dl umn - cadernos saÚde coletiva - iesc / ufrj · a; i t r: t i dl hlu oos loucos a0 grande...
TRANSCRIPT
.
:
a
;
I
t
r
:
t
I
Dl Hlu oos Loucos A0 GRANDE ExcLAUsURAMEI{To: Umn ntsróRln ons
HIsTÓRIAs FOCAULTIAiIAS sOBRE A tOucURA
From Stultifera Navis lo ¿he great externment: an history of Foucault'sh¡stor¡es of madness
Arthur Arruda Leal Ferreiral
Rris u MoA mcta dcstc artigo é, inicialmcntc, fazer um lcva¡¡tamct¡to dos t¡abalhos dc MichclFoucault sobre a história da loucura, do Rcnascimcnto (século XU ató os nossos dias.Lcvantamcnto que inclui náo apcnas o clássico A H¡stór¡a da Inurura (1961), masigualmcnte outros trabalhos quc sc manifcstaram cm fascs mais tardias do scu
pcnsamcnto. Estc mapeamcnto do t¡abalho de Foucault náo üsa apenas umrcccnscamcnto cxtcnsivo do tcma, mas pincipalmcntc um diagnóstico dos perigosatuais cxistcntcs no tmto com a loucur¿. No pr.esente, um destes riscos sc manifestana conjungáo do p¡lccsso da Rcforma Psiquiátrica com a Rcfo¡ma do Estado brasilciro,cm quc a dcsarticulagáo do modclo asilar podc scr assimilada ao próprio dcsmontcdc ccrtos scrvigos públicos, langando toda uma populagáo enclausurada c tutclada nocspago público cada vcz mais cxíguo dc nossas cidadcs. Moümento quc faz com quccsta populagáo rccncont¡c alguns parceiros clássicos da grandc internagáo produzidacm mcados do sóculo XVII: mcndigos, prostitutas, blasfcmadorcs, ctc. Como cstc
processo agora sc produz fora das gmdes e muros das casas, pragirs c prédios das
cidadcs, scni elc denominado: o grandc cxclausuramcnto.
PALAvRAs-cHAVIHistó¡ia da psiquiatria, políticas de saúde mental, filosofia contemporánea
A BS t RAC',I
Thc aim ofthis aniclc is, initially, to makc an inventory ofthc worls ofMichel Foucault'son tl¡e l¡istory ofmadness from thc si¡,tcenth-ccntury Renaissance until thc prescnt day.
Tlris invcntory addrcsscs not only his classic Tlv Hstor¡ oJMalness (1961), but also otherworks pr.oduccd in later pcriods of lús i¡tcllcctual dcvclopment. This cxamination ofFoucault's publications is not simply an cxtcnsivc ¡cvicw of his writiugs; it is a criticaldiagDosis of thc daogcrs which exist in today's treatmcnt of insanity, or radrcr, intoday's politics of mcntal hcalü. In present-day Bmzil, one of thesc ¡isl¡s is manifestcdin drc conjoining of Psychiatric Rcform and Statc Rcform, in which the undoing oftheasylum modcl can be asúmilated into its own destruction ofpublic services, Iaunclúnginto drc strccts, cach timc morc fastidiously from our citics, thc cntircty ofdrc populationofthe intemed and the necd, a movcmcnt that forccs tlis populatio¡r into rcconnaissanccwith bcggars, prostitutcs, blasphcmcrs a¡d crazics: thc classic cha¡actcn of thc grcatincarccration ofthe mid-scvcntccnth ccntury. How this proccss ofcxclusion takcs placc
Pr1fessat ad)unto d0 Departanenlo de Ps¡col1gia Geral e Exper¡nenlal d0 lnstitulo de Ps¡colagia da
UFBJ e D7utu en Psjc1lag¡a Clinica pela PUC SP Pesquisad1r f¡nanciado pela FAPERJ e pe¡a FUJB.
CaDcn¡os Sarior CoLE¡rvÁ, Rro 0E J^Íflño, 9 (1):69 -81,2001 - 69
I
I Anrnun A¡nuo¡ L¡¡r F¡nnrn¡
today, bryond thc barrerl lr'indows and protcctivc walls of thc houscs, squarcs anobuildings ofthc citics, will bc known as thc great ,.extcr.ning,,.
