne o momento
central da aprendizagem; 2. Como entrelaçada intimamente com as
pesquisas das ciências experimentais, às quais a educação deve recorrer para
definir corretamente seus próprios problemas, e em particular à psicologia e
à sociologia; 3. Como empenhada em construir uma filosofia da educação
assumindo um papel muito importante também no campo social e político
[...] (CAMBI, 1999, p. 549).
Segundo Franco (2008, p. 43), o trabalho do filósofo pragmatista Dewey foi
significativo na questão da confluência de saberes na estruturação da ciência da
educação e isso marcou profundamente o novo caminhar epistemológico da pedagogia.
Entretanto, a autora identifica como um grave problema da pedagogia deweyana a submissão
do pensamento à ação, cabendo a inteligência o papel de transformar a realidade no sentido
utilitarista. Para ela, isso produziu “um sofisticado processo de alienação com ares de
conscientização, um sofisticado processo de submissão com formas de eficiência e uma
limitação a processos criativos e discrepantes do consenso” (idem, p. 44).
A concepção de Dewey fundamenta os pilares do edifício piagetiano na segunda metade
do século XX (EIDT, 2009). Período caracterizado pelo curso efetivo de redefinição da
identidade da pedagogia, “da pedagogia passou-se a ciência da educação: de um saber
unitário e „fechado‟ passou-se a um saber plural e aberto; do primado da filosofia passou-se
ao das ciências” (CAMBI, 1999, p. 595, grifos nossos).
72
Segundo Saviani (2008a, p. 78), na tendência tradicional a pedagogia é subsumida,
assimilada à filosofia da educação; enquanto que na “concepção humanista moderna” 22
, a
pedagogia passa a teoria da educação e ganha autonomia em relação à filosofia, devendo
buscar apoio nas ciências, “já que é através do método científico que nos é possível ter acesso
aos elementos empíricos que caracterizam a vida dos educandos”.
A partir dessas considerações, pretendemos discutir as bases teóricas pragmáticas de
Dewey e sua “teoria da experiência” para compreender o movimento da perspectiva da
“pedagogia humanista moderna” (Escola Nova) a qual denomina a Pedagogia como ciência
da educação sob uma base epistemológica prática, uma ciência da educação de acordo com
“a necessidade de um novo saber pedagógico, mais experimental, mais empírico” e
pragmático para atender os anseios da nova sociedade industrial democrática em
construção (CAMBI, 1999, p. 596, grifos nossos).
3.2.1 O “Pensamento Reflexivo” em Dewey: a Ênfase na Experiência
O pragmatista Dewey (1959a, p. 288), interessado em construir uma ciência da criança,
“reconhece” o antagonismo do trabalho e da dicotomia entre teoria e prática afirmando que:
“assim, como se contrapõem o trabalho para ganhar a vida e o gozo de lazeres, também se faz
o mesmo com a teoria e prática, a inteligência e a ação, o saber e o fazer”. No entanto, Dewey
se propõe a solucionar o dualismo na filosofia idealista, entre o racionalismo (intelectualistas)
e o empirismo, por meio de um novo conceito de “experiência”. Para ele, a experiência, em
verdade, não conhece separação alguma entre interesses humanos e o mundo físico, entre
ideias dos homens e as coisas do mundo, entre pensamento e ação, entre teoria e a prática.
Pois, o “agir sobre outro corpo e sofrer de outro corpo uma reação” caracteriza o termo
experiência na concepção de Dewey (TEIXEIRA, 1980, p. 113).
Para Dewey (idem, ibidem), a experiência “é uma fase da natureza, é uma forma de
interação, pela qual os dois elementos que nela entram - situação e agentes - são
22
Saviani (2007b, p. 17) diz que na concepção humanista moderna a filosofia da educação não supõe o homem
como uma essência universal, mas entendem que os homens devem ser considerados na sua existência real,
como indivíduos vivos que se diferenciam entre si, notamos que a teoria da educação deverá dar conta das
diferenças que caracterizam os indivíduos, os quais devem ser considerados nas suas situações de vida e na
interação com os outros indivíduos. A teoria da educação ganha, então, autonomia em relação à filosofia da
educação, devendo buscar apoio nas ciências, já que é através do método científico que nos é possível ter acesso
aos elementos empíricos que caracterizam a vida dos educandos. Eis porque a pedagogia nova será uma teoria
que buscará se revestir do atributo de cientificidade, seja apoiando-se nas ciências já constituídas, com destaque
para a biologia, a psicologia e a sociologia, seja procurando tornar científica a própria pedagogia por meio das
escolas e classes experimentais. Orientada pelos princípios da pedagogia nova, a prática pedagógica, tal como se
patenteia no escolanovismo, irá valorizar a atividade, as experiências, a vida, os interesses dos educandos.
73
modificados”. A partir desse conceito de experiência, Dewey (1959a, p. 296-297) elenca três
graves defeitos do empirismo como filosofia educacional: 1) o valor histórico dessa teoria era
crítico, foi o dissolvente das convicções dominantes sobre o mundo e as instituições políticas,
mas no que se refere à educação ela não supõe existentes as velhas crenças a serem
eliminadas ou revistas; 2) no empirismo, as impressões diretas têm a vantagem de ser de
primeira mão, mas a desvantagem de ser limitada; e, por conseguinte, a 3) a experiência não
consiste em receber passivamente as impressões. O empirismo esquece os elementos ativos e
motores da experiência.
A experiência, na concepção de Dewey (1959a, p. 152), “encerra em si mesmo um
elemento ativo e outro passivo”, proporciona “respostas” ativas no sentido de experimentar
o mundo que consiste no uso das coisas e no aprender as propriedades destas coisas por meio
da descoberta das conseqüências de seu uso, e passivas na medida das consequências
sofridas. Nesse sentido, o autor enfatiza o aprender com a experiência:
A capacidade de aprender com a experiência significa formação de hábitos.
Os hábitos dão-nos o domínio sobre o meio e a capacidade de utilizá-lo para
fins humanos. Os hábitos tomam uma forma passiva ou de equilíbrio
geral e persistente da atividade orgânica com o meio – e uma forma
ativa de aptidões para readaptar a atividade a condições novas. A
primeira fornece a base para o crescimento, o desenvolvimento; a segunda
constitui o desenvolvimento. Os hábitos ativos subentendem reflexão,
invenção e iniciativa para dirigir as aptidões e novos fins (DEWEY, 1959a,
p. 57, grifos nossos).
Os hábitos são as maneiras usuais de ser, fazer e sentir individual ou coletivamente.
Assim, através da experiência o ser humano contrai hábitos ou desenvolve determinadas
atitudes. Diante deste conceito Dewey (idem, p. 301-303) chega às seguintes conclusões: 1) a
experiência consiste, primeiramente, em relações ativas entre um ser humano e seu ambiente
natural e social; 2) as mudanças que se operam no conteúdo da vida social facilitam
consideravelmente a seleção da espécie de atividade que intelectualizará os trabalhos
educativos escolares; e 3) os homens se quiserem descobrir alguma coisa, precisam fazer
alguma coisa aos objetos e ser passivos às consequências sofridas. Para ele, esta é a lição do
método do laboratório e a lição que toda educação deve aprender.
Segundo Eidt (2009, p. 20-21), a presença do elemento intelectual na obra de Dewey
não altera a finalidade última do pensar, que se limita a verificar a utilidade que a
consequência da ação tem para o indivíduo. Nota-se, portanto, neste aspecto, uma evidente
influência do pragmatismo, circunscrevendo o pensamento aos limites da ação utilitária. Outra
vinculação ao pragmatismo na obra de Dewey é constatada pela autora quando ele afirma que
74
o conteúdo do conhecimento somente tem importância se ele se mostrar útil em uma situação
prática, havendo uma negação do conhecimento como instrumento de desvelamento e
transformação da realidade, já que limita à mera instrumentalização da ação humana para
fins imediatos e utilitários, no sentido de adaptar-se ao que se exige na situação da ação,
portanto, fins extremamente pragmáticos. Como o próprio Dewey afirma:
A teoria do método de conhecer exposta nestas páginas pode ser
denominada pragmática. Sua feição essencial é manter a continuidade do
ato de conhecer com a atividade que deliberadamente modifica o ambiente.
Ela afirma que o conhecimento em seu sentido estrito de alguma coisa
possuída consiste em nossos recursos intelectuais – em todos os hábitos que
tornam a nossa ação inteligente. Só aquilo que foi organizado em nossas
disposições mentais, de modo a capacitar-nos a adequar o meio às nossas
necessidades e adaptar nossos objetivos e desejos à situação em que
vivemos, é realmente conhecimento ou saber (DEWEY, 1959a, p. 377-
378, grifos nossos).
Nessa citação, Dewey declara sua base teórico-filosófica, o pragmatismo23
. Assim,
apesar dos defeitos do empirismo sensacionalista postos anteriormente por ele, sua filiação
filosófica se aproxima bastante do empirismo, podemos dizer que o pragmatismo seja uma
denominação do empirismo. Pois, a filosofia pragmática se opõe ao racionalismo com
fundamento e representação na atitude empírica, “tanto em uma forma mais radical quanto em
uma forma menos contraditória” (JAMES, 1979, p. 20).
O pragmatista volta as costas resolutamente e de uma vez por todas a uma
série de hábitos inveterados, caros aos filósofos profissionais. Afasta-se da
abstração e da insuficiência, das soluções verbais, das más razões a priori,
dos princípios firmados, dos sistemas fechados, com pretensões ao absoluto
e às origens. Volta-se para o concreto e o adequado, para os fatos, a ação e o
poder. O que significa o reinado do temperamento empírico e o
descrédito sem rebuços do temperamento racionalista. O que significa ar
livre e possibilidades da natureza, em contraposição ao dogma, à
artificialidade e à pretensão de finalidade na verdade (JAMES, 1979, p. 20,
grifos nossos).
Nessa perspectiva, fundamentando-se no pragmatismo empírico, considerado uma nova
corrente da filosofia burguesa com maior proporção no início do século XX, Dewey direciona
23
A verdade objetiva deixa de ter espaço na filosofia pragmática em prol das verdades, no plural, e no sentido
subjetivo contando “com as experiências mais pessoais e mais humildes”, pois, mesmo uma experiência mística
se tiver conseqüências práticas, o pragmatismo não pode ver sentido em tratar como não verdadeira (JAMES,
1979, p. 30). Para James (idem, p. 60), o espírito fica como que esticado com uma nova disposição de certo
número de idéias, porque uma verdade não pode ser mais verdadeira que outra. Assim, as novas verdades
trazidas pela experiência se associam com as antigas, ao mesmo tempo em esta se altera pelo que absorve. Então,
as novas verdades e velhas verdades combinadas se modificam entre si, pois, “os mais primitivos meios de
pensamento não podem ser, todavia, completamente expurgados”. Para o autor, “devemos perturbar o menos
possível o senso comum e a crença anterior, e deve levar a algum término perceptível ou a outro que possa ser
verificado exatamente”.
75
para a educação os aspectos fundamentais da filosofia pragmática, dando ênfase na ação, na
utilidade da ação para a aprendizagem no sentido de adaptação do meio às necessidades do
indivíduo, ao mesmo tempo em que adapta os objetivos e desejos do indivíduo a situação em
que vive. Portanto, a educação consiste em um processo ativo e construtor do
conhecimento através da experiência de uma forma pessoal e de acordo com a situação
empírica em que vive (DEWEY, 1959a, p. 41).
Além do empirismo, Eidt (2009, p. 22) verifica que o pragmatismo assume um caráter
irracionalista, quando se posiciona radicalmente contra o racionalismo, e que também se
harmoniza com o positivismo. Dessa forma, podemos constatar ecletismo no pragmatismo.
O pragmatismo relaxa todas as nossas teorias, flexiona-as e põe-nas a
trabalhar. Não sendo nada essencialmente novo, se harmoniza com muitas
tendências filosóficas antigas. Concorda com o nominalismo, por exemplo,
sempre apelando para os particulares; com o utilitarismo, dando ênfase aos
aspectos práticos; com o positivismo, em seu desdém pelas soluções
verbais, pelas questões inúteis e pelas abstrações metafísicas (JAMES, 1979,
p. 20-21, grifos nossos).
A partir da filosofia pragmática, Dewey (1959a, p. 55) afirma que “a tendência a
aprender-se com a própria vida e a tornar tais as condições da vida que todos aprendem
com o processo de viver, é o mais belo produto da eficiência escolar”. Percebemos aqui o
entendimento da educação escolar na perspectiva de tirar os indivíduos das abstrações e
impregná-lo na vida cotidiana. A escola apenas reforçaria o que o indivíduo aprende fora dela,
pois, o que aprende no processo de viver tem mais significação para o indivíduo. Para o autor,
somente através dessa concepção de educação que se chegaria, de fato, a uma sociedade
democrática.
Uma sociedade democrática na proporção em que prepara todos os seus
membros para com igualdade aquinhoarem de seus benefícios e em que
assegura o maleável reajustamento de suas instituições por meio da interação
das diversas formas da vida associada. Essa sociedade deve adotar um tipo
de educação que proporcione aos indivíduos um interesse pessoal nas
relações e direção sociais, e hábitos de espírito que permitam mudanças
sociais sem o ocasionamento de desordens (DEWEY, 1959a, p. 106, grifos
nossos).
Dessa forma, o objetivo ou fim da educação consiste em pôr em prática de forma eficaz
o princípio de liberdade do indivíduo, pôr em prática as novas ideias para que uma nova e
futura sociedade seja efetivada, em favor do ideal democrático. Para tanto, Dewey (1959a) faz
severas críticas a escola tradicional e ao professor que impõe na sequência dos atos de seus
discípulos lições marcada e direções dadas por outrem, para ele o processo de aprendizagem é
76
algo pessoal, portanto, cada um deve aprender a aprender, cada um constrói seu próprio
conhecimento, e este aprender construtivo se aprende fazendo. “Aprender é próprio do
aluno: só ele aprende, e por si; portanto, a iniciativa lhe cabe. O professor é um guia, um diretor; pilota
a embarcação, mas a energia propulsora deve partir dos que aprendem” (DEWEY, 1959b, p. 43).
Assim, Dewey (1959a; 1959b) desconsidera como necessidade a apropriação do
conhecimento na forma objetivo - histórica para o desenvolvimento do gênero humano e,
com efeito, da individualidade para si. Apesar do autor não abrir mão da escola, sua
concepção de educação escolar se limita a ligar-se intimamente ao “progresso da
sociedade democrática” a partir dos desejos, dos interesses e das esperanças do indivíduo
como central para o desenvolvimento da ação, não se preocupando, portanto, com a
apropriação do conhecimento como instrumento que contribui para uma ação no
sentido de enriquecimento e transformação da realidade.
O autor escamoteia o fato de que uma sociedade democrática é uma
sociedade dividida em classes. A estrutura econômica engendra divisão em
diferentes classes sociais, em que a classe dominante extrai mais-valia
daqueles que precisam vender sua força de trabalho em troca do salário. Este
processo gera capital, impossibilitando a igualdade de interesse e de
oportunidades para os diferentes membros das distintas classes sociais.
Dewey, como um defensor da lógica capitalista, não pode ir além e, no
limite, é enredado por uma insolúvel contradição: como, então, garantir
condições iguais de desenvolvimento em uma sociedade marcada pela
exploração? A saída encontrada pelo autor consiste em afirmar que, com o
declínio do feudalismo, as oportunidades tornam-se iguais e, portanto, todos
teriam condições de desenvolver igualmente suas aptidões (EIDT, 2009, p.
37).
Diante da posição pragmática e liberal de Dewey (1959a) da relação entre sociedade e
educação, percebemos que existe uma crença na educação como redentora dos problemas
sociais, por isso, a busca por eficiência social por meio da socialização “da inteligência que
contribua ativamente para tornar a experiência mais comunicável e para derrubar as
barreiras das separações sociais que tornam os indivíduos impenetráveis aos interesses dos
demais” (p. 131), mas os interesses da classe dominante não são os interesses da classe
trabalhadora e, dificilmente, a classe dominante estará aberta a socialização do conhecimento
historicamente acumulado pela humanidade, o qual ela se apropriou de forma privada,
negando-o a classe trabalhadora.
Entretanto, a concepção de educação escolar e do método experimental de Dewey se
tornou bastante divulgada na sociedade brasileira desde os anos 1920, tendo como
representantes: Anísio Teixeira, Lourenço Filho e Fernando de Azevedo, os quais tiveram
77
participação efetiva na estruturação do ensino básico e superior no país, em especial a
formação de professores no espaço acadêmico, como melhor veremos no próximo capítulo.
O método experimental de Dewey (1959a, p. 153), consiste no aprender na
experiência que é “fazer uma associação retrospectiva e prospectiva entre aquilo que fazemos
às coisas e aquilo que em consequência essa coisa nos fazem gozar ou sofrer. [...] experimenta
o mundo para se saber como ele é; o que se sofre em conseqüência torna-se instrução”.
O método experimental para Dewey (1959b) seria a verdadeira forma de relação
entre pensamento e ação, entre teoria e prática. Pois, “uma teoria à parte da experiência
não pode nem mesmo ser definitivamente apreendida como teoria” (DEWEY, 1959a, p. 158).
A filosofia de Dewey articula-se em torno de uma “teoria da experiência”
vista como o âmbito do intercâmbio entre sujeito e natureza, intercâmbio
ativo [...]. Assim, é ao homem e a sua “inteligência criativa” que é confiado
o desenvolvimento e o controle da experiência, mediante o uso da lógica,
definida como “teoria da pesquisa” e caracterizada pelo método científico e
pelos princípios da experimentação, da generalização e da hipótese, da
verificação (CAMBI, 1999, p. 547-548).
O autor acima enfatiza que Dewey considera a experiência como importante meio de
crescimento, assim, com o uso da lógica a experiência é definida como pesquisa e
caracterizado método científico. Para Dewey (1959a, p. 159), as experiências passam por
duas fases: 1) “tentativa e erro”; e 2) ato intelectual. Entretanto, Dewey ressalta que a ação
que repousa unicamente no método de tentativa e erro fica à mercê das circunstâncias, mas se
soubermos minuciosamente do que depende o resultado, podemos verificar se existem
circunstâncias requeridas. Dessa forma, na descoberta minuciosa das relações entre os nossos
atos e o que acontece em consequência deles, surge o elemento intelectual, o que aumenta o
valor da experiência e a torna significativa, tão significativa que para o autor podemos chamar
reflexiva esta experiência, porque provoca o pensar reflexivo. Então, o pensar reflexivo seria
“o esforço intencional para descobrir as relações específicas entre uma coisa que fazemos e a
consequência que resulta, de modo a haver continuidade entre ambos”.
O ato de pensar surge em situação em que existe dúvida, portanto, o ato de pensar
reflexivo é um meio de investigar, de inquirir, de perquirir, de observar as coisas; todo ato
de pensar é investigação, “é pesquisa e pesquisa pessoal, original, da pessoa que faz,
mesmo que o resto do mundo já conheça aquilo que o indivíduo procura descobrir”
(DEWEY, 1959a, p. 162, grifos nossos).
Mais uma vez, é perceptível em Dewey a concepção subjetivista, pessoal, pontual e a -
histórica do conhecimento científico. Nesse sentido, percebemos a despreocupação do autor
78
em relação à apropriação do acúmulo de conhecimento nas formas mais desenvolvidas
produzido historicamente pela humanidade. Sabemos que, como bem discutido no capítulo
anterior, o conjunto das objetivações para si existentes acumulada pela humanidade quando
apropriadas pelo indivíduo o mesmo pode dar saltos qualitativos em seu desenvolvimento.
Todavia, ao contrário, Dewey coloca como central para o desenvolvimento o
processo da pesquisa e não a socialização do conhecimento, uma pseudopesquisa por
meio da experimentação do mundo, “o ensino como um processo de pesquisa”
(SAVIANI, 2006, p. 45). Experimentando o mundo o indivíduo construirá o seu próprio
conhecimento, construirá o que muitas vezes já foi construído coletivamente pela
humanidade, mas que na concepção deweyana pouco importa se as condições históricas são
outras, o indivíduo para se desenvolver precisa criar de novo o que já foi criado, assim, o
homem aprende a pensar de forma reflexiva.
Desse modo, o ato de pensar tem relação com a eficiência na ação. O conhecimento, que
para Dewey (1959b) corresponde a informativos, são conhecimentos mortos quando separado
da ação reflexiva. Para ele o ato de pensar por si mesmo é um método, método da
experiência em curso. Para tanto, são necessários três estágios para o ato de pensar: 1) o
estágio inicial é a experiência, o ensino ou aprendizagem tem que ter um valor utilitário, e
não intelectual, o indivíduo deve experimentar; 2) o segundo estágio é a dos dados para
suprir as considerações indispensáveis à análise e percepção da dificuldade específica que se
apresentou na situação inicial de experiência; e 3) o último estágio que é o de examinar os
correlatos que são as sugestões, inferências, interpretações conjeturais, suposições,
explicações tentadas, em suma, ideias (DEWEY, 1959a, p. 174). A partir desses estágios,
Dewey afirma:
O professor proporcionou as condições que estimulam o pensamento e
assumiu atitude interessada para com a atividade de quem aprende,
participando de experiência comum ou conjunta, fez, com isso, tudo o que
uma segunda pessoa pode fazer uma incentivar a outra. O resto é com a
pessoa diretamente interessada. Se ela própria não puder conseguir a
solução do problema (é claro que não isolada e sim em correspondência com
seu professor e outros discípulos) e descobrir seu próprio caminho, não
aprenderá, nem mesmo que possa dar resposta perfeitamente certa (DEWEY,
1959a, p. 176, grifos nossos).
Nessa perspectiva do método experimental, o professor seria apenas um mero
incentivador do aluno para que este possa descobrir por si só a resposta do problema. Se
o professor incentivou, pronto, tudo o que um professor como segunda pessoa no processo da
aprendizagem poderia fazer, fez. O resto é com a pessoa interessada na aprendizagem, no
79
caso, o aluno. Mas, se o aluno não consegue chegar à solução do problema, o professor não
pode interferir, porque caso isso aconteça, o aluno não aprenderá. Para ser uma aprendizagem,
de fato, o aluno tem que fazer sozinho, sem a intervenção de outros, em última instância
somente aquilo que o aluno não foi capaz de aprender sozinho é que deve ser ensinado
(DEWEY, 1959a, p. 199).
O evidente ponto de partida pedagógico para a instrução científica não é
ensinar coisas rotuladas como ciência, e sim utilizar as ocupações e
recursos familiares para orientarem a observação e a experimentação,
até os discípulos chegarem ao conhecimento de alguns princípios
fundamentais, apreendendo-os nos trabalhos práticos que lhes são
familiares (DEWEY, 1959a, p. 317, grifos nossos).
Mas, no processo ensino e aprendizagem a relação precisa ser mútua, recíproca. E a
concepção de Dewey descaracteriza o papel do professor e da escola, transformando o
professor em um mero animador, estimulador, incentivador da curiosidade e da atividade, o
professor deixa de centrar o seu trabalho pedagógico no conhecimento essencial que o aluno
precisaria apropriar para o desenvolvimento da genericidade humana. Dewey (1959b, p.53)
coloca-se contra a organização seqüenciada e lógica dos conteúdos escolares, afirmando que a
transmissão dos conteúdos é incapaz de promover hábitos lógicos nos alunos.
Além disso, entendemos que a experiência individual ou coletiva do aluno defendida
por Dewey (1959b, p. 19) caracteriza uma “disposição inata”, assim, postulado pelo filósofo
como forma de desenvolver no indivíduo o querer aprender sempre, o aprender a aprender
como objetivo central da educação, mas desvinculados dos conteúdos (EIDT, 2009, p. 32).
Para Dewey (1959b) é através do método da experiência que se desenvolve o ato de
pensar reflexivo o que possibilita a aprendizagem. Entretanto, Dewey (1959b, p. 15-20)
diferencia o pensar do pensamento reflexivo afirmando que “um pensamento ou ideia é a
representação mental de algo não realmente presente [...]. Em contraste, o pensamento
reflexivo traz um propósito situado além da diversão proporcionada pelo curso de agradáveis
invenções e representações mentais”. Para ele, são três os sentidos do pensamento: o acaso;
histórias imaginárias; e as crenças. Os dois primeiros sentidos não pretendem a verdade,
consiste em prazer e emoção. O terceiro sentido, por outro lado, é que envolve
precisamente a realização intelectual e prática, isto é, teórico e prática. Porém, o autor
enfatiza que pensamento reflexivo só pode existir em função por efeito da qual uma coisa
significa ou indica outra, levando-nos a examinar até que ponto uma coisa pode ser
considerada garantia para acreditarmos em outra.
80
Um simples perpassar de ideias ou sugestão é pensar, mas não pensar
reflexivo, não observação e pensamento dirigido para uma conclusão
aceitável – isto é, para uma conclusão em que seja razoável crer, graças às
bases em que se apóia e à evidencia que a fundamenta [...]. A conversão de
sugestão em ato de pensar reflexivo exige, pois, uma outra dimensão: a
propriedade de ordem, consecutividade. [...] Temos pensamento reflexivo
apenas quando a sucessão é tão controlada que se torna uma seqüência
ordenada, rumo a uma conclusão, que contém a força intelectual das ideias
precedentes. E “força intelectual” significa força de dar a uma ideia valor de
crença, de torná-la digna de crédito (DEWEY, 1959b, p. 54-55).
Dewey (1959b, p. 24) afirma que a origem do pensamento é de alguma perplexidade,
confusão ou dúvida. Há sempre alguma coisa que o ocasiona e o provoca. Dada uma
dificuldade, a fase imediata é a sugestão, plano ou projeto, ou a elaboração de alguma teoria,
sua fonte é a experiência de situações semelhantes, se assim for, as sugestões serão adequadas
e eficientes, mas não havendo experiência a confusão continuará. Por conseguinte, a função
do pensamento reflexivo é transformar uma situação de obscuridade, dúvida, conflito de
algum gênero, numa situação clara, coerente, assentada e harmoniosa.
Portanto, a reflexão inclui três pontos importantes que traduz o método: 1) observação –
no momento em que começa a refletir, forçosamente começa a observar, a fim de inventariar
as condições. Algumas dessas observações são feitas pelo uso direto dos sentidos; outras,
pelas lembranças das observações previamente feitas pela própria pessoa ou por outras; 2)
sugestões – ao mesmo tempo que se observam as condições que constituem os fatos a ser
tratados, são sugeridos os cursos possíveis de ação; e 3) os dados e as ideias – os dados são os
fatos e as ideias as sugestões, e são fornecidos pela observação e inferência. Os fatos
observados são os dados, estes formam o material a ser interpretado, considerado, explicado;
ou no caso de deliberações sobre o que fazer ou como fazer (DEWEY, 1959b, p. 107-109).
Dessa forma, Dewey (1959b) apresenta os estados do método experimental: 1)
sugestão; 2) intelectualização da dificuldade ou perplexidade que foi sentida e que passa a
constituir um problema; 3) uso de uma sugestão como hipótese, a iniciar e guiar a observação
e outras operações durante a coleta de dados; e 4) a verificação da hipótese, mediante ação
exterior ou imaginativa. Esta sequência de fases não é fixa, uma à outra em ordem
estabelecida. O autor, ainda, determina o método sistematizado como uma necessidade e
enfatiza que a observação tem valor quando guiada por hipóteses, assim, conclui que a
observação não é operação que se oponha ao pensamento ou, mesmo, que independa deste, ao
contrário, “a observação reflexiva é, pelo menos, metade do pensamento, sendo a outra
metade destinada à admissão e elaboração de múltiplas hipóteses” (DEWEY, 1959b, p. 170).
81
Após esta síntese do pensamento de Dewey, podemos afirmar que o seu método
experimental é incapaz de ultrapassar os limites do pensamento empírico, imediato e
direto. De acordo com o que Eidt (2009) afirma em tese:
[...] mediante a negação do movimento e da ideia de que o pensamento não
alcança uma forma mais desenvolvida, o que se dá é uma repetição de um
mesmo estado. Verifica-se, assim, a estreita relação com a premissa
considerada central na obra deste autor, qual seja, a da mínima apropriação
da cultura pelos membros da classe dominada. O conteúdo sistematizado
pelo professor se restringe àquele que o aluno não é capaz de aprender por
meio de suas experiências, sendo que estas estão sempre vinculadas à
solução de uma questão imediata e pragmática, o que, no limite, engendra as
possibilidades de desenvolvimento do pensamento que se reduzem, em
grande parte, ao pensamento sensorial (EIDT, 2009, p. 36).
A negação do movimento histórico, de mudança das circunstâncias e, portanto, da
apreensão da realidade de forma mediata, assenta na base da lógica formal. Dewey evidencia-
se na perspectiva da lógica formal, pois, sua premissa se reduz a repetição do mesmo estado já
que não há diferença entre pensamento prático e teórico e, ainda, “defende o pensamento
como uma adição de elementos simples, (ou seja, como uma soma do momento da teoria e do
momento da prática)” (EIDT, 2009, p.35).
Para Dewey (1959a; 1959b), a apreensão da realidade se dá de forma imediata,
assim a teoria e a prática coincidem. O autor não concebe que o movimento do pensamento
é distinto do movimento histórico, o lógico e o histórico, a teoria e a prática. Entretanto, são
duas diferentes atividades, não são idênticas (como visto no capítulo anterior) e, portanto, não
podem ocorrer simultaneamente, como pretende o método experimental do pensamento
reflexivo de Dewey, o pensar ativamente.
Em relação ao pensamento e a lógica formal, Dewey (1959b, p. 80) traça três diferenças
entre o pensar real e a lógica formal: 1) a matéria da lógica formal é tão estritamente
impessoal como as fórmulas algébricas. Por outro lado, o modo de pensar de cada qual
depende de seus hábitos; 2) as formas lógicas são constantes, imutáveis e indiferentes à
matéria que contém. O pensar real é um processo, está em continua mudança enquanto a
pessoa pensa; e 3) na lógica formal não importa o contexto. O pensar real sempre se reporta a
algum contexto. Entretanto, para Dewey o pensamento é produto e processo; processo no
sentido de dizer como pensamos, coisa que o produto não explica.
Apesar de Dewey (1959b) delinear tais diferenças; na verdade, estas pouco se
distinguem das leis fundamentais da lógica formal, pois, “a lógica formal excluem de si
mesmas o movimento, a mudança e, portanto, o faz também com o resto da realidade, a
82
mudança para Dewey está no pensamento e não na matéria, na realidade. Como afirma
Novack (2005, p. 39) a lógica das formas não nega explicitamente a existência do racional do
movimento, mas estão obrigados a fazê-lo indiretamente pela necessária inércia de sua própria
lógica interna”.
Novack (2005, p. 27-29) caracteriza as três leis fundamentais da lógica formal: 1) a lei
de identidade que formula o fato concreto de que determinadas coisas e alguns de seus traços
persistem e mantêm reconhecível similaridade em meio a suas mudanças, esta lei nos leva a
reconhecer o igual na diversidade, a permanência nas mudanças, a traçar conexões entre
diferentes e consecutivas do mesmo fenômeno; 2) a lei de contradição que estabelece o fato
de que coisas e tipos de coisas convivem, ou estados consecutivos da mesma coisa, diferem e
se excluem mutuamente; e, com efeito, a 3) a lei do terceiro excluído a qual expressa que as
coisas se opõem e excluem mutuamente na realidade.
Desse modo, embora a lógica formal se apresente como significativa devido a toda a
produção de conhecimentos existentes sob o domínio do pensamento burguês, Novack (2005,
p. 35-43) expõe as deficiências da lógica das formas. No que se refere à lei de identidade,
afirma que os corpos mudam constantemente, nunca são iguais a si mesmo. No entanto, no
método experimental de Dewey podemos considerar duvidoso o valor prático de uma
proposição indicada a partir de uma situação de experiência, pois, tal proposição provada
na prática combina, se adapta e se identifica, com uma nova situação prática, não
considerando o movimento do real, do histórico. Assim, a proposição não suporta a crítica e,
portanto, não elimina a contradição, mas acentua.
Além disso, a lógica formal assume que cada coisa ou estado de uma coisa é
absolutamente independente de qualquer outra coisa ou estado, isso pressupõe um mundo em
que tudo existe isolado dos demais. E mais, a lógica formal, como o próprio nome já diz, é a
lógica das formas, do método, de ênfase nos métodos, no como se faz, excluindo o conteúdo.
A lógica formal é o processo do pensamento dominado pelas leis que “são formulações
explícita da lógica instintiva do bom senso; que constituem as regras predominantes de
pensamento no mundo burguês” (NOVACK, 2005, p. 33). Dewey (1959a; 1959b) representa
o pensamento burguês e o faz sob a perspectiva da lógica formal, principalmente, porque na
lógica formal “não há lugar para a mudança, não há relação dinâmica com o mundo externo,
assim, a contradição eliminada no sistema da lógica formal, adquire supremacia no mundo
real” (NOVACK, 2005, p. 40).
Ao contrário da lógica formal, a lógica dialética do marxismo é a lógica do movimento,
da evolução, da mudança. Assim, o pensamento concreto deve ser concreto, variável e pronto
83
para detectar e usar as contradições apresentadas na realidade objetiva e histórica. Enquanto a
lógica formal está restrita a classificação, silogismos, juízos; a lógica dialética se preocupa
com a totalidade, as contradições, a transformação, portanto, vai além do formal no sentido da
transformação da sociedade burguesa. A lógica formal fala de mudanças, mas no sentido
adaptativo do pensamento aos contextos e não de transformação da realidade. Além disso, a
lógica dialética é a lógica dos conteúdos concretos que busca a unidade teoria e prática, ou
seja, a atividade teórica e a atividade prática como duas atividades que não se identificam,
mas que são atividades recíprocas, pois o conhecimento surge da prática, sendo a própria
prática parte indissolúvel e necessária do conhecimento, este que serve de guia da prática
enriquecendo-a no sentido qualitativo de desvelamento e transformação da realidade.
Portanto, diferentemente de uma posição de transformação, Dewey “defende a
adaptação do indivíduo ao modo de produção capitalista (EIDT, 2009, p. 39), defende um
projeto burguês para educação com base na filosofia pragmática, com ênfase na prática
experimental do pensamento reflexivo desconsiderando a apropriação do conhecimento
científico como importante contribuição para uma prática transformadora da realidade.
E estas são as bases conceituais que foram desdobradas por Piaget. Se Dewey pensou
em construir uma ciência pedagógica, ciência da criança, com base no método experimental
em defesa do “pensamento reflexivo”, Piaget na metade do século XX consolida a Pedagogia
como ciência da educação sob uma base também experimental e técnica de uma nova
epistemologia, a epistemologia da prática.
3.2.2 A Redefinição da Pedagogia como Ciência da Educação
Conforme Franco (2008, p. 31), a partir do século XVIII quando houve um enorme
entusiasmo pela experiência pedagógica, “a pedagogia, para se fazer ciência, precisou
adequar-se à lógica que presidia a ciência da época e isso implicou sistematizar sua ação
prática, com base nas teorizações dos experimentos. [...] Dessa forma, ela se organiza como
ciência empírica”. Segundo a sua análise dos clássicos da pedagogia, não fica dúvida que a
pedagogia é reconhecida como ciência da educação24
. Entretanto, para a autora, percebe-se
claramente que além de ciência da educação, há uma tendência a considerá-la arte, ciência e
arte da educação, ou mesmo ciência da arte educativa (idem, p. 25).
24
Quem primeiro referiu-se à pedagogia como ciência da educação foi Herbart na metade do século XVIII. E
tenta superar as contradições na pedagogia mesclando a ciência com a filosofia e incorporando como via auxiliar
a psicologia, a psicologia experimental.
84
Além dessas tendências mencionadas, Saviani (2004, p. 55-58) sumaria outras diversas
tendências: técnica da educação, filosofia da educação, história da educação, teologia da
educação, teoria da educação. Para o autor um exame superficial das tendências do termo
pedagogia permite perceber que existe um ponto em comum entre elas, todas trazem uma
referência explícita à educação, podendo, pois, considerar a Pedagogia como teoria geral
da educação, construída a partir em função das exigências da realidade educacional.
No entanto, a denominação da pedagogia como ciência da educação começa a se
construir no início do século XX com o surgimento de experiências educacionais que trazem
o conceito da educação ativa, por meio da concepção deweyana; de uma preocupação com a
prática sem deixá-la de ser científica, alinhando pesquisa experimental com a reflexão
epistemológica traduzindo nisso uma suposta teoria e prática inseparável. A concepção
de Dewey era de uma pedagogia que buscasse considerar os conhecimentos das chamadas
ciências da educação, tais como sociologia e psicologia (CAMBI, 1999).
Mas, segundo Cambi (1999, p. 595), a redefinição da pedagogia como ciência da
educação se concretiza na segunda metade do século XX. Esta redefinição está ligada,
sobretudo, ao advento de uma sociedade pós-guerra, cada vez mais dinâmica, que reclamava a
formação de um novo homem frente às tecnologias, ao avanço das ciências naturais e exatas.
É na década de 1950, com o teórico da psicologia genética Piaget (1896-1980) o
conhecido pai do construtivismo25
o qual lança conceitos no campo pedagógico
correspondente à maturação cognitiva numa perspectiva biologizante, que a pedagogia se
reconstitui como ciência da educação em torno desses princípios psicológicos os quais devem
também integrá-los à pedagogia que vai operar sobre eles e produzir sua otimização
(CAMBI, 1999, p. 610).
Segundo Piaget, a mente infantil é caracterizada por uma inteligência que
parte de comportamentos animistas e subjetivistas, mas descobre e se
adapta, gradativamente, à um uso formal cada vez mais abstratos dos
conceitos lógicos, regulando o próprio processo de desenvolvimento através
dos princípios biológicos da “assimilação” e “acomodação” que liga
estritamente a mente infantil ao ambiente (CAMBI, 1999, p. 610, grifos
nossos).
Na relação entre a pedagogia e a psicologia, Cambi (idem, ibidem), afirma que a
pedagogia neste momento tem, de fato, uma autonomia em relação à psicologia, mas
25
Segundo Facci (2004, p. 72-78), a teoria do professor reflexivo tem suas bases no construtivismo, nas ideias de
Piaget o qual representa também um desdobramento da concepção do pensamento reflexivo do Pedagogo e
Filósofo Dewey. A “teoria do professor reflexivo e o construtivismo são, pode-se dizer, o que se encontra de
mais “avançado” no sentido de ser atual, em termos de literatura que trata da formação e/ou atuação do professor
na contemporaneidade”.
85
enquanto uma disciplina operativa, que deve produzir efeitos práticos na educação de
determinados sujeitos. Tal pedagogia, nutrida de espírito experimental, se concretiza na
prática de uma escola ativa (contrária à escola tradicional, de tipo passiva) que deve ter em
mira ensinar a todas as crianças “um método que lhes ensinará para toda vida”.
Assim, afirma Piaget (1970, p. 25) que “os progressos da pedagogia experimental -
enquanto ciência independente quanto ao seu objeto - só pode estar ligados, como em todas as
ciências, às pesquisas interdisciplinares, se trata de construir uma verdadeira ciência”.
Em relação à questão interdisciplinar, Piaget (1970, p. 10) enfatiza que certas
inspirações fundamentais podem ser devidas a homens que não pertenciam à “profissão”,
citando conhecidos educadores como Herbart que era psicólogo, Dewey filósofo e Montessori
médica, que deram grandes contribuições para a pedagogia. Nesse sentido, o autor põe em
questão o problema da pedagogia:
Por que, então, a pedagogia só em ínfima parte é obra de pedagogos? Eis um
problema grave e sempre atual. A ausência ou a carência de pesquisas sobre
os resultados do ensino, sobre que acabamos de insistir, não passa de um dos
aspectos do problema. O problema geral consiste em compreender a razão
por que a imensa corte de educadores, que trabalham no mundo inteiro com
tanta dedicação e, na maioria dos casos, competência, não foi capaz de
produzir uma elite de pesquisadores que fizessem da pedagogia uma
disciplina, ao mesmo tempo científica e viva, como ocorre com todas as
disciplinas aplicadas que participam simultaneamente da arte e da ciência
(PIAGET, 1970, p. 10, grifos nossos).
