disse, ficando morto o conde no campo da bata lha as
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L IVRO I
1097 - 1 128
Os districtos de Co imbra e Portugal pelo meado do
seculo XI . Os borgonheses Raimundo e Henri quegenre s de Aff onso VI . Governo do conde Raimun do emtoda Gal liza até Coimbra . Affonso VI estabelece ocondado ou p rovinc ia portugalense ao sul do Minho e
dá o governo del le Henrique .— A c ções deste até
par tir para Syria e sua vol ta Hespan ha . Designios
amb ic iosos dos dons condes . Morte de Raimundo e pre
tensões de Henrique .— Fal lece A ffonso VI . Consequen
c ias do successo . Procedimento do conde de Portugalnas discordias en tre Affonso I d
'
Aragão , rainhaD . Urraca
'
e o infante Affonso Raimundes . Ten tativasd
'
engrandecimento . Trai ç õ es mutuas Influencia da
infanta D . Th eresa ; mulher de Henrique . Morte deste .
Os seus intentos e politi ca . Lançou os al icerces da inde
pendencia de Portugal. D . Theresa dom inando nestaprovincia depois da morte do marido . Seus enredos e
&llían ça com Affonso de Aragão . D enominada geralmenterainha pelos subditos . Symptomas cada ve z mai s Vi si
veis das tendencias de Portugal para se desmembrar damonarch ia . D . Theresa reconhece auctoridade suprema
de sua irman D . Urraca . Ligada com os nobres de Gall iza faz —lhe depois guerra . Commettimentos dos sar
racenos pelo meio-dí a . D . Urraca invade Portugal .
Paz entre as duas írmans . Fernando Peres de Travae o seu val imento . A ffonso VII succede D . Urraca .
Primeiras acç ões do in fan te Affonso fi l ho do conde Hen
rique e de D . Theresa . En tra Affonso VlI em Portugale constrange infanta-rainha reconhecer a supremac ia
de Leão . Odi'
o dos portugueses contra o conde Fer
nando Peres . Conj uração e alevantamento . O conde e
D . Theresa expulsos . O infante apóssa-se do poder .
D . Theresa morre desterrada . Apreciação do seu caracterpo l ítico e do seu governo .
8 H I STOR IA DE PORTUGAL
5 limites dos estados de Fernando Magno haviam-se dilatado para o occidente da Península
,
conqu istadas successivamente Lamego , Vi seu , Seiae Co imbra A província da Galliza , cuj a f ronteira variava continuamente segundo os christãos
estendiam os seus domínios por esta parte maispara O sul ou tinham de retroceder diante dasarmas dos sarracenos
,muitas vezes victoriosas
,
dilatou — se , emfim,permanentemente até 0 Mon
dego . Coimbra, que ,
não só pela sua antiguidade e
grandeza relativa,mas ainda mais por ser militar
mente como a chave do territorio encerrado entreeste u ltimo rio e 0 Douro
,era uma povoação impor
tante,foi feita capital de um novo condado ou dis
tricto,cuj o governo O guerreiro principe confi ou
áquelle que 0 incitara proseguir por este lado assuas brilhantes conquistas .
Antes desta epocha , bem como as outras províncias da antiga monarch ia leonesa , Gallize era
regida por diversos condes cuj os territorios variavam ern extensao . A ' s vezes
,estes condes tinham
debaixo da sua auctoridade mais de um districto ;
às vezes eram suj eitos a um conde superior ouVice-rei da província . Entre estes governos , desde0 meado do seculo XI
,apparece 0 districto ou con
dado portucalense . Assim como Coimbra era apovoação mais notavel sobre 0 Mondego , Portucale ,
situado juncto ao Douro , era no seculo XI pela sua
situação Vizinha da foz do rio,pela sua antiguidade ,
que não só remontava á epocha dos Wisigodos mas
ainda ao tempo do domínio romano,e pela fortaleza
do sitio cabeça e principal povoação de um territorio que abrangia ao norte uma parte do litoral da
( 1 ) Vej a-se lntroducção ,D ivis . llI .
I O H ISTORIA DE PORTUGAL
moderna província do Minho e ao sul as terras queaté o Vouga se tinham successivamente conquistadoSesnando ou Sisenando ,
filho de David,rico
mosar abe da que hoj e denominamos província daBeira , senhor de Tentugal e de outras terras no
territorio de Coimbra,tinha sido introduzido na
corte de Sevilha no tempo de Ibn Abbad e,pelos
seus talentos e importantes serviços feitos ao principe sarraceno , chegara occupar o cargo de W&SÍI
'
no diwan,isto é
,de ministro ou membro do su
premo conselho do amir, que o distinguia partien
larmente entre os seus conselheiros . Sesnando
tornou-se temido nas guerras com os inimigos deIbn Abbad ; porque nas emprezas que dirigiaobtinha sempre prosperos successe s . O motivo por
que abandonou amir de Sevilha para entrar no
serviço de Fernando Magno ignora-se ; mas o seuprocedimento posterior persuade que alguma of
fensa recebida dos sarracenos isso 0 instigara .
Admittido na corte do rei de Leão e Castella , alcan
eon brevemente convencê-lo das vantagens queobteria invadindo 0 occidente da antiga Lusitania .
O resultado da invasão justifi cou as previsões deSesnando ,
e o rei de Leão retribui u o bom servi ço
que mosarabe lhe fizera,dando— lhe o governo de
um districto constituido com as novas conquistas ecom a terra portugalense ao sul do Douro , ao qualservia de limites
,pelo oriente
,linha de Lamego ,
Viseu e Seia , e de fronteira , pelo sueste , o pendorseptemtrional da Serra da Estrella Deste modoa parte do moderno Portugal ao norte do Mondego
( 1 ) No ta I no lim do vo lume .
(2 ) Nota 11 no tim do vo lume .
1 2 H ISTOR IA DE PORTUGAL
e do Alva estava possuída pelos christãos quandoFernando I fallecen O districto de Coimbra ,como dissemos , abrangia do Douro ao Mondego , e 0do Porto , desmembrada delle terra de SantaMaria (Feira) , dilatava-se para o norte e nascente ,abrangendo talvez o Alto Minho e para o orienteainda parte da província de Trás-os —Montes . In
elnido até ahi na Galliza'
,0 territorio denominado
nos documentos e chronicas dos seculos XI e XIIPortucale , Terra portucalens is , começa então afigurar como provincia distincte , postoque outrasvezes pareça continuar a ser considerado comoporção da Galliza e
,até
,tornar-se mais circums
cripto , o que tudo provinha da falta de limites permanentes nos diversos condados' ou governos em
que se dividia o reino de Leão e Caste lla , e dadiversa importancia que os respectivos condestinham na j erarchia administrativa , sendo umasvezes dependentes immediatamente do rei , outras ,
como j á observámos,de um conde superior ,
e speciede vice-rei preposto ao regimento de uma provínciainteira I ) .
Repartida entre os tres fi lho s de Fernando Magnomonarchia que elle tanto dilatara , coub e GarciaGalliza
,abrangendo Portugal e as novas con
quistas até 0 Mondego . Sesnando continuava adominar 0 territorio de Coimbra , emquanto 0 condeNuno Mendes parece governava o do Porto . Ellepelo menos foi o cabeça de uma rebellião dos povosdaquelle districto ,
o s portucalenses , contra Garcia ,que , encontrando — se com os levantados entre Bragae 0 rio Cávado
,os destroçou ,
como noutra parte se
( 1 ) Ribeiro ,D issert . Chronologicas e Cri ticas , T . 4 , P . I
,
p . 2 0 a 3 1 . Memor . sobre a ori gem e l imites de Por
tugal (Mem . da Acad ., T . Art . 2 e 3 .
L IVRO 1 1 3
disse,fi cando morto O conde no campo da bata
lhaAs discordias dos tres irmãos fi zeram passar suc
cessivamente coroa de Galliza da cab eça de Gar ciapara a de Sancho
,rei de Castella e , a final , para a
de Affonso de Leão , que ajunctou outra vez todosos estados de seu pae . Entretido com guerras nasprovíncias centraes da Península até se apossar deToledo
,elle deixou tranquillos por alguns annos
os sarracenos que estanceavam ao sul de Coimbra,
applicando-se depois da conquista da antiga capitalde Hespanha restaurar as povoações das fronteirasvizinhas do Donro . Porventura entre Sesnando e osmussuhnanos limitrophes alguns recontros haveria
,segundo parece indicá-lo o foral dado a
Coimbra por Af fonso VI ; 1nas as correrias e entradasdos christãos
-
no occidente da Hespanha só prose
guirem depois da morte do conde mosarabe succe
di da nos fins de 1 0 9 1"
'
Os fi lhos de Fernando I tinham respeitado ohomem a quem este principe confiara o regimentoe defesa do territorio chamado então colímbriense .
Sesnando serviu lealmente até 0 seu ultimo dia acausa da monarchia christan , que elle abraçara , eainda , segundo parece , acompanhou Affonso VI em1 086 á infeliz bata lha de Zalaka . Sua fi lha Elviracasara com Martim Moni z
,cavalleiro i llustre
,
( 1 ) Dedit D . Garseano totam Gallecíam una com totaPortugale Pelagius Ovetensis , Chron icon , p . 75 (edi ç . de
Sandoval) .— Sobre rebellião dos Portagalenses veja-se
Chronica. Gothorum era 1 1 0 9 , n o Appendice da 3 .
ªPart'
e da
Monarch ia Lusi tana , e o que j á fi ca dito na Introducção ,
Divis . I II .
(2 ) Acqui si ta urbe regia . resta uratis Oppidis et Civi tatiba s extremorum Dori i : Ruderi cus Toletanus , De RebusHispaniae, L, 6
,c . Diss . Chron .
, T . 4 . P. 1 , p . 31 .
1 4 H ISTOR IA DE PORTUGAL
quem por morte do conde foi dado o governo deCoimbra . Affonso entretanto , reparadas as forçasda monarchia quasi destruídas na j ornada deZalaka , resolveu ,
inimigo sempre incançavel dossarracenos
,accommettê-los pelo occidente
,pas
sando com 0 seu exercito na primavera de 1 0 93
para o sul do Mondego e indo pôr sítio Santarem .
Esta povoação importante,cuj a expugnação se jul
gava quasi imposs ível,não tardou cair-lhe nas
mãos,e dentro de poucos di as igual sorte coube a
Li sboa e Cintra,dilatando— se as fronteiras até a
foz do Tej o com essas novas conquistas , cuj o
governo foi dado Sueiro Mendes , irmão de Gon
çalo Mendes da Maia , tã o celebre depois com 0
nome de Lidador ( 1 )A Galliza ,
incluindo debaixo desta denominaçãoa extensa provincia portugalense , que naturalmente se devi a considerar como incorporado o territorio novamente adquirido no Gharb mussulmano
,constituía j á um vasto estado remoto do
centro da monarchia leonesa . O s condes que dominavam os districtos em que esse largo tracto deterra se dividia fi cavam assás affastados da acçãoimmediate do rei e eram assás poderosos para facilmente se possuírem das ideas de independencia erebellião communs naquelle tempo , tanto entre os
sarracenos como entre os christãos . Affonso VI pôdeevitar esse risco convertendo toda Galliza
,na
mai s extensa significação desta palavra , em um
grande senhorio , cuj o governo entregou a ' um
membro da sua fam ília , ao qual dera o governo de
(1 ) Livro Preto da Sé de Co imbra , f . 1 0 , 1 1 e 2 1 .
_ D i ssert . Chronol . , T . 4 , P . 1
, p . 2 9 . Rod . To let . , L . 6 , c . 32
ad tin . Chron . Gothor. era 1 1 31 , na Mon . Lusit .
, L . 8,
c . 7 .
LIVRO 1 1 5
Coimbra e Santarem logo depois da conquistadesta
,removendo para 0 di stricto de Arouca Mar
tim Moniz e suj eitando ao noV0 . c 0 nde 0 governador de Santarem , Sueiro MendesO principe quem Affonso deu 0 regimento
desta imp ortante parte da monarchia era um es
trangeiro ,mas estrangeiro illustre por sangue , que
vi era naturalisar — se na Hespanha , arriscandovida pelo christianí smo e pela monarchia leonesana terrível lucta que durava havia seculos sobre Osolo ensanguentado da Península . Raymond , Rei
mondo ou Raimundo , fi lho de Guilherme conde deBorgonha , tinha vindo Hespanha tempos antes ,porventura nos fins de 1 0 79 ou princí pios de 1 0 80
em companhia da rainha Constancia,segunda mu
lher de Affonso VI , ou no anno de 1 0 86,em que ,
segundo O testemunho da chronica lusitana ou dosgodos
,muitos franceses pa ssaram os Pirenéus para
a batalha de Zalaka,ou
, finalmente , ainda depoi s ,como outros pretendem . O rei de Leão desposouunica fi lha legitima que tinha , Urraca , havida darainha Constancia , com 0 conde borgonhês , postoque ella apenas saísse da infancia ,
e encarregou-odo governo de toda a parte Occidental da monarchia e da defensão daquellas fronteiras . A in fanta ,cuj a idade nessa epocha ( 1 0 94 ) não podia excedertreze ou quatorze
'
annos , foi entregue Raimundo ,
mas , segundo parece , debaixo da tutela e guardado presbytero Pedro , me stre ou aio da j oven princeza
(1 ) Chron . G 0 th0 r .
, ibid . D issert . Chron .,T . 4 , P . 1 ,
p . 2 9 .
(2 ) Flores , Reynas Catholicas , T . 1 , p . 2 31 e segg . Dissert . Chronol .
, T . 4 , P . 1 , p . 2 9 e 30 . Mondejar (Ori g . yAscend . del prínc . D . Ramon) pretende que o conde só
1 6 H I STÓR IA DE PORTUGA L
Além de Raimundo,outro nobre cavalleiro
francês passara Hespanha naquella epocha . Era
Henrique seu primo , de ascendencia não menosillustre que elle . Roberto chamado O idoso ,
fi lho deRoberto II e irmão de Henrique II rei de França
,
recebera investidura do ducado de Borgonha e ,
casando com Helie 0 11 Alice,filha do senhor de
Sernur,tivera della quatro filhos varões
,Hugo
,
Henrique , Roberto e Simão . Hugo,0 mai s velho
,
foi morto numa batalha sem deixar fi lhos .
segundo genito Henrique teve de Sibylla sua Inu
lber (filha de Reinaldo , senhor de Borgonha con
dado,
” e irman do conde Guilherme I,pae de Rai
mundo) quatro fi lhos Hugº., Endo
,Roberto e
Henrique . Era este ultlmo que tambem se achava
por esse tempo na Hespanha e que provave lmenteveio com Raimundo seu primo coirmão Buscavam
,porventura
,fortuna na Península
,onde no
meio de continuas guerras e conquistas se offerecia
amplo theatro para a ambição e para O desej o deadquirir gloria . Do mesmo modo que as acções deseu primo , as de Henrique , nos primeiros tempos .
em que residiu áquem dos Pirenéus , j azem sepul
tadas em profundas trevas , se é que não foi 0 principal motivo da sua vinda
,como ha quem O pre
tenda ácerca de Raimundo ,procurar um consorcio
viesse Hespanha em 1 0 89 , e os seus fundamentos não
são de desprezar . Na doação do mosteiro de Vaccariça áSé de Co imbra feita pelo conde Raymundo e sua mulherD . Urraca (Novembro de 1 0 94) entre d iversas personagensque con firmam apparece 0 presbytero Pedro mag ister
suprad icte j í lie reg is Liv . Pre to , f . 4 0 .
( 1 ) Anonymus Floriacensi s , em Duch esne, Hist . Francor .
Scriptores , T . 4 . D . Ribe iro de Macedo , Nascimento e
Genealogia do Conde D . Henrique , p . 89 . Art de Véri fi er
les Dates , T . 3 , P, 2 , p. 14 (ediç . de
L IVRO 1 1 7
illustre por intervenção da rainha Constancia suatia . Em tal caso essa vinda
' seria pouco anterior àepocha em que 0 obteve . E certo , porém , que no
princípio de 1 0 95 Henrique estava casado com
Tarasia ou Tarej a (Theresa) , fi lha bastarda de Affonso VI
,que
,além de E lvira ou Geloira
,aquelle
principe houvera de uma nobre dama chamadaXimena Nunes , ou Muníones A escaceza dememorias e documentos di vulgados sobre a his toriado nosso paiz na ultima decada do seculo XI apenasconsente uma luz frouxa e duvidósa , que mal deixadescubrir O fio que prende os successos daque
'
lla
epocha . O que parece resultar . da comparaçãoattenta dos diversos monumentos que nos restam , é
que Henrique começou a governar 0 territorio portugalense ainda , talvez , nos fins de 1 0 94 , ou principios de 1 0 95, e com certeza , pelo menos 0 districtode Braga ,
nos primeiros meses deste ultimo anno ,como conde dependen te de seu primo . Por maiscurto que supponhamos esse período de suj eição ;por mais raros que sej am os vestígios detal suj ei
ção , ella é indubitavel . Todavia , em breve a porçãodos domínios de Raimundo , desde as margens doMinho até 0 Tejo
,foi desmembrada defini tivamente
da Galliza para constituir um vasto di stricto á parteregido pelo conde Henrique . O s successos militaresoccorridos na primavera de 1 0 95 moveram ,
talvez,
Affonso VI a estabelecer esta di visão,sem a qual
era difâcultoso fazer a guerra na fronteira comenergia , estando 0 centro do governo da p rovínciaoccidental mais de cem leguas das raias mussulmanas
,muito além do rio Minho
( 1 ) D issert . Chronol .
, T . 3 , P . 1 , p . 30 , n . 9 1 , e p . 33,n . 98 e a nota I I I no fim deste volume .
(a) Nota IV no fim do volume .
VOL . II .
1 8 H I STORIA ml: PORTUGAL
Vimos como Alfonso VI dilatou as suas con
quistas para O sul de Portugal no anno de 1 0 93 ,
tomando em poucas semanas Santarem ,Lisboa e
Cintra , logares então os mai s importantes da quehoj e chamamos província da Estremadura . No anno ,porém , de 1 0 95 as cousas haviam ,
até certo ponto,
mudado . O celebre Seyr rex Cir das chronicas
christans ) general de Yu su f,tinha nos fins de
93 invadido os estados de Omar Ibn Alafttas amirde Badajoz , cuj os dominios comprehendiarn todo 0
Gharb ou occidente da Hespanha mussulmana atéa fronteira christan . Iaborah (Evora) , Chelb (Silves)e outros logares principaes haviam aberto as portasaos almoravides . Um historiador
'
arabe diz que domesmo modo Santarem e Li sboa lhes caíram nas
mãos . Quanto Santarem,0 foral dado a esta po
voação por Affonso VI em 1 0 95 não indica de _modoalgum que ella houvesse s ido perdida depois de1 0 93 e retomada de novo . Quanto , porém ,
a Lisboa,
não só a falta de um d iploma analogo,passado a
favor della,torna provavel tradição arabe , mas
tambem os successos posteriores parece confi rmarem-na . Em fevereiro de 1 0 94 Badajoz tinha-se ren
dido aos almoravides . Submettido 0 Gharb ,Seyr
dirigira as suas armas victoriosas contra 0 Cid Rui
D ias , que os arabes andaluses tinham tomado porcapitão e que cercara Valencia . Entretanto 0 condeRaimundo descera da Gallize e viera Coimbraacompanhado dos seus cabos de guerra e de uma
lnstrose companha de cavalleiros . Pouco depois deacabar no Gharb dynastia dos Beni Alafttas 0
conde residia naquella cidade , convocando , segundoparece , os homens d
'
armas e peões para prea zr ia ,
como então s e chamavam as entradas que tinham
por obj ecto , não só invadir 0 territorio inimigo , mas
tambem estabelecer-se definitivamente ahi . D e
L IVRO 1 1 9
Coimbra hoste christan marchou , provavelmentena primavera segu inte , para as immediações deLisboa
,perto da qual assentou os seus arrai áes . O s
sarracenos,unindo forças de todos os lados e
, por
ventura , ajudados por algumas tropas almoravides ,que lhes houvesse enviado Seyr , cercaram 0 condee rompendo— lhe 0 campo 0 desbarataram ,
ficandouma grande parte dos seu s soldados mortos ou captivos . Resulta deste successo que os christãos tinh amjá perdido 0 dí stricto de L isboa
,ali ás seria incom
prehensivel a vinde do conde com um exercito estaespecie de peninsula fechada entre e ampla bahí a doTejo e 0 oceano , da qual não podia fazer entradas ecorreriasnasprovínciasmussulmanas ao suldo rioEste desbarato de Raimundo concorreu talvez
em parte para que todo 0 territorio desde emergemesquerda do Minho até Santarem se desmembrasseinteiramente da Gall ize . Se não suppusermos devidoexclusivamente 0 consorcio de Henrique á influencia
“
da rainha Constancia , concessão de uma fi lhapropria , bem que illegitime ,
feita por Affonso VI aum simples cavalleiro , postoque i llustre
,parece
provar que elle merecera tal distincção pelos seusmeritos pessoaes e por serviços feito s na guerra ,servi ços que vagamente lh e attribue um s eu con
temporaneo Fossem,porém
,estes ou outros os
( 1 ; Nota V no fim do volume .
(2 ) el qual enquanto elr ey D .Alonso vevia nob lemen tedomó los moros , guerreando contra e l los ; por 10 qu alel d icho rey le dió com sua ( ij a en casamiento Coimbrae a la provincia de Portugal , que son fronteras de moros ,en las quales con -
el exercício batalloso muy nob lementeengrandescia su caballeria Chroni ca L
ª de Sahagun , c 2 1
em Escalona,Historia del Monasterio de S ahagun ,Appen
dice 1, p . 30 6 . Sobre a importancia desta chronica , escriptaem lat im por um monge anonymo
, que viveu na epochados successos que narra
, e da qual só resta uma an tiga
2 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL
motivos que guiaram O rei de Leão e Caste'
lla'
,é
certo que no anno de 1 0 97 Henrique dominava todo0 territorio do Minho ao Tejo , e os estados de Raimundo tinham recuado por esta parte para as fronteiras meridionaes da moderna Galliza .
Casando sua fi lha Theresa com Henrique , Affonso VI não se limitou a entregar a este 0 governoda província portugalense , corn a qual j á frequentemente se confunde nos monumentos dessa epocha 0di stricto colimbriense e 0 de Santarem
,debaixo do
nome commum de Portugal . As propriedade s regalengas , isto é
,do patrimonio do rei e da coroa
,
passaram a ser possuídas como bens proprios ehereditarios pelos dou s consortes . Assim O cava]leiro francês , que viera buscar na Hespanha uma
fortuna mai s brilhante do que poderia esperar na
patria , Viu reali sadas as suas esperanças,porventura
além daquillo que imaginamO s principes arabes da Andalusia tinham-se
ligado contra os almoravides depois que,pelas con
quistas de Badaj oz , este s se achavam -senhores detoda Hespanha mussulmana , á excepção do amirado de Saragoça , cuj o amir Ahmed Ab
'
u Jafar sou
bera tempo buscar alliança de Yu su f . O celebreCid capitaneava , como di s semos , os andaluses colli
versão , por ter perecido O original no grande incendio
daquelle famoso mosteiro , consul te-se 0 erudito Berganza ,
An tigp edades de Espana , T . º . , p . 5.
(1 ) E a estes b ens , que nos parece se ha-de entenderal lusiva celebre passagem da chronica de AHonso VI I ,fallando de Theresa ,
ded it maritatam Enrico comiti , c i
dotavit eammagnif cê , dans portugalensem terramj ure hered itario . Evidentemente 0 conde falava dess es b ens heredi tarios na doação Sueiro Mendes (Dissert . Chrono l . ,
T . 3 , P . 1 , p . Sobre a tradição de haver s ido 0 governode Portugal dado como dote d e D . Theresa , veja — se
no ta Vl no fim do vo lume .
LIVRO I 2 1
gados . Valencia cercada por elles rendeu — se e porintervenção de Rui D ias veio , emflm ,
reconhecer0 senhorio de Aff onso VI . Seyr não estava entretanto -ocioso esquipando uma poderosa frota , suj eitara aos almoravides as ilhas Baleares , dependentesaté então dos amires de Valencia e de Denia . Avi
sado pelo wali d '
Almeria da sorte de Valencia,O
general lamtunense di rigiu para allí a-
sua armadacom muitas tropas de desembarque e cercou-a pormar e terra . O Cid era j á fallecido , e os christãos
alli ados dos arabes andalnses , depois de um di latado cerco
, em que a perda de ambas as partesparece ter sido avultada
,abandonaram '
finalmenteValencia aos almoravides A tomada destaimportante cidade acabou com as resistencias dosmussulmanos hespanhoes ao domínio de Yusuf , eeste
,voltando Hespanha em 1 1 0 3 , só tracton
'
de
associar ao governo seu fi lho Aly ,sem intentar
nenhuma campanha importante contra os christãos ,contentando — se c0 1n ordenar se deixas se a cargodos naturaes guarda das fronteiras e com tomardiversas providencias para defensão e bom r egimento do territorio da Península suj eito ao seuimperioDurante os eunos em que estes successos occor
reram , guerra nas fronteiras de Portugal ou cessou ou reduz iu-se apenas correrias e devastaçõesmutuas de tão pouca monta que nenhuns vestigios.
deixaram nos monumentos daquella epocha . Hen
rique dedi cou-se , acaso , nos primeiros tempos aprover às mai s urgentes necessidades de uma pro
vincia assolada por tão continuas guerras ; mas a
( 1 ) Cond e , P . 3 , c . 2 2 e 2 3 . Annales Toled . 1 na Esp .
sªgu , T . ºf . p . 386. Yahya e Al-kodai e1n Casiri , T . 2,
p . 1 58 a 1 74 .
2 2 H ISTOR IA DE PORTUGAL
sua residencia nestas partes não parece ter sidodilatada . Os grandes senhores
,embora encarre
gados de importante s governos , quando as 0ccu
pações militares não tornavam ahi necessaria — a sua
presença,frequentavam corte do rei , e os proprios
bispos abandonavam por ella as suas dioceses . O
conde de Portugal , tendo feito no inverno de 1 0 97a 1 0 98 uma viagem á Gallii a para Vi sitar 0 celebretemplo de Sanctiago ,
achava-se em 1 1 0 0 e ainda em
1 1 0 1 na corte de Affonso VI . Postoque historiadas emprezas do rei de Leão contra os sarracenos edas represalias destes contra elle nos dou s ultimosannos do século XI sej a assás escura , todavia consta
que em 1 0 97 elle entrou em C onsuegra e que ossarracenos
,fazendo uma entrada para 0 lado de
Toledo,
recuperaram na occasião em que regressavam . D 'aqui se Vê que O rei christão aproveitavaausencia de Seyr
,entretido com a conquista das
Baleares,para assolar 0 territorio inimigo
,e que
os mussulmanos não cessavam de fazer entradaspelas fronteiras dos christãos . Os chefes sarracenosAly Ibnu-l—haj e Ibn Sakun tinham avançado com
um corpo de tropas para Castella e,segundo todas
as probabilidades,0 conde foi enviado repelli-los .
Atravessando , pois , as serras chamadas Montes de
Toledo , Henrique encontrou os inimigos nas immediações de Ciudad-real , perto da qual está assentadapovoação de Malagon . Travàram pelej a . Foi esta ,como se colhe das palavras de um historiadorarabe , disputada e sanguinolenta . Pelej aram — se
ahi d iz elle na sua linguagem emphatica as
batalhas do extermínio Mas por fim 0 conde tevede abandonar 0 campo aos seu s adversarios
(1 ) Sobre residenc ia do cond e junc to de A ff onso VI ,
de 1 1 0 0 a 1 1 0 1 , D issert . Chronol .
, T . 3 , P . 1 , p . 39 , nº1 1 5.
2 4 H ISTORIA DE PORTUGAL
ultramar . Seis anuos depois da primeira invasão,
em 1 1 0 1,uma segunda cruzada partiu para 0
oriente,cuj os successos desastrados não impediram
que novos peregrinos se fossem precipitar naquellevasto sorvedouro de quantos homens de fé Vivatinha a Europa e tambem de quantas fezes de cor
rupção ,cubiça e ferocidade havia nelle . Para as
almas crentes ou devoradas de remorsos Syriaera a piscina da rehabilitação moral : para os ambiciosos e devassos fonte inexgotavel de fortuna e dedeleites . As paixões boas e más ligavam-se numpensamento unico 0 demandar 0 oriente ; porquetanto a Vida como a morte offereciam ao que par tiauma perspectiva de felicidade .
O s espíritos receberam na Hespanha 0 impulso
geral da Europa ; mas as circumstancias peculiaresdeste pa iz oppunham
— se que este impulso produzisse os mesmos resultados . Envolvidos na luctacom os sarracenos , contra os quaes mal bastavamtodas as forças christans da Península , os hes
panhoes não poderam associar- se nenhuma dasduas primeiras cruzadas , salvo um ou outro cavalleiro
,de cuj o s nomes ás vezes se encontram vesti
gios nas memorias daquellas longínquas expe
dições . Todavia , depois da segunda cruzada 0
enthusiasmo pela peregrinação da terra sanctaadquiriu maior força . O exemplo dos bispos
,
alguns dos quaes emprehenderam por aquelle
tempo,além de muitos outros membros do clero ,
contribuira em grande parte para excitar esseaugmento de mal entendida piedade . Roma , queentão era , por assim nos exprimirmos
,0 fó co da
intelligencia humana nomeio de nações ainda semibarbaras e que vigiava pela segurança da christandade , mostrou-se illustrada e prudente , como e lla 0
sabia ser quando 0 proprio interesse não deslum
L IVRO 1 2 5
brava, prohibindo essas Viagens aos hespanhoes .
“
O
papa Paschoal I I por duas vezes ordenou expressemente que minguem destas partes as intentasse
,e
áquelles que seguiam caminho por terra para Jerusalem 0 11 iam embarcar na Italia constrangia — os
retrocederem ,i1np0 nd0 nas suas bullas silencio aos
que na patria ousassem calumniá-los ou infamá-los
por não haverem cumprido 0 começado propositoO conde Henrique não s e esquivou á influencia
da grande idea que agitava Europa . Como jádi ssemos , depois da mort e dó Cid e da perda deValencia guerra com os sarracenos tornou — se
menos violenta . Yusuf , voltando á Mauritaniadepois da sua ultima vinda á Peninsula ,
poucosobreviveu e seu âlho Abu- l— hassan Aly ,
entretido em firmar 0 proprio domínio na Africa,
deixou Hespanha num estado,senão de repouso ,
porque algumas memorias na de acontecimentosmilitares por estes tempos , ao menos comparativamente paci fica . Por todo O período d ecorridode 1 1 0 2 até 1 1 0 6 foi 0 maior fervor de peregrinaçõesá Palestina , e 0 exemplo do proprio primaz daigrej a hespanhola ,
0 arcebispo de Toledo Bernardo,
dirigindo— s e Jerusalem na primavera de 1 1 0 4 ,prova quão vulgar se tornara então esta romagem .
Tinha-o precedido 0 conde de Portugal ; porque asua partida para 0 oriente nos primeiros mesesde 1 1 0 3 é hoj e irrefragavel. Nessa viagem prova
(1 ) Acerca destas primeiras cruzadas consul te— se Gibbon,
Dec l ine an d Fal l of the Rom . Emp ire , c . 58, 59 , 60 .
Hal lam , Europe in Middle Ages , c . 1 , P . I . Wi lken ,
Gesch ich te der Kreuzzuge , T . 1 (Leipzig — Michaud ,
Histoire des Croisades , T . 1 e 2 .
'A bu lla de Paschoal I Ireferindo-se a outra an terior
,vem na Hist . Compos
tell . , L . 1 , c . 39 .
H I STORIA DE PORTUGAL
nte 0 acompanhou Mauricio,b ispo de Co im
lepois tão ce lebre pelas suas pretensões áapal e que por esta epocha consta ter partidoSyria . Presume
,e pare ce — nos que com razão
,
us nos sos ma is jud iciosos h i storiadore s que 0
aproveitaria para a sua passagem a armadaesa que em 1 1 0 4 ajudou B conquista»lemaida ( 1 )loções do conde no
todas as
L IVRO I 2 7
Até este tempo 0 genio e 0 caracter do e dePortugal ainda se não revelaram aos olho s queestudam os successos daquella epocha é vultode guerreiro que s e confunde com os autosoutros que então sabiam elevar-se pela 5
dade e valor no meio de uma ex istenciaunos combates . Os dote s que 0 distinguemão
que . nelle deviam imprimir educaç
aquellas eras semi-barbaras e 0 habitoé,O esforço e a perícia militar e
8 os podemos deduzir da alta situatado . que dessas poucas acçque delle nos cons ervaannos , porém . da sua vidaracter do conde tendem a de
e O pensamento dento aliás muipoderosos dade de tal arte
,
ue as de bom sol
ndo , casado com
Affonso VI p
2 6 H I STOR IA DE PORTUGAL
velmente 0 acompanhou Mauricio ,b ispo de Coim
bra , depois tão celebre pelas suas pretensões átiara papal e que por esta epocha consta ter partidopara Syria . Presume
,e parece-nos que com razão
,
um dos nossos mais jud iciosos historiadores que 0
conde aproveitaria para a sua passagem a armada
genovesa que em 1 1 0 4 ajudou Balduino á conquistade PtolemaidaAs acções do conde no oriente encobre — as escuri
dade completa ,e todas as conj ecturas este respeito
seriam infundadas . Unicamente ha certeza de queelle tinha voltado a Portugal em 1 1 0 5 e vivia na
corte de A ffonso VI em 1 1 0 6 . Nos anuos seguinte s ,até a morte deste principe , Henrique apparece residindo , ora juncto delle , ora em Co imbra , onde se
occupava em administrar 0 paiz e em restaurar ,
segundo O rei lhe ordenava . as povoações ermas oudestruídas pelas invasões successivas de christãos
e mussulmanos
(1 ) Annales To led . 1 na Esp . Sagr .
, T . 2 3 , p . 386 . Mem .
da Acad .
,T . 4 , P . 2 , p . 1 47 . Duchesne , H ist . Cardinal .
Francor . c it . por Baluz,V ita Mauriti i Burd in i (Miscell. ,
T . 3 , p . Mon . Lusi t .
, L . 8, c . 2 2 . Art de véri f .
les dates , T . 2 , p . 2 0 e 2 1 (ediç . de D izemos que a
partida do conde Henrique para 0 ori en te fora nos pri
meiros meses de 1 1 0 3 , porque só assim p ó de concordar Odocumen to do Liv . Preto f . 38 com 0 do Bezerro d '
Astorga
f . 79 (c itado por Sandoval , C in co Reyes , f . 94 , col peloqual se vê residir a inda 0 conde na corte do sogro emj ane iro desse anno . Na escriptura 1 38 do Appendice II Ida H is toria de Sahagun ( fevere iro de 1 1 0 4 ) em que flgura 0
conde como con lirmante com muitos b i spo s e magnates ,sendo uma doação d e part icular, só pôde entender-se que 0
seu redactor quiz ind icar al l i ex istenc ia daquelles prelados e senhores e 0 seu governo nos respectivos districtose dioceses . Rej e itada esta conc iliação ,
e necessario suppô
la fal sa .
(2 ) D issert . Chronol . , T . 3 , P . 1, p . 42 ,
n .
º1 26 e segg. No
L IVRO 1 2 7
Até este tempo 0 genio e 0 caracter do conde dePortugal ainda se não revelaram aos olhos dos queestudam os successos daquella epocha : é um vultode guerreiro que se confunde com os de tantosoutros que então sabiam elevar-se pela sua activi
dade e valor no meio de uma existencia de continuos combates . Os dotes que 0 distinguem são os
que . nelle deviam imprimir a educação propriadaquellas eras semi-barbaras e 0 habito da guerra ,
isto é,O es forço e a perícia militar e ainda estes
mais os podemos deduzir da alta situação a que 0
vemos remontado . que dessas poucas acções de certaimportancia que delle nos conserva a historia . Nos
ultimos seis annos ,porém . da sua Vida os linea
mentos do caracter do conde tendem desenhar— se
um pouco melhor,e O pensamento de fugir á suj eição
real,pensamento aliás mui commum entre os
senhores mai s poderosos da Península,é prose
guido pelo conde de tal arte , que descobre nelle ,ainda melhor que as de bom soldado , as qualidadesde político .
O conde Raimundo , casado com uma fi lha primo
genita e legítima de Affonso VI , possuidor de maisimportantes domíni os que outro qualquer conde damonarchia leonesa , muitos dos quaes lhe eramsuj eitos
,considerava necessariamente a coroa como
herança que a morte do sogro lhe devia trazer eque
,ate
,1he f0 ra pr0 1nettida ( 1 ) . O s grandes pen
savam por certo do mesmo modo ; ao menos os actospracticados por elles depois do fallecimento de Raimundo provam que a crença recebida , e com razão ,
foral de Tentugal de 1 1 08 d iz 0 conde g ne 0 dá j ussu reg is
domniAlf ons i , qui j uss it eam nobis hedíj ícare ci cons truere :
Liv . Preto,f . 2 1 3 v .
(1 ) Chron . Compos tell. na Esp . Sagr . , T . 2 0 , p . 61 1 .
2 8 H I STOR IA DE PORTUGA L
era que , fosse quem fosse O marido de D . Urraca,
esse teria de ser O verdade iro rei de Leão e Castella .
Uma circumstancia,porém , viera turbar ultima
mente as ambiciosas esperanças do conde de Galliza . Affonso houvera de Zaida , fi lha de Ibn Abbadrei de Sevilha , qual uns pretendem considerarcomo sua concubina
,outros como sua mulher legi
tima,um filho varão , 0 infante Sancho . O s senti
mentos da natureza e as considerações da politicapersuadem 0 que , segundo O testemunho de Rodrigode Toledo
,0 proprio rei confessara depois da morte
do infante,isto é , que 0 tinha na conta de seu unico
herdeiro Affonso começara a mani festar estasintenções ainda na meninice de Sancho , fazendo — 0
confi rmar os diplomas junctalnente com D . Urracae dando lhe desde logo 0 principad0 deToledoPor esse motivo se tornam provavei s as desintelli
gencias de Raimundo com 0 sogro,de que apparece
tradição nas chronicas desses temposDa solidão de um mosteiro situado na Borgonha
um velho monge influia então nos negocios mais
graves da Europa . Cluni era esse mosteiro ; Hugoesse monge . Durante sessenta annos Hugo
'
regera
aquelle celebre cenobio , cuj os chefes chegaram na
sua soberba considerarem— se como papas d0monachismo
,intitulando se abbades dos abbades .
Foi Hugo quem lançou os fundamentos deste podere grandeza . Elle era 0 homem em cuj o seio Gre
(1 ) ! nic a s haeres meus Rod .
,To let . , L . 6, c . 33. Qui
(scil . Adefonsus) quoniam viri lem non habui t sobolem ,
interf ecto i l lo (Sancio) de quo d iximus , etc . Anonym . Flo
riac . em Duchesne , T . 4 , p . 96 .
(2 ) Sandoval , Cinco Reyes , f . 94 e 56 .
(3) Flores , Reynas Cathol.
,T . 1
, p . 237 . Roder . To let .,
L . 6, c . 34 .
30 H I STOR IA DE PORTUGAL
que dictara as condições desse pacto . Eram estas
que os dou s condes lealmente respeitariam e defenderiam vida e a liberdade um do outro ; que Hen
rique,depois da morte do sogro , sustentaria fiel
mente O domínio de Ra imundo como seu unicosenhor sobre todos os e stados do mesmo rei contra
quem quer que fosse , correndo prompto ajudá- loadquiri— los ; que , no caso de lhe caírem primeira
mente nas mão s os thesouros de Toledo ,fi caria com
um terço e ceder-lhe-hia dou s que Raimundo pelasua parte , depois de fallecer O rei , daria Hen
rique cidade de Toledo com 0 seu districto , sobcondição que por e sse territorio que assim lhe concedia fi casse suj eito elle Raimundo e 0 tivessecomo dependente delle , e que depois d e 0 receberlhe entregasse todas as terras de Leão e de Castella ; que , se elguem lhes quizesse resistir ou fazerlhes injuria , lhe fi zessem ambos guerra ou come
çasse logo qualquer delles , até que 0 territorio fosseentregue a um ou a outro , e Raimundo dess eHenrique 0 que lhe promettera ; que , se Raimundoobtivesse primeiramente 0 thesouro de Toledo
,
guardaria para si duas partes,dando a outra
Henrique . Tal era substancia do tractado . Parece,
porém , que 0 conde de Portugal receava lhes fossedemasiado diffi cultoso assenhorearem-se da novacapitalda monarchia ou que esta tornasse cair empoder dos sarracenos ; porque se accrescentou aopacto um como artigo addicional
,em que Raimundo
affiançava nas mãos do enviado de Cluni que,no
caso de não poder dar Toledo seu primo,lhe daria
Galliza , não faltando elle em ajudá-lo apoderar-se de Leão e Castella , effeituando-se n ovacondição logo que Raimundo estivesse pacificosenhor de tudo
,e entregando — lhe Henrique as terras
de Leão e Castella que estivessem em seu poder,
LIVRO 1 3 1
tanto que fosse mettido de posse da GallizeAinda que a letra deste pacto sobre successão
da coroa indique bem claramente a menor importeueia que 0 conde de Portugal se attribuia em
relação ao de Galliza ,é evidente que , se tal tractado
chegasse a execução , a perspectiva do novo estado
que Henrique intentava fundar era mai s lisongeirano futuro que a dos que Raimundo ambicionavapara si . q uanto Leão e Castella ficavam limitados ao oriente .
pelo Aragão ou pelos territoriosmussulmanos que esta monarchia devorava poucoa pouco , 0 conde de Portugal dominaria ao sul quasitoda a fronteira dos sarracenos e achar— se-hia comocollocado na vanguarda da reacção chri stan . Era
sem duvida esta uma situação mais arriscada ; mas
a conquista do meio — dia da Hespanha facilitava— se
lhe grandemente ; porque , senhor dos districtos
contíguos á margem direita do Tejo,desde quasi
foz do rio até quas i sua origem ,e accrescentados
0 5“
pr0 prios recursos com es se novo senhorio quedevia receber de Raimundo e com uma porção dosthesouros de A ffonso VI
,poderia dilatar as invasões
pelo Gharb e pela Andalusia , que exclusivàmente
fi cariam entestando com os seus antigo s e novosdominios .
(1 ) c e lebre pac to successorio entre os condes de Gal
liza e Portugal não tem data . O cardeal Saraiva (S . Luiz,
Mem .
,
do C . D . Henrique , nas Mem . da Acad ., T . 1 2 , p . 49)
mostrou com bons fundamentos que não podia collocar-se
senão entre 1 0 96 e 1 1 0 7 . Nenhuns outros motivos provaveisda feitura de seme lhante pac to apparecem na h istoriadesse período senão as intenç ões visíve is de A ffonso VIde legar coroa ao fllho de Zaida . Estas inten ç ões tor
nam— se patentes em 1 1 06 (Sandoval , Cinco Reys , f . 94 e
e por i s so lhe suppomos esta data . O documento foipub l icado por A chery (Spicilegium , T . 3 , p . 4 18)
'
e entrenó s por J . P . Ribeiro , D issert . Chronol . , T . 3 . P . 1
, p . 45 .
32 H I STOR IA DE PORTUGAL
Ou O segredo sobre O pacto dos dou s condes nãofoi perfeitamente guardado , ou por algum actoexterno elles deram indícios dos seus desígniospouco ajustados pelos de Affonso VI . A accusação
de se haver mostrado algum tanto rebelde ao sogropesa sobre a memoria de Henrique , e Raimundodecaiu por esse tempo da graça do rei , ainda que
'
naoccasião da sua morte Affonso estava , segundoparece , congraçado com elle . A morte , com effeito ,
salteando 0 conde de Galliza no outono de 1 1 0 7 ,
inutilisou alliança dos dous primos e destruiu asesperanças que Henrique concebera de obter Odomínio de Toledo Não abandonóu ,
todavia , 0conde as suas idéas de engrandecimento e independenc ia ; os successos posteriores n0 — 10 revelam ; mas
nos dous annos que decorreram entre 0 fallecimento
de Raimundo e 0 de Aífonso VI ( 1 1 0 7 a 1 1 0 9) elleresidiu quasi sempre em Portugal na obediencia dosogro
,empenhado , talvez , nas correrias contra os
sarracenos que era costume fazer todas as primaveras
, que e stavam obrigados os homens d'
ermasou cavalle iros vilãos e que s e conheciam pela denominação de fossadoA enfermidade que conduziu Affonso VI á sepul
tura foi longa e aggravada nos u ltimos meses pela
(1 ) Comes coep i t aliquan tulum rebel lare non
tamen subtraxit homin ium toto tempore vitae suae Eu
cusque etenim cum gente sua mandatum ad ex erci tumet ad curiam veniebat , sed b enignitas imõ negl igentia Aldephonsi tanquam consanguineo et affini improvidedeferebat : Rod . Tolet . , L . 7 , c . 5. Comes Raimundus non
fuerat in regis oculis gratiosus . Id em , L . 8, c . 34 . Com
pare-se Hist . Compostell.
,L . 1
, c . 2 5.
(2 ) D issert . Chronol .,T . 3
, P . 1 , p . 45 e p . 49 e em es
pecial carta de A ffonso VI sobre a Vi l la Volpelíares , queJ . P . Ribeiro parece attribuir ao anno de 1 1 09 .
LIVRO 1 33
desgraçada sorte de seu filho Henrique haviaconceb ido , como O pacto feito com Raimundo e ossuccessos posteriores 0 provam , atrevida idea defi car senhor por morte do monarcha de uma partedos seus estados . Fallecido 0 conde de GalJi za ,
ambição delle , longe de enfraquecer ,punha , talvez ,
ainda,mais longe a mira . Poucos dias antes de ex
pirar 0 monarcha ,Henrique foi persegui — lo no seu
leito de morte . Ignoram-se até onde chegavam as
pretensões do conde ; mas sabe -se que elle saíra deToledo furioso contra 0 sogro moribundo Antesde morrer
,Affonso declarou unica herdeira da
coroa sua filha Urraca,e tal foi por certo a causa
da colera de Henrique e a origem do audaz proj ecto
que desde então formou de se apossar , não de uma
parte , mas de toda monarchia de Leão e Castella .
Apenas , porém ,constou que 0 principe , terror
dos sarracenos,não existia
,estes cobraram novos
brios . Os de Cintra, que reconheciam 0 senhorio do
conde , quebraram immedi atamente 0 jugo . Semelh
'
ante successo suscita ideia de que os mussul
manos do districto ao sul de Santarem , ultimapovoação que provavelmente fi cou por este lado em
poder do rei de Leão e Castella desde 0 desbaratode Raimundo em 1 065
,inquietados pelas algaras ou
entradas do conde , e por outro lado não tendo re
conhecido O domínio dos almoravides , como adiante
( 1 ) Veja-se a Introducção ,D ivi s . I II .
(2 ) dias an tes que c lrey íí ciese tin de vivir , nosê porque sana 0 discordia se parti ó ayrado del ; e por
que aques to era an si no e stuvo presente quando clreyqueria morir
, e disponía de la succession del reyno esteconde non era presente ; por 10 qual
, por zelo del reynomovido , traspasó los montes Perineos . p 0 r hab er ayudade los fran ceses , con los quales guarnec ido e escoltado ,
digo es forzado , por fuerza tuviesse el reyno de Espaúa
Anonymo de Sahagun , c . 2 1 .
VOL . 1 1 .
34 H I STOR IA DE PORTUGAL
veremos,se lhe fariam tributarios para viverem
em paz . Isto não passa , todavia , de uma conj ecturadeduzida principalmente dos successos posterioresporque os monumentos relativos a estes dous anuosdo governo de Henrique só nos provam que residiuuma ou outra vez em Portugal . Rebellada Cintra
,
Henrique marchou contra esse castello, que ,
na
quella epocha parece tinha uma importancia poucoin ferior á de Lisboa
,e de novo 0 reduziu á sua
obedienciaA morte de Affonso VI (junho de 1 1 0 9) pelas cir
cumstancias de que Vinha acompanhada , t0 rn0 u— seum successo gravíssimo para Hespanha christane foi , com razão
,sentida como origem de largos
males . O sceptro leonês , que deveria eaír em mãoscapazes de assegurarem as conqu istas feitas por
aquelle celebre principe , ficava pertencendo á viuvado conde Raimundo . Da vasta herança que legavasua fi lha , O rei fallecido separara de certo modo
Galliza , declarando em sua Vida que, no case de
D . Urraca passar segundas nupcias , Affonso Raimundes
,fi lho della e seu neto , ficaria reinando nesta
provincia . Contava 0 infante pouco mais de tresannos quando Affonso Vl expirou ,
e por isso á Galliza
,como ao resto da monarchia , faltava um suc
cessor capaz de defender a integridade do territoriocontra os commettimentos dos sarracenos e de conter a ousadia dos senhores poderosos
,cuj as antigas
ideas de ambição ,ou pelo menos de independen
cia,
fraqueza do thr0 n0 forçosamente havia dedespertar .
( 1 ) Men se Jul i o capta fui t Sintria comite D .
Audientes en im sarraceni mortem regis D . Al fonsi coepe
run t reb el lare Chron . Goth . ad aer . 1 1 47 . A 29 de
julho j á 0 conde se achava em Viseu , Liv . Preto,f . 28 .
L IVRO 1 35
Affonso I rei d'
Aragão estava nesse tempo na florda idad e e pelo seu genio guerreiro adquirira 0
appellido de lidador batallador) . A nobreza cas
telhana ,considerando . a necessidade de confi ar
defensão da patr ia commum um príncipe cuj onome e cuj a espada podessem enfrear os sarrace
nos , constrangeu rainha que 0 recebesse pormarido
,e as sim O rei aragonês obteve a coroa de
Leão e Castella Uma classe,porém
, poderosis
sima,0 clero
,recebeu mal este consorcio
,e boa
parte dos prelados hespanhoes declararam— se abertamente contra elle . Era a causa desse procedimento0 parentesco dos dou s esposos em grau prohi bido ,procedimento approvado pelo papa , que decretou 0
divorcio . Em consequencia di sto Affonso , que j á seachava em Castella com tropas de Aragão e cuj o careeter Violento mal poderia soffrer que 0 clero pretendesse despoj á— lo de uma coroa que tão facilmentealcançara
,começou a perseguir os prelados que
lhe eram adversos . O arcebispo de Toledo , que promulgara bulla do d ivorcio
,fi cou por quasi dous
annos expulso da sua sé . Igual sorte coube aos bispos de Leão e de Burgos
,e os de Palencia , Osma e
Orense'
foram postos ferros . Este s factos deviamali enar— lhe os animos dos leoneses e castelhanos ,quando para isso não bastasse 0 ser el le até certoponto estrangeiro . Desconfiado
,portanto , da leal
dade dos ricos-homen s e alcaides de Castella , 0
novo rei de Leão começou substitui — los nas tenen
(1 ) Rodrigo de To ledo diz ter s ido 0 casamento do rei
de Aragão com D . Urraca celebrado ainda em v ida d e
A ffonso V I .— Apesar do p eso que tem O testemunho deste
h istoriador , op in ião que seguimos funda— se na da H i storia Compostellana , L . I , c . 64 , g 1 , c om quem concordamLucas de Tuy ,
Chronica de Fleury e 0 Anonymo de Sahagun (c .
36 H ISTOR IA DE PORTUGAL
cias dos logares importantes por aragoneses , 0 queforçosamente contribuía para augmentar 0 desgostoe preparar a guerra civilEntregue ao conde Pedro Froylaz de Trava
,
fidalgo poderoso de Galliza ,0 in fante Affonso Rai
mundes Vivia nesta provincia esquecido no meiodos graves negocios que agitavam nação . Logo
,
porém, que ahi constou 0 casamento de sua mãe 0
conde de Trava tracton de realiser às ultimas disposições de Affonso VI ácerca do neto e com essefundamento fez alevantar Galliza receosa do dominio aragonês . Fora celebrado 0 consorcio de D . U r
raca durante 0 outono de 1 1 0 9 , e no princípio doestio do anno seguinte a revolução tinha tornado talincremento que O rei de Aragão resolveu invadi raquella provincia . O primeiro castello que tomoufoi 0 de Monteroso . En trado este
,um cavalleiro
i llustre chamado Pedro que ahí se achava lançou-s eaos pés de D . Urraca pedindo a vida : Conhecia— o
ella e quiz salvá — lo ; mas 0 feroz Affonso matou-ocom um venabulo naquelle mesmo logar . Esteexemplo de crueldade encheu de indignação os nobres leoneses e ainda mais a rainha
,que
,obrigada
ao novo consorcio,se via em poder de um d
'
espota .
Desde este momento ella tomou a resolução dedivorciar— s e confiada na indignação dos nobres , nareprovação dos prelados ao matrimonio que con
trahira e na resistencia da Galliza ao domínio ara
gonês Não di ssimulando 0 seu descontenta
( 1 ) Hi s t . Compostel., L . 1 , c . 64 , 55 2 e 3 , c . 79 , g 5.
Aguirre , Conci l. Hisp . , T . 5, p . 2 6 .
(2 ) Anonymo de Sahagun , c . 1 7 . His t . Compostel. , L . 1 ,
c . 64 . Fala-se neste ultimo logar de muitos nobres e
cavalleiro s mortos em Monteroso . A narração que vamo sfazendo parece — nos un ica possíve l para conc i l iar H istoria Compostellana com 0 Anonymo de Sahagun .
38 H I STORIA DE PORTUGAL
que decorreram dos fins de agosto de 1 1 1 0 aos finsde abri l de 1 1 1 1 em que nenhuma memoria combecida do conde Henrique existe em Portugal , antesparece regia O condado D . There sa na ausencia domarido Chegando aos estados de A ffonso I , Hen
rique achou ahi O rei aragonês . Temendo que estepríncipe
, que se julgava com direito á coroa leonesa
,sabendo os seus intentos , lhe atalhasse os
passos , procurou e alcançou alliar— se com elle . Foi
a condição da liga marcharem as suas forças contraD . Urraca
,procurando unidos conquistar as terras
de Leão e Castella e reparti-las depois igualmenteentre ambos . Depoi s deste pacto vemos , todavia ,Henrique voltar para Portugal , onde se demoroudurante uma parte do verão de 1 1 1 1
Para se conhecer a causa provavel desta Vinda eda volta subsequente do conde unir— se ao rei deAragão é necessario que atemos O fi o dos successos acontecidos durante a sua breve residencia emFrança e nas províncias orientaes da Hespanha . O
conde Gomes Gonçalves era um dos mais i llustressenhores daquelle tempo . Se acreditarmos 0 chro
nista Rodrigo de Toledo , ainda em Vida de Affonso VI elle pretendera , favorecido por uma parteda nobreza
,mão de D . Urraca . O velho monar
(1 ) D issert . Chronol . , T . 3 , P . 1 , p . 55 e 56. O documenton º
1 60 (ib id . ) que J . P . Rib eiro dá por duvidoso por ser
passado só em nome de D . Theresa ,expl ica— se assim
naturalmente e vem corroborar narrativa do Anonymo
de Sahagun .
(2 ) Anonymo de Sahagun , c . 2 1 Pe la narração destachronica parece ter come çado a guerra apenas fei ta a
l i ga de A ffonso I e do conde ; todavia os documentos dePortugal provam residenc ia do ultimo n este paiz emmaio e junho. A batalha de Camp o d
'
Espina entre os
dous alliados e 0 conde Gomes fo i dada em outubrodesse anno .
LIVRO 1 39
cha rej eitar'
a c0 1n indignação proposta , e os parciaes do conde viram-se obrigados abandoná-loneste intento . Suscitada pelos prelados questão dodi vorcio , elle sentiu renascer as suas amorte cidasesperanças . Ou fosse que entre Gomes Gonçalves eD . Urraca existisse atl
'
eição secreta ou que elle'
soubesse então accende-la no coração da rainha
, que
os escriptores contemporaneos nos pintam comopouco severa em costumes , O que parece certo é
que entre Affonso I e sua mulher rebentaram gra
ves di ssensões . Depois de espancar bruta lmente,
O rei de Aragão conduziu — a Castellar,onde a con
servon como presa , e resolveu-se acceitar 0 di vorcio . Temendo as consequencias desta separação ,tanto mais que Affonso tinha nas mãos de capitãesseus as principaes forta lezas de Castella , os nobres
que seguiam a corte buscaram e obtiveram congra
çar os dons esposos e atfastar por algum tempoprocella Mas O resentimento contra O maridohavia despertado 0 amor pelo filho no coração deD . Urraca retida em Castellar , e ella tinha enviadomensageiros incumbidos de recordar ao s nobres deGalliza 0 que Alfonso VI lhes fiz era jurar ácerca deseu neto , convidandoe s proclamarem-no rei nos
estados que O avô lhe legara no caso de sua mãe
passar segundas nupcias . Recebida esta mensagem
, os fidalgos gallegos encaminharam — s e Leãopara cumprir os desej os da rainha , quando souberam que ella se congraçara com O marido Asituação dos parciaes de Affonso Raimundes tornava — se assás melindrosa com este inopinado successo . Unidos de novo D . Urraca e A lf onso I , elles
( 1 ) Roder . Tole t . , De Reb . B isp . , L .
“
6 , c . 34 , e L . 7 , c . 1
e 2 H ist . Compost .
, L . 1,c . 64 , g2 .
(2 ) Hi st . Compost .
,L . 1
,c . 48.
40 H I STOR IA DE PORTUGAL
temiam tornarem — se unico alvo da vingança do im
petuoso aragonês , muito mai s que este não deviater esquecido 0 desar da sua primeira tentativacontra Gallize .
Na falta absoluta que se dá de notas chronologí
cas nas chronicas contemporaneas , O historiadormoderno que desej a acertar com a verdade vê-s emui ta s Vezes perplexo para assignalar ordem eligação dos acontecimentos . Quando Hespanhativer uma historia escripta com sinceridade e consciencia
,O período do governo de D . Urraca será um
daquelles em que 0 di scernimento do historiadorterá sido posto a mais dura prova Ligados
, po
rem , os acontecimentos que nos cumpre mencionaraos do resto da Hespanha christan , cabe-nos fazeruma parte desse trabalho , sem que nos sej a poss ivel examinar os archivos da nação Viz inha
,e somos
constrangidos deduz ir a nossa narrativa dos mo
numentos impressos . Procedendo por conj ecturas ,podemos não acertar ; mas ao menos no que eserevermos procuraremos harmoniser os documentosportugueses com as narrações das chronicas que
desse tempo nos restam .
Como já advertimos,
ida do conde HenriqueFrança e a sua volta ao Aragão não se podem collocar noutro período que não sej a 0 decorrido deagosto de 1 1 1 0 a maio de 1 1 1 1 . Foi por este tempo
que as dissensões de A ffonso I e de sua mulher che
garam ao ultimo auge e vieram declarada inimizade . O pacto do príncipe aragonês com 0 conde de
( 1 ) Um escriptor moderno (Romey) mui gabado pe losque não cons ideram as cou sas Senão pela superfície ,
esquivou perfei tamente as di l'
íiculdades que o fl'
erec e 0
tempestuoso re inado de D . Urraca . Limi tou— se escrevera h istoria do s estados mussulmanos nes se período e
esqueceu— se comple tamente da He
'
spanha christan .
ILIVRO 1 4 1
Portugal devia ser feito por essa occasião mas em
quanto os dons pensavam em dividir entre si 0 imperio de Affonso VI , D . Urraca buscava alliar -se
com os fidalgos de Gallíza,approvando os desígnios
delles ácerca da elevação ao thr0 n0 do in fanteAff onso Raimundes . Reconciliada
,porém
, rainhacom O marido por intervenção dos barões castelhanos
,a situação dos personagens mai s importantes
deste grande drama mudava inteiramente . Os interesses do rei de Aragão tornavam vincular-se aos
de D Urraca e, pelo contrario , os do conde liga
vam — s e naturalmente á cau sa do infante seu so
brinho e dos barões de Galliza . Estes,sabedores da
inopinada reconciliação e conhecendo,talvez
, que
ella era contraria aos intentos de Henrique , dirigiram se a este para que os aconselhasse sobre O modode saírem do passo dif ficultoso em que se achavam ,
victimas do caracter mudável de D . Urraca . Nãodevi a ser menor 0 despeito do conde que 0 dos ba
rõeé de Galli za . Aproveitou,pois , 0 ensej o que s e
lhe otferecia e excitou fortemente 0 conde PedroFroy laz que proseguisse na revolução favor doinfante , porventura com promessas de soccorro . Defeito , continuando no encetado empenho
,Pedro
Froylaz ,ao “voltar para Gallize com os outros fidal
gos,prendeu juncto de Castro Keriz (perto de Bur
gos ) alguns daquelles que , esquecidos das obriga
ções contrahidas pela promessa feita Aff onso VI ,não só se haviam bandeado com O príncipe aragonês ,
.
