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Universidade Federal de Minas Gerais
Departamento de Geografia
Valria Amorim do Carmo
A CONTRIBUIO DA ETNOPEDOLOGIA PARA O PLANEJAMENTO DAS TERRAS: ESTUDO DE CASO DE UMA COMUNIDADE DE AGRICULTORES DO ENTORNO DO PARNA
CAPARA.
Minas Gerais Brasil Fevereiro de 2009
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Valria Amorim do Carmo
A CONTRIBUIO DA ETNOPEDOLOGIA PARA O PLANEJAMENTO DAS TERRAS: ESTUDO DE CASO DE UMA COMUNIDADE DE AGRICULTORES DO ENTORNO DO PARNA
CAPARA.
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial obteno do ttulo de Doutora em Geografia .
rea de Concentrao: Anlise Ambiental
Orientadora: Profa. Dra. Cristiane Valria de Oliveira
Co-orientadora: Profa. Dra. Irene Maria Cardoso
Belo Horizonte Departamento de Geografia da UFMG
2009
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Dedicatria: minha me, D. Norminha e ao meu filho, Pedro Gabriel, o PG...
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Agradecimentos:
Ao Programa de Ps Graduao em Geografia e ao Departamento de
Geografia do Instituto de Geocincias pela acolhida e pela oportunidade de realizao
deste trabalho.
Ao Parque Nacional do Capara e toda a sua equipe, na pessoa do Sr.
Estevo Marchesini gerente do Parque, pelo total apoio realizao deste trabalho;
Ao Ncleo de Unidades de Conservao do IBAMA - MG, por toda a ajuda
desde o incio dos trabalhos na pessoa de Francisco Neves Carvalho, Haroldo P.
Coelho, Cristiane Consolao, Nino Kamini.
A amiga e colega, professora Cristiane Valria de Oliveira pela orientao,
estmulo e total apoio mesmo antes da minha entrada no programa...obrigado por sua
acolhida.
professora Irene Maria Cardoso pela co-orientao e principalmente, por seu
estmulo e ajuda mesmo quando este trabalho ainda era somente uma idia.
Aos membros da banca: Dr. Joo Roberto Correia, Dra. Elke Mannigel, Prof.
Dr. Bernardo Machado Gontijo, Prof. Dr. Roberto Clio Valado, Profa. Dra. Cristiane
Valria de Oliveira.
Aos tcnicos do Laboratrio de Geomorfologia e Sedimentologia do Instituto de
Geocincias da Universidade Federal de Minas Gerais, Nvea e Ricardo e ao
Laboratrio de Solos da Universidade Federal de Viosa, pelas anlises de solo.
A toda a comunidade de Galilia especialmente, ao Sebastio Brinate, Ana e
Vincius, ao Gladistone Nogueira, Luciana e Fabrcio, ao Vantuil Xavier e Maria
Antnia, ao Lilinho (Hlio Chagas) e Maria Lcia, ao Gilmar e Aparecida, ao Edson e
Penha, Samuel Meiro e Snia, ao Benildo e Lcia, ao Elias e Esmelinda, ao Nestor,
ao Ronaldo e Rosrio, ao Rufino e Maria Jos, Simeo Xavier e Terezinha, ao Valquer
e Lcia, ao Antnio Jos, Darlene e Wagner. Por terem me ajudado com tanta
presteza, principalmente, durante o perodo de colheita do caf, momento em que
todos se envolvem com suas famlias nos trabalhos e mesmo assim, encontraram um
tempo para me ajudar com tanta dedicao. A vocs, mulheres da Galilia, pelos
deliciosos cafs com biscoito... com queijo e os incontveis almoos especiais que
estaro sempre comigo. Pelos momentos inesquecveis nas lavouras de caf, pela
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oportunidade de compartilhar com Sr. Simeo, uma tarde especial colhendo o caf no
p. A Penha, Lilinho, Gladistone por me deixar retribuir a valorosa ajuda que me
deram, virando, mesmo que de forma desajeitada, o caf no terreiro, obrigado pela
acolhida.
A Marina e Ariane (Pipoca) pelo apoio fundamental no campo durante as
entrevistas e a travessia. Sem vocs, teria sido muito difcil aproveitar, com tamanha
intensidade, todos os momentos inclusive, as horas especiais colhendo o caf com
Simeo e virando os gros no terreiro do Lilinho, da Penha, do Gladistone. Horas que
ficaro para sempre...
Aos colegas de curso pela oportunidade de compartilhar momentos de saberes
e sabedoria.
A todos os amigos com os quais tive a honra de conviver durante o Projeto
Doces Matas e que passaram a fazer parte de minha vida, como Gustavo Wachtel,
Valria Mussi, Francisco Neves Carvalho, Vitor Moura, Helton Nonato, Elke Mannigel e
tantos outros.
A Elke Mannigel e Helton Nonato, companheiros fundamentais nesta
caminhada que comeou em 2000. Companheiros, amigos e por que no dizer,
conselheiros principalmente, quando os estudos participativos junto s comunidades
da Zona da Mata e os conhecimentos dentro da agroecologia e mesmo na
Etnopedologia passaram a fazer parte da minha vida.
A Helder Jardim, Magda Luzimar, Giovana Parizzi, Cristiane Valria de Oliveira,
Bernardo Gontijo, Roberto Valado, Vilma Macagnan, Marly Nogueira, amigos e
colegas de Departamento de Geografia que em vrios momentos estiveram presentes,
seja nos corredores do IGC, durante o almoo e at dentro da nossa sala (Helder...),
me ajudando a ver as coisas com mais clareza quando as dvidas inevitveis surgiam
pelo caminho.
Ao Vladimir pela ajuda com os mapas, obrigado.
A Virgnia Palhares, Maria Cristina Villefort, Carla Jusclia por tudo. Desde
1992 quando entramos no mestrado e nos transformamos, alm de amigas, em grupo
de estudo. Todos os momentos em que estivemos juntas foram de muita riqueza e
crescimento.
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A turma do Fronteiro por terem tornado esse final de caminhada ainda mais
prazeroso.
Ao Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata pela oportunidade de
participar de suas atividades que me ajudaram, atravs das vrias indas e vindas
Viosa e da convivncia com todos, a ter certeza de minha escolha.
A minha famlia e a Paulinha pela pacincia e compreenso principalmente,
nos momentos difceis.
A minha me pelo total e irrestrito apoio, no s emocional, mas tambm como
minha agncia de fomento...
Ao Juca, pela sua companhia em silncio, tpica dos gatos, em qualquer hora
do dia ou da noite.
A tantos outros que, mesmo no tendo uma relao direta com este trabalho,
me ajudaram e deram total apoio, tornando possvel a minha chegada at aqui.
A todos vocs e, principalmente, a voc PG, meu muito obrigado...
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o saber a gente aprende com os mestres e os livros. A sabedoria se aprende
com a vida e com os humildes Cora Coralina
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SUMRIO Agradecimentos
SUMRIO
Lista de Figuras
Lista de Tabelas
Lista de Quadros
Lista de Anexos
Lista de Siglas
RESUMO
SUMMARY
USO DAS TERRAS E A CONSERVAO DOS RECURSOS NATURAIS ................... 1
1. UM NOVO OLHAR SOBRE O PLANEJAMENTO DO USO DA TERRA:
EM BUSCA DO DILOGO NECESSRIO ............................................................... 6
1.1 Aptido agrcola das terras: um mtodo adaptado realidade brasileira ................ 6
1.2 A etnopedologia: os solos sob o olhar de quem lida com a terra ........................ 14
1.3 Pesquisa-Participante: construindo o dilogo de saberes ..................................... 20
1.4 O uso terras nas Zonas de Amortecimento: a necessidade do dilogo
entre os de dentro com os de fora. ................................................................... 26
2. GALILIA: UMA COMUNIDADE NO ENTORNO MINEIRO DO PARNA
CAPARA ............................................................................................................. 32
O Parque Nacional do Capara .................................................................................. 41
3. A CAMINHO DA CONSTRUO DO DILOGO .................................................... 47
3.1 ETAPA 1 - Identificao dos solos e de suas potencialidades de
aproveitamento agrcola ......................................................................................... 48
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3.1.1 Identificao dos solos da comunidade .............................................................. 48
3.1.2 Levantamento da Aptido Agrcola das terras na Galilia .................................. 52
3.2 ETAPA 2 - A estratificao dos ambientes segundo os agricultores ..................... 56
3.3 ETAPA 3 - Comparao da Estratificao de Ambientes com a Aptido
Agrcola das Terras ................................................................................................ 66
4. RESULTADOS ....................................................................................................... 72
4.1 Levantamento tcnico ........................................................................................... 72
4.1.1 Os solos da Galilia segundo o Sistema Brasileiro de Classificao
dos Solos ............................................................................................................... 72
4.1.2 O uso das terras na Galilia ............................................................................... 95
4.1.3 Aptido Agrcola das terras na comunidade de Galilia ................................... 100
4.2 Os Ambientes e usos segundo os agricultores ................................................... 112
4.2.1 A Estratificao de Ambientes ......................................................................... 113
4.2.2 Aptido das terras da Galilia: possibilidades e limitaes segundo os
agricultores .......................................................................................................... 146
4.3 Comparao da Aptido das Terras segundo os Agricultores com a
Avaliao Tcnica da Aptido Agrcola das Terras (Sistema
FAO/Brasileiro) ..................................................................................................... 162
CONSIDERAES FINAIS ...................................................................................... 175
Referncias Bibliogrficas ........................................................................................ 182
ANEXOS ................................................................................................................... 194
ANEXO 1 - LEI 14309 2002 Data: 19/06/2002 Origem: LEGISLATIVO .................... 195
ANEXO 2 - Propostas de aes de planejamento relacionadas ao uso das
terras para a Zona de Amortecimento em algumas Unidades de
Conservao de proteo integral ........................................................................ 202
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ANEXO 3 Descrio Morfolgica dos Perfis .......................................................... 207
ANEXO 4 Caractersticas Morfolgica dos Perfis ................................................... 214
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Lista de Figuras Figura 1 Localizao da comunidade de Galilia ...................................................... 32
Figura 2 Geologia da Galilia e entorno Capara/ MG .......................................... 34
Figura 3 - Localizao das reas de Preservao Permanente, uso legal e
conflito de uso no entorno do Parque Nacional do Capara (lado
Mineiro). .............................................................................................................. 38
Figura 4 - O Parque Nacional do Capara e sua Zona de Amortecimento .................. 42
Figura 5 Esquema da Etapa 1 ................................................................................. 48
Figura 6 Ao fundo, a participao do observador-relator que garante o
registro das atividades realizadas. ....................................................................... 61
Figura 7 Participao da famlia de um agricultor na elaborao do mapa
da propriedade..................................................................................................... 64
Figura 8 Esquema da fase de sistematizao das informaes de campo .............. 65
Figura 9 - Localizao dos perfis de solos analisados em maio de 2007 ................... 73
Figura 10 Mapa dos Solos da Comunidade de Galilia ............................................ 77
Figura 11 Perfil aberto expondo os horizontes do Argissolo Vermelho
Amarelo ............................................................................................................... 79
Figura 12 Ambiente em que se encontra o perfil 1 - ARGISSOLO
VERMELHO-AMARELO Distrfico latosslico. Em primeiro plano, a
plancie do Rio Capara. Ao fundo, a encosta onde est localizado o
perfil mostrando o cultivo de caf ........................................................................ 79
Figura 13 Perfil aberto em corte de estrada revelando ARGISSOLO
AMARELO Distrfico abrptico. Em destaque, nota-se a presena de
pedotbulos nos horizontes A, Bt1 e Bt2 ............................................................. 83
Figura 14 Perfil aberto em corte de estrada expondo horizontes do
LATOSSOLO AMARELO Distrfico hmico ......................................................... 85
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Figura 15 Ambiente em que se encontra o segundo perfil analisado
caracterizado pela presena da lavoura de caf .................................................. 86
Figura 16 Perfil expondo o LATOSSOLO AMARELO Distrfico hmico.
