vocação eficaz e evangelismo: uma convocação aos eleitos de deus
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SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO REVERENDO DENOEL NICODEMOS ELLER
BACHAREL EM TEOLOGIA
A VOCAÇÃO EFICAZ E EVANGELISMO:
UMA CONVOCAÇÃO AOS ELEITOS DE DEUS
POR
WELISON RODRIGUES AYRE
2007
Monografia apresentada como
requisito para conclusão de
curso no seminário Teológico
Presbiteriano Reverendo
Denoel Nicodemos Eller para a
obtenção do grau de Bacharel
em Teologia.
2
Agradecimentos ............................................................................................... 6
Introdução ......................................................................................................... 7
CAPÍTULO1: A VOCAÇÃO EFICAZ: DEFINIÇÃO E CONFESSIONALIDADE
........................................................................................................................ .10
1. Definição De Termo .................................................................................... 10
1.1. A Vocação Eficaz Nas Confissões Reformada ..................................... 10
1.2. Fundamentos Teológicos Da Vocação Eficaz ...................................... 12
2. A Queda Do Homem ................................................................................... 13
CAPÍTULO 2: AS CONSEQUÊNCIAS DA QUEDA ........................................ 16
1. O Pelagianismo – A Liberdade Completa Do Pecado ............................. 16
1.1 Entendo O Pensamento De Pelágio ........................................................ 18
2. O Semipelagianismo .................................................................................. 21
2.1. Entendendo O Pensamento Semipelagiano ......................................... 22
3. O Arminianismo .......................................................................................... 28
3.1 Entendendo O Pensamento Arminiano .................................................. 28
4. O Calvinismo .............................................................................................. 32
4.1. Ponto Inicial: Da Criação Do Homem. ................................................... 33
CAPÍTULO 3: O FUNDAMENTO DA VOCAÇÃO EFICAZ – O DECRETO DE
DEUS ............................................................................................................... 38
1. Definição Do Termo ................................................................................... 38
1.2 Nomes Bíblicos Para Os Decretos Divinos ............................................ 39
1.2.1 Termos Do Antigo Testamento ............................................................ 39
3
1.2.2 Termos Do Novo Testamento ............................................................... 40
1.3 A Natureza Dos Decretos Divinos ........................................................... 40
1.4 As Características Do Decreto Divino .................................................... 42
2 A Predestinação .......................................................................................... 43
2.1 Definição Da Doutrina .............................................................................. 43
2.2 Eleição Como Obra De Deus ................................................................... 44
2.3 A Eleição É Fundamentada Em Cristo.................................................... 46
2.4 A Eleição É Garantia De Salvação .......................................................... 47
2.5 O Propósito Da Eleição ............................................................................ 50
3. A Reprovação ............................................................................................. 51
3.1. Definição Da Doutrina Da Reprovação .................................................. 52
3.2. A Justiça Da Reprovação ....................................................................... 54
CAPÍTULO 4: A VOCAÇÃO EFICAZ E A RELAÇÃO ENTRE A ELEIÇÂO
DIVINA E A LIBERDADE HUMANA ............................................................... 56
1 O Ministério Da Igreja A Evangelização .................................................... 57
1.1 Definição De Termo .................................................................................. 57
2 A Pregação Do Evangelho No Novo Testamento ..................................... 59
3 O Antinomismo Da Pregação Do Evangelho – Eleição X Liberdade ...... 60
3.1 Desprezando A Vocação Eficaz E Confiando Em Métodos .................. 65
3.2 O Perigo De Nos Preocuparmos Exclusivamente Com A Soberania De
Divina. ............................................................................................................. 67
4 A Palavra Como Instrumento Do Chamamento Eficaz............................ 69
4.1 O Conteúdo Da Mensagem Evangelística .............................................. 70
4
4.1.1 Mensagem Sobre O Deus Verdadeiro.................................................. 71
4.1.2 Mensagem Sobre O Pecado ................................................................. 72
4.1.3 Uma Mensagem A Cerca De Cristo ...................................................... 73
4.1.4 Convocação Para Se Responder A Cristo Pessoalmente Em
Arrependimento E Fé ..................................................................................... 74
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 76
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 79
5
A antiga verdade que Paulo pregou, que Agostinho pregou,
que Calvino pregou é a verdade que eu também devo pregar. Se não fazê-lo deixaria de ser fiel a minha consciência
e a meu Deus.
6
C.H Spurgeon
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar a Deus, autor da vida que desde a eternidade me tem
amado. Não por méritos meus, mas única e exclusivamente pela sua graça.
Que tendo o poder de chamar para o servi pessoas mais qualificadas, resolveu
pela sua misericórdia escolher a mim. Louvado seja o Senhor.
Louvo a Deus por minha esposa amada, Adriana que durante todo este
tempo de seminário esteve ao meu lado, me incentivando às vezes exortando,
mas acima de tudo sendo providencia de Deus. A agradeço pela compreensão
e amor com que suportou todo este período de estudo. À minha filha Maria
Eduarda, que veio crescendo durante estes anos e por quem todas as coisas
valem apena, presente de Deus para mim.
Louvado seja Deus pela Igreja Presbiteriana do Vale do Jatobá. Primeiro
por ter me enviado ao seminário e por ter me confiado o privilégio de trabalhar
em seu campo. Mas, sobre tudo pelo sustendo financeiro com que me assistiu
durante estes quatro anos. Possibilitando-me a tranqüilidade necessária para
estudar sem as preocupações financeiras tão comuns em nossos dias. A cada
dificuldade esta Igreja esteve presente me tratando com amor e dedicação,
como uma mãe que cuida de seu filho.
Sou grato pela Vida do Rev. Jalon, meu tutor que durante todo este
período sempre me assistiu e me aconselhou. Enquanto vários colegas
reclamavam sobre seus tutores tive o privilégio de ter ao meu lado alguém que
verdadeiramente me ajudou a crescer como pessoa e como cristão.
Quero agradecer de forma especial aos irmãos que me ajudaram na
elaboração deste trabalho. Rev. Domingos Silva, que leu o projeto da
monografia e deu valiosas sugestões sobre o assunto; Rev. Jalon que também
leu o projeto e desde o começo o aprovou. Pelos professores do seminário
Rev. Ulisses Horta Simões e René Stoffel que contribuíram com preciosas
sugestões em conversas sobre este tema.
7
INTRODUÇÃO
Grande ênfase tem sido dada aos métodos evangelísticos nestes últimos
dias. Congressos e mais congressos são organizados prometendo a seus
participantes a fórmula mágica para que a Igreja possa conquistar mais
adeptos e assim crescer quantitativamente. Contudo nesta busca desenfreada
para crescer muitas igrejas tem tirado os olhos dos padrões bíblicos e buscado,
através de suas próprias forças, os meios para alcançar seus últimos objetivos:
o número.
As Igrejas de herança calvinista são caracterizadas pela sua ênfase no
ensino dos decretos de Deus; sobre tudo na doutrina da eleição. O
desembocar mais controverso deste ensino, causado principalmente pela
influência arminiana no evangelicalismo brasileiro, é o que tange seu trato
soteriológico. Se Deus escolhe de antemão aqueles que serão salvos e destina
outros para a perdição eterna, qual é a real necessidade da Igreja evangelizar,
uma vez que os eleitos serão de qualquer forma salvos?
Outra realidade que a igreja enfrenta em sua missão é a do pecado. O
homem em, seu estado de pecado, pode responder positivamente ao convite
do Evangelho? A resposta a esta pergunta é um indiscutível, não! Mas se não,
qual é a razão da comissão dada pelo próprio Cristo, para que a sua igreja vá
ao mundo e pregue o evangelho a toda Criatura, uma vez que este homem não
pode responder positivamente ao evangelho?
De um lado tem-se a realidade do decreto de Deus que de forma mais
específica desemboca na doutrina da eleição e que garante a salvação final de
todos os eleitos. Do outro lado tem-se homens em estado de pecado, caídos e
por isto incapazes de se aproximarem de Deus. Para fazer a união destas duas
realidades, as escrituras declaram que: “aos que (Deus) predestinou, a esses
também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou, e aos que
justificou, a esses também glorificou”. (Rom 8.30)
De forma clara o apóstolo Paulo declara nesta passagem de Romanos,
que existe um chamado feito àqueles que foram predestinados. E uma vez que
8
estes chamados são justificados e por fim glorificados, pressupõe-se
claramente a realidade de que este homem em estado de pecado, pela
atuação de Deus, pode se voltar para o seu criador e por fim ser salvo. A este
chamamento dos eleitos a doutrina reformada chama de vocação eficaz e será
esta a doutrina explorada neste trabalho.
Devido à grande influência do arminianismo em nossas Igrejas e do
acúmulo de tantos métodos de evangelismo a soberania de Deus expressa
pela doutrina da vocação eficaz tem sido eclipsada pela determinação do
homem. A mensagem é um apelo emotivo para que o homem deixe seu estado
de pecado e se converta ao Senhor. O fundamento defendido por várias linhas
teológicas ao longo da história e tão propagada nestes dias é a do livre arbítrio.
Entretanto, o homem deixado em seu estado de pecado é incapaz de se voltar
para o Senhor. Desta forma a única possibilidade de conversão está na
eleição. O presente estudo busca oferecer uma resposta teológica enfatizando
a soberania de Deus de um lado e a responsabilidade da Igreja como
instrumento divino para execução de seus decretos.
O trabalho procurará mostrar o fundamento confessional desta doutrina
e ainda em seu primeiro capítulo a realidade da necessidade de salvação do
homem causada pela queda. Mas, quais foram às conseqüências da queda
para Adão e conseqüentemente a toda a sua geração? Devido a grandes
debates ao longo da história sobre este tema, quais sejam: as conseqüências
da queda para todos os homens; será tratado algumas linhas teológicas sobre
este tema.
No entanto, o trato especificamente deste assunto será feito de uma
forma diferente. Falando a respeito das conseqüências da queda em sua
relação com o livre-arbítrio poderia ser feito um trabalho específico e de muitas
páginas só sobre este tema, levantando personagens históricos e que muito
contribuíram para a controvérsia e também para a elucidação do assunto ao
logo dos tempos. Neste caso, personagens como Agostinho de Hipona,
Erasmo de Hortedã, Lutero e outros necessariamente deveriam ser explorados
e estudados.
Contudo as linhas que serão tratadas no segundo capítulo deste estudo
são as que a igreja de Cristo enfrenta na realidade brasileira. A única exceção
será feito ao pelagianismo que não vê relação do ato de Adão e com seus
9
descendentes. No restante do capítulo será tratada as conseqüências da
queda na teologia arminiana, que é à base das igrejas pentecostais e neo
pentecostais e o semipelagianismo defendido pela Igreja Católica apostólica
romana. Como resposta a estas variáveis doutrinárias será apresenta a visão
Calvinista da queda como fundamento teológico correto.
Sendo o fundamento da vocação eficaz os decretos de Deus, em um
terceiro momento será tratado esta doutrina. Em especial sua ramificação na
predestinação. Que por sua fez trabalha com a eleição e reprovação.
Novamente poderia ser destinado um trabalho específico apenas sobre este
ponto. No entanto, ele será brevemente visto aqui para dar suporte à doutrina
da vocação eficaz. Este capítulo não pretende ser uma análise minuciosa da
doutrina dos decretos nem da predestinação, mas busca apenas apresentar a
realidade da eleição e da reprovação como fator motivador para que a igreja
saia ao mundo pregando o evangelho. E conseqüentemente a eficácia do
chamado de Deus destinado ao eleito.
Por fim em seu capítulo final será trabalhado especificamente a obra
evangelística da Igreja que é o cumprimento de seu ministério no mundo.
Mostrando a pregação do evangelho no Novo Testamento e a relação do
convite do evangelho feito pela Igreja e a liberdade humana em responder
positivamente a este convite. Sendo a vocação eficaz o fundamento para o
ministério da Igreja, será apresenta uma critica a super valorização dos
métodos com fins em si mesmos capazes de converter alguém. Princípio
comum dentro das Igrejas de teologia arminiana, mas que tem entrado nas
fronteiras calvinistas fazendo com que a igreja despreze o método estabelecido
pelo próprio Deus. Por fim será defendida a pregação da palavra como o meio
pelo qual o Espírito santo age na vida dos eleitos, devendo ser desta forma o
método utilizado pela Igreja de Cristo em sua ação no mundo.
10
CAPÍTULO1: A VOCAÇÃO EFICAZ: DEFINIÇÃO E
CONFESSIONALIDADE
Toda a obra evangelística da igreja é edificada sobre a premissa de que
o homem está perdido morto espiritualmente e precisa ser salvo. Pois se o
homem estivesse em uma situação normal para com Deus, seu criador, não
haveria a necessidade de se pregar o evangelho e nem a de anunciar a Cristo
como o Salvador. Aliás, a própria apresentação de um salvador pressupõe a
necessidade de se ser salvo de alguém ou de alguma coisa e mais ainda,
firma-se a convicção de que o homem perdido pode ser salvo. Esta convicção
reformada da possibilidade dos homens ouvirem e aceitarem o evangelho é
baseada na doutrina da vocação eficaz.
1. Definição de Termo
Vocação eficaz é o ato de Deus pai, que fala por meio da proclamação
humana do evangelho conclamando as pessoas para si mesmo de tal maneira
que elas respondam com fé1. Esta vocação está ligada com o poder de Deus
que regenera o pecador trazendo-o da morte espiritual para a vida, habilitando-
o a responder com arrependimento e fé ao convite do evangelho. “Refere-se ao
chamado de Deus que por seu soberano poder e autoridade produz seu
designado e ordenado efeito.” 2
1.1. A vocação Eficaz nas confissões reformada
Na confissão Belga3 a vocação eficaz é declarada em seu artigo 24 nos
seguintes termos:
1 GRUDEM, Wayne. Manual de Teologia Sistemática: Uma introdução aos princípios
da fé cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001. pág. 324
2 SPROUL, R.C. Verdades Essenciais da fé Cristã. São Paulo: Cultura Cristã. 1999.
pág. 60
3 A confissão Belga foi escrita em 1531 por Guido de Brès
11
Cremos que a verdadeira fé, tendo sido acesa no homem pelo ouvir da Palavra de Deus e pela obra do Espírito Santo, regenera e o torna um homem novo. A verdadeira fé o faz levar uma vida nova e o liberta da escravidão.4
A confissão declara que o instrumento utilizado por Deus para despertar
a fé no coração do pecador eleito é a exposição da Palavra de Deus pela
mediação do Espírito Santo. Este desperta da fé no coração do homem o
liberta da escravidão do pecado algo que por si mesmo o homem não pode
fazer.
No início do século 17 com o despertar da controvérsia arminiana na
igreja um sínodo da igreja protestante reunido na cidade de DORT da Holanda
se pronuncia contra o partido arminiano declarando de uma forma um pouco
mais detalhada a doutrina da vocação eficaz:
Mas quando Deus leva a efeito o Seu beneplácito nos eleitos, ou produz neles a conversão verdadeira, Ele não só faz com que o Evangelho lhes seja pregado externamente, e ilumina poderosamente as suas mentes mediante o Seu Santo Espírito, para que eles possam compreender e discernir acertadamente as coisas do Espírito de Deus5
Assim, declara a confissão que somente iluminado pelo Espírito Santo o
homem consegue compreender as coisas de Deus, sendo que antes da ação
divina nada lhe era possível fazer para compreender e discernir as coisas do
Espírito de Deus. Mais detalhadamente esta confissão da Igreja revela que
esta ação de Deus é dirigida somente aos eleitos, por meio da pregação
externa do evangelho e pela instrumentalidade do Espírito Santo.
Contudo a forma mais completa de exposição da doutrina da Vocação
eficaz se encontra na confissão de Fé de Westminster do fim do século 17 que
declara:
Todos aqueles a quem Deus predestinou para a vida, e só esses, é ele servido chamar eficazmente pela sua palavra e pelo seu Espírito, no tempo por ele determinado e aceito, tirando-os daquele estado de pecado e morte em que estão por natureza para a graça e salvação, em Jesus Cristo. Isso ele faz iluminando o entendimento deles, espiritual e salvificamente, a fim de
4 ______________Confissão de Fé e Catecismo de Heidelberg. São Paulo: Cultura
Cristã. 1999. Artigo XXIV pág. 22
5 ______________Cânones de DORT. São Paulo: Cultura Cristã. Capítulo 3 e 4 artigo
11
12
compreenderem as coisas de Deus, tirando-lhes o coração de pedra e dando-lhes um coração de carne, renovando as suas vontades e determinando-as, pela sua onipotência, para aquilo que é bom, e atraindo-os eficazmente a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para isso dispostos pela sua graça.6
Nota-se no texto da confissão a exposição da condição de escravidão do
homem em seu estado de pecado, do qual não pode se libertar por suas
próprias forças. Que existe uma vocação que abrange todos os eleitos e
somente eles. O agente desta vocação é o Espírito Santo que atua no coração
deste eleito pela pregação do evangelho que é o instrumento divino. Operando
uma mudança radical no coração do pecador fazendo-lhe se voltar
voluntariamente para Deus de forma que ele decide por si mesmo a buscá-lo e
aceitá-lo em sua vida
1.2. Fundamentos teológicos da vocação eficaz
Todo o trato da vocação eficaz se fundamenta como se pode facilmente
se verificar nos relatos das confissões, sobre três princípios teológicos. O
primeiro o da Predestinação, pois o texto afirma que “a quem Deus predestinou
para a vida”, o segundo a incapacidade do homem em abandonar por si
mesmo o seu estado de pecado e se voltar para Deus; e em terceiro lugar a
ação evangelizadora da igreja levando a palavra do evangelho aos homens,
sendo desta forma instrumento de Deus no mundo, para que através do
ministério da Igreja o Espírito Santo atue despertando os eleitos. Desta feita
para que se compreenda a vocação eficaz se faz necessário compreender
estas três áreas, ou seja, a queda do homem que resulta no seu afastamento
de Deus; a eleição divina que é a garantia de Salvação e o trabalho da Igreja
no mundo sendo o elo como propagadora da palavra do evangelho, deste Deus
soberano a este homem caído.
6 ______________ A Confissão de Fé De Westminster. 17ª Edição. São Paulo: Cultura
Cristã, 2003 .Cap. 10 sessão 1 pág. 92
13
2. A Queda Do Homem
O homem é o ápice da criação, ou como alguns observam a coroa da
criação divina. O homem é a mais nobre e excelente das obras de Deus.7 Este
homem fora criado a imagem e semelhança de Deus, ou seja, “ícones de Deus,
criaturas feitas com a capacidade única de espelhar e refletir o caráter de
Deus.” 8 Em seu estado original, sem pecado, o homem desempenhava ofícios
específicos e absolutamente distintivos do restante da criação. Sendo
representantes divinos na ordem criada se portavam como profeta, sacerdote e
rei de toda a terra.
O ofício profético estava presente, como ficou evidente quando Adão falou em nome do Soberano Criador: ele deu nome aos animais (Gn 2.20) e à sua mulher (v.23)... O ofício sacerdotal se manifesta no ato de a humanidade, como parte representativa da criação falar para o cosmo e apresentá-la a Deus à medida que se desdobrava e, conseguintemente, expressava a glória do seu Criador...9
Neste ato criativo de Deus o homem foi dotado com a capacidade de
fazer o bem ou de fazer o mal.
Assim, pois Deus adornou a alma do homem com o entendimento, para que distinguisse entre o bem e o mal, o justo e o injusto, e iluminado com a luz da razão enxergasse o que devia seguir... Estes são os excelentes dotes com que o homem em seu estado original esteve adornado; razão, entendimento, prudência e juízo, não somente para dirigir convenientemente na vida presente, mas também para chegar até Deus e a felicidade perfeita.10
Adão era completamente distinto de todos os seus descendentes, tendo
condições de escolher entre o bem e o mal. È importante salientar que este
livre arbítrio, do qual o homem é dotado11 é algo bom vindo da parte de Deus.