Na perspectiva de responder a este problema geral da pedagogia, o autor defende a
pesquisa das práticas de ensino na formação universitária do professor e do pedagogo como
fundamental para o desenvolvimento da ciência pedagógica, para a construção de
conhecimentos no campo do ensino, e valorização do trabalho do mestre-escola. No entanto,
Piaget observa alguns obstáculos que impedem os mestres se dedicarem à pesquisa de
conhecimentos elementares, entre eles: 1) o público não sabe (e o público acaba por englobar
certas autoridades escolares e um número de mestres) que a pedagogia é, entre outras, uma
ciência, e das mais difíceis; 2) o mestre-escola limita-se a um programa e a aplicar os métodos
que lhe são ditados; e 3) o sistema universitário tradicional tem sido funesto à pesquisa
pedagógica, acrescentando que para este os problemas essenciais da pesquisa pedagógica
estão fecundados em sua vinculação com as outras disciplinas (PIAGET, 1970, p. 13-14).
No que se refere ao desenvolvimento da pesquisa na Pedagogia, o autor põe em debate
um problema da relação entre a pedagogia e as demais ciências ou profissionais de outras
áreas que formularam contribuições para o campo pedagógico, chegando a afirmar que:
86
Embora a medicina aplique a biologia e a fisiologia geral aos problemas da
cura das doenças, ela não hesita sobre os objetivos a atingir e utiliza as
ciências já avançada, colaborando ela mesma na edificação das disciplinas
intermediárias (fisiologia humana, patologia, farmacodinâmica etc.). Quando
a pedagogia procura aplicar os dados da psicologia e da sociologia, encontra-
se, ao contrário, em presença de questões enredadas tanto de fins como de
meios, nada recebendo das ciências-mãe a não ser modestos socorros, em
virtude da falta de progresso suficiente dessas disciplinas, não constituindo
sequer um corpo de conhecimentos específicos (uma psicologia pedagógica
que não seja simples psicologia infantil aplicada dedutivamente, uma
didática experimental etc.) (PIAGET, 1970, p. 13).
O que o autor chama a atenção tem fundamento. O campo pedagógico não foi capaz de
fazer avançar as disciplinas que utiliza como contribuição, nem mesmo constituir um corpo
teórico de conhecimentos específicos à prática pedagógica com base nestas contribuições. E
isso se deve aos fatores históricos: 1) de indefinição em relação ao campo de atuação prática
do pedagogo; 2) a desvalorização da prática; 3) a desvalorização do professor primário que
não tinha sua formação conectada à universidade; 4) sua característica de operar, ou seja,
apenas aplicar os conhecimentos das demais ciências; e 5) devido à fragmentação e
especializações das ciências.
Entretanto, Piaget propõe indicar como “resposta” a este problema trazendo para a
formação de professores e pedagogos, a partir da década de 1970, o que Dewey já havia
estruturado para a formação da criança com a centralidade no “aprender a aprender”, isto é, na
construção subjetiva do conhecimento. Piaget defende o fazer experimental da prática
educativa como referência, e, além disso, a interdisciplinaridade como resposta à
fragmentação e especializações das disciplinas nas concepções empiricista e positivista
de formação do pedagogo e professores.
A epistemologia genética é necessariamente de natureza interdisciplinar [...]
A aquisição do conhecimento é entendida por Piaget como um processo e
não um fato. Um processo que para ser compreendido precisa do auxílio de
outras ciências. Piaget deu grande ênfase aos aspectos biológicos e
maturacionais do desenvolvimento, extraindo das ciências naturais, de
caráter evolucionista, os fundamentos para sua teoria (FACCI, 2004, p. 95)
Para Piaget (1973), a interdisciplinaridade não se resume a facilitação do trabalho a qual
se reduz a explorar aspectos em comuns nas regiões fronteiras, mas afirma que:
[...] a tendência inovadora visa fazer recuar as fronteiras na dimensão
longitudinal e a pô-las em causa nas dimensões transversais. O verdadeiro
objetivo da investigação interdisciplinar é, portanto, uma reforma ou uma
reorganização dos domínios do saber, por trocas que consistem, na realidade,
em combinações construtivas (PIAGET, 1973, p. 141).
87
Dessa forma, Piaget (1970; 1973) propõe uma relação de troca entre as disciplinas, mas
não com a pretensão de extinguir as diferenças entre elas. Para o autor, o conhecimento
pedagógico deve ser construído na ação pedagógica através das relações interdisciplinares por
possuir uma abrangência e complexidade superiores às estabelecidas no âmbito disciplinar;
não possuindo as disciplinas e nem o interdisciplinar um fim em si mesmo, mas são formas de
produção de conhecimentos tanto ao nível interno (disciplina) quanto ao externo (das demais
disciplinas). O termo interdisciplinaridade em Piaget significa - formas de relações da
disciplina consigo mesma e com as demais disciplinas – e que, portanto, apresenta um
aspecto formal. Interdisciplinaridade como método de investigação e/ou técnica didática,
como forma de reflexão do sujeito na prática, um sujeito epistêmico, lhe retirando o
caráter de ser social-concreto. Pois, o que lhe importa é a forma como se constrói o
conhecimento e não o conteúdo da realidade em si e para si.
Em relação à construção do conhecimento pelo sujeito, podemos afirmar que a
concepção de Piaget apresentava nova roupagem da concepção de Dewey. Eidt (2009, p. 47),
também afirma existir um núcleo essencial comum na obra de Dewey e Piaget, “qual seja, a
defesa de uma mínima apropriação da cultura pelos membros da classe dominada”, assim,
Piaget a partir da década de 1950 atualiza a proposição deweyana afirmando que “o ideal da
educação não é aprender ao máximo, maximizar os resultados, mas antes de tudo, é aprender
a aprender; é aprender a se desenvolver e aprender a continuar a se desenvolvendo depois da
escola” (PIAGET apud EIDT, 2009, p. 48).
A premissa da mínima apropriação da cultura pode ser verificada na obra de
Piaget, na medida em que, para este autor, a forma pode ser considerada a
essência, já que é universal; ao passo que o conteúdo seria a aparência,
pois é circunstancial. Tal como em Dewey, o que está em questão é a
premissa do “aprender a aprender”, ou seja, são as experiências dos alunos e
a construção e de seus próprios conhecimentos [...] como conseqüência, na
prática pedagógica piagetiana, o conteúdo se faz presente de modo não
consciente, ou seja, de maneira assistemática; cujos traços essenciais são o
improviso, o espontaneísmo e o pragmatismo. Não por mera coincidência
[...] estas são justamente as características presentes nas obras dos defensores
contemporâneos do aprender a aprender (EIDT, 2009, p. 58, grifos original).
Então, como se observa tanto Dewey quanto Piaget se vale de uma lógica formal, pois,
Piaget “na concepção de desenvolvimento do pensamento faz com que este se limite, em
grande medida, ao nível sensorial” (EIDT, 2009, p. 59). Assim, a pedagogia como ciência da
educação se estruturou sob esta lógica formal, reforçando a separação entre teoria e
prática a partir de uma concepção pedagógica fundamentada na psicologia
88
experimental, no pragmatismo, na prática utilitária, na construção do conhecimento na
experiência prática e na construção das contribuições das ciências da educação para a
pedagogia de forma interdisciplinar, considerando minimamente a educação como
ponto de partida do empírico e chegada ao concreto pensado.
A pedagogia tornou-se “outra coisa” em relação ao seu modelo passado: foi
redescrita em termos empíricos, articulou-se sobre várias ciências,
colocou-se o tema da sua unidade de saber como problema, mas,
sobretudo, predispôs um saber tecnicamente mais eficaz, pensando
sobre a experiência e pela experiência, para guiá-la, para modificá-la,
para planificá-la. Entre empirismo (ciência empírica) e tecnologia, se
dispôs a nova identidade da pedagogia, provocando um amplo
reordenamento de toda sua frente teórica. Nasceu uma pedagogia
caracterizada de maneira bastante diferente em relação ao passado e que
através do filtro científico – técnico vive agora a sua estreita relação com
a prática. E é com esse modelo de pedagogia que a pesquisa científica
atual deve trabalhar, assumindo-o como guia (CAMBI, 1999, p. 599,
grifos nossos).
Como uma pedagogia experimental sob uma base epistemológica prática propõe-se
construir e verificar as proposições estruturadas a partir da experiência, mas estas proposições
não ultrapassam os limites do campo empírico, não vai do abstrato ao concreto, portanto, não
corresponde a unidade teoria – prática. Assim, não há o conhecimento da prática educativa na
totalidade, como uma realidade de múltiplas determinações, e sim uma interdisciplinaridade
da prática educativa apenas na perspectiva epistemológica como método ou técnica, como um
campo que possui um cabedal de conhecimentos que os utiliza quando necessários à prática,
não fazendo a ciência pedagógica avançar, pois, não busca conhecer na concreticidade e nas
contradições apresentadas, apreender a realidade se aproximando dela, ao máximo, através da
apropriação do conhecimento científico já existente.
3.3 As Pedagogias do “Aprender a Aprender” como Renovação da Escola Nova
A concepção da pedagogia experimental, discutida no item anterior, no atual contexto,
desde a década de 1990 até então, tem sido mais fortemente desdobrada e bastante divulgada
no campo de formação de professores por vários autores através das denominadas pedagogias
do “aprender a aprender”, as quais têm base material no processo de reestruturação da
sociedade capitalista a partir da segunda metade do século XX. Entre as pedagogias do
aprender a aprender, a pedagogia do professor reflexivo-pesquisador tem se colocado como
possibilidade “efetiva” de uma unidade teoria-prática na formação e trabalho do professor, por
89
considerar a produção teórica a partir da pesquisa constante da prática. Mas, antes de
debruçarmos na análise crítica da “teoria do professor reflexivo” na Pedagogia, pensamos ser
necessário compreender as bases sócio-históricas que tornaram aceitáveis as pedagogias do
“aprender a aprender”, bem como, seus princípios fundamentais.
A crise do modelo desenvolvimentista da sociedade capitalista já na década de 1960
começava a se fazer presente se estendendo até a década de 1970 e 1990. Esta crise baseou-se
no esgotamento do modelo taylorista/fordista de produção e do estado de bem-estar social,
entre outros fatores, devido à ausência de novos mercados, o que faz a elevação da
produtividade atingir seu limite, há um declínio do crescimento econômico e a manifestação
do princípio da política neoliberal26
de “Estado mínimo” com novas formas de organização do
trabalho. “Não se trata de uma alternativa para a crise, mas a busca da recomposição dos
mecanismos de reprodução do capital” (FRIGOTTO, 2003, p. 81).
O que os neoliberais e conservadores combatem é a forma histórica específica
que assume a intervenção estatal no período fordista, propondo, junto com
isso, um novo padrão de intervenção de caráter mais autoritário e
antidemocrático (...) para desfazer-se do “bem-estar” que caracteriza aquele
tipo de Estado, os neoliberais precisam recriar um tipo de intervenção estatal
mais violenta tanto no plano material como no simbólico (GENTILI, 1998, p.
237).
As reformas neoliberais são intensificadas pelos órgãos internacionais e pelos governos.
A formação de professores, em consequências das crises de 1970-90 e das mudanças nas
relações de trabalho, incorpora uma diversidade de pedagogias as quais integram as
pedagogias do “aprender a aprender” no sentido de atender às exigências da
reestruturação produtiva do capital (entre elas, pedagogia construtivista, pedagogia das
competências, pedagogia do professor reflexivo-pesquisador e pedagogia multiculturalista).
Assim, a sociedade neoliberal atravessada pela microeletrônica propõe como
instrumento para atingir a reestruturação produtiva o toyotismo27
, porém, os modelos
produtivos sofrem reestruturação sem, no entanto, transformar as bases essenciais do modo de
produção capitalista. O toyotismo e a era da acumulação flexível procura gestar um projeto de
recuperação da hegemonia por meio do culto de um subjetivismo e de um ideário
fragmentador que faz apologia ao individualismo exacerbado, estabelecendo nova forma de
26
O termo neoliberalismo surge na década de 1990. Para Melo (2007, p. 191-197) o prefixo “neo” quer indicar
um novo florescimento do liberalismo em termos mais presentes, potentes, realizadores de um objetivo
harmonioso, direto, final e espontâneo da própria ordem social [...] o termo atende a problemas de uma nova
época, um novo liberalismo para responder às mudanças histórico-sociais do século que tinha se iniciado
resgatando os princípios do liberalismo clássico – o individualismo, a propriedade privada e o “Estado mínimo”. 27
O Toyotismo é um modo de organização da produção capitalista originário do Japão, resultante da conjuntura
desfavorável do país.
90
relacionamento entre o capital e o trabalho com o advento de um trabalhador mais
qualificado, participativo, multifuncional e polivalente, e na ideia de um relacionamento
cooperativo com o trabalho (ANTUNES, 2007, p. 48-49).
São pilares do toyotismo ou acumulação flexível: 1) a produção se torna vinculada à
demanda, de modo a atender as especificidades e exigências do mercado consumidor; 2) o
trabalhador deve trabalhar em equipe e desempenhar várias funções, diferentemente do
movimento repetitivo do taylorismo/fordismo; 3) a produção baseada no método Just in time,
no aproveitamento máximo do tempo no processo produtivo; 4) estrutura horizontalizada, esta
diminuição da hierarquia deposita no trabalhador a necessidade de criação e valorização do
capital; e 5) organização de controle de qualidade, trabalho e desempenho visando o aumento
da produtividade, sendo esta uma importante estratégia em que o capital se apropria do saber
intelectual e cognitivo do trabalhador (ANTUNES, 2007, p. 54-55).
No campo da educação estes pilares se manifestam da seguinte forma: não se tornam
mais necessários os conhecimentos universais, mas aqueles vinculados com as especificidade
e exigências da sociedade capitalista no sentido de adequação; os conhecimentos úteis às
atividades práticas; propõe-se uma estrutura horizontalizada na relação professor-aluno,
criticando as formas clássicas da educação escolar de transmissão dos conhecimentos em
defesa da afirmação de que o professor assim como o aluno está aprendendo. O professor
aprende em sua atividade prática. Entre outras manifestações, a do desempenho que
determina uma formação com base na criatividade, na resolução de problemas em prol da
produtividade, da valorização das exigências da sociedade regida pelo capital.
Dessa forma, no contexto neoliberal apresentam-se novas adjetivações para o trabalho
em atendimento a lógica de mercado, baseadas, não mais apenas, em habilidades do fazer
(execução), mas na articulação dessas com uma capacidade cognitiva para a operação dos
novos dispositivos organizacionais e da nova base técnica flexível. Além disso, exige-se
autonomia na formação e a capacidade de iniciativa e criatividade para resolução de
problemas.
Segundo Kuenzer (2003, p. 05), “entram em jogo as capacidades para mobilizar e
transferir conhecimentos tácitos e teóricos, o que depende apenas em parte do domínio
cognitivo, adentrando-se na esfera do domínio afetivo ou comportamental”. Assim, exigem-se
muito mais conhecimentos do indivíduo, porém, o indivíduo precisa aprender a buscar
sozinho estes conhecimentos e saber quais conhecimentos respondem as necessidades de
sua atividade operativa.
91
Para Eidt (2009), estas características do toyotismo ou acumulação flexível intensifica o
processo de estranhamento entre o indivíduo e o gênero humano, pois se reduz a atividade
intelectual ao mecanismo de adaptação biológica como propunha a filosofia pragmática de
Dewey, que se baseava “na defesa de uma epistemologia fundada na ação, em que o
conhecimento cede lugar à experiência e o professor se limita a um mero „guia‟ ou „animador‟
do processo pedagógico” (idem, p. 145).
Dessa forma, o toyotismo ou acumulação flexível representa a base material para uma
necessária extensão e atualização do ideário da Escola Nova. Trata-se do “aprender a
aprender”, o qual se concentra no sujeito empírico, no saber-fazer advindo da
experiência, verificando uma ruptura da unidade teoria e prática em prol do pensamento
sensorial-prático e, sobretudo, negando a necessidade do pensamento em direção do abstrato
ou teórico (EIDT, 2009, p. 153).
Duarte (2003a) focaliza quatro princípios fundamentais na pedagogia do “aprender a
aprender”: 1) são mais desejáveis as aprendizagens que o indivíduo realiza por si mesmo, nas
quais está ausente a transmissão, por outros indivíduos, de conhecimentos e experiências; 2) é
mais importante adquirir método científico que o conhecimento científico já existente, este
posicionamento não se separa do primeiro, pois o indivíduo só poderia adquirir o método
científico por meio de uma atividade autônoma; 3) para que a atividade seja verdadeiramente
educativa deve ser impulsionada e dirigida pelo interesse do indivíduo; e 4) preparar o
indivíduo para acompanharem a sociedade em acelerado processo de mudança.
Portanto, as pedagogias do aprender a aprender defendem a formação do indivíduo
no sentido da disposição em adaptar-se à sociedade capitalista. Verifica-se, assim, de
acordo com os estudos de Duarte (2001; 2003a), Eidt (2009), Facci (2004) que as pedagogias
do aprender a aprender são extensões do escolanovismo pragmático de Dewey, mais
fortemente demarcado com o aprofundamento de sua defesa a qual se baseia na adaptação à
sociedade capitalista, no sujeito empírico construtor de seu próprio conhecimento, a
construção do conhecimento com base na experiência, uma supervalorização da prática
em detrimento do teórico.
Nesse sentido, a partir da década de 1980-90, observa-se um recuo da teoria (MORAES,
2003) na formação do indivíduo, a negação da apropriação do conhecimento e desprezo pelas
formas clássicas da educação. Na década de 1990 a adesão pragmática se evidencia mais
fortemente no ensino superior por meio das políticas oficiais e documentos internacionais de
reforma da educação, tais como: Banco Mundial e a Unesco com seu relatório encomendado –
92
Educação: um tesouro a descobrir, organizado por Jacques Delors para a divulgação dos
pilares da educação, aprender a ser, a fazer, a aprender e a conviver.
3.4 A Pedagogia como Ciência da Educação e o seu Respaldo na Teoria do Professor
Reflexivo – Pesquisador
Foi a partir da década de 1990, tendo como seu principal formulador o norte-americano
Donald Schön, que a formação do profissional reflexivo ocupou espaço através de sua grande
divulgação sob o argumento da formação do profissional que “não consegue dar respostas às
situações que emergem no dia-a-dia profissional, porque estas ultrapassam os conhecimentos
elaborados pela ciência” (PIMENTA, 2006, p. 19). Assim, “Schön revitalizou e conceituou
mais explicitamente a figura do profissional reflexivo ao propor uma epistemologia da prática,
da reflexão e do conhecimento na ação” (PERRENOUD, 2002, p. 14). Embora
O profissional reflexivo é uma antiga figura de reflexão sobre a
educação, cujas bases podem ser encontradas em Dewey [...]
Encontramos essa ideia – e não a expressão – em todos os grandes
pedagogos que, cada um a seu modo, considera o professor ou educador
um inventor, um pesquisador, um improvisador, um aventureiro que
percorre caminhos nunca antes trilhados e que pode se perder caso não
reflita de modo intenso sobre o que faz e caso não aprenda rapidamente
com a experiência (PERRENOUD, 2002, p. 13, grifos nossos).
Para Perrenoud (2002, p. 30-31), Schön distingue a reflexão na ação e a reflexão sobre a
ação, embora as distinções sejam flexíveis: a reflexão na ação consiste na meditação antes de
agir, ressaltando que esta reflexão exige urgência. Já a reflexão sobre a ação toma-se a própria
ação como objeto de reflexão, passa por uma crítica, uma análise, por uma relação com as
regras, teorias ou outras ações, imaginadas ou realizadas em uma situação análoga.
Nesse sentido, Perrenoud (2002) afirma com muita clareza que:
[...] é preciso aceitar algumas perdas: para que os alunos aprendam a se
tornar profissionais reflexivos, é preciso renunciar à atitude de sobrecarregar
o currículo da formação inicial de saberes disciplinares e metodológicos; é
preciso reservar tempo e espaço para realizar um procedimento clínico,
com resolução de problemas, com a aprendizagem prática da reflexão
profissional, em articulação entre tempo de intervenção em campo e
tempo de análise (PERRENOUD, 2002, p. 44, grifos nossos).
A prática reflexiva seria um domínio conquistado mediante a prática, a prática de
pesquisa. A postura reflexiva para o autor está relacionada aos recursos cognitivos, os
saberes da ação, a experiência que desenvolve a prática reflexiva. Então, Perrenoud
93
(2002) afirma que não basta renunciar um procedimento padronizado, não basta saberes
procedimentais, tem que reconhecer que a aplicação dos saberes a situação complexa
necessita de outros recursos cognitivos, isto é, a experiência. Por isso, a sua defesa na
dedicação aos estágios e às classes para que o profissional da educação possa aprender.
Postura reflexiva mobiliza saberes teóricos e metodológicos, mas não se
reduz a eles. Ela não pode ser ensinada. Pertence ao âmbito das
disposições interiorizadas, entre os quais estão as competências, bem
como uma relação reflexiva com o mundo e com o saber, a
curiosidade, o olhar distanciado, as atitudes e a vontade de
compreender (PERRENOUD, 2002, p. 81).
Assim, para “o desenvolvimento da postura reflexiva é preciso formar habitus e
estabelecer esquemas de reflexão”. Para o autor, habitus (categoria de Bourdieu) é
mediação entre os saberes e as situações que provocam uma ação (idem, ibidem).
Perrenoud enfatiza que a universidade parece ser o contexto privilegiado para uma
formação em prática reflexiva, porém, ressalta que esta aposta
Só será ganha se houver aumento da lucidez no interior das faculdades
de ciências da educação; para serem bem-sucedidas na formação dos
professores, elas não devem conservar nenhuma ilusão sobre o estado
dos saberes teóricos e sua pertinência para fundar a prática
profissional [...] Nesse sentido, é preciso orientar com clareza a
formação dos professores para uma prática reflexiva, valorizar os
saberes advindos da experiência e da ação dos profissionais e
desenvolver uma forte articulação teórico-prática e uma verdadeira
profissionalização. Essas transformações questionam o status
epistemológico das ciências da educação e a vocação das unidades que o
exigem (PERRENOUD, 2002, p. 90).
É perceptível na concepção do autor uma posição de secundarização do
conhecimento científico em defesa da valorização da experiência . Ao invés de permitir
o acesso ao conhecimento científico para que de forma adequada o professor possa agir sobre
a prática pedagógica, e esta, neste sentido, enriquecer a teoria, se propõe conhecer na ação, na
prática, na experiência subjetiva, pessoal e a - histórica, sob a égide da “teoria do professor
reflexivo-pesquisador”. Além disso, como um sujeito pesquisador capaz de construir seu
próprio conhecimento, há uma desvalorização do status do professor enquanto aquele que
ensina conhecimentos, como se ensinar fosse algo inferior à pesquisa.
O conhecer na ação caracteriza-se por ser um conhecimento
interiorizado, “inconsciente e mecânico”, que seria capaz de orientar
boa parte do conhecimento dos professores. Este conhecimento seria
decorrente, em parte, de crenças provenientes da experiência prática da
profissão docente e se expressariam em um saber-fazer espontâneo. É
94
importante ressaltar que durante a ação docente, o professor, imbuído da
necessidade de tomar decisões em cada situação específica, faria uma
reflexão em que o rigor, a sistematização e o distanciamento
requeridos pela análise racional ficariam minimizados em nome da
“riqueza da totalidade do momento” (EIDT, 2009, p. 74, grifos
original).
Nesse sentido, se construiu uma “nova” epistemologia da prática, isto é, o
conhecimento construído subjetivamente na experiência da prática. Por isso,
Perrenoud (2002, p. 107-108) defende a formação de profissionais reflexivos por meio de
um procedimento clínico, onde a prática não é simples exercício de aplicação de
conhecimentos adquiridos, além da aplicação, a prática é um trabalho de construção de
conceitos e de novos saberes teóricos a partir da situação singular e um trabalho de
integração e mobilização de recursos adquiridos.
Surge uma “nova” epistemologia da prática, a qual se desenvolve a partir da
“crítica” ao tecnicismo, pois a racionalidade técnica contribuiu para a desvalorização da
experiência pessoal e dos saberes gerados pela prática; e da crítica ao intelectualismo
tradicional acadêmico, que distancia a universidade das práticas cotidianas dos
professores em salas de aula. Segundo Pérez Gomes (1997, p. 108), a prática na
racionalidade técnica situa-se no final do currículo de formação, “quando alunos-mestres
já dispõem do conhecimento científico e das suas derivações normativas”. Então, a
“nova” epistemologia da prática busca uma relação diferente da teoria -prática, qual seja:
uma concepção construtivista da realidade através do processo de reflexão na ação do
profissional ao longo da formação (idem, p. 110).
O profissional competente atua refletindo na ação, criando nova
realidade, experimentando, corrigindo e inventando através do diálogo
que estabelece com essa mesma realidade. Por isso, o conhecimento que
o novo professor deve adquirir vai mais longe do que as regras, fatos,
procedimentos e teorias estabelecidas pela investigação científica. [...] a
prática adquire o papel central de todo o currículo, assumindo-se
como o lugar de aprendizagem e de construção do pensamento
prático do professor (PÉREZ GOMES, 1997, p. 110, grifos nossos).
Nesse sentido, Perrenoud (2002, p. 204-206) reafirma a formação de profissionais
reflexivos por meio da pesquisa da prática, mas adverte que nem toda pesquisa forma o
profissional reflexivo. O autor propõe ampliar a concepção de pesquisa para a
pesquisa na perspectiva da prática reflexiva e o desenvolvimento da prática
reflexiva de forma independente da pesquisa, porém, contribuindo para a formação de
pesquisadores colocados, acima de tudo, a serviço de uma ação complexa, reflexiva.
95
A formação por meio da pesquisa nos parece um desvio útil para a
formação teórica, vivaz, ativa e personalizada. Essa opção postula que a
principal regulação da prática docente provém da reflexão do próprio
profissional, desde que ele seja capaz de propor questões, de aprender a
partir da experiência, de inovar, observar, ajustar progressivamente sua
ação às reações previsíveis dos outros. Sendo assim, as teorias das
ciências humanas não podem pretender substituir a prática reflexiva
dos professores em situação (PERRENOUD, 2002, p. 101, grifos
nossos).
Para o autor, mais que associar os futuros professores a trabalhos de análises de
dados, observação, etc., é associá-los às fases de construção do conhecimento, “às etapas
mais subjetivas, menos codificadas e mais criativas do trabalho de pesquisa”. Assim,
proporcionaria a igualdade entre os profissionais e os pesquisadores. Zeichner (1998)
também propõe eliminar as diferenças entre o acadêmico e o professor, indo além da
divisão transformando o professor em pesquisador.
Isso nos parece um nivelamento por baixo, já que os profissionais da educação
sofrem historicamente uma desqualificação em relação ao pesquisador no que se refere à
valorização e apropriação do conhecimento científico na formação. Então, ao invés de
proporcionar aos professores acesso ao conhecimento científico, a noção de pesquisa
evidenciada pelos autores reforça esta desqualificação fazendo os professores
acreditarem que estão desenvolvendo pesquisa científica, quando, na verdade,
desenvolvem uma pseudopesquisa.
Em relação à Pedagogia com as demais ciências, Perrenoud (2002) se contrapõe a
concepção da Pedagogia em torno da filosofia, a qual determina a Pedagogia como
uma ciência unitária.
Se pensarmos que educação é um objeto em torno do qual se pode
construir uma ciência unificada e, em certa medida, auto-suficiente, “a
ciência da educação”, estaremos privilegiando uma dinâmica endógena
de desenvolvimento: o objetivo da pesquisa é tornar a teoria cada vez
mais coerente e completa de acordo com as observações. Os usos
práticos passam a ser concebidos como subprodutos dos conhecimentos
fundamentais, pela pesquisa aplicada ou pela vulgarização. Sob esse
ponto de vista, a formação dos professores é empreendimento secundário
[...] (PERRENOUD, 2002, p. 95).
Assim como na metade do século XX, a Pedagogia continua sendo entendida
como uma ciência da educação no sentido pluralístico, multidisciplinar,
interdisciplinar, e, portanto, de dependência em relação às conhecidas ciências da
educação. A pedagogia como campo de operar os conhecimentos das ciências da
educação. Para o autor, a pesquisa, ao contrário da concepção unificada de ciência da
96
educação em que o uso da prática se torna um subproduto dos conhecimentos
fundamentais, com uso da prática em relação à concepção plural das ciências da
educação, a formação de professores assume empreendimento fundamental, colocando as
ciências da educação na perspectiva interdisciplinar, os professores vão construir
conhecimentos relativos à utilidade de sua prática no sentido de resolver problemas
imediatos.
Se, ao contrário, considerarmos que a educação é definitivamente um
objeto interdisciplinar, podemos delegar às disciplinas contributivas
(psicologia, sociologia e outras) o desenvolvimento dos conhecimentos
fundamentais que provêm de seus respectivos campos. [...] ela acentua
mais a cooperação interdisciplinar que o estímulo às pesquisas
monodisciplinar (PERRENOUD, 2002, p. 95).
Dessa forma, a interdisciplinaridade na Pedagogia se assenta como
possibilidade da “unidade” entre as várias ciências da educação e isso apenas se
efetiva a partir da constante referência ao sistema de ação em busca da construção
constante de uma linguagem comum na prática.
A única forma duradoura de propiciar certa unidade ao trabalho
interdisciplinar seria referi-lo constantemente ao sistema de ensino [...]
Nesse sentido, a referência à profissão de professor, assim como a outras
práticas educativas, é um ponto central na construção de uma linguagem
comum, de problemáticas compartilhadas e de saberes interdisciplinares
(PERRENOUD, 2002, p. 96).
A interdisciplinaridade na pedagogia do professor reflexivo é um desdobramento da
concepção piagetiana, embora esta pedagogia apresente uma diferença em relação às
concepções deweyana e piagetina, qual seja: no escolanovismo e construtivismo sempre há
uma defesa no método científico, tanto que afirmam ter entrado na fase do pensamento
científico ao contrário da pedagogia tradicional que é dogmática, por outro lado, os atuais
construtivistas escolanovista da pedagogia do professor reflexivo-pesquisador não defendem o
método padronizado, mas a diversidade de métodos, na multireferencialidade.
Entretanto, os autores da pedagogia do professor reflexivo defendem com muita
veemência a mesma perspectiva, a construção contínua e interdisciplinar do conhecimento
pelo sujeito na prática, mas acrescentam afirmando que: não se reduzindo apenas aos
saberes teórico-metodológicos adquiridos, sendo estes importantes para a aplicação na prática
quando necessário.
Contrária a posição anterior, para Frigotto (2001), a interdisciplinaridade não pode ser
considerada como método de investigação ou como técnica didática, não pode abrir mão da
97
especificidade das disciplinas, o interdisciplinar tem que está no plano do movimento do real
e não no movimento da razão, portanto, o interdisciplinar deve buscar a objetividade e não a
subjetividade do conhecimento, objetividade significa as múltiplas determinações e se
distancia da neutralidade, pois, o interdisciplinar está lotado na materialidade da sociedade
capitalista de relações capitalistas de produção da existência.
Podemos concluir que na “teoria do professor reflexivo” a construção do conhecimento
se dá a partir da experiência dos indivíduos ou coletiva. Reconhecemos que refletir sobre a
prática seria um avanço em termos profissionais, mas, nesta perspectiva, o conhecimento que
se constrói não ultrapassa o pensamento empírico, sendo este essencialmente baseado na
lógica formal e que tem, portanto, um caráter imediato. Os conceitos empíricos e teóricos
diferem tanto em conteúdo quanto na forma. O pensamento teórico é essencialmente baseado
na lógica dialética, de caráter mediado.
É sob esta “teoria do professor reflexivo” que Franco (2008) estrutura sua tese em
relação à Pedagogia - ciência da educação e o pedagogo como um cientista. A autora
apresenta três abordagens decorrentes na história referente à pedagogia: 1) pedagogia
filosófica (metafísica social e idealista-dialética); 2) pedagogia técnico-científica (baseada no
positivismo); e 3) pedagogia crítico-emancipatória (com base em Marx, Engels, Gramsci etc.).
A partir disso, se diz enquadrar na pedagogia crítico-emancipatória que, para ela, tem caráter
histórico-crítica. Todavia, algumas análises precisam ser feitas no sentido de compreender
melhor tal posição, pois, sua proposição, que “responde” ao problema da dicotomia teoria e
prática na pedagogia, parece se aproximar bastante da atual perspectiva da pedagogia do
profissional reflexivo, inclusive, a qual está fundamentada em autores como Donald Schön,
Pérez Gomez, Zeichner e António Nóvoa.
Mas, antes de qualquer análise de sua proposição, é importante destacar que Franco faz
parte do grupo de José Carlos Libâneo e Selma Garrido Pimenta, grupo este que tem uma
posição em relação à pedagogia, qual seja: a ação do pedagogo não se confunde com a ação
docente, ambos funcionam ainda como papéis complementares, mas diferente; o pedagogo
não foi representado historicamente como docente, mas como aquele profissional que
organiza as possibilidades da ação docente (FRANCO, 2008). Para os autores, a formação do
pedagogo não pode se limitar a docência, pois, a pedagogia como ciência da educação tem um
campo vasto de pesquisa e investigação científica, assim sendo:
O currículo de formação do pedagogo deve assegurar a formação em
pesquisa e o exercício de atividades educativas nas escolas e em espaços
não escolares, tais como: sistemas escolares e escolas, incluindo
98
universidades e instituições de ensino superior; movimentos sociais,
organizações comunitárias; mídias, incluindo o campo editorial, vídeos, e
outras tecnologias; áreas da saúde (projetos de prevenção, difusão científica
para fins educativos etc.); empresas; sindicatos; instituições culturais, de
lazer, de turismo para diversas faixas etárias, entre outros.
Em seu exercício profissional, o pedagogo estará habilitado a
desempenhar atividades relativas à: formulação e gestão de políticas
educacionais; formulação e avaliação de currículos e de políticas
curriculares; organização e gestão de sistemas e de unidades escolares;
coordenação, planejamento, execução e avaliação de programas e
projetos educacionais, para diferentes faixas etárias (crianças, jovens,
adultos, terceira idade); formulação e gestão de experiências
educacionais; coordenação pedagógica e assessoria didática a
professores e alunos em situações de ensino e aprendizagem;
coordenação de atividades de estágios profissionais em ambientes
diversos; formulação de políticas de avaliação e desenvolvimento de
práticas avaliativas no âmbito institucional e nos processos de ensino e
aprendizagem em vários contextos de formação; produção e difusão de
conhecimento científico e tecnológico do campo educacional; formulação
e coordenação de programas e processos de formação contínua e
desenvolvimento profissional de professores em ambientes escolares e
não escolares; produção e otimização de projetos destinados à educação
a distância, programas televisivos, vídeos educativos; desenvolvimento
cultural e artístico para várias faixas etárias. Em toda e qualquer inserção
profissional e nas funções que exerça, o pedagogo, assim formado, estará em
condições de articular as diversidades, as desigualdades culturais e sociais e
as necessidades especiais dos seres humanos envolvidos no processo de
educação (FRANCO; LIBANEO & PIMENTA, 2007, p. 85).
Desse modo, é no sentido do entendimento da pedagogia como ciência da educação, de
forma a não centrar a formação na docência, que o grupo se posiciona em defesa da
pesquisa, da investigação científica na formação do pedagogo e, de um campo de
investigação amplo correspondente ao escolar e não escolar. A partir disso, Franco (2008)
defende as bases teóricas e metodológicas necessárias para a pesquisa na formação do
pedagogo, as quais evidenciam um ecletismo e, ao mesmo tempo uma ancora nos
fundamentos da formação do pesquisador reflexivo que, para ela, precisa ser crítico-reflexivo.
A pedagogia não poderá ser ciência se não se organizar em torno da reflexão
engajada, devendo se construir como ciência crítica e reflexiva, mergulhada
no universo da prática educativa, engajada nos anseios coletivos, sabendo,
por princípio, que não basta a ela ser uma ciência da crítica sobre a prática
(FRANCO, 2008, p. 91).
O ecletismo ou maneira velada de se posicionar fica evidente quando a autora propõe
como metodologia das pesquisas a serem desenvolvidas pelos pedagogos: a metodologia
formativo-emancipatória, com fundamento na formação do profissional reflexivo com base
em Zeichner, Pérez-Gomes etc., além de fazer uso da filosofia da práxis em Marx, Vázquez e
Kosik, fazendo aproximações díspares entre o marxismo e a “teoria do professor reflexivo”,
99
sugerindo em sua proposição como possibilidade de solucionar a separação entre teoria e
prática na formação do pedagogo, “como base epistemológica da pesquisa, a prática
reflexiva” (FRANCO, 2008, p. 94).
Nas palavras da autora, “o exercício de uma prática reflexiva requer a presença
contínua, crítica e construtiva do pesquisador educacional, que reconheço como o
pedagogo” (idem, p. 99). Com efeito, a autora sugere duas abordagens a sua metodologia
formativo-emancipatória: reconhecimento – utilizando procedimentos de observação, de
estudo de caso, de história de vida, entre outros; e a intervenção - sendo que a pesquisa-ação
é o procedimento que mais se aproxima da intervenção, por ser uma pesquisa colaborativa.
Sob esta abordagem, para Franco (2008, p. 89, grifos nossos), “ao pesquisador serão
necessários um olhar fenomenológico e um fazer crítico-dialético”. Para a autora o olhar
fenomenológico é fundamental para adentrar nos sentidos que o coletivo vai construindo e
para explicar “as ideologias subjacentes às práticas cotidianas, bem como, para desvendar e
decifrar os pressupostos implícitos nos discursos, nos textos da existência, nas
comunicações”. E o fazer crítico-dialético, nas palavras da autora, como “postura científica
que denomino crítico-emancipatória” que carrega entre as implicações de atitudes, a de
trabalhar no coletivo a partir da intersubjetividade construída, e em contínua
construção.
Diante esta síntese, podemos afirmar que o ecletismo e, ao mesmo tempo, o predomínio
da formação do profissional reflexivo na obra de Franco (2008) corresponde a uma
propositiva que está de acordo com as concepções de Dewey, Jean Piaget e seus divulgadores,
anteriormente citados, da pedagogia do professor reflexivo no atual contexto das pedagogias
do “aprender a aprender”. Apesar de a própria autora fazer críticas às concepções deweyana e
ao técnico-cientificismo de Piaget, sua proposição não se afasta da “teoria do professor
reflexivo” divulgada por Schön, Pérez-Gomes, Zeichner etc., os quais, inclusive são os que
fundamentam sua proposição em relação à reflexibilidade na Pedagogia.
Nesse sentido, o que Franco (2008) propõe é um processo contínuo de construção do
conhecimento a partir da prática reflexiva, para ela, somente assim seria desenvolvida uma
prática reflexiva, crítica e transformadora. E, por isso, sua concepção também é a de não
valorização da apropriação dos conhecimentos científicos já produzidos pelas gerações
anteriores como forma de desenvolver uma prática transformadora, adequada, qualitativa e
enriquecedora.
Embora os defensores da “teoria do professor reflexivo”, assim como a autora e seu
grupo, não identificar a sua associação à racionalidade técnica do aprender fazendo,
100
afirmando está se contrapondo ao tecnicismo, o “aprender a aprender” também é um aprender
fazendo na clássica formulação de Dewey (DUARTE, 2003a, p.06). Dessa forma, a pedagogia
do professor reflexivo está ligada mais ao “como” aprender do que “o que” e “porque”
aprender (FACCI, 2004, p. 70). Com ênfase no método, no processo, na construção do
conhecimento pelo sujeito, ao invés do produto que é o conhecimento já existente. Facci
enfatiza, ainda, que:
Nos materiais que pesquisei, é dada muita ênfase à questão da reflexão-na-
ação, reflexão-sobre-a-ação e reflexão-sobre-a-ação-na-ação. Reconheço que
o conhecimento da prática é fundamental. Mas, conforme tenho enfatizado
neste estudo, acredito que somente o conhecimento advindo da prática
do professor, produzido no cotidiano da sala de aula, não é suficiente
para uma prática que se quer transformadora. O conhecimento teórico-
crítico, já produzido pelas gerações anteriores e que explica a forma
histórica de ser dos homens, é que serve de ferramenta para entender e
significar a prática atual (FACCI, 2004, p. 70, grifos nossos).