Observa-se o contraste na cor entre o horizonte A e o restante do
perfil devido ao acumulo da matria orgnica. ..................................................... 86
Figura 17 Ambiente de onde se insere o perfil 3 - LATOSSOLO
AMARELO Distrfico hmico. Em primeiro plano, o corte de estrada
nas imediaes onde foi feita a anlise. Assim como no ponto anterior,
o caf o uso predominante. Ao fundo, presena de afloramentos
rochosos, onde parte da vegetao natural foi substituda pela
pastagem. ............................................................................................................ 87
Figura 18 Neossolo Regoltico marcado pela ausncia do horizonte B .................... 89
Figura 19 O perfil encontra-se em ambiente de pastagem onde os
terracetes so freqentes. ................................................................................... 89
Figura 20 Perfil de NEOSSOLO REGOLTICO Eutrfico tpico ................................ 90
Figura 21 Ambiente onde foi coletado o Neossolo Regoltico Eutrfico
tpico. Pastagem sobre relevo forte ondulado localizado nas
proximidades da plancie do Rio Capara que, aparece em primeiro
plano. ................................................................................................................... 91
Figura 22 Perfil de Neossolo Flvico ........................................................................ 92
Figura 23 Em primeiro plano, ambiente tpico de plancie aluvial onde se
observa a pastagem e mais ao fundo, remanescentes da mata ciliar. ................. 92
Figura 24 Ao fundo, afloramento rochoso recoberto por neossolo litolgico
cuja vegetao predominante constituda, em sua maior parte, por
espcies rasteiras e/ ou de pequeno porte. ......................................................... 93
Figura 25 rea da Neossolo Litlico localizada dentro da lavoura de caf ................ 93
Figura 26 Gleissolo onde se observa, no detalhe, mosqueamento ........................... 94
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Figura 27 Uso das Terras na comunidade de Galilia municpio de
Capara/ MG em 1986 ........................................................................................ 97
Figura 28 - Uso das Terras na comunidade de Galilia municpio de
Capara/ MG em 2007 ........................................................................................ 98
Figura 29 Mapa de Aptido Agrcola das Terras da Galilia segundo o
Sistema FAO/Brasileiro ...................................................................................... 107
Figura 30 localizao dos informantes-chave ........................................................ 112
Figura 31 Exemplo de mapas elaborados pelos agricultores. O da
esquerda representando as principais alteraes ocorridas em uma
parte da comunidade antes da chegada do IBC, em 1970 e
posteriormente. No mapa da direita a nfase foi dada ao uso e
cobertura das terras. .......................................................................................... 113
Figura 32 o processo de identificao dos estratos ambientais pelos
agricultores ........................................................................................................ 114
Figura 33 Exemplos do sistema radicular do caf .................................................. 116
Figura 34 Viso geral dos compartimentos ambientais da comunidade de
Galilia .............................................................................................................. 117
Figura 35 Unidades Morfolgicas segundo os agricultores .................................... 118
Figura 36 Localizao dos tipos de terras segundo os agricultores ....................... 119
Figura 37 Mapa dos Ambientes identificados pelos agricultores ............................ 120
Figura 38 Viso geral do Compartimento Serra ..................................................... 121
Figura 39 Viso parcial do ambiente Alto da Serra com Terra do Alto da
Serra .................................................................................................................. 123
Figura 40 Ambiente Lanante com Terra de Serra. So reas de
topografia suave ocupados em sua maioria com lavoura de caf. ..................... 123
Figura 41 Na foto da esquerda, a Terra Bosta de Minhoca e direita,
viso geral do ambiente de Bacia com Bosta de Minhoca. ................................ 125
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Figura 42 Terra Poenta apresentando as duas camadas relatadas pelos
agricultores ........................................................................................................ 126
Figura 43 Morro com antiga rea para extrao de caulim. esquerda
pode ser observado de onde se extraia o caulim, em detalhe na foto
da direita. ........................................................................................................... 128
Figura 44 rea de NEOSSOLO LITLICO correspondendo ao moledo
(horizonte Cr) de tonalidade mais clara recoberto por uma camada de
Terra de Moledo. Esta rea o nico local onde o caf cultivado
utilizando irrigao por asperso. ...................................................................... 129
Figura 45 Na foto inferior, Terra de Oca usada para forrar a forma de
fazer tijolo. Nas fotos acima, material de origem da Terra de Oca. .................... 130
Figura 46 Uma das reas de brejo onde se extraia Terra de Telha.
Antigamente existia uma fbrica de tijolos atrs dessas casas. ......................... 131
Figura 47 Terra usada para fazer telha e tijolo. No detalhe,
mosqueamento em meio a uma matriz acinzentada tpica de ambiente
hidromrfico. ...................................................................................................... 131
Figura 48 Viso geral do compartimento Baixada da Serra .................................... 132
Figura 49 Viso geral da Baixada do Rio onde prevalece a pastagem. .................. 136
Figura 50 Viso geral do compartimento Terras Arenosas ..................................... 137
Figura 51 Ambiente de Morros Arenosos na margem esquerda do Rio
Capara onde predominam os Neossolos Regolticos ....................................... 140
Figura 52 Destacados pelas setas est o conjunto de Morros Arenosos
localizados na margem direita do Rio Capara .................................................. 140
Figura 53- Terra Massap Vermelha Canjiquenta ..................................................... 141
Figura 54 Duas reas de ocorrncia da Terra de Moledo sob relevo forte
ondulado recoberto por pastagem. .................................................................... 142
Figura 55 Terra Roxa de Grota cujas camadas identificadas pelo
agricultor so: Primeira camada orgnica 44cm; Segunda camada
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terra roxa 44 121cm; Terceira camada terra roxa com moledo
121-220cm+....................................................................................................... 143
Figura 56 Ao centro, Baixada do Elias ................................................................... 144
Figura 57 esquerda, pista de MotoCross construda no ambiente de
Baixada. direita, Baixada do Elias ocupada com caf. .................................... 144
Figura 58 Aptido das terras da Galilia segundo os agricultores .......................... 152
Figura 59 Vista geral da pista de MotoCross construda na Baixada onde
predomina terra arenosa .................................................................................... 161
Figura 60- Aptido Agrcola segundo o Sistema FAO/Brasileiro e segundo
os agricultores ................................................................................................... 162
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Lista de Tabelas Tabela 1 Normais Climatolgicas da Estao de Capara MG (1961-
1990) ................................................................................................................... 36
Tabela 2 - Distribuio da populao dos municpios que possuem rea
dentro do Parque Nacional do Capara ............................................................... 40
Lista de Quadros Quadro 1 Proposta do Sistema FAO/Brasileiro Modificado ...................................... 12
Quadro 2 Consolidao das formas de abordagem das Zonas de
Amortecimento nos Planos de Manejo de algumas Unidades de
Conservao. ...................................................................................................... 29
Quadro 3 Simbologias das classes de aptido agrcola das terras ........................... 53
Quadro 4 Alternativas de utilizao das terras de acordo com os grupos
de aptido agrcola .............................................................................................. 54
Quadro 5 Quadro-guia de avaliao da aptido agrcola das terras
(regio de clima tropical- mido) .......................................................................... 55
Quadro 6 Quadro-guia de avaliao da aptido agrcola das terras
(Modificado) Clima Tropical mido ................................................................... 70
Quadro 7 Cronograma das campanhas de campo no perodo 2006-2008 ............... 72
Quadro 8 - Resultado das anlises fsicas dos solos da comunidade de
Galilia MG ....................................................................................................... 81
Quadro 9 - Resultado das anlises qumicas dos solos da comunidade de
Galilia MG ...................................................................................................... 82
Quadro 10 Classes de Aptido Agrcola encontradas para a comunidade
de Galilia, segundo a rea de abrangncia. ..................................................... 108
Quadro 11 Quadro Sntese Uso Atual X Uso Potencial .......................................... 109
Quadro 12 Tipos de terra do Compartimento SERRA ............................................ 122
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Quadro 13 Terras do compartimento Baixada da Serra ......................................... 133
Quadro 14 Caractersticas da terra do compartimento Baixada do Rio
levantadas pelos agricultores ............................................................................. 135
Quadro 15 Principais caractersticas das terras do compartimento Terras
Arenosas ........................................................................................................... 139
Quadro 16 - Quadro Sntese da Aptido das Terras da Galilia segundo os
agricultores ........................................................................................................ 147
Quadro 17 Comparao entre a aptido agrcola segundo o Sistema
FAO/Brasileiro e segundo o Sistema de FAO/Brasileiro Modificado
(MARQUES, 2004) ............................................................................................ 169
Quadro 18 Comparao da aptido das terras da Galilia, segundo o
Sistema FAO/Brasileiro, O Sistema FAO/Brasileiro Modificado e
segundo os agricultores ..................................................................................... 173
Lista de Anexos ANEXO 1 - LEI 14309 2002 Data: 19/06/2002 Origem: LEGISLATIVO .................... 195
ANEXO 2 - Propostas de aes de planejamento relacionadas ao uso das
terras para a Zona de A mortecimento em algumas Unidades de
Conservao de proteo integral ..................................................................... 202
ANEXO 3 Descrio Morfolgica dos Perfis .......................................................... 207
ANEXO 4 Caractersticas Morfolgica dos Perfis ................................................... 214
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Lista de Siglas APP rea de Preservao Permanente
CEMIG Companhia Energtica de Minas Gerais
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CTA ZM Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata
CTC Capacidade de Troca Catinica
DARP Diagnstico Ambiental Rural Participativo
DRP Diagnstico Rural Participativo
DRPA Diagnstico Rural Participativo de Agroecossistemas
EMATER Empresa de Assistncia Tcnica e Extenso Rural do Estado
de Minas Gerais
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria
EPAGRI Empresa de Pesquisa Agropecuria e Extenso Rural de
Santa Catarina
FAO Organizao das Naes Unidas para Agricultura e
Alimentao -
GPS Global Positioning System
GT Gradiente Textural
GTZ Agencia de Cooperao Tcnica Alem
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovveis
IBC Instituto Brasileiro do Caf
IBDF Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IEF Instituto Estadual de Florestas
LCCS Land Capability Classification System
ONG Organizao No Governamental
PAE Plano de Ao Emergencial
ParNa Parque Nacional
PDM Projeto Doces Matas
RL Reserva Legal
SAF Sistema Agroflorestal
SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservao da Natureza
UC Unidade de Conservao
VARENA Valorisation ds Resources Naturelles par l'Autopromotion
ZA Zona de Amortecimento
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RESUMO Carmo, Valria Amorim do. A contribuio da etnopedologia para o planejamento das terras: estudo de caso de uma comunidade de agricultores do entorno do parna capara. 2009. 219p. Tese (Doutorado em Geografia com nfase em Anlise Ambiental) Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais.
