UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA PROJETO DE DISSERTAÇÃO
Brasil e Coreia do Sul: semelhanças e disparidades das trajetórias de crescimento no
final do século XX
MARCONI EDSON FERREIRA VIANA Matrícula nº: 107393803
E-mail: [email protected]
ORIENTADOR: Prof. Fabio N. P. de Freitas E-mail: [email protected]
DEZEMBRO 2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA PROJETO DE DISSERTAÇÃO
Brasil e Coreia do Sul: semelhanças e disparidades das trajetórias de crescimento no
final do século XX
____________________________________________________ MARCONI EDSON FERREIRA VIANA
Matrícula nº: 107393803 E-mail: [email protected]
ORIENTADOR: Prof. Fabio N. P. de Freitas E-mail: [email protected]
DEZEMBRO 2009
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As opiniões contidas nesse trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.
4
Para meus pais, Cecilia e Marconiedson, que me abriram as portas para chegar onde estou e me fizeram capaz de ir além. Para Jessica, eterna companheira nessa longa jornada.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço, antes de tudo, a meus pais e minhas irmãs, que, mesmo frente a
incertezas, sempre me apoiaram em minhas decisões e me deram o impulso necessário para
seguir em frente.
Agradeço a meus professores, que foram fundamentais para meu desenvolvimento
pessoal nessa etapa de minha vida que ora termina e para minha formação profissional na
etapa que ora se inicia. Agradeço, particularmente, ao professor Fabio Freitas, pela
orientação e os conselhos durante a elaboração deste trabalho de dissertação.
Agradeço aos meus amigos de graduação e pós-graduação pelos momentos
agradáveis proporcionados dentro e fora das salas de aula, sem os quais, certamente, teria
sido tudo muito mais difícil.
Agradeço, em especial, a minha companheira, Jessica, pela presença constante e
fundamental ao longo de todos meus anos de vida acadêmica.
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RESUMO
A presente dissertação analisa o processo de distanciamento das trajetórias de
crescimento econômico de Brasil e Coreia do Sul ao longo das três últimas décadas do
século XX. Para tanto, faz-se uso de uma metodologia específica de decomposição do
crescimento econômico pela ótica da demanda, desagregando a participação dos principais
componentes do PIB dos países. A análise demonstra que os gastos autônomos se
apresentaram como o principal fator explicador do crescimento econômico tanto na Coreia
do Sul quanto no Brasil no período compreendido entre os anos 1970 e 2000, em que pesou
principalmente a participação das exportações e o consumo do governo em ambos os casos.
Ademais, ressalta-se a importância da análise econômica em conjunto da análise da
conjuntura político-estrutural dos países pesquisados, levando em consideração toda a
complexidade da interdependência dos fatores geopolíticos específicos dos países com a
dinâmica do crescimento econômico, destacando o contraste notório entre essa
interpretação e aquela proposta pela tradicional abordagem neoclássica do tema.
7
ÍNDICE INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 8
CAPÍTULO I – A TEORIA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO: AS ABORDAGENS NEOCLÁSSICA E SRAFFIANA .............. 10
1.1 – A teoria neoclássica do crescimento econômico: o modelo de Solow ............................ 11
1.1.1 – Setor externo e crescimento na visão neoclássica ................................................... 14
1.2 – A teoria sraffiana do crescimento econômico: o modelo do Supermultiplicador ........... 16
1.2.1. – Metodologia de decomposição do crescimento econômico ................................... 21
CAPÍTULO 2 – COREIA DO SUL: A TRAJETÓRIA DE CRESCIMENTO ACELERADO EM PERSPECTIVA ANALÍTICA .......... 25
2.1 – Breve histórico dos primórdios da industrialização sul-coreana ..................................... 25
2.2 – Década de 70: industrialização pesada e orientação exportadora .................................. 27
2.3 - Década de 80: globalização financeira, crise e recuperação ............................................ 34
2.4 - Década de 90: reformas, internacionalização e crise ....................................................... 41
CAPÍTULO 3 – BRASIL: INSTABILIDADE E DESEQUILÍBRIO EXTERNO NUM CONTEXTO DE DESCOORDENAÇÃO DE
POLÍTICAS DE LONGO PRAZO .............................................................................................................. 51
2.1 – Breve histórico dos primórdios da industrialização brasileira ......................................... 51
2.2 – Década de 70: o grande salto da industrialização ........................................................... 52
2.3 - Década de 80: crise e estagflação .................................................................................... 61
2.4 - Década de 90: reestruturação, estabilização, vulnerabilidade externa e baixo
crescimento. ............................................................................................................................ 66
CAPÍTULO 4 – COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS OBTIDOS ........................................................................ 74
CONCLUSÃO ................................................................................................................................... 82
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................. 84
8
INTRODUÇÃO Brasil e Coreia do Sul são países que se assemelham em muito quando observados
do ponto de vista histórico. Outrora colônias, obtiveram muito tarde sua independência
político-econômica, o que foi responsável em parte pelo subdesenvolvimento de ambos
ainda em meados do século XX. Em seguida, se alternam em suas histórias períodos de
governos autoritários e democráticos, com consequências severas sobre a estabilidade
institucional dos dois países, que só recentemente puderam viver a experiência de uma
democracia legítima com instituições autônomas.
Entretanto, a despeito de algumas semelhanças do ponto de vista sócio-político,
Brasil e Coreia do Sul apresentaram diferenças em suas trajetórias de industrialização tardia
que são fundamentais para entender a forte disparidade entre seus atuais estágios de
desenvolvimento e também na forma como cada país se insere hoje no contexto global.
Nesse sentido, a Coreia do Sul logrou manter taxas de crescimento acima da média mundial
ao longo das três últimas décadas do século XX, sustentando um ritmo acelerado de
industrialização somado a crescentes exportações mesmo nos períodos de maior
instabilidade da economia mundial. Em contraste, a trajetória de crescimento da economia
brasileira se mostrou errática e fortemente instável frente a perturbações no mercado global,
o que levou ao notável atraso do grau de industrialização brasileiro relativo à economia
coreana nos dias de hoje.
O objetivo geral desse trabalho de dissertação consiste em comparar as estratégias
de desenvolvimento econômico utilizadas por Brasil e Coréia do Sul nas três últimas
décadas do século XX. De um modo geral, busca-se a expor as diferenças da condução da
política macroeconômica que possibilitaram à Coreia superar o Brasil em diversos
indicadores sócio-econômicos ao longo desse período. Para tanto, essa dissertação analisará
9
dados empíricos dos dois países em questão sob a ótica da contabilidade do crescimento
pelo lado da demanda, fazendo uso da metodologia de decomposição do crescimento
proposta por Freitas & Dweck (2009). Este estudo, por sua vez, será fundamentado na
chamada abordagem clássica do excedente (MEDEIROS, C. A.; SERRANO, F. 2004),
mais especificamente nos modelos sraffianos de crescimento, tendo por base a teoria do
supermultiplicador sraffiano, tal como abordada por Serrano (1995).
O capítulo 1 contém uma breve abordagem do modelo de crescimento econômico
neoclássico, principal referencial para a literatura de growth account no mainstream
acadêmico. Em seguida, é exposta, de forma sucinta, a abordagem sraffiana para o tema
assim como o modelo de decomposição que será utilizado para a análise nos capítulos
posteriores.
Nos capítulos 2 e 3, serão expostos os resultados obtidos para a decomposição do
crescimento do PIB de Coreia do Sul e Brasil, respectivamente. Tal exposição se dará
inserida num contexto de descrição da história econômica de ambos os países nos períodos
em questão.
O capítulo 4 apresenta a comparação dos resultados obtidos nos capítulos 2 e 3,
analisando-os à luz da teoria do supermultiplicador sraffiano e dentro contexto geopolítico
de cada país. A síntese dessa comparação estará na conclusão que segue esse capítulo.
10
CAPÍTULO I – A TEORIA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO: AS ABORDAGENS NEOCLÁSSICA E
SRAFFIANA
O objetivo desse primeiro capítulo é realizar um resumo de duas abordagens de
teorias do crescimento econômico utilizadas atualmente tanto na fundamentação de estudos
acadêmicos e publicações de cunho científico quanto no embasamento de análises acerca de
temas transversais ao desenvolvimento econômico dos países: os modelos neoclássico
(SOLOW, 1956) e do supermultiplicador sraffiano (SERRANO, 1995). Nesse sentido, aqui
serão explicitados, de forma simplificada, os alicerces principais dos modelos apresentados,
bem como suas implicações imediatas para orientações de política econômica, além de
eventuais críticas para o modelo neoclássico, corrigidas no contexto do modelo do
supermultiplicador.
A primeira parte será reservada ao modelo de Solow, principal referencial teórico
utilizado pelo mainstream acadêmico para estudos de crescimento e distribuição. A versão
do modelo abordada será a original apresentada por Solow em 1956, sem perda de
credibilidade para a evolução do presente estudo, dado que o foco deste capítulo concentra-
se sobre os fundamentos teóricos dos modelos analisados.
A segunda parte descreve simplificadamente o modelo do supermultiplicador
sraffiano, teoria sobre a qual estará fundamentado todo o estudo dos capítulos
subsequentes. A conclusão de que são os gastos autônomos improdutivos da economia que
conduzem o processo de crescimento servirá de base para o modelo de análise por
decomposição dos principais agregados macroeconômicos pelo lado da demanda
(FREITAS; DWECK, 2009) detalhado na sequência.
11
1.1 – A teoria neoclássica do crescimento econômico: o modelo de Solow
A abordagem neoclássica para o estudo do crescimento econômico e da distribuição
tem suas bases no artigo publicado pelo economista americano Robert Solow, em 1956,
intitulado “A Contribution to the Theory of the Economic Growth” (SOLOW, 1956). O
modelo básico de Solow é desenvolvido sobre duas equações fundamentais, a ver, uma
equação de produção e uma equação de acumulação de capital.
Preliminarmente, considera-se uma economia fechada e sem governo que produz
um único produto (Y). A equação de produção procura descrever de forma breve as
diferentes combinações de fatores de produção, simplificados em duas categorias – capital
(K) e trabalho (L) –, que, aplicados ao processo produtivo, podem gerar o produto da
economia (Y). Esses fatores são transformados em produto por meio de um conjunto de
produção, cuja fronteira é uma função matematicamente dita bem comportada (i.e.,
contínua com derivadas contínuas em todos os pontos do seu domínio), duas vezes
diferenciável, com retornos constantes de escala e rendimentos marginais decrescentes para
cada fator .
Ou seja,
� � ���, ��
Tal que
���, �� � ���, ��; � 0
E
���� � 0 , ���
����� � 0
���� � 0 , ���
����� � 0
12
Ademais, pressupõe-se a hipótese de que o mercado opera sob concorrência
perfeita, a saber, com livre mobilidade de fatores e preços flexíveis, sendo os agentes
econômicos fundamentalmente tomadores de preço (price takers). A disponibilidade dos
fatores de produção é definida no mercado de fatores, que, através de um processo de
market clearing, é integralmente ofertada independentemente do preço. Cabe ressaltar que,
por uma questão de escopo, esse capítulo limitar-se-á a descrever tão só os processos de
acumulação de capital e reprodução do sistema econômico sob a ótica neoclássica, sem
adentrar em análises aprofundadas acerca do processo distributivo inerente ao crescimento.
Considerando o investimento (I) como uma função do produto (I = s.Y), e dada a
propensão marginal a poupar da economia (s), chega-se a uma equação para o crescimento
do estoque de capital (gK):
� � �. �
� � ����
�� � �� � ��
� � ��
Nesse esquema, “v” equivale à relação capital-produto (K/Y) e o investimento é
aferido em termos líquidos (i.e., exclui-se o cálculo da depreciação).
O progresso técnico (A) é acrescentado à equação de produção (Y = f (K, AL), com a
hipótese de retornos constantes de escala) com caráter exógeno (gA=a) e aumentador de
trabalho (“Harrod-neutro”, ou seja, implica em produtividade média do capital constante e
produtividade média do trabalho crescente). Atribuindo-se um caráter igualmente exógeno
ao crescimento da força de trabalho (gL=n) e chamando “α” a elasticidade do produto (“Y”)
em relação ao fator capital (“K”) (no que, considerando a hipótese de retornos constantes de
escala, “1-α” representa a elasticidade do produto em relação ao fator trabalho – “L”),
13
chega-se, por meio de simples recursos algébricos e derivações, à equação definitiva para a
análise do processo dinâmico de crescimento do produto em uma economia em estado
estacionário (steady state) no modelo básico de Solow:
� �� �� � �1����� � ��
O modelo possui uma tendência à trajetória de crescimento equilibrado
fundamentada sobre uma lógica de ajuste via preços no mercado de fatores, de forma que,
na possibilidade de um crescimento mais acelerado de um dos fatores, uma redução de seu
preço relativo ocorreria em escala suficiente para absorver o excesso de oferta e, assim,
retomar a trajetória de equilíbrio. O estoque de capital crescendo à mesma taxa da força de
trabalho (medida em unidade de eficiência) constitui, por definição, a trajetória de
crescimento em estado estacionário.
Sendo assim, seriam mudanças na propensão marginal a poupar, na taxa de
crescimento da força de trabalho e no progresso técnico que acarretariam numa variação
mútua da taxa e do nível de crescimento do produto da economia. Os dois primeiros fatores
definiriam variações temporárias a esse ritmo de crescimento, enquanto que o progresso
técnico implicaria mudanças perenes ao mesmo, razão pela qual recebe o epíteto de “motor
do crescimento” pela teoria neoclássica.
Variações do modelo incluíram, posteriormente, elementos outros, tais como capital
humano e aprendizado, como determinantes do crescimento econômico. Todavia, não cabe
aqui uma abordagem mais extensa sobre essas expansões do modelo, tendo em vista que o
foco geral da presente análise se concentra em apresentar os fundamentos da visão
neoclássica sobre a teoria do crescimento econômico, mais especificamente sobre como a
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interpretação dessa vertente teórica, ampliada a uma economia aberta, observa o papel
desempenhado pelo comércio exterior no processo de crescimento.
Cabe destacar que a contabilidade do crescimento a partir do modelo de Solow
consiste numa metodologia de análise empírica do tipo não paramétrico que não objetiva
testar o modelo em si, mas apenas dar-lhe uma dimensão quantitativa. Assumindo a
validade do modelo, a análise recai sobre a dimensão quantitativa das contribuições dos
vários fatores que afetam o crescimento segundo a visão de Solow, distribuídos entre
capital, trabalho e a produtividade total dos fatores. Em face ao padrão de progresso técnico
aumentador utilizado pelo modelo não ser verificado na realidade do processo de
crescimento econômico, faz-se necessário estimar a contribuição do progresso técnico (bem
como da eficiência alocativa) por resíduo.
1.1.1 – Setor externo e crescimento na visão neoclássica
A visão neoclássica do processo de crescimento econômico tem suas bases
construídas sobre a teoria clássica da chamada Lei de Say, na qual, grosso modo, a oferta
agregada é responsável por gerar a demanda agregada necessária para absorvê-la. Desse
modo, é a acumulação de capital em si, conjugada com a disponibilidade de força de
trabalho de uma economia, que determina, em primeira instância, o produto potencial dessa
economia, o qual, por sua vez, determina o produto efetivo.
