fotografia e colonialismo: para lá do visível

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1 'ftulo original: o imperio Colonial em XIX-XX). ,\a.beres i nstituifoes. os autorcs dos textos e Edi<;:6es 70 Capa de FBA Deposito Legal n.Q 352535/12 Miguel Bandeira eDU Indices: PAUl.A GON(,:ALVES Pagina<;ao: RITA LYNCF Imprcssao acabamento: PAPELMUNDE, SMG, LDA. para 70, LDA. ern Novembro de 2012 Direitos rcservados para todos os Daises de por Edi<;;6es 70, uma chanccla 70, Lda. Rua Luciano Cordeiro, 123 1..0 Esq ..o 1069-157 Lisboa I Portugal Telefs.: 213190240- Fax: 213J90249 e-mail: [email protected] www.edicoes70.pt Esta obra esta protegida lei. Nao podc ser reproduzida, no todo ou ern parte, o IMPERIO COLONIAL EM QDESTiO (SEGS. XIX-XX) MIGUEL BARDEIIA JERONIMO ORG. r2QJ qualquer que 0 utilizado, incluindo fotoc6pia e xeroc6pia, scm previa autoriz3<;ao Editor. Oualquer lranSgressao a lei dos Direitos de Autor

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1 ftulo original o imperio Colonial em XIX-XX) aberes instituifoes

os autorcs dos textos e Edilt6es 70

Capa de FBA

Deposito Legal nQ 35253512

Miguel Bandeira

eDU 9J(H)~))1PEJ(012)

Indices PAUlA GON(ALVES

Paginaltao RITA LYNCF

Imprcssao acabamento PAPELMUNDE SMG LDA

para 70 LDA

ern Novembro de 2012

Direitos rcservados para todos os Daises de por Edilt6es 70 uma chanccla

~lJlyU~ 70 Lda Rua Luciano Cordeiro 123 10 Esqo 1069-157 Lisboa I Portugal

Telefs 213190240- Fax 213J90249 e-mail geralcdicoes70pt

wwwedicoes70pt

Esta obra esta protegida lei Nao podc ser reproduzida no todo ou ern parte

o IMPERIO COLONIAL EM QDESTiO (SEGS XIX-XX)

MIGUEL BARDEIIA JERONIMO ORG

r2QJ qualquer que 0 utilizado incluindo fotoc6pia e xeroc6pia scm previa

autoriz3ltao Editor Oualquer lranSgressao a lei dos Direitos de Autor

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO para Li do visfvel

FILIPA LOWNDES VICENTE

Ao longo da segunda metade do seculo XIX a fotografia surshygiu como urn instrumento central na defmicao de identidades nacionais coloniais e individuais e como uma nova forma de conhecimento e de comunicacao Entre os anos 1850 e os anos 1950 a fotografia foi mesmo 0 principal modo de tornar 0 mundo vislvel Esta hegemonia da fotografia correspondeu a hegemonia do colonialismo contemporaneo Uma coincidencia temporal que se refletiu na estreita relacao entre colonialismo e fotografia por urn lado nos modos como contribui para uma cultura colonial (1) E por outro na forma como se tornou urn dos objetos hist6ricos

(1 ) A genese deste artigo esteve na candidatura ao proje to de investigaltao financiado pea Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia Conhecimento e Visao Fotoshygrafia no Arquivo eno Museu Colonial Portugues (1850-1950) Ver Nicholas Thomas Colonialisms culture Anthrop ology travel and government (Princeton Princeton University Press 1994) Nos ultimos dez anos urn grupo de historiadores franceshyses tern u sado a expressao laquoculture colonialeraquo para dar nome aos livros que tern organizado em conjunto A cultura visual do colonialismo incluindo a fotografia e urn dos temas privilegiados por estes investigadores Para alguns exemplos ver Pasca l Blanchard Sandrine Lemaire e Nicolas Bance eds Culture Coloniale en France De la R evolution franfaise anos jours prefacio de Gilles Boetsch (Paris CNRS Editions 2003) Pascal Blanchard e Sandrine Lemaire Eds Culture Coloshyniale La France conquise par son Empire (1871-1931) (Paris Autrement 2003) Eric Deroo com a colab de Sandrine Lemaire LIllusion Coloniale (Paris Editions Tallandier 2005)

425 I

424 0 IMPIRIO COLONIAL EM QUESTAo (stes XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

determinantes do arquiUo e museu colonial- aqueles espacos e lugashyres onde os vestfgios materiais visuais e escritos da experiencia colonial acabaram as suas viagens Mas nao acabaram as suas hist6shyrias Estes lugares do arquivo encontram-se na ex-metropole coloshynial nos ex-espacos colonizados ou em qualquer outro lugar pois uma das caracterfsticas de materiais facilmente transportaveis como a fotografia ou 0 documento e precisamente 0 da sua porshytabilidade e mobilidade Se estas caracterfsticas beneficiam os movimentos destes objetos indissociaveis de historias pessoais como de historias de est ados e nacoes tambem representam uma vulnerabilidade a passagem do tempo as condicoes climatericas ou a facilidade com que podem ser considerados dispensaveis e desprezados em contraste com aquilo que se considera digno de preservacao Os tipos de arquivo onde se podem encontrar mateshyriais para 0 estudo das relacoes entre a fotografia e 0 colonialismo sao inumeros de arquivos pessoais pertencentes a familias ou a indivfduos a arquivos comerciais governamentais e pertencentes a todo 0 tipo de instituicoes de bibliotecas a museus

Para estudar a fotografia em contexto colonial e necessaria uma abordagem interdisciplinar mas tambem e necessario como ja alertou Elizabeth Edwards sair de uma mera perspetiva de urn laquoolhar colonialraquo ou seja conjugar as interrogacoes deste tipo de abordagem teorica com uma atencao a laquomultiplicidade de possibishylidades hist6rias e contra-historias que habitam as fotografias raquo e)

Este artigo surge como urn mapa a sugerir varios caminhos de investigacao possiveis e a enunciar algumas das questoes teoricas que tern interpelado as analises deste tema

A fotografia em contexto colonial 0 que nao quer dizer necesshysariamente laquofotografia coloniaraquo teve multiplos usos e sentidos e seria redutor defini-la como urn mero instrumento de exerdcio da autoridade a diferenciar 0 gesto ativo dos colonizadores que fotoshygrafavam do gesto passivo dos colonizados que eram fotografados

(2) Elizabeth Edwards Raw histories Photographs Anthropology and Museums (Oxford e Nova Iorque Berg 2001) p 12

I Alem destes usos sobretudo no ambito da antropologia em C011shyI texto colonial existiram muitas outras formas de fotografar e de

ser fotografado Numa discussao desenvolvida em paralelo com aquela que foi suscitada pelo termo laquoorientalismoraquo nos ultimos trinta anos tambem a teoria crftica que se dedica afotografia coloshynial tende hoje a questionar os pressupostos que limitaram a fotografia a uma relacao entre conhecimento e poder sublinhando a complexidade e multiplicidade dos seus usos em contexto coloshynial e a diversidade de relacoes possiveis entre fotografo e fotoshygrafado (3) No entanto muitos dos estudos que incidem sobre a fotografia em contexto colonial continuam a ter como objetivo laquoverishyficar como e que a fotografia serviu para legitimar as ideologias de dominio cultural e racial da epoca modernaraquo ou a analisar a intersecao entre conhecimento colonial e producao fotografica algo que parece contrariar a anunciada vontade de alargar as aborshy

dagens cIa fotografia (l) Este tipo de abordagem tende a concentrar-se em fotografias

realizadas nas colonias por fot6grafos que se situam numa posicao de poder queI por pertencerem ao grupo dos colonizadores quer por pretenderem alcancar urn tipo de classificacao visual indissoshyciavel de outros instrumentos de formacao de urn conhecimento colonial (5) A fotografia sobretudo quando usada peIa antropoloshygia ffsica ou pelas suas versoes popularizadas foi muito importante para divulgar ideias contemporaneas de raca sobretudo no Ocidenshyte que do Oriente so conhecia imagens e textos reforltando preconshyceitos raciais hierarquias entre povos e legitimando as necessidades dos poderes coloniais 0 gigantesco The People of India (1868-75)

(3) Eleanor M Hight e Gary D Sampson laquoIntroduction Photography Race and Post-Colonial Theoryraquo in Colonialist photography Irnag(in)ing race and place eds Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorque Routledge 2002) James R Ryan Picturing empire Photography and the visualization ofthe Brishytish Empire (Londres Reaktion Books 1997) Joan M Schwartz e James R Ryan eds Picturing place and th e geographical imagination (Londres e Nova Iorque I B Tauris 2003)

(4) Hight e Sampson laquoIntroduction Photography raquo p 16 Maria Antonella Pelizzari laquoIntroductionraquo in Traces ofIndia Photography Architecture and the Polishytics of Representation 1850-1900 (New Haven e Londres Yale University Press 2003) pp 13-18 14

(5) John Tagg The burden ofTepresentation essays on photographies and histo-

Ties (Londres The Macmillan Press 1988)

427

T 1

o IMPERIO COLON IAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX) 426

laquo0 encantador de serpentes Caicutaraquo Litografia a cores sd Uma mulher britanica os seus filh os e os empregados indianos observam urn encantador cle serpentes Coleltao particular

compendio fotografico de oito volumes que pretendia classificar os povos da india em cerca de 500 fotografias comentadas e um exemplo desta perspetiva (6) Em contexto colonial a fotografia tende assim a ser estudada para mostrar 0 seu papel na identifishycaltao classificaltao controlo e afirmaltao dos poderes coloniais

Entre os muitos usos da fotografia enl contexto colonial podeshydamos sugerir tres abordagens em primeiro lugar ao servilto da propaganda a anular a distancia entre metr6pole e imperio e a mostrar as col6nias e os seus habitantes aqueles que era colonizashydares mas nao podiam ver ou conhecer os espaltos que colonizavam atraves de outros meios Em segundo lugar na produltao de conheshycimento ao ser primeiro um instrumento insepanlvel dos varios saberes cientificos que usavam as col6nias como laborat6rio e mais tarde ja em finais do seculo XIX ao converter-se num eleshymento fundamental para as varias ciencias coloniais que se conshysolidaram em todos os contextos europeus deste pedodo atraves de instituilt6es exposilt6es museus congressos e revistas Finalshy

(6) J ohn Falconer A Pure Labor of Love a publishing history of The Peoshyple of Indiaraquo in Colonialist Photography Ima(inJing race and place ed Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorgue Routledge 2002)

FOTOGRAFI A E COLONIALISMO

mente a fotografia constituiu-se num elemento central da relaltao entre conhecimento e colonialismo mas tambem foi apropriada pelos locais no fOljar das suas identidades e das suas agendas nacionalistas por vezes contra 0 dominio colonial Neste caso docaisraquo e uma palavra mais adequada do que laquocolonizadoraquo porshyque esta ultima e muito limitadora para definir aqueles que se dedicavam a fotografia e nao pertenciam aquele grupo que se poderia identificar como laquocolonizadon) ou laquocolonizadoraquo Podiam ser laquoIocais )) no sentido mais tradicional em que 0 termo e usado (aqueles que nasceram no lugar) mas tambern estrangeiros de varias nacionalidades como os europeus nao pertencentes a llacioshynalidade dos colonizadores mas que habitavam 0 espalto colonial Talvez falta mesmo sentido deixar de utilizar estas categorias que tendem a dividir os projetos fotograficos de iniciativa colonial daqueles de iniciativa local pois esta abordagem dicot6mica nao permite reconhecer a complexidade inerente a laquoexperiencia e aos filovimentos dos fotografos patronos e dos pr6prios objetosraquo (7) Assim por urn lado importa explorar quao enraizada estava a fotografia na cultura colonial em geral e pensar nos problemas comuns a todos os espaltos coloniais mas por Olltro lado tambem enecessario ter em conta como e que a fotografia foi apropriada e usada em diferentes espaltos geograficos e ter em conta as espeshy

cificidades de cada lugar Muitas das ideias abordagens metodologias e problemas de

investigaltao que associam fotografla e colonialismo foram explorashydos e mesmo iniciados por antropologos como Elizabeth Edwards Christopher Pinney e James Ryan Elizabeth Edwards foi pioneira em estudar as hist6rias paralelas da fotografia e da antropologia e em explorar as ligalt6es entre a fotografia e deg museu e arquivo coloniais (8) 0 seu trabalho foi fundamental em abordar a fotoshygrafia atraves de praticas de colecionismo formaltao de conhecishymento cientifico e circulaltao e intercambio de ideias Ou seja em estudar a hist6ria individual de uma fotografia na sua articulaltao com a historia a laquobiografia sociab que Christopher Pinney analishy

(7) Erin Haney Photography and Africa (Londres Reaktion Books 2010) p 10 (8) Elizabeth Edwards Raw histories Elizabeth Edwards ed Anthropology

and photograph)) 1860-1920 (New H aven Yale University Press 1992)

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T 428 o IMPERIO COLON IAL EM QUESTtO (SECS XIX-XX)

sou de modo tao brilhante no seu livro sobre fotografia na India nos seculos XIX e XX Camera Indica (9)

Todos estes autores coincidiram numa critica a uma mera laquodesshycricao da superficieraquo em relacao afotografia ou a uma mera analise do seu contexto de producao Em vez disso defendem a necessidade de explorar a sua propria historia para la de identificar quem fotoshygrafou e 0 que eque foi fotografado Esta abordagem tambem foi levada a cabo com sucesso em Portugal por Nuno Porto urn dos pioneiros na escrita sobre fotografia no contexto colonial portushygues nos seus trabalhos sobre fotografia e ciencia na Angola coloshynial (10) Tanto os escritos de Christopher Pinney como os deJames Ryan foram inovadores nos modos como inscreveram a fotografia nos mecanismos de poder colonial opressao e domfnio (11) Ao centrarem as suas investigacoes no Imperio Britanico e na sua principal colonia a India tanto Pinney como Ryan contribufram para reforcar urn campo especffico 0 da fotografia na India coloshynial Britanica que ja tinha uma certa tradicao historiografica desde os anos 1980 (12) mas que passou a assumir uma linha censhytral de investigacao em muitas outras contribuiltoes mais recentes como e 0 caso de The Coming ofPhotography in India de Pinney e de Traces ofIndia Photography Architecture and the Politics ofRepreshysentation 1850-19000 livro editado por Maria Antonella Pelizzashyri (13) Estes dois livros exemplificam uma das novas abordagens a fotografia na India colonial e ao colonialismo oitocentista em geral 0 de explorar os modos como as elites indigenas e as comushynidades locais usa ram a fotografia e 0 de chamar a atencao para as limitacoes ou mesmo impossibilidades de colocar colonizadoshy

(9) Christopher Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs (Londres Reaktion Books 1997)

(10) Nuno Porto Angola a preto e bran co - fotografia e ciencia no Museu do Dundo 1940-1970 (Coimbra Museu Antropologico da Uuiversidade de Coimbra 1999)

(11) James R Ryan Picturing Empire Christopher Pinney Camera Indica (12) John Falconer laquoPhotography in Nineteenth Century Indiaraquo in The Raj

India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Galshylery Publications 1990) Judith Mara Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India (Nova Iorque Oxford University Press Intershynational Center for Photography 1982)

(3) Pelizzari ed Traces ofIndia Christopher Pinney The coming ofphotograshyphy in India (Londres The British Library 2008)

I I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

res de urn lado e colonizados do outro quanto as praticas relacioshynadas com a fotografia se refere

Neste aspeto 0 caso africano num sentido generalizado pode ser comparado com 0 caso indiano Durante muito tempo os estushydos sobre a fotografia que se concentravam no continente africano apenas estudavam os fotografos estrangeiros que se instavam nas colonias ou que as percorriam enquanto fotografos profissionais itinerantes ou enquanto membros de missoes cientificas ou de misshysionacao Desde a decada de 1980 no en tanto que uma historiograshyfiamais atenta as praticas criativas e profissionais dos nao-europeus (ou das mulheres em geral) descobriu varios fotografos de origem Africana ainda no seculo XIX (14) 0 mesmo foi reconhecido em relashyltao as praticas fotograficas no territorio colonial asiatico onde as tecnicas fotograficas foram acolhidas com entusiasmo pelos muitos indianos que se dedicaram pIofissionalmente a fotografia

Historiografias nacionais e fotografia colonial

I

Para la das diferentes abordagens teoricas existe claramente uma literatura sobre fotografia e colonialismo que tende a ser de cariz nacional ou seja a debrultar-se em contextos nacionaiscoloniais especificos do britanico ao italiano ou alemao e que pelas razoes obvias se tende a concentrar na segunda metade do seculo XIX primeiras decadas do seculo XX (15)0 caso portugues com todas

t (14) Haney Photography and Africa p 14

I (15) Para 0 caso frances ver Pascal Blanchard Nicolas Bauce e Sandrine

Lemaire dir La frature coloniale La societe franfaise au prisme de lheritage colonial (Paris La Decouverte 2005) Pascal Blanchard Stephane Blanchoin Nicolas Bancel et al dir Lautre et nous laquoscenes et typesraquo Anthropologues et historiens devant