1nas até de accordo corn elle machinavam
morte do conde de Trava e do seu real pup i llo
( 1 ) Con sulem d i ligenti cura con suluerunt :
consi lio fortiter exci tatus consul Petrus quosdarnex i l li s qui jusjurandurn
'
íi lio comi ti scepit : Hist . Compost .
, L . 1 , c . 48. Ex istimans regno se
4 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
proced imento , porém ,de Pedro Froylaz fez reben
tar uma guerra civil na Galliza . Os fidalgos partidarios de Affonso d
'
Aragão trabalharam por vin
gar-se . Alcançando aprisionar condessa de Trava
em Sancta Maria de Castrello , aonde se acolheracom 0 infante , souberam tambem prender artifi ciosemente 0 depois tão celebre bi spo de Compostella ,
que,havendo até ahi seguido uma política vacillante
,
se declarara final protector de Affonso Raimundes ; mas 0 activo
'
prelado achou meio de obter alib erdade e de paci fi car temporariamente Galliza ,
attrahindo de novo á parcialidade do infante os
principaes fi dalgos que se lhe tornavam mostraradversos .
Henrique havia-se retirado neste meio tempo paraPortugal , visto que a paz entre os dous consortesannullava , ao menos temporariamente , as esperan
gas que havia fundado na concordia que , voltandode França , fizera com O rei de Aragão . Se elle tinhacalculado com a guerra civil na Galliza para divertir attenção da rainha e de seu marido , emquanto
ganhava forças , não só para constituir um estadocapaz de sustentar a propria independencia
,mas
tambem para realizar as miras ambiciosas de maisvasto dominio
,os seus calculos foram bem depressa
baralhados por novas e violentas desintelligencias
que em breve rebentaram entre Affonso e Urraca .
animo altivo ou antes 0 procedimento leviano darainha trouxe por fun uma ruptura decisiva . Pro
cure potiri si puer quoquo 1nodo traderetur neci quo
com item d ira machinatione p erditumire moliebatur : ID. , e . 64 , g 2 . A vol ta de Pedro
Froylaz p elo lado de Burgos prova indisputavelmente qu'
e
el le fo i ao Aragão consultar Henrique , e que na H i storiaCompostellana (ib id . ) onde Flores leu accersentes , se develer accedentes .
L IVRO 1 43
feriu-se 0 divorcio , e D . Urraca,chamando a si 0
seu velho aio Pedro An sures,0 conde Gomes Gon
çalves , 0 conde Pedro de Lara e . muitos outros se
nhores castelhanos e leoneses , começou com 0 rei deAragão uma lucta que , com poucas interrupções evaria fortuna , durou muitos annos . As relações quetentara já estreitar com os parciaes de seu filho naGalliza renovaram-se então com mais pró spero re
sultado , e ao passo que Leão e Castella se declaravam geralmente favoraveis á rainha
,Affonso , 0
lidador,via as suas forças quasi reduzidas à s do
Aragão e às dos fidalgos e cavalleiros aragoneses
que poderam conservar -lhe fié is alguns logaresfortes , cuj os alcaides eramE evidente que O estado polí ti co da Hespanha
mudava completamente em relação ao conde de Portugal . A concordj a de D . Urraca e dos defensoresde Affonso Raimundes ligava outra vez 0 vastocorpo do imperio de Affonso VI que ameaçam des
pedaçar— se . Por outra parte
,convertida guerra
civi l em guerra estrangeira , vi sto que pelo facto dodivorcio O príncipe aragonês tinha de a sustentar ,
não como legi timo senhor de Leão , Castella e Galliz a contra subdi tos rebeldes
,mas como rei de Ara
gão contra um paiz alheio,pouco era de esperar
,
attenta desigualdade dos recursos , lhe coubessevictoria
,apesar da sua actividade e esforço . Nesta
conjunctura é mai s de crer que elle tentasse realisar O pacto celebrado com 0 conde de Portugal e
que este esquecesse facilmente O passado para denovo correr após as suas amb iciosas esperanças .
( 1 ) et muni tiones e regime naturali dominaereddiderunt Rod . To let . , L
'
. 9 , c . 1 . Adhuc mun i tioraloca in Castellae terminis detinebat Id . ih . c . 2 . Vej ase Hist . Compost , L . 1 , c . 64 e segg .
44 H I STOR IA DE . PORTUGAL
D 'aqu i nasceu, em nosso entender , prompta união
de AH'
onso e de Henrique para guerrearem D . Ur
raca . Mas , antes que falemos dos resultados dessaliga
,cumpre-nos narrar successos que interessam
especialmente,não só 0 conde de Portugal , mas
ainda mai s de perto 0 paiz que elle regia .
Abu-l— hassan Aly succedera , como j á dissemos ,seu pae Yusu f no vasto imperio da Mauritania e daHespanha mussulmana em 1 1 0 6 . Depois de aquietada rebellião de Yahya wali de Fez , elle passara0 Estreito ( 1 1 0 7) mai s para ordenar as cou sas do
governo nas províncias da Europa que para proseguir na guerra sancta . No anno seguinte , porém ,
tornou a passar d'
Africa resolvido accommetter
A ffonso VI . Seu irmão Temin ganhou celebrebatalha d '
Uclés,e muitos logares fortes lhe caíram
nas mão s ; mas esses triumphos custaram rios desangue aos sarracenos . Aly pouco depois voltou
'
à
Africa , e as suas conquistas não se dilataram para :
O interior dos territorios de Leão e Castella . Todavia
,0 amir almoravide , seguindo 0 exemplo de
Yu suf s eu pae, incançável em combater os inimigos
da sua crença , pas sou de novo O mar , dizem que
com cem mi l cavalleiros , no verão de 1 1 0 9 ,e come
çando guerra no outono desse mesmo anno , proseguiu — a por todo 0 seguinte até O princípio de1 1 1 1 , em que voltou à Africa , por junho ou julho .
Foi esta uma das campanhas mais fataes para oschristãos . Ao passo que Aly invadia os territorioscentraes e
,tornando successivamente Talavera
Madrid , Guadalaxara e mais vinte e sete castellos ,
vinha sitiar Tnledo ,0 amir de Saragoça marchava
contra O rei de Aragão que havia posto cercoTudela
,e 0 celebre Seyr . Ibn Abi Bekr marchava
para 0 occidente . As narrativas dos historiadoresarabes revelam— nos neste ponto successos ante
46 H ISTOR IA DE PORTUGAL
no anno antecedente algumas forças almoravidestinham passado 0 Tej o , fazendo uma entrada na
moderna Estremadura . O conde de Portugal , vendo0 activo general lamtunense combater e reduzir . as
principaes povoações do antigo emirado de Badaj oz,
enviara tropas que reforçassem guarnição de Santarem . Marchavaln descuidados os homens d '
ermasdo conde ; acamparam num sitio denominado Vatalandi e começavam a levantar as tendas para repousar quando d
'
improviso um grosso corpo de serracenos
,sabendo que era pouco avu ltado O numero dos
christãos , os atacou , passando provavelmente 0
Tej o . Salteados assim repentinamente,estes foram
destroçados“
com grande mortandade , fi cando no
campo Suario Fromarigues , que os capitaneava , eoutro cavalleiro notavel chamado Mido Crescones .
Na primavera do anno seguinte Seyr , submettidas
as cidades mais importantes do Gharb,pôs cerco
Santarem , qual se rendeu em maio ou junhodesse mesmo anno
,e nada induz a crer que 0 conde
soccorresse este ponto extremo dos seus domíniosou que ao menos tentasse inquietar os sarracenos Foi , todavia , durante estes dous meses
( 1 ) Conde , P . 3 , c . 2 5. Abdel-halim (aliás Ibn Abi
Zará ) , Hist . dos Sober . Mabom . , p . 1 78— A Chr0 n . G0 th0 r .
(naMon . Lus . , T . 4 , f . 2 72 v . ) põ e a tomada de San taremnos tins de mai o
, e o Chron icon Lamecence (nas D i ssert .Chronol . , T . 4 . P . 1
, p . 1 74) nos fins de junho . Conded iz Syr
-ben — Bekir tomó las ciudades de Zintiras , Badaj oz , Jabora , Bortecal y Lisbona , y todos los pueb los quetenían ocupados los christianos , o no habían tomado la voz
de los a lmoravides Conde , ibid . Seyr retook the citiesof Shan tireyn , Batalió s , Bortokal, Yeborah and Alisbúnaband purged the who le of those western provincies fromthe íilth of the in fi dels Al—makkari
,Versão de Gayangos ,
Vol . p . 30 3 . Al—makkari colloca es tes successos em 1 1 1 0 ,
0 que não concorda com a data estab elecida pelos chro
nioons christãos .
LIVRO I 7
que Henrique residiu em Portugal , depois de sua
volta de França e do Aragão e antes de se ligarde novo com A ffonso I para , a guerra contraD ,Urraca . Um d iploma exarado no mesmo dia em
que,segundo chronica dos godos , Santarem caía
em poder dos mussuhnanos alguma luz derramapara se descortinarem as causas que tolhiam aoconde 0 soccorrer as suas fronteiras meridionaes .
É elle 0 foral de Coimbra . Sesnando , attrahindo
para alli população chri stan , não organisara 0
municip io,contentando — se os novos habitadores
com lhes ser assegurada por um título geral a
posse hereditaria das propriedades rusticas ou urbanas que se lhes distribuíam . D epois , por quasimeio seculo , Coimbra fora a capital de um districto
,
e ainda no tempo de Henrique se podia considerarcomo a principal cidade do condado ou provincia dePortugal ; mas uma t radição , que os documentoscontempora neos parece confirmarem ,
nos assegura
que o genro de A lfonso VI estabelecera em Guimarães sua corte
,se tal se pôde dizer de urna resi
deneia incerta e quas i annualmente interrompida .
Coimbra, postoque ,
como v imos , fosse frequentadado conde
,0 qual por vezes fez ahi larga assistencia ,
tinha , como todos os logares principaes , governadores proprios suj eitos elle , segundo 0 systemahierarchico da monarchia leonesa . Estes governadores com os seus offi ciaes provavelmente vexavam0 5 habitantes , que não possuíam ainda os largosprivi legios municipaes attribuidos j á nessa epochapovoaçõe s menos importantes . Segundo parece
poder concluir-se das allusões obscuras do diplomaa que nos referimos , os moradores de Coimbra
,
opprimidos por uns certos Munio Barroso e Ebraldoou Ebrardo ,
talvez chefes mi litares,talvez exactores
de fazenda,amotinaram— se , expulsando-os da cidade .
48 H I STOR IA DE PORTUGAL
Devia succeder isto durante a ausencia do conde .
Voltando,elle se dirigiu a Coimbra ; mas os habi
tantes resistiram-lhe , e Henrique teve de pactuarcom elles . O resultado destes successos foi obterapovoação uma carta de foral com amplos privilegios ,especi fi cando-se as contribuições e declarando — seexpressamente quenemMunio Barroso , nem Ebraldotornariam ser admittidos dentro dos seus muros ,e que 0 conde
,satisf eito de 0 haverem emflm rece
bido,poria em esquecimento tudo 0 que contra elle
tinham até aquelle dia practicadoEntretanto Seyr
,fortificada e guarnecida Santa
rem e as outras praças tanto de christãos com0 demussuhnanos submettidas por elle ao imperio almoravide
,voltara para Sevilha . Entrado em avançada
idade,este celebre capitão ahi fallecen pouco depois .
sem poder continuar no occidente da Peninsula
guerra que por este lado parece lhe estava partienlarmente incumbida . Com a sua morte Portugal
( 1 ) Car ta aos povoadores de Coimbra , nas con firmaç õessuccessive s de A ffon so VI de 1 085 e 1 093 , Liv . Preto ,
f . 7 .
Vi ta B . Geraldi , c . 8,em Baluz . Misc .
, T . 3 , p . 185.
Doç . A . Tibaldi , ern Figue iredo ,Hist . de Mal ta , T . 1
,
p . 1 7 . Este documento é dado como suspei to por J . P .
Rib eiro (Dissert . Chronol . , T . 1 , p . mas não tendocaracter algum de falsi dade à excep ção da data errada ,
esse erro se pôde suppôr commettido pe lo copista, por ser
um traslado do sec . 1 3 . Estaço, Var . Ant .
, 0 . 1 2 . Mon .
Lusit L . 8, c . 1 5. Foral de Coimbra d e 2 5 de mai . de
1 1 1 1 no Liv . Preto , f . 9 v . e f . 2 39 . Colimbriam nunquamdabo per alkavallam (aliás cava llariam) al ieni . Non in troducam Mun ium Barrosum vel Ebrardum (aliás Ebraldum)
Promi ttimus non tenere in mente vel corde
malam voluntatem vel iram de hoc quod nunc usque
eg is tis adversum nos , sed habeb imus gratum quo d co l l ig is tis nos , et honorabimus vos sicut mel ius potuerimus ,et nunquam in vestra re vel in vestri s corporibus habeb i tis deshonor vel perdida ib id .
LIVRO 1 9
respirou , e as correrias (10 5 sarracenos dirigiram — seprincipalmente contra a província de Toledo , cuj ascercanias , tendo debalde tentado tomar aquellacidade
,deixou taladas 0 wah de Cordova
,Mezdeli .
A Hespanha christan offerecia então O tristeespectaculo de que tantas vezes foi theatro antes edepois destes successos . q uanto os infiéis invadiam as fronteiras
,a guerra civil encruecia cada
vez mais no seio della . Era Do mesmo tempo em
que os almoravides faziam recuar as fronteiras dePortugal que os condes Gomes Gonçalves e Pedrode Lara
,lisonj eados com 0 valimento da rainha e
esperançados ambos de que 0 divorcio de D . Urracalhes abrisse O caminho do throno
,ajunctavam os
partidarios desta para accommetterem O rei ara
gonês , que durante a sua passageira reconcili açãocom a rainha se apoderara de Toledo Como j áobservámos
,liga entre 0 conde de Portugal e
Affonso I renovou— se naturalmente por estes meses ,e Henrique , apaziguada rebellião de Coimbra ,
apressou-se ir ajunctar-se com 0 seu alliado .
Uni dos ambos , pouco tardou que chegassem umencontro decisivo com os leoneses e castelhanos . Os
condes Gomes Gonçalves e Pedro de Lara vieramesperá — los em Campo d
'
Espina ,poucas leguas ao
nordeste de Sepulveda,n0 districto de Segovia .
Lara , apenas começada pelej a , fugiu ,deixando 0
conde Gomes luctar só sinho com as forças deAffonso I e do seu alli ado , que 0 venceram e mata
(1 ) É l— Rey d'
Aregon en 1 4 d ias kal. de Ma io entrô en To
ledo e regno'
era MCXLIX Annal . Tol . 1 ad ann . 1 1 1 1 na
ESP. Sagr , T . 2 3 , p . 387 . Vej a— se 0 que a este propositoob serva Berganza (Antiguedades , T . 2 , p . attendendo áescriptura n º
1 2 do App . do 7 .
º vol. da Chronica Benedictina de Yepes .
VOL . I I .
50 H I STOR IA DE PORTUGAL
ram Obtida esta victoria (novembro de Orei de Aragão passou 0 Douro e invadiu 0 territorioleonés . Entretanto O bispo de Compostella Gelmires ,com os principaes fidalgos e cavalleiros de Galliza
,
dirigiram— se á cidade de Leão para ahi acelamaremAf fonso Raimundes . Soube -o O rei de Aragão e ,
marchando ao encontro delles , accommetteu— os (Pimproviso entre Astorga e Leão n0 logar chamadoFonte d *
Angos ou Viadangos . Depois de tenaz resistencia ,
os gallegos foram destroçados , e Gelmires ,enviando O moço principe para a fortaleza d
'
Or
sillon na Caste lla , onde então se achava D . Urraca,
retirou - se com as relíquias das t ropas gallegas paraAstorga e , demorando - se ahi apenas tres d ias
,
voltou Compostella ,fazendo um largo rodei0 ,
afun de evitar 0 encontro dos vencedoresNesta facção , porém , interviera só O rei aragonês
abandonado Já pelo conde de Portugal . Immediatamente depois da batalha de Campo ( 1 Espina 0 exer
cito dos dous alliados entrara em Sepulveda . Os
fidalgos castelhanos recorreram então aos meneios
( 1 ) Era MCXLIX,VI I kal. Novemb . Rex Adefonsus Ara
gonens is et Comes Enricus occiderunt Comitem D . Gomes
in campo de Spina : Annal . Complut . ad ann . 1 1 1 1 na
Esp . Sagr ,T . 2 3
, p . 3 1 4 . Lucas de Tuy (Chron . Mundi naHisp . Illustr . , T . 4 , p . 1 0 3) diz que Gomes Gon çalves forapreso e depo is morto pe lo conde Henrique . Veja-se Rod .
To le t .
, L . 7 , c . 2 .
(2 ) H ist . Compo stell. , L . 1, c . 68, g2 . Flores estabelece
para data destes successos 0 outono de 1 1 1 0 .
— C0m 0
advertimos na nota VI I no fim do volume , chronologia
da H istoria Compostellana é errada . Lucas de Tuy, Ro
drigo X imenes e todo s os h istoriadores p õem 0 recontrode V iadangos d epois do de Campo d '
Espina . Os annaes
Complutenses Hxam es te em outubro de 1 1 1 1 , 0 que é
conlirmado pe los Annaes Compostellanos na ESp . Sagr . ,
T . 2 3, p . 32 1 .
L IVRO 1 51
occultos para os dividir . Mandaram afeiar Hen
rique 0 haver-Se unido ao inimigo commum da mo
narchia contra os outros barões de Leão e Castella .
Pediam — lhe que se apartasse do aragonés e queviesse ajunctar as suas forças ás delles
, pr0mettend0
fazerem—no'
seu chefe nestas guerras e induziremrainha repartir fraternalmente comelle uma partedos estados de Affonso VI . Alguns fidalgos
,aos
quaes 0 prendi am laços de antiga amizade , invocavam,
até,
. as recordações do passado para mais 0moverem . Cedeu , emíi rn ,
0 conde á estas suggestões ,e para não despertar as suspeitas do rei de Aragãopretextou a occorrencia de negociosque o chamavamaos seus domínios Então , partindo de Sepa lveda
,veio ao castello de Monzon onde se achava
rainha , qual confi rmou as promessas feitas aoconde pelos barões seus parciaes . Esperando ass imver realisados os desígnios de engrandecimento queconcebera
,Henrique não tardou declarar — se pelo
partido de D. Urraca Esta , apenas seu fi lhochegou ao castello de Orsillon ou de Monzon
,dei
xando 0 entregue a alguns cavalleiros em que
mais confiavà,partiu para Galliza , atravessando
as montanhas de Oviedo no coração do inverno,
postoque este fosse naquelle anno rigorosissimo .
D'alli encaminhou — se na primavera de 1 1 1 2 (4 ) paraAstorga com as tropas da Gallize
'
e enviou mensa
( 1 ) Cas i corno quien va a ver sus heredades , part ió — se de
el— rei Anonymo d c Sahag .
,c . 2 1 .
(2 ) Parece que é 0 mesmo a que na H istoria Compo stellana se chama Orsillon ,
na Castel la Ve lha , onde a
rainha se achava quando se deu a batalha de Viadangos .
(3) Anon . de Sahagq c . 2 1 .
(4 ) Pro fecta e st per gravia itinera et laboriosos montes ,frigidosque n ivibus e t glacie p raeteritae h iemis Hist .Compostell .
,L . 1 , c . 73 .
y
0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
geiros às Asturias , Castella e aos districtos meridionaes de Leão , ordenando marchassem paraaquelle ponto todos os que se lhe conservavamfi éis . Mas Affonso I , que entretanto tinha engrossado 0 seu exercito com os soccorros de variaspartes
,ao mesmo tempo que chamava novas tropas
do Aragão,marchou cercar Astorga . Sendo
,
todavia,destroçados pelos castelhanos os cavalleiros
aragoneses que vinham ajudar os sitiadores , Affonsoalevantou O sítio e retirou — se para 0 f0rte castellode Penafi el Entretanto 0 conde de Portugalajunctava os seus homens d
'
armas emquanto astropas da rainha convergiam das Asturias
,de Cas
tella e das Estremaduras para se reunirem comella . Estas forças capitaneadaspor Henrique , ao qualacompanhava D . Urraca
,avançaram para 0 lado
do castello de Penafi el nas vizinhanças de Valladolid e puseram lhe cerco . Era 0 logar forte e bemdefendido
,e 0 assedio prolongou-se . ( ) s sitiadores
n0 emtanto occupavam— se em assolar e roubar os
territorios circumvizinhos que se dilatam pela
(1 ) Anon . de Sahag .
,c . 2 1 . Hist . Compostell . , L . 1 , c . 73 .
As duas chron icas contemporaneas de Sahagun e Com
postella parece con tradizerem-se e até certo ponto não concordam entre si . A primeira omitte o s successos de Via
dangos e d'
Astorga e dá a entender que A ffonso I , sab idamudan ça do conde de Portugal , se retirara para Pena
fi e l , emquanto segunda 0 faz acolher— se Carriondepois do cerco d
'
Astorga . Nó s atemos— nos ao unico
arb ítrio que nos parece razoavel . O si lencio de uma das
chronicas não basta para recusar a narrativa da outra,
sendo ambas coevas , e por isso , não havendo impossibilidade de tempo ou de logar que 0 proh iba , procurámos
l igar os successos contidos numa e noutra . Quanto ao sitiopara onde se retirou O rei d
*
Aragã0 seguimos 0 anonymo
d e Sahagun , que escrevia mais perto do theatro ,daguerra .
54 H ISTOR IA DE PORTUGAL
nominalmente O castello de Ce ia sobre 0 rio domesmo nome , que tocara ao conde , lhe foi logoentregue , e resolveu-se que elle , ajudado peloshomens d
º
arlnas da rainha marchasse apoderar-sede Zamora
, que era uma das terras mais importantes das que lhe tocavam e que provavelmenteestava então pelos aragoneses . As duas irmans
deviam entretanto recolher-se á cidade de LeãoTaes eram as intenções patentes de D . Urraca
,
mas bem diversas as occultas . Aos cavalleiros que
iam na companhia do conde ordenou em segredo
que ,t0 1nada Zamora
, não lhº
a entregassem ,e ao
mesmo tempo mandou prevenir a guarnição dePalencia de que , se A ffonso I para alli se encami
nhasse lhe abrissem'
as portas . Depois disto diri
giu— se v illa de Sahagun
,cuj os habitantes eram
fautores daquelle príncipe e por isso facilmente ospersuadiu fazerem 0 mesmo . D 'ahi
,separando — se
primeiro de D . Theresa ,recolheu-se effectivamente
Leão , conservando — se no emtanto condessa dePortugal no celebre mosteiro de Sahagun ,
contracuj os monges corno senhores da v i lla 0 odio dosburgueses era grande e causa do seu af ferno á parc ialidade aragonesa . A partida de D . Urraca , abandonando alli irman
,parece ter sido resultado de
accordo secreto com O rei de Aragão , porque este
( 1 ) Se acred itassemos um documento,
achado ultlma
mente , esta divisão ter-se — hia realisado . E 0 foral de Aukaem c opia do seculo X I I I e sem data ,
d ad o por D iogoVermudez 0 tenens de Auka em n ome do conde Henriquee de D . Theresa . No preambulo desse foral narram — se as
guerras de D . Urraca e do re i de Aragão ,e como a fi lha
de A lfonso VI por conselho do s seus barões dividiu Oreino com 0 cunhado . O que não é faci l é d izer onde era
Auka . Veja-se Collecc ion de Fueros y Cartas Pueblas por[a H. Academia de His toria , Cata logo , pag . 32 Madrid 1 852 .
(2 ) Anon . d e Sahag .
, c . 2 1 .
L IVRO 1 55
entrou de repente na vi lla ,e sabendo que D . The
resa fugira , mandou após ella tropas que perse
guissem , mas que não poderam alcançá-laA noticia da traição de D j Urraca brevemente
chegou aos ouvidos de Henrique , ta lvez pela bocada infanta sua mulher fugi da de Sahagun . É facilde suppôr qual seria a indignação do conde ,
vendo-se assim“
escarnecido e transtornados os seusdesígni os . Os nobres de Leão e Castella , quemsobretudo era odioso O domíni o do rei de Aragão ,
mostraram- se inclinados favorecer Henrique , desapprovando O procedimento da rainha . Aproveitou0 conde esta irritação dos animos e com os outrosbarões off endi dos resolveu proseguir contra os dous
guerra que'
até então tinha feito unicamente aopríncipe aragonês .
D . Urraca partindo de Sahagun pouco tempo -se
demorara em Leão , aonde O marido se foi unircom ella , havendo— lhe saído baldada tentativa daprisão de D . Theresa . Sab ida esta nova
,0 conde de
Portugal e os barões seus alliados marcharam
pôr sitio á Carrion,para onde A ffonso e D . Urraca
tinham entretanto voltado . Breve , porém ,acabou
0 assedi o,porque di z um escriptor contempo
raneo os nobres , além do respeito que deviam áfi lha de Affonso VI
,estavam certos de que , attento
0 genio do rei aragonês , poucos dias durariaconcordia entre elle e sua mulher .
*
ão parece estemotivo 0 mais provavel para as sim ab andonaremempreza ; mas , fosse essa ou di versa causa dosuccesso , é certo que Henrique se retirou com os
outros nobres que elle se haviam assoc iado
( 1 ) Anon . de Sanag . , c . 2 1 .
(2 ) Idem ,c . 23 .
56 H I STOR IA DE PORTUGAL
Se attendermos que O cerco de Pena fi el , de queacima fallárnos e a que precederam diversos acontecimentos posteriores á batalha do Campo d'
Es
pina,só poderia veri ficar- se no verão de 1 1 1 2 ,
osvariados successos que havemos referido deviamoccupar o outono deste anno . Quaes fossem ,
porém,
as acções do conde depois de levantado O cerco deCarriqn nenhum monumento contemporaneo n0 -10diz . E crível andasse empenhado em obter pelasarmas ou por outro qualquer meio o s senhorios
que sua cunhada lhe cedera para trahir causa dorei aragonês . Entretanto este , cuj a reconciliaçãocom D . Urraca não era senão um calculo de cubiça ,
apenas se achou livre do cerco" procurou affastá - lade si . Com promessas lisonj eiras e por intervençãodos seus habeis conselheiros alcançou
,emfim,
re
so lvê- la ir administrar 0 Aragão emquanto elleficava ordenando as cousas da monarchia leonesa .
Partiu com effeito rainha ; mas pouco tardou a
receber novas das violencias que nos seus estadoscontinuava practicar O marido . Desde então resolven - se voltar ; mas , seguindo 0 exemplo deAtl
'
onso, que soubera crear um partido entre cas
telhanos e leoneses , buscou iguaes allianças entreos subditos delle
,chamando a si alguns nobres ara
goneses descontentes , ao mesmo tempo que trabalhava po
r crear ou renovar sympathie s em Leãoe Castella . A lfonso I
,sabendo que sua mulher
regressara , pensou em embargar-lhe os passos , oudesvanecendo ira de que ella vinha possuída ouprendendo — a
,se as circumstancias 0 permittisscm .
Nem uma nem outra cousa obteve . A parcialidadeda rainha engrossara ponto de se fazer temer, e aconfiança nos seus parciaes animava D . U rracaabandonar 0 systema da dissimulação. As discord ias renovadas entre os dou s consortes chegaram a
LIVRO I
termos de separação e logo de guerra , que se dilatou
,segundo parece , por algum tempo
Concebe-se facilmente qual seria O estado de umpaiz , em cuj o solo se viam ainda os tristes vestigios( las correrias dos sarracenos , convertido agora em
theatro de longas e deploraveis luctas civis . Nobrese burgueses tinham sido víctimas das dissensõessuscitadas ou favorecidas por elles proprios . O
desejo da paz devia ter ganhado incremento no
meio de tantas devastações e de tanto sangue ver
tido em vão . As igrej as roubadas muitos persona
gens notaveis do clero e da fidalguiamortos a ferro ,
presos ou fugitivos ; os peões perecendo de nudez ede fome ou passados á espada ; tal é 0 quadro quenos apresenta um hi storiador desse tempo Ian
çando — o á conta do rei de Aragão , mas em que e decrer fossem culpados os diversos partidos . E , todavia
, certo que Alfonso I , empregando nestas guerras
gente collecticia de além dos'
Pyreneus e dotado deunrgenio tão violento e feroz como valoroso , deviater maior quinhão nos males commettidos , posto
que muito se haja de rebaixar nas accusações dosseus inimigos . Mas
,devido a uns ou a outros , O
estado das cousas era intoleravel, e alguns barõesleoneses e castelhanos com os cabeças popularesdos mais poderosos municípios de Leão ajunctaram-se em Sahagun com 0 proposito de constrangeros
“dons consortes darem treguas ás suas discordias e a deixarem
, emfim ,respirar a nação das cala
midades que padecia . Exigiam que O rei de Aragão
guardasse as condições estabelecidas quando , em
consequencia das pretensões do conde de Portugal ,
( 1 ) Anon . de Sahag .
,c . 2 7 ad íinern .
(2 ) Hist . Compostell. , L . 1 , c . 79 .
58 H I STOR IA DE PORTUGAL
D . Urraca se
'
congraçara com elle em Pena fi el .
Falto acaso de forças para quebrar com assembléa que assim lhe impunha lei
,O príncipe ara
gonês valeu — se da d is simulação ; fingiu reconciliar — se com rainha
'
e ,
tendo-se demorado algumtempo em Carrion , veio comella re sidir em AstorgaA dobrez de Affonso I
logo se tornara visível . Compretextos e evasivas dilatava O cumprimento daspromessas que fi zera . Entreestas era a principal tiraros castellos pertencentes asua mu lher das mãos dosaragoneses . Passando pelacidade de Leão ao dirigir-seAstorga , recusou entregar
0 alcassar desta cidade,ape
ser de D . Urraca assim 0
3 . Conde Henrique requerer . Era evidente que
íãªn
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lfoifâi pacificação obtida á forçala) . pelos povos não duraria
largo tempo . A primeiracircumstancia que se offerecesse para nova rupturahavia de ser aproveitada por elle , e tal circumstancia não tardou apparecer .
Estes successos passavam nos primeiros .meses
de 1 1 1 4 . Postoque ,no meio das inquietações e ban
dos em que figuraram tantos individuos eminentes ,os factos relativos ao conde de Portugal sej am
( 1 ) Anon . de Sabagun . c . 2 9 . Compare-se com Hist .Compostell. , L . 1 , c . 80 .
L IVRO 1 59
muitas vezes esquecidos nas incompletas e informesmemorias desse tempo , todavia , se dermos creditoum documento ácerca do qual não nos occorre
duvida,mas que já foi impugnado , ao menos na
sua data , Henrique ligou-se com a rainha quandoella , tendo voltado do Aragão , se achava mai s uma
vez_ separada do marido Foi no meio destas
repetidas d iscordias (2 ) e paci fi cações passageiras
que findou carreira das ambições e esperançasdo conde
,atalhando — lhe morte os desígnios mas
O modo , 0 logar e as particularidades deste successocobre — os véu impenetravel. Sabemos só que ellefallecen no 1 .
º de maio do anno de 1 1 1 4 A nar
ração do anonymo de Sahagun faz suspeitar que ,durante residencia de Affonso e D . Urraca em
Astorga ,Henrique os seguira e alli morrera (4 ) , 0 quede certo modo é fortifi cado pela tradição dos ehronistas portugueses , que 0 dão por morto naquella ci
dade, postoque essa tradição revista O facto das
cireumstancias extraordinarias e fabu losas com
que a imaginação do povo costuma poetisar historiaVoltemos agora os olhos para O passado e obser
( 1 ) Doeum . na Esp . Sagr. , T . 38, p . 347 . Veja— se nota VI Ino fim do volume .
(2 ) Ibid . , T . 36 . App . 43 . Por este documen to se vêque 1 2
: de abri l ainda durava separação .
(3; Gal Maii ob iit comes D . Henricue Chron . Gothor,
ad aer. 1 1 52 . Veja— se especialmen te sobre esta materianota VI I no fim do volume .
(4) entramb o s fue ronse para A storga . Muerto el conde
Enrique , D . Theresa al lá se me, e con la reyna su her
mana é con el rei gran compe tencia armaba Anon . de
Sahag. , c . 29 .
(5) Nob il iario attribuido ao conde D . Pedro , tit . 7 .
Galvão , Chron ica d'
e lre i D . All'
. Henriques , c . 4 . Ace
nheiro Chron . dos Reys d e Port . , 0 . 2 .
60 H I STOR IA DE PORTUGAL
vemos qual era a verdadeira situação política deHenrique no momento de fallecer . Levado pelanatureza das cousas e ainda mais pela ambiçãorepresentar um papel importante no meio da guerracivi l que devorava monarchia , conhece — se pelosactos dos ultimos quatro anuos da sua vida que atodas as considerações elle antepunha 0 pensamento de obter para si
,não só independencia do
condado cuj o governo subalterno alcançara da generosidade do sogro , mas tambem largo quinhão nasoutras províncias limitrophes
,de modo que Por
tugal se convertesse e1n nucleo de um poderosoestado no occidente da Península . Pelo tractado dedivisão que a necessidade de 0 attrahir ao seu par
tido obrigou D . Urraca celebrar com elle sabemoslhe ficava pertencendo Zamora
,cuj o di stricto se
dilata pela fronteira oriental do nosso paiz . E seoutro tractado entre a rainha e D . Theresa , de queadiante havemos de falar
,assentava
,corno suspei
tamos,sobre este pacto anterior feito com 0 conde ,
vemos por elle que esses territorios abrangiammaior porção das províncias que então chamavamde Campos e das Estremaduras e hoj e s e denoIninam de Valladoli d
,Zamora ,
Toro e Salamanca .
E provavel que j á nos ajustes feitos com Affonso Ipara repartirern entre si monarchia leonesa 0
conde tivesse escolhido estas províncias . Assim ,
se elle morreu depois da ultima reconciliação deAffonso com D . Urraca
,achando — se nessa occasião
alliado com a rainha e tendo direito pelas conven
ções anteriores a exigir de ambos a cessão daquellesdistrictos
,seria o ffender todas as probabilidades 0
imaginar que não cuidasse então seriamente emrealisar um facto a que dedicara todos os seuses forços e para 0 qual trabalhava já
,como Vimos
,
em vida de A ffonso VI .
62 H I STOR IA DE PORTUGAL
mulheril pod ia tirar tanta vantagem como O maridotirara do esforço e perícia milita r : empregouastucia . Por intervenção de um individuo de — cuj asartes se flava , teve modo de persuadir O rei deAragão de que sua mulher intentava dar-lhe pe
çonha,accusação ,
talvez,não inteiramente infun
dada A ffonso, que nada desej ava tanto como um
pretexto para punir rainha,sem que lhe fugissem
da mão os vastos estados de que ella era legitimaherdeira , deu ou fingiu dar credito á revelação quelhe fora feita . Perante os nobres que estavam na
corte , accusou-a do intentado assassínio , para assimse justificar do procedimento que determinava se
guir ,e este era 0 separar— se della . Segundo O cos
tume daquelles tempos , recorreu a rainha á provado combate , escolhendo um cavalleiro que mentivesse na estacada sua innocencia ; mas O rei ne
gou-se acceitar O chamado juízo de Deus , fazendo— se
julgador da propria causa . Debalde os conde s deCastella e até os barões aragonese s que se achavampresentes procuraram socegar os animos irritadosdos dons consortes D . Urraca foi expulsa deAstorga seguida de poucos cavalleiros , ,que não qui
zeraln abandoná-la naquella desgraçada conjaneturaA violencia de Affonso
, que recusara sua mulber um meio de j usti fi cação considerado como 0
mais solemne que um réu pod ia recorrer parase mostrar alheio imputação do crime
,produziu
geral descontentamento . O s proprios aragonese s
( 1 ) Orderico Vi tal af firma positivamen te que D . Urracatentara envenenar O marido Urraca ei (Hildefonso)p ern ic iem tam veneno , quam arm is macbinata : H ist .Ecc les . , I, . 1 3 .
(2 ) Anon . de Sahagun , c . 2 9 .
L IVRO 1 63
que guarneciam as torres da antiga capital da Inonarchia ,
cidade de Leão,abriram as portas do
castello á desterrada princesa . Os burgueses , que
até ahi se haviam mostrado mais favoraveis ao rei
de Aragão que a D . Urraca,uniram— se ao partido
della . 0 8 concelhos de Burgos , de Naxera , de Carrion
,de Leão e de Sahagun , junctos nesta ultima
villa com mu itos nobres , ou porque ainda se não
houvesse dissolvido passada assemblea ou porquede novo se congregasse , mostraram — se tão resoluto sem sustentar . as condições juradas por Affonso I ,que este , obrigado deelarar-se abertamente e nãopodendo resistir á torrente
,sa fu occultas de Saha
gun e quasi como fugitivo recolheu-se aos seus estados . Então os nobres e burgueses reconheceram
por toda a parte , nas Villas e castellos , auctori
dade da rainhaD . Theresa ficara residindo em Astorga quando
sua irman fora expulsa . Alli pactuara alliança comO rei de Aragão ; mas os acontecimentos de Sahagunvinham collocá— la numa situação excessivamentedif fi cultosa . Os seus domínios eram demasiado cir
cumscriptos : não podi a achar nelles recursos con
tra irman offendida morta lmente por ella . O seu
alliado, que se retirara para os .
pr0 prios estados , sóde modo indi recto poderia ser util Portugal ,divertindo as armas leonese s para as fronteiras deCastella . Por outra parte a morte do conde
,succe
dida antes de elle obter de finitivamente a posse deuma parte da monarchia em que p odesse constituirum
'
reino independente e assás importante parase fazer respeitar , deixava , até , a província queAffonso VI lhe dera para governar ligada Virtual
( 1 ) Hist . Compostell .
, L . 1 , c . 80 . Anon . de Sahagun ,
c . 30 .
64 H ISTOR IA 'DE PORTUGAL
mente Leão e , se D . Theresa quebrasse os laçosde obediencia que uniam á irman , esse acto seriacons iderado como flagrante rebelliãoA infanta de Portugal debaixo de gesto ange
lico (2 ) escondia 0 animo sagaz e vivo que lhe atribue mn escriptor , 0 qual devia conhecê-la e tractá— lade perto , ao menos durante a sua residencia ern
Sahagun O s factos de quatorze annos em que
regeu provincia cuj o governo lhe legara O maridoprovam que 0 monge ehronista se não enganamem assim qualifi car . E durante esse período quea nacionalidade portuguesa começa caracterisar— sebem
,e á politica de D . Theresa se deve
,até certo
ponto , 0 nascer e radicar— se ; em Portugal aquelle
sentimento de individualidade que constitue barreiras entre povo e p0v0 mai s solidas
'
e duradouras
que os limites geographicos de duas naçoes V 1 z1nhas .
Como a infanta evitou as consequencias das diffi
culdades em que s e lançara e como aproveitou asdi scordias civis da Hespanha christan
'
para ir fundando independencia dos seus estados
, Vê-lohemos subsequentemente . Agora observemos maisde perto qual era a situação especial da monarchialeonesa
,de que ainda O nosso paiz fazia parte ,
quando a paz do sepulchro veio atalhar as lidas eintentos do ambicioso conde de Portugal .
( 1 ) Considerando (D . Th eresa) que para se rebelar la
fortuna no le abastava : Anon . de Sahagun , c . 2 9 .
(2 ) A formosura de D . Theresa foi celebrada p elos seuscontemporan eos . Vej a— se Bernard . V ita B . Geraldi , c . 8
em Baluz . Miscell. , T . 3, p . 1 85.
— Doc . nas D issert . Chronol. , T . 3
, P . 1 , p . 45, n º1 36 .
(3) Un saber astuto e ingen ioso Anon . de - Sahagun ,
c . 2 9 . O auctor desta importan te chroni ca era companheiro do abbade Domingos e leito em 1 1 1 1 .
LIVRO 1 65
O
Já anteriormente narrárnos quaes perturbacões
agitaram Gallize depois das primeiras di scordiasentre Affonso e Urraca . O bispo Gelmires , declarando — se pelo partido do filho do conde Raimundo ,restabelecera momentaneamente paz . Novas dissensões , porém ,
se alevantaram entre os barõesdaquella provincia , movidos por interesses obscurose dando largas violentas paixões á sombra da fra
queza do poder real, que disputavam entre si O
príncipe aragonês , rainha,e 0 infante Affonso
Raimundes , ou antes os barões e prelados que s echamavam seus defensore s . Quando D . Urraca sedivorciava do marido ligava-se com os parciaes dofilho ; quando se reconciliava com agnelle mostravase adversa estes . Mas
,em realidade
,cada um dos
personagens que figuravam naquelle drama , querprincipes , quer s enhores , só pensava em tirar dasdesgraças publicas maior vantagem possível . As
allianças faziam — se e desfaziam — se rapidamente ;porque nenhuma sinceridade havia no procedimentodos indivíduos . Os interesses particulare s dosnobres e prelados cruzavam-se com as questõespolíticas e modiâcavam-nas diversamente . Era
anarchia descendo dos paços para os municípios eensinando— lhes com a licença a liberdade , porque ,faltandoa força á auctoridade publica , os burgueses ,no meio das vexações de uma fidalguia desenfreada ,valiam-se dos proprios recursos para se defendereme vingarem dos seus oppressores . Talvez
,durante
a idade média, nenhuma epocha da historia peni n
sular olfereça tantos vestígios da influencia mu'
ni
cipal nos acontecimentos políticos , tantas resistencias das villas contra O domínio dos senhores , tantoscommettimentos das povoações contra os castellos
que as assoberbavam,como 0 primeiro quartel do
seculo XII . Mas isto que era um bem absoluto , um
VOL . 1 1 .
66 H ISTOR IA'
DE PORTUGAL
elemento de ordem futura , porque ia estabelecendoO equi líbrio entre as diversas classes , era relativam ente um mal e mais uma causa de confusão e dederramamento de sangue : tendia a produzir desmembràção do paiz ; porque a s províncias e districtos
, não só moralmente , mas tambem materialmente , se dividiam uns dos outros . Assim
,durante
os successes que narrámos , Galliza,principal
mente addicta ao infante Affonso Raimundes , virarebentar no seu seio uma revolução de alcaides decastellos e senhores deterras que tomara por bandeira 0 nome do rei de Aragão e se derramara aosul pelo extenso territorlo entre 0 U lla e 0 MinhoEntretanto O bispo de Sanctiago ,
Gelmires, que pelo
seu engenho enredador e manhoso soubera obter
grande influencia naquella provincia , ajunctara umpoderoso exercito para combater os levantados , eparcialidade aragonesa foi vencida .
'
Não deixaram ,
porém,as perturbações de se protrahirem ainda
por algufn tempoD . Theresa achava— se viuva , e de tres filhos que
lhe deixara 0 c0 nde um só era varão , e esse , 0 in
fante Affonso Henriques , apenas de - dou s ou tre sannós de idade O rei de Aragão , com quem ellase ligara em Astorga , era na verdade um poderosoe activo alliado . Mas
,repellido de Leão pela assem
bléa de Sahagun ,e perdido 0 alcassar de Burgos
(então cap ital da Castella ) com muitos outros logares fortes que ou se rendiam às tropas de D . Urracaou estavam estreitamente cercados
,Affonso I fez
proposições de treguas , que foram acceitas D es
( 1 ) H ist . Compostell. , L . 1 , c . 74 e s egg .
(2 ) Duorum vel trium annorum Chron . Gothor .
(3) H is t . Compostell.
, L , 1 , c , 83 a 90 .
L IVRO 1 67
apressada assim da guerra , podi a rainha vingarse do mal que sua irman tentara causar-lhe . Não 0
fez . As actas das cortes de Oviedo , de que adiantehavemos de falar
,persuadem que a infanta dos
portugueses recorrera á submissão para evitarprocella ; mas 0 que não parece menos provavel é
que 0 esquecimento da passada injuria não fora emD . Urraca pura longanimidade . Ha muitas vezes nahi storia ao lado dos factos publicos outros succedidos nas trevas , os quaes frequentemente são a causaverdadeira daquelles e que os explicariam se fossemrevelados . Mas ordinariamente
,nào passando de
enredos obscuros , noticia de taes factos morrecom os que ,
nelles intervieram ,e 0 mai s que ao his
toriador cabe, quando crê descortiná-los
,é apontar
as suas suspeitas e deixar aos que 0 lêem ayahar 0
fundado 0 11 infundado dellas . E tal doutrina applí
cavel ás considerações que vamos fazer ; considera
ções que , a serem exactas , lançam bastante luz sobreepocha de que tractamos e sobre successos poste
riores , aliá s inexplicaveis .
Desde a morte de Fernando Magno di ocese doPorto
,como quasi todas as dioceses do moderno
Portugal , carecia de bispo e era governada porarcediagos . No reinado de Affonso VI a sé portuga
lense estava unida 5 de Braga ,e esta mesma
,me
tropolitana da Gallize ,achou-se por alguns annos
sem pastor nos tempos que precederam eleição deGiraldo . Até pouco antes do fallecimento do condeHenrique as cousas conservaram — se no me smoestado . Nos fins
,porém , de 1 1 1 2 ou
,0 que é mais
certo,entrado 0 anno de 1 1 1 3 O francês Hugo ,
arcediago da sé de Compostella ,
fora escolhido parabispo do Porto e sagrado n0 anno seguinte
'
pelometropolitano bracharenseMauriciq Burdino . Hugoera homem inteiramente estranho ao clero portu
68 H I STOR IA DE PORTUGAL
guês , e não nos consta residisse Jamais em Portugalou elle viesse , senão em companhia de Gelmires ,annos antes ,
para roubar certas relíquias . Era
Hugo,além d isso , entre os conegos de Çompostella
O amigo íntimo do bispo e a pessoa a quem esteincumbia com especialidade de ir tracter em Romaos seus negocios mais arduos . A devoção do arcediago para com D iogo Gelmires foi illimitada , não
só nessa epocha , mas ainda depois,quando
,j á
iguaes ambos no episcopado , elle emprehendia no
vas viagens para servir na curia romana de simplesprocurador ao seu antigo patrono , 0 qual acompanhou para Compostella depois de b ispo , não apparecendo memorias delle em Portugal senão em
tempo bastante posterior . A escolha ,. portanto ,
deum hornem que nem sequer tinha ainda 0 grau de
presbytero quando foi eleito e que residia em uma
província que , segundo havemos visto , estava em
relações hostis com Portugal , teve necessariamentecausas extraordinarias . Outras circumstancias se
deram nesta elevação de Hugo , relatadas por escriptor contemporaneo e testemunha ocular dos successos que narra , as quaes vão rasgar um pouco mais0 véu que nos encobre as causas probabilissimas
,
não só dos acontecimentos desse tempo , mas aindados subsequentesEra no inverno de 1 1 1 3 para 1 1 1 4 Maurício
resolvera ir Tuy sagrar 0 novo bi spo do Porto e
junctamente 0 de Mondonhedo eleito por essemesmo tempo . O arcebispo convidou para assistir aesta solemnidade 0 prelado compostellano ,
cuj o
Esp . Sagr .
,T . 2 1 , p . 56 e segg . Dissert .
Chrono] T . 1 , p . 1 4g e segg . e T . 5, p . 1 80 . Bern . Vi taB . Girald i , c . 5. L . 1 , pass im.
(2 ) No ta VI I I no fim do volume .
70 H I STOR IA DE PORTUGAL
serem essas perturbações cau sa do seu procedimento . Era
,pois
,a paz com Portugal que elle pre
tendia definitivamente assentar pazque das palavrasdo his toriador se deduz ter-se já (Pentes procurado .
A eleição de Hugo , do valido mimoso do influenteGelmires , foi acas o 0 primeiro passo para ella
,0
preço imposto para se obter . Se não nos enganamos ,d *aqui datam as relações estreitas e
,às vezes
,mys
teriosas de D . Theresa com O poderoso prelado deCompostella ; e este facto , passado nos ultimos mesesda vida do conde Henrique , mas em que devia talvez exclusivamente intervir sua mulher
,então resi
dente em Portugal , parece-nOs ter contribuido maispara salvar este paiz e a infanta do que generosidade de D . Urraca . A influencm de , Gelmires na
Galliza era illimitada , e a soberania da rainha nestáprovincia mai s um título vão que uma
'
realidade ;título que obtinha á custa de considerar como a s sociado ao imperio seu filho Affonso Raimundes ,
á
sombra de cuj o nome os barões da Galliza dirigidospelo prelado compostellano gosavam de urna quasiindependencia . Se
,como 0 que
.
havemos relatadonos leva a acreditar
,D . Theresa se ligara com Gel
mires , qualquer procedimento da rainha contra ellapodia trazer-lhe por esse motivo as graves conse
quencias que , por diversa causa , não pôde poucodepois evitar .
Todavia este estado forçadamente pacifico deixava subsistir incerteza sobre a sorte futura dePortugal . D . Theresa
, que durante a vida de seumarido usara apenas do titulo de condessa e deinfanta , e desses mui raras vezes
,contentando se
ordinariamente da qualificação mais modesta demulher do conde Henrique e da de filha de Affonso VI , começava já a usar promiscuamente nosseus d iplomas do titulo de infanta
,de rainha e de
LIVRO 1 7 1
ambos junctos . O de rainha preValeceu por fim os
proprios subditos , como vimos , lhº
o davam j á em
vida do conde e,até
,O papa , depois ,
' li sonj eavacom elle A vastidão relativa
'
dos seus estados ea importancia destes
, que augmentava á prqporção
que se enfraquecia di lacerada monarchia leonesacastelhana
,
" davam valor material a um título deque
,aliás
,vulgarmente usavam todas as fi lhas legi
timas dos reis , mas que por isso mesmo mal caberiaá fi lha de Ximena Muníones . Ao passo que a c on
dessa de Portugal acceitava aquella denomlnaçao ,
provincia cuj o governo Ihe legara Seu marido parece ter principiado poucos annos depois receb
'
erdos proprios habitantes O titulo de reino
( 1 ) D issert . Chronol . , T . 1 , p . 1 56 e segg .
, T . 3 , P . 1 , p .-30
90 , T . 4 , P . 1 , p . 1 58 e 1 59 .
'Neste ultimo logar vem citaidos do cumentos de 1 1 20 em que ainda se dá a D . TheresaO titulo de comitissa . A chron ica de Af fonso VI I diz , failando de l la Mortuo autem Enri co comi te Portugalenses
vocaverunt eam reginam (Esp . Sagr . , T . 2 1 , pag . Estefac to é contirmado por um documen to de 1 1 1 4 do Car tulario de Refoios de Lima (Kopke ,
Apontam . Arche0 1 .
, p . 28) ,no qual se d iz
,no preambul o Ego Tares ie f i lia reg is An
f us , depois da data Imperante Portugalis Reg ine Tares íe,e no logar da robora (equivalente á ass ignatura ) Ego Ta
res ie Inf ans , donde se vê que 0 redactor do d iploma ou
notario lhe chamava rainha ,ao pas so que e lla se denomi
nava j ílha do rei Af onso e Inf anta . Rodrigo Ximenes,do
modo como se expressa (L . 7 , c . 5) dá a entender que
D . Theresa usava do titulo de rainha duran te a vida de seumarido , O que é desmentido pelos documentos con temporaneos , posto seja inn egavel qu e os subditos j á então lh 'odavam , segundo O testemunho do anonymo de Sahagun ,
este respeito anteriormente citado . Em 1 1 1 4 Bernardo arce
b i spo de To ledo denominava-a inf anta dos portugueses .
Em 1 1 1 6 b'ulla de Paschoal I I Fratrum nostrorum é d iri
gida Taras ie reg ine ( Liv . Preto ,f . mas O b ispo
D . Gon çalo de Coimbra , seu subd ito , tractava—a por inf anta
neste mesmo anno ib id ., f . 2 51 .
(2 ) O primeiro documento em que Portugal fi gura com
72 H I STOR IA DE PORTUGAL
Mas,considere — se Portugal naquella epocha ou
como condado ou como provincia ou como reino , écerto que os povos derramados por todo 0 tra
'
cto deterra desde 0 M inho até 'o Mondego começavam adeixar perceber j á na segunda e terceira decadasdo sec
'
ulo XII certo caracter de nacionalidade quenão é possível desconhecer . Os successos politicosmostram-no melhor que nenhum outro indício .
Nas g uerras civis , que 0 malfadado consorciode D . Urraca e de Affonso I deu origem e que seprolongaram por tantos annos , as di ssensões não
rebentavam entre um ou outro estado , entre uma
ou outra provincia , mas nasciam de districto paradistricto
,de castello para castello e quasi de indi
vidno para individuo . Os barões ou nobres principaes conhecidos vulgarment e pelós nomes decondes e de ricos-homens
,inimigos muitas vezes uns
dos outros,tomavam cada qual sua bandeira e
satisfaziam odios particulares a pretexto de seguirem esta bu aquella parcialidade . Os calculos dos
ambiciosos , as mudanças de opinião , as vingan
qas de família ,as modifi cações dos partidos davam
frequentemente áquellas'
discordias um caracterpessoal . A Galliza ,
cuj a historia relativa áquelleperiodo chegou até nó s mais particularisada que adas restantes províncias , não nos offerece outro
quadro . Leão ainda nos u ltimos annos desta sanguinolenta lucta apresenta quas i 0 mesmo espectaculo ,
ponto que na capital do reino v inham às mãos os
O titulo de rem o e a carta de couto de Osseloa feitoGonçalo Eriz em 1 1 1 7 D issert . Chronol . , T . 1 , p . 245. São ,porém , tão raros os analogos este antes de A ffonso I
,
que não bastam para se afíi rmar positivamente cousaalguma seme lhante respeito . Vej a-se , todavia , Memoria
sobre a origem d 0 '
n0 1ne e l imi tes de Portugal , nas Mem .
da Acad .
,T . 1 2 , P . 2 .
L IVRO 1 73
burgueses com os cavalleiros que guarneciam asfortifi cações da Cidade , aquelles em nome de AffonsoRaimundes , estes em nome do conde castelhanoPedro de Lara Portugal , porém , no meio de taesdivisões
,conservou sempre um notavel aspecto de
unidade moral . Fosse qual fosse O partido a que ellese associasse
,todos os barões portugueses . se mos
travam conformes . ao menos passivamente , com 0
systema da que,debaixo desse aspecto , podemos
chamar política externa do paiz . Favorecendo 0
infante Affonso Raimundes , O rei d*
Aragã0 , ouD . Urraca ; fazendo a guerra por conta de um
'
dellesou por interesse proprio , os nobres de Portugal combatiam sempre sob 0 mesmo pendão , embora tivessementre si malquerenças particulares , de que aliás nãofaltam vestigios . Assi1n
,O pensamento de desmem
bração e independencia , que eé visivel existia j á nosanimos de Henrique e da sua viuva e que veiorealisar-se completamente no tempo de AffonsoHenriques ,
ée u1n pensamento commum ao che fe doestado e aos membros delle
,sendo talvez os actos
dos príncipes ainda mais 0 resultado da influenciado espirito pub lico do que a mani festação espon
tanea da propria ambição . Os documentos dos primeiros annos em que regeu Portugal A ffonso Hen
riques , concordes com os da epocha de D . Theresa,
tendem a confirmar e sta suspeitaOs acontecimentos interiores do condado ou pro
L(11 ) Hist . Compostell. pass im. Chronica Adefonsi Imper . ,
1 , c . 1 .
(2 ) Assim como em d ip lomas particulares D . Theresaera chamada rainha, antes de e l la tomar esse titu10 , as
sim a seu fi lho se deu 0 de rei em documentos semelhamtes quando e l le apenas usava do s de infante e de principe . Veja se D issert . Chron0 1 . , T . 1 , p . 62 , nota 4 — Memsobre a origem de nome e limites de Port .
,.p 43 e 44 .
74 H I STOR IA DE PORTUGAL
vincia portuguesa nos tempos immediatos mortede Henrique ignoram-se , e 0 silencio das memoriascontemporaneas prova , pelo menos , que elles foramde bem pequena importancia . As treguas propostas
por A ffonso I e acceitas por D . Urraca trouxeram,
senão uma paz definitiva , ao menos uma suspensãode hostilidades . Mas indole do príncipe aragonêsnão lhe consentia depôrj ámais as armas . Repellido
de Castella,voltou ao Aragão para renovar a guerra
com os sarracenos . A judado pelo conde de Perche ,Rotrou ,
assenhoreou — se de Tudela ainda nesse annoe cercou Saragoça , cuj o dilatado assedio lhe fez leventar em 1 1 1 6 0 wali almoravide de Granada , AbuMohammed EntretantoD . Urraca , receosa
' das
intrigas do astuto Gelmires e aproveitando 0 desafogo que lhe concedia O rei de Aragão, voltavaGallize no anno de 1 1 1 5. O bispo compostellano ,
que havia sido maltractado em Burgos por se mo strar contrario á paz , a qual por outro lado hypocritamente aconselhava , começara , de feito, naquellaprovincia indispôr occultam
'ente os animos con
tra rainha . Intentou ella prendê — lo,
s malogrous e-lhe 0 intento ; porque 0 soberbo pre
'
dombstrouse assás forte e resoluto para lhe resistir . Por intervenção dos fidalgos gallegos esta discordia asserenou ; porém os acontecimentos posteriores bem depressa mostraram a pouca sinceridade com que sefi zera reconciliação( ) s ambiciosos desígnios do conde de Portugal , .
em que suamulher tomara tão activa parte , pareciam
( 1 ) His t . Compostell .
, L . 1 , c . 85, 87 e segg . Foral de
Tudela , referido por Moret , em Pagi , Cri t . annal . Baroni iad ann . 1 1 14 . Orderic . Vital , Hist . Ecol . , na Esp . Sagr . ,
T . 1 0, p . 580 . Conde ,
P . 3 , c . 2 5.
(2 ) H ist . Compostell. , Liv . c . 1 0 2 .
LIVRO 1 75
inteiramente abandonados por ella . Nas relaçõescom a rainha de Leão e Castella D . Theresa reconhecia inferioridade da sua situação . Os actos queserviam então para indicar a suj eição dos grandevassallos ao imperante não eram tão característicoscomo 0 foram em seculos subsequentes , e aindamais raros e obscuros se tornavam nas occasiões debandorias e luctas civis , em que os membros maispoderosos da nobreza procuravam
"
á porfia sacudirtodo 0 jugo de obediencia , para lhes impôr 0 qualmuitas vezes faltava a força . Assim
,no estudo das
phases politicas daquella epocha , importa não des
prezar às menores circumstancias dos factos, por
que ahi se encontra ás vezes a solução de muitas
questões historicas .
Na antiga capital das Asturias , em Oviedo , celebrou — se em 1 1 1 5 uma assemblea de b ispos , de no
bres e de deputações municipaes plebs com 0 in
tuito de occorrer aos crimes e Violencias que se per
petravarn por toda monarchia,e especialmente
entre os asturianos . Considere — Se aquelle numerosoajunctamento como cortes ou como concílio
,porque
a natureza de taes assemblée s celebradas por essestempos nem sempre se pôde bem distinguir , é certo
que uma parte das suas actas chegou até nós , e nellas se encontram disposições
,não só ecclesiasticas
,
mas tambem criminaes e civis . Assistiram estascortes D . Urraca e suas duas irmans , Theresa e É lvira
,com' avultado numero de prelados e barões
das diversas províncias da monarchia ,á excepção
dos de Portugal . A subscripção daquelle importantedocumento apresenta — nos situação relativa dasduas filhas de Ximena Muniones e da herdeira deAffonso VI . Eis aqui essa subscripçã
'
o
A rainha D . Urraca com todos os seus filhose filhas confi rmou e jurou sobredicta constituição
76 H I STOR IA DE PORTUGAL
e mandou — a jurar e confi rmar a todos os habitantesdo seu reino inteiro , tanto ecclesiasticos como seculares . E ass im as irmans da mesma rainha
,D . Ge
loira inf anta , com todos os seu s filhos e filhas e com
todos os seus subdítos,e a inf anta D . Theresa , com
todos os seus filhos e filhas a ella suj eitos , jurarame confi rmaram como acima fica declarado .
Portanto , nó s todos que subscrevemos,etc .
