UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS
RAFAELA RODRIGUES DA SILVA CARVALHO
ABOLIÇÃO NO SUL DE MINAS: O CASO DE VARGINHA
Varginha/MG
2014
RAFAELA RODRIGUES DA SILVA CARVALHO
ABOLIÇÃO NO SUL DE MINAS: O CASO DE VARGINHA
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao
Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da
Universidade Federal de Alfenas, como
requisito parcial à obtenção do título de
Bacharel em Ciências Econômicas com Ênfase
em Controladoria.
Orientador: Prof. Thiago Fontelas Rosado
Gambi
Co-orientador: Prof. Daniel do Val Cosentino
Varginha/MG
2014
RAFAELA RODRIGUES DA SILVA CARVALHO
ABOLIÇÃO NO SUL DE MINAS: O CASO DE VARGINHA
A Banca examinadora abaixo-assinada aprova
a monografia apresentada como parte dos
requisitos para obtenção do título de Bacharel
em Ciências Econômicas com Ênfase em
Controladoria da Universidade Federal de
Alfenas.
Aprovada em: Varginha, de de 2014.
________________________________
Prof. Thiago Fontelas Rosado Gambi (Orientador)
________________________________
Prof. Daniel do Val Cosentino (Co-orientador)
________________________________
Prof. Michel Deliberali Marson
Agradecimentos
Agradeço a meus pais, Neuza e João, pela força cotidiana; e a meus irmãos, Fábio e
Jaqueline, pela boa vontade e paciência para com meu trabalho.
Agradeço aos meus amigos, pela preocupação com o andamento da pesquisa e por se
alegrarem com os avanços desta. Em especial, quero agradecer à Bruna e à Alessandra, por
estarem sempre por perto com palavras de incentivo, piadas para fazer rir e puxões de orelha
quando necessário.
Agradeço ao Guilherme, a quem coube a ingrata tarefa de ouvir meus lamentos,
aguentar meus maus humores e buscar por várias referências utilizadas nesse trabalho.
Obrigada pelo apoio incondicional e paciência.
Agradeço ao meu orientador, Thiago Gambi, por aceitar a empreitada e ser paciente no
meu caminhar.
Agradeço especialmente ao Daniel Cosentino, professor e amigo de muitos anos, sem
cuja dedicação e estímulo não teria sido possível realizar a pesquisa. Obrigada pelos livros,
por acreditar em mim, por me dar forças, por dizer que era possível e por sempre me deixar
mais calma. Meu sucesso é em grande parte obra sua.
Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cúm'lo de maldade,
Nem são livres p'ra morrer. .
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.1
1 ALVES, Castro. O Navio Negreiro. São Paulo: Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro, s/d.
Resumo
O século XIX foi um período de grandes transformações para o Brasil. Uma das principais foi
a abolição da escravidão em 1888, que reorganizou a estrutura produtiva da sociedade. Nesse
contexto, Minas Gerais se configurava como a maior Província escravista do Império, sendo
grande importadora de cativos durante os oitocentos e dona de uma economia voltada para o
mercado interno e o externo. Paralelamente, o Sul mineiro é apontado por várias pesquisas
como região entre as mais dinâmicas da Província, cujas principais áreas consistiam na
produção agropecuária voltada para o mercado interno, na circulação tanto de produtos quanto
de pessoas por se tratar de região de passagem, na participação política e na concentração de
escravos. Neste sentido, o presente trabalho se propõe a realizar um levantamento de aspectos
que permitam apresentar o processo de abolição da escravatura em Varginha, localizada ao
Sul de Minas, compreendendo as transformações sociais e econômicas pelas quais passou,
bem como se deu o desenvolvimento da mesma.
Palavras-chave: Trabalho servil. Abolição da escravatura. Transformações sociais.
Abstract
The nineteenth century was a period of great transformation for Brazil. One of the main was
the abolition of slavery in 1888, which reorganized the structure of the productive society. In
this context, Minas Gerais was configured as slave largest province of the Empire, being a
major importer of slaves during the eight hundred and owner of an economy for the domestic
and foreign market. Meanwhile, the South miner is pointed out by several studies as among
the most dynamic region of the province, whose main areas consisted of agricultural
production for the domestic market, the movement of both products as people because it is a
region of passage, participation politics and the concentration of slaves. In this sense, the
present study aims to conduct a survey of aspects for the present the process of abolition of
slavery in Varginha, located to the South of Minas Gerais, comprising social and economic
transformations which went as well as it did its development.
Key words: Servile labor. Abolition of slavery. Social transformations.
Sumário
1 Introdução ....................................................................................................................8
2 Aspectos gerais da escravidão no Brasil ..................................................................10
3 Escravidão em Minas Gerais .....................................................................................19
4 A região do Sul de Minas Gerais ...............................................................................31
5 Varginha, uma cidade do Sul das Gerais .................................................................38
6 Considerações finais ................................................................................................. 47
Referências ................................................................................................................. 49
8
1 Introdução
O fim da escravidão no Brasil se deveu a um processo intenso de luta interna e pressão
externa contra o regime de produção servil. Fortemente representados nas Câmaras e
corroborados pela monarquia, os fazendeiros, donos dos cativos, constituíam a elite da época,
dominando toda a estrutura de organização social, assentada na escravidão.
Esta, por sua vez, foi a forma mais eficaz encontrada pelas metrópoles europeias para
explorarem o chamado Novo Mundo, a partir do que se constituiria como colônias imperiais.
Uma vez que explorar terras virgens exigia grande número de braços além de trabalho
constante, recusando tal empreitada os europeus preferiram optar pelo caminho mais fácil:
escravizar povos alheios. A começar pelos índios, próprios da região, logo em seguida os
africanos em larga escala, a escravidão ganhou importância ainda nos primeiros períodos da
colonização2.
Embora o regime de escravidão já tivesse existido na Europa durante a Antiguidade,
ela surge agora, sob nova forma, como regime necessário ao desenvolvimento do capitalismo.
Ainda que tal ideia seja contraditória, já que nesse sistema ditado pelo capital é indispensável
o trabalho assalariado, se faz necessário dividi-lo em duas fazes: capitalismo primário e
secundário3.
No capitalismo primário, também chamado de comercial, o comércio era a principal
atividade econômica, de modo que a agricultura e a indústria lhe eram subordinadas4. Nesse
processo de acumulação de capital, o comércio representava o meio mais rápido de
enriquecimento, devendo haver, então, sempre mais e mais mercadorias para venda. Sob este
aspecto, as colônias das Américas cumpriram muito bem seu papel de exportadores de
produtos primários aos grandes centros, devido à abundância de mão de obra barata.
No entanto, progressivamente houve uma inversão, na qual o capitalismo primário
cedeu lugar ao capitalismo produtivo, ou secundário, estando aquele então subordinado a este.
Agora, a acumulação de capital passou a se realizar na produção de mercadorias através de
máquinas e mão de obra assalariada, encontrando restrições de escoamento criadas pelo
2 QUEIROZ, 1999.
3 GORENDER, 1999.
4 GORENDER, 2000.
9
capitalismo comercial. Nesse estágio, a acumulação proporcionada pela circulação de
mercadorias já não é importante, como também não o é o regime escravista de produção5.
Tendo a Inglaterra feito a Revolução Industrial e saído na frente na corrida por novos
mercados, a fim de evitar a concorrência desigual frente à mão de obra tipicamente escrava, é
ela quem vai exercer a pressão externa para que os demais países avancem também no
processo capitalista de produção. Por outro lado, o movimento abolicionista, aliado a levantes
e fugas dos próprios negros, demonstra a insatisfação interna para com o regime escravocrata
que ainda imperava no Brasil.
Entretanto, não constitui um processo simples modificar a estrutura produtiva, o modo
de organização social, tão profundamente arraigados à sociedade brasileira. Tanto traficantes
de escravos, quanto a classe dos donos dos cativos defendiam o produto de sua riqueza e sua
hegemonia. Ademais, a posse de escravos significava status social, uma vez que sinalizava o
poder do dono.
As mudanças pelas quais a estrutura socioeconômica passou na segunda metade do
século XIX, porém, suscitaram uma revisão da estrutura produtiva, provocando, para tanto,
uma intensificação dos conflitos de interesses. Depois de intensa luta e várias décadas de
atraso, a abolição da escravatura finalmente libertou os negros do trabalho servil.
No Nordeste brasileiro já quase não havia escravos6, o Sul já iniciava um processo de
importação de mão de obra, bem como o Oeste paulista, tido como o setor mais dinâmico da
economia mais dinâmica do país. Já o Vale do Paraíba, que compreende parte de Minas
Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, constitui a região onde o trabalho servil mais está
arraigado à cultura e havia a forte impressão de que a abolição sem indenização causaria
grande impacto à sua economia.
Nesse cenário, o território localizado ao Sul de Minas Gerais se caracterizava pela
dinâmica de sua produção para abastecimento, estando entre os primeiros tanto em número de
comércio quanto de atividade açucareira na primeira metade do século XIX. Uma vez que a
elite dependia da mão de obra servil, seja na produção agropecuária, nas atividades comerciais
ou no trabalho doméstico, pode-se concluir que a escravidão desempenhou um papel decisivo
na estrutura social e econômica do Sul de Minas ao longo do período oitocentista.
Tendo os escravos como maior valor monetário no que se refere à composição da
riqueza da elite nessa região, o presente trabalho tem como objetivo realizar um levantamento
5 QUEIROZ, 1999.
6 Para compreender melhor o comércio interno de escravos, ver MELO, 1984; CONRAD, 1975; e MARTINS,
2002.
10
de aspectos que permitam analisar o processo de abolição em Varginha, localizada no Sul das
Gerais, compreendendo o cenário econômico que se seguiu ao fim do trabalho servil.
2 Aspectos gerais da escravidão no Brasil
O fim da escravidão no Brasil ensejou uma nova forma de organização social: não
mais baseada no trabalho servil, mas no trabalho livre. De um lado a pressão da Inglaterra, da
sociedade, do movimento abolicionista e dos próprios escravos; do outro os grandes
fazendeiros e traficantes de cativos; e ao centro o governo, que tomava medidas paliativas
para abolir a escravidão, mas agradando ora um lado ora outro, até se tornar insustentável a
manutenção da sociedade escravocrata. Este foi o cenário do país no século XIX, marcado por
intensas transformações na conjuntura nacional e internacional, influenciando o preço dos
escravos e a composição da riqueza na economia.
Em 1808, a Corte portuguesa chega ao Brasil com ajuda da Inglaterra7, fazendo do Rio
de Janeiro a capital da Monarquia. A partir de então, o Príncipe-Regente Dom João VI adotou
medidas que representaram mudanças significativas na estrutura econômica brasileira, bem
como no Sul das Gerais. Abertas novas rotas de comércio, a região abasteceria não apenas a
Corte, como outras áreas do Sudeste do país, possibilitando um crescimento significativo
tanto da população quanto da economia.
Em troca do “favor”, a Inglaterra exigiu, além da abertura comercial e outros
benefícios, o comprometimento de Dom João à cooperação com o fim do comércio de
escravos já em 1810. Fazendo-o assinar o Tratado de Aliança e Amizade, a Inglaterra assim
iniciou o seu resguardo contra a concorrência com mercados cuja produção era ainda baseada
no trabalho servil8. Ao intensificar o repúdio ao tráfico negreiro, uma vez que o Brasil era a
maior e a mais rentável colônia de Portugal, a Inglaterra concluía que o fim da escravidão
estava próximo.
Em 1822, é declarada a Independência e o Rio de Janeiro torna-se a capital do Império
brasileiro. Porém, nem a chegada da Coroa Portuguesa, nem a declaração da Independência
7 Trabalhos recentes vão aprofundar a discussão sobre o caráter da vinda da Coroa portuguesa para o Brasil.
Porém, não é o objetivo deste trabalho um debate mais amplo acerca do tema. Para compreender melhor, ver
ARRUDA, José Jobson de Andrade. Uma Colônia entre dois Impérios: a abertura dos portos brasileiros –
1880-1808. São Paulo: EDUSC, 2008. 8 Ver QUEIROZ (1999).
11
foram suficientes para mudar a condição dos escravos. A elite que ascendeu em 1822 se
apoiava no trabalho servil e na grande propriedade, indo contra a tentativa de
desenvolvimento da indústria e contra a pressão inglesa para o fim do tráfico negreiro. O
Brasil tinha necessidade de reconhecimento de sua autonomia, motivo pelo qual vai se
submeter às exigências da Inglaterra, cuja meta era o fim do tráfico negreiro até 1827. Apesar
dos tratados firmados com os ingleses, o governo Imperial não tomaria ação efetiva para
romper com a estrutura social do país.
Embora o acordo tenha se configurado como lei “para inglês ver”9, cumpriu um papel
importante no que tange tanto à elevação dos preços dos cativos quanto à entrada massiva
deles. Desde o século XVI, com o sistema de plantation nas lavouras de açúcar10
, a economia
brasileira se assentava em uma estrutura de produção essencialmente escravista11
. Três
séculos depois, nos oitocentos, a estrutura produtiva permanecia a mesma, com os negros
agora nas lavouras de café. Os escravocratas buscavam defender de qualquer forma sua mão
de obra servil, de modo que seus interesses imperavam mesmo quanto ao cumprimento da lei,
fazendo com que, em detrimento dela, o Brasil recebesse cerca de 600.000 escravos
contrabandeados entre 1831 e 185012
.