Sendo assim, aos componentes autônomos da demanda agregada que não são
capazes de gerar capacidade produtiva, como as exportações, é atribuído um papel
secundário na análise do crescimento econômico. No caso específico das exportações, na
teoria neoclássica o ajustamento da taxa de câmbio real (via variações na taxa nominal de
câmbio e/ou via ajustes nos níveis de preços relativos) faz com que o ajustamento do
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balanço de pagamentos elimine qualquer problema de restrição de divisas que possa surgir,
fazendo prevalecer a restrição de recursos como limitante ao crescimento do produto. Nesse
sentido, a única questão relevante é que a intervenção estatal pode alterar os preços
relativos (em particular o câmbio real e taxa de juros),gerando uma ineficiência na
alocação de recursos que não existiria na sua ausência.
Pelo modelo neoclássico, economias com patamar tecnológico, taxas de
investimento e de crescimento populacional semelhantes possuiriam, de uma forma geral,
estados estacionários semelhantes, de modo que suas respectivas taxas de crescimento
variam de acordo com a “distância” que essas economias se encontram, acima ou abaixo,
desse estado estacionário. Assim, países com estados estacionários semelhantes tenderiam,
no longo prazo, a apresentar convergência em termos de produto por trabalhador (JONES,
2000).
Desse modo, o “receituário” neoclássico para o desenvolvimento econômico
concentra-se em estimular o progresso tecnológico e a poupança como forma de acelerar o
crescimento, estabelecendo o livre mercado como cenário ideal para a plena realização do
processo de convergência. Como bem ressaltam Medeiros e Serrano (2001):
A rigor, a versão neoclássica do crescimento liderado pelas exportações,
difundida pelo Banco Mundial, enfatiza não propriamente o papel das
exportações no crescimento, mas a importância da neutralidade de
incentivos (tarifas, taxa real de câmbio etc.) e da abertura externa
(importações) para uma alocação eficiente de recursos. Segue-se desta
abordagem um corolário inteiramente arbitrário: as vias de crescimento
lideradas pelas exportações foram construídas por políticas econômicas
16
“amigáveis aos mercados”, ao contrário do que teria predominado
naquelas lideradas pelo mercado interno. (p. 1)
1.2 – A teoria sraffiana do crescimento econômico: o modelo do Supermultiplicador
O estudo proposto pelo presente trabalho de dissertação será fundamentado na
chamada abordagem clássica do excedente (MEDEIROS, C. A.; SERRANO, F. 2004),
mais especificamente nos modelos sraffianos de crescimento, tendo por base a teoria do
supermultiplicador sraffiano, tal como abordada por Serrano (1995). Por se tratar de uma
abordagem que, de certa forma, se distancia da maneira como o tema é atualmente
discutido pelo mainstream acadêmico, o referencial teórico aqui destacado reduzir-se-á a
um conjunto relativamente pequeno de fontes e autores, que, todavia, esgota parte
importante da literatura econômica dessa vertente.
A teoria do supermultiplicador sraffiano parte da concepção de que são os
componentes autônomos da demanda final (i.e., aqueles que não geram capacidade
produtiva) que conduzem o processo de crescimento, seja gerando consumo induzido
através do multiplicador ou investimento (i.e., gastos que geram capacidade produtiva)
induzido através do mecanismo do acelerador (SERRANO, F. 1995), de forma que, na
ausência de perturbações ao longo do processo, haveria uma tendência ao grau de utilização
efetiva da capacidade produtiva convergir para seu nível normal. Nesse sentido, o grau de
utilização é uma variável endógena do modelo cujo valor em equilíbrio seria igual ao grau
normal de utilização. O termo sraffiano, por sua vez, reflete a hipótese de que não existe
nenhuma conexão necessária os processos de crescimento e distribuição da renda numa
economia capitalista e de que o processo de concorrência que governa as decisões de
17
investimento capitalista promoveria uma tendência ao ajustamento da utilização da
capacidade produtiva a um nível considerado normal.
A idéia por trás do conceito de grau normal de utilização da capacidade produtiva
surge da percepção de que o princípio da demanda efetiva opera tanto no curto quando no
longo prazo, de forma que, como resultado do ajustamento do nível e da taxa de
crescimento da capacidade produtiva às variações da demanda efetiva através do
mecanismo do acelerador, há uma tendência (com suporte empírico) da economia não se
afastar sistematicamente por períodos prolongados do grau de utilização normal da
capacidade. Desse modo, são o produto e a capacidade produtiva da economia que se
ajustam à demanda agregada, e não o contrário, como ocorre nos modelos neoclássicos de
crescimento. A versão a seguir é uma forma simplificada do modelo.
Diferentemente do modelo neoclássico, o modelo do supermultiplicador sraffiano
endogeiniza o investimento agregado, que passa a ser função do produto agregado da
economia e do grau de utilização da capacidade produtiva (u, sendo un o grau de utilização
normal da economia):
� � �� � ! �" � �#�$ � $%�
O grau de utilização da capacidade produtiva, por sua vez, varia em função da
diferença entre as taxas de crescimento do produto agregado (g) e do estoque de capital
(gk):
$" � $�� � ���
18
A taxa de crescimento do estoque de capital é função direta do coeficiente de reação do
investimento induzido pelo produto agregado (h) e do grau de utilização da capacidade
produtiva, e inversa da relação capital-produto (v):�� � &'() . $
A taxa de crescimento do produto agregado, por sua vez, é determinada parte pela
taxa de crescimento dos gastos improdutivos (gz), parte pela taxa de crescimento da
propensão a investir (gh), ponderada por sua razão com a parcela dos gastos autônomos na
renda (β):
� � �* � &'+) . �'
Na trajetória de crescimento equilibrado no longo prazo não haveria, por definição,
variações no grau de utilização da capacidade produtiva ou da propensão a investir, de
forma que a taxa de crescimento do produto agregado da economia tenderia a convergir
com a taxa de crescimento do estoque de capital. Nesse contexto, a taxa de crescimento do
produto agregado, na ausência de distúrbios externos, tenderia a gravitar em torno da taxa
de crescimento dos gastos autônomos, ao tempo em que a utilização da capacidade
produtiva oscilaria em torno de seu grau normal.
Definindo-se o nível de importações (M) como sendo induzido tanto pelas decisões
de produzir como de investir e o consumo doméstico privado (C) como uma composição de
dois componentes: o gasto em consumo influenciado pelo poder de compra introduzido na
economia como resultado direto das decisões produção das empresas. (wY) e a parte do
consumo financiado por crédito ou riqueza acumulado e, portanto, desvinculado das
decisões de produzir das empresas (ZD),tem-se, respectivamente:
, � !-.� � !/012 � !3�
19
Partindo da equação de equilíbrio entre oferta e demanda no mercado de bens e
serviços:
, � � � 4 � � � 5 � 6
Substituindo e resolvendo para o produto (Y), chega-se à equação que define o nível
de demanda efetiva de longo prazo:
� � 7 11 � .�1 � !-� � �1 � !3��8 �12 � 5 � 6�
O primeiro termo entre parênteses do lado direito da equação representa o
supermultiplicador sraffiano (α), através do qual o nível de produto e o grau normal de
utilização da capacidade produtiva se ajustam à demanda efetiva. A taxa de crescimento
esperada é igual à realizada, sendo determinada pela taxa e crescimento dos gastos
autônomos improdutivos.
Entretanto, o nível e a taxa de crescimento da capacidade produtiva só serão
inteiramente determinados pela taxa de crescimento dos gastos autônomos se a parcela do
somatório do consumo induzido e do investimento induzido no produto potencial (i.e., a
propensão marginal a gastar) for menor do que um, o que implica:
�* � 1 � . � !-�1 � !3��
Como a taxa de investimento induzido da economia é uma função crescente da taxa
de crescimento (em decorrência do mecanismo acelerador), tem-se:
�� � ��/
Assim, , a taxa de investimento determina a taxa de poupança da economia tanto
quanto o nível de investimento determina o nível de poupança.
20
Vale destacar que a restrição do crescimento associada ao balanço de pagamento,
pela literatura econômica (e.g., SERRANO; WILLCOX, 2000) mostra-se muito mais
efetiva que a restrição de capacidade. Assim, do ponto de vista da sustentabilidade do
balanço de pagamentos, ganham relevância as exportações como fonte primária de divisas
para fazer frente à capacidade de pagamento do país. Sob uma ótica simplificada do
processo de crescimento para uma economia aberta, a aceleração das importações
decorrentes do crescimento da demanda interna gera uma pressão sobre o balanço de
pagamentos de um país, que, no longo prazo, pode vir a acarretar em perda de reservas,
colocando em risco a sustentabilidade do processo.
A equação a seguir representa o saldo do balanço de pagamentos (BP) de um país:
9: � 6 � , � ;�< � =; � >
9: � 6 � !-.� � !3�� � !/012 � ;�< � =; � >
onde “RLE” corresponde à Renda Líquida Enviada ao Exterior, “TU” são as Transferências
Unilaterais e “F” representa o Fluxo de entrada de capitais.
Supondo a situação limite de variação nula de reservas internacionais de um país
(BP = ∆R = 0), o produto agregado máximo que um país pode obter com equilíbrio em seu
balanço de pagamentos (YBP) é determinado da seguinte forma:
�?@ � 6 � !/012 � ;�< � =A � >!-. � !3�
Observa-se que o aumento das exportações, além de representar um gasto autônomo
capaz de conduzir o processo de crescimento, também gera uma maior “folga” a esse
processo sem esbarrar no limite da sustentabilidade do balanço de pagamentos. Nesse
sentido, as exportações teriam um duplo papel: pelo lado das divisas, dando
21
sustentabilidade ao passivo externo de um país, e no âmbito do no processo de crescimento
econômico, possibilitando maior grau de liberdade à expansão da demanda interna.
Ademais, cabe destacar o fato de que alguns fatores de oferta podem influenciar a
trajetória de crescimento por meio de seus impactos sobre as variáveis arroladas pelo
modelo como determinantes diretos do crescimento econômico. Tomando, por exemplo, o
progresso técnico, uma inovação de processos que seja capaz de gerar redução de custos
(por induzir à concorrência) pode levar a um incremento na demanda interna (caso acarrete
numa inovação de produto) ou externa, via aumento das exportações (com empresas
nacionais ganhando parcelas de mercados internacionais).
1.2.1. – Metodologia de decomposição do crescimento econômico
Partindo da dissociação destacada na seção anterior entre gastos produtivos e
improdutivos, autônomos e induzidos, pode-se desagregar a identidade contábil entre oferta
e demanda agregada da seguinte forma:
� � , � 4BCC2 � 4B2 � �D � 4E � �E � �FF � �F@ � 6 � <
onde CFD e CFND correspondem ao consumo das família de bens duráveis e não-duráveis,
respectivamente, IR se refere ao investimento residencial, CG e IG representam,
respectivamente, os gastos do governo em consumo e investimento (no sentido de gasto
que cria capacidade produtiva), IEE é o investimento autônomo dos empresários, IEP é o
investimento induzido via acelerador em decorrência das variações no grau de utilização da
capacidade produtiva, X é o nível de exportações e E corresponde ao ajuste dos estoques.
Como CFND e IR fundamentalmente não dependem do nível de renda das família,
mas, sim, do volume de crédito ao qual elas têm acesso e seus montante de riqueza prévia,
tornam-se variáveis exógenas ao modelo, assim como CG e IG, dado que o governo pode
22
financiar seus gastos independente do nível de renda agregada, bem como IEE (autônmo por
definição) e X, que depende do nível de renda do resto do mundo:
1 � 4B2 � �D � 4E � �E � �FF � 6
Dessa forma, as únicas variáveis endógenas ao modelo são CHND, IPE e M, todas função
direta do nível de renda agregada. Ou seja,
4BC2 � ��
�F@ � ��
, � �1 � G��4BC2 � 4B2 � �D � 4E � �E � �FF � �F@ � 6 � <�
Substituindo essas relações na primeira equação (da identidade entre oferta e
demanda), obtém-se:
� � G�� � G�� � G�1 � <�
A partir dessa equação, a variação do produto agregado pode ser descrita da
seguinte forma:
��1� � ��0� � G�1���1���1� � G�0���0���0� � G�1���1���1� � G�0���0���0�� G�1�H1�1� � <�1�I � G�0�H1�0� � <�0�I
Ao somar e subtrair do lado direito da equação os termos G�1���1���0�,
G�1���1���0� e G�1�H1�0� � <�0�I , e usando a relação:
� � ���0�
Obtém-se:
g��0� � G�1���1�g��0� � G�1���1�g��0� � HG�1���1� � G�0���0�I��0�� HG�1���1� � G�0���0�I��0� � G�1�HΔ1 � Δ<I � ΔGH1�0� � <�0�I
Dividindo ambos os lados por Y(0), chega-se a uma equação preliminar para a taxa
de crescimento econômico:
23
g � G�1���1�g � G�1���1�g � G�1���1� � G�0���0� � G�1���1� � G�0���0�� G�1� L Δ1
��0�M � G�1� L Δ<��0�M � ΔG N1�0� � <�0�
��0� O
Somando e subtraindo G�1���0� e G�1���0� no lado direito da equação, tem-se:
g � G�1���1�g � G�1���1�g � G�1�Δ� � ΔG��0� � G�1�Δ� � ΔG��0� � G�1� L Δ1��0�M
� G�1� L Δ<��0�M � ΔG N1�0� � <�0�
��0� O Resolvendo para a taxa de crescimento (g):
g � α�1�Δ� � α�1�G�1� ΔG��0� � α�1�Δ� � α�1�
G�1� ΔG��0� � α�1� L Δ1��0�M � α�1� L Δ<
��0�M
� α�1�G�1� ΔG N1�0� � <�0�
��0� O
Sabendo que ΔG � �QG�0�, colocando em evidência R�S�Q�S� ΔG e substituindo na
equação os componentes autônomos dos gastos Δ1 � Δ4B2 � Δ�D � Δ4E � Δ�E � Δ�FF �Δ6, chega-se a:
g � α�1�Δ� � α�1�Δ� � α�1� LΔ4B2 � Δ�D � Δ4E � Δ�E � Δ�FF � Δ6��0� M
� α�1�G�1� gµ NG�0�U��0���0� � ��0���0� � 1�0� � <�0�V
��0� O � α�1� L Δ<��0�M
Como ��0� � G�0���0���0� � G�0���0���0� � G�0�W1�0� � <�0�X, então o
quarto termo do lado direito da equação acima é R�S�Q�S� gµ.
Visando isolar a contribuição individual de cada categoria de gastos envolvidos,
chega-se ao terceiro termo e, por conseguinte, à equação final:
24
� � Y�1� N4BC2�0���0� O �- � Y�1� N�F@�0�
��0� O �' � Y�1� N4B2�0���0� O �Z[0 � Y�1� N�D�0�
��0� O �3\
� Y�1� N4E�0���0� O �Z] � Y�1� N�E�0�
��0� O �3] � Y�1� N�FF�0���0� O �3^^
� Y�1� N6�0���0�O �_ � α�1�
G�1� gµ � α�1� L Δ<��0�M
A parcela correspondente à contribuição de cada componente da demanda agregada
no crescimento do período analisado (g) é determinada pelo produto do supermultiplicador
(α) com a respectiva parcela desse componente sobre o produto agregado no período base
(t=0) e a taxa de crescimento do componente (no caso dos gastos autônomos) ou de seu
respectivo coeficiente de reação (no caso dos gastos induzidos) no período atual (t=1). A
contribuição relativa do coeficiente de produção doméstica é determinada pelo produto do
supermultiplicador com a taxa de crescimento desse coeficiente, dividido por seu valor
absoluto no período.
