UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – CCS
CURSO DE PSICOLOGIA
CRISTIANE SOTELO DA SILVA
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA EXISTENCIAL NO
ENFRENTAMENTO DAS PERDAS E DA MORTE
Itajaí – SC
2007
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CRISTIANE SOTELO DA SILVA
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA EXISTENCIAL NO
ENFRENTAMENTO DAS PERDAS E DA MORTE
Itajaí – SC
2007
Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do Título de Bacharel em Psicologia, na Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências da Saúde.
Orientador – Prof. Aurino Ramos Filho, MsC
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AGRADECIMENTOS
Agradeço meus pais aos quais devo minha vida, o que eu sou e o que
poderei vir a me tornar. Agradeço a eles todo amor, paciência, incentivo e apoio que
me foi dado para que eu pudesse chegar até aqui.
Aos meus professores que foram e outros que continuam sendo pessoas
fundamentais no meu caminhar. Professores que me apresentaram uma Psicologia
verdadeira, ética e capaz de aliviar dores e sofrimento. Devo muito de meu amor a
Psicologia a eles que por meio de suas atitudes plantaram em mim o desejo de
também querer ser uma profissional de verdade.
Agradeço em especial ao Mestre e meu Orientador Aurino Ramos Filho.
Professor do qual me orgulho muito de ter escolhido para me orientar. Além de ter
me ajudado no melhor entendimento dos conteúdos, acreditou em mim e me
incentivou ao crescimento. Professor Aurino, Mestre que tenho muita honra em
poder dizer que conheço.
Agradeço a todos os amigos, colegas, familiares e parentes que acreditaram
em mim, me entusiasmaram e me escutaram durante horas falando sobre minhas
descobertas em relação ao tema.
Agradeço aos convidados da banca Dr. Fabiano José Alves e Professora Ana
Luiza Maximo que tão gentilmente aceitaram compartilhar e contribuir no
aperfeiçoamento dessa pesquisa.
Agradeço minha irmã que serviu de inspiração. Dedico este trabalho a ela que
há dez anos fez sua passagem. Gostaria de deixar registrado o quanto me sinto
presenteada pela vida por ter tido como irmã e amiga Tatiana Sotelo da Silva. Irmã
que por meio de seu exemplo de vida me ensinou lições valiosas que jamais
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esquecerei. Viveu e morreu dignamente, deixando para seus entes queridos, além
de saudades, uma marca de amor, respeito e comprometimento com a vida.
Agradeço e também dedico este trabalho a todas as pessoas que já
experimentaram na alma a dor dilacerante por perder alguém especial. E meus
respeitos e consideração àqueles que já enfrentaram e aos que estão enfrentando a
despedida da vida. Por fim, agradeço e dedico este trabalho a todas as pessoas que
buscam de alguma forma dar acolhimento e dignidade as experiências de perdas e
morte.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
2 AS PERDAS E A MORTE .................................................................................... 10
2.1 CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DA MORTE ................................................. 10
2.2 DEFINIÇÃO DE MORTE ................................................................................... 17
2.3 A MORTE E O MORRER .................................................................................. 20
2.4 PERDAS E VIVENCIA DO LUTO ...................................................................... 25
3 PERDAS, MORTE E DESENVOLVIMENTO HUMANO ...................................... 28
3.1 PERDAS, MORTE E A CRIANÇA ..................................................................... 29
3.2 PERDAS E MORTE NA ADOLESCÊNCIA ....................................................... 32
3.3 PERDAS E MORTE NA VIDA ADULTA ............................................................ 35
3. 4 PERDAS, MORTE E A VELHICE ..................................................................... 37
4 PSICOLOGIA EXISTENCIAL .............................................................................. 40
4.1 DEFINIÇÃO DE PSICOLOGIA EXISTENCIAL .................................................. 40
4.2 CARACTERÍSTICAS ONTOLÓGICAS DO SER ............................................... 54
4.3 PSICOLOGIA EXISTENCIAL, PERDAS E MORTE .......................................... 56
5 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA EXISTENCIAL NO ENFRENTAMENTO
DAS PERDAS E DA MORTE ................................................................................. 63
6 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .................................................. 78
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 81
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES
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Contribuições da psicologia existencial no enfrentamento das perdas e da morte
Orientador – Professor Aurino Ramos Filho, MsC.Defesa – novembro de 2007.
RESUMO
As perdas e a morte são realidades universais, intrínsecas e intransponíveis a vida humana. A marginalização social das perdas e da morte em nossa sociedade enfraqueceu o ser humano e seus recursos de enfrentamento diante das questões que envolvem nossa existência finita. As perdas e a morte fazem parte da vida e cumprem seu papel social, não há vida sem morte. No contato com a finitude, o ser humano tem a possibilidade de descobrir formas mais autênticas de existir. Refletir para dar dignidade às perdas e morte é também dar-se a chance de enriquecer a própria vida por meio de todas as lições que essas experiências são capazes de nos ensinar. O presente trabalho tem como objetivo geral o estudo da contribuição da Psicologia Existencial na confrontação das perdas e da morte; como objetivos específicos se propõem a definir o conceito de Psicologia Existencial, analisar suas contribuições no enfrentamento das perdas e da morte e propor estratégias de enfrentamento de acordo com este referencial teórico. Investigação bibliográfica, quali-quantitativa e do tipo exploratório. No primeiro capítulo apresenta as perdas e o contexto histórico da morte; no segundo capítulo o desenvolvimento humano perante as perdas e a morte; o terceiro capítulo traz à definição de Psicologia Existencial e no capítulo quatro, as contribuições da Psicologia Existencial no enfrentamento das perdas e da morte; seguido da análise dos resultados obtidos e das considerações finais.
Palavras-chave – Psicologia Existencial. Perdas. Morte.
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Contribuições da psicologia existencial no enfrentamento das perdas e da morte
Adviser – Professor Aurino Ramos Filho, MsC.Defense – november th 2007.
ABSTRACT
The losses and the death are universal, intrinsic and unsurmountable realities the life human being. The social marginalization of the losses and the death in our society ahead weakened the human being and its resources of confrontation of the questions that involve our finitude. The losses and the death are part of the life and fulfill its paper social, do not have life without death. In the contact with the finitude the human being has the possibility to discover more authentic forms to exist. To reflect to give to dignity the losses and death is also to give possibility to it to enrich the proper life by means of all the lessons that these experiences are capable of in teaching them. The present work presents as objective generality the study of the contribution of Existencial Psychology in the confrontation of the losses and the death; as objective specific if it considers to define the concept of Existencial Psychology, to analyze its contributions in the confrontation of the losses and the death and to consider confrontation strategies according to this theoretical referencial. Bibliographical inquiry, of quali-quantitative matrix and the exploratory type. The first chapter presents the losses and the historical context of the death; in the chapter as the human development is boarded before the losses and the death; the third chapter brings the definition of Existencial Psychology and chapter four deals with the contributions of Existencial Psychology in the confrontation of the losses and the death; followed for the analysis of the results and the final considerations.
Keywords – Death. Losses. Existencial Psychology.
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INTRODUÇÃO
É imprescindível para a Psicologia compreender a atuar nos processos de
perdas e morte, haja vista que são realidades humanas universais, intransponíveis e
cuja existencialização é frequentemente dolorosa.
A relevância dessas realidades em nossas vidas é inegável, já que estão
intimamente relacionadas com o existir e repercutem diretamente no
desenvolvimento humano.
Para crescer, a todo momento o ser humano precisa aprender a perder e a
recomeçar. A vida é um continuo movimento de nascer e morrer, ninguém aprende a
nascer, a recomeçar sem antes, ter aprendido a perder e morrer.
Viver perdas significativas ou o próprio morrer frequentemente causa muita
dor. As perdas e a morte destroem nossas ilusões infantis a respeito do que seja
viver e muitas vezes, com nossas ilusões vão embora partes de nossas vidas que
consideramos valiosas e isso nos machuca muito.
Parte do excesso de sofrimento que essas experiências nos causam tem
ligação com o fato de que as perdas e a morte se transformaram em tabus em nossa
sociedade.
As representações sociais e pessoais negativas construídas a respeito das
perdas e da morte influenciam sobremaneira como vivenciamos essas experiências.
Outros aspectos como a fase do ciclo vital, momento de vida e religiosidade,
também influencia a forma como vivemos essas experiências (ARRIÉS, 1981;
KOVÀCS, 1992).
As perdas e a morte são realidades atreladas. Ambas nos colocam em
contato com nossa finitude. Cada pessoa tem uma maneira particular de viver essas
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realidades. Apesar de serem experiências que machucam muito, não precisam
necessariamente ser traumáticas.
Refletir sobre a finitude é essencial, pois vida e morte estão sempre juntas,
uma não existe sem a outra. Reconhecer e aceitar nossa finitude, nos fortalece,
humaniza o nosso ser e nos faz crescer (KÜBLER-ROSS, 2005).
As perdas e a morte trazem em si características similares, ambas
representam corte, abandono e desistência, mas por outro lado podem ser vistas
como descanso ou encerramento de um ciclo. (KOVÀCS, 1992).
Coragem, segundo May1 (1987) é a qualidade necessária para existirmos.
É também a qualidade necessária para refletirmos sobre nossa condição
humana de sermos para o fim.
A Psicologia Existencial centra sua reflexão na existência humana e tem
como um de seus temas centrais a finitude humana. Pois, compreende que a
consciência da finitude aumenta as possibilidades de um viver mais autêntico e
prazeroso.
A negação da finitude é vista como um empecilho para o crescimento
(ERTHAL, 1989). A vivência das perdas e da morte podem nos revelar muito sobre
nós mesmos. A experiência de finitude torna clara nossas limitações, fragilidades e
imperfeições.
Por outro lado, também revela nossas capacidades e forças.
O ser humano é visto pela Psicologia Existencial como um ser que se constrói
constantemente e se defini a partir de seu existir. É dotado de autoconsciência,
capaz de manter-se consciente de sua existência e por isso pode se auto-planejar.
1 Rollo May (1909-1994)This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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O ser humano é o único ser que tem consciência de sua finitude, portanto tem
conhecimento de que cada momento da vida é único e que todos caminhamos para
um fim.
É comum que experiências de finitude despertem na pessoa um valor sobre o
seu existir.
Ser mais consciente e responsável por seu aqui-agora, viabiliza uma
existência de maior qualidade (ANGERAMI-CAMON, 2007).
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2 AS PERDAS E A MORTE
2.1 CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DA MORTE
O estudo da morte possibilita a compreensão das relações que o ser humano
estabelece com esse fenômeno e também revela muito sobre nós mesmos e sobre a
sociedade na qual vivemos (ARRIÈS, 1981).
Tema de discussão de várias áreas do saber, o fascínio e temor diante da
morte e seus espectros, sempre influenciaram a maneira de viver humana
A morte sempre foi vivida com sofrimento, no entanto antigamente a morte
não era um tabu. Ao contrário, era uma realidade aceita como natural e vivida em
casa.
Vista como algo que fazia parte de cada pessoa e que inevitavelmente
aconteceria um dia. Era comum as pessoas refletirem, conversarem e vivenciarem a
morte em suas casas (MORIN, 1970; SCHMITT, 1999).
Na Idade Média européia os cemitérios geralmente ocupavam o centro das
cidades e eram mantidos sob os domínios da Igreja Católica.
Os mortos socialmente importantes eram enterrados dentro das igrejas, os
menos importantes eram enterrados em terrenos próximos as igrejas.
A proximidade dos corpos em relação à igreja dependia do grau de
importância social do indivíduo (ARRIÉS, 1981).
Os desfavorecidos socialmente eram considerados desprovidos de dignidade
e por isso, eram enterrados em valas comuns que permaneciam abertas ao público.
Neste espaço a população transitava, fazia comércio, namorava, brincava e faziam
festas regadas de muita comida e bebida.
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As chamadas festas macabras, eram festas pagãs e tinham um cunho de
deboche e intencionalidade de denegrir a autoridade da Igreja, era uma total
inversão dos rituais católico-cristãos. (SCHMITT, 1999).
A partir do Século XIX, com o advento da industrialização e com o
desenvolvimento técnico-científico da Medicina nas sociedades ocidentais, a visão e
a interação com a morte mudaram.
A revolução higienista radicalizou a separação entre vivos e mortos de tal
modo que o convívio entre ambos passou a ser visto como uma fonte de
contaminação por doenças. (RODRIGUES, 1995).
Arriès (1981) no Século XIX a morte menos temida era a morte lenta e em
casa, em que se havia a possibilidade da pessoa se organizar e fazer suas
despedidas antes de morrer.
Já no Século XX a morte inesperada ou a morte súbita foram às formas mais
desejadas ou menos temidas de se morrer. Essa realidade revela o temor e
despreparo diante da morte, que as sociedades modernas foram adquirindo.
Na medida em que as sociedades se industrializavam, a morte se afastava do
ambiente doméstico e, deixava de ser vivida como uma realidade triste, porém
natural. Esse afastamento agravou os impactos da morte sobre as pessoas.
Outros acontecimentos além da industrialização favoreceram para o
afastamento da morte da vida cotidiana até a forma como ela é vista hoje.
O comportamento humano é impregnado de influências culturais, Nietzsche2
(1998) em Assim Falou Zaratustra traduziu em palavras o pensamento e sentimento
vividos de sua época, principalmente no terreno das ciências naturais e sociais
quando anunciou que Deus estava morto.
2 Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844-1900).This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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O narcisismo e o individualismo foram características que assolaram o ser
humano, após as ciências terem substituído quase tudo àquilo que, até então, a
idéia de Deus representava.
Com Deus moral morto cada um poderia tornar-se seu próprio deus e a
crença em Deus foi redirecionada para o próprio eu.
Freud 3 (1988) em O mal estar na civilização, analisa esse fato como uma
tentativa narcísea do ser humano de enfrentar seu abandono e lidar com seu mal-
estar por meio de uma divinização do humano.
Freud ainda advertiu que futuramente com o avanço científico-tecnológico
essa deificação aumentaria e que não seria por meio dessa semelhança com Deus
que o ser humano se livraria de seu mal-estar.
Atualmente, a sociedade ocidental é massificada pela aparência, pelo
individualismo, pelo culto ao novo, belo e saudável. A maior expressão disso foi à
exclusão social da morte. O silêncio que é dado a essa parte de nossas vidas,
tornou a morte um tabu.
Falar sobre a morte é um assunto que causa constrangimento.
Não é de bom tom lembrá-la, pois é um assunto que é comum não se saber
como lidar direito, podendo despertar e revelar o que há de mais frágil em cada ser.
Uma exposição das fragilidades e limitações humanas não seria considerada
natural, uma vez que aprendemos, gostamos e estamos habituados a viver
aparentando sermos super-humanos: saudáveis, fortes, belos e alegres. Contudo, é
importante aceitar que a fraqueza, a pobreza e o desespero também fazem parte do
humano (RABELO, 2006).
3 Sigmund Freud (1856-1939).This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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Hoje uma parte significativa do mundo pode contar com o avanço científico e
tecnológico. Há uma ampla estrutura sócio-econômico-cultural que sustenta e
incentiva toda uma sociedade, cuja ideologia é viver bem a qualquer custo.
Esta ideologia se revela de diversas maneiras, uma de suas principais formas
de expressão é o consumismo. Principalmente, a sociedade ocidental tornou-se uma
sociedade cujo sofrimento, a falta, a dor, a angústia, fatos que são intrínsecos a vida
humana, já não fazem mais sentido.
As pessoas passaram a acreditar que qualquer sofrimento poderia ser evitado
ou reduzido por meio do materialismo, hedonismo, da permissividade, do relativismo
e em destaque do consumismo (ROJAS, 1994).
A vida reduziu-se ao poder de consumo de cada um e a ordem passou a ser:
se está com dor tome um analgésico, se está ansioso tome ansiolíticos, caso esteja
comendo demais compre um inibidor de apetite, se está triste compre um
antidepressivo ou uma roupa nova, um calçado, vá a uma festa, beba um pouco e
jogue conversa fora com outras pessoas ou até quem sabe, consuma um novo
namorado, marido ou uma nova mulher.