7 CALVINO, João, institución de La religión Cristiana. 5ª Edição. Barcelona: Felire. 1999
p.113
8 SPROUL, R. C. Verdades Essenciais Da Fé Cristã. 2ª impressão. São Paulo: Cultura
Cristã. 2001 p 28 – Imagem e semelhança acentuam uma dimensão de identidade. Como Deus
é pessoal, assim é a humanidade. (Van Groninger – Revelação messiânica – pág. 97)
9 GRONINGEN, Gerard Van. Revelação Messiânica no Antigo Testamento. 2ª Edição.
São Paulo: Cultura Cristã. 2003 pág. 101
10 CALVINO op.cit. livro 1. cap.15 § 8 pág. 122, 123
11 Ibid. livro 1. cap.15 § 8 p 123 “Quando o homem desfrutava de sua integridade
possuía o livre arbítrio, com o qual, se quisesse, poderia alcançar a vida eterna”
14
Pelo menos esta é conclusão de Agostinho de Hipona em quem Calvino se
apóia. O livre arbítrio vem de Deus e por isso é bom e é uma das
características de um ser verdadeiramente racional.12
Embora Adão tenha recebido o Livre arbítrio ele não foi dotado com o
dom da perseverança13, ou seja, ele possuía todas as possibilidades de resistir
ao pecado, assim como todas as possibilidades de cair. Quanto a isto é
importante as palavras de Calvino:
Em relação à causa de não ter sido dado o dom da perseverança, é algo que permanece oculto em seu (de Deus) secreto conselho; e nosso dever é saber com sobriedade. Deus havia concedido a Adão que, se quisesse, poderia, mas não lhe concedeu o querer com que pudesse, pois, a este querer se seguiria a perseverança.14
Sem esta perseverança, embora possuindo a capacidade de resistir, Adão
sucumbe e desobedece a Deus. (Gn 3.6).
As conseqüências do pecado, quais sejam a morte física, espiritual e
eterna além das maldições ordenadas por Deus logo após a queda, não é algo
restrito a Adão. Nas palavras do Apóstolo Paulo estas conseqüências são
partilhadas por todos os homens. Nos diz ele: “Portanto, assim como por um só
homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte assim a morte
passou a todos os homens, por que todos pecaram.” (Rm 5.12) Desta forma
pelo pecado de Adão no Éden toda a sua geração ordinária partilha de seu
reino.
Mas como os descendentes de Adão podem ser culpados pelo seu
pecado? Em que grau a raça humana partilha, hoje, da natureza corrompida de
seus primeiros pais? Será que o homem continua livre podendo escolher e
efetuar o bem? O homem hoje, assim como Adão antes da queda, possui
verdadeiramente um livre arbítrio? Dando respostas a estas perguntas algumas
escolas se levantaram na história. E baseadas nestas repostas formularam
toda a sua ação missionária e evangelística fazendo com que a resposta do
12
GONZALES, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão: De Agostinho às
vésperas da reforma. Volume 2. São Paulo: Cultura Cristã. 2004 p.42 De acordo com
Gonzáles Agostinho considerava o livre arbítrio como um bem intermediário, pois ele poderia
fazer tanto o bem como o mal.
13 CALVINO op.cit. livro 1. cap.15 § 8 p. 123
14 Ibid. livro 1. cap.15 § 8 p.124
15
homem ao evangelho se centraliza-se ora na vontade do homem ora na
soberania divina. Mas assim como o diagnóstico errado da enfermidade faz
com que o enfermo tome o remédio errado ficando ainda mais doente; uma
visão errada das conseqüências da queda fará com que a Igreja apresente o
evangelho de uma forma errada e prejudicial e desonrosa ao nome de Deus.
16
CAPÍTULO 2: AS CONSEQUÊNCIAS DA QUEDA
A Bíblia declara a realidade da queda do homem no Éden. Assim, o
homem tendo sido criado por Deus e colocado no jardim para, ali manter
comunhão intima com seu criador se vê agora expulso do paraíso por causa da
desobediência.
Que Adão desobedeceu a Deus todas as linhas teológicas concordam.
Mas, no que tange a como este ato de Adão afetou o restante da humanidade
e como ele se relaciona com a capacidade do homem em responder ao
evangelho, as diversas linhas se distanciam consideravelmente.
Um dos fundamentos sobre os quais a vocação eficaz se edifica é sobre
a realidade da queda e a necessidade que o homem tem de ser salvo. No
entanto a missão evangelística da igreja será consideravelmente afetada se as
conseqüências da queda não forem corretamente entendidas.
1. O Pelagianismo – A liberdade completa do pecado
Pelágio foi um monge britânico nascido possivelmente na Irlanda e que
estava em Roma por volta do ano 400 d.C15. Ele era um moralista sincero que
convocava os homens a serem cumpridores dos mandamentos divinos. Para
ele “Deus não havia ordenado nada impossível. Que o homem possuía o poder
de fazer o bem se assim o desejasse e que a fraqueza da carne era apenas um
pretexto.”16 Foi exatamente por este apelo ao moralismo da sociedade que
Pelágio se levantou contra Agostinho de Hipona.
O ponto inicial de toda controvérsia se dá por meio de uma oração
escrita de Agostinho, que dizia: “Dar o que tu ordenas, e ordenar o que tu
queres.”17
15
WRIGHT, Mc Gregor; A Soberania Banida: Redenção para a cultura pós-moderna.
São Paulo: Cultura Cristã. 1998. pág.22
16 SPROUL, R. C; Sola Gratia: A controvérsia sobre o livre-arbítrio na história. São
Paulo: Cultura Cristã. 2001. pág. 29
17 WRINGHT. Op. Cit. pág. 22 - Existem certas variações da mesma frase de
Agostinho como a seguinte: concede o que tu ordenaste, e ordena o que tu desejas ( Sola
Gratia p. 30).
17
Pelágio se tornou temeroso de que a oração de Agostinho pudesse conduzir à imoralidade e lassidão porque ela implicava que mesmo os regenerados não poderiam obedecer a Deus a menos que fossem continuamente capacitados pelos dons da graça divina.18
O ponto nevrálgico para Pelágio é a parte inicial da oração: “Dar o que
me pedes” o homem, dizia ele, não precisa de permissão para cumprir o que
está ordenado. Portanto o que Agostinho esta pedindo era algum tipo de
assistência vinda de Deus que ajudaria o homem a cumprir o que o próprio
Deus havia ordenado. Pelágio levantou a seguinte questão: “A assistência da
graça é necessária para o ser humano obedecer aos comandos de Deus? ou
esses comandos podem ser obedecidos sem esta assistência?” 19
A resposta dada por ele era claramente a que ressaltava a capacidade
da humanidade cumprir por ela mesma, sem a necessidade de auxílio divino,
tudo o que Deus lhes havia ordenado.
A ordem de obedecer implicava habilidade para obedecer. Isso se aplicaria não apenas à lei moral de Deus, mas, também aos comandos inerentes ao Evangelho. Se Deus ordena que as pessoas creiam em Cristo, então elas devem ter o poder de crer em Cristo sem a ajuda da graça. Se Deus ordena que os pecadores se arrependam, eles devem ter habilidade de se inclinarem para obedecer ao comando.20
Para Pelágio a natureza humana não precisa ou não requer o auxílio da
graça divina21 para o cumprimento dos mandamentos e ordenanças divinas.
Mas, apenas o exercício do livre-arbítrio era suficiente para fazer o homem
capaz de obedecer. “por meios do seu próprio esforço, o homem pode alcançar
tudo o que se requer dele na moralidade e na religião.”22
18
Ibid. pág. 22
19 SPROUL; Sola Gratia. Pág.30
20 Ibid. pág. 30
21 GONZALES, Op. Cit. pág. 31 – Gonzáles explica que isto não significa que no
pensamento pelagiano a graça é completamente descartada. Pois Pelágio fazia a distinção
entre três tipos de Graças. 1º Graça original ou graça da criação que é dada para todos. 2º
Graça da revelação ou graça do ensino, que consiste na revelação de Deus mostrando o
caminho que o homem deve seguir. 3º A graça do perdão – esta é a graça que Deus concede
àqueles que pelo seu livre arbítrio se arrependem de seus pecados.
22 SPROUL; Sola Gratia. pág. 31
18
A doutrina do estado original do homem está em uma posição subordinada no sistema de Pelágio, mas a doutrina da liberdade é central; porque em sua visão o estado original coincide substancialmente com o presente, desde que a liberdade é a característica essencial do homem como um ser moral em todo o estágio do seu desenvolvimento.23
1.1. Entendendo o pensamento de Pelágio
Para Pelágio os atributos essenciais de Deus são a sua justiça e a sua
bondade. É o exercício destes atributos que o faz ser Deus. Sendo Deus
absolutamente bom toda a sua criação deriva dele a sua bondade. Assim toda
a criação é boa, sendo uma das características essenciais do homem a
liberdade. Para Pelágio:
Ele (Adão) foi favorecido com razão e vontade livres. Com esta razão ele tinha domínio sobre as criaturas irracionais; com sua vontade livre ele servia a Deus. Liberdade é o supremo bem, a honra e a glória do homem, que não pode ser perdida; é a base única do relacionamento ético do homem para com Deus... O Livre arbítrio é a liberdade de escolha, a habilidade absolutamente igual de, em muitos momentos, fazer o bem ou o mal. A capacidade de fazer o mal depende necessariamente da liberdade, porque nós não desejamos o bem sem a mesma possibilidade de desejar o mal.24
Além desta razão e vontade livres Adão possuía uma santidade natural
recebida de Deus como um dom inerente a sua criação.25
A natureza humana foi criada não apenas boa, mas, incontestavelmente
boa, “inocente, livre das tendências depravadas, e perfeitamente capaz de
obedecer a Deus, como Adão o foi na sua criação.” 26 A liberdade com a qual o
homem foi favorecido é a base para todo o seu desenvolvimento. “uma tabula
rasa sobre a qual o homem pode escrever tudo o que lhe agrada.” 27 Assim o
mal não é algo essencial à natureza caída visto que este mal é uma das
23
__________________The master Christian Library. Version 8. SCHAFF,
Philp;History of the Christian Church. Vol. 3 . pág. 605 em
24 ibid. pág. 605, 606
25 SPROUL, Sola Gratia, pág. 34
26 STRONG, Augustus Hopkins,Teologia Sistemática.São Paulo: Editora Hagnos. 2003.
pág. 209
27 Ibid. pág. 32
19
possibilidades que se apresenta ao homem podendo ele escolher entre fazer o
bem ou fazer o mal. “o homem não é um ser moral subjetivamente auto
determinado, mas bondade e maldade, vida e morte tem sido dado em suas
mãos” 28 Independente de Deus ou de sua graça.
Se a vontade do homem é uma tabula rasa perpétua, então quando uma pessoa peca, a natureza da vontade não passa por uma mudança e nem por uma deformação. Não há uma corrupção inerente no homem. Não há predisposição ou inclinação para o pecado que é em si mesmo, um resultado do pecado.29
Assim sendo a única conseqüência real da queda de Adão é o mau
exemplo30 que ele passou aos seus descendentes que não significa corrupção
da raça. O ato de Adão no éden feriu somente a ele e de modo algum os seus
descendentes31. A essência do homem é boa, pois partilha do ato criativo de
Deus que é bom. A natureza não pode ser mudada em sua essência. Assim,
quando o homem peca o que muda é o seu comportamento e não a sua
essência.32 O mal é mera possibilidade que pode ser resistido pelo exercício do
livre arbítrio, pois “o pecado é sempre um ato e nunca uma natureza.”33
Quando o ser humano comete um erro, sua natureza não é afetada; mais tarde, é capaz de fazer o que é certo tanto quanto o era antes de cometer o erro. Como uma porta de vaivém, que se abre para dentro ou para fora, o homem sempre volta à posição neutra.34
Desta forma conclui-se do pensamento de Pelágio a possibilidade, ou
até mesmo a realidade de homens sem pecados. “Os homens podem ser
salvos pela lei como pelo evangelho; e, na verdade, alguns obedeceram a
Deus de um modo perfeito e assim foram salvos.”35
28
SCHAF, op. cit. pág. 606
29 SPROUL, Sola Gratia, pág.33
30 HOEKEMA, Anthony Criados a Imagem de Deus. São Paulo: Cultura Cristã. 1999.
pág. 174
31 STRANG. Op. cit. pág. 209
32 SPROUL, Sola Gratia . pág. 33
33 Ibid. pág. 33
34 HOEKEMA, Op. Cit. pág. 174
35 STRONG. Op. Cit. pág. 209
20
Explicando o pecado de Adão Pelágio ressalta alguns aspectos
interessantes. Adão pecou por vontade própria sem ser coagindo por qualquer
ser, incluindo Deus. Este pecado não resultou na corrupção de sua natureza e
não teve como causa a morte física, pois Adão, segundo Pelágio teria sido
criado mortal, ou seja, ele morreria independente de ter pecado, pois a morte
física seria apenas uma lei original da natureza.36 Mas resultou em sua morte
espiritual “que não era a perda da habilidade moral ou uma corrupção inerente,
mas a condenação da alma por causa do pecado.” 37
A descendência de Adão não herdou as conseqüências de seus atos.
Eles continuaram morrendo visto terem sido também criados mortais e não
herdaram a morte espiritual, mas se afastaram de Deus por pecados
particulares cometidos. Ao explicar o texto de Romanos 5.12 onde Paulo diz
que a morte entrou no mundo pelo pecado de Adão e esta morte passou a
todos os homens, Pelágio comenta: “A morte passou a todos os homens,
porque todos pecaram, significa: todos incorreram na morte eterna porque
pecaram seguindo o exemplo de Adão.”38
As diferenças entre Adão e seus descendentes na visão de Pelágio é
apenas as do local e início da vida. Adão foi criando Adulto e já desenvolvido
em sabedoria enquanto seus filhos nasceram crianças e precisaram crescer no
conhecido. Enquanto Adão foi criado em um paraíso longe do mal, seus
descendentes nascem em um mundo influenciado pelo mal. Mas ambos, Adão
e seus descendentes, possuem em comum a natureza sem pecado.39 Embora
a descendência seja mais forte que o próprio Adão visto que os descendentes
cumprem durante a vida diversos mandamentos enquanto Adão não cumpriu
nenhum.40 Assim a humanidade não possui a corrupção e a culpa pelo pecado
de Adão, mas somente seus próprios pecados e não podem ser condenados
pelo pecado de seu primeiro pai.
Pelágio considerava a doutrina do pecado transmitido e a do pecado original como uma doutrina blasfema arraigada no maniqueísmo. Pelágio insistia que seria injustiça de Deus
36
Ibid. pág 209
37 SPROUL, Sola Gratia. pág 34
38 STRONG. Op. Cit. pág 209
39 SPROUL, Sola Gratia. pág 35
40 STRONG. Pág 210
21
transmitir ou imputar o pecado de um homem a outros... O pecado original envolveria uma mudança na natureza constituinte do homem de boa para má. O homem se tornaria naturalmente mau. Se o homem fosse mau por natureza, tanto antes quanto depois do pecado de Adão, então Deus seria considerado o autor do mal.41
O sistema pelagiano, embora tenha conquistado alguns seguidores não
prevaleceu na igreja tendo sido condenado pelos concílios de Cartago em 418
d.C e pelo concílio de Éfeso em 431 d.C. Neste sistema não há a necessidade
de uma vocação eficaz, visto que cabe ao homem deixar o mau exemplo de
Adão e seguir voluntariamente a Deus deixando até mesmo de cometer
pecados neste mundo vivendo de uma forma santa.
Entretanto a possibilidade de existência de pessoas sem pecado deveria
significar a possibilidade de sociedades sem pecados, mas o que se percebe
mundo a fora é a corrupção enraizada no coração dos homens os afastando
cada fez mais de Deus.
Uma derivação do sistema pelagiano reconhece o pecado original, mas
também leva o pensamento para longe da realidade bíblica é o que será visto a
seguir.
2. O Semipelagianismo
Embora o pelagianismo tenha sido condenado pela igreja, à doutrina
expressa por Agostinho não foi de todo aceita tendo sido alvo de grande
controvérsia. A principal questão da controvérsia diz respeito à graça e a
predestinação. Os oponentes de Agostinho nesta questão:
Têm sido tradicionalmente chamados de semi-pelagianos, embora tal nome não seja totalmente justificado. De fato, os assim chamados semi-pelagianos eram, na verdade, semi-agostinianos. Que rejeitavam as doutrinas de Pelágio e admiravam e respeitavam Agostinho, embora não estivessem dispostos a seguir o bispo de Hipona até as últimas conseqüências de sua teologia.42
A oposição ao pensamento de Agostinho surgiu primeiramente na áfrica
do Norte. Seus oponentes eram contra a “visão de que o homem caído é
41
Ibíd. pág. 34
42 GONZALES. Op. Cit pág 56
22
moralmente incapaz de se inclinar à graça de Deus.”43 Antes de se iniciar a
discussão da visão semi-pelagiana é importante salientar que nas respostas
dadas tanto por parte dos defensores de Agostinho quanto dos proponentes
semipelagianistas a visão de que o assunto proposto se tratava de questões
ligadas à religião cristã e interpretação dada ao princípio das escrituras. O
mesmo não acontecia para com os pelagianos, visto que “essencialmente,
tanto os agostinianos quanto os semi-pelagianos tendem a considerar o
pelagianismo como uma heresia tão séria a ponto de chamá-la de não cristã”44.
O oponente histórico mais destacado das fronteiras semipelagianas foi
sem dúvida João Cassiano. Um monge que se estabelecera nas regiões de
Marselha na França, que supostamente foi um dos discípulos de João
Crisóstomo.45 Ele é tão identificado com o semipelagianismo que este, algumas
vezes, é chamado de Cassianismo.46 A intenção de Cassiano não era a de dar
ao homem um lugar de destaque na soteriologia cristã, mas o de reconhecer a
responsabilidade moral do homem frente ao evangelho e a graça de Deus que
é oferecida a todo o mundo.
2.1. Entendendo o pensamento semipelagiano
Seus defensores defendiam que os ensinos de Agostinho eram novos e
um afastamento do ensino dos pais da igreja. Seus argumentos eram: Sendo
as escrituras a regra de fé a Igreja, ela deve ser guiada por ela. Mas sendo
difícil a sua interpretação Deus levantou a tradição da Igreja para guiar o seu
povo pelo caminho certo da interpretação.47 “O senhor deu a tradição como um
meio de determinar em que se deve acreditar.” 48 Não sendo, portanto
43
SPROUL, Sola Gratia pág. 72
44 Ibíd. pág 72
45 GONZALES, Op. Cit. pág. 57
46 SPROUL, Sola Gratia Pág. 72
47 Note-se aqui o princípio hermenêutico do Catolicismo romano, onde a igreja
interpreta as escrituras para os fiéis. Assim é o clero que determina o caminho e não o texto
bíblico.
48 GONZALES, Op. Cit. Pág., 58
23
encontrado o ensino da predestinação de Agostinho na tradição da Igreja ele
deve ser rejeitado como uma inovação que não tem lugar na Igreja.49
O ensino da predestinação tornava desnecessário o ofício da pregação
como instrumento para a salvação um vez que os salvos serão salvos. No
entanto o homem é responsável em se aproximar de Deus. E é exatamente
neste ponto que o agostinianismo se distancia radicalmente do
semipelagianismo. Dizem eles que o primeiro passo da fé depende da
liberdade humana.50
Embora a Graça de Deus seja necessária para a salvação e assista a vontade humana no fazer o bem, é o homem, não Deus, quem deve desejar o que é bom. A graça é dada afim de que aquele que começou a desejar seja assistido, não para dar o poder de desejar.51
Por conseguinte Deus deseja a salvação de todos os homens
propiciando assim por meio do sacrifício vicário e expiatório de Cristo52 a
propiciação pelos pecados; disponível a todos os homens53 indistintamente. De
fato Deus predestinou àqueles que seriam salvos, mas esta predestinação se
baseia na presciência divina. Ou seja, aqueles a quem Deus sabia que o
aceitariam ele destinou para a salvação. A conclusão lógica deste raciocínio é
o de que não existe um número determinado e restrito para os salvos, pois
Deus deseja que todos os homens sejam salvos. “a assim chamada
predestinação é nada mais do que o julgamento de Deus baseado no pré-
conhecimento divino do que cada um fará com a liberdade”.54
Diferentemente de Pelágio o semipelagianismo reconhece a
universalidade do pecado e a introdução deste pecado por meio da queda de
Adão. Mas as conseqüências da queda não foram ruína completa, ou a
depravação total do gênero humano. Estas conseqüências, segundo o
semipelagianismo foi uma doença hereditária. O homem não está morto em
pecado, mas apenas ferido55. O livre-arbítrio de Adão foi infectado pela queda,
49 Ibid. pág. 58
50 Ibid pág. 59
51 SPROUL, Sola Gratia. pág 73
52 Ibid. pág. 75
53 GONZALES. Op. Cit. pág. 59
54 Ibid. pág. 59
55 SPROUL. Sola Gratia pág. 76
24
e algo ali aconteceu tirando-lhe a pureza original, não ao ponto de haver uma
perda total deste livre-arbítrio, mas apenas uma debilidade, sendo que a
vontade do homem não foi completamente destruída e nem é moralmente
impotente de forma completa. A liberdade do homem não foi aniquilada na
queda56.
