as microalgas como fonte de produção de biodiesel: discussão de sua viabilidade

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AS MICROALGAS COMO FONTE DE PRODUÇÃO DE BIODIESEL: DISCUSSÃO DE SUA VIABILIDADE LAUREN ESPINOSA 1 , NEYDA DE LA CARIDAD OM TAPANES 2 , DONATO ALEXANDRE GOMES ARANDA 1 , YORDANKA REYES CRUZ 1 1 Escola de Química, Universidade Federal de Rio de Janeiro, EQ/UFRJ, [email protected] 2 Centro Universitário Estadual da Zona Oeste, UEZO, [email protected] Email: [email protected], [email protected]. ABSTRACT: Proportion to the growth of energy consumption, increased pollution, making it necessary the development of "clean” energy sources that enable the stabilization of this situation of pollution. For this reason, the research has focused on developing new basic petrochemicals, renewable character, to produce fuels that can replace petroleum, which puts the biomass in an important role. In this sense, the incorporation of biodiesel energy matrix is a significant environmental gain due to the reduction of emissions. Being microalgae primary producers that store solar energy to convert it into biological energy, this work seeks a review of its use for the production of biodiesel. To complete this objective, it has been proposed to discuss their technical, economic and environmental viability taking into account some likely scenarios. Without doubt, the most promissory alternative will be those applying biorefinery concept to optimize process economics as well as environmental gains. Keywords: Biodiesel, microalgae, viability. INTRODUÇÃO As tendências atuais no fornecimento e uso da energia são insustentáveis economicamente, ambientalmente e socialmente. Sem uma ação decisiva, a energia relacionada aos gases de efeito estufa vai mais que dobrar até 2050 e a demanda crescente por petróleo irá aumentar as preocupações sobre a segurança do abastecimento. Podemos e devemos mudar o caminho em que estamos hoje. As tecnologias de baixo teor de carbono de energia terão um papel crucial na revolução da energia necessária para fazer esta mudança acontecer. (OECD/IEA 2011)............................................ Os biocombustíveis hoje comercializados são o bioetanol e o biodiesel. Projetase um crescimento da ordem de 14% a.a. para os biocombustíveis líquidos nos próximos 5 anos, sendo o mercado atual da ordem de US$ 26 bilhões (Biomass Research and Development Technical Advisory Committee 2007). Hoje existe uma grande variedade de tecnologias de conversão de biocombustíveis convencionais e avançados das quais depende a qualidade final dos biocombustíveis, sempre visando processos mais eficientes. Os processos de biocombustíveis convencionais, como o etanol a partir de açúcar, biodiesel a partir de transesterificação, apesar de já disponíveis RESUMO: Proporcionalmente ao crescimento do consumo de energia, cresceu a poluição, fazendose necessário o desenvolvimento de fontes energéticas “limpas”, que permitam a estabilização desse quadro de poluição. Por esse motivo as pesquisas têm se concentrado no desenvolvimento de novos insumos básicos, de caráter renovável, para a produção de combustíveis que possam substituir os derivados de petróleo, o que coloca a biomassa em papel de destaque. Nesse sentido a incorporação do biodiesel à matriz energética constitui um ganho ambiental significativo devido à redução das emissões. Sendo as microalgas produtores primários que armazenam energia solar para convertêla em energia biológica, o pressente trabalho busca uma análise de seu uso para a produção de biodiesel. Para este fim se propõe discutir a sua viabilidade técnica, econômica e ambiental levando em conta alguns cenários prováveis. Sem dúvidas as alternativas mais promissórias serão aquelas que apliquem o conceito de biorefinaria para otimizar a economia do processo assim como os ganhos ambientais. Palavras chave: Biodiesel; microalgas, viabilidade. ISSN: 23178957 Volume 2, Number 1, Jun. 2014

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AS MICROALGAS COMO FONTE DE PRODUÇÃO DE BIODIESEL:DISCUSSÃO DE SUA VIABILIDADELAUREN ESPINOSA1, NEYDA DE LA CARIDAD OM TAPANES2, DONATO ALEXANDRE GOMES

ARANDA1, YORDANKA REYES CRUZ1

1 Escola de Química, Universidade Federal de Rio de Janeiro, EQ/UFRJ, [email protected] Centro Universitário Estadual da Zona Oeste, UEZO, [email protected]

E­mail: [email protected], [email protected].

