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Ensino a Distância

Atendimento ao Aluno EADDDG 0800.0514131

DDG: 0800.6426363E-mail: [email protected]

Campus Canoas: Av. Farroupilha, 8001 · Prédio 11 · 2º andar

Corredor central - Sala 130 · Canoas/RSAtendimento de segunda-feira a sexta-feira:

Manhã/Tarde/Noite: Das 8:00hs às 22:30hsAtendimento aos sábados:Manhã: 8:00hs às 12:00hs

MANTENEDORAComunidade Evangélica Luterana São Paulo - CELSP

Rua Fioravante Milanez, 206 CEP 92010-240 – Canoas/RS

Telefone: 51 3472.5613 - Fax: 51 3477.1313 DIREÇÃO

PresidenteDelmar Stahnke

UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASILAv. Farroupilha, 8001 - Bairro São José

CEP 92425-900 - Canoas/RS Telefone: 51 3477.4000 - Fax: 51 3477.1313

REITORIAReitor

Marcos Fernando Ziemer Vice-Reitor

Valter KuchenbeckerPró-Reitor de Administração

Ricardo MüllerPró-Reitor de Graduação

Ricardo Prates Macedo Pró-Reitor Adjunto de Graduação

Pedro Antonio Gonzalez HernandezPró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação

Erwin Francisco Tochtrop JúniorPró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários

Ricardo Willy RiethCapelão geral Gerhard Grasel

Diretor de Ensino do EADJoelci Clécio de Almeida

Orientação e revisão da escritaDóris Cristina Gedrat

Design/Infografia/ProgramaçãoJosé Renato dos Santos Pereira

Luiz Carlos Specht FilhoSabrina Marques Maciel

Sum

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Vermelho

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A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA .............................................................3

HINDUÍSMO ..................................................................................7

BUDISMO ....................................................................................14

ISLAMISMO ................................................................................. 21

JUDAÍSMO ...................................................................................28

CONFUCIONISMO ........................................................................35

XINTOÍSMO .................................................................................40

TAOÍSMO ..................................................................................... 41

CRISTIANISMO ............................................................................44

A MENSAGEM CRISTÃ NAS PARÁBOLAS DE JESUS .........................55

LUTERO E A REFORMA ..................................................................60

IGREJA LUTERANA E EDUCAÇÃO ...................................................70

AS RELIGIÕES DO BRASIL .............................................................79

CULPA E PERDÃO: UMA QUESTÃO EXISTENCIAL ...................................... 90

A RELAÇÃO ENTRE ....................................................................... 97

FÉ E SAÚDE ................................................................................. 97

ÉTICA ........................................................................................103

ÉTICA SOCIAL CRISTÃ APLICADA ................................................. 110

REFERÊNCIAS............................................................................ 117

SUMÁRIO

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A religião tem estado presente no cotidia-no através de diferentes manifestações. Pode-se, sem entrar em detalhes por

ora, mencionar algumas áreas, alguns eventos e algumas práticas pessoais e sociais marcadas por idéias, ritos e símbolos consagrados ao campo religioso.

Vamos utilizar aqui alguns pontos trabalha-dos pelo colega Ronaldo Steffen, estudioso do assunto, professor de Cultura Religiosa, publica-do no site da Universidade.

De uma forma bem simples, podemos repor-tar o leitor a algumas práticas familiares ligadas à tradição religiosa como o casamento, batismo, morte e velamento. São cerimônias religiosas tão tradicionais, que muitas pessoas, sem que se dêem conta, se envolvem. O que dizer de pessoas doentes ou com problemas mais sérios que bus-

A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA

Você já deve ter passado por alguma experiência Religiosa. Se não passou, alguém ao seu lado já deve ter contado algo que o levou a refletir sobre o assun-to. Neste capítulo vamos ver que a experiência religiosa é mais rica do que se imagina e é universal.

Por Prof. Douglas Moacir Flor*

cam ajuda divina como alternativa para a cura?

No esporte estamos acostumados, marcada-mente no futebol, com a cena de uma oração con-junta antes da entrada no campo. Numa decisão por pênalti, por exemplo, é comum a imagem de jogadores ajoelhados, rezando ou beijando sua santinha.

No campo musical não são raras as menções que se faz a personagens religiosos e até mesmo a sentimentos de ordem religiosa; no campo das artes somos conduzidos a milhares de imagens notadamente carregadas de simbolismo religioso dos mais diversos matizes. A literatura não tem deixado por menos e tem sido o mercado que mais cresce em termos de editoria nos últimos anos. O cinema tem sido pródigo nas temáticas de ordem religiosa. As novelas, fenômeno bra-sileiro que ganha o mundo, jamais têm deixado

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de lado alguma alusão, personagem e até mesmo a temática central ligados a fatos eminentemente religiosos.

A nossa alimentação está em grande parte determinada por elementos de ordem religiosa; o modo de expressar nossas idéias através da lin-guagem é, igualmente, em grande parte determi-nada por formas religiosas. O turismo religioso é hoje um grande filão na arrecadação de divi-sas para um município. A educação é fortemente marcada pelos valores que ela prega, quase sem-pre idênticos aos valores de ordem religiosa. A área da saúde, o trato com a dor, a vida e a morte foi e ainda é construída com suporte religioso. Nosso calendário, suas datas festivas e grandes eventos, têm sua origem no meio eclesiástico. As diversas áreas do conhecimento humano, duma ou de outra maneira, têm-se ocupado com a te-mática religiosa, como a Filosofia, a Psicologia, a Sociologia, a Antropologia, a História, a Medi-cina, a Física, a Arqueologia, a Geografia e assim por diante.

A palavra Religião

Afinal, o que é religião? No texto a seguir temos uma definição que pode-

rá ajudá-lo a entender o sentido.

Etimologicamente, o termo Religião surge na história da humanidade através dos autores clássicos, como Cícero, Lactânio e Agostinho, respectivamente, nas palavras re-legere, que sig-nifica reler, re-ligare, que significa religar, e re-eligere, que significa reeleger. Todos os conceitos nos dão a idéia de voltar a uma situação anterior, ou seja, ligar novamente a criatura com o criador. É exatamente esta tentativa de religar com o Ser Superior, através de um conjunto de crenças, nor-mas, ritos ou costumes, que dá origem às diver-sas religiões o fenômeno religioso propriamente dito. (KUCHENBECKER, 2000, 0.)

Apesar de seguidamente ouvir-se que reli-gião é coisa do passado, as menções acima indi-cam uma direção contrária. Estão apontando para o fato de que o ser humano preocupa-se com o di-vino, aqui entendido no sentido daquilo que ocu-pa lugar de destaque ou o primeiro lugar na vida.

Conhecimento ReligiosoAinda tentando responder o que é religião,

podemos dizer que religião é um batismo numa igreja cristã. É um ritual sagrado nas águas do Rio Ganges. É a adoração num templo budista. Pode ser um muçulmano ajoelhado e orando para o Alá. Ou os mesmos devotos do Islã peregrinan-do a Meca. Pode ser um Judeu diante do Muro das lamentações em Jerusalém. São tantas as menções que seria impossível citar todas.

O que pretendemos fazer é ligar os fatos. As ciências da religião procuram responder o que as atividades citadas acima têm em comum. Nós procuramos, como pesquisadores, investigar os rituais de uma perspectiva externa. Buscamos semelhanças e diferenças. Queremos entender como se dá o processo historicamente e o que isso representa para sociedade hoje.

1 - Batismo;

2 - Um monge budista;

3 - Peregrinos no Rio Ganges, na Índia;

4 - Muçulmanos orando;

5 - O muro das lamentações em Jerusalém

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Por que estudar as religiões?

Dependendo da experiência de cada um, as respostas serão diferentes. Talvez você seja um religioso e não precise de tantas explicações. Mas, com certeza, muitas pessoas não se ligaram para a importância do assunto.

Jostein Gaarder, escrevendo O Livro das Re-ligiões, nos ajuda a responder a pergunta acima:

Um rápido olhar para o mundo ao redor mostra que a religião desempenha um papel bastante significativo na vida so-cial e política de todas as partes do globo. Ouvimos falar de católicos e protestantes em conflito na Irlanda do Norte, cristão contra muçulmanos nos Balcãs, atrito entre muçulmanos e hinduístas na Índia, guerra entre hinduístas e budistas no Sri Lanka. Nos Estados Unidos e no Japão há seitas religiosas extremistas que já prati-caram atos de terrorismo. Ao mesmo tem-po, representantes de diversas religiões promovem ajuda humanitária aos pobres e destituídos do terceiro mundo. É difícil adquirir uma compreensão adequada da política internacional sem que se esteja consciente do fator religião. (GAARDER)

Além disso, explica Gaarder, um conheci-mento religioso também pode ser útil num mun-do que se torna cada vez mais multicultural. Ain-da mais quando falamos em globalização, apesar de que o termo deva ser usado com cuidado. Muitos de nós viajamos pelo Brasil ou mesmo ao exterior, entrando em contato com as diver-sas culturas religiosas. Estes povos têm costumes diferentes que devem ser respeitados pelos seus visitantes. Se uma mulher estiver num país mu-çulmano, por exemplo, terá que observar o tipo de roupa que usará nas ruas. É claro que não pre-cisará andar com uma Burca, mas terá que cobrir seu corpo com roupas decentes.

Finalmente, acreditamos que o estudo das religiões pode ser importante para o desenvolvi-mento pessoal do indivíduo. As religiões podem responder várias das perguntas existenciais que fazemos como: de onde viemos, o que somos e para onde iremos.

Tolerância religiosaEste é um dos pontos mais importantes na

nossa caminhada. Tolerância é o respeito pelas pessoas que possuem diferentes pontos de vista em relação à religião. Não significa que precisa-mos concordar com tudo o que as outras religiões praticam e seguir os mesmos rituais. Cada um tem o direito de seguir aquilo que é melhor para si, pode ter uma fé sólida. Mas a tolerância não é compatível com atitudes como zombar das opi-niões alheias ou se utilizar da força e de ameaças. A Tolerância não limita o direito de fazer propa-ganda, mas exige que esta seja feita com respeito pela opinião dos outros (GAARDER).

O respeito pela vida religiosa dos outros, pelas suas opiniões e pontos de vista, é um pré-requisito para a nossa aula de Cultura Religiosa. Sem isso, é impossível começar, pois:

Com freqüência, a intolerância é resultado do conhecimento insuficiente de um assunto. Quem vê de fora uma religião, enxerga apenas as suas manifestações, e não o que elas significam para o indivíduo que a professa (GAARDER).

O respeito pela vida religiosa dos outros, pelas suas opiniões e pontos de vista, é um pré-requisito para a nossa aula de Cultura Religiosa. Sem isso, é impossível começar, pois:

Com freqüência, a intolerância é re-sultado do conhecimento insuficiente de um assunto. Quem vê de fora uma religião, enxerga apenas as suas manifestações, e não o que elas significam para o indivíduo que a professa (GAARDER).

O Alcorão, livro sagrado dos muçulmanos, de-termina que as mulheres devem se vestir de forma a não atrair a atenção dos homens, para isso é preciso esconder todo o corpo, utilizando trajes como o Xador ou a Burca. Trata-se de uma veste fe-minina que cobre todo o corpo. No caso da Burca, até o rosto e os olhos são cobertos. É usada pelas mulheres do Afeganistão.

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Quem sabe você conhece alguém que se identifica com este personagem. É comum a gente encontrar situações como esta. Nas aulas de Cultura Religiosa, quando perguntamos se nossos alunos têm alguma religião, muitos respondem: Sou Católico Apostólico Romano, não praticante. Isto significa que eles são Católicos por tradição, mas não vão à igreja aos domingos. Muitos são católicos, mas não deixam de ir ao terreiro ou ao Centro Espírita.

ConclusãoÉ importante ressaltar aqui a questão da to-

lerância. Religião sem o devido respeito perde o sentido. Não é possível pregar algo e praticar ou-tra coisa. Por outro lado, a experiência religiosa é importante na vida de todo o ser humano. Se você ainda não passou por isso, busque entender um pouco mais do assunto. Leia, reflita sempre.

“Hem? Hem? O que mais penso, texto e explico: todo-o-mundo é louco. O senhor, eu, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de re-ligião: para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. No geral. Isso é que é a salvação-da-alma... Muita reli-gião, seu moço! Eu cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... Uma só, para mim é pouca, talvez não me chegue. Rezo cristão, ca-tólico, embrenho a certo; aceito as preces de compadre meu Que-lemém, doutrina dele, de Car-déque. Mas, quando posso, vou no Mindubim, onde um Matias é crente, metodista: a gente se acu-sa de pecador, lê alto a Bíblia, e ora, cantando hinos belos deles. Tudo me quieta, me suspende. Qualquer sombrinha me refres-ca. Mas é só muito provisório. Eu queria rezar – o tempo todo. Mui-ta gente não me aprova, acham que lei de Deus é privilégios, in-

variável. E eu! Bofe! Detesto! O que sou? – o que faço, que quero, muito curial. E em cara de todos faço, executado. Eu? – não tres-malho!

Olhe: tem uma preta, Maria Leôncia, longe daqui não mora, as rezas dela afamam muita vir-tude de poder. Pois a ela pago, todo mês – encomenda de rezar por mim um terço, todo santo dia, e, nos domingos, um rosário. Vale, se vale. Minha mulher não vê mal nisso. E estou, já mandei recado para uma outra, do Vau-Vau, uma Izina Calanga, para vir aqui, ouvi de que reza também com grandes meremerências, vou efetuar com ela trato igual. Que-ro punhado dessas, me defendo em Deus, reunidas de mim em volta... Chagas de Cristo!

JOÃO GUIMARÃES ROSA

Sincretismo ReligiosoNo Brasil é muito interessante falar sobre

religião. Isto porque temos aqui uma pluralidade religiosa bem interessante. Além disso, encontra-mos o que chamamos de Sincretismo Religioso. Isso acontece quando misturamos elementos de várias religiões numa só. Sincretismo é o ter-mo que os historiadores denominam de fusão ou interpenetrações de religiões, ritos, crenças e personagens cultuais. Os cultos afro-brasileiros são um exemplo comprovado de sincretismo re-ligioso. Queremos mostrar como isso acontece através da fala de um pesonagem sertanejo do passado: Riobaldo Tatarana do Grande Sertão: Veredas:

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HINDUÍSMOCerca de 13% da população mundial segue o Hinduísmo, tornando-a uma

das religiões com mais seguidores no mundo.

Por Prof. Ronaldo Steffen

História

É difícil identificar uma data para regis-trar o início do hinduísmo. Costuma-se atribuir a alguma data entre 1500 a.C.

e 200 a.C. Nesse período, um grupo de nobres (denominados de arianos) dominou o vale do rio Indo. Os nobres trouxeram suas crenças, forte-mente influenciadas por concepções religiosas indo-européias (grega, romana e germânica). Esse período é denominado de período védico do hinduísmo em razão dos hinos recitados pelos sacerdotes. Esses hinos eram chamados de vedas e significam “conhecimento”.

O sacrifício era importante para o culto aria-no. Faziam-se oferendas aos deuses a fim de se conquistarem seus favores e se manterem sob controle as forças do caos.

Achados arqueológicos no vale do rio Indo indicam que houve uma civilização avançada na Índia, anterior à chegada dos indo-europeus, e é certo que essa civilização também contribuiu para o hinduísmo moderno.

Num período posterior, provavelmente entre 1000 a.C. e 500 a.C., surgiram os Upanishads,

escritos em forma de diálogos entre o mestre e o discípulo. É nesse período que é introduzida a noção de Brahman, a força espiritual essencial sobre a qual se baseia todo o universo. É por essa razão que se diz que todos nascem do Brahman, vivem no Brahman e retornam ao Brahman por ocasião da morte.

Os “Upanishads” introduzem a idéia de “Brahman”. Todos nas-cem dele, vivem nele e na morte

retornam a ele.

HojeO hinduísmo, embora originário da Índia,

possui adeptos espalhados por todos os países a sua volta, em especial Nepal, Bangladesh e Sri Lanka.

Apenas em 1947 é que a Índia deixa de ser um Estado religioso e passa a garantir direito de expressão religiosa a todas as denominações re-ligiosas.

Nesse mesmo ano, a tensão entre hinduís-tas e muçulmanos em razão da independência

OHM: é símbolo universal do Hinduísmo e seu som impede sentimentos ruins e transmuta os pensamentos negativos em positivos.

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da Índia resultou na criação do Paquistão como um Estado muçulmano separado, dividido em duas partes distintas, o Paquistão do Leste e o Paquistão do Oeste. Depois da guerra de 1971 entre a Índia e o Paquistão, o Paquistão do Leste se tornou um Estado independente com o nome de Bangladesh.

EnsinamentosDeuses

A multiplicidade do hinduísmo também se manifesta em seu conceito de transcendente. Há duas formas de compreender o tema: uma filosó-fica (Brahman é o princípio e a realidade última; o universo em sua totalidade é um só com a di-vindade; Brahman toma a forma de três divinda-des: Brahma, Vishnu e Shiva, respectivamente o Criador, o Mantenedor da criação e o Destruidor) e outra popular, ou menos acadêmica (acredita-se num grande número de divindades a tal ponto que quase todas as aldeias elegem sua divindade local).

DeusasO hinduísmo tem uma série de deusas. Al-

guns adotam a teoria de que essa abundância de deusas não passa da expressão de uma grande e poderosa divindade feminina, a Rainha do Uni-verso ou Deusa-Mãe. Sua manifestação mais conhecida é Kali, a deusa negra, adorada, sobre-tudo, no Leste da Índia e a quem se sacrificam animais. O alto status de Kali no mundo dos deu-

ses é evidente pelas imagens que a mostram piso-teando o corpo de Shiva.

A importância das deusas na religião india-na é visível pela escolha da Mãe Índia (Bhárata Mata ou Bharthamata) como a divindade nacio-nal do moderno Estado da Índia. Na cidade de Varanasi há um templo especial que lhe é dedica-do. Ali, em vez de uma representação da deusa, está exposto um mapa da Índia.

Divindades menoresA maioria das aldeias tem seu templo dedi-

cado a Vishnu ou a Shiva. Esses deuses se con-centram nas questões maiores, universais e, em geral, são homenageados nos grandes festivais. Num nível mais doméstico, as pessoas costumam visitar pequenos templos dedicados a divindades menos importantes.

Embora não sejam tão poderosas como Vishnu ou Shiva, é mais fácil se aproximar delas para assuntos de menor importância, tais como os problemas pessoais.

Há deuses para as questões universais e deuses para as

questões pessoais.

Os deuses menores por vezes exercem in-fluência em áreas específicas, como, por exem-plo, em certos tipos de doença. Muitos deles têm origem humana: podem ser heróis que morreram em batalha ou esposas que se ofereceram para serem queimadas na pira funerária do marido. Alguns deuses são espíritos malignos que foram

Conheça alguns deuses do hinduísmo

Vishnu reencarnado também como Krishna

Shiva, senhor da criação e destruição

Bharata Mata, divindade nacional da Índia

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deixados para trás por homens maus. Ao cultivar esses espíritos como deuses, é possível controlar e neutralizar sua maldade.

Ser humanoA concepção que o hinduísmo desenvolve

a respeito do ser humano está intimamente vin-culada a uma compreensão ampla que privilegia os entendimentos sobre carma, reencarnação e o sistema de castas.

Carma e reencarnação

O ser humano tem uma alma imortal que não lhe pertence. Depois da morte, a alma volta a aparecer pelo renascimento, não necessariamen-te em forma humana, podendo, também, vir a re-nascer num animal.

O conceito que expli-ca esse eterno vai-e-vem da alma é o carma (“ato” ou “ação”) do ser humano, referindo-se tanto às ações como aos pensamentos, às palavras e aos sentimentos. Desse modo, entende-se que o carma é determinante para o que irá ocorrer numa pró-xima existência. Muito embora se possa concluir que o carma é uma punição ou uma recompensa das ações humanas, não é esse o modo de com-preender sua extensão. É como se ele fosse ape-nas uma lei natural da existência. Colhe-se aquilo que se planta, e é justamente isso que explica as diferenças entre as pessoas. O ser humano é res-ponsável por si mesmo e de posse do livre-arbí-trio está apto a produzir as mudanças necessárias com vistas a uma melhor existência posterior, quando renascer.

O sistema de castas

O surgimento do conceito de casta é confu-so. O fato a ressaltar é a chegada dos arianos à Índia, com língua, cultura e traços fisionômicos (altos, pele clara, olhos azuis e cabelos lisos) di-ferentes. A diferença propiciou um sistema de identificação pela cor (varna, em sânscrito). As

classificações tiveram ampliação à medida que a organização se fazia necessária, de modo que se chegou a uma estratificação com quatro classes sociais: videntes, administradores, produtores e seguidores.

Na prática popular, hoje, a casta é entendi-da como as possibilidades que alguém tem de se relacionar com coisas mais puras ou impuras. Essas possibilidades são determinadas pelas re-gras que conduzem cada casta: castas elevadas buscam cada vez mais distanciamento das coi-sas materiais; castas mais baixas se permitem a aproximação com as coisas da matéria. Duma ou doutra forma, se alguém quebrar alguma das re-gras de sua casta, restam-lhe os rituais de purifi-cação, sendo o mais conhecido o banho num dos muitos rios sagrados.

Os efeitos do sistema de castas e suas regras específicas influenciam di-retamente a base da divisão de trabalho na comunidade. Certas atividades e certos trabalhos são tão impuros que somente determinadas castas podem realizá-los. Essas castas têm o dever de ajudar os outros a manterem sua pureza. Por outro lado, apenas as castas que pre-

encham os requisitos de pureza podem se apro-ximar dos deuses mais elevados. Para que isso ocorra com mais facilidade, outras pessoas de-vem ser impuras. Entretanto, todos se beneficiam da limpeza dos puros, pois todos os hinduístas tiram proveito dos ritos que são praticados.

O sistema de castas deu um novo contexto à vida do indiano moderno. Assim, ser expulso de sua casta é o pior castigo imaginável e, por isso, só utilizado para crimes muito sérios. O nível mais baixo no sistema de castas é o dos intocá-veis ou sem-casta (também chamados de párias): criminosos, lixeiros e curtidores de couro de ani-mais, por exemplo.

As complexas regras que controlam o con-trato social entre as castas eram muito rígidas. A Constituição da Índia, de 1947, introduziu, no en-tanto, medidas com a finalidade de banir a discri-minação por casta. Como não basta mudar a le-gislação para acabar com antigas divisões sociais

Reigiosa-mente, as cas-tas indicam o mente, as castas indicam o mente, as cas

grau de pureza ou impureza de grau de pureza ou impureza de grau de pureza

uma pessoa.

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e religiosas, o sistema de castas continua tendo um papel importante, em especial nas aldeias.

Vida e MorteDurante o período védico, as doutrinas do

carma e dos renascimentos eram vistas como algo positivo. Por meio dos sacrifícios e das boas ações, o ser humano podia garantir que viveria várias vidas. Mais tarde, o hinduísmo passou a considerar esse ciclo como algo negativo, como um círculo vicioso a ser quebrado. É possível, as-sim, distinguir três caminhos para a libertação: as vias do sacrifício, do conhecimento e da devoção.

A via do sacrifício

Como vimos, a palavra indiana para ”ato” é carma. Hoje ela é usada para denotar todos os atos humanos e até mesmo a coletividade desses atos. No período védico, o termo se referia basi-camente a atos religiosos ou rituais, em especial aos atos sacrificiais. Estes eram necessários para incrementar a fertilidade e manter a ordem uni-versal, além de propiciar a possibilidade de liber-tação do constante nascer-renascer, integrando-se de modo definitivo com Brahman.

A via da compreensão ou do conheci-mento

A compreensão ou o conhecimento é apenas uma das formas de libertar-se do ciclo de renas-cimentos, pois se enfatiza que é a ignorância que aprisiona o ser humano a esse ciclo.

Compreender a verdadeira natureza da exis-tência, o oposto da ignorância, é, portanto, um caminho para a libertação. É apenas quando o ser humano adquire o reto conhecimento que ele é redimido da implacável roda da transmigração. O reto conhecimento mencionado nada mais é do que a compreensão de que a alma humana (atmã: é o reflexo da alma universal e encontra-se nos seres humanos, nas plantas e nos animais) e o mundo espiritual (Brahman) são uma e a mesma coisa.

A via da devoção

Uma terceira rota para a salvação é a via da devoção, que é a dedicação que o ser humano de-vota a um deus e o seu agir desinteressado para com o seu semelhante. Essa proposta começou a difundir-se no Sul da Índia, por volta de 600 a.C. e logo se espalhou por toda a região da Índia. Já no século III a.C. esse caminho para a libertação encontrara sua expressão no Bhagavad Gita, um

As possibilidades de ciclo da vida. Tudo é determinado pelas ações do presente

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poema catequético. Essa terceira tendência do hinduísmo é a que predomina na Índia moderna, e o livro Bhagavad Gita é o texto sagrado que ocupa o lugar supremo na consciência do indiano médio.

MundoÉ plural

O mundo não é uno, mas plural. Há diver-sos mundos interconectados pela mesma razão. É como se fossem infinitas galáxias, e cada uma com o seu ponto de referência, como a Terra. Para dar uma dimensão superlativa ao conceito de infinitas galáxias, o hinduísmo entende que entre esse ponto de referência e o restante da ga-láxia há diversos outros mundos mais sutis, aci-ma, e mais grosseiros, abaixo. Os mundos sutis e grosseiros são os espaços ocupados pelas almas e que por eles transitam conforme os méritos ad-quiridos ou não.

Cada mundo e galáxia têm ciclos diferentes de tempo. Há tempo que se expande e tempo que se recolhe, eterna e incontavelmente no mesmo movimento, estabelecendo os ciclos cósmicos.

É meio

O mundo e suas galáxias têm uma razão. É o espaço onde as almas individuais cumprem a inexorável lei do carma até sua libertação. Ine-rente ao conceito de carma está que toda decisão do ser humano terá determinadas conseqüências. Não há fatalismos no universo.

Nos mundos mais grosseiros há uma percep-ção maior dos elementos sensoriais. Em razão dos prazeres proporcionados, geralmente assen-tados no eu individual, o ser humano deve buscar a libertação para mundos cada vez mais sensí-veis, em direção ao EU absoluto, o Transcenden-te, até sua integração completa.

É moderado

O mundo e suas galáxias são o espaço onde bem e mal, prazer e dor, conhecimento e igno-

rância se entrelaçam em proporções quase iguais. Não faz parte dos propósitos do universo ser um paraíso, mas o espaço onde o espírito do ser hu-mano pode viabilizar seu aprendizado de integra-ção ao Transcendente. É como se o universo per-ceptível servisse apenas para poder perceber-se que há outra realidade além dele.

É maya

O mundo e suas galáxias são maya. A palavra maya possui a mesma raiz que mágica. Na mági-ca, o que vemos nem sempre é o que pensamos ver. Assim é o universo. Enquanto em processo de constantes renascimentos, o ser humano pode cair no ardil de que a materialidade e a multipli-cidade são realidades independentes, quando, em realidade, são Brahman, o todo inclusivo de tudo o que é e de tudo o que não é.

O mundo e suas galáxias podem ser a pri-são do ciclo de constantes e infindáveis renasci-mentos do ser humano. O universo aí está para poder perceber-se sua unidade, que é Brahman. Mesmo que o ser humano não o perceba ou o perceba apenas parcialmente, ele continua sendo Brahman.

É lila

O mundo e suas galáxias são o espaço lila (“dança”) do Transcendente. É onde ele dança, numa espécie de jogo, de forma incansável, in-finda, irresistível, mas absolutamente benéfica. É o jogo que o Transcendente criou a fim de que o finito seja superado e destruído pelo infinito.

Principais tendênciasEscolas do pensamento hindu

Entre os séculos II a.C. e IV d.C., surgiram seis escolas ortodoxas da filosofia clássica hindu, descritas a seguir. Não eram grupos organizados, mas sistemas de pensamento que apresentavam perspectivas diversas, porém complementares, de métodos devocionais, interpretação das escri-turas e cosmologia.

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• Vaiseshika – Defende que a libertação do ser humano se dá pela compreensão das leis da natureza.

• Nyaya – A libertação do ser humano se dá pelo conhecimento por meio do raciocínio lógico.

• Sakhya – A libertação do ser humano ocorre quando se alcança a união da alma individual com o Transcendente (moksha) por meio da consciência que se desvencilha das preocupações mundanas e ma-teriais. Ela acreditava numa libertação ascética que acontece através de meditação e no domínio das paixões

• Mimamsa – A libertação do ser humano dar-se-á à medida que os escritos sagrados forem adequadamente interpretados e, em decor-rência, produzirem o justo agir (darma).

• Vedanta – A libertação do ser humano é decorrência da correta compreensão do Transcendente e dos conhecimentos espirituais, possibilitada pela igualda-de entre a alma individual e o Trans-cendente. Isto é atingido por técnicas transcendentes de controle de corpo e mente.

• Bhakti – A libertação do ser huma-no é possível em razão das atitu-des devocionais que permitem a união entre a alma individual e o Transcendente, embora sejam diferentes.

O pensamento hindu no ocidente

Em meados do século XX, surgiu na Europa e nos Estados Unidos um grande interesse pela espiritualidade oriental. Dentre as muitas razões para isso, podemos afirmar que o Ocidente ma-terialista, espiritualmente estéril, percebeu que a vida e o viver iam muito além dos reducionis-

tas aspectos biológicos. Esse interesse, que atin-giu seu ponto culminante nas décadas de 1960 e 1970, concentrou-se no budismo e no hinduísmo, com destaque para a ioga. Surgiram inúmeros movimentos que apresentaram o modo hinduísta de responder às questões da vida. Eram, em re-gra, movimentos centrados na personalidade de algum mestre (guru) carismático, venerado como se fosse um avatar. Dos movimentos que perma-neceram na ativa após a morte de seus fundado-res, destacamos:

As 6 escolas ortodoxas da filosofia clássica hindu

Templo hindu em Mysore - Índia

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• Meher Baba (1894-1969) – Foi o primeiro guru moderno de importância a con-quistar adeptos no Ocidente. Nascido na Índia, elaborou uma doutrina que sin-tetizava várias tradições religiosas, inclusive os conceitos de carma e samsara (“renascimento cíclico”). Ensinava que o estado de iluminação que liberta só se alcança por meio do amor puro, desinteressado.

• Sociedade Internacional da Consciência de Krishna – Foi fundada em mea-dos da década de 1960 no Ocidente por A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada (1896-1977). Seus discípulos de túnica amarela procuram a iluminação por meio do estudo das escrituras védicas, em especial o Bhagavad Gita, e do canto de um mantra em louvor a Krishna e Rama (graças ao qual o movimento é popularmen-te conhecido como Hare Krishna). Praticam um ascetismo rigoroso, que inclui o celibato, a não ser com finalidade de procriação e dentro do casamento.

• Meditação transcendental – Ensina um método simples de meditação que se baseia em um mantra pessoal (palavra ou frase) que, constantemente repetido, produz o efeito de reduzir o estresse e de promover a integração pessoal e, por conseqüência, a iluminação que liberta. Foi trazido para o Ocidente por Maha-rishi Mahesh Yogi, nascido em 1911, em fins da década de 1950 e alcançou po-pularidade quando os Beatles se tornaram seus adeptos.

• Missão da Luz Divina – Fundado na Índia em 1960 e no Ocidente em 1971, proclamou um menino guru, Maharah Ji, nascido em 1958, o mais recente avatar do Transcendente. Ensina quatro técnicas de meditação que capacitam os devo-tos a se voltarem para dentro de si mesmos a fim de experimentarem o estado de iluminação: a Luz Divina, a Harmonia Divina, o Néctar Divino e a Palavra Divina.

• Bhagwan Shri Rajneesh (1931-1990) – Também conhecido como Osho. Mi-nistra a doutrina do amor livre, da sexualidade desinibida e dos atos impulsivos, juntamente com uma forma de meditação dinâmica que visa liberar a energia da Terra. Uma das técnicas de liberação das energias reprimidas é o riso. Possui centros de meditação em todo o mundo. Só no Brasil são oito centros, além de um jornal de circulação nacional.

Alguns movimentos que permaneceram na ativa após a morte de seus fundadores

Fundador: não há fundador.

Ano de fundação: as raízes do hinduísmo remontam a um período entre 1500 a.C. e 200 a.C.

Textos sagrados: Livro dos Vedas, que consiste numa coletânea de qua-tro obras, das quais certas partes datam de 1500 a.C.

Estatística: hoje, cerca de 80% da população da Índia é hinduísta. O restante divide-se entre muçulmanos (10%), cristãos (4%) e outros gru-pos (6%). Em todo o mundo, os hinduístas perfazem cerca de 13% da população mundial.

Perfil do Hinduísmo

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Estátua monumental de Buda em Kamakura - JapãoEstátua monumental de Buda em Kamakura - Japão

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BUDISMOUma religião e filosofia baseada nos ensinamentos deixados por Siddhartha

Gautama, objetivando o fim do ciclo de sofrimento.

Por Prof. Ronaldo Steffen

HistóriaA Índia antes do budismo

O mundo à época do nascimento de Siddartha era de mudanças. Por volta de 1500 a.C., a Índia passou a ser influenciada pela religião védica, trazida pelos guerreiros arianos. Possivelmente o processo sincrético ocorrido entre os arianos e os não-arianos tenha originado o hinduísmo

após séculos de evolução. Essas mudanças teriam ocorrido entre os anos 1000 a.C. e 200 a.C. Além das revoltas filosóficas contra o vedismo e o bramanismo, duas religiões surgiram na Índia: o jainismo

e o budismo. Acresce que nesse tempo surgiram duas grandes escolas filosóficas: a Ajivakas, ou nihilistas, e a Lokayatas, ou materialis-

tas. Posteriormente, essas duas escolas opuseram-se ao hindu-ísmo. Popular também à época do nascimento de Siddartha

era um movimento denominado Sâmara, uma espécie de contracultura dos mendicantes religiosos, que optaram pela renúncia ao mundo. Todos esses movimentos surgi-ram no exato momento em que o ambiente da Índia era

um campo fértil para novas idéias.

Num período posterior, provavelmente entre 1000 a.C. e 500 a.C., surgiram os Upanishads, escritos em for-ma de diálogos entre o mestre e o discípulo. É nesse perío-

do que é introduzida a noção de Brahman, a força espiritual essencial sobre a qual se baseia todo o universo. É por

essa razão que se diz que todos nascem do Brahman, vivem no Brahman e retornam

ao Brahman por ocasião da morte.

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O nascimento e vida de Siddartha

O príncipe Siddartha cresceu em meio à for-tuna e ao luxo. Seu pai ouvira uma profecia de que seu filho ou seria um poderoso governan-te, ou abandonaria por completo o mundo. Esta última opção ocorreria caso o príncipe testemu-nhasse as mazelas e o sofrimento das pessoas. Para evitar essa situação, tentou proteger seu fi-lho, mantendo-o recluso aos limites do palácio e cercado de delícias e diversões. Casou-se jovem com uma prima e mantinha um harém de dan-çarinas.

Aos 29 anos, Siddartha experimenta uma situação que mudaria por completo sua vida palaciana. Embora proibido pelo pai, arriscou-se a sair do palácio e viu, pela primeira vez, um velho, um homem doente e um cadáver em de-composição. A contradição se interpôs quando, a seguir, viu um asceta com uma expressão de radiante alegria. Percebeu que a vida de riqueza e prazer não traduz uma existência plena e com sentido. Questionou-se sobre a possibilidade de haver algo que ultrapassasse a velhice, a doença e a morte. Percebeu-se tocado por um profundo sentimento de compaixão pelas pessoas e por um chamado a fim de libertá-las do sofrimento. Ato contínuo, renuncia à vida prazerosa do palácio, a sua esposa e filho e parte para uma vida de andarilho.

Da vida de abundância passa aos extremos dos exercícios ascéticos. Come cada vez me-nos; chega a alimentar-se apenas com um grão de arroz por dia. O que esperava conseguir era o domínio do sofrimento. Sem resultado, adota o

“caminho do meio”, a meditação. Após seis anos de meditação ascética, aos 35 anos, chega à ilu-minação (bodhi), à margem de um afluente do rio Ganges. Agora era um buda, um iluminado. Alcançara a percepção de que todo o sofrimento do mundo é causado pelo desejo. É apenas su-primindo o desejo que o homem pode escapar de outras encarnações e atingir a realidade última: o nirvana. Encontrara para si uma saída para a su-peração do sofrimento. Passo seguinte, Siddartha decide compartilhar sua percepção.

À época, Benares era um grande centro re-ligioso. É para lá que se dirige. Faz sua primeira pregação e desencadeia o que se denomina de rodas de instrução. Monges mendigos tornam-se seus discípulos e por aproximadamente 40 anos o seguem pelo Nordeste da Índia. Seus seguidores, desde o princípio, dividem-se em dois grupos: os leigos e os monges.

Por volta dos 80 anos, adoece e despede-se de seus discípulos. Daí para frente eles poderiam contar somente com o darma (“instrução”) que Siddartha lhes havia dado nos anos anteriores.

Uma vez que o budismo surge dentro do contexto hinduísta como um caminho individu-al para a libertação dos renascimentos, é natural que muitos de seus ensinamentos estejam marca-dos por esse pensamento. Destacam-se, de modo especial, os pensamentos referentes às doutrinas do renascimento, do carma e da libertação (ou salvação).

DeusesBuda não negou a existência dos deuses. To-

davia, acreditava que esta era transitória, assim como a existência humana. Embora eles vives-

A Árvore da Ilumi-nação, venerada por monges bu-distas, tem sido por séculos um lo-cal de constante peregrinação.

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Dukkha é mais que sofrimento: refere-se à ausên-cia de perfeição universal

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sem mais tempo que os seres humanos, também estavam atrelados ao ciclo de renascimentos e em nada podiam ajudar os seres humanos a se redi-mirem de tal ciclo.

Outro aspecto a ressaltar diz respeito à ado-ração de demônios, espíritos e outras divindades. Todos são seres vivos e, se cultuados de modo correto, podem trazer vantagens para a vida neste mundo.

Ser humano

“Aquilo que você planta é o que colhe.” O ser humano é dono de seu destino: o que pensa e faz é determinante

de seu futuro cósmico.

Para o hinduísmo, originalmente, todo ser humano, bem como todo o universo, possui uma única alma (atmã), que sobrevive de uma existên-cia a outra e é idêntica, total ou parcialmente, ao Transcendente universal (Brahman).

Buda rompe essa lógica. Nega que o ser humano tenha alma e rejeita a existência de um espírito universal. A alma é fugaz e fruto da ig-norância humana, que promove o desejo, funda-mental para a criação do carma individual.

Nessa dimensão, o budismo entende a vida humana como uma série de processos mentais e

físicos que alteram o ser humano de momento a momento. Tudo é transitório.

Vida e morteA lei do carma

Para Siddartha, o Buda, o ser humano é es-cravizado por uma série de renascimentos. Como todas as ações têm conseqüências, o princípio propulsor que está por detrás do ciclo nascimen-to-morte-renascimento são os pensamentos dos seres humanos, suas palavras e seus atos (carma).