Assim sendo o homem pós queda precisa da graça de Deus para a
justiça, mas esta graça é resistível, pois o homem pode e deve cooperar com
ela. Neste ponto pode-se concluir do pensamento semipelagiano que o homem
morto em seus delitos e pecados uma vez alcançado pela graça de Deus tem o
poder e o direito de escolher permanecer em seu estado de pecado rejeitando
desta forma a Deus.
A diferença entre Agostinho e Cassiano é a diferença entre monergismo e sinergismo no começo da salvação... O semipelagianismo é com relação ao passo inicial do pecador em direção à salvação decididamente sinergístico.57
O homem deve contribuir com a sua vontade débil se voltando para Deus e
para a sua graça que, gratuitamente, é oferecida a todos os homens.
Aqui vale fazer uma breve distinção entre o semipelagianismo e o
arminianismo visto que os dois sistemas são muito parecidos. Mas qual seria a
diferença entre eles. Para o semipelagianista o homem possui uma capacidade
volitiva inerente a ele e que não foi perdida na queda, possibilitando que ele,
sem qualquer ajuda de Deus possa responder ao evangelho e por fim se
salvar. Enquanto que o arminianismo defende a idéia de que em estado de
pecado só pode ser liberto deste estado pela graça de Deus. o homem não
possui uma capacidade volitiva que o capacite a sair de seu estado de pecado,
mas possui a capacidade de negar o convite do evangelho.58
Historicamente a controvérsia semipelagiana teve seu fim no concílio de
Orange em 529 d.C59 não obstante tenha havido ainda por muito tempo o
desenvolvimento deste movimento. O concílio de Orange, embora condenando
o pelagianismo e algumas posições semipelagianas não fez mais do que
56
Ibíd. pág. 76
57 SPROUL. Sola Gratia. pág. 75
58 HOEKEMA, Anthony. Salvos pela graça: a doutrina bíblica da salvação. São Paulo:
Cultura Cristã. 1997. pág. 87
59 GONZALES. Op. Cit. pág 60
25
adotar um agostinianismo moderado. As doutrinas da predestinação e da graça
irresistível de Agostinho foram omitidas dos pronunciamentos do concílio e a
igreja tentou adotar uma via média entre a posição de Agostinho e Cassiano,
ainda que com maior pendência para Agostinho.60Os cânones deste concílio
foram desconhecidos da grande maioria durante grande período da idade
média, embora fosse o posicionamento oficial da igreja frente às posições
semipelagianas.
Séculos mais tarde, após a reforma protestante do século 16 a Igreja
Católica Apostólica Romana61 inicia uma contra reforma contra o movimento
reformista liderado por Lutero tendo como pedra de fundamento o concílio de
Trento. Este concílio se reuniu na cidade de Trento entre os anos de 1545 a
1563 e é considerado o concílio que marca o nascimento da igreja católica
moderna.62
As questões mais importantes deste concílio são as que tratam a
respeito da justificação, considerado o coração do concílio, que constou de 16
capítulos e 33 cânones. Os três primeiro Cânones claramente são uma
afirmação da posição da igreja contra o pelagianismo ao afirmar a
incapacidade do homem caído alcançar a justificação, por isso este homem
tem a necessidade de Cristo para que àqueles a quem ele (Cristo) comunique
os seus méritos possam ser justificados.63 No entanto nota-se a presença da
concepção semipelagiana nos cânones 4 e 5. O cânone 4 diz:
Se alguém disser que o livre-arbítrio do homem (quando) movido e despertado por Deus; por consentimento ao chamado e ação de Deus, não coopera de forma alguma com respeito ao inclinar-se e preparar-se para obter a graça da justificação, e que ele não pode recusar seu consentimento se o desejar, mas que, como algo inanimado nada faz e é meramente passivo, que seja anátema.64
A grande questão é saber até que ponto o homem morto em seus delitos
e pecados pode contribuir na aceitação, pois o texto diz que o homem coopera
60
SPROUL. Sola Gratia. pág. 79
61 Doravante será identificada pela sigla ICAR.
62 GONZALES, Justo L. Uma história ilustrada do Cristianismo volume 6: A era dos
reformadores. São Paulo: Vida Nova, Reimpressão 2005. pág. 199, 200
63 GONZALES, Justo, L. Uma História do Pensamento Cristão: Da Reforma Protestante
ao século 20. Volume 3. . São Paulo: Cultura Cristã. 2004. pág. 244
64 SPROUL, Sola Gratia. Pág. 80
26
na recepção da graça aceitando-a ou rejeitando-a. A teologia agostiniana que
supostamente era o fundamento da igreja desde o concílio de Orange,
responde a esta pergunta concordando com a primeira parte do cânone onde
se diz que somente depois de movido ou despertado por Deus o homem pode
se voltar para o seu criador. No entanto há uma negação clara do pensamento
de Agostinho no fim da passagem onde se afirma que o homem pode rejeitar a
graça de Deus que lhe é oferecida; e isto é semipelagianismo. Visto que a
teologia agostiniana afirma que o homem alcançado e despertado pela graça
de Deus não rejeita esta graça, mas persevera nela até o fim. Todavia a igreja
assume a posição de liberdade de escolha do homem mesmo em estado de
pecado.
A posição semipelagiana da ICAR fica de forma ainda mais evidente na
conclusão do 5º Cânone depois de afirmar que a justificação tem início na
graça precedente de Deus, mas cabe ao homem, por meio de seu livre-arbítrio
aceitá-la ou rejeitá-la.65 O cânone diz o seguinte:
Se alguém disser que após o pecado de Adão, o livre-arbítrio foi perdido e destruído, ou que ele é algo apenas em nome, na verdade um nome sem realidade, uma ficção introduzida na igreja por Satanás, seja anátema.66
Percebe-se claramente a posição semipelagiana durante o século 16 na
ICAR. No entanto não houve uma mudança de posicionamento na teologia
católica pós - concílio, pelo contrário, apenas reafirmações da desta posição.
Vê-se isto no catecismo oficial67 da ICAR e usado para a catequese de seus
fieis.
O catecismo afirma o livre-arbítrio do homem nos seguintes parágrafos:
173068 Deus criou o homem dotado de razão e lhe conferiu dignidade de uma pessoa agraciada com a iniciativa e o domínio de seus atos. "Deus deixou o homem nas mãos de sua própria decisão" (Eclo 15,14), para que pudesse ele mesmo procurar seu Criador e, aderindo livremente a Ele, chegar à plena e feliz
65
GONZALES, Uma História do Pensamento Cristão: Da Reforma Protestante ao
século 20. Pág. . 245
66 SPROUL. Sola Gratia pág. 82
67 Catecismo Consultado no Site: www.catequisar.com.br/tx/materiaispg_cat.htm
68 Os números se referem aos parágrafos. Eles são classificados numericamente
tornando fácil encontrá-los.
27
perfeição. O homem é dotado de razão e por isso é semelhante a Deus: foi criado livre e senhor de seus atos.
1731. A liberdade é o poder, baseado na razão e na vontade, de agir ou não agir, de fazer isto ou aquilo, portanto, de praticar atos deliberados. Pelo livre-arbítrio, cada qual dispõe sobre si mesmo. A liberdade é, no homem, uma força de crescimento e amadurecimento na verdade e na bondade. A liberdade alcança sua perfeição quando está ordenada para Deus, nossa bem-aventurança.
O catecismo continua afirmando que mesmo longe de Deus o homem
pode escolher entre o que é bom e o que é mal.
1732 Enquanto não se tiver fixado definitivamente em seu bem último, que é Deus, a liberdade comporta a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, portanto, de crescer em perfeição ou de definhar e pecar. Ela caracteriza os atos propriamente humanos. Toma-se fonte de louvor ou repreensão, de mérito ou demérito.
Cabe ao homem aceitar por vontade própria ao convite do evangelho
sem a intervenção de Deus em seu coração tirando-lhe da morte para a vida.
160 Para que o ato de fé seja humano, "o homem deve responder a Deus, crendo por livre vontade. Por conseguinte, ninguém deve ser forçado contra sua vontade a abraçar a fé. Pois o ato de fé é por sua natureza voluntária”. "Deus de fato chama os homens para servi-lo em espírito e verdade. Com isso os homens são obrigados em consciência, mas não são forçados... Foi o que se patenteou em grau máximo em Jesus Cristo." Com efeito, Cristo convidou à fé e à conversão, mas de modo algum coagiu. "Deu testemunho da verdade, mas não quis impô-la pela força aos que a ela resistiam. Seu reino... se estende graças ao amor com que Cristo exaltado na cruz, atrai a si os homens."
Esta é a posição da ICAR das conseqüências da queda no homem. O
que historicamente se tem chamado de Semipelagianismo. Percebe-se a
posição contrária a uma vocação eficaz no sistema semipelagiano visto que o
chamado de Deus por meio da pregação e iluminação do Espírito não é
suficiente para trazer o homem do estado de pecado para o estado de graça.
Cabendo a cada indivíduo por quem Cristo morreu, segundo o sistema
semipelagiano, responder por si mesmo à voz de Deus. Neste sistema não
existe uma chamada vocação eficaz, mas sim uma resposta eficaz do pecador
a Deus.
28
Outro sistema, extremamente parecido com o semipelagianismo surge
na história só que agora dentro do circulo reformado e que também ressalta a
liberdade do homem em aceitar ou negar o convite do evangelho.
3. O Arminianismo
O arminianismo deriva seu nome de um teólogo e pastor holandês
chamado Jacó Armínio (1520-1609). Ainda que educado na tradição
reformada, ele se inclinou para o humanismo de Erasmo de Roterdã69
passando a questionar a doutrina da predestinação como ensinado por Calvino
e sustentando a liberdade do homem. Seus seguidores chamados arminianos
ou sectários de Armínio passaram a ensinar suas doutrinas baseadas sobre
tudo na premissa de que o homem precisa cooperar com a graça70 divina antes
que possa ser regenerado.
A teologia arminiana se apresenta de forma muito confusa no que tange
o entendimento da queda do homem e as conseqüências que esta queda
trouxe para a humanidade e do relacionamento do homem caído para com
Deus. Em um primeiro instante a descrição da queda parece se confundir com
os conceitos reformados, mas somente até se compreender que para o
arminiano a queda não impossibilitou o relacionamento do homem com Deus.
3.1. Entendendo o pensamento arminiano
O homem foi criado à imagem e a semelhança de Deus e colocado em
um ambiente ideal recebendo tudo o que lhe era necessário para a o seu
desenvolvimento material, afetivo e espiritual. Neste ambiente o homem
poderia se relacionar harmoniosamente como seu semelhante e manter
comunhão com o seu criador. O homem criado a imagem de Deus recebeu
inteligência, emoção e vontade. E desta maneira era um agente moral livre e,
portanto tinha a capacidade de escolha. No entanto eles não eram
69
SPENCER, Duane Edward. Tulip: Os cinco Pontos do Calvinismo à luz das
Escrituras. 2ª Edição. São Paulo: Edições Parakletos. 2000 pág. 11
70 HOEKEMA, Criados a Imagem de Deus. Pág. 87
29
completamente santos. Duffield e Cleavan (teólogos arminianos) se expressam
desta maneira:
Nossos primeiros pais possuíam naturezas santas, mas não tinham um caráter santo. Natureza santa é resultado da criação, o caráter santo é o resultado de um teste em que se faz a escolha do bem quando seria possível decidir-se pelo mal.71
No entanto, seduzidos pelo diabo, Adão e Eva desobedeceram a Deus e
comeram do fruto que lhes havia sido proibido comer. Entrava desta forma o
pecado no mundo. “O resultado do pecado de Adão foi vergonha, culpa,
separação e morte não só para ele mesmo, mas para toda a raça humana.”72
Pelo ato de desobediência os primeiros pais entraram em um estado de culpa,
ou seja, a responsabilidade legal pelo erro praticado aos olhos de Deus, o que
incorre em penalidade.73 Perderam a Inocência original, tiveram a imagem de
Deus distorcida e se tornaram escravos do pecado.74
A essência do pecado, portanto, é optar pela satisfação do próprio “eu”
em lugar do original e mais elevado objetivo na vida – buscar a Deus e a sua
Justiça.75 Agora a partir de Adão todo gênero humano foi inteiramente infectado
pelo pecado. Sendo Adão o cabeça representativo da raça humana o seu ato
traz conseqüências a toda a sua posteridade. O homem passa a receber a
natureza genérica de Adão que foi corrompida com base na aliança adâmica.76
Mas o quanto esta queda verdadeiramente afetou a condição humana?
Tiago Armínio falando sobre a conseqüência da queda diz:
Nesse estado, o livre-arbítrio do homem em direção ao verdadeiro bem fica não apenas ferido, mutilado, débil, torto e enfraquecido, mas também prisioneiro, destruído e perdido. E seus poderes não
71
DUFFIEL, Guy P.; CLEAVE, Nathaniel M. Van; Fundamentos da teologia
pentecostal. V.1 São Paulo: EPQ George Russell Faulker. 1991. pág.190
72 Ibid pág. 188
73 HORTON, Stanley M.; MENZIES, William W. Doutrinas Bíblicas: Uma Perspectiva
Pentecostal. Rio De Janeiro: CPAD. 1993. pág. 93
74 Idem. pág. 93
75 Idem. pág. 94
76 HORTON, Stanley M. Teologia sistemática. 4ª Edição. Rio De Janeiro: CPAD 1997
pág. 275, 276
30
são apenas debilitados e inúteis a não ser que sejam assistidos pela graça divina...77
Os teólogos arminianos sustentam a posição de Armínio
contemporaneamente dizendo que: “Por estar à natureza Humana tão
deteriorada pela queda, pessoa alguma tem a capacidade de fazer o que é
espiritualmente bom sem a ajuda graciosa de Deus...”78
Armínio não apenas afirma a escravidão da vontade, mas insiste em que o homem natural, estando morto no pecado, existe num estado de inabilidade moral ou impotência... O único remédio para a condição caída do homem é a operação graciosa do Espírito de Deus. A vontade do homem não é livre para fazer qualquer bem a não ser que seja feita livre ou libertada pelo Filho de Deus mediante o Espírito de Deus.79
Esta graça de Deus é chamada pelos arminianos de graça preventiva80
e é oferecida a todos os homens. É exatamente aqui o ponto de afastamento
entre o calvinismo e o arminianismo. Enquanto a teologia calvinista sustenta a
irresistibilidade da graça de Deus, ou seja, aqueles a quem Deus dispensa a
sua graça salvadora não podem deixar de vir a Cristo, mas são vencidos em
sua aversão a Deus e por fim são salvos, ou seja, são eficazmente chamados.
A teologia arminiana diz que esta graça dispensada a todos os homens pode
sim ser resistida. Assim se expressa Armínio:
Todas as pessoas não-regeneradas têm liberdade de vontade e uma capacidade para resistir ao Espírito Santo, para rejeitar a oferta da graça de Deus, para desprezar o Evangelho da graça e para não abrir àquele que bate à porta do coração; e essas coisas eles realmente podem fazer sem qualquer diferença entre o eleito e o réprobo.81
77
SPROUL; Sola Gratia pág 137 Percebe-se claramente que a visão de Armínio não
difere da perspectiva reformada calvinista, Sproul salienta que Armínio “insistiu em que a
vontade do homem atingida pela queda estava aprisionada, destruída e perdida. As maneiras
de se expressar de Agostinho, Martinho Lutero ou de João Calvino dificilmente são mais fortes
do que a de Armínio”
78 HORTON, Stanley M. Teologia sistemática. Op. Cit. pág. 269
79 SPROUL; Sola Gratia .pág. 140
80 Idem pág. 142 Graça preventiva: do latim VENIO que significa simplesmente “vir”.
Com o prefixo PRE que significa “antes”, portanto graça preventiva é a graça que vem antes da
salvação.
81 Idem pág. 143
31
A teologia arminiana é extremamente confusa no tocante a pratica do
homem em relação às coisas de Deus. Se por um lado o homem é
espiritualmente morto, fato ensinado e defendido pelos arminianos por outro
lado eles também ensinam que o homem pode voluntariamente e de forma
positiva responder ou não à graça de Deus. Os teólogos arminianos tentam se
defender da acusação de serem semipelagianos82, entretanto basta uma
análise de sua “ordus Salutis” para se perceber que é o homem que possui a
total responsabilidade na salvação.
O homem recebe a natureza genérica83 de Adão que foi corrompida pelo
pecado, sem, contudo ser ele mesmo corrompido nem culpado por causa desta
natureza genérica. Mas esta natureza genérica o impede de agradar a Deus.84
embora não o torne culpado diante dele. Para que o que homem seja
condenado como pecador é necessário que ele peque por si mesmo. Ele só se
torna pecador com a sua participação responsável. “A tentação bem-sucedida
requer a colaboração do indivíduo tentado. Ele deve ceder como Adão e Eva
cederam.”85 Embora ele possua uma força positiva para o mal86, mas que não
necessariamente desembocará em pecado.
Contudo “não é necessário ao homem aprender a pecar. O princípio do
pecado está em sua própria natureza desde os primeiro dias de vida.” Esta
natureza herdada o levará ao pecado e, por conseguinte culpado diante de
Deus.
É por esta convicção a respeito do pecado que os arminianos sustentam
que as crianças, muito embora possuindo a natureza genérica de Adão, não
são condenadas a perdição eterna quando morrem na infância. Elas estariam
debaixo da ira de Deus somente após atingirem a “idade da razão” e terem
pessoal e responsavelmente cometido algum pecado.
82
Os semipelagianos sustentam que: Embora a humanidade tenha se enfraquecido
com a natureza de Adão, sobrou livre-arbítrio suficiente para a iniciativa de ter fé em Deus e
então ele corresponderá.
83 Este termo é utilizado pela literatura arminiana sem que seja definida de forma clara.
84 HORTON, Stanley M. Teologia sistemática. Op. Cit pág. 276
85 DUFFIEL e CLEAVE. Op. cit. pág. 209
86 idem . pág 221
32
Assim percebe-se na teologia arminiana a participação direta do homem
em responder ou não a vocação divina. Está no homem, como ser moral
responsável aceitar ou não aceitar, mesmo que iluminado pelo Espírito santo, o
evangelho da Graça. Usando a analogia da ressurreição de Lázaro (Jo 11),
para a teologia arminiana, Lazaro poderia escolher como agente moral
permanecer morto, mesmo tendo sido chamado por Cristo. Neste modelo a
salvação dependendo do homem, mesmo que a graça parta de Deus. Pois
cabe ao homem dizer sim, ou não, neste caso a vocação não é eficaz, mas
condicional a vontade volúvel do homem.
Sendo a vocação condicional a vontade do homem, conclui-se a
completa incerteza da salvação pessoal por parte dos cristãos arminianos que
a qualquer momento podem decidir rejeitar a graça de Deus e voltarem para o
seu estado de pecado. Assim a vocação não é eficaz no seu chamamento e
nem mesmo a graça perseverante no coração arminiano.
Mas o que as escrituras ensinam a respeito da queda e de suas
conseqüências no homem? Respondendo a esta pergunta o sistema Calvinista
claramente é o que faz justiça ao ensino escriturístico. Passemos a ele.
