disse, ficando morto o conde no campo da bata lha as

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L IVRO I

1097 - 1 128

Os districtos de Co imbra e Portugal pelo meado do

seculo XI . Os borgonheses Raimundo e Henri quegenre s de Aff onso VI . Governo do conde Raimun do emtoda Gal liza até Coimbra . Affonso VI estabelece ocondado ou p rovinc ia portugalense ao sul do Minho e

dá o governo del le Henrique .— A c ções deste até

par tir para Syria e sua vol ta Hespan ha . Designios

amb ic iosos dos dons condes . Morte de Raimundo e pre

tensões de Henrique .— Fal lece A ffonso VI . Consequen

c ias do successo . Procedimento do conde de Portugalnas discordias en tre Affonso I d

'

Aragão , rainhaD . Urraca

'

e o infante Affonso Raimundes . Ten tativasd

'

engrandecimento . Trai ç õ es mutuas Influencia da

infanta D . Th eresa ; mulher de Henrique . Morte deste .

Os seus intentos e politi ca . Lançou os al icerces da inde

pendencia de Portugal. D . Theresa dom inando nestaprovincia depois da morte do marido . Seus enredos e

&llían ça com Affonso de Aragão . D enominada geralmenterainha pelos subditos . Symptomas cada ve z mai s Vi si

veis das tendencias de Portugal para se desmembrar damonarch ia . D . Theresa reconhece auctoridade suprema

de sua irman D . Urraca . Ligada com os nobres de Gall iza faz —lhe depois guerra . Commettimentos dos sar

racenos pelo meio-dí a . D . Urraca invade Portugal .

Paz entre as duas írmans . Fernando Peres de Travae o seu val imento . A ffonso VII succede D . Urraca .

Primeiras acç ões do in fan te Affonso fi l ho do conde Hen

rique e de D . Theresa . En tra Affonso VlI em Portugale constrange infanta-rainha reconhecer a supremac ia

de Leão . Odi'

o dos portugueses contra o conde Fer

nando Peres . Conj uração e alevantamento . O conde e

D . Theresa expulsos . O infante apóssa-se do poder .

D . Theresa morre desterrada . Apreciação do seu caracterpo l ítico e do seu governo .

8 H I STOR IA DE PORTUGAL

5 limites dos estados de Fernando Magno haviam-se dilatado para o occidente da Península

,

conqu istadas successivamente Lamego , Vi seu , Seiae Co imbra A província da Galliza , cuj a f ronteira variava continuamente segundo os christãos

estendiam os seus domínios por esta parte maispara O sul ou tinham de retroceder diante dasarmas dos sarracenos

,muitas vezes victoriosas

,

dilatou — se , emfim,permanentemente até 0 Mon

dego . Coimbra, que ,

não só pela sua antiguidade e

grandeza relativa,mas ainda mais por ser militar

mente como a chave do territorio encerrado entreeste u ltimo rio e 0 Douro

,era uma povoação impor

tante,foi feita capital de um novo condado ou dis

tricto,cuj o governo O guerreiro principe confi ou

áquelle que 0 incitara proseguir por este lado assuas brilhantes conquistas .

Antes desta epocha , bem como as outras províncias da antiga monarch ia leonesa , Gallize era

regida por diversos condes cuj os territorios variavam ern extensao . A ' s vezes

,estes condes tinham

debaixo da sua auctoridade mais de um districto ;

às vezes eram suj eitos a um conde superior ouVice-rei da província . Entre estes governos , desde0 meado do seculo XI

,apparece 0 districto ou con

dado portucalense . Assim como Coimbra era apovoação mais notavel sobre 0 Mondego , Portucale ,

situado juncto ao Douro , era no seculo XI pela sua

situação Vizinha da foz do rio,pela sua antiguidade ,

que não só remontava á epocha dos Wisigodos mas

ainda ao tempo do domínio romano,e pela fortaleza

do sitio cabeça e principal povoação de um territorio que abrangia ao norte uma parte do litoral da

( 1 ) Vej a-se lntroducção ,D ivis . llI .

LIVRO 1

1 . Sé Velha de Co imbra.

I O H ISTORIA DE PORTUGAL

moderna província do Minho e ao sul as terras queaté o Vouga se tinham successivamente conquistadoSesnando ou Sisenando ,

filho de David,rico

mosar abe da que hoj e denominamos província daBeira , senhor de Tentugal e de outras terras no

territorio de Coimbra,tinha sido introduzido na

corte de Sevilha no tempo de Ibn Abbad e,pelos

seus talentos e importantes serviços feitos ao principe sarraceno , chegara occupar o cargo de W&SÍI

'

no diwan,isto é

,de ministro ou membro do su

premo conselho do amir, que o distinguia partien

larmente entre os seus conselheiros . Sesnando

tornou-se temido nas guerras com os inimigos deIbn Abbad ; porque nas emprezas que dirigiaobtinha sempre prosperos successe s . O motivo por

que abandonou amir de Sevilha para entrar no

serviço de Fernando Magno ignora-se ; mas o seuprocedimento posterior persuade que alguma of

fensa recebida dos sarracenos isso 0 instigara .

Admittido na corte do rei de Leão e Castella , alcan

eon brevemente convencê-lo das vantagens queobteria invadindo 0 occidente da antiga Lusitania .

O resultado da invasão justifi cou as previsões deSesnando ,

e o rei de Leão retribui u o bom servi ço

que mosarabe lhe fizera,dando— lhe o governo de

um districto constituido com as novas conquistas ecom a terra portugalense ao sul do Douro , ao qualservia de limites

,pelo oriente

,linha de Lamego ,

Viseu e Seia , e de fronteira , pelo sueste , o pendorseptemtrional da Serra da Estrella Deste modoa parte do moderno Portugal ao norte do Mondego

( 1 ) No ta I no lim do vo lume .

(2 ) Nota 11 no tim do vo lume .

L IVRO 1

1 2 H ISTOR IA DE PORTUGAL

e do Alva estava possuída pelos christãos quandoFernando I fallecen O districto de Coimbra ,como dissemos , abrangia do Douro ao Mondego , e 0do Porto , desmembrada delle terra de SantaMaria (Feira) , dilatava-se para o norte e nascente ,abrangendo talvez o Alto Minho e para o orienteainda parte da província de Trás-os —Montes . In

elnido até ahi na Galliza'

,0 territorio denominado

nos documentos e chronicas dos seculos XI e XIIPortucale , Terra portucalens is , começa então afigurar como provincia distincte , postoque outrasvezes pareça continuar a ser considerado comoporção da Galliza e

,até

,tornar-se mais circums

cripto , o que tudo provinha da falta de limites permanentes nos diversos condados' ou governos em

que se dividia o reino de Leão e Caste lla , e dadiversa importancia que os respectivos condestinham na j erarchia administrativa , sendo umasvezes dependentes immediatamente do rei , outras ,

como j á observámos,de um conde superior ,

e speciede vice-rei preposto ao regimento de uma provínciainteira I ) .

Repartida entre os tres fi lho s de Fernando Magnomonarchia que elle tanto dilatara , coub e GarciaGalliza

,abrangendo Portugal e as novas con

quistas até 0 Mondego . Sesnando continuava adominar 0 territorio de Coimbra , emquanto 0 condeNuno Mendes parece governava o do Porto . Ellepelo menos foi o cabeça de uma rebellião dos povosdaquelle districto ,

o s portucalenses , contra Garcia ,que , encontrando — se com os levantados entre Bragae 0 rio Cávado

,os destroçou ,

como noutra parte se

( 1 ) Ribeiro ,D issert . Chronologicas e Cri ticas , T . 4 , P . I

,

p . 2 0 a 3 1 . Memor . sobre a ori gem e l imites de Por

tugal (Mem . da Acad ., T . Art . 2 e 3 .

L IVRO 1 1 3

disse,fi cando morto O conde no campo da bata

lhaAs discordias dos tres irmãos fi zeram passar suc

cessivamente coroa de Galliza da cab eça de Gar ciapara a de Sancho

,rei de Castella e , a final , para a

de Affonso de Leão , que ajunctou outra vez todosos estados de seu pae . Entretido com guerras nasprovíncias centraes da Península até se apossar deToledo

,elle deixou tranquillos por alguns annos

os sarracenos que estanceavam ao sul de Coimbra,

applicando-se depois da conquista da antiga capitalde Hespanha restaurar as povoações das fronteirasvizinhas do Donro . Porventura entre Sesnando e osmussuhnanos limitrophes alguns recontros haveria

,segundo parece indicá-lo o foral dado a

Coimbra por Af fonso VI ; 1nas as correrias e entradasdos christãos

-

no occidente da Hespanha só prose

guirem depois da morte do conde mosarabe succe

di da nos fins de 1 0 9 1"

'

Os fi lhos de Fernando I tinham respeitado ohomem a quem este principe confiara o regimentoe defesa do territorio chamado então colímbriense .

Sesnando serviu lealmente até 0 seu ultimo dia acausa da monarchia christan , que elle abraçara , eainda , segundo parece , acompanhou Affonso VI em1 086 á infeliz bata lha de Zalaka . Sua fi lha Elviracasara com Martim Moni z

,cavalleiro i llustre

,

( 1 ) Dedit D . Garseano totam Gallecíam una com totaPortugale Pelagius Ovetensis , Chron icon , p . 75 (edi ç . de

Sandoval) .— Sobre rebellião dos Portagalenses veja-se

Chronica. Gothorum era 1 1 0 9 , n o Appendice da 3 .

ªPart'

e da

Monarch ia Lusi tana , e o que j á fi ca dito na Introducção ,

Divis . I II .

(2 ) Acqui si ta urbe regia . resta uratis Oppidis et Civi tatiba s extremorum Dori i : Ruderi cus Toletanus , De RebusHispaniae, L, 6

,c . Diss . Chron .

, T . 4 . P. 1 , p . 31 .

1 4 H ISTOR IA DE PORTUGAL

quem por morte do conde foi dado o governo deCoimbra . Affonso entretanto , reparadas as forçasda monarchia quasi destruídas na j ornada deZalaka , resolveu ,

inimigo sempre incançavel dossarracenos

,accommettê-los pelo occidente

,pas

sando com 0 seu exercito na primavera de 1 0 93

para o sul do Mondego e indo pôr sítio Santarem .

Esta povoação importante,cuj a expugnação se jul

gava quasi imposs ível,não tardou cair-lhe nas

mãos,e dentro de poucos di as igual sorte coube a

Li sboa e Cintra,dilatando— se as fronteiras até a

foz do Tej o com essas novas conquistas , cuj o

governo foi dado Sueiro Mendes , irmão de Gon

çalo Mendes da Maia , tã o celebre depois com 0

nome de Lidador ( 1 )A Galliza ,

incluindo debaixo desta denominaçãoa extensa provincia portugalense , que naturalmente se devi a considerar como incorporado o territorio novamente adquirido no Gharb mussulmano

,constituía j á um vasto estado remoto do

centro da monarchia leonesa . O s condes que dominavam os districtos em que esse largo tracto deterra se dividia fi cavam assás affastados da acçãoimmediate do rei e eram assás poderosos para facilmente se possuírem das ideas de independencia erebellião communs naquelle tempo , tanto entre os

sarracenos como entre os christãos . Affonso VI pôdeevitar esse risco convertendo toda Galliza

,na

mai s extensa significação desta palavra , em um

grande senhorio , cuj o governo entregou a ' um

membro da sua fam ília , ao qual dera o governo de

(1 ) Livro Preto da Sé de Co imbra , f . 1 0 , 1 1 e 2 1 .

_ D i ssert . Chronol . , T . 4 , P . 1

, p . 2 9 . Rod . To let . , L . 6 , c . 32

ad tin . Chron . Gothor. era 1 1 31 , na Mon . Lusit .

, L . 8,

c . 7 .

LIVRO 1 1 5

Coimbra e Santarem logo depois da conquistadesta

,removendo para 0 di stricto de Arouca Mar

tim Moniz e suj eitando ao noV0 . c 0 nde 0 governador de Santarem , Sueiro MendesO principe quem Affonso deu 0 regimento

desta imp ortante parte da monarchia era um es

trangeiro ,mas estrangeiro illustre por sangue , que

vi era naturalisar — se na Hespanha , arriscandovida pelo christianí smo e pela monarchia leonesana terrível lucta que durava havia seculos sobre Osolo ensanguentado da Península . Raymond , Rei

mondo ou Raimundo , fi lho de Guilherme conde deBorgonha , tinha vindo Hespanha tempos antes ,porventura nos fins de 1 0 79 ou princí pios de 1 0 80

em companhia da rainha Constancia,segunda mu

lher de Affonso VI , ou no anno de 1 0 86,em que ,

segundo O testemunho da chronica lusitana ou dosgodos

,muitos franceses pa ssaram os Pirenéus para

a batalha de Zalaka,ou

, finalmente , ainda depoi s ,como outros pretendem . O rei de Leão desposouunica fi lha legitima que tinha , Urraca , havida darainha Constancia , com 0 conde borgonhês , postoque ella apenas saísse da infancia ,

e encarregou-odo governo de toda a parte Occidental da monarchia e da defensão daquellas fronteiras . A in fanta ,cuj a idade nessa epocha ( 1 0 94 ) não podia excedertreze ou quatorze

'

annos , foi entregue Raimundo ,

mas , segundo parece , debaixo da tutela e guardado presbytero Pedro , me stre ou aio da j oven princeza

(1 ) Chron . G 0 th0 r .

, ibid . D issert . Chron .,T . 4 , P . 1 ,

p . 2 9 .

(2 ) Flores , Reynas Catholicas , T . 1 , p . 2 31 e segg . Dissert . Chronol .

, T . 4 , P . 1 , p . 2 9 e 30 . Mondejar (Ori g . yAscend . del prínc . D . Ramon) pretende que o conde só

1 6 H I STÓR IA DE PORTUGA L

Além de Raimundo,outro nobre cavalleiro

francês passara Hespanha naquella epocha . Era

Henrique seu primo , de ascendencia não menosillustre que elle . Roberto chamado O idoso ,

fi lho deRoberto II e irmão de Henrique II rei de França

,

recebera investidura do ducado de Borgonha e ,

casando com Helie 0 11 Alice,filha do senhor de

Sernur,tivera della quatro filhos varões

,Hugo

,

Henrique , Roberto e Simão . Hugo,0 mai s velho

,

foi morto numa batalha sem deixar fi lhos .

segundo genito Henrique teve de Sibylla sua Inu

lber (filha de Reinaldo , senhor de Borgonha con

dado,

” e irman do conde Guilherme I,pae de Rai

mundo) quatro fi lhos Hugº., Endo

,Roberto e

Henrique . Era este ultlmo que tambem se achava

por esse tempo na Hespanha e que provave lmenteveio com Raimundo seu primo coirmão Buscavam

,porventura

,fortuna na Península

,onde no

meio de continuas guerras e conquistas se offerecia

amplo theatro para a ambição e para O desej o deadquirir gloria . Do mesmo modo que as acções deseu primo , as de Henrique , nos primeiros tempos .

em que residiu áquem dos Pirenéus , j azem sepul

tadas em profundas trevas , se é que não foi 0 principal motivo da sua vinda

,como ha quem O pre

tenda ácerca de Raimundo ,procurar um consorcio

viesse Hespanha em 1 0 89 , e os seus fundamentos não

são de desprezar . Na doação do mosteiro de Vaccariça áSé de Co imbra feita pelo conde Raymundo e sua mulherD . Urraca (Novembro de 1 0 94) entre d iversas personagensque con firmam apparece 0 presbytero Pedro mag ister

suprad icte j í lie reg is Liv . Pre to , f . 4 0 .

( 1 ) Anonymus Floriacensi s , em Duch esne, Hist . Francor .

Scriptores , T . 4 . D . Ribe iro de Macedo , Nascimento e

Genealogia do Conde D . Henrique , p . 89 . Art de Véri fi er

les Dates , T . 3 , P, 2 , p. 14 (ediç . de

L IVRO 1 1 7

illustre por intervenção da rainha Constancia suatia . Em tal caso essa vinda

' seria pouco anterior àepocha em que 0 obteve . E certo , porém , que no

princípio de 1 0 95 Henrique estava casado com

Tarasia ou Tarej a (Theresa) , fi lha bastarda de Affonso VI

,que

,além de E lvira ou Geloira

,aquelle

principe houvera de uma nobre dama chamadaXimena Nunes , ou Muníones A escaceza dememorias e documentos di vulgados sobre a his toriado nosso paiz na ultima decada do seculo XI apenasconsente uma luz frouxa e duvidósa , que mal deixadescubrir O fio que prende os successos daque

'

lla

epocha . O que parece resultar . da comparaçãoattenta dos diversos monumentos que nos restam , é

que Henrique começou a governar 0 territorio portugalense ainda , talvez , nos fins de 1 0 94 , ou principios de 1 0 95, e com certeza , pelo menos 0 districtode Braga ,

nos primeiros meses deste ultimo anno ,como conde dependen te de seu primo . Por maiscurto que supponhamos esse período de suj eição ;por mais raros que sej am os vestígios detal suj ei

ção , ella é indubitavel . Todavia , em breve a porçãodos domínios de Raimundo , desde as margens doMinho até 0 Tejo

,foi desmembrada defini tivamente

da Galliza para constituir um vasto di stricto á parteregido pelo conde Henrique . O s successos militaresoccorridos na primavera de 1 0 95 moveram ,

talvez,

Affonso VI a estabelecer esta di visão,sem a qual

era difâcultoso fazer a guerra na fronteira comenergia , estando 0 centro do governo da p rovínciaoccidental mais de cem leguas das raias mussulmanas

,muito além do rio Minho

( 1 ) D issert . Chronol .

, T . 3 , P . 1 , p . 30 , n . 9 1 , e p . 33,n . 98 e a nota I I I no fim deste volume .

(a) Nota IV no fim do volume .

VOL . II .

1 8 H I STORIA ml: PORTUGAL

Vimos como Alfonso VI dilatou as suas con

quistas para O sul de Portugal no anno de 1 0 93 ,

tomando em poucas semanas Santarem ,Lisboa e

Cintra , logares então os mai s importantes da quehoj e chamamos província da Estremadura . No anno ,porém , de 1 0 95 as cousas haviam ,

até certo ponto,

mudado . O celebre Seyr rex Cir das chronicas

christans ) general de Yu su f,tinha nos fins de

93 invadido os estados de Omar Ibn Alafttas amirde Badajoz , cuj os dominios comprehendiarn todo 0

Gharb ou occidente da Hespanha mussulmana atéa fronteira christan . Iaborah (Evora) , Chelb (Silves)e outros logares principaes haviam aberto as portasaos almoravides . Um historiador

'

arabe diz que domesmo modo Santarem e Li sboa lhes caíram nas

mãos . Quanto Santarem,0 foral dado a esta po

voação por Affonso VI em 1 0 95 não indica de _modoalgum que ella houvesse s ido perdida depois de1 0 93 e retomada de novo . Quanto , porém ,

a Lisboa,

não só a falta de um d iploma analogo,passado a

favor della,torna provavel tradição arabe , mas

tambem os successos posteriores parece confi rmarem-na . Em fevereiro de 1 0 94 Badajoz tinha-se ren

dido aos almoravides . Submettido 0 Gharb ,Seyr

dirigira as suas armas victoriosas contra 0 Cid Rui

D ias , que os arabes andaluses tinham tomado porcapitão e que cercara Valencia . Entretanto 0 condeRaimundo descera da Gallize e viera Coimbraacompanhado dos seus cabos de guerra e de uma

lnstrose companha de cavalleiros . Pouco depois deacabar no Gharb dynastia dos Beni Alafttas 0

conde residia naquella cidade , convocando , segundoparece , os homens d

'

armas e peões para prea zr ia ,

como então s e chamavam as entradas que tinham

por obj ecto , não só invadir 0 territorio inimigo , mas

tambem estabelecer-se definitivamente ahi . D e

L IVRO 1 1 9

Coimbra hoste christan marchou , provavelmentena primavera segu inte , para as immediações deLisboa

,perto da qual assentou os seus arrai áes . O s

sarracenos,unindo forças de todos os lados e

, por

ventura , ajudados por algumas tropas almoravides ,que lhes houvesse enviado Seyr , cercaram 0 condee rompendo— lhe 0 campo 0 desbarataram ,

ficandouma grande parte dos seu s soldados mortos ou captivos . Resulta deste successo que os christãos tinh amjá perdido 0 dí stricto de L isboa

,ali ás seria incom

prehensivel a vinde do conde com um exercito estaespecie de peninsula fechada entre e ampla bahí a doTejo e 0 oceano , da qual não podia fazer entradas ecorreriasnasprovínciasmussulmanas ao suldo rioEste desbarato de Raimundo concorreu talvez

em parte para que todo 0 territorio desde emergemesquerda do Minho até Santarem se desmembrasseinteiramente da Gall ize . Se não suppusermos devidoexclusivamente 0 consorcio de Henrique á influencia

da rainha Constancia , concessão de uma fi lhapropria , bem que illegitime ,

feita por Affonso VI aum simples cavalleiro , postoque i llustre

,parece

provar que elle merecera tal distincção pelos seusmeritos pessoaes e por serviços feito s na guerra ,servi ços que vagamente lh e attribue um s eu con

temporaneo Fossem,porém

,estes ou outros os

( 1 ; Nota V no fim do volume .

(2 ) el qual enquanto elr ey D .Alonso vevia nob lemen tedomó los moros , guerreando contra e l los ; por 10 qu alel d icho rey le dió com sua ( ij a en casamiento Coimbrae a la provincia de Portugal , que son fronteras de moros ,en las quales con -

el exercício batalloso muy nob lementeengrandescia su caballeria Chroni ca L

ª de Sahagun , c 2 1

em Escalona,Historia del Monasterio de S ahagun ,Appen

dice 1, p . 30 6 . Sobre a importancia desta chronica , escriptaem lat im por um monge anonymo

, que viveu na epochados successos que narra

, e da qual só resta uma an tiga

2 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL

motivos que guiaram O rei de Leão e Caste'

lla'

certo que no anno de 1 0 97 Henrique dominava todo0 territorio do Minho ao Tejo , e os estados de Raimundo tinham recuado por esta parte para as fronteiras meridionaes da moderna Galliza .

Casando sua fi lha Theresa com Henrique , Affonso VI não se limitou a entregar a este 0 governoda província portugalense , corn a qual j á frequentemente se confunde nos monumentos dessa epocha 0di stricto colimbriense e 0 de Santarem

,debaixo do

nome commum de Portugal . As propriedade s regalengas , isto é

,do patrimonio do rei e da coroa

,

passaram a ser possuídas como bens proprios ehereditarios pelos dou s consortes . Assim O cava]leiro francês , que viera buscar na Hespanha uma

fortuna mai s brilhante do que poderia esperar na

patria , Viu reali sadas as suas esperanças,porventura

além daquillo que imaginamO s principes arabes da Andalusia tinham-se

ligado contra os almoravides depois que,pelas con

quistas de Badaj oz , este s se achavam -senhores detoda Hespanha mussulmana , á excepção do amirado de Saragoça , cuj o amir Ahmed Ab

'

u Jafar sou

bera tempo buscar alliança de Yu su f . O celebreCid capitaneava , como di s semos , os andaluses colli

versão , por ter perecido O original no grande incendio

daquelle famoso mosteiro , consul te-se 0 erudito Berganza ,

An tigp edades de Espana , T . º . , p . 5.

(1 ) E a estes b ens , que nos parece se ha-de entenderal lusiva celebre passagem da chronica de AHonso VI I ,fallando de Theresa ,

ded it maritatam Enrico comiti , c i

dotavit eammagnif cê , dans portugalensem terramj ure hered itario . Evidentemente 0 conde falava dess es b ens heredi tarios na doação Sueiro Mendes (Dissert . Chrono l . ,

T . 3 , P . 1 , p . Sobre a tradição de haver s ido 0 governode Portugal dado como dote d e D . Theresa , veja — se

no ta Vl no fim do vo lume .

LIVRO I 2 1

gados . Valencia cercada por elles rendeu — se e porintervenção de Rui D ias veio , emflm ,

reconhecer0 senhorio de Aff onso VI . Seyr não estava entretanto -ocioso esquipando uma poderosa frota , suj eitara aos almoravides as ilhas Baleares , dependentesaté então dos amires de Valencia e de Denia . Avi

sado pelo wali d '

Almeria da sorte de Valencia,O

general lamtunense di rigiu para allí a-

sua armadacom muitas tropas de desembarque e cercou-a pormar e terra . O Cid era j á fallecido , e os christãos

alli ados dos arabes andalnses , depois de um di latado cerco

, em que a perda de ambas as partesparece ter sido avultada

,abandonaram '

finalmenteValencia aos almoravides A tomada destaimportante cidade acabou com as resistencias dosmussulmanos hespanhoes ao domínio de Yusuf , eeste

,voltando Hespanha em 1 1 0 3 , só tracton

'

de

associar ao governo seu fi lho Aly ,sem intentar

nenhuma campanha importante contra os christãos ,contentando — se c0 1n ordenar se deixas se a cargodos naturaes guarda das fronteiras e com tomardiversas providencias para defensão e bom r egimento do territorio da Península suj eito ao seuimperioDurante os eunos em que estes successos occor

reram , guerra nas fronteiras de Portugal ou cessou ou reduz iu-se apenas correrias e devastaçõesmutuas de tão pouca monta que nenhuns vestigios.

deixaram nos monumentos daquella epocha . Hen

rique dedi cou-se , acaso , nos primeiros tempos aprover às mai s urgentes necessidades de uma pro

vincia assolada por tão continuas guerras ; mas a

( 1 ) Cond e , P . 3 , c . 2 2 e 2 3 . Annales Toled . 1 na Esp .

sªgu , T . ºf . p . 386. Yahya e Al-kodai e1n Casiri , T . 2,

p . 1 58 a 1 74 .

2 2 H ISTOR IA DE PORTUGAL

sua residencia nestas partes não parece ter sidodilatada . Os grandes senhores

,embora encarre

gados de importante s governos , quando as 0ccu

pações militares não tornavam ahi necessaria — a sua

presença,frequentavam corte do rei , e os proprios

bispos abandonavam por ella as suas dioceses . O

conde de Portugal , tendo feito no inverno de 1 0 97a 1 0 98 uma viagem á Gallii a para Vi sitar 0 celebretemplo de Sanctiago ,

achava-se em 1 1 0 0 e ainda em

1 1 0 1 na corte de Affonso VI . Postoque historiadas emprezas do rei de Leão contra os sarracenos edas represalias destes contra elle nos dou s ultimosannos do século XI sej a assás escura , todavia consta

que em 1 0 97 elle entrou em C onsuegra e que ossarracenos

,fazendo uma entrada para 0 lado de

Toledo,

recuperaram na occasião em que regressavam . D 'aqui se Vê que O rei christão aproveitavaausencia de Seyr

,entretido com a conquista das

Baleares,para assolar 0 territorio inimigo

,e que

os mussulmanos não cessavam de fazer entradaspelas fronteiras dos christãos . Os chefes sarracenosAly Ibnu-l—haj e Ibn Sakun tinham avançado com

um corpo de tropas para Castella e,segundo todas

as probabilidades,0 conde foi enviado repelli-los .

Atravessando , pois , as serras chamadas Montes de

Toledo , Henrique encontrou os inimigos nas immediações de Ciudad-real , perto da qual está assentadapovoação de Malagon . Travàram pelej a . Foi esta ,como se colhe das palavras de um historiadorarabe , disputada e sanguinolenta . Pelej aram — se

ahi d iz elle na sua linguagem emphatica as

batalhas do extermínio Mas por fim 0 conde tevede abandonar 0 campo aos seu s adversarios

(1 ) Sobre residenc ia do cond e junc to de A ff onso VI ,

de 1 1 0 0 a 1 1 0 1 , D issert . Chronol .

, T . 3 , P . 1 , p . 39 , nº1 1 5.

2 4 H ISTORIA DE PORTUGAL

ultramar . Seis anuos depois da primeira invasão,

em 1 1 0 1,uma segunda cruzada partiu para 0

oriente,cuj os successos desastrados não impediram

que novos peregrinos se fossem precipitar naquellevasto sorvedouro de quantos homens de fé Vivatinha a Europa e tambem de quantas fezes de cor

rupção ,cubiça e ferocidade havia nelle . Para as

almas crentes ou devoradas de remorsos Syriaera a piscina da rehabilitação moral : para os ambiciosos e devassos fonte inexgotavel de fortuna e dedeleites . As paixões boas e más ligavam-se numpensamento unico 0 demandar 0 oriente ; porquetanto a Vida como a morte offereciam ao que par tiauma perspectiva de felicidade .

O s espíritos receberam na Hespanha 0 impulso

geral da Europa ; mas as circumstancias peculiaresdeste pa iz oppunham

— se que este impulso produzisse os mesmos resultados . Envolvidos na luctacom os sarracenos , contra os quaes mal bastavamtodas as forças christans da Península , os hes

panhoes não poderam associar- se nenhuma dasduas primeiras cruzadas , salvo um ou outro cavalleiro

,de cuj o s nomes ás vezes se encontram vesti

gios nas memorias daquellas longínquas expe

dições . Todavia , depois da segunda cruzada 0

enthusiasmo pela peregrinação da terra sanctaadquiriu maior força . O exemplo dos bispos

,

alguns dos quaes emprehenderam por aquelle

tempo,além de muitos outros membros do clero ,

contribuira em grande parte para excitar esseaugmento de mal entendida piedade . Roma , queentão era , por assim nos exprimirmos

,0 fó co da

intelligencia humana nomeio de nações ainda semibarbaras e que vigiava pela segurança da christandade , mostrou-se illustrada e prudente , como e lla 0

sabia ser quando 0 proprio interesse não deslum

L IVRO 1 2 5

brava, prohibindo essas Viagens aos hespanhoes .

O

papa Paschoal I I por duas vezes ordenou expressemente que minguem destas partes as intentasse

,e

áquelles que seguiam caminho por terra para Jerusalem 0 11 iam embarcar na Italia constrangia — os

retrocederem ,i1np0 nd0 nas suas bullas silencio aos

que na patria ousassem calumniá-los ou infamá-los

por não haverem cumprido 0 começado propositoO conde Henrique não s e esquivou á influencia

da grande idea que agitava Europa . Como jádi ssemos , depois da mort e dó Cid e da perda deValencia guerra com os sarracenos tornou — se

menos violenta . Yusuf , voltando á Mauritaniadepois da sua ultima vinda á Peninsula ,

poucosobreviveu e seu âlho Abu- l— hassan Aly ,

entretido em firmar 0 proprio domínio na Africa,

deixou Hespanha num estado,senão de repouso ,

porque algumas memorias na de acontecimentosmilitares por estes tempos , ao menos comparativamente paci fica . Por todo O período d ecorridode 1 1 0 2 até 1 1 0 6 foi 0 maior fervor de peregrinaçõesá Palestina , e 0 exemplo do proprio primaz daigrej a hespanhola ,

0 arcebispo de Toledo Bernardo,

dirigindo— s e Jerusalem na primavera de 1 1 0 4 ,prova quão vulgar se tornara então esta romagem .

Tinha-o precedido 0 conde de Portugal ; porque asua partida para 0 oriente nos primeiros mesesde 1 1 0 3 é hoj e irrefragavel. Nessa viagem prova

(1 ) Acerca destas primeiras cruzadas consul te— se Gibbon,

Dec l ine an d Fal l of the Rom . Emp ire , c . 58, 59 , 60 .

Hal lam , Europe in Middle Ages , c . 1 , P . I . Wi lken ,

Gesch ich te der Kreuzzuge , T . 1 (Leipzig — Michaud ,

Histoire des Croisades , T . 1 e 2 .

'A bu lla de Paschoal I Ireferindo-se a outra an terior

,vem na Hist . Compos

tell . , L . 1 , c . 39 .

H I STORIA DE PORTUGAL

nte 0 acompanhou Mauricio,b ispo de Co im

lepois tão ce lebre pelas suas pretensões áapal e que por esta epocha consta ter partidoSyria . Presume

,e pare ce — nos que com razão

,

us nos sos ma is jud iciosos h i storiadore s que 0

aproveitaria para a sua passagem a armadaesa que em 1 1 0 4 ajudou B conquista»lemaida ( 1 )loções do conde no

todas as

L IVRO I 2 7

Até este tempo 0 genio e 0 caracter do e dePortugal ainda se não revelaram aos olho s queestudam os successos daquella epocha é vultode guerreiro que s e confunde com os autosoutros que então sabiam elevar-se pela 5

dade e valor no meio de uma ex istenciaunos combates . Os dote s que 0 distinguemão

que . nelle deviam imprimir educaç

aquellas eras semi-barbaras e 0 habitoé,O esforço e a perícia militar e

8 os podemos deduzir da alta situatado . que dessas poucas acçque delle nos cons ervaannos , porém . da sua vidaracter do conde tendem a de

e O pensamento dento aliás muipoderosos dade de tal arte

,

ue as de bom sol

ndo , casado com

Affonso VI p

2 6 H I STOR IA DE PORTUGAL

velmente 0 acompanhou Mauricio ,b ispo de Coim

bra , depois tão celebre pelas suas pretensões átiara papal e que por esta epocha consta ter partidopara Syria . Presume

,e parece-nos que com razão

,

um dos nossos mais jud iciosos historiadores que 0

conde aproveitaria para a sua passagem a armada

genovesa que em 1 1 0 4 ajudou Balduino á conquistade PtolemaidaAs acções do conde no oriente encobre — as escuri

dade completa ,e todas as conj ecturas este respeito

seriam infundadas . Unicamente ha certeza de queelle tinha voltado a Portugal em 1 1 0 5 e vivia na

corte de A ffonso VI em 1 1 0 6 . Nos anuos seguinte s ,até a morte deste principe , Henrique apparece residindo , ora juncto delle , ora em Co imbra , onde se

occupava em administrar 0 paiz e em restaurar ,

segundo O rei lhe ordenava . as povoações ermas oudestruídas pelas invasões successivas de christãos

e mussulmanos

(1 ) Annales To led . 1 na Esp . Sagr .

, T . 2 3 , p . 386 . Mem .

da Acad .

,T . 4 , P . 2 , p . 1 47 . Duchesne , H ist . Cardinal .

Francor . c it . por Baluz,V ita Mauriti i Burd in i (Miscell. ,

T . 3 , p . Mon . Lusi t .

, L . 8, c . 2 2 . Art de véri f .

les dates , T . 2 , p . 2 0 e 2 1 (ediç . de D izemos que a

partida do conde Henrique para 0 ori en te fora nos pri

meiros meses de 1 1 0 3 , porque só assim p ó de concordar Odocumen to do Liv . Preto f . 38 com 0 do Bezerro d '

Astorga

f . 79 (c itado por Sandoval , C in co Reyes , f . 94 , col peloqual se vê residir a inda 0 conde na corte do sogro emj ane iro desse anno . Na escriptura 1 38 do Appendice II Ida H is toria de Sahagun ( fevere iro de 1 1 0 4 ) em que flgura 0

conde como con lirmante com muitos b i spo s e magnates ,sendo uma doação d e part icular, só pôde entender-se que 0

seu redactor quiz ind icar al l i ex istenc ia daquelles prelados e senhores e 0 seu governo nos respectivos districtose dioceses . Rej e itada esta conc iliação ,

e necessario suppô

la fal sa .

(2 ) D issert . Chronol . , T . 3 , P . 1, p . 42 ,

n .

º1 26 e segg. No

L IVRO 1 2 7

Até este tempo 0 genio e 0 caracter do conde dePortugal ainda se não revelaram aos olhos dos queestudam os successos daquella epocha : é um vultode guerreiro que se confunde com os de tantosoutros que então sabiam elevar-se pela sua activi

dade e valor no meio de uma existencia de continuos combates . Os dotes que 0 distinguem são os

que . nelle deviam imprimir a educação propriadaquellas eras semi-barbaras e 0 habito da guerra ,

isto é,O es forço e a perícia militar e ainda estes

mais os podemos deduzir da alta situação a que 0

vemos remontado . que dessas poucas acções de certaimportancia que delle nos conserva a historia . Nos

ultimos seis annos ,porém . da sua Vida os linea

mentos do caracter do conde tendem desenhar— se

um pouco melhor,e O pensamento de fugir á suj eição

real,pensamento aliás mui commum entre os

senhores mai s poderosos da Península,é prose

guido pelo conde de tal arte , que descobre nelle ,ainda melhor que as de bom soldado , as qualidadesde político .

O conde Raimundo , casado com uma fi lha primo

genita e legítima de Affonso VI , possuidor de maisimportantes domíni os que outro qualquer conde damonarchia leonesa , muitos dos quaes lhe eramsuj eitos

,considerava necessariamente a coroa como

herança que a morte do sogro lhe devia trazer eque

,ate

,1he f0 ra pr0 1nettida ( 1 ) . O s grandes pen

savam por certo do mesmo modo ; ao menos os actospracticados por elles depois do fallecimento de Raimundo provam que a crença recebida , e com razão ,

foral de Tentugal de 1 1 08 d iz 0 conde g ne 0 dá j ussu reg is

domniAlf ons i , qui j uss it eam nobis hedíj ícare ci cons truere :

Liv . Preto,f . 2 1 3 v .

(1 ) Chron . Compos tell. na Esp . Sagr . , T . 2 0 , p . 61 1 .

2 8 H I STOR IA DE PORTUGA L

era que , fosse quem fosse O marido de D . Urraca,

esse teria de ser O verdade iro rei de Leão e Castella .

Uma circumstancia,porém , viera turbar ultima

mente as ambiciosas esperanças do conde de Galliza . Affonso houvera de Zaida , fi lha de Ibn Abbadrei de Sevilha , qual uns pretendem considerarcomo sua concubina

,outros como sua mulher legi

tima,um filho varão , 0 infante Sancho . O s senti

mentos da natureza e as considerações da politicapersuadem 0 que , segundo O testemunho de Rodrigode Toledo

,0 proprio rei confessara depois da morte

do infante,isto é , que 0 tinha na conta de seu unico

herdeiro Affonso começara a mani festar estasintenções ainda na meninice de Sancho , fazendo — 0

confi rmar os diplomas junctalnente com D . Urracae dando lhe desde logo 0 principad0 deToledoPor esse motivo se tornam provavei s as desintelli

gencias de Raimundo com 0 sogro,de que apparece

tradição nas chronicas desses temposDa solidão de um mosteiro situado na Borgonha

um velho monge influia então nos negocios mais

graves da Europa . Cluni era esse mosteiro ; Hugoesse monge . Durante sessenta annos Hugo

'

regera

aquelle celebre cenobio , cuj os chefes chegaram na

sua soberba considerarem— se como papas d0monachismo

,intitulando se abbades dos abbades .

Foi Hugo quem lançou os fundamentos deste podere grandeza . Elle era 0 homem em cuj o seio Gre

(1 ) ! nic a s haeres meus Rod .

,To let . , L . 6, c . 33. Qui

(scil . Adefonsus) quoniam viri lem non habui t sobolem ,

interf ecto i l lo (Sancio) de quo d iximus , etc . Anonym . Flo

riac . em Duchesne , T . 4 , p . 96 .

(2 ) Sandoval , Cinco Reyes , f . 94 e 56 .

(3) Flores , Reynas Cathol.

,T . 1

, p . 237 . Roder . To let .,

L . 6, c . 34 .

30 H I STOR IA DE PORTUGAL

que dictara as condições desse pacto . Eram estas

que os dou s condes lealmente respeitariam e defenderiam vida e a liberdade um do outro ; que Hen

rique,depois da morte do sogro , sustentaria fiel

mente O domínio de Ra imundo como seu unicosenhor sobre todos os e stados do mesmo rei contra

quem quer que fosse , correndo prompto ajudá- loadquiri— los ; que , no caso de lhe caírem primeira

mente nas mão s os thesouros de Toledo ,fi caria com

um terço e ceder-lhe-hia dou s que Raimundo pelasua parte , depois de fallecer O rei , daria Hen

rique cidade de Toledo com 0 seu districto , sobcondição que por e sse territorio que assim lhe concedia fi casse suj eito elle Raimundo e 0 tivessecomo dependente delle , e que depois d e 0 receberlhe entregasse todas as terras de Leão e de Castella ; que , se elguem lhes quizesse resistir ou fazerlhes injuria , lhe fi zessem ambos guerra ou come

çasse logo qualquer delles , até que 0 territorio fosseentregue a um ou a outro , e Raimundo dess eHenrique 0 que lhe promettera ; que , se Raimundoobtivesse primeiramente 0 thesouro de Toledo

,

guardaria para si duas partes,dando a outra

Henrique . Tal era substancia do tractado . Parece,

porém , que 0 conde de Portugal receava lhes fossedemasiado diffi cultoso assenhorearem-se da novacapitalda monarchia ou que esta tornasse cair empoder dos sarracenos ; porque se accrescentou aopacto um como artigo addicional

,em que Raimundo

affiançava nas mãos do enviado de Cluni que,no

caso de não poder dar Toledo seu primo,lhe daria

Galliza , não faltando elle em ajudá-lo apoderar-se de Leão e Castella , effeituando-se n ovacondição logo que Raimundo estivesse pacificosenhor de tudo

,e entregando — lhe Henrique as terras

de Leão e Castella que estivessem em seu poder,

LIVRO 1 3 1

tanto que fosse mettido de posse da GallizeAinda que a letra deste pacto sobre successão

da coroa indique bem claramente a menor importeueia que 0 conde de Portugal se attribuia em

relação ao de Galliza ,é evidente que , se tal tractado

chegasse a execução , a perspectiva do novo estado

que Henrique intentava fundar era mai s lisongeirano futuro que a dos que Raimundo ambicionavapara si . q uanto Leão e Castella ficavam limitados ao oriente .

pelo Aragão ou pelos territoriosmussulmanos que esta monarchia devorava poucoa pouco , 0 conde de Portugal dominaria ao sul quasitoda a fronteira dos sarracenos e achar— se-hia comocollocado na vanguarda da reacção chri stan . Era

sem duvida esta uma situação mais arriscada ; mas

a conquista do meio — dia da Hespanha facilitava— se

lhe grandemente ; porque , senhor dos districtos

contíguos á margem direita do Tejo,desde quasi

foz do rio até quas i sua origem ,e accrescentados

0 5“

pr0 prios recursos com es se novo senhorio quedevia receber de Raimundo e com uma porção dosthesouros de A ffonso VI

,poderia dilatar as invasões

pelo Gharb e pela Andalusia , que exclusivàmente

fi cariam entestando com os seus antigo s e novosdominios .

(1 ) c e lebre pac to successorio entre os condes de Gal

liza e Portugal não tem data . O cardeal Saraiva (S . Luiz,

Mem .

,

do C . D . Henrique , nas Mem . da Acad ., T . 1 2 , p . 49)

mostrou com bons fundamentos que não podia collocar-se

senão entre 1 0 96 e 1 1 0 7 . Nenhuns outros motivos provaveisda feitura de seme lhante pac to apparecem na h istoriadesse período senão as intenç ões visíve is de A ffonso VIde legar coroa ao fllho de Zaida . Estas inten ç ões tor

nam— se patentes em 1 1 06 (Sandoval , Cinco Reys , f . 94 e

e por i s so lhe suppomos esta data . O documento foipub l icado por A chery (Spicilegium , T . 3 , p . 4 18)

'

e entrenó s por J . P . Ribeiro , D issert . Chronol . , T . 3 . P . 1

, p . 45 .

32 H I STOR IA DE PORTUGAL

Ou O segredo sobre O pacto dos dou s condes nãofoi perfeitamente guardado , ou por algum actoexterno elles deram indícios dos seus desígniospouco ajustados pelos de Affonso VI . A accusação

de se haver mostrado algum tanto rebelde ao sogropesa sobre a memoria de Henrique , e Raimundodecaiu por esse tempo da graça do rei , ainda que

'

naoccasião da sua morte Affonso estava , segundoparece , congraçado com elle . A morte , com effeito ,

salteando 0 conde de Galliza no outono de 1 1 0 7 ,

inutilisou alliança dos dous primos e destruiu asesperanças que Henrique concebera de obter Odomínio de Toledo Não abandonóu ,

todavia , 0conde as suas idéas de engrandecimento e independenc ia ; os successos posteriores n0 — 10 revelam ; mas

nos dous annos que decorreram entre 0 fallecimento

de Raimundo e 0 de Aífonso VI ( 1 1 0 7 a 1 1 0 9) elleresidiu quasi sempre em Portugal na obediencia dosogro

,empenhado , talvez , nas correrias contra os

sarracenos que era costume fazer todas as primaveras

, que e stavam obrigados os homens d'

ermasou cavalle iros vilãos e que s e conheciam pela denominação de fossadoA enfermidade que conduziu Affonso VI á sepul

tura foi longa e aggravada nos u ltimos meses pela

(1 ) Comes coep i t aliquan tulum rebel lare non

tamen subtraxit homin ium toto tempore vitae suae Eu

cusque etenim cum gente sua mandatum ad ex erci tumet ad curiam veniebat , sed b enignitas imõ negl igentia Aldephonsi tanquam consanguineo et affini improvidedeferebat : Rod . Tolet . , L . 7 , c . 5. Comes Raimundus non

fuerat in regis oculis gratiosus . Id em , L . 8, c . 34 . Com

pare-se Hist . Compostell.

,L . 1

, c . 2 5.

(2 ) D issert . Chronol .,T . 3

, P . 1 , p . 45 e p . 49 e em es

pecial carta de A ffonso VI sobre a Vi l la Volpelíares , queJ . P . Ribeiro parece attribuir ao anno de 1 1 09 .

LIVRO 1 33

desgraçada sorte de seu filho Henrique haviaconceb ido , como O pacto feito com Raimundo e ossuccessos posteriores 0 provam , atrevida idea defi car senhor por morte do monarcha de uma partedos seus estados . Fallecido 0 conde de GalJi za ,

ambição delle , longe de enfraquecer ,punha , talvez ,

ainda,mais longe a mira . Poucos dias antes de ex

pirar 0 monarcha ,Henrique foi persegui — lo no seu

leito de morte . Ignoram-se até onde chegavam as

pretensões do conde ; mas sabe -se que elle saíra deToledo furioso contra 0 sogro moribundo Antesde morrer

,Affonso declarou unica herdeira da

coroa sua filha Urraca,e tal foi por certo a causa

da colera de Henrique e a origem do audaz proj ecto

que desde então formou de se apossar , não de uma

parte , mas de toda monarchia de Leão e Castella .

Apenas , porém ,constou que 0 principe , terror

dos sarracenos,não existia

,estes cobraram novos

brios . Os de Cintra, que reconheciam 0 senhorio do

conde , quebraram immedi atamente 0 jugo . Semelh

'

ante successo suscita ideia de que os mussul

manos do districto ao sul de Santarem , ultimapovoação que provavelmente fi cou por este lado em

poder do rei de Leão e Castella desde 0 desbaratode Raimundo em 1 065

,inquietados pelas algaras ou

entradas do conde , e por outro lado não tendo re

conhecido O domínio dos almoravides , como adiante

( 1 ) Veja-se a Introducção ,D ivi s . I II .

(2 ) dias an tes que c lrey íí ciese tin de vivir , nosê porque sana 0 discordia se parti ó ayrado del ; e por

que aques to era an si no e stuvo presente quando clreyqueria morir

, e disponía de la succession del reyno esteconde non era presente ; por 10 qual

, por zelo del reynomovido , traspasó los montes Perineos . p 0 r hab er ayudade los fran ceses , con los quales guarnec ido e escoltado ,

digo es forzado , por fuerza tuviesse el reyno de Espaúa

Anonymo de Sahagun , c . 2 1 .

VOL . 1 1 .

34 H I STOR IA DE PORTUGAL

veremos,se lhe fariam tributarios para viverem

em paz . Isto não passa , todavia , de uma conj ecturadeduzida principalmente dos successos posterioresporque os monumentos relativos a estes dous anuosdo governo de Henrique só nos provam que residiuuma ou outra vez em Portugal . Rebellada Cintra

,

Henrique marchou contra esse castello, que ,

na

quella epocha parece tinha uma importancia poucoin ferior á de Lisboa

,e de novo 0 reduziu á sua

obedienciaA morte de Affonso VI (junho de 1 1 0 9) pelas cir

cumstancias de que Vinha acompanhada , t0 rn0 u— seum successo gravíssimo para Hespanha christane foi , com razão

,sentida como origem de largos

males . O sceptro leonês , que deveria eaír em mãoscapazes de assegurarem as conqu istas feitas por

aquelle celebre principe , ficava pertencendo á viuvado conde Raimundo . Da vasta herança que legavasua fi lha , O rei fallecido separara de certo modo

Galliza , declarando em sua Vida que, no case de

D . Urraca passar segundas nupcias , Affonso Raimundes

,fi lho della e seu neto , ficaria reinando nesta

provincia . Contava 0 infante pouco mais de tresannos quando Affonso Vl expirou ,

e por isso á Galliza

,como ao resto da monarchia , faltava um suc

cessor capaz de defender a integridade do territoriocontra os commettimentos dos sarracenos e de conter a ousadia dos senhores poderosos

,cuj as antigas

ideas de ambição ,ou pelo menos de independen

cia,

fraqueza do thr0 n0 forçosamente havia dedespertar .

( 1 ) Men se Jul i o capta fui t Sintria comite D .

Audientes en im sarraceni mortem regis D . Al fonsi coepe

run t reb el lare Chron . Goth . ad aer . 1 1 47 . A 29 de

julho j á 0 conde se achava em Viseu , Liv . Preto,f . 28 .

L IVRO 1 35

Affonso I rei d'

Aragão estava nesse tempo na florda idad e e pelo seu genio guerreiro adquirira 0

appellido de lidador batallador) . A nobreza cas

telhana ,considerando . a necessidade de confi ar

defensão da patr ia commum um príncipe cuj onome e cuj a espada podessem enfrear os sarrace

nos , constrangeu rainha que 0 recebesse pormarido

,e as sim O rei aragonês obteve a coroa de

Leão e Castella Uma classe,porém

, poderosis

sima,0 clero

,recebeu mal este consorcio

,e boa

parte dos prelados hespanhoes declararam— se abertamente contra elle . Era a causa desse procedimento0 parentesco dos dou s esposos em grau prohi bido ,procedimento approvado pelo papa , que decretou 0

divorcio . Em consequencia di sto Affonso , que j á seachava em Castella com tropas de Aragão e cuj o careeter Violento mal poderia soffrer que 0 clero pretendesse despoj á— lo de uma coroa que tão facilmentealcançara

,começou a perseguir os prelados que

lhe eram adversos . O arcebispo de Toledo , que promulgara bulla do d ivorcio

,fi cou por quasi dous

annos expulso da sua sé . Igual sorte coube aos bispos de Leão e de Burgos

,e os de Palencia , Osma e

Orense'

foram postos ferros . Este s factos deviamali enar— lhe os animos dos leoneses e castelhanos ,quando para isso não bastasse 0 ser el le até certoponto estrangeiro . Desconfiado

,portanto , da leal

dade dos ricos-homen s e alcaides de Castella , 0

novo rei de Leão começou substitui — los nas tenen

(1 ) Rodrigo de To ledo diz ter s ido 0 casamento do rei

de Aragão com D . Urraca celebrado ainda em v ida d e

A ffonso V I .— Apesar do p eso que tem O testemunho deste

h istoriador , op in ião que seguimos funda— se na da H i storia Compostellana , L . I , c . 64 , g 1 , c om quem concordamLucas de Tuy ,

Chronica de Fleury e 0 Anonymo de Sahagun (c .

36 H ISTOR IA DE PORTUGAL

cias dos logares importantes por aragoneses , 0 queforçosamente contribuía para augmentar 0 desgostoe preparar a guerra civilEntregue ao conde Pedro Froylaz de Trava

,

fidalgo poderoso de Galliza ,0 in fante Affonso Rai

mundes Vivia nesta provincia esquecido no meiodos graves negocios que agitavam nação . Logo

,

porém, que ahi constou 0 casamento de sua mãe 0

conde de Trava tracton de realiser às ultimas disposições de Affonso VI ácerca do neto e com essefundamento fez alevantar Galliza receosa do dominio aragonês . Fora celebrado 0 consorcio de D . U r

raca durante 0 outono de 1 1 0 9 , e no princípio doestio do anno seguinte a revolução tinha tornado talincremento que O rei de Aragão resolveu invadi raquella provincia . O primeiro castello que tomoufoi 0 de Monteroso . En trado este

,um cavalleiro

i llustre chamado Pedro que ahí se achava lançou-s eaos pés de D . Urraca pedindo a vida : Conhecia— o

ella e quiz salvá — lo ; mas 0 feroz Affonso matou-ocom um venabulo naquelle mesmo logar . Esteexemplo de crueldade encheu de indignação os nobres leoneses e ainda mais a rainha

,que

,obrigada

ao novo consorcio,se via em poder de um d

'

espota .

Desde este momento ella tomou a resolução dedivorciar— s e confiada na indignação dos nobres , nareprovação dos prelados ao matrimonio que con

trahira e na resistencia da Galliza ao domínio ara

gonês Não di ssimulando 0 seu descontenta

( 1 ) Hi s t . Compostel., L . 1 , c . 64 , 55 2 e 3 , c . 79 , g 5.

Aguirre , Conci l. Hisp . , T . 5, p . 2 6 .

(2 ) Anonymo de Sahagun , c . 1 7 . His t . Compostel. , L . 1 ,

c . 64 . Fala-se neste ultimo logar de muitos nobres e

cavalleiro s mortos em Monteroso . A narração que vamo sfazendo parece — nos un ica possíve l para conc i l iar H istoria Compostellana com 0 Anonymo de Sahagun .

38 H I STORIA DE PORTUGAL

que decorreram dos fins de agosto de 1 1 1 0 aos finsde abri l de 1 1 1 1 em que nenhuma memoria combecida do conde Henrique existe em Portugal , antesparece regia O condado D . There sa na ausencia domarido Chegando aos estados de A ffonso I , Hen

rique achou ahi O rei aragonês . Temendo que estepríncipe

, que se julgava com direito á coroa leonesa

,sabendo os seus intentos , lhe atalhasse os

passos , procurou e alcançou alliar— se com elle . Foi

a condição da liga marcharem as suas forças contraD . Urraca

,procurando unidos conquistar as terras

de Leão e Castella e reparti-las depois igualmenteentre ambos . Depoi s deste pacto vemos , todavia ,Henrique voltar para Portugal , onde se demoroudurante uma parte do verão de 1 1 1 1

Para se conhecer a causa provavel desta Vinda eda volta subsequente do conde unir— se ao rei deAragão é necessario que atemos O fi o dos successos acontecidos durante a sua breve residencia emFrança e nas províncias orientaes da Hespanha . O

conde Gomes Gonçalves era um dos mais i llustressenhores daquelle tempo . Se acreditarmos 0 chro

nista Rodrigo de Toledo , ainda em Vida de Affonso VI elle pretendera , favorecido por uma parteda nobreza

,mão de D . Urraca . O velho monar

(1 ) D issert . Chronol . , T . 3 , P . 1 , p . 55 e 56. O documenton º

1 60 (ib id . ) que J . P . Rib eiro dá por duvidoso por ser

passado só em nome de D . Theresa ,expl ica— se assim

naturalmente e vem corroborar narrativa do Anonymo

de Sahagun .

(2 ) Anonymo de Sahagun , c . 2 1 Pe la narração destachronica parece ter come çado a guerra apenas fei ta a

l i ga de A ffonso I e do conde ; todavia os documentos dePortugal provam residenc ia do ultimo n este paiz emmaio e junho. A batalha de Camp o d

'

Espina entre os

dous alliados e 0 conde Gomes fo i dada em outubrodesse anno .

LIVRO 1 39

cha rej eitar'

a c0 1n indignação proposta , e os parciaes do conde viram-se obrigados abandoná-loneste intento . Suscitada pelos prelados questão dodi vorcio , elle sentiu renascer as suas amorte cidasesperanças . Ou fosse que entre Gomes Gonçalves eD . Urraca existisse atl

'

eição secreta ou que elle'

soubesse então accende-la no coração da rainha

, que

os escriptores contemporaneos nos pintam comopouco severa em costumes , O que parece certo é

que entre Affonso I e sua mulher rebentaram gra

ves di ssensões . Depois de espancar bruta lmente,

O rei de Aragão conduziu — a Castellar,onde a con

servon como presa , e resolveu-se acceitar 0 di vorcio . Temendo as consequencias desta separação ,tanto mais que Affonso tinha nas mãos de capitãesseus as principaes forta lezas de Castella , os nobres

que seguiam a corte buscaram e obtiveram congra

çar os dons esposos e atfastar por algum tempoprocella Mas O resentimento contra O maridohavia despertado 0 amor pelo filho no coração deD . Urraca retida em Castellar , e ella tinha enviadomensageiros incumbidos de recordar ao s nobres deGalliza 0 que Alfonso VI lhes fiz era jurar ácerca deseu neto , convidandoe s proclamarem-no rei nos

estados que O avô lhe legara no caso de sua mãe

passar segundas nupcias . Recebida esta mensagem

, os fidalgos gallegos encaminharam — s e Leãopara cumprir os desej os da rainha , quando souberam que ella se congraçara com O marido Asituação dos parciaes de Affonso Raimundes tornava — se assás melindrosa com este inopinado successo . Unidos de novo D . Urraca e A lf onso I , elles

( 1 ) Roder . Tole t . , De Reb . B isp . , L .

6 , c . 34 , e L . 7 , c . 1

e 2 H ist . Compost .

, L . 1,c . 64 , g2 .

(2 ) Hi st . Compost .

,L . 1

,c . 48.

40 H I STOR IA DE PORTUGAL

temiam tornarem — se unico alvo da vingança do im

petuoso aragonês , muito mai s que este não deviater esquecido 0 desar da sua primeira tentativacontra Gallize .

Na falta absoluta que se dá de notas chronologí

cas nas chronicas contemporaneas , O historiadormoderno que desej a acertar com a verdade vê-s emui ta s Vezes perplexo para assignalar ordem eligação dos acontecimentos . Quando Hespanhativer uma historia escripta com sinceridade e consciencia

,O período do governo de D . Urraca será um

daquelles em que 0 di scernimento do historiadorterá sido posto a mais dura prova Ligados

, po

rem , os acontecimentos que nos cumpre mencionaraos do resto da Hespanha christan , cabe-nos fazeruma parte desse trabalho , sem que nos sej a poss ivel examinar os archivos da nação Viz inha

,e somos

constrangidos deduz ir a nossa narrativa dos mo

numentos impressos . Procedendo por conj ecturas ,podemos não acertar ; mas ao menos no que eserevermos procuraremos harmoniser os documentosportugueses com as narrações das chronicas que

desse tempo nos restam .

Como já advertimos,

ida do conde HenriqueFrança e a sua volta ao Aragão não se podem collocar noutro período que não sej a 0 decorrido deagosto de 1 1 1 0 a maio de 1 1 1 1 . Foi por este tempo

que as dissensões de A ffonso I e de sua mulher che

garam ao ultimo auge e vieram declarada inimizade . O pacto do príncipe aragonês com 0 conde de

( 1 ) Um escriptor moderno (Romey) mui gabado pe losque não cons ideram as cou sas Senão pela superfície ,

esquivou perfei tamente as di l'

íiculdades que o fl'

erec e 0

tempestuoso re inado de D . Urraca . Limi tou— se escrevera h istoria do s estados mussulmanos nes se período e

esqueceu— se comple tamente da He

'

spanha christan .

ILIVRO 1 4 1

Portugal devia ser feito por essa occasião mas em

quanto os dons pensavam em dividir entre si 0 imperio de Affonso VI , D . Urraca buscava alliar -se

com os fidalgos de Gallíza,approvando os desígnios

delles ácerca da elevação ao thr0 n0 do in fanteAff onso Raimundes . Reconciliada

,porém

, rainhacom O marido por intervenção dos barões castelhanos

,a situação dos personagens mai s importantes

deste grande drama mudava inteiramente . Os interesses do rei de Aragão tornavam vincular-se aos

de D Urraca e, pelo contrario , os do conde liga

vam — s e naturalmente á cau sa do infante seu so

brinho e dos barões de Galliza . Estes,sabedores da

inopinada reconciliação e conhecendo,talvez

, que

ella era contraria aos intentos de Henrique , dirigiram se a este para que os aconselhasse sobre O modode saírem do passo dif ficultoso em que se achavam ,

victimas do caracter mudável de D . Urraca . Nãodevi a ser menor 0 despeito do conde que 0 dos ba

rõeé de Galli za . Aproveitou,pois , 0 ensej o que s e

lhe otferecia e excitou fortemente 0 conde PedroFroy laz que proseguisse na revolução favor doinfante , porventura com promessas de soccorro . Defeito , continuando no encetado empenho

,Pedro

Froylaz ,ao “voltar para Gallize com os outros fidal

gos,prendeu juncto de Castro Keriz (perto de Bur

gos ) alguns daquelles que , esquecidos das obriga

ções contrahidas pela promessa feita Aff onso VI ,não só se haviam bandeado com O príncipe aragonês ,

.

