Mesa temática: Epistemologías coloniales/des/poscoloniales
ESTADOS PLURINACIONAIS, DESCOLONIZAÇÃO DO PODER E
NOVAS EPISTEMOLOGIAS NA AMÉRICA LATINA
GRAZIANO, Valéria Teixeira (autora)
Mestra em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação
Internacional pela Universidade de Brasília.
Mestranda em Estudos Culturais pela Universidade de São Paulo.
E-mail: [email protected]
RESUMO
O artigo tem como objetivo refletir acerca das contribuições dos
processos de refundação do Estado no Equador e na Bolívia para a
descolonização do poder e do pensamento nas sociedades latino-
americanas e, assim, para o desenvolvimento de uma nova epistemologia.
Tal reflexão é realizada a partir de revisão bibliográfica da teoria social
latino-americana e das perspectivas pós-coloniais e descoloniais,
centrando-se na análise de três paradigmas fundamentais para tais
processos de refundação do Estado: (i) a criação de novo tipo de
constitucionalismo; (ii) a adoção das noções de plurinacionalidade e
interculturalidade; e (iii) o buen vivir/vivir bien como projeto de país e
modelo civilizatório. A reflexão proposta insere-se no contexto do atual
debate acerca das possibilidades e limites inerentes à criação de Estados
Plurinacionais neste início de século, bem como sobre as contribuições e
paradoxos de tais processos no que se referem às lutas anticoloniais, à
superação da situação de dominação e ao pensamento pós-colonial. Desse
modo, pretende-se contribuir para o incipiente debate acerca da
construção de novos instrumentos conceituais, teóricos e metodológicos,
fundamentais não só para a compreensão de novas e emergentes
realidades, mas também como projeto político para a emancipação dos
povos na América Latina.
2
Palavras-chave: América Latina; Estado Plurinacional; descolonização do
poder; epistemologias do Sul.
1. Introdução
Os impactos dos processos coloniais na América Latina são ainda hoje
evidentes em questões fundamentais como a estrutura de poder
dominante, a imposição da lógica capitalista de exploração e a
predominância de valores e paradigmas eurocêntricos. Com a
rearticulação desse sistema de poder a partir da colonialidade global, e o
consequente aprofundamento da desigualdade e da exclusão econômica,
social e cultural, os países latino-americanos viram emergir neste início de
século diversos movimentosliderados por grupos historicamente
marginalizados, os quaispassaram a questionar a legitimidade do Estado-
Nação e a reivindicar transformações políticas e sociais baseadas em
outras realidades,valores, práticas e saberes.
Assim, pode-se afirmar que a América Latina protagoniza hoje uma
das mais avançadas lutas anticapitalistas e anticoloniaisno cenário da
chamada globalização contra-hegemônica (SANTOS, 2010). E, neste
contexto, inserem-se os processos de refundação do Estado no Equador e
na Bolívia, os quais, a partir das noções de plurinacionalidade e
interculturalidade, visam romper com o sistema de dominação de matriz
coloniale propor um novo padrão civilizatório.
Neste sentido, este artigo tem como objetivorefletir acerca das
contribuições desses processosde refundação do Estado para a
descolonização do poder e do pensamento nas sociedades latino-
americanose, assim, para o desenvolvimento de uma nova epistemologia,
construída desde abaixo e a partir da realidade regional. Tal reflexão é
realizada apartir derevisão bibliográfica da teoria social latino-americana e
das perspectivas pós-coloniais e descoloniais, centrando-se na análise de
3
três paradigmas fundamentaispara os processos de refundação do Estado
no Equador e na Bolívia: (i) a criação de novo tipo de constitucionalismo;
(ii) a adoção das noções de plurinacionalidade e interculturalidade; e (iii)
o buen vivir/vivir bien como projeto de país e modelo civilizatório.
Desse modo, a reflexão proposta insere-se no contexto do atual
debate acerca das possibilidades e limites inerentes à superação da
situação de dominação colonial, bem como das limitações das teorias
eurocêntricas para analisar tais processos. Assim, pretende-secontribuir
para o incipiente debate acerca da construção de novos instrumentos
conceituais, teóricos e metodológicos, fundamentais não só para a
compreensão de novas e emergentes realidades, mas também como
projeto político essencial para a superação do colonialismo e do
capitalismo na América Latina.
2. Globalização, contra-hegemonia e novas epistemologias
Considerando que a colonialidade do poder, conforme proposto por
Quijano (2005)1, continua a definir as relações de exploração e dominação
na América Latina no contexto do sistema mundo moderno colonial, é
preciso primeiramente enfatizar a necessidade de tomar distância do
pensamento eurocêntrico convencional sob o qual tais relações foram
estabelecidas, consolidadas e legitimadas, para que seja possível
compreender de maneira abrangente as complexas lutas e processos de
transformações radicais pelos quais passam a região, marcada por
contextos culturais bastante diversos e por processos políticos
heterodoxos.