Seguem os nome s dos condes , nobres e prelados ,que se achavam presentes ou que depois adheriralnás resoluções ahi tornadasE
'
numa assembléa dos principaes personagens deLeão e Castellar
, que D . Theresa figura como infantae 0 seu nome e incluido nas subscripções , nãó Só
depois do da rainha,mas tambem depois do de É l
vira ,sua irman mais velha mas
,ao passo que É l
vira con fi rma e j ura, em nome dos seus descenden
tes ( 2 ) e subditos,ella (se não suppusermos aquella
( 1 ) As actas do concí l io ou cortes de Oviedo , guardadasno arch ivo da Cathedral de Toledo
,foram extractadas
por Sandoval (Cinco Reys , p . Aguirre pub l icou—asdepoi s na Co l lect . Max . Concilior . B isp . , T . 3 , p . 34 e d
'
a
hi passaram para a grande Collecção de Concí lios deMansi (Veneza T . 2 1 , p . 1 33 . Barbosa (Catal . das
Rainhas de Portugal , p . 46 e segg . ) pretendeu negar a an
thenticidade destas ac tas que con trariavam as suas opi
n iões , mas com tão fraco s fundamentos, que J . P . Ribeiro
as citou como não duvidosas no T . 3 , P . 1 , p . 65 e 66 das
Dissert . Chrono]. Pôde haver erros nas co p ias que del
las se tiraram , e de certo os ha ao menos nas datas relativas al gumas con fi rmaçõ es posteriores : mas isto não
bas ta para inval i dar 0 documento . Sobre estas subscrip
çõ es dos ausen tes veja— se Mabillon,De Re Diplomat .
,L . 2 ,
c . 2 0 .
(2 ) Cum omnibus j í lus et j í líabus suis signi íica evidentemente na subscripção das tres primeiras 0 mesmo que nas
dos barões , que depois subscreveram , as palavras omn i
progenie nostra f utura .
78 H I STOR IA DE PORTUGAL
mãos,destruindo os gados e plantíos ; emfim ,
e spalhavam tal terror entre a gente dos campos , que oshabitantes das vizinhanças do mar durante a forçado estio abandonavarn os seus lares ou escondiamse em cavernas
,onde podessem ao menos salvar a
vida dos repentinos saltos dos sarracenos . Por estaepocha tinha crescido tal ponto audac ia dos inimigos que se tornava indispensavel occorrer tamanha ruína . O activo bispo de Compostella ,
1nan
dando vir de Genova , onde então florescia scien
cia naval obreiros babeis , ordenou se construissemduas gales
,que , dirigidas por pilotos genoveses e
guarnecidas com soldados e marinhagem de Padron ,
saíram para as costas do Gharb . Os estragos queahi fi zeram desaggravaram ,
até certo ponto,os
chri stãos dos que antes haviam padecido . Com estaexpedição
,em que foram destruídos muitos navios
dos sarracenos , Portugal ganhou 0 fi carem os seusportos mais livres para O pequeno commercio costeiro que então faz ia , e Gallize convertida em alvoprincipal da vingança dos sarracenos , que contraella especialmente dirigiram nos annos seguintesas suas tentativasAo mesmo tempo que D iogo Gelmires buscava
assim attrahir as sympathias populares , defendendoGalliza das aggressões dos mouros , não se esque
c ia de promover por todos os outros meios realisação das suas ambiciosas miras . Quaes estas fossem transluz do seu panegyrico historico ( íeito porordem delle proprio ) 0 qual chegou até nó s com Otitulo de Historia Compostellana . Viviam os
'
aucto
res deste livro em tempos demasiado rudes e faltosd arte , e por i s so não souberam dar às acçõe s do
( 1 ) H ist . Compo stell. , L . 1 , L . 2, c . 2 1 .
L IVRO 1 79
seu patrono 0 aspecto de honestidade e rectidão queintentam — attribuir-lhes . Gelmires era homem deintoleravel vaidade e de não menor cubiça ,
e parasatisfazer esta s duas paixões nenhuns meios julgava vedados a corrupção , a revolução
, guerra ,
insolencia , à humilhação , os enredos occultos eramas armas a que succ essivamente recorria
,conforme
as circumstancias lhe indicavam conveniencia deusar de umas ou de outras . De sde a sua apparentereconciliação com D . Urraca
,de que ha pouco fize
mos menção,parece que elle não cessara de promo
ver secretamente as perturbações civi s . Pedro Froylaz , conde de Trava, era na apparencia 0 cabeça deum partido que pretendi a despoj ar rainha do governo ou pelo menos separar da coroa Galliza eos districtos de Salamanca e Zamora Estremaduras)para constituir emfim um governo , na realidadeindependente , para 0 seu pupillo Affonso Raimundes . Havia estreita amizade entre Gelmires e 0 con
de de Trava , e as suspeitas de connivencia do b ispocom os partidarios do infante
,su speitas que his
toria parece legitimar , deram provavelmente motivo ao procedimento de D . Urraca . Esta
,vindo á
Galliza , segunda vez tentou prender 0 ardiloso prelado , que segunda vez lhe baldou os intentos resis
tindo com mão armada . Cedeu rainha,e quando
voltou para Castella , senão mutua confiança,ao
menos a paz parecia re stabelecida . Mas é evidente
que entre ambos devia subsistir inimizade e temor .
Não tardou nova tentativa de prisão do l ado de D .
Urraca,nem Gelmires tirar mascara . Declarou
se pelo infante ,. e os barões de Galliza que ainda se
não haviam unido ao conde de Trava seguiram ,de
boa ou de má vontade,0 exemplo . Pedro Froylaz
d irigiu— se entã o com 0 seu pupillo Compostella ;mas a rainha retrocedeu immediatamente para Gal
80 H I STOR IA DE PORTUGAL
liza com os cavalleiros que pôde ajunctar para soccorrer os poucos que ainda obedeciam alli á suaauc toridade . O s descontentes da nova revoluçãocomeçaram unir- se-lhe , e ella marchou para Com
postella ,ao mesmo tempo que procurava com lar
gas promessas mover 0 animo de D iogo Gelmirespela cubiça trahir causa que tinha abraçado .
Ernquanto 0 conde de Trava saía com 0 seu exer
cito fim de procurar ensej o de dar batalha D .
Urraca , os parciaes desta , que eram a maior partedos burgueses , abriram — lhe as portas . Já , porém ,
O bi spo fi zera com que 0 infante se retirasse da ci
dade,emquanto elle , vendo — se abandonado do povo
que 0 aborrecia cordealmente,se fortifi cava n0 edi
flcio da cathedral com os seus homens d*
er1nas .
Conhecendo , emfim, que era inutil resistencia
,
humilhou — se constrangido p ela necessidade,tanto
mais que 0 conde de Trava,de cuj o exercito muitos
transfuge s tinhampassado para 0 campo da rainha ,não se atrevera accommetê — la
,e se havia retirado .
Todavia,corn a fuga de Pedro Froylaz e com a
submissão do turbulento Gelmires , 0 mais influent ee perigoso 1n1 1n1g0 de D . Urraca
,ella não obteve a
paz . Um dos barões da Galliza ,Gomes Nunes , se
nhor de muitos castellos e que trazia soldo grandenumero de homens d
'
urmas e peões , proseguiu na
guerra a favor de Affonso Raimundes . D . Urraca intentou subjugá-lo
,marchando sitiar os logares que
tinham voz pelo infante ; mas um novo adversarioveio embargar-lhe os passo s e fazer com que
,em vez
de cercar Gomes Nunes,se visse si mesma sitiada .
Estas cousas passavam-s e nos primeiros mesesde 1 1 1 6 . No
. anno antecedente,como d issemos
,
D . Theresa assistira pacifi camente com sua irmanás cortes de Oviedo , e nem a h istoria , nem os documentos dessa epocha nos indicam que houvesse
LIVRO 1
motivos alguns extraordinarios para a boa barmonia se quebrar entre as duas írmans . Fora escusadoprocurar outro que não sej a soltura das paixões
proprias de tempos semi-barbaros . Os pretextos quehoj e se buscam para cohonestar ainda as guerrasmai s injustas sabiam-se aproveitar
,se occorriam
,
mas não se faziam nascer,nem se inventavam com
0 profundo artifi cio da moderna política . A amb i
ção ,turbulencia
,ingratidão eram ferozmente
sinceras, quando hypocrisia não alcançava facil
mente dis farçá — las . Se , como todas as probabilidades 0 insinuam , D iogo Gelmires , ligado com
Pedro Froylaz , era intelligencia que dirigia occultamente guerra civil na Galliza ,
e se entre elle eD . Theresa havia as relações cuj a existencia pareceresultar da elevação de Hugo ao episcopado da diocesse portucalense , nada mais natural do que fazerentrar a infanta dos portugueses na vasta conspira
ção que , rebentando nas Estremaduras , tão rapidamente lavrou por toda Galliza ,
até porque à Viuvado conde Henrique não falmriam desej os de irreconquistando nascente independencia dos pro
prios dominios , qual,pela sua accessão á asseln
bléa de Oviedo , de certo modo resignara . Seja 0 quefor , é certo que , tendo D . Urraca d ividido o exercitopara cercar os castellos dos rebeldes e demorandose no de Suberoso ,
0 conde Pedro Froylaz e ainfanta D . Theresa com tropas numerosas vieramcercá — la ella . Então a rainha fez aproximar ' assuas forças e
,protegida por estas , retirou-se pera
Compostella
(1 ) Hist . Compostell .
, L . 1 , c . 1 0 7 1 1 0 :'
cu1n reg ina ve l letobsidere s ibi rebelles , obsessa es t ab eis . Comes P . pedago
gus regis et inf antisa Terasia soror reginae, domina totiusPortugal ia , cum exercita magno obsedere reginam in
VOL . II .
82 H I STOR IA DE PORTUGAL
Ficaram desbaratados o' conde e a infanta
,ou
D . Urraca pôde apenas evadir— se ao cerco ?-As palavras do unico historiador contemporaneo que nos
transmittiu aquelles successos parece favoreceremsegunda interpretação ; mas 0 que se passou depoisdesse acontecimento persuade primeira . Em
Compostella os burgueses tinham-se valido dasdesintelligencias da rainha com O bispo
,senhor da
c idade,para formarem uma dessas ligas populares
que depois , dilatadas e aperfeiçoadas , tão celebresse tornaram na historia de Hespanha com 0 nomede irmandades . A vida municipal surgia energicaem meio das luctas dos poderosos , e D . Urracaaproveitara habilmente conj uração dos compostellanos para annullar influencia e . os recursos _doprelado
,approvando-a e collocando-se de certo modo
á frente della . Voltando de Suberoso ,demorou— se
mui pouco alli , partindo para Leão , e apesar de queos burgueses aconselhavam que se vingasse deGelmires
,deixou— o em paz
, postoque humilhado ,talvez para que 0 odioso da sua presença alimen
tasse 0 ardor dos populares e ao mesmo tempo ser
visse de seguro penhor de mutua união e de lealdade para com ella . Se os inimigos não houvessemsido destroçados
,fora pouco provavelque D . Urraca
abandonasse assim Gallize ,aonde só viera para os
castigar. E'
por isso que nos parece mais de crer queD . Theresa e Pedro Froylaz fossem desbaratadosem Suberoso .
Mas a partida da rainha foi como 0 signal denovas luctas . O conde de Trava com seus dousfllhos
, Bermudo eFernando ,0 qual j á anteriormente
se distinguira no meio desta s perturbações as so
castro Suberoso . Sed regina . ascito exercitu suo , evas it e treversa est Compostellam Ib id .
, c . 1 1 1 .
LIVRO 1 3
lando 0 districto saliniense,avançou immediate
mente com os seus. alliados para as cercanias deCompostella ,
matando e captivando os homens edestruindo os gados . Theresa ,
affeita á dura vidados campos , talvez 0 acompanhava nesta guerra .
Ahi,no meio das fadiga s e . riscos dos combates ,
despontaria essa affeição entre Fernando de Travae D . Theresa que tão notavel se tornou annos depoise que veio a produzir em Portugal scenas analogasàs que se representavam então na GallizeOs soccorros dados por D . Theresa ao conde
Pedro Froylaz não foram gratuitos . Os seus dominios dilataram-se
,conforme parece , desde esta
epocha,para além do M inho pelos distrietos de Tuy
e de Orense,cuj os b ispos j á seguiam
,tres annos
depois,pelo menos , a sua corte , exercendo ella n0
territorio, de Tuy actos de
'
senhorio por largotempo Mas os primeiros annuncios da procella
que se alevantava nas fronteiras meridionaes dos
s eus estados começavam apparecer , e é provavel
que para occorrer ella voltasse então a Portugalcom as forças que tinha na Galliza ; porque nenhunsvestigios mai s encontramo s da sua intervenção nosbandos c ivis que assolavam aquella provincia .
( 1 ) As palavras da H ist . Compostell . (L . 1 , c . 1 1 1 , g 3)Comes Petrus cum et coadj utor ibus suis , e a não
existencia conh ecida d e algum d ip loma de D . Th eresaexpedido em Portugal neste anno an tes de novembro ,
claramente indi cam persi stencia da in fanta em Galli za .
(2 ) Portugalensis Regina Tudem et circumquaque olíminvasera t, sib ique ea mancipaverat : H ist . Compostell. , L .
2, c . 40 . Em 1 1 1 9 os b i spos de Tuy e Orense con
firmam j á a doaçã o de Lourosa á Sé . de Coimbra Liv .
Preto , f . 1 35 Veja— se ácerca do tempo em que ainda
durava este domínio de D . Theresa além do Minho , E sp .
Sagr , T . 1 7 , p . 81 , e T . 2 2 , p . 2 56 e 2 58.— Yepes , Chron . de
S . Beni to , T . 7 , App . f . 2 4 v .
84 H ISTOR IA DE PORTUGAL
q uanto D . Theresa buscava assim alargar aonorte os limites dos proprios estados, aproveitandoas inquietações da monarchia , os s
'
arracenos atra
vessavam os ermos que se“
e stendiam entre as fronteiras portuguesas do sul e as praças do Gharb na
margem direita do Tej o , e vinham cercar 0 castellode Miranda sobre 0 Doessa ao sueste de Coimbra .
Subjugado 0 de Miranda ; mettidos á espada oureduzidos à escravidão os seus defensores , os mus
sulmanos , atravessando para 0 poente , ousarampassar 0 Mondego e accometter 0 castello de SanctaEulalia juncto de Montemor . A sorte deste foi igualá do primeiro ; porventura ambos mal defendidosem consequencia da expedição em Galliza . Os
sarracenos arrasaram-no até os fundamentos edepois
,retrocedendo , dirigiram — se ao de Soure .
Aqui,porém ,
O terror dos habitantes tornara inutil
0 commettimento ; porque , lançando fogo '
áquella
povoação e desamparando-a , haviam-se acolhido aos
muros de Coimbra . Miranda , Soure , Sancta Eulalia ,com outros Castellos que por esses tempos existi
riam ,formavam uma linha curva de fortifi cações
avançadas, que defendiam a capital do districto
pelo lado do oriente , meio-dia e p oente . Destruidoselles
,
-C0 i1nbra ficava exposta ao primeiro embate
dos inimigos : Esse , talvez , foi o objecto desta entrada
feita '
ainda em 1 1 1 6 e que os historiadores arabesconfundem com a do anno seguinte dirigida pessoal
mente pelo príncipe dos almoravides ; ao passo que ,se attendermos ao nome que as memorias christansdão ao general sarraceno na invasão deste anno , ellaparece ter sido capitaneada pelo wali de Cordova ,Yahya Ibn Taxf m ( 1 )
(1 ) Chron . Lusit .,Chron . Conimbric . e Chron . Lamec
era 1 1 54 . Salvatus , Vita S . Martini Sauriensis , na Mon .
86 H I STOR IA DE PORTUGAL
Aly passara de novo 0 E streito e voltara Ceuta,
satis feito com a vingança que tomara dos christãos .
Nos districtos , porém , de leste , as armas mussulmanas haviam sido m
'
a] succedidas . Temin,destro
çado pelos aragoneses , tinha— se retirado para Valencia
,e finalmente Affonso I Viu realisada d ,ahi
pouco a sua antiga pretensão de conquistar Sara
goça Dez mil almoravides, que haviam sido
mandados d 'além mar em soccorro daquella cidade ,chegaram tarde para a salvar ,
e só serviram paratornar mais brilhantes as Victorias do rei aragonês ,
ao qual bem quadrava 0 appellido de lidadorTranspondo 0 Ebro para 0 sudoeste , Affonso e os
seus cavalleiros precipitaram— se como uma tó rrente
pelo territorio mussulmano e ,desbaratando mai s
uma vez Temin na terrível batalha de Gotanda(j unho appossaram
-se de Kalat Ayub (Calataiud ) e successivamente de muitas outras povoaçõesimportantes dos sarracenos .
Ao passo que O rei de Aragão proseguía tão Vigorosarnente guerra contra este s , continuava pelosseus capitãe s disputar a D . Urraca posse dacoroa de Leão e Castella ou
,como dizem os histo
riadores arabes , não cessava de fazer entradas nosterritorios de Al-dj uf (do norte) . Ainda durante 0
anno de 1 1 1 6 0 conde de Trava e 0 seu pup illo sehaviam reconciliado com a rainha por di ligencia deGelmires , que , odiado do povo
,constrangido
vera inquisi tione memorarent , alteris (aliás lítieris ) portugalensis reginee ,
vel barones (al . baronum) queequze ipsipro certo noverant , edocti , hoc in anno mu ltis hinc inde
milibus (al . militibus ?) amiss is ,suburb io e tiam Con ím
briae commato (al. cremato) in fra muros c iv itatis ,reginam
v ix v i tam servasse Boson is Ep is t . ad Pasch . ex Conc il
Burgens i (era 1 1 55) Liv . Preto ,f . 2 39 v .
LIVRO I 7
guerrear 0 conde , seu occulto alliado, e temido por
D . Urraca , só assim podia saír de situação difficultosa em que a final 0 tinham collocado dobréz e
perâdia do seu caracter . A'
sombra desta pacificação,
em que 0 conde de Trava se não esqueceria de aincluir D . Theresa pôde empregar todos
“
os seusrecursos em resistir á furiosa invasão do amir deMarrocos , 0 que de outro modo lhe houvera s idoimpossível . Neste respiro que davam á monarchiaas di scordias civi s , guerra com 0 Aragão vinhasubstitui-las . Em 1 1 1 7 um exercito combinado deLeão
, Galliza , Estremaduras , Castella e Asturiasmarchou para a fronteira aragonesa , e lucta pro
trahiu-se ,mais ou menos violenta
,entre os don s
estados pelos annos seguintes até a morte de D . Ur
raca, succedída em 1 1 2 6
,como adiante veremos .
O s reveses recebidos nas fronteiras orientaes , as
perturbações intestinas e ,mais que tudo , revolu
ção que a nova seita de Al—mahdi ou dos Almohadesprod uziu brevemente em Africa obrigaram osalmorav ides affrouxar nas correrias pelas terrasdos christãos . Se acreditassemos as chronicas arabes
,
em 1 1 2 0 Aly teria feito uma segunda entrada em
Hespanha e , marchando para 0 Gharb , houveracercado e tomado L isboa ou , segundo outros , uma
( 1 ) Em 1 1 1 9 allían ça'
estreita entre D . Urraca, os par
ciaes do infante e D . Theresa parece concluir-se das palavras do b ispo do Porto , Hugo , die tas em Burgos , ondefora reconhecid0 , passand 0 por al l i d isfarçado e 1n romeiro ,
por man dado de ' D io go Gelmires'
: neque reg ina
D . Urraca , neque fi l io suo rege A . neque ab inf antissaPortuga
—l iee'
m issus pro íi c iscor in Fran ciam aut Burgundiam ; hoc enim pertimesc it rex cester aragonens ís Hi s t .Compostel .
, L . 2 , c . 1 3 , g2 . Isto é confirmado pe los documen tos do mesmo anno e do antecedente , em que se
vê reinar harmonia en tre D . Urraca e seu f i lho ( Flores ,Reynas Cath0 1 .
, T . 1 , p .
88 H I STOR IA DE PORTUGAL
cidade chamada Medina Sanabria , voltando paraAfrica em 1 1 2 1 , depois de assolar e submetter todo0 occidente . Mas O silencio dos monumentos christãos ácerca destes successos extraordinarios , con
fusão e variedade que reinam semelhante respeitonas relações arabes e , até , as contradições em que
ellas laborarn , tudo nos persuade que os escriptoresmussulmanos quizerem ,
com entradas e Victoriasimaginarias , tornar menos triste O quadro dasperdas experimentadas nos districtos orientaes e donenhum resultado importante que 0 amir tirara nooccidente da pas sada tentativa contra D . Theresa ( 1 )No decurso daquella calamitosa epocha ,
em que
as províncias do norte e oeste da Península eramsuccess ivamente opprimidas e devastadas pelasdiscordias civis , pela guerra com O rei de Aragãoe pelas invasões dos almoravides
,os tre s annos de
1 1 1 7 a 1 1 2 0 passaram comparativamente tranquillos ,sobretudo para Por tugal . Nenhuns indícios seencontram de que D . Theresa ou os ricos— homensdos seus estados interviessem na empreza guerreirade D . Urraca e de seu filho
“
contra os aragoneses ,para a qual v imos terem marchado as tropas dequasi todos os outroá districtos . Creríamos que osbarões de Portugal procediam em tudo guiadospelo pensamento de consolidarem pouco a pouco asbarreiras entre monarchia leonesa e a província
que habitavam ,se fosse lícito attribuir guerreiros
rudes e, por assim dizer ,
semi-barbaros um systemaao mesmo tempo generalisado e profundo , que honraria ainda uma epocha muito mal s illustrada .
Todavia,é impossível deixar de reconhecer na
serie dos factos que illustram historia do estabe
( 1 ) Vej a-se ácerca destes ultimos 55a no ta IX no fim do
vo lume .
L IVRO 1 89
lecimento da independencia portuguesa certo instineto de vida política individual nas populaçõesáquem do M inho
, que j á annuncia nellas à futuraperseverança com
'
que resistiram desde então atéhoj e assimi lar-se ao resto da Hespanha e incorporar — se nella . E
,ao passo que este espirito publico
se desenvolve e progride , vemos D . Theresa,rece
bendo em Leão e Castella O titulo indefinido e sin
gular de infanta dos portugueses , exercitar entreestes um poder que torna duvidoso 0 predomíni ode D . Urraca e , até , conservar 0 senhorio de Tuy ede Orense , fazendo com que sigam sua corte osprelados daquellas dioceses .
De fei to, a posse de Tuy foi O motivo ou 0 pre
texto de um rompimento de hostilidades em 1 1 2 1 .
O territorio do nascente Portugal , que até ahi
escapara de ser theatro das luctas civis , teve finalmente O seu quinhão nos males que Opprimirammonarchia durante O longo e desgraçado governode D . Urraca . As circumstancias deste successo eas suas consequencias politicas foram assás graves ,para que haj amos de lançar toda a luz possívelsobre elle , e i sso não será facil emquanto pretendermos desligar os acontecimentos desta parte daHespanha dos que eram communs á monarchialeonesa . Em nosso entender O erro vulgar dos historiadores nacionaes é 0 quererem determi nar datapreci sa á independencia de Portugal ; é 0 imaginarern como simples e
,digamos as sim
,fundido de um
só j acto um successo complexo,que
,progredindo
com phases mai s ou menos rapidas , veio a ser por
fim úma eousa definida e completa . Assim , segundoepocha que escolhem para assignalar instan
tanea passagem do reino de Portugal do não-ser á"
exi stencia,vêem-se obrigados a rej eitar como falsos
ou desprezar todos os monumentos que se oppõem
90 H I STOR IA DE PORT UGAL
á propria op inião,ão passo que , _ p0 r sua parte
,
alguns escriptores castelhanos rej eitam 0 11 fingemesquecer os monumentos em que ess
º
outros se estribarn . E por este modo que O diploma se tem oppostoao diploma
,chronica á chronica
,interpretação
á interpretação, com uma gravidade e um peso de
erudição de que _
é impossível,ás vezes , deixar de
sorrir . O historiador,porém , que não se collocar á
luz falsa em que um mal entendido pundonor na
cional pôs os que . 0 precederam,longe de ahando
nar as fontes historicas só porque se contrapõemuma opinião formada antecipadamente , acceita — as
todas quando intrinsecamente puras e deduz dellasas suas conclusões . Os que procedem por d iversomodo
,não sómente avaliam Ina] esse grande facto
da independencia,mas ainda fechando — se num
horisonte limitado,attribuem naçãó logo no seu
berço urna individualidade tão profunda , que seinhabilitam para avaliar bem 0s homens e as cousas ,desprezando as soluções que factos
,aliás inexpli
caveis ,'
lhes ministraria historia das paixões e dosinteresses que então se
'
agi tavam no seio da monarch ia leonesa , ligada ainda ao novo estado que se
formava no occidente da Península por mil laços
que só gradualmente se podiam quebrar . As sim ossuccessos occorridos em Portugal durante as primeiras decadas do seculo XII são quasi sempredeterminados pelos
, acontecimentos communs daHespanha christan . E 0 que até aqui temos visto , eé 0 que ainda veremos por alguns annos na prosecução desta narrativa .
Como dissemos , D . Theresa tinha — s e apossado,
segundo todas as probabilidades em 1 1 1 6 , de uma
parte do territorio da Galliza,e com certeza era
senhora de Tuy e Orense no anno de 1 1 1 9 , em que
os bispos daquellas duas dioceses seguiam a sua
L IVRO 1 9 1
corte e confirmavam em Coimbra as mercês que ellafazia aos seus subditos de
'
Portugal . A boa barmonia
,ao menos apparente , reinava , todavia , entre
ella e sua irman , e O rei de Aragão consideravaViuva do seu antigo alliado c0 1n0 ligada intimamente com os proprios inimigos . Na assemblea deOviedo in fanta dos portugueses tinha de certomodo de finido a sua situação poli ticá relativamentea D . Urraca independencia completa de Portugal
, sua desmemb ração da monarchia não estavaconsumada
,e a guerra que D . Theresa fizera na
Gallize em 1 1 1 6 provava tanto independencia dosseus domínios como provaria dos do conde deTrava ou dos outros fidalgos gallegos quem ellaauxiliara . Feita a paz nesse mesmo anno ,
as cousastornaram naturalmente ao antigo estado , e especie de supremacia de D . Urraca , reconhecida porD .Theresa n0 anno antecedente , continuava subsis
tir . Uni camente retenção de uma parte da Gallizameridi onal pela infanta era um facto que os successos posteriores nos mostram ter fi cado indefini do .
A rainha de Leão e Castella visitou essas provincias por duas ou tres vezes nos fins de 1 1 2 0 e nos
primeiros meses de 1 1 2 1 . A guerra do Aragãocorria frouxamente
,porque Affonso I , empenhado
nas suas gloriosas campanhas contra os sarraº
cenos ,
não podia conduzi-la com grande vigor . A estacausa se attribuiria volta de D . Urraca ao outroextremo dos seu s estados
,se não fosse mai s prova
vel desse causa a essa vinda a trama que de novo se
urdia para lhe tirarem coroa e pôrem-na na
cabeça do infante Affonso Raimundes chegado ápuberdade , para quem naturalmente se voltavamos olhos de todos os poderosos senhores inimigosda rainha . A Em de ' podermos explicar razoavel
mente as cir'
cumstancias que concorreram para a
92 H I STORIA DE PORTUGAL
invasão dos estados de D . Theresa em 1 1 2 1 , e ne
cessario conhecer essa trama , em que , como era deesperar ,
figura , postoqne entre sombras , 0 façanhosoGelmires .
Este homem,cuj a vaidade era igual á sua cubiça ,
desej ava ardentemente ver elevada a Sé de Sanctiago á categoria de metropolitana . Tinha tentado 0negocio no tempo dos papas Paschoal e Gelasio ,sem que 0 chegasse a alcançar . A eleição de Callixto II veio reanimar — lhe as esperanças . Callixto
era irmão do conde Ra imundo ,e estava
, por conse
quencia , l igado por estreitas relaçõe s com Hespa
nha . Pedia Gelmires que fosse transferida cadeiraarchiepi scopal de Braga para Compostella ,
transfe
rencia tanto mais importante quanto era esse 0 meiode humilhar 0 grosseiro Pelagio ou Paio Mendessuccessor de Burdino e irmão dos senhores da Maia
,
Sueiro e Gonçalo Mendes D . Pa io tinha — se apossado de varios bens na diocese de Braga que pertenciam á Sé de Compostella e recusara re stitui los .
Bastava isto para suscitar 0 rancor do prelado com
postellano ; mas accrescia que D . Paio ,como me
tropolita da Galliza , tinha necessariamente nestàprovincia uma superioridade que morti fi cavaGelmires . Giraldo , conego de Sanctiago ,
sollicitava na
curia à pretenção ,empregando as importunações
,0
dinheiro e a protecção de poderosos barões franceses
,dos quaes O bispo Gelmires soubera captar
benevo lencia . O papa . eleito , em França , reservavae ste negocio para 0 resolver no concílio que ia reu
nir em Tolosa quando uma diffi culdade po
( 1 ) Pelagius Menendiz quidam idª
iota : Hist. Compos tell.,
L . 1 , c . 1 1 7 . Cunha,Hist . eccles . de Brega, P . 2 , c . 1 1
,
5 4
94 H I STOR IA DE PORTUGAL
a nomeação de legado do papa nas províncias ecclesiasticas de Compostella e Braga (fevereiroN bulla de erecção da nova metropole Callixto declara que os rogos d
'
Af fonso Raimundes contribuiram para esta resolução . Semelhante s palavras , se
as comparamos com a s queixas feitas no anno anterior
,provam que Gelmires nesta concessão do
pontífi ce recebia 0 preço da sua perfi dia para comD . Urraca No meio dos enredos políticos 0 novolegado não se esqueceu de D . Paio
,commettendo
contra elle vexames taes que este recusou assistir aosynodo convocado por Gelmires n0 anno de 1 1 2 1
,
recus a que O papa approvou depois como justa ,exemptando diocese braeharense da legacia docompostellano . O receio de que este pretendesseaproveitar — se da sua situação para 0 esbulhar daposse de uma parte do senhorio de Braga , sobre 0qual versayam entre ambos disputas , foi talvez Omotivo por que D . Paio buscou obter da rainha deLeão e Castella , não só a confirmação do couto dasua Sé , mas igualmente que este fosse ampliado .
diploma expedido por essa occasião,0 qual ainda
existe,nos mostra que D . Urraca se considerava
( 1 ) A narração deste bem como dos antecedentes e
posteriores , resulta de um estudo attento do 2 .
º livro daHi storia Compostellana , 0 que dizemos aqui para evitarrepetição de ci taç ões . Que por este anno de
'
1 1 2 0 se naviam renovado d issen sões entre D . Urraca e seu fi lho vêse dos documentos contemporaneos (Flores , R . Cath .
,T . 2 ,
p . mas_da narração da H istoria Compostellana re
sulta que estavam apparentemente congraçados em 1 1 2 1 ,
porque O mo ço A ffonso Raymundes acompanhava sua
mãe na exped ição áquem do Minho,talvez porque a re
volução , que se preparava nas trevas , não estava perfei
tamente amadurec ida .
L IVRO I
como revestida , ao menos de direito , , da supremaauctoridade na província de PortugalO papa não cessava de recommendar ao arcebispocausa do j oven Affonso , e , porventura , es tas re
commendações importavam as do cumprimento deuma promessa ; Ao mesmo tempo O duque d
º
Aqui
tania,Guilherme IX , e a condessa de Flandres
,
parentes do infante , escreviam Gelmires cartasanalogas , . chegando O duque declarar— lhe que es
tava resolvido a empregar quaesquer meios parafazer seu sobrinho herdeiro de Affonso VI
,e avi
sando— o de que sobre tal materia se entendesse comPedro Froylaz . Então 0 ardiloso prelado impetroude Callixto II uma bulla que 0 desligava dos juramentos feitos a D. Urraca e lhe impunha O deverde guardar aquelles que fizera ao infante . Depoisdi sto elle se cria hab ilitado para entrar em algumatentativa
,cuj a natureza é faci l de adivinhar ; mas
0 cardeal Boso , tambem legado em Hespanha, di s
suadiu-o disso . Postoque , diz ia elle , muito desejassever levar 0 negocio cabo ,
'
aconselhava— o não ten
tasse nada de leve,porque lhe estavam armadas por
toda a parte ci ladas . Na sua op inião,0 melhor seria
fazer a paz com a rainha . Assim procedia 0 arcebispo , ao menos simu ladamente . Chegava perse
(1 ) Liber Fidei , f . 54 V . nas Mem . da Acad .
,T . 1 3 , P . 1 .
Hist . Compos tell .,L . 2 , c . 16 e s egg . A confirmação do
conto de Braga por D . Urraca parece-nos evidentementecorrelativa às bullas que e levaram Gelmires ao arch iepis
copado e á legacia de Merida e Braga . Destas bullas , passadas em feverei ro e março , haveria notíc ia na Hespanhaem junho ( quando se pas sou a carta de couto de Braga) ,postoque só em Agos to se pub l icassem ,
solemnemente . Aconfi rmação de Gelmires nesse d ip loma nada prova contraa nossa. opin ião . El le não pod ia recusar vivendo na
corte , apparentemente de accordo com a rai nha .
6 H I STOR IA DE PORTUGAL
guir aquelles mesmos que mais seus parciaes eram ,
como Fernando Peres de Trava,alferes— mór ou
che fe das tropas archiepiscopaes ( 1 ) e que da mãode Gehn ires tinha aleaidarias e terras em soldo ouprestamo . Um castello que este havia edifi cado noterritorio de Sanctiago foi derribado , e sorte igualcoube varios outros de dlversos nobres . Apesardestas demonstrações exteriores
,D . Urraca parece
que não ignorava os enredos daquelle homem astucioso e sem fé ; mas , ou porque ja não podesse
luctar com elle frente a frente ou pela fraqueza pro
pria do seu sexo , não ousava tomar uma resoluçãoenergica . As tentativas indirectas para 0 prendereram desfeitas pelo prelado
,
"
e a rainha para 0 miti
gar Via-se constrangida augmentar-lhe influen
cia e 0 poderio . Nestes enganos mutuos'
nesta
guerra covarde e tenebrosa passaram os primeirosmeses de 1 1 2 1 . Então occorreram os successos que
interessam e specialmente a nossa historia,para ex
plicar os quaes era preciso comprehender situaçãodos dons partidos e ,
sobretudo,a de D iogo Gelmi
res, especie de Mephistopheles sacerdotal , cuj o
caracter é íassás negro para“ ainda sobresair no
quadro da anarchia e dos crimes que despedaçavam0 seio da monarchia leonesa .
moço Affonso Raimundes simulava entretantonão proceder de accordo com os fidalgos 'do seu par
tido , que aliás trabalhavam , como 0 tempo mostrou ,
em dispôr os elementos de uma revolução,cuj o re
sa ltado , differente do das tentativas até ahi feitas ,fosse decisivo . D . Urraca veio então Compostella
acompanhada de seu fi lho . Foi nessa occasião que
se resolveu a guerra com Portugal , dando— se por
(1 ) ejus (se . archiepiscopi ) , 1nilitiae princeps H ist .Compostell L. 2
,c . 51
, 5 2 .
L IVRO 1 7
motivo que D . Theresa havia noutro tempo invàdido Tuy e as suas cercanias e que retivera essesterritorios debaixo do proprio dominio Seria
,
talvez , esse 0 fundamentq da'
empreza ; mas tem
visos de ser apenas um pretexto especioso,se
,como
cremos,
occupação daquelle territorio remonta acinco annos antes ,
durante os quaes as duas irmans
conservaram entre si paz, quer fingida , quer sin
cera . D . Urraca,aproveitando alliança apparente
de Gelmires , tinha feito damnos consideraveis aos
seus inimigos na Galliza 0 mais provavel é queD . Theresa estivesse ligada com elles e que sua
irman , instruída até Certo ponto do que se forjava,
quizesse dar um golpe no adversario mais poderoso ,como era D . Theresa
, que dispunha dos recursos deuma província inteira . Porventura
,tambem Gel
mires aconselhava este movimento,ou para des
pertar 0 incendio ou para entreter rainha numa
guerrap erigosa ,cuj os cuidado s di strahisseln de
seguir O fi o da conspiração na Galliza .
Já no princípio deste anno ou do antecedente ,Fernando Peres , fi lho de Pedro Froylaz e alferesmó r do arcebispo , vivia na corte de D . Theresa
,de
quem obtivera os mais importantes governos quelhe podi am ser confiados
,os do districto do Porto e
do districto de Coimbra com O titulo de consul ouconde
,como 0 tivera 0 borgonhês Henrique
(1 ) Nempe Portugalensis reg ina Tudem et circumquaqueolim invaserat , s ibique ea manc
'
ipaverat Hist . Compo stel l . , L . 2
, c . 40 .
(2 ) Consule D . Fernando dominante Colimbrie et Portugali , Doc . de j aneiro de 1 1 2 1 ex trahido do cartorio de
Lorvão na Mon . Lu s . , P . 3 , L . 9 , c .
-2 . Cf . Hist . Com
postel l . , L . 2 , c . 51 , e D issert . Chron .,T . 3 , P . 1 , p . 73 .
Na doação de Ulvar ia Odorio prior de Vi seu do 1 .
º de
fevereiro de 1 1 2 0 (Arch . Nac .,Gav . 1
, M. 7 , Nº 6) j á con
VOL . I I .
98 H I STOR IA DE PORTUGAL
Era preciso'
que as suas relações com a infanta dosportugueses fossem antigas e súa influencia no
animo della excessiva para que um simples cavalleiro e
, postoque filho segundo de uma das maisnobres famílias de Hespanha
,soldado do arcebispo
de Compostella ,subis se tão elevados cargos . A
boa harmonia do filho de Pedro Froylaz com 0 pre
lado subsistia ainda depois da guerra . Seguindocada qual 0 campo de uma das irmans
,amizade
entre os dou s não acabara,porque na realidade de '
viam ser estreitas as suas relações occultas . O vin
culo que os unia pôde , em parte,conhecer-se do
que até aqui temos relatado .
Resolvida invadir os estados da irman ,D . Ur
raca marchou com seu filho para Tuy na primaveraou no estio de 1 1 2 1 . Segu iu-a, postoque constran
gido 0 façanhoso Gelmires , acompanhado dosseus homens d
'
armas e dos cavalleiros villãos deCompostella , que por seus fó ros não eram obrigadosa avançar até 0 districto de Tuy
,mas que elle teve
artes de arrastar comsigo . Sabida aproximação doexercita gallego ,
D . Theresa com as forças que pôdecolligir veio acampar na margem esquerda do Minho . Os mimigos fi zeram alto na margernfronteira .
Mais proximo ao lado de Portugal , 0 ri p fazia na
quelle sitio uma insua . A posse della facilitava “
passagem , más defendiam-na as barcas portuguesas
firma Comes Fernandus . Este documento não tem ,todavia ,
inteira força , por ser uma pub lic a fôrma de 1 306 e por
ser um co .
(1 Bland íssimis aggreditur precibus (s . Gelmiridem ) utsecum i llõ ire non recuset : H ist . Compostell.
, L . 2,c . 40 .
Quem está a(f eito linguagem dos h istoriadores compostellanos , quando falam do seu patrono ,
sabe que bland iss imis prec ibus sign ifi ca por f orça .
L IVRO 1 9
que vogavam pelo Minho . Os destros marinheirosde Padron e alguns compostellanos com varios ca
valleiros escolhidos embarcaram da parte opposta evieram accomettê-las . Vencedores , em breve se apossaram da insua . Este successo levou O terror panicoaos arraiaes de D . Theresa , que foram abandonados , e , quasi sem combate
,D . Urraca entrou no
territorio inimigo . Nesta epocha de barbaridade ebruteza guerra entre os christãos assemelhava— se
nas devastações às correrias mutuas entre elles e ossarracenos . O exercito gallego , descendo para 0 in
terior da província ,incendiava
,roubava e assolava
impunemente'
as povoações e os campos,porque ,
fugindo desordenadas , as tropas portuguesas se
haviam dispersado . A conquista de Portugal corriarapida . Gelmires , porém , pesou as consequencias detal conquista e começou ,
segundo parece , a trabalharoccultamente para que se não realisasse um aconte
cimento que,augmentando força moral e material
do partido da rainha,empecia O progresso da cons
piração ,
ª
cuja existencia os factos até aqui narradosnos revelam .
Capitaneando forças avultadas,cuj a falta neces
seriamente devia embargar continuação da guerra ,
este homem que,para segurar no rosto mascara
hypocríta de uma fidelidade em que a propriarainha não cria e da qual elle pedira ao papa 0
absolvesse,não duvidara combater os seu s mai s
íntimos alliadós,nem destruir — lhes os castellos e
propriedades ; este homem vingativo e cruel sentiuum subito horror das atrocidades commettidas no
territorio português e um desejo invencível devoltar ao exercício das suas funcções episcopaes ,
pretendendo recolher-se para Galli'
za com as tro
pas compostellanas . Todavia,D . Urraca
,suspei
tando provavelmente qual seria 0 fi to deste ines
I OO H I STOR IA DE PORTUGAL
perado acces so de amor da humanidade , concedeu
que OS' burgueses de Compostella se retirassem
,
attentos os seus privilegios , mas recu sou a licençaao arcebi spo e aos homens d '
ermas que 0 seguiam .
Não descoroçoou elle ; escreveu ao legado Boso , que
j á vimos não era alheio , nem como agente deCallixto II 0 pod ia ser
,ás tramas que se urdiam . O
legado respondeu-lhe congratulando — se com elledas Victorias obtidas pela rainha e pelo filho mas
recommendando- lhe ao mesmo tempo com a maioreffi cacia que por nenhum caso deixasse de comparecer no concílio que se ia celebrar em Sahagun . Aconvocação deste concílio fora resolvida pouco antesda expedição contra Portugal ahi se deviam tracternegocios
,não só pertencentes á igrej a , mas tambem
ao estado,e por isso mal se comprehende como elle
se poderia ajunctar sem a
'
concorrencia da rainha . edo infante Affonso Raimundes , que haviam determinado reunião daquella assemblea e que seachavam retidos entre Douro e Minho por uma
guerra cuj o prospero progre sso lhes não permittiaabandonarem — na . A carta do cardeal legado
,evi
dentemente feita para facilitar a partida do arcebispo
,não surtiu effeito antes
,talvez
,serviss e para
tornar D . Urraca mais Vigilante sobre 0 procedimento deste .
A sorte das armas continuava mostrar-seadversa D . Theresa . Uma não pequena parte dePortugal achava — se j á subjugada : 0 exercito real
,
marchando pelo sul e poente,tinha chegado até as
margens do Douro , e a infanta rainha dos portu
gueses tinha retirado para 0 districto ao oriente. deBraga . Perseguida por sua irman , encerróu-se n0
castello d e Lanhoso , onde não tardou a ser si tiada .
As cousas tinham chegado à extremidade , tanto paraella como para os barões desta provincia . Tomado
1 0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
resolução atrevida para salvar a caus a em que seachava empenhadoIgnoramos quaes fossem nesse momento os facto ;
practicados por Gelmires conducentes ao seu fim .
'
E
certo , porém , que D . Urraca resolveu prendê-lo .
Era negocio delicado . Tinha elle comsigo os seushomens d '
armas tinha,além dis so
, parciaes no
exercito e uma influencia na Galliza que era impossivel desconhecer . Em frente do inimigo , seme e
lhante empenho tornava — se quas i inexequível pelacerteza de que os sitiados aproveitariam a
,
,lucta
intestina dos sitiadores para os destroçarem . E provavel que neste apuro rainha preferi sse congraçarse com irman deixar impune aquelle homemdesleal e hypocrite ,
contra 0 qual sentiria odio tantomais violento
, quanto se vira por longo tempoobrigada reprimi — lo e disfarçá-lo .
Fez — se de feito,a paz . Por quaes meios e por
intervenção de quem, eis 0 que não chegou até nó s .
Um tractado,porém
,existe celebrado entre as duas
irmans, que attribuimos esta conjunctu
'
re e que,
na verdade , fora d iffi cultoso de conciliar com outradata . Ou a situação de D . Urraca habi litouD . Theresa para negociar com immensa vantagema cessação das hostilidades
,0 11 aquella princesa
quiz assegurar a lealdade de sua irlnan ,confiando
lhe um senhorio muito mais ex tenso do que até ahi
dis fructara . Na convenção e j uramento feito pelarainha á infanta
, prometteu aquella conservar aesta amizade fiel e oppôr — se todo O mal que lheintentassem fazer . Concedeu-lhe
,além d isso
, 0 dominio de muitos logares e terras nos modernosdistric tos de Zamora
,Toro
,Salamanea e Avila com
( 1 ) Sobre este e os anteceden tes gg le iam — se atten tamen teos 4 1 , 42 e 51
, g2 do L . 2 da Hist . Compos tell.
L IVRO 1 1 0 3
as rendas e direitos senhoriaes destas_cidades ,
afóra outros nos de Valladolid e Toledo,obrigando
por isso D . Theresa que lhe j urasse amparo edefesa contra os seus inimigos
, quer mouros , querchristãos
,e a que lhe promettesse não dar acolhi
mento nenhum vassallo da rainha levantado comterras ou castellos , nem a nenhum traidor . Os
dominios novamente concedidos á infanta deviamser considerados como uma tenencia semelhante àdos que anteriormente possuía , no que , porventura ,só se fazia referencia às terras de Tuy e Orense , ouantes , como cremos ,
estas e às de PortugalO leitor , de certo , não esqueceu a cessão feita
por D ; Urraca a o conde Henrique quando pretendeu attrahi — lo ao seu partido
,nem que a di vi são
dos estados de Affonso VI assentada em Palencianão parece ter chegado realisar-se plenamentedurante a Vida do conde . Igualmente estará lembrado do modo como D . Theresa se houve
,depois
da morte delle,para tornar effectivas as miras
ambiciosas que lhe eram communs com O marido,e
das circumstancias que reduziram contentar-sedo senhorio de Portugal como provincia dependente de Leão . Comparando agora este facto com
essbutros _
e com as c onquistas feita s em 1 1 1 6 na
Galliza, tal comparação 0 levará,
'como nos leva anós
,vermos n0 tractado de Lanhoso uma reno
vagão , postoque mod ifi cada , daquellas antigas promessas e pactos . Neste persupposto , as terrascedidas ao conde teriam sido as de Galliza , de queD . Theresa se apoderara depois
,e as que sua irman
lhe cedia especifi cadamente pelo actual convenio,
entre as quaes se encontra Zamora, que sabemos
( 1 ) Nota X no fim do vo lume .
1 0 4 H I STOR IA DE PORTUGAL
tocara Henrique na divisão feita em 1 1 1 1 . .Se 0
conde,porém
,pretendera e obtivera cessão do
pleno e independente dominio dess es territorios ,havia entre os dons factos uma diff erença profunda ,a da vassalagem de D . Theresa , nascida das circums
tancias que tinham obrigado a infanta acceder áassemblea de Oviedo em 1 1 1 5.
Dados recíprocos fiadores da execução do tractado ,
as duas irmans parece terem convivido familiarmente ; ao menos os íntimos conselheiros da rainhajulgaram poder communicar D . Tbere sa 0 que setinha resolvido ácerca da prisão de Gehnires e os
meios que para isso s e haviam de empregar .
D . Theresa , porém , talvez por influencia de Fernando Peres , mandou avisar 0 prelado offerecendo
lhe ao mesmo tempo ou um dos seu s castellos paraelle se acolher , ou algum dos seus navios para
voltar Compostella . Gelmires, confi ado na recon
ciliação j urada com D . Urraca ou , 0 que é maiscerto , nos homens d
'
ermas que 0 cercavam,recusou
offerta , postoque antes deste aviso já corresse no
arraial uma noticia vaga da tentativa . Assim ,pondo
se em retirada para Gallize 0 exercito invasor,
elle não se apartou da rainha , quem tambemacompanhavam alguns subditos de D . Theresa
,
porque nos consta seguiam 0 campo O arcebispo deBraga e O bispo _de Orense . Chegados á margemesquerda do M inho , rainha ordenou passassemprimeiro os cavalleiros de Gelmires , 0 que effectiva
mente se executou ,fi cando este com 0 infante e com
ella para depois seguirem com O resto do exercito .
Apenas,porém ,
os homens d'
armas do compostellano pisavam 0 territorio gallego
,e começavam
acampar — se ,rainha mandou prender 0 prelado ,
que,na impossibilidade de resistir , contentou — se de
protestar contra semelhante procedimento . Divul
1 0 6 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Dentro de poucos dias seu filho Affonso Raimundes,
0 conde de Trava Pedro Froylaz e outros fidalgos daGalliza abandonaram-na
,dirigindo-se à s margens
do Tambre , ao norte de Sanctiago , onde as tropasdelles dependentes estavam acampadas . A rebellião
não tardou a rebentar na cidade . A rainha viu — seobrigada a ceder a torrente , e Gehnires foi solto ,
retendo,todavia
,a rainha em poder de governa
dores seus os castellos do arcebispo , de que , depoisde 0 prender , s e havia successivamente apoderado .
Não bastava,porém , ao orgulhoso sacerdote 0
haver sido restituído a liberdade e 0 ver mai s uma
vez D . Urraca humilhada . A posse desses castellos
era assas importante para elle não abandonar semtentar fortuna a idea de os recuperar . q uanto arainha diffi cultava final concordia , impondo ora
estas,ora aquellas cond ições , Gelmires julgou oppor
tuno tirar finalmente a mascara . Faz sorrir 0
grosseiro engano que os historiadores compostellanos pretendem fazer aposteridade assegurando
que O arcebispo , ao ver que nem obteria os castellos
,nem alcançaria apaziguar 0 animo da rainha
sem despender avultadas sommas,se ligara então
com Affonso Raimundes e attrahira ao seu partidoPedro Froylaz
'e os outros condes e senhores deGalliza, que os successos até aqui narrados nos
mostraram serem , havia muito , seus íntimos , postoque occultos alliados . A verdade é que a hypocrisia de lealdade arainha não lhe era j á nem possívelnem necessaria Affonso Raimundes entrara nos
dezoito annos,e a monarchia inteira estava cançada
das calamidades que sobre ella trouxera a adminis
tração de D . Urraca,pouco habilita da
,apesar da
energia do seu caracter,para dirigir os negocios do
estado . Accresc ia a isto 0 ciume dos barões hes
panhoes contra a privança do conde Pedro de Lara,
LIVRO 1 1 0 7
marido occulto ou , antes ,amante da rainha
,e cuj a
influencia , como era natural,não conhecia limi tes
,
ao passo que Affonso I &Aragão , continuando a denominar se não só rei
,mas tambem imperador de
Leão e Castella,apesar de occupado nas suas g10
riosas campanhas contra os sarracenos , proseguía ,ou pessoalmente ou por seus capitães , em assolar amonarchia que chamava sua e na qual ainda , com
effeito,pos suia algumas povoações e castellos . A
irritação dos animos e a situação dos negocios facilitavam 0 veri ficar-se plenamente 0 que os parentesestrangeiros do infante , j á de mu ito rei nominal daGalliza
,ardentemente desej avam ,
e que 0 mancebo,
dotado de altos espíritos,não menos ambicionava
,
isto é, 0 ser mettido de posse da herança inteira de
Affonso VI . O que,pois , até ahi não passara de uma
conspiração permanente tornou — se numa revoluçãodeclarada . Desde 1 1 2 2 vemos Aff onso Raimundes ,
ou antes Affonso VII,adquirir uma verdadeira
supremacia nos estados de sua mãe e esta reduzidaa submetter — se ao orgulho de Gehn ires e a buscar oamparo daquelle famoso intrigante nas obscuras einuteis dissensões que ainda teve com
'
seu fi lho,
durante os quatro annos em que sobreviveu a estesacontecimentos .
D . Theresa havia — se uni do immediatamente aopartido do arcebispo , ou ,
0 que é mais de crer ,
c0 1n0 acima insinuámos , tendo aprove itado a con
junctura da paz offerecida ,não só para salvar o que
possuia por morte de Henrique e as terras de Gallizaretidas por ella , mas tambem para assegurar osnovos senhorios que sua irman lhe confiava
, en
tendeu que não devia arriscar— se a perdê-los conservando— se no partido da rainha
,cuj a estrella visível
mente declinava . Era tã o frequente naquelles
tempos a quebra das mai s solemnes promessas , a
1 0 8 H I STOR IA DE PORTUGAL
ambição e 0 egoismo tão pouco rebuçados, que não
devemos j ulgar e sse procedimento com 0 mesmorigor com que 0 condemnariamos numa epochamais recente . Além disso
,Fernando Peres obtivera
inteiro dominio no seu espírito,e nesta resolução
da infanta-rainha sabemos que elle interveio pormetadeNão seguiremos aqui a serie dos successos passa
dos desde então na Galliza . Traçámos com cores
que reputamos verdadeiras O quadro da tenebrosatrama que ahi s e urdira porque sem conhecer esse
quadro nunca se comprehenderá bem O período do
governo de D . Theresa,nem se poderá encontrar a
deducção natural dos factos pertencente s a estadiffi cultosa epocha da nos sa historia . Desde os fins
,
porém,de 1 1 2 1 (2 ) até a morte de D . Urraca
(março de no longo crepusculo do poder darainha de Leão e Castella , Portugal parece conservar-s e inteiramente a lheio as convulsões mai s oumenos violentas da monarchia , de que , até certoponto
,elle ainda fazia parte . Volvamos agora os
olhos para 0 seu estado poli tico interno emquanto
no— lo consente 0 remanso da paz exterior .
A intervenção da infanta-rainha dos portuguesesnos acontecimentos geraes da Hespanha christantinha augmentado quasi em dobro a extensão dosseu s domínios . No sueste da Galliza elles se di latavam até as margens do Vibey , por todo 0 terri
( 1 ) adscivi t sib i plures Gallec iae principes insuperreginam Portugaliae T . et comi tem Fredenandum Hist .Compostell .
, L . 2 , c . 42 , g 7 .
(2 ) Os successos até aqu i narrados passaram-se-no verão
de 1 1 2 1 . A paz en tre Gelm ires , Urraca e Affonso Raimundes
,dep o is da prisão do arceb ispo , fo i ce lebrada nos
ultimos dias de dezembro deste mesmo anno Hist . Com
postel l . , L . 2 , c . 49 , g3 .
I I O H ISTOR IA DE PORTUGAL
throno,para a qual contribuira , veio a ser-lhe con
”
traria,ao passo que a sua affeição desordenada por
Fernando Peres não tardou a saciá la nos u ltimosanuos da vida de desventuras maiores que as deD . U rraca .
fi lho de Pedro Froylaz achava-se revestido deuma auc toridade tal que nos documentos contem
poraneos elle figura como igual ou quasi igual dainfanta — rainha . Elevado a categoria de conde , eutregues á sua administração immediata os districtos
do Porto e Coimbra,os principaes dos estados de
D . Theresa ,e obcecada esta por uma paixão ,
se
gundo parece , violenta ,e natural que Fernando
Peres obtivesse,até
,a supremacia sobre os outros
condes ou tenentes do resto do paiz . Os diplomasexpedidos durante esse período
,as expressõe s dos
chronistas,as formulas das es cripturasparticulares ,
tudo conspira em persuadi — lo . A infanta seguia Otri ste eXemplO
'
que sua irman lhe dera , e 0 al feresmó r do arcebispo Gehn ires representava em Por
tugal 0 mesmo papel que Pedro de Lara fazia em
Leão e Castella . As consequencias disso deviam ser
semelhantes,em mai s resumido theatro ,
às que
tinham enchido de perturbações a monarchia .
D . Paio,arcebispo de Braga , era homem rude e
pertencia a uma fami lia cuj o s membros forammai snotaveis por façanhas guerreiras que por brandurae polícia cortesans . As suas discordias com 0 arcebispo de Sanctia
'
go sobre a posse de varios bens eutre Douro e M inho pertencentes aSé de Compostella tinham sido violentas e di latadas . A final os
dons prelados reconciliaram— se,e a legacia de Gel
Imper. , L . 1, g 2 ) conservando tambem , porventura , a0
menos uma parte das outras terras adquiridas pelo trac.
tado de 1 1 2 1 .
L IVRÓ 1 1 1 1
mires em Braga foi reconhecida por D . Paio,a tró
co de conservar as propriedades disputadas com Otitulo de prestimonio ou mercê , como conego deSanctiago , n0 gremio de cuj o cabido entrou ,
segundo O costume
,vulgar nesse tempo , de serem os bis
pos de uma
'
diocese membros do cabido de outra .
Fizera- se esta reconciliação nos fins de 1 1 2 1 e já emmarço d e 1 1 2 2 elle enviava 0 clero da sua metropole ao synodo nesse mês reunido em Compostella ,
não indo elle proprio por se achar então ausen te emZamora ( 1 Voltando d ahi a pouco a Portugal , foipreso por D . Theresa . Os motivos que para issohouve ignoram — se . Sabemos só que 0 papa expediuuma bulla a Gehnires em j unho deste mesmo anno
,
para que compellisse a rainha dos portugueses asoltá 10 até os fins do mês seguinte , aliás declaravaa excommungada ,
-ordenando ao compostellano pu
sesse interdicto em todos 0 5 senhorios della . A amea
ça produziuseu effeito ,porque
“
D . Paio apparece
j á cónfirmando os diplomas da rainha — infanta ºem
outubro dess e annoSe 0 5 monumentos historicos nos não transmitti
rarn as causa s da prisão do metropolita bracharense
,as circumstanciasdeste facto
,comparadas Com
0 5 successos contemporaneos e com 0 5 que poucodepois occorreram ,
leva'
m-nos a suspeitar que estaprisão sej a 0 primeiro e tenue indício da revoluçãoque , arrancando O poder das mãos de D . Theresa ,
0 fez cair nas de seu filho . A influencia illimitada .
de Fernando Peres deviaforçosamente excitar desde 0 principio 0 descontentamento e 0 ciume dosbarões portugueses , e as revoltas de Galliza produ
(1 ) Bracharensis archiepiscopus . c irca id tempus in Numantiae 'morabatur lin ibus Hist . Compostell. , L . 2 , c . 52 .
(2 ) Doc. de outubro de 1 1 2 2 no Liv . Preto,f . 85.
1 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
zidas por um caso analogo eram exemplo mui evi
dente e proximo , que lhes apontava O caminho quedeviam seguir . Não ignoravam elles , por certo , os
meios a que 0 5 fidalgos gallegos tinham recorridona sua conspiração
,porque Portugal nella tivera
boa parte . Os poderosos parentes que O amante deD . Theresa tinha na Galliza e as suas relações com
0 omnipotente Gehnires tornavam necessario queelle s preparassem de sobremão os meios de sacudir0 jugo importuno do conde . A familia dos MendesdaMaia ,
aa qual pertencia O arceb ispo , foi uma das
que principalmente figuraram na revoluçãoque d ahia annos privou D . Theresa . do governo Existiamj á neste anno principios da Conj uração Era Zamora , c0 1n 0 logar remoto e ao mesmo tempo importante , 0 centro della ? Dá-s e alguma relação entreesta residencia em Zamora de D . Paio e O facto deir Affonso Henriques armar — se alli cavalleiro pouco depois , 0 que , como adiante diremos , tem paranó s uma significação diversa da que lhe attribuem
os hi storiadores Teve indícios D . Theresa da co
meçada trama e quiz por ella punir O arcebispo“?
Eis uma serie de questões que , nas trevas e spessas
que obscurecem a maior parte dos successos da
quelle tempo , não passam de conj ecturas , mas conj eeturas verosimeis , que os progressos dos estudoshistoricos virão acaso algum dia resolver a fíirmati
vamente .
Temo—nos até aqui abstido de falar em AffonsoHenriques , acerca de cuj a infancia não faltam curiosas lendas nos nossos livros historicos . Como a de
(1 ) Doc . do infante A ffonso Henriques de mai o de 1 1 28,no Elucidario V . Tempreiros , onde en tre 0 5 principaes
confirmantes liguram tres membros d esta famíl ia . Doc .
de Pedroso , em Brandão , Mon . Lusit .
,L . 9 , c . 1 9 .