I les representations des populations colonisees des ethnies des tribus et des races depuis les conquetes coloniales Colloque organise p ar I Association Connaissance de lhisshytoire de lAfrique contemporaine GDR Ocean Indien UPR 221 CNRS (Marseille

f fevrier 1995) (Paris Syros 1995) Para 0 caso italiano ver Brunetto Chiarelli

I I Cosimo Chiarelli e Paolo Chiozzi ed Etnie La scuola antropologica fiorentina e la

fotografia (Florenlta Alinari 1996) Cosimo Chiarelli I ritratti dellaltrove Roland Bonaparte Paolo Mantegazw Elio Modigliani (Roma Societa Geografica Ita liana 2004) Cosimo Chiarelli laquoListinto e la disciplina La fotografia di Elio Modigliashyniraquo in Elio Modigliani Viaggiatore e naturalista sulla rotta delle rneraviglie Nias Surnatra Engano M entawai 1886-1894 Lo sguardo il racconto la collezione (Floshy

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

T I I

432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

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1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

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T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

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1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

1

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO para Li do visfvel

FILIPA LOWNDES VICENTE

Ao longo da segunda metade do seculo XIX a fotografia surshygiu como urn instrumento central na defmicao de identidades nacionais coloniais e individuais e como uma nova forma de conhecimento e de comunicacao Entre os anos 1850 e os anos 1950 a fotografia foi mesmo 0 principal modo de tornar 0 mundo vislvel Esta hegemonia da fotografia correspondeu a hegemonia do colonialismo contemporaneo Uma coincidencia temporal que se refletiu na estreita relacao entre colonialismo e fotografia por urn lado nos modos como contribui para uma cultura colonial (1) E por outro na forma como se tornou urn dos objetos hist6ricos

(1 ) A genese deste artigo esteve na candidatura ao proje to de investigaltao financiado pea Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia Conhecimento e Visao Fotoshygrafia no Arquivo eno Museu Colonial Portugues (1850-1950) Ver Nicholas Thomas Colonialisms culture Anthrop ology travel and government (Princeton Princeton University Press 1994) Nos ultimos dez anos urn grupo de historiadores franceshyses tern u sado a expressao laquoculture colonialeraquo para dar nome aos livros que tern organizado em conjunto A cultura visual do colonialismo incluindo a fotografia e urn dos temas privilegiados por estes investigadores Para alguns exemplos ver Pasca l Blanchard Sandrine Lemaire e Nicolas Bance eds Culture Coloniale en France De la R evolution franfaise anos jours prefacio de Gilles Boetsch (Paris CNRS Editions 2003) Pascal Blanchard e Sandrine Lemaire Eds Culture Coloshyniale La France conquise par son Empire (1871-1931) (Paris Autrement 2003) Eric Deroo com a colab de Sandrine Lemaire LIllusion Coloniale (Paris Editions Tallandier 2005)

425 I

424 0 IMPIRIO COLONIAL EM QUESTAo (stes XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

determinantes do arquiUo e museu colonial- aqueles espacos e lugashyres onde os vestfgios materiais visuais e escritos da experiencia colonial acabaram as suas viagens Mas nao acabaram as suas hist6shyrias Estes lugares do arquivo encontram-se na ex-metropole coloshynial nos ex-espacos colonizados ou em qualquer outro lugar pois uma das caracterfsticas de materiais facilmente transportaveis como a fotografia ou 0 documento e precisamente 0 da sua porshytabilidade e mobilidade Se estas caracterfsticas beneficiam os movimentos destes objetos indissociaveis de historias pessoais como de historias de est ados e nacoes tambem representam uma vulnerabilidade a passagem do tempo as condicoes climatericas ou a facilidade com que podem ser considerados dispensaveis e desprezados em contraste com aquilo que se considera digno de preservacao Os tipos de arquivo onde se podem encontrar mateshyriais para 0 estudo das relacoes entre a fotografia e 0 colonialismo sao inumeros de arquivos pessoais pertencentes a familias ou a indivfduos a arquivos comerciais governamentais e pertencentes a todo 0 tipo de instituicoes de bibliotecas a museus

Para estudar a fotografia em contexto colonial e necessaria uma abordagem interdisciplinar mas tambem e necessario como ja alertou Elizabeth Edwards sair de uma mera perspetiva de urn laquoolhar colonialraquo ou seja conjugar as interrogacoes deste tipo de abordagem teorica com uma atencao a laquomultiplicidade de possibishylidades hist6rias e contra-historias que habitam as fotografias raquo e)

Este artigo surge como urn mapa a sugerir varios caminhos de investigacao possiveis e a enunciar algumas das questoes teoricas que tern interpelado as analises deste tema

A fotografia em contexto colonial 0 que nao quer dizer necesshysariamente laquofotografia coloniaraquo teve multiplos usos e sentidos e seria redutor defini-la como urn mero instrumento de exerdcio da autoridade a diferenciar 0 gesto ativo dos colonizadores que fotoshygrafavam do gesto passivo dos colonizados que eram fotografados

(2) Elizabeth Edwards Raw histories Photographs Anthropology and Museums (Oxford e Nova Iorque Berg 2001) p 12

I Alem destes usos sobretudo no ambito da antropologia em C011shyI texto colonial existiram muitas outras formas de fotografar e de

ser fotografado Numa discussao desenvolvida em paralelo com aquela que foi suscitada pelo termo laquoorientalismoraquo nos ultimos trinta anos tambem a teoria crftica que se dedica afotografia coloshynial tende hoje a questionar os pressupostos que limitaram a fotografia a uma relacao entre conhecimento e poder sublinhando a complexidade e multiplicidade dos seus usos em contexto coloshynial e a diversidade de relacoes possiveis entre fotografo e fotoshygrafado (3) No entanto muitos dos estudos que incidem sobre a fotografia em contexto colonial continuam a ter como objetivo laquoverishyficar como e que a fotografia serviu para legitimar as ideologias de dominio cultural e racial da epoca modernaraquo ou a analisar a intersecao entre conhecimento colonial e producao fotografica algo que parece contrariar a anunciada vontade de alargar as aborshy

dagens cIa fotografia (l) Este tipo de abordagem tende a concentrar-se em fotografias

realizadas nas colonias por fot6grafos que se situam numa posicao de poder queI por pertencerem ao grupo dos colonizadores quer por pretenderem alcancar urn tipo de classificacao visual indissoshyciavel de outros instrumentos de formacao de urn conhecimento colonial (5) A fotografia sobretudo quando usada peIa antropoloshygia ffsica ou pelas suas versoes popularizadas foi muito importante para divulgar ideias contemporaneas de raca sobretudo no Ocidenshyte que do Oriente so conhecia imagens e textos reforltando preconshyceitos raciais hierarquias entre povos e legitimando as necessidades dos poderes coloniais 0 gigantesco The People of India (1868-75)

(3) Eleanor M Hight e Gary D Sampson laquoIntroduction Photography Race and Post-Colonial Theoryraquo in Colonialist photography Irnag(in)ing race and place eds Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorque Routledge 2002) James R Ryan Picturing empire Photography and the visualization ofthe Brishytish Empire (Londres Reaktion Books 1997) Joan M Schwartz e James R Ryan eds Picturing place and th e geographical imagination (Londres e Nova Iorque I B Tauris 2003)

(4) Hight e Sampson laquoIntroduction Photography raquo p 16 Maria Antonella Pelizzari laquoIntroductionraquo in Traces ofIndia Photography Architecture and the Polishytics of Representation 1850-1900 (New Haven e Londres Yale University Press 2003) pp 13-18 14

(5) John Tagg The burden ofTepresentation essays on photographies and histo-

Ties (Londres The Macmillan Press 1988)

427

T 1

o IMPERIO COLON IAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX) 426

laquo0 encantador de serpentes Caicutaraquo Litografia a cores sd Uma mulher britanica os seus filh os e os empregados indianos observam urn encantador cle serpentes Coleltao particular

compendio fotografico de oito volumes que pretendia classificar os povos da india em cerca de 500 fotografias comentadas e um exemplo desta perspetiva (6) Em contexto colonial a fotografia tende assim a ser estudada para mostrar 0 seu papel na identifishycaltao classificaltao controlo e afirmaltao dos poderes coloniais

Entre os muitos usos da fotografia enl contexto colonial podeshydamos sugerir tres abordagens em primeiro lugar ao servilto da propaganda a anular a distancia entre metr6pole e imperio e a mostrar as col6nias e os seus habitantes aqueles que era colonizashydares mas nao podiam ver ou conhecer os espaltos que colonizavam atraves de outros meios Em segundo lugar na produltao de conheshycimento ao ser primeiro um instrumento insepanlvel dos varios saberes cientificos que usavam as col6nias como laborat6rio e mais tarde ja em finais do seculo XIX ao converter-se num eleshymento fundamental para as varias ciencias coloniais que se conshysolidaram em todos os contextos europeus deste pedodo atraves de instituilt6es exposilt6es museus congressos e revistas Finalshy

(6) J ohn Falconer A Pure Labor of Love a publishing history of The Peoshyple of Indiaraquo in Colonialist Photography Ima(inJing race and place ed Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorgue Routledge 2002)

FOTOGRAFI A E COLONIALISMO

mente a fotografia constituiu-se num elemento central da relaltao entre conhecimento e colonialismo mas tambem foi apropriada pelos locais no fOljar das suas identidades e das suas agendas nacionalistas por vezes contra 0 dominio colonial Neste caso docaisraquo e uma palavra mais adequada do que laquocolonizadoraquo porshyque esta ultima e muito limitadora para definir aqueles que se dedicavam a fotografia e nao pertenciam aquele grupo que se poderia identificar como laquocolonizadon) ou laquocolonizadoraquo Podiam ser laquoIocais )) no sentido mais tradicional em que 0 termo e usado (aqueles que nasceram no lugar) mas tambern estrangeiros de varias nacionalidades como os europeus nao pertencentes a llacioshynalidade dos colonizadores mas que habitavam 0 espalto colonial Talvez falta mesmo sentido deixar de utilizar estas categorias que tendem a dividir os projetos fotograficos de iniciativa colonial daqueles de iniciativa local pois esta abordagem dicot6mica nao permite reconhecer a complexidade inerente a laquoexperiencia e aos filovimentos dos fotografos patronos e dos pr6prios objetosraquo (7) Assim por urn lado importa explorar quao enraizada estava a fotografia na cultura colonial em geral e pensar nos problemas comuns a todos os espaltos coloniais mas por Olltro lado tambem enecessario ter em conta como e que a fotografia foi apropriada e usada em diferentes espaltos geograficos e ter em conta as espeshy

cificidades de cada lugar Muitas das ideias abordagens metodologias e problemas de

investigaltao que associam fotografla e colonialismo foram explorashydos e mesmo iniciados por antropologos como Elizabeth Edwards Christopher Pinney e James Ryan Elizabeth Edwards foi pioneira em estudar as hist6rias paralelas da fotografia e da antropologia e em explorar as ligalt6es entre a fotografia e deg museu e arquivo coloniais (8) 0 seu trabalho foi fundamental em abordar a fotoshygrafia atraves de praticas de colecionismo formaltao de conhecishymento cientifico e circulaltao e intercambio de ideias Ou seja em estudar a hist6ria individual de uma fotografia na sua articulaltao com a historia a laquobiografia sociab que Christopher Pinney analishy

(7) Erin Haney Photography and Africa (Londres Reaktion Books 2010) p 10 (8) Elizabeth Edwards Raw histories Elizabeth Edwards ed Anthropology

and photograph)) 1860-1920 (New H aven Yale University Press 1992)

429

T 428 o IMPERIO COLON IAL EM QUESTtO (SECS XIX-XX)

sou de modo tao brilhante no seu livro sobre fotografia na India nos seculos XIX e XX Camera Indica (9)

Todos estes autores coincidiram numa critica a uma mera laquodesshycricao da superficieraquo em relacao afotografia ou a uma mera analise do seu contexto de producao Em vez disso defendem a necessidade de explorar a sua propria historia para la de identificar quem fotoshygrafou e 0 que eque foi fotografado Esta abordagem tambem foi levada a cabo com sucesso em Portugal por Nuno Porto urn dos pioneiros na escrita sobre fotografia no contexto colonial portushygues nos seus trabalhos sobre fotografia e ciencia na Angola coloshynial (10) Tanto os escritos de Christopher Pinney como os deJames Ryan foram inovadores nos modos como inscreveram a fotografia nos mecanismos de poder colonial opressao e domfnio (11) Ao centrarem as suas investigacoes no Imperio Britanico e na sua principal colonia a India tanto Pinney como Ryan contribufram para reforcar urn campo especffico 0 da fotografia na India coloshynial Britanica que ja tinha uma certa tradicao historiografica desde os anos 1980 (12) mas que passou a assumir uma linha censhytral de investigacao em muitas outras contribuiltoes mais recentes como e 0 caso de The Coming ofPhotography in India de Pinney e de Traces ofIndia Photography Architecture and the Politics ofRepreshysentation 1850-19000 livro editado por Maria Antonella Pelizzashyri (13) Estes dois livros exemplificam uma das novas abordagens a fotografia na India colonial e ao colonialismo oitocentista em geral 0 de explorar os modos como as elites indigenas e as comushynidades locais usa ram a fotografia e 0 de chamar a atencao para as limitacoes ou mesmo impossibilidades de colocar colonizadoshy

(9) Christopher Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs (Londres Reaktion Books 1997)

(10) Nuno Porto Angola a preto e bran co - fotografia e ciencia no Museu do Dundo 1940-1970 (Coimbra Museu Antropologico da Uuiversidade de Coimbra 1999)

(11) James R Ryan Picturing Empire Christopher Pinney Camera Indica (12) John Falconer laquoPhotography in Nineteenth Century Indiaraquo in The Raj

India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Galshylery Publications 1990) Judith Mara Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India (Nova Iorque Oxford University Press Intershynational Center for Photography 1982)

(3) Pelizzari ed Traces ofIndia Christopher Pinney The coming ofphotograshyphy in India (Londres The British Library 2008)

I I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

res de urn lado e colonizados do outro quanto as praticas relacioshynadas com a fotografia se refere

Neste aspeto 0 caso africano num sentido generalizado pode ser comparado com 0 caso indiano Durante muito tempo os estushydos sobre a fotografia que se concentravam no continente africano apenas estudavam os fotografos estrangeiros que se instavam nas colonias ou que as percorriam enquanto fotografos profissionais itinerantes ou enquanto membros de missoes cientificas ou de misshysionacao Desde a decada de 1980 no en tanto que uma historiograshyfiamais atenta as praticas criativas e profissionais dos nao-europeus (ou das mulheres em geral) descobriu varios fotografos de origem Africana ainda no seculo XIX (14) 0 mesmo foi reconhecido em relashyltao as praticas fotograficas no territorio colonial asiatico onde as tecnicas fotograficas foram acolhidas com entusiasmo pelos muitos indianos que se dedicaram pIofissionalmente a fotografia

Historiografias nacionais e fotografia colonial

I

Para la das diferentes abordagens teoricas existe claramente uma literatura sobre fotografia e colonialismo que tende a ser de cariz nacional ou seja a debrultar-se em contextos nacionaiscoloniais especificos do britanico ao italiano ou alemao e que pelas razoes obvias se tende a concentrar na segunda metade do seculo XIX primeiras decadas do seculo XX (15)0 caso portugues com todas

t (14) Haney Photography and Africa p 14

I (15) Para 0 caso frances ver Pascal Blanchard Nicolas Bauce e Sandrine

Lemaire dir La frature coloniale La societe franfaise au prisme de lheritage colonial (Paris La Decouverte 2005) Pascal Blanchard Stephane Blanchoin Nicolas Bancel et al dir Lautre et nous laquoscenes et typesraquo Anthropologues et historiens devant

I les representations des populations colonisees des ethnies des tribus et des races depuis les conquetes coloniales Colloque organise p ar I Association Connaissance de lhisshytoire de lAfrique contemporaine GDR Ocean Indien UPR 221 CNRS (Marseille

f fevrier 1995) (Paris Syros 1995) Para 0 caso italiano ver Brunetto Chiarelli

I I Cosimo Chiarelli e Paolo Chiozzi ed Etnie La scuola antropologica fiorentina e la

fotografia (Florenlta Alinari 1996) Cosimo Chiarelli I ritratti dellaltrove Roland Bonaparte Paolo Mantegazw Elio Modigliani (Roma Societa Geografica Ita liana 2004) Cosimo Chiarelli laquoListinto e la disciplina La fotografia di Elio Modigliashyniraquo in Elio Modigliani Viaggiatore e naturalista sulla rotta delle rneraviglie Nias Surnatra Engano M entawai 1886-1894 Lo sguardo il racconto la collezione (Floshy

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

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432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

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T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

