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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAFaculdade de Filosofia e Cincias Humanas
Departamento de PsicologiaPrograma de Ps-Graduao em Psicologia
FABOLA MARINHO COSTA
Salva
200
MLTIPLOS COMPROMETidentificando padres e exp
trabalhadores de or
IMENTOS NO TRABALHO:lorando antecedentes entreganizaes agrcolas
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao emPsicologia da Universidade Federal da Bahia, como parte dosrequisitos para obteno do ttulo de Mestre em Psicologia.
rea de concentrao: Psicologia Social e do Trabalho
Orientador: Prof. Dr. Antonio Virglio Bittencourt Bastos
dor
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Mltiplos comprometimentos no trabalho:identificando padres e explorando antecedentes entre
trabalhadores de organizaes agrcolas
FABOLA MARINHO COSTA
BANCA EXAMINADORA:
________________________________________________________
Prof. Dr. Antonio Virglio Bittencourt Bastos (Orientador)
________________________________________________________
Profa. Dra. Snia Regina Pereira Fernandes
________________________________________________________
Prof. Dr. Jos Albertino Lordelo
Dissertao defendida e aprovada em: 17 / 06 / 2005
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Ao meu Amor, Roberval,que honrou seu compromisso
de amar e respeitarna alegria e na tristeza,
na sade e na doena,na euforia e no desespero,
todos os dias do meu mestrado.
Aos meus pais, Cristiano e Eny,pela histria, pelo lar,
pela doao, pelo 'a mais'.
Aos meus irmos,Leonardo e Camila,
companheiros de vida.
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Agradecimentos
O presente trabalho contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientfico - CNPq e da Fundao de Amparo Pesquisa do Estado da Bahia -
FAPESB, instituies que garantiram o suporte financeiro pesquisa, alm das bolsas
concedidas autora da presente dissertao pelo Programa de Capacitao para o
Ensino Superior - PROCES, no perodo de junho de 2003 a maro de 2004, e pela
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado da Bahia - FAPESB, no perodo de um ano,
com incio em maio de 2004. Apoios essenciais para a realizao deste trabalho.
Ao ISP, onde tudo comeou e onde amigos eu ganhei. Desde 1998, como bolsista de
iniciao cientfica, o ISP vem sendo o lugar de grandes aprendizados, que no se
restringe aos acadmicos. Espao de encontro com autores e amigos, com mestres e
aprendizes, com amigos de vida acadmica e, simplesmente, amigos. Aos Ispianos. Em
especial a Zez, sempre dedicada e eficiente, e a Regina, pela alegria.
Aos alunos do tirocnio docente, que acolheram com respeito a inexperincia e fizeram
do 'primeiro lecionar' uma feliz experincia.
Aos amigos e familiares pela presena e pelo esforo em compreender minhas
ausncias.
Aos trabalhadores e s organizaes agrcolas pela receptividade.
"Se os frutos produzidos pela terraAinda no so to docesE polpudos quanto as prasDa tua ilusoAmarra o teu arado a uma estrelaE os tempos daroSafras e safras de sonhosQuilos e quilos de amorNoutros planetas risonhosOutras espcies de dor"
Amarra o teu arado a uma estrela (Gilberto Gil)
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Aos trabalhadores temporrios que tanto me fizeram pensar na efemeridade da vida.
"Sabes ao que estou me referindoPorque todo tamarindo temO seu agosto azedoCedo, antes que o janeiroDoce manga venha ser tambm"
Refazenda (Gilberto Gil)
s colegas de mestrado que participaram da caminhada: Aldinia Souza, Ana Karina
Santos, Ana Patrcia Borges, Ana Rita Fraga, Cristiane Sampaio, Dafne Suit, Gilca
Siebra, Giovana Mesquita, Hortnsia Brando, Maria Vitria Moinhos e Verena Freire.
Em especial s "colegas leitoras" Mrcia Tironi e Mrcia Fraser.
"Devia ter amado mais, ter chorado maisTer visto o sol nascerDevia ter arriscado mais e at errado maisTer feito o que eu queria fazer(...)Devia ter complicado menos, trabalhado menosTer visto o sol se prDevia ter me importado menos com problemas pequenosTer morrido de amor"
Epitfio (Srgio Britto)
Aos companheiros do grupo de pesquisa (Ana Carolina Rodrigues, Ana Carolina
Lima, Antonio Virglio Bastos, Elizabeth Loiola, Frailan Mota, Igor Menezes, Ingrid
Rapold, Janice de Souza, Jonas Zaidys, Jorge Neris, Karina Ude, Lzaro Brando, Lvia
Melo, Luciana Dantas, Magno Macambira, Maria Fernanda Pimenta, Rebeca Grangeiro
e Vnia Costa) e aos entrevistadores (Hamilton, Ivna, Luiz Fernando, Milena, Naiara e
Roberval), que juntos fizeram acontecer.
"Todos juntos somos fortesSomos flecha, somos arcoTodos ns num mesmo barcoNo h nada pra temer"
Todos juntos (Enriquez, Bardotti e Chico Buarque)
Em especial, a Ana Carolina de Aguiar Rodrigues, fiel escudeira, e a Henrique
Morais e Ivan Faria, primeiros companheiros de pesquisa.
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Aos professores pelo simples exerccio da profisso.
" Sabe, gente tanta coisa pra gente saberO que cantar, como andar, onde irO que dizer, o que calar, a quem querer(...)Eu preciso aprender a ser sReagirE ouvirO corao responder:"Eu preciso aprender a s ser"
Preciso aprender a ser s (Gilberto Gil)
Em especial, a Virglio Bastos pelo seu compromisso em ensinar e formar
pesquisadores. A Snia Regina Fernandes por ajudar a ver o caminho e pelas
orientaes desde a graduao at as qualificaes no mestrado. A Ana Ceclia Bastos
por ser a prova de que a poesia sobrevive academia. A Snia Gondim pela defesa da
'qualidade' e por me fazer acreditar. A Marcos Emanoel Pereira por falar da
'quantidade' e por me fazer desconfiar. A Eulina Lordelo pela sua dedicao ao
PROCES. A Antonio Marcos Chaves pelas tardes de 'saber'. Aos professores,
Helmuth Krger, Paulo Menandro e Maria Lcia Moura, pelos importantes
comentrios nas qualificaes.
Ao meu orientador, Antonio Virglio Bittencourt Bastos, por tudo que venho dizendo
e por tudo o que eu no sei dizer. Pela paternidade da minha vida acadmica; por
proporcionar o 'feijo com arroz' para que um dia possa cham-lo, enfim, de colega;
pelos escritos que muito me ajudaram, em especial, pela 'bblia' - sua tese de doutorado;
pela presena na ausncia; pela oportunidade de exercitar o 'aprender a dividir'; por me
questionar se eu esperava coerncia do ser humano; por me falar do mito do erro zero;
pelos preciosos vnculos afetivo e instrumental; pela estrada percorrida...
" Voc me faz correr demaisOs riscos desta highwayVoc me faz correr atrsDo horizonte desta highway(...)
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'Ser a estrada uma priso?'Eu acho que sim,voc finge que no(...)Eu vejo um horizonte trmuloEu tenho os olhos midosEu posso estarcompletamente enganadoPosso estar correndoPro lado erradoMas a dvida o preo da pureza intil ter certeza"
Infinita Highway (Humberto Gessinger)
minha famlia pelo alicerce.
"a gua molhao tempo passae l em casa est tudo beml em casa est tudo bemdireitinhodireitinhodireitinho(...)
a folha caia chuva caie a famlia vai muito bema famlia vai muito bemdireitinhodireitinhodireitinho"
Direitinho (Arnaldo Antunes)
Aos meus pais, Cristiano e Eny, e meus irmos, Leonardo e Camila, por manterem
tudo direitinho. Aos meus avs e padrinhos, Jos Costa e Lourdes, que, mesmo sem
entender o que um mestrado, ajudaram. Ao meu marido, Roberval, meus sogros,
Jaime e Yda, e meus cunhados, Rogrio e Ronaldo, que, sempre a postos, tambm
fazem parte desta histria. Aos meus "irmos, sobrinhos e filhos", Snoopy, Tito,
Tico, Lurdeca e Lola, pelos singelos momentos de alegria.
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Ao meu amor, Roberval, por cuidar de mim.
"O amor como a rosa no jardimA gente cuida, a gente olha, a gente deixa o sol baterPra crescer, pra crescerA rosa do amor tem sempre que crescerA rosa do amor no vai despetalarPra quem cuida bem da rosaPra quem sabe cultivar"
Amor at o fim (Gilberto Gil)
Aos dois anos vividos no mestrado, pelo tempo, embora corrido, prazeroso.
"Tempo tempo mano velhoFalta um tanto ainda eu seiPra voc correr macioComo zune um novo sedTempo tempo mano velhoVai, vai, vai...Tempo amigo seja legalConto contigo pela madrugadaS me derrube no final"
Sobre o tempo (John)
Ao grande dia, pela esperana de ter feito o melhor que podia e de fazer melhor um
dia.
"Um cara que anda tem que chegar em algum lugarUm cara que trabalha, trabalha, trabalha deve se cansarO cara estuda tanto e ainda tem tanto pra aprenderPassa o tempo e fica mais fcil esquecerNo h o que lamentarQuando chega o fim do diaSe despede da sua dorDiz adeus sua alegria"
Fim do dia (Arnaldo Antunes e Paulo Miklos)
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E aos prximos dias, poesia.
Liberdade (Fernando Pessoa)
Ai que prazerNo cumprir um deverTer um livro para lerE no o fazer!Ler maada,Estudar nada.O sol doiraSem literatura.
O rio corre, bem ou mal,Sem edio original.E a brisa, essa,De to naturalmente matinal,Como tem tempo no tem pressa ...
Livros so papis pintados com tinta.Estudar uma coisa em que est indistintaA distino entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor, quando h bruma,Esperar por D. Sebastio,Quer venha ou no!
Grande a poesia, a bondade e as danas ...Mas o melhor do mundo so as crianas,Flores, msica, o luar, e o sol, que pecaS quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto Jesus Cristo,Que no sabia nada de finanasNem conta que tivesse biblioteca ...
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"Eu sou o bom pastor.O bom pastor d a vida por suas ovelhas.
O mercenrio, que no pastore no dono das ovelhas,
v o lobo chegar,abandona as ovelhas e foge,e o lobo as ataca e dispersa.
Pois ele apenas um mercenrioe no se importa com as ovelhas."