ABSTRACT:Proportion to the growth of energy consumption, increased pollution, making it necessary the development of "clean” energy sources that enable thestabilization of this situation of pollution. For this reason, the research has focused on developing new basic petrochemicals, renewable character, toproduce fuels that can replace petroleum, which puts the biomass in an important role. In this sense, the incorporation of biodiesel energy matrix isa significant environmental gain due to the reduction of emissions. Being microalgae primary producers that store solar energy to convert it intobiological energy, this work seeks a review of its use for the production of biodiesel. To complete this objective, it has been proposed to discusstheir technical, economic and environmental viability taking into account some likely scenarios. Without doubt, the most promissory alternative willbe those applying biorefinery concept to optimize process economics as well as environmental gains.Keywords: Biodiesel, microalgae, viability.INTRODUÇÃOAs tendências atuais no fornecimento e uso daenergia são insustentáveis ­ economicamente,ambientalmente e socialmente. Sem uma açãodecisiva, a energia relacionada aos gases deefeito estufa vai mais que dobrar até 2050 e ademanda crescente por petróleo irá aumentaras preocupações sobre a segurança doabastecimento. Podemos e devemos mudar ocaminho em que estamos hoje. As tecnologiasde baixo teor de carbono de energia terão umpapel crucial na revolução da energianecessária para fazer esta mudança acontecer.(OECD/IEA 2011)............................................

Os biocombustíveis hoje comercializados são obioetanol e o biodiesel. Projeta­se umcrescimento da ordem de 14% a.a. para osbiocombustíveis líquidos nos próximos 5 anos,sendo o mercado atual da ordem de US$ 26bilhões (Biomass Research and DevelopmentTechnical Advisory Committee 2007). Hojeexiste uma grande variedade de tecnologias deconversão de biocombustíveis convencionais eavançados das quais depende a qualidade finaldos biocombustíveis, sempre visandoprocessos mais eficientes. Os processos debiocombustíveis convencionais, como o etanola partir de açúcar, biodiesel a partir detransesterificação, apesar de já disponíveis

RESUMO:Proporcionalmente ao crescimento do consumo de energia, cresceu a poluição, fazendo­se necessário o desenvolvimento de fontes energéticas“limpas”, que permitam a estabilização desse quadro de poluição. Por esse motivo as pesquisas têm se concentrado no desenvolvimento de novosinsumos básicos, de caráter renovável, para a produção de combustíveis que possam substituir os derivados de petróleo, o que coloca a biomassaem papel de destaque. Nesse sentido a incorporação do biodiesel à matriz energética constitui um ganho ambiental significativo devido à reduçãodas emissões. Sendo as microalgas produtores primários que armazenam energia solar para convertê­la em energia biológica, o pressente trabalhobusca uma análise de seu uso para a produção de biodiesel. Para este fim se propõe discutir a sua viabilidade técnica, econômica e ambientallevando em conta alguns cenários prováveis. Sem dúvidas as alternativas mais promissórias serão aquelas que apliquem o conceito de biorefinariapara otimizar a economia do processo assim como os ganhos ambientais.Palavras­ chave: Biodiesel; microalgas, viabilidade.