1 1 4 H I STOR IA DE PORTUGAL
chronista ignorava , até , a epocha prefixa do seunascimento A crítica tem feito a devida justiçaaos documentos forj ados para enç her essa lacuna
,
aliás de nenhuma importancia . E em 1 1 2 5 que 0
infante practica 0 primeiro acto de que a historiaconserva lembrança . Este acto foi 0 armar-se cavalleiro em Zamora , então unida , como Vimos
,aos
domínios de D . Theresa . Na cathedral daquellacidade
, no sancto dia de Pentecostes , elle propriofoi tirar as armas de cavalleiro de c ima do altar deS . Salvador e juncto delle vestiu loriga e cingiu 0
cinto mil itar,segundo O costume dos reis A
elevação de A ffonso Henriques ao mais nobre grauda vida das armas , em idade impropria para sati sfazer as obrigações que ella lhe impunha , o fferece
urna circumstancia notavel,e é , que no anno ante
cedente e neste mesmo dia Affonso VII practicaraigual ceremonia na cathedral de Compostella , et omara do altar de Sanctiago a espada que paraesse fun D iogo Gelmires benzera Brevemente
(1 ) Sobre ep o cha do nascimento de Affonso Henriquesvej a-se nota X I no fim do vo lume .
apud sedem Zamorensem,ah altario sancti Salva
toris , ipse sib i manu propria sump sit mi litaria arma ah
altari , et ib idem in altari indutus est e t accinctus mi l itaribus armis , sicut mori s est regibus facere , in die san cto
Pentecoste s Chron . Gothor . ad aer. 1 1 63 . O Pen tecos tesera a festividade em que mai s costumavam armar se 0 5
cavalleiros . Vej a- se Ducange verbo Arma, M iles , e Car
pentier v . Al ilitia , Como 0 caval leiro que armava umnovél tomava sobre el le uma especie d e superioridade
(Ducange ib id . ut porrô apud romanos,etc . )
“
os reis de
Hespanha , c iosos da sua independencia ,segu iam 0 cos
turne de se armarem pe las proprias mão s . Compare — se
Roder . Tolet . , L . 9 , c . 1 0 , E5p . Sagr . , T . 26 , p . 30 4 .— Mun
taner, Chron . del rey D . James primer, c . 297 : Chron . del
rey en Pedro de Arago , L . c . 9 , etc .
(3) H ist . Compostell. , L . 2 , c . 64 , 5 2 .
1 1 6 H I STOR IA DE PORTUGAL
0 5 dous primos deviam exercitar um contra 0 0 utr0
0 nobre mis ter que ahi acceitavam e que a igrejasancti ficara para os combates contra os
"
infiéis .
Durante es tes annos as perturbações causadasem Africa pela nova seita dos almohades tinhamimpedido Aly , 0 amir de Marrocos , de promover a
guerra contra 0 5 christãos de Hespanha . Nestaregião 0 terrível açoute dos mussulmanos
,Affonso l
de Aragão ,entretinha principalmente as forças dos
almoravides , e as incursões das fronteiras do occi
dente eram passageiras e apenas feitas p elos sarraeenos naturaes do paiz D . Theresa aproveitaraesta conjuncção para restaurar a linha de ca5tellos
que defendiam a fronteira meridional do districtode Coimbra . Pelo menos 0 5 de Soure e Sancta Eulalia foram por esses annos reedifi cados . Em 1 1 2 2 0
conde Fernando Peres , que possuia 0 de Coj a sobre0 Alva
,cedeu-o a rainha ,
recebendo em recompen
sa 0 senhorio daquell” outros . Soure
,como mai s ex
posto ás correrias,c0 1n difíi culdade achava habita
dores ; todavia ,j á por 1 1 2 5 elle era nao 50 umlogar
forte,mas tambem uma povoação importante
Depois de um reinado de dezesete annos cousumidos em tumultos e guerras , D . Urraca fal lecen
( 1 ) agarenorum ins idias , qui tunc ( 1 1 23) viarum co
meatus clam ,neemon et pub lice incursabant grave cap ti
vi tatis pondus cum acerbae mortis casibus hominibus inferentes . Salvatus , Vi ta S . Martini Saur . 6 . ]smaelitae
ou Agareni era naquella ep ocha a denominação que da
vam 0 5 christãos aos mussulmanos hespanhoes palavra ]lloabitae , como no s parece ter dicto j á , designava 0 5
almoravides (al-morabethyn) .
(2 ) Carta de permutação de Coj a por San ta Eulalia e
Soure , e doaçã o daquelle castel lo ao b i5p 0 de Co imbra(novembro de Liv . Preto
, f . 2 e 1 4 85 v . Salvat . V .
S . Mart . gg6 , 7 , 8 .
1 1 8 H ISTOR IA DE PORTUGAL
atreveu a accommetter 0 enteado . Tracton — se ent ãode armistí cio entre 0 5 dous principes
,e a guerra
ficou suspensa,para d 'ahi a dous annos rebentar
corn dobrada violencia .
As duvidas que , provavelmente , foram suscitadas nas Vis tas em Zamora entre D . Theresa e 0 50
brinho sobre as relações politicas de Portugal comLeão parece terem ficado indecisas como 0 estavamhavia annos . Mas a infanta-rainha
,emquanto Affon
50 VII partia para Castella contra 0 5 aragoneses ,
cuidava activamente de pôr em estado de defesa osseus domínios da Galliza . Com este intuito faz iapas sar tropas para 0 norte do Minho e , não s e julgando segura com 0 5 castellos que alli possuia ,
edi ficava outros de novo, por cuj o meio cria habili
tar — se para recusar suj eição seu sobrinho,se e ste
pretendesse impôr — lkf a Ao mesmo tempo osfidalgos gallegos
,sempre turbulentos , começavam
a preparar de novo a guerra civi l ; 1nas Gelmires ,0 11 já cançado das perturbações passadas ou por
que sinceramente se resolvera a seguir por então Opartido do novo rei
,soube trazê-los pormeios bran
dos a obediencia,e Arias Peres , que se mostrava
tenaz na intentada rebellião , V iu destruídas ou tomadas pelas forças do arcebispo e do conde Gomes0 5 castellos de Lobeira , Taberiolo , Penacornaria eoutros em que confiavaA reda cção de Portugal era , porém ,
negocio mai s
grave . D . Theresa tinha por si não só os barões dePortugal , mas tambem Fernando Peres seu amante
(1 ) íines Galleciae armato exerci tu invadebat mun ic ip ia etiam nova ad inquietandam et ad devastandam
patriam et ad rebellandum regi aedi íi cari faciehat : Hist .Compostel. ,
L . 2 , c . 85.
(2 ) Ibid . , c . 84 .
LIVRO 1 1 1 9
e 0 5 cavalleiros de Galliza que á sombra delletinham vindo residi r em Portugal . Não lhe faltavam , além dis so ,
homens d '
armas e riquezas parasustentar a guerra . Orgulhosa do seu poder , D . Theresa
, que durante 0 governo de D . Urraca evi tara,
como temos visto,0 declarar — se de todo indepen
dente , constrangida , talvez , agora pelas pretensõesmais precisas de Affonso VII , recusava formalmente cumprir com as obrigações nascidas da tenencia que , conforme 0 tractado de 1 1 2 1 e attenta aorigem primitiva dos dominios de que era senhora
,
O rei leonês entendia que ella exercitavaForam estes 0 5 motivos que trouxeram a Portugal
uma invasão semelhante a que 0 deixara assoladodez annos antes . Na primavera de 1 1 2 7 , feitas já as
treguas com O rei de Aragão , Affonso VII veio aGalliza e
,mandando ajunctar as tropas desta pro
vincia,marchou com um exercito numeroso por
Entre-Douro e M inho . Das circumstancias da guerranão nos restam memorias senão dos males que são
communs em taes successos e que pela barbaria dostempos ainda 0 eram mai s naquelle secu lo devastações dos campos e aldeias , assedios de castellos
,
ruína das grandes povoações . A sorte das armasmostrou— se mais uma vez adversa a D . Theresa ,
cuj o poder, por grande que fosse , era por certo mui
inferior às forças do seu sobrinho . O s reveses eXpe
rirnentados nesta campanha , que apenas durou seissemanas , obrigaram a rainha a humilhar— se e areconhecer a supremacia do monarcha . Fez-se entãoa paz
,e Affonso VII regressou immediatamente a
(1 ) Fastu superbiae elata terminos j us titiae egrediebatur,e t nullum
_
regi servitium de regno ,quod ah i l lo tenere
debebat , exhibere d ignabatur ; im1n0 viris , armis , atqueopibus potens ib id .
,c . 85.
1 2 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Compostella ,cuj o
'
prelado 0 acompanhara com todasas tropas que podera ajunctar para aquella expe
dição
Um dos factos mais poeticos da nossa historia parece ter-se verifi cado durante esta invasão do rei
leonês . Falamos da devoção heroica de Egas Moniz ,tantas vezes citada como um dos mais nobres exelnplos de honra e lealdade . Collocando a data do successo nos fins do anno seguinte ou nos principios de1 1 2 9 ,
como 0 fazem commummente os historiadores ,seria necessario rej eitá— lo por fabuloso , como con
trario a factos indisputaveis . Suppondo—o , porém ,
realisado neste anno , não só se t orna poss ível , mas
tambem ,concordando com documentos de outro
modo inexplicaveis ,reforça a nossa
,opinião sobre
haverem apparecido j á neste anno 0 5 primeirossymptomas de rebellião do infante A ffonso Henri
ques contra D . Theresa .
F izemos antes notar circumstancia da prisão doarcebispo de Braga depois de uma residencia demorada em Zamora
,e a de ser este prelado de um ge
nio violento e membro da família dos senhores daMaia
,cuj as estreitas ligações políticas com 0 infante
,
ainda em vida da rainha , é impossível desconhecer .
Narrámos tambem por que man eira Affonso Henriques
,tendo apenas quatorze annos , idade mai s
própria dos entretenimentos juvenis que da ambiçãode gloria , se armara cavalleiro por suas propriasmão s na Sé de Zamora . O exemplo do que haviasuccedido em Leão e Galliza nos ann0 5 anteriores ,
(1 ) Magno ex erc itu ibique per sex hebdomadas vi llasdevastando , castra et c ivitates capiendo donec terrafere to ta devastata fuit , Rex A . portucalense pago acqui
s ito et pacifi cato, Compostellam c itato cal le ad ivit ib id . ,
c . 85 e 86 .
LIVRO 1 1 2 3
camente em 1 1 2 8 que as discordi as entre D . Theresae seu filho chegaram a declarada ruptura . Nó s per
suadimo —nos de que as primeiras tentativas de rebellião começaram um anno antes e de que a narraçãodas chronicas do seculo XVI ,
hoj e com razão excluidas do numero das legí timas fontes historicas , _pôdenão se a ffastar absolutamente da ve rdade nesta
Em tal presupposto , eis , segundo a nossaopinião , como devia passar 0 successo . A s terras dePortugal em que dominavam ou influiam 0 5 par
ciaes de Aff onso Henriques começaram a rebellar
se nos princípios de 1 1 2 7 . Entre ella s Guimarães , aantiga corte do conde Henrique , declarou— se peloinfante que ahi se achava . A invasão
”
de Affonso VIIveio então impedi r ou antes adiar a guerra civi l .
Na sua marcha victoriosa 0 . rei de Leão ,rendidos
outros castellos e povoações , pôs sitio a Guimarãesporque ao principe não importava por certo se era
sua tia ou seu primo que regia Portugal ; importava-lhe que e sta provincia reconhecesse a sua auctoridade suprema . Depois de alguma resistencia ,vendo que as suas forças não basta vam para repelliraos cercadores , os barões e cavalleiros encerradosnos muros de Guimarães declararam em nome domoço Affonso que elle s e consideraria de futurovassallo da coroa leonesa . Egas Moniz , poderosofidalgo
,cuj os senhorios se di latavarn pelas margens
do alto Douro e que,talvez mais que nenhum ,
gosava a reputação — de homem leal,ficou por fiador
da promessa . O rei de Leão levantou O cerco e ,de
pois de reduzir a obedi encia D . Theresa , retirou— separa Galliza . Quando , porém ,
os successos de 1 1 2 8
( 1 ) Galvão , Chron . d'
el— rey D . A ff onso Éenriques , cap . 6 .
Acenheiro ,Coronyqua dos Reis de Portug .
, c . 2 .
Nob i liario attrib . ao C . D .
. Pedro . Ti t . 7 .
2 4 H I STOR IA DE PORTUGAL
entregaram Portugal nas mãos do filho do condeHenrique , elle esqueceu as promessas de Guimaraes
,e com elle as esqueceram os barões portu
gueses . Só Egas Moniz se lembrou do que j urara .
Seguido de sua mulher e filhos,dirigiu-s e a cortedo monarcha e
,
apresentando -se
perante elle descalço e com uma
corda ao pesco
ço ,pediu para
resgatar com amorte a sua palavra nunca trahida. Era grandea colera de Affon50 VII mas ven
c e u -o a q u e l l ainaudita façanhade l ealdade . Dei
6 . Mosteiro e paço de Sousa, onde está XOIl-O Partlr 80 1"
O monumento de Egas Moniz . to e livre e,0
que era mais para 0 nobre cavalleiro
,sem a tacha de desleal
dade ( 1 )A independencia portuguesa , que por tantos
annos tendera a realisar s- e , retrocedia ainda uma
vez ; era um problema cuj a solução Já perto do seutermo devia tornar a ser tentada de novo . Mas as
consequencias da victoria obtida pelo rei de Leão ,postoque graves , não eram talvez as mais de recear0 amor cego da rainha por um homem alheio a provincia
,poderoso por allianças e parentescos com
( 1 ) Sobre este e o s antecedentes ggveja-se a nota XII nofim do vo lume .
H I STOR IA DE PORTUGAL
attribuirern a tão curta idade , .
a nobreza da figurae a belleza do rosto A ambição do poder
, 0
exemplo'
de seu primo Affonso Raimunde s , a disposição dos animos irritados contra 0 predomínio deFernando Peres
,as instigações dos fidalgos
,a
exclusão ignorniniosa em que 0 conservavam dos
negocios publicos , tudo 0 exc itara a collocar-se á
frente de uma revolução cuj as consequenc ias , na
quelles verdes annos , não era facil prever . Tinhaamigos proprios , e a principal nobreza preferia vê10 apossar- se do mando supremo a so lfrer que 0 5
estranhos e 0 5 partidarios destes governassem por
intervenção de D . Theresa Como se manifestoua rebeldia e quaes foram as particularidades queoccorreram nella são cousa s sobre que restam 50
bej as fabu la s , mas apenas fug itivas memorias .
Parece , p0 re1n ,certo que nos prime i ros meses de
1 1 2 8 a guerra civil , encetada n0 anno antecedente,
se preparava de novo ou j á porventura come çara .
As principaes personagens que em maio desse annoestavam ligadas com Affonso Henriques eram Oarceb ispo D . Paio , seu irmão Sueiro Mendes denom inado O g rosso , Ermigio Moniz , Sancho Nunes ,marido que era ou depoi s foi de D . Sancha
,irman
do infante,e Garcia Soares . D iante destes e d '
outros
( 1 ) Fui t vir arm is s trenuus , l ingua eruditus , prudentis
S ÍDI II S in operibus suis , claras ingenio , corpore decorus ,
pulcher aspectu ,e visu desiderab ilis Chron . Gothor . ad
aer . 1 1 63 .
(2 ) qvidam indign i e t alienigenae V'
endicabant regnumPortugallis , 1natre ejus regina D . Tarasia eis c onsentiente ,
vol ens et ipsa superb e regnare loco mari ti sui , a1n 0 t0 f i lioa negotio regni . Quam injuriam nullatenus ferre
valens convocatis am ic i s su i s e nobilioribus de Por
tugal , qui cum multõ maxime quam watrem ejus , vel
ind ignos et ex teros natione ,volebant regnare super se :
ib id . adaer . 1 1 66 .
1 2 8 H I STOR IA DE PORTUGAL
nobres cavalleiros de Portugal declarava elle em
Braga a sua intenção de se apossar do governo , efazia dh ntemão mercês ao metropolita
,contando
com 0 auxilio delle nessa emprezaPelos indício s que 0 5 documentos n0 5 ministram
,
0 infante abandonou sua mãe , a qual talvez se
achava então na corte de Atí'
onsp VII , e dirigiu — se áprovincia de Entre — Douro e Minho no mês de abril.
A revolução parece ter rebentado naquella pro
vincia, dilatando — se pelo districto de Guimarães ,
pelo condado de Refoio s de Lima , pelo territorio deBraga e pelas terras , em fim
,dos nobres que se
guiam a parcialidade do infante . A suspeita daausencia de D . Theresa na occasi
'
ão do alevantamento adqu ire maior probabilidade , se attendermos
a que só quas i tre s meses_
(iEpois 0 5 dou s partidosVieram a uma batalha , que fó i decisiva e fatal paraa rainha . De feito
,esta
,tendo marchado para Gui
marães com as tropas dos fidalgos gallegos e dosportugueses seus partidarios , ahi se encontrou com
0 exercito do infante no campº de S . Mamede junctodaquella povoação . Foi desbaratada D . Theresa efugiu nesta fuga
,porém
,perseguida pelo fi lho ,
flcou prisioneira commuitos dos seus A tradiçãore fere que Affonso Henriques a lançara carregadade cadeias no castello de Lanhoso . Não desdiz essatradição dos costumes ferozes do tempo ; mas desdiz
( 1 ) Quando habuero p ortugalensem terramut tu (se . Pe lagius archiepi SCOpus ) sis adjutor meusDoação a Sé de Braga (maio de 1 1 2 8) no Elucidar. , T . 2
,
p . 352 . A '
cerca de Sancho Nunes veja -se 0 Liv. ve lho dasLinhag . na H ist . Geneal . , Provas , T . 1 .
(2 ) Comm is it cum e is praelium in campo S . Mametis ,
quod est prope caste llum de Vimaranes , et contri ti sunt ,et devíc ti ah eo
,e t fugerun t l'ac ie ejus , et comprehendit
eos Chron . Go thor . ad aer . 1 1 66 . Veja— se a no ta XIII nofim do vo lume .
1 30 msronm DE PORTUGAL
de terras aSé de Coimbra para que Deus associasseaos bemaventurados a
_) a fallecida princesa sealguem houver ahi que intente annullar (0 que não
creio ) a doação que ora faç0 , _pague em dobro a ousadia á auctoridade real , e se for algum individuotão poderoso e cruel que pos sa conservar-se pertinaz ,sej a 0 seu destino na morte 0 de Dathan e Abiron ( 1 ) A formula insolita por que termina estediploma diz — nos que os restos de D . Theresa aindativeram quem sobre elles vertesse lagrymas . Os
monumentos historicos contelnporaneos apenas,
porém,nos referem que fallecera no primeiro de
novembro de 1 1 30 Um antigo tumulo na cathedral de Braga nos assegura ,
finalmente, que as suas
cinzas foram transportadas para 0 logar ondetambem repousam as cinzas de seu marido .
0 5 escriptores modernos , empenhados em salvara reputação moral de D . Theresa como
,mulher
,
esqueceram— se de lhe fazer j ustiça como rainha ouregente de Portugal . Tem-se dissertado largamentesobre 0 seu consorcio com 0 conde Fernando Peres
,
que nada nos auctorisa a admittir emquanto 0
valor historico do seu governo é perfeitamente desprezado . Todavia ,
durante quatorze anuos os actosda viuva do conde Henrique mostram bem a perseverança e destreza com que buscou desenvolver e
realisar O pensamento de independencia que elle lhelegara . Cedendo a força das circumstancias , não
( 1 ) S i vero aliquis , quod ( i eri non credo , ad conturbandum ve l irrumpendum hoc meum testamentum , restituat et reg ie protestati al iud tantum . Qui s i tante potencievel crudelila tis f uerit ut in ista pertina cia hujus vite íinemí'
ac ia t, cum Dathan et Ahirou , e tc . Liv . Preto , f . 1 26 .
( 2 ) Era 1 168 . Ob ii t regina Donna Tarasia mater dominiAll
'
onsi , calend . novembris Chron . Gothor .
(3) Nota XIV no lim do volume .
1 32 11 151 0 R IA DE PORTUGAL
duvidava de reconhecer a supremacia da corte deLeão para obter a paz quando della carecia , salvo 0
recusar a obediencia quando cria possível resistir .
Associando-se habilmente aos bandos civis que des
pedaçavam a monarchia leonesa , ia creando no meiodella para si e para os seus uma patria . Apesar dasinvasões de christãos e sarracenos e das devasta
ções e males causados por uns ou por outros nos
territorios dos s eus estados , estes cresceram em po
pulação , em riquezas e em forças militares Pelasarmas e pela política augmentou a extensão ( 10 5 pro
prios dominios ao oriente e ao norte , conservando aomeio — dia a linha das fronteiras que seu marido j álhe deixara encurtadas . O castigo de 11 11 1 erro , que ,medido pelos costumes do tempo , estava longe deser imperdoavel, parece — nos demasiado severo , e Oprocedimento dos barões portugueses para com ellamerecerá dos desprevenidos a imputação de ingrato .
D . Theresa foi Víctima de um sentimento nobre emsi
,mas às vezes excessivo e cego
, que ella tinhafeito crescer
,radicar-se
,definir-se e que serviu de
pretexto de rebeldia á ambição de Atfonso Henriques
,ou antes á daquelles que por meio do inexpe
riente principe esperavam melhor satisfazê-la . E stesentimento era 0 da nacionalidade . A Chronica dosGodos
,que , narrando 0 5 successos de 1 1 2 8, toma 0
estylo do libello político ,não era provavelmente
mais que 0 echo da opinião vulgar . Ahi 0 5 gallegossão tractados de estrangeiros ou forasteiros indi
gnos . Esta denominação de injuria , que , applicadavinte annos antes aos habitantes das outras provincias da monarchia fundada por Pelagio
,seria inin
telligivel em Portugal , estreava por uma revoluçãogravíssima a sua fortuna popular de sete seculos .
( 1 ) Viris , armis atque opibus potens Hist . Compostell.
L IVRO I I
1 128— 1185
Primeiros annos do governo de A ffonso Henriques .
Guerra na Galliza . Ten tat iva de rebellião . Cont inuação da guerra . O castel lo de Celmes fundado e
perdido . Allianças de A ffon so com 0 rei de Navarrae com al guns fidalgos de Galliza . Vi ctoria de Cer
neja . Perda de Leiria e d estroço em Thomar . Paz
de Tuy c om O imperador A ffonso VI I . 0 5 almora
vides e 0 5 almohades . Jornada de Ourique . Renovação das discordias com O imperador . Recon tro de
Valdevez . Pac i ficação .— A lgara dos sarracenos .
Le iria e Trancoso destruídas . Desbarato dos invasores .
A lfonso toma O ti tulo de rei . Feudo ao papa . Cir
cumstanc ias do suc c esso . S i tuação dos sarracenos .
Alliança de A ffonso I c om Ibn Kas i e'
correrias dos
chris tão s no Gharb . Con sorc io do rei de Portugal .Tomada de Santarem .
XPULSOS de Portugal a rainha D . Theresa e 0
conde Fernando Peres , toda a provincia seguiua fortuna do vencedor , postoque um documento con
temporaneo pareça indicar que algumas res istenciashouve e que estas se prolongaram até os fins de 1 1 2 8
ou principios do anno seguinte
( 1 ) Ego infans ab omni pressura a líenus , e t Co
limbriens ium ac t0 tius urbium portugalens ium dom inus
secaras eff ec tus Doc . de Arouca ,em Brandão Mon . Lusi t . ,
P. 3, L . 9 , c . 16 (abril de
1 36 H I STOR IA DE PORTUGAL
Não podia,porém , A ffonso VII olhar com indifíe
rença para esse grave succes so . Apenas decorrera umanno desde que O moço rei obrigara sua tia a reconhecer- lhe uma especie de vassalagem ,
fazendo pazcom ella depois de lhe devastar os domínios . O pre
texto de nacionalidade que servira de estandarte arevolução ,
segundo se deduz da Chronica denominada dos godos , equivalia a uma declaração formalde independencia ,
porque este pensamento se con
tinha virtualmente naquelle . Dous meios tinha 0
principe leonês de acudir ao mal ou restituir pelasarmas arainha fugitiva O poder de que seu fllhO aprivara , ou ,
acceitando O facto consumad0,
'
exigir
de A ffonso Henriques que se considerasse comosimples logar— tenente ou vassalo da c
,
0 r0 a,qual fora
sua mãe , ao menos nos ultimos tempos . AS inquie
tações intestinas da monarchia e a guerra quasiincessante com 0 belli coso rei de Aragão aconselhavam 0 segundo expediente ou ,
antes,constrangiam
Affonso VII a segui-lo . Mas s e as circumstancias
politicas tornavam inexequível 0 usar do primeirocom toda a energi a , 0 5 successos posteriores provaram que
,empregadas frouxamente as armas e só
como auxiliares do segundo ,isso não serviria senão
de ir firmando O poder independente do fi lho doconde Henrique .
Vimos como D . Theresa se apoderara , além do
que propriamente era territorio de Portugal , dosdistrictos de Tuy e Orense e como
,pelo convenio
celebrado em 1 1 2 1 com D . Urraca,ficara pos suindo ,
não só estes,mas tambem outros senhorios em
nome de sua irman ate'
a morte della . As questõessusc itadas em 1 1 2 7 e a entrada do rei de Leão em
Portugal lh'
0 5 f i zeram provavelmente perder ; aomenos
,depois deste acontecimento nenhuns vesti
gios se encontram da sua jurisdicção na Galliza ou
1 38 H I STOR IA DE PORTUGAL
armada ( 1 Serviarn lhe,provavelmente
,de pre
texto as convenções feitas com seu pae e,sobretudo
,
a posse que D . Theresa tivera de Tuy e da terra deL imia
,de que pretenderia ser senhor como 0 era
de Portugal . Este pensamento explica a sua insistencia em accommetter as províncias limitrophesde Portugal pelo norte . Fossem
,porém , quaes
fossem os motivos de semelhante procedimento,a
tentativa de Affonso Henriques causou sério s receiosao rei de Leão . Andava elle a braços nesse tempocom terríveis di ffi cuidades a Hespanha chri stanardia em guerras Affonso I de Aragão continuavadevastar a Ca stella ,
e as turbulencias dos fidalgos
parciaes dos Laras ou do principe aragonés não
davam um momento de descanço a Atfonso VII ,obrigado a submetter successivamente pela forçadas armas 0 5 castellos rebellados nas Estremaduras,em Castella
,nas Asturias e em Leão A entrada
de Affonso Henriques augmentava 0 5 embaraços .
Para obviar ao mal , O rei leonês mandou ao arcebispo Gehn ires e aos condes e magistrados da Galliza que lhe saíssem ao encontro e 0 repellissem domodo que fosse possível . q uanto os demai s colligiam forças e se preparavam para marchar contra0 5 portugueses 0 prelado compostellano adoeceuou fingiu adoecer , e as tropas municipaes de Sanctiago intimadas 'para acompanharem 0 exercitorecusaram obedecer . A traição de alguns individuos
« 1 . Jam olím multotíes ipse rex portugalen s ium venerat
in Gallaetiam : diz a Chron . de A lfonso VII , falando de
successo s o ccorridos em 1 1 34 e a Hist . Compost . Cum
que pugnaturus in Gallec iam ven ire nequiret , ut
cum (scil . Alphonsum Henrichidem ) man
ut c i obviam ircut . L . 3 , c . 2 4 , g 1 .
(2 ) Chron . Ade f . Imper . 1 6 am H ist . Compostell.
L. 3 ,c . 2 4 .
L IVRO 1 1 1 39
acabou de mallograr a empreza , e A ffonso Henri
ques voltou a Portugal sem ter encontrado resis
tencia na sua tentativa
Quaes foram ,porém
,as consequencias della ? Eis
0 que não nos conservaram 0 5 monumentos dessetempo . O mais provavel é que 0 infante se conten
tasse com 0 5 resultados ordinarios destas correrias,
muitas vezes suscitadas pelos 0 di0 5 dos príncipes enão raro pela cubiça , sem nenhum outro pensamento politico . E , todavia , certo que Affonso VIInão procurou por então tirar vingança do damno eatfronta recebidos . A necessidade de dar treguas asdesordens pub licas moveu-o a convocar cortes em
Leão ( 2 ) onde se tracton de restab elecer a paz publicae onde foram muletados 0 5 burgueses de Compostella que haviam recusado de fender a província dainvasão dos portugueses . Estes ultimos , satisfeitoscom as vantagens obtidas ,
abraçaram,tacita 0 11
expressamente,as disposições pací ficas das cortes
de Leão . Ao menos,é _preciso suppôr que a boa
harmonia "
reinava entre as duas províncias limitrophes nos fins de 1 1 30 e em 1 1 3 1
,para compre
hendermos a persistencia de Fernando Peres em
( 1 ) Nec tainen contra eum quorundam fraudulentia pu
gnaverunt ib id .
( 2 ) Risco (Esp . Sagr . , T . 35, p . 1 80 e segg . ) parece con
fundir esta assemb lea de Leão, convo cada por A ffonso V I I ,
com 0 synodo de Carrion desse mesmo anno , presid idopelo legado Humberto . A H istoria C0 1np0 5 tellana fala , noc 2 4 do L . 3 , daquella ,
e diz -nos que 0 s eu 0 13j ec t0 era 0
que vae apontado no texto . O synodo carri onense t inhaprecedido , como se co lhe da m esma H istoria Compostel
lana (L . 3 , c . 1 5) e da doação fe ita durante 0 synodo p eloprimaz d e To ledo ao b ispo de Se govia (Co lmenares , His t .
de 8eg0 v . , p 1 1 5) em que ainda íi gura' D iogo b i spo de
Leão , quando nas cortes des ta c idade j á assistia A rias seu
successor.
1 4 0 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Portugal por este período Expulso d 'aqui dousannos antes , e combatendo encarniçadamente durante 0 5 seguintes contra Affonso Henriques , comodepois veremos , só por este meio se poderá explicara vinda do conde aos estados do seu émulo , cuj aauctoridade parece reconhecer nas proprias expressões do documento que nos guia e que nos deixa veruma luz fugitiva
'
no meio das trevas que cercamestes primeiros tempos do governo do infanteluz
,na verdade
,tenuissima
,mas que é preferível as
fabulas inventadas com 0 correr dos seculos e astradições maravilhosas recebidas com sobrada boafé
,não só pelos chronistas , mas até
.pelos mais
graves historiadores .
Dissemos j á que Bermudo Peres , irmão do condeFernando e cunhado de Affonso Henriques obti
vera durante 0 grande predomínio de seu irmão O
governo de Viseu . Ou elle se conseríf ara estranhoaos successos de 1 1 28
,ou se reconciliara com 0
cunhado . D e um ou d 'outro modo , é certo que re sidia em Portugal em 1 1 3 1 , e que 0 castello de Seiaestava debaixo do seu domínio ; Era Seia um desseslogares fortes , edificados pelas ramifi caçoes da Serra
( 1 ) Doc . de julho de 1 1 31 , Liv . Preto , f . 1 26, citado no T . 1º
,
p . 384 . Uma parte dos confirmantes são conegos de Coimbra , e por i sso all i 0 suppomos exarado . Por outro documento do Liber Fid ei , ci tado por Brandão (Mon . Lus .
, L . 9 ,se conhece tambem a assis tencia do conde em Por
tugal j á em julho de 1 1 30 .
(2 ) do e t s icut illarn et superScriptum terminaverat infan s domnus Ade f0 n 5u5 .
'
Doc . do
Liv . Preto, c itado .
(3) Este conde D . Vermuim fo i casado com a fi lha doconde D . Henrique e da rainha D . Terej a Liv . Ve lhodas Linhagens , na Historia Geneal . , Provas , T . 1 , p . 1 98.
A mulher de Bermudo era D . Urraca a outra irman d e
A ffonso Henriques casou com Sancho Nunes , Ib id . , p . 1 46 .
1 42 H I STOR IA DE PORTUGAL
Seia,e a conspiração falhou . Bermudo , expulso
daquelle castello e da província de Portugal , serviudepois Alfonso VII contra 0 cunhado
,cuj o prisio
neiro foi no recontro de Valdevez , vindo a acabar ,passados annos
,monge no mosteiro de Sobrado .
Aquelles que se haviam unido a Bermudo Peresforam despoj ados dos seus bens
,e estes di stribui
dos pelos servidores do infanteNa idade de pouco mais de vinte e um annos
,
dotado de geni o bellicoso e destro nas armasA ffon so Henriques estava t alhado para desenvolverlargamente a idea da nacionalidade portuguesa ,idea que amadure cera e se radicara nos animos demodo indestructivel . 0 Portugal daquella epochaabrangia escaçamente metade do n0 550 modernoterritorio . No resto da Hespanha a nova monarchianão tinha alliado algum natural
,salvo 0 Aragão e
a Navarra ao norte e oriente O poder do já vastiss imo imperio de Leão e Castella ameaçava esmagá1a
,e ao meio-dia os seus limites ia1n
.
entestar com
0 5 sarracenos , inimigos irreconc iliaveis pela differença ou antes opposição de raça e de crença . Aenergia e O es forço necessarios para resistir a tãoperigosos vizinhos deviam ser
'
grandes . Affonsoprovou por todo 0 decurso de um longo reinado
que 0 5 pos su ia . Na falta de educação litteraria ,
inconveniente commum a todos 0 5 principes ecavalleiros de então ; privado ainda na infanciadaquelle amor de mãe que tantas vezes affeiçoa esuavisa os caracteres mais duros ; repellido da inter
( 1 ) Chron . Go thor . ad aer . 1 1 69 . Yepes , T . 7 , f . 32 3 v .
º
Doação a JoãoViegas dos bens d e Ayres Mendes e Pedro
Paes Caro fa , em Rib eiro , D issert . Chron ., T . 3 , P . 1
, p . 1 0 3,
n .
º 306 .
(2 ) S trenuus fuit armis et bellicosus Luc . Tud ens. na
HiSp . Illustr ., Vol. 4 , p . 1 06 .
L IVRO 1 1 43
venção nos negocios pela influencia illimitada dafami lia de Trava , em parte as licções da adversidadesupprirarn
— lhe as licções dos homens , e em parte a «
oppressão produziu nelle 0 que por via de regraproduz nas almas rijamente temperadas
“
: redobroulhe a ambição e a audacia ; mas tornou-o cauteloso ,desconfi ado dos homens e
, por consequencia , mudavel . O mancebo diz um escriptor dessetempo sabia a arte de reinar , e todavia , possuídode ardente amor de gloria , 0 0 111 0 a fragil eanna
facilmente se inclinava para onde quer que 0 soprodas auras 0 levava ( 1 ) Cubiçoso de renome ,valente
,sem affeições profundas e duradouras , elle
não houvera sido,ta lvez
,apesar da sua aptidão
para d irigir 0 5 negocios,um dos principes mais
apropriados a tempos tranquillos ; mas era-o paraesta epocha , em que 0 enthusiasmo
,O es forço
,
ambição e , até , 0 desprezo de certas consideraçõesda ordem moral se tornavam necessarios para pôr0 remate ao edifi cio que estepaiz ia laboriosamenteconstruindo , 0 ediâcio da sua independencia .
Aos successos que decorreram desde 1 1 32 até 1 1 35
não é facil assignalar datas precisas e,se houvesse
mos só de attender aos monumentos nacionaes , 0
silencio que elles guardam acerca deste periodo demais de tre s anuos nos persuadiria que Portugal
gosara da paz exterior ,só interrompida pelas corre
rias obscuras das fronteiras mussulmanas,facções
unicamente de roubos e morte,sem nenhuma con
sequencia politica,e que mais importavam aos
habitantes das povoações limitrophes do que ao
( 1 ) Qui'
j uven is ,e tsi regendi imperii j am b ene sciolus ,
tamen amore landis ardenter plenus , ad quo scunque
aurae flatus ut arundo fragi l is ferebatur : Liv . do s Testam .
de Sancta Cruz de Coimbra , em Brandão, M . Lusit .
,T . 3
,
App . escrit . 1 5.
1 44 H I STOR IA DE PORTUGAL1
commum do paiz . Com 0 caracter,porém
,do infante
essa ex istencia pac ifica fora impossível por tãolargo e spaço . A guerra tornou ,
de feito,a renovar
se por aquelles annos . D . Theresa forcej ara constantemente por dilatar 0 5 proprios estados para a Galliza , e este systema era seguido com a mesma tenacidade por seu fi lho . Ignoramos quaes motivos , anão serem as antigas pretensões a que j á mais deuma vez alludimos , Affonso Henriques teve paranova invasão naquella provincia . Talvez nenhuns ;como provavelmente nenhuns existiram para asu spensão d
,
ar1nas que parece houvera em 1 1 31 .
Penetrou,pois
,0 infante por terras de Limia . Saí
ram— lhe ao encontro os condes Fernando Peres eRodrigo Vela e outros fronteiros do rei de Leão .
Desbarataram-no e constrangeram—no retirar— separa Portugal Não desanimou elle
,todavia ;
ajuntando 0 5 mais valentes e nobres cavalleiros'
e
as bandeiras populares , volveu de novo ao districtode Limia . Os capitães leoneses ou não ousaramdi sputar-lhe O passo ou foram destroçados pelosportugueses . Senhor daquelle territorio , AlfonsoHenriques edifi cou um castello conhecido nas me
morias desse tempo pelo nome de Celmes ; pôs ahi
( 1 ) multoties venerat in Galleti am et a comi te Ferdinando Petri et Roderico Velle , et ah ali is ducibus Gallae
tiae expulsus fuerat inde et reversus est in terram suamsine honore : Chron . Adef . Imper . I 30 . Esta passagem ,
a que j á alludimos , re ferindo-se aos annos que precede
ram a coroação de A ffonso VII corno imp eradorvem necessariamente collocar 0 5 successos que narra no
tem a que 0 5 attribuimos . A expressão multoties obriganosHÍambem suppôr que estas entradas foram
, pelomenos
,quatro ou cinco , contando entre e llas a de 1 1 30
,e
tres ou quatro nos annos de 32 e 33 . A de que se vae falardevia ser em 34 ; porque as cortes de Leão , em que A ffon5 0 VI I foi acclarnado imperador, celebraram-se na prima
vera do anno seguinte .
1 46 H I STOR IA DE PORTUGAL
do principe leonês 0 senhor de uma pequena provincia
,cercada ao meio-dia pelos mussulmanos
,não
só ousara recusar-lhe obediencia,mas até invadia 0
territorio da monarchia e ,apesar dos ultimos revé
ses,conservava hasteado 0 pendão da independen
c ia,re solvido a de fendê-la com as armas na mão
contra aquelle ante quem outros principes mai spoderosos curvavam 0 j oelho . Sem a menor sombrade vaidade nacional , parece — nos ser licito dizer queO es forço e a constancia dos portugueses e do seupríncipe nesta conjunctura são um dos mais bellosexemplos daquella energia moral de que tão ricaera a idade média e a troco da qual a Europa 111 0
derna tem ido éomprando a brandura do tracto
entre 0 5 homens e 0 5 commodos da civilisação .
Exceptuada,pois
,a pequena provincia de Por
tugal,toda a Hespanha christan e ainda uma parte
da Françaaquem do Rhodano reconheciam directaou indirectamente O domínio de A ffonso VII O
titulo de imperador que se lhe attribuia vulgarmente e de que j á ,
não raro , elle propriQ usava nosseus diplomas cabia com razão ao senhor de tãovastos dom inios . No mê s , pois , de j unho de 1 1 35
,
convocadas cortes em Leão , foi O moço principe acclamado solemnernente imperador . A desgraça deCehnes re freara a audacia dos portugueses , e asituação comparativamente pacifi ca da Peninsulahabilitava-o para dar nova força às l eis esquecidasno meio das guerras civis , que , por breves periodosinterrompidas , duravam desde 0 tempo de D . Ur
raca . Empenhou— se então em restaurar as igrej as e0 5 mosteiros e em restabelecer a boa administração
( 1 ) fact i sunt term ini regni Ade fonsi regis Legionis a
mare magno oceano , quod est a pa trono S . Jacobi usque ad
fluviam Rodani Chron . Adef . Imper .
,L . 1 , c . 2 6.
L IVRO 1 1 1 47
e a ordem pub lica,perseguindo e castigando 0 5
malfeitores sem distincção de classes . Com O intu itode alargar de futuro as suas conquistas pelo territ0 ri0 mus sulmano , elle buscava reanimar as forçasinternas da monarchia com a paz e prosperidadecommuns . As sim
,apesar das vantagens obtidas de
seu primo,deixou—o tranquillo O resto deste anno e
todo 0 de 1 1 36,em que nem nas memorias de Leão
,
nem nas de Portugal se encontram vestigios demutuas aggressões
Todavia 0 animo inquieto de Affonso Henrique a facilidade que O imperador lhe dera de reparar0 damno recebido na Galliza não consentiram du
rasse por muito tempo O estado pacifico dos paizeschristãos da Hespanha . O anno de 1 1 37 viu de novorebentar a guerra . As circumstancias della obrigamnos a dizer alguma cousa sobre successos que não
pertencem immediatamente á nos sa hi storia,mas
que explicam ,até certo ponto
,as audazes tentativas
do infante contra um principe tão poderoso comoera seu primo . A morte do celebre rei de Aragão
,
pouco posterior a j ornada de Fraga , trouxera a desmembração dessa monarchia . Na Navarra fora eleitorei Garcia Ramires , descendente dos antigos principes daquelle estado , e no Aragão pr0 prian1 entedicto
,
' Ramiro,monge de Thomieres
,irmão de
Affonso I . O rei de Leão ,ou com 0 pretexto de ser
0 herdeiro de seu padrasto,
.ou porque parte dasprovíncias aragonesas tinham pertencido outr 'oraa Castella ou ,
finalmente,porque era 0 mai s forte
,
marchou immedi atamente para a R ioja,de que se
apossou sem contradicção . O n0 v0 rei de Navarralonge de mostrar intenções de lhe resistir
,saíu a
( 1 ) Veja-se summa dos successos d este período emSandoval , Cinco Reyes , f . 1 56 e segg . : e melhor em Risco
,
Reyes de Leon ,T . 1 , p . 337 e segg .
1 48 H I STOR IA DE PORTUGAL
recebê-lo , reconhecendo-o a maneira francesa por
suzerano e evitando assim as consequencias quasicertas da guerra . Então A ffonso VII d irigiu— se aoAragão e apoderou — se da nova cap ital del le
,Sara
goga , que lhe abriu as portas . Dizemuns que Ramirose retirara a Sobra1 :be , outros que , imitando 0 deNavarra , 0 acceitara por suzeranq . Não nos per
tence a nó s averiguar este ponto . E,todavia
,certo
que desde essa epocha A ffonso VII se intitulou ,não
só rei ou imperador de Leão e Castella , mas tambem
de Saragoça e Navarra . Garcia,porém
,não fi zera
mai s do que ceder á força das circumstancias . Era
natural que,asserenada a tempestade que 0 amea
çava,renascesse Da sua alma O desej o da indepen
deneia . A esta causa nos parece dever-se attribuir 0
seu procedimento u lterior .
O genio guerreiro de Affonso Henriques e a nobreousadia com que 0 5 habitantes de Portugal se con
servavam estranhos a submissão geral da Hespanhachristan deviam excitar a admiração e fazer desejara alliança do senhor desta pequena
“ provincia e dosseus indomaveis barões e homens d '
armas a todosaquelles que so ffriam impacientemente 0 jugo doimperador . Entre estes era 0 mais notavel Garcia
,
0 j oven monarcha navarro,que
,antes de nada
tentar contra aquella especie de suzerania, que re
conhecera,procurou e obteve travar alliança com
A ffonso Henriques . Dos mesmos fidalgos da antigamonarchia leonesa
,habituados ao desenfrearnento
e á independencia de facto que tinham desfructado
a sombra das desordens publicas,muitos suspi
ravam pelo momento em que podessem renovar as
anteriores parcialidades Essa disposição dos
( 1 ) Comites et qu ia potins laetan tur
guerra imminente quam pac is e t lranquillitatis temporeHist . Compost . , L . 3 , c . 51 .
1 50 H ISTOR IA DE PORTUGAL
0 infante apoderou — se de Tuy e successivamente doscastellos e terras que elle s possuiam e cuj o dominiosupremo voluntariamente lhe cederam . Não con
tentes com isso , uniram as suas tropas às de Portu
gal e , junctos com 0 seu novo alliado,prepararam-se
para a guerra , emquanto Garcia de Navarra , quebrando 0 preito que fi zera , rompia as hosti lidadespelo oriente
castello de Allariz está assentado na margemesquerda do Arnoya
, que vem desaguar no Minhopouco abaixo da confluencia deste rio com 0 Avia .
Governava-o nessa epocha um cavalleiro esforçado
por nome Fernando Annes , cuj a lealdade ao imperador era radicada e sincera e de quem dependiamvarios outros castellos circumvizinhos . Com seusfilhos
,irmãos e amigos
,Fernando Annes
,oppôs
— se
valorosamente á invasão e , postoque vencido , combateu até perder todos 0 5 logares que lhe cumpriadefender e guardar . Vencido 0 alcaide de AllarizA ffonso Henriques , tendo levado as suas arInas ate
O coração da Galliza e mettido guarnições nos castellos que a traição lhe entregara ,
recolheu-se a Portugal
,porventura para augmentar 0 exercito
,ne
ce55ariamente enfraquecido com a distribuição dastropas pelos logares fortes de que 0 infante se fi zerasenhor . Que e ste fosse O motivo parece indicá — lo asua volta immediata a Galliza para continuar a
guerra . O s capitães do imperador tinham entretantoajunctado os seus homens d '
armas e preparavam— se
para seguir 0 nobre exemplo de Fernando Annes .
0 5 motivos por que Gomes Nunes (que em 1 1 28 tinhasegu ido a parcial idade de D . Theresa) tornou a possuirterras em Portugal desvanecem-se com 0 5 successos que
vamos narrando e que exp licam obviamente a vo lta doc onde ao seu paiz .
(1 ) Chron . Ade f . 1
L IVRO I I 1 0 1
Distinguiam— se entre elles os condes Rodrigo Velae Fernando Peres nestes encontrara sempre 0 in
fante 0 5 mais duros adversarios,e nas suas passadas
emprezas contra a Galliza fora por elles rechaçado .
Junctas as tropas dos fronteiros , 0 exercito gallegoveio encontrar os portugueses num s itio chamadoCernesa ou Cernej a . Travada batalha , a fortuna declaron — s e contraria aos condes de Leão
,e as tropas
gallegas retiraram— se desordenadamente . RodrigoVela caiu nas mãos dos inimigos com outros cavalleiros ; Inas dous dos seus homens (Par inas arriscaram— se denodadamente para 0 salvar
,atirando
se como desesperados ao meio dos que 0 levavamcaptivo e
,tendo— o desembaraçado das mãos destes
,
foram com elle ajunctar— se ao e xercito fugitivoCom semelhante vi ctoria 0 futuro parecia sorrir
a Affonso Henriques e aos condes rebeldes de Toronho e Limia seus alliados . Suj eitos 0 5 districtos
meridionaes e desbaratados 0 5 mais illustres capitaes de Affonso VII nestas partes , 0 norte da Gallizaofferecia-se para theatro de novas conquistas . Eellas teriam de feito proseguido
,se um acónteci
mento gravíssimo não viera j ustamente nessa con
j unctura atalhar 0 5 passos do infante e chamar— lheattenção para a de fesa dos proprios estados .
A ordem dos templarios,da qual
,conjunctarnente
com as outras ordens militares,teremos de falar
em tempo opportuno,conforme O plano do nosso
trabalho , tinha recebido de D . Theresa nos ultimosmeses do seu governo 0 senhorio do castello deSoure . 0 5 monges cavalleiros
,cuj o enthusiasmo e
valor em parte nenhuma se desmentiam,e cuj o ins
titúto era 0 pelejar sem descanço contra 0 5 sectariosd0 i51a1ni5 1n0
, haviam em pouç os annos mudado 0
( 1 ) Chron . Adef . 1 30 e 3 1 .
1 52 H I STOR IA DE PORTUGAL
aspecto daquelles arredores . Cubriam então extensosbosques e matos 0 tracto de terra que hoj e constituea Estremadura alta
,e A ffonso Henriques devia
ceder com facilidade estes desertos, que eram como
barreira natural entre as duas raças inimigas , aessa ordem composta inteiramente
.de esforçados
homen s de guerra . Com a espada numa das mãos ecom a enchada 0 11 alvião na outra , elles foram gra
dualmente contendo 0 11 castigando as correrias dossarracenos e desbravando ou povoando aquelles ar
redores A oeste,porém
,de Soure ficava um
largo espaço aberto às invasões dos sarracenos ,que vinham , sem encontrar resistencia , assolar asviz inhanças de Coimbra . A este mal occorrera 0
infante . Aproveitando a conjunctura da paz quehouve por anno e meio depois da acelamação deA ffonso V[I
,começara durante O inverno de 1 135 a
edificação do castello de Leirena (Leiria ) . Era 0 logaridoneo não só para servir de de fensão aos seu s estados
,mas tambem para guerrear 0 5 mussulmanos .
N0 meio daquelles vastos desertos que se dilatavamao sul de Soure e ao noroeste do Nabão escolheraA ffonso Henriques para lançar os fundamen tos deLeiria um monte que satis fazia não só às condiçõesindispensaveis de defensão numa praça de fronteira , mas tambem ao fim principal para que esselogar era destinado . Guarnecido por tropas esco
(1 ) Doaç ões de Soure aos templarios de março de 1 1 28 e
de março de 1 1 2 9 ._Cart . de Thomar no Arch . Nacion . )
Viterbo , Eluc . V . Ladera e Tempreíros . Bu l las relativasaos Templarios no A rch . Nacion , Gav . 7 , M . 3 , n
º1 7 , e
M . 9 , nº 35 rex portugalensis (a do M . 9 , n .
º 35
diz illus lris portugalens is reg is) quandams i lvam dumui vestrae in perpetuum con tullisset , eam cumdif f cultate max ima de sarracenorum manibus liberantes ,
per vos et homines ves tros situdiosus coluis tis
1 54 H I STOR IA DE PORTUGAL “
lhidas , cubriría facilmente o _ caminho de Coimbrae , por outra parte , tornaria facil , partindo-se da
quelle ponto , atacar inesperadamente qualquer dastres praças mais importantes do occidente do GharbSantarem , Lisboa , Cintra . Concluída a edificação
de Leiria nomeou 0 infante um dos seus cavalleiros , Pai o Gutterres , suj eito de estremado esforço ,para alcaide do cas tello
,e debaixo
“
do seu mandopôs alli uma forte guarniçãoDeviam 0 5 sarracenos fronteiros so ffrer mal este
novo padrasto que O guerreiro principe christão
alevantava na raia dos seus dominios . Paio Gutterres
, que um antigo escriptor compara Scipião
africano opprimia-os com correrias e entradas .
Irritados pelos damnos que recebiam da molestavizinhança de Leiria
,congregaram suffi cientes
forças e marcharam sitiá-la . Affonso Henriquesach ava— se na Galliza e acabara de obter a victoria deCernej a quando recebeu as novas do movimentodos sarracenos e com ellas as do tragico desfecho
que a tentativa tivera contra 0 5 christãos . O exer
cito mu ssulmano,composto de almoravides ou
mouros e de sarracenos hespanhoes tinha aecommettido e levado a e scala 0 castello de Leiria . Adefesa fora desesperada . Duzentos e quarenta ca
valleiros e homens d *arma5 da guarnição haviamficado mortos de fendendo aquellas muralhas , eentre elles contavam-se individuos de alta j erar
( 1 ) Chron . Gothor . ad aer . 1 1 78 .
(2 ) Pelagium Guterriz ; ah i l lo ergo virtus et audaciasarracenorum c oepit in íirmari , qu ia vid eban t quidem al
terum Scip ionem africanum , qui eos valde opprimeret et
affligeret (ibid . ) se isto não se refere antes a A ff onsoHenriques .
(3) Moab i tes et agareni Chron. Ade f. Imp . 1 32 .
LIVRO 1 1 1 55
chia Salvou— se,porém
,0 valoroso Paio Gut
terres , que posteriormente d evia alli mesmo cai rnos ferros do captiveiro Na conjunctura em que
0 5 christãos recebiam tão importante perda experi
mentavam outro revés de que apenas resta confusamemoria 0 11 fosse uma di versão que 0 5 fronteirostentassem fazer para inquietar 0 5 sitiadores deLeiria
,ou alguma correria anterior a este successo ,
a qual 0 provocasse mais depressa,é certo que um
corpo de tropas,tendo avançado até as proximi
dades do Nabão , foi destroçado no sitio chamadoThomar ( se não era antes este 0 nome arabe do rio) ,onde annos depoi s 0 5 templarios construíram a casacapitular da ordem e O forte castello que ahi sub
siste aindaA perda de Leiria era nos seus effeitos analoga de
certo modo a de Celmes e ainda mais dolorosa ; mas
ao menos aqui fora,conforme as ideas do tempo ,
sangue de martyres 0 que por mãos de infi éis tin
gira aquelles muros . O lastimoso acontecimentodesse castello e 0 destroço de Thomar annullavam
as consequencias do triumpho obtido em Cernej a .
A força moral do paiz diminuira necessariamentecom estes reveses
,ao mesmo tempo que se tornava
necessario ao infante voltar a Portugal para oppôr
barreiras á audacia dos sarracenos , guarnecendomelhor as fronteiras meridi onaes . E
' a e stas causasevidentes que nó s attribuimos 0 5 successos posteriormente acontecidos na Galliza .
Dissemos já que O rei de Navarra soffria impacientemente 0 jugo que O temor nascido de se acharcollocado num thr0 n0 vaci llante lhe fizera acceitar
( 1 ) ld em , ib id .
(2 ) Chron . Go thor. ad aer . 1 1 78.
(3) Era 1 1 75 even i t infortunium super christianos in
Thomar . Vej a— se nota XV no fim do vo lume .
1 56 H I STOR IA DE PORTUGAL
pouco depo is de obter a coroa daquelle paiz . Defeito
,elle quebrara a sua vassalagem a Allonso VII
na me sma occas ião em que 0 infante português penetrava na Galliza . Acudira O imperador a rebater0 navarro como mai s poderoso , e principalmente aisto devera
,talvez
,Affonso Henriques a fortuna
das suas armas . Mas O imperador alcançara cousideraveis vantagens contra Garcia , ao passo que ,com a j ornada de Cernej a , a guerra de Gallizat0 1nava um aspecto assa s graVe para attrahir todaa sua attenção . Tinha elle par tido havia pouco dePalencia para Zamora
,quando nesta cidade encon
trou um cavalleiro que Vinha relatar-lhe . 0 5 successos occorridos na fronteira de oeste . Partiu immediatamente com marchas rapidas , acempanhado
das ponças forças que pôde colligir em Zamora e ,
dirigindo — se de salto a Tuy,teve a feli cidade de
entrar ah i , parece que sem combate . De Tuy envioumensageiros aos nobres , condes , alcaides e ao proprio arcebispo de Compostella ,
para que viessemajunctar-se alli a fim de invadirem Portugal , aproveitando a proxima conjunctura das ceifas paradestruírem as cearas e reduzirem esta turbulentaprovincia aultima estreitezaO in fante voltava então a soccorrer as suas fron
teiras meridi onaes ,e a impressão de desalento, que
era natural incutisse nos animos dos portugueses amorte de tantos cavalleiros illustres como 0 5 que
tinham perecido em Leiria,proporcionava ao impe
rador 0 ensej o para duras represalias . Não aconte
ceu , porém ,assim . Os senhores e cavalleiros que
Alionso VII convocara para a intentada invasãodilataram O cumprimento do que lhes fora ordenado , e entretanto O velho Gelmires , que se dispu
( 1 ) lbid . 1,2 9 e 32 . H is t Compo stell.
, L . 3 , c . 51 .
1 58 H ISTOR IA DE PORTUGAL
celebrado então foi , todavia , a ssas desfavoravel paraAffonso Henriques , visto que desse pacto só paraelle resultavam obrigações e nenhumas para Affonso VII . Ahi jurou 0 infante leal amizade aoimperador, para que nunca por si ou por outremlhe buscasse morte ou damno e que
,se alguem lh
,
0
fizesse , elle di sso tomasse vingança como por umfilho que
“
muito amasse . Prometteu igualmente respeitar 0 5 territorios do imperio em seu nome e no
dos seus barões e que , se algum destes 0 5 invadisse ,elle ajudaria lealmente avingança ou a restaurá-loscomo se fossem os proprios : que no caso de invasão ,quer de mussulmanos
, quer de christãos , marchariaa soccorrer Affonso VII
,sendo — lhe pedido soccorro
que,se 0 6 111 0 ou fllhOS do imperador quizessem
permanecer na paz,elle infante seria obrigado a
guardar as condições desta que no caso de ser que
brada aquella convenção por algum dos barões portugueses ,
0 infante repararia O mal até onde fossepossível
,a arbítrio dos que então trabalhassem em
impedi r a quebra da boa harmonia que as honras
(terras immunes ) , que O imperador lhe dava restitui — las -hia a elle ou ao seu successor
,sem tergiver
sação ( 1 ) nem engano,em qualquer tempo que lhe
fossem pedidas . Este pacto foi jurado pelo in fantecom cento e cincoenta dos seu s homens bons e exarado em Tuy a 4 de j ulho de 1 1 37 , na presença doarcebispo de Braga e dos bispos de Segovia , Porto ,
Tuy e Orense
(1 ) Et dahi t ira ias aut paca ttzs . Esta expressão é tradu
z ida nas formulas vulgares dos p rei tos e menagens dos
castellos em tempos posteriores , por dará 0 d i cto cas
tel lo irado e pagado
(2 ) Este tractado vem transcrip to no App . 3 da H ist . do
Mosteiro de Sahagun por Escalona , p . 52 7 , escrit . 1 61 .
LIVRO I I
Um tractado em que se continham j á estipulaçõesrelativas aos successores de Affonso VII importavaidea de bem longa duração ; mas nem O imperador
nem 0 in fante deviam considerá — lo na realidadesenão como treguas mais ou menos dilatadas , se
gundo as circumstancias futuras 0 exigi ssem ouaconselhassem . Sobradamente desvantaj oso paraAffonso Henriques , cuj a virtude não era por certo aresignação , podia logo prever— se que
,reparada a
desgraça de Leiria ou obtidas quaesquer vantagensimportantes contra 0 5 sarracenos nas fronteiras me
ridionaes , elle nào tardaria a buscar pretextos ou aachar motivos para quebrar aquella especie de jugoa que se curvava . Desde esse momento a guerracontra 0 primo a qual até aqui seria impossívelattribuir causas bem precisas , converte — se em uma
necessidade de situação . As expressões do tractadosão c laras 0 fi lho de D . Tberesa conserva “dominioscomo vassalo do imperador e , postoque não possa1n 0 5 di zer ao certo quaes fos sem , O facto nem por
isso é menos indubitavel , Se Portugal fosse um paizcuj a independencia ,
datando de largo tempo , esti a
vesse be in firmada , essa vassalagem do infante poroutros senhorios serem diversos dosque herdara )nada influiria na sua auctoridade como principe dosportugueses , não faltando naquella epocha barõesd 'além dos Pyreneus que pos suí ssem terras na Peninsula ,
sem que os reis hespanhoes pretendessem
por i sso ter O domínio eminente sobre 0 5 territoriosfranceses de que elles eram senhores . Mas é evi
dente que,sendo a independencia da província de
Portugal apenas um facto duvidoso,
suj eição deAffonso Henriques ao imperador ,
debaixo de qual
quer pretexto , influiria por muitos modos na sortefutura deste paiz . Apesar , pois , de todas as solemnidades de que fora revestido , O tratado de Tuy não
1 60 H I STOR IA DE PORTUGAL
podia subsistir , e a quebra delle dentro de um pe
riodo mais ou menos curto era inevitavel.
Durante O resto deste anno e quas i por todo 0
decurso dos dons seguintes as fronteira s daGalliza e de Portugal respiraram do continuo revolver das batalhas e das correrias assoladoras emquetanto sangue christão tingira as espadas christans .
Como de rommum accordo,os dons primos volta
ram as armas para mais nobre empreza 0 combater os antigos inimigos da cruz ; 0 proseguir nessalonga lucta , encetada havia mais de quatro seculos
e que desde a conquista de Toledo dava j á indíciosde terminar um dia pela victoria deci siva do christianisrno . O s desastres padecidos na Estremadurae 0 5 proprios triumphos obtidos na Galliza tinhamattenuado as forças de Portugal . Era por isso indis
pensavel refazê-las antes de tentar qualquer facçãocontra 0 5 sarracenos do Gharb . Devia O golpe dadonos infiéi s soar bem alto para lhes quebrar 0 orgulho das passadas vantagens , vantagens que estavamhabituados a alcançar nestas partes desde 0 tempodo conde Henrique , todas as vezes que a s propriasdiscordias lhes consentiam repellir as lenta s e fracas tentativas dos christãos
,entretidos
,ainda
,talvez
,
(1 ) Que a paz durava em 1 1 38 deduz-se ,não só do si len cio
das memorias co evas sobre succes sos mili tares entre Portugal e Galliza durante este anno e quasi todo 0 seguinte ,
mas tambem da presença do conde Fernando Peres na
corte d '
Aífon so Henriques em mai o do mesmo anno, con
iirmando a amp l iação do Conto do Porto (Arch . Nacion ,
Chancell. de A ffonso IV , L . 2 , f . se não era antes oFernando
'
Peres , que com O titulo d e Coiermanus do in
fante con firma a carta de Couto de Cucuj ães em . julho de1 1 39 (Arch . Nacion . M . 1 2 de For . An t . n .