(Evangelho segundo So Joo 10, 11-13)
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SUMRIO
RESUMO ___________________________________________________________ xii
ABSTRACT ________________________________________________________ xiii
INTRODUO _______________________________________________________ 1
PARTE I - MARCO TERICO-CONCEITUAL _____________________________ 6CAPTULO 1 - Comprometimento no trabalho: bases conceituais e reviso deliteratura _________________________________________________________________ 6
Comprometimento organizacional: perspectiva unidimensional____________________________12Comprometimento: perspectiva multidimensional com focos _____________________________18Comprometimento organizacional: perspectiva multidimensional com bases _________________22Mltiplos comprometimentos: articulando focos e bases _________________________________34Comprometimento e contrato de trabalho _____________________________________________37
CAPTULO 2 - As organizaes agrcolas e os contratos de trabalho no ploJuazeiro/Petrolina_________________________________________________________ 41
PARTE II - ASPECTOS METODOLGICOS _____________________________ 58CAPTULO 3 - Delimitao do problema investigado ___________________________ 58
Objetivos da investigao _________________________________________________________59Modelo da investigao___________________________________________________________60
CAPTULO 4 - Desenvolvimento do estudo ___________________________________ 63Participantes: organizaes e trabalhadores ___________________________________________63Instrumento de coleta de dados _____________________________________________________67Procedimento de coleta de dados____________________________________________________70Anlise dos dados _______________________________________________________________72
PARTE III - RESULTADOS E DISCUSSO ______________________________ 75CAPTULO 5 - Comprometimento no trabalho: intensidade e relao com variveisantecedentes _____________________________________________________________ 76
CAPTULO 6 - Padres de comprometimento: distribuio em grupos e seusantecedentes _____________________________________________________________ 96
Os vnculos de comprometimento frente organizao e ao trabalho _______________________96As bases afetiva e instrumental do comprometimento organizacional ______________________111
PARTE IV - CONSIDERAES FINAIS________________________________ 127
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ___________________________________ 138
ANEXOS
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RESUMO
Atualmente, o comprometimento, atitude que reflete sentimentos como apego,identificao ou lealdade com o objeto de compromisso, tem recebido grande atenodos pesquisadores, sendo considerado um importante conceito para a compreenso decomo se articulam os vnculos das pessoas com seus trabalhos e empresasempregadoras. Nas organizaes, os indivduos possuem uma srie de compromissos -com o trabalho, com a organizao -, assim como existem diferentes processospsicolgicos que embasam seus vnculos - de base afetiva, instrumental -, o quecaracteriza uma abordagem multidimensional do fenmeno e conduz pesquisa decomo esses mltiplos vnculos so articulados. Apoiando-se nessa perspectiva, nopresente estudo, toma-se como unidade de anlise trabalhadores de organizaesagrcolas do plo Juazeiro/Petrolina, pelo que essas representam de inovaotecnolgica e organizacional no contexto agrrio nordestino do Brasil. Considerando aespecificidade deste contexto agroindustrial, analisa-se a relao entre a natureza doscontratos de trabalho e os vnculos com o trabalho e a organizao, investigando comoesses se configuram. Trata-se de um estudo extensivo de corte transversal, em 32organizaes agrcolas, envolvendo uma amostra de 919 trabalhadores. Os dados foramcoletados atravs de entrevistas estruturadas e analisados com o auxlio do programaSPSS. Foram realizadas anlises estatsticas descritivas, anlises de varincia, anlisesde contingncia e utilizados procedimentos de cluster analysis para identificar padresde comprometimento. A amostra foi constituda, predominantemente, por homens,pessoas casadas, jovens, com pouca escolaridade e que realizam atividades de campo.Observou-se que 71,3% dos trabalhadores eram permanentes. Dentre os temporrios,61,0% estavam trabalhando na empresa pela primeira vez e 39,0% j trabalharam maisde uma vez na empresa como temporrios. Verificou-se que os trabalhadoresapresentaram elevados escores de comprometimento com o trabalho (6,42 - mdia emuma escala de 7 pontos) e com a organizao (5,83), assim como no que diz respeito sbases do comprometimento organizacional (5,30 - afetiva - e 5,22 - instrumental).Embora no tenham sido encontradas diferenas estatisticamente significantes entretrabalhadores temporrios e permanentes, observou-se que os temporrios que estavamtrabalhando pela primeira vez na empresa eram menos comprometidos com aorganizao do que os demais. Esses trabalhadores, no entanto, eram maiscomprometidos instrumentalmente com a organizao do que os trabalhadorespermanentes. As anlises possibilitaram, adicionalmente, a identificao de quatrodiferentes padres de comprometimento tanto frente aos focos, quanto frente s bases decomprometimento organizacional, sendo predominantes aqueles com nveis decompromisso elevados. O presente estudo abre uma ampla agenda para a continuidadede pesquisas sobre comprometimento e enfatiza a importncia de investigar essefenmeno psicossocial, considerando a diversidade de contextos e de vnculoscontratuais estabelecidos entre trabalhadores e organizaes.
Palavras-chave: comprometimento organizacional, comprometimento com o trabalho,contrato de trabalho, organizaes agrcolas, trabalhadores rurais.
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ABSTRACT
Presently, it is known that commitment, an attitude which reflects feelings such asattachment, identification or loyalty to the object to which one compromises himself,has received great attention from researchers, and it is considered an important conceptto understanding how bonds between people and their works and employing companiesare made. In organizations, individuals have a series of commitments - to work, to theorganization-, just as there are different psychological processes that support thosebonds - (affectively and instrumentally based), what characterizes this as amultidimensional approach to the phenomenon and leads to researching how themultiple bonds are made. In this approach, at the present study, we take as unity ofanalysis workers from agricultural organizations of the Juazeiro/Petrolina pole, becausethese companies represent technological and organizational innovation in theagricultural context of the northeast of Brazil. Considering the specificity of thisagroindustrial context, we analyze the relationship between the nature of work contractsand the bonds with work and the organization, investigating how they are configurated.This is a cross-sectional extensive study, in 32 agricultural organizations, involving a919 workers sample. The data were collected with structured interviews and analyzedby the SPSS program. Descriptive statistical analyses, variance analyses andcontingence analyses were made, as were also cluster analysis procedures used toidentify commitment patterns. The sample was constituted mainly by men, married,young, not highly educated and that were rural workers. We observed that 71,3% of theworkers were permanent. Among the temporary workers, 61,0% were working at thecompany for the first time and 39,0% had already worked at he company as temporaryworkers. We found out that the workers presented high scores for commitment to work(6,42- average in a 7 point-scale) and to the company (5,83), just as in what comes tothe bases of commitment (5,30 - affective and 5,22 - instrumental). Although thereweren't found any statistically significant differences between temporary and permanentworkers, we observed that the temporary ones that were working at the company for thefirst time were less committed to the organization than the others. These workers,however, were more instrumentally committed to the organization than the permanentones. In addition, the analyses made possible the identification of 4 commitmentpatterns, not only related to the foci, but also related to the bases of organizationalcommitment, being prevailing the patterns with high levels of commitment. The presentstudy opens a new large agenda for the continuity for researchs on commitment andemphasizes the importance of investigating this psico-social phenomenon, consideringthe diversity of contexts and contractual bonds established between workers andorganizations.
Key-words: organizational commitment, commitment to work, work contract,agricultural organizations, rural workers.
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LISTA DE FIGURAS
Figura Pgina
Figura 01 - Modelo terico do trabalho emprico. 61
Figura 02 - Mdias dos comprometimentos. 76
Figura 03 - Mdias de comprometimento por padres (focos). 97
Figura 04 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(focos). 98
Figura 05 - Importncia do trabalho por padres de comprometimento (focos). 102
Figura 06 - Satisfao com o trabalho por padres de comprometimento(focos). 103
Figura 07 - Mdias de comprometimento por padres (bases). 112
Figura 08 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(bases). 113
Figura 09 - Importncia do trabalho por padres de comprometimento (bases). 117
Figura 10 - Satisfao com o trabalho por padres de comprometimento(bases). 118
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LISTA DE TABELAS
Tabela Pgina
Tabela 01 - Caractersticas dos participantes por durao do contrato detrabalho. 66
Tabela 02 - Estatsticas descritivas que caracterizam as medidas decomprometimento. 77
Tabela 03 - Mdias de comprometimento por caractersticas pessoais. 78
Tabela 04 - Mdias de comprometimento por caractersticas pessoaisrelacionadas ao trabalho. 82
Tabela 05 - Mdias de comprometimento por caractersticas relativas aotrabalho. 85
Tabela 06 - Nmero e percentual de trabalhadores por tipo de contrato detrabalho. 89
Tabela 07 - Mdias de comprometimento por contrato de trabalho. 90
Tabela 08 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(focos) e caractersticas pessoais. 99
Tabela 09 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(focos) e caractersticas pessoais relacionadas ao trabalho. 101
Tabela 10 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(focos) e caractersticas relativas ao trabalho. 104
Tabela 11 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(focos) e contrato de trabalho. 105
Tabela 12 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(bases) e caractersticas pessoais. 114
Tabela 13 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(bases) e caractersticas pessoais relacionadas ao trabalho. 116
Tabela 14- Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(bases) e caractersticas relativas ao trabalho. 119
Tabela 15 - Percentual de trabalhadores por padres de comprometimento(bases) e contrato de trabalho. 121
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LISTA DE QUADROS
Quadro Pgina
Quadro 01 - Itens adaptados das escalas de comprometimento utilizadas. 68
Quadro 02 - Sntese das caractersticas pessoais e relativas ao trabalho frenteaos comprometimentos. 92
Quadro 03 - Sntese dos aspectos que caracterizam os padres decomprometimento (focos). 107
Quadro 04 - Sntese dos aspectos que caracterizam os padres decomprometimento (bases). 122
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INTRODUO
Existe uma slida tradio de pesquisa na rea do comprometimento, que se tornou,
sobretudo nos ltimos dez anos, um dos tpicos de pesquisa mais intensamente
estudados no campo da pesquisa micro-organizacional, tanto no exterior quanto no
Brasil. No entanto, as agendas de pesquisa, estabelecidas por diversos autores
considerados clssicos nesse campo de estudo, apontam lacunas e novos desafios para
esse domnio de pesquisa (Bastos, 1994; Bastos, 1995; Medeiros, Albuquerque,
Siqueira & Marques, 2002). Dentre os possveis avanos na rea, pode-se incluir a
incorporao de contextos organizacionais e segmentos de trabalhadores ignorados ou
muito esporadicamente estudados na pesquisa acadmica em Psicologia Organizacional.
