dinÂmica e organizaÇÃo da sala de aula 86.pdf · independentemente das vantagens ou desvantagens...
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DINÂMICA E ORGANIZAÇÃO DA SALA DE AULA1
A. J. BISHOP e F. GOFFREE
Um episódio Quando Watanabe Sensei colocou três marcas magnéticas no quadro e desenhou um cesto por baixo delas, todos os alunos disseram que se lembravam. Antes de pedir a resposta, Sensei desenhou um cesto vazio, um sinal mais e um sinal de igual.
+ =• ••
Fig. 1
Então, para reconstituir os últimos minutos da aula anterior, Sensei chamou Kaneko para mostrar o que tinha feito na véspera. Este foi ao quadro e colocou as marcas, sucessivamente, em dois arranjos diferentes, explicando que em qualquer dos casos o resultado seria sempre três (2+1 ou 1+2).
No dia anterior Katakura tinha comentado: " Engraçado, o significado é diferente, não é?". Sensei pediu a Katakura que explicasse este seu comentário.
Katakura acrescentou: "Não significa exactamente três".
Sensei perguntou-lhe: "Katakura, o 'três' de que falas é este do cesto ou este aqui no sítio da resposta?"
Katakura apontou para o último.
"O três à direita é o resultado da adição", continuou Sensei. "Isto é o resultado de juntar isto com aquilo. Ele diz que não significa três. Discutam isto. Quem terá razão, Katakura ou Kaneko? Haverá ainda outras opiniões diferentes?"
Cada grupo de alunos conversou seriamente cerca de um minuto. Sensei contou os votos: 10 apoiavam Kaneko e 28 Katakura. Então, Sensei perguntou: "Quem não pôs o braço no ar?"
Ichimura Kun: "Não se pode adicionar. Não se pode adicionar 3+0. Sendo assim, não há nenhum resultado."
Sensei perguntou: "Quer dizer com isto que a resposta é zero?"
— "Sim."
— "Quem concorda?" (oito) "Oh, alguém mudou de ideias!"
Sato San levantou-se. "Não se pode adicionar 3 com 0, por isso o resultado é três."
Sensei perguntou: "Não se pode adicionar ou não há nada a adicionar?"
— "Não há nada a adicionar", respondeu ela.
Sekine Kun concordou com Ichimura que o resultado seria zero.
Akutsu levantou-se e disse, "Uma vez que existem aqui três, mesmo não havendo nada aqui, há três".
1 Capítulo 8 do livro Perspectives on Mathematics Education, organizado por B. Christiansen, A. G. Howson e M. Otte e publicado pela editora D. Reidel, em 1986. A tradução é de José Manuel Varandas, Hélia Oliveira e João Pedro da Ponte.
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(De J. Easley e E. Easley, 'Math Can Be Natural: Kitamaeno Priorities Introduced to American Teachers', 1982, App. IIA, pp. 4-5; Research Report for the Bureau of Educational Recearch, University of Illinois at Urbana-Champaign. Reproduzido com permissão)
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1. INTRODUÇÃO — DESMISTIFICANDO
Este capítulo trata alguns aspectos da formação inicial de professores relacionados com o
funcionamento das actuais aulas de Matemática, e o episódio anterior ajuda a fazer o
enquadramento. É neste contexto que as ideias de Matemática, de educação, de socialização e de
psicologia aparecem juntas ao jovem professor2. É aqui que ele deve aprender a manobrar com
habilidade e atenção a dinâmica dentro de uma aula cheia de alunos muito vivos tentando dominar
esse complicado assunto que é a Matemática.
Contudo, apesar das fortes motivações que os jovens professores têm para aprender a
conduzir estas aulas com eficiência, quando vêem um professor experiente em acção, como
Watanabe Sensei, é difícil para eles perceberem como as coisas se passam. Os alunos parecem
saber o que se pretende que eles façam nos seus grupos, as discussões parecem acontecer quase
naturalmente e sem muito esforço óbvio do professor, e conceitos matemáticos abstractos são
debatidos sensatamente pelos alunos do primeiro ano de escolaridade.
Por isso, a tarefa do formador é essencialmente a de desmistificar o desempenho do perito
— de desfazer o mistério e mostrar as competências, as técnicas e os conhecimentos de ensino na
sala de aula de modo a tornarem-se acessíveis aos formandos(student teachers).
No entanto, como educadores matemáticos que somos, estamos bem cientes dos valores e
ideologias que estruturam o nosso trabalho e do tipo de questões que qualquer formador tem que
considerar ao planificar este aspecto da formação dos jovens professores. Que conhecimentos de
metodologia são indispensáveis/valiosos/necessários? Que competências são importantes?
Deveremos concentrar-nos em estratégias pormenorizadas? Isso depende muito da ideologia da
formação — estamos a tentar fazer professores "que se encaixem" nas práticas e situação existentes,
ou, em vez disso, estamos a tentar formar professores criativos e autónomos preparados para
experimentarem tudo? Quais devem ser as fontes a utilizar para os temas e métodos da nossa
formação? Que parte deve ser edificada na sabedoria comumente aceite dos professores
experientes? Que utilidade terá qualquer investigação no ensino?
Assim consideramos que o objectivo deste capítulo não é simplesmente dar resposta a essas
questões, porque cada formador de professores tem que procurar a sua própria resposta dentro de
cada contexto. Devemos sim, em vez disso, tentar sintetizar os conhecimentos existentes, os saberes
empíricos e os novos progressos para criar uma estrutura conceptual dentro da qual cada formador
de professores possa desenvolver respostas significativas, encontrar as ilustrações mais significativas
e seleccionar materiais úteis para os seus formandos(student teachers). Perguntas acerca de como
organizar a formação de professores e acerca da filosofia da aprendizagem e do ensino da
Matemática, não serão consideradas neste capítulo.
2 Traduzimos “student teacher” por “jovem professor”.
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2. MODELOS PARA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
2.1. Modelo convencional
Apesar do que foi dito, ao criar uma estrutura conceptual apropriada para esta parte da
formação de professores tentámos consciente e deliberadamente redefinir o contexto. Estamos bem
conscientes da existência de um modelo particular que tem controlado e formado muitas
mentalidades ligadas à educação Matemática e, em consequência, influenciado a formação de
professores ao longo de várias décadas e sentimos que é necessário tornar bem explícito este
modelo para que se fique inteiramente consciente da sua força e das suas omissões.
Chamamos a este modelo a "aula de Matemática”. Claro que há diferentes tipos de aulas de
Matemática envolvendo diferentes épocas, diferentes tipos de actividades e com diferentes idades e
níveis de conhecimentos, mas o que é conhecido por "aula de Matemática" é um fenómeno familiar e
facilmente reconhecido por todos os professores e formadores, e pela maior parte das crianças e
adultos na maioria dos países. Nós caracterizamo-las como se segue:
São elaboradas como um "acontecimento" com um princípio explícito, um desenvolvimento e
um fim definido. Têm uma duração fixa. Tipicamente todas as crianças estarão ocupadas com as
actividades que foram planificadas, iniciadas e controladas pelo professor. As aulas são niveladas
para as crianças médias com adaptações adequadas aos "mais rápidos" e aos "mais lentos".
Normalmente, ordens, exposições, quadro e giz3, trabalhos no quadro, perguntas e respostas, são os
principais métodos de ensino utilizados, juntamente com trabalhos no lugar, prática e ajuda individual
às crianças que "precisam de ajuda". O professor deverá manter-se dentro de certos limites, não
pode ir demasiado depressa para permitir que todas as crianças sejam capazes de prestar atenção,
nem demasiado devagar de modo a que os sumários sejam cumpridos. O tempo é fundamental.
Independentemente das vantagens ou desvantagens das aulas de Matemática em geral, não há
dúvida da sua influência na maneira como encaramos a formação. A planificação de aulas ocupará
muito tempo, e normalmente será pedido ao jovem professor para planificar e executar várias aulas
com os seus colegas. Geralmente são apresentados planos de aulas nos quais elementos padrão têm
que ser preenchidos: motivação, acção, objectivos, actividades de aprendizagem, materiais ou mais
especificamente para Matemática: orientação, classificação, abstracção, interpretação, execução
(Dormolen, 1978).
Também será dada alguma prática de planificação de currículos, ou seja de como sequenciar
um conjunto de aulas cobrindo uma parte do currículo de Matemática. Em certos contextos este
trabalho já foi feito pelo autor do livro de texto; neste caso o formando precisa apenas de aprender a
implementar o ensino pelo livro no tempo disponível de cada aula.
3 “Chalk and talk” no original.
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Dentro da sala de aulas, serão valorizadas a competência de dominar a situação e disciplinar
os alunos assim como a clareza da exposição do formando. A sabedoria convencional ajuda a
classificar as aulas em "boas" e "más" e examinadores farão uma visita para julgar as "lições de
prova"4. As aulas em que falte "impacto" no início serão criticadas assim como as aulas que não
tenham um bom clímax ou um fim explícito.
Esperamos que esta caracterização soe a verdade para qualquer leitor que seja um formador
de professores, e também que isto é uma caracterização e não uma caricatura. Não procuramos
ridicularizar esse modelo, porque foi claramente considerado válido durante muitos anos e em muitos
contextos.
Além disso existe agora um considerável corpo de investigação em ensino que se dedica ao
modelo convencional ("lesson" frame) — por exemplo, a investigação em descoberta/exposição
(bem resumido por Anthony, 1973), em organizadores avançados (Ausubel, 1968), nos tão falados
métodos "piagetianos" (Case,1975), em corporizações5 (por exemplo, Fennema, 1972) e em
sistemas de ensino (por exemplo, Bennett, 1976). Na verdade, a maior parte das investigações
experimentais em métodos de ensino têm sido estruturadas, e consolidadas, a partir do modelo
convencional. Mais recentemente estudos naturalisticos sobre a eficácia do ensino , por exemplo a
investigação em causa-efeito (processo-produto) de Good e Grouws (1977), têm limitado muito a
procura da aula "ideal", o que na nossa opinião está condenado ao mesmo destino que as
investigações anteriores que tentavam identificar o "melhor" método de ensino ou o "melhor" método
de subtracção.
Contudo, vamos defender que nos últimos anos se desenvolveram três correntes que abalaram
os alicerces puseram em dúvida na formação de professores a noção tão limitada da aula de
Matemática.
Em primeiro lugar, não há dúvida que o crescimento geral da investigação nas salas de aula
significa que outras perspectivas de investigação e outros centros de interesse têm sido utilizados, o
que tem sensibilizado a comunidade da educação matemática muito mais amplamente que nunca.
Como exemplos podemos citar o trabalho de etnógrafos e sociólogos sobre as salas de aula, a
investigação na análise das interacções e na linguagem das salas de aula e trabalhos em decisões de
professores, e em percepções e expectativas de alunos e professores. Estamos agora muito mais
conscientes dos aspectos afectivos, tais como o stress dos professores, o medo que os alunos têm
da Matemática, dos efeitos da percepção dos professores no desempenho dos alunos e da
interacção entre os alunos, do poder da posição do professor na sala de aula e das estratégias dos
alunos para lidarem com os seus insucessos.
Em segundo lugar, o sentimento de descontentamento com o que se está a passar nas aulas de
Matemática tem vindo a crescer, alimentado por documentação na forma de relatórios de pesquisa,
creditado por professores, artigos de imprensa e relatórios do governo. Estudos de grande escala
tais como CSMS (1981), APU (1980a, 1980b), NAEP (1979), e o Second International Study 4 Este sistema desde há muitos anos (com a abolição do exame de estado) que deixou de existir em Portugal. 5 “Embodiments” no original.
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on Mathematical Attainment indicaram claramente a limitada qualidade da aprendizagem
Matemática atingida em muitas salas de aula.
Uma criança de 14 anos expressou do seguinte modo a sensação de frustração que isto
produz:
Álgebra: Sempre o mesmo, nunca fazemos coisas diferentes, e então nunca aprendemos nada porque há algumas crianças nas aulas que só fazem distúrbios. Assim, nesse dia não aprendemos nada, limitamo -nos a repetir o mesmo todos os dias, todas as semanas do ano. Não aprendemos nada, e então, no ano seguinte, porque não aprendemos nada, teremos que fazer o mesmo outra vez. (Hoyles, 1975)
Num relatório recente, um inspector na Inglaterra resumiu o problema nestes termos:
O trabalho era predominantemente controlado pelo professor: os professores explicavam, ilustravam, demonstravam e talvez dessem alguns apontamentos com regras e exemplos. Os alunos eram conduzidos dedutivamente através de pequenos passos e perguntas fechadas até ao princípio considerado. Um padrão muito comum, particularmente utilizado com alunos fracos, era mostrar alguns exemplos no quadro no início da aula e depois dar exercícios semelhantes para os alunos fazerem individualmente. Havia poucas perguntas que estimulassem a conjectura ou a iniciativa independente. Na melhor das hipóteses, e no caso de haver alunos suficientemente capazes, este estilo de ensino atingia aquilo para que tinha sido feito. Na pior das hipóteses, tornava-se num simples "dizer como" pelo professor, seguido da incompreensão por parte dos alunos. O que faltava neste método, mesmo no seu melhor, era a sensibilidade para uma pesquisa genuína , ou qualquer estímulo à curiosidade ou apelo à imaginação. Havia pouca noção de que alguém pudesse descobrir uma abordagem a novos problemas sem ter que se dar instruções detalhadas. (H.M.I., 1979, p. 136).
Em terceiro lugar, outra evidência da investigação tornou-nos cada vez mais conscientes das
actividades de aprendizagem dos alunos, particularmente da maneira muito pessoal que os alunos
têm de estruturar o seu significado matemático. É importante o facto de os erros passarem a ser
considerados indicadores do significado que os conceitos matemáticos têm para as crianças em vez
de se considerar os erros como noções incorrectas a serem corrigidas. Booth (1981) debate esta
ideia detalhadamente e mostra muitos exemplos do que chama "métodos da criança". Por exemplo,
foi posto o seguinte problema a uma criança de 12 anos de idade: "Um jardineiro tem 391 narcisos.
Estes devem ser plantados em 23 floreiras. Cada floreira tem que ter o mesmo número de narcisos.
Como é que fazes para saber quantos narcisos serão plantados em cada floreira?". As escolhas
foram do tipo: 391-23, 23-391, etc. Na entrevista, uma criança, "YG", explicou assim:
YG : ... Eu sei o que fazer mas não consigo dizer...
MB (entrevistador): Sim, então faz. Consegues fazê-lo?
YG: Aqueles são os narcisos e estes são as floreiras, espaçosas como vê... oh! para serem plantados em diferentes floreiras, teria que os pôr em grupos...
MB: Sim, quantos terias em cada grupo? O que farias com 23 e 391, se tivesses que descobrir?
YG: Se os tivesse, teria que os contar... digamos que tinha 20 de cada... poria 20 naquela...
MB: Supõe que sobravam alguns depois de teres esgotado as 23 floreiras, que farias?
YG: Plantava-os num vaso (!!) (Brown e Kuchemann, 1976)
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Booth comenta acerca deste exemplo: "Para o experimentador (e para o professor de
matemática) a pergunta realmente é: "aqui está um problema que pode ser exemplificado por um
algoritmo; qual é o algoritmo?" Contudo, para a criança, é um problema específico que trata de
plantar narcisos, e o "truque" do problema está provavelmente em decidir o que fazer com aqueles
que sobram" (p. 37) e ela recomenda: "Assim, deve-se encontrar formas de trabalhar a partir da
própria estratégia da criança, mas de modo a garantir a sua substituição pelas aproximações mais
matemáticas" (p. 39).