4. O Calvinismo
Calvino assim com Lutero deriva quase que a totalidade de seus ensinos
nos escritos de Agostinho. Esta constatação é feita por qualquer estudante que
já tenha lido o teólogo de Hipona e o tratamento sobre o pecado feito pelo
reformador genebrino. “Na verdade há pouca coisa original, se houver alguma,
na visão de Calvino sobre a vontade ou sobre a predestinação.”87
O ensino calvinista sobre as conseqüências do pecado se inicia na
criação do homem. Calvino procura tratar deste assunto tentando evitar dois
erros. O primeiro o da negligência, que poderia levar os homens a mais
pecados. E o segundo o da atribuição da glória da nossa redenção a outro que
não fosse Deus. Pois uma visão errônea sobre as conseqüências do pecado
levam os homens a se considerarem capazes de se aproximarem de Deus,
acentuando a responsabilidade do homem frente ao chamado do evangelho. E
87
STRONG. Op. Cit pág 134
33
é neste ponto que Calvino se levanta contra o ensino religioso de seus dias,
pois os considerava nada mais que uma tentativa de reconciliar a doutrina das
escrituras com os dogmas da filosofia.
4.1. Ponto inicial: da Criação do homem.
O homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. Que consiste de
perfeitas sabedoria, justiça, virtude, santidade e verdade. Esta imagem atestou
ao homem uma singular generosidade do seu criador. Porque se ligou
fortemente a ele pela participação de todos os bens, para viver eternamente,
desde que perseverassem na integridade que tinha recebido. No ato de sua
criação o homem foi dotado com a capacidade de fazer e escolher o bem em
todas as circunstâncias. Para que se entenda de maneira correta as
conseqüências da queda de Adão é necessário que se tenha por certo que
Adão
Poderia se quisesse permanecer como havia sido criado; e não caiu senão por sua própria vontade. Mas porque sua vontade era flexível, tanto para o bem como para o mal, e não tinha o dom da perseverança, por isto caiu tão facilmente. No entanto teve livre eleição do bem e do mal; e não somente isto, teve também o máximo de retidão de entendimento e de vontade, e todas as suas faculdades orgânicas estavam preparadas para obedecer.88
O mandamento que o homem deveria se submeter era o de não comer
do fruto da árvore da ciência do bem e do mal. Sendo lhe feita à promessa “que
seria imortal enquanto comesse da árvore da vida; e pelo contraio, a terrível
ameaça de que no momento em que comesse da árvore da ciência do bem e
do mal, morreria.”89
Mas homem enganado pelo diabo comete o primeiro pecado, a
desobediência. Sendo assim infiel a Deus deixando de lado a sua palavra. O
homem que havia, apouco sido feito do pó da terra à semelhança de Deus, não
se contenta com isto, mas deseja mais; ser não apenas semelhantes, mas
igual a Deus.90
88
Ibid. Livro 1; Cap.15 § 8 pág. 123
89 Ibid. Livro 2; cap. 1 § 4 pág. 163
90 Ibid. Livro 2; cap. 1 § 4 pág. 164
34
Com o ato de desobediência de Adão a Imagem de Deus no homem foi
manchada e veio sobre ele a ignorância, a fraqueza, a torpeza, a vaidade e a
injustiça culminando na maior das conseqüências do pecado sobre o homem
que foi a morte. Não a dúvida de que Adão ao cair de sua dignidade, pela sua
apostasia se apartou de Deus. No entanto Deus não permitiu que a sua
imagem, com a qual o homem foi criado tenha se manchado por completo e
nem mesmo destruída, “no entanto ela se corrompeu de tal maneira, que não
ficou dela mais que uma horrível deformidade.” 91 A condenação da morte física
que se seguiu ao ato de Adão, embora não de forma imediata, se fez presente
de forma espiritual. A vida espiritual de Adão estava em sua união com o seu
criador, conseqüentemente o apartar-se Dele significou a sua morte espiritual.92
Assim a morte espiritual que é a separação da alma em relação a Deus
constitui-se na perda da sua retidão original, e a depravação de todas as suas
forças “ou em outras palavras, o declínio do seu intelecto, a corrupção dos
seus sentimentos e a escravidão da sua vontade.”93
Mas estas conseqüências não ficaram restritas à pessoa de Adão, mas,
atinge toda a ordem criada tanto o céu como na terra e “se levantaram contra
toda a sua posteridade.”94 Pois Adão não foi apenas o progenitor da raça
humana, mas também a sua raiz, o seu ato atinge toda a sua descendência
que passa a compartilhar da condenação que é imposta sobre ele como
represente e pai da raça. Desta maneira as conseqüências do pecado de Adão
passam a todos os habitantes do mundo, quais sejam a morte física e a morte
espiritual; pois todos procedem de uma raiz contaminada pelo pecado. Assim
“ao pecar Adão arrastou toda a linhagem humana ao mesmo despenhadeiro...
pois com a sua queda infectou a toda a sua descendência.”95
Esta corrupção que passa da semente de Adão a todos os seus
descendentes é chamada pecado original, onde a palavra pecado denota a
depravação da natureza que acompanha toda a humanidade desde o ventre da
mãe. “Todos nós que somos produtos de semente imunda, nascemos
91
Ibid. Livro 1; cap. 15 § 4 pág. 118
92 Ibid. Livro 2; Cap. 1 § 5 pág. 165,166
93 STRONG Op. Cit. pág. 201
94 CALVINO. Op. Cit. Livro 2 Cap. 1 § 6 pág 167
95 Ibid. Livro 2 cap. 1 § 6 pág. 166
35
maculados pela infecção do pecado, e mesmo antes de virmos à luz, estamos
contaminados perante a face de Deus.”96
O breve catecismo de Westminster reflete este conceito da transmissão
do pecado nos seguintes termos: “Visto que o pacto foi feito com Adão não só
para ele, mas também para a sua posteridade todo o gênero humano que dele
procede por geração ordinária, pecou e caiu com ele na sua primeira
transgressão.”97Claramente ressalta Calvino que”o pecado reside na alma.”98
Sobretudo considerando que o pecado mancha ou deforma a imagem de Deus
no homem residindo, de acordo com Calvino, esta imagem de Deus na alma.99
Esta transmissão do pecado dos pais aos filhos faz dos filhos herdeiros
da corrupção e da culpa. Continua Calvino:
Ouvimos que a mancha dos pais se comunica aos filhos de tal maneira, que todos, sem exceção alguma, estão manchados desde o início da existência. Mas não se poderá achar o princípio desta mancha se não ascendermos à fonte e manancial até nosso primeiro pai. Temos, pois, que admitir como certo que Adão no somente tem sido o progenitor da linhagem humana, como tem sido, além disso, sua raiz, e por isto com sua corrupção tem corrompido toda a linhagem humana.100
É importante salientar que é neste ponto que a má compreensão do
calvinismo leva a muitos a se levantarem contra ele. Esta má compreensão diz
que os homens são condenados por Deus pelo pecado de Adão e isto seria
injusto da parte de Deus. Pressupondo que os descendentes de Adão não
poderiam pagar pelo erro de seu pai. Mas não é o caso de Adão ser pecador e
seus descendentes serem pessoas santas e boas que recebem o castigo por
um ato que não praticaram.
Não é a mera possibilidade de pecado, mas a semente de pecado, a
realidade da depravação e a corrupção da natureza que passa dos pais aos
filhos fazendo assim os filhos também pecadores. A semente do pecado passa
a ser do próprio indivíduo fazendo-lhe pecador. Os homens não são culpáveis
96
Ibid. Livro 2 cap. 1 § 5 pág. 166
97 Breve Catecismo de Westminster Resposta a pergunta 16 “Caiu todo o gênero
humano pela primeira transgressão de Adão?”
98 CALVINO, Op. Cit. Livro 2 Cap. 1 § 8 pág 168
99 Ibid. Livro 1 Cap. 15 § 3
100 Ibid. Livro 2; cap. 1 § 6 pág. 166
36
diante de Deus apenas pelo pecado de Adão, embora também o sejam, mas,
pelo pecado que passa a ser dele próprio. Não é o caso de Adão ter se tornado
um pecador e por isso Deus considera seus descendentes pecadores embora
não tenham pecados algum. Pelo contrário, Adão cometeu o primeiro pecado e
por isso se tornou pecador, seus filhos ao nascerem herdaram a semente do
pecado e nasceram pecadores e por isso são condenáveis diante de Deus.101
O pecado levou o homem para longe de Deus e das coisas de Deus. E
sem a possibilidade de retornar por livre vontade a presença do seu criador. A
conseqüência da queda na vida humana é uma alienação de todo bem e
bondade, além da incapacidade de se libertar de sua situação pecaminosa. A
natureza humana não é apenas vazia e destituída de todo o bem, mas também
é solo fértil e apto em toda espécie de mal.102 “Todas as partes constitutivas do
homem, do entendimento à vontade, da alma à carne, estão contaminadas e
repletas dessa concupiscência, ou, para resumir o ponto, o homem, em si
mesmo, não é outra coisa, senão corrupção.” 103
Esta corrupção do gênero humano não é parte substancial de sua
natureza, mas uma “qualidade” vinda sobre ele estando, a partir da queda no
éden, arraigado no homem. Esta qualificação se faz necessário para não se
identificar o homem como tendo sido criado pecador. Absolutamente não. O
homem tendo sido feito a imagem de Deus refletia sua santidade e, portanto
não possuía pecado, mas o pecado adveio sobre o homem pós criação.104
Calvino, no entanto traça um paralelo entre o estado da mente e o
estado da vontade depois da queda:
A faculdade natural da razão permanece intacta depois da queda, mas a perfeição do nosso pensamento foi manchada pelo pecado. O homem está presentemente em exílio do reino de Deus e só a graça da regeneração pode restaurá-lo. Embora o poder do pensamento racional do homem não tenha sido completamente destruído e ele não tenha se tornado um mero animal, a luz da sua razão é tão obscurecida pelo pecado que não pode resplandecer para qualquer bom efeito.105
101
Ibid. Livro 2; Cap. 1 § 8 pág.168
102 Ibid. Livro 2 Cap. 1 § 8 pág. 169
103 Ibid. Livro 2 Cap. 1 § 8 pág. 169
104 Ibid. Livro 2 Cap. 1 § 8 pág. 170
105 SPROUL, Sola Gratia. p. 118
37
A queda afeta todo o relacionamento do homem para com Deus embora
este homem permaneça ainda com a capacidade de se utilizar de sua mente e
seu intelecto.
Calvino se fundamenta em Agostinho para definir o livre arbítrio partindo
da idéia que o arbítrio do homem é livre para escolher de acordo com os seus
desejos. E sendo os desejos do coração do homem infectados pelo pecado, ele
escolhe apenas o que é mal. Diz Calvino: “se diz que o homem tem livre
arbítrio, não porque seja livre para escolher o bem ou o mal; mas que o mal
que o homem escolhe ele o faz sem ser coagido a fazê-lo.”106 Ou seja, o
homem age de acordo com a sua natureza e é absolutamente livre para agir
dentro dela, mas incapaz de agir contra a sua natureza. Assim, o homem em
seu estado de pecado é livre para escolher o mal sem ser impulsionado, ou
coagido a escolhê-lo, mas incapaz de desejar a Deus o que seria agir contra a
sua natureza corrompida. Pois a vontade caída está enraizada na
concupiscência e cativa, escrava do pecado e não pode se libertar por si
mesma, a menos que Deus aja libertando o homem deste estado.107 Nas
palavras de Agostinho a quem Calvino segue o homem em estado de pecado
“não pode não pecar.108”
A única possibilidade de salvação está na operação positiva de Deus em
tirar o homem do estado de pecado e o trazer para o estado de graça. Aqui se
verifica a real necessidade de uma vocação absolutamente eficaz, pois estando
o homem morto em delitos e pecados, se faz necessário que haja uma atuação
objetiva neste homem morto para lhe dar a vida.
Entretanto nem todos os homens são alvos desta atuação de Deus.
Aliás, tendo a Igreja a comissão de ir e pregar o evangelho a toda criatura e
sabendo que é Deus que eficazmente chama o pecador, conclui-se que nem
todos são chamados eficazmente por Deus. Aqui está o outro fundamento para
a doutrina da vocação eficaz: a eleição.
106
CALVINO Op. Cit Livro 2 cap. 2 § 7 pág. 178
107 Ibid. Livro 2 cap. 2 § 7 pág. 179
108 SPROUL. R. C., Eleitos de Deus. São Paulo: Cultura Cristã. 1998. pág. 57,58
38
CAPÍTULO 3: O FUNDAMENTO DA VOCAÇÃO EFICAZ – O
DECRETO DE DEUS
Estando o homem em estado de pecado e por isso mesmo incapaz de
se voltar para Deus como poderia ele ter alguma esperança de Salvação?
Diante do exposto acima, fica evidente que o ministério da Igreja seria
completamente ineficaz em alcançar os corações de pessoas que não podem
por si mesmas se voltarem para Deus. Assim qualquer obra por parte de
Denominações, agências missionárias ou igrejas institucionais não resultarão
em nenhuma conversão. O homem por si mesmo é incapaz de buscar a Deus.
Nas palavras de Paulo em Efésios 2.1-3 os homens estão mortos em delitos e
pecados, seguindo o curso deste mundo, são filhos da desobediência, segundo
o príncipe da potestade do ar, andando segundo as inclinações da carne e
fazendo a vontade da carne e dos pensamentos e por causa disto tudo são
filhos da ira.
Se o homem pecador não pode aceitar a Cristo como salvador por causa
do pecado, por que evangelizar, qual a motivação para que a igreja cumpra seu
ministério no mundo? Qual a esperança da Igreja em colher frutos de sua
tarefa evangelística? A única esperança da Igreja está em Deus. O homem não
pode vencer o pecado, mas Deus pode. Todo o ministério da Igreja precisa ter
como base, suporte e fundamento a doutrina da predestinação que por sua fez
se fundamenta no decreto.
1. Definição do termo
A teologia reformada, calvinista enfatiza em sua proclamação a
soberania de Deus. Soberania esta exercida sobre toda a criação, tanto natural
como espiritual. Ela é tão ampla quanto o seu governo e se relaciona com a
vida com e a morte com o tempo e a eternidade.109 Determinando tudo quanto
à de suceder de acordo com a sua vontade. A esta determinação divina
109
PINK, A. W. Los Atributos de Dios.. 2ª Reimprensão. Barcelona: El Estandarte de la
Verdad .1997. p.16
39
denomina-se decreto. Os decretos de Deus são definidos da seguinte forma
pelo catecismo Maior de Westminster:
Os decretos de Deus são os atos sábios, livres e santos do conselho de sua vontade, pelos quais, desde toda a eternidade, ele, para a sua própria glória, imutavelmente predestinou tudo o que acontece, especialmente com referencia aos anjos e aos homens.110
Deus executa seu decreto por meio das obras da criação e da providencia. A
confissão belga embora não possuindo um parágrafo determinado para expor a
doutrina dos decretos de Deus o faz em sua discussão da providência divina
nos seguintes termos:
Cremos que o bom Deus, depois de ter criado todas as coisas, não as abandonou, nem as entregou ao acaso ou à sorte, mas que as dirige e governa conforme sua santa vontade de tal maneira que neste mundo nada acontece sem sua determinação.111
O estudo dos decretos de Deus necessariamente deve anteceder o estudo da
predestinação visto que esta é um ramo dentro da doutrina dos decretos.
1.2 Nomes Bíblicos para os decretos divinos
Pelo termo decreto procura-se de forma genérica explicar uma séria de
palavras e expressões bíblicas que ressaltam a determinação, controle e
soberania de Deus sobre todas as coisas.
1.2.1. Termos do Antigo Testamento
Existem alguns termos que acentuam o elemento intelectual do decreto
tais como:
hc'î[e (`etsah) - Aconselhar, dar aviso, designo - Jó 38.2; Is 14.26;
46.11
dAså (Sod) - Sentar-se junto para deliberação (nifal), conselho - Jr
23.18, 22
110
__________________Catecismo Maior de Westminster, pergunta 12. 12ª edição.
São Paulo: cultura Cristã. 2002
111 __________________Confissão de fé e catecismo de Heidelberg, Artigo 13. São
Paulo: Cultura Cristã. 1999
40
ytiMoêz: ((Zaman) – Meditar, ter em mente, propor-se a - Jr 4.28; 51.12;
PV 30.32
Termos que salientam o elemento volitivo:
#peÛx' (Chaphts) – Inclinação, Vontade, Beneplácito – Is 53.10
‘!Acr” ( Ratson) – Agradar, deleitar-se, ou vontade soberana – Is 49.8
1.2.2 Termos do Novo Testamento
Termo que designa o decreto em geral, indicando também o fato de que
o propósito de Deus se baseia num conselho.
boulh/| (Boule) – Conselho, Propósito - At. 2.23; 4.28; Ef. 1.11; Hb 6.17
Termo que quando aplicado ao conselho de Deus da ênfase no aspecto
volitivo.
qelh,matoj (Telemas) – Vontade, Escolha, inclinação, desejo, prazer,
satisfação. Ef 1.11
termo que acentua a liberdade do propósito de Deus.
euvdoki,aj (Eudokia) – Vontade, escolha, satisfação, deleite, prazer – Lc
2.14; Ef. 1.5,9.
1.3 A natureza dos decretos divinos
Embora o termo decretos de Deus seja usado no plural ele á apenas um
único atos divino. “Não existe uma série de decretos de Deus, mas somente
um plano compreensivo, que abrange tudo o que se passa”.112
Temos usado o singular como faz a Escritura (Rm 8.28; Ef 3.11), porque há somente um ato de sua mente infinita acerca do futuro. Nós falamos como se houvesse havida muitos, porque nossas mentes somente podem pensar em ciclos sucessivos, à medida que surgem os pensamentos e ocasiões; Em referência aos decretos, os quais sendo muitos, nos parece que requerem um propósito diferente para cada um. Entretanto o conhecimento de
112
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. 2ª Edição. São Paulo: Cultura Cristã 2001.
p.97
41
Divino não procede gradualmente, ou por etapas: “Conhecidas são a Deus desde os séculos todas as suas obras.”113
O decreto de Deus se relaciona de forma estreita com o seu
conhecimento. E assim pode-se verificar que: Deus Conhece todas as coisas e
necessariamente sabe de todas as causas e resultados possíveis. Esse
conhecimento fornece o material necessário para o decreto.
Deste conhecimento de todas as coisas possíveis ,ele escolheu por um ato da sua vontade perfeita, levado por sábias considerações, o que desejava levar à realização, e assim formulou o seu propósito eterno.114
Claramente percebe-se que o conhecimento necessário e absoluto de
Deus precede o seu decreto e logicamente este mesmo conhecimento segue-
se a ele. “sustenta-se isto contra a alegação semi-pelagiana e arminiana de
uma predestinação baseada na presciência de Deus”.115 Verdadeiramente
Deus sabe de todas as coisas futuras, não simplesmente pelo seu
conhecimento deste futuro, mas pela determinação de todas as coisas que
aconteceriam neste futuro. Percebe-se que os decretos de Deus estão
relacionados a todas as coisas futuras sem exceção. “Tudo o que é feito há seu
tempo, foi predeterminado antes do início do tempo.”116
A relação do decreto de Deus tem haver de uma forma prática com as
sua criação e de forma particular com os homens e os anjos sendo executados
na criação, onde Deus em um espaço de seis dias fez todas as coisas do nada
e tudo muito bem; na providência onde Deus exerce seu governo e
preservação sobre todas as suas criaturas e todas as ações delas; e na obra
da redenção da seguinte maneira.
Deus, por um decreto eterno e imutável, unicamente do seu amor e para patentear a sua gloriosa graça, que tinha de ser manifestada em tempo devido, elegeu alguns anjos para a glória e, em Cristo, escolheu alguns homens para a vida eterna e os meios para consegui-la; e também, segundo o seu soberano poder e o conselho inescrutável de sua própria vontade (pela qual ele concede, ou não, os seus favores conforme lhe apraz), deixou e predestinou os mais à desonra e à ira que lhes serão infligidos
113
PINK, Op. Cit. p.15
114 Ibid. p.97
115 Ibid. p. 97
116 PINK, op. Cit p 16
42
por causa dos seus pecados, para patentear a glória da sua justiça.117
Nesta relação do decreto de Deus com a sua criação segue apenas de foram
lógica o reconhecimento requerido do governo do criador sobre todas as suas
criaturas, do grande rei em ralação aos seus servos.