A solução do sofrimento humano foi reduzida ao poder que cada um tem de
consumir coisas, objetos e pessoas.
Consuma o que for necessário para aparentemente, ficar melhor. O lema é
permitir-se, pois tudo é relativo. Essas idéias têm alimentado várias gerações que
contaminadas pelo hedonismo foram tomadas por um enorme vazio moral.
Tornando-as cada vez mais frágeis e com poucas capacidades de enfrentamento
diante das adversidades e agruras da vida.
Claro que a modernidade e os avanços científico-tecnológicos trouxeram
muitos progressos que nos são imprescindíveis. É excelente poder contar com
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remédios para as enfermidades, contar com uma infra-estrutura que melhora e muito
a qualidade de vida humana. Contudo, há um exagero nisso, um imenso vazio moral
acompanhado de uma ilusão do não sofrer, do não perder, do não morrer.
As pessoas passaram a acreditar que essa parte de nossas vidas somente
ocorre em decorrência de um erro ou fracasso cometido pela própria pessoa.
Há um imenso desejo de se viver só de alegrias e beleza. Esquecendo, pois,
que a vida também é feita de dor, sofrimento e feiúra. O distanciamento constante
daquilo que desagrada, fragilizou muito o ser humano diante das durezas da vida.
Atualmente sofremos em demasia por termos transformado as perdas, o
sofrimento, o medo e principalmente a morte em tabu.
A morte foi deslocada do comum “noa” para “tabu”, pois já não há mais um
lugar social para a expressão do sofrimento diante da morte. Freud (1996, p. 37)
conceitua “Tabu” – Termo polinésio que, segundo a enciclopédia Wikipedia 4 (2007)
significa:
[...] por um lado, sagrado, consagrado, e, por outro, misterioso, perigoso, proibido, impuro. O inverso de tabu em polinésio é “noa”, que significa comum ou geralmente acessível. Assim, “tabu” traz em si um sentido de algo inabordável, sendo principalmente expresso em proibições e restrições (WIKIPEDIA, 2007).
Os rituais de sepultamento tornam-se cada vez mais rápidos e os enterros
dos corpos começam a ser substituídos pela cremação. O que não deixa de ser uma
forma de acabar ainda mais rápido com os vestígios da morte e com a possibilidade
desconfortável e dolorosa de ver cemitérios em meio às paisagens urbanas que
tentam refletir a ideologia de uma sociedade narcísea e jovem, porém imatura.
4 Disponível em <http://www.wikipedia.com>. Acesso em 25/10/2007.This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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Acabar com os cemitérios é também uma forma de esconder o doente, o feio,
o diferente, a tristeza, o fracasso humano, enfim, esconder tudo aquilo que leva a
morte. As pessoas de modo geral não suportam pensar a própria morte ou a morte
de quem estimam (ARRIÈS, 1981).
A morte passou a ocorrer entre as paredes dos hospitais, muitas vezes longe
da presença da família. O paciente terminal tornou-se objeto de decisão do hospital
e do médico. O médico, por sua vez, tornou-se refém da tecnologia e do contexto
político-administrativo do hospital.
A morte institucionalizou-se e a Medicina passou a legitimar o morrer
(ARAÚJO, SILVA, 2006).
A equipe de saúde preenchendo uma demanda social deixou de ter seu papel
curador para se tornar “guerreira da cura”. Na luta contra a morte o médico é o
grande guerreiro e a ele cabe a difícil decisão de determinar quando é a hora de
parar e aceitar que a morte se fez implacavelmente presente.
É comum que médico e equipe de saúde, mesmo sabendo que fizeram tudo o
que lhes era possível pela vida, sejam invadidos por sentimentos de impotência e
sensação de fracasso ao perderem a batalha (BROMBERG, 1996; KOVÀCS, 1992).
O ser humano com tantos recursos científico-tecnológicos acabou quase que
conseguindo esquecer que é finito, morre e por mais triste que isso seja é nossa
condição humana. A morte não escolhe idade, sexo ou classe social.
A morte é parte de nossa existência. Negá-la nos machucaria ainda mais.
Neste contexto surge no Século XXI a bioética para discutir questões
importantes sobre vida e morte. A bioética surgiu de preocupações Teológicas que
se estenderam para outras áreas do saber.
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Na área da saúde são discutidos princípios importantes sobre as condutas
médicas: cuidados paliativos, re-humanização do morrer, prolongamento da vida,
morrer com dignidade, eutanásia, ortotanásia e suicídio assistido.
Outros aspectos relativos à autodeterminação, a autonomia, direitos
humanos, macro-política e economia da saúde e a questão dos excluídos também
sã temas refletidos e discutidos atualmente (KOVÀCS, 2003; ZIEGLER, 1977).
Situações de vida e morte envolvem vários personagens: pacientes,
familiares, equipe de saúde, além da instituição hospitalar.
Quando é estabelecida uma relação simétrica entre todos os membros
envolvidos, os prós e os contras de qualquer decisão são articulados entre todos
estes personagens, dessa forma todos se tornam responsáveis pelo destino de cada
decisão.
Na maior parte das instituições hospitalares observa-se ainda uma posição
paternalista, baseada no princípio da beneficência, em nome do desejo de se fazer o
bem evitando sofrimento adicional, a equipe termina agindo sozinha justificada pela
idéia de que sabe o que é melhor para o paciente, considerando que não esteja
preparado para saber o que é o melhor. (CAPRARA, RODRIGUES, 2004).
Quando todo saber é depositado na equipe de saúde, também todas as
responsabilidades são assumidas. No âmbito desse debate estão envolvidas dentre
outras, questões Médicas, Sociais, do Direito, Filosofia e Teologia.
Somente uma definição de morte não seria suficiente para esclarecer este
assunto.
Com intenção de modificar essa realidade surgiram movimentos e grupos que
tentam resgatar o lugar social das perdas e da morte, dando-lhes dignidade.
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Entre estes estão Kübler-Ross 5 (2005), uma das precursoras dos estudos e
pesquisas sobre morte, os profissionais de Tanatologia, bioética, humanização
hospitalar, a filosofia do hospice que teve início na Inglaterra e se espalhou pelo
mundo todo para e cuidar de pacientes com diagnóstico reservado e muitos outros
profissionais que incitam o acolhimento, reflexão e amadurecimento da sociedade
frente a esses temas.
O movimento de acolhimento à vida e a morte é cada vez maior.
2.2 DEFINIÇÃO DE MORTE
Cada pessoa desde a mais tenra idade constrói por meio das influências
culturais, familiares e das experiências pessoais sua própria representação do que
seja a morte.
Uma das principais representações da morte está ligada a perda, ausência,
ruptura, desintegração, abandono, degeneração, dor, castigo, desamparo,
separação, aniquilação e despedida (KOVÁCS, 1992).
A morte é o grande desconhecido e talvez por isso tenha uma de suas
principais representações ligadas ao mal. O símbolo da foice frequentemente
representa esse espectro da morte descrita acima (MORIN, 1970).
A morte vista por outro ângulo, pode estar cercada de representações como:
fascínio, sedução, mistério, poder, força, grande viagem, entrega, descanso, alívio,
acolhimento e conforto.
5 Elizabeth Kubler-Ross (1926-2004).This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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Esta última representação é bastante observada em indivíduos que tentam
suicídio diante de situações por eles avaliadas como insuportáveis ou diante de
profundos impasses.
Também é bastante presente a fantasia de se morrer só um pouco. Vista
dessa forma a morte é a grande mãe que acolhe, ampara e dá conforto aos aflitos e
desesperados (KOVÁCS, 1992, ZIEGLER, 1997).
Na cultura ancestral egípcia a morte era definida como a partida da alma do
corpo. Esta visão é a base do conceito helênico, judaico-cristão de morte como
sendo uma partida da alma para outro plano.
As religiões e culturas tinham as mais variadas concepções sobre a morte
(ARRIÉS, 1981).
No Século XVIII a putrefação dos corpos era o sinal manifesto de que a morte
havia realmente ocorrido. Os velórios, nesta época, além de serem rituais de
despedida, permitiam o tempo necessário para comprovação da morte, uma forma
de garantir que pessoas vivas não seriam enterradas.
Com a descoberta da circulação sangüínea e do estetoscópio, o critério da
morte passa a ser a ausência dos batimentos cardíacos. A medicina passa a definir
cientificamente os critérios de morte (CAPRARA, RODRIGUES, 2004).
Atualmente o conceito de morte mais usado é o da morte clínica. Esta pode
ser definida como perda irreversível da consciência e da capacidade de respirar.
Ausência total de consciência, reflexos, respiração e atividade cardíaca.
A morte clínica se tornou um conceito, pois atualmente todas as funções vitais
podem ser substituídas por máquinas, que podem prolongar a vida indefinidamente
(KOVÀCS, 1992).
A irreversibilidade é uma das principais características da morte. This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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Atualmente cabe ao médico definir quando a irreversibilidade da morte se faz
presente por completa. Jean Ziegler (1977) descreve alguns critérios que definem o
momento que a morte ocorre.
1. Não reação total a qualquer tipo de estímulo interno ou externo,
mesmo que doloroso.
2. Ausência de movimentos respiratórios ao se desligar o aparelho
respiratório e ausência de movimentos musculares espontâneos.
3. Ausência de reflexos, ou coma irreversível com abolição da atividade
do Sistema Nervoso Central.
4. Encefalograma plano, comprovando destruição cerebral plena e
irreversível.
Mollaré e Goulon (1959) citados por Lamb (2001) definem morte encefálica
como um estado de irresponsividade, flacidez, dificuldade de regulação térmica,
ausência de reflexos e falta de respiração autônoma.
É necessário que outras hipóteses com características semelhantes sejam
excluídas.
Na morte encefálica a irreversibilidade é total, este é um critério fundamental
de morte. O encéfalo é um órgão que não pode ser substituído e é indispensável
para a continuação da vida, quando sua morte ocorre não importa quantos outros
sistemas estejam funcionando artificialmente, a vida neste momento se esvai.
O parecer nº. 12 / 98 do Código de Ética Médica se refere à morte encefálica
como o momento do óbito. A família precisa ser avisada antes do desligamento dos
aparelhos ou da não reanimação.
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É importante, também, informar a equipe de enfermagem, que é a que está
mais em contato com o paciente e seus familiares.
Como a morte encefálica é considerada, na maior parte dos países
ocidentais, como sinônimo de óbito, só após sua ocorrência se passa a manipular o
corpo cadáver, em caso do uso de órgãos para transplante.
Se for constatada a morte encefálica, o prolongamento dos tratamentos pode
configurar obstinação terapêutica (MARTIN, 1993).
O ato do morrer além de um fenômeno biológico contém uma dimensão
simbólica, relacionada tanto a Psicologia como as Ciências Sociais.
A morte enquanto fenômeno se apresenta carregada de valores e
significações do contexto sócio-histórico-cultural.
A morte vivida como limite nos ajuda a crescer, mas também é vivenciada
como dor, perda da função, do corpo, do afeto, é corte, separação, solidão, tristeza,
pobreza, é ausência, abandono, desamparo e castigo.
E também pode ser comparada a figura materna que acolhe, dá conforto, paz,
receptividade, descanso e imortalidade.
2.3 A MORTE E O MORRER
Kübler-Ross (2005) na década de 1960, por meio de pesquisas com
pacientes terminais, observou que os pacientes vivenciavam algumas experiências
semelhantes ao longo do processo do morrer.
Intitulou, assim, os cinco estágios diante da morte: negação, raiva, barganha,
depressão e, por último, a aceitação do termino da vida.
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21
Mais tarde, a própria Kübler-Ross substituiu o termo estágio por tarefas
emocionais diante da morte. Considerado este um termo mais adequado, já que não
necessariamente as pessoas passariam por todos os estágios e ainda nessa ordem
e nem eles ocorreriam com todas as pessoas.
A dinâmica das fases é muito variada.
De modo geral, o que se observa é que diante da notícia a primeira reação
costuma ser a de negação da realidade. Quando a pessoa consegue assimilar o que
está vivendo, fica com raiva por ser justamente com ela àquela realidade tão triste.
É comum, principalmente entre as pessoas que acreditam na existência de
uma força superior, que nesse momento haja uma espécie de negociata em que a
pessoa faz promessas, em troca de uma cura ou uma melhora que o seja (KUBLER-
ROSS, 2005).
Quando a pessoa percebe que suas barganhas não irão mudar sua condição,
que realmente sua hora chegou, é natural que a pessoa seja invadida por um estado
depressivo.
A depressão ocorre quando os mecanismos de defesa anteriores se esvaem
em meio a inevitável realidade e a pessoa passa a perceber claramente que está
fazendo a despedida com a própria vida e de tudo aquilo que mais ama (KUBLER-
ROSS, 2005).
A aceitação é a última fase e a mais difícil de ocorrer. Muitas são as pessoas
que morrem sem ter conseguido aceitar que o fim se fazia presente.
Esta é uma fase em que grandes despedidas e reajustes acontecem. Na
despedida com a vida é comum que as pessoas consigam se declarar, perdoar
umas as outras e se reconciliar (KUBLER-ROSS, 2005).
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22
O progresso técnico-científico das últimas décadas ajudou a modificar a forma
como as pessoas enfrentam suas perdas e morte.
Atualmente a expectativa de vida é maior, o que é um avanço muito positivo.
Entretanto, as pessoas estão criando esperanças irreais sobre o poder da Medicina
no prolongamento da vida, aumentando de forma relevante à negação em relação
às perdas e a morte. O que torna o morrer um momento ainda mais difícil (ARAÚJO,
SILVA, 2006).
A morte tornou-se uma realidade institucionalizada. Logo, muitas pessoas têm
vivenciado perdas significativas e o seu próprio morrer em instituições desprovidas
da afetividade das pessoas conhecidas e da intimidade do lar.
No enfrentamento da morte cada indivíduo tem lutas individuais a travar e
cada um conta com uma rede de apoio diferente. A rede de apoio são pessoas
próximas que têm vontade e disponibilidade para acompanhar e ajudar na medida
do possível àquele que está morrendo.
É muito importante que a pessoa possa contar com uma rede de apoio
formada por pessoas com um forte vínculo de intimidade, pois a rede além de ajudar
em questões práticas e burocráticas, também fornece segurança, força e mais
tranqüilidade a quem está morrendo (KOVÀCS, 2003; ISMAEL, 2005).
É fundamental que nesse momento tão difícil de despedida com a vida, que o
indivíduo possa contar com o apoio de pessoas queridas e ter pelo menos algumas
dessas pessoas para dividir suas dúvidas, medos, culpas, conflitos e também para
dividir o amor, a saudade, alegria e os desejos que ainda lhe restam.
A morte é um momento em que experiências profundas podem ser divididas.
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A rede de apoio também tem papel fundamental no destino desse
enfrentamento, uma vez que o morrer é um fardo pesado demais para ser carregado
sozinho.
Todas as pessoas são diferentes umas das outras, e por isso cada uma tem o
seu próprio jeito de viver e de morrer. Isso precisa ser identificado e respeitado.
As pessoas não se transformam em outras porque estão morrendo, cada um
vive sua morte com as condições que dispõe no momento. Entretanto, a morte é
uma experiência profunda que pode favorecer aprendizados e transformações
jamais esperados (KELEMAN, 2005).
Frente a morte a pessoa pode escolher se entregar aos medos, culpas e
desânimo, enfrentando a morte apática ou revoltada em uma cama, mas também há
a possibilidade da pessoa escolher encarar a morte como uma despedida que
precisa ser acolhida.
Um momento em que os pensamentos e sentimentos mais profundos podem
ser compartilhados e tentar fazer o que for possível para enfrentar essa experiência
com maior consciência e dignidade.
