políticas públicas de saneamento e abastecimento de água em ituiutaba/mg
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AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SANEMAMENTO NO BRASIL ENTRE 1930 E 1970 E O ABASTECIMENTO DE ÁGUA EM ITUIUTABA-MG
Maria Angélica da Costa Silva – [email protected]
Universidade Federal de Uberlândia – Faculdade de Ciências Integradas do Pontal - UFU/FACIP
Eixo Temático 4: Meio Ambiente e espaço urbano Resumo: Este trabalho é parte da pesquisa realizada para o Trabalho de Conclusão de
Curso de graduação em História. Nele tratar-se-á do abastecimento de água na cidade de
Ituiutaba – MG, dentro da conjuntura nacional, de modo a apresentar a relação entre os
programas de saneamento e saúde do Governo Federal e a instalação do sistema de
abastecimento de água local. O Objetivo do trabalho é apresentar esse processo de modo
geral, dentro da conjuntura do processo de modernização urbana da cidade de Ituiutaba,
MG. Dessa forma, é possível expor também como as políticas federais foram impactantes
para a cidade, assim como para outros municípios do interior do país que demandavam
recursos no setor de saneamento, e, da mesma forma, na região do Triângulo Mineiro. Isso
reflete diretamente na qualidade de vida da população e proporciona condições para o
desenvolvimento urbano, material e humano nesses locais. A metodologia de pesquisa
consistiu em levantamento bibliográfico, discussão teórico-metodológica e análise
documental, incluindo legislação, fotografias, jornais, relatórios e atas do Legislativo
municipal. Por meio dos documentos foi possível empreender uma narrativa linear a respeito
do processo de instalação da autarquia municipal SAE- Superintendência de Água e
Esgotos, na cidade de Ituiutaba, processo compreendido no período entre os anos 1963 e
1970, presente na conjuntura de modernização urbana da cidade, iniciada em 1955. Ao
mesmo tempo, se compara brevemente o processo na cidade, com o que ocorreu nos
municípios vizinhos, também afetados pelas mesmas políticas públicas voltadas ao
saneamento. O artigo está dividido em três partes que trazem as políticas públicas federais
voltadas ao saneamento e modernização do país, de 1930 a 1970, de modo a explicar o
surgimento da Fundação SESP (Fundação Serviço de Saúde Pública) até o PLANASA
(Plano Nacional de Saneamento). No tópico seguinte, explana-se brevemente a respeito dos
processos de instalação do abastecimento de água de alguns municípios do Triângulo
Mineiro. Por fim, adentra-se no processo de instalação do abastecimento de água na cidade
de Ituiutaba, objetivo primeiro da pesquisa. Dessa forma, é possível ligar a esfera local à
esfera regional e nacional, sem perder de vista as peculiaridades do período estudado, no
que tange ao objeto de estudo, que foi imprescindível para a efetivação do processo de
modernização urbana iniciado na década de 1950, com o aumento de capitais e de
contingente populacional em decorrência das atividades comerciais oriundas do plantio e
beneficiamento de cereais na cidade e na região. Com o aumento do contingente
populacional, a cidade começou a demandar cada vez mais por condições mínimas de
salubridade e organização, de modo que nos meados da década de 1950, começou o
processo de modernização urbana, consistindo em pavimentação de ruas, promulgação de
leis, como os Códigos de Posturas (1955), o Zoneamento Urbano (1955), e o Plano Diretor
do Município. Para a realização de muitas obras, a preocupação com o abastecimento de
água e o despejo de esgotos não eram ignorados, mostrando que havia a preocupação de
ofertar mais salubridade às áreas beneficiadas com as obras, sendo essas áreas,
logicamente, a parte central da cidade. No entanto, muitas das obras, como as estradas e
rodovias, e o abastecimento de água, demandavam investimentos Federais e Estaduais, o
que interferia diretamente no andamento do processo de modernização da cidade. Os
resultados obtidos mostram a importância desse processo para a constituição da cidade no
presente, além estar diretamente ligado à modernização urbana de Ituiutaba. Além disso,
mostra que esse processo esteve diretamente ligado aos programas federais de
saneamento, de modo que a instalação do serviço na cidade somente foi possibilitada
através do financiamento federal. Entre o que pode ser observado no estudo foi que o