Com relação à contribuição da variação de estoques, optou-se por realizar uma
contração da fórmula utilizada para o cálculo dos demais componentes, de modo a impedir
que, num eventual caso de acumulação nula de estoques no ano-base, a existência de um
valor nulo no numerador levasse a um resultado igualmente nulo para a contabilidade da
contribuição desse componente. Dessa forma, a contribuição referente à acumulação de
estoques no crescimento do período é determinada pelo produto do supermultiplicador com
a variação da variação de estoques entre o ano-base e o período atual, divididos pelo PIB do
ano-base.
25
CAPÍTULO 2 – COREIA DO SUL: A TRAJETÓRIA DE CRESCIMENTO ACELERADO EM
PERSPECTIVA ANALÍTICA
2.1 – Breve histórico dos primórdios da industrialização sul-coreana
A Coreia do Sul se apresenta atualmente na literatura econômica como um dos
casos mais categóricos de sucesso no processo de industrialização tardia. Outrora uma
economia fundamentalmente agrária, o país tem demonstrado grande dinamismo industrial
desde a década de 60, quando teve início uma série de planos econômicos que reorientaram,
a priori, o desenvolvimento da manufatura leve para a exportação, abarcando em seguida
outros setores estratégicos da economia, como a indústria pesada, automobilística e de alta
tecnologia. Ao final da década de noventa, o país lograra atingir um patamar de
desenvolvimento comparável às grandes nações industrializadas, tendo realizado, num
período de aproximadamente quatro décadas, um enorme salto qualitativo que o transpôs da
segunda para a terceira revolução industrial, em plena fronteira tecnológica. No que tange a
estrutura do parque industrial e ao modelo de sociedade, a Coreia do Sul do início do século
XXI apresenta escassas semelhanças com aquele mesmo país de meados do século XX, o
que pode ser facilmente compreendido quando observado sob perspectiva histórica.
Após um longo período como colônia japonesa (1910 a 1945) e quase quatro anos
de ocupação americana (1945 a 1948), a Coreia do Sul consolidou-se muito tardiamente
como uma nação autônoma do ponto de vista político-institucional, o que explica em parte
seu relativo atraso econômico-social ainda no início da segunda metade do século XX. Em
meio ao caos econômico após a divisão do país, o governo de Syng-Man Rhee (1948-1960)
implementou duas importantes reformas institucionais. A primeira foi a reforma agrária,
que, agindo em dois momentos (1947 e 1950), revelou-se fundamental para a redução da
26
desigualdade de renda do país, além de liberar a mão-de-obra das lavouras para o progresso
industrial que estava por vir, acabando, dessa forma, com um dos principais obstáculos
sócio-políticos para o desenvolvimento sul-coreano. A segunda reforma ocorreu no âmbito
educacional, ao se tornar compulsório o ensino primário e elementar em todo o país.
Entretanto, o crescimento econômico ainda não era visto como uma meta no
governo Rhee, o que, em paralelo com a instabilidade política e social do país, que
culminou com a Guerra da Coreia em junho de 1950, resultou num período de baixo
crescimento da economia sul-coreana com uma leve concentração de renda. Somente após
o cessar-fogo, obtido em julho de 1953 sob forte assistência dos EUA e das Nações Unidas,
a Coreia do Sul pôde finalmente buscar sua reconstrução econômica de fato, crescendo,
com breves interrupções, a uma taxa média anual superior a 7% ao ano (5% em termos per
capita) durante as quatro décadas seguintes.
A estratégia de retomada do desenvolvimento econômico, conduzida pelo governo
sul-coreano, consistiu basicamente numa política industrial orientada para a substituição de
importações até os primeiros anos da década de 60, quando então ganhou ênfase uma
política de forte estímulo às exportações, que se firmaram como o cerne da dinâmica de
crescimento econômico do país nas décadas seguintes (AMSDEN, 1989). Paralelamente,
no campo político, após um curto período de experiência parlamentarista iniciada com a
renúncia do presidente Rhee em abril de 1960, o país, tomado por uma crescente
instabilidade política, mergulhava então numa ditadura militar, sob mão-de-ferro do
general-presidente Park Chung Hee que perduraria por toda a década seguinte.
O longo período que se seguiu de elevado crescimento econômico foi guiado pelos
planos quinquenais de desenvolvimento, estabelecidos pelo governo sul-coreano. O
primeiro plano (entre 1962 e 1966) foi responsável pela condução dos primórdios da
27
estrutura industrial do país, com ênfase no desenvolvimento da matriz energética (energia
elétrica e petróleo) e nas indústrias básicas e de infra-estrutura (fertilizantes, fibras
sintéticas e cimento). A política comercial tinha como objetivo expandir fortemente o setor
exportador, que desde então ganhou destaque dentro do cenário econômico do país. Para
tanto, o governo lançou mão desde empréstimos em condições facilitadas, até apoios
administrativos e benefícios fiscais, que resultaram numa forte aceleração das exportações
no período, puxando consigo o restante da economia (COUTINHO, 1999).
2.2 – Década de 70: industrialização pesada e orientação exportadora
A Coreia do Sul ingressa na década de setenta ainda sob a égide do governo Park e
no percurso do 2º Plano Quinquenal, o qual fortaleceu a indústria de manufaturas leves com
fins de intensificar o viés exportador do país. Como primeiro resultado desse esforço, as
exportações ampliaram enormemente sua participação no Produto Interno Bruto do país, de
4% no início dos anos 60 para cerca de 12,5%, apresentando um crescimento médio anual
de aproximadamente 34,5% ao longo dos dois primeiros Planos (COUTINHO, 1999).
Todavia, cabe ressaltar que o fortalecimento do setor exportador não foi o único
objetivo almejado pelo dirigismo do governo Park. Paralelamente, observou-se um
aprimoramento da infraestrutura básica do país, mais especificamente nos setores de
construção civil, transportes e energia. Ademais, verificou-se um forte estímulo ao
desenvolvimento do mercado interno através da substituição de importações via proteção
tarifária e ganhos de produtividade.
Entretanto, deve-se buscar entender tal processo menos como uma estratégia isolada
de fortalecimento da demanda doméstica do que como uma necessidade inerente à
industrialização já em curso, uma vez que o avanço da industrialização via manufaturas
28
leves demandava uma série de insumos intermediários que, em grande parte, não eram
supridos pela base pesada pouco estruturada da indústria sul-coreana. A dívida externa do
país a partir da segunda metade da década de sessenta e os primeiros anos da década
seguinte foi utilizada fundamentalmente para o financiamento às exportações, às
importações de bens de capital para o setor de manufaturas leves, à substituição de
importações na indústria pesada (fertilizantes e cimento) e aos investimentos em
infraestrutura. O objetivo era diminuir, dessa forma, a dependência do país em relação ao
apoio financeiro externo, que vinha se ampliando gradativamente nos últimos anos, tendo
saltado da faixa dos US$ 308 milhões durante o primeiro Plano Quinquenal para cerca de
US$ 2,3 bilhões ao longo do segundo Plano (AMSDEN, 1989).
Em 1973, o 3º Plano Quinquenal (1972 a 1976) dá início a um período de forte
expansão da indústria pesada que perduraria pelo 4º Plano (1977 a 1981), se estendendo ao
longo de toda a década de setenta. Siderurgia, petroquímica e a indústria de cimento
formavam o tripé de sustentação da indústria de base no período que, em conjunto com o
desenvolvimento dos setores automobilístico, naval e de bens de capital, foram
responsáveis pela consolidação da indústria pesada sul-coreana ao final da década.
Ao término dos anos setenta, a industrialização do período se caracterizava pela
descontinuidade (quantitativa e qualitativa) – local dos processos de acumulação de capital
intrínseca à industrialização pesada tardia, além de baixa participação de investimentos
diretos externos, com predomínio do ingresso de tecnologia sob modalidades exteriorizadas
e a composição de passivos externos junto ao sistema bancário privado internacional.
Ademais, o período também foi marcado pela centralização financeira e decisória dos
investimentos pelo Estado, que controlava em última instância a grande maioria dos fundos
de investimentos (internos e externos) através do sistema bancário local estatizado, e pela
29
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
12,00%
14,00%
1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979
Taxa
de
Cre
scim
ento
AnoFonte: Bank of Korea
emergência dos chamados chaebols, um conjunto de conglomerados industriais
extremamente diversificados responsáveis pela execução do projeto estatal de
industrialização (CANUTO, 1994).
O sucesso do projeto de industrialização pesada e dinamização da economia sul-
croeana se refletiu em elevadas taxas de crescimento do produto agregado ao longo da
década de setenta, numa média de 8,28% ao ano (de acordo com dados do Bank of Korea),
como pode ser observado no Gráfico 1 a seguir:
Gráfico 1: Taxa de Crescimento do PIB da Coreia do Sul na década de 70
A tabela 1 a seguir demonstra o resultado encontrado para a decomposição do
crescimento econômico da Coreia do Sul pela ótica da demanda (tal como apresentado no
capítulo 1) para o período compreendido entre os anos de 1970 e 1980:
30
Público Privado
Cons. Gov. 39,22% 39,22%
Invest. Gov. 0,01% 0,01%
Cons. NPISH's 3,07% 3,07%
Invest. Res. Fam. 16,32% 16,32%
Cons. Duráveis Fam. 1,86% 1,86%
Cons. Não-Dur. Fam. -15,56% -15,56%
Invest. Emp. Priv. 24,62% 24,62%
Coef. Prod. Dom. -25,19% -25,19%
Exportações 62,93% 62,93%
Var. Estoques -1,77% -1,77%
Discrep. Estatística -4,34% -4,34%
Total 39,23% 30,30% 37,74% -1,77% -4,34% 101,17%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Discrep.
Estatística
Tabela 1: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1970 e 1980
O esforço de industrialização realizado pelo governo Park, principalmente a partir
dos anos 70, mostrou-se gratificante à medida que o país apresentou um crescimento
vertiginoso do Produto Interno Bruto da ordem de 101% entre 1970 e 1980, com uma
média anual de cerca de 7,3% (8,5% a partir da segunda metade da década). As exportações
foram o componente da demanda agregada que mais contribuíram isoladamente para o
crescimento do produto agregado (62,93 p.p.), refletindo o sucesso da estratégia de
industrialização orientada para exportação empreendida pelo governo sul-coreano (com
destaque para a criação do Eximbank do país em 1976, visando a oferecer financiamento a
operações de exportação com juros mais acessíveis e condições facilitadas). Todavia,
apesar das exportações terem sido um importante vetor do crescimento econômico do
período, o setor externo não logrou uma maior contribuição para o crescimento apresentado
em função do resultado para o coeficiente de produção doméstica, negativo em 25,2 p.p.
Dessa forma, verifica-se que a dinâmica do setor exportador não foi acompanhada por um
maior dinamismo do mercado interno do país por conta do processo de penetração das
31
importações, que cresceram a uma taxa real (numa série livre da influência do câmbio, a
partir de dados do IPEA) acumulada de 120,53% entre 1970 e 1980.
O setor doméstico da economia também teve forte contribuição para a evolução da
produção agregada do país, contribuindo com aproximadamente 69,53 pontos percentuais
(p.p., doravante) dos 101% alcançados no período, dos quais 39,23 p.p. correspondem à
contribuição do setor público, ao tempo em que o setor privado contribuiu com 30,3 p.p..
Cabe destacar que o consumo do governo foi o componente da demanda agregada
majoritariamente responsável pela contribuição do setor público no processo de
crescimento do período enquanto que o investimento do governo1 contribuiu com apenas
0,01 p.p., o que representa uma participação praticamente nula desse componente no
mesmo processo. No setor privado, os investimentos das empresas e o investimento
residencial das famílias foram os principais indutores do processo de crescimento (24,62
p.p. e 16,32 p.p., respectivamente), compensando a retração do consumo de bens não-
duráveis das famílias (15,56 p.p. negativos).
Todavia, a ínfima contribuição dos investimentos do governo ao processo de
crescimento do produto agregado sul-coreano de maneira alguma se traduz em irrelevância
do governo como agente do desenvolvimento da Coreia do Sul. Desde o princípio dos
planos quinquenais (e ao longo de todos), o processo de industrialização do país sempre
dependeu fundamentalmente da coordenação do Estado, responsável tanto por induzir
quanto por estimular o processo de desenvolvimento, seja proporcionando financiamento 1 Cabe destacar que, na ausência de uma série histórica com dados da Formação Bruta de Capital Fixo do
Governo da Coreia do Sul, utilizou-se para a análise da série referente à Formação Bruta de Capital do
Governo, isto é, incluindo a variação de estoques, sendo a diferença decorrente dessa variação descontada
dos valores referentes ao investimento das empresas privadas, que foram calculados de forma residual
(investimento das empresas privadas = Investimento total – investimento residencial – investimento do
governo). Todavia, como se perceberá ao longo desse capítulo, a contribuição do investimento do governo
(enquanto dispêndio) para o crescimento do PIB não chega a um centésimo por cento do total, de forma
que a distorção gerada pela inclusão dos estoques tem significância nula.
32
em condições facilitadas (juros mais baixos e prazos mais longos) ou praticando medidas
de proteção tarifária e isenção fiscal, de forma a reduzir o risco e ampliar o retorno dos
empreendimentos tanto das empresas privadas quanto das estatais (AMSDEN, 1989).
Sendo assim, nota-se que a política de substituição de importações e ganhos de
produtividade nos setores produtores de bens intermediários não foi suficiente para
compensar mais que proporcionalmente o incremento na demanda por insumos importados
acarretada pela aceleração do processo de industrialização, mas, ainda assim, logrou
estabilizar o endividamento externo como parcela do PIB. Segundo Amsden (1989),
Rather than soften external shocks with austerity measures, the Korean
government has been wont to adopt expansionary policies and borrow its
way out of balance-of-payments difficulties. It has been able to do so
because heavy foreign borrowing has been balanced by large productivity
increases. Therefore, despite massive foreign borrowing to finance
diversification, the debt/GNP ratio even fell slightly in Korea by the end of
the Big Push into heavy industry in 1979. (p. 367)
Assim, o esforço de reduzir a dependência de empréstimos e apoio financeiro
externo não apresentou resultados muito expressivos no período, mas foi suficiente para
manter relativamente estável a relação dívida externa sobre PIB do país, que, à exceção de
um breve pico de 39% em 1975, permaneceu oscilando na faixa de 32% anuais, como pode
ser observado no gráfico 2 a seguir.
33
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979
Rel
ação
Dív
ida/
PIB
AnoFonte: Bank of Korea
Gráfico 2: Relação Dívida Externa / PIB da Coreia do Sul na década de 70
Ao final da década de 70, a súbita elevação da taxa de juros dos EUA pelo Federal
Reserve acarretou uma quase imediata corrida de capitais especulativos para títulos da
dívida americana, de menor risco e, a partir daquele momento, de rentabilidade
relativamente alta. Os países em desenvolvimento, que se beneficiavam da relativa
abundância de liquidez no mercado internacional para promover a industrialização,
sofreram as consequências da abrupta reversão do fluxo de divisas no mercado
internacional, que escoavam da periferia para os países do “centro” no afã do “efeito
manada” provocado num segundo momento da crise pela busca de aplicações financeiras
ditas mais “seguras” aos olhos do investidor internacional.
Nesse contexto, interpenetrado pelo segundo choque de preços do petróleo, a Coreia
do Sul adentra a década de 80 sob os efeitos da súbita contração de divisas que ameaçava a
manutenção do surto industrializante da última década. Em paralelo à crise econômica, em
outubro de 1979 o general Park Chung Hee é assassinado por membros dos serviço secreto
coreano, dando início ao uma fase de intensa instabilidade política no país.