Franco (2008) e seu grupo apresentam a defesa, como anteriormente mencionada, de
um fazer crítico-dialético, mas de que dialética se refere? Porque no marxismo, “não há
margem para ecletismos nem para justaposições que desconsiderem o núcleo da concepção
marxista” (DUARTE, 2003a, p. 43). Além disso, a dialética marxista busca a essência dos
fenômenos indo além das aparências, do imediato, da prática imediata e direta. O pensamento
dialético deve ser concreto por meio das abstrações para compreensão da totalidade e das
contradições da realidade (NOVACK, 2005, p. 62).
[...] a essência do objeto em seu estágio de maior desenvolvimento não se
apresenta ao pesquisador de maneira imediata, mas sim de maneira
mediatizada. Essa mediação é realizada pelo processo de análise, o qual
trabalha com as abstrações. Trata-se do método dialético de apropriação do
concreto pelo pensamento científico por meio da mediação do abstrato. O
processo do conhecimento conteria três momentos: síncrese, análise e
síntese. Sem a mediação da análise do pensamento científico não seria capaz
de superar a síncrese própria do senso comum e, portanto, não seria capaz de
alcançar a síntese, isto é, alcançar a compreensão da realidade investigada
em seu todo concreto (DUARTE, 2003a, p. 46).
Apesar do grupo composto por Libâneo, Pimenta e Franco traçar diferenças entre a
“teoria do professor reflexivo” e sua defesa na formação crítico-reflexivo, afirmam que as
orientações teóricas da formação crítico-reflexivo estão na fenomenologia, na teoria da ação
comunicativa e no marxismo/neomarxismo (LIBANEO, 2006, p. 63), evidenciando o
ecletismo inaceitável na perspectiva verdadeiramente marxista e, ao mesmo tempo uma
grande aproximação à “teoria do professor reflexivo” de matriz pragmática.
101
José Carlos Libâneo apresenta um discurso que nos parece ambíguo e
contraditório, no qual podem ser encontradas passagens que apontariam
para uma visão crítica da educação, mas que acabam sendo anuladas pelo
conjunto do pensamento exposto pelo autor, conjunto esse que se mostra em
sintonia com os ideários educacionais voltados para o lema “aprender a
aprender”. [...] A concepção do papel da educação escolar atualmente
defendida por José Carlos Libâneo acaba levando-o a aderir também ao
lema “aprender a aprender”, tanto no que se refere à aprendizagem dos
estudantes, como no que se refere à formação de professores,
endossando explicitamente as abordagens de Zeichner, Pérez-Gomes e
Perrenoud (DUARTE, 2006, p 42-44, grifos nossos).
Para Libâneo (2006, p. 62), existem outros sentidos do conceito de prática reflexiva: a
reflexibilidade de cunho neoliberal e a reflexibilidade de cunho crítico, o primeiro conceito
denomina-se da racionalidade instrumental, tecnicista e pragmático, o qual se trata de
apreensão da prática; enquanto que o segundo do reconstrucionismo social, comunicativa e
hermenêutica, se preocupa com apreensão teórica – prática. Entretanto, percebemos que neste
ponto não há muitas diferenças, pois, “teórica – prática”, para o autor, realça uma identidade
entre duas atividades distintas que possuem uma relativa independência.
Numa revisão de literatura, Facci (2004, p. 43) identifica três abordagens sobre a
formação reflexiva dos professores: a narrativa, a crítica e a cognitivista, sendo que as três
abordagens não são excludentes entre si. A abordagem das narrativas (Schön) que valoriza os
conhecimentos práticos e as reflexões realizadas pelos professores. Na abordagem crítica,
(Zeichner) a ênfase é colocada no tipo de decisões tomadas pelos professores, concebendo a
reflexão num contexto sócio-político mais amplo e levando-se em conta a diversidade
cultural. E a abordagem cognitivista que se preocupa com o papel do conhecimento no ensino.
Diante estas abordagens podemos afirmar que o grupo de Libâneo se relaciona de
forma muito harmônica à abordagem crítica, por isso, se refere ao professor crítico-
reflexivo utilizando como um dos principais referenciais o Zeichner. Para Zeichner (1997,
p. 118), se fazem necessários algumas inovações para a formação de professores, tais como:
1) o desenvolvimento de um currículo explícito do practicum (momentos estruturados da
prática pedagógica) e uma associação mais estreita com os cursos específicos; 2) o
conhecimento da escola e das vivências comunitárias, isto é, o alargamento da prática para
além das fronteiras da escola; 3) o practicum centrado na investigação incluindo o practicum
reflexivo de Schön, a escola como clínicas ou escola como centro da formação profissional.
Segundo Geraldi, Messias e Guerra (1998, p. 250-251), Zeichner explica a origem do
termo prática reflexiva em Dewey tentando apontar a sua relevância para a formação de
professores, mostrando que não configura uma prática do professor reflexivo: 1) o professor
102
universitário ajudar os professores que estão na escola, pois o mérito da produção acaba
ficando para a academia que detém o conhecimento; 2) achar que a reflexão se dá sobre as
questões técnicas do ensino, excluindo o âmbito ético e moral do ensino; 3) afirmar que a
reflexão ocorre individualmente; e, com efeito, 4) considerar que os defeitos e ganhos, os
insucessos e sucessos pertencem apenas ao professor.
Nesse sentido, Zeichner (1998) configura um caráter coletivo, crítico e político ao
profissional reflexivo-pesquisador, pesquisadores e professores sem estar em posição
hierárquica, sem diferenciar o pesquisador professor do pesquisador acadêmico. Assim,
considerando o professor como sujeito do processo de produção do conhecimento, o autor
propõe como proposta de seu trabalho a pesquisa-ação; são professores que têm voz, que
utiliza a pesquisa-ação para o desenvolvimento profissional e como instrumento para
conhecer os problemas do ensino de forma contextualizada e encaminhar possibilidades de
políticas públicas (GERALDI; MESSIAS & GUERRA, 1998, p. 255).
Para Zeichner os critérios de legitimidade da produção do professor pesquisador estão
na exposição, na subjetividade e na validade dialógica. Isto é, subjetividade no que se refere à
voz e a existência do pesquisador em seu trabalho e a validade dialógica relativo ao debate
entre as pessoas, a interação que possibilita a reflexão de maneira diferente da sua rotina
diária. Dessa forma, o autor tenta romper com a tradição de que o conhecimento só é
produzido na academia (idem, p. 260-262).
Para este autor, a função do professor é mais de ajudar os alunos a construírem o
conhecimento do que lhes transmitir este saber e que o professor tem que ver as implicações
sociais e políticas das suas ações e dos contextos nos quais trabalham (FACCI, 2004, p. 52).
Enquanto Schön trata de um professor prático – reflexivo, Zeichner entende
o professor como investigador. Ele utiliza a pesquisa-ação em seus
programas de formação de professores. Estas pesquisas envolvem quatro
fases de desenvolvimento: planejar, agir, observar e refletir. [...] defende
uma maior interação entre as vozes dos professores e dos acadêmicos, um
desempenho mais ativo dos professores na tomada de decisões, um maior
respeito pelo conhecimento do professor e a utilização da ética nas relações
entre pesquisadores e professores (FACCI, 2004, p. 53).
Mas, o professor prático-reflexivo ou o professor investigador estão dentro de uma
mesma abordagem, a pedagogia do professor reflexivo-pesquisador. Numa análise crítica da
literatura do Zeichner, Facci (2004) enfatiza que:
A abordagem de Zeichner é apresentada como se fosse uma abordagem
crítica por considerar a reflexão coletiva e contemplar a dimensão política.
No entanto, parece-me, que a dimensão política desse pesquisador está
103
ancorada em ideários propostos pela burguesia, fundamentando-se nos
princípios de “igualdade”, “justiça social”, “ fraternidade”, “ liberdade”,
palavras de ordem que cumprem a função de mostrar o humanismo possível
dentro do capitalismo, o que se constitui num grande engodo. [...] Além do
mais, do meu ponto de vista, refletir coletivamente não significa que esta
reflexão esteja pautada em argumentos que levem em consideração o
contexto sócio-histórico no qual o professor desenvolve sua prática, ou
mesmo que se analisem as relações que perpassam os pesquisadores e
professores (FACCI, 2004, p. 54).
A autora, ainda, afirma que valorizar a experiência e a construção individual ou coletiva
do conhecimento também é um aspecto prioritário numa prática pedagógica construtivista,
sobre esta aproximação do construtivismo e a perspectiva do professor reflexivo, Zeichner
parte da tradição desenvolvimentista, centrada nos fundamentos do construtivismo, ou seja,
nas ideias piagetiana (FACCI, 2004, p. 73-74).
Assim, a concepção do professor reflexivo seja na abordagem narrativa, ou crítica ou,
ainda, cognitivista, apresenta quatro características comuns as quais fazem parte do lema
“aprender a aprender”: 1) a construção do conhecimento com ênfase na prática; 2) a
construção do conhecimento pelo sujeito, dando um caráter subjetivo (individual ou coletivo
dialógico) e não objetivo ao conhecimento; com efeito, 3) construir “teorias” sem ultrapassar
os limites do campo empírico; e 4) a secundarização do conhecimento científico acumulado,
determinando uma mínima apropriação do conhecimento.
Portanto, denominar a formação do professor reflexivo, seja na abordagem da narrativa
ou cognitivista ou na orientação da reflexibilidade crítico-dialético (Zeichner ou Libâneo),
como um paradigma do pesquisador, do professor pesquisador, seria está contrária aos
princípios de verdadeira crítica e transformação da sociedade capitalista, porque a
investigação que se propõem na teoria do “pensamento reflexivo” não extrapola os limites do
empírico, no sentido de buscar as abstrações necessárias para o desvelamento da realidade, ou
seja, os conhecimentos científicos historicamente acumulados pela humanidade como um
suporte fundamental para conhecer verdadeiramente a prática social em que estamos inseridos
com o objetivo da crítica radical e transformação desta mesma prática social, que depois das
abstrações já não nos é caótica, sincrética, e sim síntese do seu todo concreto.
104
4. A RELAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DO PEDAGOGO NO BRASIL E O
HEGEMÔNICO MOVIMENTO ESCOLANOVISTA
No capítulo anterior a discussão se restringiu nas análises das bases teóricas em relação
à teoria e prática na Pedagogia, na pedagogia nova e seus desdobramentos contemporâneos,
além da redefinição da Pedagogia enquanto ciência da educação sob estas bases. Neste
momento, pretendemos analisar historicamente a formação do pedagogo a partir das várias
reconfigurações do curso de Pedagogia no Brasil.
O curso de Pedagogia sempre enfrentou discussões históricas em relação às
configurações acerca da formação profissional do pedagogo: licenciatura versus bacharelado,
professor versus especialista, generalista versus especialistas, técnico em educação versus
professor (FREITAS, 1993, p. 65). Supõe-se que este embate no histórico do curso de
Pedagogia se fundamenta na preponderância do pragmatismo e do escolanovismo, os quais
assinalam uma prática separada da teoria. Pois, observa-se nestas discussões uma indefinição
relacionada tanto ao campo prático de atuação profissional do pedagogo quanto aos
conhecimentos estruturados a partir e em função da sua prática.
O objetivo desse capítulo consiste em abordar a dicotomia da teoria e prática no curso
de Pedagogia, a partir dos determinantes sócio-históricos do escolanovismo no Brasil, das
pedagogias do aprender a aprender traduzidas como renovação do escolanovismo da década
1930 e das políticas oficiais que demarcaram reconfigurações na formação de pedagogos nos
diferentes contextos.
Dessa forma, este capítulo concentra-se em três itens: 1) discute as perspectivas de
formação de professores em nível superior com base na Escola Nova e a instituição do curso
de Pedagogia no espaço acadêmico até a reforma com o Parecer n. 251/1962; 2) analisa as
reconfigurações expressas no Parecer n. 252/1969, a qual se refere às várias habilitações para
o curso de Pedagogia, passando pelo movimento de educadores até a LDB 9394/1996; 3)
discute as Diretrizes Curriculares Nacionais de formação de pedagogos homologada em 2006.
Não se trata de analisar em profundidade o histórico do curso de Pedagogia, mas de
evidenciar o quanto a relação teoria e prática foi demarcada pelo predomínio das pedagogias
hegemônicas de influência escolanovista de acordo com os determinantes sócio-históricos do
processo de desenvolvimento da sociedade capitalista no Brasil. A partir disso, fizemos estes
“recortes” no sentido de verificar as influências escolanovista na formação de pedagogos
105
traduzidas na separação entre teoria e prática, conforme a sua defesa da “mínima apropriação
dos conhecimentos científicos” (EIDT, 2009).
4.1 A Instituição da Formação de Pedagogos no Espaço Acadêmico no Brasil e os
Determinantes Teórico-Históricos do Escolanovismo
A formação de professores no espaço acadêmico, em 1934 com a criação da USP por
Fernando de Azevedo e em 1935 da UDF implantada por Anísio Teixeira, tinha como um dos
principais objetivos, a construção de uma ciência pedagógica através da experiência. Anísio
Teixeira28
, “acreditava que a ciência subsidiava a prática, e que a reflexão sobre essa prática
levaria a novas concepções científicas, de forma que a finalidade da educação estivesse de tal
maneira imbricada com seu fazer que dele não se destacasse” (VIDAL, 2001, p. 96).
Para Anísio, a universidade é uma das instituições características e indispensável à
sociedade moderna e sem ela não chega sequer a existir um povo. Seria o lócus por excelência
de formação de uma nova cultura, de investigação e pesquisa científica (MENDONÇA, 2002,
p. 72-73) que respondesse a sociedade em processo de desenvolvimento sócio-econômico.
A Universidade do Distrito Federal disseminava as ideias pragmáticas, renovadoras,
fundamentada na experiência-laboral, incumbindo ao professor “relacionar a matéria à
sua utilidade cotidiana, de maneira a promover a experiência dos conceitos” (VIDAL,
2001, p. 63, grifos nossos). A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP não tinha
disposição para a profissionalização, tal responsabilidade cabia aos Institutos de Educação
que funcionava de forma desarticulada da primeira, mas quando incorporada à Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da USP, esta se transformava, por um lado, em um centro de
pesquisa pura, e, por outro, um centro de treinamento profissional de educadores
(BRZEZINSKI, 1996, p. 38-42).
Segundo Mendonça (2002, p. 18) “os cursos de formação de professores em nível
superior surgiram no bojo das diferentes propostas de universidade emergentes ao longo da
década de 30”, isto é, “diferentes” perspectivas de formação de professores. Para a autora,
Tais cursos, entretanto, estão na confluência de dois movimentos distintos,
que ora se identificam, ora correm paralelos e até mesmo contrapõem-se.
Um deles é a luta pela implantação de verdadeiras universidades, isto é,
28
Educador, democrático – liberal e escolanovista que divulgou os escritos de John Dewey no Brasil, foi
perseguido pelo governo autoritário acusado de “divulgar idéias comunistas”, por defender: a escola única,
educação laica, pública e gratuita, o trabalho na vida escolar, entre outros, o partido político. Apesar de suas
idéias “assemelharem” com as do pedagogo comunista Gramsci. Saviani (2008, p. 218-229) explicita sua
acepção muito distante do pensamento comunista da época, especialmente, do pensamento de Gramsci.
106
instituições voltadas para pesquisa e desenvolvimento de estudos
desinteressados, em constante com a forma até então existente de ensino
superior, constituído exclusivamente de escolas isoladas profissionalizantes;
o outro é o esforço de instalação das chamadas escolas normais superiores,
nos moldes da instituição francesa ou do teacher‟s college norte-americano
(Idem, p. 19).
Assim, na discussão sobre a formação de professores em nível superior diante os
movimentos “distintos” três personalidades se destacavam: Anísio Teixeira, Lourenço Filho e
Fernando de Azevedo. Anísio Teixeira e Lourenço Filho como educadores da Escola de
Professores, a qual em 1935 possibilitou a fundação da UDF, apresentavam certas
“divergências”: Lourenço afirmava que a educação deveria ser guiada por conhecimentos
científicos com ênfase no biológico, e considerava que a experiência apenas significava o
resultado prático de um experimento, enquanto que Anísio acreditava categoricamente na
experiência como condição de possibilidades de criação de novas concepções científicas,
condição do progresso humano privilegiando o filosófico (VIDAL, 2001). Mas, ambos
afirmavam ser o ensino uma prática, uma técnica, que se aprende a fazer, fazendo29
.
No embate entre Lourenço e Teixeira percebemos que enquanto o primeiro com ênfase
no biológico, concepção naturalizante do ser humano, acreditava na educação como mera
aplicabilidade dos conhecimentos guiados por esta concepção na prática, para Teixeira os
conhecimentos científicos referentes à educação só poderiam ser construídos com base na
experiência. Entretanto, isso não se configura exatamente uma divergência, pois estas
posições entre ambos são características de uma mesma concepção, a idealista pragmática da
Escola Nova.
Para Fernando de Azevedo, que também apresentava uma suposta divergência em
relação à perspectiva de Anísio Teixeira, seria necessária além da formação profissional, uma
formação propedêutica, porque a formação do professor necessitava de uma capacitação não
apenas técnica, mas de caráter abrangente através de uma cultura geral sólida. No entanto,
ambos concebiam a escola como laboratório.
Tanto Fernando de Azevedo quanto para Anísio Teixeira concebiam a escola
como laboratório. Para Fernando, entretanto, essa nova função devia-se ao
29
John Dewey representante do pragmatismo americano, filósofo e educador, para quem o aluno deve aprender
fazendo, inaugura, assim, um empirismo “que leva em consideração a práxis”, ou seja, a idéia de que tudo deve
ser ensinado em função do seu uso na vida prática. Um conhecimento utilitarista, no sentido de resolver os
problemas enfrentados pelo homem. Dewey é considerado um antifundacionista (GOTTSCHALK, 2007, p.
462). Afirma que o educador deve ter apenas o cuidado de imprimir a correta direção... A direção entendida não
como imposição externa, mas como uma “libertação do processo vital para o seu mais completo e adequado
desenvolvimento” (DEWEY apud GOTTSCHALK, 2007).
107
fato da aprendizagem ser percebida como atividade. Ao ensino verbalista,
opunha uma escola em que a ação era o motor do processo educativo. O
aluno transformava-se em experimentador, em pesquisador, reproduzindo
em laboratório as experiências aprendidas em sala. A escola-laboratório para
Anísio representava mais do que ensino-ação. Além de procurar estimular a
atividade do estudante, a escola servia como um campo de experimentação e
observação do aluno, objetivando distinguir elementos para a construção de
uma ciência da criança; e, como um campo de reflexão sobre a prática
educativa, pretendia a revisão constante dos métodos aplicados (VIDAL,
2001, p. 83-84).
Neste momento, podemos identificar a configuração de dois modelos de formação de
professores: 1) modelo dos conteúdos culturais - cognitivos: a formação de professores se
esgota na cultura geral e no domínio específico dos conteúdos da área de conhecimentos
correspondente à disciplina que o professor irá lecionar; e 2) modelo pedagógico – didático:
contrapondo-se ao anterior, a formação propriamente dita dos professores só se completa com
o efetivo preparo pedagógico-didático (SAVIANI, 2008a, p. 08).
Antes, o modelo dos conteúdos culturais - cognitivos predominou nas universidades e
demais instituições de ensino, ao passo que o modelo pedagógico - didático tendeu a
prevalecer nas Escolas Normais. “Do outro lado, contrapõe-se, o modelo segundo o qual a
formação de professores só se completa com o efeito preparo pedagógico - didático”. Isto é,
além da cultura geral e da formação específica na área do conhecimento, a instituição deverá
assegurar a preparação pedagógica - didática (SAVIANI, 2008a, p. 09)
Embora tivessem diferenças entre as perspectivas de formação de professores em nível
superior, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP (Azevedo) e a Universidade do
Distrito Federal (Teixeira), possuíam “uma base comum, na medida em que são expressões
do ideário do chamado Movimento da Escola Nova, resumido no Manifesto de 1932”
(MENDONÇA, 2002, p. 26, grifos nossos).
Os educadores Anísio, Lourenço e Fernando comungavam de um mesmo ideário, o
escolanovismo. Estiveram preocupados em consolidar novas técnicas e métodos na educação
brasileira. Eram integrantes da Associação Brasileira de Educação30
a qual “firmou-se como
órgão apolítico, destinado a congregar todos os interessados na causa da educação,
independente das doutrinas filosóficas ou religiosas ou de posições políticas” (SAVIANI,
2008, p. 229).
30
Conhecida como ABE, foi fundada em 15 de outubro de 1924, com sede na cidade do Rio de Janeiro. A
Associação Brasileira de Educação é uma instituição que tem por finalidade congregar educadores, professores,
pessoas físicas e jurídicas interessadas no estudo e no debate de assuntos ligados à Educação e à Cultura.
108
A Associação Brasileira de Educação, em defesa da Escola Nova através do Manifesto
de 1932, posicionava-se “contra as tendências à passividade, ao intelectualismo e
verbalismo da escola tradicional, a nova concepção estimulava a atividade espontânea,
tendo em vista a satisfação das necessidades da criança individualmente considerada” (idem,
p. 225). Pois, a educação nova foi determinada como possibilidade de mudança da sociedade
aristocrática para uma sociedade nova, com base nas ideias da burguesia industrial, a
educação como redenção, salvação dos problemas alastrados pelo caráter da sociedade
capitalista. No entanto,
[...] esta confiança na educação como uma alavanca da história, corrente
entre os teóricos da nova educação, supõe um desconhecimento absoluto da
realidade social. Ligada estreitamente à estrutura econômica das classes
sociais, a educação, em cada momento histórico, não pode ser outra coisa a
não ser um reflexo necessário e fatal dos interesses e aspirações dessas
classes (PONCE, 2003, p. 168-169).
Segundo Carvalho (1998, p. 22) o “novo”, em relação à educação nova, para Azevedo
possuía três acepções básicas: 1) permeabilização do país aos valores culturais da Europa e
Estados Unidos, com destaque para as reformas educacionais com que se sonhava forjar uma
humanidade nova; 2) adaptação do sistema escolar às exigências de uma sociedade nova,
de forma industrial, em franca evolução para uma democracia social e econômica; e 3)
unificação do sistema educacional em nível nacional por uma política orgânica pelas elites
governantes. Estas acepções tinham como objetivo abrir caminho para a Escola Nova.
Assim, Carvalho (1998) afirma que a Associação Brasileira de Educação desde os anos
1920 caracterizou-se por assimilar a orientação global do modelo industrial, fazendo constatar
que antes mesmo da Revolução de 1930, já se delineava um projeto de hegemonia da
burguesia liberal no Brasil. “Tratava-se de um projeto marcadamente elitista cujo suposto
principal era o de que a „nação‟ só poderia constituir-se por um trabalho de direção das
„elites‟ [...] Tomando a fábrica como paradigma de escola e da sociedade” (CARVALHO,
1998, p. 24-27).
O projeto de educação da ABE baseava-se na defesa do “direito à educação das classes
populares”, esta defesa se intensificou nos anos 1960 com a educação popular, porém, a
educação como redenção dos problemas sociais alastrados pelo processo de industrialização
no país no sentido de formar mão-de-obra para as indústrias com base meramente na técnica.
A educação tradicional não correspondia à formação do “novo” homem adaptável às
mudanças e exigências da sociedade industrial. Assim, considerava a educação o grande
109
problema, colocando como necessária a emergência de outra educação; a educação nova, a
qual “busca organizar a escola como um meio propriamente social para tirá-la das
abstrações e impregná-la na vida em todas as suas manifestações” (SAVIANI, 2008, p. 244,
grifos nossos).
Em 1932, no mesmo ano em que foi publicado o “Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova”, inaugurou-se uma nova fase nas Escolas Normais do Distrito Federal e de São Paulo,
ambos sob a inspiração do ideário da Escola Nova. No entanto, dois aspectos marcam a
estrutura do texto do Manifesto:
É, por um lado, um documento doutrinário e, por outro, um documento de
política educacional. Como documento doutrinário, o texto declara-se filiado
à Escola Nova. [...] No entanto, não se trata de um texto homogêneo, sendo
possível, mesmo, considerá-lo um tanto contraditório. Isso é explicável seja
pelo caráter de manifesto que procura angariar adeptos junto à opinião
pública, o que geralmente implica concessões em detrimento da pureza
doutrinária; seja pelo seu redator, Fernando de Azevedo, cuja adesão à
Escola Nova, foi marcada por certa heterodoxia ou ecletismo [...] Em termos
políticos o „Manifesto‟ expressa a posição de uma corrente de educadores
que busca se firmar pela coesão interna e pela conquista da hegemonia
educacional diante o conjunto da sociedade, capacitando-se,
conseqüentemente, ao exercício dos cargos de direção da educação pública
(SAVIANI, 2008, p. 251-253).
Em suma, em presença ao ecletismo característico da Escola Nova, têm-se duas
posições organizativas da universidade: uma técnica, outra propedêutica. A formação
técnica levaria à formação da perícia à vida prática, profissional. Já a orientação propedêutica
visaria a competência na investigação e na contribuição para o avanço da ciência, contudo de
uma ciência com base no idealismo e na concepção naturalizante, quando oportuno, dirigido
especialmente para os fatos do Brasil no sentido do progresso capitalista da sociedade
(CARVALHO, 1998, p. 268). Vale acrescentar que na defesa do Teixeira, o segredo da
formação de professores estaria na integração, a mais íntima possível, entre os materiais e as
técnicas da arte de ensinar, assim, o trabalho docente era mais como uma arte prática que
uma ciência aplicada, por isso, a ênfase na prática de ensino (MENDONÇA, 2002, p. 94-95).
Além das “divergentes” concepções de formação de professores em nível superior
discutidas anteriormente, os católicos “tradicionalistas”, apesar da participação na ABE e do
“desinteresse pelo ensino superior”, demonstravam-se opositores aos escolanovistas
(CARVALHO, 1998, p. 226). Em 1932 os católicos romperam com o Movimento da ABE
por desacreditar nas acepções defendidas pelos escolanovistas.
110
Os católicos se opunham aos escolanovistas por três razões básicas: a responsabilidade
de organização do ensino e da educação que os escolanovistas depositavam nas mãos do
Estado; a laicidade, gratuidade e obrigatoriedade como interferência do Estado na Educação
como monopólio estatal do ensino (SAVIANI, 2008, p. 258). E, por fim, os católicos também
questionavam os novos métodos e técnicas de ensino os quais centralizavam na criança,
opondo-se ao naturalismo pedagógico. Mas, estes embates político-ideológicos foram
substituídos pela colaboração recíproca nas relações entre Igreja e Estado.
As contraposições entre Estado, Igreja e a Escola Nova foram contrapesadas, quando o
movimento operário se tornou ameaça constante, pois vinha divulgando no Brasil as
realizações da sociedade Soviética no campo educativo. Daí a formação da Aliança Nacional
Libertadora31
(ANL), a aliança das esquerdas com setores da burguesia nacional que
possibilitou o predomínio da Escola Nova como única possibilidade de transformação da
sociedade brasileira, impossibilitando a formulação de uma Pedagogia de Esquerda no país
(SAVIANI, 2005, p. 24). Isso aconteceu em vários países porque confundiu os ideais da nova
educação com os ideais do proletariado, o que se explica a perseguição do Estado contra os
escolanovistas por serem considerados socialistas. No entanto,
O socialismo aspira a realizar a plenitude do homem, isto é, libertar o
homem da opressão das classes [...] Mas, se em alguns pontos, a „doutrina‟
da nova educação parece coincidir com o ideal socialista, as diferenças são
tão grandes em outros [...] A nova educação se propõe, com efeito, construir
o novo homem a partir da escola burguesa (PONCE, 2003, p. 165).
Principalmente, com o advento do Estado Novo, o qual não permitiu que vicejassem
propostas pedagógicas de esquerda não se configurando, de modo geral, algum espaço para
concepções pedagógicas alternativas (SAVIANI, 2005, p. 25). Assim, a aliança entre o
Estado, a Igreja e os escolanovistas, possibilitou o “apaziguamento das divergências”; um
equilíbrio em busca de interesses político-ideológicos; um equilíbrio conservador para
impedir a consolidação de uma possível mudança no país através do movimento contra-
hegemônico.
Em suma, no período compreendido entre 1932 e 1947, as ideias
pedagógicas na Brasil foram marcadas por um equilíbrio entre a pedagogia
tradicional, representada dominantemente pelos católicos, e a pedagogia
31
A III internacional orientou cada país conduzir o seu processo revolucionário, segundo peculiaridades
próprias. Como a burguesia tinha se mostrado mais capaz de resistir do que se poderia acreditar. Sua principal
força repousava nos dirigentes da social-democracia. Isso permitiu às burguesias recuperar-se e lançar uma nova
ofensiva contra os trabalhadores.
111
nova. Um equilíbrio tenso, em algumas circunstâncias, quando eram
assacados virulentos acusações de modo especial por parte dos católicos
contra os escolanovistas; ou quando se tramavam nos bastidores políticos
indicações e vetos de nomes para compor os quadros de pessoal docente e
administrativo (SAVIANI, 2008, p. 271).
Entretanto, a predominância da Escola Nova se aproxima apenas a partir de 1947 e
consolida-se na década de 1960, com a comissão de elaboração do projeto da primeira Lei de
Diretrizes e Bases da educação, composta pelos os representantes da educação nova, embora
junto aos pouquíssimos representantes católicos, por isso, acabava sempre prevalecendo no
texto as ideias renovadoras. Isso se deve ao fato, também, da ampliação dos representantes da
pedagogia nova através dos espaços burocráticos. Assim, na medida em que se ampliava,
“também foi modificando a sua relação com a pedagogia tradicional por conta do
reconhecimento dos pontos convergentes e da renovação pedagógica católica, claro que, sem
abrir mão de seus objetivos religiosos” (SAVIANI, 2008).
Em suma, podemos afirmar que no processo de industrialização as questões sociais
emergiram, de forma contundente, provocando um movimento de contraposição ao projeto
hegemônico da burguesia liberal. Assim, para amenizar toda esta efervescência dois pontos
foram decisivos, não necessariamente nesta ordem: 1) a aliança entre a Igreja e os
escolanovistas, pois, a “Igreja aparecia como um antídoto importante com sua doutrina social”
(SAVIANI, 2008, p. 196); e 2) “a crença no poder da educação, mas não de qualquer tipo de
educação, enfatizando a importância da nova pedagogia na formação do homem novo” e,
portanto, de uma nova sociedade (CARVALHO, 1998, p. 32). Em relação às pedagogias:
tradicional e nova, ao analisá-las, Manacorda (1996, p. 106) afirma que
Frente à pedagogia tradicional do determinismo ambiental, que reduzia cada
homem a um processo formativo limitado e predeterminado pela situação
social, as pedagogias novas, que por diversas vias, destacam a natureza da
criança ou do homem, produzem, sem dúvida, uma ruptura, mas
permanecem limitadas a um desenvolvimento espontâneo e, por isso mesmo,
parcial; põem frente apenas a si mesmo e não diretamente frente ao mundo
concreto das coisas e das relações sociais; substituem um processo educativo
“heterônomo” por um processo “autônomo”, que é igualmente limitado.
Contudo, com o objetivo de subsidiar a “constituição” de uma ciência pedagógica
adaptada às condições brasileiras que foi criado a Universidade do Distrito Federal em 1935
para o desenvolvimento de pesquisas no campo educacional e de cultura superior (VIDAL,
2001, p. 19). Mas, poucos anos depois, a UDF foi extinta em decorrência de atitudes
112
repressivas do governo autoritário que acusava os escolanovistas de “socialistas”, sendo
incorporada, contraditoriamente, à Faculdade Nacional de Filosofia em 1939. A Faculdade
Nacional de Filosofia foi criada por Capanema pelo Decreto n. 1.119 de 1939 denominada da
Universidade do Brasil criada em 1937, esta que “determinou a forma de organização desse
nível de ensino no país. E essa tarefa foi facilitada pelo quadro político, uma vez que estava
em vigência o regime centralizado do Estado Novo” (SAVIANI, 2008a, p. 37).
O fato acima foi possível devido à formação do Estado Novo em 1937 e a união do
Estado com os católicos, para os quais Capanema tinha íntima associação chegando ao
Ministério da Educação (1934-1945) firmando pacto político com o Estado representado por
Getúlio Vargas (1930-1945), possibilitando, assim, a extinção da UDF e, ao mesmo tempo, a
criação da Universidade do Brasil, “como indispensável pelo próprio caráter de „instituição
total e unânime‟, portanto, completa” (MENDONÇA, 2002, p. 150).
A UB e a UDF não poderiam coexistir. Não apenas pelas razões alegadas,
mas principalmente porque expressavam concepções divergentes de
universidade, as quais, por sua vez, integravam a projetos de reconstrução
nacional distintos e excludentes, no seio dos quais a educação- e
especificamente a universidade- ocupava um papel absolutamente central.
Segundo Anísio, a reconstrução do país se faria pela dupla via da
disseminação da mentalidade científica [...] ciência e democracia, portanto,
seriam os pilares desse progresso. Já para Capanema, a reconstrução do
país passaria pela construção da nacionalidade, [...] valorização das tradições
nacionais [...] e defesa de agentes externos (MENDONÇA, 2002, p. 123,
grifos nossos).
Dessa forma, o Ministro da Educação Capanema traz a marca do pacto com o Estado
através da criação da Universidade do Brasil em 1937, dando organização definitiva à
Faculdade Nacional de Filosofia pelo Decreto n. 1.119 de 1939. “A concepção que orienta a
organização da Faculdade Nacional de Filosofia se contrapõe tanto à ideia inicial que presidiu
à proposta de criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, quanto,
principalmente, à Universidade do Distrito Federal” (SAVIANI, 2008a, p. 37),
principalmente, porque a “constituição dessa Faculdade foi bastante influenciada pelo
contrato de poder entre o governo e a Igreja católica” (BRZEZINSRI, 1996, p. 41).
Para Saviani (2008a, p. 37), enquanto na UDF a formação profissional é aportada no
“desenvolvimento de estudos e pesquisas e na observação e no exercício prático das escolas –
laboratório, na Faculdade Nacional de Filosofia separa-se o profissional do cientista,
deslocando-se o eixo das atividades universitárias para a formação profissional”. Entretanto,
113
apesar da Faculdade Nacional de Filosofia afastar-se da experiência da UDF, esta última
contraditoriamente é incorporada àquela Faculdade, Mendonça (2002, p. 114) explicita o
processo:
A respeito da extinção da universidade dá-nos a entender que a posição de
Capanema com relação a ela oscilou entre a ideia de sua eliminação pura e
simples e a atitude mais pragmática – que acabou sendo a solução adotada –
de incorporá-la à Universidade do Brasil, feitos os devidos e necessários
expurgos [...] Por outras razões, a simples extinção da UDF foi também a
reivindicação da Igreja católica.
Além disso, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP que se destinava ao
cultivo do saber desinteressado, em que a pesquisa e a investigação seriam o princípio
norteador, tinha uma concepção distinta da UDF esta que vinculava a produção científica ao
progresso e às condições sócio-econômicas do país. Assim, o espaço da educação na USP não
se encontrava na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, devido ao seu entendimento
prático e profissionalizante, mas que, depois de incorporado à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras, esta “se aproximou da estrutura definitiva para a Faculdade de Educação,
Ciências e Letras” (SAVIANI, 2008a, p. 29).
A Faculdade de Educação, Ciências e Letras, proposta pela Reforma de Francisco
Campos32
(1931) a qual Capanema adotou, deveria se constituir órgão de alta cultura ou de
ciência pura e desinteressada e, simultaneamente, ou melhor, antes de tudo, e eminentemente,
Instituto de Educação destinado a formar professores. Mas que, em segundo momento,
pensou-se no desmembramento da Faculdade de Educação, Ciências e Letras em duas: uma
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e uma Faculdade de Educação, sendo este último o
modelo que organizou a Universidade do Brasil prevendo a constituição da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras e a Faculdade Nacional de Filosofia (MENDONÇA, 2002, p. 150-
151).
Enfim, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras teve seu destino atrelado
ao padrão federal de universidade, e acabou por estigmatizar a formação de
professores pelo seu caráter prático utilitarista [...] Sendo assim,
fortaleceu-se a tendência de converter as faculdades de filosofia em centros
de transmissão de conhecimentos, divorciados da pesquisa e da busca
constante de produção de novos saberes (BRZEZINSKI, 1996, p. 41-42,
grifos nossos).
32
Francisco Campos foi Ministro da Educação em 1931 durante o governo provisório, após a Revolução de 1930
que pôs fim a República Velha. A Reforma de Francisco Campos é creditada o mérito de, pela primeira vez, ser
colocada em prática no sistema educacional brasileiro uma estrutura orgânica ao ensino secundário, comercial e
superior, que foi imposta a todo o sistema educacional do país, dando início à ação objetiva do Estado na
Educação.
114
Pois, na concepção do ministro Capanema, a formação pedagógica tinha um caráter
meramente complementar no processo de preparação do professor, a qual se fizesse
exclusivamente após a formação da cultura geral, em um único ano, sendo esta denominação
adotada na organização da Faculdade Nacional de Filosofia (MENDONÇA, 2002, p. 153).
A Faculdade Nacional de Filosofia com seu caráter centralizador foi transformando o
“sistema universitário em aparelho ideológico do Estado” (BRZEZINSRI, 1996, p. 41). Esta
centralização era característica do governo autoritário, que buscava a intervenção do Estado
também na educação para disciplinar as sucessivas gerações. Assim, a Faculdade Nacional de
Filosofia desempenhava “um papel orientador e disciplinador da cultura do país [...] Nessa
visão, o preparo de professores assumia o caráter de simples formação profissional,
desvinculada do desenvolvimento da pesquisa” (SAVIANI, 2008a, p. 38).
A Faculdade Nacional de Filosofia estruturou-se em quatro seções: filosofia, ciências,
letras e pedagogia, e, ainda, a didática, considerada uma seção especial. O curso de Pedagogia
foi definido como um curso de bacharelado, o diploma de licenciatura seria obtido por meio
do curso de didática. O curso de didática, com duração de um ano e com disciplinas que
determinava “na organização formal, certa influência do ideário da Escola Nova” (SAVIANI,
2008a, p. 40).
Dessa forma, o mesmo Decreto n. 1.119 de 1939 que dá organização a Faculdade
Nacional de Filosofia, constitui a criação do curso de Pedagogia no Brasil. O modelo
implantado designa “um currículo pleno fechado para o curso de pedagogia, em
homologia com os cursos das áreas de filosofia, ciências e letras e não os vinculando aos
processos de investigação sobre os temas e problemas da educação” (SAVIANI, 2008a, p.
41).
A nosso ver, predomina na formação de professores em nível superior a concepção da
Escola Nova fundamentada na filosofia pragmática. Ao instituir o curso de Pedagogia
observa-se a divulgação no espaço acadêmico de formação para o magistério a importância da
técnica, da prática, esta desarticulada da produção e apropriação da teoria educacional e
pedagógica, da produção científica a partir em função da prática educativa, e isso explica o
fato da pedagogia se centrar demasiadamente na prática de forma desconectada da teoria
científico-acadêmica.