processo de modernização urbana da cidade de Ituiutaba ocorreu de forma desconexa ao
longo do século XX, com a valorização das áreas centrais da cidade, que foram
beneficiadas com obras, tais como a pavimentação de vias, iluminação pública,
abastecimento de água e coleta de esgotos. Além disso, o abastecimento de água na
cidade, que era ofertado também em sua grande parte, para a população da parte central da
cidade, era insuficiente para atender a uma demanda crescente, sobretudo com o
crescimento populacional vivido no período entre 1955 -1970. Dentre os desdobramentos do
processo de modernização da cidade e da instalação do abastecimento de água em
Ituiutaba, está a forma como a água é gerida, ou seja, a partir da implantação do
abastecimento de água na cidade, a autarquia municipal, SAE (Superintendência de Água e
Esgotos) se manteve atrelada a outras instituições e programas Federais de modo a
aperfeiçoar os serviços, chegando-se a implantar uma estação de tratamento de esgotos,
com a construção da ERPAI (Estação de Recuperação e Preservação Ambiental), obra
concluída em 1999. Além disso, a autarquia zela pela excelência dos serviços prestados à
cidade, que conferem à mesma selos e prêmios de qualidade que promovem o nome da
empresa, como o Isso 9002, outorgado pela BVQI (Bureau Veritas Quality Internacional).
Através da participação em programas que premiam a qualidade dos serviços, a instituição
mantém seu renome ajudando na implantação programas que beneficiam a cidade, como a
coleta seletiva e a construção de um aterro sanitário, que depois de concluídos, passaram a
ser responsabilidade da Prefeitura Municipal. A pesquisa abre, portanto, possibilidades de
investigação no que tange à importância da SAE par a cidade e a sua ligação com outros
órgãos Federais e internacionais, no que tange ao consumo e exploração dos recursos
hídricos locais, e à preservação ambiental.
Palavras-chave: Ituiutaba; modernização; abastecimento de água; SAE
Os projetos modernizadores do Brasil de 1930 a 1970: da Fundação SESP ao
PLANASA
A responsabilidade do saneamento no Brasil entre as décadas de 1940 e 1960 ficou
a cargo do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), órgão federal formado a partir de um
acordo bilateral entre os Estados Unidos e o Brasil, no contexto da Segunda Guerra
Mundial, durante o governo Vargas. Em 1960 o SESP foi transformado em Fundação
Serviço de Saúde Pública (FSESP), durante a gestão do ex-presidente Juscelino
Kubitscheck. Nove anos após a criação deste, surgiu o Plano Nacional de Saneamento
(PLANASA), durante a ditadura militar, no governo de Costa e Silva. O PLANASA era
responsável por algumas das políticas de saneamento que ainda são vigentes, e influenciou
diretamente na criação da Companhia de Abastecimento de Minas Gerais (COPASA).
No entanto, alguns municípios mineiros, inclusive da região do Triângulo, não são
vinculados ao órgão, por possuírem um sistema de abastecimento local efetuado antes da
década de 1970, através da iniciativa municipal, ou no momento em que ainda existia o
SESP ou o FSESP, órgão que esteve responsável pelo saneamento em diversas
localidades do país até os anos 1970.
O Plano Nacional de Saneamento, PLANASA, foi criado em 1971, visava a oferta de
recursos financeiros aos estados brasileiros para que eles criassem suas próprias
companhias de saneamento. A implementação do PLANASA aponta para o aumento da
demanda urbana de saneamento básico, em decorrência do recente processo de
urbanização no país, nas décadas de 1950 e 1960. Com isso, fica evidente que as cidades
passavam por um processo de transformação naquele período, o que, entre outras coisas,
resultou num aumento de um contingente populacional em busca de oportunidades de
emprego nas cidades e nas indústrias. Além disso, com a expansão da fronteira agrícola, e
a concentração da propriedade fundiária, muitas famílias camponesas precisaram se
adequar à vida urbana, em detrimento da expulsão das mesmas do campo, seja pela perda
das terras, seja pela falta de emprego, visto que os investimentos em maquinário e insumos
ajudavam a enxugar o uso da mão-de-obra camponesa. Ao se estabelecerem no meio
urbano, essas populações, se inseriam nas atividades produtivas na indústria ou na
prestação de serviços, de acordo com as possibilidades de sua formação e especialização.
