OLHARES SOBRE IDENTIDADE, JUVENTUDE E SOCIABILIDADE NAS
REDES VIRTUAIS
Kirla Korina dos Santos Anderson1
Resumo: Compreender significados sobre o acesso às redes virtuais no cotidiano de
jovens estudantes do ensino médio na cidade de Tucuruí, localizada na Região Sudeste
do estado do Pará, consistiu no principal objetivo deste trabalho, no sentido de perceber
como tais redes contribuem para a formação (e ou exposição) de suas identidades. O
estudo se deu no contexto da tecnologia da informação e comunicação e sua influência
no cotidiano dos jovens, investigando quais são os recursos mais utilizados por eles,
quais mais usam para se comunicar, e como expõe sua identidade (quais aspectos da
identidade são ressaltados por eles e quais momentos fazem isso). Foram ouvidos 26
jovens, com idades de 16 à 18 anos, com ênfase para abordagem qualitativa, sobre as
redes virtuais que mais costumam acessar, o que costumam expor publicamente, quais
critérios adotam para aceitar amigos, além de também investigar o que costumam fazer
em seu tempo livre (além de conectados às redes virtuais). Neste sentido, posso dizer
que a janela de contatos sociais que a Internet pode disponibilizar, em especial para os
jovens, comporta também a necessidade de compreender o universo dos estudantes
dentro e fora da sala de aula, enfatizando qual percepção têm estar com o outro,
principalmente através das redes virtuais, investigando a importância de “estar
conectado” no seu cotidiano e a como as redes virtuais se estabelecem como
instrumentos para construção de identidade.
Palavras-chaves: Juventude, Redes Sociais, Identidade, Antropologia
Introdução
A intenção deste artigo é o de contar uma parte de minha experiência como
docente de sociologia no ensino médio, no que se refere ao entendimento de
significados no acesso às redes virtuais por jovens estudantes. O estudo foi realizado na
cidade de Tucuruí, localizada na Região Sudeste do estado do Pará, com o interesse de
compreender como tais redes contribuem para a formação (e ou exposição) de suas
identidades2.
Os personagens principais são jovens, com idades entre 16 e 18 anos, que cursam
ensino técnico, em uma cidade do interior do Estado do Pará, como falei antes. Nesse
tempo de atuação no ensino médio, tenho percebido (assim como outros colegas) a
1 Profa. Dra. do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA). E-mail:
[email protected]. 2 As reflexões deste trabalho correspondem à uma parte dos resultados obtidos no âmbito do Projeto
Conectados às Redes Sociais: juventude, cotidiano e sociabilidade em Tucuruí/PA, que teve duas bolsas
de iniciação científica júnior, custeadas pelo Programa Interno de Bolsas de Iniciação Científica e de
Extensão (PIBICE) do Campus Tucuruí/IFPA.
intensidade com que usam os aparelhos eletrônicos (smarthphones, tablets, notebooks),
principalmente com conexão à Internet, seja para jogar, ouvir música e/ou para acessar
às redes virtuais. Muitas vezes acontece desses aparelhos serem utilizados inclusive em
sala de aula, com a presença do professor, em momentos de avaliação ou exposição do
conteúdo3. No intervalo entre uma aula e outra, é certo encontrá-los entretidos no
mundo virtual4.
É neste sentido que o estudo tem como contexto a tecnologia da informação e
comunicação e sua influência no cotidiano dos jovens, investigando quais são os
recursos mais utilizados por eles, quais mais usam para se comunicar, e como expõe sua
identidade (quais aspectos da identidade são ressaltados por eles e quais momentos
fazem isso). Foram ouvidos 26 jovens, com idades entre 16 e 18 anos, com ênfase para
abordagem qualitativa, sobre as redes virtuais que mais costumam acessar, o que
costumam expor publicamente, quais critérios adotam para aceitar amigos, além de
também investigar o que costumam fazer em seu tempo livre (além de conectados às
redes virtuais).
