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FEMINIZAO DO MAGISTRIO NO BRASIL: O QUE RELATAM OS PARECERES DO PRIMEIRO CONGRESSO DA INSTRUO DO RIO DE JANEIRO. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARING.
Juliana Keller Nogueira* Profa. Dra. Analete Regina Schelbauer**
Introduo
O artigo visa refletir sobre o processo de feminizao do magistrio no Brasil no final
do sculo XIX, momento de significativas mudanas sociais voltadas para a idia de
progresso onde era atribudo a educao, o papel de promover a modernizao do pas. Busca-
se entender as influncias das instncias polticas e econmicas no processo de feminizao
do magistrio, entendendo que as transformaes sociais, polticas, econmicas e culturais
ocorridas na sociedade no final do sculo XIX repercutiram no campo educacional,
principalmente no que se refere ao perfil da formao docente.
preciso salientar que, no final do sculo XIX o pas passava por uma intensa
campanha em prol da democratizao do ensino, visando a constituio do sistema nacional
de instruo, apesar das discusses e projetos voltados para elaborao desse, sua efetivao
no ocorreu. Nesse contexto histrico busca-se educar o homem livre, sendo essa liberdade
direcionada pela ordem produtiva, enfatizando por meio da escola o desenvolvimento das
virtudes morais, onde a mulher iria representar a me educadora responsvel pela educao da
nao.
Nesse contexto pretende-se desvelar as formas de representaes direcionadas as
mulheres, revelando as contradies e determinaes sociais e polticas que delinearam os
contornos da feminizao do magistrio nos finais do sculo XIX. Para refletir sobre esse
processo, priorizou-se a utilizao de uma fonte primria intitulada Atas e Pareceres do
Congresso da Instruo do Rio de Janeiro1, de 1884, e algumas referncias historiogrficas
pertinentes ao tema. Quanto fonte primria, focalizou-se algumas questes pertinentes para
esclarecer e auxiliar na compreenso da representao da formao docente, principalmente
no que diz respeito a educao das mulheres para o magistrio.
* Aluna do Programa de Ps - Graduao em Educao da Universidade Estadual de Maring. **Professora do Departamento de Teoria e Prtica da Educao e do Programa de Ps-graduao em Educao da
Universidade Estadual de Maring. 1 Foram realizadas atualizaes ortogrficas nas citaes dessa fonte primria.
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A necessidade em educar as mulheres estava ligada modernizao da sociedade e ao
processo de higienizao da famlia, juntamente com a idia da criao de um sentimento
nacional vinculando a ordem e progresso. Convm destacar as condies e circunstncias que
levaram as mulheres a ocuparem as salas de aula, refletindo sobre as posturas femininas que
foram construdas historicamente sendo que a escola representa uma das instncias
ideolgicas, que ir contribuir quanto a postura em que a mulher preenche no mundo do
trabalho, ajudando a reforar ou transformar os papis a elas estabelecidos socialmente.
Entende-se que a insero da mulher no magistrio no ocorreu de forma natural,
pois, no apenas as relaes econmicas e polticas tiveram grande importncia no processo
de feminizao da profisso. As reivindicaes femininas, que buscavam seus direitos ao
exigirem o acesso a instruo e a oportunidade de trabalho remunerado, tambm tiveram um
papel importante e utilizaram-se da imprensa peridica feminina para divulgao de seus
direitos.
Para refletir sobre as condies e circunstncias que fizeram com que as mulheres
ocupassem as salas de aula, importante pensar que essa histria permeia a questo de
gnero, procurando explicar as maneiras com que homens e mulheres formam sua
subjetividade, sendo que no interior desses discursos so construdas suas prticas sociais
capaz de intervir nas formas de representaes que lhe so impostas. A ideologia dominante,
que junto com a dominao de classe passava a dominao do sexo masculino sobre o
feminino, vinha pela imprensa, pela escola, pela igreja, dissolvidas nas instituies polticas e
sociais (LOURO, 1986, p. 29).
De fato os ideais positivistas contriburam para a dominao sexista, por meio de seus
currculos, orientaes, valorizando a religio e a moral apregoando dessa maneira a
submisso s mulheres. Mas como afirma Louro (1986), por meio do mesmo currculo que
possibilitou maneiras de expresso e organizao, criando possibilidades para participao e
liderana.
O pensamento educacional brasileiro no sculo XIX: Repercusses no campo
educacional
No final do sculo XIX, ocorreu uma srie de discusses acerca das mudanas que
deveriam se efetuar, no que diz respeito aos posicionamentos polticos, pois as estatsticas
revelaram sobre a escolarizao do povo, um grande ndice de analfabetismo. Os discursos
apontavam como responsveis pela crise s instituies do regime monrquico, [...] as quais
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eram consideradas pouco democrticas pela precria representatividade poltica, pela
centralizao de poderes, pela represso s liberdades de conscincia, de imprensa e de
ensino (SCHELBAUER, 1998, p. 56).
Ao fomentar a discusso sobre um regime poltico mais democrtico, ocorreu uma
preocupao com a educao da populao iletrada, visto que nesse momento grande parte da
populao era analfabeta. Para reverter esse quadro, os intelectuais e governantes da poca
pensavam em criar um esprito de nao, ou seja, nacionalizar o pas preparando os cidados
para o trabalho livre, correspondendo ao ideal de um pas republicano. Toda essa discusso
em torno das questes polticas exigindo uma conduta mais democrtica do regime poltico,
trouxe a tona os problemas educacionais.
Acreditava-se que para reverter os problemas que assolavam o pas, era necessrio
fazer reformas nas instituies monrquicas, onde depois de reformadas poderiam representar
um regime poltico capaz de conciliar com a nova organizao do trabalho que se institua.
Foi no meio desse contexto, que a mulher cogitada como educadora, visto que para reverter
o quadro de analfabetismo era necessria a criao de escolas e conseqentemente aumentaria
a demanda de mo-de-obra, onde abriria o acesso para a mulher adentrar na profisso do
magistrio.