4.1.1 A Formação de Pedagogos na Perspectiva da Universidade Nacional de Filosofia
115
Com a definição de um currículo fechado distante do processo de investigação sobre os
temas e problemas educacionais, a formação do pedagogo começava a ser contida pelas
disciplinas de diferentes áreas do conhecimento, os estudos não tinham relação com a
prática educativa desenvolvida pelo professor. “O curso de Pedagogia perseguia um caráter
específico inexistente [...] seu aprofundamento teórico constituía-se de generalidades sobre as
ciências auxiliares da pedagogia” (BRZEZINSKI, 1996, p. 44), configurando certa dicotomia
entre teoria e prática.
Os conhecimentos científicos eram apropriados de forma desconectada da realidade
educacional escolar, isto é, apropriados de forma precária ou equivocada. Isso se torna
evidente na formação de pedagogos no padrão federal, no seguinte currículo:
1º ano – Complementos da matemática; história da filosofia; sociologia;
fundamentos biológicos da educação; psicologia educacional.
2º ano – Psicologia educacional; estatística educacional; história da
educação; fundamentos sociológicos da educação; administração escolar.
3º ano – Psicologia educacional; história da educação; administração escolar;
educação comparada; filosofia da educação (SAVIANI, 2008a, p. 39).
Sob esta organização a formação do pedagogo se distanciava dos conhecimentos e
pesquisa no campo educacional, se tornavam técnicos em educação, e para a obtenção da
licenciatura teriam que cursar a seção de didática, ao terminar a seção se perguntava:
licenciado em quê? Lecionar onde? Nem mesmo nas escolas normais, porque não havia
especificação que para ser professor da escola normal tinha que ter licenciatura em pedagogia.
O pedagogo tinha que competir com os outros que também podiam lecionar lá pela tradição
(SAVIANI, 2008b, p. 649).
Em um ano na seção de didática, o pedagogo recebia uma formação em licenciatura
com as mesmas disciplinas da formação de professores na Universidade do Distrito Federal:
didática geral, didática especial, psicologia educacional, fundamentos biológicos da educação,
fundamentos sociológicos da educação e administração escolar. “Pelos nomes das disciplinas
nota-se, na organização formal, certa influência do ideário da Escola Nova” (SAVIANI,
2008a, p. 40).
A ideia que se tem, é de uma separação entre o conteúdo teórico e o conteúdo
específico em relação ao campo prático de atuação do pedagogo, pois na conhecida
formação do 3+1 não possibilitava a relação da teoria com a prática de modo que a formação
de pedagogos pudesse ser efetiva. Isso demonstra o choque de ideias controvérsias e, ao
mesmo tempo, o equilíbrio conservador concretizada entre as pedagogias hegemônicas para
116
responder a emergência de uma nova sociedade, que exigia produtividade por meio da pouca
qualificação e resolução imediata dos problemas com base na técnica.
Segundo padrão federal eram necessários três anos para cursar o conteúdo
específico da área de saber e mais um para o curso de didática [...] O curso
de Pedagogia também foi padronizada com a utilização da simetria artificial
adotada para cursos de bacharelado. O bacharel em pedagogia se formava
técnico em educação, cuja função no mercado de trabalho nunca foi
precisamente definida. A falta de identidade do curso de Pedagogia refletia-
se no exercício profissional do pedagogo (BRZEZINSKI, 1996, p. 43).
Não havia campo de trabalho para o pedagogo técnico em educação, inclusive, o que se
estudava nos três primeiros anos do curso, não tinha nem a preocupação de aplicação da
ciência. Não se formava no curso de Pedagogia nem o professor nem o pesquisador, até
porque não se tinha clareza da identidade do pedagogo, pois o curso de Pedagogia
supostamente surgia no espaço acadêmico com a missão de disseminar as ideias da educação
nova, embasadas no pragmatismo, na técnica e métodos/práticas de ensino, sem preocupação
com a assimilação dos conhecimentos denominados dos fundamentos da educação para
buscar a reflexão sobre a prática educativa, conhecimentos científicos intimamente
relacionados com o objeto de estudo da Pedagogia que é a prática educativa, o qual neste
período não apresentava perceptibilidade.
A escola nova funda-se no caráter psico-biológico da educação, tanto que podemos
observar no currículo do curso de Pedagogia disciplinas tônicas relacionadas à Biologia
e a Psicologia educacional, fundamentada numa concepção naturalizante do homem.
Além dessas disciplinas, como já mencionado, a seção de didática também é expressão do
escolanovismo. Inclusive, o curso de didática representava uma “tautologia da „didática da
pedagogia‟, situação estranha que dissociava o conteúdo da pedagogia do conteúdo da
didática em cursos distintos, provocando a ruptura entre os conhecimentos específicos e o
método de ensinar esse conteúdo” (idem, p. 44).
Esta perspectiva dificultava a construção de uma teoria pedagógica, o que mais tarde
possibilitou que cada disciplina desenvolvesse o método de ensinar de acordo com os
conteúdos específicos de sua área. Não havia uma relação do processo de formação do
pedagogo com o seu real e possível campo de trabalho, o qual somente era encontrado no
exterior do curso, depois de cursar a seção de didática, ao trabalhar como professor da Escola
Normal, o que evidencia a não relação dos seus estudos na universidade com a prática
117
educacional que iria desenvolver, principalmente, por que essa licenciatura em pedagogia não
contemplava o conteúdo do curso primário.
Aos poucos houve uma onda de fatores os quais demonstravam o desprestígio do curso
de Pedagogia, pois “os professores mais bem preparados na universidade não se dedicavam ao
curso de Pedagogia” (BRZEZINSKI, 1996, p. 46), isso se deve a amputação da autonomia
dos Institutos de Educação da USP, universidade que prezava pela qualidade do ensino e pela
dedicação à pesquisa, e criação da seção de Pedagogia de acordo o padrão federal da
Faculdade Nacional de Filosofia, a qual, como já exposto, determinava desvios e
ambigüidades aos estudos pedagógicos, devido sua vinculação à prática.
Pois, enquanto a Pedagogia se destinava a técnica em educação, nos outros cursos se
formava o pesquisador de acordo com as áreas específicas, embora se formasse bacharéis em
pedagogia havia uma enorme distancia da mesma em relação à pesquisa, mais ainda da
pesquisa no campo pedagógico. Isso determinava uma desarticulação entre os saberes
pedagógicos e os saberes específicos das licenciaturas, o que acarretava uma formação
“desavisada” tanto para o pedagogo quanto para qualquer outro especialista de disciplina
específica, porque, geralmente só se descobria que seria professor nas disciplinas pedagógicas
no final do curso (BRZEZINSKI, 1996).
Em lugar de abrir caminho para o desenvolvimento do espaço acadêmico da
pedagogia, acabou por enclausurá-lo numa solução que se supôs
universalmente válida em termos conclusivos, agravando progressivamente
os problemas que se recusou a enfrentar (SAVIANI, 2008a, p. 41).
A escola idealizada por Anísio Teixeira tinha como prioridade formar professores
primários com nível superior no sentido de constituir esta identidade para o curso de
Pedagogia. Mas, a educação no país começava de cima para baixo, devido à falta de
professores especializados para lecionar na universidade e ensino médio, por isso, talvez a
exigência apenas da formação secundária de professores para atuar no ensino primário. Ser
professor no curso de Pedagogia e na educação primária tornava-se um desprestígio, na
medida em que não havia espaço acadêmico. Exigiam-se o diploma de curso superior para
lecionar no nível médio, assim, o pedagogo como prêmio de consolação assumia o direito de
lecionar nos cursos de nível médio com algumas disciplinas específicas na formação de
professores para o ensino primário.
Brzezinski (1999, p. 87) destaca que “em decorrência da hegemonia de áreas
consideradas „mais nobres‟ científica e socialmente, foi se configurando uma resistência à
118
formação de professores entre os próprios cientistas”. Assim, a falta de professores
habilitados e as condições precárias das instalações da Faculdade de Filosofia que cresciam
desordenadamente. Foi por conta do caráter profissionalizante na formação de professores um
dos fatores que contribuiu para sua desvalorização.
Impediram o cumprimento desejável das finalidades de formação cultural e
científica, do desenvolvimento de pesquisas e da preparação pedagógica dos
professores da escola secundária. De um lado, faltava-lhe arcabouço teórico
para desenvolver altos estudos e pesquisas. De outro, o afastamento dessa
instituição dos reais problemas das escolas primária e média acabou por
restringir o seu caráter profissionalizante em um simplificado
treinamento de habilidades realizado na disciplina didática e prática de
ensino (BRZEZINSKI, 1996, p.51, grifos nossos).
Dessa forma, podemos afirmar que o pragmatismo impregnado na Faculdade Nacional
de Filosofia, modelo padrão, negava o aprofundamento teórico e o desenvolvimento da
pesquisa no curso de Pedagogia, enfatizando mais o caráter profissionalizante. “O professor
formado passava a dominar métodos e técnicas adequados à prática [...] não se aprofundava
em estudos pedagógicos como área do saber [...] como se fosse possível separar o
indissociável: teoria e prática” (idem, p. 42, grifos nossos).
4.1.2 O Currículo Mínimo do Curso de Pedagogia: Dicotomia entre Bacharelado e
Licenciatura
Uma nova regulamentação do curso de Pedagogia decorreu da primeira LDB n. 4.024
de 1961, da qual se desdobrou o Parecer n. 251/1962 que traz algumas considerações sobre a
indefinição do curso, discutindo a sua permanência ou extinção. Mas, o que mudou no curso
de Pedagogia? Com a ausência de uma definição para o curso de Pedagogia, foram efetuadas
pequenas alterações na estrutura, como na “duração do curso que foi definida em quatro anos,
englobando o bacharelado e a licenciatura, correspondendo à definição anterior” (SAVIANI,
2008a, p. 42). A diferença fica por conta da flexibilidade das disciplinas de licenciatura que
poderiam ser cursadas concomitantemente as do bacharelado (idem, ibidem).
A nova regulamentação do Curso de Pedagogia decorreu do Parecer 251, de
autoria do conselheiro Valnir Chagas, aprovado pelo Conselho Federal de
Educação em 1962. O texto tece considerações sobre a indefinição do curso;
refere-se à controvérsia relativa à sua manutenção ou extinção; lembra que a
tendência que se esboça no horizonte é a da formação dos professores
119
primários em nível superior e a formação dos especialistas em educação em
nível de pós-graduação, hipótese que levaria à extinção do Curso de
Pedagogia. Considera, entretanto, que a referida hipótese só poderia ser
levada em conta num momento posterior justificando-se, ainda que em
caráter provisório, a sua manutenção naquele início dos anos 60 do século
XX. Em conseqüência, procede à sua regulamentação efetuando apenas
pequenas alterações na estrutura até então em vigor (SAVIANI, 2007, p. 14).
No que se refere ao currículo do curso de Pedagogia, o caráter generalista foi mantido,
principalmente, as disciplinas que compunham a licenciatura na regulamentação anterior,
inclusive as disciplinas Biologia Educacional, Psicologia Educacional e as disciplinas
administrativas se mantiveram na formação do pedagogo. Apesar disso, “diferentemente da
regulamentação anterior, não se fechou a grade curricular com a distribuição das disciplinas
[...] Essa tarefa foi deixada para as instituições” (SAVIANI, 2008a, p. 42).
Dessa forma, foi em 1962, com o Parecer n. 251, que se fixou um currículo mínimo
para o curso de Pedagogia. Embora, ainda ficar evidente a desarticulação entre o conteúdo
teórico e a prática de ensino, ou seja, entre conteúdo e forma, pois, de certa forma, o
esquema de 3+1 permaneceu e, de maneira muito rápida, o bacharel em pedagogia se tornava
licenciado para atuação no ensino médio com disciplinas referentes à formação de professores
para as séries iniciais. Em meio à indefinição, dois grupos defendiam posições diferentes:
Na introdução do Parecer n. 251/1962, que regulamenta o currículo mínimo
do curso de Pedagogia, seu relator, conselheiro Valnir Chagas, argumenta
que duas correntes posicionavam-se acerca dos rumos do curso: a que
pretendia sua extinção, alegando a falta de conteúdo próprio, e outra, que
defendia a existência do curso, supervalorizando este conteúdo. Em uma
postura conciliatória, ou para ficar “em cima do muro”, o autor do parecer dá
razão às duas correntes e, valendo-se das experiências e modelos de países
mais adiantados defende a tese da elevação de níveis de formação do
professor [...] No entanto, avaliava que, para a época, a proposta de elevar no
Brasil a formação do professor primário ao nível superior era bastante
ambiciosa. Previa, contudo, que seria a solução uma solução real por volta
dos anos 70 (BRZEZINSKI, 1996, p. 54).
Como naquela época ainda não exigia a formação do professor primário em nível
superior, permaneceu a ausência da especificação das habilitações para o curso de Pedagogia,
as discussões acerca das habilitações somente foram recuperadas na Reforma Universitária de
1968. Todavia, evidentemente, percebemos na organização dada ao curso de Pedagogia em
1962 que a dicotomia entre o bacharelado e a licenciatura, isto é, entre a pesquisa e o ensino,
entre o conteúdo e o método, entre a teoria e prática, conduzia a questões relativas a
120
dificuldades de definição do campo de trabalho do pedagogo, o que daria espaço para uma
nova regulamentação nos anos subseqüentes. Segundo Silva (1999, p. 37),
[...] os legisladores tratam a questão do curso de Pedagogia começando por
onde, muito provavelmente, deveriam ter terminado, ou seja, fixaram um
currículo mínimo visando à formação de um profissional ao qual se referem
vagamente e sem considerar a existência ou não de um campo de trabalho
que o demandasse.
Principalmente, por conta da representação política de uma nova versão pedagógica na
pessoa de Valnir Chagas, o qual, embora se considerar continuador do Anísio Teixeira, muito
se equivocava quando ao invés de assumir no curso de Pedagogia a base na formação de
professores primários como era o objetivo do Anísio, defendia sua extinção e, depois as várias
habilitações para o curso com nítida perspectiva da sociologia positivista, na busca por
“apresentar um equilíbrio entre as duas posições opostas: o Bacharel (Especialista em
Educação) e o Licenciado (Professor da Escola Normal)” (RODRIGUES, 2005, p. 68). Dessa
forma, permanecia a dicotomia entre conteúdo e método nos cursos de formação de
pedagogos no país.
Contudo, de acordo com a análise de Saviani (2008, p. 376-377), pode-se concluir que
Valnir estaria, sim, em continuidade com o escolanovismo, o que justificaria as menções de
simpatia a Anísio Teixeira, porém era evidente seu ecletismo, suas várias referências,
entretanto o ecletismo sempre foi uma característica da escola nova. No regime militar, no
final da década de 1960, Valnir assumiu o enfoque de princípios da eficiência, neutralidade,
produtividade e racionalidade, utilizando-os para a organização curricular se situando
claramente no âmbito da pedagogia tecnicista, como discutiremos no próximo tópico.
Portanto, compreende-se que a década de 1960 foi marcada por algumas
transformações no campo da inovação educativa, no sentido de ter deixado mais claro a
predominância das teorias pedagógicas renovadoras, sem as tensões contraditórias entre
católicos e renovadores, e o próprio Estado, diferente do momento efervescente das décadas
de 1930-40, os anos seguintes até a década de 1960 a pedagogia nova encontrou um espaço
mais bem definido na academia e na política desenvolvimentista.
A Escola Nova alcançou seu apogeu na década de 1960, depois da publicação do
“Manifesto: mais uma vez convocados” o qual foi estruturado em tópicos, entre eles, o da
educação para o trabalho e desenvolvimento econômico: explicitando a necessidade de
sintonizar a educação com o seu tempo de acordo as características da sociedade, pondo o
trabalho como fonte de todas as conquistas materiais e culturais e a escola não como o lugar
121
da ciência pura e desinteressada, mas o lugar para objetivos mais práticos, mais
profissionais e de ciência aplicada (SAVIANI, 2008).
Mas, a escola nova mal conseguiu seu apogeu no Brasil, ainda nos anos de 1960
enfrentou uma crise. Isso acontecia em vários países, principalmente, após a União Soviética
ter saído à frente dos Estados Unidos na corrida espacial, o que provocou questionamentos em
relação à eficácia da educação nova (SAVIANI, 2008, p. 340). Além disso, “o excesso de
capacidade produtiva e de produtos que surgiu, acarretou a perda de lucratividade nas
indústrias de transformação” (SILVA, 1994, p.03), o que, conseqüentemente, provocou novas
formas de organização e racionalização do trabalho.
No decorrer da crise, em 1968, surgiram mobilizações reivindicando a reforma
universitária. Contudo, os estudantes e professores pautavam-se na concepção moderna de
educação; os quais nas universidades ocupadas “desenvolviam o método de projetos, o ensino
centrado nos núcleos temáticos extraídos da preocupação político-existencial dos estudantes,
o método de solução de problemas” (SAVIANI, 2008, p. 338). Pois, com a crise do ciclo
monopolista do capitalismo, a formação de professores em nível superior precisava se adequar
a sociedade em reestruturação, através das exigências cada vez mais centradas na técnica.
O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), fundado em 1961, já discutia uma
política educacional que viabilizasse o rápido desenvolvimento econômico do país. Após o
golpe militar, em 1965 o Brasil assinava os Acordos MEC-Usaid, o qual reforçava o
desenvolvimento a partir da abertura para as empresas internacionais que através do capital
financeiro e especulativo determinava novas exigências para o trabalho. Porém,
Os trabalhadores contrapõem uma nova ordenação [...]. A intensidade e a
magnitude do movimento dos trabalhadores transbordam a esfera da
produção, atingindo diversas instituições: igreja, partidos políticos, escolas,
entre outras. Dentre esses movimentos, destaca-se o movimento dos
trabalhadores do ensino (SILVA, 1994, p. 04).
Assim, desde os anos 1960 até início de 1970, em meio à crise da escola nova e do
modo de acumulação do capital, foram preconizadas as pedagogias emergentes. A pedagogia
tecnicista, demarcada no final da década de 1969, depois da reforma universitária, até os anos
1980, quando surge o movimento contra-hegemônico e novas reconfigurações da pedagogia
hegemônica.
Entretanto, o aprofundamento do modo de produção capitalista na década de 1970
regulamentou-se, a partir da pedagogia tecnicista, a formação de especialistas, reestruturando
as universidades brasileiras na perspectiva da racionalidade técnica, com base na neutralidade
122
científica e nos princípios da eficiência e produtividade. Acreditamos significar não
exatamente uma ruptura com a pedagogia nova, mas um “aprofundamento” mais ríspido por
conta da crise seguida de reestruturação do sistema capitalista nos anos 1960-70, como será
mais bem discutido no próximo subitem.
4.2 A Formação do Pedagogo Especialista: entre a Modernização Conservadora e as
Propostas de Formação de Pedagogos
O Brasil nos anos 1930 estava em processo de transição econômica, deixando de ser um
país essencialmente agrário33
para se industrializar. Uma nova classe social surgia - a
burguesia industrial. No contexto mundial, havia a necessidade de formação do Estado Nação,
com o objetivo de eliminar a concorrência da política oligárquica da República Velha entre os
Estados brasileiros, implantando um novo modelo econômico para a inserção do país no
mercado internacional.
A ruptura com a política oligárquica, a “Revolução” de 30 propunha-se como
o desfecho necessário da insatisfação política dos anos 20, capturada como
embate contra o arcaico. Concretizada, teria potenciado a circulação de ideias
e trocas culturais. Com isto, teria possibilitado a infiltração de doutrinas
extremas e partidos subversivos que turvaram as cristalinas águas do embate
entre novos e velhos, tradicionais e renovadores. O Estado Novo - é o que fica
sugerido- vinha repor em seu curso correto a marcha avassaladora do novo
sobre o velho, depurando-a (CARVALHO, 1998, p. 21).
Em relação aos embates entre o velho e o novo, Ponce (2003, p. 172) diz que a imagem
“do novo que a burguesia liberal nos prometia é a velha imagem já bem nossa conhecida: a de
uma classe opressora que monopoliza a riqueza e a cultura diante de uma classe oprimida,
para qual só é permitida a superstição religiosa e um saber bem dosado”.
No Estado Novo, as medidas tomadas no início dos anos 30 não indicavam que Vargas
apostasse inicialmente na superação da crise34
de superprodução pela via desenvolvimentista.
Isso aconteceu com o aprofundamento das disputas imperialistas e com a maior visibilidade
das transformações que esta nova situação acarretava. Mas, o nacional desenvolvimentismo
33
Vale ressaltar que havia uma divisão do trabalho: determinada região brasileira continuava agrária, com a
função de fornecer matéria prima, o processo de industrialização aconteceu na região sudeste do país, atualmente
diminuída, mas, ainda permanece esta divisão. Esse processo de industrialização ocasionou migrações, o que
gerou inúmeros problemas nas grandes cidades. 34
Crise de 1929 da super produção, desemprego devido à mecanização e a recuperação dos países da Europa,
que eram potenciais compradores dos Estados Unidos, porém reduzam isso drasticamente após a recuperação
desses países depois da primeira guerra mundial.
123
praticado no Estado Novo, não tinha intenção de uma emancipação política marcada pelo
confronto com o capital externo, e sim o trampolim para levar o Brasil a um novo patamar de
desenvolvimento no qual caberia ao país um papel de destaque no cenário mundial, como
nação industrializada (BRITO s/d, p. 08).
Dessa forma, a partir dos anos pós- 1945, o modelo de industrialização constitui-se em
“grandes fábricas, decomposições de tarefas na perspectiva taylorista35
, mão-de-obra pouco
qualificada, gerência científica do trabalho, separação crescente entre a concepção e a
execução do trabalho” (FRIGOTTO, 2003, p. 70). Para Brito (s/d, p. 02-03), este contexto
marca o segundo grande ciclo da fase de desenvolvimento da sociedade capitalista,
caracterizado pela presença do Estado capitalista, enquanto Estado que se envolveu na
produção direta dentro do campo econômico, o Estado mantenedor de um rol de garantias e
direitos sociais, o chamado Estado do Bem-Estar Social.
Frigotto (2003, p. 70), afirma que o Estado de Bem-Estar social corresponde à ideia de
“Estado-Nação (totalitário ou democrático) e que, após a segunda Guerra Mundial, ganha
força [...]. É também neste período que os regimes social-democratas se apresentaram como
„alternativa‟ ao capitalismo „selvagem‟ e aos projetos socialistas e comunistas”. Somente no
início dos anos 1970 que o taylorismo-fordismo36
, “padrão produtivo, estruturalmente
comprometido, começou a dar sinais de esgotamento” (ANTUNES, 2007, p. 38).
Entretanto, o trabalho massificado gerado pelo fordismo, determina condições de
trabalho precário, reforçado por uma organização racional do trabalho e da produção
através do parcelamento de tarefas fundado na tradição taylorista, para o trabalhador ser
mais eficaz e adaptar-se à demanda. Dessa forma, na medida em que o capitalismo se
desenvolvia através do processo de industrialização com máquinas as quais para ser dirigida
necessitava de um saber, este modelo de fábrica esteve presente no discurso para a
organização da educação brasileira, na tentativa de aproximar ao máximo a escola com a
vida do trabalhador na fábrica.
[...] assim, o capitalismo fornece o trabalho científico, mediante escolas
técnicas e laboratórios de altos estudos como uma questão vital. A burguesia
35
Segundo Silva (1994, p. 02) o taylorismo pode ser concebido como um modo de organização racional do
trabalho, fruto do trabalho de engenheiros, tendo como expoente Taylor. É uma construção teórica por meio da
qual os técnicos tentam regular a produção e as relações sociais, aplicando seus princípios na organização das
empresas. O taylorismo utiliza dos referenciais das ciências humanas, tais como psicologia, sociologia, medicina
do trabalho, ergonomia, entre outras. Salienta ao extremo o valor da divisão do trabalho em duas direções: (i)
separação rigorosa do trabalho manual e do trabalho intelectual, da concepção e da execução do trabalho; (ii)
decomposição rigorosa, nos seus elementos gestuais, das operações do trabalho produtivo. 36
O fordismo se caracteriza por um sistema de máquinas acoplado, aumento intenso de capital morto de
produtividade, produção em grande escala e consumo de massa (FRIGOTTO, 2003, p. 70).
124
reservava, todavia, para os seus filhos outras formas de educação em que as
ciências ocupavam um lugar discreto, em que o saber continuava livresco e
bastante divorciado da vida real, enquanto nas outras escolas a orientação
francamente prática e impregnada de intenção utilitária (PONCE, 2003, p.
147).
Segundo Carvalho (1998, p. 151), no discurso da Escola Nova na ABE em defesa da
educação, freqüentemente já era tematizada a “organização racional do trabalho”, referindo à
escola medidas de racionalização do trabalho escolar sob o modelo de fábrica, o que parece
evidente que, de alguma forma, o taylorismo estava no horizonte. A universidade se
organizava nestes moldes, associando a pesquisa científica com a produção do conhecimento
tido como indispensável ao progresso, formando na perspectiva da consciência nacional e de
atuação na resolução de problemas.
Diante esta afirmação, Mendonça (2002, p. 88) não concorda que se possa generalizar
sem reservas para o grupo dos chamados intelectuais da educação, dominante da ABE, de
moldagem da nacionalidade com base no modelo de fábrica. Para a autora, o pensamento de
Anísio se afasta da visão tecnicista da década de 1970 que lhe tem sido freqüentemente
imputada, defendendo o termo técnica utilizado por ele como marca específica de que se
apóiam e tendem a se apoiar cada vez mais nas aplicações da ciência.
De fato, existia como defesa, naquele período em que Anísio esteve imerso no debate
em relação à formação de professores no espaço acadêmico, uma mínima apropriação do
conhecimento científico, considerando o viés do pragmatismo. Pois, no que se refere aos
conhecimentos pedagógicos o que predominava era “aprender a fazer, fazendo”, aprender
sobre os processos didático-pedagógicos na prática, ou seja, aprender na prática em sala de
aula como experiência do processo de formação do professor.
Dessa forma, torna-se possível afirmar que desde o processo de construção e
consolidação da Escola Nova entre os anos 1920-1960 já se preconizava a educação na
perspectiva do modelo de produção taylorista. Tanto na defesa do Anísio Teixeira - “aprende
a fazer, fazendo” (MENDONÇA, 2002) quanto nas defesas do Lourenço e Fernando: do
Lourenço Filho que realçava as conquistas do behaviorismo e da psicologia naturalista
(VIDAL, 2001, p. 93) e do Fernando de Azevedo, positivista sociólogo que “encontrou em
Durkheim sua inspiração principal” (SAVIANI, 2008, p. 214), estão presentes tanto na
pedagogia tecnicista quanto na pedagogia nova da década de 1930. Inclusive, Eidt (2009, p.
22) afirma em sua tese a harmonia entre o positivismo (pedagogia tecnicista) e o pragmatismo
125
(pedagogia nova), não sendo o positivismo característica exclusiva do tecnicismo, ao
evidenciar em Dewey seu posicionamento positivista.
Segundo Lowy (apud Eidt, 2009) uma das ideias principais que caracteriza o
positivismo baseia-se na defesa dos fenômenos humanos e sociais como regulados por leis
naturais, invariáveis e independentes da ação humana, esta ideia evidencia a íntima relação do
positivismo com o pragmatismo, pois para o último a sociedade constitui-se em um ambiente
natural, imediato, em que prevalece uma total indistinção entre o homem e as espécies
animais, “o indivíduo se adapta ao meio” (EIDT, 2009, p. 22, grifos nossos).
Além disso, no nível universitário, Anísio Teixeira incluía como objetivo o estudo
especializado da educação. Para ele, os “especialistas em educação” se constituiriam em
verdadeiros intelectuais da educação (MENDONÇA, 2002, p. 103), defendendo a existência
de uma base comum de formação permanente de professores implantando, portanto, a
supervisão no sistema de ensino (idem, p.105).
Com a formação dos especialistas a partir da pedagogia tecnicista, a supervisão foi
considerada como uma das habilitações para a formação do pedagogo especialista em 1969,
entre outras que também possuem suas bases neste período da UDF. Para Anísio, “como
intelectuais os „especialistas de educação‟, mais do que técnicos, seriam fundamentalmente
filósofos e políticos” (VIDAL, 2001, p. 106), mas, a sua perspectiva filosófica se baseava no
pragmatismo de Dewey, o qual introduz um novo sentido para o conceito de experiência,
afirmando que se aprende fazendo e que tudo deve ser ensinado em função de seu uso e
da sua função na vida, isto é, conhecimento útil (GOTTSCHALKP, 2007, p. 462, grifos
nossos).
Entretanto, Saviani (2008, p. 382) afirma que para a pedagogia tecnicista o elemento
principal passa a ser a organização racional dos meios, e que, embora a pedagogia nova
também enfatizar a importância dos meios, há uma diferença fundamental: “enquanto na
pedagogia nova são os professores e os alunos que decidem se utilizam ou não determinados
meios, bem como e quando farão, na pedagogia tecnicista cabe ao processo definir”. No
tecnicismo,
A educação será concebida como um subsistema cujo funcionamento eficaz
é essencial ao equilíbrio do sistema social de que faz parte. Sua base de
sustentação teórica desloca-se para a psicologia behaviorista, a engenharia
comportamental, a ergonomia, informática, cibernética, que têm em comum
a inspiração filosófica neopositivista e o método funcionalista. Do ponto de
vista pedagógico, conclui-se que, se para a pedagogia tradicional a questão
central é aprender, e para a pedagogia nova, aprender a aprender, para a
pedagogia tecnicista o que importa é aprender a fazer (idem, p. 383).
126
Este contraponto diferencia a pedagogia nova da pedagogia tecnicista, porém as duas
são pedagogias hegemônicas que se baseiam na tendência liberal da educação, empenhadas no
sentido de corresponderem aos interesses da burguesia liberal, conseqüentemente, da
sociedade capitalista, a pedagogia tecnicista seria, pois, um alargamento, uma “renovação” do
escolanovismo. Como o próprio Saviani (2008a, p. 83) afirma, “diante das contestações
críticas que enfrenta, a Escola Nova assegura seu predomínio assumindo novas versões”.
Assim sendo, na década de 1980-90, demarcadamente, estas novas versões pedagógicas,
sofreram imbricações das ideias do escolanovismo, de forma a integrar uma corrente
denominada pedagogias do “aprender a aprender”, pois “esse aprender a aprender é, portanto,
também um aprender fazendo [...] elos de ligação entre ideários pedagógicos normalmente
vistos [...] como ideários pertencentes a universos distintos” (DUARTE, 2003, p. 06).
Contudo, o movimento geral da sociedade capitalista em sua crise estrutural, nos anos
1960-1970, resulta em documentos oficiais com o espírito norteador das práticas educativas
para atender as necessidades da nova recomposição organizacional do sistema sócio-
econômico. A necessidade de instituir “outra pedagogia” foi inevitável, principalmente, por
que a política nacionalista desenvolvimentista no Brasil repousava no equilíbrio de uma
contradição: “ao mesmo tempo em que estimulava a ideologia política nacionalista, dava
seqüência ao projeto de industrialização do país, por meio de uma progressiva
desnacionalização da economia” (SAVIANI, 2008b, p. 359).
O processo de industrialização intensificado anos após 1930, já havia “atingido” sua
meta de desenvolvimento, e a crise do sistema sócio-econômico mundial no final da década
de 1960 marca a abertura de uma nova etapa na educação brasileira. Depois da Lei n.
5540/68, a qual institui a reforma universitária e que se desdobra no Parecer n. 252 de 1969
com as habilitações técnicas para o curso de pedagogia. A predominância da pedagogia
tecnicista foi evidenciada, ainda mais, com a aprovação da Lei n. 5692/71 que “buscava
estender essa tendência produtivista a todas as escolas do país, por meio da pedagogia
tecnicista, convertida em pedagogia oficial” (SAVIANI, 2008b, p. 363). Contudo, antes
mesmo de 1969, no início da década de 1960 já se preconizavam a preparação de técnicos.
No intervalo entre 1960-64 foi marcado pela eficaz preparação de técnicos,
entre esses os da educação, objetivando atender ao apelo do modelo
desenvolvimentista. [...] A adoção dessa política de treinamento em massa
visava compartilhar de transformações das forças produtivas para dinamizar
a economia. É a etapa do capitalismo brasileiro dedicada aos investimentos
em educação alicerçados no ideário tecnicista (BRZEZINSKI, 1996, p. 58).
127
Portanto, vale reafirmar que a suposta ruptura da pedagogia nova com a divulgação da
pedagogia tecnicista derivada da crise, foi essencialmente política para fazer prevalecer a
condição sócio-econômica do país. Por isso, compreende-se que os desdobramentos das ideias
tecnicistas estão associados a uma implícita manutenção das bases da sociedade sob uma
forma revigorada atendendo a necessidade daquele momento de crise. Tanto que as
reivindicações feitas pelo movimento estudantil para a reforma universitária em 1968, como
vimos, pautavam-se nos fundamentos da concepção da pedagogia nova.
O mundo encontrava-se no momento de crise em disputa pelo espaço de país potência
mundial, a guerra fria traduz exatamente o jogo hegemônico entre duas nações com
concepções educacionais distintas (os Estados Unidos e a Soviética), foi esta disputa que
culminou a necessidade de uma “nova” pedagogia, baseada num momento de produção
industrial em massa e em grande quantidade e que, para isso, necessitava de uma divisão do
trabalho (trabalho manual x trabalho intelectual) mais determinada, de uma racionalidade
técnica relacionada à eficiência na produção, surgindo, assim, o tecnicismo na educação
brasileira.
A concepção tecnicista baseava-se no trabalho fabril pretendendo a objetivação do
trabalho pedagógico, ou seja, o trabalho é organizado de forma parcelada através da utilização
de instrumentos necessários para atingir a produtividade, é a produtividade na escola. A
pedagogia tecnicista tentava minimizar as inferências subjetivas, e com a divisão do trabalho
surge na educação brasileira o especialista. Especializações de funções, e esses especialistas
como orientadores do professores executores de um processo planejado de forma neutra
e objetiva para a garantia de sua eficácia.
Na pedagogia tecnicista o elemento principal passa a ser a organização
racional dos meios, ocupando o professor e o aluno posição secundária,
relegados que são à condição de executores de um processo cuja concepção,
planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de especialistas
supostamente neutros, objetivos e imparciais (SAVIANI, 2008b, p. 382).
A partir dessa concepção tecnicista na educação brasileira, o debate em relação ao curso
de Pedagogia substanciava-se novamente resultando em novas definições que estiveram em
consonância às exigências sócio-econômicas desse período da produtividade.
“O curso de Pedagogia, com o Parecer 252/69, além de formar o professor para a Escola
Normal, passava a conceder o direito ao magistério primário e, em atendimento ao art. 30 da
Lei 5.540/68, passava a formar o especialista em educação” (RODRIGUES, 2005, p. 99).
128
Estabelecendo inúmeras habilitações para o curso de Pedagogia: orientação educacional,
administração escolar, supervisão e inspeção escolar, entre outras, ensino das disciplinas e
atividades práticas dos Cursos Normais. A estrutura curricular dividia-se em duas partes: a
primeira composta por matérias como: sociologia geral e da educação, psicologia da
educação, história da educação, filosofia da educação e didática; a segunda, matérias
diversificadas correspondentes às habilitações mencionadas (BRZENZINSKI, 1996, p. 74).
O curso de Pedagogia foi reformulado pelo Parecer 252/69 que deu origem
às habilitações pedagógicas. Com isso, ficou diluída a formação básica, a
fundamentação teórica, em benefício da formação de técnicos em
habilitações que, entretanto, carecem de especificidade quer teórica
(epistemológica) quer prática (empírica) (SAVIANI, 1982, p. 13, grifos
nossos).
Além de todas essas habilitações o licenciado em Pedagogia adquiriu, “como
subproduto de seu curso, o direito de ser „professor primário‟, sob o argumento de que quem
prepara o professor primário tem condições de ser professor primário” (BRZENZINSKI,
1996).
[...] de modo a procurar adequar-se também à preparação do professor para
as séries iniciais, tarefa essa que vinha desempenhando sem estar
devidamente instrumentado. Antes centrados, sobretudo nas ciências básicas
da educação, tais cursos vieram a incorporar, depois de 1969, a Teoria e
Prática do Ensino Primário, na Habilitação Magistério para o ensino de 2º
grau. Entretanto, essa habilitação passou a visar também ao preparo dos
professores para as séries iniciais – conforme, aliás, possibilitava o próprio
Parecer CFE 252/69 – e, em alguns casos, criaram-se habilitações
específicas para esse fim, o que motivou um esforço para ampliação das
disciplinas de instrumentação, diversificando-as de modo a cobrir os
diversos componentes curriculares dos anos iniciais da escolaridade
(metodologia do ensino da matemática, dos estudos sociais, da alfabetização,
das artes). (TANURI, 2000, p. 84).
Pelas habilitações pretendeu-se formar técnicos com funções supostamente específicas
do âmbito escolar e sistema de ensino, com as quais o mercado de trabalho configurar-se-ia
para atender a demanda. Dessa forma, em relação às configurações do curso de Pedagogia até
então determinadas pelas políticas oficiais, Silva (1999, p. 70) afirma que:
(...) não se pode formar o educador com partes desconexas de conteúdos,
principalmente quando essas partes representam tendências opostas em
educação: uma tendência generalista e outra tecnicista. Essas tendências (...)
a primeira quase que exclusivamente na parte comum, considera que ela se
caracteriza, “grosso modo”, pela desconsideração da educação concreta
129
como objeto principal e pela centralização inadequada nos fundamentos em
si (isto é, na psicologia e não na educação; na filosofia e não na educação, e
assim por diante). A segunda, por sua vez, é identificada com as
habilitações, consideradas como especializações fragmentadas,
obscurecendo seu significado de simples divisão de tarefas do todo que é a
ação educativa escolar.
Conforme a Lei n. 5540/68 a concepção dicotômica relacionada ao bacharelado e a
licenciatura tão discutida anteriormente continuava sendo uma problemática, pois, como
discutido, as várias habilitações determinaram a divisão do curso em dois blocos: um
composto por disciplinas conhecida como os fundamentos da educação e outro com as
disciplinas das habilitações específicas.
A meu ver, transferir disciplinas de uma unidade acadêmica para outra,
como foi feito pela Lei da reforma universitária e seus desdobramentos, não
constitui o cerne da questão curricular da formação do educador. O problema
está na indefinição do conteúdo específico da pedagogia, até hoje
polemizado pela questão basilar: a pedagogia é ciência com natureza, objeto
e conteúdo específicos? Ou é um campo de aplicação dos princípios de
outras ciências, transformando-se numa prática que se fundamenta em
metodologias e teorias que pertencem ao domínio das ciências sociais
denominadas ciências da educação? (BRZEZINSKI, 1996, p. 72).
Embora, o Parecer n. 252/69 ter fixado um currículo com os “conteúdos mínimos” e
duração na organização do curso, tornando obrigatório o estágio supervisionado nas áreas
correspondentes às habilitações, o mesmo não especificava o número de horas e nem o
período para o estágio. Somente, pelo Parecer n. 867/72 que definiu um ano letivo de
experiência de magistério para as habilitações educacional e um semestre letivo para as
demais. Entretanto, o Parecer n. 252/69 conduzir encaminhamento de disciplinas no currículo
ligadas a formação de professores das séries iniciais e diminuição das disciplinas que pelo
menos identificavam mais com as habilitações; a base da formação do pedagogo apesar das
habilitações já se configurava na docência (BRZEZINSKI, 1996).
Em síntese, a reforma universitária, durante o governo militar, reformulou o
curso de Pedagogia pelo Parecer n. 252/69 provocando mudanças estruturais
que aprofundaram ainda mais a indefinição de sua identidade ao fragmentar
a formação do pedagogo em habilitações técnicas efetivadas na graduação
(BRZEZINSKI, 1996, p. 78).
A Lei n. 5692/71 possibilitou maior entrave para o não avanço das condições de
realização de uma definição para o curso de Pedagogia. A formação técnica foi mais
130
fortemente demarcada por ampliar as resoluções referentes à reforma universitária em 1968,
legando ao curso uma formação de separação entre o pensar e o fazer, a teoria e a prática,
com ênfase no pragmatismo e no tecnicismo na educação para o controle mediante uma
prática funcionalista, concebida a partir do conceito de competência definida como algo que
uma pessoa deve fazer ou deveria estar em condições de fazer, pois o que importava eram os
resultados obtidos de acordo os objetivos traçados, o desempenho satisfatório, e não o
processo do fazer com as abordagens teóricas, históricas e políticas.