Para isso, tomou como campo de análise a juventude como momento de
experimentações, rituais de passagens e projetos para o futuro, articulando com a
construção de identidade no contexto da sociedade contemporânea (CASTELLS, 1999;
ABRAMO, 2004; NOVAES, 2004).
1 Quando a sala de aula é o campo de estudo
O interesse pelo tema surgiu a partir de meu contato diário com jovens estudantes
de cursos técnicos, integrados ao ensino médio, mais especificamente, no quadro de
discussões da disciplina de sociologia. É muito comum que eles refiram exemplos da
internet, pela facilidade que têm em acessar às redes virtuais, principalmente através do
celular (aliás, segundo eles, não é luxo ter celular que acesse internet, ainda mais com os
pacotes das operadoras que oferecem pacotes de acesso de dados, custando centavos por
dia; ou através do acesso por redes Wi-Fi).
Esse contato diário nas salas e corredores despertou minha curiosidade etnográfica
para compreender tais experiências, pois estamos envolvidos por vários significados que
o tal encontro pode trazer. Nesse encontro etnográfico, a alteridade é estabelecida
3 Sobre este assunto, não posso me esquecer de mencionar que as estratégias de “cola” também se
utilizam dessas tecnologias (por Bluetooth ou pelo whatsapp são as que já ouvi). 4 Apesar de proibição de uso de celulares e computadores em sala de aula no IFPA-Campus Tucuruí, essa
é uma reclamação recorrente nas reuniões de professores.
através da relação professor-aluno, cujo estranhamento acontece entre gerações,
principalmente quando se considera o acesso às redes virtuais.
O caminho escolhido para entendimento dos significados do acesso às redes no
cotidiano dos jovens consiste na construção etnográfica, no sentido de situar o leitor no
cenário estudado, como dizem Malinowski (1978) e Geertz (1989). Neste sentido,
pode-se dizer que a antropologia permite uma leitura do que acontece na vida social e
que o pano de fundo para a interpretação das práticas sociais é a teia de significados que
formam a cultura. A teia de significados de minha etnografia parte de questões que pude
observar durante a pesquisa no mestrado, em leituras, na participação em eventos e
memórias de minha infância – que podem representar limites para compreender o ponto
de vista do nativo, conforme mostra Geertz (2006) ao tratar dos significados da tradução
na pesquisa antropológica. Assim, a leitura da vida social em seu contexto que a
antropologia permite não vale apenas para os nativos, mas inclui o pesquisador também.
Geertz (1989), ao reunir alguns de seus trabalhos e publicá-los numa coletânea,
deu destaque para as observações de campo, tomando como eixo de análise a cultura. O
estudo de questões empíricas tratadas pelo autor como um trabalho artesanal, no qual se
faz imprescindível a descrição dos aspectos que compõem a vida social, falando de uma
“descrição densa”. Seu objetivo consiste na observação e interpretação de como as
ações são produzidas, percebidas e interpretadas pelos agentes.
