imaginando a paisagem urbana de oeiras do piauí (1697-1762)

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GEOGRAFIA, Rio Claro, v. 41, n. 2, p. 351-371, mai./ago. 2016. IMAGINANDO A PAISAGEM URBANA DE OEIRAS DO PIAUÕ (1697-1762) 1 Esdras ARRAES 2 Resumo A HistÛria da paisagem colonial brasileira privilegiou o estudo de n˙cleos urba- nos localizados em ·reas cujas atividades econÙmicas mobilizaram o interesse da Co- roa portuguesa. Cidades e vilas associadas ‡ cana-de-aÁ˙car plantada na Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro, assim como aqueles n˙cleos fundados em ·reas de mineraÁ„o de Minas Gerais entram nesse bojo empÌrico. Aquelas vilas que surgiram nos sertıes da pecu·ria apresentaram, atÈ um passado muito recente, poucas pesquisas. Assim, o objetivo deste artigo È analisar a paisagem urbana de uma dessas povoaÁıes ìmarginaisî ñ Oeiras do PiauÌ ñ a primeira cidade mais interiorizada do Estado do Maranh„o. A hermenÍutica da paisagem vale-se da documentaÁ„o coeva e da cartogra- fia desenhada no sÈculo XVIII. Busca-se, com isso, desconstruir a paisagem urbana de Oeiras desde sua origem, como freguesia, atÈ sua oficializaÁ„o como cidade, sempre destacando as operaÁıes sociais e seus agentes como basilares ‡ sua materialidade. Parte-se, tambÈm, de metodologia com enfoque multidisciplinar, gravitando nas di- mensıes da Geografia Humana e Cultural, Arquitetura, Arqueologia, UrbanizaÁ„o, His- tÛria e Fenomenologia. Palavras-chave: Paisagem. Oeiras do PiauÌ. Multidisciplinaridade. UrbanizaÁ„o. Resumen Imaginando el paisaje urbano de Oeiras del PiauÌ (1697-1762) La Historia del paisaje colonial brasileÒo ha privilegiado el estudio de poblaciones ubicadas en ·reas cuyas actividades econÛmicas movilizaran el interÈs de la Corona de Portugal. Ciudades y villas asociadas a la caÒa plantada en Bahia, Pernambuco y Rio de Janeiro, asÌ como aquellas poblaciones fundadas en ·reas de minerÌa de Minas Gerais entran en esa regulaciÛn empÌrica. Aquellas poblaciones que han surgido en regiones de creaciÛn de ganado han presentado, hasta un pasado muy reciente, pocas investigaciones. AsÌ que la intenciÛn de este artÌculo es analizar el paisaje urbano de una de una ciudad instalada en esa regiÛn ìmarginalî ñ Oeiras del PiauÌ ñ la primera ciudad m·s interiorizada del Estado del Maranh„o. La hermenÈutica del paisaje se presta de la documentaciÛn coet·nea y de la cartografÌa dibujada en el siglo XVIII. Se busca ìdes-construirî el paisaje de Oeiras desde su origen como parroquia hasta su oficializaciÛn como ciudad, siempre destacando las operaciones sociales y sus agentes como fundadores a su materialidad. Se parte de metodologÌa interdisciplinar gravitando en las dimensiones de la GeografÌa Humana y Cultural, Arquitectura, ArqueologÌa, UrbanizaciÛn, Historia y FemonenologÌa. Palabras claves: Paisaje. Oeiras del PiauÌ. Interdisciplinaridad. UrbanizaciÛn. 1 Este ensaio faz parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida junto ‡ Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de S„o Paulo (FAU USP), em nÌvel de doutorado. AgradeÁo ‡ FundaÁ„o de Amparo ‡ Pesquisa do Estado de S„o Paulo (FAPESP) pelo apoio ‡ conclus„o dessa pesquisa sobre as paisagens dos sertıes do Nordeste brasileiro. 2 Arquiteto e Urbanista. Doutorando na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de S„o Paulo ñ FAU USP - Bolsista FAPESP - Rua Sena Madureira, 1225. Apto. 1210. Vila Clementino. S„o Paulo ñSP - CEP.: 04021-051. E mail: [email protected]

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GEOGRAFIA, Rio Claro, v. 41, n. 2, p. 351-371, mai./ago. 2016.

IMAGINANDO A PAISAGEM URBANA DEOEIRAS DO PIAUÕ (1697-1762)1

Esdras ARRAES2

Resumo

A HistÛria da paisagem colonial brasileira privilegiou o estudo de n˙cleos urba-nos localizados em ·reas cujas atividades econÙmicas mobilizaram o interesse da Co-roa portuguesa. Cidades e vilas associadas ‡ cana-de-aÁ˙car plantada na Bahia,Pernambuco e Rio de Janeiro, assim como aqueles n˙cleos fundados em ·reas demineraÁ„o de Minas Gerais entram nesse bojo empÌrico. Aquelas vilas que surgiram nossertıes da pecu·ria apresentaram, atÈ um passado muito recente, poucas pesquisas.Assim, o objetivo deste artigo È analisar a paisagem urbana de uma dessas povoaÁıesìmarginaisî ñ Oeiras do PiauÌ ñ a primeira cidade mais interiorizada do Estado doMaranh„o. A hermenÍutica da paisagem vale-se da documentaÁ„o coeva e da cartogra-fia desenhada no sÈculo XVIII. Busca-se, com isso, desconstruir a paisagem urbana deOeiras desde sua origem, como freguesia, atÈ sua oficializaÁ„o como cidade, sempredestacando as operaÁıes sociais e seus agentes como basilares ‡ sua materialidade.Parte-se, tambÈm, de metodologia com enfoque multidisciplinar, gravitando nas di-mensıes da Geografia Humana e Cultural, Arquitetura, Arqueologia, UrbanizaÁ„o, His-tÛria e Fenomenologia.

Palavras-chave: Paisagem. Oeiras do PiauÌ. Multidisciplinaridade. UrbanizaÁ„o.

Resumen

Imaginando el paisaje urbano de Oeiras del PiauÌ (1697-1762)

La Historia del paisaje colonial brasileÒo ha privilegiado el estudio de poblacionesubicadas en ·reas cuyas actividades econÛmicas movilizaran el interÈs de la Corona dePortugal. Ciudades y villas asociadas a la caÒa plantada en Bahia, Pernambuco y Rio deJaneiro, asÌ como aquellas poblaciones fundadas en ·reas de minerÌa de Minas Geraisentran en esa regulaciÛn empÌrica. Aquellas poblaciones que han surgido en regionesde creaciÛn de ganado han presentado, hasta un pasado muy reciente, pocasinvestigaciones. AsÌ que la intenciÛn de este artÌculo es analizar el paisaje urbano deuna de una ciudad instalada en esa regiÛn ìmarginalî ñ Oeiras del PiauÌ ñ la primeraciudad m·s interiorizada del Estado del Maranh„o. La hermenÈutica del paisaje sepresta de la documentaciÛn coet·nea y de la cartografÌa dibujada en el siglo XVIII. Sebusca ìdes-construirî el paisaje de Oeiras desde su origen como parroquia hasta suoficializaciÛn como ciudad, siempre destacando las operaciones sociales y sus agentescomo fundadores a su materialidad. Se parte de metodologÌa interdisciplinar gravitandoen las dimensiones de la GeografÌa Humana y Cultural, Arquitectura, ArqueologÌa,UrbanizaciÛn, Historia y FemonenologÌa.

Palabras claves: Paisaje. Oeiras del PiauÌ. Interdisciplinaridad. UrbanizaciÛn.

1 Este ensaio faz parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida junto ‡ Faculdade de Arquiteturae Urbanismo da Universidade de S„o Paulo (FAU USP), em nÌvel de doutorado. AgradeÁo ‡FundaÁ„o de Amparo ‡ Pesquisa do Estado de S„o Paulo (FAPESP) pelo apoio ‡ conclus„o dessapesquisa sobre as paisagens dos sertıes do Nordeste brasileiro.