A idéia básica consiste em que tudo o que fi-zemos em determinada vida, ainda que passada, repercute e alcança-nos no presente. As ações de uma vida estendem-se a outra. O ser humano irá colher no presente aquilo que plantou no passa-do. Não há “destino cego” nem “divina providên-cia”. Daí a impossibilidade de escapar do carma. Enquanto houver um carma, o ser humano está fadado a renascer e manter-se preso à existência humana, não transcendendo. Em razão disso, tor-na-se imperiosa a busca por uma saída que seja capaz de produzir a libertação humana.

As quatro nobres verdades sobre o sofrimento

O denominado Sermão de Benares, que apresentou as quatro verdades sobre o sofrimento humano, ocorreu depois que Siddartha obteve o estado de iluminação.

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As quatro nobres verdades sobre o sofrimento1

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2 Resolução justa

3 Palavra justa

4 Conduta justa

5 Sustento de vida justa

6 Esforço justo

7 Pensamento justo

8 Meditação justa

Tudo é sofrimento

A causa do sofrimento é o desejo

O sofrimento cessa quando o desejo cessa

O desejo cessa seguindo-se o caminho das 8 vias:

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aqui e agora e, por isso, nirvana não é um estado futuro. Simplesmente é o estado em que o desejo cessa completamente.

O desejo cessa seguindo-se o caminho das oito vias – São elas:

Entendimento (ou percepção/vi-são) justo: para conhecer a natureza e a origem do sofrimento, a cessação do sofrimento e o caminho que con-duz para a cessação do sofrimento.

Resolução justa: renunciar à mate-rialidade presente no mundo e não prejudicar ou odiar o semelhante.

Palavra justa: abster-se da mentira ou da calúnia, da injúria e dos me-xericos.

Conduta justa: abster-se de tirar a vida, roubar e praticar a luxúria.

Sustento de vida justo: abster-se de pegar ou comercializar armas, con-sumir álcool e tóxicos e de qualquer outra atividade que possa trazer pre-juízo a outros.

Esforço justo: é a vontade necessá-ria para estancar as más qualidades que afloram à mente, eliminar todas as que ali ainda estão e desenvolver bons estados mentais.

Pensamento justo: ter consciência do seu próprio corpo, dos sentimen-tos e das atividades da mente.

Meditação justa: é quando, priva-do de luxúria e disposições erradas, a serenidade interna é desenvolvida por meio da prática de meditação. Esta é a atividade que, em última análise, conduz ao nirvana.

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Tudo é sofrimento – Para o budismo, o sofrimento implica algo mais do que mero desconforto físico e psicológico. Toda a existência é manchada pelo so-frimento, pois tudo é passageiro. Quem não percebe isso é cego. Isso, no entanto, não significa que o budismo negue toda a felicidade material e mental. A felicidade pode ser encontrada em muitos setores da vida, como na família, e em muitas coisas que estão à volta do ser humano. Porém, nada disso vai durar para sempre.

A causa do sofrimento é o desejo – O desejo é o mesmo que ânsia. Há três tipos de desejos: desejo pela sensualidade, de-sejo por ser/existir e desejo por não ser/não existir. Resumida e metaforicamente, significa prender-se a algo no curso da existência como se ele fosse absoluta-mente substancial para o ato de existir. É o desejo que produz a existência conti-nuada e a necessidade do renascimento. Não é a transitoriedade da felicidade que causa o sofrimento, mas a atitude frente a ela, como o apego e a ignorância.

O sofrimento cessa quando o desejo cessa – A experiência de interrupção do sofrimento é tão real quanto a própria ex-periência do sofrimento. À interrupção do sofrimento dá-se o nome de nirvana. O nirvana é a cessação de mudança. O nirvana pode apenas ser experimentado, mas não descrito. Resumidamente pode ser definido como a cessação dos apegos ou dos desejos e certamente não é iden-tificado com o céu. O nirvana não é um lugar real ou metafórico. Em vez disso, o pressuposto é que a dor e a cessação da dor são duas experiências reais realizadas

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Analise os oito caminhos como uma proposta de conduta ética e tire suas próprias conclusões.Para pesquisar e confrontar:Como o cristianismo explica o sofrimento?Nirvana e céu são a mesma coisa?

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ÉticaCom a decisão de Buda, depois de alcançar

a iluminação, de tornar-se guia do ser humano, passam a ser fundamentais para o budismo o amor e a compaixão. Não só as ações, mas tam-bém os sentimentos e os afetos são importantes. A caridade realizada não apenas afeta aos outros, mas contribui para enobrecer o próprio caráter de quem a pratica.

Nessa dimensão, o budismo tem cinco re-gras de conduta:

As 5 regras de conduta do Budismo

•Com relação às criaturas vivas: evitar toda maldade.

•Evitar o roubo.

•Não ser sexualmente promíscuo.

•Falar apenas a verdade.

•Evitar o uso de álcool e drogas.

MundoNo mundo tudo é transitório. Nada é defi-

nitivo e, por isso, essa transitoriedade deve ser abandonada para evitar-se todo e qualquer de-sejo. Notemos, no entanto, que, quando se fala em abandonar a transitoriedade da materialida-de constante no mundo, o que se tem em mente é o apegar-se a essa materialidade como se ela fosse capaz de resolver os problemas da natureza humana. A única saída para a transitoriedade do mundo é o nirvana.

Uma vez que o nirvana é o oposto direto do ciclo de renascimentos, e uma vez que ele não pode ser comparado a nada neste mundo, só é possível dizer que o nirvana não é. Alcançá-lo só é possível por meio do estado de iluminação e de nada adiantam, por si sós, as boas obras.

Embora o mundo não tenha autonomia, seja transitório e pleno de sofrimento, este é o espaço dado e no qual o ser humano pode chegar à liber-tação plena dos renascimentos.

O Caminho ao Nirvana: é como se os desejos fossem sendo apagados

Principais tendênciasOs pensamentos de Buda foram transmiti-

dos oralmente. O resultado foi o surgimento de, pelo menos, 18 escolas diferentes. As escolas re-lacionadas a seguir representam apenas as mais importantes ramificações do budismo no mundo moderno.

Budismo Theravada – É a mais antiga es-cola da tradição budista. Defende que cada ser humano é responsável sozinho pela sua própria iluminação. Apenas poucos alcançam esse esta-do. A sabedoria e a disciplina são virtudes valio-sas. Os rituais não são fundamentais, e sim a de-voção. Está presente no Sri Lanka, na Tailândia, em Mianmar, em Laos e no Camboja.

Budismo Mahayana – É o budismo das pessoas comuns. Enfatiza que qualquer pessoa pode alcançar o estado de iluminação que liberta. A compaixão e o amor pelos menos afortunados são mais importantes que a sabedoria.

Budismo Zen – É um amálgama da escola Mahayana com o taoísmo. Zen é o caminho da iluminação por meio da meditação e da vida sim-ples, evitando as teorias abstratas e favorecendo a experiência direta de um espírito “vazio” e aber-to. Há duas grandes escolas: a Rinzai Zen, que dá ênfase à iluminação espontânea, e a Soto, que enfatiza a concentração espiritual e corporal dis-ciplinada na meditação. As escolas Zen também enfatizam a pintura, a caligrafia e até a cerimô-nia do chá como expressões de um vínculo não interpretado com a natureza. Tornou-se popular

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no Ocidente a partir da década de 1950, com o surgimento dos movimentos holísticos.

Budismo da Terra Pura – É o culto de um buda ou bodhisattva que vive numa terra pura, celestial. Seus devotos procuram renascer na Ter-ra Pura, onde alcançarão a iluminação libertado-ra.

Budismo Nichiren – Também conhecido como Seita do Lótus, ensina que o budista verda-deiro é o que segue os ensinamentos contidos no Sutra do Lótus, escritura do século I d.C. A ênfa-se é que Buda é eterno e cósmico, manifestando-se incessantemente em budas terrenos. O maior grupo dessa tendência é o Nichiren Shoshu.

Budismo tibetano – Também conhecido como lamaísmo, adota a doutrina do bodhisattva e o caminho gradual rumo ao estado de ilumina-ção por meio de rígidas disciplinas monásticas. O grupo mais importante nessa tendência é de Gelugpa, fundado em fins do século XIV d.C. Seu líder espiritual é o Dalai-Lama (“guru ocea-no”), cuja sabedoria é profunda e ampla como o mar. O Dalai-Lama é considerado a encarnação

de um bodhisattva, e cada dalai-lama sucessivo é a reencarnação do anterior. A partir do século XVII, o Dalai-Lama passou a ser também o lí-der secular do Tibete, até o país ser ocupado pela China, em 1959, quando o Dalai-Lama passou a viver em exílio.

No Brasil, como podemos ver a seguir, po-dem ser identificadas três grandes escolas bu-distas. Devemos levar em conta que cada escola pode estar subdividida em vários grupos.

As três tradições fundamentaisAs diversas escolas budistas existentes po-

dem ser agrupadas em três tradições fundamen-tais. Ainda na Índia, desenvolveram-se diferentes correntes com interpretações específicas dos en-sinamentos de Buda. Desse budismo primitivo, sobrevive até hoje a tradição Theravada. Simul-taneamente, a doutrina de Buda correu a Ásia e foi adaptada a diferentes culturas. O resultado é a diversidade.

As 3 grandes escolas budistasInício

Região de Consolidação

Filosofia*Grupos no Brasil

Membros no Brasil

Alguns líderes no Brasil

Theravada(Hinayana)

Séc IV a.C. Sul da Ásia (Sri Lanka, Tailân-dia, Mianmar, Laos, Camboja)

A figura do “vaículo pequeno” resume o espírito da tradição Theravada, também chamada de Hinayana. Cada um é responsável por guiar o próprio barco. Sozinho, o praticante busca a auto-iluminação por meio da meditação e de uma conduta condizente com a doutrina de Buda.

5 Menos de 1 mil

Pushwelle Vipasse

Mahayana Séc. I a.C. Norte da Ásia (China, Coréia, Japão)

A tradição Mahayana pode ser simbolizada pela figura do “veículo grande”. O fiel não apenas busca a própria ilumi-nação como pode contribuir para que todos a sua volta evoluam espiritualmente. O bodhisattva (ser iluminado) é o timoneiro em um barco com muitos passageiros

85 Cerca de 220 mil

Monja Sinceri-dade e Monja Coen

Vajarayana Séc. VII d.C.

Tibete Os primeiros missionários a visitar o Tibete tiveram de incorporar algumas práticas xamânicas da população na-tiva. A tradição Vajrayana, ou “veículo diamante” combina a ética Mahayana com doutrinas esotéricas do Tantrismo

45 Cerca de 3 mil

Lama Michel e Segyu Rinpoche

*Números aproximadosConsultoria: Prof. Frank Usarski, programa de pós-graduação em Ciências da Religião da PUC de São Paulo. Fonte: Revista Isto É, 2003.

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Fundador: Siddartha Gautama, identificado por seus seguidores como Sakyamuni (pertencente ao clã dos Sakya), Buddha (“o iluminado”) ou Bhagavat (“senhor”). É tido como o quarto dos cinco budas encarnados. Não há certezas, as biografias men-cionam datas desde 624 a.C. até 410 a.C.

Data de nascimento: Livro dos Vedas, que consiste numa coletânea de quatro obras, das quais certas partes datam de 1500 a.C.

Local de nascimento: reino dos Sakyas, na cidade de Kapilavastu, próxima à fronteira atual entre a Índia e o Nepal.

Ano de fundação: estima-se que Siddartha tenha atingido o estado de iluminação por volta de seus 35 anos de idade.

Textos sagrados e reverenciados: os ensinamentos de Buddha não foram original-mente escritos por ele, mas transmitidos oralmente por seus seguidores. Ao surgi-rem os primeiros escritos, duas formas podem ser identificadas: o cânone sulista de Pali, da tradição Theravada (escrito no Sri Lanka por volta do século I a.C.), e o cânone nortista sânscrito, da tradição Mahayana. O cânone de Pali é composto por três obras (pitaka):

a) Sutra: os discursos de Buddha;

b) Vinaya: as origens das regras da disciplina monástica;

c) Abdhidharma: tratados escolásticos sobre a psicologia e a filosofia budis-tas. Já o cânone de tradição Mahayana crê que as doutrinas primeiras são incompletas e necessitam ser aperfeiçoadas com os tratados interpreta-tivos.

Estatística: atualmente é um dos quatro maiores grupos de tradição religiosa. Os nú-meros correspondentes a essa afirmação são difíceis de serem comprovados em vis-ta das diversas escolas budistas. Hoje é muito difundido no Sri Lanka e no Sudoeste da Ásia, embora esteja também presente na China, na Coréia e no Japão. Excluindo a China, estima-se que cerca de 200 milhões de pessoas professam a fé budista.

Perfil do Budismo

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ISLAMISMOEnquanto religião, o islã abrange todas as áreas da vida humana, pessoal e

social.

Por Prof. Ronaldo Steffen

História

Com origem na Arábia, o islã está pro-fundamente relacionado com a cultura árabe. Ressaltemos, no entanto, que hoje

apenas uma minoria de seus seguidores são ára-bes. O islã está difundido por regiões da África e da Ásia, em especial, e é seguido por cerca de 15% da população mundial.

A palavra árabe islam significa “submissão”. É pertinente ao seu conteúdo que o ser humano deve entregar-se a Deus e submeter-se a Sua von-tade em todas as áreas da vida. Esse entendimen-to sugere que, enquanto religião, o islã abrange todas as áreas da vida humana, pessoal e social.

É a terceira e última das religiões originadas com Abraão, após o judaísmo e o cristianismo. Fruto de um “segundo casamento” de Abraão, agora com Hagar, Ismael dá origem aos muçul-manos.

De importância capital para a compreensão do islã é a figura de Muhammad, ou Mohammed, ou, ainda, Maomé.

MaoméNasceu em Meca, na Arábia, por volta de

570 d.C. Nascido numa das principais famílias da cidade, ficou órfão ainda criança. Criado por um tio, Abu Talib, foi trabalhar como condutor de camelos para Khadidja, viúva de um rico mer-cador. Quinze anos mais velha que Maomé, veio a ser sua esposa e exerceu grande influência no desenvolvimento religioso de seu esposo.

A peregrinação (Hajj) a Meca é um dos “cinco pilares do islã”

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A Arábia Saudita hoje.

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A formação religiosa de Ma-omé

Meca era um importante centro comercial e religioso da Arábia. Tribos nômades já adora-vam, bem antes de Maomé, a pedra preta, objeto de muitas peregrinações de beduínos. Era prática comum na região, também, cultuar muitos deu-ses e seres sobrenaturais, quase sempre ligados a práticas animistas. Em geral, os cultos eram tribais. Aliás, a tribo e a família eram estruturas centrais para o modo de vida dos nômades. Todo o sistema legal estava vinculado à tribo, originada e mantida pelos laços de sangue. Era recorrente o exercício da lei do “olho por olho”, quando um dos membros de uma tribo era assassinado por um membro de outra. Um cenário de constantes e sangrentas rixas fixou-se como prática comum.

Maomé foi fortemente influenciado pelos ideais judaicos e cristãos, espe-cialmente o monoteísmo.

Já à época de Maomé, apresentava-se um quadro de transição. A sociedade beduína nôma-de começava a dar lugar a uma sociedade urba-na mais fixa. Com isso, a religião e as práticas tradicionais passaram a ser revistas. Nesse hiato aumentou em muito a influência do judaísmo e do cristianismo. Com toda a certeza, Maomé foi fortemente influenciado pelo monoteísmo e pela noção de fim de mundo acompanhado de juízo final.

O judaísmo havia se estabelecido em toda a Arábia depois da queda de Jerusalém em 70 d.C. Aos poucos, os judeus incorporaram a língua e o estilo de vida dos árabes, mantendo, porém, sua própria crença e seu culto mosaico.

O cristianismo, por sua vez, também havia avançado por muitas regiões do Oriente Médio. Estados como a Abissínia (atual Etiópia) e mui-tas tribos beduínas tornaram-se cristãos. Com certeza o grupo que mais influenciou Maomé em sua formação religiosa foram monges e ere-mitas cristãos, que viviam isolados nos desertos da Arábia. Devotos e generosos eram pródigos na ajuda aos viajantes.

A recitação de Maomé resulta no Alcorão.

Deus revela-se a MaoméEra costume de Maomé retirar-se todos os

anos para uma caverna aos arredores de Meca com o fim de meditar. Esse hábito também era prática corrente dos eremitas cristãos, que, di-ferentemente de Maomé, fundamentavam sua meditação em algum texto sagrado, em geral os Evangelhos da tradição cristã.

Aos 40 anos, Maomé teve uma revelação. Apareceu-lhe o arcanjo Gabriel com um perga-minho ordenando-lhe que o lesse. Maomé não sabia ler e, em vista disso, o arcanjo incitou-lhe a recitar o que ouvia.

Sura (capítulo) do alcorão

As recitações transmitidas por Maomé fo-ram reunidas num livro, o Qu´ran, o Corão, ape-nas após a sua morte. Assim como no judaísmo e no cristianismo, o islamismo também passa a ter seu livro sagrado.

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De Meca a MedinaApós a revelação, Maomé começa sua pre-

gação em Meca. Proclama-se profeta e mensa-geiro de Deus. As famílias abastadas entende-ram essa pregação como manobra para usurpar o poder político da cidade. Também as famílias assentadas no tradicionalismo religioso se lhe opuseram por entenderem que, se abandonassem suas antigas crenças, estariam reconhecendo que seus antepassados foram pagãos.

A crise estava instalada. A situação de Ma-omé piora após a morte de seu tio e esposa. Al-guns de seus seguidores, residentes em Medina, mostraram-se dispostos a aceitá-lo na cidade. Assim, em 622 d.C. Maomé sai de Meca e vai para Medina.

Esse episódio é conhecido como hégira, que significa “rompimento” ou “partida”, mas jamais “fuga”.

Líder religioso e políticoEm Medina, Maomé torna-se um líder reli-

gioso e político. Sem perder de vista seu futuro retorno a Meca, procura se estabelecer financei-ramente por meio de assaltos a caravanas perten-centes às famílias ricas de Meca. O conjunto das atividades desenvolvidas por Maomé com vistas ao retorno a Meca é conhecido como jihad, hoje empregado para designar a guerra santa.

Na década seguinte, Maomé toma a cida-de de Meca por meios militares e diplomáticos. Ocupou, a seguir, grande parte da Arábia. Em 632 d.C., pouco antes de morrer, havia realizado o feito de unir o país e torná-lo um só domínio, no qual a religião tinha mais representatividade que os antigos laços familiares e tribais.

O Cisma no islã após MaoméApós a morte de Maomé, a liderança do

movimento foi assumida pelos califas, ou suces-sores. Os três primeiros califas eram parentes de Maomé. O quarto califa, Ali, genro de Maomé, casado com sua filha Fátima, era filho de seu tio, Abu Talib, que o havia criado.

Surgem os Xiitas e os SunitasO Cisma no mundo islâmico começa na

época de Ali. Sua liderança foi repleta de contro-vérsias, e ele acabou sendo assassinado por seus adversários. Os seguidores de Ali defendiam e acreditavam que, por ser o parente mais próximo de Maomé, ele era o seu sucessor natural. Esses seguidores eram identificados como os Shiat Ali (o partido de Ali), ou xiitas, que formam a base da religião oficial do Irã de hoje.

Os xiitas entendiam que a liderança do mo-vimento deveria ser concedida a um descendente direto de Maomé, enquanto o grupo divergente, facção bem maior que os xiitas, identificados como sunitas, julgava que a liderança cabia ao indivíduo que de fato controlava o poder.

Após a morte de Ali, o califado teve sede em Damasco por algum tempo e, a seguir, instalou-se em Bagdá, onde permaneceu por 500 anos. Depois disso, a liderança passou para o sultão turco de Istambul. O último sultão foi derrubado em 1924 e, desde então, o mundo islâmico dei-xou de ter um califa como líder.

Sunitas Xiitas

Os dois grupos reúnem a maioria dos adeptos do islamismo.

84% 16%

EnsinamentosDeus

Não há Deus, senão Alá, e Maomé é seu pro-feta. Este é o resumo da fé islâmica: o monoteís-mo e a revelação dada a Maomé.

MonoteísmoAlá não constitui um nome pessoal, mas,

sim, a palavra árabe que significa “Deus”. Eti-

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mologicamente, a palavra alah se relaciona com a palavra hebraica el, que é utilizada na Bíblia para nomear o Deus dos hebreus.

O termo “alah”, ára-be, e o termo “el”, hebraico, referem-se a “Deus”

O politeísmo é atacado com veemência, res-saltando-se a crença num só Deus, que é criador e juiz. Ele criou o mundo e tudo o que há nele. No último dia irá trazer todos os mortos de volta à vida para julgá-los.

Há uma forte ênfase no amor e na compai-xão divinos. Embora Deus seja aquele a quem to-dos devem submeter-se, também é o que perdoa e auxilia o ser humano. Este não merece nada de Deus nem pode invocar direitos sobre nada. A salvação e a fé brotam somente da graça de Deus e são coisas que os seres humanos podem apenas ter esperança de conseguir.

RevelaçãoDeus falou ao ser humano por intermédio

de seu profeta Maomé. Ele é o último dos pro-fetas enviados por Deus à humanidade. Embora, de início, Maomé estivesse próximo às tradições judaico-cristãs, delas se distancia em razão de controvérsias tidas com os judeus sobre narrati-vas do Antigo Testamento.

O fundo histórico do movimento desencade-ado por Maomé é encontrado em Abraão e seu filho, Ismael, antepassado dos árabes. Maomé ensinou que Abraão e Ismael tinham reconstru-ído a sagrada Kaaba, que fora erigida por Adão e destruída pelo dilúvio. Para Maomé, tanto os judeus como os cristãos distanciaram-se do mo-noteísmo de Abraão.

Quando em Medina, Maomé ensinara que, ao orar, o rosto deveria estar voltado para Jeru-salém. Depois de rompidas as relações com os judeus, a orientação mudou: o fiel, agora, deve estar de frente para Meca ao orar. Por essa época

também, designou-se a sexta-feira como dia sa-grado da semana.

A Kaaba hoje em dia de peregrinação

Em relação ao cristianismo, a diferença acentuou-se na questão da Trindade. Além disso, houve divergência quanto ao papel de Jesus, que, para o cristianismo, é o Verbo (Palavra) revelado, enquanto, para o islamismo, a revelação é o pró-prio Qu´ran (Corão).

Ser humanoO ser humano possui um estatuto especial

e uma posição privilegiada no universo. A vida é dádiva divina. O ser humano é criatura divi-na perfeita e possuidor de uma alma que perdura após a morte.

A bondade lhe é inata por graça divina e não se perde por qualquer meio ou motivo. Não há a noção de um pecado herdado. O ser huma-no é sempre bom. Quando muito, ele se esque-ce de sua origem divina e da bondade que lhe é inerente. Para que isso não ocorra, o ser humano necessita constantemente reavivar suas origens e qualidades divinas.

O fato de ter sido escolhido por Deus para que Ele se revele ao mundo, dá a dimensão exata dos grandes valores e qualidades humanas.

Vida e morteOs cinco pilares

A vida de um seguidor do islamismo está marcada por cinco passos bem definidos, deno-minados de Os cinco pilares, descritos a seguir.

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Os cinco pilares do Islamismo:•Credo

•Oração

•Caridade

•Jejum

•Peregrinação à Meca

Credo – “Não há outro Deus senão Alá, e Maomé é seu Profeta.” É a primeira coisa que se deve sussurrar ao ouvido da criança recém-nascida e a última a ser sussurrada no ouvido do moribundo.

Oração – Deve ser feita cinco vezes ao dia; o pressuposto é estar ritualmente limpo das im-purezas, causadas pelas funções corporais, o que é obtido pelo banho em água corrente.

Mesmo em terras distantes mantém-se a obrigação das orações diárias

Caridade – É uma espécie de taxa sobre a riqueza e a propriedade, fixada em cerca de 2,5% sobre o montante; ela é destinada a usos sociais, objetivando diminuir as desigualdades entre ri-cos e pobres, sem interferir no princípio da pro-priedade privada. O islã não proíbe que se des-

frute a vida na terra, mas lembra que se deve ter sempre em mente o fato de que esta não passa de uma preparação para a vida que começará depois do julgamento divino.

Jejum – O Corão proíbe comer porco e be-ber álcool. De resto, nada se proíbe. A exceção é o jejum durante o Ramadan, mês em que Maomé teve sua primeira revelação. Nesse período, entre o nascer do sol e o pôr-do-sol, é proibido comer, beber, fumar ou ter relações sexuais. Os viajan-tes, os doentes, as crianças e as mulheres grávi-das ou que estão amamentando são exortados a cumprir o jejum numa data posterior.

Peregrinação a Meca – Todo muçulmano adulto que dispõe de meios financeiros deve rea-lizar, pelo menos uma vez na vida, uma peregri-nação a Meca. Os peregrinos que para lá se diri-gem, passam a usar vestes brancas e caminham em torno da Kaaba por sete vezes. Outro mo-mento importante é quando os peregrinos vão ao monte Arafat e lá ficam, sem cobrir a cabeça, do meio-dia até o pôr-do-sol. Foi no monte Arafat que Adão e Eva se encontraram de novo, depois que foram expulsos do jardim do Éden. O ponto alto das festividades é o sacrifício de algum ani-mal (carneiro, bode, camelo, boi etc.). A finali-dade é relembrar que Abraão foi tão obediente a Deus que se dispôs a sacrificar seu próprio filho, Ismael. Deus foi misericordioso com Abraão e enviou-lhe um animal para que ele o sacrificasse em lugar do filho.

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Relações humanas - Ética e Política

Quando as instruções do Livro não forem suficientes, recorre-se a dois princípios:

•Princípio da similaridade ou analogia: busca-se no Corão um exemplo semelhante e capaz de sugerir uma decisão;

•Princípio do consenso: uma decisão de consenso pode ser vista como lei a ser observada.

•Já os xiitas adotam um terceiro princípio: o da revelação.

Não há no islã distinção entre religião e po-lítica, tampouco entre a fé e a moral. O Corão é suficiente para resolver todas as questões que envolvem os relacionamentos humanos.

Os xiitas acreditam que a revelação não está concluída e que seus líderes são os instrumentos divinos para as novas interpretações. Essa posi-ção contraria a dos sunitas, que afirmam que a re-velação veio apenas uma vez, em sua forma final.

As mulheres no islãHá profundos contrastes no tratamento con-

cedido a homens e mulheres na vida social e nas leis relativas ao casamento. Devemos, no entan-to, ressaltar que o Corão, em relação às mulhe-res, determina tanto obrigações (“os homens têm autoridade sobre as mulheres”) quanto direitos (o dote pago pelo marido, por ocasião do casamen-to, é propriedade da mulher e não pode ser usado sem o consentimento dela).

A mulher só pode ter um marido. Já o ho-mem pode ter até quatro esposas, desde que as possa sustentar. A poligamia é proibida na Tur-quia e na Tunísia. Outra particularidade com relação ao casamento e que é pouco conhecida, embora bastante difundida, é o casamento por contrato com tempo determinado. É utilizado, em especial, quando o marido fica por muito tempo fora de casa e tem por fim preservar a sus-tentabilidade da mulher.

O divórcio é possível, mas apenas quando iniciado pelo marido, que é o responsável pelo lado financeiro do ca-samento. O marido também tem o direito de punir fisi-camente a mulher se ela for desobediente.

A excisão do clitóris (mutilação genital femini-na) não é obrigatória, mas mesmo assim é praticada com freqüência no Norte da África. Não há no Co-rão menção a essa prática, bem como à tradição de usar o xador, o véu.

A morteApós a morte, a alma do fiel muçulmano

vai a um paraíso desfrutar dos seus deleites e contemplar o rosto de Alá. A alma do infiel, por seu turno, vai ao inferno. Aguardar-se-á o dia do juízo, quando as ações dos seres humanos serão definitivamente julgadas e receberão a devida paga. As almas dos mártires e dos profetas não passarão pelo juízo final, pois já estão no paraí-so. O ato final será a proclamação do islã como religião mundial, liderada por Jesus.

A crença num julgamento final após a morte é necessária, segundo muitos muçulmanos, para que o ser humano assuma a responsabilidade so-bre seus atos. A idéia de um julgamento cria um senso moral de dever que é relevante para a co-munidade.

MundoO mundo foi criado por um ato deliberativo

de Alá. Em decorrência, dois aspectos emergem: o mundo da matéria é real e importante, e, por ser obra de Alá, que é perfeito em bondade e poder, o mundo material também o é.

O Xador (véu) usado pelas mulheres da religião islamica

O divórcio é possível, mas apenas quando iniciado pelo marido, que é o responsável

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Principais tendênciasSunitas – Defendem que a unidade da co-

munidade islâmica é muito mais importante que a genealogia de seu líder. Acreditam que o pro-feta morreu sem indicar um sucessor e que os lí-deres que o sucederam, os califas, representam a sucessão legítima. Distinguem-se, ainda, pela ênfase dada à inescrutabilidade racional de Alá e à extensão limitada do livre-arbítrio humano.

Xiitas – Defendem que a unidade da comu-nidade islâmica só é possível reconhecendo-se que os descendentes do profeta são os líderes (imã) ou modelos naturais escolhidos por Alá. É particularmente importante para esse grupo não perder de vista que o terceiro líder, assassinado em 680 d.C. ao recusar-se jurar fidelidade ao ca-lifa regente, optou pelo martírio como forma de obediência às revelações dadas ao profeta. Essa lembrança manifesta-se no sentimento de luto que toma conta dos xiitas por ocasião da morte, quando em luta, de um de seus adeptos. Possuem um clero hierárquico organizado, no qual a as-censão se dá segundo o grau de cultura, sendo o mais alto nível o de aiatolá.

Sufismo – É o grupo islâmico com tendên-cia mística e cuja característica mais marcante é a renúncia ao eu por meio de hábitos devocionais e pela convicção de que Alá é a verdade suprema da existência humana e o caminho para os esta-

dos mais elevados de consciência e iluminação. O termo sufi designa “o que se veste com lã”, numa referência possível às vestes dos primeiros sufis.

Fundamentalismo islâmico – Defendem que a shari´ah (conjunto de regras islâmicas ex-traídas do Corão e dos ensinamentos de Maomé) tem validade eterna e deve ser seguida à risca. O movimento surgiu por volta do século XVIII como uma reação ao avanço ocidental e ao con-seqüente relaxamento dos princípios da shari´ah. Imaginam que será por meio de uma inserção cada vez maior na política que poderão ser res-tabelecidos os princípios islâmicos. Defendem uma estrutura familiar patriarcal e entendem que os postos militares e políticos só devem ser entre-gues a muçulmanos comprometidos com a comu-nidade islâmica e que aos empregados deve ser dado tempo para as orações diárias. Acreditam ainda que se deve solidariedade aos muçulmanos no mundo todo e opõem-se ao homossexualismo e ao aborto.

Fundador: o profeta Muhammad (Maomé).

Data de nascimento: 570 d.C.

Local de nascimento: Meca, atual Arábia Saudita.

Ano de fundação: 622 d.C., em Meca.

Textos sagrados e reverenciados: Qu´ran (Corão), coleção das escrituras divinas como reveladas ao profeta Maomé pelo arcanjo Gabriel, e Hadith, coleção de ditos de Maomé e seus seguidores e que se perpetuaram com o decorrer do tempo.

Estatística: estima-se hoje em cerca de 1 bilhão e 300 milhões de adeptos distribuí-dos por várias localidades: Turquia, Oeste da África, Sul da Ásia, Filipinas, Indonésia, Índia, Oriente Médio, Europa e as três Américas. No Brasil, fala-se em 1 milhão de adeptos.

Perfil do Islamismo

SÍMBOLO DO ISLAMISMO: Enquanto a estrela indica o caminho a seguir, a lua o ilumina. O símbolo é utilizado para significar como o Islamismo guia e ilumina o caminho dos seus seguidores.

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História

O judaísmo é uma religião inteiramente ligada à história. As narrativas bíblicas começam com Adão e Eva e os relatos

que apontam as conseqüências do pecado, mani-festadas no desejo humano de rebelar-se contra Elohim (Deus). Segue-se a expulsão do paraíso. Mais tarde, o mundo inteiro é destruído pelo di-lúvio, salvando-se apenas Noé e sua família, jun-tamente com todos os animais da Terra. Sodoma e Gomorra, cidades sem Elohim, são aniquiladas, e a torre de Babel é derrubada por representar a tentativa humana de chegar até o céu*.

De Abraão a MoisésA fase histórica seguinte tem seu ponto de

partida com Abraão, ao sair da cidade de Ur, lo-

calizada no atual Sul do Iraque, por volta de 1700 AEC. Seguindo orientação divina, Abraão saiu de sua terra e foi em direção à terra indicada por Elohim, a fim de formar um grande povo. Esse povo ganhou um nome após uma dramática luta entre Jacó, neto de Abraão, e um anjo de Elohim. O anjo lhe dá o nome de Israel (o que venceu a Elohim). Os filhos de Jacó, mais tarde, vieram a ser identificados como as doze tribos de Israel.

Com José, um dos filhos de Jacó, as narra-tivas bíblicas mostram como os israelitas foram parar no Egito. Após serem escravizados, foram retirados do Egito com a ajuda de Moisés, numa jornada de 40 anos pelo deserto antes de chega-rem à Canaã, a terra prometida.

Fato marcante da travessia acontece no mon-te Sinai, quando Elohim dá a Moisés as duas tá-buas da Lei com os Dez Mandamentos.

Por volta de 1200 AEC, os israelitas con-

JUDAÍSMOUma religião inteiramente ligada à história:

Por Prof. Ronaldo Steffen

A jornada de Abraão

*Confira esses relatos no “Livro de Êxodo”, disponível em: http://www.sbb.org.br.

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quistaram parte de Canaã, convivendo com povos não israelitas. Foi a época dos juízes que cuida-vam para que o povo respeitasse as leis dadas por Elohim. A luta com os filisteus, nesse período, foi o episódio determinante da necessidade da criação de um poder político centralizado.

Divisão das 12 Tribos de Israel

O reino de IsraelO ano 1000 AEC marca a introdução da mo-

narquia por meio de Saul. Davi e Salomão são os expoentes desse período. Com Davi, nascido em Belém, dá-se a unificação das tribos de Israel. Com Salomão, dá-se a construção do Templo de Jerusalém no século X AEC.

A prática de sacrifícios no templo, espécie de oferenda, passou a ser uma forma mecânica de adoração. Surgem daí os profetas. Destaca-se

Amós, que viveu por volta de 750 AEC e ataca-va os males sociais, como a opressão dos pobres pelos ricos.

O exílio na BabilôniaAdvertidos pelos profetas do juízo e da pu-

nição divinos em razão do descumprimento das leis divinas, os israelitas, sem retroceder, viram o seu reino dividido em dois: o reino do Norte (Israel) e o do Sul (Judá). Em 722 AEC os as-sírios invadiram e devastaram o reino do Norte, que deixa de ter importância política e religiosa.

O reino do Sul foi conquistado em 587 AEC pelos babilônios, que deixaram como marca da ocupação a destruição do Templo de Jerusalém. Os habitantes do reino do Sul tiveram permissão para voltarem a sua terra em 539 AEC e daí em diante se tornaram conhecidos como judeus. O Templo de Jerusalém foi reerguido em 516 AEC.

O Templo de Jerusalém hoje

Ocupação estrangeiraSeguidas vezes, após o retorno da Babilônia,

os judeus caíram sob o domínio político estran-geiro. Foi assim que, em 70 EC (Era Comum), uma revolta contra os romanos levou ao saque de Jerusalém. O Templo, que recentemente ha-via sido ampliado pelo rei Herodes, foi outra vez arrasado. Dessa época em diante se estabelece um novo formato do judaísmo, desvinculado do Templo e centrado na sinagoga. Muitos judeus estavam agora dispersos pelas terras do Mar Me-diterrâneo.

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História mais recenteA dispersão dos judeus provocada pelas di-

versas ocupações permitiu que eles, em muitas ocasiões e em diferentes lugares, assumissem pa-pel de grande importância e destaque, tanto nas letras como na economia (a religião lhes permitia ganhar juros emprestando dinheiro).

No entanto, o que mais tem marcado a dis-persão dos judeus é a constante campanha que diferentes países e culturas têm desencadeado com o fim de afastar os judeus de seus limites geográficos, em especial a partir da Baixa Idade Média. Por muito tempo o cristianismo encabe-çou a perseguição aos judeus sob a alegação de terem sido os judeus os culpados pela morte de Jesus. Da França e da Inglaterra os judeus foram deportados nos séculos XIII e XIV; na Espanha a perseguição dá-se no século XV, e os judeus são expulsos desse país em 1492; em 1687, fo-ram proibidos de entrar no território da Noruega. Culmina o cenário de perseguição, na história recente, com o avanço nazista na Europa, entre 1933 e 1945.

Mesmo em épocas em que as perseguições explícitas não ocorriam, os judeus continuaram a sofrer restrições: tratados como párias sociais; obrigados a adotar nomes de fácil identificação e a residir em lugares específicos; proibidos de possuir terras e assim por diante.

Apenas em 1948 veio o reconhecimento mundial com um ato da ONU, que criou o Estado de Israel. Os primeiros passos foram dados no

fim do século XIX. Muitos judeus pensaram na possibilidade de voltar para sua antiga pátria e, assim, fugir das constantes perseguições de que eram alvo. Essa idéia foi chamada de sionismo. A princípio, muitos sionistas desejavam criar um estado laico, secular, mas os judeus ortodoxos conseguiram realizar o seu desejo de que o país fosse fundado com base na religião judaica.

Esse novo Estado tem vivido em contínuo conflito com o mundo árabe, também por causa dos milhares de palestinos que foram deslocados de suas propriedades na época da fundação de Israel.

Hoje as terras israelenses abrigam apenas cinco dos onze milhões de judeus

EnsinamentosDeus

O judaísmo é uma religião monoteísta. Elo-him, o Deus único, é o criador do mundo e o se-nhor da história. Toda vida depende dele, e tudo o que é bom flui dele. É pessoal e tem preocupa-ção com as coisas que criou.

Quem é Elohim é algo que não pode ser expresso em palavras. O nome de Deus é repre-sentado pelas letras IHVH, um acrônimo que em hebraico significa “eu sou o que sou”. Esse acrô-nimo costuma ser lido como Jeová ou Javé, po-rém o nome real é tão sagrado que sempre se usa algum sinônimo, como “o Senhor” ou “o nome”.

Atual localização de Israel

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Jeová é o criador e o sustentador do mundo. A idéia de que Elohim possa não existir é alheia a um judeu.

Particularmente específica na concepção de Elohim é a expectativa nutrida pela vinda de um messias (“o ungido”) que virá criar um rei-no de paz na terra. Historicamente, a expectati-va remonta à época do rei Davi, quando os reis eram ungidos ao subir ao trono. Desde o exílio babilônico, os judeus alimentam a expectativa da chegada de um messias, saído da linhagem de Davi. Esse rei ideal restabeleceria Israel como uma grande potência, e seu povo desfrutaria de eterna felicidade.

Até hoje essa expectativa continua viva. Nem todos os judeus, entretanto, identificam o Messias como uma pessoa; alguns falam numa “era messiânica” – um estado de paz na Terra, com destaque especial para Israel. Há alguns judeus que identificam a criação do Estado de Israel, em 1948, como o cumprimento dessa ex-pectativa.

O Messias para os Judeus:•Alguns esperam a vinda de uma pessoa;

•Outros esperam uma era messiânica;

•Outros identificam que essa era chegou com a criação do Estado de Israel legítima.