Experimentei o registro etnográfico através do diário de campo, que não sendo
escrito todos os dias, procurou dar conta das observações e comentários que ouvi nesse
período de elaboração do trabalho. O quadro a seguir mostra um resumo do perfil dos
entrevistados:
QUADRO 1: PERFIL DOS ENTREVISTADOS
Nº Idade Cor /
Raça
Relacionamento Ocupação Mora com
quantas
pessoas
Relação de
Parentesco
com o
entrevistado
01 16 Pardo Solteiro Estudante 1 Mãe
02 17 Branca Solteira Estudante 3 Pai, mãe, irmã
03 16 Branca Namorando Estudante 2 Padrastro e mãe
04 16 Branca Solteira Estudante 3 Pai, mãe, irmão
05 17 Pardo Ficando Estudante 3 Pai, mãe, irmão
06 16 Branco Solteiro Estudante 3 Pai, mãe, irmão
07 16 Parda Solteira Estudante e
Jovem
aprendiz
7 Pai, mãe, 3
irmãos e 2
irmãs
08 16 Parda Solteiro Estudante 3 Pai, mãe, irmão
09 17 Parda Namorando Estudante 4 Pai, mãe, irmã,
prima
10 16 Branca Solteira Estudante 2 Mae, irmão
11 16 Parda Solteira Estudante 4 Pai, mãe, 2
irmãos
12 17 Pardo Solteiro Estudante 4 Tio, tia, 2
primas
13 16 Parda Solteira Estudante 2 Pai, mãe
14 18 Negro Namorando Estudante 6 2 tias, 2 primos,
irmão, prima
15 16 Branca Solteiro Estudante 2 Pai, mãe
16 16 Branca Solteira Estudante 3 Pai, mãe, irmão
17 16 Branca Ficando Estudante e
Jovem
Aprendiz
3 Pai, mãe, irmã
18 18 Parda Solteira Estudante 5 Mãe, tia, 3
primas
19 16 Branca Namorando Estudante e
Jovem
aprendiz
4 Pai, mãe, 2
irmãs
20 16 Pardo Solteiro Estudante 2 Mãe, prima
21 17 Branca Namorando Estudantee
Jovem
Aprendiz
4 Pai, mãe, 2
irmãos
22 18 Negro A espera de um
milagre
Estudante 1 Irmão
23 17 Negra Solteira Estudante 5 Pai, mãe, 2
irmãos, irmã
24 17 Negro Namorando Estudante 1 Pai
25 16 Parda Namorando Estudante e
serva na igreja
6 Pai, mãe, 2
irmãos, irmãs
26 16 Branca Namorando Estudante 1 Avó
Fonte: Pesquisa de Campo, 2014.
Foram entrevistados 14 meninos e 12 meninas, totalizando 26 jovens. Todos
moram com familiares, sejam eles pais, tios, avós, padrasto ou madrasta, irmãos, o que
chama atenção para a diversidade nas configurações familiares, conforme estudos
antropológicos (LÉVI-STRAUSS, 1989; SARTI, 1996 e 2004; DAUSTER, 1985 e
1988; LINS DE BARROS, 1985 e 1987; VELHO, 1985, 1987, 2008; ALMEIDA, 1987;
DAMATTA, 1987; FONSECA, 1995, 2002, 2007). É importante ressaltar que há casos
específicos como: os que moram com mãe e padrasto são típicos da sociedade
contemporânea.
Todos são estudantes, mas 4 deles trabalham como Jovem Aprendiz em empresas
da cidade. como o que requer a dedicação de tempo numa terceira jornada para os
trabalhos extracurriculares e para o tempo livre. Essa realidade implica no trabalho na
madrugada, prejudicando a noite de sono e consequentemente nas atividades matutinas.
Quanto ao status de relacionamento (como divulgado nas redes virtuais),
observamos uma variedade de definições. O conceito de relacionamento sério, que
implica em assumir para a família e amigos o compromisso com alguém, é o que eles
costumam tomar como referência para falar de si mesmos. Dessa maneira, 8 estão
namorando ( com intenção de construir família com seu atual parceiro, mas a longo
prazo), 15 se declararam solteiros e, dos 3 restantes, 2 disseram que estão ficando e 1 “a
espera de um milagre”.
Observando os gráficos, é possível afirmar que os jovens entrevistados formam
uma coorte, assim como afirma Paul Singer. Pois, estão na mesma faixa etária,
permanecem no mesmo país, e estão vivendo experiências parecidas juntos. Experiência
essas tais como: compartilham as mesmas tecnologias, estão terminando o ensino médio
junto, provavelmente ingressarão na universidade no mesmo tempo e alguns já estão
começando a ingressar no mercado de trabalho etc.
Pensando inicialmente em observar e compreender significados relacionados à
redes virtuais e identidade no cotidiano de jovens estudantes, meus alunos (meus
“interlocutores” nesse contexto) deixaram claro que faço parte da alteridade que me
proponho a compreender, pois me colocam como “outro” na pesquisa, me levando a
rever minha própria experiência de jovem e estudante, conforme situações já
mencionadas aqui.