Mortes inesperadas na maioria das vezes são consideradas como agravantes
para quem fica. Por ser uma ruptura brusca e inesperada, não há nenhum tipo de
preparação para a chegada da morte daquele determinado ente.
Se a pessoa tiver um papel central ou relevante para a organização da vida
das pessoas que ficaram, pode ser ainda mais grave a desorganização que é
causada com a ausência desta pessoa.
Um exemplo, é quando um dos pais morre ou até mesmo os dois e, deixam
os filhos ainda pequenos ou quando ainda existe um alto nível de dependência.
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A superação desse tipo de morte pode ser mais difícil e demorada (KOVÁCS,
1992).
A mutilação do corpo costuma ser outro fator agravante, acarreta
freqüentemente em revolta e desespero. O estado em que fica o corpo tem forte
influência no processo de elaboração do luto, principalmente num primeiro momento.
Quando o corpo não é encontrado pode haver dificuldade na elaboração do luto.
Em casos de doenças graves pode ocorrer o luto antecipatório, a doença
impõe a elaboração de muitas perdas com a pessoa ainda viva (RAIMBAULT, 1979).
O medo é a resposta mais comum diante da morte. Apresenta-se de diversas
formas e cada pessoa teme mais certo aspecto da morte.
O tipo de medo e a maneira como este poderá ser experienciado dependeram
muito do tipo de representação que cada um tem da morte, a idade, o momento de
vida da pessoa, a época, a cultura na qual se está inserido, as capacidades de
enfrentamento disponíveis no momento e a forma como a morte ocorreu (KOVÁCS,
1992).
O ser humano tem dois grandes medos: o medo da vida e o medo da morte.
O medo da vida se vincula ao medo da realização, da individualização, medo de Ser
e, portanto, propenso à destruição.
O medo da morte é o medo de viver o não-ser definitivo.
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25
2.4 PERDAS E VIVENCIA DO LUTO
As perdas são um dos eventos mais estressantes que um ser humano pode
viver. Segundo Bowlby 6 (2002) o apego é algo natural ao ser humano e há uma
tendência humana em estabelecer laços afetivos com outras pessoas.
O primeiro apego é com a mãe ou alguém que desempenhe esse papel e isso
acontece devido a necessidade do bebê de ter segurança e proteção para
sobreviver.
Quando a pessoa de apego do bebê está ausente ou há ameaça de perdê-la,
fortes reações emocionais são vividas e uma sensação de estar perdido toma conta
da psique do recém nascido.
Estas são as primeiras experiências de perda e ficam registradas na mente
sob forma de perigo, sofrimento e desespero. Ao longo do desenvolvimento outras
experiências de perdas ocorrem.
São muitas ao longo da vida e mesmo quando adulto, as perdas ainda são
acompanhadas de sensações de perigo, sofrimento e desespero (VIORST, 2005).
Toda perda significativa pressupõe o luto, um processo que visa retirada da
energia investida e fixada em um determinado objeto e redirecionada para outro.
A desvinculação do objeto perdido ajuda a pessoa a vencer as etapas do luto.
A fixação na perda ou no objeto perdido contribuirá para que o processo do luto se
desenvolva de maneira patológica.
O luto como processo pressupõe fases. Segundo Bowlby (1997), primeiro
estado do luto é o de torpor. Nessa fase é comum acessos de extrema aflição,
desolamento e raiva. Este momento pode durar horas ou dias.
6 John Bowlby (1907-1990)This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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Depois vem a fase da saudade e busca da figura perdida.
Esta fase pode durar meses e até anos.
É comum, por exemplo, que as pessoas por alguns meses ou até anos
ouçam a voz ou sintam o cheiro do objeto perdido. No entanto, a realidade se impõe
ao desejo de recuperar quem ou o que se perdeu e depois de diversas tentativas em
vão de recuperar o objeto perdido, é vivida uma fase de desespero e
desorganização.
Nesse momento, a raiva e a culpa se apresentam de forma mais intensas e
associadas ao sentimento de impotência que se instala podem desencadear o
desejo de se procurar algo ou alguém para responsabilizar ou culpar.
Nessa etapa há a compreensão consciente de que a perda é real e que nada
mais poderá ser feito para recuperar quem ou o que foi perdido (BOWLBY, 1997).
Por último é vivida uma fase de um maior grau de organização. Estas fases
não têm uma ordem rígida para acontecer.
Podem ser nessa ordem, ocorrer ao mesmo tempo, intercalar-se, sobrepor-
se, podem ocorrer fixações em determinadas fases e também pode não acorrer.
É preciso sobreviver e a vida novamente impulsiona para a homeostase. Mas
para que isso aconteça é necessário que a pessoa se permita viver a dor e a tristeza
da perda, a passagem pelo luto é necessária.
Cada um processa essa experiência à sua maneira e é preciso que seja dada
vazão aos sentimentos que sufocam, facilitando a superação do luto.
Existem vários tipos de perdas e cada qual carrega especificidades no luto.
Suicídio, aborto, morte sem a presença do corpo, morte na qual o corpo está
mutilado e assassinato são perdas vividas com especial dificuldade.
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27
Há ainda as perdas pelas separações, nas quais não há nenhuma morte real,
mas ocorrem mortes simbólicas entre vivos. Também as doenças, vividas como
partes da pessoa que morre.
Existem as chamadas perdas necessárias que ocorrem para que o
desenvolvimento humano possa continuar. Esse tipo de perda é marcado
principalmente pelas diversas escolhas que são feitas ao longo da vida.
O não escolher é também um tipo de escolha e por isso envolve perdas
(VIORST, 2005).
As escolhas podem ser fáceis ou difíceis, isso dependerá da importância do
que está em risco de se perder e também do que se está sujeito a ganhar.
Há ainda perdas que não são sentidas como tal. Ao contrário, são vividas
com comemoração. No entanto, não deixam de ter o espectro da morte, próprio das
perdas. Os aniversários, a entrada na vida adulta, saída da faculdade, casamento,
chegada de um filho são alguns exemplos.
Ao longo da vida várias perdas acontecem e várias mortes são vividas.
Algumas são experienciadas com sofrimento e outras com alegria
(COMBINATO, 2006; BOWLBY, 1998).
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3 PERDAS, MORTE E DESENVOLVIMENTO HUMANO
É somente na idade moderna que a idade assume o significado de elemento
de identificação individual. Nesse momento as fases do ciclo vital surgem de
maneira a ordenar e dar significado a cada fase (CAPODIECI, 2000).
O desenvolvimento humano é um processo que envolve mudanças continuas
ao longo da vida. É marcado por mudanças que ocorrem de forma relativamente
ordenada, duradoura e afetam as estruturas físicas, neurológicas, os processos de
pensamento, emoções, interação social e muitos outros comportamentos (BIAGGIO,
1998).
Nos primeiros anos de vida, a criança não tem consciência de sua condição
humana e de sua real relação com a vida. São ou deveriam ser protegidas e
amparadas por seus tutores e o ambiente que a cerca.
Quando devidamente acolhidas e protegidas as crianças convivem bem com
muitas fantasias e ilusões.
O mundo infantil com todas as suas características oferece o aparato
necessário para que grandes ilusões e fantasias co-existam em harmonia com a
realidade. Já os adultos não conseguem isso e também não podem mais fazê-lo,
pois sua relação com a vida já não sustenta mais tantas ilusões e fantasias.
O adulto deve assumir muitos papéis e um de seus principais é ter
consciência e responsabilidade por sua própria vida e morte. Não importa o destino
que cada pessoa escolha para si, a verdade é que todos somos seres para a morte.
As fases do ciclo vital são alguns dos fatores que influenciam a experiência
do individuo com a morte.
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29
3.1 PERDAS, MORTE E A CRIANÇA
As representações sobre as perdas e a morte são construídas desde a mais
tenra infância, por meio da educação, cultura, religião e das experiências individuais.
Um dos grandes medos que a morte impõe a criança é o da separação
definitiva com o corpo. A criança sofre, também, angústias físicas e psicológicas
diante da morte.
Essas angústias muitas vezes são mascaradas por meio de sintomas,
revelando-se, por exemplo, em forma de uma dificuldade de conduta, dificuldades de
aprendizagem, excessiva apatia ou agressividade. São muitas as formas que as
angústias tomam para se expressar (BOWLBY; 1998; 2002; SPITZ, 1998).
A criança passa pelas mesmas fases do luto que um adulto, desde que ela
seja esclarecida a respeito do que está lhe acontecendo.
Segundo Winnicott (1990) para que seja preservada a individualidade e a
maneira de ser do bebê, este precisa ser reconhecido e respeitado no seu ritmo
natural e em sua espontaneidade. Precisa ser protegido das possíveis ameaças que
o levem a se defender reagindo.
Um bebê quando reage não está existindo e sim, lutando para sobreviver.
Winnicott (2002) ressalta o papel de espelho da mãe, que reflete a
singularidade do filho. Entretanto, há bebês que olham para o rosto de suas mães e
não se vêem refletidos, o que vêem é apenas a rigidez das próprias defesas da mãe.
As crianças dependem de um adulto para ajudá-las a identificar e nomear o
que se passa com elas, alguém que lhes dêem um significado coerente com aquilo
que elas experimentam. A criança não precisa apenas de um significado, mas
também de continência para suas angústias dores e sofrimento.
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30
E necessário levar em conta a fase do desenvolvimento da criança e sua
capacidade de compreensão cognitiva e emocional. O processo de luto não é mais
rápido na criança do que em um adulto.
A criança sofre como qualquer outra pessoa. O que acontece é que muitas
vezes isso não fica tão claro para o adulto (ABERASTURY, 1984; RAIMBAULT,
1979).
É muito importante que a criança possa contar com o apoio e suporte
emocional de pelo menos um adulto de sua confiança, pois ela ainda não tem uma
estrutura cognitiva e emocional que a capacite fazer suas próprias elaborações a
respeito de suas experiências (ABERASTURY, 1984; RAIMBAULT, 1979).
A criança é capaz de captar tudo o que acontece ao seu redor. Esconder a
realidade dela é um dos principais fatores de manifestações patológicas que se
desenvolvem na criança.
Não falar sobre a morte ou mentir para criança quando esta solicita falar, não
ajuda em nada. Aliás, só aumenta a angústia, gera ainda mais confusão mental e
sentimento de desesperança criados porque a criança quando negada em sua
expressão, sente como se estivesse sozinha e não tivesse a quem recorrer, sente-
se desolada em sua realidade (ABERASTURY, 1984).
A criança ainda perde a confiança de expressar suas angústias e medos.
Dessa forma ela fica isolada em seu sofrimento e as palavras ficam presas dentro
dela e isso faz mal. A ignorância e o esquecimento não devem ser estimulados.
Ao desejar respostas ou se expressar isso deve lhe ser permitido, haja vista
que a criança recebe esse acolhimento como um gesto de respeito e amor por ela.
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31
A criança é capaz de perceber o ocultamento e as mentiras que são ditas e
também percebe o incentivo que lhe é dado para não saber ou para esquecer o que
está acontecendo. Mentiras e segredos dificultam o processo de luto na criança.
Podem ocasionar perturbações no desenvolvimento e provocar dificuldades
no vínculo entre a criança e o mundo adulto. Falar sobre a morte ajuda a aliviar a dor
e a elaboração da perda (BOWLBY, 1997; GOLSE, 1998).
Quando são as próprias crianças que estão em perigo de morte, observa-se
que elas possuem grande consciência sobre sua situação. Mesmo quando os
adultos mentem sobre seu estado de saúde e a criança a princípio demonstra
acreditar, observou-se que a ela é capaz de perceber a proximidade da morte em
seu corpo e expressa isso de diversas maneiras e não necessariamente por meio da
linguagem.
No lúdico a criança se sente mais confiante e a vontade para expressar seus
medos, angústias, sofrimento e fantasias a respeito das perdas e da morte
(RAIMBAULT, 1979; WINNICOTT, 1993).
É importante sensibilidade e delicadeza para falar com as crianças sobre as
perdas e a morte. A linguagem deve ser adequada ao seu nível e o que será
conversado é a própria criança quem determina que ao adulto caberá ser suporte
emocional e cognitivo para ela.
Sua dor não deve ser evidenciada a todo o momento, mas tão pouco
ignorada.
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3.2 PERDAS E MORTE NA ADOLESCÊNCIA
A adolescência é uma etapa do desenvolvimento marcada por muitas
transformações. Conseqüentemente muitos ganhos e perdas são vividos. É o
momento da etapa final do processo de individualização e substituição do vínculo de
dependência com os pais por relações objetais mais autônomas.
A adolescência implica a construção de um código de valores e ética próprio,
construção de novos ideais e desenvolvimento das capacidades de lutar para
consegui-los.
Há também a busca de identificação no grupo de iguais, aceitação dos ritos
de iniciação do status de adulto, desenvolvimento dos papéis sexuais e
estabelecimento de um padrão de luta-fuga no relacionamento com a geração
precedente (ABERASTURY, 1986; OSORIO, 1989).
Lutos ocorrem nessa etapa da vida, como a perda do corpo e da identidade
infantis e a perda da relação com os pais da infância.
Estes lutos interferem no estado de ânimo do adolescente, que por vezes se
encontra submerso em profundas desesperanças. Porém, por outro lado também
pode viver uma presunção de onipotência que freqüentemente é desmentida pela
própria realidade (BLOS, 1996; OSORIO, 1989).
Aberastury e Knobel (1981) ressaltam que:
A qualidade do processo de amadurecimento e crescimento dos primeiros
anos, a estabilidade de afetos, a soma de gratificações e frustrações e a adaptação
gradativa às exigências ambientais vão marcar a intensidade e a gravidade desses
conflitos.
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O adolescente ainda vive dilemas existenciais, vocacional, sexual e o dilema
do tóxico. Todo esse montante de dilemas e mudanças marcam a crise da
adolescência.
Conta um corpo potente e com uma grande capacidade cognitiva o que lhe
permite grandes conquistas. Contudo, por conta de sua pouca experiência, pode
viver grandes perdas.
A adolescência é um período de preparação para a vida adulta e todas as
responsabilidades que a acompanham. A energia vital está muito voltada para esses
aspectos. A morte ainda é algo distante.
O adolescente é capaz de perceber as características essenciais da morte,
como a irreversibilidade, universalidade e intransponibilidade. Pode responder
racionalmente a essa realidade, porém emocionalmente ainda pode estar distante
dela.
Em contato com a morte o adolescente sofre muito, haja vista que ainda vive
uma onipotência infantil e as primeiras experiências de impotência o machucam
muito. (KOVÀCS, 1992).
O adolescente caminha para o auge da vida, e este é um dos momentos onde
a morte mais aparece. É um período em que muitas mortes acontecem
inesperadamente, não se sabe ao certo se propositadamente ou não.
Uma das explicações para isso é que na construção da identidade, o
adolescente testa e acaba por extrapolar muito os seus limites (SHAFFER, 2005).
Na busca de uma vida intensa pode ocorrer a morte por exagero na dose, por
descuido, acidente ou assassinato. O adolescente se coloca como um herói no
mundo.
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34
Ele não conhece o medo, não tem fraquezas ou limitações e se as tem não
assume isso publicamente. É o verdadeiro herói e pensa que a morte só acontece
com o outro por inabilidade ou descuido (VIORST, 2005).
É uma fase de ambivalências e isso aparece quase que integralmente na
adolescência. O paradoxo vida-morte fica mais evidente nessa fase.
Claro, que é um exagero falar que todos os adolescentes são assim, mas de
alguma forma mais ou menos acentuada eles vivem isso (FERRARI, 1996;
SHAFFER, 2005).
O bem-estar biopsicossocial do indivíduo está intrinsecamente relacionado
com a aceitação de sua finitude. Fundamental por exemplo, a aceitação por parte
dos pais de que já não são os donos do destino dos filhos e que é inevitável esta
perda para proporcionar o crescimento deles.