É neste sentido que pretendem contribuiras perspectivas pós-
coloniais e descoloniais, as quais visam, a partir do testemunho de países
colonizados e dos grupos silenciados e subalternizados, reconstruir
1 Para o autor, o novo padrão de poder mundial, que começou com a constituição da América e do capitalismo
colonial/moderno e culminou na globalização, tem como um de seus eixos fundamentais a classificação social da população mundial a partir da ideia de raça, construção mental que expressa a experiência básica da dominação colonial e que continua a permear as relações de poder. Implica, desse modo, num elemento de colonialidade no padrão de poder atualmente hegemônico.
4
histórias plurais e intervir nos discursos dominantes da racionalidade
monocultural eurocêntrica, que historicamente buscaram naturalizar as
forças hegemônicas e as histórias de exploração dos diferentes povos e
nações. Walsh (2008, p.135) ressalta que a perspectiva descolonial tem
sido, “desde a colonização e escravidão, eixos de luta dos povos sujeitos a
essa violência estrutural” e, por isso, tem importância e utilidade
tantocomo projeto e posicionamento político quanto do ponto de vista
teórico-analítico.
Ademais, Santos (2010) lembra que não é fácil analisar processos
sociais, políticos e culturais novos, já que existe sempre o risco de utilizar-
se de quadros analíticos e conceituais antigos, o que pode levar à
desvalorização ou até mesmo à satanização do novo, ignorando seu
potencial transformador e emancipador.Por isso, considerando as
dificuldades e limitações da imaginação política e sociológica construída a
partir das teorias eurocêntricas dominantes para dar conta das realidades
emergentes no Sul e, mais especificamente, na América Latina, o autor
defende a construção de uma nova epistemologia, a qual ele denomina
Epistemologias do Sul.
De acordo com o autor, a construção de uma nova epistemologia
desde o Sul tem como objetivo dar conta das experiências e saberes
complexos, bem como das distintas formas de conhecimento e
aprendizagem desenvolvidas nessa parte do mundo, aproximando-se das
versões subalternas e marginalizadas de modernidade e racionalidade.
Assim, uma epistemologia do Sul deve dar conta dos novos processos de
produção de conhecimento e das novas relações entre diferentes tipos de
conhecimento, a partir das experiências de grupos que tenham sofrido as
desigualdades e discriminações geradas pelo capitalismo e pelo
colonialismo.
Desse modo, para analisar de maneira adequada as complexas lutas
que emergem na América Latina, torna-se imprescindívelcompreender
5
como a região foi inserida no atual projeto de modernidade e de
globalidade, o qual, segundo Quijano (2005), estrutura-se a partir da
articulação de três elementos centrais: a colonialidade do poder, o
capitalismo mundial e o eurocentrismo.Embora a globalização seja um
fenômeno bastante antigo, é preciso lembrar que atualmente caracteriza-
se por ser um fenômeno muito mais amplo, cujos impactos econômicos,
políticos e sociais atingiram patamares até então desconhecidos. As
assimetrias entre o centro e a periferia do sistema mundo moderno
colonial geradas por esse novo padrão de poder global são muito mais
dramáticas que qualquer outro período histórico. Escobar (2005) acredita
que é possível afirmar que tem surgido uma nova forma de globalidade, a
qual ele denomina globalidade imperial.
Tendo em conta que o atual processo da globalização dominante é
articulado a partir de um espaço eurocêntrico de discursos,
representações e práticas, e com o objetivo de apontar a dimensão
cultural e epistemológica do eurocentrismo, Escobar (2005) sugere
também a adoção da noção de colonialidade global, formulada por Walter
Mignolo a partir do conceito de colonialidade do poder, para acompanhar o
conceito de globalidade imperial. Assim, o autor propõe como categoria de
análise a dupla colonialidade global/globalidade imperial.
Pode-se concluir então que a matriz colonial não apenas estruturou,
mas continua estruturando as sociedades na América Latina, a partir de
um marco capitalista global moderno, o qual está presente em
praticamente todos os âmbitos da vida. Esse sistema estruturou-se a
partir de quatro eixos centrais: a colonialidade do poder, a qual se refere
ao estabelecimento de um sistema de classificação social e identitária
baseada em uma hierarquia racial e sexual; a colonialidade do saber, a
partir do eurocentrismo como perspectiva única de conhecimento; a
colonialidade do ser, pro meio da inferiorização, subalternização e
desumanização;e a colonialidadeda natureza e da vida (SANTOS, 2010;
WALSH, 2008).
6
Como lembra Quijano (2005b, p. 24),
a colonialidade do poder implicava então, e ainda
hoje no fundamental, a invisibilidade sociológica dos
não europeus, “índios”, “negros” e seus “mestiços”, ou
seja, da esmagadora maioria da população da América
e sobretudo da América Latina, com relação à produção
de subjetividade, de memória histórica, de imaginário,
de conhecimento “racional”. Logo, de identidade.