Sobre as definições do campo de estudo e a seleção de uma sociedade para isso, a
antropologia contemporânea propõe uma inversão do paradigma clássico da disciplina
em estudar sociedades primitivas e/ou exóticas, para estudar nossa própria sociedade,
configurando uma tendência autorreflexiva da antropologia pós-moderna. Partindo da
década de 1980, Cardoso de Oliveira (1983), Fischer (1985) e Trajano Filho (1988)
dizem que acontece na antropologia um novo debate teórico, que salienta que a
sociedade estudada é apresentada nos textos antropológicos de acordo com a
perspectiva subjetiva do pesquisador, inaugurando a tendência para a reflexão sobre a
produção etnográfica. Neste contexto, entra em cena o poder, ou autoridade do
pesquisador, exigindo reflexão sobre a dinâmica do encontro etnográfico entre
pesquisador e nativo, o que implica na consideração de que a etnografia é formada por
um conjunto de relações.
Sobre esta questão, Clifford (1998) fala da tendência reflexiva na antropologia.
Para ele, a autoridade na etnografia possui um caráter metodológico central, pois é
sempre o pesquisador quem seleciona o que entra e como entra no texto. Por isso, a
etnografia é mais que descrição, pois envolve interpretação, em que o texto etnográfico
faz parte de uma rede de relações vivida entre antropólogos e nativos, por isso a
construção de um campo de atuação.
O encontro com o outro (e as reflexões que emergem dessa relação), de que
Geertz (2006) fala, significa que o modo de interpretação das práticas culturais dos
outros também pode provocar mudanças no próprio observador, o que é influenciado
pelo intercâmbio das formas culturais. É no “encontro”, que envolve uma relação de
intersubjetividade, ou seja, de troca entre pesquisador e pesquisado, como disse Minayo
(2000), que aparece a possibilidade de compreensão não apenas do “outro”, como de si
mesmo também.
Desta maneira, estar disposto a abdicar de alguns posicionamentos é um dos
pontos que Geertz (2006) sinaliza, pois é possível interpretar o ponto de vista do outro,
mas é importante que se considere que não se dará conta de tudo e que não será um
processo fácil. De acordo com os argumentos apresentados pelo autor, interpretar o
“outro” é um exercício minucioso, que requer atenção, vigilância e cuidado. Isso
implica que o pesquisador também está preso às interpretações de seu grupo e que o que
vai expressar do nativo não será na linguagem “nativa”, compondo ângulos sobre o
processo de “tradução” no trabalho antropológico.
De acordo com o que foi apresentado por Cardoso de Oliveira (2002a), o trabalho
de campo pode ser entendido como um exercício de encontros, que acontece não apenas
entre pesquisador e pesquisado, mas também representa um processo em que o
pesquisador pode (re)conhecer a si mesmo. O trabalho de campo consiste, então, num
espaço de expectativas, em que questões como “tomar decisões”, “rever posições” e
“ser observado” ajudam a compor o cenário. Assim, além da perspectiva de trabalho de
campo, ou seja, de um momento pensado como específico para perguntas, encontros,
dúvidas, coleta de informações.
O campo de atuação do pesquisador, portanto, envolve ideias e práticas sobre a
construção do “outro”, tanto do grupo pesquisado (ou nativo), como também conhecer a
si mesmo (o “outro” que está no próprio pesquisador). Isto acontece porque o processo
de construção cultural, neste contexto do encontro etnográfico, as categorias envolvidas
permitem compreender como essas pessoas classificam, distribuem e significam suas
práticas, tanto do pesquisador com do nativo, assim como rever as categorias na
experiência pessoal do pesquisador – como faz Cardoso de Oliveira (2002a), nas
margens do diário, ao relembrar a sua origem portuguesa.
2. Ampliando o olhar: jovens e redes sociais em Tucuruí
Os discentes demonstram bastante interesse, iniciativa e participação quando são
utilizadas matérias de jornal, músicas, vídeos do gosto deles (sendo o interesse maior
quando já tenha sido compartilhado nas redes virtuais). Assim, é muito comum também
que tragam outros exemplos da internet, pela facilidade que têm em acessar à rede
virtual, principalmente através do celular (aliás, segundo eles, não é luxo ter celular que
acesse internet, ainda mais com os pacotes das operadoras que oferecem pacotes de
acesso de dados, custando centavos por dia; ou através do acesso por redes Wi-Fi).