Muitas acabavam à margem do mercado de trabalho e tentavam sobreviver nas áreas
periféricas, cuja valorização do solo era menor, tanto pela distância do centro econômico
das cidades, como pela falta de infraestrutura, como luz elétrica e saneamento básico, além
da precariedade das moradias, que tornavam o custo de vida menor. Com isso, não
somente as obras de saneamento se faziam necessárias para manter a salubridade nesses
locais, e no país em geral, como também o governo empreendeu políticas educacionais,
visando adequar aquelas populações às normas de comportamento condizentes à
manutenção da saúde.
No contexto do regime militar foram tomadas providências em relação à demanda de
abastecimento de água no país, dando continuidade às políticas públicas desenvolvidas até
o momento, por meio do FSESP (Fundação Serviço de Saúde Pública). Em decorrência da
grande necessidade de se implantar o sistema de abastecimento em várias cidades
brasileiras, foi criado o Conselho Nacional de Saneamento (CONSANE), durante o governo
de Castelo Branco. O objetivo do CONSANE era o de coordenar a política de saneamento
no Brasil. No entanto, o Conselho não foi capaz de atender aos objetivos de atender à
demanda por saneamento, entre outros cuidados relacionados à conservação da
salubridade urbana. Assim, as políticas públicas de saneamento continuaram a cargo do
FSESP e do Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu), com o apoio do Banco
Nacional de Habitação (BNH)1, do Ministério do Interior e do Ministério da Saúde
(GAMA:2010; LUCENA:2006).
A solução definitiva para a criação e implementação de um programa que
conseguisse aumentar a quantidade de políticas públicas de saneamento ocorreria a partir
da criação do PLANASA, em 1970. Esta ocorreu no contexto em que os estudos do BNH,
feitos em 1967, apontavam que os déficits no abastecimento de água e esgotos no país,
eram respectivamente, de 50% e 70%, além de verificar a falta de coordenação entre as
esferas federal, estadual e municipal, insuficiência dos recursos financeiros disponíveis e a
despreocupação com o tratamento dos esgotos, antes de sua destinação final (LUCENA,
2006:4-5). Os recursos para o financiamento das obras viriam do FGTS2, que seriam usados
pelo BNH para efetuar os aportes necessários para as obras de saneamento, a partir de
1967. Para isso, foi criado o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS), órgão responsável
pelo financiamento das obras, gerenciado pelo BNH. Cada estado deveria criar um fundo,
denominado Fundo de Financiamento para Águas e Esgotos (FAE), em consonância com
seu orçamento, além de uma companhia estadual de saneamento. As federações deveriam
investir pelo menos 50% dos recursos de seu FAE para a implantação do serviço de
saneamento, e criar Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESBs). Estas, por sua
vez, implantariam os sistemas de abastecimento nas cidades sob a forma de monopólio,
com a concessão das prefeituras. Nesse momento é importante também ressaltar a
participação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que financiou as
construções das companhias estaduais de saneamento (SALLES: 2009; ARRETCHE:
2004).