Percebe-se que o curso de Pedagogia, ao longo de sua existência foi se adequando aos
interesses hegemônicos dos projetos educativos vigentes. No período de 1968-1990, esses
interesses ficam latentes e como no decorrer da história da educação, os interesses da época
foram determinados pelas políticas educacionais. São as leis, os pareceres e as suas
significações concedidas que constituem a educação, a formação de professores, com base nas
exigências de uma sociedade, ao mesmo tempo em que a educação torna-se constituinte da
mesma.
Então, o que se pode compreender é que o formato, ou seja, a organização curricular e o
momento histórico-econômico do tecnicismo e da produtividade no curso de Pedagogia não
foram favoráveis para uma definição em relação à especificidade da Pedagogia como campo
teórico e prático da educação. E, mais uma vez, as políticas do Estado impossibilitaram uma
visão mais ampla da formação do pedagogo. O laço estreito da Pedagogia com as diversas
áreas das ciências viriam a consolidar definitivamente o espaço da educação na universidade
brasileira, a pedagogia como campo de mera aplicação das teorias dessas ciências, e isso
ocorreu à custa do afastamento da pedagogia como teoria e prática da educação.
4.2.1 Propostas de Formação do Pedagogo e a Base Comum Nacional
No final da década de 1970 e início de 1980, no momento de redemocratização do país
e ainda predomínio do tecnicismo na educação, foram inúmeras as críticas direcionadas ao
curso de Pedagogia. Críticas relacionadas à formação do especialista, ao caráter
didático-metodológico e organizacional. Foram vários os problemas apresentados em
relação à formação de pedagogos, tais como: não há correspondência entre a formação e a
realidade brasileira; o mercado de trabalho está saturado de profissionais oriundos dos cursos
de Pedagogia com baixo nível de qualificação; o curso não tem proporcionado atitude crítica
para analisar os problemas reais do sistema de ensino brasileiro; com efeito, o curso de
131
Pedagogia deverá ser redefinido para que nele se apóiem os primeiros ensaios de formação do
professor primário em nível superior (BRZEZINSKI, 1996, p. 132).
Assim, surge à questão da teoria e prática na formação de pedagogos no interior do
movimento de educadores, que propõe “como umas das alternativas de solução, sua
organização de forma que desde o início, haja vinculação entre a prática (Estágios e
Pesquisas de campo etc.) e as teorias que se aprendem nas instituições” (I Seminário de
Educação Brasileira apud FREITAS, 1993, p. 76). Para Freitas (1993, p. 77), já neste
momento, percebe-se a preocupação com a unidade teoria e prática nos cursos de
formação de educadores por meio do questionamento em relação à estrutura dos cursos que
situavam os estágios supervisionados e as primeiras experiências práticas apenas no final
do curso.
Além da questão sobre a prática, na década de 1980 surge a proposta de base comum
nacional de formação de professores, deliberada pelo movimento de educadores37
organizados
no sentido de se contrapor às políticas do MEC e a formação do pedagogo como especialista
sem que se formasse professor. A base comum nacional se referia à formação de todos os
educadores, ela seria a base que uniria a formação dos educadores independente do conteúdo
específico de cada área. Seria a introdução do pedagógico na formação das demais
licenciaturas, das licenciaturas específicas.
A base comum nacional seria a garantia de uma prática comum nacional a
todos os educadores, qualquer que seja o conteúdo específico de sua área de
atuação [...] A base comum seria considerada como uma diretriz que envolve
uma concepção básica de formação do educador e que se concretiza através
da definição de um corpo de conhecimento fundamental. Essa concepção
básica de formação do educador deve traduzir uma visão de homem situado
historicamente, uma concepção de educador comprometido com a realidade
do seu tempo e com o projeto de uma sociedade justa e democrática [...] A
base comum às várias licenciaturas deve principalmente destinar-se ao
compromisso político do educador, o que implica a formação da consciência
crítica. Daí ser necessário incluir um corpo de conhecimento fundamental,
que aprofunde o domínio filosófico, sociológico, político e psicológico do
processo educativo, dentro de uma abordagem crítica, que explore o caráter
científico da educação, tomando como referência o contexto socioeconômico
e político brasileiro (CONARFCE apud SCHEIBE; AGUIAR, 1999, p. 228).
37
ANFOPE – Associação Nacional de Formação de Profissionais da Educação, na época o Comitê Nacional e
depois a Comissão Nacional até a década de 1990 quando se transformou na ANFOPE. Havia uma tentativa da
ANFOPE de ampliar a pedagogia para as demais licenciaturas e defesa da base comum nacional.
132
No que se refere ao curso de Pedagogia, na década de 1980 o movimento de
reformulação dividia-se em dois grupos: “um, que era favorável à permanência das
habilitações fundamentais [...]. Outro, que postulava a eliminação das habilitações [...].
Todavia, entre os grupos havia um consenso: a docência era prioritária e base da identidade da
formação do pedagogo” (BRZEZINSKI, 1996, p. 157).
Ao contrário da proposta do movimento de educadores, Saviani (1982) propôs em suas
contribuições o entendimento da Pedagogia como teoria geral da educação e de que o curso
teria por finalidade a formação do educador38
, aquele que realiza a ação educativa, com o
desenvolvimento de uma aguda consciência da realidade em que vão atuar; uma adequada
fundamentação teórica que lhe permita uma ação coerente; e uma instrumentalização técnica
(BRZEZINSKI, 1996, p. 133). Para Saviani (1982) a base seria a formação do educador e não
do professor, se formaria o professor e o especialista de forma conjugada no educador.
O essencial é formar o educador, o qual, se bem formado, será capaz de
exercer as atividades específicas que a maior ou menor divisão de tarefas,
segundo maior ou menor complexidade da organização educacional venha a
exigir. Nossa concepção implica, portanto, uma alteração no “slogan”
proposto por Valnir Chagas: em lugar de “formar especialista no professor”,
diríamos que se trata de formar, seja o especialista, seja o professor, no
educador (SAVIANI, 1982, p. 02).
Para Brzezinski (1996, p. 135), Saviani permite encontrar a possibilidade dessa
articulação em sua proposta. Mas, em síntese, a discussão circundante neste contexto se
referia à base comum nacional que seria a formação de professores, pois deveria constituir
uma articulação da pedagogia com as licenciaturas em geral. Na década de 1990, Freitas
define a base comum nacional afirmando:
A concepção de uma base comum nacional, fundada na concepção sócio-
histórica do educador e traduzida pela formação do profissional crítico,
capaz de articular o conhecimento teórico com a prática educativa, amplia o
campo epistemológico do profissional da educação em uma perspectiva de
„compreensão da totalidade do processo educativo e seu significado na
formação social brasileira‟ (FREITAS, 1993, p. 81).
Esta seria a concepção de formação de professores do movimento de educadores quando
em discussão defendia a base comum nacional, o qual estabelecia alguns pontos básicos para
se pensar o currículo de formação de professores (CONARCFE apud FREITAS, p. 81-82):
38
Ver a proposta de formação do educador elaborada por Saviani nos anexos.
133
1) Sólida formação teórica e interdisciplinar sobre o fenômeno educacional e seus
fundamentos “que permita a apropriação de seu processo de trabalho”, com
condições de exercer a análise crítica da sociedade brasileira e realidade
educacional;
2) Novas formas de relação teoria/prática que implica assumir uma postura em
relação à produção do conhecimento que impregna a organização curricular dos
cursos, e não se reduz à mera justaposição da teoria e prática em uma grade
curricular, teoria e prática que perpassam todo o curso de formação e não apenas a
prática de ensino, o que implica novas formas de organização curricular dos cursos
de formação; a ênfase no trabalho docente como base da formação e fonte dessa
nova forma de articulação teoria e prática; ênfase no desenvolvimento de
metodologias de ensino dos conteúdos das áreas específicas; tomar o trabalho como
princípio educativo na formação do profissional, revendo-se os estágios e sua
relação com rede pública e a forma de organização do trabalho docente na escola; e
ênfase na pesquisa como meio de produção do conhecimento e intervenção na
prática social;
3) Gestão democrática como instrumento de luta contra a gestão autoritária da escola;
4) Compromisso social do profissional da educação, contra concepções educacionais
obsoletas e com ênfase na concepção sócio-histórica de educador;
5) Trabalho coletivo e interdisciplinar entre alunos e entre professores como eixo
norteador do trabalho docente na universidade e da redefinição da organização
curricular.
Além da proposta de Saviani (1982) e do movimento de educadores, outras se
apresentavam como forma de contribuição: a proposta de Ulhôa (1981) a qual dizia que a
atitude reflexiva habitual, de partir de conceitos abstratos sobre fins da educação, seja
substituída pela prática de partir do real, para chegar aos princípios, uma crítica do autor era
direcionada para a pretensão de se formar o educador e uma prática que nega a educação,
afirmando que a formação do educador deve ser polivalente e, portanto, o currículo deve ser
organizado em parte comum e diversificado; a proposta de Moacir Gadotti, ancorado na
Pedagogia do Conflito a qual atribui ao pedagogo eminentemente crítico de inquietar, um
papel político a desempenhar dando à educação formal o papel de preparar o educador
popular mediante um currículo que transforme o voluntário em profissional; e a proposta do
comitê paulista (comitê locais do Estado de São Paulo), a qual estabelece princípios
norteadores de formação do educador inspirada na proposta tanto de Saviani (núcleo comum)
134
quanto de Gadotti (formar educadores para a empresa, sindicatos e meios de comunicação de
massa), propondo também a formação exclusiva em nível superior do professor para as séries
iniciais o que implica extinção da habilitação de magistério em nível de 2º grau
(BRZEZINSKI, 1996, p. 135-142).
Em suma, Brzezinski (1996) afirma que mediante as várias concepções e discussões da
comissão nacional (ANFOPE) fica a defesa da base comum nacional e as reformulações
curriculares com autonomia para a realização das experiências pedagógicas tendo por base os
princípios e as indicações do movimento nacional. Então, a base comum insere-se no contexto
de 1983 pela contestação e refutação dos atos advindos da tecnoburocracia.
Assim, várias faculdades de educação iniciavam experiências de formação do pedagogo
com base na docência para as séries iniciais. Esta tendência de 1983 considera a teoria e
prática como unidade indissociável e como núcleo integrador da formação do pedagogo,
colocando-a como eixo curricular, assim como também da formação teórica considerando que
o profissional de educação carece de teoria, “ao contrário do que apontava o senso comum
que tornou corrente a expressão: os cursos são teóricos, falta-lhes a parte prática”
(BRZEZINSKI, 1996, p. 202). Diante esta posição da ANFOPE, vale ressaltar a avaliação que
Saviani (2007, p. 17) faz em relação à defesa da base comum nacional:
A mobilização dos educadores foi importante para manter vivo o debate;
para articular e socializar as experiências que se realizaram em diferentes
instituições; manter a vigilância sobre as medidas de política educacional;
explicitar as aspirações, reivindicações e perplexidades que os assaltavam; e
para buscar algum grau de consenso sobre certos pontos que pudessem
sinalizar na direção da solução do problema. Em termos concretos
emergiram do movimento duas ideias-força. A primeira foi a de que a
docência é o eixo sobre o qual se apóia a formação do educador. A partir
dessa ideia prevaleceu entre as instituições a tendência a organizar o Curso
de Pedagogia em torno da formação de professores, seja para a habilitação
magistério, em nível de 2º grau, seja, principalmente, para atuar nas séries
iniciais do ensino fundamental. A segunda ideia se expressou na "base
comum nacional". Em vários dos eventos realizados essa ideia foi
retomada sendo explicitada mais pela negação do que pela afirmação.
Com efeito, foi se fixando o entendimento que "base comum nacional" não
coincide com a parte comum do currículo nem com a ideia de currículo
mínimo. Seria, antes, um princípio a inspirar e orientar a organização dos
cursos de formação de educadores em todo o país. Seu conteúdo, entretanto,
não poderia ser fixado por um intelectual de destaque, por um órgão de
governo e nem mesmo por decisão de uma eventual assembléia de
educadores. Deveria fluir das análises, dos debates e das experiências que
fossem encetadas possibilitando, num processo a médio prazo, que se
135
chegasse a um consenso em torno dos elementos fundamentais que devem
basear a formação de um educador consciente e crítico, capaz de intervir
eficazmente na educação visando à transformação da sociedade
brasileira.[...] a noção de "base comum nacional" foi incorporada ao texto da
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No entanto, o seu
conteúdo ainda permanece pouco claro [...] Com efeito, a excessiva
preocupação com a regulamentação, isto é, com os aspectos
organizacionais, acabou dificultando o exame dos aspectos mais
substantivos referente ao próprio significado e conteúdo da pedagogia
sobre cuja base cabe estruturar o curso correspondente (grifos nossos).
A ANFOPE afirma que a base comum nacional não significa um currículo mínimo ou
um elenco de disciplinas e sim uma concepção básica de formação do educador e a definição
de um corpo de conhecimentos fundamentais. Nesse sentido, a base comum nacional viria
solidificar a base da formação de professores no país. Entretanto, a base comum nacional
centrou-se na formação do professor ao invés da formação do educador. A docência passava
já neste momento, a ser o eixo articulador da Pedagogia com as demais licenciaturas. A defesa
do movimento de educadores erigia uma importante crítica, mas apenas às especializações
sem clareza da concepção de docência que assumiria, pois a organização curricular era a
centralidade das preocupações da ANFOPE, ao invés do aprofundamento conceitual e teórico.
Assim,
Entendemos que a ANFOPE, embora não forneça o contexto para a
epistemologia da prática, traz elementos que conduzem a esta
concepção, uma vez que não insiste numa articulação entre a docência e as
ciências da educação. Da mesma forma, não desconsideram a importância
das ciências da educação, as quais são colocadas como suporte à formação
docente, servindo, neste sentido, para instrumentalizar a prática e não para
articular essas dimensões (RODRIGUES, 2005, p.171).
A base comum nacional defendida pela ANFOPE não resulta numa proposta de
aprofundamento nas ciências da educação, como forma de fazer desenvolvê-las a partir das
contribuições do campo pedagógico ao tempo em que também desenvolveria o pedagógico
com um corpo teórico-prático estruturado, assim, o movimento de educadores dicotomiza a
formação profissional e a formação acadêmica, o que, mais tarde, tornou possível como
solução a ocupação neste espaço da formação do profissional reflexivo-pesquisador.
Rodrigues (2005) enfatiza, ainda, que mediante o debate de mais de vinte anos não foi
possível se definir a identidade do curso de Pedagogia; ao mínimo de consenso a respeito do
caráter científico dessa área; respostas às críticas da inconsistência e fragmentação da
136
formação ofertada por grande parte das instituições que separam a formação de professores e
especialistas através das habilitações; subsídios para formar o pedagogo com uma visão total
do processo educativo, sem estar limitado à sua área de habilitação e/ou a docência (idem,
ibidem).
4.2.2 A LDB n. 9394/1996 e a Reivindicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Curso de Pedagogia
No início da segunda metade da década de 1990, mais discussões polêmicas em relação
ao curso de Pedagogia passavam a ser discutidas devido às determinações da LDB 9394/1996
que “ao impacto inicial seguiram-se especulações, dentre elas a de que haveria intenção
velada de extinguir o curso de Pedagogia no Brasil” (CAÇÃO, 2009, p. 02). Acreditamos que
estas especulações devem-se, especialmente, ao Art. 63º que institui o curso Normal Superior
para a formação de professores da Educação Infantil e Séries Iniciais.
A instituição do curso Normal Superior devia-se ao Art. 62º da LDB 9394/1996 que
determinava a formação de docentes em nível superior para atuar na Educação Básica,
criando, em seguida, o curso Normal Superior, o qual passava a oferecer a mesma habilitação
que os cursos de Pedagogia vinham oferecendo desde meados da década de 1980, existindo,
portanto, o receio de sua extinção. Vejamos abaixo os artigos que exigem a formação superior
de professores para atuar nas séries iniciais, destinando esta formação ao curso Normal
Superior, e ao curso de Pedagogia a formação de especialistas.
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação
mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro
primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na
modalidade Normal.
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
I - cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;
Art. 64. A formação de profissionais de educação para administração,
planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a
educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em
nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
formação, a base comum nacional (BRASIL, LDB 9394/1996).
137
Como podemos observar, a base comum nacional foi concretizada no Art. 64 da
LDB, e o curso de Pedagogia em consonância as experiências prestadas desde a década de
1980 de formação para o magistério em anos iniciais do Ensino Fundamental foi efetivada, no
entanto, conjuntamente às habilitações específicas que também poderão ser oferecidas em
nível de pós-graduação.
Neste momento, Libâneo (2004), ao contrário da concepção do movimento de
educadores (1990), defende categoricamente as especializações na formação do pedagogo,
como modo de auxiliar os professores no processo fragmentado da escola. Para ele as
especializações têm mais conectividade entre as teorias específicas da pedagogia e a sua
atuação prática, assim, retirando as especializações em defesa da base comum nacional, da
docência, provocaria esvaziamento da teoria no curso de pedagogia.
Acreditamos que a base de um curso de Pedagogia não pode ser a docência.
Como já afirmamos, todo trabalho docente é trabalho pedagógico, mas nem
todo trabalho pedagógico é trabalho docente. A docência é uma modalidade
de atividade pedagógica, de modo que a formação pedagógica é o suporte, a
base, da docência, não o inverso. Ou seja, a abrangência da Pedagogia é
maior que a da docência. Um professor é um pedagogo, mas nem todo
pedagogo precisa ser professor. Isso de modo algum leva a secundarizar a
docência, pois não estamos falando de prioridades de campos científicos ou
de atividade profissional, estamos falando de uma epistemologia do
conhecimento pedagógico (FRANCO; LIBÂNEO; PIMENTA, 2007, p. 22).
Assim, a partir das indefinições ainda presentes na LDB 9394/1996 em relação ao curso
de Pedagogia, do embate teórico a respeito do curso de Pedagogia e da posição contra a
formação do “especialista no professor” que as entidades docentes se empenhavam reacendem
o debate a fim de construírem uma proposta para as Diretrizes Curriculares Nacionais do
curso de Pedagogia, já que seriam essas DCN que efetivamente ditaria qual a especificidade
do pedagogo e, assim, a finalidade da formação no curso de Pedagogia.
4.3 Sobre as DCN do Curso de Pedagogia: Debates e Ambigüidades acerca da Formação
do Pedagogo
Muitos anos se passaram até que se definissem as Diretrizes Curriculares Nacionais para
o curso de Pedagogia no Brasil. Somente em 2006 é que a Resolução CNE/CP n. 1/2006 foi
homologada pelo Ministério da Educação. Entretanto, o debate em relação às DCN se
138
aprofundou na década de 1990 quando o curso de Pedagogia emerge como principal lócus da
formação docente para atuar na educação infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Neste item pretendemos discutir o processo de elaboração das DCN diante as posições
divergentes entre os intelectuais da educação, as entidades representativas e o Conselho
Nacional de Educação, as quais subsidiaram o debate em busca de uma definição para o curso
de Pedagogia. Além disso, analisar as DCN na perspectiva de identificar as bases pedagógicas
que as fundamentam, bem como o conceito de docência que é estabelecido, considerando as
influências das pedagogias do aprender a aprender.
4.3.1 O Debate sobre as Diretrizes para a Formação de Pedagogos: Continuidade das
Posições Divergentes
A elaboração do documento das Diretrizes a partir de 1999 desencadeou uma ampla
discussão, em nível nacional, pois o Conselho Nacional de Educação passava a “considerar”
as posições das entidades representativas de educadores e estudantes do curso de Pedagogia
(ANFOPE, FORUMDIR, ANPED, CEDES e a Executiva Nacional dos Estudantes de
Pedagogia). A comissão de especialista39
do SESU/MEC com base nas contribuições das
entidades representativas de educadores e nas propostas das instituições de ensino superior
elaborou uma proposta de diretrizes curriculares a ser encaminhada para o CNE. Esta
comissão assumiu a seguinte tese:
O curso de pedagogia destina- se à formação de um “profissional habilitado
a atuar no ensino, na organização e na gestão de sistemas, unidades e
projetos educacionais e na produção e difusão do conhecimento, em diversas
áreas da educação, tendo a docência como base obrigatória de sua formação
e identidade profissional” (SCHEIBE; AGUIAR, 1999, p. 232).
Assim, nesta Proposta encaminhada ao MEC a base da organização curricular abrange
duas parte intrinsecamente relacionada: os conteúdos básicos e a parte diversificada ou de
aprofundamento, a primeira se referia a um núcleo básico articuladores da teoria e prática, e a
segunda parte aos tópicos de estudos diversificados com o objetivo de atender as diferentes
demandas sociais e articular a formação aos aspectos inovadores do mundo contemporâneo.
Em relação à prática pedagógica, esta se configura como um trabalho coletivo o que implica a
39 Compõem a Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia da SESu/ MEC os Professores Leda Scheibe
(UFSC), Márcia Angela da Silva Aguiar (UFPE), Celestino Alves da Silva Júnior (UNESP), Tizuko Morchida
Kishimoto (USP), Zélia Milléo Pavão (PUC/PR).
139
participação dos professores na formação teórica e prática de seus alunos, a relação teoria e
prática considerada como eixo articulador da produção do conhecimento (SHEIBE; AGUIAR,
1999, p. 233). Dessa forma,
A prática pedagógica expressa-se mediante três modalidades. A primeira
modalidade, percebida como instrumento de integração do aluno com a
realidade social, econômica e do trabalho de sua área/curso, possibilita a
interlocução com os referenciais teóricos do currículo. Pretende- se que seja
iniciada nos primeiros anos do curso e acompanhada pela coordenação
docente da instituição de ensino superior. Essa modalidade de estágio deve
permitir a participação do aluno em projetos integrados, favorecendo a
aproximação entre as ações propostas pelas disciplinas/áreas/atividades.
A segunda modalidade de prática pedagógica, como instrumento de
iniciação à pesquisa e ao ensino, na forma de articulação teoria-prática,
considera que a formação profissional não se desvincula da pesquisa. A
reflexão sobre a realidade observada gera problematizações e projetos de
pesquisa entendidos como formas de iniciação à pesquisa educacional. A
terceira modalidade de estágio, destinada à iniciação profissional, deve
ocorrer nas escolas e unidades educacionais, nas atividades de
observação, regência ou participação em projetos, como um “saber
fazer” que busca orientar-se por teorias pedagógicas para responder às
demandas colocadas pela prática pedagógica. Estará presente desde os
primeiros anos do curso, configurando a prática pedagógica necessária ao
exercício profissional (idem, p. 234).
Uma das modalidades da prática pedagógica substanciadas nos currículos do curso de
pedagogia com muito vigor foi a iniciação à pesquisa no ensino na forma de articulação entre
teoria e prática. Porém, podemos de antemão perguntar sem necessidade de respostas
apressadas já que a questão da prática pedagógica enquanto disciplina ou “componente
curricular” será discutida no próximo capítulo: esta modalidade já seria uma aproximação à
teoria do professor pesquisador? Qual o sentido da pesquisa nesta perspectiva do professor
pesquisador na formação do professor quando seu papel é o ensino? Se o curso tem por base a
docência, então, ensino é pesquisa?
Neste mesmo ano, o documento de diretrizes elaborado pelas entidades foi encaminhado
ao CNE que decidiu não encaminhá-lo para a discussão e aprovação, aguardando a definição e
regulamentação de outros pontos polêmicos, como o próprio curso Normal Superior. Neste
intervalo, que vai de 1999 a 2004, iniciativas do MEC em relação à formação de professores e
de pedagogos causou mais transtornos do que encaminhamentos positivos (exemplo das
Resoluções CNE/CP n. 01 e 02/2002 de formação inicial de professores no ensino superior)
(ANFOPE, 2004, p. 01).
140
Vale ressaltar que nas Resoluções CNE/CP n. 01 e 02/2002 as competências se tornam
central na formação inicial de professores no espaço acadêmico. Na Resolução 1/2002 no Art.
6º são elencadas as competências para os projetos dos cursos de formação, as quais se
inspiram na sociedade capitalista de forma que o docente se adapte às demandas e exigências
desta. Entre as várias competências destacamos “as competências referentes ao
conhecimento de processos investigativos que possibilitem o aperfeiçoamento da prática
pedagógica” (BRASIL, 2002, p. 03), isso significa também implícita uma formação do
professor reflexivo-pesquisador, em consonância ao III ponto do Art. 3º que se refere à
“pesquisa, com foco no processo de ensino e aprendizagem, uma vez que ensinar requer tanto
dispor de conhecimentos e mobilizá-los para a ação, como compreender o processo de
construção do conhecimento” (idem, p. 02).
O eixo central da proposta de diretrizes está na formação de profissionais
“técnicos”, centrada nas competências. Para tanto, é enfatizado o fazer
prático, ou seja, os professores devem ser formados para aprender somente
aquilo que é de utilidade imediata, capacitando-se em mobilizar
conhecimentos para transformá-los em ação (LACKS, 2004, p. 83).
Numa análise dos documentos da Resolução n. 01 e 02 de 2002 de formação de
professores na universidade, Lacks (2004, p. 248) ressalta, ainda, que as competências
“voltadas apenas para solução de questões práticas revelam-se como a expressão dos nexos
entre trabalho pedagógico e uma dada concepção de formação que tem na dicotomia teoria e
prática seu principal elemento”.
Mobilizar conhecimentos para a ação e compreender o processo de construção do
conhecimento, são predicados da pedagogia das competências e da pedagogia do professor
reflexivo-pesquisador, isto é, além das competências observa-se também fortemente a
pedagogia do professor reflexivo. Eidt (2009, p. 64-78), evidencia o quanto a pedagogia das
competências e a pedagogia do professor reflexivo fundamentam as diretrizes oficiais de
formação de professores de forma articulada, colocando uma contradição, qual seja:
Se na aparência, esta educação faz apologia à formação do pensamento
reflexivo como uma suposta forma de promoção do desenvolvimento do
pensamento humano, na essência, esta perspectiva teórica caminha na
contramão do desenvolvimento do pensamento abstrato, restringindo os
indivíduos da classe trabalhadora aos limites do pensamento empírico
(EIDT, 2009, p. 155).
Após a homologação dessas Diretrizes oficiais de formação de professores, e antes
mesmo da homologação das DCN do curso de Pedagogia, vários cursos de Pedagogia em
141
todo o país reformularam os currículos na perspectiva de adequá-los as imposições do CNE.
Isso aconteceu, principalmente, devido à urgência de uma definição para curso, o que
prejudicou a compreensão dos princípios para a formação de pedagogos. As Resoluções
CNE/CP n. 01 e 02/2002, supostamente, com seus fundamentos na pedagogia das
competências e na pedagogia do professor reflexivo determinaram a concepção de docência
que seria em 2006 atribuída como base para a formação de pedagogos.
Entretanto, a ANFOPE em documento publicado em setembro de 2004 reforça sua
defesa já pontuada desde a década de 1980, como vimos no item anterior: a organização
institucional e curricular dos Cursos de Formação dos Profissionais da Educação, tendo por
referência a base comum nacional de forma a superar as práticas curriculares que
tradicionalmente dicotomizam teoria x prática, pesquisa x ensino (ANFOPE, 2004, p. 02).
Para Saviani (2008, p. 650), a ANFOPE desenvolveu um combate às especializações,
porque eram vistas como tecnicistas; era divisão do trabalho no campo pedagógico. Portanto,
sua concepção vigente de base comum nacional não implicava a conjugação do professor e
especialista num mesmo curso no sentido deste se voltar para o modo de organização e
funcionamento da educação escolar. Como vimos, esta conjugação foi proposta por Saviani
em 1982 no texto publicado no caderno da ANDE.
Enquanto a ANFOPE combate as especializações e defende a docência como base
comum na formação, Libâneo (2004), e seu grupo em defesa do bacharelado em Pedagogia
lançam o Manifesto dos Educadores Brasileiros em busca da garantia da pesquisa; afirma que
a redução da formação de pedagogos à docência provoca um esvaziamento da teoria
pedagógica, acaba por descaracterizar o campo teórico-investigativo da Pedagogia quando
diminui o peso das disciplinas que identificam mais o exercício do profissional pedagogo,
incluída nas habilitações concernentes a real função do pedagogo.
[...] é o conhecido lema: a docência é a base de identidade profissional do
educador. Penso que essa afirmação incorre num equívoco lógico-conceitual.
A pedagogia é uma reflexão teórica a partir e sobre as práticas educativas.
Ela investiga os objetivos sociopolíticos e os meios organizativos e
metodológicos de viabilizar os processos formativos em contextos
socioculturais específicos. Todo educador sabe, hoje, que as práticas
educativas ocorrem em muitos lugares, em muitas instâncias formais, não-
formais, informais [...] Não é possível mais afirmar que o trabalho
pedagógico se reduz ao trabalho docente nas escolas (LIBANEO, 2004, p.
13-14).
142
Entretanto, não podemos deixar de constatar que “a escola na sociedade moderna se
converteu no espaço por excelência da educação” (SAVIANI, 2008, p. 647). É na educação
escolar onde estão sistematizados os conhecimentos socialmente elaborados e acumulados
pela humanidade, é o espaço onde os indivíduos têm acesso, ou pelo menos deveriam
(considerando o esvaziamento da educação escolar), a cultura em sua forma mais
desenvolvida cientificamente. Assim, Saviani (2008) explicita sua posição:
O docente é, assim, educador por excelência porque é aquele que atua na
instituição educativa para formar as novas gerações. Em conseqüência, a
escola passou a ser referência para as outras formas de educação, sendo
valorizada pela família, pela sociedade e, até mesmo, por aqueles que são
contra ela naquele sentido de ser formativa. Não há como barrar esse
movimento. Até os neoliberais, os assistencialistas, que tentam transformar a
escola num espaço de assistencialismo, não abrem mão da escola. Então, por
esse ângulo poderia se defender a docência como base comum do educador e
também perguntar qual é o educador que nós queremos formar. A meu ver
esse educador seria exatamente o pedagogo, entendido como o especialista
na organização dos processos educativos. E onde esses processos educativos
são organizados de forma mais sistemática? É nas escolas. Decorre desse
entendimento a posição que venho defendendo [...] Nessa perspectiva não
torna tão complicado pensar o curso de Pedagogia articulando a formação do
pedagogo, isto é, do especialista em educação, com a formação dos
professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino
Fundamental. Mas para isso eu teria que tomar como campo de referência a
escola. Tratar-se-ia, então, de formar o pedagogo ou especialista da educação
que tem o domínio da escola, isto é, da forma como a escola está constituída
com seu currículo em pleno funcionamento. Assim, o pedagogo, ao
dominar o modo como a escola funciona, estaria, sem dúvida,
capacitado tanto para ministrar o ensino, como para coordenar as
atividades didático-pedagógicas ou gerir o funcionamento da escola.
(SAVIANI, 2008, p. 647, grifos nossos).
Esta posição do autor prestada desde os anos 1980 nos demonstra grande
esclarecimento em relação à Pedagogia e ao campo de atuação do pedagogo que é a formação
do professor para atuação na Ed. Infantil e Séries Iniciais, pois se bem formado no sentido de
compreensão do funcionamento da educação escolar poderá também atuar em outras funções
na escola. Mas, diante as divergências teóricas e políticas, a primeira versão das Diretrizes do
curso de Pedagogia apresentada pelo CNE em 2005 restringia a formação no curso de
Pedagogia a uma licenciatura à semelhança do curso Normal Superior e criava a figura do
bacharelado para a formação dos especialistas, em atendimento ao Art. 64 da LDB,
desconsiderando todo o esforço das entidades e intelectuais referente à elaboração da proposta
143
e tomando o curso por um “nivelamento por baixo em face da ênfase numa formação
eminentemente prática” (RIBEIRO; DORNELAS, s/d, p. 06).
Diante o fato, foram várias as críticas ao projeto do CNE, as principais eram: 1) o CNE
desconhece e nega as diversas formas de atuação do pedagogo, ao impor diretrizes contrárias
às lutas e consensos no campo educacional; 2) o CNE desconsiderou todas as construções
adquiridas em debates e encontros ao longo dos anos em favor da consolidação dos cursos de
Pedagogia; 3) no projeto do CNE apresentava-se uma contradição entre a formação do
licenciado e o perfil desejado para a formação do pedagogo, um licenciado em habilitações
fragmentadas no Art. 2º e ao mesmo tempo um “super pedagogo” presente no Art. 3º; entre
outras críticas, a possibilidade de cursar duas habilitações, com o acréscimo de 800 horas às
2.800 do primeiro curso, na forma de estudo concomitantes ou subseqüentes, indicando uma
flexibilização curricular do agrado das instituições mercantis de ensino; de forma geral, estes
aspectos desvalorizavam a formação teórica para os licenciados indicando que a formação
para a docência não exigiria igual aprofundamento teórico em relação ao bacharelado
(RIBEIRO; DORNELAS, s/d).
Para a ANFOPE o projeto do CNE não rompe com as concepções que dicotomizam a
licenciatura e o bacharelado. Nesse sentido, a ANFOPE reafirma sua defesa em relação às
Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia em duas teses:
1) A base do curso de Pedagogia é a docência – o eixo de sua formação é o trabalho
pedagógico, escolar e não escolar, que tem na docência compreendida como ato
educativo intencional, o seu fundamento. A concepção de docência supõe: sólida
formação teórica e interdisciplinar sobre os fenômenos educacionais e seus
fundamentos históricos, políticos e sociais bem como domínio dos conteúdos;
unidade teoria e prática; gestão democrática como instrumento de luta pela
qualidade do projeto educativo; compromisso social do profissional da educação
com ênfase na concepção sócio-histórica do educador; trabalho coletivo e
interdisciplinar proporcionando a unidade do trabalho docente; incorporação da
concepção de formação continuada; e avaliação permanente dos processos de
formação;
2) O curso de Pedagogia é ao mesmo tempo uma licenciatura e um bacharelado -
“As diferentes ênfases do trabalho pedagógico (educação infantil, fundamental e
médio, jovens e adultos, trabalhadores, e assim por diante), assim como as tarefas de
organização e gestão dos espaços escolares e não escolares, de formulação de
políticas públicas, de planejamento, etc., constroem-se sobre uma base comum de
144
formação, que lhes confere sentido e organicidade: a ação docente. [...] esta forma
de conceber, que toma a ação docente como fundamento do trabalho pedagógico,
determina que os processos de formação dos profissionais da educação tenham
organicidade a partir de uma base comum – os processos educativos em sua
dimensão de totalidade sobre a qual dar-se-ão os recortes específicos, em termos de
aprofundamento” (ANFOPE apud FORUMDIR, 1998).
Em relação à base na docência e esta posição da ANFOPE, Saviani (2008), faz uma
observação importante:
A prática educativa é a base de formação do educador e essa prática foi
compreendida como docência. O problema é que nunca se conseguiu definir
exatamente do que se tratava. Docência se refere ao trabalho pedagógico que
se desenvolve na relação entre o professor e o aluno nas escolas, geralmente
nos espaço caracterizados como salas de aulas? Ou se estende a múltiplos
espaços de diferentes tipos? Isso abriu caminho para se entender a docência
de uma forma um tanto caótica. Parece-me que o caos presente nessa tese da
docência como base da formação do educador é a ideia de que a educação é
um processo multifacetado que consiste na docência, mas a docência está
ligada a um aspecto da visão majoritária, da educação formal, da educação
escolar. Então, desde o movimento da Escola Nova passando pelo
movimento da UNESCO, com a proposta da educação permanente, vem se
combatendo a concepção que liga a docência ao trabalho escolar, vista como
uma característica da pedagogia tradicional, da educação como transmissão
de conhecimento. Assim, pode se definir a docência como compatível a essa
visão na medida em que se considera docência como prática educativa
(SAVIANI, 2008, p. 646).
Dessa forma, podemos observar na definição de docência pela ANFOPE uma ampliação
do trabalho pedagógico, da docência para a educação não escolar, o que dá margens para uma
descaracterização da relação específica entre professor e aluno que se desenvolve no âmbito
da educação escolar. Como Saviani (2000) afirma abaixo, a cultura letrada, o saber
sistematizado está disponível na sociedade, porém, este saber necessita ser apropriado pelos
indivíduos de forma seqüenciada, sistemática, dosada e intencional, e é na escola que se
encontra este saber sistematizado sob esta forma, então, é na educação escolar que está a
especificidade da docência.
O saber sistematizado está disponível socialmente, mas, para ser assimilado
pelas crianças, ele precisa ser dosado e seqüenciado, isto é, organizado de
uma forma tal que se torne assimilável progressivamente pelos educandos
através do trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas. Esta é uma
145
característica inerente ao funcionamento das escolas e está, pois, presente em
todas as formas de organização escolar. Na sua realização prática, entretanto,
essa característica própria das escolas irá se manifestar de diferentes
maneiras, de forma mais ou menos consistente, trabalhada segundo
orientações metodológicas distintas conforme as corrente pedagógicas que
influenciam direta ou indiretamente, de modo orgânico ou difuso, a
organização escolar (SAVIANI, 2000, p. 05).
Descentralizar o trabalho pedagógico da educação escolar e ampliar para a educação
não escolar pode disseminar uma perspectiva de interpretação da não necessidade da escola já
que em outros âmbitos da sociedade estão outros processos educativos, e como a educação
escolar está sob o domínio do Estado somente a enxerga como reprodutora da sociedade
capitalista, ou quando levam para a escola o cotidiano, a educação não escolar traduzida em
temas ou questões da sociedade que a escola não é capaz de resolver. Portanto, percebe-se um
esvaziamento da educação escolar.
[...] hoje em dia, vivemos uma situação um tanto paradoxal, do ponto de
vista escolar. De um lado, a escola é secundarizada; afirma-se que não só
através dela que se educa; educa-se através de múltiplas formas, através de
outras instituições, como os partidos, os sindicatos, associações de bairro,
associações religiosas, através de relações informais, a convivência, dos
meios de comunicação de massa – isto é, do cinema, do rádio, da televisão.
Portanto, há múltiplas formas de educação, entre as quais se situa a escolar.
Segundo esta tendência, a escola não é a única e nem mesmo a principal
forma de educar; há, até mesmo, aqueles que consideram a escola negativa,
do ponto de vista educacional [...] De acordo com esta proposta, a escola não
apenas é desnecessária e prescindível, como até prejudicial. Portanto, o que
de melhor a sociedade pode fazer é se livrar das escolas; é um peso inútil.
Mais do que inútil, a escola é considerada nociva (SAVIANI, 2008c, p. 97)
Segundo Duarte (2005, p. 205), pensando a educação escolar dialeticamente é preciso
radicalizar nossa luta contra o brutal esvaziamento da educação escolar nos dia de hoje.
Entretanto, lutar com clareza dos limites e das possibilidades da educação escolar contribuir
para a transformação radical da sociedade capitalista, pois, não é possível superar plenamente
os problemas e limitações da educação oferecida pela sociedade capitalista sem transformar
esta mesma sociedade. Assim, a educação pode contribuir de forma indireta e mediata através
da valorização e apropriação dos conteúdos concretos pelos sujeitos práticos.
Contudo, as Diretrizes Curriculares Nacionais homologadas em maio de 2006 determina
a formação do pedagogo com base na docência, mas, que conceito de docência? Foi
preservada a docência sob sua forma clássica, essencial para o processo de socialização dos
146
conhecimentos científicos na relação específica professor-aluno? É o que procuraremos
discutir no próximo subitem, além de outras questões ambíguas na definição do curso de
Pedagogia.