Conquanto os decretos de relacionam com atos realizados
pessoalmente por Deus, eles abrangem também os atos e ações de suas
criaturas livres. Todas as coisas decretadas às tornam absolutamente certas,
embora não sejam executadas todas da mesma maneira.
No caso de algumas coisas, Deus decidiu não meramente que viessem acontecer, mas que ele as faria acontecer, quer imediatamente, como na obra da criação, que por intermédio de causas secundárias continuadamente vitalizadas e fortalecidas pelo seu poder.118
Há outras coisas incluídas no decreto de Deus, que são certas de
acontecer, mas as quais ele decidiu não efetuar pessoalmente. Como os atos
pecaminosos das suas criaturas racionais. O decreto no que se refere a estes
atos é geralmente denominado decreto permissivo119.
Naturalmente, Deus é o único agente na criação, na providência, na regeneração, na inspiração, etc. Igualmente é ele que inspira as boas ações de agentes livres (especialmente no caso de pecadores que, de outro modo, nada podiam fazer de bom)... todavia os pecados cometidos por livres agentes – os anjos e os homens – foram decretados apenas permissivamente, porque Deus não pode ser o autor do pecado, e porque nada podia acontecer sem a sua permissão.120
1.4 As características do decreto Divino
O decreto de Deus tem seu fundamento em sua sabedoria. Um dos
termos pelos quais o decreto é designado sugere uma intercomunhão entre as
três pessoas da divindade uma cuidadosa consulta e deliberação. “no decreto
117
Catecismo Maior op. Cit pergunta 13. p.20
118 BERKHOF op.Cit p.97
119 Falcão, Samuel. Escolhidos em Cristo: O que de fato a Bíblia ensina sobre a
predestinação. 3ª Edição. São Paulo: Cultura Cristã. 1997 p. 65 – O Rev. Samuel Falcão faz
uma distinção entre duas categorias de decretos. 1ª Decretos positivos e eficazes; 2ª Decretos
permissivos
120 Ibid. p.66
43
pode houver muita coisa que ultrapasse o entendimento e que seja inexplicável
para o mente finita, mas não contém nada que seja irracional ou arbitrário.”121
O decreto de Deus é eterno no sentido de que está na eternidade.
Embora se relacione no tempo sua essência parte de um ato dentro do ser
divino que está fora do tempo. Por esta razão pode-se considerar os decretos
ou suas execuções de uma forma lógica, mas não cronológica. Este decreto é
absolutamente eficaz. “Aquilo que Deus decretou certamente sucederá; que
nada pode frustrar o seu propósito.”122 Assim como o decreto de Deus é eficaz
ele também é imutável, pois parte de uma Deus perfeito que fundamenta todas
as suas determinações sobre o seu conhecimento absoluto e que por isso não
possui a necessidade de mudar seus planos.
O decreto de Deus é absoluto em si mesmo, não dependendo em
nenhuma de suas particularidades de nada fora de si mesmo para a sua
concretização. “A execução do plano pode exigir meios ou depender de certas
condições, mas nesse caso, estes meios ou condições também foram
determinadas no decreto.”123 Segue-se a abrangência da determinação divina.
Tudo o que se passa no mundo está incluso no decreto divino. Tudo o que se
refere aos homens desde suas ações morais, atos iníquos, eventos
contingentes, os meios bem como os respectivos fins e a duração da vida.
2. A predestinação
Deforma mais particular a doutrina dos decretos se relacionam com a
doutrina da predestinação.
2.1 Definição da doutrina
Calvino define predestinação como segue:
Chamamos predestinação ao eterno decreto de Deus pelo qual Ele determinou o que quer fazer a cada um dos homens. Por que ele não os criou a todos com a mesma condição, senão que ordena a uns para a vida eterna, e a outros para a condenação
121
BERKHOF op. Cit pg. 98
122 Ibid. pg 98
123 Ibid pg 99
44
perpétua. Portanto, segundo o fim para o qual o homem foi criado, dizemos que está predestinado para a vida ou para a morte.124
A predestinação é dirigida a seres morais, ou seja, homens e anjos.125 E
possui duas divisões lógicas, eleição em relação aos salvos e reprovação aos
condenados. A citação de Calvino feita à cima demonstra de forma clara esta
duas verdades. Deus não criou todos os homens com a mesma condição, mas
ordena uns para a vida, e a estes a vocação será realmente eficaz, e outros
para a morte. Em outro lugar Calvino deixa de forma mais explicita esta
doutrina nos seguintes termos:
Como a Escritura demonstra com toda a evidência – que Deus tem designado de uma vez para sempre em seu eterno e imutável conselho àqueles que ele quer que se salvem, e também àqueles que ele quer que se condenem. Dizemos que este conselho, em relação aos que foram eleitos, se funda na gratuita misericórdia divina sem consideração alguma a dignidade do homem; ao contrário, que a entrada na vida está fechada para todos àqueles que Ele quis entregar a condenação; e que isto Ele fez por seu secreto e incompreensível juízo, o qual, no entanto, é justo e irreprovável.126
2.2 Eleição como obra de Deus
O decreto da predestinação é em todas as suas partes um ato das três
pessoas da trindade. Como exposto até aqui é uma ato de Deus Pai,
executado na história por Deus Filho que é a base da Eleição e aplicada nos
alvos da eleição pelo Espírito Santo através da instrumentalidade da Palavra
de Deus. Entretanto na economia da trindade é algo mais estritamente ligado
ao Pai. Percebe-se isto nas declarações da própria escritura sobre o tema. No
evangelho de João 6.37-39, Cristo saliente que somente viriam a ele aqueles
que o fossem dado pelo Pai. “Note-se bem que o princípio para ser admitidos
debaixo da proteção e amparo de nosso Senhor Jesus Cristo provem da
doação do Pai”.127
124
CALVINO, JUAN. Instituición de La religión Cristiana. 5ª Edição. Barcelona: FELiRe.
1999. Livro 3 cap. 21 § 5 pág. 728, 729
125 Falcão Op. Cit. p. 82
126 CAVINO Op. Cit. livro 3, cap. 21 § 7 pág. 733
127 CALVINO. Instituición de La religión Cristiana Livro 3, Cap. 22 § 7 Pág. 740
45
A aplicação da obra de Deus é particular visto que tem como alvo a
indivíduos específicos. Não é um decreto geral, nem mesmo um decreto que
vise salvar aquele que crer como se houvesse um alvo ou objetivo genérico da
eleição. Pelo contrário a eleição para a salvação é dirigida particularmente ao
indivíduo determinado por Deus. Em outras palavras, pode-se explicar este
ponto deixando claro que Deus não decidiu salvar uma parte do grande número
de perdidos como que colocando todos juntos e aleatoriamente separa parte e
deixa o restante. Pelo contrário Deus escolhe individualmente os seus e a
estes ele salva.
A eleição é uma expressão da vontade soberana de Deus, não
possuindo nada no homem que motivasse a sua escolha.
Ao adotar-nos, o Senhor não levou em conta o que somos então nos conciliou consigo mesmo com base em alguma dignidade que porventura tivéssemos. Seu único motivo é o eterno beneplácito por meio do qual ele nos predestinou.128
Erram, portanto aqueles que consideram haver algo no homem que
motivasse a ação de Deus para com a sua criação sejam boas obras ou
previsão de fé. Esta eleição é incondicional dependendo única e
exclusivamente do soberano beneplácito de Deus que desde a eternidade
decretou salvar, não por previsão de fé ou mérito temporal; como se o decreto
fosse escrito como recompensa por uma boa ação no tempo. Assim até mesmo
a fé com que os crentes crêem é graça divina.
O próprio tempo da eleição deixa de forma inequívoca o seu aspecto
gratuito. Deus elegeu os salvos antes da fundação do mundo; e seguindo este
raciocínio “o que poderíamos merecer, ou em que consistia o nosso mérito,
antes que o mundo fosse criado?”129
A declaração confessional da vocação eficaz transparece de forma
inequívoca este detalha da doutrina da eleição. Deus chama eficazmente o
perdido não por qualquer mérito que este possua, mas exclusivamente por sua
graça que atua livremente de acordo com o seu propósito. O texto confessional
assim diz em sua segunda sessão:
Esta vocação eficaz provém unicamente da livre e especial graça de Deus e não de coisa alguma prevista no homem; nesta
128
CALVINO, João. Efésios. São Paulo: Edições Paracletos. 1998 .pg 28
129 Ibid. pág 24
46
vocação ele é totalmente passivo, até que, vivificado e renovado pelo Espírito Santo, seja desse modo capacitado a responder a esta vocação e a abraças a graça oferecida e comunicada nela.130
O exemplo bíblico clássico desta ação gratuita de Deus na eleição sem
base algum em méritos está, está em romanos 9. 11 – 13; onde Paulo diz de
forma clara que Deus amou a Jacó e se aborreceu de Esaú quando os gêmeos
ainda não haviam nascido nem praticado o bem nem o mal. Perceba-se que
não havia nada que distinguisse os gêmeos para sustentar a eleição de um em
detrimento de outro; no entanto o texto diz que Deus amou a Jacó. Mas qual
seria a diferença entre eles? “São diferentes pela predestinação de Deus
enquanto não existia diferença alguma referente aos méritos.”131
Nem mesmo a santidade dos fiéis é base para a eleição, pois a igreja
não foi eleita por ser santa, mas para ser santa. Explicando o texto da epistola
aos Efésios capítulo 1. 4; Calvino diz:
Podemos, pois, concluir com toda a segurança: Deus nos tem escolhido para que fossemos santos, portanto não nos tem escolhido por haver previsto que seriamos; pois são dois casos contrários, que os fiéis tenham sua santidade pela eleição, e que por esta santidade de suas obras tenham sido eleitos.132
2.3 A eleição é fundamentada em Cristo
A declaração bíblica que sustenta a eleição é de que os fiéis foram
eleitos em Cristo. “Quando se acrescenta que foram eleitos em Cristo, se
segue... que foram eleitos fora de si mesmos.” 133 Significando que os fiéis
foram eleitos não com base em si mesmos, mas fundamentados na obra de
Cristo, pois não havia no homem qualquer dignidade que justificasse a sua
eleição, mas:
Como o pai celestial não achou em toda a descendência de Adão quem merecesse a sua eleição, pôs seus olhos em Cristo, a fim de eleger, como membros de Seu corpo, aqueles aquém fosse receber em comunhão da vida. Estejam, pois convencidos, os fiéis que Deus nos tem adotados em Cristo para ser seus
130
Confissão de Fé de Westminster, Op. Cit cap. 10 sessão 2 pág. 95
131 CALVINO, JUAN. Instituición de La religión Cristiana. Livro 3 Cap. 22 § 5 Pg. 739
132 Ibid. § 3 pg 736
133 Ibid § 2 Pg. 735
47
herdeiros, porque não éramos por nós mesmos capazes de tão grande dignidade e excelência.134
Segue-se, portanto que a causa material ou a base da eleição é Cristo
Jesus. Pois é através dele que o amor de Deus é derramado sobre os
eleitos.135
É algo que parte de Deus e que precede até mesmo o conselho da
redenção, visto ter sido fixada antes de se incumbir à obra meritória de Cristo
no conselho da redenção.136
2.4 A eleição é garantia de Salvação
Este ato decretivo de Deus é imutável garantindo assim a segura certeza
da salvação dos eleitos. E é neste ponto que a igreja se fixou para estabelecer
a doutrina da vocação eficaz. Pois Aqueles que Deus predestinou para a vida
são alcançados pelo evangelho e por fim são salvos.
Deus executa o decreto da eleição com a sua própria eficiência, pela obra salvadora que realiza em Jesus Cristo. É o seu propósito que certos indivíduos creiam e perseverem até o fim, e ele assegura este resultado pela obra objetiva de Cristo e pelas operações subjetivas do Espírito Santo.137
Perceba-se a certeza e segurança de Calvino de que Deus assegura os
resultados do ministério da Igreja dizendo que o homem em seu estado de
pecado pode ser alcançado passando assim a crer salvadoramente em Cristo
sendo liberto do império das trevas. E não apenas isso ele persevera até o fim.
Assim o crente pode descansar sabendo que sua salvação não tem segurança
em sua vontade incerta, mas no firme propósito de Deus.
A eleição é irresistível, pois Deus vence qualquer oposição da vontade
humana contra ele. Não que Deus force a vontade do homem, mas sim que
Deus ilumina de tal forma o pecador que este se volta voluntariamente para
ele. Este ponto é importante e muito bem descrito no texto sobre a vocação
eficaz na confissão de Westimister:
134
Ibid. § 1pg 735
135 CALVINO, Comentário de Efésios Op. Cit. pág.25
136 BERKHOF, Op. Cit. Pág. 107
137 Ibid. Pág. 108
48
Todos aqueles a quem Deus predestinou para a vida, e só esses, é ele servido chamar eficazmente pela sua palavra e pelo seu espírito, no tempo por ele determinado e aceito, tirando-os daquele estado de pecado e morte em que estão por natureza para a graça e salvação, em Jesus Cristo. Isso ele faz iluminando o entendimento deles, espiritual e salvificamente, a fim de compreenderem as coisas de Deus, tirando-lhes o coração de pedra e dando-lhes um coração de carne, renovando as suas vontades e determinando-as, pela sua onipotência, para aquilo que é bom, e atraindo-os eficazmente a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para isso dispostos pela sua graça138
O texto descreve o homem sendo chamado pelo ministério da palavra e
iluminado pelo Espírito Santo passando a entender as coisas de Deus e são
atraídos eficazmente a Cristo “mas de tal maneira que eles vêm mui livremente,
sendo para isso dispostos por sua graça.”
A boa compreensão deste ponto é de vital importância para a
compreensão da vocação eficaz baseada na eleição. Sérias críticas são
levantadas contra a doutrina calvinista dizendo que a doutrina da eleição
subtrai do homem a sua liberdade, e que Deus em seu ato irresistível de
chamar o pecador força-o a aceitá-lo. No entanto esta é uma má compreensão
do que de fato significa a eleição e a vocação eficaz. O texto não diz que
homens em estado de pecado vêm a Cristo, mas homens que foram
alcançados pela graça de Deus, deixaram de ser mortos e passaram a ter vida
espiritual.
O homem primariamente foi criado para ter comunhão com Deus, louvá-
lo e gozá-lo para sempre.139 Com a entrada do pecado no mundo o homem se
afasta de Deus perdendo qualquer possibilidade de se aproximar por si mesmo
de seu criador. Seu destino eterno é a perdição. No exercício do ministério da
Igreja que é a pregação do evangelho, Deus ilumina a mente caída do homem
e o processo que se dá em seu coração é um processo de renovação,
recriação, de regeneração. Tendo o homem sido criado para ter comunhão
com Deus e sendo o pecado o fator que o afastou dele, uma vez que este
homem é liberto do pecado ele se volta voluntariamente para Deus, pois o
propósito primeiro de sua criação foi ter comunhão com Deus. Não é que o
138
Confissão de Fé de Westminster, Op. Cit pág. 92
139 Breve Catecismo de Westminster resposta a pergunta 1
49
homem não tenha a liberdade de recusar a graça e decidir permanecer em seu
estado de pecado como sustentam os arminianos140 mas o homem regenerado
por Deus não tem o desejo, o querer, a vontade de despreza ou rejeitar a
graça. Por isso o texto da confissão é enfático ao afirmar que o homem se volta
voluntariamente para Deus.
Pode ser usada uma analogia para deixar mais clara este ponto. A
bússola é um instrumento utilizado para a orientação. Tendo sempre sua
agulha apontada para a direção norte, onde fica o ponto magnético da terra.
Mas se for colocado um ponto magnético próximo da agulha e em outra
direção, o sul, por exemplo, ela deixa de apontar para o norte passando assim
a apontar para o sul onde está o outro ponto magnético. A bússola foi criada
para apontar para o norte, mas o outro ponto magnético a faz apontar para a
direção errada. No entanto se for retirado o ponto magnético que a faz apontar
para a direção errada, a agulha, sem que ela seja forçada ou sem que
necessite da intervenção direta do homem, volta-se instantaneamente para a
direção correta, ou seja, o norte.
O homem sendo criado para ter comunhão com Deus deveria sempre
andar em direção a este Deus. (apontar para o norte). Mas com a entrada do
pecado no mundo (outro ponto magnético), o homem passou a ir à direção
errada. Mas, quando o Espírito Santo alcança o coração do eleito regenerando
e o chamando eficazmente (retirando o ponto magnético falso, neste caso
libertando-o do pecado) o homem voluntariamente retorna à direção correta.
(assim como a agulha se volta para o norte). Não existe coação, e nem é
forçada a liberdade do homem.
A vocação eficaz baseada na eleição é monergística e sinergistica
conseqüentemente. O texto confessional é claro ao afirma esta verdade
dizendo que é Deus que predestina e desperta, mas o homem uma vez
despertado é “capacitado a responder a esta vocação e a abraçar a graça
oferecida e comunicada nela.” 141 Ela é monergística, pois é um ato de Deus.
Deus elege, Deus chama, Deus ilumina, Deus regenera. Mas ela é sinergistica,
140
SPENCER, Duane Edward, TULIP: Os cinco pontos do Calvinismo a Luz das
escrituras. 2ª Edição. São Paulo: Edições Parakletos. 2000. pág; 122
141 Confissão de Fé de Westminster, Op. Cit Cap. 10 sessão 2 pág. 95
50
pois é o homem quem responde, é o homem que crer, é o homem que se
arrepende.
Quando a teologia reformada diz que a eleição é irresistível ela
Quer dizer que ela é eficaz. Ela é uma obra monergística de Deus que realiza o que ele pretende que ela realize. A graça divina muda o coração humano, ressuscitando o pecador da morte espiritual para a vida espiritual. A graça regeneradora faz com que o pecador deseje crer e se aproxime de Cristo. Anteriormente, o pecador não desejava e não estava inclinado a escolher a Cristo, mas agora ele não apenas deseja, mas está ansioso por escolher Cristo. O pecador não é arrastado a Cristo contra a sua vontade ou forçado a escolher algo que não quer. A graça divina da regeneração muda a disposição do coração de forma a levantar o pecador da morte para a vida, da incredulidade para a fé.142
De maneira alguma a eleição é injusta. Pois Deus não é devedor do
perdão a nenhum pecador. “o pecador não tem absolutamente, nenhum direito
ou alegação que possa apresentar quanto às bênçãos decorrentes da eleição
divina. De fato, ele perdeu o direito a essas bênçãos.”143 Deus seria
absolutamente justo se não salvasse ninguém assim como ele decidiu não
salvar os anjos que caíram144. O Ato de ele salvar alguns, que não mereciam
ser salvos, o faz gracioso145·;e não injusto.
2.5 O Propósito da Eleição
O propósito da eleição é duplo sendo um próximo e um objetivo final. O
propósito próximo é a salvação dos eleitos, pois o homem segundo a Bíblia foi
escolhido para a salvação (Nm 11.7; 2Ts 2.13). O objetivo final da eleição é a
glória de Deus, pois é a execução de seu conselho eterno sem que haja falhas
ou erros. Decreto este determinado antes da fundação do mundo. Como obra
de Deus, a eleição se destina à salvação dos homens, operada exclusivamente
pelo Deus soberano. Assim o objetivo final da eleição só é atingido quando o
142
SPROUL, Sola Gratia pág. 75
143 BERKHOF, Op. Cit. pág 108
144 GRUDEM. OP. Cit. pág 316
145 Ibid. pág. 316
51
eleito definitivamente é glorificado junto o Pai.146 E neste ato Deus é glorificado
como o grande Deus eterno e soberano, misericordioso e justo.
Na vida do eleito este propósito último da glorificação é visto no
progresso feito pelas escrituras sobre a ordem da salvação elaborada pelo
apóstolo Paulo no livro de Romanos 8.30: A eleição é vista na primeira palavra,
Aos que predestinou. Percebe-se a vocação eficaz no ato certo e garantido do
despertamente do eleito, pois o texto continua: a esses também chamou. E por
fim a ordem segue até que o propósito último é alcançado: a esses também
justificou, a esses também glorificou. Deus é glorificado tanto na salvação dos
eleitos quanto na condenação dos perdidos, visto que a doutrina da
predestinação possui dois lados. Eleição e reprovação.