I I

urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

425 I

424 0 IMPIRIO COLONIAL EM QUESTAo (stes XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

determinantes do arquiUo e museu colonial- aqueles espacos e lugashyres onde os vestfgios materiais visuais e escritos da experiencia colonial acabaram as suas viagens Mas nao acabaram as suas hist6shyrias Estes lugares do arquivo encontram-se na ex-metropole coloshynial nos ex-espacos colonizados ou em qualquer outro lugar pois uma das caracterfsticas de materiais facilmente transportaveis como a fotografia ou 0 documento e precisamente 0 da sua porshytabilidade e mobilidade Se estas caracterfsticas beneficiam os movimentos destes objetos indissociaveis de historias pessoais como de historias de est ados e nacoes tambem representam uma vulnerabilidade a passagem do tempo as condicoes climatericas ou a facilidade com que podem ser considerados dispensaveis e desprezados em contraste com aquilo que se considera digno de preservacao Os tipos de arquivo onde se podem encontrar mateshyriais para 0 estudo das relacoes entre a fotografia e 0 colonialismo sao inumeros de arquivos pessoais pertencentes a familias ou a indivfduos a arquivos comerciais governamentais e pertencentes a todo 0 tipo de instituicoes de bibliotecas a museus

Para estudar a fotografia em contexto colonial e necessaria uma abordagem interdisciplinar mas tambem e necessario como ja alertou Elizabeth Edwards sair de uma mera perspetiva de urn laquoolhar colonialraquo ou seja conjugar as interrogacoes deste tipo de abordagem teorica com uma atencao a laquomultiplicidade de possibishylidades hist6rias e contra-historias que habitam as fotografias raquo e)

Este artigo surge como urn mapa a sugerir varios caminhos de investigacao possiveis e a enunciar algumas das questoes teoricas que tern interpelado as analises deste tema

A fotografia em contexto colonial 0 que nao quer dizer necesshysariamente laquofotografia coloniaraquo teve multiplos usos e sentidos e seria redutor defini-la como urn mero instrumento de exerdcio da autoridade a diferenciar 0 gesto ativo dos colonizadores que fotoshygrafavam do gesto passivo dos colonizados que eram fotografados

(2) Elizabeth Edwards Raw histories Photographs Anthropology and Museums (Oxford e Nova Iorque Berg 2001) p 12

I Alem destes usos sobretudo no ambito da antropologia em C011shyI texto colonial existiram muitas outras formas de fotografar e de

ser fotografado Numa discussao desenvolvida em paralelo com aquela que foi suscitada pelo termo laquoorientalismoraquo nos ultimos trinta anos tambem a teoria crftica que se dedica afotografia coloshynial tende hoje a questionar os pressupostos que limitaram a fotografia a uma relacao entre conhecimento e poder sublinhando a complexidade e multiplicidade dos seus usos em contexto coloshynial e a diversidade de relacoes possiveis entre fotografo e fotoshygrafado (3) No entanto muitos dos estudos que incidem sobre a fotografia em contexto colonial continuam a ter como objetivo laquoverishyficar como e que a fotografia serviu para legitimar as ideologias de dominio cultural e racial da epoca modernaraquo ou a analisar a intersecao entre conhecimento colonial e producao fotografica algo que parece contrariar a anunciada vontade de alargar as aborshy

dagens cIa fotografia (l) Este tipo de abordagem tende a concentrar-se em fotografias

realizadas nas colonias por fot6grafos que se situam numa posicao de poder queI por pertencerem ao grupo dos colonizadores quer por pretenderem alcancar urn tipo de classificacao visual indissoshyciavel de outros instrumentos de formacao de urn conhecimento colonial (5) A fotografia sobretudo quando usada peIa antropoloshygia ffsica ou pelas suas versoes popularizadas foi muito importante para divulgar ideias contemporaneas de raca sobretudo no Ocidenshyte que do Oriente so conhecia imagens e textos reforltando preconshyceitos raciais hierarquias entre povos e legitimando as necessidades dos poderes coloniais 0 gigantesco The People of India (1868-75)

(3) Eleanor M Hight e Gary D Sampson laquoIntroduction Photography Race and Post-Colonial Theoryraquo in Colonialist photography Irnag(in)ing race and place eds Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorque Routledge 2002) James R Ryan Picturing empire Photography and the visualization ofthe Brishytish Empire (Londres Reaktion Books 1997) Joan M Schwartz e James R Ryan eds Picturing place and th e geographical imagination (Londres e Nova Iorque I B Tauris 2003)

(4) Hight e Sampson laquoIntroduction Photography raquo p 16 Maria Antonella Pelizzari laquoIntroductionraquo in Traces ofIndia Photography Architecture and the Polishytics of Representation 1850-1900 (New Haven e Londres Yale University Press 2003) pp 13-18 14

(5) John Tagg The burden ofTepresentation essays on photographies and histo-

Ties (Londres The Macmillan Press 1988)

427

T 1

o IMPERIO COLON IAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX) 426

laquo0 encantador de serpentes Caicutaraquo Litografia a cores sd Uma mulher britanica os seus filh os e os empregados indianos observam urn encantador cle serpentes Coleltao particular

compendio fotografico de oito volumes que pretendia classificar os povos da india em cerca de 500 fotografias comentadas e um exemplo desta perspetiva (6) Em contexto colonial a fotografia tende assim a ser estudada para mostrar 0 seu papel na identifishycaltao classificaltao controlo e afirmaltao dos poderes coloniais

Entre os muitos usos da fotografia enl contexto colonial podeshydamos sugerir tres abordagens em primeiro lugar ao servilto da propaganda a anular a distancia entre metr6pole e imperio e a mostrar as col6nias e os seus habitantes aqueles que era colonizashydares mas nao podiam ver ou conhecer os espaltos que colonizavam atraves de outros meios Em segundo lugar na produltao de conheshycimento ao ser primeiro um instrumento insepanlvel dos varios saberes cientificos que usavam as col6nias como laborat6rio e mais tarde ja em finais do seculo XIX ao converter-se num eleshymento fundamental para as varias ciencias coloniais que se conshysolidaram em todos os contextos europeus deste pedodo atraves de instituilt6es exposilt6es museus congressos e revistas Finalshy

(6) J ohn Falconer A Pure Labor of Love a publishing history of The Peoshyple of Indiaraquo in Colonialist Photography Ima(inJing race and place ed Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorgue Routledge 2002)

FOTOGRAFI A E COLONIALISMO

mente a fotografia constituiu-se num elemento central da relaltao entre conhecimento e colonialismo mas tambem foi apropriada pelos locais no fOljar das suas identidades e das suas agendas nacionalistas por vezes contra 0 dominio colonial Neste caso docaisraquo e uma palavra mais adequada do que laquocolonizadoraquo porshyque esta ultima e muito limitadora para definir aqueles que se dedicavam a fotografia e nao pertenciam aquele grupo que se poderia identificar como laquocolonizadon) ou laquocolonizadoraquo Podiam ser laquoIocais )) no sentido mais tradicional em que 0 termo e usado (aqueles que nasceram no lugar) mas tambern estrangeiros de varias nacionalidades como os europeus nao pertencentes a llacioshynalidade dos colonizadores mas que habitavam 0 espalto colonial Talvez falta mesmo sentido deixar de utilizar estas categorias que tendem a dividir os projetos fotograficos de iniciativa colonial daqueles de iniciativa local pois esta abordagem dicot6mica nao permite reconhecer a complexidade inerente a laquoexperiencia e aos filovimentos dos fotografos patronos e dos pr6prios objetosraquo (7) Assim por urn lado importa explorar quao enraizada estava a fotografia na cultura colonial em geral e pensar nos problemas comuns a todos os espaltos coloniais mas por Olltro lado tambem enecessario ter em conta como e que a fotografia foi apropriada e usada em diferentes espaltos geograficos e ter em conta as espeshy

cificidades de cada lugar Muitas das ideias abordagens metodologias e problemas de

investigaltao que associam fotografla e colonialismo foram explorashydos e mesmo iniciados por antropologos como Elizabeth Edwards Christopher Pinney e James Ryan Elizabeth Edwards foi pioneira em estudar as hist6rias paralelas da fotografia e da antropologia e em explorar as ligalt6es entre a fotografia e deg museu e arquivo coloniais (8) 0 seu trabalho foi fundamental em abordar a fotoshygrafia atraves de praticas de colecionismo formaltao de conhecishymento cientifico e circulaltao e intercambio de ideias Ou seja em estudar a hist6ria individual de uma fotografia na sua articulaltao com a historia a laquobiografia sociab que Christopher Pinney analishy

(7) Erin Haney Photography and Africa (Londres Reaktion Books 2010) p 10 (8) Elizabeth Edwards Raw histories Elizabeth Edwards ed Anthropology

and photograph)) 1860-1920 (New H aven Yale University Press 1992)

429

T 428 o IMPERIO COLON IAL EM QUESTtO (SECS XIX-XX)

sou de modo tao brilhante no seu livro sobre fotografia na India nos seculos XIX e XX Camera Indica (9)

Todos estes autores coincidiram numa critica a uma mera laquodesshycricao da superficieraquo em relacao afotografia ou a uma mera analise do seu contexto de producao Em vez disso defendem a necessidade de explorar a sua propria historia para la de identificar quem fotoshygrafou e 0 que eque foi fotografado Esta abordagem tambem foi levada a cabo com sucesso em Portugal por Nuno Porto urn dos pioneiros na escrita sobre fotografia no contexto colonial portushygues nos seus trabalhos sobre fotografia e ciencia na Angola coloshynial (10) Tanto os escritos de Christopher Pinney como os deJames Ryan foram inovadores nos modos como inscreveram a fotografia nos mecanismos de poder colonial opressao e domfnio (11) Ao centrarem as suas investigacoes no Imperio Britanico e na sua principal colonia a India tanto Pinney como Ryan contribufram para reforcar urn campo especffico 0 da fotografia na India coloshynial Britanica que ja tinha uma certa tradicao historiografica desde os anos 1980 (12) mas que passou a assumir uma linha censhytral de investigacao em muitas outras contribuiltoes mais recentes como e 0 caso de The Coming ofPhotography in India de Pinney e de Traces ofIndia Photography Architecture and the Politics ofRepreshysentation 1850-19000 livro editado por Maria Antonella Pelizzashyri (13) Estes dois livros exemplificam uma das novas abordagens a fotografia na India colonial e ao colonialismo oitocentista em geral 0 de explorar os modos como as elites indigenas e as comushynidades locais usa ram a fotografia e 0 de chamar a atencao para as limitacoes ou mesmo impossibilidades de colocar colonizadoshy

(9) Christopher Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs (Londres Reaktion Books 1997)

(10) Nuno Porto Angola a preto e bran co - fotografia e ciencia no Museu do Dundo 1940-1970 (Coimbra Museu Antropologico da Uuiversidade de Coimbra 1999)

(11) James R Ryan Picturing Empire Christopher Pinney Camera Indica (12) John Falconer laquoPhotography in Nineteenth Century Indiaraquo in The Raj

India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Galshylery Publications 1990) Judith Mara Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India (Nova Iorque Oxford University Press Intershynational Center for Photography 1982)

(3) Pelizzari ed Traces ofIndia Christopher Pinney The coming ofphotograshyphy in India (Londres The British Library 2008)

I I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

res de urn lado e colonizados do outro quanto as praticas relacioshynadas com a fotografia se refere

Neste aspeto 0 caso africano num sentido generalizado pode ser comparado com 0 caso indiano Durante muito tempo os estushydos sobre a fotografia que se concentravam no continente africano apenas estudavam os fotografos estrangeiros que se instavam nas colonias ou que as percorriam enquanto fotografos profissionais itinerantes ou enquanto membros de missoes cientificas ou de misshysionacao Desde a decada de 1980 no en tanto que uma historiograshyfiamais atenta as praticas criativas e profissionais dos nao-europeus (ou das mulheres em geral) descobriu varios fotografos de origem Africana ainda no seculo XIX (14) 0 mesmo foi reconhecido em relashyltao as praticas fotograficas no territorio colonial asiatico onde as tecnicas fotograficas foram acolhidas com entusiasmo pelos muitos indianos que se dedicaram pIofissionalmente a fotografia

Historiografias nacionais e fotografia colonial

I

Para la das diferentes abordagens teoricas existe claramente uma literatura sobre fotografia e colonialismo que tende a ser de cariz nacional ou seja a debrultar-se em contextos nacionaiscoloniais especificos do britanico ao italiano ou alemao e que pelas razoes obvias se tende a concentrar na segunda metade do seculo XIX primeiras decadas do seculo XX (15)0 caso portugues com todas

t (14) Haney Photography and Africa p 14

I (15) Para 0 caso frances ver Pascal Blanchard Nicolas Bauce e Sandrine

Lemaire dir La frature coloniale La societe franfaise au prisme de lheritage colonial (Paris La Decouverte 2005) Pascal Blanchard Stephane Blanchoin Nicolas Bancel et al dir Lautre et nous laquoscenes et typesraquo Anthropologues et historiens devant

I les representations des populations colonisees des ethnies des tribus et des races depuis les conquetes coloniales Colloque organise p ar I Association Connaissance de lhisshytoire de lAfrique contemporaine GDR Ocean Indien UPR 221 CNRS (Marseille

f fevrier 1995) (Paris Syros 1995) Para 0 caso italiano ver Brunetto Chiarelli

I I Cosimo Chiarelli e Paolo Chiozzi ed Etnie La scuola antropologica fiorentina e la

fotografia (Florenlta Alinari 1996) Cosimo Chiarelli I ritratti dellaltrove Roland Bonaparte Paolo Mantegazw Elio Modigliani (Roma Societa Geografica Ita liana 2004) Cosimo Chiarelli laquoListinto e la disciplina La fotografia di Elio Modigliashyniraquo in Elio Modigliani Viaggiatore e naturalista sulla rotta delle rneraviglie Nias Surnatra Engano M entawai 1886-1894 Lo sguardo il racconto la collezione (Floshy

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

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432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

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o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

427

T 1

o IMPERIO COLON IAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX) 426

laquo0 encantador de serpentes Caicutaraquo Litografia a cores sd Uma mulher britanica os seus filh os e os empregados indianos observam urn encantador cle serpentes Coleltao particular

compendio fotografico de oito volumes que pretendia classificar os povos da india em cerca de 500 fotografias comentadas e um exemplo desta perspetiva (6) Em contexto colonial a fotografia tende assim a ser estudada para mostrar 0 seu papel na identifishycaltao classificaltao controlo e afirmaltao dos poderes coloniais

Entre os muitos usos da fotografia enl contexto colonial podeshydamos sugerir tres abordagens em primeiro lugar ao servilto da propaganda a anular a distancia entre metr6pole e imperio e a mostrar as col6nias e os seus habitantes aqueles que era colonizashydares mas nao podiam ver ou conhecer os espaltos que colonizavam atraves de outros meios Em segundo lugar na produltao de conheshycimento ao ser primeiro um instrumento insepanlvel dos varios saberes cientificos que usavam as col6nias como laborat6rio e mais tarde ja em finais do seculo XIX ao converter-se num eleshymento fundamental para as varias ciencias coloniais que se conshysolidaram em todos os contextos europeus deste pedodo atraves de instituilt6es exposilt6es museus congressos e revistas Finalshy

(6) J ohn Falconer A Pure Labor of Love a publishing history of The Peoshyple of Indiaraquo in Colonialist Photography Ima(inJing race and place ed Eleanor M Hight e Gary D Sampson (Londres e Nova Iorgue Routledge 2002)

FOTOGRAFI A E COLONIALISMO

mente a fotografia constituiu-se num elemento central da relaltao entre conhecimento e colonialismo mas tambem foi apropriada pelos locais no fOljar das suas identidades e das suas agendas nacionalistas por vezes contra 0 dominio colonial Neste caso docaisraquo e uma palavra mais adequada do que laquocolonizadoraquo porshyque esta ultima e muito limitadora para definir aqueles que se dedicavam a fotografia e nao pertenciam aquele grupo que se poderia identificar como laquocolonizadon) ou laquocolonizadoraquo Podiam ser laquoIocais )) no sentido mais tradicional em que 0 termo e usado (aqueles que nasceram no lugar) mas tambern estrangeiros de varias nacionalidades como os europeus nao pertencentes a llacioshynalidade dos colonizadores mas que habitavam 0 espalto colonial Talvez falta mesmo sentido deixar de utilizar estas categorias que tendem a dividir os projetos fotograficos de iniciativa colonial daqueles de iniciativa local pois esta abordagem dicot6mica nao permite reconhecer a complexidade inerente a laquoexperiencia e aos filovimentos dos fotografos patronos e dos pr6prios objetosraquo (7) Assim por urn lado importa explorar quao enraizada estava a fotografia na cultura colonial em geral e pensar nos problemas comuns a todos os espaltos coloniais mas por Olltro lado tambem enecessario ter em conta como e que a fotografia foi apropriada e usada em diferentes espaltos geograficos e ter em conta as espeshy

cificidades de cada lugar Muitas das ideias abordagens metodologias e problemas de

investigaltao que associam fotografla e colonialismo foram explorashydos e mesmo iniciados por antropologos como Elizabeth Edwards Christopher Pinney e James Ryan Elizabeth Edwards foi pioneira em estudar as hist6rias paralelas da fotografia e da antropologia e em explorar as ligalt6es entre a fotografia e deg museu e arquivo coloniais (8) 0 seu trabalho foi fundamental em abordar a fotoshygrafia atraves de praticas de colecionismo formaltao de conhecishymento cientifico e circulaltao e intercambio de ideias Ou seja em estudar a hist6ria individual de uma fotografia na sua articulaltao com a historia a laquobiografia sociab que Christopher Pinney analishy