4.3.2 Uma Análise das DCN do curso de Pedagogia: a Docência com Base na Pedagogia
do Professor Reflexivo-Pesquisador
As Diretrizes Curriculares Nacionais foram homologadas em 2006 pelo Ministério da
Educação, determinando a formação do Pedagogo com base na docência para o exercício na
Educação Infantil, nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio na
modalidade normal e em cursos de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar,
bem como em outras áreas na quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. No Art. 2º §
1º deixa implícito o conceito de docência assumida nas DCN:
Compreende-se a docência como ação educativa e processo pedagógico
metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e
produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da
Pedagogia, desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos científicos
e culturais, valores éticos e estéticos inerentes a processos de
aprendizagem, de socialização e de construção do conhecimento, no
âmbito do diálogo entre diferentes visões de mundo (BRASIL, 2006, p.
01, grifos nossos).
Podemos observar que o conceito de docência se define com base no atendimento das
demandas e das exigências das relações sociais, étnico-raciais e produtivas da sociedade
capitalista, estas relações que deveram organizar e estruturar a prática pedagógica; são estas
as relações que influenciaram os conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia; a
socialização e construção do conhecimento a partir dessas relações articulando o
científico e o cultural, portanto, não no sentido de suplantar essas relações que na
sociedade capitalistas são de dominação, portanto, alienadas e alienantes, mas de adequar
às demandas e exigências desta sociedade, propondo um diálogo entre diferentes visões de
mundo; ou seja, não se propõe apropriação do conhecimento científico na perspectiva da
elevação do nível de compreensão dessas relações para a superação, mas de um diálogo,
uma negociação entre visões diferentes as quais deverão sempre prevalecer aquela que
atende as requisições da sociedade regida pelo capital.
Além do mais, as Diretrizes nos artigos que definem o curso de Pedagogia com base na
docência não esclarecem com precisão os conceitos de Pedagogia e de docência, os quais
147
desconsideram a rica tradição da Pedagogia enquanto um campo teórico-prático da educação,
isto é, ciência da educação, reduzindo os estudos “teórico-práticos”, a mera investigação e
reflexão crítica ao planejamento, execução e avaliação das atividades educativas; a
aplicação ao campo da educação de contribuições de conhecimentos de outras ciências.
§2º O curso de Pedagogia, por meio de estudos teórico-práticos, investigação
e reflexão crítica, propiciará:
I - o planejamento, execução e avaliação de atividades educativas;
II - a aplicação ao campo da educação, de contribuições, entre outras, de
conhecimentos como o filosófico, o histórico, o antropológico, o ambiental-
ecológico, o psicológico, o lingüístico, o sociológico, o político, o
econômico, o cultural (BRASIL, 2006, p. 01).
O que fica evidente é uma predominância da técnica na formação do pedagogo
longe da apropriação dos conhecimentos científicos de forma conectada aos problemas e
necessidades educativas no sentido da superação; longe da apropriação dos resultados, dos
conhecimentos científicos objetivados de outras ciências que contribuem para o campo
educacional, com o objetivo de enriquecimento da prática e da teoria pedagógica, portanto,
das propostas pedagógicas concretas. O que as DCN propõem é uma construção subjetiva e
não generalizada de novos conhecimentos na prática de forma ajustada em relação tanto
aos princípios da interdisciplinaridade, das ciências entre si, quanto à pertinência e relevância
social, isto é, apenas os conhecimentos que sejam úteis de acordo com as exigências das
relações sociais que são estabelecidas pela sociedade capitalista.
Em relação à interdisciplinaridade, categoria escolanovista tão disseminada hoje no
campo educacional, vale ressaltar que Frigotto (2001) aborda a interdisciplinaridade como
necessidade e como problema na educação, na produção do conhecimento nas ciências
sociais: a necessidade do interdisciplinar funda-se no caráter dialético da realidade social que
implica compreensão das categorias totalidade concreta e objetividade, e o problema do
interdisciplinar reside no limite e na complexidade da realidade social, esta dificuldade é
potenciada pela forma alienada que o homem produz sua vida material.
Entretanto, o conceito em vigor de interdisciplinaridade nas DCN está voltado para
abordagens reducionistas do conhecimento e de ajustamento à realidade social sem pretensões
de conhecer esta realidade de forma radial e concreta. O conceito de interdisciplinaridade
implícita nas DCN está em concordância de seu entendimento como método de investigação
ou técnica didática. O interdisciplinar, considerando as demais ciências, porém, não os
resultados já elaborados, mas a construção contínua por cada sujeito das contribuições dessas
148
ciências permitindo a existência de uma diversidade metodológica aplicada a situações
específicas, não mais as generalizando. E isso se desenvolve através da pesquisa, a pesquisa
como eixo “articulador entre teoria e prática”.
Através da pesquisa se constrói o conhecimento teórico na e sobre a prática empírica
sem ultrapassar esta mesma prática, no sentido de um conhecimento subjetivo, não
generalizado, pessoal e a - histórico por desconsiderar a necessidade da apropriação dos
conhecimentos científicos já existentes para apreensão da prática de forma a se aproximar da
realidade concreta, ao tempo em que esta possa enriquecer o próprio conhecimento e
qualificar a prática.
Portanto, no II ponto do parágrafo único do Art. 3º ao propor para a formação do
licenciado em Pedagogia “a pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de investigação
de interesse da área educacional” (BRASIL, 2006, p. 01, grifos nossos), a concepção de
pesquisa está bastante conectada à pedagogia do professor reflexivo-pesquisador; ou seja, esta
concepção de docência foi a que complementou a imprecisão das diretrizes, determinando a
prática como o lócus da reflexão no campo pedagógico. Assim, a docência:
[...] assume contorno de “ação”, com viés pragmático, reforçado pela noção
de pesquisa assentada sobre a solução de problemas postos pela prática
pedagógica e à busca de resultados, tanto no que se refere aos escores a
serem alcançados pelos alunos, como pelos professores e instituições
escolares (EVANGELISTA; TRICHES, 2008, p. 13).
A docência que se refere ao ato de ensinar, socializar conhecimentos, na relação
específica professor-aluno na educação escolar, com a pedagogia do professor reflexivo passa
a caracteriza-se pela reflexão da prática que o docente desenvolve no âmbito escolar e não
escolar, no para além do escolar. Amplia-se a docência para o âmbito não escolar de
forma a descaracterizar o papel da docência, além disso, transformando o docente em
um pesquisador que reflete sobre sua prática, o professor como um suposto pesquisador.
A imprecisão conceitual que salta aos olhos é o entendimento de que
quaisquer atividades profissionais realizadas no campo da Educação, ligadas
à escola ou extra-escolares, são atividades docentes. Ou seja, o planejador da
educação, o especialista em avaliação, o animador cultural, o pesquisador, o
editor de livros, todos eles estariam nessas atividades exercendo docência
(são docentes). Em suma, é patente a confusão que o texto provoca ao não
diferenciar campos científicos, setores profissionais, áreas de atuação, ou
seja, uma mínima divisão técnica do trabalho necessária em qualquer âmbito
científico ou profissional sem o que a prática profissional pode tornar-se
inconsistente e sem qualidade. (LIBÂNEO, 2006, p. 222).
149
Embora Libâneo (2006) ressaltar tal imprecisão conceitual em relação às atividades
docentes, sua justificativa refere-se a não formação do professor no curso de Pedagogia, e sim
do especialista e pesquisador. Esta concepção de docência nas DCN está muito próxima da
defendida pela ANFOPE, ANPED, FORUMDIR e CEDES no documento de 2004 enviado ao
CNE, assim como a questão da gestão educacional como maneira de formar o licenciado e, ao
mesmo tempo, o bacharel em Pedagogia, mas, não restando dúvida de que o curso de
Pedagogia é uma licenciatura (EVANGELISTA; TRICHES, 2008, p. 07-09). Entretanto,
Saviani (2005c, p. 74) ressalta uma diferença fundamental entre a formação do cientista e a
formação do professor: enquanto o cientista está interessado em fazer avançar a ciência, o
professor está interessado em fazer progredir o aluno, sendo o conhecimento para ele como
um meio para o crescimento do aluno, ao passo que para o cientista o conhecimento é o fim.
Ressaltando, ainda, que:
Não deixa de ser curioso observar que o movimento pela reformulação dos
cursos de pedagogia e licenciatura, que desembocou na ANFOPE, se
constituiu em oposição às propostas apresentadas por Valnir Chagas, em
especial aquela traduzida no slogan “formar o especialista no professor”. No
entanto, esse movimento acabou por incorporar, de certo modo, esse slogan,
ao definir como eixo de sua concepção a docência como base da formação
dos profissionais da educação (SAVIANI, 2008a, p. 69).
Para Saviani (2008a, p. 65), as funções de gestão, planejamento, coordenação e
avaliação, tradicionalmente entendidas como próprias das especializações haviam sido
assimiladas à função docente, o que demonstra uma ambigüidade que se fazia presente
mesmo na primeira versão das DCN quando se havia excluído a formação dos chamados
especialistas em educação. Numa avaliação geral das DCN, Saviani (2008a) afirma:
Vê-se pelos termos em que se encontram vazados os textos do Parecer e da
Resolução, que eles se encontram impregnados do espírito dos chamados
novos paradigmas que vêm prevalecendo na cultura contemporânea, em
geral, e na educação, em articular. O resultado coloca-nos diante do seguinte
paradoxo: as Novas Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de
Pedagogia são, ao mesmo tempo, extremamente restritas e demasiadamente
extensivas muito restritas no essencial e assaz excessivas no acessório. São
restritas no que se refere ao essencial, isto é, àquilo que configura a
pedagogia como um campo teórico-prático dotado de um acúmulo de
conhecimentos e experiências resultantes de séculos de história. Mas são
extensivas no acessório, isto é, dilatam-se em múltiplas e reiterativas
referências à linguagem hoje em evidência, impregnada de expressões
150
como conhecimento ambiental-ecológico; pluralidade de visões de mundo;
interdisciplinaridade, contextualização, democratização; ética e sensibilidade
afetiva e estética; exclusões sociais, étnico-raciais, econômico, culturais,
religiosas, políticas; diversidade; diferença; gêneros; faixas geracionais;
escolhas sexuais, como se evidencia nos termos da Resolução (SAVIANI,
2008a, p. 67, grifos nossos).
Então, podemos identificar neste percurso e análise das DCN posições distintas que
ilustra a polêmica: enquanto a ANFOPE, como vimos, levantava bandeira contra as
especializações em defesa da base comum, da formação de pedagogos com base na docência,
sendo esta a concepção assumida pelo CNE; Libâneo; Franco e Pimenta (2007) afirmam que a
Resolução do CNE expressa uma concepção simplista, reducionista da Pedagogia quando
toma como base de formação a docência. E o Saviani que enfatiza ser necessária a formação
do pedagogo escolar contrária a concepção “decorrente de precária fundamentação teórica, de
imprecisões conceituais, de desconsideração dos vários âmbitos de atuação científica e
profissional do campo educacional (apud SAVIANI, 2008a, p. 69).
[...] não cabe identificar esse meu encaminhamento com a descaracterização
da especificidade da pedagogia ou com sua redução ao ensino escolar.
Igualmente, não cabe também equipará-lo à tentativa de inserir no curso de
pedagogia uma multiplicidade de funções, como de certo modo o fez a
Resolução que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais, o que
inviabiliza uma formação qualitativamente aceitável (SAVIANI, 2008a, p.
154).
Saviani (2008a) ao recuperar o debate da Pedagogia considerando sua história e
acúmulo teórico nos mostra uma posição diante este debate, faz-se necessário aceitar o
convite a inserção na fase clássica da educação, de acesso ao conhecimento científico,
tendo na formação de pedagogos o domínio sobre a realidade escolar e dos fundamentos
teórico-práticos elevando a pedagogia à condição de ciência da e para a prática
educativa. Para Saviani (2005c, p. 13), “o clássico não se confunde com o tradicional e
também não se opõe, necessariamente, ao moderno e muito menos ao atual. O clássico é
aquilo que se firmou como fundamental, como essencial”, em verdade, é o que resistiu aos
embates no tempo, é o que resistiu ao tempo.
Em suma, a formação de pedagogos com base na docência no atual contexto, a partir
das imprecisões teóricas e conceituais nas Diretrizes Curriculares Nacionais, é de uma
docência fundamentada na “teoria do professor reflexivo-pesquisador”, da epistemologia
da prática, a qual centra na mínima apropriação do conhecimento científico, na construção do
151
conhecimento com base no individualismo-subjetivista e na prática sem ultrapassar os limites
do campo empírico, ou seja, na prática desvinculada da teoria, na prática pela prática. O que
impede compreender o que é pedagogia de acordo com o seu objeto de estudo que á a práxis
educativa, ou seja, teoria e prática da educação no sentido da lógica dialética.
152
5. A TEORIA E PRÁTICA NA PROPOSTA DE FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS DA UNEB:
UMA ANÁLISE DOS COMPONENTES CURRICULARES PESQUISA E PRÁTICA
PEDAGÓGICA E PESQUISA E ESTÁGIO
Para este estudo, procuramos realizar uma análise da separação entre teoria e prática
gerada pela divisão social do trabalho e apropriação privada do conhecimento na sociedade
capitalista, bem como sua unidade específica na perspectiva marxista, no sentido de
radicalizar as investigações sobre a dicotomia teoria e prática na Pedagogia e na formação de
pedagogos, buscando a crítica e apontamentos superadores. A crítica dos pressupostos
hegemônicos escolanovistas, os quais elaboram e divulgam o conceito do “pensamento
reflexivo” com ênfase na experiência, isto é, na construção do conhecimento na prática
subjetiva, pessoal e a- histórica sem a necessidade de superar o pensamento empírico.
Dessa forma, considerando a problemática histórica da dicotomia entre teoria e prática
no curso de Pedagogia de acordo com o predomínio das ideias escolanovistas e de seu
desdobramento na pedagogia do professor reflexivo-pesquisador, pretendemos, neste capítulo,
analisar os fundamentos pedagógicos do projeto do curso de Pedagogia da UNEB com ênfase
nos componentes PPP e PE, buscando responder à questão problema deste trabalho: que
concepção de teoria e prática fundamenta a formação de pedagogos da UNEB e, em que
medida, esta concepção apresenta elementos para a análise e intervenção efetiva sobre a
prática educativa com vias a superação da histórica dicotomia entre teoria e prática?
Nesse sentido, optamos por um método de análise do Projeto Político Pedagógico; e
Planos de Ensino dos componentes - PPP e PE, de cinco Departamentos40
, entre os dez que
desenvolve o projeto de reformulação de 2008. O método de análise baseia-se na leitura dos
documentos referente à formação de pedagogos na UNEB, construindo quadros e buscando
nas categorias de conteúdo (concepção da formação de pedagogos e da relação teoria e
prática) comprovar nossa hipótese de que os fundamentos teóricos da orientação das DCN do
curso de Pedagogia são assimilados pela UNEB como uma real possibilidade de solução da
dicotomia teoria e prática. Assim, a proposta da UNEB distende a compreender a relação
teoria e prática como: de um lado, a construção do conhecimento na experiência empírica ou
mera descrição do fenômeno; de outro lado, devido ao objetivo interdisciplinar no sentido de
40
No total são doze Departamentos na UNEB que oferece o curso de Pedagogia. Entretanto, dez adotaram a
reformulação de 2008. Entre os dez Departamentos apenas cinco enviaram os planos de ensino dos Componentes
PPP e PE, foram os Departamentos de Irecê, Teixeira de Freitas, Senhor do Bonfim, Itaberaba e Barreiras, o que
corresponde 50% dos Departamentos, considerado o suficiente para as nossas análises.
153
utilizar as contribuições das disciplinas, direcionarem estas contribuições à mera aplicação,
isto é, justaposição da teoria na pesquisa e na prática pedagógica, sem estabelecer relação
desta com os reais problemas e necessidades educativas numa sociedade regida pelo capital,
sem analisar os limites e as possibilidades que esta sociedade estabelece.
No primeiro momento fizemos a leitura dos documentos (Projeto e Planos de Ensino).
No segundo momento buscamos construir quadros41
para a sistematização das informações
extraídas relativas aos objetivos, conteúdos, metodologias e referenciais mais utilizados nos
planos, além das concepções das categorias - formação de pedagogos e relação teoria e prática
no Projeto Político Pedagógico. Após a construção dos quadros iniciamos nossas análises no
sentido de apreender as contradições da formação de pedagogos no atual contexto da
sociedade capitalista.
5.1 A Teoria e Prática na Proposta do Curso de Pedagogia da UNEB: a Pesquisa como
Elemento Central na Formação do Licenciado em Pedagogia
O curso de Pedagogia na UNEB passou por inúmeras reformulações ao longo de suas
quase três décadas de existência. A última reformulação entre os anos 2007 e 2008 ocorreu
com base na Resolução CNE/CP n.1 de 2006, a qual homologou as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o curso de Pedagogia. É o Projeto Político Pedagógico e a Proposta Curricular
de 2008 os quais procuraremos analisar no sentido de identificar a concepção da formação do
pedagogo e da relação teoria e prática estabelecida nesta formação.
Para a elaboração do Projeto se constituiu uma comissão especial com professores de
três Departamentos junto aos seus colaboradores. A comissão foi formada através de uma
eleição no sentido de “dá forma às diferentes e contraditórias concepções teórico-
metodológicas do curso de Pedagogia de uma universidade multicampi” (UNEB, 2008, p. 07).
Assim, a elaboração se concretizou a partir das orientações e exigências nas legislações
pertinentes e dos encontros objetivando contemplar conhecimentos e habilidades básicas na
formação do pedagogo. Entre os anos de elaboração aconteceram eventos, alguns com a
presença da totalidade dos coordenadores do curso e outros com a comissão especial (MEMO
n. 201/UNEB, 2009).
Em conformidade com as DCN do curso de Pedagogia, o objetivo da elaboração do
Projeto Político Pedagógica da UNEB versou em:
41
Consultar os apêndices.
154
Proporcionar a construção de saberes pertinentes à formação do (a)
pedagogo (a), refletindo, de forma efetiva, sobre os debates contemporâneos
de perspectivas mais sensíveis como, por exemplo, a transdisciplinaridade, a
multireferencialidade, o multiculturalismo crítico, visto que o pedagogo,
enquanto profissional que lida com a diversidade e a diferença, deve
contemplar novas as possibilidades de reflexão e ação educativa que estão
sendo postas em discussão por estas referências elucidativas (UNEB, 2008,
p. 35).
A partir desse objetivo, foram estabelecidos os princípios norteadores para o currículo
de formação, tais como: 1) O trabalho pedagógico escolar como elemento educativo que
norteia o desenvolvimento da proposta curricular; 2) A prática da interdisciplinaridade
como elemento para o desenvolvimento de um trabalho que articule os conteúdos das diversas
áreas de estudo em torno de questões centrais e/ou que garanta a observância do princípio
definido; 3) A pesquisa como elemento constitutivo da formação para a práxis pedagógica; 4)
A indissociabilidade entre teoria e prática; e 5) Considerações/observância das
especificidades: tempo, espaço e interação entre os sujeitos (idem, p. 36).
Assim, são estabelecidos quatro eixos correspondentes aos quatro anos de graduação: 1)
Educação e abordagens sócio-culturais; 2) Abordagens político-pedagógicos; 3) Abordagens
pedagógicas contemporâneas; e 4) Pesquisa e Prática como elementos constitutivos da
formação do pedagogo. Dentro de cada eixo, as práticas da interdisciplinaridade42
articulam
os componentes PPP e PE às disciplinas das diferentes áreas.
Diante os princípios norteadores e os eixos a UNEB propõe a formação do pedagogo
“aliada ao contato empírico com o cotidiano escolar, de forma crítica, enfatizando a
complexidade, incerteza, provisoriedade, singularidade e diversidade dos fenômenos
educativos” (UNEB, 2008, p. 38, grifos nossos).
Pleiteia-se uma formação crítica e contextualizada através da busca,
entrecruzamento e construção de saberes de conseqüências pessoais,
acadêmicas, políticas, estéticas, éticas e sociais. Neste sentido, a pesquisa é
o meio pelo qual se configura o desenvolvimento profissional (pesquisa –
formação), a produção de conhecimentos (instauração de autorias) e a
socialização destes conhecimentos (idem, ibidem, grifos nossos).
Enfatiza, ainda, que a socialização e construção de conhecimento “nas diversas visões
de mundo aponta para a importância da formação do professor pesquisador, baseada na
prática interdisciplinar, fundamentada no trabalho coletivo e na articulação entre teoria e
prática (práxis)” (UNEB, 2008, p. 39, grifos nossos).
42
Consultar os anexos.
155
Nesse sentido, a concepção de Pedagogia e de formação do pedagogo no Projeto de
curso da UNEB se traduz na seguinte fala:
[...] Há, pois, um reconhecimento de que o acesso e a construção do
conhecimento, portanto da aprendizagem, se dá em múltiplos espaços que
articulem cada um ao seu modo e diferentemente formas inteligíveis de
conhecimentos produzidos. Esse sentido de aprendizagem leva-nos a
pensar esse fenômeno como nômades. [...] Ao reconhecermos os vários
espaços onde a aprendizagem significativa se dá acabamos atribuindo um
sentido mais ecologizante à aprendizagem e, mais especificamente,
reconhecemos o professor como sujeito do conhecimento. Esta
compreensão reconhece ainda que a aprendizagem significativa de fato,
se constrói, a partir de processos muito próprios do sujeito e a itinerância
do futuro pedagogo (a) é construída num movimento labiríntico sob as mais
diversas e híbridas formas (UNEB, 2008, p. 59-60).
E em relação aos saberes na e da formação do pedagogo, enfatizam que:
[...] a formação do pedagogo da UNEB para fins da realização da docência
na perspectiva de uma compreensão mais ampliada da sua profissão e
da sua ação como ato político, só efetivamente encontram bases para a sua
edificação se forem analisadas e percebidas ligadas a estes processos
múltiplos, num movimento de inter-relações e co-ocorrência. Portanto, são
múltiplos os saberes que compõem o repertório do professor. Saberes
advindos de diferentes espaços, linguagens e tempos e que numa dinâmica
relacional aponta para o caráter sincrônico desses saberes (UNEB, 2008, p.
61).
De acordo com as DCN, a concepção da formação do pedagogo professor-pesquisador
na UNEB é ampliada não somente no sentido de tornar o professor em um pesquisador, mas,
de ampliar a prática docente para o âmbito não escolar, compreendendo que a ação do
professor deve ultrapassar os muros da escola, descentralizando-a, ao tempo em que a
transforma em um ato político, “tornando o pedagógico mais político e o político mais
pedagógico” (UNEB, 2008, p. 65).
Diante a descrição do Projeto do curso de Pedagogia da UNEB, podemos observar uma
preocupação central, qual seja: a oposição da concepção iluminista de caráter fragmentário
das ciências na formação do pedagogo, propondo a interdisciplinaridade, a
multireferencialidade, o multiculturalismo crítico, o diálogo intersubjetivo, a ação pedagógica
crítica como um ato político e o contato empírico como inovação fundamental para a
formação do pedagogo professor pesquisador constante das suas práticas educativas escolares
e não escolares. Para a UNEB, estas categorias se caracterizam uma efetiva articulação entre
teoria e prática, articulação dos conhecimentos das ciências com a prática empírica a qual o
156
estudante tem contato desde os primeiros semestres da sua formação no sentido de
responder a esta realidade, portanto, considerando esta propositiva avançada.
Em concordância com § 2º das DCN, II ponto, o qual determina: “a aplicação ao campo
da educação, de contribuições, entre outras, de conhecimentos como o filosófico, o histórico,
o antropológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o lingüístico, o sociológico, o político,
o econômico, o cultural” (BRASIL, 2006), a formação do licenciado em pedagogia na UNEB
desde os primeiros semestres centra-se na formação do professor-pesquisador que irá aplicar
as contribuições das ciências humanas e sociais conforme a observação, experiência e
reflexão crítico-política da prática pedagógica no campo empírico. Como um cabedal de
conhecimentos diversificado tanto em relação às ciências quanto à visão de mundo, que serão
aplicados na realidade educativa empírica quando necessário, e isso através dos componentes
PPP e PE.
Nos primeiros semestres os componentes de Pesquisa e Prática Pedagógica dá ênfase ao
método e as coletas de dados da realidade educacional numa dimensão subjetiva. Os
estudantes, antes de emergir nas abstrações para apreender a realidade em sua concreticidade -
compreender o que é educação e suas problemáticas na atual sociedade capitalista - estão
sendo conduzidos ao “pensar reflexivo” no campo empírico articulando nos primeiros
semestre a construção intersubjetiva (individual ou coletiva) de contribuições das ciências
humanas e sociais de acordo com as necessidades de resolução dos problemas específicos em
determinada situação. Isto caracteriza uma mera aplicabilidade dos conhecimentos sem a
possibilidade de transcender ao concreto e objetivo, apreensão da realidade educativa em sua
totalidade43
.
Poderiam argumentar que a intenção dos componentes PPP nos quatro primeiros
semestres seria justamente para enfatizar o campo prático de atuação profissional e pesquisas
científicas no sentido de desenvolver o pedagógico, a prática pedagógica, o qual
historicamente sofreu desvalorização acadêmica e profissional. Entretanto, de início já deixam
de abordar a educação na perspectiva pedagógica, não compreendendo que as demais ciências
não têm como ponto de partida e chegada a prática educativa, ou seja, estas ciências partem
de métodos e conhecimentos próprios e específicos passando pela educação, mas com o
objetivo de fazer desenvolver elas mesmas. Isto é, na exposição da proposta da UNEB a
educação, nos primeiros semestres, é abordada sob as perspectivas das ciências humanas e
43
Estamos tomando como referência para a análise do Projeto do curso de Pedagogia da UNEB, uma proposta
do Dermeval Saviani publicada nos anos 1980, intitulado - Uma estratégia para a reformulação dos cursos de
Pedagogia e licenciatura: formar o especialista e o professor no educador. Ver texto nos anexos.
157
sociais. Este entendimento determina a Pedagogia como mero campo de aplicação de outras
ciências.
Saviani (2008a, p. 139) ressalta que as conhecidas ciências da educação são ciências já
constituídas com um objeto próprio, externo à educação, que podem considerar a educação
pelo aspecto de seu próprio objeto, portanto, diferente da ciência da educação – a Pedagogia -
que constituiria a educação em sua concreticidade e totalidade como estruturante da teoria.
No Projeto da UNEB (2008), tem a seguinte afirmação em relação ao primeiro eixo
correspondente aos dois primeiros semestre, ou seja, ao primeiro ano letivo referente aos
componentes PPP (I) e PPP (II):
O eixo aborda temas de caráter sociológico, artístico e cultural, com
privilégio para as manifestações de tradição regionalista em sua diversidade
de tipologias e linguagens. Enfoca, temas de relevância social para a
comunidade local e suas interfaces com o fenômeno educacional em sentido
mais lato, de modo teórico-prático, interdisciplinar, transversal e
contextualizado [...] (UNEB, 2008, p. 67).
Percebemos, nesta citação, que o fenômeno educativo fica em segundo plano, o
importante é fomentar temas de relevância social para a comunidade local e disso estabelecer
suas interfaces com o educacional. Então, o enfoque pedagógico não é priorizado, pois, o
objetivo se restringe a responder as manifestações sociais, artísticas e culturais de uma
determinada realidade, deixando a base educacional para segundo plano.
Evidentemente, as ciências da educação contribuem para a prática educativa, por isso,
faz-se necessário a apropriação dessas contribuições já existentes, mas não de forma
desconectada do objeto da Pedagogia que é a práxis educativa, isto é, a prática educativa
como ponto de partida e chegada. Não podemos apropriar de maneira somativa e aplicativa de
resultados de outras áreas sem clareza do problema educacional que se tem, e esta clareza
advinda não do contato empírico, mas das abstrações, das aproximações teóricas na realidade
educacional. Pois, “a Pedagogia seria o recurso que nos permitiria unificar as perspectivas e
eliminar a diversidade de abordagens; haveria, para lá e acima da diversidade, uma e mesma
abordagem: a abordagem pedagógica”, esta é a abordagem que caracteriza a unidade teoria e
prática da educação (SAVIANI, 2004, p. 55).
Assim, Saviani (2007, p. 03) adverte “que se toda pedagogia é teoria da educação, nem
toda teoria da educação é pedagogia. Na verdade o conceito de pedagogia se reporta a uma
teoria que se estrutura a partir e em função da prática educativa”, uma teoria que estabelece a
relação entre educação e sociedade, e que procurar intervir na prática educativa, esta prática
como ponto de partida e de chegada da teoria.
158
Os componentes PPP (III) e PPP (IV) no segundo ano letivo, de acordo com a ementa
no Projeto, têm como finalidade “a produção de um projeto de pesquisa em educação [...]
tendo em vista a produção do conhecimento científico” (UNEB, 2008, p. 88) e a realização do
mesmo “com estudo em campo voltado para a prática pedagógica em espaços escolares e não
escolares. Análise de dados e elaboração de artigo científico” (idem, p. 90).
Nos demais anos com os componentes PE (II) e (III), as disciplinas são essencialmente
pedagógicas, em sua maioria relacionada ao âmbito escolar, com a exceção do componente
Pesquisa e Estágio em Espaços não formais, embora algumas disciplinas oscilar entre o
escolar e o não escolar. O que percebemos é que o objetivo da UNEB com os componentes
PPP e PE, que está de acordo com as DCN, é formar o pedagogo professor-pesquisador com
uma postura crítico– reflexiva das práticas educativas escolares e não escolares, estabelecendo
uma suposta articulação entre teoria e prática.
A partir das Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia (Res.
CNE/CP 01/2006) o Curso assume como perspectiva teórico-metodológica
formar professores/as pesquisadores/as e reflexivos/as sobre suas
próprias práticas e sobre tantas outras que fazem parte da realidade
brasileira. [...] através da interlocução teórico-prática que possibilite o
diálogo reflexivo com a realidade contextual dos alunos e professores,
consolidando espaços de interação e socialização de saberes que
encaminhem à construção da identidade pessoal, profissional e cidadã do
futuro (a) pedagogo (a) (UNEB, 2008, p. 69, grifos nossos).
Assim, determina a pesquisa como atividade responsável pela produção de
conhecimento, compreensão ampla e consistente do fenômeno e da prática educativa,
compreensão do processo de construção do conhecimento do indivíduo inserido em seu
contexto social e cultural, capacidade de identificar problemas sócio-culturais e educacionais
bem como pela intervenção na realidade escolar (UNEB, 2008, p. 68). Destacando a pesquisa
e a prática como elementos fundamentais na formação que
Irá contribuir para que os sujeitos se percebam como potenciais
pesquisadores das diferentes práticas educacionais, possibilitando a interação
com as mesmas e buscando transformar a realidade excludente,
hierarquizada e silenciadora das pessoas e dos saberes divergentes (UNEB,
2008, p. 69).
Conforme as ementas, já no segundo ano letivo o estudante de pedagogia constrói e
executa um projeto de pesquisa, intervindo na realidade. Estas pesquisas são, normalmente,
subjetivas, e desenvolvidas em grupo ou individuais, como demonstra os planos de ensino dos
componentes PPP e PE, e devem orientar os temas dos projetos monográficos. Assim,
percebemos nos componentes uma intenção de contrariar as concepções essencialistas de
159
caráter metafísico e positivistas, no entanto, uma aproximação das concepções escolanovista
da pedagogia do professor reflexivo-pesquisador, a qual determina a construção subjetiva
do conhecimento a partir da experiência (observação, levantamento de dados etc.) na prática
empírica.
Como discutido no segundo capítulo, a teoria do professor reflexivo-pesquisador busca
eliminar as diferenças e hierarquia entre professor-escola e o professor-acadêmico, afirmando
o Zeichner (1998) que a pesquisa pode ser desenvolvida tanto pelo professor-escola quanto
pelo acadêmico, portanto, formando os futuros professores aptos para a pesquisa, por isso a
prática e pesquisa desde o início da formação. Pesquisa que não necessita está vinculada a
universidade, a um projeto sob a coordenação de um professor acadêmico, pois, a formação
do professor pesquisador busca dá voz aos professores na escola, assim, o ensino é
descentralizado do papel do professor, este que irá construir seus próprios conhecimentos
através da pesquisa na prática empírica.
Para a teoria do professor reflexivo na perspectiva do Zeichner (1997; 1998), dá voz aos
professores em suas práticas cotidianas implica uma atitude política, crítica, sócio-cultural e
ética que traduz a construção subjetiva do conhecimento respeitando a pluralidade. Assim,
Como ciência da educação a Pedagogia precisa passar da racionalidade
técnica à racionalidade prática, reflexiva, formativa e emancipatória. A
formação de pedagogo deve enfatizar o aspecto crítico-reflexivo, que
compreenda a complexa pluralidade do âmbito educacional, a necessidade
de mediar um processo de aprendizagem voltado para a formação integral de
um sujeito de pensamento fragmentado, acrítico, alienado das questões
políticas e socioculturais. Está claro que essa tarefa extrapola os muros
escolares (LIBANEO; PEREIRA, 2007, p. 512).
Entretanto, como também já discutido no primeiro capítulo, a apreensão da realidade se
dá em dupla dimensão, objetiva e subjetiva. A realidade é objetiva, independe do indivíduo,
mas, na construção do conhecimento sobre esta realidade objetiva o indivíduo relaciona suas
impressões subjetivas com os conhecimentos objetivos e históricos já produzidos socialmente.
Esta relação não se contrapõe uma sobre a outra, porém, depende das condições objetivas do
indivíduo e do quanto que o mesmo já tenha se apropriado dos conhecimentos científicos já
existentes, os quais permitem se aproximar da realidade objetiva.
Dessa forma, o conhecimento não é mero reflexo da realidade, o conhecimento
científico ou teórico tem uma relativa independência com a prática, pois o movimento do
pensamento não coincide com o movimento do real. Portanto, o conhecimento científico não
pode ser construído de forma imediata no ou com o contato da prática empírica, faz-se
160
necessário pensar sobre a realidade prática buscando aproximações teóricas sobre a mesma,
isto é, apropriação dos conhecimentos científicos já existentes sobre tal realidade.
Ao contrário dessa dupla dimensão, objetiva e subjetiva, a teoria do professor reflexivo-
pesquisador, a qual a proposta da UNEB de formação de pedagogos se aproxima bastante,
centra na dimensão subjetiva do conhecimento que é construído de forma imediata. E apesar
das categorias utilizadas como: o político, o crítico sócio-cultural, a dimensão ética,
transformação social etc., nos parece que sua concepção busca desenvolver uma perspectiva
praticista, pois considera a pesquisa sem a necessidade da transmissão e apropriação do
conhecimento, e sim a pesquisa para a construção do conhecimento por meio da atividade
prática do sujeito.
Apesar da UNEB se declarar na perspectiva da concepção de Paulo Freire, Fontana44
afirma que o pensamento de Freire no final da década de 1970 já abordava a reflexibilidade na
prática, o diálogo intersubjetivo e a ação coletiva e política. Assim, podemos estabelecer
aproximações entre a concepção do professor reflexivo-pesquisador do Zeichner (e do grupo
de Libâneo que, inclusive se fundamenta também em Freire) e a concepção pedagógica do
Paulo Freire45
, as quais abordam a importância da reflexão para a pesquisa e prática docente,
assim como o diálogo, a ação coletiva e política no sentido da intervenção na realidade.
Embora, indiscutivelmente, a pesquisa “tem sido base de legitimação da excelência
universitária, porém, consideramos que essa constatação não pode preterir que um dos
fundamentos da pesquisa é o ensino de qualidade” (MARTINS, 2008, p. 03).
Por tais razões inclusive, a dupla função do ensino superior não pode ser
dissociada. Se por um lado ele é via de formação profissional, implicando a
aprendizagem de um conjunto de conhecimentos e domínios metodológico-
técnicos é, também, via estruturante de recursos afetivo-cognitivos
imprescindíveis para que os educandos possam conhecer com o devido rigor,
cientificidade e criticidade não apenas as dimensões técnicas de seu futuro
exercício profissional como também as condições histórico-sociais nas quais
este exercício ocorrerá, dado que reafirma a importância da
indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão (MARTINS, 2008, p. 04).
44
Texto de Iolanda Fontana sem data de publicação – A prática de pesquisa: relação teoria e prática no curso de
Pedagogia, disponível: http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/trabalhos/GT08-2858--Int.pdf, acesso: Jan/2011. 45
Não é objeto deste estudo análises mais profundas a respeito do educador Paulo Freire. Mas, para saber mais
indico as seguintes teses de Doutorado em Educação: FÉLIX, Cláudio E. dos Santos – Relativismo e
escolanovismo na Licenciatura em Educação do Campo, cap. I - UFBA 2011; OLIVEIRA, Marcos Antônio – As
bases filosóficas e epistemológicas de alguns projetos de educação do campo: do pretendido marxismo à
aproximação ao ecletismo pós-moderno, capítulos IV e V - UFPR 2008; PAIVA, Vanilda no livro – Paulo Freire
e o nacionalismo desenvolvimentista (2000); e a tese de SOUZA, Marilsa Miranda – Imperialismo e educação do
campo: uma análise das políticas educacionais no Estado de Rondônia a partir de 1990, na UNESP-Araraquara
(2010). Além do livro do Dermeval Saviani – História das idéias pedagógicas (ver nos referenciais). Todos estes
trabalhos enfatizam a relação entre Paulo Freire e as concepções escolanovistas e pós-modenas da educação.
161
A autora afirma, ainda:
Pressupõe a formação superior como síntese de três grandes processos, quais
sejam: processos de transmissão e apropriação do saber historicamente
sistematizado, a pressupor o ensino; processos de construção do saber, a
pressupor a pesquisa e os processos de objetivação ou materialização
desses conhecimentos, a pressupor a intervenção sobre a realidade e que,
por sua vez, retornam numa dinâmica de retro-alimentação do ensino e da
pesquisa. Pelos processos de transmissão e apropriação do conhecimento
coloca-se o formando em relação com o produto da ciência, com as teorias e
tecnologias historicamente elaboradas. Nesses processos, o professor
desempenha o papel insubstituível de ensinar, conduzindo os alunos em
assimilações cada vez mais complexas do acervo científico-cultural e
metodológico-técnico necessários aos domínios da realidade da qual faz
parte como ser social, e sobre a qual irá intervir (MARTINS, 2008, p. 05).
Um ambiente de pesquisa faz parte do processo de formação do professor na
universidade, mas, não de forma dissociada da transmissão e apropriação do conhecimento
científico nem mesmo se pode tratar de pesquisas subjetivas e imediatas, pois, para que o
professor possa se objetivar através da intervenção sobre a realidade seja na atividade
profissional na escola ou na atividade acadêmica de pesquisa, se torna imprescindível a
apropriação do produto da ciência historicamente já elaborado.
Ensino e pesquisa como duas atividades fundamentais no processo de formação do
professor na universidade de modo interdependente, embora, sejam duas atividades com
especificidades que não pode desprezar uma em função da outra. Como Saviani afirma, “(...)
ninguém chega a ser pesquisador, a ser cientista, se ele não domina os conhecimentos já
existentes na área em que ele se propõe a ser investigador, a ser cientista” (apud MARTINS,
2008, p. 06). Assim, antes da pesquisa, vem eminentemente o ensino, isto é, a transmissão e
apropriação dos conhecimentos científicos pelos professores em formação inicial. No entanto,
[...] a Escola Nova acabou por dissolver a diferença entre pesquisa e ensino,
sem se dar conta de que assim fazendo, ao mesmo tempo em que o ensino
era empobrecido inviabilizava-se também a pesquisa. O ensino não é um
processo de pesquisa. Querer transformá-lo num processo de pesquisa é
artificializá-lo (SAVIANI, 2006, p. 46).