ISSN: 2317­8957Volume 2, Number 1, Jun. 2014

comercialmente, continuam a melhorar emeficiência e economia. As rotas de conversãoavançadas, como o etanol celulósico ou o óleovegetal hidrogenado, estão se movendo para afase de demonstração ou já estão lá. No casodo biodiesel baseado em microalgas aindaencontra­se na fase de P+D básico e aplicado.(OECD/IEA 2011).............................................O biodiesel, biocombustível derivado de fonterenovável para uso em motores a combustãointerna com ignição por compressão, contribuipara a redução da temperatura global doplaneta e dos custos com a saúde, devido àredução das emissões, pois parte do gáscarbônico emitido na queima do combustível éabsorvida durante o crescimento da cultura damatéria­prima utilizada na sua produção(Bermann 2008). Além de isto proporcionaemprego e renda, é totalmente miscível emóleo diesel mineral, aumenta a lubricidade docombustível melhorando o desempenho domotor, é biodegradável e não tóxico(Encarnação 2008)............................................O uso de algas é de grande importância paracaptura de CO2 e produção de biomassa, bio­óleo e produtos de alto valor agregado(espirulina, astaxantina, carotenos, etc.).Apesar do grande interesse que a utilização dealgas para a produção de biocombustíveis ebioprodutos tem despertado, os problemasexistentes, entenda­se economia do cultivo,colheita e extração do óleo, são vistos aindacomo importantes. O potencial das microalgasé reconhecido: alto rendimento em óleo (60%),rápido crescimento, utilização de terras erecursos de baixo custo de oportunidade, nãocompetição com alimentos e captura e uso deCO2. Entretanto, ainda é necessária melhorcompreensão dos princípios de base para que oscale­up comercial seja viável, P&Dfundamental e aplicado ainda parecemnecessários. (Darzins e Garofalo 2009)Dentro das principais temáticas de pesquisa edesenvolvimento que tem hoje a produção debiocombustíveis baseado em microalgas,encontram­se os custos eficientes do cultivo, acolheita e a extração do óleo. A reciclagem da

agua e nutrientes assim como o valor agregadodos coprodutos constituem assuntos de grandeinteresse para lograr a viabilidade do processo.MATERIAIS E MÉTODOS...........................Para este trabalho se levaram em consideraçãobibliografia dos últimos 10 anos, com o 50%dentro dos últimos 5 anos, onde foramestudadas as principais experiências refletidasna literatura. Também se levaram em conta osestudos relativos ao sistema de cultivo usadono Laboratório GreenTec da Escola deQuímica/UFRJ os quais são descritos emrelatórios técnicos. Seguiu­se a técnica daanálise de cenários para discutir as seguintesvariantes:Cenário 1: Produção de Biodiesel baseado emmicroalgas com o aproveitamento de águaresidual.Cenário 2: Produção de Biodiesel baseado emmicroalgas com o aproveitamento de CO2industrial e venda dos créditos de carbono.Cenário 3: Produção de Biodiesel baseado emmicroalgas com o aproveitamento decoprodutos de valor agregado.Tais cenários serão avaliados levando emconta os seguintes aspetos: Viabilidade técnica,Viabilidade econômica, Viabilidade ambiental.RESULTADOS E DISCUSSÃO..................Viabilidade técnica da produção de biodieselbaseado em microalgasExtrair óleo das algas é como tirar o suco dalaranja: com uma reação química adicional. Asalgas são plantadas em sistemas de lagoasabertas ou fechadas. Uma vez que as algas sãocolhidas, os lipídios, ou óleos, são extraídosdas paredes das células das algas, o que podeser feito utilizando vários métodos (Defanti etal. 2010). Esse óleo passa ser processado paraobtenção de biodiesel.........................................O crescimento fotossintético requer luz,dióxido de carbono, água e sais inorgânicas. Atemperatura deve manter­se geralmente dentrode 20 a 30 ° C. Para minimizar os gastos, aprodução de biodiesel deve contar com a luz

