1
História Oral e Ensino de História: uma experiência escolar em torno de memórias e
narrativas
RENAN RUBIM1
Introdução
Este trabalho tem como objetivo apresentar a criação e as experiências do projeto de
História Oral e Memória no Colégio Estadual Paulo de Assis Ribeiro (CEPAR), localizado
em Pendotiba, Niterói, e que teve início por meio do Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência (PIBID/Capes) do curso de História da Universidade Federal
Fluminense, grupo coordenado pela Profª. Drª. Juniele Rabêlo de Almeida. Buscar-se-á
esclarecer como o projeto surgiu, quais são os seus objetivos, como ele foi posto em
funcionamento, como foi o envolvimento dos alunos, que experiências foram vivenciadas e
quais são as expectativas e metas para os próximos meses de trabalho.
O projeto surgiu em agosto de 2014 a partir de um interesse em utilizar a história oral
como uma das possíveis metodologias de investigação histórica e, ao mesmo tempo,
estabelecer um diálogo com a educação e com as possibilidades do ensino de história. O
trabalho de História Oral e Memória no CEPAR têm como objetivos a integração e o
envolvimento dos alunos com o contexto social e histórico em que a escola está inserida, com
a história e a memória locais e escolares e com a história de vida dos sujeitos escolares, ou
seja, os (ex)funcionários, os (ex)professores e a comunidade. A intenção é estimular os alunos
a serem protagonistas do processo de construção do conhecimento histórico e enfatizar o seu
papel como sujeito e agente da história. Assume-se também que com o trabalho de história
oral é possível potencializar a construção de memórias, reforçar vínculos identitários com a
escola e estimular o processo de ensino-aprendizagem entre alunos e professores. Além desses
objetivos, ao final do projeto, tem-se como meta montar uma sala memorial com o acervo das
entrevistas (áudio e transcrições) e das produções textuais dos próprios alunos que
participaram do processo.
O trabalho começou com oficinas de orientação e preparação dos alunos para irem a
campo realizar as entrevistas. Nessas oficinas foram discutidas as seguintes questões: o que é
história oral, quais são os seus propósitos, qual a sua importância, quais são suas questões,
1 Graduado em História na Universidade Federal Fluminense
2
quais são seus elementos, como ela é feita e como se faz uma entrevista. Durante o texto
trataremos, de forma mais aprofundada, da estrutura do projeto como um todo, de como ele
foi colocado em prática, da criação, do conteúdo e do funcionamento das oficinas.
Sobre a formação do aluno e a relação entre história oral e ensino de história
Uma das nossas maiores preocupações como professores, e que discutimos na
universidade e experienciamos isso na prática cotidiana das escolas, é como tornar o
conhecimento histórico significativo para a formação intelectual e crítica do aluno. Isso faz
com que um dos objetivos fundamentais do ensino de história seja o de desenvolver a
compreensão histórica da realidade social em diálogo constante com os alunos. Fazer com que
o discente compreenda e explique, historicamente, a realidade em que vive é o principal
desafio para os professores de história.
Tanto os professores como os alunos são sujeitos e agentes da história, caracterizados
pela complexidade, pelas incertezas, pelas particularidades e pelos conflitos de valores. São
portadores de visões de mundo, de interesses e de experiências variadas e diferenciadas, que
abrem múltiplas possibilidades de intepretação, apropriação e ressignificação em cada relação
que estabelecem entre si.
O professor de História do ensino básico é um dos principais responsáveis pela
atribuição de sentido na História como saber escolar. É ele quem mobiliza, com relativa
autonomia, os saberes acadêmicos, os saberes sociais e, segundo Tardiff (2002), os saberes
docentes dentro de sala de aula: saberes disciplinares, curriculares, profissionais/pedagógicos
e, principalmente, os saberes experienciais, que esses professores incorporam ao longo de sua
trajetória pessoal, coletiva e profissional. A História como saber escolar é reinventada em
cada aula, no contexto de situações de ensino específicas, que coloca em constante interação
as características subjetivas do professor, dos alunos e da instituição como um todo, criando
condições para que possa emergir a disciplina e os saberes escolares.
A relação próxima entre o professor e o aluno, o uso de analogias, de comparações, de
ilustrações, de exemplos e também a maneira como o professor opera com o tempo histórico
em sala de aula, ou seja, negociando as distâncias entre passado, presente e futuro, são
fundamentais e determinantes para o sucesso em propiciar uma aprendizagem significativa em
3
história, segundo Fernando Araújo Penna (2011).2 Além disso, faz-se muito importante tomar
as experiências dos alunos como ponto de partida para o trabalho com os conteúdos,
estimulando-os a se identificarem como sujeitos da história e produtores de conhecimento
histórico. Esses são um dos principais objetivos do projeto de História Oral e Memória no
CEPAR. Mas como podemos pensar a relação entre história oral e ensino de história?