Dessa maneira, a partir da adoção de tais perspectivas teóricas e
analíticas para analisar os novos paradigmas que emergem no contexto
dos processos de refundação do Estado no Equador e na Bolívia, espera-
se contribuir na busca denovos caminhos para uma radical
reconceitualização da teoria e da política na América do Sul, a partir da
criação de novas categorias e paradigmas teóricos.
3. O Estado-nação e a refundação do Estado na América Latina
Em primeiro lugar, é preciso sublinhar que, com a reconfiguração de
poderes no sistema mundo colonial moderno e o aprofundamento do
processo de globalização nas últimas décadas, o modelo de Estado-nação
tal como imposto pelo mundo europeu ocidental vem sendo alvo de
intensos questionamentos. Énecessário lembrar também que a
consolidação dos Estados modernos a partir desse modelo eurocêntrico
dependeu, em muitos casos – e na América Latina, em especial –, da
construção de identidades nacionais baseadas em homogeneização
cultural, as quais resultaram de longos processos de conquistas violentas,
negações e exclusões de grupos étnicos e culturais (QUIJANO, 2005b) e
que tem permitido manter a dominação econômica, política, social e
cultural.
Desse modo, considerando que os Estados nacionais na América
Latina refletem a colonialidade do poder e as dinâmicas de exploração
impostas pelo capitalismo global, pode-se concluir que os mesmos
7
dificilmente se alterarão sem que suas estruturas passem por
transformações radicais, ou seja, sem a sua descolonização. Como afirma
Quijano (2005, p. 135), “o processo de independência dos Estados da
América Latina sem a descolonização da sociedade não pôde ser, não foi,
um processo em direção ao desenvolvimento dos Estados-nação
modernos, mas uma rearticulação da colonialidade do poder sobre novas
bases institucionais”.
Ressalta-se, ainda, que os modelos de desenvolvimento
historicamente impostos à América Latina baseados no liberalismo
econômico contribuíram para a continuidade do colonialismo e da
dependência e para o aumento da desigualdade e da exclusão. Para
Santos (2010), o neoliberalismo acabou paradoxalmente reforçando o
componente colonial da equação capitalismo-colonialismo ao tentar liberar
o capitalismo de todas as mediações políticas nacionais, fazendo com que
os Estados nacionais perdessem sua soberania a ponto de voltarem a ser
semi-colônias.
É a partir desse contexto de imposição histórica de modelos de
Estado e paradigmas de pensamento eurocêntricos que emergem as lutas
e os processos de transformação mais recentes na América Latina, os
quais culminaram, nas últimas décadas, no fortalecimento dos
movimentos sociais, bem como na ascensão de governos ditos de
esquerda ou pós-neoliberais em diversos países.Esses novos atores, que
se organizaram especialmente a partir de movimentos político-culturais
indígenas e afrodescendentes, ganharam força com um discurso de luta
contra a continuidade da situação colonial e do rompimento com a versão
eurocêntrica de modernidade/racionalidade, negando a legitimidade
política do Estado-Naçãoe teórica e social da classificação “racial” e
“étnica” imposta.
A partir do questionamento acerca das reais possibilidades de saída
para o subdesenvolvimento no marco do capitalismo e da modernidade,
8
tais processos têm resultado em projetos políticos alternativos
einovadores que apontam para a construção de um novo padrão
civilizatório, tal como a criação de Estados Plurinacionais no Equador e na
Bolívia.Santos (2010, p. 59) chega a afirmar que o continente latino-
americano “tem conseguido, mais que qualquer outro, fazer com êxito um
uso contra-hegemônico de instrumentos políticos hegemônicos, tais como
a democracia representativa, o direito, os direitos humanos e o
constitucionalismo”.
Para o autor,esse debate é muito promissor, pois significa que “os
movimentos sociais adquiram a consciência de que os sistemas de
dominação – capitalismo e colonialismo – são simultaneamente distintos e
inseparáveis, e que sem entender a articulação entre eles não poderá ter
êxito” (SANTOS, 2010, p. 60). E é neste mesmo sentido que Walsh (2008)
afirma que tais transformações políticas e sociais representam esforços
históricos, insurgentes e transcendentais.
Dessa maneira, pode-se afirmar que os processos que culminaram na
criação de Estados Plurinacionais no Equador e na Bolívia inserem-se num
contexto histórico de exploração e dominação colonial e de crise do
modelo capitalista neoliberal; de fortalecimento e protagonismo de
movimentos sociaise culturais historicamente marginalizados nas agendas
políticas latino-americanas; e de reformas constitucionais em diversos
países nas últimas três décadas.