34
2.3 - Década de 80: globalização financeira, crise e recuperação
Sob lei marcial, o general Chun Doo Hwan assume o governo da Coreia do Sul em
meio à turbulência político-econômica de 1980. No âmbito internacional, a crise provocada
como uma rápida resposta dos investidores dos principais centros financeiros mundiais à
súbita e acentuada elevação da taxa de juros dos EUA refletia as transformações do
mercado financeiro decorrentes dos avanços alcançados no campo da tecnologia da
informação. A “globalização financeira” ganhava força com a propagação das novas
tecnologias, articulando de forma cada vez mais perene uma maior interpenetração dos
mercados.
Nesse contexto, vale destacar que o estreitamento da integração econômica
desenvolveu-se de forma categórica entre as economias da OCDE (Organização para a
Cooperação Econômica e o Desenvolvimento). De acordo com Coutinho (1999),
A acumulação de capitais extravasou significativamente as fronteiras
nacionais, sob a égide da globalização financeira, implicando forte
interpenetração patrimonial através de fusões e aquisições internacionais
e elevados fluxos de investimento direto das grandes empresas dos países
industrializados. (...) Na década de 80, o estreitamento da
interdependência e da integração concentrou-se dentro da OECD,
encampando apenas alguns países do Leste Asiático, e deixou à deriva o
restante dos países em desenvolvimento. (pp. 363-364)
35
Público Privado
Cons. Gov. 4,88% 4,88%
Invest. Gov. 0,00% 0,00%
Cons. NPISH's 0,99% 0,99%
Invest. Res. Fam. 4,19% 4,19%
Cons. Duráveis Fam. 5,16% 5,16%
Cons. Não-Dur. Fam. -8,34% -8,34%
Invest. Emp. Priv. -0,72% -0,72%
Coef. Prod. Dom. 1,70% 1,70%
Exportações 14,87% 14,87%
Var. Estoques -0,14% -0,14%
Discrep. Estatística 3,63% 3,63%
Total 4,88% 1,28% 16,57% -0,14% 3,63% 26,22%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Discrep.
Estatística
Tabela 2: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1980 e 1983
A Tabela 2 anterior apresenta o resultado da decomposição do crescimento do
produto agregado da Coreia do Sul entre os anos 1980 e 1983. A exemplo do que foi
observado para o período entre 1970 e 1980, as exportações continuaram sendo o principal
componente autônomo da demanda agregada no crescimento do PIB sul-coreano,
contribuindo isoladamente com 14,87 p.p. dos 26,22% de crescimento apresentado no
período. Isso demonstra que a funcionalidade da orientação exportadora do padrão de
industrialização do país permitiu manter elevada a participação das exportações na
dinâmica do crescimento econômico, mesmo em face à retração da renda interna de alguns
dos principais países importadores de produtos sul-coreanos.
Paralelamente, a participação em 1,7 p.p. do coeficiente de produção doméstica
reflete basicamente os resultados do esforço de substituição de importações em voga desde
os primeiros Planos Quinquenais, o que reduziu a necessidade de se recorrer a insumos
intermediários de origem externa para suprir o processo de industrialização. Assim,
diferentemente do resultado encontrado anteriormente para o período de 1970 a 1980, dessa
36
vez o setor externo como um todo foi o grande condutor do crescimento econômico nos
primeiros anos da década de oitenta, tendo contribuído com expressiva parcela (16,57 p.p.)
do total apresentado no período.
O setor doméstico participou com 6,16 p.p., dos quais 1,28 são oriundos do setor
privado, enquanto 4,88 foram decorrentes dos gastos realizados pelo setor público. No
âmbito privado, a contribuição positiva dos componentes autônomos da demanda (a ver,
consumo das NPISH, investimento residencial e consumo de bens duráveis das famílias) foi
compensado pela contribuição negativa do investimento das empresas privadas e do
consumo das famílias de bens não-duráveis, ambos gastos induzidos pela demanda
agregada. Em relação ao setor público, novamente a exemplo dos resultados encontrados
para a decomposição do crescimento entre 1970 e 1980, os investimentos públicos mais
uma vez tiveram baixa significância enquanto componente da demanda, enquanto o
consumo do governo estabeleceu-se como o componente majoritário, contribuindo
integralmente com o total de 4,88 p.p. referentes ao setor.
Ademais, verifica-se a contribuição negativa do supermultiplicador em 7,36 p.p.,
reflexo do arrefecimento da demanda agregada e consequente aumento da capacidade
ociosa da indústria sul-coreana no período (observado que o coeficiente de produção
doméstica foi o único componente induzido que apresentou contribuição positiva, conforme
ressaltado anteriormente). Dessa forma, os gastos autônomos foram os grandes
responsáveis pelo resultado positivo do crescimento, contribuindo com 30,09 p.p..
A Coreia do Sul consegue se reerguer da crise econômica de forma relativamente
rápida em comparação aos demais países em desenvolvimento, graças a uma estratégia bem
sucedida de articulação financeiro-produtiva com o Japão. De um lado, substituíram-se
fontes tradicionais de crédito (empréstimos bancários) no Euromercado ou junto a bancos
37
americanos por novas operações de captação securitizadas no mercado financeiro japonês
(COUTINHO, 1999). De acordo com CANUTO (1994),
O suporte dos bancos japoneses à reestruturação coreana teve uma
contrapartida em termos de repasse de tecnologia. Desde o primeiro
momento da industrialização pesada coreana nos anos 70, firmas
japonesas já haviam sido uma grande fonte de tecnologia, papel
acentuado no ajustamento estrutural rumo à eletrônica e à
automobilística. (p. 121)
No âmbito industrial, acordos com empresas japonesas possibilitaram o rápido
aprendizado tecnológico através da transferência para a Coreia do fornecimento de
componentes e produtos eletrônicos, automobilísticos e mecânicos, além da contratação de
engenheiros japoneses para capacitação tecnológica da mão-de-obra sul-coreana2
(COUTINHO, 1999). Segundo CANUTO (1994),
A relação de complementaridade, entre firmas japonesas e coreanas,
funcionou bem no período entre meados dos anos 70 e 80, conforme
manifesto no comércio triangular com os EUA. (...) A partir de 1985,
acelerou-se a substituição de produtos japoneses por coreanos, fazendo
com que a complementaridade, pelo lado japonês, se aproximasse de seu
limite. A valorização do iene (50%) – maior que a do won sul-coreano
(20%) – em relação ao dólar em 1985-87, o rápido aprendizado
tecnológico das firmas coreanas, bem como o protecionismo mais
2 Nesse aspecto, vale destacar o papel fundamental desempenhado pelo alto padrão de escolaridade dos
trabalhadores sul-coreanos, resultado do enorme esforço educacional desempenhado pelo governo desde
as reformas de Syng-Man Rhee, que possibilitou a fácil absorção dos novos métodos e processos produtivos.
38
acentuado sobre o Japão, abriram várias oportunidades de expansão
aproveitadas pelos chaebol. (pp. 122-123)
O 5º e o 6º Planos Quinquenais (1982 a 1986 e 1987 a 1991, respectivamente)
focaram fundamentalmente numa estratégia de aumento da competitividade do parque
industrial sul-coreano por meio do estímulo à capacitação tecnológica e aos investimentos
em P&D. O objetivo, bem sucedido ao final da década, era aproximar a indústria local da
fronteira tecnológica, promovendo, dessa forma, um “salto” do país rumo à terceira
Revolução Industrial.
Nesse contexto, destaca-se novamente o papel da articulação do Estado no processo
de recuperação da crise e retomada do desenvolvimento. Segundo COUTINHO (1999),
Embora a retórica dos planos quinquenais (5º e 6º) fosse de crescente
liberalização e de ênfase no livre funcionamento dos mecanismos de
mercado – aliviando-se o grau de dirigismo que caracterizara a “era
Park“ – não resta dúvida de que o Estado continuou determinando os
rumos e as prioridades do processo de desenvolvimento, embora
delegasse um espaço bem mais para que o setor privado tomasse
iniciativas e escolhesse alternativa, porém, dentro das diretrizes oficiais.
(p. 367)
Todavia, outro elemento-chave para se entender a rápida superação da Coreia do Sul
aos efeitos adversos da chamada “Crise da Dívida”, que se abateu principalmente sobre os
países em desenvolvimento nos primeiros anos da década de oitenta, consiste na peculiar
estrutura do balanço de pagamentos do país naquele momento, que favoreceu a
39
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986
Re
laçã
o D
ívid
a/PI
B
AnoFonte: Bank of KoreaFonte: Bank of Korea
sustentabilidade do financiamento do processo de industrialização sul-coreano ao longo de
um período caracterizado pela escassez de divisas no mercado internacional.
Ao tempo em que a Coreia do Sul incorria em constantes déficits em sua conta
corrente com o Japão, por conta da crescente importação de bens de capital, tecnologia e
produtos de alto valor agregado necessárias ao processo de industrialização (em montante
bem menor que os insumos intermediários – petroquímicos, produtos siderúrgicos, papel e
metais não-ferrosos – exportados para aquele país), compensava através do acúmulo de
superávits com os EUA que, num posicionamento estratégico dentro do contexto da Guerra
Fria, possibilitava acesso facilitado ao mercado americano pela Coreia do Sul (AMSDEN,
1989). Sendo o país um aliado incondicional dos EUA na vertente asiática da Guerra Fria, o
objetivo último dessa medida era limitar a influência do bloco comunista sobre o país, além
de fortalecê-lo frente à constante ameaça da Coreia do Norte. Isso explica em parte a
postura leniente dos EUA em relação ao dirigismo estatal no processo de industrialização,
às praticas de protecionismo e subsídios e a regulação do crédito pelo governo.
Gráfico 3: Relação Dívida Externa / PIB da Coreia do Sul: 1980 a 1986
40
0,00
100,00
200,00
300,00
400,00
500,00
600,00
700,00
800,00
900,00
1.000,00
Par
idad
e
Ano
Won/Dólar
Won/Iene
Fonte: Bank of Korea
O Gráfico 3 anterior demonstra o bom resultado atingido por essa articulação
político-econômica, que logrou manter a dívida externa do país relativamente estável nos
anos que sucederam a crise. Entretanto, cabe destacar que o Estado também contribuiu para
o sucesso dessa estrutura de trocas comerciais, intervindo através de uma política cambial
ativa.
Como forma de manter a moeda local numa posição intermediária que não
prejudicasse sua balança comercial, o estratégia do Banco Central sul-coreano foi fazer o
Won acompanhar apenas parcialmente as valorizações do Iene, mas sempre com a
preocupação de não sobrevalorizar a moeda local em relação ao Dólar. A trajetória das duas
taxas de câmbio ao longo do período pode ser observada no Gráfico 4 a seguir:
Gráfico 4: Taxas de Câmbio: Won/Dólar X Won/Iene (1980 a 1989)
Sendo assim, a Coreia do Sul, que iniciara a década de oitenta sentindo os efeitos do
ambiente econômico adverso aos países em desenvolvimento provocado pela reversão da
confiança dos investidores internacionais, encerra o mesmo período tendo fortalecido seus
grandes grupos econômicos frente ao mercado global e em pleno processo de transição para
41
-2,00%
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
12,00%
1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989
Taxa
de
Cre
scim
ento
Ano
Fonte: Bank of Korea
a Terceira Revolução Industrial, com um complexo eletrônico bem estruturado e
competitivo. Os bons resultados em termos de crescimento do produto agregado (com
destaque à forte recuperação ainda em 1981) podem ser observados no Gráfico 5 a seguir:
Gráfico 5: Taxa de Crescimento do PIB da Coreia do Sul na década de 80
2.4 - Década de 90: reformas, internacionalização e crise
Os primeiros anos da década de noventa são marcados por uma leve recessão da
economia dos EUA, que logo se dissemina entre os países do G-7. Com intuito de recuperar
o crescimento, bancos centrais das nações mais desenvolvidas reduzem sistematicamente
suas taxas básicas de juros, tornando novamente atrativo ao capital financeiro internacional
o investimento nos mercados emergentes.
42
Público Privado
Cons. Gov. 32,80% 32,80%
Invest. Gov. 0,01% 0,01%
Cons. NPISH's 3,60% 3,60%
Invest. Res. Fam. 27,40% 27,40%
Cons. Duráveis Fam. 17,18% 17,18%
Cons. Não-Dur. Fam. -10,71% -10,71%
Invest. Emp. Priv. 16,58% 16,58%
Coef. Prod. Dom. -15,45% -15,45%
Exportações 60,73% 60,73%
Var. Estoques -2,62% -2,62%
Discrep. Estatística -4,66% -4,66%
Total 32,82% 54,04% 45,29% -2,62% -4,66% 124,87%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Discrep.
Estatística
Tabela 3: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1983 e 1993
Entre os anos de 1983 e 1993, período de consolidação da industrialização pesada
na Coreia do Sul e do fortalecimento de sua integração econômica com o Japão, o PIB sul-
coreano cresce a uma taxa média anual da ordem de 8,7%, alcançando 124,87% no
acumulado. Conforme pode ser observado na Tabela 3 anterior, mais uma vez, as
exportações tiveram destaque como componente isolado da demanda agregada (e também
dentre os gastos autônomos) com maior contribuição para o resultado do período,
participando com 60,73 p.p..
Todavia, diferentemente do verificado para o período de 1980 a 1983, foi o setor
doméstico, e não o externo, que mais impulsionou o crescimento, contribuindo com um
total de 86,86 p.p., contra 45,29 p.p. do setor externo. A forte participação das exportações
no processo de crescimento foi parcialmente contrabalanceada pela contribuição negativa
em 15,45 p.p. do coeficiente de produção doméstica, fruto do processo de penetração das
importações decorrente da industrialização em curso.
43
No âmbito doméstico, o consumo do governo, participando com 32,8 p.p., se
estabelece como predominante dentro da contribuição do setor público ao crescimento
econômico, tendo em vista que os investimentos públicos continuam a ter participação
ínfima no processo (0,01 p.p.). O setor privado volta a ser o principal impulsionador do
processo de crescimento, contribuindo com 54,04 p.p., com o investimento residencial das
famílias tendo a maior participação (27,4 p.p.), seguido do consumo de bens duráveis
(17,18 p.p.) e do investimento das empresas privadas (16,58 p.p.), este último provável
resultado da aceleração da taxa de crescimento no período. O consumo de bens não-
duráveis continua a retrair o processo de crescimento, contribuindo agora com 10,71 p.p.
negativos.
Nesse contexto, a Coreia do Sul, que logrou manter relativamente estáveis os
fundamentos de sua economia ao longo do cenário econômico internacional adverso da
década de oitenta, inicia os anos noventa com uma boa avaliação aos “olhos” do mercado
financeiro mundial, que enxergava nos bons resultados apresentados na década anterior
pelo país como um sinal do potencial de crescimento e sustentabilidade de sua economia no
longo prazo. A retomada do fluxo de capitais para dentro do país serviu para alavancar os
planos de internacionalização dos chaebols, com vista a aumentar o market-share através
de investimentos externos diretos e uma estratégia robusta de fortalecimento de suas marcas
e inserção nos mercados dos países desenvolvidos.
Todavia, a facilidade do acesso ao crédito pelas firmas, em conjunto com o
ambiente macroeconômico favorável, acarretou numa maior indulgência dos agentes
econômicos para com a execução e gestão dos investimentos. A contrapartida foi um forte
incremento nos níveis de alavancagem financeira das firmas e um saldo negativo
44
0,00
200,00
400,00
600,00
800,00
1.000,00
1.200,00
1.400,00
1.600,00
Pari
da
de
Ano
Won/Dólar
Won/Iene
Fonte: Bank of Korea
expressivo na conta capital do país, acarretando um aumento significativo no déficit em seu
balanço de pagamentos (COUTINHO, 1999).