As discusses a respeito do desenvolvimento local tm destacado cada vez mais, a necessidade de envolver a participao no s do grupo formado por tcnicos e especialistas, mas tambm e principalmente, do grupo de agricultores. O agricultor capaz de perceber e entender, atravs do conhecimento adquirido ao longo de sua vivncia com a terra, como se d o funcionamento dos diversos ambientes dentro de sua propriedade e com isso, pensar melhor sobre o uso da terra. Quando esse conhecimento considerado no processo de planejamento de uso visando a adoo de formas menos agressivas de trabalhar a terra, a possibilidade de xito alcana nveis mais elevados se comparado com a imposio verticalizada e unilateral de prticas normalmente recomendadas pelos tcnicos. Assim, pretendeu-se com esta pesquisa compreender como a Etnopedologia, cincia que considera a importncia do conhecimento dos agricultores em relao terra e seu manejo, e o estudo tcnico da avaliao da aptido agrcola das terras se integrariam para melhorar o uso das terras. Para a consecuo deste objetivo, a pesquisa se desenvolveu em quatro momentos principais: a identificao dos solos da comunidade; a avaliao da aptido agrcola; a estratificao dos ambientes segundo os agricultores; e o cruzamento da estratificao com a aptido agrcola. As classes de solos encontradas na comunidade da Galilia foram os Argissolos, os Latossolos, os Gleissolos e os Neossolos. De uma maneira geral, o Latossolo a classe predominante em termos de extenso seguida pelos Argissolos. Ambos so ocupados, em sua maior parte, por lavouras de caf e esto localizados, principalmente, na poro leste da comunidade, esquerda do Rio Capara. Sobre os Neossolos predominam as pastagens. Entretanto, considerando o Sistema FAO/Brasileiro, os Latossolos foram classificados como aptido regular (LATOSSOLO AMARELO Distrfico hmico) e restrita (LATOSSOLO AMARELO Distrfico tpico) para pastagem plantada, portanto inaptas para o caf. Mas ao analisar as reas das lavouras, percebe-se que no existe um comprometimento da qualidade ambiental dessas reas e que, portanto, se mostram tolerantes ao cultivo de lavouras permanentes. A diferena de aptido apresentada para as reas de latossolo no que tange classificao tcnica e a dos agricultores um dos reflexos do nvel de detalhamento considerado por um e outro. No caso dos agricultores, estes ainda consideram separadamente as lavouras de ciclo curto e as de ciclo longo como o caso do caf. Esta diferena quanto ao nvel de detalhamento pode ser constatada tambm na estratificao dos ambientes. Na sua classificao, o agricultor considera principalmente, o tipo de terra, a forma de relevo associada s condies de temperatura e umidade. Na identificao dos tipos de terra ele utiliza critrios semelhantes aos utilizados na classificao tcnica como a cor, textura, estrutura, consistncia, teor de umidade, o que resultou em 14 tipos de terra, que, no geral, se aproximam da classificao tcnica. E com relao estratificao foram identificados 28 ambientes. Estes resultados mostram que existe relao entre o conhecimento dos agricultores a respeito dos solos e os resultados obtidos a partir dos levantamentos tcnicos dos solos e sua respectiva aptido agrcola. Alm disso, refora a necessidade de reavaliao do sistema FAO/Brasileiro de avaliao da aptido agrcola em funo das incongruncias encontradas quando se compara a classificao tcnica com a realizada pelos agricultores.
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SUMMARY Carmo, Valria Amorim do. A contribuio da etnopedologia para o planejamento das terras: estudo de caso de uma comunidade de agricultores do entorno do parna capara. 2009. 219p. Tese (Doutorado em Geografia com nfase em Anlise Ambiental) Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais.
The discussions concerning the local development have been pointing out more and more, the necessity of involving not only the group formed by technicians and specialists, but also and principally, the group of farmers. The farmer is able to realize and to understand, through the knowledge acquired along his existence on the land, how the different environments of his property are functioning and with that he plans better the use of the land. When this knowledge is considered in the process of use planning aiming at the adoption of the least aggressive forms of working the land, the possibility of success reaches more elevated levels compared with the vertical and unilateral imposition of practices normally recommended by the technicians. Thus, this research is considering how Ethnopedology, a science that combines the importance of the knowledge of the farmers in relation to the soil and its management, and the scientific studies of the evaluation of the Land suitability can be integrated to improve the use of the lands. To attain this objective the research was designed in four steps: the identification of the soil by the community, the evaluation of the Land suitability the division of the environment in different layers by the farmers, and the comparison of the layers with the Land suitability. The different soil types found in the community of Galilia were the Argissolos, the Latossolos, the Gleissolos and the Neossolos. In a general way the Latossolo is the predominant type in terms of extension, followed by Argissolos. Both are occupied in mayor parts by coffee plantation and are principally localised in the eastern part of the community on the left of the Capara River. On Neossolos grassland predominates. However, considering the Brazilian FAO System, the Latossolos were classified with regular (LATOSSOLO AMARELO Distrfico hmico) and limited (LATOSSOLO AMARELO Distrfico tpico) Land suitability for planted pasture, therefore unsuitable for coffee. But analyzing the areas of the plantations it was noticed, that there is no effect on environmental quality in these areas ant that they are thus tolerant to annual cultivation. The difference of the Land suitability shown in the area of the latossolo in the scientific classification and through the farmers is a result of the level of detail considered by one and the other. Farmers separate short and long cycle plantations as is the case of coffee. This difference in level of detail can be noticed as well in the division of the environment in different layers. In his classification, the farmer considers principals the earth type, the form of relief associated to the conditions of temperature and humidity. For the identification of the earth he utilises criteria similar to that used in the scientific classification, such as colour, texture, structure, consistence, content of humidity. This resulted in 14 earth types that get close to the scientific classification. Twenty eight environmental layers were identified. This results show, that there is a relationship between the knowledge of the farmers concerning the soils and the results obtained through scientific studies of the soil and there respective Land suitability. Moreover, it strengthens the need to reevaluate the Brazilian FAO Soil system for the evaluation of Land suitability concerning the incongruencies found between the scientific and the farmers classification.
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1
USO DAS TERRAS E A CONSERVAO DOS RECURSOS NATURAIS
A transformao das paisagens pelo homem ao longo de sua histria trouxe como
conseqncia alm da (re)significao destes espaos, o progressivo comprometimento
da disponibilidade de recursos essenciais vida tanto em termos qualitativos quanto em
termos quantitativos. Dentre os impactos negativos resultantes do uso inadequado dos
recursos ambientais, podem ser citados a degradao do solo e da cobertura vegetal, a
contaminao e at mesmo, a extino de cursos dgua decorrentes da adoo de
prticas agrcolas ditas, convencionais.
Pensando especificamente na busca por alternativas que visem recuperao
no s da capacidade produtiva, mas tambm, da qualidade ambiental das terras, uma
das questes chave o levantamento inicial das diferentes possibilidades e limitaes de
uso da terra, atravs do conhecimento das caractersticas de cada tipo de solo, dos
ambientes associados e tudo isto, considerando o contexto scio econmico.
No Brasil, uma das maneiras de se adquirir tal conhecimento atravs dos
estudos de Avaliao de Aptido Agrcola das Terras realizados, na sua maioria, segundo
a metodologia proposta pelo Sistema FAO/Brasileiro (RAMALHO FILHO & BEEK, 1995).