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solar disponível livremente, apesar dasvariações diárias e das diferentes estações doano nos níveis de luz. O meio de crescimentodeve fornecer os elementos inorgânicos queconstituem a célula de algas. Os elementosessenciais incluem nitrogênio (N), fósforo (P),ferro e, em alguns casos silício. Os meios decrescimento são geralmente baratos (Chisti2007).A produção em larga escala da biomassa demicroalgas em geral, usa a cultura contínuadurante o dia. Neste método de operação, omeio de cultura fresco é alimentado a uma taxaconstante e a mesma quantidade de cultivo demicroalgas é retirado continuamente. Segundoexpõe Chisti 2007, os únicos métodos viáveisde produção em larga escala de microalgas sãolagoas Raceway e fotobioreatores tubulares.Cultivo (Lagoas Raceway vs. fotobioreatores)O cultivo de microalgas para a produção debiodiesel em raceway ponds tem sidolargamente avaliado em estudos financiadospelo Departamento dos Estados Unidos vistoque constitui uma metodologia menosdispendiosa que os fotobioreatores em termosde custos de construção e manutenção.Contudo, este tipo de cultivo, emboraapresente produtividades geralmentesuperiores a 10 g de peso seco/m2d, mantém­se aquém do rendimento dos fotobiorreactores.Uma vez que um sistema aberto é sujeito aflutuações diárias e sazonais de temperatura, asperdas para a atmosfera por evaporação tornamtambém a utilização do CO2 menos eficiente, oque conduz a uma produtividade sub­óptima.Adicionalmente, a contaminação por algas emicrorganismos que se alimentem de algas,afeta também a eficiência da produção debiomassa (OILGAE, 2012). Uma produção porperíodo muito longo acaba sendo contaminadae por isso, essa não é a forma mais indicadapara obtenção de compostos puros a partir dealga para indústria farmacêutica, de cosméticos

ou alimentícia (Arceo 2010).Contudo, os lagos de cultivo abertoapresentam algumas vantagens: não competempor terra agricultável e podem ser construídosem terras com produção marginal, requeremmenos consumo energético para manutenção,operação e limpeza e podem retornar umbalanço energético favorável. É por isso queeste tipo de sistema é geralmente encaradocomo a base para a cultura de microalgas emlarga escala para a produção de biodiesel,embora estejam ainda a serem optimizadas ascondições para cultura das espécies­chave paraa produção de biodiesel (OILGAE, 2012).No caso dos fotobioreatores, os cultivos sãorealizados em sistemas fechados, em painéisde forma plana ou em forma de serpentinas,espirais ou cilindros, construídos com tubos deplástico, vidro ou policarbonato. Os tubosformam o sistema coletor de luz solar, nointerior dos quais uma solução de microalgas écirculada, advindas de um reservatório, onde oar (contendo CO2) é alimentado, a alimentaçãoé mantida constante, durante os períodos desol. Subseqüentemente à passagem pelostubos, parte do inóculo é removido comoproduto e o restante recirculado à coluna deseparação de gás. Água, CO2 e os nutrientesnecessários são providos de forma controlada,enquanto oxigênio tem que ser removido(Borges 2010). Existem muitas variações, masde forma geral os fotobioreatores podem serclassificados quando ao formato em: planos,tubulares ou verticais (tubulares em coluna).Nos fotobioreatores é possível controlar ascondições de cultivo (quantidade de nutrientes,temperatura, iluminação, pH etc.). Isto implicauma elevada produtividade, viabilizando aprodução comercial de uma série decompostos de elevado valor agregado (Teixera2007).Seu ponto forte principal é a baixacontaminação exterior, o que possibilitacultura e obtenção de monoculturas ecompostos para farmácia e alimentaçãoproduzem biomassa de forma mais densa, oque reduz os custos de colheita, mas ainda