Paralelamente, com o intuito de tornar mais propícia a incursão de bancos e
empresas estrangeiras no mercado local, a taxa de câmbio, que ao longo da década de
oitenta era administrada de forma a seguir uma paridade intermediária entre o Dólar e o
Iene, sofre uma revisão quanto à sua política de condução e passa a acompanhar (extra-
oficialmente) as variações da moeda americana, o que implicou em constantes
sobrevalorizações do Won (ver Gráfico 6 a seguir).
Gráfico 6: Taxas de Câmbio: Won/Dólar X Won/Iene (1980 a 1989
A sobrevalorização da taxa de câmbio (acarretando em aumento das importações e
perda de competitividade das exportações), somada ao fraco desempenho da economia
japonesa no período (com impacto negativo sobre as exportações sul-coreanas), levou ao
acúmulo crescente de déficits em conta corrente pelo país, que por sua vez eram
financiados por empréstimos externos de curto prazo, constituía um ambiente de alta
vulnerabilidade para a Coreia do Sul. Com o deflagrar da crise de balanço de pagamentos
45
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Re
laçã
o D
ívid
a/PI
B
AnoFonte: Bank of KoreaFonte: Bank of Korea
da Tailândia e o colapso da bolsa de Hong Kong pouco depois, a reversão da confiança do
mercado financeiro internacional rapidamente se expandiu para as demais economias do
Leste Asiático, e a volatilidade dos bancos sul-coreanos foi exposta. A fuga maciça de
capitais de curto prazo que veio a seguir levou ao enxugamento das reservas do Banco
Central do país e a uma consequente e forte depreciação de sua taxa de câmbio, o que levou
a Coreia do Sul a decretar a moratória e recorrer à ajuda do Fundo Monetário Internacional
– FMI (COUTINHO, 1999).
O recrudescimento da parcela da dívida externa sobre o Produto Interno Bruto do
país pode ser observado no Gráfico 7 a seguir:
Gráfico 7: Relação Dívida Externa / PIB da Coreia do Sul: 1994 a 2000
Sobre a crise econômica que se abateu sobre os países do Leste Asiático em 1997,
Medeiros (2001) diz que,
“o acúmulo de capitais voláteis de curto prazo em relação às reservas
disponíveis tornou os regimes cambiais vigentes insustentáveis,
provocando intensa onda especulativa e fuga de capital com consequente
46
-6000000
-5000000
-4000000
-3000000
-2000000
-1000000
0
10000000
20000000
30000000
40000000
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Exp
ort
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s co
nst
an
tes
de
200
0)
AnoFonte: OCDE
colapso do câmbio e do preço dos ativos domésticos. As suas causas
imediatas foram a abertura e desregulação financeira e a valorização da
taxa de câmbio real. Devido ao alto endividamento de curto prazo do
sistema bancário, o colapso do câmbio e dos ativos levou a pronunciada
crise financeira e a um credit crunch responsável por intensa contração
econômica em 1998 – a maior, em toda a região, desde 1930 – e à
bancarrota de inúmeros bancos e empresas”. (p. 33)
Sob a tutela do FMI, a Coreia do Sul retoma, já em 1999, a trajetória de forte
expansão do Produto Interno Bruto, dando prosseguimento aos processos de abertura
comercial e financeira. A forte desvalorização de sua taxa de câmbio e o desaquecimento
de seu mercado interno por conta da crise econômica tiveram um grande impacto positivo
(ver Gráfico 8 a seguir) sobre o saldo da balança comercial do país (fortalecendo as
exportações e arrefecendo as importações, respectivamente), o que, somado à redução da
vulnerabilidade de curto prazo mediante o aporte de recursos do FMI, criou as condições de
liquidez e solvência externa necessárias à rápida recuperação (MEDEIROS, 2001).
Gráfico 8: Exportações Líquidas da Coreia do Sul na década de 90
47
-8,00%
-6,00%
-4,00%
-2,00%
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
12,00%
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Taxa
de
Cre
scim
ento
Ano
Fonte: Bank of Korea
Amsden (2009) ressalta que “entre o final de 1993 e final de 1997, a dívida externa
total na Coreia, epicentro da crise asiática, aumentou por um fator de 3,3, o maior aumento
no Leste Asiático, cujo índice médio de crescimento foi ainda assim alto. (...) Apenas três
anos depois que o desastre se abateu sobre o Leste Asiático, o rápido crescimento retornou”
(p. 439). A trajetória de crescimento do PIB sul-coreano pode ser observada no Gráfico 9 a
seguir:
Gráfico 9: Taxa de Crescimento do PIB da Coreia do Sul na década de 90
Observa-se que, a despeito da forte crise cambial que se abateu sobre o país nos
últimos meses de 1997, a Coreia do Sul apresentou uma rápida e expressiva recuperação,
voltando a crescer vigorosamente nos anos que sucederam sua recessão. Ademais, ainda no
final de 1998, o país logrou restaurar sua posição em reservas internacionais, que era da
ordem de US$ 33 bilhões ao final de 1996 e caíra para cerca de US$ 20,5 bilhões em
dezembro de 1997, atingindo aproximadamente US$ 52 bilhões no encerramento de 1999,
segundo dados do Bank of Korea.
A Tabela 4 a seguir apresenta o resultado da decomposição do crescimento do PIB
sul-coreano no período que precedeu a Crise e o ano em que seus efeitos foram sentidos de
48
Público Privado
Cons. Gov. 5,89% 5,89%
Invest. Gov. 0,01% 0,01%
Cons. NPISH's 0,41% 0,41%
Invest. Res. Fam. -1,02% -1,02%
Cons. Duráveis Fam. -1,65% -1,65%
Cons. Não-Dur. Fam. -5,19% -5,19%
Invest. Emp. Priv. -6,77% -6,77%
Coef. Prod. Dom. -5,42% -5,42%
Exportações 43,10% 43,10%
Var. Estoques -6,99% -6,99%
Discrep. Estatística 1,22% 1,22%
Total 5,89% -14,23% 37,68% -6,99% 1,22% 23,58%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Discrep.
Estatística
fato pela economia do país, entre 1993 e 1998:
Tabela 4: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1993 e 1998
A Coreia do Sul crescia a uma taxa média de 7,1% ao ano, acumulando um
crescimento de 32,68% entre 1993 e 1997, quando recuou -6,85% em 1998 por conta dos
efeitos da crise cambial. Dessa forma, no acumulado entre 1993 e 19983, o crescimento do
PIB sul-coreano foi de 23,58%.
Seguindo a tendência de anos anteriores, as exportações representaram o principal
componente impulsionador do crescimento no período, contribuindo isoladamente com
37,68 p.p., além de apresentar a contribuição majoritária dentre os gastos autônomos no
período. Isso significa que o dinamismo apresentado pelo setor exportador não perdeu força
ao longo dos anos noventa, resultado da estabilidade da orientação exportadora através dos
diferentes governos. Todavia, o coeficiente de produção doméstica apresentou uma
colaboração negativa em 5,42 p.p., muito provavelmente fruto do processo de abertura
3 Em função da escassez de matrizes de insumo-produto (necessárias para o processo de decomposição do
crescimento do PIB) disponibilizadas pelo Bank of Korea (são apresentados dados apenas para os anos 1990,
1993, 1995 e 1998 da década de noventa), realizou-se a divisão da análise do período compreendido entre
os anos de 1993 a 1998, ao invés de 1993 e 1997, como seria mais adequado.
49
Público Privado
Cons. Gov. 1,01% 1,01%
Invest. Gov. 0,00% 0,00%
Cons. NPISH's 0,09% 0,09%
Invest. Res. Fam. -1,44% -1,44%
Cons. Duráveis Fam. 3,08% 3,08%
Cons. Não-Dur. Fam. -0,08% -0,08%
Invest. Emp. Priv. 3,89% 3,89%
Coef. Prod. Dom. -13,69% -13,69%
Exportações 20,89% 20,89%
Var. Estoques 5,59% 5,59%
Discrep. Estatística -0,58% -0,58%
Total 1,01% 5,55% 7,20% 5,59% -0,58% 18,78%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Discrep.
Estatística
econômica e internacionalização dos chaebols no período.
Dentre os demais gastos autônomos, o consumo do governo representou a segunda
maior contribuição positiva do período, com 5,89 p.p.. O investimento público, por sua vez,
manteve a participação diminuta como componente gerador de demanda. Entretanto, a
relevância da contribuição do setor público para o período não deve ser desprezada, dado
que o setor privado contribuiu negativamente com 14,23 p.p..
À exceção do consumo das NPISH, que contribuiu positivamente com ínfimos 0,41
p.p., todos os demais gastos componentes do setor privado apresentaram contribuição
negativa para o crescimento do período, sejam eles autônomos (investimento residencial e
consumo de bens duráveis das famílias, com 1,02 p.p. e 1,65 p.p. respectivamente) ou
induzidos (consumo das famílias de bens não-duráveis e investimentos das empresas
privadas, com 5,19 p.p. e 6,77 p.p. respectivamente). A contribuição da variação do
supermultiplicador foi negativa em 17,39 p.p., tendo sido também negativa em todos os
seus determinantes (consumo de bens não-duráveis das famílias, investimento das empresas
privadas e coeficiente de produção doméstica).
Tabela 5: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1998 e 2000
50
A Tabela 5 anterior demonstra os resultados para a decomposição do crescimento
no acumulado dos anos que seguiram a crise asiática até 2000. Após uma retração de quase
7% do PIB em 1998, o país consegue, já no ano seguinte, recuperar o patamar de produção
agregada anterior à crise, atingindo uma taxa de crescimento de cerca de 9,5% em relação
ao ano anterior (aproximadamente 2% de crescimento em relação ao PIB de 1997) e 8,5%
entre 1999 e 2000. No acumulado entre 1998 e 2000, pós-crise, a Coreia do Sul obteve um
crescimento do PIB de 18,78%.
As exportações se mantêm como principal componente da demanda (e,
consequentemente, principal gasto autônomo) a contribuir isoladamente para o crescimento
do PIB no período (20,89 p.p.). Contudo, as variações no coeficiente de produção
doméstica levaram a uma contribuição negativa do mesmo em 13,69 p.p., muito
provavelmente ainda por ordem do processo de abertura da economia e internacionalização
dos chaebols. Nesse sentido, o setor externo manteve-se como principal condutor do
processo de crescimento econômico, embora sua contribuição tenha perdido espaço para o
setor doméstico ao longo desses três anos.
O setor privado recuperou-se do mau desempenho no contexto da dinâmica do
processo de crescimento nos anos que antecederam a crise e participa com 5,55 p.p. no
crescimento do período. As principais contribuições vieram do consumo de bens duráveis
das famílias e do investimento das empresas privadas, com 3,08 p.p. e 3,89 p.p.
respectivamente. O setor público, por sua vez, é novamente representado unicamente pelos
gastos em consumo do governo (1,01 p.p.), tendo em vista que o investimento do governo,
enquanto gerador de demanda, se mantém praticamente nulo em termos de participação no
crescimento do PIB.
51
CAPÍTULO 3 – BRASIL : INSTABILIDADE E DESEQUILÍBRIO EXTERNO NUM CONTEXTO DE
DESCOORDENAÇÃO DE POLÍTICAS DE LONGO PRAZO
2.1 – Breve histórico dos primórdios da industrialização brasileira
Até o fim dos anos 20, o Brasil, assim como a grande maioria dos países da
América Latina, exibia um padrão de desenvolvimento voltado para fora, tendo sua
economia impulsionada principalmente pelas exportações de bens primários. Contudo, a
Grande Depressão da década de 30, com seus graves efeitos sobre o comércio internacional
e os preços das commodities, enterra a possibilidade do Brasil e dos demais países
primário-exportadores latino-americanos de manter um padrão de crescimento a longo
prazo sustentável, em face à enorme redução da capacidade de importar desses países
somada à situação de escassez permanente de divisas nos mercados internacionais. A
solução “natural” para esses países foi voltar a dinâmica de seu crescimento para dentro de
suas fronteiras, o que se tornou possível a partir da introdução de programas de substituição
de importações frente à impossibilidade de se manter o ritmo anterior de crescimento das
exportações.
O padrão de desenvolvimento baseado na substituição de importações vigorou no
Brasil entre as décadas de 30 e 80, sendo que, somente a partir da década de 50, com o
Plano de Metas do governo Kubitschek, passou a ser uma estratégia deliberada do Estado
brasileiro, que tinha como objetivo inicial o crescimento do mercado interno e logrou taxas
de crescimento superiores a 7% ao ano. Após um breve período de estagnação econômica
decorrente da aplicação do receituário ortodoxo para o combate à inflação no início dos
anos 60, a retomada do crescimento tornou-se a palavra de ordem na primeira década dos
governos militares que se seguiram.
52
2.2 – Década de 70: o grande salto da industrialização
A crise do dólar enquanto principal divisa da economia global e a consequente
desregulamentação do mercado financeiro mundial, provocando a expansão do
euromercado, já impulsionada pelo intenso fluxo de petrodólares oriundos do primeiro
choque de preços do petróleo em 1973 esboça o cenário dos primeiros anos da década de
setenta. Dentro do contexto do Programa Estratégico de Desenvolvimento, lançado em
1968 durante o governo militar do marechal Costa e Silva, o Brasil buscava legitimar o
regime político priorizando a retomada do crescimento econômico, com fortalecimento do
comércio exterior e em paralelo a uma estratégia de redução da inflação que não
sacrificasse a demanda.
A retomada do crescimento se daria em três fases. Primeiramente, visava-se à
melhor utilização da capacidade instalada para, em seguida, focar-se na melhoria
quantitativa e qualitativa dos fatores de produção, por meio de investimentos nos setores
tidos naquele momento como prioritários ao país. Nesse sentido, foram planejados
investimentos concentrados nos setores de infraestrutura (energia, transportes e
comunicação), além de siderurgia, mineração, habitação, saúde, educação e agricultura,
paralelamente a um projeto de aperfeiçoamento dos métodos de produção.
Como forma de estimular a demanda, as políticas monetária, creditícia e fiscal
foram sendo gradualmente relaxadas a partir de 1967, com um aumento do volume de
crédito disponível no mercado, em particular ao consumidor e à agricultura. A expansão do
crédito ao consumidor possibilitou o desenvolvimento do setor produtor de bens de
consumo duráveis (automóveis e eletrodomésticos) através do endividamento familiar
(classe média alta), ao tempo em que o maior volume de crédito ao setor agrícola (somado
a uma política seletividade do crédito, que proporcionava isenções fiscais e menores juros
53
ao setor) foi responsável por estimular as exportações de produtos primários e assegurar
uma oferta adequada de alimentos ao mercado interno, com forte impacto positivo sobre o
controle de preços domésticos (LAGO, 1990).
