o envolvimento das famÍlias no processo educativo: resultados de um estudo em cinco paÍses -...

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SÍNTESE DO ARTIGO CIENTÍFICO MARQUES, R. (1996) O envolvimento das famílias no processo educativo: resultados de um estudo em cinco pais. http://www.eses.pt/usr/ramiro/Texto.htm 12-11-2006 1 “O ENVOLVIMENTO DAS FAMÍLIAS NO PROCESSO EDUCATIVO: RESULTADOS DE UM ESTUDO EM CINCO PAÍSES” Síntese do artigo cientifico Miguel de Carvalho [email protected] Professor do 1.º Ciclo do Ensino Básico Mestre em Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico Licenciado em Educação Básica Introdução Entre 1992 e 1995 foram realizados estudos em escolas de cinco países (Austrália, Chile, Espanha, Portugal e República Checa) com o propósito de analisar e incentivar o envolvimento das famílias nas escolas. Este estudo foi orientado por Don Davies e Vivian Johnson, da Boston University, tinha oito investigadores principais, distribuídos por cada país em análise, sendo quadro destes portugueses, e ainda setenta e cinco investigadores com cargos de responsabilidade nas escolas analisadas. O estudo esteve sob a direção institucional do Center on Families, Communicaties, Schools and Children’s Learning (CFCSCL). Como se iniciou este estudo Este estudo teve início com o mestrado em Educação de três dos quatro investigadores portugueses, sob a direção de Don Davies, em 1987. Estes investigadores realizaram um estudo com o objetivo de a) identificar os obstáculos à colaboração escola-família em Portugal e b) caracterizar as escolas difíceis de alcançar e as famílias difíceis de envolver. Depois de analisar os resultados de Portugal com os de Liverpool e Boston, Don Davies concluiu que os obstáculos que impedem o envolvimento das famílias no processo educativo são os mesmos: existe uma cultura escolar que marca a separação; há uma cultura pedagógica que acentua uma linguagem técnica; existem rituais e formalismos que afastam as famílias das escolas; não há tempo para diálogos entre as escolas e as famílias; os professores não estão habilitados para resolver os problemas de comunicação, envolvimento, participação e criação de projetos de colaboração.

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SÍNTESE DO ARTIGO CIENTÍFICO

MARQUES, R. (1996) O envolvimento das famílias no processo educativo: resultados de um estudo em

cinco pais. http://www.eses.pt/usr/ramiro/Texto.htm 12-11-2006

1

“O ENVOLVIMENTO DAS FAMÍLIAS NO PROCESSO EDUCATIVO:

RESULTADOS DE UM ESTUDO EM CINCO PAÍSES”

Síntese do artigo cientifico

Miguel de Carvalho

[email protected]

Professor do 1.º Ciclo do Ensino Básico

Mestre em Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico

Licenciado em Educação Básica

Introdução

Entre 1992 e 1995 foram realizados estudos em escolas de cinco países (Austrália, Chile,

Espanha, Portugal e República Checa) com o propósito de analisar e incentivar o envolvimento das

famílias nas escolas. Este estudo foi orientado por Don Davies e Vivian Johnson, da Boston

University, tinha oito investigadores principais, distribuídos por cada país em análise, sendo quadro

destes portugueses, e ainda setenta e cinco investigadores com cargos de responsabilidade nas escolas

analisadas. O estudo esteve sob a direção institucional do Center on Families, Communicaties,

Schools and Children’s Learning (CFCSCL).

Como se iniciou este estudo

Este estudo teve início com o mestrado em Educação de três dos quatro investigadores

portugueses, sob a direção de Don Davies, em 1987. Estes investigadores realizaram um estudo com

o objetivo de a) identificar os obstáculos à colaboração escola-família em Portugal e b) caracterizar

as escolas difíceis de alcançar e as famílias difíceis de envolver. Depois de analisar os resultados de

Portugal com os de Liverpool e Boston, Don Davies concluiu que os obstáculos que impedem o

envolvimento das famílias no processo educativo são os mesmos: existe uma cultura escolar que

marca a separação; há uma cultura pedagógica que acentua uma linguagem técnica; existem rituais e

formalismos que afastam as famílias das escolas; não há tempo para diálogos entre as escolas e as

famílias; os professores não estão habilitados para resolver os problemas de comunicação,

envolvimento, participação e criação de projetos de colaboração.