Malgrado a resistência de algumas cidades em conceder o monopólio dos serviços
de saneamento às companhias estaduais, a maior parte dos municípios aderiu ao programa,
seja por não possuírem os serviços, seja pela pressão exercida pelo governo militar, visando
implantar um sistema centralizado e técnico de administração. Dessa forma, apenas um
quarto dos sistemas existentes até o momento da implementação do PLANASA
permaneceram aos moldes de administração de autarquias municipais, como foram
implantadas pelo SESP e pela FSESP. Outra característica do modelo de administração
proposto pelo PLANASA foi a intenção dos governos militares de despolitizar as ações
coronelísticas das pequenas e médias cidades, impondo um modelo de administração
tecnocrático e centralizado na criação do Fundo Nacional de Saneamento (FISANE) e
1 O BNH – Banco Nacional de Habitação – foi criado em 1964 e ficou responsável pelo financiamento de
programas de habitação e logo em seguida também ficaria responsável pelo financiamento de obras de
saneamento nos municípios. 2 Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, criado em 1966.
tendo, novamente, o BNH como instituição de financiamento das obras a serem feitas
(SALLES, 2009: 43-44).
O abastecimento de água na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
Muitas cidades da região do Triângulo Mineiro têm seus sistemas de saneamento
mantidos pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA). Esta foi criada em
1974, após a implementação do PLANASA. O sistema funciona aos moldes exigidos pelo
Plano nacional, no qual a companhia recebeu a concessão de monopólio dos serviços das
prefeituras dos municípios mineiros.
Até o ano de 1963 o estado de Minas Gerais não possuía uma companhia de
abastecimento de água, tampouco uma política pública de saneamento voltada aos
municípios. Naquele ano o governo estadual (José Magalhães Pinto – 1961 a 1966) criou a
Companhia Mineira de Agua e Esgotos – COMAG3. Até então, existia um autarquia
municipal, na cidade de Belo Horizonte, o Departamento Municipal de Água e Esgotos
(Dmae) que era responsável pelo abastecimento de água e coleta de dejetos residenciais.
Quando o PLANASA foi criado, as duas companhias, DMAE e COMAG se uniram
originando a COPASA/MG, em 19744. Dos 73 municípios da mesorregião do Triângulo
Mineiro e Alto Paranaíba5, 23 deles não são contemplados pelos serviços da COPASA6.
Esse dado aponta para duas possibilidades: significa que estes municípios, ao menos em
sua maioria, podem ter sido atendidos com relação às políticas públicas de saneamento
após a criação do PLANASA, ou seja, a partir dos anos 1970, ou que suas autarquias
municipais, aderiram à administração da COPASA.
Algumas cidades do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, assim como Ituiutaba, não
têm seu sistema de saneamento gerido pela companhia de saneamento do Estado. Entre
elas, as cidades de Uberlândia e Uberaba. No entanto, o histórico das instituições aponta
para iniciativas locais para o suprimento da demanda de saneamento, antes dos anos 1940.
Em Uberlândia, o Departamento Municipal de Água e Esgotos, (Dmae) foi criado em 1967,
com a construção da Estação de Tratamento de Água “Sucupira”. Possivelmente, o sistema
foi contemplado pela iniciativa do FSESP. Já a cidade de Uberaba possui a autarquia
municipal Centro Operacional de Desenvolvimento e Saneamento (Codau), criada em 1998.
Essa autarquia é responsável pela captação, tratamento e distribuição de água na cidade e
pelo tratamento e despejo de esgotos sanitários. No entanto, a cidade possuía um sistema
3 MINAS GERAIS, Lei nº 2. 842 DE 05/07/1963.
4 MINAS GERAIS, Lei nº 6.475, de 14/11/1974.
5<http://www.mg.gov.br/governomg/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=69547&chPlc=69
547&termos=s&app=governomg&tax=0&taxn=5922>. Acessado em 12/2/14. 6 <http://www.copasa.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=22>. Acessado em 12/02/14.
de abastecimento de água de aproximadamente quarenta anos antes da criação7 do
CODAU, (UBERABA, Lei Nº 106/1998), levando a crer que o responsável pela obra foi o
SESP.
O caso da cidade de Ituiutaba ocorreu de forma semelhante às cidades de
Uberlândia e Uberaba. O abastecimento de água foi implantado com o auxílio do SESP,
obtendo financiamento para a execução de parte das obras. Mesmo com a implantação do
PLANASA a autarquia municipal, a Superintendência de Água e Esgotos (SAE), não foi
encampada pela COPASA.