Uma vez conquistada a Independência, as elites competiam com o imperador pelo
controle da nação, tendo conquistado a vitória em 1831 com a abdicação de D. Pedro I. Uma
clara evidência de que a sociedade se organizava a partir do trabalho escravo está no fato de
que tanto liberais quanto conservadores se consolidaram hegemonicamente como elite
conservadora. Desse modo, após a abdicação revezavam o poder, porém, e em detrimento de
9 Ver CONRAD, 1975.
10 Inicialmente a mão de obra escrava utilizada nas plantações de açúcar no nordeste brasileiro era de índios
nativos. Os negros africanos chegaram “para a expansão da empresa, que já estava instalada. É quando a
rentabilidade do negócio está assegurada que entram em cena, na escala necessária, os escravos africanos: base
de um sistema de produção mais eficiente e mais densamente capitalizado.” (FURTADO, 2007, p. 77). Ver
também PRADO JÚNIOR (1994a) e GORENDER (2000). 11
A grande diferença entre os trabalhos livre e escravo consiste no fato de, no primeiro, o trabalhador ser
desprovido dos meios de produção, motivo pelo qual é obrigado a vender sua força de trabalho como
mercadoria, ou seja, em troca de salário. Já no regime escravista, o escravo é ele próprio uma mercadoria, no
sentido de ser comprado, vendido, trabalhar sob coação física e psicológica, e ter todo o produto do seu trabalho
apropriado por seu dono. Do mesmo modo, ser caracterizado como propriedade é um atributo primário do ser
escravo, dele resultam dois atributos derivados: “o primeiro é o da hereditariedade da condição servil. O filho de
escrava também é escravo. [...] Assim, a escravidão se reproduz pela própria reprodução vegetativa natural da
população escrava. O segundo atributo consiste na perpetuidade da condição servil. Ou seja, o escravo morre
escravo.” (GORENDER, 2000, p. 21-22). Ver também COSENTINO (2006) e GORENDER (1991). 12
JOSÉ, 1962. O autor demonstra ainda como a ideia da abolição do tráfico era tão absurda para os
escravocratas mineiros, que quando da proibição do tráfico o Conselho Geral da Província de Minas Gerais
aprova em janeiro de 1829 uma advertência ao Trono, ressaltando o quão maléfico consistia a medida para a
economia mineira, e no limite para o prejuízo das rendas públicas.
12
suas posições políticas antagônicas, concordavam em questões fundamentais, como a
manutenção da ordem escravocrata e da economia agrária.
Como um exemplo disso, houve um amplo processo de cooptação dos novos grupos
urbanos em formação, como os bacharéis e os setores industriais nascentes, que não se
constituíram enquanto oposição, sendo, pelo contrário, incorporados ao sistema, assimilando
tanto o estilo de vida quanto as aspirações das elites. A instituição escravista estava tão
enraizada na consciência social que, embora mulatos e negros fossem desprezados de maneira
“natural” pelo sistema socioeconômico de segregação, aqueles poucos integrados às classes
sociais mais favorecidas foram classificados como brancos, identificando-se inclusive com os
brancos da elite dominante13
.
O processo abolicionista no Brasil apresenta algumas singularidades. Dentre elas,
Jacob Gorender14
destaca duas. A primeira consiste no mais longo regime de escravidão
existente que, por isso, aliado à grande dimensão e domínio, possibilitou inclusive um
processo interno de acumulação de capital, ou seja, formação do modo capitalista de
produção. A segunda incide ao fato de ser o Brasil o único Estado independente ainda
plenamente escravocrata, de modo que sua monarquia extremamente centralizada fomentou a
coesão interna necessária à organização social escravista.
De fato, a manutenção da sociedade escravista suscitava a manutenção da unidade
nacional, sem a qual poderia ter havido inclusive fracionamento político ou geográfico do
território brasileiro. A opção pela unidade nacional se fundamenta em três razões: no fato de
ser praticamente impossível sustentar a escravidão sem um Estado unificado, dada sua
alimentação via tráfico negreiro e a perseguição inglesa; na necessidade de assegurar o tráfico
interno dos cativos, que chegavam da África pelos portos do Recife, Salvador e Rio de
Janeiro, e daí redistribuídos pelas demais regiões; na utilização do poder coercitivo
centralizado, com capacidade de reprimir qualquer rebelião abolicionista em qualquer lugar
do país15
.
A escravidão consistiu, ao mesmo tempo, em uma regressão da sociedade e em uma
instituição de fortalecimento do capitalismo europeu. A escravidão não teve vez na Europa,
onde progredia o capitalismo, mas na América, local propício para a produção em larga escala
de bens agrícolas demandados pelo mercado europeu. Desse modo, a produção proporcionada
13
COSTA, 2010. Para compreender melhor o processo de cooptação que ocorreu em relação aos poucos pretos e
mulatos que conseguiram ascender na sociedade escravocrata, ver o Capítulo 9: O mito da democracia racial no
Brasil. 14
GORENDER, 1991. 15
GORENDER, 2000.
13
por braços cativos africanos derivados do tráfico se caracterizavam como enorme fonte de
riqueza, sustentando a acumulação capitalista na Europa.
A instituição escravista moderna na América foi primordialmente mercantil, tendo
como propósito principal a produção para exportação. Tal sistema se tornava possível por ter
assegurado monopólio pela metrópole que, por isso, garantia aos produtores preços de
monopólio. A metrópole portuguesa, então, era a única compradora de açúcar produzido no
Brasil, ao passo que os colonos brasileiros podiam importar bens procedentes apenas de
Portugal.
Nesse sentido, a característica de economia colonial, associada à política semelhante,
se tornou possível frente à inviabilidade de formar no Brasil Colônia um modo de produção
de bens para exportação baseada no trabalho livre, uma vez que tal trabalho assalariado ainda
estava em formação na Europa16
. O emprego do trabalho escravo, então, surge em sua forma
mais extrema, fato que não mudará após a independência política do Brasil.
Pelo contrário, o poder do escravismo brasileiro se potencializou através da prática do
tráfico de escravos. Os interesses da Inglaterra e os do Brasil, então, iam para lados contrários,
entrando inevitavelmente em choque. Como os ingleses constituíam a maior potência da
época, em 1845 aprovaram o Bill Aberdeen, segundo o qual navios brasileiros poderiam ser
revistados a qualquer momento sob acusação de transporte ilegal de africanos. Esta linha de
perseguição bem mais enérgica ao tráfico internacional de escravos vai ferir diretamente a
soberania brasileira, deixando desgostosos tanto fazendeiros e traficantes, quanto o próprio
Império.
A despeito dessa pressão exercida pelos ingleses17
, e como política e economicamente
o Brasil estava subjugado à esta, em 1850, aos quatro de setembro, se instituiu a Lei Eusébio
de Queiroz, abolindo o tráfico de escravos no Brasil. Desse modo, extinta a principal fonte de
abastecimento de mão de obra para o regime escravista, este tenderia a acabar, como tanto
queriam os ingleses18
.
Além da pressão dos ingleses, o sucesso da lei se deveu a fatores internos, tais como o
descontentamento dos agricultores quanto aos preços elevados dos escravos, dado às
constantes capturas dos navios negreiros pela Inglaterra; bem como a submissão destes aos
traficantes, que se tornavam cada vez mais importantes na concessão de crédito. Apesar do
16
GORENDER, 2000. 17
A historiografia é bastante rica no que diz respeito à participação inglesa para a efetiva abolição do tráfico
negreiro no Brasil, de modo que há várias interpretações, inclusive que a pressão da Inglaterra pouco contribuiu.
Para compreender mais esse debate ver GORENDER (1991), QUEIROZ (1999) e COSTA (2001). 18
COSENTINO, 2006; CONRAD, 1975; GORENDER, 1991; JOSÉ, 1962.
14
desprestígio que a sociedade lhes conferia, faziam sombra com seu dinheiro à elite, que ditava
ideias políticas e sociais do país19
, a saber, fazendeiros e grandes proprietários de terras, que
são devedores àqueles20
.
A extinção do tráfico acarreta outro efeito direto: põe fim ao longo conflito com a
Inglaterra, de maneira que, das relações políticas que então se firmam com aquele país,
derivará nova afluência de iniciativas e capitais para o Brasil21
. Com efeito, o fim do tráfico
proporcionou um acelerado processo de modernização, que a partir da disponibilidade
financeira, teve lugar a fundação do segundo Banco do Brasil e do Banco Rural e Hipotecário,
além de varias sociedades anônimas e companhias. Analogamente, as áreas de comunicação e
transporte também apresentam um salto positivo, com navios a vapor substituídos pelos
barcos à vela, linhas telegráficas e estradas de ferro, melhorando o escoamento da produção
também em Minas Gerais. É nesse contexto que a indústria começa a despontar, de maneira
ainda tímida, mas já mecanizando algumas lavouras de café.
No entanto, as ações realizadas contra o tráfico, consistiam apenas em medidas para
adiar a abolição definitiva, resguardando os interesses dos grandes senhores de terra. Duas
semanas após a extinção do tráfico de escravos, foi promulgada a Lei de Terras, com o fim de
regulamentar o direito sobre a propriedade no Brasil. Até então, a apropriação territorial se
dava por meio da posse, na qual os grandes proprietários aumentavam seus domínios se
apossando das terras dos demais. Este período “estruturou de forma definitiva o latifúndio,
que tinha base no poder local e se valia da ausência estatal”22
.
Extinta a fonte de mão de obra servil barata, o preço do escravo sobe
consideravelmente, uma vez que o crescimento vegetativo era baixo23
. Além disso, o alto
preço dos cativos vai agravar a situação do Nordeste, cujos produtos tradicionais sofrem
muito frente a competição no exterior. Com isso, a região vai vender seus escravos ao sul do
país, então perfeitamente capaz de incorporar essa mão de obra em suas lavouras de café, o
19
PRADO JÚNIOR, 1994b. 20
Suely Queiroz (1999) vai dizer que muitos fazendeiros compravam escravos a prazo e a juros altíssimos, de
modo que quando não conseguiam pagar aos traficantes perdiam suas posses para estes. Além disso, um
sentimento xenofóbico também contribuiu para o fim do tráfico de africanos, uma vez que grande parte dos
traficantes era de estrangeiros, com grande número de portugueses. 21
PRADO JÚNIOR, 1994. 22
COSENTINO, 2006, p. 26. Ver SILVA, 1996. 23
Quanto ao crescimento vegetativo, alguns autores vão defender que como no sul dos Estados Unidos, no Brasil
também havia condições da própria população escrava dar continuidade à escravidão, o que outros autores vão
refutar por causa da origem dos africana da maioria cativos, da grande concentração de escravos na faixa de
idade de 20 a 39 anos, das condições impostas a eles, bem como à disparidade entre gêneros. Ver SLENES,
1985; LUNA & CANO, 1983; GORENDER (1991) e QUEIROZ (1999).
15
que vai fazer com que aumente em alto grau o tráfico interno de escravos, principalmente para
São Paulo24
.
Uma vez que a questão agrária sempre esteve ligada à discussão da mão de obra, a Lei
de Terras nasceu como um complemento à abolição do tráfico, primeiro porque todo o valor
que o escravo representava em mercadoria e capital imobilizado deveria agora ser substituído
pela terra, e depois porque o fim do tráfico negreiro implicava o fim do trabalho escravo e, em
consequência disso, a transição para o trabalho livre25
. A lei, então, foi essencial para a
inserção do trabalho assalariado no Brasil.
Na década de 1860, a sustentação internacional da escravidão sofre um grande abalo
com a Guerra de Secessão nos Estados Unidos, que pôs fim à escravidão naquele país. Além
disso, o preço do café sofre um declínio, desponta uma crise financeira em meados do decênio
e uma guerra: a do Paraguai, fatores tais que vão impor limitações econômicas e problemas
políticos ao país. Ao mesmo tempo, a opinião pública começa a se posicionar favoravelmente
à abolição, surgindo as primeiras associações abolicionistas; ao passo que há uma grande
desorganização na frente de homens livres, aqueles favoráveis ao regime escravista26
.
É nesse cenário que o debate da abolição chega aos escravos, esperançosos de que
finalmente se verão livres do cativeiro. Os negros, indubitavelmente os que mais sofreram
desde os primórdios da escravidão, percebem a mudança social que está havendo a sua volta,
porém sem conseguir compreender a razão pela qual lhes prendem com os grilhões. Dado o
baixo – ou quase inexistente – grau de escolaridade, a maioria dos cativos tem conhecimento
apenas do que conseguem escutar nas ruas, nas casas das fazendas, entre o comércio, etc., das
pessoas que comentam.
Alguns teóricos, como de Gilberto Freyre, com seu monumental “Casa grande e
senzala”, vão defender que a escravidão no Brasil foi de ordem patriarcalista, ou seja, capaz
de tratar os cativos com critérios de justiça. De acordo com essa visão, no limite a escravidão
foi benéfica e protetora para os escravos, o que deixou de ser quando da abolição da
escravatura. Tal ideia patriarcalista está de acordo com aquela que afirma haver entre escravos
e senhores um contrato social, no qual as duas partes se beneficiam mutuamente.
Na contestação do patriarcalismo, outros autores vão fazer referência ao processo
social de coisificação vivido pelo escravo, reconhecido juridicamente na sua identificação
enquanto mercadoria. Alguns autores, como Fernando Henrique Cardoso, vão avançar para a
24
Para compreender melhor o comércio interprovincial de escravos, ver CONRAD (1975); MARTINS (2002) e
JOSÉ (1962). 25
COSENTINO, 2006; GORENDER, 1991. 26
JOSÉ, 1962; GORENDER, 1991.
16
coisificação subjetiva, isto é, o escravo deixa de ser pessoa e passa a ser um mero objeto,
reconhecendo no seu igual também um objeto.
Em refutação a esta, por sua vez, outra linha da literatura vai defender que o escravo é
dotado de vontade própria, perfeitamente capaz de modelar os termos da escravidão quase
como o é capaz os senhores. Nesse sentido, nos negros prevalece a subjetividade autônoma,
na qual impera a acomodação quanto ao regime escravocrata. Desse modo, o escravo consiste
em um “agente voluntário da reconciliação com a escravidão”27
.
Ora, nem patriarcalismo, nem contrato social e consenso, nem coisificação subjetiva.
O escravo não era um agente passivo, mas um sujeito do processo de trabalho bem como
sujeito histórico, sem acomodação e sem contrato, capaz de lutar contra toda a opressão que o
tratava como coisa. O escravo trabalhava sob forte coação física e psicológica do senhor, de
modo que sua forma de se rebelar, uma vez que não dispunha de consciência de classe, era
principalmente o atraso do serviço e as fugas.
Ademais, a grande maioria dos escravos morreu escrava, o que não significa que
aceitaram a escravidão que lhes foi imposta. Havia a clara necessidade de se adaptar à
escravidão para sobreviver a ela, de maneira que o próprio fato de resistir à coação constante
do senhor, à violência e à sua condição de mercadoria fazia parte do processo de adaptação.
Tal fato, que em nenhum momento se assemelhava à pretendida “acomodação consensual”,
era indispensável para impedir que a coisificação social, estabelecida pelo regime escravista,
se transformasse em coisificação subjetiva28
.