SÍNTESE DO ARTIGO CIENTÍFICO

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cinco pais. http://www.eses.pt/usr/ramiro/Texto.htm 12-11-2006

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Após esta análise Don Davies criou, em 1991, a League of Schools Reaching Out (LSRO),

associação de escolas que geram projetos de colaboração com as famílias. Estas escolas receberam

documentos, boletins informativos, revistas e relatórios, e aplicaram-nos em conjunto com as

seguintes estratégias: sala para as famílias, boletim para as famílias, equipas de investigação

constituídas por pais, professores e por um investigador principal, e por fim realizaram visitas ao

domicílio. Em 1994 a LSRO tinha 4 escolas portuguesas. Com o objetivo de partilhar experiencias,

estratégias, instrumentos e resultados, foram realizados encontros e seminários. Após estes encontros

e seminários concluiu-se que em todos os países analisados os resultados eram semelhantes:

- maior aproveitamento escolar;

- maior envolvimento das famílias no processo educativo em casa;

- maior participação das famílias nas atividades escolares;

- maior colaboração das escolas com as agências comunitárias.

Investigação-ação. Porque?

O grupo de investigadores recorreu a este processo, investigação-ação, pois admite oferecer

demonstrações sobre as formas alternativas de governar as escolas e de concretizar o curriculum.

Uma avaliação minuciosa destes projetos permite a construção de teorias e de exemplos orientadores

da mudança em outros cenários. O grupo de investigadores, responsáveis por este projeto, aceita que

a generalização da inovação nas escolas faz-se pelo exemplo. Através deste, as escolas adquirem

visibilidade, estimulam a inovação e proporcionam exemplos que podem ser utilizados e até mesmo

adaptados à escola em causa. Os investigadores aceitam que, quanto maior for a variedade de

contextos a beneficiar de projetos de investigação-ação, mais fácil será a generalização da

experimentação e da inovação na área da colaboração escola-família.

Os projetos de inovação bem sucedidos são um incentivo para as escolas e professores

interessados em aproximar as escolas das famílias e as escolas das comunidades.

Este estudo tem como características inovadoras as seguintes:

envolve escolas básicas de cinco países;

quatro destas cinco países estiveram durante muitos anos sob regimes ditatoriais;

os projetos são desenvolvidos em cooperação entre o ensino básico e o ensino superior;

todo o projeto foi coordenado por um centro de investigação privado, o CFCSCL;

assiste-se à criação de grupos de investigação constituídos por professores e pais;

recolha de dados (questionários, entrevistas semi-estruturadas, registos de observação

diária, análise de documentos escolares e análise de relatórios).

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As escolas

Este projeto foi desenvolvido em:

três escolas portuguesas (no Entroncamento, em Leiria e em Lisboa);

duas escolas chilenas, localizadas em La Florida, nos Andes;

uma escola espanhola, em Laviada, Gijón, nas Astúrias;

uma escola da República Checa, localizada a 12km de Praga;

uma escola australiana, situada no Estado de Vitória.

Destas instituições de ensino básico, apenas uma é privada.

No seguinte quadro está a caracterização das escolas envolvidas no projeto.

Países e

escolas

Características das

escolas

Portugal Chile Espanha Republica

Checa Austrália

En

tro

nca

men

to

Lei

ria

Lis

bo

a

La

Flo

rid

a –

An

des

Lav

iad

a, G

ijó

n

– A

stú

rias

A 1

2k

m d

e

Pra

ga

Est

ado

de

Vit

óri

a

Nº de alunos existentes 120 74 400 813 650

Alunos imigrantes (40%)

40%

(África

e China)

Elevada

(Europa e

Ásia)