' 3 , f . 62 v . ) quesuppomos ser Fernando Furtado , f i lho bastardo de D . Ur
raca e do conde Pedro de Lara , cuja presen ça na corte doprimo prova igualmen te a existencia da paz entre os
dous paizes .
1 62 H ISTOR IA DE PORTUGAL
capital,como seductor do vulgo mas elle foi esta
belecer a suamorada num cemiterio viz inho,aonde
concorriam a ouvir-lhe as practicas os seus devotos , practicas nas quaes , como é facil de antever ,
não poupava 0 5 almoravides .
Neste tempo ( 1 1 2 0 ) tomou elle 0 nome de Almahdi
,que
,segundo a tradição arabe
,era um
chefe poderoso que no fim dos seculos devia vir
ao mundo reconduzir 0 5 homens aos verdadeiroscaminhos do islamismo . Seguiam-no j á muitos , e0 amir pensou seriamente em acabar com esteperigoso propheta. Sabendo-o a tempo
, Al— mahdifugiu para Tynmal
,na provínc ia de Sus
,onde se
fez acclamar imarn ou summo pontí fi ce e,prose
guindo entre os rudes montanhes es mi ssão queemprehendera ,
em breve augmentou O numero dosseus sectarios a ponto de se fazer temido . Denomi
nou— os almohades (Al»muwahedun) ou unitarios ;porque um dos obj ectos a que mais se dedicava era
a provar a unidade de Deus . Tanto que pôde ajunctarVinte mil homens capazes de pegar em armas
,
recorreu ao systema de conversão mussu lmanoa guerra . Desde 1 1 2 2 até 1 1 30 , em que Al
— mahdifallecen
,0 5 alrnohades augmentaram em poder e
em numero com repetidas Victorias contra 0 5 almoravides . Por morte do propheta , Abdu-l— mumen
,
que entre os seus primeiros di scípulos fora 0 que
elle sempre distinguira , soube obter para si a dignidade de unam e , continuando com prospera fortunaa combater os seus adversarios , vendo— se j a obede
eido numa grande parte do Moghreb ,declarou-se
amir-al— muminin 0 11 khalifa , título que nenhumdos amires lamtunenses , apesar de dominarem na
A frica e na Hespanha , ousara tomar para si
( 1 ) Abd-el-halim ,H ist . dos Sober . Mohamet . (Vers . de
c . 43 e 44 . Conde, P . c . 26 a 28 e 3 1 . Khawel
LIVRO 1 1 1 63
No meio destes acontecimentos chegou O anno dahegira 532 ( 1 1 37 A Temi n ,
seu irmão , Aly substituira no governo de Hespanha 0 proprio fi lho esuccessor
,Taxfin . Era O príncipe sarraceno activo
e valente sustentava com esforço a guerra nas
fronteiras christans e continha com energia 0 5 mu ssulmanos de Andalús , malsoffridos debaixo do jugoalmoravide . Porém es se espirito d
'
independencia
dos indígenas,em grande parte . de raça arabe e
inimigos dos lamtunitas berbers , que, não con
tentes de 0 5 dominarem ,0 5 opprimiam ,
começou amostrar — se claramente apenas foram sabidos na
Peninsula 0 5 triumphe s dos almohades e que apotencia almoravide começava a declinar . Os dis
trictos de Huete eAlarcon rebellaraln-se , e a cidadede Cuenca ousou resistir a Taxfin , que viera soce
gar aque11es alvorotos . Entrada a força,os seus
hab itantes foram passados a espada . No meio destessymptomas tanto de recear
,0 principe sarraceno
recebeu ordem de seu pae para passar ao Moghreb .
( ) s exercitos do amir eram destroçad0 5 em quasitodos 0 5 recontros com 0 5 sequazes de Abdu-lmumen
,j á senhor de grande parte das províncias
do imperio,com 0 que a ruína da dynastia lamtu
nense parecia imminente . Pas sou Taxíin logo Omar
,levando comsigo a flor das tropas almoravides
que traziam sopeados 0 5 mussulmanos andaluses edefendiam as fronteiras contra 0 5 christãos , augmentando
,além disso
,0 seu luzido exercito com
quatro mil auxiliares mosarabes,homens moços
e valentes . A partida destas forças,deixando des
guarnecidas as praças mussulmanas,abriu cami
cl Tewarikh , p . 335, em Romey , Hist . d'
Esp . , T . 6 , p . 1
e segg . Al-makkari , History o f the Mohammedan Dynasties in Spain (Vers . de Gayangos ) , B . 8, c . 1 e 2 .
1 64 H I STOR IA DE PORTUGAL
nho ao fogo da rebellião que lavrava nos animos eexcitou a audacia dos christãos
, que fraca resis
teueia podiam achar nas rareadas fi leiras dos lamtunitas , obrigados a prevenirem-se contra as tenta
tivas dos proprios sarracenos de HespanhaNeste estado de cousas
,A ffonso VII
,feita a paz
com 0 infante de Portugal , preparou— se para invadir 0 territorio mussu lmano . Postoque O rei deNavarra continuasse a sustentar a guerra contra 0
monarcha leonês , este fazia — a alli pelos seus capitães e
,livre das inquietações que lhe davam 0 5
portugueses pelo lado da Galliza ,avançou ( 1 1 38)
até as margens do Guadalquivir . Deste ponto , dividindo 0 exercito em corpos volantes , mandou — o sdevastar e saquear 0 5 districtos de Jaen ,
Baeza ,
Ubeda e Anduj ar,queimando 0 5 logares abertos
e destruindo os campo s e arvoredos . Marchandonesse mesmo anno contra Coria , apesar de fazer
grandes estragos nas cercanias , não a pôde tomar eretirou — se a Salamanca ; mas no anno seguinte preparou— se para a conquista do famoso castello deAurelia (Orej a ) . Era este uma das principaes fortalezas mouriscas das fronteiras de Toledo e terrívelpadrasto contra 0 5 christãos . Começou O cerco em
Passô a A frica l levando en su compania la j lor —de la
caballeria de 10 5 almoravides , que h izo notable f alta paralas revue ltas y turbaciones que en Espana se susci taroncon su ausencia y assi m esmo l l evó quatro mil christianos de Andalusia mui dies tros eu las Conde ,
P . 3 , c . 36. Rex Texuíinus ab ii t trans et transtul it secum multos chri stianos quos vocant musarabesChron . Adef . Imperat , L . 2
, c . 52 . Esta chron ica põ e a
partida de Tax íin em 1 138,0 que devia ser no princ ípio
do anno . A en trada de A ffonso VII até 0 Guadalquivire a divisão do seu exercito em partidas provam , alémd isso , claramente a ausenc ia de Tax fln e da cavallaria
almoravide .
1 66 H ISTOR IA DE PORTUGAL
leiros de A ffonso Henriques . Era uma seita agonisante debaixo dos golpes da sua feliz e vigorosarival ; era a estrella da dynastia lamtunense que se
eclipsava ; era um povo,conquistador recente , que
sentia agitar-se — lhe em roda sedento de vingança Opovo subjugado , 0 qual virtualmente conspiravacom os seus proprios e antigos adversarios , 0 5
christãos,para a ruína daquelles que se podiam
chamar inimigos de uns e d *outros ; inimigos dos sarracenos hespanhoes por tyrannia politica dos christãos por odios de crença e por emulação de con
quista . O armistício tão facilmente concedido porA ffonso VII aos esforçados defensore s d ,
:àurelia
prova que O verdadeiro estado dos negocios na
Africa era por elle bem conhecido . A sua apparente
generosidade , que , de outro modo , seria um grandeerro , sem dúvida se estribava na certeza que tinhada inutilidade della para 0 5 sitiados .
Atfonso Henriques j azia apparentemente em pro
funda inacção desd e a paz de Tuy,como s e 0 seu
animo inquieto e guerreiro se achasse cançado deuma vida de contínuos perigos e combates . Não eraassim . Preparava-se em silencio para novas e mais
gloriosas emprezas do que fazer nos domínios doimperador uma guerra sem resultados seguros eque
,na situação especial da Península , onde duas
crenças e duas raças estavam a braços uma com aoutra , se podia considerar de certo modo como
guerra civi l . Tinha de vingar 0 5 desares por que
passara nas fronteiras meridionaes ,e era assim
,
entretido nos preparativos para uma grande cor
reria dirigida ao coração do Gharb , que 0 principese conservava em simu lado repouso . A conjuncturaaccommodava-se marav ilhosamente ao intento . Noanno preterito seu primo pene trara até bem pertoda
'
cap ital dos estados mussulmanos da Hespanha e
L IVRO 1 1 1 67
deixara assoladas províncias até onde raro ou nuncatinham ousado chegar as armas christans . A debilresistencia que A ffonso VII encontrara era indícioevidente da impotencia do imperio lamtunense .
Era-o agora tambem O cerco de Aurelia , praça militarimportantíssima , para 0 5 sarracenos não haveremde consentir em que estivesse posta impunementeem apertado sitio ,
se lhe fosse possível soccorre— la .
Na verdade Ibn Ghanyyiah ,wali de Valencia
,com
outros cabos principaes das forças almoravides doAndalú s tinham feito uma demonstração contraToledo com O intuito de divertirem para a capitala attenção do imperador , mas nem por i sso esteabrira mão da empreza
'
em que estava empenhadoe 0 5 generaes almoravides haviam -se retirado se1ntirarem proveito algum da sua tentativaEra tempo de aproveitar as circumstancias . Ja
em maio deste anno de 1 1 39 se faziam os preparativos de uma expedição militar
,e 0 5 homens d '
armas
corriam a ajunctar-se as suas bandeiras Entrado0 mês de julho 0 exercito português marchou para0 meio-dia Em vez de se encaminhar paraaquella parte do Gharb que se dilatava desde afronteira de Santarem até Li sboa pela margemdireita do Tej o e que , por este lado da Hespanha ,tinha tantas vezes sido theatro de sanguinolentasluctas
,0 infante transpôs 0 rio e , atravessando no
seu terrível fos sado 0 11 correria 0 sertão da provincia
, nunca até ahi devassado das armas chris
(1 ) Chron . Adef . lmper . , L . 2 , cap . 68.
(2 ) cl s i obiero ia exercita reg is , d iz um cavalleiro em
doação de 1 8 de mai o de 1 1 39 ao mosteiro d e PendoradaD issert . Chronol .
, T . 3,P . 1 , p . 1 1 6, n .
º 354 .
(3) Doaç . a Monío Guimariz fei ta pelo in fan te em j ulhode 1 1 39 quando ia para o f ossado de Ladera Eluc id ; de
Viterbo,T . 1 , p . 473 , verb . Foro morto .
1 68 H I STOR IA DE PORTUGAL
tan s , dava mostras de se dirigir contra Silves , apovoação mais importante daquellas partes . A au
dacia da empreza,os estragos inevitaveis nestes
fossados , expedições cuj o firn principal era 0 talaros campos do inimigo
,deviam causar profundo
susto, por isso que a invasão de Af fonso Henriques
parecia combinada , e porventura 0 era , com 0 commettimento de Aurelia pelo imperador . Por outraparte
,5 Vista do que temos narrado ,
mal podiamos governadores almoravides destes districtos es
perar soccorro das províncias mai s orientaes deAndalús , e a marcha rapida de Ibn Errik (nomecom que 0 filho do conde Henrique era designado
pe10 5 sarracenos ) diffi cilmente consentiria delongaspara invocar alheio aux ilio
,ainda quando houvesse
probabilidade de obtê-lo . Assim,era necessario que
em si proprios buscassem recursos para cortaremO p asso aos christãos ,
servindo — se unicamente dasforças que
,partindo para a Africa
,lhes deixara
Taxfin .
A vasta extensão de territorio que se divide hoj enas duas províncias do Alemtejo e do Algarve
,
quando 0 5
'
a11n0 ravide5 subjugaram a Hespanhanos fins do secu lo XI constituía junctamente com
uma porção da Estremadura hespanhola e , talvez ,da província de Sevi lha 0 5 estados dos Beni Alafftas0 11 amires de Badaj oz , que senhoreavam tambem
aquella parte da Estremadura portuguesa aindanão conquistada pelos christãos
,inti tulando— se por
is so amires do Gharb . Com a entrada dos lamtunitas acabou este amirado ,
como 0 5 outros do Andalús e 0 5 waliados dos districtos
,0 5 wasirados
das cidades de segunda ordem e as al-kayidarias
( 1 ) - 11) n Al— khatib , em Casi ri Bib l . Arab . Hisp . , T . 2 ,
2 1p . 7 . Conde , P . 3 , c . 1 e espec ialmente 0 2 2 .
1 70 H I STOR IA DE PORTUGAL
dos castellos foram naturalmente distribuídos entre0 5 conquistadores . Se estes conservaram as anteriores divisões territoriaes ou se fi zeram nova di5tribuição de governos subalternos é 0 que não seráfacil dizer . Todavia
,antes de começarem 0 5 chris
taos a apoderar — se dos territorios além do Tej o e aosul de Leiria , 0 Gharb compunha — se de tre s provincias 1 .
ª de Al— faghar ou de Chenchir,onde
estavam situadas as cidades e castellos de SanctaMaria (Faro) , Mirtolah (Mertola) , Chelb (Silves ) ,Oksonoba (E5t0 i ) , Tabira (Tavira) , e outro s ; ade AI — kassr Ibn Abu Danes , contendo a s importantes cidades de Bataliõs (Badaj oz ) , Xerixa (Xerezde 10 5 Caballeros ) , Iaborah (Evora) , Marida (Merida) , Cantarat Al— seyf (Alcantara ) , Curia (Coria ) ,Belc'h ou Ielch (E1vas Baj ah (Beja ) , Al-kassar (Alcacer do Sal) . e varios castellos e povoações , comoJelmanyah e Sheberina3.
ª a de Belatha,cuj os principaes logares eram as
duas cidades de Chantarin 0 11 Chantireyn (Santarem) e Lixbona 0 11 Achbuna(Lisboa) e 0 roqueirocastello de Chintra ou Zintiras (Cintra) . Abaixo deAchbuna , na margem opposta da bahia do Tej o
,
via-se O forte de Al-maaden (Almada) , isto é , damina
,nome que lhe Vinha das palhetas de ouro
que 0 r0 10 do mar lançava nas suas pra ias , e que se
entretinham em ajunctar durante O inverno 0 5
habitantes daquelles districtos Esta importante
(1 , Edrisi , Geograph . (versão de Jaubert : Par1 s ,Vol . 2 , p 1 5 e 1 6 , e p . 2 1 e segg . , comparado com Al
makkari e Ibn Khaldun (versão de Gayan gos) , Vol . 2 ,
texto e append ices pass im, Conde . P . 3 , e Casiri , Vol . 2 ,
pass im. Edrisi acab ou de escrever a Geographia em 1 1 54por ordem de Rogerio de Sic i lia ; mas a sua viagem na
Hespanha devia ter sido bastante anterior, porque as ma
terias para a obra levaram muito tempo a colligir (Pro
L IVRO 1 1 1 7 1
parte da Hespanha mu ssulmana foi a primeira aabandonar a decadente dynastia lamtunita . Nomeio das perturbações que agitavam então 0 Andalús , um certo Ahmed Ibn Kasi apoderou — se deMertola e dos territorios circumvizinhos , emquantoSeddaray 0 11 Sid Ray se fazia senhor de Badaj oz edo resto do Gharb . Das narrativas dos historiadoresarabes não se pôde conhecer exactamente quando severifi cou a partilha ; se ante s
,se depois de 1 1 39 .
Occorressem ,porém , taes successos anterior ou
posteriormente a essa data , é certo que por aquellaepocha Seddaray e Ahmed desmembraram em dousestados independentes a antiga monarch ia dos BeniAlafftas dominando Seddaray , segundo parece ,ao norte e ao oriente
,e Ahmed ao 511 1 e occidente .
Ou dominassem estes regu los , ou estivesse ainda0 paiz suj eito aos governadore s ahi postos peloimperador de Marrocos , 0 que sabemos é que os
chefes mussuhnanos,pelo menos 0 5 do Alemtejo ,
se“
uniram para atalhar a invasão do terrível IbnErrik . Este achava-se j á nos campos que se dilatamao sul de Bej a quando 0 5 walis e kayids das praçasdo Gharb marcharam ao seu encontro . Numa das
logo , XX e XXI) . E na verdade,essa viagem foi feita de
1 1 42 a 1 1 47 , p o is que da narrativa d'
Edrisi se vê que pre
cedeu a conquista d e Santarem e Lisboa pe los christãos
e foi posterio'
r à tomada de Coria em 1 1 42 Edrisi , Vol. 2 ,
p . 2 5. e Chron . Ade f . Imp . 2 —
74 .
(1 ) Ibn Khaldun cit . por Al-makkari : L . 8, c . 2 (T . 2 ,
p . 30 9 de Gayangos) . Ibn Kasi (Ahmed ) and Ibn Wasir
(Seddaray) shared among themselves the w hole o f thatcountrv , wh ich had once b elonged to th e Beni Alaíitasib id . Ahmed Ibn pro íi ting by the c ivil wars ,wh ich di stracted Mohammed on Spain at the commence
ment o f the twe l fth cen tui y , be made h imselt master o f a
considerab le portion o f the Al Gharb : Gayangos , Vol. 2,
App . D , D. 49 . Conde , P . 3 . c . põe estes successos deIbn Kasi (Aben Cosai) em 1 144 .
1 72 H I STOR IA DE PORTUGAL
eminencias , por me io das quaes 0 50 10 se vaefazendo mais agro e ondeado desde as planuras deBej a até se converter nas asperas serranias deMonchique
,estava assentado 0 logar ou ca stello
denominado pelos arabes Orik Foi nestas immediações que sarracenos e christãos se encontraram .
Apesar de que O antigo esforço e 0 irresistívelenthusiasmo dos lamtunitas , corrompidos pelasriquezas e pelo luxo , fructos das passadas c
'
on
quistas , tinham grandemente esmorecido , ellesrecorreram a uma das guerreiras usanças dos seusantepassados do Moghreb para preencherem asfi leiras
,ou rareadas pela partida de Taxfin
,ou
porque as guarnições dos castellos daquelle tempo ,ainda completas
,eram 1nui pouco numerosas
As mulheres a1n1 0 ravides,vestindo as armas
,
Vi eram pelej ar ao lado de seus maridos e irmãosem defesa da terra que as tribus de Lamtunaolhavam como nova patria depois da conquista doAndalú s
Aº excepção desta , as circumstancias da batalha
de Ourique ignoram — se inteiramente . As chronicas
christans coevas ou quasi coevas que a mencionamfazem-no em bem curtas palavras
,e nos di versos
escriptores arabes que nos transmittiram a historiade Hespanha neste periodo não se encontra 0 mi
(1 ) Moura , Vestig . da Ling . Arab , p . 1 71 .
(2 ) Para se fazer idea do l imitado numero d e soldados ,que guarnec iam qualquer castel lo naquelle tempo , oh
serve-se que Merto la , a ma is f orte de todo o Gharb, fo i
salteado por seten ta homens do partido de Ibn KasiConde , P . 3 , c . 34 .
(3) foerninae sarracenae in hoc praelio ,amazonico ritu ,
ao mod o pugnarunt , ut occ isz—e tales deprehensae Chron .
Go thor . na Mon . Lusit .
, P . 3 , L . 1 0 , c . 3 . Es te uso de
entrarem as mulh eres nas batalhas era pecul iar dos almoravides Casiri
, Vol. 3, p . 2 1 9 .
1 74 H I STOR IA DE PORTUGAL
vencidos a quatro centos mil sarracenos e a'
fazerintervir na tentativa 0 proprio Deus . Se acredi
tarmos os chronistas antigos e ainda 0 5 hi storiadores modernos a batalha de Ourique foi a pedraangular da monarchia portuguesa . A11i 0 5 soldadosno delírio de tão espantosa Victoria
,de que haviam
sido instrumento e víctimas cinco reis mouros e 0 5
exercitos sarracenos d,
Africa e de Hespanha,acela
maram monarcha O moço principe que 0 5'
conduz1ra
ao triumpho . Algumas,porém
,das memorias ou
coevas ou mais proximas contentam— se de exaggerarO numero dos inimigos , omittindo as outras particularidades que 0 tempo
.foi accrescentando ao
successo dizemos exaggerar, porque 0'
li1nitad0
das forças almoravides que guarneciam a Hespanhamussulmana
,segundo se Vê do . que anteriormente
narrámos,e a rapidez da invasão
,feita em quinze
ou vinte d ias,não consentiam virem a Ourique
tropas das províncias mai s remotas,ainda sup
pondo a exi stencia dessas tropas,0 que O abandono
de Aurelia bastaria para ' nos constranger a não
acreditarApó s esta j ornada
,Affonso Henriques , saqueados
e destruídos,provavelmente , os logares abertos da
provincia de Al— kassr,voltou aos seus dominios .
Os despoj os,porém
,daquella bri lhante entrada
eram 0 preço de menos valia em tal empreza . Mais
graves resultados deviam ser 0 5 da ordem moral?principe português dera aos sarracenos uma
aspera demonstração de que as algaras pelo ladodas fronteiras de Santarem elle respondia assolandoos districtos centraes do Gharb ; mostrava aoimperador qual era a ousadia dos cavalleiros e
(1 ) Nota XV I no fim do vo lume .
-L IVRO I I
homens d '
armas de Portugal ; habituava estes acombater os infi éis e1n rasa campanha , exercitando0 5 e predispondo — os para as futuras conquistas
,e ,
finalmente , restaurava 0 5 brios necessariamenteamortecidos com 0 5 tristes acontecimentos renovados por tantos annos nas fronteiras do di strictode Belatha e com as humilhantes condições imposta s
por Affonso VII ao infante na conju'
nctura dosreveses de Leiria e Thomar .
A guerra entre Portugal e Leão rompeu d 'ahi apouco
,ainda nos fins de 1 1 39 ou ,
0 que nos parecemais de crer , nos principios do an o seguinteAS memorias desse s tempos não nos di zem quem
quebrou as pazes j uradas só sabemos que a luctainterrompida por dous annos começou de novo . O
mais de presumir é que Affonso Henriques fosse 0
agressor ,porque era a elle que interessava 0
annullar 0 tractado de 1 1 37 . Nesse ou noutro presupposto
,é certo que O vencedor de Ourique pene
tr0 u*
na Galliza -pelo lado de Tuy Invadi ndo,
porém,aquella provincia , 0 infante encontrou 0
seu mais perigoso adversario , 0 valente alcaide de
(1 ) A falta absoluta d e dip lomas originaes de Atl'
onso
Henriques desde junho de 1 1 39 até junho de 1 1 40 persuadeque el le se demorara na expedi ção do Alemtej o e que ,
vol tando aos seus estados , quebrara immediatamente apaz com O imperador , penetrando na Galliza . Esta fal ta dediplomas , que verificamos por nossos proprios 0 1h0 5 no
Archivo Nacional e que em vão temos fei to examinar se é
supprida nas outras collecçõ es de documentos do paiz , énotavel. Existe , todavia , uma carta de privi legios aos
cavalleiros do Sepulchro , incluída em coníi rmação de 1 256
(Arch . Nacion , Gav . 6 , M . un . n .
º29 ) e datada de 3 das
kal. d,
ab ri1 de 1 1 78 (30 março Mas como dizemos nofim da nota IV , esta data é obviamente errada
, perten cen
do 0 dip loma a uma epocha bastante posterior .
(2 ) D . Alfonsum in partibus Galleciae circa TudemChron . Go thor , ad aer . 1 1 78.
1 76 H ISTÓR IA DE PORTUGAL
Allariz . Fernando Annes j a não era 0 simplesde fensor de um castello ; era O general ou princ ipe ( 1 ) do districto de Limia. Nessa campanha
,se
acreditarmos a chronica de Affonso VII,0 5 portu
gueses não foram felizes , postoque se apoderassemde alguns castellos
,e 0 si lencio dos nos sos chroui
cons a respeito de taes successos,longe de invalidar
aquella narrativa , tende , quanto a nó s ,.a confi rma
la . fronteiro leonês obteve diversas vantagens ,aprisionando alguns dos principaes cavalleiros dePortugal , que para obterem a liberdade sacrifi caramavultadas sommas , naturalmente adquiridas na
passada correria além do Tej o . O proprio infantesaíu ferido em certo recontro de uma ascuma 0 11
lança vibrada por um peão das tropas de Limia ,ficando assim por algum tempo impossibilitado deconduzir pessoalmente a guerraPostoque pareça não terem sido em geral 0 5
successos da campanha nas fronteiras do norte favoraveis a A ffonso Henriques , todavia 0 seu valorajudado pelo dos barões e cavalleiros portuguesestornavam — no adversario digno de séria attenção .
Apesar da entrada pela terra dos sarracenos até 0
Guadalquivir e do assedio e conquista de AureliaI
(1 ) Ferdinandus princeps Limiae Chron . Adef . Imper.
1 32 .
(2 ) Idem ,ib id . Das memorias de Portugal apenas a
Chron ica dos Godos nos diz que ,neste anno Esmar, sa
bendo que Affonso Henriques estava na Galliza para as
bandas de Tuy , retido por negoc ios de que não podia f ac ilmente desembaraçar— se, veio sub ito , etc . , etc . Estes negociosnão podem ser , quan to a n ó s , senão a guerra com Fer
nando Annes,e a ferida que imp ossib i l itou 0 infante de
vestir armas por al gum tempo , e depo is a entrada do
imperador e 0 recontro de Valdevez , de que vamos falar .
Sobre chronologia destes successos veja-se a
no ta 111 .
1 78 H I STOR IA DE PORTUGAL
contro dos invasores . Travou-se um combate,e 0
conde, que loucamente se atrevera a affastar-se do
grosso do exercito ,foi desbaratado e captivo . C0 1n
este prospero successo 0 5 portugueses não hesitaramem avançar para Valdevez
,e Affonso VII viu
coroarem — s e de uma selva de lanças as altas easperas serranias que se prolongavam defronte doseu acampamentoAssim como as epochas de adiantada civilisação
tendem a fazer semelhantes os costume s de povosdiversos
,assim na infancia das sociedades usanças
barbaramente poeticas se repetem frequentementeentre nações divididas por largas distancias de espaço 0 11 de tempo .
' Os heróes da Ilíada preludiavam ao travar as batalhas por combates singulares ,com 0 5 quaes se excitavam O esforço e 0 enthusiasmo
do c0 1n1nu1n dos guerreiros . A idade média viumuitas vezes renovarem — se estas scenas da infancia da civilisação grega ,
e nas raízes do carrancudoSoaj o repetiram-se tambem esses duellos homeri
cos . Entre 0 5 dous exercitos a veiga do Vez o fferecia-se como uma
.
vasta estacada,onde os barões e
cavalleiros de Leão e Portugal podiam encontrars e corpo a corpo
,sem a desordem e confusão de
uma batalha , e experimentarem qual das duas províncias da Hespanha gerava braços mai s robustos ,animos mais feros . Foi um largo torneio em que avictoria coube aos valente s homens de guerra doinfante . Fernando Furtado ,
irmão do imperador,
Vermudo Peres , cunhado de Affonsb Henriques , 0
conde Ponce de Cabrera e mu itos outros dos maisnotaveis fidalgos da corte do imperador ,
derribadospelas lanças dos portugues es ,
ficaram prisioneiros ,segundo as le is da cavallaria . A memoria do facto
(1 ) Ib id .
L IVRO 1 1 1 79
perpetuou
)
se ahi no nome de Jog o do Buf urd io 0 11
Bof orda ( 1 ,que se pôs ao logar do torneio , O qual ,
depo is , a tradição popular , engrandecendo 0 successo , segundo é costume , denominou Veiga da Matança , bem que a h istoria não nos diga que Inorresse no combate um só dos nobres contendoresSupersticiosa como era aquella idade
,0 desba
rato do conde Radimiro e 0 captiveiro de tantossenhores e cavalleiros principaes deviam pareceraos leones es pessimos auspícios para uma batalha ,
que,aliás , s e tornava inevitavel. E na verdade - a
perda daquelles illustres guerreiros era justo 1n0
tivo de desalento . Accrescia que 0 5 portuguesestinham tomado melhores posições Nesta situa
ção ,Affonso VI I mandou ao campo inimigo men
sageiros que , em nome delle,pedissem ao arce
bispo de Braga para por sua intervenção se tractarda paz . Não obstante as vantagens alcançadas peloinfante
,0 desfecho da batalha era incerto ,
e 0 prelado português accedeu facilmente aos desej os domonarcha . Os receios de um combate brevemente
( 11 ) Ib id . Chron . G 0 1h0 r . Na Mon . Lusit . , P . 3 , L .
e 8 Cap ti s quibusdam castel lan is in 10 0 0 qui vocatur Lu
dus Buf urdii . e mai s particularmen te na que suppomos
paraphrase posterior : ibid . App . 1 ad aer . 1 1 78. Captisun t ex utraqueparte d iz 0 chronista de A ffonso VI I mas
vê— se em toda a narrativa deste successo que e l le pre
tende attenuar a desvan tagem do imperador , que aliásnão pôde negar . Buf urdium (baf orda ou bof orda , e d'
ah ibaf ordar ou bof ordar Elucid , P . 1 , p . 1 68) signi ficava con
junctamen te 0 que depo is veio a distinguir— s e com 0 5
nomes de torneio e de justa isto é j ogos m il itares comarmas verdadeiras e em que corria O sangue , e j ogos comarmas embotadas e de puro d ivertimento . Veja se Du
cange ,verb . Bohordium . Os ingleses chamavam— lhe buhur
dicium Rymer , Foedera (Lond . Vol . 1 , P . 1 , p . 2 1 3 .
(2 ) Chron . Adef . Imper . 1 33 . Chron . G0 1h0 r . 10 0 0 ci t .
(3) In 10 c0 altiori et aspero Chron . Ader. 1 . c it .
1 80 H I STOR IA DE PORTUGAL
se desvaneceram e, concordados a final o s dons
primos,falaram amigavelmente um com 0 outro .
Ajustou- se uma suspensão d'
armas por alguns annos
,ficando por mutuos fi adore s os cabos princi
paes de um e de outro exercito,até que depois com
mais socego se podesse assentar uma paz definitivae duradoura
,0 que poucos annos depois se reali
sou . Entretanto os prisioneiros feitos de parte aparte foram logo postos em liberdade
,
'e restituidos0 5 castellos reciprocamente conqu istadosEs tes acontecimentos passaram , Como j á notamos ,
dos fins de 1 1 39 até a primavera de 1 1 40 . O chefesarraceno desbaratado ern Ourique soubera da eutrada de Affonso Henriques ,
n'
a Galliza e dos re
véses que experimentara . E,até , ' natural que a
fama exaggerasse 0 perigo da ferida que ahi recebera . Sedento de vingança , Omar (se este era 0 seu
nome) ajunctou as tropas do Gharb e,atraves
sando inesperadamente a fronteira,accommetteu e
tomou 0 castello de Leiria , j á reparado e guarneeido de novo . Morta uma parte da guarnição e captiva outra com 0 seu antigo alca ide , Paio Gutterres ,
aquella importante fortaleza foi reduzida a um
montão de ruínas. D'
a11i,segundo parece , 0 5 sarra
cenos proseguindo na suamarcha assoladora,inter
naraln-se no coração de Portugal e,dirigindo-se
para 0 nordeste , avançaram até as immediações deTrancoso . A sorte desta povoação foi igual a de Leiria
,e 0 5 sarracenos haveriam tirado maior vingança
das devastações ( 10 anno antecedente feitas pelos
(1 ) Chr0 n . Gothor . na Mon . Lusit ., P . 3, L . 1 0 , c . 8.
Chron . Adef . 1 . c . A chronica toledana attribue aos
portugueses as d i l igencias para se fazer a paz . A verosi
milhan ça favorece a narrativa da Chronica dos Godos , queas attribue ao imperador, contra 0 qual estavam as pro
hab i l idades da batalha imminente .
1 82 H I STOR IA DE PORTUGAL
portugueses á coroa leonesa ; embora ,como depoi s
da invasão de 1 1 2 7 ,Portuga1 pareça as vezes resi
gnar-se a sorte das outras províncias'
da He spanhachristan
,os factos positivos e palpaveis contradi
zem essa especie de ficção polít ica . 0 5 pendões por
tugueses j á não esvoaçam em terras dos infiéis aolado dos de Leão e Asturias ,
'
de Galliza, de Castella e de Toledo . O in fante de .Portugal , quandosolta 0 seu grito de guerra , ao atirar — se por entrese1va5 de lanças sarracenas
,vae ,
como O rei das
feras , bu scar solitario sua prêa ; arca peito a peitocom 0 islamismo
,sem pedir soccorro aos outros
principes, que tem j á na conta de estranhos na
corte do imperador ninguem 0 viu nunca ; nas as
sembléas políticas da monarchia 0 . seu logar estásempre vazio os cofres do estado jamais se abrempara receber os tributos munic ipaes das provincias portuguesas , que começam cubrir — se de povoações , restauradas ou fundadas de novo finalmente , O orgulhoso A ffonso V II , que não pôde consentir a independencia do Aragão e ,
de certo modo ,
da Navarra , tomando O titulo de senhor de Naxera ;Affonso VII
, que inclue na enumeracão dos seus domini os esses paizes , ainda quando 0 5 naturaes lhedisputam 0 senhorio delles
,nem uma só vez se inti
tu la dominador de Portugal , contentando — se , acaso ,com imaginar que esse novo estado virtualmentese acha incluido debaixo do nome da Galliza , daqual é senhor e a que poucos annos antes os dousdistrictos do Porto e Co imbra estiveram
'
ligados .
Que se pôde deduz ir desta opposição entre 0 5 factos materiaes e 0 caracter politico das nossas relações corn a monarchia leonesa naquella epochaA mais obvia é que certo « numero de circumstan
cias , cuj a apprec iação na maxima parte é hoj e impossível , tinham tornado assas distincta naciona
-LIVRO 1 1 1 83
lidade portuguesa , apesar da sua recente data,para
se perceber ,ainda nesses rude s tempos
, que seriadiffi cil empreza 0 destrui-la . Mas
, em nosso entender
,não era só isto . O leitor não esqueceu por certo
quaes foram depois da morte de Atl'
onso VI as pretensões do conde Henrique , pretensões que são
como 0 elo de todo O processo da desmembração dePortugal . Quizera elle para si um largo quinhão naherança do sogro
,e ambos os partidos contendores
,
0 do rei dº
Aragão e 0 de D . Urraca,tinham enten
dido dever ceder-lhe 0 oeste da Península para 0attrahirem a propria parcialidade . A divi são e ademarcação do novo estado chegaram a fazer — se
com a possível solemnidade e com a concorrencia
dos barões leoneses e castelhanos . Desde esse 1110
mento a ambição do conde tinha um fundamentolegitimo . D
'ahi as pretensões de D . Theresa depoisda morte do marido , e d
'ah i, quanto a nó s , a insis
teueia,assim da rainha como de seu âlho , em ten
tarem apoderar— se das terras na Galliza e ainda nosdistrictos de Zamora
,Toro
,Salamanca e Valladolid ,
que em 1 1 2 1 vimos serem tão facilmente cedidas
por D . Urraca a sua irman . As invasões para alémdas fronteiras septemtrionaes e orientaes de Portugal
, por este período , apparecem— nos sempre na
historia tão repentinas,tão destituídas de motivos
conhec idos , que dessa mesma circumstancia se
conclue a existencia de uma causa permanente quetornava inuteis outros quaesquer pretextos para talprocedimento . Póde
,na verdade
,a ferocia dos tem
pos explicá-la s algumas vezes mas fora exaggerardemasiado a barbaria da epocha 0 attribui-las constantemente ao desenfreamento das paixões e a quebra de solemnes promessas .
Nesta hypothese , que nos parece a unica verosimil
,a situação relativa entre Portugal e Leão era
1 84 H I STOR IA DE PORTUGAL
reciprocamente falsa . Se por um lado a questão daindependencia se podia ainda em 1 1 40 considerarcomo problema ,
a dos limite s verdadeiros dos territorios que deviam pertencer ao herdeiro e repre
sentante de Henrique de Borgonha não era menosdisputavel. A dif ficuldade de resolver este complicado negocio parece-nos conciliar as ideas
,appa
rentemente oppostas , que as memorias e documen
tos daquelle periodo suscitam sobre 0 valor exactodas relações entre 0 novo e stado que surgia eaquelle de que nascera .
No seculo XI,bem como nos que lhe precederam ,
O titulo de infante era j á 0 que se dava aos filhos dosreis . D . Theresa
,que , como vimos , recebia dos sub
ditos 0 de rainha ainda em vida do conde Henrique ,havia tomado este ultimo quasi constantementenos seu s diplomas pouco tempo depoi s da morte domarido . Arrancando — lhe das mãos O poder
,seu
fi lho conservou por alguns annos 0 de in fant e com
que antes disso era designado . Todavia os portu
gueses não tardaram a dar-lhe 0 de rei, que 0 man ;
cebo hesitava em acceitar . Pouco a poucó , porém ,
elle começou a adoptar 0 de príncipe misturadocom 0 de infante e predominando sobre este desde1 1 36 . Era a palavra principe um vocabulo genericopara ind icar O che fe ou principal personagem deuma provincia
,de um districto e ,
até , de um corpode tropas , V indo
,portanto , a ser mais ambíguo
ainda que na linguagem moderna e por is so aecommodado á situação incerta em que Affonso Hen
riques se achava collocado . Vê — se,comtudo
,que ,
quando as circumstancias 0 constrangiam a recuarnos seus desígnio s de completa independencia elle0 abandonava
,limitando — se ao de infante . O povo
attribuia-lhe as vezes um ou outro , postoque O usomais commum pareça ter sido 0 denominá-lo rei .
1 86 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Entretanto os sarracenos,desbaratados na jor
nada de Trancoso,tinham retrocedido para O sul .
Soube então A lfonso I que uma armada francesa desetenta Ve las surgira juncto ao porto de Gaia e
,
acos sada dos temporaes ou por outro qualquer 1n0
tivo , viera fundear dentro do rio . Navegavam paraa terra sancta
,. talvez porque o s príncipes christãos
da Syria pediam'
soccorros aos seus co-religionarios
da Europa,suspeitando j á 0 5 successos que trouxe
ram em breve a perda de Edessa e deram motivo asegunda cruzadaÇO principe portuguê s resolveuentão commetter 0 5 sarracenos pelo districto deSantarem . Tracton 0 negocio com os capitães dafrota
, que levantou ferro e,descendo ao longo da
costa,entrou na bahia do Tej o
,emqnanto um exer
cito,marchando por terra , se aproximava de Lisboa .
Era 0 logar forte e bem defend ido,como 0 tempo
mostrou , e as forças do rei de Portugal junctas àsdos cruzados insufficientes para conquistá-la . Devastados os seus arredores
,a armada velej ou para
0 Estreito,e 0 exercito recolheu — se com os despoj os
obtidos, que eram um dos principaes motivos des
sas correrias continua sD epois deste succes so 0 5 primeiros cuidados de
Affonso Henrique s foram 0 fortifi car as fronteirasmeridionaes dos seus estados . O castello de Leiria
,
que úcara destruido na passada algara dos sarrace
nos,considerava — se como a chave do paiz por este
lado . Assim não tardou a ser de novo edificado e
guarnecido . A sua importancia era tal, que num
documento pouco posterior 0 5 alvazis e demaismembros do concelho municipal de Coimbra declaray am que os homens d '
armas do concelho que ten
( 1 ) Chron . Gothor. na Mon . Lusit .
, P . 3 , L . 1 0 , c . 9 .
LIVRO 1 1 1 87
tassem ir combater pela fé na Palestina fossem defender a Estremadura e em especial Leiria
,onde
,
se morressem ,obteriam a remissão dos seus pecca
dos do mesmo modo que em Jerusalem A for
taleza de Germanello foi construida tambem por
esses tempos para impedir os insultos dos inimigos,
que , avançando da provincia d'
A l—kassr pelos territorios agrestes e montuosos ao noroeste do Tej o ,
vinham ousadamente,seguindo 0 curso dó Doessa
ou por entre Pombal e Penella , talar os campos deAteanha e do AlvorgeNo meio de taes
.
prevenções chegou O a nno de1 1 43. Aproveitando as di fficuldades com que 0 5
almoravides andavam a braços,O imperador sitiara
Coria, que se rendeu depois de ter implorado emvão 0 5 soc corros d
'
Africa,emquanto O famoso al
caide de Toledo , Munio Affonso , desbaratava 0 5
walis de Sevi lha e de Cordova . Na primavera desteanno Affonso VII devastou os districtos de Carmona
,de Cordova e de Sevi lha
,e,rico de despoj os
,
voltou a Toledo para 0 5 repartir com os seus h0mens d
'
armas . A morte,porém , de Munio A ffonso ,
que entretanto perecera num combate com 0 adalidsarraceno de Calatrava , produziu viva impressãono animo do principe leonês , que despediu as suastropas
,resolvido a não proseguir a guerra senão
no anno seguinte
( 1 ) Doação do domínio ecc lesiastico de Leir ia San c taCruz de Coimb ra em 1 1 42 na Mon . Lusi t .
,ubi supra ;
Posturas da Camara de Co imbra de 1 1 45 no Liv . Pre to .
f . 2 2 1 . A-C hronica dos Godos (exemplar de Resende)traz a data da reed i íi cação de Leiria evidentemente errada ,
attribuindo -a ao anno de 1 1 44 11 1 82 O seu prime iro fora lé de 1 142 . (Arch . Nac . , M . 1 2 de For . An t . n .
º 3 , f .
(2 ) Chron . Gothor . ad aer . 1 1 80 . For . de Germanello
n 0 Liv . Preto . f . 2 2 2 .
(3) Chron . Ad ef . Imper . 2 —
74 .
1 88 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Foi durante esta calma da guerra com 0 5 mussul
manos que se tracton de estabelecer definitivamentea paz cuj os preliminares se tinham assentado em
Valdevez . O cardeal Guido de Vico viera por
aquelle tempo a Hespanha como legado do papaInnocencio II e ajunctara um concílio provincialem Valladolid
, em que se promulgaram as resolu
ções do segundo concílio geral de Latrão e se deram algumas outras providencias relativas especialmente á igrej a de Hespanha . O imperador e Orei de Portugal dirigiram— se ne ssa conjuncturaZamora para numa conferencia assentarem as condições de duradoura concordia . Guido
, provavel
mente como representante do pontífi ce,foi cha
mado a assistir á conferencia dos dons principes ,que , segundo parece , resolveram amigavelmente ascontroversias que 0 5 tinham obrigado a demorar aconclusão da paz . Quaes foram as condições desta ?
Nenhum monumento especial que n0 — 10 diga che
gou até nós mas 0 que s e pôde asseverar é que Oimperador reconheceu O titulo de rei que seu primotomara
,e que este recebeu delle 0 senhorio de AS
torga considerando-se por essa tenencia seu vas
sa110 . Não é menos provavel que , ainda como rei dePortugal , ficasse numa especie de dependencia politica de Affonso VII
,O imperador das Hespanhas
ou de toda a Hespanha ,como e11e se intitulava nos
seus diplomas . Segura assim a tranquillidade dos
( 1 ) A 4 de diciembre del 1 1 43 en donacion de la in fantaD . que ten ia esta c iudad (A storga) el rey de
Portugal por grac ia de1 nuestro ; anadiendo que la gobernaba em nome del portugues , Fernando Captivo , etc .
Flores , Esp . Sagr .
, T . 1 6, p . 20 6 . Sobre a narrativa destee dos sub sequen tes parágraphos veja-se no ta XIX no fimdo vo lume .
1 90 H I STOR IA DE PORTUGAL
rei, postoque nenhum acto nos reste de uma elei
ção regular . Mas isto não erabastante para destruir as le is gothicas que se oppunham á desmembração da monarchia
,apesar de alguns abusos
anteriores Ass im,com um direito politico assas
disputave1, nu1na epocha em que a força resolviamai s que nunca a sorte dos povos e dos imperantese ,sendo possível
,ou antes provavel, que , renovada
a lucta da independencia , Portugal , ainda em debilinfancia , viesse ou cedo ou tarde a succumbir
,
como succedera á Navarra , só collocando 0 seuthrono a sombra do solio pontificio Affonso Henriques podia torná-lo solido e estavel. A
' supremacia que em geral 0 5 11 111 111 0 pastor exercia sobretodas as monarchias chri stans associava-se a ideade que na Hespanha tinha a sé romana um dominioparticular e immediato e por isso , uma vez quee11a s e declarasse protectora do novo estado , a existencia individual deste estribava — se numa jurisprudeneia politica superior às mesmas instituiçõesW isigothicas .
Desde 0 X secu lo,e ainda mai s desde 0 tempo de
Gregorio VII , a maxima de que do papa derivavade certo modo a legitimidade e 0 poderdos principestemporaes havia — se dilatado e estabelecido comoum principio de direito pub lico
, que chegou aoauge do seu predomi ni o no pontificado de Innocencio III . Era 0 papado
,para nos servirmos da phrase
11 , Idem , ib id .
( 2 ) Non latere vob i s credimus regnum“
Hispaniae ah
antiquo juris S . Pe tri fa isset,et null i mortalium
sed so l i apostolicae sedi ex aequo p ertin ere . RegnumHispaniae ex antiquis consti tutionibus b eato Pe tro et S .
Rom . Eccles iae in jus et pr0 prietaten1 esse tradi tum
Gregorii V I I Episto lae I e V I I, apud Aguirre . Co l lect .
Max . Conci lior. B isp .
, T . 4 , p . 438 e 442 .
' L IVRO I I 1 9 1
de um profundo e por vezes eloquente de fensor desemelhante ordem de cousas naquelles temposuma especie de dictadura tribuni cia porque , re
caindo a sua acção sobre 0 5 ferozes e brutaes dominadores da Europa
,ella não podi a deixar de ser
protectora dos pequenos e desvalid os . A influenciare ligiosa do pontiíi ce ,
numa epocha principalmente caraéterisada pela a ssociação da crença Vivacom a soltura dos costumes , vinh a a ser urna poderosa alavanca para fazer vacillar 0 5 throno s maisfirmes e ao mesmo tempo uma columna de bronzea que s e encostavam 0 5 mai s vacillantes .
'
Se1n sy s
tema fixo , os soberanos de entã o procuravam aju .
dar-se da força moral do papa nas suas questões deamb ição , e obtinham esse perigoso auxílio a custade concessões que iam con50 1idand0 poli tica invariavel de Roma em tornar reali dade practica as
doutrinas da dictadura universal . Repelliam ellesalgumas vezes a idea de que O papa fos se 0 dispen
sadór das coroas mas esses mesmos que numa ounoutra conjunctura recu savam a jurisdicção emi
nente da igrej a,levados da necessidade ou da cu
biça ,d 'ahi a pouco a reconh eciam
,invocando — a por
interesse proprio . Em tempo opportuno teremos detractar especi almente das opiniõe s que nessestempos vogavam semelhante respeito e
'
das suasconsequencias . Aqui será suffi ciente advertir quepelo meado do seculo XII
'
a theoria da di ctadurados papas adquiria cada vez mais força , e 0 5 estados que se formavam de novo
,0 11 as dynastias re
centes que as revoluções substi tuiam às antigasprocuravam legitimar a sua exi stencia politica pela
« 1 : Gioberti , Del Primato Morale e C iv'
i l e degli I taliani ,
T. 1 , p . 2 45 l_ediç . de
1 92 H I STOR IA DE PORTUGAL
confi rmação do successor de S . Pedro , esquecendose do preço porque haviam de comprar no futuroessa sancção do chefe visível da igrej aPartindo do pensamento theocratico predominante
na christandade,A ffonso Henriques , apenas assen
tada a paz de Zamora , tracton de illudir as couse
quencias della que lhe podiam ser de futuro desfavoraveis , appellando para a doutrina de Gregorio VIIe reconhecendo que ao pontí fi ce pertencia 0 summoimperio dos estados christãos da Peninsula . Estereconhecimento fé — lo nas mãos de Guido ,
ou anteriormente apartida do legado , nos l S de novembrode 1 1 43 para presidir ao synodo de Gerona oudepoi s disso
,suppondo que elle veio a Portuga l
antes de regressar para Roma . Numa carta dirigidaao papa 0 novo monarcha declarava qual era a si
tuação em que se collocara relativamente aSé apostolica em virtude da homenagem que fizera , e olferecia 0 seu reino a igrej a romana pagando O censoannual de quatro onças de ouro . As condições destahomenagem eram que os seus successores contribuiriam sempre com igual quantia e que elle rei , cornovas sa110 (miles) de S . Pedro e do pontífice , não sóem tudo 0 que pessoalmente lhe tocasse , mas tam
bem naquillo que dissesse respeito ao seu paiz e áhonra e dignidade do mesmo paiz
,achasse aux ílio
e amparo na sancta Sé,não reconhecendo dominio
algum eminente,ecclesiastico ou secular , que não
fosse 0 de Roma na pessoa do seu 1egad0 (3) .
(1 ) A'
cerca da supremacia temporal do papa nesta ep ochaveja— se Hal lam , Europe in the M iddle Ages , Chapt . VI , inmedio . Eichhorn , Deutsche S t . u . Rech tsgesch ichte II ,52 31 . Baumer , Gesen. der Hoh enstauffen ,
VI,S . 1 1 2 e
seqq . (2 .
ªed ição) .
(2 ) Aguirre , T . 5, p . 57 .
(3) Ex regesto Innoc . IV p . 364 authenticum exemp lar (no
H ISTOR IA DE PORTUGAL
seus adversarios e obtivessem na morte a recompensa da vida eterna ( 1 )Apesar da linguagem affectuosa que predominava
na resposta do pontí fi ce,dava-se nella uma cir
cumstancia que de certo modo devia tornar menosval iosas as promessas tão largamente liberalisadas .
Affonso 1 era rei pela vontade dos subditos e pelaconcessão do proprio imperador das Hespanhas ,
que por esse título 0 designava . Portugal era , por
tanto , um reino,embora O quizessem considerar
como dependente da coroa leonesa . Lucio II,porém
,
no endereço da carta tractava 0 j oven monarcha
por dux portugallenszs ,-0 que , no rigor da língua
lat ina,significava O principal cabeça , O chefe de
Portugal , designação vaga que admittia diversasinterpretaçõe s , esquivando — se ao mesmo tempo aintitular 0 paiz reino
,u sando do nome terra em
relação aos domínios de Affonso I, postoque este na
carta de vassa11agen1 se intitulasse rei e qualificassereino esses dominios que fizera censuaes ao papa .
Bastava uma circumstancia tal para mudar 0 as
pecto do negocio . Acceita pela Sé apostolica a homenagem da coroa portuguesa , os ultimos vestigiosda dependencia para com Leão desappareciam detodo
,mas O titulo de rei tornava — se duvidoso para
A ffonso Henriques . A separação de Portugal e stavaconcluida e legitimada ; não assim a questão damonarchia . Subdito do príncipe da igrej a , a estepertencia confi rmar-lhe a dignidade real . Era sobretal materia que
" desde então deviam versar as ne
gociações com Roma e sobre que provavelmenteversaram até 0 tempo de Alexandre III , que a finalreconheceu de modo explicito essa dignidade na
dynastia de Henrique 0 borgonhês .
(1 ) Idem,loc . citat .
L IVRO I I
Parece que a noticia das relações especiaes que
se estabeleciam entre Portugal e O papa não transpirou durante algum tempo e que este negocio foiConduzido com discri ção e segredo ; mas , emfim
,
Affonso VII chegou a saber 0 que se forj ava . Acasoe11e chamara O rei português para 0 seguir á con
quis ta de Almeria , a que assistiram todos 0 5 principes e senhores christãos da Península exceptuando Affonso I
,e este se negou a servi-lo , fazendo
então valer a homenagem que tributara ao pontífi cee 0 5 privilegios que alcançara de Roma . As memorias contemporaneas auctorisam a nossa “
conj ectura Lucio II vivera apenas um anno , e Eugenio III lhe succedera em f evereiro de 1 1 45. A estepontífice dirigiu 0 imperador uma carta que não
chegou até nós , mas cuj o conteúdo se deprehende
da resposta de Eugenio . Tinha ella por obj ectoprincipal duas questões diversas , uma ecclesiastica
,
outra secular,mas ambas vinham a cifrar-se na da
independencia de Portugal . Para conhecermos arazão por que A ffonso VII as tractava na sua cartaconjunctarnente e com igual interesse , e para entendermos como a questão ecclesiastica , naapparencia
ab solutamente estranha a politica , se prendia c0 1n
ella , é necessario que antecipemos aqui resumidamente alguns dos factos que havemos de tractar
com mais individuação quando chegarmos a estudara historia do clero nesta epocha ,
da qual é um dosmais curiosos ep isodios lucta entre 0 5 me tropolitanos de Toledo e de Braga .
Desde 0 VII secu lo,no tempo dos godos
,O bispo
de Toledo ,isto é
,da cidade cabeça da monarchia
,
tinha obtido uma especie de superioridade sobre 0 5
( 1 ) Nota XX no fim do vo lume .
1 96 H I STOR IA DE PORTUGAL
das outras metropoles , pormotivos de disciplina daigrej a nacional nas suas relações com O poder civil .
q uanto 0 5 arabes dominaram na maior par te daPeninsula
,0 prelado de Cordova
,sede do governo
sarraceno , teve em boa parte e ssa especie de supremacia
,que
,como a de todos 0 5 primados de di ffe
rentes regiões , nasceu de causas puramente politicas . Restaurada Toledo e convertida em corte danova monarchia gothica ,
bem como 0 fora da antiga,
Bernardo,seu primeiro arcebi spo , obteve de Ur
bano II O titulo e a dignidade de primaz das Hespa
nhas,em Virtude das anteriores preeminencias de
que esta Sé gosara Por algum tempo Braga acceitou O facto sem disputar a validade daquella primaz ia . O primeiro arcebispo bracharep se depoi s derestaurada esta metropole foi Giraldo
, que era
client e de Bernardo e que por consequencia não
repugnou a ordem hierarchica então estabelecida .
Seguiram— se— lhe tres homen s de caracter violento ,
que successivamente obtive ram a Sé archiepiscopalde Braga Mauricio Burdino , Paio Mendes, J0 50Peculiar . As resistencias
'
destes tres prelados áauctoridade que sobre elles pretendiam exercer os
arcebispos de Toledo , 0 11 como primazes 0 11 comolegados do papa
,foram cada vez mais energicas ,
aopasso que a Sé toledana mais vivamente insistia emexigir delles obedienc ia . As phase s daquella largacontestação acompanharam as do estabelecimentoda independencia de Portugal . Ao passo que a desmembração deste paiz se caracterisava mais e mai s
,
exaggeravam-se as pretenções de primazia daparte
de Toledo . Eram dous factos accidentalmente para
( 1 ) Flores , Esp . Sagr .
,T . 4 , p . 2 37 e sc a o: Masdeu
,Ó Ó'
H ist . Crit. d '
Esp .
, T . 1 1 , p . 1 49 e 5egg ., T . 1 3
, p . 288 e segg .
1 98 H ISTOR IA DE PORTUGAL
com uma injustiça não transitoria,mas perpetua .
Queixava — se tambem de que O arceb ispo de Braganão reconhecesse a primaziade Toledo estabelecida
por Urbano 11 e confi rmada por todos os
'
seus suecessores , sem excluir 0 proprio EugenioTaes eram 0 5 aggravos de Affonso VII . A res
posta é redigida corn a astucia ordinaria da chancellaria romana . A11udind0 rapidamente às queixassobre a acceitação do censo e sobre as promessasde protecção contra quem quer que pretendesse dominar em Portugal , ao que , é evidente , se referia Oimperador , Eugenio , que provavelmente renovaraas p romessas do seu antecessor Lucio II , nega 0
facto de um modo ambíguo,envolvendo a sua obs
cura negativa numa torrente de expressões vagasde carinho e affeição . Passando depois a tractar deoutros obj ectos
,procura dar satisfação ao monar
cha offendido á custa do arcebi spo de Braga . Nesteponto Eugenio abandona 0 estylo luxuario ,
as lon
gas phrases que se arrastam como a serpente e éemfim
, claro e conciso . Os seus predecessores man
daram que 0 5 metropolitas bracharenses obedecesseIn aos to ledanos elle mandou 0 mesmo
,e os seus
preceitos serão ex ecutados . João Peculiar é o ffereeido por Víctima expiatoria da homenagem feita peloprincipe português e acceita pela corte de “
Roma .
O papa mostrou-se,de feito
,inexoravel nesta mate
ria , e 0 prelado de Braga , suspenso do officio pas
( 1 ) Neque nob i s fuit quandoque vo luntas ut hono
rem vel dignitatem tuam, seu jus titiam regni tib i a DO
mino coxnmissi minuere in aliquo B ignum est ig itur ,
de cae tero , ut a querimonia tua des istas in eo videl icetquod portugalensium duce nos a l iquid recepisse , vel ei
etiam concess isse, unde j ura regni tui debeant imminui , velauf erri vel perpetuá injuria irrogar i Eugenii I II , Ep ist .
74 , apud Mansi , T . 2 1 , p . 672 .
L IVRO 1 1 1 99
toral , debalde foi advogar a suaLcausa perante
Eugenio,que
,para lisonj ear O imperador
,não só
constrangeu a e11e ,mas tambem a todos 0 5 arcebis
pos e bispos da Península a reconhecerem a prima
zia de ToledoA ssim terminou a larga contenda da separação
de Portugal da monarchia leonesa ao menos 1 150
nos restam monumentos de nenhuma outra tentativa do imperador para recobrar a minima aucto
ridade directa nesta parte da Hespanha . AO mes
mo tempo Affonso I parece abandonar para '
sem
pre a idea de dilatar os seu s estados ao norte e nascente das fronteiras portuguesas , e nem sequer se
encontram vestígios de que conservasse 0 dominiode Astorga , do qual , aliás , é naturalíssimo 0 pri
vas se Alfonso VII logo que soube das negociações
que elle entabolara com'
Roma . Desde este momento toda a actividade e espírito conquistador (10 principe português voltam-se para 0 meio — dia é sobre0 5 territorios s arracenos que e11e vae disputar ao
primo os limites dos proprios estados . Cada um deseu lado
,5 poríia ,
elles vibram as achas (Yarmas
sobre as arrancas e troncos da arvore carcomida doislamismo hespanhol ; e a arvore geme estroncandose debaixo dos golpes daquelles braços robustos . E
'
uma grande mudança que por esta epocha se operano caracter da nossa historia politica . A 1 lueta dadesmembração vae succeder a de assimilação . Por
tugal está constituido . O sangue derramado em
muitos combates , os estragos de successivas invasões e quasi trinta annos de energia , de perseveran
ça e de destreza tal foi 0 preço por que nossos avó scompraram a sua independencia . Os historiadores
Idem,ib id . Epist . 75 e segg .
2 0 0 H I STOR IA DE PORTUGAL
teem pretendido assignalar uma data exacta , umunico ponto no correr dos tempos em que ella nascesse e plenamente se realisasse ,
como se a natureza das cou sas não repugnasse a isso , e os factossuccessivos que compõem este facto ,
multiplo,com
plexo e , por consequencia , lento em completar— se ,não lhes bradassem bem alto que semelhante pensamento era absurdo . Preoccupados por aquellaidea no exame dos successos parciaes , ç ollocaram auma luz falsa a maior parte delles . E assim que
a historia de Portugal no seu berço , amplamenterecheada de fabulas inverosimeis e insulsas , está ,acaso , transfigurada pela má appreciação dos acontecimentos verdadeiros ainda mais do que por ellas .
AS fabulas,versando ordinariamente sobre parti
cularidades,fogem
, em parte , da memoria do leitor . 0 que fica e stampado na sua alma são 0 5 1ineamentos dos factos capitaes da historia . 0 valor men
tido destes,a sua cor legitima alterada , eis 0 que
induz mais que tudo emerrograve , e , por via de regra , 0 5 erros mais graves sao 0 5 de mai s largavida .
Antes de começarmos a narrativa das emprezas
guerreiras de Atfonso I contra 0 5 sarracenos cum
pre que volvamos 0 5 olhos para 0 que se passavanos estados mussulmanos que iam ser theatro dessas emprezas . Importantes acontecimentos coinci
diam ahi com os actos que,assegurando -a definiti
vamente,consumavam a separação de Portugal
do resto da Hespanha chris tan . Esses acontecimen
tos facilitavam de extraordinario modo as novastentativas que ia fazer 0 es forçado rei dos portugueses , constrangido não menos da necessidade politica do que da ambição . Examinados superfi cialmente
,vistos unicamente por um lado , não teem
facil explicação 0 5 repetidos triumphos e rapidas
2 0 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
dade do homem,a magestade dos principes e as
virtudes da família se converteram em tre s grandes mentiras , ha ahi uma nação que vae morrer . Aprovidencia , que 0 previu
,suscita então outro povo
que venha envolver aquelle cadaver no sudario dosmortos . Pobre , grosseiro ,
não numeroso, que im
porta i s so ? Para pregar as taboas de um ataúde
qualquer pequena força basta .