3. A Reprovação
A doutrina da Vocação eficaz trabalha também com o fundamento da
reprovação. Visto esta vocação ser eficaz, significando que ela alcança os
objetivos propostos por Deus, ou seja, a salvação do eleito. Surge a pergunta:
se a grande comissão de Jesus é enfática para que se pregue o evangelho a
toda Criatura (Mc 16. 15 e Mt 28.19) e a igreja cumpre este mandato de Cristo
indo mundo e pregando o evangelho porque nem todos respondem da mesma
maneira, se voltado assim para Cristo Jesus. O texto da confissão de fé se
expressa como segue:
Os não-eleitos, ainda que sejam chamados pelo ministério da Palavra e tenha algumas das operações comuns do Espírito, contudo jamais chegam a Cristo e, portanto não podem ser salvos.147
Quando se fala a respeito da doutrina da reprovação existe um perigo de
elaborar uma forma de pensamento absolutamente apavorante em relação a
Deus, mas que é defendida por um grupo de teólogos calvinistas. Este sistema
conhecido historicamente como hiper-calvinismo defende que Assim como
Deus intervém na vida do eleito criando fé em seu coração “Deus igualmente
intervém nas vidas dos reprovados para criar ou operar incredulidade em seus
146
KLOOSTER, Fred H. A Doutrina da Predestinação em Calvino. São Paulo: Socep.
1992 pág. 29
147 Confissão de Fé de Westminster, Op. Cit. cap. 10 sessão 4 pág. 98
52
corações.”148 Neste fale a descrição feita por Sproul definindo o hiper-
calvinismo:
A destinação simultânea não é a visão reformada ou calvinista da predestinação. Alguns a têm chamado de “hiper-calvinismo”, eu prefiro chamá-la de “subcalvinismo”, ou, melhor, de “anticalvinismo”.
3.1. Definição da doutrina da reprovação
A confissão de fé de Westminster define esta doutrina nos seguintes
termos:
Segundo o inescrutável conselho da sua própria vontade, pela qual ele (Deus) concede ou recusa misericórdia, como lhe apraz, para a glória do seu soberano poder sobre as suas criaturas, o resto dos homens, para louvor da sua gloriosa justiça, foi Deus servido não contemplar e ordená-los para desonra e ira por causa dos seus pecados.149
Em outras palavras pode-se definir a doutrina da reprovação como: “a
decisão de Deus antes da criação de deixar de lado algumas pessoas,
decidindo não salvá-las e puni-las por seus pecados, manifestando deste modo
a sua justiça.”150
A doutrina da reprovação se firma sobre a soberania de Deus, pois a
reprovação é antes de tudo um ato decretivo de Deus. Em sua soberana
vontade Deus recusa misericórdia como lhe apraz, fazendo assim com que
nem todos os homens sejam alvos de sua graça. Em uma distinção já feita
neste capítulo foi ressaltado que os homens não foram criados todos em iguais
condições “ao contrário, uns são preordenados á vida eterna e outros
preordenados a eterna condenação”151 Calvino continua a ressaltar esta
verdade dizendo:
Estamos dizendo que a escritura mostra claramente que Deus, por seu eterno e imutável desígnio, determinou, de uma vez por todas, aqueles a quem queria receber para sempre à salvação e, por outro lado aqueles a quem queria entregar à perdição.152
148
SPROUL, Eleitos de Deus Op. Cit. pág. 126
149 Confissão de Fé de Westminster, Op. Cit. Cap. 3 sessão 7 pág. 41
150 GRUDEM. Op. Cit. pág. 318
151 CALVINO, JUAN. Instituición de La religión Cristiana. Livro 3 Cap. 23 § 1
152 CALVINO, JUAN. Instituición de La religión Cristiana. Livro 3 Cap. 21 § 7 Pág. 731
53
Todas as coisas partiram de Deus e assim como não se consegue
encontrar uma causa para justificar a graça destinada aos eleitos, também não
se pode encontra um causa para que os preteridos sejam deixados sem que
seja possível a graça os alcançar. Neste ponto é importante salientar o
completo desconhecimento daqueles que são eleitos e daqueles que são
preteridos. Isto só Deus sabe. “Por isso no curso da história, não podemos
tratar com qualquer indivíduo como se ele ou ela fosse claramente um
reprovado.”153 Assim a igreja tem a obrigação de cumprir o seu mandato no
mundo de pregar o evangelho a toda criatura, sabendo que Deus eficazmente
chamará aqueles que lhe pertencem. E o mesmo ministério da Igreja servirá
para a condenação daqueles que ouvirem e não aceitarem ao convite do
evangelho.
Deus não impede o pecador de aceitar o evangelho, ou lhe
impede de se aproximar de Cristo. Isto seria hiper-calvinismo e como já visto
esta posição não reflete o ensino reformado. Mas o que de fato acontece? O
que se verifica aqui é uma única ação de Deus direcionada aos eleitos. Nos
eleitos Deus age de forma direta e positiva mudando-lhes a disposição do
coração, dando-lhes vida espiritual. Em relação aos reprovados ou preteridos
Deus não age de forma alguma, ou seja, eles são deixados em seu estado de
pecado sem sofrerem qualquer ação de Deus para que ali continuem. Não é
Deus que faz o homem pecar, mas eles pecam por terem prazer no pecado.
Da mesma forma pela qual Deus realiza a salvação dos eleitos pela eficiência da sua vocação e segundo estabeleceu no seu eterno conselho, assim também Ele, nos seus juízos contra os réprobos, executa os desígnios estabelecidos para eles. Portanto, aqueles a quem criou para a desonra na vida e para a destruição na morte – para serem instrumentos de sua ira e exemplos de sua severidade, ora os priva da capacidade de ouvir a Sua palavra, ora os torna cegos e entorpecidos para não entenderem a sua pregação. Portanto, esse Juiz supremo conduz a sua predestinação quando deixa cegos aqueles a quem privou de sua luz, quando uma vez os reprovou.154
Ainda assim o homem é completamente responsável pela sua
condenação, pois o homem nunca é desculpado pela sua incredulidade em
relação a Cristo. O homem tem a obrigação de crer em Jesus para ser salvo e
153
KLOOSTER. Op. Cit. pág. 57
154 CALVINO, JUAN. Instituición de La religión Cristiana. Livro 3 Cap. 24 § 12 Pág 774
54
não há nada fora dele mesmo que o impeça de Crer, a não ser seu estado de
pecado.
A diferença crucial entre os eleitos e os réprobos e que a estes, Deus os
deixa no estado de pecado em que estão. E por causa de seus pecados eles
são condenados. Contudo o pecado não é a base para a reprovação. E o
motivo é simples. Se a reprovação tivesse como causa o pecado do homem,
todos deveriam ser reprovados, pois todos pecaram e são pecadores.
3.2. A justiça da Reprovação
Uma das acusações que a doutrina da reprovação pode receber que ele
a faz com que Deus seja injusto determinando salvar alguns enquanto
determina que outros sejam condenados. No entanto não há injustiça da parte
de Deus. Pois não é o caso de Deus fazer a sua escolha em meio aos santos
onde não havia pecado. Pelo contrário Deus escolhe entre pecadores que já
estavam condenados.155 Quando todos mereciam a condenação o ato gracioso
de Deus se estabelece na salvação de parte de todos os perdidos que estão
recebendo a justa condenação pelos seus atos.
Deus não é injusto por condenar àqueles que merecem a condenação,
antes é gracioso por oferecer misericórdia àqueles que ele quiser oferecer
misericórdia. 156
Em relação à pergunta se Deus salva parte, porque ele não salva a
todos o apostolo Paulo responde nos seguintes termos em Romanos 9 :
14 Que diremos, pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo nenhum! 15 Pois ele diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão. 16 Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia. 17 Porque a Escritura diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para mostrar em ti o meu poder e para que o meu nome seja anunciado por toda a terra. 18 Logo, tem ele misericórdia de quem quer e também endurece a quem lhe apraz.19 Tu, porém, me dirás: De que se queixa ele ainda? Pois quem jamais resistiu à sua vontade? 20 Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim? 21 Ou não tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra? 22 Que diremos, pois,
155
FALCÃO. Op. Cit. pág 170
156 Ibid. pág 171
55
se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, 23 a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão.
Quem são os eleitos? Quem são os reprovados? As respostas a estas
duas perguntas são claras e fáceis. Apenas Deus sabe! Sendo assim o dever
da igreja, enquanto neste mundo, é o de ir por todo a todo os povos pregando o
evangelho a toda criatura. Cumprindo desta maneira a grande comissão dada
por Cristo a seus discípulos e a toda a sua Igreja. No entanto em seu ato
proclamador a igreja se fundamente na preciosa promessa de que Deus
conhece aqueles que lhe pertencem (2Tm 2.19) e por fim estes serão
eficazmente chamados e por fim salvos. A doutrina da predestinação é o
fundamento para qualquer ação da Igreja no mundo, pois sem eleição não há
salvação, mas somente condenação eterna.
Surge desta forma a inegável tarefa da verdadeira igreja de Cristo a de
pregar o evangelho. Com a mesma intensidade com que o apóstolo Paulo
encarava esta tarefa. Ele diz:
“Se anuncio o evangelho, não tenho de que me gloriar, pois sobre mim
pesa essa obrigação; porque ai de mim se não pregar o evangelho!”
(1Co 9.16)
Assim também sobre os ombros da Igreja do Senhor Jesus pesa a obrigação
de cumprir o seu ministério neste mundo, mas se valendo apenas do método
estabelecido pelo próprio Deus para alcançar o coração dos eleitos; A
pregação da Palavra.
56
CAPÍTULO 4: A VOCAÇÃO EFICAZ RELAÇÃO E ENTRE A
ELEIÇÂO DIVINA E A LIBERDADE HUMANA
“Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda a Criatura.” ( Mc 16.
16 RA) Desde esta ordem de Cristo a seus discípulos a igreja tem saído ao
mundo com o propósito de levar a mensagem da obra salvífica da cruz do
calvário ao homem perdido. A mensagem apostólica é clara no sentido de que,
aqueles que crerem em Jesus e o aceitarem como Senhor de suas vidas serão
salvos. (At .16.31; Rm 10.9 – 12 RA). A palavra do apóstolo Paulo realçando
esta convicção é clara e enfática quando declara que o “evangelho é o poder
de Deus para a Salvação de todo aquele que crê” (Rm 1.16 RA). Desta feita a
missão da Igreja, enquanto neste mundo, é evangelizar.157
Entretanto a teologia calvinista fundamentada na doutrina da eleição vez
por outra ouve por parte dos proponentes arminianos a idéia de que a eleição
torna supérflua a ação evangelizadora. Pergunta-se: "Se o decreto da eleição é
imutável e, portanto, torna absolutamente certa a salvação dos eleitos, que
necessidade tem eles do Evangelho? Os eleitos não vão ser salvos mesmo
que ouçam ou não o Evangelho?" A premissa desse argumento é inteiramente
verdadeira. A eleição divina torna a salvação dos eleitos inteiramente certa.
Mas a conclusão derivada dessa premissa revela grave incompreensão da
soberania divina como expressa no decreto da eleição.
A igreja se coloca no centro de duas realidades inegáveis e expressas
até aqui. A primeira diz que o homem foi completamente corrompido pela
queda de Adão, de forma que não há a mera possibilidade que este homem em
seu estado de pecado e miséria, por si mesmo, sem a ação externa se volte
para Deus e se reconheça como pecador. Destarte o homem necessita de um
salvador. A segunda verdade é a que Deus da eternidade elegeu aqueles que
seriam salvos, não por previsão de fé, mas pela sua determinação. Vê-se,
157
MENEZES, Antônio Carlos F, Evangelismo e Despertamento Espiritual. Contagem/MG: M
Editora. 2ª edição. 2000 p. 5 e 6 “ Menezes chega a ser mais enfático ao afirmar que não
havendo outro caminho de salvação a não ser o revelado no evangelho todo o cristão têm por
obrigação sustentar as ordenanças onde já estiverem estabelecidas, e a contribuir, por meio de
suas orações, bem como por seus esforços, para a dilatação do Reino de Cristo por todo o
mundo.
57
portanto a depravação do homem, que garante a sua condenação eterna de
um lado e a eleição divina que garante a salvação do eleito de outro. E é
exatamente aqui que entra o ministério da Igreja no mundo.
A igreja é o instrumento de Deus para alcançar o homem caído e por
meio da mensagem do evangelho despertar e levar vida àquele que estava
morto em seus Delitos e pecados. Pois a eleição se confirma com o
chamamento eficaz que é Deus despertando o eleito por meio da iluminação do
Espírito Santo que intrinsecamente está ligado à pregação da Palavra de Deus.
O texto confessional assim declara: “Todos aqueles a quem Deus predestinou
para a vida, e só esses, é ele servido chamar eficazmente pela sua palavra e
pelo seu Espírito”158
1. O ministério da Igreja a Evangelização
O ministério da Igreja pode ser considerado a luz de vários aspectos
particulares tais como a celebração dos sacramentos,sendo instrumento de
aperfeiçoamento dos santos159. Mas estritamente quando se fala do ministério
da igreja o primeiro aspecto levantado é a obra evangelizadora e missionária
que a igreja exerce no mundo em cumprimento ao mandato de Cristo.
1.1. Definição de termo
O substantivo Euangelion No Antigo Testamento não ocorre no sentido
religioso, sendo usado de forma secular “trazer notícia” ou “recompensar pelas
boas novas” (2Sm 4.10; 18.22,25).
"O sentido básico da palavra "Euangelion" é "boas Novas" sendo
um termo técnico para "novas de vitória" consistindo o "evangelizar no ato de "trazer ou anunciar boas novas", "proclamar, pregar" ser o agente das notícias de vitória “160
158
______________ A Confissão de Fé De Westminster. 17ª Edição. São Paulo:
Cultura Cristã, 2003 .Cap. 10 sessão 1 pág. 92
159 Confissão de Fé de Westminster. Capítulo 25 seção 3 pág 198
160 COSTA, Hermisten M. P.; Breve Teologia da Evangelização. São Paulo: PES. 1996
p. 12
58
O verbo Evnagelizomai já era usado em seu sentido teológico muito
antes da grande comissão dada por Jesus nos evangelhos aos seus discípulos.
Já no Antigo Testamento encontramos o termo sendo uso nas seguintes
ocorrências:
1. Proclamar a Glória de Deus manifesta em sua justiça, fidelidade,
salvação, graça e verdade. (Sal 40.10; 96.2).
2. Proclamar as boas novas referentes ao ungido de Deus (Is 40.6. 52.7)
3. As boas novas proclamadas pelo ungido de Deus (Is 61.1).
Herminsten Costa define evangelizar já usando o sentido
neotestamentário da seguinte maneira:
A proclamação essencial da Igreja de Cristo, que consiste no anúncio de Suas perfeições e de Sua obra salvífica, conforme ensinadas nas Sagradas Escrituras, reivindicando pelo Espírito, que os homens se arrependam de seus pecados e creiam salvadoramente em Cristo...161
Em termos semelhantes Russel Shedd também define evangelizar como:
A proclamação do Cristo Crucificado e ressurreto, o único redentor do homem, de acordo com a Escritura, com o propósito de persuadir pecadores condenados e perdidos a pôr sua confiança em Deus, recebendo e aceitando a Cristo como Senhor em todos os aspectos da vida e na comunhão de sua Igreja, aguardando o dia de sua volta gloriosa.162
A mensagem do evangelho é a proclamação essencial da Igreja, isto é, a
missão da igreja no mundo é pregar o evangelho. “a Evangelização não é um
passatempo de alguns maníacos, é a própria razão de ser, o propósito da
existência da Igreja no mundo.” 163Sem abrir mão de sua mensagem essencial
Embora os métodos e os meios evangelísticos possam apresentar diferenças conforme a época e a cultura, a mensagem não pode sofrer alterações. As línguas e os contextos podem apresentar desafios distintos em todo o mundo, mas as "boas novas" não deverão prescindir de seu conteúdo básico, onde quer que seja. A evangelização proclama a mensagem imutável de um Deus que não muda jamais164
161
Ibid. p.7 162
SHEDD, Russell P.; Fundamentos Bíblicos da Evangelização. São Paulo: Edições Vida Nova. 1996 p. 8
163 THOMAS, Owen. Quatro Dimensões da Evangelização. São Paulo:PES. 2000. pg
20
164 Ibid. p.9
59
A igreja possui a missão de pregar, e a mensagem a ser transmitido: o
evangelho da graça de Deus. No entanto surge a questão dos resultados. Será
que para se ter evangelização deve-se ter necessariamente resultados
positivos, ou seja, pessoas se convertendo ao evangelho. Ou mesmo que não
se tenham resultados visíveis à simples pregação do evangelho já se constitui
em evangelismo. A percepção de Herminsten Costa parece correta:
A evangelização deve ser definida dentro de uma perspectiva da sua mensagem, não do seu resultado. Nem toda proclamação que "surte efeito" é evangelização e, nem toda a pregação que "não alcança os resultados esperados", deixou de ser evangelização. ”165
No Novo Testamento evangelizar significa simplesmente pregar o
evangelho, a mensagem das boas novas. E sempre que o pregador é fiel a
esta mensagem ele estará evangelizando, independente dos resultados.
Possuindo a missão de sair e evangelizar a Igreja deve lidar com os dois
enfoques apresentados nos capítulos precedentes. O que será discutido a
seguir.
2. A pregação do Evangelho no Novo Testamento
Logo após sua ressurreição, Cristo Jesus reuniu seus discípulos e lhes
deu a grande comissão; Ou melhor, a missão de sair e pregar o evangelho a
toda criatura (Mc 16.15). E assim fazer discípulos de todas as nações (Mt
28.19). Esta comissão é enfatizada pouco antes de Cristo ser assunto aos céus
em Atos capítulo 1, quando ele se volta para os apóstolos e lhes diz: “... e
sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda Judéia e
Samaria e até aos confins da terra.” (At. 1.8) A partir desta declaração de
Jesus, Lucas começa a descrever o avanço do evangelho no mundo, e como
este evangelho vai transformando as vidas. Primeiro três mil em Jerusalém
subindo o número mais tarde para quase cinco mil pessoas (At. 2.41; 4.4).
À medida que se multiplicava o número dos discípulos crescia também a
palavra de Deus e muitos sacerdotes obedeciam à fé (At. 6.1,7); Após a
perseguição em Jerusalém este evangelho chega a Samaria por meio de Filipe
(At. 8) e finalmente aos gentios em Damasco na Síria partindo da pregação de
165 COSTA, Hermisten M. P.; Breve Teologia da Evangelização. São Paulo: PES. 1996 p. 19
60
Saulo, agora convertido ao evangelho. E principalmente simbolizado na visão
que Pedro teve e o seu conseqüente envio a casa de Cornélio (At. 9; 10). Logo
em seguida Paulo sai em suas viagens missionárias fazendo com que a
palavra de Deus fosse semeada na Galácia (At. 13 – 14.28), pela Ásia Menor e
na Grécia (At 15.40 – 18.22; 18.23 – 21.10.11)166 e Lucas por fim termina sua
narrativa a Teófilo descrevendo Paulo no coração do Império preso, mas ainda
assim pregando o Evangelho.E assim nos diz Lucas: “Por dois anos,
permaneceu Paulo na sua própria casa que alugara, onde recebia todos que o
procuravam, pregando o reino de Deus, e, com toda a intrepidez, e sem
impedimento algum, ensinava as cousas referentes ao Senhor.” (At. 28.30,31).
Entretanto Paulo visualizava mais, tinha uma visão mais distante e que
ultrapassava a capital do Império. Pouco antes de retorna a Jerusalém com
ofertas que esteve angariando pelas Igrejas por onde passava (At. 24.17),
Paulo estava na cidade de Corinto por volta do ano 56-57 e dali envia uma
correspondência a Igreja em Roma descrevendo o que então era a sua maior
ambição, pregar o evangelho na Espanha167. Desta forma Paulo escreve sua
epístola aos romanos fazendo uma descrição detalhada do evangelho que ele
pregava e tendo como objetivo que a Igreja em Roma lhe enviasse para
Espanha para pregar ali o evangelho. (Rm 15. 24,28). E assim o Novo
Testamento descreve a Igreja avançando mundo adentro e crescendo a cada
dia.