Uma vitória parcial que os escravos tiveram, data de 1871. A todo o momento o
governo, obrigado a dar respostas ao regime servil, tentava alterar o status quo da sociedade,
atendendo, para isso, aos críticos da escravidão, mas sem prejudicar as lavouras e os
interesses dos donos dos cativos. Com efeito, em 28 de setembro, foi criada a Lei Rio Branco,
mais conhecida como Lei do Ventre Livre. Essa medida declarava livres os filhos dos negros
nascidos após a sua vigência, contanto que, mantidos sob os “cuidados” dos senhores até os
oito anos de idade, trabalhassem até os vinte para pagarem a “educação” recebida. Os donos
poderiam optar, ainda, por receberem uma indenização do Estado29
.
Essa lei, mais uma vez, configurava uma manobra essencialmente política,
caracterizada pela astúcia do governo em alcançar seus objetivos atendendo a interesses tanto
27
GORENDER, 1991, p. 20. 28
É importante ter “em vista a coisificação social, que não é sinônimo de coisificação subjetiva. A coisificação
social se chocava com a pessoa do escravo (pessoa = subjetividade humana). Ferida, humilhada, comprimida, a
pessoa do escravo não era anulada (exceto em casos patológicos). A contradição entre ser coisa e ser pessoa
constituía a vivência do escravo durante toda a sua existência” (GORENDER, 1991, p. 22-23). 29
PRADO JÚNIOR, 1994b; COSTA, 2001; JOSÉ, 1962.
17
de liberais quanto de conservadores. Nesse sentido, a medida não percutiu efeitos imediatos,
já que os escravos seriam libertos após os vinte e um anos de idade. Essa proteção ao
proprietário adiou a discussão da libertação definitiva dos cativos.
Os anos que se seguiram à abolição do tráfico de escravos não foram de plena
prosperidade para o conjunto dos fazendeiros brasileiros, de modo que um grande problema
os preocupava: a escassez de mão de obra. As dificuldades pelas quais passava a agricultura
eram derivadas primordialmente da falta de trabalhadores, o que se configurou numa típica
característica da sociedade brasileira enquanto a escravidão existiu. Vale lembrar que o
trabalho escravo repelia o trabalho livre, tanto o nacional quanto o estrangeiro, o que fazia
com que os grandes senhores de terras exigissem constantemente do governo auxílio na
aquisição de novos trabalhadores, que eram poucos e dispendiosos30
.
Em consequência disso, em 1879, foi criada a Lei de Locação e Serviços, como uma
forma de organização do trabalho assalariado. Essa lei regulamentava o trabalho dos
imigrantes, incentivado pelo governo, bem com o trabalho dos nacionais, por meio de
contratos que durariam, para estes, de três a seis anos, e, para aqueles, o máximo de cinco
anos, podendo ser renovados. A lei visava atrair os imigrantes, iniciando um processo de
imigração europeia, para dar respostas mais favoráveis aos trabalhadores mas sem deixar de
ser repressivo. Por outro lado, a reorganização do mercado de trabalho tirou a atenção do fim
da escravatura31
.
O problema da mão de obra, porém, não foi solucionado, muito embora uma série de
leis referentes à locação de serviços tenham sido promulgadas em 1830, 1837 e 1879. Não
obstante, tais leis expressam os desejos dos fazendeiros de manter constantemente o controle
de sua mão de obra não pela concessão de incentivos, mas pela obrigação legal32
.
A última medida antes de tal fim, a Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva-Cotegipe,
datada de 28 de setembro de 1885, estipulava que os escravos acima de 60 anos seriam
libertos, contanto que ou trabalhassem mais três anos ou pagassem uma multa a seus donos,
podendo ser dispensados caso chegassem aos 65 anos. Essa “foi uma tentativa desesperada
30
CONRAD, 1975; COSENTINO, 2006. 31
Ver LAMOUNIER, 1988; GEBARA, 1986. 32
Segundo Conrad (1975, p. 52) um conhecido autor abolicionista, d’Escragnolle Taunay, em 1884 “disse à
Câmara dos Deputados que a acusação, tantas vezes ouvida na Europa, de que o Brasil estava tentando
transformar europeus em servos, se não escravos, tinha por base, principalmente, essas leis de locação de
serviços de 1830, 1837 e 1879, todas elas contendo artigos penais que afetavam gravemente a liberdade
humana”.
18
daqueles que se apegavam à escravidão para deter a marcha do processo”33
. No limite, a
liberdade dos sexagenários continuava condicionada às vontades dos senhores.
A partir de 1880, o movimento abolicionista ganhou grande força na sociedade,
invertendo os papéis de escravos e de senhores: agora estes apresentavam-se como algozes e
aqueles como vítimas. A justiça passava a olhar com maus olhos a escravidão a despeito dos
senhores, e os próprios escravos contestavam cada vez mais a legitimidade de sua situação,
bem como reivindicavam sua liberdade. Não suportando as pressões, aos treze de maio de
1888, foi assinada pela Princesa Isabel a Lei Áurea, abolindo definitivamente a escravidão no
Brasil34
.
O emprego da mão de obra escrava não teria durado mais de três séculos se não fosse
altamente lucrativo. A recorrência a ele “não decorreu somente da falta de alternativa, o que
se dava até o século XIX, mas principalmente do fato de que a exploração de escravos se
praticava em regime de preços de monopólio”35
. Assim, os produtos do trabalho servil se
destinavam a mercados sem ou com pouca concorrência, de modo que persistiu mesmo após a
superação do sistema colonial.
Por outro lado, não é difícil compreender o grande problema que a escravidão causou
no Brasil. Considerando a intensidade da demanda por mão de obra frente à escassez de
trabalhadores, pode parecer contraditório que houvesse milhares de brasileiros que
conseguiam viver através de crimes, esmolas ou vício, ou ainda que subsistissem à margem da
economia. Entretanto, enquanto persistiu o trabalho escravo, os senhores de terra pouco se
predispunham a contratar trabalhadores livres. Por seu turno, homens e mulheres livres e
pobres, muitos deles ex-escravos, possuíam alguma resistência em se submeterem às
condições de dificuldades e até mesmo de degradação que a vida rural requeria.
De fato, para abolicionistas como Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, André
Rebouças e Manuel de Souza Dantas, a abolição da escravatura consistia apenas em primeiro
– muito importante – passo para a redemocratização do país36
. Quase quatro séculos de
trabalho forçado e desigualdades sociais não teriam seus efeitos superados com somente tal
avanço. Prevalecera ainda uma gama de hábitos e costumes que condenaria ainda por muito
tempo tanto os libertos quanto seus descendentes a uma condição social e econômica
deliberadamente inferior.
33
COSTA, 2001, p. 70. 34
COSTA, 2001; PRADO JÚNIOR, 1994b; JOSÉ, 1962. 35
GORENDER, 2000, p. 41. 36
CONRAD, 1975.
19
3 Escravidão em Minas Gerais
Lavradores, pastores ou mineradores, os homens de Minas se distinguem em razões
dos ciclos econômicos, que lhes presidiram a formação. Cada qual deixou um
sentido próprio no seu estímulo, através de aspectos peculiares de sua “cultura”. A
mineração teve a missão precípua da coordenação, incentivando a imigração para o
centro, devassando o sertão, construindo as primeiras cidades...; o pastoreio, com
sua ânsia de expansão, levada a efeito por peões e vaqueiros, com aquele
‘sentimento de infinito’, de que fala Humboldt..., exerceu o papel de ocupação; e a
agricultura, com seu espírito fundiário, gerado no poderio de café, realizou a grande
tarefa de fixação.37
As notícias de que havia ouro em abundância no interior do Brasil animaram os
habitantes não só do litoral da colônia, mas também da metrópole e das ilhas lusas. As
possibilidades reais e ilusórias de rápido enriquecimento parecia a realização dos sonhos de
riqueza que os portugueses alimentavam há tanto tempo bem como da esperança que nutria a
Coroa de encontrar metais preciosos, de modo que partiram em marcha para as Minas Gerais
multidões que impressionavam.
Contudo, poucos se enriqueciam de fato e de modo permanente, alguns conseguiam
posse de boas quantidades de ouro, mas acabavam por gastar tudo dado a vida que levavam.
As multidões, por sua vez, permaneciam pobres e cheias de necessidade. A partir disso,
surgiram várias coletividades, nas quais predominavam a divergência, instituindo um
verdadeiro caos nas entranhas do Brasil, de modo que as autoridades se viram obrigadas a
instaurar algum órgão do governo em favor da ordem. Assim, em 1709 será criada a Capitania
de São Paulo e Minas, e em 1720 a Capitania de Minas Gerais38
.
A mobilização populacional para Minas, nos moldes como ocorreu, abarcou
características claramente sociais uma vez que as multidões ansiavam melhores padrões de
vida, “mas gerou efeitos econômicos, políticos e administrativos da maior repercussão,
inclusive permitindo a Minas centros urbanos definidos antes de contar com razoável vida
rural”39
. Desse modo, estava definida a primeira fase da economia mineira, a saber, a da
mineração, que se subdivide em duas menores: a do ouro e a dos diamantes. E assim a
escravidão chegou a Minas Gerais40
.
37
JOSÉ, 1993, p. 11-12 38
FREDERICO, 2013; JOSÉ, 1993. 39
JOSÉ, 1993, p. 44. 40
PAULA, 2000; BOTELHO, 2000.
20
A quantidade existente de brancos não dava conta de atender às necessidades que a
atividade mineradora exigia, ao passo que o índio fugia desse tipo de trabalho. Tais fatos
demandaram a presença dos escravos, que introduzidos através do Rio de Janeiro e da Bahia,
em pouco tempo dinamizaram os trabalhos da mineração41
. Nesse sentido, a abertura de uma
nova possibilidade de expansão econômica se fez a partir do trabalho escravo, dando
prosseguimento a esta característica peculiar de colonização da América42
.
Na fase do ouro, primeira da mineração, o trabalho do escravo consistia em retirar o
ouro de aluvião, e em seguida, das barrancas. Quando o negro foi obrigado a tirar o ouro do
fundo dos rios, as condições de trabalho estavam bem mais precárias, tendo ele os pés
descalços e as costas queimadas pelo sol constante, trabalhando várias horas dentro dos rios
sob severa vigilância dos feitores. Além da alimentação ruim, lhe era servida cachaça, que
acreditavam consistir em ricas calorias capazes de aliviar os efeitos da umidade nos pés e
pernas43
. Nesse período, os problemas derivados da dificuldade de abastecimento alimentar
obrigaram a população a direcionar parte dos escravos envolvidos na mineração para a
agricultura de subsistência.
Na segunda fase, a dos diamantes, o emprego do trabalho servil era idêntico ao do
ouro, não só porque o nível de exploração do trabalho escravo e a precariedade deste eram
muito elevados, mas também porque os cativos pouco se beneficiavam do processo
minerador, além dos diamantes, assim como o ouro, abastecerem os mercados e economias
europeus. Diminuindo a atividade de extração do diamante, o negro foi deslocado para a
lavoura.
As atividades econômicas, que até então gravitavam basicamente em torno da
mineração, passaram a abarcar outras atividades em desenvolvimento, como a agricultura e a
pecuária, e as que estavam no início, como a produção de açúcar, aguardente, rapadura,
tecelagem, fiação, etc. A sociedade mineira, por sua vez, refletia a tal diversidade econômica
na diversidade de sua população, constituindo uma estrutura social bastante variada “onde
brancos, negros, índios e mestiços designavam qualidades que se articulavam das mais
diversas maneiras (consensuais e/ou conflituosas) às condições expressas nas categorias:
livres, forros, escravos e administrados”44
. A diversidade se verificava ainda na distribuição
da força de trabalho, na qual grande parte dos cativos estava empregada na agricultura, mas a
41
JOSÉ, 1993. 42
BOTELHO, 2000. 43
JOSÉ, 1993. 44
GUIMARÃES, 2000, p. 325.
21
parcela direcionada a serviços artesanais e manufatureiros era maior que de Províncias como
Rio de Janeiro e São Paulo45
.
De fato, findo o período minerador, a política de isolamento com vistas a um maior
controle sobre a extração de ouro e diamantes, sofrida pela região mineradora, ainda
dificultava o desenvolvimento de atividades econômicas voltadas para exportação. A
população buscou, então, outros meios de subsistência, como a plantação do fumo, da cana e
do algodão, da agricultura dos cereais e a criação de gado, modificando assim o tipo
predominante de trabalho.
A especialização produtiva deu estímulos à estruturação de uma divisão territorial do
trabalho ainda rudimentar, interligando o Nordeste e o Sul, que eram fornecedoras de carne e
animais para transporte às regiões mineiras. Portanto a atividade mineradora integrou as
regiões, promovendo a interiorização do território mineiro. Nas regiões nas quais a extração
aurífera se prolongou de maneira estável por algumas décadas, foram organizadas cidades
com forte concentração populacional, dando características urbanas peculiares à Minas
setecentista46
.
Há um grande debate na historiografia acerca do caráter econômico da Província
mineira após a decadência da mineração. Roberto Simonsen47
defende a tese de que a
economia mineira essencialmente para subsistência persistiu à margem da economia para
exportação. Tendo a produção pecuária uma importância bem pequena, para ele, há um
grande vazio entre o declínio da atividade mineradora e o despontamento do café, tendo que
aguardar um período de várias décadas até o auge do empreendimento cafeeiro.
Analogamente, Celso Furtado também parte do pensamento de que apenas a
exportação é capaz de movimentar a economia e gerar riquezas. O autor enfatiza que as
regiões mineiras absteram-se de criar, à exceção de uma precária agricultura de subsistência,
formas permanentes de atividades econômicas, o que faria natural a plena decadência da
economia mineira com o declínio da produção do ouro. Com a quebra da produção “todo o
sistema se ia assim atrofiando, perdendo vitalidade, para finalmente desagregar-se numa
economia de subsistência” de baixa produtividade, de modo que tal involução da atividade
econômica implicaria na decadência das cidades e dispersão da população48
.
45
COSENTINO, 2006. 46
FREDERICO, 2013. 47
SIMONSEN, 2005. 48
FURTADO, 2007, p. 132.