Ser humano

O ser humano, embora biológi-co, faz parte da essência divina

e deve cumprir a missão de Elohim aqui na Terra.

O fato de que Elohim é um, e apenas um, reflete-se na existência humana. Toda a vida do ser humano deve ser consagrada. Não há linha divisória que separe o sagrado do profano.

Enquanto ser biológico, o ser humano faz parte do cosmo. No entanto, de tudo o que há no cosmo, o ser humano foi escolhido como parte da essência divina, ultrapassando os limites bio-

lógicos. Por isso, faz parte da missão divina no cosmo, realizando a mediação entre o Criador e a criatura. A tarefa mais importante do ser humano é cumprir todos os seus deveres para com Elohim e para com seus semelhantes.

Vida e morteA vida e a morte de um judeu têm seus cami-

nhos e atalhos traçados nas Escrituras Sagradas.

Os Escritos Sagrados

O chamado cânone judaico foi fixado por um concílio em Jabne por volta de 100 EC. São 24 livros divididos em três grupos:

• Torá (a Lei): os cinco livros de Moisés.

• Nevim (os Profetas): os livros históricos e proféticos.

• Ketuvim (os Escritos): os demais livros.

Além da Torá, os judeus obedeciam às regras transmitidas oralmente. Conforme a tradição, no monte Sinai, Moisés teria recebido a Lei Escrita e a Lei Falada. A Lei Falada era proibida de ser escrita, pois deveria adaptar-se às condições re-ais da vida em diferentes lugares e épocas. Após a dispersão dos judeus, sob pena de perder-se a tradição oral, decidiu-se registrar as orientações. Esse material se chama Talmude. Não é em si um livro de ensinamentos, e sim um texto usado pelos rabinos em seus ensinamentos, para orien-tação dos fiéis em situações concretas.

A sinagoga e o sábado

Desde o exílio, a sinagoga tem desempenha-do papel primordial na preservação das práticas religiosas dos judeus. É nesse espaço que se en-contra a Arca, uma espécie de armário colocado sistematicamente na direção de Jerusalém e onde são guardados os rolos da Torá. Nas manhãs dos sábados (shabat), das segundas e das quintas-feiras, os rolos são lidos de tal forma que todo o livro é lido no decurso de um ano. A sinagoga pode abrir suas portas para os serviços religiosos três vezes por dia, desde que dez homens estejam presentes. As mulheres não desempenham parte ativa no serviço religioso, pelo menos nos grupos

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ortodoxos. No entanto, encontram seu espaço nos rituais do Shabat.

A Arca numa Sinagoga.

O Shabat dura desde o pôr-do-sol de sexta-feira até o pôr-do-sol de sábado. É uma relem-brança do ato criador de Jeová que descansa no sétimo dia. O sábado se tornou uma festa sema-nal de renovação que ocorre em família. A espo-sa abençoa as velas do Shabat na mesa já posta, e o marido abençoa o vinho e o pão. É mais um grande momento para a união familiar judaica.

Quem olha hoje pelos cuidados da alimentação na família?

As regras alimentares

É responsabilidade da mulher zelar pela ali-mentação da família. Há, para tanto, que respei-tar as regras definidas nos livros sagrados.

A carne só pode provir de animais que rumi-nam e têm o casco partido, o que exclui o porco, o camelo, a lebre, o coelho e outros. Das aves pode-se comer as não-predatórias. Dos peixes pode-se comer os que possuem escamas e bar-batanas, excluindo-se polvos, lagostas, mariscos, caranguejos, camarões etc.

Toda comida feita de sangue também é proi-bida, já que a vida está no sangue. Os animais com sangue e permitidos para alimentação devem ser abatidos de forma que o máximo possível de san-

gue seja extraído. Além disso, é proibido comer derivados de carne juntamente com derivados de leite. As frutas, as verduras, as bebidas alcoólicas e não alcoólicas são permitidas.

A ética

O religioso e o ético se fundem na vida de um judeu. Tudo pertence à Lei de Elohim. Além das 248 ordens afirmativas e das 365 proibições, a vida do judeu ainda deve respeitar os costumes e as práticas que se consolidaram ao longo de sua história.

Dentre as qualidades éticas recomendadas estão a generosidade, a hospitalidade, a boa von-tade para ajudar, a honestidade e o respeito pelos pais.

O dízimo (10%) faz parte do comportamen-to de muitos judeus. Com relação aos pobres e necessitados, é curioso notar que o ato de dar es-molas não é considerado caridade, mas justiça. O dever de combater a pobreza é preceito bíblico a fim de cumprir-se a palavra de que jamais haverá pobre no povo escolhido. A mesma concepção é mantida em relação às viúvas, aos órfãos e aos estrangeiros.

Quando em determinada situação não hou-ver clareza sobre o que fazer ou se a atitude gerar conflito, prevalece a vida humana.

Dar esmola não é caridade, mas ato de justiça.

As fases da vida

Nascimento, juventude, casamento e morte são fases da vida, marcadas por costumes antigos e ainda mantidos.

• Circuncisão – Oito dias após o nascimen-to, os meninos são circuncidados e recebem formalmente seu nome. A menina também recebe seu nome na sinagoga uma semana após o nascimento.

• Bar Mitsvá e Bat Mitsvá – No primeiro sábado após completar treze anos, o meni-no é recebido como “filho do mandamento” (bar mitsvá). No ano precedente, ele é ins-

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truído nas leis e nos costumes judaicos, bem como aprende a ler o trecho da leitura da Torá que fará no sábado de sua recepção. Já a menina torna-se “filha do mandamento” (bat mitsvá) automaticamente ao completar doze anos. Por volta dos quinze anos, ela aprende o principal da história e dos costu-mes judaicos e, particularmente, empenha-se em aprender as regras alimentares, que é sua responsabilidade doméstica.

Cerimônia do Bar Mitsvá

• Casamento – A família tem papel primor-dial na manutenção da cultura e da educa-ção judaicas. O casamento é o modo de vida ideal e o único tipo de coabitação permiti-do. Por princípio, judeu deve casar com ju-deu. O divórcio é permitido, mas, para que seja legítimo, deve ser sancionado por um tribunal rabínico e selado pelo marido, que dá à esposa a carta de divórcio.

Cerimônia de casamento

• Enterro – O enterro deve ocorrer o mais rápido possível depois da morte. A cre-mação não é permitida. No cerimonial de sepultamento, não se usam flores nem mú-sica. O cemitério é sempre muito bem cui-dado em razão de ser o lugar onde os mor-tos descansam até a ressurreição.

Os festivais

As festas judaicas marcam não apenas mo-mentos de alegria. Elas trazem consigo uma for-te conotação histórica e religiosa e servem para marcar eventos que ressaltam a intervenção di-vina na vida do povo judaico, tanto no passado como no presente.

• Rosh há-shaná (Ano Novo) – Celebrado em setembro ou outubro, rememora Jeová como criador e rei, conduzindo as pessoas a se concentrarem na auto-análise e no ar-rependimento.

• Iom Kippur (Dia do Perdão) – É o fim do período de dez dias de arrependimento, iniciado no Ano Novo.

• Sukot (Festa dos Tabernáculos) – Ocorre alguns dias após o Dia do Perdão e procura relembrar o período em que os ju-deus, durante sua peregrinação pelo deser-to, residiam em tendas.

• Chanuká (Festa da Inauguração) – Re-alizada em novembro ou dezembro, por oito dias, comemora a reinauguração do Templo de Jerusalém, ocorrida em 165 AEC.

• Pessach (Páscoa) – Celebrada em mar-ço ou abril, relembra a passagem do anjo do Senhor “por cima” (pessach) das casas dos israelitas, quando no Egito, por ocasião da décima praga, matou os primogênitos egípcios. Tem a duração de oito dias e só se come pão sem fermento.

• Shavuot (Festa das Semanas) – Ocorre em maio ou junho e comemora a ocasião em que a Torá foi dada ao povo no monte Sinai.

MundoReza o texto sagrado, registrado em Gênesis,

capítulo 1, que Elohim criou o “céu e a terra” (o universo), o ser humano inclusive. Tendo conclu-ído sua obra criadora, emanada exclusivamente de sua inexplicável vontade, constata que o uni-verso é bom. A força da qual flui o ato criador é sua ordem, a partir do nada e concretizada por suas palavras. A soberania divina está realçada. Ele é o criador.

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“A força da qual flui o ato cria-dor é sua ordem, a partir do nada e concretizada por suas

palavras.”

Uma vez criado, o universo continua a exis-tir por vontade divina e não por moto próprio. A força vem de fora, não de forma impessoal, mas pessoal e, ainda que o universo possua caracte-rísticas materiais evolutivas, percebe-se nesse processo a vontade divina presente no ato criador que lhe deu essa característica.

TendênciasO judaísmo é tanto uma identidade heredi-

tária e um modo de vida quanto um sistema re-ligioso. Essa colocação faz perceber a existência de uma diversidade de entendimentos.

A partir do século XIX, três comunidades religiosas distintas, descritas a seguir, desenvol-veram-se com opiniões divergentes acerca da im-portância da tradição e da teologia judaica.

Judaísmo ortodoxo – Mantém as crenças tradicionais, inclusive a doutrina de que tanto a

lei bíblica quanto a lei oral são de inspiração di-vina, e obedece aos costumes e aos rituais tradi-cionais, com a rígida observância do Shabat e das leis de alimentação.

Judaísmo reformista – Surgiu no período do Iluminismo e, menosprezando a autoridade talmúdica, realiza cultos simplificados no verná-culo, dando maior importância aos padrões éti-cos do que às leis rituais, grande parte das quais considera irrelevantes no mundo moderno.

Judaísmo conservador – Situa-se entre a aceitação da autoridade das Escrituras e a per-missão de adaptação às mudanças dos tempos e das situações.

No século XX, outras tendências se acentua-ram, como a corrente liberal da Reforma Judaica e o Movimento Reconstrucionista, fundado por Mordecai Kaplan, que entende o judaísmo como uma “civilização religiosa”.

A ESTRELA DE DAVI: Dois triângulos entrelaçados. Um aponta para o alto e relembra tudo o que é sagrado. Outro aponta para baixo e relembra tudo o que é secular. Juntos representam a união indis-solúvel entre o sagrado e o secular.

Fundador: Abraão e seus descendentes Isaque e Jacó.

Data de nascimento: por volta de 1700 AEC (antes da Era Comum; é assim que os judeus preferem identificar a cronologia antes de Cristo).

Local de nascimento: provavelmente em Ur, na Caldéia.

Ano de fundação: 1700 AEC.

Textos sagrados e reverenciados: a Torah, que descreve a criação do mun-do e a fundação do reino de Israel, além de contar as leis divinas; o Tal-mude, um conjunto de escritos jurídicos, éticos e litúrgicos, bem como de histórias e lendas judaicas.

Estatística: fala-se em 15 milhões de adeptos, dos quais seis milhões es-tão fora de Israel. No Brasil, estima-se em 130 mil adeptos.

Perfil do Judaísmo

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As religiões orientais

Neste e nos próximos dois capítulos, apresentaremos três Grandes Religiões (Confucionismo, Xintoísmo e Taoís-

mo). Apesar de não serem populares no Brasil, consideramos interessante uma leitura e análi-se para nos darmos conta de como pensam ou-tros povos e a diversidade religiosa encontrada no mundo. É bom observar que o pensamento oriental é diferente do ocidental.

ConfucionismoVocês devem estar observando hoje que a

China está despontando em todo o mundo pelo seu crescimento econômico e aos poucos vem sendo reconhecida como uma grande potência mundial. Talvez o que você não saiba é que até 1911 a China foi uma potência imperial, onde o imperador reinava acima de tudo. O Imperador era considerado o representante do país diante do supremo deus Céu.

O que havia por traz de tudo isso era uma ideologia confucionista. O conjunto de pensa-mentos, regras e rituais sociais, foram desenvol-vidos pelo filósofo K’ung-Fu-Tzu. No Brasil o conhecemos como Confúcio. Além disso, Con-fúcio formulou normas para a vida religiosa, para os sacrifícios e os rituais. ,

O confucionismo era, na verdade, uma re-ligião estatal praticada pela elite e pelas classes dominantes, a qual, no entanto, nunca se disse-minou muito entre as massas, as camadas mais amplas da população. Da mesma forma que o imperador, em seu palácio em Pequim, ficava re-motamente afastado das pessoas comuns, o Céu era remoto e impessoal para a grande massa dos chineses pobres, trabalhadores e camponeses. A

Religião dos pobres era a adoração dos espíritos, particularmente dos antepassados, religiosidade carregada de magia e traços de outras religiões. (GAARDER, 2000, P.77)

Confúcio ensinando, re-tratado por Wu Daozi, Dinastia Tang

Quem foi ConfúcioConfúcio nasceu em 551. a.C., filho de pes-

soas pobres, que desde cedo demonstrou um grande interesse que se referia à vida. Diz a his-tória que após iniciar sua carreira pública como um oficial de segunda classe no estado de Lu, aos

CONFUCIONISMOEstas religiões orientais ou sapienciais buscam o caminho através da sabe-

doria e do conhecimento.

Por Prof. Moacir Douglas Flor

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18 anos, tornou-se professor e começou a ensinar história, filosofia, ética, música, poesia e boas maneiras. A idéia era mostrar aos seus alunos o princípio que ele sentiu necessários naquele mo-mento de decadência da ordem feudal chinesa.

Embora suas lembranças da infância con-tenham referências nostálgicas à caça, à pesca e ao arco, sugerindo com isso que ele foi tudo menos uma traça de livro, Confúcio dedicou-se cedo aos estudos e se saiu bem. “Chegando aos quinze anos de idade, forcei a minha mente ao aprendizado.” Com vinte e poucos anos, depois de ter ocupado vários cargos públicos insigni-ficantes, depois de ter feito um casamento não muito bem sucedido, ele se estabeleceu como professor particular. Essa era obviamente a sua vocação. A reputação de suas qualidades pesso-ais e sabedoria prática espalhou-se com rapidez, atraindo um circulo de discípulos entusiasmados.(SMITH, 1991, p. 156)

A carreira de Confúcio não foi um sucesso. Sua ambição era bem maior. Alguns biógrafos chegaram a criar a lenda de que, por volta dos 50 anos, Confúcio realizou uma brilhante adminis-tração durante cinco anos, avançando rapidamen-te de ministro de Obras Públicas para ministro da Justiça e primeiro-ministro, e fazendo de Lu uma província modelo. “A verdade é que os go-vernantes da época tinham medo da franqueza e integridade de Confúcio, tanto medo que nunca o designariam para qualquer posição de poder.” (SMITH, 1991, p. 156)

Suas obras O que marca a obra de um líder é a seu lega-

do escrito. Confúcio deixou várias obras escritas sobre sua filosofia de vida: O Shih Ching ( Li-vro de poesias), Li Chi (Livro dos ritos), I Ching (Livro das transformações), Shu Ching (Livro de história) e Ch’um Ch’íu (os anais da primavera e do outono).

A filosofia de Confúcio A questão central na filosofia de Con-

fúcio está na palavra “li”. Significa “cortesia”, “reverência”, “ritos e cerimônias” e o “posicio-

namento ideal na vida pública e privada”. “O Chinês mais moderno entende por “li” uma or-dem social ideal, com tudo em seu devido lugar e com todas as pessoas prestando respeito e re-verência aos outros na hierarquia social” (STE-FFEN, 2000, p. 48).

De uma certa forma, a idéia era estabelecer a ordem e acabar com a queda do respeito desen-cadeada pela ordem feudal. Confúcio acreditava que, se cada um soubesse o seu lugar, poderia haver um comportamento de reciprocidade como um guia de vida. É aqui que vai surgir o dito “não faças aos outros o que não queres que te façam.

Há quatro coisas no Caminho da pessoa pro-funda, nenhuma das quais fui capaz de fazer. Servir ao meu pai, como esperaria que um filho me servisse. Servir ao meu governante, como esperaria que meus ministros me servissem. Servir ao meu irmão mais velho, como esperaria que meus irmãos mais novos os servissem. Ser o primeiro a tratar os amigos como esperaria que eles me tratassem. Essas coisas não fui capaz de fazer.

Político fracassado, Confúcio foi, sem dúvi-da, um dos maiores professores do mundo. Pre-parado para ensinar história, poesia, governança, propriedade, matemática, música, adivinhação e esportes, ele foi, à moda de Sócrates, um ho-mem Universidade. Seu método de ensino tam-bém era socrático. Sempre informal, ele não fazia preleções; preferia conversa sobre os problemas apresentados por seus alunos, citando leitura e fazendo perguntas. Ele se apresentava aos alunos como um companheiro de viagem, comprometi-do com a tarefa de se tornar plenamente humano, mas modesto. Quanto ao ponto a que chegou no cumprimento dessa tarefa, ele mesmo cita:

Homem simples e humildeNão havia nada de sobrenatural nele. Con-

fúcio gostava de estar com as pessoas, de jantar fora, de cantar em coro uma bela canção e de beber, mas não em excesso. Seus discípulos re-lataram que, nas horas de folga, o Mestre tinha um comportamento informal e alegre. Ele era afável, mas firme, digno, mas agradável. Estava sempre pronto para defender a causa das pessoas

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comuns contra a nobreza opressiva de sua época; nas suas relações pessoais, ele rompia escanda-losamente as linhas de classe impostas pela so-ciedade e nunca menosprezava os alunos mais pobres, mesmo quando não podiam pagar as au-las. Era gentil, mas capaz de sarcasmos quando achava merecido. Falando daquele que começava a criticar suas companhias, Confúcio observou: “É evidente que Tzu Kung tornou-se perfeito. Ele tem tempo para esse tipo de coisa. Eu não tenho tempo livre”.

Confúcio nunca lamentou a escolha que fez. Com alimento ordinário para comer, água para beber e o braço dobrado como travesseiro, ainda tenho alegria em meio a isso e a tudo. As rique-zas e honrarias adquiridas por meios iníquos não significam para mim mais do que as nuvens flu-tuantes, diz ele.

A glorificação veio após a sua morte. Entre seus discípulos, o gesto foi imediato. Disse Tzu Kung: “Ele é o sol, a luz, aos quais não há meios de se subir. A impossibilidade de igualarmos nosso Mestre é como a impossibilidade de alcan-çarmos o céu subindo por uma escada”. Em pou-cas gerações, Confúcio era visto em toda a China como o “mentor e modelo de dez mil gerações. O que mais lhe teria agradado foi a atenção dada às suas idéias. Durante dois mil anos – até o século XX – toda criança chinesa chegou à sala de aula, toda manhã, e lavantou as mãozinhas postas na direção de uma mesa que tinha uma placa com o nome de Confúcio. Praticamente, todo estudante chinês estudou cuidadosamente os provérbios de Confúcio, durante horas à fio; o resultado é que eles se tornaram parte da mente chinesa, chegan-do até os analfabetos na forma de provérbios. O governo chinês também foi influenciado por es-sas idéias, mais profundamente do que qualquer outra pessoa.

Pano de FundoÉ claro que os provérbios, por si só, não ex-

plicam o sucesso de Confúcio.

A Antiga China não era nem mais nem me-nos turbulenta do que as outras terras. Do oitavo ao terceiro século a.C., porém, a China testemu-nhou o colapso da dinastia Chou, que foi um go-

• Verdadeiro filósofo não será aquele que, mesmo sendo reconhecido, jamais guarda ressentimento?

• Não faças aos outros o que não queres que te façam.

• Não me entristece que os outros não me conheçam. Entristece-me não conhecer os outros.

• Não esperes resultados rápidos nem pro-cures pequenas vantagens. Se buscares resultados rápidos, não alcançarás a meta final. Se te deixares desviar por pequenas vantagens, nunca realizarás grandes feitos.

• As pessoas mais nobres primeiro praticam o que pregam e depois pregam de acordo com a sua prática. Se quando olhas dentro do teu coração não vês nada de errado, por que te preocupas? O que há para temeres?

• Quando conheces uma coisa, reconhecer que tu a conheces; e quando não a conhe-ces, saber que tu não sabes – isso é conhe-cimento.

• Ir longe demais é tão mau quanto ficar aquém.

• Quando vês um homem digno, pensa quan-do poderás emulá-lo.

• Quando vês um homem desprezível, exami-na o teu próprio caráter.

• Riqueza e posição, eis o que as pessoas desejam; mas se não as conseguirem da maneira correta, nunca as possuirão.

• Sê bondoso com todos, mas íntimo apenas dos virtuosos.

Alguns provérbios

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verno de paz e ordem. Baronatos rivais ficaram em liberdade para fazer o que bem entendiam, criando uma situação idêntica à da Palestina no período dos juízes: “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada homem fazia o que parecia certo a seus próprios olhos”.

É necessário compreender o que havia de errado na socie-

dade em que ele vivia.

A Guerra quase contínua desse período começou dentro dos padrões do cavalheirismo. O carro de guerra era sua arma, a cortesia era o seu código e os atos de generosidade confe-riam honra. Diante da invasão, o barão arrogante enviaria um comboio de provisões ao exército invasor. Ou, para provar que seus homens esta-vam além do medo e da intimidação, ele envia-ria, como mensageiro, soldados que cortariam a própria garganta diante do invasor. Tal como na era de Homero, guerreiros de exércitos inimigos se reconheciam, trocavam desdenhosos cumpri-mentos do alto de seus carros de guerra, bebiam juntos e à vezes trocavam armas antes de entrar em combate.

Na época de Confúcio, porém, a guerra in-terminável degenerava; de cavalheiresca, tornara-se o terror desenfreado do Período dos Estados Combatentes. O horror chegou ao auge no século seguinte à morte de confúcio. Os combatentes entre carros de guerra deram lugar à cavalaria, com seus ataques de surpresa e reides súbitos. Em vez do ato nobre de manter os prisioneiros até receber o resgate, os conquistadores promo-viam execuções em massa. Populações inteiras, capturadas nos azares da guerra, eram decapita-das, incluindo velhos, mulheres e crianças. Le-mos descrições de chacinas de 60.000, 80.000 e até de 400.000 pessoas. Há relatos de vencidos atirados em caldeirões de água fervente e seus familiares forçados a beber aquela sopa humana.

A pergunta, nessa época, era: Por que conti-nuamos nos destruindo? Talvez aí esteja a respos-ta para compreendermos o poder do Confucionis-mo. Confúcio viveu numa época em que a coesão social havia deteriorado até o ponto crítico.

Confúcio insistia que o amor ocupa um lu-gar importante na vida; mas também que o amor deve ser apoiado por estruturas sociais e por um etos coletivo. Bater exclusivamente na tecla do amor é o mesmo que pregar os fins sem os meios. Quando perguntaram à Confúcio certa vez, “de-vemos amar nossos inimigos, aqueles que nos causam mal?”. Ele respondeu: “De modo algum. Respondei ao ódio com a justiça e ao amor com a benevolência. Caso contrário, estaríeis desperdi-çando vossa benevolência.”

Respeito às tradiçõesO que chama a atenção nas religiões orien-

tais é o respeito que todos cultivam pelos mais velhos. A idade não é um peso, mas uma benção. A experiência é importante para os mais novos, que a buscam nas pessoas de maior vivência. As-sim também são conservadas as tradições, trans-mitidas pelos mais velhos. Sobre a socialização, o próprio Confúcio ensinou:

Deve ser transmitida dos velhos para os jovens, enquanto os hábitos e as idéias devem ser con-servados como uma teia ininterrupta de memó-ria entre os portadores da tradição, geração após geração. (...) Quando a continuidade das tradições de civilidade se rompe, a comunida-de é ameaçada. A menos que essa ruptura seja consertada, a comunidade se esfacelará em (...) guerras de facções. Isso porque, quando a continuidade é interrompida, a herança cultural não está sendo transmitida. A nova geração se defronta com a tarefa de redescobrir, reinventar e reaprender, por tentativa e erro, a maior parte daquilo que precisa saber. (...) Essa não é tarefa para uma única geração.

Tradição deliberadaA tradição deliberada segue, no esquema de

Confúcio, cinco termos chaves:

JEN: Etimológicamente uma combinação dos caracteres correspondentes a “ser humano” e “dois”, designa o relacionamento ideal que deve existir entre as pessoas. Traduzido das mais va-riadas formas (bondade, fraternidade, benevolên-cia e amor), talvez a melhor maneira de transmi-

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tir a idéia seja pela expressão “Sensibilidade do coração humano”. Jen envolve simultaneamente um sentimento de compaixão pelos outros e de respeito por si mesmo, um sentimento indivisível da dignidade da vida humana, onde quer que ela apareça.

CHUN TZU: Se Jen é o relacionamento ideal entre seres humanos, chu tzu refere-se ao termo ideal nesses relacionamentos. Esse concei-to tem sido traduzido como Homem Superior e O Melhor da Humanidade. Talvez Pessoa Amadu-recida seja uma tradução tão fiel quanto qualquer outra. É o oposto de pessoa estreita, da pessoa mesquinha, da pessoa de espírito pequeno. So-mente quando aqueles que formam a sociedade se transformarem em chun tzus é que o mundo poderá caminhar na direção da paz.

•Se houver honra no coração, haverá beleza no caráter.

•Se houver beleza no caráter, haverá harmonia no lar.

•Se houver harmonia no lar, haverá ordem no país.

•Se houver ordem no país, haverá paz no mundo.

LI: O terceiro conceito, li, tem dois signifi-cados. Seu primeiro significado é propriedade, a maneira pela qual as coisas devem ser feitas. As pessoas precisavam de modelos, e Confúcio que-ria direcionar a atenção delas para os melhores modelos oferecidos pela sua história social Pro-priedade é um conceito com amplo alcance, mas podemos perceber o âmago do interesse quando ele diz:

“Se as palavras não forem corretas”:... a linguagem não estará de acordo com a ver-dade das coisas. Se a linguagem não estiver de acordo com a verdade das coisas, os negócios não poderão ser concluídos com sucesso. (...) Portanto, um homem superior considera neces-sário que os nomes por ele utilizados sejam fala-dos apropriadamente, e também que aquilo que ele fala possa ser transmitido apropriadamente. O que o homem superior requer é que em suas palavras nada haja de encontro.

Todo o pensamento humano avança por meio de palavras; logo, se as palavras forem oblíquas, o pensamento não conseguirá avançar em linha reta. Aí é importante aquilo que Confúcio cha-

mava de “Retificação dos nomes”. A retificação dos nomes, na Doutrina do meio, nas Relações Constantes, no Respeito pela Idade e pela Famí-lia, esboçamos importantes aspectos específicos de li no seu primeiro significado: propriedade ou o que é certo.

O outro significado da palavra é ritual, que transforma o certo – no sentido daquilo que é cor-retor fazer – em rito. Quando o comportamento correto é detalhado em minúcias confucionistas, a vida inteira do indivíduo se estiliza numa dança sagrada. A vida social foi coreografada.

TE: O quarto conceito axial que Confúcio procurou elaborar para seus conterrâneos foi Te. Significa Poder. Especificamente, o poder por meio do qual os homens são governados. Ele es-tava convencido de que nenhum governante con-segue reprimir todos os seus cidadãos o tempo todo, nem mesmo grande parte deles na maior parte do tempo. O governo precisa contar com uma aceitação da sua vontade, uma confiança apreciável naquilo que está fazendo. Confúcio acrescentou que a confiança popular era de longe a mais importante, pois “se o povo não tiver con-fiança em seu governo, este não se sustentará”. Para ele, somente são dignos de governar aqueles que prefeririam não Ter de governar.

“Governar é manter-se reto. Se tu, senhor, dirigi-res teu povo em linha reta, qual de teus súditos se arriscará a sair dessa linha?

Quando o Barão de Lu lhe perguntou como gover-nar, Confúcio respondeu:

WEN: O conceito final na estrutura confucionista é wen. Refere-se às “artes da paz”, enquanto diferencia-das das “artes da guerra”, à música, à arte, à poesia, à soma da cultura no seu modo estético e espiritual. Con-fúcio considerava apenas semi-humanas as pessoas que eram indiferentes à arte. Mas o que atraía seu interesse não era a arte pela arte. Era o poder da arte de trans-formar a natureza humana na direção da virtude que o impressionava – seu poder de facilitar o interesse pelos outros.

Pela poesia, a mente é despertada; pela música, recebe-se o acabamento. As odes estimulam a mente. Elas induzem à autocontemplação. Ensinam a arte da sensibilidade. Ajudam a evitar o ressentimento. Fazem-no acreditar no dever de servir ao país e ao príncipe.

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O caminho dos deuses

Apenas para cultura geral vamos tecer algumas considerações sobre o Xintoís-mo, que tem grande influência sobre a

cultura japonesa. A partir desta religião podere-mos entender a força de um povo, sua seriedade, seus compromissos e sua devoção.

Primitivamente, a religião Xintoísta era cha-mada de Kami-no-michi, que é traduzido por “o caminho dos deuses”. Em chinês, a mesma expressão é shen-tao, de onde procede a palavra shinto ( em português, xinto).O Xintoísmo é uma religião peculiar por sua expressão de amor japo-nês pelo seu país e suas instituições. Este aspecto da história sagrada está descrito no Kojiki, data-do do século VIII. (STEFFEN, 2000, p.50)

O Kojiki diz que as ilhas japonesas foram criadas por Izanami e Izanagi, que também ha-bitaram a terra como numerosas divindades, das quais os japoneses são descendentes . A família real é descendente de Jimmu Tenno ( cerca de 660 a.C.), o primeiro imperador humano, neto de Ni-ni-go, neto de Amaterasu, a divindade femi-nina Sol. No Shinto, Amaterasu é reconhecida como a primeira no panteão das divindades, mas não é a única. É apenas uma entre muitos. O Xin-toísmo primitivo via o Japão como a terra dos deuses, o que explica o caráter nacionalista da religião. Acreditam que todos os japoneses têm origem divina, mas em especial o imperador, que é descendente da própria deusa do sol.

Principais ideiasO mito da origem japonesa parece ser uma

resposta animista primitiva à natureza. A multi-

plicidade de deuses japoneses pode ser atribuída a condições civis primitivas, quando a nação era habitada por um grande número de clãs indepen-dentes, cada um com seus próprios deuses e prá-ticas religiosas.

As cerimônias religiosas ajudam a evitar acidentes, promovem a cooperação e o contato com os Kamis, e geram o contentamento e a paz para o indivíduo e a sociedade. As cerimônias são feitas tanto no próprio lar, como nas grandes festas anuais do templo – Morada dos Kamis.

XINTOÍSMOQuando falamos do Xintoísmo normalmente nos

reportamos aos Japoneses, ricos pela sua forma de pensar, por sua cultura e também pelos seus valores religiosos.

Por Prof. Moacir Douglas Flor

O Shinto, “o caminho dos deuses”, pode ser des-crito como um modo ideal de comportamento. O seu sistema ético inclui os seguintes preceitos:

• Lealdade ao imperador • Gratidão • Coragem diante da morte • O serviço aos outros acima dos inte-

resses próprios • Verdade • Polidez até mesmo com os inimigos • Controle das manifestações de sen-

timentos e honra, que significa o ato de preferir a morte do que a desgraça.

Os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial nos mostram um pouco desses conceitos quando os pilotos japoneses corajosamente jogaram seus próprios aviões para atingir o alvo e acabar com o inimigo.

Os preceitos do Shinto

Quatro elementos estão sempre presentes nestas cerimônias: • Purificação

• Sacrifício

• Oração

• Refeição Sagrada

Torii (monumento xintoísta) de hiroshima, Japão

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Lao Tsé

Os problemas éticos, sociais e políti-cos estão no centro das discussões da maioria das religiões orientais. É a op-

ção pelo ser e não pelo ter. Apresenta uma visão diferente da vida. É uma cultura oposta ao que estamos acostumados a viver no ocidente. Se-rão recomendadas leituras complementares para quem tiver interesse maior em conhecer melhor as idéias de Lao-tsé – o grande e velho mestre.

A origem do Taoísmo é apresentada com o nome de um homem chamado Lao-tsé. Suposta-mente nascido por volta de 604 a.C. As histórias sobre a vida deste homem são muito variadas. Alguns historiadores não têm nem certeza se ele realmente existiu. Algumas lendas são fantásti-cas, como aquela que diz “ter sido ele concebido por uma estrela cadente, permaneceu no ventre materno por 82 anos e já nasceu velho, sábio e com os cabelos brancos”. (SMITH, 1991, P.193)

Lao-tsé se traduz como “o velho”, “o ve-lho amigo”, ou “o grande e velho mestre”. Era contemporâneo de Confúcio. Um historiado Chinês relata que Confúcio ficou intrigado com o que ouvira a respeito de Lao-tsé e, certa vez, o visitou. Sua descrição sugere que aquele estra-nho homem o desconcertou, enchendo-o porém de respeito. “Eu sei que um pássaro pode voar; sei que um peixe pode nadar, sei que os animais podem correr. Criaturas que correm podem ser

apanhadas em redes; as que nadam, em armadi-lhas de vime; as que voam, atingidas por flechas. Mas o dragão está além do meu conhecimento; ele sobe ao céu nas nuvens e no vento. Hoje vi Lao-tsé, e ele é como o dragão”.

O Livro SagradoUma boa idéia do início do Taoísmo, como

conta a tradição, é o que lemos no texto de Hus-ton Smith, que assim coloca:

A história tradicional conta que Lao-tsé, entristecido com o seu povo pela relutância em cultivar a bondade natural que ele prega-va e buscando maior solidão para os seus úl-timos anos de vida, montou nas costas de um búfalo e galopou para o oeste, na direção do atual Tibete. No passo de Hankao, uma senti-nela, percebendo o caráter incomum daquele viajante, tentou convencê-lo a retornar. Não obtendo êxito, pediu ao velho que, ao menos, deixasse um registro de suas crenças para a civilização que estava abandonada. Lao-tsé, concordando com o pedido, recolheu-se du-rante três dias e retornou com um magro vo-lume de 5.000 caracteres intitulado Tao Te King, ou O Caminho e o seu Poder. O livro pode ser lido em meia hora ou durante toda a vida, e continua a ser, até os dias de hoje, o texto básico do pensamento Taoísta. Um li-vrinho de apenas 25 páginas e 81 capítulos. (SMITH, 1991, P.194)

O Tao Te King tem sido traduzido como O Caminho e seu Poder.

O Taoísmo Filosófico tem como objetivo ali-nhar a vida cotidiana da pessoa ao Tao. O cami-nho básico para fazê-lo é aperfeiçoar uma vida de

TAOÍSMOSe as idéias de Confúcio são estimulantes para governan-

tes sérios, o Taoísmo apresenta uma visão transcendente das preocupações com a vida.

Por Prof. Moacir Douglas Flor

Templo Taoísta nas Filipinas

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Taoí

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wu wei. Wu Wei Significa pura eficácia e quie-tude criativa. O conceito mais tradicional signi-fica não-ação ou inação. Mas devemos cuidar para não entender como atitude vazia, ócio. O Taoísmo, na concepção de muitos, implica passi-vidade e não atividade. Para um sábio taoísta, a ação mais importante é a “não ação”. Enquanto Confúcio desejava educar o homem por meio do conhecimento, Lao-Tse preferia que as pessoas permanecessem ingênuas e simples, como crian-ças. Enquanto Confúcio ansiava por regras e sis-temas fixos na política, Lao-Tsé acreditava que o homem deveria interferir o mínimo possível no desdobramento natural dos fatos. Confúcio queria uma administração bem-ordenada, mas Lao-Tsé acreditava que qualquer administração é má. “Quanto mais leis e mandamentos existirem, mais bandidos e ladrões haverá”, diz o Tao Te King.

Para Lao-Tse o estado ideal era a pequena comunidade ( a aldeia ou a cidade pequena) que, segundo ele, já existia nos tempos antigos. Ali as pessoas viviam em paz e contentes, sem interesse em guerrear contra seus vizinhos, como fizeram mais tarde as províncias chinesas. O líder devia ser um filósofo, e sua única tarefa era que sua passividade e seu distanciamento servissem de exemplo para os outros.

No Taoísmo tudo gira em torno do Tao, que literal-mente significa caminho. Este caminho pode ser entendido de três maneiras:

1 O Tao é o caminho da realidade última. É de-masiado vasto para que a realidade humana possa sondá-lo. De todas as coisas, o Tao cer-tamente é o maior.

2 O Tao é o caminho do universo, a norma, o rit-mo, o poder propulsor de toda a natureza, o princípio ordenador por trás de toda a vida.

3 O Tao se refere ao caminho da vida humana, quando ela se harmoniza com o Tao do univer-so.

Os significados do Tao

Lendo o Tao Te KinA pessoa precisa deixar o Tao fluir para den-

tro e para fora de si mesma, até toda a sua vida

se tornar uma dança na qual não há febres nem desequilíbrios. Wu wei é a vida vivida acima da tensão:

Encha a tigela até a borda E ela vai derramar Fique sempre afiando a faca E ela vai cegar ( Cap.9)

Wu wei é a materialização da maleabilidade, da simplicidade, da liberdade – uma espécie de pura eficácia na qual não se desperdiçam movi-mentos em discussões ou exibições externas.

A pessoa pode caminhar tão bem que nunca deixa pegadas Falar tão bem que a língua nunca come-te deslizes, Calcular tão bem que não precisa de ábaco. ( cap.27)

Uma eficácia dessa ordem obviamente exi-ge uma capacidade extraordinária, o que é trans-mitido pela lenda Taoísta do pescador: com um simples fio, ele conseguia puxar para a terra pei-xes enormes, porque o fio havia sido fabricado com tanta perfeição que não tinha um “ponto fraco”. A capacidade taoísta raramente é notada, porque vista de fora, wu wei – nunca forçando, nunca sob tensão – parece não exigir praticamen-te nenhum esforço. O Segredo está na maneira pela qual ele busca os espaços vazios na vida e na natureza, e se move através deles.

A água era o paralelo mais próximo ao Tao do mundo natural. Era também o protótipo do wu wei. Os chineses observavam a maneira pela qual a água se adapta ao ambiente e procura os lugares mais baixos. Por isso:

O bem supremo é como a água, Que alimenta todas as coisas sem esforço. Ela se contenta com os lugares baixos, que as pessoas desdenham. Por isso, ela é como o Tao. ( cap. 8)

Mas a água, apesar de se acomodar, tem um poder que não é conhecido pelas coisas duras e quebradiças. A água abre caminho além das fron-teiras e por baixo dos muros divisórios. Seu flu-xo suave acaba dissolvendo as rochas e levando embora as orgulhosas montanhas que pensamos eternas.

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Nada no mundo É tão suave e maleável como a água No entando, para dissolver o duro e inflexível Nada a suplanta. O suave supera o duro; O gentil supera o rígido. Todos sabem que isso é verdade, Mas poucos o põem em prática.

A pessoa que incorpora estas virtudes, diz o Tao Te King, “Trabalha sem trabalhar”. Ela age sem tensão, persuade sem argumentação, é eloqüente sem floreios e alcança resultados sem violência, coersão ou pressão. Enquanto o agen-te mal seja percebido, sua influência é de fato decisiva.

Quando o bom líder governa, O povo mal percebe que ele existe. O bom líder não fala, age. Quando ele termina o trabalho, O povo diz: “fomos nós que fizemos so-zinhos.”( cap. 17)

Uma última característica da água, que torna apropriada sua analogia com o wu wei, é a clare-za que ela alcança ficando parada. “Água lodosa deixada parada”, diz o Tao Te King, “ficará lim-pida.”