E, dessa forma, as alternativas políticas que emergem na América
Latina neste início de século têm impactado diretamente a compreensão
teórica de noções como modernidade,Estado-nação, desenvolvimento e
identidade, impondo a necessidade de repensar as sociedades a partir de
concepções renovadoras, que possibilitem a emancipação dos grupos
sociais excluídos, o reconhecimento de seus direitos e identidades e o fim
da situação de dominação colonial e capitalista. E, por isso, representam
também a abertura de novas possibilidades e horizontes para a
9
construção de novas epistemologias, que se distanciem do pensamento
eurocêntrico e se aproximem da realidade do Sul global, como propõe
Santos (2010; 2010b).
4. Novos paradigmas para arefundação do Estado
4.1 Novo constitucionalismo
Os processos de refundação do Estado no Equador e na Bolívia
exigiram o desenvolvimento de um novo tipo de constitucionalismo, muito
diferente daquele concebido pelas elites políticas e que tem caracterizado
os Estados modernos, constituídos a partir do modelo “um Estado, uma
nação”,e baseados em uma concepção monolítica e centralizadora do
poder e da violência.Construído desde abaixo e protagonizado por
movimentos de excluídos e aliados, esse novo constitucionalismo baseia-
se em relações interculturais igualitárias e caracteriza-se por uma ampla
mobilização social e política, tendo como objetivo a construção de novas
institucionalidades, territorialidades, legislações, regimes políticos e
subjetividades. Visa, dessa forma, romper com o modelo político e
epistêmico eurocêntrico e propor um novo padrão civilizatório.
Neste sentido, em seu artigo 1º, a Constituição boliviana aprovada
em 2009 define o novo Estado como um “Estado Unitário Social de Direito
Plurinacional Comunitário, livre, independente, soberano, democrático,
intercultural, descentralizado e com autonomias”. E, em seu artigo 1º, a
nova Constituição equatoriana,de 2008,define que o “Equador é um
Estado constitucional de direitos e justiça, social, democrático, soberano,
independente, unitário, intercultural, plurinacional e laico”.
Além de estabelecer novos tipos de Estado, os dois textos
constitucionais preveem novas formas de participação política. Em seu
artigo 11, a Constituição boliviana reconhece, ademais da democracia
representativa, as formas democráticas participativa e comunitária,
apresentando-se como uma das mais avançadas formulações sobre
democracia do mundo. A Constituição equatoriana, em seu artigo 95,
10
define como mecanismos a democracia representativa, direta e
comunitária. Assim, para Santos (2010), tais textos constitucionais
consagram a ideia de democracia intercultural, um novo tipo de
democracia que reconhece e valoriza a pluralidade de formas de
deliberação e representação e de diferentes tipos de direitos.
Entende-se, portanto, que a partir desse novo constitucionalismo,
foram abertos processos de participação muito ricos nesses países, não
isentos de conflitos e contradições, em torno da articulação de novas
formas de gestão coletiva. Para Thwaites Rey (2010), os processos de
reforma constitucional encarados pelo Equador e pela Bolívia, bem como
as discussões sobre a conformação de Estados Plurinacionais superadores
das formas tradicionais de Estado-nação, marcam uma mudança
fundamental na práxis emancipadora do continente.
Entretanto, é preciso lembrar que, durante os processos
constituintes, muitas das propostas formuladas por movimentos sociais
não foram incluídas nos textos constitucionais, as interferências do
Executivo e do Congresso geraram tensões diversas eas relações de força
foram se alterando em favor de posições mais conservadoras, resultando,
muitas vezes, na marginalização de movimentos indígenas e outros
historicamente excluídos.Diante das dificuldades de negociação, muitas
propostas foram ignoradas ou se tornaram meros textos declaratórios, tal
como a transformação da estrutura do próprio Estado em plurinacional,
permanecendo assim uma estrutura baseada no Estado republicano
anterior. Muitas outras questões permaneceram abertas e, por isso, tais
constituições podem ser consideradas como instrumentos ainda bastante
frágeis.Santos (2010) denomina esse novo constitucionalismo como
transformador e experimental. Para o autor,
apesar de suas diferenças, os dois processos
constituintes [na Bolívia e no Equador] revelam com
igual nitidez as dificuldades de realizar, dentro do
11
marco democrático, transformações políticas profundas
e inovações institucionais que rompam com o horizonte
capitalista, colonialista, liberal e patriarcal da
modernidade ocidental (SANTOS, 2010, p. 79).
Ele lembra ainda que a refundação do Estado moderno capitalista
colonial a partir de princípios como plurinacionalidade, interculturalidade e
participação democrática é um processo histórico e político complexo e de
longo prazo. Ressalta, ademais, que o que está em jogo não são apenas
um conjunto de políticas públicas mais ou menos inovadoras, e sim um
novo pacto político, que contém inclusive uma dimensão de mudança no
padrão civilizatório. Trata-se, portanto, de um processo intrinsecamente
marcado por intensas disputadas entre os diversos grupos culturais,
étnicos e de poder, os quais possuem diferentes valores e interesses em
mudanças radicais ou permanências nas estruturas de poder que
compõem o Estado.