22
Na contramão da defesa da decadência da economia de Minas após o fim da
mineração, Caio Prado Júnior49
se atenta à especificidade da economia mineira de
subsistência, dando especial atenção ao Sul da Província, para traçar inclusive o panorama do
conjunto da economia colonial. Prado Júnior desvendou o movimento que a produção para
subsistência conferiu à procura de novos mercados, bem como sua abertura a estes, mesmo
após o declínio da mineração.
Para Alcir Lenharo, com o passar do tempo a produção agrícola cresceu a tal ponto
que proporcionou a criação de um centro comercial de distribuição, encontrando escoamento
dos produtos através dos tropeiros, que cuidavam do abastecimento da região. A produção
para tal abastecimento compreendia porcos, galinhas, carneiros e gado em pé, em grande
quantidade, além de toucinhos, queijos e cereais, sendo tais itens exportados principalmente
para o mercado do Rio de Janeiro. O principal centro abastecedor consistia no Sul de Minas,
embora outras regiões complementassem a produção, como era o caso de Paracatu50
.
Nesse sentido, faz-se necessário compreender que a crise aurífera não compreendeu
toda a economia mineira. A diversificação econômica desde o começo possibilitou alguma
elasticidade à estrutura econômica da época, de modo que a crise da mineração não se
convertesse em uma decadência geral da economia mineira51
. Um claro exemplo disso
consiste nos dados sobre a população escrava, que cresceu nitidamente após a superação da
crise mineradora.
A partir de 1808, além do fim do exclusivo colonial52
, com o estabelecimento da Corte
portuguesa no Rio de Janeiro, ocorreu a internalização do capital no Centro-Sul. O novo
cenário político e econômico do Brasil proporcionou um processo de desenvolvimento
econômico muito particular da região do Sul das Gerais, permitindo ainda a expansão
economia cafeeira, utilizando sobremaneira o trabalho escravo.
O mercado carioca se viu sobrecarregado de serviços, apresentando deficiência em
suprir as demandas da população que crescera consideravelmente. Minas Gerais providenciou
para socorro da capital grande quantidade de gado vacum, porcos, cavalos e bestas,
organizando ela própria as remessas para o Rio de Janeiro53
. No entanto, as doações, mesmo
aliada às de particulares em busca de reconhecimento da Corte, não eram suficientes para
49
PRADO JÚNIOR, 1994a. 50
LENHARO, 1993. 51
Ver também LENHARO, 1993; GUIMARÃES, 2000; COSENTINO, 2006. 52
Sobre o fim do exclusivo colonial, ver PRADO JÚNIOR, 1994b. 53
LENHARO, 1993.
23
atender ao mercado em crescente demanda, de modo que se tornaram constantes as crises de
abastecimento de gêneros alimentícios.
O problema de abastecimento conheceu um agravo maior com a ascensão da economia
cafeeira. As grandes propriedades rurais tipicamente escravistas tomavam para si a
especialização da produção do café, restringindo ainda mais a produção de alimentos de
primeira necessidade. Além disso, tais propriedades, com elevado número de escravos,
transformavam-se em grandes centros consumidores desses gêneros, aumentando a carência
de víveres. Entre as diversas medidas tomadas para solucionar o problema do abastecimento
está a isenção de recrutamento tanto para tropeiros e condutores de gado quanto para os
mantimentos destinados à Corte e até para os agricultores mineiros54
.
Os caminhos que levavam ao mercado carioca no início dos novecentos eram os
mesmos que abasteceram as Minas Gerais no século XVIII. Desde 1733 vigorava lei que
proibia abertura de novas estradas a fim de conter a debandada de ouro e diamantes através do
contrabando. Várias trilhas, porém, seriam abertas, fosse para diminuir o caminho a ser
percorrido ou para fugir dos impostos sobre as mercadorias em trânsito, sendo a principal
delas o Caminho Novo com suas variantes, Caminho do Couro e Caminho da Terra, os canais
de comunicação com o mercado carioca55
.
Figura 1 – Estradas reais
Fonte: Núcleo de Pesquisas Arqueológicas do Alto Rio Grande, 2013.
54
LENHARO, 1993. 55
LENHARO, 1993.
24
Antes da construção dessas novas estradas, a região Sul de Minas Gerais já se
interligava à capital via duas outras: ao sul, pelo caminho da estrada Rio-São Paulo; e por São
João del-Rei, que acessava diretamente o Caminho Novo. Este caminho funcionava como um
atalho aos viajantes para o Rio de Janeiro, tornando-se estrada pelo governo a partir de 1808,
dada a necessidade de transportar gado sul-mireiro para o mercado carioca56
.
Nesse processo de integração do Centro-Sul, a articulação de algumas famílias na
prestação de serviços à Corte, principalmente no que tange à infraestrutura de transportes,
conferiu a elas favorável situação política e econômica. Conquistando primordialmente acesso
a grandes quantidades de terras, tais grupos familiares, fazendo uso dos seus braços escravos,
conseguiram imprimir sua marca no cenário social que então se configurava, quer fosse
atuando diretamente na produção, venda e transporte que o café exigia, quer fosse provendo
empréstimos a proprietários menores ou no rendoso tráfico de escravos, mas tendo sempre por
base sua relação com o Estado57
.
Acumulando forças em nível mesmo de administrações provinciais, a maneira como se
desenvolveu a elite cafeeira no Centro-Sul implica em um “fenômeno peculiar de
acomodação social que entrelaçava os setores burocráticos e mercantil, instalados na capital,
com setores emergentes do interior, oriundos do comércio regional ou da mineração,
geralmente procedentes da comarca do Rio das Mortes”58
.
Tal ascensão, por sua vez, só foi possível dado o emprego do trabalho servil nesses
setores. As famílias se utilizavam de seus escravos para cumprirem atividades em favor do
Estado metropolitano, este as recompensava com terras e prestígio político, ao passo que
aquelas compravam mais escravos. No limite, aos escravos competiam o processo produtivo,
árduo e braçal, cuja riqueza gerada engrandecia diretamente aos seus senhores.
O censo realizado em Minas Gerais em 1831-32 expõe as atividades nas quais eram
empregados tantos os livres quanto os escravos:
56
LENHARO, 1993. 57
LENHARO, 1993. 58
LENHARO, 1993, p. 56.
25
Tabela1 - Estrutura ocupacional livre e escrava no censo e na amostra,
segundo setores de atividade em Minas Gerais - 1831-1832
Setores
Censo 1831-1832
Livres
Escravos
Total
Nº abs. %
Nº abs. % Nº abs. %
Sem informação 77.638 39,2 68.200 64,4
145.838 48,0
Agropecuária 38.562 19,5
18.368 17,3
56.930 18,7
Mineração 3.246 1,6
2.055 1,9
5.301 1,8
Atividades manuais e
mecânicas 54.950 27,8
11.311 10,7
66.261 21,8
Comércio 6.450 3,3
401 0,4
6.851 2,3
Serviços domésticos 1.818 0,9
3.819 3,6
5.637 1,9
Funções públicas 1.058 0,5
0 0,0
1.058 0,4
Outras atividades 11.553 5,8
1.488 1,4
13.041 4,3
Desocupados 1.653 0,8
121 0,1
1.774 0,6
Associações ocupacionais 929 0,5
146 0,1
1.075 0,4
Total 197.857 100,0 105.909 100,0 303.766 100,0
Setores
Amostra
Livres Escravos Total
Nº abs. % Nº abs. % Nº abs. %
Sem informação 9.495 17,0
5.889 19,7
15.384 17,9
Agropecuária 14.095 25,2
11.668 39,1
25.763 30,0
Mineração 729 1,3
1.622 5,4
2.351 2,8
Atividades manuais e
mecânicas 23.436 41,9
6.140 20,6
29.576 34,5
Comércio 1.801 3,2
225 0,8
2.026 2,4
Serviços domésticos 1.087 1,9
3.012 10,1
4.099 4,8
Funções públicas 255 0,5
0 0,0
255 0,3
Outras atividades 3.883 6,9
1.104 3,7
4.987 5,8
Desocupados 741 1,3
75 0,3
816 1,0
Associações
ocupacionais 466 0,8
109 0,4
575 0,7
Total 55.988 100,0 29.844 100,0 85.832 100,0
Fonte: Godoy e Paiva, 2010, p.174.
Marcelo Godoy e Clotilde Paiva analisam os resultados tanto dos números absolutos,
determinados pelo censo, quanto da amostra, demonstrando que, exceto funções públicas,
todos os setores apresentam participação relativa inferior à amostra. Os autores destacam que
a omissão e distorção das informações implicaram em resultados que contestam a qualidade
26
da variável ocupação59
. Porém, é possível perceber que a estrutura exposta pela amostra
elevou a diversificação ocupacional do total da população, ainda que predominada pela
agropecuária e pelas atividades manuais e mecânicas.
Para a população livre, o destaque desses setores era ainda maior, embora o comércio
apresentasse posição mais expressiva do que a população total; já para os escravos, notou-se a
“inversão na posição relativa dos maiores setores, com a agropecuária perfazendo quase o
dobro da participação das atividades manuais e mecânicas, além da significativa importância
da mineração e, principalmente, do serviço doméstico”60
.
Com efeito, para Roberto Martins61
, o sistema escravista de Minas Gerais nos
oitocentos configurou a maior instituição servil que existiu em toda a história brasileira. A
grande quantidade de escravos na Província, então, era oriunda de massiva importação,
destinados não só à atividade mineradora, mas àquelas voltadas também para o mercado
interno, como a agricultura e a pecuária.
Minas Gerais, dona do maior plantel de escravos durante todo o século XIX,
sustentava sua economia através do abastecimento interno e externo62
. Porém, é necessário
compreender o território mineiro como região de contrastes, caracterizado pela disparidade de
sua formação. John Wirth63
defende que Minas não era uma região, mas um mosaico com sete
sub-regiões, definidas pelo autor como Norte, Leste, Mata, Sul, Centro, Triângulo e Oeste, de
modo que as sub-regiões mais desenvolvidas – Zona da Mata, Triângulo e Sul – se ligavam
historicamente às regiões mais desenvolvidas de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Nesse sentido, o escravo não permaneceu apenas na capital da Província, Ouro Preto,
mas se espalhou por todo o território mineiro. O declínio do ouro culminou no esvaziamento
das vilas com o deslocamento das populações para outras localidades da Província, o que
expandiu suas fronteiras, antes restritas à região das minas. Segundo Oiliam José64
, as
famílias e seus escravos que deixavam para trás a mineração lançavam-se para além de
59
Os autores vão demonstrar que as divergências entre o censo e amostra evidenciam que as proporções de livre
e escravos são diferentes, sendo mais sentidas na agropecuária, cuja participação dos escravos não só é maior na
amostra como supera a dos livres. Não é objetivo deste trabalho discutir as deficiências do censo, embora não
seja menos importante discutir as qualidades das informações. Para aprofundar mais no debate, ver GODOY E
PAIVA, 2010. 60
GODOY E PAIVA, 2010, p. 174. 61
MARTINS, 1982. 62
Várias são as discussões em torno da produção na economia mineira. Roberto Martins (1980) e Robert Slenes
(1985) discorreram muitos debates sobre o caráter exportador ou interno da economia mineira, ao que Alcir
Lenharo (1993, p. 26) destaca que “quase sempre a economia de subsistência é vista como caracterizada por
baixa produtividade e rentabilidade [...]. As forças de trabalho nela empregadas tendem a diferenciá-la da
economia de exportação: nesta utiliza-se extensivamente o trabalho escravo; naquela é mais comum o emprego
de formas não escravistas de trabalho”. Ver ainda GUIMARÃES, 2000; FURTADO, 2007. 63
WIRTH, John, 1982. 64
JOSÉ, 1993.
27
Guarapiranga, desciam as serras para adentrarem nos sertões do Leste ou Áreas Proibidas,
procurando as bacias dos rios Pomba, Muriaé, Paraibuna e Paraíba do Sul; outros foram em
direção às bacias dos rios Piranga, Casca e Doce. Sem os braços cativos Minas não teria se
desenvolvido, principalmente no que diz respeito à agricultura e ao ouro, intensamente
retirado da região.
A elite mineira era tão conservadora, que quando da convenção de 1826, na qual o
Brasil se comprometia com a Inglaterra a proibir o tráfico de escravos, o Conselho Geral da
Província de Minas Gerais aprovou uma advertência ao Trono e à Assembleia Geral,
denunciando as consequências maléficas que poderiam suceder da convenção, que, como
alegavam, seriam fatais a Minas. Os grandes fazendeiros justificavam a advertência
defendendo não terem tido tempo hábil para garantir “bom suprimento” de negros africanos,
principalmente os mais próprios para os serviços minerais. Alegavam ainda que em
consequência do tratado, a produção seria necessariamente afetada, como o seria também as
rendas públicas65
.
Com a abolição do tráfico em 1850, a oscilação do preço dos escravos provocará um
intenso tráfico interno na Província mineira, deslocando muitos braços cativos principalmente
para a Zona da Mata nos dois decênios seguintes. Tal ideia defende a tese de que o café foi
importante atividade de dinamização da economia mineira no século XIX, compondo um
complexo de plantation voltado também para a exportação66
. Ademais, findo o tráfico a
escravidão apresentava vida longa, mediante a alta dos preços dos gêneros de subsistência,
que aumentavam em relação proporcional aos preços dos escravos.
Enquanto não conseguiam sua almejada liberdade, os escravos mais articulados iam
planejando seu meio de emancipação, seja por meio da fuga ou do quilombola, do bom
comportamento forçado ou do afinco ao trabalho, da amizade com os filhos e filhas dos
senhores ou de processos que lhes valorizavam preço e trabalho, entre outros. Assim, se o
escravo possuía profissão, como carpinteiro, alfaiate, ferreiro, etc., aumentava os cuidados
recebidos do senhor67
. Por outro lado, o proprietário dificilmente se desfaria desse negro, já
65
JOSÉ, 1962. O autor demonstra ainda que era tal a hostilidade da elite mineira contra as ideias abolicionistas
que no mesmo ano havia sido proposta na Assembleia Geral do Império a emancipação dos cativos e a abolição
de forma progressiva da escravidão particular, tendo os legisladores brasileiros não permitido sequer a leitura do
projeto (JOSÉ, 1962, p. 14). 66
Roberto Martins (1980) e Robert Slenes (1988) teceram amplo debate em diversos artigos sobre as
características da economia mineira, entre elas se havia ou não sistema de plantation na Província, bem como se
teria existido tráfico interno de cativos entre as regiões mineiras. Para compreender melhor, ver trabalhos dos
referidos autores. 67
JOSÉ, 1962.