Os filhos por sua vez devem aceitar que não podem deter o envelhecimento
dos pais e nem assegurar sua onipotência protetora. Para Osório (1989):
A família que aceita sua finitude permite. O crescimento individual, a autonomia e a diferenciação de seus membros e torna-se mais apta a desenvolver-se satisfatoriamente dentro dos limites previsíveis de sua ação e existência, ao passo que a família que nega sua transitoriedade e mantém seus membros aglutinados numa perene disposição à possessividade uns dos outros deixa de funcionar como um continente adequado para a definição e manutenção das diferenças humanas e com isso estiola seu papel cultural e adoece como organismo social (OSORIO, 1989).
O término da adolescência é marcado pelo estabelecimento de uma
identidade sexual e possibilidade de estabelecer relações afetivas estáveis,
capacidade de assumir compromissos profissionais e manter independência
financeira, aquisição de um sistema de valores pessoais e relação de reciprocidade
com a geração precedente, sobretudo com os pais.
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3.3 PERDAS E MORTE NA VIDA ADULTA
O início da fase adulta é marcada pela responsabilidade em relação a
comunidade, colaboração com o próprio desenvolvimento e constituição de uma
nova família. A energia está muito voltada para a tentativa de se auto-nutrir física,
psicológica e existencialmente.
Somente dessa forma, também poderá nutrir as próximas gerações que
poderão surgir. Muita energia é investida na construção desses pilares e o espaço
para morte na consciência ainda pode estar distante (KOVÀCS, 1992).
Na vida adulta mudanças físicas e cognitivas são mais graduais e variáveis
de um indivíduo para outro. No processo de amadurecimento ocorre a aquisição de
muitos papéis. Como, a transferência do apego com os pais para outra pessoa ou
pessoas. Esse distanciamento é necessário para que haja a emancipação
psicológica.
Na vida adulta o elo entre pais e filhos é transferido para um outro. No
entanto, ele não se acaba. Outra aquisição importante para a vida adulta é a
capacidade de conviver em intimidade com outra pessoa que não seja seus pais ou
irmãos (BEE, 1997).
Muitos adultos procuram se casar e ter filhos quando sentem que estão aptos
a conviver intimamente com alguém. O casamento muda o estado civil da pessoa e
isso significa dentre outras coisas ter que morrer para a vida de solteiro.
A maternidade e a paternidade transformam marido e mulher também em pai
e mãe. Muitas escolhas precisam ser feitas ao longo da vida adulta e muitas
mudanças ocorrem.
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36
Uma teia de questões está envolvida em cada escolha. Ter consciência do
quê se escolhe e do para quê se escolhe são algumas perguntas importantes para
serem feitas na vida adulta.
A aquisição de papéis do início da vida adulta envolve muitos ganhos como: a
individualização, conquista da autonomia, escolha da profissão, casamento, filhos e
assim por diante.
O desenvolvimento humano não acontece espontaneamente, ao contrário,
exige participação ativa da pessoa para que os seus projetos de ser se concretizem
(MAY, 1988; BEE, 1997).
Já na metade da vida é um momento o qual, de modo geral muitas
realizações já foram feitas e é comum que as pessoas façam um balanço sobre suas
vidas até aquele momento.
Muitas alegrias, tristezas, vitórias e derrotas já foram vividas e a morte
começa a ter um espaço maior na consciência. Esta é uma fase na qual a pessoa já
não pode mais contar com toda potência e força de um corpo jovem. No entanto,
pode contar com todas as vantagens que as experiências vividas podem trazer.
Ninguém se mantém no topo, no auge da vida eternamente. Esta fase marca
a descida. Os limites agora são mais respeitados, constata-se que já não há mais
todo tempo do mundo e a evidência de uma possível morte geralmente dá um novo
significado a vida neste momento (KOVÀCS, 1992).
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37
3. 4 PERDAS, MORTE E A VELHICE
A velhice é a fase do ciclo vital que carrega mais estigmas e atributos
negativos. Isso se justifica em parte porque essa realmente é a fase do
desenvolvimento em que diversas perdas acontecem.
A velhice é um momento de profundas separações e despedidas com o
trabalho, do corpo jovem, de muitos pertences, projetos, familiares e por fim da
própria vida. Nessa fase, muitas mortes são vividas concreta e simbolicamente.
A maneira de viver ou representar cada uma dessas perdas depende muito
da consciência de cada um. Na velhice a ênfase pode estar na vida ou na morte.
Como cada pessoa encara as suas perdas interfere, sobremaneira, no
processo do envelhecer saudável (MONTEIRO, 2004; LOUREIRO, 2000).
A velhice é uma fase em que todas as experiências se somam e valores de
vida ainda podem ser resignificados. Pode-se dizer que a velhice é a fase da
sabedoria, da plena experiência afetiva e intelectual, por isso, a vida pode ser
aproveitada de forma muito mais significativa.
A velhice não precisa necessariamente ser um momento triste da vida, pode
ser um momento muito feliz e de grandes satisfações, recomeços, acertos e
reconciliações Nesse sentido, a velhice é o tempo de preparação para morte
(BEAUVOIR, 1990; NERI, 2001).
Há o estereotipo de que o velho não tem mais desejos, que está pronto para
morrer, pois aceita tudo muito bem, inclusive a morte. Isso não é verdade.
A velhice pode ser uma fase em que a pessoa pode estar mais preparada
para a finitude, mas isso não é em razão da suposta falta de desejos da velhice.
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38
Quanto melhor se vive, menor tende a ser o temor pela morte. Isso na velhice
fica ainda mais claro. Quanto mais insatisfatória a vida, mais a pessoa se agarra a
ela. Muitas vezes pela esperança de melhora ou pela fantasia de que a morte seja
ainda pior.
Percebe-se que quanto mais ligado a vida a pessoa está pela via da
satisfação, menos ligada a morte ela fica, menos preocupada com o futuro e com o
que pode acontecer (PY, 1999).
A morte é uma realidade que na velhice se torna mais cedo ou mais tarde
inevitável. O espectro da morte passa a ser cada vez mais visível, se torna inegável
a caminhada para o fim.
O medo de ficar sem cuidados na velhice é uma preocupação que assombra
muitas pessoas, assim como precisar dos cuidados das pessoas e se tornar um
empecilho na vida dos mesmos.
Como a grande despedida com a vida acontecerá, é uma preocupação que
passa a fazer parte da vida de forma muito mais consciente.
A grande maioria das pessoas tem muita dificuldade em lidar com o
sofrimento do outro. Então, subjuga-se o outro ao nosso desejo de calar com a
justificativa de que esta é a melhor atitude nessa hora.
É o outro que não suporta manter um dialogo genuíno com a pessoa que
enfrenta a terminalidade e que prefere calar como uma forma de se sentir mais
aliviado, como se não saber do sofrimento alheio fosse fazer realmente o sofrimento
desaparecer.
Não conseguir ouvir o depoimento da pessoa que está morrendo é isolá-la em
vida para morrer. A morte é sempre um ato solitário, pois somente a pessoa pode
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viver sua morte. No entanto, é muito triste para uma pessoa se sentir isolado com
sua morte.
Morrer sem apoio, sem amparo, sem conforto físico e emocional, ou ainda
morrer guardando em si toda angústia e medo. A morte não é necessariamente
justa, mas deve ser digna e acolhida.
A dimensão espiritual, questões sobre o sentido da vida, nessa fase já podem
estar bem respondidas e isso melhora a qualidade de como se enfrenta a vida e
finitude.
O ser humano tem a necessidade de se perceber pertencendo a um plano
mais amplo do que seu simples cotidiano. Quanto mais satisfatórias forem as
respostas para essas perguntas, mais tranquilamente é enfrentada a vida e a
finitude (FRANKL, 1976).
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40
4 PSICOLOGIA EXISTENCIAL
4.1 DEFINIÇÃO DE PSICOLOGIA EXISTENCIAL
A Psicologia Existencial se apóia na Filosofia Existencial.
O Existencialismo é uma corrente filosófica que tem como principal
preocupação compreender e explicar a experiência humana. O Existencialismo
moderno surge com Kierkegaard 7 e com Heidegger 8.
Outros nomes como: Nietzsche, Sartre, Jaspers, Buber e Gabriel Macel
também foram importantíssimos para na construção desse movimento (SARTRE,
1970).
A palavra existencialismo vem da palavra “existir”, que derivou do latim
existire que significa emergir, surgir, salientar-se. No existencialismo o Ser humano é
visto como aquilo que ele consegue construir de fato em seus três mundos – no
mundo interno do sujeito, de suas inter-relações e no mundo externo a ele. Esses
três mundos acontecem simultaneamente na pessoa e se influenciam entre si.
A existência é vista como uma continua relação entre a pessoa com ela
mesma e com o mundo. O indivíduo precisa permanentemente escolher como
deseja existir no próximo momento, o ser depende de escolhas para existir, uma vez
que não é como as árvores ou frutos que amadurecem com o tempo.
Neste contexto o ser humano ganha mais liberdade para escolher o que
deseja ser, mas também ganha responsabilidades por sua vida. O Existencialismo
tira o destino do lugar de sujeito que constrói o ser e o coloca como uma
7 Soren Aabye Kierkegaard (1813-1855)8 Martin Heidegger (1889-1976)This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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conseqüência da construção do individuo. O movimento existencialista colaborou
para apropriação do ser por seu próprio existir (HUISMAN, 2001).
O ser humano é o único Ser que possui autoconsciência de sua existência e,
portanto tem capacidade de autoplanejar-se dentro dos potenciais e limitações da
sua realidade. Por meio de sua autoconsciência pode transcender-se no tempo e no
espaço.
Pode viver o passado, presente e futuro, pode ainda ir à lugares muito além
do espaço físico que seu corpo ocupa. Ter autoconsciência tornou o homem
construtor de seu próprio destino (ERTHAL, 1989, HEIDEGGER, 2005).
O Existencialismo surge com a preocupação de recuperar a essência do
indivíduo enquanto Ser no mundo, valoriza a experiência do existir e a atitude
humana em relação a isso.
Questiona-se a forma pela qual a capacidade de existir acontece e como ela
é estruturada. Na perspectiva existencialista o Ser ganha não só a liberdade de
auto-determinar seu próprio existir, mas também a responsabilidade de fazê-lo só,
pois ninguém vive senão a sua própria vida (XAUSA, 1986).
O ser humano é visto como um Ser de potencialidades que podem se
concretizar ou não. Isso dependerá muito das escolhas que o próprio sujeito faz para
si e das relações que estabelece com suas potencialidades, dentro de seus três
mundos e dos limites que envolvem tal existência. (ANGERAMI-CAMON, 1984).
O indivíduo não se constrói somente do que compreende racionalmente, se
constrói a partir do que realmente deseja e do que escolhe para si. Não desejar e o
não escolher também são formas de existir.
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O ser humano só existe de fato quando se lança no mundo por meio de suas
escolhas construindo suas verdades. Pensar não é existir, mas é tornar-se
espectador da experiência.
Kierkegaard (1974) em o Diário de um Sedutor defendia a idéia de que deve
existir uma verdade subjetiva pela qual a pessoa possa viver ou morrer. É essa idéia
ou idéias que fazem com que um ser humano transite pela vida.
O ser humano tem a necessidade de ter um ou mais sentidos do porque viver
e do para quê viver, é um Ser que tem a necessidade de possuir um corpo de
valores próprio para orientá-lo. Cada ser humano constrói sua própria teoria a
respeito do que seja a vida e o viver (FRANKL, 1976).
O ser humano não pode viver todas as possibilidades que deseja, pois está
submetido a condição de Ser finito. É necessário que escolhas sejam feitas
constantemente.
As escolhas não acontecem sem angústia, uma vez que cada escolha acolhe
o risco de um possível fracasso do projeto de vir-a-ser-no-mundo (MAY, 1988).
A coragem é a qualidade necessária para o Ser existir. A obrigação de
escolher desperta angústia e desespero.
A angústia é a forma que toma a consciência devido ao risco que é existir. O
desespero é o estado que a angústia conduz (LESSA, 1998; MAY, 1988).
O movimento Existencialista adota o método fenomenológico para suas
investigações. Husserl 9 criou o método fenomenológico como uma tentativa de
apreender o fenômeno como ele realmente se apresenta sem interferências
interpretativas de quem os apreendeu.
9 Edmund Husserl (1859-1938)This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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É uma tentativa de apreender e compreender as experiências do ponto de
vista de quem as viveu e não de quem as observou.
Husserl e outros filósofos perceberam que a maneira como se conhece a
experiência humana não pode ser da mesma forma pela qual se conhece a
realidade física e biológica.
A realidade humana é conhecida por meio de dois aspectos: intuitivo por meio
dos sentidos e pelo sistema de integração significativo que integra as informações
recebidas dá uma ordem e significado ao objeto em sua totalidade.
Primeiramente o Ser entra em contato com o objeto por meio dos sentidos e
apenas alguns aspectos do objeto são percebidos, devido às próprias limitações dos
órgãos do sentido.
Pode-se concluir que o humano jamais dispõe de verdades absolutas
(RANSON, 1975). O ato de conhecer se completa com a integração significativa que
realiza uma síntese do objeto parcialmente percebido, porém referido como objeto
total.
Quando a atenção se volta para o que está sendo conhecido pela
consciência, o que se está captando já não é mais o objeto tal como ele se
apresentou, mas sim como a consciência o vivenciou naquele determinado
momento.
A consciência é comumente influenciada pelas prévias experiências a
respeito de determinado objeto. Então, o que comumente a consciência apreende
não é o objeto, mas sim o objeto misturado aos julgamentos prévios sobre objetos
semelhantes que a consciência já havia apreendido anteriormente.
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44
Consciência e objeto estão diretamente relacionados nesse processo de
conhecer. Pois não existe consciência sem objeto e o contrário também é verdadeiro
(HEIDEGGER, 2005).
A consciência tem sempre uma intencionalidade. Os fenômenos são descritos
tais como a consciência os percebe. Para que o fenômeno possa ser apreendido
com mais fidedignidade é feita a redução fenomenológica ou epoché, ou seja, todo
juízo prévio a respeito do objeto deve ser colocado entre parênteses (FRANÇA,
1989).
Este método permite uma apreensão mais fidedigna do objeto pela
consciência. Há uma preocupação em diminuir ao máximo os níveis de
contaminação da consciência por julgamentos anteriores ou por concepções
pessoais a respeito do objeto.
Este método exige do indivíduo a capacidade de se abrir para o novo.
A fenomenologia foi o método que alguns pensadores encontraram para
melhor apreender a experiência vivida e suas significações. Acredita-se que não é
possível compreender a experiência humana por uma relação de causa e efeito,
reduzindo-a a leis, princípios ou conceitos gerais, mas é realmente compreendida
quando descrita em sua singularidade, tal como ela se apresenta na consciência do
sujeito que a experienciou.
Constatou-se que é impossível se chegar a uma verdade absoluta para
qualquer ramo do conhecimento humano. Já que esta é uma busca interminável, a
qual pensadores concordam entre si, discordam, se completem e se contradizem.
Os pensadores da corrente existencial fenomenológica apresentaram uma
profunda preocupação acerca do enigma de como o conhecedor conhece o
cognoscível.
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45
Em que medida as características dadas ao objeto realmente pertencem a ele
ou à mente de quem o percebe. Quais são os elementos objetivos e subjetivos do
conhecimento (HEIDEGGER, 2005).
A corrente fenomenológica não privilegia nem o sujeito e nem o objeto, mas a
relação entre ambos. Sujeito e objeto, consciência e o mundo, são determinantes
um do outro, há uma relação de dependência mútua.
A consciência é vista como tendo sempre uma intencionalidade, é voltada
sempre para algo que não ela mesma. É a ligação do homem com o mundo.
A Psicologia Existencial não é uma escola psicoterápica, não possui um corpo
de técnicas psicoterapicas suficientes para isso, tão pouco tem a pretensão de o ser.
É mais uma atitude, uma postura diante do fenômeno humano. Contudo,
pode-se considerar que suas orientações têm conseqüências terapêuticas, uma vez
que a verdadeira atitude de querer acolher, conhecer e compreender a experiência
do ser gera conseqüências benéficas (MAY, 1980).