Propomos então que, no sentido de fazer justiça a estas ideias, particularmente no que respeita
à tarefa de preparar o jovem professor para o seu trabalho na sala de aula, é necessário alargar o
quadro da formação aula de Matemática". É o que vamos agora fazer.
2.2. A perspectiva da construção social
Para o jovem professor compreender a organização e dinâmica da sala aula é fundamental ter
consciência de que se está a lidar com pessoas. Pode parecer trivial dizer isto mas o facto pode
facilmente ser esquecido quando se discute detalhes de partes de aulas, por exemplo, ou as
capacidades dos alunos, motivação ou qualquer outra construção psicológica ou matemática. É com
certeza verdade, que a sala de aula, sendo parte de uma instituição, institucionaliza os participantes
— o professor experiente já aceitou este facto, e as crianças estão a aprender a tornarem-se
aprendizes/alunos/estudantes. Mas cada turma continua a ser uma combinação única de pessoas —
tem a sua própria identidade, a sua própria atmosfera, os seus próprios êxitos, as suas próprias
satisfações e as suas próprias crises. Como resultado, criou a sua própria história, compartilhada e
recordada pelas pessoas dentro do grupo.
Uma consequência que é significativa para o jovem professor é que cada indivíduo na turma
cria a sua própria interpretação do resto dos participantes, dos seus objectivos, das interacções
entre ele próprio e os outros e de todos os acontecimentos, tarefas, conteúdos matemáticos que
ocorrem na aula. "Objectos" como as capacidades das crianças, o sentido da Matemática, a
sabedoria dos professores, as regras de comportamento, não existem como factos objectivos mas
são o produto individual de cada estrutura pessoal.
O reconhecimento desta estrutura social leva-nos a propor uma orientação mais ampla para a
formação de professores do que o quadro da lição descrita anteriormente. Esta orientação vê o
ensino na aula de matemática como dominar a organização e dinâmica da sala de aula para
partilhar e desenvolver o sentido da matemática.
Esta orientação tem os seguintes aspectos:
(1) relaciona o professor com toda a turma;
(2) dá ênfase à dinâmica e à natureza interactiva do ensino;
(3) assume a natureza interpessoal do ensino, isto é, o professor está a trabalhar com
aprendizes e não meramente a encorajar a aprendizagem;
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(4) reconhece a ideia "comum" de saber e conhecimento, que exprime a importância tanto do
conteúdo como do contexto;
(5) tem em conta os conhecimentos que o aluno já tem, as capacidades e as opiniões, dá mais
ênfase ao desenvolvimento do que a uma aprendizagem teórica;
(6) dá ênfase ao desenvolvimento do sentido matemático como objectivo geral do ensino da
Matemática, incluindo os objectivos cognitivos e afectivos;
(7) reconhece a existência de muitos métodos e organizações de aulas, isto é, por definição
não exclui nenhuma metodologia já estabelecida;
(8) é uma concepção que permite a evolução do professor durante a formação inicial e a
contínua.
Uma questão central a esta corrente de ensino na aula é a ideia de sentido matemático — uma
noção que talvez deva ser clarificada neste ponto. Aquilo a que procuramos dar ênfase é à natureza
pessoal de qualquer novo conceito matemático. Um novo conceito é significativo na medida em que
faça a ligação com os conhecimentos individuais já adquiridos. Pode ter ligação com o conhecimento
individual sobre outros tópicos e conceitos matemáticos mas pode também estar associado ao
conhecimento de outros assuntos fora da matemática. Pode muito bem estar relacionado com o
imaginário, a analogia e a metáfora, mas estas conexões serão de um tipo diferente. O conceito pode
ser um exemplo de outro conceito matemático (porque isto é a natureza da matemática) e pode
gerar exemplos próprios. Finalmente, um argumento muito importante, pode estar relacionado com o
conhecimento individual das situações reais. É no entanto evidente que não há duas pessoas com as
mesmas conexões e ideias, e em particular professor e aluno terão muitas ideias diferentes
associadas à matemática. O professor "conhece" o conceito que está a ensinar no contexto do seu
conhecimento matemático. O aluno contudo é o "fazedor de significado"6 (Postman e Weingartner,
1971) na iniciativa educacional e deve estabelecer as ligações entre o novo conceito e o seu
conhecimento já existente, se o conceito é para ser significativamente aprendido. Como disse Thom
(1973) "O problema real que confronta o ensino de Matemática não é o do rigor, mas o problema
da evolução do significado, da existência dos objectos matemáticos". O objectivo educacional que
nos diz respeito aqui, é o de partilhar e desenvolver o significado o da matemática.
Na base desta orientação, propomos três conceitos chave que vamos usar para estruturar as
nossas ideias e métodos sobre formação de professores para as aulas de matemática. Eles são:
actividade — escolhido para dar ênfase ao envolvimento do aluno mais com trabalho
matemático do que com o conteúdo matemático apresentado pelo professor;
comunicação — escolhido porque é a razão fundamental de todo o ensino, é tanto o
objectivo como o método, e é essencialmente sobre a troca de conhecimentos;
negociação — escolhido para dar ênfase directamente ao processo através do qual,
professor e aluno, procuram atingir os respectivos objectivos.
6 “Meaning making” no original.
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Vamos agora desenvolver estes três conceitos, relacionando-os com conhecimentos anteriores
e recentes investigações. De certo modo esta abordagem representa o nosso ponto de vista sobre a
"essência" da formação de professores para as aulas de Matemática, enquanto que a secção 6 irá
resumir as implicações na prática da formação de professores, de estruturar o assunto desta maneira.
Contudo, antecipando isto, queremos assinalar aqui uma consequência imediata para a
educação matemática. Dar ênfase aos aspectos dinâmicos do ensino da matemática significa
abandonar o caminho seguro. Os conhecimentos que os alunos já têm, bons e maus pressentimentos,
atitudes e experiências irão desempenhar um papel importante no processo de ensino-aprendizagem.
O professor, ao dar a oportunidade de comunicar todos estes elementos, não poderá planificar e
prever com detalhe as aulas de matemática pretendidas. Os formadores de professores de
Matemática, pela parte que lhes toca, não podem ensinar todos os detalhes do conhecimento
didático subjacentes a este ensino, por várias razões, incluindo o facto que isto é indeterminado.
Além disso, dissertar sobre dinâmica sem dinâmica, não iria convencer os jovens professores da
necessidade de dar este difícil passo. Assim, os formadores de professores terão de actuar na sala
de aula como pretendem que os jovens professores actuem. Contudo, constatamos que, em primeiro
lugar, os formadores de professores não ensinam matemática; actualmente ensinam o ensino da
matemática. A sua área de trabalho não é a Matemática mas o ensino (e a aprendizagem) da
Matemática. Os jovens professores, pela parte que lhes toca, não estão essencialmente a aprender
Matemática mas o ensino da Matemática. Todas as espécies de conhecimento existentes, bons e
maus pressentimentos, atitudes e experiências sobre o ensino e a aprendizagem da Matemática
devem estar presentes na sala de aula na formação de professores. No fim de contas, a história dos
grupos na sala de aula, nas instituições de formação de professores, tem as suas raízes na infância
assim como no seu passado mais recente. A necessidade está em actualizar e reflectir sobre
dinâmicas, de modo que os jovens professores tenham oportunidade de partilhar experiências
significativas no seu nível profissional.
ACTIVIDADE
3.1. Construções
Na nossa filosofia de educação Matemática o conceito de actividade tem um papel essencial e
configura a nossa teoria sobre o ensino e a aprendizagem. Observando na sala de aula os processos
de ensino-aprendizagem, individual ou em grupo, a actividade dá-nos critérios para avaliar quer os
processos quer os produtos. Além disso, ajuda-nos a ver mais claramente certas limitações e
constrangimentos. Conforme foi referido no capítulo 1, a avaliação exterior e as normas sociais, e
como foi considerado no capítulo 2, o horário e não só, são aspectos que os professores têm que
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considerar e não nos podemos recusar a estas pressões exteriores à sala de aula. Contudo, é um
dado adquirido para nós, ao considerar a formação do professor do ponto de vista da sala de aula,
que a actividade da aprendizagem é o ponto fulcral, onde o professor desempenha o papel de
criador, iniciador, estimulador, controlador e gestor da referida actividade. Obviamente, a idade dos
alunos, aspecto principal, e a organização da escola, influenciarão os métodos usados pelo professor
na sala de aula, mas como veremos, o interesse dos alunos será estimulado pelas actividades
escolhidas pelo professor, situações e contextos de aprendizagem e pela capacidade do professor
para desenvolver e conduzir as actividades com sucesso. Serão as tarefas e situações que dão
oportunidade aos alunos de se envolverem na criação da sua reflexão, da sua própria Matemática. O
exemplo seguinte acerca da complicada noção de fracção ilustra bem esta ideia (Bidwell, 1982):
A tarefa que se segue foi dada a trezentas crianças dos 10 aos 12 anos de idade, em quatro
escolas primárias na Escócia: "Corta estas barras de chocolate de modo a reparti-las em partes
iguais por 6 crianças"
Foram registados 28 cortes diferentes. Posteriormente estas "construções" imprevistas
poderam ser categorizadas. As três principais categorias são ilustradas pelas seguintes soluções.
Esta solução pareceu ser a mais usual. Muito embora não tenha sido pedida qualquer
interpretação numérica, os alunos descreveram esta solução da seguinte maneira: 16
+16
+16
+16
+16
.
O segundo tipo de solução revela um nível mais avançado de raciocínio com fracções:
6 6 6 6 6
1 2 3 4 5
Uma possível descrição desta solução em linguagem numérica seria: 16
+16
+16
+16
+16
=56
.
Ou 1 −16
=56
, ou 5 ×16
=56
.
Mais interessante era a terceira categoria. As soluções nesta categoria têm sido classificadas
como o método prático de recreio e são muito semelhantes aos métodos usados pelos Egípcios para
resolver problemas semelhantes há 4 mil anos (Chace, 1979).
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12
+13
=56
Outras construções desta categoria podiam ser descritas por: 14
+14
+14
+1
12,
13
+13
+16
, 69
+16
Não é dificil imaginar os referidos cortes.
Uma posição semelhante tem sido defendida por Streefland (1982). Isso mostra-nos que os
alunos, mesmo em contextos matemáticos limitados, são capazes de construir matemática
significativa. Isso suporta a ideia de "fazer Matemática" na qual se refletem não só as actividades
físicas, mas especialmente as capacidades mentais. Aprender Matemática fazendo, significa não só
manipular objectos, mas também pensar acerca dessa manipulação e reflectir acerca do
procedimento e da execução. Nesta perspectiva, ensinar não pode ser apenas apresentar os
conteúdos matemáticos, e particularmente com o conceito de fracção os professores de todo o
mundo conhecem os problemas e as dificuldades ao tentar apresentar este conteúdo em diversos
meios e a diferentes níveis.
Contudo a escolha da actividade como a nossa primeira ideia chave, não significa que
desejamos desvalorizar o papel do professor, mas sim que procuramos adaptá-lo de acordo com as
necessidades gerais para a clarificação do que foi tratado no início. Pretendemos, em especial,
centrar a atenção do formador nas tarefas importantes que os professores devem apresentar,
relacionadas com as actividades através das quais os alunos adquirem conhecimentos matemáticos.
Mas, redefinindo o papel do professor, neste sentido, significa que têm de ser considerados novos
desafios ao profissionalismo do professor. O nosso exemplo da fracção, deliberadamente excluído
no contexto do ensino, esclarece alguns desses papeis quando realmente o inserimos no contexto da
aula. O que deverá fazer o professor com, por exemplo, as diferentes abordagens das crianças? Elas
não só manifestam capacidades diferentes mas também nos mostram que experiências anteriores
(como distribuir justamente os objectos, como construir partes iguais), linguagens aprendidas e
conhecimentos actuais, influenciam também a abordagem. O professor sabendo que várias soluções
podem ser imaginadas pelos seus alunos, cria largos espaços para a actividade. Mas mais do que
isso, é provável que ele queira estimular a discussão sobre as diferentes soluções, depertando os
alunos para diferentes possibilidades, fazendo-os reflectir sobre o seu próprio processo de
aprendizagem e sobre o dos outros a fim de partilhar o conceito de fracção.Talvez o professor
pretenda apenas salientar a interacção social, escutando-se os alunos uns aos outros, tentando
convencer os seus colegas com base nos seus argumentos ou encontrando uma solução comum
baseada em todas as descobertas anteriores.
Nesta aula são mais evidentes os desafios profissionais. São principalmente sobre
comunicação e interacção, quer do professor quer do aluno. Contudo antes de abordarmos esta
questão da comunicação, observaremos, primeiro, possíveis tarefas que estimulem as actividades
dos estudantes7. 7 No capítulo 7 deste livro foram explorados os conhecimentos epistemológicos das tarefas e actividades; neste capítulo focamos a sala de aula.
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3.2. Actividade através da realização de tarefas em contextos
Boris ao simplificar a fracção 12/16 obteve 6/8. O professor perguntou se tinha obtido o menor denominador possível. Propôs-lhe que deveria pensar nisso. Muitos alunos, colocando os dedos e os braços no ar mostravam-se ansiosos por corrigir a solução obtida. Boris estava com um ar infeliz e provavelmente bloqueado intelectualmente. O professor, serena e pacientemente, ignorou os sinais dos outros alunos e centrou-se em Boris. Perguntou-lhe: Não encontras um número maior que dois pelo qual possas dividir ambos os termos da fracção por ele? Após um ou dois minutos continuou a questionar Boris, mas este não respondeu nada. Voltou-se então para a classe e perguntou: Quem pode dizer ao Boris qual é o número pretendido? Praticamente todos os alunos queriam responder. O professor chamou Gretchen. Gretchen disse que quatro era o número pelo qual se podia dividir o numerador e o denominador. (Biermann, 1980)
Nesta tarefa (simplificação da fracção 12/16) toda a classe estava envolvida. Ao questionar
Boris, pelo menos para este, a situação mudou totalmente. A situação inicial, na qual ele era um dos
vários alunos, transformou-se numa situação ameaçadora. Como consequência disso, ele tornou-se
completamente passivo. A impaciência dos seus colegas em responder correctamente conduziu ao
seu isolamento e impedia-o de continuar a raciocionar.
A experiência frustante de Boris mostra-nos como uma turma inteira pode criar situações nas
quais os alunos deixam de participar individualmente. Os professores devem estar cientes disto e
podem tentar criar um ambiente descontraído que permita aos alunos exteriorizarem os seus
raciocínios, mesmo quando estes estão errados ou incorrectos.
No exemplo seguinte foi criado um tal ambiente: 3º ano de escolaridade, os alunos entram na
sala. No quadro estava desenhada uma grande mão. O professor inicia a seguinte história.