28
que seu valor também crescia, o que consistia no lado negativo de ser bem visto aos olhos do
senhor.
Os escravos empregados na mineração eram os mais bem cuidados, uma vez que se
caracterizavam como fortes e vigorosos, além de possuírem conhecimentos inerentes à
mineração que nem sempre se encontrava entre os cativos de maneira geral. Não se pode
deduzir, no entanto, que estes negros não sofreram com sua condição de escravos, poderia ser
dito que apenas em menor grau que os demais. O trabalho nas minas era o preferido pelos
cativos, visto que tinham maiores chances de pagar pela alforria com o que conseguiam juntar
dos furtos de ouro e de diamante.
Desse modo, os senhores passavam a necessitar mais dos escravos que estes daqueles.
Através principalmente do contrabando de metais preciosos, os negros conseguiam finalmente
a quantia necessária para alcançarem a liberdade completa, deixando em apuros os senhores e
contribuindo para a elevação dos índices estatísticos de libertos em Minas Gerais68
. Porém, o
plantel escravista continuaria a crescer.
O recenseamento de 1872, que foi o único a abranger todo o território brasileiro
durante o Império escravista, apresenta dados relevantes para a análise demográfica do
Brasil69
. Entre as maiores Províncias, Minas Gerais possuía a maior quantidade de cativos:
Tabela 2 – Comparativo da população livre e escrava no censo de 1872
Províncias
Livres Escravos
Total Homens Mulheres Homens Mulheres
Brancos Negros Brancas Negras
Bahia 170.412 462.381 154.924 430.119 91.576 80.580 1.389.992
Minas Gerais 423.917 428.505 416.064 417.724 184.173 161.360 2.031.743
Rio de Janeiro 170.670 118.911 174.009 119.914 138.831 124.611 846.946
São Paulo 197.491 113.616 197.991 110.103 69.105 57.584 745.890
Províncias
Livres Escravos
Brancos % Negros % N %
Bahia 325.336 23,40 892.500 64,20 172.156 12,38
Minas Gerais 839.981 41,34 846.229 41,65 345.533 17,01
Rio de Janeiro 344.679 40,69 238.825 28,20 263.442 31,10
São Paulo 395.482 53,02 223.719 29,99 126.689 16,98
Fonte: Adaptado de Paiva; et al., 2013.
Nota: O campo "negros" abarca pardos, pretos e caboclos.
68
JOSÉ, 1962. 69
Embora o recenseamento tenha constituído num levantamento completo da população do império, são
apresentadas inúmeras críticas aos dados, como a classificação das ocupações e a não incorporação da totalidade
das paróquias. Para compreender melhor a crítica, ver PAIVA, 2013.
29
De acordo com os dados70
, num comparativo entre as maiores Províncias do país, em
1872 Minas concentrava não apenas a maior população, como também o maior número de
cativos (23,75% a mais que o Rio de Janeiro, segunda maior quantidade de escravos),
sustentando a característica de Província com o maior plantel de escravos também nas
décadas finais antes da abolição. Em seguida tem-se a Bahia, com população 31,58% menor
que a de Minas, mas com o índice de negros livres mais elevado, ainda que somente 5,18%
maior que a Província mineira.
Em 1872, grande maioria dos cativos mineiros era empregada na agricultura,
conforme tabela abaixo:
Tabela 3 – Distribuição da população por profissões - Minas Gerais - 1872
Grupos de profissão
Livres Escravos
H % M % H % M %
Prof. Liberais 13.038 1,53 1.716 0,21 4 ... 5 ...
Prof. Industriais e comerciais 15.298 1,79 411 0,05 46 0,02 - -
Prof. Manuais ou mecânicos 39.344 4,6 201.430 24,59 5.358 2,68 22.485 13,48
Prof. Agrícolas 268.394 31,4 104.674 12,78 78.444 39,24 32.266 19,34
Pessoas assalariadas 157.468 18,42 12.304 1,5 19.864 9,94 7.885 4,73
Serviços domésticos 33.623 3,93 215.965 26,36 35.783 17,90 46.211 27,7
Sem profissão 327.678 38,33 282.648 34,51 60.412 30,22 57.951 34,74
Total 854.843 100,00 819.148 100,00 199.911 100,00 166.803 99,99
Fonte: Adaptado de Paiva; et al., 2013.
Esses fatores eram inerentes à economia escravista mineira. Desse modo, esperava-se
que o negro produzisse ao extremo de suas possibilidades físicas com materiais de produção
ultrapassados, o que exigia maior consumo de energia dos cativos, mas que não eram
acompanhados de alimentação ou cuidados adequados.
O Almanaque das Províncias do Império do Brasil de 188571
estima para a Província
de Minas Gerais no referido ano a população 2.500.000, com pelo menos 266.000 escravos72
.
70
Os dados foram ajustados em relação ao censo. Ver PAIVA; et al., 2013. 71
LAEMMERT, 1885. 72
Segundo o Almanaque (LAEMMERT, 1885, p. 275), “não se computando a população de 16 freguezias, nas
quaes deixou de effectuar-se o recenceamento, a população da provincia era, em 1872, de 2,009,023 habitantes.
Estimando-se essa omissão em 80,000 almas e calculando-se o augmento provavel da população no periodo
decorrido em dous por cento annuaes, no que não ha exagero, segundo os calculos de Malthus, parece-nos que
Minas-Geraes deve ter actualmente cerca de dous milhoes e meio de habitantes, não devendo exceder de 266,000
almas a parte escrava.” De qualquer forma, é necessário considerar que, como todos os dados da época,
apresentam problemas como possível imprecisão, o que compromete a confiabilidadas informações.
30
Pode-se perceber, portanto, que às vésperas da abolição da escravidão no Brasil, Minas Gerais
ainda possuía elevada quantidade de cativos. Daí se conclui que a Província era formada por
uma sociedade enraizada e estruturada cultural e economicamente uma sociedade totalmente
estruturada pelo trabalho servil. De fato, não houve na Província mineira grandes campanhas
em favor da libertação dos escravos, uma vez que as características provincianas no que diz
respeito às condições econômicas, políticas e econômicas não favoreciam.
A instituição escravista vigorou por pelo menos dois séculos na Capitania e na
Província mineira. Durante esse tempo, as estruturas político-sócio-econômicas não
permitiram alteração com velocidade por legislações, por mais que estas tenham sido
apropriadas e atuantes. Por certo se dá o fato de que a emancipação do negro acarretou sérias
consequências econômicas, não só para os senhores como também para os libertos.
Os donos de escravos, muito embora advertidos com a Lei do Ventre Livre e Lei dos
Sexagenários, não cuidaram se preparar para a extinção do trabalho servil. Agarrados às
estruturas produtivas dos braços negros, nem mesmo o desenvolvimento cada vez mais
acelerado do movimento abolicionista os despertou para a realidade, de fato que a Lei Áurea
os deixou perplexos e desatinados quanto ao futuro. Vendo seus antigos escravos
abandonarem as lavouras e migrarem para outros locais, e os que ficaram serem insuficientes
para as atividades rurais, e sem perspectiva de reposição de trabalhadores, os fazendeiros se
viram obrigados a desempenhar tarefas que julgavam pesadas e humilhantes.
Quanto aos negros libertos, eles parecem ter saído das senzalas e dos livros de
história73
, uma vez que foram segregados pela sociedade no pós-abolição. Classificados como
malandros e preguiçosos, a extinção da instituição servil suscitou problemas não só de ordem
econômica, mas também de ordem social. Não haveria nenhum amparo ao negro no que tange
a políticas públicas ou superação do racismo sofrido por ele.
Com a abolição da escravidão e dado o alto grau de apego dos senhores de terras aos
escravos, ao contrário do que aconteceu no oeste paulista, dificultou o processo de transição
para o trabalho livre. A economia de Minas Gerais possuía traços não modernos, apesar de
dinâmica, demonstrada pela concentração de terras e pelas relações de dependência de
senhores e homens livres agregados.
73
RIOS e MATTOS, 2004.
31
4 A região do Sul de Minas Gerais
O Sul de Minas Gerais, região localizada bem entre as capitais do Rio de Janeiro, São
Paulo e Minas, teve um processo de ocupação tardio em relação ao centro da Província. A
região surgiu a partir da mineração aurífera, descoberta pelos paulistas nas primeiras décadas
do século XVIII, de modo que foram eles os primeiros a povoá-la74
. Não sendo significantes
as catas de ouro, a produção agropecuária voltada essencialmente para abastecimento ganhou
expressão, dinamizando a economia no período oitocentista.
A região teve como início o ano 1789 com a formação de Campanha da Princesa,
termo da comarca do Rio das Mortes75
. Na região mais ao Sul, Campanha consistia na vila
mais antiga ao lado de Airuoca, Baependi, e se caracterizou como principal cidade do
território, pelo menos durante a primeira metade do século XIX. Mais tarde despontando
como centro político e sede da comarca que hoje é conhecida como Sul de Minas Gerais, a
cidade se destacou ainda pela expansão de suas freguesias no âmbito comercial, pela
quantidade de cativos e por se interligar às demais regiões do Sudeste76
.
Figura 2 – A comarca do Rio das Mortes.
Fonte: Acervos Documentais Da Comarca Do Rio Das Mortes, 2013.
74
ANDRADE e 2000; VIEIRA, 2013. 75
A comarca recebeu o nome de Rio das Mortes por estar a vila de São João del-Rei assentada junto ao rio de
mesmo nome (SALES, 2003, p. 88). 76
CUSTÓDIO SOBRINHO, 2011; SAES e AVELINO FILHO, 2012.
32
O Sul mineiro constituía o caminho das tropas que abasteciam a Corte, além de ter se
convertido no principal centro de produção e abastecimento do mercado carioca. Tal região é
composta por grandes propriedades escravistas essencialmente voltadas para o abastecimento
interno. A economia de subsistência do Sul de Minas, então, teria sido estabelecida para
abastecer a Província no século XVIII, mantendo a mesma natureza da economia regional
através do direcionamento do excedente para o mercado do Rio de Janeiro77
.
Durante o período de florescimento da mineração, a região Sul-mineira já se
especializava na produção dos gêneros de primeira necessidade, direcionada ao abastecimento
de Minas. Com o refluxo da atividade mineradora, já foi discutido anteriormente que as
regiões envolvidas na mineração buscaram se reorganizar economicamente por meio da
produção de subsistência. O Sul de Minas, com sua produção mercantil já estabilizada,
ganhara reforço na sua estrutura econômica, voltando seus mantimentos de subsistência para
fora, ou seja, em busca de novos mercados78
.
Alcir Lenharo destaca o papel mercantil dessa produção, que foi responsável pela
absorção do fluxo migratório das áreas mineradoras em crise. Por apresentar atividades
comerciais altamente desenvolvidas, foram direcionados para o Sul de Minas os capitais
deslocados da mineração79
. Tais fatos justificavam os desvios de escravos para a produção
agropastoril, o que conferia à grande propriedade sul-mineira, essencialmente voltada para a
subsistência, uma característica peculiar, já que amplamente sustentada pelo trabalho servil.
Segundo Marcos Andrade80
, os dados populacionais para o ano de 1824 eram bastante
expressivos, de modo que as freguesias que compunham o Sul mineiro, a saber, Conceição do
Pouso Alto, Nossa Senhora da Conceição de Aiuruoca, Santa Catarina, São Gonçalo, Maria
de Baependi e Santo Antônio da Campanha, apresentavam um total de 47.348 habitantes. Para
o ano de 1836, o relatório fiscal da província mostra que Campanha ocupava o sexto lugar em
atividade açucareira, com 84 engenhos, bem como a maior quantidade de pequenos
comércios, com 471 vendas. Assim, a produção nos engenhos era comercializada tanto nestes
estabelecimentos quanto nos caminhos que interligavam as fazendas, os arraiais e as vilas até
as Províncias carioca e paulista, demonstrando a articulação existente entre os setor produtivo
e o comercial.
O sucesso da integração Centro-Sul, nesse sentido, se deu justamente à abertura do
mercado, uma vez que a produção dos gêneros de primeira necessidade crescia
77
LENHARO, 1993. 78
LENHARO, 1993. 79
LENHARO, 1993. 80
ANDRADE, 2010.
33
proporcionalmente à expansão daquele. Paralelamente, a produção de subsistência, à procura
de escoamento, pressionava a abertura de novas vias de ligação, orientando as políticas de
estrutura de transporte do príncipe regente81
.
No que tange à vida nas fazendas, as grandes unidades escravistas giravam em torno
do plantio de cana, produzindo açúcar, aguardente e rapadura, além da criação de animais. Por
várias décadas a produção consistiu nos cereais como arroz, feijão e milho, nos animais
suínos e bovinos e em produtos como açúcar, algodão, fumo, chapéus e tecidos. Tais
atividades, embora garantissem o enriquecimento dos proprietários mais abastados da região,
representavam pouco na composição da riqueza. Porém, estas atividades eram as grandes
responsáveis pelas casas de vivenda, benfeitorias e senzalas82
.
Para tanto, era indispensável a mão de obra servil. A distribuição de braços livres e
escravos em Campanha evidencia que a maioria destes estava empregada na agricultura83
. O
grande número de escravos está diretamente relacionado ao poderio econômico da elite
agrária no Sul de Minas Gerais, que alcançou importância social e política, participando
inclusive de processos históricos a nível nacional, como a Independência do Brasil em 192284
.
Tal ascensão política permitiu que a elite da região almejasse paz social e estabilidade, de
maneira que o fluxo mercantil permitisse a reprodução da estrutura produtiva e,
consequentemente, da sua vida social85
.
Assim, as atividades de produção e comércio, além dos cargos políticos
desempenhados por tais proprietários, fomentaram as interações político-sociais necessárias à
construção do país. Enquanto se estreitavam os laços de interdependência que interligavam as
atividades mercantis entre as regiões produtoras do Centro-Sul e a capital, ao mesmo tempo
ganhavam notoriedade os políticos dessas regiões interioranas, que na grande maioria das
vezes estavam envolvidos na tarefa de produzir e comercializar as mercadorias de suas
próprias fazendas86
.