1nas até de accordo corn elle machinavam

morte do conde de Trava e do seu real pup i llo

( 1 ) Con sulem d i ligenti cura con suluerunt :

consi lio fortiter exci tatus consul Petrus quosdarnex i l li s qui jusjurandurn

'

íi lio comi ti scepit : Hist . Compost .

, L . 1 , c . 48. Ex istimans regno se

4 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

proced imento , porém ,de Pedro Froylaz fez reben

tar uma guerra civil na Galliza . Os fidalgos partidarios de Affonso d

'

Aragão trabalharam por vin

gar-se . Alcançando aprisionar condessa de Trava

em Sancta Maria de Castrello , aonde se acolheracom 0 infante , souberam tambem prender artifi ciosemente 0 depois tão celebre bi spo de Compostella ,

que,havendo até ahi seguido uma política vacillante

,

se declarara final protector de Affonso Raimundes ; mas 0 activo

'

prelado achou meio de obter alib erdade e de paci fi car temporariamente Galliza ,

attrahindo de novo á parcialidade do infante os

principaes fi dalgos que se lhe tornavam mostraradversos .

Henrique havia-se retirado neste meio tempo paraPortugal , visto que a paz entre os dous consortesannullava , ao menos temporariamente , as esperan

gas que havia fundado na concordia que , voltandode França , fizera com O rei de Aragão . Se elle tinhacalculado com a guerra civil na Galliza para divertir attenção da rainha e de seu marido , emquanto

ganhava forças , não só para constituir um estadocapaz de sustentar a propria independencia

,mas

tambem para realizar as miras ambiciosas de maisvasto dominio

,os seus calculos foram bem depressa

baralhados por novas e violentas desintelligencias

que em breve rebentaram entre Affonso e Urraca .

animo altivo ou antes 0 procedimento leviano darainha trouxe por fun uma ruptura decisiva . Pro

cure potiri si puer quoquo 1nodo traderetur neci quo

com item d ira machinatione p erditumire moliebatur : ID. , e . 64 , g 2 . A vol ta de Pedro

Froylaz p elo lado de Burgos prova indisputavelmente qu'

e

el le fo i ao Aragão consultar Henrique , e que na H i storiaCompostellana (ib id . ) onde Flores leu accersentes , se develer accedentes .

L IVRO 1 43

feriu-se 0 divorcio , e D . Urraca,chamando a si 0

seu velho aio Pedro An sures,0 conde Gomes Gon

çalves , 0 conde Pedro de Lara e . muitos outros se

nhores castelhanos e leoneses , começou com 0 rei deAragão uma lucta que , com poucas interrupções evaria fortuna , durou muitos annos . As relações quetentara já estreitar com os parciaes de seu filho naGalliza renovaram-se então com mais pró spero re

sultado , e ao passo que Leão e Castella se declaravam geralmente favoraveis á rainha

,Affonso , 0

lidador,via as suas forças quasi reduzidas à s do

Aragão e às dos fidalgos e cavalleiros aragoneses

que poderam conservar -lhe fié is alguns logaresfortes , cuj os alcaides eramE evidente que O estado polí ti co da Hespanha

mudava completamente em relação ao conde de Portugal . A concordj a de D . Urraca e dos defensoresde Affonso Raimundes ligava outra vez 0 vastocorpo do imperio de Affonso VI que ameaçam des

pedaçar— se . Por outra parte

,convertida guerra

civi l em guerra estrangeira , vi sto que pelo facto dodivorcio O príncipe aragonês tinha de a sustentar ,

não como legi timo senhor de Leão , Castella e Galliz a contra subdi tos rebeldes

,mas como rei de Ara

gão contra um paiz alheio,pouco era de esperar

,

attenta desigualdade dos recursos , lhe coubessevictoria

,apesar da sua actividade e esforço . Nesta

conjunctura é mai s de crer que elle tentasse realisar O pacto celebrado com 0 conde de Portugal e

que este esquecesse facilmente O passado para denovo correr após as suas amb iciosas esperanças .

( 1 ) et muni tiones e regime naturali dominaereddiderunt Rod . To let . , L

'

. 9 , c . 1 . Adhuc mun i tioraloca in Castellae terminis detinebat Id . ih . c . 2 . Vej ase Hist . Compost , L . 1 , c . 64 e segg .

44 H I STOR IA DE . PORTUGAL

D 'aqu i nasceu, em nosso entender , prompta união

de AH'

onso e de Henrique para guerrearem D . Ur

raca . Mas , antes que falemos dos resultados dessaliga

,cumpre-nos narrar successos que interessam

especialmente,não só 0 conde de Portugal , mas

ainda mai s de perto 0 paiz que elle regia .

Abu-l— hassan Aly succedera , como j á dissemos ,seu pae Yusu f no vasto imperio da Mauritania e daHespanha mussulmana em 1 1 0 6 . Depois de aquietada rebellião de Yahya wali de Fez , elle passara0 Estreito ( 1 1 0 7) mai s para ordenar as cou sas do

governo nas províncias da Europa que para proseguir na guerra sancta . No anno seguinte , porém ,

tornou a passar d'

Africa resolvido accommetter

A ffonso VI . Seu irmão Temin ganhou celebrebatalha d '

Uclés,e muitos logares fortes lhe caíram

nas mão s ; mas esses triumphos custaram rios desangue aos sarracenos . Aly pouco depois voltou

'

à

Africa , e as suas conquistas não se dilataram para :

O interior dos territorios de Leão e Castella . Todavia

,0 amir almoravide , seguindo 0 exemplo de

Yu suf s eu pae, incançável em combater os inimigos

da sua crença , pas sou de novo O mar , dizem que

com cem mi l cavalleiros , no verão de 1 1 0 9 ,e come

çando guerra no outono desse mesmo anno , proseguiu — a por todo 0 seguinte até O princípio de1 1 1 1 , em que voltou à Africa , por junho ou julho .

Foi esta uma das campanhas mais fataes para oschristãos . Ao passo que Aly invadia os territorioscentraes e

,tornando successivamente Talavera

Madrid , Guadalaxara e mais vinte e sete castellos ,

vinha sitiar Tnledo ,0 amir de Saragoça marchava

contra O rei de Aragão que havia posto cercoTudela

,e 0 celebre Seyr . Ibn Abi Bekr marchava

para 0 occidente . As narrativas dos historiadoresarabes revelam— nos neste ponto successos ante

46 H ISTOR IA DE PORTUGAL

no anno antecedente algumas forças almoravidestinham passado 0 Tej o , fazendo uma entrada na

moderna Estremadura . O conde de Portugal , vendo0 activo general lamtunense combater e reduzir . as

principaes povoações do antigo emirado de Badaj oz,

enviara tropas que reforçassem guarnição de Santarem . Marchavaln descuidados os homens d '

ermasdo conde ; acamparam num sitio denominado Vatalandi e começavam a levantar as tendas para repousar quando d

'

improviso um grosso corpo de serracenos

,sabendo que era pouco avu ltado O numero dos

christãos , os atacou , passando provavelmente 0

Tej o . Salteados assim repentinamente,estes foram

destroçados“

com grande mortandade , fi cando no

campo Suario Fromarigues , que os capitaneava , eoutro cavalleiro notavel chamado Mido Crescones .

Na primavera do anno seguinte Seyr , submettidas

as cidades mais importantes do Gharb,pôs cerco

Santarem , qual se rendeu em maio ou junhodesse mesmo anno

,e nada induz a crer que 0 conde

soccorresse este ponto extremo dos seus domíniosou que ao menos tentasse inquietar os sarracenos Foi , todavia , durante estes dous meses

( 1 ) Conde , P . 3 , c . 2 5. Abdel-halim (aliás Ibn Abi

Zará ) , Hist . dos Sober . Mabom . , p . 1 78— A Chr0 n . G0 th0 r .

(naMon . Lus . , T . 4 , f . 2 72 v . ) põ e a tomada de San taremnos tins de mai o

, e o Chron icon Lamecence (nas D i ssert .Chronol . , T . 4 . P . 1

, p . 1 74) nos fins de junho . Conded iz Syr

-ben — Bekir tomó las ciudades de Zintiras , Badaj oz , Jabora , Bortecal y Lisbona , y todos los pueb los quetenían ocupados los christianos , o no habían tomado la voz

de los a lmoravides Conde , ibid . Seyr retook the citiesof Shan tireyn , Batalió s , Bortokal, Yeborah and Alisbúnaband purged the who le of those western provincies fromthe íilth of the in fi dels Al—makkari

,Versão de Gayangos ,

Vol . p . 30 3 . Al—makkari colloca es tes successos em 1 1 1 0 ,

0 que não concorda com a data estab elecida pelos chro

nioons christãos .

LIVRO I 7

que Henrique residiu em Portugal , depois de sua

volta de França e do Aragão e antes de se ligarde novo com A ffonso I para , a guerra contraD ,Urraca . Um d iploma exarado no mesmo dia em

que,segundo chronica dos godos , Santarem caía

em poder dos mussuhnanos alguma luz derramapara se descortinarem as causas que tolhiam aoconde 0 soccorrer as suas fronteiras meridionaes .

É elle 0 foral de Coimbra . Sesnando , attrahindo

para alli população chri stan , não organisara 0

municip io,contentando — se os novos habitadores

com lhes ser assegurada por um título geral a

posse hereditaria das propriedades rusticas ou urbanas que se lhes distribuíam . D epois , por quasimeio seculo , Coimbra fora a capital de um districto

,

e ainda no tempo de Henrique se podia considerarcomo a principal cidade do condado ou provincia dePortugal ; mas uma t radição , que os documentoscontempora neos parece confirmarem ,

nos assegura

que o genro de A lfonso VI estabelecera em Guimarães sua corte

,se tal se pôde dizer de urna resi

deneia incerta e quas i annualmente interrompida .

Coimbra, postoque ,

como v imos , fosse frequentadado conde

,0 qual por vezes fez ahi larga assistencia ,

tinha , como todos os logares principaes , governadores proprios suj eitos elle , segundo 0 systemahierarchico da monarchia leonesa . Estes governadores com os seus offi ciaes provavelmente vexavam0 5 habitantes , que não possuíam ainda os largosprivi legios municipaes attribuidos j á nessa epochapovoaçõe s menos importantes . Segundo parece

poder concluir-se das allusões obscuras do diplomaa que nos referimos , os moradores de Coimbra

,

opprimidos por uns certos Munio Barroso e Ebraldoou Ebrardo ,

talvez chefes mi litares,talvez exactores

de fazenda,amotinaram— se , expulsando-os da cidade .

48 H I STOR IA DE PORTUGAL

Devia succeder isto durante a ausencia do conde .

Voltando,elle se dirigiu a Coimbra ; mas os habi

tantes resistiram-lhe , e Henrique teve de pactuarcom elles . O resultado destes successos foi obterapovoação uma carta de foral com amplos privilegios ,especi fi cando-se as contribuições e declarando — seexpressamente quenemMunio Barroso , nem Ebraldotornariam ser admittidos dentro dos seus muros ,e que 0 conde

,satisf eito de 0 haverem emflm rece

bido,poria em esquecimento tudo 0 que contra elle

tinham até aquelle dia practicadoEntretanto Seyr

,fortificada e guarnecida Santa

rem e as outras praças tanto de christãos com0 demussuhnanos submettidas por elle ao imperio almoravide

,voltara para Sevilha . Entrado em avançada

idade,este celebre capitão ahi fallecen pouco depois .

sem poder continuar no occidente da Peninsula

guerra que por este lado parece lhe estava partienlarmente incumbida . Com a sua morte Portugal

( 1 ) Car ta aos povoadores de Coimbra , nas con firmaç õessuccessive s de A ffon so VI de 1 085 e 1 093 , Liv . Preto ,

f . 7 .

Vi ta B . Geraldi , c . 8,em Baluz . Misc .

, T . 3 , p . 185.

Doç . A . Tibaldi , ern Figue iredo ,Hist . de Mal ta , T . 1

,

p . 1 7 . Este documento é dado como suspei to por J . P .

Rib eiro (Dissert . Chronol . , T . 1 , p . mas não tendocaracter algum de falsi dade à excep ção da data errada ,

esse erro se pôde suppôr commettido pe lo copista, por ser

um traslado do sec . 1 3 . Estaço, Var . Ant .

, 0 . 1 2 . Mon .

Lusit L . 8, c . 1 5. Foral de Coimbra d e 2 5 de mai . de

1 1 1 1 no Liv . Preto , f . 9 v . e f . 2 39 . Colimbriam nunquamdabo per alkavallam (aliás cava llariam) al ieni . Non in troducam Mun ium Barrosum vel Ebrardum (aliás Ebraldum)

Promi ttimus non tenere in mente vel corde

malam voluntatem vel iram de hoc quod nunc usque

eg is tis adversum nos , sed habeb imus gratum quo d co l l ig is tis nos , et honorabimus vos sicut mel ius potuerimus ,et nunquam in vestra re vel in vestri s corporibus habeb i tis deshonor vel perdida ib id .

LIVRO 1 9

respirou , e as correrias (10 5 sarracenos dirigiram — seprincipalmente contra a província de Toledo , cuj ascercanias , tendo debalde tentado tomar aquellacidade

,deixou taladas 0 wah de Cordova

,Mezdeli .

A Hespanha christan offerecia então O tristeespectaculo de que tantas vezes foi theatro antes edepois destes successos . q uanto os infiéis invadiam as fronteiras

,a guerra civil encruecia cada

vez mais no seio della . Era Do mesmo tempo em

que os almoravides faziam recuar as fronteiras dePortugal que os condes Gomes Gonçalves e Pedrode Lara

,lisonj eados com 0 valimento da rainha e

esperançados ambos de que 0 divorcio de D . Urracalhes abrisse O caminho do throno

,ajunctavam os

partidarios desta para accommetterem O rei ara

gonês , que durante a sua passageira reconcili açãocom a rainha se apoderara de Toledo Como j áobservámos

,liga entre 0 conde de Portugal e

Affonso I renovou— se naturalmente por estes meses ,e Henrique , apaziguada rebellião de Coimbra ,

apressou-se ir ajunctar-se com 0 seu alliado .

Uni dos ambos , pouco tardou que chegassem umencontro decisivo com os leoneses e castelhanos . Os

condes Gomes Gonçalves e Pedro de Lara vieramesperá — los em Campo d

'

Espina ,poucas leguas ao

nordeste de Sepulveda,n0 districto de Segovia .

Lara , apenas começada pelej a , fugiu ,deixando 0

conde Gomes luctar só sinho com as forças deAffonso I e do seu alli ado , que 0 venceram e mata

(1 ) É l— Rey d'

Aregon en 1 4 d ias kal. de Ma io entrô en To

ledo e regno'

era MCXLIX Annal . Tol . 1 ad ann . 1 1 1 1 na

ESP. Sagr , T . 2 3 , p . 387 . Vej a— se 0 que a este propositoob serva Berganza (Antiguedades , T . 2 , p . attendendo áescriptura n º

1 2 do App . do 7 .

º vol. da Chronica Benedictina de Yepes .

VOL . I I .

50 H I STOR IA DE PORTUGAL

ram Obtida esta victoria (novembro de Orei de Aragão passou 0 Douro e invadiu 0 territorioleonés . Entretanto O bispo de Compostella Gelmires ,com os principaes fidalgos e cavalleiros de Galliza

,

dirigiram— se á cidade de Leão para ahi acelamaremAf fonso Raimundes . Soube -o O rei de Aragão e ,

marchando ao encontro delles , accommetteu— os (Pimproviso entre Astorga e Leão n0 logar chamadoFonte d *

Angos ou Viadangos . Depois de tenaz resistencia ,

os gallegos foram destroçados , e Gelmires ,enviando O moço principe para a fortaleza d

'

Or

sillon na Caste lla , onde então se achava D . Urraca,

retirou - se com as relíquias das t ropas gallegas paraAstorga e , demorando - se ahi apenas tres d ias

,

voltou Compostella ,fazendo um largo rodei0 ,

afun de evitar 0 encontro dos vencedoresNesta facção , porém , interviera só O rei aragonês

abandonado Já pelo conde de Portugal . Immediatamente depois da batalha de Campo ( 1 Espina 0 exer

cito dos dous alliados entrara em Sepulveda . Os

fidalgos castelhanos recorreram então aos meneios

( 1 ) Era MCXLIX,VI I kal. Novemb . Rex Adefonsus Ara

gonens is et Comes Enricus occiderunt Comitem D . Gomes

in campo de Spina : Annal . Complut . ad ann . 1 1 1 1 na

Esp . Sagr ,T . 2 3

, p . 3 1 4 . Lucas de Tuy (Chron . Mundi naHisp . Illustr . , T . 4 , p . 1 0 3) diz que Gomes Gon çalves forapreso e depo is morto pe lo conde Henrique . Veja-se Rod .

To le t .

, L . 7 , c . 2 .

(2 ) H ist . Compo stell. , L . 1, c . 68, g2 . Flores estabelece

para data destes successos 0 outono de 1 1 1 0 .

— C0m 0

advertimos na nota VI I no fim do volume , chronologia

da H istoria Compostellana é errada . Lucas de Tuy, Ro

drigo X imenes e todo s os h istoriadores p õem 0 recontrode V iadangos d epois do de Campo d '

Espina . Os annaes

Complutenses Hxam es te em outubro de 1 1 1 1 , 0 que é

conlirmado pe los Annaes Compostellanos na ESp . Sagr . ,

T . 2 3, p . 32 1 .

L IVRO 1 51

occultos para os dividir . Mandaram afeiar Hen

rique 0 haver-Se unido ao inimigo commum da mo

narchia contra os outros barões de Leão e Castella .

Pediam — lhe que se apartasse do aragonés e queviesse ajunctar as suas forças ás delles

, pr0mettend0

fazerem—no'

seu chefe nestas guerras e induziremrainha repartir fraternalmente comelle uma partedos estados de Affonso VI . Alguns fidalgos

,aos

quaes 0 prendi am laços de antiga amizade , invocavam,

até,

. as recordações do passado para mais 0moverem . Cedeu , emíi rn ,

0 conde á estas suggestões ,e para não despertar as suspeitas do rei de Aragãopretextou a occorrencia de negociosque o chamavamaos seus domínios Então , partindo de Sepa lveda

,veio ao castello de Monzon onde se achava

rainha , qual confi rmou as promessas feitas aoconde pelos barões seus parciaes . Esperando ass imver realisados os desígnios de engrandecimento queconcebera

,Henrique não tardou declarar — se pelo

partido de D. Urraca Esta , apenas seu fi lhochegou ao castello de Orsillon ou de Monzon

,dei

xando 0 entregue a alguns cavalleiros em que

mais confiavà,partiu para Galliza , atravessando

as montanhas de Oviedo no coração do inverno,

postoque este fosse naquelle anno rigorosissimo .

D'alli encaminhou — se na primavera de 1 1 1 2 (4 ) paraAstorga com as tropas da Gallize

'

e enviou mensa

( 1 ) Cas i corno quien va a ver sus heredades , part ió — se de

el— rei Anonymo d c Sahag .

,c . 2 1 .

(2 ) Parece que é 0 mesmo a que na H istoria Compo stellana se chama Orsillon ,

na Castel la Ve lha , onde a

rainha se achava quando se deu a batalha de Viadangos .

(3) Anon . de Sahagq c . 2 1 .

(4 ) Pro fecta e st per gravia itinera et laboriosos montes ,frigidosque n ivibus e t glacie p raeteritae h iemis Hist .Compostell .

,L . 1 , c . 73 .

y

0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

geiros às Asturias , Castella e aos districtos meridionaes de Leão , ordenando marchassem paraaquelle ponto todos os que se lhe conservavamfi éis . Mas Affonso I , que entretanto tinha engrossado 0 seu exercito com os soccorros de variaspartes

,ao mesmo tempo que chamava novas tropas

do Aragão,marchou cercar Astorga . Sendo

,

todavia,destroçados pelos castelhanos os cavalleiros

aragoneses que vinham ajudar os sitiadores , Affonsoalevantou O sítio e retirou — se para 0 f0rte castellode Penafi el Entretanto 0 conde de Portugalajunctava os seus homens d

'

armas emquanto astropas da rainha convergiam das Asturias

,de Cas

tella e das Estremaduras para se reunirem comella . Estas forças capitaneadaspor Henrique , ao qualacompanhava D . Urraca

,avançaram para 0 lado

do castello de Penafi el nas vizinhanças de Valladolid e puseram lhe cerco . Era 0 logar forte e bemdefendido

,e 0 assedio prolongou-se . ( ) s sitiadores

n0 emtanto occupavam— se em assolar e roubar os

territorios circumvizinhos que se dilatam pela

(1 ) Anon . de Sahag .

,c . 2 1 . Hist . Compostell . , L . 1 , c . 73 .

As duas chron icas contemporaneas de Sahagun e Com

postella parece con tradizerem-se e até certo ponto não concordam entre si . A primeira omitte o s successos de Via

dangos e d'

Astorga e dá a entender que A ffonso I , sab idamudan ça do conde de Portugal , se retirara para Pena

fi e l , emquanto segunda 0 faz acolher— se Carriondepois do cerco d

'

Astorga . Nó s atemos— nos ao unico

arb ítrio que nos parece razoavel . O si lencio de uma das

chronicas não basta para recusar a narrativa da outra,

sendo ambas coevas , e por isso , não havendo impossibilidade de tempo ou de logar que 0 proh iba , procurámos

l igar os successos contidos numa e noutra . Quanto ao sitiopara onde se retirou O rei d

*

Aragã0 seguimos 0 anonymo

d e Sahagun , que escrevia mais perto do theatro ,daguerra .

54 H ISTOR IA DE PORTUGAL

nominalmente O castello de Ce ia sobre 0 rio domesmo nome , que tocara ao conde , lhe foi logoentregue , e resolveu-se que elle , ajudado peloshomens d

º

arlnas da rainha marchasse apoderar-sede Zamora

, que era uma das terras mais importantes das que lhe tocavam e que provavelmenteestava então pelos aragoneses . As duas irmans

deviam entretanto recolher-se á cidade de LeãoTaes eram as intenções patentes de D . Urraca

,

mas bem diversas as occultas . Aos cavalleiros que

iam na companhia do conde ordenou em segredo

que ,t0 1nada Zamora

, não lhº

a entregassem ,e ao

mesmo tempo mandou prevenir a guarnição dePalencia de que , se A ffonso I para alli se encami

nhasse lhe abrissem'

as portas . Depois disto diri

giu— se v illa de Sahagun

,cuj os habitantes eram

fautores daquelle príncipe e por isso facilmente ospersuadiu fazerem 0 mesmo . D 'ahi

,separando — se

primeiro de D . Theresa ,recolheu-se effectivamente

Leão , conservando — se no emtanto condessa dePortugal no celebre mosteiro de Sahagun ,

contracuj os monges corno senhores da v i lla 0 odio dosburgueses era grande e causa do seu af ferno á parc ialidade aragonesa . A partida de D . Urraca , abandonando alli irman

,parece ter sido resultado de

accordo secreto com O rei de Aragão , porque este

( 1 ) Se acred itassemos um documento,

achado ultlma

mente , esta divisão ter-se — hia realisado . E 0 foral de Aukaem c opia do seculo X I I I e sem data ,

d ad o por D iogoVermudez 0 tenens de Auka em n ome do conde Henriquee de D . Theresa . No preambulo desse foral narram — se as

guerras de D . Urraca e do re i de Aragão ,e como a fi lha

de A lfonso VI por conselho do s seus barões dividiu Oreino com 0 cunhado . O que não é faci l é d izer onde era

Auka . Veja-se Collecc ion de Fueros y Cartas Pueblas por[a H. Academia de His toria , Cata logo , pag . 32 Madrid 1 852 .

(2 ) Anon . d e Sahag .

, c . 2 1 .

L IVRO 1 55

entrou de repente na vi lla ,e sabendo que D . The

resa fugira , mandou após ella tropas que perse

guissem , mas que não poderam alcançá-laA noticia da traição de D j Urraca brevemente

chegou aos ouvidos de Henrique , ta lvez pela bocada infanta sua mulher fugi da de Sahagun . É facilde suppôr qual seria a indignação do conde ,

vendo-se assim“

escarnecido e transtornados os seusdesígni os . Os nobres de Leão e Castella , quemsobretudo era odioso O domíni o do rei de Aragão ,

mostraram- se inclinados favorecer Henrique , desapprovando O procedimento da rainha . Aproveitou0 conde esta irritação dos animos e com os outrosbarões off endi dos resolveu proseguir contra os dous

guerra que'

até então tinha feito unicamente aopríncipe aragonês .

D . Urraca partindo de Sahagun pouco tempo -se

demorara em Leão , aonde O marido se foi unircom ella , havendo— lhe saído baldada tentativa daprisão de D . Theresa . Sab ida esta nova

,0 conde de

Portugal e os barões seus alliados marcharam

pôr sitio á Carrion,para onde A ffonso e D . Urraca

tinham entretanto voltado . Breve , porém ,acabou

0 assedi o,porque di z um escriptor contempo

raneo os nobres , além do respeito que deviam áfi lha de Affonso VI

,estavam certos de que , attento

0 genio do rei aragonês , poucos dias durariaconcordia entre elle e sua mulher .

*

ão parece estemotivo 0 mais provavel para as sim ab andonaremempreza ; mas , fosse essa ou di versa causa dosuccesso , é certo que Henrique se retirou com os

outros nobres que elle se haviam assoc iado

( 1 ) Anon . de Sanag . , c . 2 1 .

(2 ) Idem ,c . 23 .

56 H I STOR IA DE PORTUGAL

Se attendermos que O cerco de Pena fi el , de queacima fallárnos e a que precederam diversos acontecimentos posteriores á batalha do Campo d'

Es

pina,só poderia veri ficar- se no verão de 1 1 1 2 ,

osvariados successos que havemos referido deviamoccupar o outono deste anno . Quaes fossem ,

porém,

as acções do conde depois de levantado O cerco deCarriqn nenhum monumento contemporaneo n0 -10diz . E crível andasse empenhado em obter pelasarmas ou por outro qualquer meio o s senhorios

que sua cunhada lhe cedera para trahir causa dorei aragonês . Entretanto este , cuj a reconciliaçãocom D . Urraca não era senão um calculo de cubiça ,

apenas se achou livre do cerco" procurou affastá - lade si . Com promessas lisonj eiras e por intervençãodos seus habeis conselheiros alcançou

,emfim,

re

so lvê- la ir administrar 0 Aragão emquanto elleficava ordenando as cousas da monarchia leonesa .

Partiu com effeito rainha ; mas pouco tardou a

receber novas das violencias que nos seus estadoscontinuava practicar O marido . Desde então resolven - se voltar ; mas , seguindo 0 exemplo deAtl

'

onso, que soubera crear um partido entre cas

telhanos e leoneses , buscou iguaes allianças entreos subditos delle

,chamando a si alguns nobres ara

goneses descontentes , ao mesmo tempo que trabalhava po

r crear ou renovar sympathie s em Leãoe Castella . A lfonso I

,sabendo que sua mulher

regressara , pensou em embargar-lhe os passos , oudesvanecendo ira de que ella vinha possuída ouprendendo — a

,se as circumstancias 0 permittisscm .

Nem uma nem outra cousa obteve . A parcialidadeda rainha engrossara ponto de se fazer temer, e aconfiança nos seus parciaes animava D . U rracaabandonar 0 systema da dissimulação. As discord ias renovadas entre os dou s consortes chegaram a

LIVRO I

termos de separação e logo de guerra , que se dilatou

,segundo parece , por algum tempo

Concebe-se facilmente qual seria O estado de umpaiz , em cuj o solo se viam ainda os tristes vestigios( las correrias dos sarracenos , convertido agora em

theatro de longas e deploraveis luctas civis . Nobrese burgueses tinham sido víctimas das dissensõessuscitadas ou favorecidas por elles proprios . O

desejo da paz devia ter ganhado incremento no

meio de tantas devastações e de tanto sangue ver

tido em vão . As igrej as roubadas muitos persona

gens notaveis do clero e da fidalguiamortos a ferro ,

presos ou fugitivos ; os peões perecendo de nudez ede fome ou passados á espada ; tal é 0 quadro quenos apresenta um hi storiador desse tempo Ian

çando — o á conta do rei de Aragão , mas em que e decrer fossem culpados os diversos partidos . E , todavia

, certo que Alfonso I , empregando nestas guerras

gente collecticia de além dos'

Pyreneus e dotado deunrgenio tão violento e feroz como valoroso , deviater maior quinhão nos males commettidos , posto

que muito se haja de rebaixar nas accusações dosseus inimigos . Mas

,devido a uns ou a outros , O

estado das cousas era intoleravel, e alguns barõesleoneses e castelhanos com os cabeças popularesdos mais poderosos municípios de Leão ajunctaram-se em Sahagun com 0 proposito de constrangeros

“dons consortes darem treguas ás suas discordias e a deixarem

, emfim ,respirar a nação das cala

midades que padecia . Exigiam que O rei de Aragão

guardasse as condições estabelecidas quando , em

consequencia das pretensões do conde de Portugal ,

( 1 ) Anon . de Sahag .

,c . 2 7 ad íinern .

(2 ) Hist . Compostell. , L . 1 , c . 79 .

58 H I STOR IA DE PORTUGAL

D . Urraca se

'

congraçara com elle em Pena fi el .

Falto acaso de forças para quebrar com assembléa que assim lhe impunha lei

,O príncipe ara

gonês valeu — se da d is simulação ; fingiu reconciliar — se com rainha

'

e ,

tendo-se demorado algumtempo em Carrion , veio comella re sidir em AstorgaA dobrez de Affonso I

logo se tornara visível . Compretextos e evasivas dilatava O cumprimento daspromessas que fi zera . Entreestas era a principal tiraros castellos pertencentes asua mu lher das mãos dosaragoneses . Passando pelacidade de Leão ao dirigir-seAstorga , recusou entregar

0 alcassar desta cidade,ape

ser de D . Urraca assim 0

3 . Conde Henrique requerer . Era evidente que

íãªn

ãb

ªgª

àe

md

lfoifâi pacificação obtida á forçala) . pelos povos não duraria

largo tempo . A primeiracircumstancia que se offerecesse para nova rupturahavia de ser aproveitada por elle , e tal circumstancia não tardou apparecer .

Estes successos passavam nos primeiros .meses

de 1 1 1 4 . Postoque ,no meio das inquietações e ban

dos em que figuraram tantos individuos eminentes ,os factos relativos ao conde de Portugal sej am

( 1 ) Anon . de Sabagun . c . 2 9 . Compare-se com Hist .Compostell. , L . 1 , c . 80 .

L IVRO 1 59

muitas vezes esquecidos nas incompletas e informesmemorias desse tempo , todavia , se dermos creditoum documento ácerca do qual não nos occorre

duvida,mas que já foi impugnado , ao menos na

sua data , Henrique ligou-se com a rainha quandoella , tendo voltado do Aragão , se achava mai s uma

vez_ separada do marido Foi no meio destas

repetidas d iscordias (2 ) e paci fi cações passageiras

que findou carreira das ambições e esperançasdo conde

,atalhando — lhe morte os desígnios mas

O modo , 0 logar e as particularidades deste successocobre — os véu impenetravel. Sabemos só que ellefallecen no 1 .

º de maio do anno de 1 1 1 4 A nar

ração do anonymo de Sahagun faz suspeitar que ,durante residencia de Affonso e D . Urraca em

Astorga ,Henrique os seguira e alli morrera (4 ) , 0 quede certo modo é fortifi cado pela tradição dos ehronistas portugueses , que 0 dão por morto naquella ci

dade, postoque essa tradição revista O facto das

cireumstancias extraordinarias e fabu losas com

que a imaginação do povo costuma poetisar historiaVoltemos agora os olhos para O passado e obser

( 1 ) Doeum . na Esp . Sagr. , T . 38, p . 347 . Veja— se nota VI Ino fim do volume .

(2 ) Ibid . , T . 36 . App . 43 . Por este documen to se vêque 1 2

: de abri l ainda durava separação .

(3; Gal Maii ob iit comes D . Henricue Chron . Gothor,

ad aer. 1 1 52 . Veja— se especialmen te sobre esta materianota VI I no fim do volume .

(4) entramb o s fue ronse para A storga . Muerto el conde

Enrique , D . Theresa al lá se me, e con la reyna su her

mana é con el rei gran compe tencia armaba Anon . de

Sahag. , c . 29 .

(5) Nob il iario attribuido ao conde D . Pedro , tit . 7 .

Galvão , Chron ica d'

e lre i D . All'

. Henriques , c . 4 . Ace

nheiro Chron . dos Reys d e Port . , 0 . 2 .

60 H I STOR IA DE PORTUGAL

vemos qual era a verdadeira situação política deHenrique no momento de fallecer . Levado pelanatureza das cousas e ainda mais pela ambiçãorepresentar um papel importante no meio da guerracivi l que devorava monarchia , conhece — se pelosactos dos ultimos quatro anuos da sua vida que atodas as considerações elle antepunha 0 pensamento de obter para si

,não só independencia do

condado cuj o governo subalterno alcançara da generosidade do sogro , mas tambem largo quinhão nasoutras províncias limitrophes

,de modo que Por

tugal se convertesse e1n nucleo de um poderosoestado no occidente da Península . Pelo tractado dedivisão que a necessidade de 0 attrahir ao seu par

tido obrigou D . Urraca celebrar com elle sabemoslhe ficava pertencendo Zamora

,cuj o di stricto se

dilata pela fronteira oriental do nosso paiz . E seoutro tractado entre a rainha e D . Theresa , de queadiante havemos de falar

,assentava

,corno suspei

tamos,sobre este pacto anterior feito com 0 conde ,

vemos por elle que esses territorios abrangiammaior porção das províncias que então chamavamde Campos e das Estremaduras e hoj e s e denoIninam de Valladoli d

,Zamora ,

Toro e Salamanca .

E provavel que j á nos ajustes feitos com Affonso Ipara repartirern entre si monarchia leonesa 0

conde tivesse escolhido estas províncias . Assim ,

se elle morreu depois da ultima reconciliação deAffonso com D . Urraca

,achando — se nessa occasião

alliado com a rainha e tendo direito pelas conven

ções anteriores a exigir de ambos a cessão daquellesdistrictos

,seria o ffender todas as probabilidades 0

imaginar que não cuidasse então seriamente emrealisar um facto a que dedicara todos os seuses forços e para 0 qual trabalhava já

,como Vimos

,

em vida de A ffonso VI .

62 H I STOR IA DE PORTUGAL

mulheril pod ia tirar tanta vantagem como O maridotirara do esforço e perícia milita r : empregouastucia . Por intervenção de um individuo de — cuj asartes se flava , teve modo de persuadir O rei deAragão de que sua mulher intentava dar-lhe pe

çonha,accusação ,

talvez,não inteiramente infun

dada A ffonso, que nada desej ava tanto como um

pretexto para punir rainha,sem que lhe fugissem

da mão os vastos estados de que ella era legitimaherdeira , deu ou fingiu dar credito á revelação quelhe fora feita . Perante os nobres que estavam na

corte , accusou-a do intentado assassínio , para assimse justificar do procedimento que determinava se

guir ,e este era 0 separar— se della . Segundo O cos

tume daquelles tempos , recorreu a rainha á provado combate , escolhendo um cavalleiro que mentivesse na estacada sua innocencia ; mas O rei ne

gou-se acceitar O chamado juízo de Deus , fazendo— se

julgador da propria causa . Debalde os conde s deCastella e até os barões aragonese s que se achavampresentes procuraram socegar os animos irritadosdos dons consortes D . Urraca foi expulsa deAstorga seguida de poucos cavalleiros , ,que não qui

zeraln abandoná-la naquella desgraçada conjaneturaA violencia de Affonso

, que recusara sua mulber um meio de j usti fi cação considerado como 0

mais solemne que um réu pod ia recorrer parase mostrar alheio imputação do crime

,produziu

geral descontentamento . O s proprios aragonese s

( 1 ) Orderico Vi tal af firma positivamen te que D . Urracatentara envenenar O marido Urraca ei (Hildefonso)p ern ic iem tam veneno , quam arm is macbinata : H ist .Ecc les . , I, . 1 3 .

(2 ) Anon . de Sahagun , c . 2 9 .

L IVRO 1 63

que guarneciam as torres da antiga capital da Inonarchia ,

cidade de Leão,abriram as portas do

castello á desterrada princesa . Os burgueses , que

até ahi se haviam mostrado mais favoraveis ao rei

de Aragão que a D . Urraca,uniram— se ao partido

della . 0 8 concelhos de Burgos , de Naxera , de Carrion

,de Leão e de Sahagun , junctos nesta ultima

villa com mu itos nobres , ou porque ainda se não

houvesse dissolvido passada assemblea ou porquede novo se congregasse , mostraram — se tão resoluto sem sustentar . as condições juradas por Affonso I ,que este , obrigado deelarar-se abertamente e nãopodendo resistir á torrente

,sa fu occultas de Saha

gun e quasi como fugitivo recolheu-se aos seus estados . Então os nobres e burgueses reconheceram

por toda a parte , nas Villas e castellos , auctori

dade da rainhaD . Theresa ficara residindo em Astorga quando

sua irman fora expulsa . Alli pactuara alliança comO rei de Aragão ; mas os acontecimentos de Sahagunvinham collocá— la numa situação excessivamentedif fi cultosa . Os seus domínios eram demasiado cir

cumscriptos : não podi a achar nelles recursos con

tra irman offendida morta lmente por ella . O seu

alliado, que se retirara para os .

pr0 prios estados , sóde modo indi recto poderia ser util Portugal ,divertindo as armas leonese s para as fronteiras deCastella . Por outra parte a morte do conde

,succe

dida antes de elle obter de finitivamente a posse deuma parte da monarchia em que p odesse constituirum

'

reino independente e assás importante parase fazer respeitar , deixava , até , a província queAffonso VI lhe dera para governar ligada Virtual

( 1 ) Hist . Compostell .

, L . 1 , c . 80 . Anon . de Sahagun ,

c . 30 .

64 H ISTOR IA 'DE PORTUGAL

mente Leão e , se D . Theresa quebrasse os laçosde obediencia que uniam á irman , esse acto seriacons iderado como flagrante rebelliãoA infanta de Portugal debaixo de gesto ange

lico (2 ) escondia 0 animo sagaz e vivo que lhe atribue mn escriptor , 0 qual devia conhecê-la e tractá— lade perto , ao menos durante a sua residencia ern

Sahagun O s factos de quatorze annos em que

regeu provincia cuj o governo lhe legara O maridoprovam que 0 monge ehronista se não enganamem assim qualifi car . E durante esse período quea nacionalidade portuguesa começa caracterisar— sebem

,e á politica de D . Theresa se deve

,até certo

ponto , 0 nascer e radicar— se ; em Portugal aquelle

sentimento de individualidade que constitue barreiras entre povo e p0v0 mai s solidas

'

e duradouras

que os limites geographicos de duas naçoes V 1 z1nhas .

Como a infanta evitou as consequencias das diffi

culdades em que s e lançara e como aproveitou asdi scordias civis da Hespanha christan

'

para ir fundando independencia dos seus estados

, Vê-lohemos subsequentemente . Agora observemos maisde perto qual era a situação especial da monarchialeonesa

,de que ainda O nosso paiz fazia parte ,

quando a paz do sepulchro veio atalhar as lidas eintentos do ambicioso conde de Portugal .

( 1 ) Considerando (D . Th eresa) que para se rebelar la

fortuna no le abastava : Anon . de Sahagun , c . 2 9 .

(2 ) A formosura de D . Theresa foi celebrada p elos seuscontemporan eos . Vej a— se Bernard . V ita B . Geraldi , c . 8

em Baluz . Miscell. , T . 3, p . 1 85.

— Doc . nas D issert . Chronol. , T . 3

, P . 1 , p . 45, n º1 36 .

(3) Un saber astuto e ingen ioso Anon . de - Sahagun ,

c . 2 9 . O auctor desta importan te chroni ca era companheiro do abbade Domingos e leito em 1 1 1 1 .

LIVRO 1 65

O

Já anteriormente narrárnos quaes perturbacões

agitaram Gallize depois das primeiras di scordiasentre Affonso e Urraca . O bispo Gelmires , declarando — se pelo partido do filho do conde Raimundo ,restabelecera momentaneamente paz . Novas dissensões , porém ,

se alevantaram entre os barõesdaquella provincia , movidos por interesses obscurose dando largas violentas paixões á sombra da fra

queza do poder real, que disputavam entre si O

príncipe aragonês , rainha,e 0 infante Affonso

Raimundes , ou antes os barões e prelados que s echamavam seus defensore s . Quando D . Urraca sedivorciava do marido ligava-se com os parciaes dofilho ; quando se reconciliava com agnelle mostravase adversa estes . Mas

,em realidade

,cada um dos

personagens que figuravam naquelle drama , querprincipes , quer s enhores , só pensava em tirar dasdesgraças publicas maior vantagem possível . As

allianças faziam — se e desfaziam — se rapidamente ;porque nenhuma sinceridade havia no procedimentodos indivíduos . Os interesses particulare s dosnobres e prelados cruzavam-se com as questõespolíticas e modiâcavam-nas diversamente . Era

anarchia descendo dos paços para os municípios eensinando— lhes com a licença a liberdade , porque ,faltandoa força á auctoridade publica , os burgueses ,no meio das vexações de uma fidalguia desenfreada ,valiam-se dos proprios recursos para se defendereme vingarem dos seus oppressores . Talvez

,durante

a idade média, nenhuma epocha da historia peni n

sular olfereça tantos vestígios da influencia mu'

ni

cipal nos acontecimentos políticos , tantas resistencias das villas contra O domínio dos senhores , tantoscommettimentos das povoações contra os castellos

que as assoberbavam,como 0 primeiro quartel do

seculo XII . Mas isto que era um bem absoluto , um

VOL . 1 1 .

66 H ISTOR IA'

DE PORTUGAL

elemento de ordem futura , porque ia estabelecendoO equi líbrio entre as diversas classes , era relativam ente um mal e mais uma causa de confusão e dederramamento de sangue : tendia a produzir desmembràção do paiz ; porque a s províncias e districtos

, não só moralmente , mas tambem materialmente , se dividiam uns dos outros . Assim

,durante

os successes que narrámos , Galliza,principal

mente addicta ao infante Affonso Raimundes , virarebentar no seu seio uma revolução de alcaides decastellos e senhores deterras que tomara por bandeira 0 nome do rei de Aragão e se derramara aosul pelo extenso territorlo entre 0 U lla e 0 MinhoEntretanto O bispo de Sanctiago ,

Gelmires, que pelo

seu engenho enredador e manhoso soubera obter

grande influencia naquella provincia , ajunctara umpoderoso exercito para combater os levantados , eparcialidade aragonesa foi vencida .

'

Não deixaram ,

porém,as perturbações de se protrahirem ainda

por algufn tempoD . Theresa achava— se viuva , e de tres filhos que

lhe deixara 0 c0 nde um só era varão , e esse , 0 in

fante Affonso Henriques , apenas de - dou s ou tre sannós de idade O rei de Aragão , com quem ellase ligara em Astorga , era na verdade um poderosoe activo alliado . Mas

,repellido de Leão pela assem

bléa de Sahagun ,e perdido 0 alcassar de Burgos

(então cap ital da Castella ) com muitos outros logares fortes que ou se rendiam às tropas de D . Urracaou estavam estreitamente cercados

,Affonso I fez

proposições de treguas , que foram acceitas D es

( 1 ) H ist . Compostell. , L . 1 , c . 74 e s egg .

(2 ) Duorum vel trium annorum Chron . Gothor .

(3) H is t . Compostell.

, L , 1 , c , 83 a 90 .

L IVRO 1 67

apressada assim da guerra , podi a rainha vingarse do mal que sua irman tentara causar-lhe . Não 0

fez . As actas das cortes de Oviedo , de que adiantehavemos de falar

,persuadem que a infanta dos

portugueses recorrera á submissão para evitarprocella ; mas 0 que não parece menos provavel é

que 0 esquecimento da passada injuria não fora emD . Urraca pura longanimidade . Ha muitas vezes nahi storia ao lado dos factos publicos outros succedidos nas trevas , os quaes frequentemente são a causaverdadeira daquelles e que os explicariam se fossemrevelados . Mas ordinariamente

,nào passando de

enredos obscuros , noticia de taes factos morrecom os que ,

nelles intervieram ,e 0 mai s que ao his

toriador cabe, quando crê descortiná-los

,é apontar

as suas suspeitas e deixar aos que 0 lêem ayahar 0

fundado 0 11 infundado dellas . E tal doutrina applí

cavel ás considerações que vamos fazer ; considera

ções que , a serem exactas , lançam bastante luz sobreepocha de que tractamos e sobre successos poste

riores , aliá s inexplicaveis .

Desde a morte de Fernando Magno di ocese doPorto

,como quasi todas as dioceses do moderno

Portugal , carecia de bispo e era governada porarcediagos . No reinado de Affonso VI a sé portuga

lense estava unida 5 de Braga ,e esta mesma

,me

tropolitana da Gallize ,achou-se por alguns annos

sem pastor nos tempos que precederam eleição deGiraldo . Até pouco antes do fallecimento do condeHenrique as cousas conservaram — se no me smoestado . Nos fins

,porém , de 1 1 1 2 ou

,0 que é mais

certo,entrado 0 anno de 1 1 1 3 O francês Hugo ,

arcediago da sé de Compostella ,

fora escolhido parabispo do Porto e sagrado n0 anno seguinte

'

pelometropolitano bracharenseMauriciq Burdino . Hugoera homem inteiramente estranho ao clero portu

68 H I STOR IA DE PORTUGAL

guês , e não nos consta residisse Jamais em Portugalou elle viesse , senão em companhia de Gelmires ,annos antes ,

para roubar certas relíquias . Era

Hugo,além d isso , entre os conegos de Çompostella

O amigo íntimo do bispo e a pessoa a quem esteincumbia com especialidade de ir tracter em Romaos seus negocios mais arduos . A devoção do arcediago para com D iogo Gelmires foi illimitada , não

só nessa epocha , mas ainda depois,quando

,j á

iguaes ambos no episcopado , elle emprehendia no

vas viagens para servir na curia romana de simplesprocurador ao seu antigo patrono , 0 qual acompanhou para Compostella depois de b ispo , não apparecendo memorias delle em Portugal senão em

tempo bastante posterior . A escolha ,. portanto ,

deum hornem que nem sequer tinha ainda 0 grau de

presbytero quando foi eleito e que residia em uma

província que , segundo havemos visto , estava em

relações hostis com Portugal , teve necessariamentecausas extraordinarias . Outras circumstancias se

deram nesta elevação de Hugo , relatadas por escriptor contemporaneo e testemunha ocular dos successos que narra , as quaes vão rasgar um pouco mais0 véu que nos encobre as causas probabilissimas

,

não só dos acontecimentos desse tempo , mas aindados subsequentesEra no inverno de 1 1 1 3 para 1 1 1 4 Maurício

resolvera ir Tuy sagrar 0 novo bi spo do Porto e

junctamente 0 de Mondonhedo eleito por essemesmo tempo . O arcebispo convidou para assistir aesta solemnidade 0 prelado compostellano ,

cuj o

Esp . Sagr .

,T . 2 1 , p . 56 e segg . Dissert .

Chrono] T . 1 , p . 1 4g e segg . e T . 5, p . 1 80 . Bern . Vi taB . Girald i , c . 5. L . 1 , pass im.

(2 ) No ta VI I I no fim do volume .

70 H I STOR IA DE PORTUGAL

serem essas perturbações cau sa do seu procedimento . Era

,pois

,a paz com Portugal que elle pre

tendia definitivamente assentar pazque das palavrasdo his toriador se deduz ter-se já (Pentes procurado .

A eleição de Hugo , do valido mimoso do influenteGelmires , foi acas o 0 primeiro passo para ella

,0

preço imposto para se obter . Se não nos enganamos ,d *aqui datam as relações estreitas e

,às vezes

,mys

teriosas de D . Theresa com O poderoso prelado deCompostella ; e este facto , passado nos ultimos mesesda vida do conde Henrique , mas em que devia talvez exclusivamente intervir sua mulher

,então resi

dente em Portugal , parece-nOs ter contribuido maispara salvar este paiz e a infanta do que generosidade de D . Urraca . A influencm de , Gelmires na

Galliza era illimitada , e a soberania da rainha nestáprovincia mai s um título vão que uma

'

realidade ;título que obtinha á custa de considerar como a s sociado ao imperio seu filho Affonso Raimundes ,

á

sombra de cuj o nome os barões da Galliza dirigidospelo prelado compostellano gosavam de urna quasiindependencia . Se

,como 0 que

.

havemos relatadonos leva a acreditar

,D . Theresa se ligara com Gel

mires , qualquer procedimento da rainha contra ellapodia trazer-lhe por esse motivo as graves conse

quencias que , por diversa causa , não pôde poucodepois evitar .

Todavia este estado forçadamente pacifico deixava subsistir incerteza sobre a sorte futura dePortugal . D . Theresa

, que durante a vida de seumarido usara apenas do titulo de condessa e deinfanta , e desses mui raras vezes

,contentando se

ordinariamente da qualificação mais modesta demulher do conde Henrique e da de filha de Affonso VI , começava já a usar promiscuamente nosseus d iplomas do titulo de infanta

,de rainha e de

LIVRO 1 7 1

ambos junctos . O de rainha preValeceu por fim os

proprios subditos , como vimos , lhº

o davam j á em

vida do conde e,até

,O papa , depois ,

' li sonj eavacom elle A vastidão relativa

'

dos seus estados ea importancia destes

, que augmentava á prqporção

que se enfraquecia di lacerada monarchia leonesacastelhana

,

" davam valor material a um título deque

,aliás

,vulgarmente usavam todas as fi lhas legi

timas dos reis , mas que por isso mesmo mal caberiaá fi lha de Ximena Muníones . Ao passo que a c on

dessa de Portugal acceitava aquella denomlnaçao ,

provincia cuj o governo Ihe legara Seu marido parece ter principiado poucos annos depois receb

'

erdos proprios habitantes O titulo de reino

( 1 ) D issert . Chronol . , T . 1 , p . 1 56 e segg .

, T . 3 , P . 1 , p .-30

90 , T . 4 , P . 1 , p . 1 58 e 1 59 .

'Neste ultimo logar vem citaidos do cumentos de 1 1 20 em que ainda se dá a D . TheresaO titulo de comitissa . A chron ica de Af fonso VI I diz , failando de l la Mortuo autem Enri co comi te Portugalenses

vocaverunt eam reginam (Esp . Sagr . , T . 2 1 , pag . Estefac to é contirmado por um documen to de 1 1 1 4 do Car tulario de Refoios de Lima (Kopke ,

Apontam . Arche0 1 .

, p . 28) ,no qual se d iz

,no preambul o Ego Tares ie f i lia reg is An

f us , depois da data Imperante Portugalis Reg ine Tares íe,e no logar da robora (equivalente á ass ignatura ) Ego Ta

res ie Inf ans , donde se vê que 0 redactor do d iploma ou

notario lhe chamava rainha ,ao pas so que e lla se denomi

nava j ílha do rei Af onso e Inf anta . Rodrigo Ximenes,do

modo como se expressa (L . 7 , c . 5) dá a entender que

D . Theresa usava do titulo de rainha duran te a vida de seumarido , O que é desmentido pelos documentos con temporaneos , posto seja inn egavel qu e os subditos j á então lh 'odavam , segundo O testemunho do anonymo de Sahagun ,

este respeito anteriormente citado . Em 1 1 1 4 Bernardo arce

b i spo de To ledo denominava-a inf anta dos portugueses .

Em 1 1 1 6 b'ulla de Paschoal I I Fratrum nostrorum é d iri

gida Taras ie reg ine ( Liv . Preto ,f . mas O b ispo

D . Gon çalo de Coimbra , seu subd ito , tractava—a por inf anta

neste mesmo anno ib id ., f . 2 51 .

(2 ) O primeiro documento em que Portugal fi gura com

72 H I STOR IA DE PORTUGAL

Mas,considere — se Portugal naquella epocha ou

como condado ou como provincia ou como reino , écerto que os povos derramados por todo 0 tra

'

cto deterra desde 0 M inho até 'o Mondego começavam adeixar perceber j á na segunda e terceira decadasdo sec

'

ulo XII certo caracter de nacionalidade quenão é possível desconhecer . Os successos politicosmostram-no melhor que nenhum outro indício .

Nas g uerras civis , que 0 malfadado consorciode D . Urraca e de Affonso I deu origem e que seprolongaram por tantos annos , as di ssensões não

rebentavam entre um ou outro estado , entre uma

ou outra provincia , mas nasciam de districto paradistricto

,de castello para castello e quasi de indi

vidno para individuo . Os barões ou nobres principaes conhecidos vulgarment e pelós nomes decondes e de ricos-homens

,inimigos muitas vezes uns

dos outros,tomavam cada qual sua bandeira e

satisfaziam odios particulares a pretexto de seguirem esta bu aquella parcialidade . Os calculos dos

ambiciosos , as mudanças de opinião , as vingan

qas de família ,as modifi cações dos partidos davam

frequentemente áquellas'

discordias um caracterpessoal . A Galliza ,

cuj a historia relativa áquelleperiodo chegou até nó s mais particularisada que adas restantes províncias , não nos offerece outro

quadro . Leão ainda nos u ltimos annos desta sanguinolenta lucta apresenta quas i 0 mesmo espectaculo ,

ponto que na capital do reino v inham às mãos os

O titulo de rem o e a carta de couto de Osseloa feitoGonçalo Eriz em 1 1 1 7 D issert . Chronol . , T . 1 , p . 245. São ,porém , tão raros os analogos este antes de A ffonso I

,

que não bastam para se afíi rmar positivamente cousaalguma seme lhante respeito . Vej a-se , todavia , Memoria

sobre a origem d 0 '

n0 1ne e l imi tes de Portugal , nas Mem .

da Acad .

,T . 1 2 , P . 2 .

L IVRO 1 73

burgueses com os cavalleiros que guarneciam asfortifi cações da Cidade , aquelles em nome de AffonsoRaimundes , estes em nome do conde castelhanoPedro de Lara Portugal , porém , no meio de taesdivisões

,conservou sempre um notavel aspecto de

unidade moral . Fosse qual fosse O partido a que ellese associasse

,todos os barões portugueses . se mos

travam conformes . ao menos passivamente , com 0

systema da que,debaixo desse aspecto , podemos

chamar política externa do paiz . Favorecendo 0

infante Affonso Raimundes , O rei d*

Aragã0 , ouD . Urraca ; fazendo a guerra por conta de um

'

dellesou por interesse proprio , os nobres de Portugal combatiam sempre sob 0 mesmo pendão , embora tivessementre si malquerenças particulares , de que aliás nãofaltam vestigios . Assi1n

,O pensamento de desmem

bração e independencia , que eé visivel existia j á nosanimos de Henrique e da sua viuva e que veiorealisar-se completamente no tempo de AffonsoHenriques ,

ée u1n pensamento commum ao che fe doestado e aos membros delle

,sendo talvez os actos

dos príncipes ainda mais 0 resultado da influenciado espirito pub lico do que a mani festação espon

tanea da propria ambição . Os documentos dos primeiros annos em que regeu Portugal A ffonso Hen

riques , concordes com os da epocha de D . Theresa,

tendem a confirmar e sta suspeitaOs acontecimentos interiores do condado ou pro

L(11 ) Hist . Compostell. pass im. Chronica Adefonsi Imper . ,

1 , c . 1 .

(2 ) Assim como em d ip lomas particulares D . Theresaera chamada rainha, antes de e l la tomar esse titu10 , as

sim a seu fi lho se deu 0 de rei em documentos semelhamtes quando e l le apenas usava do s de infante e de principe . Veja se D issert . Chron0 1 . , T . 1 , p . 62 , nota 4 — Memsobre a origem de nome e limites de Port .

,.p 43 e 44 .

74 H I STOR IA DE PORTUGAL

vincia portuguesa nos tempos immediatos mortede Henrique ignoram-se , e 0 silencio das memoriascontemporaneas prova , pelo menos , que elles foramde bem pequena importancia . As treguas propostas

por A ffonso I e acceitas por D . Urraca trouxeram,

senão uma paz definitiva , ao menos uma suspensãode hostilidades . Mas indole do príncipe aragonêsnão lhe consentia depôrj ámais as armas . Repellido

de Castella,voltou ao Aragão para renovar a guerra

com os sarracenos . A judado pelo conde de Perche ,Rotrou ,

assenhoreou — se de Tudela ainda nesse annoe cercou Saragoça , cuj o dilatado assedio lhe fez leventar em 1 1 1 6 0 wali almoravide de Granada , AbuMohammed EntretantoD . Urraca , receosa

' das

intrigas do astuto Gelmires e aproveitando 0 desafogo que lhe concedia O rei de Aragão, voltavaGallize no anno de 1 1 1 5. O bispo compostellano ,

que havia sido maltractado em Burgos por se mo strar contrario á paz , a qual por outro lado hypocritamente aconselhava , começara , de feito, naquellaprovincia indispôr occultam

'ente os animos con

tra rainha . Intentou ella prendê — lo,

s malogrous e-lhe 0 intento ; porque 0 soberbo pre

'

dombstrouse assás forte e resoluto para lhe resistir . Por intervenção dos fidalgos gallegos esta discordia asserenou ; porém os acontecimentos posteriores bem depressa mostraram a pouca sinceridade com que sefi zera reconciliação( ) s ambiciosos desígnios do conde de Portugal , .

em que suamulher tomara tão activa parte , pareciam

( 1 ) His t . Compostell .

, L . 1 , c . 85, 87 e segg . Foral de

Tudela , referido por Moret , em Pagi , Cri t . annal . Baroni iad ann . 1 1 14 . Orderic . Vital , Hist . Ecol . , na Esp . Sagr . ,

T . 1 0, p . 580 . Conde ,

P . 3 , c . 2 5.

(2 ) H ist . Compostell. , Liv . c . 1 0 2 .

LIVRO 1 75

inteiramente abandonados por ella . Nas relaçõescom a rainha de Leão e Castella D . Theresa reconhecia inferioridade da sua situação . Os actos queserviam então para indicar a suj eição dos grandevassallos ao imperante não eram tão característicoscomo 0 foram em seculos subsequentes , e aindamais raros e obscuros se tornavam nas occasiões debandorias e luctas civis , em que os membros maispoderosos da nobreza procuravam

"

á porfia sacudirtodo 0 jugo de obediencia , para lhes impôr 0 qualmuitas vezes faltava a força . Assim

,no estudo das

phases politicas daquella epocha , importa não des

prezar às menores circumstancias dos factos, por

que ahi se encontra ás vezes a solução de muitas

questões historicas .

Na antiga capital das Asturias , em Oviedo , celebrou — se em 1 1 1 5 uma assemblea de b ispos , de no

bres e de deputações municipaes plebs com 0 in

tuito de occorrer aos crimes e Violencias que se per

petravarn por toda monarchia,e especialmente

entre os asturianos . Considere — Se aquelle numerosoajunctamento como cortes ou como concílio

,porque

a natureza de taes assemblée s celebradas por essestempos nem sempre se pôde bem distinguir , é certo

que uma parte das suas actas chegou até nós , e nellas se encontram disposições

,não só ecclesiasticas

,

mas tambem criminaes e civis . Assistiram estascortes D . Urraca e suas duas irmans , Theresa e É lvira

,com' avultado numero de prelados e barões

das diversas províncias da monarchia ,á excepção

dos de Portugal . A subscripção daquelle importantedocumento apresenta — nos situação relativa dasduas filhas de Ximena Muniones e da herdeira deAffonso VI . Eis aqui essa subscripçã

'

o

A rainha D . Urraca com todos os seus filhose filhas confi rmou e jurou sobredicta constituição

76 H I STOR IA DE PORTUGAL

e mandou — a jurar e confi rmar a todos os habitantesdo seu reino inteiro , tanto ecclesiasticos como seculares . E ass im as irmans da mesma rainha

,D . Ge

loira inf anta , com todos os seu s filhos e filhas e com

todos os seus subdítos,e a inf anta D . Theresa , com

todos os seus filhos e filhas a ella suj eitos , jurarame confi rmaram como acima fica declarado .

Portanto , nó s todos que subscrevemos,etc .