Era uma vez um gigante chamado Bert. Ele sentia-se muito só, porque já não existiam outros gigantes na terra. Ele não tinha ninguém com quem conversar. Um dia Bert questionou-se: ser-lhe-ia possível dialogar com seres humanos? Tristemente ele curvou a cabeça. Não, isso seria certamente impossível. As pessoas receariam morrer. Ele era tão grande e feio. Mas mesmo assim ele não conseguia deixar de pensar nisto, e tentou relacionar-se com as pessoas. Ele desejava ardentemente que os seres humanos não tivessem receio... Olha, aqui pode-se ver o que Bert mostrou às pessoas... (o professor indica o desenho no quadro).
P: Como é que sabe que esta é a mão de um gigante?
S: Certamente é. Eu nunca vi uma mão tão grande.
P: Pensa que o gigante é maior do que eu? (Ela fez esta pergunta para também dar oportunidade aos alunos mais fracos).
S: A mão de um gigante é muito maior do que a tua. Por isso o gigante é maior do que tu (o professor acentuou esta declaração pondo a sua mão no desenho).
P: Qual é o tamanho do gigante?
Várias crianças aderiram à discussão dando a sua opinião: "Do tamanho da sala de aula"..."do tamanho de uma árvore". (Mas a professora não fez estas perguntas).
P: Olhem para a minha mão e para a mão do gigante. Comparem ambas. (Ela colocou a sua mão ao lado da mão grande na mesma linha).
Contudo, as tarefas matemáticas para alunos do 3º ano de escolaridade, obviamente se
referiam a razão e proporção, mas o assunto da tarefa não era Matemática. Com certeza que esta
actividade com o gigante foi escolhida por razões de motivação, e os alunos, provavelmente,
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pretendem explorar a situação, comentar as questões postas pelo professor. Ao discutir estas
questões têm a oportunidade de compartilhar conhecimentos matemáticos.
No exemplo seguinte, a situação da totalidade da turma reveste-se de diferentes aspectos. Os
alunos já estão inseridos no contexto matemático, trabalhando individualmente em tarefas práticas:
O professor escreve no quadro cerca de dez equações e diz aos alunos que comecem a resolvê-las. Permite-lhes usar notas da aula anterior. As equações são simples, como por exemplo 3x = 12, 6x = 48, etc. O professor circula pela sala, dando apoios individuais aos alunos ou referindo-se aos seus apontamentos da aula anterior. Quando toca a campainha, o professor diz-lhes para copiarem o resto das equações e continuarem o trabalho em casa. (Roberts, 1971, p. 227).
Nos dois exemplos foi o professor quem iniciou a actividade, mas analisando o processo de
ensino-aprendizagem como consequência destas actividades, observamos a enorme diferença entre
os dois exemplos. Ela pode ser descrita em termos de interacção, estreitamente relacionadas com as
tarefas, de situação e de formulação.
Outro tipo de interacção ocorrerá num pequeno grupo de trabalho. Neste cenário sem realçar
a possibilidade do trabalho em pequenos grupos — voltaremos a este ponto mais tarde —
mostraremos o que queremos dizer:
"Um pequeno grupo de alunos do 6º ano de escolaridade está a discutir no corredor. Um deles tem um cronómetro e outro desenrola uma fita métrica. A tarefa de investigação era qual a velocidade de um pião? " Andamos dez metros e medimos o tempo" era a sugestão. Começaram a fazer. "Mas tu estás a andar muito depressa!" "É como o meu pai anda sempre!" "Ele é um pião muito estupido"...Os alunos continuaram a ensaiar e mediram o tempo de um velho, um desportista, uma criança... O que fazer com estes números todos? O aluno encarregado de registar os dados parecia estar atrapalhado. Outro aluno aparentemente parecia saber como determinar a média: "Basta somá-los todos e dividir por cinco!" Ninguém levantou questões, e todos esperaram enquanto se faziam os cálculos: 7.27 segundos. O que fazer agora? "Vamos perguntar ao professor para ele nos dizer se a resposta está correcta!". Mas nem todos os alunos estavam de acordo. "Não podemos dizer que a velocidade de um pião é 7.27 segundos. Por acaso dizem " O nosso carro vai a tantos segundos?" "É Kilómetros por hora". "E nós calculamos 7.27 segundos por dez metros, temos que fazer mais cálculos!"... (Goffree, 1983)
Deixámos o grupo a trabalhar, pois ainda existem vários problemas para resolver. Analisando
o trabalho deste pequeno grupo, vemos perfeitamente diferentes actividades. A tarefa proposta
parece ser perfeitamente clara, no sentido em que os alunos conseguiram começar a fazer alguma
coisa. Eles conseguiram imaginar todos os tipos de piões, mas tiveram dificuldade com o conceito de
média. Obviamente, alguns alunos não sentiram necessidade de compreender o significado do
algoritmo, apenas se satisfizeram com a experiência de um aluno. Na ausência do professor eles não
aprofundaram, não houve reflexão sobre o significado matemático do resultado, 7.27 segundos,
fizeram os cálculos sem prestar atenção à questão central que tinha sido posta. Felizmente um aluno
pôde descrever uma experiência anterior que servia para o que os alunos estavam a viver.
Obviamente, os processos de aprendizagem semelhantes a este não são tão consistentes como
os referidos anteriormente. Posteriormente, o professor deve gastar algum tempo a ajudar os alunos
a reflectir nas actividades anteriores. O pequeno grupo de trabalho com estas características
necessita de reflexão, para se poder ter a certeza que as crianças aprenderam fazendo.
— 14 —
Uma situação totalmente diferente acontece quando o professor comunica com uma criança
individualmente. Também neste caso existem várias possibilidades diferentes, das quais o diagnóstico
e as entrevistas remediadoras têm sido frequentemente referidas. No capítulo 6 foi discutida uma
aproximação particular (tarefa apoiada em entrevista). O exemplo que se segue mostra-nos a
discussão entre o professor e alguns alunos. O objectivo era envolver os alunos em raciocínios
matemáticos. A tarefa era:
Nesta questão o número 1 foi escrito ... vezes. Primeiro todos os alunos querem escrever “1”. Eu (professor) pedi para lerem o resultado alto. Francis parece decidido a fazê-lo, mas depois diz:
F: Se se escrever o numeral 2, então não é duas vezes, mas agora é duas vezes.
I: Sim, neste caso temos duas vezes um.
Ellen: Se tu puzeres dois não há dois deles.
I: Poderás pôr 2?
Ellen: ...Não...um.
I: Está certo com um?
Ilona: Julgo que também não está certo.
F: Porque agora existem dois outra vez.
I: Sim
Ilona: Se escreveres 2 então é uma vez.
Após alguns comentários semelhantes, os alunos decidem escrever para além da questão:
“Se escreveres 1 significa duas vezes e se escreveres 2 significa uma vez”
Então eu volto a questionar simulando lentidão de compreensão.
I: Eu tenho que saber o que é,o um ou o dois.
Ellen: O um.
Ernestine: o dois.
Illona: Não sei.
E a discussão recomeça... (Goddijn, 1982)
Apesar do professor estar a trabalhar com um pequeno grupo de alunos, a sua abordagem é
semelhante a trabalhar individualmente. Na verdade, os alunos são desafiados a comentar
directamente a tarefa confusa e as propostas dos seus colegas. O professor não está a tentar
descobrir algo acerca do conhecimento ou deficiências, nem tão pouco ajudando os alunos. O que
ele fez foi apoiá-los enquanto pensavam, enfatisando o conflito, tentando manter o processo de
aprendizagem em movimento. Quando os alunos pensavam ter acabado a actividade, porque
escreveram a resposta no papel, ele tornava-os activos novamente duvidando da solução dada.
O facto de os alunos não defenderem a resposta dada, mostra que o seu processo de
aprendizagem ainda não está concluído. Neste momento uma vantagem deste modo de trabalhar
(discussão individual em pequeno grupo) fica clara. Quando a discussão aluno/professor acaba, os
alunos geralmente inferem que o problema foi resolvido, ou pelo menos o professor é responsável
pelo último toque.
— 15 —
Analisando a actividade dos alunos no exemplo anterior, na perspectiva do aluno, pode-se
observar muitas possibilidades relacionadas com as tarefas atribuídas. Comparando todos os
exemplos dados, torna-se claro que o método e o nível da actividade depende muitíssimo do
contexto na qual a tarefa se enquadra. Este contexto tem vários aspectos. No caso de Boris era o
clima pedagógico na sala de aula, no caso do gigante era tão emocional quanto matemático.
Os alunos têm de confrontar-se com todos os contextos. O contexto da escola/aprendizagem
é o predominante. Frequentemente, os alunos só sentem que estão a aprender quando executam
tarefas práticas, nas quais a intenção de aprender é muito clara (ver capítulo 7). As tarefas no
contexto da avaliação conduzem a actividades diferentes, por exemplo, das tarefas em contexto de
livre exploração, as quais diferem, outra vez, das tarefas produzidas numa atmosfera de competição.
Estamos aqui a pensar em quaisquer actividades dos livros, fichas de trabalho, investigação, trabalho
prático, tarefas para fazer no lugar, exercícios práticos, problemas tanto conduzidos pelo professor
como individuais, jogos e competições, mini-testes, discussões, debates matemáticos, tirar notas e
reflexões.
Ainda na perspectiva do aluno, não é dificil distinguir entre tarefas físicas e mentais, entre
tarefas imediatas e aquelas que têm de ser consideradas como parte de um longo processo, tarefas
incluídas num contexto matemático e tarefas formuladas num contexto "não matemático", tarefas
escritas e tarefas orais, tarefas de exploração e tarefas para praticar, tarefas heurísticas e tarefas
algorítmicas, tarefas individuais e partilhadas, etc.
A variedade de tarefas e actividades, para possível uso do professor de matemática, é desta
maneira extremamente lata, o que torna surpreendente que a aula de Matemática típica seja um local
tão rotineiro e ritualista como é frequentemente descrito. Segundo o que afirmámos anteriormente,
contudo essa semelhança era devida em grande parte à estrutura da lição, no que dirige muito do
pensamento do professor de matemática e que a alteração para a ideia de "actividade" poderá fazer
muito para quebrar esta monotonia.
Então, uma área importante da competência necessita de ser desenvolvida na área da selecção
de formandos, ou talvez na criação e iniciação de tarefas, contextos e actividades. Qualquer
professor tem de aprender a lidar com os vários constrangimentos, que reduzem as possibilidades
dentro da sala de aula, tais como o tempo, o espaço, o livro de texto, o programa, mas dentro
destes constrangimentos, o aspecto mais importante para o professor é conhecer bem os alunos,
para que seja capaz de imaginar e avaliar os potenciais valores de qualquer tarefa para eles. A
principal fonte de dificuldades para o formando é a que ele não pode conhecer os alunos do mesmo
modo que o professor regular, nem pode ser parte das experiências do grupo constituído pela turma
do mesmo modo que o pode ser o professor da turma. Contudo, no processo de desmistificação do
desempenho do professor-perito, o formador de professores deve desenvolver formas que permitam
ao jovem professor compartilhar esse tipo de conhecimentos e essa experiência, para que a selecção
de tarefas não se torne num mero exercício teórico e abstracto. Obviamente grande parte dessas
treino na selecção das tarefas necessita de ser feita num contexto real de sala de aula com alunos
reais, com constrangimentos também reais e sucessos e insucessos reais. Só através do
— 16 —
conhecimento prático dessa realidade é que o jovem professor pode começar a compreender a
complexidade e a subtileza da tarefa e selecção do contexto.
Agora, vamos para outro aspecto das tarefas e actividades na sala de aula, o de gerir e
organizar as actividades para que os alunos possam retirar o máximo proveito delas. Nós
consideramos sucessivamente as actividades de pequenos grupos e actividades individuais, porque
nelas as diferenças são as mais significativas da perspectiva da gestão.
3.3. Gestão de actividades colectivas da turma
Consideramos, em primeiro lugar, como os professores dirigem toda a turma, porque é uma
realidade da vida da sala de aula que sempre que o professor constitui pequenos grupos ou
actividades individuais, a direcção destas é adicional à gestão de toda a sala de aula.
Felizmente, há uma vasta literatura de investigação, que podemos usar aqui para as nossas
ideias em formação de professores e muitas revisões da literatura estão cheias de conselhos ao
professor. Por exemplo Brophy (1982) afirma:
Os gestores eficientes da sala de aula distinguem-se pelo seu sucesso em prever problemas em vez da capacidade especial de gerir os problemas quando eles ocorrem. É também claro que o seu sucesso não é obtido através de técnicas isoladas ou 'gimnicks', mas em vez disso é o resultado de uma aproximação sistemática da gestão da sala de aula que começa com uma preparação e planificação antes do início do ano escolar, e implementado inicialmente através de uma comunicação sistemática de expectativas e o estabelecimento de procedimentos e rotinas no início do ano, que é mantido durante o ano, não só pela consistência em seguir as expectativas, mas apresentando aos alunos uma corrente contínua de actividades bem escolhidas e preparadas que prendam a atenção deles nas aulas em grupo e prenda a sua concentração e esforço no tempo de trabalho independente (p. 16).
O trabalho de Kounin (1970) estimulou muito as pesquisas da direcção da sala de aula e as
suas ideias ainda sustentam repetições. Uma qualidade através da qual é possível distinguir os
gestores mais efectivos da sala de aula dos menos efectivos é a "withitness" — a qualidade de
conhecimento do que está a acontecer na sala de aula, para que os alunos também saibam que o
professor sabe como correm as coisas. Outra qualidade chave é a sobreposição, pela qual o
professor está apto a dar atenção a mais do que um fenómeno de imediato. Isto relata claramente o
que dissemos acima — mesmo se o professor está a trabalhar cuidadosamente como um indivíduo,
tem ainda a necessidade de gerir toda a classe e, se necessário, dar atenção aos assuntos
administrativos, disciplinares ou pedagógicos de toda a classe. Um terceiro aspecto é a capacidade
efectiva do professor para, em qualquer momento, conhecer como vai a actividade da classe.
Através de um contacto com o olhar, de uma boa técnica de perguntar, evitando longas pausas,
ignorando acontecimentos eventualmente propiciadores de distracção e evitando desvios laterais
desnecessários, as actividades podem avançar a bom ritmo.
Um trabalho posterior de Emmer, Eerston e Anderson (1980) não só reforçou estas
descobertas mas também estabeleceu a ideia de que a implementação dos procedimentos e "regras"
bem sucedida em toda a classe é mais uma questão ligada ao ensino do que de "controlo". Isto é, os
— 17 —
procedimentos na sala de aula foram planeados e especificamente ensinados às crianças da mesma
maneira que lhes foram ensinados os tópicos académicos. Contudo, não seria de esperar que alguém
necessitaria de continuar com isto — Se as actividades “procedimentais” são planeadas e ensinadas
mais cedo, então só seria necessário usar chamadas de atenção mais tarde e com pouca frequência.
O foco passaria a ser nas actividades académicas. A mensagem desta pesquisa é que, através do
ensino de procedimentos, como lhe chamámos, as crianças estão instruídas a tornar-se mais
independentes e aprendizes com consciência de grupo. Elas estão a ser treinadas para serem
capazes de aprender eficazmente no ambinte da sala de aula. Evidentemente, existem aqui lições
importantes para o jovem professor e através de técnicas de microensino e jogos de papeis, é
possível desenvolver a capacidade necessária para a gestão bem sucedida de toda a turma (ver
Allen e Ryan, 1969 e Brown, 1975).