Atravs dele se identificam no terreno, em funo principalmente das caractersticas dos
solos existentes, do ambiente e do nvel de manejo, reas com potencialidade ou no
para o uso agrcola.
Entretanto, quando se trata de uma matriz agrcola caracterizada por pequenas
propriedades como o caso do entorno do Parque Nacional do Capara, este mtodo se
torna inadequado. A maior parte dos estudos para determinao da aptido de uso
realizada em uma escala generalizada que nem sempre contempla todos os ambientes
de interesse do agricultor que pensa o uso da terra numa escala de propriedade, ou seja,
na escala local. Portanto, para que os estudos de aptido agrcola atendam s
necessidades do agricultor familiar, os levantamentos a serem realizados devem ser
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2
feitos em uma escala de detalhe1. Todavia, alm de caros, muitas vezes sua elaborao
complexa devido existncia de padres de solos de difcil separao, mesmo usando
fotografias areas e realizando caminhamentos intensivos (EMBRAPA, 1997). Alm
disso, o estudo de aptido envolve uma quantidade de informao que o torna complexo
e de difcil acesso, principalmente ao agricultor familiar (RESENDE, 1996; PETERSEN,
1996, CARDOSO & RESENDE, 1996). Outro aspecto a ser salientado que o sistema
est baseado em indicadores diferentes daqueles normalmente utilizados pelos
agricultores para estabelecer reas adequadas ou no a determinado uso. Os
agricultores utilizam outros critrios como insolao, vento, temperatura que no so
considerados no sistema de aptido agrcola.
Uma alternativa deficincia de informaes detalhadas demandadas pelos
estudos em escala local a estratificao de ambientes. Para Resende (1996, p.11), o
uso de chaves de identificao de ambientes para fins locais, pode amenizar a falta de
mapas detalhados. Nesse processo, o agricultor participa ativamente. Ele capaz de
perceber e entender, atravs do conhecimento adquirido ao longo de sua vivncia com a
terra, como se d o funcionamento dos diversos ambientes dentro de sua propriedade e
com isso, pensar melhor sobre o uso da terra.
Assim, quando esse conhecimento considerado no processo de planejamento
de uso visando a adoo de formas menos agressivas de trabalhar a terra, a
possibilidade de xito alcana nveis mais elevados se comparado com a imposio
verticalizada e unilateral de prticas normalmente recomendadas pelos tcnicos. Tem
sido cada vez mais destacada, no mbito das discusses a respeito do desenvolvimento
local, a necessidade de envolver a participao no s do grupo formado por tcnicos e
especialistas, mas tambm e principalmente, do grupo de agricultores.
Segundo Cardoso (1993), o montante de estudos que destacam a importncia do
conhecimento popular, em particular do pequeno agricultor, na soluo de problemas
relacionados ao uso das terras tem crescido. A este ramo do conhecimento d-se o nome
de Etnopedologia, que segundo a mesma autora, pode ser definido como o conjunto de
1 Nvel de levantamento Detalhado, segundo a EMBRAPA (2005)
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3
conhecimentos adquiridos por determinados grupos humanos, no que se refere ao uso do
solo e suas relaes com o meio ambiente.
Diante do exposto, apresenta-se como hiptese dessa pesquisa: a integrao
entre o conhecimento tcnico-cientfico e o conhecimento do agricultor pode contribuir
para um manejo mais adequado das terras, contribuindo, no s para a melhoria das
caractersticas ambientais como tambm da qualidade de vida dos agricultores.
Um processo de avaliao das terras que parta do conhecimento que o agricultor
tenha e que v sendo acrescido do conhecimento tcnico poder tornar o processo mais
significativo e ajudar na deciso quanto ao tipo de uso mais adequado (que respeite
melhor as limitaes das terras).
Assim, pretende-se com esta pesquisa compreender como a Etnopedologia e o
estudo tcnico da avaliao da aptido agrcola das terras se integrariam para contribuir
para melhorar o uso das terras.
A preocupao com o planejamento do uso das terras envolvendo agricultores se
torna ainda mais significativo quando a rea est localizada no entorno de uma Unidade
de Conservao2, como o caso da rea de estudo. A demanda posta pela agricultura
praticada na maior parte dessas reas implica na adoo de prticas que tm contribudo
para que Unidades de Proteo Integral como os Parques, se tornem cada vez mais
isoladas de seu entorno, quase sem conexo com ecossistemas que poderiam atuar
como corredores ecolgicos3 de fauna e flora. No entorno do Parque Nacional do
Capara a situao no diferente. A maior parte dos remanescentes de Mata Atlntica
foi substituda pelas lavouras de caf, principal atividade econmica da regio. Hoje a
2 Espao territorial e seus recursos ambientais, incluindo as guas jurisdicionais, com caractersticas naturais relevantes, legalmente institudo pelo Poder Pblico, com objetivos de conservao e limites definidos, sob regime especial de administrao, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteo (BRASIL, 2000 s/p).
3 corredores ecolgicos: pores de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservao, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a disperso de espcies e a recolonizao de reas degradadas, bem como a manuteno de populaes que demandam para sua sobrevivncia reas com extenso maior do que aquela das unidades individuais.
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4
matriz agrcola caracterizada por um mosaico composto por manchas de caf e
pastagem entre as quais esto os remanescentes florestais.
Nesse contexto, optou-se por trabalhar com uma comunidade que no s fosse
representativa, mas tambm, que se destacasse pela receptividade dos agricultores, pela
sensibilidade para a questo ambiental, pela relao de cordialidade com o Parque e pela
sua organizao. Uma comunidade que atende a estes requisitos Galilia.
A escolha dessa comunidade decorreu da participao da autora no Projeto
Doces Matas - PDM4 - que teve o Parque Nacional do Capara como um de seus objetos
de estudo. No decorrer desse projeto foi possvel ter contato com a rea e, atravs da
administrao da Unidade, conhecer a comunidade.
Especificamente, busca-se:
Realizar o levantamento e a classificao dos solos segundo o Sistema Brasileiro
de Classificao dos Solos;
Analisar a aptido agrcola das terras usando o Sistema FAO/Brasileiro
(RAMALHO FILHO & BEEK, 1995);
Comparar a aptido agrcola proposta pelo Sistema FAO/Brasileiro com o uso
atual das terras na comunidade;
4 O Projeto Doces Matas foi um projeto de cooperao tcnica Brasil - Alemanha, desenvolvido em parceria pelo Instituto
Estadual de Florestas (IEF), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA - MG), a Fundao Biodiversitas e a Agncia de Cooperao Tcnica Alem (GTZ). O objetivo do Projeto era dar apoio tcnico conservao e ao manejo de Unidades de Conservao da Mata Atlntica em Minas Gerais. O Projeto enfocou as parcerias entre os setores pblico e privado e com Unidades vizinhas s reas protegidas dando nfase cooperao interinstitucional e aos processos de gesto ambiental participativos em Unidades de Conservao selecionadas (Parque Nacional do Capara, Parque Estadual do Rio Doce e Reserva Particular do Patrimnio Natural Mata do Sossego). Sendo que a atividade de alguns Grupos Temticos, estendeu sua ao a outras Unidades alm das acima citadas. O Projeto Doces Matas escolheu focar sua atuao em duas metas principais:
O fortalecimento participao comunitria, envolvendo e sensibilizando as populaes vizinhas s Unidades de Conservao sobre as questes ecolgicas;
A articulao interinstitucional, estimulando e ampliando o intercmbio entre as diferentes instncias envolvidas: federal, estadual e privada.
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5
Levantar o conhecimento dos agricultores quanto aos tipos de solos, suas
caractersticas, a sua relao com os diferentes usos das terras associando aos
diferentes ambientes existentes na comunidade;
Integrar a estratificao realizada pelos agricultores com a anlise da aptido
agrcola.
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6
1. UM NOVO OLHAR SOBRE O PLANEJAMENTO DO USO DA TERRA: EM BUSCA DO DILOGO NECESSRIO
1.1 Aptido agrcola das terras: um mtodo adaptado
realidade brasileira
A necessidade de buscar alternativas de uso das terras que priorizem a
recuperao da capacidade produtiva e a melhoria de sua qualidade ambiental passa,
inicialmente, pela avaliao ou classificao da capacidade das terras. Nesta fase
necessrio conhecer as caractersticas de cada tipo de solo, dos ambientes nos quais
esto inseridos e tudo isto, associado s caractersticas scio econmicas. Em outras
palavras, a avaliao deve considerar:
(1) uma parte fsica, que caracteriza e sintetiza as qualidades da terra, incluindo a identificao dos problemas principais e a previso da relao entre aplicao de insumos e reduo desses problemas; o levantamento dos solos e mais outros aspectos ligados ao clima, hidrologia, vegetao, etc., esto a includos;
(2) uma avaliao socioeconmica, que envolve aspectos como preo dos produtos, preo do trabalho, relao entre insumos e produo em termos econmicos, etc. (RESENDE et al., 2002, p.152)
De posse de todas as informaes, o passo seguinte levantar os diferentes usos
a que as terras poderiam ser submetidas sem que isso implique na sua degradao. Em
outras palavras, identificar o grau de capacidade de uso significa identificar a intensidade
mxima de cultivo a ser implantada em certo tipo de solo sem que isto implique em perda
permanente de produtividade ou mesmo em degradao por causa da eroso (LEPSCH,
2002).
Segundo Bacic et al. (2003), os mtodos de avaliao so tradicionalmente
baseados principalmente nos levantamentos de solo. Essa tem sido a tendncia por mais
de cem anos na Rssia, nos Estados Unidos e Hungria e por mais de cinqenta anos,
nas outras partes do mundo. Tais levantamentos tinham como objetivo inicial dar suporte
s decises com relao ao uso rural das terras associando os diferentes tipos de solos
aos sistemas de produo. O enfoque est na capacidade de uso onde os diversos tipos
de solo eram categorizados pela sua capacidade de sustentar classes de tipos de uso.