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assim sua montagem e manutenção é mais caraque o cultivo aberto (Arceo 2010).Suas principais limitações incluem:sobreaquecimento, bio­incrustantes, acúmulode oxigênio, dificuldade de ampliação, altocusto de construção, operação do cultivo algale danos às células pelo estresse decisalhamento (shear stress) e deterioração domaterial utilizado para aproveitar a iluminaçãonatural. Adicionalmente, o custo da produçãode biomassa algal em fotobioreatores pode sermaior que em tanques. Isto dependerá dodestino que será dado à biomassa microalgal(obtenção de químicos de alto ou baixo valorno mercado) (Brennan & Owende 2010).Devido ao exposto acima, os fotobioreatorespodem não ter um impacto significante em umfuturo próximo sobre qualquer produto ouprocesso que possa ser obtido nos tanquesaerados abertos.ColheitaDiversas metodologias podem ser utilizadaspara a colheita de microalgas. Os custos decolheita da biomassa representam cerca de 20­30 % do custo total. Atualmente, a colheita dabiomassa de microalgas baseia­se emprocessos de sedimentação em camposgravitacionais, centrifugação, fracionamentode espuma, floculação, filtração por membranae separação com ultra­som (Carlsoon 2007).Secagem ou desidrataçãoUma vez que ocorre a separação a biomassa édesidratada. Para tanto, podem ser empregadasdiversas técnicas, dentre os mais comuns têm­se a secagem com spray (spry­drying), tamborde secagem (drum­drying), liofilização esecagem ao sol. A secagem ao sol é maisutilizada para biomassas com um baixo teor deumidade e a secagem com spray não éeconomicamente viável para produtos de baixovalor, como biocombustíveis e proteínas. Aliofilização tem sido utilizada para secagem de

microalgas em pesquisas laboratoriais. Noentanto, este método é muito caro para serutilizado em uma escala comercial para arecuperação de produtos microalgais. Emalguns casos, a extração com solvente debiomassa seca tem demonstrado uma maiorrecuperação de metabólitos intracelulares doque a biomassa úmida. Produtos intracelularescomo óleos podem ser de difícil extração debiomassas úmidas de células não rompidas.Mas são extraídas facilmente se a biomassa forseca anteriormente (Brennan & Owende2010).Extração do óleoEmbora existam diversas metodologias para adisrupção celular, o critério fundamental é amaximização do valor dos materiais obtidos. Adisrupção mecânica das células é geralmente ométodo por excelência uma vez que evita acontaminação química da preparação.A extração do óleo das microalgas é um tópicopolêmico atualmente debatido em virtude deseu alto custo e pode determinar asustentabilidade do biodiesel de microalgas(Pérez 2007). De acordo com este autor, hácinco métodos bem conhecidos para extrair oóleo das sementes oleaginosas, e estes métodostambém devem aplicar­se bem para asmicroalgas: Prensagem, Extração porsolventes, Extração fluída supercrítica,Extração enzimática, Choque osmótico.Produção de Biodiesel: Transesterificação vs.hidroesterificaçãoUma vez que os óleos são extraídos a partir dapasta de microalgas, são depois transformadosem biodiesel e glicerina onde geralmente sãoutilizados os métodos da transesterificação(alcalina ácida ou enzimática) ou ahidroesterificação. Ambos apresentam a suasvantagens e desvantagens.Na hidroesterificação, a reação de hidróliseeleva a acidez da matéria­prima e tornadesnecessária a remoção dos ácidos graxos