O projeto foi inspirado nos trabalhos já feitos pelo historiador Paul Thompson, que
desenvolveu projetos de história oral nas escolas com crianças, nos quais elas mesmas faziam
o papel de pesquisadoras e entrevistadoras. Segundo o autor, a história oral é um método de
investigação do passado que tem como natureza a criação, a cooperação, o diálogo e o debate.
O trabalho de campo em história oral propicia o ingresso na vida de outras pessoas e com isso
cria uma experiência humanizada profunda e comovente. Ela estimula o trabalho coletivo,
fomenta e estreita as relações entre as pessoas de uma comunidade, fazendo com que olhem
para dentro e percebam que a comunidade carrega uma história multifacetada de trabalho,
vida familiar e de relações sociais (THOMPSON, 1992:217).
O trabalho de história oral feito na escola ajuda os alunos a desenvolverem habilidades
linguísticas, um sentido de evidência e uma consciência social para o estudo da história
escolar e local. Ao entrevistar e perceber as construções narrativas, a partir das memórias, os
alunos se deparam com evidências e marcas de outros tempos, outros contextos, e se
envolvem na sua avaliação, “vivenciam a história, em nível prático, como processo de
recriação do passado” e desenvolvem habilidades de pesquisa (THOMPSON, 1992: 218-219).
Podem aprender habilidades sociais básicas por meio dos encontros estabelecidos durante as
entrevistas. Desenvolve o tato, a paciência, a capacidade de se comunicar, de escutar os outros
e de fazê-los sentirem-se confortáveis, elementos importantes para a entrevista e para análise
das narrativas produzidas. E o mais importante: além de ter uma visão sobre o processo
histórico, podem ter uma compreensão mais profunda do outro (exercício de alteridade), de
perceber como a experiência do outro, no passado e atualmente, é diferente das suas próprias
2 Para saber mais sobre a concepção de tempo histórico e sua relação com a aprendizagem significativa em história ver: PENNA, F.A. Negociando a distância entre passado, presente e futuro em sala de aula: a relação entre o tempo histórico e a aprendizagem significativa no ensino de história. Anais do XVI Encontro Regional de História da Anpuh-Rio: Saberes e práticas científicas, 2014; PENNA, F. A.; MONTEIRO, Ana Maria. Ensino de História: saberes em lugar de fronteira. Educação e Realidade. Porto Alegre, v.36, n. 1, p. 191 – 211, jan/abr. 2011
4
experiências, e com isso compreender e sentir-se solidárias, e enfrentar valores e atitudes
conflitantes em relação à vida (THOMPSON, 1992: 220).
A história oral é comumente definida como uma metodologia, uma fonte ou uma
técnica. No entanto, nesse projeto assume-se o seu caráter metodológico, observando os
procedimentos que ultrapassam o momento da entrevista e perpassam o diálogo entre o
entrevistador e o entrevistado. Partimos do pressuposto que,
“A história oral, como todas as metodologias, apenas estabelece e ordena
procedimentos de trabalho [...] funcionando como ponte entre teoria e prática. Esse
é o terreno da história oral – o que a nosso ver, não permite classificá-la
unicamente como prática. Mas, na área teórica, a história oral é capaz apenas de
suscitar, jamais de solucionar, questões; formula as perguntas, porém não pode
oferecer as respostas. As soluções e explicações devem ser buscadas onde sempre
estiveram: na boa e antiga teoria da história. Aí se agrupam conceitos capazes de
pensar abstratamente os problemas metodológicos gerados pelo fazer histórico”
(FERREIRA; AMADO; 1996: 16)
Além disso, assumimos também que a história oral é um “movimento”, um processo
pedagógico, e como a educação, ela é também um ato político, que possui um potencial
transformador (TEIXEIRA; PRAXEDES, 2006: 155). Nessa aproximação entre a história oral
e a educação é importante frisar a relação entre lembrar e aprender, lembrar para aprender.