Como bem observa um historiador moderno,a
Hespanha mussu lmana representava n0 meado doseculo XII uma imagem do Baixo -Imperio
,inhabi
litada igualmente para se defender e para se governar O quadro que do estado das cousas pub licas naquelle tempo nos deixaram os escriptores
arabes,ou contemporaneos 0 11 mais proximos
,é,
na verdade , 1asti1n 0 50 . A ruína do pa iz,aos 0 1110 5
das pessoas prudentes,parecia inevitavel
,porque
a decadencia moral era extrema . 0 5 homens deprobidade e 5c1en0 1a V 1V1a1n desprezados e esquecidos
,e 0 5 que se apoderavam das magi straturas pu
blicas ajunctavam á cubiça e ao orgulho completaincapacidade . No meio de guerras c ivis , feita s sem
enthusiasmo , sern gloria e só por causas abj ectas ,ao passo que a agricultura se de finhava e as artesesmoreciam
,O povo deixava aos ambiciosos tracta
rem das armas , e 0 5 homens de guerra habituavamse a combater mais com 0 5 enredos do que com Oferro . Bastava só 0 nome dos inimigos (0 5 christãos) para fazer enfi ar de susto 0 5 mussulmanç s . Apaz desapparecera completamente , e ninguelnpodia contar com a propria segurança . Corria-se evi
dentemente para a dissolução da sociedade atravésdas di scordias intestinas e , por assim dizer
,no
( 1 ) Rosseeuw Saint — H ilaire H ist . d '
Espagne ,T . 3 , p . 461
(ed iç .
L IVRO 1 1 2 0 3
paiz de Andalú s eram já tantos os potentados quantas as povoações que havia nelle ( 1 )Vimos antes como 0 principe Tax fin fora chama
do á Africa por Aly . O renomemili tar do capitãosarraceno e as tropas de Hespanha que levavacomsigo eram a ultima esperança do imperio 1a1ntunense . A guerra com 0 5 almohades continuousem interrupção ; mas a sorte das armas nuncamelhorou para 0 5 almoravides
,e Aly , con sumido
de desgostos,fallecen em Marrocos dei
xando ao fi lho a triste herança de 11 111 throno que
desabava . Como general de seu pae e como im
perador ,Taxfin perdera 0 prestigio da passada
reputação e a boa estrella que na Hespanha O guiara . Os destroços succedi am aos destroços , sem que ,apesar da sua actividade e e sforço , podesse uma
só vez melhorar— se . Vencido numa sanguinolentabatalha juncto de Tlemecen
,acolheu-se a esta cida
de , onde se fortifi cou . Alli 0 teve cercado 0 principe
i
dos almohades,Abdu-I-mumen e
,não podendo
assenhorear-se da povoação que Taxfin defendi ava10 r0 5a1nente , marchou contra Oran em soccorroda qual foi logo O imperador a1n1 0 raV 1de . Por mui
to tempo as duas seitas combateram encarniçadamente sobre a posse daquelle logar que 0 amir deMarrocos considerava como um dos mai s importantes ; porque os seus desígnios eram passar d 'ahipara a Hespanha no caso de se ver inteiramenteperdido na Africa
,salvando assim ao menos os
seus estados da Europa . Nestes combates as forçasdos lamtunitas diminuiam
,e Taxf mvia desvanece
(1 ) Ibn Abdu — l— Wah ed , apud Casiri , B ib l . Arab . H isp .
T . 1, p . 2 1 5 . Abu— b ekr ,
Vestis Serica ,ib id . T . 2
, p . 53 .
Ibn Khaldun c it . por Al— ln akkari (Vers . de Gayangos ; ,
B . 8, ch . 2 .
2 0 4 H I STOR IA DE PORTUGAL
rem-se cada vez mais as esperanças de remedio .
Reso lveu — se , emfim ,a partir . Certa noite saíu de
Gran só sinho , d irigindo -se a uma das fortalezas doporto , juncto da qual tinha os nav ios apparelhadospara a pas sagem . Eram pro fundas as trevas , e elleseguia a cavallo as ribas do mar fragosas e altas .
No meio da escuridão errou O caminho e , precipi
tando — se dos barrocaes ,pereceu miseravelmente
Este acontecimento foi um golpe mortalp ara 0 5 almoravides . Ibrah im Abu I sak
,irmão ou
antes 6 111 0 , como outros d izem ,de Tax6n
,acclama
do em Marrocos por successor do pae , brevementeviu reduzidos os seus dominios ao ambito da capital . Sitiada
,e1n6 n1
,esta pór Abdu-l-mumen
,caiu
nas mãos dos almohades e Ibrahim foi bar
baramente decapitado pelo s vencedores,acabando
ne11e dynastia do celebre Yusuf , 0 feli z e valorosoe'
1nu10 de Affonso VI
q uanto estes successos se passavam na Africa,
via a Hespanha mus sulmana representarem-se
iguaes scenas , postoque. em mai s resumido theatro .
Abu Zakaria Ibn Ghanyviah era nesta epocha O chefesupremo do resto das tropas almoravides que guarneciam 0 Andalú s . Os mussulmanos hespanhoes
davam desde a partida de Tax6n vi síveis signaes
de quererem sacudir 0 jugo dos lamtunitas . 0 5
symptomas de odio profundo contra aquelles que ,
vindos como salvadores e amigos se haviam con
vertido e1n senhores tyrannicos surgiam por todaa parte
,e a fraqueza dos ministros publicos , que
não tinham,como dentro de pouco se experimen
tou,os meios necessarios de repressão para com os
indígenas,começava a ser de todos conhec ida . A
( 1 ) Conde , P . 3 , c . 36 e 37 Abd— el-halim (vers . de
Moura) , p . 2 0 6 e segg .
2 0 6 H I STOR IA DE PORTUGA L
desta guerra sanguinolenta , que se prolongou durante os ultimos meses de 1 1 44 e proseguiu pelosanuos segu inte s , senão no que tocar aos districtosoccidentaes , que , em consequencia daquellas discordlas
,Vi eram cair
nas mãos de A ffon50 HenriquesEstes districtos
estavam irreme
diavelmente per
didos para 0 5 lamtunitas . Ibn Kasi
1 2 . Moeda arabe cunhada em Merto6 zera dO fºrte C&S la por Ibn Kasi . Seg undo um, decalque
18 110 de 34 9 1 10 13 O do Snr . 0 . Antonio Vives de Madrid.)
centro dos seus es
tados , emquanto Seddaray fazia 0 mesmo em Badaj oz . Omar Ibn Al-mundhir , que fora um dos primeiros e mais ardentes partidarios de Ibn Kasi , reee
bera deste 0 governo de Silve s , sua patria , com uma
especie de independencia ) Ibn Ghanyyiah , que tra
ctava por todos 0 5 modos de amparar 0 decadentedominio almoravide
,buscou meios de introduz ir 0
ciume entre estes tres chefes quehaviam sido os principaes motores da guerra civil . Breve se lhe offereceuoccasião para realisar 0 intento , 0 qual devia dar umresu ltado que elle não previra . A revolução doGharb tinha-se estribado em dous solidos fundamentos
,um político e outro religioso . Era 0 pri
meiro 0 odio concebido pelos indígenas contra 0 5
lamtunitas ; era 0 segundo, que Ibn Kasi começara
a sua ambiciosa carreira seguindo as pisadas deAl-rnahdi
,0 que fundara na A frica a seita dos a1
mohades . Como e11e,Ibn Kasi estudara as doutrinas
( 1 ) Conde , P . 3,c . 34 , 35, 37 e 38 .
Ln'
Eo 1 1 2 0 7
de Al-ghazaly e como elle viera propagá-las entreos seus naturaes , onde encontrou muitos outros domesmo sentir Por este meio alcan çou a influencianecessaria para dirigir a reacção politica . Sabendoda morte de Tax6n em Africa
,succes so que excitou
ainda mais,como era natural , 0 incendi o da revo
lução na Peninsula , Ibn Kasi , uni do pela identidadede crença com 0 5 almohades , enviou mensageirosAbdu — l—mumen , offerecendo -lhe obediencia . O principe africano nomeou-o então wali do Gharb
,0 que
era habilitá-lo para opprimir de futuro aquel1es
que 0 tinham ajudado a engrandecer . Este negocio,
segundo parece , fora tractado em segredo ; mas Ibn
Ghanyyiah , que dell e tivera noti cia , aproveitou 0
ensej o para semea r a di scordi a entre os tres cabeça sda revolução
,fazendo persuadir a Seddaray e a
Omar,cousa aliás facil
, que Ibn Kasi só dera estepasso para se engrandecer á custa de11es , trazendoa Península 0 jugo a1n1 0 hade
,mai s duro que 0 dos
lamtunitas . Surtiu eíf eito O aviso , Seddaray e Omarbuscaram pretextos para declarar guerra áquelle
que havia s ido seu chefe ,e as tropas de Badaj oz e
de Silves marcharam contra Ibn KasiEstes successos passavam em 1 1 45, quando as
sanguinolentas dissenções entre O rei de Portugal e0 imperador se haviam já trocado , senão em pazsincera
,ao menos em combates
,nos quaes a m
'
ctoria se nao disputava com O ferro , mas com as in
trigas em Roma e com as queixas e as concessõesao ponti6ce que anteriormente relatamos . F0 rti6cadas as fronteiras
,vendo— se á frente de homens
d'
armas aguerridos nas passadas luctas , A ffonso I ,
( 1 ) 1de1n , P . 3 , c . 34 in prin cip .
( 2 ) lbn Kh aldun ,em Gayangns (vers . de Al Vo l .
2 , App . D , p . 50 ,— ª Conde , P . 3 , c . 88.
2 0 8 H I STOR IA DE PORTUGAL
cuj o pensamento quasi exclusivo de toda a Vida foi0 das guerras e conquistas , e cuj o valor e constancialhe grangearam entre christãos e sarracenos a re
putação de um dos príncipes do seu tempo maisemprehendedores e pertinazes não devia estartranqui llo emquanto 0 estrondo das armas retumbava por todos 0 5 angulos da Peninsula . AS turhulencias do Gharb o ffereceram-lhe brevemente ensej opara ceder as suas propensões bellicosas . Aecommettido a um tempo por Seddaray e por Omar , 0
wali de Mertola lançou-se nos braços do tyrannoIbn Errik ,
senhor de Coimbra,como 0 5 sarracenos
denominavam O guerreiro principe português .
Além das inclinações militares deste , um motivorecente de Vingança 0 impellia a intervir ne stas discordias em que O sangue dos mussulmanos deviacorrer em torrentes por mão dos seus proprios co
religionarios . Como as algaras ou correrias mutuasdas duas raças inimigas se repetiam regularmentetodas as primaveras
,n0 anno antecedente ( 1 1 44 ) 0
wasir on kayid de Santarem ,Abu Zakaria
,um dos
mais valorosos chefes dos sarracenos,invadira as
fronteiras christans e aproximara-se de Soure . Saí
ram a encontrá-lo 0 5 cavalleiros templarios,mas
foram desbaratados,6 cand0 a maior parte delles
captivos e ,satisfeito com 0 feliz resultado da a1
gara ,Abu Zakaria tinha-se recolhido ao seu forte
castello de Santarem
( 1 ) Hic Aldephonsus fuit strenuus et pertinax in agendis
Roder . To let .
, de Reb . Hisp .,L . 7 , c 6 — Alfonso was one
o f the most entreprising among the christian Kings of
th ese calamitous times lbn Sah ib i — s — Salat cit . por Al
makkari,vol. 2 , p . 52 2 .
( 2 ) Salvatus , V it . B . Martini Saur. 1 1 . Que Abu — Za
karia (Auzecri 0 11 Abzecri ) foi O capi tão desta entrada deduz- s e d e serem os captivos l evados a Santarem
2 1 0 H I STOR IA DE PORTUGAL
j ulgasse dever desped ir 0 seu auxiliador,ou que
este , com 0 mesmo ou diverso pretexto, quizesse
retirar— se,é certo que as tropas christans ahando
naram O senhor de Mertola quando a fortuna da
guerra se lhe mo strava contraria . Tendo j á recuadopara 0 centro dos seus estados e indo buscar refugio11 0 5 fortes muros de Mertola
,I
'
bn Kasi despediu 0 5
christãos c0 n1 ricos presentes . Era tarde para contersem os soldados de Alfonso a indignação popular e0 ímpeto dos inimigo s . O s habitantes daque1la povoação rebellaram — se
,e O chefe sarraceno , tentando
debalde defender-se no alcassar,caiu prisioneiro
nas mãos de Seddaray ,a quem os levantados tinham
aberto as portas . Conduzido a Bej a e lançado numcalabouço
,deveu a liberdade a Ibn Samail , um dos
seu s antigos parciaes queº
lhe 6 cara 6 e1 e que logrouapoderar-se daquella cidade . Ibn Kasi di rigi u - seentão ao Moghreb para invocar 0 soccorro dos a1
mohades,incitando — os a invadirem a Hespanha e a
restituírem-no ao waliado do Gharb,cargo em que
pedira ser confirmado por Abdu— l-Inumen e de quelhe 6 zera homenagemTal fora 0 resultado da poli tica de Ibn Gha
nyyiah obtivera os seus 6ns ; mas as consequen
cias iam mai s longe . As representações do walifugitivo não saíram baldadas . Elle chegara a Africaj u stamente na conjunctura em que Abdu — l-mumense tinha apoderado de Marrocos . O príncipe almohade enviou logo para a Hespanha uma expedição
( 1 ) Conde ,Ib id . Ibn Khaldum loc . ci t . É a esta cam
panha de A ffonso 1 no Alemtej o que allude provavelmentea Chron ica dos Godos ( exemplar de Resende ) quandodiz Rex Portugaliae D . A l fonsus vehementer eos devastabat , e t depraedabatur terram eorum militam
, et ad nih iu1n redigens
L IVRO I I 2 1 1
capitaneada por Berraz Ibn Mohammed Al-masufi,
a qual foi seguida immediatamente de outras duasdebaixo do mando de Abu Imram Musa Ibn Said ede Omar Ibn Saleh As— senhaj i . As tropas de desembarque eram ,
segundo alguns , trinta mil homens ,dos quaes dez mil de cavallaria . Berraz , generaldaquellas forças , encaminhou -se rapidamente para0 Gharb . Xeres , R0 nda ,
Nieb1a caíram uma apó soutra em poder dos almohades . Mertola
,aonde elles
se dirigiram ,não foi accommettida , porque j á , se
gundo parece,Ibn Kasi se fi zera outra vez senhor
della . O exercito de Berraz transpôs,
então as serrase accommetteu Silves
, que levou a escala , entregando —a depois ao wali de Mertola . De Si lves retrocedeu para a província de Al-kassr com 0 intentode subjugar 0 5 estados de Seddaray ; mas este , receando sorte igual a de Al-mundhir , apressou-se adar obediencia ao general almohade e a reconhecera supremacia de Abdu — l—mumen . Berraz ,
tendo passad0 0 5 ultimos meses de 1 1 45 em Mertola , marchoucontra Sevilha no principio do anno seguinte . Nocaminho , Hisn Al-kassr e Tablada abriram— lhe as
portas emquanto de toda a parte 0 5 mussulmanos
hespanhoes corriam a unir— se aos almohades em
odio dos almoravides . Investida Sevilha , foi tomadaá viva força
,e d 'alli proseguiu Berraz nas suas con
qu istasNo meio destas perturbações e guerras pro
vincia mai s occidental do Gharb ,denominada pelos
arabes Belatha,a qual
,como d issemos
,occupava 0
territorio entre 0 Tej o,0 oceano e as fronteiras me
ridionaes de Portugal , deixa de 6gurar , ao menos
( 1 ) Ibn Khaldun e Conde , loc . c it . Segu imos principalmente a narrativa de Ibn Khaldun como mais com
pleta .
2 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
activamente,na historia dos sarracenos . Abu Za
karia,O governador de Santarem , apparece
— nos
nas chronicas chri stans como O ultimo capitão illustre dos mussulmanos de Belatha . Era um chefe
que se tinha conservado fi el aos almoravides ? Reconhecia a auctoridade de Seddaray ou de Ibn Kas i?
Eis 0 que 0 silencio completo dos historiadoresarabes nos não consente resolver . O que de tal si
lencio,comparado com 0 5 successos que acima re
latamos,parece poder conclui
'
r— se é que esta porçãodo territorio mus sulmano esquecera , por assimdizer
,às parcia1idade5 que combatiam nas duas
proyinc ias mais importantes e sem comparaçãomai s vastas , d
1
Al-kassr e de Chenchir ou AI— faghar . .
O estado de completa anarchia a que tinham'
chegado as cousas do Andalú s
,a situação deste pe
queno districto separado pelo Tej o da província deAl-kassr
,donde só podia ser soccorrido , e sobretudo
0 caracter do rei de Portugal deviam fazer sentiraos sarracenos dessas partes que a hora de seremsubjugados pelos christãos não tardaria a soar . O shabitantes de Santarem
,de Lisboa ,
. e dos outroslogares menos importante s estavam na triste persuasão de que O termo de uma guerra com Ibn
Errik, 0 fero senhor de Coimbra , lhes seria fatal .
As devastações f eitas por Affonso 1 nos domíniosde Seddaray eram um bem temeroso exemplo
, e ,
para ao menos arredar por algum tempo a u ltimaruína
,0 5 moradores das povoações de Belatha ,
semexceptuar Santarem e Lisboa , 6 zeram— se tributariosdo príncipe christão ,
esperando salvar assim a trocoda fazenda a Vida e a liberdade
( 1 ) H0 magiu1n e i facientes dabant e i tributum et censumde c ivi tatibus e t de castellis de Santarem et de Ulixbona
et de vic in is su is Chron . Gothor .
L IVRO 1 1
geis rodeavam — na por toda a parte , e a fertilidadedos campos que se dilatam ao sul della pelas mar
gens amenissimas do rio tinha-s e por tão sub ida
que se acreditava geralmente no Gharb bastarem
quarenta dia s para nelles nascerem,vegetarem e
amadurecerem 0 5 cereaes Com estas circums
tancias,as tentativas dos christãos para se apode
rarem de Santarem , tentativas repetidas corn me
lhor 0 11 peor fortuna desde 0 tempo dos reisleoneses
,eram cousa bem natural . Estava
,porém
,
reservado para A ffonso 1 0 hastear naquelle inex
pugnavel caste llo , de uma vez para sempre, 0 es
tandarte Victorioso da cruz .
A lueta em que andavam envolvidas as duasraças inimigas que habitavam na Península tinhaindole diversa das guerras do resto da Europa . Lá ,
por via de regra ,ou eram disco rdias entre os mo
narchas sobre 0 senhorio de uma provincia ou duasdynastias que contendiam ácerca de um throno ou ,
emfim , questões de dependencia entre suzeranos efeudatarios na Hespanha , porém ,
eram duas 50
ciedades e duas religiões que disputavam uma a
outra a existencia,e para as quaes a posse ou per
dimento da mais diminuta porção de territorio si
gni fi cava a posse ou perdimento , digamos assim ,
de um membro,de uma parte da propria indivi
dualidade . D '
aqui nascia que 0 systema mi litarapr esentava nestas partes
"
caracteres especiaes . A
guerra era essencialmente local . As batalhas cam
liar a af6r1n ativa de Edrisi (Vol . 2, p . 2 9) de que Santa
rem não era c ercada d e inuralhas , com 0 encarec imentodas nossas memorias coevas sobre a exc essiva fortalezadaquelle castello ,
conc iliação que aliás parece casar-se
com a tºpographia da povoação .
( 1 ) Edrisi , ib id .
2 1 6 H I STOR IA DE PORTUGAL
paes , postoque disputadas e sanguinolentas quandooccorriam
,davam — se raramente . Defesas e comlnet
timentos de castellos,eis 0 que se repetia
,a bem
dizer , diariamente ; porque em ca da montanha ,quasi em cada outeiro
,surgia uma fortaleza
,ás
vezes uma simples torre,cuj a conquista importava
a suj eição do territorio circumvizinho e que eramsustentadas com tanta 6r1neza pelos que as defeud iam
,como combatidas com pertinacia pelos que
as assaltayam . A ss im a arte da guerra consistiaprincipalmente no systema o ffensivo ou
'
defensivodos assedios . As scenas que teremos de descreverda tomada de algumas c idades importantes mostrarão ao leitor quanta energia e audacia de uma
parte , valor e soffrimento de outra se tornavamnecessarios para este combate incessante de se
manas e meses,não só com 0 5 homens
,mas tambem
com 0 5 elementos .
A solidez e 0 inaccessivel do castello de Santarem e 0 grande numero de defensores que achariana povoação assentada a s ombra delle na margemdo rio tinham convencido Affonso 1 de que os seusrecursos militares não eram suf6 ciente5 para 0
levar a escala v ista . M editava,portanto
,no modo
de se apoderar delle por algum estratagema . Educado no meio dos perigos da guerra , a experienciaajudava 0 seu engenho natural , as suas irresistíveispropensões de conquistador . Como todas as intelli
gencias eminentes , 0 5 grandes capitães não alcan
çarn nome glorioso senão por meio das inspiraçõessubitas e fecundas a que chamamos 0 genio . O rei
dos portugueses teve uma'
inspiração des sas , edesde então a conquista do famoso castello foi irrevogavellnente resolvida
( 1 ) Cum en im rex civi tatem ipsam novo generi pugnandi
2 1 8 H I STOR IA DE PORTUGAL
Fernando Peres . AO segundo dia de marcha umcerto Martim Mohab
,provavelmente sarraceno
renegado ou mosarabe, partiu com 'mais dous para
intimarem aos de Santarem que as treguas 6 cavamrotas por tres dias . A pequena hoste havia caminhado para sudoeste
,com 0 fim
,talvez
,de não des
pertar suspeitas,Visto que, annunciada a quebra
da paz,0 5 exploradores sarracenos deviam princi
palmente vigiar a estrada de Coimbra . Chegando aserra de Albardos , a cavalgada fez um angulo para0 oriente
,seguindo ao longo das serras que se
estendem naquella direcção , e chegou a Pernes aoromper da alva da sexta feira . Acamparam . As
marchas,pelo menos as u ltimas
,tinham sido feitas
de noite,e a gente que O rei trazia ignorava qual
era O alvo da correria,porque Affonso só revelara
0 seu desígnio a Mem Ramires e ao prior de SanctaCruz , Theotonio Em Pernes , porém , e11e lhespatenteou tudo
,animando-os com dizer-lhes que
tinha comprados alguns dos vigias do castel lo,
postoque ass im não foss e . A tentativa assustou 0 5
cavalleiros,não por si
,mas pelo príncipe
, que
viam of t'
erecido a tamanho risco . Insistiam em que
não 0 5 acompanhasse achando-o,porém
,inaba
lavel,prepararam — se para aquelle arduo feito . Par
tindo ao anoitecer ,ajunctaram-se os peões e ca
valleiros a pouca distancia da povoação ameaçadae tomaram por um valle
,entre O monte Iraz ou
Motiraz e a fonte de Tamarmá, assim chamada
pela doçura das suas aguas Ia na frente Mem
( 1 ) Ad virum Dei veniens (se . Theo tonium) 1111 50 11 con
s ilium detex it : Vita S . Theo toni i , ubi supra .
(2 ) Fon te ln qui propter amaras aquas arab ice appelatur
Athumarmal Tamarmá tem a s igni ticação que lhe damos :
Moura , Ves tig . da Lingua A rab .
, p . 1 90 .
L IVRO 1 1 2 1 9
Ramires como practico ; e , não presentidos pelapovoação adormecida ,
aproximaram— se dos muros
do castello .
O desenho para saltear aquella fortaleza inexpu
gnavel tinha sido de antemão traçado pelo rei, que
1 4 . Santarem . Porta de Atamarma,demolida em 1864 , vista do
exterior da c idade .
para is so aproveitara as informaçõesde Ramires .
Haviam - se feito dez escadas , a cargo cada uma dedoze homens d
º
armas escolh idos,os quaes , por
tanto,sommavam cento e Vinte . Doze golpes de
gente , de dez soldados cada um ,subiriam assim
successivamente ao muro no sitio que indicara 0
espia e que era uma quadrella 0 11 lanço onde 0 5sarracenos não costumavam collocar es culca s ouvigias nocturnas . Subidos todos
,deviam hastear a
signa ou pendão real sobre as ameias,de modo que
se podesse enxergar a luz duvidosa da noite edepois
,descendo do adarve ou andaime da muralha
2 2 0 H I STOR IA D E PORTUGAL
para a corredoura interior , quebrar os ferrolhosdas porta s por onde entrariam 0 5 que ficavam defó ra . que especialmente se recommendava aoscento e Vinte que tinham de subir a e scala era que
naquelle primeiro ímpeto , emquanto os inimigose stavam somnolentos e inermes
,não perdoassem
nem a homens nem a mulheres,nem aos velhos
nem as creanças . Os gritos variados dos moribandos , O sangue correndo em torrentes , aquelle
relampaguear incessante dos ferros e O som
rouco dos golpes indiscriminados espalhariam talconfusão ,
terror tão profundo, que a defesa se tor
naria impossível , e 0 castello seria sem grandecusto subjugado .
Tal era O plano ; mas 0 alvitre que occorrera aAffonso para tomar os defensores de Santaremdescuidados não aproveitou por demasiado subtil ,segundo se pôde colligir da narrativa que vamosseguindo . Vimos que na terça feira O rei enviaramensageiros a declarar que as treguas 6 cavan1 portres dias suspensas . O praso terminava na sexta ,e era durante elle que 0 5 sarracenos deviam redobrar de Vigilancia e cautela . Nos termos da declaração feita por Ibn Errik , expirado 0 praso , era
natural que , apó s tão longa anciedade , não vendomovimento algum , elles se limitassem de novo ásprevenções ordinarias . A ssim na noite do sabbado ,
destinada para O assalto,tornava-se probabilissimo
que 0 5 atalaias e roldas estivessem descuidados . Se ,como parece , 0 calculo foi este , calculo na verdadenão exempto de per6dia , as esperanças dos christãos
falharam em parte . No logar onde habitualmentenão havia sentinellas descubriam-se agora duas quemutuamente se espertavam a vozes .A pequena hostecuj a retaguarda O príncipe fechava ,
parou então nomeio de uma seara , esperando que 0 5 vigias adorme
2 2 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
parte impedir-lhe 0 aproximar— se da entrada . Aomesmo tempo 0 5 Vinte e cinco esforçados tentavam
quebrar as portas , arremessando pedras contraellas
,mas debalde
,até que
,atirando 0 5 de fóra um
malho de ferro por cima do muro , poderam 0 5 que
se achavam dentro partir com elle 0 5 ferrolhos .
Despedaçado 0 dique , a torrente precipitou-se dentrodo castello . Affon so
,movido pelo ímpeto do enthu
siasmo religioso , aj 0 e1h0 un0 1i 1niar daquellas portas
que mal cuidava se haviam tão facilmente de abrirpara 0 receberem vencedor . Seguiu-se uma resis
teueia inutil e uma larga carni6 cina . Os raios do50 1, que nascera entretanto , não encontraram j ásobre 0 roqueiro castello 0 e standarte d0 i51a1n
,
derribado nessa noite ( 1 5 de março) para nuncamais se erguer sobre as torres da opulenta San
taremEste acontecimento extraordinario
,este feliz
resultado de uma tentativa que,talvez , parecera
loucura , se antes se d ivulgasse , ao passo que augmentava a audacia e a confiança dos christãos
,
devia gerar pro fundo desalento nos mussulmanos
de Belatha , abandonados aos proprios recursos no
(1 ) In era MCLXXXV pressa fui t civitas Sanctae Herenae
per manus Ilde fonsi portugallen sis regis Chron . Conimbr .
Cap ta est idus Marci i ( 1 5) illucescent'
e die sabbati inera MCLXXXV : Relaç . da tomada de San tarem Annoah incarnatione MCLIV . e t ah urb e ista capta VI I Inscripç .
de Santa Maria da Alcaçova no Elucid , p . 354 . A chro
n ica dos Godos attribue 0 successo ao dia 1 1 de Mai o dom esmo anno , a um sabbado , no que ha eviden te erro
1 .
º
, porque 0 d ia 1 1 de mai o deste anno não caiu ao sab
bado , mas s im 0 dia 1 5 de março , como d iz a Re lação deAlcobaça ; 2 .
º
, porque existe a doação aos temp larios dodomínio ecc lesiasti co de Santarem
, fei ta em abri l destemesmo anno . Cart . d e Thomar no Arch . Nacion ,
e nas
D issert . Chronol .
,T . 3
,P . 1 , p . 1 30 n .
º
40 0 .
LIVRO 1 1 2 2 3
meio das guerras civis . Subjngada aquella povoação,
só restavam aos sarracenos em todo 0 territorio aooccidente do Tej o dous logares verdadeiramenteimportantes Lisboa
,pela sua grandeza , pela soli
dez de seus muros,pelos recursos que podia tirar
do seu vantaj oso assento sobre a vasta bahia doTej o
,e 0 castello de Cintra
, por estar situado nocimo de um rochedo quasi inaccessivel e posto comona vanguarda de serrania aspera e intractavel
,
onde 0 5 hab itantes dos campos vizinhos poderiamfaci lmente abrigar-se e defender — se . No
“
resto dodistricto
,talvez alguns castellos ou torre s 0 0 110
cad0 5 pelos cabeços dos montes amparavam as
aldeias e habitações ruraes derramadas pelos cam
pos e valles que se dilatam entre 0 Tej o e 0 oceano ;mas todas aquellas pequenas fortalezas , se existiam ,
eram cousa de pouco momento ao menos 0 5 historiadores e viaj antes arabes desses tempos comotaes as consideravam , esquecendo -se de nos con
servar nos seus escriptos a memoria da existenciade11a5 .
NOTAS
CALE PORTU GALE PORTUGAL,PAG . 1 0
Sobre a origem de Cale e sobre : a sua situação na
margem'
esquerda do Douro no tempo dos romanosveja-se Flores
,Esp . Sagr .
,T . 2 1
, p . 1 e segg . Conhe
cida no tempo dos barbaros (seculo V) pelo nome dePortucale
,em Idacio
,no T . 4 , p . 374 , 377 e seggf da
E sp . Sagr . Com 0 mesmo nome no seculo IX ,em
Sampiro , Chron . 9 . Si
tuada ainda na mar
gem esquerda do Dou
r0 no principio do X(9 1 2 ) em documentodo Livro Preto da Séde Coimbra
,f . 38
,ci
tado 11 0 5 Novos Addi t .
as Dissert . Chron0 1.
,15. MoedaWisigoth ica de Slsebuto ,
p . 5,e ahi palavra
cunhada no Porto .
Galhía em logar de
Ga . .a, que apenas se pôde ler naquelle codi ce . Es te
ultimo documento prova contra Flores (Esp . Sagra,T . 2 1 , pag . 1 0
, g3 1 ) que eff ectivamente povoaçao
ao sul do rio se chamou Portucale . A escriptura sobre adivisão dos bispados em tempo dos suevos, e
mbora
não remonte a antigui dade que se lhe'
attribue , naodeixando de ser bas tante remota ,
nos explica perfei tamente como nasceu 0 Porto moderno , chamando — se
2 2 8 H I STOR IA DE PORTUGAL
ahi a es te Por tucale castrum novum e a povoação primitiva na margem fronteira Portucale castrum anti
quum . A Cale d0 Itinerario deAntonino ou 0 Portucale
de ldac io es tava assentada ao sul do rio, provavelmente
no monte hoj e chamado Cas tello de Gaia . No correr dostempos foi — se , talvez , es tabelecendo uma p ovoação namargem oppo sta , ou antes , 0 que nos parece mais verosimil
,quando as conquis tas dos christãos se dilatararn
até 0 Douro,elles fundaram um cas tello nomonte mai s
eminente da margem direita , onde hoj e existe a cathedral . Estendidas es tas conquis tas até 0 Vouga , 0 5 douscastellos fi caram cons tituindo de certo modo um só
Portucale, e , porventura ,des sa epocha é distincçâo
de Portucale.
castrum antiquum e Portucale castrumnovum,
que se lê nas suppostas ac tas do primeiro con
cílio de Lugo . O nosso pensamento, de que 0 5 castellos
das duas margens constituiriam ,ao
'
menos durantecerto tempo
,uma povoação unica
,occorre facilmente
vendo — se es tender n 0 seculo XI 0 territorio portugalense tanto para O interior da província do Minho (Doc .
de Pedroso,nas Dissert . Chronolj , T . 1
, p . 2 2 1 ) comopara 0 lado do Vouga (Liv . Pretc ,
f . 62 e despre
zada a divisão natural de_
um rio caudaloso,como 0
Douro,circumstancia aliás insolita naquelles tempo s ,
em que muito se attendía hydrographia interior paraes tremar as provín cias e d istrictos dos di fferentesgovernos . E
' vulgarmente sabido que desta povoaçãoveio 0 nome do nosso paiz , e por 15 5 0 nos parece inutila crescentar mai s nada ao que tica dicto no texto .
O CONDE SESNANDO , PAG . 1 0
Sesnandus,David Tentugal que fuit hereditas
parenturnmeorurn,Liv . Preto
,f 37 . Obsedit Colimbriam
c ivi tatem cum consilio D . Sisenandi consulis , que antea
2 30 H I STOR IA DE PORTUGAL
quelle mos teiro . 0 anonymo não só viveu em tempo deD . Theresa
,mas tambem devia tê-la tractado de perto
quando ella residiu em Sahagun . Apesar de não existires te monumento senão numa traducção vulgar , talvezdo seculo XIII , e de ter perecido O original no incendiodo mos teiro , a sua phrase latino-barbara transpareceainda na phrase da versão , e nunca sobre a authentici
dade della se levantou, que nó s saibamos
,a minima
duvida,sendo citada frequentemente pelo continuador
da Hespanha Sagrada , 0 P . Ri sco , e pelo severíssimoe , as vezes exaggeradamente desconfiado auctor daHis toria Critica de Hespanha
,Masdeu . Fazemos aqui
esta advertencia , porque nos espanta 0 haverem des
conhecido os nos sos modernos escriptores tão importante fonte da hi storia portuguesa n0 .prin1 eiro quar teldo seculo XII
, para escrever a qual não sobram 0 5
recursos . O anonymo,pois
,de Sahagun di z expressa
mente : és de saber que elrey D . Alonso de noble me
mor ia,mientras que el vívíesse
,de una manceba
, pero
bien noble,hab ia hab ido una haj a l lamada Teresa ,
la
qua l el hab ia casado con un conde l lamado Enr ique , queven ia de sang re real de Franc ia Este testemunhoclaro e terminante vem confi rmar os de Pelaío de Ovie
do,de Rodrigo Ximenes
,da Chroni ca Latina de
Affonso VII e do Monge de S ilos , expostos largamentepor Pereira de Figueiredo , que numa Memoria especialprovou illegitimidade de D . Theresa (Me1n .
_
da Acad .
,
T . 9 , p . 2 74 e e de cujo trabalho se aproveitou ,nes ta parte , 0 mais recente auctor dos Exames Comparativos .
Na Memoria de S . Luiz em que se tornou a pôr em
questão esta materia recorreu— se a dous argumentosem favor da legitimidade . E
'
0 primeiro : que
D . Af fonso VI f oi obr igado a separar-se de D . Ximena ,
mãe de D . Elvira e deD . Theresa, por uma ba ila do papa
S . Gregorio VII, que vem nos Annaes de Baronia no
anno 1 0 80 e em Sandova l e em Ag uirre . E d iz o Santo
Padre que 0 matr imonio era nulla, por se haver contra
Izído sem dispensação ( lo parentesco que hav ia entre aactual e outra precedente mulher de D . Af onso E
' o
NOTAS 2 3 1
segundo : que a Senhora D . Theresa era f requentemente denominada Infan ta e Rainha nos documentos e
monumentos historicos , antig os e coevos,de Leão
, Cas
tella e Portugal e e'
certo que nem uma nem outra qua
lzjâcaçáo se dava ord inar iamente naquelles tempos a'
s
f ilhas ílleg ítimas dos reis Estribado neste s dous fundamentos 0 auc tor da Memoria mos tra — se favoravel á
opini ão da legitimi dade .
Es te segundo argumento chega a parecer impossívelse 6 zesse
,
'
p0 rque a proposição em que se funda , isto é ,que as bas tardas se não davam aquelles títulos , estádesmentida quanto ao de infanta pelos documentosdesses tempos e
,0 quemais é , t inha-se já demonstrado
isso mesmo com exemplos indi sputaveis nas duas Memorias ante riores a favor da illegitim idade , sem que
todavia 0 A . daquella a que alludimos se 6 zesse cargode as refutar e
, pelo que toca ao tí tulo de rainha,da
nos sa narrativa , fundada igualmente em auctoridades
insuspei tas e que 0 escriptor recente tinha obrigaçãode conhecer , se vê por quem ,
quando e de que modolhe foi dado .
0 primeiro argumento ,resumido de Brandão (Mon .
Lus it .
,L . 8
,c . pos toque 0 auctor o não diga , é mai s
grave . Se foi preciso queuma bu lla separasse Affonso VIde Ximena e declarasse 0 matrimonio nu110 , é evidenteque esse matrimonio existia
,e a sua dis solução não
importava a illegitim idade dos 61h0 5 gerados e nascidos duran te elle . Tal é O raciocínio con fusamenteexpres so por Brandão e apresentado mais perspicuamente pelo escriptor moderno .
Mas,averiguou— se j á bem se a celebre bulla de Gre
gorio VII di zia respeito Ximena Muni ones? Parecenos que era essa uma questão que valia a pena detractar-se ,
porque ,resolvida negativamente , não restava
um unico pretexto para protrahir as interminaveis dis
pu tas sobre a legi timi dade ou illegitimi dade da mãe donosso primeiro rei
,que tem entretido demas iadamente
os espíritos por mal entendi do pundonor nacional . Fá10 -l1 en1 os aqui
, pos toque de má vontade , porque cha
2 32 H ISTOR IA DE PORTUGAL
mam por nó s questões d interesse historico um poucoma i s grave .
Primeiro que tudo Aguirre (Max . Collee . Concil .
Hisp .
,T . IV
, p . 446) at tribue a esta bulla a data de1 0 79 . E
'
um erro , demonstrado como tal por F lores (Esp .
Sagr ,T . 3 , p . e de feito ella vem com 0 seu ver
dadeiro anno em Mansi ( Sacror . Concilior . Nova et
Ampliss . Collect ,T . XX , p . Foi remettida ao
abbade de C luni,Hugo
,inclusa em car ta para este
datada de 2 7 de junho de 1 0 80 a fim de que'
a
fizesse chegar á, mão do rei hespanhol, e, portanto ,
devia ser exarada igualmente nos fins de junho . Daren1 0 5 un1 a idea de l la e da carta em que vinha inclusa ,para 0 que depois veremo s .
Nesta ultima di z O papa a Hugo que um seu monge,
chamado Roberto , 6 zera grandes males na Hespanha'
a
religião , pondo ahi em grande perigo a igreja e enganando O rei com suas fraudes : que ha grandes queixascontra e11e Hugo ,
que se teria inimizado com Roma , se0 proprio papa não 0 sus tentasse
,fechando os ouvidos
as accusações ordena-lhe que corrija os seus monges ,que obrigue 0 d ic to Roberto a voltar a Cluni e que avise0 rei da ira de S . Pedro
,em que incorreu por trac tar
indi gnalnente O legado romano (era 0 cardeal Ricardo ,
abbade de Marselha) , e de que para ser ab solvido,lhe
cumpre dar satis fação ao d icto legado que affrontara :
adverte— o de que excommungará 0 mesmo rei , se não 0
fi zer assim,e de que até elle papa virá a Hespanha
para 0 perseguir , se tanto for preciso exige,finalmente ,
que Hugo tome a seu cuidado fazer com que os ”
monges
d ispersos inj ustamente nestas partes voltem ao seu mosteiro
,etc .
Na bulla ou carta a Affonso VI di z Gregorio VII : quelhe consta que elle se aftas tara do seu antigo e bomprocedimento em relação a igrej a , indu zido pelo falsomonge Roberto e pela mulher perdi da sua antiga pro
lec tora (per Bobertum pseudo—nlonáchum et p er antí
quam aclj utr íccm suam perdítam f aemínam) ; que lhepede remova de s i 0 5 conselheiros da falsidade ; queobedeça ao legado Ricardo que não torne surdo às
2 34 H ISTOR IA DE PORTUGAL
rei ao legado . As cartas de Gregorio VII , recheadas deameaças
,mos tram bem 0 caracter violento do pontífi ce
e quão grande havia sido a afªfronta recebida pelo car
deal Ricardo . Quando , porém ,essas cartas chegaram
tinha já vindo aHespanha 0 cluniacense Bernardo,que
,
promovido a abbade de Sahagun, partiu para Roma ,
como narra 0 anonymo, pelos motivos que es te occulta ,e que nos revela uma nova carta de Hildebrando , cartacuja intima ligação com as antecedentes é visível .Aguirre at tribue — a ao anno de 1 0 80 porém Mansi redula ao de 1 0 81 , que é a sua verdadeira data (S . Con
cilior. N . et A . Collect,T . XX
, p . Della parec ecolher-se que Affonso Vl escrevera energicamente ao
ponti6 0 e ; mas que ao mesmo tempo lhe assegurara terestabelecido em toda a monarchia 0 rito romano comexclusão do mosarabe
,cousa em que O papa altamente
se empenhava . Tracta ahi Hildebrando d a eleição de umcerto arcebispo que elle recusa pela incapacidade litteraria d0 eleito , propondo a A6
'
0 n50 VI elej a outro e que ,se no seu paiz não tiver pessoa di gna disso , 0 procurees trangeiro ; faz-lhe varias recommendações contra os
judeus mas sobretudo allude a dous objecto s, que são
aquelles que nos parece terem intima con exão com as
anteriores cartas . Diz -1he que pelo que respeita ao quelhe pede acerca de sua mulher e do mos teiro de Sahagun , responderá pelo legado e pelo b ispo Simeão . Depois espraia-se en1 encarecimentos e acções de graçaspelo riquí ssimo presente que Affonso lhe 6 zera
,t ão
amplo e magnifico,di z O papa
, que era di gno de ser
feito por um rei e recebido por S . Pedro . Acaba a cartacom as expressões mais amigaveis que podia empregarum homem da altivez de Hildebrando , debaixo das
impressões agradaveis que nelle produzira a liberalidade do monarcha hespanhol .
Qualquer verá no complexo dos documen tos quehavemos apontado O começo
,meio e des fecho de um
negocio em que [iguram Affonso V1,sua mulher
,O
papa , 0 legado Ricardo , 0 monge Roberto , 0 5 cluniacenses e 0 5 benedi c tinos de Sahagun
,e em que , por
ultimo, quem lucra é Hildebrando , que obtem do rei a
NOTAS 2 35
conclusão da mudança de rito , no que trabalhavacorte de Roma havia annos
,e,além di sso , dons precio
sos que extasiam 0 ambicioso ponti6 ce . Ninguem ima
ginará que essa mulher do rei , de que se tracta na
ultima carta,seja diversa da p erd itam f aemínam da
primeira . Todavia,a admittir commum op inião , nes ta
alludi ria O papa D . Ximena , devendo suppôr— se em
tal hypothese que na'
ul tima se refere a D . Cons tanciaque em
“
1 081 estava indi sputavelmente casada com 0
rei leonês .
Mas como admittir semelhante presupposto ? O
monge Roberto veio de França para Hespanha em 1 080,
segundo O tes temunho do anonymo,ou an tes em 1 0 79 ,
conforme se deve ler : Ximena era asturiana : c0 n1 0
podi a,pois
, ser antiga pro tectora de um monge quenesse ou no antecedente anno veio de além dos Pyrenéus Se
,porém
,suppusermos que O papa se referia a
D. Constancia , 0 patronato desta para com Roberto nãosó era po ssível , mas
,até
,natural . Roberto fora escolhido
para vir Sahagun pelo abbade de Cluni , e este era tiode D . Constancia . As relações da sobrinha deHugo 0 0 11 10 niosteiro que seu tio governava e que era então 0
mais celebre da Europa deviam ser es treitas,e porven
tura , á sua influencia deveu Roberto 0 ser chamadopara reformador de Sahagun .
anno do casamento de Affonso VI com D . Constancia é ainda di sputado
, 0 0 111 0 0 é tudo 0 que respeitaàs cinco ou seis mulheres que teve este principe . A pri
meira,D . Ignez
, que uns fazem hespanhola ,outros fran
cesa , fallecen ou foi repudiada que até is so é disputavel) em 1 0 78. porque é de maio des te anno O ultimodiploma de seu marido em que ella 6gura (Flores ,Reynas Cath0 1 . , T . 1
, p . E'
depois di sto que os
h is toriadores põem commummente 0 enlace de Affon5 0 VI com Ximena Muniones todavia muitos dos maisgraves escrip tores cas telhano s , como Sandova1, M0 n
dejar e outros , datam de 1 0 78 0 consorcio de D . Constancia
, á vis ta de documentos de cuja veracidade nãoduvidam . Flores
, preoccupado pela idea de que a bullade 1 080 allude necessariamente ás ligações de Affon
2 36 H I STOR IA DE PORTUGAL
5 0 VI com uma concubina,rejeita de certo modo todos
0 5 documentos em que se fala de Constancia anterioresa es te anno , para a suppôr casada depo is de junho (E sp .
Sagu, T . 3 , pag . 3 1 7 e mas faziam-lhe tal ' força as
provas diplomaticas em contrario , que conclue pordizer que quem f or ma is destro que elle desatara
'
estas
duvidas . Longe de nó s 0 suppormo-nos mais intelli gentesque 0 sab io hespanhol, mas a d if6 cu1dade desapparecelogo que se abandone a ideia de que elle es tava preoccupado e que nenhum facto , nenhum documento nos obrigaa acceitar. Porque , pos suído de colera violenta pelasaffrontas feitas ao seu legado , não applicaria 0 orgulh0 5 0 e irascível Hildebrando 0 nome de mulher perdidaa D . Cons tancia Não era elle homem cuja linguagempara com os prín cipes fo sse medida pelos respeitoshumanos . Leia as suas cartas e a sua h istoria quemquizer desenganar— se di sso .
Mondejar (Casamientos delrey D . Affonso VI , g9) fixaos desposorios de D . Constancia nos 6ns de 1 0 78avistade urna escriptura citada por Arevalo . Sandoval (CincoReys , f . 45) es tabelece a mesma data por outra escriptura , que Flores (Reynas Ca th 0 1.
,T . 1
, p . 1 68) dá por
suspeita pela mesma preoccupação a que acima alludin1 0 5 . Deixando es ta questão
,venhamos ao exame de
diplomas que parecem indi sputaveis . Exis te a nomeaçãodo celebre Roberto para abbade de Sahagun (Esca1 0 na ,
His t . del Monast . de Sahag . App . 111,escrit . 1 1 3 ) feita
por D . Affonso e por sua mulher D . Constancia em 1 0
de maio de 1 0 79 (por is so se deve emendar 0 anno XVdo anonymo para XIV ) ,
'e ahi se expõem 0 5 motivosdaquella nomeação , concordes com 0 5 que aponta aChronica de Sahagun , is to é ,
0 introduzir nes te mos
teiro a reforma cluniacense . Em ma io do anno seguinteachamos a nomeacão de Bernardo para subs tituir R0berto feita pelos mesmo s principes na presença do car
deal Ricardo ( ibid . escri t . donde se vê que na
occasião em que Hildebrando preparava a fulminantebulla para desaggravar O legado ,
es tava já es te con
graçado com Affonso VI , provavelmente porque Hugosoubera antecipadamente da tempes tade que ia levan
2 38 H ISTOR IA DE PORTUGAL
elementos que bastam para achar a expli cação do factoa quem quer que não estiver inteiramen te convencidodasanc tidade de Gregorio VII , sem que por isso lhe negue0 haver sido , talvez , 0 maior homem da sua epocha .
COMEÇO DO GOVERN O DO CONDE HENR IQUE ; PA G . 1 7
Em julho de 1 0 95, já S . Giraldo era arcebispo'
de
Braga (Dissert . Chro'
11 0 1 ., T . 3
,P . 1
, p . 32 , nº Vê
se d aqui que elle era considerado como metropolitanoantes de ser confi rmado nesta digni dade por Paschoal H(Bern . Vita B . Ger . apud . Baluz . Misce1.
, T . 3, p .
Todavia , foi eleito bispo pelo clero e pe10 povo, concordando nisso O rei Af onso e conde Henrique (Doc . do
Liber Fidei . na Mon . Lusit .
,Liv . 8
,c . mas resis
tindo por mui to tempo O arcebispo de Toledo , que não0 queria deixar sair da sua Sé (Vi ta B . G . em Baluz . T . 3 ,
p . 181 ) e que e1n6 1n 0 sagrou b isp o em Sahagun,donde
partiu para Braga . Contrahindo todos estes successos
dentro do menor tempo que se queira imaginar, não
póde eleição de S . G iraldo,em que interveio a aucto
ridade do conde Henrique , ser pos terior aos fins de 1 0 94 .
Em março de 1 0 95 ainda Raimundo exercia jurisdicçãoem Coimbra (Dissert . Chronol .
,T . 3 , P . 1 , p . 3 1 , n .
º
e em agos to intitulava-se conde de Galliza e Santarem(ibid .
, p . 38, n .
º E' preciso
,pois
,ou suppôr que no
centro dos seus domínios se creon um distric to indepen
dente delle,cousa
,senão impossível , improbabih
'
ssima,
ou admittir a Opinião que seguimos . Em dezembro de1 0 95 e pelo anno de 1 0 96 Henrique governava en1 Coimbra e Braga (Dissert . Chronol .
,T . 3 , P . 1
, p . 33 e Em1 097 dominava desde o
'
Minho até 0 Tejo e nes teterritorio tinham desapparecido inteiramente 0 5 vestigios da auctoridade de Raimundo , embora elle se con tinuasse chamar nos seus diplomas Senhor de toda aGalliza .
NOTAS 2 39
DESTROÇO Do CONDE RA IM UNDO JUNCTO A L I SBOA,
PAG . 1 9
Timorem cumulavit subditorum lusitanorum ah e0
defectio , qui almoraviditis Ulyssiponam et Santaremalíaque oppida , rege ipso absente , vel invito ,anno egirae 487 ( 1 0 94 ) Ben-Khathib , Bibl . Arab .
-Bi sp .
,
eln Casiri,Biblioth .
,T . 2 , p . 67 . Conde
,Domin . de
los Arabes , P . 3 , c . 2 2 . Liv . Preto,f . 40 . Th . ah
Incarnatione , H is t . Ecc les . Lusit .
,T . 2
, p . 2 0 7 , onde ,na espec ie de foral pas sado aos habitantes de Mon
temór em 2 7 de fevereiro de 1 095, di z Raimundoqui pr ius d á pesur íum (aliás presar iam) venistis . O
destroço do conde juncto de Lisboa foi depois da pri
meira prepositura de Gehnires na diocese de Sanctíago ,
portanto no episcopado de Dalmacio,is to é , dos 611 5
de 1 0 94 aos fins de 1 095 (Dissert . Chronol . , T . 5, p . 20 9 ,
e ESpafla Sagr.
,T . 2 0
, p . Ora,demorando— se 0
conde em Coimbra durante O inverno,aquelle facto só
podia acontecer na primavera des te ultimo anno . Eis
como a His t . Compostell. (Livro 2,cap . 53) narra 0
succes so ante episcºpatum , postpraeposituram ,
in procinetu cum Comite R. et cum
optimatibus Gallec iae ad extirpandum tenderet (Gelmires ) perf idíam g entilium,
sarraceni , collectis undique
viribus , cbristicolarum castra propeOlisbonam circun
dantes,immensa obsederunt bellatorurn mul titudine .
Tanta confluxerat incredulae gentis multitudo ,tanta
convenerant barbarorum agrnina ad christianoruin
perniciexn irnpetum facturi . Denique , cu1n christianorumalios caederent, al io s vinculis etc .
2 40 H I STOR IA DE PORTU GAL
PORTUGAL DADO EBI DOTE A D . TH ERESA, PAG : 2 0
Até a invasão dos arabes 0 5 godos conservaram nas
Hespanhas tenazrnente as institui ções germani cas
ácerca dos dotes . Pelas suas leis,contrarias ao que
estatuiam as leis romanas, era O noivo quem dotava a
mulher . Semelhante costume dos barbaros , porventuramais nobre que 0 romano , foi reguladoporuma leide Chindaswintho
,inserida no codigo Wisigothico (L . 3 , tit . 1
,
le15.
ª
) . Es ta lei , assim como as mais di sposições daquellecodi go ,
atravessando O domínio dos arabes, que deixa
ram aos vencidos 0 governarem-se civilmente pela sua
legislação e pelos seus magis trados , continuou a vigorar
,não só até 0 tempo de Affonso v 1 , mas
, porventura, até a publicação da lei das Partidas . (Vejam— se noEnsaio de Martines Marina , 2 49 e seguintes , as provasindubitaveis di sso . ) Não havia , pois , na legislação deHespanha
,nem nos uso s nacionaes
,nes ta parte perfei
tamente accordes com ella,causa alguma para O rei de
Leão se lembrar de pôr em practica no casamento desua filha um cos tume romano
, provavelmente até ignorado por elle . A predi lecção que sempre mostrou pelascousas de França e que tanto contribuiu para alteraros costumes wisigo thicos podi am tê-lomovido a seguir,casando suas 6 1has 0 0 111 os príncipes borgonheses Rai
mundo e Henrique e outra com 0 conde de Tolosa , oscostumes daquelle paiz , se elles nes ta parte fossem con
trarios aos das Hespanhas ; mas não acontecia assim .
A inda naquelle seculo eram communs por toda a Europa as ins tituições germanicas ácerca dos dotes
,as
quaes se podem ver no excellente livro de Eichhorn,
Deutsche S taats-und-Rech ts — Gesch ich te,T . 1
, p . 361 esegg . (Go tting . EID Ducange , a palavra Dos , seacham colligidas as d isposições dos diversos codi gos,
2 42 HI STOR IA DE PORTUGAL
Se attendermos a uma passagem do Chronicon Floriacense ,
quando fala do conde Raimundo,veremos 0
nenhum fundamento da expli cação que se pretende dara exc lusão do conde de Tolo sa das generosidadesextra-legaes de Affonso VI . Tractando dos casamentosde Raimundo e de Henrique ,
'
diz Quam (D . Urraca)in matrímoníum ded it Raimundo comiti
, qui comítatum' trans Arar im tenebat . Alteram Aínr ico um
f i liorum ]llíi Ducís Rober ti E is,pois
,Raimundo
com 0 mesmo impedimento para receber dote quetinha 0 conde de Tolo sa , visto que Raimundo .era jáconde em Borgonha ,
tendo o condado a lém do Arar
( Saône ) , 0 que se prova , não só do tes temun ho doFloriacense , mas tambem dos documen tos irrefragaveisque colligiu Mondejar (Orig . y ascend . de1 Princ .
D . Ramon Mss . na Biblioth . R . da Ajuda) .Adm ittindo ,
porém , que isto acontecesse , ainda restaoutra di fficuldade maior . Além de Urraca
,Theresa e
Elvira ,Affonso VI teve uma 6 1ha chamada Sancha
,e
outra Elvira (Flores , Reynas Cath0 1.
, T . 1, p . 1 80 ) nas
cidas da rainha Isabel,a primeira das quaes ca sou com
0 conde Rodrigo Gonçalves e a segunda com Rogerioduque de S icilia . Quanto a este , nada acerescentarei
ao que j á disse acerca do conde de Tolosa,Raimundo
de S . Gil. Mas no conde Rodrigo Gonçalves não se
dava, por certo , circums tancia de ser principe es tran
geiro com es tados fóra de Hespanha,e todavia não
consta que el— rei dotasse a infan ta D . Sancha comterras ou províncias que ella devesse possui r hered itar iamenle, antes pelo contrario , possuindo 0 condeRodrigo as honras de As turias de Santillana
,lhe foram
es tas tiradas por suas turbulencias e , reconciliadodepois com AíTonso VI lhe deu elrei 0 governo de Segovia . e alcaidaria de Toledo
,que tornou tirar-lhe
passado tempo , segundo parece , por seu genio in
quieto . (Vej a-se Sota , Princ . das As tur . Appendiced
'
escrit Colmenares,Hist . de Segov .
,c . 1 4 , g1 0 .
Mondejar,Succes . d ,A10n50 VI
, 5 Porque seriaexcluido , porém , 0 conde Rodrigo
,nobre , natural e
podero so,do beneli cio. que recebera um es trangeiro
NOTAS 2 43
pobre ,embora illustre e valente ?É
,na verdade
,inex
plicavel semelhante contradicção .
A es tes raciocínios , fundado s em factos incontroversos , nenhum argumento, nenhuma auctoridade se
pôde oppôr senão uma phrase do chroni sta anonymo
de Affonso Railnundes , que , falando de D . Theresa ,
não directamente,mas por occasião da guerra de
Atfonso VII com seu primo Affonso Henriques , d izque Affonso VI a casara com 0 conde Henrique e a
dotara magnifi camente , dando — lhe a terra portugalensecom domín io hereditá r io Este testemunho s ingular ebastante pos terior ao facto provaria ,
quando muito,
que Affonso VI dera a seu genro , em attenção aD . Theresa , 0 governo de Portug
'
al para si e s eus6 lhos perpetuamente , visto que hereditariedadeapparece uma ou outra vez nos cargos admini strativos .
Tal seria,pois , nesse caso a signi f icação da palavra
dote,que então era mui di y ersa da que hoj e lhe damo s
e correspondia a donatio . E 0 que , entre varios outrosdocumentos
,se vê da Fundação do mos teiro de Naxera
e Foros da povoação , n0 anno de 1 0 52 lg itur cumhuj us rei voluntate , tum in aedif candae ecc
'
les ie constructione quam in dotis astípulare donatione e na
doação de Jubera a igreja de Sancto André ( 1 0 57)Haec est carta de dote quae dederunt vicinos de Jubera
d á S . Andrede (Collecç . de Privi leg . de 1a Corona deCastilla
, T . 6, p . 58 e
DATA DA MORTE DO CONDE HENR IQUE ,ETC .
,
PAG . 59
São tantas e taes as difíi culdades chronologicas que
se offerecem a quem es tuda a h istoria dos successos
da monarchia leonesa desde a morte de'
Affonso VI até
a de seu genro , 0 conde de Portugal , que chega aperder-se esperança de as conciliar . Ha
,. todav ia
,
2 44 H ISTOR IA DE PORTUGAL
certo numero de factos , cujas datas precisas ou quasi
precisas , se devem tomar como norte para chronologia,
desprezando as c ircumstancias secundal ias , que con
duzem muitas vezes a con fusão e a duvida . Esses factossão 0 5 segu intesMorte de Affonso VI no ultimo de junho de 1 1 0 9 .
Veja-se Rib eiro , Dissert . Chronol .,T . 3 , P . 1
, p . 51 .
Casamento de D . Urraca e do rei de Aragão depoisda morte de Atl
'
onso VI , consequentemente em julhoou nos seguintes meses do mesmo anno : Concordesnes te ponto todos 0 5
'
his toriad0 res contemporaneos , só
contradi ctos pelo arcebispo de To ledo , que viveu posteriormente .
Batalha de canipo de Espina em outubro de 1 1 1 1,a
que as sis tiu 0 0 111 0 alliado do rei de Aragão 0 condeHenrique . Concordes 0 5 Annaes Complutenses eCompostellanos , quanto a data do su'ccesso
,e confi r
mado este pela narração de Lucas de Tuy .
Esta batalha ée posterior á volta do conde Henriquede França ,
segundo O tes temunho do anonymo de
Sahagun . Existem documentos authenticos da resideneia do
'
conde em Portugal nos meses de julho ,ago s to
,setembro , outubro e dezembro de 1 1 0 9 e de
março,julho e agosto de 1 1 1 0 (Dissert . Chr0 11 0 1 .
, T . 3,
P . 1 , p . 53 e segg .
,e T . 4 , P . 1
, p . 55 e segg . ) O
maior in tervallo que ha nes te período em que nos
faltem documentos do conde ee o de março a ju1h0 de
1 1 1 0 . Neste espaço de tres para quatro meses éinadmi ssível que elle fosse de Portugal a França ,
es tivesse lá preso , fugis se , vivesse algum tempo no
Aragão e tornasse a Portugal . Logo é necessario collocar esses successos nos oito a nove meses de agostode 1 1 1 0 a ma io de 1 1 1 1 .