Prestando atenção à direcção das actividades matemáticas com toda a classe, pode-se ver a
progressão da menor para a maior complexidade, dependendo do tipo de actividades. (Esta
progressão, também, pode ter consequências importantes tanto para o ensino como para o treino
específico de futuros professores de Matemática). No ponto menos complexo da escala está o
papel de supervisor do professor quando dirige actividades como testes, quando as normas de
trabalho individual, sem conversação e sem fraude são para ser seguidas. Tirar apontamentos é outra
actividade relativamente "formal", onde as notas são também ditadas pelo professor, copiadas do
quadro ou feitas individualmente pelos alunos. Normalmente tais actividades serão também
preliminarmente para/ou uma reflexão sobre, ou um resumo de outras actividades mais envolventes,
mas podem ocupar um papel mais central em certas sala de aula autoritárias e fortemente
controladas.
Com o uso de actividades como o trabalho no lugar e exercícios chegam as tarefas adicionais
de ajuda, de animação e de explicação do professor. É onde a sobreposição de Kounin pode
começar a ser vista de como o professor procura combinar os papeis de consultor e supervisor. É
quando a actividade toma a forma de discussão de toda a turma, ao falar de um problema posto
pelo professor e exposto no quadro, que as tarefas deste se tornam mais complexas. Não só temos
que supervisionar e ajudar, como também o professor precisa de sentir que todos os alunos estão
envolvidos e compreendem os vários tipos de comunicação envolvida.
A discussão efectiva, entre um grupo de qualquer tamanho, requer um comportamento
disciplinar dos participantes para que, por exemplo, eles não falem todos ao mesmo tempo, mas a
discussão na aula envolvendo 20 ou 30 crianças requer uma grande capacidade do professor para
que não degenere numa confusão ou num monólogo do professor.
O essencial é a natureza pública e partilhada da actividade e o professor deve constantemente
gerir a aula para observar possíveis sinais de não compreensão e não envolvimento. A disposição
dos lugares é também importante, visto que a melhor disposição para um teste (lugares separados
em fila) não é a melhor para uma discussão em classe. Sem professor ou líder a disposição mais
apropriada para a discussão seria o círculo, mas numa discussão orientada pelo professor fica
melhor em ferradura, onde o professor e o quadro podem ser vistos por todos e onde o professor
— 18 —
pode ver todos os alunos facilmente. O quadro serve como espaço público em discussões como
estas e em aulas de resolução de problemas onde os alunos precisam tanto de ter acesso ao quadro
como o professor.
Outra parte da tarefa do professor é ser sensível à atenção que acompanha estas discussões
"públicas". Muitas crianças sentir-se-ão inibidas pelo tamanho do grupo e hesitarão em dar qualquer
contributo. Igualmente a avaliação de uma ideia entre 20 possíveis pode ser assustador para muitas
crianças, particularmente nas aulas de matemática onde critérios de certo/errado parecem ser
relativamente fáceis de aplicar. Já falamos deste aspecto em termos de um contexto e aprendizagem.
Por esta razão a gestão com sensibilidade de contribuições, tentativas, especulativas ou incorrectas
dos alunos é uma aptidão necessária, mas súbtil a desenvolver no professor, se se quiser que as
discussões de toda a turma sejam efectivas e genuínas. Igualmente, haverá algumas crianças que
gostam de representar perante a "audiência" e o seu nível de contribuição necessita também de ser
cuidadosamente controlado. De todas estas actividades esta é, provavelmente, a mais complexa do
ponto de vista do professor e não deverá ser levada a cabo por um jovem professor sem uma
grande preparação e exercícios preliminares. Contudo, o episódio de Easley and Easley (1982)
mostrado no início do capítulo e o do gigante em 3.2, dão-nos algumas indicações sobre o que pode
ser conseguido por um professor perito com uma discussão com toda a turma.
3.4. Orientando actividades em pequenos grupos
Na secção anterior os padrões de comunicação, em que o professor dominava, constituiram a
norma. Com o desenvolvimento de actividades em pequenos grupos, outros padrões entram em
jogo. Assim, apesar de o professor ainda dever continuar a ter o papel de supervisor e de,
ocasionalmente, poder juntar novamente todo o grupo, grande parte da aprendizagem terá lugar sem
a sua orientação directa e, consequentemente, estará sobre a influência predominante dos colegas de
grupo. Este tipo de actividade não surge com frequência entre os professores de Matemática, ou
pelo menos eles não aparentam usá-la, deliberadamente, com frequência. Contudo, na maioria das
salas de aula, exercícios no lugar e outras actividades supostamente individuais serão muitas vezes
levadas a cabo pelas crianças, cooperativamente. Permitindo a opção, o que aparentemente muitos
professores fazem, os alunos tenderão a escolher um modo de trabalho cooperativo em detrimento
de um modo totalmente independente. Possivelmente, os professores de matemática deveriam
considerar mais deliberadamente o uso e a exploração de actividades em pequenos grupos, O
episódio de Easley e Easley (1982) mostra a promoção intencional trabalho em grupo ou ´han` e que
as possibilidades para o trabalho de grupo são muitas e variadas.
Num relato de uma "experiência única e recompensadora que eles partilharam em fazer
pesquisa matemática original", Borenson (1981) refere-se a Torrance (1963) que fornece uma lista
de indicadores de trabalho de grupo criativo:
— 19 —
Os que se seguem foram considerados sinais de interacções positivas e produtivas: cooperar, auxiliar,trabalhar em conjunto, organizar, envolvimento na tarefa, elogiarem-se mutuamente, respeitar as ideias dos outros, ouvir, considerar as ideias dos outros, tentar as ideias dos outros, consultarem-se, agradável, interessado, inquiridor, curioso.
Quais são, então, para o professor, as implicações das vantagens e desvantagens das
actividades de grupo? Considerando as vantagens, é como se os alunos individualmente fossem
estimulados por outros trabalhando na mesma tarefa - existe um factor ´contagioso` quanto ao
comportamento e, além disso, muitas vezes, um factor competitivo. Também com problemas
complexos é benéfico haver mais do que uma pessoa a gerar possilidades, hipóteses ou construções
alternativas. Freudenthal (1978) argumenta fortemente a favor do "trabalho de grupo heterogéneo" o
qual "abrange alunos de diferentes níveis colaborando numa tarefa, cada um ao seu nível (p. 61). A
noção de ´nível`, fundamental para o seu caso, é ilustrada pela ideia de "matemática praticada num
nível inferior torna-se matemática observada num nível superior". O poder dos grupos
heterogéneos, argumenta Freudenthal, é que "é mais fácil observar processos de aprendizagem com
outros do que consigo próprio" e "entende-se como o outro aprende, imagina como o geriria,
objectifica este nível mais baixo de actividade de forma a repeti-la conscientemente mesmo se
entretanto já a mecanizou ou algoritmizou" (p. 61). Em geral, a discussão num grupo ajuda a articular
estratégias para a solução e a expor erros de compreensão. Contrastar as suas ideias com as dos
colegas é, sem dúvida, uma parte crítica do desenvolvimento intelectual. Eis um excerto duma
discussão entre três rapazes sobre o problema " o que é nada?" (i.e., um zero):
Robin 76. Mas é dez porque podes chamar-lhe dez
Nicky 77. Sim
David 78. É simplesmente um número/tal como o meu nome David
Nicky 79. É?
David 80. Tal como o meu nome é David o número é chamado dez/tens que ter um nome
Christopher 81. Sim porque o teu nome não pode ser chamado dez
Nicky 82. O meu nome é Nicky/suponho que é o mesmo
Christopher 83. O teu nome podia ser dez (risos)
Nicky 84. Ou onze ou doze
Estas vantagens podem ser interpretadas como razões pelas quais as crianças preferem
trabalhar cooperativamente do que independentemente. É claro também que muitas actividades
matemáticas poderiam ser levadas a cabo em pequenos grupos, particularmente as de resolução de
problemas ou que exigem investigações. Não é por acidente que estas envolvem actividades de nível
mental mais elevado, apesar de este não constituir um pré-requisito para a actividade cooperativa. A
prática de competências básicas, por exemplo, podem florescer, frequentemente, na atmosfera
´competitiva` de um grupo, enquanto actividades matemáticas ´práticas` tais como levantamentos e
— 20 —
medições, jogos matemáticos ou recolher dados estatísticos exigem competências de natureza mais
colaborativa e social.
Um conjunto de tarefas do professor, relaciona-se, então, com a maximização dos benefícios
de actividades de grupo — ajudar e encorajar a colaboração e cooperação, estimular a comparação
e a oposição de ideias e arbitrando as ´competições`.
Um outro conjunto de tarefas diz respeito à minimização das desvantagens do trabalho de
grupo. É muito provável que surjam problemas se um membro do grupo tenta dominar os outros —
a liderança é correcta, e talvez até deva ser encorajada, mas, para que todos os membros do grupo
tirem o máximo benefício da actividade em grupo, é necessário desencorajar o domínio contínuo por
uma só pessoa. Isto pode ser feito pelo professor quer formalmente, por usar o princípio do ´líder
rotativo`, quer através de estratégias mais informais e pessoais, tais como colocar todos esses líderes
dominantes num único grupo ou por consciencializar o ´líder` do seu comportamento e encorajá-lo a
modificá-lo.
O aspecto matemático da actividade acrescenta a isto uma outra dimensão. A vantagem, para
a criança mais lenta, de aprender do colega mais lesto pode não corresponder a uma vantagem
semelhante para este último. De facto, o aluno mais lento pode não beneficiar, também, se o aluno
mais lesto domina e aumenta os sentimentos de incompetência matemática nos outros. Pode então
simplesmente desistir de contribuir e limitar-se a copiar. O professor precisa, sem dúvida, ser
sensível a estas possibilidades e tomar uma acção preventiva e ´curativa`.
Ao orientar o trabalho em pequenos grupos, o professor precisa, portanto, mudar da
monitorização da criança individualmente no contexto da turma, tal como na secção anterior, para a
monitorização do indivíduo em relação com o grupo. Além disso, tal como existe a necessidade de
ensinar à turma as competências e ´regras` da actividade do grupo-turma, igualmente é necessário
que o professor ensine competências de aprendizagem em pequeno grupo. Variações no tipo de
actividade de grupo parecem, assim, importantes, bem como alterações na constituição dos grupos.
O conhecimento da criança individualmente irá provavelmente influenciar a composição dos grupos;
por exemplo, a proximidade de níveis de desempenho pode ser um critério para a composição do
grupo no caso de uma actividade de prática de competências ´competitivas` enquanto que outras
qualidades podem determinar a composição do grupo para actividades envolvendo instrumentos ou
jogos.
Finalmente, o professor precisa ajuizar quando os benefícios da actividade de grupo são
sobrepujados pela necessidade de mudar para uma actividade com a turma toda (talvez de forma a
exercer um controlo mais apertado da turma) ou para encorajar mais actividade individual (talvez
porque os grupos tenham atingido a fase de escrever as soluções ou dar conta do seu trabalho
prático). Transições suaves entre actividades parecem ser a marca do contraste dos professores
mais eficientes.
3.5. Orientando actividades individuais
— 21 —
Os valores específicos da actividade individual na sala de aula são associados primeiramente
com a natureza independente deste trabalho e secundariamente com o tipo ´personalizado` de ensino
que o professor desenvolve. Enquanto as actividades de grupo enfatizam e promovem a
interdependência, a actividade individual requere trabalho independente. Através do uso de muitos
tipos de trabalho no lugar como exercícios, exemplos, problemas, investigações e relatórios práticos,
o indivíduo é encorajado a desenvolver hábitos independentes e auto-confiantes de pensar e de
comportamento, exigidos, em parte, pela natureza individual da maioria dos exames em matemática.
A tarefa do professor precisa, portanto, ser vista a essa luz. É relativamente fácil, mas não tão
válido que o professor diga, por exemplo, à criança o que ela fez de errado e o que deve fazer para
corrigir o erro. É muito mais difícil mas também muito mais importante, ser capaz de ajudar o aluno a
localizar a origem do erro e a utilizar procedimentos auto-correctivos. O professor pode conhecer os
critérios pelos quais pode avaliar se a resposta, ou a estratégia para a solução é certa ou errada, mas
o papel do professor é, em última instância, ensinar esses critérios ao aluno. Similarmente as tarefas
de comunicação que serão descritas na secção seguinte, e as quais são relevantes aqui, tais como a
interpretação, translação, atribuir significado e conexões, devem ser realizadas de uma forma que
possibilitem ao aluno aprender como as pode desenvolver por si próprio.
Do ponto de vista afectivo, o professor precisa encorajar o envolvimento do aluno com as
tarefas, por recompensar o comportamento focalizado na tarefa, dando feed-back e elogios a
propósito do desempenho, e por tornar, em geral, o aluno consciente do seu desenvolvimento e do
crescimento independente. O professor deve igualmente ser explícito quanto a se a tarefa é para ser
feita individualmente ou em grupos informais, porque como vimos estes dois tipos de actividades têm
objectivos diferentes e exigem do professor atitudes diversas.
Isto pode ser facilmente observado se considerarmos a natureza pessoal do ensino que a
actividade individual possibilita. Aqui a palavra ´pessoal` reflecte o facto de que o professor pode
individualizar a sua ajuda ou explanação de uma forma que é impossível na actividade de grupo.
Além disso, algo que os professores em início de carreira têm dificuldade em perceber é que é
possível num momento surgir como rígido, exigente e controlador com toda a classe, e, no momento
seguinte, ser afável e paciente com um aluno individualmente que precisa de ajuda — as crianças não
veêm qualquer inconsistência nestes dois tipos de comportamentos porque sabem, mesmo que o
jovem professor o tenha esquecido, que eles se ligam a dois conjuntos de circunstâncias muito
diferentes, e a dois conjuntos de objectivos bem diversos.
Portanto, o papel do professor consiste, essencialmente, em conhecer o aluno e ser capaz de
explorar esse conhecimento maximamente. De particular importância é o conhecimento sobre as
diferenças de experiências de vida, quando se está a tentar atribuir, a cada aluno, significado para as
ideias matemáticas, ou sugestões sobre as suas aplicações ou a sua relevância. Um passatempo, ou
interesse, ou um trabalho fora da escola que se conheça, pode oferecer um contexto mais
significativo para uma ideia matemática do que algumas experiências escolares.
Em resumo, as actividades individuais permitem ao professor desempenhar, com o aluno, um
papel tutorial, mas 20-30 alunos numa sala de aula forçam-no a adoptar outros papéis também.
— 22 —
Contudo, o modo de grupo é um contexto de aprendizagem tão importante como o modo de
actividade individual — simplesmente, outros objectivos de natureza participada e social são nutridos
por esses meios. Deste modo, parte do papel do professor consiste em combinar as diferentes
actividades de um modo que os objectivos mutuamente incompatíveis, interdependência e
independência, possam ser atingidos, na extensão possível, naquele contexto cultural e educacional
particular.
4. COMUNICAÇÃO
O que significa partilhar significado através da comunicação? Como afirmámos anteriormente,
os alunos criam os seus próprios significados graças ao, e às vezes apesar do, ensino da matemática.
Eles entendem a matemática de uma forma muito pessoal — não somente os conteúdos
matemáticos específicos, mas também a matemática como uma disciplina. No entanto, esta
compreensão é frequentemente mantida escondida do professor, a menos que o professor faça uma
tentativa específica para a descobrir. Este é particularmente o caso quando falar sobre matemática
não ocorre na aula, e argumentaremos que apenas através do encorajamento do professor para a
comunicação entre todos os participantes da aula é possível uma genuína partilha de significados
matemáticos.