(7) Erin Haney Photography and Africa (Londres Reaktion Books 2010) p 10 (8) Elizabeth Edwards Raw histories Elizabeth Edwards ed Anthropology

and photograph)) 1860-1920 (New H aven Yale University Press 1992)

429

T 428 o IMPERIO COLON IAL EM QUESTtO (SECS XIX-XX)

sou de modo tao brilhante no seu livro sobre fotografia na India nos seculos XIX e XX Camera Indica (9)

Todos estes autores coincidiram numa critica a uma mera laquodesshycricao da superficieraquo em relacao afotografia ou a uma mera analise do seu contexto de producao Em vez disso defendem a necessidade de explorar a sua propria historia para la de identificar quem fotoshygrafou e 0 que eque foi fotografado Esta abordagem tambem foi levada a cabo com sucesso em Portugal por Nuno Porto urn dos pioneiros na escrita sobre fotografia no contexto colonial portushygues nos seus trabalhos sobre fotografia e ciencia na Angola coloshynial (10) Tanto os escritos de Christopher Pinney como os deJames Ryan foram inovadores nos modos como inscreveram a fotografia nos mecanismos de poder colonial opressao e domfnio (11) Ao centrarem as suas investigacoes no Imperio Britanico e na sua principal colonia a India tanto Pinney como Ryan contribufram para reforcar urn campo especffico 0 da fotografia na India coloshynial Britanica que ja tinha uma certa tradicao historiografica desde os anos 1980 (12) mas que passou a assumir uma linha censhytral de investigacao em muitas outras contribuiltoes mais recentes como e 0 caso de The Coming ofPhotography in India de Pinney e de Traces ofIndia Photography Architecture and the Politics ofRepreshysentation 1850-19000 livro editado por Maria Antonella Pelizzashyri (13) Estes dois livros exemplificam uma das novas abordagens a fotografia na India colonial e ao colonialismo oitocentista em geral 0 de explorar os modos como as elites indigenas e as comushynidades locais usa ram a fotografia e 0 de chamar a atencao para as limitacoes ou mesmo impossibilidades de colocar colonizadoshy

(9) Christopher Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs (Londres Reaktion Books 1997)

(10) Nuno Porto Angola a preto e bran co - fotografia e ciencia no Museu do Dundo 1940-1970 (Coimbra Museu Antropologico da Uuiversidade de Coimbra 1999)

(11) James R Ryan Picturing Empire Christopher Pinney Camera Indica (12) John Falconer laquoPhotography in Nineteenth Century Indiaraquo in The Raj

India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Galshylery Publications 1990) Judith Mara Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India (Nova Iorque Oxford University Press Intershynational Center for Photography 1982)

(3) Pelizzari ed Traces ofIndia Christopher Pinney The coming ofphotograshyphy in India (Londres The British Library 2008)

I I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

res de urn lado e colonizados do outro quanto as praticas relacioshynadas com a fotografia se refere

Neste aspeto 0 caso africano num sentido generalizado pode ser comparado com 0 caso indiano Durante muito tempo os estushydos sobre a fotografia que se concentravam no continente africano apenas estudavam os fotografos estrangeiros que se instavam nas colonias ou que as percorriam enquanto fotografos profissionais itinerantes ou enquanto membros de missoes cientificas ou de misshysionacao Desde a decada de 1980 no en tanto que uma historiograshyfiamais atenta as praticas criativas e profissionais dos nao-europeus (ou das mulheres em geral) descobriu varios fotografos de origem Africana ainda no seculo XIX (14) 0 mesmo foi reconhecido em relashyltao as praticas fotograficas no territorio colonial asiatico onde as tecnicas fotograficas foram acolhidas com entusiasmo pelos muitos indianos que se dedicaram pIofissionalmente a fotografia

Historiografias nacionais e fotografia colonial

I

Para la das diferentes abordagens teoricas existe claramente uma literatura sobre fotografia e colonialismo que tende a ser de cariz nacional ou seja a debrultar-se em contextos nacionaiscoloniais especificos do britanico ao italiano ou alemao e que pelas razoes obvias se tende a concentrar na segunda metade do seculo XIX primeiras decadas do seculo XX (15)0 caso portugues com todas

t (14) Haney Photography and Africa p 14

I (15) Para 0 caso frances ver Pascal Blanchard Nicolas Bauce e Sandrine

Lemaire dir La frature coloniale La societe franfaise au prisme de lheritage colonial (Paris La Decouverte 2005) Pascal Blanchard Stephane Blanchoin Nicolas Bancel et al dir Lautre et nous laquoscenes et typesraquo Anthropologues et historiens devant

I les representations des populations colonisees des ethnies des tribus et des races depuis les conquetes coloniales Colloque organise p ar I Association Connaissance de lhisshytoire de lAfrique contemporaine GDR Ocean Indien UPR 221 CNRS (Marseille

f fevrier 1995) (Paris Syros 1995) Para 0 caso italiano ver Brunetto Chiarelli

I I Cosimo Chiarelli e Paolo Chiozzi ed Etnie La scuola antropologica fiorentina e la

fotografia (Florenlta Alinari 1996) Cosimo Chiarelli I ritratti dellaltrove Roland Bonaparte Paolo Mantegazw Elio Modigliani (Roma Societa Geografica Ita liana 2004) Cosimo Chiarelli laquoListinto e la disciplina La fotografia di Elio Modigliashyniraquo in Elio Modigliani Viaggiatore e naturalista sulla rotta delle rneraviglie Nias Surnatra Engano M entawai 1886-1894 Lo sguardo il racconto la collezione (Floshy

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

T I I

432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

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1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

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T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

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1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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I I

I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

429

T 428 o IMPERIO COLON IAL EM QUESTtO (SECS XIX-XX)

sou de modo tao brilhante no seu livro sobre fotografia na India nos seculos XIX e XX Camera Indica (9)

Todos estes autores coincidiram numa critica a uma mera laquodesshycricao da superficieraquo em relacao afotografia ou a uma mera analise do seu contexto de producao Em vez disso defendem a necessidade de explorar a sua propria historia para la de identificar quem fotoshygrafou e 0 que eque foi fotografado Esta abordagem tambem foi levada a cabo com sucesso em Portugal por Nuno Porto urn dos pioneiros na escrita sobre fotografia no contexto colonial portushygues nos seus trabalhos sobre fotografia e ciencia na Angola coloshynial (10) Tanto os escritos de Christopher Pinney como os deJames Ryan foram inovadores nos modos como inscreveram a fotografia nos mecanismos de poder colonial opressao e domfnio (11) Ao centrarem as suas investigacoes no Imperio Britanico e na sua principal colonia a India tanto Pinney como Ryan contribufram para reforcar urn campo especffico 0 da fotografia na India coloshynial Britanica que ja tinha uma certa tradicao historiografica desde os anos 1980 (12) mas que passou a assumir uma linha censhytral de investigacao em muitas outras contribuiltoes mais recentes como e 0 caso de The Coming ofPhotography in India de Pinney e de Traces ofIndia Photography Architecture and the Politics ofRepreshysentation 1850-19000 livro editado por Maria Antonella Pelizzashyri (13) Estes dois livros exemplificam uma das novas abordagens a fotografia na India colonial e ao colonialismo oitocentista em geral 0 de explorar os modos como as elites indigenas e as comushynidades locais usa ram a fotografia e 0 de chamar a atencao para as limitacoes ou mesmo impossibilidades de colocar colonizadoshy

(9) Christopher Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs (Londres Reaktion Books 1997)

(10) Nuno Porto Angola a preto e bran co - fotografia e ciencia no Museu do Dundo 1940-1970 (Coimbra Museu Antropologico da Uuiversidade de Coimbra 1999)

(11) James R Ryan Picturing Empire Christopher Pinney Camera Indica (12) John Falconer laquoPhotography in Nineteenth Century Indiaraquo in The Raj

India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Galshylery Publications 1990) Judith Mara Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India (Nova Iorque Oxford University Press Intershynational Center for Photography 1982)

(3) Pelizzari ed Traces ofIndia Christopher Pinney The coming ofphotograshyphy in India (Londres The British Library 2008)

I I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

res de urn lado e colonizados do outro quanto as praticas relacioshynadas com a fotografia se refere

Neste aspeto 0 caso africano num sentido generalizado pode ser comparado com 0 caso indiano Durante muito tempo os estushydos sobre a fotografia que se concentravam no continente africano apenas estudavam os fotografos estrangeiros que se instavam nas colonias ou que as percorriam enquanto fotografos profissionais itinerantes ou enquanto membros de missoes cientificas ou de misshysionacao Desde a decada de 1980 no en tanto que uma historiograshyfiamais atenta as praticas criativas e profissionais dos nao-europeus (ou das mulheres em geral) descobriu varios fotografos de origem Africana ainda no seculo XIX (14) 0 mesmo foi reconhecido em relashyltao as praticas fotograficas no territorio colonial asiatico onde as tecnicas fotograficas foram acolhidas com entusiasmo pelos muitos indianos que se dedicaram pIofissionalmente a fotografia

Historiografias nacionais e fotografia colonial

I

Para la das diferentes abordagens teoricas existe claramente uma literatura sobre fotografia e colonialismo que tende a ser de cariz nacional ou seja a debrultar-se em contextos nacionaiscoloniais especificos do britanico ao italiano ou alemao e que pelas razoes obvias se tende a concentrar na segunda metade do seculo XIX primeiras decadas do seculo XX (15)0 caso portugues com todas

t (14) Haney Photography and Africa p 14

I (15) Para 0 caso frances ver Pascal Blanchard Nicolas Bauce e Sandrine

Lemaire dir La frature coloniale La societe franfaise au prisme de lheritage colonial (Paris La Decouverte 2005) Pascal Blanchard Stephane Blanchoin Nicolas Bancel et al dir Lautre et nous laquoscenes et typesraquo Anthropologues et historiens devant

I les representations des populations colonisees des ethnies des tribus et des races depuis les conquetes coloniales Colloque organise p ar I Association Connaissance de lhisshytoire de lAfrique contemporaine GDR Ocean Indien UPR 221 CNRS (Marseille

f fevrier 1995) (Paris Syros 1995) Para 0 caso italiano ver Brunetto Chiarelli

I I Cosimo Chiarelli e Paolo Chiozzi ed Etnie La scuola antropologica fiorentina e la

fotografia (Florenlta Alinari 1996) Cosimo Chiarelli I ritratti dellaltrove Roland Bonaparte Paolo Mantegazw Elio Modigliani (Roma Societa Geografica Ita liana 2004) Cosimo Chiarelli laquoListinto e la disciplina La fotografia di Elio Modigliashyniraquo in Elio Modigliani Viaggiatore e naturalista sulla rotta delle rneraviglie Nias Surnatra Engano M entawai 1886-1894 Lo sguardo il racconto la collezione (Floshy

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

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432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

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o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

1 430 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

as suas possibilidades nao tern sido historiograficamente aproveitado da mesrna maneira e os estudos que existem caracterizam-se pela sua fragmentacao (16) Em contraste a antropologia portuguesa tem-se revelado muito mais aberta a fotografta e as suas relaC6es com a propria historia da antropologia como ilustra 0 trabalho inovador e precursor da antropologa Jill R Dias ou mais recenshytemente dos antropologos Nuno Porto (17) ou Clara Carvalho (18) Jill Dias foi precursora na medida em que compreendeu a imporshy

ren lt a Pagliai Polistampa 2002) pp 30-33 Luigi Goglia laquoAfrica colonialismo fotografia il caso italiano (1885-1940)gtgt in Fonti e problemi della politica coloniale italiana Atti del convegno Taormina-Messina 23-29 Ottabre 1989 vol II (Roma Publicazioni degli Archivi de Stato 1996) pp 805-904 Para 0 caso espanhol Luis Angel Sanchez G6mez Un imjJerio en la vitrina El colanialismo espanal en el Pacifico y la expasici6n de Filipinas de 188 7 (Madrid Consejo Superior de Investishygaciones Cientfficas 2003) Para 0 caso alemao Christraud M Geary Images of Barnum German colonial photograJfty at the court of King Nyoja Cameroon liVest Afrishyca 1902-191 5 (Washinglon DC SIlIithsonian Institution Press 1988)

(l G) Andreas E Eckl laquoGerman and Portuguese colonial ambitions as mirroshyred in early pictorial documents from the Kavango arearaquo in Wolfram Hartmann Hues between black and white Historical photography from Colonial Namibia 18605 ta 1915 (Namibia Out of Africa Publishers 2004) pp 185-210 Helena Freitas et al orgs Missiio botanica Angola (1927-1937) (Coimbra lmprensa da Universidashyde 2005) Isabel de Castro Henriques Territ6rio e identidade a constru~iio da Angoshyla [o lonial (c 18 72 - c 1926) (Lisboa Centro de Hist6ria da Universidade de Lisboa 2004) Is abel de Castro Henriques laquoLAfrique dans liconographie coloshyniale portugaiseraquo in Images et colonie Nature discours et influence de liconogmphie coloniale liee a la propagande coloniale et ala representation des Africains et de lAfrique en France de 1920 aux independances Actes du colloque organise par lACHAC du 20 au 22janvier 1993 a la Bibliotheque Nationale sous la direction de Pascal Blanshychard et Armelle Chatelier (Paris Syros 1993) pp 117-120

(17) Para alguns exemplos dos trabalhos de Nuno Porto sobre fotografia e coloshynialismo ver Nuno Porto Modos de objectificafiio da dornina~iio colonial a caso do Museu do Dundo 1940-1970 (Lisboa Fundacao Calouste Gulbenkian Fundacao para a Ciencia e TecnoJogia 2009) Nuno Porto ltltUnder the Gaze of the Ancestors Phoshytographs and performance in Colonial Angolaraquo in Photographs objects histories eds Elizabeth Edwards e Janice Hart (Londres e Nova lorque Routledge 2004) pp 113shy-13 I Nuno Porto laquoPicturing the Museum Photography and the work of mediation in the Third Portuguese Empireraquo in Academic Anthropology and the Museum Back to the futUTe ed Mary Bouquet (Nova lorque e Oxford Berghan Books 2001) pp 36-54 Nuno Porto Angola a preto e bmnco - Fotagrafia e Ciencia no Museu do Dundo 1940-1970

(18) Clara Carvalho laquo0 olhar colonial antropologia e fotografia no Centro de Estudos da Guine Portuguesaraquo in A persistencia da Hist6ria Passado e contemshyporaneidade em Africa orgs Clara Carvalho e Joao de Pina Cabral (Lisboa Imprenshysa de Ciencias Sociais 2004) pp 119-145

1 43 lFOTOGRAFIA E COLONIALISMO

tancia da fotografia para 0 estudo do colonialismo portugues enl Africa 0 seu principal objeto de estudo (19) Alern disso ao ter publicado tambern em ingles e em revistas internacionais projeshytoU a historia de Angola nurn contexto africano mais alargado num periodo em que isto ainda era bastante invulgar

Urn fenomeno paradoxal no nosso contexto nacional tem sido a recente proliferacao de livros sobre a vida nas ex-col6nias afrishycanas durante a primeira rnetade do seculo xx feitos habitualshymente por aqueles que viveram a experiencia Caracterizados pelo uso alargado de irnagens - de postais fotograficos a fotografias parshyticulares - estes livros tendem a alimentar a avidez por rnemorias visuais de urn passado que ja n3o esta la e que provoca saudade e sentimentos de nostalgia (20) Apresentadas de forma acritica as fotografias de nostalgia colonial tendem a ser usadas por aquilo que mostram e nao por aquilo que sao ou que signiftcam Ou seja sao usadas precisamente enquanto laquodescricao de superficieraquo aquishy10 que alguns autores criticaram como sendo a abordagem rnais literal (e menos problematica) afotografia Mas meSIllO este fenomeshyno que associa a fotografia anostalgia de urn tempo colonial que foi a experiencia de vida de rnilhares de pessoas deve ser estudado enquanto urn fen6meno historico pertinente para se compreenshyderern os usos da fotografia na vivencia da memoria do passado e na partilha entre pessoas que viveram as mesmas experiencias ou experiencias semelhantes E deve ser feito sem desrespeitar aqueshylcs para os quais estas imagens nao sao laquoobjetos hist6ricosraquo mas sim fragmentos das suas vidas das suas historias privadas e pesshysoais em relacao as quais nem sempre e possivel adquirir a dist2mshycia necessaria a uma abordagern critica