Valores taoístasO Taoísta rejeita todas as formas de auto-

afirmação e competição. O mundo está cheio de pessoas determinadas a ser alguém ou causar problemas; pessoas que querem avançar, se des-tacar. O Taoísmo não vê utilidade nessa ambição. “O machado abate primeiro a árvore mais alta”.

Aquele que se põem na ponta dos pés Não tem firmeza. Aquele que se apressa Não vai longe. Aquele que tenta brilhar Tolda sua própria luz. ( cap. 24)

As pessoas deveriam evitar a estridência e a agressividade não só em relação aos outros, mas também em relação à natureza. No taoísmo exis-te um naturalismo profundo e um respeito muito grande pela natureza. Tanto que quando falamos

na escalada do Everest, por exemplo, nós ociden-tais dizemos que o Everest foi conquistado. Os orientais diriam que este ato foi o de fazer amiza-de com o Everest.

Aqueles que querem dominar o mundo E moldá-lo à sua vontade Nunca, percebo, terão sucesso. O mundo é como um vaso, tão sagrado Que, à mera aproximação do profano, Se danifica,E quando estendem a mão para pegá-lo, ele se perdeu ( cap. 29)

Yin YangOutra característica do Taoísmo é a sua no-

ção da relatividade de todos os valores e, como idéia correlata, a identidade dos opostos. Nesse aspecto, o taoísmo está ligado ao tradicional sím-bolo chinês do yin/yang:

Essa polaridade resume to-das as oposições básicas da vida: bem/mal, ativo/passivo, positivo/negativo, claro/escuro, verão/inver-no, masculino/feminino.

Mas as metades, embora estejam em tensão, não são francamente opostas; elas se contem-plam e se equilibram uma à outra. Cada uma invade o hemisfério da outra e faz sua morada no recesso mais profundo do domínio de sua parceira. E, no fim, ambas se resolvem no cír-culo que os cerca, o Tao em sua totalidade. A vida não se dobra sobre si mesma, e chega, completando o círculo, à percepção de que tudo é um e tudo está bem. (SMITH, 1991, p. 210)

O Taoísmo segue seu princípio da relativida-de até seu limite lógico, colocando a vida e a mor-te como ciclos complementares no ritmo do Tao.

Há o globo, O alicerce de minha existência física Ele me gasta com trabalho e deveres, Dá-me repouso na velhice, E me dá paz na morte. Pois quem me deu o que necessitei na vida Também me dará o que necessito na mor-te. ( Chuang Tzu )

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HistóriaO contexto da Palestina

Depois da época dos reis Davi e Salomão, Israel entrou em decadência. Das doze tribos ori-ginais só restavam duas (Judá e Benjamim). As outras haviam sido extintas desde 722 a.C. As duas tribos restantes, por sua vez, foram subme-tidas, sucessivamente, aos impérios babilônico, persa, grego e, em 63 a.C., reduzidas a provín-cias romanas. No decorrer desses fatos, os judeus continuaram a ter esperança de que um novo rei, ou messias, da linhagem de Davi, haveria de vir.

Acrescenta-se ao quadro da época uma con-dição econômica desfavorável. A saída era bus-car fora da Palestina os mecanismos necessários para a sobrevivência. Era a diáspora, que perdu-rava desde o cativeiro babilônico (587 a.C. a 539 a.C.). O desejo, com certeza, de estarem nova-mente juntos na mesma terra não tinha desapare-cido entre os judeus.

Desfavorável, ainda, era a presença de He-rodes como rei. Embora semita, era visto como uma extensão do poder imperial romano, que governava com mão-de-ferro. Imperdoável para o judeu foi a destruição do templo que Herodes promoveu na conquista de Jerusalém. Um rei ju-deu, ungido a exemplo de Davi e Salomão, era uma esperança latente.

O desejo de um rei judeu ungido era alimentado:

• pela dissolução das tribos de Israel;

• pela diáspora;

• pelo rei Herodes.

JesusJesus de Nazaré

Os Evangelhos dizem pouca coisa sobre a vida que Jesus levou durante 30 anos em Nazaré com seus pais, José e Maria. Somente dois Evan-gelhos narram fatos relativos ao seu nascimento. Em contrapartida, os quatro têm a preocupação de apresentar os três anos de sua vida pública, centrando-se na proclamação da mensagem sal-vadora.

Jesus nasceu em Belém antes da morte de Herodes, o Grande (ano romano de 749), prova-velmente no ano romano de 754, correspondente ao ano 6 a.C. Em sua juventude, o reino judaico estava sob o controle direto de um oficial do im-pério romano. Aos 30 anos, início de sua prega-ção pública, suas idéias baseadas nas escrituras judaicas despertaram interesse em alguns e pro-vocaram rejeição em outros.

CRISTIANISMOBaseada na vida e nos ensinamentos

de Jesus de Nazaré, o cristianismo é hoje a maior religião mundial.

Por Prof. Ronaldo Steffen

CRISTO REDENTOR: Monumento brasileiro construido na cidade do Rio de Janeiro em 1931, sim-bolizando a fé cristã nacional

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Jesus, como Cristo, assenta seus discursos bem distantes

das idéias nacionalistas-revo-lucionárias de seu contexto

Aos 33 anos, foi acusado de blasfêmia por um tribunal religioso judaico. Sentenciado à morte por um funcionário romano, Pôncio Pila-tos, foi crucificado publicamente nos arredores de Jerusalém.

Cristo, de Guido Reni, obra impregnada de idealismo classicista, da mesma forma que a pintura de temática mitológica do mesmo autor. (Museu de São Telmo, San Sebastián, Espanha)

Jesus, o MessiasA palavra messias significa “o ungido”,

numa referência à maneira como o rei de Israel era ungido com óleos ao subir ao trono. Traduzi-da para o grego, messias é christos. Dessa forma, Jesus Cristo é o nome que reconhece em Jesus o esperado Messias.

Desde o princípio, sua mensagem esteve centrada no reino de Deus, no conceito de um Pai amoroso, no seu próprio sacrifício expiatório, no arrependimento e na fé. Embora se anunciasse como o Cristo, evitou que as pessoas o soubes-sem, porque temia que o termo fosse colocado em associação com as aspirações nacionalistas-revolucionárias latentes. Só quando a hora da morte se aproximou é que assumiu sua messiani-dade, pois via nessa morte sacrificial a sua glória suprema, enquanto o Cristo de Deus.

Jesus, o RessuscitadoO nascer e o morrer integram o ciclo nor-

mal da existência humana. Ressuscitar, porém,

constitui algo totalmente fora da experiência das pessoas. A ressurreição de Jesus quebra, assim, a seqüência natural dos fatos existenciais. Inaugura um novo ciclo no existir do ser humano, pois a sua ressurreição é a garantia da nova vida pronta e consagrada ao mundo amado por Deus.

A ressurreição do Cristo ga-rante nova vida ao mundo

amado por Deus.

Jesus, a AscensãoUma vez ressuscitado, Jesus subiu ao céu e

está à direita do Pai. A expressão subiu ao céu não significa estar num lugar geograficamente definido. Igualmente, estar à direita do Pai é ape-nas expressão da posição de honra que é dada a Jesus, que, antes, fora humilhado até à morte.

Jesus está em toda parte e em qualquer lugar com sua divindade e humanidade completas, en-chendo os céus e a terra.

Tela Pentescostes – El Greco d.C. 1600 – Museo del Prado, Espanha

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As viagens missionárias de Paulo faz do cristianismo uma religião mundial:

Origens e primórdiosEm Jerusalém

O advento do Espírito Santo sobre os após-tolos no dia do Pentecostes judaico, isto é, 50 dias depois da Páscoa, marcou o início histórico do cristianismo.

O Pentecostes tornou-se para o cristianismo a renovação da aliança, semelhante à ocorrida no Monte Sinai quando Javé apareceu a Moisés. Os apóstolos foram tomados pelo Espírito San-to, passando a pregar o que Jesus fizera e o que lhes ensinara. Dirigiram-se primeiramente aos judeus, vindos de toda a parte, reunidos em Jeru-salém para a festa e primeiros destinatários dessa nova aliança, considerada a consolidação da an-tiga. Esses primeiros cristãos eram todos judeus, praticavam a Lei e acrescentaram observâncias inéditas, como o batismo e a repartição do pão.

Em Antioquia e por toda parteLogo surgiram obstáculos. Podem ser enu-

merados três, pelo menos, sendo um de ordem interna e dois de caráter externo.

Internamente, os primeiros cristãos, de tra-dição judaica, julgavam que, antes de serem ba-tizados, os novos convertidos deveriam ser cir-cuncidados. A questão foi resolvida no Concílio de Jerusalém, com a presença dos apóstolos, aceitando-se o batismo cristão sem a imposição da circuncisão.

Duas situações externas criaram embaraços ao avanço do cristianismo:

• identificação do cristianismo, por parte da liderança judaica da época, como mais uma seita que deveria ser desestimulada e banida;

• os impedimentos levantados pelo império ro-mano, entre os quais se destaca a ênfase dada pelo cristianismo à igualdade entre todos, in-clusive em relação aos escravos.

Impedimentos à expansão cristã:• a exigência da circuncisão aos convertidos;

• a compreensão de que seria apenas mais uma seita;

• o entendimento cristão da igualdade de todos os se-res humanos.

A conseqüência imediata foi a saída dos cristãos de Jerusalém. Espalham-se por toda a Palestina e Síria e fazem de Antioquia o novo

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centro expansionista do cristianismo. Jerusalém conservaria uma comunidade judaico-cristã até o ano de 66 d.C.

As primeiras comunidades cristãs se desen-volveriam em torno da bacia do Mediterrâneo, durante o período apostólico. Éfeso, Filipos, Tes-salônica, Corinto, Roma e Alexandria foram os primeiros grandes centros do cristianismo, reco-nhecidos como núcleos apostólicos.

Papel importante na expansão do cristianis-mo deve-se a Paulo, convertido por volta de 32 d.C. Ele não apenas divulgou o cristianismo pelo mundo greco-romano, como também é responsá-vel pelos fundamentos da teologia cristã.

Pedro teria sido martirizado em Roma, em 65 d.C., depois do incêndio da cidade sob Nero; Paulo em 66 d.C., também em Roma; João em Éfeso, por volta do ano 100 d.C., e Marcos teria se instalado em Alexandria depois da morte de Pedro.

A evolução até ConstantinoA organização

Do século II ao século IV, o cristianismo se estendeu a todas as cidades da costa do Medi-terrâneo e inseriu-se no interior dos continentes. Implantou-se, assim, tanto no Oriente como no Ocidente. Os grandes centros cristãos do sécu-lo I tornaram-se modelos para a organização das

comunidades que iam surgindo. À frente de cada comunidade (igreja) estava o bispo, uma espécie de vigilante, que também era o pastor e o mestre. Seus auxiliares eram os diáconos e os presbíte-ros. De início todos os bispos eram denominados de papa, e só a partir do século IV o termo é atri-buído exclusivamente ao bispo de Roma.

No início todos os bispos eram chamados de “papa”.

As perseguiçõesAinda que mal compreendido, o cristianis-

mo era tolerado, como o eram todas as religiões no império romano. As perseguições eram espo-rádicas, em especial na Ásia.

O culto ao imperador impunha os limites e os determinantes das perseguições. Prestar culto ao imperador, o que um cristão não fazia, era con-siderado gesto de civismo. A recusa representava uma ameaça ao equilíbrio religioso, rompendo as relações entre os deuses e o império.

Causa das perseguições: os cristãos não cultuavam o imperador. Isso punha em risco as relações entre os

deuses e o império.

Os Escritos do Novo Testamento:À tradição oral dos ensinamentos de Cristo acrescentaram-se os escritos identificados como Novo Testamento, consolidados até o ano 100 d.C. O conjunto da obra é formado por:

• QUATRO EVANGELHOS: Mateus, Marcos, Lucas e João;

• ATOS dos Apóstolos;

• 21 CARTAS: Romanos, Coríntios (1 e 2), Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, Tessalonicenses (1 e 2), Timóteo (1 e 2), Tito, Filemon, Hebreus, Tiago, Pedro (1 e 2), João (1, 2 e 3) e Judas;

• UM TEXTO APOCALÍPTICO: Apocalipse.

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De forma sistemática, as perseguições ocor-reram por volta de 249 d.C., com Décio e depois com Galiano e Valeriano. As ações se faziam principalmente contra os bispos e os cristãos de alta posição, a fim de privar o cristianismo de seus dirigentes. A última perseguição geral foi ordenada em 303 d.C. por Diocleciano em nome da união imperial, temendo, possivelmente, que a organização cristã se tornasse um outro estado dentro do império. Em 311 d.C., um edito de to-lerância, liderado por Constantino, concedia uma trégua ao cristianismo sob a condição de que nada se fizesse aos cristãos que fossem contrá-rios à disciplina.

Por fim, em 313 d.C., ainda sob o coman-do de Constantino, o Edito de Milão concedia a liberdade religiosa aos cristãos e punha fim às perseguições.

Em 313 d.C, sob Constantino, chegam ao fim as perseguições

aos cristãos.

O império cristãoDesde 305 d.C., Constantino já era senhor

da Gália, da Espanha e da Bretanha e, em 312 d.C., tornou-se imperador. Sua aproximação aos cristãos remonta a seu pai, que, em período de perseguição sob Diocleciano, protegeu e salvou muitas pessoas. Os dois editos, o de 311 d.C. e o de 313 d.C., tinham um ingrediente político bas-tante forte, além de proteger os cristãos. O fato é que, livre das perseguições, o cristianismo cairia sob o controle do imperador.

Constantino vislumbrava na aproximação com o cristianismo a culminância do processo de unificação do império. Havia uma só lei, um só imperador e uma só cidadania. Por que não tam-bém uma só religião? Protegida por Constantino, a Igreja Cristã cresceu rapidamente: isentou o clero dos encargos públicos, concedeu à Igreja o direito de receber legados, proibiu o trabalho aos domingos nas cidades e o sacrifício pagão em ca-sas particulares, erigiram-se grandes templos em Roma, Jerusalém e Belém. Além disso, transfe-riu a sede do império para Bizâncio (depois Nova Roma e, por fim, Constantinopla), no Oriente, a

parte mais cristianizada do império. O laço im-perial com o Ocidente era a figura do bispo de Roma, ao redor do qual gravitava a vida.

Com Constantino, O Grande (275-337 DC), uma só lei, um só imperador e por que não uma só religião a fim de uni-ficar o império?

Em 381 d.C., o cris-tianismo é declara-do religião oficial

do império.

Após a morte de Constantino em 337 d.C., o processo de aproximação entre Igreja e Estado foi se consolidando e tomou sua forma final com Teodósio, em 381 d.C., com a declaração do cris-tianismo como a religião oficial do império.

De Constantino ao Grande Cisma

Embora unificado, o cristianismo tinha suas diferenças regionais. Uma das mais marcantes foi entre o Oriente (sede em Constantinopla) e o Ocidente (sede em Roma). Várias razões podem ser alinhadas para o afastamento progressivo en-tre as duas sedes cristãs.

A língua

A tentativa de implantar uma única língua no império, o

latim, fracassa.

Até o século III, o espaço geográfico forma-do pela bacia do Mediterrâneo conhecia o grego. O avanço do latim no Ocidente teve como conse-qüência inevitável o recuo do grego. Ao fundar sua nova capital, Bizâncio (depois Nova Roma e, mais tarde, Constantinopla), o imperador Cons-tantino queria fazer dela uma nova Roma, com uma administração que utilizasse o latim. Não deu certo: o Oriente não se latinizou. Sem língua

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comum, os problemas emergiram, e os acertos esbarravam nas questões lingüísticas, em espe-cial os acertos teológicos.

Os concíliosA partir do Concílio de Nicéia (325 d.C.),

as discussões tornaram-se constantes. Os Concí-lios de Éfeso (431 d.C.), Calcedônia (451 d.C.) e Constantinopla (553 d.C.) foram ocasiões de confronto em detrimento da conciliação.

As discussões religiosas distan-ciam o Oriente do Ocidente.

As discussões religiosas eram agravadas em razão da primazia da sede de Roma, que Cons-tantinopla queria compartilhar. Podem ser acres-centadas as questões referentes às imagens, nor-mais no Ocidente, mas rejeitadas por parte dos cristãos orientais, e ao celibato, obrigatório no Ocidente, porém exigido no Oriente apenas para os bispos

A política fiscalO imperador Justiniano (482 d.C.-565 d.C.)

contribuiu muito para o agravamento das divi-sões religiosas. Nas províncias ocidentais re-conquistadas aos bárbaros, ele impôs o fisco e a administração detalhista do Oriente. O Ocidente não rejeitou apenas essa prática, mas também o poder imperial. As populações passaram a adotar como prática comum tratar diretamente com os bárbaros, rejeitando todas as orientações e obri-gações impostas por Constantinopla.

O CismaFinalmente, em 1054, ocorre o episódio fi-

nal da separação em decorrência de uma recusa de reconhecimento mútuo entre os legados do papa e do patriarca Miguel Cerulário. Essa recu-sa provocou uma excomunhão mútua, e cada uma das partes do cristianismo passou a construir sua própria tradição.

Tentativas de reunificaçãoApós o Cisma, os contatos prosseguiram. Os

imperadores do Oriente (ou bizantinos) solicita-ram ajuda ao Ocidente para lutar contra o avanço do islamismo. O apelo às cruzadas, lançado pelo papa Urbano II, em 1095, foi motivado, em parte, para atender às solicitações orientais.

Cruzadas: Guerreiros cristãos contra muçulmanos

As primeiras cruzadas foram organizadas com a ajuda oriental. No entanto, logo se perce-beu que os orientais ora apoiavam o Ocidente, ora os muçulmanos. Uma tentativa de corrigir essa distorção ocorreu em 1204, durante a Quarta Cruzada, quando o Ocidente saqueou Constanti-nopla e estabeleceu um passageiro império lati-no. À medida que o avanço islâmico se concre-tizava, fortalecia-se a esperança de um retorno à unidade religiosa do cristianismo. As esperanças, no entanto, dissiparam-se em 1453, quando a ca-pital do Oriente caiu nas mãos dos otomanos. Era o fim da Igreja Cristã Bizantina, que se divide, a partir daí, em Igrejas nacionais independentes. .

Do Cisma ao século XVIO Cisma deu origem, com sede em Roma, à

Igreja Católica Apostólica Romana e, com sede em Constantinopla, às Santas Igrejas Católicas Ortodoxas Orientais.

A unidade ocidental, por sua vez, não era

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concisa, e não tardou o surgimento de vozes dis-cordantes aqui e acolá, especialmente no que to-cava à detenção do poder: a Igreja ou o Estado? Vislumbrava-se a necessidade de reformar a Igre-ja cristã ocidental. A Inquisição nesse cenário foi uma tentativa religiosa que, por fim, serviu como instrumento de pressão e eliminação das vozes discordantes.

No Ocidente continuam as vo-zes discordantes, e a Inquisição serviu apenas como forma de

reprimir os dissidentes.

O desejo de reforma cedeu lugar à indispen-sabilidade desse processo, especialmente após a Guerra dos Cem Anos (1337-1453) e a abertura da sociedade às novas técnicas: redescoberta da Antigüidade, exploração do mundo, renascimen-to do grande comércio, aparecimento da impren-sa. A esse clima de efervescência contrapunham-se a pouca instrução dos ministros religiosos, a ausência constante dos bispos de suas dioceses e o Cisma, já mencionado, provocando um enfra-quecimento cada vez mais acentuado do cristia-nismo ocidental.

A divisão geográfica do Império Romano em 1054 d.C.

Não bastasse isso, durante todo o século XIV, os monarcas europeus se enfrentaram e tomaram como refém a hierarquia da Igreja. De 1309 a 1327, os papas se instalaram em Avignon, sob influência francesa. A volta do papa a Roma, em 1378, provocou uma eleição pontificial dissi-dente em Avignon. Os Estados da Europa, e com eles a cristandade, dividiram-se em torno desses

dois papas sem poderes.

A crise chegaria ao fim em 1417. Os Estados conseguiram se entender, convocando o Concílio de Constança, sob a presidência do imperador da Alemanha. Houve concordância em restabelecer a unidade da Igreja, depondo os papas em exercí-cio e propondo um único papa para a cristandade ocidental.

INQUISIÇÃO: Tela de Goya (pintor espanhol 1746-1828)

Ainda assim, a reforma necessária era cons-tantemente adiada.

No início do século XVI, os papas deixa-ram-se levar, a exemplo de outros príncipes, pe-las lutas políticas e pela renovação arquitetônica em Roma.

O projeto de reforma da antiga basílica im-punha despesas consideráveis. Para suprir as ne-cessidades, o papa Leão X (1513-1521) recorreu ao sistema de indulgências, criado no ano 1000. De forma reducionista, os fiéis, com o pagamen-to de uma quantia em dinheiro, podiam substituir as penas impostas pelo confessor aos pecados co-metidos após o batismo, como o jejum, as rezas, as peregrinações e assim por diante. Não tardou que os excessos na venda das indulgências apa-recessem. Em 1476, outro decreto papal determi-nava que a indulgência também tinha o poder de remir as almas do purgatório.

Explodiam por toda a Europa movimentos que exigiam um retorno às Escrituras. Assim foi na Grã-Bretanha, com John Wyclif, e na Boêmia, com João Hus. Nos Países Baixos, Erasmo dedi-cou-se à revisão da Bíblia, partindo do texto gre-go. O momento era de reforma, e nesse cenário surge a Reforma do século XVI, destacando-se a figura de Lutero.

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EnsinamentosAtualmente, há três grandes matrizes do

cristianismo: catolicismo romano, catolicismo ortodoxo e protestantismo. Internamente, cada uma dessas três matrizes se desdobra em inúme-ras outras correntes. Essa é uma dificuldade em afirmar um único pensamento cristão.

Apesar das divergências, há, em linhas ge-rais, algumas concepções que permeiam os gru-pos cristãos: a figura de Jesus, a Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo iguais em natureza e dig-nidade), a criação divina do mundo a partir do nada, a vinda do reino de Deus no fim dos tem-pos e o amor a Deus sobre todas as coisas, entre outras.

Em razão dos limites desta obra, optamos por mencionar apenas alguns dos temas citados.

DeusCom seus fundamentos no judaísmo, o cris-

tianismo preservou a crença num único Deus, criador do universo e de tudo o que nele há, po-dendo intervir conforme a Sua vontade.

Ainda herança do judaísmo, o cristianismo manteve muitos dos atributos divinos, como a onipotência, a onipresença e a onisciência. Me-rece, no entanto, um destaque um outro atributo divino: o do amor de Deus, que se estende sobre todas as pessoas, estabelecendo uma relação pes-soal entre o Criador e a criatura.

A relação de Deus com suas criaturas é pessoal, por

meio do amor.

A trindadeA partir do Concílio de Nicéia (325 d.C.),

a doutrina da Trindade passa a fazer parte do pensamento cristão. Um só Deus em três pessoas distintas e inseparavelmente unidas: Pai, Filho e Espírito Santo, assim como confessado no Credo Apostólico.

Não há concordância com relação ao tema.

Percebem-se, de modo geral, dois grupos discor-dantes: externamente ao cristianismo, judaísmo e islamismo divergem do cristianismo; interna-mente, há grupos nascidos no pensamento cris-tão, mas que afirmam a existência de apenas duas pessoas: o Pai, que deve ser adorado, e o Filho, sem nenhum direito à adoração.

JesusEsse é um tema candente. O monoteísmo

cristão difere dos demais por ser o único que defende e proclama a realidade de um homem-Deus, Jesus Cristo, possuidor de duas naturezas iguais entre si: a divina e a humana.

Fazem parte das crenças no Cristo Jesus a importância de Sua mensagem de amor ao Pai e ao próximo e Sua encarnação, que vem libertar os seres humanos de seus pecados por meio de Sua morte expiatória na cruz e oferecer a vida eterna por meio de Sua ressurreição.

Ser humanoÉ único

O pastor e professor Leopoldo Heimann as-sim se expressa: “o ser humano, como animal ra-cional, não é produto do acaso, mas é uma criação divina, criado segundo a imagem de Deus. Para conceder a vida eterna a este ser humano, Jesus Cristo foi crucificado no Calvário e ressusci tou ao terceiro dia.”

O diferencial do ser humano, nesse contex-to, é que é a única criatura divina que recebeu a imagem e semelhança de Deus. Há, no entanto, grupos dentro do cristianismo que colocam o ser humano, a natureza e Deus em nível de igualda-de.

Criado à imagem e semelhan-ça de Deus, o ser humano recebeu a alma vivente.

É mordomo da criação

Ao ser humano, criado à imagem divina, foi dada a tarefa de cuidar da criação divina. Gêne-

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sis 2.15 assim descreve: “Tomou o Senhor Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para cultivá-lo e guardá-lo”. Faz parte da essência hu-mana o cuidado com o universo. Ele não é dono, mas apenas responsável pela conservação e pela manutenção adequada do mundo. Nessa dimen-são, é tarefa do ser humano zelar pelo adequado manejo dos recursos naturais, e de forma susten-tável, bem como pela preservação de todos os seres vivos.

Cuidar, proteger e cultivar toda a criação divina é tarefa do ser humano. O que você tem feito em relação a isso?

É livre

Deus correu o risco, por assim dizer, de criar um ser passível de rebelar-se e recusar a existên-cia que lhe foi dada. Ainda assim, dotou o ser humano de livre-arbítrio, tornando-o completa-mente livre e responsável pela sua liberdade.

Incentivo: pesquise e discu-ta com os colegas o tema do

livre-arbítrio.

Pode transcender

As promessas de Deus conduzem o ser humano à certeza de que pode ir além de suas naturais limitações físicas. É com base nessas promessas que o cristianismo pode propor novos objetivos, sentidos e conquistas ao ser humano, como a da ressurreição e o da posse de um assen-to no reino de Deus que está por vir.

A morte não é mais o fim; é apenas ponte, passagem, para a vida eterna.

A dimensão de pertencer a uma realidade que ultrapassa

a materialidade conhecida faz dessa vida uma passagem

obrigatória na direção da vida eterna.

Vida e morteA vida do seguidor de Jesus, o Cristo, é pau-

tada pela sua resposta ao amor de Deus, que lhe aceita em razão da expiação e da morte de Jesus.

Em retribuição à bondade e à gratuidade de sua aceitação, salvação, por Deus, o cristão pon-tua sua existência pelos parâmetros encontrados nos preceitos de conduta do Novo Testamento, uma extensão dos Dez Mandamentos encontra-dos no Antigo Testamento. A diferença é que agora não mais por obrigação e, sim, por agra-decimento à salvação concedida sem nenhum merecimento. A moralidade cristã encontra sua fundamentação na ética do amor e merecerá todo um capítulo à parte, mais adiante.

As festas

Há no cristianismo, como em outras tradi-ções, festivais que promovem a relembrança dos feitos divinos em favor dos seres humanos. Muito embora haja divergência sobre esse tema em al-gumas tradições cristãs, o que percebemos é que o cristianismo é festivo. De uma forma geral e ressalvadas as interpretações divergentes, pode-mos considerar como as principais festas cristãs as apontadas a seguir.

Advento – Ocorre nas quatro semanas que precedem o Natal e dá início ao chamado Ano Litúrgico, preparando os cristãos para o nasci-mento de Jesus, o Cristo.

Natal – Fixado sempre aos 25 de dezembro, relembra o nascimento de Jesus como o Messias prometido.

Epifania – Festa fixada em 6 de janeiro, portanto 12 dias após o Natal, celebra a adoração de Jesus Cristo pelos Reis Magos e, para os cris-tãos ortodoxos, o seu batismo.

Sexta-Feira Santa – Data variável, ocor-rendo na sexta-feira imediatamente anterior ao domingo de Páscoa, relembra o sofrimento e a morte de Jesus.

Domingo de Páscoa – O dia da Páscoa, por definição, é o primeiro domingo após a Lua cheia, que ocorre após o equinócio vernal e pode cair entre 22 de março e 25 de abril. Celebra a

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ressurreição de Jesus e a Sua vitória sobre a mor-te.

Ascensão de Jesus ao céu – Data variável e determinada por ocorrer 40 dias após o domingo de Páscoa, celebra a presença de Cristo junto ao Pai como intercessor.

Pentecostes – Data variável, ocorrendo 50 dias após a Páscoa, celebra o aparecimento do Espírito Santo sobre os discípulos, conforme Atos 2.

Os símbolosA simbologia cristã é muito rica e procura

remeter o fiel à lembrança das promessas divinas e conduzi-lo à fé nessas promessas de salvação e cuidado. Neste espaço restrito, no entanto, fare-mos apenas algumas menções.

O Bom Pastor – Seguidamente Jesus é identificado como o bom pastor que cuida de suas ovelhas e que se dispõe a buscar, com o mesmo amor, aqueles que se desviam dos Seus caminhos.

O Bom Pastor, Catacumbas de Roma, séc. 3

A Cruz – Há muitas variedades de cruz en-quanto símbolos do cristianismo. Entre nós, no Brasil, há duas formas mais comuns: os católicos utilizam o crucifixo, enfatizando a morte e o so-frimento do Cristo, e os protestantes utilizam a cruz vazia, enfatizando a vitória da vida sobre a morte por meio da ressurreição do Cristo.

O Peixe – Nos primórdios do cristianismo, a figura do peixe era utilizada para identificar os

cristãos entre si em razão das perseguições. Pei-xe, em grego Ichthys, traduz o acrônimo de Iesus Christus Theou Yicus Soter – Jesus Cristo Filho de Deus Salvador.

Mosaico com dois peixes em achado arqueológico do Vale do Megido (anterior ao séc. 3)

Alfa e Ômega – A primeira letra do alfabeto grego é o alfa e a última é o ômega. O símbolo dá a dimensão de que Jesus, o Cristo, é o princípio e o fim de todas as coisas.

A vida depois da morte

Não é possível fugir dos temas do céu e do inferno quando se menciona a questão da vida após a morte.

Os católicos consideram que, após a morte, há ainda uma outra realidade: a do purgatório, local onde as almas que morreram em estado de graça, mas cometeram pecados, podem ser puri-ficadas.

O cristianismo defende que a vida plena, sem pecado e permeada pela santidade, dar-se-á no Juízo Final, quando Cristo voltará para julgar os vivos e os mortos e dar a vida eterna a todos os que creram nas Suas promessas.

Juízo Final - Afresco de Michelangelo pintado no teto da Capela Sistina – Roma - 1541

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Quem é Jesus? Por que ele veio? Como morreu? Que papel terá?Hi

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é um avatar, alguém enviado por Deus para descer ao mun-do material e agir em um determinado tempo e lugar.

para estabelecer um darma (a paz e a justiça) e introduzir o batismo com água.

terminada sua missão na Palesti-na, Jesus foi para a Índia, onde mor-reu vários anos depois.

os hindus acre-ditam que Jesus voltará, como prometeu, como um avatar, para mais uma vez es-tabelecer a ordem no mundo.

Juda

ísmo é um judeu comum

que, como outros na História, se procla-mava o Messias.

os judeus não crêem que Jesus seja um profeta.

foi crucificado pelos romanos por afrontar o poder do império ao declarar-se rei dos judeus.

não atribui papel futuro a Jesus.

Islam

ismo

é um entre muitos profetas, como Moi-sés ou Maomé, e não o filho de Deus.

sua missão foi trazer a men-sagem de Deus para o povo da Palestina.

foi condenado à cruz, mas outro acabou crucificado em seu lugar por intervenção divi-na. Ele então subiu aos Céus para encontrar Deus.

voltará no final dos tempos para dirigir a humani-dade no caminho da salvação.

Espi

ritism

o

um espírito, como os demais homens, mas com tal grau de evolução moral que é visto como modelo e guia para a humanidade.

para oferecer os padrões éticos e morais necessá-rios à evolução espiritual.

depois do suplí-cio, não retornou em seu corpo. A ressurreição é uma materialização de seu espírito – o chamado corpo espiritual.

sua volta não se dará num corpo, mas em forma es-piritual, restabele-cendo a ordem.

Fundador: Jesus Cristo.

Data de nascimento: ano 1 da era cristã. Há estudos que apon-tam o ano 6 a.C. como a data de nascimento (esse ano corres-ponderia ao ano romano de 754).

Local de nascimento: Palestina.

Textos sagrados e reverenciados: Bíblia, formada, conforme o entendimento da Sociedade Bíblica do Brasil, pelo Antigo Tes-tamento (39 livros escritos por diversos autores) e pelo Novo Testamento (27 livros, também escritos por diversos autores).

Estatística: o conjunto dos cristãos, hoje espalhados por todo o mundo, é estimado em torno de 2 bilhões e 100 milhões de adeptos (dados de 2001).

Perfil do Cristianismo

Como algumas tradições religiosas pensam sobre a figura de JesusHi

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Juda

ísmo

Islam

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oQuem é Jesus?é um avatar, alguém enviado por Deus para descer ao mun-do material e agir em um determinado tempo e lugar.

é um judeu comum que, como outros na História, se procla-mava o Messias.

é um entre muitos profetas, como Moi-sés ou Maomé, e não o filho de Deus.

um espírito, como os demais homens, mas com tal grau de evolução moral que é visto como modelo e guia para a humanidade.

Como morreu?terminada sua missão na Palesti-na, Jesus foi para a Índia, onde morna, Jesus foi para a Índia, onde morna, Jesus foi para

-a Índia, onde mor-a Índia, onde morreu vários anos depois.

foi crucificado pelos romanos por afrontar o poder do império ao declarar-se rei dos judeus.

foi condenado à cruz, mas outro acabou crucificado em seu lugar por intervenção divi-na. Ele então subiu aos Céus para encontrar Deus.

depois do suplí-cio, não retornou em seu corpo. A ressurreição é uma materialização de seu espírito – o chamado corpo espiritual.

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A Bíblia, o livro sagrado do cristianismo

A palavra Bíblia significa “conjunto de li-vros”. É isso o que ela, na verdade, é, sendo que se divide em dois grandes

blocos, o Antigo e o Novo Testamentos (AT e NT). A palavra testamento lembra aliança ou acordo, estabelecido entre Deus e os seres huma-nos. No caso do AT, refere-se a Abraão, que re-

cebeu a promessa de vir a formar-se uma grande nação, de onde viria o Messias, o Redentor de todos os homens. Também lembra a libertação da escravidão do Egito por meio do sangue do cordeiro. Quanto ao NT, é lembrado o cumpri-mento da promessa, a saber, que o Messias veio na pessoa de Jesus, que Ele salva os homens da morte eterna com o derramar do Seu sangue, o sangue da nova aliança, e envia Seus mensagei-ros ao mundo para pregar Seu evangelho. Para facilitar a leitura, a Bíblia foi dividida em capítu-los e versículos.

A MENSAGEM CRISTÃ NAS PARÁBOLAS DE JESUS

Como os cristãos colocam em prática a sua fé e onde está o fundamento dessa fé? A idéia não é catequizar, mas mostrar idéias contextualizadas a partir das parábolas de Jesus.

Por Prof. Ronaldo Steffen

• Formado por 39 livros, escrito em hebraico e ara-maico pelos profetas aproximadamente entre 1260 a.C. e 400 a.C.;

• Livros da Lei (Pentateuco);

• Históricos – Josué até Éster;

• Poéticos – Jó até Cantares de Salomão;

• Profetas Maiores – Isaías até Daniel;

• Profetas Menores – Oséias até Malaquias.

Em relação ao conteúdo do AT, destacamos:• criação do mundo em seis dias;

• queda em pecado pelos primeiros homens;

• promessa do Messias, o Redentor;

• formação e história do povo de Israel;

• profecias sobre Jesus (Gn. 3.15; Gn. 12.2; Is. 7.14; Mq. 5.2; Is. 53.4-11; S.l 16.10).

• Formado por 39 livros, escrito em hebraico e ara-maico pelos profetas aproximadamente entre 1260 a.C. e 400 a.C.;

• Livros da Lei (Pentateuco);

• Históricos – Josué até Éster;

• Poéticos – Jó até Cantares de Salomão;

• Profetas Maiores – Isaías até Daniel;

• Profetas Menores – Oséias até Malaquias.

Em relação ao conteúdo do AT, destacamos:• criação do mundo em seis dias;

• queda em pecado pelos primeiros homens;

• promessa do Messias, o Redentor;

• formação e história do povo de Israel;

• profecias sobre Jesus (Gn. 3.15; Gn. 12.2; Is. 7.14; Mq. 5.2; Is. 53.4-11; S.l 16.10).

Antigo Testamento• Formado por 27 livros, escrito em grego pelos

evangelistas e apóstolos entre 50 d.C. e 100 d.C.

Em relação ao conteúdo do NT, destacamos:• Quatro Evangelhos que narram vida, ensinamen-

tos, milagres, sofrimento, morte, ressurreição e ascensão de Jesus;

• Atos dos Apóstolos: iniciando pela ascensão, nar-ra o Pentecostes, a formação da Igreja Cristã, seu desenvolvimento, suas atividades e perseguições que sofreu;

• Cartas: Paulo (13), Pedro, Judas, Tiago; Hebreus (não se sabe o autor); João;

• Profecia: Livro do Apocalipse – Revelação.

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As parábolasA divindade de Jesus é percebida pelos cris-

tãos por meio de Suas mensagens, transmitidas oralmente e, posteriormente, consagradas nos quatro Evangelhos. Entre as mensagens de Je-sus, o Cristo, sempre se dá um especial destaque às parábolas. Foram usadas por Ele para dar um sentido às perguntas dos discípulos e dos demais seguidores, utilizando-se de uma contextualiza-ção capaz de ser compreendida pelos Seus inter-locutores.

A título de exemplificação, apresentaremos três parábolas que resumem alguns ensinamentos de Jesus, em idéias desenvolvidas pelo professor Egon Seibert.

O filho pródigo

Sobre o amor devido àquele que retorna arrependido –

Lucas 15.11-32

Esta parábola nos apresenta três persona-gens: o filho mais moço, o pai e o irmão mais velho.

O filho mais moço

Pede ao pai sua parte na herança que lhe se-ria devida (conforme os costumes da época, ele tem direito a um terço dos bens paternos, porém, após o recebimento, abdica do direito dos bens

que o pai adquirir). Ressaltemos: o pai não tinha a obrigação de satisfazer a vontade do filho, mas atende ao pedido.

O jovem sai de casa e gasta tudo o que re-cebeu de forma dissoluta, extravagante e imoral. Quando o dinheiro acaba, o jovem se dá conta de que está em meio a uma grande crise: a re-gião está assolada pela fome. Procura empregos e o que lhe sobra é tornar-se cuidador de porcos. Aceita o emprego por imaginar que ali pudesse alimentar-se das vagens gigantes que eram dadas aos porcos. Ninguém, no entanto, lhe dá coisa alguma.

Caindo em si, lembra-se da casa de seu pai, onde a vida dos escravos era bem melhor que a sua. Toma uma decisão: voltar, pedir desculpas e suplicar que o pai o aceite de volta como um de seus escravos.

Bartolomé Esteban Murillo. O Filho Pródigo Comendo com os Porcos. 1660s. Galeria Nacional da Irlanda – Dublin

• Ensina o que nós devemos fazer ou deixar de fazer.

• Manifesta o nosso pecado e a ira de Deus.

• Exige, ameaça e condena eternamente quem não cumpre os mandamentos.

• Provoca a ira no homem e afasta-o de Deus.

• Deve ser pregada aos impenitentes.