Acompanhando o processo de insero das mulheres no magistrio e a sua influncia aos bancos das escolas normais, podemos perceber claramente uma ao de enquadramento s normas morais dominante. Essa ao se consubstanciou em discursos e prticas que conformavam toda a possibilidade de atuao das mulheres nesse espao acadmico ou profissional (VILLELA, 2000, p. 121)
Entendendo que esse processo de insero da mulher no magistrio correspondia
necessidade poltica e social do final do sculo XIX, entendendo que esse processo no
ocorreu de forma passiva, pois essa abertura do campo de trabalho as mulheres no ocorreu
sem reivindicaes, visto que a imprensa feminina e educacional teve um papel importante
para ressaltar as sucessivas mudanas de costumes e mentalidades acerca do trabalho
feminino, que vinham na esteira do novo sculo, para uma sociedade que precisava, de novos
atores sociais para o seu desenvolvimento (ALMEIDA, 1998, p. 70).
Para procurar resolver os problemas da falta de professores, o governo utilizou-se das
escolas complementares correspondendo ao segundo grau do ensino primrio para formao
de professores (SOUZA, 2006, p. 72). Em 1846, foi criada em So Paulo pela Lei n.34 de 16
de maro, a primeira Escola Normal onde era destinada aos meninos e havia apenas um
professor que fazia a funo de diretor acompanhando a sala dos alunos at o fim do ano. No
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ano de 1847 pela Lei n. 5 de 16 de fevereiro, foi criado uma Escola Normal Feminina
conhecida com Seminrio do Au, funcionando com curso de dois anos de durao. Essa
escola funcionou por menos de dez anos sendo suprida. J em 1874, com a Lei n.9 de 22 de
maro foi instalada a Escola Normal, que iniciou seu funcionamento em 1875, sendo fechada
depois de trs anos de funcionamento, por falta de recursos. Sendo reaberta em 1880
passando a funcionar na rua da Boa Morte at sua mudana para a Praa da Repblica em
1894, funcionando por dois anos (ALMEIDA, 1998, p.58). No ano de 1894 a Escola Normal
passou a funcionar em quatro anos formando alunos de ambos os sexos.
Nesse momento a formao dos profissionais da educao se tornou um critrio
importante para o ingresso a carreira, visto que a conquista de uma vaga no grupo escolar
significava para os professores em especial as mulheres adquirir o mximo da ascenso na
carreira, pois os cargos de direo ficava para o sexo masculino.
De acordo com Almeida (1998), nos finais do sculo XIX, a educao voltada para
meninas ficava nas mos das instituies particulares, recebendo o descaso nacional das
famlias e pelo poder pblico.
Na poca da implantao do regime republicano, do total das mulheres, quase dois teros eram analfabetas, embora o mesmo acontecesse com a populao em geral. Ao mesmo tempo, principiaram os debates sobre a co-educao e, em 1880, na inaugurao da terceira Escola Normal na provncia de So Paulo, introduziram as aulas mistas (ALMEIDA, 1998, p. 56).
Nota-se que um dado importante sobre a formao de professores, est no
desenvolvimento do ensino complementar e normal onde esse representa um ponto importante
no que diz respeito a expanso e melhora na qualidade do ensino primrio considerado um
fator relevante para o desenvolvimento da instruo feminina nos primrdios da repblica.
Ampliando as oportunidades de escolarizao da mulher, em nvel ps-primrio antes restrita aos colgios pagos e destinados s camadas favorecidas a escola normal e as complementares possibilitaram, indubitavelmente, o ingresso da mulher na populao economicamente ativa e representaram o ponto de partida para o seu aprimoramento cultural e para a sua penetrao nos outros ramos de ensino mdio e no superior. Graas predominncia do contedo de cultura geral nas mencionadas instituies, elas puderam ultrapassar mais facilmente o mbito de suas funes especficas (TANURI, 1979, p. 117).
Essas modificaes no ensino elementar procuravam corresponder ao processo de
modernizao da educao, almejando chegar ao patamar dos pases europeus em maior
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desenvolvimento. No final do sculo XIX, o processo de universalizao do ensino primrio
j ocorria em vrios pases europeus e nos Estados Unidos da Amrica como afirma Souza
(2006). Entendendo que existia uma grande diferenciao dos interesses do Estado no Brasil a
respeito da educao, sendo que no Brasil os positivistas se opem a interveno do Estado na
Educao no que compete a liberao de recursos diferenciando das posturas dos pases da
Europa onde a interveno do estado na educao era defendida pelos seus governantes,
demonstrando dessa forma a distino entre a organizao desses sistemas.
No bojo desse processo, a escola primria foi (re) inventada: novas finalidades, uma outra concepo educacional e uma outra organizao de ensino. O mtodo individual cedeu lugar ao ensino simultneo e a escola unitria foi, paulatinamente, substituda pela escola de vrias classes e vrios professores, o mtodo tradicional cedeu lugar ao mtodo intuitivo, a mulher encontrou no magistrio primrio uma profisso, os professores e professoras tornaram-se profissionais de educao (SOUZA, 2006, p. 35).
As formas da educao na sociedade brasileira de fins do sculo XIX eram variadas,
mas sobre essas vrias formas um discurso imperava, o de que as mulheres deveriam ser mais
educadas do que instrudas, sendo priorizadas a formao moral e do carter em detrimento da
instruo. O acesso das mulheres ao ensino ainda era um campo restrito, embora j existissem
intelectuais que apoiavam o ingresso das mulheres a educao, defendendo a idia de
instruo para formar as boas esposas e mes da nao, pois educar as meninas significava
educar os homens da nao.
Nesse momento buscava-se reverter o quadro desolador em que se encontrava a
educao no Brasil, vrias so as discusses que colocam em foco as mudanas necessrias no
campo educacional e trazem a tona temas como jardins de infncia, organizao do ensino
primrio, escola normal, liberdade e obrigatoriedade de ensino dentre outras.
A crena no poder da escola de moralizar, civilizar e consolidar a ordem social difunde-se extraordinariamente nessa poca, tornado-se a justificativa ideolgica para a construo dos sistemas estatais de ensino. Nesse sentido, configurar, uma nova organizao pedaggica racional tendo em vista o ensino simultneo compreendeu um grande desafio e uma necessidade essencial para a difuso da escolarizao em massa (SOUZA, 2006, p. 36).