Seguem os nome s dos condes , nobres e prelados ,que se achavam presentes ou que depois adheriralnás resoluções ahi tornadasE

'

numa assembléa dos principaes personagens deLeão e Castellar

, que D . Theresa figura como infantae 0 seu nome e incluido nas subscripções , nãó Só

depois do da rainha,mas tambem depois do de É l

vira ,sua irman mais velha mas

,ao passo que É l

vira con fi rma e j ura, em nome dos seus descenden

tes ( 2 ) e subditos,ella (se não suppusermos aquella

( 1 ) As actas do concí l io ou cortes de Oviedo , guardadasno arch ivo da Cathedral de Toledo

,foram extractadas

por Sandoval (Cinco Reys , p . Aguirre pub l icou—asdepoi s na Co l lect . Max . Concilior . B isp . , T . 3 , p . 34 e d

'

a

hi passaram para a grande Collecção de Concí lios deMansi (Veneza T . 2 1 , p . 1 33 . Barbosa (Catal . das

Rainhas de Portugal , p . 46 e segg . ) pretendeu negar a an

thenticidade destas ac tas que con trariavam as suas opi

n iões , mas com tão fraco s fundamentos, que J . P . Ribeiro

as citou como não duvidosas no T . 3 , P . 1 , p . 65 e 66 das

Dissert . Chrono]. Pôde haver erros nas co p ias que del

las se tiraram , e de certo os ha ao menos nas datas relativas al gumas con fi rmaçõ es posteriores : mas isto não

bas ta para inval i dar 0 documento . Sobre estas subscrip

çõ es dos ausen tes veja— se Mabillon,De Re Diplomat .

,L . 2 ,

c . 2 0 .

(2 ) Cum omnibus j í lus et j í líabus suis signi íica evidentemente na subscripção das tres primeiras 0 mesmo que nas

dos barões , que depois subscreveram , as palavras omn i

progenie nostra f utura .

78 H I STOR IA DE PORTUGAL

mãos,destruindo os gados e plantíos ; emfim ,

e spalhavam tal terror entre a gente dos campos , que oshabitantes das vizinhanças do mar durante a forçado estio abandonavarn os seus lares ou escondiamse em cavernas

,onde podessem ao menos salvar a

vida dos repentinos saltos dos sarracenos . Por estaepocha tinha crescido tal ponto audac ia dos inimigos que se tornava indispensavel occorrer tamanha ruína . O activo bispo de Compostella ,

1nan

dando vir de Genova , onde então florescia scien

cia naval obreiros babeis , ordenou se construissemduas gales

,que , dirigidas por pilotos genoveses e

guarnecidas com soldados e marinhagem de Padron ,

saíram para as costas do Gharb . Os estragos queahi fi zeram desaggravaram ,

até certo ponto,os

chri stãos dos que antes haviam padecido . Com estaexpedição

,em que foram destruídos muitos navios

dos sarracenos , Portugal ganhou 0 fi carem os seusportos mais livres para O pequeno commercio costeiro que então faz ia , e Gallize convertida em alvoprincipal da vingança dos sarracenos , que contraella especialmente dirigiram nos annos seguintesas suas tentativasAo mesmo tempo que D iogo Gelmires buscava

assim attrahir as sympathias populares , defendendoGalliza das aggressões dos mouros , não se esque

c ia de promover por todos os outros meios realisação das suas ambiciosas miras . Quaes estas fossem transluz do seu panegyrico historico ( íeito porordem delle proprio ) 0 qual chegou até nó s com Otitulo de Historia Compostellana . Viviam os

'

aucto

res deste livro em tempos demasiado rudes e faltosd arte , e por i s so não souberam dar às acçõe s do

( 1 ) H ist . Compo stell. , L . 1 , L . 2, c . 2 1 .

L IVRO 1 79

seu patrono 0 aspecto de honestidade e rectidão queintentam — attribuir-lhes . Gelmires era homem deintoleravel vaidade e de não menor cubiça ,

e parasatisfazer esta s duas paixões nenhuns meios julgava vedados a corrupção , a revolução

, guerra ,

insolencia , à humilhação , os enredos occultos eramas armas a que succ essivamente recorria

,conforme

as circumstancias lhe indicavam conveniencia deusar de umas ou de outras . De sde a sua apparentereconciliação com D . Urraca

,de que ha pouco fize

mos menção,parece que elle não cessara de promo

ver secretamente as perturbações civi s . Pedro Froylaz , conde de Trava, era na apparencia 0 cabeça deum partido que pretendi a despoj ar rainha do governo ou pelo menos separar da coroa Galliza eos districtos de Salamanca e Zamora Estremaduras)para constituir emfim um governo , na realidadeindependente , para 0 seu pupillo Affonso Raimundes . Havia estreita amizade entre Gelmires e 0 con

de de Trava , e as suspeitas de connivencia do b ispocom os partidarios do infante

,su speitas que his

toria parece legitimar , deram provavelmente motivo ao procedimento de D . Urraca . Esta

,vindo á

Galliza , segunda vez tentou prender 0 ardiloso prelado , que segunda vez lhe baldou os intentos resis

tindo com mão armada . Cedeu rainha,e quando

voltou para Castella , senão mutua confiança,ao

menos a paz parecia re stabelecida . Mas é evidente

que entre ambos devia subsistir inimizade e temor .

Não tardou nova tentativa de prisão do l ado de D .

Urraca,nem Gelmires tirar mascara . Declarou

se pelo infante ,. e os barões de Galliza que ainda se

não haviam unido ao conde de Trava seguiram ,de

boa ou de má vontade,0 exemplo . Pedro Froylaz

d irigiu— se entã o com 0 seu pupillo Compostella ;mas a rainha retrocedeu immediatamente para Gal

80 H I STOR IA DE PORTUGAL

liza com os cavalleiros que pôde ajunctar para soccorrer os poucos que ainda obedeciam alli á suaauc toridade . O s descontentes da nova revoluçãocomeçaram unir- se-lhe , e ella marchou para Com

postella ,ao mesmo tempo que procurava com lar

gas promessas mover 0 animo de D iogo Gelmirespela cubiça trahir causa que tinha abraçado .

Ernquanto 0 conde de Trava saía com 0 seu exer

cito fim de procurar ensej o de dar batalha D .

Urraca , os parciaes desta , que eram a maior partedos burgueses , abriram — lhe as portas . Já , porém ,

O bi spo fi zera com que 0 infante se retirasse da ci

dade,emquanto elle , vendo — se abandonado do povo

que 0 aborrecia cordealmente,se fortifi cava n0 edi

flcio da cathedral com os seus homens d*

er1nas .

Conhecendo , emfim, que era inutil resistencia

,

humilhou — se constrangido p ela necessidade,tanto

mais que 0 conde de Trava,de cuj o exercito muitos

transfuge s tinhampassado para 0 campo da rainha ,não se atrevera accommetê — la

,e se havia retirado .

Todavia,corn a fuga de Pedro Froylaz e com a

submissão do turbulento Gelmires , 0 mais influent ee perigoso 1n1 1n1g0 de D . Urraca

,ella não obteve a

paz . Um dos barões da Galliza ,Gomes Nunes , se

nhor de muitos castellos e que trazia soldo grandenumero de homens d

'

urmas e peões , proseguiu na

guerra a favor de Affonso Raimundes . D . Urraca intentou subjugá-lo

,marchando sitiar os logares que

tinham voz pelo infante ; mas um novo adversarioveio embargar-lhe os passo s e fazer com que

,em vez

de cercar Gomes Nunes,se visse si mesma sitiada .

Estas cousas passavam-s e nos primeiros mesesde 1 1 1 6 . No

. anno antecedente,como d issemos

,

D . Theresa assistira pacifi camente com sua irmanás cortes de Oviedo , e nem a h istoria , nem os documentos dessa epocha nos indicam que houvesse

LIVRO 1

motivos alguns extraordinarios para a boa barmonia se quebrar entre as duas írmans . Fora escusadoprocurar outro que não sej a soltura das paixões

proprias de tempos semi-barbaros . Os pretextos quehoj e se buscam para cohonestar ainda as guerrasmai s injustas sabiam-se aproveitar

,se occorriam

,

mas não se faziam nascer,nem se inventavam com

0 profundo artifi cio da moderna política . A amb i

ção ,turbulencia

,ingratidão eram ferozmente

sinceras, quando hypocrisia não alcançava facil

mente dis farçá — las . Se , como todas as probabilidades 0 insinuam , D iogo Gelmires , ligado com

Pedro Froylaz , era intelligencia que dirigia occultamente guerra civil na Galliza ,

e se entre elle eD . Theresa havia as relações cuj a existencia pareceresultar da elevação de Hugo ao episcopado da diocesse portucalense , nada mais natural do que fazerentrar a infanta dos portugueses na vasta conspira

ção que , rebentando nas Estremaduras , tão rapidamente lavrou por toda Galliza ,

até porque à Viuvado conde Henrique não falmriam desej os de irreconquistando nascente independencia dos pro

prios dominios , qual,pela sua accessão á asseln

bléa de Oviedo , de certo modo resignara . Seja 0 quefor , é certo que , tendo D . Urraca d ividido o exercitopara cercar os castellos dos rebeldes e demorandose no de Suberoso ,

0 conde Pedro Froylaz e ainfanta D . Theresa com tropas numerosas vieramcercá — la ella . Então a rainha fez aproximar ' assuas forças e

,protegida por estas , retirou-se pera

Compostella

(1 ) Hist . Compostell .

, L . 1 , c . 1 0 7 1 1 0 :'

cu1n reg ina ve l letobsidere s ibi rebelles , obsessa es t ab eis . Comes P . pedago

gus regis et inf antisa Terasia soror reginae, domina totiusPortugal ia , cum exercita magno obsedere reginam in

VOL . II .

82 H I STOR IA DE PORTUGAL

Ficaram desbaratados o' conde e a infanta

,ou

D . Urraca pôde apenas evadir— se ao cerco ?-As palavras do unico historiador contemporaneo que nos

transmittiu aquelles successos parece favoreceremsegunda interpretação ; mas 0 que se passou depoisdesse acontecimento persuade primeira . Em

Compostella os burgueses tinham-se valido dasdesintelligencias da rainha com O bispo

,senhor da

c idade,para formarem uma dessas ligas populares

que depois , dilatadas e aperfeiçoadas , tão celebresse tornaram na historia de Hespanha com 0 nomede irmandades . A vida municipal surgia energicaem meio das luctas dos poderosos , e D . Urracaaproveitara habilmente conj uração dos compostellanos para annullar influencia e . os recursos _doprelado

,approvando-a e collocando-se de certo modo

á frente della . Voltando de Suberoso ,demorou— se

mui pouco alli , partindo para Leão , e apesar de queos burgueses aconselhavam que se vingasse deGelmires

,deixou— o em paz

, postoque humilhado ,talvez para que 0 odioso da sua presença alimen

tasse 0 ardor dos populares e ao mesmo tempo ser

visse de seguro penhor de mutua união e de lealdade para com ella . Se os inimigos não houvessemsido destroçados

,fora pouco provavelque D . Urraca

abandonasse assim Gallize ,aonde só viera para os

castigar. E'

por isso que nos parece mais de crer queD . Theresa e Pedro Froylaz fossem desbaratadosem Suberoso .

Mas a partida da rainha foi como 0 signal denovas luctas . O conde de Trava com seus dousfllhos

, Bermudo eFernando ,0 qual j á anteriormente

se distinguira no meio desta s perturbações as so

castro Suberoso . Sed regina . ascito exercitu suo , evas it e treversa est Compostellam Ib id .

, c . 1 1 1 .

LIVRO 1 3

lando 0 districto saliniense,avançou immediate

mente com os seus. alliados para as cercanias deCompostella ,

matando e captivando os homens edestruindo os gados . Theresa ,

affeita á dura vidados campos , talvez 0 acompanhava nesta guerra .

Ahi,no meio das fadiga s e . riscos dos combates ,

despontaria essa affeição entre Fernando de Travae D . Theresa que tão notavel se tornou annos depoise que veio a produzir em Portugal scenas analogasàs que se representavam então na GallizeOs soccorros dados por D . Theresa ao conde

Pedro Froylaz não foram gratuitos . Os seus dominios dilataram-se

,conforme parece , desde esta

epocha,para além do M inho pelos distrietos de Tuy

e de Orense,cuj os b ispos j á seguiam

,tres annos

depois,pelo menos , a sua corte , exercendo ella n0

territorio, de Tuy actos de

'

senhorio por largotempo Mas os primeiros annuncios da procella

que se alevantava nas fronteiras meridionaes dos

s eus estados começavam apparecer , e é provavel

que para occorrer ella voltasse então a Portugalcom as forças que tinha na Galliza ; porque nenhunsvestigios mai s encontramo s da sua intervenção nosbandos c ivis que assolavam aquella provincia .

( 1 ) As palavras da H ist . Compostell . (L . 1 , c . 1 1 1 , g 3)Comes Petrus cum et coadj utor ibus suis , e a não

existencia conh ecida d e algum d ip loma de D . Th eresaexpedido em Portugal neste anno an tes de novembro ,

claramente indi cam persi stencia da in fanta em Galli za .

(2 ) Portugalensis Regina Tudem et circumquaque olíminvasera t, sib ique ea mancipaverat : H ist . Compostell. , L .

2, c . 40 . Em 1 1 1 9 os b i spos de Tuy e Orense con

firmam j á a doaçã o de Lourosa á Sé . de Coimbra Liv .

Preto , f . 1 35 Veja— se ácerca do tempo em que ainda

durava este domínio de D . Theresa além do Minho , E sp .

Sagr , T . 1 7 , p . 81 , e T . 2 2 , p . 2 56 e 2 58.— Yepes , Chron . de

S . Beni to , T . 7 , App . f . 2 4 v .

84 H ISTOR IA DE PORTUGAL

q uanto D . Theresa buscava assim alargar aonorte os limites dos proprios estados, aproveitandoas inquietações da monarchia , os s

'

arracenos atra

vessavam os ermos que se“

e stendiam entre as fronteiras portuguesas do sul e as praças do Gharb na

margem direita do Tej o , e vinham cercar 0 castellode Miranda sobre 0 Doessa ao sueste de Coimbra .

Subjugado 0 de Miranda ; mettidos á espada oureduzidos à escravidão os seus defensores , os mus

sulmanos , atravessando para 0 poente , ousarampassar 0 Mondego e accometter 0 castello de SanctaEulalia juncto de Montemor . A sorte deste foi igualá do primeiro ; porventura ambos mal defendidosem consequencia da expedição em Galliza . Os

sarracenos arrasaram-no até os fundamentos edepois

,retrocedendo , dirigiram — se ao de Soure .

Aqui,porém ,

O terror dos habitantes tornara inutil

0 commettimento ; porque , lançando fogo '

áquella

povoação e desamparando-a , haviam-se acolhido aos

muros de Coimbra . Miranda , Soure , Sancta Eulalia ,com outros Castellos que por esses tempos existi

riam ,formavam uma linha curva de fortifi cações

avançadas, que defendiam a capital do districto

pelo lado do oriente , meio-dia e p oente . Destruidoselles

,

-C0 i1nbra ficava exposta ao primeiro embate

dos inimigos : Esse , talvez , foi o objecto desta entrada

feita '

ainda em 1 1 1 6 e que os historiadores arabesconfundem com a do anno seguinte dirigida pessoal

mente pelo príncipe dos almoravides ; ao passo que ,se attendermos ao nome que as memorias christansdão ao general sarraceno na invasão deste anno , ellaparece ter sido capitaneada pelo wali de Cordova ,Yahya Ibn Taxf m ( 1 )

(1 ) Chron . Lusit .,Chron . Conimbric . e Chron . Lamec

era 1 1 54 . Salvatus , Vita S . Martini Sauriensis , na Mon .

86 H I STOR IA DE PORTUGAL

Aly passara de novo 0 E streito e voltara Ceuta,

satis feito com a vingança que tomara dos christãos .

Nos districtos , porém , de leste , as armas mussulmanas haviam sido m

'

a] succedidas . Temin,destro

çado pelos aragoneses , tinha— se retirado para Valencia

,e finalmente Affonso I Viu realisada d ,ahi

pouco a sua antiga pretensão de conquistar Sara

goça Dez mil almoravides, que haviam sido

mandados d 'além mar em soccorro daquella cidade ,chegaram tarde para a salvar ,

e só serviram paratornar mais brilhantes as Victorias do rei aragonês ,

ao qual bem quadrava 0 appellido de lidadorTranspondo 0 Ebro para 0 sudoeste , Affonso e os

seus cavalleiros precipitaram— se como uma tó rrente

pelo territorio mussulmano e ,desbaratando mai s

uma vez Temin na terrível batalha de Gotanda(j unho appossaram

-se de Kalat Ayub (Calataiud ) e successivamente de muitas outras povoaçõesimportantes dos sarracenos .

Ao passo que O rei de Aragão proseguía tão Vigorosarnente guerra contra este s , continuava pelosseus capitãe s disputar a D . Urraca posse dacoroa de Leão e Castella ou

,como dizem os histo

riadores arabes , não cessava de fazer entradas nosterritorios de Al-dj uf (do norte) . Ainda durante 0

anno de 1 1 1 6 0 conde de Trava e 0 seu pup illo sehaviam reconciliado com a rainha por di ligencia deGelmires , que , odiado do povo

,constrangido

vera inquisi tione memorarent , alteris (aliás lítieris ) portugalensis reginee ,

vel barones (al . baronum) queequze ipsipro certo noverant , edocti , hoc in anno mu ltis hinc inde

milibus (al . militibus ?) amiss is ,suburb io e tiam Con ím

briae commato (al. cremato) in fra muros c iv itatis ,reginam

v ix v i tam servasse Boson is Ep is t . ad Pasch . ex Conc il

Burgens i (era 1 1 55) Liv . Preto ,f . 2 39 v .

LIVRO I 7

guerrear 0 conde , seu occulto alliado, e temido por

D . Urraca , só assim podia saír de situação difficultosa em que a final 0 tinham collocado dobréz e

perâdia do seu caracter . A'

sombra desta pacificação,

em que 0 conde de Trava se não esqueceria de aincluir D . Theresa pôde empregar todos

os seusrecursos em resistir á furiosa invasão do amir deMarrocos , 0 que de outro modo lhe houvera s idoimpossível . Neste respiro que davam á monarchiaas di scordias civi s , guerra com 0 Aragão vinhasubstitui-las . Em 1 1 1 7 um exercito combinado deLeão

, Galliza , Estremaduras , Castella e Asturiasmarchou para a fronteira aragonesa , e lucta pro

trahiu-se ,mais ou menos violenta

,entre os don s

estados pelos annos seguintes até a morte de D . Ur

raca, succedída em 1 1 2 6

,como adiante veremos .

O s reveses recebidos nas fronteiras orientaes , as

perturbações intestinas e ,mais que tudo , revolu

ção que a nova seita de Al—mahdi ou dos Almohadesprod uziu brevemente em Africa obrigaram osalmorav ides affrouxar nas correrias pelas terrasdos christãos . Se acreditassemos as chronicas arabes

,

em 1 1 2 0 Aly teria feito uma segunda entrada em

Hespanha e , marchando para 0 Gharb , houveracercado e tomado L isboa ou , segundo outros , uma

( 1 ) Em 1 1 1 9 allían ça'

estreita entre D . Urraca, os par

ciaes do infante e D . Theresa parece concluir-se das palavras do b ispo do Porto , Hugo , die tas em Burgos , ondefora reconhecid0 , passand 0 por al l i d isfarçado e 1n romeiro ,

por man dado de ' D io go Gelmires'

: neque reg ina

D . Urraca , neque fi l io suo rege A . neque ab inf antissaPortuga

—l iee'

m issus pro íi c iscor in Fran ciam aut Burgundiam ; hoc enim pertimesc it rex cester aragonens ís Hi s t .Compostel .

, L . 2 , c . 1 3 , g2 . Isto é confirmado pe los documen tos do mesmo anno e do antecedente , em que se

vê reinar harmonia en tre D . Urraca e seu f i lho ( Flores ,Reynas Cath0 1 .

, T . 1 , p .

88 H I STOR IA DE PORTUGAL

cidade chamada Medina Sanabria , voltando paraAfrica em 1 1 2 1 , depois de assolar e submetter todo0 occidente . Mas O silencio dos monumentos christãos ácerca destes successos extraordinarios , con

fusão e variedade que reinam semelhante respeitonas relações arabes e , até , as contradições em que

ellas laborarn , tudo nos persuade que os escriptoresmussulmanos quizerem ,

com entradas e Victoriasimaginarias , tornar menos triste O quadro dasperdas experimentadas nos districtos orientaes e donenhum resultado importante que 0 amir tirara nooccidente da pas sada tentativa contra D . Theresa ( 1 )No decurso daquella calamitosa epocha ,

em que

as províncias do norte e oeste da Península eramsuccess ivamente opprimidas e devastadas pelasdiscordias civis , pela guerra com O rei de Aragãoe pelas invasões dos almoravides

,os tre s annos de

1 1 1 7 a 1 1 2 0 passaram comparativamente tranquillos ,sobretudo para Por tugal . Nenhuns indícios seencontram de que D . Theresa ou os ricos— homensdos seus estados interviessem na empreza guerreirade D . Urraca e de seu filho

contra os aragoneses ,para a qual v imos terem marchado as tropas dequasi todos os outroá districtos . Creríamos que osbarões de Portugal procediam em tudo guiadospelo pensamento de consolidarem pouco a pouco asbarreiras entre monarchia leonesa e a província

que habitavam ,se fosse lícito attribuir guerreiros

rudes e, por assim dizer ,

semi-barbaros um systemaao mesmo tempo generalisado e profundo , que honraria ainda uma epocha muito mal s illustrada .

Todavia,é impossível deixar de reconhecer na

serie dos factos que illustram historia do estabe

( 1 ) Vej a-se ácerca destes ultimos 55a no ta IX no fim do

vo lume .

L IVRO 1 89

lecimento da independencia portuguesa certo instineto de vida política individual nas populaçõesáquem do M inho

, que j á annuncia nellas à futuraperseverança com

'

que resistiram desde então atéhoj e assimi lar-se ao resto da Hespanha e incorporar — se nella . E

,ao passo que este espirito publico

se desenvolve e progride , vemos D . Theresa,rece

bendo em Leão e Castella O titulo indefinido e sin

gular de infanta dos portugueses , exercitar entreestes um poder que torna duvidoso 0 predomíni ode D . Urraca e , até , conservar 0 senhorio de Tuy ede Orense , fazendo com que sigam sua corte osprelados daquellas dioceses .

De fei to, a posse de Tuy foi O motivo ou 0 pre

texto de um rompimento de hostilidades em 1 1 2 1 .

O territorio do nascente Portugal , que até ahi

escapara de ser theatro das luctas civis , teve finalmente O seu quinhão nos males que Opprimirammonarchia durante O longo e desgraçado governode D . Urraca . As circumstancias deste successo eas suas consequencias politicas foram assás graves ,para que haj amos de lançar toda a luz possívelsobre elle , e i sso não será facil emquanto pretendermos desligar os acontecimentos desta parte daHespanha dos que eram communs á monarchialeonesa . Em nosso entender O erro vulgar dos historiadores nacionaes é 0 quererem determi nar datapreci sa á independencia de Portugal ; é 0 imaginarern como simples e

,digamos as sim

,fundido de um

só j acto um successo complexo,que

,progredindo

com phases mai s ou menos rapidas , veio a ser por

fim úma eousa definida e completa . Assim , segundoepocha que escolhem para assignalar instan

tanea passagem do reino de Portugal do não-ser á"

exi stencia,vêem-se obrigados a rej eitar como falsos

ou desprezar todos os monumentos que se oppõem

90 H I STOR IA DE PORT UGAL

á propria op inião,ão passo que , _ p0 r sua parte

,

alguns escriptores castelhanos rej eitam 0 11 fingemesquecer os monumentos em que ess

º

outros se estribarn . E por este modo que O diploma se tem oppostoao diploma

,chronica á chronica

,interpretação

á interpretação, com uma gravidade e um peso de

erudição de que _

é impossível,ás vezes , deixar de

sorrir . O historiador,porém , que não se collocar á

luz falsa em que um mal entendido pundonor na

cional pôs os que . 0 precederam,longe de ahando

nar as fontes historicas só porque se contrapõemuma opinião formada antecipadamente , acceita — as

todas quando intrinsecamente puras e deduz dellasas suas conclusões . Os que procedem por d iversomodo

,não sómente avaliam Ina] esse grande facto

da independencia,mas ainda fechando — se num

horisonte limitado,attribuem naçãó logo no seu

berço urna individualidade tão profunda , que seinhabilitam para avaliar bem 0s homens e as cousas ,desprezando as soluções que factos

,aliás inexpli

caveis ,'

lhes ministraria historia das paixões e dosinteresses que então se

'

agi tavam no seio da monarch ia leonesa , ligada ainda ao novo estado que se

formava no occidente da Península por mil laços

que só gradualmente se podiam quebrar . As sim ossuccessos occorridos em Portugal durante as primeiras decadas do seculo XII são quasi sempredeterminados pelos

, acontecimentos communs daHespanha christan . E 0 que até aqui temos visto , eé 0 que ainda veremos por alguns annos na prosecução desta narrativa .

Como dissemos , D . Theresa tinha — s e apossado,

segundo todas as probabilidades em 1 1 1 6 , de uma

parte do territorio da Galliza,e com certeza era

senhora de Tuy e Orense no anno de 1 1 1 9 , em que

os bispos daquellas duas dioceses seguiam a sua

L IVRO 1 9 1

corte e confirmavam em Coimbra as mercês que ellafazia aos seus subditos de

'

Portugal . A boa barmonia

,ao menos apparente , reinava , todavia , entre

ella e sua irman , e O rei de Aragão consideravaViuva do seu antigo alliado c0 1n0 ligada intimamente com os proprios inimigos . Na assemblea deOviedo in fanta dos portugueses tinha de certomodo de finido a sua situação poli ticá relativamentea D . Urraca independencia completa de Portugal

, sua desmemb ração da monarchia não estavaconsumada

,e a guerra que D . Theresa fizera na

Gallize em 1 1 1 6 provava tanto independencia dosseus domínios como provaria dos do conde deTrava ou dos outros fidalgos gallegos quem ellaauxiliara . Feita a paz nesse mesmo anno ,

as cousastornaram naturalmente ao antigo estado , e especie de supremacia de D . Urraca , reconhecida porD .Theresa n0 anno antecedente , continuava subsis

tir . Uni camente retenção de uma parte da Gallizameridi onal pela infanta era um facto que os successos posteriores nos mostram ter fi cado indefini do .

A rainha de Leão e Castella visitou essas provincias por duas ou tres vezes nos fins de 1 1 2 0 e nos

primeiros meses de 1 1 2 1 . A guerra do Aragãocorria frouxamente

,porque Affonso I , empenhado

nas suas gloriosas campanhas contra os sarraº

cenos ,

não podia conduzi-la com grande vigor . A estacausa se attribuiria volta de D . Urraca ao outroextremo dos seu s estados

,se não fosse mai s prova

vel desse causa a essa vinda a trama que de novo se

urdia para lhe tirarem coroa e pôrem-na na

cabeça do infante Affonso Raimundes chegado ápuberdade , para quem naturalmente se voltavamos olhos de todos os poderosos senhores inimigosda rainha . A Em de ' podermos explicar razoavel

mente as cir'

cumstancias que concorreram para a

92 H I STORIA DE PORTUGAL

invasão dos estados de D . Theresa em 1 1 2 1 , e ne

cessario conhecer essa trama , em que , como era deesperar ,

figura , postoqne entre sombras , 0 façanhosoGelmires .

Este homem,cuj a vaidade era igual á sua cubiça ,

desej ava ardentemente ver elevada a Sé de Sanctiago á categoria de metropolitana . Tinha tentado 0negocio no tempo dos papas Paschoal e Gelasio ,sem que 0 chegasse a alcançar . A eleição de Callixto II veio reanimar — lhe as esperanças . Callixto

era irmão do conde Ra imundo ,e estava

, por conse

quencia , l igado por estreitas relaçõe s com Hespa

nha . Pedia Gelmires que fosse transferida cadeiraarchiepi scopal de Braga para Compostella ,

transfe

rencia tanto mais importante quanto era esse 0 meiode humilhar 0 grosseiro Pelagio ou Paio Mendessuccessor de Burdino e irmão dos senhores da Maia

,

Sueiro e Gonçalo Mendes D . Pa io tinha — se apossado de varios bens na diocese de Braga que pertenciam á Sé de Compostella e recusara re stitui los .

Bastava isto para suscitar 0 rancor do prelado com

postellano ; mas accrescia que D . Paio ,como me

tropolita da Galliza , tinha necessariamente nestàprovincia uma superioridade que morti fi cavaGelmires . Giraldo , conego de Sanctiago ,

sollicitava na

curia à pretenção ,empregando as importunações

,0

dinheiro e a protecção de poderosos barões franceses

,dos quaes O bispo Gelmires soubera captar

benevo lencia . O papa . eleito , em França , reservavae ste negocio para 0 resolver no concílio que ia reu

nir em Tolosa quando uma diffi culdade po

( 1 ) Pelagius Menendiz quidam idª

iota : Hist. Compos tell.,

L . 1 , c . 1 1 7 . Cunha,Hist . eccles . de Brega, P . 2 , c . 1 1

,

5 4

94 H I STOR IA DE PORTUGAL

a nomeação de legado do papa nas províncias ecclesiasticas de Compostella e Braga (fevereiroN bulla de erecção da nova metropole Callixto declara que os rogos d

'

Af fonso Raimundes contribuiram para esta resolução . Semelhante s palavras , se

as comparamos com a s queixas feitas no anno anterior

,provam que Gelmires nesta concessão do

pontífi ce recebia 0 preço da sua perfi dia para comD . Urraca No meio dos enredos políticos 0 novolegado não se esqueceu de D . Paio

,commettendo

contra elle vexames taes que este recusou assistir aosynodo convocado por Gelmires n0 anno de 1 1 2 1

,

recus a que O papa approvou depois como justa ,exemptando diocese braeharense da legacia docompostellano . O receio de que este pretendesseaproveitar — se da sua situação para 0 esbulhar daposse de uma parte do senhorio de Braga , sobre 0qual versayam entre ambos disputas , foi talvez Omotivo por que D . Paio buscou obter da rainha deLeão e Castella , não só a confirmação do couto dasua Sé , mas igualmente que este fosse ampliado .

diploma expedido por essa occasião,0 qual ainda

existe,nos mostra que D . Urraca se considerava

( 1 ) A narração deste bem como dos antecedentes e

posteriores , resulta de um estudo attento do 2 .

º livro daHi storia Compostellana , 0 que dizemos aqui para evitarrepetição de ci taç ões . Que por este anno de

'

1 1 2 0 se naviam renovado d issen sões entre D . Urraca e seu fi lho vêse dos documentos contemporaneos (Flores , R . Cath .

,T . 2 ,

p . mas_da narração da H istoria Compostellana re

sulta que estavam apparentemente congraçados em 1 1 2 1 ,

porque O mo ço A ffonso Raymundes acompanhava sua

mãe na exped ição áquem do Minho,talvez porque a re

volução , que se preparava nas trevas , não estava perfei

tamente amadurec ida .

L IVRO I

como revestida , ao menos de direito , , da supremaauctoridade na província de PortugalO papa não cessava de recommendar ao arcebispocausa do j oven Affonso , e , porventura , es tas re

commendações importavam as do cumprimento deuma promessa ; Ao mesmo tempo O duque d

º

Aqui

tania,Guilherme IX , e a condessa de Flandres

,

parentes do infante , escreviam Gelmires cartasanalogas , . chegando O duque declarar— lhe que es

tava resolvido a empregar quaesquer meios parafazer seu sobrinho herdeiro de Affonso VI

,e avi

sando— o de que sobre tal materia se entendesse comPedro Froylaz . Então 0 ardiloso prelado impetroude Callixto II uma bulla que 0 desligava dos juramentos feitos a D. Urraca e lhe impunha O deverde guardar aquelles que fizera ao infante . Depoisdi sto elle se cria hab ilitado para entrar em algumatentativa

,cuj a natureza é faci l de adivinhar ; mas

0 cardeal Boso , tambem legado em Hespanha, di s

suadiu-o disso . Postoque , diz ia elle , muito desejassever levar 0 negocio cabo ,

'

aconselhava— o não ten

tasse nada de leve,porque lhe estavam armadas por

toda a parte ci ladas . Na sua op inião,0 melhor seria

fazer a paz com a rainha . Assim procedia 0 arcebispo , ao menos simu ladamente . Chegava perse

(1 ) Liber Fidei , f . 54 V . nas Mem . da Acad .

,T . 1 3 , P . 1 .

Hist . Compos tell .,L . 2 , c . 16 e s egg . A confirmação do

conto de Braga por D . Urraca parece-nos evidentementecorrelativa às bullas que e levaram Gelmires ao arch iepis

copado e á legacia de Merida e Braga . Destas bullas , passadas em feverei ro e março , haveria notíc ia na Hespanhaem junho ( quando se pas sou a carta de couto de Braga) ,postoque só em Agos to se pub l icassem ,

solemnemente . Aconfi rmação de Gelmires nesse d ip loma nada prova contraa nossa. opin ião . El le não pod ia recusar vivendo na

corte , apparentemente de accordo com a rai nha .

6 H I STOR IA DE PORTUGAL

guir aquelles mesmos que mais seus parciaes eram ,

como Fernando Peres de Trava,alferes— mór ou

che fe das tropas archiepiscopaes ( 1 ) e que da mãode Gehn ires tinha aleaidarias e terras em soldo ouprestamo . Um castello que este havia edifi cado noterritorio de Sanctiago foi derribado , e sorte igualcoube varios outros de dlversos nobres . Apesardestas demonstrações exteriores

,D . Urraca parece

que não ignorava os enredos daquelle homem astucioso e sem fé ; mas , ou porque ja não podesse

luctar com elle frente a frente ou pela fraqueza pro

pria do seu sexo , não ousava tomar uma resoluçãoenergica . As tentativas indirectas para 0 prendereram desfeitas pelo prelado

,

"

e a rainha para 0 miti

gar Via-se constrangida augmentar-lhe influen

cia e 0 poderio . Nestes enganos mutuos'

nesta

guerra covarde e tenebrosa passaram os primeirosmeses de 1 1 2 1 . Então occorreram os successos que

interessam e specialmente a nossa historia,para ex

plicar os quaes era preciso comprehender situaçãodos dons partidos e ,

sobretudo,a de D iogo Gelmi

res, especie de Mephistopheles sacerdotal , cuj o

caracter é íassás negro para“ ainda sobresair no

quadro da anarchia e dos crimes que despedaçavam0 seio da monarchia leonesa .

moço Affonso Raimundes simulava entretantonão proceder de accordo com os fidalgos 'do seu par

tido , que aliás trabalhavam , como 0 tempo mostrou ,

em dispôr os elementos de uma revolução,cuj o re

sa ltado , differente do das tentativas até ahi feitas ,fosse decisivo . D . Urraca veio então Compostella

acompanhada de seu fi lho . Foi nessa occasião que

se resolveu a guerra com Portugal , dando— se por

(1 ) ejus (se . archiepiscopi ) , 1nilitiae princeps H ist .Compostell L. 2

,c . 51

, 5 2 .

L IVRO 1 7

motivo que D . Theresa havia noutro tempo invàdido Tuy e as suas cercanias e que retivera essesterritorios debaixo do proprio dominio Seria

,

talvez , esse 0 fundamentq da'

empreza ; mas tem

visos de ser apenas um pretexto especioso,se

,como

cremos,

occupação daquelle territorio remonta acinco annos antes ,

durante os quaes as duas irmans

conservaram entre si paz, quer fingida , quer sin

cera . D . Urraca,aproveitando alliança apparente

de Gelmires , tinha feito damnos consideraveis aos

seus inimigos na Galliza 0 mais provavel é queD . Theresa estivesse ligada com elles e que sua

irman , instruída até Certo ponto do que se forjava,

quizesse dar um golpe no adversario mais poderoso ,como era D . Theresa

, que dispunha dos recursos deuma província inteira . Porventura

,tambem Gel

mires aconselhava este movimento,ou para des

pertar 0 incendio ou para entreter rainha numa

guerrap erigosa ,cuj os cuidado s di strahisseln de

seguir O fi o da conspiração na Galliza .

Já no princípio deste anno ou do antecedente ,Fernando Peres , fi lho de Pedro Froylaz e alferesmó r do arcebispo , vivia na corte de D . Theresa

,de

quem obtivera os mais importantes governos quelhe podi am ser confiados

,os do districto do Porto e

do districto de Coimbra com O titulo de consul ouconde

,como 0 tivera 0 borgonhês Henrique

(1 ) Nempe Portugalensis reg ina Tudem et circumquaqueolim invaserat , s ibique ea manc

'

ipaverat Hist . Compo stel l . , L . 2

, c . 40 .

(2 ) Consule D . Fernando dominante Colimbrie et Portugali , Doc . de j aneiro de 1 1 2 1 ex trahido do cartorio de

Lorvão na Mon . Lu s . , P . 3 , L . 9 , c .

-2 . Cf . Hist . Com

postel l . , L . 2 , c . 51 , e D issert . Chron .,T . 3 , P . 1 , p . 73 .

Na doação de Ulvar ia Odorio prior de Vi seu do 1 .

º de

fevereiro de 1 1 2 0 (Arch . Nac .,Gav . 1

, M. 7 , Nº 6) j á con

VOL . I I .

98 H I STOR IA DE PORTUGAL

Era preciso'

que as suas relações com a infanta dosportugueses fossem antigas e súa influencia no

animo della excessiva para que um simples cavalleiro e

, postoque filho segundo de uma das maisnobres famílias de Hespanha

,soldado do arcebispo

de Compostella ,subis se tão elevados cargos . A

boa harmonia do filho de Pedro Froylaz com 0 pre

lado subsistia ainda depois da guerra . Seguindocada qual 0 campo de uma das irmans

,amizade

entre os dou s não acabara,porque na realidade de '

viam ser estreitas as suas relações occultas . O vin

culo que os unia pôde , em parte,conhecer-se do

que até aqui temos relatado .

Resolvida invadir os estados da irman ,D . Ur

raca marchou com seu filho para Tuy na primaveraou no estio de 1 1 2 1 . Segu iu-a, postoque constran

gido 0 façanhoso Gelmires , acompanhado dosseus homens d

'

armas e dos cavalleiros villãos deCompostella , que por seus fó ros não eram obrigadosa avançar até 0 districto de Tuy

,mas que elle teve

artes de arrastar comsigo . Sabida aproximação doexercita gallego ,

D . Theresa com as forças que pôdecolligir veio acampar na margem esquerda do Minho . Os mimigos fi zeram alto na margernfronteira .

Mais proximo ao lado de Portugal , 0 ri p fazia na

quelle sitio uma insua . A posse della facilitava “

passagem , más defendiam-na as barcas portuguesas

firma Comes Fernandus . Este documento não tem ,todavia ,

inteira força , por ser uma pub lic a fôrma de 1 306 e por

ser um co .

(1 Bland íssimis aggreditur precibus (s . Gelmiridem ) utsecum i llõ ire non recuset : H ist . Compostell.

, L . 2,c . 40 .

Quem está a(f eito linguagem dos h istoriadores compostellanos , quando falam do seu patrono ,

sabe que bland iss imis prec ibus sign ifi ca por f orça .

L IVRO 1 9

que vogavam pelo Minho . Os destros marinheirosde Padron e alguns compostellanos com varios ca

valleiros escolhidos embarcaram da parte opposta evieram accomettê-las . Vencedores , em breve se apossaram da insua . Este successo levou O terror panicoaos arraiaes de D . Theresa , que foram abandonados , e , quasi sem combate

,D . Urraca entrou no

territorio inimigo . Nesta epocha de barbaridade ebruteza guerra entre os christãos assemelhava— se

nas devastações às correrias mutuas entre elles e ossarracenos . O exercito gallego , descendo para 0 in

terior da província ,incendiava

,roubava e assolava

impunemente'

as povoações e os campos,porque ,

fugindo desordenadas , as tropas portuguesas se

haviam dispersado . A conquista de Portugal corriarapida . Gelmires , porém , pesou as consequencias detal conquista e começou ,

segundo parece , a trabalharoccultamente para que se não realisasse um aconte

cimento que,augmentando força moral e material

do partido da rainha,empecia O progresso da cons

piração ,

ª

cuja existencia os factos até aqui narradosnos revelam .

Capitaneando forças avultadas,cuj a falta neces

seriamente devia embargar continuação da guerra ,

este homem que,para segurar no rosto mascara

hypocríta de uma fidelidade em que a propriarainha não cria e da qual elle pedira ao papa 0

absolvesse,não duvidara combater os seu s mai s

íntimos alliadós,nem destruir — lhes os castellos e

propriedades ; este homem vingativo e cruel sentiuum subito horror das atrocidades commettidas no

territorio português e um desejo invencível devoltar ao exercício das suas funcções episcopaes ,

pretendendo recolher-se para Galli'

za com as tro

pas compostellanas . Todavia,D . Urraca

,suspei

tando provavelmente qual seria 0 fi to deste ines

I OO H I STOR IA DE PORTUGAL

perado acces so de amor da humanidade , concedeu

que OS' burgueses de Compostella se retirassem

,

attentos os seus privilegios , mas recu sou a licençaao arcebi spo e aos homens d '

ermas que 0 seguiam .

Não descoroçoou elle ; escreveu ao legado Boso , que

j á vimos não era alheio , nem como agente deCallixto II 0 pod ia ser

,ás tramas que se urdiam . O

legado respondeu-lhe congratulando — se com elledas Victorias obtidas pela rainha e pelo filho mas

recommendando- lhe ao mesmo tempo com a maioreffi cacia que por nenhum caso deixasse de comparecer no concílio que se ia celebrar em Sahagun . Aconvocação deste concílio fora resolvida pouco antesda expedição contra Portugal ahi se deviam tracternegocios

,não só pertencentes á igrej a , mas tambem

ao estado,e por isso mal se comprehende como elle

se poderia ajunctar sem a

'

concorrencia da rainha . edo infante Affonso Raimundes , que haviam determinado reunião daquella assemblea e que seachavam retidos entre Douro e Minho por uma

guerra cuj o prospero progre sso lhes não permittiaabandonarem — na . A carta do cardeal legado

,evi

dentemente feita para facilitar a partida do arcebispo

,não surtiu effeito antes

,talvez

,serviss e para

tornar D . Urraca mais Vigilante sobre 0 procedimento deste .

A sorte das armas continuava mostrar-seadversa D . Theresa . Uma não pequena parte dePortugal achava — se j á subjugada : 0 exercito real

,

marchando pelo sul e poente,tinha chegado até as

margens do Douro , e a infanta rainha dos portu

gueses tinha retirado para 0 districto ao oriente. deBraga . Perseguida por sua irman , encerróu-se n0

castello d e Lanhoso , onde não tardou a ser si tiada .

As cousas tinham chegado à extremidade , tanto paraella como para os barões desta provincia . Tomado

1 0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

resolução atrevida para salvar a caus a em que seachava empenhadoIgnoramos quaes fossem nesse momento os facto ;

practicados por Gelmires conducentes ao seu fim .

'

E

certo , porém , que D . Urraca resolveu prendê-lo .

Era negocio delicado . Tinha elle comsigo os seushomens d '

armas tinha,além dis so

, parciaes no

exercito e uma influencia na Galliza que era impossivel desconhecer . Em frente do inimigo , seme e

lhante empenho tornava — se quas i inexequível pelacerteza de que os sitiados aproveitariam a

,

,lucta

intestina dos sitiadores para os destroçarem . E provavel que neste apuro rainha preferi sse congraçarse com irman deixar impune aquelle homemdesleal e hypocrite ,

contra 0 qual sentiria odio tantomais violento

, quanto se vira por longo tempoobrigada reprimi — lo e disfarçá-lo .

Fez — se de feito,a paz . Por quaes meios e por

intervenção de quem, eis 0 que não chegou até nó s .

Um tractado,porém

,existe celebrado entre as duas

irmans, que attribuimos esta conjunctu

'

re e que,

na verdade , fora d iffi cultoso de conciliar com outradata . Ou a situação de D . Urraca habi litouD . Theresa para negociar com immensa vantagema cessação das hostilidades

,0 11 aquella princesa

quiz assegurar a lealdade de sua irlnan ,confiando

lhe um senhorio muito mais ex tenso do que até ahi

dis fructara . Na convenção e j uramento feito pelarainha á infanta

, prometteu aquella conservar aesta amizade fiel e oppôr — se todo O mal que lheintentassem fazer . Concedeu-lhe

,além d isso

, 0 dominio de muitos logares e terras nos modernosdistric tos de Zamora

,Toro

,Salamanea e Avila com

( 1 ) Sobre este e os anteceden tes gg le iam — se atten tamen teos 4 1 , 42 e 51

, g2 do L . 2 da Hist . Compos tell.

L IVRO 1 1 0 3

as rendas e direitos senhoriaes destas_cidades ,

afóra outros nos de Valladolid e Toledo,obrigando

por isso D . Theresa que lhe j urasse amparo edefesa contra os seus inimigos

, quer mouros , querchristãos

,e a que lhe promettesse não dar acolhi

mento nenhum vassallo da rainha levantado comterras ou castellos , nem a nenhum traidor . Os

dominios novamente concedidos á infanta deviamser considerados como uma tenencia semelhante àdos que anteriormente possuía , no que , porventura ,só se fazia referencia às terras de Tuy e Orense , ouantes , como cremos ,

estas e às de PortugalO leitor , de certo , não esqueceu a cessão feita

por D ; Urraca a o conde Henrique quando pretendeu attrahi — lo ao seu partido

,nem que a di vi são

dos estados de Affonso VI assentada em Palencianão parece ter chegado realisar-se plenamentedurante a Vida do conde . Igualmente estará lembrado do modo como D . Theresa se houve

,depois

da morte delle,para tornar effectivas as miras

ambiciosas que lhe eram communs com O marido,e

das circumstancias que reduziram contentar-sedo senhorio de Portugal como provincia dependente de Leão . Comparando agora este facto com

essbutros _

e com as c onquistas feita s em 1 1 1 6 na

Galliza, tal comparação 0 levará,

'como nos leva anós

,vermos n0 tractado de Lanhoso uma reno

vagão , postoque mod ifi cada , daquellas antigas promessas e pactos . Neste persupposto , as terrascedidas ao conde teriam sido as de Galliza , de queD . Theresa se apoderara depois

,e as que sua irman

lhe cedia especifi cadamente pelo actual convenio,

entre as quaes se encontra Zamora, que sabemos

( 1 ) Nota X no fim do vo lume .

1 0 4 H I STOR IA DE PORTUGAL

tocara Henrique na divisão feita em 1 1 1 1 . .Se 0

conde,porém

,pretendera e obtivera cessão do

pleno e independente dominio dess es territorios ,havia entre os dons factos uma diff erença profunda ,a da vassalagem de D . Theresa , nascida das circums

tancias que tinham obrigado a infanta acceder áassemblea de Oviedo em 1 1 1 5.

Dados recíprocos fiadores da execução do tractado ,

as duas irmans parece terem convivido familiarmente ; ao menos os íntimos conselheiros da rainhajulgaram poder communicar D . Tbere sa 0 que setinha resolvido ácerca da prisão de Gehnires e os

meios que para isso s e haviam de empregar .

D . Theresa , porém , talvez por influencia de Fernando Peres , mandou avisar 0 prelado offerecendo

lhe ao mesmo tempo ou um dos seu s castellos paraelle se acolher , ou algum dos seus navios para

voltar Compostella . Gelmires, confi ado na recon

ciliação j urada com D . Urraca ou , 0 que é maiscerto , nos homens d

'

ermas que 0 cercavam,recusou

offerta , postoque antes deste aviso já corresse no

arraial uma noticia vaga da tentativa . Assim ,pondo

se em retirada para Gallize 0 exercito invasor,

elle não se apartou da rainha , quem tambemacompanhavam alguns subditos de D . Theresa

,

porque nos consta seguiam 0 campo O arcebispo deBraga e O bispo _de Orense . Chegados á margemesquerda do M inho , rainha ordenou passassemprimeiro os cavalleiros de Gelmires , 0 que effectiva

mente se executou ,fi cando este com 0 infante e com

ella para depois seguirem com O resto do exercito .

Apenas,porém ,

os homens d'

armas do compostellano pisavam 0 territorio gallego

,e começavam

acampar — se ,rainha mandou prender 0 prelado ,

que,na impossibilidade de resistir , contentou — se de

protestar contra semelhante procedimento . Divul

1 0 6 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Dentro de poucos dias seu filho Affonso Raimundes,

0 conde de Trava Pedro Froylaz e outros fidalgos daGalliza abandonaram-na

,dirigindo-se à s margens

do Tambre , ao norte de Sanctiago , onde as tropasdelles dependentes estavam acampadas . A rebellião

não tardou a rebentar na cidade . A rainha viu — seobrigada a ceder a torrente , e Gehnires foi solto ,

retendo,todavia

,a rainha em poder de governa

dores seus os castellos do arcebispo , de que , depoisde 0 prender , s e havia successivamente apoderado .

Não bastava,porém , ao orgulhoso sacerdote 0

haver sido restituído a liberdade e 0 ver mai s uma

vez D . Urraca humilhada . A posse desses castellos

era assas importante para elle não abandonar semtentar fortuna a idea de os recuperar . q uanto arainha diffi cultava final concordia , impondo ora

estas,ora aquellas cond ições , Gelmires julgou oppor

tuno tirar finalmente a mascara . Faz sorrir 0

grosseiro engano que os historiadores compostellanos pretendem fazer aposteridade assegurando

que O arcebispo , ao ver que nem obteria os castellos

,nem alcançaria apaziguar 0 animo da rainha

sem despender avultadas sommas,se ligara então

com Affonso Raimundes e attrahira ao seu partidoPedro Froylaz

'e os outros condes e senhores deGalliza, que os successos até aqui narrados nos

mostraram serem , havia muito , seus íntimos , postoque occultos alliados . A verdade é que a hypocrisia de lealdade arainha não lhe era j á nem possívelnem necessaria Affonso Raimundes entrara nos

dezoito annos,e a monarchia inteira estava cançada

das calamidades que sobre ella trouxera a adminis

tração de D . Urraca,pouco habilita da

,apesar da

energia do seu caracter,para dirigir os negocios do

estado . Accresc ia a isto 0 ciume dos barões hes

panhoes contra a privança do conde Pedro de Lara,

LIVRO 1 1 0 7

marido occulto ou , antes ,amante da rainha

,e cuj a

influencia , como era natural,não conhecia limi tes

,

ao passo que Affonso I &Aragão , continuando a denominar se não só rei

,mas tambem imperador de

Leão e Castella,apesar de occupado nas suas g10

riosas campanhas contra os sarracenos , proseguía ,ou pessoalmente ou por seus capitães , em assolar amonarchia que chamava sua e na qual ainda , com

effeito,pos suia algumas povoações e castellos . A

irritação dos animos e a situação dos negocios facilitavam 0 veri ficar-se plenamente 0 que os parentesestrangeiros do infante , j á de mu ito rei nominal daGalliza

,ardentemente desej avam ,

e que 0 mancebo,

dotado de altos espíritos,não menos ambicionava

,

isto é, 0 ser mettido de posse da herança inteira de

Affonso VI . O que,pois , até ahi não passara de uma

conspiração permanente tornou — se numa revoluçãodeclarada . Desde 1 1 2 2 vemos Aff onso Raimundes ,

ou antes Affonso VII,adquirir uma verdadeira

supremacia nos estados de sua mãe e esta reduzidaa submetter — se ao orgulho de Gehn ires e a buscar oamparo daquelle famoso intrigante nas obscuras einuteis dissensões que ainda teve com

'

seu fi lho,

durante os quatro annos em que sobreviveu a estesacontecimentos .

D . Theresa havia — se uni do immediatamente aopartido do arcebispo , ou ,

0 que é mais de crer ,

c0 1n0 acima insinuámos , tendo aprove itado a con

junctura da paz offerecida ,não só para salvar o que

possuia por morte de Henrique e as terras de Gallizaretidas por ella , mas tambem para assegurar osnovos senhorios que sua irman lhe confiava

, en

tendeu que não devia arriscar— se a perdê-los conservando— se no partido da rainha

,cuj a estrella visível

mente declinava . Era tã o frequente naquelles

tempos a quebra das mai s solemnes promessas , a

1 0 8 H I STOR IA DE PORTUGAL

ambição e 0 egoismo tão pouco rebuçados, que não

devemos j ulgar e sse procedimento com 0 mesmorigor com que 0 condemnariamos numa epochamais recente . Além disso

,Fernando Peres obtivera

inteiro dominio no seu espírito,e nesta resolução

da infanta-rainha sabemos que elle interveio pormetadeNão seguiremos aqui a serie dos successos passa

dos desde então na Galliza . Traçámos com cores

que reputamos verdadeiras O quadro da tenebrosatrama que ahi s e urdira porque sem conhecer esse

quadro nunca se comprehenderá bem O período do

governo de D . Theresa,nem se poderá encontrar a

deducção natural dos factos pertencente s a estadiffi cultosa epocha da nos sa historia . Desde os fins

,

porém,de 1 1 2 1 (2 ) até a morte de D . Urraca

(março de no longo crepusculo do poder darainha de Leão e Castella , Portugal parece conservar-s e inteiramente a lheio as convulsões mai s oumenos violentas da monarchia , de que , até certoponto

,elle ainda fazia parte . Volvamos agora os

olhos para 0 seu estado poli tico interno emquanto

no— lo consente 0 remanso da paz exterior .

A intervenção da infanta-rainha dos portuguesesnos acontecimentos geraes da Hespanha christantinha augmentado quasi em dobro a extensão dosseu s domínios . No sueste da Galliza elles se di latavam até as margens do Vibey , por todo 0 terri

( 1 ) adscivi t sib i plures Gallec iae principes insuperreginam Portugaliae T . et comi tem Fredenandum Hist .Compostell .

, L . 2 , c . 42 , g 7 .

(2 ) Os successos até aqu i narrados passaram-se-no verão

de 1 1 2 1 . A paz en tre Gelm ires , Urraca e Affonso Raimundes

,dep o is da prisão do arceb ispo , fo i ce lebrada nos

ultimos dias de dezembro deste mesmo anno Hist . Com

postel l . , L . 2 , c . 49 , g3 .

I I O H ISTOR IA DE PORTUGAL

throno,para a qual contribuira , veio a ser-lhe con

traria,ao passo que a sua affeição desordenada por

Fernando Peres não tardou a saciá la nos u ltimosanuos da vida de desventuras maiores que as deD . U rraca .

fi lho de Pedro Froylaz achava-se revestido deuma auc toridade tal que nos documentos contem

poraneos elle figura como igual ou quasi igual dainfanta — rainha . Elevado a categoria de conde , eutregues á sua administração immediata os districtos

do Porto e Coimbra,os principaes dos estados de

D . Theresa ,e obcecada esta por uma paixão ,

se

gundo parece , violenta ,e natural que Fernando

Peres obtivesse,até

,a supremacia sobre os outros

condes ou tenentes do resto do paiz . Os diplomasexpedidos durante esse período

,as expressõe s dos

chronistas,as formulas das es cripturasparticulares ,

tudo conspira em persuadi — lo . A infanta seguia Otri ste eXemplO

'

que sua irman lhe dera , e 0 al feresmó r do arcebispo Gehn ires representava em Por

tugal 0 mesmo papel que Pedro de Lara fazia em

Leão e Castella . As consequencias disso deviam ser

semelhantes,em mai s resumido theatro ,

às que

tinham enchido de perturbações a monarchia .

D . Paio,arcebispo de Braga , era homem rude e

pertencia a uma fami lia cuj o s membros forammai snotaveis por façanhas guerreiras que por brandurae polícia cortesans . As suas discordias com 0 arcebispo de Sanctia

'

go sobre a posse de varios bens eutre Douro e M inho pertencentes aSé de Compostella tinham sido violentas e di latadas . A final os

dons prelados reconciliaram— se,e a legacia de Gel

Imper. , L . 1, g 2 ) conservando tambem , porventura , a0

menos uma parte das outras terras adquiridas pelo trac.

tado de 1 1 2 1 .

L IVRÓ 1 1 1 1

mires em Braga foi reconhecida por D . Paio,a tró

co de conservar as propriedades disputadas com Otitulo de prestimonio ou mercê , como conego deSanctiago , n0 gremio de cuj o cabido entrou ,

segundo O costume

,vulgar nesse tempo , de serem os bis

pos de uma

'

diocese membros do cabido de outra .

Fizera- se esta reconciliação nos fins de 1 1 2 1 e já emmarço d e 1 1 2 2 elle enviava 0 clero da sua metropole ao synodo nesse mês reunido em Compostella ,

não indo elle proprio por se achar então ausen te emZamora ( 1 Voltando d ahi a pouco a Portugal , foipreso por D . Theresa . Os motivos que para issohouve ignoram — se . Sabemos só que 0 papa expediuuma bulla a Gehnires em j unho deste mesmo anno

,

para que compellisse a rainha dos portugueses asoltá 10 até os fins do mês seguinte , aliás declaravaa excommungada ,

-ordenando ao compostellano pu

sesse interdicto em todos 0 5 senhorios della . A amea

ça produziuseu effeito ,porque

D . Paio apparece

j á cónfirmando os diplomas da rainha — infanta ºem

outubro dess e annoSe 0 5 monumentos historicos nos não transmitti

rarn as causa s da prisão do metropolita bracharense

,as circumstanciasdeste facto

,comparadas Com

0 5 successos contemporaneos e com 0 5 que poucodepois occorreram ,

leva'

m-nos a suspeitar que estaprisão sej a 0 primeiro e tenue indício da revoluçãoque , arrancando O poder das mãos de D . Theresa ,

0 fez cair nas de seu filho . A influencia illimitada .

de Fernando Peres deviaforçosamente excitar desde 0 principio 0 descontentamento e 0 ciume dosbarões portugueses , e as revoltas de Galliza produ

(1 ) Bracharensis archiepiscopus . c irca id tempus in Numantiae 'morabatur lin ibus Hist . Compostell. , L . 2 , c . 52 .

(2 ) Doc. de outubro de 1 1 2 2 no Liv . Preto,f . 85.

1 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

zidas por um caso analogo eram exemplo mui evi

dente e proximo , que lhes apontava O caminho quedeviam seguir . Não ignoravam elles , por certo , os

meios a que 0 5 fidalgos gallegos tinham recorridona sua conspiração

,porque Portugal nella tivera

boa parte . Os poderosos parentes que O amante deD . Theresa tinha na Galliza e as suas relações com

0 omnipotente Gehnires tornavam necessario queelle s preparassem de sobremão os meios de sacudir0 jugo importuno do conde . A familia dos MendesdaMaia ,

aa qual pertencia O arceb ispo , foi uma das

que principalmente figuraram na revoluçãoque d ahia annos privou D . Theresa . do governo Existiamj á neste anno principios da Conj uração Era Zamora , c0 1n 0 logar remoto e ao mesmo tempo importante , 0 centro della ? Dá-s e alguma relação entreesta residencia em Zamora de D . Paio e O facto deir Affonso Henriques armar — se alli cavalleiro pouco depois , 0 que , como adiante diremos , tem paranó s uma significação diversa da que lhe attribuem

os hi storiadores Teve indícios D . Theresa da co

meçada trama e quiz por ella punir O arcebispo“?

Eis uma serie de questões que , nas trevas e spessas

que obscurecem a maior parte dos successos da

quelle tempo , não passam de conj ecturas , mas conj eeturas verosimeis , que os progressos dos estudoshistoricos virão acaso algum dia resolver a fíirmati

vamente .

Temo—nos até aqui abstido de falar em AffonsoHenriques , acerca de cuj a infancia não faltam curiosas lendas nos nossos livros historicos . Como a de

(1 ) Doc . do infante A ffonso Henriques de mai o de 1 1 28,no Elucidario V . Tempreiros , onde en tre 0 5 principaes

confirmantes liguram tres membros d esta famíl ia . Doc .

de Pedroso , em Brandão , Mon . Lusit .

,L . 9 , c . 1 9 .