3. O Antinomismo da pregação do Evangelho – Eleição X Liberdade
Entretanto na medida em que se avança na leitura do livro de Atos
percebesse duas realidades no que tange a evangelização e que
166
LOPES, Nicodemus Augustus. Restaurando a Teologia da Evangerlização. www.
Monergismo.com; Postado em 08/02/2005 e acessado em 18/12/2006. Doravante citado como
RTE - em menos de 10 anos de atividades, provavelmente entre o ano 47 e 57 A.D., ele
plantou igreja nas quatro províncias do império (Galácia, Macedônia, Acaia e Ásia)”
167 BRUCE F. F. Romanos: Introdução e comentário. 4ª Edição. São Paulo:mundo
Cristão.1986. “Ao Fazer a escolha de uma nova esfera de atividade, resolveu fazer-se pioneiro.
Não se estabeleceria como apóstolo radicado num lugar já alcançado pelo Evangelho. (Rm
15.2). Sua escolha recaiu na Espanha, a mais antiga colônia romana no Ocidente e o principal
baluarte da civilização romana naquelas partes.”
61
aparentemente são contraditórias, mas que claramente são percebidas por
qualquer leitor. Quais sejam: a soberania de Deus na conversão e a total
responsabilidade do homem frente ao convite do evangelho. Estas duas
realidades podem ser vistas nos texto que seguem:
Soberania de Deus:
Atos 2:47 “louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo.
Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo
salvos.”
Atos 16:14 “Certa mulher, chamada Lídia, da cidade de Tiatira,
vendedora de púrpura, temente a Deus, nos escutava; o Senhor lhe abriu o
coração para atender às coisas que Paulo dizia.”
Atos 13:48 “Os gentios, ouvindo isto, regozijavam-se e glorificavam a
palavra do Senhor, e creram todos os que haviam sido destinados para a vida
eterna.”
Responsabilidade Humana:
Atos 2:38 “Respondeu-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós
seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e
recebereis o dom do Espírito Santo.”
Atos 3:19 “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados
os vossos pecados...”
Atos 4:4 “Muitos, porém, dos que ouviram a palavra a aceitaram,
subindo o número de homens a quase cinco mil.”
Atos 10:43 “Dele todos os profetas dão testemunho de que, por meio de
seu nome, todo aquele que nele crê recebe remissão de pecados.”
Atos 13:39 “e, por meio dele, todo o que crê é justificado de todas as
coisas das quais vós não pudestes ser justificados pela lei de Moisés.”
Atos 16:31 “Responderam-lhe: Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e
tua casa.”
Os textos supracitados mostram claramente um Deus que acrescenta à
Igreja os que vão sendo salvos, abre os corações para que os homens
62
compreendam a mensagem do evangelho. E estes acrescentados e iluminados
são alvos do favor divino no tempo e no espaço, por terem sido destinados
para a vida eterna. No entanto, o mesmo autor contando com a mesma
inspiração divina, destaca que é responsabilidade dos homens aceitarem a
palavra, crerem para serem justificados e remidos e conseqüentemente salvos.
Estas duas conclusões partindo do mesmo livro sagrado, quais sejam, a
soberania de Deus na salvação e a responsabilidade do homem em aceitar a
mensagem do evangelho para ser salvo, parece indicar uma contradição clara;
visto que: ou Deus é soberano e por ser soberano leva os homens a salvação;
ou o homem é responsável em aceitar o convite do evangelho e sendo assim
também responsável pela punição advinda da rejeição deste convite. Como
compreender isto?
O que temos aqui é o que em teologia se chama Antinomismo. O
dicionário de Teologia assim define Antinomia: “União de dois princípios,
declarações ou leis, que, apesar de parecerem contraditórios ou em tensão
entre si, são considerados igualmente verdadeiros.”168 Duas verdades que
postas lado a lado se chocam e aparentemente se contradizem. Embora esta
definição realce a tensão entre as verdades consideradas, que no caso deste
estudo é a soberania de Deus e a responsabilidade do homem, ela destaca
também que os princípios, declarações ou leis “parecem” contraditórias, o que
indica que, apesar da incapacidade humana em ordenar e compreender a
relação entre estas verdades elas se relacionam harmoniosamente, pois
ambas são verdadeiras. Este é o mesmo conceito que Parker realça:
...a questão toda de um antinômio – em qualquer caso no campo da teologia – é que não se trata de uma contradição real, embora assim pareça. Trata-se, antes de uma aparente incompatibilidade entre duas verdades evidentes.169
Esta aparente contradição entre a soberania de Deus e a
responsabilidade do homem pode ser percebida não apenas no trato
soteriológico, mas também em definições nevrálgicas na área de antropologia
168
GRENZ, Satanley J; Guretzki, David; NORDLING, Cherith Fee; Dicionário de
teologia: Edição de Bolso. 2ª impressão. São Paulo: Vida. 2001 p.10
169 PACKER, J.I. A Evangelização e a soberania de Deus. São Paulo: Cultura Cristã.
2002. P 15,16
63
cristã tais como a definição do homem como criatura e como pessoa. Anthony
Hoekema chama esta relação de “o mistério fundamental do homem” e ele
descreve este mistério como segue:
Como pode o ser humano ser igualmente uma criatura e uma pessoa? Ser uma criatura, como já vimos, significa dependência absoluta de Deus; ser uma pessoa significa independência relativa. Ser uma criatura significa que não posso mover um dedo ou pronunciar uma palavra à parte de Deus; ser uma pessoa significa que, quando meus dedos são movidos, eu os movo e que, quando as palavras são pronunciadas por meus lábios, eu as pronuncio. Sermos criaturas significa que Deus é o oleiro e nós o barro (Rm 9.21); sermos pessoas significa que nós mesmos é que moldamos nossa vida pelas nossas próprias decisões (Gl 6.7-8).170
A descrição deste antinomismo nos serve para compreender a tarefa da
igreja em sair ao mundo para evangelizar. Embora o homem seja responsável
em aceitar ao convite do evangelho, as conseqüências da queda tais como
compreendidas pela teologia bíblica reformada é enfática em afirmar que
deixado a sua própria sorte, este homem é incapaz de agir contra a sua
natureza pecaminosa.
O homem é absolutamente livre para fazer qualquer escolha dentro de
sua natureza corrompida e por estar morto em seus delitos e pecados (Ef, 2.1)
é incapaz de se voltar para Deus. Desta forma a única possibilidade de
salvação deste homem é a intervenção de Deus trazendo vida a este coração
pela atuação do Espírito Santo171. No entanto esta atuação divina não se dá
em todos os homens, mas somente naqueles que, antes da criação de todas
as coisas foram eleitos.
Diante do exposto observam-se duas realidades: homens pecadores
incapazes de buscarem a Deus e dentre estes, homens que foram eleitos antes
170
HOEKEMA, Anthony. Criados à imagem de Deus.São Paulo: Cultura Cristã. 1999
p.17
171 DE CAMPOS, Heber Carlos, O ser de Deus e os seus atributos. 2ª Edição. São
Paulo: Cultura Cristã. 2002 “ Nosso redentor Jesus Cristo é chamado poder de Deus e
sabedoria de Deus (1 Co 1.24). Tudo o que diz respeito ao Redentor e à nossa redenção é
produto do maravilhoso poder de Deus... Na aplicação da salvação, Deus também exerce o
seu poder absoluto, porque ele opera diretamente, sem causas secundárias, especialmente
porque a regeneração tem o característica de um poder criador de Deus.”
64
da fundação do mundo para a salvação em Cristo. E é exatamente aqui que
entra o ministério da Igreja172. A igreja é o elo entre o Deus soberano e o
homem pecador. “A evangelização... é a própria razão de ser, o propósito da
existência da Igreja no mundo”173 . Assim enfatiza a confissão de fé de
Westimister declarando-se a respeito da missão da Igreja:
A esta Igreja Católica Visível Cristo deu o ministério, os oráculos e as ordenanças de Deus, para congregamento e aperfeiçoamento dos santos nesta vida, até o fim do mundo, e pela sua própria presença e pelo seu Espírito, os torna eficazes para esse fim, segundo a sua promessa. 174
A esta igreja Deus deu o ministério, o serviço de estar no mundo levando
a mensagem do evangelho e assim congregando os eleitos que são iluminados
pelo Espírito Santo à medida que a palavra de Deus é exposta.175
Entretanto na tarefa evangelística da Igreja, o antinomismo da Soberania
de Deus e a responsabilidade humana sempre estarão presentes, pois “o
homem é um agente moral responsável, ainda que seja, ao mesmo tempo,
controlado pela divindade, o homem é divinamente controlado, embora seja
também, um agente moral responsável.”176
Contudo a incapacidade da igreja em compreender, ou aceitar este
antinomismo pode levá-la a acentuar um lado em detrimento do outro, Ou seja,
realçar a responsabilidade do homem em aceitar o evangelho em detrimento
da soberania de Deus. Quando não se realça a vocação eficaz que é obra
exclusiva de Deus a igreja corre o risco de elaborar métodos e confiar neles
como o único meio para se alcançar resultados; desprezando a iluminação do
172
TRIBBLE, H. W. Nossas Doutrinas. 7ª Edição. Rio de Janeiro: Juerp 1989. p. “o
propósito de uma Igreja do Novo Testamento é duplo: o cultivo espiritual dos seus membros e
a difusão do reino de Cristo na terra.”
173 THOMAS, Owe. 4 Dimensões da Evangelização. São Paulo: PES.2000; p.20
174__________________ A Confissão de Fé de Westinmister. 17ª Edição. São Paulo:
Cultura Cristã.2003 Capítulo XXV, secção III p. 198
175 RIBEIRO, Boanerges. O Senhor que se fez Servo. São Paulo: O Semeador. 1989
p.43 – o rev. Boanerges fala com muita propriedade sobre a missão da igreja no mundo e
enfatizando que a igreja “não pode fugir à vocação de seu próprio ser”, mais a frente ele
ressalta a razão da presença da igreja no mundo: A igreja foi “conservada no mundo para ser
testemunha de Cristo por meio da Palavra de Deus.”
176 PACKER Op Cit. P 19,20
65
Espírito e o método estabelecido por Deus que é a pregação do evangelho.
Contudo o realçar a soberania de Deus sem levar em conta a responsabilidade
do homem pode levar a igreja a apresentar um evangelho deturpado que
certamente causará dano à sua tarefa evangelística.
3.1. Desprezando a vocação eficaz e confiando em métodos
O homem foi criado por Deus um ser moral responsável, isto é mais que
ser apenas uma criatura é também ser uma pessoa. Aqui a definição que
Hoekema faz é importante ao definir uma pessoa como ser que possui
liberdade177, diz ele:
Ser uma pessoa significa ter alguma forma de independência – não absoluta, mas relativa. Ser uma pessoa significa ser capaz de tomar decisões, de estabelecer objetivos e ser capaz de perseguir esses objetivos. Significa possuir liberdade – ao menos no sentido de ser capaz de fazer as suas próprias escolhas.178
Por ser esta pessoa capaz de fazer escolhas o homem como pecador
culpado terá que responder diante de Deus pelo fato de ter quebrado a sua
lei.179 Por isso o homem precisa do evangelho. Ao ouvir o evangelho o homem
passa a ser responsável pela decisão que tomar. Entretanto a consciência da
responsabilidade humana não pode fazer o pregador descartar a verdade de
que é Deus quem salva. Pois, longe desta verdade o pregador passa a buscar
em seus próprios esforços meios para levar o ouvinte a uma decisão em prol
do evangelho que será baseado em fatores diversos que não a graça e a
intervenção de Deus.
Uma vez que a igreja vê apenas a responsabilidade do homem, ela
passa a criar meios de condicionar a sua mensagem e a torná-la mais aceitável
177
O termo liberdade expresso pela idéia de pessoa não está sendo considerado neste
ponto sob o aspecto da influência do pecado que faz com que toda a liberdade de escolha seja
determinada pelo pecado. Esta relação da liberdade de escolha em relação ao pecado será
tratado no capítulo sobre as conseqüências da queda.
178 HOEKEMA, Op. Cit pág.17
179 HOEKEMA, Op. Cit. pág. 18 “Embora reconhecendo que a razão pela qual o
homem pecou permanecerá um mistério insondável, será preciso dizer que o homem pôde cair
em pecado exatamente porque ele era uma pessoa, capaz de fazer escolhas – até mesmo
escolhas que fossem contrárias à vontade de Deus.”
66
ao seu público alvo. Meios estes tais como: teatros, cantatas, festas, shows
com cantores “famosos”. A pregação do evangelho perde o lugar para longos
períodos de cânticos regados a muito barulho e “mantras” evangélicos
visualmente chamativos com os grupos de coreografias. A pregação da cruz,
do negar-se a si mesmo, da santificação diária é vilipendiada em prol da
mensagem da cura interior, da expulsão de demônios, da prosperidade. E
assim o homem passa a ser o centro, o protagonista enquanto Deus se torna
mero coadjuvante no processo de salvação.
Métodos evangelísticos são criados com a finalidade de alcançar o
crescimento das igrejas. E cada método sustentando-se sobre a promessa de
ser o mais eficaz no convencimento do pecador. Não que seja errada uma
evangelização engajada, e uma apresentação, mesmo que metódica, do
evangelho de forma consististe. O erro está na pressuposição de que o
convencer está no método e não na atuação de Deus. Sobre este assunto é
interessante a declaração de Bill Hull180 quando fala a respeito do movimento
de crescimento de igreja:
A igreja evangélica parece ter se tornado como uma criança com um brinquedo novo. Igrejas e pastores esperam uma parafernália mais sofisticada da parte dos magos do marketing, e esses últimos são estimulados a aumentar a criatividade até que os métodos acabem por sepultar a mensagem na obscuridade. Esta é a razão pela qual o movimento de crescimento de igreja não deve ser um manual para o crescimento efetivo de igrejas; tem base sociológica, é orientado por dados, e cultua no altar do pragmatismo. Sobretudo, ele valoriza aquilo que dá certo e define sucesso em termos mundanos e míopes. Oferece modelos que não podem ser produzidos e líderes que não podem ser imitados. Os princípios dos negócios modernos são mais reverenciados do que a doutrina; de fato a doutrina é tida geralmente como algo negativo ou pelo menos como distração do alvo de crescimento da igreja.181
De fato vê-se muitas denominações evangélicas com templos cheios e
outras com crescimento explosivo, no entanto percebe-se claramente a
fragilidade teológica de tais denominações e mesmo a concepção de uma
180
Bill Hull é o diretor de ministérios eclesiásticos da Evangelical Free Church of
América (EFCA).
181 HORTON, Michael Scoot. Religião de Poder. São Paulo: Cultura Cristã. 1998 pp.
117, 118
67
divindade construída à imagem do adorador e totalmente deturpada do Deus
das Escrituras. “O ser humano quer um deus que ele possa sentir, tocar, ver e
ouvir em seus próprios termos, e está é a razão para o crescimento da religião
altamente emocional através dos tempos.”182
Assim sendo a igreja só pode se manter fiel à sua missão evangelística
no mundo reconhecendo sim a responsabilidade do homem, mas baseando
todos os seus métodos e práticas na soberania de Deus. “Nosso trabalho
evangelístico é o instrumento que Deus usa para este fim (salvar), mas não
está no instrumento o poder que conduz a salvação. O poder está nas mãos
daquele que usa o instrumento.”183
Esta é a mesma convicção expressa por R. B. Kuiper quando diz:
A tarefa do evangelista é comunicar aos homens o Evangelho; infundir no homem a fé no Evangelho é prerrogativa de Deus. A fé salvadora não é dom do evangelista ao seu ouvinte não salvo; "é dom de Deus" (Efésios 2:8). Nenhum evangelista jamais deu fé em Cristo a uma única alma. Ela é produzida nos corações humanos pelo Espírito Santo, pois "ninguém pode dizer: Jesus é o Senhor senão pelo Espírito Santo" (1 Co 12:3). Nenhum pecador jamais foi convertido por um evangelista; o autor da conversão é Deus.184
Quando a igreja se volta aos métodos com o fim de conseguir angariar
fiéis corre o risco de ter templos cheios de pessoas fazias e sem Deus.
3.2 O perigo de nos preocuparmos exclusivamente com a soberania
de Divina.
Diante da constatação de um Deus soberano que rege todo o universo e
todas s coisas à sua vontade; totalmente independente, que não necessita de
ajuda, mas que executa seus planos a despeito da iniciativa da sua criação
existe o perigo de se negligenciar completamente a responsabilidade do
homem em responder ao evangelho e, por conseguinte “caem na tentação de
182
HORTON, Michael. A Face de Deus: Os perigos e as delícias da intimidade
espiritual. São Paulo: Cultura Cristã. 1999 p.13
183 PACKER. Op Cit. p.24
184 KUIPER, R. B. Evangelização Teocêntrica. São Paulo: PES. Capítulo: Deus e a
suficiência da Salvação. Consultado no Site. www.monergistmo.com acessado em 20/07/2007
68
perder de vista a responsabilidade da igreja na evangelização.”185 O fato de a
Igreja conhecer e reconhecer o governo de Deus não anula a sua tarefa
delegada pelo próprio Jesus de ir o mundo e pregar. E muito menos reduz “a
urgência do imperativo evangelístico.”186
Uma das críticas que se levanta contra a doutrina da eleição é a de que
a igreja não precisa fazer nada em relação a evangelismo. Pois se existem
aqueles que foram eleitos para a salvação eles de qualquer forma serão salvos
independente de qualquer ação por parte da igreja. Por isso não é preciso
evangelizar. Sproul Coloca esta mesma questão nos seguintes termos: “Se a
salvação pessoal é decidida anteriormente, por um imutável decreto divino,
qual é o sentido ou urgência do trabalho de evangelismo?”187
Mas outra pergunta poderia ser formulada: Sem a salvação pessoal
decidida anteriormente pela eleição divina, alguém poderia se salvar? Com
base na teologia Pelagiana a resposta a esta pergunta é um enfático sim. Indo
em direção ao semipelagianismo e ao arminianismo, embora com outras
variáveis a resposta é o mesmo sim. Neste ponto Pelagianos, semipelagianos
e arminianos se encontram e uníssonos proclamam a quatro ventos que ao
homem é possível a salvação por seus próprios esforços, ou o homem pecador
pode, apesar de estar em estado de pecado, ter fé, a partir dele próprio, em
Deus.
Entretanto não é isto que a Bíblia expõe em suas páginas, ao contrário
todo ensino bíblico revela que o homem em estado de pecado está morto em
seus delitos e pecados (Ef 2.8) e, por conseguinte incapaz de se voltar para
Deus com fé. E é neste ponto que a eleição se torna o fundamento para a obra
evangelística da Igreja. Não basta a igreja sair ao mundo pregando o
evangelho, os homens neste mundo são incapazes de por si mesmos se
salvarem. Desta forma se faz necessário contar com a intervenção de Deus.
A eleição é a garantia que obra evangelística da igreja alcançará frutos.
Se não houvesse eleição não haveria razão alguma para a igreja sair ao
mundo pregando, pois ninguém ouviria e nem aceitaria o evangelho. A eleição,
longe de ser um fator desestimulante para a missão da igreja, por pensar que
185 PACKER. Op. Cit. p. 28
186 Ibid. p. 30
187 SPROUL, R. C. Eleitos de Deus; São Paulo: Cultura Cristã. 1998. p. 188
69
apesar de seus esforços os eleitos de qualquer forma serão salvos, ela é o
fator motivador; para que a igreja se dedique com mais contumácia e
entusiasmo à comissão dada pelo próprio Cristo, pois a Igreja pode ter a
certeza que com base na eleição os pecadores se converterão.
4. A Palavra como instrumento do chamamento eficaz
O método estabelecido por Deus e utilizado pelo Espírito Santo para o
despertamento dos eleitos é o método da Palavra de Deus. Claramente se
percebe isto na seqüência elabora pelo Apostolo Paulo em Romanos 10 ao
falar da necessidade de se pregar o evangelho. E fazendo argumentação
teológica com o próprio pensamento paulino pode-se perceber claramente esta
verdade, ou seja, é por meio da pregação do Evangelho que os eleitos são
salvos.