Como uma das mais importantes conquistas no campo educacional do final do sculo
XIX, fruto desses debates, podemos citar a criao da escola primria, organizada por meio
dos grupos escolares, cujo primeiro foi criado em 1893, no Estado de So Paulo (SOUZA,
2006). Esse modelo educacional pretendia abarcar um nmero maior de crianas, visando
uma escolarizao em massa, onde a organizao desse ensino elementar voltava-se mais
racionalizado e padronizado.
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Como se pode perceber no final do imprio no que diz respeito a provncia de So
Paulo, a educao no obteve grandes avanos, apesar das vrias discusses e propostas
formuladas referentes a implantao da educao essas no se consolidaram na prtica.
Ligado ao descompromisso do Estado, o sculo XIX tambm nos legou a idia de liberdade de ensino associada ao favorecimento da iniciativa privada. Instituies particulares de ensino de diferentes tipos floresceram no perodo imperial, especialmente para atender demanda por ensino secundrio. E, nas trs ltimas dcadas desse breve sculo, as vises positivistas e liberal reforaram tal legado: a mentalidade cientificista de orientao positivista declarava-se adepta da completa desoficializao e a mentalidade liberal, em nome do princpio de que o Estado no tem doutrina, chegava a advogar o seu afastamento no mbito educacional (SAVIANI, 2006, p. 29).
Convm ressaltar sobre as idias e propostas educacionais do final do sculo XIX,
onde se cogitava sobre o dever do Estado em promover uma base comum de conhecimentos
incentivando o desenvolvimento da nao. Mas essas modificaes no mbito educacional,
advindas do Estado criou no final do sculo XIX, uma srie de transtornos no que se refere a
manuteno das escolas, pois essas muitas vezes foram abertas e logo fechadas por falta de
recurso financeiro.
O regime federativo que havia sido promulgado na Constituio da Repblica, em 1891, em continuidade ao Ato Adicional de 1834 que coloca a educao elementar nas mos das Assemblias Provinciais, representa um grande entrave de ordem legal e poltica. Durante o imprio, a interveno do Estado no ensino primrio, alm de inconstitucional por ser de competncia das provncias estava nas mos dos poderes locais em conflito permanente com os presidentes das provncias (SCHELBAUER, 1998, p. 82).
O Processo de feminizao do magistrio sofreu uma grande interveno por parte do
Estado principalmente no que diz respeito s determinaes advindas do currculo que
procurava intervir no funcionamento interno das escolas estabelecendo horrios, escolhas de
material (livros) e determinando salrios. Essas mudanas promoveram modificaes na
formao e representao do corpo docente, onde o currculo, normas, doutrinas e smbolos
foram sendo adequados para corresponder os pressupostos pedaggicos e orientaes polticas
marcando as mudanas quanto a formao docente do final do sculo XIX. Cabe nesse
momento nos questionarmos sobre essa abertura profissional feminina, na profisso docente.
Se por um lado representou um importante avano para a mulher em ter condies de exercer
uma profisso e adquirir uma certa autonomia econmica, por outro lado vale questionar que
esse campo de trabalho, era organizado pela figura masculina, eram os homens que
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elaboravam os currculos e coordenavam as escolas por meio da direo da instituio escolar,
onde a educao feminina estava normalmente relacionada com os ideais positivistas sendo
essa instruo feminina voltada para a estabelecimento de padres comportamentais
femininos, onde a influncia do cristianismo era bastante forte, ajudando a forjar uma
representao simblica de mulher-me.
Parece-nos que fica implcito que a posio dominante na escola esperava formar uma jovem com religiosidade, obediente aos superiores e s leis, recatada; uma professora bem preparada para exercer suas funes, ou seja com domnio do saber escolar, habilidades tcnico pedaggicas e dedicao quase maternal a seus alunos (LOURO, 1986, p. 36).
A imagem do sexo feminino estava ligada aos ideais de moralidade crist,
pureza, maternidade e patriotismo, a mulher era valorizada como me e esposa, o lar seria o
seu domnio e o casamento sua principal aspirao. Os ideais positivistas indicaram a mulher
para ser educadora da infncia base da famlia e da ptria, atribuindo as virtudes da professora
como sendo as qualidades da me dando nfase maior no sentimento.
Importante destacar as novas regras que constituam a cultura escolar, evidenciados
em prticas simblicas, onde essas regras faziam parte do ideal poltico que buscava civilizar
e moralizar o povo por meio de normas baseadas na persuaso.
Refinados mecanismos disciplinares passaram a fazer parte da cultura escolar, muitos deles inscritos em prticas simblicas. A arquitetura do edifcio escolar, a distribuio dos espaos a estrutura da sala de aula, as categorias, os mveis, o controle do tempo, a interdio do espao, alm das normas e dos valores relacionados a conduta, ordem, limpeza, asseio, higiene, compreendiam um conjunto de dispositivos que enredavam as crianas visando a conteno dos gestos, dos instintos e das emoes (SOUZA, 2006, p. 79).
Nota-se que os ideais polticos do final do sculo XIX, podem ser evidenciados no
documento em anlise, os Pareceres do Primeiro do Primeiro Congresso da Instruo do Rio
de Janeiro, que por meio dos relatrios ministeriais juntamente com as falas dos educadores,
podem disponibilizar um panorama das questes que estavam sendo objeto de preocupao
para a sociedade do final do sculo XIX.
Nesse perodo, como mencionado anteriormente ocorreu uma inquietao e uma
preocupao com relao as questes educacionais visto que no Brasil a maioria da populao
era analfabeta. Esse fato pode ser evidenciado num dos Pareceres do Congresso de Instruo
do Rio de Janeiro, onde Benjamin Constant Botelho de Magalhes, faz referencias as
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deficincias existentes na instruo pblica primria brasileira, onde essa instruo abarca
apenas uma pequena parcela da sociedade, ficando a maior parte da populao desprovida do
alimento intelectual o qual o Estado lhe concede. Benjamin Constant, faz uma srie de
observaes no seu Parecer, com o objetivo de chamar a ateno do Estado para melhorar a
qualidade do ensino e expandi-lo ao povo, destacando a importncia do professor para realizar
esse objetivo.