Para Novaes (2004), a juventude – principal usuária das redes virtuais – como
categoria de entendimento das relações sociais ganhou conteúdos, contornos sociais e
jurídicos ao longo da história, traduzidos em aspectos culturais e regras socialmente
construídas, que corroboram para determinar em que momento e por meio de quais
rituais de passagem se muda de uma fase da vida para outra. Por isso, é compreendida
como um tempo de construção de identidades e de definição de projetos para o futuro,
marcada por intensas experimentações e importantes decisões. É vista como etapa de
transição entre a infância e vida adulta, em que os indivíduos processam sua inserção
nas diversas dimensões da vida social, como inserção no mundo do trabalho,
responsabilidade com a própria família, exercício pleno de direitos e deveres de
cidadania.
Pelo que vem sendo dito, a juventude deve ser considerada como um momento da
vida em que se possa efetivar o exercício de direitos e cidadania, para construção de
autonomia. Não é apenas uma etapa de vulnerabilidade social, mas um momento em
que se passa a ser responsável pelas suas decisões, sendo capaz de exercer atividades
relacionadas à produção (sustento de si e de outros), à reprodução e participação em
momentos de decisões, direitos e deveres da sociedade.
Em relação às redes virtuais mais acessadas, nas entrevistas que foram realizadas
listaram 05 redes visitadas com mais freqüência: YouTube, WhatsApp, Facebook,
Instagram e Twitter. O acesso costuma acontecer no horário que tiverem disponível,
como aos fins de semana, durante viagens, pela madrugada, na hora da aula...),
geralmente para “passar o tempo” ou para “se manter atualizado”, como disseram. O
aparelho celular é o preferido para os acessos, pois “a gente anda o tempo todo com ele,
professora”, “é mais prático”, “fica mais fácil para entrar na internet na hora que a
gente quiser”, “é só clicar no aplicativo aqui e pronto, no computador dá mais
trabalho”.
Observando as redes virtuais pela perspectiva dos discentes, ficar conectado é
importante para estar sempre atualizado. Eles têm acesso a informações sobre os mais
variados assuntos: música, artista preferido, namoros e paqueras, vídeos e imagens mais
compartilhados. De uma forma ampla, tais redes são aquelas em que o usuário deve se
inscrever para criar um perfil (uma espécie de página personalizada com fotos e
informações sobre gosto pessoal) e a partir daí começar a fazer amigos (fazer ou
desfazer amizade/seguir ou ter seguidores), assistir vídeos ou músicas (com opção de
download em alguns casos), bater papo.
Em resumo, as redes virtuais mais acessadas pelos jovens deste estudo são:
QUADRO 2: REDES VIRTUAIS MAIS ACESSADAS PELOS JOVENS
REDES MAIS
ACESSADAS
CARACTERÍSTICA(S)
PRINCIPAL(IS)
GÍRIAS
RELACIONADAS
YOUTUBE Assistir, curtir ou compartilhar vídeos Dar um like
WHATSAPP Conversar instantaneamente, que serve
para enviar ou receber vídeos e imagens
Manda um zap
FACEBOOK Publicar ou compartilhar fotos, vídeos
ou imagens sobre o dia a dia
“Compartilha ou curte
aí”
INSTAGRAM Compartilhar fotos “Instagood”
TWITTER Postar mensagens de até 140 caracteres Hoje vou twittar sobre...
Fonte: Pesquisa de Campo, 2014.
Ademais, o acesso às redes virtuais fornece informações sobre renda das famílias,
pois implica principalmente em investimento em aparelho eletrônico e plano para
conexão à internet. A forma de conexão preferida é a Wi-Fi, pela qualidade da conexão
e carregar os dados, disponível na casa de 22 deles.