O setor público teve papel central na retomada do crescimento, preenchendo o
espaço deixado pelo setor privado, seja através da realização de investimentos em
infraestrutura, que contribuíram para a consolidação do setor de bens de capital, seja pela
proliferação de centenas de novas estatais e expansão das empresas públicas já existentes,
que atuavam como importante fator pró-cíclico na dinâmica da economia do período. O
setor industrial cresceu expressivamente entre 1968 e 1973 a uma taxa média anual de
11,16%. Conforme planejado, esse crescimento se deu, inicialmente, através da ocupação
de uma expressiva capacidade ociosa do setor. Em seguida, ao tempo em que se
aproximava de sua plena capacidade, o setor foi impulsionado por um expressivo aumento
de investimentos, tanto públicos quanto privados, que, por um lado, alavancaram a indústria
de bens de capital, todavia à custa de maiores importações de bens intermediários. Segundo
Hermann (2005),
A rápida expansão das importações e da dívida externa brasileiras
durante o “milagre econômico” (1968-73) implicou um aumento da
dependência externa do país nesses anos e em anos subsequentes. O forte
crescimento das importações resultou, em grande parte, das mudanças
estruturais associadas ao perfil de crescimento do período: um
crescimento liderado pelo setor industrial e, neste, pelos bens de consumo
duráveis, o que ampliou a dependência externa da economia em relação a
bens de capital. (p. 95)
54
As vendas industriais foram beneficiadas pela enorme expansão da demanda
interna, consequência do maior dinamismo da economia doméstica decorrente do sucesso
de diversas políticas setoriais do governo, assim como pelo incremento das exportações.
O setor externo logrou manter a continuidade na promoção das exportações,
beneficiadas por incentivos fiscais, creditícios e tarifários e pelo regime de
minidesvalorizações cambiais, em voga desde 1968. Ademais, o crescimento da economia
global, com relativa abundância de liquidez internacional (elevado influxo de empréstimos
e financiamentos externos, além da retomada dos investimentos estrangeiros diretos no
setor industrial), contribuiu para a consolidação do equilíbrio externo do país. Como
resultado do esforço exportador, houve um aumento significativo das exportações de
produtos primários (soja, carne, algodão e açúcar), uma maior diversificação da pauta de
exportações (com o café dando lugar a uma maior participação de produtos manufaturados)
e uma maior abrangência de mercados de destino (Europa e Japão) (LAGO, 1990).
Com o aumento da liquidez internacional no período veio o incentivo à captação de
recursos externos, dando continuidade ao processo de internacionalização da economia.
Entre o final dos anos 60 e início dos anos 70, houve um aumento significativo do volume
de empréstimos externos (captados por empresas privadas e, principalmente, estatais)
oriundos de bancos privados, o que implicava em taxas de juros mais elevadas do que
daqueles advindos de fontes oficiais. Tal fato, somado ao encurtamento do prazo médio
desses empréstimos, acarretou numa deterioração do perfil da dívida externa brasileira, que
se agravava em face ao aumento da participação de empréstimos a juros flutuantes no total
de empréstimos externos.
A despeito do problema da dívida externa e da deterioração de alguns indicadores
sociais em termos macroeconômicos (piora na distribuição pessoal e funcional da renda, do
55
ponto de vista dos trabalhadores), o período compreendido entre os anos de 1968 e 1973
tornou-se conhecido na grande mídia como o “milagre econômico brasileiro”. Isso se deveu
à combinação do resultado excepcional apresentado pelo crescimento do PIB do país no
período (apresentando uma taxa média anual de 11,16%, segundo dados do IPEA), com o
controle da inflação (que apresentou ligeira queda) e a consolidação do equilíbrio externo,
com o aumento do saldo total do balanço de pagamentos (HERMANN, 2005).
Em 1973, o primeiro choque de preços do petróleo, que quadruplicou a cotação do
barril no mercado internacional a partir de um corte abrupto da oferta global orquestrado
pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), provocou um enorme abalo
no comércio mundial, que se refletiu num forte desequilíbrio na balança comercial (ver
Gráfico 10 abaixo) e no balanço de pagamentos brasileiro como um todo. Nesse contexto, a
necessidade de legitimação do regime militar impunha ao governo a lógica de priorização
do crescimento econômico em detrimento da sustentabilidade de longo prazo do processo
de desenvolvimento (estabilidade monetária, equilíbrio externo e endividamento), de forma
que se optou pelo financiamento do novo desajuste do balanço de pagamentos a partir de
recursos oriundos da maior abundância de liquidez internacional (petrodólares), decorrente
do aumento da receita de exportação da OPEP. A opção de crescimento com
endividamento acarretou no aumento da dependência do Brasil ao capital estrangeiro, em
detrimento de uma estratégia de ajuste das contas externas (CARNEIRO, 1990).
56
Público Privado
Cons. Gov. 13,05% 13,05%
Invest. Gov. 6,07% 6,07%
Invest. Estatais 10,90% 10,90%
Invest. Res. Fam. 4,21% 4,21%
Cons. Duráveis Fam. 10,40% 10,40%
Cons. Não-Dur. Fam. 0,51% 0,51%
Invest. Emp. Priv. 6,76% 6,76%
Coef. Prod. Dom. -9,07% -9,07%
Exportações 11,78% 11,78%
Var. Estoques 6,96% 6,96%
Total 30,02% 21,88% 2,71% 6,96% 61,57%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
GastosSetor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Gráfico 10: Saldo da Balança Comercial brasileira entre 1970 e 1975
A tabela a seguir demonstra o resultado da decomposição do processo de
crescimento do PIB do Brasil para o período compreendido entre 1970 e 1975, abarcando o
final do chamado “milagre brasileiro” e os dois primeiros anos do governo do general
Geisel (que vigorou de 1974 a 1979):
Tabela 6: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1970 e 1975
De 1970 a 1975 o PIB brasileiro cresceu a uma média anual de 10,16%,
apresentando um forte crescimento acumulado de 61,57%. A demanda doméstica
-5000
-4000
-3000
-2000
-1000
0
1000
1970 1971 1972 1973 1974 1975
Ano
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apresentou-se como motor do crescimento no período, contribuindo expressivamente com
51,9 p.p..
A atuação incisiva do setor público no período, seja através dos investimentos do
governo em obras de infraestrutura, seja pela criação e expansão de estatais, refletiu-se na
contribuição robusta do setor no crescimento, em torno de 30,02 p.p. O setor público
contribuiu majoritariamente com 30,02 p.p., sendo 16,97 p.p. correspondentes a
investimentos públicos (estatais e administração pública). O consumo do governo também
apresentou contribuição relevante, a maior isolada entre gastos públicos, de 13,05 p.p..
No setor privado, a expansão do mercado de bens de consumo duráveis possibilitada
pelo o aumento do volume de crédito disponível refletiu-se numa contribuição de 10,40 p.p.
desses gastos no crescimento, muito acima da parcela dos gastos em bens de consumo não-
duráveis e do investimento residencial. O investimento das empresas privadas, induzido
pelo aquecimento da demanda e pela ocupação da capacidade produtiva ociosa nos
primeiros anos da década de setenta, também contribuiu de forma relevante, com 6,76 p.p.
Todavia, a absorção de bens intermediários inerentes ao processo de
industrialização impactou numa contribuição negativa de 9,07 p.p. correspondentes à
variação do coeficiente de produção doméstica. Assim, apesar do resultado positivo do
esforço exportador do período, em que as exportações contribuíram isoladamente com
11,78 p.p., o setor externo como um todo teve sua participação suavizada no processo de
crescimento, participando com apenas 2,71 p.p..
A partir de 1975, aprofunda-se a estratégia de aceleração do crescimento em
detrimento do ajuste inflacionário com o lançamento do segundo Plano Nacional de
Desenvolvimento (II PND). Segundo Carneiro (1990),
58
De 1975 em diante, a acomodação diante da taxa de inflação seria
periodicamente sujeita a surtos de contenção, todos eles de curta duração.
A aprovação do II PND significou (...) a subordinação dos objetivos de
estabilização às metas de longo prazo. (p. 306)
O II PND pretendia promover a reestruturação da oferta agregada através de um
processo de substituição de importações nos setores de setores de bens de capital e insumos
básicos, além de amplo conjunto de investimentos nos setores de insumos básicos e
infraestrutura (energia e telecomunicações). Adicionalmente, buscava-se o ajuste da
balança comercial, com o fomento às exportações e forte desestímulo às importações,
através de restrições quantitativas, elevação generalizada de tarifas e criação de encargos
financeiros.
Gráfico 11: Taxa de Crescimento do PIB brasileiro entre 1975 e 1980
O II PND logrou manter em patamares elevados o crescimento da economia (ver
Gráfico 11 acima), contudo não conseguiu alcançar os resultados obtidos na primeira
metade da década. A Tabela 7 a seguir apresenta o resultado da decomposição do
crescimento brasileiro no período compreendido entre os anos 1975 e 1980:
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
12,00%
1975 1976 1977 1978 1979 1980
Ano
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Público Privado
Cons. Gov. 7,27% 7,27%
Invest. Gov. -0,85% -0,85%
Invest. Estatais 4,10% 4,10%
Invest. Res. Fam. 7,46% 7,46%
Cons. Duráveis Fam. 7,71% 7,71%
Cons. Não-Dur. Fam. 4,10% 4,10%
Invest. Emp. Priv. 1,87% 1,87%
Coef. Prod. Dom. -0,47% -0,47%
Exportações 14,68% 14,68%
Var. Estoques -4,27% -4,27%
Total 10,51% 21,14% 14,20% -4,27% 41,59%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
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Tabela 7: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1975 e 1980
Entre 1975 e 1980, o Brasil reduz o ritmo acelerado ao qual cresceu na primeira
metade da década, mas ainda assim mantém um crescimento robusto. O PIB cresceu a uma
taxa média de 6,88% anuais, apresentando 41,59% de crescimento no acumulado do
período.
Revertendo a tendência anterior, o setor privado assume maior participação no
crescimento, contribuindo com 21,14 p.p. do total apresentado, com destaque mais uma vez
para o consumo de bens duráveis (7,71 p.p.), mas com participação mais distribuída entre o
mesmo e o investimento residencial das famílias (7,46 p.p.) e o consumo de bens não-
duráveis (4,10 p.p.). A participação das empresas privadas no crescimento diminui,
atingindo 1,87 p.p..
No setor público, por sua vez, perdeu força o investimento da administração
pública, que contribuiu negativamente com 0,85 p.p.. A participação do setor no processo
de crescimento ficou restrita aos gastos em consumo do governo (7,27 p.p.) e aos
investimentos das estatais (4,10 p.p.).
60
Com a maturação dos investimentos na indústria de bens de capital, reduziu-se a
demanda por bens intermediários importados, cuja oferta já era em parte suprida pela
indústria nacional. Isso se refletiu na significativa redução da participação negativa da
variação do coeficiente de produção doméstica no processo de crescimento, de 9,07 p.p. na
primeira metade da década de setenta para 0,47 p.p. na metade seguinte. Isso representa
uma melhora no dinamismo interno da economia brasileira no período, em que a
contribuição positiva e expressiva das exportações no período (14,68 p.p.) pôde ser quase
integralmente internalizada ao processo de crescimento, legando ao setor externo uma
posição mais relevante em termos de geração de demanda.
De um modo geral, os objetivos do II PND foram atingidos, consolidando-se a
matriz industrial brasileira com o sucesso da industrialização por substituição de
importações, que logrou reduzir a importação de bens de capital. No âmbito da política
comercial, conseguiu-se reduzir, ainda que temporariamente, o desequilíbrio na balança
comercial.
Todavia, a desaceleração do crescimento externo nos últimos anos da década de
setenta contribuiu para o aumento gradativo da dívida externa brasileira, cujos juros
(internacionais) aumentavam continuamente. A partir de 1979, com a eclosão do segundo
choque do petróleo, a súbita elevação dos juros internacionais levou ao acirramento do
desequilíbrio externo brasileiro. Ao longo do período de 1975 a 1980, não houve sucesso
na reversão da tendência deficitária da balança comercial brasileira, como pode ser
observado no Gráfico 12 a seguir.
61
Gráfico 12: Saldo da Balança Comercial brasileira entre 1975 e 1980
2.3 - Década de 80: crise e estagflação
A súbita elevação dos juros da dívida dos EUA a patamares históricos para fazer
frente a seu enorme déficit comercial (aprofundado com a duplicação dos preços do
petróleo) e ao processo de estagflação (inflação com baixo crescimento) que se desenhava
em seu território gerou uma corrida de juros dos demais países desenvolvidos, na tentativa
de reter capitais em seus mercados, arrastando a economia mundial a uma profunda
recessão. Nesse contexto, a América Latina, incluindo o Brasil, foi fortemente prejudicada
pelo ambiente econômico adverso, seja pela súbita elevação dos juros internacionais e
consequente reversão dos fluxos de capitais, seja pela forte contração do comércio
internacional.
A escassez de financiamento externo somada ao aprofundamento do desequilíbrio
na balança de pagamentos (tanto pelo lado das transações correntes quanto pela conta de
capitais) obrigou o Brasil a uma reversão em sua política econômica, levando-o a buscar
um ajuste externo baseado numa política ortodoxa de controle da demanda. O principal
-4000
-3500
-3000
-2500
-2000
-1500
-1000
-500
0
500
1975 1976 1977 1978 1979 1980
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objetivo dessa medida era reverter os saldos negativos da balança comercial, de forma a
reduzir a necessidade de divisas.
O ajuste da absorção interna deu-se através de uma combinação de medidas de
contenção salarial e austeridades fiscal (controle de gastos do governo com aumento da
arrecadação) e monetária (contração da liquidez interna), paralelamente a uma política de
promoção das exportações por meio de um regime de minidesvalorizações cambiais, que
buscavam manter a competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Apesar do
resultado positivo quanto à reversão da balança comercial ainda em 1981, apresentando um
superávit de US$ 1,2 bilhões após atingir um déficit de US$ 2,8 bilhões em 1980
(CARNEIRO; MODIANO, 1990), o aprofundamento da recessão mundial a partir do ano
seguinte frustrou as expectativas brasileiras de gerar um maior saldo na balança comercial.
A decisão do México de decretar a moratória de sua dívida naquele ano provocou uma
imediata piora da percepção (já abalada) das fontes tradicionais (bancos privados) de
financiamento externo com os países latino-americanos, levando as autoridades brasileiras
a recorrerem a um empréstimo de emergência com o FMI, tendo em vista o crescente
aumento das despesas com juros da dívida.
A recuperação econômica dos EUA nos primeiros meses de 1984 e o consequente
reaquecimento do comércio global gerou um alívio na restrição externa da economia
brasileira. A combinação da retomada do fluxo de trocas comerciais com a conclusão da
maioria dos projetos do II PND foi fundamental para o esboço de recuperação econômica
brasileira em 1984. A geração de um grande superávit comercial (ver Gráfico 13 a seguir)
contribuiu de forma relevante para o sucesso do ajuste externo na primeira metade da
década de oitenta, em que, por outro lado, se perpetuou o problema do descontrole interno
da inflação.
63
Gráfico 13: Saldo da Balança Comercial brasileira entre 1980 e 1985
Todavia, o reaquecimento do comércio mundial e a retomada do equilíbrio externo
não foram suficientes para garantir o crescimento econômico do período, como pode ser
observado no Gráfico 14 a seguir:
Gráfico 14: Taxa de Crescimento do PIB brasileiro entre 1980 e 1985
Como se verifica, após um alto crescimento em 1980, o Brasil ingressa num período
de profunda recessão no triênio de 1981 a 1983, recuperando-se brevemente nos dois anos
seguintes. A Tabela 8 abaixo apresenta o resultado para a decomposição do processo de
crescimento brasileiro nesse período:
-4000
-2000
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
1980 1981 1982 1983 1984 1985
Ano
Sa
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da
Ba
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(US$
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-6,00%
-4,00%
-2,00%
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
1980 1981 1982 1983 1984 1985
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Público Privado
Cons. Gov. 4,69% 4,69%
Invest. Gov. 0,96% 0,96%
Invest. Estatais -3,21% -3,21%
Invest. Res. Fam. -0,40% -0,40%
Cons. Duráveis Fam. 1,66% 1,66%
Cons. Não-Dur. Fam. -13,07% -13,07%
Invest. Emp. Priv. -8,44% -8,44%
Coef. Prod. Dom. 8,63% 8,63%
Exportações 11,29% 11,29%
Var. Estoques 4,43% 4,43%
Total 2,44% -20,26% 19,92% 4,43% 6,53%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
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Tabela 8: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1980 e 1985
A crise da dívida teve efeito perverso sobre o crescimento econômico brasileiro. De
1980 a 1985, o PIB cresceu apenas 6,53%, pouco menos do que o crescimento apresentado
apenas para o ano de 1979 (6,76%). A situação torna-se ainda mais alarmante quando se
verifica que, ao longo do triênio compreendido entre 1981 a 1983, a taxa média de
crescimento anual foi negativa em 2,12%.