No exemplo seguinte o significado do aluno é descoberto por um professor sensível
permitindo uma comunicação fácil entre ele próprio e os alunos. Note-se também que neste
intercâmbio as questões colocadas pelo professor, uma vez que ele quer, verdadeiramente, saber.
Frequentemente, as questões que os professores colocam são artificiais, no sentido em que eles já
sabem antecipadamente a resposta! A1. 15 é ímpar e 1/2 é par.
P. 15 é ímpar e 1/2 é par? É mesmo?
A1. Sim.
P. Por que é 1/2 par?
A1. Porque erm, 1/4 é ímpar e 1/2 tem que ser par.
P. Por que é 1/4 ímpar?
A1. Porque é só 3.
P. O que é só 3?
A1. Um 1/4.
P. Um 1/4 é só 3?
A1. Foi o que eu fiz na minha divisão.
Neste momento outra criança junta-se para explicar ao professor:
A2. Sim, há três partes num quarto como num relógio. Vai 5, 10, 15.
P. Oh, estou a ver.
— 23 —
A2. Há só três nele.
P. Ah, então tens três partes com 5 minutos o que faz um quarto de hora.
A1. Sim. Não. Sim, sim, sim. (Harvey et al., 1982, p.28)
Teria sido mais fácil ter interrompido o aluno depois da primeira linha e “corrigido” a
afirmação de que “1/2 é ímpar” por dizer que a distinção par/ímpar só se aplica a números inteiros.
Por ter perguntado e estar preparado para ouvir, o professor é ajudado a partilhar do significado
dos alunos. Mas existe mais neste exemplo. Tendo perguntado “Por que é 1/2 par?”, o professor
poderia ter esperado uma resposta ligada com 1/2, 1/4, 1/6, 1/8, ... serem pares, isto é, fracções
cujo denominador é par. Porém esta era a hipótese errada como foi mostrado pela resposta da
criança “Porque 1/4 é ímpar”. Então mais uma vez o professor procurou obter o significado e
finalmente a sua paciência foi recompensada. Além disso, se o professor (um perito matemático
quando comparado com o aluno) tem que fazer um esforço árduo e paciente para entender o aluno,
considere o quanto tem o aluno que se esforçar para entender o professor — uma lição salutar para
os futuros professores!
Somente quando a comunicação ocorre entre intervenientes que desejam ouvir e identificar-se
com o(s) outro(s), podem estes significados ocultos serem tornados explícitos. A comunicação
entendida desta forma tem muitas facetas — brainstorming uma ideia, participar numa discussão,
desempenhar papeis na resolução de problemas, explicar a um colega, defender o seu argumento,
convencer outros de uma afirmação, rejeitar proposições falsas, entrevistar um especialista, colocar
questões, apresentar relatórios, distribuir tarefas, etc.
Assim, para além de tudo mais que o ensinar envolve, deve, claramente, incluir a comunicação,
porque sem ela não pode haver aprendizagem alguma e sem aprendizagem não há ensino.
No entanto, é necessário que os formadores de professores desmistifiquem o processo de
comunicação por focalizar a atenção do jovem professor nas tarefas que têm que ser desenvolvidas
pelo professor na sala de aula. Para que isto aconteça sentimos que é de grande valor considerar
dois tipos diferentes de comunicação que têm significância especial nas aulas de matemática: explicar
e interpretar, as quais desenvolveremos em seguida.
4.1. Explicar
Para a maioria dos futuros professores ela poderá surgir como sendo a chave da tarefa de
ensinar. Como um especialista de matemática, eles dizem, que têm conhecimento “perito” do
conteúdo, o mais importante a aprender é como ser capaz de explicar o conteúdo, de forma clara,
ao aluno.
Mas, o que significa explicar? É, obviamente, mais do que descrever, definir, dizer, afirmar.
Pode-se definir um triângulo como uma figura plana com três lados mas como se explica um
triângulo? Ter-se-á que descrevê-lo ou defini-lo e depois explicar os termos da descrição ou da
definição. Para fazê-lo de modo mais “apropriado” talvez se devesse também explicar o que se
— 24 —
entende por definição matemática. Mas então, e quanto aos termos na explicação dos termos na
definição? Manifestamente, explicar é um processo sem fim de representar as conexões, as relações
entre a ideia que se está a explicar e outras ideias.
Está-se a expor as conexões, e a exposição por parte do professor é uma forma comum de
explicar. Porém, é uma forma ilusoriamente difícil porque a exposição, no sentido usual, não inclui
contribuições algumas dos alunos. Assemelha-se mais a uma prelecção, na qual o orador deve fazer
muitas suposições sobre o que os ouvintes sabem, quais as conexões e significados que já existem
para eles, de forma que possa ligar as suas explicações com o conhecimento que possuem. Se as
explicações não estabelecem nenhuma ligação com o conhecimento do ouvinte, então falham.
É esse o motivo porque os oradores conscienciosos tentam descobrir o que os ouvintes já
estudaram na área, e utilizam instrumentos tais como previews, visões gerais, revisões, sumários. Os
organizadores prévios de Ausubel (1968) são, igualmente, pensados para funcionar como
instrumentos que permitirão que a exposição seja mais bem recebida e compreendida. Geralmente
também, serão permitidas questões no fim da palestra, e, muitas vezes, é nesse momento que o
orador se apercebe de que sobre ou subestimou a extensão de conhecimento dos ouvintes.
Obviamente, um orador, sem oportunidade de feedback da parte dos ouvintes, tem uma tarefa
difícil.
O mesmo problema existe para os autores de livros de texto e pode-se ocasionalmente
encontrar organizadores prévios como os seguintes, usados para estabelecer conexões com o aluno:
Provámos em primeiro lugar que
limθ→0
senθθ
= 1
Ao calcular o limite usamos um argumento geométrico no qual θ é interpretado como a medida, em radianos, do ângulo. Uma vez que nos ocupamos de θ tendendo para zero, podemos supor que θ é um número pequeno positivo ou negativo e que, em particular, -1/2π<θ<1/2π. O limite pretendido é calculado enquadrando senθ/θ entre fronteiras que manifestamente conduzem a limites definidos à medida que θ se aproxima de zero. (SMG, 1975, p. 227)
O argumento em pormenor é então desenvolvido. Dum modo semelhante, mas num nível
matemático mais elementar:
Quando queremos comparar a área de duas figuras, escolhemos a unidade de área mais conveniente. Mas, com frequência, necessitamos de medir e descrever a área de uma figura. Para fazer isto, comparamo -la com uma unidade de área padrão que seja familiar para todos (tal como fizemos para os comprimentos). A forma da unidade de área padrão pode ainda ser escolhida de acordo com a nossa conveniência. Quando afirmamos que uma certa área é 37 unidades, não damos indicação sobre a forma da região. (SMP, 1969, p. 41)
Portanto, os professores e os autores de livros de texto partilham o problema da falta de
feedback da sua “audiência” ou da informação sobre ela. Felizmente, os professores estão numa
posição melhor, no sentido de que têm muitas oportunidades para conhecerem o estado de
conhecimento dos seus alunos, e assim, eles estão, potencialmente, mais aptos para explicar de
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forma significativa. Contudo, se o professor decide ignorar essas oportunidades e baseia-se
fortemente na exposição então corre o risco de criar, para os seus alunos, situações relativamente
sem significado. Um famoso episódio de Wertheimer (1959) ilustra bem o perigo da exposição pelo
professor, e a falta de oportunidades para explicar:
Estou a visitar uma sala de aula. O professor: ”No decorrer da última aula aprendemos como determinar a área de um rectângulo. Todos sabem?” A turma: “Sim”. Um aluno diz: “A área de um rectângulo é igual ao produto dos dois lados”. O professor aprova, fornece em seguida um certo número de problemas com rectângulos de vários tamanhos, que são resolvidos rapidamente.
“Agora,” diz o professor, “Continuemos”. Desenha um paralelogramo no quadro. “Isto chama-se um paralelogramo. Um paralelogramo é um quadrilátero em que os lados opostos são iguais e paralelos.”
Nesse momento um aluno levanta a sua mão: “Por favor, professor, quanto medem os lados?”
“Oh, os lados podem ser de variadíssimos comprimentos”, diz o professor. “No nosso caso, um segmento mede 11 polegadas, o outro 5 polegadas.” “Então a área é 5x11 polegadas.” “Não”, responde o professor, “está errado; vais aprender agora como se encontra a área de um paralelogramo”. Ele designa os vértices por a, b, c, e d.
“Traço uma perpendicular a partir do vértice superior esquerdo e uma outra perpendicular a partir do vértice superior direito.”
“Estendo o segmento da base para a direita, designo os dois novos pontos e e f .”
a b
cd
e f
(mais tarde)
“Encontrarão o que vos mostrei no vosso livro de texto, na página 62. Estudem a lição em casa, repitam-na cuidadosamente para a saberem bem.”
Wertheimer assistiu, também, ao encontro seguinte. O professor está muito satisfeito, os alunos
fizeram bem o trabalho de casa. Wertheimer escreveu: “Mas observando a turma sinto-me
apreensivo, estou preocupado. `O que é que eles aprenderam?´ pergunto-me. `Fizeram, de facto,
alguma coisa? Compreenderam, realmente o assunto? Talvez tudo o que tenham feito é pouco mais
do que repetição cega´...”
O resto da história confirma que Wertheimer estava certo. Simplesmente desenhar esta figura
perturbou tanto os alunos como o professor.
— 26 —
Mesmo que o professor estivesse certo ao assumir que os alunos tinham, realmente,
compreendido a área dos rectângulos, estava errado ao avaliar a resposta do aluno “5 x 11”
dizendo somente “Não, está errado; vais aprender agora (a forma correcta — por implicação)”.
Não são apresentadas aos alunos as razões porque o seu método é errado e o do professor
correcto, não existe possibilidade de verificarem de alguma forma a sua resposta (talvez contando
quadrados ou medindo), não são estimulados pelo professor para se focalizarem na área do
paralelogramo mas somente no modo de calcular a área. O professor teve uma boa oportunidade
para expor as conexões para os alunos - eles ofereceram-lhe a contribuição “5x11”, mas ele optou
por ignorá-la. A possibilidade de explicar foi perdida, o professor regressou à exposição e os alunos
foram deixados a enfrentar o melhor que podiam uma situação literalmente sem significado.
Explicar, para ter algum valor, deve ser, então, mais do que exposição. Explicar relaciona-se
intimamente com compreender, e ao se desenvolver uma explanação bem sucedida estende-se a
compreensão do outro. O aluno R no exemplo “1/2 é par” alargou com êxito a compreensão do
professor ao passo que o aluno D tinha falhado. a afirmação do aluno R “Sim, há três partes num
quarto como num relógio. Vai 5, 10, 15” torna explícita a conexão que o professor (e suspeitamos,
também o leitor) não fez por ele próprio.
Uma rapariga de catorze anos tinha dificuldade em entender que o círculo tinha área até que
lhe foi mostrado o este diagrama:
O seu problema tinha sido que a área para ela era algo rectangular, e o diagrama estabeleceu a
conexão necessária entre o círculo e o rectângulo.
Esta confusão entre explicar e expor é ilustrada novamente pelo facto de que o equívoco mais
comum (e bastante revelador) entre os student teachers é o associar pelo professor do “explicar”
com o “dizer”. Na realidade, muito do explicar com sucesso nas aulas origina-se da questionação
levada a cabo pelo professor. Por exemplo, se considerarmos a situação do “triângulo” dada
anteriormente, um professor que diga meramente à turma uma definição tipo de triângulo não terá
igual probabilidade de fomentar a compreensão do aluno como um professor que comece por
colocar questões como:
Como descreverias um triângulo a alguém de outro planeta?
O que há de errado com esta definição de triângulo — “três linhas ligadas”?
Qual destas três definições é a melhor? (São mostrados três exemplos.)
Tais questões não só exigem que os alunos reflitam sobre o seu próprio conceito de
´triângulo`, mas também, se acompanhados habilmente pelo professor, tornam-nos despertos para o
— 27 —
processo de descrição, de comparação de descrições e, portanto, dos objectivos de, e dos critérios
para, avaliar descrições. Através de tais procedimentos o significado matemático é, efectivamente,
comunicado.
Esta utilização do questionar, pelo professor, mostra-nos que o que é importante no explicar é,
tal como mencionámos anteriormente, que as conexões sejam expostas — não necessariamente que
seja o professor a expor, pela “exposição”. O aluno não é um aprendente passivo que absorve
exposições, antes é um participante activo no processo de partilha — e por isso questões subtis do
professor podem focar esta actividade em conexões e no processo de conectar.
No entanto, para além do questionamento, outras oportunidades para explicar podem ser
criadas pelo professor, encorajando a reflexão a seguir a uma actividade. É provável em qualquer
caso que o envolvimento numa actividade matemática estimulará conexões com outras ideias, apesar
de algumas actividades o fazerem melhor do que outras. Vimos, também, na secção anterior algo
sobre as tarefas do professor ligadas à criação de actividades significativas para o aluno.
A fase reflexiva de uma actividade é, porém, a ocasião mais apropriada para ajudar a que
sejam expostas conexões e significados. Por exemplo, com a mão do gigante, um bom momento de
reflexão pode permitir aos alunos ligar ideias sobre volume, área, comprimento, com medição,
proporções, razões, fracções, não num sentido exaustivo ou ´final` mas como um bom exemplo de
como as ideias matemáticas são intimamente interligadas.
Mesmo uma actividade pouco prometedora como executar subtracções pode ser
significativamente explorada por um simples acto de pedir a três alunos para mostrarem os seus
diferentes trabalhos no quadro e comparar os seus métodos. A reflexão está num nível cognitivo
mais elevado do que o algoritmo e a técnica da ´comparação` estimula o pensamento num nível
superior, o que proporciona a discussão de significados.
Mais tarde no desenvolvimento matemático do aluno, à medida que os problemas se tornam
mais complexos, a comparação de, a reflexão sobre, vários métodos de solução ou de ´ataque`
podem tornar-se extremamente produtivos. Por exemplo, ao se compararem várias provas de que 2
x 2 = 4 podem-se revelar muitas ideias sobre o processo de provar e os critérios a seguir; e
investigar diferentes abordagens para uma conjectura como “O produto de números de qualquer
triplo Pitagórico é sempre um múltiplo de 60” faz mais do que apenas expandir as ideias do aluno
sobre um teorema bem conhecido. Afinal de contas, de que se trata prova, racionalização e
argumentação se não de estabelecer e expor conexões entre ideias matemáticas?
Em resumo, podemos observar que é necessário para que a noção simplista, possuída pelo
jovem professor, de explicar como sendo ´dizer`, seja desenvolvida e expandida para uma
concepção mais rica e mais geral de expor as conexões entre as ideias matemáticas. Este
desenvolvimento centra a atenção nas diferentes tarefas do professor que podem facilitar a
´exposição`, particularmente:
(a) no uso de overviews, visões gerais, organizadores prévios, revisões e sumários;
(b) nos diferentes tipos de questões que podem encorajar contribuições dos alunos sob a
forma de ´exposições`;
— 28 —
(c) na criação e escolha de actividades que permitam que as conexões sejam reveladas; e por
(d) reflectir nestas actividades.