Além disso, considerando que as constituições representam apenas
mecanismos de transição, ou seja, o ponto de partida para a construção
de um novo projeto de país,o diálogo constante entre os diversos atores
será fundamental para a efetiva implementação dos Estados
Plurinacionais. A grande disputa que se seguirá refere-se à interpretação e
aplicação dos artigos constitucionais. É por isso que Santos (2010) alerta
que, apesar de esse tipo de constitucionalismo transformador representar
um processo de caráter contra-hegemônico de ampla mobilização popular,
qualquer quebra nessa mobilização pode representar retrocessos em seu
conteúdo ou vazio de sua eficácia prática, o que pode resultar na
desconstitucionalização da Constituição.
Para Walsh (2008), esse processo dá espaço, pela primeira vez, para
a consideração do Estado como lugar possível para a descolonialidade.A
novidade de ambas os processos constitucionais reside justamente na
possibilidade de construir novas lógicas, novas formas de conhecer,
12
pensar, ser e viver, a partir do rompimento com o Estado de matriz
colonial e da descolonização de suas estruturas de poder. Permitem,
dessa maneira, transformar o modelo de Estado baseado na
homogeneização, exclusão e dominação, num modelo de Estado
construído a partir da pluralidade, inclusão e participação.E é neste
sentido que esse constitucionalismo transformador que emerge no
Equador e na Bolívia pode contribuir para a construção de uma nova
epistemologia.
4.2 Plurinacionalidade einterculturalidade
De acordo com Santos (2010), a refundação do Estado no Equador e
na Bolívia a partir das noções de plurinacionalidade e interculturalidade
representam as experiências mais avanças no continente em termos de
refundação do Estadomoderno capitalista colonial, já que sintetizam as
possibilidades e também os limites da imaginação política do fim do
capitalismo e do fim do colonialismo como sistemas de dominação e
exploração.
Primeiramente, destaca-se que o reconhecimento da
plurinacionalidade no processo de refundação do Estado representa um
radical desafio ao conceito de Estado-nação moderno ao reivindicar o
reconhecimento do conceito de nação a partir da perspectiva de
pertencimento comum a uma etnia, cultura ou religião. A
plurinacionalidade implica, assim, no reconhecimento de direitos coletivos,
na possibilidade de convivência de uma nação cívica com diversas nações
culturais dentro de um mesmo Estado, bem como em noções como
autogoverno e autodeterminação, dentre outros. Desse modo, constitui
uma tentativa de construção de um sistema político que, ao invés de
excluir e homogeneizar, seja capaz de articular a diferença e que
reconheça outros sujeitos e visões de mundo.
Para Santos (2010), a plurinacionalidade não representa a negação
da nação, mas o reconhecimento de que está inconclusa e que novos
13
conceitos de nação devem emergir para superar a polarização entre nação
cívica e nação étnico-cultural. Neste mesmo sentido, Walsh (2008, p.143)
afirma que “a importância da plurinacionalidade é permitir o re-pensar e
re-fundar do uni-nacional, colonial e excludente, dentro de um projeto de
Estado e sociedade que se constrói desde a pluralidade e desde as
diferenças ancestrais”.
No que se refere ao conceito de interculturalidade, é preciso
esclarecer que, diferentemente de países onde essa noção é proposta e
definida a partir do Estado e de uma perspectiva mais restrita de
reconhecimento e tolerância com relação à diversidade, no Equador e na
Bolívia foi inicialmente reivindicado pelos movimentos indígenas e outros
grupos subalternizados como formas de lutas contra a hegemonia colonial
e imperial dominante.É neste sentido que Walsh (2008)propõe a noção de
interculturalidade crítica de caráter descolonial, ou seja, uma
interculturalidade que vise transformar radicalmente as estruturas e
relações sociais e construir novas e distintas formas de vida. Para ela,
apesar das limitações em termos da aplicação deste princípio e de
consensos de como promovê-la concretamente, o caráter político e social
da interculturalidade é necessário e evidente.
Walsh (2008) acredita que a plurinacionalidade e a interculturalidade
são complementares enquanto ferramentas e projetos para a
transformação e a descolonização do Estado e da sociedade. Neste mesmo
sentido, Santos (2010) afirma que o reconhecimento da plurinacionalidade
é um mandato político para a promoção da interculturalidade, e que sua
prática ao longo do tempo deverá dar origem a um novo tipo de
mestiçagem, uma mestiçagem pós-colonial dialógica e plural.