Segundo as autoras citadas,
“a lembrança torna-se aprendizado quando associada à reinterpretação dos
acontecimentos e das experiências vividas, individual e coletivamente. Neste
sentido, lembrar é, também, ressignificar as experiências pretéritas e presentes”
(TEIXEIRA; PRAXEDES, 2006: 155)
Como uma experiência que possui caráter educativo, a história oral é formadora e
potencializa a condição e a ação dos sujeitos e agentes no mundo. Através da memória e da
narrativa os sujeitos significam a história, reinterpretando-o e ressignificando-o à luz do
presente e dos projetos futuros, produzem conhecimentos e sentidos sobre si e sobre os outros,
se identificam e se distinguem.
A história oral também possibilita o encontro, que acontece no momento da marcação
da entrevista e durante a mesma. O encontro entre o entrevistador e o entrevistado é um
momento de troca, de aprendizagem mútua, um momento de geração de novas experiências.
A aprendizagem do encontro estimula novos projetos e novas entrevistas.
5
O contato dos alunos com a história oral permite também que eles percebam como a
história e a experiência individual são intimamente articuladas com a história e a experiência
coletiva de grupos, ou seja, que elas não se encontram isoladas da história, mas sim
participantes de um mesmo processo histórico, que envolve o compartilhamento de memórias,
ideias e ações entre as pessoas. Assim, a nosso ver, isso os ajuda a compreender que eles
também são partícipes desse processo e que eles também fazem a história.
Sobre o projeto
Tendo já esclarecido a base teórica do projeto e quais são seus objetivos, cabe discutir
como ele foi estruturado, como foi posto em funcionamento e quais são as experiências
vivenciadas até agora. Como foi dito anteriormente, são os próprios alunos que marcam as
entrevistas e as realizam, entrando em contato com professores e ex-professores que atuam ou
já atuaram no CEPAR, funcionários e ex-funcionários e ex-alunos. Porém, antes dos alunos
irem a campo, é preciso um processo de preparação e orientação com oficinas sobre o que é
história oral, qual sua importância, como fazer uma entrevista, etc. Foi proposto um
calendário de agosto até o final do ano de 2014 apenas para preparação e realização dessas
oficinas, para que os alunos pudessem se familiarizar com essa nova maneira de compreender
a história e de produzir conhecimento.
Para a viabilização de um projeto que está apenas começando e passando pelas suas
primeiras experiências, foi estipulada a participação de no máximo 15 alunos, com a ideia de
dividi-los em duplas ou trios para cada pessoa a ser entrevistada. Os alunos foram convidados
pessoalmente para participarem do projeto, e a maioria já se encontra envolvida em outros
projetos na escola, como o projeto Jovens Leitores, um grupo de leitura que se reúne na
biblioteca. Foi justamente neste espaço frequentado pelos alunos que se estabeleceu uma
aproximação e o envolvimento dos mesmos no projeto. Grande parte dos estudantes que
participam do projeto de história oral é do 1º e 2º anos do ensino médio. Com isso, as
atividades foram pensadas para serem adequadas a este público, especialmente.
6
Todo projeto precisa de um programa de etapas a ser cumprido. Este, no caso, baseia-
se no seguinte: agendamento, elaboração e realização das entrevistas a partir da rede
estabelecida; transcrição e textualização (produção dos textos documentais); autorização dos
narradores (que podem ser gravadas no início das entrevistas ou indicada por meio da
assinatura, pelo entrevistado, da Carta de Cessão); possível entrega dos textos transcritos para
o entrevistado; análise das narrativas - transformar a entrevista em um texto trabalhado,
evidenciando o diálogo entrevistado/entrevistador; possível disponibilização das entrevistas e
das publicações delas decorrentes por meio de critérios de abertura ao público.
Estas são basicamente as etapas e as metas do primeiro semestre de 2015, e se
necessário também será utilizado o segundo semestre para finalizar o projeto. O agendamento
das entrevistas será feito a partir de um “café memória”, ou seja, vamos convidar algumas
pessoas que viveram e vivem a realidade do colégio para um encontro informal com os alunos
e iremos abrir uma caixa de fotos antigas da escola que encontramos no CEPAR, para que
essas mesmas pessoas possam tentar identificar (exercício subjetivo de identificação) quem
está na foto, onde ela foi tirada e de quando elas são datadas. Esse encontro já possibilita a
aproximação e o envolvimento dos alunos com as histórias e as memórias dessas pessoas que
participaram e ainda participam da história da escola, além de facilitar o agendamento das
entrevistas.