Nesse contexto, a manutenção da sociedade sul-mineira dependia essencialmente de
dois aspectos primordiais: de um lado, a continuidade das relações mercantis de
abastecimento interno, e, por outro, a estrutura produtiva assentada na escravidão. Dessa
maneira, estava garantida a organização social por meio da mão de obra barata, e esta, por sua
81
LENHARO, 1993. 82
ANDRADE, 2010; SAES E AVELINO FILHO, 2012; LENHARO, 1993. 83
ANDRADE E CARDOSO, 2000. 84
LENHARO, 1993; MARTINS, 2013. 85 Para compreender melhor o papel do Sul de Minas no cenário político, ver PASCOAL, 2012. 86
LENHARO, 1993.
34
vez, embasava a interação comercial com a capital do Império, o que conferia prestígio e
poder político à elite da região.
Tal situação tem reflexo direto na composição da riqueza da elite. Uma vez que se
tratava de uma sociedade escravista, a ideia de um homem rico naqueles tempos passava pela
avaliação da posse de homens e terras. Nesse sentido, do primeiro quartel do século XIX para
o segundo, verifica-se uma elevação significativa no nível da riqueza, que pode ser explicada
pelo aumento considerável no preço do escravo.
Tabela 4 – Composição da riqueza para a cidade de Campanha.
Riqueza Entre 1803 e 1831 Entre 1851 e 1865
Escravos 34,71% 39,73%
Imóveis rurais 38, 81% 29,97%
Dotes 8,32%
Dívidas ativas 11,75%
Fonte: Tabela organizada pela autora com base nos dados de Marcos Andrade, 2010.
Tais dados corroboram a importância das unidades escravistas agropecuárias por sua
capacidade tanto de gerar riqueza quanto de articular o abastecimento interno. Assim, as
grandes fortunas se originavam das múltiplas atividades, nas quais geralmente um grande
fazendeiro também fazia as vezes de negociante. Paralelamente, a região dependia de itens
importados, a começar pela mão de obra, sendo esta o principal ativo na composição da
riqueza da elite sul-mineira.
Não só organizados nas atividades produtivas, os escravos costumavam também
compor as tropas que cuidavam dos transportes das mercadorias. Os proprietários sul-
mineiros possuíam suas próprias tropas87
, evitando atravessadores para alcançar lucros
maiores para seus produtos. O emprego de seus filhos na direção das tropas isentava o
fazendeiro de investir grandes quantias de capital e cuidados coercitivos com os escravos, ao
passo que o trabalho livre também era rejeitado frente ao desempenho tido como pouco
87
As empresas rurais apresentavam caráter familiar, abalizadas nos trabalhos dos filhos dos proprietários que, na
maioria das vezes, eram os responsáveis pelas tropas (LENHARO, 1993).
35
produtivo e o problema da supervisão do trabalho. Porém, os escravos aparecem em maior
número nas tropas mineiras que abasteciam o mercado carioca88
.
Em Minas, podia-se encontrar inclusive escravos à frente da tropa, cumprindo a
função de tropeiros. A grande quantidade de cativos no transporte das mercadorias pode ser
explicada pelo fato de que as propriedades, produtoras para exportação, tinham o trabalho
como fator extensivo preponderante, cuja mão de obra, escrava, podia ser deslocada para o
setor de distribuição em épocas de maiores folgas na produção ou logo após a safra89
.
A escravidão persistiu até os seus últimos dias, e no Sul de Minas não foi diferente.
Nas duas décadas finais do Império, a região computava quase 21% do total dos escravos da
Província, atrás apenas da Zona da Mata. Para a cidade de Lavras, Eduardo Vieira90
analisa a
composição da riqueza, demonstrando que os principais abastados não sofreram modificações
em sua estrutura mesmo às vésperas da abolição. O mesmo se aplica à maioria das cidades da
região, que de 1873 a 1885 aumentaram sua população escrava, como é o caso de Alfenas,
Cabo Verde, Caldas, Campanha, Christina, Itajubá, Jaguary, Passos e São Sebastião do
Paraíso. As cidades que apresentaram quedas consideráveis no número de cativos podem ter
passado por desmembramento de seu território91
.
As ações abolicionistas também cresciam na região, em consonância com o que
ocorria em todo o país nos anos finais da escravidão. Desse modo, temendo a perda do
controle da ordem, as autoridades locais suplicavam ajuda das tropas provinciais para evitar
as rebeldias e rebeliões, já previsíveis no começo da década de 1880, fruto das transformações
sociais, econômicas, políticas e culturais que conferiam contradições e incertezas à sociedade
escravista brasileira92
.
Nos periódicos do Sul de Minas, Fábio Castilho93
constata que os escravos aparecem
como sujeitos de seus atos apenas de duas maneiras: nas fugas em que são procurados por
seus senhores e quando cometem crimes. Ou seja, eram reservados espaços nos periódicos
para os cativos somente “como fugitivos ou como agressores da elite, únicos momentos em
que eram considerados como sujeitos”.
Nos últimos anos da instituição escravista, a legitimidade da propriedade escrava
estava comprometida, dado o rebuliço do abolicionismo que ganhava adeptos no Brasil, e no
88
LENHARO, 1993. 89
LENHARO, 1993. 90
VIEIRA, 2013. 91
SAES e AVELINO FILHO, 2012. 92
CUSTÓDIO SOBRINHO, 2011. 93
CASTILHO, 2008, p. 98.
36
Sul de Minas não era diferente. De acordo com Maria Helena Machado94
, a coerção para com
os escravos nesses tempos, decorria não só de seus donos, mas também da polícia, cuja
função se confundiu com a de capturar escravos fugitivos, além de combater a desordem e as
revoltas suscitadas por cativos, forros e abolicionistas.
O papel da polícia ia além de assegurar os interesses dos senhores de escravos. As
repercussões conferidas pela crise da instituição escravista se agravavam dado o medo das
ações dos escravos. Tais fatos contribuíam para a dúvida quanto à segurança pública, o que
obrigava o regimento policial a garantir a defesa da ordem, desempenhando papel estratégico
à época. Com ebulições sociais cada vez mais constates, incumbiu-se à polícia a tarefa de
fazer crer que estava tudo em completa ordem, mesmo sabendo que seu aparato de coerção já
não era capaz de assegurar a ordem pública como em tempos anteriores95
.
A discussão sobre a mão de obra há muito já circulava entre escravocratas,
emancipacionistas, imigrantistas e abolicionistas. Porém, quando da transição para o
capitalismo, um periódico sul-mineiro se posiciona engrandecendo o trabalho e quem o
pratica96
, demonstrando a transformação de uma sociedade até então hierarquizada, na qual
considerava o ato de trabalhar pouco nobre.
De fato, a estrutura social que imperou no século XIX estava em transformação, e com
ela o modo de organização dos municípios sul-mineiros. A localidade expandiu seus centros
urbanos, conseguindo ainda modernizar algumas cidades. Ao passo dessa modernização, outra
mudança seria fundamental para a região: agora as atividades econômicas não são pautadas
apenas pelo comércio de abastecimento, mas também pelo café, que apresenta uma nova
dinâmica.
Com o “boom” do café, as tropas não conseguiriam transportar a mercadoria, que era
produzida em várias localidades. Portanto, não fossem as estradas de ferro, o desenvolvimento
da economia pautada pelo café não teria sido possível. No terceiro quartel dos oitocentos,
Minas Gerais também passou a construir malhas ferroviárias para garantir o escoamento do
produto principalmente para o porto de Santos em São Paulo e o porto do Rio de Janeiro97
.
A estrada de ferro consistia em grande símbolo de transformação econômica e social,
relacionada a um vultoso processo de modernização. A implantação das ferrovias podia
depender não só do transporte do café, mas de influências políticas, de integração regional ou
94
MACHADO, 1994. 95
MACHADO, 1994; CUSTÓDIO SOBRINHO, 2011. 96
Segundo Castilho (2008, p.100), “nas folhas do Baependiano o trabalho era apresentado como grande
responsável pelas melhorias que chegavam à região e como principal elemento causador da modernização que o
Sul de Minas vinha conhecendo”. 97
SAES, COSENTINO, SILVA e GAMBI, 2012.
37
de transporte de pessoas. Assim, o Sul de Minas, em fins dos oitocentos, registrava maior
crescimento das linhas férreas de Minas Gerais, o que demonstra a importância da região no
cenário geral de Minas e do Sudeste do Brasil98
.
Tal período é considerado o marco da expansão e consolidação do capitalismo no país.
Suas implicações abarcaram toda a sociedade, sendo mais sentidas na urbanização, na
concentração de capitais nas mãos de poucos fazendeiros, empresários e companhias, e na
mão de obra, que também passava por transformações profundas: da escrava, servil, para a
livre, assalariada.
No entanto, pouco se sabe ao certo como se deu esse processo de transição para o
capitalismo no Sul de Minas, compreendendo a qualidade da mão de obra que se formou no
pós-abolição, bem como se configurou a estrutura de renda da região. Há na literatura
carência de trabalhos que tratam sobre o tema. Nesse sentido, a organização da economia que
se seguiu a essas transformações podem delinear o cenário econômico nas primeiras décadas
do século XX.
5 Varginha, uma cidade do Sul das Gerais
Mas, qual o fator propulsivo do progresso das Catanduvas? Ali não havia o ouro,
floreando ao solo, nem o entusiasmo contagiante de certas organizações causadoras
de um lucro imediato. Outros metais seriam explorados, e com muita facilidade e
felicidade. Quem sabe um lugar, nascido para ser tornar um pólo regional e quiçá,
mundial. Assim, nasceu Espírito Santo das Catandubas, hoje Varginha99
.
As primeiras alusões que se tem sobre Varginha remontam a 1763, com a Ermida de
Santo Antônio100
, localizada na antiga estrada que ligava Campanha a Três Pontas. Edificada
provavelmente por bandeirantes que transitavam por ali, em volta da capela desenvolvera-se
pousos para os viajantes, de maneira que o povoado crescia no caminho das tropas
transportadas via muares que vinham de São Paulo, carregadas com variadas espécies de
mercadorias as quais eram demandadas pela atual cidade de Campanha101
.
98
SILVA, 2012. 99
EQUIPE DO MUSEU MUNICIPAL DE VARGINHA, 2003. 100
Segundo o Dicionário Aurélio, ermida significa pequena igreja ou capela, quase sempre erguida em lugar
despovoado. 101
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 2013.
38
De acordo com a Equipe do Museu Municipal de Varginha, a cidade nasceu da atual
estação da Flora, local onde já havia moradores das fazendas São Paulo, Santa Maria e Bom
Jardim, constituindo um trajeto de tropeiros que transitavam entre Campanha, Três Pontas,
Três Corações e Lavras. Depois de alguns anos de deslocamento, famílias dessas fazendas
bem como viajantes e tropeiros foram povoando o território antigo conhecido como bairro da
Vargem102
.
A partir de então, “deu-se ao nascente povoado, o nome de Catanduvas ou
Catandubas que significa ‘mato cerrado’, muito encontrado naquela época. Em virtude do
padroeiro da capela, passou-se a chamar Espírito Santo das Catanduvas”103
. Em 1803, o
povoado já possuía lista com os primeiros habitantes, baseados no registro dos batizados da
paróquia de Lavras, agrupados os anos de 1800, 1801, 1802 e 1803:
Tabela 5 – População do povoado das Catandubas em 1803.
População
Homens Mulheres
Casados Solteiros Casadas Solteiras
46 27 46 0
73 46
Total 119
Fonte: SALES, 2003, p. 52. Nota: Foram registrados apenas os nomes dos adultos, crianças e adolescentes não eram
incluídos no censo. As mulheres eram incluídas somente depois do casamento.
Ainda que não se possa atribuir aos dados a veracidade de um recenseamento
construído a partir da metodologia empregada atualmente na contagem populacional, as
informações fornecem uma ideia aproximada da população da época.
Para o ano de 1832 foi realizado um censo no distrito e curato do Espírito Santo da
Varginha, assinado em 16 de janeiro por Domingos Figueiredo de Carvalho. Tal distrito
pertencia à freguesia de Lavras que, por sua vez, consistia em termo da vila de São João Del
Rei. De acordo com o Arquivo Público Mineiro104
, a população foi agrupada em 15
quarteirões com 25 fogos105
cada para facilitar a contagem e registro, sendo muito provável
que estes tenham se dado somente com os habitantes fixos.
102
EQUIPE DO MUSEU MUNICIPAL DE VARGINHA, 2003. 103
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 2013, P. 2. 104
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1832. 105
De acordo com o Dicionário Priberam, fogo significa casa, família.
39
As páginas do documento foram divididas nas seguintes colunas: número de fogos,
habitantes, qualidades, condições, idades, estados e ocupações. No campo “habitantes” consta
os nomes da população do distrito, de modo que apenas os brancos apresentam registro
completo dos nomes, com pré-nome e patronímico. Os escravos, uma vez que consistiam em
propriedade dos seus senhores, possuíam apenas o primeiro nome. Analogamente, os forros
não adquiriam patronímicos quando de sua libertação. As “qualidades” dizem respeito à cor
da pele, a saber, branco, preto, pardo (mulato) ou criolo. As “condições”, relacionadas às
qualidades dos negros, declaram se estes são cativos ou já conquistaram sua liberdade
(forros). Os “estados” se referem ao estado civil dos habitantes, ou seja, casado, solteiro ou
viúvo.
Tabela 6 – População de Varginha no Censo de 1832
Habitantes N abs. %
Livres 1300 70,08
Cativos 555 29,91
Total 1855 100
Fonte: Arquivo Público Mineiro, 1832.
No censo, crianças menores de quatro anos não foram contabilizadas. No mesmo
sentido, para a população com idade aproximadamente até os quinze anos não consta estado e
ocupação, e parte dos casos nem em qualidades e/ou condições106
. As idades conferidas
variam de quatro a 80 anos, sendo registradas cinco habitantes com a idade máxima, quatro
homens e uma mulher.
No campo “ocupações”, as registradas entre os homens são lavrador, jornaleiro,
ferreiro, feitor, administrador, alfaiate, engenheiro, cultura, caixeiro, pedreiro, seleiro,
sapateiro, carpinteiro, camarada, ourives, vintenário, ofício de escrivão, negociante e negócio
de venda. Entre as mulheres, são relatadas as profissões de fiadeira, fiar, fiar e roca, fias e
tecer, oleira, lavradora, rendeira, vendedeira, tecideira, agência, jornaleira e costureira.