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7
Rossiter (2000) define um levantamento de solos como o processo a partir do qual
se determina o padro da cobertura dos solos, caracterizando-os, e apresentando um
resultado compreensvel e que possa ser interpretado pelos diferentes pblicos. Ainda
segundo esse autor, um levantamento de solos feito para atender basicamente, a dois
objetivos: utilitrio (direcionado a responder a uma questo especfica sobre o
comportamento da terra a um tipo de uso) ou cientfico (para compreender o solo como
um corpo natural na paisagem).
Independente do objetivo a cumprir, os levantamentos de solos implicam na
gerao de dois produtos: mapa e relatrio. Os dados gerados tratam no s da
identificao e distribuio dos tipos de solos como tambm na sua interpretao para o
uso. O segundo documento, bem mais detalhado em termos de informao, apresenta
alm da explicao da legenda e da descrio das unidades de mapeamento, uma
caracterizao da rea no que se refere sua localizao, material de origem, descrio
do relevo, cobertura vegetal existente e caractersticas do clima. As previses e
recomendaes apresentadas para os tipos de solos identificados dependem da escala
em que o mapeamento foi realizado que podem variar de ultradetalhado (escala de
publicao > 1:10.000) ao exploratrio (escala de publicao de 1: 750.000 a
1:2.500.000) (RESENDE et al., 2002).
De posse do levantamento de solos, parte-se ento, para a classificao de
aptido agrcola das terras. No Brasil, segundo Resende et al. (2002), os sistemas de
classificao mais usados so o de Capacidade de Uso (MARQUES, 1971; LEPSCH et
al, 1983) e o Sistema FAO/Brasileiro de Avaliao da Aptido Agrcola das Terras
(BENNEMA et aI., 1964; RAMALHO FILHO et al., 1978 e 1983; RAMALHO FILHO &
BEEK, 1995).
O primeiro deles uma adaptao do sistema desenvolvido nos Estados Unidos
(Land Capability Classification System LCCS), com o objetivo de agrupar as classes de
solo em classes de capacidade de uso, para projetos de planejamento agrcola visando o
uso sustentvel, ou seja, sem degradao socioecolgica.
Segundo Lepsch (1991, p.15)
O sistema de classificao de terras em capacidade de uso foi elaborado primordialmente para atender a planejamentos de prticas de
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8
conservao dos solos. Contudo, leva em conta outros fatores, alm daqueles de exclusivo interesse s prticas de controle eroso, tais como os impedimentos motomecanizao, produtividade dos solos, riscos de inundao.
Entretanto, este sistema apresenta algumas limitaes apontadas por Lepsch
(1991). Como os levantamentos de solos em escala de detalhe so raros no Brasil, ele
no adequado para aplicao em nvel da propriedade agrcola, principalmente em se
tratando de agricultura familiar. Nestas situaes, uma alternativa proposta a realizao
dos chamados levantamentos utilitrios. Neste tipo de levantamento devem ser
consideradas tanto as caractersticas que influenciam diretamente na degradao do
solo, quanto as que, mesmo no influenciando diretamente, devem ser consideradas no
planejamento5.
A outra limitao est relacionada
(...) s disparidades regionais de emprego de tecnologia agrcola e capital, to comuns no Brasil, e que fazem com que a aptido agrcola deva ser julgada em face de diferentes nveis de manejo, o que normalmente no possvel na classificao da capacidade de uso, porque pressupe basicamente manejo moderadamente alto (LEPSCH, 1973, p.16).
Gjorup (1998) tambm aponta alguns problemas com relao aplicao deste
sistema no Brasil, principalmente, em se tratando de agricultura familiar. Um desses
problemas de carter mais geral, e se refere adoo de um sistema originrio de
regies cujos solos se comportam de maneira diferente dos solos sob influncia de um
clima tropical. Outro problema est relacionado com os ambientes ocupados pela
agricultura familiar. Geralmente, estes ambientes se caracterizam por apresentarem
limitaes no s de ordem ecolgica como tambm socioeconmica, o que restringe a
aplicao das tcnicas sugeridas neste sistema como a mecanizao e o uso intensivo
de fertilizantes (CARVALHO et al., 1996). Este fato foi destacado tambm por Krasilnikov
& Tabor (2003), em relao de uso descontextualizado do sistema de capacidade de uso
numa regio semi-rida no Novo Mxico com os povos Zuni.
5 consideram-se os critrios: profundidade efetiva do solo, textura, permeabilidade, declividade e eroso; os fatores limitantes que podem ser identificados no campo: pedregosidade, risco de inundao, carter abrupto, carter vrtico, hidromorfismo, seca prolongada, deficincia hdrica, geada; e aqueles fatores limitantes que dependem de anlise de laboratrio: carter distrofico, carter lico, baixa reteno de ction, tiomorfismo, sodificacao, salinizao, carbonatos.
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9
Outros estudos tambm questionam a real utilidade dos mtodos de avaliao da
capacidade de uso das terras. Bacic et al. (2003) realizaram estudo baseado na
avaliao do sistema de capacidade de uso desenvolvido pela Empresa de Pesquisa
Agropecuria e Extenso Rural de Santa Catarina - EPAGRI a partir da viso de
extensionistas. Segundo estes autores, o sistema desenvolvido pela EPAGRI tem suas
razes no sistema americano dos anos de 1930, desconsiderando as mudanas
propostas pela FAO. Os resultados mostraram que por ser muito generalizado, o sistema
adotado no atende demanda especfica do agricultor. No h uma especificao de
manejo ou prticas culturais para os diferentes tipos de uso. Faltam informaes mais
detalhadas para os diferentes usos alm de serem considerados basicamente, os fatores
fsicos na avaliao da capacidade das terras. Este ltimo aspecto, tambm ressaltado
por Sojaya (2005), quando afirma que em muitos pases, os sistemas de avaliao das
terras priorizam os aspectos biofsicos em detrimento dos aspectos socioeconmicos, o
que se apresenta como um problema, uma vez que, a deciso por parte dos agricultores
pelos diferentes tipos de usos conduzida muito mais por fatores de ordem
socioeconmica do que propriamente pela diferena nas caractersticas fsicas de aptido
das terras.
No incio da dcada de 60 foi criado um sistema mais adaptado realidade
brasileira6. O Sistema FAO/Brasileiro, segundo Resende et al. (2002), apresenta como
caractersticas principais:
Considerar diferentes nveis de manejo uma vez que os problemas de solo no
so igualmente importantes para o grande e o pequeno agricultor. Os problemas relativos
aos impedimentos mecanizao esto muito mais relacionados a uma agricultura
mecanizada do que ao pequeno agricultor que, na maioria das vezes, no tem acesso a
alternativas deste nvel tecnolgico.
Considerar uma viabilidade de estimativa de reduo de problemas atravs do
uso de capital e tcnica, o que ir afetar de forma diferente o grande e o pequeno
agricultor.
6 Bennema, J. et al. 1964. Um sistema de classificao de capacidade de uso da terra para levantamento de reconhecimento de solos. Em 1967 o nome foi modificado para Um sistema de Classificao da Aptido de Uso da Terra para Levantamentos de Reconhecimento de Solos
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Permitir ajustes a conhecimentos novos, inclusive adaptaes regionais sem
comprometer a sua unidade. Isto se deve sua metodologia que sintetiza as qualidades
do ecossistema quanto aos parmetros: nutrientes, gua, oxignio, impedimentos
mecanizao e susceptibilidade eroso.
O mtodo baseado na anlise dos parmetros acima relacionados considerando
o desvio de cada um em relao a um solo ideal, ou seja, aquele que no apresentaria
nenhum problema em termos de fertilidade, excesso de gua ou deficincia de oxignio,
eroso ou impedimento mecanizao. Este um modelo fictcio, pois se sabe que um
solo nestas condies, no existe. Sendo assim, todo solo apresentaria um determinado
grau de desvio com relao a cada um desses parmetros, uns mais, outros menos.
Esse desvio pode ser estimado em graus (nulo, ligeiro, moderado, forte e muito forte),
expressando, nesta ordem, um agravamento da situao, maiores problemas a corrigir,
maiores desvios ou limitaes para reduzir (RESENDE et al., 2002).
Em seguida, uma vez definidos os graus de limitao, passa-se a avaliar as
possibilidades de corrigir os problemas detectados. Neste momento, faz-se necessrio a
observao do contexto socioeconmico da realidade considerada, pois a correo
proposta atravs do uso de prticas conforme o nvel de manejo indicado: com baixo (A),
com mdio (B) e com alto nvel tecnolgico (C). Enquanto no nvel A se exige pouco
conhecimento tcnico e baixo emprego de capital, no nvel de manejo C, as prticas
agrcolas esto associadas a um nvel elevado de conhecimento tecnolgico, sendo
necessrio maior investimento de capital uma vez que a mecanizao est presente em
praticamente todas as fases de operao agrcola.
Uma vez analisados os graus de limitao dos cinco parmetros e as possveis
correes considerando o nvel de manejo, a prxima etapa a classificao da aptido
agrcola. O sistema de 1964 j reconhecia diferentes nveis de manejo. Entretanto, a
aptido das terras era definida apenas para o grupo das lavouras (RAMALHO FILHO &
BEEK, 1995). No sistema atual, alm do grupo das lavouras, a aptido considerada
tambm para: pastagens plantadas, pastagens naturais e silvicultura, preservao da
fauna/flora e recreao. Seguindo essa ordem tm-se, de maneira crescente, as
limitaes de uso. Assim, por exemplo, uma terra apta para pastagem assim o , porque
os solos apresentam uma srie de limitaes que a torna menos apropriada para o uso
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com lavoura. Mas esta uma anlise mais geral. Mesmo para um mesmo grupo, como o
exemplo das lavouras, estas limitaes ainda podem variar em ligeiras, moderadas,
fortes e at mesmo, inaptas, dependendo do nvel de manejo considerado.
Conforme Ramalho Filho & Beek (1995), o sistema de avaliao da aptido
agrcola constitui uma orientao para o planejamento em nvel regional e nacional. Os
prprios autores desse sistema concordam que para a sua aplicao ao nvel de pequena
propriedade, seriam necessrios reajustes.