2 Arquiteto e Urbanista. Doutorando na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade deS„o Paulo ñ FAU USP - Bolsista FAPESP - Rua Sena Madureira, 1225. Apto. 1210. Vila Clementino.S„o Paulo ñSP - CEP.: 04021-051. E mail: [email protected]

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IMAGINANDO PAISAGENSÖ

GeÛgrafos, arquitetos e historiadores preocupados em descrever a paisagemurbana e as tessituras sociais de vilas e cidades coloniais deparam-se com muitoshiatos deixados pelas fontes manuscritas e iconogr·ficas, as quais, muitas vezes, n„oformam uma sequencia temporal lÛgica, dificultando as interpretaÁıes dos processosque fundamentaram as transformaÁıes urbanas no decorrer dos anos. ¿ luz dasfontes catalogadas, resta imaginar como tais assentamentos estruturaram-se a partirdas relaÁıes operadas entre os agentes e o lugar, entre o homem e o mundocircundante; sem esquecer que as relaÁıes humanas imprimem alianÁas, acordos,tensıes e conflitos, ‡s vezes imperceptÌveis nos textos ou imagens, mas evidentesempiricamente na localizaÁ„o de determinados elementos urbanos na paisagem. Dessaforma, o ato de imaginar cria mundos, sendo considerado neste ensaio como a proje-Á„o consciente de objetos posicionados como possibilidades, isto È, atos essenciais deimaginaÁ„o empregados como mediaÁ„o do conhecimento e entendimento das coisas(CASEY, 1971, p. 476). A imaginaÁ„o e a vis„o est„o conectadas entre si, de modoque ìverî implicaria experimentar o mundo por meio da imaginaÁ„o; e a express„oda imaginaÁ„o se d· por meio da criaÁ„o de imagens mentais ou iconogr·ficas(COSGROVE, 2008, p. 15).

Imaginar as paisagens de Oeiras do PiauÌ, a partir de sua oficializaÁ„o comofreguesia, em 1697, atÈ o ano de 1762 (j· com o foro de cidade), ser· o foco dean·lise deste ensaio, fruto de mais de seis anos de pesquisa dedicada ‡s representa-Áıes dos ìCertoensî das capitanias do Norte e do Estado do Maranh„o. Faz-se, por-tanto, um exercÌcio de ìarqueologia da paisagemî, tendo como mediaÁ„o hermenÍuticaos discursos presentes em textos, mapas e fotografias, cujo argumento direto ouindireto, refira-se ‡s mutaÁıes urbanas da cidade em an·lise.

Oeiras, antes vila da Mocha, gravitou, desde sua origem, em dimensıes con-troladas por agentes sociais (civis e eclesi·sticos) que ora acordavam em suas pr·ti-cas, ora seguiam t·ticas diametralmente opostas. Essas operaÁıes registraram ‡paisagem tensıes e acordos, dicotomia comum aos processos de urbanizaÁ„o doBrasil colonial. Uma reconstruÁ„o aproximada da paisagem urbana da primeira capi-tal da capitania de S„o JosÈ do PiauÌ vale-se da documentaÁ„o localizada no ArquivoHistÛrico Ultramarino de Lisboa digitalizada pelo Projeto Resgate Bar„o do Rio Bran-co. Com respeito ao PiauÌ, j· transcrevemos cerca de 200 documentos oficiais queabordam assuntos diversos, mas sempre convergentes ‡ ideia de paisagem adotadaem nossos estudos, veiculada ‡ multidisciplinaridade como aporte epistemolÛgico.

Parte-se de pressuposto metodolÛgico transdisciplinar, orbitando entre diferen-tes campos do saber como a Geografia Humana e Cultural, a Arquitetura, a Arqueo-logia, a HistÛria Cultural e EconÙmica e a Fenomenologia. O historiador francÍs BernardLepetit (2001, p. 31) considerou as diferentes disciplinas como atuantes no mesmotipo de conhecimento, e que entre elas as inter-relaÁıes s„o m˙ltiplas e os limitesjamais estanques. Na mesma linha, o arquiteto argentino RamÛn Gutierrez (1982)apontou que o enfoque multidisciplinar n„o restringe os resultados a visıes parciaisque poderiam empobrecÍ-los.

De fato, a paisagem È uma categoria do conhecimento fluÌda, movediÁa e pl·s-tica. Algumas abordagens fundamentam-se nas chaves estÈtica e Ètica, campos queaqui ser„o tocados lateralmente, pois privilegiamos a construÁ„o social da paisagemou o resultado simbÛlico-material das transformaÁıes do mundo operadas pelo ho-mem, muitas delas comunicando profundos jogos de poder entre os envolvidos noprocesso.

A Geografia vem desenvolvendo ao redor desse tema um produtivo debatedesde a segunda dÈcada do sÈculo passado. Aqui situamos a proposta do geÛgrafo

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cultural inglÍs Denis Cosgrove (1998, p. 05), quando em seu Social Formation andsimbolic landscape chamou a atenÁ„o aos aspectos materiais da paisagem ou aobjetificaÁ„o de relaÁıes sociais e do imagin·rio humano. Paisagem, para Cosgrove,seria um mundo mediado pela experiÍncia do olhar, uma construÁ„o material do ima-gin·rio, este considerado como o principal meio de modificaÁ„o da Terra e da existÍn-cia humana. Na mesma linha, o historiador Simon Schama (1995, p. 14) relacionou apaisagem a uma ìmaneira de observarî (way of looking) culturalmente apreendidaem mitos, na memÛria, no discurso e nas obsessıes. Sendo assim, a vis„o incorporatanto aspectos biolÛgicos e fÌsicos como o registro empÌrico de mundos externos, porprojetar imagens derivadas da cogniÁ„o e imaginaÁ„o humanas (COSGROVE, 2008,p. 05).

Ainda na Geografia, h· os estudos de Milton Santos (2009), nos quais a paisa-gem È compreendida como um conjunto de formas que, num dado momento, expri-me heranÁas que representam sucessivas relaÁıes localizadas entre o homem e anatureza. Ela teria uma qualidade transtemporal, reunindo, superpondo e excluindoobjetos passados e presentes, uma construÁ„o transversal (SANTOS, 2009, p. 103).Santos articula a paisagem ao j· batido tema do palimpsesto3 onde, mediante acumu-laÁıes e substituiÁıes, a aÁ„o de diferentes geraÁıes se superpıe cristalizada nasìrugosidadesî do lugar, isto È, o tempo histÛrico empiricizado e perceptÌvel aos olhosdo observador. A paisagem, assim, adquire um qualitativo histÛrico, contendo refe-rÍncias de eventos pretÈritos, muitos deles apresentados sutilmente em sÌmbolos ouimaterialidades, como a memÛria e as narrativas dos habitantes (BENDER, 2002, p.136).

No ‚mbito da Arqueologia as definiÁıes s„o tambÈm flexÌveis, porÈm o social,o material e o simbÛlico tornam-se a base comum de determinadas abordagens ana-lisadas. Marisa Lazzari (2010, p. 54) menciona a paisagem mais que um simples planode fundo do desenvolvimento humano. Trata-se de uma coleÁ„o de fatores humanose n„o humanos (objetos e elementos do meio ambiente, por exemplo) que configu-ram o concreto e imaginam lugares compostos de mundos sociais. Seria uma entida-de viva e din‚mica, compartilhada e contestada por meio de pr·ticas sociais como astarefas do cotidiano, as cerimÙnias, a circulaÁ„o e troca de objetos e ideias vindos delocalidades muito distantes. Na mesma direÁ„o de Lazzari, os arqueÛlogos Anna Agbe-Davies e Alexander Bauer (2010, p. 18) opinam a paisagem como uma ativa dimen-s„o da vida social formada pela circulaÁ„o de pessoas e itens dentro dela. Juntos -pessoas e cultura material - criam uma rede de experiÍncias onde os significados dosagentes e dos lugares envolvidos est„o continuamente em transformaÁ„o. Dentrodessa lÛgica, os arqueÛlogos consideram a circulaÁ„o, a troca, os fluxos de pessoas,artefatos e ideias como atos comunicativos da cultura, o que eles nomearam de ìpai-sagem da circulaÁ„oî (LAZZARI, 2010, p. 61). Com efeito, o movimento produz pai-sagens. E o ato de atravessar lugares, quaisquer que sejam as escalas geogr·ficas,converte-se numa mediaÁ„o fenomenolÛgica de conhecimento, interpretaÁ„o e modi-ficaÁ„o do territÛrio em paisagem (CARRERI, 2002, p. 11).

Portanto, imagin·rio, relaÁıes sociais, trocas culturais e materiais comportamos fundamentos adotados ‡ compreens„o das paisagens de Oeiras durante o recortecronolÛgico proposto. Veremos como a documentaÁ„o oficial coeva descreveu uma

3 Palimpsesto era um pergaminho ou papiro cujo texto primitivo foi raspado, para dar lugar a outro.DefiniÁ„o tirada de HOUAISS, AntÙnio. Grande Dicion·rio da LÌngua Portuguesa. Rio de Janeiro:Objetiva, 2001. p. 2111. Ainda sobre a met·fora do palimpsesto, o historiador inglÍs W. G.Hoskins (1985, p. 50) revelou a paisagem como o incorporamento material das atividades huma-nas, um ìpalimpsestoî irrevogavelmente permeado de tempos que permitem decifrar as assinatu-ras dos eventos anteriores.

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cidade din‚mica forjada numa complexa textura social, cujas relaÁıes extrapolavamos contornos polÌticos da capitania, comarca ou municÌpio. Faremos um breve percur-so histÛrico pelas trajetÛrias das hierarquias urbanas do n˙cleo, iniciando em suaprimeira fase, como freguesia, atÈ culminar em sua convers„o, por Carta RÈgia de1761 do rei D. JosÈ I, ‡ qualidade de cidade.