Na Psicologia Existencial todas as descobertas e estudos científicos são
considerados. No entanto, o conhecimento é sempre usado sob as bases
existenciais de respeito e aceitação a complexidade e singularidade da existência
humana.
Não há a tentativa de subjugar o humano aos conhecimentos científicos até o
momento disponíveis, uma vez que a ciência está subordinada ao ser. A ciência é
feita para o ser humano e não o contrário. Não é a existência humana que deve se
moldar aos conhecimentos científicos, em uma tentativa de enquadramento sócio-
cultural.
A ciência é criada por pessoas, é também impregnada de influências sócio-
econômico-culturais e por isso passível de erros, modificações ou reorganizações. O
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ser humano na tentativa de se reduzir as explicações disponíveis até o momento
está sujeito a adoecer por talvez não conseguir dar-se um significado a si mesmo.
É fundamental para saúde mental que o indivíduo se aproprie do seu próprio
existir, construindo suas significações que podem ou não estar em consenso com a
ciência. Isso não significa que o sujeito deva usar de má-fé, tentar viver de ilusões e
fantasias ou ainda persistir em significações inadequadas ou desproporcionais a
realidade.
Ser sujeito de sua própria existência é um ato de muita responsabilidade e
coerência com a sua realidade. Ninguém melhor do que o próprio indivíduo para
apreender e dar significado a sua realidade. Isso não significa dizer que a existência
não seja passível de compreensão e explicações teóricas.
É fundamental que as explicações venham depois do objeto ter sido
conhecido como ele realmente é. As explicações teóricas são indispensáveis ao
profissional, mas é importante ressaltar que elas não interessam ao sujeito, saber
explicações sobre ele não modificam sua condição existencial (ANGERAMI-CAMON,
2007).
Ao indivíduo interessa de modo geral ser acolhido, compreendido e ser
ajudado na elaboração de suas experiências, segundo as suas próprias verdades. O
indivíduo experiência a vida e também experienciado por ela, ou seja, o Ser é
sujeito, mas também é objeto no mundo, faz escolhas e também é escolhido.
A psicoterapia é vista como processo de libertação e crescimento do Ser que
é sujeito e também é objeto.
O Ser não existe sozinho no mundo, em contato com outras consciências ele
pode ver como é percebido por elas. É preciso que uma outra consciência
reconheça o Ser como tal, somente assim ele sente-se existindo de fato.
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As consciências lutam entre si para serem reconhecidas uma pelas outras. É
no confronto com outro que se assegura a individualidade. Seja qual for o olhar do
outro, este pode petrificar o sujeito, paralisando em seu devir.
A pessoa que não conhece sua existência cria uma dependência patológica,
na qual o outro é quem sabe e determina o que ela é e pode “vir a ser”. O “ser para
o outro” é estrutura essencial da consciência, no entanto é necessário que antes
esta se reconheça ou pode perder-se em meio as outras consciências (XAUSA,
1986).
Em contato com outras consciências ao não se ter uma relação
suficientemente intima com quem se é, corre-se o risco muito grande de se perder
entre as outras consciências, tornando-se um estranho para si mesmo.
Caso isso aconteça a pessoa é invadida por sentimentos de culpa por não ter
conseguido se apoderar de sua existência, vazio por não se reconhecer enquanto
individuo, também o desespero e apatia são conseqüências de uma vida inautêntica
(MAY, 1987).
A falta de autoconsciência leva a despersonificação, provoca um sentimento
de futilidade e incapacidade, pois a pessoa se percebe não sendo capaz de fazer
algo realmente verdadeiro por ela mesma.
Uma vez que a ela já não se reconhece mais, não conseguirá mais identificar
os seus verdadeiros desejos, sentimentos, crenças e valores. É comum que
escolhas incongruentes sejam feitas, o que gera ainda mais sentimento de
incapacidade e perda de confiança em si mesma.
A falta de contato consigo mesmo também gera a sensação de vazio e tédio.
O vazio e a solidão caminham juntos. Pessoas em fase de mudança ou enfrentando
crises percebem a dificuldade que é não ter consciência de si mesma, pois nesses
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momentos a pessoa se dá conta de que convicções sociais não são o suficiente
para orientá-las e lhes dar segurança.
Sentem um vazio e uma solidão em meio ao que está vivendo, sente-se em
perigo, fragilizada e sem saber o que fazer (LESSA, 1998).
Quanto mais autoconsciência a pessoa tem de si mesma, de suas
potencialidades, limites, condições existenciais e desejos, maior é o sentimento de
identidade integrada do sujeito.
Identidade não é um conceito estático, a identidade acompanha as
experiências vividas do individuo, mais importante do que viver é como viver e para
que se deseja viver determinadas experiências.
Autoconsciência aumenta a liberdade, pois amplia a capacidade de escolhas
mais autênticas. Quem se conhece, conhece sua realidade e não se coloca nela
como uma vitima aumenta a capacidade para conquistar realizações em sua vida.
A Psicologia Existencial enfatiza o conceito de identidade e da experiência de
identidade que todo ser humano vive. O Eu é visto como uma sede de valores que
dão respaldo para pessoa circular na vida.
Também são estudas as aspirações humanas e suas limitações. O ser
humano divide-se entre o que a pessoa é, o que ela gostaria de ser e o que ela tem
potencial para ser e isto está intimamente ligado a questão da identidade.
Questiona-se quais são as forças determinantes para uma escolha e quais são as
forças bloqueadoras para outras.
As forças citadas referem-se, não somente aos nossos impulsos, instintos e
genética, mas tudo aquilo que em determinado momento influencia no projeto de Ser
de uma pessoa (ANGERAMI-CAMON, 1984; FRANKL, 1990).
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Grande parte da ansiedade de nossos tempos deriva do medo de não ser
querido, viver isolado, ficar solitário, abandonado e por isso nos subjugamos muitas
vezes àquelas escolhas que nos parecem socialmente as mais aceitáveis ou as que
nos parecem serem as mais fáceis ou viáveis no momento.
Quanto mais se é capaz de enfrentar as dificuldades normais da vida, menos
ansiedade neurótica é sentida (MAY, 1988).
Ansiedade neurótica é a desproporcional ao perigo real e é resultante de um
conflito interno, é alimentada principalmente por nossas escolhas incongruentes. A
ansiedade destrói a autoconsciência, mas por outro lado quanto mais forte a
autoconsciência, mais autênticos conseguimos ser e menos ansiedade neurótica é
sentida.
O sentimento de incapacidade gera muita ansiedade neurótica e na tentativa
de se defender e neutralizar o desconforto e sofrimento, a pessoa pode desenvolver
como autodefesa apatia e embotamento afetivo.
Dessa forma o indivíduo não sente desconforto, mas tão pouco sente prazer,
torna sua existência uma morte em vida.
A Psicologia Existencial desafia e questiona o Ser exatamente na raiz de seus
projetos de vida. O enfoque é na experiência vivida, independente se o que é vivido
é real ou não para outras pessoas.
Procura tornar possível que a pessoa se torne auto-consciente do seu “aqui e
agora”, possibilitando que escolhas autênticas sejam feitas.
May (1980) define o encontro entre o psicólogo e o cliente, não como sendo
um encontro agradável e casual, sem objetivo, mas sim é um encontro estruturado
profissionalmente subordinado a práticas teórico-técnicas, já validadas, porém
relembra que antes de mais nada é um encontro entre dois seres humanos.
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50
Nesse encontro a pessoa revive muitas experiências tristes, difíceis e
delicadas, se propõe a refletir sobre coisas que se não fosse por esse encontro ela
jamais enfrentaria sozinha.
É fundamental para pessoa sentir-se acolhida e compreendida em seu
sofrimento, sentir que não está sozinha. Ter a certeza que dispõe de um profissional
que irá fazer esse caminho junto com ela, lado a lado.
Nessa relação genuína e estruturada que o trabalho do psicólogo deve
acontecer. Somente assim, resultados significativos poderão ser atingidos. O
psicólogo para conseguir apreender e compreender o seu cliente precisa antes de
tudo ter o verdadeiro desejo de conhecê-lo e respeitá-lo enquanto sujeito da sua
própria existência.
Cada pessoa demanda do psicólogo uma postura e compreensão únicas. As
pessoas são diferentes em suas experiências e no significado que cada uma oferece
a estas.
O profissional deve ser sensível a isso e jamais subjugar o outro as suas
próprias concepções ou desejos a respeito da vida. Portanto, é sensato e ético que
as verdades e escolhas de vida sejam construídas pela própria pessoa.
O psicólogo ajuda a revelar aquilo que até então se encontrava obscuro ou
mal resolvido e somente a pessoa cabe escolhe o que deseja fazer dela mesma.
A pessoa ao procurar um psicólogo guarda em seu íntimo o desejo de
melhora e só irá se submeter ao doloroso processo psicoterápico caso ela tenha o
mínimo de esperança e confiança de que esse encontro poderá lhe render
benefícios. Sobre essa relação May (1980, p 13) diz:
[...] nenhuma pessoa submeter-se-á ao doloroso processo de desvendar os níveis mais profundos de seus conflitos, suas
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angústias, seus anseios – não a uma outra pessoa, certamente e raramente a si mesma – a não ser que por esse processo ela tenha alguma esperança de superar seus bloqueios e aliviar seu sofrimento(MAY, 1980, p. 13).
A Psicologia Existencial preocupa-se em compreender não somente o que há
de doente, de problemático, de sofrimento na pessoa, mas também o que há de
saudável, positivo e criativo no ser humano.
Admite que o modo como o ser humano pensa não muda alguns fatos
limitadores e rudes da vida, mas muda muito a forma como estes são vividos e a
direção que é dada a própria vida.
Nessa realidade reside a liberdade, criatividade e finitude humana (SARTRE,
1970; TULKU, 1997).
A Psicologia Existencial trabalha conceitos como responsabilidade, liberdade,
escolhas, auto-criação, autonomia, amor, altruísmo, culpa, coragem, vontade,
empatia, intuição e finitude. Interessa-se por assuntos ontológicos ao ser, realidades
que acometem todos os seres humanos.
Estuda a saúde, o ser humano ideal, autêntico ou perfeito. Faz um amplo
estudo das potencialidades humanas, do que há de positivo no Ser. Interessa-se
muito pela saúde e o que isto vem a ser na prática da existência humana.
Estudar o que é comum nos seres humanos, não é o mesmo que estudar o
que é adotado como normal. May (1980) alerta que o “normal” em psicologia pode
ser uma psicopatologia da média, tão amplamente difundida que nós nem mesmo
estranhamos. O estudo da pessoa autêntica e do viver autêntico ajuda no
questionamento do é que é tido como “normal”.
A pessoa autêntica é alguém que assume uma nova relação com a sociedade
em geral.
É uma pessoa que transcende a si própria e a sua cultura. This document was created by the trial version of Print2PDF. !
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52
É mais desvinculada dos padrões sócio-culturais, faz suas escolhas baseada
no que realmente acredita e não naquilo que uma determinada época dita como
comportamento padrão.
Não é uma pessoa alienada consigo mesma, tem muita autoconsciência e
coloca-se no mundo e nas suas relações carregando este carimbo.
Não é irresponsável ou rebelde é apenas uma pessoa que acredita e respeita
sua própria existência e também a experiência de existir do outro.
A autenticidade está intimamente relacionada com a aceitação da
responsabilidade com o próprio existir.
A liberdade e também obrigação de escolher não é vista como um fardo, mas
como um privilégio. A pessoa autêntica tem uma visão ampliada dos valores de vida
que a embasam, tem muitos sentidos do porque e para quê viver e está sempre que
necessário atualizando esses sentidos.
É uma pessoa que tem consciência do seu projeto de “vir a ser”, aceita sua
condição de ser finito e sozinho, aceita o preço que o viver impõe que é a angustia
de ter que se escolher a cada minuto e por isso correr riscos.
A pessoa autêntica reconhece e acolhe vida e morte como forma de existir.
O homem é um ser que só existe no contexto de suas realizações. Necessita
dar um sentido ao que vive. Na busca pelas diversas significações e sentido da sua
existência o ser humano abre a possibilidade para seu desenvolvimento e
realizações.
Questões como: o que é a vida, quem sou eu, o que estou fazendo, para que
vivo que relação existe entre mim e as coisas, são algumas questões que permeiam
o pensamento humano.
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53
Há a busca pelo sentido, e este não pode ser qualquer um, mas um que faça
a vida valer a pena, que faça com que o ser valha a pena. Ainda hoje, apesar de
todos os avanços tecnológicos o ser humano ainda não conseguiu encontrar o
sentido para sua existência e parece se afastar cada vez mais dessa resposta
(FRANKL, 1990; ANGERAMI-CAMON, 1984).
O sentido da vida é a propulsão motivacional da existência.
A pessoa desprovida de um sentido de vida pode ser considerada
existencialmente morta. O homem ao longo de sua existência deve renovar seu
sentido e significado de vida, acompanhando o seu desenvolvimento.
O sentido de vida que é capaz de dar a existência dignidade, plenitude e
beleza. Sem um sentido de vida o homem se envolve de tal forma nas agruras da
vida que se torna incapaz de superá-las (FRANKL, 1990).
É fundamental que o projeto de “vir a ser” esteja em congruência com as
verdades da pessoa. As realizações devem ser conseqüências da adequação do
que se deseja ser, do que se deseja alcançar e do sentido que se dá a tudo isso que
é buscado. É importante saber não só o que é desejado, mas também para quê se
deseja.
A Psicologia Existencial compreende que a psicoterapia deve levar a pessoa
à libertação das situações e emaranhados existenciais que de alguma forma estejam
confinando as possibilidades mais plenas para uma existência satisfatória.
A psicoterapia está a serviço de cessar a coisificação do Ser. A libertação do
processo psicoterápico deve levar a pessoa ao reencontro com sua dignidade
existencial.
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4.2 CARACTERÍSTICAS ONTOLÓGICAS DO SER
O estudo existencial sobre o ser humano só tem significado se este for
colocado no contexto de ser existente, de ser vivo. Há um profundo interesse em
estudar as qualidades ontológicas da raça humana.
Primeira característica é que toda pessoa é centrada em si mesma, e um
ataque a este centro é um ataque à sua própria vida. Entender esse conceito
proporciona o entendimento de como a Psicologia Existencial encara a constituição
e a dinâmica da doença e da saúde na pessoa.
A neurose é vista como uma forma inadequada que a pessoa encontra para
preservar seu próprio centro, uma maneira ineficiente para se proteger das ameaças
que perturbam sua existência.
É o recurso que a pessoa por alguma razão dispôs em determinado no
momento para adaptar-se a sua realidade. Atacar a neurose é atacar a própria
existência da pessoa.
Não se pode desejar tirar a neurose que mantém a centralidade da pessoa,
sem antes esta ter encontrado alternativas de vida. A pessoa, antes de tudo, precisa
conseguir viver a partir de outras formas mais funcionais, caso contrário não
desejará mudar (MAY, 1980).
Segunda característica ontológica é que toda pessoa tem o caráter de auto-
afirmação, a necessidade de preservar sua centralidade e tê-la reconhecida.
Nos seres humanos o ser nunca se dá automaticamente, mas depende de
sua coragem e criatividade para o ser, caso contrário ele perde-se em si mesmo e
jamais chega a acontecer realmente.
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Coragem e criatividade para ser são qualidades que a pessoa precisa para
manter sua auto-afirmação e é por meio da auto-afirmar é veiculo necessário para o
ser que constrói a si mesmo (MAY, 1987; LESSA, 1998).
Terceira característica é que toda pessoa tem a necessidade de sair de sua
centralidade e participar da vida de outros seres, mas se o organismo vai muito
longe ele perde sua centralidade, sua identidade.