A etapa de transcrição e textualização será um desafio por exigir tempo livre e grande
esforço por parte dos alunos. É uma etapa que ainda vamos considerar a possibilidade de ser
feita, porque depende do calendário escolar (provas, trabalhos, outros projetos) e a
disponibilidade dos alunos. Dependendo de como tudo transcorrer, a ideia é transcrever
apenas os trechos mais importantes das entrevistas.
Sobre as oficinas, estas foram estruturadas da seguinte maneira: 1ª oficina: O que é
história oral? Para que serve? Qual sua importância? Quais são suas questões e quais são seus
elementos? ; 2ª oficina: Apresentação e discussão do filme “Narradores de Javé” – Sobre
fontes orais, memórias, experiências e narrativas; 3ª oficina: Como se faz um trabalho de
história oral? Como se faz uma entrevista? ; 4ª oficina: Apresentação de um objeto biográfico
pelos alunos (narrativa pública) e discussão de temas para orientação e elaboração de
perguntas para uma entrevista “teste” dos alunos com um professor escolhido (experiência
7
prévia); 5ª oficina: Discussão de temas para orientação e elaboração de perguntas para
entrevistas específicas do projeto sobre história e memória da escola; 6ª oficina: Relatos da
experiência das entrevistas e audição das mesmas; 7ª oficina: Continuação de relatos da
experiência das entrevistas e audição das mesmas; 8ª oficina: Análise das entrevistas pelos
grupos de alunos e produção textual; 9ª oficina: Continuação da análise das entrevistas pelos
grupos de alunos e produção textual.
Na 1ª oficina foram abordadas junto aos alunos, principalmente, questões teóricas e
introdutórias sobre o tema história oral. Neste encontro, foi apresentado aos mesmos: o que é
o projeto, quais são seus objetivos, quais são suas metas práticas, como ele funciona e como
serão as oficinas. Nessa oficina foram discutidos diversos pontos, como: o fato de a história
oral ser um método de investigação - construção e utilização das fontes orais; que a história
oral tem como elementos centrais as memórias e recordações de gente viva sobre seu passado;
que ela nos oferece interpretações de processos históricos e sociais; e que centra sua análise
nas visões e nas versões do passado que nascem da experiência e da narrativa das pessoas.
Sobre a importância da história oral foi apresentado e discutido com os alunos um
trecho escrito pelo Paul Thompson:
“A história oral é uma história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida
para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação. Admite heróis
vindos não só dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida do povo.
Estimula professores e alunos a se tornarem companheiros de trabalho. Traz a
história para dentro da comunidade e extrai a história de dentro da comunidade.
Ajuda os menos privilegiados, e especialmente os idosos, a conquistar dignidade e
autoconfiança. Propicia o contato – e, pois, a compreensão – entre classes sociais e
entre gerações. E para cada um dos historiadores e outros que partilhem das
mesmas intenções, ela pode dar um sentimento de pertencer a determinado lugar e a
determinada época. Em suma, contribui para formar seres humanos mais
completos. Paralelamente, a história oral propõe um desafio aos mitos consagrados
da história, ao juízo autoritário inerente a sua tradição. E oferece os meios para
uma transformação radical no sentido social da história” (THOMPSON; 1992: 44)
Também foi apresentado e discutido com os alunos os elementos do tempo, da
memória e da narrativa, fundamentais para a história oral. Sobre o tempo foi falado que é uma
vivência concreta e que é um elemento central na história, já que vivemos no tempo, entre
passado, presente e futuro; que o tempo é um movimento que possui permanências e
mudanças; que a história é a ciência dos homens no tempo; que o tempo é dividido em
8
sucessão linear (dia após dia) e em simultaneidade social (ao mesmo tempo); que existem o
tempo coletivo (hora do intervalo na escola, por exemplo) e o tempo individual (hora de
tomar banho e escovar os dentes, por exemplo). Também foi debatida a ideia de que o tempo
é suporte na construção de identidades pessoais e coletivas, ou seja, fundamental para
entendermos quem nós somos.
Sobre a memória foi possível problematizar o que lembramos dos acontecimentos
anteriores, distinguimos ontem de hoje, e confirmamos que já vivemos um passado; que é um
ato de lembrar; que é mutável e plena de significados de vida; que tempo e memória andam
juntos, não se separam; que ela também atua como um suporte construtor de identidades
pessoais e coletivas; que é flexível e os eventos são lembrados de acordo com as experiências
vividas no presente.