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livres, que é realizada no refino. Sendo assim,qualquer matéria­prima graxa (gordura animal,óleo vegetal, óleo de fritura usado, borrasácidas de refino de óleos vegetais, entre outros)pode ser utilizada neste processo, independenteda acidez e da umidade. A possibilidade deutilizar matéria­prima nestas condições é ogrande diferencial em relação ao processotradicional de transesterificação que,inevitavelmente, gera sabões e afeta orendimento das plantas e dificulta a separaçãodo biodiesel e da glicerina. (Encarnação 2008).O alto custo de produção da biomassa seca eda extração do óleo podem ser resolvidosmediante a utilização do processo dehidroesterificação, já que a secagem dabiomassa não seria precisa. Tais mudanças sãoapropriadas quando são utilizadas águasresiduais (Cenário 1) para o cultivo das algas.Para cultivos que visam obter o valorizar todosos componentes das microalgas (Cenário 3),pode ser que este processo não seja o maisadequado, as altas temperaturas utilizadaspodem trazer consequências nefastas para asproteínas e vitaminas que ainda contém o“CAKE” de algas. A esterificação gera então obiodiesel e como subproduto a água, que podeser reutilizada no processo de hidrólise,fechando o ciclo. O processo dehidroesterificação (hidrólise seguida deesterificação) se insere neste contexto comouma alternativa ao processo convencional deprodução de biodiesel (Arceo 2010).Em relação aos custos de ambos processos,como cerca de 80% do custo de produção dobiodiesel é proveniente do custo da matéria­prima, a hidroesterificação permite umsignificativo salto na viabilidade de um projetode biodiesel. Na tabela 1 se apresenta umestudo comparativo em relação aos custosoperacionais destes processos:

Tabela 1 Comparação dos custos operacionais entre as tecnologiasTransesterificação e Hidrólise + Esterificação (50,000 mton/ano).Fonte: Cruz & Aranda 2011.

Viabilidade econômicaAtualmente, o processo de produção decombustível a partir de algas poderá parecernão rentável, embora existam muitas empresasde biocombustíveis a base de algas, nenhumaainda com a produção de quantidades emescala comercial nem a preços competitivos(St John 2009) Tem sido sugerido que o custode produção deve ser reduzido em até duasordens de magnitude para se tornar econômica(Wijffels 2007).Muitas pesquisas publicadas apresentamresultados diferentes para o custo de produçãoe venda do biodiesel de microalgas. Estima­seque os custos de biodiesel a partir de algas,pelo menos, 10 a 30 vezes superior doproduzido a partir de matérias primasconvencionais (Kovalyova 2009). O custoestimado para o barril de óleo de microalgaspode variar de $39 ­ $69, onde estes cálculosforam feitos com base no cultivo de 400hectares em tanques abertos, usando aliberação de CO2 puro a partir da liberação deuma termoelétrica onde a previsão deprodutividade é de 30­60g m2 dia­ 1 debiomassa de microalga com um rendimentoaproximado de 50% de lipídeos (Kowalski2010).O custo para se produzir um kg de biomassa demicroalgas é de U$ 2,95 em fotobioreatores eU$ 3,80 para produção em piscinas abertas(Chisti 2007). Estas estimativas pressupõemque o CO2 está disponível sem custo e que asmatrizes algais receberam água e luz solar.Quando a produção de biomassa aumenta paraaproximadamente 10.000 ton. por ano o custodo kg reduz­se a cerca de U$ 0,47

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para produção em fotobioreatores e U$ 0,67para produção em piscinas abertas por causa daeconomia de escala.O custo de produção de biomassa de algas seconum bioreactor tubular tem sido dado comoUS$ 32.16 por Kg (Molina et al. 2003).Algumas estimativas indicam que os sistemasde reatores fechados só serão capazes decompetir com o petróleo ao preço de US $ 800por barril (US $ 5 por litro) (Broere 2009).Muitos admitem que a indústria de cultivo dealgas para biocombustíveis não pode serrentável por si só. É necessário oaproveitamento de co­produtos de alto valoragregado, tais como "nutracêuticos",fertilizantes e a produção de energia a partir deresíduos de biomassa de algas.Sem dúvidas o conceito de biorefinaria deveser aplicado, já que os óleos representamapenas um dos muitos produtos com valorcomercial. Um sistema integrado implica nãosó que a biomassa de algas alimentadiretamente a biorefinaria, mas também adireta utilização dos efluentes e gases deexaustão (por exemplo, gás de síntese, metano,calor, dióxido de carbono, esgoto, etc) pelabiorefinaria ou usina de energia em nossosnovos sistemas de produção de algas.O Cenário 1, relativo ao aproveitamento deágua residual, traz muitos benefícios tantoeconómicos como ambientais. As microalgasalimentadas por efluente, em um sistema delagoa de estabilização, por exemplo, podem serutilizadas para a obtenção de um óleo maisbarato quando comparado aos obtidos emsistemas de cultivos. Isso levará a umaeconomia de água e nutrientes, bem comoservirá para a remoção de nutrientes doefluente, como nitrogênio e fósforo.A obtenção de biomassa microalgaldiretamente da lagoa facultativa mostra­secomo uma alternativa aos processos deobtenção de biomassa algal tradicionalmenteutilizados (fotobioreator e tanques aerados).Além de apresentar um motivo para oinvestimento da instalação de um sistema pararecuperar a biomassa microalgal deixando,