1 1 4 H I STOR IA DE PORTUGAL

chronista ignorava , até , a epocha prefixa do seunascimento A crítica tem feito a devida justiçaaos documentos forj ados para enç her essa lacuna

,

aliás de nenhuma importancia . E em 1 1 2 5 que 0

infante practica 0 primeiro acto de que a historiaconserva lembrança . Este acto foi 0 armar-se cavalleiro em Zamora , então unida , como Vimos

,aos

domínios de D . Theresa . Na cathedral daquellacidade

, no sancto dia de Pentecostes , elle propriofoi tirar as armas de cavalleiro de c ima do altar deS . Salvador e juncto delle vestiu loriga e cingiu 0

cinto mil itar,segundo O costume dos reis A

elevação de A ffonso Henriques ao mais nobre grauda vida das armas , em idade impropria para sati sfazer as obrigações que ella lhe impunha , o fferece

urna circumstancia notavel,e é , que no anno ante

cedente e neste mesmo dia Affonso VII practicaraigual ceremonia na cathedral de Compostella , et omara do altar de Sanctiago a espada que paraesse fun D iogo Gelmires benzera Brevemente

(1 ) Sobre ep o cha do nascimento de Affonso Henriquesvej a-se nota X I no fim do vo lume .

apud sedem Zamorensem,ah altario sancti Salva

toris , ipse sib i manu propria sump sit mi litaria arma ah

altari , et ib idem in altari indutus est e t accinctus mi l itaribus armis , sicut mori s est regibus facere , in die san cto

Pentecoste s Chron . Gothor . ad aer. 1 1 63 . O Pen tecos tesera a festividade em que mai s costumavam armar se 0 5

cavalleiros . Vej a- se Ducange verbo Arma, M iles , e Car

pentier v . Al ilitia , Como 0 caval leiro que armava umnovél tomava sobre el le uma especie d e superioridade

(Ducange ib id . ut porrô apud romanos,etc . )

os reis de

Hespanha , c iosos da sua independencia ,segu iam 0 cos

turne de se armarem pe las proprias mão s . Compare — se

Roder . Tolet . , L . 9 , c . 1 0 , E5p . Sagr . , T . 26 , p . 30 4 .— Mun

taner, Chron . del rey D . James primer, c . 297 : Chron . del

rey en Pedro de Arago , L . c . 9 , etc .

(3) H ist . Compostell. , L . 2 , c . 64 , 5 2 .

1 1 6 H I STOR IA DE PORTUGAL

0 5 dous primos deviam exercitar um contra 0 0 utr0

0 nobre mis ter que ahi acceitavam e que a igrejasancti ficara para os combates contra os

"

infiéis .

Durante es tes annos as perturbações causadasem Africa pela nova seita dos almohades tinhamimpedido Aly , 0 amir de Marrocos , de promover a

guerra contra 0 5 christãos de Hespanha . Nestaregião 0 terrível açoute dos mussulmanos

,Affonso l

de Aragão ,entretinha principalmente as forças dos

almoravides , e as incursões das fronteiras do occi

dente eram passageiras e apenas feitas p elos sarraeenos naturaes do paiz D . Theresa aproveitaraesta conjuncção para restaurar a linha de ca5tellos

que defendiam a fronteira meridional do districtode Coimbra . Pelo menos 0 5 de Soure e Sancta Eulalia foram por esses annos reedifi cados . Em 1 1 2 2 0

conde Fernando Peres , que possuia 0 de Coj a sobre0 Alva

,cedeu-o a rainha ,

recebendo em recompen

sa 0 senhorio daquell” outros . Soure

,como mai s ex

posto ás correrias,c0 1n difíi culdade achava habita

dores ; todavia ,j á por 1 1 2 5 elle era nao 50 umlogar

forte,mas tambem uma povoação importante

Depois de um reinado de dezesete annos cousumidos em tumultos e guerras , D . Urraca fal lecen

( 1 ) agarenorum ins idias , qui tunc ( 1 1 23) viarum co

meatus clam ,neemon et pub lice incursabant grave cap ti

vi tatis pondus cum acerbae mortis casibus hominibus inferentes . Salvatus , Vi ta S . Martini Saur . 6 . ]smaelitae

ou Agareni era naquella ep ocha a denominação que da

vam 0 5 christãos aos mussulmanos hespanhoes palavra ]lloabitae , como no s parece ter dicto j á , designava 0 5

almoravides (al-morabethyn) .

(2 ) Carta de permutação de Coj a por San ta Eulalia e

Soure , e doaçã o daquelle castel lo ao b i5p 0 de Co imbra(novembro de Liv . Preto

, f . 2 e 1 4 85 v . Salvat . V .

S . Mart . gg6 , 7 , 8 .

1 1 8 H ISTOR IA DE PORTUGAL

atreveu a accommetter 0 enteado . Tracton — se ent ãode armistí cio entre 0 5 dous principes

,e a guerra

ficou suspensa,para d 'ahi a dous annos rebentar

corn dobrada violencia .

As duvidas que , provavelmente , foram suscitadas nas Vis tas em Zamora entre D . Theresa e 0 50

brinho sobre as relações politicas de Portugal comLeão parece terem ficado indecisas como 0 estavamhavia annos . Mas a infanta-rainha

,emquanto Affon

50 VII partia para Castella contra 0 5 aragoneses ,

cuidava activamente de pôr em estado de defesa osseus domínios da Galliza . Com este intuito faz iapas sar tropas para 0 norte do Minho e , não s e julgando segura com 0 5 castellos que alli possuia ,

edi ficava outros de novo, por cuj o meio cria habili

tar — se para recusar suj eição seu sobrinho,se e ste

pretendesse impôr — lkf a Ao mesmo tempo osfidalgos gallegos

,sempre turbulentos , começavam

a preparar de novo a guerra civi l ; 1nas Gelmires ,0 11 já cançado das perturbações passadas ou por

que sinceramente se resolvera a seguir por então Opartido do novo rei

,soube trazê-los pormeios bran

dos a obediencia,e Arias Peres , que se mostrava

tenaz na intentada rebellião , V iu destruídas ou tomadas pelas forças do arcebispo e do conde Gomes0 5 castellos de Lobeira , Taberiolo , Penacornaria eoutros em que confiavaA reda cção de Portugal era , porém ,

negocio mai s

grave . D . Theresa tinha por si não só os barões dePortugal , mas tambem Fernando Peres seu amante

(1 ) íines Galleciae armato exerci tu invadebat mun ic ip ia etiam nova ad inquietandam et ad devastandam

patriam et ad rebellandum regi aedi íi cari faciehat : Hist .Compostel. ,

L . 2 , c . 85.

(2 ) Ibid . , c . 84 .

LIVRO 1 1 1 9

e 0 5 cavalleiros de Galliza que á sombra delletinham vindo residi r em Portugal . Não lhe faltavam , além dis so ,

homens d '

armas e riquezas parasustentar a guerra . Orgulhosa do seu poder , D . Theresa

, que durante 0 governo de D . Urraca evi tara,

como temos visto,0 declarar — se de todo indepen

dente , constrangida , talvez , agora pelas pretensõesmais precisas de Affonso VII , recusava formalmente cumprir com as obrigações nascidas da tenencia que , conforme 0 tractado de 1 1 2 1 e attenta aorigem primitiva dos dominios de que era senhora

,

O rei leonês entendia que ella exercitavaForam estes 0 5 motivos que trouxeram a Portugal

uma invasão semelhante a que 0 deixara assoladodez annos antes . Na primavera de 1 1 2 7 , feitas já as

treguas com O rei de Aragão , Affonso VII veio aGalliza e

,mandando ajunctar as tropas desta pro

vincia,marchou com um exercito numeroso por

Entre-Douro e M inho . Das circumstancias da guerranão nos restam memorias senão dos males que são

communs em taes successos e que pela barbaria dostempos ainda 0 eram mai s naquelle secu lo devastações dos campos e aldeias , assedios de castellos

,

ruína das grandes povoações . A sorte das armasmostrou— se mais uma vez adversa a D . Theresa ,

cuj o poder, por grande que fosse , era por certo mui

inferior às forças do seu sobrinho . O s reveses eXpe

rirnentados nesta campanha , que apenas durou seissemanas , obrigaram a rainha a humilhar— se e areconhecer a supremacia do monarcha . Fez-se entãoa paz

,e Affonso VII regressou immediatamente a

(1 ) Fastu superbiae elata terminos j us titiae egrediebatur,e t nullum

_

regi servitium de regno ,quod ah i l lo tenere

debebat , exhibere d ignabatur ; im1n0 viris , armis , atqueopibus potens ib id .

,c . 85.

1 2 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Compostella ,cuj o

'

prelado 0 acompanhara com todasas tropas que podera ajunctar para aquella expe

dição

Um dos factos mais poeticos da nossa historia parece ter-se verifi cado durante esta invasão do rei

leonês . Falamos da devoção heroica de Egas Moniz ,tantas vezes citada como um dos mais nobres exelnplos de honra e lealdade . Collocando a data do successo nos fins do anno seguinte ou nos principios de1 1 2 9 ,

como 0 fazem commummente os historiadores ,seria necessario rej eitá— lo por fabuloso , como con

trario a factos indisputaveis . Suppondo—o , porém ,

realisado neste anno , não só se t orna poss ível , mas

tambem ,concordando com documentos de outro

modo inexplicaveis ,reforça a nossa

,opinião sobre

haverem apparecido j á neste anno 0 5 primeirossymptomas de rebellião do infante A ffonso Henri

ques contra D . Theresa .

F izemos antes notar circumstancia da prisão doarcebispo de Braga depois de uma residencia demorada em Zamora

,e a de ser este prelado de um ge

nio violento e membro da família dos senhores daMaia

,cuj as estreitas ligações políticas com 0 infante

,

ainda em vida da rainha , é impossível desconhecer .

Narrámos tambem por que man eira Affonso Henriques

,tendo apenas quatorze annos , idade mai s

própria dos entretenimentos juvenis que da ambiçãode gloria , se armara cavalleiro por suas propriasmão s na Sé de Zamora . O exemplo do que haviasuccedido em Leão e Galliza nos ann0 5 anteriores ,

(1 ) Magno ex erc itu ibique per sex hebdomadas vi llasdevastando , castra et c ivitates capiendo donec terrafere to ta devastata fuit , Rex A . portucalense pago acqui

s ito et pacifi cato, Compostellam c itato cal le ad ivit ib id . ,

c . 85 e 86 .

2 2 H IS TOR IA DE PORTUGAL

LIVRO 1 1 2 3

camente em 1 1 2 8 que as discordi as entre D . Theresae seu filho chegaram a declarada ruptura . Nó s per

suadimo —nos de que as primeiras tentativas de rebellião começaram um anno antes e de que a narraçãodas chronicas do seculo XVI ,

hoj e com razão excluidas do numero das legí timas fontes historicas , _pôdenão se a ffastar absolutamente da ve rdade nesta

Em tal presupposto , eis , segundo a nossaopinião , como devia passar 0 successo . A s terras dePortugal em que dominavam ou influiam 0 5 par

ciaes de Aff onso Henriques começaram a rebellar

se nos princípios de 1 1 2 7 . Entre ella s Guimarães , aantiga corte do conde Henrique , declarou— se peloinfante que ahi se achava . A invasão

de Affonso VIIveio então impedi r ou antes adiar a guerra civi l .

Na sua marcha victoriosa 0 . rei de Leão ,rendidos

outros castellos e povoações , pôs sitio a Guimarãesporque ao principe não importava por certo se era

sua tia ou seu primo que regia Portugal ; importava-lhe que e sta provincia reconhecesse a sua auctoridade suprema . Depois de alguma resistencia ,vendo que as suas forças não basta vam para repelliraos cercadores , os barões e cavalleiros encerradosnos muros de Guimarães declararam em nome domoço Affonso que elle s e consideraria de futurovassallo da coroa leonesa . Egas Moniz , poderosofidalgo

,cuj os senhorios se di latavarn pelas margens

do alto Douro e que,talvez mais que nenhum ,

gosava a reputação — de homem leal,ficou por fiador

da promessa . O rei de Leão levantou O cerco e ,de

pois de reduzir a obedi encia D . Theresa , retirou— separa Galliza . Quando , porém ,

os successos de 1 1 2 8

( 1 ) Galvão , Chron . d'

el— rey D . A ff onso Éenriques , cap . 6 .

Acenheiro ,Coronyqua dos Reis de Portug .

, c . 2 .

Nob i liario attrib . ao C . D .

. Pedro . Ti t . 7 .

2 4 H I STOR IA DE PORTUGAL

entregaram Portugal nas mãos do filho do condeHenrique , elle esqueceu as promessas de Guimaraes

,e com elle as esqueceram os barões portu

gueses . Só Egas Moniz se lembrou do que j urara .

Seguido de sua mulher e filhos,dirigiu-s e a cortedo monarcha e

,

apresentando -se

perante elle descalço e com uma

corda ao pesco

ço ,pediu para

resgatar com amorte a sua palavra nunca trahida. Era grandea colera de Affon50 VII mas ven

c e u -o a q u e l l ainaudita façanhade l ealdade . Dei

6 . Mosteiro e paço de Sousa, onde está XOIl-O Partlr 80 1"

O monumento de Egas Moniz . to e livre e,0

que era mais para 0 nobre cavalleiro

,sem a tacha de desleal

dade ( 1 )A independencia portuguesa , que por tantos

annos tendera a realisar s- e , retrocedia ainda uma

vez ; era um problema cuj a solução Já perto do seutermo devia tornar a ser tentada de novo . Mas as

consequencias da victoria obtida pelo rei de Leão ,postoque graves , não eram talvez as mais de recear0 amor cego da rainha por um homem alheio a provincia

,poderoso por allianças e parentescos com

( 1 ) Sobre este e o s antecedentes ggveja-se a nota XII nofim do vo lume .

H I STOR IA DE PORTUGAL

attribuirern a tão curta idade , .

a nobreza da figurae a belleza do rosto A ambição do poder

, 0

exemplo'

de seu primo Affonso Raimunde s , a disposição dos animos irritados contra 0 predomínio deFernando Peres

,as instigações dos fidalgos

,a

exclusão ignorniniosa em que 0 conservavam dos

negocios publicos , tudo 0 exc itara a collocar-se á

frente de uma revolução cuj as consequenc ias , na

quelles verdes annos , não era facil prever . Tinhaamigos proprios , e a principal nobreza preferia vê10 apossar- se do mando supremo a so lfrer que 0 5

estranhos e 0 5 partidarios destes governassem por

intervenção de D . Theresa Como se manifestoua rebeldia e quaes foram as particularidades queoccorreram nella são cousa s sobre que restam 50

bej as fabu la s , mas apenas fug itivas memorias .

Parece , p0 re1n ,certo que nos prime i ros meses de

1 1 2 8 a guerra civil , encetada n0 anno antecedente,

se preparava de novo ou j á porventura come çara .

As principaes personagens que em maio desse annoestavam ligadas com Affonso Henriques eram Oarceb ispo D . Paio , seu irmão Sueiro Mendes denom inado O g rosso , Ermigio Moniz , Sancho Nunes ,marido que era ou depoi s foi de D . Sancha

,irman

do infante,e Garcia Soares . D iante destes e d '

outros

( 1 ) Fui t vir arm is s trenuus , l ingua eruditus , prudentis

S ÍDI II S in operibus suis , claras ingenio , corpore decorus ,

pulcher aspectu ,e visu desiderab ilis Chron . Gothor . ad

aer . 1 1 63 .

(2 ) qvidam indign i e t alienigenae V'

endicabant regnumPortugallis , 1natre ejus regina D . Tarasia eis c onsentiente ,

vol ens et ipsa superb e regnare loco mari ti sui , a1n 0 t0 f i lioa negotio regni . Quam injuriam nullatenus ferre

valens convocatis am ic i s su i s e nobilioribus de Por

tugal , qui cum multõ maxime quam watrem ejus , vel

ind ignos et ex teros natione ,volebant regnare super se :

ib id . adaer . 1 1 66 .

L IVRO I

7. Baixos— relevos do monumento de Egas Moniz ,

em Paço de Sousa .

1 2

1 2 8 H I STOR IA DE PORTUGAL

nobres cavalleiros de Portugal declarava elle em

Braga a sua intenção de se apossar do governo , efazia dh ntemão mercês ao metropolita

,contando

com 0 auxilio delle nessa emprezaPelos indício s que 0 5 documentos n0 5 ministram

,

0 infante abandonou sua mãe , a qual talvez se

achava então na corte de Atí'

onsp VII , e dirigiu — se áprovincia de Entre — Douro e Minho no mês de abril.

A revolução parece ter rebentado naquella pro

vincia, dilatando — se pelo districto de Guimarães ,

pelo condado de Refoio s de Lima , pelo territorio deBraga e pelas terras , em fim

,dos nobres que se

guiam a parcialidade do infante . A suspeita daausencia de D . Theresa na occasi

'

ão do alevantamento adqu ire maior probabilidade , se attendermos

a que só quas i tre s meses_

(iEpois 0 5 dou s partidosVieram a uma batalha , que fó i decisiva e fatal paraa rainha . De feito

,esta

,tendo marchado para Gui

marães com as tropas dos fidalgos gallegos e dosportugueses seus partidarios , ahi se encontrou com

0 exercito do infante no campº de S . Mamede junctodaquella povoação . Foi desbaratada D . Theresa efugiu nesta fuga

,porém

,perseguida pelo fi lho ,

flcou prisioneira commuitos dos seus A tradiçãore fere que Affonso Henriques a lançara carregadade cadeias no castello de Lanhoso . Não desdiz essatradição dos costumes ferozes do tempo ; mas desdiz

( 1 ) Quando habuero p ortugalensem terramut tu (se . Pe lagius archiepi SCOpus ) sis adjutor meusDoação a Sé de Braga (maio de 1 1 2 8) no Elucidar. , T . 2

,

p . 352 . A '

cerca de Sancho Nunes veja -se 0 Liv. ve lho dasLinhag . na H ist . Geneal . , Provas , T . 1 .

(2 ) Comm is it cum e is praelium in campo S . Mametis ,

quod est prope caste llum de Vimaranes , et contri ti sunt ,et devíc ti ah eo

,e t fugerun t l'ac ie ejus , et comprehendit

eos Chron . Go thor . ad aer . 1 1 66 . Veja— se a no ta XIII nofim do vo lume .

1 30 msronm DE PORTUGAL

de terras aSé de Coimbra para que Deus associasseaos bemaventurados a

_) a fallecida princesa sealguem houver ahi que intente annullar (0 que não

creio ) a doação que ora faç0 , _pague em dobro a ousadia á auctoridade real , e se for algum individuotão poderoso e cruel que pos sa conservar-se pertinaz ,sej a 0 seu destino na morte 0 de Dathan e Abiron ( 1 ) A formula insolita por que termina estediploma diz — nos que os restos de D . Theresa aindativeram quem sobre elles vertesse lagrymas . Os

monumentos historicos contelnporaneos apenas,

porém,nos referem que fallecera no primeiro de

novembro de 1 1 30 Um antigo tumulo na cathedral de Braga nos assegura ,

finalmente, que as suas

cinzas foram transportadas para 0 logar ondetambem repousam as cinzas de seu marido .

0 5 escriptores modernos , empenhados em salvara reputação moral de D . Theresa como

,mulher

,

esqueceram— se de lhe fazer j ustiça como rainha ouregente de Portugal . Tem-se dissertado largamentesobre 0 seu consorcio com 0 conde Fernando Peres

,

que nada nos auctorisa a admittir emquanto 0

valor historico do seu governo é perfeitamente desprezado . Todavia ,

durante quatorze anuos os actosda viuva do conde Henrique mostram bem a perseverança e destreza com que buscou desenvolver e

realisar O pensamento de independencia que elle lhelegara . Cedendo a força das circumstancias , não

( 1 ) S i vero aliquis , quod ( i eri non credo , ad conturbandum ve l irrumpendum hoc meum testamentum , restituat et reg ie protestati al iud tantum . Qui s i tante potencievel crudelila tis f uerit ut in ista pertina cia hujus vite íinemí'

ac ia t, cum Dathan et Ahirou , e tc . Liv . Preto , f . 1 26 .

( 2 ) Era 1 168 . Ob ii t regina Donna Tarasia mater dominiAll

'

onsi , calend . novembris Chron . Gothor .

(3) Nota XIV no lim do volume .

Tumulo do conde Henrique .

8. Tumulo da rainha D . Theresa .

1 32 11 151 0 R IA DE PORTUGAL

duvidava de reconhecer a supremacia da corte deLeão para obter a paz quando della carecia , salvo 0

recusar a obediencia quando cria possível resistir .

Associando-se habilmente aos bandos civis que des

pedaçavam a monarchia leonesa , ia creando no meiodella para si e para os seus uma patria . Apesar dasinvasões de christãos e sarracenos e das devasta

ções e males causados por uns ou por outros nos

territorios dos s eus estados , estes cresceram em po

pulação , em riquezas e em forças militares Pelasarmas e pela política augmentou a extensão ( 10 5 pro

prios dominios ao oriente e ao norte , conservando aomeio — dia a linha das fronteiras que seu marido j álhe deixara encurtadas . O castigo de 11 11 1 erro , que ,medido pelos costumes do tempo , estava longe deser imperdoavel, parece — nos demasiado severo , e Oprocedimento dos barões portugueses para com ellamerecerá dos desprevenidos a imputação de ingrato .

D . Theresa foi Víctima de um sentimento nobre emsi

,mas às vezes excessivo e cego

, que ella tinhafeito crescer

,radicar-se

,definir-se e que serviu de

pretexto de rebeldia á ambição de Atfonso Henriques

,ou antes á daquelles que por meio do inexpe

riente principe esperavam melhor satisfazê-la . E stesentimento era 0 da nacionalidade . A Chronica dosGodos

,que , narrando 0 5 successos de 1 1 2 8, toma 0

estylo do libello político ,não era provavelmente

mais que 0 echo da opinião vulgar . Ahi 0 5 gallegossão tractados de estrangeiros ou forasteiros indi

gnos . Esta denominação de injuria , que , applicadavinte annos antes aos habitantes das outras provincias da monarchia fundada por Pelagio

,seria inin

telligivel em Portugal , estreava por uma revoluçãogravíssima a sua fortuna popular de sete seculos .

( 1 ) Viris , armis atque opibus potens Hist . Compostell.

L IVRO I I

1 128— 1185

Primeiros annos do governo de A ffonso Henriques .

Guerra na Galliza . Ten tat iva de rebellião . Cont inuação da guerra . O castel lo de Celmes fundado e

perdido . Allianças de A ffon so com 0 rei de Navarrae com al guns fidalgos de Galliza . Vi ctoria de Cer

neja . Perda de Leiria e d estroço em Thomar . Paz

de Tuy c om O imperador A ffonso VI I . 0 5 almora

vides e 0 5 almohades . Jornada de Ourique . Renovação das discordias com O imperador . Recon tro de

Valdevez . Pac i ficação .— A lgara dos sarracenos .

Le iria e Trancoso destruídas . Desbarato dos invasores .

A lfonso toma O ti tulo de rei . Feudo ao papa . Cir

cumstanc ias do suc c esso . S i tuação dos sarracenos .

Alliança de A ffonso I c om Ibn Kas i e'

correrias dos

chris tão s no Gharb . Con sorc io do rei de Portugal .Tomada de Santarem .

XPULSOS de Portugal a rainha D . Theresa e 0

conde Fernando Peres , toda a provincia seguiua fortuna do vencedor , postoque um documento con

temporaneo pareça indicar que algumas res istenciashouve e que estas se prolongaram até os fins de 1 1 2 8

ou principios do anno seguinte

( 1 ) Ego infans ab omni pressura a líenus , e t Co

limbriens ium ac t0 tius urbium portugalens ium dom inus

secaras eff ec tus Doc . de Arouca ,em Brandão Mon . Lusi t . ,

P. 3, L . 9 , c . 16 (abril de

1 36 H I STOR IA DE PORTUGAL

Não podia,porém , A ffonso VII olhar com indifíe

rença para esse grave succes so . Apenas decorrera umanno desde que O moço rei obrigara sua tia a reconhecer- lhe uma especie de vassalagem ,

fazendo pazcom ella depois de lhe devastar os domínios . O pre

texto de nacionalidade que servira de estandarte arevolução ,

segundo se deduz da Chronica denominada dos godos , equivalia a uma declaração formalde independencia ,

porque este pensamento se con

tinha virtualmente naquelle . Dous meios tinha 0

principe leonês de acudir ao mal ou restituir pelasarmas arainha fugitiva O poder de que seu fllhO aprivara , ou ,

acceitando O facto consumad0,

'

exigir

de A ffonso Henriques que se considerasse comosimples logar— tenente ou vassalo da c

,

0 r0 a,qual fora

sua mãe , ao menos nos ultimos tempos . AS inquie

tações intestinas da monarchia e a guerra quasiincessante com 0 belli coso rei de Aragão aconselhavam 0 segundo expediente ou ,

antes,constrangiam

Affonso VII a segui-lo . Mas s e as circumstancias

politicas tornavam inexequível 0 usar do primeirocom toda a energi a , 0 5 successos posteriores provaram que

,empregadas frouxamente as armas e só

como auxiliares do segundo ,isso não serviria senão

de ir firmando O poder independente do fi lho doconde Henrique .

Vimos como D . Theresa se apoderara , além do

que propriamente era territorio de Portugal , dosdistrictos de Tuy e Orense e como

,pelo convenio

celebrado em 1 1 2 1 com D . Urraca,ficara pos suindo ,

não só estes,mas tambem outros senhorios em

nome de sua irman ate'

a morte della . As questõessusc itadas em 1 1 2 7 e a entrada do rei de Leão em

Portugal lh'

0 5 f i zeram provavelmente perder ; aomenos

,depois deste acontecimento nenhuns vesti

gios se encontram da sua jurisdicção na Galliza ou

1 38 H I STOR IA DE PORTUGAL

armada ( 1 Serviarn lhe,provavelmente

,de pre

texto as convenções feitas com seu pae e,sobretudo

,

a posse que D . Theresa tivera de Tuy e da terra deL imia

,de que pretenderia ser senhor como 0 era

de Portugal . Este pensamento explica a sua insistencia em accommetter as províncias limitrophesde Portugal pelo norte . Fossem

,porém , quaes

fossem os motivos de semelhante procedimento,a

tentativa de Affonso Henriques causou sério s receiosao rei de Leão . Andava elle a braços nesse tempocom terríveis di ffi cuidades a Hespanha chri stanardia em guerras Affonso I de Aragão continuavadevastar a Ca stella ,

e as turbulencias dos fidalgos

parciaes dos Laras ou do principe aragonés não

davam um momento de descanço a Atfonso VII ,obrigado a submetter successivamente pela forçadas armas 0 5 castellos rebellados nas Estremaduras,em Castella

,nas Asturias e em Leão A entrada

de Affonso Henriques augmentava 0 5 embaraços .

Para obviar ao mal , O rei leonês mandou ao arcebispo Gehn ires e aos condes e magistrados da Galliza que lhe saíssem ao encontro e 0 repellissem domodo que fosse possível . q uanto os demai s colligiam forças e se preparavam para marchar contra0 5 portugueses 0 prelado compostellano adoeceuou fingiu adoecer , e as tropas municipaes de Sanctiago intimadas 'para acompanharem 0 exercitorecusaram obedecer . A traição de alguns individuos

« 1 . Jam olím multotíes ipse rex portugalen s ium venerat

in Gallaetiam : diz a Chron . de A lfonso VII , falando de

successo s o ccorridos em 1 1 34 e a Hist . Compost . Cum

que pugnaturus in Gallec iam ven ire nequiret , ut

cum (scil . Alphonsum Henrichidem ) man

ut c i obviam ircut . L . 3 , c . 2 4 , g 1 .

(2 ) Chron . Ade f . Imper . 1 6 am H ist . Compostell.

L. 3 ,c . 2 4 .

L IVRO 1 1 1 39

acabou de mallograr a empreza , e A ffonso Henri

ques voltou a Portugal sem ter encontrado resis

tencia na sua tentativa

Quaes foram ,porém

,as consequencias della ? Eis

0 que não nos conservaram 0 5 monumentos dessetempo . O mais provavel é que 0 infante se conten

tasse com 0 5 resultados ordinarios destas correrias,

muitas vezes suscitadas pelos 0 di0 5 dos príncipes enão raro pela cubiça , sem nenhum outro pensamento politico . E , todavia , certo que Affonso VIInão procurou por então tirar vingança do damno eatfronta recebidos . A necessidade de dar treguas asdesordens pub licas moveu-o a convocar cortes em

Leão ( 2 ) onde se tracton de restab elecer a paz publicae onde foram muletados 0 5 burgueses de Compostella que haviam recusado de fender a província dainvasão dos portugueses . Estes ultimos , satisfeitoscom as vantagens obtidas ,

abraçaram,tacita 0 11

expressamente,as disposições pací ficas das cortes

de Leão . Ao menos,é _preciso suppôr que a boa

harmonia "

reinava entre as duas províncias limitrophes nos fins de 1 1 30 e em 1 1 3 1

,para compre

hendermos a persistencia de Fernando Peres em

( 1 ) Nec tainen contra eum quorundam fraudulentia pu

gnaverunt ib id .

( 2 ) Risco (Esp . Sagr . , T . 35, p . 1 80 e segg . ) parece con

fundir esta assemb lea de Leão, convo cada por A ffonso V I I ,

com 0 synodo de Carrion desse mesmo anno , presid idopelo legado Humberto . A H istoria C0 1np0 5 tellana fala , noc 2 4 do L . 3 , daquella ,

e diz -nos que 0 s eu 0 13j ec t0 era 0

que vae apontado no texto . O synodo carri onense t inhaprecedido , como se co lhe da m esma H istoria Compostel

lana (L . 3 , c . 1 5) e da doação fe ita durante 0 synodo p eloprimaz d e To ledo ao b ispo de Se govia (Co lmenares , His t .

de 8eg0 v . , p 1 1 5) em que ainda íi gura' D iogo b i spo de

Leão , quando nas cortes des ta c idade j á assistia A rias seu

successor.

1 4 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Portugal por este período Expulso d 'aqui dousannos antes , e combatendo encarniçadamente durante 0 5 seguintes contra Affonso Henriques , comodepois veremos , só por este meio se poderá explicara vinda do conde aos estados do seu émulo , cuj aauctoridade parece reconhecer nas proprias expressões do documento que nos guia e que nos deixa veruma luz fugitiva

'

no meio das trevas que cercamestes primeiros tempos do governo do infanteluz

,na verdade

,tenuissima

,mas que é preferível as

fabulas inventadas com 0 correr dos seculos e astradições maravilhosas recebidas com sobrada boafé

,não só pelos chronistas , mas até

.pelos mais

graves historiadores .

Dissemos j á que Bermudo Peres , irmão do condeFernando e cunhado de Affonso Henriques obti

vera durante 0 grande predomínio de seu irmão O

governo de Viseu . Ou elle se conseríf ara estranhoaos successos de 1 1 28

,ou se reconciliara com 0

cunhado . D e um ou d 'outro modo , é certo que re sidia em Portugal em 1 1 3 1 , e que 0 castello de Seiaestava debaixo do seu domínio ; Era Seia um desseslogares fortes , edificados pelas ramifi caçoes da Serra

( 1 ) Doc . de julho de 1 1 31 , Liv . Preto , f . 1 26, citado no T . 1º

,

p . 384 . Uma parte dos confirmantes são conegos de Coimbra , e por i sso all i 0 suppomos exarado . Por outro documento do Liber Fid ei , ci tado por Brandão (Mon . Lus .

, L . 9 ,se conhece tambem a assis tencia do conde em Por

tugal j á em julho de 1 1 30 .

(2 ) do e t s icut illarn et superScriptum terminaverat infan s domnus Ade f0 n 5u5 .

'

Doc . do

Liv . Preto, c itado .

(3) Este conde D . Vermuim fo i casado com a fi lha doconde D . Henrique e da rainha D . Terej a Liv . Ve lhodas Linhagens , na Historia Geneal . , Provas , T . 1 , p . 1 98.

A mulher de Bermudo era D . Urraca a outra irman d e

A ffonso Henriques casou com Sancho Nunes , Ib id . , p . 1 46 .

1 42 H I STOR IA DE PORTUGAL

Seia,e a conspiração falhou . Bermudo , expulso

daquelle castello e da província de Portugal , serviudepois Alfonso VII contra 0 cunhado

,cuj o prisio

neiro foi no recontro de Valdevez , vindo a acabar ,passados annos

,monge no mosteiro de Sobrado .

Aquelles que se haviam unido a Bermudo Peresforam despoj ados dos seus bens

,e estes di stribui

dos pelos servidores do infanteNa idade de pouco mais de vinte e um annos

,

dotado de geni o bellicoso e destro nas armasA ffon so Henriques estava t alhado para desenvolverlargamente a idea da nacionalidade portuguesa ,idea que amadure cera e se radicara nos animos demodo indestructivel . 0 Portugal daquella epochaabrangia escaçamente metade do n0 550 modernoterritorio . No resto da Hespanha a nova monarchianão tinha alliado algum natural

,salvo 0 Aragão e

a Navarra ao norte e oriente O poder do já vastiss imo imperio de Leão e Castella ameaçava esmagá1a

,e ao meio-dia os seus limites ia1n

.

entestar com

0 5 sarracenos , inimigos irreconc iliaveis pela differença ou antes opposição de raça e de crença . Aenergia e O es forço necessarios para resistir a tãoperigosos vizinhos deviam ser

'

grandes . Affonsoprovou por todo 0 decurso de um longo reinado

que 0 5 pos su ia . Na falta de educação litteraria ,

inconveniente commum a todos 0 5 principes ecavalleiros de então ; privado ainda na infanciadaquelle amor de mãe que tantas vezes affeiçoa esuavisa os caracteres mais duros ; repellido da inter

( 1 ) Chron . Go thor . ad aer . 1 1 69 . Yepes , T . 7 , f . 32 3 v .

º

Doação a JoãoViegas dos bens d e Ayres Mendes e Pedro

Paes Caro fa , em Rib eiro , D issert . Chron ., T . 3 , P . 1

, p . 1 0 3,

n .

º 306 .

(2 ) S trenuus fuit armis et bellicosus Luc . Tud ens. na

HiSp . Illustr ., Vol. 4 , p . 1 06 .

L IVRO 1 1 43

venção nos negocios pela influencia illimitada dafami lia de Trava , em parte as licções da adversidadesupprirarn

— lhe as licções dos homens , e em parte a «

oppressão produziu nelle 0 que por via de regraproduz nas almas rijamente temperadas

: redobroulhe a ambição e a audacia ; mas tornou-o cauteloso ,desconfi ado dos homens e

, por consequencia , mudavel . O mancebo diz um escriptor dessetempo sabia a arte de reinar , e todavia , possuídode ardente amor de gloria , 0 0 111 0 a fragil eanna

facilmente se inclinava para onde quer que 0 soprodas auras 0 levava ( 1 ) Cubiçoso de renome ,valente

,sem affeições profundas e duradouras , elle

não houvera sido,ta lvez

,apesar da sua aptidão

para d irigir 0 5 negocios,um dos principes mais

apropriados a tempos tranquillos ; mas era-o paraesta epocha , em que 0 enthusiasmo

,O es forço

,

ambição e , até , 0 desprezo de certas consideraçõesda ordem moral se tornavam necessarios para pôr0 remate ao edifi cio que estepaiz ia laboriosamenteconstruindo , 0 ediâcio da sua independencia .

Aos successos que decorreram desde 1 1 32 até 1 1 35

não é facil assignalar datas precisas e,se houvesse

mos só de attender aos monumentos nacionaes , 0

silencio que elles guardam acerca deste periodo demais de tre s anuos nos persuadiria que Portugal

gosara da paz exterior ,só interrompida pelas corre

rias obscuras das fronteiras mussulmanas,facções

unicamente de roubos e morte,sem nenhuma con

sequencia politica,e que mais importavam aos

habitantes das povoações limitrophes do que ao

( 1 ) Qui'

j uven is ,e tsi regendi imperii j am b ene sciolus ,

tamen amore landis ardenter plenus , ad quo scunque

aurae flatus ut arundo fragi l is ferebatur : Liv . do s Testam .

de Sancta Cruz de Coimbra , em Brandão, M . Lusit .

,T . 3

,

App . escrit . 1 5.

1 44 H I STOR IA DE PORTUGAL1

commum do paiz . Com 0 caracter,porém

,do infante

essa ex istencia pac ifica fora impossível por tãolargo e spaço . A guerra tornou ,

de feito,a renovar

se por aquelles annos . D . Theresa forcej ara constantemente por dilatar 0 5 proprios estados para a Galliza , e este systema era seguido com a mesma tenacidade por seu fi lho . Ignoramos quaes motivos , anão serem as antigas pretensões a que j á mais deuma vez alludimos , Affonso Henriques teve paranova invasão naquella provincia . Talvez nenhuns ;como provavelmente nenhuns existiram para asu spensão d

,

ar1nas que parece houvera em 1 1 31 .

Penetrou,pois

,0 infante por terras de Limia . Saí

ram— lhe ao encontro os condes Fernando Peres eRodrigo Vela e outros fronteiros do rei de Leão .

Desbarataram-no e constrangeram—no retirar— separa Portugal Não desanimou elle

,todavia ;

ajuntando 0 5 mais valentes e nobres cavalleiros'

e

as bandeiras populares , volveu de novo ao districtode Limia . Os capitães leoneses ou não ousaramdi sputar-lhe O passo ou foram destroçados pelosportugueses . Senhor daquelle territorio , AlfonsoHenriques edifi cou um castello conhecido nas me

morias desse tempo pelo nome de Celmes ; pôs ahi

( 1 ) multoties venerat in Galleti am et a comi te Ferdinando Petri et Roderico Velle , et ah ali is ducibus Gallae

tiae expulsus fuerat inde et reversus est in terram suamsine honore : Chron . Adef . Imper . I 30 . Esta passagem ,

a que j á alludimos , re ferindo-se aos annos que precede

ram a coroação de A ffonso VII corno imp eradorvem necessariamente collocar 0 5 successos que narra no

tem a que 0 5 attribuimos . A expressão multoties obriganosHÍambem suppôr que estas entradas foram

, pelomenos

,quatro ou cinco , contando entre e llas a de 1 1 30

,e

tres ou quatro nos annos de 32 e 33 . A de que se vae falardevia ser em 34 ; porque as cortes de Leão , em que A ffon5 0 VI I foi acclarnado imperador, celebraram-se na prima

vera do anno seguinte .

1 46 H I STOR IA DE PORTUGAL

do principe leonês 0 senhor de uma pequena provincia

,cercada ao meio-dia pelos mussulmanos

,não

só ousara recusar-lhe obediencia,mas até invadia 0

territorio da monarchia e ,apesar dos ultimos revé

ses,conservava hasteado 0 pendão da independen

c ia,re solvido a de fendê-la com as armas na mão

contra aquelle ante quem outros principes mai spoderosos curvavam 0 j oelho . Sem a menor sombrade vaidade nacional , parece — nos ser licito dizer queO es forço e a constancia dos portugueses e do seupríncipe nesta conjunctura são um dos mais bellosexemplos daquella energia moral de que tão ricaera a idade média e a troco da qual a Europa 111 0

derna tem ido éomprando a brandura do tracto

entre 0 5 homens e 0 5 commodos da civilisação .

Exceptuada,pois

,a pequena provincia de Por

tugal,toda a Hespanha christan e ainda uma parte

da Françaaquem do Rhodano reconheciam directaou indirectamente O domínio de A ffonso VII O

titulo de imperador que se lhe attribuia vulgarmente e de que j á ,

não raro , elle propriQ usava nosseus diplomas cabia com razão ao senhor de tãovastos dom inios . No mê s , pois , de j unho de 1 1 35

,

convocadas cortes em Leão , foi O moço principe acclamado solemnernente imperador . A desgraça deCehnes re freara a audacia dos portugueses , e asituação comparativamente pacifi ca da Peninsulahabilitava-o para dar nova força às l eis esquecidasno meio das guerras civis , que , por breves periodosinterrompidas , duravam desde 0 tempo de D . Ur

raca . Empenhou— se então em restaurar as igrej as e0 5 mosteiros e em restabelecer a boa administração

( 1 ) fact i sunt term ini regni Ade fonsi regis Legionis a

mare magno oceano , quod est a pa trono S . Jacobi usque ad

fluviam Rodani Chron . Adef . Imper .

,L . 1 , c . 2 6.

L IVRO 1 1 1 47

e a ordem pub lica,perseguindo e castigando 0 5

malfeitores sem distincção de classes . Com O intu itode alargar de futuro as suas conquistas pelo territ0 ri0 mus sulmano , elle buscava reanimar as forçasinternas da monarchia com a paz e prosperidadecommuns . As sim

,apesar das vantagens obtidas de

seu primo,deixou—o tranquillo O resto deste anno e

todo 0 de 1 1 36,em que nem nas memorias de Leão

,

nem nas de Portugal se encontram vestigios demutuas aggressões

Todavia 0 animo inquieto de Affonso Henrique a facilidade que O imperador lhe dera de reparar0 damno recebido na Galliza não consentiram du

rasse por muito tempo O estado pacifico dos paizeschristãos da Hespanha . O anno de 1 1 37 viu de novorebentar a guerra . As circumstancias della obrigamnos a dizer alguma cousa sobre successos que não

pertencem immediatamente á nos sa hi storia,mas

que explicam ,até certo ponto

,as audazes tentativas

do infante contra um principe tão poderoso comoera seu primo . A morte do celebre rei de Aragão

,

pouco posterior a j ornada de Fraga , trouxera a desmembração dessa monarchia . Na Navarra fora eleitorei Garcia Ramires , descendente dos antigos principes daquelle estado , e no Aragão pr0 prian1 entedicto

,

' Ramiro,monge de Thomieres

,irmão de

Affonso I . O rei de Leão ,ou com 0 pretexto de ser

0 herdeiro de seu padrasto,

.ou porque parte dasprovíncias aragonesas tinham pertencido outr 'oraa Castella ou ,

finalmente,porque era 0 mai s forte

,

marchou immedi atamente para a R ioja,de que se

apossou sem contradicção . O n0 v0 rei de Navarralonge de mostrar intenções de lhe resistir

,saíu a

( 1 ) Veja-se summa dos successos d este período emSandoval , Cinco Reyes , f . 1 56 e segg . : e melhor em Risco

,

Reyes de Leon ,T . 1 , p . 337 e segg .

1 48 H I STOR IA DE PORTUGAL

recebê-lo , reconhecendo-o a maneira francesa por

suzerano e evitando assim as consequencias quasicertas da guerra . Então A ffonso VII d irigiu— se aoAragão e apoderou — se da nova cap ital del le

,Sara

goga , que lhe abriu as portas . Dizemuns que Ramirose retirara a Sobra1 :be , outros que , imitando 0 deNavarra , 0 acceitara por suzeranq . Não nos per

tence a nó s averiguar este ponto . E,todavia

,certo

que desde essa epocha A ffonso VII se intitulou ,não

só rei ou imperador de Leão e Castella , mas tambem

de Saragoça e Navarra . Garcia,porém

,não fi zera

mai s do que ceder á força das circumstancias . Era

natural que,asserenada a tempestade que 0 amea

çava,renascesse Da sua alma O desej o da indepen

deneia . A esta causa nos parece dever-se attribuir 0

seu procedimento u lterior .

O genio guerreiro de Affonso Henriques e a nobreousadia com que 0 5 habitantes de Portugal se con

servavam estranhos a submissão geral da Hespanhachristan deviam excitar a admiração e fazer desejara alliança do senhor desta pequena

“ provincia e dosseus indomaveis barões e homens d '

armas a todosaquelles que so ffriam impacientemente 0 jugo doimperador . Entre estes era 0 mais notavel Garcia

,

0 j oven monarcha navarro,que

,antes de nada

tentar contra aquella especie de suzerania, que re

conhecera,procurou e obteve travar alliança com

A ffonso Henriques . Dos mesmos fidalgos da antigamonarchia leonesa

,habituados ao desenfrearnento

e á independencia de facto que tinham desfructado

a sombra das desordens publicas,muitos suspi

ravam pelo momento em que podessem renovar as

anteriores parcialidades Essa disposição dos

( 1 ) Comites et qu ia potins laetan tur

guerra imminente quam pac is e t lranquillitatis temporeHist . Compost . , L . 3 , c . 51 .

1 50 H ISTOR IA DE PORTUGAL

0 infante apoderou — se de Tuy e successivamente doscastellos e terras que elle s possuiam e cuj o dominiosupremo voluntariamente lhe cederam . Não con

tentes com isso , uniram as suas tropas às de Portu

gal e , junctos com 0 seu novo alliado,prepararam-se

para a guerra , emquanto Garcia de Navarra , quebrando 0 preito que fi zera , rompia as hosti lidadespelo oriente

castello de Allariz está assentado na margemesquerda do Arnoya

, que vem desaguar no Minhopouco abaixo da confluencia deste rio com 0 Avia .

Governava-o nessa epocha um cavalleiro esforçado

por nome Fernando Annes , cuj a lealdade ao imperador era radicada e sincera e de quem dependiamvarios outros castellos circumvizinhos . Com seusfilhos

,irmãos e amigos

,Fernando Annes

,oppôs

— se

valorosamente á invasão e , postoque vencido , combateu até perder todos 0 5 logares que lhe cumpriadefender e guardar . Vencido 0 alcaide de AllarizA ffonso Henriques , tendo levado as suas arInas ate

O coração da Galliza e mettido guarnições nos castellos que a traição lhe entregara ,

recolheu-se a Portugal

,porventura para augmentar 0 exercito

,ne

ce55ariamente enfraquecido com a distribuição dastropas pelos logares fortes de que 0 infante se fi zerasenhor . Que e ste fosse O motivo parece indicá — lo asua volta immediata a Galliza para continuar a

guerra . O s capitães do imperador tinham entretantoajunctado os seus homens d '

armas e preparavam— se

para seguir 0 nobre exemplo de Fernando Annes .

0 5 motivos por que Gomes Nunes (que em 1 1 28 tinhasegu ido a parcial idade de D . Theresa) tornou a possuirterras em Portugal desvanecem-se com 0 5 successos que

vamos narrando e que exp licam obviamente a vo lta doc onde ao seu paiz .

(1 ) Chron . Ade f . 1

L IVRO I I 1 0 1

Distinguiam— se entre elles os condes Rodrigo Velae Fernando Peres nestes encontrara sempre 0 in

fante 0 5 mais duros adversarios,e nas suas passadas

emprezas contra a Galliza fora por elles rechaçado .

Junctas as tropas dos fronteiros , 0 exercito gallegoveio encontrar os portugueses num s itio chamadoCernesa ou Cernej a . Travada batalha , a fortuna declaron — s e contraria aos condes de Leão

,e as tropas

gallegas retiraram— se desordenadamente . RodrigoVela caiu nas mãos dos inimigos com outros cavalleiros ; Inas dous dos seus homens (Par inas arriscaram— se denodadamente para 0 salvar

,atirando

se como desesperados ao meio dos que 0 levavamcaptivo e

,tendo— o desembaraçado das mãos destes

,

foram com elle ajunctar— se ao e xercito fugitivoCom semelhante vi ctoria 0 futuro parecia sorrir

a Affonso Henriques e aos condes rebeldes de Toronho e Limia seus alliados . Suj eitos 0 5 districtos

meridionaes e desbaratados 0 5 mais illustres capitaes de Affonso VII nestas partes , 0 norte da Gallizaofferecia-se para theatro de novas conquistas . Eellas teriam de feito proseguido

,se um acónteci

mento gravíssimo não viera j ustamente nessa con

j unctura atalhar 0 5 passos do infante e chamar— lheattenção para a de fesa dos proprios estados .

A ordem dos templarios,da qual

,conjunctarnente

com as outras ordens militares,teremos de falar

em tempo opportuno,conforme O plano do nosso

trabalho , tinha recebido de D . Theresa nos ultimosmeses do seu governo 0 senhorio do castello deSoure . 0 5 monges cavalleiros

,cuj o enthusiasmo e

valor em parte nenhuma se desmentiam,e cuj o ins

titúto era 0 pelejar sem descanço contra 0 5 sectariosd0 i51a1ni5 1n0

, haviam em pouç os annos mudado 0

( 1 ) Chron . Adef . 1 30 e 3 1 .

1 52 H I STOR IA DE PORTUGAL

aspecto daquelles arredores . Cubriam então extensosbosques e matos 0 tracto de terra que hoj e constituea Estremadura alta

,e A ffonso Henriques devia

ceder com facilidade estes desertos, que eram como

barreira natural entre as duas raças inimigas , aessa ordem composta inteiramente

.de esforçados

homen s de guerra . Com a espada numa das mãos ecom a enchada 0 11 alvião na outra , elles foram gra

dualmente contendo 0 11 castigando as correrias dossarracenos e desbravando ou povoando aquelles ar

redores A oeste,porém

,de Soure ficava um

largo espaço aberto às invasões dos sarracenos ,que vinham , sem encontrar resistencia , assolar asviz inhanças de Coimbra . A este mal occorrera 0

infante . Aproveitando a conjunctura da paz quehouve por anno e meio depois da acelamação deA ffonso V[I

,começara durante O inverno de 1 135 a

edificação do castello de Leirena (Leiria ) . Era 0 logaridoneo não só para servir de de fensão aos seu s estados

,mas tambem para guerrear 0 5 mussulmanos .

N0 meio daquelles vastos desertos que se dilatavamao sul de Soure e ao noroeste do Nabão escolheraA ffonso Henriques para lançar os fundamen tos deLeiria um monte que satis fazia não só às condiçõesindispensaveis de defensão numa praça de fronteira , mas tambem ao fim principal para que esselogar era destinado . Guarnecido por tropas esco

(1 ) Doaç ões de Soure aos templarios de março de 1 1 28 e

de março de 1 1 2 9 ._Cart . de Thomar no Arch . Nacion . )

Viterbo , Eluc . V . Ladera e Tempreíros . Bu l las relativasaos Templarios no A rch . Nacion , Gav . 7 , M . 3 , n

º1 7 , e

M . 9 , nº 35 rex portugalensis (a do M . 9 , n .

º 35

diz illus lris portugalens is reg is) quandams i lvam dumui vestrae in perpetuum con tullisset , eam cumdif f cultate max ima de sarracenorum manibus liberantes ,

per vos et homines ves tros situdiosus coluis tis

1 54 H I STOR IA DE PORTUGAL “

lhidas , cubriría facilmente o _ caminho de Coimbrae , por outra parte , tornaria facil , partindo-se da

quelle ponto , atacar inesperadamente qualquer dastres praças mais importantes do occidente do GharbSantarem , Lisboa , Cintra . Concluída a edificação

de Leiria nomeou 0 infante um dos seus cavalleiros , Pai o Gutterres , suj eito de estremado esforço ,para alcaide do cas tello

,e debaixo

do seu mandopôs alli uma forte guarniçãoDeviam 0 5 sarracenos fronteiros so ffrer mal este

novo padrasto que O guerreiro principe christão

alevantava na raia dos seus dominios . Paio Gutterres

, que um antigo escriptor compara Scipião

africano opprimia-os com correrias e entradas .

Irritados pelos damnos que recebiam da molestavizinhança de Leiria

,congregaram suffi cientes

forças e marcharam sitiá-la . Affonso Henriquesach ava— se na Galliza e acabara de obter a victoria deCernej a quando recebeu as novas do movimentodos sarracenos e com ellas as do tragico desfecho

que a tentativa tivera contra 0 5 christãos . O exer

cito mu ssulmano,composto de almoravides ou

mouros e de sarracenos hespanhoes tinha aecommettido e levado a e scala 0 castello de Leiria . Adefesa fora desesperada . Duzentos e quarenta ca

valleiros e homens d *arma5 da guarnição haviamficado mortos de fendendo aquellas muralhas , eentre elles contavam-se individuos de alta j erar

( 1 ) Chron . Gothor . ad aer . 1 1 78 .

(2 ) Pelagium Guterriz ; ah i l lo ergo virtus et audaciasarracenorum c oepit in íirmari , qu ia vid eban t quidem al

terum Scip ionem africanum , qui eos valde opprimeret et

affligeret (ibid . ) se isto não se refere antes a A ff onsoHenriques .

(3) Moab i tes et agareni Chron. Ade f. Imp . 1 32 .

LIVRO 1 1 1 55

chia Salvou— se,porém

,0 valoroso Paio Gut

terres , que posteriormente d evia alli mesmo cai rnos ferros do captiveiro Na conjunctura em que

0 5 christãos recebiam tão importante perda experi

mentavam outro revés de que apenas resta confusamemoria 0 11 fosse uma di versão que 0 5 fronteirostentassem fazer para inquietar 0 5 sitiadores deLeiria

,ou alguma correria anterior a este successo ,

a qual 0 provocasse mais depressa,é certo que um

corpo de tropas,tendo avançado até as proximi

dades do Nabão , foi destroçado no sitio chamadoThomar ( se não era antes este 0 nome arabe do rio) ,onde annos depoi s 0 5 templarios construíram a casacapitular da ordem e O forte castello que ahi sub

siste aindaA perda de Leiria era nos seus effeitos analoga de

certo modo a de Celmes e ainda mais dolorosa ; mas

ao menos aqui fora,conforme as ideas do tempo ,

sangue de martyres 0 que por mãos de infi éis tin

gira aquelles muros . O lastimoso acontecimentodesse castello e 0 destroço de Thomar annullavam

as consequencias do triumpho obtido em Cernej a .

A força moral do paiz diminuira necessariamentecom estes reveses

,ao mesmo tempo que se tornava

necessario ao infante voltar a Portugal para oppôr

barreiras á audacia dos sarracenos , guarnecendomelhor as fronteiras meridi onaes . E

' a e stas causasevidentes que nó s attribuimos 0 5 successos posteriormente acontecidos na Galliza .

Dissemos já que O rei de Navarra soffria impacientemente 0 jugo que O temor nascido de se acharcollocado num thr0 n0 vaci llante lhe fizera acceitar

( 1 ) ld em , ib id .

(2 ) Chron . Go thor. ad aer . 1 1 78.

(3) Era 1 1 75 even i t infortunium super christianos in

Thomar . Vej a— se nota XV no fim do vo lume .

1 56 H I STOR IA DE PORTUGAL

pouco depo is de obter a coroa daquelle paiz . Defeito

,elle quebrara a sua vassalagem a Allonso VII

na me sma occas ião em que 0 infante português penetrava na Galliza . Acudira O imperador a rebater0 navarro como mai s poderoso , e principalmente aisto devera

,talvez

,Affonso Henriques a fortuna

das suas armas . Mas O imperador alcançara cousideraveis vantagens contra Garcia , ao passo que ,com a j ornada de Cernej a , a guerra de Gallizat0 1nava um aspecto assa s graVe para attrahir todaa sua attenção . Tinha elle par tido havia pouco dePalencia para Zamora

,quando nesta cidade encon

trou um cavalleiro que Vinha relatar-lhe . 0 5 successos occorridos na fronteira de oeste . Partiu immediatamente com marchas rapidas , acempanhado

das ponças forças que pôde colligir em Zamora e ,

dirigindo — se de salto a Tuy,teve a feli cidade de

entrar ah i , parece que sem combate . De Tuy envioumensageiros aos nobres , condes , alcaides e ao proprio arcebispo de Compostella ,

para que viessemajunctar-se alli a fim de invadirem Portugal , aproveitando a proxima conjunctura das ceifas paradestruírem as cearas e reduzirem esta turbulentaprovincia aultima estreitezaO in fante voltava então a soccorrer as suas fron

teiras meridi onaes ,e a impressão de desalento, que

era natural incutisse nos animos dos portugueses amorte de tantos cavalleiros illustres como 0 5 que

tinham perecido em Leiria,proporcionava ao impe

rador 0 ensej o para duras represalias . Não aconte

ceu , porém ,assim . Os senhores e cavalleiros que

Alionso VII convocara para a intentada invasãodilataram O cumprimento do que lhes fora ordenado , e entretanto O velho Gelmires , que se dispu

( 1 ) lbid . 1,2 9 e 32 . H is t Compo stell.

, L . 3 , c . 51 .

1 58 H ISTOR IA DE PORTUGAL

celebrado então foi , todavia , a ssas desfavoravel paraAffonso Henriques , visto que desse pacto só paraelle resultavam obrigações e nenhumas para Affonso VII . Ahi jurou 0 infante leal amizade aoimperador, para que nunca por si ou por outremlhe buscasse morte ou damno e que

,se alguem lh

,

0

fizesse , elle di sso tomasse vingança como por umfilho que

muito amasse . Prometteu igualmente respeitar 0 5 territorios do imperio em seu nome e no

dos seus barões e que , se algum destes 0 5 invadisse ,elle ajudaria lealmente avingança ou a restaurá-loscomo se fossem os proprios : que no caso de invasão ,quer de mussulmanos

, quer de christãos , marchariaa soccorrer Affonso VII

,sendo — lhe pedido soccorro

que,se 0 6 111 0 ou fllhOS do imperador quizessem

permanecer na paz,elle infante seria obrigado a

guardar as condições desta que no caso de ser que

brada aquella convenção por algum dos barões portugueses ,

0 infante repararia O mal até onde fossepossível

,a arbítrio dos que então trabalhassem em

impedi r a quebra da boa harmonia que as honras

(terras immunes ) , que O imperador lhe dava restitui — las -hia a elle ou ao seu successor

,sem tergiver

sação ( 1 ) nem engano,em qualquer tempo que lhe

fossem pedidas . Este pacto foi jurado pelo in fantecom cento e cincoenta dos seu s homens bons e exarado em Tuy a 4 de j ulho de 1 1 37 , na presença doarcebispo de Braga e dos bispos de Segovia , Porto ,

Tuy e Orense

(1 ) Et dahi t ira ias aut paca ttzs . Esta expressão é tradu

z ida nas formulas vulgares dos p rei tos e menagens dos

castellos em tempos posteriores , por dará 0 d i cto cas

tel lo irado e pagado

(2 ) Este tractado vem transcrip to no App . 3 da H ist . do

Mosteiro de Sahagun por Escalona , p . 52 7 , escrit . 1 61 .

LIVRO I I

Um tractado em que se continham j á estipulaçõesrelativas aos successores de Affonso VII importavaidea de bem longa duração ; mas nem O imperador

nem 0 in fante deviam considerá — lo na realidadesenão como treguas mais ou menos dilatadas , se

gundo as circumstancias futuras 0 exigi ssem ouaconselhassem . Sobradamente desvantaj oso paraAffonso Henriques , cuj a virtude não era por certo aresignação , podia logo prever— se que

,reparada a

desgraça de Leiria ou obtidas quaesquer vantagensimportantes contra 0 5 sarracenos nas fronteiras me

ridionaes , elle nào tardaria a buscar pretextos ou aachar motivos para quebrar aquella especie de jugoa que se curvava . Desde esse momento a guerracontra 0 primo a qual até aqui seria impossívelattribuir causas bem precisas , converte — se em uma

necessidade de situação . As expressões do tractadosão c laras 0 fi lho de D . Tberesa conserva “dominioscomo vassalo do imperador e , postoque não possa1n 0 5 di zer ao certo quaes fos sem , O facto nem por

isso é menos indubitavel , Se Portugal fosse um paizcuj a independencia ,

datando de largo tempo , esti a

vesse be in firmada , essa vassalagem do infante poroutros senhorios serem diversos dosque herdara )nada influiria na sua auctoridade como principe dosportugueses , não faltando naquella epocha barõesd 'além dos Pyreneus que pos suí ssem terras na Peninsula ,

sem que os reis hespanhoes pretendessem

por i sso ter O domínio eminente sobre 0 5 territoriosfranceses de que elles eram senhores . Mas é evi

dente que,sendo a independencia da província de

Portugal apenas um facto duvidoso,

suj eição deAffonso Henriques ao imperador ,

debaixo de qual

quer pretexto , influiria por muitos modos na sortefutura deste paiz . Apesar , pois , de todas as solemnidades de que fora revestido , O tratado de Tuy não

1 60 H I STOR IA DE PORTUGAL

podia subsistir , e a quebra delle dentro de um pe

riodo mais ou menos curto era inevitavel.

Durante O resto deste anno e quas i por todo 0

decurso dos dons seguintes as fronteira s daGalliza e de Portugal respiraram do continuo revolver das batalhas e das correrias assoladoras emquetanto sangue christão tingira as espadas christans .

Como de rommum accordo,os dons primos volta

ram as armas para mais nobre empreza 0 combater os antigos inimigos da cruz ; 0 proseguir nessalonga lucta , encetada havia mais de quatro seculos

e que desde a conquista de Toledo dava j á indíciosde terminar um dia pela victoria deci siva do christianisrno . O s desastres padecidos na Estremadurae 0 5 proprios triumphos obtidos na Galliza tinhamattenuado as forças de Portugal . Era por isso indis

pensavel refazê-las antes de tentar qualquer facçãocontra 0 5 sarracenos do Gharb . Devia O golpe dadonos infiéi s soar bem alto para lhes quebrar 0 orgulho das passadas vantagens , vantagens que estavamhabituados a alcançar nestas partes desde 0 tempodo conde Henrique , todas as vezes que a s propriasdiscordias lhes consentiam repellir as lenta s e fracas tentativas dos christãos

,entretidos

,ainda

,talvez

,

(1 ) Que a paz durava em 1 1 38 deduz-se ,não só do si len cio

das memorias co evas sobre succes sos mili tares entre Portugal e Galliza durante este anno e quasi todo 0 seguinte ,

mas tambem da presença do conde Fernando Peres na

corte d '

Aífon so Henriques em mai o do mesmo anno, con

iirmando a amp l iação do Conto do Porto (Arch . Nacion ,

Chancell. de A ffonso IV , L . 2 , f . se não era antes oFernando

'

Peres , que com O titulo d e Coiermanus do in

fante con firma a carta de Couto de Cucuj ães em . julho de1 1 39 (Arch . Nacion . M . 1 2 de For . An t . n .