É o que acontece muitas vezes quando a pessoa envolvida por um grupo ou
sociedade já não sabe mais quem é, acredita ser o grupo, perde-se entre os seus
membros e fica tão voltada para fora que esquece de seu próprio centro.
Ao abandonar-se a pessoa tem seu centro invadido pelo vazio existencial.
Quarta característica é que todo ser humano tem em sua percepção uma
parte que apreende a realidade subjetivamente e outra parte apreende a realidade
objetiva.
A percepção é vista como a parte que vigia o Ser, percebe as possíveis
ameaças a sua existência (HEIDEGGER, 2005).
Quinta característica é a autoconsciência, característica exclusivamente
humana. Percepção e autoconsciência não são a mesma coisa. A consciência é a
capacidade do ser de se auto-reconhecer como pessoa no mundo.
Por meio da autoconsciência o ser é capaz de transcender a situação
concreta imediata. A liberdade psicológica tem sua base ontológica na
autoconsciência (FALCI, 2001).
Sexta característica é a ansiedade. Este é o estado do ser humano que luta
contra o que poderá destruir seu ser. É um conflito entre o ser e o não-ser. O ser é a
possibilidade de existir concretizada e o não-ser é a possibilidade de não existir de
alguma forma concretamente.
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Uma vez finitos sempre precisamos estar escolhendo ser algumas coisas e
escolhendo não-ser outras. Muitas vezes essas escolhas se tornam muito difíceis de
serem vividas. O não-ser existe justamente nesse abismo entre as potencialidades e
a realidade, entre projeto de um eu ideal e o eu real que é concretizado na realidade
(MAY, 1980; 1988).
A ansiedade saudável é o desconforto necessário que o ser sente quando
tem que escolher, e é justamente para se livrar dessa ansiedade que o ser se
movimenta no mundo em busca de escolhas que lhe coloquem novamente numa
situação confortável e assim sucessivamente.
Nossas escolhas não são sem preço, nos custam a coragem de nos
lançarmos ao desconhecido e responsabilizarmos tanto pelo nosso ser quanto pelo
não ser que assumimos ao escolher.
Porém, é um exagero dizer que o eu é formado inteiramente pelas escolhas
da própria pessoa, sabemos que outros fatores influenciam na construção do Eu
como a genética, educação, situação econômica, por exemplo. Influenciar não é de
forma alguma o mesmo que determinar o destino do Ser.
4.3 PSICOLOGIA EXISTENCIAL, PERDAS E MORTE
A morte é algo inevitável e intransponível.
Várias perdas são vividas ao longo da vida até que a morte aconteça. A morte
só ocorre uma vez, porém o sentido de sermos para um fim ocorre a todo minuto.
Não se morre somente fisicamente, também pode ocorrer morte psicológica sem que
o corpo necessariamente morra junto.
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57
A Psicologia Existencial coloca a morte no centro da existência, a finitude é o
que lhe confere significado e valor. A morte não é vista como uma etapa isolada da
vida, ela é uma realidade que acompanha o ser diariamente, bem como uma forma
de existir.
Negar a presença da morte é empobrecer a própria existência (ERTHAL,
1998).
O projeto de “ser no mundo” é grandemente afetado pela finitude.
A limitação temporal e espacial influencia na construção do “vir a ser” do
sujeito. Ter consciência da possibilidade de não existir desperto o indivíduo para a
responsabilidade que é viver seu “aqui e agora”.
As pessoas passam a perceber que a vida somente acontece de fato no
presente e que não haja todo tempo do mundo para aproveitar a própria vida e tudo
que a acompanha.
Nada na vida é eterno, tem-se a chance de escolher dar valor para a vida
enquanto ainda ela é presente ou deixar que ela escape por entre os dedos das
mãos, sem jamais tê-la experienciado realmente.
A finitude é estrutura da consciência que determina a liberdade. Não há outra
forma de existir senão a de ser livre para escolher. A própria escolha trás em si sua
marca da finitude, as escolhas são finitas em sua possibilidade, não se escolhe
indiscriminadamente, existem possibilidades de escolhas.
O desespero marca o morrer, principalmente, quando se percebe que já não
há mais tempo para escolher viver outra vida. Escolhas autênticas confortam e
consolam a pessoa na medida em que esta se percebe tendo escolhido se envolver,
se comprometer com a vida de forma integra, inteira, tentando fazer o melhor que
lhe era possível no momento.
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Optar por escolhas autênticas dá a sensação de dever cumprido dentro das
possibilidades de sua realidade (KUBLER-ROSS, 2005; XAUSA, 1986).
Em momentos de crise quando uma perda é sofrida ou quando se enfrenta a
própria morte as convenções sociais, as escolhas que não são autênticas não são
suficientes para consolar, orientar e reerguer o Ser.
Tudo que não seja realmente verdadeiro perde o sentido, se esvai em meio a
tal realidade. A morte é uma experiência profunda que causa muita dor, mas
também faz crescer.
Heidegger (2005) diante da possibilidade de morte, o Ser experimenta
angústia, pois a morte o coloca diante da possível impossibilidade de sua existência,
o coloca na presença do nada.
É por meio do contato com a morte que o Ser compreende-se em sua
totalidade e pode escolher viver uma existência autêntica. A pessoa se torna mais
consciente de si e a existência ganha um significado muito mais amplo e claro.
Diante do nada as fantasias, ilusões e tudo aquilo que diariamente nubla a
consciência desaparece. Frente o nada a pessoa pode sucumbir ao desanimo e
desespero ou escolher emergir de forma autêntica.
Grandes perdas e principalmente a morte revela quem realmente se é.
Comumente a consciência é ofuscada para que as questões mal resolvidas não
sejam enfrentadas a todo momento.
É como se diariamente a consciência fosse entorpecida, amortecida para que
os conflitos não fossem vivenciados constantemente. Essa é uma reação natural e
saudável quando não usada em exagero, pois não é possível viver constantemente
confrontando as questões mal resolvidas.
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Viver sem nunca confrontar os conflitos e tão doentio quanto querer viver
integralmente centrado nos próprios conflitos. Um equilíbrio precisa existir entre a
experiência de vida e de morte. A vida precisa ser celebrada e também as perdas
significativas e a morte precisam ser acolhidas, refletidas e superadas (MAY, 1980;
VIORST, 2005).
É necessário que as pessoas tenham consciência suficiente de si mesmas e de sua existência, só assim terão autonomia para escolherem como querem viver e morrer. O ser humano está sempre nascendo e morrendo, é fundamental poder ter uma compreensão de como essas realidades podem ser acolhidas. Ter consciência do “aqui e agora” é imprescindível para o melhor aproveitamento da existência. As perdas e a morte são experiências necessárias para o desenvolvimento, elas colocam cada pessoa mais em contato consigo mesma no “aqui e agora”. Aceitar morrer é requisito necessário para viver novas experiências (ANGERAMI-CAMON, 2001; KELEMAN, 2005).
Diante das perdas e da morte há algumas possibilidades de escolhas. Apesar
de toda dor sofrida a pessoa pode escolher recomeçar a sua vida buscando seus
reais interesses, redescobrir-se novamente, fortalecer-se enquanto indivíduo e dar
um novo destino à sua vida, ou pode escolher tentar não viver os seus conflitos,
estabelecendo relações com as pessoas, com o trabalho ou com qualquer outra
coisa de forma a usá-los para fugir de seus conflitos, se esquivando do confronto
com suas perdas e morte.
Manter pseudo-relações só fragiliza ainda mais a pessoa, só aumenta sua dor
e o seu desespero frente à vida.
É muito valido poder dividir as dificuldades, sofrimentos e questões mal
resolvidas com as pessoas que se gosta e confia. O que não é indicado é deixar que
as escolhas da própria vida sejam feitas por outras pessoas quando a pessoa pode
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Escolhas autênticas promovem saúde na medida em que elas colocam o ser
no mundo de forma mais integra e verdadeira. Por meio das escolhas acontece a
construção da identidade de cada pessoa Cada escolha leva a um destino diferente.
A individualização é um dos requisitos para que o sujeito se torne construtor
de sua própria vida. As pessoas, o trabalho, lazer e tudo na vida não podem servir
de fuga para as dificuldades. Não se pode fugir a responsabilidade de viver seu
próprio existir.
Vida e morte precisam ganhar um sentido, mas este só acontece por meio da
autoconsciência, criatividade e coragem para existir por meio de escolhas
autênticas.
A morte psicológica é o fim de uma possibilidade de vida saudável, muitas
vezes por conflitos mal resolvidos a pessoa abandona sua própria existência, se
nega a viver de fato.
Deixa de experimentar o sentimento de coesão do Eu, deixa de sentir sua
própria identidade e autonomia, aniquila a vida por meio da negação de si mesma.
Diante do temor de viver o não-ser e pela angústia que é viver a pessoa se refugia
numa existência inautêntica.
Esta é uma tentativa de evitar confrontar-se de maneira responsável com sua
finitude e o preço pago por isso é o de viver uma morte psíquica. Nesses casos a
pessoa deixa de dar-se um próprio significado, não tem um sentido de vida e
entrega toda a responsabilidade de sua existência para o outro.
Este passa a lhe dar um significado e um sentido. A pessoa se larga ao
coletivo e já não vive a própria existência, vive somente o que o outro lhe determina,
vira objeto de escolha do outro.
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No movimento de fuga a pessoa tem um ganho imediato que é o de isentar-
se de sua responsabilidade de viver e resolver a sua própria vida. Aparentemente
evita todo desconforto e dificuldades que o auto-crescimento exige do Ser.
Por outro lado, a pessoa não se desenvolve, perde ainda mais a
autoconsciência, gera mais sentimento de incapacidade, desconfiança de si mesma,
ansiedade, sentimento de vazio, tédio e solidão.
Esses sentimentos costumam levar as pessoas ao desespero e a apatia
(HEIDEGGER,2005; ERTHAL, 1989).
Quando a própria morte é vivida muitas despedidas são feitas e essas não
acontecem sem sofrimento. A pessoa vive a perda da identidade corporal,
identidade social, do trabalho, da autonomia, das relações afetivas e da privacidade,
esta última ocorre principalmente quando a morte ocorre em hospitais e a pessoa
tem seu corpo manipulado por equipe de saúde e invadido por procedimentos
médicos muitas vezes dolorosos.
Na despedida com a vida a pessoa pode ser invadida por sentimentos de
raiva, medo, revolta, profunda tristeza e desespero. Todos esses sentimentos ainda
se associam com o medo da dor, da deteriorização do corpo e da mente.
A pessoa vive um sofrimento psíquico e físico, talvez mais terríveis que a
própria morte A morte é um fardo pesado demais para quem a enfrenta. Ser
acolhida e estar junto das pessoas queridas é imprescindível para que o morrer
aconteça com dignidade (ANGERAMI-CAMON, 2004; 2002).
Uma crise interna é vivida quando se acompanha a morte de um ente querido
ou quando por outras razões se perde algo ou alguém. Perder alguém querido ou
algo estimado é também perder partes de si mesmo, quanto mais importante e
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enraizado este alguém ou objeto estiver na pessoa mais sofrimento, dor e sensação
de morte em vida é experimentado.
Diante desse contexto há a necessidade de se adaptar a nova situação,
deixando que este alguém ou algo morra dentro de você e também aceitar que você
morrerá para este outro.
Morrer e deixar morrer em vida são realidades duras somente podem ser
superadas quando a pessoa se permita viver a experiência do luto. Este é o tempo
necessário para que a perda possa ser aceita, chorada e devidamente cicatrizada.
A superação luto ocorre quando a pessoa consegue preencher com vida o
espaço no qual havia morte (BOWLBY, 1997; VIORST, 2005).
Somente quando se tem consciência de si mesmo, dos seus desejos,
sentimentos e valores é que a pessoa consegue discernir como realmente deseja
existir.
Autoconsciência, criatividade e coragem de ser fornecem a clareza e força
necessária para que a pessoa consiga superar as dificuldades da vida e se orientar
em busca de seus objetivos.
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5 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA EXISTENCIAL NO ENFRENTAMENTO
DAS PERDAS E DA MORTE
A Psicologia Existencial não tem formulas ou um corpo de técnicas para
oferecer no enfrentamento das perdas e da morte. Porém, isso não diminui o valor
da sua contribuição diante desses eventos, uma vez que a Psicologia Existencial
oferece uma compreensão aprofundada sobre a existencialização das mesmas, e
ainda nos convida a refletir sobre temas e questões humanas de fundamental
importância para o nosso existir, ainda oferece baseada em seus estudos posturas e
atitudes que podem contribuem muito no enfrentamento da vivencia do luto que as
perdas e a morte impõe a todos.
Tais posturas não precisam ser adotadas apenas por profissionais que estão
em contato com essas questões, mas podem e ser muito úteis para qualquer ser
humano que tenha interesse em aprender mais sobre si, sobre o outro e sobre o que
é existir.
A Psicologia Existencial se propõe a descrever na integra os eventos que
assolam a existência humana e ainda desperta o ser para uma reflexão a respeito
de seu existir que é uma interação com a vida e a morte.
O psicólogo enquanto profissional que trabalha diretamente com as questões
que envolvem as perdas e a morte pode contribuir de diversas formas.
Nessas situações o acolhimento, respeito e bom senso são fundamentais,
além dos conhecimentos teórico-técnicos a respeito do assunto.
O psicólogo é o profissional que por sua formação está ou deveria estar
capacitado para acolher e oferecer alternativas de enfrentamento para os que
sofrem. O psicólogo para estar apto para esse papel deve estar não só preparado
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teórico e tecnicamente, mas também já ter suas questões sobre finitude
satisfatoriamente resolvidas, bem como as questões que envolvam aceitar a finitude
do outro (KOVÀCS, 1992).
As perdas trazem em si o espectro da morte, portanto também envolvem
questões relacionadas a nossa finitude. As perdas podem ser por doenças, por
separações, mudanças ou mesmo pelas cristalizações de comportamento.
É imprescindível estar atendo para o fato de que cada perda carrega
especificidades, cada pessoa as experiência com os recursos que lhes são
possíveis no momento e outros vários aspectos precisam ser avaliados antes de
uma intervenção. Ter uma atitude de realmente querer conhecer e compreender a
experiência do ponto de vista de quem as vive, ajuda o psicólogo a se aproximar da
realidade do paciente e dessa forma poder ajudá-lo (VIORST, 2005; CAMON, 1984).
Em casos de perdas, as intervenções acontecem em diversos níveis e são
trabalhadas as mais variadas questões que envolvem a experiência da perda. Para
viver o processo de luto a pessoa precisa aceitar a realidade da perda.
Ao passo que a pessoa entra contato com o seu sofrimento vão sendo
trabalhadas a expressão das dores. Expressar a dor e conseguir refletir sobre ela
ajuda a pessoa a dar um significado e um destino mais adequado ao sofrimento.
Este é um trabalho muito delicado, pois envolve muito sofrimento e por isso grandes
cargas emocionais estão presentes na intervenção.
Toda a vida da pessoa de modo geral é tocada por esta dor. As perdas
trazem a tona com mais força as questões mal resolvidas, os medos e as culpas
mais primitivos que existem em nós.
Muitas questões precisam ser re-significadas e o papel técnico do psicólogo é
tornar possível e suportável essa reforma interna (WORDEN, 1998).
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65
O papel humano do psicólogo é o de manter sempre sua postura de respeito,
compreensão e acolhimento com os que sofrem. É difícil, por exemplo, para uma
mãe entrar no quarto do filho e ver que ele nunca mais vai estar ali.
Viver a ausência de alguém amado é também ter que morrer um pouco. A
morte de quem se ama deixa marcas, estas podem ser tão profundas que a pessoa
enlutada talvez não consiga de fato cicatrizar este ferimento.
O papel do psicólogo é acolher e sempre trabalhar em prol da saúde
psicológica da pessoa. No entanto, por mais que se faça um trabalho de boa
qualidade isso não é garantia que a pessoa conseguirá superar suas agruras.