A reversão do padrão de crescimento brasileiro foi notável observando-se
isoladamente os componentes da demanda agregada na Tabela 8 anterior. A demanda
interna, grande propulsora do crescimento na década anterior, sofreu uma abrupta
contração, contribuindo negativamente com 17,82 p.p. no processo de crescimento do
período.
No setor público, o consumo do governo foi o componente que mais contribuiu
isoladamente, com 4,69 p.p., ainda assim num patamar bem abaixo do observado nos anos
anteriores. O investimento público foi duramente afetado pela escassez de crédito privado
externo, apresentando uma contribuição negativa de 2,25 p.p., ainda que a administração
pública tenha contribuído positivamente com 0,96 p.p..
65
Com relação ao setor privado doméstico, o consumo de bens duráveis foi o único
componente a contribuir positivamente com o crescimento, com 1,66 p.p, de forma que o
setor como um todo apresentou forte contribuição negativa, em 20,26 p.p. No contexto de
esfriamento repentino da demanda agregada, os investimentos das empresas privadas
participaram negativamente com 8,44 p.p..
O regime de minidesvalorizações cambiais somado ao reaquecimento do comércio
mundial a partir de 1984 foi responsável pela expressiva participação das exportações no
processo de crescimento do período (11,29 p.p.). Adicionalmente, o desaquecimento da
industrialização somado a uma política e contenção da demanda refletiu sobre o coeficiente
de produção doméstica, cuja variação contribuiu com expressivos 8,63 p.p..
Na introdução da chamada Nova República, o governo civil do presidente Sarney
tinha como prioridade econômica o combate à inflação. O insucesso das políticas de
combate à inflação implementadas anteriormente levou à busca por teorias alternativas de
controle inflacionário, no que a chamada “teoria inercialista”, na qual a inflação decorria de
reajustes contratuais inseridos na estrutura do sistema econômico, ganhou destaque. Nesse
sentido, perdia forças a interpretação do processo inflacionário como fruto do excesso de
demanda em relação à oferta em termos agregados, de forma que o déficit público deixava
de ser um indicador relevante. Os planos de estabilização que se seguiram a esse
diagnóstico (“Cruzado” em 1986, “Bresser” em 1987 e “Verão” em 1989), após alguns
breves esboços de arrefecimento dos índices de preços nos primeiros meses, fracassaram,
em última instância, em suas tentativas de controle da inflação.
66
2.4 - Década de 90: reestruturação, estabilização, vulnerabilidade externa e baixo
crescimento.
O período de 1990 a 1993 foi marcado por um atribulado panorama político com a
primeira eleição direta a presidente da República em 30 anos (em que se elegeu Fernando
Collor de Mello) e seu subsequente impeachment em 1992 e pela proposta de
reestruturação do modelo econômico brasileiro, com o início do processo de privatizações e
a intensificação da abertura econômica. Segundo Castro (2005),
As reformas propostas por Collor, de fato, introduziram uma ruptura com
o modelo brasileiro de crescimento com elevada participação do Estado e
proteção tarifária, ainda que, na prática, a abertura comercial e
financeira, bem como o processo de privatização, apenas deram seus
primeiros passos no período de 1990-94. (p. 142)
No âmbito da política industrial, não ocorreram mudanças significativas no curto
período do governo Collor, sendo os resultados mais expressivos legados restritamente à
estabilização monetária. Todavia, os dois planos levados a cabo ao longo do governo
(Collor I e II) fracassaram na tentativa de eliminar o processo inflacionário, tendo impacto
positivo apenas no aumento do passivo externo bruto, embora à custa da manutenção do
padrão de crescimento instável apresentado na segunda metade da década anterior, como
pode ser verificado no Gráfico 14 a seguir.
67
-6,00%
-4,00%
-2,00%
0,00%
2,00%
4,00%
6,00%
8,00%
10,00%
1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993
Ano
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Público Privado
Cons. Gov. 21,54% 21,54%
Invest. Gov. 1,39% 1,39%
Invest. Estatais -1,28% -1,28%
Invest. Res. Fam. 1,85% 1,85%
Cons. Duráveis Fam. -2,26% -2,26%
Cons. Não-Dur. Fam. -3,59% -3,59%
Invest. Emp. Priv. -0,85% -0,85%
Coef. Prod. Dom. -3,43% -3,43%
Exportações -1,71% -1,71%
Var. Estoques 4,06% 4,06%
Total 21,65% -4,85% -5,15% 4,06% 15,71%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
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Gráfico 14: Taxa de Crescimento do PIB brasileiro entre 1985 e 1993
A decomposição do crescimento do período pode ser observada na Tabela 9 a
seguir:
Tabela 9: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1985 e 1993
Entre 1985 e 1993, a economia brasileira cresce a uma taxa média anual de 2,54%,
cobrindo um total de 15,71% ao final do período. Todavia, o processo de crescimento
apresenta uma trajetória instável, alternando períodos de crescimento com anos de recessão.
Em função da mudança de interpretação do processo inflacionário como fruto do
excesso de demanda em relação à oferta em termos agregados (de forma que o déficit
68
público deixava de ser um indicador relevante), a administração pública amplia de forma
considerável seus dispêndios no período, de modo que o consumo do governo acaba por
destacar-se como principal componente da demanda agregada no período, tendo
contribuído com 21,54 p.p.. Os demais componentes tiveram contribuição – positiva ou não
– reduzida. Nesse contexto, destaca-se o consumo de bens duráveis, que vinha mantendo
certa estabilidade em períodos anteriores e, nesse momento, demonstra uma contribuição
negativa de 3,59 p.p., muito provavelmente em face ao sequestro de ativos nas cadernetas
de poupança ocorrido no Plano Collor I, que diminuiu consideravelmente o poder de
compra da classe média, grande compradora desses bens.
O governo de Itamar Franco, que assumiu logo após o impeachment de 1992,
destacou-se pela implementação do Plano Real, uma tentativa bem sucedida de
estabilização monetária baseada em três pilares fundamentais: o ajuste fiscal, que buscava
restabelecer o “equilíbrio das contas do governo” (tido como principal causa da inflação
brasileira); a reforma monetária, na tentativa a priori de criar um padrão estável de valor
(URV) sobre o qual estariam estabelecidas as bases de emissão e lastreamento da nova
moeda (o Real); e a âncora cambial. Quando de sua implantação, em meados de 1994, o
Plano Real logrou reduzir expressivamente os índices de preços e eliminar a memória
inflacionária do mercado interno, mantendo os índices de preços em patamares mínimos
para sua série histórica de forma perene.
Todavia, os bons resultados alcançados pelo Plano Real não devem ser analisados
apenas sob a ótica restrita de suas medidas e sua estratégia de implantação, sendo
importante levar em conta todo um conjunto de fatores estruturais, internos e externos, que
foram fundamentais para o sucesso da estabilização de preços. Em primeiro lugar, a
abundância de liquidez no mercado internacional (cuja disponibilidade ao mercado
69
brasileiro só foi possibilitada em virtude da conclusão da reestruturação da dívida externa
do país a partir do chamado “Plano Brady”, em 1991), somado às reservas acumuladas dos
planos anteriores, asseguraram a eficácia da âncora cambial, de suma importância para a
estratégia de estabilização. Além disso, o apoio político do Congresso ao governo de
Fernando Henrique Cardoso, instaurado em 1995 numa atmosfera de continuidade em
relação ao governo anterior, se mostrou essencial para a manutenção dos juros em
patamares elevados ao longo dos anos do primeiro mandato (CASTRO, 2005).
Ademais, o sucesso em termos de redução da inflação embora acompanhado do
incremento do investimento externo direto e o aumento do poder aquisitivo da parcela da
população de renda mais baixa (comum a experiências de estabilização de preços), não se
refletiu em outros indicadores pelo lado real da economia. Ao final de 1998, a
sobrevalorização do câmbio, derivada do expressivo influxo de divisas decorrente da
manutenção da taxa básica de juros em patamares elevados, em conjunto com a abertura
comercial (redução das barreiras tarifárias e não-tarifárias) e financeira (liberalização da
conta capital), foi responsável pela reversão da tendência superavitária da balança
comercial brasileira (ver Gráfico 15 a seguir), além de acirrar o processo de
desindustrialização e desnacionalização da indústria brasileira e impactar negativamente
sobre a dívida pública (COUTINHO, 1999). Adicionalmente, houve uma significativa
desaceleração do crescimento econômico, que vinha esboçando uma retomada entre os anos
1993 (4,92%) e 1994 (5,85%), e apresentou uma média anual de cerca de 2,6% de
crescimento real do PIB entre 1995 e 1998, segundo dados do IPEA.
70
Público Privado
Cons. Gov. 14,73% 14,73%
Invest. Gov. -2,05% -2,05%
Invest. Estatais -2,78% -2,78%
Invest. Res. Fam. -0,03% -0,03%
Cons. Duráveis Fam. 3,24% 3,24%
Cons. Não-Dur. Fam. 9,05% 9,05%
Invest. Emp. Priv. -1,08% -1,08%
Coef. Prod. Dom. 0,38% 0,38%
Exportações -5,71% -5,71%
Var. Estoques 0,43% 0,43%
Total 9,90% 11,18% -5,33% 0,43% 16,19%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
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Gráfico 15: Saldo da Balança Comercial brasileira entre 1993 e 1998
A tabela a seguir mostra os resultados encontrados para a decomposição do
crescimento entre os anos de 1993 e 1998:
Tabela 10: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1993 e 1998
A chegada do Plano Real implica certa estabilidade ao modelo econômico
brasileiro, cuja trajetória de evolução do produto agregado deixa de apresentar oscilações
-10000
-5000
0
5000
10000
15000
1993 1994 1995 1996 1997 1998
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constantes entre períodos de aceleração e retração. O PIB brasileiro cresceu 16,19% no
período, com uma média anual de 3,33%, sem apresentar anos de retração.
Em face da abertura comercial e financeira e da sobrevalorização da moeda
nacional, as exportações aprofundam a contribuição negativa no crescimento, agora com
5,71 p.p.. O setor externo perde forças nesse novo cenário, participando negativamente com
5,33 p.p., paralelamente a uma leve melhoria no coeficiente de produção doméstica, que
contribuiu com 0,38 p.p.. Sobre esse ponto, cabe observar que, apesar do período ser
caracterizado pelo alto crescimento das importações (de onde se espera um grau elevado de
penetração das importações), verifica-se a ocorrência do efeito contrário. Tal fato se deve à
uma distorção derivada da utilização de um único deflator geral (deflator “implícito” do
PIB) para a aferição do crescimento real das importações, ao tempo que, a partir de uma
análise mais detalhada dos dados fazendo uso de um deflator próprio para as importações,
percebe-se uma valorização do câmbio no período, que implicou a queda do preço das
importações em reais, além de uma redução do preço de diversos itens da pauta de
importações.
O setor doméstico firma-se como principal colaborador com o processo de
crescimento, com a melhoria no poder aquisitivo das populações de baixa renda após a
expressiva redução do imposto inflacionário, o que se expressa na contribuição significativa
do consumo das famílias, de 12,29 p.p.. No setor público, o consumo do governo ainda
representa o componente de maior participação isolada no crescimento, com 14,73 p.p..
O segundo governo FHC foi marcado pela ocorrência de uma forte crise cambial em
1999, decorrente de um ataque especulativo possibilitado graças à combinação do
desequilíbrio externo com a trajetória de crescimento gradual das dívidas externa pública e
privada denominadas em moedas estrangeiras, que obrigou o governo a abandonar o regime
72
Público Privado
Cons. Gov. -1,32% -1,32%
Invest. Gov. 0,19% 0,19%
Invest. Estatais 0,01% 0,01%
Invest. Res. Fam. 1,10% 1,10%
Cons. Duráveis Fam. 0,60% 0,60%
Cons. Não-Dur. Fam. 0,06% 0,06%
Invest. Emp. Priv. 1,39% 1,39%
Coef. Prod. Dom. -6,24% -6,24%
Exportações 7,78% 7,78%
Var. Estoques 0,99% 0,99%
Total -1,11% 3,16% 1,54% 0,99% 4,57%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
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monetário de metas cambiais e adotar o regime de metas de inflação. O resultado do
cenário adverso foi a perda substantiva de reservas internacionais, além de novo sacrifício
do crescimento em prol da manutenção da estabilidade de preços.
A tabela a seguir apresenta o resultado para a decomposição do crescimento do PIB
brasileiro para o período de 1998 a 2000:
Tabela 11: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1998 e 2000
As consequências da crise cambial de 1999 e as medidas tomadas para sua solução
levam a nova reversão do padrão de crescimento brasileiro. A economia cresce a uma taxa
média anual de 1,53% (0,14%, levando-se em conta apenas os anos de 1998 e 1999),
alcançado 4,57% no total do período.
O processo de desindustrialização e desnacionalização da indústria brasileira se
reflete na contribuição negativa expressiva da variação do coeficiente de produção
doméstica em 6,24 p.p.. Por outro lado, o abandono da âncora cambial impactou
diretamente na retomada das exportações, cuja participação no crescimento foi de 7,78 p.p.,
a maior vista de forma isolada.
73
O setor privado doméstico foi o que mais contribuiu com o crescimento (3,16 p.p.),
com destaque para o esboço de retomada dos investimentos das empresas privadas, que
atingiu uma participação de 1,39 p.p.. O setor público, por sua vez, sofreu os efeitos do
foco sobre o problema da dívida pública e do consequente receituário ortodoxo de políticas
de geração de superávits primários, de modo que sua contribuição foi negativa em 1,11
p.p..
74
CAPÍTULO 4 – COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS OBTIDOS
As trajetórias econômicas díspares de Brasil e Coreia do Sul nas três últimas
décadas do século XX são exemplos da importância de um planejamento estratégico de
longo prazo na condução processo de desenvolvimento de economias de industrialização
tardia. Ambos os países obtiveram êxito em expandir seus parques industriais a taxas de
crescimento notáveis a partir de uma estrutura fundamentalmente primária, consolidando
uma matriz industrial dinâmica e com elevado grau de integração entre os setores da
economia em pouco mais de uma década – nos anos sessenta e setenta. Todavia, as bases
sobre as quais se estruturou o desenvolvimento econômico foram por demasiado distintas e,
de tal forma, determinantes para o abismo existente entre o desempenho econômico dos
dois modelos sócio-econômicos.