É assaz infeliz que a palavra ´exposição` tenha adquirido o sentido de um acto de ensinar
muito particular, porque o que a análise nesta secção manifesta é que a exposição na sala de aula é
um processo interactivo.
4.2 Interpretar
Na secção anterior detivemo-nos no papel do professor ao expor a relação entre as ideias
matemáticas. Agora voltaremos a nossa atenção para as várias tarefas do professor associadas com
diferentes representações de ideias matemáticas. Da perspectiva da comunicação de significado
matemático, as formas e as representações particulares usadas são manifestamente de interesse, mas
não é nossa intenção aqui desenvolver uma análise exaustiva destas representações. Igualmente não
nos ocuparemos dos assuntos complexos de ´forma` vs. ´conteúdo`, ou da natureza e existência de
´objectos` matemáticos, apesar destes assuntos estarem subjacentes em toda esta secção.
Ficaremos, ao invés, no nível da sala de aula, e com o papel do professor em facilitar a
interpretação de muitas representações comumente utilizadas. Comecemos por considerar dois
problemas típicos. No primeiro o professor e o aluno estão a trabalhar com varas coloridas:
P: Porquê chamar dez, a esta vara laranja?
C: Porque é laranja.
P: Por que não chamar dez, à vara azul?
C: Porque não é laranja.
P: Por que é a laranja a dez, então?
C: Porque é o número maior.
P: O que queres dizer por ´é o número maior`?
C: Não sei o que queria dizer. (De ATM, 1977, p. 216)
No segundo, lida-se com simbolismo algébrico: Para a Julie, de 13 anos, a equação 7 - x = 9 era "absolutamente estúpida". "Alguma vez" quis ela saber, "pode-se tirar alguma coisa a sete e ter uma resposta maior do que quando se começou?" (Kent, 1979, p. 29)
No primeiro, o problema diz respeito à relação entre números e objectos, no segundo à
relação entre palavras e o simbolismo matemático. Em ambos os casos foi estabelecida uma relação
pelo aluno — dito de outra forma, já tinha sido feita uma conexão. Em ambos os casos existe um
sentimento de insatisfação sobre a congruência dessa relação, sugerida pelo professor ao fazer uma
pergunta, no primeiro caso, ou ao colocar um problema, no segundo. Tanto num como no outro
— 29 —
existe um sentimento, evidente, de incompreensão e de frustação expresso pelo aluno. O cenário
está montado para possibilitar uma forte negociação!
Como trataremos da negociação somente na próxima secção, vamos, então, permanecer por
agora com os aspectos da comunicação em problemas como estes, os quais dizem respeito às
relações entre representações. Tal como na secção anterior, o objectivo é, essencialmente que o
professor encorage o surgimento de conexões, de forma a que os alunos possam partilhar
conhecimento.
Eis aqui um bom exemplo do que queremos dizer. O problema tem a ver com o significado de
um dividido por um quarto:
P: Um dividido por um quarto ... O que significa isso?
Alguém expressa isto na linguagem comum.
A: Um quarto de um.
P: É um quarto de um? O que é um quarto de um?
A: Um quarto.
P: Um quarto. Não será mais do que isso?
O que será então? Sim, Fairley?
A: Sir, é um mais um quarto.
P: É o quê?
A. Um mais um quarto.
P: Aquele é um mais um quarto, é? (escrevendo no quadro) Pensei que aquele era um mais um quarto. E aquele?
A: Sir.
P: O que é este?... O que significa? Sim ...?
A: Um dividido por um quarto.
P: É um dividido por um quarto. O que significa um dividido por um quarto? Sim...?
A: Quantos quartos existem em um.
P: Quantos quartos existem em um. Bem, se pensas dessa forma, ´Quantos quartos existem em um?` Sim, Brooke?
A: Quatro, sir.
P: Sim, existem quatro. (Barnes, 1969, p. 40-41) A linguagem resultante pode não ser, verdadeiramente, comum, mas o sentido da
interpretação ´andar para a frente e para trás` é claro. O professor ao dizer ‘comum’ está a
desformalizar a representação — tentando tornar a ideia acessível aos alunos por relançá-la numa
linguagem mais familiar, ou poderiamos dizer "em linguagem mais significativa".
Note-se, porém, que o professor não o está a impor. Ele encoraja os alunos a tentarem as
suas diferentes representações ´familiares` e ajuda-os a avaliá-las. Poder-se-ia, de facto, argumentar
que em última instância, o significado ´correcto` é imposto, mas nesse sentido toda a educação é
imposta. Por exemplo, se contrastarmos este episódio com o seguinte, podemos reconhecer,
claramente, a genuína tentativa do primeiro professor em tornar a representação significativa:
— 30 —
A professora na lição J estava solicitando os seus alunos a operarem com os conceitos de fracções dividindo rectângulos em partes. Ela preparou um grande diagrama para ilustrar 3/6 = 1/2:
12
16
16
16
Ela mostrou-o — apesar de muitos alunos não poderem, aparentemente, ver o diagrama — e diz à turma para dividir a metade em sextos. Após uma pausa ela pegou no trabalho de um aluno:
16
16
16
P: Porque é que eu não estou muito satisfeita com esse?... Não posso riscar e dizer que está errado mas não estou satisfeita... (pausa) Vamos lá... pensem no que eu vos pedi para fazerem... Linda?
A1: Pediu-nos não para sublinhar a segunda mas para pôr o número de sextos.
P: Oh, nada disso... Tinham que sublinhar do mesmo modo como a metade... Bem, ele sublinhou na mesma área?
Alunos: (respondem inaudivelmente)
P: Qual é a sua forma... qual é a sua forma?... Como é ela ?
A2: Ele colocou dois no cimo e um em baixo.
P: Certo... bem, é como um L gordo ou algo que tenha desenhado... Está certo, não está Shaw?
A3: Sim.
P: Não, não ilustra a nossa ideia. (Barnes, 1969, p. 36)
Num certo sentido, podemos ver que aquilo que o professor estava a tentar fazer era positivo,
mas parece que se perdeu uma boa oportunidade para clarificar a relação entre representações. No
exemplo anterior, o professor estava a encorajar os alunos positivamente para gerarem formulações
em ´linguagem comum`, enquanto que aqui o aluno é repreendido por o equivalente com a
representação gráfica de uma fracção. Claramente, quanto mais o último acontecer mais sem
significado serão as actividades.
Uma outra fonte de dificuldades para o aluno é o facto de que algumas vezes não é muito claro
qual é a finalidade da interpretação. Consideremos este diálogo:
P: Agora, o que significa, de facto, quando dizemos "três vezes seis"? Sim, Jamieson?
A: Três multiplicado por seis.
Pode ajudar ao fazer a transição para a multiplicação de fracções ou decimais onde a ideia
associada de "tantos vezes tantos" já não é válida. Menos tolerante pode, simplesmente, ser um
estratagema de controlo pelo professor, significando "use a palavra certa, por favor". É, desse
modo, um meio do professor se assegurar que o conhecimento é definido nos seus própios termos.
Por outro lado se se está genuinamente a tentar partilhar significado, então o que há a fazer é
clarificar por que é necessária a interpretação e por que é útil uma representação diferente.
— 31 —
A razão pode ser evidente se o aluno sente dificuldade em entender uma palavra. Por
exemplo, Jones (1981) aponta para diferentes significados de 'mais' nas seguintes questões:
O que é mais, 10 ou 13?
Qual é o número que é 1 mais do que 5?
O número 8 é 2 mais que número?
e se a criança tem problemas em distinguir e entender estes, pode ser necessário interpreta-los com
outras palavras, com contas e pedrinhas ou com representações gráficas tais como a recta numérica.
No exemplo seguinte podemos observar como a palavra 'mais' pode ser difícil. Este provém de uma
entrevista CSMS (1981) a uma criança, sendo um dos autores o entrevistador: Questão: 10 rebuçados são partilhados entre 2 rapazes de forma a que um tenha mais quatro do que o outro. Quantos recebe cada um?
ME: Quantos deveriam obter?
I: Sim, se um rapaz tem mais 4 quatro que o outro.
ME: Um tem 9 e o outro tem 1.
I: Um teria mais 4 do que o outro?
ME: Sim porque se dividires 10 por 2 rapazes, então um teria 9 e o outro teria que ter 1.
I: Estou a ver. Então qual dos rapazes tem mais 4 do que o outro?
ME: (Aponta para o de '9')
I: Ele tem mais 4 do que o outro?
ME: Sim.
I: Como sabes que ele tem mais 4?
ME: Porque ele tem 9 e o outro tem 1.
I: Isso faz com que ele tenha mais 4 do que o outro?
ME: Sim.
I: Como?
ME: Porque eu pensei assim. Se há 10, e dividindo por 2, então há 5, e se aquele tem mais 4, ele tem 9, então o outro tem 1.
I: Porquê '1'?
ME: Porque só sobra um.
I: E agora esse rapaz tem agora mais 4 do que o outro?
ME: Sim.
I: Aquele que tem 9 tem mais 4 do que o rapaz com 1?
ME: Sim.
Relacionada com a interpretação de problemas escritos, a investigação escrita mais relevante
em termos das intenções dos professores é, provavelmente, a que se baseia no trabalho de Newman
(1977) em análise de erros. Clements (1980) tem discutido muitos aspectos deste trabalho e oferece
conselhos úteis para o ensino. Os erros cometidos pelas crianças num conjunto de problemas
verbais foram classificados como, Leitura, Compreensão, Transformação, Capacidades de
processo, Codificação ou Negligência, e foi mostrado que muitos erros eram cometidos nas
— 32 —
primeiras três categorias. Em particular para um vasto grupo de alunos com baixo rendimento, mais
de 50% dos erros foram cometidos nessas categorias, isto é, antes de a criança ter sequer
começado a usar quaisquer capacidades de processo aritméticas.
Clement argumenta:
Frequentemente quando um professor se senta para ajudar um aluno com um problema matemático ele é tentado "a mostrar ao aluno como fazer". Em vez disso é recomendado, especialmente com alunos do ensino básico, que o professor comece por pedir ao aluno que leia a questão em voz alta. Então o professor pode perguntar "O que está a questão a pedir que faças?" e "Como vais fazê-lo?" e assim por diante (p. 19-20)
seguindo a orientação de análise de erros.
Noutro contexto, Kalmykova (1975) relata sobre a professora Petrova que "ensina os seus
alunos a ler problemas". Por exemplo: Uma aluna lê um problema: "Dez toros de... faia foram colocados num fogão e —". Ela introduziu uma pausa a qual estragou a lógica, e a profª, imediatamente, chamou a sua atenção para isso: "Onde está a vírgula?" perguntou ela. "A seguir à palavra 'fogão' " respondeu a rapariga. "Então deveria estar ali uma pausa na leitura também", lembrou-lhe a professora e pediu uma nova leitura com a entoação correcta. A rapariga leu: "Dez toros de faia foram postos num fogão, e foram também postos menos seis toros de bétula do que de faia. Quantos toros ao todo foram postos no fogão?"
Outros erros foram também corrigidos e, posteriormente, a professora pediu aos alunos para "enumerar cada um dos dados e, em particular, identificar a incógnita". Eis como foi feita a desmontagem do problema por uma aluna, Katya S.:
"É sabido", diz ela " que puseram 10 toros no fogão. É igualmente sabido que também foram postos menos seis toros de bétula do que o número de toros de faia, mas não é conhecido quantos toros foram, no total, postos no fogão."
Uma análise adicional foi então procurada: "Quantos toros de faia foram postos?"
"Dez"
"Lê novamente o que diz sobre os toros de bétula."
"Foram também postos seis toros a menos de bétula do que de faia"
"Menos do que o quê?"
"Do que toros de faia."
Kalmykova continua a dar conta dos efeitos positivos, para os alunos, deste tipo de análise
detalhada de problemas. Nitidamente, encorajar o aluno "a usar as suas próprias palavras" é uma
técnica didáctica poderosa. É valioso para o aluno usar a sua própria linguagem para "falar para a
sua própria compreensão” como Barnes (1969) o descreveria.
Claro que a interpretação não está somente confinada a palavras ou a problemas com
palavras, apesar de muita investigação ter abordado esta forma de particular de representação. Já
observámos um exemplo de uma representação gráfica e eis outro, que está a trazer problemas ao
aluno: A placa mostra que são 29 milhas oeste de Grange e 58 milhas este de Barton. Como calcular quantas milhas são de Grange a Barton?
— 33 —
29 Grange Barton 58
29 - 58 58 : 29
58 - 29 29x2
29 : 58 58 + 29
58 x 29 87 - 29
(CSMS, 1981) "O problema da placa é colocado a Miranda: (12 anos)
Ela hesita por um momento. Então lê o problema novamente e escreve: 29-58. P: Porquê esses números? Bem, é 29 oeste e 58 este. A professora desenha um esquema como este:
29 58
Poste
Este não se revela muito proveitoso. Então a professora sugere um passeio com Miranda. Onde gostarias de começar? Por um momento a placa está (psicologicamente) a bloquea-la. Mas, se Miranda faz a sua escolha de começar em Barton, então o problema deixa de existir: 58+29!"
Miranda interpretou a situação, apoiada pela professora, do seu próprio modo. Realmente, o
que a professora fez foi muito interessante e mostra-nos tal como na secção anterior sobre 'explicar',
que não é necessário o professor afirmar e demonstrar as conexões entre representações. Pelo facto
do professor colocar uma questão apropriada, o aluno é estimulado a reajustar a sua percepção de
representação. Além disso, espera-se que não exista unicamente um benefício a curto prazo para o
aluno (isto é, que o problema imediato foi resolvido) mas também que com o estímulo apropriado
do professor, uma reflexão sobre o episódio traga, para Miranda, um efeito a longo prazo.
Representações gráficas abundam nas aulas de matemática e existe um 'vocabulário' visual
complexo que necessita ser aprendido pelos alunos (ver Bishop, 1974). Considere as diferenças
significativas entre as seguintes representações gráficas:
— 34 —
0 3 6 9 12 15 21
Diagramas e figuras não são 'óbvias' nem são claras as suas relações com outras
representações. O professor principiante, para o qual estas coisas podem não ser bem perceptíveis,
pode não se aperceber que longe de clarificar a situação problemática ao aluno, o seu uso pode
simplesmente aumentar a confusão. Considere as dificuldades causadas ao aluno pelas diferentes
representações usadas aqui (Clements, 1980, p. 17):
Após uma discussão preliminar sobre o significado de 'um terço' e 'um quinto', escrevi o numeral 2/7 pedindo-lhe para o ler. Ele leu: 'dois -sete'. Disse-lhe que deveria ter lido 'dois sétimos' e que 1/4 era normalmente lido: 'um quarto'. Pouco depois, ele estava habilitado a ler numerais tais como 2/5, 4/7, 3/8 correctamente. Pedi-lhe então 'para encontrar o número no quadrado' se
3/8 de 16 = [] Ele disse que não o poderia fazer porque não sabia o que significava 3/8. Desenhei um rectângulo e pedi-lhe para sombrear um oitavo dele. Ele fê-lo correctamente. Desenhei um outro rectângulo, e pedi-lhe para sombrear um oitavo dele. Ele não tinha ideia de como o poderia fazer. Expliquei-lhe que 3/8 é 'três porções de 1/8' e mostrei-lhe como sombrear três oitavos de um rectângulo. Ele pareceu contente com a explicação, mas quando lhe foi pedido para sombrear cinco sextos de um outro rectângulo não o conseguiu fazer. Ele não conseguia sombrear um oitavo de um círculo. Quando se mostrou 16 berlindes ele conseguia separar um oitavo, mas não sabia quantos berlindes teria se tivesse três oitavos de 16 berlindes.