At ento, os estudos sobre comprometimento foram conduzidos em empresas
industriais e de servio, quase sempre localizadas em grandes centros ou em suas reas
metropolitanas.
O presente estudo incorpora aos estudos acerca do comprometimento a investigao de
segmentos da agricultura moderna e agroindstria, analisando um contexto
extremamente importante para a economia dos Estados da Bahia e de Pernambuco. As
organizaes agrcolas do plo Juazeiro/Petrolina foram o campo de anlise deste
estudo, tendo como foco principal trabalhadores que vivenciam uma agricultura
moderna em tecnologias fsicas e organizacionais. Buscou-se caracterizar o trabalhador
em termos dos seus contratos de trabalho e de seus vnculos com o trabalho e a
organizao, investigando como esses se configuram. Foi explorado, portanto, o
complexo vrtice que une indivduos, trabalho e organizaes, utilizando-se o
comprometimento como referencial terico para a investigao. Articula-se, portanto,
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um tpico clssico, e ao mesmo tempo atual de pesquisa, a um contexto no qual ainda
no fora estudado e cuja dinmica tecnolgica e organizacional tem impacto profundo
em uma regio desafiada a superar seus fracos indicadores sociais e econmicos. Tal
mudana de contexto para o estudo do comprometimento impe vrios desafios.
A Psicologia, afirma Albuquerque (2002), tem se voltado, preferencialmente, para o
estudo de fenmenos psicossociais do ambiente urbano, conseqentemente, a
metodologia e os instrumentos utilizados so baseados e pensados para a populao
urbana. Nesse sentido, "... ao analisarmos o rural, devemos ter o cuidado de
despojarmo-nos dos nossos olhos urbanos" (Albuquerque, 2002, p. 41). Mariutti (1998)
tambm discute a soberania de anlises elaboradas sob o ponto de vista eminentemente
urbano. Mesmo quando o foco de estudo o campo e as relaes de produo na
agricultura, o urbano se constitui como referencial, sendo o ambiente rural usualmente
enquadrado como um estgio anterior. Mariutti (1998) argumenta que elementos
tipicamente rurais, como por exemplo, a relao entre o homem e a natureza e o
estabelecimento de relaes sociais entre os prprios homens, devem ser estudados,
centrando o foco de anlise realmente no campo.
Alm do desafio referente ao novo contexto estudado, o presente estudo tambm
focaliza uma temtica de relevncia para os estudos sobre comprometimento que
envolve as relaes contratuais entre trabalhadores e organizaes. As novas relaes de
trabalho, que vm sendo estabelecidas na atualidade, impem maior complexidade nas
interaes entre os trabalhadores e as organizaes, fazendo emergir novos tipos de
contratos de trabalho e impactando no comprometimento dos indivduos. Se, por um
lado, as organizaes dependem cada vez mais de uma fora de trabalho envolvida e
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comprometida com o xito dos objetivos organizacionais, por outro, h evidncias de
que decresce o grau de lealdade s organizaes, com as pessoas mudando de empregos
e de ocupaes mais freqentemente (Bastos, 1994).
Nos contextos organizacionais, o gestor vem assumindo o grande desafio de ter sob sua
superviso, a um s tempo, empregados efetivos, terceirizados, autnomos, especialistas
e consultores, com os quais so estabelecidos diferentes contratos e mltiplos vnculos
(Sansur, Canado, Fernandes & Steuer, 2002). nesse contexto de questionamentos
sobre a continuidade do emprego, de precarizao das relaes de trabalho e de estmulo
a que cada trabalhador construa a sua carreira, no tendo como referncia central uma
organizao empregadora, que as organizaes mais necessitam de uma fora de
trabalho efetivamente comprometida com sua misso e valores (Bastos, 1998). Nesse
sentido, torna-se importante investigar a natureza e os fatores associados emergncia
de vnculos de compromisso entre trabalhadores e diferentes aspectos do seu mundo do
trabalho, a partir do constructo comprometimento no trabalho.
A presente investigao encontra-se vinculada ao Projeto "Os vnculos com o trabalho e
os processos de mudana no padro de explorao agrria: um estudo entre empresas e
trabalhadores da fruticultura nordestina", que vem sendo desenvolvido pelo grupo de
pesquisa Indivduo, Trabalho e Organizaes: aspectos psicossociais. Em suas linhas
gerais, o referido Projeto integrado por trs etapas, que se articulam em torno do
objetivo geral: compreender como os trabalhadores de empresas da fruticultura, que
atuam no semi-rido nordestino, articulam seus vnculos com o trabalho e vivenciam as
transies decorrentes de sua insero nesse tipo particular de empreendimento, que
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representa uma inovao significativa no modo de produo agrrio da regio. Os dados
discutidos nesta dissertao foram coletados na segunda etapa do Projeto.
Esta dissertao est estruturada em quatro partes, estando algumas dessas divididas em
captulos. A Parte I composta pelo marco terico-conceitual e compreende dois
captulos. No Captulo 1, so abordados os vnculos do trabalhador com o trabalho e a
organizao, a partir do constructo do comprometimento, apresentando uma reviso de
literatura pautada em estudos mais recentes. No Captulo 2, apresentado o contexto
no qual a pesquisa foi realizada - regio do plo Juazeiro/Petrolina -, focando as
modernas organizaes agrcolas, beneficiadas pelos projetos de irrigao. Em seguida,
so apresentados alguns dos distintos contratos, entendidos como o vnculo de emprego
entre trabalhador e organizao, estabelecidos no meio rural.
Os aspectos terico-metodolgicos so abordados na Parte II. No Captulo 3,
encontra-se a delimitao do problema investigado, onde so apresentados os objetivos
da investigao e o modelo do trabalho emprico. No Captulo 4, so descritos os
participantes da pesquisa, o instrumento de coleta de dados e os procedimentos
envolvidos na coleta e anlise dos dados.
Na Parte III, so apresentados e discutidos os resultados da pesquisa em dois captulos.
No Captulo 5, caracteriza-se os participantes da pesquisa frente a variveis pessoais e
relativas ao trabalho, considerando o comprometimento com os focos - trabalho e
organizao - e as bases - afetiva e instrumental. Posteriormente, so caracterizados os
tipos de contratos de trabalho estabelecidos entre os trabalhadores e suas organizaes
empregadoras. No Captulo 6, descreve-se como os trabalhadores das organizaes
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agrcolas articulam os vnculos de comprometimento com dois diferentes focos do seu
contexto de trabalho - organizao e trabalho -, apresentando os quatro padres de
comprometimento identificados. Ainda nesse captulo, tomando como foco a
organizao, apresenta-se a descrio de como os trabalhadores articulam elementos
afetivos e instrumentais como bases para a sua relao com a organizao empregadora.
Em ambos os captulos so analisadas as relaes de algumas variveis antecedentes
com os padres identificados.
Por fim, na Parte IV, so apresentadas as consideraes finais, analisando contribuies
e limitaes do estudo, alm de recomendaes para futuras pesquisas.
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PARTE I - MARCO TERICO-CONCEITUAL
CAPTULO 1 - Comprometimento no trabalho: bases conceituais e reviso de
literatura
O presente captulo discorre acerca do comprometimento no trabalho. Em um primeiro
momento, ser tratado de forma breve o conceito e as abordagens dominantes na
investigao do comprometimento. Em seguida, ser apresentada a reviso de literatura
que se divide em estudos acerca do comprometimento dentro de uma perspectiva:
unidimensional, tendo como foco a organizao; multidimensional, com mltiplos
focos; multidimensional, com mltiplas bases; multidimensional, que tentam articular
os mltiplos focos e as mltiplas bases. Por fim, sero apresentados estudos que
relacionam o comprometimento com diferentes tipos de contrato de trabalho.
Vrios conceitos foram construdos por estudiosos para representar uma srie de reaes
dos indivduos dirigida ao trabalho executado e organizao empregadora, objetos
intimamente relacionados entre si, porm capazes de desencadear percepes, afetos,
intenes e aes diferenciados nos trabalhadores (Siqueira & Gomide Jnior, 2004).
Dentre esses, surgiu o conceito psicossocial de 'comprometimento'.
Atualmente, o comprometimento no trabalho tem recebido grande ateno dos
pesquisadores, sendo considerado um importante conceito para a compreenso de como
se articulam os vnculos das pessoas com seus trabalhos e empresas empregadoras. O
comprometimento no trabalho vem sendo concebido como um requisito de bom
desempenho, relaes interpessoais adequadas, eficincia e eficcia individuais e
organizacionais (Bastos & Costa, 2000). Rocha e Bastos (1999) consideram o
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comprometimento um conceito importante por se revestir de aspectos que atendem no
s aos interesses da organizao - um indivduo mais comprometido mais produtivo -,
como tambm aos interesses dos prprios trabalhadores, j que a falta de
comprometimento pode significar pouca perspectiva de transformar o trabalho em
instrumento de auto-realizao.
Existe, como apresentado por Bastos (1994), mltiplos significados associados ao
conceito de comprometimento. "Redundncia, ambigidade, impreciso, pulverizao
de conceitos so o quadro caracterstico" (Bastos, 1994, p. 21) da tradio de pesquisa
em comprometimento. O autor assinala os problemas que emergem por no serem
consideradas a natureza disposicional e a adverbial que o conceito traz do seu uso
cotidiano, visto que o mesmo termo utilizado para descrever dimenses valorativas
opostas.
Em sntese, na linguagem cotidiana, pelo menos trs usos do conceito de comprometimento so
mais freqentes: o primeiro aproxima-se dos conceitos de "compromisso", "com envolvimento" e
descrevem formas de como as pessoas se comportam em relao a determinados alvos; "com
comprometimento" seria o oposto de "descompromissadamente" e indicaria o grau de ateno,
esforo, cuidado que a pessoa coloca ao realizar algo. Por extenso, comprometimento passou a
significar um estado do indivduo; um estado de lealdade a algo, relativamente duradouro e que
pode ser descrito atravs de sentenas que descrevem intenes, sentimentos, desejos. Finalmente,
um terceiro uso freqente refere-se relao entre conjuntos de condies que conduzem a
produtos indesejados (comprometer como prejudicar, impedir) (Bastos, 1994, p. 25).