A implantação do abastecimento de água e esgotos em Ituiutaba – a fundação da SAE
– Superintendência de Água e Esgotos
No início da década de 1960 a população urbana estava em crescimento e com ela a
demanda pelo fornecimento de água. Esse aumento ocorria devido ao contingente,
populacional, diretamente ligado à produção e beneficiamento de cereais, no município e
região (SILVA, 1997). Visando os auspícios que a agricultura trazia a iniciativa privada, nos
anos 1950 e 1960, começou a equipar a cidade com máquinas beneficiadoras de arroz,
casas de comércio, pensões, hotéis, visando atender atrair mais possibilidades de negócio.
Dessa forma, o esforço para a implantação do abastecimento de água apresenta a
convergência da demanda da população e dos interesses da prefeitura municipal, no sentido
de oferecer uma estrutura urbana melhor para uma cidade que estava se tornando um
referencial na região, devido à sua produção agrícola. Assim, foram unidos esforços para a
modernização da cidade, alavancados pela instalação do abastecimento de água.
Para o SESP efetuar as obras de abastecimento de água nos municípios, estes
deveriam arcar com 50% do custo total das obras. No entanto, desde o início da década de
1950, o sistema de água existente em Ituiutaba já apresentava sinais de insuficiência em
relação à população urbana. Nesse interim, nas gestões municipais de 1950 a 1960 buscou-
se uma alternativa para atender à demanda de abastecimento de água: foram perfurados 31
poços artesianos na cidade, pela escola de sondadores, na gestão de Antônio Souza
Martins (1956 a 1959). Destes, três foram cedidos ao Clube Ituiutaba e doze deles
destinados à distribuição de água à população. Dessa forma, a água era reservada no
tanque de distribuição da cidade, e de lá distribuída às residências8. Com isso, as redes de
água e esgotos puderam ser ampliadas, juntamente com a efetivação de obras urbanas de
pavimentação e urbanização.
7 <http://serv1.codau.com.br:8080/historia.php> Acessado em: 13/2/14.
8 Relatório de estudos preliminares apresentado à prefeitura de Ituiutaba, para implantação do
sistema de abastecimento e tratamento de água. Data aproximada: 1955/56. p. 10.
Durante os anos de 1958 a 1967 ocorreu um elevado número de promulgações de
leis municipais e de obras relacionadas ao saneamento na cidade, estendendo as redes de
água e esgotos, a partir da área central ou nos conjuntos habitacionais, como no local9 onde
seriam construídas 300 habitações de acordo com o projeto da Companhia de Habitação de
Minas Gerais (COHAB/MG). A prefeitura adquiriu um empréstimo junto ao BNH10 que visava
efetuar obras de saneamento e de infraestrutura no lugar destinado ao conjunto
habitacional. O conjugado de benfeitorias elencava a terraplanagem, construção de redes
de água e esgotos, galerias pluviais e pavimentação11. Além desse novo bairro que seria
construído, o bairro Junqueira, considerado na época um bairro periférico, também recebeu
benfeitorias, como as obras de saneamento, energia elétrica e ajardinamento de praças.
Outras obras relevantes para o saneamento urbano foram as construções de galerias
pluviais e emissários de esgotos nas bacias dos córregos Sujo12 e Pirapitinga, locais onde
se dejetavam os esgotos residenciais da cidade.
As obras relacionadas ao saneamento destinavam-se ao cumprimento das
exigências feitas pelos engenheiros do SESP para a instalação do abastecimento de água
na cidade. Além do cumprimento dessas obras, ocorreram numerosas negociações para
conseguir efetivar o pleito. O início das tentativas de instalação do abastecimento de água
começa quando o SESP finaliza o orçamento das obras, em 1960. Para as atividades de
levantamento, a Prefeitura Municipal, assinou um contrato com o SESP, no qual esta
instituição faria o projeto e o orçamento do serviço de abastecimento de água da cidade,
dentro do prazo de quatro meses. Para isso, a prefeitura pagou ao SESP a quantia de Cr$
350.000,0013.