Observamos aspectos da construção narrativa, da arte de contar; que existe sob a
forma de registros orais ou escritos; que é um instrumento importante de preservação e
transmissão de heranças identitárias e das tradições, como contos, lendas, canções, etc.; que
são importantes como estilo de transmissão, de geração para geração, das experiências mais
simples da vida cotidiana e dos grandes eventos que marcaram a história da humanidade; que
a história oral estimula a arte de narrar, o ato de contar e de relembrar, e a disponibilidade
para escutar; e que a fala, a escuta e troca de olhares na entrevista são importantes de serem
consideradas.
Essas questões teóricas que são bastante abstratas para os alunos foram discutidas por
meio de exemplos e analogias feitas com a realidade dos alunos, buscando facilitar a sua
compreensão. Alguns levantavam a mão para tirar algumas dúvidas e pareciam bastante
interessados. Essas são questões fundamentais para o projeto e que o permeiam
estruturalmente, que voltaram e voltarão a ser tratadas e debatidas nas oficinas. Essa 1ª oficina
foi preparada com base nos seguintes autores: Alberti, 2004; Delgado, 2006; Pollack, 1992;
Portelli, 1991, 1996, 2010; Thompson, 1992.
Na 2ª oficina, assistimos ao filme “Narradores de Javé” com o objetivo de tornar as
questões teóricas da 1ª oficina mais concretas e palpáveis para os alunos, facilitando o seu
entendimento. Os alunos gostaram bastante do filme por acharem ele dinâmico, engraçado e
por te ajudado a esclarecer alguns pontos que havíamos conversado na oficina anterior. Logo
9
em seguida nós montamos uma roda e discutimos sobre como aspectos da história oral
aparecem no filme; sobre como são construídas as fontes orais; sobre a multiplicidade da
memória e sobre como as experiências de vida de cada um modifica a narrativa de uma
maneira específica produzindo diferentes versões e interpretações do passado; sobre a relação
entre o entrevistador e o entrevistado e como a visão de cada um influencia e modifica o
relato sobre o fato; sobre a noção de verdade e de mentira, etc.
Na 3ª oficina discutimos como se faz um projeto de história oral e como se faz uma
entrevista. Nesta oficina abordamos questões mais pragmáticas: como elaborar um roteiro de
perguntas para entrevista; quais são as pessoas que queremos e podemos entrevistar; como
utilizar o gravador; sobre o lugar da entrevista, onde o entrevistado possa se sentir
confortável, mas também um lugar silencioso e sem barulho que possa comprometer o áudio;
sobre a cópia, nomeação e datação do arquivo, seguida da carta de autorização para
publicação da entrevista; sobre como se portar numa entrevista, com respeito diante do
entrevistado, e com disposição e atenção para escutá-lo; sobre prestar atenção no “clima” da
entrevista e como o entrevistado reage a certas perguntas, considerando seus gestos e suas
expressões faciais, os silêncios; sobre não questionar ou refutar que o entrevistado está
dizendo na hora, e aceitar a sua ênfase e evitar interromper toda hora, etc. Também nessa
oficina levantamos algumas entrevistas feitas em outros projetos para que eles ouvissem e já
tivessem uma primeira aproximação com o assunto.
Na 4ª e ultima oficina do ano combinamos de discutir temas para orientação e
elaboração de perguntas para uma entrevista “teste” dos alunos com um professor escolhido,
para que eles tenham uma experiência prévia de como é feita uma entrevista. Eles se
dividiram em dupla e tiveram que marcar uma entrevista com um professor. No dia da oficina,
debatemos uma série de temas possíveis para o roteiro e os próprios alunos formularam as
perguntas.
A maioria dos alunos não conseguiu marcar a entrevista com o professor, por causa do
final do ano letivo. Apenas três alunas conseguiram marcar e realizar uma entrevista com a
professora de História Maria Gabriela. A entrevista aconteceu na biblioteca e as três alunas
demonstraram, a partir da preparação prévia, autonomia na condução. A professora foi muito
simpática e solícita em ajudar, o que contribuiu para que as alunas ficassem calmas. Ao final
10
da entrevista as alunas expressaram a satisfação com aquela experiência e afirmaram que
estavam aprendendo bastante.
Além da preparação do roteiro de perguntas nessa 4ª oficina, combinamos que todos
levassem seu próprio objeto biográfico, algum objeto que lhes tenham marcado a vida e que
lhes representasse, algo que evocasse lembranças de pessoas, acontecimentos e momentos. No
final da oficina fizemos uma roda e cada um apresentou seu objeto. Essa experiência foi feita
com o intuito dos alunos se aproximarem do tema da narrativa pública e também perceberem
como cada um tem sua própria história e trajetória de vida, suas memórias, suas conquistas,
seus dilemas e seus problemas, que são tanto pessoais quanto coletivos. Além disso, puderam
ouvir e contar histórias, compartilhar momentos especiais e emoções, e estreitar ainda mais os
laços de amizades que eles já cultivavam.