• Serve como freio (impedindo que o mal tome conta do mundo), espelho (revelando os erros humanos) e norma (mostrando ao ser humano como agir).

Lei• O que Deus fez e ainda faz pela nossa salvação.

• Manifesta o nosso Salvador e a graça de Deus.

• Promete, dá e sela o perdão, a vida e a salvação ao que crê em Jesus.

• Chama e atrai para Cristo, opera a fé.

• Anuncia-se aos atemorizados.

• É a boa nova da graça, do amor de Deus em Cristo Jesus (João 3.16) e motiva o cristão à prática das ações que agradam.

Evangelho

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O pai

Chama a atenção um registro na parábola: o pai estava aguardando a volta de seu filho. Tanto é que, ao vê-lo vindo pela estrada, não apenas o reconhece, mas vai ao seu encontro. Expressa sua compaixão abraçando-o e beijando-o. Diante da expressão de tanta bondade paterna, o filho reco-nhece sua situação – sem nenhum direito a exigir –, mas faz apenas uma súplica: “Aceita-me como um de seus escravos.”

A surpresa: o pai reintegra o filho à família e expressa essa aceitação providenciando as me-lhores roupas, colocando um anel em seu dedo, dando-lhe sandálias para seus pés, promoven-do uma recepção com festa, comida e dança. A razão? O próprio pai explica: “Este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado.”

O irmão mais velho

Estava no campo trabalhando. Ao retornar para casa, ouve o som da música e gritos de ale-gria. Intrigado, pergunta o que estava acontecen-do. Ao tomar ciência de que se tratava de uma festa para o irmão que retornara, recusa-se, indig-nado, a participar da festa. Não bastasse isso, ain-da repreende seu pai e aponta uma razão lógica: “Estou há tanto tempo contigo e nem um cabrito preparas para festejar comigo. Mas este teu filho, que foi embora e gastou tudo, volta e é recebi-do com festas? Até um novilho cevado é abatido para festejar?” O pai justifica sua atitude: “Tudo isso aqui é teu. Nada perdeste; a herança continua sendo tua. Mas era preciso que nos alegrássemos, pois este teu irmão estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado.”

Deus aguarda sempre e de braços abertos o retorno de

Seus filhos dispersos.

O ensino desta parábola:

Jesus narra de forma clara que Deus é o pai que recebe o pecador que o busca em arrependi-mento. Os que retornam, por piores que tenham

sido as suas ações do ponto de vista humano, se-rão por Ele recebidos.

Ele, porém, aponta para as atitudes, por ve-zes hipócritas, de quem se julga de sua família e que se dá o direito de discriminar quem errou e que, arrependido, deseja voltar a esse convívio. Ao invés de lamentar e até estranhar que o ar-rependido é aceito por Deus em sua família, os cristãos devem alegrar-se, pois o que Ele mais deseja é que todos se arrependam dos seus peca-dos e vivam.

O Retorno do Filho Pródigo – Rembrandt.

Sobre o perdão ao próximo - Mateus 18.21-35

Esta parábola é conhecida como O credor incompassivo.

Jesus é colocado diante de uma questão in-trigante: quantas vezes alguém deve perdoar ao seu próximo? Alguns argumentaram que até 7 vezes e espantaram-se com a dimensão dada por Jesus: 70 vezes 7, ou seja, sempre. É nesse con-texto que Jesus conta a parábola para ensinar a Sua vontade a respeito do perdão.

Um rei ajusta suas contas com seus servos. Um lhe deve 10 mil talentos (cerca de 1 bilhão e 800 milhões). Como o devedor não tem como lhe pagar, o rei ordena que todos os seus bens sejam vendidos, bem como sua família e ele mesmo. Desesperado, lança-se aos pés do rei e suplica-lhe clemência. Não é que o rei o atende?! Tocado por tamanha generosidade, sai aliviado da presença do rei. No caminho de sua casa, en-contra um conservo seu, uma espécie de presta-

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dor de serviço, que lhe devia 100 denários (cerca de 100 dólares) e, intransigentemente, insiste no recebimento da dívida. Como não a recebe, vai às últimas conseqüências e conduz seu conservo à prisão.

Amigos desse pobre infeliz se dirigem ao rei e delatam a situação. Irado, o rei chama o servo devedor a sua presença, manda prendê-lo e entre-ga sua vida às mãos dos carrascos.

Harold Copping: O Credor Incompassivo

O ensino desta parábola:

A nossa vida sobrecarregada de dívidas (er-ros, pecados) não pode ser paga diante de Deus. Muitos ainda tentam efetuar o pagamento. Im-possível! O valor é alto demais. A bondade, a ge-nerosidade e o amor de Deus, no entanto, vêm ao encontro de nossas necessidades e perdoa nossas dívidas. Estamos livres!

Assim, contudo, como somos perdoados, Deus espera que também perdoemos a todos que têm dívidas a nos pagar, sejam elas de quaisquer naturezas. É fácil? Com certeza, não! Mas, assim como somos perdoados, espera-se que perdoe-mos aos que nos ofendem.

Assim como alguém é per-doado em suas muitas faltas,

também pode perdoar as faltas daqueles que lhe são

próximos.

Sobre o amor ao próximo - Lucas 10.25-37

Esta parábola é mais conhecida como O bom samaritano.

Um intérprete da Lei perguntou certo dia a Jesus o que deveria fazer para herdar a vida eter-na. Jesus lhe disse: “O que está escrito na Lei?” Ele respondeu: “Ama a Deus de todo o coração, alma e entendimento e ama ao próximo como a ti mesmo.” Jesus, por sua vez, falou: “Faze isto e viverás.” Como que se desculpando, o intérpre-te da Lei perguntou: “Quem é o meu próximo?” Foi aí que Jesus lhe contou a parábola do bom samaritano.

Um homem foi assaltado e deixado semi-morto na estrada que ligava Jerusalém a Jeri-có. Por ele passam um sacerdote e um levita. Nenhum dos dois o assiste. Passa também pelo assaltado um samaritano, grupo inimigo dos israelitas, etnia do assaltado. Este, contrário ao senso do contexto, cuida do ferido e ainda o con-duz a uma pousada, paga as despesas iniciais e compromete-se com despesas posteriores do tra-tamento, se houver.

A pergunta de Jesus é retórica: “Quem foi o próximo do homem assaltado?” O intérprete da Lei, contrariado, precisa reconhecer que fora o que usara de misericórdia em favor do assaltado. Diante disso, Jesus finaliza: “Vai e procede tu de igual modo.”

O ensino desta parábola:

O amor ao próximo foi sempre uma das ca-racterísticas dos primeiros cristãos. Havia entre eles, especialmente em Jerusalém, muitos po-bres. A comunidade cristã, por meio de ofertas voluntárias, sustentava seus pobres, especial-mente os órfãos e as viúvas.

A certa altura surge um problema. As viúvas de origem grega sentem-se prejudicadas na medi-da em que começam a receber auxílio menor que o oferecido às de origem judaica. Reclamam. Pe-dro, líder da comunidade cristã, convoca as lide-ranças e ordena que sejam eleitos sete diáconos, homens fiéis para que cuidem da distribuição do

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alimento entre os necessitados, enquanto ele e os demais apóstolos iriam dedicar-se ao ofício da oração e da pregação do evangelho.

Hoje denominamos esse serviço de diaconia. É o serviço amoroso que o cristão presta ao seu próximo em resposta ao amor de Deus. Ela lida com as conseqüências e as causas do pecado: do-enças, sofrimentos, pobreza, miséria, ganância, preguiça, exploração, luto, solidão, violência (as-

saltos, estupros, homicídios), guerra, catástrofes naturais, fome, vícios, insensibilidade, solidão e morte.

A idéia de próximo é ampla: amar não só os amigos, mas

também os inimigos.

• visitar doentes em seus lares e hospitais (câncer, Aids, lepra);

• visitar idosos (nossos avós ou pais) para conversar, passear (asilos, casas-lares, cre-ches, orfanatos);

• visitar os que sofrem (enlutados, órfãos);

• visitar os presos;

• auxiliar os pobres (alimentos, roupas, remédio, estudo, emprego);

• encaminhar dependentes de drogas ou de álcool às instituições especializadas;

• olhar pelos portadores de deficiências físicas (hospitais), mentais (Apae), visuais (doação de córneas), auditivas etc.;

• lutar contra a poluição, preservando a natureza (lixo, inseticida, biodegradáveis), rios, ar, florestas, solo;

• lutar pela justiça social e contra qualquer tipo de discriminação (igualdade no trato com a lei);

• lutar pelo direito à vida (contra o aborto);

• apoiar o pacifismo (não à violência, à guerra);

• lutar contra a corrupção – não sendo corruptor nem corrupto;

• ajudar e orientar migrantes e desempregados;

• organizar palestras sobre higiene, saúde, drogas em associações de bairros;

• participar da vida política do País.

Sugestões de como é possível demonstrar amor ao próximo:

Um desafio incentivador: em razão do amor motivante, mobilize seu grupo de estudo, olhe ao seu redor e descubra formas e meios de poder exercitar o amor ao próximo.

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O meio familiar e a educação

Martinho Lutero nasceu em 10 de no-vembro de 1483, em Eisleben, Alema-nha. Sua família não era abastada, e

a educação familiar era pautada por padrões de severidade, próprios da época.

Os primeiros anos escolares (1488-1497) fo-ram marcados pelo aprendizado do latim, do can-to e dos princípios básicos da fé cristã. O método empregado para o ensino era caracterizado pela memorização e, não raro, por castigos físicos.

À fase escolar seguinte, até 1501, conheci-da como escola do trívio (estudo da gramática, da retórica e da dialética), seguiu-se o quadrívio (estudo da geometria, da aritmética, da música e da astronomia). Assim, Lutero estava pronto para ingressar na faculdade de Direito.

Compare as ênfases dadas à edu-cação da época com as de hoje. Compartilhe suas conclusões.

Da universidade para o mosteiro

A continuação dos estudos em Direito nem se deu. Foi interrompida em julho de 1505. Em razão de um raio que quase o atingira, e apavora-do com a proximidade com que esteve da morte, promete abandonar tudo e tornar-se monge. Há outras duas versões para sua decisão. Uma con-ta que, pouco antes de quase ser fulminado pelo raio, um amigo teria sido acometido de um mal súbito e morrera, deixando Lutero profundamen-te assustado com a possibilidade da morte. Outra versão, ainda, relata que Lutero teria sido ferido nos meses precedentes por um golpe de espada.

O que transparece, em qualquer dos três relatos, é a forte presença de um sentimento de medo pelo castigo associado à culpa. Essa per-cepção, aliás, não era exclusividade de Lutero. O forte sentimento de pecaminosidade era a tônica de todo um movimento de reavivamento religio-so na Alemanha da época. É assim que ainda em julho de 1505 ingressa no convento dos agosti-nianos.

LUTERO E A REFORMAEm 31 de outubro de 1517, Lutero torna público as 95 Teses contra as Indul-

gências e inicia a Reforma Protestante.

Por Prof. Ronaldo Steffen

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Tormentos e penitências marcaram sua passagem pelo mosteiro

Reflita: Qual seu parecer sobre movimentos religiosos que oprimem as consciên-

cias com o pavor da conde-nação eterna?

Sacerdote e mongeSeguindo a tradição dos monges agostinia-

nos, Lutero tornou-se um sacerdote e em 1507 reza sua primeira missa. Durante uma das ora-ções, é tomado por enorme angústia, provocada, ao que parece, pelo temor de aproximar-se de Deus. A forte certeza de ser pecador, aliada à an-gustiante sensação de culpa, faz Lutero perceber-se diante de um Deus severo, esboçado essencial-mente como juiz.

A entrada na vida monástica não foi o su-ficiente para acalmar Lutero nem lhe trazer a desejada paz interior. As penitências constantes e precedidas de confissões diárias não foram o suficiente para lhe afastar a imagem de um Deus que pune.

Os estudos em teologia e a paz interior

Em sua busca de paz, resolve estudar teolo-gia (1507-1512). Muda-se para Wittenberg e ob-tém o título de doutor. Passa a lecionar na facul-dade de Teologia sem, contudo, abandonar sua busca por um Deus que lhe desse a paz desejada.

Na universidade foi auxiliado por um de seus professores, o qual lhe pondera que a verdadeira penitência começa com o amor a Deus e não com o temor pela punição. O estudo de Agostinho o fascina, em especial o significado da vida e da morte de Cristo para a salvação. Ao proferir suas conferências sobre os Salmos (1513-1515), Lute-ro se convence de que a salvação é uma nova re-lação com Deus, fundamentada na absoluta con-fiança nas promessas divinas. Em final de 1516, ao preparar sua preleção sobre Romanos, detém-se na palavra de que “o justo viverá por fé”. Era a chave que lhe faltava. A salvação é dádiva divina, é amor. A justiça, que poderia significar o direito e o merecimento de quem age de modo correto, e por isso está apto a ser chamado de justo, é perce-bida por Lutero isenta de direito e merecimento, ainda que tenha agido de modo correto. O ser hu-mano não merece a identificação como justo. Ela lhe é atribuída em razão das promessas divinas e só pode ser recebida por fé, pelo simples fato de já terem sido dadas. Era o achado da salvação pela fé, independente das obras.

Na universidade, após estu-dos em Salmos e Romanos, Lutero “descobre” que a vida eterna é dada pela

fé.Salvação é amor divino e não merecimento humano.

As 95 Teses e o conflito com a Igreja

Lutero não era contra a idéia das indulgên-cias, muito embora suas 95 Teses (1517) tenham tido como alvo exatamente as indulgências. Teo-

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ricamente, estas constituíam um perdão relativo às penas impostas pela própria Igreja.

Com os abusos, muitos passaram a entender que o perdão podia ser estendido à diminuição das penas do purgatório.

A indulgência contra a qual Lutero se rebe-lava havia sido promulgada em 1506 e renovada em 1517. As somas recolhidas estavam destinadas a financiar a construção da basílica de São Pedro, em Roma. Soma-se a esse episódio especial a fi-gura de Alberto de Brandemburgo, decisivo no desenlace dos fatos que se sucederam.

Alberto era nobre e já bispo alemão, quando ficou vago o arcebispado de Mainz (Mogúncia), desejado por Alberto. A importância dessa dioce-se estava no fato de ser uma das que tinham direi-to a voto na eleição para imperador (três bispos e quatro príncipes do Sacro Império Romano-Ger-mânico, após a morte do imperador, reuniam-se para eleger o novo). Ao solicitá-la ao papa, este estipulou uma alta soma. O problema agrava-se porque Alberto já era supervisor de duas outras dioceses, o que era proibido pelo direito canô-nico. Sem recursos suficientes para “comprar” a

diocese vaga, Alberto recorre aos Fugger, uma família de banqueiros. Resolvido o pagamento ao papa, Alberto tinha uma enorme dívida com os Fugger. A solução? Utilizar as somas recolhidas com as indulgências, incrementando sua venda quase à banalização, além de inflacionar os va-lores (1 florim para artesão e 25 para o clero e a nobreza; observemos que 1 florim era o neces-sário para uma semana de subsistência de uma pessoa). Apenas a metade dos recursos era repas-sada a Roma. A outra metade ia diretamente para a instituição bancária dos Fugger.

O documento de Lutero dado a público em 31 de outubro de 1517 não tinha como alvo as negociatas de Alberto, das quais, segundo alguns historiadores, Lutero nem tinha conhecimento, mas, sim, as questões doutrinais e religiosas. Propunha uma reforma nos costumes na Igreja e um retorno às Sagradas Escrituras, em especial no que respeitava à salvação. A reação foi tão imediata que em pouco tempo já circulava por boa parte da Europa e, ainda que não imaginas-se tanto, já que Lutero pretendia uma discussão acadêmica, historicamente estava marcada a de-flagração do conflito que marcaria toda a história do mundo ocidental.

O abuso das indulgências: ver-bas para construção de basíli-

ca e compra de diocese.

A reação da IgrejaAs afirmações de Lutero encontraram ter-

reno fértil para se ampliarem. Uns não apenas o defendiam, mas também se admiravam de que alguém desconhecido tivesse ousadia para en-frentar a Igreja. Outros o condenavam e, ainda, irritavam-se com sua pretensão de sugerir mu-danças na Igreja.

Um dos primeiros a responder a Lutero foi Tetzel, o responsável nomeado por Alberto de Brandemburgo para a venda das indulgências. Logo a seguir outro oponente, João Eck, também se manifesta por meio de um texto. Lutero repli-ca com um sermão. Corria o início de 1518, e a situação estava assim colocada, e sem solução.

Divulgação das 95 Teses

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É quando entra em cena mais uma vez Al-berto de Brandemburgo, que se associa aos do-minicanos, ordem à qual Tetzel pertencia. Enca-minham a Roma denúncias contra Lutero, e daí para frente os acontecimentos se precipitam. Inti-mado pelo papa Leão X a comparecer em Roma, Lutero é protegido pelo príncipe-eleitor Frederi-co, o Sábio, que consegue trazer a audiência para a Alemanha, em Augsburgo.

Lutero na dieta de worms. Sem retratação, Lutero é excomungado e perde seus direitos religiosos. Confir-mada a excomunhão pelo império, perde os direitos civis e é, agora, um criminoso.

Instado a retratar-se, Lutero apela a instân-cias superiores. Outros encontros se sucedem, e as discussões tornam claro que as posições são cada vez mais contraditórias. Por fim, é solicita-da a Roma uma bula condenatória contra Lutero, publicada em junho de 1520, concedendo-lhe 60 dias para a retratação.

Nesse mesmo ano, e em meio às discussões que continuavam, Lutero produziu o escrito À nobreza cristã da nação alemã, sugerindo que o poder temporal deve assumir suas responsabi-lidades sociais e políticas. Ainda nesse mesmo ano, publicaria mais duas obras que provocariam um aprofundamento nas diferenças: Cativeiro ba-bilônico da Igreja, em que ataca ensinamentos da Igreja, e Sobre a liberdade cristã, enfatizando que o cristão é o mais livre de todos, não estando su-jeito a ninguém, e é o mais devoto servo de todos, estando a todos sujeito.

Sem a retratação, em janeiro de 1521, é pu-blicada a decretação da excomunhão de Lutero. Estava posto fora da Igreja Católica Apostólica Romana, perdendo todos os seus direitos religio-sos, inclusive os sacerdotais. O império preci-sava confirmar a excomunhão, cassando-lhe os

direitos civis e políticos. Para tratar o assunto, foi convocada a Dieta de Worms, na Alemanha, no mesmo ano. Sem acerto, Carlos V, recém-eleito imperador, confirma a excomunhão em maio de 1521. Lutero era agora um criminoso.

O exílioTemerosos pela vida de Lutero, alguns de

seus amigos o “seqüestraram” e o conduziram ao castelo de Wartburgo, sob a proteção de Frederi-co. Nos dez meses de reclusão, produziu como nunca: traduziu o Novo Testamento do grego para o alemão e produziu diversas obras teológicas.

Considerado como desaparecido, a ausência de Lutero desencadeou muita confusão. Radi-cais e fanáticos mostravam muita imprudência na condução das reformas. A volta se impunha como necessária e foi a própria Câmara Munici-pal de Wittenberg que fez a solicitação. O episó-dio marcou a volta de Lutero em março de 1522.

Embora a interdição contra Lutero nunca te-nha sido suspensa, ela também não se cumpriu. A razão maior encontra-se na ausência de um poder central forte, o que permitiu a Lutero con-duzir as reformas religiosas por ele pretendidas.

Sem Lutero o movimento torna-se caótico e incontrolável.

Sem Lutero o movimento tor-na-se caótico e incontrolável.

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O andamento das reformas

Até 1524 as reformas prosseguiram sem maiores desassossegos. É a partir dessa data que principiam as divisões. Os humanistas, liderados por Erasmo, separam-se de Lutero. Radicais es-piritualistas pregavam a necessidade da experi-ência religiosa. Outros radicais, os sociais, dese-javam reformas mais rápidas e desencadearam a Guerra dos Camponeses, considerada por Lutero como rebelião contra Deus, fortalecendo o poder temporal dos príncipes e, por conseqüência, per-dendo prestígio popular.

A reação aos avanços das reformas e de pos-teriores divisões fez com que os opositores de Lutero mais uma vez, em 1524, se organizassem na tentativa de cumprirem o interdito imperial.

Em meio a tudo, Lutero, aos 42 anos, surpre-ende ao casar-se, em junho de 1525, com Catari-na, uma ex-freira com 26 anos.

Até 1526, todas as tentativas de aplicação da interdição de Lutero fracassaram. Nesse ano, uma abertura maior nas discussões introduziu um adendo ao texto original da Dieta de Worms que dava aos príncipes a responsabilidade pela escolha da religião a ser seguida em sua área ad-ministrativa. Em 1529, novo encontro restringe essa resolução e quer fazer a situação voltar ao que antes era. Os príncipes luteranos reagiram por meio de um documento, no qual começa-vam as suas afirmações sempre com a palavra protestamos, dando origem à identificação como protestantes a todos os que se opunham à Igreja Católica Apostólica Romana.

Lutero (42 anos) e Catarina (26 anos): cena do casamento

Humanismo, espiritualismo e radicalismo social impunham

reformas em outros rumos.

A Dieta de Augsburgo (1530)

Convocada originalmente por Carlos V para estabelecer os parâmetros de defesa do império contra a invasão dos turcos otomanos, liderados por Solimão, os príncipes “protestantes” aprovei-taram-se para entregar uma declaração de fé em defesa de Lutero e seus seguidores, conhecida como Confissão de Augsburgo.

Em vista da necessidade de ter a seu lado todas as forças militares disponíveis, inclusive as dos príncipes protestantes, Carlos V firmou a Paz de Nüremberg, assegurando a liberdade religiosa aos príncipes e às suas cidades que haviam as-sinado o documento, mas impedindo que outros príncipes adotassem a Reforma em seus territó-rios. Era 25 de junho de 1530.

Somente em 1555 a controvérsia sobre a liberdade religiosa chega ao fim por meio da conhecida Paz de Augsburgo, ainda sob Carlos V, concedendo direitos iguais tanto a católicos quanto a protestantes, mas enfatizando que a res-ponsabilidade da escolha religiosa era prerroga-tiva dos príncipes. Ao súdito que não concordas-se com seu príncipe restava apenas a emigração para outro principado.

Dieta de Augsburgo (1530)

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A “Paz de Augsburgo” (1555) concede direitos iguais a cató-

licos e protestantes.

A morte de LuteroAos 62 anos, em fevereiro de 1546, Lutero

falece em Eisleben, onde nascera.

Reflita: No Oriente, o plura-lismo religioso, embora regio-nalizado, já era prática cor-rente; no Ocidente, a Reforma propiciou a mesma prática.

Posicione-se: A liberda-de de culto contribui ou não para o exercício pleno da hu-manidade do ser humano?

Igrejas cristãs de tradição reformada

As principais denominações protestantes que surgiram da Reforma foram a Igreja de tra-dição luterana e a Igreja de tradição reformada. Já mencionamos os alicerces que deram origem à tradição cristã luterana. Aqui queremos men-cionar os principais grupos de tradição cristã re-formada.

AngelicanaParalelamente ao movimen-to da Reforma na Alema-nha, ocorria fato semelhante na Suíça (1522), com Ulrico Zwinglio. Em 1529, Lutero e Zwinglio tentaram a apro-ximação de seus movimen-tos, impedida pela discordância com relação à Eucaristia (Santa Ceia).

Após a morte de Zwinglio, seu sucessor, João Calvino (1509-1564), liderou o movimento e emprestou-lhe o nome até 1561, quando os seus

seguidores foram identificados como reformados daí por diante.

A Igreja Anglicana teve seu início em 1530, com Henrique VIII, denominado pelo papa Leão X de Defensor da Fé por ter se posiciona-do contra Lutero em 1521. Casado com Catarina de Aragão, viúva de seu irmão, teve seis filhos, sobrevivendo apenas uma filha, Maria. Uma vez que o casamento tivera sido apenas nominal e impossibilitado de ter outros filhos com Catari-na, Henrique VIII aliou a esses dois fatores seu desejo de ter um filho homem para ser seu her-deiro e alegou à Igreja de tradição católica roma-na escrúpulos religiosos sobre a validade de seu casamento para solicitar sua anulação.

Enamorara-se de Ana Bolena, uma dama de sua corte. Com a demora da decisão de seu di-vórcio, insurge-se contra Roma, contando com o apoio popular contra as autoridades estrangeiras. O Parlamento inglês aprova um Ato de Supre-macia, declarando o rei como chefe da Igreja na Inglaterra.

Seu sucessor, Eduardo VI, conduz a Igreja mais para o lado calvinista, e sua sucessora, Isa-bel I, procurou integrar na Igreja todos os seus súditos (católicos, luteranos e calvinistas), dan-do origem à Igreja Anglicana, uma igreja para os anglos.

Nos Estados Unidos, após a independência em 1776, os seguidores da Igreja Anglicana pas-sam a ser identificados como seguidores da Igre-ja Episcopal Protestante.

No Brasil, os primeiros cultos anglicanos datam de 1810, no Rio de Janeiro.

PresbiterianaO ano de 1560 marca a introdução do calvi-nismo na Escócia, por meio de John Knox, discípulo de Calvino. Nessa data, o Parla-mento escocês aboliu a jurisdição papal e proibiu a celebração da missa na Escócia. É preciso enfatizar, no entanto, que os fatos não se sucederam de forma pacífica.

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Houve oposição.

As situações se complicam com a implanta-ção, na Grã-Bretanha, por Isabel I de uma igreja única para os anglos. Outros dissidentes – os que se opunham à intervenção do Estado nas questões religiosas – surgiram. Estes defendiam, confor-me Calvino, que o governo da Igreja deveria ser exercido pelo presbitério (o conjunto dos mais velhos/experientes). Os ingleses mais próximos do calvinismo recebem então a identificação de presbiterianos. Porém, foi apenas em 1876 que se organizaram como instituição, a Igreja Pres-biteriana da Inglaterra, livre e não estatal, muito embora seja atribuída a data de 1572 como ano de fundação do movimento.

O primeiro missionário com assento presbi-teriano chega ao Brasil em 1859.

BatistaHá duas teorias

que explicam o sur-gimento dos batistas. Uma reporta-se ao ba-tismo de Jesus no rio Jordão. Outra identifi-ca nos anabatistas, sé-culo XVI, sua origem. Os anabatistas rejeita-vam a validade do batismo de crianças e exigiam um novo batismo. Daí o termo anabatistas, “os que batizam de novo”.

Com forte entonação calvinista, o movimen-to batista é uma dissidência da Igreja Anglica-na. As primeiras comunidades religiosas estru-turadas tiveram lugar na Inglaterra, em 1611, e logo depois na Holanda. Defendem a separação entre Igreja e Estado e um governo eclesiástico descentralizado, razão pela qual as congregações têm autonomia. Fazem parte, ainda, da tradição batista os seguintes princípios: batismo apenas de adultos e por imersão; concepção de que ba-tismo e santa ceia são apenas ordenanças; não-admissão do uso de imagens; forte atividade mis-sionária e obra educacional.

No Brasil, o trabalho permanente dos batis-tas teve seu início em Salvador, Bahia, em 1882.

Outras tradições religiosas

A Paz de Augsburgo (1555) foi um avanço na época, porém ainda manteve nas mãos dos príncipes o direito de escolha da religião a ser seguida por seus súditos. Somente em 1648, com a Paz de Westphalia, documento que poria fim à Guerra dos Trinta Anos, é que se chegou à li-berdade religiosa individual. Caberia a cada in-divíduo escolher livremente sua fé religiosa. A data marca, ainda, o fim do período histórico da Reforma na Europa.

A partir dessa liberdade surgem, em diversos lugares, e com diferentes interpretações bíblicas, bem como costumes e práticas, líderes religiosos, pastores e profetas, dando origem a novas tradi-ções religiosas cristãs.

MetodistaO movimento

surgiu na Universi-dade de Oxford, na Inglaterra, por volta de 1739. Não tinha a pretensão de criar uma nova tradição religiosa, mas tão-somente reavivar a espiritualidade, marcada pela frieza e lassidão dos costumes da época, vigentes na Igreja An-glicana.

Um grupo de estudantes, liderados pelos ir-mãos John e Charles Wesley, passou a reunir-se para, em conjunto, orar e estudar a Bíblia. O gru-po foi denominado de Clube Santo e visto pelos de fora do movimento como metodistas em razão de sua aplicação metódica na prática devocional.

A primeira sociedade metodista organizada estabeleceu-se em Bristol, em 1739. Em 1818, ocorre a ruptura com a Igreja Anglicana.

Adventista do Sétimo diaO pastor batista americano Guilherme Miller

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(1782-1849) é quem dá início a essa tra-dição. Tudo teria começado em 1818, quando Guilherme, ao estudar a Bíblia, acreditou ter desco-berto o dia da volta

de Jesus Cristo (advento). A data estava próxima: 22 de outubro de 1844.

A notícia espalhou-se rapidamente. O movi-mento teve o seu número de adeptos aumentado, os quais aguardavam ansiosos o dia em que en-trariam na glória celestial. A data chegou e nada aconteceu.

Em decorrência, ocorreu uma fragmentação do movimento em três grupos: um continuou a marcar novas datas; outro se tornou incrédulo e, ainda, um terceiro continuou a estudar a Bíblia, concluindo que Miller estava certo quanto à data, mas que havia errado na interpretação da profe-cia, pois o santuário a ser purificado naquela data seria o céu e não a terra. Cristo passaria do lugar santo para o local santíssimo no céu, onde estaria intercedendo e julgando o caso de todos os seres humanos. É desse último grupo que surgem per-sonagens como Ellen G. White, a quem muitos atribuem a origem do movimento, organizado em 1861, nos Estados Unidos, com a identificação de Igreja Adventista do Sétimo Dia.

O assento da identificação em sétimo dia deu-se em razão de o movimento enfatizar o dia de sábado, o sétimo dia, como o dia de descanso para os cultos e a adoração.

No Brasil, suas atividades iniciaram-se em 1916, e a central da Igreja está em Santo André (São Paulo).

Além da guarda do sábado, os adventistas do sétimo dia observam os seguintes princípios: ba-tismo por imersão a partir dos 12 anos de idade; realização do ritual da Ceia com suco de uva e pão, precedido pelo lava-pés; dízimo como regra das ofertas; defesa do milênio (reinado de Cristo no céu entre sua primeira e segunda vinda, fican-do a terra sujeita apenas a Satanás e seus anjos; por ocasião da segunda vinda de Cristo, junto com seus santos, os ímpios mortos serão ressus-citados e destruídos junto com Satanás, estabele-

cendo-se a purificação da terra); não-crença no inferno.

MórmonsEm 1830, nos Estados Unidos, Joseph Smith

inicia o movimento conhecido como Igreja dos Mórmons, embora o nome oficial seja Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias.

Segundo os relatos de Joseph Smith, ele foi atendido em sua busca pela verdadeira Igreja de Cristo em 1820, por meio de uma revelação que lhe recomendara não entrar em nenhuma das igrejas existentes. Em 1823, o anjo Moroni lhe apareceu e falou de certas placas douradas enter-radas no chão. Quatro anos após, Smith desenter-rou essas placas, encontrando ainda duas pedras especiais em recipientes de prata. Com a ajuda das pedras, após algum tempo, Smith conseguiu decifrar as placas, que foram então levadas de volta pelo anjo Moroni. A tradução das placas foi publicada em livro em 1830, com o título O Li-vro de Mórmon.

O Templo de Salt Lake City (USA)

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O livro fala dos povos indígenas da Améri-ca e afirma que, depois de ressuscitar, Cristo se revelou a uma raça, mais tarde exterminada, que vivia na América.

Após sofrer muitos contratempos e até per-seguições, o movimento estabeleceu-se no atu-al estado de Utah. Ali construíram uma cidade e fundaram uma comunidade estatal teocrática que se expandiu rapidamente. Manter um Estado mórmon puro ficou impossível, sendo que, quan-do Utah se uniu à federação na condição de es-tado membro dos Estados Unidos, a comunidade precisou abrir mão de alguns de seus costumes, entre eles a poligamia.

Dentre os seus pensamentos, podemos desta-car: os seus escritos sagrados englobam O Livro de Mórmon, bem como outros textos com o mes-mo valor; Deus tem um corpo exatamente como o humano; Jesus é o Salvador que voltará à terra para estabelecer um reino de paz; o casamento realizado no templo é eterno; o batismo pode ser indireto, isto é, um mórmon vivo pode ser rebati-zado em nome de um parente já falecido.

Exército da SalvaçãoApós a Revo-

lução Industrial, Londres ficou muito abalada. Surgiram muitos mendigos, vicia-dos e prostitutas. Tomados de com-paixão por essas pessoas, o casal William e Catherine Booth, em 1865, fundou a missão cristã com o intuito de ajudar as pessoas em suas necessidades básicas e, com isso, evitar que o mal tomasse conta das pessoas.

O Exército da Salvação se estrutura rigida-mente dentro da orientação militar, com oficiais e soldados. A obediência aos superiores é uma regra essencial. Os oficiais têm emprego perma-nente e podem se casar, com a condição de que a esposa também seja oficial. Os soldados são pes-soas que possuem outros empregos e trabalham

para o Exército da Salvação nas horas vagas. Ocasionalmente os mais experientes são empre-gados em tempo integral, recebendo a patente de sargento ou oficial local. As mulheres têm plena emancipação em todos os níveis, e um soldado do grupo não precisa renunciar a sua própria co-munidade religiosa.

Além disso, o trabalho social é parte de sua atividade evangélica. O movimento conta com um grande número de instituições diversas para órfãos, alcoólatras e mães solteiras. Acrescente-mos que as reuniões religiosas são marcadas por muita música e canto.

Testemunhas de JeováO grupo teve sua

origem em 1872. Um americano de família presbiteriana, conver-tido ao movimento adventista, chamado Charles Taze Russel, desgostoso com as religiões existentes, formou um pequeno grupo de amigos a fim de estudar a Bíblia.

Em 1878, abandonou o movimento adventis-ta e, em 1879, lançou o primeiro número da re-vista Torre de Vigia (hoje, A Sentinela), na qual afirmava que o fim do mundo seria no outono de 1914.

A maioria dos adeptos do movimento cos-tuma participar na difusão de sua fé de porta em porta, fazendo circular a Bíblia e suas revistas A Sentinela e Despertai.

Não possuem nenhum credo, baseando-se exclusivamente na Bíblia. Não acreditam na Trindade e afirmam que apenas Jeová é Deus. O filho unigênito de Deus, sua primeira criação ce-lestial, tornou-se Jesus Cristo, e o Espírito Santo é a força invisível de Deus. Assim, rejeitam a di-vindade de Jesus.

O ponto central das convicções do movi-mento consiste na idéia de que a única esperança do ser humano é o reino de Deus, um governo celestial que compreende Cristo e 144 mil indi-víduos escolhidos, os quais serão elevados a uma nova vida no céu. Todos os outros crentes terão uma existência eterna na terra como súditos do

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reino celestial.

Adotam um comportamento que promove a honestidade, a higiene, a temperança e a solida-riedade. Não se envolvem em questões políticas e sociais e reservam a si o direito de não partici-parem do serviço militar.

Assembléia de DeusOs movimentos re-ligiosos de reaviva-mento espiritual que marcaram o final do século XIX deram ori-gem à Assembléia de Deus. Corria o ano de 1892 nos Estados Unidos, quando dois pregadores pertencentes à Igreja Batista deram início ao movimento. Por volta de 1914 já havia um considerável grupo que, reuni-do, deu início à Igreja da Fé Apostólica, nome alterado em 1918 para Assembléia de Deus.

As idéias e o comportamento do movimento são pautados pelo relato do dia de Pentecostes no Novo Testamento. Nessa data, Deus Espírito Santo desceu sobre os apóstolos, permitindo-lhes falar em outras línguas, curar enfermos e realizar milagres. Foi o primeiro impulso de conversão que ocorreu na Igreja cristã primitiva, expandin-do-se daí para frente.

Fundamentados em especial nessa passa-gem, os devotos pregam o dom de línguas, curas e milagres. Para que isso ocorra, é preciso que o homem esteja cheio do Espírito Santo, por ve-zes identificado como batismo do Espírito Santo. Defendem, ainda, a Santíssima Trindade, o batis-mo por imersão e o dízimo como única regra de oferta; os pastores, além de estudarem teologia, devem ser chamados por Deus e pelo batismo nas águas.

No Brasil, a Assembléia de Deus começou a atuar em 1910, em Belém do Pará, quando ainda estava ligada à Igreja Batista.

Evangelho QuadrangularA viúva de Aimée Semple McPherson, em 1922, nos Estados Unidos, funda o movimento do Evan-

gelho Quadrangular. O nome do movimento deve-se ao modo como Jesus Cristo é apresenta-do pelos quatro evange-listas: em Mateus, como Rei; em Lucas, como Médico; em Marcos, como Salvador e, em João, como Batizador. Além disso, cada função de Je-sus descrita nos Evangelhos é simbolizada por meio de cores: respectivamente, vermelho, ama-relo, roxo e azul.

O movimento está ligado ao tronco pente-costal e, por isso, é enfatizado o dom de línguas, curas e milagres, e especial valor é dado à con-versão pessoal e individual.

No Brasil, o Evangelho Quadrangular surgiu por volta de 1940, com um missionário metodista e só foi oficializado em 1951, na cidade de São Paulo. Cabe destacar que, a partir desse movi-mento, ocorreram separações que deram origem a dois grandes movimentos pentecostais brasi-leiros: em 1955, fundada pelo pastor Manoel de Melo, a Igreja Pentecostal do Brasil para Cristo e, em 1962, fundada pelo pastor Davi Miranda, a Igreja Evangélica Pentecostal Deus é Amor.

Igreja Universal do Reino de DeusCom fundamentos na As-sembléia de Deus, e por isso pentecostal, em 1977, o bispo Edir Macedo, no Rio de Janeiro, funda sua primeira sede com o fim de acabar com dogmas e regras impostas pela Igreja que, segundo ele, só afastam as pessoas de Deus.

Os fiéis defendem que todo o mal que ocorre na vida do ser humano é fruto da obra de espíri-tos malignos e demônios que precisam ser afas-tados por meio de sessões de exorcismo (“descar-rego”). O bem-estar na vida terrena, inclusive o econômico-financeiro, é sinal visível da presença divina na vida da pessoa e de sua família. Seus lí-deres devem ter como pré-requisito a visibilidade do Espírito Santo e vivem, exclusivamente, das ofertas de seus fiéis, desafiados a contribuírem com o dízimo e ofertas especiais como forma de demonstrarem sua dependência de Deus.

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O passado

Em 1517, acontecimento já visto em tópi-co anterior, os fatos não se sucederam ao acaso, e isso por duas razões. Uma, e fun-

damental, é a compreensão de que no universo, como na vida, as coisas não acontecem ao acaso. Deus, o criador e o mantenedor, é quem conduz a bom fim todas as coisas. Outra, decorrente des-ta, é que os acontecimentos que cercaram aquela data prepararam o evento atualmente denomina-do Reforma.

Lutero, hoje o reformador, com a publicação de suas 95 Teses, desejava à época sustentar que a libertação das almas do purgatório dava-se por obra e graça divina, em Cristo Jesus, e que ne-nhum valor em dinheiro era capaz de fazer isso.

Os fatos foram sendo desencadeados à medi-

da que as discussões ocorriam. Inevitável, veio à tona o debate sobre o poder do papa e dos bispos sobre o sacramento da penitência. Acirraram-se as divergências.