Nº de professores existentes 38

Nº de anos de escolaridade 4 4 8 9

Horário de funcionamento 9h-19h Manha

e tarde

Edifício moderno X

Edifício antigo X

Complexo escolar com

possibilidade de os alunos

praticarem desporto

X X

Aulas complementares e

ocupação de tempos livres X

Alunos que vivem só com um

dos progenitores (%) 30%

Alunos provenientes de famílias

desfavorecidas ou com

rendimentos anuais inferiores a

10.000€ (%)

50% Mais de

50%

Alunos de famílias pobres X X

Alunos de famílias de classe

média ou com rendimentos

médios

X X X

Pais com escolaridade inferior ao

ensino secundário (%) 90%

Quadro 1 – Características de cada escola em estudo

Legenda:

Informação não disponível

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Metodologia, procedimentos e instrumentos

O presente estudo tem como objetivo a) identificar semelhanças e diferenças em escolas de

cinco países, referente ao envolvimento das famílias juntos das escolas, b) avaliar estratégias e saber

as que melhor se adaptam a cada escola, c) explorar/descobrir o uso do processo investigação-ação e

d) estimular/motivar as outras escolas a realizarem projetos semelhantes.

O seguinte quadro apresenta a constituição dos grupos de investigação nas diferentes escolas.

Países e escolas

Membros dos grupos

de investigação

Portugal Chile Espanha Republica

Checa Austrália

En

tro

nca

men

to

Lei

ria

Lis

bo

a

La

Flo

rid

a –

An

des

Lav

iad

a, G

ijó

n

– A

stú

rias

A 1

2k

m d

e

Pra

ga

Est

ado

de

Vit

óri

a

Diretor(a) da escola básica X X X X X X

Diretor(a)-adjunto da escola

básica X

Professor do ensino básico X X X X X

Professor do ensino superior X X X X X

Finalistas da FPCE1 X

Investigadores do CIDE X

Mães de alunos X X

Quadro 2 - Constituição dos grupos de investigação de cada escola

Legenda:

Não faz parte do grupo de investigação

Nos projetos desenvolvidos, nos cinco países, existem características comuns:

os projetos são realizados em escolas de ensino básico;

em todas as escolas cerca de 50% das crianças são provenientes de famílias com rendimentos

baixos;

as escolas básicas estão associadas a escolas superior;

em todas as escolas é, pelo menos, realizada uma intervenção de promoção para o

envolvimento das famílias;

foram realizados questionários para recolher dados dos professores, dos pais e dos alunos;

1 Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.

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foram realizadas entrevistas, diários, registos de observação e análise de documentos

escolares.

As escolas de ensino básico foram escolhidas pelos investigadores principais, segundo os

seguintes critérios: a escola básica tem um diretor interessado na promoção do envolvimento das

famílias; a escola básica está, geograficamente, perto da escola superior; as famílias dos alunos da

escola apresentam rendimentos baixos.

Quando as escolas ingressam neste projeto começam a receber a documentação do CFCSCL.

A partir deste momento o facilitador reúne-se uma vez por mês com o grupo de investigação da escola

básica para recolher dados, analisa-los e reformular estratégias. Sucessivamente, a equipa de

investigação portuguesa reúne-se uma vez por ano para avaliar as atividades desenvolvidas. Todas as

equipas mantêm contacto com os coordenadores, Don Davies e Vivian Johnson, por e-mail, por três

seminários internacionais realizados em Portugal e por três mesas-redondas sobre Colaboração

Escola-Família, estas últimas realizadas nos congressos da American Education Research

Associations (AERA).

Em todas as escolas três questionários comuns foram aplicados no início e no fim de cada ano

letivo. Estes foram, posteriormente, analisados pela CSRO. Os questionários tinham trinta perguntas

divididas por a) oportunidades para a comunicação, b) oportunidades para falar sobre os objetivos

educativos, c) oportunidades para a participação na tomada de decisões, d) contactos para resolver

problemas, e) contactos para analisar os aspetos positivos e f) oportunidades para conceber planos

para melhorar a escola.