O ofício de jornaleiro é impreciso uma vez que não diz respeito a uma atividade, mas à
jornada de trabalho. Assim, a remuneração salarial paga por um dia de trabalho se caracteriza
como jornal, que por sua vez é o que se paga ao jornaleiro. O ofício de engenheiro se refere,
no Brasil, a dono de engenho de açúcar ou de beneficiamento de mate. Como em Varginha
106
Desse modo, a contagem na tabela, que se deu a partir dos dados descritos no documento, culminou na
porcentagem sobre o total da população.
40
não há registro de plantações de erva mate, conclui-se que no município trata-se de engenho
de açúcar. Camarada consistia no emprego temporário em uma propriedade rural para
trabalho agrícola, pecuário, doméstico, etc.
Segundo José Roberto Sales107
, durante os oitocentos agência e vintenário não tinham
os mesmos significados de hoje. Agência indicava aquele que vivia de sua agência, isto é,
aquele que vivia por conta própria. O termo, genérico, podia abranger várias atividades, como
venda de doces e quitutes, lavagem de roupas, ou até pequenos negócios sem estabelecimento
próprio. Já o ofício de vintenário se referia ao juiz de vintena. A ocupação de caixeiro
certamente se atribui a comerciantes, não necessariamente os viajantes, uma vez que os
transportes eram realizados através dos tropeiros. Cultura importava o cultivo da terra,
principalmente dos cereais, bem como seleiro era aquele que fabricava as selas ou era dono de
selaria. Na categoria “ocupações” constam ainda os registros de doente e mudo para ambos os
sexos.
As informações apresentadas pelo censo demonstram um povoado com economia
predominantemente rural. Para os homens foram descritas 19 ocupações, enquanto que para
as mulheres foram 12. Para eles, a uma atividade de maior predomínio era a de lavrador, ao
passo que para elas era a de fiar. Disso, podemos concluir que as ocupações dos homens
constituem maior diversidade que as das mulheres, bem como há evidente delimitação tanto
quanto à ocupação quanto à gênero, de modo que apenas uma das 31 atividades são comuns a
ambos os sexos: lavrador e lavradora108
.
O censo apresenta outro dado importante: o número de escravos em 1832, em termos
relativos, consistia em quase 30% da população, sendo exceção o fogo que não continha
nenhum cativo. Alguns moradores, como a viúva Marianna de Jesus, que tem a ocupação de
lavradora, e do senhor José Luiz Alvez, também lavrador, apresentam um número razoável de
cativos, sendo 22 cativos em posse daquele e 20 para este109
. Não há registro de ocupação
para estes escravos, entretanto, de acordo com a grande quantidade de braços cativos e a
ocupação de seus senhores, pressupõe-se que trabalhavam também na lavoura.
Em 1850 o curato foi elevado à freguesia, ganhando enfim o nome de Varginha,
derivado do Bairro da Vargem. Aos 22 de setembro de 1881, Varginha conquistava a
categoria de vila, sendo aos 7 de outubro do ano seguinte elevada à cidade. Para a época, a
107
SALES, 2003. 108
O espaço do “campo pertencia, na maioria dos casos, aos homens. O interior da casa era exclusivo da mulher
– e falamos aqui da mulher branca – que fiava, tecia e costurava. A imagem que podemos formar do varginhense
em 1832 é a do homem com a enxada na mão, arando o campo e a da mulher, sentada num tamborete ou bando
de sua casa, puxando o fio da roca” (SALES, 2003, p. 56). 109
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1832.
41
cana consistia na cultura mais usada, muito embora fossem cultivados os gêneros alimentícios
mais comuns, como o café, o fumo e o algodão para consumo, bem como a criação regular de
gado. Estes eram destinados à exportação para a Corte, enquanto muitos daqueles eram
levados à venda no mercado de povoações vizinhas, principalmente Campanha, aumentando a
exportação de queijos110
. Poucos são, porém, os fazendeiros da freguesia que possuíam mais
de 40 escravos. Possui a cidade ainda diversas fábricas “de licores, cerveja, vinho e de velas
de cêra para exportação, não havendo a criação de abelhas, o que obriga os fabricantes a
mandarem vir de fóra a cêra bruta para o fabrico das velas”111
.
Na cidade de Varginha são raras as fontes documentais acerca da escravidão durante o
século XIX, de modo que não foram encontrados dados para os setecentos. Os primeiros
documentos que tratam sobre tráfico de escravos, porém, datam de 1864, fazendo referência a
uma escritura de troca realizada entre Domingos Pinto Ribeiro e Francisco Joaquim Tavares
no referido ano, quando a cidade ainda era termo de Três Pontas. Foram trocados os bens
servis Rita Crioula, 30 anos, solteira; por Gabriel da Nação, 40 anos, também solteiro. A troca
foi negociada “valor por valor”, sem especificação de quantia112
.
A Lei do Ventre Livre, de 28 de setembro de 1871, determinou que os páracos seriam
obrigados a manterem livros especiais para registrar nascimentos e óbitos de filhos de
escravos nascidos após vigência da lei, sob pena de multa de 100$000 (cem mil réis) para
cada omissão. A Paróquia do Divino Espírito Santo da Varginha, acatando a decisão, traz
registro de primeiro óbito de filho de cativos nascidos livres em novembro de 1871, isto é,
apenas dois meses depois data da lei113
.
Entre 1884 e 1887, foram registrados no livro documental Escripturas Tráfico de
Escravos 1884-1887, 24 escrituras de compra e venda, permuta e dação em pagamento em
Varginha, sendo distribuídos da seguinte forma:
110
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 2013. 111
LAEMMERT, 1885, p. 571. 112
As informações foram retiradas de um livro incompleto e muito danificado sobre tráfico de escravos,
composto de papéis avulsos. A documentação encontra-se em poder do Museu Municipal de Varginha (PAPÉIS
AVULSOS, 1864). 113
SALES, 2008.
42
Tabela 7 – Tráfico de escravos em Varginha por ano de negociação
Ano N
1884 5
1885 9
1886 7
1887 3
Fonte: Escripturas Tráfico de Escravos 1884-1887.
Do total, 24 foram registros de compra e venda, 3 permutas e 1 dação em
pagamento114
, mais 4 procurações; perfazendo um total de 16 homens e 15 mulheres. Não
foram computados os menores de idade acompanhando os pais. O maior valor de mercado foi
dado ao escravo de sexo masculino, com idade inferior a 30 anos. Porém, os arquivos
mostram equilíbrio em relação à proporção de homens e mulheres.
Quanto à idade, entre os homens variou de 12 a 48 anos, enquanto entre as mulheres a
variação foi entre 15 e 44. De forma semelhante se deu a diferença de preços, sendo que o
negro mais barato foi vendido por 200$000 (duzentos mil réis), e o mais caro por 1:500$000
(um conto e quinhentos mil réis). Já a negra mais barata foi vendida por 200$000 (duzentos
mil réis) e a mais cara por 550$000 (quinhentos e cinquenta mil réis). A média dos preços
ficou em 640$000 (seiscentos e quarenta mil réis) para os cativos do sexo masculino e
421$000 (quatrocentos e vinte e um mil réis) para o feminino, ou seja, em média, os homens
valiam 219$000 (duzentos e dezenove mil réis) a mais que as mulheres.
Às vésperas da abolição da escravatura, a elite econômica, política e social
varginhense apresentava-se tensa e insegura quanto ao destino de seus bens mais caros e
rendosos. Nesse sentido, uma Ata da Câmara Municipal em sessão do dia 20 de abril de 1888,
propõe um apelo aos fazendeiros da cidade para que se reúnam com o propósito de discutir o
futuro econômico de Varginha:
Pelo o Presidente, foi proposto que atendendo ao estado anormal em que se achão as
relações dos escravos para com os senhores e temendo um desastre para a lavoura,
em consequencia da imigração de escravos para os pontos em que são mais
protegidos na cenda da liberdade que buscão, esta Camara dirigisse a todos os
fasendeiros e passividores de escravos municipio, um apello para uma reunião nesta
Cidade, no dia trez de Maio do corrente anno, afim de tratar-se da transsição do
trabalho servil ao livre, e que esta apelo fosse publicado pela emprensa115
.
114
Não foi encontrado nos dicionários significado para dação, mas acredita-se que consistia na entrega de bens
móveis ou imóveis para quitação ou parte de pagamento de dívida. 115
ATAS DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 1888.
43
O presidente da Câmara, cuja função equivalia à de prefeito, o Major Evaristo Gomes
de Paiva, tinha ciência do cenário conturbado que se configurava na cidade, em reflexo das
lutas abolicionistas seguidas da mesma agitação que assolava o Brasil como um todo. O
estado atípico em que se deparava as relações entre escravos e senhores evidenciava a vontade
que aqueles detinham de se libertarem dos grilhões. Ante a percepção do inevitável, a elite da
cidade se reúne para discutir as medidas necessárias para realizar a transição do trabalho
servil para o livre com os menores danos possíveis à economia municipal e,
consequentemente, às suas próprias.
Por efeito da compreensão de iminência do fim da escravatura, os fazendeiros, através
da Câmara Municipal que de fato os representava, preocupavam-se em substituir a mão de
obra escrava por meio da imigração europeia, trazendo principalmente italianos para as
lavouras varginhenses. A atitude consistia em medida puramente pragmática, erigida sobre
um paradigma exclusivamente econômico.
Tabela 8 - População escrava em Varginha em 1872
Número Homens Mulheres
Minas Gerais 345.533 184.173 161360
Varginha 1.427 725 702
Fonte: Adaptado de Paiva; et al., 2013.; e Arquivo Histórico da Câmara Municipal de
Varginha, 2013.
Nas últimas décadas de escravidão, a quantidade de cativos era grande em Varginha,
organizado primordialmente nas lavouras. Porém, antes mesmo da abolição, muitos
fazendeiros da cidade já os tinha alforriado116
, como em algumas fazendas pelo Sul de Minas.
O fato de a reunião ser marcada para dez dias antes do fim da instituição escravista demonstra
o apego à instituição servil e desespero da elite econômica quanto à perda de seus bens
produtivos. Após a abolição, entretanto, não há nas Atas nenhuma alusão sequer à situação do
negro, agora liberto, na cidade de Varginha.
De acordo com Luiz José Álvares Rubião, um memorialista do início dos novecentos,
a substituição da cana pelo café, pela qual as lavouras varginhenses passavam, que dependia
de mão de obra intensa e numerosa, ocorria de maneira lenta em meio a um cenário de
dúvidas e incertezas. Dessa maneira, se fazia necessário novos braços para assumir as
116
SALES, 2008.
44
atividades dos escravos, já escassos na cidade. Segundo ele, a imigração italiana teria salvado
a lavoura, bem a economia de Varginha117
.
Com a intensificação do processo imigratório de brancos europeus em 1847, consistia
em estratégia econômica a fim de solucionar o problema que a mão de obra já infligia aos
senhores de escravos, bem como acelerar a europeização/embranquecimento do Brasil,
pretendido inclusive como um processo civilizatório. De fato, a cidade, tendo acompanhado
São Paulo no que se refere tanto ao crescimento econômico quanto à produção de café, se
apoiou na imigração italiana para alcançar o progresso. A partir de 1888, a onda imigratória
que trazia estrangeiros principalmente da Itália para o Brasil chegou à Varginha, ramificados
de São Paulo. Os italianos passaram então a se ocupar das plantações de café, tendo se
tornado posteriormente negociantes, proprietários, industriais, etc118
.
No recenseamento de 1900, a população varginhense consistia em quase 30.000
habitantes119
, dos quais 806 eram italianos e 119 portugueses120
.
Tabela 9 – População de cidades do Sul de Minas no censo de 1900
Cidade População
Alfenas 25.132
Ayruoca 25.919
Baependy 43.167
Caldas 17.064
Campanha 19.120
Christina 10.149
Itajubá 28.941
Jaguary 13.552
Lavras 38.685
Ouro Fino 30.151
Passos 22.658
Pouso Alegre 31.863
S. S. do Paraíso 25.623
Três Pontas 31.336
Varginha 29.322
Fonte: Censo 1900 (DGE)
117
RUBIÃO, 1919. 118
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 2013. 119
CENSO 1900 (DGE). Mais uma vez, é importante ressaltar a problemática dos dados que pode culminar no
comprometimento das informações. 120
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA, 2013.
45
Relativamente equiparada a cidades muito mais antigas, donas de economias mais
fortes e desenvolvidas como Campanha, Varginha viveu sua belle époque do período
compreendido entre 1881 e 1913. Marcada pelo desenvolvimento social e econômico, a
cidade se fez um centro de expressão regional a partir da criação do município e da cidade em
1881 e 1882, a abolição em 1888, a ascensão a sede de comarca em 1890, a implantação da
estrada de ferro em 1892 e a imigração italiana em fins dos oitocentos e começo do século
XX, na prática determinaram o progresso de Varginha no transcurso dos novecentos121
.
121
SALES, 2003.
46
6 Considerações finais
O longo processo de escravidão no Brasil sustentou todo o sistema produtivo, fazendo
gravitar em torno da instituição escravista toda a estrutura social da época. Enquanto mera
mercadoria de composição dos modos produtivos, os escravos eram submetidos à dominação
objetiva imposta pela sociedade, para garantir a manutenção de um capitalismo pouco
desenvolvido.
A contradição vai justamente à encontro desse desenvolvimento, uma vez que o
capitalismo pressupõe mão de obra assalariada e mercado interno consumidor. Os fazendeiros
brasileiros, donos dos planteis de escravos, ao contrário, almejavam o aumento das vendas de
suas mercadorias tipicamente agropastoris, aspirando a padrões de vida nos moldes do
capitalismo europeu, mas totalmente amparados pelo trabalho servil.
A revisão dessa lógica suscitou transformações sociais das mais profundas,
questionando o próprio modo de organização da sociedade. De um lado escravocratas,
fortemente representados nas instâncias políticas em favor de seus interesses econômicos; de
outro abolicionistas, ganhando cada vez mais espaços e adeptos em favor da abolição. Entre
medidas paliativas para adiar o fim da escravatura e as investidas dos abolicionistas contra a
instituição servil estavam os cativos, cada vez mais esperançosos de se libertarem dos
grilhões.