Para Lutero, a situação teológica definiu-se com a compreensão de que o justo é salvo pela fé nas promessas e nas realizações divinas já garan-tidas. A justiça é ato divino e sem nenhum me-recimento por parte do ser humano. Se assim é, como ficam as boas obras?

Boas obras não obtêm a sal-vação. Elas são agradecimen-to pela salvação já dada na

promessa divina.

Num escrito de 1520, Sobre as boas obras, Lutero define o novo rumo do agir humano. A

IGREJA LUTERANA E EDUCAÇÃO

Discorrer sobre o vínculo existente entre a Igreja Luterana e a educação re-quer, inicialmente, uma volta ao passado – buscar as raízes, compreender o pre-sente e vislumbrar a caminhada futura.

Por Prof. Ronaldo Steffen

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fé é certeza de que a promessa divina de salva-ção será cumprida, e Deus faz isso como favor aos seres humanos. Receber um presente dessa natureza, ser considerado justo e salvo sem me-recer, provoca uma reação de agradecimento, a única possível: amar a quem nos presenteou e aos outros presenteados, também tornados justos por puro favor. Não é preciso mandar agradecer. É espontâneo, a partir do amor que Deus teve com a humanidade. Para agradar, o beneficiado não se eximirá de esforços agradecidos.

Numa sociedade fortemente regulada pelas orientações emanadas das autoridades religio-sas, e por vezes cumpridas ou à força, ou contra a vontade, as implicações sociais e políticas de-correntes da idéia de que as boas obras não são definidoras nem da justiça, nem da salvação logo se evidenciam.

Em outro escrito, também de 1520, À no-breza cristã da nação alemã sobre a reforma da Cristandade, Lutero propõe reformas no corpo cristão composto por todos os cristãos, indepen-dente dos papéis que desempenham. Príncipes, senhores, artesãos, camponeses, clérigos, todos, pelo batismo, fazem parte do corpo de Cristo, nele integrados pelo mesmo favor divino.

Todos, religiosos ou clérigos, receberam a graça da salvação e podem agir, também na vida da cidade, por agradecimento.

Todos estão no mesmo barco e na mesma di-reção: agem por agradecimento. As autoridades religiosas, cuja competência é veicular a Palavra de Deus e aplicar os sacramentos, agem com amor por terem sido amadas primeiro. As auto-ridades seculares, cuja competência é manter em boa ordem o corpo cristão, agem igualmente com amor por terem sido amadas primeiro. Quando uma parte falha, é preciso que a outra intervenha. Naquele momento, Lutero entendia que as auto-ridades religiosas estavam falhando e as autori-dades seculares deveriam intervir, empreenden-do as necessárias reformas, movidos por amor ao corpo de Cristo.

Reflita:Diante de Deus, auto-ridades religiosas e civis têm a mesma direção: agir por agra-decimento. Quando uma falha, a outra deve intervir. Qual sua

opinião?

Entre as reformas necessárias, insere-se a das universidades e escolas. Lutero sugere que a Sagrada Escritura constitua a matriz do currícu-lo. Nas séries iniciais, meninos e meninas estuda-riam o Evangelho, em latim ou alemão. Continu-ariam os estudos superiores aqueles alunos que se destacassem nesse período, escolhidos pelos príncipes e conselhos das cidades. Nas escolas intermediárias, deveriam ser realizados estudos que remetessem à reflexão e à observação da na-tureza, além do estudo das línguas (latim, grego, hebraico), da matemática e da história. Em rela-ção aos cursos superiores de Direito, seria neces-sário dar ênfase ao direito civil e, quanto aos de Teologia, as Escrituras deveriam ser enfatizadas como objeto principal dos estudos.

A dimensão política do amor seria amplia-da em outro escrito, de 1523, Sobre a autoridade secular. Lutero torna mais transparente que exis-tem dois reinos ou regimes, o de Deus e o do mundo. O reino de Deus é integrado por todos aqueles que, agradecidos pelo favor recebido, já atuam movidos por amor. Em tese, não preci-sam do regime secular, mas submetem-se a ele e preservam-no a fim de que seu próximo seja beneficiado. O reino do mundo é integrado por todos aqueles que também receberam o favor, muito embora alguns ainda ajam movidos pelo egoísmo e precisem ser controlados para que no corpo cristão haja dignidade.

Em tese, o cristão não precisa das regras do mundo secular, mas a elas se submete devi-

do aos não-cristãos, a fim de manter a boa ordem do mundo. Analise essa afirmação tendo em vista a questão do aborto.

Cabe à educação, nos diferentes níveis, um

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papel relevante. Orientar as consciências para que as pessoas saibam como se conduzirem é tarefa que cabe não somente aos religiosos, mas também às autoridades e aos pais.

À medida que se aprofundam as diferenças entre Lutero e seus seguidores e a Igreja Católica Apostólica Romana, também seus escritos com referência à educação vão se tornando mais espe-cíficos. É assim na carta aberta Aos prefeitos das cidades alemãs, escrita em 1524.

A Reforma provocara um desestímulo à entrada nos mosteiros, justamente onde se en-contravam as escolas. Sozinhos, os pais não conseguiriam educar seus filhos. Lutero apela às autoridades civis cristãs para que tomem a si a responsabilidade da educação, movidas por amor. Zelar pelo bem-estar da cidade inclui a formação de cidadãos instruídos, hábeis e sábios, que tenham condições de adquirir e aumentar terras e propriedades. Daí que investir em edu-cação e na formação de cidadãos é concretizar a ética do amor.

No que se refere ao reino do mundo, Lutero entende que o estudo das artes e das línguas é que proporciona a formação de homens capazes de reger domínios e mulheres habilitadas para governar filhos e empregados. No tocante ao rei-no de Deus, entende que, igualmente, é preciso estudar as artes e as línguas a fim de melhor en-tender as Escrituras e saber conduzir os negócios seculares.

Educação por amor, na vida secular, habilita homens e mu-lheres ao governo das cidades e das famílias. Educação por

amor, na vida religiosa, habilita a uma melhor compreensão das

Escrituras.

Lutero recomenda, ainda, que, ao criarem escolas, os conselhos municipais deveriam ter o cuidado de formar boas bibliotecas em torno das Escrituras, das línguas e das artes.

A preocupação de Lutero com a educação não se limita às autoridades civis. Ele defende que, se estas realizarem a sua parte, resta, ain-

da, aos pais fazerem a sua enviando seus filhos à escola. Em 1530, numa pregação conhecida como Sermão sobre o dever de mandar os filhos à escola, Lutero faz um alerta aos pais que pre-feriam colocar seus filhos no trabalho ao invés de enviá-los às escolas criadas pelas autoridades civis. Ele entende que há proveito ou prejuízo em educar ou deixar de educar os filhos. Em ambos os casos, os pais estão beneficiando ou prejudi-cando o próprio Deus, que rege o mundo, o qual precisa de pessoas que se apliquem ao estudo e ao ensino das Escrituras, bem como de pessoas que se apliquem ao estudo a fim de assegurarem a sobrevivência e a harmonia da sociedade tanto com relação às leis como com relação à medicina e às artes liberais.

Este é o entendimento teocêntrico da edu-cação: é meio e instrumento de Deus. Mais uma vez é a ética do amor decorrente da fé que funda-menta a responsabilidade dos pais pela educação cristã das novas gerações, a fim de realizarem Deus em dois seguimentos: um buscando a sal-vação de todos os homens e outro construindo a paz no mundo.

A educação, dever dos pais e do Estado, e o progresso dela decorrente devem assegurar a sobrevivência e a harmonia da sociedade. A compreensão está

na direção do bem-estar coletivo.

O que impele Lutero a escrever sobre educa-ção? Esta foi a indagação que motivou as refle-xões que seguem, desenvolvidas pelo Dr. Martin N. Dreher no 1º Fórum de Lutero, na Ulbra – Ca-noas, sob o título Lutero, Teólogo para a Univer-sidade.

O desencadeamento do movimento re-formatório tornara evidente a necessida-de de uma reforma educacional. O sistema educacional medieval estava em crise em virtude das transformações pelas quais pas-sava a sociedade, em especial o surgimento do mercantilismo. Estava surgindo um novo tipo de sociedade, na qual o comércio come-çava a ter uma importância muito grande. As escolas, nas quais se estudava Filosofia e Teologia em altíssimo nível, eram escolas

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monásticas. A educação superior era toda ela eclesiástica. Mas o novo tipo de socie-dade que surgia estava a exigir novo tipo de educação.

Necessário se fazia que houvesse forma-ção para as áreas do comércio, para a dire-ção dos negócios do Estado, pois também um novo tipo de Estado, mais centralizado, esta-va surgindo. Era necessário que se formas-sem conselheiros, administradores e juristas. O crescimento do comércio, principalmente, requeria economistas.

Havia, porém, outro motivo que reque-ria a reforma do ensino. Até agora, o ensino fora religioso; seu alvo era o céu. Pais que optassem pelo “estudo” para seus filhos faziam-no no sentido de garantir e alcançar méritos para si e para seus filhos. O filho ia “estudar” para se tornar sacerdote e, assim, garantir sua própria salvação e a salvação dos pais. A salvação do mundo pouco ou nada importava. Quando Lutero descobriu a salvação gratuita, a justificação por graça e fé, esse tipo de educação não tinha mais fun-damento e ruiu. O alvo da ética não era mais o céu, mas a terra, a preservação das coisas criadas por Deus. A descoberta da justifica-ção por graça colocaria, além disso, a ênfase do estudo teológico na pregação e no estudo da Bíblia, e não mais no aspecto sacerdotal. Outros, pois, deveriam ser os conteúdos pre-paratórios para o ensino superior.

Os príncipes haviam aproveitado o mo-vimento reformatório para se apossarem dos bens eclesiásticos. Ora, das rendas dos bens eclesiásticos havia sido mantida até então a

educação dos sacerdotes. Agora, não havia mais recursos para manter a educação. A educação fora privilégio de minorias religio-sas. Lutero, em contraposição, vai anunciar a necessidade de um sistema educacional que esteja ao alcance de toda a população. Daí vem seu apelo para que as cidades criem e mantenham escolas. Se antes se gastava di-nheiro com a salvação, é necessário que ago-ra se use o dinheiro para a educação, consi-derada por ele a atividade mais importante. Fundamentalmente, para ele, a educação é de responsabilidade da autoridade civil e não da autoridade eclesiástica.

A argumentação de Lutero vai mais lon-ge. Centro da Reforma é a redescoberta do Evangelho. Essa redescoberta não deveria ser deixada de lado na reforma educacional. Aliás, assim pensa Lutero, se não acontecer uma reforma educacional que dê acesso ao ensino para toda a população, a redescober-ta do Evangelho estará sendo posta em peri-go! Caso a população não puder se educar, ter acesso à leitura do Evangelho, em pouco tempo o Evangelho estará encoberto nova-mente.

Interessante é a fundamentação de Lu-tero. A educação é, para ele, uma ordem de Deus. Deus quer que existam e sejam criadas escolas, pois é nelas que poderão ser apre-endidas as profissões e Lutero entende que é através da profissão que Deus chama as pes-soas para o Sacerdócio Universal de Todos os Crentes. Essa é a base para a educação universal. (...)

Resta a pergunta: Quem será o sujeito da reforma educacional? Segundo Lutero, é dever dos pais enviar os filhos à escola. As pessoas com recursos nas cidades são por ele convocadas a financiar e a manter escolas. Mas não só elas. A educação deve ser tarefa política. Quem deve, então, criar e manter escolas? Poder-se-ia pensar nos príncipes. No governador, para usar uma pa-lavra de nossos dias. Lutero não pensa neles. Ele propõe que os conselheiros das cidades, os vereadores, assumam essa tarefa. Educa-ção é tarefa do Estado. Segundo Lutero, sem-pre que for investido um florim em gastos mi-litares, devem ser investidos cem florins em educação. Os conselhos municipais devem obrigar os pais a enviarem os filhos à escola. Aqui a exigência da obrigatoriedade escolar,

As 95 Teses deflagram a pregação da salvação pela fé

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mas também a orientação precisa quanto às prioridades da política. Para Lutero está cla-ro que governar é criar escolas e mantê-las.

Fica a pergunta: quem é que se bene-ficia com a educação, segundo Lutero? A resposta é simples: a Igreja e o Estado. A Igreja se beneficia em sua tarefa de prega-ção. É necessário que se formem pregadores que anunciem o Evangelho. Os pais devem enviar os filhos à escola para que sejam pas-tores ou professores. Ambos dedicar-se-ão à tarefa mais nobre: a de pregar o Evangelho. Lutero pensa, em seu tempo, que se deve en-sinar as línguas bíblicas, para que todos te-nham acesso à Bíblia no original. A Bíblia é, aliás, o livro escolar mais importante. Além das línguas deve-se estudar a história, pois se aprende das experiências, dos êxitos e dos erros do passado. Estudando história, evita-se a repetição dos erros do passado.

O outro beneficiário da educação é o Estado. Vai ter cidadãos preparados para assumir as tarefas na sociedade. O Estado necessita de funcionários (homens e mu-lheres). É verdade que Lutero ainda limita a função pública da mulher ao magistério. As professoras ensinarão nas escolas de me-ninas. Mas ele cria espaços para os estudos da mulher. O Estado, pensa Lutero, precisa, ainda, de juristas e médicos.

Como deve ser a educação? Lutero nega a educação repressiva (surras, pressão...). A educação deve ser lúdica, isso é, deve-se aprender, jogando, cantando e dançando. Mas a escola também deve estar vinculada ao trabalho. Ao lado das matérias comuns a todos os alunos, deveria haver aprendizado artesanal. Nas escolas devem existir boas bi-bliotecas que deveriam ter a Bíblia e outras obras básicas. Finalmente, Lutero propõe uma escola cristã, gratuita e obrigatória. Os professores não são apenas funcionários pú-blicos, mas também pessoas que exercem um ofício espiritual. Quais os valores da propos-ta de Lutero? Fundamental na proposta de Lutero é que com a educação se mantenha a liberdade evangélica. Através da educa-ção se tem acesso à verdade do Evangelho e a liberdade dele decorrente. É a liberda-de evangélica que possibilita a participação crítica na sociedade. Depois, Lutero advoga-va a popularização da educação. Ela não é questão de elite leiga ou religiosa. É direito

fundamental de todo cristão. Finalmente, é importante ver que Lutero propõe um novo tipo de pedagogia: aprender brincando. (...) Lutero considera que a atividade do(a) professor(a) é, ao lado do ministério da pre-gação, a atividade “mais útil, maior e me-lhor” que existe. O mundo é dádiva de Deus, mas, para que haja paz e ordem na terra, é necessário que existam muitos professores e cientistas crentes e sérios. Esta necessidade é para ele uma das razões de se enviar filhos à escola. Ao mencionar esta razão, está fa-lando dos professores destas escolas que são pessoas crentes e sérias a exercer a maior função que existe. São eles que levam seres humanos a Cristo. Educar é levar a Cristo. Por isso, educação é dádiva de Deus, ofereci-da através dos pro fessores, nas escolas.

É verdade que Lutero falava em tempos de regime de cristandade. É, também, verda-de que seus ideais eram humanísticos. Não vivemos mais em regime de cristandade; os ideais humanísticos também foram abando-nados. A tarefa do educador cristão, porém, continua: preparar pessoas para a salvação do mundo; preparar cidadãos capazes de re-mar contra a correnteza, bons políticos, bons administradores, pessoas capazes de tornar o mundo mais humano.

Fonte: DREHER, 2004.

Compare:O percentual do Produto Interno Bruto (PIB) que os países desenvolvidos investem em educação em relação ao que se aplica na mesma área no Brasil.

Profissão é sacerdócio!A afirmação enquadra-se na idéia do sacerdócio universal de todos os crentes. Proveitosa é a leitura de “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, de Max Weber.

Confira:A educação não garante a vida eterna. A educação garante a preservação das coisas criadas por Deus. A finalidade da educação se cumpre no cuidado com o mundo e com tudo o que nele há.

Discuta:Escola cristã, gratuita e obrigatória.

Reflita e discuta:Qual o valor que se atribui ao magistério hoje?

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O presenteQuase 500 anos nos separam de Lutero. Em-

bora o mundo tenha mudado, a Igreja Luterana ainda mantém sua perspectiva histórica sobre a educação e dela não se tem descuidado. O pre-sente da educação luterana pode reportar-se ao início do luteranismo no Brasil.

Quando chegaram ao País em 1824, os imi-grantes alemães trouxeram tanto a marca do clima cultural que se respirava na Europa como uma história de ensino dentro da própria Igreja em que cresceram.

Tradição escolar entre imi-grantes alemães

Por ocasião dos 170 anos da imigração ale-mã no Rio Grande do Sul (1994), o Dr. Lúcio Kreutz publicou o artigo Escolas da imigração alemã no Rio Grande do Sul: perspectiva histó-rica, em livro editado pela Ulbra (Os alemães no Sul do Brasil) e do qual extraímos boa parte do texto deste tópico.

Até meados do século XVIII, predominou na Alemanha o motivo religioso na educação. A es-cola era concebida como uma instância de apoio à formação religiosa. É nela que ocorriam os pri-meiros passos para a formação do cristão. A es-cola e o professor eram paroquiais. Ao professor atribuía-se importante ação pastoral, pois, além do magistério, deveria exercer ampla liderança social e religiosa. O ensino religioso ocupava lu-gar central em todo o processo educacional.

O professor era responsável pela transmissão do conheci-

mento e pela formação religiosa e moral.

Na segunda metade do século XVIII, houve um avanço na compreensão da educação, realçan-do-se a responsabilidade do Estado na educação. Entendia-se que a prosperidade e a estabilidade nacionais dependiam da educação geral do povo. Assim, a partir de 1763, a freqüência à escola tornou-se obrigatória, estipulou-se remuneração

adequada aos professores, organizaram-se livros didáticos e implantou-se a inspeção escolar.

No início do século XIX, novos avanços. Implantaram-se escolas normais para melhor formação dos professores, e um novo pressupos-to tomava conta da educação: reforma social e política só é possível pela educação.

Essa cultura os alemães trouxeram para o Brasil. É assim que podemos entender o empe-nho dos imigrantes em implantar uma escola ao lado da igreja. A escola seria um mecanismo tanto para a melhor formação religiosa de seus filhos quanto para despertá-los para a vivência da cidadania.

Ao lado da igreja, uma escola: formação cristã e de cidadania.

Para termos uma idéia do valor atribuído à educação pelos alemães, basta recordar que nas décadas de 1920/30 já havia, só no Rio Grande do Sul, uma rede de 1.041 escolas comunitárias (evangélicas e católicas) com 1.200 professores.

É essa cultura de educação que vai pautar o fazer religioso da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, criada em 1900 com a vinda de um mis-sionário americano ao Sul do Brasil.

A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB)

A Ielb tem sua origem, no Brasil, em 1900 e a partir do trabalho desenvolvido pela The Lu-theran Church – Missouri Synod. Esse grupo foi fundado em 1847, em terras norte-americanas, a partir da iniciativa de um pastor que sai da Ale-manha por razões de consciência religiosa. Ocor-rera que em 1817 o rei da Prússia, Frederico Gui-lherme III, decretara em seus domínios a união da Igreja Luterana com a Igreja Reformada em razão de disputas religiosas. A decretada união resultara na Igreja Evangélica Unida. Evangéli-cos luteranos, inconformados com a ingerência do Estado nas questões da Igreja, além de pro-testarem contra o racionalismo que invadira a teologia, emigraram para os Estados Unidos na esperança de desfrutarem liberdade de culto sem a interferência do Estado. É desse grupo que re-

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sulta o Missouri Synod e a Igreja Evangélica Lu-terana do Brasil.

Oficialmente a fundação ocorreu apenas em 1904, muito embora já desde 1900 houvesse con-gregações organizadas no interior do Rio Grande do Sul.

A herança religiosa e escolar que se trans-ferira da Alemanha para os Estados Unidos se manteve. Escolas eram criadas e mantidas junto com as congregações religiosas. No Brasil não foi diferente. Acabou se consagrando o ditado “ao lado de cada congregação, uma escola”. Essa era uma estratégia empregada entre os imigrantes alemães a fim de fixá-los nos locais que ocupa-ram e não apenas expandir a mensagem religiosa, mas também dar-lhes o conhecimento e a educa-ção necessários a fim de progredirem.

À medida que avançava o trabalho religioso, ampliava-se, na mesma medida, a fundação de escolas. Assim, em 1907 já havia 13 escolas e, em 1924, 68 com mais de 2.000 alunos. Na dé-cada de 1970, o número de escolas chegou a 130.

Problemas é que não faltaram. Em 1922, uma corrente política pretendia eliminar as es-colas particulares. Em 1938, o Brasil foi toma-do por uma onda de nacionalismo, motivando a proibição do uso de línguas estrangeiras nas es-colas primárias. Isso sem levar em conta os pro-

blemas decorrentes de duas guerras mundiais em que a Alemanha esteve envolvida, ocasionando reflexos nos imigrantes aqui residentes e em suas instituições, quer religiosas, quer educacionais.

É dentro desse quadro geral que se encon-tram as origens da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra).

A Universidade Luterana do Brasil (ULBRA)

A chegada da Igre-ja Luterana – Sínodo de Missouri em Canoas dá-se em 1905, com o atendi-mento religioso feito pelo pastor de São Leopoldo (RS), recebendo a deno-minação de Comunidade Evangélica Luterana São Paulo. Com a expansão do trabalho religioso duas medidas se faziam neces-sárias: uma capela para as atividades religiosas e uma escola para ensinar os filhos dos seus con-gregados.

A primeira capela e, ao mesmo tempo, a pri-meira escola foram inauguradas em 1911. Após

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a Primeira Guerra, passadas as hostilidades con-tra os alemães, a comunidade religiosa sentiu a necessidade de ampliar a capela e a escola. A inauguração dá-se em 1925 e, no mesmo ano, é oficialmente criada a Escola Evangélica Lutera-na São Paulo.

A Segunda Guerra sobrevém e com ela uma série de efeitos desastrosos para as colônias ale-mãs, como perseguições e entraves burocráticos. A Comunidade Evangélica Luterana São Paulo também foi afetada nesse período. Seu pastor foi aprisionado em 1942, e o professor responsável pela escola teve de fugir a fim de não ter o mes-mo fim. A escola, que até então ministrava suas aulas em alemão, passou a fazê-lo em português.

Alunos da ULBRA

No pós-guerra, as atividades gradativamente foram sendo retomadas. A Comunidade São Pau-lo ampliou-se, e a terceira capela foi inaugura-da em 1965. Em 1966, a Comunidade tornara-se independente e recebeu seu primeiro pastor re-sidente, o reverendo Ruben Eugen Becker, que, além das obrigações religiosas, deveria dedicar um turno de suas atividades à escola da comu-nidade. A situação financeira da escola era um grande problema, a ponto de pensar-se em fechá-la.

Elaborou-se, para continuarem abertas as portas da escola, um projeto de reformulação com vistas a expandir a escola, aproveitando-se o momento histórico de forte empenho governa-mental na educação. O projeto visava à criação de um ginásio orientado ao trabalho, um giná-sio profissionalizante. Daí para diante não parou mais o avanço da escola.

Em 1968, lança-se a pedra angular que daria origem ao Colégio Cristo Redentor, e tornava-se

realidade o ensino profissionalizante de segundo grau. A cerimônia oficial de inauguração de fun-cionamento do Colégio Cristo Redentor ocorre em 7 de maio de 1969.

Implantado o projeto de ensino profissio-nalizante no segundo grau, tornou-se inevitável pensar em nova expansão, desta vez em direção ao terceiro grau. Já desde 1970 se pensava nessa direção. Encaminhadas as questões burocráti-cas, em janeiro de 1972, foi aprovado o funcio-namento da Faculdade Canoense de Ciências Administrativas, com aulas iniciadas em março do mesmo ano. Logo a seguir, vieram os cursos de Arquitetura, Ciências Contábeis e Educação Física, todos funcionando nas dependências do Colégio Cristo Redentor. Em 1976, novos cursos eram pensados. O projeto para uma universidade estava em andamento e, para tanto, adquiriu-se em 1978 a área onde hoje se encontra o campus central da Universidade.

A caminhada foi premiada, em janeiro de 1988, com a autorização da criação da Univer-sidade Luterana do Brasil (Ulbra). Os cursos fo-ram ampliados, a pós-graduação foi implantada, os espaços físicos aumentaram, e novas unidades foram abertas em todo o País, fazendo da Ulbra uma referência nacional.

ULBRA - Comprometimento com sua confissão

O jeito de ser da Ulbra é reflexo do jeito de ser de sua mantenedora, a Comunidade Evangé-lica Luterana São Paulo. A Ulbra confessa, a par-tir de sua mantenedora, que o mundo é obra de Deus e por Ele regido, e não fruto do acaso ou do arbítrio. Confessa, igualmente, que Jesus Cristo se entregou à morte como sacrifício pela culpa humana e ressuscitou para reger as criaturas, bem como os corações dos crentes, pelo seu Espírito.

Entende a Ulbra, como parte da Igreja, que esta se apresenta como assembléia de todos os fiéis que o Senhor congregou pelo evangelho, para o fim específico de proclamar a salvação a todos os homens. A vocação própria da Igreja é, pois, anunciar o evangelho e exercer a caridade à imagem de Jesus Cristo, construindo o reino de Deus. No entanto, ainda vive no reino do mun-

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do em expectativa pelo reino divino e, por isso, não pode a Igreja nem seus seguidores se man-ter indiferentes às necessidades dos homens e de todas as criaturas. O mesmo amor que salva é o que constrange a Igreja a assistir todo ser huma-no, minorando sofrimentos, suprindo carências, abrindo novas perspectivas de vida.

Embora confessional, a Ulbra respeita a liberdade religiosa e rejeita todo e qualquer tipo de

preconceito.

Essa é uma tarefa a ser construída historica-mente, e a educação é um desses meios históricos disponíveis para chamar o ser humano à comu-nhão com Deus e habilitá-lo à busca de uma so-ciedade melhor. Assim a Ulbra confessa.

É em razão de sua visão de Deus, do mundo e do ser humano que a Ulbra, embora transparen-temente luterana, respeita a liberdade religiosa e rejeita preconceitos de qualquer natureza. Ciente de que não é Igreja, a Universidade vê na educa-ção um instrumento para promover a formação integral do ser humano com intuito de construir uma sociedade mais justa e menos carente, sem perder de vista, contudo, que a perfeição e a ide-alidade serão obtidas por obra e graça de Deus, quando um novo céu e uma nova terra serão pre-senteados.

A Ulbra não apenas confessa, mas também estimula a vivência diária e constante nas rela-ções decorrentes das atividades educacionais

fundamentadas nos preceitos teológicos que as regem e motivam. Para isso, zela e cultiva a práti-ca de virtudes espirituais e rejeita todos os valores negativos da natureza humana. Com isso, o que pretende é formar profissionais capazes, honra-dos, honestos, sábios e humanos, que respeitam os valores morais e éticos, ainda que numa socie-dade marcada pela competitividade. Dos egres-sos da Universidade espera-se o comportamento de guias e líderes humanos e altruístas.

Para chegar a esse resultado, a Universidade está ciente de que seus alunos precisam de mo-delos. As pessoas que ocupam qualquer cargo e função na Universidade precisam conhecer, com-preender e defender a qualidade acadêmica e a personalidade confessional da instituição. Em es-pecial, a Ulbra rejeita o comportamento dos ba-juladores, dos confidentes, dos fofoqueiros e dos interessados – que se apresentam como pessoas amigas e de confiança, mas que no íntimo apenas usam a instituição para benefício e proveito pró-prio e egoísta.

O futuroTeologicamente, educação não é uma opção,

mas um imperativo. Como imperativo, é impen-sável deixar de fazê-la, não apenas no âmbito re-ligioso, apontando diretamente para o reino de Deus, mas também no âmbito secular, apontando para o reino do mundo.

O cristianismo e a Igreja Evangélica Lu-terana do Brasil têm ainda muito a oferecer na construção de uma sociedade mais justa, espe-cialmente de uma sociedade, como a brasileira, marcada por tantas e profundas diferenças e desi-gualdades de toda ordem.

Enfatizamos, no tópico anterior, a Ulbra como o lugar onde estamos cumprindo a vontade divina. No entanto, a educação na Ielb não é feita apenas pela Ulbra. Seguindo sua historicidade, a Ielb continua a enfatizar a necessidade de escolas cristãs, hoje espalhadas por todo o Brasil, com o mesmo propósito de formar religiosos que se apliquem ao serviço da construção do reino de Deus, educar e preparar bons cristãos para a Igre-ja e o exercício da cidadania, bem como educar e preparar cidadãos livres e altruístas.

Incentivo às práticas religiosas na Universidade

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Catolicismo

Desde sua deescoberta em 1500, passan-do pela conquista, pela colonização e estendendo-se até a Proclamação da Re-

pública, são quase quatro séculos em que o Brasil é reconhecido como oficialmente católico.

A presença católica no Brasil deve-se a um fato ocorrido décadas antes do descobrimento e denominado de o direito de padroado sobre as igrejas instaladas nas terras conquistadas por Portugal, concedido pelo papa. A descoberta de novas terras e sua colonização eram acompanha-das de conversão compulsória de suas popula-ções, nem sempre pacífica. Junto com a ocupa-ção vinha a religião.

Direito de padroadoVocê sabe o que é isso?

Pesquise outras fontes e aprenda um pouco mais so-bre a formação religiosa e moral do povo brasileiro.

Como surgiu essa prática? Era uma recom-pensa dada ao Estado português pelo seu empe-nho na conversão de “infiéis”. Cabia ao rei de Portugal conquistar novas almas junto com a conquista de novas terras. Era da responsabilida-de do Estado construir os templos e os mosteiros, dotá-los de padres e religiosos e, ainda, nomear os bispos. Dessa forma, o clero católico aqui pre-sente fazia parte do funcionalismo público, re-munerado pelo Estado.

A Igreja submetida ao Estado tornou-se

AS RELIGIÕES DO BRASIL

Assim como a diversidade racial da população, a pluralidade religiosa é pre-sente em nosso país.

Por Prof. Ronaldo Steffen

“Primeira missa”, tela de Vitor Mei-relles, na Escola Nacional de Belas Artes

Reprodução do livro Grandes Perso-nagens da Nossa História, volume 1, 1969, Editora Abril Cultural, São Paulo/SP

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mais visível no período colonial brasileiro. Toda e qualquer orientação oriunda do Vaticano para os seus religiosos aqui presentes era repassada pela administração portuguesa, que podia revisar os documentos e considerar se era ou não viável publicá-los, conforme o interesse.

Com o estabelecimento do Império, o padro-ado passou a ser direito do imperador D. Pedro I, em 1827. O catolicismo torna-se a religião oficial do Estado brasileiro, e a ingerência deste sobre a Igreja torna-se maior. Eram os funcionários pú-blicos das províncias que regulamentavam o fun-cionamento da Igreja em nível local.

A Proclamação da República em 1889 é que vai abolir o caráter de religião oficial do cato-licismo no Brasil, tornando o Estado brasileiro religiosamente neutro e abrindo os caminhos para outras tradições religiosas se organizarem e expressarem com liberdade seus ritos e crenças.

A partir de então, o Vaticano passa a ter a responsabilidade de manutenção e sustento da Igreja Católica em território brasileiro. É verdade que perder o caráter de religião oficial não foi um processo fácil e muito menos rápido. As autori-dades eclesiásticas, duma ou doutra forma, uns mais e outros menos, ainda insistiam em manter aproximação com as autoridades civis e exercer influência religiosa sobre elas, determinando, por vezes, apoio religioso a atos políticos com o fim de não perder a ascendência que até então tivera sobre a população. O efeito imediato foi um distanciamento das realidades e das necessi-dades do cotidiano religioso e espiritual do povo católico.

A reaproximação ampla com os seguidores do catolicismo ocorre na década de 1960, com a realização do Concílio Vaticano II. Sob a escolha pelos pobres se dá uma série de conformações e acomodações que visavam estar mais perto da população e atendê-la mais adequadamente com o fim de evitar a evasão de seus fiéis para outras tradições religiosas emergentes.

Aprofunde sua compreensão sobre a Teologia da Libertação e os movi-mentos carismáticos na Igreja Ca-tólica Romana conversando com o

sacerdote de sua localidade

Ao “abrir-se” e adequar-se às necessidades do seu povo, a Igreja Católica permitiu a emer-gência interna de diversas tendências, entre as quais se destacam a Teologia da Libertação, que foi buscar no materialismo histórico marxis-ta possibilidades de nova práxis religiosa, e os movimentos carismáticos, que buscam, por meio dos dons carismáticos, uma confirmação do sta-tus de maior proximidade com Deus e do Seu po-der de ação sobre Seus filhos.

É mais que evidente que esses avanços não obtiveram a concordância de todos. Muitos re-ligiosos se opuseram às novas tendências e de-flagraram movimentos que visavam a um retorno aos princípios anteriores ao Concílio. Uma des-sas vozes fortes foi Dom Lefebvre, que, em 21 de novembro de 1974, assim declara:

Aderimos com todo coração, com toda nossa alma, à Roma católica, guardiã da fé católica e das tradições necessárias à manutenção dessa mesma fé, à Roma eterna, mestra de sabedoria e de verdade. Por outro lado, recusamos, e temos sempre recusado, a Roma de tendência neomo-dernista e neoprotestante que se manifes-tou claramente no Concílio Vaticano II e, depois do Concílio, em todas as reformas que saíram dele.

Protestantismo de imigração

O protestantismo chegou ao Brasil de forma massificada e efetiva com a chegada dos imi-

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grantes, que, junto de suas tradições e costumes, traziam as práticas religiosas oriundas de seus países.

Isso ocorreu a partir de 1824 com a chegada dos imigrantes alemães ao Rio Grande do Sul e a Santa Catarina, dando origem à presença lute-rana no Brasil. Os primeiros que aqui se fixaram, entre 1824 e 1864, tinham atendimento religioso desempenhado por leigos. Só a partir de 1886 é que as igrejas alemãs passaram a enviar pastores para atenderem às colonizações germânicas. Era a Igreja Evangélica Alemã no Brasil. Em 1904, uma missão luterana vinda dos Estados Unidos daria origem à Igreja Evangélica Luterana do Brasil. Após a Segunda Guerra Mundial, os gru-pos que constituíam a Igreja Evangélica Alemã no Brasil formam a Igreja Evangélica de Confis-são Luterana no Brasil.

Os anglicanos e uma parte dos metodistas também começam seu enraizamento no Brasil a partir dos imigrantes americanos confederados que se estabelecem no interior de São Paulo. Os primeiros anglicanos chegam ao País por volta de 1810, tendo como característica não apenas a continuação de sua tradição religiosa, mas tam-bém a preservação da língua materna, as tradi-ções e os vínculos de dependência política e fi-nanceira com as Igrejas de origem.

Protestantismo de conversão

Outros grupos protestantes também foram se instalando no Brasil, mas com a característica de que para cá vinham não para atender a imigran-tes, mas a fim de converter os brasileiros.

Diferentemente do protestantismo de imi-gração, esses grupos procuravam rapidamente adequar-se ao jeito brasileiro, pois disso depen-dia o crescimento do número de convertidos. En-quadram-se nessa perspectiva os presbiterianos, os metodistas, os batistas e os episcopais vindos dos Estados Unidos.

O movimento missionário protestante tem seu início na metade do século XIX, e boa parte de sua rápida expansão deveu-se ao trabalho de propaganda desenvolvido pela sociedade bíblica

de origem inglesa e norte-americana. Aliada à Sociedade Bíblica, os metodistas, que aqui che-garam em 1835, distribuíram milhares de Bíblias entre os brasileiros nos anos 1850-1860.

A partir daí proliferaram os movimentos missionários, todos de procedência norte-ameri-cana: em 1858, dá-se a criação da Igreja Congre-gacional; em 1859, chega a primeira missão pres-biteriana; em 1868, outra missão presbiteriana, desta vez do Sul dos Estados Unidos. A missão metodista aporta em terras brasileiras em 1870, os batistas em 1881, e os episcopais em 1889.

No final do século XIX, já apareciam im-plantados no Brasil os movimentos protestantes de tradição luterana, anglicana ou episcopal, me-todista, presbiteriana, congregacional e batista.

Por volta de 1850, havia nos EUA a idéia corrente de unicidade do continente americano. Embutiu-se nessa concepção a de também haver uma só religião. Será que

isso favoreceu o avanço no Brasil das religiões ligadas ao protes-

tantismo de conversão? Leia mais sobre o assunto.

PentecostalismoO movimento pentecostal chega ao Brasil

nas primeiras décadas do século XX. A primei-ra Igreja formalmente criada foi a Congregação Cristã do Brasil, em 1910, no Paraná e em São Paulo. No ano seguinte, no Pará, é criada a As-sembléia de Deus.

O crescimento das Igrejas Pentecostais efe-tivamente ocorre a partir dos anos de 1950: em 1953, surge em cena a Igreja do Evangelho Qua-drangular; em 1955, a Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo; em 1962, a Deus é Amor, e, em 1964, a Casa da Bênção.

A partir dessas Igrejas, o movimento pente-costal dá origem a outros grupos, denominados de neopentecostais, entre as quais se destacam: Igreja da Nova Vida (1960), Comunidade Evan-

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gélica Sara Nossa Terra (1976), Igreja Universal do Reino de Deus (1977), Igreja Internacional da Graça de Deus (1980) e Renascer em Cristo (1986).

Religiões não cristãsEntre os grupos fora do cristianismo, os mais

representativos e que merecem ser mencionados, são o judaísmo, o islã, o budismo, o Hare Krish-na, o xintoísmo, a Seicho-No-Ie, a Soka Gakkai e a Igreja Messiânica.

Há ainda outro grupo, denominado por uns de neocristão e por outros de paracristão (gru-pos que partem de fundamentos cristãos, porém afastam-se gradativamente dos mesmos), que também tem representação no Brasil, como os mórmons, as testemunhas de Jeová, a ciência cristã e o racionalismo cristão.

EspiritismoOs meados do século XIX foram particular-

mente revolucionários para o campo da biologia. Em 1859, foi publicada a primeira edição do livro Origem das espécies, de Charles Darwin, obra em que o autor defende a evolução das espécies pelo processo de seleção natural. Não é nosso propósito aqui discutir os méritos das colocações de Darwin, mas, sim, constatar que ocorreram

grandes mudanças provocadas pelos seus estudos ao asseverar que o universo dos seres vivos está absolutamente colocado dentro dos domínios ex-clusivos da lei natural. Essa forma de enxergar a vida que já vinha sendo construída em séculos anteriores passa, agora, a influenciar muitos co-nhecimentos e pensamentos nos séculos seguin-tes, inclusive no campo religioso.

O espiritismo parece encaixar-se nesse qua-dro. Até então, de uma forma generalizada, acei-tava-se, teológica e religiosamente, que o corpo humano, embora criado por Deus, era matéria física passível de análise pelas ciências naturais. Já a alma, ou espírito, embora também criada por Deus, não era matéria física e, portanto, ficava distante do alcance das ciências naturais. Essa perspectiva é alterada pelo espiritismo, com ori-gem na França.