' 3 , f . 62 v . ) quesuppomos ser Fernando Furtado , f i lho bastardo de D . Ur

raca e do conde Pedro de Lara , cuja presen ça na corte doprimo prova igualmen te a existencia da paz entre os

dous paizes .

1 62 H ISTOR IA DE PORTUGAL

capital,como seductor do vulgo mas elle foi esta

belecer a suamorada num cemiterio viz inho,aonde

concorriam a ouvir-lhe as practicas os seus devotos , practicas nas quaes , como é facil de antever ,

não poupava 0 5 almoravides .

Neste tempo ( 1 1 2 0 ) tomou elle 0 nome de Almahdi

,que

,segundo a tradição arabe

,era um

chefe poderoso que no fim dos seculos devia vir

ao mundo reconduzir 0 5 homens aos verdadeiroscaminhos do islamismo . Seguiam-no j á muitos , e0 amir pensou seriamente em acabar com esteperigoso propheta. Sabendo-o a tempo

, Al— mahdifugiu para Tynmal

,na provínc ia de Sus

,onde se

fez acclamar imarn ou summo pontí fi ce e,prose

guindo entre os rudes montanhes es mi ssão queemprehendera ,

em breve augmentou O numero dosseus sectarios a ponto de se fazer temido . Denomi

nou— os almohades (Al»muwahedun) ou unitarios ;porque um dos obj ectos a que mais se dedicava era

a provar a unidade de Deus . Tanto que pôde ajunctarVinte mil homens capazes de pegar em armas

,

recorreu ao systema de conversão mussu lmanoa guerra . Desde 1 1 2 2 até 1 1 30 , em que Al

— mahdifallecen

,0 5 alrnohades augmentaram em poder e

em numero com repetidas Victorias contra 0 5 almoravides . Por morte do propheta , Abdu-l— mumen

,

que entre os seus primeiros di scípulos fora 0 que

elle sempre distinguira , soube obter para si a dignidade de unam e , continuando com prospera fortunaa combater os seus adversarios , vendo— se j a obede

eido numa grande parte do Moghreb ,declarou-se

amir-al— muminin 0 11 khalifa , título que nenhumdos amires lamtunenses , apesar de dominarem na

A frica e na Hespanha , ousara tomar para si

( 1 ) Abd-el-halim ,H ist . dos Sober . Mohamet . (Vers . de

c . 43 e 44 . Conde, P . c . 26 a 28 e 3 1 . Khawel

LIVRO 1 1 1 63

No meio destes acontecimentos chegou O anno dahegira 532 ( 1 1 37 A Temi n ,

seu irmão , Aly substituira no governo de Hespanha 0 proprio fi lho esuccessor

,Taxfin . Era O príncipe sarraceno activo

e valente sustentava com esforço a guerra nas

fronteiras christans e continha com energia 0 5 mu ssulmanos de Andalús , malsoffridos debaixo do jugoalmoravide . Porém es se espirito d

'

independencia

dos indígenas,em grande parte . de raça arabe e

inimigos dos lamtunitas berbers , que, não con

tentes de 0 5 dominarem ,0 5 opprimiam ,

começou amostrar — se claramente apenas foram sabidos na

Peninsula 0 5 triumphe s dos almohades e que apotencia almoravide começava a declinar . Os dis

trictos de Huete eAlarcon rebellaraln-se , e a cidadede Cuenca ousou resistir a Taxfin , que viera soce

gar aque11es alvorotos . Entrada a força,os seus

hab itantes foram passados a espada . No meio destessymptomas tanto de recear

,0 principe sarraceno

recebeu ordem de seu pae para passar ao Moghreb .

( ) s exercitos do amir eram destroçad0 5 em quasitodos 0 5 recontros com 0 5 sequazes de Abdu-lmumen

,j á senhor de grande parte das províncias

do imperio,com 0 que a ruína da dynastia lamtu

nense parecia imminente . Pas sou Taxíin logo Omar

,levando comsigo a flor das tropas almoravides

que traziam sopeados 0 5 mussulmanos andaluses edefendiam as fronteiras contra 0 5 christãos , augmentando

,além disso

,0 seu luzido exercito com

quatro mil auxiliares mosarabes,homens moços

e valentes . A partida destas forças,deixando des

guarnecidas as praças mussulmanas,abriu cami

cl Tewarikh , p . 335, em Romey , Hist . d'

Esp . , T . 6 , p . 1

e segg . Al-makkari , History o f the Mohammedan Dynasties in Spain (Vers . de Gayangos ) , B . 8, c . 1 e 2 .

1 64 H I STOR IA DE PORTUGAL

nho ao fogo da rebellião que lavrava nos animos eexcitou a audacia dos christãos

, que fraca resis

teueia podiam achar nas rareadas fi leiras dos lamtunitas , obrigados a prevenirem-se contra as tenta

tivas dos proprios sarracenos de HespanhaNeste estado de cousas

,A ffonso VII

,feita a paz

com 0 infante de Portugal , preparou— se para invadir 0 territorio mussu lmano . Postoque O rei deNavarra continuasse a sustentar a guerra contra 0

monarcha leonês , este fazia — a alli pelos seus capitães e

,livre das inquietações que lhe davam 0 5

portugueses pelo lado da Galliza ,avançou ( 1 1 38)

até as margens do Guadalquivir . Deste ponto , dividindo 0 exercito em corpos volantes , mandou — o sdevastar e saquear 0 5 districtos de Jaen ,

Baeza ,

Ubeda e Anduj ar,queimando 0 5 logares abertos

e destruindo os campo s e arvoredos . Marchandonesse mesmo anno contra Coria , apesar de fazer

grandes estragos nas cercanias , não a pôde tomar eretirou — se a Salamanca ; mas no anno seguinte preparou— se para a conquista do famoso castello deAurelia (Orej a ) . Era este uma das principaes fortalezas mouriscas das fronteiras de Toledo e terrívelpadrasto contra 0 5 christãos . Começou O cerco em

Passô a A frica l levando en su compania la j lor —de la

caballeria de 10 5 almoravides , que h izo notable f alta paralas revue ltas y turbaciones que en Espana se susci taroncon su ausencia y assi m esmo l l evó quatro mil christianos de Andalusia mui dies tros eu las Conde ,

P . 3 , c . 36. Rex Texuíinus ab ii t trans et transtul it secum multos chri stianos quos vocant musarabesChron . Adef . Imperat , L . 2

, c . 52 . Esta chron ica põ e a

partida de Tax íin em 1 138,0 que devia ser no princ ípio

do anno . A en trada de A ffonso VII até 0 Guadalquivire a divisão do seu exercito em partidas provam , alémd isso , claramente a ausenc ia de Tax fln e da cavallaria

almoravide .

1 66 H ISTOR IA DE PORTUGAL

leiros de A ffonso Henriques . Era uma seita agonisante debaixo dos golpes da sua feliz e vigorosarival ; era a estrella da dynastia lamtunense que se

eclipsava ; era um povo,conquistador recente , que

sentia agitar-se — lhe em roda sedento de vingança Opovo subjugado , 0 qual virtualmente conspiravacom os seus proprios e antigos adversarios , 0 5

christãos,para a ruína daquelles que se podiam

chamar inimigos de uns e d *outros ; inimigos dos sarracenos hespanhoes por tyrannia politica dos christãos por odios de crença e por emulação de con

quista . O armistício tão facilmente concedido porA ffonso VII aos esforçados defensore s d ,

:àurelia

prova que O verdadeiro estado dos negocios na

Africa era por elle bem conhecido . A sua apparente

generosidade , que , de outro modo , seria um grandeerro , sem dúvida se estribava na certeza que tinhada inutilidade della para 0 5 sitiados .

Atfonso Henriques j azia apparentemente em pro

funda inacção desd e a paz de Tuy,como s e 0 seu

animo inquieto e guerreiro se achasse cançado deuma vida de contínuos perigos e combates . Não eraassim . Preparava-se em silencio para novas e mais

gloriosas emprezas do que fazer nos domínios doimperador uma guerra sem resultados seguros eque

,na situação especial da Península , onde duas

crenças e duas raças estavam a braços uma com aoutra , se podia considerar de certo modo como

guerra civi l . Tinha de vingar 0 5 desares por que

passara nas fronteiras meridionaes ,e era assim

,

entretido nos preparativos para uma grande cor

reria dirigida ao coração do Gharb , que 0 principese conservava em simu lado repouso . A conjuncturaaccommodava-se marav ilhosamente ao intento . Noanno preterito seu primo pene trara até bem pertoda

'

cap ital dos estados mussulmanos da Hespanha e

L IVRO 1 1 1 67

deixara assoladas províncias até onde raro ou nuncatinham ousado chegar as armas christans . A debilresistencia que A ffonso VII encontrara era indícioevidente da impotencia do imperio lamtunense .

Era-o agora tambem O cerco de Aurelia , praça militarimportantíssima , para 0 5 sarracenos não haveremde consentir em que estivesse posta impunementeem apertado sitio ,

se lhe fosse possível soccorre— la .

Na verdade Ibn Ghanyyiah ,wali de Valencia

,com

outros cabos principaes das forças almoravides doAndalú s tinham feito uma demonstração contraToledo com O intuito de divertirem para a capitala attenção do imperador , mas nem por i sso esteabrira mão da empreza

'

em que estava empenhadoe 0 5 generaes almoravides haviam -se retirado se1ntirarem proveito algum da sua tentativaEra tempo de aproveitar as circumstancias . Ja

em maio deste anno de 1 1 39 se faziam os preparativos de uma expedição militar

,e 0 5 homens d '

armas

corriam a ajunctar-se as suas bandeiras Entrado0 mês de julho 0 exercito português marchou para0 meio-dia Em vez de se encaminhar paraaquella parte do Gharb que se dilatava desde afronteira de Santarem até Li sboa pela margemdireita do Tej o e que , por este lado da Hespanha ,tinha tantas vezes sido theatro de sanguinolentasluctas

,0 infante transpôs 0 rio e , atravessando no

seu terrível fos sado 0 11 correria 0 sertão da provincia

, nunca até ahi devassado das armas chris

(1 ) Chron . Adef . lmper . , L . 2 , cap . 68.

(2 ) cl s i obiero ia exercita reg is , d iz um cavalleiro em

doação de 1 8 de mai o de 1 1 39 ao mosteiro d e PendoradaD issert . Chronol .

, T . 3,P . 1 , p . 1 1 6, n .

º 354 .

(3) Doaç . a Monío Guimariz fei ta pelo in fan te em j ulhode 1 1 39 quando ia para o f ossado de Ladera Eluc id ; de

Viterbo,T . 1 , p . 473 , verb . Foro morto .

1 68 H I STOR IA DE PORTUGAL

tan s , dava mostras de se dirigir contra Silves , apovoação mais importante daquellas partes . A au

dacia da empreza,os estragos inevitaveis nestes

fossados , expedições cuj o firn principal era 0 talaros campos do inimigo

,deviam causar profundo

susto, por isso que a invasão de Af fonso Henriques

parecia combinada , e porventura 0 era , com 0 commettimento de Aurelia pelo imperador . Por outraparte

,5 Vista do que temos narrado ,

mal podiamos governadores almoravides destes districtos es

perar soccorro das províncias mai s orientaes deAndalús , e a marcha rapida de Ibn Errik (nomecom que 0 filho do conde Henrique era designado

pe10 5 sarracenos ) diffi cilmente consentiria delongaspara invocar alheio aux ilio

,ainda quando houvesse

probabilidade de obtê-lo . Assim,era necessario que

em si proprios buscassem recursos para cortaremO p asso aos christãos ,

servindo — se unicamente dasforças que

,partindo para a Africa

,lhes deixara

Taxfin .

A vasta extensão de territorio que se divide hoj enas duas províncias do Alemtejo e do Algarve

,

quando 0 5

'

a11n0 ravide5 subjugaram a Hespanhanos fins do secu lo XI constituía junctamente com

uma porção da Estremadura hespanhola e , talvez ,da província de Sevi lha 0 5 estados dos Beni Alafftas0 11 amires de Badaj oz , que senhoreavam tambem

aquella parte da Estremadura portuguesa aindanão conquistada pelos christãos

,inti tulando— se por

is so amires do Gharb . Com a entrada dos lamtunitas acabou este amirado ,

como 0 5 outros do Andalús e 0 5 waliados dos districtos

,0 5 wasirados

das cidades de segunda ordem e as al-kayidarias

( 1 ) - 11) n Al— khatib , em Casi ri Bib l . Arab . Hisp . , T . 2 ,

2 1p . 7 . Conde , P . 3 , c . 1 e espec ialmente 0 2 2 .

1 70 H I STOR IA DE PORTUGAL

dos castellos foram naturalmente distribuídos entre0 5 conquistadores . Se estes conservaram as anteriores divisões territoriaes ou se fi zeram nova di5tribuição de governos subalternos é 0 que não seráfacil dizer . Todavia

,antes de começarem 0 5 chris

taos a apoderar — se dos territorios além do Tej o e aosul de Leiria , 0 Gharb compunha — se de tre s provincias 1 .

ª de Al— faghar ou de Chenchir,onde

estavam situadas as cidades e castellos de SanctaMaria (Faro) , Mirtolah (Mertola) , Chelb (Silves ) ,Oksonoba (E5t0 i ) , Tabira (Tavira) , e outro s ; ade AI — kassr Ibn Abu Danes , contendo a s importantes cidades de Bataliõs (Badaj oz ) , Xerixa (Xerezde 10 5 Caballeros ) , Iaborah (Evora) , Marida (Merida) , Cantarat Al— seyf (Alcantara ) , Curia (Coria ) ,Belc'h ou Ielch (E1vas Baj ah (Beja ) , Al-kassar (Alcacer do Sal) . e varios castellos e povoações , comoJelmanyah e Sheberina3.

ª a de Belatha,cuj os principaes logares eram as

duas cidades de Chantarin 0 11 Chantireyn (Santarem) e Lixbona 0 11 Achbuna(Lisboa) e 0 roqueirocastello de Chintra ou Zintiras (Cintra) . Abaixo deAchbuna , na margem opposta da bahia do Tej o

,

via-se O forte de Al-maaden (Almada) , isto é , damina

,nome que lhe Vinha das palhetas de ouro

que 0 r0 10 do mar lançava nas suas pra ias , e que se

entretinham em ajunctar durante O inverno 0 5

habitantes daquelles districtos Esta importante

(1 , Edrisi , Geograph . (versão de Jaubert : Par1 s ,Vol . 2 , p 1 5 e 1 6 , e p . 2 1 e segg . , comparado com Al

makkari e Ibn Khaldun (versão de Gayan gos) , Vol . 2 ,

texto e append ices pass im, Conde . P . 3 , e Casiri , Vol . 2 ,

pass im. Edrisi acab ou de escrever a Geographia em 1 1 54por ordem de Rogerio de Sic i lia ; mas a sua viagem na

Hespanha devia ter sido bastante anterior, porque as ma

terias para a obra levaram muito tempo a colligir (Pro

L IVRO 1 1 1 7 1

parte da Hespanha mu ssulmana foi a primeira aabandonar a decadente dynastia lamtunita . Nomeio das perturbações que agitavam então 0 Andalús , um certo Ahmed Ibn Kasi apoderou — se deMertola e dos territorios circumvizinhos , emquantoSeddaray 0 11 Sid Ray se fazia senhor de Badaj oz edo resto do Gharb . Das narrativas dos historiadoresarabes não se pôde conhecer exactamente quando severifi cou a partilha ; se ante s

,se depois de 1 1 39 .

Occorressem ,porém , taes successos anterior ou

posteriormente a essa data , é certo que por aquellaepocha Seddaray e Ahmed desmembraram em dousestados independentes a antiga monarch ia dos BeniAlafftas dominando Seddaray , segundo parece ,ao norte e ao oriente

,e Ahmed ao 511 1 e occidente .

Ou dominassem estes regu los , ou estivesse ainda0 paiz suj eito aos governadore s ahi postos peloimperador de Marrocos , 0 que sabemos é que os

chefes mussuhnanos,pelo menos 0 5 do Alemtejo ,

se“

uniram para atalhar a invasão do terrível IbnErrik . Este achava-se j á nos campos que se dilatamao sul de Bej a quando 0 5 walis e kayids das praçasdo Gharb marcharam ao seu encontro . Numa das

logo , XX e XXI) . E na verdade,essa viagem foi feita de

1 1 42 a 1 1 47 , p o is que da narrativa d'

Edrisi se vê que pre

cedeu a conquista d e Santarem e Lisboa pe los christãos

e foi posterio'

r à tomada de Coria em 1 1 42 Edrisi , Vol. 2 ,

p . 2 5. e Chron . Ade f . Imp . 2 —

74 .

(1 ) Ibn Khaldun cit . por Al-makkari : L . 8, c . 2 (T . 2 ,

p . 30 9 de Gayangos) . Ibn Kasi (Ahmed ) and Ibn Wasir

(Seddaray) shared among themselves the w hole o f thatcountrv , wh ich had once b elonged to th e Beni Alaíitasib id . Ahmed Ibn pro íi ting by the c ivil wars ,wh ich di stracted Mohammed on Spain at the commence

ment o f the twe l fth cen tui y , be made h imselt master o f a

considerab le portion o f the Al Gharb : Gayangos , Vol. 2,

App . D , D. 49 . Conde , P . 3 . c . põe estes successos deIbn Kasi (Aben Cosai) em 1 144 .

1 72 H I STOR IA DE PORTUGAL

eminencias , por me io das quaes 0 50 10 se vaefazendo mais agro e ondeado desde as planuras deBej a até se converter nas asperas serranias deMonchique

,estava assentado 0 logar ou ca stello

denominado pelos arabes Orik Foi nestas immediações que sarracenos e christãos se encontraram .

Apesar de que O antigo esforço e 0 irresistívelenthusiasmo dos lamtunitas , corrompidos pelasriquezas e pelo luxo , fructos das passadas c

'

on

quistas , tinham grandemente esmorecido , ellesrecorreram a uma das guerreiras usanças dos seusantepassados do Moghreb para preencherem asfi leiras

,ou rareadas pela partida de Taxfin

,ou

porque as guarnições dos castellos daquelle tempo ,ainda completas

,eram 1nui pouco numerosas

As mulheres a1n1 0 ravides,vestindo as armas

,

Vi eram pelej ar ao lado de seus maridos e irmãosem defesa da terra que as tribus de Lamtunaolhavam como nova patria depois da conquista doAndalú s

Aº excepção desta , as circumstancias da batalha

de Ourique ignoram — se inteiramente . As chronicas

christans coevas ou quasi coevas que a mencionamfazem-no em bem curtas palavras

,e nos di versos

escriptores arabes que nos transmittiram a historiade Hespanha neste periodo não se encontra 0 mi

(1 ) Moura , Vestig . da Ling . Arab , p . 1 71 .

(2 ) Para se fazer idea do l imitado numero d e soldados ,que guarnec iam qualquer castel lo naquelle tempo , oh

serve-se que Merto la , a ma is f orte de todo o Gharb, fo i

salteado por seten ta homens do partido de Ibn KasiConde , P . 3 , c . 34 .

(3) foerninae sarracenae in hoc praelio ,amazonico ritu ,

ao mod o pugnarunt , ut occ isz—e tales deprehensae Chron .

Go thor . na Mon . Lusit .

, P . 3 , L . 1 0 , c . 3 . Es te uso de

entrarem as mulh eres nas batalhas era pecul iar dos almoravides Casiri

, Vol. 3, p . 2 1 9 .

1 74 H I STOR IA DE PORTUGAL

vencidos a quatro centos mil sarracenos e a'

fazerintervir na tentativa 0 proprio Deus . Se acredi

tarmos os chronistas antigos e ainda 0 5 hi storiadores modernos a batalha de Ourique foi a pedraangular da monarchia portuguesa . A11i 0 5 soldadosno delírio de tão espantosa Victoria

,de que haviam

sido instrumento e víctimas cinco reis mouros e 0 5

exercitos sarracenos d,

Africa e de Hespanha,acela

maram monarcha O moço principe que 0 5'

conduz1ra

ao triumpho . Algumas,porém

,das memorias ou

coevas ou mais proximas contentam— se de exaggerarO numero dos inimigos , omittindo as outras particularidades que 0 tempo

.foi accrescentando ao

successo dizemos exaggerar, porque 0'

li1nitad0

das forças almoravides que guarneciam a Hespanhamussulmana

,segundo se Vê do . que anteriormente

narrámos,e a rapidez da invasão

,feita em quinze

ou vinte d ias,não consentiam virem a Ourique

tropas das províncias mai s remotas,ainda sup

pondo a exi stencia dessas tropas,0 que O abandono

de Aurelia bastaria para ' nos constranger a não

acreditarApó s esta j ornada

,Affonso Henriques , saqueados

e destruídos,provavelmente , os logares abertos da

provincia de Al— kassr,voltou aos seus dominios .

Os despoj os,porém

,daquella bri lhante entrada

eram 0 preço de menos valia em tal empreza . Mais

graves resultados deviam ser 0 5 da ordem moral?principe português dera aos sarracenos uma

aspera demonstração de que as algaras pelo ladodas fronteiras de Santarem elle respondia assolandoos districtos centraes do Gharb ; mostrava aoimperador qual era a ousadia dos cavalleiros e

(1 ) Nota XV I no fim do vo lume .

-L IVRO I I

homens d '

armas de Portugal ; habituava estes acombater os infi éis e1n rasa campanha , exercitando0 5 e predispondo — os para as futuras conquistas

,e ,

finalmente , restaurava 0 5 brios necessariamenteamortecidos com 0 5 tristes acontecimentos renovados por tantos annos nas fronteiras do di strictode Belatha e com as humilhantes condições imposta s

por Affonso VII ao infante na conju'

nctura dosreveses de Leiria e Thomar .

A guerra entre Portugal e Leão rompeu d 'ahi apouco

,ainda nos fins de 1 1 39 ou ,

0 que nos parecemais de crer , nos principios do an o seguinteAS memorias desse s tempos não nos di zem quem

quebrou as pazes j uradas só sabemos que a luctainterrompida por dous annos começou de novo . O

mais de presumir é que Affonso Henriques fosse 0

agressor ,porque era a elle que interessava 0

annullar 0 tractado de 1 1 37 . Nesse ou noutro presupposto

,é certo que O vencedor de Ourique pene

tr0 u*

na Galliza -pelo lado de Tuy Invadi ndo,

porém,aquella provincia , 0 infante encontrou 0

seu mais perigoso adversario , 0 valente alcaide de

(1 ) A falta absoluta d e dip lomas originaes de Atl'

onso

Henriques desde junho de 1 1 39 até junho de 1 1 40 persuadeque el le se demorara na expedi ção do Alemtej o e que ,

vol tando aos seus estados , quebrara immediatamente apaz com O imperador , penetrando na Galliza . Esta fal ta dediplomas , que verificamos por nossos proprios 0 1h0 5 no

Archivo Nacional e que em vão temos fei to examinar se é

supprida nas outras collecçõ es de documentos do paiz , énotavel. Existe , todavia , uma carta de privi legios aos

cavalleiros do Sepulchro , incluída em coníi rmação de 1 256

(Arch . Nacion , Gav . 6 , M . un . n .

º29 ) e datada de 3 das

kal. d,

ab ri1 de 1 1 78 (30 março Mas como dizemos nofim da nota IV , esta data é obviamente errada

, perten cen

do 0 dip loma a uma epocha bastante posterior .

(2 ) D . Alfonsum in partibus Galleciae circa TudemChron . Go thor , ad aer . 1 1 78.

1 76 H ISTÓR IA DE PORTUGAL

Allariz . Fernando Annes j a não era 0 simplesde fensor de um castello ; era O general ou princ ipe ( 1 ) do districto de Limia. Nessa campanha

,se

acreditarmos a chronica de Affonso VII,0 5 portu

gueses não foram felizes , postoque se apoderassemde alguns castellos

,e 0 si lencio dos nos sos chroui

cons a respeito de taes successos,longe de invalidar

aquella narrativa , tende , quanto a nó s ,.a confi rma

la . fronteiro leonês obteve diversas vantagens ,aprisionando alguns dos principaes cavalleiros dePortugal , que para obterem a liberdade sacrifi caramavultadas sommas , naturalmente adquiridas na

passada correria além do Tej o . O proprio infantesaíu ferido em certo recontro de uma ascuma 0 11

lança vibrada por um peão das tropas de Limia ,ficando assim por algum tempo impossibilitado deconduzir pessoalmente a guerraPostoque pareça não terem sido em geral 0 5

successos da campanha nas fronteiras do norte favoraveis a A ffonso Henriques , todavia 0 seu valorajudado pelo dos barões e cavalleiros portuguesestornavam — no adversario digno de séria attenção .

Apesar da entrada pela terra dos sarracenos até 0

Guadalquivir e do assedio e conquista de AureliaI

(1 ) Ferdinandus princeps Limiae Chron . Adef . Imper.

1 32 .

(2 ) Idem ,ib id . Das memorias de Portugal apenas a

Chron ica dos Godos nos diz que ,neste anno Esmar, sa

bendo que Affonso Henriques estava na Galliza para as

bandas de Tuy , retido por negoc ios de que não podia f ac ilmente desembaraçar— se, veio sub ito , etc . , etc . Estes negociosnão podem ser , quan to a n ó s , senão a guerra com Fer

nando Annes,e a ferida que imp ossib i l itou 0 infante de

vestir armas por al gum tempo , e depo is a entrada do

imperador e 0 recontro de Valdevez , de que vamos falar .

Sobre chronologia destes successos veja-se a

no ta 111 .

1 78 H I STOR IA DE PORTUGAL

contro dos invasores . Travou-se um combate,e 0

conde, que loucamente se atrevera a affastar-se do

grosso do exercito ,foi desbaratado e captivo . C0 1n

este prospero successo 0 5 portugueses não hesitaramem avançar para Valdevez

,e Affonso VII viu

coroarem — s e de uma selva de lanças as altas easperas serranias que se prolongavam defronte doseu acampamentoAssim como as epochas de adiantada civilisação

tendem a fazer semelhantes os costume s de povosdiversos

,assim na infancia das sociedades usanças

barbaramente poeticas se repetem frequentementeentre nações divididas por largas distancias de espaço 0 11 de tempo .

' Os heróes da Ilíada preludiavam ao travar as batalhas por combates singulares ,com 0 5 quaes se excitavam O esforço e 0 enthusiasmo

do c0 1n1nu1n dos guerreiros . A idade média viumuitas vezes renovarem — se estas scenas da infancia da civilisação grega ,

e nas raízes do carrancudoSoaj o repetiram-se tambem esses duellos homeri

cos . Entre 0 5 dous exercitos a veiga do Vez o fferecia-se como uma

.

vasta estacada,onde os barões e

cavalleiros de Leão e Portugal podiam encontrars e corpo a corpo

,sem a desordem e confusão de

uma batalha , e experimentarem qual das duas províncias da Hespanha gerava braços mai s robustos ,animos mais feros . Foi um largo torneio em que avictoria coube aos valente s homens de guerra doinfante . Fernando Furtado ,

irmão do imperador,

Vermudo Peres , cunhado de Affonsb Henriques , 0

conde Ponce de Cabrera e mu itos outros dos maisnotaveis fidalgos da corte do imperador ,

derribadospelas lanças dos portugues es ,

ficaram prisioneiros ,segundo as le is da cavallaria . A memoria do facto

(1 ) Ib id .

L IVRO 1 1 1 79

perpetuou

)

se ahi no nome de Jog o do Buf urd io 0 11

Bof orda ( 1 ,que se pôs ao logar do torneio , O qual ,

depo is , a tradição popular , engrandecendo 0 successo , segundo é costume , denominou Veiga da Matança , bem que a h istoria não nos diga que Inorresse no combate um só dos nobres contendoresSupersticiosa como era aquella idade

,0 desba

rato do conde Radimiro e 0 captiveiro de tantossenhores e cavalleiros principaes deviam pareceraos leones es pessimos auspícios para uma batalha ,

que,aliás , s e tornava inevitavel. E na verdade - a

perda daquelles illustres guerreiros era justo 1n0

tivo de desalento . Accrescia que 0 5 portuguesestinham tomado melhores posições Nesta situa

ção ,Affonso VI I mandou ao campo inimigo men

sageiros que , em nome delle,pedissem ao arce

bispo de Braga para por sua intervenção se tractarda paz . Não obstante as vantagens alcançadas peloinfante

,0 desfecho da batalha era incerto ,

e 0 prelado português accedeu facilmente aos desej os domonarcha . Os receios de um combate brevemente

( 11 ) Ib id . Chron . G 0 1h0 r . Na Mon . Lusit . , P . 3 , L .

e 8 Cap ti s quibusdam castel lan is in 10 0 0 qui vocatur Lu

dus Buf urdii . e mai s particularmen te na que suppomos

paraphrase posterior : ibid . App . 1 ad aer . 1 1 78. Captisun t ex utraqueparte d iz 0 chronista de A ffonso VI I mas

vê— se em toda a narrativa deste successo que e l le pre

tende attenuar a desvan tagem do imperador , que aliásnão pôde negar . Buf urdium (baf orda ou bof orda , e d'

ah ibaf ordar ou bof ordar Elucid , P . 1 , p . 1 68) signi ficava con

junctamen te 0 que depo is veio a distinguir— s e com 0 5

nomes de torneio e de justa isto é j ogos m il itares comarmas verdadeiras e em que corria O sangue , e j ogos comarmas embotadas e de puro d ivertimento . Veja se Du

cange ,verb . Bohordium . Os ingleses chamavam— lhe buhur

dicium Rymer , Foedera (Lond . Vol . 1 , P . 1 , p . 2 1 3 .

(2 ) Chron . Adef . Imper . 1 33 . Chron . G0 1h0 r . 10 0 0 ci t .

(3) In 10 c0 altiori et aspero Chron . Ader. 1 . c it .

1 80 H I STOR IA DE PORTUGAL

se desvaneceram e, concordados a final o s dons

primos,falaram amigavelmente um com 0 outro .

Ajustou- se uma suspensão d'

armas por alguns annos

,ficando por mutuos fi adore s os cabos princi

paes de um e de outro exercito,até que depois com

mais socego se podesse assentar uma paz definitivae duradoura

,0 que poucos annos depois se reali

sou . Entretanto os prisioneiros feitos de parte aparte foram logo postos em liberdade

,

'e restituidos0 5 castellos reciprocamente conqu istadosEs tes acontecimentos passaram , Como j á notamos ,

dos fins de 1 1 39 até a primavera de 1 1 40 . O chefesarraceno desbaratado ern Ourique soubera da eutrada de Affonso Henriques ,

n'

a Galliza e dos re

véses que experimentara . E,até , ' natural que a

fama exaggerasse 0 perigo da ferida que ahi recebera . Sedento de vingança , Omar (se este era 0 seu

nome) ajunctou as tropas do Gharb e,atraves

sando inesperadamente a fronteira,accommetteu e

tomou 0 castello de Leiria , j á reparado e guarneeido de novo . Morta uma parte da guarnição e captiva outra com 0 seu antigo alca ide , Paio Gutterres ,

aquella importante fortaleza foi reduzida a um

montão de ruínas. D'

a11i,segundo parece , 0 5 sarra

cenos proseguindo na suamarcha assoladora,inter

naraln-se no coração de Portugal e,dirigindo-se

para 0 nordeste , avançaram até as immediações deTrancoso . A sorte desta povoação foi igual a de Leiria

,e 0 5 sarracenos haveriam tirado maior vingança

das devastações ( 10 anno antecedente feitas pelos

(1 ) Chr0 n . Gothor . na Mon . Lusit ., P . 3, L . 1 0 , c . 8.

Chron . Adef . 1 . c . A chronica toledana attribue aos

portugueses as d i l igencias para se fazer a paz . A verosi

milhan ça favorece a narrativa da Chronica dos Godos , queas attribue ao imperador, contra 0 qual estavam as pro

hab i l idades da batalha imminente .

1 82 H I STOR IA DE PORTUGAL

portugueses á coroa leonesa ; embora ,como depoi s

da invasão de 1 1 2 7 ,Portuga1 pareça as vezes resi

gnar-se a sorte das outras províncias'

da He spanhachristan

,os factos positivos e palpaveis contradi

zem essa especie de ficção polít ica . 0 5 pendões por

tugueses j á não esvoaçam em terras dos infiéis aolado dos de Leão e Asturias ,

'

de Galliza, de Castella e de Toledo . O in fante de .Portugal , quandosolta 0 seu grito de guerra , ao atirar — se por entrese1va5 de lanças sarracenas

,vae ,

como O rei das

feras , bu scar solitario sua prêa ; arca peito a peitocom 0 islamismo

,sem pedir soccorro aos outros

principes, que tem j á na conta de estranhos na

corte do imperador ninguem 0 viu nunca ; nas as

sembléas políticas da monarchia 0 . seu logar estásempre vazio os cofres do estado jamais se abrempara receber os tributos munic ipaes das provincias portuguesas , que começam cubrir — se de povoações , restauradas ou fundadas de novo finalmente , O orgulhoso A ffonso V II , que não pôde consentir a independencia do Aragão e ,

de certo modo ,

da Navarra , tomando O titulo de senhor de Naxera ;Affonso VII

, que inclue na enumeracão dos seus domini os esses paizes , ainda quando 0 5 naturaes lhedisputam 0 senhorio delles

,nem uma só vez se inti

tu la dominador de Portugal , contentando — se , acaso ,com imaginar que esse novo estado virtualmentese acha incluido debaixo do nome da Galliza , daqual é senhor e a que poucos annos antes os dousdistrictos do Porto e Co imbra estiveram

'

ligados .

Que se pôde deduz ir desta opposição entre 0 5 factos materiaes e 0 caracter politico das nossas relações corn a monarchia leonesa naquella epochaA mais obvia é que certo « numero de circumstan

cias , cuj a apprec iação na maxima parte é hoj e impossível , tinham tornado assas distincta naciona

-LIVRO 1 1 1 83

lidade portuguesa , apesar da sua recente data,para

se perceber ,ainda nesses rude s tempos

, que seriadiffi cil empreza 0 destrui-la . Mas

, em nosso entender

,não era só isto . O leitor não esqueceu por certo

quaes foram depois da morte de Atl'

onso VI as pretensões do conde Henrique , pretensões que são

como 0 elo de todo O processo da desmembração dePortugal . Quizera elle para si um largo quinhão naherança do sogro

,e ambos os partidos contendores

,

0 do rei dº

Aragão e 0 de D . Urraca,tinham enten

dido dever ceder-lhe 0 oeste da Península para 0attrahirem a propria parcialidade . A divi são e ademarcação do novo estado chegaram a fazer — se

com a possível solemnidade e com a concorrencia

dos barões leoneses e castelhanos . Desde esse 1110

mento a ambição do conde tinha um fundamentolegitimo . D

'ahi as pretensões de D . Theresa depoisda morte do marido , e d

'ah i, quanto a nó s , a insis

teueia,assim da rainha como de seu âlho , em ten

tarem apoderar— se das terras na Galliza e ainda nosdistrictos de Zamora

,Toro

,Salamanca e Valladolid ,

que em 1 1 2 1 vimos serem tão facilmente cedidas

por D . Urraca a sua irman . As invasões para alémdas fronteiras septemtrionaes e orientaes de Portugal

, por este período , apparecem— nos sempre na

historia tão repentinas,tão destituídas de motivos

conhec idos , que dessa mesma circumstancia se

conclue a existencia de uma causa permanente quetornava inuteis outros quaesquer pretextos para talprocedimento . Póde

,na verdade

,a ferocia dos tem

pos explicá-la s algumas vezes mas fora exaggerardemasiado a barbaria da epocha 0 attribui-las constantemente ao desenfreamento das paixões e a quebra de solemnes promessas .

Nesta hypothese , que nos parece a unica verosimil

,a situação relativa entre Portugal e Leão era

1 84 H I STOR IA DE PORTUGAL

reciprocamente falsa . Se por um lado a questão daindependencia se podia ainda em 1 1 40 considerarcomo problema ,

a dos limite s verdadeiros dos territorios que deviam pertencer ao herdeiro e repre

sentante de Henrique de Borgonha não era menosdisputavel. A dif ficuldade de resolver este complicado negocio parece-nos conciliar as ideas

,appa

rentemente oppostas , que as memorias e documen

tos daquelle periodo suscitam sobre 0 valor exactodas relações entre 0 novo e stado que surgia eaquelle de que nascera .

No seculo XI,bem como nos que lhe precederam ,

O titulo de infante era j á 0 que se dava aos filhos dosreis . D . Theresa

,que , como vimos , recebia dos sub

ditos 0 de rainha ainda em vida do conde Henrique ,havia tomado este ultimo quasi constantementenos seu s diplomas pouco tempo depoi s da morte domarido . Arrancando — lhe das mãos O poder

,seu

fi lho conservou por alguns annos 0 de in fant e com

que antes disso era designado . Todavia os portu

gueses não tardaram a dar-lhe 0 de rei, que 0 man ;

cebo hesitava em acceitar . Pouco a poucó , porém ,

elle começou a adoptar 0 de príncipe misturadocom 0 de infante e predominando sobre este desde1 1 36 . Era a palavra principe um vocabulo genericopara ind icar O che fe ou principal personagem deuma provincia

,de um districto e ,

até , de um corpode tropas , V indo

,portanto , a ser mais ambíguo

ainda que na linguagem moderna e por is so aecommodado á situação incerta em que Affonso Hen

riques se achava collocado . Vê — se,comtudo

,que ,

quando as circumstancias 0 constrangiam a recuarnos seus desígnio s de completa independencia elle0 abandonava

,limitando — se ao de infante . O povo

attribuia-lhe as vezes um ou outro , postoque O usomais commum pareça ter sido 0 denominá-lo rei .

1 86 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Entretanto os sarracenos,desbaratados na jor

nada de Trancoso,tinham retrocedido para O sul .

Soube então A lfonso I que uma armada francesa desetenta Ve las surgira juncto ao porto de Gaia e

,

acos sada dos temporaes ou por outro qualquer 1n0

tivo , viera fundear dentro do rio . Navegavam paraa terra sancta

,. talvez porque o s príncipes christãos

da Syria pediam'

soccorros aos seus co-religionarios

da Europa,suspeitando j á 0 5 successos que trouxe

ram em breve a perda de Edessa e deram motivo asegunda cruzadaÇO principe portuguê s resolveuentão commetter 0 5 sarracenos pelo districto deSantarem . Tracton 0 negocio com os capitães dafrota

, que levantou ferro e,descendo ao longo da

costa,entrou na bahia do Tej o

,emqnanto um exer

cito,marchando por terra , se aproximava de Lisboa .

Era 0 logar forte e bem defend ido,como 0 tempo

mostrou , e as forças do rei de Portugal junctas àsdos cruzados insufficientes para conquistá-la . Devastados os seus arredores

,a armada velej ou para

0 Estreito,e 0 exercito recolheu — se com os despoj os

obtidos, que eram um dos principaes motivos des

sas correrias continua sD epois deste succes so 0 5 primeiros cuidados de

Affonso Henrique s foram 0 fortifi car as fronteirasmeridionaes dos seus estados . O castello de Leiria

,

que úcara destruido na passada algara dos sarrace

nos,considerava — se como a chave do paiz por este

lado . Assim não tardou a ser de novo edificado e

guarnecido . A sua importancia era tal, que num

documento pouco posterior 0 5 alvazis e demaismembros do concelho municipal de Coimbra declaray am que os homens d '

armas do concelho que ten

( 1 ) Chron . Gothor. na Mon . Lusit .

, P . 3 , L . 1 0 , c . 9 .

LIVRO 1 1 1 87

tassem ir combater pela fé na Palestina fossem defender a Estremadura e em especial Leiria

,onde

,

se morressem ,obteriam a remissão dos seus pecca

dos do mesmo modo que em Jerusalem A for

taleza de Germanello foi construida tambem por

esses tempos para impedir os insultos dos inimigos,

que , avançando da provincia d'

A l—kassr pelos territorios agrestes e montuosos ao noroeste do Tej o ,

vinham ousadamente,seguindo 0 curso dó Doessa

ou por entre Pombal e Penella , talar os campos deAteanha e do AlvorgeNo meio de taes

.

prevenções chegou O a nno de1 1 43. Aproveitando as di fficuldades com que 0 5

almoravides andavam a braços,O imperador sitiara

Coria, que se rendeu depois de ter implorado emvão 0 5 soc corros d

'

Africa,emquanto O famoso al

caide de Toledo , Munio Affonso , desbaratava 0 5

walis de Sevi lha e de Cordova . Na primavera desteanno Affonso VII devastou os districtos de Carmona

,de Cordova e de Sevi lha

,e,rico de despoj os

,

voltou a Toledo para 0 5 repartir com os seus h0mens d

'

armas . A morte,porém , de Munio A ffonso ,

que entretanto perecera num combate com 0 adalidsarraceno de Calatrava , produziu viva impressãono animo do principe leonês , que despediu as suastropas

,resolvido a não proseguir a guerra senão

no anno seguinte

( 1 ) Doação do domínio ecc lesiastico de Leir ia San c taCruz de Coimb ra em 1 1 42 na Mon . Lusi t .

,ubi supra ;

Posturas da Camara de Co imbra de 1 1 45 no Liv . Pre to .

f . 2 2 1 . A-C hronica dos Godos (exemplar de Resende)traz a data da reed i íi cação de Leiria evidentemente errada ,

attribuindo -a ao anno de 1 1 44 11 1 82 O seu prime iro fora lé de 1 142 . (Arch . Nac . , M . 1 2 de For . An t . n .

º 3 , f .

(2 ) Chron . Gothor . ad aer . 1 1 80 . For . de Germanello

n 0 Liv . Preto . f . 2 2 2 .

(3) Chron . Ad ef . Imper . 2 —

74 .

1 88 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Foi durante esta calma da guerra com 0 5 mussul

manos que se tracton de estabelecer definitivamentea paz cuj os preliminares se tinham assentado em

Valdevez . O cardeal Guido de Vico viera por

aquelle tempo a Hespanha como legado do papaInnocencio II e ajunctara um concílio provincialem Valladolid

, em que se promulgaram as resolu

ções do segundo concílio geral de Latrão e se deram algumas outras providencias relativas especialmente á igrej a de Hespanha . O imperador e Orei de Portugal dirigiram— se ne ssa conjuncturaZamora para numa conferencia assentarem as condições de duradoura concordia . Guido

, provavel

mente como representante do pontífi ce,foi cha

mado a assistir á conferencia dos dons principes ,que , segundo parece , resolveram amigavelmente ascontroversias que 0 5 tinham obrigado a demorar aconclusão da paz . Quaes foram as condições desta ?

Nenhum monumento especial que n0 — 10 diga che

gou até nós mas 0 que s e pôde asseverar é que Oimperador reconheceu O titulo de rei que seu primotomara

,e que este recebeu delle 0 senhorio de AS

torga considerando-se por essa tenencia seu vas

sa110 . Não é menos provavel que , ainda como rei dePortugal , ficasse numa especie de dependencia politica de Affonso VII

,O imperador das Hespanhas

ou de toda a Hespanha ,como e11e se intitulava nos

seus diplomas . Segura assim a tranquillidade dos

( 1 ) A 4 de diciembre del 1 1 43 en donacion de la in fantaD . que ten ia esta c iudad (A storga) el rey de

Portugal por grac ia de1 nuestro ; anadiendo que la gobernaba em nome del portugues , Fernando Captivo , etc .

Flores , Esp . Sagr .

, T . 1 6, p . 20 6 . Sobre a narrativa destee dos sub sequen tes parágraphos veja-se no ta XIX no fimdo vo lume .

1 90 H I STOR IA DE PORTUGAL

rei, postoque nenhum acto nos reste de uma elei

ção regular . Mas isto não erabastante para destruir as le is gothicas que se oppunham á desmembração da monarchia

,apesar de alguns abusos

anteriores Ass im,com um direito politico assas

disputave1, nu1na epocha em que a força resolviamai s que nunca a sorte dos povos e dos imperantese ,sendo possível

,ou antes provavel, que , renovada

a lucta da independencia , Portugal , ainda em debilinfancia , viesse ou cedo ou tarde a succumbir

,

como succedera á Navarra , só collocando 0 seuthrono a sombra do solio pontificio Affonso Henriques podia torná-lo solido e estavel. A

' supremacia que em geral 0 5 11 111 111 0 pastor exercia sobretodas as monarchias chri stans associava-se a ideade que na Hespanha tinha a sé romana um dominioparticular e immediato e por isso , uma vez quee11a s e declarasse protectora do novo estado , a existencia individual deste estribava — se numa jurisprudeneia politica superior às mesmas instituiçõesW isigothicas .

Desde 0 X secu lo,e ainda mai s desde 0 tempo de

Gregorio VII , a maxima de que do papa derivavade certo modo a legitimidade e 0 poderdos principestemporaes havia — se dilatado e estabelecido comoum principio de direito pub lico

, que chegou aoauge do seu predomi ni o no pontificado de Innocencio III . Era 0 papado

,para nos servirmos da phrase

11 , Idem , ib id .

( 2 ) Non latere vob i s credimus regnum“

Hispaniae ah

antiquo juris S . Pe tri fa isset,et null i mortalium

sed so l i apostolicae sedi ex aequo p ertin ere . RegnumHispaniae ex antiquis consti tutionibus b eato Pe tro et S .

Rom . Eccles iae in jus et pr0 prietaten1 esse tradi tum

Gregorii V I I Episto lae I e V I I, apud Aguirre . Co l lect .

Max . Conci lior. B isp .

, T . 4 , p . 438 e 442 .

' L IVRO I I 1 9 1

de um profundo e por vezes eloquente de fensor desemelhante ordem de cousas naquelles temposuma especie de dictadura tribuni cia porque , re

caindo a sua acção sobre 0 5 ferozes e brutaes dominadores da Europa

,ella não podi a deixar de ser

protectora dos pequenos e desvalid os . A influenciare ligiosa do pontiíi ce ,

numa epocha principalmente caraéterisada pela a ssociação da crença Vivacom a soltura dos costumes , vinh a a ser urna poderosa alavanca para fazer vacillar 0 5 throno s maisfirmes e ao mesmo tempo uma columna de bronzea que s e encostavam 0 5 mai s vacillantes .

'

Se1n sy s

tema fixo , os soberanos de entã o procuravam aju .

dar-se da força moral do papa nas suas questões deamb ição , e obtinham esse perigoso auxílio a custade concessões que iam con50 1idand0 poli tica invariavel de Roma em tornar reali dade practica as

doutrinas da dictadura universal . Repelliam ellesalgumas vezes a idea de que O papa fos se 0 dispen

sadór das coroas mas esses mesmos que numa ounoutra conjunctura recu savam a jurisdicção emi

nente da igrej a,levados da necessidade ou da cu

biça ,d 'ahi a pouco a reconh eciam

,invocando — a por

interesse proprio . Em tempo opportuno teremos detractar especi almente das opiniõe s que nessestempos vogavam semelhante respeito e

'

das suasconsequencias . Aqui será suffi ciente advertir quepelo meado do seculo XII

'

a theoria da di ctadurados papas adquiria cada vez mais força , e 0 5 estados que se formavam de novo

,0 11 as dynastias re

centes que as revoluções substi tuiam às antigasprocuravam legitimar a sua exi stencia politica pela

« 1 : Gioberti , Del Primato Morale e C iv'

i l e degli I taliani ,

T. 1 , p . 2 45 l_ediç . de

1 92 H I STOR IA DE PORTUGAL

confi rmação do successor de S . Pedro , esquecendose do preço porque haviam de comprar no futuroessa sancção do chefe visível da igrej aPartindo do pensamento theocratico predominante

na christandade,A ffonso Henriques , apenas assen

tada a paz de Zamora , tracton de illudir as couse

quencias della que lhe podiam ser de futuro desfavoraveis , appellando para a doutrina de Gregorio VIIe reconhecendo que ao pontí fi ce pertencia 0 summoimperio dos estados christãos da Peninsula . Estereconhecimento fé — lo nas mãos de Guido ,

ou anteriormente apartida do legado , nos l S de novembrode 1 1 43 para presidir ao synodo de Gerona oudepoi s disso

,suppondo que elle veio a Portuga l

antes de regressar para Roma . Numa carta dirigidaao papa 0 novo monarcha declarava qual era a si

tuação em que se collocara relativamente aSé apostolica em virtude da homenagem que fizera , e olferecia 0 seu reino a igrej a romana pagando O censoannual de quatro onças de ouro . As condições destahomenagem eram que os seus successores contribuiriam sempre com igual quantia e que elle rei , cornovas sa110 (miles) de S . Pedro e do pontífice , não sóem tudo 0 que pessoalmente lhe tocasse , mas tam

bem naquillo que dissesse respeito ao seu paiz e áhonra e dignidade do mesmo paiz

,achasse aux ílio

e amparo na sancta Sé,não reconhecendo dominio

algum eminente,ecclesiastico ou secular , que não

fosse 0 de Roma na pessoa do seu 1egad0 (3) .

(1 ) A'

cerca da supremacia temporal do papa nesta ep ochaveja— se Hal lam , Europe in the M iddle Ages , Chapt . VI , inmedio . Eichhorn , Deutsche S t . u . Rech tsgesch ichte II ,52 31 . Baumer , Gesen. der Hoh enstauffen ,

VI,S . 1 1 2 e

seqq . (2 .

ªed ição) .

(2 ) Aguirre , T . 5, p . 57 .

(3) Ex regesto Innoc . IV p . 364 authenticum exemp lar (no

H ISTOR IA DE PORTUGAL

seus adversarios e obtivessem na morte a recompensa da vida eterna ( 1 )Apesar da linguagem affectuosa que predominava

na resposta do pontí fi ce,dava-se nella uma cir

cumstancia que de certo modo devia tornar menosval iosas as promessas tão largamente liberalisadas .

Affonso 1 era rei pela vontade dos subditos e pelaconcessão do proprio imperador das Hespanhas ,

que por esse título 0 designava . Portugal era , por

tanto , um reino,embora O quizessem considerar

como dependente da coroa leonesa . Lucio II,porém

,

no endereço da carta tractava 0 j oven monarcha

por dux portugallenszs ,-0 que , no rigor da língua

lat ina,significava O principal cabeça , O chefe de

Portugal , designação vaga que admittia diversasinterpretaçõe s , esquivando — se ao mesmo tempo aintitular 0 paiz reino

,u sando do nome terra em

relação aos domínios de Affonso I, postoque este na

carta de vassa11agen1 se intitulasse rei e qualificassereino esses dominios que fizera censuaes ao papa .

Bastava uma circumstancia tal para mudar 0 as

pecto do negocio . Acceita pela Sé apostolica a homenagem da coroa portuguesa , os ultimos vestigiosda dependencia para com Leão desappareciam detodo

,mas O titulo de rei tornava — se duvidoso para

A ffonso Henriques . A separação de Portugal e stavaconcluida e legitimada ; não assim a questão damonarchia . Subdito do príncipe da igrej a , a estepertencia confi rmar-lhe a dignidade real . Era sobretal materia que

" desde então deviam versar as ne

gociações com Roma e sobre que provavelmenteversaram até 0 tempo de Alexandre III , que a finalreconheceu de modo explicito essa dignidade na

dynastia de Henrique 0 borgonhês .

(1 ) Idem,loc . citat .

L IVRO I I

Parece que a noticia das relações especiaes que

se estabeleciam entre Portugal e O papa não transpirou durante algum tempo e que este negocio foiConduzido com discri ção e segredo ; mas , emfim

,

Affonso VII chegou a saber 0 que se forj ava . Acasoe11e chamara O rei português para 0 seguir á con

quis ta de Almeria , a que assistiram todos 0 5 principes e senhores christãos da Península exceptuando Affonso I

,e este se negou a servi-lo , fazendo

então valer a homenagem que tributara ao pontífi cee 0 5 privilegios que alcançara de Roma . As memorias contemporaneas auctorisam a nossa “

conj ectura Lucio II vivera apenas um anno , e Eugenio III lhe succedera em f evereiro de 1 1 45. A estepontífice dirigiu 0 imperador uma carta que não

chegou até nós , mas cuj o conteúdo se deprehende

da resposta de Eugenio . Tinha ella por obj ectoprincipal duas questões diversas , uma ecclesiastica

,

outra secular,mas ambas vinham a cifrar-se na da

independencia de Portugal . Para conhecermos arazão por que A ffonso VII as tractava na sua cartaconjunctarnente e com igual interesse , e para entendermos como a questão ecclesiastica , naapparencia

ab solutamente estranha a politica , se prendia c0 1n

ella , é necessario que antecipemos aqui resumidamente alguns dos factos que havemos de tractar

com mais individuação quando chegarmos a estudara historia do clero nesta epocha ,

da qual é um dosmais curiosos ep isodios lucta entre 0 5 me tropolitanos de Toledo e de Braga .

Desde 0 VII secu lo,no tempo dos godos

,O bispo

de Toledo ,isto é

,da cidade cabeça da monarchia

,

tinha obtido uma especie de superioridade sobre 0 5

( 1 ) Nota XX no fim do vo lume .

1 96 H I STOR IA DE PORTUGAL

das outras metropoles , pormotivos de disciplina daigrej a nacional nas suas relações com O poder civil .

q uanto 0 5 arabes dominaram na maior par te daPeninsula

,0 prelado de Cordova

,sede do governo

sarraceno , teve em boa parte e ssa especie de supremacia

,que

,como a de todos 0 5 primados de di ffe

rentes regiões , nasceu de causas puramente politicas . Restaurada Toledo e convertida em corte danova monarchia gothica ,

bem como 0 fora da antiga,

Bernardo,seu primeiro arcebi spo , obteve de Ur

bano II O titulo e a dignidade de primaz das Hespa

nhas,em Virtude das anteriores preeminencias de

que esta Sé gosara Por algum tempo Braga acceitou O facto sem disputar a validade daquella primaz ia . O primeiro arcebispo bracharep se depoi s derestaurada esta metropole foi Giraldo

, que era

client e de Bernardo e que por consequencia não

repugnou a ordem hierarchica então estabelecida .

Seguiram— se— lhe tres homen s de caracter violento ,

que successivamente obtive ram a Sé archiepiscopalde Braga Mauricio Burdino , Paio Mendes, J0 50Peculiar . As resistencias

'

destes tres prelados áauctoridade que sobre elles pretendiam exercer os

arcebispos de Toledo , 0 11 como primazes 0 11 comolegados do papa

,foram cada vez mais energicas ,

aopasso que a Sé toledana mais vivamente insistia emexigir delles obedienc ia . As phase s daquella largacontestação acompanharam as do estabelecimentoda independencia de Portugal . Ao passo que a desmembração deste paiz se caracterisava mais e mai s

,

exaggeravam-se as pretenções de primazia daparte

de Toledo . Eram dous factos accidentalmente para

( 1 ) Flores , Esp . Sagr .

,T . 4 , p . 2 37 e sc a o: Masdeu

,Ó Ó'

H ist . Crit. d '

Esp .

, T . 1 1 , p . 1 49 e 5egg ., T . 1 3

, p . 288 e segg .

1 98 H ISTOR IA DE PORTUGAL

com uma injustiça não transitoria,mas perpetua .

Queixava — se tambem de que O arceb ispo de Braganão reconhecesse a primaziade Toledo estabelecida

por Urbano 11 e confi rmada por todos os

'

seus suecessores , sem excluir 0 proprio EugenioTaes eram 0 5 aggravos de Affonso VII . A res

posta é redigida corn a astucia ordinaria da chancellaria romana . A11udind0 rapidamente às queixassobre a acceitação do censo e sobre as promessasde protecção contra quem quer que pretendesse dominar em Portugal , ao que , é evidente , se referia Oimperador , Eugenio , que provavelmente renovaraas p romessas do seu antecessor Lucio II , nega 0

facto de um modo ambíguo,envolvendo a sua obs

cura negativa numa torrente de expressões vagasde carinho e affeição . Passando depois a tractar deoutros obj ectos

,procura dar satisfação ao monar

cha offendido á custa do arcebi spo de Braga . Nesteponto Eugenio abandona 0 estylo luxuario ,

as lon

gas phrases que se arrastam como a serpente e éemfim

, claro e conciso . Os seus predecessores man

daram que 0 5 metropolitas bracharenses obedecesseIn aos to ledanos elle mandou 0 mesmo

,e os seus

preceitos serão ex ecutados . João Peculiar é o ffereeido por Víctima expiatoria da homenagem feita peloprincipe português e acceita pela corte de “

Roma .

O papa mostrou-se,de feito

,inexoravel nesta mate

ria , e 0 prelado de Braga , suspenso do officio pas

( 1 ) Neque nob i s fuit quandoque vo luntas ut hono

rem vel dignitatem tuam, seu jus titiam regni tib i a DO

mino coxnmissi minuere in aliquo B ignum est ig itur ,

de cae tero , ut a querimonia tua des istas in eo videl icetquod portugalensium duce nos a l iquid recepisse , vel ei

etiam concess isse, unde j ura regni tui debeant imminui , velauf erri vel perpetuá injuria irrogar i Eugenii I II , Ep ist .

74 , apud Mansi , T . 2 1 , p . 672 .

L IVRO 1 1 1 99

toral , debalde foi advogar a suaLcausa perante

Eugenio,que

,para lisonj ear O imperador

,não só

constrangeu a e11e ,mas tambem a todos 0 5 arcebis

pos e bispos da Península a reconhecerem a prima

zia de ToledoA ssim terminou a larga contenda da separação

de Portugal da monarchia leonesa ao menos 1 150

nos restam monumentos de nenhuma outra tentativa do imperador para recobrar a minima aucto

ridade directa nesta parte da Hespanha . AO mes

mo tempo Affonso I parece abandonar para '

sem

pre a idea de dilatar os seu s estados ao norte e nascente das fronteiras portuguesas , e nem sequer se

encontram vestígios de que conservasse 0 dominiode Astorga , do qual , aliás , é naturalíssimo 0 pri

vas se Alfonso VII logo que soube das negociações

que elle entabolara com'

Roma . Desde este momento toda a actividade e espírito conquistador (10 principe português voltam-se para 0 meio — dia é sobre0 5 territorios s arracenos que e11e vae disputar ao

primo os limites dos proprios estados . Cada um deseu lado

,5 poríia ,

elles vibram as achas (Yarmas

sobre as arrancas e troncos da arvore carcomida doislamismo hespanhol ; e a arvore geme estroncandose debaixo dos golpes daquelles braços robustos . E

'

uma grande mudança que por esta epocha se operano caracter da nossa historia politica . A 1 lueta dadesmembração vae succeder a de assimilação . Por

tugal está constituido . O sangue derramado em

muitos combates , os estragos de successivas invasões e quasi trinta annos de energia , de perseveran

ça e de destreza tal foi 0 preço por que nossos avó scompraram a sua independencia . Os historiadores

Idem,ib id . Epist . 75 e segg .

2 0 0 H I STOR IA DE PORTUGAL

teem pretendido assignalar uma data exacta , umunico ponto no correr dos tempos em que ella nascesse e plenamente se realisasse ,

como se a natureza das cou sas não repugnasse a isso , e os factossuccessivos que compõem este facto ,

multiplo,com

plexo e , por consequencia , lento em completar— se ,não lhes bradassem bem alto que semelhante pensamento era absurdo . Preoccupados por aquellaidea no exame dos successos parciaes , ç ollocaram auma luz falsa a maior parte delles . E assim que

a historia de Portugal no seu berço , amplamenterecheada de fabulas inverosimeis e insulsas , está ,acaso , transfigurada pela má appreciação dos acontecimentos verdadeiros ainda mais do que por ellas .

AS fabulas,versando ordinariamente sobre parti

cularidades,fogem

, em parte , da memoria do leitor . 0 que fica e stampado na sua alma são 0 5 1ineamentos dos factos capitaes da historia . 0 valor men

tido destes,a sua cor legitima alterada , eis 0 que

induz mais que tudo emerrograve , e , por via de regra , 0 5 erros mais graves sao 0 5 de mai s largavida .