Em certo sentido, os usos do termo comprometimento trazem em si a noo de "algo
que amarra, ata, une" o indivduo a alguma coisa (Bastos, 1994). Quanto ao uso do
conceito comprometimento na cincia, observa-se uma reduo na sua extenso, embora
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se verifique que ele ainda traz ambigidade. "Na esfera cientfica, comprometimento
passou a significar uma adeso, um forte envolvimento do indivduo com variados
aspectos do ambiente de trabalho" (Bastos, 1994, p. 28).
O comprometimento tem sido definido como uma atitude que reflete sentimentos como
apego, identificao ou lealdade com o objeto de compromisso (Morrow, 1993). Nas
organizaes, os indivduos possuem uma srie de compromissos - com a organizao,
com o trabalho, com o grupo de trabalho, com a ocupao - que afetam seus
comportamentos no trabalho, o que caracteriza uma perspectiva multidimensional do
fenmeno e conduz pesquisa de como esses mltiplos vnculos so articulados
(Cohen, 2003).
De acordo com Siqueira e Gomide Jnior (2004), na viso contempornea que aborda
os vnculos do indivduo com a organizao e com o trabalho, esto entrelaadas e
presentes trs disciplinas - Psicologia, Sociologia e Filosofia - e diversas teorias delas
integrantes.
No estudo do comprometimento organizacional, h duas perspectivas dominantes: a
afetiva e a instrumental. Alm dessas duas perspectivas so citados por Bastos (1994): o
enfoque "sociolgico", com origem na Sociologia; o enfoque "normativo", que nasce da
interseco entre a teoria organizacional de Etzioni (1975, citado por Bastos, 1994) e a
Psicologia Social; e o enfoque "comportamental", que traz a influncia da Psicologia
Social e insere comprometimento nas teorias de atribuio.
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O estudo do comprometimento organizacional encontra-se largamente dominado pela
abordagem atitudinal/afetiva (Bastos, 1994; Bastos & Costa, 2000; Foss &
Sartoretto, 2002; Medeiros, Albuquerque & Marques, 2004; Siqueira, 2001), que
enfatiza a natureza afetiva do processo de identificao do indivduo com os objetivos e
valores da organizao, e o desejo de manter-se como membro, de modo a facilitar a
consecuo desses objetivos. Segundo Siqueira e Gomide Jnior (2004), essa
abordagem se assenta nas teorias psicolgicas sobre ligaes afetivas e na concepo de
atitudes, refletindo o entendimento de que o indivduo desenvolve uma forte
identificao com a organizao e nutre por ela sentimentos e afetos positivos ou
negativos.
Para melhor explicar o comprometimento organizacional afetivo, Siqueira e Gomide
Jnior (2004) afirmam:
Quando o indivduo internaliza os valores da organizao, identifica-se com seus objetivos, se
envolve com os papis de trabalho, desempenhando-os de forma a facilitar a consecuo dos
objetivos do sistema, e deseja permanecer trabalhando para ela, considera-se que foi desenvolvida
uma ligao psicolgica, de natureza afetiva, com a organizao (Siqueira & Gomide Jnior, 2004,
p. 316).
Mowday, Steers e Porter (1979) afirmam que o comprometimento envolve um
relacionamento ativo que busca o bem-estar da organizao, indo alm de uma postura
de lealdade passiva para com a organizao. Esses estudiosos definiram
comprometimento da seguinte forma:
Comprometimento uma relao forte entre um indivduo identificado com e envolvido numa
organizao em particular, e pode ser caracterizado por pelo menos trs fatores: (1) estar disposto
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em exercer um esforo considervel em benefcio da organizao; (2) uma forte crena e a
aceitao dos objetivos e valores da organizao; e (3) um forte desejo de se manter membro da
organizao (Mowday et al., 1979, p. 226).
Os trabalhos desenvolvidos por essa equipe de pesquisadores consolidaram uma
estratgia de pesquisa definida metodologicamente pelo uso de escalas concebidas a
partir do modelo tripartite, englobando sentimentos, crenas e intenes
comportamentais. Mesmo reconhecendo a existncia de uma corrente comportamental
na definio do comprometimento, os citados pesquisadores o assumem em uma
perspectiva atitudinal (Medeiros et al., 2004) e, portanto, defrontam-se com problemas
como o da consistncia entre atitudes e o do poder de predizer comportamentos, que no
foram equacionados dentro de modelo tripartite de atitude (Bastos, 1994).
A exemplo do que ocorre na literatura internacional, no Brasil, muitos estudos sobre
comprometimento tomam como base a perspectiva afetiva, utilizando o instrumento
OCQ Organizational Commitment Questionnaire, proposto por Mowday et al. (1979).
Esse questionrio foi traduzido e adaptado para o contexto brasileiro por Borges-
Andrade, Afanasieff e Silva (1989), que obtiveram um bom ndice de consistncia
interna. A partir desse trabalho pioneiro, outros estudos surgiram, utilizando o mesmo
instrumento e modelos explicativos bastante semelhantes (Bastos, 1994).
De acordo com Bastos (1994), a segunda perspectiva dominante entende o
comprometimento em funo das recompensas e custos associados com a condio de
membro da organizao. Sendo chamada de instrumental, calculativa, continuao ou
side-bets, essa vertente define o comprometimento com a organizao como a tendncia
do trabalhador a se manter nela engajado devido aos custos associados sua sada. O
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compromisso instrumental, de acordo com Siqueira e Gomide Jnior (2004), insere-se
em concepes sociolgicas sobre relaes de troca e cognitivistas sobre crenas
desenvolvidas por indivduos trabalhadores acerca de suas relaes com a organizao.
Os estudos de Becker so apontados pelos estudiosos da rea (Bastos, 1994; Foss &
Sartoretto, 2002; Medeiros & Enders, 1997; Medeiros et al., 2002; Medeiros & Enders,
1998; Medeiros, Enders, Sales, Oliveira & Monteiro, 1999; Moraes, Marques, Kilimnik,
Pereira & Santos, 1997; Siqueira, 2001; Siqueira & Gomide Jnior, 2004; Tamayo,
Souza, Vilar, Albernaz, Ramos & Ferreira, 2000) como a origem do comprometimento
instrumental, descrito como uma tendncia do indivduo a permanecer na organizao -
ao consistente -, devido a percepes individuais sobre custos e benefcios associados
a sua sada, que seriam as trocas laterais.
A manuteno de uma dada linha de ao consistente seria resultante da acumulao ao longo do
tempo de side-bets, termo utilizado pelo autor [Becker] para se referir a algo de valor (tempo,
esforo, dinheiro) investido pelo indivduo durante sua relao com outro objeto, que seria
perdido, ou percebido como um custo, caso a interao cessasse (Siqueira, 2001, p. 3).
O comprometimento instrumental de um empregado com uma organizao pode ser
entendido, portanto, pelo ato do indivduo nela permanecer, causado por percepes
individuais sobre investimentos feitos, resultados alcanados na organizao e custos
associados sua perda. Parece, portanto, existir um processo cognitivo avaliativo,
atravs do qual o trabalhador faz uma anlise da sua relao com a organizao
empregadora (Siqueira, 2001; Siqueira & Gomide Jnior, 2004).
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As duas perspectivas dominantes no estudo do comprometimento organizacional -
afetiva e instrumental - partilham uma mesma estratgia metodolgica: "usam
largamente estudos de corte-transversal, desenvolvem escalas para mensurar os diversos
construtos envolvidos nos modelos tericos submetidos a teste e recorrem anlise
quantitativa dos dados obtidos" (Bastos, 1994, p. 44).
Comprometimento organizacional: perspectiva unidimensional
A literatura internacional apresenta alguns estudos que privilegiam apenas o foco
organizao (Currivan, 1999; Francesco & Chen, 2004; Gaertner, 2000; Grunberg,
Anderson-Connolly & Greenberg, 2000; Nystedt, Sjberg & Hgglung, 1999; Perry,
2004; Peterson, 2004; Pittinsky & Shih, 2004; Rhoades, Eisenberger & Armeli, 2001;
Scotter, 2000; Sjberg & Sverke, 2000; Wright & Bonett, 2002), no assumindo uma
perspectiva multidimensional.
Como possvel observar a partir da reviso de literatura da rea, muitas investigaes
acerca do comprometimento tm sido desenvolvidas para identificar, simultaneamente
ou no, fatores antecedentes, outros conceitos j existentes na literatura que so
correlatos e, por fim, fatores conseqentes. Alguns estudos da rea (Bastos, 1994; Fink,
1992; Mathieu & Zajac, 1990; Meyer & Allen, 1997; Mowday, et al., 1982; Siqueira &
Gomide Jnior, 2004; Scheible, 2004; Tamayo, Souza, Vilar, Ramos, Albernaz &
Ferreira, 2001) vm discutindo os antecedentes, correlatos e conseqentes, e nortearam
as afirmaes seguintes.
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So inmeras as variveis consideradas antecedentes ou preditoras do
comprometimento, que podem ser agrupadas como: caractersticas pessoais,
caractersticas do trabalho e caractersticas organizacionais. Dentre as caractersticas
pessoais, so estudadas variveis como: sexo; estado civil; idade; escolaridade; tempo
no cargo; tempo na organizao; percepo de competncia; habilidades; salrio; e nvel
do cargo. As caractersticas do trabalho so: autonomia na tarefa; variedade de
habilidades; desafio; relao com o supervisor; e desenho do cargo. J entre as
caractersticas organizacionais so estudadas: tamanho, centralidade, polticas de gesto
e comunicao organizacional.
Maiores nveis de comprometimento tendem a estar associados com: mulheres e pessoas
casadas; maiores medidas de idade; tempo na organizao; nvel ocupacional e
remunerao; menores medidas de escolaridade; caractersticas de trabalho inovador e
no rotineiro; estilo participativo da gerncia; e liderana com habilidade de
comunicao.
Quanto aos correlatos do comprometimento, vm sendo estudados: stress, envolvimento
com o trabalho, motivao e satisfao com o trabalho. Entre os conseqentes esto:
desempenho no trabalho, alternativas de trabalho percebidas, inteno de procurar outro
emprego ou deixar a organizao, pontualidade, rotatividade e absentesmo. Apesar da
pesquisa nesse domnio se apoiar no pressuposto de que elevados nveis de
comprometimento levam, por exemplo, melhoria no desempenho, menor rotatitivade e
baixo absentesmo, os resultados tm sido inconsistentes (Bastos, 1994). No entanto, no
Brasil, pouco tem sido feito para se preencher essa lacuna. O que se verifica uma
concentrao de estudos acerca dos antecedentes do comprometimento, enquanto a
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pesquisa relativa aos conseqentes do comprometimento vem sendo um pouco
negligenciada (Medeiros et al., 2002).