Definido por Leon Hippolyte Denizard Ri-vail (1804-1869) – mais conhecido como Allan Kardec – como um movimento científico, filo-sófico e religioso, o espiritismo contesta a exis-tência de apenas um mundo material, afirmando não só a existência, mas a própria materialidade de um mundo sobrenatural. A dicotomia corpo/alma deixa de existir para afirmar-se uma unida-de inseparável, sendo que a alma, como o corpo, pode ser percebida e estudada em sua materiali-dade.

A essa análise Allan Kardec acrescenta em sua sistematização os milenares conhecimentos

• crença nos milagres exatamente como ocorridos em Pentecoste;

• inexistência de grande apreço pela organização hierárquica e sacerdotal (pastor é quem possui dons, e não estudo);

• negação do batismo infantil (o benefício do batis-mo é recebido de forma consciente);

• culto baseado na Bíblia e com interpretação livre conduzida pelo Espírito Santo;

• ausência de imagens e proibição de seu uso e ado-ração;

• atribuição de grande importância à inspiração in-terior e liberdade para expressá-la.

• ênfase no exorcismo;

• os dons espirituais ainda ocorrem como em Pen-tecostes;

• a cura é divina;

• biderança carismática;

• discurso e ações voltados ao bem-estar

• material, físico e emocional;

• pobreza, problemas sentimentais e pessoais são ações do diabo, que deve ser expulso.

Algumas características neopentecostais:

Algumas características pentecostais:

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evolucionistas (reencarnação e carma) e os de pluralidade de mundo (a existência de vários pla-nos habitados, já que a Terra não é o único mundo habitado, mas apenas um dos planetas habitados e distante da perfeição), ambos já encontrados no hinduísmo antigo (vedismo e bramanismo). Essa é uma dentre as muitas causas que estabelecem o distanciamento entre o espiritismo e o cristia-nismo.

A partir da reinterpretação de conceitos já existentes, como

“Deus”, “mundo”, “ser huma-no” e “evolução espiritual”, o

espiritismo busca oferecer expli-cações racionais para os questio-

namentos humanos.

Ainda no decorrer da segunda metade do século XIX, logo após sua criação, o espiritis-mo chega ao Brasil, hoje o país que tem o maior número de adeptos. As primeiras organizações espíritas surgiram por volta de 1870, na Bahia e no Rio de Janeiro. No início, o traço distinto do espiritismo no Brasil, assim como na França, era sua proposta de terapia mediúnica por meio de “passes” para combater todos os tipos de enfer-midade e desconforto. De lá para cá, ocorreu uma mudança de direção, de forma que o espiritismo hoje no Brasil realça mais o seu lado religioso de moralização da conduta.

De modo genérico, e a título de exemplifica-ção, seguem-se alguns dos principais conceitos espíritas.

Ser humanoA visão que o espiritismo possui de ser hu-

mano é denominada de tridimensional. São três dimensões do mesmo elemento: o corpo, o peris-pírito e o espírito.

O corpo é sem valor em si mesmo e a parte menos nobre do ser humano, valorizada apenas na medida em que possibilita ao espírito uma re-lação com o planeta Terra. O perispírito é a con-densação de um fluído universal normalmente invisível, que possibilita e explica as aparições

nas sessões espíritas; é como se fosse um envol-tório do espírito, necessário para a união das di-mensões do corpo e do espírito, e, por isso, não é só material nem só espiritual. O espírito é de criação divina e é o princípio inteligível respon-sável pelo pensamento, pela vontade e pelo senso moral; portador do livre-arbítrio, o espírito une-se ao corpo a partir da concepção, iniciando a possibilidade de decidir por atos que permitirão ou não a evolução da dimensão espiritual.

O ser humano segundo o espiritismo

•Espírito: princípio inteligente.

•Perispírito: envoltório semimaterial.

•Corpo: ser material; alma encarnada.

MundoO mundo é concebido em dois grandes pla-

nos: o material (não se restringe à Terra, pois nesse plano há diversos níveis de materialidade, determinados pela pureza ou pelo grau de desen-volvimento moral a que se conseguir chegar) e o espiritual (também marcado por graus de mo-ralidade e perfeição, é o plano em que habitam os espíritos desencarnados – aqueles cujo peris-pírito, já gasto e não realizando mais suas fun-ções de unir o corpo ao espírito, deixa o espírito separar-se do corpo, provocando o que se chama de morte).

A comunicação entre os dois planos é possí-vel graças ao médium, cuja função é intermediar e interpretar os espíritos por meio de diferentes aptidões, que o tornam capaz de captar e trans-mitir as mensagens recebidas. Entre as aptidões, podem ser destacadas as percepções de: efeitos físicos, como batidas, levitação ou transporte de objetos; auditivos, como sons; artísticos, como pintura, desenho, poesia ou romance; musicais e psicográficos – a captação da escrita desenvolvi-da por um espírito desencarnado.

PasseÉ uma espécie de exorcismo leve, dado in-

dividualmente por um dirigente ou pelo médium em transe durante a sessão espírita, com o obje-

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tivo de afastar as influências negativas, as más vibrações, os “encostos” e as “demandas”, além de transmitir energia espiritual positiva. A ener-gia positiva é sempre pensada como sendo “luz”.

DeusÉ exaltado como Ser e Fim Supremo, meta

de perfeição de todo o processo evolutivo dos espíritos. É inacessível ao ser humano. O mais perto que o ser humano pode chegar é dos es-píritos desencarnados, para os quais o espiritis-mo disponibiliza o principal meio de expiar suas obrigações cármicas – a caridade. Ajudar a hu-manidade é um meio eficaz de expiar as faltas passadas e, assim, progredir rumo à perfeição.

Evolução dos espíritosOs seres humanos encontram-se num ex-

tenso processo de evolução, que não se limita ao tempo curto de uma encarnação, mas prossegue por reencarnações sucessivas, indefinidamente. As vidas passadas explicam a atual situação e condição aqui na Terra dos seres humanos a par-tir da lei do carma, que determina a casualidade moral – toda ação, boa ou má, recebe a devida retribuição.

No longo percurso da evolução, os espíritos passam por diversos mundos habitados, os quais se localizam em diferentes planos, escalonados de acordo com os princípios evolutivos, distribu-ídos numa escala que vai dos planos mais próxi-mos à matéria, os andares inferiores, até o plano mais elevado, o da suprema perfeição espiritual, atingível, acima de tudo, pela prática constante da caridade e pelas orações dos espíritos de luz já desencarnados.

Uma transcrição esclarecedora do Jornal Zero Hora (RS), publicada em 11/04/2004, pági-na 4, por Itamar Melo:

No espiritismo, doutrina religiosa fun-dada no século 19 pelo francês Allan Kardec, acredita-se que a alma é independente do cor-po e retorna à Terra em várias reencarnações, até atingir a perfeição.

Jesus não é Deus, mas um espírito do mais alto nível enviado por Deus à Terra para ser-

vir de modelo e guia a toda a humanidade. Ele veio para oferecer à humanidade os padrões éticos e morais necessários à evolução espi-ritual. Conforme a Federação Espírita Brasi-leira (FEB), Cristo não é uma figura mágica. É um educador. O que importa, portanto, são seus ensinamentos – e não sua morte física ou seus milagres. Jesus é o médium de Deus.

O Espiritismo, partindo das próprias pa-lavras de Cristo, como este partiu de Moisés, é conseqüência direta de sua doutrina – escre-veu Kardec.

A importância de Jesus assume tal dimen-são que um dos textos básicos da doutrina é O Evangelho Segundo o Espiritismo – obra que consiste de explicações e comentários sobre as narrativas dos evangelhos. Os espíritas não valorizam os milagres de Jesus. A FEB susten-ta que todos eles são explicáveis pela ciência, e não fruto de qualquer poder mágico. Se ain-da não foram explicados, é porque nossa atual condição intelectual e moral não dá acesso ao conhecimento que Jesus possuía.

O espiritismo defende também que, como espírito puro, Jesus era desprendido da maté-ria. Vivia mais da vida espiri tual do que da corporal, a cujas fraquezas não estava sujeito. Diz a FEB que sua alma provavelmente se en-contrava presa ao corpo apenas “pelos laços estritamente indispensáveis”. Por isso, se des-prendia constantemente.

Além disso, como os espíritas entendem que é impossível um espírito retornar a um corpo depois que este morre, não aceitam que Jesus ressuscitou no corpo que teve. Para eles, a ressurreição se explica pela materialização do espírito – uma espécie de corpo espiritual que nada tem a ver com o corpo físico.

Processo de comunicação entre o médium e o espírito

Medium - corpo

Perispírito

Comunicante

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Cultos afro-brasileirosSão assim chamados em razão das práticas

religiosas realizadas pelos negros que vieram tra-zidos para o Brasil como escravos e que aqui, re-primidas, buscaram adaptação às religiosidades já existentes.

De início, as práticas religiosas dos negros serviam mais como elemento de coesão da raça e preservação de suas tradições culturais. Não houve um movimento organizado. Os fatos fo-ram acontecendo. Inicialmente, ainda eram tradi-ções religiosas praticadas exclusivamente pelos negros.

Consulte o site http://www.fgv.br/cps/ e descubra em “Retrato das religiões do Brasil” qual o lugar do País onde os cultos de origem afro são mais praticados, propor-

cionalmente à população.

A organização das religiões negras no Brasil é recente. Deu-se, em especial, ao final do século XIX, quando as grandes levas de negros trafica-dos eram assentadas nas cidades. A aproximação uns dos outros e a relativa liberdade de movimen-tos no espaço urbano sem dúvida favoreceram a sobrevivência não apenas dos costumes culturais mais amplos, mas também das práticas religio-sas. Começavam a surgir os primeiros grupos organizados de culto. Ainda assim, essa organi-zação ocorria de forma localizada, o que veio a favorecer a formação de grupos com diferentes formas rituais e até diferentes formas de interpre-tação das forças transcendentes que conduzem o universo e a vida.

Uma nota de observação se faz necessária. Em regra, os fenômenos religiosos são estudados a partir de suas estruturas de pensamento. Com relação aos cultos afro-brasileiros, notamos a impossibilidade de perceber uma estrutura única e universal. Falta-lhes a concepção de essências imutáveis, bem como a idéia de um ser que se possa captar intelectualmente. A força vital ou primeira dos fenômenos religiosos não é para ser pensada, mas vivida e manipulada, o que geral-

mente se dá por meio do transe. Com essa di-mensão, é potencialmente impossível estabelecer regras, normas, pensamentos e comportamentos absolutamente iguais. A experiência vivida vai ser diferente de pessoa para pessoa e de grupo para grupo.

As crenças e os rituais de origemafricana possuem característicascomuns:

•a religião não é para ser entendida, mas vivida;

•sincretismo;

•ausência de uma estrutura religiosa única;

•ausência da concepção de essências imutáveis;

•a concepção de certo e errado é variável de pessoa para pessoa e de divindade para divindade.

Você sabe o que é sincretismo? Pesquise.

CandombléO candomblé, enquanto religião, é um pro-

cesso sincrético intertribal africano, formado ba-sicamente por quatro grandes nações africanas, nomeadamente Kêtu, Fan, Jejê e Angola. Geo-graficamente, essas nações podem ser situadas no atual Sudão, na Nigéria e na cidade de Dao-mé. As três primeiras nações são de origem suda-nesa, os nagôs. A quarta nação, a angolana, são os bantos e caracteriza-se por um espírito menos tolerante frente ao sincretismo desenvolvido por outras nações africanas no Brasil.

O termo candomblé designava a dança, o instrumento e a música utilizados pelas quatro nações em seus rituais. Só mais tarde é que o sen-tido ampliou-se para indicar a própria vivência religiosa. Ainda assim, não existe unanimidade quanto ao uso do termo. Na Bahia, o termo se mantém, bem como em São Paulo e no Rio de Ja-neiro. Em Pernambuco e Alagoas, é denominado de xangô. No Maranhão e no Pará, é conhecido

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como tambor de mina e, no Rio Grande do Sul, como batuque. Por muito tempo, no Rio de Janei-ro, foi conhecido como macumba.

Perfil do Candomblé

Criador: Olorum.

Auxiliares: orixás (determinam o destino da pessoa).

Chefe dos orixás: Oxalá (recebe os pedidos e as homenagens dos seres humanos).

As crenças do candomblé repousam na exis-tência de uma pluralidade de deuses, denomina-dos de orixás, com diferentes poderes e funções na vida humana, além de diferentes exigências aos seus adeptos. Os orixás são elementos da natureza divinizados, percebidos sensorialmente e manifestados por meio de imagens, em geral figuras humanas, adaptadas sincreticamente aos santos aceitos pela Igreja Católica Romana.

Conforme as tradições religiosas do candom-blé, o mundo foi criado por Olorum, que, após a criação, recolhe-se e deixa que seus auxiliares, os orixás, tratem das questões relacionadas aos seres humanos. Oxalá, o chefe de todos os ori-xás, é quem recebe todos os pedidos e as home-nagens dos seres humanos. A função dos orixás é governar o mundo, intervir em favor dos seres humanos e puni-los quando necessário. Cada pessoa, já antes de nascer, recebe um orixá, que lhe é dado, e não escolhido. A partir da geração comandará toda a existência da pessoa (tristeza, dor, sofrimento, alegria, prazer etc.). Considera-se que, de uma forma geral, o ser humano cos-tuma apresentar traços de caráter de seu orixá, que, por isso, é chamado de orixá de cabeça. Essa identificação determina que tudo o que a pessoa tem a fazer é acomodar sua vida aos gostos e aos desejos de seu orixá para que possa ser bem-sucedida. Não compete ao indivíduo discutir ou duvidar das preferências de seu orixá. Tudo o que tem a fazer é vivenciar as preferências, indepen-dentemente dos conceitos de bem e mal.

A identificação do orixá é feita por meio do jogo de búzios, em atendimento individualizado e conduzido pelo sacerdote, denominado de ba-balorixá ou pai-de-santo, se homem, e ialorixá ou mãe-de-santo, se mulher. A função da lide-

rança religiosa é incorporar o seu próprio orixá e dar licença aos seus seguidores para que possam levar adiante os pedidos e os desejos aos seus ori-xás pessoais.

Os orixás são, ainda, desprovidos de morali-dade e, por isso, não há uma ênfase nas questões éticas e morais. Não há exigência ou recompensa para quem faz o bem nem condenação ou castigo para quem faz o mal. A religiosidade centra-se nas questões rituais e mágicas, como o uso de roupas adequadas e próprias a cada orixá, ali-mentação e bebidas específicas, sons, perfumes, flores, cores e assim por diante.

Além das propriedades e das funções des-critas com relação ao orixá, acredita-se que cada pessoa possui, ainda, um segundo orixá, chama-do de juntó, que complementa o primeiro, de-terminando que a pessoa seja considerada, por exemplo, filho de Iemanjá e Oxalá. Esta segunda divindade, além de possibilitar ao seguidor inú-meras combinações de comportamento, permite que ele possa identificar a presença em sua vida de um pai e de uma mãe. Em regra, se o “santo de cabeça” for masculino, o segundo será feminino e vice-versa.

Não há preocupação com ques-tões éticas e morais.

Há nos rituais do candomblé constantes re-ferências ao Exu. Não é propriamente um orixá, embora assim seja designado, mas um interme-diário entre o orixá e o ser humano. Assim, para se conseguir algo de algum orixá, é o Exu que lhe deve ser enviado (despachado) com o pedido, quer seja bom, quer seja mau.

Para o pedido chegar logo, as pessoas devem oferecer ao Exu coisas de que ele gosta. É uma forma de agrado; esquecer tal princípio faz com que sejam desencadeadas todas as forças negati-vas contra a pessoa esquecida. O reinado de Exu está presente nas ruas, nas encruzilhadas e nos lugares considerados perigosos.

Não há a percepção de pecado. Os limites são estabelecidos pelo orixá,

variando de pessoa para pessoa.

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Para o candomblé, o pecado não existe. A distinção entre bem e mal depende basicamente da relação entre cada seguidor e seu orixá. É nes-sa relação que irá ser estabelecido o que se pode e o que não se pode fazer, mas sempre de forma individualizada. Isso determina que o orixá tem a possibilidade de estabelecer alguns tipos de li-mites a um seguidor e de não impô-los a outro seguidor. O que é proibido para um não é neces-

sariamente proibido para outro.

A seguir apresentamos uma lista com os principais orixás com algumas de suas caracte-rizações, muito embora possa haver divergências quanto a esse aspecto, uma vez que as diferentes percepções e interpretações são profundamente influenciadas pela cultura da região em que se encontram.

Orixás do Candomblé

Exu: orixá mensageiro; guardião das encruzilhadas e da entrada das casas. É considerado masculino, e suas cores são o vermelho e o preto. No sincretismo, está associado ao diabo.

Ogum: orixá da metalurgia e da tecnologia e ligado à guerra. É masculino, e suas cores são o azul-escuro, o verde e o branco. No sincretismo, está associado a São Jorge e Santo Antonio.

Oxossi: orixá da caça e ligado à fauna. É masculino, e suas cores são o azul-turquesa e o verde. No sincretismo, está associado a São Sebastião e São Jorge.

Ossaim: orixá da vegetação e ligado às folhas. É masculino, e suas cores são o verde e o branco. No sincretismo, está associado a Santo Onofre.

Oxumarê: orixá do arco-íris. É andrógino, e suas cores são o amarelo, o verde e o preto. Está associado, no sincretismo, a São Bartolomeu.

Obulaiê: orixá da varíola, da peste, das pragas e doenças e da cura. É masculino, e suas cores são o vermelho, o branco e o preto, além de ser identificado pelo capuz de palha. Está associado, no sincretismo, a São Lázaro e São Roque.

Xangô: orixá do trovão e ligado à justiça. É masculino, e suas cores são o vermelho, o marrom e o branco. Está associado, no sincretismo, a São Jerônimo e São João Batista.

Iansã: orixá dos relâmpagos e ligado aos espíritos dos mortos. É feminino, e suas cores são o marrom, o vermelho-escuro e o branco. Está associado, no sincretismo, a Santa Bárbara.

Oba: orixá da água e do poder da mulher, ligado ao trabalho doméstico. É feminino, e suas cores são o vermelho e o dourado. Está associado, no sincretismo, a Santa Joana d’Arc.

Oxum: orixá das águas doces e do ouro, ligado ao amor e à fertilidade. É feminino, e suas cores são o amarelo e o dourado. No sincretismo, está associado a Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora Aparecida.

Logum Edé: orixá dos rios dentro das florestas. É alternadamente masculino e feminino, e suas cores são o dourado e o azul-turquesa. Está associado, no sincretismo, a São Miguel Arcanjo.

Iemanjá: orixá das grandes águas, mares e oceanos, e ligado à maternidade. É feminino, e suas cores são o azul-claro, o branco e o verde-claro. Está associado, no sincretismo, a Nossa Senhora das Candeias (ou Navegantes) e Nossa Senhora da Conceição.

Nana: orixá da lama do fundo das águas. É feminino, e suas cores são o lilás, o azul e o branco. Está associado, no sincretismo, a Santa Ana.

Oxaguiã: orixá da criação da cultura material e ligado à sobrevivência. É masculino, e suas cores são o branco com um mínimo de azul real. No sincretismo, está associado ao Menino Jesus.

Oxalufã: orixá da criação da humanidade. É andrógino, e sua cor é o branco. Está associado, no sincretismo, ao Jesus Crucificado e ao Senhor do Bonfim.

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Hierarquia das divindades da umbanda

UmbandaA umbanda é um comportamento religioso

próprio do Brasil. Entre as muitas histórias sobre a sua origem, conta-se a de Zélio Fernandinho de Moraes, um espírita que recebeu orientação mediúnica para criar a nova religião no Rio de Janeiro, em 1908.

Algumas considerações merecem ser feitas com relação à natureza das práticas e das idéias da umbanda. Uma delas é que, apesar de suas origens remontarem aos ritos africanos, não há a preocupação de preservar essas raízes. Outra é a sua rápida expansão nos centros urbanizados, onde se apresenta como religião aberta a qualquer pessoa, independentemente das questões étnicas, enfatizando sua brasilidade. Para tanto, aboliu o uso de idiomas africanos, evitou os sacrifícios de sangue e os processos iniciáticos, próprios do candomblé. Ainda outra questão relevante é a que diz respeito à origem da composição dos conceitos que determinam as crenças umbandis-tas, pois resulta do encontro de diversas crenças e tradições africanas com as formas populares do catolicismo romano, mais o sincretismo hindu-cristão próprio do espiritismo kardecista. A par-tir dessa constatação, é possível perceber que a umbanda possui uma diversidade de elementos que a compõe e que se refletirá nas experiências religiosas por ela desenvolvidas, de tal forma que tudo o que se disser sobre as observações em de-terminada experiência poderá ser contrariado em outra observação da vivência umbandista.

Compreender as divindades que compõem as práticas umbandistas, bem como sua forma de atuação é, sem dúvida, tarefa nada fácil, até porque compreender não é o elemento primordial dos rituais, mas, sim, a vivência. Viver é mais importante do que compreender. De alguma for-ma, no entanto, é possível aproximar-se de algum entendimento, embora não definitivo.

Composição dos conceitos

•tradições africanas;

•formas populares do catolicismo romano;

•espiritismo.

A divindade maior é Zambi (Nzambi), tido como perfeito, não concebido nem criado e de quem emanam os orixás que formam as sete li-nhas. Uma linha de orixá equivale a um grande número de espíritos que devem obediência ao orixá que dá seu nome à linha, distribuídos em sete legiões, cada uma com um chefe específico.

Cada legião, por sua vez, divide-se em sete grandes falanges, cada uma com seu chefe espe-cífico, que se dividem cada uma em outras sete falanges menores, também com seus respectivos chefes, e assim por diante.

A título de exemplificação, apresentamos a seguir uma descrição de cada uma das sete linhas com suas sete legiões e seus chefes.

Essa complexa hierarquia tem como alvo o ser humano, que, assim como os orixás, as le-giões, as falanges maiores, as falanges menores e os guias, possui um espírito que não morre e tem possibilidade de infinito aperfeiçoamento. Esse espírito possui individualidade própria e livre-arbítrio, o que lhe possibilita buscar o aper-feiçoamento, alcançado pela sintonia e pela har-

Zambi

Orixás

Legião

Falange maior

Falange menor

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monização com Zambi. O livre-arbítrio é que de-termina se as ações e as intenções vão na direção da harmonização ou não. Duma ou doutra forma, o espírito reencarnará e sofrerá a lei do carma, segundo a qual o estado atual do ser humano é decorrente de atos passados e determinante da vida posterior, à semelhança do hinduísmo e do kardecismo. No decorrer de uma encarnação, o ser humano tem, de um lado, entidades que o querem ajudar e, de outro, entidades que o que-rem prejudicar. As entidades que o querem ajudar são denominadas de orixás, e as que o querem prejudicar são conhecidas como kimbas, extre-mamente violentas, vingativas e cruéis.

É oportuno, a esta altura, comentar rapida-mente sobre o Exu, uma da figuras mais polêmi-

cas da umbanda. É uma espécie de guerreiro que quer impedir o acesso das entidades guerreiras, os kimbas, às zonas espirituais mais elevadas. Faz parte de sua função ser justo (nem bom, nem mau), castigando e protegendo segundo a lei cár-mica.

Por fim, é interessante fazer um breve co-mentário sobre a função sacerdotal na umbanda, exercida pelo pai-de-santo e pela mãe-de-santo. Eles fazem parte da chamada hierarquia espiri-tual (há também a hierarquia administrativa, que cuida da sustentação do templo), que tem por função incorporar o espírito protetor, identificar os espíritos que baixam, riscar o ponto, explicar a doutrina, dar os passes, curar as doenças e adi-vinhar pelos búzios.

Orixás do Candomblé

Linha de Oxalá: sincretizado por Jesus Cristo. Esta linha é constituída de espíritos de pessoas que na Terra tiveram grande sentimento religioso. A missão das suas falanges é catequizar os maus espíritos que atuam a partir das forças negativas do universo e arrastá-los para o bem.

Linha de Iemanjá: sincretizada pela Virgem Maria. As falanges de suas legiões têm por missão proteger as criaturas do sexo feminino e desmanchar os trabalhos de magia preta feitos no mar e nos rios.

Linha do Oriente: sincretizado por São João Batista. As falanges de suas legiões estão incumbidas de ensinar os habitantes da Terra tudo o que lhes for desconhecido. São os grandes mestres do ocultismo.

Linha de Oxossi: sincretizado por São Sebastião. As falanges de suas legiões praticam a caridade, doutrinam os sofredores, fazem curas e aplicam a medicina à base de ervas.

Linha de Xangô: sincretizado por São Jerônimo. As falanges de suas legiões formam o povo da justiça, amparam os humildes e os humilhados.

Obulaiê: orixá da varíola, da peste, das pragas e doenças e da cura. É masculino, e suas cores são o vermelho, o branco e o preto, além de ser identificado pelo capuz de palha. Está associado, no sincretismo, a São Lázaro e São Roque.

Linha de Ogum: sincretizado por São Jorge. As falanges de suas legiões são responsáveis pelas grandes demandas e são os defensores de todos os adeptos da umbanda, se estiverem no caminho da caridade.

Linha de Iofá: sincretizado por São Cipriano (pretos velhos). As falanges de suas legiões conhecem todos os segredos da magia da umbanda e empregam todos os rituais na prática da caridade em benefício daqueles que buscam auxílio.

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Uma das primeiras questões que introdu-zem a nossa discussão diz respeito ao porquê de abordar a temática da culpa

na disciplina de Cultura Religiosa. O texto base que nos conduz nesta discussão encontra-se na obra do psiquia tra suíço Paul Tournier, cujo su-gestivo título é Culpa e graça: uma análise do sentimento de culpa e o ensino do evangelho1.

Vamos tentar mostrar que a culpa é um dos fato res fundantes e estruturantes de muitas religi-ões, o que não invalida uma análise mais criterio-sa desse elemento, que aponte para as interfaces da culpa com aspectos psi cológicos, sociológi-cos, antropológicos e existenciais do ser huma-no. É essa visão interdisciplinar que propomos observar.

A culpa é uma questão existen-cial. Ela acompanha o ser huma-no desde o início da civilização. É formada a partir das normati-zações sociais e de sua própria consciência. Pode se tornar um

peso insustentável na vida do ser humano.

A universalidade da culpaAlguns poderiam perguntar: será que é re-

levante abor dar a questão do sentimento de cul-pa? Será que a culpa diz respeito a minha vida ou faz parte do meu cotidiano? Poderíamos ten-

tar responder a esse questionamento de muitas maneiras, mas duas delas já são suficientes para fundamentar nossa posição de concordância. A primeira delas remete a uma reportagem da Re-vista Veja2 , cujo título de capa foi: “Culpa – por que esse sentimento se tornou um dos tormentos da vida moderna”. Nessa reportagem, a revista procura apontar para “as culpas cotidianas de cada um”, que parecem não ser mais uma ques-tão de escolha pessoal, mas sim de imposição aos indivíduos que vivem na sociedade moder-na: competição no emprego, filhos ou carreira, desempenho sexual, comer demais, insucesso fi-nanceiro são apenas algumas das culpas listadas.

Uma segunda forma de fundamentar a uni-versalidade da culpa é fazer um exercício de auto-análise. Cada um pode olhar para seu pas-sado, recente ou remoto, e tentar listar todos os momentos, as vivências e as situações em que se sentiu culpado, seja na última semana ou mês, seja no último ano. Poderíamos perguntar se é possível um sujeito saudável psiquicamente olhar para o seu passado e dizer que nunca sentiu al-gum tipo de culpa. Uma resposta adequada preci-saria ser negativa, pois a culpa parece fazer parte da dimensão humana, sendo uma questão inclu-sive civilizatória.

Não queremos aqui dimensionar a culpa ou medir a sua intensidade, pois sabemos que as cul-pas são diferentes para cada uma das pessoas: o que para um pode ser motivo de culpa para ou-tro pode ser motivo de riso. A culpa é um senti-mento muito pessoal, particular e subjetivo. Isso não quer dizer, porém, que as culpas também não

CULPA E PERDÃO: UMA QUESTÃO EXISTENCIAL

Você já se sentiu culpado? Como é viver sob o peso da culpa? Qual o efeito do perdão sobre as nossas vidas e relações?.

Por Prof. Thomas Heimann

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possam ser questões de caráter cultural, religioso e familiar, ou seja, o que para determinada socie-dade, grupo ou cultura pode ser taxado de culpa (ou ato culposo) para outra pode ser um costume normal ou natural.

O que podemos afirmar, catego-ricamente, é que a culpa é um sentimento humano universal,

existencial, que preci saria estar presente em todos os seres huma-nos ditos saudáveis, isto é, a falta de qualquer sentimento de culpa é uma das marcas da psicopatia,

de uma mente não saudável.

Origem da culpaDe onde, afinal, surge a culpa humana? É um

fator externo ou interno ao ser humano? Ela brota de dentro para fora, sendo um aspecto humano inato, ou é incutida de fora para dentro, como um produto do meio social? Observamos que as duas visões não se excluem mutuamente, pelo contrá-rio, são complementares. Há, portanto, um duplo caminho na formação da culpa humana: interno e externo.

Que a culpa é incutida exteriormente é pos-sível pro var a partir de uma rápida análise do meio em que se vive. Quanto mais regras, leis e mandamentos uma sociedade tiver, tanto mais culpa gerará nos indivíduos que dela fazem parte. Mesmo que os indivíduos não se sintam cul pados em transgredir determinadas regras sociais, a culpa existe e é reputada a eles. Há inúmeros ti-pos de regras ou leis que regem a convivência em sociedade: civis, religio sas, sociais, profissionais e pessoais. Todas elas são pratica mente “impos-tas” aos indivíduos que desejam viver e con viver em coletividade.

Nesse sentido, precisamos fazer aqui uma diferencia ção entre dois tipos de culpa: culpa ob-jetiva e culpa subje tiva, conforme descreve Gary Collins.

A culpa objetiva existe em separado de nos-sos sentimen tos. Ela ocorre quando uma lei ou

norma é violada. O trans gressor é culpado peran-te essa lei (pela transgressão dela), mesmo que talvez não se sinta culpado. Já a culpa subjetiva é o sentimento pouco confortável de pesar, remor-so, vergo nha e autocondenação que surge com freqüência quando fazemos e pensamos algo que sentimos estar errado ou quando deixamos de fa-zer algo que julgamos que deveria ter sido feito3.

A culpa subjetiva, portanto, está intimamen-te asso ciada aos sentimentos humanos e remete-nos à segunda fonte da culpa: a nossa própria consciência. É possível afirmar que o ser huma-no é dotado de uma capacidade inata, uma voz interior, que lhe dá uma intuição íntima e pessoal do que é certo ou errado. Vamos exemplificar: você pode ter feito algo que todas as pessoas ao seu redor julgam como correto, mas mesmo as-sim brota no seu cora ção o sentimento de culpa. Dois exemplos concretos: uma mãe que precisa aplicar um castigo ao filho por um erro que este cometeu ou um gerente que precisa despedir um mau funcionário que, entrementes, está com difi-culdades de saúde na família. Tanto a mãe quanto o gerente fazem o que é socialmente esperado, agindo corretamente; porém, mesmo assim, po-dem sentir-se culpados pela decisão que toma-ram. Isso confirma que a culpa subjetiva pode brotar no indivíduo mesmo quando não há uma culpa objetiva ou exterior imposta a ele.

Culpa: um sentimento nega-tivo ou positivo?

Um dos grandes questionamentos na análi-se do senti mento de culpa é se ele é um aspecto negativo ou posi tivo na vida de um indivíduo e da própria sociedade. A resposta dependerá de alguns critérios, como freqüência, quantidade, intensidade e duração da culpa ou, ainda, do uso e do abuso que alguns indivíduos fazem dela.

Numa primeira análise, podemos dizer que os aspec tos negativos da culpa prevalecem, sen-do vista como pro dutora de neuroses, geradora de angústias e até promotora de doenças de cunho psicossomático. Aprofundaremos tais questões mais adiante.

Vamos olhar, contudo, para os aspectos po-sitivos da culpa. Ela pode, sim, cumprir funções

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positivas e constru tivas, tanto para o indivíduo quanto para a sociedade. São elas:

Os aspectos benéficos da culpa:

•prevenção

•reflexão

•reparação

•retificação de vida

Prevenção – Antes de cometer um ato ilíci-to, a culpa já pode surgir, evitando que o indiví-duo cometa o ato que está pensando. Ou seja, a culpa antecipatória age prevenindo um possível erro moral ou legal, podendo evitar um eventual prejuízo de terceiros.

Reflexão – Após cometer uma ação que a sua cons ciência apontou como errada ou má, a culpa surge e leva o indivíduo a refletir sobre esta sua ação. A culpa leva, portanto, a uma auto-aná-lise crítica das próprias ações.

Reparação – Quando a culpa brota no indi-víduo, pode levá-lo a reparar o seu erro, seja no pedido de perdão e desculpas, seja na restituição concreta do que lesou ao outro.

Retificação de vida – Como última função positiva, a culpa pode levar o indivíduo a não mais cometer um ato que sua consciência julgou como ilícito, isto é, a culpa faz com que o sujeito não reincida no erro, gerando uma mudança po-sitiva de comportamento.

Olhando para as funções positivas mencio-nadas, pode mos afirmar que um indivíduo que não sinta nenhuma culpa diante de algumas ati-tudes e decisões pessoais pode se tornar uma ameaça para si e para a própria sociedade. A au-sência da culpa, que parece indicar a inoperância da consciência moral, faz com que o indivíduo perca a noção dos limites e da liberdade do outro, tornando-o um indiví duo “perigoso”.

Um outro aspecto negativo da culpa é o uso nocivo que alguns indivíduos fazem dela, no sentido de manipular as pessoas, situação que é comumente chamada de chantagem emocional. Normalmente, quando fazemos as pessoas se sentirem culpadas, passamos a ter certo contro-le sobre elas. Essas pequenas chantagens fazem

parte de nosso repertório comportamental. É um filho que diz que a mãe não gosta dele, caso não lhe pague uma viagem; é um pai que simula ao filho choro, caso ele não lhe dê um abraço; é o rapaz que se faz de vítima diante do término do namoro, dizendo que vai se matar etc. Aqui cabe um alerta: preci samos tomar cuidado para não pautarmos os nossos rela cionamentos sobre o sentimento de culpa, pois ele leva a sentimentos não construtivos, como pena, comiseração, ran-cor, indiferença, gerando um ambiente não sau-dável e de sofrimento aos envolvidos.

Culpa e pagamentoSegundo Paul Tournier, toda

culpa implica em um pagamen-to. Nas relações interpessoais é

comum pagarmos nossas faltas e culpas com agrados ou presentes,

na busca de obter o perdão de quem magoamos.

Na obra do psiquiatra Paul Tournier, que ci-tamos na intro dução, o autor afirma que a culpa traz como conseqüên cia quase inevitável uma idéia de pagamento: “tudo deve ser pago”, diz o autor. “Parece-me que isto surge, pelo menos em grande medida, de uma atitude psicológica que eu agora quero enfatizar, a saber, a idéia, profundamente enraizada no coração de todos os homens, de que tudo deve ser pago”4.

Esse sentimento de dívida constante, mesmo que tenha sido valorizado na perspectiva judai-co-cristã, não fica circunscrito ao mundo cristão tradicional. Como diz Tournier, basta lembrar as multidões inumeráveis de fiéis hindus que mer-gulham nas águas do rio Ganges a fim de serem lavados de suas culpas e até as ofertas votivas e o ouro que cobrem as estátuas de Buda. Igualmen-te, são inúmeros os penitentes e os peregrinos de todas as religiões que impõem a si mesmos sa-crifícios, práticas ascéticas (privar-se de qualquer forma de prazer) ou duras jornadas como formas de pagamento, seja por culpas cometidas, seja até por graças alcançadas. Tais pessoas parecem ter uma necessidade interna de pagar, de expiar as suas culpas5.

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Aqui podemos perguntar: será que a culpa e o seu res pectivo pagamento são produtos ex-clusivos da religião? Será que Freud está certo em afirmar que, libertando-se o homem do sen-timento de culpa, a religião perde a sua finali-dade ou necessidade? Pensamos que essa é uma afir mação muito radical. Afinal, a relação entre culpa-paga mento-perdão existe também fora do contexto religioso ou espiritual.

Basta observarmos as relações humanas cotidianas para comprovar tal assertiva. Muitos exemplos podem ser dados. Uma falha leve com a namorada (deixar de acompa nhá-la à liquida-ção no shopping para ir ao jogo com os ami gos) pode ser pago com um buquê de flores e um con-vite para jantar. Já uma falha mais grave (uma traição) certa mente exigirá um pagamento mais “caro”, para a conquista de um eventual perdão.

A típica frase “Essa ele me paga!”, muitas vezes repetida por nós em inúmeras e variadas situações e contextos, expressa o que estamos afirmando neste texto. Todas as faltas, erros, de-litos e pecados exigem um pagamento, que nor-malmente implica uma proporcionalidade, isto é, o tamanho (preço) do pagamento é proporcional ao tamanho do erro. Exemplo: no direito, um cri-me leve normalmente demanda uma pena leve, já um crime grave demanda uma pena mais longa e severa. Também na prática da confissão católica, normalmente, a penitência é dada ao fiel de acor-do com a gravidade do seu pecado.

Indo além nesta abordagem psicológica, muitos dos problemas e neuroses trazidos pelos pacientes nos consul tórios estão ligados direta-mente ao sentimento de culpa, como já foi dito anteriormente. Algumas vezes essa culpa é cla-ramente identificável e manifesta, estando no plano consciente. Outras vezes, porém, as culpas surgem como um sentimento vago e indefinido, ligado a uma esfera semi consciente, cujo prejuí-zo na saúde psíquica pode ser até mais grave do que quando se trata de culpa consciente.

A própria psicanálise afirma que muitas doenças ner vosas e físicas, e até mesmo aciden-tes, bem como frustra ções na vida profissional podem ser tentativas de expia ção da culpa que é totalmente inconsciente. Essa seria uma forma de punição que o sofredor administra a si mes-

mo e continua repetindo indefinidamente como uma espécie de fatalidade inexorável6. Um exem-plo hipotético de como isso pode acontecer: uma mãe, muito irritada com seu filho de oito anos, acaba dizendo a ele que o seu nascimento a impe-diu de concluir o curso de Medicina, levando-a a abdi car de sua realização pessoal e profissional, e que hoje se vê frustrada por ter feito tal escolha. Esse filho pode interna lizar essa crítica e, por um sentimento de culpa reprimido, não conseguir concluir nenhum curso superior como forma de pagar a culpa pela frustração profissional da mãe.

A culpa, portanto, sempre cobra algum pre-ço, muitas vezes um preço altíssimo, que pode incapacitar o indiví duo de ser uma pessoa reali-zada e feliz. Essa é uma crítica também reputada às religiões, como veremos a seguir.

Culpa e religiãoA culpa é um dos aspectos fundantes ou es-

truturantes de muitas religiões. Por mais ácida que seja essa afirmação, ela não é de todo injusta, pois, após analisarmos grande parte das religiões existentes, veremos que a culpa foi, e ainda é, uti-lizada como um dos mais eficazes instrumen tos de domínio das Igrejas sobre os fiéis. Porém, ao final desta análise, queremos apontar para uma proposta reli giosa que vai num caminho contrá-rio, ensinando a total erradicação da culpa por intermédio de Jesus Cristo.