Portanto, mesmo que o sistema de avaliao da aptido agrcola das terras
FAO/Brasileiro seja mais adaptado realidade da agricultura nacional do que o sistema
de Capacidade de Uso, ele apresenta algumas restries no que se refere s demandas
da agricultura familiar. Basicamente, as restries so as mesmas apontadas
anteriormente para o Sistema de Capacidade de Uso. A escala em que os levantamentos
tcnicos so realizados, por ser mais regional, no oferece o nvel de detalhe necessrio
para atender o agricultor familiar que, normalmente, est restrito ao seu campo de cultivo.
Alm disso, a linguagem empregada na apresentao dos resultados de difcil
compreenso para o pblico no especializado (CARDOSO & RESENDE, 1996;
KRASILNIKOV & TABOR, 2003).
Uma verso modificada do Sistema FAO/Brasileiro foi proposta por Marques
(2004) visando a sua aplicao em planejamento agroecolgico ao nvel de bacia
hidrogrfica. Dentre as alteraes propostas, destaca-se a discriminao de lavouras de
ciclo curto das de ciclo longo. Esta distino se justifica uma vez que reas que no so
aptas para lavouras temporrias, poderiam ser utilizadas com lavouras anuais como o
caso de frutferas que possuem graus de exigncia menores em relao aos fatores de
limitao. Outra proposta o desmembramento do grupo onde esto pastagem natural e
silvicultura em dois grupos independentes onde o grupo relativo silvicultura seria
considerado de uso mais intensivo. Desta maneira, segundo a nova proposta a estrutura
teria a seguinte configurao (QUADRO 1):
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Quadro 1 Proposta do Sistema FAO/Brasileiro Modificado
Grupo de aptido Nvel de manejo Tipo de utilizao
indicado A B C
Boa 1A 1B 1C
Regular 1a 1b 1c Culturas temporrias
Restrita 1(a) 1(b) 1(c)
Boa 2A 2B 2C
Regular 2a 2b 2c Culturas permanentes
Restrita 2(a) 2(b) 2(c)
Boa 3A 3B 3C
Regular 3a 3b 3c Silvicultura
Restrita 3(a) 3(b) 3(c)
Boa 4P
Regular 4p Pastagem plantada
Restrita 4(p)
Boa 5E
Regular 5e Extrativismo
Restrita 5(e)
Sem aptido Preservao/recreao
Fonte: Adaptado de MARQUES (2004)
Apesar de ressaltado pelo autor o carter preliminar da proposta, ela se mostra
com maior potencial de aplicao no caso de reas cuja realidade se assemelha rea
de estudo, do que o sistema original. Entretanto, ainda sim apresenta as mesmas
limitaes que so o tempo e o custo necessrios para a realizao dos levantamentos
de solo.
Por isso, importante considerar alguns fatores antes de investir mais recursos e
tempo em levantamentos tcnicos dessa natureza para atender as necessidades da
agricultura familiar. Um deles que alguns estudos tm mostrado que o agricultor e as
populaes tradicionais que convivem com a terra h vrias geraes, adquirem atravs
de sua prtica, um conhecimento especializado que, os tornam hbeis para lidarem com
as potencialidades e se adaptarem aos limites impostos pelo ambiente sua volta. Com
esse conhecimento, os agricultores so capazes de relacionar os diferentes elementos
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13
integrantes da paisagem, interpret-los e, ento, associados ao uso, compartimentar o
ambiente em que vivem. Essa compartimentao da paisagem agrcola aparece na
literatura sob a denominao de Estratificao7 de Ambientes (RESENDE, 1996;
CARDOSO & RESENDE, 1996; PETERSEN, P.1996; GJORUP, 1998; KRASILNIKOV &
TABOR, 2003).
Cada estrato caracterizado pelo agricultor considerando principalmente, os
critrios (indicadores) relacionados ao uso e manejo dos solos: tipo de solo existente e
cultivo a ele associado. Segundo Cardoso & Resende (1996), existe uma tendncia do
agricultor repassar os critrios de identificao dos ambientes de uma maneira
interligada: ''o local (terrao) bom para o milho, mas se chover muito fica ruim, a terra
barrenta''8. Ele procede dessa forma porque a ele interessa saber como as caractersticas
do ambiente interferem na produtividade de suas lavouras e na facilidade de manej-las.
Ao descreverem os solos, os agricultores utilizam caractersticas facilmente
identificveis em campo como sua aparncia fsica (cor, posio na paisagem), algumas
propriedades fsicas e qumicas (textura, estrutura, consistncia, pedregosidade,
salinidade, capacidade de reteno de gua, permeabilidade), performance (capacidade
de produo, susceptibilidade eroso, risco de inundao) e vegetao associada
(cultivada ou espontnea) (CARDOSO & RESENDE, 1996; WERNER, 2001; TALAWAR
& RHOADES, 1998, BARRERA-BASSOLS, ZINCK 2003, OUTWATER & MARTIN, 2003;
VALE, et al. 2007). Em grande parte da literatura consultada ressalta-se o fato de que
os agricultores, ao caracterizarem os solos, tm como referncia a camada superficial, o
que pode ser explicado pela sua influncia mais direta no tipo de manejo adotado
(WERNER, 2001; RYDER, 2003; ERICKSEN & ARDON, 2003).
Aps o levantamento, as informaes coletadas precisam ser organizadas para
que as anlises possam ser realizadas com maior eficincia. Petersen (1996) e Resende
(1996) propem organiz-las atravs da chave de identificao de ambientes, que tem
7 segundo Resende et al. (2002:154) ''estratificar significa separar uma rea maior em pores mais ou menos homogneas. Identificar, numa rea heterognea, as partes componentes, apresentando, cada qual, considervel homogeneidade''
8 declarao obtida por um agricultor em trabalho realizado pelos autores em uma microbacia do municpio de Ervlia, Zona da Mata Mineira.
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um significado apenas local, pois est baseada nos critrios definidos pelos agricultores
de um determinado local e por isso no deve ser generalizada. A generalizao no pode
ser feita em nvel regional, mas a uma escala mais local, entre comunidades localizadas
dentro de um contexto scio econmico semelhante, talvez seja possvel.
Vrios autores que se dedicam ao estudo das relaes entre o homem e a terra
tm reconhecido a importncia de se levar em considerao o conhecimento construdo
pelos agricultores a partir da sua lida diria com a terra ao longo dos anos (DIEGUES,
1996; BORRINI-FEYERABEND, 1997; AMLER et al., 1999; PIMBERT & PRETTY, 2000;
WERNER, 2001; BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2002; WINKLERPRINS & SANDOR,
2002; KRASILNIKOV & TABOR, 2003;OUTWATER & MARTIN, 2003; BARRIOS &
TREJO, 2003; BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2003; WINKLERPRINS & BARRERA-
BASSOLS, 2004; MANNIGEL, 2004; CORREIA, 2005; ALVES, 2004; HAGENBROCK &
SANTOS, 2006).
1.2 A etnopedologia: os solos sob o olhar de quem lida com a
terra
Entender como os agricultores trabalham a terra, considerando que esta uma
tarefa que resulta da combinao no apenas dos elementos do meio, mas tambm da
cultura e da socioeconomia, um dos principais objetivos de uma cincia que tem
ganhado expresso, principalmente a partir da dcada de 1980, a Etnopedologia. Ela
considerada como um ramo da etnoecologia que por sua vez, seria um campo dentro das
etnocincias9 (BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2002, 2003; ALVES & MARQUES, 2005),
que estuda o conhecimento indgena ou local a respeito do meio ambiente. De acordo
com Diegues (2000, p.28), a etnocincia
9 O estudo do conhecimento local primeiramente objeto da etnoecologia uma subdiviso da etnocincia. A
etnoecologia se refere ao estudo de como os grupos tradicionais concebem seu ambiente, ou seja, como eles organizam e
classificam seu conhecimento sobre a natureza e os processos ecolgicos associados. (WERNER, 2001)
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15
(...) parte da lingstica para estudar o conhecimento das populaes humanas sobre os processos naturais, tentando descobrir a lgica subjacente ao conhecimento humano do mundo natural.
A Etnopedologia uma disciplina que utiliza conhecimentos provenientes de
diferentes campos como as cincias naturais e sociais para buscar respostas s
questes relacionadas aos solos e ao manejo das terras praticadas pelas populaes
tradicionais ou no, considerada, portanto, uma disciplina hbrida (WINKLERPRINS &
BARRERA-BASSOLS, 2004; ALVES & MARQUES, 2005). Nesse sentido...
...' (...) estruturada a partir da combinao das cincias naturais e sociais, como a cincia dos solos e levantamentos geopedolgicos, antropologia social, geografia rural, agronomia e agroecologia. (...) De maneira ideal, a etnopedologia abarca todos os sistemas de conhecimento emprico da populao rural sobre o solo e a terra, desde o mais tradicional ao mais moderno. Analisa o papel dos solos e da terra no processo de manejo dos recursos naturais, como parte de uma racionalidade econmica e ecolgica (BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2003, p. 172-173).10
A etnopedologia abarca percepes e explicaes sobre as propriedades do solo;
classificao, manejo, e inter-relao solo-planta (BARRIOS & TREJO, 2003). Para Alves
& Marques (2005:326), o termo etnopedologia utilizado para
Designar o conjunto de abordagens interdisciplinares desenvolvidas ao longo da histria (...) dedicadas a estudar as interfaces entre os solos, a espcie humana e os outros componentes dos ecossistemas.
O conhecimento das populaes consideradas nos estudos etnopedolgicos
recebe diferentes denominaes: indgena, local, tradicional ou ''Folk'' sendo que os dois
primeiros so mais recorrentes. Alguns autores preferem o uso do termo local por
acharem que tradicional pode dar a falsa idia de que este conhecimento fechado, no
sujeito s interferncias externas. Entretanto, sempre que ocorre uma mudana seja, nas
questes inerentes ao prprio ambiente (reduo na disponibilidade de gua em uma
regio), ou externos a ele, como o desenvolvimento de novas tecnologias ou por
questes econmicas, esse conhecimento passa por adaptaes (COOLS et al., 2003;
10 It is a hybrid discipline structured from the combination of natural and social science and geopedological survey, social anthropology, rural geography, agronomy and agro-ecology. () Ideally, ethnopedology encompasses all empirical soil and land knowledge systems of rural populations, from the most traditional to the modern ones. It analyzes the role of soil and land in the natural resources management process, as part of ecological and economic rationale. Traduo da autora
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16
BARRIOS & TREJO, 2003; BARRERA- BASSOLS et al., 2006). Por estar de acordo com
estas ponderaes, neste estudo ser adotado o termo conhecimento local.