com isso, de lançá­la no córrego e podendoter­se um ganho econômico e ambiental(Cardoso & Vieira 2010).Outro estudo foi o realizado por umauniversidade espanhola: Universidade deMálaga com o cultivo da microalgaScenedesmus dimorphus utilizando uma fontede água residual suína. Dado a possibilidadeda água residual ser obtida sem custosadicionais existe a oportunidade de associar ocrescimento de algumas espécies ao tratamentodas águas residuais suínas conseguindo assim,por um lado, a obtenção a baixo custo debiomassa com apreciável conteúdo lipídico e,por outro lado, o tratamento dessas águas.Por outra parte, não é mistério que o cultivo demicroalgas requer de grandes quantidades deCO2, dentre todos os organismosfotossintéticos e autotróficos, capazes deremover CO2 de correntes gasosas, asmicroalgas são o grupo que suportam até 50%de CO2. No caso de se integrar a qualquerusina que emita quantidades significativas deesse gás (Cenário 2), poderiam ser reduzido oscustos e a poluição ambiental, além de gerarpara a empresa uma nova fonte de ingressos aoexistir a possibilidade de comercializar hojeem dia os créditos de carbono. Cada toneladade CO2 que é absorvida (sequestro decarbono) ou a quantidade de gases poluentesque deixam de ser produzidos pela empresaclassificada como poluidora é convertida emuma unidade de crédito de carbono, que énegociada em dólar no mercado mundial.Levando em conta o relatório divulgado porPeters­Stanley & Hamilton 2012, aonde opreço médio ponderado dos créditosnegociados no mercado OTC (Over­TheCountry) foi de US $ 6/tCO2e = R$12/tCO2e,e que segundo Chisti 2007 para o crescimentodas microalgas se precisam 1,88356 Kg deCO2/ kg de biomassa, então se obteria umareceita aproximadamente de $R 0,226 por cadaquilograma de biomassa cultivada.Em relação ao Custo de operação do processode recuperação do CO2, apesar de queantigamente se considerava custoso, alguns

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autores já considerarem que este processoesteja disponível a baixos, ou nenhum custo(Chisti 2007), porém, se faz preciso analisarvários parâmetros que afetam sensivelmenteessa estimativa. Atualmente pode ser assumidoo custo operacional de US $ 1,00 por toneladade CO2 recuperado, incluindo as etapas decoleta e redirecionamento de CO2 para ostanques, com uma eficiência de 99% narecuperação de CO2.No caso do Cenário 3, é conhecido que osácidos graxos poliinsaturados (ácidoaraquidônico ­ ARA, ácido eicosapentaenóico ­EPA e ácido docosahexaenóico – DHA, porexemplo) e pigmentos carotenóides(astaxantina, betacaroteno, luteína,cantaxantina etc.) apresentam propriedadesterapêuticas. Atualmente, são comercializadascomo alimento natural ou suplementoalimentar e são encontradas formulações empó, tabletes, cápsulas ou extratos. São tambémincorporadas em massas, petiscos, doces,bebidas etc., tanto como suplementonutricional quanto como corantes naturais(Becker 2004). Na Tabela 2 mostra­se comosão comercializados alguns produtos eaplicações obtidas da biomassa microalgal.