Em meio a este debate, persistia o problema da mão de obra, cuja carência afetaria não
só os fazendeiros mas toda a economia brasileira. Portanto, desde 1850 com a Lei de Terras,
já se tentava resguardar a elite numa tentativa de transferir para as terras o que o escravo
representava em ativo financeiro. Porém, a substituição da mão de obra ainda consistia em
grande dificuldade, quer porque se pensava serem os brasileiros ladinos e preguiçosos, ou
porque não se quereria os libertos trabalhando nas lavouras.
Entretanto, as tensões sociais se agudizaram ao ponto de tornar insustentável o modo
de organização servil. Com a libertação dos escravos, que parecem ter saído das senzalas e da
História, poucos são os estudos que pesquisam o que aconteceu com eles. No Sul de Minas
Gerais, importante região voltada para o abastecimento, algumas fazendas se preocuparam em
alforriar seus cativos às vésperas da abolição, numa clara tentativa desesperada de manter nas
fazendas a mão de obra não mais escrava.
Em Varginha há poucos documentos que abarcam a situação dos escravos, sendo que
alguns dos que existem estão incompletos e danificados, o que tende a prejudicar uma análise
47
mais precisa sobre a abolição na cidade e suas consequências. Porém, é possível perceber que,
tendo sido tardiamente elevada à cidade, se comparada com outras mais desenvolvidas,
Varginha progrediu muito rapidamente no processo de transição ao modo de organização
capitalista.
Entretanto, a marcação de reunião para debater o fim da escravatura poucos dias antes
de sua efetivação faz crer que os fazendeiros varginhenses estavam tão apegados à instituição
servil quanto no geral os senhores em Minas estavam. Tal reunião, tendo sido convocada em
apelo pelo presidente da Câmara demonstra ainda o poder político conferido à elite da cidade,
provavelmente proporcionado por seu poder econômico.
A chegada dos imigrantes principalmente italianos, embora não haja dados confiáveis
o suficiente para determinar seu papel na economia da cidade, por ter sido o fator chave para a
propulsão de Varginha no cenário econômico, aliado ao progresso que uma estação de trem
ocasiona em renda e serviços para o município. No entanto, ainda que se possa pressupor o
ocorrido, seria necessário realizar estudos mais aprofundados em documentos mais confiáveis
para analisar de fato como se deu o processo de abolição da escravidão em Varginha.
48
7 Referências
ACERVOS DOCUMENTAIS DA COMARCA DO RIO DAS MORTES. Disponível em
<http://www.documenta.ufsj.edu.br/modules/brtchannel/index.php?pagenum=2>. Acesso em
dezembro de 2013.
ALVES, Castro. O Navio Negreiro. São Paulo: Biblioteca Nacional do Estudante Brasileiro,
s/d.
ANDRADE, Marcos Ferreira de; CARDOSO, Maria Tereza Pereira. A vila da Campanha
da Princesa: fontes para a História do Sul de Minas. Varia História, UFMG - FAFICH - Belo
Horizonte, v. 23, p. 214-233, 2000.
ANDRADE, Marcos Ferreira de. Elite escravista no Sul de Minas Gerais: opções de
investimento e composição da riqueza - século XIX. In: XIV Seminário sobre Economia
Mineira, 2010, Diamantina. Anais Eletrônicos do XIV Seminário sobre Economia Mineira.
Belo Horizonte: CEDEPLAR-UFMG, 2010. v. 1. p. 1-19.
ARQUIVO HISTÓRICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE VARGINHA. Monografia
Histórica. Disponível em
<http://www.camaravarginha.mg.gov.br/downloads/historia_varginha.pdf>. Acesso em
novembro de 2013.
BOTELHO, T. R. População e escravidão nas Minas Gerais, c. 1720. In: XII Encontro
Nacional de Estudos de População, 2000, Caxambu. XII Encontro Nacional de Estudos de
População, Anais.... Belo Horizonte: ABEP, 2000.
CARDOSO, Ciro Flamarion. Escravidão e Abolição no Brasil: novas perspectivas. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editora, 1988.
CASTILHO, Fábio Francisco de Almeida. A transição da mão-de-obra no Sul de Minas:
cultura política na imprensa local (1879-1888). Cadernos de história (UFOP. Mariana), v. 2,
p. 96-116, 2008.
CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil: 1850-1888; tradução de
Fernando de Castro Ferro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1975.
COSENTINO, D. V. Um múltiplo de transições: a transição para o trabalho livre em Minas
Gerais. 2006. 207 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Econômico) – Instituto de
Economia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 2006.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição. 7. ed. São Paulo: Global, 2001.
COSTA, Emília Viotti da. Da monarquia à república: momentos decisivos. 9.ed. São Paulo:
Editora UNESP, 2010.
CUSTÓDIO SOBRINHO, Juliano . Escravos, polícia e conflitos sociais às vésperas da
abolição. Minas Gerais - 1880-1888. In: XXVI Simpósio Nacional de História, 2011, São
Paulo-SP. XXVI Simpósio Nacional de História, 2011.
49
EQUIPE DO MUSEU MUNICIPAL DE VARGINHA. Varginha: sua origem. Disponível
em: < http://fundacaoculturaldevarginha.com.br/museu/varginha-sua-origem/ >. Acesso em
novembro de 2013.
FREDERICO, Samuel. Formação territorial de Minas Gerais. Disponível em
<http://enhpgii.files.wordpress.com/2009/10/samuel-frederico.pdf>. Acesso em novembro de
2013.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da
economia patriarcal. – 481 ed. rev. – São Paulo: Global, 2003.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 34. ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2007.
GEBARA, Ademir. O Mercado de Trabalho Livre no Brasil (1871-1888), São Paulo:
Brasiliense, 1986.
GODOY, Marcelo Magalhães; PAIVA, Clotilde Andrade. Um estudo da qualidade da
informação censitária em listas nominativas e uma aproximação da estrutura
ocupacional da província de Minas Gerais. R. bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v. 27, n. 1, p.
161-191, jan./jun. 2010.
GORENDER, Jacob. Brasil em preto & branco: o passado escravista que não passou. São
Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2000.
GORENDER, Jacob. A escravidão reabilitada. São Paulo: Editora Ática, 1991.
GUIMARÃES, Carlos Magno. Escravismo e rebeldia escrava: quilombos nas Minas Gerais
do século XVIII. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Brasil: colonização e escravidão. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2000. p. 324-338.
JOSÉ, Oiliam. O negro na economia mineira. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Limitada,
1993.
JOSÉ, Oiliam. A abolição em Minas. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Limitada, 1962.
LAEMMERT, Eduardo von. Almanak das Provincias do Imperio do Brazil para 1885.
Organizado e redigido por Arthur Sauer. Rio de Janeiro: Casa dos Editores Proprietarios
Laemmert & C., 1885.
LAMOUNIER, Maria Lúcia. Da escravidão ao trabalho livre: a lei da locação de serviços
de 1879, Campinas: Papirus, 1988.
LENHARO, Alcir. As tropas da moderação: o abastecimento da Corte na formação da
política do Brasil, 1808-1842. 2. ed. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Turismo
e Esportes, Departamento Geral de Documentação e Informação Cultural, Divisão de
Editoração, 1993.
50
LIBBY, Douglas Cole. Historiografia e a formação social escravista mineira. In:
ACERVO – Revista do Arquivo Nacional. v. 3. n. 1, jan-jun. 1988.
LUNA, Francisco Vidal. Estrutura da Posse de Escravos em Minas Gerais - 1718. In:
BARRETO, A. E. M. et alii. História Econômica: Ensaios, São Paulo, IPE/USP, p. 25-41,
1983.
LUNA, Francisco Vidal & CANO, Wilson. Economia escravista em Minas Gerais. In:
Cadernos IFCH-Unicamp, Campinas, outubro de 1983
MACHADO, Maria Helena. O Plano e o Pânico. Os Movimentos Sociais na Década da
Abolição. Rio de Janeiro: Editora UFSJ, EDUSP, 1994.
MARTINS, Marcos Lobato. Plantar, pastorar e fiar na Vila Formosa de Alfenas, MG:
décadas de 1850-1890. Estud. Econ. [online]. 2013, vol.43, n.2, pp. 397-429. ISSN 0101-
4161.
MARTINS, Roberto Borges. A Economia escravista de Minas Gerais no século XIX. Belo
Horizonte: Cedeplar/UFMG, 1982.
MARTINS, Roberto Borges. Minas Gerais, século XIX: tráfico e apego à escravidão numa
economia não-exportadora. Estudos Econômicos, Instituto de Pesquisas Econômicas – USP,
São Paulo, v. 13, n. 1, 1983.
MARTINS, Roberto Borges. Minas e o Tráfico de Escravos no Século XIX, Outra Vez. In
SZMRECSÁNYI, Tamás & LAPA, José Roberto do Amaral (orgs.). História Econômica da
Independência e do Império. São Paulo: Hucitec/ABPHE/Edusp/Imprensa Oficial, 2002.
MELO, Evaldo Cabral de. O Norte agrário e o Império: 1871-1889, Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1984.
NÚCLEO DE PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS DO ALTO RIO GRANDE. Disponível em
http://www.npa.org.br/cidade_estrada_real.php. Acesso em dezembro de 2013.
PAIVA, Clotilde Andrade; et al. Publicação crítica do recenseamento geral do Império do
Brasil de 1872. Núcleo de Pesquisa em História Econômica e Demográfica – NPHED, Minas
Gerais, 2012. Disponível em <http://www.nphed.cedeplar.ufmg.br/wp-
content/uploads/2013/02/Relatorio_preliminar_1872_site_nphed.pdf>. Acesso em dez. 2013.
PASCOAL, Isaías. O Sul de Minas no processo de constituição do Estado nacional. Fênix
– Revista de História e Estudos Culturais. Vol. 9 Ano IX nº 1. Janeiro/ Fevereiro/ Março/
Abril de 2012.
PAULA, João Antônio de. Raízes da Modernidade em Minas Gerais. Belo Horizonte:
Autêntica, 2000.
PAULA, João Antônio de. O mercado e o mercado interno no Brasil: conceito e história.
História Econômica & História de Empresas. V1, 2002, São Paulo: Hucitec/ABPHE, 2002.
51
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo. 23. ed. São Paulo: Editora
Brasiliense, 1994a.
PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. 41. ed. São Paulo: Brasiliense,
1994b.
QUEIROZ, Suely R. Reis de. A abolição da escravidão. São Paulo: Brasiliense, 1999.
RIOS, Ana Maria; MATTOS, Hebe Maria. O pós-abolição como problema histórico:
balanços e perspectivas. TOPOI, v. 5, n. 8, jan.-jun. 2004, pp. 170-198.
RUBIÃO, Luiz José Álvares. Álbum de Varginha. Varginha: Casa Maltese, 1919.
SAES, A. M. ; COSENTINO, D. V. ; SILVA, M. P. ; GAMBI, T. F. R. . Sul de Minas em
transição: ferrovias, bancos e indústrias na constituição do capitalismo na passagem do
século XIX para o século XX. In: XIV Seminário Sobre a Economia Mineira, 2010,
Diamantina - MG. Anais do XIV Seminário Sobre a Economia Mineira, 2010.
SAES, Alexandre Macchione; AVELINO FILHO, A. Trajetórias das elites locais:
Campanha e Pouso Alegre no ocaso da escravidão. Cultura Histórica e Patrimônio, v. 1, p. 39-
64, 2012.
SAES, Alexandre Macchione (Org.); MARTINS, Marcos Lobato (Org.). Sul de Minas em
transição: a formação do capitalismo na passagem para o século XX. Bauru, SP: Edusc,
2012.
SALES, José Roberto. Espírito Santo da Varginha (MG): 1763 – 1920. Varginha: Gráfica e
Editora Sul Mineira, 2003.
SALES, José Roberto. Tráfico de escravos no município de Varginha – MG, 1884-1887.
Varginha: José Roberto Sales, 2008.
SLENES, Robert. Os múltiplos de porcos e diamantes: a economia escravista de Minas
Gerais no século XIX. Cadernos IFCH-UNICAMP. Campinas. N 17. 1985.
SILVA, Lígia Osório. Terras Devolutas e latifúndio: efeitos da Lei de 1850. Campinas:
Editora da Unicamp, 1996.
SILVA, M. P. Tem café nesse trem? As ferrovias no Sul de Minas Gerais (1874-1910). In:
Alexandre Macchione Saes; Marcos Lobato Martins. (Org.). Sul de Minas em transição. A
formação do capitalismo na passagem para o século 20.. Bauru: EDUSC, 2012, p. 177-207. SIMONSEN, Roberto. História Econômica do Brasil: 1500-1820. Brasília: Edições do
Senado Federal. Conselho Editorial, 2005.
TAVARES, Luís Henrique Dias. O capitalismo no comércio proibido de escravos. In:
ACERVO – Revista do Arquivo Nacional. v. 3. n. 1, jan-jun. 1988.
VEIGA, Bernardo Saturino da. Almanach Sul-Mineiro. Campanha: Typhographia do
Monitor Sul-Mineiro, 1874 e 1884.
52
VIEIRA, Eduardo José. A Economia de um município mineiro nas décadas finais do
regime escravista brasileiro - Lavras-MG (1870-1888). In: III Congreso Latinoamericano de
Historia Económica y XXIII Jornadas de Historia Econômica, 2012, San Carlos de Bariloche.
Disponível em <http://www.aahe.fahce.unlp.edu.ar/jornadas-de-historia-economica/iii-
cladhe-xxiii-jhe/ponencias/Vieira.pdf/view?searchterm=None>. Acesso em maio de 2013.
WILLIAMS, Eric. Capitalismo e escravidão. Tradução Denise Bottmann. – 1. ed. – São
Paulo: Companhia das Letras, 2012.
WIRTH, John. O Fiel da Balança. Minas Gerais na Federação Brasileira, 1889 – 1937. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
Fontes documentais
Arquivo Público Mineiro – Mapas de População – Espírito Santo da Varginha, Termo de São
João Del Rei – 1832.
Atas da Câmara Municipal de Varginha, 1888.
Escripturas Tráfico de Escravos 1884-1887. Museu Municipal de Varginha.
Papéis Avulsos, Espírito Santo da Varginha, fl. 63 vº e 64f, 30 de janeiro de 1864.
Recenseamento – Diretoria Geral de Estatística – DGE – dez, 1900.