O psicólogo não deve manter expectativa em relação ao cliente, haja vista
que expectativas a mais em cima da pessoa só tornaria sua existência ainda mais
difícil. A pessoa nesse momento precisa ser acompanhada em seu sofrer, sentir que
não está sozinha e que pode contar com alguém capacitado para refletir junto com
ela suas inúmeras questões mal resolvidas.
Os resultados poderão surgir como conseqüência desse encontro que deve
ser genuíno e despretensioso.
Há certos tipos de perdas que levam a um tipo especial de luto como, por
exemplo, o suicídio. Nesse caso um alto grau de culpa e rejeição comumente estão
presentes nas famílias.
Sentimentos de que poderia ter sido feito algo para evitar tal realidade se
chocam com sentimentos de raiva em relação ao morto por este ter causado
tamanho sofrimento a eles e ainda tê-los colocado numa situação socialmente
discriminada, como se a família não tivesse sido capaz de impedir o acontecimento
(ANGERAMI-CAMON, 1984).
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O aborto é outro tipo de perda que indica um luto especial, primeiro porque é
uma perda carregada de auto-censura mesmo que tenha sido espontâneo. E se o
aborto foi provocado pode haver muito mais dificuldade de ser elaborado, pois está
enquadrado entre as perdas socialmente negadas, principalmente em países como
o nosso em que o aborto é crime.
Outro tipo de perda de difícil resolução é a morte com ausência do corpo.
Nesse caso fica a sensação de que a qualquer momento a pessoa perdida poderá
reaparecer.
Outro tipo de perda que leva a um luto mais dificultoso é a morte por
assassinato. Quando o assassino continua solto após cometer o crime, dificilmente a
família ou o ente mais atingido conseguirá entrar no processo do luto.
É comum que o desejo de vingança ou justiça suprimam os outros
sentimentos em relação à perda. Nesses casos a aceitação da morte é muito mais
difícil, pois as pessoas não entendem a morte nesse caso como algo inevitável, ao
contrário, a morte fica vinculada à interrupção por violência.
Aceitar viver o luto pode parecer ter que aceitar a violência que o ente morto
sofreu.
As perdas por separações, caracterizam-se por haver uma morte simbólica
entre vivos e uma perda muitas vezes vivida como fracasso. Nesse caso a pessoa
para superar o luto precisa mais do que aceitar a perda e desejar preencher o
espaço que ficou com a partida do outro, é fundamental que a pessoa consiga
perdoar-se por esta perda e perdoar aquele que se foi.
Muitos ressentimentos, magoas, desilusões estão presentes nesse luto.
O perdão é o veiculo para a superação, mas para que a pessoa consiga
perdoar-se e perdoar o outro é antes necessário que muitas questões sejam re-
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significadas. É preciso que a pessoa se sinta capaz de viver experiências novas com
a esperança que estas possam ser satisfatórias para que ela realmente se lance na
vida outra vez (PINCUS, 1989).
Na doença, principalmente nas mais graves, muitas perdas podem estar
envolvidas. Quando o doente necessita de hospitalização algumas questões são
muito importantes de serem investigadas e avaliadas para que possa haver uma
intervenção psicológica.
É fundamental para o psicólogo compreender os aspectos psicodinâmicos do
adoecer e as reações emocionais envolvidas no processo. Conhecer o tipo de
doença que a pessoa enfrenta, como ela se instalou, em que momento da vida e
quais as modificações que houve na vida e no ambiente da pessoa nos períodos
anteriores e posteriores a doença (ANGERAMI-CAMON, 2001).
A doença suscita o aparecimento da angústia de morte; sensação de
aniquilamento, medo de perder as partes do corpo, de perder os afetos, objetos,
lugares e situações de vida significativa.
Também é freqüente o medo do abandono, solidão, perda da autonomia,
medo de ficar a mercê dos outros, medo de ser um incomodo, medo da perda do
controle físico e mental, a pessoa ainda pode ter medo de perder a imagem que está
habituada a identificar-se e dessa forma também perder o amor das pessoas
(KUBLER-ROSS, 2005; VIORST, 2005).
As reações emocionais e comportamentais mais comuns ligadas a angústia
de morte são: ansiedade de separação, sensação de pânico, impotência, culpa e
medo de retaliação como se a doença fosse um castigo pelos maus
comportamentos, apresenta sentimento de menos valia, baixa auto-estima, raiva,
negação, regressão, sentimento de abandono e desamparo, despessoalização,
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fantasias mórbidas em relação a doença e sua situação vividas, dentre outras
reações (ANGERAMI-CAMON, 1998; ISMAEL, 2005).
O objetivo do psicólogo no hospital é garantir tratamento humanizado ao
paciente e seus entes por que equipe de saúde diante de suas responsabilidades
biológicas diante do morrer podem por vezes vir a esquecer o quão humano é o
processo do morrer.
Humanizar o tratamento é consequentemente diminuir sofrimentos
desnecessários que o paciente possa vir a sofrer no contexto hospitalar.
O psicólogo além de auxiliar o paciente nas questões de cunho psicológico,
também deve contribuir junto ao paciente para a adesão ao tratamento, ajudando o
paciente, por exemplo, em algumas questões práticas como verificar sua rede de
apoio e ajudá-lo a se organizar de maneira a se sentir mais seguro e confortável no
hospital.
O trabalho no hospital sempre envolve a tríade paciente+família+equipe de
saúde. É um trabalho interdisciplinar em que o foco principal é a possível cura do
paciente e o seu bem-estar.
Como um membro da equipe o psicólogo também está a serviço de criar um
canal de comunicação mais simétrico entre esta tríade, facilitando a aproximação e o
vinculo de respeito e confiança.
Muitos conflitos podem aparecer nessa relação, é também papel do psicólogo
procurar estabelecer um dialogo verdadeiro e humanizado entre todos. Este trabalho
ajuda a diminuir muitas ansiedades, angústias, medos e fantasias do paciente
(ANGERAMI-CAMON, 2001; ISMAEL, 2005).
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É importante realizar uma avaliação psicossocial e um exame do estado
mental do paciente, a fim de conhecer a vida do paciente, e também avaliar quais os
processos mentais afetados pela a doença.
Esclarecer família e equipe sobre o estado psicológico da pessoa, esclarecer
as relações psicológicas que ela estabeleceu com a doença, com a equipe de saúde
e com e contexto hospitalar são procedimentos que o psicólogo pode fazer para
favorecer a comunicação e compreensão entre paciente-família-equipe (KOVÀCS,
1992).
Cada paciente acamado irá pedir um tratamento específico.
Pacientes deprimidos normalmente não verbalizam, demonstram sua
melancolia por meio do silêncio, apatia, isolamento e excessiva passividade diante
do tratamento.
Esses pacientes quando possível devem ser estimulados a falar,
movimentarem-se, expressarem suas angústias, preocupações e medos. Deve-se
tentar evitar que este paciente entre em depressão profunda, pois esse quadro
compromete a recuperação do paciente.
Outros pacientes podem apresentar comportamentos onipotentes, de
desprezo em relação ao tratamento e equipe. Estes pacientes normalmente causam
ressentimento e impaciência na equipe de saúde, por sentirem seus esforços
menosprezados.
Na verdade pacientes assim, têm muita dificuldade de entrar em contato com
sua impotência, sentem-se aterrorizados diante dessa realidade e usam como
defesa a onipotência.
Quanto mais onipotência mais impotência tem por trás. Falar das impotências
não é algo fácil, no entanto com um bom manejo o psicólogo juntamente com equipe
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podem criar um espaço que a pessoa se sinta segura para falar do quão frágil e
assustada ela pode estar se sentindo (KUBLER-ROSS, 2005; KOVÁCS, 1992).
O doente que permanece quieto e de olhos fechados muitas vezes não quer
dizer que ele não queira falar, talvez até já tenha feito tentativas e se deparou com o
medo e angústia no olhar do outro por não saberem se conseguiram escutar e
manter um diálogo verdadeiro com a pessoa que está morrendo.
Muitas vezes quando esta pessoa consegue falar, ela só irá dizer que se
sente sozinha (KUBLER-ROSS, 2005).
O tratamento que é oferecido deve sempre se adaptar as características
individuais de cada pessoa e também as particularidades que a situação apresenta.
O acolhimento e a escuta são dirigidos a todos os assuntos que a pessoa deseja
trabalhar.
O enfoque psicoterápico é aplicado somente àqueles casos em a pessoa
dispõe de condições físicas e mentais suficientemente fortes para suportar um
tratamento desse caráter.
Em casos em que a pessoa não cumpre com esses requisitos, por se
encontrar mais debilitada, o mais indicado são as Psicoterapias de Apoio, Breve e
Focais.
O trabalho nesses casos é centrado no acolhimento, suporte emocional,
diminuição das ansiedades e atenuação ou supressão dos sintomas emergenciais.
O objetivo é o de recuperar na medida do possível o equilíbrio emocional da
pessoa, sem a expor ao libertador, porém doloroso processo psicoterápico (ISMAEL,
2005).
O psicoterapeuta deve ter tolerância e sabedoria para atuar segundo o tempo
e momento do paciente. Muitas vezes, além de estar junto é necessário atuar junto à
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pessoa, criando uma atmosfera que possibilite o indivíduo pensar sua própria
existência e resolver as questões que lhe são pertinentes.
Atuar junto com o paciente, é muito diferente de atuar pelo paciente. O
psicólogo não tem o direito de decidir como a pessoa deve viver suas experiências.
Pode ajudá-la a refletir, mas não decidir por ela.
Recalcar as emoções e sentimentos das pessoas é extremamente danoso à
saúde. Sentimentos e emoções quando não expressados, geram muito sofrimento e
podem levar a depressão ou a outras doenças.
Abrir a possibilidade para essas experiências serem vividas e refletidas de
forma verdadeira contribui para que profundos aprendizados aconteçam
(HENNEZEL, LELOUP, 1999).
Quando o que se está perdendo é a própria vida, como colaborar no
enfrentamento do delicado processo do morrer. A experiência do morrer exige mais
do que qualquer outra experiência uma postura verdadeiramente autêntica do
psicólogo, no morrer, a ausência de autenticidade “berram” e isso barra qualquer
possibilidade de uma despedida genuína entre as pessoas.
Enfrentar a própria morte é por si só um fardo pesado demais e as pessoas
não precisam receber lições ou pressões desnecessárias e indesejadas nessa hora.
Quem determina o que irá ser trabalhado é a pessoa que vive a perda ou a
morte. Essa irá revelar suas necessidades e o que ela consegue enfrentar. Não é o
psicólogo que determina como ela deverá viver seu morrer.
Somente a própria pessoa ou um responsável por ela tem o direito de decidir
por sua vida. Ao psicólogo cabe acolher e ajudar dentro dos limites técnicos e éticos
de sua profissão a pessoa viver o que lhe é desejado (KUBLER-ROSS, 2005;
ANGERAMI-CAMON, 2002).
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72
O contato com a morte é um momento muito delicado e de extremo
sofrimento. O psicólogo pode ajudar as pessoas a se permitirem essa experiência de
forma verdadeira, sem mentiras ou segredos que ao invés de proteger, só terminam
por ferir a todos ainda mais.
Um clima verdadeiro entre as pessoas envolvidas é necessário, porém muito
difícil de ser conseguido. A angústia ligada a separação contamina o ambiente e o
tabu da morte tornou as pessoas inseguras e aterrorizadas no trato com o paciente
terminal.
Diante dessa realidade cria-se um constrangimento velado entre as pessoas
e elas de fato quase nunca conseguem conversar ou expressar o que realmente
gostariam (HENNEZEL, LELOUP, 1999).
No processo do morrer com dignidade, o medo, a culpa e as questões mal
resolvidas são grandes empecilhos. Entretanto, observa-se que a coragem de
encarar os próprios, temores, culpas e questões mal-resolvidas, resgata na pessoa o
seu senso de respeito e amor próprio.
Essas pessoas normalmente partem mais tranqüilas e com a sensação de
dever cumprido. Por outro lado existem pessoas que irão querer até o fim negar a
morte e esse desejo deverá ser respeitado, pois essa é a forma como
provavelmente a pessoa está acostumada a enfrentar as dificuldades de sua vida e
talvez seja a única forma como ela saiba enfrentar situações que envolvem muito
sofrimento e isso deve ser acolhido e respeitado.
Toda pessoa tem o direito de viver segundo seus princípios e necessidades.
Quando o morrer acontece no hospital ele é influenciado sobremaneira pela
rede de apoio e a equipe de saúde. A pessoa que está morrendo mais do que nunca
precisa sentir que pode contar com essas pessoas.
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73
A equipe de saúde e pessoas envolvidas precisam tentar compreender que
para as pessoas que estão morrendo a qualidade de vida que lhes resta é mais
importante do que a quantidade de tempo de vida que ainda elas possam ter.
Os pacientes têm consciência de que estão morrendo e transmitem isso de
diversas formas. Quanto mais verdadeira for a atmosfera entre as pessoas, mais
fácil e adequadamente a pessoa que está morrendo conseguirá se expressar.
O contrário também é verdadeiro, quanto mais inautenticidades, climas de
mentira e segredo houver diante da morte, mais difícil se torna o morrer e mais
tortuosos serão os caminhos que o sofrimento buscará para se expressar.
Acompanhar alguém que está morrendo é uma experiência carregada de
emoções. É comum entes queridos sentirem muita culpa por continuarem vivos e
saudáveis enquanto o outro morre.
Aparece a culpa por pensarem que não fizeram o suficiente.
Quando o outro morre até o amor é colocado em risco. A morte pode ser
sentida como se o amor pelo outro não fosse o suficiente para tê-lo segurado em
vida. Como se o amor pudesse nos livrar de nossa finitude.
A morte é uma experiência que meche tanto com as nossas emoções que
mesmo quando racionalmente algumas questões sejam claras, emocionalmente as
coisas ficam muito confusas.
O fato é que o amor não muda o destino do ser humano de ter que morrer,
mas pode lhe dar dignidade, conforto, segurança e alívio (HENNEZEL, LELOUP,
1999).
Existe ainda diante da morte o receio de que se as pessoas abordarem a
questão do morrer de forma verdadeira que isso poderá fazer com que o paciente se
perceba abandonado e sem esperanças.
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74
Para evitar tirar as supostas ilusões da pessoa que está morrendo as pessoas
ao redor criam um pacto de silêncio constrangedor. Esta super-proteção acontece
de ambas as partes, entre paciente, seus entes e equipe de saúde, ambos tentam
esconder o que está acontecendo como se isso conseguisse suprimir os
sentimentos ali envolvidos.
A atmosfera carregada de angustias e segredos tornam a situação
insuportável para todos, e as tensões e sofrimentos vividos ao invés de serem
compartilhados, acabam sendo isoladamente vividos.
Essa super-proteção mostra o quanto as pessoas se subestimam por
acharem que são incapazes de lidar com questões que são tão humanas. Não
existem receitas para como se lidar com a vida, o que existem são princípios.
Quando as pessoas se desarmam tudo fica mais fácil de resolver
(BROMBERG, 1996; ANGERAMI-CAMON, 2001; 2004).
A equipe médica também envolvida por uma cultura que não consegue
aceitar a morte, se sente culpada quando se depara com os limites de sua técnica e
não conseguem evitar a degradação da vida diante de suas mãos.
A equipe fica narcisicamente muito ferida, se sentem impotentes e limitados
diante da morte e da dor dos familiares que permaneceram. É papel do psicólogo
também ajudar a equipe a lidar com seus sentimentos de impotência diante da
morte, proporcionando um espaço adequado onde equipe possa expressar, refletir e
debater sobre seus sentimentos e questões frente a finitude.
O único modo de aprendermos a melhor digerir as situações que envolvem a
morte é justamente conseguindo falar francamente sobre ela. Dar vazão para os
sentimentos num espaço e local adequado não enfraquece em nada a equipe, ao
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contrário quando se cria um clima de cumplicidade e acolhimento para a troca de
experiência e saberes entre as pessoas da equipe, estas se fortalecem.