Para melhorar o estado por demais precrio do nosso ensino pblico, no basta evidentemente reformar as nossas escolas, dando-lhes excelentes planos de instruo, largos e bem combinados programas e todos os recursos que a arte da educao tem durante tantos sculos sucessivamente acumulados e aperfeioado; tambm necessrio ou antes condio indispensvel, dar-lhes bons professores dotados de vocao e competncia para difundi-los pelo povo (ATAS...1884, p. 278).
Essas questes tratavam a respeito da educao no sentido de expandi-la as novas
geraes criando um sentido de responsabilidade pela modernizao e civilizao do pas.
Com relao aos Pareceres do Congresso de Instruo do Rio de Janeiro, compete ressaltar
alguns pontos que serviro de base para reflexo sobre as idias relacionadas educao em
geral, destacando especialmente as questes relacionadas a feminizao do magistrio no final
do sculo XIX no Brasil.
A imagtica construda ao redor da figura feminina que se perdurou pelo sculo XIX
vem demonstrando uma representao feminina vinculada a atributos de pureza e amor ao
prximo, vinculando esses atributos com a importncia da mulher na educao escolar.
Ao longo do sculo XVIII e XIX, a mentalidade vigente, herdeira legtima do colonialismo, dava pouco valor instruo feminina, concentrando sua ateno nas normas sociais que impediam as mulheres de ocupar espaos sociais e at mesmo sarem desacompanhadas. Essa imagtica estendeu-se ao longo do Imprio e mesmo durante os anos republicanos. Por conta dessas normas os pais preferiam educar suas filhas em sua prpria casa, com professoras particulares ou clrigos. Essa educao concentrava-se nas aulas de ensino elementar com um pouco de gramtica, que visavam preparar as meninas para o casamento, que costumava acontecer muito cedo (ALMEIDA, 2006, p. 70).
Era esperado da mulher um comportamento que agradasse ao homem, sem concorrer
com ele de modo profissional e intelectual, pois se fosse dado a mulher a liberdade
econmica, poderia ocasionar um risco, pois se tornaria igual o homem no intelecto. A
mulher caberia uma instruo que lhe permitisse regenerar a sociedade, mas esse instrumento
deveria gerar o bem estar do marido e dos filhos, revertendo-se em benefcio para a famlia se
estendendo a ptria garantindo o desenvolvimento da nao.
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Contribuies dos Pareceres do Congresso da Instruo do Rio de Janeiro para o debate
sobre a formao feminina para o magistrio
Para melhor compreenso das idias relativas ao mbito educacional que permeavam o
fim do sculo XIX, convm refletir sobre os escritos encontrados nas Atas e Pareceres do
Congresso da Instruo do Rio de Janeiro. Sua realizao deveria ter ocorrido em junho de
1883, no Rio de Janeiro. Teve suas atividades iniciadas em Janeiro de 1883 e finalizadas em
maio do mesmo ano. Por falta de recursos financeiros, o Congresso no foi realizado. Convm
destacar que esse documento contm Pareceres de questes referentes ao tema, desde o jardim
de infncia at a Universidade, trazendo uma importante contribuio sobre o panorama
educacional da poca.
No Brasil, a preocupao em torno da difuso da educao do povo e da organizao de um sistema nacional de ensino, considerados como fundamentais para criar a unidade da nao, orientava os discursos da imprensa, dos educadores, publicistas e, sobretudo, dos parlamentares da poca (SCHELBAUER, 1998, p. 64).
Para responder ao objetivo do presente artigo, priorizou-se dar um maior enfoque
sobre as questes contidas no documento, no que se refere organizao do ensino secundrio
para o sexo feminino, com o intuito de compreender as discusses e construes ocorridas em
torno da formao e educao dos profissionais do magistrio, principalmente sobre as
questes da formao do magistrio feminino no Brasil.
Nas Atas e Pareceres do Congresso da Instruo do Rio de Janeiro, cuja publicao
feita em 1884, v-se a defesa da instruo feminina, mas desde que seja feita de forma
ponderada, como demonstra a opinio da escritora D. Thereza Pizarro Filha, encontrada na
15o. Questo referente Organizao do ensino secundrio para o sexo feminino:
As mulheres devem ser preparadas pela educao para companheiras dos maridos, com quem vivero a mesma vida intelectual e moral. Convm form-las na cincia da direo do lar, na costura, na cozinha e nos pormenores da vida domstica. Se a misso social da mulher profundamente diversa do homem, no convm dar-lhe educao igual dele (ATAS..., 1884. P. 2).
Nota-se que a inferioridade biolgica e intelectual agregada a mulher bastante
ressaltada pelos ideais positivistas do final do sculo XIX, levando o positivismo a considerar
natural a consolidao do homem no poder justificando a submisso feminina e seu
afastamento da esfera pblica. Esse iderio de inferioridade feminina foi bastante propagado
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at que conseguisse passar por um questionamento, apesar de persistirem ainda as
formulaes higinicas, que encontraram respaldo em vrios setores sociais, existentes entre o
sexo masculino e tambm no feminino, assegurando vria maneiras de submisso. A
educao das meninas diferenciavam dos meninos, principalmente nos objetivos, pois cabias
as meninas serem educadas para os afazeres domsticos e o cuidado com o marido e os filhos.
Segundo o iderio social da poca, os estudos e disciplinas ministrados para as mulheres no
deveriam fatiga-las nem apresentar um risco para sua sade, pois creditava-se que a mulher
possua uma estrutura fsica frgil. A representao da mulher deveria estar atrelada ao perfil
de mulher-me sendo esta pura assexuada e possuidora de valores morais e patriticos,
estabelecidos.