A historiografia contempo[sectnea em Portugal nao tern em geral reconhecido as possibilidades da fotografia enquanto docushymento Inseparavel deste fenomeno e a inexistencia por urn lado

(19) Vel os resultados do projeto FCT Jill Rosemary Dias acervo documental bibliografica efotografico que se dedicou a classificar e estudar 0 esp61io da invesshytigadora doado a Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas de Lisboa e gerido peio CRIA (Centro em Rede de Investigacao em Antropologia) Cadernos de Jill Dias Inventario de umArquivo (Lisboa CRIA 2011)

eO) J030 Loureiro Mem6rias de Angola (Lisboa Mais Imagem Banco Comershycial Portuglles 2000) Ver tambem os livros equivalentes para Cabo Verde Loushy

renlto Marques Timor Mocambique

433

T I I

432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

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T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

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1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

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Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

433

T I I

432 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

de uma tradiltao de ensino e investigaltao de hist6ria da fotografia tal como aconteceu nas ultimas decadas em Franlta no Reino Unido ou nos Estados Unidos e por outro lado a ausencia ate ha pouco tempo de uma cultura generalizada que valorizasse colecionasse ou expusesse fotografia S6 recentemente e que esta comeltou a ser mais valorizada em leiloes ou mesmo em exposishyltoes - a exposiltao sobre 0 fot6grafo Carlos Relvas no Museu Nacioshynal de Arte Antiga em Lisboa ou as exposiltoes sobre fotografia hist6rica nos Encontros de Fotografla de Coimbra sao apenas dois exemplos entre os muitos que se poderiam enunciar 0 desdem a que durante muito tempo foi votada a fotografia - invenltao demashysiado recente para ser considerada uma antiguidade mas demashysiado laquobanalraquo para se considerar que merecia a pena guarda-Ia ou estuda-Ia - teve consequencias inevitaveis no lugar que a fotografia enquanto objeto hist6rico veio a ocupar na ideia literal e metaf6shyrica do laquoarquivo portuguesraquo Nao sendo valorizada historicamente como os documentos textuais sem uma linguagem tao compreenshySlvel como a palavra escrita a fotografia - e dentro dela a vasta quantidade de fotografia relacionada com 0 colonialismo portushygues - tendeu a ocupar uma posiltao secundaria no interior deste laquoarquivoraquo_Estranhamente presente atraves da sua materialidade visibilidade e ate banalidade mas tambem estranhamente ausente devido ao excesso dos seus posslveis significados Existe uma inseshyparabilidade entre a negligencia hist6rica e a arquivlstica tal como e mais provavel que urn tema valorizado historicamente tambem seja valorizado pelas instituiltoes de classificaltao epreservaltao de objetos A crescente classificaltao e digitalizaltao de nucleos fotoshygraficos em arquivos portugueses - onde se destacam os exemplos de fotografia realizada em contexto colonial- e prova da tambem crescente valorizaltao da fotografia enquanto documento hist6rico

Tendo em conta aja longa tradiltao de reflexao sobre fotograshyfia na literatura francesa e britanicatornou-se premente que a equivalente produltao escrita portuguesa assuma 0 mesmo desafio inscrevendo a sua palavra nos debates criticos com que a historioshygrafia internacional tern abordado 0 assunto Isto implica exploshyrar as coleltoes de fotografias produzidas no contexto colonial portugues que existem nos arquivos e museus nacionais ou em coleltoes privadas mas tambem aquelas que existem em arquivos

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

estrangeiros - como 0 Museu de Tervuren na Belgica e a British Library em Londres - enos arquivos publicos e privados das ex-col6nias portuguesas Assim urn desafio dos caminhos histoshyriograficos recentes do colonialismo e 0 de incorporar a fotografia - as suas hist6rias permutas reprodultoes e usos - no contexto colonial portugues Ate porque somente assim se podera inscrever os usos da fotografia na experiencia colonial portuguesa na liteshyratura internacional sobre fotografia e colonialismo Nao somente fazendo abordagens transnacionais ou comparativas com casos como o frances ou britanico mas tambem com outras experiencias coloshyniais apartida nao tao 6bvias Internacionalizaltao deveria signishyficar incluir 0 caso portugues no interior da vasta historiografia sobre fotografia colonial mas tambem encorajar investigadores de outras naltoes que se tern concentrado sobre outras geografias e arquivos a usarem 0 caso portugues nos seus trabalhos

Por exemplo um livro recente - Photography in Africa - refere alguns exemplos relacionados com 0 colonialismo portugues em Africa mas que nao deixam de ser ocasionais pontuais e clarashymente marginais ao paradigma dominante dos casos britanicos e franceses (21) Erin Haney refere 0 daguerre6tipo da laquoRainha Xai Xai de Sofala Moltambiqueraquo realizada pOI urn fot6grafo viajante de origem francesa que e considerado urn dos primeiros exemshyplos de fotografia nesta regiao africana pois data de 1845 (22) Tambem menciona dois dos primeiros estudios a abrir na costa oeste africana na decada de 1870 JN da Silveira e Viuva Moraes e filhos em Luanda assim como alguns dos primeiros fot6grafos profissionais na costa leste africana em Moltambique J eM Lazashyrus JP Fernandes e J Wexelson a trabalhar em Lourenlto Marshyques e na Beira a partir da decada de 1890 (23) Mas 0 destaque e dado a JA de Cunha Moraes autor de urn vasto corpus visual da

(21) Existe uma vasta bibliografia sobre fotografia em Africa Alguns exemshyplos Christraud M Geary com urn ensaio de Krzysztof Pluskota In and out of focus Images from Central Africa (Londres Philip Wilson Publishers Smithsosian National Museum of African Art 2002) Catalogo de exposicao organizado pelo National Museum ofAfrican Art Smithsonian Institution

(22) Haney Photography in Africa p 35 (23) Ibidem p 42 A autora recolheu estas informalt6es no trabalho de Jill R

Dias laquoPhotographic sources for the History of Portuguese Speaking Africa 1870shy-1914raquo History in Africa 18 (1991) pp 67-82

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

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T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

I I

urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

434 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)

regiao a partir dos anos 1870 tal como 0 demonstra 0 album de quatro volumes Africa Occidental publicado em Lisboa em 1885-86 o trabalho precursor de Cunha Moraes e a vastidao e qualidade do seu corpus fotografico visivel neste album tern sido reconheshycidos em varios trabalhos (24) Podemos perguntar-nos no entanto se fara sentido realizar uma hist6ria unificada das praticas fotoshygraficas naquilo que poderiamos denominar 0 Imperio Portugues As diferenltas significativas entre espaltos geograficos distintos durante 0 mesmo periodo - do caso goes ao angolano - e a mulshytiplicaltao de usos da fotografia significa que este tema tera que ser abordado de urn modo fragmentario

Para hi do vislvel fotografia enquanto objeto historico

Para compreender a fotografia enquanto objeto (e nao apenas como uma superfkie que mostra outros objetos) e necessario inshyseri-Ia numa cultura discursiva e textual Para la da sua novidade tecnica enquanto dispositivo de representaltao a fotografia afirmoushy-se como uma transformaltao cultural imersa na crialtao de novas relalt6es sociais Alem de ser uma representaltao de servir de Velshyculo a uma representaltao - algo que deve ser em si mesmo sujeito a uma analise critica - a fotografia e urn objeto que e produzido num contexto espedfico por pessoas espedficas urn objeto que viaja que pode ter multiplos us os e que deve ser colocado lado a lado com outros modos de conhecer e organizar 0 mundo Ao analisar uma fotografia enquanto objeto historico ha que ter em conta 0 risco de descontextualizar uma imagem de a retirar da sua laquohistoria de arquivoraquo usando-a como se nao tivesse laquopalavrasraquo e valesse por si Este tipo de uso da fotografia - por aquilo que esta representado na sua superfkie bidimensional - nao e alias muito distinto da forma como a disciplina historica usou e usa muitas vezes a fotograshyfia como ilustraltao daquilo que esta escrito e nao enquanto objeshyto historico em si Se nos ficarmos pelas caracteristicas visiveis da

(24) Antonio Pedro Vicente e Nicolas Monti Cunha Moraes Viagens em Angola 1877-1897 (Coimbra II Encontros de Fotografia 1991) Catalogo de exposit3o

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO 4 35

fotografia ou seja se nos cingirmos aquilo que ela representa na sua bidimensionalidade aquilo que vemos estamos a limitar as suas multiplas possibilidades de se constituir num objeto historico

Muitas vezes pensa-se a fotografia enquanto urn dos objetos do laquoarquivo colonial metropolitanoraquo - juntamente com todos aqueles documentos escritos produtos naturais objetos artisticos etnograshyficos exemplos da flora e da fauna ou seja tudo aquilo que vi~ashyva das colonias para a metropole e por vezes para outros lugares Importa aqui sublinhar a necessidade de nao isolar ou dividir arti shyficialmente os varios elementos que compunham estas remessas que em muitos casos eram indissociaveis entre si Pensemos por exemplo nas miss6es cientificas que incluiam varias formas difeshyrentes de estudar um mesmo tema ou lugar da escrita de relatorios a recolha de objetos ou a feitura de fotografias (25) Neste como noutros casos estudar apenas urn dos resultados destes projetos de conhecimento pode invisibilizar precisamente a abordagem tot alishyzante com que se pretendia apreender urn assunto Tambem e imporshytante no entanto pensar na fotografia enquanto algo produzido consumido colecionado guardado por aqueles que habitavam os espaltos coloniais e que eram constituidos por uma multiplicidade de pessoas Para la da circulaltao entre metropole e colonias e necesshysario ter tambem em conta a mobilidade da fotografia e dos fotoshygrafos entre diferentes fronteiras que muitas vezes eram fronteiras coloniais Por exemplo as viagens de fotografias e dos seus agentes entre distintas colonias africanas ou indianas

Com a inspiraltao de algumas abordagens realizadas nos ultishymos anos nomeadamente as de Ann Stoler ou de Tony Ballantyshyne 0 arquivo deixou de ser apenas 0 lugar onde se recolhem classificam ou preservam documentos para ser ele proprio urn objeto historico (26) Assim a fotografia no arquivo tambem cleve ser pensada neste senti do Muitas vezes uma coleltao fotografica faz parte de urn arquivo espedfico que contem muitos outros tipos

(25) Helena Freitas et at orgs Missao Eotanica Angola (1927-1937) (Coimshybra Imprensa da Universid ad e 2005)

(26) Tony Ballantyne laquoMr Peals Archive Mobility and exchange in histories of empireraquo in Archive Histories Facts fi ctions and the writing of history ed Antoinette Burton (Durham e Londres Duke University Press 2005) Ann Laura Stoler laquoColoshynial archives and the arts of governanceraquo Archival Science nO 2 (2002) pp 87-109

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

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urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

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1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

437 436 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

de materiais - de uma expedicao antropol6gica de uma explorashycao de carater militar cientifico de obras publicas ou de investishygacao geral de urn determinado territorio de uma empresa ou companhia particular de uma missao religiosa ou de urn projeto governamental de exploracao - mas em muitos outros casos as hist6rias de uma colecao fotografica sao mais fragmentadas Nalshyguns casos surgiram de praticas pessoais hist6rias individuais constituindo-se em fragmentos cujas hist6rias tern que ser invesshytigadas atraves de fontes menos 6bvias De qualquer forma quase sempre a fotografia faz parte de urn conjunto de materiais distinshytos onde tambem podem estar objetos ou documentos escritos (27)

Ao analisarmos a hist6ria de uma fotografia ou de urn cOrYunshyto de fotografias nas suas relac6es com a hist6ria do colonialismo temos que fazer as seguintes perguntas qual foi 0 seu contexto de producao Onde e que as fotografias foram guardadas expostas reproduzidas colecionadas ou disseminadas Onde estao agora num museu arquivo instituicao publica ou numa casa privada Encontram-se numa ex-metr6pole numa ex-coI6nia ou num lugar fora de urn circuito colonial Os lugares onde se encontram foram eles pr6prios criados num contexto colonial Quem e que a viu quem escreveu sobre ela e quem e que a usou e como a usou Quais foram os usos ideol6gicos da fotografia Foi reproduzida num posshytal numa revista academica num livro de viagens ou numa revisshyta de grande circulacao Foi reproduzida nas muitas exposic6es coloniais universais ou de natureza local que a ela recorreram

As fontes escritas indissociaveis das hist6rias das fo~ografias podem ser de varia ordem de jornais peri6dicos relat6rios e livros publicados nas col6nias ou na metropole catalogos de museus e exposic6es livros turisticos ou de divulgacao sobre as col6nias mas tambem documentacao oficial correspondencia privada diarios de viagem ou relat6rios nao publicados Nalguns casos a fotograshyfia pode fazer parte do pr6prio documento escrito - por exemplo uma imagem no interior de urn livro monografico sobre uma coloshynia escrito para urn publico nacional ou internacional- mas imashygem e texto podem tambem nao fazer parte diretamente do mesmo

(27) Chris Gosden e Chantal Knowles Collecting Colonialism Material culture and colonial change (Oxford Berg 2001)

T i

FOTOGRAFIA E COLONIALIS~lO

objeto - pOI exemplo quando urn catalogo de uma exposicao apresenta a legenda de uma fotografia que esteve exposta na exposhysicao sem a mostrar Ai s6 existe a descricao da imagem mas nao a imagem em si

Urn dos possiveis caminhos de investigacao neste sentido e 0

de identificar referencias afotografia em publica~6es produzidas nas col6nias Uornais livros relat6rios ou catalogos) ou publicashyc6es produzidas na metr6pole mas sobre as col6nias Como e que surge a fotografia no interior destas publicaC6es Enquanto prova da presenca colonial atraves de edifkios projetos agricolas ou industriais construcao de caminhos-de-ferro ou de pontes naoshy-europeus vestidos de europeus escolas museus instituic6es de saude Ou mostrando praticas e costumes locais trajes locais trashydic6es etnograficas enquanto forma de transmitir e reforcar ideias de lugar primitivo remoto pobre prestes a desaparecer ou a preshycisar de ser colonizado e civilizado pela presenca colonial Ou e a fotografia usada para transmitir ambas as ideias numa mesma publicacao

Outra questao a colocar seria a da relacao entre a imagem e o texto numa mesma publicacao foram as imagens usadas merashymente como uma ihistracao ao texto ou estara 0 texto a dizer alguma coisa sobre a imagem sobre 0 contexto da sua producao por quem ou para quem e que foi feito quem foram as pessoas envolvidas como e que foi feita a producao selecao ou escolha das imagens Outra abordagem que envolve a rela~ao entre texto e imagem e a da fotografia usada em projetos ou praticas cientificas De que modos e que as diferentes disciplinas cientfficas deste perioshydo sobretudo aquelas mais usadas em contexto colonial fizeram uso da fotografia Existem referencias a projetos etnograficos arqueologicos antropologicos agrkolas ou de historia natural De onde provinha a iniciativa 0 investimento material e as pesshysoas envolvidas nestes projetos Eram desenvolvidos por instituishyc6es nas pr6prias col6nias organizados a partir da metropole ou envolviam varias instituic6es ou pessoas Havia projetos estranshygeiros Ou em associacao com outras nac6es colonizadoras Qual era a presenca de laquolocaisraquo nestes espacos de producao cientifica equal era a sua formacao Que papel e que tinha a fotografia nos intershyclmbios de objetos e de correspondencia entre museus e instituic6es

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

I I

urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

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o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

439

1 I

o IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (Sfcs XiX-XX)438

cientificas de diferentes col6nias (entre museus de Bombaim e de Goa ou entre museus de paises Africanos sob dominios coloniais

distintos por exemplo)

Reproducao circulacao e mobilidade

Se ha objeto que atravessa fronteiras a partir da segunda metashyde do seculo XIX ele e sem duvida a fotografia_ E pensamos quer em fronteiras geograficas e literais - quando uma fotografiaobjeshyto viajava de urn lugar para 0 outro - quer em fronteiras de reproshydutibilidade - quando uma fotografia realizada num lugar era impressa ou copiada em forma de desenho eou litografia num outro lugaL A fotografia em si foi urn objeto particularmente sujeishyto amobilidade globalizaltao transnacionalismo transcolonialisshymo reprodultao visibilidade e transformaltao Assim e como vimos apesar da bibliografia sobre colonialismo e fotografia estar marshycada por uma perspetiva nacionalista as qualidades portateis e reprodutiveis da fotografia assim como a mobilidade intrinseca dos agentes que a produziam - de fot6grafos profissionais itineshyrantes a viajantes que fotografavam - desafiam uma abordagem nacional da fotografia