Tendo em vista as formas gerais de interação nas redes virtuais, ao publicar ou
compartilhar alguma mensagem, é comum colocar o símbolo cerquilha (#),
popularmente conhecido como “jogo da velha”, ao lado de uma palavra ou frase para
dar destaque no texto (altera a cor em comparação ao restante do texto) e cria uma
ligação com outras publicações de outros usuários também (um link). Esta ação de
escrever cerquilha mais alguma palavra cria uma expressão chamada hashtag5. A
hashtag faz com que o conteúdo do seu post seja acessível a todas as pessoas com
interesses parecidos.
Em relação à identidade, as publicações virtuais se referem principalmente ao que
estão fazendo no momento (quase um diário), convidar alguém para conversar,
perguntar assuntos da aula (na maioria das vezes, na véspera de alguma avaliação ou
entrega de atividades), dar avisos sobre isso (à pedido de professores), além de
compartilhar “memes”.
De acordo com o que venho discutindo, além de gostar de compartilhar
informações com o professor, eles também gostam de “indicar” sites e páginas de
relacionamento, que, segundo eles, “é importante que a senhora veja o que tem lá,
professora”, postam (ou fazem menção de que gostariam) publicar os acontecimentos
no Facebook (uma foto, recados, declarações de amor, “indiretas”, sem contar na
reprodução dos bordões de novelas e comerciais, que viram referencia fácil no
vocabulário deles). Neste sentido, as redes que eles mais utilizam são Facebook e
WhatsApp.
A diferença de visão de mundo é vista pelas ciências sociais como diferenças
entre gerações. Singer (2004) diz que a experiência de geração, ou de coorte, significa
um grupo de pessoas que nasceram num mesmo período histórico e passam por
experiências comuns, resguardadas suas especificidades. Para outros autores, a questão
das diferenças de visão de mundo pelas gerações não pode ser vista apenas como uma
diferença de idade, pois idade não pode ser vista apenas pela contagem de tempo para
uma pessoa, mas sociologicamente importa compreender por quais experiências ela
passou, qual a rede de relações integra o processo e de maneira percebe isso.
5 Por exemplo, se você usar a palavra #família, quando for pesquisar em qualquer rede social irá mostrar
publicações anteriores de todos os usuários que usaram “#família” em suas mensagens. As hashtags
aparecem como links, quando usadas em mensagens, bastando clicar sobre elas para ver todos os
resultados em qualquer parte do mundo.
Interpretar significados sobre a perspectiva de vida e projetos para o futuro na
juventude em Tucuruí, portanto, indica pensá-la como um universo relacional, pois as
representações e expectativas sobre juventude não se restringem à figura dos jovens,
mas se estendem às demais pessoas e coisas que interagem com eles. Por isso, quando
me refiro ao estudo dos significados das redes sociais entre os jovens, busquei enfatizar
a sociabilidade entre eles, como parte do processo de construção de identidades.
Considerações Finais
Neste sentido, o entendimento do papel (se é que posso falar assim) das redes
sociais no cotidiano dos jovens, e, consequentemente, formas de transição para a vida
adulta, implicou identificar as redes ou comunidades que os jovens mais acessam e
acompanhar as mensagens e informações que trocam e divulgam. Devo salientar que
analisar as redes sociais dos jovens, significa considerar as relações de sociabilidade que
estabelecem no cotidiano, levando em conta a importância que dão para a interação,
para estar com o outro no cotidiano, configurando a relação de alteridade estudada pela
antropologia (MALINOWSKI, 1978; GEERTZ,1989; MAUSS, 2003), dos significados
do que comunicar nas redes virtuais, quando, para quem, buscar companhia, mostrar
poder, etc.
A socialização, como sabemos, consiste num processo, ao mesmo tempo, de
ingresso e construção da vida social, de interação em que se costuma dar atenção para
regras, expectativas, posições e significados ligados, principalmente, ao que a família
considera ser importante “transmitir” às novas gerações (MAYER, 1970; BERGER e
BERGER, 1984; VELHO, 1987; SILVA, 2004). O contexto para entendimento dos
significados das redes virtuais no cotidiano consiste na visão de mundo que os jovens
compartilham e quais significados estão presentes nas formas de acesso e do que
representa estar com o outro.