Klt'-rvottt¡sHistory of psychiatry, politics of mcntal hcalth, contcmporary philosophy
An¡;n lun,lO Rio de Janeiro é uma cidade singular, que neqocia o scu cspago
urbano com os acidentes geográficos que a cercam, fazendo com que elasempre se abra para o exterior, para os seus limites. Alguns acidentes sáo
domesticados, outros provocados. O Aterro do Flamengo é um acidentepremeditado na conquista do mar para que a cidade se nutra de espaqo
externo; um espaqo público de circulagáo, em um processo inverso ao daprivatizagáo e interiorizagáo das grandes cidades modernas. Nesta longaextensáo de quadras, üas ejardins (uma pálida cópia do projeto original deBurle Marx), circula uma populaqáo heterogénea: moradores da cercania,desportistas, meninos de rua, mendigos, pregadores, mich€s, farofeiros delinal de semana e... alguns loucos. Curiosa populagáo congregada mr prazer,no lazer e na desconfianga e na auséncia de alternativa. Reúne-se umagrupamento táo heterogéneo como o que p6de ser congregado trés séculos
atrás na Europa no espago interno dos Hospitais Gerais, como mostraMichel Foucault em A Histórin da Loucura (196l). O que teria se passado
nestes t[és séculos entre o recolhimento e o ostracismo de populagóes táodiversas? Seria a simples revisáo de uma liberdade injustamente confiscadae enfim restituida? E, mais exatamente) o que pode se suceder.com os
loucos e seus companheitos de nomadismo? Devemos ter a esperanga derevéJos navegar em sua Shtbifera,Nbair (a Nau dos [,oucos) nos rios dejaneiro a janeiro, como p6de ocorrer no Renascimento?
N,ÍcHrx, FoucAUI;t : A Hls l óRrA D^s Hrs l.óRr^s D LoucuR/1.
Um grande parceiro na abordagem destas questóes será o pensadorMichel Foucault. Pensador de dificil classificagáo dentro dos ramostradicionais do saber. Historiador-, se náo propusesse uma genealogia deinspiragáo nietzscheana em substituiEáo á história tradicional das idéias,marcada pelo intele ctualismo, continuísmo e primazia do sujeito.Epistemólogo, se náo recuasse a abordagem epistemológica em prol deuma arqueologia, devotada á descriqáo dos solos epistémicos de onde os
70 - C¡oentos SaúDE CorÉr|va, Rro or Jrrrrro, g {t):69 -01,2001
0a tau 00s touc0s Áo cRAIDE EtcLAUsuRAxEt{Tol Ux¡ Hts¡0nra D¡s tttslónt^s FocauLTlÁtlas s08nf a toucuna I
saberes surgem, sem se indagar sobre a sua cientificidade. Filósofo, se náo
recusasse a primazia dos sistemas em prol de um pensamento estratégico,
problematizador das questóes atuais, modificando a partir destas os seus
conceitos e métodos. E é nesta atitude estratégica de seu pensamento que
a sua parceria será tomada: náo para extrair dele o sumo do qual possa
ser decantada uma verdade maior, mas utilizá-lo como uma ferramenta a
operar criticamente sobre a nossa contemporaneidader . E algo deve Éer
dito claramente sobre esta caixa de ferramentas foucaultiana: sua fungáo
náo é nos fornecer um apoio ou um fundamento, mas desmontar nossas
verdades mais caras, destronar as nossas evidéncias reificadas e calcular
os riscos do nosso presente. Pensar com um autor nesta perspectiva náo
é o juramento de fidelidade aos seus princípios, mas é estrategicamente
pensar com ele e, ás vezes, contra ele, se abrindo a outras parcerias,
Quando pensamos nesta ferramenta foucaultiana, neste martelo
destruidor das evidéncias tomado de empréstimo a Nietzsche, com o qual
se é necessário filosofar, pensamos em uma espécie de utensílio ou arma
única, com o mesmo porte para destruir qualquer certeza. Contudo, nós
enconraremos nos ditos e escritos de Foucault um farto arsenal de máquinas
de guerra, cada qual forjada para a sua evidéncia sólida. O tema da saúde
é um dos mais reconentes nos trabalhos foucaultianos por se tratar de um
aglutinador de dispositivos que produzem um alto capital de verdades ao
mesmo tempo que um vasto arsenal de formas de governo de si e dos
outros. Contudo, a abordagem deste tema varia em torno de uma série de
termos específicos, conceitos-chave e alvos estratégicos. Cartografar o tema
da saúde seria um árduo trabalho de cruzar e combinar temas, conceitos
e alvos estratégicos. Mais interessante seria a tomada de um tema nos
escritos foucaultianos e observá-lo variar em torno de conceitos e
problematizagóes. Insiste-se: náo para extrair dele um sistema, mas uma
montagem de seus dispositivos históricos, que sirvam para problematizar
as evidéncias presentes.