A FREGUESIA DE NOSSA SENHORA DA VIT”RIA

A fixaÁ„o dos colonos nos sertıes das Capitanias do Norte foi motivada, inicial-mente, pela pecu·ria atravÈs da instalaÁ„o de currais e fazendas de criaÁ„o seguindoo curso das principais ribeiras. J· em meados do sÈculo XVII, as margens dos riosS„o Francisco, Itapicur˙, Real e Vaza-Barris, por exemplo, foram ocupadas por umapopulaÁ„o oriunda do litoral baiano ou da Zona da Mata pernambucana. AtÈ ent„o, oreconhecimento de juri dessas imensas ·reas pela Coroa portuguesa ocorreu atravÈsda concess„o de sesmarias a um reduzido n˙mero de sesmeiros4, os quais estavammais preocupados em dilatar seus domÌnios fundi·rios e o n˙mero de reses de seuscurrais do que em estimular o cultivo de facto das zonas concedidas legalmente.

O poder desses homens sobre a terra provocou sÈrios agravantes fundi·rios econstante instabilidade com as sociedades indÌgenas habitantes seculares do territÛ-rio. N„o apenas: deslizava-se pelas m„os da Coroa o controle efetivo da regi„o. Poressa raz„o, eram urgentes medidas mais incisivas nos sertıes ou a adoÁ„o de polÌti-cas vi·veis ao fracionamento regular do territÛrio, como preconizava as OrdenaÁıesdo Reino. Une-se a tais episÛdios os descobertos aurÌferos no final do Seiscentos emlocalidades que pertenceriam ‡ futura capitania de Minas Gerais. ¿s vistas da Coroa,os sertıes das capitanias do Norte tornaram-se espaÁos de f·cil deslocamento ilegaldo ouro e, por conseguinte, n„o poderiam passar despercebidos. Com efeito, a reso-luÁ„o mais eficaz, pelo menos em tese, seria a oficializaÁ„o de povoaÁıes aos statusde freguesia, julgado ou vila. As freguesias ou parÛquias foram, inicialmente, preferi-das, por demandar menos recursos pecuni·rios da Fazenda Real, ao passo que osprÛprios fregueses se comprometiam a pagar os emolumentos aos padres designa-dos pelos bispos. AlÈm disso, como o estudo de Murillo Marx (1991) apontou, apresenÁa marcante em nossa paisagem de capelas, igrejas e conventos ilustra ainiciativa tomada pela Igreja CatÛlica na expans„o das fronteiras dos domÌnios portu-gueses na AmÈrica. A disseminaÁ„o desses edifÌcios pios no processo de urbanizaÁ„obrasileira representou a objetificaÁ„o de uma sÈrie de acordos de benefÌcios m˙tuosfirmados entre a Santa SÈ e a monarquia portuguesa, desde os tempos medievais(MARX, 1991, p. 17). Tais acordos, como afirmou Caio Boschi (1986, p. 02), seriam aconfirmaÁ„o da autoridade dos reis sobre os negÛcios eclesi·sticos, tirando proveitoda cristandade para a implementaÁ„o dos seus projetos coloniais.

Nos sertıes em estudo, existiram duas modalidades de freguesia que aquiesboÁaremos. A primeira, mais comum, foi o curato amovÌvel, cuja administraÁ„odos sacramentos, registros paroquiais e cobranÁas dos dÌzimos eram agendas docura, cujo sustento derivava-se de donativos conhecidos como pÈ-do-altar. A segun-da era a parÛquia colada, tÌtulo concedido pelo rei apÛs criteriosa seleÁ„o de igre-jas e de p·rocos, e sua escolha n„o era feita ao acaso (FONSECA, 2011, p. 100). Os

4 Dentre esses agentes podemos elencar a familÌa Dias dí¡vila (Casa da Torre), os Guedes de Brito(Casa da Ponte), Domingos Afonso Mafrense e Juli„o Afonso Serra.

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vig·rios das freguesias coladas eram funcion·rios rÈgios, participando da folha ecle-si·stica da Fazenda Real por receber a cÙngrua, isto È, um ordenado que oscilavaentre 50 e 200 mil rÈis. A cidade de Oeiras passou pelos predicamentos de curato efreguesia colada em momentos histÛricos chave dos processos de urbanizaÁ„o dossertıes piauienses. A mudanÁa de status ou hierarquia repercutiu diretamente noremodelamento da edificaÁ„o (principalmente em seu altar-mor), na paisagem urba-na da cidade e em seu papel desempenhado nas polÌticas rÈgias de controle do terri-tÛrio da capitania do PiauÌ e circunscriÁıes limÌtrofes.

Em 1695, o bispo de Pernambuco, D. Frei Francisco de Lima, atravÈs de missivasenviadas ao rei D. Pedro II, deixou claro sobre os agravantes sociais e fundi·rios dossertıes de sua diocese. Na sua opini„o, uma das maneiras de remediar os malessofridos por aquela sociedade, que vivia em fazendas de gado dispersas uma dasoutras lÈguas e lÈguas, seria ì...povoarem aquellas Terraz, reduzindoas a Collonias, ePovoaÁoens...î (ENNES, 1938, p. 349). A criaÁ„o de sÛlidas comunidades no interiorpernambucano garantiria, como projeto, dois objetivos. O primeiro, referia-se ‡ ocu-paÁ„o de ·reas que escapavam do controle da Coroa por estarem sob o domÌnio depoderosos senhores (como a Casa da Torre) ou de seu associados. A oficializaÁ„o den˙cleos urbanos possibilitaria a reduÁ„o de injustiÁas sociais e o parcelamento dasterras uniformemente. No entanto, como exemplo de Estado mercantilista, Portugalse interessou em fundar povoaÁıes nos sertıes para ì...lucrar grandes convinienÁiasa fazenda de Vossa Magestade...î (ENNES, 1938, p. 349) em detrimento da criseeconÙmica sofrida pela queda do preÁo do aÁ˙car no mercado internacional e dosgastos feitos com a guerra de Reconquista (1640).

Dentre as povoaÁıes fundadas sob a qualidade de curato amovÌvel situamos ade Nossa Senhora da VitÛria e a de S„o Francisco das Chagas do Rio Grande do Sul,ambas em 1697. Esta implantada nas margens do rio S„o Francisco, no caminho queconectava o interior pernambucano ‡ regi„o das minas gerais. Aquela, encontrava-seno epicentro do PiauÌ, cortada por trÍs importantes vias que ligavam a nova localida-de ao Maranh„o, Pernambuco e Bahia. A posiÁ„o no territÛrio da igreja de NossaSenhora da VitÛria foi precisa, sendo definida segundo as necessidades e comodida-des dos principais moradores ñ os ìhomens-bonsî do PiauÌ - compostos, na maioria,de procuradores e/ou rendeiros da Casa da Torre ou de Domingos Afonso Mafrense:

... e detriminar„o, que se fundaÁe, e fizeÁe a Igr.ia no Breyo,chamado a Mocha por ser a parte mais conveniente aosmoradores de toda a PovoaÁ„o, fincando no meio della comiguais distanÁias, e Caminhos para todos os riachos e partespovoadas (...) se elegeu para lugar de Ig.ia e Cazas doR.do, o taboleiro que se acha pegado a passayem doJatub·... (ENNES, 1938, p. 364).

O brejo da Mocha, formado por um riacho que serpenteava o terreno da parÛ-quia, foi o local escolhido pelos moradores para a edificaÁ„o do templo catÛlico. Eraum sÌtio ìconvenienteî, ou seja, acessÌvel por estar ìno meio della [igreja] com iguaisdistanÁias, e caminhosî, demandando deslocamentos mais curtos da populaÁ„oestruturada, naqueles anos finais do Seiscentos, por cerca de 605 pessoas, entreÌndios, brancos, negros escravos e mestiÁos, distribuÌdas em 129 sedes de fazendasde gado (ENNES, 1938, 370). Conveniente, tambÈm, no sentido de ìdecenteî(BLUTEAU, 1721, 526), um lugar plano e nas proximidades de cursos fluviais. Valelembrar que os rios desempenharam um papel preponderante na localizaÁ„o, desen-volvimento e imagem dos n˙cleos urbanos coloniais, conferindo-lhes uma configura-Á„o especÌfica e um valor simbÛlico determinante, cuja relaÁ„o urbis x fluminis cons-truiu um sistema indissoci·vel (SARAIVA, 1987, p. 461). Recordemos de cidades comoS„o Luiz, situada nas proximidades do rio Anil; de Recife implantada nas margens do

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rio Capibaribe; da vila de Ìndios de Santa Maria, erigida na ribeira do rio S„o Francis-co; de Aracati, projetada em 1748 nas bordas do rio Jaguaribe, assim como muitosoutros assentamentos humanos que viam os rios uma mediaÁ„o de sua existÍncia.Isso nos faz pensar que a igreja de Nossa Senhora da VitÛria foi construÌda segundolÛgicas utilit·rias e Èticas, transparecendo nos discursos da paisagem original de Oeiras.