Alguns estudos internacionais examinaram a relao entre o comprometimento
organizacional e o desempenho no trabalho. Essa relao foi investigada por Scotter
(2000) entre mecnicos da fora area americana. De acordo com o autor, empregados
com desempenhos no trabalho mais elevados, tambm relataram estarem mais
satisfeitos com o trabalho e mais comprometidos com a organizao. No estudo,
conduzido por Grunberg, Anderson-Connolly e Greenberg (2000), os resultados
indicam que percepes de demisses como injustas esto associadas com os mais
baixos nveis de comprometimento organizacional. Esses, por sua vez, esto associados
com o aumento do absentesmo e a reduo do desempenho no trabalho.
Ao investigar o comprometimento organizacional e o desempenho do empregado na
China, Francesco e Chen (2004) encontraram uma relao, embora fraca, entre esses
fenmenos psicossociais. Segundo os autores, essa relao pode ser explicada em
funo dos sentimentos de obrigao para com a organizao, que podem estar
presentes entre os empregados na China, pas considerado predominantemente
coletivista. Em uma meta-anlise, Writh e Bonett (2002) observaram que o tempo de
servio no emprego tem um efeito moderador na correlao entre o comprometimento
organizacional e o desempenho no trabalho, com correlaes tendendo a decrescer
exponencialmente com o tempo de servio.
Outros estudos investigam a relao entre o comprometimento organizacional e a
rotatividade. Em um estudo entre enfermeiras na Sucia, Sjberg e Sverke (2000)
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encontraram que quanto maior o envolvimento com o trabalho e o comprometimento
com a organizao, menor a inteno de deixar a organizao. De acordo com os
achados de Gaertner (2000), em sua meta-anlise, a justia distributiva, as chances de
promoo e o suporte da superviso (trs determinantes para a rotatividade) esto
diretamente relacionadas ao comprometimento com a organizao. A anlise da ordem
causal da relao entre satisfao no trabalho e comprometimento organizacional, em
modelos explicativos da rotatividade, realizada por Currivan (1999), sugere que sejam
revistos esses modelos, apontando para a necessidade de novos estudos.
Temas como satisfao no trabalho, percepo de suporte organizacional, confiana na
superviso, responsabilidade social da empresa e mobilidade dos trabalhadores tambm
vm sendo relacionados ao comprometimento organizacional. Os resultados do estudo
de Nystedt, Sjberg, e Hgglung (1999) do suporte concluso de que o envolvimento
com o trabalho, a satisfao com o trabalho e a comprometimento organizacional so
trs construtos empiricamente distintos.
Rhoades, Eisenberger, e Armeli (2001), examinando a relao entre a percepo de
suporte organizacional e o comprometimento organizacional em empresas do leste dos
Estados Unidos, afirmaram que condies de trabalho favorveis produzidas a partir da
percepo do suporte organizacional aumentam o comprometimento com a organizao.
Perry (2004) contribuiu para discusso da relao, contraditria na literatura, entre o
comprometimento organizacional e a confiana no supervisor. Em sua pesquisa, foi
verificado que essa relao se apresenta fraca. Os achados tambm levaram o autor a
apontar para o fato de que o aumento de demisses e as estruturaes organizacionais
fazem decrescer o comprometimento organizacional, baseado na teoria de que o
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comprometimento influenciado por mudanas nas normas e condies
organizacionais.
A investigao, conduzida por Peterson (2004), demostrou que a reputao de uma
empresa acerca da responsabilidade social influencia o comprometimento
organizacional dos trabalhadores. No estudo, essa relao foi mais fortemente observada
entre os empregados que mais acreditavam na importncia da responsabilidade social
das empresas. J Pittinsky e Shih (2004) examinaram o comprometimento
organizacional entre trabalhadores que mudam constantemente de organizaes. Os
autores utilizaram a metfora dos "nmades conhecedores" (Knowledge Nomads) para
substituir uma viso de que tais trabalhadores so "viajantes itinerantes", que mudam
freqentemente de organizao sem criar vnculos de compromisso com ela. Os achados
desse estudo evidenciam que "nmades conhecedores", trabalhadores que detm
conhecimentos que so importantes para o sucesso de suas organizaes, so capazes de
desenvolver comprometimento com a organizao em que esto no momento, mesmo
com um alto ndice de mobilidade. Como os nmades, esses trabalhadores fazem do
lugar em que esto sua casa.
No Brasil, alguns estudos tambm privilegiam apenas o foco organizao (Azevedo &
Dias, 2002; Ferreira & Siqueira, 2002; Pereira & Oliveira, 2000; S & Lemoine, 1998;
S & Lemoine, 1999; Sanches, 1997; Tamayo et al., 2000; Tamayo et al., 2001).
Sanches (1997) estudou o comprometimento organizacional em diferentes grupos de
empregados em dois momentos distintos de uma empresa, no decorrer do processo de
preparao para a implantao de um programa de qualidade. Investigando a influncia
do estilo de liderana sobre o comprometimento das pessoas na empresa, S e Lemoine
(1998) concluram que os trabalhadores se revelaram mais comprometidos em
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organizaes com uma gesto participativa. J em um estudo acerca da influncia das
condies de trabalho e das relaes interpessoais no comprometimento organizacional,
S e Lemoine (1999) verificaram pequena influncia das condies de trabalho.
Ao estudar a relao entre os valores do empregado e o comprometimento
organizacional, Tamayo et al. (2000) verificaram duas motivaes subjacentes ao
comprometimento: uma motivao conservadora e a outra altrusta. Segundo os autores,
os trabalhadores com maior motivao para a conservao do status quo, opostos
inovao e mudana, e que tm como meta motivacional a aceitao dos outros e a
transcendncia de interesses pessoais em benefcio dos outros, apresentam maiores
escores de comprometimento. Ainda estudando essa mesma relao, Tamayo et al.
(2001) corroboram os achados anteriores de que o comprometimento organizacional
parece atender motivaes de conservao do status quo, de procura do bem-estar
coletivo e de obteno de status social, de prestgio e de controle de pessoas e recursos.
Ferreira e Siqueira (2002) tambm contemplaram a organizao em um estudo sobre os
antecedentes de inteno de rotatividade, apontando a satisfao e o
comprometimento afetivo como antecedentes diretos e a percepo de justia de
remunerao como antecedente indireto de inteno de sair da empresa. A partir desses
resultados, os autores concluram que: se o trabalhador percebe justia na remunerao
que recebe, est satisfeito com o trabalho executado e comprometido afetivamente com
a empresa de que faz parte, tende a reduzir sua inteno de deix-la.
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Comprometimento: perspectiva multidimensional com focos
A pesquisa sobre os focos do comprometimento procura descrever como o trabalhador
articula seus compromissos frente a diferentes facetas da vida organizacional, que se
tornam alvos dos vnculos do trabalhador. De acordo com Siqueira e Gomide Jnior
(2004), os estilos de comprometimento, no mundo do trabalho, podem ser dirigidos a
diversos objetos sociais, ou seja, a diferentes focos - a exemplo da organizao,
sindicato, profisso, trabalho, grupo de trabalho, topo gerencial, supervisores imediatos
-, sendo que o mais estudado o vnculo com a organizao empregadora.
Segundo Medeiros et al. (2002), a pesquisa brasileira sobre mltiplos focos do
comprometimento, apesar de no ser extensa, possui bastante profundidade e qualidade,
sendo, principalmente, representada por trabalhos desenvolvidos por Bastos e
colaboradores, que privilegiaram focos como carreira, sindicato e organizao.
Bastos (1994) investigou a existncia de padres de comprometimento - unidades de
anlise que integra mltiplos compromissos - do trabalhador frente a trs distintos focos
- a organizao, a carreira e o sindicato -, identificando oito padres: comprometido,
descomprometido, sindicalista, anti-sindicalista, profissional, descomprometido apenas
com a carreira, localista, profissional-sindicalista. O estudo adotou a abordagem
quantitativa, dominante na rea, e partiu do seguinte pressuposto:
As interaes ou experincias modelam repertrios nicos, constrem padres diferenciados de
perceber e de responder a aspectos do ambiente de trabalho que no podem ser ignorados e que
explicam a consistncia do comportamento de um indivduo, mesmo diante de contextos
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diferenciados. Esse 'repertrio' singular, como parte do ambiente, afeta o tipo, a natureza e a
intensidade da resposta das pessoas s demandas de trabalho (Bastos, 1994, p. 30).
De acordo com Bastos (1995), mltiplos focos podem funcionar como alvos do vnculo
do trabalhador, e, embora todos se constituam linhas de investigao prprias, existe a
necessidade de integr-las. A identificao de padres visa a trabalhar o
comprometimento de uma forma menos fragmentada, em uma perspectiva cognitivista,
coerente com as tendncias que emergem no estudo das atitudes (Bastos, 1994).
Ao se buscar descrever como indivduos organizam e estruturam seus compromissos frente a
diferentes focos do contexto de trabalho, assume-se mais claramente, a necessidade de se lidar
com uma unidade de anlise mais prxima da complexidade natural do ser humano e dos contextos
em que trabalha (Bastos, 1994, p. XXIV).
Alguns trabalhos, desenvolvidos por Bastos e colaboradores, privilegiaram os focos
'organizao', 'profisso/carreira' e 'sindicato' (Bastos & Borges-Andrade, 1999; Bastos
& Costa, 2000; Bastos & Pereira, 1997). Ao explorar o impacto dos processos de
mudana organizacional no comprometimento com a organizao, com a profisso e
com o sindicato, Bastos e Pereira (1997) concluram que a dimenso da mudana, que
se torna saliente para o trabalhador, pode gerar impactos positivos ou negativos sobre o
seu comprometimento, especialmente, com a organizao. Bastos e Borges-Andrade
(1999), estudando os padres de comprometimento em diferentes contextos
organizacionais, observaram que, em funo de uma maior presena de padres com
baixo comprometimento organizacional nas organizaes burocrticas, essas se
diferenciam significativamente das organizaes consideradas inovadoras, destacando,
dessa forma, o impacto do contexto de trabalho no comprometimento do trabalhador.
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Por outro lado, os autores argumentaram que a presena de indivduos com distintos
padres, em uma mesma organizao, fortalece a determinao pessoal ou individual.