O autor enfatiza o quanto a ausência do ensino também empobrece a pesquisa. A Escola
Nova e seu desdobramento na pedagogia do professor reflexivo-investigador transforma o
ensino em pesquisa, o indivíduo aprende por meio da pesquisa na atividade prática de forma
subjetiva. Nesse sentido, a pesquisa se torna incursão no desconhecido, por isso, não pode
estar atrelada a esquemas rigidamente lógicos e preconcebidos, mesmo que o desconhecido
para o indivíduo seja já conhecido pela humanidade (idem, ibidem). Entretanto,
162
[...] primeiro, o desconhecido só se define por confronto com o conhecido,
isto é, se não se domina o já conhecido, não é possível detectar o ainda não
conhecido, a fim de incorporá-lo, mediante a pesquisa, ao domínio do já
conhecido. Aí, parece-me que esta é uma das grandes fraquezas dos métodos
novos. Sem o domínio do conhecido, não é possível incursionar no
desconhecido. [...] Em segundo lugar, o desconhecido não pode ser
definido em termos individuais, mas em termos sociais, isto é, trata-se
daquilo que a sociedade e, no limite, a humanidade em seu conjunto
desconhece. Só assim seria possível encontrar-se um critério aceitável para
distinguir as pesquisas relevantes das que não são, isto é, para se distinguir a
pesquisa da pseudopesquisa, da pesquisa de “mentirinha”, da pesquisa de
brincadeira, que, em boa parte, me parece, constitui o manancial dos
processos novos do ensino (SAVIANI, 2006, p. 47).
A universidade possui três dimensões, além do ensino e da pesquisa, a extensão. A
extensão seria a intervenção na realidade. No entanto, esta intervenção não pode ocorrer de
modo imediato, como método de resolução de problemas identificados na prática empírica.
Para que esta intervenção seja tanto qualitativa, no sentido de proporcionar o acesso ao que a
universidade produz e a transformação efetiva, quanto enriquecedora do conhecimento, faz-se
imperativo que a própria universidade tenha o compromisso da produção científica com um
rigoroso sistema lógico considerando os problemas e necessidades da humanidade em seu
conjunto, e não uma pseudoprodução científica em termos individuais - subjetivos para a
construção do conhecimento sem ultrapassar os limites do campo empírico.
Consideramos que o saber científico em sua máxima abrangência - as
formas mais elaboradas de conhecimento - devam ser exigências
nucleares em todas as ações pedagógicas, e deste ponto de vista, as
aprendizagens não podem estar circunscritas e subordinadas às ações
dos alunos a partir da realidade imediata, apreendida quer pela
pesquisa quer pela extensão. Se por um lado, o conhecimento não pode
ser identificado apenas como um recurso cognitivo para a resolução de
problemas concretos e imediatos apresentados pelo contexto, por outro,
a imersão, a captação da realidade por si mesma não assegura o seu real
conhecimento, dado que exige a construção da inteligibilidade sobre a
realidade captada, isto é, a realidade precisa ser conhecida e explicada. Apenas assim, pelas mediações filosóficas e teórico-práticas, é que a
percepção empírica da realidade pode estar a serviço de sua real
transformação. [...] É como possibilidade explicativa, como abstração
mediadora na análise do real, que o conhecimento sistematizado e sua
transmissão assumem a máxima relevância, possibilitando o estabelecimento
de relações causais inteligíveis entre os fenômenos. Esta afirmação recorda-
nos o ocorrido em dezembro de 2004, quando uma jovem estudante
moradora no interior da França, graças às suas aulas de geografia, foi capaz
de reconhecer alterações no mar precedentes ao fenômeno dos tsunamis,
alertando e salvando, por seu conhecimento, centenas de pessoas que como
ela estavam na praia. Com certeza, se a formação desta pessoa fosse
circunscrita ao seu entorno imediato tal feito teria poucas probabilidades de
ocorrência (MARTINS, 2008, p. 09).
163
Em síntese, a autora evidencia que a pesquisa das práticas educativas não pode ser
recurso cognitivo para a aprendizagem subjetiva ou resolução de problemas imediatos no
contexto. Além disso, a imersão na prática contextualizada não assegura o real conhecimento,
considerando que se faz necessário a apreensão dessa prática por meio das mediações
filosóficas e teóricas nas formas mais desenvolvidas.
5.2 Os Componentes Curriculares PPP e PE: a Prática como Foco da Pesquisa e a
Necessidade da Apropriação do Conhecimento na Formação do Pedagogo
[...] os processos formativos de docentes absorvam a dimensão experencial,
não mais separando teoria e prática, mas mergulhando, desde o início, o
aluno e o formador em situação de mediação dos confrontos da prática,
buscando a significação das teorias. Só assim será possível fazer o
exercício fundamental da Pedagogia: criar articulações cada vez mais
profundas entre a teoria e a realidade. Ou seja, fazer dialogar a lógica das
práticas com a lógica da formação. Essa é a grande tarefa que os cursos de
formação devem enfrentar (FRANCO, 2008, p. 123, grifos nossos).
Os componentes curriculares PPP e PE estão na proposta de formação do licenciado em
Pedagogia na UNEB desde a reformulação em 2004, como resultado das Resoluções CNE/CP
n. 1 e 2/2002. Entretanto, a configuração mais definida da formação do professor reflexivo-
pesquisador está na reformulação de 2008, pós-DCN. Estes componentes curriculares são
atribuídos na proposta do curso de Pedagogia da UNEB como possibilidades de uma efetiva
articulação entre teoria e prática com base na dimensão experencial a partir da prática desde o
início da formação, a prática como foco da pesquisa no sentido da construção do
conhecimento pelo sujeito. De acordo com a UNEB, este conhecimento se torna mais
significativo porque mais útil na resolução dos problemas no cotidiano desse profissional em
formação.
Esta perspectiva, como a própria autora acima enfatiza de forma coerente a concepção
deweyana, se expressa como superadora da dicotomia entre teoria e prática. Todavia, ao
contrário, a teoria no sentido imediato e utilitário para responder as demandas da realidade,
como forma de dialogar a lógica das práticas com a lógica da formação, estimulando desde o
início da formação do licenciado em Pedagogia estratégias de autoformação, corresponde a
uma perspectiva dicotomizante por não priorizar a transmissão e apropriação do
conhecimento como fundamental para o desenvolvimento seja da prática pedagógica, seja da
pesquisa, no sentido de qualificação do trabalho e enriquecimento da teoria.
164
Assim, percebemos nas análises dos Planos de Ensino dos componentes PPP e PE que o
importante para o profissional da educação em formação é o domínio dos métodos científicos
através do acumulo das experiências vividas para a investigação científica como atividade
prática desde o início do curso. Como Martins (2007, p. 20) afirma, percebemos nos
componentes o desenvolvimento “não apenas a cumulatividade das experiências, mas também
a capacidade do indivíduo para reelaborá-las e transferi-las para outras situações, integrando-
as no processo de autoconstrução”.
O que os componentes apresentam como uma perspectiva avançada para UNEB é o
processo de formação pela qual se constrói a identidade do pedagogo (professor-pesquisador)
de forma essencialmente interativa, numa relação entre a situação prática em que o indivíduo
se depara e a sua formação, ratificando a prioridade no cotidiano do contexto escolar e a
apologia ao saber experimental. Nesse sentido, busca-se a autoformação, como exposto
abaixo:
[...] professor-pesquisador da sua própria prática. Analisar criticamente e
buscar aprofundar esse entendimento de que o professor é autor e sujeito do
conhecimento [...] na perspectiva do fazer reflexivo para investigação social
da pesquisa em abordagem qualitativa nas diferentes do eixo de trabalho
para o semestre (UNEB, Pesquisa e Prática Pedagógica III, Plano I, 2008).
Dessa forma, as contribuições das demais disciplinas curriculares são construídas pelos
indivíduos neste processo de maneira que também seja considerada a relação interdisciplinar
no processo da atividade da prática de pesquisa, como forma de aplicar tais contribuições
nesta mesma atividade com a intervenção na realidade.
Então, os componentes PPP e PE buscam através de seus objetivos, metodologias e
conteúdos desenvolver na formação do licenciado em Pedagogia o investigador constante de
suas práticas educativas (escolar e não escolar): conhecer os métodos e as etapas de pesquisa
como inerente ao fazer educativo, a pesquisa da prática pedagógica como elemento da
resignificação profissional, desenvolvendo o entendimento de que o professor é autor e sujeito
do conhecimento e o fazer da prática e da pesquisa como instrumentos possíveis para a
apreensão e intervenção da realidade.
Mesmo os componentes de estágio PE (I, II e III) são compreendidos como ancoras para
a investigação, como momento ímpar para a efetivação da reflexão-ação-reflexão que irá
potencializar a atitude de investigador do professor, aquele que constrói sua formação
no processo do se autoproduzir através da sua atividade prática interventiva e
interativa. Nesse sentido, os elementos fundamentais correspondentes ao trabalho do
professor, enquanto aquele que no espaço escolar na relação professor-aluno socializa o saber
165
historicamente produzido tendo em vista a máxima humanização, elevação dos indivíduos,
está numa esfera secundária, porque o importante se baliza em “construir a consciência de
pesquisador a partir da pesquisa científica é compromisso da formação do professor. [...] a
experiência da pesquisa como atividade prática de ensaio através do projeto” (UNEB,
Pesquisa e Prática Pedagógica II, Plano II, 2008). Dessa forma, os planos de ensino dos
componentes PPP e PE evidenciam sua vertente pedagógica, podemos tomar como exemplo a
seguinte afirmação:
Por pensar o educando como sujeito de sua própria aprendizagem, o
construtor de seu próprio conhecimento, a disciplina dará ênfase ao
“aprender a aprender” ao “saber pensar crítico”, na tentativa de romper
dicotomias (UNEB, Pesquisa e Prática Pedagógica I, Plano I, 2008).
É claro que, como ressalta Martins (2007, p. 25), “a referida elevação não é tarefa
exclusiva da instituição escolar, porém, para sua efetivação a escola desempenha um papel
insubstituível”, uma vez que a escola representa o desenvolvimento da verdadeira consciência
por meio da apropriação dos conhecimentos de forma que os homens possam intervir na
realidade qualitativamente. Entretanto, a formação do professor reflexivo-pesquisador nos
componentes se expressa na descentralização do ensino, mais importante do que ensinar é
estimular o “aprender a aprender”. Estes esforços se “justificam pela necessidade de produzir
um tipo de conhecimento que esteja mais próximo do cotidiano do professor”, um
conhecimento subjetivo-pessoal e contextualizado (idem, p. 33). No entanto, ao contrário, “o
sujeito da práxis não prescinde de sua subjetividade, mas a transcende em direção à sua
objetividade, para integrar ao processo social de transformação da realidade” (idem, p. 53).
O futuro professor precisa se apropriar das objetivações, isto é, dos conhecimentos
historicamente acumulado, tendo como papel fundamental a seleção dentre tudo que os
homens já produziram o que essencial para o desenvolvimento da genericidade humana, e de
transmitir estes conhecimentos. Se isso não for priorizado a conseqüência é o esvaziamento, o
empobrecimento de seu trabalho e de si mesmo. Não podendo se objetivar em sua atividade,
pois como discutido no primeiro capítulo todo objetivar-se necessita da apropriação, sua
atividade de trabalho se torna cada vez mais alienada e alienante, e isso provoca conseqüência
trágica porque, diferentemente, “a alienação, por exemplo, do operário da indústria
automobilística não compromete a qualidade do automóvel que ele contribui para construir,
mas a alienação do trabalho do professor interfere decisivamente na qualidade de seu produto
de trabalho” (MARTINS, 2007, p. 05). Isso porque o produto do trabalho do professor é a
promoção da humanização dos homens através da transmissão da cultura humana nas formas
mais desenvolvidas.
166
Nesse sentido, a prática do professor não poderia ser foco de pesquisa científica e sim o
espaço de realização, de efetivação da promoção da humanização dos indivíduos, pois, como
Saviani (2005c) afirma, o objetivo do professor é fazer desenvolver o aluno, ao contrário do
pesquisador que tem como objetivo fazer avançar o conhecimento. Assim, a prática social
deveria ser entendida como ponto de partida e chegada no processo educativo escolar.
Baseando-se em Saviani, Marsiglia (2009) esclarece:
O ponto de partida da prática educativa: neste primeiro momento cabe ao
professor conhecer a realidade social dos educandos e nela reconhecer aquilo
que deve servir como ponto de partida do processo de ensino e
aprendizagem. No entanto, é relevante destacar que considerar a realidade do
aluno e utilizar seu conhecimento de senso comum como ponto de partida
não deve significar oferecer ao aluno tão somente aquilo que já está em seu
cotidiano. Ao contrário, o ponto de partida determina os problemas da
prática social que devem ser compreendidos em totalidade em busca de sua
superação e modificação (MARSIGLIA, 2009, p. 03).
Nesse momento da prática como ponto de partida o professor tem uma “síntese
precária” e a compreensão do aluno é de caráter sincrético, pois, o conhecimento e
experiências em relação à prática social são limitados. Entretanto, “do ponto de vista
pedagógico há uma diferença essencial que não pode ser perdida de vista: o professor, de um
lado, e seus alunos, de outro, encontram-se em níveis diferentes de compreensão
(conhecimento e experiência) da prática social” (SAVIANI, 2006, p. 70).
A compreensão é sintética porque implica certa articulação dos conhecimentos e
experiências que detém relativamente à prática social, porém, esta síntese é precária porque a
inserção de sua própria prática pedagógica como dimensão da prática social envolve uma
antecipação do que será possível fazer com os alunos, somente depois da realização,
efetivação da atividade é que o professor terá uma compreensão concreta da sua prática social.
Quando professor e aluno transcendem de uma compreensão limitada para uma compreensão
concreta da prática social, podemos dizer que a pratica social, antes ponto de partida, se torna
agora ponto de chegada, pois, há uma superação em relação ao conhecimento e experiência
anterior porque passou por uma alteração qualitativa. A “educação, portanto, não transforma
de modo direto e imediato e sim de modo indireto e mediato, isto é, agindo sobre os sujeitos
da prática” (SAVIANI, 2006, p. 70-73).
Portanto, a prática pedagógica tem como finalidade a elevação do nível de
consciência do aluno, do indivíduo que chega à escola com uma visão sincrética da
realidade, este mesmo indivíduo busca na escola o que fora dela não encontra, o
conhecimento elaborado e sistematizado que lhe permite pensar a sua prática de forma
167
consciente, este indivíduo não quer encontrar na escola o que já vivencia fora dela que é o seu
cotidiano, o que quer é entender este cotidiano que é determinado por relações sociais de
dominação, por isso, este indivíduo precisa mesmo é de entrar no mundo das abstrações, do
não-cotidiano, das objetivações para si, no mundo da ciência, para quando retornar a sua
prática cotidiana seja capaz de desenvolver uma prática transformadora.
A prática pedagógica teleologicamente se encarrega do desenvolvimento do ser humano
em sua totalidade, e isso tão-somente se torna possível quando o indivíduo singular se
apropria da riqueza que a humanidade já produziu, fazendo com que o indivíduo se torne cada
vez mais humanizado para poder intervir objetivamente se objetivando em sua prática
transformadora, podendo desenvolver sua individualidade para si criando necessidade de nível
cada vez mais superior.
[...] o processo educativo escolar, ao mediar a relação do indivíduo com as
objetivações para si, pode ser considerado um processo criador de
carecimentos. Quando o processo educativo escolar, na sociedade alienada,
se limita ao âmbito da genericidade em si, ele se reduz a satisfazer apenas
carecimentos dos quais o indivíduo se apropriou de forma determinada pela
existência alienada. Quando o processo educativo escolar eleva ao nível da
relação consciente com a generecidade, ele cria no indivíduo carecimentos
cuja satisfação gera novos carecimentos de nível superior (DUARTE, 2007,
p. 02).
Assim sendo, não faz sentido a afirmativa que hoje em dia se faz, quando se refere à
ciência, ao saber elaborado metodicamente como uma “ciência burguesa” e que, por isso,
nega esta ciência em defesa da supervalorização do conhecimento popular porque dá voz
àqueles que não se apropriaram da cultura erudita, isso dicotomiza o popular e o erudito. Mas,
“o que hoje é denominado „saber burguês‟ é um saber do qual a burguesia se apropriou e
colocou a serviço de seus interesses” (SAVIANI, 2008c, p. 79), portanto, o conhecimento é o
patrimônio da humanidade que a burguesia se apropriou de forma a privar esta apropriação
impedindo que a classe social desfavorecida aproprie desse patrimônio.
[...] a constatação da existência da alienação da ciência e do ensino da
ciência não pode assumir uma unilateralidade tal que nos impeça de
refletirmos sobre o papel humanizador que o ensino da ciência pode e deve
ter na formação dos indivíduos (DUARTE, 2007, p. 07).
Então, o que interessa na formação do licenciado em pedagogia ou do educador de
modo geral é a necessidade de apropriação do conhecimento científico referente à educação
como um processo amplo e, especificamente, à prática pedagógica escolar, por que o
168
professor deverá interessar-se em articular a escola com as necessidades da classe
trabalhadora, empenhando-se em pôr em ação métodos de ensino eficazes (SAVIANI, 2008a,
p. 129). A apropriação do conhecimento deveria ser prioridade na formação do educador.
[...] ao centrar o foco do processo formativo na unidade escolar, aquilo de
que se trata é capacitar o futuro pedagogo ao pleno domínio do
funcionamento da escola. [...] Esta centralização no funcionamento da
escola não deve ser interpretada, porém, como coincidindo com a
iniciativa de colocar os alunos, desde o início do curso, em contato direto
com as escolas, para as vivenciarem, para se familiarizarem com elas.
Ao contrário. Quando os alunos ingressam no curso de pedagogia, eles
vêm de uma experiência de, no mínimo, 11 anos de escola. Portanto, eles
estão mais do que familiarizados com ela. Nesse momento, parece mesmo
recomendável que eles se distanciem da escola básica; vivam intensamente o
clima da universidade; mergulhem nos estudos dos clássicos da pedagogia e
dos fundamentos filosóficos e científicos da educação. Com esse preparo,
estarão municiando-se de ferramentas teóricas que lhe permitirão analisar o
funcionamento das escolas de educação infantil e de ensino fundamental,
para além do senso comum propiciado por suas experiências imediatas
vivenciada por longos anos no interior a instituição escolar. A partir daí eles
poderão voltar-se para a escola elementar, observando-a, porém, com outros
olhos. Poderão, então, analisar a prática educativa guiados pela teoria
pedagógica, ultrapassando, assim, o nível da doxa (o saber opinativo) e
atingindo o nível da episteme (o saber metodicamente organizado e
teoricamente fundamentado). Fica claro, também, que não cabe
identificar esse meu encaminhamento com a descaracterização da
especificidade da pedagogia ou com sua redução ao ensino escolar.
Igualmente, não cabe também equipará-lo à tentativa de inserir no
curso de pedagogia uma multiplicidade de funções, como de certo o fez a
Resolução que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais, o que
inviabiliza uma formação qualitativamente aceitável (SAVIANI, 2008a, p.
153-154).
Como Saviani expõe: a justificativa de que se faz necessário o contato dos alunos com
prática pedagógica desde o início do curso para que os mesmos possam se familiarizar ou
identificar contradições no sentido de buscar resoluções sob o argumento de que sempre se
teve muita teoria e pouca prática, não é aceitável. Pois, o aluno neste momento não possui
uma compreensão concreta da realidade educativa, porque não é possível apreendê-la em suas
múltiplas determinações por meio das inúmeras aproximações teóricas sobre esta realidade de
forma direta e imediata. É necessário tempo suficiente para a maturação do conhecimento,
porque como já discutimos anteriormente, o movimento do pensamento não se identifica com
o movimento do real, do histórico. Além disso, ao contrário, sempre se teve pouca teoria na
formação do educador; é de conhecimento teórico – científico que estamos necessitando para
qualificar a prática pedagógica em sala de aula.
169
Assim, Saviani (2008b, p. 644) insiste que “o curso de Pedagogia deveria ser um
ambiente rico, intenso e exigente de estímulo intelectual, que retornasse os clássicos,
acolhesse os jovens e os colocasse em processo de formação”, para que o estudante de
pedagogia tenha clareza do modo de organização e funcionamento da educação escolar, dessa
forma, estaria preparado para atuar qualitativamente em sua prática.
170
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
ARTICULADAS ÀS CONTRIBUIÇÕES SUPERADORAS DA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA
Para o conhecimento da situação, nós contamos
hoje com um instrumento valioso: a Ciência. O
educador não pode dispensar-se desse instrumento,
sob o risco de se tornar impotente diante da
situação com que se defronta... A partir do
conhecimento adequado da realidade é possível agir
sobre ela adequadamente.
Dermeval Saviani (2004, p. 59)
Começamos as considerações referentes a esta pesquisa com a citação acima do Saviani,
a qual nos faz avançar na compreensão do que foi discutido no decorrer deste estudo sobre a
relação entre teoria e prática como atividades distintas, porém recíprocas. A teoria em face da
realidade objetiva mantém uma atitude de propiciar a verdade científica, transformando a
teoria em manifestação, como plano de ação do homem sobre esta realidade. Assim, quanto
“mais próximo estiver do conhecimento científico, tanto mais rápido e plenamente se realizará
na atividade dos homens [...] Mas para a realização prática, o conhecimento deve, em sua
evolução, atingir determinado grau de maturidade” (KOPNIN, 1978, p. 309).
Nesse sentido, o educador necessita em sua formação se apropriar do conhecimento
científico acumulado historicamente e produzido coletivamente pelos homens, pois, os
conhecimentos científicos são os resultados mais elaborados da experiência humana e são
imprescindíveis para a apreensão da realidade objetiva no sentido do agir adequadamente.
Entretanto, percebemos que a formação do professor pesquisador sob a égide do “pensamento
reflexivo” não busca o desenvolvimento do grau de maturidade científica para a ação prática
na realidade, determinando a relação teoria e prática como atividades concomitantes e que,
portanto, identificando-as uma exclui a outra.
Como foi possível constatar a formulação do “pensamento reflexivo” se desenvolve
com hegemonia desde o início do século XX traduzida na concepção de Dewey, em seguida,
na concepção construtivista de Piaget e, no atual contexto, nas concepções de diversos autores
que buscam sob estas matrizes conceituais desdobrar o “pensamento reflexivo” na formação
de professores. Pudemos constatar também que desde o início do século XX e, mais
fortemente na metade do século XX, esta concepção hegemônica foi decisiva na redefinição
da pedagogia como ciência da educação. Passando a pedagogia de uma ciência unitária para
171
uma ciência plural e bastante articulada às demais ciências humanas e sociais as quais
discutem sobre educação, de tal forma que a identidade da pedagogia tornou-se um problema
ainda hoje muito discutido, no que se refere à ausência de produção de conhecimentos no
campo da prática pedagógica, já que as conhecidas “ciências da educação” dominaram este
espaço, determinando a Pedagogia como mero campo de aplicação das suas contribuições.
Dessa forma, entendemos que este problema da identidade do pedagogo decorre da
preeminência de uma determinada pedagogia, qual seja, a pedagogia nova. A pedagogia nova,
representada nas ideias de Dewey, pronunciou sua concepção de pedagogia e formação de
pedagogos sob uma lógica formal a qual reproduziu, de modo contundente, a separação da
teoria e prática, embora se colocar numa perspectiva de superação de tal problema. Como
vimos, a lógica formal denomina o pensamento e o real como idêntico, desconsiderando o
movimento de independência relativa entre ambos, o que determina a teoria e prática de
maneira concomitante, excluído dessa forma uma em função da outra, pois, neste caso, a
apreensão da prática se torna imediata e direta.
Na “teoria do professor reflexivo-pesquisador”, que é desdobramento da concepção
escolanovista, a Pedagogia passa a ser entendida não apenas como campo de aplicação das
contribuições das demais ciências, mas, também, como um campo prático no qual se constrói
os conhecimentos com ênfase na experiência sem a necessidade de ultrapassar os limites do
campo empírico, agora valorizando o interdisciplinar e a pluralidade de visões e métodos.
Portanto, apesar de se justificar na formação de professores como uma inovação por
considerar a prática como o principal referencial na produção do conhecimento de forma a
superar a dicotomia entre teoria e prática, entendemos que, ao contrário, não supera. Isso
porque a apropriação do conhecimento já existente e historicamente acumulado é
secundarizado, o que torna a prática esvaziada de conteúdo.
Diante estas discussões de acordo com as filiações teóricas identificamos quatro
propostas de formação do pedagogo no Brasil: 1) a da ANFOPE na defesa da base comum
nacional, na ampliação do trabalho pedagógico para o âmbito não escolar e a integração numa
mesma formação do bacharelado e licenciado, 2) a do grupo de Libânio composto por Garrido
e Franco, os quais defendem a formação do pedagogo pesquisador com base na “teoria do
professor reflexivo-pesquisador” e em favor das especializações como forma de não reduzir a
formação do pedagogo a docência, 3) a do Saviani em defesa da formação do professor e
especialista de forma conjugada no educador, dando ênfase a pedagogia escolar e a
necessidade de apropriação do conhecimento científico, e, por fim, 4) a proposta do CNE
homologada em 2006, a qual atende as posições da ANFOPE determinando a docência como
172
base da formação, ao mesmo tempo em que amplia a função docente para a educação não
escolar, e também a posição do Libânio, Garrido e Franco, se fundamentando na pedagogia do
professor reflexivo-pesquisador. Identificamos, também, que a proposta da UNEB de
formação de pedagogos se fundamenta na pedagogia do professor reflexivo-pesquisador.
A partir disso, pudemos confirmar nossas hipóteses em relação ao curso de Pedagogia
da UNEB: os fundamentos teóricos da orientação das DCN do curso de Pedagogia são
assimilados pela UNEB como uma real possibilidade de solução da dicotomia teoria e prática.
Assim, a proposta da UNEB compreende a relação teoria e prática através dos componentes
PPP e PE como: de um lado, a construção do conhecimento na experiência empírica ou mera
descrição do fenômeno; de outro lado, como mera aplicação da teoria na prática, isso devido a
questão da interdisciplinaridade no sentido de utilizar as contribuições das ciências humanas e
sociais. Seria uma justaposição da teoria na pesquisa e na prática pedagógica, sem buscar
compreender os reais problemas e necessidades educativas na sociedade capitalista, sem
analisar os limites e as possibilidades que esta sociedade estabelece. Portanto, uma formação
para a adaptação de forma a responder às demandas dessa sociedade.
Deste modo, no decorrer dos estudos verificamos que: 1) a pedagogia do professor
reflexivo-pesquisador não aponta para o conhecimento da situação prática de forma objetiva e
concreta por secundarizar a fundamental apropriação do conhecimento científico
historicamente acumulado, determinando, assim, um conhecimento da prática de forma
imediata, subjetiva e a-histórica sem ultrapassar o empírico; 2) a pedagogia do professor
reflexivo-pesquisador busca a diversificação teórica e metodológica não considerando o
suficiente os métodos padronizados, assim, cada indivíduo deve construir suas próprias
teorias e metodologias; 3) os componentes PPP e PE na proposta da UNEB se tornam os
meios de construção dos conhecimentos e métodos próprios na perspectiva do professor
reflexivo-pesquisador; portanto, fica evidente 4) a descentralização do ensino, por considerar
o ensinar um status inferior em relação à pesquisa; 5) ampliação do trabalho docente para o
âmbito não escolar; 5) a não priorização da apropriação do conhecimento científico; e, por
fim, concluímos que 6) o contato com a prática desde o início do curso não garante
aprofundamento e sólida formação teórica ou identificação e enfrentamento das contradições,
pois a prática pode se restringir ao método de resolução de problemas, ou seja, ao imediato e,
portanto, dicotomizando, ainda mais, a teoria e prática.
Entretanto, a característica marcante da Pedagogia em sua trajetória histórica é a relação
teoria e prática, pois, a Pedagogia é a ciência da educação, a teoria da prática educativa.
Portanto, seu objeto de estudo é a práxis educativa. A Pedagogia possui uma rica tradição
173
teórica, e ao longo da história foi se constituindo em um campo de estudos sobre os processos
educativos, a prática educativa na medida em que o homem busca compreendê-la e intervir
nela de forma intencional.
Ao longo da história da chamada civilização ocidental a pedagogia foi se
firmando como correlato da educação, entendida como o modo de apreender
ou de instituir o processo educativo. Efetivamente, a educação aparece como
uma realidade irredutível nas sociedades humanas. Sua origem se confunde
com as origens do próprio homem. Na medida em que o homem se empenha
em compreendê-la e busca intervir nela de maneira intencional, vai se
constituindo um saber específico que, desde a Paideia grega, passando por
Roma e pela Idade Média chega aos tempos modernos fortemente associado
ao termo pedagogia. [...] Ao longo de vários séculos a pedagogia construiu
uma rica tradição teórica e científica sobre a prática educativa que deve
continuar a ser desenvolvida, a despeito e até mesmo por causa das inúmeras
negativas de que foi alvo na história do pensamento humano (SAVIANI,
2007, p. 02).
E no sentido de solucionar o dilema da dicotomia entre teoria e prática na Pedagogia em
face ao predomínio das pedagogias burguesas, a pedagogia histórico-crítica interessada em
articular a escola com as necessidades da classe trabalhadora, situa-se na busca pela
articulação teórica - prática, determinando o trabalho pedagógico como um processo de
mediação que permite a passagem do aluno de uma inserção acrítica, prática, cotidiana e
empírica para uma inserção crítica, teórica, não-cotidiana e concreta, isso através do acesso ao
saber elaborado científico nas suas formas mais avançadas, pois somente com posse dos
instrumentos práticos e teóricos será possível a sua inserção numa luta política mais ampla.
Sendo a prática pedagógica o alvo, o fundamento e a finalidade da teoria (SAVIANI, 2008a).
Assim, Saviani (2005c) define o que é Pedagogia:
A pedagogia é o processo através do qual o homem se torna plenamente
humano. No meu discurso, distingui entre pedagogia geral, que envolve essa
noção de cultura como tudo que o que o homem produz, tudo que o homem
constrói, e a pedagogia escolar, ligada à questão do saber sistematizado, do
saber elaborado, do saber metódico. A escola tem o papel de possibilitar o
acesso das novas gerações ao mundo do saber sistematizado, do saber
metódico, científico. Ela necessita organizar processos, descobrir formas
adequadas a essa finalidade. Esta é a questão central da pedagogia escolar.
Os conteúdos não representam a questão central da pedagogia46
, porque se
46
A Pedagogia centra-se no como fazer para que os alunos se apropriem dos conteúdos, tendo como
preocupação a forma. A Escola Nova colocou na forma um valor em si mesmo, desprovido de sentido, tanto que
tornou a forma um processo vazio, sem conteúdo. Na pedagogia histórico – crítica, os meios tem muito valor,
pois não existe forma sem conteúdo, mas o conteúdo por si mesmo não caracteriza a forma, é necessário se
174
produzem a partir das relações sociais e se sistematizam com autonomia em
relação à escola (SAVIANI, 2005c, p. 75).
A partir disso, Saviani (2005c, p. 77) descreve a diferença entre a produção e a
elaboração do saber: elaboração do saber não é sinônimo de produção do saber, a produção do
saber é social, ocorre no interior das relações sociais, a elaboração do saber implica expressar
de forma elaborada o saber que surge na prática social, é neste sentido que a escola se torna
fundamental no processo de socialização do saber elaborado, científico. Então, a pedagogia
escolar estaria lidando com este saber elaborado, e sua finalidade consiste em organizar
processos, descobrir formas adequadas que possibilite o acesso, a socialização desse saber
elaborado, metódico, científico.
A produção do saber é histórica, portanto não é obra de cada geração
independente das demais. O problema da pedagogia é justamente permitir
que as novas gerações se apropriem, sem necessidade de refazer o processo,
do patrimônio da humanidade, isto é, daqueles elementos que a humanidade
já produziu e elaborou. Não podemos fazer com que cada criança volte à
Idade da Pedra Lascada para poder depois atingir, na idade adulta, o domínio
do saber científico, tal como é formulado em nossa época (SAVIANI, 2005c,
p. 78).
Diante a importância do saber elaborado e do acesso a este saber na escola, a pedagogia
poderia ter como campo de atuação prática em sua definição a pedagogia escolar, pois “o
nível de consciência dos trabalhadores aproxima-se de uma forma elaborada à medida que
eles dominam os instrumentos de elaboração do saber [...] a consciência de classe passa pela
questão do domínio do saber” (idem, ibidem). A prioridade nos conteúdos, mas, sem perder
de vista que a questão pedagógica é a questão das formas, porém, nunca podem ser
consideradas em si, na perspectiva da lógica formal, abstrata, trata-se das formas em concreto
pelas vias dos conteúdos (SAVIANI, 2005c, p. 145).
A partir dessa compreensão da apropriação da ciência por meio da educação escolar que
se faz necessário à formação do Pedagogo na perspectiva da pedagogia escolar, pois, o papel
do pedagogo se concentraria nas formas mais adequadas de possibilitar a apropriação do saber
elaborado e científico pelos seres humanos. Embora o objeto de estudo da Pedagogia seja a
práxis educativa que se refere à educação em sua amplitude, é urgente no atual contexto de
negação das formas clássicas da educação escolar se pensar a formação do pedagogo no
apropriar do conteúdo e da forma, pois, o conteúdo é decisivo e a forma garante, dependentemente, o grau de
aprofundamento e domínio do conteúdo. Forma esta relacionada à aprendizagem de algum conteúdo, por
exemplo: a fôrma sem o pão (conteúdo) é uma fôrma vazia.
175
sentido de formar o educador preparado para atuar no âmbito da educação escolar. Com isso,
“capacitariam a atuar nas escolas e nos diversos níveis dos sistemas de ensino como
orientadores e/ou coordenadores pedagógicos, diretores, supervisores e também como
professores” (SAVIANI, 2008a, p. 159).
O pedagogo no âmbito da educação escolar teria o papel de dominar “sistemática e
intencionalmente as formas de organização do processo de formação cultural que se dá no
interior das escolas”, no sentido de possibilitar o acesso à cultura erudita, a apropriação do
conhecimento científico pelas novas gerações (SAVIANI, 1985, p. 28). Dessa forma, na
formação do pedagogo a base deveria ser a educação, geral e nacional, o ponto de partida de
sua formação deveria ser a própria educação em seu sentido amplo e específico da educação
escolar, pois, o que necessitamos é de uma formação teórico-científica.
Nesse sentido, a pedagogia histórico-crítica afirma que, ao invés de se formar os
“especialistas” no curso de Pedagogia em determinada habilitação restrita, aquilo de que
realmente estamos necessitando é de educadores com uma sólida fundamentação teórica
desenvolvida a partir e em função das exigências da ação educativa nas condições brasileiras,
capaz de enfrentar os desafios, inclusive esta formação é tarefa urgente acometida aos cursos
superiores de educação, sejam eles denominados de Pedagogia ou não (SAVIANI, 2004, p.
61).
Ao contrário da pedagogia do professor reflexivo-pesquisador a qual propõe o
desenvolvimento da pesquisa na formação inicial do professor de forma subjetiva, a-histórica
e imediata; Saviani (2008a, p. 160-161) afirma que para elevar a pedagogia à condição de
ciência da e para a prática educativa, faz-se necessário que a educação seja o eixo central na
universidade (ver a proposta nos anexos), acolhendo os jovens interessados em se tornar
educadores e colocá-los num ambiente de intenso e exigente estímulo intelectual, articulando
os fundamentos teóricos e práticos da educação com a pesquisa propiciada pela inserção dos
alunos nos projetos desenvolvidos pelos professores, mediantes programas de iniciação
científica, prosseguiria, assim, nos cursos de especializações articulados com o mestrado,
onde se daria sua plena iniciação nas lides da pesquisa, contemplando-se no doutorado.
Assim, esta sólida formação teórica não se dá na identificação imediata do movimento
do pensamento com o movimento histórico caracterizando-se numa perspectiva da lógica
formal, pois, na relação teoria e prática acaba por excluir uma em função da outra, neste caso,
a prática é supervalorizada em detrimento do conhecimento teórico. Portanto, a relação entre
teoria e prática tem que ter presente o entendimento da lógica dialética, que é a lógica dos
conteúdos e que passa pelo formal indo além; teoria e prática são aspectos distintos e
176
fundamentais da experiência humana, mas, ainda que distintos são inseparáveis, definindo-se
e caracterizando-se sempre um em relação ao outro. Assim, a prática é a razão de ser da
teoria, o que significa que a teoria só se constituiu e se desenvolveu em função da prática que
opera, ao mesmo tempo, como seu fundamento, finalidade e critério de verdade. A teoria
depende, pois, radicalmente da prática (SAVIANI, 2007, p. 07). Mas, para concretizar a
relação teoria e prática faz-se imprescindível a apropriação do conhecimento científico já
elaborado e historicamente acumulado.
No entanto, vale ressaltar em termos conclusivos que a separação entre teoria e prática
foi gerada pela divisão social do trabalho na sociedade capitalista e apropriação privada dos
meios de produção pela burguesia, assim sendo, a dicotomia entre teoria e prática é a base
sobre a qual se organiza o próprio sistema econômico vigente que propõe uma desigual
formação para as diferentes classes sociais (KUENZER, 2007). Então, se na aparência esta
perspectiva do profissional reflexivo e/ou pesquisador faz apologia a uma suposta formação
teórica e prática, na essência esta perspectiva faz reproduzir as bases do sistema capitalista.
177
REFERENCIAL:
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187
APÊNDICE
188
QUADRO 1
PESQUISA E
PRÁTICA
PEDAGÓGICA
(I)
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Compreender a função
da educação nas
formações sociais
contemporâneas;
b) Identificar as
contribuições da
educação para a
sociedade;
c) Analisar a contribuição
da ciência na
construção do
conhecimento;
d) Compreender a
organização das
atividades acadêmicas,
assim como a
realização das leituras
analítica.
e) Aplicar corretamente a
ABNT.
Por pensar o educando
como sujeito de sua própria
aprendizagem, o construtor
de seu próprio
conhecimento, a disciplina
dará ênfase ao “aprender a
aprender” ao “saber pensar
crítico”, na tentativa de
romper dicotomias. Portanto,
as aulas serão ministradas a
partir de leituras individuais,
discussões, relatos orais e
escritos, pesquisas
bibliográficas e de campo,
painel integrado, filmes,
paralelamente a atividades
individuais e de grupo,
produções orais e escritas,
aulas expositivas...
Educação e sociedade; O papel
da educação nas formações
sociais contemporâneas; Do
senso comum ao
conhecimento científico;
Organização do trabalho
acadêmico; A formação do
educador para a pesquisa;
Normas da ABNT; Resumo;
Fichamento; Resenha; Paper;
Artigo.
Plano (2)
a) Desenvolver o olhar
investigativo sobre os
processos educativos;
b) Articular os trabalhos
desenvolvidos nas
diferentes disciplinas
do núcleo de estudo a
partir do eixo temático
do semestre;
c) Aproximar-se do
campo de atuação
profissional;
d) Refletir a educação em
seus espaços múltiplos,
amplos e micros.
Pesquisa e Prática Pedagógica I é
um componente curricular no
curso de Pedagogia que articula e
viabiliza a inserção e
aproximação inicial dos alunos ao
contexto acadêmico-científico e
profissional. Enfoca a
investigação científica que irá
privilegiar a formação do
professor pesquisador,
fomentando inquietações e
problematizações da realidade,
através dos conceitos estudados
no núcleo que é norteado pelo
eixo temático do semestre. [...]
Serão adotados procedimentos de
estudos que suscitem a
Professores entre reformas
escolares e reinvenções
educacionais; Ciência e Senso
Comum; Os trabalhos
acadêmicos; Resumo, resenha,
fichamento e artigo; A
documentação como método de
estudo pessoal; Relatório
científico; Normas da ABNT.
189
participação coletiva durante as
aulas, através de aulas expositivas
participadas, seminários, estudo
dirigido.