ThomÈ de Carvalho e Silva foi o primeiro cura da freguesia designado pelobispo de Pernambuco. Desde a fundaÁ„o e construÁ„o da pequena igreja, esse agen-te social participou ativamente nas transformaÁıes da paisagem urbana de Oeiras ede partes da capitania do PiauÌ, como a ribeira do rio Itaim onde possuÌa fazendas ecurrais de gado. No princÌpio como parÛquia, a fisionomia do arraial assemelhava-sea uma instalaÁ„o rural, contando apenas com o templo catÛlico e a casa do padre,cujo ch„o de terra, ou lote, havia sido demarcado no mesmo dia da delimitaÁ„o doadro. De dimensıes reduzidas, com 24 palmos de comprimento por 12 palmos delargura, a igreja matriz foi erguida com materiais simples ì...de taypa, e cuberta depindoba por ser parte adonde n„o ha telhas...î, e situada num terreno sacralizado de100 passos de comprimento por 60 passos de largura (Figura 1).

Figura 1 - Prov·vel ocupaÁ„o da freguesia deNossa Senhora da VitÛria, em 1697

Desenho do autor sobre cartografia fornecida pelaPrefeitura da cidade de Oeiras ñ PI. Planta sem escala.

O novo curato simbolizou mais que a expans„o do catolicismo nos sertıesindefinidos do bispado de Pernambuco. Representou o escrutÌnio rÈgio em territÛriossubordinados ‡ autoridade do senhorio, que equacionavam a ordem social vigenteancorada por relaÁıes clientelares submetidas ‡ regras estritas de dependÍncia e

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lealdade substanciadas no universo da violÍncia (PUNTONI, 2002). Destarte, injustiÁasocial, crimes e irregularidade fundi·ria formularam uma parte do cotidiano dos ser-tanejos subordinados a esse sistema de viver.

Como frisado por Roberta Delson (1997), essas zonas n„o poderiam ficar semsupervis„o, cabendo ‡ Coroa a homologaÁ„o de medidas cabÌveis ao funcionamentode um programa legislativo capaz de reformar as lÛgicas de manejar a terra, oumelhor, seria estendida a autoridade do rei ‡s regiıes antes controladas pelos pode-rosos fazendeiros. A igreja do brejo da Mocha tornou-se, sob essas circunst‚ncias, osÌmbolo da tentativa de administrar as relaÁıes operadas entre os habitantes dossertıes e a paisagem. Some-se a isso, a publicaÁ„o da Carta RÈgia de 20 de janeirode 1699, na qual D. Pedro II reconhecia as dificuldades enfrentadas pelos colonosincapacitados de cultivar a terra ì...por estarem dadas a duas ou tres pessoas parti-culares que cultiv„o as terras que podem deichando [sic] as mais devolutas semconsentirem que pessoa alguma as povoe...î (AHU_ACL_CU_015, Cx. 18, D. 1771). Aordem rÈgia decretava que sesmarias incultas poderiam ser denunciadas e requisita-das pelo denunciante, desde que a parcela pedida n„o ultrapassasse a dimens„orecomendada pelas OrdenaÁıes do Reino: ì...tres legoas em cumprido e hu„ de largoou legoa e meia em quadra...î (AHU_ACL_CU_015, Cx. 18, D. 1771). O rearranjo dassesmarias era um estÌmulo ‡ produÁ„o numa escala mais ampla, porque buscavalegitimar a posse das terras ‡queles agentes antes impedidos pela violÍncia dos man-dat·rios. Seria um interessante mecanismo polÌtico que visava povoar de juri e defacto ·reas desconhecidas pelos europeus, contribuindo, dessa forma, com a trans-formaÁ„o das vastidıes imprecisas em territÛrios definidos.

A relaÁ„o entre a Coroa portuguesa e os sertıes do PiauÌ intensificaram em1701, quando o curato foi convertido em freguesia colada. A partir daquele momentoo padre deixava de ser o cura das almas, agora convertido em vig·rio colado5, parti-cipante anual da folha de pagamentos eclesi·sticos da Coroa. A colaÁ„o da parÛquiade Nossa Senhora da VitÛria seguiu estratÈgias geopolÌticas bastante precisas. Comoapontou Dom Oscar de Oliveira (1964) e reiterado por Cl·udia Damasceno Fonseca(2011), o Estado portuguÍs tinha interesse em restringir as igrejas coladas a fim den„o pagar as cÙngruas, instalando-as quando convinha por algum motivo polÌtico-econÙmico, e, dessa forma, a eleiÁ„o n„o era produto do acaso. De maneira que essefenÙmeno apareceu com maior incidÍncia nas zonas de plantaÁ„o de aÁ˙car dePernambuco e Bahia e nas ·reas de mineraÁ„o de Minas Gerais. Nos sertıes doscurrais de gado, as colaÁıes foram pontuais atÈ a segunda metade do sÈculo XVIII.No perÌodo subsequente da administraÁ„o do marquÍs de Pombal, essa modalidadepassou a ser comum em diferentes partes do interior das capitanias do Norte, emespecial nas vilas de Õndios fundadas apÛs a homologaÁ„o do DiretÛrio dos Õndios de1757.

Segundo a documentaÁ„o compulsada atÈ o momento, tudo indica que a no-meaÁ„o do primeiro vig·rio, ThomÈ Carvalho e Silva, tenha se fundamentado pordois motivos. O primeiro dizia respeito ‡s especificidades das polÌticas rÈgiasimplementadas em 1699 relativas ao controle territorial e fundi·rio das zonas

5 Essa nomeaÁıes indicavam o rigor das hierarquias no ‚mbito das cargos civis ou eclesi·sticosdurante o perÌodo colonial. O prÛprio vig·rio ThomÈ de Carvalho e Silva, em requerimento ao reiD. Jo„o V, relacionou a precis„o dos tÌtulos de cura e vig·rio colado que n„o deveriam serconfundidos: ìDiz o P.e Thome Carvalho e S.a vigario Colado nesta igreja Matriz de N. Sr.a daVictoria da Capitania do Piahuy qí elle ha trinta annos ou pouco mais exercita a d.a occupaÁ„o,havendo m.tos annos antes sido cura da d.a igreja desde o tempo da sua creaÁ„o, em cujo curatoestava quando V. Mag.de tomou a Igreja p.a o seu Padroado, e logo ordenou se colasse o supp.e

consignando lhe setenta e sinco mil rs. de cÙngrua p.a sy e mais quinze p.a hum Sacrist„o...î(AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 93).

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interiorizadas das capitanias do Norte. A segunda raz„o refere-se ‡ colaÁ„o comouma mercÍ rÈgia gratificada ao padre, em raz„o de seus empreendimentos particu-lares ‡ colonizaÁ„o portuguesa. J· em 1699, dois anos apÛs a criaÁ„o do curato,ThomÈ Carvalho reuniu, ì...com dispendio do pouco qí tinha, algum povo, qí comnossas prÛprias m„os, a falta de offertas e cabedais fizemos outra igreja mayor, ecom mais seguranÁa, qí a antiga...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 96). AlÈm disso,ele estabeleceu trÍs aldeamentos missioneiros em precisas partes do PiauÌ a favore-cer a urbanizaÁ„o das ribeiras por sÌtios e fazendas, pois ‡s vistas da Coroa portugue-sa, o Ìndio ìdomesticadoî e catequizado significava territÛrios propÌcios ‡ expans„oda pecu·ria e das fronteiras dos seus domÌnios. Com efeito, nas proximidades do rioItaim o vig·rio congregou a naÁ„o dos JaicÛs e IcÛs, dando-lhes ì...Missionario o Pe.Manuel da Sylveira Serpa; pello Rio Poty o invadi„o os valerosos Uruares a quembuesquei para Missionario o Pe. Paschoal da Sylveira Froys, em cuja Aldeia metitambem, depois de parochiado, o gentio Longa...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 96).Finalmente, na passagem de Santo AntÙnio, estratÈgico nÛ vi·rio de conduÁ„o dasboiadas e trajeto de comerciantes para a capitania do Maranh„o, foi introduzido emmiss„o religiosa os indÌgenas An˙p˙r˙ GoaÁ˙ e Meri sob a tutela do cura ManoelOliveira Teyo [sic] (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 96).