Conforme destacado anteriormente, o conhecimento desenvolvido pelas
populaes a respeito dos solos e do manejo de suas terras influenciado tanto pelo
aspecto prtico quanto pelo cognitivo. No entanto, h tambm um terceiro aspecto
representado pelo conjunto de crenas e valores que interfere na viso de mundo
desenvolvida pelo agricultor. Portanto, essa viso de mundo resulta da articulao entre
as esferas da crena, do conhecimento e das prticas de manejo, ou o que Toledo (2000)
citado por Barrera-Bassols & Zinck (2003), denomina de Complexo K C P onde
Kosmos (K) a esfera da percepo, das crenas e rituais; Corpus (C) o campo do
conhecimento em suas variadas formas e a Prxis (P) representa as diferentes prticas
de manejo utilizadas. Estes trs domnios constituem os focos centrais dos estudos
etnopedolgicos.
A histria do conhecimento acumulado pelos povos sobre os solos e o seu manejo
bem antiga e est associada historia da civilizao humana. A partir do momento em
que o homem deixa de ser nmade, e passa a cultivar seu alimento, a terra deixa de ser
vista apenas como fornecedora de pigmentos e de matria prima para a confeco de
objetos. Ela passa a desempenhar um importante papel na escolha do local de fixao de
grupos humanos. Muitas das primeiras aglomeraes se formaram em locais de terras
frteis com disponibilidade de gua e pouco sujeitas ao da eroso como as plancies
aluviais. Ao escolher estes locais para estabelecer suas terras e nelas cultivar, muito
provavelmente o homem lanou mo de um conhecimento que foi sendo adquirido a
partir de sua experincia com os recursos (LEPSCH, 2002). o caso, por exemplo, do
Egito cujo nome antigo era Kemel que significa solo aluvial preto frtil.
Segundo Krasilnikov & Tabor (2003), o sistema mais antigo de classificao de
solos que se tem notcia foi desenvolvido na China. Outros vieram depois como o dos
astecas que tinham pelo menos 45 nomes para vrios solos, sendo que, muitos deles,
ainda so utilizados pelos ndios mexicanos. Entretanto, parece que existe um hiato
temporal sobre o conhecimento local dos solos. Poucos so os registros para a Europa
Ps-Renascimento. Uma possvel explicao reside no fato de nem a igreja e nem o
prprio mtodo cientfico europeu terem dado crdito a esse tipo conhecimento. Mais
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tarde, nos sculos 15 at meados do sculo 19, na Rssia, foram desenvolvidos estudos
sobre recursos naturais que envolviam o levantamento do conhecimento a respeito dos
solos e de algumas de suas propriedades. Em 1876, Dokuchaev, considerado o pai da
cincia dos solos, participa de um estudo a partir do qual alguns nomes de solo
tradicionalmente utilizados pelos povos eslovenos como chernozem, solonetz e gley,
passam a integrar a literatura cientfica (KRASILNIKOV & TABOR, 2003).
Todavia, durante os sculos XIX e XX, a evoluo dos sistemas socioeconmicos,
as migraes causadas pelas guerras e o uso de sistemas de classificao com base
cientfica, contriburam para que esse conhecimento em relao terra e seu manejo se
perdesse nas comunidades. No caso das migraes causadas pelas guerras, muitas
populaes no puderam lanar mo do seu conhecimento tradicional e/ou local por
terem que se adaptar s novas condies, principalmente culturais da nova terra.
Somado a isso, com a valorizao crescente das classificaes cientficas, muitos
agricultores passaram a desconsiderar ou mesmo menosprezar o seu conhecimento por
acreditarem que o conhecimento adquirido numa instituio formal de ensino possua
mais valor do que o desenvolvido por ele (KRASILNIKOV & TABOR, 2003).
Segundo Talawar & Rhoades (1998), com o advento da Rio 92, as discusses em
torno da necessidade de repensar o uso dos recursos naturais frgeis e de desenvolver
formas sustentveis de desenvolvimento, fizeram reascender o interesse entre os
etngrafos e os cientistas do solo pelo estudo dos sistemas de uso e classificao dos
solos pelas populaes locais ou tradicionais. A partir de ento, comea a expanso dos
estudos etnopedolgicos. O foco era mais utilitrio, no sentido de que, o conhecimento
local estava sendo estudado com o objetivo principal de buscar novas formas de uso
sustentvel dos recursos. Para esses mesmos autores, a crena por trs destes estudos
era de que o conhecimento local a respeito dos solos e do manejo das terras poderia
tornar a assistncia tcnica mais eficiente e novas polticas poderiam ser mais bem
elaboradas.
Uma anlise realizada por Barrera-Bassols & Zinck (2003), a partir de um banco
de dados constitudo de 895 estudos, constitui uma contribuio importante para os
estudos etnopedolgicos. Destes 895 estudos, 48% esto voltados especificamente para
estudos da anlise da percepo, conhecimento e manejo dos solos pelas populaes
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locais. O restante das publicaes aborda, de alguma maneira, aspectos relacionados ao
conhecimento etnopedolgico, mas em um contexto mais amplo. Essa anlise realizada
pelos dois autores mostrou que a etnopedologia est se consolidando como disciplina;
aumentando seu arcabouo conceitual e expandindo sua produo, principalmente, a
partir do incio dos anos 90. Estes autores apontam alguns fatores que poderiam ajudar a
explicar este aumento, dentre eles a necessidade de estudar e compreender o
conhecimento das sociedades em relao aos solos visando formaliz-lo e preserv-lo
antes que o mesmo se perca em funo de mudanas culturais (BARRERA-BASSOLS &
ZINCK, 2003).
Alm do aumento constatado, essa anlise possibilitou tambm distinguir trs
grupos dentro dos quais os estudos etnopedolgicos se enquadram: os etnogrficos, os
comparativos e os integrados (BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2002, 2003).
Esta classificao possui uma relao estreita com a fase de evoluo da
natureza desses estudos. Inicialmente, os estudos etnogrficos estavam focados na
anlise lingstica dos sistemas locais de classificao de solos e terras. Os estudiosos
acreditavam que atravs do estudo da lngua, poderiam compreender as relaes de uma
determinada cultura com o meio em que viviam. Isto com base na premissa de que toda
cultura age sobre o meio com base na compreenso e classificao de diferentes objetos
e fenmenos, como o solo ou tipos de terra (TALAWAR & RHOADES, 1998).
Mais tarde, os estudos se voltaram para comparar estes sistemas de classificao
com os sistemas tcnicos buscando as semelhanas e diferenas entre o conhecimento
local e a informao cientfica (BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2003).
Na abordagem integrada, diferente das abordagens anteriores, o contexto scio-
cultural-econmico e ambiental passa a ser considerado para que um esquema de
manejo de recursos adaptado realidade da comunidade seja elaborado. A abordagem
integrada trouxe para os estudos etnopedolgicos, a preocupao com a degradao e a
importncia do manejo das terras ao nvel do campo. Nos estudos de enfoque
comparativos e integrados esto mais presentes os gegrafos culturais e ambientais,
alguns agrnomos e pedlogos (BARRERA-BASSOLS & ZINCK, 2003).
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Os mesmos autores destacam ainda que, as regies com maior ocorrncia de
estudos etnopedolgicos so: os trpicos secos da frica, sia e Amrica e as terras
baixas e midas dos trpicos como Brasil, Oeste africano, Mxico e sudeste da sia.
Alguns fatores associados a estes lugares podem ajudar a explicar a concentrao
desses estudos como: alguns pases alm de estarem localizados em zonas
agroecolgicas frgeis com acentuada aridez, apresentam alto ndice de pobreza e forte
degradao das terras; esto entre as maiores regies rurais do mundo; formam reas
com os mais elevados ndices de crescimento populacional; apresentam elevada
diversidade lingstica11; possuem significativa diversidade biolgica e foram importantes
centros de domesticao de plantas, alm de serem reas de grande produo de
alimentos. No caso da Amrica Latina, citam-se ainda, como fatores que podem explicar
a concentrao de estudos etnopedolgicos, os complexos sistemas agrcolas (manejo
de fertilidade e irrigao em terraos e campos suspensos, sistemas agroflorestais, etc) e
os sistemas de subsistncia que tm uma nfase voltada para horticulturas
(WINKLERPRINS & BARRERA-BASSOLS, 2004).
Para o Brasil, os primeiros estudos de natureza etnopedolgica datam de 1970 e
1980 e foram realizados no norte e nordeste, segundo Alves (2004) e posteriormente,
Alves & Marques (2005). Segundo estes autores, o primeiro a introduzir o termo
etnopedologia no Brasil, foi Posey, a partir de suas pesquisas com os ndios Kayaps no
sul do Par realizadas na dcada de 1980. Seus estudos sobre o manejo da fertilidade
dos solos para o sistema agrcola de cultivo em crculos concntricos foi um marco. Um
aspecto importante foi destacado em um estudo posterior realizado por Posey em
parceria com Hetcht12 no qual destacada a carncia de estudos que abordem o
conhecimento indgena em relao ao solo, base do seu sistema de produo. Outro
pesquisador que realizou estudos etnopedolgicos na dcada de 1970, na Amaznia, foi
Emilio Moran. Seus estudos procuraram comparar o conhecimento de solos dos antigos
caboclos e colonos nos assentamentos agrcolas implantados entre os anos de 1972 e
1974. Mas o trabalho cuja expresso etnopedologia aparece explicitamente no ttulo foi
11 E como essa diversidade lingstica encontra-se bastante ameaada (estima-se que o risco de perda da diversidade lingstica 500 vezes maior do que o risco da perda da biodiversidade), os estudos etnopedolgicos se mostram importantes e necessrios.