A fotografia foi tambem urn objeto privilegiado da cultura de remessas enviadas de urn lugar para 0 outro que muitas vezes unia diferentes tipos de materiais num mesmo lugar de plantas e peltas etnograficas a correspondencia administrativa ou pessoal Como Edwards descreveu laquophotographs closed the space between the site ofobservation on the colonial periphery and the site ofmetroshypolitan interpretationraquo (28) Se a sua portabilidade a converteu num laquoobjeto viajanteraquo as suas possibilidades reprodutivas multishyplicaram os seus significados discursivos_ Em finais do seculo a fotografia passa a ser impressa diretamente favorecendo a famishyliaridade do publico com a sua linguagelll visual e possibilitando a invenltao de urn dos objetos que mais contribuiu para a circulaltao de imagens das colonias 0 postal fotografico 0 postal e 0 desenshyvolvimento das publicaltoes ilustradas em geral transformaram a

(28) Elizabeth Edwards Raw Histories p 31-32

I FOTOGRAFiA E COLONIALISMO

difusao das imagens das colonias alargando 0 ambito dos seus observadores Corn uma fotografia de urn lado e do outro a posshysibilidade de se escreverem umas palavras (nao demasiadas) ao destinatario rapidamente 0 postal fotografico se tornou urn objeshyto colecionavel Podia ser enviado e trocado mas tambem simplesshymente comprado e guardado em albuns

De facto uma das principais formas de ampliar a ressonancia visual da fotografia e de fazer uso das suas possibilidades de cirshyculaltao e mobilidade foi a de as reproduzir e as transformar num objeto vendavel postais fotograficos fotografias estereosc6picas (onde a fotografia duplicada colocada Dum aparelho estereoscoshypico possibilitava ao observador a ilusao da tridimensionalidade) albuns fotograficos onde as fotografias eram coladas em papel e onde muitas vezes 0 texto consistia apenas na descriltao sumaria da imagem e no titulo que identificava a regiao geografica Estes albuns constituiam-se na prova das capacidades reprodutivas da fotografia que ja em finais do seculo XIX 0 postal fotografico veio explorar na sua totalidade (29)

A banalizaltao dos postais e a sua circulaltao global vierarn transformar a laquoAfricaraquo a laquoIndiaraquo ou a laquoChinaraquo em entidades recoshynheciveis a urn grande numero de pessoas nos mais diversos lugashyres do mundo Podiam representar lugares identificaveis cidades ou regioes com nome ou tipos e costumes mas de alguma forma cingiam-se a tipologias reconhedveis e muito mais homogeneas do que a propria pratica fotografica praticada nesses lugares que se distinguia pela sua heterogeneidade Ao destinarem-se acomershycializaltao estas imagens tendiam a reproduzir aquilo que se julshygava ser mais facilmente reconhecivel ou identificavel com ideias pre-existentes daquilo que era a laquoAfricaraquo ou a laquoAsiaraquo 0 sucesso das vendas de imagens de urn lugar - em postais fotograficos ou em fotografias que eram reimpressas para serem vendidas aunidade ou em conjuntos - tambem favoreceu a proliferaltao de estudios comerciais em Africa como na Asia (30)

Existe urn outro aspeto indissociavel desta mobilidade que tambem contraria os sentidos de uma abordagem nacionalista 0

(29) Christraud M Geary e Virginia-Lee Webb eds Delivering views distant cultures in early postcards (Washington Smithsonian Institution Press c 1998)

eO) Haney Photography in Africa p 19

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

I I

urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

I I

I ~~----~ ~ ~-

I

)v~ra~cd-

Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

I t

I J

I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

441

T 440 0 IMPERIO COLONIAL EM QU ESTAo (SEes XIX-XX) I facto de muitos fotografos profissionais serem estrangeiros por

I I

urn lado (e isto aplica-se nao apenas a contextos coloniais mas a I todos os contextos geograficos) e pOl outro lado 0 facto do ato de fotografar estar particularmente associado ao ser-se estranho a urn lugar Quem vai viver ou viajar para fora do seu lugar de orishygem tern mais tendencia para querer documentar a singularidade e 0 carater temporario da sua experiencia Isto e assim para casos individuais e particulares Mas tambem podemos transpor esta logica laquocoletoraraquo e laquodocumentadoraraquo para urn contexto nacional abstrato e nao particularizado shy ou seja aquelas praticas levadas a cabo pelos governos dos paises colonizadores para melhor laquoconheshyceremraquo e laquoidentificaremraquo 0 lugar por onde esUio a passar mas sobretudo a querer permanecer

o caso dos fotografos estrangeiros profissionais e itinerantes _ que nao pertencem ao espaltocolonia onde instal am 0 seu estushydio ou prestam os seus servi(ps em determinado momento nem a naltao colonizadora - pode ser estudado como urn fenomeno espedfico Em primeiro lugar 0 caso destes fotografos vern inviashybilizar a dicotomia entre as praticas fotograficas enquanto instrushymento de conhecimento colonial e os usos da fotografia por parte dos laquocolonizadosraquo Nos intersticios de varios lugares e caracterishyzados pela sua mobilidade os muitos estrangeiros que circulavam pelo mundo com as suas maquinas fotograficas e faziam disso proshyfissao revelam a necessidade de uma abordagem transnacional em relaltao afotografia Estes fotografos itinerantes muitas vezes anunshyciavam a sua chegada a urn local atraves de anuncios nos jornais da terra onde se iam instalar 0 caso dos fotografos indianos que exerciam a sua pratica profissional na costa leste africana e espeshycialmente curioso AC Gomes por exemplo foi urn goes que abriu 0 seu estudio em Zanzibar por volta de 1868 e se dedicou tambem a produzir postais com vistas locais para 0 publico dos navios que atracavam no porto (31) Outros fotografos de origem

(31) Isolde Brielmaier laquoPicture takingraquo and the production of urban identi shyties on the Kenyan Coast 1940-1980 unpub PhD Columbia University 2003 citado por Haney Photography in Afi-ica pp 49-51 Veja-se a curiosa fotografia que ele realizou c 1870 denominada laquoArab Ladies Zanzibarraquo reproduzida em Haney

Photography in Africa p 68

FOTOGRAFIA E COLONIALlSMO

Postal fotogrifico Elefante alegorico no Jardim Colonial da Exposicao do Mundo Portugues (1940) Col particular

goesa a trabalhar em Zanzibar ilustrando 0 fen6meno da mobilishydade destes profissionais laquoestrangeirosraquo em relaltao ao local onde trabalhavam foram EC Dias JB Coutinho e ARP de Lord Todos eles abriram os seus estudios na decada de 1890 e alguns deles tiveram sucursais dos seus estudios em Mombassa outra cidade portuaria mas no norte Estes estudios tinham duas vershytentes a de fotografarem as elites locais compostas por europeus as elites indianas de mercadores e comerciantes e uma pequena elite africana por urn lado e a de reproduzirem imagens atraves dos postais fotograficos que se comeltaram a banalizar em finais do seculo XIX Estes postais com temas africanos circulavam depois por todo mundo

Urn dos trabalhos a fazer e assim 0 de identificar os fotografos profissionais locais e itinerantes Havia anuncios aos seus serviltos e estudios nos jornais locais Como e que se situavam etnicamenshyte Tinham vindo de Portugal ou de urn outro lugar para uma colonia em busca de uma oportunidade de trabalho Qual era 0

lugar cultural e social que ocupavam nas hierarquias locais Estashy

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

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1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

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T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

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Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

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o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

442 443 0 IMPERI O COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX) FOTOGRAFIA E COLONIALISMO I

Postal fotografico Grupo de excursionistas (provaveimente britanicos residentes na India) visita as Caves de Elephanta na Ilha de Elephanta

perl o de Bombaim C 1910-1920 Colcltao Particula r

yam associados as instituilt6es culturais e intelectuais locais Qual era 0 grau da sua profissionalizaltao e mesmo da sua mobilidade para outros territ6rios a que e que eles fotografavam e para quem a caso de Goa pode ser urn exemplo a cinone visual goes que se comeltou a consolidar nas ultimas decadas do seculo XIX em grande parte devido ao trabalhodos fot6grafos Souza amp Paul veio distinguir elaramente aquele espalto do da India Britanica mas tambem veio contribuir para consolidar uma identidade local unica e distinta do pais colonizador (32)

Mulheres e fotografia

Vma hist6ria que queira explorar as relalt6es entre as mulheshyres e as suas varias formas de se relacionarem com a fotografia tera que ir para la dos jornais e dos livros ilustrados - materiais 6bvios de pesquisa mas que ocupam 0 espalto publico - para se concentrar nos arquivos particulares de familia Por sua vez os

(32) Saggi di Giovanni Ferracuti ed Goa Memoria e imrnagine architettura e citta dellIndia portoghese (Milao Ed Lybra Immagine 1991)

I arquivos locais sao tambem urn dos caminhos indispensaveis paraI uma investigaltao sobre os usos locais da fotografia Aqui usamos I a palavra laquolocalraquo para designar as laquoelites locaisraquo no seu sentido

rnais alargado e heterogeneo - de origem europeia provenientes na sua maioria da naltao colonizadora de origem etnica local I asiatica ou africana ou em muitos casos uma mistura etnica que desafiava classificalt6es estanques Enquanto os usos publicos ou proshyfissionais estavam muito mais limitados as mulheres do que aos homens - alias como todas as praticas que implicassem indepenshydencia criatividade mobilidade ou dominio de uma tecnologia moderna - havia outras formas das mulheres usarem a fotografia Uma delas era a de terem a iniciativa de ir ao fot6grafo fazer 0 seu retrato sozinhas com os filhos com 0 marido com as irmas Outra era a de emoldurar e expor as fotografias nas paredes da casa visiveis a familia que a habitava mas tambem as eventuais visitas autra ainda era a de constituir e organizar os albuns familiares - de algum modo 0 de criar uma narrativa visual sobre os memshybros da familia e a sua hist6ria Assim uma hist6ria dos usos da fotografia em contexto colonial que queira laquoencontrarraquo as mulheshyres tera necessariamente que entrar nos arquivos familiares de fotografia Mesmo tendo em conta que muitos destes arquivos prishyvados muitas vezes sob a forma de albuns ja se encontram em arquivos publicos como acontece por exemplo com os esp6lios de mulheres que viveram na India Britanica do seculo XIX prishymeira metade do XX e que hoje se encontram na British Library

As mulheres ou melhor as mulheres que sabiam ler e escreshyver tinham urn acesso muito limitado aprodultao de palavra escrishyta projetada no espalto publico - a escrita cientifica ou oficial ou a publicaltao livros e de artigos em jornais Mas tinham aces so a palavra escrita no espalto privado dos diarios privados a missiva individualizada dirigida a uma pessoa ou a urn nueleo familiar A correspondencia era considerada uma forma de comunicaltao legishytima e possivel de levar a cabo no interior domestico E a fotografia logo que deixou de ser impressa em vidro e pode ser reproduzida em papel passou tambem a constituir-se num objeto passiveI de ser enviado peIo correio como parte da correspondencia As mulheshyres podiam ter poder sobre as fotografias que enviavam e sobre 0

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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)v~ra~cd-

Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

I t

I J

I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

445 444 0 IMPERIO COLONIAL Hi QUESTAO (SECS XIX-XX) FOT OGRAFIA E COLONIALISMO T modo como organizavam ou expunham aquelas que recebiam Sobretudo para quem estava longe a fotografia podia constituir urn elo especial de ligacao A proximidade possivel de quem ha meses ou anos nao se via A possibilidade de laquoverraquo 0 objeto do afeto do amor ou da saudade De facto juntamente com 0 papel de carta onde se escrevia a tinta muitas pessoas passaram a enviar fotografias a familiares amigos ou amantes como gesto de afeto e de proximidade E a propria fotografia por vezes tambem sershyvia de suporte para a escrita uma dedicatoria escrita por cima da imagem ou urn texto mais longo escrito nas suas costas a descreshyver aquilo que se via mas que nem sempre era identificavel para o destinatltirio da missiva

Embora a fotografia profissional na sua pratica de estudio aberto ao publico ou associada a projetos ou instituic6es cientifishycas fosse sobretudo uma prltitica masculina muitas mulheres tamshybern comecaram a fotografar sobretudo aquelas pertencentes as classes sociais mais elevadas e por isso com meios economicos e com tempo de lazer disponivel para 0 fazer A britfmica Julia Marshygaret Cameron e talvez 0 exemplo rnais citado e mais estudado de uma mulher que fotografou num contexto colonial oitocentista 0

Ceilao atual Sri Lanka Para alem destas relac6es entre as mulheshyres e a fotografia - enquanto colecionadoras autoras dos albuns familiares ou mesmo fotografas nao profissionais - 0 tema que tern sido mais explorado tern sido 0 da representaltao das mulheshyres na fotografia produzida em contexto colonial (33)

Este genero de fotografia produzida em contexte colonial pode alias servir de metafora para urn outro aspeto inseparavel deste fenomeno 0 modo como 0 olhar masculino encontrava legitimishydade para olhar 0 corpo desnudo de uma mulher Tal como 0

fotografo que muitas vezes e tambem 0 antropologo podia e devia olhar para a mulher colonizada 0 espectador masculino tambem o podia fazer Este laquohomemraquo cidadao de uma nacao quase sempre colonizadora era encorajado a partilhar os valores de supremacia colonial ou etnica nem que fosse com a verificacao visual da sua

(33) Filipa Lowndes Vicente A Arte sem Hist6ria Mulheres e cultura artistica (seculos XVI-XX) (Lisboa Athena 2012) No prelo

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I

)v~ra~cd-

Postal fotografico laquoTipos do Biheraquo Coletao Moraes Luanda Coletao particular

existencia Provavelmente nunca viajaria ate as colonias mas lera e sobretudo vira muitas provas da sua existencia nos jornais ilustrashydos fotografias gravuras posters exposic6es universais e coloniais que se banalizaram em toda a Europa ao longo da segunda metashyde do seculo XIX e a medida que os processos de reproducao litoshygrafica se foram tornando mais faceis ou ainda a partir de finais do seculo XIX em postais fotograficos que multiplicaram a vulshynerabilidade dos seus corpos expostos ao torna-los disponiveis as muitas pessoas que participavam na circulacao e colecionismo de postais Assim nos postais fotograficos como nas exposic6es a legishytimidade cientifica da antropologia ou do conhecimento colonial serviu muitas vezes para produzir imagens de urn erotismo mais ou menos transgressor

Mallek Alloula foi urn dos primeiros a escrever sobre a erotizashycao de mulheres nao-europeias em postais e fotografias realizados em finais do seculo XIX principios do seculo xx (34) Desde entao

(34) Malek Alloula Le harem colonial (Images dun sous-erotisme) (Geneve-Paris Editions Slatkine 1981) Malek Alloula e Leyla Belkatd Belles Algeriennes de Geishyser Costumes parures et bijoux (Paris Marval 2001)

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

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---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

447

1 446 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (Sf~cs XIX-XX)

muitos tern sido os estudos segundo diferentes perspetivas a dedishycarem-se a representaltao de mulheres em contexto colonial Lisa Gail Collins por exemplo analisa a laquohistoria brutalraquo da represenshytaltao visual dos corpos das mulheres negras ao longo da historia muitas vezes exercida de forma fonada das imagens de mulheres escravas as imagens de uma Venus de Hottentote a circular nos meios cientfficos da Europa da primeira metade do seculo XIX (35) As desigualdades e as assimetrias de poder indissociaveis das relalt6es coloniais vieram colocar 0 corpo da mulher nao-ocidental num lugar de fronteiras mais indefinidas e numa visibilidade mais legfshytima Aqueles corpos objeto de tantos olhares - da curiosidade popular aobservaltao cientffica da antropologia ou da medicina - era suficientemente diferente para ser inspecionado livremente pertenciam a colonizados mulheres e homens e crianltas que nao tinham nome nem voz nem escolha e sobretudo nao possufam os instrumentos para contestar a erotizacao do seu corpo ou a visualidade por vezes violenta a que este se expunha

Na mesma altura em que as mulheres seminuas e de pele casshytanha escura chegavam aEuropa atraves das litografias dos jorshynais ilustrados ou das fotografias onde tantas vezes se cruzavam as fronteiras entre antropologia e erotismo ou pornografia mulheshyres reais e verdadeiras tambem seminuas vinham ocupar outros espaltos de visualidade moderna nos centros das grandes urbes europeias e norte-americanas E tambem eram fotografadas Penshysamos nos jardins de aclimataltao enos jardins zoologicos que ao longo do seculo XIX e ainda nas primeiras decadas do seculo XX receberam com regularidade grupos de pessoas provenientes de lugares do mundo que quase sempre eram tambem lugares coloshynizados pela Europa que os exibia Este fenomeno que tern sido estudado pelos estudos coloniais ou pelas abordagens da cultura visual e da antropologia e que e muitas vezes identificado com a

(35) Michael Corris e Robert Hobbs (a discussion between) laquoReading black through white in the work ofKara Walkerraquo in Difference and excess in Contemporary Art The visibility ofwomens practice ed Gill Perry (Oxford Blackwell 2004) pp 104shy-123 Para urn outro estudo sobre representalt6es de negros na fotografia produzida no Brasil ver Sandra Sofia Machado Koutsoukos Negros no estudio do fot6grafo (Campinas SP Unicamp 2010)