Este semestre, como já foi dito, será de agendamento, elaboração e realização das
entrevistas com as pessoas escolhidas. Após as entrevistas feitas pelos alunos, voltaremos
com o calendário das oficinas para a audição e análise conjunta das entrevistas e logo em
seguida os alunos irão produzir um texto escrito sobre as suas impressões acerca do projeto,
sobre suas experiências na entrevista e sobre as análises feitas. Todo material produzido
durante o projeto (áudio das entrevistas, fotos, textos dos alunos) irá compor um memorial
sobre a história do CEPAR. Já conseguimos uma sala que será reservada para a concretização
desse objetivo.
Por fim, pode-se observar que este projeto envolve elementos fundamentais tanto da
história oral quando do ensino de história: o estimulo à experiência docente e à formação
docente vivenciada na realidade escolar; o contato e estabelecimento de relações entre alunos,
professores e funcionários da escola, ou seja, que compartilham ideias, valores,
representações e práticas dentro de uma cultura escolar específica; a contribuição para o
ensino de história, no sentido de aproximar o aluno da produção do conhecimento histórico,
enfatizando o seu papel de sujeito e agente do processo histórico, fazendo-o perceber que as
histórias individuais estão intimamente vinculadas à história social, e que o passado possui
estreita relação com o presente e com as visões do futuro; e o fortalecimento de laços entre
professores, alunos e a escola, já que os alunos serão os protagonistas do projeto e das
11
entrevistas e, portanto, entrarão em contato direto com professores e funcionários e,
principalmente, com a história e a memória da escola.
Referências bibliográficas:
ALBERTI, Verena. Ouvir Contar: Textos em História Oral. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2004.
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de Historia: fundamentos e métodos. São
Paulo: Cortez, 2004.
DELGADO, Lucília de Almeida Neves. História Oral: memória, tempo, identidades. Belo
Horizonte: Autêntica, 2006.
FERREIRA, Marieta Morais, AMADO, Janaina (Orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio
de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996.
FORQUIN, Jean-Claude. Saberes escolares, imperativos didáticos e dinâmicas sociais. Teoria
& Educação, 1992, 5, p. 28 – 49.
MONTEIRO, A. M. Os saberes que ensinam: o saber escolar. In: Professores de História:
entre saberes e práticas. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007, 81 – 111.
NÓVOA, Antonio. Formação de professores e profissão docente. In: Os professores e a sua
formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992, pp. 13-33.
PENNA, F.A. Negociando a distância entre passado, presente e futuro em sala de aula: a
relação entre o tempo histórico e a aprendizagem significativa no ensino de história. Anais do
XVI Encontro Regional de História da Anpuh-Rio: Saberes e práticas científicas, 2014.
PENNA, F. A.; MONTEIRO, A. M.. Ensino de História: saberes em lugar de fronteira.
Educação e Realidade. Porto Alegre, v.36, n. 1, p. 191 – 211, jan/abr. 2011
POLLACK, Michael. Memória e identidade social. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v. 5,
n. 10, 1992, p. 200-212.
PORTELLI, Alessandro. Ensaios de história oral. São Paulo: Letra e Voz, 2010.
__________. O Massacre de Civitella Val di Chiana. In: FERREIRA, Marieta Morais,
AMADO, Janaina (Orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio
Vargas, 1996.
_________. Sonhos Ucrônicos: memórias e possíveis mundos dos trabalhadores.
Proj.História. São Paulo, dez, 1993.
12
_________. What makes Oral History different. In: PORTELLI, Alessandro. The Death of
Luigi Trastulli and other stories. Albany: State University of New York Press, 1991, pp. 45 –
58.
SCHIMIDT, Maria Auxiliadora; CAINELLI, Marlene. Ensinar história. São Paulo: Ed.
Scipione, 2004.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro; PRAXEDES, Vanda Lúcia. NEVES. História oral e
educação: tecendo vínculos e possibilidades pedagógicas. In: DELGADO, Lucília Neves;
VISCARDI, Cláudia (Orgs.). História Oral: teoria, educação e sociedade. Juíz de Fora:
Editora da UFJF, 2006.
THOMPSON, Paul. A voz do passado: História Oral. Paz e Terra, 1992