De acordo com o que pude observar em pesquisas anteriores (ANDERSON
2013a; 2013b), a socialização na contemporaneidade, tem sido alvo de constantes
debates, principalmente na TV, tendo como pano de fundo as novas formas de
sociabilidade e interação trazidas pela modernidade, como os jogos de computador e a
Internet (SETTON, 2002 e 2005; MOLLO-BOUVIER, 2005; MONTANDON, 2001 e
2005; SARMENTO, 2005; BELLONI, 2007; VIEIRA, 2012). O que estes autores estão
enfatizando é que na sociedade contemporânea (particularmente) a escola e a família
não estão sozinhas na tarefa de socializar, abrindo espaço para outros agentes de
socialização (mídia, cursos de idiomas e esportes, colônias de férias), tendo as redes
virtuais um peso muito importante nisso. Neste sentido, cabe investigar como os jovens
pensam e utilizam as redes sociais e de que maneira vão construindo suas opiniões
sobre as suas experiências de vida.
Neste sentido, o interesse deste trabalho consistiu em observar os significados
citados pelos jovens para as redes sociais no seu cotidiano. Partiu da ideia de redes
virtuais como sinônimo das redes sociais elaboradas por Bott (1951), no sentido
ampliado do termo, para incluir as redes virtuais e clássicas, como destaca Dornelles
(2004).
Compreender significados relacionados às redes virtuais no universo dos
estudantes indica um leque de relações dentro e fora da sala de aula, que enfatiza qual
percepção têm estar com o outro, principalmente através das redes virtuais, traduzido na
importância de “estar conectado” no seu cotidiano e a como as redes virtuais se
estabelecem como instrumentos para construção de identidade.
Hall (1994), em estudo sobre a identidade na pós-modernidade, mostra que aquilo
que as pessoas falam de si está intimamente relacionado ao contexto da sociedade mais
ampla e que, no contexto da pós-modernidade, muitas referencias podem ser tomadas
para as pessoas se identificarem (família, trabalho, religião, estilo de música, lugar que
mora). Considerando essas múltiplas formas de interação na vida do indivíduo, o
referido autor chama atenção para como seus interesses são confrontados com o do
grupo, através das formas de interação nas redes sociais.
Cumpre dizer que nem todos os entrevistas, mesmo visitando as páginas de
relacionamento diariamente, não costumam publicar fotos ou mensagens de sua vida
pessoal, ao contrário, preferem apenas “olhar” as publicações de amigos e seguidores
sem ao menos postar uma vez por semana. Isso se destaca quando os usuários não
querem se expor ou acham algumas coisas fúteis demais para postar.
É neste ponto que dar atenção ao ponto de vista do sujeito envolvido marca a
compreensão da sociabilidade hoje, pois cabe observar e compreender como este
articula interesses e toma suas decisões, levando em conta a reflexividade de que
Cardoso de Oliveira (2002) nos fala. O contexto atual, em que as tecnologias e a rapidez
com que as informações são processadas consistem no ponto de reflexão de Giddens
(1993), Castells (1999), Bauman (2001).
Assim, as redes virtuais funcionam como espaço de manifestação de identidade,
em que a interação não ocorre no anonimato e a pessoa tem a opção de escolher o que
dizer, como, para quem (no Facebook, por exemplo, as pessoas podem “curtir”,
“comentar” e/ou “compartilhar” informações com os amigos). Neste caso, não está em
questão discutir a veracidade dos discursos dos sujeitos sobre suas identidades (ORTIZ,
1994).
Neste sentido, posso dizer que a janela de contatos sociais que a Internet pode
disponibilizar, em especial para os jovens, comporta também a necessidade de
compreender o universo dos estudantes dentro e fora da sala de aula, enfatizando qual
percepção têm estar com o outro, principalmente através das redes virtuais, investigando
a importância de “estar conectado” no seu cotidiano e a como as redes virtuais se
estabelecem como instrumentos para construção de identidade.
Referências:
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