Após a análise dos questionários dos professores e dos pais conclui-se que, na escola do

Entroncamento, na escola de Laviada e na escola de Praga, a) pais e professores têm muitas

oportunidades de comunicação, b) pais e professores consideram que há espaço para discutirem os

objetivos, tomar decisões e fazer planos em conjunto, c) os professores queixam-se que os pais vão

pouco às escolas e d) os pais dizem que as escolas não lhes proporcionam muitos encontros. Nos

questionários realizados em Lisboa e Leiria foi possível concluir que a) a comunicação escola-família

continua pouca, mas melhorava à medida que o projeto avançava, b) a participação dos pais na tomada

de decisão continuou pouca, mas melhorava à medida que o projeto avançava. Com este projeto a

escola básica de Leiria teve uma mais valia, foi criada uma Associação de Pais com grande podes

reivindicativo junto dos professores. Com a análise dos questionários conclusões comuns

evidenciam-se que todas as escolas tinham atitudes positivas a)favoráveis à aprendizagem, b) de

encorajar as crianças face ao estudo e c) face à escola e ao trabalho dos professores.

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Após a análise dos questionários dos alunos concluiu-se que a) os alunos pensam que os pais

e os professores se interessam pelo seu sucesso académico, b) os alunos são ajudados pelos pais e

professores quando têm problemas e c) os professores não se preocupam o suficiente com os

problemas pessoais dos alunos.

Apesar das diferenças culturais, existem preocupações e problemas semelhantes. É de lembrar

que o Chile, Espanha, Portugal e República Checa estiveram sob grandes regimes ditatoriais e estão

a passar por grandes reformas educativas com os mesmos objetivos: maior descentralização; mais

autonomia para as escolas; maior aproximação das famílias; governos nas escolas mais participativos

e democráticos; maior envolvimento das famílias no processo educativo.

Os problemas identificados nestes quatro países são a) a falta de formação dos professores e

dos diretores das escolas, b) a falta de espaços para receber os pais, c) a falta de conhecimento, pelos

pais, dos seus direitos e deveres de participação e d) rituais escolares muitos formalistas.

O trabalho dos facilitadores, neste momento, é analisar a) os dados levantados pelos

investigadores, b) as visitas às escolas, c) as atas de reuniões pedagógicas, d) as fichas biográficas

dos alunos e e) os registos de aproveitamento destes. O trabalho dos diretores das escolas, foi redigir

relatórios individuais e apresentaram comunicações sobre o projeto em seminários e colóquios. Após

isto os facilitadores tinham a obrigação de enviar relatórios anuais aos coordenadores deste projeto,

para depois serem apresentados à comunidade científica.

Enquadramento teórico

Neste projeto foi escolhida a tipologia de Joyce Epstein, que agrupa as atividades em seis

tipos:

Tipo Caracterização de cada tipo

1 Ajuda das escolas às famílias: as escolas assistem as famílias, para que estas cumpram as

suas obrigações básicas (vestuário, alimentação, saúde).

2 Comunicação escola-família: escolas comunicam regularmente com as famílias acerca do

progresso dos alunos e sobre o programa educativo.

3 Ajuda das famílias às escolas: envolvimento das famílias em atividades de voluntariado

nas escolas.

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4 Envolvimento da família no processo educativo em casa: apoio na realização dos trabalhos

de casa e apoio ao estudo.

5 Participação na tomada de decisões e na direção da escola: desempenho de tarefas nos

órgãos da escola.

6 Intercâmbio com a comunidade: partilha de responsabilidades e recursos entre a escola e

as instituições comunitárias que trabalham e os jovens.

Quadro 3 – Caracterização das atividades em função da tipologia de Joyce Epstein

À tipologia de Joyce Epstein foram associadas e levadas à prática ideias de Urie

Bronfenbrenner, de James Comer e de Henry Lebine.

Às ideias de Bronfenbrenner foram buscar a que defende que escola e a família/comunidade

devem trabalhar para o mesmo, i.e., se a escola e família mantiverem um relacionamento positivo

gera-se um ambiente ecológico propicio ao desenvolvimento das crianças, mas se estas estiverem de

costas voltadas deixa de existir uma ambiente favorável ao desenvolvimento da criança.

No que respeita às ideias de James Comer destaca-se a) o apoio às famílias em visitas

domiciliárias, criação de centros de pais e difusão de boletins informativos para a os pais e b) a

partilha do poder das escolas com os pais.