Primeira separação publ ica de D . Urraca e do rei de
Aragão depois de junho de 1 1 1 1,como á vis ta dos docu
mentos diz Flores (Reynas Catholicas ,T . 1 , p .
concorde com 0 texto da Historia Compostellana . Foi
depois dessa separação que a rainha se ligou com 0 5
fi dalgos gallegos , 0 que se torna evidente do d iscursofeito por ella ao conde Fernando (His t. Compos tel.
,
2 46 H I STOR IA DE PORTUGAL
As palavras et dr ic una par iter cum eu
( 10 documento attrahiram a attenção de Berganza ,
que completa a syllaba dr ic , imaginando que alli se
alludia algum dos dons condes Rodrigo Munho z ouRodrigo de Lara ; mas é absolutamente insolito ouantes impossível que se dissesse que reinava D . Urracajunc tamente com um daquelles dous condes subalter
11 0 5, que não consta tivessem j ama i s pretensões de
soberania,
accrescendo que nos diplomas daquelle
tempo 0 nome de Rodr igo se escreve sempre Roder icas0 11 Roderic . Nó s não podemos ver no documento senãoum engano na leitura da primeira letra desse fragmentode palavra , e que se af6gur0 u a Berganza um d por um
71 devendo ler nr íc (Enric,Henrie) . Em tal presup
po sto,alludj r-se-hia ahi a ces são de uma parte da
monarchia feita ao conde de Portugal p ara 0 separardo rei de Aragão
, promessa revalidada por D . Urracaem Monzon . Desse modo O documento de Arlanza con
6rmaria a narração do anonymo de Sahagun .
Mas,deixando de parte essa circumstancia
,venha
mos ao que mai s importa . Para conciliar a relação da
Compos tellana 0 0 111 a do monge anonymo é necessarioadmittir 0 que nó s suppusemos no texto ; isto é , que0 5 auctores daquella chroni ca se enganaram,
applicandoa Carrion O cerco de Pena6 e1. Nes ta jornada aecompanhou 0 conde Henrique a D . Urraca
,veio ahi D . The
resa ,retiraram-se para Palencia e occorreram succes
sivalnente 0 5 outros acontecimentos referidos na
chroni ca de Sahagun e incluí dos na no s sa narrativaDa multiplicidade de inciden tes ahi relatados se eo
nhece claramente que é necessario espaçar reconci
liação da rainha com seumarido para 0 5 ultimosmeses
de 1 1 1 2 . E'
des ta reconciliação que fala 0 anonymo de
Sahagun (cap . 2 1 ad 6ne1n e cap . durante 0 principio da qual 0 conde Henrique e 0 5 outros 6dalg0 5puseram cerco Carrion é ella , sem duvida , a mesmade que se trac ta no princípio do . cap . 80 do liv . 1 da
Compos tellana ,capi tu10 em que se mencionam eviden
temente , não uma, porém duas reconcihações fei tas em
epochas diversas . NOS 6 11 5 des te anno foi a rainha eu
NOTAS
viada enganosamente ao Aragão pelo marido, que .
entretanto se ia apo ssando de di versos castellos epovoações nos estados de sua mu lher (Anon . de
Sahag .
,c . ao que parece allúdirem 0 5 chroni stas
compostellanos ( cap . citado in medi o ) quaecumque potuit castella
,municip ia ,
fraude sua,reg inae abstulit.
A ausencia de D . Urraca é confi rmada pela fa lta de
di plomas seus nos ultimos meses de 1 1 1 2 . O abbade
de Sahagun,que neste anno fora expulso do mosteiro ,
dirigiu — se ao Aragão e pintou— lhe as v iolencias practicadas por Affonso I em Castella e em Leão . Reso lveua rainha voltar aos seus es tado s
,O que veio a fazer
depois de alguma demora (Anon . de Sahag c . 2 7) , e
efíectivamente achamos dip10 1nas exarados em nomedella e con6rmad0 5 por seu 6 1h0 (0 que sempre indicaruptura ou , pelo menos
,dis cordi a entre a rainha e O
marido ) de janeiro a agosto de 1 1 1 3 (Berganza , T . 2,
p . 1 6 e 454 . E scalona , App . 3,escrit . Affonso
tentou então prendê-la (Anon . de Sahag .,c . 2 7 ad
6ne111 ) mas ella j á tinha por si um numeroso partidode 6dalgos cas telhanos e , até , de aragoneses , e as
tentativas do marido não tiveram etfeito .
Ajunctou-se então as semblea de Sahagun ,em que
es tiveram habitantes de Burgos , de Naxera , de Carrion ,
de Leão e alguns nobres (Burgenses , Najarei , Carrionenses , Legionenses , al ique s paníae proceres . Compo stell . , L . 1 , Los burgueses de las dichasv i llas Burgo s
,Sahagun
,Carrion Anon . de Sahag .
,
c . O rei demorou por largo tempo a conclusão do
negocio (multíp líces rationes praetendens , et de cras tíno
in crastínum argumentosís verbis rem d if erens Com
postell . Em6n1 cedeu ; uniu — se com sua mulher epartiram amb os para _Astorga . A reconciliação deviaoccorrer nos 6 11 5 de abril de 1 1 1 4 , porque temos diplomas da rainha regnante cum f ilia,
desde 0 principiodo ann0 até este mês (Berganza , T . 2
, p . 1 7 . Esp .
Sagn ,T . 36 , App . 43 , e T . 38
, p . O conde Henrique
, que seguia O partido da rainha (Doc . da Esp .
Sagn , T . 38, p . fallecen por este tempo (Anon . de
Sahag. , c . 2 9 in medi o ) no rº de maio (Chron . Gothor .
2 48 H I STOR IA DE PORTUGAL
ad aer. e D . Theresa , que viera a As torga por
morte do marido , facili tou ao aragonês pretextos , comaccusação , verdadeira ou infundada , contra a irman
,
para elle a apartar de si fi cando — lhe com 0 5 es tados .
Mas,declarando-se nobres e burgueses por D . Urraca
,
Affonso foi cons trangido a vir á as semblea de Sahagun ,
que não acabara ou se congregara de novo e que pretendia estabelecer a concordia . 0 resultado foi não se
querer elle submetter às decisões ahi tomadas, ser
obrigado a retirar se ( Compostell. , liv. 1,c . 80 ad
finem Anon . de Sahag . , c . e começar de novo aguerra contra 0 5 subditos de sua mulher . O abbade de
Sahagun, que andava f ug ido hav ia dous anuos (Anon .
foi res tituído ao seu mosteiro pela rainha .
Mencionamos es ta ultima circumstancia, porque ella
é importantíssima para estabelecer a chronologia do
Anonymo de Sahagun,0 qual nem uma
"
só data apontaem todo O processo desta parte da sua narrativa .
Tendo s ido nomeado 0 abbade D . Domingos no prin
cipio de 1 1 1 1 (Escalona , Hist . del Monas t . de Sahagun ,
p . 94 ) e expulso durante 0 de 1 1 1 2 ,fazia exactamente
dous an os em 1 1 1 4 que andava foragido . Eis comotudo conspira em favor do sys tema chronologico adoptado por nó s .
E ste sys tema torna necessario 0 collocar a morte doconde Henrique em 1 1 1 4 , contra a opini ão seguidapelos nossos principaes escriptores modernos e
,entre
elles , por J P . Ribeiro , 0 homem a quem Portugal deveos progressos principaes da sciencia historica . Dedicoueste uma di s sertação especial (Dissert . Chronol . , T . 1 ,
D issert . IV ) a provar que 0 conde fallecerapor maio de1 1 1 2 . Foi O peso que deve ter o voto de t ão eminentesujei to que nos obrigou deduzir da combinação daHistoria Compostellana , do Anonymo de Sahagun ,
dos
documentos hespanhoes daquella epocha e do calculoaproximado do tempo neces sario para se verifi caremos factos então occorridos .as provas da opinião queseguimos . Resta uni camente examinar
,nasmais breves
palavras pos síveis , os fundamentos da dissertação donos so grande diplomatico .
2 50 H ISTOR IA DE PORTUGAL
sendo facil encontrar outra semelhante em que se
alluda a morte do imperante que deixou de existir .
Admi ttindo , porém ,O diploma como genuíno
, pôdeSUppôr
-se con6 r1nação posterior, ou antes,segundo
nos parece , cumpre que as sim 0 pensemo s,aliás fica
inutil a declaração do con6rmante,que
,nas palavras
post morte de i llo comes Henr icus evidentementequiz marcar uma epocha diversa daquella em que
fora exarado 0 diploma,is to é ,
uma epocha incerta ,
posterior a 1 1 1 2 de muitos ou de poucos anuos . 0
documento é a carta de conto domosteiro de Pombeiro .
datada do 1 .
º de agosto de 1 1 1 2 (era em que
D . Theresa diz que faz aquella mercê pro an ima de
oiro meo i lle comes Henr icus Este documento já '
não
exis te senão incluido numa confi rmação regia de 1 7 1 1
e numa copia cheia de conhec idos erros,diz J P . Ri
beiro,tirada pelo celebre falsario Lousada . Se algum
fundamento se deva fazer sobre tal diploma contraprovas terminantes em contrario
,O leitor decidirá .
Dos dous Obituarios,0 de Santa Cruz de Coimbra
diz 1 1 1 2 Kal. Novembrís obi it comes Henricus , et
uxor ej us D . T/zaras ia e 0 deMoreira Kal. Novembr isPortugal. Comes D . Henr icus 1 1 1 2
,et uxor ej us reg ina
D . Tharasía 1 Ambo s elles erram certamente adata do mês quan to ao Obi to do conde
,e 0 primeiro a do
anno quanto ao Obito de D . Theresa,e por isso podi am
igualmente errar 0 anno da morte de Henrique . O que
não tem duvida é que es tas verbas foram escriptas
naquelles necrologios mui tos annos depois do fallecímento do conde
,isto é pelo menos depois de 1 130
,
epocha em que D . Theresa deixou'
de viver. O menorpeso que devem ter taes necrologios quando ha outrasprovas em contrario
,já 0 ponderou 0 mesmo Ribeiro
(Dissert . Chronol .
, T . 1 , p . 1 55, nota 0 fim dellesnão era historico ; era assignalar 0 dia do anno em
que se dev iam fazer 0 5 anniversarios ou suffragios
pelos fundadores ou bemfeitores dos mosteiros .
Em u ltimo logar advertimos que no Arch ivoNaciona l(Gav . 1 5
,M . 1 3 . n .
º
9 ) se conserva o foral de Thalavares dado em março de 1 1 14 ( era 1 152 ) pelo conde
NOTAS 2 51
Henrique e suamulher , regnates in Portugal et in Stre
madura ,Colímbra , Viseo et Sena . J . P . Ri beiro con
demnou este documento que se oppunha á sua opinião,
por dous fundamentos (Dissert . Chron0 1., T . 4 , P . 1 ,
p . 157) 0 1 .
º é a expressão regnantes não usada nosdiplomas do conde 0 2 .
º 6 ser escripto em letra fran
cesa pura, que a inda não era. usada . Quanto ao 1 .
º asolução da
_dif6 culdade é tacil, se attenderrnos as pre
tensões do conde e a palavra Stremadura , que era
então justamente a província em que es ta Zamora, aqual v imos fi car— lhe pertencendo na divisão feita com
D . Urraca . Quanto ao 2 .
º0 proprio J . P . Ribeiro res
ponde a si mesmo na tabella a pag . 1 1 4 do volume em
que impugna a genuinidade do foral de ThalavaresAhi apresenta O uso da letra francesa pura comocomeçando desde a era de 1 1 45.
Apesar de todos os esforços que 0 A . das Dissertações Chronologicas fez para fi rmar solidamente datada morte do conde em maio de 1 1 1 2
,elle proprio
mostra que não es tava de todo convencido da força dosseus argumentos , concluindo a dissertação especial quededicou a es te objecto pelas seguintes palaw as sem
estranhar que ,rej eitada a m inha conc i l iação do Chro
nicon Lus itano,leve alguem a sua morte (do conde) ao
I .
º de ma io da era de 1 1 5 2 A' vista do que temos
ponderado,estas expressões acabam de nos absolver .
HUG O , B ISPO D 0 130 11 1 0 PAG . 68
A Opinião seguida pelos modernos , e nomeadamentepor J . P . Ribeiro (Dissert . 1 , p . 153, e T . 5
,
p . é que a sagração de Hugo , b ispo do Porto , fo ifeita em 1 1 1 3 . Assenta es ta opinião sobre a erradachronologia que Flores deu aos successos narrados na
His toria Compostellana ,erro que já se mostrou na
2 52 H I STOR IA DE PORTUGAL
antecedente nota,e que es ta servirá de comprovar.
melhor. E s tava 0 erud ito auctor da Hespanha Sagradatão preoccupado do sys tema que adoptara , que , tractando (Vol . 2 1 da Esp . Sagr
, p . 56 e segg . ) do ponti6 0 ad0 de Hugo , deduz a chronologia des te succes so dedocumentos que só tornam possível aquel la sagraçãoem 1 1 1 4 e que , portanto , ve in plenamen te contirmar aque nó s seguimo s .
Tres documentos nos res tam , nos quaes , 6gurand0Hugo
,se allude ao anno do seu pontificado
, que se
deve con tar da epocha da sua sagração,sem que seja
necessario disputar sobre a epocha da eleição . Destesdocumentos é 0 1 .
º a doação do'
mosteiro de Crestuma
(Cunha , Cata]. dos b15p0 5 do Porto , P . 2,c . feita na
era de -
1 1 56, no an no do pontiíicado de Hugo é 0
a doação do burgo do Porto a 1 4 das calendas de
maio da era de 1 158 ( 18 de abril de 1 1 2 0 ) no 6 .
ºanno do
pontifi cado (Cunha , ib id . ) é 0 a doação da igrejade S . Frausto
,a 3 das nonas de outubro da era de 1 1 65
(5 de outubro de 1 1 2 7 ) no 1 4 .
º do ponti6 cad0 (Censualdo Porto
,f . 48
Segundo O texto da Compostellana,Hugo foi sagrado
em Lerez pelo arcebispo de Braga ,Mauricio
,numa
dominga da paixão no dia seguinte partiu para Sanctiago corn Gelmires depois di sto , chegando 0 dia da
annunciação (25 de março ) , celebrou a missa solemneno altar do apo s tolo : Post haec
,qu ia erat f estívítas
D . super ej usdem apostoli d l
tar í m issam celebravit . Temos pois a data do mês da
sagração de Hugo falta-nos a ( 10 anno e do dia .
Achada a primeira ,es tá achada a segunda . Flores ,
levado pela falsa chronologia que adoptara ,attribue 0
succes so ao anno de 1 1 1 3 (Esp . Sagr . , T . 2 1,Tract. 60 ,
c . 5, 58 1 0 ,
1 6,2 6 e segg . e e c0 n6rma-0 com os tres
documentos acima . . Irreflexivamente J P . Ribeiroacceita a mesma data (Dis sert . Chrono]0 g .
,T . 1
, p . 1 49e sogg .
,T . 5 , p . ape5ar das diffi culdades que es ta
opinião encerra e que elle proprio sentiria,se não esti
vesse alluc inado pelas ponderações de Flores .
0 grande argumento , tanto do auc tor da Hespanha
2 54 H I STOR IA DE PORTUGAL
Porto,é datado de 3 das Donas de outub ro do anno da
encarnação de 1 1 2 7 , era 1 165, e do pontifi cado . E stecorreu de março de 1 1 2 7 a março de 1 1 28
,10 g0 em
outubro de 1 1 2 7 só podia ser 0 1 4 .
º havendo-se feitosagração em 1 1 14 .
Resta-nos advertir que , caindo neste anno 0 dia 2 5 de
março em quarta— feira de trevas , a festividade da
annunciação devia ser transferida para depois da paschoa . Não marcando
,porém
, 0 tex to da Compostellana0 di a do mês em que 0 novo bispo celebrou a primeiramis sa , mas só 0 da festividade , tal circumstancia em
nadad estroe a conclusão que tirámos dos documentos,
conclusão de p ouca importancia pela natureza doobjecto
,todavia de grande monta por ser mais um
meio para se conhecer 0 erro de um anno em que laboraa chronologia de Flores na sua edi ção da Compostellana .
SUPPOSTA INVASÃO DOS SARRACENO S EM 1 1 2 0,
PAG . 88
Na Historia dos Soberanos Mohametanos por Abd
el-hali ln (Assaleh ,versão de Moura , p . 181 ) d
i
z — se queAly ,
sabendo das correrias do rei de Aragão feitas no
anno da hegira 51 3 passara aHespanha para apôr em socego e assegurar as fronteiras , e depois dechegar Cordova partira para Lisboa
,a qual tomou
de as salto , e d'ahi saíra a assolar 0 paiz occidental . Os
escriptores segui do s por Conde (Domin . de 10 5 Arabes ,P . 3 , c . 25 ad referem 0 mesmo
,com a differença
de 6xarem precisamente a passagem do amir em 1 1 2 0
e de darem 0 nome de Medina Sanabria ,e não de
Lisboa,a cidade do Gharb que dizem ter elle tomado .
Como notámos no texto,0 silencio absoluto de monu
mentos chris tãos acerca des ta entrada de Aly em Por
v v
NOTAS 2 0 0
tugal torna suspeita relação arabe . Mas O que a inva
lida inteiramente é 0 testemunho do proprio Abd— el
halim , dos h is toriadores compilados por J Conde e doauctor do Kamel el Tewarikh ( traducç . de Reynaud ,
em Romey ,Hist . d
'
Espagne , T . 6, p . 4 e segg. ) Por
elles vemos que Aly residia em Marrocos quando 0
Mahadi começou a pregar as suas doutrinas naquella
cidade em 1 1 2 0 . Accresce que : a suppos ta passagem do
amir a Hespanha teve por incentivo , segundo Abd — el
halim e Conde,as assolações e conquistas do rei de
Aragão . Todavia,chegado a Hespanha
,Aly , em vez de
repellir 0 5 aragoneses , marcha em direcção oppos tapara 0 occidente
,e torna Lisboa (Conde leu Sanabria ) ,
que não consta estivesse rebellada ou em poder dechristãos . Sobre as V ictorias e conqui stas de Affonso Ivejam-se Orderico Vital (Esp . Sagr .
,T . 1 0
,
'
p . 580 eAnnales Compost . ad ann . 1 1 18 (E sp . Sagr ,
T . 2 3, p . 32 0 ) e Conde (P . 3 , c . 25 ad 6D . ) que colloca a
batalha de Gotanda no mês de rabieh da hegira 51 4(julho de 1 1 2 0 ) postoque 0 5 Ann . Toled . 1 .
os lhe attri
buam a data de 1 1 2 1 . Quanto às treguas entre D . Urracae 0 conde Pedro de Trava e a guerra contra 0 Aragão ,
consulte — se Historia Compostellana,L . 1
,c . 1 1 3 e 1 1 7 .
TRACTADO ENTRE D . THERE SA E D . URRACA , PAG . 1 0 3
Este tractado acha— se transcripto no Liber Fidei daSé de Braga , donde 0 extrahiu Brandão (Mon . Lusit .
,
L . 8, c . Apesar do respei to que consagramos ao
talento e sciencia de Brandão,vimo-nos obrigado a
affastar-nos algum tanto da intelligencia que elle dááquelle documento escripto numa linguagem horrívelmente barbara . A passagem Et que s ic ista honor quela regina da ad germana quomodo et altera que il latene t não pôde ter, quanto a nó s , interpre tação di ffe
2 56 H I STOR IA DE PORTUGAL
rente da que lhe demo s no texto . Honor,como noutra
parte se verá , significava muitas vezes nos princípiosdo seculo XII 0 districto ou territorio regido por um
senhor subalterno dependen te do rei ou de outro nobrede quem O recebera ; isto e, vinha a ser 0 mesmo q ueem epochas pouco posteriores (nas quaes a significaçãode honor se achava em geral mais restricta ) a terra outenenc ia do rico-homern tenere era 0 vocabulo correlativ0
, que indicava ser O domínio da dependencia dorei tenens era 0 que possuia por esse modo . Isto nosparece mostrar com evidencia a relação mutua em queas duas irmans se consideravam . O titulo de inf antadado constantemente a D . Tberesa neste acto importante
,em contraposição ao de ra inha attribuido a
D . Urraca, nos vem confirmar na opinião de que , tanto
pelas terras que recebia , corno (quomodo) pelas que játinh a , D . Theresa revalidava expli citamente 0 que de
modo indirecto reconhecera no concílio de Oviedo em
1 1 1 5. As sim entende-se perfeitamente como , depois dossuccessos de 1 1 2 1
,D . Theresa continúa a dominar e1n
Tuy e em Orense,de que ali ás devera ter sido desa
possada .
Um escriptor recente (S . Lui z,nas Mem . da Acad .
,
T . 1 3,P . 1 ) pretende determinar a data deste tractado
corno feito depois da volta de D . Urraca para Galliza eda intentada batalha entre ella e seu filho ajudado porGelmires , batalha que não chegou dar— se por se fazera paz em que entrou O arcebispo . E sta opinião parecen0 5 menos provavel porque , se , pelo contrario , 0attribuimos á occasião em que 0 exercito de D . Urracaes tava juncto de Lanhoso , acha-se a pos sibilidade deum facto
,aliás inexplicavel ; isto é , de D Theresa
saber pelos íntimos conselhe iros de D . Urraca,não só
a intentada prisão de Gelmires , mas tambem O modoporque ella se havia de fazer : Quía intimi qui huj uscons i l io interf uerunt f acínor ís , ipsi m ih i ej us enucleaá
verunt modum cap tionis : porque a passagem do
tractado acima trans cripto nos explica porque D . Theresa em fevereiro do anno seguinte es tava senhora deOrense , e ainda em 1 1 25 de Tuy . Sem elle
,como crer
2 58 H I STOR IA DE PORTUGAL
D . Theresa, são semelhantes , até na phrase , salva amenor barbaridade da língua
,e encerram
,além di sso
,
provisões de maior independencia , como é a exempçâode ir 0 prelado á curia e expedições reaes
,signal
caracterís tico da quebra de sujeição ( como se vê do
liv . c . 5 de Rodrigo Ximenes ) , faltando-lhe tambema declaração
,de que 0 5 castellos que lhe restitue
sejam honras e tenencias .
Damos aqui uma copia do tractado,apesar de
impresso na Monarchi a Lusitana,não só pela sua
importancia, como tambem porque a 0 0 pia de Brandãoe inexacta e falha em cousas essenciaes . A nossa éfeita pelo Sr. E smeriz , de ordem do Exmº GovernadorCivil do Districto de Braga
,João Elias da Costa Faria
e S ilva,cuj a urbanidade poderia servir de modelo a
muitos . As abbreviaturas em que abunda O documento ,e que augmentam as diffi culdades de leitura do barbarissimo latim em que está escripto , são desenvolvidaspor nó s . O digno paleographo judi ciosamente as lançouou antes pintou no seu tratado
Rubr ica
Juramentum et convenientie que fecit Regina domnahurraca germane sue infante domne tarasie .
Texto em tinta preta
hec est juramenturn et convenimentum quod facit reginadomna hurracha ad sua germana infanta domna tarasia .
que li sedeat amica per fed sine 1na10 engano quomodobona germana ad bona germana . et que non facíat
morte de 511 0 corpo nec prisione nec consiJiet pro (ouper) facere . et si 10 consih
'
ado tenet que 10 di sfaciat . et
da 1a regina ad sua germana zamora cum suos directos . Exin1 a cum 5u0 5 directos . Salamanca et ripa de
torme com suo directo . avila cum suos directos . are
valo cum suos directos . Gonka cum suos direc tos .
NOTAS
Olmedo cum suos directos . portelo cum suos directos .
manlas e tudj ela . e medina de zofrangá corn suo sdirectos . ta11r0 cum suos directos . et torre cum 511 0 5
directos . medina et pausada cum 5u0 5 directos . Senabria et ripeira et valdaria et baronzeli cum 5 11 0 5 direc
tos . talaveira et kouria cum suos directos . Setmancas .
et morales que s tan pro ad indício de egas gondesindizet geda menendiz et de el con (Conde domno moni ocum fernando iohani s et exemono lupvs que si potnerint avenire que sed . et si non mi ttant sortes quelesiurent et quos iurarent levent illam . et que sic istah
'
onor que la regina da ad germana qu0 1n0 d0 et altera
que illa tenet qu li a adj uvet ad amparar et defendercontra mauros et christianos per fé sine malo engano .
et berma et populata quomodo bona germana ad bonagermana . et que non coliat 5 11 0 vas salo cum sua honoreaut aleivoso que noluerit exconduzer cum iuditio directoet si illa regina isto non attenderit que des illo die queli demandar 1a infante ad X dies 51 illa noluerit intregareque nos sedearnus 5 0 110 5 et vos periuratos ex tan
( tantum quantum 1a infante voluerit adtender ade
Dante .
NASCIMENTO DE AFF ON SO HENR IQUES , PAG . 1 1 4
A data verdadeira do nascimento de A ffonso éainda hoj e di sputada . A chroni ca dos Godo s
,contradi
zendo-se a s i prºpri a ,assigna
-1he duas diversas a de1 1 1 1 e a de 1 1 1 3 . A relação da tomada de Lisboa no
cartorio de S . Vicente de Fóra hoj e no Archivo Nacional ) fá-lo nascido em 1 1 0 7 ; mas este documento temcontra si
"
0 ser esc 1 ipt0 quasi u1n seculo depois dofacto . A Relação da tomada de Santarem (Mon . Lusit
,
P . 3,App . cuja fé para alguem é dúvidosa , estabe
lece-il1 e a data de 1 1 1 0 . O livro das Linhagens , attribuido ao conde D. Pedro , parece concordar nis so
2 60 H ISTOR IA DE PORTUGAL
mesmo ; mas 0 Livro das L inhagens,como hoj e existe
,
é obra de muitas mãos e de diversos tempos,sem que
seja facil di scriminar 0 que é do conde ou posteriorelle
,e , portanto , pouquíssima auctoridade h is tórica
póde ter . O Livro da Noa de Sancta Cruz de Coimbra.colloca O nascimento de Affonso Henriques em 1 1 0 6
,e
-com elle concorda uma nota pos ta num antigo manuscripto de Alcobaça . Um breviario do mesmo mos teiro
,
citado tambem por Brandão e cuja data ignoramos ,põe es te succe s so em 1 1 0 9 .
No meio de tanta incerteza preferimos O testemunhoda Chronica dos Godo s , por ser a que unicamentereputamos contemporanea . Entretanto
,e tambem ne
c essario remover contradicção que ahi se encontra,
referindo 0 successo numa parte ao anno 1 1 1 3 (era1 1 51 ) e em dua s ao de 1 1 1 1 . Eis as respectivas passagens Era 1 1 51 . Natus f a it inf ansEra 1 1 63 . Inf ans D . habens aetatis annos
f ere quatordecim'
no codi
ce que foi de André deResende e no de Alcobaça : Era 1 1 63. I nf ans D . Al
f onsus aetatis anno quar todecim. Era
mortuo cum adhuc ipse puer esset'
duorum vel
tr ium annaram . E sta ultima passagem ,admittida a
no ssa opinião sobre 0 anno da morte do conde em1 1 1 4 , concorda com a outra em que se afârma ter
Affonso quatorze annos em 1 1 25. Não só por concor
darem,mas até por ser mais facil introduzir-se um
erro nos algarismos a margem do codice do“
que nas
palavras do texto , é que se deve preferir a data de1 1 1 1 .
Dizemos de 1 1 1 1, postoque 0 auctor da Chrónica dós
Godo s hesite entre este anno e 0 de 1 1 1 2 (duorum ve'
l
triam armaram) , porque esse anno se aproxima maisdas datas das outras memorias , e porque desde os
ultimos meses de 1 1 1 0 até os principios de 1 1 1 2 o condeHenrique andou por França, Aragão e Castella , quasisempre ausente de sua mulher . Accresce a isto que noPentecostes de 1 1 25 tinha 0 infante 1 4 annos completos ,p0 rque of erê que se lê no exemplar da Chronicados Godos que pertenceu a André de Resende falta , .
2 62 H ISTOR IA DE PORTUGAL
mento erado tempo em que falleceu Egas Moni z . DessaMemoria
,porém
,e do que se refere na Benedictina
Lusitana acerca daquelle monumento parece deduzirse que O relevo antigo que representava a parte superior do corpo de Egas Moniz já não existe , 0 que tor
naria de nenhum valor 0 tumulo como prova do factohistorico . Entretan to
,uma no ta subministrada pelo
Sr . Velho Barbosa,escriptor bem conhecido e teste
munha ac ima de toda a excepção pelas suas luzes ecriterio , nos tira de duvida a semelhante respeito . Comoantigo monge benedictino , 0 Sr . Velho Barbosa teveoccasião de estudar attentamente aquelle monumento .
Segundo e1le af6r1na,na pedra do tumulo existe ainda
O relevo primitivo da corda pendurada ao pes coço docavalleiro
,tendo-se quebrado só a porção do vulto
acima da barba, porque só es ta porção resaltava da
pedra . Assim fica 5uf6 ciente1nente confirmada tradição popular ácerca da façanha de D . Egas .
Venhamo s,porém
,ao .obj ecto principal desta nota,
que é estabelecer nos documentos os successos que
attribuimos ao ann o de 1 1 2 7 , servindo elles ao mesmotempo de illustrar 0 que di zemos -relativamente ao annode 1 1 28.
Temos dous documentos que, combinados um com 0
outro , provam que 0 infante es teve cercado em Gui
marães por seu primo . E'
0 primeiro uma doação aMemFernandes
,datada de' maio de 1 1 2 9 , em que se declara
ser feita aquella mercê pro servitio quod m ih i f ecístiin obsidione Vimarennensi adversas Reg em Alf onsummeum consanguineum und cum Suar io Menendi
,dictas
Grossas et cum aliis de sua genere (Mon . Lusit .
,P . 3 ,
L . 9 , c . E'
0 segundo 0 foral,ou antes con6 rma
ção do foral de Guimarães pelo infante , datado 5 kal.
maii 1 1 66 (2 7 abril em cuj o preambulo se diz
vos f ec ístís honorem et cabam super me,et f ecístís
m ih i servicium bonum et j ídele e no 6 11 1 : et de i l lashered itates de illos burg ueses qui mecum sustinuerunt
male et pena in Vimaranes nunquam doueni f ossadeiras (Arch . Nac .
,For . Ant .
,Maç . 1 2
,n .
º 3,f . 51 v . e
Gav . 1 5,Maç . 3
,n .
º A' vis ta destes dous documentos
,
NOTAS 2 63
0 11 se hão — de suppôr dous cercos de Guimarães ou se
ha— de admittir que esse a que se allude na doação aMem Fernandes é 0 mesmo que se menciona no foraldaquella villa . Nesta hypothes e é certo que elle teriaprecedi do 0 mês de abrilde 1 1 28. A narrativa dos nos soschronistas e h is toriadores é que Affonso V11 cercou 0
infante,vindo em auxílio de D . Theresa ; mas a batalha
do campo de S . Mamede , depois da qual tinha logar 0
soccorro , deu-se em julho deste anno : logo não podiatal cerco ser anterior a 2 7 de abril . Na hypothese con
traria,
de dous assedi os,qual foi O motivo do 1 .
º epor quem posto ? E
' certo que na 1 .
ª doação de Soureaos Templarios (Cartor . de Thom . n0 Arch . feitapor D . Theresa e pelo conde Fernando , a 1 4 das cal. de
abril,1 166 ( 1 9 de março di z-se , depois da data
Qui presentes f uerunt Aldef onsus leg ionens ís rex,etc .
,
e alguem poderia suppôr que já então 0 infan te andarialevantado e que O rei leonês teria vindo a Portugalnessa conjunctura em soccorro de sua tia
,veri6 cand 0
se então 0 as sed io de Guimarães mas obsta um documento de 2 das cal . de abril (3 1 de março) , em queAffonso Henriques apparece con6r1nand0 um diplomade D . Theresa
,0 que prova não ter ai nda rebentado a
revolução de 1 1 28 (Dissert . Chron0 1.
,T . 3 , P . 1
, p . 90 ,
nº além de que a presença de Affonso VII aoexarar-se O diploma
, quan to a nó s , 0 que mostra é queD. Theresa se achava na corte do sobrinho : porquenesse tempo andava O rei leonês entretido com 0 5 negocios que narra a sua chronica (Chron . Adef . Imper. I
4 e 5) não embargando a doação de D . Theresa a Garciav arcez (Mon . Lusit .
,L . 9 , c . 2 ) fei ta 1 2 dias depois ;
porque,nem sabemos onde residia por essa epocha
Affonso VII, se perto , se longe das fronteiras portuguesas , nem 0 logar em que a dieta doação foi exarada .
Durante 0 5 meses antecedentes, pos teriores a julho de
1 1 2 7, tambem não podia ser es te cerco : porque nãoconsta que Affonso V11 tornasse Portugal depois da
invasão daquelle anno que referimos no tex10,nem
podi a vir, havendo o rei de Aragão no mês de julhoentrado em Cas tella para reforçar as praças que alli
2 64 H I STOR IA DE PORTUGAL
possuia , e começando 0 de Leão a chamar tropas detodas as províncias com que formou um grande exercito
, para se lhe 0 ppôr, seguindQ-se d aqui 0 5 successos
referidos na Chronica 1atina,succe55 0 5 que ella liga
immediatamente com 0 casamen to de Affonso VII emnovembro de 1 1 28.
Assim , é indispensavel que O sítio,a que evidente
mente allude 0 foral de Guimarães , fo sse posto antesde julho de 1 1 2 7, 0 que coincide com a invasão dessaprimavera ,
relatada na Historia Compostellana .
E'
forçoso , igualmente , que a doação a Mem Fernandes se re6 ra esse mesmo facto . Sendo ella datada demaio de 1 1 2 9 , e dada a batalha de S . Mamede em julhodo anno antecedente
,segue-se que nos nove meses
intermedios se deveria ter verifi cado a entrada deAffonso VII soccorrerD . Theresa e 0 eonde Fernando
,
se as cousas pas sas sem conforme imaginaram 0 5 nos
5 0 5 historiadores . Ora,em novembro de 1 1 28 casou
Affonso VII em Saldanha corn a 6 1ha de Raimundo,
conde de Barcelona , a qual conduzira da sua patriapormar dux it uxorem per mare (Chron . Adef . I
Como portanto conceberque depois de 25 de julho chegas se a Affonso VII a noticia da victoria do infanteque ajunctasse .
tropas que marchasse para Portugal ;que pusesse sítio a Guimarães que 0 levan tasse em con
sequencia das condições offerecidas por Egas Moniz ;que marchasse com 0 seu exercito para Leão ou paraCastella que fos se a um porto de mar, preparasse um0 11 mais navios e rodeasse toda a costa de Hespanhado mar do norte até 0 Mediterraneo
, porque não tinhaporto algum nes te mar ; que voltasse pelo mesmo ea
minho,e que em novembro es tivesse em Saldanha
celebrando 0 seu casamento com D. Berenguela ? Eimpossível . Separar— se—hia aca so logo de sua mulher
para vir fazer guerra a Portugal por uma causa alheiae no rigor do inverno?Fora preciso algum testemunhocontemporaneo para que 0 acreditassemos mas 0 silencio dos documentos e chronicas é completo a semelhante respeito . No mês de fevereiro de 1 1 29 , c onvocouelle cortes em Palencia e alli residia em 25 de março ,
2 66 H ISTOR IA DE PORTUGAL
lembrarmos que a tradi ção da idademédi a , conservadapelas chronicas mais antigas
,e '
que 0 infante antes dabatalha do campo de S . Mamede já andava levantadocontra D . Theresa e que lhe tinha f urtado dous cas tel10 5
,0 5 de Neyva e da Feira ? Não e tamb em notavel
que na doação de Mem Fernandes se di ga que 0 5 prin
cipaes defensores de Guimarães tinham sido SueiroMendes da Mai a e outros da sua famili a
, que eramacerrimos parciaes de Affonso Henriques , que tantaparte parece terem tido nos successos de 1 1 2 8 e que tãograndes serviços depois fizeram ao infante Tendo nó smostrado que 0 assedio daquella villa só podia acontecer na occasião da entrada de Affonso VII em 1 1 2 7 ,
porque es tavam ahi 0 5 cavalleiros de Maia,nenhum
dos quaes , que nós saibamos , governava aquella povoação e que tinham 0 seu solar em di verso di stricto ?
Todas estas considerações reforçam 0 que dissemo s ,fundado s na carta de S . Vicente de Fragoso .
E'
Verdade que J P . Ribeiro duvidou da genuinidadedeste documento . Mas porque duvidou elle ? Unicamente porque se 0 pp11nha às ideas hístoricas recebidas .
Mai s de uma vez as sim procedeu porque 0 seu 6 1n não
era escrever a h istoria,mas ajunctar solidos materiaes
para ella , e por is so recebia as vezes como índisputaveisfactos que nada menos são que certos . Desconto é esteque se deve fazer nos seus gravíssimos escriptos , que
aliás respeitamos como de mestre e sem cujo auxilionão fora possível dar passo na hi storia dos primordios
da monarchia .
REVOLUÇÃO DE 1 1 2 8,PAG . 1 2 8 .
As primeiras doações de Soure aos Templarios , feitasem março e abril de 1 1 28
,são conârmadas pelo -conde
Fernando e por Affonso VII de Leão (Dissert . Chronol . ,T . 3 , P . 1
,n ºs
2 62 e 2 63, e Elucid .
,T . 1
, p . 32 1 e 0
NOTAS 2 67
que indi ca , Segundo já notámos , estada de D . Theresa na corte do rei seu sobrinho , ao qual poucos mesesante s fora obrigada a 5 11b1netter-se . A doação GarciaGarcez
,fei ta em 3 1 de março , é O ultimo diploma da
rainhã em que intervem Affonso Henriques (Mon.Lusi t.
,L . 9 , c . Desde então , apparecem documentos
simultaneos da mãe e do fi lho , em que ella pareceexercer auctoridade ao 5111 do Douro , e elle ao norte(Dissert . Chron0 1. , T . 3
,P . 1 do n .
º2 65 a 2 68) . O di
ploma do infante é 0 foral de Guimarães j á citado nanota antecedente 0 é a nomeação de Mendo Affonsopara conde do di stricto de Refoios 0 3 .
º é a carta deconto de Braga em recompensa dos soccorros que esperava de D . Paio . A serie des tes documentos parece —nos
assignalar O progresso da revolução . Ribeiro , julgando0 5 a uma luz exclusivamente diplomatica , hesitou sobregenuinidade dos dous primeiros , por não concorda
rem com a epocha do g overno do inf ante . 0 nenhumfundamento des ta observação é obvio . O doutorKopke , que viria a ser um dos nos sos mais habeisarcheologos , se a morte não 0 roubasse na flor da idade ,vindicou perfeitamente a genuinidade do 2 .
º
(Apontam .
Archeol ., p . 2 2 e Sobre 0 é que nó s teríamos
alguma duvida a vista de outro documento analogo,
expedido na mesma data delle e que se acha lançado af . 1 1 7 v . do Liber Fidei . E s te documento , que é igualmente uma carta de conto e privilegios ao arcebispode Braga ,
di tfere mui to do que Viterbo publicou ,tirado
do archivo da-mitra bracharense . Todavia,a di fferença
dos dons privilegios tem uma explicação plausível ,visto não haver motivo para 0 5 crer forjado s , e é queum delles depois de redi gido seria julgado ou omi ssoou errado , e nesse mesmo di a se exararia outro . Mas
qual delles fi cou sendo 0 valido Nó s cremos que 0 do
Liber Fidei , tanto por ter particularidades que 0 outrocala
,como por ter sido este 0 que lançaram naquelle
an tiquíssimo chartulario, ao pas so que es t
'outro se
copiou de um regis to mui to mais moderno , donde 0
tirou 0 auctor do Elucidario . Não só para que se possacomparar com ess
'
outro,111as tambem para que se veja
268 H ISTOR IA DE PORTUGAL
com quanta razão di s semos que 0 exemplo do que se
6 zera em Leão e Galliza para privar D . Urraca do podere dá-lo a seu filho devia influir na revolta dos barõesportugueses contra D . Theresa
,0 pornos aqui . Nes te
diploma,cuj a redacção pertence naturalmente ao pro
prio agraciado ou a algum dos seus conegos,é evidente
a intenção de equiparar D . Paio ao celebre Diogo Gelmires .
Rubrica
Cautum quod concessit adefonsus enrici comitis 611u5et regine tarasie bracharensi ecclesie tempore pelagiiarchiepismpo .
Texto em tinta preta
In nornine patris et 6 1ii et spiritus sancti amen Egoalfonsus . egregii comitis henrici et egregie regina tarasie6 lius . et alfonsi obtimi regis nepos . sancte marie bracarensi et tibi arch iepiscopo domno pelagio tuisque
successoribus in perpetuum promovendi s nec non ibi
dem clericis commorantibus dono atque concedo cautum illud quod scilicet alf onsus rex consan
'
g uineus meus
et reg ina domna arracha mater ej us et eg o tibi robora
vímus in presentia compostellani archiep iscop i' domni
didaci et comitis domni gomizoni s et comitis domniroderici et aliorurn magnatum scili cet pelagii suarii
,
egee 1noni'
,—menendi monionis
,roderici vermuti . cantam
videlicet i11ud dono atque concedo ita determinatumcum villa que dicitur lapella sicut in scripto cauti continetur per illum Videlicet terminum qui est inter avellaneda et gondemar et inter
'
covas et vilar et per illurn
montem de soniariz et -per i11ud monasterium de 6ga
redo et per portellam de gisandi et per portellam de
scudarii et ad illam portellam de leitones et ad por
tellarn de villacova et inde ad pousafolles et ad por
tellam de bezerros et inde ad termínurn de donim et
inde per terminum de lauredo et ad portellam sanctivissimi (sic) et per terminum inter mauri et antonianes
2 70 H I STOR IA DE PORTUGAL
nicatus et cum iuda traditore habeat participium , et
habeat partem cum diabolo et angelis eius . et insuperincurrat iram ipsius regine sancte marie . facta fui tkartaVI kalendas innii era MCLXV1 . ego alfonsus infanshoc testamentum manu mea r0 b0 r0 .
Seguem-se as testemunhas e confirmantes, que são os
mesmos do documento pub licado por Vi terbo .
SEGUNDO CASAMENTO DE D . THERE SA , SUPPO STO ,
PAG . 1 30
O Livro das Linhagens, que ainda h oj e existe na
Torre do Tombo,attribuido ao conde D , Pedro e que
não é mai s que um composto de diversas memorias genealogicas , escriptas em epochas di fferentes , e mal coordenadas , provavelmente no seculo XV
,estabeleceu a
opinião vulgar do casamento deD . Theresa com 0 condeFernando no título 1 3
,onde são quasi tantos os erros
e as fabulas quantas as palavras . Esta Opinião generalison-se e predominou largo tempo . João de Barros eNunes de Leão foram 0 5 primeiros em contradizê— la
Brito,Estaço ,
Faria e Sousa 0 5 primeiros em tentar demonstrá— la . 0 judi ciosoBrandão combateu— a , sem todaviaassentar decisivamente a sua opinião . Seguiu—o D . J0 5éBarbosa
,sus tentando positivamente que tal casamento
era supposto . Por outra parte , em Castella,adduziam
argumentos em favor da verdade da tradi ção Yepes eSalazar de Cas tro . Nesta contrariedade de pareceres aques tão pendeu indecisa até os tempos modernos . An
tonio Pereira de Figueiredo suscitou— a de novo,decla
rando-se pela af6r1nativa (Mem . da Acad .
,T . 9 , p . 2 95
e e a sua doutrina foi commentada e desenvolvida por dous academi cos modernos
,Almeida e
S . Luiz (ib id .
,T . 1 1
,P . 1
, p . 1 74 e segg . T . 1 3 , P . 1,
p . 2 9 e segg) J 0 50 Pedro Ribeiro , cuja opinião em tal.
NOTAS 2 71
materia valera pela de mui tos , absteve-se de a declararnas passagens dos seus escriptos onde ella teria cabido .
Em tudo 0 que 0 5 propugnadores deste consorcioteem allegado não ha senão um argumento sério . E
'
0
que se deduz da carta de fundação do mosteiro deMonte —Ramo
,pub licada por Yepes (Coron . Gener. de
S . Ben .,T . 7 . App . escrit . em que se diz ego
comitis Henr ic i quondam uxor (expressãodesconhecida nos documentos de D . Theresa) nun cvero comitis F erdinand i Han c chartam 6 eri
jus si et una cum viro meo comíte Ferdinando Peres .
Este documento e'
assás duvidoso : Ribeiro deu-0 porsuspeito (Dissert. Ch1 0 n0 1.
, T . 3 , P . 1,nº
238) mar
cando — o com 0 fatal asterisco . Tinham-Ihe feito porventura peso os argumentos de Barbosa , que 0 dá porsuppos to . Entre estes argumentos ha um que desejariamos ter Vi sto combatido (Catal . das Rainhas , p . 1 0 2 ,
5 e muito mais depois da pub licação da Compostellana , que positivamen te nos diz que 0 conde e stavacasado quando veio para Portuga1 . Era sua mulherD . Sancha Gonçalves de Lara (Salazar, Hist . de 1aCasa de Lara
,T . 1 , p . 2 4 1 , n .
º a qual com seu
marido , O conde , doou em 1 1 42 a metade que lhes pertencia do mosteiro de Sobrado . Isto parece mos trarque os amores de Fernando Peres com D . Theresaforam apenas temporarios . E
'
uma terrível dif ficuldadeque se alevanta contra O documento de Monte-Ramo eque valia a pena de ser resolvida .
Viu Yepes es te documento ? Viu-o no origmal ?Eis 0
que e11e não di z . Que está viciada a copia que iruprimiué innegavel. Quem são esses ricos-homens da corte deD . Theresa que confi rmam a doação?Em que outrod iploma regio desse tempo figuram Sueda Mendes
,
Pai o Munhos,Pedro Bidularis N0 meio destas altera
ções visíveis , ainda suppondo doação verdadeira,
n'
ão e'
facil de crer que qualquer copista ,vendo um
documento exarado em nome da rainha e do condeFernando quizesse enfeitar essa associação ,
11n1 poucoestranha,
intr0 duzind0 as expressões nunc conj uxvira meo, como com evidencia se introduziram as
2 72 H I STOR IA DE PORTUGAL
de comitis Henr ici quondam uxor,absolutamente alheias
aos diplomas de D . Theresa ?Mas O que mais induz a crer esse documento ou
falso ou,antes , 0 que julgamos provavel, viciado , é a
falta completa de declaração de semelhante consorcioem todos os diplomas de D . Theresa . Este argumento ,que parece apenas negativo , tornam-no positivo as
doutrinas triviaes de diplomatica . E stabelecida comcerteza a formula de chancellaria de um governo ouperíodo de governo , os documentos que desdi zemdella
, quer para mais, quer para menos , são conside
rados suspeitos . Era as sim que procedi a 0 nos somestre commum
,0 illustre auctor das Dissertações
Chronologicas , empregando , até , esta regra , às vezes ,com demasiada severidade . Mas será , porventura , critica severa de mai s 0 suppôr viciado um un ico diplomaque foge das regras de chancellaria usadas no tempoem que foi exaradoEs te silencio de todos 0 5 monumentos tinha bastado
já para persuadi r 0 bom juízo do auctor da 3 ª Parte daMonarchia Lusitana e foi suf6 ciente para trazer a estaopinião um habi l his toriador nos so contemporaneo(Schaefer, Geschichte von Portugal , 1 . B . , S . AChroni ca dos Godos e 0 Livro dos Testamentos deSancta Cruz de Co imbra
,os dons unicos monumentos
historicos desse tempo que podi am tractar do assumpto ,
guardam 0 mesmo silencio . O ultimo,sobretudo , na
passagem relativa ao desbarato de Guimarães , em que ,se na verdade 0 conde fo s se marido da rainha
,natu
ralmente diria n is i divino nutu reg ina una cum suo
viro (vel maríto) a regno expulsís , etc . di z cum suo
comite,expressão insultuosa ,
'
a11usão amarga ao affecto
illi cito dos dous,lançada em rosto aos vencidos . O
Livro Ve1h0 das Linhagens,cuja origem,
ta lvez,
remonte quasi aos primeiros tempos da monarchi a ,
nem uma palavra contém relativa ao consorcio do
61h0 de Pedro Froylaz com a rainha dos portugueses ,antes pelo contrario , _
fá-10 ca sado com uma só mulher(Hi st . Genealog .
,Prov .
,T . 1 , p . A conspiração
contra O pobre documento de Monte-Rarno é impla
2 74 11 151 0 3 111 DE PORTUGAL
defender ou impugnar . Por curiosidade apontaremosa lgumas das allegações que se repetem nas duas maisrecentes Memorias da Academia em que se tractades te objecto . Bastam , porque são as mais fortes , paraavaliar ' a força dos outros argumentos feitos pelosdous academicos .
A Historia Compostellana diz no L . 3,e . 2 4 : Por
tugalensis acquisita portugalensi patria , et
Fernando qui,relictu sua leg itima uxore
,
cum matre ipsius infantis regina Tarasia tunc temporisadulterabatur , et toti illi terrae principabatur, vi ablato ,magnam di ssensionern habuit , ete . O infante português , ganhada a patria portuguesa , e arrancado dellaFernando Peres , que , deixada sua mulher legitima
,
havia já tempo adulterava com a mãe do mesmoinfante , a rainha Theresa , e imperava em todo aquelle
paiz,teve grande di scordia , etc . O 2 .
º academico,
dos dous a que nos referimos , verteu ví ablato e atomar por f orça referindo-se a terra ou patria . Tra
º
duzindo a letra ,daria O pensamento do historiador
compostellano ,que era indi car ter sido 0 conde expulso
de Portugal. Mas , de um ou d'outro m0 d0
,ninguen1
verá,de certo , uma prova do segundo casamento de
D .Theresa nestas palavras . PreOCCllpadOS pela sua
opinião , ,
viraln — na,porém
,ambos os escriptores . 0 1
chega a exclamar Que testemunho ma is decisivo !D . Fernando deixa sua mulher
, casa com a senhora
D . Theresa ,e governa com ella aos portugueses O 2 .
º
,
'
mais moderado , diz que , quem pretender negar, depoisde tão claras e terminantes phrases , o casamento
,se
verá constrangido imputar a rainha 0 mais indecoroso crime de tractar torpes amores com 0 conde . E
porque não havemos de crer antes is so ?Dá 0 auctorpouco adi ante a razão porque ser ia prova de não
pequena desenvoltura da parte delles e de um grande e
escandaloso deSprezo da publica honestidade e decencia .
Tudo is to é absurdo ; mas tudo isto se acha escripto .
O lexicon em que adulterari tenha a signi ficação decasar — se ainda es tá por compôr e imprimir adultera
batur , é correlativo relicta sua leg itima uxore . 0 5
NOTAS 2 75
dous academicos parece que estavam preoccupados de
uma idea grosseira ,desgraçadamente vulgar, de que só
:
ha adulterio quando a mulher trahe“
seu marido, que
es te pôde faltar a fé conjugal sem ser adultero , e quepara merecer esse título de r
'
eprovação eé necessarioque seja bigamo . Se e possível conceder— se-nos por um
momento que es te negocio passou como nó s 0 entendemos desejaríamos se nos di ssesse de qual palavrase deveriam servir os hi storiadores compostellanos paradesignarern as relações do conde com a rainha
,não
ser adulterabatur ?A razão de conveni encia moral dadapara a extravagante traducção do verbo adulterari
parece—nos inconsiderada e trazida por attenções quenunca deveriam influir n0 animo de quem se dedi ca aosevero lavor da hi storia . É necessario que es ta deixe ,em6m , de ser convencional , de ser um meio de lisonj ear 0 5 grandes ou as preoccupações nacionaes
,as glo
riolas falsas e insensatas do vulgo . E'
necessario accei
tar as gerações e 0 5 seculos como elles foram ,e não
accordar os nossos avó s do somno da morte para lhesdespir as armaduras ou 0 5 trajos de braga] e de almafega e cubri-los do veludo e lemiste cºrtezâos ou dos1ani6cios e algodões dos teares a vapor ingleses . E
'
necessario não attribuir a idade médi a ideas ou costumes diversos dos seus e não envernisar com 0 polimento hypocrita dos tempos presentes uma epochaverdadeiro caput mortuum das ultimas fezes da decadeneia romana
,em que se deliu fereza dos barbaros
do norte conquistadores do meio dia,envenenadas ,
ainda mais, pela addi ção dos costumes luxuarios e
'
voluptuosos dos sarracenos , e escumando n0 cadinho fervente da vida solta de contínuos combates . Pretendertransfigurar assim a h is toria , violentando significaçãoreal dos documentos , é lançar camphora no sepulchro
de um cadaver já corrupto , para que este não apo
dreça . Apesar da sua perversão moral , a idade média ,notavel epocha de tran sformação , tern inuitos aspec tospelos quaes eé grande e bella . Os que desconhecem 0
importante papel que lhe coub e na historia do pro
gresso humano é que se entretêem e1n cubri la de
2 76 H ISTOR IA DE PORTUGAL
remendos e parches , para que não vejamos as ulcerasque a roíam .
A s sim como se deu uma interpretação forçada aHistoria Compostellana para provar 0 segundo casamentode D . Theresa
,do mesmo modo 0 quizeram deduzir
dos preambulos e confi rmações dos diplomas,0 5 quaes
apenas provam que Fernando Peres chegou a gosar damai or auctoridade que a rainha lhe podia dar
,cousa
que , segundo cremos , ni nguem nega . Um desses documentos e uma inquirição sobre os bens e direitosreguengos n0 di s tricto de Viseu (Mem . das
'
Inquir.
,
Doeum . feita pelo prior Sandino Randufi z comvarios indi viduos , entre 0 5 quaes 6gura um NunoMendes que se diz mordomo da ra inha e do conde .
D'aqui se tirou um dos poderosos argumentos a favor
do presupposto consorcio ,argu1nent0 curioso que se
estriba nun1 calculo feito sobre a ignorancia do lei tor .
Hoje mordomo signi fica nas casas abastadas um creadoque dirige certa parte do serviço domes tico e
'
corre com
as despesas mindas da casa . Mas , como nem todos 0 5
leitores ignoram . as nos sas antigas ins tituições , aquellesque sabem que 0 maiordomus era então um recebedorde tributos e direitos reaes , revestido , além disso
,de
certa magistratura para julgar causas de fazendapub lica , rir-se —na de ver O pobre Nuno Mendes , quecom razão se intitulava ,
segundo O costume do tempo,
official da rainh a e do seu logar-tenente , convertidoem creado grave da casa dos dous conjuges . O peor é
que neste mesmo documento O bom do homem se
esquece da communhão de bens entre marido e mulhere di z com 0 prior Sandino que metade de certa leira eO terreno juncto de umas encruzilhadas era de i l lareg ina ,
sem fazer caso nem menção do conde seu amo .
Depois de tão concludentes allegações , como as quetemos visto , pareceria inutil aproveitar varian tes decodices para dellas extrahir provas . Pois até is to se
fez . A Chroni ca dos Godo s , no exemplar que foi deAndré de Resende ,
diz que 0 infante Affonso Henriquesadquirira O reino de Portugal labore suo mag is quam
parentum voluntate. A palavra parentum e mais uma
2 78 H I STOR IA DE PORTUGAL
seus fundalnentos são : que a destruição de'
Leiriade que ha no ticia fora em 1 1 40 : 2 .
º que Chroni cadosGodo s diz ter s ido 0 infortunio dos chris tãos nes te annoeu1 Thomar : Era MCLXXV evenit inf ortunium chrié
tíanís in Thomar .
A primara des tas razões é evidentemente de nenhuma
força . O ser 0 cas tello de Leiria destruí
do em 1 140 nãoobsta a que tivesse em 1 137 sido entrado pelos sarra
_cen0 5 e que , abandonado por es tes , 0 5 christãos 0 reparassem e guarnecessem de novo . O segundo fundamentonão é melhor. A Chroni ca dos Godos não fala . do cas
tello de Thomar mas do infortunio succedido aos por
tugueses em Thomar . Podi a ser, e provaveM ente foi,
um combate campal dado nas margens do Nab ão, emque 0 5 christãos 6 cas se1n desbaratados . Para pro
var que Erena de que falla Sandoval , seguindoChronica toledana
,é 0 castello de Thomar fora neces
sario que este já exi s tisse . E'
0 que se não verifi ca .
Para não multiplicar documentos , que todos conspi
ram em provar 0 mesmo,baste citar os principaes que
fazem ao nos so intento1 .
º A bulla de Urbano 111,de 1 1 86
,pas sada a reque
rimento dos templarios e , por consequencia, estribadanos factos allegados por elles , con6 rmand0 — 1hes as
terras e bens que pos suíam emGav . 7 ,M. diz que Soure e Ega lhes tinham sido doadas por D . Theresa e terram desertam inmarchia ser
racenorum por Affonso I , e que e11es ahi hav iam f undado os
'
castellos de P ombal, Thomar,Ozezar e Almon
rol. Todos estes castellos são , portanto , posteriores adoação de Affonso I .
A doação do castello de Cera feita aos templariosem fevereiro de 1 1 59 (Cartorio de Thomar no Arch .
Nacion . ) é a mais antiga desse territorio em que se di zna bulla de Urbano 111 foram f undados depois P ombal ,Thomar
, Ozezar e A1 1n 0 111 0 1. A fundação de Thomar é,
portant0 , muito posterior ao anno de 1 1 37.
3 .
º A inscripção, ern6 1n p, 0 5 ta juncto á porta da igrejado convento de Thomar (Elucidario , T . 2 , p . 359 ) fixadefini tivamente a fundação do castello em 1 1 60 .
NOTAS 2 79
Mas,di r-se—ha
,antes desta ultima fundação pedi a
exi stir outro castello nasmargens do Nabão ou T homar .
Sem duvida . Todavia , como de tal castello não ha me
moria alguma , nem a passagem da Chroni ca dos Godosa que Brandão se refere torna necessaria a sua existencia ,
é evidente que 0 chroni sta de Affonso VII fala deLeiria ,
não só pela semelhan ça do nome Erena ,Leirena ) ,
mas tambem porque não sabemos de outro castello naquelles sitios en ado por Af f onso Henriques -nessaepocha para f azer f rente a Santarem e guerreá
— la , bem
como a L isboa_
e Cintra e aos outros cas tellos circumvi
z ínhos (Chron . Ade f . , L . 1,c .
O unico meio de sustentar a opinião seguida“
peloauctor da Monarchi a Lus itan a , de que 0 castello de
Leiria foi tomado pelos sarracenos uma só vez,e esta
depois do recontro de Ourique, que é destrui çâo d e
que fala a Chroni ca dos Godos ; O uni co n1 e10 ,dize1nos ,
de sustentar tal doutrina,fora suppôr que 0 chronista
de Affonso VII introduzira deslocada'mente a narrativado cas o de Leiria entre acontecimentos de ann os an teriores . Mas
,nessa hypothese , como explicar a retirada
de Affonso Henriques depois da victoria de Cerneja ?Corno a acceitação das duras condi ções do tractado deTuy ? Além di s so
,O tes temunho da chronica toledana,
que nos referimos,é preciso . E ll a nos diz que , depois
da victoria,Affonso voltou logo a Portugal para acudir
a Leiria ( ibid . 1,
Acresce que na relação dos acontecimentos de Valdevez em 1 1 40 se allude á perda deLeiria como a um succes so de tempos passados ( ib id .
c .
'
BATALHA'
DE OUR IQUE ,PAG . 1 74
As unicas fontes legítimas e positivas para a hi storiada batalha de Ourique são as seguintes
1 .
º In loco qui dicitur Oric fuit praelium inter pagamoset chris tianos , preside rege Ildefonso portugalense ex
2 80 H I STOR I A DE PORTUGAL
una parte , et rege paganorum Examare ex altera, qui
ibidem mortem sitio evasit in di S . Jacobiapostol i mense juli i . Era MCLXXVII Chronicon Lame
cense nas D issert. Chronol .,T . 4 , P . 1
, p . 1 74 , e nos Portugaliae Monumenta H istor ied (Scr ip tores) , vol . 1 ,
p . 1 2 0 .
In era MCLXXVII mense julii , die S . Jacobi,in
10 0 0 qui dicitur Ouric , lis magna fuit inter christianoset mauros
, praesíde Ildefonso portugalensi , et ex partepaganorum rege Smare , qui vic tus fugam petut Chro
nicon Conimbr icense (Livro da Noa de Sancta Cruz )em Sousa
,Prov . da His t . Geneal . , T . 1
, p . 375, e melhorem Flores
,Esp . Sagr .