Em conjunto com um discurso que glorificava a mulher, aproximando a imagem da professora da religiosa, existia um grande controle moral da sua vida privada, que se constitui, assim, no banalizador de sua autoridade moral enquanto mestra. Numa sociedade, que alm de ser composta por classes sociais distintas, livre e democrtica, a obedincia fundamental e pode ser conseguida pela fora ou pela persuaso (SFORNI, 1996, p. 126).
No currculo de vrias escolas normais passaram a valorizar as disciplinas de
Psicologia, Puericultura e Higiene Escolar. Essas reas vinham ganhando prestgios no campo
da educao, pois procuravam ressaltar a importncia do desenvolvimento da criana
juntamente com as formas mais apropriadas de trat-las. As vrias descobertas e conceitos
cientficos davam maior ateno as crianas reforado pelos cuidados afetivos, na
alimentao, trato de doenas e higiene. Num momento em que as sociedades se tornavam
mais complexas, buscava-se ordenar e regular os sujeitos contando com a sua participao, ou
seja, se pretendia alcanar, como meta final, que os indivduos aprendessem a se
autogovernar (LOURO, 2004, p. 457).
Nas instituies, como os Institutos de Educao, era verificada uma espcie de
normatizao por intermdio de exames pblico, enfatizando premiaes. Nos encontros
solenes verificavam-se os rituais destacava-se a pontualidade, e a obedincia aos superiores,
como se pode observar nesse depoimento de uma aluna do Instituto de Educao do Rio
Grande do Sul:
A gente ia para essas solenidades, para essas comemoraes muito convicta que estava em jogo o prestgio e o nome do Instituto e a gente fazia das tripas corao para manter [...] Claro, sempre tinha uma ou outra aluna que no observava isto, mas era tremendamente mal vista pelos colegas e a coitada no tinha outra forma seno entrar nos eixos [...] Mesmo que a gente
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achasse meio ridculo certas coisas [...] mas o nome do Instituto e o conceito da escola era algo mais forte ( LOURO, 2006, p. 461).
Evidencia-se uma diferenciao na educao de meninos e meninas, onde
normalmente so atribudas as mulheres, uma imagem que refora o ideal de obedincia,
docilidade e respeito, estabelecendo uma vinculao da escola com o lar selecionando as
disciplinas, sendo priorizado para os meninos noes de geometria e para as meninas bordado
e costura. Nota-se que o acesso das mulheres ao ensino secundrio visto com algumas
ressalvas como pode-se verificar no argumento do Dr. M. T. Alves Nogueira, que est
presente na 15o. Questo relativa a Organizao do ensino secundrio para o sexo feminino.
Onde demonstra uma preocupao em igualar a instruo feminina da masculina, pois
evidencia no seu Parecer os danos que essa equiparao nas disciplinas poderia causar na
mulher.
[...] motivos poderosos, filosficos, quer psicolgicos, no permitem mulher aturada atividade escolar. E do meio em que vivem, da disposio das classes e, sobretudo da aplicao por demais prolongada que resultam atitudes defeituosas e que podem no somente determinar certas molstias como perturbaes circulatrias ou respiratrias e congestes do crebro e da vista. (ATAS..., 1884. p. 3).
Esse trecho evidencia o carter sexista ao qual imperava no final do imprio, onde as
capacidades intelectuais femininas eram postas em questionamento, demonstrando no
discurso uma inferioridade intelectual, denotando um discurso regulador acerca das
determinaes impostas sobre as mulheres. Os positivistas e higienistas contriburam para
reforar a construo ideolgica da mulher-me, guardi dos lares, esposa responsvel,
disposta a sacrificar-se em defesa do prximo.
Como se pode perceber a representao da mulher na sociedade do final do sculo
XIX, estava vinculada a funo moralizadora vinculada ao papel de me, destacando dessa
maneira as capacidades afetivas do que as intelectuais. V-se no depoimento do Dr. Joo
Barbalho Uchoa Cavalcante, referente a 12o. Questo sobre a Coeducao dos sexos nas
escolas primria, nos estabelecimentos de instruo secundria e nas escolas normais, onde
evidencia as qualidades da professora:
Sabe-se que a mulher tem mais facilidade, mais jeito de transmitir aos meninos os conhecimentos que lhes devem ser comunicados. Maneiras menos rudes e secas, mais afveis e atraentes que os mestres, aos quais incontestavelmente vence em pacincia, doura e bondade. Nela predominam os instintos maternais e ningum como ela possui o segredo de cativar a ateno de seus travessos e inquietos ouvintes, sabendo conseguir que as lies, em vez de tarefa aborrecida, tornem-se-lhes como uma
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diverso, um brinco. Sim a escola j no para os meninos um lugar de aborrecimento. Entram-na sem ter em mente o espantalho dos castigos. Acham-na at atrativa, no lhe inspiram medo. A mestra lembra-lhes a me, e afinal pensam os pequenos traquinas, preciso aprender a lio porque a mestra boa e preciso proceder bem para que ela no se zangue e ralhe. (ATAS..., 1884. p. 3).
Ainda com relao a coeducao dos sexos nas escolas primrias, pode verificar no
mesmo Parecer, citado acima um outro trecho que evidencia a discriminao das capacidades
intelectuais das mulheres. Nesse momento como enfatizado anteriormente, a identidade
feminina que era construda, por meio de uma moldura cultural em que valores, normas,
expectativas, imagens, regras, conceitos e preconceitos compunham o arcabouo social e
determinavam os hbitos e costumes(ALMEIDA, 2006, P. 73). Quanto ao idia de inserir
classes mistas nas escolas, essa idia passou a ser discutida na poca disponibilizando a
mulher a experincia em instruir meninos e meninas simultaneamente, contribuindo para
expanso da escolaridade da populao.
Diz-se que a coeducao, supondo um programa comum nas escolas, obriga deste jeito as pessoas do sexo feminino a aplicarem-se a estudos para os quais a mulher, por sua natureza nesse particular mais dbil que a do homem, incapaz, podendo nisso comprometer o regular desenvolvimento de suas faculdades. A questo do valor relativo das faculdades intelectuais de cada um dos sexos, quanto ao ensino primrio sem importncia, visto que as lies aos meninos no vo at as dificuldades e profundezas que podem e devem chegar no ensino superior (ATAS..., 1884, p. 9).