' l,ago aqui minhas as palavras dc Cillcs Dcltuzc (1972, p.7l)r "Una tcoria ó u'na (aixa
dc Ierramenlas... il prcci.o qu,: sirva, é prcciso quc luncionc. U neo Para si mcsnra. Sc
náo bá pessoas para util¡zá-la, a colrcaar pclo própr¡o teórico quc dcixa cntáo dc scr
teórico, é que cla ¡áo valc nada ou quc o |no cnto ainda náo chegou. N¡o sc rcláz uma
teor;a, I)zcrn-!,e outras; há outras para sercnr Ieitas-"
CaDEir¡os SaúoE CoLEÍva, Rr0 0E JÁxEr¡o, I (1): 69 -81, 200'| - 71
I A¡r¡un A¡nuo¡ L¡¡L Fenn¡rn¡
No caso da saúde, dentre uma arqueologia e genea.logia da clinica, daformagáo médica, do hospital e da saúde pública, destacarei uma genealogiada saírde mental. Com uma ressalva inicial do próprio Í-oucault feita emA História da ltucura: tanto a saúde mental como a doenga mental sáoinvenqóes historicamente datadas, próprias de uma forma de dominaqáoda loucura singular á modernidade. Neste aspector portanto, melhor seriafalar de uma história da loucura, ou de histórias da loucura, sabendo davariagáo no conjunto dos enunciados fout-aultianos dos conceitos e a.lvos
estratégicos. Passemos ao desfile dessas histórias da loucura, registrandonáo apenas o trabalho foucaultiano, mas igualmente o de outros pensadoresque ajrrdem a sinalizar os llossos riscos atuais.
Apesar de ter alguns textos publicados nos anos cinqüenta (por exemplo:Doenga Mental e Psicolngia), Foucault terá apenas o seu reconhecimento noinício dos anos sessenta com a publicagáo de sua tese de doutorado: IHisüria da Lou¿ara. Neste texto clássico, este filósofo mostra-los que opercurso do Renascimento até os nossos dias tem o sentido da progressivaseparagáo e exclusáo da loucura no seio das nossas experiéncias sociais.Para tal análise, sáo destacadas do século XV até o século XIX as diferentesmanilestagóes sobre o conhecimento teórico da loucura de um lado e apercepgáo social dos loucos, de outro. Deste modo é que no Renascimento(século XVI) r'ecai contra a loucura no máximo uma condenacáo decunho moral (enquanto presungáo, desregramento, irregularidade daconduta, defeito, lalta e fraqueza) sendo a sua experiéncia náo muitodistanciada daquela da própria razáo.
No periodo Clássico (séculos XVII e XVIII) a loucura é excluída daordem da razáo com Descartes e os loucos, enclausurados junto a umapopulagáo heterogé,nea, excedente moral e económico da sociedade:sodomitas, prostitutas, libertinos, blaslemadores, suicidas, magos, feiticeiros,alquimistas, etc. Outm marca deste período é a dissociagáo entre apercepgáo social dos loucos, governada pela experiéncia do internamento,e o conhecimento médico da loucura, regido por um paradigmaclassificatório-tarinómico, em que as diversas formas de loucur.a constituíamfamílias em continuidade com as demais doengas. Daí a auséncia dequalquer especificidade que conferisse ás doengas mentais um domínio áparte; no período Clássico elas náo existem.
72 - C¡o¡nr¡os S¡úoE ColÉ¡rva, Rto DE JailoÍo,9 (1):69 -8.|,2001
I
Da x^0 oos t0ucos ^o
GnaNDE Erc!^usuR^r¡ENIoi lJx¡ Írsrónra DÁs ¡rsló¡ras tocaul¡at¡s so!¡E ^
LoucuBA I
A linha separatória entre razáo e desrazáo que surge no período
Clássico cava sulcos mais profundos na Modernidade (século XIX em
diante), quando os loucos se véem libertos das correntes por Pinel e Tuke,
mas ainda circunscritos ao espago asilar no estigma da doenqa mental,
verdade considerada agora a mais profunda do homem. Assim a loucura
é liberta no confinamento ao saber médico e na solidáo dos asilos, sem
mais as suas parcerias do período Clássico. Nas palavras de Foucault,
liberta-se o louco das correntes, mas ele é atrelado á esséncia humana.
Que alternativas sáo vistas aqui para as vozes da loucura caladas na
Modernidade pelo sono dogmático-antropológico? Náo certamente o espago
clinico da psicanálise, que mesmo se abrindo ao discurso da loucura em sua
integridade, recodifica todos os poderes médicos na figura do analista (crítica
que será repetida mais adiante). O extravasamento das vozes loucas só terá
uni lugar: o da literatura, entendida náo como espago clássico da obra
erudita, mas justamente como problematizagáo e limite deste. O próprio da
literatura será promover um "desobramento" regulado da linguagem comun,
aproximando-se da linguagem louca enquanto total "auséncia de obra". E
é deste modo, através da literahrra, que vozes loucas puderam ainda vociferar:
as de Sade, Hólderlin, Nerval, Nietzsche e Artaud. Contudo, deve ficar
claro que Foucault, ao afirnar a expressáo destas vozes da loucura através
destes autores, náo tinha a menor intengáo de atrelálos a uma esséncia
louca ou a um diagnóstico psicopatógico, como procede a medicina moderna.