Plano (3)
a) Proporcionar ao aluno
condição para análise do
conhecimento, seu
processo de produção,
expressão, através de
reflexos, práticas e
reflexões da própria
prática;
b) Descrever as diferentes
etapas que compõem o
processo de produção do
conhecimento através da
metodologia científica;
c) Refletir criticamente a
respeito dos fins últimos
da pesquisa científica no
campo das ciências
humanas, principalmente
em educação;
d) Desenvolver técnicas de
elaboração de trabalhos
acadêmicos com base nas
normas técnica da ABNT;
A pesquisa como processo de
construção do conhecimento
científico. [...] O programa será
desenvolvido através de aulas
expositivas, estudos reflexivos e
analíticos de textos, práticas de
pesquisa bibliográfica, orientação
para elaboração de trabalho
acadêmico, atividades em grupo e
individual e apresentação de
seminário interdisciplinar.
Educação formal e não formal;
conhecimento, senso comum e
ciência; o nascimento do saber
científico (empirismo e
pesquisa); a pesquisa como
princípio científico e educativo;
ciências humanas e sociedade;
pesquisa científica na internet;
uso de biblioteca; fichamentos;
artigos e Normas da ABNT.
Plano (4)
Não Informados no Plano de
Ensino
A Educação formal na sociedade
e o papel da educação nas
formações sociais
contemporâneas. A contribuição
das ciências para explicação e
compreensão da educação.
Tipos de conhecimentos:
filosófico, teológico, empírico,
científico; pesquisa
bibliográfica (conceito, fases,
seleção, consulta bibliográfica);
fichamento, resumo e resenha;
processos básicos de leitura
analítica; documentação e
Normas da ABNT.
Plano (5)
a) Proporcionar um estudo crítico
sobre a educação nas formas
sociais contemporâneas,
destacando as atividades
acadêmicas;
b)Refletir sobre a importância do
A partir do referencial teórico
trabalhado na disciplina os alunos
serão incentivados a apresentar
novas reflexões acerca da prática
pedagógica, pois buscaremos uma
contextualização teórica – prática,
objetivando uma atuação mais
A importância de ensinar,
aprender, estudar e pesquisar; a
busca do conhecimento e a
necessidade de sistematização;
técnica de leituras, método e
eficiência nos estudos; pesquisa
190
ensinar, aprender, estudar e
pesquisar;
c)Explorar métodos e técnicas
para melhor qualidade do
aprendizado;
d)Aplicar métodos e técnicas da
ABNT;
coerente e significativa. Para
tanto trabalharemos círculo de
leitura, trabalho individual e
grupo, exposições, observações,
pesquisas, debates, análise de
filmes e entrevistas, seminários
etc.
bibliográfica; normas ABNT.
QUADRO 2
PESQUISA E
PRÁTICA
PEDAGÓGICA
(II)
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Aproximar dos espaços
formais e não- formais para
conhecer e construir a partir
desses contextos objeto de
pesquisa.
b) Apreender as diferenças
entre métodos de
conhecimento refletidos na
interpretação do real.
c) Utilizar o conhecimento
construído a partir do
marco referencial para
produzir documentos
acadêmicos.
d) Construir os elementos
base do projeto de
pesquisa.
e) Observar os contextos
formais e não-formais para
problematizar temática de
pesquisa articuladas aos
eixos da educação na
proposta do projeto de
pesquisa.
A pesquisa é defendida como
forma de estudo de um objeto.
Atrelada a formação do
professor é característica do
pedagogo enquanto “cientista da
educação”.
Assim, a pesquisa articulada com
as demais disciplinas do eixo da
educação promove a
transversalidade na construção do
conhecimento. Construir a
consciência de pesquisador a
partir da pesquisa científica é
compromisso da formação do
professor. [...] a experiência da
pesquisa como atividade prática
de ensaio através do projeto.
Como princípio metodológico [...]
A postura crítica, analítica das
ideias fará a dialética da
dicotomia para a síntese dos
conhecimentos construídos pelas
leituras, discussões, pesquisas e
produções.
Pesquisa bibliográfica e de
campo.
Educação formal e não-formal e
o conhecimento;
O que é pesquisa social;
Métodos de conhecimento das
ciências sociais
Tipos de pesquisa;
Elementos básicos para o projeto
de pesquisa;
Métodos e Técnicas de
pesquisas;
Abordagem qualitativa e
quantitativa;
Projeto de pesquisa;
A escolha do problema da
pesquisa;
Os dados da pesquisa.
191
Plano (2)
a) Discutir sobre as
abordagens qualitativas e quantitativas de pesquisa
em educação, diferenciando
os principais elementos
teórico-metodológicos que
caracterizam as pesquisas
desenvolvidas dentro de
cada uma dessas
abordagens.
b) Elaborar e experimentar
instrumentos de coleta de
dados em espaços escolares
e não-escolares.
c) Refletir sobre a
importância da
sistematização e análise de
dados para a elaboração dos
resultados de pesquisa.
d) Estudar as normas da
ABNT referentes à
produção de textos
acadêmicos.
As aulas de Pesquisa e Prática
Pedagógica serão desenvolvidas
sempre buscando a participação
ativa dos discentes. A exposição
das temáticas pelo docente será
ponto de partida para o
aprofundamento de discussões
teórico-críticas sobre a produção
do conhecimento em educação
por meio de pesquisas
científicas. Os alunos deverão
elaborar, com a orientação do
professor, instrumentos de coleta
de dados. Serão realizadas
orientações individuais e
coletivas para produção de
artigo científico a fim de que os
sujeitos se apropriem da
linguagem acadêmica e dela se
utilizem para construir e
divulgar o conhecimento
produzido nas pesquisas.
Pesquisa em educação:
abordagem qualitativa e
quantitativa; Tipos de pesquisa;
Principais instrumentos de
pesquisa:
Observação em campo;
Questionário e tipos e
questionários; Entrevista e
tipos de entrevista; Outras
estratégias para a coleta de
dados: grupo focal, mapa mental,
etc.
Organização e comunicação de
dados de pesquisa:
categorização; Normas da
ABNT; Elaboração de artigo
científico
Plano (3)
a) Desenvolver
competências e uma
postura de investigação
científica dentro do fazer
educativo,
instrumentalizando com
referências teóricas e
metodológicas;
b) Elaborar uma
investigação empírica da
ciência da educação, bem
como as relações existentes
entre o campo do
conhecimento e os
métodos, a fim de
proporcionar a escolha do
seu objeto de pesquisa;
c) Definir conhecimentos
teóricos e práticos sobre o
significado e atuação da
A pesquisa em educação na
abordagem qualitativa e
quantitativa com elementos
conceituais e princípios
metodológicos nos espaços
escolares e não escolares.
A metodologia baseia-se na
orientação dos trabalhos, aulas
expositivas e leituras.
Educação, pesquisa e sociedade;
revisão das normas da ABNT;
artigo; fichamento; os métodos
de investigação; pesquisa
qualitativa e quantitativa;
preparação para elaboração do
projeto de pesquisa; estrutura do
projeto de pesquisa.
192
pesquisa em educação;
d) Conhecer as etapas que
os investigadores deverão
percorrer a fim de
realizar seu projeto de
pesquisa, procedimento
técnico metodológico na
produção de trabalhos
acadêmicos;
Plano (4)
Não informados
Trabalhar as relações existentes
entre o não formal e sociedade. A
pesquisa em educação e seus
elementos conceituais e métodos
de pesquisa. Coleta de dados,
análise e interpretação de dados.
Estruturação e apresentação de
relatórios de pesquisa. Tratamento
dos dados e apresentação dos
relatórios.
O conhecimento científico; a
pesquisa em educação; a
pesquisa bibliográfica;
elaboração de projeto de
pesquisa; execução da pesquisa;
artigo científico.
Plano (5)
a) Possibilitar o
desenvolvimento da
atitude científica inerente
ao fazer educativo e a
instrumentalização teórico-
metodológica da pesquisa
em educação com vistas à
iniciação científica e ao uso
da investigação na prática
docente;
b) Refletir sobre a ciência
enquanto conhecimento
produzido historicamente;
c) Entender as abordagens
qualitativas e quantitativas;
d) Produzir fichamentos,
resumos e resenhas;
e) Saber utilizar a ABNT;
A pesquisa em educação e seus
elementos conceituais e métodos
de pesquisa. Tipos de pesquisa.
Coleta de dados, análise e
interpretação de dados em espaços
escolares e não-escolares.
Comunicação dos dados e normas
da ABNT.
Conceito de ciência; os
fundamentos epistemológicos
das pesquisas em ciências
humanas e sociais; pesquisa
qualitativa e quantitativa; tipos
de pesquisa; instrumentos de
pesquisa; resumos; fichamentos e
resenhas; normas da ABNT.
193
QUADRO 3
PESQUISA E
PRÁTICA
PEDAGÓGICA
(III)
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Relacionar teoria e
prática no fazer docente
como elemento da
ressignificação para a
pesquisa;
b) Relacionar a docência com
os vários espaços educativos
ressignificando o seu papel;
c) Construir o projeto de
pesquisa a partir da
problematização;
d) Construir diários de
registros como técnica de
estudo;
e) Reconhecer a importância
da pesquisa social como
forma de intervenção na
educação;
f) Elaborar seminários como
proposta de estudo
sistematizado e socializado;
g) Estabelecer mediação entre
o campo da pesquisa com os
eixos norteadores necessários
a articulação do
conhecimento construído
teoricamente.
Um novo perfil de educador está
sendo proposto na discussão da
formação inicial: professor-
pesquisador da sua própria
prática. Analisar criticamente e
buscar aprofundar esse
entendimento de que o professor é
autor e sujeito do conhecimento.
Nessa análise do fazer docente
propõe-se na disciplina a construção
do projeto de pesquisa como
encaminhamento ao campo de
estudo para a confrontação teoria e
prática. Para tal é necessário
reelaborar os ensaios já construídos
na perspectiva do fazer reflexivo
para investigação social da pesquisa
em abordagem qualitativa nas
diferentes do eixo de trabalho para o
semestre.
Leituras e produções em grupo;
Filmes relacionados às discussões;
Estudos dirigidos com debates;
Diários de registro das aulas
trabalhadas; Articulações com o
eixo temático do semestre: Visitas
de campo para pesquisa;
Acompanhamento do projeto com
o orientador.
Teoria e prática no fazer
docente como elemento da
ressignificação para a pesquisa;
Docência com os vários espaços
educativos ressignificando o seu
papel; O projeto de pesquisa a
partir da problematização;
Diários de registros como técnica
de estudo;
A importância da pesquisa social
como forma de intervenção na
educação; Seminários como
proposta de estudo
sistematizados e socializados;
Mediação entre o campo da
pesquisa com os eixos
norteadores necessários a
articulação do conhecimento
construído teoricamente.
Plano (2)
a) Instrumentalizar os alunos
para elaboração de projetos
de pesquisa.
b) Construir um projeto de
pesquisa elementar, cuja
estrutura apresente os
elementos fundamentais de
Produção de um projeto de
pesquisa em educação na
abordagem qualitativa.
Organização sistemática e articulada
dos elementos do projeto de
pesquisa tendo em vista a produção
do conhecimento científico. Formas
1. Aprendendo a fazer:
Introdução e delimitação de
tema;
Construindo hipóteses;
Metodologia; Análise e
Interpretação
2. Como outros fizeram:
194
um projeto de pesquisa. de organização e análise de dados.
Normas da ABNT.
Pelos caminhos do conhecer;
Uma abordagem histórico-crítica;
Trabalhando o campo;
Plano (3)
a) Desenvolver atitude
reflexiva inerente ao fazer
educativo e a
instrumentalização teórico-
metodológica da pesquisa em
educação com vistas à
iniciação científica e ao uso
da investigação na prática
pedagógica;
b) Promover a pesquisa de
campo como forma
exploratória da produção e
análise de informações sobre
um determinado objeto de
estudo;
c) Desenvolver atividades
pedagógicas integrando os
conhecimentos trabalhados
nas diversas disciplinas;
Desenvolvimento de oficinas
pedagógicas e outras atividades e
conteúdos que venham potencializar
a articulação entre as disciplinas do
semestre. As produções intelectuais,
acadêmicas e/ou de exploração de
campo de pesquisa relacionados à
docência; ferramentas
metodológicas.
A metodologia baseia-se nas
atividades envolvendo experiências
coletivas de investigação, a saber:
seminários, oficinas e pesquisa de
campo; aulas expositivas e
dialogadas.
A etnografia; Pesquisa qualitativa
e quantitativa; etapas do projeto
de pesquisa; cidadania;
identidade docente; ética
profissional; cotidiano escolar;
intervenções pedagógicas.
Plano (4)
Não informado.
Desenvolvimento de oficinas
pedagógicas e outras atividades e
conteúdos que venham potencializar
a articulação entre as disciplinas do
semestre. As produções intelectuais,
acadêmicas e/ou de exploração de
campo de pesquisa relacionados à
docência; ferramentas
metodológicas.
Prática pedagógica e prática
docente: importância da
investigação; instrumentos de
diagnóstico e coleta de dados; o
registro como instrumento de
trabalho docente; como construir
relatório de pesquisa; oficinas
pedagógicas.
a) Refletir sobre a
importância do ensinar,
aprender, estudar e pesquisar;
b) Proporcionar melhor
compreensão sobre o papel da
educação na humanização;
c) Refletir sobre a relação
Produção de um projeto de pesquisa
em educação na abordagem
qualitativa. Organização sistemática
e articulados elementos do projeto
de pesquisa tendo em vista a
produção do conhecimento
científico. Formas de organização e
A importância de ensinar, de
aprender, de estudar e de
pesquisar; o papel da educação
na humanização; o que é um
projeto de pesquisa; cotidiano
escolar; a observação na escola; a
interdisciplinaridade e mediação;
195
Plano (5)
entre o professor e a pesquisa,
discutindo a concepção de
pesquisa qualitativa e a
polêmica do professor
pesquisador e a prática de
pesquisa;
d) Proporcionar o
aprendizado da teoria aliado à
prática através de
observações nos diversos
espaços;
e) viabilizar um diálogo
interdisciplinar entre os
diferentes componentes
curriculares do semestre;
análise de dados. Normas da ABNT.
A metodologia: a partir do
referencial teórico, os alunos serão
incentivados a apresentar novas
reflexões acerca da prática
pedagógica pois buscaremos uma
contextualização teórica – prática,
objetivando uma atuação mais
coerente e significativa. Para tanto
trabalharemos círculo de leitura,
trabalho individual e grupo,
exposições, observações, pesquisas,
debates, análise de filmes e
entrevistas, seminários etc.
modalidades de pesquisa;
produção do projeto de pesquisa;
elaboração e apresentação de
seminários..
QUADRO 4
PESQUISA E
PRÁTICA
PEDAGÓGICA
(IV)
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Promover
observações e a análise
dos espaços formais e
não formais de
educação;
b) Compreender a
pesquisa científica
enquanto instrumento de
produção do
conhecimento;
c) Relacionar e articular
saberes entre os
componentes
curriculares deste
semestre para
possibilitar a
interdisciplinaridade
nas produções do ante-
projeto;
d) Produzir e socializar as
produções cientificas.
Desenvolve oficinas pedagógicas e outras
atividades e conteúdos que venham
potencializar a articulação entre as
disciplinas do semestre: As produções
intelectuais, acadêmicas e/ou de exploração
de campo de pesquisa relacionados à
docência; ferramentas metodológicas
A construção de saberes necessários para a
docência e gestão dos processos educativos
estará fundamentada na compreensão da
aprendizagem e do ensino sobre aspectos
epistemológicos, metodológicos, sócio-
culturais e psicopedagógicos; observando,
analisando, identificando problemas e
reflexionando ações em direção a pesquisa
enquanto instrumento possível para
desvelar a realidade e intervir nos espaços
em que a educação constitui-se
instrumento de formação e
transformação.
Aula expositiva e dialogada com proposição
O conhecimento como
forma de compreensão
e transformação da
realidade; A produção e
a transmissão do
conhecimento através
da pesquisa científica;
Abordagem qualitativa
e quantitativa; Pesquisa
educacional
Conhecimentos
multirreferenciais,
transversais,
interdisciplinares e
transdisciplinares;
Epistemologia e
metodologia; Etapas do
processo de produção
de pesquisas científicas;
Anteprojeto de pesquisa
196
de temas para debate e pesquisa, organização
de Grupos de Trabalho para a proposição de
leituras, discussões, apresentação de painéis
e, atividades individuais com confecção de
fichamentos, resumos e sínteses dos textos e
estudos direcionados. A orientação das
atividades serão coletivas e individualizadas
conforme a necessidade percebida em cada
atividade proposta
Plano (2)
a) Relacionar a prática
docente ao campo de
investigação científica;
b) Desenvolver o olhar
investigativo;
c) Reconhecer as
especificidades da pesquisa
no campo das CH;
d) Articular o
conhecimento das áreas de
conhecimento estudadas no
semestre;
Realização do projeto de pesquisa com
estudo em campo voltado para a prática
pedagógica em espaços escolares e não-
escolares. Análise dos dados e elaboração do
artigo científico. Normas da ABNT.
A metodologia será desenvolvida a partir de
aulas expositivas participadas, estudos
dirigidos individuais e coletivos e de
trabalhos em grupos organizados de acordo o
processo, a exemplo
de seminários, estudos do meio e discussões
e debates.
Normas da ABNT; Ensaio
de uma metodologia
efêmera, ou, sobre as
várias maneiras de se
sentir e inventar o
cotidiano escolar; A
pesquisa no cotidiano e
suas múltiplas
possibilidades de
apresentação; No cotidiano
da escola se escreve uma
história diferente da que
conhecemos até agora;
Plano (3)
a) Realizar oficinas
temáticas e outras
atividades acadêmicas que
possibilitem aos alunos e
alunas produzirem uma
visão crítica,
interseccionando e
relacionando campos do
saber;
b) Discutir tipos e
instrumentos de pesquisa
com vistas ao
desenvolvimento do
trabalho interdisciplinar em
desenvolvimento e/ou
criação de novos projetos
no semestre;
c) Produzir texto
acadêmico a partir de
atividades acadêmicas de
ensino com pesquisa
Desenvolvimento de oficinas e outras
atividades e conteúdos que venham
potencializar a articulação entre as
disciplinas do semestre às produções
intelectuais, acadêmicas e/ou exploração de
campo de pesquisa relacionados à docência;
ferramentas metodológicas.
Interdisciplinaridade:
artificialidade do
conhecimento científico;
pesquisa como princípio
científico e educativo;
Gêneros de pesquisa;
técnicas qualitativa e
quantitativa; o docente
como profissional
reflexivo (o professor
pesquisador); etnografia;
história de vida; pedagogia
e docência.
197
desenvolvidas pelas
disciplinas durantes o
semestre;
Plano (4)
Não informado.
Desenvolvimento de oficinas; produções
acadêmicas; exploração de campo de
pesquisa relacionados à docência;
ferramentas metodológicas.
O que entendemos por
teoria e prática;
importância da pesquisa na
construção do
conhecimento; o conceito
e tipos de gestão; a
elaboração do projeto de
pesquisa e pesquisa de
campo; oficina.
Plano (5)
a) Discutir o conhecimento
nas suas diversas
dimensões e significados,
destacando seu processo de
produção e apropriação,
contextualizando-o no
âmbito da história da
sociedade;
b) Discutir o papel da
pesquisa na formação do
profissional de pedagogia
numa perspectiva de
construção do professor
pesquisador;
c) Elaborar um anteprojeto
de pesquisa, a partir do
diagnóstico realizado nos
espaços educacionais;
Essa disciplina se justifica pela necessidade
formativa do profissional de educação,
buscando-o prepará-lo para o exercício de
uma prática sólida e referenciada nos
princípios do professor-pesquisador, que
problematiza a realidade na qual se insere e
empreende um esforço de análise e
entendimento para referendar sua ação. A
pesquisa enquanto esforço sistemático de
entendimento da realidade social apresenta-
se como caminho possível para subsidiar o
trabalho docente. A abordagem
interdisciplinar ergue-se nesse trabalho como
pressuposto metodológico referencial, tendo
em vista o objetivo de superar a atomização/
fragmentação do conhecimento.
A metodologia baseia-se na exposição
participativa dos temas estimulando a
reflexão e participação do discente, debates e
discussões, elaboração do anteprojeto e
apresentação.
Formas de conhecimento,
processo de construção,
significados e apropriação;
a teoria e os métodos como
base do conhecimento;
pesquisa em educação;
pesquisa e formação do
professor; planejamento da
pesquisa científica; revisão
de leitura e
problematização da
pesquisa; anteprojeto de
pesquisa e seus elementos
constitutivos (tema,
introdução, justificativa,
problematização,
objetivos, referencial e
referências).
198
QUADRO 5
PESQUISA
E
ESTÁGIO
(I)
Ed. Infantil
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Refletir sobre a relação teoria-
prática como fundamental no
processo de formação de professores.
b) Compreender a ação pedagógica a
partir dos pressupostos teórico-práticos
que sustentem tomadas de decisões
conscientes no seu campo de atuação.
c) Refletir e compreender a dimensão
formativa do estágio, reconhecendo a
prática como um campo de saber.
d) Analisar as relações existentes na
prática pedagógica, estabelecendo uma
relação entre os elementos observados
e as contribuições das disciplinas do
eixo.
e) Desenvolver nas práticas de
observações posturas éticas, críticas e
atitude de respeito aos saberes dos
docentes observados.
f) Utilizar recursos didático-
pedagógico para o planejamento e a
atuação na educação infantil.
g) Elaborar projetos de trabalho,
compreendendo a natureza, suas
peculiaridades e a importância dessa
construção para otimização da
qualidade da educação
h) Registrar as reflexões realizadas a
partir da atuação pedagógica.
i) Identificar o perfil do professor da
educação infantil.
A Educação Infantil é hoje por
excelência um espaço para atuação do
pedagogo neste segmento de ensino.
Assim é que se percebe a pesquisa e o
estágio como momento impar de
reflexão – ação –reflexão constituindo-
se uma possibilidade de permitir a este
ator (estagiário) a construção do perfil do
professor da educação infantil e ao
mesmo tempo entender em lócus a
organização, necessidades, desafios e a
natureza deste segmento.
[...] Isto permite compreender o
estágio como ancora para investigação,
articulação entre estes saberes, analise
crítica que pode convergir para uma
construção coletiva e individual do fazer
pedagógico na educação infantil.
[...] O trabalho a ser desenvolvido na
disciplina Pesquisa e Estágio, será
pautado na valorização da reflexão,
discussão e aprendizagem coletiva em
que as contribuições teóricas, e, da
analise das práticas observadas
permearão a construção dos conceitos,
procedimentos e atitude do professor
reflexivo. [...] serão construído roteiro de
observação para coleta de dado, reflexão
sobre as visitas as instituições de ensino
observadas, elaboração dos projetos de
estágios, discussões para promover a
retomada de planos pré-estabelecidos,
durante a regência serão feitas visitas
com o objetivo de promover
posteriormente reflexões dos
procedimentos durante a aula e como
configuração de uma prática em
A relação teoria-prática
como fundamental no
processo de formação de
professores; A ação
pedagógica a partir dos
pressupostos teóricos-
práticos que sustentem
tomadas de decisões
conscientes no seu campo
de atuação; A dimensão
formativa do estágio,
reconhecendo a prática
como um campo de
saber; A prática
pedagógica,
estabelecendo uma
relação entre os
elementos observados e
as contribuições das
disciplinas do eixo;
Observações posturas
éticas, críticas e atitude
de respeito aos saberes
dos docentes observados;
Recursos didático-
pedagógico para o
planejamento e a atuação
na educação infantil;
Projetos de trabalho,
compreendendo a
natureza, suas
peculiaridades e a
importância dessa
construção para
otimização da qualidade
da educação; Reflexões
realizadas a partir da
atuação pedagógica; O
199
permanente construção os educandos
serão orientados a realizar registros na
forma de diário para narrar e construir
sua identidade docente.
perfil do professor da
educação infantil.
Plano (2)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados
os planos referentes ao
PE (I)
Plano (3)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados
os planos referentes ao
PE (I)
Plano (4)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados os planos
referentes ao PE (I)
Não foram apresentados
os planos referentes ao
PE (I)
Plano (5)
a) Refletir sobre o perfil do professor
de Educação Infantil a partir das
concepções norteadoras do trabalho
pedagógico nesta modalidade de
ensino;
b) Compreender a importância do
estágio enquanto espaço de pesquisa
na formação do pedagogo;
c) Analisar a importância da pesquisa
em educação visando propor uma
intervenção significativa nos espaços
educativos, em especial na Ed.
Infantil;
d) Identificar através da observação
nos espaços de atuação as principais
dificuldades visando uma proposta de
intervenção;
e) Discutir sobre a relevância do
planejamento e da avaliação como
instrumentos de reflexão e
sistematização das intenções
educativas enfocando a importância de
conhecer a criança nos seus aspectos
sociais, físicos, afetivos e motores;
f) Elaborar e executar o projeto de
O perfil do professor da Ed. Infantil; a
organização do trabalho pedagógico;
Processos de investigação e
conhecimento da realidade; elaboração e
execução do projeto de estágio; trabalho
interdisciplinar, etc.
A metodologia baseia-se na exposição
participante; leituras e análises;
dinâmicas de grupos; análises de
documentos oficiais; vivências de outras
práticas de estágios, socialização das
vivências e etc.
O estágio em Ed. Infantil
e sua relação teoria e
prática; diferentes
concepções de estágio;
estágio enquanto espaço
de pesquisa e construção
da identidade docente;
documentos oficiais da
Ed. Infantil;
planejamento; material
escolar e recursos
educativos; a importância
da brincar na Ed. Infantil;
o cuidar e o educar;
processos de
investigação, etc.
200
intervenção a partir de diagnósticos;
g) Refletir sobre as experiências de
estágio no contexto de formação do
pedagogo na Ed. Infantil;
Etc.
QUADRO 6
PESQUISA
E
ESTÁGIO
(II)
Séries
Iniciais
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Compreender as
especificidades do processo de
formação para atuar na
docência nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental;
b) Compreender a escola como
um ambiente historicamente
constituído como espaço de
aprendizagem;
c) Perceber que os diversos
elementos que constituem a
escola interferem no processo
de aprendizagem desenvolvido
em sala de aula;
d) Fazer o diagnóstico da
realidade em que irá atuar para
propor atividades
significativas;
e) Compreender que o
espaço-tempo do estágio
apresenta-se como um
excelente campo de pesquisa;
A disciplina Pesquisa e Estágio de Ensino nas
Séries Iniciais do Ensino Fundamental é parte
integrante do curso, se constituindo em
momento onde os elementos da prática serão
objeto de discussão e reflexão, propiciando o
conhecimento da realidade do campo futuro de
atuação, além de constituir-se em espaço de
reflexão e pesquisa da prática do professor
com vista à transformação da realidade
diagnosticada.
Nesta perspectiva, pretende-se ampliar a
possibilidade de análise dos contextos onde
o estágio se realiza, como também
desenvolver habilidades que potencializem
uma postura investigativa que permita, ao
mesmo tempo, compreender e
problematizar as situações que observam. A
aprendizagem não pode estar pautada na
aquisição e acúmulos de conteúdos com
definições, informações, mas em processos de
aprendizagens significativos, interativos, em
que o discente desenvolva habilidades e
competências para aprender a aprender [...]
Promover a pesquisa como um processo de
aprendizagem da docência não é algo fácil
de desenvolver quando esta envolve uma
turma inteira pensando, criando e construindo,
os encaminhamentos de maneira sistematizada
[...] acredita-se que a pesquisa-ação será o
caminho metodológico que garantirá esse
Especificidades do
processo de formação para
atuar na docência nos Anos
Iniciais do Ensino
Fundamental;
A escola como um
ambiente historicamente
constituído como espaço de
aprendizagem;
Os diversos elementos que
constituem a escola
interferem no processo de
aprendizagem desenvolvido
em sala de aula;
O diagnóstico da realidade
em que irá atuar para
propor atividades
significativas;
O espaço-tempo do
estágio apresenta-se como
um excelente campo de
pesquisa;
201
processo como orientação para o atendimento
do que se almeja desenvolver.
Plano (2)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Não foram apresentados os planos referentes
ao PE (II)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Plano (3)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Não foram apresentados os planos referentes
ao PE (II)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Plano (4)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Não foram apresentados os planos referentes
ao PE (II)
Não foram apresentados os
planos referentes ao PE (II)
Plano (5)
a) Possibilitar a vivencia da
prática docente em classes
formais das séries iniciais do
Ensino Fundamental;
b) Analisar a política de
inclusão das crianças de seis
anos no EF;
c) Refletir sobre os
fundamentos teóricos da
educação nas séries iniciais do
EF;
d) Mapear saberes e
competências necessárias ao
exercício profissional do
educador das séries iniciais do
EF;
e) Construir diagnósticos da
instituição formal através de
recuso teórico-metodológico e
observação participante;
f) Elaborar e desenvolver
projeto de aprendizagem nas
séries iniciais do EF;
g) Reflexão e sistematizações
A formação do professor das séries iniciais do
Ensino Fundamental. A organização do
trabalho pedagógico. Processos de
investigações e conhecimento da realidade.
Elaboração e execução de um projeto.
Trabalho interdisciplinar. Análise das
abordagens de um projeto de pesquisa.
Fundamentos teóricos sobre
as séries iniciais; bases
legais para o ensino de
nove anos; pedagogia de
projetos; projeto educativo
e plano curricular;
organização do trabalho
pedagógico; práticas
interdisciplinares nas séries
iniciais; PCN; práxis
educativa; estágio: o que é?
Diferentes concepções de
estágio; planejamento;
projeto; execução do
projeto.
202
QUADRO 7
PESQUISA E
ESTÁGIO (III)
Espaços não-
formais
OBJETIVOS
JUSTIFICATIVAS E
METODOLOGIAS
CONTEÚDOS
Plano (1)
a) Diferenciar espaços
formais e não-formais de
educação.
b) Definir, identificar e
caracterizar espaços não
formais de educação.
c) Discutir sobre as
Políticas Públicas voltadas
para educação em espaços
não formais.
d) Desenvolver a
elaboração e a
implementação de projetos
de aprendizagem com
crianças de 03 a 12 anos em
espaços não-formais.
e) Proporcionar o
desenvolvimento de saberes
produzidos sobre a prática
docente em espaços não-
formais.
Em decorrência das mudanças ocorridas
na economia, na sociedade e no mundo
do trabalho, a partir dos anos 90, passou-
se a dar grande destaque aos processos de
aprendizagem em grupos, aos valores
culturais que articulam as ações dos
indivíduos e, ainda, a falar de uma nova
cultura organizacional que, em geral,
exige a aprendizagem de habilidades
extra-escolares desenvolvidos pela
educação não-formal.
A metodologia utilizada para desenvolver
os trabalhos será diversificada e bastante
participativa, aliando o teórico e o
prático, priorizando os processos
interativos que possibilitem a conjunção
entre o pensar-sentir-agir. Dessa
maneira, será utilizado, dentre outros,
aulas expositivas participadas, trabalhos
em grupo, dinâmica de grupo e exercícios
práticos.
Espaços formais e não-
formais de educação.
Características dos
espaços não formais de
educação.
Políticas Públicas
voltadas para educação
em espaços não formais.
Projetos de aprendizagem
com crianças de 03 a 12
anos em espaços não-
formais.
Prática docente em
espaços não-formais.
Plano (2)
a) Refletir sobre o conceito
de educação numa
perspectiva ampla e
diversificada;
b) Estudar a definição, o
campo de abrangência, as
metodologias e o universo
de atuação da educação
não-formal;
c) Conhecer as
especificidades da educação
não-formal da comunidade
local;
d) Mapear os saberes
necessários ao exercício
Concepções de Estágio. Estudo das
diferentes relações no campo de estágio;
saberes e competências necessárias à
formação diversificada do pedagogo e seu
exercício profissional em espaços não –
formais. A organização do trabalho
pedagógico, em projetos educacionais
com crianças, jovens, adultos e idosos em
espaços não escolares; processos de
investigação e conhecimento da realidade
para a elaboração e execução de projeto
de estágio em contextos não escolares.
Articulação interdisciplinar com o
seminário de pesquisa e acompanhamento
da produção do TCC.
Definição do conceito de
educação;
Conceito de educação
não-formal: um mosaico;
Histórico da educação
não-formal no Brasil;
Campos, contextos e
sujeitos da educação não
formal;
Metodologias e
especificidades
pedagógicas da educação
não-formal;
203
profissional do educador
dos espaços não-formais de
educação;
e) Construir um diagnóstico
da instituição educativa
não-formal através da
utilização do recurso
teórico-metodológico -
observação participante;
f) Elaborar e executar um
projeto de estágio;
g) Elaborar atividade de
sistematização do estágio,
em forma de artigo
científico, que deverá ser
socializado com a
comunidade acadêmica no
h) Seminário de Pesquisa,
tendo a participação e a
colaboração de todos os
professores do semestre.
Plano (3)
a) Discutir educações e os
espaços sociais onde
ocorrem, sejam os não
escolares por alguns
entendidos como não
formais: ONG, Empresas,
Órgãos Públicos,
Associações, Sindicatos,
Pastorais, Hospitais, Igrejas,
dentre outras. Ou mesmo
escolares, nos aspectos de
organizações político-
pedagógico, objetivos,
interesses, finalidades, e
modalidades de gestão,
como ações educativo-
formativas;
b) Compreender as
educações como processos
de diálogos, práticas da
liberdade e de emancipação
numa sociedade em
Compreensão do estágio na sua relação
teoria e prática. Saberes e competências
necessárias à formação diversificada do
pedagogo e seu exercício profissional em
processos não formais etc.
Metodologia: Mapeamento dos espaços
educativos não escolares; diagnóstico e
conhecimento da vida e ações em espaços
não escolares; relatório da experiência de
estágio e seminário.
Espaços não escolar ou
não formal, o que é?
Aspectos políticos,
histórico-social e aspectos
conceituais; Educação
popular; os espaços não
formais; projeto de
estágio; elaboração do
projeto, execução e
apresentação; leituras e
debates.
204
constantes mudanças e de
profundas contradições que
se evidenciam em espaços
coletivos, particulares como
família, instituições quer
escolar e/ou não escolar;
c) Discutir o papel do
pedagogo nos espaços não
escolar, não formais,
mediados pela pesquisa;
d) Construir caminhos de
pesquisa e estágio, ensino
com pesquisa, de
intervenção em espaços não
escolares;
Plano (4)
Não informados.
Estudo das diferentes relações no campo
de estágio; saberes e competências
necessárias à formação diversificada do
pedagogo e seu exercício profissional.
Elaboração e execução de projeto de
estágio, através da pesquisa exploratória,
com contribuição e orientação das
disciplinas deste núcleo, de forma
interdisciplinar, para realização de
trabalho de conhecimento da realidade da
educação formal e não formal.
Observação visando os estágios e TCC.
Educação não formal;
Uma pedagogia da
possibilidade: reflexões
sobre a política educativa
de Paulo Freire, vida e
obra de Paulo Freire; o
princípio da gestão
democrática, etc.
Plano (5)
a) Vivenciar situações
pedagógicas em espaços
não formais;
b) Identificar e caracterizar
espaços não formais;
c) Discutir a relação de
estágio e pesquisa em
espaço não formais e sua
contribuição para a
formação do pedagogo;
d) Desenvolver
competências pedagógicas
em espaços não formais;
e) Apresentar, através de
amostras, trabalhos e
documentados articulando-
se ao TCC.
O presente projeto deverá nortear os
trabalhos pedagógicos que serão
desenvolvidos ao longo do semestre. A
metodologia baseia-se na leitura e
discussão; definições de temas; exposição
didática; conversa informal com os
alunos; formação de grupos, etc.
Estudos teóricos sobre
educação em espaços não
formais, relatos de
experiências, visitas às
instituições, etc.
205
QUADRO 8
SÍNTESE DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA UNEB
Concepção da Formação do
Pedagogo
A concepção da relação
teoria e prática
Objetivos e Elementos
norteadores
Conforme as DCN “são destacados
de maneira precisa os campos de
atuação do licenciado em
Pedagogia, devendo este exercer a
sua função docente em três
dimensões fundamentais: na área da
docência propriamente dita, na
gestão educacional e escolar e na
produção e difusão do
conhecimento” (p. 30-31).
“Ao reconhecermos os vários
espaços onde a aprendizagem
significativa se dá acabamos
atribuindo um sentido mais
ecologizante à aprendizagem e,
mais especificamente,
reconhecemos o professor como
sujeito do conhecimento. Esta
compreensão reconhece ainda que a
aprendizagem significativa de fato,
se constrói, a partir de processos
muito próprios do sujeito e a
itinerância do futuro pedagogo (a) é
construída num movimento
labiríntico sob as mais diversas e
hibridas formas” (p. 59-60).
“A formação do pedagogo da
UNEB para fins da realização da
sua docência na perspectiva de
uma compreensão mais ampliada
da sua profissão e da sua ação
como ato político, só efetivamente
encontram bases para sua
edificação se forem analisadas e
percebidas ligadas a estes processos
múltiplos, num movimento de inter-
relações e co-oerência. Portanto,
são múltiplos os saberes que
compõem o repertório do
professor” (p. 61).
A formação profissional consiste
em “posicionar-se crítica e
Os componentes: Pesquisa e prática
pedagógica e Pesquisa e estágio junto
à interdisciplinaridade configuram a
estratégia de indissociabilidade entre
teoria e prática.
A Pesquisa e Prática como elementos
constitutivos da formação do
pedagogo (a) configura um eixo,
entre os quatro correspondentes aos
anos letivos.
“Através desse eixo aprofundar-se-á a
pesquisa como atividade responsável
pela produção do conhecimento,
compreensão ampla e consistente do
fenômeno e da prática educativa que
se dão em diferentes âmbitos e
especialidades; compreensão do
processo de construção do
conhecimento do indivíduo inserido
em seu contexto social e cultural;
capacidade de identificar problemas
sócio-culturais e educacionais bem
como pela intervenção na realidade
escolar. Nesse sentido compreende-se
que traduz a inseparabilidade entre
teoria e prática, saber e mudança” (p.
67-68).
“a interlocução teórico-prática que
possibilite o diálogo reflexivo com a
realidade contextual dos alunos e
professores, considerando espaços de
interação e socialização de saberes
que encaminham à construção da
identidade pessoal, profissional e
cidadã do/a futuro/a pedagogo/a” (p.
69).
“Pleiteia-se uma formação crítica e
contextualizada através da busca,
entrecruzamento e construção de
saberes de conseqüências pessoais,
acadêmicas, políticas, estéticas, éticas
e sociais. Neste sentido a pesquisa é o
meio pelo qual se configura o
desenvolvimento profissional (pesquisa - formação), a produção de
conhecimentos (instauração de
autorias) e a socialização destes
conhecimentos” (p. 38).
“Pretende-se oferecer aos alunos uma
sólida formação teórico/prática que
favoreça a reflexão contextualizada
sobre os principais problemas da
educação e aponte possibilidades para a
atuação de cada profissional da
educação em seu campo de trabalho”
(p. 42).
Os elementos norteadores da formação:
“1) trabalho pedagógico escolar
como elemento educativo que norteia o
desenvolvimento da proposta
curricular; 2) A prática da
interdisciplinaridade como elemento
para o desenvolvimento de um trabalho
que articule os conteúdos das diversas
áreas de estudo em torno de questões
centrais e/ou que garanta a observância
do princípio definido; 3) A pesquisa
como elemento constitutivo da
formação para a práxis pedagógica;
4) A indissociabilidade entre teoria e
prática (p. 36).
206
ativamente frente às desafios da
valorização docente e dos
problemas enfrentados pela escola
na atualidade, percebendo-a como
lócus de encontro, discussão e de
humanização das relações em torno
da construção de conhecimento
tornando o pedagógico mais
político e o político mais
pedagógico, fazendo da luta pela
solução dos problemas da escola
pública contemporânea uma
questão de honra” (p. 65).
“A partir das Diretrizes
Curriculares para o curso de
Pedagogia (Res. CNE/CP 01/2006)
o curso assume como perspectiva
teórico-metodológica formar
professores/as pesquisadores/as e
reflexivos/as sobre suas próprias
práticas e sobre tantas outras que
fazem parte a realidade
brasileira” (p. 69).
207
ANEXOS
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209
210
211
212
213
214