Representaes do magistrio feminino: refletindo sobre a prtica escolar
Com a difuso da educao popular no final do imprio, ocorreu um aumento do
trabalho feminino na educao. O magistrio era uma das poucas oportunidades profissionais
respeitveis abertas as mulheres. Com relao ao plano pedaggico referente as instituies
escolares do final do sculo XIX, trouxe alguns avanos, no sentido do rendimento escolar,
porm ressaltou no interior da escola elementos como a repetncia, devido ao
aperfeioamento dos exames, ressaltando a seletividade ocorrida nas classes homogneas dos
alunos do ensino primrio. Verifica-se elementos como a racionalidade e a eficincia do
ensino simultneo gerarem o que a educao ainda possui de mais perverso: a sublimao do
individuo em prol do coletivo e a individualizao que seleciona e pune. (SOUZA, 2006, p.
45).
Ao refletir sobre a histria das mulheres e sua insero na sala de aula pode-se
observar que nesse espao permeavam-se representaes relativas a prtica docente, onde os
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discursos religiosos, cientficos, pedaggicos e jurdicos influenciavam nas prticas sociais
dos indivduos.
Ao discutir sobre os ideais educacionais do final do sculo XIX, importante frisar
sobre a questo do mtodo educativo, visto que nesse momento ocorriam grandes discusses
em torno da organizao e constituio da educao popular. Nota-se que nos pases europeus
e nos Estados Unidos da Amrica, existia um grande debate sobre a questo do mtodo
intuitivo, e sua repercusso na prtica educativa. No sculo XIX, o mtodo intuitivo era
considerado pelos seus precursores como um instrumento pedaggico capaz de modificar a
precariedade do ensino escolar, o qual a aprendizagem era alicerada na memorizao,
valorizando a repetio em detrimento do entendimento, formando alunos com defasagem na
leitura, escrita e capacidade de clculos, como afirma Valdemarin (2006, p. 90).
Em sntese com a adoo do mtodo de ensino intuitivo, pretende-se educar a criana a partir de novos padres intelectuais, que se fundamentam numa nova concepo sobre o conhecimento, que postula a origem das idias nos sentidos humanos e que aplicada ao ensino, pretende formar indivduos que usem menos a memria e mais a razo e que valorizem a observao e o julgamento prprios como meios de construo do conhecimento e da implementao das atividades produtivas (VALDEMARIN, 2006, p. 104).
Esse mtodo era tambm conhecido como lies de coisas, sendo indicado para ser
aplicado nas classes populares, visto que na segunda metade do sculo XIX, existia uma
preocupao para disponibilizar uma educao popular, nos pases europeus e nos Estados
Unidos. Devido ao clima de descontentamento referente ao ensino da poca, ocorreu um
movimento de renovao pedaggica, onde o mtodo intuitivo representaria uma forma de
reverter ineficincia do ensino.
Com essa tnica, o conhecimento em torno do mtodo foi colocado em circulao nas Exposies Internacionais, Conferncias pedaggicas, relatrios oficiais, compndios de pedagogia e manuais de ensino, cujos resultados se espalharam pelo mundo, como a clebre Confrence sur lenseignement intuitif, proferida por Buisson durante a exposio de Paris, em 1878 (SCHELBAUER, 2005 p. 134).
De acordo com Schelbauer (2005), o mtodo intuitivo foi apresentado para a realidade
brasileira por meio de nossos intelectuais: homens pblicos, reformadores, diretores e
professores, que atravs dos projetos de reforma, conferncias pedaggicas e pareceres,
somados a iniciativas privadas e governamentais acreditavam por meio da educao modificar
a nao. Essa discusso sobre o mtodo pode ser evidenciada nos Pareceres do Congresso da
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Instruo do Rio de Janeiro de 1884, onde se verifica nas Atas a opinio do escritor Dr
Antnio Henrique Leal na 6o Questo, Mtodos e Programas de ensino nos estabelecimentos
de Instruo secundria, sua reforma adaptao de livros. Nesse Parecer Leal defende a
aplicabilidade do novo mtodo as lies de coisas:
Depois de Froebel, e com os pedagogistas que tem melhorado sua doutrinao, procura-se antes de tudo educar e desenvolver a razo, e assim desde a infncia que a despertam e a vo solicitando com as lies das coisas, nos jardins infantis, nas excurses s fbricas s oficinas, ao campo. De que se ocupa o professor moderno de estimular a curiosidade e o interesse do aluno, fazendo com que ele reflita, raciocine e tomo parte ativa na lio, e para isso o mtodo socrtico, eurstico, interrogativo e discursivo o mais convinhvel e de onde se colhe mais farta messe de frutos. (ATAS..., 1884, p. 119).
Enquanto Leal defende a aplicao do novo mtodo intuitivo em seu parecer, ele
crtica o mtodo tradicional, que prioriza a memorizao: Esse sistema de decorar tudo, de
usar e abusar da memria, est hoje banido. Exercitar o raciocnio e desenvolve-lo de par com
a memria, praticando ao mesmo passo a arte de exprimir seus pensamentos, tal o mtodo
hodierno de ensino. (ATAS..., 1884, p. 119).
Ainda com relao a questo do mtodo intuitivo no ensino das escolas normais, cabe
destacar a Atas do Dr. Antonio Herculano de Souza Bandeira Filho, onde escreve na 20o.
Questo sobre Escolas Normais Sua organizao, plano de estudos, mtodos e programas de
ensino. Nesse Parecer Filho, destaca a importncia do mtodo intuitivo na educao e
formao dos professores, alm de combater o uso do mtodo tradicional, como mencionado
no Parecer de Leal.