Para Santos (2010), a comparação entre as duas constituições
mostra que a plurinacionalidade é muito mais vinculante no caso da
Bolívia do que no Equador, não só porque a plurinacionalidade atravessa
toda a constituição boliviana, mas também porque no Equador a noção
14
republicana de cidadania individual e igualitária parece ser ainda bastante
forte, chegando a neutralizar a eficácia dos direitos coletivos dos povos
indígenas estabelecidos pela Constituição. Considerando que a
Constituição boliviana centra-se mais no esforço da plurinacionalização,
enquanto a equatoriana dedica maior espaço à interculturalização, Walsh
(2008, p.150) afirma que
Essa é, sem dúvida, uma das debilidades da
equatoriana e eixo de futura luta que o movimento
indígena recentemente apontou. (...) sem o
estabelecimento e desenvolvimento estrutural do
plurinacional, o intercultural facilmente ficará no campo
relacional, sem a transformação social e política que
aponte o conceito em sua significação pelo movimento
indígena.
Todavia, é preciso ressaltar que tais paradigmas não representam um
fim em si, mas instrumentos de luta contra o colonialismo, o capitalismo e
o racismo, cujos fins de longo prazo devem dar origem a um novo marco
civilizatório, a partir da construção de instituições e processos
democráticos mais inclusivos, do desenvolvimento de economias baseadas
em outros valores tal como a solidariedade, do reconhecimento e da
valorização da pluralidade de práticas e saberes, do respeito de direitos
individuais e coletivos, da proteção dos recursos naturais, dentre outros.
Lembrando que a Constituição de um Estado não é um texto fechado,
fixo e estático, mas um processo dinâmico de diálogo e interpretação, o
maior risco para estes novos Estados é sua redução, junto com outros
princípios constitucionais, à retórica declaratória e legitimadora de suas
instituições. Neste sentido, Grijalva (2008) ressalta que as limitações ao
desenvolvimento da plurinacionalidade e da interculturalidade vêm mais
da dinâmica de forças políticas e econômicas do que de particularidades
das normas vigentes. Assim, durante um longo período transicional é de
se esperar conflitos e intensas disputas em torno da construção desses
15
novos paradigmas, que representam novos e alternativos projetos
políticos, sociais e epistemológicos.
4.3 Buen vivir/vivir bien como projeto de país e modelo
civilizatório
O buen vivir(Equador) ou vivir bien(Bolívia) – ressaltando a
necessidade de reconhecer as diferenças em termos de significações e
apropriações, próprias de cada contexto e cultura – está consagrado nas
constituições de ambos os países como paradigma central do
ordenamento social e econômico, distanciando-se da noção de
desenvolvimento pregado pelo modelo ocidental capitalista, e resgatando
a cosmovisão dos povos e nacionalidades autóctones, baseada em outros
valores, outras formas de produção e outros modos de vida, bem como na
harmonia entre a sociedade e a natureza.O texto constitucional
equatoriano reconhece inclusive a natureza como sujeito de direito,
representando uma proposta bastante avançada e inovadora em relação
às constituições de outros países.
Para a chamada corrente pós-desenvolvimentista, o desenvolvimento
tal como pregado pelo pensamento eurocêntrico representa um conjunto
de ideias que moldam a realidade e as relações de poder, baseado em
noções etnocêntricas, construído no Norte como “modernidade” e imposto
ao Sul. Neste sentido, esses autores ressaltam a dificuldade que
representa esse paradigma para outras formas de organizações sociais
sobreviver às margens do sistema ocidental dominante. Ademais, seria
esse modelo uma forma de justificar a continuidade do colonialismo por
outros meios, mantendo nas sociedades colonizadas a lógica capitalista e
o sistema dominante de poder.
Para Sachs (2010), relacionar o desejo por igualdade ao crescimento
econômico tem sido a base conceitual da era do desenvolvimento.
Desfazer essa relação e refazê-la a partir de noções de bem-estar deve
ser a prioridade para a “era pós-desenvolvimento”. Neste sentido, Sotillo
16
(2011) sugere que o pós-desenvolvimento possibilite não apenas a criação
de diferentes discursos e representações, não mediados pela construção
do desenvolvimento, mas também indique
a necessidade de mudar as práticas de saber e
fazer, ou seja, a necessidade de multiplicar centros e
agentes de produção de conhecimentos, fazendo
visíveis as formas de conhecimento produzidas por
quem supostamente são os „objetos‟ do
desenvolvimento para que possam transformar-se em
sujeitos e agentes. (SOTILLO, 2011, p. 247).
Dessa forma, mais do que propor “desenvolvimentos alternativos”, os
pós-desenvolvimentistas propõem superar a base conceitual e o
paradigma do desenvolvimento e pensar em “alternativas ao
desenvolvimento”, criando sistemas baseados em outros valores, que
garantam alto valor e reconhecimento aos bens culturais e espirituais
(RIST, 2004; e SUMNER e TRIBE, 2008). Assim, tais autores entendem
que o buen vivir/vivir bien representa justamente esse esforço de
construção de alternativas ao paradigma do desenvolvimento e de
sistemas alternativos de valores.