Antes de começarmos a narrativa das emprezas

guerreiras de Atfonso I contra 0 5 sarracenos cum

pre que volvamos 0 5 olhos para 0 que se passavanos estados mussulmanos que iam ser theatro dessas emprezas . Importantes acontecimentos coinci

diam ahi com os actos que,assegurando -a definiti

vamente,consumavam a separação de Portugal

do resto da Hespanha chris tan . Esses acontecimen

tos facilitavam de extraordinario modo as novastentativas que ia fazer 0 es forçado rei dos portugueses , constrangido não menos da necessidade politica do que da ambição . Examinados superfi cialmente

,vistos unicamente por um lado , não teem

facil explicação 0 5 repetidos triumphos e rapidas

2 0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

dade do homem,a magestade dos principes e as

virtudes da família se converteram em tre s grandes mentiras , ha ahi uma nação que vae morrer . Aprovidencia , que 0 previu

,suscita então outro povo

que venha envolver aquelle cadaver no sudario dosmortos . Pobre , grosseiro ,

não numeroso, que im

porta i s so ? Para pregar as taboas de um ataúde

qualquer pequena força basta .

Como bem observa um historiador moderno,a

Hespanha mussu lmana representava n0 meado doseculo XII uma imagem do Baixo -Imperio

,inhabi

litada igualmente para se defender e para se governar O quadro que do estado das cousas pub licas naquelle tempo nos deixaram os escriptores

arabes,ou contemporaneos 0 11 mais proximos

,é,

na verdade , 1asti1n 0 50 . A ruína do pa iz,aos 0 1110 5

das pessoas prudentes,parecia inevitavel

,porque

a decadencia moral era extrema . 0 5 homens deprobidade e 5c1en0 1a V 1V1a1n desprezados e esquecidos

,e 0 5 que se apoderavam das magi straturas pu

blicas ajunctavam á cubiça e ao orgulho completaincapacidade . No meio de guerras c ivis , feita s sem

enthusiasmo , sern gloria e só por causas abj ectas ,ao passo que a agricultura se de finhava e as artesesmoreciam

,O povo deixava aos ambiciosos tracta

rem das armas , e 0 5 homens de guerra habituavamse a combater mais com 0 5 enredos do que com Oferro . Bastava só 0 nome dos inimigos (0 5 christãos) para fazer enfi ar de susto 0 5 mussulmanç s . Apaz desapparecera completamente , e ninguelnpodia contar com a propria segurança . Corria-se evi

dentemente para a dissolução da sociedade atravésdas di scordias intestinas e , por assim dizer

,no

( 1 ) Rosseeuw Saint — H ilaire H ist . d '

Espagne ,T . 3 , p . 461

(ed iç .

L IVRO 1 1 2 0 3

paiz de Andalú s eram já tantos os potentados quantas as povoações que havia nelle ( 1 )Vimos antes como 0 principe Tax fin fora chama

do á Africa por Aly . O renomemili tar do capitãosarraceno e as tropas de Hespanha que levavacomsigo eram a ultima esperança do imperio 1a1ntunense . A guerra com 0 5 almohades continuousem interrupção ; mas a sorte das armas nuncamelhorou para 0 5 almoravides

,e Aly , con sumido

de desgostos,fallecen em Marrocos dei

xando ao fi lho a triste herança de 11 111 throno que

desabava . Como general de seu pae e como im

perador ,Taxfin perdera 0 prestigio da passada

reputação e a boa estrella que na Hespanha O guiara . Os destroços succedi am aos destroços , sem que ,apesar da sua actividade e e sforço , podesse uma

só vez melhorar— se . Vencido numa sanguinolentabatalha juncto de Tlemecen

,acolheu-se a esta cida

de , onde se fortifi cou . Alli 0 teve cercado 0 principe

i

dos almohades,Abdu-I-mumen e

,não podendo

assenhorear-se da povoação que Taxfin defendi ava10 r0 5a1nente , marchou contra Oran em soccorroda qual foi logo O imperador a1n1 0 raV 1de . Por mui

to tempo as duas seitas combateram encarniçadamente sobre a posse daquelle logar que 0 amir deMarrocos considerava como um dos mai s importantes ; porque os seus desígnios eram passar d 'ahipara a Hespanha no caso de se ver inteiramenteperdido na Africa

,salvando assim ao menos os

seus estados da Europa . Nestes combates as forçasdos lamtunitas diminuiam

,e Taxf mvia desvanece

(1 ) Ibn Abdu — l— Wah ed , apud Casiri , B ib l . Arab . H isp .

T . 1, p . 2 1 5 . Abu— b ekr ,

Vestis Serica ,ib id . T . 2

, p . 53 .

Ibn Khaldun c it . por Al— ln akkari (Vers . de Gayangos ; ,

B . 8, ch . 2 .

2 0 4 H I STOR IA DE PORTUGAL

rem-se cada vez mais as esperanças de remedio .

Reso lveu — se , emfim ,a partir . Certa noite saíu de

Gran só sinho , d irigindo -se a uma das fortalezas doporto , juncto da qual tinha os nav ios apparelhadospara a pas sagem . Eram pro fundas as trevas , e elleseguia a cavallo as ribas do mar fragosas e altas .

No meio da escuridão errou O caminho e , precipi

tando — se dos barrocaes ,pereceu miseravelmente

Este acontecimento foi um golpe mortalp ara 0 5 almoravides . Ibrah im Abu I sak

,irmão ou

antes 6 111 0 , como outros d izem ,de Tax6n

,acclama

do em Marrocos por successor do pae , brevementeviu reduzidos os seus dominios ao ambito da capital . Sitiada

,e1n6 n1

,esta pór Abdu-l-mumen

,caiu

nas mãos dos almohades e Ibrahim foi bar

baramente decapitado pelo s vencedores,acabando

ne11e dynastia do celebre Yusuf , 0 feli z e valorosoe'

1nu10 de Affonso VI

q uanto estes successos se passavam na Africa,

via a Hespanha mus sulmana representarem-se

iguaes scenas , postoque. em mai s resumido theatro .

Abu Zakaria Ibn Ghanyviah era nesta epocha O chefesupremo do resto das tropas almoravides que guarneciam 0 Andalú s . Os mussulmanos hespanhoes

davam desde a partida de Tax6n vi síveis signaes

de quererem sacudir 0 jugo dos lamtunitas . 0 5

symptomas de odio profundo contra aquelles que ,

vindos como salvadores e amigos se haviam con

vertido e1n senhores tyrannicos surgiam por todaa parte

,e a fraqueza dos ministros publicos , que

não tinham,como dentro de pouco se experimen

tou,os meios necessarios de repressão para com os

indígenas,começava a ser de todos conhec ida . A

( 1 ) Conde , P . 3 , c . 36 e 37 Abd— el-halim (vers . de

Moura) , p . 2 0 6 e segg .

2 0 6 H I STOR IA DE PORTUGA L

desta guerra sanguinolenta , que se prolongou durante os ultimos meses de 1 1 44 e proseguiu pelosanuos segu inte s , senão no que tocar aos districtosoccidentaes , que , em consequencia daquellas discordlas

,Vi eram cair

nas mãos de A ffon50 HenriquesEstes districtos

estavam irreme

diavelmente per

didos para 0 5 lamtunitas . Ibn Kasi

1 2 . Moeda arabe cunhada em Merto6 zera dO fºrte C&S la por Ibn Kasi . Seg undo um, decalque

18 110 de 34 9 1 10 13 O do Snr . 0 . Antonio Vives de Madrid.)

centro dos seus es

tados , emquanto Seddaray fazia 0 mesmo em Badaj oz . Omar Ibn Al-mundhir , que fora um dos primeiros e mais ardentes partidarios de Ibn Kasi , reee

bera deste 0 governo de Silve s , sua patria , com uma

especie de independencia ) Ibn Ghanyyiah , que tra

ctava por todos 0 5 modos de amparar 0 decadentedominio almoravide

,buscou meios de introduz ir 0

ciume entre estes tres chefes quehaviam sido os principaes motores da guerra civil . Breve se lhe offereceuoccasião para realisar 0 intento , 0 qual devia dar umresu ltado que elle não previra . A revolução doGharb tinha-se estribado em dous solidos fundamentos

,um político e outro religioso . Era 0 pri

meiro 0 odio concebido pelos indígenas contra 0 5

lamtunitas ; era 0 segundo, que Ibn Kasi começara

a sua ambiciosa carreira seguindo as pisadas deAl-rnahdi

,0 que fundara na A frica a seita dos a1

mohades . Como e11e,Ibn Kasi estudara as doutrinas

( 1 ) Conde , P . 3,c . 34 , 35, 37 e 38 .

Ln'

Eo 1 1 2 0 7

de Al-ghazaly e como elle viera propagá-las entreos seus naturaes , onde encontrou muitos outros domesmo sentir Por este meio alcan çou a influencianecessaria para dirigir a reacção politica . Sabendoda morte de Tax6n em Africa

,succes so que excitou

ainda mais,como era natural , 0 incendi o da revo

lução na Peninsula , Ibn Kasi , uni do pela identidadede crença com 0 5 almohades , enviou mensageirosAbdu — l—mumen , offerecendo -lhe obediencia . O principe africano nomeou-o então wali do Gharb

,0 que

era habilitá-lo para opprimir de futuro aquel1es

que 0 tinham ajudado a engrandecer . Este negocio,

segundo parece , fora tractado em segredo ; mas Ibn

Ghanyyiah , que dell e tivera noti cia , aproveitou 0

ensej o para semea r a di scordi a entre os tres cabeça sda revolução

,fazendo persuadir a Seddaray e a

Omar,cousa aliás facil

, que Ibn Kasi só dera estepasso para se engrandecer á custa de11es , trazendoa Península 0 jugo a1n1 0 hade

,mai s duro que 0 dos

lamtunitas . Surtiu eíf eito O aviso , Seddaray e Omarbuscaram pretextos para declarar guerra áquelle

que havia s ido seu chefe ,e as tropas de Badaj oz e

de Silves marcharam contra Ibn KasiEstes successos passavam em 1 1 45, quando as

sanguinolentas dissenções entre O rei de Portugal e0 imperador se haviam já trocado , senão em pazsincera

,ao menos em combates

,nos quaes a m

'

ctoria se nao disputava com O ferro , mas com as in

trigas em Roma e com as queixas e as concessõesao ponti6ce que anteriormente relatamos . F0 rti6cadas as fronteiras

,vendo— se á frente de homens

d'

armas aguerridos nas passadas luctas , A ffonso I ,

( 1 ) 1de1n , P . 3 , c . 34 in prin cip .

( 2 ) lbn Kh aldun ,em Gayangns (vers . de Al Vo l .

2 , App . D , p . 50 ,— ª Conde , P . 3 , c . 88.

2 0 8 H I STOR IA DE PORTUGAL

cuj o pensamento quasi exclusivo de toda a Vida foi0 das guerras e conquistas , e cuj o valor e constancialhe grangearam entre christãos e sarracenos a re

putação de um dos príncipes do seu tempo maisemprehendedores e pertinazes não devia estartranqui llo emquanto 0 estrondo das armas retumbava por todos 0 5 angulos da Peninsula . AS turhulencias do Gharb o ffereceram-lhe brevemente ensej opara ceder as suas propensões bellicosas . Aecommettido a um tempo por Seddaray e por Omar , 0

wali de Mertola lançou-se nos braços do tyrannoIbn Errik ,

senhor de Coimbra,como 0 5 sarracenos

denominavam O guerreiro principe português .

Além das inclinações militares deste , um motivorecente de Vingança 0 impellia a intervir ne stas discordias em que O sangue dos mussulmanos deviacorrer em torrentes por mão dos seus proprios co

religionarios . Como as algaras ou correrias mutuasdas duas raças inimigas se repetiam regularmentetodas as primaveras

,n0 anno antecedente ( 1 1 44 ) 0

wasir on kayid de Santarem ,Abu Zakaria

,um dos

mais valorosos chefes dos sarracenos,invadira as

fronteiras christans e aproximara-se de Soure . Saí

ram a encontrá-lo 0 5 cavalleiros templarios,mas

foram desbaratados,6 cand0 a maior parte delles

captivos e ,satisfeito com 0 feliz resultado da a1

gara ,Abu Zakaria tinha-se recolhido ao seu forte

castello de Santarem

( 1 ) Hic Aldephonsus fuit strenuus et pertinax in agendis

Roder . To let .

, de Reb . Hisp .,L . 7 , c 6 — Alfonso was one

o f the most entreprising among the christian Kings of

th ese calamitous times lbn Sah ib i — s — Salat cit . por Al

makkari,vol. 2 , p . 52 2 .

( 2 ) Salvatus , V it . B . Martini Saur. 1 1 . Que Abu — Za

karia (Auzecri 0 11 Abzecri ) foi O capi tão desta entrada deduz- s e d e serem os captivos l evados a Santarem

2 1 0 H I STOR IA DE PORTUGAL

j ulgasse dever desped ir 0 seu auxiliador,ou que

este , com 0 mesmo ou diverso pretexto, quizesse

retirar— se,é certo que as tropas christans ahando

naram O senhor de Mertola quando a fortuna da

guerra se lhe mo strava contraria . Tendo j á recuadopara 0 centro dos seus estados e indo buscar refugio11 0 5 fortes muros de Mertola

,I

'

bn Kasi despediu 0 5

christãos c0 n1 ricos presentes . Era tarde para contersem os soldados de Alfonso a indignação popular e0 ímpeto dos inimigo s . O s habitantes daque1la povoação rebellaram — se

,e O chefe sarraceno , tentando

debalde defender-se no alcassar,caiu prisioneiro

nas mãos de Seddaray ,a quem os levantados tinham

aberto as portas . Conduzido a Bej a e lançado numcalabouço

,deveu a liberdade a Ibn Samail , um dos

seu s antigos parciaes queº

lhe 6 cara 6 e1 e que logrouapoderar-se daquella cidade . Ibn Kasi di rigi u - seentão ao Moghreb para invocar 0 soccorro dos a1

mohades,incitando — os a invadirem a Hespanha e a

restituírem-no ao waliado do Gharb,cargo em que

pedira ser confirmado por Abdu— l-Inumen e de quelhe 6 zera homenagemTal fora 0 resultado da poli tica de Ibn Gha

nyyiah obtivera os seus 6ns ; mas as consequen

cias iam mai s longe . As representações do walifugitivo não saíram baldadas . Elle chegara a Africaj u stamente na conjunctura em que Abdu — l-mumense tinha apoderado de Marrocos . O príncipe almohade enviou logo para a Hespanha uma expedição

( 1 ) Conde ,Ib id . Ibn Khaldum loc . ci t . É a esta cam

panha de A ffonso 1 no Alemtej o que allude provavelmentea Chron ica dos Godos ( exemplar de Resende ) quandodiz Rex Portugaliae D . A l fonsus vehementer eos devastabat , e t depraedabatur terram eorum militam

, et ad nih iu1n redigens

L IVRO I I 2 1 1

capitaneada por Berraz Ibn Mohammed Al-masufi,

a qual foi seguida immediatamente de outras duasdebaixo do mando de Abu Imram Musa Ibn Said ede Omar Ibn Saleh As— senhaj i . As tropas de desembarque eram ,

segundo alguns , trinta mil homens ,dos quaes dez mil de cavallaria . Berraz , generaldaquellas forças , encaminhou -se rapidamente para0 Gharb . Xeres , R0 nda ,

Nieb1a caíram uma apó soutra em poder dos almohades . Mertola

,aonde elles

se dirigiram ,não foi accommettida , porque j á , se

gundo parece,Ibn Kasi se fi zera outra vez senhor

della . O exercito de Berraz transpôs,

então as serrase accommetteu Silves

, que levou a escala , entregando —a depois ao wali de Mertola . De Si lves retrocedeu para a província de Al-kassr com 0 intentode subjugar 0 5 estados de Seddaray ; mas este , receando sorte igual a de Al-mundhir , apressou-se adar obediencia ao general almohade e a reconhecera supremacia de Abdu — l—mumen . Berraz ,

tendo passad0 0 5 ultimos meses de 1 1 45 em Mertola , marchoucontra Sevilha no principio do anno seguinte . Nocaminho , Hisn Al-kassr e Tablada abriram— lhe as

portas emquanto de toda a parte 0 5 mussulmanos

hespanhoes corriam a unir— se aos almohades em

odio dos almoravides . Investida Sevilha , foi tomadaá viva força

,e d 'alli proseguiu Berraz nas suas con

qu istasNo meio destas perturbações e guerras pro

vincia mai s occidental do Gharb ,denominada pelos

arabes Belatha,a qual

,como d issemos

,occupava 0

territorio entre 0 Tej o,0 oceano e as fronteiras me

ridionaes de Portugal , deixa de 6gurar , ao menos

( 1 ) Ibn Khaldun e Conde , loc . c it . Segu imos principalmente a narrativa de Ibn Khaldun como mais com

pleta .

2 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

activamente,na historia dos sarracenos . Abu Za

karia,O governador de Santarem , apparece

— nos

nas chronicas chri stans como O ultimo capitão illustre dos mussulmanos de Belatha . Era um chefe

que se tinha conservado fi el aos almoravides ? Reconhecia a auctoridade de Seddaray ou de Ibn Kas i?

Eis 0 que 0 silencio completo dos historiadoresarabes nos não consente resolver . O que de tal si

lencio,comparado com 0 5 successos que acima re

latamos,parece poder conclui

'

r— se é que esta porçãodo territorio mus sulmano esquecera , por assimdizer

,às parcia1idade5 que combatiam nas duas

proyinc ias mais importantes e sem comparaçãomai s vastas , d

1

Al-kassr e de Chenchir ou AI— faghar . .

O estado de completa anarchia a que tinham'

chegado as cousas do Andalú s

,a situação deste pe

queno districto separado pelo Tej o da província deAl-kassr

,donde só podia ser soccorrido , e sobretudo

0 caracter do rei de Portugal deviam fazer sentiraos sarracenos dessas partes que a hora de seremsubjugados pelos christãos não tardaria a soar . O shabitantes de Santarem

,de Lisboa ,

. e dos outroslogares menos importante s estavam na triste persuasão de que O termo de uma guerra com Ibn

Errik, 0 fero senhor de Coimbra , lhes seria fatal .

As devastações f eitas por Affonso 1 nos domíniosde Seddaray eram um bem temeroso exemplo

, e ,

para ao menos arredar por algum tempo a u ltimaruína

,0 5 moradores das povoações de Belatha ,

semexceptuar Santarem e Lisboa , 6 zeram— se tributariosdo príncipe christão ,

esperando salvar assim a trocoda fazenda a Vida e a liberdade

( 1 ) H0 magiu1n e i facientes dabant e i tributum et censumde c ivi tatibus e t de castellis de Santarem et de Ulixbona

et de vic in is su is Chron . Gothor .

2 1 H I STOR IA DE PORTUGAL

L IVRO 1 1

geis rodeavam — na por toda a parte , e a fertilidadedos campos que se dilatam ao sul della pelas mar

gens amenissimas do rio tinha-s e por tão sub ida

que se acreditava geralmente no Gharb bastarem

quarenta dia s para nelles nascerem,vegetarem e

amadurecerem 0 5 cereaes Com estas circums

tancias,as tentativas dos christãos para se apode

rarem de Santarem , tentativas repetidas corn me

lhor 0 11 peor fortuna desde 0 tempo dos reisleoneses

,eram cousa bem natural . Estava

,porém

,

reservado para A ffonso 1 0 hastear naquelle inex

pugnavel caste llo , de uma vez para sempre, 0 es

tandarte Victorioso da cruz .

A lueta em que andavam envolvidas as duasraças inimigas que habitavam na Península tinhaindole diversa das guerras do resto da Europa . Lá ,

por via de regra ,ou eram disco rdias entre os mo

narchas sobre 0 senhorio de uma provincia ou duasdynastias que contendiam ácerca de um throno ou ,

emfim , questões de dependencia entre suzeranos efeudatarios na Hespanha , porém ,

eram duas 50

ciedades e duas religiões que disputavam uma a

outra a existencia,e para as quaes a posse ou per

dimento da mais diminuta porção de territorio si

gni fi cava a posse ou perdimento , digamos assim ,

de um membro,de uma parte da propria indivi

dualidade . D '

aqui nascia que 0 systema mi litarapr esentava nestas partes

"

caracteres especiaes . A

guerra era essencialmente local . As batalhas cam

liar a af6r1n ativa de Edrisi (Vol . 2, p . 2 9) de que Santa

rem não era c ercada d e inuralhas , com 0 encarec imentodas nossas memorias coevas sobre a exc essiva fortalezadaquelle castello ,

conc iliação que aliás parece casar-se

com a tºpographia da povoação .

( 1 ) Edrisi , ib id .

2 1 6 H I STOR IA DE PORTUGAL

paes , postoque disputadas e sanguinolentas quandooccorriam

,davam — se raramente . Defesas e comlnet

timentos de castellos,eis 0 que se repetia

,a bem

dizer , diariamente ; porque em ca da montanha ,quasi em cada outeiro

,surgia uma fortaleza

,ás

vezes uma simples torre,cuj a conquista importava

a suj eição do territorio circumvizinho e que eramsustentadas com tanta 6r1neza pelos que as defeud iam

,como combatidas com pertinacia pelos que

as assaltayam . A ss im a arte da guerra consistiaprincipalmente no systema o ffensivo ou

'

defensivodos assedios . As scenas que teremos de descreverda tomada de algumas c idades importantes mostrarão ao leitor quanta energia e audacia de uma

parte , valor e soffrimento de outra se tornavamnecessarios para este combate incessante de se

manas e meses,não só com 0 5 homens

,mas tambem

com 0 5 elementos .

A solidez e 0 inaccessivel do castello de Santarem e 0 grande numero de defensores que achariana povoação assentada a s ombra delle na margemdo rio tinham convencido Affonso 1 de que os seusrecursos militares não eram suf6 ciente5 para 0

levar a escala v ista . M editava,portanto

,no modo

de se apoderar delle por algum estratagema . Educado no meio dos perigos da guerra , a experienciaajudava 0 seu engenho natural , as suas irresistíveispropensões de conquistador . Como todas as intelli

gencias eminentes , 0 5 grandes capitães não alcan

çarn nome glorioso senão por meio das inspiraçõessubitas e fecundas a que chamamos 0 genio . O rei

dos portugueses teve uma'

inspiração des sas , edesde então a conquista do famoso castello foi irrevogavellnente resolvida

( 1 ) Cum en im rex civi tatem ipsam novo generi pugnandi

2 1 8 H I STOR IA DE PORTUGAL

Fernando Peres . AO segundo dia de marcha umcerto Martim Mohab

,provavelmente sarraceno

renegado ou mosarabe, partiu com 'mais dous para

intimarem aos de Santarem que as treguas 6 cavamrotas por tres dias . A pequena hoste havia caminhado para sudoeste

,com 0 fim

,talvez

,de não des

pertar suspeitas,Visto que, annunciada a quebra

da paz,0 5 exploradores sarracenos deviam princi

palmente vigiar a estrada de Coimbra . Chegando aserra de Albardos , a cavalgada fez um angulo para0 oriente

,seguindo ao longo das serras que se

estendem naquella direcção , e chegou a Pernes aoromper da alva da sexta feira . Acamparam . As

marchas,pelo menos as u ltimas

,tinham sido feitas

de noite,e a gente que O rei trazia ignorava qual

era O alvo da correria,porque Affonso só revelara

0 seu desígnio a Mem Ramires e ao prior de SanctaCruz , Theotonio Em Pernes , porém , e11e lhespatenteou tudo

,animando-os com dizer-lhes que

tinha comprados alguns dos vigias do castel lo,

postoque ass im não foss e . A tentativa assustou 0 5

cavalleiros,não por si

,mas pelo príncipe

, que

viam of t'

erecido a tamanho risco . Insistiam em que

não 0 5 acompanhasse achando-o,porém

,inaba

lavel,prepararam — se para aquelle arduo feito . Par

tindo ao anoitecer ,ajunctaram-se os peões e ca

valleiros a pouca distancia da povoação ameaçadae tomaram por um valle

,entre O monte Iraz ou

Motiraz e a fonte de Tamarmá, assim chamada

pela doçura das suas aguas Ia na frente Mem

( 1 ) Ad virum Dei veniens (se . Theo tonium) 1111 50 11 con

s ilium detex it : Vita S . Theo toni i , ubi supra .

(2 ) Fon te ln qui propter amaras aquas arab ice appelatur

Athumarmal Tamarmá tem a s igni ticação que lhe damos :

Moura , Ves tig . da Lingua A rab .

, p . 1 90 .

L IVRO 1 1 2 1 9

Ramires como practico ; e , não presentidos pelapovoação adormecida ,

aproximaram— se dos muros

do castello .

O desenho para saltear aquella fortaleza inexpu

gnavel tinha sido de antemão traçado pelo rei, que

1 4 . Santarem . Porta de Atamarma,demolida em 1864 , vista do

exterior da c idade .

para is so aproveitara as informaçõesde Ramires .

Haviam - se feito dez escadas , a cargo cada uma dedoze homens d

º

armas escolh idos,os quaes , por

tanto,sommavam cento e Vinte . Doze golpes de

gente , de dez soldados cada um ,subiriam assim

successivamente ao muro no sitio que indicara 0

espia e que era uma quadrella 0 11 lanço onde 0 5sarracenos não costumavam collocar es culca s ouvigias nocturnas . Subidos todos

,deviam hastear a

signa ou pendão real sobre as ameias,de modo que

se podesse enxergar a luz duvidosa da noite edepois

,descendo do adarve ou andaime da muralha

2 2 0 H I STOR IA D E PORTUGAL

para a corredoura interior , quebrar os ferrolhosdas porta s por onde entrariam 0 5 que ficavam defó ra . que especialmente se recommendava aoscento e Vinte que tinham de subir a e scala era que

naquelle primeiro ímpeto , emquanto os inimigose stavam somnolentos e inermes

,não perdoassem

nem a homens nem a mulheres,nem aos velhos

nem as creanças . Os gritos variados dos moribandos , O sangue correndo em torrentes , aquelle

relampaguear incessante dos ferros e O som

rouco dos golpes indiscriminados espalhariam talconfusão ,

terror tão profundo, que a defesa se tor

naria impossível , e 0 castello seria sem grandecusto subjugado .

Tal era O plano ; mas 0 alvitre que occorrera aAffonso para tomar os defensores de Santaremdescuidados não aproveitou por demasiado subtil ,segundo se pôde colligir da narrativa que vamosseguindo . Vimos que na terça feira O rei enviaramensageiros a declarar que as treguas 6 cavan1 portres dias suspensas . O praso terminava na sexta ,e era durante elle que 0 5 sarracenos deviam redobrar de Vigilancia e cautela . Nos termos da declaração feita por Ibn Errik , expirado 0 praso , era

natural que , apó s tão longa anciedade , não vendomovimento algum , elles se limitassem de novo ásprevenções ordinarias . A ssim na noite do sabbado ,

destinada para O assalto,tornava-se probabilissimo

que 0 5 atalaias e roldas estivessem descuidados . Se ,como parece , 0 calculo foi este , calculo na verdadenão exempto de per6dia , as esperanças dos christãos

falharam em parte . No logar onde habitualmentenão havia sentinellas descubriam-se agora duas quemutuamente se espertavam a vozes .A pequena hostecuj a retaguarda O príncipe fechava ,

parou então nomeio de uma seara , esperando que 0 5 vigias adorme

2 2 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

parte impedir-lhe 0 aproximar— se da entrada . Aomesmo tempo 0 5 Vinte e cinco esforçados tentavam

quebrar as portas , arremessando pedras contraellas

,mas debalde

,até que

,atirando 0 5 de fóra um

malho de ferro por cima do muro , poderam 0 5 que

se achavam dentro partir com elle 0 5 ferrolhos .

Despedaçado 0 dique , a torrente precipitou-se dentrodo castello . Affon so

,movido pelo ímpeto do enthu

siasmo religioso , aj 0 e1h0 un0 1i 1niar daquellas portas

que mal cuidava se haviam tão facilmente de abrirpara 0 receberem vencedor . Seguiu-se uma resis

teueia inutil e uma larga carni6 cina . Os raios do50 1, que nascera entretanto , não encontraram j ásobre 0 roqueiro castello 0 e standarte d0 i51a1n

,

derribado nessa noite ( 1 5 de março) para nuncamais se erguer sobre as torres da opulenta San

taremEste acontecimento extraordinario

,este feliz

resultado de uma tentativa que,talvez , parecera

loucura , se antes se d ivulgasse , ao passo que augmentava a audacia e a confiança dos christãos

,

devia gerar pro fundo desalento nos mussulmanos

de Belatha , abandonados aos proprios recursos no

(1 ) In era MCLXXXV pressa fui t civitas Sanctae Herenae

per manus Ilde fonsi portugallen sis regis Chron . Conimbr .

Cap ta est idus Marci i ( 1 5) illucescent'

e die sabbati inera MCLXXXV : Relaç . da tomada de San tarem Annoah incarnatione MCLIV . e t ah urb e ista capta VI I Inscripç .

de Santa Maria da Alcaçova no Elucid , p . 354 . A chro

n ica dos Godos attribue 0 successo ao dia 1 1 de Mai o dom esmo anno , a um sabbado , no que ha eviden te erro

1 .

º

, porque 0 d ia 1 1 de mai o deste anno não caiu ao sab

bado , mas s im 0 dia 1 5 de março , como d iz a Re lação deAlcobaça ; 2 .

º

, porque existe a doação aos temp larios dodomínio ecc lesiasti co de Santarem

, fei ta em abri l destemesmo anno . Cart . d e Thomar no Arch . Nacion ,

e nas

D issert . Chronol .

,T . 3

,P . 1 , p . 1 30 n .

º

40 0 .

LIVRO 1 1 2 2 3

meio das guerras civis . Subjngada aquella povoação,

só restavam aos sarracenos em todo 0 territorio aooccidente do Tej o dous logares verdadeiramenteimportantes Lisboa

,pela sua grandeza , pela soli

dez de seus muros,pelos recursos que podia tirar

do seu vantaj oso assento sobre a vasta bahia doTej o

,e 0 castello de Cintra

, por estar situado nocimo de um rochedo quasi inaccessivel e posto comona vanguarda de serrania aspera e intractavel

,

onde 0 5 hab itantes dos campos vizinhos poderiamfaci lmente abrigar-se e defender — se . No

resto dodistricto

,talvez alguns castellos ou torre s 0 0 110

cad0 5 pelos cabeços dos montes amparavam as

aldeias e habitações ruraes derramadas pelos cam

pos e valles que se dilatam entre 0 Tej o e 0 oceano ;mas todas aquellas pequenas fortalezas , se existiam ,

eram cousa de pouco momento ao menos 0 5 historiadores e viaj antes arabes desses tempos comotaes as consideravam , esquecendo -se de nos con

servar nos seus escriptos a memoria da existenciade11a5 .

NOTAS

CALE PORTU GALE PORTUGAL,PAG . 1 0

Sobre a origem de Cale e sobre : a sua situação na

margem'

esquerda do Douro no tempo dos romanosveja-se Flores

,Esp . Sagr .

,T . 2 1

, p . 1 e segg . Conhe

cida no tempo dos barbaros (seculo V) pelo nome dePortucale

,em Idacio

,no T . 4 , p . 374 , 377 e seggf da

E sp . Sagr . Com 0 mesmo nome no seculo IX ,em

Sampiro , Chron . 9 . Si

tuada ainda na mar

gem esquerda do Dou

r0 no principio do X(9 1 2 ) em documentodo Livro Preto da Séde Coimbra

,f . 38

,ci

tado 11 0 5 Novos Addi t .

as Dissert . Chron0 1.

,15. MoedaWisigoth ica de Slsebuto ,

p . 5,e ahi palavra

cunhada no Porto .

Galhía em logar de

Ga . .a, que apenas se pôde ler naquelle codi ce . Es te

ultimo documento prova contra Flores (Esp . Sagra,T . 2 1 , pag . 1 0

, g3 1 ) que eff ectivamente povoaçao

ao sul do rio se chamou Portucale . A escriptura sobre adivisão dos bispados em tempo dos suevos, e

mbora

não remonte a antigui dade que se lhe'

attribue , naodeixando de ser bas tante remota ,

nos explica perfei tamente como nasceu 0 Porto moderno , chamando — se

2 2 8 H I STOR IA DE PORTUGAL

ahi a es te Por tucale castrum novum e a povoação primitiva na margem fronteira Portucale castrum anti

quum . A Cale d0 Itinerario deAntonino ou 0 Portucale

de ldac io es tava assentada ao sul do rio, provavelmente

no monte hoj e chamado Cas tello de Gaia . No correr dostempos foi — se , talvez , es tabelecendo uma p ovoação namargem oppo sta , ou antes , 0 que nos parece mais verosimil

,quando as conquis tas dos christãos se dilatararn

até 0 Douro,elles fundaram um cas tello nomonte mai s

eminente da margem direita , onde hoj e existe a cathedral . Estendidas es tas conquis tas até 0 Vouga , 0 5 douscastellos fi caram cons tituindo de certo modo um só

Portucale, e , porventura ,des sa epocha é distincçâo

de Portucale.

castrum antiquum e Portucale castrumnovum,

que se lê nas suppostas ac tas do primeiro con

cílio de Lugo . O nosso pensamento, de que 0 5 castellos

das duas margens constituiriam ,ao

'

menos durantecerto tempo

,uma povoação unica

,occorre facilmente

vendo — se es tender n 0 seculo XI 0 territorio portugalense tanto para O interior da província do Minho (Doc .

de Pedroso,nas Dissert . Chronolj , T . 1

, p . 2 2 1 ) comopara 0 lado do Vouga (Liv . Pretc ,

f . 62 e despre

zada a divisão natural de_

um rio caudaloso,como 0

Douro,circumstancia aliás insolita naquelles tempo s ,

em que muito se attendía hydrographia interior paraes tremar as provín cias e d istrictos dos di fferentesgovernos . E

' vulgarmente sabido que desta povoaçãoveio 0 nome do nosso paiz , e por 15 5 0 nos parece inutila crescentar mai s nada ao que tica dicto no texto .

O CONDE SESNANDO , PAG . 1 0

Sesnandus,David Tentugal que fuit hereditas

parenturnmeorurn,Liv . Preto

,f 37 . Obsedit Colimbriam

c ivi tatem cum consilio D . Sisenandi consulis , que antea

2 30 H I STOR IA DE PORTUGAL

quelle mos teiro . 0 anonymo não só viveu em tempo deD . Theresa

,mas tambem devia tê-la tractado de perto

quando ella residiu em Sahagun . Apesar de não existires te monumento senão numa traducção vulgar , talvezdo seculo XIII , e de ter perecido O original no incendiodo mos teiro , a sua phrase latino-barbara transpareceainda na phrase da versão , e nunca sobre a authentici

dade della se levantou, que nó s saibamos

,a minima

duvida,sendo citada frequentemente pelo continuador

da Hespanha Sagrada , 0 P . Ri sco , e pelo severíssimoe , as vezes exaggeradamente desconfiado auctor daHis toria Critica de Hespanha

,Masdeu . Fazemos aqui

esta advertencia , porque nos espanta 0 haverem des

conhecido os nos sos modernos escriptores tão importante fonte da hi storia portuguesa n0 .prin1 eiro quar teldo seculo XII

, para escrever a qual não sobram 0 5

recursos . O anonymo,pois

,de Sahagun di z expressa

mente : és de saber que elrey D . Alonso de noble me

mor ia,mientras que el vívíesse

,de una manceba

, pero

bien noble,hab ia hab ido una haj a l lamada Teresa ,

la

qua l el hab ia casado con un conde l lamado Enr ique , queven ia de sang re real de Franc ia Este testemunhoclaro e terminante vem confi rmar os de Pelaío de Ovie

do,de Rodrigo Ximenes

,da Chroni ca Latina de

Affonso VII e do Monge de S ilos , expostos largamentepor Pereira de Figueiredo , que numa Memoria especialprovou illegitimidade de D . Theresa (Me1n .

_

da Acad .

,

T . 9 , p . 2 74 e e de cujo trabalho se aproveitou ,nes ta parte , 0 mais recente auctor dos Exames Comparativos .

Na Memoria de S . Luiz em que se tornou a pôr em

questão esta materia recorreu— se a dous argumentosem favor da legitimidade . E

'

0 primeiro : que

D . Af fonso VI f oi obr igado a separar-se de D . Ximena ,

mãe de D . Elvira e deD . Theresa, por uma ba ila do papa

S . Gregorio VII, que vem nos Annaes de Baronia no

anno 1 0 80 e em Sandova l e em Ag uirre . E d iz o Santo

Padre que 0 matr imonio era nulla, por se haver contra

Izído sem dispensação ( lo parentesco que hav ia entre aactual e outra precedente mulher de D . Af onso E

' o

NOTAS 2 3 1

segundo : que a Senhora D . Theresa era f requentemente denominada Infan ta e Rainha nos documentos e

monumentos historicos , antig os e coevos,de Leão

, Cas

tella e Portugal e e'

certo que nem uma nem outra qua

lzjâcaçáo se dava ord inar iamente naquelles tempos a'

s

f ilhas ílleg ítimas dos reis Estribado neste s dous fundamentos 0 auc tor da Memoria mos tra — se favoravel á

opini ão da legitimi dade .

Es te segundo argumento chega a parecer impossívelse 6 zesse

,

'

p0 rque a proposição em que se funda , isto é ,que as bas tardas se não davam aquelles títulos , estádesmentida quanto ao de infanta pelos documentosdesses tempos e

,0 quemais é , t inha-se já demonstrado

isso mesmo com exemplos indi sputaveis nas duas Memorias ante riores a favor da illegitim idade , sem que

todavia 0 A . daquella a que alludimos se 6 zesse cargode as refutar e

, pelo que toca ao tí tulo de rainha,da

nos sa narrativa , fundada igualmente em auctoridades

insuspei tas e que 0 escriptor recente tinha obrigaçãode conhecer , se vê por quem ,

quando e de que modolhe foi dado .

0 primeiro argumento ,resumido de Brandão (Mon .

Lus it .

,L . 8

,c . pos toque 0 auctor o não diga , é mai s

grave . Se foi preciso queuma bu lla separasse Affonso VIde Ximena e declarasse 0 matrimonio nu110 , é evidenteque esse matrimonio existia

,e a sua dis solução não

importava a illegitim idade dos 61h0 5 gerados e nascidos duran te elle . Tal é O raciocínio con fusamenteexpres so por Brandão e apresentado mais perspicuamente pelo escriptor moderno .

Mas,averiguou— se j á bem se a celebre bulla de Gre

gorio VII di zia respeito Ximena Muni ones? Parecenos que era essa uma questão que valia a pena detractar-se ,

porque ,resolvida negativamente , não restava

um unico pretexto para protrahir as interminaveis dis

pu tas sobre a legi timi dade ou illegitimi dade da mãe donosso primeiro rei

,que tem entretido demas iadamente

os espíritos por mal entendi do pundonor nacional . Fá10 -l1 en1 os aqui

, pos toque de má vontade , porque cha

2 32 H ISTOR IA DE PORTUGAL

mam por nó s questões d interesse historico um poucoma i s grave .

Primeiro que tudo Aguirre (Max . Collee . Concil .

Hisp .

,T . IV

, p . 446) at tribue a esta bulla a data de1 0 79 . E

'

um erro , demonstrado como tal por F lores (Esp .

Sagr ,T . 3 , p . e de feito ella vem com 0 seu ver

dadeiro anno em Mansi ( Sacror . Concilior . Nova et

Ampliss . Collect ,T . XX , p . Foi remettida ao

abbade de C luni,Hugo

,inclusa em car ta para este

datada de 2 7 de junho de 1 0 80 a fim de que'

a

fizesse chegar á, mão do rei hespanhol, e, portanto ,

devia ser exarada igualmente nos fins de junho . Daren1 0 5 un1 a idea de l la e da carta em que vinha inclusa ,para 0 que depois veremo s .

Nesta ultima di z O papa a Hugo que um seu monge,

chamado Roberto , 6 zera grandes males na Hespanha'

a

religião , pondo ahi em grande perigo a igreja e enganando O rei com suas fraudes : que ha grandes queixascontra e11e Hugo ,

que se teria inimizado com Roma , se0 proprio papa não 0 sus tentasse

,fechando os ouvidos

as accusações ordena-lhe que corrija os seus monges ,que obrigue 0 d ic to Roberto a voltar a Cluni e que avise0 rei da ira de S . Pedro

,em que incorreu por trac tar

indi gnalnente O legado romano (era 0 cardeal Ricardo ,

abbade de Marselha) , e de que para ser ab solvido,lhe

cumpre dar satis fação ao d icto legado que affrontara :

adverte— o de que excommungará 0 mesmo rei , se não 0

fi zer assim,e de que até elle papa virá a Hespanha

para 0 perseguir , se tanto for preciso exige,finalmente ,

que Hugo tome a seu cuidado fazer com que os ”

monges

d ispersos inj ustamente nestas partes voltem ao seu mosteiro

,etc .

Na bulla ou carta a Affonso VI di z Gregorio VII : quelhe consta que elle se aftas tara do seu antigo e bomprocedimento em relação a igrej a , indu zido pelo falsomonge Roberto e pela mulher perdi da sua antiga pro

lec tora (per Bobertum pseudo—nlonáchum et p er antí

quam aclj utr íccm suam perdítam f aemínam) ; que lhepede remova de s i 0 5 conselheiros da falsidade ; queobedeça ao legado Ricardo que não torne surdo às

2 34 H ISTOR IA DE PORTUGAL

rei ao legado . As cartas de Gregorio VII , recheadas deameaças

,mos tram bem 0 caracter violento do pontífi ce

e quão grande havia sido a afªfronta recebida pelo car

deal Ricardo . Quando , porém ,essas cartas chegaram

tinha já vindo aHespanha 0 cluniacense Bernardo,que

,

promovido a abbade de Sahagun, partiu para Roma ,

como narra 0 anonymo, pelos motivos que es te occulta ,e que nos revela uma nova carta de Hildebrando , cartacuja intima ligação com as antecedentes é visível .Aguirre at tribue — a ao anno de 1 0 80 porém Mansi redula ao de 1 0 81 , que é a sua verdadeira data (S . Con

cilior. N . et A . Collect,T . XX

, p . Della parec ecolher-se que Affonso Vl escrevera energicamente ao

ponti6 0 e ; mas que ao mesmo tempo lhe assegurara terestabelecido em toda a monarchia 0 rito romano comexclusão do mosarabe

,cousa em que O papa altamente

se empenhava . Tracta ahi Hildebrando d a eleição de umcerto arcebispo que elle recusa pela incapacidade litteraria d0 eleito , propondo a A6

'

0 n50 VI elej a outro e que ,se no seu paiz não tiver pessoa di gna disso , 0 procurees trangeiro ; faz-lhe varias recommendações contra os

judeus mas sobretudo allude a dous objecto s, que são

aquelles que nos parece terem intima con exão com as

anteriores cartas . Diz -1he que pelo que respeita ao quelhe pede acerca de sua mulher e do mos teiro de Sahagun , responderá pelo legado e pelo b ispo Simeão . Depois espraia-se en1 encarecimentos e acções de graçaspelo riquí ssimo presente que Affonso lhe 6 zera

,t ão

amplo e magnifico,di z O papa

, que era di gno de ser

feito por um rei e recebido por S . Pedro . Acaba a cartacom as expressões mais amigaveis que podia empregarum homem da altivez de Hildebrando , debaixo das

impressões agradaveis que nelle produzira a liberalidade do monarcha hespanhol .

Qualquer verá no complexo dos documen tos quehavemos apontado O começo

,meio e des fecho de um

negocio em que [iguram Affonso V1,sua mulher

,O

papa , 0 legado Ricardo , 0 monge Roberto , 0 5 cluniacenses e 0 5 benedi c tinos de Sahagun

,e em que , por

ultimo, quem lucra é Hildebrando , que obtem do rei a

NOTAS 2 35

conclusão da mudança de rito , no que trabalhavacorte de Roma havia annos

,e,além di sso , dons precio

sos que extasiam 0 ambicioso ponti6 ce . Ninguem ima

ginará que essa mulher do rei , de que se tracta na

ultima carta,seja diversa da p erd itam f aemínam da

primeira . Todavia,a admittir commum op inião , nes ta

alludi ria O papa D . Ximena , devendo suppôr— se em

tal hypothese que na'

ul tima se refere a D . Cons tanciaque em

1 081 estava indi sputavelmente casada com 0

rei leonês .

Mas como admittir semelhante presupposto ? O

monge Roberto veio de França para Hespanha em 1 080,

segundo O tes temunho do anonymo,ou an tes em 1 0 79 ,

conforme se deve ler : Ximena era asturiana : c0 n1 0

podi a,pois

, ser antiga pro tectora de um monge quenesse ou no antecedente anno veio de além dos Pyrenéus Se

,porém

,suppusermos que O papa se referia a

D. Constancia , 0 patronato desta para com Roberto nãosó era po ssível , mas

,até

,natural . Roberto fora escolhido

para vir Sahagun pelo abbade de Cluni , e este era tiode D . Constancia . As relações da sobrinha deHugo 0 0 11 10 niosteiro que seu tio governava e que era então 0

mais celebre da Europa deviam ser es treitas,e porven

tura , á sua influencia deveu Roberto 0 ser chamadopara reformador de Sahagun .

anno do casamento de Affonso VI com D . Constancia é ainda di sputado

, 0 0 111 0 0 é tudo 0 que respeitaàs cinco ou seis mulheres que teve este principe . A pri

meira,D . Ignez

, que uns fazem hespanhola ,outros fran

cesa , fallecen ou foi repudiada que até is so é disputavel) em 1 0 78. porque é de maio des te anno O ultimodiploma de seu marido em que ella 6gura (Flores ,Reynas Cath0 1 . , T . 1

, p . E'

depois di sto que os

h is toriadores põem commummente 0 enlace de Affon5 0 VI com Ximena Muniones todavia muitos dos maisgraves escrip tores cas telhano s , como Sandova1, M0 n

dejar e outros , datam de 1 0 78 0 consorcio de D . Constancia

, á vis ta de documentos de cuja veracidade nãoduvidam . Flores

, preoccupado pela idea de que a bullade 1 080 allude necessariamente ás ligações de Affon

2 36 H I STOR IA DE PORTUGAL

5 0 VI com uma concubina,rejeita de certo modo todos

0 5 documentos em que se fala de Constancia anterioresa es te anno , para a suppôr casada depo is de junho (E sp .

Sagu, T . 3 , pag . 3 1 7 e mas faziam-lhe tal ' força as

provas diplomaticas em contrario , que conclue pordizer que quem f or ma is destro que elle desatara

'

estas

duvidas . Longe de nó s 0 suppormo-nos mais intelli gentesque 0 sab io hespanhol, mas a d if6 cu1dade desapparecelogo que se abandone a ideia de que elle es tava preoccupado e que nenhum facto , nenhum documento nos obrigaa acceitar. Porque , pos suído de colera violenta pelasaffrontas feitas ao seu legado , não applicaria 0 orgulh0 5 0 e irascível Hildebrando 0 nome de mulher perdidaa D . Cons tancia Não era elle homem cuja linguagempara com os prín cipes fo sse medida pelos respeitoshumanos . Leia as suas cartas e a sua h istoria quemquizer desenganar— se di sso .

Mondejar (Casamientos delrey D . Affonso VI , g9) fixaos desposorios de D . Constancia nos 6ns de 1 0 78avistade urna escriptura citada por Arevalo . Sandoval (CincoReys , f . 45) es tabelece a mesma data por outra escriptura , que Flores (Reynas Ca th 0 1.

,T . 1

, p . 1 68) dá por

suspeita pela mesma preoccupação a que acima alludin1 0 5 . Deixando es ta questão

,venhamos ao exame de

diplomas que parecem indi sputaveis . Exis te a nomeaçãodo celebre Roberto para abbade de Sahagun (Esca1 0 na ,

His t . del Monast . de Sahag . App . 111,escrit . 1 1 3 ) feita

por D . Affonso e por sua mulher D . Constancia em 1 0

de maio de 1 0 79 (por is so se deve emendar 0 anno XVdo anonymo para XIV ) ,

'e ahi se expõem 0 5 motivosdaquella nomeação , concordes com 0 5 que aponta aChronica de Sahagun , is to é ,

0 introduzir nes te mos

teiro a reforma cluniacense . Em ma io do anno seguinteachamos a nomeacão de Bernardo para subs tituir R0berto feita pelos mesmo s principes na presença do car

deal Ricardo ( ibid . escri t . donde se vê que na

occasião em que Hildebrando preparava a fulminantebulla para desaggravar O legado ,

es tava já es te con

graçado com Affonso VI , provavelmente porque Hugosoubera antecipadamente da tempes tade que ia levan

2 38 H ISTOR IA DE PORTUGAL

elementos que bastam para achar a expli cação do factoa quem quer que não estiver inteiramen te convencidodasanc tidade de Gregorio VII , sem que por isso lhe negue0 haver sido , talvez , 0 maior homem da sua epocha .

COMEÇO DO GOVERN O DO CONDE HENR IQUE ; PA G . 1 7

Em julho de 1 0 95, já S . Giraldo era arcebispo'

de

Braga (Dissert . Chro'

11 0 1 ., T . 3

,P . 1

, p . 32 , nº Vê

se d aqui que elle era considerado como metropolitanoantes de ser confi rmado nesta digni dade por Paschoal H(Bern . Vita B . Ger . apud . Baluz . Misce1.

, T . 3, p .

Todavia , foi eleito bispo pelo clero e pe10 povo, concordando nisso O rei Af onso e conde Henrique (Doc . do

Liber Fidei . na Mon . Lusit .

,Liv . 8

,c . mas resis

tindo por mui to tempo O arcebispo de Toledo , que não0 queria deixar sair da sua Sé (Vi ta B . G . em Baluz . T . 3 ,

p . 181 ) e que e1n6 1n 0 sagrou b isp o em Sahagun,donde

partiu para Braga . Contrahindo todos estes successos

dentro do menor tempo que se queira imaginar, não

póde eleição de S . G iraldo,em que interveio a aucto

ridade do conde Henrique , ser pos terior aos fins de 1 0 94 .

Em março de 1 0 95 ainda Raimundo exercia jurisdicçãoem Coimbra (Dissert . Chronol .

,T . 3 , P . 1 , p . 3 1 , n .

º

e em agos to intitulava-se conde de Galliza e Santarem(ibid .

, p . 38, n .

º E' preciso

,pois

,ou suppôr que no

centro dos seus domínios se creon um distric to indepen

dente delle,cousa

,senão impossível , improbabih

'

ssima,

ou admittir a Opinião que seguimos . Em dezembro de1 0 95 e pelo anno de 1 0 96 Henrique governava en1 Coimbra e Braga (Dissert . Chronol .

,T . 3 , P . 1

, p . 33 e Em1 097 dominava desde o

'

Minho até 0 Tejo e nes teterritorio tinham desapparecido inteiramente 0 5 vestigios da auctoridade de Raimundo , embora elle se con tinuasse chamar nos seus diplomas Senhor de toda aGalliza .

NOTAS 2 39

DESTROÇO Do CONDE RA IM UNDO JUNCTO A L I SBOA,

PAG . 1 9

Timorem cumulavit subditorum lusitanorum ah e0

defectio , qui almoraviditis Ulyssiponam et Santaremalíaque oppida , rege ipso absente , vel invito ,anno egirae 487 ( 1 0 94 ) Ben-Khathib , Bibl . Arab .

-Bi sp .

,

eln Casiri,Biblioth .

,T . 2 , p . 67 . Conde

,Domin . de

los Arabes , P . 3 , c . 2 2 . Liv . Preto,f . 40 . Th . ah

Incarnatione , H is t . Ecc les . Lusit .

,T . 2

, p . 2 0 7 , onde ,na espec ie de foral pas sado aos habitantes de Mon

temór em 2 7 de fevereiro de 1 095, di z Raimundoqui pr ius d á pesur íum (aliás presar iam) venistis . O

destroço do conde juncto de Lisboa foi depois da pri

meira prepositura de Gehnires na diocese de Sanctíago ,

portanto no episcopado de Dalmacio,is to é , dos 611 5

de 1 0 94 aos fins de 1 095 (Dissert . Chronol . , T . 5, p . 20 9 ,

e ESpafla Sagr.

,T . 2 0

, p . Ora,demorando— se 0

conde em Coimbra durante O inverno,aquelle facto só

podia acontecer na primavera des te ultimo anno . Eis

como a His t . Compostell. (Livro 2,cap . 53) narra 0

succes so ante episcºpatum , postpraeposituram ,

in procinetu cum Comite R. et cum

optimatibus Gallec iae ad extirpandum tenderet (Gelmires ) perf idíam g entilium,

sarraceni , collectis undique

viribus , cbristicolarum castra propeOlisbonam circun

dantes,immensa obsederunt bellatorurn mul titudine .

Tanta confluxerat incredulae gentis multitudo ,tanta

convenerant barbarorum agrnina ad christianoruin

perniciexn irnpetum facturi . Denique , cu1n christianorumalios caederent, al io s vinculis etc .

2 40 H I STOR IA DE PORTU GAL

PORTUGAL DADO EBI DOTE A D . TH ERESA, PAG : 2 0

Até a invasão dos arabes 0 5 godos conservaram nas

Hespanhas tenazrnente as institui ções germani cas

ácerca dos dotes . Pelas suas leis,contrarias ao que

estatuiam as leis romanas, era O noivo quem dotava a

mulher . Semelhante costume dos barbaros , porventuramais nobre que 0 romano , foi reguladoporuma leide Chindaswintho

,inserida no codigo Wisigothico (L . 3 , tit . 1

,

le15.

ª

) . Es ta lei , assim como as mais di sposições daquellecodi go ,

atravessando O domínio dos arabes, que deixa

ram aos vencidos 0 governarem-se civilmente pela sua

legislação e pelos seus magis trados , continuou a vigorar

,não só até 0 tempo de Affonso v 1 , mas

, porventura, até a publicação da lei das Partidas . (Vejam— se noEnsaio de Martines Marina , 2 49 e seguintes , as provasindubitaveis di sso . ) Não havia , pois , na legislação deHespanha

,nem nos uso s nacionaes

,nes ta parte perfei

tamente accordes com ella,causa alguma para O rei de

Leão se lembrar de pôr em practica no casamento desua filha um cos tume romano

, provavelmente até ignorado por elle . A predi lecção que sempre mostrou pelascousas de França e que tanto contribuiu para alteraros costumes wisigo thicos podi am tê-lomovido a seguir,casando suas 6 1has 0 0 111 os príncipes borgonheses Rai

mundo e Henrique e outra com 0 conde de Tolosa , oscostumes daquelle paiz , se elles nes ta parte fossem con

trarios aos das Hespanhas ; mas não acontecia assim .

A inda naquelle seculo eram communs por toda a Europa as ins tituições germanicas ácerca dos dotes

,as

quaes se podem ver no excellente livro de Eichhorn,

Deutsche S taats-und-Rech ts — Gesch ich te,T . 1

, p . 361 esegg . (Go tting . EID Ducange , a palavra Dos , seacham colligidas as d isposições dos diversos codi gos,

2 42 HI STOR IA DE PORTUGAL

Se attendermos a uma passagem do Chronicon Floriacense ,

quando fala do conde Raimundo,veremos 0

nenhum fundamento da expli cação que se pretende dara exc lusão do conde de Tolo sa das generosidadesextra-legaes de Affonso VI . Tractando dos casamentosde Raimundo e de Henrique ,

'

diz Quam (D . Urraca)in matrímoníum ded it Raimundo comiti

, qui comítatum' trans Arar im tenebat . Alteram Aínr ico um

f i liorum ]llíi Ducís Rober ti E is,pois

,Raimundo

com 0 mesmo impedimento para receber dote quetinha 0 conde de Tolo sa , visto que Raimundo .era jáconde em Borgonha ,

tendo o condado a lém do Arar

( Saône ) , 0 que se prova , não só do tes temun ho doFloriacense , mas tambem dos documen tos irrefragaveisque colligiu Mondejar (Orig . y ascend . de1 Princ .

D . Ramon Mss . na Biblioth . R . da Ajuda) .Adm ittindo ,

porém , que isto acontecesse , ainda restaoutra di fficuldade maior . Além de Urraca

,Theresa e

Elvira ,Affonso VI teve uma 6 1ha chamada Sancha

,e

outra Elvira (Flores , Reynas Cath0 1.

, T . 1, p . 1 80 ) nas

cidas da rainha Isabel,a primeira das quaes ca sou com

0 conde Rodrigo Gonçalves e a segunda com Rogerioduque de S icilia . Quanto a este , nada acerescentarei

ao que j á disse acerca do conde de Tolosa,Raimundo

de S . Gil. Mas no conde Rodrigo Gonçalves não se

dava, por certo , circums tancia de ser principe es tran

geiro com es tados fóra de Hespanha,e todavia não

consta que el— rei dotasse a infan ta D . Sancha comterras ou províncias que ella devesse possui r hered itar iamenle, antes pelo contrario , possuindo 0 condeRodrigo as honras de As turias de Santillana

,lhe foram

es tas tiradas por suas turbulencias e , reconciliadodepois com AíTonso VI lhe deu elrei 0 governo de Segovia . e alcaidaria de Toledo

,que tornou tirar-lhe

passado tempo , segundo parece , por seu genio in

quieto . (Vej a-se Sota , Princ . das As tur . Appendiced

'

escrit Colmenares,Hist . de Segov .

,c . 1 4 , g1 0 .

Mondejar,Succes . d ,A10n50 VI

, 5 Porque seriaexcluido , porém , 0 conde Rodrigo

,nobre , natural e

podero so,do beneli cio. que recebera um es trangeiro

NOTAS 2 43

pobre ,embora illustre e valente ?É

,na verdade

,inex

plicavel semelhante contradicção .

A es tes raciocínios , fundado s em factos incontroversos , nenhum argumento, nenhuma auctoridade se

pôde oppôr senão uma phrase do chroni sta anonymo

de Affonso Railnundes , que , falando de D . Theresa ,

não directamente,mas por occasião da guerra de

Atfonso VII com seu primo Affonso Henriques , d izque Affonso VI a casara com 0 conde Henrique e a

dotara magnifi camente , dando — lhe a terra portugalensecom domín io hereditá r io Este testemunho s ingular ebastante pos terior ao facto provaria ,

quando muito,

que Affonso VI dera a seu genro , em attenção aD . Theresa , 0 governo de Portug

'

al para si e s eus6 lhos perpetuamente , visto que hereditariedadeapparece uma ou outra vez nos cargos admini strativos .

Tal seria,pois , nesse caso a signi f icação da palavra

dote,que então era mui di y ersa da que hoj e lhe damo s

e correspondia a donatio . E 0 que , entre varios outrosdocumentos

,se vê da Fundação do mos teiro de Naxera

e Foros da povoação , n0 anno de 1 0 52 lg itur cumhuj us rei voluntate , tum in aedif candae ecc

'

les ie constructione quam in dotis astípulare donatione e na

doação de Jubera a igreja de Sancto André ( 1 0 57)Haec est carta de dote quae dederunt vicinos de Jubera

d á S . Andrede (Collecç . de Privi leg . de 1a Corona deCastilla

, T . 6, p . 58 e

DATA DA MORTE DO CONDE HENR IQUE ,ETC .

,

PAG . 59

São tantas e taes as difíi culdades chronologicas que

se offerecem a quem es tuda a h istoria dos successos

da monarchia leonesa desde a morte de'

Affonso VI até

a de seu genro , 0 conde de Portugal , que chega aperder-se esperança de as conciliar . Ha

,. todav ia

,

2 44 H ISTOR IA DE PORTUGAL

certo numero de factos , cujas datas precisas ou quasi

precisas , se devem tomar como norte para chronologia,

desprezando as c ircumstancias secundal ias , que con

duzem muitas vezes a con fusão e a duvida . Esses factossão 0 5 segu intesMorte de Affonso VI no ultimo de junho de 1 1 0 9 .

Veja-se Rib eiro , Dissert . Chronol .,T . 3 , P . 1

, p . 51 .

Casamento de D . Urraca e do rei de Aragão depoisda morte de Atl

'

onso VI , consequentemente em julhoou nos seguintes meses do mesmo anno : Concordesnes te ponto todos 0 5

'

his toriad0 res contemporaneos , só

contradi ctos pelo arcebispo de To ledo , que viveu posteriormente .

Batalha de canipo de Espina em outubro de 1 1 1 1,a

que as sis tiu 0 0 111 0 alliado do rei de Aragão 0 condeHenrique . Concordes 0 5 Annaes Complutenses eCompostellanos , quanto a data do su'ccesso

,e confi r

mado este pela narração de Lucas de Tuy .

Esta batalha ée posterior á volta do conde Henriquede França ,

segundo O tes temunho do anonymo de

Sahagun . Existem documentos authenticos da resideneia do

'

conde em Portugal nos meses de julho ,ago s to

,setembro , outubro e dezembro de 1 1 0 9 e de

março,julho e agosto de 1 1 1 0 (Dissert . Chr0 11 0 1 .

, T . 3,

P . 1 , p . 53 e segg .