A convers„o de curato em freguesia colada passava o Ùnus de sustentar op·roco e as reparaÁıes estruturais da igreja dos fregueses ao poder rÈgio. O novostatus permitiu a substituiÁ„o das paredes de taipa a estruturas de pedra. As altera-Áıes arquitetÙnicas empreendidas pelo vig·rio ThomÈ de Carvalho, por volta de 1728,repercutiram n„o sÛ na escala do edifÌcio, como tambÈm na paisagem urbana dapovoaÁ„o. Nesse ano, j· com o predicamento de vila adquirido em 1712, havia cercade 90 moradias ì...e algu„s por fora, que far„o cento e vinte...î (MARTINS, 1944),alÈm da igreja matriz, do aÁougue p˙blico e da praÁa que definiam os contornos davida di·ria dos habitantes.

A VILA DA MOCHA E SUAS PAISAGENS

O ImpÈrio portuguÍs expressou a posse dos sertıes brasileiros atravÈs dacriaÁ„o de uma rede de vilas precisamente instaladas segundo a normativa rÈgia,cujas polÌticas assegurariam o controle de ·reas sem autonomia administrativa. Comofrisado por Renata Malcher de Ara˙jo (2000, p. 103), a rede urbana no Brasil colonialsignificava a ocupaÁ„o polÌtica do territÛrio revestida de prioridade sobre o povoa-mento. Em alguns casos, uma povoaÁ„o recebia diretamente do rei o tÌtulo de vila,sem antes passar pela qualidade de parÛquia. Entretanto, tornar-se parÛquia pareciaimprescindÌvel a outros n˙cleos urbanos antes da concess„o da autonomia municipal.

A freguesia de Nossa Senhora da VitÛria recebeu do rei D. Jo„o V o status devila em 1712. Naquele momento batizada de Mocha, sendo o resultado de longosdebates entre a sociedade piauiense junto com os poderes administrativos locais e amonarquia portuguesa. O novo status polÌtico provocou alteraÁıes substanciais napaisagem da vila pela introduÁ„o dos sÌmbolos da municipalidade ñ o pelourinho ecasa de C‚mara e Cadeia. AlÈm desses, outros equipamentos urbanos, erguidos atÈa primeira metade do Setecentos, evidenciavam a complexidade das relaÁıes sociaisoperadas no n˙cleo, como o hospÌcio da Companhia de Jesus e a igreja de NossaSenhora da ConceiÁ„o, sede de alguma confraria religiosa ainda n„o identificada.

A criaÁ„o da vila da Mocha, das condiÁıes de sua apropriaÁ„o, uso e transfor-maÁ„o de sua paisagem foram, antes de tudo, produtos das aÁıes de agentes sociais

359Arraes, E.v. 41, n. 2, mai./ago. 2016

(REIS FILHO, 1998, p. 485), isto È, determinados pelas din‚micas do cotidiano, dastensıes e alianÁas firmadas entre os envolvidos no processo, sejam locais ou locali-zados em Portugal. De fato, a sua fundaÁ„o enquadrou-se nas pr·tica de reformafundi·ria regulamentada pela Carta RÈgia de 20 de janeiro de 1699; na busca emìremediarî as injustiÁas sociais e na tentativa de expandir o controle territorial parazonas distantes da linha da costa atl‚ntica. AlÈm desses fatores, os n˙cleos urbanosoficializados a partir do final do sÈculo XVII estiveram revestidos por um idealcivilizatÛrio. Eram usuais nos documentos de instalaÁ„o de vilas termos tais como:ìcongregar os vadios e facinorososî; ìcom a creaÁ„o desta Villa se attrahir„oî; eìpara fim de recolher a ellas [vilas] os vadiosî [sem grifo no original]. A novamunicipalidade adquiria, dessa forma, um estatuto Ètico que visava o equilÌbrio dasociedade formada por agentes de diferentes etnias e culturas e do territÛrio peloqual estava condicionado o seu governo.

Vale lembrar que o ambiente beligerante do PiauÌ, resultante das injustiÁassociofundi·rias instauradas entre os pequenos criadores de gado, as comunidadesindÌgenas e os poderosos fazendeiros, moveu a Coroa a orquestrar medidas polÌticasmais incisivas sobre o territÛrio. A decis„o foi de ì...crear algumas Villas nas partesque achar com pessoas capazes para servirem aos cargos de Officiaes nas C‚maras(...) para sugeytar esta gentilidade ao grÍmio da Igreja (...) E desta forma comeÁa acrescer a povoaÁ„o...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 1, D. 19). Em 1711, D. Jo„o V orde-nou o ouvidor do Maranh„o, EusÈbio Capelli, a fundar ì...no lugar aonde est· a Igrejacrieis huma Villa com Senado da C‚mara (Ö) para se administrar a justiÁa, e seevitarem os delictos que nella se cometem por falta de castigosÖî (ABNRJ, 1948, p.104). A vila da Mocha, porÈm, seria instalada em 1718 quando a capitania do PiauÌ foicriada como subsidi·ria ao Maranh„o. Esse parecer n„o se deu ao acaso, mas foifruto do escrutÌnio da Coroa em tentar balancear o quadro fundi·rio da capitania que,como sabemos, as sesmarias estavam doadas a Casa da Torre e seus associados(ARRAES, 2012, p. 359). Analisando cartas de concess„o de sesmarias no PiauÌ, entre1699-1750, percebe-se o esforÁo da MetrÛpole lusa em distribuir equitativamente asterras, segundo a dimens„o legal prÈ-determinada pelas OrdenaÁıes do Reino, com ointuito de minimizar o poder do senhorio sobre a paisagem (ARRAES, 2014, p. 56).

Naqueles anos iniciais, a paisagem urbana da vila da Mocha assemelhava-se aoutros assentamentos humanos do Brasil-ColÙnia, cuja imagem da igreja matriz,erguida geralmente no centro da praÁa, realÁava os propÛsitos sociopolÌticos da Co-roa unida com a Santa SÈ. ¿ frente do templo religioso encontrava-se o pelourinhoconstruÌdo em pedra. Esse sÌmbolo era o centro geomÈtrico da municipalidade peloqual o termo, ou circunscriÁ„o administrativa, foi estabelecido no ato da fundaÁ„o. Acasa de C‚mara e cadeia, porÈm, funcionaram em edifÌcios separados. Com efeito,AntÙnio Marques Cardoso, primeiro ouvidor geral do PiauÌ, relatou ao Conselho Ultra-marino, em 1727, que a maioria dos moradores da vila tinham poucos meios desubsistÍncia e, por essa raz„o, ì...careci„o que se ajudasse para fazerem cadea, ecasa da c‚mara...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 1, D. 35). A soluÁ„o encontrada pelaautoridade judicial foi ì...introduzir cadea em hu„s casas em que morava hum officialde justiÁa com o pretexto de guardar os qí se prendessem...î (AHU_ACL_CU_016, Cx.1, D. 35).

Ao que tudo indica, segundo a documentaÁ„o compulsada, a construÁ„o dasede da casa de C‚mara e cadeia da Mocha foi efetivada ainda na primeira metade dosÈculo XVIII. PorÈm, os seus melhoramentos estrutural e decorativo seriam tem·ticarecorrente dos vereadores e outras autoridades atÈ as primeiras dÈcadas do Nove-centos, quando a Junta Governativa do PiauÌ contratou o empreiteiro PedroCronemberger para concluir os reparos do edifÌcio (FALLA, 1835, p. 08). Hoje o quevemos na paisagem de Oeiras È o projeto de Cronemberger finalizado em 1845 (Figu-ra 2).

360 GEOGRAFIAImaginando a paisagem urbana de Oeiras do PiauÌ (1697-1762)

Outros edifÌcios se destacaram no espaÁo intraurbano de Mocha, dinamizandoas transformaÁıes materiais da vila fora do eixo da praÁa da igreja matriz. Os novoselementos arquitetÙnicos assumiram o papel de reordenar as zonas do aglomeradoculminando na segregaÁ„o dos espaÁos por uso e classe social (FRIDMAN, 1999, p.15). O hospÌcio e colÈgio dos jesuÌtas foi um desses equipamentos incluÌdos na paisa-gem antes de 1750. Sua edificaÁ„o envolveu agentes sociais j· atuantes na formaÁ„ooriginal da vila, como o vig·rio ThomÈ de Carvalho e Silva e criadores de gado resi-dentes em seu termo. O sacerdote ofertou ì...doze mil cruzados e hu„ fazenda degado...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 75). O ouvidor AntÙnio Marques Cardoso reu-niu um montante de 46 mil rÈis para a obra ofertados por Jo„o Campello da Fonseca(10 mil rÈis), Hyl·rio Ribeiro de Carvalho (20 mil rÈis) e Maria da Encarnass„o (16 milrÈis) (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 75). Isso demonstra a participaÁ„o ativa dos fiÈisna construÁ„o de arquiteturas pias e na promoÁ„o da religi„o catÛlica, fato que veio aqualificar a vida domÈstica no perÌodo colonial brasileiro (AZZI, 2008, p. 234).