J Bastos e Costa (2000), tomando como categoria de anlise os padres de
comprometimento do trabalhador frente a trs focos - organizao, sindicato e carreira -,
exploraram como esses poderiam ser estudados a partir de duas distintas estratgias
metodolgicas: uma estratgia clssica, com uso de escalas de atitude, e uma segunda
estratgia com a utilizao de procedimentos oriundos da Teoria do Ncleo Central das
Representaes Sociais e as concepes de esquemas cognitivos. A comparao entre as
duas estratgias metodolgicas possibilitou reconhecer que as ferramentas utilizadas
pela pesquisa clssica so apropriadas e sensveis, assim como, se concluiu que as duas
estratgias metodolgicas combinadas oferecem um quadro mais rico da realidade
estudada.
Ao tomar como focos a organizao e a carreira/profisso, Bastos, Correa e Lira (1998)
identificaram quatro padres de comprometimento. Os autores verificaram que o
comprometimento frente aos focos estudados mediado pelo nvel em que a profisso
exercida compatvel com os interesses e vocao individual e o nvel em que o
indivduo encontra, na organizao a que pertence e no trabalho que a realiza,
condies propcias realizao profissional. Morais (2004), em escolas do Estado da
Bahia, investigou a relao entre o comprometimento com a organizao e com a
profisso de professores e diretores com o desempenho dos alunos. Os resultados
confirmam a idia de que trabalhadores comprometidos aumentam os nveis de
desempenho da organizao.
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No panorama internacional, Fink (1992) estudou as relaes que os indivduos
estabelecem com trs partes importantes do contexto de trabalho: o trabalho que realiza,
o grupo de trabalho em que se insere e a organizao como um todo. O autor relata
como diferentes padres associam-se a desempenhos distintos no contexto de trabalho.
Para Fink (1992), trabalhadores com elevados comprometimentos com seu trabalho, seu
grupo e sua organizao apresentam altos desempenhos pessoais, favorecem equipes
coesas e a cooperao intragrupo, alm de voltarem os seus esforos em prol de metas e
misso organizacional.
Ao investigar os focos organizao e equipe de trabalho, Bishop e Scott (2000)
relataram a existncia de diferentes relaes entre preditores e os focos estudados.
Conflitos na comunicao e satisfao com colegas foram mais fortemente relacionados
ao comprometimento com a equipe. J os conflitos e a satisfao com o supervisor
foram mais fortemente relacionados ao comprometimento organizacional.
Cohen (1993) pesquisou o comprometimento com a organizao, com a ocupao, com
o trabalho e com o sindicato entre executivos de trs organizaes. O autor observou
que o melhor preditor para a inteno de deixar a organizao foi o comprometimento
organizacional, enquanto o comprometimento com o trabalho foi o melhor preditor para
o afastamento no trabalho. O comprometimento com a ocupao, no entanto, estava
positivamente relacionado a inteno de deixar tanto a organizao, quanto o trabalho.
J em um estudo com diversos focos entre enfermeiras em hospitais de Israel, Cohen
(2000) examinou trs modelos da relao entre comprometimento e conseqentes como
a inteno de deixar a organizao e o absentesmo. O modelo melhor ajustado
possibilitou concluir que o comprometimento com a organizao e o comprometimento
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com a ocupao mediam a relao entre outros focos (como trabalho e grupo) e os
conseqentes.
No presente estudo, integrou-se ao estudo de comprometimento organizacional a anlise
do comprometimento frente ao foco trabalho, investigando, dessa forma, dois
importantes objetos de comprometimento, simultaneamente. O estudo dessa dade de
comprometimento constitui, portanto, uma estratgia, sugerida por Bastos (1994), que
marcada pela tentativa de identificar padres descritivos de como o indivduo se
relaciona com os dois focos escolhidos. "Este objetivo parece ser relevante se tais
padres so tomados como unidades de anlise que envolvem, em algum grau, uma
estrutura de atitudes" (Bastos, 1994, p. 81).
Comprometimento organizacional: perspectiva multidimensional com bases
Dentro dos focos, existem abordagens diferenciadas quanto s bases, natureza ou aos
motivos que levam ao comprometimento, conduzindo a formulaes tericas distintas.
Dessa forma, alm dos focos de comprometimento, considera-se, como outra vertente
importante na rea, que tambm trabalha em uma perspectiva multidimensional, as
bases do comprometimento. Essas exploram como os diferentes processos psicolgicos
embasam o vnculo do trabalhador em relao ao foco organizao. Na pesquisa sobre
as bases do comprometimento, o conceito de organizao visto como um todo e so
explorados os diferentes processos psicolgicos que embasam o vnculo do trabalhador
(Bastos, 1994; Rocha & Bastos, 1999).
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23
Os modelos multidimensionais do comprometimento com a organizao comearam a
ser considerados depois que alguns pesquisadores perceberam que, mais do que tipos de
comprometimento, os enfoques unidimensionais eram componentes presentes no
vnculo psicolgico entre indivduo e organizao (Medeiros, Albuquerque, Marques &
Siqueira, 2003; Medeiros, Albuquerque & Marques, 2004). No entanto, a pesquisa na
rea est longe de chegar a um consenso quanto dimensionalidade do
comprometimento, tornando-o um conceito em construo (Medeiros et al., 2003).
O modelo de conceitualizao do comprometimento organizacional de maior aceitao
entre os pesquisadores, internacionalmente utilizado e validado em vrias culturas, foi o
modelo de trs componentes, desenvolvido por Allen e Meyer (1990) (Medeiros et al.
2004; Medeiros et a.l., 2003; Medeiros & Enders, 1997; Medeiros, Enders, Sales,
Oliveira & Monteiro, 1999; Rego & Souto, 2003). Inicialmente, o modelo foi abordado
por Meyer e Allen (1984) em duas diferentes bases psicolgicas: afetiva - apego com a
organizao; e instrumental - custos associados a deixar a organizao. Posteriormente,
os autores acrescentam um terceiro tipo de comprometimento: o normativo -
sentimentos de obrigao em permanecer na organizao. As trs bases so melhor
entendidas a partir da seguinte colocao:
Empregados com um forte comprometimento afetivo permanecem na organizao porque eles
querem, aqueles com comprometimento instrumental permanecem porque eles precisam e aqueles
com comprometimento normativo permanecem porque eles sentem que so obrigados (Allen &
Meyer, 1990, p. 03).
Ao postular a distino da natureza psicolgica entre trs vnculos - afetivo,
instrumental e normativo - os estudiosos Allen e Meyer (1990), supem que os
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24
trabalhadores poderiam "apresentar estados psicolgicos de comprometimento
organizacional diversificados, compostos pela combinao de diferentes nveis dos trs
componentes como, por exemplo, uma forte necessidade e uma forte obrigao, mas um
baixo desejo de permanecer na organizao" (Siqueira & Gomide Jnior, 2004, p. 315).
As escalas desenvolvidas por Allen e Meyer (1990) so aplicadas no formato likert e
podem ser de dois tipos: uma escala com 24 itens e outra reduzida com 18 itens, tendo
seis itens para cada base de comprometimento (Meyer, Allen & Smith, 1993). No
estudo de Allen e Meyer (1990), o comprometimento de base afetiva e o de base
instrumental mostraram-se construtos distintos e relacionados a diferentes antecedentes;
j os comprometimentos afetivo e normativo, embora distintos, encontram-se
relacionados (Bastos, 1994). Ou seja, as trs medidas utilizadas no se distinguiam
totalmente, visto que se verificou uma superposio entre itens de comprometimento
afetivo e normativo (Siqueira, 2001; Siqueira & Gomide Jnior, 2004).
Internacionalmente, as medidas da escala proposta por Allen e Meyer (1990) tambm
vm sofrendo crticas. A partir dos resultados de uma pesquisa realizada por Culpepper
(2000), nos Estados Unidos da Amrica, foi sugerido que pequenas modificaes na
escala original melhorariam substancialmente as medidas do constructo. O autor props
uma escala revisada, que possibilitou uma melhor discriminao entre os
comprometimentos afetivo e o normativo em relao escala original. Cohen (2003)
corrobora essa idia, afirmando que as diferenas conceituais entre o comprometimento
afetivo e o normativo no so claras.
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25
Medeiros e Enders (1997), em um estudo com empresas privadas, validaram o modelo
de conceitualizao de trs componentes do comprometimento organizacional de Allen
e Meyer (1990) para a realidade cultural brasileira. Apesar de obterem os trs fatores
como conceitualizados, os pesquisadores encontraram ndices moderados de
consistncia interna para os trs componentes da teoria e baixo percentual de variao
total explicada. Buscando uma maior evidncia sobre a estrutura dimensional do
modelo proposto para uma nova populao, Rocha e Bastos (1999) realizaram novas
anlises fatoriais que, embora tenham permitido a interpretao dos trs fatores,
revelaram uma certa sobreposio entre as dimenses afetiva e normativa, reafirmando
a necessidade de uma maior distino conceitual entre essas duas dimenses do
comprometimento. Bandeira, Marques e Veiga (1999b) tambm obtiveram os trs
fatores, apontando, no entanto, a existncia de indicadores pouco adequados dentro do
instrumento. Alguns itens apresentaram cargas fatoriais significativas em mais de um
fator, assim como, em um mesmo fator, foram agrupados itens normativos com itens
afetivos. Segundo Moraes, Marques e Correia (1998), existe uma afinidade entre o
conceito de comprometimento de Mowday e colaboradores, baseado no enfoque afetivo,
e o envolvimento moral de Etzioni, conceito que deu origem base normativa e refere-
se identificao e assimilao dos valores da organizao pelo indivduo. Rego e
Souto (2003) apontam para um certo desacordo sobre se o comprometimento afetivo e
normativo devem ser tomados como componentes diferentes.