12 HECHT, S.B. & POSEY, D.A. Preliminary results on soil management techniques of the Kayap Indians. Adv. Econ. Bot., 7:174-188, 1989
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realizado por Bandeira em 1996 com os ndios Pankarar no Raso da Catarina, serto da
Bahia (ALVES, 2004). Mais tarde, no final dos anos de 1990 e incio de 2000, alguns
trabalhos foram realizados tambm no sudeste como os de Cardoso (1993), Cardoso &
Resende (1996), Resende (1996) e Correia (2005).
Entre os benefcios que os estudos etnopedolgicos podem trazer est a criao
de uma linguagem nica para auxiliar na comunicao entre os agricultores e entre estes
e os extensionistas e/ou especialistas, particularmente, em se tratando do manejo da
terra, avaliao e posse dos recursos. Alm disso, a vantagem sobre os estudos formais
que os etnopedolgicos so mais significativos para as pessoas da regio, uma vez
que, resultam da anlise de um conhecimento produzido por eles a partir de sua
interao com a terra. Isto pode facilitar, no s, a avaliao das formas atuais de uso e
os impactos decorrentes, mas a discusso de possveis formas de manejo sustentvel
dos solos. Possibilitam resgatar o conhecimento do agricultor quanto ao significado e
valor dos diferentes tipos de solo em relao ao seu aproveitamento, e isto pode resultar
em valorizao de um saber que nem sempre considerado e podendo se tornar uma
fonte significativa de conhecimento no processo de definio de usos. Pode dar pistas
sobre as caractersticas mais restritivas ao manejo e assim ajudar o especialista a
identificar aquelas intervenes que podem ser feitas com o intuito de aumentar a
produtividade em termos econmicos. Alm disso, ela particularmente, importante para
a estratificao dos diferentes ambientes, o que possibilita a avaliao da qualidade das
terras principalmente em pases carentes de levantamentos detalhados de solo
(KRASILNIKOV & TABOR, 2003).
1.3 Pesquisa-Participante: construindo o dilogo de saberes
Para se obter as informaes dos agricultores sobre o seu conhecimento a
respeito dos solos, necessria a criao de um vnculo entre pesquisador-
pesquisado. Criar um ambiente para que ocorra o dilogo entre um saber produzido a
partir da experincia, como o caso dos agricultores da Galilia e um saber elaborado,
produzido no mbito formal da academia.
Mas para isso necessrio conhecer como os agricultores lidam com a terra, aqui
entendida tanto como substrato quanto do uso que dele se faz. uma pesquisa que para
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alcanar os resultados esperados demanda um plano de trabalho, meios adequados e
confiveis. Em outras palavras de uma boa pesquisa depende um bom mtodo
(PIZZOLATI & ROCHA, 2004).
Um mtodo adequado para que este tipo de pesquisa se desenvolva precisa
considerar que parte do objetivo compreender o fenmeno (uso da terra) segundo a
perspectiva do outro (agricultores). Por isso, a obteno dos dados exige o contato direto
do pesquisador com a realidade estudada. Demanda, portanto, uma participao tanto do
pesquisador quanto dos agricultores. Participao esta entendida como parceria,
interao, compartilhar de conhecimento e experincia entre pesquisador e pesquisado.
Aqui a
(...) relao tradicional de sujeito-objeto entre investigador-educador e os grupos populares deve ser progressivamente convertida em uma relao do tipo sujeito-sujeito, a partir do suposto de que todas as pessoas e todas as culturas so fontes originais de saber. A partir, tambm, da conscincia de que da interao entre os diferentes conhecimentos que uma forma partilhvel de compreenso da realidade social pode ser construda atravs do exerccio de uma pesquisa. O conhecimento cientfico e o popular articulam-se criticamente em um terceiro conhecimento novo e transformador. (BRANDO, 2005, p.261)
Alm da vivncia em campo, as pesquisas qualitativas de natureza
etnopedolgica dispem de tcnicas semelhantes s utilizadas em metodologias
participativas e, portanto em pesquisa-participante como o Diagnstico Rural Participativo
DRP, Diagnstico Rural Participativo de Agroecossistemas - DRPA, mais
especificamente o Diagnstico Ambiental Rural Participativo DARP 13 que iro
possibilitar levantar, registrar e sistematizar tal conhecimento (AMLER et al., 1999;
WERNER, 2001; KRASILNIKOV & TABOR, 2003; COOLS et al., 2003; OUTWATER &
MARTIN, 2003; ALVES, 2004; CORREIA, 2005; BARRERA-BASSOLS et al., 2006).
De acordo com Geifus (2000), as ferramentas participativas entre outras
caractersticas, possibilitam o trabalho direto no campo com as comunidades e os
13 O Diagnstico Ambiental Rural Participativo tem como objetivo analisar o ambiente agrcola. Ele busca atravs de levantamentos diversos compreender a relao do agricultor com o ambiente e com isso, contribuir no planejamento e na mobilizao para aes principalmente as relacionadas ao manejo e uso dos solos. (PETERSEN, 1996)
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agricultores e valorizam o conhecimento dos agricultores uma vez que o processo prev
a aprendizagem com enfoque para o conhecimento, prticas e experincias locais.
Ferramentas participativas
Atravs da aplicao dessas ferramentas, busca-se sempre privilegiar a
visualizao por facilitar o entendimento e a assimilao ou ainda, pelo fato de que em
muitas comunidades existem agricultores com dificuldade para ler e escrever. () por
meio de representaes grficas, se consegue a participao de pessoas com diferentes
nveis e tipos de educao e facilita a sistematizao de conhecimentos e o consenso
(GEIFUS, 2000, p. 12). 14
Alm das tcnicas de visualizao, existem outros trs grupos de ferramentas
participativas, a saber: tcnicas de dinmica de grupo; de entrevista e comunicao oral;
e de observao de campo. Nas pesquisas etnopedolgicas especificamente as
relacionadas ao estudo do manejo das terras so utilizadas ferramentas pertencentes aos
quatro grupos relacionados acima.
Entretanto, nenhuma suficiente por si s para assegurar um processo
participativo. Devem combinar-se de acordo com as necessidades e realidades da
comunidade e das instituies de desenvolvimento (Geifus, 2000, p.12).15
Dentre as oitenta ferramentas apresentadas por Geifus (2000), so propostas
algumas especficas para o estudo da problemtica do manejo dos recursos naturais:
mapas de recursos naturais e uso da terra, caminhada (Travessia), diagrama de bacia,
diagrama/mapa histrico, transecto/mapa histrico, matriz de avaliao de recursos,
mapa de acesso aos recursos naturais, matriz de tomada de deciso, matriz de anlise
de conflitos, classificao local dos solos, levantamento de problemas do uso dos
recursos naturais.
14 (...) por medio de representaciones grficas, se logra la participacin de personas con diferentes grados y tipos de educacin, y se facilita la sistematizacin de conocimientos y el consenso. traduo nossa.
15 Ninguma es suficiente de por si sola para asegurar un proceso participativo. Deben combinarse segn las necesidades y realidades de la comunidad, y de la instituicin de desarrollo. traduo nossa.
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Independente das ferramentas utilizadas importante destacar que elas se
complementam. Entretanto, importante ressaltar que se tratam apenas de propostas,
pois como coloca Pretty et al. (1995), no existe uma receita pronta, definitiva sobre quais
atividades utilizar. Alm da combinao das tcnicas mencionada anteriormente, o
sucesso est relacionado com o grau de envolvimento das pessoas, com a habilidade do
facilitador que conduz o processo e depende do contexto dentro do qual o estudo ser
realizado.
Dentre as tcnicas mais citadas nos estudos etnopedolgicos esto as Entrevistas
Semi Estruturadas, Observao Participante, Linha do Tempo, Travessias, Mapa
Participativo, Listagens, Diagramas de Venn, e Calendrios (AMLER et al., 1999;
WERNER, 2001; COOLS et al, 2003; OUTWATER & MARTIN, 2003).
As entrevistas semi-estruturadas buscam, atravs de dilogos estabelecidos a
partir de um roteiro definido previamente, obter junto aos agricultores informaes
relacionadas ao tipo de solo, uso associado, as prticas de manejo adotadas e principais
problemas. No se trata de um questionrio, mas uma relao de temas orientadores que
iro auxiliar na conduo de um dilogo com o agricultor. medida que a conversa
avanar, novas questes podero surgir. O roteiro , pois, apenas o ponto de partida.
Recomenda-se evitar o uso de perguntas indutivas, uma vez que as mesmas podero
direcionar as respostas. Por exemplo, deve-se evitar questes do tipo: o caf cultivado
nas reas mais acidentadas? E substitu-la por: como o caf plantado nesta
propriedade? Recomenda-se o uso de questes do tipo: o que? Quando? Como? Onde?
A listagem livre foi utilizada por Outwater & Martin (2003) para o levantamento dos
termos usados para identificar os tipos de solo, descrevendo cada tipo em funo das
propriedades que julgam serem as mais importantes.
O mapeamento participativo foi utilizado em vrios estudos (AMLER et al., 1999;
WERNER, 2001; COOLS et al, 2003), que destacam sua utilidade em fornecer um retrato
da distribuio das categorias de uso na paisagem agrcola alm de possibilitar, por um
processo de deciso participativa, a definio de diferentes usos para a rea.
Outwater & Martin (2003) chamam a ateno para o uso cauteloso do mapa
apontando para a sua maior eficincia como ponto de partida para a anlise quando as
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informaes mais generalizadas sobre os usos e os solos so identificadas. O
detalhamento viria em seguida durante a realizao dos transectos, momento em que
possvel uma discusso maior entre os agricultores e os tcnicos.
Os transectos ou Travessias constituem uma outra tcnica freqentemente
empregada nos estudos de carter participativo. Atravs da Travessia possvel obter
informaes relacionadas no s ao tipo de uso associado topografia, como tambm
informaes relacionadas aptido das terras, anlise das prticas utilizadas em