Das ideias de Henry Levine, destaca-se a) a participação dos pais, b) a comunicação eficaz

entre todos os membros da comunidade educativa, c) a reflexão sobre a prática, d) a construção de

equipas de investigação e inovação, e) a avaliação frequente e f) realça-se as atividades de

aprendizagem realizadas em casa.

Resultados

Comparando todos os projetos foi possível identificar as mesmas barreiras para a colaboração

escola-família: força das tradições; rituais escolares formalistas; relutância dos professores;

deficiência na formação de professores; falta de confiança dos pais.

A separação entre escola-família está mais evidente nos países que tiveram sob regimes

ditatoriais durante muito tempo. A Austrália é um país que goza de descentralização e de autonomia

nas escolas pois há um grande apoio político.

Os professores vêm/querem os pais a) como alguém que não deve interferir no seu trabalho,

b) como alguém que apoia o seu trabalho, ajudando no desenvolvimento dos educandos, c) como

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alguém que confia no conhecimento dos docentes, d) como alguém que não contesta as suas

escolhas/decisões, e) como alguém que “obriga” os educandos a fazer os trabalhos de casa e a estudar,

f) como alguém que comparece nas reunião quando solicitados, para terem conhecimento da avaliação

dos educandos, e g) como alguém que comparece nas festas das escolas. A maioria dos docentes

tenciona que os seus hábitos e valores tenham continuidade nos lares das crianças, mas quando isso

não acontece culpam os pais e referem que estes não têm interesse na educação dos educandos e não

têm cultura.

Na escola de Leiria foi evidenciado o medo que existe em interferir nos projetos pedagógicos,

vendo a Associação de Pais como uma ameaça à docência. Aqui o apoio da família só é aceite quando

esta não ultrapassa as atividades de tipo 2, 3 e 4 da tipologia de Joyce Epstein. Quando a Associação

de pais interessa-se pela tomada de decisões surgem os desentendimentos com a direção escolar.

A escola da Austrália é a única onde o sentido de que na escola manda o professor e em casa

os pais não se manifesta. Nas outras escolas este pensamento é levado à letra, quando os pais

começam a interferir nas decisões. As atividades do tipo 5 e 6 da tipologia de Joyce Epstein são vistas

como ameaças à docência dos cinco países em estudo pois gera a) reuniões fora do horário habitual,

b) mais vigilância do trabalho dos professores, c) maior partilha do poder da escola e d) maior

dependência política das escolas em resolução à família e à comunidade. Os próprios pais manifestam

atitudes negativas no que respeita às atividades de elaboração na partilha de poder. Esta ideia está nas

escolas portuguesas, exceto na do Entroncamento pois é privada e beneficia de uma liderança

educativa que cria projetos educativos adaptados às necessidades de cada um. Para dar resposta às

necessidades de cada um são necessárias reuniões mensais com os pais e maior interação escola-

família, através de telefonemas para casa dos professores, de envio de notas para os pais e distribuição

de um boletim com periodicidades trimestral. Na escola de Leiria o importante é a defesa da docência,

ficando os pais fora das decisões escolares, porque em casa mandam os pais e nas escolas os

professores, e se cada um cumprir os seus papéis não há confrontos. Na escola de Lisboa passa-se o

mesmo que na de Leiria. Tudo isto deve-se a) à falta de tempo dos docentes, b) à pouca

disponibilidade dos pais e c) à divisão de tarefas entre professores e pais, com cada um a fazer aquilo

que lhe compete. Na escola das proximidades de Praga o mesmo se passa.