Terminado o projeto, ficou estabelecido que o serviço de abastecimento de água
seria composto por uma estação de captação e casa de bombas, no leito do ribeirão São
Lourenço, composta por uma barragem dotada de posto de sucção e conjuntos elevatórios.
Dessa barragem, a água seguiria por uma rede adutora, composta por adutora de recalque
com 300 mm de diâmetro e 4000 m de comprimento, até a estação de tratamento com
capacidade de 75 litros por segundo, onde estaria localizado também o reservatório de
distribuição de 1000 m³ para uma rede de distribuição com capacidade de atender até 25
000 pessoas, aproveitando-se a rede já existente na cidade. O custo total estimado para a
obra seria de Cr$ 46.690.000,00, podendo o SESP arcar com 50% do total. Além disso,
9 Hoje Bairro Ipiranga.
10 Banco Nacional de Habitação criado no governo ditatorial de Castello Branco, em 1964.
11 ITUIUTABA, Lei nº 1136 de 16/06/1967.
12 O córrego Sujo passou se chamar Ribeirão São José em 1968 (ITUIUTABA, Lei nº 1223, de 26/03/
1968). 13
ITUIUTABA, Lei nº 577 de 04/08/1960.
caso decidissem utilizar uma adutora de recalque maior, com 16 polegadas, poderiam
dobrar a capacidade de abastecimento do sistema14.
De acordo com a reportagem do jornal Folha de Ituiutaba, a primeira etapa das obras
iniciaria em novembro de 1963, com a construção da barragem e da estação de captação e
adução no ribeirão São Lourenço. Para tanto, a FSESP15 arcaria com a quantia de Cr$
2.400.000,00, e a Prefeitura Municipal com a quantia de Cr$ 5.000.000,00. Já no mês de
fevereiro do ano seguinte, há outra notícia no mesmo jornal, afirmando que o governo
arcaria com as despesas das obras do novo sistema de abastecimento de água, através do
Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS)16. Dessa forma, não é possível
datar precisamente o início das obras, podendo elas ter começado realmente no ano de
1963, e continuado no ano seguinte, mediante financiamento do governo, ou em 1964.
Em 1967 a primeira etapa das obras do abastecimento de água, em Ituiutaba, já se
encontrava bastante adiantada, com a estação de captação e o reservatório de distribuição
quase pronto. De acordo com o jornal Município de Ituiutaba17 obras se encontravam em
fase de finalização. A reportagem é ilustrada com uma fotografia da estação de distribuição,
uma obra que se apresenta em estágio avançado, com o prédio já construído e em fase de
acabamento. Atualmente, este local ainda funciona para tal fim, além de abrigar também a
administração da autarquia municipal, a SAE e a estação de tratamento de água.
O ano de 1967 foi decisivo para a efetivação do projeto de abastecimento de água
em Ituiutaba: Em fevereiro daquele ano o prefeito Samir Tannús ficou encarregado de firmar
contrato com a FSESP para instalar a rede de abastecimento de água e sua expansão, por
meio de financiamento, com a instituição financiadora que seria indicada pela Fundação ou
pelo DNOS18. Nesse momento, o Governo Castello Branco já apontava para a centralização
das políticas de saneamento no país, visando atender à grande demanda da população.
Ainda no ano de 1967 a prefeitura criou a autarquia municipal, SAE19 que
respeitando as exigências do FSESP, seria autônoma em relação à prefeitura, no entanto,
uma instituição de economia mista, ou seja, parte do capital estaria sob a responsabilidade
14
Jornal Folha de Ituiutaba, nº 1032, 29/6/1960. 15
O SESP foi transformado em FSESP em 1960. 16
Jornal Folha de Ituiutaba, nº 1304. 1º/02/1964. O DNOS foi criado em 1940 (governo Vargas). 17
O jornal Município de Ituiutaba foi um periódico mantido pela Prefeitura municipal, que circulou na gestão do ex-prefeito Samir Tannús (1967-1971), de 1967 a 1970. Suas publicações de 6 páginas, com uma formatação simples, de pouco conteúdo editorial, veiculavam informações das reuniões da câmara Municipal, ofícios, leis, editais. Além disso, também trazia notícias da sociedade tijucana, do governo municipal e fazia propaganda da gestão de Samir Tannús. 18
ITUIUTABA, Lei nº 1101, de 27/02/1967. 19
ITUIUTABA, Lei nº 1208 DE 27/12/1967.