Para Acosta (2012), o buen vivir representa uma oportunidade de
construção coletiva de novas formas de vida, forjadas no calor das lutas
por emancipação e cujas propostas emergem de grupos tradicionalmente
marginalizados.Ele entende que obuen vivirnão sintetiza nenhuma
proposta completamente desenvolvida e também não pretende assumir o
papel de um mandato global: sua tarefa principal é romper com a ideia de
desenvolvimento como objetivo universal de todas as sociedades e propor
novas maneiras de viver e pensar, diversas e complexas. Neste sentido,
Acosta (2012, p. 202) acredita que a tarefa de reconstrução do buen vivir
é descolonizadora e despatriarcalizadora, e “estabelece definitivamente
17
uma cosmovisão diferente da ocidental ao surgir de raízes comunitárias
não capitalistas”.
Todavia, é preciso ressaltar a distância entre o paradigma do buen
vivir/vivir biene as políticas construídas a partir dele no âmbito do
processo de refundação dos Estados no Equador e na Bolívia. Embora seja
um dos eixos centrais dos novos textos constitucionais e esteja presente
nos discursos governamentais, muitas das práticas e dinâmicas levadas a
cabo pelos governos nacionais em nada remetem às propostas do buen
vivir/vivir bien. O extrativismo, por exemplo, apesar de estar ancorado na
lógica colonial e desenvolvimentista, continua tendo um papel central para
a economia desses países. Segundo Acosta (2012, p. 211),
A lista de inconsistências nos governos
progressistas, tanto em nível nacional como de
territórios descentralizados, chama a atenção para
intenções distintas entre os mandatos constitucionais e
a “real politik” de formas continuísticas de consumismo,
refletindo também o uso propagandístico do termo
Buen Vivir. Basta ver a quantidade de documentos e
programas oficiais que anunciam o fim do Buen Vivir
como pauta publicitária.
Apesar disso, e considerando que o período transicional deve ser
longo e marcado por intensas disputas, a refundação do Estado a partir de
um novo projeto de país, baseado no buen vivir/vivir bien,aponta para
uma mudança no padrão civilizatório. Para Acosta (2010), o maior mérito
desse novo tipo de Constituição está justamente nessa abertura de
possibilidades para disputar o sentido histórico do desenvolvimento.Assim,
uma das tarefas fundamentais consiste na construção de diálogos plurais
e permanentes entre os saberes e conhecimentos ancestrais e o
pensamento moderno universal, levando à construção do que Santos
(2010)denomina“diálogos interculturais” e de uma “ecologia de saberes”.
18
Essas tarefas serão fundamentais para romper com o pensamento
eurocêntrico e para a construção deum outro Estado.
5. Conclusão
Aoabordar as experiências de refundação do Estado no Equador e na
Bolívia, buscou-se identificar como tais alternativas políticas que emergem
atualmente na América Latina podem contribuir para o rompimento com a
colonialidade do poder e com o eurocentrismo como pensamento
dominante e, assim, para o desenvolvimento de sociedades baseadas em
outros valores e modo de pensar e para a construção de uma nova
epistemologia, que dê conta das realidades emergentes no contexto
latino-americano.Embora não tenha analisado osprocessos de
implementação em si de cada um desses paradigmas nas políticas e
instituições nacionais – o que mereceria um estudo à parte –, é
importante ressaltar que,muitos desses novos paradigmas e normas que
compõem as novas constituições, na prática estão longe de estarem
totalmente incorporados na gestão governamental dos dois países.
Os processos constitucionais não se encerraram com a adoção das
novas constituições nacionais, mas apenas deram início ao que deve ser
um longo e conflituoso período transicional rumo à construção de Estados
efetivamente plurinacionais e interculturais. Considerando que os textos
constitucionais não lograram resolver questões relevantes,deixando
muitas delas em aberto, é preciso reconhecer que representam
instrumentos ainda bastante frágeis, suscetíveis às disputas que se
seguirão em torno de sua interpretação.Intensas batalhas emergirão
continuamente durante a construção desses novos projetos políticos,
sociais e epistemológicos.Dessa forma, a consolidação dosnovos Estados
dependerá da maneira como as sociedades e as instituições darão vida às
suas constituições, ou seja, dependerá dos avanços futuros no processo
de implementação de seus artigos e normas e da capacidade que terão
para construir diálogos plurais, abertos e democráticos.