De acordo com Medeiros et al. (2003), nem a validao realizada por Medeiros e Enders
(1997), nem a pesquisa desenvolvida por Bandeira et al. (1999b) formaram os fatores
com os indicadores especificados pelo instrumento original. Em outro estudo, Medeiros
et al. (1999) obtiveram um outro componente - afiliativo -, encontrando, portanto, uma
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estrutura fatorial formada por quatro fatores. Esses autores afirmam que o modelo
estudado necessita de reviso, sugerem o estudo de novos modelos para a mensurao
do comprometimento organizacional, explorando novas dimenses latentes que ainda
possam existir, e concluem que a pesquisa na rea deve procurar desenvolver
instrumentos e indicadores adequados s diferentes culturas. Em um estudo sobre
criatividade e comprometimento organizacional, Fonseca e Bastos (2002) utilizaram
apenas dois comprometimento afetivo e comprometimento instrumental dos trs
fatores que compe a escala original. Os autores argumentaram que foi verificado, na
anlise fatorial, que os itens do fator normativo agruparam-se com o fator afetivo ou
apareceram com valor negativo. Os prprios autores do modelo tridimensional apontam
evidncias da sobreposio entre o comprometimento afetivo e o normativo. Essa
sobreposio justificada a partir dos antecedentes e correlatos comuns que existem
entre eles (Meyer et al. 1993) e de uma correlao substancial entre esses dois tipos de
comprometimento (Meyer, Stanley, Herscovitch & Topolnytsky, 2002).
No intuito de construir um instrumento vlido e preciso para a coleta de dados dentro
dos parmetros cientficos para a realidade brasileira, Siqueira (2001) desenvolveu
anlises sobre a validade discriminante de medidas brasileiras. Essas, alm de
possurem ndices confiveis de preciso, conseguiram aferir os vnculos do trabalhador
com a organizao sob trs bases: afetiva, calculativa e normativa. Recentemente,
Medeiros et al. (2003) apresentam resultados de uma pesquisa exploratria que utilizou
60 indicadores do comprometimento organizacional, extrados de instrumentos j
conhecidos e mais 30 indicadores construdos a partir da reviso terica realizada. Os
autores identificam sete dimenses distintas para o comprometimento organizacional:
internalizao de valores e objetivos organizacionais; sentimento de obrigao em
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permanecer na organizao; sentimento de obrigao pelo desempenho; sentimento de
fazer parte; sentimento de falta de recompensas e oportunidades; linha consistente de
atividade; e escassez de alternativas. Baseados em dados de uma nova pesquisa,
Medeiros, Albuquerque e Marques (2004) argumentam que o comprometimento
normativo poderia ser um determinante do comprometimento afetivo.
Muitos trabalhos brasileiros, que estudam as bases do comprometimento, consideram os
trs componentes do comprometimento organizacional: afetivo, instrumental e
normativo. Dentre esses, alguns (Bandeira, Marques & Veiga, 1999a; Colossi, 2004;
Medeiros & Enders, 1997; Prado & Santos, 2003; Rocha & Bastos, 1999) utilizam
escalas baseadas nas desenvolvidas por Allen e Meyer (1990); outros estudos (Cruz,
2002; Filenga, 2003; Martins, 2003; Siqueira, 2001) utilizaram o instrumento
desenvolvido por Siqueira (2001), elaborado no Brasil; e outros (Rego & Souto, 2002;
Rego & Souto, 2003) utilizam uma medida de comprometimento organizacional
previamente desenvolvida por Rego e Souto (2002) e validada em contexto luso-
brasileiro.
De acordo com Siqueira e Gomide Jnior (2004), as pesquisas sobre os antecedentes do
comprometimento afetivo tm revelado que empregados comprometidos afetivamente
so os que apresentam menores taxas de rotatividade, absentesmo e inteno de sair da
empresa, bem como melhores indicadores de desempenho no trabalho. J quando o
comprometimento afetivo baixo, so observados atrasos, fraco desempenho e esforo
reduzido aplicado ao trabalho. No que diz respeito ao comprometimento instrumental,
verifica-se que trabalhadores que percebem altos custos associados ao seu desligamento
das organizaes - mais comprometidos instrumentalmente - tendem a ser menos
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motivados e a apresentar mais baixos nveis de desempenho no trabalho do que aqueles
para quem os custos percebidos seriam em nveis mais baixos.
Ao utilizar o modelo de conceitualizao de trs componentes do comprometimento
organizacional de Allen e Meyer (1990), validado para a realidade cultural brasileira,
Medeiros e Enders (1997) estabeleceram oito padres do comprometimento
organizacional frente s trs bases e, posteriormente, examinaram as relaes existentes
entre esses padres e a performance no trabalho dos indivduos, medida atravs da
avaliao dos supervisores. Os autores identificaram trs padres que se diferenciaram
em relao a sua performance no trabalho: o padro de comprometimento afetivo-
normativo; o comprometido nas trs dimenses; e o padro instrumental-afetivo. Em
um outro estudo, com o objetivo de investigar as caractersticas pessoais (antecedentes
ao comprometimento) e a performance no trabalho (conseqente ao comprometimento
organizacional), Medeiros e Enders (1998) verificaram que os nveis de renda,
educao, religiosidade, relacionamento comunitrio, sexo, idade e o locus de controle
possuem reflexos nos padres de comprometimento que se estabeleceram na pesquisa,
bem como na performance no trabalho. Bandeira et al. (1999), estudando a interferncia
das polticas de recursos humanos de uma empresa de servios do setor pblico,
concluram que essas polticas influenciam no comprometimento de seus funcionrios
em duas dimenses: normativa e afetiva.
Siqueira (2001), aps validao de trs medidas brasileiras elaboradas para avaliar
comprometimento organizacional sob trs bases (ECOA - afetiva; ECOC - calculativa; e
ECON - normativa), estudou as relaes entre essas trs bases e trs critrios do
comportamento organizacional: inteno de rotatividade, satisfao no trabalho e
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comportamentos de cidadania organizacional. Foram verificadas relaes inversas entre
os trs estilos de comprometimento e a inteno de rotatividade, o que indica que
trabalhadores comprometidos quanto as trs bases planejam menos sair da organizao.
Quanto satisfao, pde-se observar que empregados satisfeitos com o salrio, com a
chefia, com os colegas de trabalho, com o sistema de promoes da empresa e com a
natureza do trabalho que realizam, parecem ser os mais comprometidos afetivamente,
normativamente e instrumentalmente com as empresas empregadoras. Constatou, ainda,
que aes espontneas e benficas organizao (comportamentos de cidadania
organizacional) tendem a ter sua emisso associada ao grau em que o indivduo
desenvolve afetos pela organizao (comprometimento afetivo) e acredita estar em
dbito moral com a mesma (comprometimento normativo). Entretanto, as crenas
acerca de troca econmica com a organizao (comprometimento instrumental), no
favorecem os comportamentos de cidadania organizacional.
Filenga (2003), utilizando a escala proposta por Siqueira (2001), parte do pressuposto
de que parcela significativa da varincia de comprometimento afetivo, instrumental e
normativo pode ser explicada por percepes de justia. O autor concluiu que cognies
sobre justia representam um componente psicossocial capaz de influenciar os vnculos
que o indivduo mantm com a organizao onde trabalha, considerando, portanto, a
percepo de justia como um importante antecedente de comprometimento
organizacional. J Martins (2003), ao estudar os programas de qualidade de vida,
verificou que a participao dos profissionais nesses est associada positivamente ao
comprometimento organizacional afetivo e normativo, assim como satisfao no
trabalho.
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Em estudos luso-brasileiros sobre a importncia da percepo de justia para o
comprometimento organizacional, Rego e Souto (2002) constataram que quando se
sentem tratadas com justia, as pessoas tendem a denotar mais fortes laos afetivos e
normativos, e menores ndices de comprometimento instrumental. Em um outro estudo,
Rego e Souto (2003) afirmaram que as percepes dos indivduos acerca do esprito de
camaradagem, da credibilidade do superior e das oportunidades de aprendizagem e
desenvolvimento pessoal explicam o comprometimento organizacional. Ao desenvolver
um estudo com professores do ensino superior de Portugal, Rego (2003) conclui que o
comprometimento afetivo com a organizao explicado no apenas pelas percepes
individuais de justia, mas tambm pelo clima de justia em que se inserem, ou seja,
como percebem a justia aplicada aos outros membros organizacionais.
Em um dos poucos trabalhos com uma metodologia eminentemente qualitativa, Santos
e Oliveira (2001) estudaram o comprometimento de trabalhadores, considerando as trs
bases - afetiva, instrumental e normativa -, com a programao social da organizao
onde trabalham. No caso estudado, o discurso dos entrevistados mostrou a
predominncia dos tipos de comprometimento afetivo e normativo. Em outro estudo de
cunho qualitativo, Foss e Sartoretto (2002) investigaram a relao entre
responsabilidade social empresarial e comprometimento organizacional e concluram
que, de acordo com o discurso dos trabalhadores, a implantao de um programa de
voluntariado e o incentivo ao trabalho voluntrio, por parte da empresa, no influenciam
no comprometimento desses com a organizao.
Interessados na influncia da cultura no comprometimento organizacional, estudiosos
examinaram o comprometimento organizacional, composto pelas trs dimenses -
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afetiva, instrumental e normativa - em diferentes pases. Em uma investigao no Nepal,
Gautam e Wagner (2001) constataram a adequao da tri-dimensionalidade do
comprometimento organizacional. Os autores identificaram 'a percepo do trabalho
como interessante' e 'as caractersticas do trabalho' como preditoras dos
comprometimentos instrumental e normativo. Os trs componentes do
comprometimento organizacional tambm foram estudados em amostras de engenheiros
dos Estados Unidos e da ndia. Nesse estudo, Kuantes (2003) relacionou o
comprometimento aos comportamentos de cidadania organizacional e aos
comportamentos de afastamento da organizao. Os resultados da amostra americana
sugeriram que o comprometimento afetivo a nica dimenso que tem alguma relao
com os comportamentos estudados. Na amostra indiana, contudo, os trs fatores tiveram
um papel em explicar ao menos uma das trs dimenses dos comportamentos de
cidadania e afastamento, sugerindo que as dimenses do comprometimento
organizacional no podem operar da mesma forma em diferentes lugares.
Nem todos os estudos acerca das bases de comprometimento utilizam o modelo
tridimensional concebido por Allen e Meyer (1990). Alguns analisam o fenmeno
comprometimento a partir dos enfoques afetivo e comportamental (Moraes et al., 1997;
Moraes et al., 1998). Os resultados obtidos por Moraes et al. (1997) apontam o
'contedo do trabalho' e o 'contexto de trabalho' como variveis preditoras do
comprometimento organizacional, destacando o 'ambiente social' e a 'poltica salarial' da
organizao. Ainda com base nos enfoques afetivo e comportamental, Moraes et al.
(1998) estudaram o comprometimento de servidores tcnico-administrativos de uma
universidade federal.