Obviamente, esta criança tem problemas com a ideia e o significado global de fracção como
3/8, apesar de a raiz do problema não ter sido ainda revelada.
O que é revelado por este exemplo é o facto de existirem quatro tipos principais de
representações que são utilizadas nas aulas de matemática - símbolos matemáticos, linguagem,
figuras e objectos. Cada um destes tipos tem o seu próprio vocabulário ou código que necessita de
ser aprendido de forma a compreender as ideias matemáticas expressas. Com o simbolismo,
expressões tais como ð r2 e
x =
— 35 —
evidentemente usam um código que precisa ser aprendido. Menos obviamente, a linguagem
matemática é diferente da linguagem vulgar em muitos sentidos (ver, por exemplo, Austin and
Howson, 1979). As figuras representam ideias matemáticas em termos espaciais, e os objectos
podem ser deliberadamente criados para representar relações matemáticas particulares, tal como os
blocos multibase de Dienes ou outros materiais manipulativos, ou têm as ideias matemáticas
implícitas neles, tal como tortas (para cortar em porções fraccionadas) ou rodas dentadas (razões).
Portanto, teoricamente, estão envolvidas capacidades de interpretação em, pelo menos, 16
diferentes pares-transformação:
De Para
Simbolismo
Linguagem
Figuras
Objectos
Simbolismo
Linguagem
Figuras
Objectos
Contudo, dadas as variedades de simbolismo, linguagens etc. que são usadas em matemática, muito
mais do que 16 pares-transformação pareceriam ser possíveis: De qualquer modo muitos deles são,
obviamente, parte do currículo da matemática, por exemplo:
marcar números na recta numérica,
representar equações graficamente,
derivar fórmulas a partir de problemas com palavras,
resolver problemas de partilha envolvendo objectos,
definir e classificar conjuntos de formas,
construir diagramas a partir de uma série de lançamentos de dados.
Sob a perspectiva da comunicação, o perigo consiste em que estas sejam ensinadas e aprendidas
como competências de rotina, quase como algoritmos. Por exemplo, representar graficamente uma
equação tal como y = 2x-3 pode ser transformado em rotina, desenhando e preenchendo uma
tabela como esta:
x -3 -2 -1 0 1 2 3
2x
2x -3
Esta rotina pode ser praticada e dominada.
— 36 —
O que pode ser despercebido pelo aluno é que um bom diagrama, tal como um gráfico,
evidencia tanto aspectos particulares como padrões gerais; que como uma representação tem
virtudes diferentes da equação; que para alguns fins um gráfico é preferível a uma equação, enquanto
que para outros se verifica o inverso; e que estabelecer esta conexão entre o simbolismo algébrico e
o gráfico enriquece consideravelmente o significado matemático de uma equação.
Sem este contexto de comunicação, o procedimento de representar graficamente uma
equação pode ser visto pelo aluno como uma actividade irrelevante e sem significado, aprendido
somente com o objectivo de ser capaz de desenhar o gráfico dada uma equação tipo. Um
microcomputador pode ser programado para o fazer de modo preciso e rapidamente, então porque
deveriam os alunos ser programados similarmente? De facto, seria bem mais instrutivo para os
alunos escrever tais programas, uma vez que focaria a sua atenção nas duas formas de
representação, nos limites do tipo de equação a serem representadas, e nas limitações dos próprios
gráficos. Contudo, o contexto de comunicação referido acima ainda teria de ser estabelecido pelo
professor.
Então o que aprendemos desta análise da interpretação da representação de ideias
matemáticas? É evidentemente uma área complexa e para a qual o jovem professor precisa ser
sensibilizado. É provável que muitas capacidades de transformação tenham sido já dominadas pelo
jovem professor e estas precisam de reflexão na perspectiva da comunicação. Qualquer tipo de
representação precisa de uso e familiarização para se tornar compreendida e aceite pelo aluno. O
traduzir e interpretar tem de ser desenvolvido largamente, de uma forma activa e para diante e para
trás, tal como os exemplos de ‘um dividido por um quarto’? E a lição de Petrova nos mostram. As
conexões entre representações necessitam de ser continuamente evidenciadas.
Talvez as tarefas possam ser melhor resumidas sob três títulos principais:
(a) dando oportunidade aos alunos de usar uma variedade de tipos de representação e
ganhando familiaridade com estas representações;
(b) tornando conscientes os processos de transformação de um tipo de representação noutra,
por encorajar a realização de actividades e a sua discussão;
(c) tornando os alunos conscientes da natureza e do valor da 'representação' em matemática,
em conjunto com as ideias de critérios e de escolha de representação.
5. NEGOCIAÇÃO
Esta é a nossa terceira e mais difícil componente para descrever a interacção e a dinâmica da
sala de aula, no sentido em que pretende desenvolver algumas ideias novas em formação de
professores. A negociação é, em geral, pensada como uma 'interacção dirigida para um certo
objectivo' e a nossa principal preocupação nesta secção é a negociação do significado matemático
na sala de aula. O nosso intuito será caracterizar o papel do professor nesta interacção e nas tarefas
— 37 —
particulares associadas com o estabelecimento da possibilidade de negociação e participação na
própria negociação.
Este aspecto da interacção na sala de aula não foi ainda completamente elaborado no contexto
da formação de professores, apesar de se encontrar documentado na literatura educacional. Em
particular alguns investigadores de situações de sala de aula, têm discutido várias estratégias de
alunos — por exemplo, Delamont (1976) observa:
A primeira estratégia dos alunos é descobrir o que o professor quer e corresponder-lhe na suposição de que conseguem reconhecer a recompensa, em termos de notas, eventuais trabalhos ou sossego. Quando não existe nenhum benefício discernível de dar ao professor o que ele quer, é quase certo que o 'comportamento disruptivo' se tornará a estratégia dominante (p. 99).
e seguidamente, clarificando esta ideia, afirma, "Assim, a primeira estratégia do aluno é fornecer
respostas 'correctas' - isto é, aceitáveis para o professor. Para o fazerem devem concentrar-se o
suficiente no professor para descobrir quais são as respostas certas ou as que parecem ser" (p.19).
Similarmente, Holt (1964) no seu livro clássico How children fail, dedica um capítulo inteiro à
'estratégia' e fornece muitos exemplos e reflexões sobre os usos de diferentes estratégias pelos
alunos para sobreviver e ter sucesso na escola. Emily, por exemplo,
sabe que num período de exposição a atenção do professor está distribuida por 20 alunos. Conhece também a estratégia do professor de fazer perguntas aos alunos que parecem confundidos ou que não prestam atenção. Então sente-se segura levantando a mão, como se estivesse a 'rebentar' para dar a resposta , quer saiba a resposta quer não. Este é o seu modo seguro de me dizer que, pelo menos, sabe tudo o que se está a passar na aula (p. 27).
Emily está a negociar a sua própria sobrevivência num ambiente de aula competitivo e hostil.
Indo além da mera sobrevivência, Holt mostra outro exemplo no qual Ruth está a negociar com
a sua professora o nível de trabalho matemático que desenvolve: Ela tem estado a fazer Matemática e eu estava satisfeita comigo própria porque em vez de lhe dizer as respostas e mostrar-lhe como resolver os problemas, estava a 'fazê-la pensar' fazendo-lhe perguntas. Era um trabalho lento. Questão após questão encontrava apenas silêncio. Ela não dizia nada, não fazia nada, apenas se sentava e olhava-me através daqueles óculos, e esperava. De cada vez tinha que pensar numa pergunta mais fácil e mais directa do a que a anterior, até que, finalmente, encontrava uma tão fácil que ela se sentiria segura ao respondê-la. Assim avançávamos a custo até que, de repente, ao olhar para ela enquanto esperava pela sua resposta a uma questão, apercebi-me de repente que ela não estava confundida pela pergunta que lhe tinha colocado. De facto ela nem sequer estava a pensar nela. Estava friamente a avaliar-me, pesando a minha paciência, esperando pela próxima questão, segura de que iria ser mais fácil. Pensei, ´fui apanhada!' A rapariga tinha conseguido aprender como fazer para que todos os seus professores anteriores procedessem do mesmo modo. Se não lhe desse as respostas, muito bem, ela deixar-me-ía questioná-la até chegar a elas (p. 38). Estes exemplos mostram-nos claramente que as crianças desenvolvem estratégias sofisticadas
para actuarem na sala de aula. Estas estratégias são além do mais, interpessoais, porque se
desenvolvem em contextos interpessoais e sociais onde as 'deixas', sinais, necessidades e o
feedback são dados e recebidos pessoalmente. É, então, claro, no âmbito desta secção, que os
alunos podem negociar na aula, fazendo-o mesmo. Eles estão certamente desejosos e habilitados
para entrar numa interacção interpessoal dirigida para um certo objectivo que constitui a
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aprendizagem da sala de aula. Eles não parecem, naturalmente, querer ser apáticos, nem são 'barris'
vazios à espera de serem enchidos com conhecimento. Essencialmente, os seus objectivos são os da
sobrevivência e da coexistência com as pressões e o stress da sala de aula, mas outros objectivos
como o controlar do nível de trabalho matemático que desenvolvem. Menos negativos são, talvez,
os objectivos de sucesso matemático e de compreensão das ideias matemáticas que o professor lhes
está a introduzir.
Além disso, torna-se claro a partir da evidência de Holt e de outros, que o professor joga um
papel poderoso na formação das estratégias dos alunos porque estas se formam em resposta às
estratégias do professor. O mecanismo tem a ver com o uso da professora do seu controlo e
poder. À medida que o poder do professor cresce os alunos sentem cada vez maior dificuldade em
entrar em qualquer negociação, por exemplo, num exame, onde as regras são impostas e seguidas,
tudo o que a criança discordante pode fazer é recusar-se a participar, rasgar o papel, etc. Mas com
a redução do poder e do controlo que acompanha o crescimento da função de ensino, as
possibilidades para a negociação pelos alunos e o desenvolvimento de estratégias crescem. O
professor ainda tem controlo e poder, evidentemente, mas agora é mais uma questão de como o
dirigir. Como Yates (1987) conclui do seu estudo em profundidade de quatro salas de aula de
Matemática: “A capacidade de transformar está alinhada de perto com o poder e controlo: isto
pode restringir e deformar o desenvolvimento ou pode permitir exploração; na verdade, esta
exploração pode ser mesmo encorajada” (p. 129).
Então, o controlo do professor pode ser usado para manter ou impedir negociação.
Claramente, isto relaciona-se tanto com a área do significado matemático como com aspectos da
disciplina e gestão da aula. Tal como o professor e os alunos negoceiam um modus vivendi que diz
respeito ao modo como a aula funciona, como local de trabalho, também podem negociar um
modus sciendi, um conjunto partilhado de significados. Afirmamos que isto é possível e que isto
acontece mas também afirmamos que isto não acontece tanto quanto devia. A evidência da
compreensão limitada das crianças e das suas dificuldades em fazer algo mais do que executar
algoritmos limitados, em conjunto com o bem documentado medo das aula de Matemática, sugere
que o controlo do professor está a ser principalmente usado para impor Matemática nas crianças do
mesmo modo que impomos e fazemos respeitar um conjunto de regras de conduta na sala de aula.
Investigador após investigador (Holt, 1964; Yates, 1978; Barnes, 1976; Kemme, 1981)
documentaram o controlo do professor do conhecimento da aula e a sua imposição nas crianças
(relativamente) indefesas (powerless) que desenvolvem então complicadas estratégias de
sobrevivência. Bauersfeld (1980), discutindo este ponto, descreve a investigação de Erlwanger
(1975) nestes termos: “A sua documentação das incompreensões e deficiências matemáticas
demonstra como a aprendizagem da Matemática pode ser prejudicada por uma comunicação
professor-aluno restrita — restrição que leva à quase total ausência de comunicação sobre
significados” (p. 25).
Isto não implica, evidentemente, que estamos a “acusar” (blaming) os professores em
qualquer sentido. Pelo contrário, parece que há uma consciência insuficiente na comunidade de
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educação matemática do facto que as ideias matemáticas, significados, técnicas, e critérios se
desenvolvem todos através de trocas interpessoais, e estão eles próprios sujeitos a influências
sociais. Afirmamos além disso que o quadro da lição, que discutimos anteriormente, contribui
fortemente para a ideia de um corpo de conhecimento objectivo, possuído pelo professor e que
deve ser imposto nos alunos. Isso é outra razão porque estamos propondo em vez disso propondo
para a formação de professores uma ênfase nos processos de negociação na sala de aula. Vamos
por isso considerar as tarefas do professor na negociação dos significados matemáticos com as
crianças.
5.1. Desenvolver significado matemático
Como foi descrito anteriormente, o significado matemático é obtido através do estabelecimento
de conexões entre a ideia matemática particular em discussão e os outros conhecimentos pessoais
do indivíduo. Uma nova ideia é significativa na medida em que cada indivíduo é capaz de a ligar com
os conhecimentos que já tem. As ideias matemáticas formarão conexões de alguma maneira não só
com outras ideias matemáticas mas também com outros aspectos do conhecimento pessoal. Em
particular, cada professor possuirá um conjunto de significados e correcções, enquanto que os
alunos terão as deles — de novo únicas para cada indivíduo.
Assim, como poderá o significado matemático ser partilhado e em que sentido podem duas ou
mais pessoas partilhar significados matemáticos?
Evidentemente é necessário que tornam os seus próprios significados públicos, ou visíveis —
os outros precisam de certa maneira saber alguma coisa sobre os significados que os primeiros lhes
atribuem. Conversa e discussão jogam uma parte importante assim com a participação em qualquer
actividade que faça os participantes revelar os seus pensamentos — um jogo, por exemplo, ou a
resolução de problemas com algum equipamento experimental. Questionar e responder a questões
ajudará, uma vez que tornará necessário fazer mais explicações e clarificação de conceitos.
Exemplos e contra exemplos podem ser trocados, de modo que cada um possa ir além das palavras
do outro e possa aproximar-se dos referentes. As analogias e metáforas usadas por cada um podem
ser examinadas e comparadas, e as diferenças expostas para que as suas fontes possam ser
detectadas. Através dessas trocas cada um aprende mais acerca dos referentes dos outros,
exemplos, analogias e conexões com o conhecimento existente. Quando duas pessoas concordam
com a validade dos referentes, exemplos, analogias e conexões podemos dizer que partilham o
significado desse conhecimento.
No entanto, a seguinte interacção descrita por Mellin-Olsen (1976) mostra-nos ainda outro
aspecto da negociação das ideias matemáticas entre o professor e o aluno:
Professor: Quanto mede A?
Aluno: 60º!
Professor: Sim! Porquê?
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Aluno: Eu consigo ver isso!
Professor: Tens de explicar!
Aluno: Posso medi-lo.
Professor: Não, não, na Matemática nós não medimos.
Aluno: ???