O esforqo arqueológico próprio dos anos sessenta do trabalho de
Foucault, de dar conta das condigóes de possibilidade histórica dos saberes,
encontrará nos anos setenta o poder como o seu termo-chave. Inicia-se
aqui o projeto genealógico, na tentativa de conjugar a génese dos saberes
na reformulagáo dos poderes. E nesta fase do pensamento foucaultiano, a
g€nese do saber psiquiátrico náo assumirá tanta importancia como a das
prisóes, dedicando Foucault ao tema no máimo alguns cursosz e artigos.
Um dos mais emblemáticos destes trabalhos é A Casa dos Inucos (1974), em
que este pensador mostra-nos que a articulagáo entre poder e verdade
! Dos cursos prol¿fidos sobrc o 1c,Da no Coll¿gc de ltrancc: O loda l\¡Ctiáttito (1973/t974), ot ,4 atñaii (t974/ 1975) e t, pr¿riú d¿I¿nd¿t ¿ to.ied¿d¿ (t97:r/ 197 6), o primuiro ú
consonantc ao artigo quc será apresentado:,1 C¿ du\ Loucot (197 +). Os dcnrais al:ordarna questáo psiquiátrica vinculando-a á produfáo dos anormais at¡avós dc uma lbr¡na dcpodrr regulado pclos valores da vida, o biopoder, que encontrará a sua maior manil¡st¿(áono racis¡ro do Flstado.
C¡oEfii0s S^r¡0E CoLcÍva, Rro Dr Ja¡Erno, I (l)r 69 -81, 2001 - 73
I Arrnu, Arrroo LEAr FGnñErna
(entendida aqui como prova e náo revelaqáo) atinge um de seus pontosmáximos no confinamento asilar, onde o louco é conduzido a confessarsua natureza louca. Nesta confissáo produz-se, através do poder asilar, averdade de sua loucura. Náo se trata pois de um modo de produgáo deverdades tal como ocotre na ciéncia natural, em que o objeto náo é
constrangido a revelar a sua verdade, mas a testemunhála. como em uminquérito.
Contudo, segundo Foucault, algumas estratégias de despsiquiatrizagáo,de rompimento desta relagáo entre o poder asilar e a verdade da loucura,sáo produzidas na virada para o século XX: a psicocirurgia e
psicofarmacologia de um lado, e a psicanálise de outro (podemos ver aquiuma certa continuagáo de A História da Loucura). Sáo estratégias dedespsiquiatrizagáor uma vez que a produgáo de verdade sobre a loucuranáo se equaciona mais com o confinamento asilar. Na psicofarmacologiae na psicocirurgia isto ocorre ao se lazer o poder de confinamento recuarperante uma verdade sobre a loucura revelada nos laboratórios. Napsicanálise esta quebra do dispositivo asilar se produz ao perrnitir que olouco produza a sua própria verdade, mesmo que no sz zlzg analiticorecodifique-se integralmente o poder médico na figura do analista3.Contudo, a derradeira estratégia de despsiquiatrizagáo será produzidapelo moümento antipsiquiátrico, capitaneado por Daüd Cooper, RonaldLaing, Thomas Szaz e Franco Basaglia, ao derradeiramente libertar olouco de qualquer confinamento e de qualquer verdade; a ele caberia a
produqáo de seu próprio saber. Esta produgáo do próprio discur.so e daprópria verdade é o contrapoder ou alternativa mais palpável ao poderasilar e suas formas de despsiquiatrizagáo relativas. A literatura náo terámais o poder subversivo que teve investida nos anos sessenta, sendo pois
substituída por este elogio da antipsiquiatria.