Em Romanos 10.13,14 Paulo inicia dizendo que todo aquele que invocar
o nome do Senhor será salvo. Para que o homem invoque o nome do Senhor é
necessário que ele tenha sido alvo da eleição (Rm 8.30), para que ele
responda ao chamado do evangelho é necessário que tenha fé, pois com diz
Hoekema “Fé é um aspecto essencial da conversão, junto com
arrependimento, sendo ambas necessárias para a salvação.”188 No entanto
está fé é dom de Deus como expresso pelo apóstolo em Efésios 2.8 continua
Hekema:
O fato de que somos completamente dependentes de Deus para a nossa salvação, assim como para todas as coisas, certamente implica não podermos ter fé verdadeira a não ser que sejamos capacitados por Deus.
Porém a continuação do pensamento apostólico é simples: Como
invocarão aquele em quem não creram? E como creram naquele de quem
nada ouviram? E como ouvirão se não há quem pregue? (Rm 10.14). Paulo
deixa de forma clara a necessidade de a igreja cumprir o seu papel no mundo
pregando o evangelho para que os eleitos sejam salvos. A pregação é o meio
de Deus para cumprir o seu propósito e a consumação deste. Por ordem
divina, o evangelho deve ser pregado a todos os povos sem distinção, visto
188 HOEKEMA, Anthony; Salvos pela graça: A doutrina bíblica da Salvação. São Paulo:
Cultura Cristã. 1997, 139
70
não ser conhecido por ninguém o número e a localização dos eleitos. Sobre
isto Calvino declara:
Se alguém se dirige a uma pessoa e lhe diz que se ela não crê, a razão está no fato de ela ter sido ordenada para a destruição, ao dizer isso não só adota uma atitude indolente, mas, também, dá lugar à má intenção. Se alguém estende ao futuro também a afirmação de que os que ouvirão, também não hão de crer porque foram condenados, também estará mais amaldiçoando do que ensinado. Pois não sabemos quem pertence ao número dos predestinados ou quem não pertence, mas devemos estar atentos quanto ao desejo de que todos os homens desejam ser salvos. Assim acontecerá que nós tentaremos fazer com que cada um que encontramos, seja mais participante da nossa paz... Pertence a Deus, contudo tornar efetiva a recompensa daqueles a quem pre-conheceu e predestinou.189
Contudo à Igreja pesa o dever de sair e pregar a todos o evangelho.
Percebe-se aqui a importância de um dos pontos principais da teologia
reformada e que serve para a identificação da igreja verdadeira, qual seja: a
pregação fiel das escrituras. Sendo a exposição da palavra o meio pelo qual
Deus, por seu Espírito desperta os eleitos se torna fundamental a exposição
correta da mensagem do evangelho para que o propósito de Deus seja
alcançado. “Pois Deus se mostra pela luz de sua palavra àqueles que não
mereciam como sinal evidente de sua gratuita bondade”190
4.1 O conteúdo da Mensagem evangelística
Em tempos pós modernos, caracterizado pelo relativismo tem-se visto
uma maquiagem da mensagem da igreja. Deus é colocado apenas como
àquele que pode trazer satisfação pessoal, prosperidade financeira ou um
simples fazedor de milagres. A mensagem em muitos círculos evangélicos é
absolutamente existencialista onde o homem é visto como um ser que tem o
direito de se aproximar de Deus e exigir as suas bênçãos independentemente
de serem convertidos ou não.
Este não é o ministério da Igreja. A igreja não existe para proporcionar a
elevação sócio-econômica de seus freqüentadores, mas para pregar o
evangelho.
189 CALVINO; Institucion de La religión cristiana; Livro 3, cap. 23 § 14
190 Ibid. Livro 3, cap. 24 § 2 pág. 764
71
A mensagem da Igreja, portanto é:
4.1.1 Mensagem sobre o Deus verdadeiro
Todos os homens trazem como conhecimento inato a existência de um
ser superior. Isto se pode verificar pela simples observação. Todas as culturas
de todos os continentes possuem as suas divindades. Isto é algo claro, visto
que o homem foi criado para ter comunhão com Deus e longe deste Deus cria
os seus próprios deuses caindo assim na idolatria. Calvino falando a respeito
deste senso da divindade no homem diz:
Está esculpido na alma de cada homem um sentimento da divindade, o qual de nenhum modo se pode destruir, e que naturalmente está arraigado em todos esta convicção: que há um Deus.191
Este Deus se revela ao homem por meio da criação, se mostrando
poderoso e criador. Entretanto em seu estado de pecado o homem é incapaz
de ver ao Deus verdadeiro, e passa a adorar a criatura no lugar do criador. À
igreja é dado o ministério de apresentar o Deus verdadeiro por meio da
pregação do Evangelho, para que, por meio das escrituras os homens possam
encontra-se com o verdadeiro Deus. Desta forma a mensagem da Igreja
consiste na apresentação deste Deus por meio do evangelho.
É interessante perceber que o fator motivador para a obra evangelística
do apóstolo Paulo era levar aos pagãos o conhecimento do Deus verdadeiro
para que ele pudesse ser adorado e reconhecido como criador e soberano.
Explicando aos cristãos em Roma o evangelho que ele apresentaria na
Espanha
Paulo começa dizendo que a ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça. Que Deus se revela à humanidade através da criação, do que chamamos de revelação natural... Ele diz nos versos 19 e 20 (capítulo 1 ) que os atributos de Deus, sua glória, divindade, majestade são conhecidos pelas coisas que Deus criou...No verso 21 ele diz: “Tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus”. Aqui está à preocupação de Paulo, Deus não foi glorificado pelos pagãos como deveria ter sido, como
191
CALVINO; Institucion de La religión cristiana; Livro 1, cap. 3 § 4
72
criador, majestoso, que se revela na natureza, não deram graças a Deus.192
A preocupação de Paulo é apresentar a Deus para que o homem
pecador possa glorificá-lo como Deus. A mesma função é dada a Igreja hoje.
Os homens não podem se aproximar de um Deus que desconhecem, desta
forma a mensagem evangelística da igreja consiste em pregar a Deus, seu
caráter, seus atributos e o é o dever que o homem tem para com este Deus. “O
evangelho começa ensinado-nos que, como criaturas, somos absolutamente
dependentes de Deus, e que ele, como criador, tem direito absoluto sobre
nós.”193
4.1.2 Mensagem sobre o pecado
A igreja é levada ao mundo para anunciar a condição do homem frente
ao Deus santo e declarar como arautos de Cristo a proximidade do julgamento
divino. A igreja não pode mascarar a mensagem, a tornar mais agradável. “Não
estamos evangelizando se não fizermos nada mais do que apresentar a Cristo,
como se fosse um meio de satisfação dos desejos que o homem possa
sentir.”194
A mensagem sobre o pecado deve levar as pessoas a mais que um
peso de consciência, mas a uma convicção real “a cerca da condição em que
se encontram que é de alienados de Deus pelo seu pecado e de pessoas à
mercê da sua condenação, hostilidade e ira, de modo que sua primeira
necessidade é a de restauração do relacionamento com ele.”195 A maior
necessidade do homem é a restauração de seu relacionamento com seu
criador que foi perdido pelo pecado e a fuga da perdição eterna preparada a
todos aqueles que rejeitarem o evangelho de Cristo.
Porém quando a mensagem da cruz é trocada pela mensagem da
prosperidade, da cura das enfermidades, da harmonia dos relacionamentos, da
expulsão dos demônios o homem em seu estado de pecado continua longe de
192
LOPES, Restaurando a Teologia da Evangelização
193 PACKER. Op. Cit. pág. 53
194 Ibid. pág. 55
195 Ibid. pág. 56
73
Deus embora buscando algum benefício supostamente lhe prometido pelos
“representantes” de Deus assim:
As pessoas não buscam a Deus. Elas buscam os benefícios que somente Deus pode lhes dar. O pecado do homem decaído é este: o homem busca benefícios de Deus ao mesmo tempo em que foge do próprio Deus. Somos por natureza fugitivos.196
E quando as bênçãos de Deus se tornam o a razão motivadora para que
as igrejas estejam cheias, e a mensagem do pecado e da necessidade de
salvação é negligenciada, maquiada e esquecida a Igreja se torna maldição,
deixando de ser instrumento de Deus na salvação. Fazendo com que homens
ganhem o mundo inteiro, mas percam a suas almas. Por isso necessariamente
a mensagem do evangelho deve declara em alto e bom som o estado espiritual
do homem e seu destino eterno caso permaneça neste caminho.
4.1.3 Uma mensagem a cerca de Cristo
Cristo é o centro do evangelho. É a execução no tempo e no espaço de
todo o plano e propósito de Deus. Sem Cristo não existe salvação, sem Cristo
não existe reconciliação. Visto que Cristo é a base da eleição ele também é o
centro da mensagem evangelística da Igreja. Pois, a mensagem que esta igreja
deve levar ao mundo é a mensagem do Cristo crucificado que tira o pecado do
mundo, se tornando o único caminho que leva o homem pecador a Deus. Em
última análise o homem será salvo por sua fé em Cristo, como será condenado
aquele que rejeitar a Cristo. “A cruz de Cristo foi mais que o método de Deus
para nos salvar; é a nossa própria cruz, nossa morte e ressurreição. Estamos
unidos com Cristo.”197
Sendo a mensagem centralizada em Cristo ressalta a graça dispensada
sobre os homens por meio de Jesus, pois “o foco central do Cristianismo é a
graça de Deus colocada sobre seres humanos pecadores através da morte e
ressurreição de Jesus.”198
Portanto duas realidades sobre Cristo se constituem o centro da
mensagem cristã. Quais sejam: sua divindade e humanidade e sua obra
196
SPROUL, eleitos de Deus. Op. Cit. pág. 95
197 HORTON, A Face de Deus. Op. Cit. pág. 178
198 HORTON. Religião de Poder. Op. Cit. pág. 208
74
expiatória. Sendo Cristo a solução de Deus para a condição de pecado do
homem se faz absolutamente necessária a sua apresentação como homem e
sem pecado e, por conseguinte capaz de cumprir todo o propósito de Deus,
que e o de cumprir perfeitamente a lei de Deus e morrer em prol dos
pecadores. Aliás, toda a base da doutrina da Justificação se baseia nesta obra
de Cristo. A definição da justificação deixe isto bem claro:
A justificação pode ser definida como o ato gracioso e judicial de Deus pelo qual ele declara justos os pecadores crentes, na base da justiça de Cristo que lhe é creditada, perdoando seus pecados, adotando-os como filhos, e dando-lhes direito à vida eterna.199
A importância crucial de se apresentar a Cristo se baseia no fato de que
sem Cristo os homens continuam em seu estado de pecado e
conseqüentemente condenados a perdição eterna. Um evangelho que não
apresente a Cristo deixa de ser o poder de Deus para a salvação e se torna em
mero discurso moralista incapaz de aproximar o homem perdido de Deus.
4.1.4 Convocação para se responder a Cristo pessoalmente em
arrependimento e fé
Este é o ponto culminante do ministério da igreja no mundo. O da
convocação do pecador para que se decida por Deus em arrependimento e fé.
Para se chegar neste ponto a Igreja se fundamenta da eleição divina. Visto ela
não conhecer quem são os eleitos ela faz este convite de forma geral, a todas
as pessoas, pois “quando o Novo testamento fala a respeito de pessoas vindo
à salvação, ele fala em termos da resposta pessoal ao convite do próprio
Cristo200.”
O convite feito pelo pregador do evangelho para que o pecador se
arrependa e responda com fé ao evangelho é absolutamente consistente com a
teologia reforma. Lembrando do que já foi visto, a processo de salvação na
teologia reformada é monergistica em seu início e sinergistica em seu
desenvolvimento201.
199
HOEKEMA, Salvos pela Graça. Op. Cit. pág. 179
200 GRUDEM. Op. Cit . pág. 325
201 Vide capítulo 3 – também, Sproul. Sola Gratia. Op. Cit. Pág. 75
75
Portanto, qualquer proclamação genuína do evangelho deve incluir o convite para tomar a decisão consciente de abandonar os pecados e vir a Cristo com fé, pedindo-lhe o perdão dos pecados. Se tanto a necessidade de arrependimento de pecados como a necessidade de confiar em Cristo para o perdão forem negligenciados, não terá havido uma plena e verdadeira proclamação do evangelho.202
O método estabelecido por Deus, para que o eleito seja alcançado é a
pregação genuína da Palavra. Uma vez que a igreja abre-mão desta tarefa ela
deixa de cumprir o seu ministério deixando de ser sal da terra e luz do mundo.
Os métodos não salvam, quem salva é Jesus. Esta parece ser uma conclusão
lógica, mas que infelizmente tem sido esquecida por muitos. Quando se
valoriza demasiadamente o método, ele passa a ser o centro para se alcançar
um objetivo final que é a conversão do pecador. Mas sem que haja o
chamamento eficaz da parte de Deus, ao coração do eleito nenhum método
surtirá efeito.
O método dos métodos, mesmo em tempos pós modernos, ainda é a
pregação do Evangelho. Sem o anunciou da obra de Cristo com descrita nas
páginas sagradas da Bíblia o coração do homem continuará longe de Deus,
mesmo que esteja dentro de um templo. Como Diz Paulo aos coríntios:
“Visto como, na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por sua própria
sabedoria, aprouve a Deus salvar os que crêem pela loucura da pregação.”
(1Co 1.21)
É mister que a verdadeira igreja de Cristo, sabendo da condição
espiritual do homem e, por conseguinte da sua incapacidade de se voltar para
Deus. Tendo como fundamento a garantia da salvação dos eleitos; saia ao
mundo anunciando a mensagem gloriosa do evangelho.
202
GRUDEM. Op. Cit pág. 326
76
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quiçá nunca se tenha falado tanto em crescimento numérico da igreja
como nestes últimos anos. Muitas conferências são realizadas, trazendo os
grandes “alquimistas” com suas fórmulas secretas e seus rituais litúrgicos
prometendo uma igreja grande e cheia de membros. Aliás, esta tem sido a
pérola de grande valor e sustentada como prêmio por muitas denominações.
A pressão do crescimento pode levar a igreja a entrar por caminho
perigoso, o do pragmatismo. Principalmente a igreja presbiteriana do Brasil. A
IPB sempre foi caracterizada pela sua formação teológica, sua mensagem
centralizada nas doutrinas da graça. Conclamando o homem em pecado a se
arrepender e se voltar para Deus. Seus Cultos sempre tiveram como ponto
central e principal a exposição das escrituras e o incentivo a todos os seus
membros a que conheçam a doutrina de sua igreja.
No entanto esta caracterização da Igreja Presbiteriana do Brasil tem
mudado ao longo do tempo, principalmente pela influência neopentecostal nos
círculos reformados. Influência esta nem tanto no que tange a teologia, mas
principalmente as práticas203tendo como objetivo alcançar o resultado em
números que estas igrejas alcançam. E para que este fim seja alcançado à
descaracterização é completa, e daí ver-se igrejas que sustentam em suas
placas o nome de “Igreja Presbiteriana do Brasil”, mas com práticas que a
assemelham a outras denominações.
As conseqüências práticas da supervalorização do número são
facilmente perceptivas:
1º Falta de conteúdo doutrinário da Igreja – o que importa é crescer e
para que haja crescimento não há a necessidade de doutrinamento. Doutrina,
ensinam os estrategistas do crescimento, não faz a igreja crescer, mas se
estagnar.
2º A descentralização do culto em Deus. Em uma igreja que visa
apenas o crescimento numérico o culto é mais relacional, ou seja, menos
203
Em viagem a cidade de Três Rios no interior do Rio de Janeiro, em 2003 ouvi a
propaganda no rádio da IPB da cidade em que o Pastor convidava a todos para “A quinta feira
da libertação”. Teoricamente um culto que seria realizado em sua igreja
77
vertical e mais horizontal. Grandes momentos são gastos na partilha de
experiências e na imposição de ”amuletos” evangélicos que “fortalecem a fé”
dos fiéis, tais como unção das mãos, fitas coloridas, rosas abençoadas, água
para ungir a casa e etc. Deus se torna apenas um detalhe no meio disto tudo.
Apenas aquele que existe para abençoar o freqüentador do templo que na
prática não possui nenhum compromisso concreto com a instituição.
3º o sincretismo religiosos dos crentes. A igreja que tem como objetivo
apenas o crescimento não questiona as práticas de seus adeptos, mas aceita
tudo o que fazem e o que crêem como sendo normal. Por isso se vê tão
claramente dentro de templos práticas oriundas de religiões pseudocrístãos,
como por exemplo, a prática de se colocar o copo de água sobre o rádio ou a
TV para ser “abençoada” pelo pregador. Tal prática é oriunda da legião da boa
vontade204 mas que arrebanhou muitos adeptos nas fronteiras evangélicas.
Mas será que a igreja não deve pensar em crescimento? Claro que sim.
A missão da Igreja enquanto neste mundo é alcançar os eleitos e fazer com
que eles ouçam a mensagem de Deus por meio da pregação do evangelho e
sejam eficazmente chamados. Não há erro em se querer uma igreja grande e
trabalhar para que este alvo seja alcançado. O erro é colocar este objetivo
como o maior, e o que precisa a qualquer preço ser alcançado.
Crescimento numérico é algo bíblico. Contudo o crescimento entendido
pelas escrituras é mais que numérico, mas: é o alargamento do reino de Deus
alcançando o mundo por meio dos conversos. Por isso Cristo disse que seus
seguidores seriam o sal da terra e a luz do mundo (MT 5.13,14). E Paulo
falando ao Filipenses disse que embora a Igreja estivesse no meio de uma
geração pervertida e corrupta eles deveriam resplandecer como luzeiros (Fl
2.15). O reino entrando no mundo e prevalecendo.
Toda a Obra evangelística da Igreja deve ter em mente a realidade do
pecado no coração do homem que o afasta de Deus e a necessidade que este
homem tem de se arrepender de seus atos e de se voltar para Deus. Esta é a
mensagem que à igreja foi confiada para transmitir ao mundo. E somente isto
lhe é cobrado, fidelidade na mensagem. O homem em pecado precisa de
Cristo e é necessário ser fiel levando esta mensagem.
204
Apostila de Heresiologia do curso de Apologética – pág. 19 – prof. Ulisses Horta
78
A base teológica para a proclamação do evangelho é a eleição. Quando
a Igreja entende que os eleitos serão salvos, e que Deus decidiu alcançar estes
corações pelo ministério da palavra que foi confiado a Igreja, a obra
evangelística é despida de toda pressão para que números sejam alcançados,
pois se percebe que o que é cobrado da igreja é a obediência a missão de ir e
pregar, não o converter os corações. Por isso não há a necessidade de se
mascarar a mensagem, de torná-la mais atraente e menos agressiva ao
ouvinte, pelo contrário o pregador que sabe que é Deus quem chama; que
Deus que edifica; que é Deus que consola se prenderá apenas no que diz as
escrituras, pois é por meio dela que Deus decidiu agir.
A vocação eficaz é sem sombra de dúvidas uma doutrina libertadora
para o pregador do evangelho. Pois aquele aquém Deus decidiu chamar ele
chamará eficazmente. Contudo é imprescindível a consciência da igreja que ela
é o instrumento para a evangelização e deve por isso cumprir sua vocação
enquanto no mundo de indo pregar o evangelho a toda criatura.
A GRANDE COMISSÃO205
Disse Jesus:” Ide por todo o mundo, E pregai o eterno dom
Da salvação que, com amor profundo, Dá o Deus gracioso e bom!”
Tendo na cruz a afirmação do amor, Proclamai o dom do Redentor!
Oh! Conquistai Almas perdidas, buscai
O pecador enfermo, quase moribundo
Vamos, irmãos, levar Essa luz ao mundo inteiro!
Vamos, irmãos, contar Que esse dom é verdadeiro!
Vamos, irmãos, pregar Mui confiados no Cordeiro
Que, na cruz, já fez A nossa Redenção
Soli Deo Gloria
205 Hino 282 do Hinário Novo Cântico
79
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