Professor: Temos aqui uma correspondência de ângulos entre paralelas. Não te lembras?
Aqui podemos ver o desequilíbrio no relacionamento professor/aluno requerido pelo papel
do professor no desenvolvimento do significado matemático do aluno. É aqui que o poder,
autoridade e controlo investido no professor pela instituição, pode ser usado positivamente
permitindo a negociação, interpretação e desenvolvimento de significados, ou negativamente
impondo um conhecimento sem qualquer significado. Assim, como pode este poder ser usado
positivamente? Consideramos primeiro um exemplo negativo, dado por Kerslake (in Harvey et al.,
1982):
Professor: Hoje temos 38 crianças na aula e disseram-me que 31 ficaram para almoçar. Quem me consegue dizer quantas crianças vão almoçar a casa?
Aluno: 4
Aluno: Não, 5.
Aluno: Não, é 4.
Aluno: Sim, 4
Uma "enérgica" criança parece ter conseguido persuadir uma série de crianças de que 38 - 31 é 4, assim o professor decidiu tentar outra aproximação.
Professor: Vamos pensar. Se 31 ficam para jantar, e 4 vão para casa... 31 e 4 são...?
Aluno: 35.
Professor: Então...?
Aluno: 35.
O professor tenta convencer as crianças de que a resposta não pode ser 4 tornando a questão numa adição — onde presumivelmente pensa as crianças estarem mais seguras, mas elas não parecem ver a conexão, e ficam satisfeitas com o 35. A professora continua:
Professor: Então, isto faz sentido, Christopher?
Ch: Não.
Professor: Quantos é que pensas que vão para casa jantar?
Ch: 7
Professor: O Christopher pensa 7, então 31 e 7 são...?
Aluno: 38.
Professor: Boa.
A esta altura o professor desviou a atenção da resposta errada, apelando para o Christopher, que sabe sempre a resposta correcta, e assim consegue levar a discussão para um terreno fácil, seguro para dirigir. Note-se que a professora não resolve o problema das crianças com a resposta errada, e elas podem sentir-se desencorajadas e enganadas (pp. 75-76)
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Esta é uma técnica onde apenas parece permitir a negociação. Na realidade o professor
está meramente a usar o poder da sua posição para utilizar a criança "convencida" para convencer
as outras. Ele podia ter pedido às 7 crianças que se levantassem e fossem contadas, escrevessem os
seus nomes no quadro, ou representadas por desenhos, mas em vez disto preferiu apenas ter a
resposta correcta apresentada e reforçada — de facto impondo um significado. Tais escolhas são
críticas.
Um aspecto do problema é o facto de, muitas vezes, as respostas dos alunos às questões do
professor serem julgadas por este último apenas em termos de certo/errado. Mas qual é o
conhecimento dos critérios que o professor tem e que lhes permite fazer esse julgamento? Como
pode um professor negociador ensinar tal conhecimento? Possivelmente tratando uma resposta
como uma hipótese, a ser testada publicamente e discutida abertamente. Possivelmente procurando
outras respostas ou métodos e contrastando-as no quadro, tornando explícitos os critérios?
Possivelmente procurando promover a explicação e clarificação do respondente?
No extracto seguinte, Kerslake mostra-nos como o professor encoraja a discussão entre as
crianças permitindo que expliquem o que compreenderam (note cuidadosamente o que professor
diz):
P: Quanto é 4,38 x 100?
A1: Penso que é 4,3800
P: O que é que o resto da turma pensa?
A2: Sim, penso ser — 4,3800.
A3: Não, não é. É 438.
P: O que pensas, agora, A1?
A1: É 4,3800. Temos apenas de acrescentar dois zeros.
P: O que têm estes zeros no fim?
A3: Eles não fazem nenhuma diferença.
A1: Está bem. Então eles não fazem diferença.
A3: Porque estão aqui, então?
A1: Porque tens de acrescentar dois zeros.
A3: Mas não fazem nenhuma diferença aqui.
A1: Pode ter 4,3800 ou 4,38.
P: Então pensas que a resposta pode ser tanto 4,38 como 4,3800
A1: Haaa é o mesmo. Não faz diferença (pp. 80- 81)
Esta discussão aluno-aluno é rara acontecer (em público) numa sala de aula e mostra o uso
positivo do poder do professor. É claro que o professor deve continuar a responder aquela
incompreensão, e a cena está montada para o uso de uma técnica que é pôr os alunos numa
situação de conflito cognitivo contrastando as suas contribuições.
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No exemplo seguinte, de Fielker (1977), ele cria tais conflitos cognitivos entre as
contribuições das crianças de 6 anos e o seu uso das suas palavras. Levanto no ar 5 cubos Unifix.
"Quantos tenho?" "cinco", disseram e quase no mesmo instante, "se quebrares 2 tens 3" Eu parei e delicadamente voltei para trás. Então, parto 2 e seguro 2 numa mão e 3 na outra.
"Quantos tenho", perguntei
"3"
"Mas continuo a ter 5", disse com um ar confuso.
"E se partir outro, apenas têm 2" eles continuaram, ignorando-me.
Tirei 1 e mostrei o resultado.
"Ainda tenho 5", disse eu. Voltei a junta-los
"Se tirarem 2, quantos é que terão?
"3"
"Tirem dois, então". Uma criança fá-lo. "Quantos têm agora?"
"3"
"Mas eu tenho 3. Quantos é que têm?"
E assim a negociação acerca do significado continua. O professor precisa de encorajar as
crianças a exteriorizar os seus conhecimentos, a usar as suas próprias palavras se forem válidas e a
dar forma à sua linguagem matemática quando ela não é adequada para a tarefa em questão. Como
já vimos, a linguagem faz parte de um papel importante na comunicação dos significados
matemáticos, e se esse significado é para ser partilhado então a linguagem precisa de ser acordada.
Uma tarefa muito importante para o professor negociador é modificar e dar forma à linguagem dos
alunos de modo a que se torne matematicamente adequada.
Aqui está um exemplo típico desta moldagem da linguagem onde o professor pergunta ao
aluno para explicar melhor (de Wain e Woodrow, 1980). Note que o estímulo para esta moldagem
é uma questão proveniente do aluno:
A: Um ponto onde 2 pontos se encontram chama-se vértice. O que quer isso dizer?
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P: Um ponto onde...?
A: 2 pontos se encontram
P: Lê isso outra vez com cuidado (note a estratégia de Clements)
A: Um ponto, onde 2 lados se encontram...
P: Então, onde é que esses lados se encontram? Mostra-me 2 lados seguidos.
A: B e A
P: B e A são o quê?
A: Vértices
P: Sim.
A: Como?
P: BA é um lado
A: Oh, sim.
P: e AE é um lado.
A: BC, CD, DE
P: São todos lados, não são?
A: Então são todos vértices?
P: Não, bem, o que queres dizer com — são todos vértices?
A: DB é vértice, CD é vértice....
P: Quantos lados tem essa figura?
A: 5
P: Agora aponta para um dos cinco lados ... como se chama?
A: AB
P: Diz-me os nomes dos lados ao lado desse.
A: CB
P: Sim, CB. Agora, onde é que CB e AB se encontram?
A: Ali (aponta para o diagrama)
P: Onde?
A: B
P: Então B é o ponto onde os lados AB e BC se encontram. Então como chamamos a B?
A: Um vértice... Então são todos vértices, A é um vértice, B, C,...Oh, o que eles fazem!
A: É um vértice o B, C, ... Há!
P: Então, quantos vértices tem uma figura com 5 lados?
A: Cinco
A intervenção significativa por parte do professor é "o que é que queres dizer com — são
todos vértices?"
Além de darem importantes informações ao professor, tais questões mostram ao aluno que
as suas ideias e construções são levadas a sério pelo professor — um aspecto crucial no processo
de negociação. O professor negociador terá de deixar claro que o desenvolvimento matemático dos
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alunos deve ter em conta o conhecimento que o aluno já possui, senão o aluno não será capaz de
participar na negociação.
Passando das incompreensões e da moldagem da linguagem para nível mais elevado e
complexo, o professor negociador procurará sempre encorajar os alunos a fazerem "atalhos" no seu
pensamento ou a condensar (curtail) o seu raciocínio como indica Krutetskii (1976). Outra
concepção de valor aqui é o "processo de algoritmização" ilustrada por Streefland (1982) o qual
envolve não apenas atalhos mas também progressão na esquematização. Encorajar a generalização
é outra tarefa para o professor procurar desenvolver nos alunos a compreensão matemática e o
extracto seguinte é um bom exemplo disto (de Servais e Varga, 1971):
P: Vamos formular o nosso problema: supondo que um navio consome uma certa quantidade q de óleo por milha à velocidade, digamos, 20 nós, e os tanques têm a capacidade de T toneladas de óleo, quantas milhas pode o navio viajar sem se reabastecer?
A: O que é que q e T significam?
P: Porquê? q significa a quantidade de óleo consumido por milha e T a capacidade do tanque em toneladas.
A: Porque é que tu não nos dá os números? Podíamos fazer um problema.
P: Porque não resolvê-lo sem números?
A: Eu podia resolvê-lo se tivesse números?
P: Diz-me como.
A: Dividia o número de toneladas no tanque pelo consumo por milha.
P: Porque é que não indicas a divisão?
A: Eu podia, mas não sei o que dividir pelo quê.
P: Mas tu sabes, tens tudo o que precisas. Tenta fazê-lo. Usa as letras. T para o número de toneladas e q para a quantidade de óleo consumido por milha. O que é que vais escrever para a incógnita?
A: Vamos chamar-lhe A.
P: Está bem, então A vai ser igual a quê?
A: A é igual a T a dividir por q
Mais uma vez uma "intervenção" particular da professora "Diz-me como" usar positivamente
o poder, convidando o aluno a explicar e a clarificar publicamente os seus pensamentos e
conhecimentos. Isto facilita à professora desenvolver o significado matemático dos alunos com
sucesso. Tais momentos são críticos; o acontecimento (e a intervenção) parece relativamente
insignificante, no entanto quando se acumulam produzem um ambiente de aprendizagem totalmente
diferente para os alunos daquele criado pelo professor que "impõe". Além disso, à medida que os
alunos ficam mais velhos, aprendem mais acerca dos significados matemáticos e ganham confiança
no uso das técnicas de negociação podem entrar conjuntamente no processo de aprendizagem,
muitas vezes tomando mais do poder e controlo do professor. No próximo exemplo, T é um jovem
professor e P é um jovem de 17 anos que fala com facilidade. Como se pode observar, o jovem
professor sente-se um pouco "ameaçado" e faz um erro mas tem "coração" suficiente para o admitir.
O resultado é um processo de partilha genuíno onde ambas as partes desenvolvem os seus
significados:
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P: Jovem professor A: Aluno
1- Como é que x é para ser derivado?... 2- Hum (Pausa)
3- Quando estes... 4 - Espere um minuto, deixe -me só pensar (sic!)
5- O que vai ser o n aqui? 6 - É ... x para o primeiro, então será 1 vezes x para o zero que é 1.
7 - Então é só 1 8 - Sim.
9 - O.K... Hum. 10 - Então é um número?
11 - Então e o 0..? 12 - Um número? vai ser zero? um número? Nada, é exactamente o que pensei
13 - Oh, um número. Vai para nada porque então n é nada.
14 - Isso é muito forte.
15 - Sim
16 - Uma constante vai para nada. Quase que vale a pena recordar, aquela parte, até que estejas habituado a usá-la (as fórmulas).
17 - Quando se pensa nisso, uma constante deveria ir para nada porque o que faz um constante numa curva) Nada.
18 - Sim, concordo, muito bem teres notado isso. Agora... É que (a fórmula) é muito poderosa mas não é válida para n = - 1.
19 - Sim.
20 - É verdade para tudo menos para n = -1 21 - Mas funciona para -2, -3 e isso assim?
22 - Sim ,um minuto, não, desculpa. Estou a ficar um bocado baralhado. De facto funciona para todo o n. Sim, funciona. Sim, desculpa, saltei um bocado em frente.
23 - Podemos fazer uma com um número negativo?
24 - Sim, vamos fazer uma deste modo — tiramos o limite?
25 - Sim.
25 Certo, y é igual a 1 sobre x ao cubo. Continua então.
Lakatos (1976) mostra-nos também que as negociações podem acontecer ao nível do
ensino universitário (mesmo quando são fictícias)
Professor: Esta decomposição da conjectura sugerida pela prova abre novas perspectivas para testar. A decomposição desdobra a conjectura numa área mais ampla, de forma que a nossa crítica tem mais "alvos". Temos agora pelo menos três oportunidades para contra exemplos em vez de um!
Gamma: Eu já expressei o meu desagrado do seu terceiro lema (que dizia que removendo triângulos duma rede que resulta de deformação e subsequente triangulação, só temos duas possibilidades: ou remover um vértice, ou remover duas arestas e um vértice). Suspeitei que outros modelos podem surgir da remoção do triângulo.
Professor: Suspeita não é critica.
Gamma: Então um contra exemplo é critica?
Professor: Claro. As conjecturas não têm em conta desagrados e suspeitas, mas não podem ignorar contra exemplos.
Theta: À parte) As conjecturas são obviamente diferentes de quem as representa.
Claramente o relacionamento que se desenvolveu aqui é um bastante diferente daquele que
foi visto nas escolas mas o "sentimento" da negociação educacional é similar, qualquer que seja o
nível.
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O que podemos nós dizer em geral acerca da negociação que os professores têm a seu
cargo? Em primeiro lugar, se a negociação é para se conseguir então é da responsabilidade do
professor estabelecer, na sala de aula as condições necessárias, do mesmo modo que é necessário
que o professor ensine regras e procedimentos associados a uma suave direcção da aula. De certo
modo, as “regras” para a negociação são meramente extensões, para as salas de aula, do debate
casual ou das regras de discussão e incluem:
- Falar e contribuir com frequência
- Dar aos outros a possibilidade de contribuírem.
- Tratar as outras contribuições com respeito
- Perguntar quando não entende o contributo dos outros
- Objectar, se sente que uma contribuição é de algum modo inválida.
- Apresentar razões para as tuas afirmações
- Tentar separar a ideia da pessoa que a dá.
Naturalmente estas devem ser as regras de comportamento tanto para o professor como
para os alunos e a aderência do professor a elas será fundamental para criar a atmosfera própria e o
respeito mútuo tão necessário para que a negociação ocorra com sucesso. O poder e a autoridade
do professor devem ser vistos, pelos alunos, como algo a ser utilizado positivamente.
Em segundo lugar, por cima e para além destas regras básicas para a aula está a
preocupação do professor em desenvolver a partilha de significados. Geralmente, vimos nos
exemplos anteriores, o professor que deseja promover a negociação como o modo
predominantemente na sua sala de aula precisa de
questionar e responder a questões
dar razões e pedir por razões
clarificar e pedir clarificação
dar analogias e pedir analogias
descrever e pedir por descrições
explicar e pedir explicações
dar e receber exemplos.
A simetria é óbvia e, podíamos argumentar, necessária, se queremos que ocorra uma
genuína negociação de significados.
E terceiro lugar, a meta para o professor de Matemática é o desenvolvimento de significados
matemáticas partilhados e isto incluiu a clarificação de incompreensões matemáticas, a moldagem de
linguagem matemática, encorajar a procura de atalhos e esquematização progressiva, e estimular a
generalização e racionalização.