tlin ¡mb¡s as forrrlas dc dcspsiqüiarrizaqio rcsidiria a lórrnuta: .,Sabc¡nos sot¡rc a suadoenqa e a sua singularidadc coisas sulicienres sobrc as quais vocC scqucr dcsconfia, pa.arcconhcccr que se trata de urna dornqa; rnas dcsta docnga conhccemos o basLarrLe parasabcr quc vocC n¡o podc excrccr sobrc cla c cm rcta9¡o a eta ncnhr¡nr rlircito. Sualoucura, nossa ci6ncia pcrrnirc quc chanrcmos docnfa c dai em dianre, nós, rnédicoscs(a¡nos qualilicados para intcrvir c diagnosticar uma toucura que lhe inpcdc dc scr unrdoente cor¡o or outros: voc¿ será enráo um docntc me¡tal.', (¡oulcault, l97i p.127)
74 - C¡o¡¡¡os Sarl0r C0LEr|va, Bt0 DE JarErs0, 9 (l): 69 -81, 2001
Da ¡u oos roucos a0 cna¡08 Excrau$untxE¡To: t r¡ r¡tsTó¡t^ DAs HtsTónt¡s r0c¡uL¡¡ as soB¡E ^
LouGU¡^ I
Un pr:ntco coN t EMpoRANEo: o cRAND¡t rxctAUSURArrr.tN'l oNossa história foucaultiana terminaria aqui com a possibilidade do
triunfo libertador da antipsiquiatria, na tomada de assalto do aparatopsiquiátrico a partir dos anos setenta? E bem verdade que este caminhoaberto por Foucault náo foi mais trilhado por ele nos anos setenta e
oitenta, tendo se dedicado a outras lutas, como a dos presos, no GIP(Grupo de Inlormagóes sobre as Prisóes). Contudo as problematizagóes
foucaultianas sobre a loucura contagiam outros rabalhos, como os de
Gilles Deleuze (1990) e Robert Castel (1985), contágio que me implicaigualmente. Mais decisivo na transmissáo de um vírus náo é o seu simples
contágio, mas as suas sucessivas mutagóes. Deleuze irá propor a existéncia
de uma sociedade de controle, para além das sociedades disciplinares,
baseadas na transmissáo da ordem pelo confinamento, como no asilo
psiquiátrico. O apoderamento dos corpos aqui passa a ser exercido ao arlivre e de modo contínuo, como no modelo de Hospital Aberto, porexemplo. Castel em seu A C*stdo dos Riscos irá p6r em questáo a própriaestratégia antipsiquiátrica, como um exemplo dessa nova forma de geréncia
da doenga, enquanto responsabilidade do portador. Foucault (1982: p.
256) assim se posiciona quanto este trabalho:
"Eu conco¡do inteiramente com a posigáo de Castel, mas isto nio querdizer, como alguns supóem, que os hospitais psiquiátricos sáo melhores doque a antipsiquiatria; isto náo significa que náo possamos criticar estes
hospitais. Penso que seria bom fazéJo, pois eles eram o perigo. E agoraestá bastante claro que o perigo mudou. Por exemplo, na Itália, fecharamtodos os hospitais para doentes mentais, e há mais clínicas particulares etc.
novos problemas surgiram."
A minha contribuigáo ürótica é perguntar quais sáo os riscos desta
despsiquiarizagáo que desponta numa nova sociedade de controle,especialmente no caso brasileiro. O que melhor representa aqui este processo
atual é a chamada Luta Antimanicomial, surgida nos anos oitenta como
um rebatimento em uma lrente de largo espectro doutrinário dos
moümentos antipsiquiátricos oriundos dos Estados Unidos e Europa desde
os anos sessenta. Movimento que implica na mudanga de uma série de
dispositivos institucionais, como a criagáo de hospitais abertos como Naps
e Caps, sem qualquer mecanismo asilar. Movimento que se desdobra
inclusive em direqáo ao Congresso, onde tramitou durante a década de
C^otn¡0s SaúDt ColrÍvr, ffro or J^ilErno, 9 (1): 69 -81,2001 - 75
I ABIHus ABRODA L¡¡L F¡¡¡¡¡¡¡
1990 um Projeto de reforma do sistema psiquiátrico, a Lei 10.216. Esta
lei, aprovada em 06 de abril de 2001, teve como base o projeto doDeputado Paulo Delgado apresentado em 1990, com versáo finalmodificada a partir do substitutivo do Senador Sebastiáo Rocha+. Talprojeto claramente desmantela o aparato asilar baseado em internaqóesinvoluntárias, a maior parte delas custeada pelo governo através dofinanciamento de leitos em instituigóes privadas, e subordina-as ao apar.elhojudiciário, impondo a sua notificaqáo junto ao Ministério Público (Artigo8", par'ágrafo l). Projeto pertinente, uma vez que enfrenta o enclausuramentoasilar e a inteffenqáo parasitária das clínicas particulares, especialmente
com relaEáo ao custeio estatal, além de contrabalanqar o poder médicocom o poder jurídico. A estranheza que envolveu a tramitagáo deste
projeto de lei, além de seu prolongado debate, é o jogo político que se
teceu em seu entorno. Pois se ele ganhou a antipatia óbvia do sistema
privado de saúde, que possuía boa parte de seus leitos de internagáocusteados pelo governo, por outro lado forneceu um apoio inusitado ao
projeto de reforma manicomial. Processo que, nas palavras do atual ministroda Saírde José Serra (2001, p.5) se dá na confluéncia da via legislativacom as normativas do próprio ministério, qr-re, desde a DeclaraEáo de
Caracas de 1990, estaria atuando no sentido de Gchar os hospitaispsiquiátricos iregulares, sendo estes substituídos por servigos alternativos,como leitos psiquiátricos em hospitais gerais e servigos de atenqáo diária.Estaria aqui manifesto o lesíduo esquerdista perdido do governo FernandoHenrique, agora entrincheirado nos gabinetes do Ministério da Saúde?