O mtodo de ensino em uma escola normal dever variar radicalmente do adotado em qualquer outro estabelecimento de instruo. O professor no se esforar somente por fazer-se bem entendido dos alunos, cumpre-lhe ainda dar-lhes o modelo do ensino que no futuro transmitiro aos seus discpulos. Todos os dias, alm da explicao, deve chamar os alunos lio, e solicitar a ateno deles para o modo de a reproduzirem, procurando sempre convence-los de que convem-lhes falar como si estivessem na presena de uma classe. Os compndios, as apostilas ditadas e qualquer processo mecnico de ensino, que se proponha de preferncia o cultivo da memria com prejuzo das demais funes mentais, devem ser rigorosamente proibidos (ATAS..., 1884, p.266).
Apesar dessa grande influncia ideolgica advinda das instncias superiores sobre o
profissional da educao e do espao escolar, pode-se destacar que dentro do mesmo espao
escolar possvel verificar a produo e reproduo dos discursos, mas importante perceber
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que homens e mulheres constroem de forma prpria e diversas suas identidades muitas vezes
em discordncia s proposies sociais de seus tempos, como afirma Louro (2005).
As representaes femininas vinculavam a profisso docente da mulher a idia de
misso e vocao, atribuindo ao currculo feminino, disciplinas como prendas domsticas.
Almejava-se, no entanto educar a mulher, desde que essa educao no demonstrasse risco as
normatizaes sociais que vigoravam no final do sculo XIX.
Apesar desses elementos que impunham as novas posturas as mulheres, em especial
no campo do magistrio, pode-se destacar o papel que exerceu a imprensa feminina
contribuindo como um instrumento de crtica a imposio dos valores que correspondiam as
ideais positivistas advindos de uma sociedade de classe.
A perspectiva feminista permite, por parte das mulheres a apropriao de uma conscincia crtica e poltica que as mobilize para levar apreenso de que as desigualdades s sero superadas se forem abolidas as divises de gnero, assim como as de classe e raa, numa sociedade assentadas sobre bases igualitrias. Tal premissa, de certa forma, adota uma viso socialista utpica se atentarmos, mesmo atualmente para a realidade das relaes entre os sexos, as classes sociais e as raas e da forma como se entrelaam na vida diria, apesar de algumas indiscutveis conquistas obtidas. (ALMEIDA, 1996, p. 42).
Importante destacar o papel da imprensa educacional e feminina no Brasil, onde
evidenciaram as reivindicaes das mulheres em busca de instruo, educao e
profissionalizao, revelando seu desejo. Acreditar que tudo lhe foi incutido, por um poder
oficial masculino sem que houvesse resistncia, reivindicaes no mnimo ingnuo, como
afirma Jane Soares de Almeida (2006).
A escola normal iria, paulatinamente, suprir uma necessidade e um desejo feminino. A entrada das mulheres nas escolas normais e a feminizao do magistrio primrio foram um fenmeno que aconteceu rapidamente e, em pouco tempo, foram maioria nesse nvel de ensino (ALMEIDA, 2006, p. 82).
Feminizao do magistrio: um processo de conquista ou submisso?
Pensar sobre as questes que incidiram diretamente no processo de formao docente
no sculo XIX, nos leva a refletir sobre as transformaes estruturais que repercutiam na
sociedade com um todo. Com a aplicao da Lei Euzbio de Queirz, amplia-se os
investimentos, redirecionando os investimentos que antes eram destinados ao comrcio de
escravo, passando ao investimento de obras que garantissem o acesso as comunicaes.
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[...] como construo das estradas de ferro, navegao a vapor, cabos telegrficos, iluminao pblica mudanas que redefiniam as percepes de tempo e espao, formavam novos hbitos na populao [...] conseqentemente ampliavam a demanda por instruo (VILLELA, 2005, p. 106).
Diante desse contexto histrico de profundas modificaes, que as questes relativas a
educao e formao dos profissionais do magistrio se constituram, devendo ser ressaltado o
que os discursos da poca pregavam e discutiam sobre as questes educacionais e do que
realmente ocorria no realidade brasileira. Podem ser evidenciadas nas Atas e Pareceres do
Congresso de Instruo de 1884, onde o Parecer do Dr. Benjamin Constant B. de Magalhes,
sobre a 24o. Escolas normais sua organizao, plano de estudos, mtodos e programas de
ensino evidencia uma preocupao com a expanso do ensino pblico no pas, com o intuito
de reverter o quadro educacional brasileiro, visando a idia de progresso nacional.
Facilitar a todos os indivduos, sem a mnima distino de classe, sexo, religio e nacionalidade, a maior partilha possvel no patrimnio intelectual da humanidade, incontestavelmente a mais feliz e generosa tendncia deste sculo; o reconhecimento formal do direito a que tem cada cidado [...]. Difundir por todas as classes da sociedade uma larga e slida instruo preliminar, que inicie o cidado nos mais importantes e teis resultados obtidos em todos os domnios de nossa atividade cientfica, moral, industrial e social, dando-lhe noes precisas, claras, e bem coordenadas sobre o mundo, a sociedade e o homem, que esclaream e dirijam digna e utilmente sua conduta individual, domstica e social; tal a sublime misso do ensino, considerado em sua mais ampla e elevada acepo (ATAS..., 1884, p. 4).
Essas idias encontradas no documento mostram a defesa de um modelo inovador
de formao, que exigia uma postura profissional que viesse a corresponder as regras
estabelecidas. Essas mudanas na sociedade influenciaram as mudanas nas instituies que
incidiram na organizao curricular e metodolgica onde viriam a repercutir na representao
da formao docente, onde a formao da mulher vai sendo construda por esteretipos
vinculados a inferioridade intelectual e fragilidade biolgica feminina, que j foi
anteriormente discutido no presente artigo (12o. questo acerca da Coeducao dos sexos nas
escolas primria, nos estabelecimentos de instruo secundria e nas escolas normais, escrito
pelo Dr. Joo B. U. Cavalcante).