Mesmo com a relutância dos professores, pelos pais terem voto nas decisões, verificou-se um

aumento da comunicação entre eles, apoio das famílias em atividades escolares e envolvimento da

família no processo educativo em casa (atividades tipo 2, 3 e 4, segundo Joyce Epstein),

principalmente na República Checa, no Chile, em Espanha e em Portugal. Todos os professores viam

com maus olhos tudo aquilo que tinham de fazer, que de certa forma era-lhes exigido, sem lhes

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competir, por lei. O tempo era entrave para tudo. Em todas as escolas, exceto a do Entroncamento,

existiu uma grande resistência, por parte dos professores, na marcação de reuniões em horário noturno

e na receção de telefonemas em suas casas. Quando estes aceitavam, os pais aderiam muito bem. Na

escola de Laviada e na do Chile a resistência era enorme pois os professores entendiam que só deviam

fazer aquilo que está legislado para o corpo docente. Na escola de Lisboa tiveram de ser os finalistas

da FPCEUL a realizar as visitas domiciliárias, pois os professores só faziam aquilo que a legislação

obriga.

A resistência, por parte dos professores, notou-se nos quatro países que tiveram sob regimes

ditatoriais. Em todas as escolas verificou-se que:

os professores só colaboravam quando a diretoria defendia o projeto;

os pais têm falta de confiança na escola , pois tinham más lembranças e tinham dificuldade

em entender os termos técnicos dos professores;

os professores preocupam-se com o rendimento escolar de toda a sua turma e os pais

preocupam-se só com o rendimento escolar dos seus filhos – por esta razão os professores

afirmam que há oportunidades para decidirem estratégias com os pais, por sua vez os pais

afirmam que estas oportunidades são poucas;

os pais não valorizam as reuniões coletivas de pais com os professores, pois nestes momentos

não se tratam os assuntos relacionados propriamente com os seus filhos – por esta razão

muitos professores não concordam com a participação dos pais nos trabalhos pedagógicos;

os pais têm os professores como pessoas e profissionais excecionais, principalmente os pais

de classes sociais desfavorecidas, que consideram o fraco rendimento escolar dos educandos

como uma fatalidade biológica e/ou social e revelam não conseguir ultrapassar este facto;

existe maior proximidade cultural entre os professores e as famílias de classes sociais médias,

levando à participação destes na tomada de decisões, principalmente no Entroncamento e em

Leiria.

as mães professoras apoiavam as atividades escolares e até assumiram a direção das

Associações de Pais.

Todas as escolas tinham um facilitador, membro do corpo docente de uma escola superior de

educação próxima da escola de ensino básico em estudo, que a) coordenava os trabalhos, b) preparava

a análise de dados e c) elaborava os relatórios finais. Este assegurou o apoio científico e deu

visibilidade à escola.

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Conclusões

Nos cinco países em estudo existe barreiras à colaboração escola-família, principalmente nos

que estiveram sob regimes ditatoriais durante vários anos.

Através deste projeto foi possível identificar, como obstáculos:

a escassa preparação dos professores para lidarem com os projetos de colaboração escola-

família;

a falta de preparação das famílias;

a ausência de mecanismos escolares facilitadores da comunicação continuada;

a ausência de estratégias escolares intencionalmente orientadas para o envolvimento das

famílias difíceis de alcançar;

a falta de tempo dos professores;

a incapacidade dos professores para lidarem com as diferenças culturais e as diferenças

sociais e étnicas.

o facto dos professores atribuírem responsabilidade aos pais pelo fraco rendimento escolar

dos educandos.

Em todas as escolas, verificou-se que as mães da classe média, principalmente as mães

professoras, participaram na tomada de decisões escolares.

Verificou-se que os professores abandonam todas as atividades que exigem mais obrigação e

onde há partilha de poder com os pais.

Para que o desânimo não surja, e projetos como este não desabem, os Ministérios da Educação,

e outras entidades, aprovam diplomas legais e de orientação que aumentam os direitos de participação

dos pais nos órgãos escolares.

Há necessidade de aumentar os conhecimentos dos professores sobre os benefícios da

colaboração entre a escola e a família.

A criação de equipas de investigação-ação só foi conseguida na escola de Laviada, onde todos

os membros ativos da educação trabalharam em conjunto.

As famílias difíceis de envolver continuaram afastadas da escola, notando-se um predomínio

das famílias da classe média nas atividades de coordenação e de tomada de decisões, tanto nos órgãos

da escola como na Associação de Pais.

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Bibliografia

MARQUES, R. (1996) O envolvimento das famílias no processo educativo: resultados de um estudo

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