Por que se fomra aqui uma curiosa alianga entre o govemo e gruposligados á Reforma Psiquiátrica, isolando-se os representantes do sistema
de saúde privada em alguns poucos conchavos no congr.esso? Por que a
mesma alianga náo se reproduz entre os sindicatos de f'rabalhadores naEducagáo e o Ministério da Educagáo ou ainda com o núcleo duro dogoverno representado pelo Ministério da Fazenda?
De inicio náo se deseja aqui afirmar que esta conjugaqáo de forgas é
táo simples como se pretende aqui esquadrinhar. Nfas houve e há umaforte simpatia pelo projeto por parte de setores do governo, o que náo
' Dc 1992 ató hoic Ioranr cri¡das oiro Icis csraduair inspiradas no projc(o do DrpuractoPaulo Dtleado, scndo os csrados dc Pernamb co c rlo Rio cr¡ndc do Sul
76 - C¡o¡nr¡os SaúDE CoL€Íva, Rto DE Ja ErB0,9 (1):69 -g1,200.i
;
D¡ l|Au D0s Lotrcos a0 ciatiot trcL¡t su¡¡ffltTo: [Jr¡¡ sIóRta oas Htsrónt¡s focautTt^l¡¡s so8Br a Loucuna ¡
implica necessariamente comunháo de interesses com os grupos proponentes
deste projeto, imbuídos em restituir a cidadania á loucura. Atás dos bons
acordos nem sempre se encontram as melhores intenqóes. Deve-se ressaltar
que náo se deseja aqui sugerir a restituigáo da estatizagáo psiquiátrica
centralizada e o retorno do modelo asilar, mas apenas destacar os liscos
deste projeto e de suas aliangas envolüdas. Certamente para fortalecéJo,
pois a dominagáo sobre a loucura sedimentada durante cinco séculos náo
haveria de se suprimir com a simples concessáo de cidadania á loucura.
Uma boa indicaqáo sobre estes riscos pode ser buscada nos trabalhos de
Foucault (1978) sobre a Govemamentalidade e o Liberalismo, em que
este náo é visto como uma estratégia de governo, mas uma critica á
interuengáo do governo em setores que sáo capazes de se auto-regularem,
especialmente aqueles que partem de iniciativas da sociedade civil. Em
alguns representantes do pensamento liberal como a Escola de Chicago,este mecanismo de auto-regulagáo é identificado ao mercado. Assim, se
os grupos ligados á Reforma Psiquiátrica visam conceder cidadania ao
louco, em oposigáo ao seqüestro e confinamento compulsório, o atual
governo pode ver aí uma simples possibilidade de se desobrigar, de lavar
as máos perante o mercado na regulagáo da vida daqueles quer em nome
do perigo ou da fragilidade, ele até entáo tutelava. Eles agorz que gerenciem
os riscos que eles mesmos portam. Náo apenas os loucos, mas os doentes,
os idosos e outras classes de esquecíveis. Eis uma marca do liberalismo
mesclado ás práticas de governo: delegar aos indivíduos a gestáo e aresponsabilidade sobre seus próprios riscos, repassando a estes os encargos
do próprio Estado. Insiste-se mais uma vez: a meta deste trabalho náo é
por a Reforma Psiquiátrica em xeque, mas calcular os riscos que ela traz
ao se atrelar ao processo de Reforma do Estado no Brasil, em que adesarticulaEáo do modelo asilar pode ser assimilada ao próprio desmonte
de certos servigos públicos.
Q¡ral pode ser a conseqüéncia mais perigosa deste acordo entre a
quebra dos muros psiquiátricos e o desgoverno liberalizante? A Lei 10.216,
através de seu artigo 5", mostra-se extremamente cuidadosa com os antigos
internos que se encontram no caso de dependéncia institucional, garantindo-
os através de uma política especifica de leabilitagáo. Náo há, pois, o que
supóe os críticos possíveis desta lei: o langamento puro e simples de uma
C¡or¡ros Saúoc Colrrrvl, Rro or J¡{Erno, I (1): 69 -81, 2001 - 77
I
I Anrnun Anruor IEAL FEsnETRA
populaqáo, até entáo psiquiatrizada e tutelada, na rua. Contudo, os novos
casos com a política de internagóes curtas podem ter. duas direqóes: as
clínicas psiquiátricas particulares, no caso dos indivíduos pertencentes afamílias abastadas; e a rua nos demais casos, Nas duas alternativas o seiofamiliar é o alvo mais improvável para os loucos, afinal todos os cidadáostem que se voltar para o trabalho e para a produgáo e ninguém pode se
dedicar aos loucos, Os que se direcionam para as ruas certamentereencontraráo uma populagáo outrora irmanada no enclausuramentoclássico, com a ressalva apenas de que ela está agora trancada por fora.Se o mercantilismo no periodo Clássico levou ao confinamento dos náo-produtivos e a economia de mercado moderna conduziu á reabsorgáo dosnáoJoucos nos séculos XIX e XX, na atualidade o trabalho torna-secategoria precarizada na produqáo de riquezas, acarretando a produgáode um resíduo populacional dispensável para o mercado. E cada vez maneste gesto de exclusáo torna-se mais amplo: pragas sáo cercadas, edi{iciosgradeados, calgadas bloqueadas com ferros e dormentess. Nas palavrasde Carvalho (2001, p.34): "A lógica do confinamento inevitável do louco/diferente tem a sua contrapartida no confinamento dos sáos/iguais." Umapopulagáo-resto é entáo jogada cad^ \ez mais para fora: para o asfalto,
viadutos, pontes, e estes cada vez mais e mais cercados. Neste aspecto, oAterro do Flamengo é um resquício de um espaqo exterior náo interiorizado,por onde ainda circula livremente esta populagáo externada e consternada.Talvez o que esteja em questáo por ora seja a impossibilidade degradeamento.