,e T . 4 , P . 1

, p . 55 e segg . ) O

maior in tervallo que ha nes te período em que nos

faltem documentos do conde ee o de março a ju1h0 de

1 1 1 0 . Neste espaço de tres para quatro meses éinadmi ssível que elle fosse de Portugal a França ,

es tivesse lá preso , fugis se , vivesse algum tempo no

Aragão e tornasse a Portugal . Logo é necessario collocar esses successos nos oito a nove meses de agostode 1 1 1 0 a ma io de 1 1 1 1 .

Primeira separação publ ica de D . Urraca e do rei de

Aragão depois de junho de 1 1 1 1,como á vis ta dos docu

mentos diz Flores (Reynas Catholicas ,T . 1 , p .

concorde com 0 texto da Historia Compostellana . Foi

depois dessa separação que a rainha se ligou com 0 5

fi dalgos gallegos , 0 que se torna evidente do d iscursofeito por ella ao conde Fernando (His t. Compos tel.

,

2 46 H I STOR IA DE PORTUGAL

As palavras et dr ic una par iter cum eu

( 10 documento attrahiram a attenção de Berganza ,

que completa a syllaba dr ic , imaginando que alli se

alludia algum dos dons condes Rodrigo Munho z ouRodrigo de Lara ; mas é absolutamente insolito ouantes impossível que se dissesse que reinava D . Urracajunc tamente com um daquelles dous condes subalter

11 0 5, que não consta tivessem j ama i s pretensões de

soberania,

accrescendo que nos diplomas daquelle

tempo 0 nome de Rodr igo se escreve sempre Roder icas0 11 Roderic . Nó s não podemos ver no documento senãoum engano na leitura da primeira letra desse fragmentode palavra , e que se af6gur0 u a Berganza um d por um

71 devendo ler nr íc (Enric,Henrie) . Em tal presup

po sto,alludj r-se-hia ahi a ces são de uma parte da

monarchia feita ao conde de Portugal p ara 0 separardo rei de Aragão

, promessa revalidada por D . Urracaem Monzon . Desse modo O documento de Arlanza con

6rmaria a narração do anonymo de Sahagun .

Mas,deixando de parte essa circumstancia

,venha

mos ao que mai s importa . Para conciliar a relação da

Compos tellana 0 0 111 a do monge anonymo é necessarioadmittir 0 que nó s suppusemos no texto ; isto é , que0 5 auctores daquella chroni ca se enganaram,

applicandoa Carrion O cerco de Pena6 e1. Nes ta jornada aecompanhou 0 conde Henrique a D . Urraca

,veio ahi D . The

resa ,retiraram-se para Palencia e occorreram succes

sivalnente 0 5 outros acontecimentos referidos na

chroni ca de Sahagun e incluí dos na no s sa narrativaDa multiplicidade de inciden tes ahi relatados se eo

nhece claramente que é necessario espaçar reconci

liação da rainha com seumarido para 0 5 ultimosmeses

de 1 1 1 2 . E'

des ta reconciliação que fala 0 anonymo de

Sahagun (cap . 2 1 ad 6ne1n e cap . durante 0 principio da qual 0 conde Henrique e 0 5 outros 6dalg0 5puseram cerco Carrion é ella , sem duvida , a mesmade que se trac ta no princípio do . cap . 80 do liv . 1 da

Compos tellana ,capi tu10 em que se mencionam eviden

temente , não uma, porém duas reconcihações fei tas em

epochas diversas . NOS 6 11 5 des te anno foi a rainha eu

NOTAS

viada enganosamente ao Aragão pelo marido, que .

entretanto se ia apo ssando de di versos castellos epovoações nos estados de sua mu lher (Anon . de

Sahag .

,c . ao que parece allúdirem 0 5 chroni stas

compostellanos ( cap . citado in medi o ) quaecumque potuit castella

,municip ia ,

fraude sua,reg inae abstulit.

A ausencia de D . Urraca é confi rmada pela fa lta de

di plomas seus nos ultimos meses de 1 1 1 2 . O abbade

de Sahagun,que neste anno fora expulso do mosteiro ,

dirigiu — se ao Aragão e pintou— lhe as v iolencias practicadas por Affonso I em Castella e em Leão . Reso lveua rainha voltar aos seus es tado s

,O que veio a fazer

depois de alguma demora (Anon . de Sahag c . 2 7) , e

efíectivamente achamos dip10 1nas exarados em nomedella e con6rmad0 5 por seu 6 1h0 (0 que sempre indicaruptura ou , pelo menos

,dis cordi a entre a rainha e O

marido ) de janeiro a agosto de 1 1 1 3 (Berganza , T . 2,

p . 1 6 e 454 . E scalona , App . 3,escrit . Affonso

tentou então prendê-la (Anon . de Sahag .,c . 2 7 ad

6ne111 ) mas ella j á tinha por si um numeroso partidode 6dalgos cas telhanos e , até , de aragoneses , e as

tentativas do marido não tiveram etfeito .

Ajunctou-se então as semblea de Sahagun ,em que

es tiveram habitantes de Burgos , de Naxera , de Carrion ,

de Leão e alguns nobres (Burgenses , Najarei , Carrionenses , Legionenses , al ique s paníae proceres . Compo stell . , L . 1 , Los burgueses de las dichasv i llas Burgo s

,Sahagun

,Carrion Anon . de Sahag .

,

c . O rei demorou por largo tempo a conclusão do

negocio (multíp líces rationes praetendens , et de cras tíno

in crastínum argumentosís verbis rem d if erens Com

postell . Em6n1 cedeu ; uniu — se com sua mulher epartiram amb os para _Astorga . A reconciliação deviaoccorrer nos 6 11 5 de abril de 1 1 1 4 , porque temos diplomas da rainha regnante cum f ilia,

desde 0 principiodo ann0 até este mês (Berganza , T . 2

, p . 1 7 . Esp .

Sagn ,T . 36 , App . 43 , e T . 38

, p . O conde Henrique

, que seguia O partido da rainha (Doc . da Esp .

Sagn , T . 38, p . fallecen por este tempo (Anon . de

Sahag. , c . 2 9 in medi o ) no rº de maio (Chron . Gothor .

2 48 H I STOR IA DE PORTUGAL

ad aer. e D . Theresa , que viera a As torga por

morte do marido , facili tou ao aragonês pretextos , comaccusação , verdadeira ou infundada , contra a irman

,

para elle a apartar de si fi cando — lhe com 0 5 es tados .

Mas,declarando-se nobres e burgueses por D . Urraca

,

Affonso foi cons trangido a vir á as semblea de Sahagun ,

que não acabara ou se congregara de novo e que pretendia estabelecer a concordia . 0 resultado foi não se

querer elle submetter às decisões ahi tomadas, ser

obrigado a retirar se ( Compostell. , liv. 1,c . 80 ad

finem Anon . de Sahag . , c . e começar de novo aguerra contra 0 5 subditos de sua mulher . O abbade de

Sahagun, que andava f ug ido hav ia dous anuos (Anon .

foi res tituído ao seu mosteiro pela rainha .

Mencionamos es ta ultima circumstancia, porque ella

é importantíssima para estabelecer a chronologia do

Anonymo de Sahagun,0 qual nem uma

"

só data apontaem todo O processo desta parte da sua narrativa .

Tendo s ido nomeado 0 abbade D . Domingos no prin

cipio de 1 1 1 1 (Escalona , Hist . del Monas t . de Sahagun ,

p . 94 ) e expulso durante 0 de 1 1 1 2 ,fazia exactamente

dous an os em 1 1 1 4 que andava foragido . Eis comotudo conspira em favor do sys tema chronologico adoptado por nó s .

E ste sys tema torna necessario 0 collocar a morte doconde Henrique em 1 1 1 4 , contra a opini ão seguidapelos nossos principaes escriptores modernos e

,entre

elles , por J P . Ribeiro , 0 homem a quem Portugal deveos progressos principaes da sciencia historica . Dedicoueste uma di s sertação especial (Dissert . Chronol . , T . 1 ,

D issert . IV ) a provar que 0 conde fallecerapor maio de1 1 1 2 . Foi O peso que deve ter o voto de t ão eminentesujei to que nos obrigou deduzir da combinação daHistoria Compostellana , do Anonymo de Sahagun ,

dos

documentos hespanhoes daquella epocha e do calculoaproximado do tempo neces sario para se verifi caremos factos então occorridos .as provas da opinião queseguimos . Resta uni camente examinar

,nasmais breves

palavras pos síveis , os fundamentos da dissertação donos so grande diplomatico .

2 50 H ISTOR IA DE PORTUGAL

sendo facil encontrar outra semelhante em que se

alluda a morte do imperante que deixou de existir .

Admi ttindo , porém ,O diploma como genuíno

, pôdeSUppôr

-se con6 r1nação posterior, ou antes,segundo

nos parece , cumpre que as sim 0 pensemo s,aliás fica

inutil a declaração do con6rmante,que

,nas palavras

post morte de i llo comes Henr icus evidentementequiz marcar uma epocha diversa daquella em que

fora exarado 0 diploma,is to é ,

uma epocha incerta ,

posterior a 1 1 1 2 de muitos ou de poucos anuos . 0

documento é a carta de conto domosteiro de Pombeiro .

datada do 1 .

º de agosto de 1 1 1 2 (era em que

D . Theresa diz que faz aquella mercê pro an ima de

oiro meo i lle comes Henr icus Este documento já '

não

exis te senão incluido numa confi rmação regia de 1 7 1 1

e numa copia cheia de conhec idos erros,diz J P . Ri

beiro,tirada pelo celebre falsario Lousada . Se algum

fundamento se deva fazer sobre tal diploma contraprovas terminantes em contrario

,O leitor decidirá .

Dos dous Obituarios,0 de Santa Cruz de Coimbra

diz 1 1 1 2 Kal. Novembrís obi it comes Henricus , et

uxor ej us D . T/zaras ia e 0 deMoreira Kal. Novembr isPortugal. Comes D . Henr icus 1 1 1 2

,et uxor ej us reg ina

D . Tharasía 1 Ambo s elles erram certamente adata do mês quan to ao Obi to do conde

,e 0 primeiro a do

anno quanto ao Obito de D . Theresa,e por isso podi am

igualmente errar 0 anno da morte de Henrique . O que

não tem duvida é que es tas verbas foram escriptas

naquelles necrologios mui tos annos depois do fallecímento do conde

,isto é pelo menos depois de 1 130

,

epocha em que D . Theresa deixou'

de viver. O menorpeso que devem ter taes necrologios quando ha outrasprovas em contrario

,já 0 ponderou 0 mesmo Ribeiro

(Dissert . Chronol .

, T . 1 , p . 1 55, nota 0 fim dellesnão era historico ; era assignalar 0 dia do anno em

que se dev iam fazer 0 5 anniversarios ou suffragios

pelos fundadores ou bemfeitores dos mosteiros .

Em u ltimo logar advertimos que no Arch ivoNaciona l(Gav . 1 5

,M . 1 3 . n .

º

9 ) se conserva o foral de Thalavares dado em março de 1 1 14 ( era 1 152 ) pelo conde

NOTAS 2 51

Henrique e suamulher , regnates in Portugal et in Stre

madura ,Colímbra , Viseo et Sena . J . P . Ri beiro con

demnou este documento que se oppunha á sua opinião,

por dous fundamentos (Dissert . Chron0 1., T . 4 , P . 1 ,

p . 157) 0 1 .

º é a expressão regnantes não usada nosdiplomas do conde 0 2 .

º 6 ser escripto em letra fran

cesa pura, que a inda não era. usada . Quanto ao 1 .

º asolução da

_dif6 culdade é tacil, se attenderrnos as pre

tensões do conde e a palavra Stremadura , que era

então justamente a província em que es ta Zamora, aqual v imos fi car— lhe pertencendo na divisão feita com

D . Urraca . Quanto ao 2 .

º0 proprio J . P . Ribeiro res

ponde a si mesmo na tabella a pag . 1 1 4 do volume em

que impugna a genuinidade do foral de ThalavaresAhi apresenta O uso da letra francesa pura comocomeçando desde a era de 1 1 45.

Apesar de todos os esforços que 0 A . das Dissertações Chronologicas fez para fi rmar solidamente datada morte do conde em maio de 1 1 1 2

,elle proprio

mostra que não es tava de todo convencido da força dosseus argumentos , concluindo a dissertação especial quededicou a es te objecto pelas seguintes palaw as sem

estranhar que ,rej eitada a m inha conc i l iação do Chro

nicon Lus itano,leve alguem a sua morte (do conde) ao

I .

º de ma io da era de 1 1 5 2 A' vista do que temos

ponderado,estas expressões acabam de nos absolver .

HUG O , B ISPO D 0 130 11 1 0 PAG . 68

A Opinião seguida pelos modernos , e nomeadamentepor J . P . Ribeiro (Dissert . 1 , p . 153, e T . 5

,

p . é que a sagração de Hugo , b ispo do Porto , fo ifeita em 1 1 1 3 . Assenta es ta opinião sobre a erradachronologia que Flores deu aos successos narrados na

His toria Compostellana ,erro que já se mostrou na

2 52 H I STOR IA DE PORTUGAL

antecedente nota,e que es ta servirá de comprovar.

melhor. E s tava 0 erud ito auctor da Hespanha Sagradatão preoccupado do sys tema que adoptara , que , tractando (Vol . 2 1 da Esp . Sagr

, p . 56 e segg . ) do ponti6 0 ad0 de Hugo , deduz a chronologia des te succes so dedocumentos que só tornam possível aquel la sagraçãoem 1 1 1 4 e que , portanto , ve in plenamen te contirmar aque nó s seguimo s .

Tres documentos nos res tam , nos quaes , 6gurand0Hugo

,se allude ao anno do seu pontificado

, que se

deve con tar da epocha da sua sagração,sem que seja

necessario disputar sobre a epocha da eleição . Destesdocumentos é 0 1 .

º a doação do'

mosteiro de Crestuma

(Cunha , Cata]. dos b15p0 5 do Porto , P . 2,c . feita na

era de -

1 1 56, no an no do pontiíicado de Hugo é 0

a doação do burgo do Porto a 1 4 das calendas de

maio da era de 1 158 ( 18 de abril de 1 1 2 0 ) no 6 .

ºanno do

pontifi cado (Cunha , ib id . ) é 0 a doação da igrejade S . Frausto

,a 3 das nonas de outubro da era de 1 1 65

(5 de outubro de 1 1 2 7 ) no 1 4 .

º do ponti6 cad0 (Censualdo Porto

,f . 48

Segundo O texto da Compostellana,Hugo foi sagrado

em Lerez pelo arcebispo de Braga ,Mauricio

,numa

dominga da paixão no dia seguinte partiu para Sanctiago corn Gelmires depois di sto , chegando 0 dia da

annunciação (25 de março ) , celebrou a missa solemneno altar do apo s tolo : Post haec

,qu ia erat f estívítas

D . super ej usdem apostoli d l

tar í m issam celebravit . Temos pois a data do mês da

sagração de Hugo falta-nos a ( 10 anno e do dia .

Achada a primeira ,es tá achada a segunda . Flores ,

levado pela falsa chronologia que adoptara ,attribue 0

succes so ao anno de 1 1 1 3 (Esp . Sagr . , T . 2 1,Tract. 60 ,

c . 5, 58 1 0 ,

1 6,2 6 e segg . e e c0 n6rma-0 com os tres

documentos acima . . Irreflexivamente J P . Ribeiroacceita a mesma data (Dis sert . Chrono]0 g .

,T . 1

, p . 1 49e sogg .

,T . 5 , p . ape5ar das diffi culdades que es ta

opinião encerra e que elle proprio sentiria,se não esti

vesse alluc inado pelas ponderações de Flores .

0 grande argumento , tanto do auc tor da Hespanha

2 54 H I STOR IA DE PORTUGAL

Porto,é datado de 3 das Donas de outub ro do anno da

encarnação de 1 1 2 7 , era 1 165, e do pontifi cado . E stecorreu de março de 1 1 2 7 a março de 1 1 28

,10 g0 em

outubro de 1 1 2 7 só podia ser 0 1 4 .

º havendo-se feitosagração em 1 1 14 .

Resta-nos advertir que , caindo neste anno 0 dia 2 5 de

março em quarta— feira de trevas , a festividade da

annunciação devia ser transferida para depois da paschoa . Não marcando

,porém

, 0 tex to da Compostellana0 di a do mês em que 0 novo bispo celebrou a primeiramis sa , mas só 0 da festividade , tal circumstancia em

nadad estroe a conclusão que tirámos dos documentos,

conclusão de p ouca importancia pela natureza doobjecto

,todavia de grande monta por ser mais um

meio para se conhecer 0 erro de um anno em que laboraa chronologia de Flores na sua edi ção da Compostellana .

SUPPOSTA INVASÃO DOS SARRACENO S EM 1 1 2 0,

PAG . 88

Na Historia dos Soberanos Mohametanos por Abd

el-hali ln (Assaleh ,versão de Moura , p . 181 ) d

i

z — se queAly ,

sabendo das correrias do rei de Aragão feitas no

anno da hegira 51 3 passara aHespanha para apôr em socego e assegurar as fronteiras , e depois dechegar Cordova partira para Lisboa

,a qual tomou

de as salto , e d'ahi saíra a assolar 0 paiz occidental . Os

escriptores segui do s por Conde (Domin . de 10 5 Arabes ,P . 3 , c . 25 ad referem 0 mesmo

,com a differença

de 6xarem precisamente a passagem do amir em 1 1 2 0

e de darem 0 nome de Medina Sanabria ,e não de

Lisboa,a cidade do Gharb que dizem ter elle tomado .

Como notámos no texto,0 silencio absoluto de monu

mentos chris tãos acerca des ta entrada de Aly em Por

v v

NOTAS 2 0 0

tugal torna suspeita relação arabe . Mas O que a inva

lida inteiramente é 0 testemunho do proprio Abd— el

halim , dos h is toriadores compilados por J Conde e doauctor do Kamel el Tewarikh ( traducç . de Reynaud ,

em Romey ,Hist . d

'

Espagne , T . 6, p . 4 e segg. ) Por

elles vemos que Aly residia em Marrocos quando 0

Mahadi começou a pregar as suas doutrinas naquella

cidade em 1 1 2 0 . Accresce que : a suppos ta passagem do

amir a Hespanha teve por incentivo , segundo Abd — el

halim e Conde,as assolações e conquistas do rei de

Aragão . Todavia,chegado a Hespanha

,Aly , em vez de

repellir 0 5 aragoneses , marcha em direcção oppos tapara 0 occidente

,e torna Lisboa (Conde leu Sanabria ) ,

que não consta estivesse rebellada ou em poder dechristãos . Sobre as V ictorias e conqui stas de Affonso Ivejam-se Orderico Vital (Esp . Sagr .

,T . 1 0

,

'

p . 580 eAnnales Compost . ad ann . 1 1 18 (E sp . Sagr ,

T . 2 3, p . 32 0 ) e Conde (P . 3 , c . 25 ad 6D . ) que colloca a

batalha de Gotanda no mês de rabieh da hegira 51 4(julho de 1 1 2 0 ) postoque 0 5 Ann . Toled . 1 .

os lhe attri

buam a data de 1 1 2 1 . Quanto às treguas entre D . Urracae 0 conde Pedro de Trava e a guerra contra 0 Aragão ,

consulte — se Historia Compostellana,L . 1

,c . 1 1 3 e 1 1 7 .

TRACTADO ENTRE D . THERE SA E D . URRACA , PAG . 1 0 3

Este tractado acha— se transcripto no Liber Fidei daSé de Braga , donde 0 extrahiu Brandão (Mon . Lusit .

,

L . 8, c . Apesar do respei to que consagramos ao

talento e sciencia de Brandão,vimo-nos obrigado a

affastar-nos algum tanto da intelligencia que elle dááquelle documento escripto numa linguagem horrívelmente barbara . A passagem Et que s ic ista honor quela regina da ad germana quomodo et altera que il latene t não pôde ter, quanto a nó s , interpre tação di ffe

2 56 H I STOR IA DE PORTUGAL

rente da que lhe demo s no texto . Honor,como noutra

parte se verá , significava muitas vezes nos princípiosdo seculo XII 0 districto ou territorio regido por um

senhor subalterno dependen te do rei ou de outro nobrede quem O recebera ; isto e, vinha a ser 0 mesmo q ueem epochas pouco posteriores (nas quaes a significaçãode honor se achava em geral mais restricta ) a terra outenenc ia do rico-homern tenere era 0 vocabulo correlativ0

, que indicava ser O domínio da dependencia dorei tenens era 0 que possuia por esse modo . Isto nosparece mostrar com evidencia a relação mutua em queas duas irmans se consideravam . O titulo de inf antadado constantemente a D . Tberesa neste acto importante

,em contraposição ao de ra inha attribuido a

D . Urraca, nos vem confirmar na opinião de que , tanto

pelas terras que recebia , corno (quomodo) pelas que játinh a , D . Theresa revalidava expli citamente 0 que de

modo indirecto reconhecera no concílio de Oviedo em

1 1 1 5. As sim entende-se perfeitamente como , depois dossuccessos de 1 1 2 1

,D . Theresa continúa a dominar e1n

Tuy e em Orense,de que ali ás devera ter sido desa

possada .

Um escriptor recente (S . Lui z,nas Mem . da Acad .

,

T . 1 3,P . 1 ) pretende determinar a data deste tractado

corno feito depois da volta de D . Urraca para Galliza eda intentada batalha entre ella e seu filho ajudado porGelmires , batalha que não chegou dar— se por se fazera paz em que entrou O arcebispo . E sta opinião parecen0 5 menos provavel porque , se , pelo contrario , 0attribuimos á occasião em que 0 exercito de D . Urracaes tava juncto de Lanhoso , acha-se a pos sibilidade deum facto

,aliás inexplicavel ; isto é , de D Theresa

saber pelos íntimos conselhe iros de D . Urraca,não só

a intentada prisão de Gelmires , mas tambem O modoporque ella se havia de fazer : Quía intimi qui huj uscons i l io interf uerunt f acínor ís , ipsi m ih i ej us enucleaá

verunt modum cap tionis : porque a passagem do

tractado acima trans cripto nos explica porque D . Theresa em fevereiro do anno seguinte es tava senhora deOrense , e ainda em 1 1 25 de Tuy . Sem elle

,como crer

2 58 H I STOR IA DE PORTUGAL

D . Theresa, são semelhantes , até na phrase , salva amenor barbaridade da língua

,e encerram

,além di sso

,

provisões de maior independencia , como é a exempçâode ir 0 prelado á curia e expedições reaes

,signal

caracterís tico da quebra de sujeição ( como se vê do

liv . c . 5 de Rodrigo Ximenes ) , faltando-lhe tambema declaração

,de que 0 5 castellos que lhe restitue

sejam honras e tenencias .

Damos aqui uma copia do tractado,apesar de

impresso na Monarchi a Lusitana,não só pela sua

importancia, como tambem porque a 0 0 pia de Brandãoe inexacta e falha em cousas essenciaes . A nossa éfeita pelo Sr. E smeriz , de ordem do Exmº GovernadorCivil do Districto de Braga

,João Elias da Costa Faria

e S ilva,cuj a urbanidade poderia servir de modelo a

muitos . As abbreviaturas em que abunda O documento ,e que augmentam as diffi culdades de leitura do barbarissimo latim em que está escripto , são desenvolvidaspor nó s . O digno paleographo judi ciosamente as lançouou antes pintou no seu tratado

Rubr ica

Juramentum et convenientie que fecit Regina domnahurraca germane sue infante domne tarasie .

Texto em tinta preta

hec est juramenturn et convenimentum quod facit reginadomna hurracha ad sua germana infanta domna tarasia .

que li sedeat amica per fed sine 1na10 engano quomodobona germana ad bona germana . et que non facíat

morte de 511 0 corpo nec prisione nec consiJiet pro (ouper) facere . et si 10 consih

'

ado tenet que 10 di sfaciat . et

da 1a regina ad sua germana zamora cum suos directos . Exin1 a cum 5u0 5 directos . Salamanca et ripa de

torme com suo directo . avila cum suos directos . are

valo cum suos directos . Gonka cum suos direc tos .

NOTAS

Olmedo cum suos directos . portelo cum suos directos .

manlas e tudj ela . e medina de zofrangá corn suo sdirectos . ta11r0 cum suos directos . et torre cum 511 0 5

directos . medina et pausada cum 5u0 5 directos . Senabria et ripeira et valdaria et baronzeli cum 5 11 0 5 direc

tos . talaveira et kouria cum suos directos . Setmancas .

et morales que s tan pro ad indício de egas gondesindizet geda menendiz et de el con (Conde domno moni ocum fernando iohani s et exemono lupvs que si potnerint avenire que sed . et si non mi ttant sortes quelesiurent et quos iurarent levent illam . et que sic istah

'

onor que la regina da ad germana qu0 1n0 d0 et altera

que illa tenet qu li a adj uvet ad amparar et defendercontra mauros et christianos per fé sine malo engano .

et berma et populata quomodo bona germana ad bonagermana . et que non coliat 5 11 0 vas salo cum sua honoreaut aleivoso que noluerit exconduzer cum iuditio directoet si illa regina isto non attenderit que des illo die queli demandar 1a infante ad X dies 51 illa noluerit intregareque nos sedearnus 5 0 110 5 et vos periuratos ex tan

( tantum quantum 1a infante voluerit adtender ade

Dante .

NASCIMENTO DE AFF ON SO HENR IQUES , PAG . 1 1 4

A data verdadeira do nascimento de A ffonso éainda hoj e di sputada . A chroni ca dos Godo s

,contradi

zendo-se a s i prºpri a ,assigna

-1he duas diversas a de1 1 1 1 e a de 1 1 1 3 . A relação da tomada de Lisboa no

cartorio de S . Vicente de Fóra hoj e no Archivo Nacional ) fá-lo nascido em 1 1 0 7 ; mas este documento temcontra si

"

0 ser esc 1 ipt0 quasi u1n seculo depois dofacto . A Relação da tomada de Santarem (Mon . Lusit

,

P . 3,App . cuja fé para alguem é dúvidosa , estabe

lece-il1 e a data de 1 1 1 0 . O livro das Linhagens , attribuido ao conde D. Pedro , parece concordar nis so

2 60 H ISTOR IA DE PORTUGAL

mesmo ; mas 0 Livro das L inhagens,como hoj e existe

,

é obra de muitas mãos e de diversos tempos,sem que

seja facil di scriminar 0 que é do conde ou posteriorelle

,e , portanto , pouquíssima auctoridade h is tórica

póde ter . O Livro da Noa de Sancta Cruz de Coimbra.colloca O nascimento de Affonso Henriques em 1 1 0 6

,e

-com elle concorda uma nota pos ta num antigo manuscripto de Alcobaça . Um breviario do mesmo mos teiro

,

citado tambem por Brandão e cuja data ignoramos ,põe es te succe s so em 1 1 0 9 .

No meio de tanta incerteza preferimos O testemunhoda Chronica dos Godo s , por ser a que unicamentereputamos contemporanea . Entretanto

,e tambem ne

c essario remover contradicção que ahi se encontra,

referindo 0 successo numa parte ao anno 1 1 1 3 (era1 1 51 ) e em dua s ao de 1 1 1 1 . Eis as respectivas passagens Era 1 1 51 . Natus f a it inf ansEra 1 1 63 . Inf ans D . habens aetatis annos

f ere quatordecim'

no codi

ce que foi de André deResende e no de Alcobaça : Era 1 1 63. I nf ans D . Al

f onsus aetatis anno quar todecim. Era

mortuo cum adhuc ipse puer esset'

duorum vel

tr ium annaram . E sta ultima passagem ,admittida a

no ssa opinião sobre 0 anno da morte do conde em1 1 1 4 , concorda com a outra em que se afârma ter

Affonso quatorze annos em 1 1 25. Não só por concor

darem,mas até por ser mais facil introduzir-se um

erro nos algarismos a margem do codice do“

que nas

palavras do texto , é que se deve preferir a data de1 1 1 1 .

Dizemos de 1 1 1 1, postoque 0 auctor da Chrónica dós

Godo s hesite entre este anno e 0 de 1 1 1 2 (duorum ve'

l

triam armaram) , porque esse anno se aproxima maisdas datas das outras memorias , e porque desde os

ultimos meses de 1 1 1 0 até os principios de 1 1 1 2 o condeHenrique andou por França, Aragão e Castella , quasisempre ausente de sua mulher . Accresce a isto que noPentecostes de 1 1 25 tinha 0 infante 1 4 annos completos ,p0 rque of erê que se lê no exemplar da Chronicados Godos que pertenceu a André de Resende falta , .

2 62 H ISTOR IA DE PORTUGAL

mento erado tempo em que falleceu Egas Moni z . DessaMemoria

,porém

,e do que se refere na Benedictina

Lusitana acerca daquelle monumento parece deduzirse que O relevo antigo que representava a parte superior do corpo de Egas Moniz já não existe , 0 que tor

naria de nenhum valor 0 tumulo como prova do factohistorico . Entretan to

,uma no ta subministrada pelo

Sr . Velho Barbosa,escriptor bem conhecido e teste

munha ac ima de toda a excepção pelas suas luzes ecriterio , nos tira de duvida a semelhante respeito . Comoantigo monge benedictino , 0 Sr . Velho Barbosa teveoccasião de estudar attentamente aquelle monumento .

Segundo e1le af6r1na,na pedra do tumulo existe ainda

O relevo primitivo da corda pendurada ao pes coço docavalleiro

,tendo-se quebrado só a porção do vulto

acima da barba, porque só es ta porção resaltava da

pedra . Assim fica 5uf6 ciente1nente confirmada tradição popular ácerca da façanha de D . Egas .

Venhamo s,porém

,ao .obj ecto principal desta nota,

que é estabelecer nos documentos os successos que

attribuimos ao ann o de 1 1 2 7 , servindo elles ao mesmotempo de illustrar 0 que di zemos -relativamente ao annode 1 1 28.

Temos dous documentos que, combinados um com 0

outro , provam que 0 infante es teve cercado em Gui

marães por seu primo . E'

0 primeiro uma doação aMemFernandes

,datada de' maio de 1 1 2 9 , em que se declara

ser feita aquella mercê pro servitio quod m ih i f ecístiin obsidione Vimarennensi adversas Reg em Alf onsummeum consanguineum und cum Suar io Menendi

,dictas

Grossas et cum aliis de sua genere (Mon . Lusit .

,P . 3 ,

L . 9 , c . E'

0 segundo 0 foral,ou antes con6 rma

ção do foral de Guimarães pelo infante , datado 5 kal.

maii 1 1 66 (2 7 abril em cuj o preambulo se diz

vos f ec ístís honorem et cabam super me,et f ecístís

m ih i servicium bonum et j ídele e no 6 11 1 : et de i l lashered itates de illos burg ueses qui mecum sustinuerunt

male et pena in Vimaranes nunquam doueni f ossadeiras (Arch . Nac .

,For . Ant .

,Maç . 1 2

,n .

º 3,f . 51 v . e

Gav . 1 5,Maç . 3

,n .

º A' vis ta destes dous documentos

,

NOTAS 2 63

0 11 se hão — de suppôr dous cercos de Guimarães ou se

ha— de admittir que esse a que se allude na doação aMem Fernandes é 0 mesmo que se menciona no foraldaquella villa . Nesta hypothes e é certo que elle teriaprecedi do 0 mês de abrilde 1 1 28. A narrativa dos nos soschronistas e h is toriadores é que Affonso V11 cercou 0

infante,vindo em auxílio de D . Theresa ; mas a batalha

do campo de S . Mamede , depois da qual tinha logar 0

soccorro , deu-se em julho deste anno : logo não podiatal cerco ser anterior a 2 7 de abril . Na hypothese con

traria,

de dous assedi os,qual foi O motivo do 1 .

º epor quem posto ? E

' certo que na 1 .

ª doação de Soureaos Templarios (Cartor . de Thom . n0 Arch . feitapor D . Theresa e pelo conde Fernando , a 1 4 das cal. de

abril,1 166 ( 1 9 de março di z-se , depois da data

Qui presentes f uerunt Aldef onsus leg ionens ís rex,etc .

,

e alguem poderia suppôr que já então 0 infan te andarialevantado e que O rei leonês teria vindo a Portugalnessa conjunctura em soccorro de sua tia

,veri6 cand 0

se então 0 as sed io de Guimarães mas obsta um documento de 2 das cal . de abril (3 1 de março) , em queAffonso Henriques apparece con6r1nand0 um diplomade D . Theresa

,0 que prova não ter ai nda rebentado a

revolução de 1 1 28 (Dissert . Chron0 1.

,T . 3 , P . 1

, p . 90 ,

nº além de que a presença de Affonso VII aoexarar-se O diploma

, quan to a nó s , 0 que mostra é queD. Theresa se achava na corte do sobrinho : porquenesse tempo andava O rei leonês entretido com 0 5 negocios que narra a sua chronica (Chron . Adef . Imper. I

4 e 5) não embargando a doação de D . Theresa a Garciav arcez (Mon . Lusit .

,L . 9 , c . 2 ) fei ta 1 2 dias depois ;

porque,nem sabemos onde residia por essa epocha

Affonso VII, se perto , se longe das fronteiras portuguesas , nem 0 logar em que a dieta doação foi exarada .

Durante 0 5 meses antecedentes, pos teriores a julho de

1 1 2 7, tambem não podia ser es te cerco : porque nãoconsta que Affonso V11 tornasse Portugal depois da

invasão daquelle anno que referimos no tex10,nem

podi a vir, havendo o rei de Aragão no mês de julhoentrado em Cas tella para reforçar as praças que alli

2 64 H I STOR IA DE PORTUGAL

possuia , e começando 0 de Leão a chamar tropas detodas as províncias com que formou um grande exercito

, para se lhe 0 ppôr, seguindQ-se d aqui 0 5 successos

referidos na Chronica 1atina,succe55 0 5 que ella liga

immediatamente com 0 casamen to de Affonso VII emnovembro de 1 1 28.

Assim , é indispensavel que O sítio,a que evidente

mente allude 0 foral de Guimarães , fo sse posto antesde julho de 1 1 2 7, 0 que coincide com a invasão dessaprimavera ,

relatada na Historia Compostellana .

E'

forçoso , igualmente , que a doação a Mem Fernandes se re6 ra esse mesmo facto . Sendo ella datada demaio de 1 1 2 9 , e dada a batalha de S . Mamede em julhodo anno antecedente

,segue-se que nos nove meses

intermedios se deveria ter verifi cado a entrada deAffonso VII soccorrerD . Theresa e 0 eonde Fernando

,

se as cousas pas sas sem conforme imaginaram 0 5 nos

5 0 5 historiadores . Ora,em novembro de 1 1 28 casou

Affonso VII em Saldanha corn a 6 1ha de Raimundo,

conde de Barcelona , a qual conduzira da sua patriapormar dux it uxorem per mare (Chron . Adef . I

Como portanto conceberque depois de 25 de julho chegas se a Affonso VII a noticia da victoria do infanteque ajunctasse .

tropas que marchasse para Portugal ;que pusesse sítio a Guimarães que 0 levan tasse em con

sequencia das condições offerecidas por Egas Moniz ;que marchasse com 0 seu exercito para Leão ou paraCastella que fos se a um porto de mar, preparasse um0 11 mais navios e rodeasse toda a costa de Hespanhado mar do norte até 0 Mediterraneo

, porque não tinhaporto algum nes te mar ; que voltasse pelo mesmo ea

minho,e que em novembro es tivesse em Saldanha

celebrando 0 seu casamento com D. Berenguela ? Eimpossível . Separar— se—hia aca so logo de sua mulher

para vir fazer guerra a Portugal por uma causa alheiae no rigor do inverno?Fora preciso algum testemunhocontemporaneo para que 0 acreditassemos mas 0 silencio dos documentos e chronicas é completo a semelhante respeito . No mês de fevereiro de 1 1 29 , c onvocouelle cortes em Palencia e alli residia em 25 de março ,

2 66 H ISTOR IA DE PORTUGAL

lembrarmos que a tradi ção da idademédi a , conservadapelas chronicas mais antigas

,e '

que 0 infante antes dabatalha do campo de S . Mamede já andava levantadocontra D . Theresa e que lhe tinha f urtado dous cas tel10 5

,0 5 de Neyva e da Feira ? Não e tamb em notavel

que na doação de Mem Fernandes se di ga que 0 5 prin

cipaes defensores de Guimarães tinham sido SueiroMendes da Mai a e outros da sua famili a

, que eramacerrimos parciaes de Affonso Henriques , que tantaparte parece terem tido nos successos de 1 1 2 8 e que tãograndes serviços depois fizeram ao infante Tendo nó smostrado que 0 assedio daquella villa só podia acontecer na occasião da entrada de Affonso VII em 1 1 2 7 ,

porque es tavam ahi 0 5 cavalleiros de Maia,nenhum

dos quaes , que nós saibamos , governava aquella povoação e que tinham 0 seu solar em di verso di stricto ?

Todas estas considerações reforçam 0 que dissemo s ,fundado s na carta de S . Vicente de Fragoso .

E'

Verdade que J P . Ribeiro duvidou da genuinidadedeste documento . Mas porque duvidou elle ? Unicamente porque se 0 pp11nha às ideas hístoricas recebidas .

Mai s de uma vez as sim procedeu porque 0 seu 6 1n não

era escrever a h istoria,mas ajunctar solidos materiaes

para ella , e por is so recebia as vezes como índisputaveisfactos que nada menos são que certos . Desconto é esteque se deve fazer nos seus gravíssimos escriptos , que

aliás respeitamos como de mestre e sem cujo auxilionão fora possível dar passo na hi storia dos primordios

da monarchia .

REVOLUÇÃO DE 1 1 2 8,PAG . 1 2 8 .

As primeiras doações de Soure aos Templarios , feitasem março e abril de 1 1 28

,são conârmadas pelo -conde

Fernando e por Affonso VII de Leão (Dissert . Chronol . ,T . 3 , P . 1

,n ºs

2 62 e 2 63, e Elucid .

,T . 1

, p . 32 1 e 0

NOTAS 2 67

que indi ca , Segundo já notámos , estada de D . Theresa na corte do rei seu sobrinho , ao qual poucos mesesante s fora obrigada a 5 11b1netter-se . A doação GarciaGarcez

,fei ta em 3 1 de março , é O ultimo diploma da

rainhã em que intervem Affonso Henriques (Mon.Lusi t.

,L . 9 , c . Desde então , apparecem documentos

simultaneos da mãe e do fi lho , em que ella pareceexercer auctoridade ao 5111 do Douro , e elle ao norte(Dissert . Chron0 1. , T . 3

,P . 1 do n .

º2 65 a 2 68) . O di

ploma do infante é 0 foral de Guimarães j á citado nanota antecedente 0 é a nomeação de Mendo Affonsopara conde do di stricto de Refoios 0 3 .

º é a carta deconto de Braga em recompensa dos soccorros que esperava de D . Paio . A serie des tes documentos parece —nos

assignalar O progresso da revolução . Ribeiro , julgando0 5 a uma luz exclusivamente diplomatica , hesitou sobregenuinidade dos dous primeiros , por não concorda

rem com a epocha do g overno do inf ante . 0 nenhumfundamento des ta observação é obvio . O doutorKopke , que viria a ser um dos nos sos mais habeisarcheologos , se a morte não 0 roubasse na flor da idade ,vindicou perfeitamente a genuinidade do 2 .

º

(Apontam .

Archeol ., p . 2 2 e Sobre 0 é que nó s teríamos

alguma duvida a vista de outro documento analogo,

expedido na mesma data delle e que se acha lançado af . 1 1 7 v . do Liber Fidei . E s te documento , que é igualmente uma carta de conto e privilegios ao arcebispode Braga ,

di tfere mui to do que Viterbo publicou ,tirado

do archivo da-mitra bracharense . Todavia,a di fferença

dos dons privilegios tem uma explicação plausível ,visto não haver motivo para 0 5 crer forjado s , e é queum delles depois de redi gido seria julgado ou omi ssoou errado , e nesse mesmo di a se exararia outro . Mas

qual delles fi cou sendo 0 valido Nó s cremos que 0 do

Liber Fidei , tanto por ter particularidades que 0 outrocala

,como por ter sido este 0 que lançaram naquelle

an tiquíssimo chartulario, ao pas so que es t

'outro se

copiou de um regis to mui to mais moderno , donde 0

tirou 0 auctor do Elucidario . Não só para que se possacomparar com ess

'

outro,111as tambem para que se veja

268 H ISTOR IA DE PORTUGAL

com quanta razão di s semos que 0 exemplo do que se

6 zera em Leão e Galliza para privar D . Urraca do podere dá-lo a seu filho devia influir na revolta dos barõesportugueses contra D . Theresa

,0 pornos aqui . Nes te

diploma,cuj a redacção pertence naturalmente ao pro

prio agraciado ou a algum dos seus conegos,é evidente

a intenção de equiparar D . Paio ao celebre Diogo Gelmires .

Rubrica

Cautum quod concessit adefonsus enrici comitis 611u5et regine tarasie bracharensi ecclesie tempore pelagiiarchiepismpo .

Texto em tinta preta

In nornine patris et 6 1ii et spiritus sancti amen Egoalfonsus . egregii comitis henrici et egregie regina tarasie6 lius . et alfonsi obtimi regis nepos . sancte marie bracarensi et tibi arch iepiscopo domno pelagio tuisque

successoribus in perpetuum promovendi s nec non ibi

dem clericis commorantibus dono atque concedo cautum illud quod scilicet alf onsus rex consan

'

g uineus meus

et reg ina domna arracha mater ej us et eg o tibi robora

vímus in presentia compostellani archiep iscop i' domni

didaci et comitis domni gomizoni s et comitis domniroderici et aliorurn magnatum scili cet pelagii suarii

,

egee 1noni'

,—menendi monionis

,roderici vermuti . cantam

videlicet i11ud dono atque concedo ita determinatumcum villa que dicitur lapella sicut in scripto cauti continetur per illum Videlicet terminum qui est inter avellaneda et gondemar et inter

'

covas et vilar et per illurn

montem de soniariz et -per i11ud monasterium de 6ga

redo et per portellam de gisandi et per portellam de

scudarii et ad illam portellam de leitones et ad por

tellarn de villacova et inde ad pousafolles et ad por

tellam de bezerros et inde ad termínurn de donim et

inde per terminum de lauredo et ad portellam sanctivissimi (sic) et per terminum inter mauri et antonianes

2 70 H I STOR IA DE PORTUGAL

nicatus et cum iuda traditore habeat participium , et

habeat partem cum diabolo et angelis eius . et insuperincurrat iram ipsius regine sancte marie . facta fui tkartaVI kalendas innii era MCLXV1 . ego alfonsus infanshoc testamentum manu mea r0 b0 r0 .

Seguem-se as testemunhas e confirmantes, que são os

mesmos do documento pub licado por Vi terbo .

SEGUNDO CASAMENTO DE D . THERE SA , SUPPO STO ,

PAG . 1 30

O Livro das Linhagens, que ainda h oj e existe na

Torre do Tombo,attribuido ao conde D , Pedro e que

não é mai s que um composto de diversas memorias genealogicas , escriptas em epochas di fferentes , e mal coordenadas , provavelmente no seculo XV

,estabeleceu a

opinião vulgar do casamento deD . Theresa com 0 condeFernando no título 1 3

,onde são quasi tantos os erros

e as fabulas quantas as palavras . Esta Opinião generalison-se e predominou largo tempo . João de Barros eNunes de Leão foram 0 5 primeiros em contradizê— la

Brito,Estaço ,

Faria e Sousa 0 5 primeiros em tentar demonstrá— la . 0 judi ciosoBrandão combateu— a , sem todaviaassentar decisivamente a sua opinião . Seguiu—o D . J0 5éBarbosa

,sus tentando positivamente que tal casamento

era supposto . Por outra parte , em Castella,adduziam

argumentos em favor da verdade da tradi ção Yepes eSalazar de Cas tro . Nesta contrariedade de pareceres aques tão pendeu indecisa até os tempos modernos . An

tonio Pereira de Figueiredo suscitou— a de novo,decla

rando-se pela af6r1nativa (Mem . da Acad .

,T . 9 , p . 2 95

e e a sua doutrina foi commentada e desenvolvida por dous academi cos modernos

,Almeida e

S . Luiz (ib id .

,T . 1 1

,P . 1

, p . 1 74 e segg . T . 1 3 , P . 1,

p . 2 9 e segg) J 0 50 Pedro Ribeiro , cuja opinião em tal.

NOTAS 2 71

materia valera pela de mui tos , absteve-se de a declararnas passagens dos seus escriptos onde ella teria cabido .

Em tudo 0 que 0 5 propugnadores deste consorcioteem allegado não ha senão um argumento sério . E

'

0

que se deduz da carta de fundação do mosteiro deMonte —Ramo

,pub licada por Yepes (Coron . Gener. de

S . Ben .,T . 7 . App . escrit . em que se diz ego

comitis Henr ic i quondam uxor (expressãodesconhecida nos documentos de D . Theresa) nun cvero comitis F erdinand i Han c chartam 6 eri

jus si et una cum viro meo comíte Ferdinando Peres .

Este documento e'

assás duvidoso : Ribeiro deu-0 porsuspeito (Dissert. Ch1 0 n0 1.

, T . 3 , P . 1,nº

238) mar

cando — o com 0 fatal asterisco . Tinham-Ihe feito porventura peso os argumentos de Barbosa , que 0 dá porsuppos to . Entre estes argumentos ha um que desejariamos ter Vi sto combatido (Catal . das Rainhas , p . 1 0 2 ,

5 e muito mais depois da pub licação da Compostellana , que positivamen te nos diz que 0 conde e stavacasado quando veio para Portuga1 . Era sua mulherD . Sancha Gonçalves de Lara (Salazar, Hist . de 1aCasa de Lara

,T . 1 , p . 2 4 1 , n .

º a qual com seu

marido , O conde , doou em 1 1 42 a metade que lhes pertencia do mosteiro de Sobrado . Isto parece mos trarque os amores de Fernando Peres com D . Theresaforam apenas temporarios . E

'

uma terrível dif ficuldadeque se alevanta contra O documento de Monte-Ramo eque valia a pena de ser resolvida .

Viu Yepes es te documento ? Viu-o no origmal ?Eis 0

que e11e não di z . Que está viciada a copia que iruprimiué innegavel. Quem são esses ricos-homens da corte deD . Theresa que confi rmam a doação?Em que outrod iploma regio desse tempo figuram Sueda Mendes

,

Pai o Munhos,Pedro Bidularis N0 meio destas altera

ções visíveis , ainda suppondo doação verdadeira,

n'

ão e'

facil de crer que qualquer copista ,vendo um

documento exarado em nome da rainha e do condeFernando quizesse enfeitar essa associação ,

11n1 poucoestranha,

intr0 duzind0 as expressões nunc conj uxvira meo, como com evidencia se introduziram as

2 72 H I STOR IA DE PORTUGAL

de comitis Henr ici quondam uxor,absolutamente alheias

aos diplomas de D . Theresa ?Mas O que mais induz a crer esse documento ou

falso ou,antes , 0 que julgamos provavel, viciado , é a

falta completa de declaração de semelhante consorcioem todos os diplomas de D . Theresa . Este argumento ,que parece apenas negativo , tornam-no positivo as

doutrinas triviaes de diplomatica . E stabelecida comcerteza a formula de chancellaria de um governo ouperíodo de governo , os documentos que desdi zemdella

, quer para mais, quer para menos , são conside

rados suspeitos . Era as sim que procedi a 0 nos somestre commum

,0 illustre auctor das Dissertações

Chronologicas , empregando , até , esta regra , às vezes ,com demasiada severidade . Mas será , porventura , critica severa de mai s 0 suppôr viciado um un ico diplomaque foge das regras de chancellaria usadas no tempoem que foi exaradoEs te silencio de todos 0 5 monumentos tinha bastado

já para persuadi r 0 bom juízo do auctor da 3 ª Parte daMonarchia Lusitana e foi suf6 ciente para trazer a estaopinião um habi l his toriador nos so contemporaneo(Schaefer, Geschichte von Portugal , 1 . B . , S . AChroni ca dos Godos e 0 Livro dos Testamentos deSancta Cruz de Co imbra

,os dons unicos monumentos

historicos desse tempo que podi am tractar do assumpto ,

guardam 0 mesmo silencio . O ultimo,sobretudo , na

passagem relativa ao desbarato de Guimarães , em que ,se na verdade 0 conde fo s se marido da rainha

,natu

ralmente diria n is i divino nutu reg ina una cum suo

viro (vel maríto) a regno expulsís , etc . di z cum suo

comite,expressão insultuosa ,

'

a11usão amarga ao affecto

illi cito dos dous,lançada em rosto aos vencidos . O

Livro Ve1h0 das Linhagens,cuja origem,

ta lvez,

remonte quasi aos primeiros tempos da monarchi a ,

nem uma palavra contém relativa ao consorcio do

61h0 de Pedro Froylaz com a rainha dos portugueses ,antes pelo contrario , _

fá-10 ca sado com uma só mulher(Hi st . Genealog .

,Prov .

,T . 1 , p . A conspiração

contra O pobre documento de Monte-Rarno é impla

2 74 11 151 0 3 111 DE PORTUGAL

defender ou impugnar . Por curiosidade apontaremosa lgumas das allegações que se repetem nas duas maisrecentes Memorias da Academia em que se tractades te objecto . Bastam , porque são as mais fortes , paraavaliar ' a força dos outros argumentos feitos pelosdous academicos .

A Historia Compostellana diz no L . 3,e . 2 4 : Por

tugalensis acquisita portugalensi patria , et

Fernando qui,relictu sua leg itima uxore

,

cum matre ipsius infantis regina Tarasia tunc temporisadulterabatur , et toti illi terrae principabatur, vi ablato ,magnam di ssensionern habuit , ete . O infante português , ganhada a patria portuguesa , e arrancado dellaFernando Peres , que , deixada sua mulher legitima

,

havia já tempo adulterava com a mãe do mesmoinfante , a rainha Theresa , e imperava em todo aquelle

paiz,teve grande di scordia , etc . O 2 .

º academico,

dos dous a que nos referimos , verteu ví ablato e atomar por f orça referindo-se a terra ou patria . Tra

º

duzindo a letra ,daria O pensamento do historiador

compostellano ,que era indi car ter sido 0 conde expulso

de Portugal. Mas , de um ou d'outro m0 d0

,ninguen1

verá,de certo , uma prova do segundo casamento de

D .Theresa nestas palavras . PreOCCllpadOS pela sua

opinião , ,

viraln — na,porém

,ambos os escriptores . 0 1

chega a exclamar Que testemunho ma is decisivo !D . Fernando deixa sua mulher

, casa com a senhora

D . Theresa ,e governa com ella aos portugueses O 2 .

º

,

'

mais moderado , diz que , quem pretender negar, depoisde tão claras e terminantes phrases , o casamento

,se

verá constrangido imputar a rainha 0 mais indecoroso crime de tractar torpes amores com 0 conde . E

porque não havemos de crer antes is so ?Dá 0 auctorpouco adi ante a razão porque ser ia prova de não

pequena desenvoltura da parte delles e de um grande e

escandaloso deSprezo da publica honestidade e decencia .

Tudo is to é absurdo ; mas tudo isto se acha escripto .

O lexicon em que adulterari tenha a signi ficação decasar — se ainda es tá por compôr e imprimir adultera

batur , é correlativo relicta sua leg itima uxore . 0 5

NOTAS 2 75

dous academicos parece que estavam preoccupados de

uma idea grosseira ,desgraçadamente vulgar, de que só

:

ha adulterio quando a mulher trahe“

seu marido, que

es te pôde faltar a fé conjugal sem ser adultero , e quepara merecer esse título de r

'

eprovação eé necessarioque seja bigamo . Se e possível conceder— se-nos por um

momento que es te negocio passou como nó s 0 entendemos desejaríamos se nos di ssesse de qual palavrase deveriam servir os hi storiadores compostellanos paradesignarern as relações do conde com a rainha

,não

ser adulterabatur ?A razão de conveni encia moral dadapara a extravagante traducção do verbo adulterari

parece—nos inconsiderada e trazida por attenções quenunca deveriam influir n0 animo de quem se dedi ca aosevero lavor da hi storia . É necessario que es ta deixe ,em6m , de ser convencional , de ser um meio de lisonj ear 0 5 grandes ou as preoccupações nacionaes

,as glo

riolas falsas e insensatas do vulgo . E'

necessario accei

tar as gerações e 0 5 seculos como elles foram ,e não

accordar os nossos avó s do somno da morte para lhesdespir as armaduras ou 0 5 trajos de braga] e de almafega e cubri-los do veludo e lemiste cºrtezâos ou dos1ani6cios e algodões dos teares a vapor ingleses . E

'

necessario não attribuir a idade médi a ideas ou costumes diversos dos seus e não envernisar com 0 polimento hypocrita dos tempos presentes uma epochaverdadeiro caput mortuum das ultimas fezes da decadeneia romana

,em que se deliu fereza dos barbaros

do norte conquistadores do meio dia,envenenadas ,

ainda mais, pela addi ção dos costumes luxuarios e

'

voluptuosos dos sarracenos , e escumando n0 cadinho fervente da vida solta de contínuos combates . Pretendertransfigurar assim a h is toria , violentando significaçãoreal dos documentos , é lançar camphora no sepulchro

de um cadaver já corrupto , para que este não apo

dreça . Apesar da sua perversão moral , a idade média ,notavel epocha de tran sformação , tern inuitos aspec tospelos quaes eé grande e bella . Os que desconhecem 0

importante papel que lhe coub e na historia do pro

gresso humano é que se entretêem e1n cubri la de

2 76 H ISTOR IA DE PORTUGAL

remendos e parches , para que não vejamos as ulcerasque a roíam .

A s sim como se deu uma interpretação forçada aHistoria Compostellana para provar 0 segundo casamentode D . Theresa

,do mesmo modo 0 quizeram deduzir

dos preambulos e confi rmações dos diplomas,0 5 quaes

apenas provam que Fernando Peres chegou a gosar damai or auctoridade que a rainha lhe podia dar

,cousa

que , segundo cremos , ni nguem nega . Um desses documentos e uma inquirição sobre os bens e direitosreguengos n0 di s tricto de Viseu (Mem . das

'

Inquir.

,

Doeum . feita pelo prior Sandino Randufi z comvarios indi viduos , entre 0 5 quaes 6gura um NunoMendes que se diz mordomo da ra inha e do conde .

D'aqui se tirou um dos poderosos argumentos a favor

do presupposto consorcio ,argu1nent0 curioso que se

estriba nun1 calculo feito sobre a ignorancia do lei tor .

Hoje mordomo signi fica nas casas abastadas um creadoque dirige certa parte do serviço domes tico e

'

corre com

as despesas mindas da casa . Mas , como nem todos 0 5

leitores ignoram . as nos sas antigas ins tituições , aquellesque sabem que 0 maiordomus era então um recebedorde tributos e direitos reaes , revestido , além disso

,de

certa magistratura para julgar causas de fazendapub lica , rir-se —na de ver O pobre Nuno Mendes , quecom razão se intitulava ,

segundo O costume do tempo,

official da rainh a e do seu logar-tenente , convertidoem creado grave da casa dos dous conjuges . O peor é

que neste mesmo documento O bom do homem se

esquece da communhão de bens entre marido e mulhere di z com 0 prior Sandino que metade de certa leira eO terreno juncto de umas encruzilhadas era de i l lareg ina ,

sem fazer caso nem menção do conde seu amo .

Depois de tão concludentes allegações , como as quetemos visto , pareceria inutil aproveitar varian tes decodices para dellas extrahir provas . Pois até is to se

fez . A Chroni ca dos Godo s , no exemplar que foi deAndré de Resende ,

diz que 0 infante Affonso Henriquesadquirira O reino de Portugal labore suo mag is quam

parentum voluntate. A palavra parentum e mais uma

2 78 H I STOR IA DE PORTUGAL

seus fundalnentos são : que a destruição de'

Leiriade que ha no ticia fora em 1 1 40 : 2 .

º que Chroni cadosGodo s diz ter s ido 0 infortunio dos chris tãos nes te annoeu1 Thomar : Era MCLXXV evenit inf ortunium chrié

tíanís in Thomar .

A primara des tas razões é evidentemente de nenhuma

força . O ser 0 cas tello de Leiria destruí

do em 1 140 nãoobsta a que tivesse em 1 137 sido entrado pelos sarra

_cen0 5 e que , abandonado por es tes , 0 5 christãos 0 reparassem e guarnecessem de novo . O segundo fundamentonão é melhor. A Chroni ca dos Godos não fala . do cas

tello de Thomar mas do infortunio succedido aos por

tugueses em Thomar . Podi a ser, e provaveM ente foi,

um combate campal dado nas margens do Nab ão, emque 0 5 christãos 6 cas se1n desbaratados . Para pro

var que Erena de que falla Sandoval , seguindoChronica toledana

,é 0 castello de Thomar fora neces

sario que este já exi s tisse . E'

0 que se não verifi ca .

Para não multiplicar documentos , que todos conspi

ram em provar 0 mesmo,baste citar os principaes que

fazem ao nos so intento1 .

º A bulla de Urbano 111,de 1 1 86

,pas sada a reque

rimento dos templarios e , por consequencia, estribadanos factos allegados por elles , con6 rmand0 — 1hes as

terras e bens que pos suíam emGav . 7 ,M. diz que Soure e Ega lhes tinham sido doadas por D . Theresa e terram desertam inmarchia ser

racenorum por Affonso I , e que e11es ahi hav iam f undado os

'

castellos de P ombal, Thomar,Ozezar e Almon

rol. Todos estes castellos são , portanto , posteriores adoação de Affonso I .

A doação do castello de Cera feita aos templariosem fevereiro de 1 1 59 (Cartorio de Thomar no Arch .

Nacion . ) é a mais antiga desse territorio em que se di zna bulla de Urbano 111 foram f undados depois P ombal ,Thomar

, Ozezar e A1 1n 0 111 0 1. A fundação de Thomar é,

portant0 , muito posterior ao anno de 1 1 37.

3 .

º A inscripção, ern6 1n p, 0 5 ta juncto á porta da igrejado convento de Thomar (Elucidario , T . 2 , p . 359 ) fixadefini tivamente a fundação do castello em 1 1 60 .

NOTAS 2 79

Mas,di r-se—ha

,antes desta ultima fundação pedi a

exi stir outro castello nasmargens do Nabão ou T homar .

Sem duvida . Todavia , como de tal castello não ha me

moria alguma , nem a passagem da Chroni ca dos Godosa que Brandão se refere torna necessaria a sua existencia ,

é evidente que 0 chroni sta de Affonso VII fala deLeiria ,

não só pela semelhan ça do nome Erena ,Leirena ) ,

mas tambem porque não sabemos de outro castello naquelles sitios en ado por Af f onso Henriques -nessaepocha para f azer f rente a Santarem e guerreá

— la , bem

como a L isboa_

e Cintra e aos outros cas tellos circumvi

z ínhos (Chron . Ade f . , L . 1,c .

O unico meio de sustentar a opinião seguida“

peloauctor da Monarchi a Lus itan a , de que 0 castello de

Leiria foi tomado pelos sarracenos uma só vez,e esta

depois do recontro de Ourique, que é destrui çâo d e

que fala a Chroni ca dos Godos ; O uni co n1 e10 ,dize1nos ,

de sustentar tal doutrina,fora suppôr que 0 chronista

de Affonso VII introduzira deslocada'mente a narrativado cas o de Leiria entre acontecimentos de ann os an teriores . Mas

,nessa hypothese , como explicar a retirada

de Affonso Henriques depois da victoria de Cerneja ?Corno a acceitação das duras condi ções do tractado deTuy ? Além di s so

,O tes temunho da chronica toledana,

que nos referimos,é preciso . E ll a nos diz que , depois

da victoria,Affonso voltou logo a Portugal para acudir

a Leiria ( ibid . 1,

Acresce que na relação dos acontecimentos de Valdevez em 1 1 40 se allude á perda deLeiria como a um succes so de tempos passados ( ib id .

c .

'

BATALHA'

DE OUR IQUE ,PAG . 1 74

As unicas fontes legítimas e positivas para a hi storiada batalha de Ourique são as seguintes

1 .

º In loco qui dicitur Oric fuit praelium inter pagamoset chris tianos , preside rege Ildefonso portugalense ex

2 80 H I STOR I A DE PORTUGAL

una parte , et rege paganorum Examare ex altera, qui

ibidem mortem sitio evasit in di S . Jacobiapostol i mense juli i . Era MCLXXVII Chronicon Lame

cense nas D issert. Chronol .,T . 4 , P . 1

, p . 1 74 , e nos Portugaliae Monumenta H istor ied (Scr ip tores) , vol . 1 ,

p . 1 2 0 .