Em 20 de abril de 1733, D. Jo„o V concedeu a licenÁa ao vig·rio da vila daMocha para fundar o hospÌcio e colÈgio da Companhia de Jesus. Nesse Ìnterim, auxi-liou o projeto com 3 mil cruzados (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 75), em que partedesse pec˙lio foi destinado ao mestre pedreiro Domingos Dias da Costa, residente davila e empreiteiro do plano. Segundo os padres jesuÌtas instalados no n˙cleo paratramitar os processos de construÁ„o da edificaÁ„o, o partido arquitetÙnico, ou comose usava no perÌodo colonial, a ìf·bricaî do templo deveria ter ì...o tamanho da igrejamatriz desta Villa com sua Sacristia por detr·s do Altar-mor como se costuma nos

Figura 2 - EdificaÁ„o que serviu de casa de c‚mara e cadeia em Oeiras.Hoje sede da prefeitura do municÌpio

Foto do autor, abril de 2010.

361Arraes, E.v. 41, n. 2, mai./ago. 2016

ColÈgios dos dittos padres. Tendo tambÈm o ditto Hospicio de huma parte da dittaigreja huma coadra de Sobrados para cubÌcullos por sima com seu salam de hospe-des e por baicho [sic] a oficina deste...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 75). Nesseexcerto, percebe-se uma pr·tica ou tradiÁ„o projetual jesuÌtica. Na opini„o do arqui-teto L˙cio Costa (1945, p. 27), o programa dos colÈgios, conventos e hospÌcios daOrdem contou em dispor v·rios corpos da edificaÁ„o em ìquadraî, estruturando ump·tio para a convivÍncia dos religiosos. A igreja alinhada ao cubÌculo contÌguo resul-taria numa fachada de ˙nico plano, uma linha horizontal harmÙnica. No entanto, osjesuÌtas alÈm de serem sensÌveis ‡ forma da obra, tinham o cuidado com sua localiza-Á„o, imprimindo um car·ter funcional no n˙cleo urbano ao qual era erguido (FRIDMAN,1999, p. 16). Pressupıe-se que houve um estudo prÈvio do lugar a ser estabelecido aconstruÁ„o. Para n„o competir espacialmente com a igreja matriz, elegeu-se uma·rea mais afastada, apÛs o riacho Pouca Vergonha. Trata-se de um sÌtio mais elevadoque o terreno da matriz, o cume de um pequeno promontÛrio (ARRAES, 2012, p.370).

O hospÌcio e colÈgio dos jesuÌtas desencadearam a expans„o urbana para oeixo norte da vila, urbanizando um ·rea afastada da praÁa central (Figura 3). Porvolta de 1762 essa zona abrigou uma populaÁ„o pobre branca, alguns escravos enegros forros. A ligaÁ„o entre os dois polos ñ largo da igreja matriz e vizinhanÁas danova edificaÁ„o jesuÌtica - era feita por uma pequena ponte de longarinas de madeirasobre colunas de cantaria (FERREIRA, 2010, p. 62). Depois da expuls„o dos inacianosdo Brasil em 1759, por ordens de D. JosÈ I auxiliado pelo conde de Oeiras e futuromarquÍs de Pombal, a ordem do Ros·rio dos Homens Pretos obteve a licenÁa parautilizar o templo em seus ofÌcios religiosos. Na Ûtica do mÈdico e naturalista inglÍsGeorge Gardner (1975, p. 125), que havia percorrido os sertıes do Norte entre 1836-1838, a construÁ„o era ì...um grande e belo edifÌcio, ora em ruÌnas...î.

Os rumos da paisagem da vila da Mocha mudaram a partir de 1758, quando aCoroa reformou o territÛrio piauiense criando a capitania de S„o JosÈ do PiauÌ, autÙ-noma da do Maranh„o. Foram dois os objetivos dessa decis„o rÈgia: o primeiro diziarespeito ‡ vigil‚ncia de ·reas ent„o controladas pela Companhia de Jesus. Vale lem-brar que, em 1711, o possuidor de metade das terras do PiauÌ, Domingos AfonsoMafrense, doou suas 35 fazendas de gado aos jesuÌtas de Salvador (NUNES, 1975, p.137), os quais, desde ent„o, passaram a inspecionar o comÈrcio bovino entre ossertıes e a capital da ColÙnia. De fato, de acordo com Jo„o Pereira Caldas, primeirogovernador da capitania, a precariedade do territÛrio dava-se por ì...serem muitasdas fazendas dos Padres da Companhia da Bahia, para os quais vay os productos dasdittas fazendas, ficando apenas os limitados interesses dos vaqueiros ou feitores queas administr„o...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 6, D. 378).

Quanto ao segundo motivo, a autonomizaÁ„o da capitania objetivava solucio-nar as injustiÁas sociais praticadas pelas autoridades da regi„o vivenciadas pela grandeparte da populaÁ„o. Isso alinha-se ‡s ideias de Francisco Xavier de MendonÁa Furta-do, governador do Estado do Gr„o-Par· e Maranh„o: ì...acresse t„obem a mesmaruÌna [do PiauÌ], os grandÌssimos roubos que alguns Ministros, que govern„o estaCapitania fizer„o aos seus moradores...î (AHU_ACL_CU_016, Cx. 6, D. 378).

362 GEOGRAFIAImaginando a paisagem urbana de Oeiras do PiauÌ (1697-1762)

A reforma territorial e urbana do PiauÌ foi aprovada por D. JosÈ I em CartaRÈgia de 19 de junho de 1761. O documento oficializou seis novas vilas, antes fregue-sias: ParnaÌba, Campo Maior, Marv„o, ValenÁa do PiauÌ, Jerumenha e Parnagu·. O·pice do reordenamento espacial ocorreu com a elevaÁ„o da vila da Mocha ‡ catego-ria de cidade, ent„o rebatizada de Oeiras do PiauÌ em homenagem a Sebasti„o JosÈde Carvalho e Melo, o conde de Oeiras e futuro marquÍs de Pombal. A opÁ„o porOeiras confirmava o interesse de Pombal em centralizar o governo da regi„o emoposiÁ„o ‡ dominante dispers„o dos assentamentos humanos (REIS FILHO, 2000, p.63). O PiauÌ, e por extens„o os sertıes contÌguos, subordinavam-se ainda mais ‡sestratÈgias geopolÌticas da Coroa, em tese, a autoridade maior. … interessante desta-car ainda que, as cidades do perÌodo colonial eram fundadas em pontos especiais doterritÛrio e do sistema urbano, por isso foram menos expressivas que as vilas, julga-dos e freguesias. Dentre algumas cidades que o Brasil-ColÙnia contava atÈ 1760,pode-se listar: Salvador (1549), FilipÈia (1585, atual Jo„o Pessoa ñ PB), S„o CristÛ-v„o (1590), Natal (1599), S„o Luis (1615), BelÈm (1616), Olinda (1676), S„o Paulo(1711) e Mariana (1745).

Figura 3 - Paisagem urbana imaginada da vila do Mocha apÛs aconstruÁ„o do hospÌcio dos jesuÌtas. DistinÁ„o de dois pÛlos

de atraÁ„o e expans„o do n˙cleo urbanoDesenho do autor segundo Planta da cidade de Oeyras, cujo orignal

encontra-se no Arquivo HistÛrico do ExÈrcito Brasileiro ñ RJ.

363Arraes, E.v. 41, n. 2, mai./ago. 2016

AS PAISAGENS DE OEIRAS NO CENSO DE 1762

Oeiras se expandiu. Apresentou, em 1762, 270 fogos (ou imÛveis) distribuÌdosem cinco zonas (AHU_ACL_CU_016, Cx. 9, D. 547): PraÁa, Ros·rio, ao redor daigreja de Nossa Senhora da ConceiÁ„o, edificada por volta de 1748, e nos bairros doCaquende e Dezertto (Figura 4). A tessitura social da cidade j· era bastante comple-xa, sendo formada por uma populaÁ„o de diferentes origens Ètnicas: indÌgena (numn˙mero menos expressivo), africana, europeia e mestiÁa. A paisagem do n˙cleo,segundo os aspectos sociais, pode ser imaginada n„o apenas a partir do fracionamentoda cidade em ·reas estanques, como corriqueiramente fazem os trabalhos acadÍmi-cos preocupados em estabelecer lÛgicas rÌgidas ‡s relaÁıes sociais praticadas nasvilas do perÌodo colonial.