Existe um conjunto de trabalhos que póe em discussáo este afluxo daloucura no seio da populagáo de rua em fungáo da quebra do modeloasilar. Talvez seja cedo para obselar a concretizagáo deste risco emfungáo da recentidade da reforma psiquiátrica e do seu caráter náo radical.Contudo, um trabalho merece ser destacado: o de Maria Tavares Cavalcantie de sua equipe (2001-a, pp. 24-25), que, na abordagem de uma amostrada populaqáo de rua carioca abligada junto á Fundaqáo Leáo XIII,constatou o indice de apenas 9,9olo de doentes mentais graves. Para aequipe este seria um argumento satisfatório de que a desinstitucionalizagáo
5 Co¡sra o lblclor( car;oca que inclusivc houvc um prrt¡iLo quc havia ptancjacto cobriras calqad¿s dr crcolina, cxpulrando csla poputaCáo dr scu útrirno rcduro. O rnars currosoé que esre prcl¡ito suposra "loucura" conro lraqo dr narkcring poti(¡co.
78 - C¡ornros SariDE ColErlva, Rro 0E JaNEtno, g (l): 69 -81,200'|
D¡ r¡u oos rouco$ ¡0 6¡¡rDE Ercl^üs0ta¡E¡To: u a Hts¡ónta DAs titsTónt¡s ¡oc¡ut¡¡¡¡¡$ $0¡¡¡ ¡ roucua¡ I
náo aumentou a freqüéncia de doentes mentais na rua. O diagnóstico
destes autores está baseado na avaliagáo de uma amostra populacional
abordada entre 0l/07 / 2000 e 18/04/2001 na Fundagáo Leáo XIII. Este
seria o primeiro problema: tratando-se de um grrpo de moradores de rua
assistidos pela Fundagáo, isto náo imporia um viés tendencioso na selegáo
desta populagáo? Como considerar os moradores de rua resistentes á
abordagem da Fundaqáo? Um outro problema é que este estudo é realizado
numa faixa muito restrita de tempo, náo havendo dados sobre o período
anterior á reforma. Ainda que houvesse este estudo, podeúamos nos
perguntar se o viés do diagnóstico seria igual. Apesar das dificuldades de
comparagáo com o passado, um estudo que, a partir do presente,
acompanhe a evolugáo da populagáo de rua através de uma longa duragáo
é desejável. Mas, também este possível estudo teria um problema: considerar
apenas o percentual de doentes mentais numa populagáo de rua para
avaliar o seu crescimento é insuficiente. Pois, estaríamos ignorando outras
raz6es que levam á exclusáo desta populaqáo para a rua. É necessário que
se avalie o aumento absoluto dos supostos doentes mentais e náo a sua
freqüéncia relativa. Talvez neste aspecto igualmente importante seja avaliar
o próprio aumento da populagáo de rua. Enquanto náo existem indices
seguros, permanece o risco de que esta exclusáo esteja se ampliando,
Contudo, alguns antídotos estáo sendo produzidos com relagáo a este
possível processo, como os chamados Lares Abrigados, em estado de
implementagáo aqui no Rio de Janeiro e com um sentido operacional
ainda náo muito claro, apesar de sua expansáo. Outra possibiiidade é o
trabalho de atendimento da populagáo de rua, e um exemplo disto é o
projeto desenvolvido pela própria Maria Tavares Cavalcanti (2001-a; 2001-
b), buscando-se eütar o enquadramento no modelo asilar.