I i i FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

designaltao de laquozoos humanosraquo exemplifica a centralidade do mundo colonial na visualidade moderna e nas novas praticas culturais e de lazer disponfveis nas grandes cidades europeias

Assim os laquozoos humanosraquo - a exibiltao de seres humanos proshyvenientes de fora da Europa muitas vezes vindos de territorios colonizados - que se organizavam no contexto das exposilt6es coloshyniais e universais ou nos jardins botanicos e de aclimataltao de grandes cidades europeias multiplicaram grandemente a sua visishybilidade atraves da sua reproducao em postais fotograficos (36) Este emais urn exemplo de como diferentes espaltos de visualidashyde e de exposiltao se usavam mutuamente para reforltar as suas possibilidades

F otografia e exposic6es

Tanto a fotografia como as exposic6es ambas laquoinvenc6esraquo oitoshycentistas foram centrais para a exibiltao de uma cultura colonial enquanto instrumentos de uma ideologia e de uma pratica coloshynial para sugerir ideias literais ou metaforicas de viagem e divershysidade geografica como modo de intercambio e de confronto entre diferentes experiencias coloniais mas tambem enquanto instrushymentos que foram apropriados nos proprios espacos coloniais e muitas vezes usados como forma de construir uma identidade local por vezes subversiva ou antagonica a hegemonia colonial Assim

(36) Recentemente os ZOOS humanosraquo foram objeto de uma grande exposishyltao no Museu do Quay Branly em Paris Pascal Blanchard Gilles Boetsch e Nanetshyte Jacomijn Snoep eds Human Zoos The invention ofthe savage (Paris Actes Sud e Musee du Quai Braniy 2011) De alguma forma esta exposiltao e 0 coloquio que foi organizado emjaneiro de 2012 sobre 0 mesmo assunto continuam a refJe shyxao iniciada dez anos antes tambem com a organizaltao de urn col6quio internashycional e a publicaltao de urn livro Nicolas Bance et al eds Zoos Humains De la Venus hottentote aux reality shows (Paris Editions la Decouverte 2002) Alguns outros exemplos de estudos sobre 0 assunto sao Christian Baez e Peter Mason Zoologicos humanos Fotografias de fueguinos y mapuche en elJardin dAcclimatation en Paris siglo XIX (Santiago Chile Pehuen Editores 2006) Roslyn Poignant Professional savages Captive lives and Western spectacle (New Haven e Londres Yale University Press 2004) Olivier Razac LEcran et le zoo Spectacle et domestication des expositions colonials Ii Loft Story (Paris Editions Denoel 2002)

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

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---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

449

T o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SEes XIX-XX)448

outra das linhas de investigaltao nesta area tern sido a de explorar as relaltoes entre fotografia e exposiltoes (37)

Quais eram os usos da fotografia no contexto das exposiltoes A fotografia era urn objeto e urn instrumento muito presente nas exposiltoes pelas mais divers as razoes Mas era tarnbem urn dos principais modos de multiplicar 0 efeito das exposiltoes - as fotoshygrafias das exposiltoes eram reproduzidas em jornais ou ja em finais do seculo XIX reproduzidas em postais fotograficos que se tornaram imensarnente populares e que graltas asua vasta circushylaltao geografica levavam imagens das exposiltoes para outras geografias Os usos da fotografia em museus coloniais tambem tern sido urn tema explorado pela hist6ria do colonialismo a hisshyt6ria da antropologia a hist6ria da arte e tambern os museums stushydies ou estudos de museus que desde a decada de 1980 tern feito do museu objeto de uma abordagem critic a (38) A fotografia tern

(37 ) Laetitia Dujardin Ethnics and hade photography and the colonial exhibitions in Amsterdam Antwerp and Brussels (Amsterdam Rijksmuseum Manfred amp Anna Heiting Fund 2007) Maria Inez Turazzi Poses e trejeitos Afotografia e as exposifoes na era do espetaculo (1839-1889) (Rio de Janeiro Funarte Rocco 1995) Julie K Brown Contesting images Photography and the Worlds Columbian Exposition (Tucson e Londres The University ofArizona Press 1994)Joel Dauphine Canaques de la Nouvelle-Caledonie a Paris en 1931 De la case au zoo (Paris LHarmattan 1998) Anne Maxwell Colonial Photography amp Exhibitions Representations ofthe laquonativeraquo and the making ofEuropean identities (Londres e Nova 100-que Leicester University Press 1999) Tiphaine Zirmi Expositions Universelles Expositions Internationales Expositions Coloniales Presentation des collections du Departement des estal7tpes et de la photographie de la Bibliotheque nationale de France (Paris Bibliotheque Nationale de France Departement des estampes et de la photographie 2003) Filipa Lownshydes Vicente Outros orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisshyboa Instituto de Ciencias Sociais 2009)

(38) Os estudos sobre museus e colelt6es coloniais sao imensos Para alguns exemplos Annie E Coombes Reinventing Africa Museums material culture and popular imagination (New Haven Yale University Press 1994) Le Musee et les culshytures du monde Les Cahiers de lEcole Nationale du Patrimoine nO 5 (Paris Ecole Nationale du Patrimoine 1999) Du Musee colonial au musee des cultures du monde Actes du colloque organise par Ie Musee National des Arts dAfrique et dOceanie et Ie Centre Georges~Pompidou 3-6Juin 1998 ed Dominique Taffin (Paris Musee National des Arts dAfrique et dOceanie Maisonneuve e Larose 2000) George W StockingJr ed Objects and others Essays on museums and material culture (Madishyson Wisconsin The University of Wisconsin Press 1985) Benoit de lEstoile Le gout des autres De lExposition coloniale auxArts premiers (Paris F1ammarion 2007) Anthony Shelton ed Collectors Individuals and Institutions (Londres e Coimbra The Horniman Museum and Gardens Museu Antropol6gico da Universidade de

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I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

Postal fotografico Encantadores de serpentes Indianos F Exposicao Colonial Portuguesa-Porto 1934 Co particular

sido estudada enquanto material exposto no espalto de exposiltao como forma de conhecimento de missoes organizadas pelo museu ou enquanto instrurnento museol6gico utilizado na identificaltao e classificaltao dos objetos existentes na coleltao

Tendo em conta que as exposiltoes - especialmente em finais de Oitocentos e nas primeiras decadas do seculo xx - eram insshytrumentos particularmente relevantes na exibiltao de todos os tipos de conhecimento sobre as col6nias pensamos que faz sentido penshysar nos cruzamentos entre estes dois tipos de espalto de visualidade Como se fosse uma dupla representaltao este cruzamento entre fotoshygrafia e exposiltao da-se logo desde 0 inicio a prirneira exposiltao universal que teve lugar em Londres em 1851 - Great Exhibition of all Nations - exibia a evolultao que a tecnologia fotografica tinha realizado desde a sua descoberta em 1839 A segunda exposiltao universal organizada em Paris quatro anos depois tinha uma secshyltao independente dedicada afotografia aqui ainda muito presa

Coimbra 2001) Para 0 caso portugues ver Maria Manuela Cantinho Pereira 0 Museu Etnografico da Sociedade de Geografia de Lisboa Moilernidade colonizafao e alteridade (Lisboa Fundaltao Calouste Gulbenkian Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia 2005)

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

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FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

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---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

451 450 0 nvlPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

as discussoes sobre a sua identidade - tratava-se de uma forma de arte ou de uma tecnologia ligada ao progresso industrial Ja nesta exposiltao em 1855 a reprodultao fotografica serviu para mostrar imagens de fora da Europa - por exemplo os costumes das mulheshyres turcas de Constantinopla naquilo que foi identificado no catashylogo como uma forma da etnografia usar a fotografia (39) Mas 0 contributo da fotografia para esta diversidade geografica fazia mais parte de uma ideia de Tour du Monde de urn laquoviajar sem sair do lugarraquo que como era tantas vezes repetido era atributo da fotoshygrafia do que propriamente de urn instrumento para expor as col6nias tal como acontecera mais tarde

Vma das formas de compreender 0 lugar da fotografia na culshytura colonial portuguesa e investigar qual 0 papel da fotografia nas exposiltoes espaltos onde as col6nias passaram a ter uma cresshycente importfmcia ao lange da segunda metade do seculo ate as palavras laquocolonialraquo ou laquoimperialraquo passarem mesmo a estar incluidos nos nomes das exposilt6es (40) Como e que a fotografia foi utilizada na representaltao colonial portuguesa na Exposition Universelle de Paris em 1889 que pela primeira vez teve urn pavilhao a parte espeshycialmente dedicado as col6nias E nas exposiltoes que tiveram lugar aquando do Centendrio da india em Lisboa ou em Goa (1898) E quais foram os muitos usos da fotografia na Exposifiio Colonial do Porto em 1934 tanto enquanto modo de mostrar ao publico as modershynizaltoes empreendidas pela empresa colonial portuguesa como enquanto forma de transformar 0 evento (e a pr6pria colonizaltao) num projeto estetizado civilizado e modelar (11) Este e urn objeto de estudo onde mais uma vez nao se pode isolar a imagem do texto As muitas publicaltoes que se produziam para cada uma das exposhy

(39) Ernest Lacan Esquisses photographiques Ii propos de [Exposition Universelle et de la Guerre dOrient (Paris Grassart Editeur 1856 edicao fac-simile Paris Edishytions Jean-Michel Place 1986) p 105 Filipa Lowndes Vicente Viagens e exposishyfoes D Pedro V na Europa do seculo XIX (Lisboa Gatica 2003) pp 259-261

(40) Ver 0 trabalho de Patricia Ferraz de Matos sobre representac6es raciais no imperio portugues onde a autora da urn grande destaque as exposic6es coloshyniais As Cores do Imperio Representafoes raciais no Imperio Colonial Portugues (Lisshyboa Imprensa de Ciencias Socia is 2006)

(41) Maria do Carmo Serem ed A porta do meio A Exposifiio Colonial de 1934 Fotografia da casa Alviio (Porto Centro Portugues de Fotografia 2001)

T I i

I I

I

FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

silt6es eram quase todas compostas por texto e imagens sobretudo amedida que as tecnologias reprodutivas se foram desenvolvendo ao lange do seculo XIX

Alem dos usos espedficos da fotografia no espalto da exposishyltao em si a fotografia teve urn papel determinante na multiplicashyltao do impacto das exposilt6es muito para la da sua presenlta fisica numa determinada cidade e mesmo para la da temporalishydade provis6ria que fazia com que nao durassem mais do que uns meses Para cada uma das exposiltoes produziam-se inumeros catalogos folhetos livros relat6rios postais ou posters exemplos de material escrito que era consumido por aqueles que visitavam as exposilt6es mas tambem por aqueles que nunca la iriam e que muitas vezes se encontram noutros lugares (os catalogos das exposhysiltoes de Paris por exemplo eram traduzidos para portugues e vendidos em Portugal) A fotografia teve urn papel determinante nestas publicaltoes sobre as exposiltoes mesmo antes de se terem inventado os metodos que permitiam a reprodultao fotografica direta e a litografia servia de intermediaria (e os desenhadores tinham que copiar as fotografias que depois eram impressas litoshygraficamente nos jornais ou livros) Urn dos aspetos que fotografia e exposiltoes tiveram em comum foi sem duvida 0 de divulgar uma visualidade colonial entre espectadores leitores observadoshyres que na sua maioria eram europeus Quer as exposilt6es quer a fotografia contribuiram para exibir espaltos coloniais pessoas objetos e aquilo que era denominado como sendo laquocostumesraquo aqueles publicos que estavam muitas vezes na posiltao do colonishyzador - porque pertenciam ao pais colonizador - mas que nao tinham nenhuma ligaltao espedfica ao projeto colonial e provashyvelmente nunca viajariam as col6nias (42)

No entanto as exposiltoes tal como a fotografia nao foram apenas usadas enquanto dispositivos ideol6gicos de poder colonial Tambem foram usadas pelos colonizados de multiplas formas - em colaboraltao com iniciativas coloniais ou de modos mais indepenshydentes e mesmo subversivos Introduzida pela presenlta europeia nas mais diversas regioes da Asia de Africa ou da Oceania a fotoshy

(42) Tony Bennett The birth of the Museum History theory politics (Londres e Nova Iorque Routledge 1995)

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

453 452 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX)

grafia foi desde logo apropriada e usada de multiplas formas pelos locais Na India por exemplo tornou-se numa das rna is populashyres tecnicas modernas na india da segunda metade do seculo XIX (43) E por vezes foi mesmo utilizada como urn modo de subshyverter 0 colonialismo europeu de refonar agendas nacionalistas ou de construir imagens locais atraves de uma visualidade que se afirmava pela sua diferenca Quando pensamos no caso portushygues de onde e que devemos partir Do arquivo colonial portushygues metropolitano ou seja daquilo que se encontra hoje nos arquivos publicos e privados daquela que no passado foi a metr6shypole colonial Ou de uma perspetiva muito mais centrada em Afrishyca ou na India naqueles contextos geograficos que estiveram sob a hegemonia colonial portuguesa Embora as duas perspetivas sejam valid as e ate inseparaveis uma da outra existe de facto nos ultimos anos uma tendencia para ir de uma abordagem metroshypolitana centralizadora para urn foco mais local (44) Esta abordashygem tern a vantagem de confrontar 0 aqui com 0 la de sail de uma perspetiva metropolitana e colonizadora para avaliar 0 impacto e os llsos locais da fotografia Isto por vezes pode significar afastarmoshy-nos de projetos coloniais levados a cabo localmente ou de outras formas mais organizadas e institucionalizadas de usar a fotograshyfia para nos levar a refletir sobre ideias de apropriacao subversao

(43) Nicholas Thomas Colonialisms CultUTe Anthropology travel and governshyment Sobre fotografia na india ver Pinney The Corning of Photography in India Malavika Karlekar Re-Visioning the Past Early Photography in Bengal 1875-1915 (New Delhi Oxford University Press 2005) Pelizzari ed Traces ofIndia Photoshygraphy Architecture and the Politics of Representation 1850-1900 Vidya Dehejia ed India through the lens Photography 1840-1911 (Washington DC Freer Gallery of Art and Arthur M Sackler Gallery Smithsonian Institution 2000) Pinney Camera Indica The social life of Indian photographs John Falconer laquoPhotography in Nineteenth-Century Indiaraquo in The Raj India and the British 1600-1947 ed C A Bayly (Londres National Portrait Gallery Publications 1990) John Falconer laquoEarly British Photography in Indiaraquo History ofPhotography 16 no 4 (l992)John Falconer org India Pioneering photographers 1850-1900 (Londres British Librashyry Howard and Jane Ricketts Collection 2001) Gutman Through Indian eyes 19th and early 20th century photography from India Ray Desmond Victorian India in focus a selection of early photographs from the collection in the India Office Library and Records (Londres HMSO 1982) Ray Desmond Nineteenth Century Indian Photographers in India (Londres Taylor amp Francis 1977)

(44) Ver por exemplo a conferencia internacional que foi recentemente orgashynizada na Australia Facing Asia Histories and Legacies ofAsian Studio Legacy 2010

1 FOTOGRAFIA E COLONIALISMO

e iniciativa local POI outro lado mais do que dividir as prltiticas fotograficas realizadas localmente com aquelas indissociaveis de projetos coloniais e ter em conta os muitos cruzamentos que exisshytern entre elas A literatura recente sobre fotografia tern explorado a sua riqueza e profundidade abordando-a como mais urn objeto do conhecimento escrito material e visual produzido num conshytexto colonial - a fotografia como urn espaco laquode hist6rias multishyplas que contestam e sao contestadasraquo (45)

(45) Elizabeth Edwards Raw Histories p 22

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

548 549 o IMPERIO COLONIAL EM QLESTAO (SECS XIX-XX)

Bernardo Pinto da Cruz Licenciado em Ciencia Politica e Relalt6es Internacionais e Messhytrando em Ciencia Politic a na Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa prepara uma tese sobre o Gabinete dos Negocios Politicos do Ministerio do Ultramar (1959-1974)

Claudia Castelo Historiadora e arquivista investigadora auxiliar (compromisso com a ciencia) no Instituto de Investigalt~l0 Cientffica Tropical Lisshyboa Entre as suas publicalt6es mais recentes destaca laquoInvestigaltao cientifica e politica colonial portuguesa evolultao e articulalt6es 1936-1974raquo Hist6ria Ciencias Saude - Manguinhos Rio de Janeishyro 19(2)2012 p 391-408 Eco-organizadora de Os Qutros da Coloshynizaiio Ensaios sobre 0 Colonialismo Tardio em MOfambique (2012) Os seus atuais interesses de investigaltao congregam a hist6ria do tardo-colonialismo portugues a hist6ria oral e a hist6ria da ciencia