Aceitar a impotência que existe diante da morte humaniza a relação entre
médico-paciente-família. Para um morrer humanizado é tão necessário que os
desejos do paciente possam ser identificados e viabilizados dentro do possível.
Geralmente o que os pacientes mais desejam nessa hora é poder usufruir de
um contato de amor genuíno com as pessoas presentes, muitas vezes a
necessidade de perdão entre os familiares aparece.
Equipe de saúde e psicólogo podem servir naturalmente de ponte para esse
encontro, por meio de uma atitude verdadeira e respeitosa perante paciente e
família. (KOVÁCS, 1992).
Criar um clima favorável para que vida e morte consigam ser compartilhadas
é humanizar o morrer. No momento em que o médico informa que restam apenas
dias ou horas de vida para a pessoa acamada é importante que o psicólogo tente ir
preparando a família para chegada desse momento.
Este é um trabalho muito cuidadoso, a intervenção deve seguir o ritmo e
desejo da família e paciente. Ajudar a família a preparar seu ritual de despedida,
dando o suporte emocional necessário para que as pessoas consigam se libertar e
dar adeus para quem está partindo.
Ajudar a tornar os últimos momentos um encontro de amor entre os que se
despedem. Aceitar e liberar a pessoa para que ela possa seguir seu destino, é o
último gesto de amor que os entes podem oferecer a pessoa que já não consegue
mais estar na vida.
Deixar partir em paz e de maneira humana aquele cuja continuidade da vida
já não se faz mais possível gera um sentimento de dever cumprido, não só em quem
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partiu, mas também na família e equipe de saúde. E ao invés de impotência e culpa
o que fica é um sentimento de amor e respeito pela vida (KOVÀCS, 1992; KUBLER-
ROSS, 2005).
A religiosidade também e um fator importante no enfrentamento da morte.
Pessoas que acreditam na existência de um ser superior e que acreditam que existe
uma continuidade da vida tendem a aceitar mais facilmente a morte.
Algumas variáveis nesse caso são relevantes como: a pessoa realmente
acredita e é praticante de sua doutrina religiosa e quais são as crenças que
embasam está religião (MAY, 1980).
Doutrinas que pregam que haverá um implacável julgamento divino no qual
as pessoas poderão ser aceitas ou não podem agravar o temor frente a morte
porque além da dor da despedida a pessoa ainda tem a preocupação de não ser
aceita e ainda castigada.
Pessoas que acreditam em um julgamento divino mais brando ou as que
acreditam que serão aceitas e ainda aquelas que não acreditam em um julgamento
apresentam geralmente menos angústia diante da morte, pois se sentem consoladas
com a crença de que continuaram vivas e serão acolhidas em uma outra dimensão.
Não significa que as pessoas religiosas sofrem mais ou menos diante da
morte do que as não religiosas. O fator religioso, com certeza é um fator que
influencia muito, no entanto, existem outros também, além do que a forma como ele
pode influenciar é muito particular, próprio da experiência de cada um com
determinada religião.
Algumas pessoas poucos dias antes da morte, retomam a lucidez e
conseguem falar, esboçam novamente esperança de viver, falam como se talvez
pudessem ser eternas e depois morrem.
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Isso mostra que a pessoa no limiar da morte pode estar lúcida de seu fim e
ainda mesmo assim expressar esperança. O ser humano tem em seu intimo um
desejo de eternidade.
Esse é um modo de funcionar muito freqüente no ser humano.
Isso deve ser acolhido e respeitado porque preserva certa vivacidade até o
fim. Acompanhar quem está morrendo é conseguir amparar, inclusive na esperança,
a pessoa e o modo como ela escolheu viver sua morte (KUBLER-ROSS, 2005;
BOFF, 2001).
Não se trata de falsear a realidade, mas de compartilhar que o imprevisto
acontece, que pode haver um alívio repentino ou uma diminuição do sofrimento. O
tempo que lhe resta de vida não pode ser aniquilado pelo nosso desespero, temor e
desesperança.
O contrário pode acontecer da pessoa chegar tão próximo da morte que ela já
não mantém mais esperanças sobre continuar. Esse momento deve ser tão ou mais
acolhido do que os outros, não cabe a nós impormos nosso desejo de esperança
para quem já não os tem mais por já sentir a morte quase em sua plenitude. Nesse
momento é necessário a presença da calma, da companhia silenciosa que acolhe e
ampara, a companhia que não prende, mas que possui uma atitude de profundo
amor que liberta o outro para seguir seu destino (HENNEZEL, LELOUP, 1999).
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6 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O que as experiências das perdas e da morte nos mostram é que para
crescermos precisamos aprender a abandonar nossas ilusões infantis de
onipotência, renunciar o passado e desistir das expectativas impossíveis.
É preciso aprender a abdicar de muitos objetos de desejo ao longo do
desenvolvimento e também aprender a conviver com o fato de que na vida tudo,
inclusive nós, somos finitos.
Crescer significa ter que morrer para muitas partes de nossas vidas, deixando
espaço para que o novo possa surgir. A perda e a morte são necessárias para que o
novo aconteça e renove a vida.
O medo da morte e das perdas é em parte o medo de perder o que se pensa
ter, o que já se conhece e estima para viver o que ainda é desconhecido (KOVÀCS,
1992; VIORST, 2005).
A morte revela quem realmente somos.
Aflora questões dolorosas a nosso respeito e sobre o nosso existir. É comum
que um balanço da vida seja feito. As pessoas se perguntam sobre o que acertaram
ou erraram ao longo de suas vidas, sobre o que fizeram ou deixaram de fazer e
ainda sobre o que irão fazer com o resto de vida que lhes resta.
Muitas pessoas são capazes de superar o ressentimento, amargura e
sentimento de impotência que a morte provoca e conseguem enfrentar as perdas e a
morte com coragem, fazendo aquilo que lhes é possível no momento.
A elaboração das perdas se faz necessária para um existir mais saudável,
dessa elaboração podem surgir grandes ensinamentos e aprendizados de vida, isso
não significa dizer que devamos desejar as perdas ou que elas nos tragam alegrias,
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mas sem dúvidas as perdas bem vividas podem sim nos tornarem num segundo
momento pessoas mais amadurecidas e sábias.
A inconformidade, revolta e desespero prolongado só ferem ainda mais, só
empobrecem a vida da pessoa que escolheu essa forma triste de viver essas
experiências naturais a todos os seres humanos que são as perdas e morte.
Assim como outros pesquisadores, Kübler-Ross (2005) também destaca a
relevância da espiritualidade, independente de fé religiosa, no enfrentamento das
perdas e da morte.
A espiritualidade quando satisfatoriamente resolvida é um grande consolador,
pois conseguir dar um sentido maior a vida dá a sensação de integração do eu. A
integração do eu proporciona segurança e consolado diante dos acontecimentos da
vida. Como afirma Nietzsche (in Frankl, 1990) “Quem tem porque viver, suporta
quase qualquer como”. Encontrar na vida um sentido que a faça valer a pena, é a
motivação propulsora do existir autêntico.
Na maioria das vezes é em contato com a finitude que o ser humano encontra
esse sentido, que pode ser um ou vários. O sentido de vida faz toda a diferença e
poder usufruir desse sentido nem que seja por uns segundos, faz a vida valer a pena
(FRANKL, 1990).
A religião também tem papel importante no enfrentamento e superação do
luto pelas perdas e morte. Pessoas que acreditam na existência de um Ser superior
e de uma possível continuidade da vida, se sentem de modo geral, mais consoladas
e seguras no enfrentamento da morte.
No entanto, May (1980) por meio de pesquisas constatou que a
espiritualidade ligada à fé religiosa pode ser tanto um consolador como um
agravante no enfrentamento da morte.
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O tipo de personalidade, estilo de vida, fase do ciclo vital também influenciam
sobremaneira no morrer. A experiência do não-ser é uma experiência muito
particular. Nota-se que grande parte das pessoas viveram suas perdas e o seu
morrer como viveram suas vidas.
O psicólogo necessita estar preparado para conviver com o sofrimento e
desespero humano. Identificar, compreender e acolher as inúmeras formas que o
sofrimento usa para se manifestar.
É dever do psicólogo abrir espaço para que o sofrimento, a dor possam ser
expressados. Abrir um espaço não é o mesmo que instigar, provocar a amostra
grátis do sofrimento.
Caso haja, o desejo ou a necessidade da pessoa em se expressar é
importante que ela saiba que existe um espaço, no qual suas emoções e
sentimentos serão permitidos e devidamente acolhidos. Facilitar a expressão do
sofrimento contribui para libertação da pessoa (ANGERAMI-CAMON, 2004)
Acolhimento, respeito, amor a verdade do outro, atitude verdadeiramente
autêntica diante da vida, aceitação da finitude, da liberdade e da responsabilidade
que esta nos impõe são alguns princípios tão valiosos que a Psicologia Existencial
nos propõe como estratégia de enfrentamento não só para experiência do morrer,
mas para a experiência da vida.
A Psicologia Existencial nos provoca para o que é de mais humano em nós e
é aí que ela nos liberta. Tornar-se humano é uma tarefa ativa de verdadeiro amor e
comprometimento com a existência.
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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proximidade da morte pode ser a ocasião para descobrirmos que desde
sempre somos mortais. É na fragilidade e pobreza da finitude que nos percebemos
completamente humanos. Esse é um momento que quando acolhido pode realmente
gerar grandes aprendizados.
A experiência da finitude é capaz de tornar inegável que somos seres de
cuidado e amor, não somos capazes de sobrevivemos na ausência do cuidado e do
amor.
A morte enquanto experiência última do processo de vir-a-se-no-mundo é
implacável assim como o olhar puro de uma criança, que não tenta esconder ou
mentir a respeito do que percebe.
A morte por vezes é tão dura porque nos revela quem realmente somos e o
que fizemos do que somos.
Para aprendermos a superar as perdas e a morte é preciso aprender a amar
de forma verdadeira. O amor nasce do acolhimento e tem a natureza de querer se
expandir para ganhar formar mais complexas.
O amor nunca fica só em si, é a natureza do amor buscar o social, expandir-
se (BOFF, 2004).
Amar é aceitar nossos limites, assumir nossa impotência e aceitar somente
estar presente no desenrolar das coisas, acompanhar o outro sem desejar se impor
ou tirar vantagens dessa relação.
Amar é aprender a perder, é aprender aceitar, respeitar e acolher a vida como
ela é. Isso não significa sermos conformados e complacentes com a vida, mas saber
também sermos conformados e complacentes.
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Aceitar o convite que essas experiências nos fazem, é aceitar mergulhar num
nível mais profundo de si mesmo. É nesse nível no qual a verdade prevalece que
conseguimos nos tornamos maiores (HENNEZEL, LELOUP, 1999).
O momento de nossa morte é resultado de tudo aquilo que vivemos.
Diante da experiência da finitude as pessoas se tornam mais capazes de
amar, doarem-se e perdoar. É possível ver vínculos entre familiares serem
resgatados, muitas vezes gerações são reconciliadas nesse momento.
O morrer quando acolhido com profundo amor não é vivido com temor,
solidão ou desamparo. É um momento em que podem existir grandes trocas sobre o
que há de mais humano em nós; os sentimentos, as dúvidas, os medos, as
saudades, o perdão, a necessidade de acolhimento e também a necessidade de
dar-se a alguém, necessidade de amar e também sentir que realmente é amado.
Nesse momento o nosso humano é capaz de se rebelar contra todas as
coisas não autênticas, medos de desagradar, de estar socialmente inadequado ou
de não ser coerente e científico, superando o medo de não parecer adequado e
organizado.
O que de há de mais humano em nós nessa hora quer sair, mas não sabe se
será acolhido e por isso pode retrair-se, tentar se esconder quando não dá mais e
isso é que torna a morte insuportável.
Quanto mais as pessoas sentirem que podem se mostrar, que serão
acolhidas em seu modo de ser e ainda que serão ajudas na medida do possível
pelas pessoas ao seu redor, mais o morrer deixa de ser um uma experiência
solitária, de isolamento, medo e dor.
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É preciso que as pessoas consigam superar seus bloqueios para poderem
entrar em sintonia nas experiências vividas. Não há uma receita a qual devamos
seguir, mas alguns princípios.
A experiência do luto humaniza o ser, uma vez que ela nos tira do nosso
pedestal narcíseo nos machuca, nos humilha, nos arranca todas as ilusões de
onipotência, evidenciando que tudo passa, tudo muda, que não somos tão fortes,
que perdemos as pessoas que amamos e que perdemos inclusive a nós mesmos.
A dor do luto abre dentro de nós um espaço de pobreza necessário para
conseguirmos perceber o que realmente tem importância na vida.
Esta completa pobreza nos ensina o que é viver e o valor que é viver.
Aprender a viver é aceitar nossas limitações, aceitar nossa impotência,
fragilidade, nossa feiúra. É perceber que no final o que mais importou é se
conseguimos viver em comunhão com nós mesmos, com o outro e com a vida.
Aceitar a realidade é um profundo gesto de amor que liberta, humaniza e
torna a vida muito mais bonita. A morte não nos ensina nada que a solidão, as
perdas, as frustrações, as escolhas já não nos tenham sussurrado.
Os profissionais que em razão do seu trabalho compartilham desse momento
deveriam estar aptos pessoalmente, muito mais do que tecnicamente para, além de
cuidar, oferecer respeito aos que fazem suas últimas despedidas.
Uma morte que é no outro, mas que também acontece comigo.
A Psicologia Existencial não têm receitas e nem truques a oferecer, mas nos
faz um convite para mais do que refletirmos, no convida a nos humanizarmos, como
chance única de não perdemos aquilo que há de mais valioso em nós, que somos
nós mesmos, convida o ser humano a se experimentar, a investir e acreditar em
projetos de si mesmo.
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A Psicologia Existência encoraja a aceitarmos a liberdade e responsabilidade
de uma vida autêntica. Respeita e reconhece o ser humano na sua essência e não
tenta de forma alguma tentar negar ou esconder do que é feita essa essência
humana.
A Psicologia Existencial nos faz um convite de coragem para nos tornarmos
mais verdadeiros, mais comprometidos e mais sensíveis com a vida. Nos alerta que
a postura excessivamente inautêntica diante da vida, só desmerece, endurece e
diminui o ser humano em suas potencialidades.
Ser autêntico é buscar criatividade e coragem para construir-se e ser
autêntico também é conseguir nos perdoar pelas nossas “inautenticidades”.
O psicólogo é o profissional que por dever de seu oficio se comprometeu a
acolher e ajudar a dar sentido e um destino melhor ao sofrimento humano.
Este é um compromisso muito sério, haja vista que não seria ético e nem
humano agravar ainda mais o sofrimento e desespero humano.
A Psicologia Existencial não oferece respaldo psicoterápico enquanto
abordagem teórica, pois não o é. Ela oferece respaldo para uma postura ética,
verdadeira, acolhedora e de respeito com o cliente ou paciente que o seja.
Essa postura realmente só tem eficácia quando usada de forma verdadeira.
A Psicologia Existencial entende que não há espaço para fingimentos no
encontro entre psicólogo e paciente.
O psicólogo só colhe os frutos dessa postura quando ele antes de querer
oferece-la para alguém, já estiver experienciado essa postura em si mesmo.
O outro é sempre um desconhecido que antes de querer ser explicado quer
ser compreendido em seu sofrimento e tem o desejo de melhora.
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O psicólogo para ajudar a curar precisa antes aceitar que na verdade ele não
cura, ninguém cura senão a própria vida. O psicólogo é o profissional especializado
para acompanhar e facilitar a cura.
A Psicologia existencial vê a cura da alma como sendo uma libertação do ser
das amarras que bloqueavam suas possibilidades de expansão. Pode-se concluir
que o ser humano tem necessidade de cura porque tem necessidade de expansão,
e expansão é amor.
É somente num encontro genuinamente humano de amor e respeito a
realidade do paciente que as curas ou libertações podem se dar.
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