19
Apesar das limitações e dificuldades, tais processos constituintes
abriram espaços para diálogos muito criativos, possibilitando a
emergência de novos conceitos e formas institucionais e revelando novos
caminhos para pensar muitas das crises que marcam o mundo
contemporâneo, tal como o paradigma da modernidade; a ideia de nação;
o Estado moderno; e as formas de organização política e social. Ou seja,
contribuem para a construção de formas de pensar para além dos
paradigmas eurocêntricos que até agora determinaram as condições
políticas, sociais e econômicas da América Latina. Neste sentido,
representam não apenas a possibilidade de superação do colonialismo e
do capitalismo, mas apontam para a construção de um novo padrão
civilizatório, que poderálevar à emancipação das sociedades latino-
americanas e, quiçá, de outras populações do Sul global. Por isso,os
processos por que passam Equador e Bolívia são reconhecidos como
avançadas lutas anticapitalistas e anticoloniais no contexto da chamada
globalização contra-hegemônica.
Dessa maneira, pode-se concluir que os processos de refundação do
Estado na América Latina a partir da plurinacionalidade revelam não
apenas a possibilidade de romper com o sistema colonial de exploração,
mas de propor novos caminhos para a construção de diálogos
verdadeiramente interculturais e pós-coloniais, de onde poderão emergir,
como sugere Santos (2010), “criativas mestiçagens conceituais, teóricas e
políticas”, as quais servirão de base para a construção de um novo padrão
civilizatório e de novas epistemologias. Revelam, assim, as possibilidades
de imaginar outras sociedades e outros mundos, mais justos e humanos
6. Referências bibliográficas
ACOSTA, Alberto. El Buen (con) Vivir, una utopía por (re)construir:
Alcances de la Constituición de Montecristi. OtraEconomía (online), vol. 6,
20
nº6, 2010. Acesso: 15 de outubro de 2014. Disponivel em:
http://www.riless.org/otraeconomia
_______________. O Buen Vivir: uma oportunidade de imaginar
outro mundo. In: Um campeão visto de perto: Uma Análise do Modelo de
Desenvolvimento Brasileiro. Série Democracia. Rio de Janeiro: Heinrich-
Böll-Stiftung, 2012.
CLAURE, María Teresa Zegada. Elementos para pensar la
reconfiguración del campo político boliviano. Cuadernos del Pensamiento
Crítico Latinoamericano, nº28. CLACSO, 2010.
BOLIVIA. Constitución Política del Estado Plurinacional de Bolivia. El
Alto, Bolivia:Asamblea Constituyente de Bolivia, 2009.
ECUADOR. Constituciónde la República del Ecuador.Montecristi,
Ecuador:Asamblea Constituyente, 2008.
ESCOBAR, Arturo.Más allá del Tercer Mundo: Globalización y
Diferencia. Bogotá: Imprenta Nacional, 2005.
GRIJALVA, Agustín. El Estado Plurinacional e Intercultural en la
Constitución Ecuatoriana del 2008. In: Revista Ecuador Debate, n. 75,
p.49-62. Quito: Centro Andino de Acción Popular, 2008.
QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América
Latina. In: LANDER, Edgardo (org.). A colonialidade do saber:
eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas.
Colección Sur-Sur. Buenos Aires: CLACSO, 2005. Disponívelem:
http://biblioteca.clacso.org.ar/ar/libros/lander/pt/Quijano.rtf.Acesso: 10
de maio de 2014.
21
_______________. Dom Quixote e os moinhos de vento na América
Latina. In: Dossiê América Latina, Revista Estudos Avançados, nº55,
2005b.
RIST, Gilbert. The history of development:from western origins to
global faith. 3ª ed. Londres: Zed Books Ltd., 2008.
SACHS, Wolfgang (ed.). The development dictionary:a guide to
knowledge as power. 2ª ed. Londres: Zed Books Ltd., 2010.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Refundación del Estado en América
Latina. Perspectivas desde una epistemología del Sur. Lima: Instituto
Internacional de Derecho y Sociedad; Programa Democracia y
Transformación Global, 2010.
__________________; MENESES, Maria Paula (orgs). Epistemologias
do Sul. São Paulo: Cortez, 2010b.
SOTILLO, José Ángel. El sistema de cooperación para el desarrollo:
actores, formas y procesos. Série Desarrollo y Cooperación. Madri: Los
libros de la catarata, 2011.
SUMMER, Andy; TRIBE, Michael.International Development
Studies:Theories and Methods in Research and Practice. Wiltshire: The
Cromwell Press Ltd., 2008.
THWAITES REY, Mabel. Después de la globalización neoliberal. ¿Qué
Estado em América Latina?. Cuadernos del Pensamiento Crítico
Latinoamericano. nº 32, CLACSO, 2010. Acesso: 10 de maio de 2014.
Disponível em
http://biblioteca.clacso.edu.ar/ar/libros/secret/cuadernos/32/32.t.rey
.pdf.
22
WALSH, Catherine.Interculturalidad, plurinacionalidad y
decolonialidad: las insurgencias político-epistémicas de refundar el
Estado.Tabula Rasa, online, 2008 (Julio-Diciembre). Acesso: 15 de
outubro de 2014.Disponível em:
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=39600909