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O trabalho de Fonseca e Bastos (2002) privilegiou apenas o comprometimento afetivo e
instrumental. Esses autores, ao estudar funcionrios de um banco, no Brasil,
confirmaram a hiptese de que, nos ambientes em que os comportamentos criativos so
estimulados e onde os ndices de comprometimento organizacional so mais altos, a
percepo de desempenho em relao s equipes de trabalho maior do que naqueles
em que aquelas condies no so encontradas. Algumas pesquisas internacionais
tambm consideram as duas bases - afetiva e instrumental - para o estudo do
comprometimento organizacional (Andolsek & Stebe, 2004; Casper, Martin, Buffardi &
Erdwins, 2002; Glazer, Daniel & Short, 2004; Wasti, 2002).
Wasti (2002) investigou os comprometimentos afetivo e instrumental com a
organizao na Turquia, uma sociedade predominantemente coletivista. Nesse estudo, o
autor confirmou a trans-cultural generalidade dos antecedentes e conseqentes do
comprometimento afetivo, como tambm indicou que as normas de lealdade e
aprovao do grupo aumentam o comprometimento instrumental. Wasti (2002)
salientou, ainda, a importncia das empresas em compreender o vnculo dos
empregados em contextos coletivistas. A relao entre os comprometimentos afetivo e
instrumental e os valores humanos foi estudada por Glazer et al. (2004). Os dados dessa
pesquisa foram coletados entre enfermeiras de dois pases que enfatizam mais a relao
com os outros (Hungria e Itlia) e de dois pases que enfatizam mais as relaes de troca
(Inglaterra e Estados Unidos da Amrica). Os autores concluram que alguns valores se
correlacionam mais com o comprometimento afetivo ou com o comprometimento
instrumental, dependendo da cultura na qual esto inseridos.
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Tambm dentro de uma perspectiva comparativa, Andolsek e Stebe (2004) buscaram
mostrar como diferentes fatores influenciam os comprometimentos afetivo e
instrumental de empregados numa organizao. Ao comparar diversos pases -
Alemanha Ocidental e Oriental, Japo, Hungria, Eslovnia, Reino Unido e Estados
Unidos -, os autores concluram que h alguns preditores universais (a exemplo da
satisfao e da qualidade do trabalho), mas suas configuraes dependem, sobretudo, do
contexto cultural. J Casper et al. (2002) investigaram o impacto do conflito trabalho-
famlia no comprometimento organizacional de mes americanas que trabalham fora de
casa. Esse conflito se apresentou positivamente relacionado ao comprometimento
instrumental, mas no ao comprometimento afetivo. Segundo os autores, mes que
vivenciam a interferncia do trabalho na famlia, permanecem nas organizaes
empregadoras e atribuem seus comprometimentos necessidade (comprometimento
instrumental) em oposio ao desejo (comprometimento afetivo), evitando a culpa por
permitir que seu trabalho interfira na sua famlia.
Ao considerar sete dimenses (internalizao de valores e objetivos organizacionais;
sentimento de obrigao em permanecer na organizao; sentimento de obrigao pelo
desempenho; sentimento de fazer parte; sentimento de falta de recompensas e
oportunidades; linha consistente de atividade; e escassez de alternativas) distintas para o
comprometimento organizacional, Medeiros et al. (2004) investigaram a relao entre as
bases do comprometimento e o desempenho organizacional. Os autores encontraram
relaes significantes entre as dimenses latentes do comprometimento e a taxa de
ocupao dos hotis. Enquanto um conjunto de dimenses latentes do
comprometimento, predominantemente afetivas, influi positivamente no desempenho;
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outro conjunto de dimenses latentes, predominantemente instrumentais, influi
negativamente no desempenho.
No presente estudo, integrou-se investigao do foco organizao a anlise do
comprometimento frente a duas distintas abordagens quanto natureza ou aos motivos
que levam ao comprometimento. Considerando a sobreposio entre a base afetiva e
normativa apontada pela literatura, foram simultaneamente investigadas, portanto, as
duas principais bases de comprometimentos: a 'afetiva' e a 'instrumental'.
Mltiplos comprometimentos: articulando focos e bases
Determinados a aumentar a contribuio terica e prtica do comprometimento,
pesquisadores passaram a perceb-lo como um conceito multidimensional (Cohen,
2003). Em consonncia com esse movimento de afirmao de uma perspectiva
multidimensional, comearam a aparecer trabalhos que tentam articular as duas
vertentes: os mltiplos focos e as mltiplas bases (Becker & Billings, 1993; Carvalho,
2000; Dias & Marques, 2002; Scheible, 2004; Vandenberghe, Stinglhamber, Bentein &
Delhaise, 2001). Em suas pioneiras pesquisas, Becker (1992) estabelece, de forma clara,
a distino entre focos e bases do comprometimento, permitindo colocar em perspectiva
a grande disperso de estudos e fixando, simultaneamente, os dois eixos bsicos sob os
quais os estudos na rea poderiam incorporar as idias de estrutura, padres, perfis
ou, em sntese, mltiplos compromissos. Bastos e Costa (2000) justificam o estudo do
comprometimento enquanto padres atitudinais, baseados no fato de que, no mundo do
trabalho, as pessoas esto continuamente sob demandas de compromisso, muitas vezes
conflitantes, de diferentes entidades. Assim, as decises pessoais so melhor
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compreendidas quando essas mltiplas fontes so examinadas conjuntamente. De
acordo com Cohen (2003), o comprometimento no trabalho pode ser melhor elucidado a
partir de uma abordagem multidimensional e, conseqentemente, proporcionar melhores
preditores do comportamento, superando muitas limitaes da tradicional pesquisa
sobre comprometimento.
Em um estudo considerando bases e focos do comprometimento, Becker e Billings
(1993) investigaram a existncia de padres de comprometimento entre trabalhadores de
uma indstria de suprimentos militares. Foram considerados quatro focos (organizao,
topo gerencial, supervisores imediatos e grupo de trabalho) e trs bases (internalizao,
identificao e obedincia). Quando consideradas as bases do compromisso, vrias
diferenas e similaridades foram encontradas nos quatro padres de comprometimento
com a organizao, identificados a partir do uso do procedimento de anlise de cluster.
Foram observadas diferenas significativas entre os padres quanto s variveis
dependentes - satisfao, inteno de sair e comportamentos prossociais no trabalho -,
demogrficas e contextuais.
A validade de um modelo multidimensional de comprometimento no trabalho foi
examinada por Vandenberghe et al.(2001) em 12 naes europias. Foram investigados:
a inteno de deixar a organizao; o comprometimento afetivo e o normativo para a
organizao, a ocupao, o grupo de trabalho e a Europa; e o comprometimento
instrumental para a organizao e a ocupao. Os autores verificaram que o modelo de
comprometimento e a relao entre os componentes do comprometimento e a inteno
de deixar a organizao foram culturalmente constantes. Enfatizaram tambm a
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importncia de considerar mltiplos componentes de comprometimento para predizer a
inteno de deixar a organizao.
J Dias e Marques (2002) articularam simultaneamente os focos (organizao e carreira)
e as bases (afetiva, instrumental e normativa), em um trabalho com profissionais e
gerentes de uma grande empresa do setor metal-mecnico. Quando analisadas as cinco
dimenses separadamente, os autores observaram que todos os nveis funcionais
tenderam a ser mais comprometidos afetivamente, estando os supervisores mais
focalizados na organizao, enquanto os analistas e gerentes direcionados tanto para a
organizao, quanto para a carreira. Os autores verificaram tambm que quanto maior o
grau de atendimento da empresa s expectativas dos empregados, maior o nvel de
comprometimento. Articulando tambm mltiplos focos (organizao e carreira) e bases
(afetiva e instrumental), Scheible (2004) analisou as relaes entre o padro de
comprometimento com a organizao e a carreira/profisso dos indivduos, que
trabalham em um ambiente de desenvolvimento de software, e seus desempenhos. A
autora afirma que os padres de comprometimento que melhor caracterizam esses
profissionais so o duplo compromisso e o unilateral com a organizao, e aponta para
uma correlao positiva entre comprometimento afetivo com a organizao e
desempenho auto relatado.
Ao analisar os avanos e as lacunas que o estudo do comprometimento organizacional
obteve nos ltimos anos no Brasil, Medeiros et al. (2002) apontam a abordagem
multidimensional, com mltiplos focos e bases, como uma busca para entender os
indivduos e seu vnculo com a organizao de uma maneira mais complexa, sendo
considerada um dos novos desafios para a pesquisa na rea. Demo (2003) corrobora
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essa idia, destacando a premncia de se realizar pesquisas que integrem as mltiplas
bases e focos do constructo e combinem diferentes perspectivas metodolgicas para se
entender o tema com maior propriedade.
Como j mencionado, na presente dissertao, dentro de uma perspectiva
multidimensional do comprometimento, foram investigados os vnculos de
trabalhadores de organizaes agrcolas frente a dois focos - trabalho e organizao - e a
duas bases - afetiva e instrumental.
Comprometimento e contrato de trabalho
A literatura da rea j apresenta algumas contribuies acerca do fenmeno psicossocial
'comprometimento' entre trabalhadores com distintos tipos de contrato de trabalho. A
investigao dessa relao, ainda pouco estudada e de grande importncia, apontada
por estudiosos (Cohen, 2003; Gallagher & Parks, 2001; Meyer, Allen & Topolnytsky
1998; Witte & Nswall, 2003) como uma recomendao para futuras pesquisas. Meyer
et al. (1998) afirmam que a multiplicidade de relaes entre empregador e empregado,
dentro das organizaes, apresenta-se como uma mudana no mundo do trabalho que
traz implicaes para o comprometimento dos trabalhadores. Gallagher e Parks (2001)
corroboram esta afirmao ao considerar que o estudo da relao entre o
comprometimento e as vrias formas de contrato eventual de emprego implicam em
questes tanto tericas, quanto relativas ao gerenciamento dos recursos humanos.
Campbell e Burgess (2001), em uma pesquisa que comparou a Austrlia com pases
europeus, demonstraram a importncia de estudos acerca do contrato temporrio,
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relatando no s os elevados nveis desse tipo de vnculo empregatcio, como tambm
os altos ndices de seu crescimento. Em um estudo na Sucia, Korpi e Levin (2001)
discutiram a relao entre desemprego e trabalho temporrio, sendo esse percebido
como um precursor do desemprego, assim como uma porta de entrada para um emprego
estvel. Conley (2003), focalizou o setor pblico da Inglaterra, examinando o impacto
do crescimento dos contratos de emprego temporrio nas polticas pblicas. Os dados
indi