Tabela 2. Comercialização de produtos e aplicações a partir de.algumas espécies de microalgas. Fonte: BRENNAN e OWENDE,.2010.

Por sua parte, o betacaroteno de fontemicroalgal tem sido comercializado sob trêsformas: extratos, pó e como biomassa seca.

Segundo Ben­Amotz 2004, o preço desteproduto varia entre US$ 300,00 e US$3.000,00 por quilograma. Em quanto asproteínas solúveis para alimentação humanapodem ser vendidas a €5/kg e para alimentaçãoanimal em €0,75/kg (Wijffels et al 2010).Viabilidade ambientalUma das características relevantes dasmicroalgas é a capacidade destes micro­organismos transformarem o dióxido decarbono presente na atmosfera e a luz solar emvárias formas de energia, através do processode fotossíntese, também são capazes deremover a presença de outros compostos comoNO e SO2.Neste contexto, as microalgas ganhamdestaque na redução de concentrações dosgases do efeito estufa devido à capacidadefotossintética e sua aplicabilidade em sistemasde engenharia em que a energia solar leva afixação de CO2 convertendo­o de energiatérmica em biomassa rica em energia comadição de valor agregado gerando produtosquímicos e alimentícios. (Chisti 2007).Estima­se que a fixação de carbono porcultivos de microalgas em condições ótimasestaria entorno de 11­36 ton. C ha/ano.Durante a remoção de CO2 e NO, geradosdurante a combustão do carvão, pormicroalgas, estudos têm revelado que aremoção máxima de CO2 chegou a 22,97%, ede NO 27,13% o que pode reduzir os custoscom nutrientes do meio de cultivo e problemasgerados com a emissão de gases. (Morais &COSTA 2008)Por outra parte, as microalgas podem mitigaros efeitos dos esgotos e fontes industriais denitrogênio residual como aqueles derivados detratamento de água residual ou da ictioculturae, ao mesmo tempo, contribuindo para apreservação da biodiversidade. Além disso,removendo nitrogênio e fósforo da água, asmicroalgas podem ajudar a reduzir aeutrofização no ambiente aquático (Mulbry etal 2008).Também não pode se deixar de mencionar que

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como seu cultivo pode ser feito em águamarítima ou salobra e em terras nãocultiváveis, não incorre na degradação dossolos, minimizando os impactos ambientaisassociados, ao mesmo tempo em que nãocompromete a produção de alimentos,forragens e outros produtos derivados deculturas.Considerações FinaisAs microalgas constituem uma alternativapromissora devido a suas inúmeras vantagens,por exemplo: o rendimento do óleo extraídopara fazer biodiesel nas microalgas é cerca de200 vezes maior do que o rendimento obtidocom outras mais produtivas oleaginosas;podem ser produzidas em qualquer época doano de forma rápida, os nutrientes para ocultivo de microalgas (especialmentenitrogênio e fósforo) podem ser obtidos a partirde águas residuais, tendo nestes casos duplafuncionalidade: captura de CO2 e tratamentode efluentes contribuindo à manutenção emelhoria da qualidade do ar; podem produziruma série de outros produtos valiosos além doóleo, tais como proteínas e carboidratos quepodem ser utilizados como alimento paraanimais ou fertilizantes, ou fermentados paraproduzir etanol, metano, ou outros produtoscom maior valor agregado, como PUFAs,pigmentos, açúcares e antioxidantes.Em relação às desvantagens, além dasuscetibilidade à contaminação e a adaptaçãoao ambiente, o aspecto que não pode se deixarde mencionar é a dificuldade para umaprodução economicamente viável, o alto custodo processo de cultivo e da produção dabiomassa seca e extração do óleo. Mas essesproblemas podem se resolver num futuroquando se saibam aproveitar as vantagens jámencionadas anteriormente e aplicar oconceito de biorefinaria com o objetivo depotenciar a economia do processo e os ganhosambientais.

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