Cada paisagem tem sua linguagem. Carrega em sua materialidade elementosque apresentam estruturas de poder, a formaÁ„o sÛcioeconÙmica e simbologias quelhes s„o prÛprias. A leitura da retÛrica de paisagens pretÈritas È um exercÌcio comple-xo e, muitas vezes, imaginativo, deduzido pela inferÍncia de velhas fotografias ou derelatos orais dos habitantes. As escassas sÈries documentais cartogr·ficas e textuaisdificultam a tarefa do arqueÛlogo da paisagem. Contudo, certas fontes pıem luz naaridez documental, tornando nosso labor instigante. Este foi o caso do censo de 1762,localizado pela ìbrasilianistaî americana Mary Karash, transcrito por Marcos SimıesAmorim e publicado por Miridan Britto Falci (2000-2001, p. 165-206), referente ‡populaÁ„o dos espaÁos urbano e periurbano da cidade de Oeiras. De modo que expo-

Figura 4 - OcupaÁ„o prov·vel da cidade de Oeiras em 1762. MarcaÁ„o dequatro das cinco zonas existentes na Època segundo o censo

realizado pelo governador Jo„o Pereira CaldasDesenho do autor sobre cartografia, Oeyras do Piauhi, localizada noCD-ROM Vilas e imagens do Brasil colonial. Planta sem escala gr·fica.

364 GEOGRAFIAImaginando a paisagem urbana de Oeiras do PiauÌ (1697-1762)

remos alguns resultados n„o peremptÛrios da an·lise feita, observando como a soci-edade colonial oeirense foi imaginada pelas inst‚ncias do poder local encarregadasde relacionar os moradores em categorias prÈ-determinadas pela polÌtica ilustrada domarquÍs de Pombal. Consequentemente, notaremos os seus desdobramentos nahierarquizaÁ„o do espaÁo intraurbano, na formaÁ„o social e na paisagem em si.

Os censos no perÌodo pombalino eram subsÌdios de controle e conhecimento doterritÛrio, sendo comum por toda a ColÙnia a partir da segunda metade do sÈculoXVIII. Moldava-se particularmente a maneira pela qual o Estado colonial imaginou oseu domÌnio ñ a natureza dos seres humanos por ele governado, a geografia doterritÛrio e a legitimidade do seu passado (ANDERSON, 2008, p. 227). Os administra-dores envolvidos no trabalho deveriam informar o n˙mero de habitantes, fogos, ocu-paÁ„o, idade, sexo, estado civil, etnia, populaÁ„o escrava e forra, caminhos, rios,riachos, bairros, edifÌcios religiosos e p˙blicos, engenhos e engenhocas, fazendas,ruas e suas denominaÁıes, termo, rossio, roÁas, milÌcias, escolas, lugares de Ìndios,entre outras questıes (FLEXOR, 1998, p. 262).

Nas cinco ·reas de Oeiras existiram separaÁ„o social por afinidades raciais,profissionais e econÙmicas, o que Jacques Le Goff (1992, p. 186) chamou apropriada-mente de ìsociotopografiaî, relativizando a homogeneidade da populaÁ„o e do con-junto construÌdo. Mesmo em regiıes remotas, os n˙cleos urbanos apresentavam nÌti-das diferenÁas sociotopogr·ficas (VASCONCELOS, 2010, p. 103).

Os principais sÌmbolos de municipalidade eram a igrejas, o pelourinho, a casade C‚mara e a cadeia. A matriz ìtem seu acento no meyo da praÁa principal damesma Cidade de ordinaria grandeza, com duas capellas; dous altares, alÈm do mor,e duas sacristias...î (FALCI, 2000-2001, p. 174). No bairro do Ros·rio havia a igrejadedicada ‡ santa que carrega o seu nome ì...com bastante grandeza, seus altares emcuja obra ainda se continua...î (FALCI, 2000-2001, p. 174) O pelourinho, sÌmbolo daautonomia municipal conquistada em 1712, foi realocado ìpor ser de antes sentadoem lugar menos prÛprio...î (FALCI, 2000-2001, p. 175), ficando desde ent„o a mÈdiadist‚ncia da matriz e paÁo do concelho.

A vida urbana adensava-se no circuito da praÁa e em suas proximidades. Ali,existiam 33 casas onde viveram 114 pessoas, entre estes, membros da elite local eos funcion·rios do governo. Fazendeiros tinham suas residÍncias de domingos ou diasfestivos localizadas nesse lugar da cidade. A praÁa foi o espaÁo das casas do gover-nador Jo„o Pereira Caldas, de dois tabeli„es, de um intendente, de um sargento-mor,do vig·rio colado, do capit„o-mor e, ao nosso ver, do mais rico morador da cidade ño homem de negÛcios Francisco Barreira de Macedo (FALCI, 2000-2001, p. 171). ApopulaÁ„o da praÁa era m˙ltipla, composta por setenta homens (23 escravos e 45livres) e quarenta e quatro mulheres (26 escravas, 15 livres e trÍs Ìndias agregadas).

As irmandades eram detentoras dos principais edifÌcios do largo. Alugavam-nos para o governador, desembargador e vig·rio da matriz, DionÌsio JosÈ de Aguiar. Opal·cio do governo, por exemplo, pertencia ‡ irmandade de Santa Anna, sendo co-brado um aluguel de 84$000 rÈis (AHU_ACL_CU_016, Cx. 8, D. 504). O desembargadoralugava a casa da confraria de S„o Jo„o Nepomuceno. O p·roco residia numa resi-dÍncia da irmandade de Nossa Senhora da VitÛria.

Em seguida foram arrolados os fogos das ruas que cruzavam o ·trio da matrizou ‡quelas que lhe eram paralelas: rua Direita, Pataratas, PaÁo, Poeyra, do Jorge, doPrÌncipe, Nova das Flores e Nova da Bica. A toponÌmia indica os usos predominantesnesses espaÁos ou referÍncias destacadas. Segue a lista com as suas respectivastessituras social e material:

ï Rua Direita: casas: 07; alugadas: 0; homens: 10 (04 livres, 05 escravos e 01forro); mulheres: 12 (02 livres, 05 escravas e 05 forras).

365Arraes, E.v. 41, n. 2, mai./ago. 2016

ï Rua das Pataratas: casas: 12; alugadas: 10; homens: 25 (12 livres, 12 es-cravos e um Ìndio); mulheres: 05 (02 livres, 02 escravas e 01 forra);

ï Rua do PaÁo: casas: 05; alugadas: 02; homens: 08 (05 livres e 03 escra-vos); mulheres: 03 (02 livres 01 escrava).

ï Rua das Poeyras: casas: 26; alugadas: 12; homens: 42 (27 livres, 14 escra-vos e 01 forro); mulheres: 25 (11 livres, 11 escravas e 03 forras)

ï Rua do PrÌncipe: casas: 11; alugadas: 02; homens: 06 (04 livres e 02 for-ros); mulheres: 06 (01 livre, 03 escravas e 02 forras)

ï Rua Nova das Flores: casas: 05; alugadas: 02; homens: 08 (05 livres, 01escravo e 02 forros); mulheres: 13 (07 livres, 04 escravas e 02 forras)

ï Rua Nova da Bica: casas: 16; alugadas: 05; homens: 28 (09 livres, 15 escra-vos e 04 forros); mulheres: 25 (07 livres, 11 escravas e 07 forras)

AlÈm dos cargos rÈgios, no n˙cleo central e ruas adjacentes existiam oficiaismec‚nicos e o que hoje denominamos de profissionais liberais (Tabela 1). A presenÁadesses agentes na cidade È indÌcio de uma populaÁ„o permanente, cujas economiasderivaram do urbano (comÈrcio, por exemplo) e do periurbano, favorecendo as trans-formaÁıes materiais da paisagem. Seriam, como opinou Nestor Goulart Reis Filho,evidÍncias de uma urbanidade em ascens„o (REIS FILHO, 2000, p. 49).

Tabela 1 - Oficiais mec‚nicos e ìprofissionais liberaisî de Oeiras. ElaboraÁ„odo autor segundo informaÁıes do ACENTO das cazas propias, e de aluguerqí ocupa os moradores da Cidade de Oeyras capitannia de SaíIozÈ do Piahuyí,Suas FamÌlias, Pessoas de hum, e outro sexo, mossos, Escravos, SeusSub˙rbios...

(FALCI, 2001, p. 174-206). A indicaÁ„o (...)* refere-se a quantidade de profissionaisexistentes em cada ·rea da cidade.

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A segunda zona - o bairro do Ros·rio - alÈm das residÍncias prÛximas ao largoda igreja de Nossa Senhora do Ros·rio (antes hospÌcio e colÈgio dos jesuÌtas), existi-ram outras edificadas em duas ruas (Cadeya Velha e Cadeia Nova, totalizando 36casas, das quais 10 eram alugadas). Numa delas vivia o carpinteiro Fellix Pereyra daSylva, cuja moradia pertencia ao patrimÙnio da cadeia, o que nos leva a pensar queo ato de alugar parecia um negÛcio valorizado por distintas esferas da sociedadeoeirense. Ainda no Ros·rio, uma comunidade de aproximadamente 53 pessoas habi-tavam 13 moradias. Desses, 25 eram homens (13 livres, 08 escravos e 04 forros) e28 mulheres (11 livres, 13 escravas e 04 forras). Dois dos treze homens livre eramcarpinteiros. A mulher forra, QuitÈria de Souza, vivia de aluguel na casa de Manuel deSouza Pacheco, com sua famÌlia e mais quatro escravos seus.