Este processo de exclusáo, náo mais no interior dos asilos, mas no
exterior das cidades é simétrico ao "Enclausurame nto clássico", destacado
por Foucault. Por tal razáo, batizo-o de "O Grande Exclausuramento",
que náo se trata certamente de uma exclusividade brasileira, mas de um
desmonte em escala global e a toque de caixa dos aparelhos públicos de
acolhimento, tutela e governo de populagóes. A gestáo das populagóes
náo é mais alvo da governamentalidade, sendo substituída por aquilo que
deve se tornar meta e medida de todo o valor de agora em diante: o
mercado e suas flutuagóes. Se a produgáo, a mais racional, lucrativa e
CaDE¡Nos SaúDE Cortrrra, Rr0 DE JÁ[sno, I (l)j 69 -81, 2001 - 79
I
I Anrrun Annuo¡ [EAL FEFnErn^
eficaz comporta sempre um resto, um dejeto (seja pelo excedente, sejapelo náo-aproveitável), por que o mesmo náo deve se dar com as populagóes,
agora táo precarizadas quanto o traba.lho que delas se esperava na geragáo
de riquezas? Sempre um resto populacional do qual tentaremos nos defendervagará no coragáo das cidades, levando a uma separagáo cada vez maisradical entre o interior gradeado e o exterior nas cidades. Como se as
fronteiras das cidades medievais que demarcavam o espaqo por onde os
loucos deveriam navegar com as suas Naves fosse introjetado para ointerior das cidades. Como lembra Paul Virilio (1997). as cidades seráo deagora em diante divididas entre os ndmades e os sedentáúos, diferenciadospela posse de novas tecnologias (os carros, celulares e tnptnps, por exemplo),que habilitaráo os segundos, onde quer que estejam, a estarem sernpre emcasa, ao contrário dos despossuídos. E dentre os n6mades que vagamvagabundo neste vago mundo, divagam os loucos, cada vez mais distantes,enclausurados no fora do dentro de nossas cidades e sem mais qualquerdireito á sua StulQfera Nauis.
R¡rEREtcrns BtBLtocBÁFtcAS
Cnstut., R. A gestdo dos rü¿o¡. Rio deJaneiro: Francisco Alves, lgB5.
C,tnv,tt.Ho, J. J. Saúde mental e diferenga: a üoléncia da exclusio.Reuista da Satfule. Ano II, Número 2. Dezembro de 2001.
C,tv.ll.c..tntt, M. T. et alli. A psiquiatria e o social: aproximagóes e
especificidades. In: C¡v,u.t',nr,¡ n, M. T. & VEN^Ncro, A. T. (Orgs.) Salletrlental: Campo, Saberu e Dücursos Rio deJaneiro: Edigóes IpUB-UFRJ,2001-a.
A loucura na rua. In: C,rv,lr.c,,rrvrr, M. T. & Ftcutrnnno,A. C. (Orgs.) A refonna psiquiátrica e os daafns da desinstitucimali¿agd.o. Node Janeiro: Edigóes IPUB-UFRJ, 2001-b.
Dt:r.r:uzr:, G.; Fouc,,rur.r', M. Os intelectuais e o poder. In: M,tcu,rno,R. (Org.). Microfuba dn Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1982 (entrevistarealizada em 1972).
Drt.v,u't.t',, G. Conaasagda. Rio de Janeiro: Editora 34, 19g0.
Fouc,tut.'t , M. A História da Ltua¿ra. Sáo Paulo: Perspectiva, l97B (tese
de doutorado defendida em 196l).
80 - C¡o¡ntos S¡úoe Corrrrvr, Rro oe Jrrrrno, 9 (l)j 69 -g1,2001
D¡ x^u Dos !0üc08 r0 e¡^rft ErcttuSünafttr0: Ur¡ Htsrú¡t¡ o^s itsT0nra8 Foc¡ütl|¡i¡s 8ot¡¡ ¡ Louou¡r I
. A Casa dos Loucos. In: MacHaoo, R. (O.g). Minofisita dn
Poda. Rio deJaneiro: Graal, 1982 (artigo publicado em 1974).
Os Awrmnü. Sáo Paulo: Martins Fontes, 2001 (Curso de
1974-1975).
. E preciso defmder a sodzdadz. Sáo Paulo: Martins Fontes,
2001 (Curso de 197,1-1975).
. Do governo dos üvos. ln: Fouce.urr, M. Resmn dos r¿rsos.
Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
. Sobre a genealogia da ética: uma revisáo do trabalho. In:DRgytruss, H. & Rerulow, P, (Orgs). Mbhel Foueault nn hqieürin filosófua.Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995 (enrevista publicada em
1983).
Macueoo, R. Cihuin e Saber: a trajeüria mpnlógica de Miñel Forcuk. Node Janeiro: Graal, 1982.
Snnna, J. Apresentagáo. In: kgislagáo em Saúde Mental. Brasília:
Mnistério da Saúde, 2001.
VttIt-to, P. A caástrofe u¡bana. In: Foka de Sdn Pauh (Cadmn Mais). 28
de setembro de 1997.
C^oEii08 S¡r¡0r CoLErvr, f,ro or Jutrno, I {1}r 69 -81,2001 - 81