da administração municipal, além de também responder à FSESP20. Esta empresa,
futuramente, poderia aderir ou não à encampação da companhia de abastecimento
estadual21.
O contrato de financiamento pelo BID só foi assinado em 1969, tendo o Banco do
Brasil como intermediador, ou seja, a instituição financeira responsável pelo depósito do
BID, destinado à SAE – Superintendência de Água e Esgotos. A verba estava designada
para o fim das obras, pois a estação de distribuição estava pronta.
O último passo para a efetivação do serviço foi a autorização da prefeitura para que
fossem criadas as tarifas do serviço de água22. No ano seguinte, as obras foram finalizadas
e a população passou a contar com o serviço da autarquia.
A SAE permaneceu vinculada à FSESP, e depois à Funasa até 1999, quando
retornou à Administração Municipal. Neste mesmo ano, as obras da Estação de
Recuperação e Preservação Ambiental (ERPAI) estavam concluídas, iniciando-se o
tratamento dos esgotos dejetados na cidade23.
A autarquia é responsável pela implantação da coleta seletiva em Ituiutaba, e pela
construção de um aterro sanitário, ambos sob a responsabilidade da prefeitura - Secretaria
Municipal de Obras. Estes projetos foram criados no intuito de garantir a excelência da
empresa, no que tange à qualidade dos serviços e à sua sustentabilidade, fatores que
pesam aos olhos das agências avaliadoras da qualidade da água e do papel exercido pela
empresa, como ocorre com a ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e
Ambiental, e o BVQI – Bureau Veritas Quality Internacional, que conferiu o isso 9002 à SAE,
em 1999.
Considerações Finais
O estudo do processo de implantação do sistema de abastecimento de água da
cidade, observado a partir da conjuntura nacional, de criação de políticas públicas de
saneamento, ao longo da segunda metade do século XX, permitiu verificar que foi
importante a atuação da esfera federal para a consolidação de políticas públicas de
saneamento em âmbito local, estadual e federal.
O trabalho de pesquisa procurou trazer algumas contribuições para o tema, em se
tratando do estudo da implantação de políticas públicas na cidade e na região, apontando
20
ITUIUTABA, Lei nº 1102 de 27/02/1967 21
A criação das autarquias era uma exigência da FSESP para que fosse efetuado o empréstimo pela agência financiadora das obras, para a implantação do sistema de abastecimento de água e da exploração do mesmo, de modo a torná-lo autossustentável, e que tivesse condições de expandir-se futuramente. O órgão financiador das obras foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento. 22
ITUIUTABA, Lei nº 1285, de 31/07/1969. 23
< http://www.saeituiutaba.com.br/?sec=sae&pg=historico> Acessado em 13/2/2014.
caminhos para pesquisas futuras, principalmente no que tange à ação do SESP em âmbito
local e regional.
Uma importante questão merecedora de investigação futura, repousa sobre as
razões que levaram à não adesão de algumas autarquias municipais ao PLANASA, no
momento de sua implantação, em 1971, segundo a proposta do programa, de estabelecer
uma política nacional de saneamento, de fato. Tanto na região, como no estado, há
municípios, que preferiram não aderir à mesma, e assim, usufruir de benefícios federais que
poderiam ampliar o acesso de água potável e facilitar o processo de construção dos
sistemas de fornecimento de águas e esgotos. Em muitos sentidos, o acesso à água tratada
e a construção de redes de esgotos são um sinal das dificuldades de enfrentadas pelos
processos de modernização num país como o Brasil e, principalmente, as limitações do
acesso à cidadania.
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