Seis casas prÛprias e quatro alugadas representavam a paisagem da rua daCadeya Velha (hoje Nogueira Tapety). A populaÁ„o deste logradouro, em 1762, erade 41 moradores arrolados em 18 homens (13 livres, 03 escravos, 01 forro e umÌndio) e 23 mulheres (11 livres, 06 escravas, 03 forras, 02 Ìndias e uma Ìndia forra).Presume-se que a categoria ìÌndia forraî decorria da escravid„o do indÌgena, logoapÛs a homologaÁ„o das leis que garantiam a sua liberdade. … prov·vel que ela tenhaobtido sua alforria com a sanÁ„o das leis de 06 e 07 de junho de 1755 ou devido aoDiretÛrio dos Õndios de 1757, que garantiam liberdade incondicional aos nativos doBrasil. Viveram nesta paisagem mista um sargento e um mercador. DistribuÌdos aolongo da rua da Cadeia Nova identificamos, alÈm da nova cadeia, 13 moradias (04alugadas) totalizando 38 residentes: 23 homens (14 livres, 08 escravos e 01 forro);15 mulheres (12 livres, 02 escravas e uma forra). No que tange os bairros do Dezertoe Caquende elaboramos a tabela 2. No sub˙rbio da cidade, detectamos 88 moradias.

A an·lise dos Ìndices parcialmente apresentados nos d· um prÈvio balanÁosobre o comportamento social e urbano de Oeiras pombalina. Seguindo o raciocÌniode Pedro Vasconcelos (2010, p. 112) e Diogo Fonseca Borsoi (2013), pode-se perce-ber um dÈgradÈ social bem mais complexo que uma suposta sociedade di·tica desenhores e escravos, dominantes e dominados. A paisagem urbana da cidade repre-sentada no censo expıe uma sociedade din‚mica, complexa e plural: forros poderi-am alugar casas e ter seus escravos, brancos pobres viviam de aluguel sem possuirescravos, irmandades detinham as principais residÍncias da praÁa, casas tÈrreas es-tavam alugadas por brancos, escravos e forros.

Havia homens que lucraram com a pr·tica de alugar. Beatriz Bueno (2005, p.146) mostrou que desde o perÌodo colonial os imÛveis urbanos eram passÌveis decompra, venda e aluguel, implicando em lucro para os que neles investissem. Estu-dando o censo de 1762, avaliamos que todos os 27 agentes envolvidos na pr·tica doaluguel, com exceÁ„o das irmandades religiosas, n„o residiam em Oeiras, mas talvezem suas fazendas de gado, ou, quem sabe, em alguns casos, no litoral6. A ascens„oda pecu·ria na colÙnia È concomitante ‡ reduÁ„o da exportaÁ„o do aÁ˙car produzidona Zona da Mata pernambucana e no RecÙncavo Baiano, atraindo para os sertıesalguns senhores de engenho interessados no gado e no couro. … interessante subli-nhar o caso de AntÙnio GonÁalves Jorge. Uma rua prÛxima ‡ praÁa recebeu o seunome. Dos quatro edifÌcios localizados nesse logradouro, trÍs lhe pertenciam e esti-veram alugados.

6 Por exemplo, o criador de gado, AntÙnio JosÈ de Sousa Freire Tavares Castro Leal, morador deSalvador, possuiu duas fazendas de gado nos sertıes do PiauÌ. Uma com o nome de Empoeira e aoutra chamada de Ryacho. Ver AHU_ACL_CU_018, Cx. 8, D. 513.

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Tabela 2 - Bairros do Dezertto e Caquende e suas tessituras social e material.ConstruÁ„o do autor segundo ACENTO das cazas propias, e de aluguer qíocupa os moradores da Cidade de Oeyras capitannia de SaíIozÈ do Piahuyí,Suas FamÌlias, Pessoas de hum, e outro sexo, mossos, Escravos, SeusSub˙rbios...

(FALCI, 2001, p. 174 ñ 206).

368 GEOGRAFIAImaginando a paisagem urbana de Oeiras do PiauÌ (1697-1762)

Um dado que sobressai ‡s nossas vistas diz respeito ‡ diminuta presenÁa doindÌgena na escala intraurbana de Oeiras. Ser· que poucos se revestiram da civilida-de almejada para o convÌvio? Os par·grafos 87, 88 e 89 do DiretÛrio dos Õndiosmencionavam o matrimÙnio e a sociabilidade entre brancos e gentios ìpara facilitaros ditos matrimonios, empregaraı os Directores toda a efficacia do seu zelo em per-suadir a todas as Pessoas Brancas, que assistirem nas suas PovoaÁoens, que osIndios tanto naı saı de inferior qualidade...î (ALMEIDA, 1997). Neste caso, ao nossover, a cidade agiu como fronteira de repuls„o aos nativos da capitania de S„o JosÈ doPiauÌ, por isso a congregaÁ„o das comunidades indÌgenas ocorreu em trÍs lugares deÌndios especÌficos, erguidos em outras partes da capitania: Nossa Senhora das MercÍsde JaicÛs (atual JaicÛs - PI), S„o JosÈ de Sende (RegeneraÁ„o - PI) e S„o GonÁalo doAmarante (Amarante ñ PI).

Em 1772, dez anos depois da finalizaÁ„o do primeiro censo, a paisagem urbanade Oeiras praticamente manteve-se inalterada, apresentando, segundo o relatÛrio doouvidor AntÙnio JosÈ Morais Dur„o, 269 fogos e uma populaÁ„o hÌbrida de 1252 pes-soas formada por brancos, mulatos, mestiÁos, vermelhos, mamelucos e pretos(AHU_ACL_CU_016, Cx.12, D. 684).

A permanÍncia da paisagem nesse perÌodo parece valer-se da queda econÙmi-ca sofrida pela pecu·ria (economia base da capitania), a partir de meados do Sete-centos, e da ascens„o da produÁ„o algodoeira no Maranh„o, principalmente na juris-diÁ„o do julgado das Aldeias Altas (atual Caxias ñ MA), no qual a migraÁ„o de comer-ciantes de diferentes praÁas ajudou a incrementar esse fenÙmeno na escala mundiale em nÌvel do mercado interno. Isso acarretou em diversos debates proferidos pelasautoridades e elites locais com o Conselho Ultramarino a fim de trasladar a cidadepara um sÌtio mais conveniente capaz de reestruturar as instabilidades econÙmicas.Cogitou-se na vila de ParnaÌba por ter um perfil mais comercial e estar localizada apoucos quilÙmetros do oceano, assim como possuir importantes portos que serviramcomo ancoradouros de barcos e sumacas procedentes de diferentes partes da ColÙ-nia, em geral, Recife, Salvador, Aracati, BelÈm, S„o Luis e Rio de Janeiro. Com efeito,Oeiras perdeu o status de capital da provÌncia do PiauÌ em 1852, quando o corpoadministrativo foi transferido n„o para ParnaÌba como inicialmente se pretendia, maspara a planificada Teresina.

REFER NCIAS

Fontes prim·rias manuscritas

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AHU_ACL_CU_015, Cx. 18, D. 1771; AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 93;AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 96; AHU_ACL_CU_016, Cx. 1, D. 19; AHU_ACL_CU_016,Cx. 1, D. 35; AHU_ACL_CU_016, Cx. 2, D. 75; AHU_ACL_CU_016, Cx. 6, D. 378;AHU_ACL_CU_016, Cx. 9, D. 547; AHU_ACL_CU_016, Cx. 8, D. 504;AHU_ACL_CU_016, Cx.12, D. 684; AHU_ACL_CU_018, Cx. 8, D. 513.

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Fontes manuscritas impressas

ACENTO das cazas propias, e de aluguer qí ocupa os moradores da Cidade de Oeyrascapitannia de SaíIozÈ do Piahuyí, Suas FamÌlias, Pessoas de hum, e outro sexo, mossos,Escravos, Seus Sub˙rbios, e Rebaldes, cazas , Rossas delles qí o Ilmo. Sr. Ioao PereyraCaldas Goverdador da ditta Capitania mandou fazer, e averiguar por DomingosBarreyra de Macedo Capp.am mor da mesma Cid.e , e da GovernaÁa della, que foyEscriv„o o Luis Ant.o Ribr.o da mesma GovernaÁaî. In FALCI, Miridan Britto. ìA cidadede Oeiras do PiauÌî. Revista do Instituto HistÛrico de Oeiras. Oeiras: Secretariade Cultura, 2000. p. 174 ñ 206.

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Recebido em setembro de 2015

Aceito em novembro de 2015