Dentre os inúmeros fatores político-econômico-estruturais constituintes das
trajetórias díspares de industrialização dos dois países, dois grandes elementos se destacam:
o papel do Estado no processo de desenvolvimento e o grau de integração do setor externo
na dinâmica do crescimento. No caso sul-coreano, a presença do Estado na economia,
apesar de não implicar uma participação significativa de suas despesas de investimento
dentre os gastos agregados, se deu notadamente através de uma expressiva contribuição do
consumo do governo no processo de crescimento (a segunda maior contribuição de um
componente isolado da demanda, abaixo apenas das exportações), além de sua atuação
fundamental na dinâmica do processo de industrialização sob a forma da coordenação e
orientação dos recursos produtivos. Desde a década de sessenta, com a execução dos
primeiros Planos Quinquenais, o Estado participou ativamente junto à iniciativa privada,
através de políticas de incentivos fiscais e direcionamento do crédito que consolidaram os
75
grandes conglomerados nacionais (os chaebols), numa bem sucedida simbiose que se
estenderia ao longo das décadas seguintes.
A visão de longo prazo no planejamento dos setores industriais apoiados pelos
Planos, em paralelo à uniformidade e continuidade das estratégias de política industrial dos
sucessivos governos, mostrou-se fundamental para o bom encadeamento do setor
exportador, fortemente estimulado desde os primeiros Planos, com a estrutura produtiva da
matriz industrial sul-coreana, o que possibilitaram o grande dinamismo do mercado interno.
Ademais, o governo sul-coreano soube posicionar-se estrategicamente dentro do contexto
geopolítico em que o país estava inserido, de modo a possibilitar o equilíbrio de longo
prazo do balanço de pagamentos do país e garantir a oferta de recursos externos necessárias
ao processo de industrialização acelerada.
O sucesso do planejamento estatal para o setor externo deu-se em duas frentes:
primeiro, ao aproveitar-se do ambiente político da Guerra Fria para estabelecer uma
estrutura de parcerias técnico-comerciais com EUA e Japão em condições facilitadas e,
segundo, ao administrar suas taxas de câmbio com esses dois países, de modo a garantir um
saldo continuamente superavitário em seu balanço de pagamentos a partir da manutenção
de uma taxa subvalorizada (i.e, relativamente desvalorizada) em relação àquele parceiro
comercial com quem mantinha superávits constantes na balança comercial (EUA) e uma
taxa sobrevalorizada (i.e, relativamente valorizada) em relação àquele com quem vinha
acumulando sucessivos déficits (Japão). Esse modelo, iniciado ainda nos anos sessenta,
permaneceu vigente ao longo das três últimas décadas do século XX, sendo gradativamente
abandonado (ou alterado) a partir das reformas liberalizantes dos anos noventa ocorridas no
país. Dentro desse contexto, o resultado do esforço exportador da Coreia do Sul no período
76
Público Privado
Cons. Gov. 130,48% 130,48% 130,48%
Invest. Gov. 0,07% 0,07% 0,07%
Cons. NPISH's 12,79% 12,79% 12,79%
Invest. Res. Fam. 52,25% 52,25% 52,25%
Cons. Duráveis Fam. 53,86% 53,86% 53,86%
Cons. Não-Dur. Fam. -28,06% -28,06% -28,06%
Invest. Emp. Priv. 25,01% 25,01% 25,01%
Coef. Prod. Dom. -44,65% -44,65% -44,65%
Exportações 543,42% 543,42% 543,42%
Var. Estoques -2,73% -2,73% -2,73%
Discrep. Estatística -4,36% -4,36% -4,36%
Total 130,56% 115,85% 498,77% -2,73% -4,36% 738,09% 792,87% -47,69% -2,73% -4,36%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Bank of Korea e da OCDE
Super-
multiplicador
Variação
Estoques
Discrep.
EstatísticaGastos
Setor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Gastos
Autônomos
Discrep.
Estatística
pode ser verificado a partir da decomposição de seu forte crescimento, conforme a Tabela
12 a seguir:
Tabela 12: Decomposição do Crescimento da Coreia do Sul entre 1970 e 2000
Em primeiro lugar, aquém da decomposição, chama a atenção o crescimento
vertiginoso da Coreia do Sul, atingindo 738,09% no acumulado do período, o que
corresponde a uma taxa média anual de cerca de 7,4% ao longo de três décadas. As
exportações se apresentaram como principal indutor do processo de crescimento, sendo de
longe o componente que mais contribuiu isoladamente, com 543,42 p.p..
Nesse contexto, o processo de penetração de importações decorrente da
industrialização mostrou-se brando, tendo em vista que a contribuição relacionada à
variação do coeficiente de produção doméstica foi negativa em 44,65 p.p., valor
relativamente baixo para o patamar elevado de crescimento apresentado no período. Cabe
destacar que, entre 1970 e 2000, o crescimento acumulado real das exportações foi de cerca
de 791%, ao tempo em que as importações cresceram aproximadamente 472%.
Em termos absolutos, ao longo da década de setenta, o Brasil apresentou um padrão
de crescimento econômico semelhante ao demonstrado pela Coreia do Sul, conseguindo
atingir uma taxa média de 8,28% anuais, contudo sem apresentar as reformas de base
77
Público Privado
Cons. Gov. 120,71% 120,71% 120,71%
Invest. Gov. 4,85% 4,85% 4,85%
Invest. Estatais -2,60% -2,60% -2,60%
Invest. Res. Fam. 20,96% 20,96% 20,96%
Cons. Duráveis Fam. 27,99% 27,99% 27,99%
Cons. Não-Dur. Fam. -3,61% -3,61% -3,61%
Invest. Emp. Priv. -1,09% -1,09% -1,09%
Coef. Prod. Dom. -9,53% -9,53% -9,53%
Exportações 60,32% 60,32% 60,32%
Var. Estoques 24,61% 24,61% 24,61%
Total 122,96% 44,25% 50,78% 24,61% 242,60% 232,23% -14,23% 24,61%
Fonte: IBRE-FGV; IBGE; Morandi & Reis (2004); e Freitas & Dweck (2009)
Super-
multiplicador
Variação
EstoquesGastos
Setor Doméstico Setor
Externo
Variação
EstoquesTotal
Gastos
Autônomos
(educacional e agrária) nem internalizar os ganhos oriundos do crescimento acelerado em
termos de melhorias dos indicadores sociais (aprimoramento da distribuição pessoal da
renda, redução do analfabetismo etc.) a exemplo do caso sul-coreano. O Estado brasileiro,
participa diretamente do processo de crescimento econômico, por meio das estatais, do
investimento ou do consumo do governo, como elemento relevante da demanda agregada e
gerador de capacidade produtiva, atuando em paralelo ao setor privado, ao tempo em que o
governo sul-coreano, apesar de ter pouca participação no âmbito dos investimentos, seja
pelas estatais ou pela administração pública, contribui fortemente com a demanda agregada
pela via do consumo, além de atuar mais ativamente na geração de externalidades positivas
ao sistema econômico. A participação do gasto público no crescimento acumulado entre
1970 e 2000 pode ser visto na Tabela 13 a seguir:
Tabela 13: Decomposição do Crescimento do Brasil entre 1970 e 2000
Diferentemente do resultado apresentado para a Coreia do Sul, no caso brasileiro o
setor externo não se apresenta como principal indutor do processo de crescimento
econômico das três últimas décadas do século XX, sendo substituído notadamente pelo
setor doméstico, que contribuiu com 167,21 p.p. dos 242,23% de crescimento acumulado
78
verificado, tendo o setor público sido o principal indutor do processo de crescimento,
participando com 122,96 p.p.. Nesse sentido, vale analisar mais especificamente o papel
desempenhado pelos gastos públicos dentro da dinâmica do crescimento de ambos os
países.
Comparando-se as duas tabelas anteriores, nota-se que, apesar de não ter havido
uma estratégia deliberada do governo sul-coreano no sentido de estimular os gastos
públicos como forma de aquecer a demanda agregada, o consumo do governo apresentou
forte contribuição para o crescimento do PIB da Coreia do Sul (130,48 p.p.), representando
o segundo maior gasto isolado no período (atrás apenas das exportações). No Brasil, por
sua vez, o consumo do governo representou a maior contribuição isolada (120,71 p.p.),
porém dentro de um contexto de forte participação do Estado enquanto agente econômico
que se prolongou até meados da década de oitenta.
Sob o ponto de vista do investimento público, o cenário toma contornos ainda mais
divergentes. No Brasil, a contribuição do investimento público na dinâmica da economia
teve importância significativa na década de setenta (ver Tabelas 6 e 7 no capítulo 3), com
forte participação das empresas estatais, que contribuíram fortemente para a redução de
gargalos logísticos e o incremento no coeficiente de produção doméstica ao operarem sobre
setores-chave para a dinâmica industrial, em especial atuando na infraestrutura (energia) e
no suprimento de insumos intermediários (indústria de base), além de ser um forte
componente contracíclico da demanda agregada em períodos de crise. Na década de oitenta,
em virtude da escassez de crédito internacional num primeiro momento, e a partir dos anos
noventa, em função dos processos de desestatização e desindustrialização em curso, a
participação do investimento público no processo de crescimento brasileiro sofre uma forte
reversão (ver Tabelas 8, 9 e 10 do capítulo 3), em magnitude mais que suficiente para
79
contrabalancear os bons resultados dos anos anteriores, de forma que a contribuição desse
componente da demanda agregada no crescimento acumulado de 1970 a 2000 fica negativa
em 2,6 p.p.
No caso sul-coreano, por outro lado, a participação do Estado na economia,
conforme ressaltado acima, deu-se majoritariamente por meio do planejamento estratégico
de longo prazo acerca do processo de industrialização, contribuindo para a geração de
externalidades positivas ao sistema (tais como, por exemplo, avanços tecnológicos), e da
coordenação de políticas (fiscal e cambial e de crédito) no sentido de possibilitar o
ambiente econômico favorável ao desenvolvimento. Dessa forma, o investimento público
fica relegado a segundo plano, contribuindo marginalmente para o resultado agregado
(ínfimos 0,07 p.p. do total para o período de 1970 a 2000). O papel das estatais, por sua
vez, é ainda mais marginalizado no padrão sul-coreano de desenvolvimento, de modo que
são mínimas as informações disponibilizadas acerca dessas empresas pelos órgãos oficiais
de estatística do país.
No âmbito do setor externo, um importante fator derivado do crescimento
conduzido pelas exportações não pode ser captado diretamente pela decomposição do
crescimento: a contribuição das exportações como fonte última de obtenção de divisas.
Nesse sentido, além de serem responsáveis pela dinâmica do crescimento econômico sul-
coreano entre 1970 e 2000, as exportações (em conjunto com a estrutura de parcerias com
EUA e Japão orquestrada pelo governo sul-coreano) possibilitaram o relaxamento da
restrição externa de divisas, tão comum para casos de industrialização tardia.
O Brasil, que não se beneficiou de uma estrutura favorável de comércio exterior tal
como no caso da Coreia do Sul, buscou, em vão, consolidar o setor exportador como forma
de subverter a problemática da escassez de divisas. Por outro lado, as exportações,
80
enquanto componente da demanda agregada, tiveram participação relevante no crescimento
do período, contribuindo com 60,32 p.p.. Tendo em vista que houve um suave processo de
penetração das importações no período, de forma que a variação do coeficiente de produção
doméstica traduziu-se numa contribuição negativa desde elemento em 9,53 p.p., o setor
externo como um todo apresentou uma contribuição líquida expressiva para o processo de
crescimento, de 50,78 p.p..
Cabe destacar que, nos casos de ambos os países, o crescimento econômico foi
explicado majoritariamente pelos gastos que não geram capacidade produtiva (gastos
autônomos), em maior parte em decorrência dos gastos públicos realizados e pelas
exportações (conforme já ressaltado anteriormente), mas também, de forma relevante, pelo
investimento residencial e pelo consumo de bens duráveis, em função do aumento do
crédito disponível (principalmente à classe média assalariada) nos dois países ao longo do
período analisado. Em relação aos gastos induzidos, componentes do supermultiplicador,
além do coeficiente de produção doméstica (já abordado anteriormente), dois fatos
merecem atenção. Primeiramente, a queda do consumo de bens não-duráveis observada em
ambos os países, que seria explicado pelo comportamento da parcela salarial, pelas
alíquotas tributárias e pela evolução do padrão de consumo dos assalariados. Ademais,
verifica-se uma forte divergência em relação à contribuição das empresas privadas no
processo de crescimento, com participação positiva de 25,01 p.p. para o caso sul-coreano e
negativa de 1,09 p.p. para o caso brasileiro. Tal fato reflete principalmente diferenças na
base estrutural da industrialização de cada país, em que o governo da Coreia do Sul
trabalhou no sentido de fortalecer a grande indústria nacional, que operou em parceria com
o Estado ao longo de todos os Planos que se seguiram até aos anos noventa, ao tempo em
que, no caso brasileiro, houve um solapamento gradativo da indústria nacional desde a
81
década de oitenta, seja em função da exiguidade do mercado consumidor em função do
baixo crescimento (interno e externo), seja devido aos processos de desindustrialização e
desnacionalização da indústria brasileira derivados a partir das reformas liberais dos anos
noventa.
82
CONCLUSÃO
Os gastos autônomos se apresentaram como o principal fator explicador do
crescimento econômico tanto na Coreia do Sul quanto no Brasil no período compreendido
entre os anos 1970 e 2000, em que pesou principalmente a participação das exportações e o
consumo do governo em ambos os casos. Os gastos induzidos, componentes do
supermultiplicador, contribuíram negativamente para o processo de crescimento em ambos
os países, demonstrando uma certa homogeneidade na ocorrência de um processo de
penetração de importações para os dois casos de industrialização tardia. A queda da
propensão a consumir, representada pela contribuição negativa do consumo de bens não-
duráveis no processo de crescimento, também teve paralelo nas duas trajetórias.
Os resultados obtidos pela decomposição do crescimento sob a ótica da demanda
refletiram o contexto geopolítico específico para cada país nos períodos analisados, o que
demonstra a importância da análise econômica em paralelo à análise da conjuntura político-
estrutural do país pesquisado. O sucesso da trajetória de crescimento da Coreia do Sul,
como bem observou Medeiros (1998), vai além da mera interpretação de “uma estratégia
market friendly caracterizada pela adoção de ‘saudáveis’ políticas macroeconômicas, um
genuíno esforço de desenvolvimento baseado na poupança interna e na educação e um
apurado sistema de checks and balances na relação entre o setor público e o setor privado”
(p. 151).
Nesse sentido, cabe ressaltar a análise do crescimento pelo lado da ofertade algumas
correntes neoclássicas (e.g., JONES, 2000) atribui erroneamente demasiado peso sobre o
papel do progresso técnico no processo de crescimento, tendo em vista que, sob essa ótica,
foi a produtividade total dos fatores, comparativamente ao aumento nos estoques de capital
e mão-de-obra (ou capital humano), a principal responsável pelo forte crescimento sul-
83
coreano. Deve-se notar que tal interpretação não corresponde à realidade da economia, uma
vez que o progresso técnico, apesar de poder gerar dinamismo ao mercado interno, está
sempre limitado pelo crescimento da demanda agregada.
Assim sendo, a divergência entre as trajetórias de crescimento econômico do Brasil
e da Coreia do Sul não pode ser explicada simplesmente pela suposta existência de dois
modelos de crescimento dicotômicos entre os países – um “orientado para fora”, liderado
pelas exportações, e outro “orientado para dentro”, liderado pelo mercado interno – uma
vez que, além desta ser uma abordagem em demasiado reducionista, eliminando as
diferenças estruturais dos países e não levando em consideração toda a complexidade da
interdependência dos fatores geopolíticos específicos dos países com a dinâmica do
crescimento econômico, também não reflete o fato de que as exportações tiveram forte
participação no processo de crescimento brasileiro no período (como foi verificado no
capítulo 4 a partir dos dados da Tabela 13).
84
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