Diogo Ramada Curto Professor do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa publicou recentemente Cultura Politica no Tempo dos Filipes 1580-1640 (Lisboa Edilt6es 70 2011) Co-dirige a Coleltao laquoHisshyt6ria amp Sociedaderaquo na Edilt6es 70

Fernando Tavares Pimenta Doutor em Hist6ria e Civilizaltao pelo Instituto Universitario Euroshypeu de Florenlta e investigador de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e a Tecnologia junto do Centro de Estudos Intershydisciplinares do Seculo xx da Universidade de Coimbra Eautor de varios livros sobre 0 colonialismo portugues entre os quais Angola Os Brancos e a Independencia (2008) e Portugal eo Seculo XX Estado-Imperio e Descolonizafiio 1890-1975 (2011)

Frederico Agoas Licenciado e doutorado em Sociologia pela Faculdade de Ciencias Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Tern trabalhashydo no ambito da Sociologia Hist6rica com incidencia nas relalt6es entre a hist6ria das ciencias sociais e os processos de construltao do Estado moderno Einvestigador do CesNova (FCSH-UNL) e do

NOTIS BIocRAFICAS

Departamento de Estudos Ibericos e Latino-Americanos de Birkshybeck Universidade de Londres it bolseiro de p6s-doutoramento da Fundaltao para a Ciencia e Tecnologia e membro do projeto de investigaltao laquoA Formaltao do Poder de Estado em Portugal Proshycessos de Institucionalizaltao de 1890 a 1986raquo

Filipa Lowndes Vicente Investigadora Auxiliar do Instituto de Ciencias Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa Doutorada pela Universidade de Londres em 2000 (Department of Historical and Cultural Studies Goldsshymiths College) com uma tese que deu origem ao livro Viagenl e Exposifoel D Pedro V na Europa do Seculo XIX (Lisboa G6tica 2003) que obteve 0 Premio Victor de Sa de Hist6ria Contemposhyranea em 2004 Recentemente publicou Outros Orientalismos a india entre Florenfa e Bombaim (1860-1900) (Lisboa ICS 2009) A versao inglesa deste livro foi publicada na india em 2012 (Orient Blackswan) e a versao italiana (Florence University Press) tambem saira ainda este ano Tambem no prelo encontra-se a Arte lem Hisshytoria mulheres artistas (leculos XVI-XX) (Lisboa Athena)

Hugo Gonltalves Dores Licenciado em Hist6ria (2005) e Mestre em Hist6ria Contemposhyranea (2009) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Prepara uma tese de doutoramento sobre a questao missionaria no imperio portugues em Africa no Programa Inter-UniversiUlrio de Doutoramento em Hist6ria Emembro do Centro de Estudos de Hist6ria Religiosa da Universidade Cat61ica Portuguesa

Jose Pedro Monteiro Licenciado em Relalt6es Internacionais pela Universidade do Minho mestrando em Ciencia Politic a e Relalt6es Internacionais na Faculshydade de Ciencias Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) onde aguarda a defesa da sua dissertaltao laquoPortugal a Organizashyltao Internacional do Trabalho e 0 Problema do Trabalho N ativo a Queixa do Estado do Ganaraquo E doutorando do Programa de Doutoramento Inter-Universitario em Hist6ria no Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa com uma tese intitushy

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

551

tl ~

---- 1

o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAo (SECS XIX-XX) 550

lada laquoPortugal as Organizaltoes Internacionais e a Polltica do Trashybalho Nativo no Imperio Colonial Portugues (1924-1974) gtgt

Margarida Calafate Ribeiro Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e docente em varios programas de doutoramento Eresshyponsavel pela Catedra Eduardo Louren~o do Instituto Camoes e da Universidade de Bolonha Das suas publicaltoes destacam-se os livros de autor Africa no Feminino as Mulheres Portuguesas e a

Guerra Colonial (2007) e Uma Historia de Regressos Imperio Guershy

ra Colonial e Pos-Colonialismo (2011) e a organizaltao de varios volushymes coletivos Organizou recentemente com Roberto Vecchi a Antologia da Memoria Poetica da Guerra Colonial (20l1)

Marta Macedo Licenciada em Arquitetura e doutorada elll Arquitetura especiashylidade Teoria e Historia pela Faculdade de Ciencias e Tecnologia da Universidade de Coimbra e atualmente investigadora de posshy-doutoramento no Centro Inter-Universitario de Historia das Cienshycias e da Tecnologia - Universidade de Lisboa Presentemente trabalha sobre 0 papel das praticas tecnico-cientificas na construshyltao dos projetos coloniais europeus durante 0 seculo xx

Miguel Bandeira Jeronimo Historiador doutorado pelo Kings College London (2008) e invesshytigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa Foi Investigador no Instituto Universitario Europeu (Florenlta Italia) e Professor Visitante na Universidade de Brown (EUA) Os seus interesses de pesquisa centram-se na Ciencia PoHtica nas Relaltoes Internacionais e na Historia Global e Comparada do Imperialismo e do Colonialismo (seculos XVIII-XX) Autor de Livros Brancos Almas Negras A laquoMissiio Civilizadora do Colonialisshy

mo Portugues c 1870-1930 (Imprensa de Ciencias Sociais 2010) e A Diplomacia do Imperio Politica e Religiiio na Partilha de Africa (Edishy~oes 70 2012) E co-editor da coleltao laquoHistoria amp Sociedaderaquo na Ediltoes 70

NOTAS BIOGRAFICAS

Nuno Domingos Investigador do Instituto de Ciencias Sociais da Universidade de Lisboa e do Food Studies Centre da School of Oriental and Afrishycan Studies da Universidade de Londres Publicou Futebol e Coloshy

nialismo Corpo e Cultura Popular em Morambique (Lisboa ICS 2012) e co-editou com Victor Pereira 0 Estado Novo em Questiio (Lisboa Ediltoes 70 2010) Eco-editor da cole~ao laquoHistoria amp Sociedaderaquo

na Ediltoes 70

Pedro Aires de Oliveira Professor auxiliar no Departamento de Historia da FCSH memshybro do Instituto de Historia Contemporfmea e do IPRI -UNL Autor de Os Despojos da Alianra A Grii-Bretanha e a Questao Colonial Porshy

tuguesa 1945-1975 (Tinta-da-China 2007) e de outros trabalhos no ambito da historia do colonialisl1lO e descolonizaltao e da polishy

tica externa portuguesa

Ricardo Roque Investigado Auxiliar no Instituto de Ciencias Sociais da Univershysidade de Lisboa e Investigador Convidado no Departamento de Historia e no Centro para os Valores Etica e Direito na Medicina da Universidade de Sydney Tem-se especializado em antropoloshygia historica estudos sobre a ciencia historia da antropologia racial historia imperial e estudos p6s-colon iais com especial enfoshyque no imperialismo portugues tardio Projetos recentes incluem o estudo do mimetismo colonial da classificaltao antropologica em Timor Leste e da ciencia racial no mundo de expressao porshytuguesa E0 autor de laquoHeadhunting and Colonialismraquo (2010) e de laquoAntropologia e Imperioraquo (2001) e 0 co-organizador de laquoEngashyging Colonial Knowledgeraquo (2012) e laquoObjectos Impurosraquo (2008)

Victor Pereira Professor auxiliar na Universidade de Pau (Franlta) e investigador associado ao Instituto de Hist6ria Contemporanea da Universishydade Nova de Lisboa Estuda os movimentos migrat6rios e as elishytes administrativas do Estado Novo Publicou varios artigos em revistas nacionais e internacionais Na mesma coleltao dirigiu

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

INDICE

o Imperio Colonia l em Questao Problemas e Perspetivas

MIGUEL BANDEIRAJERONIMO VII

Agradecimentos XIII

Siglas XV

1 OS GOVERNOS DO IMPERIO IDEOLOGIA POLITICA

E GUERRA middotmiddotmiddot middotmiddotmiddotmiddot middotmiddot middotmiddotmiddotmiddotmiddotmiddot middotmiddotmiddot middotmiddotmiddot 1 Terror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes

Os Nacionalismos no Imperio Angola e Moltambique

na Baixa de Cassange janeiro e fevereiro de 1961

DIOGO RAMADA CURTO E BERNARDO PINTO DA CRUZ 3

Sanzala Mihinjo abril de 1961 ANTONIO ARAUJO 37

Dragoes -- 10 Esquadrao 54

FERNANDO TAVARES PIMENTA 59

A Diplomacia do Terceiro Imperio P EDRO AIRES OLIVEIRA 87

Urn imperialismo laquoexcecionairaquo 88

Imperio e sistema internacional 93 Imperio e regimes politicos 98 o fim do jogo a era da descolonizaltao 104

As Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio

Colonial Portugues MIGUEL BANDEIRA JERONIMO E

Algumas direltoes de pesquisa futura 112

Sugestoes de Leitura 116

H UGO GONltALVES DORES 119

Contrariando laquoespolialtoesraquo 124

Preservar os direitos hist6ricos 130

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

576 o IMPERIO COLONIAL EM QUESTAO (SECS XIX-XX)

A missiio de ocupar 141 Em busca de um modus vivendi 148

Conclusao 154

2 AS ECONOMIAS DO IMPERIO ESTADO COLONIAL

TRABALHO E PROPRIEDADE 157

Das laquodificuldades de levar os indigenas a trabalharraquo

o laquosistemaraquo de trabalho nativo no imperio colonial

portugues MIGUEL BANDEIRA J ERONIMO EJOSE PEDRO

MONTEIRO 159

Introdultao 159

Uma transicao civilizada 163 Confrontando laquointernacionalismos perigososraquo 173

Um Desenvolvimentismo repressivo 182

Conclusao 191

Terra trabalho e colonialismo em Mocambique 0 caso do

distrito de Inhambane c1900-c1930 BARBARA DIREITO 197

I 198

II 206

III 220

Bloqueios no sistema elites africanas 0 fenomeno do

trabalho forcado e os limites de integracao no Estado

colonial portugues 1945-1974 ALEXANDER KEESE 223

Introducao 223

A exclusao das elites africanas - urn topico da historia

da Africa lus6fona 227

196061 Uma outra oportunidade perdida para a

integracao das elites africanas 234

A Geracao de 1953 em Sao Tome e Principe os limites

da participacao africana local 336

Julio Monteiro a ilusao da carreira imperial para os

cidadaos laquonegrosraquo 242

Conclusao 247

A Economia do Imperio e os PIanos de Fomento

VICTOR PEREIRA 251

PIanos inuteis e esquecidos 252

Integracao nacional vs Europa 262

577IND ICE

o planeamento econ6mico ao servico do espaco 262econ6mico portugues 268A viragem europeia 271PIanos de fomento ou de povoamento 276PIanos de industrializacao 279PIanos para conquistar laquomentes e corac6esraquo 281Conclusao

3 AS CIENCIAS DO IMPERIO ATORES INSTITUICOES 287E SABERES

Imperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho 289em Sao Tome no inicio do seculo XX MARTA MACEDO 289In troducao 293A emergencia das plantacoes na col6nia de Sao Tome 295Uma paisagem de cacaueiros

Regimes tecnico-cientificos e tecnologias de trabalho 296intensivo na roca da Boa Entrada 299Uma ciencia global da fermentacao

Praticas de agricultura moderna com velhos 302fertilizantes 304Disciplinar 0 corpo para 0 trabalho

Negociacao e cooperacao entre territorios imperiais 310 de Sao Tome para os Camaroes 315 Conclusao

Estado universidade e ciencias sociais a introducao da

sociologia na Escola Superior Colonial (1952-1972) 317FREDERICO AcoAs 317Introducao 320 Hist6ria das ciencias sociais urn programa de pesquisa

A laquosociologia colonialraquo no ambito da hist6ria da 327sociologia em Portugal 330Uma mudanca de paradigma 338o papel dos tecnicos 345Conclusao

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo 349portugues tardio CLAuDIA CASTELO

1 laquoCiencia colonialraquo e colonialismo desenvolvimentista 350questionar (pre)conceitos

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

578 o IMPERIO COLONIAL EM Q UESTAO (SECS XIX-XX)

2 Que investigaltao cientifica e que desenvolvimento

no contexto do imperio portugues tardio 359 3 Em jeito de conclusao questoes para pesquisa futura 379

4 AS CULTURAS DO IMPERIO GENERO FICltAo E

CONSUMOS 389 Cultura Popular urbana e configuraltoes imperiais

NUNO DOMINGOS 391 Problemas e possibilidades 393 Uma cultura urbana em Lourenlto Marques 397 o movimento de uma cultura global 399 o imperial e 0 global 404 Desigualdades sociais e redes alternativas 409 USOS e Aproprialtoes 411

Perspetivas de investigaltao 418 Fotografia e colonialismo para la do visivel

FILIPALOWNDESVICENTE 423 Historiografias nacionais e fotografia colonial 429 Para la do visivel fotografia enquanto o~jeto hist6rico 434 Reprodultao circulaltao e mobilidade 438 Mulheres e fotografia 442 Fotografia e exposiltoes 447

A circulaltao de hist6rias e colelt6es nos imperios coloniais

RICARDO ROQUE 455

Introdultao 455 Mobilidade de cranios e hist6rias 459 A noltao de trabalho historiografico 464

Cranios e hist6rias no museu 465

Historiografia em miniatura 469 Narrativas e interferencias 471

Circulalt6es 472 Mudanltas epistemicas 478 Conclusao 481

Genero e colonialismo a escrita feminina sobre a india

colonial portuguesa e britanica FILIPA LOWNDES

VICENTE 487 Cruzar colonialismo e estudos de genero 487

579IN DICE

Mulheres brit2micas a escrever sobre a india colonial 493na decada de 1870

As narrativas de viagem de Isabel Burton e Katherine 502Guthrie a escrita como transgressao 510As possibilidades da escrita feminina

Letras do Imperio percursos da literatura colonial 515portuguesa MARGARIDA CALAFATE RIBEIRO 515Introdultao 519No principio e depois com 0 Estado Novo 524Imagem de Imperio e Literatura Colonial

Os Tristes Tr6picos ou outras formas de dizer 0 mundo 530colonial 538Tristes lusotropicalismos 544Conclusao

547N otas Biograficas 553Illdice Analitico 561indice Onomastico 560indice Geografico

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012

COPYRIGHT DOS TEXTOS

0 Imperio Colonial em Questao Problemas e Perspetivasraquo Miguel BandeiraJeronimo e Edi~6es 70 2012

laquoTerror e saberes coloniais Notas acerca dos incidentes na Baixa de Cassangejaneiro e fevereiro de 1961raquo

copy Diogo Ramada Curto Bernardo Pinto da Cruz e Edic6es 702012

Sanzala Mihinjo abril de 1961raquo copy Antonio Araujo e Edic6es 70 2012

laquoOs NacionalisITIos no Imperio Angola e Mocambiqucraquo copy Fernando Tavares Pimenta e Edic6es 70 2012

laquoA Diplomacia do Terceiro Imperioraquo copy Pedro Aires Oliveira e Edic6es 70 2012

laquoAs Missoes do Imperio Polftica e Religiao no Imperio Colonial Portuguesraquo copy Miguel BandeiraJer6nimo Hugo Goncalves Dores e Edicoes 70 2012

laquoDas dificuldades de levar os indigenas a trabalhar o sistema de trabalho nativo no imperio colonial portuguesraquo

copy Miguel BandeiraJer6nirno Jose Pedro Monteiro e Edicoes 70 2012

laquoTerra trabalho e colonialismo em Mocambique o caso do distrito de Inhamhane c1900 c1930raquo

copy Barbara Direito e Edic6es 70 2012

laquoBloqlleios no sistema elites africanas 0 fenomeno do trabalho forcado e os limites de integracao no Estado colonial portugues 1945-1974raquo

copy Alexander Keese e Edic6es 702012

laquoA Economia do Imperio e os PIanos de Fomentoraquo copy Victor Pereira e Edic6es 70 2012

laquoImperio de cacau ciencia agricola e regimes de trabalho em Sao Tome no infcio do seculo XXraquo

copy Marta Macedo e Edic6es 702012

laquoEstado universidade e ciencias sociais a introducao da sociologia n- Escola Superior Colonlal (1952-1972) gtgt

copy Frederico Agoas e Edic6es 70 2012

Ciencia Estado e desenvolvimento no colonialismo portugues tardioraquo copy Claudia Castelo e Edic6es 70 2012

laquoCultura Popular urbana e configuraC6es imperiaisraquo copy Nuno Domingos e Edic6es 702012

laquoFotografia e colonialismo para la do visivelraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edi~6es 70 2012

laquoA circulacao de historias e colec6es nos imperios coloniaisraquo copy Ricardo Roque e Edic6es 70 2012

laquoGenero e colonialismo a escrita feminina sobre a India colonial portuguesa e britanicaraquo copy Filipa Lowndes Vicente e Edic6es 70 2012

laquoLeu-as do Imperio percursos da literatura colonial portuguesaraquo copy Margarida Calafate Ribeiro e Edic6es 70 2012