,T . 2 3
, p . 330 , e nos Monumenta,
ibid .
, p . 2 .
3 .
º Inquirição sobre as questões de primazia entreBraga e Toledo , na qual um certo Garcia Liufreiz de
Jaraz di s se que se lembrava de ter vinte annos,tem
p ore Belli de Aur ich : E lucid . verb . Ladera,T . 2
, p . 80,
c . 2 .
111 campo Haulich quinque reges paganos cuminnumera e0 r11 1n barbara multitudíne
c
de ultra citraque
mare,ut eum 0 1nnin0 perderent coadunata ,
devic_1 t
,
auxilio sibi facto divino,ac B . Jacobi patrocinio , cujus
ea die solemnitas fui sse perhibetur : Vita S . Theotoníi
nos Monumenta,ibid .
, p . 86, g2 7 .
5.
º Era MCLXXVII julio mense die divi Jacobi apostoli fuit victoria Alfonsi regis de E smar rege sarrace
norum et innumerabili prope exercitu, in 100 0 qui di citur Aulic
,tunc cor terrae sarracenorurn quo perrexit
rex Alfonsus . Foeminae sarracenae in 11 0 0 praelio amazonico ri tu ac modo pugnarunt ut occisae tales deprehensae : Chronica Gothorum,
em Brandão, Mon . Lusit
P . 3 , L . 1 0 , c . 3 , e nos Monumenta,ibid .
, p . 1 2 .
0 Chronicon Lamecense acha— se escripto em le trafrancesa na primeira fo lha de 11 11 1 martyrologio da Séde Lamego
,e ahi se di z que foi tirado authenticamente
de outro mais antigo no anno de 1 262 . Vi terbo suppõe
O original anterior um seculo . A palavra Orich escriptade um modo que parece mais arabe , a singeleza verdadeiramente de chronicon com que es tá escripto e 0 ter
2 82 H ISTOR IA DE PORTUGAL
6 cam é que dava mais fé aos exemplares de SanctaCruz e d
'
Alcobaça , conformes entre si . 0 exemplar deResende foi , sem duvida
,enfei tado e paraphraseado
posteriormente , não dizemos por e11e ,mas por alguem .
Nó s subscrevemos inteiramente ao voto de Brandão .
Na copia de Resende ha artigos que desdi zem completamente da fórma sempre resumida e rapida com que
se lançavam aquellas series de apontamentos chamados Chronicons . E sta fôrma é constante , não só emtoda a Península
,mas também em toda a Europa , como
se pôde ver nas Collecções de Martene , Achery , Muratori , etc : , e ainda melhor na mais perfeita de todas essascollecções , os MonumentaH istoriae Germanica de Pertz .
Assim , dando textualmente as fontes para a h is tori ada batalha de Ourique , aproveitamos 0 artigo da Chron ica dos Godos inserido na narrativa de Brandão , desprezando leitura do codi ce de Resende ,
'
evidente para
.phrase de mão mais moderna .
Ba inda assim,consideramos a auc toridade da Chro
ni ca dos Godos como inferior á da Chronica Lamecense,
,porque , posto ambas sej am do seculo XII,a relação
daquella é por certo pos terior, nessa parte , aos succes5 0 5 que narra : as palavras tunc cor terrae sarraceno
rum que ahi se lêem ,não deixam a menor duvida de
que a memoria da batalha foi escripta depois da con
quis ta do A1e1ntej 0 , quando j á Ourique não era 0 cara
ção da terra dos sarracenos ao passo que 0 artigo doChronicon Lamecense pôde ter sido lançado nelle poroccasião do acontecimento . Por via de regra era as simque se iam redigindo aquellas como ementas his toricas .
Se descerrnos a examinar criticamente a narração docodi ce de Resende
,delle mesmo se tirarão as provas
contra 0 subido valor que se lhe tem dado . Não transcrevemos na integra aquelle artigo , porque não lhe
attribuimos grande importancia , á vista do que . ficaadvertido . 0 5 que pretenderem consultá-lo podemrecorrer aos Appendi ces da 3 .
ª Parte da Monarchia Lnsitana . Citaremos só as passagens que , em nos so entender, 0 condemnam . A primeira cousa que offerece uma
.dífâculdade,talvez insoluvel, é dizer— se-nos ahi que
NOTAS 2 83
O rei Esmar, tendo congregado infini ta multidão de
sarracenos africanos que trouxera comsigo e dos deáquem mar
,dos di strictos de Sevilha , Badaj oz , E lva s ,
Evora e Beja e de todos 0 5 cas tellos até Santarem ,
saíra ao encontro de Affonso Henriques Comecemospor nos recordarmos de que ainda nos princípios domês de j ulho O príncipe português não tinha saído dosseus domínios
,onde então fazia mercês (E lucid . verb .
Ladera) e de que a 2 5 se deu a batalha .Assim,é neces
sario que em vinte dias,pouco mais ou menos , 0 exera
cito christão passasse 0 Tej o ; que Esmar soubesse dainvasão ; que desse ordem às tropas almoravides e andaluses para marcharem de tão diversos pontos ; queessa inf ini ta multidão marchasse de feito , se reuni ssee viesse encontrar os portugueses em Ourique . E
'
durode crer ; mas sigamos ávante . Con1 o tinham Vindo estastropas d
'
Africa , se Tax6n havia dous annos levara paralá as melhores de Hespanh a
,a 6m de salvar 0 imperio
das mãos dos almohades,e desde então' só experimen
tara reveses e , por consequencia , diminui çã o de forças ª?
Porque não se encontra 0 menor vestígio desta vindanos hi s toriadores arabes Porque não se dirigiu Esmar
contra Affonso VH para descercarAurelia ,negocio sem
comparação mais importante do que repellir uma
correria, quando a retirada dos christãos ,mettidos no
centro do territorio inimigo,não podi a tardar Porque
se respondeu aos defensores d'
Aurelia nesta mesmaconjunctura que não havia forças para enviar a soccorrê .10 5 Não invejamos quem quizer salvar esta passagem 0 trabalho de annullar h iste ria dos successos da
Hespanha e da Africa , no meio dos quaes dynastia do
zenetense Abdu —l-mumen veio a substituir no supremopoder entre 0 5 mussulmanos do lamtunita Tax6n .
Diz — nosmais esta narrati va extraordinaria que tendoaquella in6ni tamultidão de sarracenos cercado AffonsoHenriqii es em um outeiro
,no qual estava acampado
com um punhado de gente (cu1n paucis suorurn) , qui zeram os infiéis romper O arrai al
,mas que ,
saindo contraelles a lgumas tropas escolhidas (e1ecti mih tes) os passaram á espada depois de 0 5 repellirern ; que ,
'
vend0 isto
2 84 H I STOR IA DE PORTUGAL
O rei Esmar e conhecendo que 0 5 christãos es tavam re
solvidos a triumphareln e a morrerem antes do que
fugirem ,fugiu elle 0 0 111 os seus
,e não houve mai s que
matar e di spersar multidão dos infiéis . Tinha E smar
razão de as sim 0 fazer,e qualquer
, por mais esforçadoque fosse , . fugiria do mesmo modo . São poucos os
christãos ; innumeraveis 0 5 soldados sarracenos . Aecommettem 0 campo ; mandam 0 5 portugueses algun s ca
valleiros a recebê — los . Tal era a conta em que tinhamaquelle gentio que nem quizeram saír todos ao rebate .
0 5 cavalleiros escolhidos repellern 0 5 aggressores epassam-nos á espada . A
' vista de tão inaudi to e incrivel espectaculo , quem é que não fugiria?Diz — nos por 6n1 narrativa daquella ,
não j á extraor
dinaria,mas sim milagrosa victoria ,
que ahi ficou prisioneiro um certo Omar Atagor, sobrinho do rei Esmar
e neto do rei Aly . Vemos , pois , que E smar era fi lho doimperador de Marrocos e , por consequencia , irmão deTax6n
,vindo Omar Atagor ser ou fi lho ou sobrinho
deste principe . Semelhantes personagens deviam ser
conhec idos na hi storia dos sarracenos,e Esmar um dos
mais illus tres caudilhos lamtuni tas . Busquem-se,porém
,
estes nomes na his toria dos arabes, que delles não se
encontrará 0 menor vestígio . Pelo contrario,sabemos
que os chefes principaes dos almoravides de Hespanha ,depois da partida de Tax6n para Africa , eram Aly Ibn
Ahu-bekr,tio do principe lamtunense , Abu Zakaria Ibn
Ghanyyiah ,e Osman Ibn Adha unicos de que se acha
feita menção nos historiadores da Hespanh a arabe(Conde , P . 3 , c .
Que 6rmeza ,pois
,se pôde fazer numa narração que
nos conta successos humanamente impossíveis e quenelles faz figurar individuos cuj a exis tencia é deseonhecida dos escriptores que tinham obrigação de conservar sua memoria , se realmente houvessem exi s
udo ?
Bes tam-nos , pois , 0 5 cinco monumentos que acimatranscrevemos como unicas provas do facto . O Chro
ni con Lamecense e inquirição de Braga apenas nos
asseguram que elle não é uma fi cção .. O Chronicon Co
2 86 H I STOR IA DE PORTUGAL
meiro aspecto ( 0 que facilmente poderá qualquer veriíicar no Archivo Nacional
,onde hoje se acha ) . Parece ,
na verdade , impossível que tão grosseira falsidade ser
vis se de assumpto discussões graves . Quem ,todavia
,
desejar conhecer a impostura desse documento famosoconsulte a memoria de Fr . Joaquírn de Santo Agostinho(Mem . de Lit ter . da Acad .
,T . 6 , as Dissertações
Chronologicas (T . 1 , Dissert . 2 , p . 60 e segg .
,e T . 3 ,
P . 1,n .
º e as Memorias da Academia (T . 1 2,P . 1
,
p . 75 e segg . ) onde a censura não consentía que se dissesse tudo
,mas onde se diz 0 sufãciente para 0 5 enten
di dos . 0 aindamai s celebre auto das cortes de Lamego,
un ico pela sua fórma e circumstancias no meio de tan tasactas que nos restam de concílios e cortes de Hespanhae Portugal desde 0 tempo dos Godo s até 0 6m do secu10 XV ,
tambem se refere á batalha de Ourique como O
fundamento da acclamação de Affonso I naquellas
cortes . Faremos devida justiça a esta invenção dealgum dos falsarios do seculo XVI quando tractarmos
da h istoria das institui ções e legislação do berço damonarchia . Dire111 0 5 , porém ,
de passagem que paraconhecer que as actas das cortes de Lamego seriamabaixo da crítica ,
se não fosse 0 haverem sido cousideradas desde 0 seculo XVII como as leis fundamen
taes do nosso paiz,bastará attender ao seu preambulo
,
no qual j á figura um procurator reg is na epocha emque procurator signi6 0 ava sempre administrador
,cd
beça , pr incipal de uma terra ou de uma corporação , eonde 0 5 imaginarios representantes dos muni cípios quealli se fazeín 6 gurar se dizem procurantes bonam prolem per suas civitates , no que 0 falsario passou alémda meta
,carregando ignorantemente mão na barba
ridade do latim . P rol proveito) era palavra antiquadajá no 6n1 do seculoXVI , e por is so querendo 0 impos tortraduzir em latim barbaro que elles eram 0 5 que proeu
ravam o bom proveito dos concelhos , faz di zer ao redac
tor das acta s , que elles procuravam ter boa descendencia
ou j í lhos nas suas c idades . E'
pelo menos como entenderia aquella phrase um homem do seculo XI ou XII,tempo em que prolís tinha a restricta signi6 0 ação de
NOTAS 2 87'
j í lho ou d escendente e em que até , commummente,as
personagens que intervêem nas escripturas se di zem ,
por exemplo , Sane ias prolís Roder ici , Alf onsus p ro lísOveci
,em logar de filho de Rodrigo , ou filho de Oveco .
Apontamos estas duas pequenas circumstancias para
dar uma idea do mesquinho talento dos falsarios que
tanto enredaram com 0 5 embustes de diplomas grosseiramente forjados a hi storia dos primeiros tempos damonarchia .
XVI I
DESTRU IÇÃO DE LE IR IA E TRANCO SO ,PAG . 1 81
Attribuindo ao anno de 1 1 40 varios successos que 0
commum dos hi storiadores , ainda aquelles que mai sattentos se mostram às investigações cflronologicas ,suppõem anteriores , aproveitaremos aqui as passagensdas chronicas em que nos fundamos para alterar essachronologia e Ci taremos 0 5 documentos que , revalidandoa aii ctoridade das chronicas
,nos levam a apartarmo
nos da ordem dos successos estabelecida pelos hi storiadores que nos precederam , entre os quaes se contamO português Brandão e 0 castelhano Ri sco . E
'
mais curtoe mais claro provar a nossa opinião que refutar emespecial a de cada um delles .
Na h istoria latina de A ffonso VII ha uma passagemimportante para chronologia daquella epocha . A L
ª
des truição de Leiria, que a his toria do imperador espe
cificadamente narra , j á vimos na nota XV que foi em1 137, quando , pelo tes temunho da Compostellana epelo tractado de Tuy des te anno , sabemos que se fez apaz entre O imperador e 0 infante depois da invasão daGa11i za , intentada por instigações de Gomes Nunes ede Rodrigo Velloso .
Eodem tempore venerunt moab ite s e t agareni superpraedictum castellurn Erene . ceperunt que
gererentur imperator f ac íebat bellum in
terra reg is Garc iae , cepit Comitem Latronem Na
2 88 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Comes vero Latron Nafarrus , dato imperatorijuramento , servivít ei multis postquam paxf actaest inter imperatorem et comitem Latronern Nafarrumfuit bellum per aliquot anuos inter regem Garc iam et
Ceteru'
m in Portugali Ferdinandus Joan
quo tidie agebat bellum contra Ferdinan
dus praedictus cepi t aliquos ex principibus regis , et
expoliatos magni s divitiis dimi sit . Et factum est post
quam haec g esta sunt imperator abii t in Portugale
Segue-se a relação dos acontecimentos de Valdevez,
succedidos em 1 1 40 , segundo a Chronica dos Godos .
Vemos , po is , que 0 5 recontros de Fernando Annescom 0 infante não podiam veri6 car— se senão nos 6ns
de 1 1 39 ou princípios de 1 1 40 , porque das palavraspostquam haec gesta sunt se vê que a vinda do imperador precederam immediatamente esses recontros
,
tendo 0 chroni sta narrado antes que a outra guerraentre Affonso VII e Garcia (pos terior a 1 137 durarapor
a lguns annos . Além di sso,não se podendo attribuir
estes successos aos primeiros sete meses de 1 1 39 emque Affonso Henriques preparava e emprehendia a jornada do Ale1ntejo
, seria necessario atrasá-los a 1 138,em que nem nos monumentos de Hespanha , nem nos
de Portugal se acha 0 menor vestígio de commettimen
tos na fronteira de Galliza,antes vemos - Fernando
Peres , quer seja 0 de Trava,quer O irmão do impera
dor,6gurand0 na corte de Affonso Henriques e acom
panhando— o , talvez, ainda á batalha de Ourique (Doc .
do Arch . Nac .
, Chancell. de A ffonso IV,L . 2
,f . 2 ,
eM . 1 2 de For. Ant . , n
º 3,f . 62 Como j á notámos
,
notícia que teve Esmar de que 0 infante es tava ocenpado na Galliza (in partibus Galleciae circa Tudem)em negocios de que se não podia desembaraçar , e 0
restituir Atfonso Henriques ao primo nas treguas deValdevez 0 5 castellos que lhe tinha tomado (Chron .
Adef . 1 são dous factos que reciprocamente seillustram . A noticia recebida pelo chefe sarraceno era
relativa , sem ques tão , a successos posteriores a jornadade Ourique e portanto , a guerra do príncipe dos portugueses com O príncipe de Limia , sendo uma só , devia
2 90 H I STOR IA DE PORTUGAL
li cado 0 5 successos de Valdevez ; porque j á a 26 de
junho estava All'
onsoVII em Zamora (Doc . daEsp . Sagn,
T . 2 2 , p . Dos particulares exis te apenas uma
escriptura do de outubro de 1 139 em que é denominado inf ante (Dissert . Chronol . , T . 3
,P . 1
,n .
º 358) eoutra de 1 9 de agosto desse anno em que tambem 0
notario lhe dá 0 mesmo título (Escambo entre EgasGonçalves e Toda Egas : Tombo de D . Maior Martinsno Cartorio de Arouca
,hoj e no Arch . Nac .
,P . 1
,Doc .
1510 quanto aos documentos ; quanto , porém , as
memorias historicas ,nenhuma das indubitavelmente
coevas encerra a menor allusão donde se possa concluirque Af fonso Henriques fos se acclamado em OuriqueO monumento mai s antigo em que temos achado men
ção des sa particularidade é um extenso rolo de pergaminho do cartorio de Palmella
,contendo 0 5 artigos
apresentados ao papa pela ordem de Sanctiago em Portugal para se desmembrar da de Cas tella ( transcriptosno Livro dos Copos
,f . 53 , aliá s artigos offerecidos
no tempo do mestre Pero Escacho ( 13 1 6 a Ahi se
diz D . Al fonsus 1 .us rex in manu
po tenti conterendo sarracenorum barbaricam feritatem
in campo de Ourique a suis nobilibus et aliis communitatibús in regem assumptus es t Es te documento posterior quasi duzentos annos ao successo
,se não serve
para a h istoria ,serve para 0 5 amigos de tradições .
Offerecemos-lh'
o . E'
em especial digno de notar-se queessa circumstancia de ser eleito rei se omitta na Chro
ni ca dos Godos enf eitada (exemplar de Resende) , 0 que ,send0 as sas adverso a verdade da tradi cção , persuadeque as addições feitas nesta copia da chronica são anteriores ao seculo XIV,
aliás não escaparia alli .
anec
do ta da acclalnaçâo ,que pelo documento de Palmella
Vimo s que j á vogava no meado deste seculo .
A taes considerações accrescem as probabilidadeshistoricas . Se a batalha de Ourique não teve nem as
dimensões , nem a importancia que se lhe attribui ram,
desapparece todo O mo tivo racional de acclarnação ,
quer antes,quer depois do recontro . Além di sso
,0 5
sarracenos podiam disputar a Affonso Henriques 0 do
NOTAS 2 9 1
mini o de um ou de outro castello , de um ou de outroterritorio , mas O titulo de rei , de príncipe ou de infante ,de certo não , e por isso 0 resultado do combate nadatinha que ver com a questão polí tica da independencia .
Pelo contrario, em Valdevez O imperador achava-se
braços com 0 infante,e a causa da guerra era talvez
únicamente essa . As vantagens obtidas pelo príncipeportuguês offereciam-lhe ensejo accommodado paralançar fóra a mascara e quebrar os derradeiros e tenueslaços que 0 ligavam a coroa leonesa . Recordemo-nosde que em 1 1 38 , usando j á Affonso Henriques na maiorparte de seus diplomas do titulo de príncipe
,ao cele
brar 0 tractado de Tuy em julho desse anno , 0 abdi capara se intitular infante ( convenientia quam facit infan sportugalensis cum A . Ispanie imperatore ) e de que ,expedindo nesse mesmo mês , provavelmente ainda em
Tuy ,0 foral de Penella (Dissert . Chronol .
,T . 3
,P . 1
,
p . 1 1 3 , n .
ºse limita igualmente ao primeiro título
que adoptara . Não nos indica isto que Affonso VII,
quando era 0 mai s forte,não consentia seu primo
denominação de . prínc ip e dos portugueses, que, por 155 0
mesmo que era demasiado vaga, favorecia as suas pre
tensões ? Parece-nos que di f6 ci1n1 ente se achará outraexplicação aquelles documentos . Depois da j ornada deValdevez
,tomar Affonso Henriques O ti tulo de rei era
uma verdadeira reacção era annullar aomesmo tempoa letra e O espírito do trac tado de 1 1 37 . Foi isto , porcerto
,0 que elle fez , se a harmoni a dos documento s ,
das memorias coevas e de grandes probabilidades historicas tem alguma força contra tradições assas 1n 0
dernas em relação aos tempos a que se referem . Um
diploma original dos ultimos cinco meses de 1 139 em
que Affonso Henriques se denominasse rei destruirianos sa opinião . As diligencias que temos feito para 0
encontrar foram baldadas ; ou tros serão , porventura ,
mais felizes .
Não nos esquece 0 haver 0 A . das .D issertações dadopor suspeito 0 2 .
º dos dons documentos que acima citámos . Fez mais deu como taes todos aquelles em que
Affonso Henriques se denomina inf ante depois de no
2 92 H I STOR IA DE PORTUGAL
vembro de 1 136 . Num dos seus primeiros trabalhos decritica historica tinha elle estabelecido como regra geralque 0 [ilho do conde Henrique se intitulara inf ante de1 1 28 a 1 1 36 desse anno até 0 de 1 1 39 (batalha de Ourique ) pr incípe ; desde esta epocha em diante
,rei . Posto
semelhante principio a vista de um certo numero dedocumentos
,elle lançou na conta de suspeitos 0 5 que
fug iam a es ta classi6 cação e que não tinham outromotivo de suspeita senão modi fi carem a regra . Sem
que por is so desconsideremos as opiniões do nossomai s illus tre critico
,seja— nos líci to di zer que esta não
nos parece admissível . Ribeiro foi como O chefe e guiada eschola diplomatica e
,convencido por diuturna
experiencia de que nos nossos arch ivos não faltam documentos forjado s
,mostrou— se p or vezes severo de
mais , rejeitando c0 n1 0 suppostos ou duvidosos mui tosque nada tinham contra si
,senão 0 ppôre1n
-se a opini õeshistoricas geralmente recebidas . Aque11e sabio era essencialmente 0 homem da reacção contra 0 5 crendeiros e
'
falsarios e,como todos 0 5 homens de reacção , exaggerou
um tanto a critica . Não é evidente que , achando algun s ,bemque raros , diplomas anteriores a_
1 1 36 em que AffonsoHenriques se intitula pr íncipe e bastantes pos teriores aessa epocha em que se denomina inf ante , ;se1n que contraa genuinidade delles lhe occorresse outra duvida , resultava d 'ahi
,não 0 dá— los por suspeitos , mas 0 alterar a
regra e reconhecer que O uso destas diversas designações era modi ficado pelas circums tancias? O que jáacima advertimos mos tra bem porque no foral de Penella Affonso Henriques se inti tula infante assim para0 5 outros dar— se—hiam motivos analogos . Nesta materiamesma Ribeiro reconheceu a pos sibilidade das variações , acceitando como genuínos documentos partienlares posteriores a 1 13 1 em que é intitulado infante epríncipe , quando ,
não só por outros documentos , mas
tambem pelo tes temunho das historias coevas sabemosque desde esse anno O povo lhe chamava geralmenterei . Ainda depois d e 1 1 40 nos apparecem diplomas emque 0 novo monarcha se di z Affonso rei , príncipe dos
portugueses (Dissert . Chronol .,T . 3
,P . 1 , n
ºs 368, 371
2 94 H ISTOR IA DE PORTUGAL
Chronol . T . 3,P . 1
,n .
ºS 368, 371 e pela accumulação dos títulos de rei e p rínc ipe Ego egregius rex
al f'onsus gloriosissimi yspani e imperatoris nepos et consulis d0 1nni henrici et tarasie regine filius , dei vero providentia totius portugalensis provincie princeps esendo datado V idas aprilis era MCLXXVIII
,acha — se
entre 0 5 con6rn1ante5 0 ir1não do imperadorAffonso Vll,Fernando Furtado
,0 qual vinha no exercito de Leão e
foi um dos prisioneiros em Valdevez . Portanto , 0 filhobastardo de D . Urraca só poderia con6 1mar aquelle
diploma depóis do recontro , 0 11 quando se achava captivo no campo de Affonso Henriques 0 11 depois de con
graçados 0 5 dous primos,0 que é mai s provavel. Deste
modo 0 successo de Valdevez começa a aproximar— se
de uma data precisa ; pois 6 cam0 5 sabendo que precedeu a 1 0 de abril de 1 1 40 .
Na nota ( 1 ) a pag . 1 75, alludirnos ao documento de
30 de março de 1 1 40 (Arch . Nacion .
,Gav
'
. 6,M . nu .
,
n .
ºem que Affonso I se intitula rei , dando-o por
'
suspeito . Guiou — nos naquelle logar um curto apontamento que delle extrahiramos . Examinando — o de novono Arch ivo Nacional
,vimos efl
'
ectivarnente que lhe
erraram data ao transcrevê— lo na c0 n6r1nação de
A ffonso 11, porque nelle j íg ura j a
'
a rainha D . ZVIaf aldacasada em 1 1 4 6
SUJE IÇÃO AO PAPA , PA G . 1 88
Apesar de tantos escriptos que possuímos sobre adifúcultosa chronologia da nossa his toria , O lei tor temvisto quantas vezes ainda as opiniões mais acreditadasse affastarn da verdade
,até nas datas dos successos . O
complicado negocio da con6rmação do titulo de rei eda sujeição immediata a Sé apostolica
,offerecida por
Affonso Henriques para firmar separação de Portugal ,é um dos factos mais obscuros e di sputados na historia daquelle reinado . São 0 5 erros de datas uma das
NOTAS 2 95
causas principaes da obscuridade e das di sputas . Nacarta de Lucio H, pub licada por Baluzio (M isce11 .
,T . 2 .
p . 2 2 1 ) do arch ivo da igrej a Rutbenense (e não Ausci
tana,
“ como aponta J P . Ribeiro ) e por Viterbo (Blucidario
,T . 1
, p . 378) do archivo de Braga , di z O papa queAffonso l fizera homenagem ao seu predecessor Innocencio 11 nas mãos de Guido
,cardeal diá cono
,então
leg ado naquellas partes (em Hespanha ) . Se a carta deLuc io 11 é verdadeira (e logo veremos que não ha n1 0
tivo sut'
6 ciente para a suppôr fal sa) , devemos procuraruma epocha em que se realise a circumstancia de seachar Guido na Península como legado de Innocencio IIe de ser ao mesmo tempo conjun ctura propria p ara
A ffonso Henriques dar esse passo . Vej amos primeiroquaes foram as 1egacia5 do cardeal de Vico , Gui do , naHespanh a .
Sem di scutir se 0 subdiacono Gui de , legado em Hes
p anh a em 1 1 3 1,era 0 mesmo Guido de Vico , é certo
que es te , já cardeal diacono , se achava aqui legado em1 1 34 (Hist . Compost . , L . 3 , c . 39 e que es tava em
Roma no ann o seguinte ( ibid .
,c . e que voltou a
Pení nsula em 1 136 . Celebrado em outubro desse anno0 concíli o de Burgos , de novo regressou a Roma , dondena primavera de 1 1 37 escrevia ao arcebispo Ge1mi re5( ibid .
,c . 49 e 50 ) e onde subscrevia nesse an o em abril
as letras apos toLicas (Gioconius , Vitae Pontif . , T . 1 ,
p . Desde então O uni co legado , que encontramosna Península até 1 1 43 , é um ou tro Guido , não cardeal ,mas b15p0 lascurrense 11115 1 . Compos t.
, L . 3 , c . 57, eLivro Preto
,f . vindo extraordinariamente em 1 1 38
a convocar os bispos he5panl1 0 es para 0 concílio 11 1ateranense celebrado na quaresma de 1 1 39 (Mansi , T . 2 1
,
p . Por todo este período de 1 1 37 até 1 1 43 , não sófaltam absolutamente not icias do cardeal Vico en1 Hespanha
,n1 a s
,ainda
,achan1 0 -10 subscrexendo em Roma
as bullas pontilicias nos an os de 1 1 38, 40 , 4 1 e 42 (Ciaconins ubi supra ) .
Yepes ( Coron . de S . Benito,X0 1. 7 , App . escri t. 9 )
publicou um privilegio dado ao mosteiro de Valparay5 0por Affonso VU
, em cuj o fecho se di z : Facta carta
2 96 H I STOR IA DE PORTUGAL
donationis Zamore I V non . octob. tempore quo Gu idoromande eccles iae cardinalis concílium in Valleoleti cele
bravit et d á co lloqu ium reg is Portugaliae cum imperatore venzt . Era 1 1 7 5 Des te documen to deduziramAguirre , Pagi, Mansi e 0 5 outros collec tores de monumentos ecclesias ticos a existencia de um concílio de
Valladolid de 1 1 37 cujas actas se não podem encontrar .
E como se encontrariam,se tal concílio nesse anno é
evidentemente um sonho A data attribuida por Yepesao privilegio de Valparayso está errada . D . Thomas daEncarnação collocou aquelle concílio no anno de 1 1 40
(Hist . Eccl . Lusit .
,T . p . 69) sem nos dizer porque .
J . P . Ribeiro inclina-se a es ta data (Dissert . Chronol . ,T . 3 , P . 1
,n º 344 ,
nota ) , por se dar nelle 0 nome derei Affonso Henriques . Com effeito
,como poderia
Affonso VII chamar rei a seu primo em 1 1 37, quandoainda este se não arrogava tal titulo Mas não é só is to0 privilegio de Valparayso é datado de 4 de outubro , ea 1 0 deste mês de 1 1 37—estava Affonso Vll a _ cem legoasde Zamora nas margens do Ebro (Doeum . em Colmenares , His t . de Segovia , p . Accresce que nesse privilegio se encontra entre 0 5 con6r1nantes Petrus compostellanus archiepiscopus , e Diogo Gelmires Viveu até
1 1 39 (E sp . Sagr .
,T . 1 9 , p .
Vê — se , pois , que é indispensavel suppôr 0 concílio deVal ladolid pos terior a 1 1 39 . No anno
,porém
,de 1 140
Guido , que presidi u .a elle,estava em Roma como vimos
,
e não achamos memoria daquelle legado nos documen
tos de Hespanha nes te ann0,nen1 nos dous seguin tes .
As s im,como D . Thomas da Encarnação não nos diz
porque attribuiu a 1 1 40 0 concílio de Valladolid , deque
ninguem faz menção nes ta epocha , para rejeitar a sua
Opinião basta 0 infundado della .
No Livro Preto da Sé de Co imbra acham-se lançadasas actas de um concílio de Valladolid , celebrado anno
d ó incarnatione dominica MCXLIVpontij í catus D . P ape
Innocentiz secundi XI V presente D .
Guidone sante romane ecclesie cardinali d iacono , apos
tolíce sedis legato . São es tas sem duvida .as celebresac tas que ninguem pôde encontrar, porque , collocado 0
2 98 H I STOR IA DE PORTUGAL
tinu0 11 a fi car dependente do imperador, como se vêda doação re ferida pelo auctor da Hespanha Sagrada .
O mais crível é que Affonso Henriques , acceito por
Affonso VII 0 seu ti tulo de rei,cedes se no ponto da
independencia absoluta . O exemplo de Garcia de Navarra ,
cuj os d irei tos eram mais an tigos e legítimos , eque , por 6m ,
conviera em se considerar como vas sallodo príncipe leonês , devia induz i-lo suj eitar-se a uma
situação analoga . Sem is so , é incomprehensivel comoseu primo lhe concedesse 0 senhorio de Astorga e ,
porventura , de outros logares . rescripto do papaEugenio UI citado no texto con6 rn1 a — n0 5 na nossaconjectura
,qual temos por mais que provavel. Em
Valdevez só rigorosamente se haviam feito treguas ,reservando — se para tempo mais oportuno a conclusãode uma paz definitiva fecerunt paceni inter imperatorem et regem di z a chroni ca de Affonso VII
non absolute sempiterne , sed per aliquot armis , et
juraverunt eam ,ut i terum . dum pax esset f rmius pac i
j ícarentur e pouco depois accrescenta Fac ta est
pax inter i110 5 per multas annos Aqui temos , pois ,duas convenções di versas uma por a lguns an osoutra pos terior por muitos . Em 1 1 43 tinham decorridoalgun s annos
,e a propria chronica , apesar de não nos
dizer a data precisa da final concordia , harmonisacom os factos que resultam dos documentos . E porquenão se fez logo em Valdevez a paz defini tiva? E
'
evi
dente que havia condi ções para ella que era necessariodi scutir pausadamente , e es tas não podiam versar
,
quanto a nós,senão sobre dous pontos 0 da
“vas salagern ou não vas salagem da coroa de Portugal a deLeão
,e 0 das terras e senhorios que deviam consi
derar-se corno pertencendo ao filho e herdeiro de
Henrique e Theresa . Se vemos que O imperador cedeuquanto ao título de rei tomado pelo primo e quanto auma parte , ao menos , de senhorios que Affonso Henriques tin ha até certo ponto direito , porque havemo sde imaginar que es te não cederia da sua parte numavas salagem mais de nome que de subs tancia? Urnpundonor nacional pouco illustrado poderá fazer in
NOTAS 2 99
elimar a negativa ; mas a razão desapaixonada e friapersuade conjecturar 0 contrario . Que s igni fi ca ahomenagem feita immedi atamente pelo rei portuguêsao papa nas mão s de Gui do ? E ' claro que foi paraquebrar outra que , embora fos se pouco pesada , podi acomprometter algum dia independencia real dosseus estados . Imaginar que Affonso Henriques se fez
subdito ou homem do papa por s imples devoção econhecer bemmal as cousas e 0 5 personagens da idademédia . Nos exemplos que se podem citar de factosanalogos não se encontrará um só procedi do de sim
ples e espontanea vontade . Esta deferencia para com
a Sé apos tolica nascia sempre de uma necessidade ouconveniencia política ou das v
pretensões dos propriospapas apresentadas em conjuncturas di f6 ceis . Era
sempre uma nova dy nastia que tentava sanctifi car asua origem impura
,urn feudatario (nos paizes feudaes)
q ue sacudia 0 jugo de suzerano , ummonarcha electiy o,
cuja exis tencia politica se acharia,sem a pro tecção de
Roma , amercê dos eleitores , um príncipe , emfim , queprocurava defender— se com os raios da igreja con traos seus 5ubdi t0 5 rebe11ad0 5 . E ainda que es te caracterpoli ticamente hypocrita daquellas eras só teve com
pleto desenvolvimento no tempo de Innocencio III ,lembremo-nos de que já no seculo YII Pepin , pae de
Karl 0 grande , buscava legitimar a sua usurpação do
throno de Hild — rik,fazendo que 0 papa Zacharias trans
ferisse da raça dos Merwings p ara elle O titulo de rei .
Postos es tes fac tos e es tas datas , segue— se 0 examinarmos 0 caracter dos documentos relativos a homenagem feita á Sé apostolica . A sua veracidade impugnada habilmente nos tempos modernos , parece—nos
dever,
« apesar dis so , ser admi t tida . Determinada aprimeira epocha dos successos , as di ffi culdades que
se 0 ppunham á acceitação dos documentos em que se
funda a h is toria dessa homenagem desapparecern em
grande parte . A carta de 'Affonso Henriques ao papaque começa Claves regni coelorum é 0 primeiro monumento dos que chegaram até nó s relativos aquellahomenagem . Es ta carta foi publicada por Fr . Bernardo
30 0 11 151 0 11 1 11 DE PORTUGAL
de Brito (Chron . de Cister, L . 3 , c causa principaldo seu descredito ; porque 0 falsario , semelhan te ao
animal immundo , pollue tudo'
aquillo em que toca .
Brandão accei tou-a por genuína , reproduzindo-a (Mon .
Lusit . ,L . 1 0 ,
c . Viterbo (Elucidario ,T . 1 , p . 378)
publicou— a de novo , extrahindo-a do arch ivo da Sé deBraga e dando — a como verdadeira . Ultimamente ,J P . Ribeiro
,numa di ssertação destinada pulverisar
a ridícula carta de feudo ao mos teiro de Claraval , incidentemente combateu a genuinidade desta , persuad ido de que fora fabricada para corroborar
'
aquellainsigne impostura , devida a penna de Brito , de Lousada 0 11 de algum outro mentiroso da es cola dos dousfalsarios . Vej amos os argumentos em que se es triba aOpinião de que ess
'
outra carta ao papa é igualmenteforjada .
1 .
º Diz-se que este diploma dirigido'
a Innocencio
II fora extrahido do regesto de Lucio 11 . Não é naturalque
,mettendo— se de permeio entre Innocencio e Lucio
0 pontificado de Celestino II,se lançasse no reges to
de Lucio uma carta dirigida a Innocencio .
2 .
º Na subscripção do mesmo diploma , segundo acopia de Brito , lia-se 0 nome de Dominicus como bispodo Porto e , sendo a sua data de 1 1 42 (dezembro ) , naquella conjunctura quem presidia na diocese do Portoera Pedro Rabaldiz , não havendo nunca ahi bispochamado Domingos .
3 .
º Sendo a carta datada dos idos de dezembro da
era 1 180 ( ann o na edi ção de Baluzio suppõe— se
d irigida,não a Innocencio ,
mas a Lucio II,e a resposta
deste papa é datada das calendas de maio . E estauma prova clara de falsidade . Lucio só foi papa de
'
1 2 de março de 1 1 44 até 25 de fevereiro de 1 1 45. Nãose lhe podia
,po is
,escrever uma carta em dezembro
de 42 e , suppondo que se lhe d irigisse em dezembrode 1 1 44 , não podia elle responder em maio de 45,quando j á era fallecido .
A copia de Braga , publicada por Viterbo , apparece 0 0 111 a data de 1 1 81 (anno e confirmada por,
D . J0 50,b i spo de Coimbra . Nes te anno ainda Lucio II
30 9. H ISTOR IA DE PORTUGAL
idéa da homenagem nas mãos de Guido . Era precisoum título da suj eição , título que o cardeal devia apresentar em Roma . Não é muito se gastasse pouco maisde um mês com es te negocio . A carta redigiu se no1 .
º de dezembro de s se me smo anno . A quem foi elladirigida ?
Questão de pouca monta . Não a este ou áquelle
homem offerecia, principe submetter os seus es tados,
ma s sim a entidade papa ; S . Pedro,como então se
diz ia ; a uma potencia quem Affonso VlI nâo ousas sed isputar a supremacia sobre Portugal . Assim ,
di ziaelle na carta pz homenagem nas mãos do c ardealGuido meu senhor e meu pae o papa , e tambemof ereço mi nha terra a S . Pedro e á sancta igrej aromana e mais abaixo de modo
, que não recebanunca na minha terra o j ugo (potes tatem) de nenhumdom in io ecc les ias t ico ou secular
,senão o do s delegados
da Sé apos tolica enviados por ellaNa occasião da homenagem e naquella em que esta
carta se escrevia,epochas diversas
,segundo se vê das
palavras f ec i , off ero , era j á Cele s tino Il pontífi ce ; mas
a morte de Innocenc io 11 ainda , ao fazer s e caªrta
era provavelmente desconhecida em Portugal . Por mar
não é crível viesse a no tícia no coração do inverno ,num seculo em que a arte ,de navegar estava nain fancia ; por terra , às
_
di l'
fi culdades ordinarias dotransito
,á falta de postas ordinarias ajunctava — s e 0
rigor da e stação . As relações entre Roma e o occidenteda Hespanha deviam ser forçosamente tardias . Pelomenos a homenagem foi sem questão feita Innocencio lI crendo-o vivo
,suppormos es te acto prae
ticado dias depois da conferencia de Zamora , 0 queé necessario admittir di zendo Affonso Henriques no1 .
º de dezembro fi z homenagemGuido demorou-se na He spanha duran te ao menos
uma parte do cur to pontificado de Celes tino 11 . E' o
que se deduz de uma carta de s te papa ao arcebispode Toledo (Aguirre , T . 5
, p . e dos documentos doLivro Preto ( f
'
. 2 35 e 2 35 v . ) em que se Vê fazer elle emRoma confirmar por Luc io I I a s o lução que dera em
NOTAS 30 3
Portugal como legado de Innocencio I I às questõe s
que se agitavam entre o s bi spos do Port o e de Coimbra . E
' po r i s so de crer que elle só vie s s e apresentar carta de Affonso I (di rigida Innocencio ]Iem dezembro de 1 1 43 , porque se ignorava o seu fallecimento ) ao novo pontífice que succedera Cele s tinoII em fevereiro de 1 1 44 . Nada mais facil que , ao lançar
-se no regesto de Lucio II aquell a declaração dehomenagem , reduzirem di recção della ao papa queel
'
fectivamente recebera,até porque
,s endo datada
do 1 .
º de Dezembro de 1 1 43, não condi zia tambem
com o p onti ficado de Innocencio,o que de certo modo
auc torisava alteração .
A s s im desapparece O motivo de suspeição resultantede s e achar lançada a carta do rei dos portuguese s noregesto de Lucio II e igualmente di ffi culdade deconciliar a s data s . E s se papa podia responder em
maio de 1 1 44 a uma carta datada de dezembro de 1 1 43,ape s ar de ser escripta para um seu antecess or . Foraum homem que morrera e não o papado ,
e era este,era
á entidade moral,o papa
,que Affonso se dirigia .
“
No te-se agora que as duas copi as mais seguras destedocumento lhe attribuem data de dezembro de 1 1 81
( anno E'
a I .
ª de Braga,tirada do proprio t e
gesto de Lucio II , e examinada por Viterbo ; é 2 .
ª
que foi remettida ao Archivo Nacional em 1 84 I pelosur . Visconde da Carreira , pas sada por certidão ,
junc tamente com a resp osta de Lucio II,do apographo
authentico do regesto de Innocencio IV , que a s man
dou trasladar instancias do arcebispo de Braga emun ir com 0 proprio sello
,não para que tives sem
mais auctoridade do que deviam ter,mas para dar
testemunho , elle papa , de que eram authenticas non
ex hoc auctor itatem eis a l iam impendentes , n is i quodeas esse authenticas perhibemus . Deste modo Innocencio IV conúrma e explica o que j á Innocencio III asseverava na carta Sancho I
,que começa Serenita
tem regiam (Baluzius , Epistol. In'
nocencio III , lib . 1,
epis t . 99 , T . 1 , pag . isto é, que dos regestos pon
tíficios constava que Affonso fizera o seu reino cen
30 4 H I STOR IA DE PORTUGAL
sual á Sé apostolica,e is to
,segundo Innocencio 111
,
no tempo de Lucio II .
Mo s trámos acima que no regesto de s te p apa s epodia lançar a carta como di rigida elle
,ao pas so
que no autographo se mencionava Innocencio 11 .
Assim as copias deviam variar,con forme fossem ex
trahidas do rege s to ou do original , que provavel
mente existiu por mui tos annos e,talvez
,ainda exista
nos ar'
chivos apostolicos , que não é permittido exa
mmar .
Os que se ativerem á op inião de Ribeiro di rão queisto são conj ecturas . Mas são conj ecturas que se es
tribam em factos seguros e a que elle não attendeu .
Pelo contrario , para admittir que é falsa cartacumpre , não fazer conj ecturas verosimeis
,mas suppôr
quas i um milagre . Que ell a não foi fabricada pelosfalsarios do seculo XVI e evidente . Exi s te no regestode Innocencio IV
,que vivia no seculo XIII exi ste em
copias antigas nos archivos bracharense e ruthenense .
Como s e multiplicou e ste documento por tão diversoslogares crê— lo forj ado e , sobretudo , : comó crê-lo forjado em tempos moderno s? Ou mentem todos osdocumentos íncontroversos pelos quaes se conhece quePortugal pagava ou devia pagar um censo á Sé apostolica desde o tempo de Lucio II
,ou e ste censo se
estriba nalgum título . Se recusamos aquella carta ,aonde vamos buscar outro ? E ' o que valeria a pena dese nos dizer
,ainda que não fosse mai s do que por
conj ectura .
Resta di fíi culdade de se lerem variamente entreos bispos confirmantes os nome s dos bispos do Portoe Coimbra
,mas estes nomes facilmente se podiam
al terar nas copias achando-se escriptos só pelas ini ;c iaes . Além di sso
,sendo tantos o s tras lados e encon
trando— se certos esses nomes num ou noutro delles ,é nece s sario acredi tar que a ser o diploma forj ado ehavê-lo 0 falsario feito depositar em tão diverso sarchivos
,eraummentecapto para assim pôr es sa varie
dade de bi spos con firmantes,quando sabia quaes
eram os verdadeiros . Do mesmo modo 0 era ,se fez a
30 6 H I STOR IA DE PORTUGAL
cutor da vontade suprema . Neste sentido,semelhantes
palavra s,longe de pertencerem a tempos mais illumi
medos , pertencem áquella epocha e muito ella . Emgra nde numero de bullas ou cartas expedida s desde opontificado de Gregorio VII até o de Innocenpio [II selêem expre s sões equivalentes a estas , em algumasquasi exactamente as mesmas . Taes são as de Gre
gorio VII ao rei de Dinamarca (Mansi , T . 2 0, p . 244)
ut t ib i comm iss i a Deo regn icus todias a de Innocencio III Henrique de Iuglaterra (ibid .
,T . 2 1 , p . 424) exp edit ut regno, sive
ducatu,a div ina dispositíone t ib i e a de
Eugenio III Affonso VII,que fica citada no texto
(Idem ,ibid .
, p . 672 ) j ustitíam regn i t ib i a Dom inocomm iss i Assim as palavras notadas na carta deLucio II como provando sua falsidade tendem
,pelo
contrario, a mostrar que é genuína .
Quando um homem como J P . Ri beiro não achoumelhores provas contra genuím
'
dade daquelle documento que as acima refutadas
,é que ná realidade
não as havia . Cegava— o o desejo de d emonstrar impos tura da carta de feudo Claraval
,e por isso
combateu tudo 0 que lhe parecia ter correlação com
ella . Não era,porém
,nece s sario tanto . As allusões
ao apparecimento de Ourique , os confirmantes , oestylo e os caracteres extrínsecos do diploma bastavam para o condemner , não menos que imaginariacarta de Innocencio II Affonso I
,que
,na verdade
,
tem todos o s s ignees de ser forjada,como j á adver
timos .
Na mesma Dis sertação em que se impugnaram ascartas de A ffonso Henriques e Lucio II foi po s ta emques tão a fíirmativa de Innocencio III (Bulla Serenitatem reg iam) , de que até o tempo de Alexandre IIIO no s so primeiro rei fora tractado pelo título de duque(Pater tuas usque d á tempora f elicis memor iae Ale
xandri ducis esset nomine appellatus) . Aproveitaremos esta nota para illustrar esse ponto , em quetambem J P . Ribeiro nos parece ter-se affastado umpouco da sua natural exacção e criterio .
NOTAS 30 7
Diz elle que Innocencio IH affirma expressamente que Affonso I só usou do titulo de Dux até 0
tempo de Alexandre III .
Innocencio Ill não afíirma tal o que certifica é queo príncipe português f ora tractado pelo título de duque . Tractado por quem? Pela corte de Roma . Eraisto o que ,
como logo veremo s,Innocencio tinha ra
zão para a ssegurar .
2 .
º O s di plomas do reino e que nos podem indi caro titulo de que usava Affonso Henriques , e não otes temunho de Innocencio III .Os diplomas portugueses podem mo s trar— nos O
título que a si attribuia O príncipe ma s aquelle com
que era tractado melhor o podi a di zer Innocencio IIIque tinha á vis ta os regestos do s papas seus antecessores , tanto mais que a validade do titulo rea l sópodiam dar o s p ontifices
,segundo e stes o ' criam , e
não menos o crera Affonso I, que tanto s anuos dílí
genciou obtê-lo de Roma .
3 .
º E notavel que o titulo de dux s ó appareça em
um documento do governo do nosso primeiro rei,e
esse anterior ao anno de 1 1 40 .
Esta proposição é ambígua . Tomada “em relação
aos diplomas expedi dos pelo príncipe,é exacta . To
mada em relação a todos os documentos des sa epocha
,é fal sa . O s papas effectivamente
,
lhe chamavamdux depois de elle tomar O titulo de rei . Daremos algun sexemplos .Bulla de Lucio II
,de protecção ao mosteiro de
Sancta Cruz Qu icqu id etíam Alf onsus íllustris duxvob is concesserit (Livro Preto f . 2 45
Carta de Eugeni o III Affonso VII,citada no texto
e anteriormente ne s ta nota : quod a portugallensiumduce nos a l iqu id recep isse (Mansi , T . 2 1
, p .
Bulla de Alexandre II] (VI kal. aprili s índi c tione XIincarnat . domin . de protecção Alcobaça , coníir
mando-lhe em e special a posse daquelles bens , queAlf onsus portugallens is dux una cum Mahalda uxore
concess it (Cart. de Alcobaça no Arch . N acion ) .Eis aqui , pois , como por todo o periodo decorrido
30 8 H ISTOR IA"DE PORTUGAL
desde que Af fonso Heúriques tom'
o'
u o titu—ló de reiaté que Alexandre III lh 'o confirmou chancellaria romana não lhe deu senão 0 de duque
,em
conformidade com o que posteriormente af íi rmava
Innocencio III .
ULT IMO S VEST IG IOS DAS PRETENSÓES DE
AFFON SO fvu , PAG . 1 95
O que dizemos no texto como simples conj ecturaé O unico meio de explicar e concordar uma passagem de Rodrigo de Toledo e outra do rescripto de
Eugenie III Affonso VII que começa . In pastoramspecula com a materia da nota anterior
,a qual
,
assim entendi das,confirmam e illustram . Hic pri
mus diz o arcebi spo in POrtugallia sibi imposuitnomen regis
,cum pater ejus comes et
”
ipse dux anteadicerentur et ab Eugenio papa I II , cui regnum saumcons tituit censuale, multa pr ivileg ia et indulgent
'
ias
ímpetravit . No rescripto le— se seguinte passagem
petitiones tuas de Affonso VII ) pro expeditione con
tra inúdelium ty rannidem f acíenda ,lib enter admissi
mus et ad hoc ipsum faciendum in posterum cumhonore Domini paternae sun1us caritatis debito pre fparati . Bignum est igitur de caetero ut querimoniatua desis tas in eo videlicet , quod portugallensium
e 0 mai s que fica, citado pag . 1 98 notaVê— se deste s extrac tos que no tempo de Rodrigo de
Toledo,is to é , menos de um seculo depois do facto ,
se cria em Hespanha que fora Eugenio 111 que.
Affonso Henriques fizera a— homenagem
, 0 que m ostra ,quanto a nós
, que ne s ta conjunctura é que se divulgou existencia do ac to practicado anuo s antes . Pa
rece tambem deduzir— se d ahi que o rei portuguêsobtivera de Eugenio novas concessões e privilegio s
3 1 0 H I STOR IA DE PORTUGAL
segunda é inteiramente futil . As provas de que Santarem se tomou em 1 1 47 , e com probab ilidade em março
,
acham — se solidamente es tabelecidas p or Brandão (Mon .
Lusit .
,P . 3 , L . 1 0
,0 . ºf ) . Que importa , pois , que docu
mentos suspeito s,ou escriptores mai s recentes variem
na data,se este concorda com a verdade?E stribar— se
aquelle crítico para provar a incerteza do anno naChroni ca ci s terciense de Montalvo
, que a ttribue con
quista 1 1 44 , é na verdade extraordinario . O s unicosdou s his toriadores quasi coevos do successo que Montalvo cita emabono da sua opinião são Lucas de Tuye Rodrigo Ximenes
, em cujas chroni cas elJe criticopodia facilmente verificar que Montalvo fizera duascitações falsas
,visto que nenhum assignala data da
tomada de Santarem,e Lucas de Tuy nem sequer par
ticularisa este acontecimento . O 1 .
º fundamento paraduvidar da genuinidade da Noticia seria mais attendivel se fosse exacto . No codice 2 0 7 de Alcobaça , hoj e naBibliotheca Publica de Lisboa
,ha cousas de mão muito
mais moderna,mas nem a narrativa da tomada de
Santarem,nem 0 poema de Gosuino -o são . Assim as
consideraçõe s de Fr . Joaquim de Santo Agostinho carecem de fundamento s razoaveis . Veja — se 0 que dizemosácerca desta relação pag . 93 do s Por tugalíae Monu
menta H is toried Scr ip tores , vol. 1 .
O que poderia produzir suspeitas,se j á não exis
tis se 0 codi ce 2 0 7 de Alcobaça , seria a correcção com
parativa da phrase latina em que está escripta narrativa . Mas es sas suspeitas seriam destruídas , quandonão nos re s ta s se senão uma 0 0 pia moderna deste 111 0numento historico ,
pela concordancia delle com outrosmonumentos daquelle epocha recentemente descubertose,portanto
,desconhecidos dos falsarios do seculo XVI .
Tae s são O modo e particularidades do commettímento ,
que ahi s e fazem proceder de um plano previamenteas sentado
,0 que concorda com 0 systema que , segundo
O testemunh o de Ibn Sahib i — s-salat , de que noutro logardo texto fazemos menção
,Affonso I seguiu constante
mente,atacando os castellos sarracenos . Além de con
cordar com 0 A . da Vida de S . Theotonio (publicada
N OTAS 3 1 1
pelos Bollandj stas e mai s c orrectamente no s PortugalíaeMonumenta H is tor ia l Scr ip tores , vol . 1
, p . 11 0 es sencial de ser Santarem tomada por estratagema , temo sdi sso documento índi sputavel numa doação de Sancho I aos cavalleiros de Sanctiago (Cart . de Palmella11 0 Arch . Nacion . doc . original) de i ll is nostr ís domibusin quibus f acta est tarr is, per quam pater meus rex
Domnus Alf onsus , f elícís memor ie,Sanctaren f urtivê
intravít .
Uma das circumstancias que mai s contribuem paradar á memoria de Alcob aça um caracter de verdade é0 deprehender
— se do seu contexto que foi , não povoação ,
mas 0 castello 0 ponto accommettido na noite de1 5 de março . O logar por onde o s portugueses avançaram naquella arriscada noite índj ca-o bem ,
mas aindamelhor 0 di vidir O rei a sua gente e 0 enviar um troçoimpedir 0 soccorro externo do arrabalde de Seserigoutpraeoccupet callem, qui ven it de Seter ígo aliás Seser igo ne portae additus ab i l l is praeoccupetur Edri sidi z-no s (Versão de Jaub ert , vol. 2
, p . 2 9) Chantarín
est une v i l le bâtie sur une montagne três haute , d a m idide laquelle est un was te enf oncement. Il n
'
y point demurailles , ma is d a p ied de lamontagne est unf aubourgbâti sur le bord du fleuve . E ste bairro ou arrabalde
,
hoj e a Ribeira,pelo nome que lhe dá a memoria de
A lcobaça,é 0 mesmo a que ella allude . A denominação
de Seserigo dada á Ribeira de Santarem apparece numdocumento dos templarios de 1 159 (E lucidar .
,T . 2
,
p . 357 e ainda no Cancioneiro do Collegio dos Nobres
Ai senterigo ,ai senterigo !
Ai é Alfanx , e al Seserigo .
Es ta palavra é derivada de Sessega , que parece significar
,_nã0 qualquer as sento ou planície (como interpreta
Viterbo) , mas e spec ialmente O terreno á borda de umribeiro ou ri0
,proprio para cons truir azenhas (Doc . n0
Elucid .
, verb . Sessega , e no Direito Emphyteut . de LObão
, Append , p . 80 e nem s abemo s em que s efunda extraordinaria significação que J P . Ribeiro
3 1 2 H I STOR IA DE PORTUGAL
dá a este vocabu10 (Dissert . Chrono l . , T . 4 , P . 2, p .
nós,pelo menos
,nunca em ta l sentido encontrámos ,
A comparação do diploma de Sancho I, que acima
citámo s do cartorio de Palmella,com os artigo s o ffe
recidos pelos freires de Portugal para obterem separar ,
se do mes trado de Castella (Liv . dos Copos , f .
aliás prova de modo índisputavelque foi alcaçova
velha ou cas tello mourisco,e não a v illa
, 0 ponto amcado . Alludindo áquella doação de D . Sancho
, , dizemos freires concess it dicto ordini f ortellitium cum turre
et domibus alcaceoe veteris cas tr i Sanctaren, per quem
locum idem castrumf uit recuperatum a sarracenis Osfreires deviam saber onde era a propriedade que possuiam ,
e Sancho I 0 logar por onde seu pae aecommettera 0 castello .
3 1 4 INDICE
D . Urraca invade Portugal . Paz entre as duasirmans . Fernando Peres de Trava e 0 seu val imento . A ff onso VII succede D . Urraca .
Prime iras ac çõ e s d o infante Affonso fi lhod o conde Henrique e d e D . Th eresa . EntraAffonso VH em Portugal e constrange infantarainha re conh ecer a supremac ia de Leão .
Od io do s portuguese s contra 0 cond e FernandoPere s . Conjuração e revo lução . O cond e eD . Th ere sa expulso s . O infante apo ssa-s e dopod er . D . There sa morre d esterrada . Aprec i ação do seu caracter po lí ti co e do seu governo .
L IVRO I I
1 1 2 8 — 1 1 85
Prime iros annos do governo d e Affonso Henr ique s . Guerra na Galliza . Tentat iva d e ' reb e ll ião . Continuação da guerra . O cas te l lo d eCelmes fun dado e p erd ido .
-Allian ças de
Affonso com O re i d e Navarra e com al gunsfi da lgo s d e Galliza . V ictoria de Cernej a .
Perda d e Le iri a e de stro ço em Thomar . Pazde Tuy qom O imp erador Aff onso VII . Os
almoravid es e os almohade s . Jornada d eOurique . Renovação das d iscord ias com 0
imperador . Recontro de Vald evez . Paci fi
cação . Al gara dos sarraceno s . Le iri a e Tranco so d estruídas . Desb arato do s invasore s .
Affonso toma 0 ti tulo d e re i . Feudo aopapa . Circumstaneias do succe sso . Situação do s sarracenos . Alliança d e A ff ons o Icom Ibn
'
Kasi,e correri as dos christãos no
Gharb . Consorcio do re i d e Portugal.
Tomada d e Santarem
7 3 1 32
1 35 a 2 93
IN D ICL
' “J d
NOTAS
I . Cal e Portucale Portugal . .
II . O cond e SesnandoII I . Illegitímidade d e D . Th eresa .
IV . Começo do governo do conde Henrlque .
V . Destro ço do cond e Raimundo Juncto
Li sboaVI . Portuga l dado em do te D . Th eresaV I I . Data' da morte d o conde Henrique , etc .
VI I I . Hugo , b ispo do Porto .
IX . Supposta i nvasão do s sarracenos em 1 1 2 0 .
X . Tractado entre D . Th eresa e D . UrracaXI . Nascimento d e Af fonso Henrique s .
XI I . Façanha d e Egas MonizXIII . Revo lução de 1 1 28
XIV . Segun do casam ento d e D . Th eresa , supposto
XV . Desbar ato dos christãos em ThomarXVI . Batalha d e OuriqueXVI I . Destrui ção de Le iria e TrancosoXVII I . Af fons o I toma O titul o d e re i .
XIX . Suj e i ção ao papaXX . U ltimos ves tigios das pretensõ e s d e Af
fonso VII
XXI . Tomada de San tarem
INDICE DE ILLUSTRAÇOES
1 se Velha de Coimbra2 . Tumulo d o conde Sesnando na . Sé Ve lha de
Coimbra . (I llus tração portuguesa , 30 d e julho
3 . Cond e Henrique ( Tomb0.
d
o
a
.
86; de“
Sânc tiag ode Compos tella) .
3 1 5
31 6 INDICE
Igrej a d e S . Migue l d e Guimarães , onde é trad ição que fo i baptizado A ffonso Henriques .
Cas te l lo d e Guimarães .
Mo s te iro e Paço d e Sousa , ond e es tá 0 monum ento d e Egas Moniz . (I llustração portug uesa ,
2 7 d e Julho d eBaixos-re l evos do monumento d e Egas Moniz
,
em Paço d e SousaTumulo do cond e Henrique . Tumulo darainha D . Th ere sa
Espada que se guardaxa em Santa Cruz d eCo imbra como
z,
sendó d e Affonso Henriques .
(Museu da Academia de Bellas-Artes do
P orto) .
Cas te l lo de Le iri aCava l le iro d o tempo d e Aff onso Henriques .
(Archivo Nac ional Commentario ao Apoca
ly pse de Lorvão)Mo eda arab e , cunhada em Merto la por IbnKas i . (Seg undo um decalque do sr . D . Antonio Vivas , de
Uma forti fi cação d o tempo d e Aff onso Hen
riques . (Archivo Nac ional : Commentario ao
Apoca ly pse de Lorvão'
Sant arem . Porta d e Atamarma,demo l ida
em V i sta do exterior d a c idade . (Seg undouma antiga photog raphia .)
Mo eda W i sigothica d e Sisebuto , cunhada 11 0
Porto .
. TY P . A ILLAL'
D , A LVE S Cªª