In era MCLXXVII mense julii , die S . Jacobi,in

10 0 0 qui dicitur Ouric , lis magna fuit inter christianoset mauros

, praesíde Ildefonso portugalensi , et ex partepaganorum rege Smare , qui vic tus fugam petut Chro

nicon Conimbr icense (Livro da Noa de Sancta Cruz )em Sousa

,Prov . da His t . Geneal . , T . 1

, p . 375, e melhorem Flores

,Esp . Sagr .

,T . 2 3

, p . 330 , e nos Monumenta,

ibid .

, p . 2 .

3 .

º Inquirição sobre as questões de primazia entreBraga e Toledo , na qual um certo Garcia Liufreiz de

Jaraz di s se que se lembrava de ter vinte annos,tem

p ore Belli de Aur ich : E lucid . verb . Ladera,T . 2

, p . 80,

c . 2 .

111 campo Haulich quinque reges paganos cuminnumera e0 r11 1n barbara multitudíne

c

de ultra citraque

mare,ut eum 0 1nnin0 perderent coadunata ,

devic_1 t

,

auxilio sibi facto divino,ac B . Jacobi patrocinio , cujus

ea die solemnitas fui sse perhibetur : Vita S . Theotoníi

nos Monumenta,ibid .

, p . 86, g2 7 .

5.

º Era MCLXXVII julio mense die divi Jacobi apostoli fuit victoria Alfonsi regis de E smar rege sarrace

norum et innumerabili prope exercitu, in 100 0 qui di citur Aulic

,tunc cor terrae sarracenorurn quo perrexit

rex Alfonsus . Foeminae sarracenae in 11 0 0 praelio amazonico ri tu ac modo pugnarunt ut occisae tales deprehensae : Chronica Gothorum,

em Brandão, Mon . Lusit

P . 3 , L . 1 0 , c . 3 , e nos Monumenta,ibid .

, p . 1 2 .

0 Chronicon Lamecense acha— se escripto em le trafrancesa na primeira fo lha de 11 11 1 martyrologio da Séde Lamego

,e ahi se di z que foi tirado authenticamente

de outro mais antigo no anno de 1 262 . Vi terbo suppõe

O original anterior um seculo . A palavra Orich escriptade um modo que parece mais arabe , a singeleza verdadeiramente de chronicon com que es tá escripto e 0 ter

2 82 H ISTOR IA DE PORTUGAL

6 cam é que dava mais fé aos exemplares de SanctaCruz e d

'

Alcobaça , conformes entre si . 0 exemplar deResende foi , sem duvida

,enfei tado e paraphraseado

posteriormente , não dizemos por e11e ,mas por alguem .

Nó s subscrevemos inteiramente ao voto de Brandão .

Na copia de Resende ha artigos que desdi zem completamente da fórma sempre resumida e rapida com que

se lançavam aquellas series de apontamentos chamados Chronicons . E sta fôrma é constante , não só emtoda a Península

,mas também em toda a Europa , como

se pôde ver nas Collecções de Martene , Achery , Muratori , etc : , e ainda melhor na mais perfeita de todas essascollecções , os MonumentaH istoriae Germanica de Pertz .

Assim , dando textualmente as fontes para a h is tori ada batalha de Ourique , aproveitamos 0 artigo da Chron ica dos Godos inserido na narrativa de Brandão , desprezando leitura do codi ce de Resende ,

'

evidente para

.phrase de mão mais moderna .

Ba inda assim,consideramos a auc toridade da Chro

ni ca dos Godos como inferior á da Chronica Lamecense,

,porque , posto ambas sej am do seculo XII,a relação

daquella é por certo pos terior, nessa parte , aos succes5 0 5 que narra : as palavras tunc cor terrae sarraceno

rum que ahi se lêem ,não deixam a menor duvida de

que a memoria da batalha foi escripta depois da con

quis ta do A1e1ntej 0 , quando j á Ourique não era 0 cara

ção da terra dos sarracenos ao passo que 0 artigo doChronicon Lamecense pôde ter sido lançado nelle poroccasião do acontecimento . Por via de regra era as simque se iam redigindo aquellas como ementas his toricas .

Se descerrnos a examinar criticamente a narração docodi ce de Resende

,delle mesmo se tirarão as provas

contra 0 subido valor que se lhe tem dado . Não transcrevemos na integra aquelle artigo , porque não lhe

attribuimos grande importancia , á vista do que . ficaadvertido . 0 5 que pretenderem consultá-lo podemrecorrer aos Appendi ces da 3 .

ª Parte da Monarchia Lnsitana . Citaremos só as passagens que , em nos so entender, 0 condemnam . A primeira cousa que offerece uma

.dífâculdade,talvez insoluvel, é dizer— se-nos ahi que

NOTAS 2 83

O rei Esmar, tendo congregado infini ta multidão de

sarracenos africanos que trouxera comsigo e dos deáquem mar

,dos di strictos de Sevilha , Badaj oz , E lva s ,

Evora e Beja e de todos 0 5 cas tellos até Santarem ,

saíra ao encontro de Affonso Henriques Comecemospor nos recordarmos de que ainda nos princípios domês de j ulho O príncipe português não tinha saído dosseus domínios

,onde então fazia mercês (E lucid . verb .

Ladera) e de que a 2 5 se deu a batalha .Assim,é neces

sario que em vinte dias,pouco mais ou menos , 0 exera

cito christão passasse 0 Tej o ; que Esmar soubesse dainvasão ; que desse ordem às tropas almoravides e andaluses para marcharem de tão diversos pontos ; queessa inf ini ta multidão marchasse de feito , se reuni ssee viesse encontrar os portugueses em Ourique . E

'

durode crer ; mas sigamos ávante . Con1 o tinham Vindo estastropas d

'

Africa , se Tax6n havia dous annos levara paralá as melhores de Hespanh a

,a 6m de salvar 0 imperio

das mãos dos almohades,e desde então' só experimen

tara reveses e , por consequencia , diminui çã o de forças ª?

Porque não se encontra 0 menor vestígio desta vindanos hi s toriadores arabes Porque não se dirigiu Esmar

contra Affonso VH para descercarAurelia ,negocio sem

comparação mais importante do que repellir uma

correria, quando a retirada dos christãos ,mettidos no

centro do territorio inimigo,não podi a tardar Porque

se respondeu aos defensores d'

Aurelia nesta mesmaconjunctura que não havia forças para enviar a soccorrê .10 5 Não invejamos quem quizer salvar esta passagem 0 trabalho de annullar h iste ria dos successos da

Hespanha e da Africa , no meio dos quaes dynastia do

zenetense Abdu —l-mumen veio a substituir no supremopoder entre 0 5 mussulmanos do lamtunita Tax6n .

Diz — nosmais esta narrati va extraordinaria que tendoaquella in6ni tamultidão de sarracenos cercado AffonsoHenriqii es em um outeiro

,no qual estava acampado

com um punhado de gente (cu1n paucis suorurn) , qui zeram os infiéis romper O arrai al

,mas que ,

saindo contraelles a lgumas tropas escolhidas (e1ecti mih tes) os passaram á espada depois de 0 5 repellirern ; que ,

'

vend0 isto

2 84 H I STOR IA DE PORTUGAL

O rei Esmar e conhecendo que 0 5 christãos es tavam re

solvidos a triumphareln e a morrerem antes do que

fugirem ,fugiu elle 0 0 111 os seus

,e não houve mai s que

matar e di spersar multidão dos infiéis . Tinha E smar

razão de as sim 0 fazer,e qualquer

, por mais esforçadoque fosse , . fugiria do mesmo modo . São poucos os

christãos ; innumeraveis 0 5 soldados sarracenos . Aecommettem 0 campo ; mandam 0 5 portugueses algun s ca

valleiros a recebê — los . Tal era a conta em que tinhamaquelle gentio que nem quizeram saír todos ao rebate .

0 5 cavalleiros escolhidos repellern 0 5 aggressores epassam-nos á espada . A

' vista de tão inaudi to e incrivel espectaculo , quem é que não fugiria?Diz — nos por 6n1 narrativa daquella ,

não j á extraor

dinaria,mas sim milagrosa victoria ,

que ahi ficou prisioneiro um certo Omar Atagor, sobrinho do rei Esmar

e neto do rei Aly . Vemos , pois , que E smar era fi lho doimperador de Marrocos e , por consequencia , irmão deTax6n

,vindo Omar Atagor ser ou fi lho ou sobrinho

deste principe . Semelhantes personagens deviam ser

conhec idos na hi storia dos sarracenos,e Esmar um dos

mais illus tres caudilhos lamtuni tas . Busquem-se,porém

,

estes nomes na his toria dos arabes, que delles não se

encontrará 0 menor vestígio . Pelo contrario,sabemos

que os chefes principaes dos almoravides de Hespanha ,depois da partida de Tax6n para Africa , eram Aly Ibn

Ahu-bekr,tio do principe lamtunense , Abu Zakaria Ibn

Ghanyyiah ,e Osman Ibn Adha unicos de que se acha

feita menção nos historiadores da Hespanh a arabe(Conde , P . 3 , c .

Que 6rmeza ,pois

,se pôde fazer numa narração que

nos conta successos humanamente impossíveis e quenelles faz figurar individuos cuj a exis tencia é deseonhecida dos escriptores que tinham obrigação de conservar sua memoria , se realmente houvessem exi s

udo ?

Bes tam-nos , pois , 0 5 cinco monumentos que acimatranscrevemos como unicas provas do facto . O Chro

ni con Lamecense e inquirição de Braga apenas nos

asseguram que elle não é uma fi cção .. O Chronicon Co

2 86 H I STOR IA DE PORTUGAL

meiro aspecto ( 0 que facilmente poderá qualquer veriíicar no Archivo Nacional

,onde hoje se acha ) . Parece ,

na verdade , impossível que tão grosseira falsidade ser

vis se de assumpto discussões graves . Quem ,todavia

,

desejar conhecer a impostura desse documento famosoconsulte a memoria de Fr . Joaquírn de Santo Agostinho(Mem . de Lit ter . da Acad .

,T . 6 , as Dissertações

Chronologicas (T . 1 , Dissert . 2 , p . 60 e segg .

,e T . 3 ,

P . 1,n .

º e as Memorias da Academia (T . 1 2,P . 1

,

p . 75 e segg . ) onde a censura não consentía que se dissesse tudo

,mas onde se diz 0 sufãciente para 0 5 enten

di dos . 0 aindamai s celebre auto das cortes de Lamego,

un ico pela sua fórma e circumstancias no meio de tan tasactas que nos restam de concílios e cortes de Hespanhae Portugal desde 0 tempo dos Godo s até 0 6m do secu10 XV ,

tambem se refere á batalha de Ourique como O

fundamento da acclamação de Affonso I naquellas

cortes . Faremos devida justiça a esta invenção dealgum dos falsarios do seculo XVI quando tractarmos

da h istoria das institui ções e legislação do berço damonarchia . Dire111 0 5 , porém ,

de passagem que paraconhecer que as actas das cortes de Lamego seriamabaixo da crítica ,

se não fosse 0 haverem sido cousideradas desde 0 seculo XVII como as leis fundamen

taes do nosso paiz,bastará attender ao seu preambulo

,

no qual j á figura um procurator reg is na epocha emque procurator signi6 0 ava sempre administrador

,cd

beça , pr incipal de uma terra ou de uma corporação , eonde 0 5 imaginarios representantes dos muni cípios quealli se fazeín 6 gurar se dizem procurantes bonam prolem per suas civitates , no que 0 falsario passou alémda meta

,carregando ignorantemente mão na barba

ridade do latim . P rol proveito) era palavra antiquadajá no 6n1 do seculoXVI , e por is so querendo 0 impos tortraduzir em latim barbaro que elles eram 0 5 que proeu

ravam o bom proveito dos concelhos , faz di zer ao redac

tor das acta s , que elles procuravam ter boa descendencia

ou j í lhos nas suas c idades . E'

pelo menos como entenderia aquella phrase um homem do seculo XI ou XII,tempo em que prolís tinha a restricta signi6 0 ação de

NOTAS 2 87'

j í lho ou d escendente e em que até , commummente,as

personagens que intervêem nas escripturas se di zem ,

por exemplo , Sane ias prolís Roder ici , Alf onsus p ro lísOveci

,em logar de filho de Rodrigo , ou filho de Oveco .

Apontamos estas duas pequenas circumstancias para

dar uma idea do mesquinho talento dos falsarios que

tanto enredaram com 0 5 embustes de diplomas grosseiramente forjados a hi storia dos primeiros tempos damonarchia .

XVI I

DESTRU IÇÃO DE LE IR IA E TRANCO SO ,PAG . 1 81

Attribuindo ao anno de 1 1 40 varios successos que 0

commum dos hi storiadores , ainda aquelles que mai sattentos se mostram às investigações cflronologicas ,suppõem anteriores , aproveitaremos aqui as passagensdas chronicas em que nos fundamos para alterar essachronologia e Ci taremos 0 5 documentos que , revalidandoa aii ctoridade das chronicas

,nos levam a apartarmo

nos da ordem dos successos estabelecida pelos hi storiadores que nos precederam , entre os quaes se contamO português Brandão e 0 castelhano Ri sco . E

'

mais curtoe mais claro provar a nossa opinião que refutar emespecial a de cada um delles .

Na h istoria latina de A ffonso VII ha uma passagemimportante para chronologia daquella epocha . A L

ª

des truição de Leiria, que a his toria do imperador espe

cificadamente narra , j á vimos na nota XV que foi em1 137, quando , pelo tes temunho da Compostellana epelo tractado de Tuy des te anno , sabemos que se fez apaz entre O imperador e 0 infante depois da invasão daGa11i za , intentada por instigações de Gomes Nunes ede Rodrigo Velloso .

Eodem tempore venerunt moab ite s e t agareni superpraedictum castellurn Erene . ceperunt que

gererentur imperator f ac íebat bellum in

terra reg is Garc iae , cepit Comitem Latronem Na

2 88 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Comes vero Latron Nafarrus , dato imperatorijuramento , servivít ei multis postquam paxf actaest inter imperatorem et comitem Latronern Nafarrumfuit bellum per aliquot anuos inter regem Garc iam et

Ceteru'

m in Portugali Ferdinandus Joan

quo tidie agebat bellum contra Ferdinan

dus praedictus cepi t aliquos ex principibus regis , et

expoliatos magni s divitiis dimi sit . Et factum est post

quam haec g esta sunt imperator abii t in Portugale

Segue-se a relação dos acontecimentos de Valdevez,

succedidos em 1 1 40 , segundo a Chronica dos Godos .

Vemos , po is , que 0 5 recontros de Fernando Annescom 0 infante não podiam veri6 car— se senão nos 6ns

de 1 1 39 ou princípios de 1 1 40 , porque das palavraspostquam haec gesta sunt se vê que a vinda do imperador precederam immediatamente esses recontros

,

tendo 0 chroni sta narrado antes que a outra guerraentre Affonso VII e Garcia (pos terior a 1 137 durarapor

a lguns annos . Além di sso,não se podendo attribuir

estes successos aos primeiros sete meses de 1 1 39 emque Affonso Henriques preparava e emprehendia a jornada do Ale1ntejo

, seria necessario atrasá-los a 1 138,em que nem nos monumentos de Hespanha , nem nos

de Portugal se acha 0 menor vestígio de commettimen

tos na fronteira de Galliza,antes vemos - Fernando

Peres , quer seja 0 de Trava,quer O irmão do impera

dor,6gurand0 na corte de Affonso Henriques e acom

panhando— o , talvez, ainda á batalha de Ourique (Doc .

do Arch . Nac .

, Chancell. de A ffonso IV,L . 2

,f . 2 ,

eM . 1 2 de For. Ant . , n

º 3,f . 62 Como j á notámos

,

notícia que teve Esmar de que 0 infante es tava ocenpado na Galliza (in partibus Galleciae circa Tudem)em negocios de que se não podia desembaraçar , e 0

restituir Atfonso Henriques ao primo nas treguas deValdevez 0 5 castellos que lhe tinha tomado (Chron .

Adef . 1 são dous factos que reciprocamente seillustram . A noticia recebida pelo chefe sarraceno era

relativa , sem ques tão , a successos posteriores a jornadade Ourique e portanto , a guerra do príncipe dos portugueses com O príncipe de Limia , sendo uma só , devia

2 90 H I STOR IA DE PORTUGAL

li cado 0 5 successos de Valdevez ; porque j á a 26 de

junho estava All'

onsoVII em Zamora (Doc . daEsp . Sagn,

T . 2 2 , p . Dos particulares exis te apenas uma

escriptura do de outubro de 1 139 em que é denominado inf ante (Dissert . Chronol . , T . 3

,P . 1

,n .

º 358) eoutra de 1 9 de agosto desse anno em que tambem 0

notario lhe dá 0 mesmo título (Escambo entre EgasGonçalves e Toda Egas : Tombo de D . Maior Martinsno Cartorio de Arouca

,hoj e no Arch . Nac .

,P . 1

,Doc .

1510 quanto aos documentos ; quanto , porém , as

memorias historicas ,nenhuma das indubitavelmente

coevas encerra a menor allusão donde se possa concluirque Af fonso Henriques fos se acclamado em OuriqueO monumento mai s antigo em que temos achado men

ção des sa particularidade é um extenso rolo de pergaminho do cartorio de Palmella

,contendo 0 5 artigos

apresentados ao papa pela ordem de Sanctiago em Portugal para se desmembrar da de Cas tella ( transcriptosno Livro dos Copos

,f . 53 , aliá s artigos offerecidos

no tempo do mestre Pero Escacho ( 13 1 6 a Ahi se

diz D . Al fonsus 1 .us rex in manu

po tenti conterendo sarracenorum barbaricam feritatem

in campo de Ourique a suis nobilibus et aliis communitatibús in regem assumptus es t Es te documento posterior quasi duzentos annos ao successo

,se não serve

para a h istoria ,serve para 0 5 amigos de tradições .

Offerecemos-lh'

o . E'

em especial digno de notar-se queessa circumstancia de ser eleito rei se omitta na Chro

ni ca dos Godos enf eitada (exemplar de Resende) , 0 que ,send0 as sas adverso a verdade da tradi cção , persuadeque as addições feitas nesta copia da chronica são anteriores ao seculo XIV,

aliás não escaparia alli .

anec

do ta da acclalnaçâo ,que pelo documento de Palmella

Vimo s que j á vogava no meado deste seculo .

A taes considerações accrescem as probabilidadeshistoricas . Se a batalha de Ourique não teve nem as

dimensões , nem a importancia que se lhe attribui ram,

desapparece todo O mo tivo racional de acclarnação ,

quer antes,quer depois do recontro . Além di sso

,0 5

sarracenos podiam disputar a Affonso Henriques 0 do

NOTAS 2 9 1

mini o de um ou de outro castello , de um ou de outroterritorio , mas O titulo de rei , de príncipe ou de infante ,de certo não , e por isso 0 resultado do combate nadatinha que ver com a questão polí tica da independencia .

Pelo contrario, em Valdevez O imperador achava-se

braços com 0 infante,e a causa da guerra era talvez

únicamente essa . As vantagens obtidas pelo príncipeportuguês offereciam-lhe ensejo accommodado paralançar fóra a mascara e quebrar os derradeiros e tenueslaços que 0 ligavam a coroa leonesa . Recordemo-nosde que em 1 1 38 , usando j á Affonso Henriques na maiorparte de seus diplomas do titulo de príncipe

,ao cele

brar 0 tractado de Tuy em julho desse anno , 0 abdi capara se intitular infante ( convenientia quam facit infan sportugalensis cum A . Ispanie imperatore ) e de que ,expedindo nesse mesmo mês , provavelmente ainda em

Tuy ,0 foral de Penella (Dissert . Chronol .

,T . 3

,P . 1

,

p . 1 1 3 , n .

ºse limita igualmente ao primeiro título

que adoptara . Não nos indica isto que Affonso VII,

quando era 0 mai s forte,não consentia seu primo

denominação de . prínc ip e dos portugueses, que, por 155 0

mesmo que era demasiado vaga, favorecia as suas pre

tensões ? Parece-nos que di f6 ci1n1 ente se achará outraexplicação aquelles documentos . Depois da j ornada deValdevez

,tomar Affonso Henriques O ti tulo de rei era

uma verdadeira reacção era annullar aomesmo tempoa letra e O espírito do trac tado de 1 1 37 . Foi isto , porcerto

,0 que elle fez , se a harmoni a dos documento s ,

das memorias coevas e de grandes probabilidades historicas tem alguma força contra tradições assas 1n 0

dernas em relação aos tempos a que se referem . Um

diploma original dos ultimos cinco meses de 1 139 em

que Affonso Henriques se denominasse rei destruirianos sa opinião . As diligencias que temos feito para 0

encontrar foram baldadas ; ou tros serão , porventura ,

mais felizes .

Não nos esquece 0 haver 0 A . das .D issertações dadopor suspeito 0 2 .

º dos dons documentos que acima citámos . Fez mais deu como taes todos aquelles em que

Affonso Henriques se denomina inf ante depois de no

2 92 H I STOR IA DE PORTUGAL

vembro de 1 136 . Num dos seus primeiros trabalhos decritica historica tinha elle estabelecido como regra geralque 0 [ilho do conde Henrique se intitulara inf ante de1 1 28 a 1 1 36 desse anno até 0 de 1 1 39 (batalha de Ourique ) pr incípe ; desde esta epocha em diante

,rei . Posto

semelhante principio a vista de um certo numero dedocumentos

,elle lançou na conta de suspeitos 0 5 que

fug iam a es ta classi6 cação e que não tinham outromotivo de suspeita senão modi fi carem a regra . Sem

que por is so desconsideremos as opiniões do nossomai s illus tre critico

,seja— nos líci to di zer que esta não

nos parece admissível . Ribeiro foi como O chefe e guiada eschola diplomatica e

,convencido por diuturna

experiencia de que nos nossos arch ivos não faltam documentos forjado s

,mostrou— se p or vezes severo de

mais , rejeitando c0 n1 0 suppostos ou duvidosos mui tosque nada tinham contra si

,senão 0 ppôre1n

-se a opini õeshistoricas geralmente recebidas . Aque11e sabio era essencialmente 0 homem da reacção contra 0 5 crendeiros e

'

falsarios e,como todos 0 5 homens de reacção , exaggerou

um tanto a critica . Não é evidente que , achando algun s ,bemque raros , diplomas anteriores a_

1 1 36 em que AffonsoHenriques se intitula pr íncipe e bastantes pos teriores aessa epocha em que se denomina inf ante , ;se1n que contraa genuinidade delles lhe occorresse outra duvida , resultava d 'ahi

,não 0 dá— los por suspeitos , mas 0 alterar a

regra e reconhecer que O uso destas diversas designações era modi ficado pelas circums tancias? O que jáacima advertimos mos tra bem porque no foral de Penella Affonso Henriques se inti tula infante assim para0 5 outros dar— se—hiam motivos analogos . Nesta materiamesma Ribeiro reconheceu a pos sibilidade das variações , acceitando como genuínos documentos partienlares posteriores a 1 13 1 em que é intitulado infante epríncipe , quando ,

não só por outros documentos , mas

tambem pelo tes temunho das historias coevas sabemosque desde esse anno O povo lhe chamava geralmenterei . Ainda depois d e 1 1 40 nos apparecem diplomas emque 0 novo monarcha se di z Affonso rei , príncipe dos

portugueses (Dissert . Chronol .,T . 3

,P . 1 , n

ºs 368, 371

2 94 H ISTOR IA DE PORTUGAL

Chronol . T . 3,P . 1

,n .

ºS 368, 371 e pela accumulação dos títulos de rei e p rínc ipe Ego egregius rex

al f'onsus gloriosissimi yspani e imperatoris nepos et consulis d0 1nni henrici et tarasie regine filius , dei vero providentia totius portugalensis provincie princeps esendo datado V idas aprilis era MCLXXVIII

,acha — se

entre 0 5 con6rn1ante5 0 ir1não do imperadorAffonso Vll,Fernando Furtado

,0 qual vinha no exercito de Leão e

foi um dos prisioneiros em Valdevez . Portanto , 0 filhobastardo de D . Urraca só poderia con6 1mar aquelle

diploma depóis do recontro , 0 11 quando se achava captivo no campo de Affonso Henriques 0 11 depois de con

graçados 0 5 dous primos,0 que é mai s provavel. Deste

modo 0 successo de Valdevez começa a aproximar— se

de uma data precisa ; pois 6 cam0 5 sabendo que precedeu a 1 0 de abril de 1 1 40 .

Na nota ( 1 ) a pag . 1 75, alludirnos ao documento de

30 de março de 1 1 40 (Arch . Nacion .

,Gav

'

. 6,M . nu .

,

n .

ºem que Affonso I se intitula rei , dando-o por

'

suspeito . Guiou — nos naquelle logar um curto apontamento que delle extrahiramos . Examinando — o de novono Arch ivo Nacional

,vimos efl

'

ectivarnente que lhe

erraram data ao transcrevê— lo na c0 n6r1nação de

A ffonso 11, porque nelle j íg ura j a

'

a rainha D . ZVIaf aldacasada em 1 1 4 6

SUJE IÇÃO AO PAPA , PA G . 1 88

Apesar de tantos escriptos que possuímos sobre adifúcultosa chronologia da nossa his toria , O lei tor temvisto quantas vezes ainda as opiniões mais acreditadasse affastarn da verdade

,até nas datas dos successos . O

complicado negocio da con6rmação do titulo de rei eda sujeição immediata a Sé apostolica

,offerecida por

Affonso Henriques para firmar separação de Portugal ,é um dos factos mais obscuros e di sputados na historia daquelle reinado . São 0 5 erros de datas uma das

NOTAS 2 95

causas principaes da obscuridade e das di sputas . Nacarta de Lucio H, pub licada por Baluzio (M isce11 .

,T . 2 .

p . 2 2 1 ) do arch ivo da igrej a Rutbenense (e não Ausci

tana,

“ como aponta J P . Ribeiro ) e por Viterbo (Blucidario

,T . 1

, p . 378) do archivo de Braga , di z O papa queAffonso l fizera homenagem ao seu predecessor Innocencio 11 nas mãos de Guido

,cardeal diá cono

,então

leg ado naquellas partes (em Hespanha ) . Se a carta deLuc io 11 é verdadeira (e logo veremos que não ha n1 0

tivo sut'

6 ciente para a suppôr fal sa) , devemos procuraruma epocha em que se realise a circumstancia de seachar Guido na Península como legado de Innocencio IIe de ser ao mesmo tempo conjun ctura propria p ara

A ffonso Henriques dar esse passo . Vej amos primeiroquaes foram as 1egacia5 do cardeal de Vico , Gui do , naHespanh a .

Sem di scutir se 0 subdiacono Gui de , legado em Hes

p anh a em 1 1 3 1,era 0 mesmo Guido de Vico , é certo

que es te , já cardeal diacono , se achava aqui legado em1 1 34 (Hist . Compost . , L . 3 , c . 39 e que es tava em

Roma no ann o seguinte ( ibid .

,c . e que voltou a

Pení nsula em 1 136 . Celebrado em outubro desse anno0 concíli o de Burgos , de novo regressou a Roma , dondena primavera de 1 1 37 escrevia ao arcebispo Ge1mi re5( ibid .

,c . 49 e 50 ) e onde subscrevia nesse an o em abril

as letras apos toLicas (Gioconius , Vitae Pontif . , T . 1 ,

p . Desde então O uni co legado , que encontramosna Península até 1 1 43 , é um ou tro Guido , não cardeal ,mas b15p0 lascurrense 11115 1 . Compos t.

, L . 3 , c . 57, eLivro Preto

,f . vindo extraordinariamente em 1 1 38

a convocar os bispos he5panl1 0 es para 0 concílio 11 1ateranense celebrado na quaresma de 1 1 39 (Mansi , T . 2 1

,

p . Por todo este período de 1 1 37 até 1 1 43 , não sófaltam absolutamente not icias do cardeal Vico en1 Hespanha

,n1 a s

,ainda

,achan1 0 -10 subscrexendo em Roma

as bullas pontilicias nos an os de 1 1 38, 40 , 4 1 e 42 (Ciaconins ubi supra ) .

Yepes ( Coron . de S . Benito,X0 1. 7 , App . escri t. 9 )

publicou um privilegio dado ao mosteiro de Valparay5 0por Affonso VU

, em cuj o fecho se di z : Facta carta

2 96 H I STOR IA DE PORTUGAL

donationis Zamore I V non . octob. tempore quo Gu idoromande eccles iae cardinalis concílium in Valleoleti cele

bravit et d á co lloqu ium reg is Portugaliae cum imperatore venzt . Era 1 1 7 5 Des te documen to deduziramAguirre , Pagi, Mansi e 0 5 outros collec tores de monumentos ecclesias ticos a existencia de um concílio de

Valladolid de 1 1 37 cujas actas se não podem encontrar .

E como se encontrariam,se tal concílio nesse anno é

evidentemente um sonho A data attribuida por Yepesao privilegio de Valparayso está errada . D . Thomas daEncarnação collocou aquelle concílio no anno de 1 1 40

(Hist . Eccl . Lusit .

,T . p . 69) sem nos dizer porque .

J . P . Ribeiro inclina-se a es ta data (Dissert . Chronol . ,T . 3 , P . 1

,n º 344 ,

nota ) , por se dar nelle 0 nome derei Affonso Henriques . Com effeito

,como poderia

Affonso VII chamar rei a seu primo em 1 1 37, quandoainda este se não arrogava tal titulo Mas não é só is to0 privilegio de Valparayso é datado de 4 de outubro , ea 1 0 deste mês de 1 1 37—estava Affonso Vll a _ cem legoasde Zamora nas margens do Ebro (Doeum . em Colmenares , His t . de Segovia , p . Accresce que nesse privilegio se encontra entre 0 5 con6r1nantes Petrus compostellanus archiepiscopus , e Diogo Gelmires Viveu até

1 1 39 (E sp . Sagr .

,T . 1 9 , p .

Vê — se , pois , que é indispensavel suppôr 0 concílio deVal ladolid pos terior a 1 1 39 . No anno

,porém

,de 1 140

Guido , que presidi u .a elle,estava em Roma como vimos

,

e não achamos memoria daquelle legado nos documen

tos de Hespanha nes te ann0,nen1 nos dous seguin tes .

As s im,como D . Thomas da Encarnação não nos diz

porque attribuiu a 1 1 40 0 concílio de Valladolid , deque

ninguem faz menção nes ta epocha , para rejeitar a sua

Opinião basta 0 infundado della .

No Livro Preto da Sé de Co imbra acham-se lançadasas actas de um concílio de Valladolid , celebrado anno

d ó incarnatione dominica MCXLIVpontij í catus D . P ape

Innocentiz secundi XI V presente D .

Guidone sante romane ecclesie cardinali d iacono , apos

tolíce sedis legato . São es tas sem duvida .as celebresac tas que ninguem pôde encontrar, porque , collocado 0

2 98 H I STOR IA DE PORTUGAL

tinu0 11 a fi car dependente do imperador, como se vêda doação re ferida pelo auctor da Hespanha Sagrada .

O mais crível é que Affonso Henriques , acceito por

Affonso VII 0 seu ti tulo de rei,cedes se no ponto da

independencia absoluta . O exemplo de Garcia de Navarra ,

cuj os d irei tos eram mais an tigos e legítimos , eque , por 6m ,

conviera em se considerar como vas sallodo príncipe leonês , devia induz i-lo suj eitar-se a uma

situação analoga . Sem is so , é incomprehensivel comoseu primo lhe concedesse 0 senhorio de Astorga e ,

porventura , de outros logares . rescripto do papaEugenio UI citado no texto con6 rn1 a — n0 5 na nossaconjectura

,qual temos por mais que provavel. Em

Valdevez só rigorosamente se haviam feito treguas ,reservando — se para tempo mais oportuno a conclusãode uma paz definitiva fecerunt paceni inter imperatorem et regem di z a chroni ca de Affonso VII

non absolute sempiterne , sed per aliquot armis , et

juraverunt eam ,ut i terum . dum pax esset f rmius pac i

j ícarentur e pouco depois accrescenta Fac ta est

pax inter i110 5 per multas annos Aqui temos , pois ,duas convenções di versas uma por a lguns an osoutra pos terior por muitos . Em 1 1 43 tinham decorridoalgun s annos

,e a propria chronica , apesar de não nos

dizer a data precisa da final concordia , harmonisacom os factos que resultam dos documentos . E porquenão se fez logo em Valdevez a paz defini tiva? E

'

evi

dente que havia condi ções para ella que era necessariodi scutir pausadamente , e es tas não podiam versar

,

quanto a nós,senão sobre dous pontos 0 da

“vas salagern ou não vas salagem da coroa de Portugal a deLeão

,e 0 das terras e senhorios que deviam consi

derar-se corno pertencendo ao filho e herdeiro de

Henrique e Theresa . Se vemos que O imperador cedeuquanto ao título de rei tomado pelo primo e quanto auma parte , ao menos , de senhorios que Affonso Henriques tin ha até certo ponto direito , porque havemo sde imaginar que es te não cederia da sua parte numavas salagem mais de nome que de subs tancia? Urnpundonor nacional pouco illustrado poderá fazer in

NOTAS 2 99

elimar a negativa ; mas a razão desapaixonada e friapersuade conjecturar 0 contrario . Que s igni fi ca ahomenagem feita immedi atamente pelo rei portuguêsao papa nas mão s de Gui do ? E ' claro que foi paraquebrar outra que , embora fos se pouco pesada , podi acomprometter algum dia independencia real dosseus estados . Imaginar que Affonso Henriques se fez

subdito ou homem do papa por s imples devoção econhecer bemmal as cousas e 0 5 personagens da idademédia . Nos exemplos que se podem citar de factosanalogos não se encontrará um só procedi do de sim

ples e espontanea vontade . Esta deferencia para com

a Sé apos tolica nascia sempre de uma necessidade ouconveniencia política ou das v

pretensões dos propriospapas apresentadas em conjuncturas di f6 ceis . Era

sempre uma nova dy nastia que tentava sanctifi car asua origem impura

,urn feudatario (nos paizes feudaes)

q ue sacudia 0 jugo de suzerano , ummonarcha electiy o,

cuja exis tencia politica se acharia,sem a pro tecção de

Roma , amercê dos eleitores , um príncipe , emfim , queprocurava defender— se com os raios da igreja con traos seus 5ubdi t0 5 rebe11ad0 5 . E ainda que es te caracterpoli ticamente hypocrita daquellas eras só teve com

pleto desenvolvimento no tempo de Innocencio III ,lembremo-nos de que já no seculo YII Pepin , pae de

Karl 0 grande , buscava legitimar a sua usurpação do

throno de Hild — rik,fazendo que 0 papa Zacharias trans

ferisse da raça dos Merwings p ara elle O titulo de rei .

Postos es tes fac tos e es tas datas , segue— se 0 examinarmos 0 caracter dos documentos relativos a homenagem feita á Sé apostolica . A sua veracidade impugnada habilmente nos tempos modernos , parece—nos

dever,

« apesar dis so , ser admi t tida . Determinada aprimeira epocha dos successos , as di ffi culdades que

se 0 ppunham á acceitação dos documentos em que se

funda a h is toria dessa homenagem desapparecern em

grande parte . A carta de 'Affonso Henriques ao papaque começa Claves regni coelorum é 0 primeiro monumento dos que chegaram até nó s relativos aquellahomenagem . Es ta carta foi publicada por Fr . Bernardo

30 0 11 151 0 11 1 11 DE PORTUGAL

de Brito (Chron . de Cister, L . 3 , c causa principaldo seu descredito ; porque 0 falsario , semelhan te ao

animal immundo , pollue tudo'

aquillo em que toca .

Brandão accei tou-a por genuína , reproduzindo-a (Mon .

Lusit . ,L . 1 0 ,

c . Viterbo (Elucidario ,T . 1 , p . 378)

publicou— a de novo , extrahindo-a do arch ivo da Sé deBraga e dando — a como verdadeira . Ultimamente ,J P . Ribeiro

,numa di ssertação destinada pulverisar

a ridícula carta de feudo ao mos teiro de Claraval , incidentemente combateu a genuinidade desta , persuad ido de que fora fabricada para corroborar

'

aquellainsigne impostura , devida a penna de Brito , de Lousada 0 11 de algum outro mentiroso da es cola dos dousfalsarios . Vej amos os argumentos em que se es triba aOpinião de que ess

'

outra carta ao papa é igualmenteforjada .

1 .

º Diz-se que este diploma dirigido'

a Innocencio

II fora extrahido do regesto de Lucio 11 . Não é naturalque

,mettendo— se de permeio entre Innocencio e Lucio

0 pontificado de Celestino II,se lançasse no reges to

de Lucio uma carta dirigida a Innocencio .

2 .

º Na subscripção do mesmo diploma , segundo acopia de Brito , lia-se 0 nome de Dominicus como bispodo Porto e , sendo a sua data de 1 1 42 (dezembro ) , naquella conjunctura quem presidia na diocese do Portoera Pedro Rabaldiz , não havendo nunca ahi bispochamado Domingos .

3 .

º Sendo a carta datada dos idos de dezembro da

era 1 180 ( ann o na edi ção de Baluzio suppõe— se

d irigida,não a Innocencio ,

mas a Lucio II,e a resposta

deste papa é datada das calendas de maio . E estauma prova clara de falsidade . Lucio só foi papa de

'

1 2 de março de 1 1 44 até 25 de fevereiro de 1 1 45. Nãose lhe podia

,po is

,escrever uma carta em dezembro

de 42 e , suppondo que se lhe d irigisse em dezembrode 1 1 44 , não podia elle responder em maio de 45,quando j á era fallecido .

A copia de Braga , publicada por Viterbo , apparece 0 0 111 a data de 1 1 81 (anno e confirmada por,

D . J0 50,b i spo de Coimbra . Nes te anno ainda Lucio II

30 9. H ISTOR IA DE PORTUGAL

idéa da homenagem nas mãos de Guido . Era precisoum título da suj eição , título que o cardeal devia apresentar em Roma . Não é muito se gastasse pouco maisde um mês com es te negocio . A carta redigiu se no1 .

º de dezembro de s se me smo anno . A quem foi elladirigida ?

Questão de pouca monta . Não a este ou áquelle

homem offerecia, principe submetter os seus es tados,

ma s sim a entidade papa ; S . Pedro,como então se

diz ia ; a uma potencia quem Affonso VlI nâo ousas sed isputar a supremacia sobre Portugal . Assim ,

di ziaelle na carta pz homenagem nas mãos do c ardealGuido meu senhor e meu pae o papa , e tambemof ereço mi nha terra a S . Pedro e á sancta igrej aromana e mais abaixo de modo

, que não recebanunca na minha terra o j ugo (potes tatem) de nenhumdom in io ecc les ias t ico ou secular

,senão o do s delegados

da Sé apos tolica enviados por ellaNa occasião da homenagem e naquella em que esta

carta se escrevia,epochas diversas

,segundo se vê das

palavras f ec i , off ero , era j á Cele s tino Il pontífi ce ; mas

a morte de Innocenc io 11 ainda , ao fazer s e caªrta

era provavelmente desconhecida em Portugal . Por mar

não é crível viesse a no tícia no coração do inverno ,num seculo em que a arte ,de navegar estava nain fancia ; por terra , às

_

di l'

fi culdades ordinarias dotransito

,á falta de postas ordinarias ajunctava — s e 0

rigor da e stação . As relações entre Roma e o occidenteda Hespanha deviam ser forçosamente tardias . Pelomenos a homenagem foi sem questão feita Innocencio lI crendo-o vivo

,suppormos es te acto prae

ticado dias depois da conferencia de Zamora , 0 queé necessario admittir di zendo Affonso Henriques no1 .

º de dezembro fi z homenagemGuido demorou-se na He spanha duran te ao menos

uma parte do cur to pontificado de Celes tino 11 . E' o

que se deduz de uma carta de s te papa ao arcebispode Toledo (Aguirre , T . 5

, p . e dos documentos doLivro Preto ( f

'

. 2 35 e 2 35 v . ) em que se Vê fazer elle emRoma confirmar por Luc io I I a s o lução que dera em

NOTAS 30 3

Portugal como legado de Innocencio I I às questõe s

que se agitavam entre o s bi spos do Port o e de Coimbra . E

' po r i s so de crer que elle só vie s s e apresentar carta de Affonso I (di rigida Innocencio ]Iem dezembro de 1 1 43 , porque se ignorava o seu fallecimento ) ao novo pontífice que succedera Cele s tinoII em fevereiro de 1 1 44 . Nada mais facil que , ao lançar

-se no regesto de Lucio II aquell a declaração dehomenagem , reduzirem di recção della ao papa queel

'

fectivamente recebera,até porque

,s endo datada

do 1 .

º de Dezembro de 1 1 43, não condi zia tambem

com o p onti ficado de Innocencio,o que de certo modo

auc torisava alteração .

A s s im desapparece O motivo de suspeição resultantede s e achar lançada a carta do rei dos portuguese s noregesto de Lucio II e igualmente di ffi culdade deconciliar a s data s . E s se papa podia responder em

maio de 1 1 44 a uma carta datada de dezembro de 1 1 43,ape s ar de ser escripta para um seu antecess or . Foraum homem que morrera e não o papado ,

e era este,era

á entidade moral,o papa

,que Affonso se dirigia .

No te-se agora que as duas copi as mais seguras destedocumento lhe attribuem data de dezembro de 1 1 81

( anno E'

a I .

ª de Braga,tirada do proprio t e

gesto de Lucio II , e examinada por Viterbo ; é 2 .

ª

que foi remettida ao Archivo Nacional em 1 84 I pelosur . Visconde da Carreira , pas sada por certidão ,

junc tamente com a resp osta de Lucio II,do apographo

authentico do regesto de Innocencio IV , que a s man

dou trasladar instancias do arcebispo de Braga emun ir com 0 proprio sello

,não para que tives sem

mais auctoridade do que deviam ter,mas para dar

testemunho , elle papa , de que eram authenticas non

ex hoc auctor itatem eis a l iam impendentes , n is i quodeas esse authenticas perhibemus . Deste modo Innocencio IV conúrma e explica o que j á Innocencio III asseverava na carta Sancho I

,que começa Serenita

tem regiam (Baluzius , Epistol. In'

nocencio III , lib . 1,

epis t . 99 , T . 1 , pag . isto é, que dos regestos pon

tíficios constava que Affonso fizera o seu reino cen

30 4 H I STOR IA DE PORTUGAL

sual á Sé apostolica,e is to

,segundo Innocencio 111

,

no tempo de Lucio II .

Mo s trámos acima que no regesto de s te p apa s epodia lançar a carta como di rigida elle

,ao pas so

que no autographo se mencionava Innocencio 11 .

Assim as copias deviam variar,con forme fossem ex

trahidas do rege s to ou do original , que provavel

mente existiu por mui tos annos e,talvez

,ainda exista

nos ar'

chivos apostolicos , que não é permittido exa

mmar .

Os que se ativerem á op inião de Ribeiro di rão queisto são conj ecturas . Mas são conj ecturas que se es

tribam em factos seguros e a que elle não attendeu .

Pelo contrario , para admittir que é falsa cartacumpre , não fazer conj ecturas verosimeis

,mas suppôr

quas i um milagre . Que ell a não foi fabricada pelosfalsarios do seculo XVI e evidente . Exi s te no regestode Innocencio IV

,que vivia no seculo XIII exi ste em

copias antigas nos archivos bracharense e ruthenense .

Como s e multiplicou e ste documento por tão diversoslogares crê— lo forj ado e , sobretudo , : comó crê-lo forjado em tempos moderno s? Ou mentem todos osdocumentos íncontroversos pelos quaes se conhece quePortugal pagava ou devia pagar um censo á Sé apostolica desde o tempo de Lucio II

,ou e ste censo se

estriba nalgum título . Se recusamos aquella carta ,aonde vamos buscar outro ? E ' o que valeria a pena dese nos dizer

,ainda que não fosse mai s do que por

conj ectura .

Resta di fíi culdade de se lerem variamente entreos bispos confirmantes os nome s dos bispos do Portoe Coimbra

,mas estes nomes facilmente se podiam

al terar nas copias achando-se escriptos só pelas ini ;c iaes . Além di sso

,sendo tantos o s tras lados e encon

trando— se certos esses nomes num ou noutro delles ,é nece s sario acredi tar que a ser o diploma forj ado ehavê-lo 0 falsario feito depositar em tão diverso sarchivos

,eraummentecapto para assim pôr es sa varie

dade de bi spos con firmantes,quando sabia quaes

eram os verdadeiros . Do mesmo modo 0 era ,se fez a

30 6 H I STOR IA DE PORTUGAL

cutor da vontade suprema . Neste sentido,semelhantes

palavra s,longe de pertencerem a tempos mais illumi

medos , pertencem áquella epocha e muito ella . Emgra nde numero de bullas ou cartas expedida s desde opontificado de Gregorio VII até o de Innocenpio [II selêem expre s sões equivalentes a estas , em algumasquasi exactamente as mesmas . Taes são as de Gre

gorio VII ao rei de Dinamarca (Mansi , T . 2 0, p . 244)

ut t ib i comm iss i a Deo regn icus todias a de Innocencio III Henrique de Iuglaterra (ibid .

,T . 2 1 , p . 424) exp edit ut regno, sive

ducatu,a div ina dispositíone t ib i e a de

Eugenio III Affonso VII,que fica citada no texto

(Idem ,ibid .

, p . 672 ) j ustitíam regn i t ib i a Dom inocomm iss i Assim as palavras notadas na carta deLucio II como provando sua falsidade tendem

,pelo

contrario, a mostrar que é genuína .

Quando um homem como J P . Ri beiro não achoumelhores provas contra genuím

'

dade daquelle documento que as acima refutadas

,é que ná realidade

não as havia . Cegava— o o desejo de d emonstrar impos tura da carta de feudo Claraval

,e por isso

combateu tudo 0 que lhe parecia ter correlação com

ella . Não era,porém

,nece s sario tanto . As allusões

ao apparecimento de Ourique , os confirmantes , oestylo e os caracteres extrínsecos do diploma bastavam para o condemner , não menos que imaginariacarta de Innocencio II Affonso I

,que

,na verdade

,

tem todos o s s ignees de ser forjada,como j á adver

timos .

Na mesma Dis sertação em que se impugnaram ascartas de A ffonso Henriques e Lucio II foi po s ta emques tão a fíirmativa de Innocencio III (Bulla Serenitatem reg iam) , de que até o tempo de Alexandre IIIO no s so primeiro rei fora tractado pelo título de duque(Pater tuas usque d á tempora f elicis memor iae Ale

xandri ducis esset nomine appellatus) . Aproveitaremos esta nota para illustrar esse ponto , em quetambem J P . Ribeiro nos parece ter-se affastado umpouco da sua natural exacção e criterio .

NOTAS 30 7

Diz elle que Innocencio IH affirma expressamente que Affonso I só usou do titulo de Dux até 0

tempo de Alexandre III .

Innocencio Ill não afíirma tal o que certifica é queo príncipe português f ora tractado pelo título de duque . Tractado por quem? Pela corte de Roma . Eraisto o que ,

como logo veremo s,Innocencio tinha ra

zão para a ssegurar .

2 .

º O s di plomas do reino e que nos podem indi caro titulo de que usava Affonso Henriques , e não otes temunho de Innocencio III .Os diplomas portugueses podem mo s trar— nos O

título que a si attribuia O príncipe ma s aquelle com

que era tractado melhor o podi a di zer Innocencio IIIque tinha á vis ta os regestos do s papas seus antecessores , tanto mais que a validade do titulo rea l sópodiam dar o s p ontifices

,segundo e stes o ' criam , e

não menos o crera Affonso I, que tanto s anuos dílí

genciou obtê-lo de Roma .

3 .

º E notavel que o titulo de dux s ó appareça em

um documento do governo do nosso primeiro rei,e

esse anterior ao anno de 1 1 40 .

Esta proposição é ambígua . Tomada “em relação

aos diplomas expedi dos pelo príncipe,é exacta . To

mada em relação a todos os documentos des sa epocha

,é fal sa . O s papas effectivamente

,

lhe chamavamdux depois de elle tomar O titulo de rei . Daremos algun sexemplos .Bulla de Lucio II

,de protecção ao mosteiro de

Sancta Cruz Qu icqu id etíam Alf onsus íllustris duxvob is concesserit (Livro Preto f . 2 45

Carta de Eugeni o III Affonso VII,citada no texto

e anteriormente ne s ta nota : quod a portugallensiumduce nos a l iqu id recep isse (Mansi , T . 2 1

, p .

Bulla de Alexandre II] (VI kal. aprili s índi c tione XIincarnat . domin . de protecção Alcobaça , coníir

mando-lhe em e special a posse daquelles bens , queAlf onsus portugallens is dux una cum Mahalda uxore

concess it (Cart. de Alcobaça no Arch . N acion ) .Eis aqui , pois , como por todo o periodo decorrido

30 8 H ISTOR IA"DE PORTUGAL

desde que Af fonso Heúriques tom'

o'

u o titu—ló de reiaté que Alexandre III lh 'o confirmou chancellaria romana não lhe deu senão 0 de duque

,em

conformidade com o que posteriormente af íi rmava

Innocencio III .

ULT IMO S VEST IG IOS DAS PRETENSÓES DE

AFFON SO fvu , PAG . 1 95

O que dizemos no texto como simples conj ecturaé O unico meio de explicar e concordar uma passagem de Rodrigo de Toledo e outra do rescripto de

Eugenie III Affonso VII que começa . In pastoramspecula com a materia da nota anterior

,a qual

,

assim entendi das,confirmam e illustram . Hic pri

mus diz o arcebi spo in POrtugallia sibi imposuitnomen regis

,cum pater ejus comes et

ipse dux anteadicerentur et ab Eugenio papa I II , cui regnum saumcons tituit censuale, multa pr ivileg ia et indulgent

'

ias

ímpetravit . No rescripto le— se seguinte passagem

petitiones tuas de Affonso VII ) pro expeditione con

tra inúdelium ty rannidem f acíenda ,lib enter admissi

mus et ad hoc ipsum faciendum in posterum cumhonore Domini paternae sun1us caritatis debito pre fparati . Bignum est igitur de caetero ut querimoniatua desis tas in eo videlicet , quod portugallensium

e 0 mai s que fica, citado pag . 1 98 notaVê— se deste s extrac tos que no tempo de Rodrigo de

Toledo,is to é , menos de um seculo depois do facto ,

se cria em Hespanha que fora Eugenio 111 que.

Affonso Henriques fizera a— homenagem

, 0 que m ostra ,quanto a nós

, que ne s ta conjunctura é que se divulgou existencia do ac to practicado anuo s antes . Pa

rece tambem deduzir— se d ahi que o rei portuguêsobtivera de Eugenio novas concessões e privilegio s

3 1 0 H I STOR IA DE PORTUGAL

segunda é inteiramente futil . As provas de que Santarem se tomou em 1 1 47 , e com probab ilidade em março

,

acham — se solidamente es tabelecidas p or Brandão (Mon .

Lusit .

,P . 3 , L . 1 0

,0 . ºf ) . Que importa , pois , que docu

mentos suspeito s,ou escriptores mai s recentes variem

na data,se este concorda com a verdade?E stribar— se

aquelle crítico para provar a incerteza do anno naChroni ca ci s terciense de Montalvo

, que a ttribue con

quista 1 1 44 , é na verdade extraordinario . O s unicosdou s his toriadores quasi coevos do successo que Montalvo cita emabono da sua opinião são Lucas de Tuye Rodrigo Ximenes

, em cujas chroni cas elJe criticopodia facilmente verificar que Montalvo fizera duascitações falsas

,visto que nenhum assignala data da

tomada de Santarem,e Lucas de Tuy nem sequer par

ticularisa este acontecimento . O 1 .

º fundamento paraduvidar da genuinidade da Noticia seria mais attendivel se fosse exacto . No codice 2 0 7 de Alcobaça , hoj e naBibliotheca Publica de Lisboa

,ha cousas de mão muito

mais moderna,mas nem a narrativa da tomada de

Santarem,nem 0 poema de Gosuino -o são . Assim as

consideraçõe s de Fr . Joaquim de Santo Agostinho carecem de fundamento s razoaveis . Veja — se 0 que dizemosácerca desta relação pag . 93 do s Por tugalíae Monu

menta H is toried Scr ip tores , vol. 1 .

O que poderia produzir suspeitas,se j á não exis

tis se 0 codi ce 2 0 7 de Alcobaça , seria a correcção com

parativa da phrase latina em que está escripta narrativa . Mas es sas suspeitas seriam destruídas , quandonão nos re s ta s se senão uma 0 0 pia moderna deste 111 0numento historico ,

pela concordancia delle com outrosmonumentos daquelle epocha recentemente descubertose,portanto

,desconhecidos dos falsarios do seculo XVI .

Tae s são O modo e particularidades do commettímento ,

que ahi s e fazem proceder de um plano previamenteas sentado

,0 que concorda com 0 systema que , segundo

O testemunh o de Ibn Sahib i — s-salat , de que noutro logardo texto fazemos menção

,Affonso I seguiu constante

mente,atacando os castellos sarracenos . Além de con

cordar com 0 A . da Vida de S . Theotonio (publicada

N OTAS 3 1 1

pelos Bollandj stas e mai s c orrectamente no s PortugalíaeMonumenta H is tor ia l Scr ip tores , vol . 1

, p . 11 0 es sencial de ser Santarem tomada por estratagema , temo sdi sso documento índi sputavel numa doação de Sancho I aos cavalleiros de Sanctiago (Cart . de Palmella11 0 Arch . Nacion . doc . original) de i ll is nostr ís domibusin quibus f acta est tarr is, per quam pater meus rex

Domnus Alf onsus , f elícís memor ie,Sanctaren f urtivê

intravít .

Uma das circumstancias que mai s contribuem paradar á memoria de Alcob aça um caracter de verdade é0 deprehender

— se do seu contexto que foi , não povoação ,

mas 0 castello 0 ponto accommettido na noite de1 5 de março . O logar por onde o s portugueses avançaram naquella arriscada noite índj ca-o bem ,

mas aindamelhor 0 di vidir O rei a sua gente e 0 enviar um troçoimpedir 0 soccorro externo do arrabalde de Seserigoutpraeoccupet callem, qui ven it de Seter ígo aliás Seser igo ne portae additus ab i l l is praeoccupetur Edri sidi z-no s (Versão de Jaub ert , vol. 2

, p . 2 9) Chantarín

est une v i l le bâtie sur une montagne três haute , d a m idide laquelle est un was te enf oncement. Il n

'

y point demurailles , ma is d a p ied de lamontagne est unf aubourgbâti sur le bord du fleuve . E ste bairro ou arrabalde

,

hoj e a Ribeira,pelo nome que lhe dá a memoria de

A lcobaça,é 0 mesmo a que ella allude . A denominação

de Seserigo dada á Ribeira de Santarem apparece numdocumento dos templarios de 1 159 (E lucidar .

,T . 2

,

p . 357 e ainda no Cancioneiro do Collegio dos Nobres

Ai senterigo ,ai senterigo !

Ai é Alfanx , e al Seserigo .

Es ta palavra é derivada de Sessega , que parece significar

,_nã0 qualquer as sento ou planície (como interpreta

Viterbo) , mas e spec ialmente O terreno á borda de umribeiro ou ri0

,proprio para cons truir azenhas (Doc . n0

Elucid .

, verb . Sessega , e no Direito Emphyteut . de LObão

, Append , p . 80 e nem s abemo s em que s efunda extraordinaria significação que J P . Ribeiro

3 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL

dá a este vocabu10 (Dissert . Chrono l . , T . 4 , P . 2, p .

nós,pelo menos

,nunca em ta l sentido encontrámos ,

A comparação do diploma de Sancho I, que acima

citámo s do cartorio de Palmella,com os artigo s o ffe

recidos pelos freires de Portugal para obterem separar ,

se do mes trado de Castella (Liv . dos Copos , f .

aliás prova de modo índisputavelque foi alcaçova

velha ou cas tello mourisco,e não a v illa

, 0 ponto amcado . Alludindo áquella doação de D . Sancho

, , dizemos freires concess it dicto ordini f ortellitium cum turre

et domibus alcaceoe veteris cas tr i Sanctaren, per quem

locum idem castrumf uit recuperatum a sarracenis Osfreires deviam saber onde era a propriedade que possuiam ,

e Sancho I 0 logar por onde seu pae aecommettera 0 castello .

3 1 4 INDICE

D . Urraca invade Portugal . Paz entre as duasirmans . Fernando Peres de Trava e 0 seu val imento . A ff onso VII succede D . Urraca .

Prime iras ac çõ e s d o infante Affonso fi lhod o conde Henrique e d e D . Th eresa . EntraAffonso VH em Portugal e constrange infantarainha re conh ecer a supremac ia de Leão .

Od io do s portuguese s contra 0 cond e FernandoPere s . Conjuração e revo lução . O cond e eD . Th ere sa expulso s . O infante apo ssa-s e dopod er . D . There sa morre d esterrada . Aprec i ação do seu caracter po lí ti co e do seu governo .

L IVRO I I

1 1 2 8 — 1 1 85

Prime iros annos do governo d e Affonso Henr ique s . Guerra na Galliza . Tentat iva d e ' reb e ll ião . Continuação da guerra . O cas te l lo d eCelmes fun dado e p erd ido .

-Allian ças de

Affonso com O re i d e Navarra e com al gunsfi da lgo s d e Galliza . V ictoria de Cernej a .

Perda d e Le iri a e de stro ço em Thomar . Pazde Tuy qom O imp erador Aff onso VII . Os

almoravid es e os almohade s . Jornada d eOurique . Renovação das d iscord ias com 0

imperador . Recontro de Vald evez . Paci fi

cação . Al gara dos sarraceno s . Le iri a e Tranco so d estruídas . Desb arato do s invasore s .

Affonso toma 0 ti tulo d e re i . Feudo aopapa . Circumstaneias do succe sso . Situação do s sarracenos . Alliança d e A ff ons o Icom Ibn

'

Kasi,e correri as dos christãos no

Gharb . Consorcio do re i d e Portugal.

Tomada d e Santarem

7 3 1 32

1 35 a 2 93

IN D ICL

' “J d

NOTAS

I . Cal e Portucale Portugal . .

II . O cond e SesnandoII I . Illegitímidade d e D . Th eresa .

IV . Começo do governo do conde Henrlque .

V . Destro ço do cond e Raimundo Juncto

Li sboaVI . Portuga l dado em do te D . Th eresaV I I . Data' da morte d o conde Henrique , etc .

VI I I . Hugo , b ispo do Porto .

IX . Supposta i nvasão do s sarracenos em 1 1 2 0 .

X . Tractado entre D . Th eresa e D . UrracaXI . Nascimento d e Af fonso Henrique s .

XI I . Façanha d e Egas MonizXIII . Revo lução de 1 1 28

XIV . Segun do casam ento d e D . Th eresa , supposto

XV . Desbar ato dos christãos em ThomarXVI . Batalha d e OuriqueXVI I . Destrui ção de Le iria e TrancosoXVII I . Af fons o I toma O titul o d e re i .

XIX . Suj e i ção ao papaXX . U ltimos ves tigios das pretensõ e s d e Af

fonso VII

XXI . Tomada de San tarem

INDICE DE ILLUSTRAÇOES

1 se Velha de Coimbra2 . Tumulo d o conde Sesnando na . Sé Ve lha de

Coimbra . (I llus tração portuguesa , 30 d e julho

3 . Cond e Henrique ( Tomb0.

d

o

a

.

86; de“

Sânc tiag ode Compos tella) .

3 1 5

31 6 INDICE

Igrej a d e S . Migue l d e Guimarães , onde é trad ição que fo i baptizado A ffonso Henriques .

Cas te l lo d e Guimarães .

Mo s te iro e Paço d e Sousa , ond e es tá 0 monum ento d e Egas Moniz . (I llustração portug uesa ,

2 7 d e Julho d eBaixos-re l evos do monumento d e Egas Moniz

,

em Paço d e SousaTumulo do cond e Henrique . Tumulo darainha D . Th ere sa

Espada que se guardaxa em Santa Cruz d eCo imbra como

z,

sendó d e Affonso Henriques .

(Museu da Academia de Bellas-Artes do

P orto) .

Cas te l lo de Le iri aCava l le iro d o tempo d e Aff onso Henriques .

(Archivo Nac ional Commentario ao Apoca

ly pse de Lorvão)Mo eda arab e , cunhada em Merto la por IbnKas i . (Seg undo um decalque do sr . D . Antonio Vivas , de

Uma forti fi cação d o tempo d e Aff onso Hen

riques . (Archivo Nac ional : Commentario ao

Apoca ly pse de Lorvão'

Sant arem . Porta d e Atamarma,demo l ida

em V i sta do exterior d a c idade . (Seg undouma antiga photog raphia .)

Mo eda W i sigothica d e Sisebuto , cunhada 11 0

Porto .

. TY P . A ILLAL'

D , A LVE S Cªª