A insero da mulher no magistrio deve ser analisada de forma ampla, pois existem
uma srie de fatores envolvidos que necessitam ser considerados. Almeida (2006), faz uma
srie de observaes a respeito desse processo por meio de sua pesquisa, explica que o
processo de desvalorizao do magistrio est mais vinculado ao atendimento populao
mais carente, desvalorizada na concepo capitalista. Trata da questo da conquista feminina
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nesse campo de trabalho, pois afirma que os homens resistiram sim, a entrada das mulheres na
profisso. A ampliao das escolas no Brasil contribuiu para gerar argumentaes que atribua
s mulheres o papel de educadoras da nao. Apesar desse discurso sexista que predominava
na sociedade da poca, a profisso docente significou um comeo, uma abertura para que as
mulheres pudessem ter acesso ao conhecimento e adentrarem no campo profissional. Nesse
contexto histrico era vivel que a mulher desempenhasse a funo de educadora,
regeneradora da sociedade, desde que correspondesse a expectativa esperada de sua conduta
moral, imposta por uma sociedade moralizadora. Havia, pois, um interesse em educar as
mulheres, desde que essas no concorressem com os homens, mas fossem educadas para
educar as futuras geraes.
Mantida dentro de certos limites, a instruo feminina no ameaaria os lares, a famlia e o homem. Essa educao, que, a princpio e de acordo com a tradio portuguesa, fora negada sob o pretexto de que conhecimento e sabedoria eram desnecessrios e prejudiciais sua frgil constituio fsica e intelectual, acabou por revelar-se desejvel a partir do momento em que a mulher passou a ser vista, na sociedade da poca, como a principal mantenedora da famlia e da ptria, conforme pregava o discurso eugnico e positivista (ALMEIDA, 1998, p. 33).
Importante destacar que essas normatizaes advindas do pensamento positivista do
final do sculo XIX, no foram aceitas com passividade, na sua totalidade, pois, nesse perodo
j podia ouvir algumas vozes femininas representadas pela imprensa feminina que se
desenvolvia principalmente nos grandes centros, Rio de Janeiro e So Paulo, onde os papis
atribudos as mulheres vinham sendo repensados e discutidos. Todas essas mudanas
ocorridas no sculo XIX, como afirma Villela, 2000, tanto na sociedade como no corpo
docente contriburam para o estabelecimento do processo da profisso docente no Brasil,
significando uma tomada de conscincia do corpo docente, com relao aos seus interesses
como grupo profissional.
As campanhas abolicionistas e republicanas mais as idias liberais vindas do continente europeu e largamente disseminadas no perodo ensejaram a abertura de discusses sobre os direitos das mulheres, sua educao e insero social (ALMEIDA, 1998, p. 123).
Permitir a mulher o acesso a escola, mesmo que essa instituio muitas vezes
transmitia no seu espao uma parte significativa na dominao sexista, por meio de currculos,
normas e orientaes que primavam a obedincia, submisso e docilidade, foi considerado
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um avano, no sentido de representar uma ruptura com o mundo domstico, garantindo uma
participao no mundo produtivo, gerando com isso uma autonomia econmica e intelectual.
Consideraes finais
Numa sociedade que buscava reverter o quadro de abandono da educao nas
provncias brasileiras, utilizando-se de discursos que propunham uma formao de
professores e professoras num intuito de corresponder aos ideais de democratizao do pas,
que comeam a serem criadas as primeiras escolas normais. Nesse contexto verifica-se a
hegemonia masculina que influenciou na educao das mulheres em vrias instncias; sendo
evidenciadas no lar, escola e sociedade, como se pode observar nos discursos contido na
fonte primria analisada (ATAS..., 1884).
Eram os homens que at ento estabeleciam as regras com relao a instruo
feminina controlando seu ingresso em outras profisses. A criao de Leis para aberturas de
escolas, seus currculo e programas compunham uma srie de instrumento que iria moldar e
disciplinar as professoras, entendendo que essa educao seria uma continuao da educao
do lar. Era vinculada a profisso docente a idia de misso e vocao, onde professoras
estavam responsveis por transmitir as novas geraes as instrues e educao necessria
tendo como objetivo o progresso da nao.
A anlise de alguns pontos dos Pareceres do I Congresso de Instruo do Rio de
Janeiro,de 1884, contribuiu para identificar as representaes no que se refere a atuao da
mulher na profisso do magistrio, evidenciando uma grande diferenciao na educao do
corpo docente feminino em detrimento ao masculino. Sendo que para a educao feminina
deve-se priorizar uma formao mais tnue, voltada para as funes moralizadoras, dando
continuidade ao papel de me.
Outro ponto a ser destacado refere-se a criao das escolas normais e suas interrupes
por falta de recursos demonstrando a desonerao do Estado frente aos seus deveres para com
a educao, criando dessa forma uma contradio entre os discursos proferidos e a prtica
evidenciadas. Uma das hipteses mais recorrentes da historiografia educacional, com relao
a problemtica no que se refere ao posicionamento do estado que ora investe na formao e
manuteno das escolas normais, ora desonera sua responsabilidade, a de que so projetos
avanados para uma realidade que no se encontra ainda preparada para assimila-los.
(VILLELA, 2000, P. 123). Essa inconstncia, relacionada a manuteno das escolas pode ser
observada em quase todas as provncias do Brasil no final do sculo XIX.
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Ao procurar entender sobre o processo de feminizao do magistrio no final do
sculo XIX, ficou evidente tanto nos discursos da fonte primria, como nas discusses com a
literatura consultada, que as exigncias de novas posturas e mudanas estruturais sobre a
formao profissional docente est diretamente relacionada com as necessidades materiais as
representaes de cada momento histrico. Evidencia-se que no final do sculo XIX, ocorreu
uma preocupao em priorizar uma mentalidade moralizante, cujas disciplinas, currculos e
metodologias iriam formar esse profissional de acordo com a lgica de uma sociedade
hierarquizada e excludente.
Analisando por uma outra perspectiva o processo de feminizao do magistrio
representou para as mulheres uma forma de avano no que se refere a possibilidade de
conquistar um espao pblico no ficando confinada apenas aos ambientes domsticos. O
contato com a instruo, no ambiente escolar, mesmo que carregada da dominao sexista
possibilitou as mulheres o desenvolvimento das formas de expresso, dando oportunidade das
mulheres adquirirem outros instrumentos que lhes permitam uma participao mais ativa no
mundo produtivo, o que possibilita uma condio para a construo de uma identidade
profissional.
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