O próprio Sigmund Freud, fundador da psi-canálise e um dos maiores críticos da religião, afirma que o sentimento de culpa é que deu ori-gem às religiões, quando faz referência ao tote-mismo, que se configura como uma das mais an-tigas e primitivas formas de religiosidade. Na sua obra Totem e tabu, Freud faz referência ao mito do parricídio, em que os filhos se unem e matam o pai, chefe do clã, que era invejado e temido por eles. Após o assassinato, os filhos devoram seu cadáver (antropofagia) e, identificando-se com o pai, apropriam-se de sua força. Após o parricí-dio, a culpa dos filhos se estabelece em virtude dos sentimentos ambivalentes: ódio ao pai, que representava um impedimento de alcançar o po-der e satisfazer os desejos sexuais, em contrapo-sição ao amor e à admiração pelo que ele repre-

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sentava. Essa afeição, antes recalcada, surge em forma de remorso. A partir daí, os filhos criam uma representação totêmica do pai morto, que se torna ainda mais forte do que quando estava vivo. Esta, portanto, seria para Freud a base estrutu-rante das religiões: a culpa que deu origem aos rituais religiosos totêmicos.

Nota: O mito é contado aqui de forma muito resumida. Para uma melhor compre-ensão, devido à complexidade do tema, sugere-se a leitura do texto de Freud na sua íntegra.

Saindo dessa abordagem antropológica, po-demos apon tar diversas religiões que fazem uso cotidiano da culpa na sua relação com os fiéis. Como diz Tournier, para apagar o passado de cul-pas e pecados, uma expiação (pagamento) deve ser feita, sendo esse o sentido de quase todos os ritos e sacrifícios praticados nas diferentes religi-ões. Atos de culto não deixam de ser uma forma de pagamento, ao menos do ponto de vista psico-lógico. Espera-se que eles garantam a libertação da culpa descartando o débito que deu origem a ela7. Vamos traduzir isso em exemplos práticos.

Em tribos primitivas, quando aconteciam tragédias, derrotas ou cataclismas (furacões, ter-remotos, temporais etc.), normalmente se acre-ditava que alguém da tribo havia cometido um grave pecado. Quando se achava o culpado, este era punido e sacrificado aos deuses. Portanto, aplacar a ira dos deuses por meio de oferendas, rituais e sacrifícios era prática comum em inú-meros povos, tribos e culturas da Antigüidade.

Na realidade brasileira, temos a doutrina es-pírita, que se aproxima muito da expressão, utili-zada por Tournier, de que “tudo deve ser pago”. Mesmo que o conceito pagamento não seja no-meado, sendo substituído por palavras como resgate, missão ou aprendizado, está implícito na doutrina espírita que cada indivíduo é respon-sável pelo seu aprimoramento e pelo “resgate” de suas culpas passadas. Muitas doenças, pro-blemas, dificuldades e tragédias que surgem na vida das pessoas são interpretados pelos espíritas como uma forma de “pagamento” de um carma anterior. Sem esse resgate, não há evolução.

O cristianismo, por um longo tempo, tam-bém se estru turou sobre a prática do pagamento

pelas culpas e pelos pecados cometidos. Na Ida-de Média, era comum a venda das indulgências, que representavam a compra do perdão e da sal-vação, além da veneração de relíquias sagradas, das encomendas de missas pagas, da realização de votos e pro messas e das práticas de autoflage-lo, tudo como forma de expiar as suas culpas, pa-gar as dívidas com Deus e ganhar algum mérito pessoal diante Dele.

A colunista Martha Medeiros, numa de suas crôni cas publicadas no Zero Hora8, intitulada Prometa não sofrer, ressalta que algumas religi-ões cristãs têm na culpa o seu maior alicerce, e o rito das promessas seria a maior prova de que, aos olhos de Deus, o ser humano não é merece dor da felicidade, ao menos não de uma felicidade gra tuita. A autora faz referência a ritos penosos, como subir 300 degraus de uma igreja, caminhar vários quilômetros para pagar uma graça alcança-da, dar uma soma polpuda para a caixa de coleta etc. “Como sofrem esses fiéis”, diz Martha Me-deiros, afirmando que eles se sentem devedo res da própria fé, impingindo a si próprios inúmeros sofri mentos e privações para pagar o que julgam dever a Deus. Ao almejar a felicidade, finaliza a autora, torna-se implícito que se pagará muito caro por ela, se não financeiramente, ao menos com bolhas nas mãos e calos nos pés.

Não é essa proposta, porém, que o cristianis-mo, com prometido com os evangelhos bíblicos e com a obra de Jesus Cristo, oferece aos seres humanos. A Igreja cristã tem o compromisso de proclamar a salvação, a graça e o per dão de Deus à humanidade oprimida pela culpa: a salva ção conquistada em Cristo, por Cristo e por intermé-dio de Cristo. Essa salvação não tem preço, não pode ser com prada por ninguém, até porque, para o cristianismo, sacri fícios expiatórios ou esfor-ço moral não são suficientes para pagar a dívida com Deus. Na realidade, o cristão não pre cisa pagar nada, pois Cristo já pagou em seu lugar. Como lembra Tournier,

é Deus mesmo quem paga, Deus mesmo pa-gou o preço de uma vez por todas, o preço mais caro que ele poderia pagar: a sua própria morte, em Jesus Cristo, na cruz. A obliteração (destrui-ção/eliminação) de nossa culpa é livre para nós porque Deus pagou o preço. Jesus Cristo veio ‘para salvar o que estava perdido’ (Mt 18:11).9

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Conforme está escrito na Escritura Sagrada, “O sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado” (1 João 1:7); “no qual temos a re-denção pelo seu sangue, a remissão dos pecados” (Efésios 1:7); “Pois também Cristo morreu, uma única vez, pelos pecados, o justo pelos injustos” (1 Pedro 3:18).

Em síntese, a libertação total da culpa, a sal-vação, não é mais uma idéia remota de perfeição, para sempre inacessível, mas é uma pessoa: Jesus Cristo, que veio a nós, veio para ficar conosco, em nossas casas, em nossos corações. O remorso é silenciado pela sua absolvição. Jesus substitui o remorso com uma simples pergunta, aquela que fez ao apóstolo Pedro, que o tinha negado por três vezes: “Tu me amas?” (João 21:15). Precisamos responder a essa questão e achar em nossa liga-ção pessoal com Jesus Cristo paz para as nossas almas.

Todos os homens podem se beneficiar dessa expiação única; todos os homens, de fato, “todo o mundo”, como João afirmou (1 João 2:2). Jesus Cristo morreu por todos, sem qualquer distinção, para homens de todas as idades e regiões, para hindus, para budistas, para muçulmanos, para pa-gãos e para ateus; basta que nele creiam.

Culpa e perdãoO grande ápice de nosso texto é a palavra

perdão. De nada adianta falar de culpas se não abrimos a possibilidade de refletir sobre o per-dão. Numa dimensão humana, a das relações in-terpessoais, poderíamos afirmar que o perdão é uma das mais importantes ferramentas terapêuti-cas exis tentes nesta vida. O perdão pode ser visto sob três aspec tos: o perdão divino, o perdoar a si próprio e o perdoar aos outros. Poderíamos per-guntar: o que é mais difícil, per doar aos outros, pedir perdão aos outros ou ainda se apo derar do perdão divino? Obviamente que a resposta a essa questão está ligada a uma série de variáveis.

Para um indivíduo orgulhoso, assumir o erro e pedir perdão é quase uma impossibilidade. Para um indivíduo com pouca confiança em Deus, aceitar o perdão de Cristo também é difícil. Ago-ra, perdoar realmente aos que nos fizeram algum mal parece ser a mais árdua das tarefas. Não é à

toa que se diz que “errar é humano e perdoar é divino”.

Hoje já há estudos que comprovam ter a prá-tica do perdão um efeito benéfico sobre a saúde humana. O psicólogo americano Frederic Luskin faz uma relação entre o bem-estar trazido pelo perdão e a saúde do ser humano. Luskin afirma que guardar ressentimentos, culpar os outros ou apegar-se às mágoas estimula o organismo a libe-rar na corrente sangüínea as mesmas substâncias químicas associadas ao estresse, que prejudicam o corpo. Um outro estudo de Luskin indicou que as pessoas mais inclinadas ao perdão sofriam menos enfermidades e tinham menos doenças crônicas diagnosticadas10.

Portanto, perdoar e pedir perdão são ações promoto ras da saúde na dimensão emocional, fí-sica e espiritual. São ações que precisamos apri-

Nesta obra de Rembrandt, “O Filho Pródigo”, temos o re-trato de um pai amoroso que recebe o seu filho de volta, perdoando seu pecado. Trata-se de uma parábola bíblica que fala do amor incondicional de Deus por seus filhos e do perdão oferecido por ele a todos que se arrependem.

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morar em nossa vida. O pri meiro passo para isso é aceitar que as nossas culpas, os nossos erros já estão perdoados por Deus.

Acabamos de ver que esse perdão divino é concedido a nós gratuitamente, sem qualquer barganha com Deus. Ele nos oferece o perdão a todas as nossas culpas. Diante dessa verdade bíblica, vem-nos à mente um ditado popu lar: “Quando a esmola é muita, o santo desconfia”.

O ser humano parece ter uma grande di-ficuldade de se apoderar do perdão oferecido pelo evangelho bíblico. Mesmo participando de rituais como a Comunhão (Santa Ceia), a Con-fissão e a Absolvição nas missas e nos cultos, o ser humano não consegue libertar-se de suas cul-pas, pre sas a ele como sanguessugas a retirar sua alegria, bem-estar, auto-estima e paz de espírito. Como diz Tournier:

Parecia-lhe impossível (ao ser humano) que Deus pudesse remover a sua culpa sem que ele tivesse de pagar alguma coisa. Pois a noção de que tudo tem que ser pago está profundamente arraigada e atuante em nós, tão universal quan-to inabalável por qualquer argumento lógico. Portanto, as pessoas que anseiam ardentemente pela graça são as que têm maior dificuldade em aceitá-la. Seria uma solução muito simples, e uma espécie de intuição se lhe opõe.12

Precisamos crer e confiar que Deus nos per-doa. O grande privilégio que temos como cris-tãos é saber que somos perdoados e que o perdão nos alcança por meio de Jesus Cristo. Foi para pregar a transformação radical, o des pertar da consciência de culpa e a erradicação desta culpa: a humilhação do orgulhoso e a restauração dos angustia dos. Não que a salvação tenha que ser conseguida. Ela já foi de uma vez assegurada a nós e a todos os que crêem. Tudo já foi consuma-do em Jesus Cristo12.

Vale uma reflexão final para o tema em ques-tão: o processo que leva a uma verdadeira liber-tação da culpa, que parte da confiança no perdão divino oferecido a nós, implica três momentos. Primeiro, o reconhecimento dos nossos erros que leve a um verdadeiro e sincero arrepen dimento. Segundo, o firme desejo de corrigir a nossa vida, transformando-nos positivamente como pessoas e como cristãos. Como diz a Bíblia, os frutos e

as obras do cristão acompanham a verdadeira fé, mas obras feitas como sím bolo de gratidão, como conseqüência natural da morada de Cristo em nossos corações e mentes, e não como forma de pagar alguma culpa ou ganhar mérito diante de Deus. Finalmente, libertar-se da culpa impli-ca também uma dis posição interna constante em perdoar aos outros, num compartilhamento mú-tuo e recíproco do perdão que nos é oferecido por Deus em Cristo Jesus.

Culpa e perdão – uma questão existencial que per manecerá atuando e ressoando nos corações humanos enquanto o indivíduo viver, mas cuja resolução está mais próxima do nosso alcance do que podemos imaginar: na pessoa que se tornou a encarnação viva do amor, da paz, do consolo e do perdão, chamada Jesus Cristo. Crer nesse perdão e apoderar-se dele é a ferramenta terapêutica por excelência, fonte de vida e alegria, da qual todos, sem exce ção, podem fazer uso.

Pela fé em Jesus Cristo as culpas do ser humano são apagadas e o perdão nos é concedida de graça. É a grande e libertadora mensa-

gem do Cristianismo.

Notas deste capítulo1 Paul Tournier. Culpa e graça: uma análise do senti-mento de culpa e o ensino do evangelho. São Paulo: ABU, 1985.2 Revista Veja, 31 de julho de 2002, edição 1762.3 Collins, Gary R. Aconselhamento cristão. São Pau-lo: Vida Nova, 1995, p.100-101.4 Tournier, Paul. Culpa e graça: uma análise do senti-mento de culpa..., p.200.5 Ibidem, p.200-16 Ibidem, p 2017 TOURNIER, Paul. Op.cit., p.2028 Jornal Zero Hora, Caderno Donna, 12 de setembro de 1999.9 TOURNIER, Paul. Op.cit., p.212-310 Mônica TARANTINO. Perdoar é humano. Revista Isto É, 08 de janeiro de 2003, edição n. 1736.11 TOURNIER, Paul. Op.cit., p.20012 Ibidem, p.215

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Mesmo que essa relação seja muita anti-ga – em inúmeras culturas a doença e a cura eram experiências que ficavam

ao encargo dos sacerdotes, dos pajés e dos xamãs –, nos dias de hoje, tem-se discutido muito quais são os limites de cada uma das duas áreas. Ape-sar de haver inúmeras correntes que vêem aí opo-sição total, tensão constante ou diálogo crítico, uma outra corrente procura caminhar no sentido de pro por uma perspectiva convergente ou inte-gralista de ambas as áreas, sem desrespeitar as especificidades de cada uma delas.

No artigo de Horta et al. cujo título é Psi-quiatria na prá tica médica: a religiosidade e suas interfaces com a medicina, a psicologia e a edu-cação, os autores afirmam:

A partir de Einstein, reduziram-se, um a um, os impedimen tos de cercania para ci-ência e religião, a ponto de João Paulo II afirmar que religião sem ciência não é boa religião, bem como ciência sem religião não é boa ciência. Uma posição conver gente com a do sumo pontífice foi, recentemente, tomada pela Organização Mundial da Saúde (1998), ao ter acrescentado a dimensão de bem-estar espiritual ao seu conhecido con-ceito multidisciplinar de saúde, que, como se sabe, só entendia uma condição de saúde se existisse a presença de bem-estar nas di-mensões físicas, psíquicas e sociais.1

É possível afirmar que o acréscimo da di-mensão espi ritual/religiosa à concepção de saúde

integral constitui um aspecto que aponta para uma valorização dessa área, tra tando-se de um marco decisivo na aproximação e no entre laçamento da ciência com a religião ou, mais amplamente di-zendo, com a espiritualidade humana.

Dois trabalhos de cunho científico, entre tantos outros que poderiam ser citados, indicam essa aproximação. O primeiro deles é a tese da psicóloga gaúcha Luciana F. Marques, realizada pela PUCRS, em que ela procura com provar que a religiosidade e o bem-estar existencial são fa-tores importantes para os indivíduos terem uma melhor saúde física e mental. Em sua pesquisa, as pessoas que afir maram não ter religião, em ge-ral, foram as que demonstra ram menor bem-estar existencial.2

O segundo trabalho é oriundo da Univer-sidade do Texas e aponta para o fato de que a espiritualidade tem a ver com disposição física e mental. As pessoas que pra ticam uma religião apresentam melhores condições de saúde. Os maiores ganhos são de fundo psicológico, visto que os religiosos têm auto-estima maior e um círculo de amizades com o qual têm afinidades, prevenindo doenças de fundo emocional.3

Num mesmo caminho, as faculdades de Me-dicina dos Estados Unidos já têm dado espaço à relação entre a espiri tualidade e a saúde na forma-ção acadêmica de seus alunos. Vários simpósios, congressos, palestras e cursos na área da saúde também vêm enfocando essa questão nos últimos anos, o que demonstra o aumento de interesse e preocupa ção dos profissionais no sentido de, ao

A RELAÇÃO ENTRE FÉ E SAÚDE

Um dos temas mais instigantes e polêmicos da atuali dade é a relação (ou talvez tensão) entre fé e saúde, reli gião e ciência, medicina e espiritualidade.

Por Prof. Thomas Heimann

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menos, refletir sobre a temática.

Há algum tempo, trabalhos e afirmações que apro ximassem a espiritualidade da ciência pareceriam idéias sentidas como completamente ilegítimas e estranhas aos preceitos religiosos e científicos, tal como explicam Horta et al.:

Ciência e religião eram campos histori-camente opostos, pelo menos, na cultura do ocidente. O apego da cultura ocidental por um pensamento linear (causalista e simpli-ficador) e seu encantamento pelos avanços tecnológicos e sua crença numa filosofia empirista – em síntese, a adição ocidental ao positi vismo estrito – configuram um con-junto de condições que, provavelmente, pro-porcionaram o isolamento e estimularam os conflitos entre religiosidade e pensamento científico.4

Para os autores supracitados, defender o pensamento de que a religiosidade de uma pessoa influencia não ape nas seu espírito, mas também seu corpo, sua mente e sua interação com os ou-tros já causa bem menos estranheza nos dias de hoje, mesmo que tal concepção ainda perma neça gerando desconfiança e inquietação em muitos meios acadêmicos.

Vamos passar agora a analisar um dos tantos fenôme nos religiosos que podem ser interpre-tados de uma forma interdisciplinar, apontando justamente para os diversos tipos de relações existentes entre religião e ciência, medi cina e es-piritualidade.

Análise de um fenômeno religioso: doença mental ou possessão?

Uma interpretação de práticas de liberta-ção espiritual e exorcismo numa ótica multi-disciplinar.

Quem de nós já não ouviu falar de filmes como O exorcista (1973) ou, mais recentemente, O exorcismo de Emily Rose (2005)? Ou, ainda, quem de nós já não ouviu falar de cultos de liber-

tação, sessões de descarrego ou então de pessoas que afirmaram estar “com um encosto” ou nas quais “baixou o santo”? Transe religioso, mundo dos espíritos ou apenas transtornos mentais?

Todos esses exemplos apontam para um fe-nômeno que vamos chamar aqui, genericamente, de possessão. Importa afirmar, desde o princípio dessa discussão, que esse é um tema controverso, e que estamos cientes de que há diversas formas de nominar e significar o fenômeno, dependendo do viés religioso ou científico de cada grupo, que constrói a sua própria nomenclatura e interpreta-ção do fato.

Desde o início da história humana, há indí-cios de que sofrimento e doença eram considera-dos fruto de uma força externa maligna, que atu-ava negativamente sobre os cor pos e as mentes das pessoas. As curas eram ministradas por meio da expulsão dessa força maligna do corpo do indiví duo, em práticas que denominaríamos hoje de exorcismos, realizadas por inúmeras tribos ao longo da história.

Portanto, a idéia do mal, de espíritos ruins ou de “pouca luz”, de demônios que atuam no plano físico e atormen tam os seres humanos não é privilégio do mundo cristão, embora a socieda-de ocidental seja muito influenciada pelo cristia-nismo e sua idéia do mal.

De um modo geral, o que se entende por possessão? Para o cristianismo, demônios são es-píritos ou poderes espirituais contrários a Deus e cujas fileiras são compostas pelos chamados anjos caídos, que acompanharam Lúcifer na re-belião contra Deus.

Caracterizando de modo geral uma posses-são, um ser humano que está “possuído” por uma dessas entidades espirituais maléficas acaba fi-cando sob o controle total dela. O indivíduo per-

O cinema retratou o tema das possessões em filmes como “O Exorcista” e “O Exorcismo de Emily Rose”, este baseado numa história verídica, ocorrida na Alema-nha com Annelise Michel, uma jovem católica que jul-gou-se ter sido possuída por demônios e que foi subme-tida a uma série de sessões de exorcismo. O caso acabou tendo implicações jurídicas.

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de sua identidade pessoal, bem como sua liberda-de de pensamento e até de ação, ficando alienado de si mesmo. Normalmente, uma possessão de-moníaca é acompanhada de um comportamento violento e destrutivo contra os outros e contra o ambiente, assim como contra o próprio indivíduo “possuído”.

Para que se levante a possibilidade de um diagnóstico positivo de possessão, é necessário que um indivíduo apre sente, de forma clara e significativa, uma série de sinto mas, indicados na tabela a seguir, levando-se também em conta nesse diagnóstico a freqüência, a duração e a in-tensidade dos sintomas. O filme Stigmata (1999), mesmo que não trate da questão da possessão, traz cenas que pratica mente sintetizam todos os sintomas descritos neste texto, dando uma visão concreta (um pouco exagerada) do que aqui esta-mos tratando.

É prudente afirmar, porém, que a ciência já consegue provar que muitos desses sintomas podem ser explicados à luz da fisiologia huma-na, como, por exemplo, em momen tos de muita tensão, extrema força e insensibilidade à dor em função de descargas de adrenalina.

Wegner, ao abordar essa temática, faz refe-rência aos critérios que a Igreja Católica Apos-tólica Romana levanta para indicar uma possível possessão, descritos no Rituale Romanum (escri-

to séculos atrás). São eles6:

•O possesso deve falar diversas palavras de um língua estranha ou entender o que alguém diz numa língua desconhecida.

•Deve ser capaz de relatar fatos secretos ou acontecidos em lugares distantes.

•Deve demonstrar forças que excedam a sua idade e transcendam a possibilidade de que a natureza humana dispõe.

Diante desse tema, que desperta inúmeras dúvidas sobre a sua etiologia, isto é, de onde sur-gem e por que se manifestam as possessões nos indivíduos, segue uma série de possíveis inter-pretações para o fenômeno, que transver salizam a medicina e a religião.

Doença, espíritos ou apenas fraude? Diferentes interpretações da possessão

Interpretação bíblico-cristã – As Igrejas cristãs têm como fonte de suas doutrinas as Sa-gradas Escrituras (Bíblia), de modo mais especial

Sintomas Físicos Sintomas Psicológicos Sintomas Espirituais

Força sobre-humana Clarividência Caráter (profanidade, nudez e lin-guajar obsceno...)

Expressão facial alterada Telepatia Ameaça verbal ou física a tudo que representa Cristo / Cristianismo

Mudança na voz (aspereza, zombaria, ronquidão...)

Habilidade para prever o fu-turo

Entra em estado de transe quando alguém ora

Convulsões, prostração Habilidade para falar línguas estrangeiras desconhecidas da pessoa possuída

incapacidade de confessar Jesus de forma reverente

Insensibilidade à dor Estado de transe Fenômenos poltergeist (p. ex.: ruí-dos inexplicáveis, telecinésia, odo-res desagradáveis

O que diz a Bíblia

Mt 8.28; At 19.16; Lc 4.33; Mc 9.18-22; 5.1-5

At 16.16-18; Mc 1.21-24, 34; Lc 4.33; 1 Sm 18.10; Mc 9.18-22

At 13.4-11; Mc 5.1-5; Lc 9.41s; 1 Jo 4.1-6; 1 Co 12.3; 1 Sm 18.10

Sintomas relacionados à possessão demoníaca5

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o Novo Testamento. A partir desse pressuposto, as religiões cristãs admi tem a existência e a ação de seres espirituais maléfi cos, chamados de de-mônios. Há muitos textos bíblicos que mostram Jesus Cristo e também os seus discípulos expul-sando demônios. Há, porém, diferenças entre as Igrejas cristãs tradicionais (Católica, Luterana, Batista, Metodista, Presbiteriana etc.) e as pen-tecostais/neo pentecostais (Deus é Amor, Univer-sal do Reino de Deus etc.) no que tange à prática de rituais exorcistas e à própria interpretação do que pode ser considerado possessão demoníaca. Logo a seguir trataremos desse aspecto.

Interpretação desmitologizante – Baseia-se na parap sicologia, que procura diferenciar fenômenos verdadei ros daqueles que não o são, desmascarando e desmis tificando fraudes e tru-ques. Os fenômenos verídicos podem ser produ-tos de uma mente perturbada, fruto de uma psi-corragia, isto é, uma energia mental que foge ao controle voluntário humano, gerando fenôme nos paranormais que se fazem presentes no indivíduo e no ambiente em que ele se encontra, tais como tip tologia, telecinesia, xenoglosia, glossolalia, clarividên cia etc. Essa linha de interpretação tem como represen tante conhecido no Brasil o padre Oscar Quevedo.

Interpretações psicológico-psiquiátricas – As pos sessões são interpretadas como casos de transtornos mentais. A psiquiatria, ao descrever as psicoses e as esquizofrenias, elenca uma série de sintomas que se aproximam dos relatados nas possessões espirituais, como delírios, alucina-ções visuais, auditivas, táteis, entre outras. Pode-mos ainda citar crises histéricas, dis sociações de personalidade e até mesmo crises de epi lepsia e convulsões, que, muitas vezes, foram e ainda são confundidas e interpretadas por alguns religiosos como possessões. O psiquiatra Rogério Zimpel afirma que os transtornos dissociativos talvez se-jam o grupo de perturbações mentais que mais se confundam com os fenômenos espirituais, englo-bando o transtorno de personalidade múltipla (ou dissociativo de identidade) e ainda o transtorno de despersonalização. É impor tante afirmar que ainda existe pouca literatura psiqui átrica e psico-lógica que trabalhe simultaneamente com os dois paradigmas, a saber, o psíquico/científico e o es-piritual/religioso.7

Interpretações sociológicas – As posses-sões são vistas como comportamentos de protes-to por parte de pessoas oprimidas, que não têm condições de buscar ajuda de cunho profissional, como médicos psiquiatras, psicólogos e outros terapeutas. Tais indivíduos encontram em igrejas um lugar de livre expressão de sua condição de opressão e que serve também de espaço terapêu-tico para elas.

Fenômenos catárticos – Uma outra inter-pretação, ligada à anterior, afirma que os fenô-menos observá veis numa possessão nada mais são do que uma des carga externa de muita opres-são, violência e repressão, cuja expressão livre é favorecida pelo ambiente suges tivo do culto. São os “demônios internos” de um indiví duo, o con-junto de muitas frustrações reprimidas, que são colocadas para fora, numa catarse individual e/ou coletiva.

Fraude – Uma das interpretações aponta o fato de que algumas igrejas podem fazer uso de estratégias teatrais para gerar espanto e admira-ção do público, treinando indivíduos para se fa-zerem passar por endemoniados. Pressupõe má-fé e falta de ética de religiosos.

Não é possível, a priori, dizer qual das in-terpretações é a mais acertada, até porque cada situação deverá ser analisada individualmente, podendo ser qualquer uma das propostas aqui.

Visões religiosas diferentes da possessão

Vamos examinar como as diversas religiões tratam do fenômeno, que, mesmo não sendo o mesmo em cada uma delas, estruturalmente se mostra muito semelhante.

Religiões afro-brasileiras – Afirmam que os eguns, espíritos zombeteiros de pessoas fale-cidas, podem importunar ou atormentar os vivos. Nos cultos afro, diversas entidades também in-corporam (“ocupam”, “baixam”) nos indivíduos (médiuns), porém essas enti dades não são vistas como espíritos malignos.

Doutrina espírita (Allan Kardec) – Não crê em demô nios, mas em espíritos obsessores

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de “pouca luz”. Andrade_ define obsessão como a ação persistente que um espírito mau exerce so-bre um indivíduo, cujas carac terísticas podem ir desde uma simples influência moral, sem sinais exteriores perceptíveis, até a perturbação comple-ta do organismo e das faculdades mentais.8 Essa obsessão pode ser de três tipos ou graus: a)obses-são simples: o sujeito é perseguido tenazmente pela ação mental de um espírito; b)fascinação: mais grave, pois o espírito passa a controlar os pensamentos e o raciocí nio do obsedado, como um processo parasitário; c)sub jugação: há um domínio quase total do espírito sobre a pessoa, moral e corporalmente. As formas de combater a obsessão são a prece, a fluidoterapia (passes e água magnetizada), a participação em reuniões mediúnicas de desobsessão e exercício constante do bem.9

Religiões cristãs históricas/tradicionais – Admitem a possessão, mas após acurada inves-tigação do caso, o que implica levantar todas as possíveis causas racionais para os fenômenos, incluindo diagnósticos médicos e psicológicos. Essas igrejas também diferenciam os con ceitos de tentação, influência e possessão demoníaca.

Religiões pentecostais e neopentecostais – Afirmam que os demônios atuam intensamen-te, sendo que todos os males físicos e mentais podem ser sinais de posses são demoníaca. Em movimentos carismáticos, a pos sessão e o exor-cismo são práticas “comuns”, fazendo parte do cotidiano religioso.

Islamismo – Também acredita em demô-nios. Considera que Satanás e seus filhos, os anjos caídos, chama dos de gênios, demônios e duendes, podem desobedecer a Deus e possuir o corpo das pessoas. Tais espíritos maus precisam ser expulsos por meio do ritual em que se lê o Alcorão e se fazem súplicas pela libertação do possesso.

Judaísmo – Acredita que espíritos de pesso-as que já faleceram (os dibbuks) podem atormen-tar os vivos.

Hinduísmo – Desde os Vedas, textos an-tigos e sagra dos dos hindus, já há menção dos chamados exorcismos medicinais, nos quais se usavam mantras e frases objeti vando conjurar e expulsar os demônios.

A prática do exorcismo nos dias de hoje

Há dois tipos básicos de exorcismo pratica-dos nos dias atuais: o público e o privado.

Privado – A pessoa atormentada é levada para um local reservado. Não há público ou pla-téia. Os exorcistas (padres ou pastores) realizam o rito de exorcismo, que implica uma “guerra” entre o exorcista e o possuído, o que pode ser traduzido como uma batalha entre o próprio Deus (na pessoa de Jesus) e o demônio. São os exorcismos praticados pelas Igrejas tradicionais (como a Católica), sempre após acurada investi-gação psiquiá trica. A Igreja Católica, a partir do Concílio Vaticano II (década de 1960), decretou que apenas alguns sacerdotes poderiam expulsar demônios. Já no ano 2000 foi lançado pela Igreja Católica um manual oficial de exorcismo, bus-cando-se regulamentar a prática desses rituais.

Público – Está presente em alguns cultos evangéli cos de cunho pentecostal (ou neopen-tecostal). São os chamados cultos de libertação ou sessões de descarrego. Nesses cultos normal-mente os demônios manifestam-se em várias pessoas, que são publicamente exorciza das. Pode ser observada nessas sessões a utilização de vá-rios recursos como:

Trilha sonora: ouvem-se melodias leves na hora das bênçãos e acordes pesados quando se mencionam demônios e espíritos malignos.

Iluminação: na penumbra os fiéis ficam mais suges tionáveis. Pode-se pedir para fechar os olhos.

Figuração: o burburinho de pessoas rezan-do e gri tando rebaixa os níveis de consciência de fiéis susce tíveis (influência do meio).

Roteiro: para evocar demônios, os pastores fazem orações repetitivas. Ditas em tom de au-toridade e num ambiente emocional, soam reais.

Coreografia: aperta-se e balança-se a cabe-ça/corpo do fiel em movimentos circulares. Ton-tura e falta de apoio podem induzir ao transe.

Sonoplastia: podem ser introduzidos grava-ções e sons que lembram assombração. Tais ruí-

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dos estimu lam o inconsciente das pessoas10.

Um aspecto que chama a atenção dos estu-diosos das religiões é o fato de que a manifesta-ção dos demônios é quase inexistente nos cultos e nas missas tradicionais (não pentecostais ou carismáticos). Ao compararmos tais even tos com as sessões de descarrego ou libertação, em que pro lifera a manifestação dos casos de possessão, fica em aberto uma grande pergunta: por que há essa grande diferença?

Entre as possíveis respostas poderíamos ci-tar: o clima sugestivo dos cultos de libertação, a quase conjuração à manifestação das possessões nesses cultos e o estado psi coemocional do fiel que vai a uma sessão de descarrego.

Uma fala de um pastor batista no programa Documento Especial, da extinta Rede Manchete, no ano de 1989, talvez seja um bom pensamento final. Mesmo admitindo a possibilidade e a ação dos demônios, ele afirma: “Eu acho que muitas igrejas estão se preocupando demais com os de-mônios e se esquecendo do principal, que é Jesus Cristo”.

É o anúncio do amor, do consolo, da pro-teção em Deus que precisa ocupar o centro da mensagem cristã, e não insistentemente o medo ao demônio. Como diz a Escritura Sagrada,

Se Deus está do nosso lado, quem nos ven-cerá?... Em tudo isso temos a vitória por meio daquele que nos amou. Pois eu tenho a certeza de que nada nos pode separar do amor de Deus: nem a morte, nem a vida; nem os anjos, nem outras autoridades ou poderes celestiais; nem o presen-te, nem o futuro; nem o mundo lá de cima, nem o mundo lá de baixo. Em todo o universo não há nada que nos possa separar do amor de Deus, que é nosso por meio de Cristo Jesus, nosso Senhor. (Romanos 8.31, 37-39)

Conclusão deste capítulo

Voltamos a afirmar que tratar desse tema exige prudên cia, sem abrir mão de um olhar crí-tico e interdisciplinar, respeitando-se sempre os diversos pontos de vista e inter pretações trazidos

pelos diferentes grupos, científicos e/ou religio-sos.

Não queremos aqui emitir juízos de valor ou descon siderar algumas das interpretações, até porque a verdade religiosa é uma questão subje-tiva, que implica fé e que transcende uma análise lógica e racional dos fatos.

Muitas ainda poderiam ser as questões a serem discu tidas dentro dessa temática, como, por exemplo, as possí veis conseqüências para os indivíduos que se submetem aos rituais do exorcismo, bem como o efeito terapêutico ou neurotizante de tais rituais. Mas isso implicaria um outro estudo, que não é o objetivo desta breve análise do fenô meno possessão.

Notas deste capítulo1 Psiquiatria na prática médica: A religiosidade e suas interfaces com a medicina, a psicologia e a educação (Paulo LR Sousa, Ieda A Tillmann, Cristina L Horta e Flávio M de Oliveira - Universidade Católica de Pelo-tas, RS, Brasil In: http://www.unifesp.br/dpsiq/pol-br/ppm/especial07.htm.2 Jornal Zero Hora, Caderno Vida, 16/12/2000. 3 Revista Veja, 08/12/1999.4 Psiquiatria na prática médica: A religiosidade e suas interfaces com a medicina, a psicologia e a educação (Paulo LR Sousa, Ieda A Tillmann, Cristina L Horta e Flávio M de Oliveira - Universidade Católica de Pelo-tas, RS, Brasil In: http://www.unifesp.br/dpsiq/pol-br/ppm/especial07.htm.5 Cf. B. J. OROPEZ, 99 perguntas sobre anjos, demô-nios e batalha espiritual. São Paulo: Mundo Cristão, 2000, p.131.6 Apud WEGNER, Uwe. Demônios, maus espíritos e a prática exorcista de Jesus segundo os evangelhos. In: Espiritualismo/espiritismo: desafios para a igreja na América Latina. Org. Ingo Wulfhorst – São Leopoldo, RS: Sinodal; Genebra, CH: Federação Luterana Mun-dial, 2004, p. 126.7 TOURNIER, Paul. Op.cit., p.202.7 ZIMPEL, Rogério. Fenômenos espirituais: a visão da psiquiatria. In: Espiritualismo/espiritismo: desafios para a igreja na América Latina. Org. Ingo Wulfhorst – São Leopoldo, RS: Sinodal; Genebra, CH: Federação Luterana Mundial, 2004, p.79ss.8 Presidente da Federação Espírita do Rio Grande do Sul entre 1998-2001.9 ANDRADE, Nilton Stamm de. Espíritos e obsessão conforme a doutrina espírita codificada por Allan Kardec., p. 55-58. In: Espiritualismo/espiritismo: desafios para a igreja na América Latina. Org. Ingo Wulfhorst – São Leopoldo, RS: Sinodal; Genebra, CH: Federação Luterana Mundial, 2004, p.55.10 Ibidem, p.56-7

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Até aqui passamos por várias visões reli-giosas e suas respectivas respostas para as questões religiosas e existenciais.

Cada uma, a sua maneira, segue o que denomi-namos de filosofia de vida, os princípios ideais que normatizam o seu modo específico de pensar

Por vezes, no entanto, é difícil conciliar ide-al e realidade. No campo religioso o problema assume proporções ainda maiores, pois somos inclinados a pensar que tanto o movimento reli-gioso como seus seguidores são perfeitos e não se desviam nunca de sua pregação. Não raro, para indicar nossa indignação, usamos expres-sões como “isso é uma imoralidade” ou, ainda, “isso é antiético”

Ética e moralAs palavras ética e moral, embora usadas in-

diferentemente, possuem significados distintos. A moral se relaciona às ações, isto é, à conduta real. A ética diz respeito aos princípios ou juí-zos que originam essas ações. Nessa dimensão, a ética e a moral são como a teoria e a prática. A partir dessa constatação, é possível afirmar que a ética é a teoria ou filosofia moral.

Todo ser humano tem uma moral em razão de que pratica ações que podem ser eticamente examinadas. Contudo, nem todos levam em con-ta quais são os princípios éticos que determinam suas ações e, por isso, é fundamental avançar na compreensão da ética.

Para refletir:Tenho claro qual é o princípio ético que determina minhas ações?

Ética descritiva e ética normativa

De forma sintética, podem ser identificados, com relação à ética, dois modos de percepção de-nominados de ética descritiva e ética normativa.

A ética descritiva retrata as noções éticas predominantes nas diversas culturas. Ao conside-rar essas noções, não julga o que é certo e errado; apenas descreve o que as pessoas pensam e como se comportam, sem emitir juízos de valor. Nor-malmente a ética descritiva pode ser observada nas pesquisas de opinião que são feitas com as pessoas no intuito de identificar seus pontos de

ÉTICACada visão religiosa tem princípios que orientam a maneira de

pensar dos seus seguidores e, muitas vezes, isso influencia no julga-mento do que é moral e ético.

Por Prof. Ronaldo Steffen

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vista sobre assuntos como sexualidade, aborto, impostos, roubos, violência e outros. Um alerta se faz necessário: a ética descritiva pode gerar uma “moralidade estatística”, ou seja, a noção de que aquilo que a maioria faz, deve estar certo.

A ética normativa, por outro lado, procura mostrar quais ações são certas e quais são etica-mente inaceitáveis. Ela tem como pressupostos determinados valores e, a partir deles, fornece normas para as ações. Sua busca não é pelo que é certo ou errado, mas pela idealidade do que deve ser. Nesse sentido, os Dez Mandamentos, por exemplo, são ações de idealidade motivadas por uma ética normativa.

ValoresNa Antiguidade, valor é o que deve ser obje-

to de preferência ou de escolha.

Contemporaneamente, identificam-se três aspectos no conceito de valor. Em primeiro lu-gar, valor não é somente a preferência ou o objeto da preferência, mas é o preferível, o desejável, a partir de uma expectativa normativa. Um segun-do aspecto aponta que valor não é simples ide-al que pode ser posto de lado pelas preferências ou escolhas efetivas, mas é guia ou norma das escolhas, sendo, por isso, o critério para um ju-ízo. O terceiro aspecto remete à idéia de que va-lor é a possibilidade das escolhas, privilegiando umas em detrimento de outras, repetindo sempre a mesma escolha quando as condições determi-nadas para a escolha ocorrerem e concedendo a essas escolhas o caráter de autênticas e certas, com pre tensão à universalidade.

Para refletir:Quais valores mais e melhor preenchem nossas preferências: dinheiro, carro, lazer, saúde, liberdade, amizade, amor?

É possível também pensar que alguns valo-res são apenas meios para se alcançarem outros valores mais desejados. Consideremos como exemplo o dinheiro: ele não tem valor intrínseco, em si mesmo e por si mesmo, mas pode ser usado para se obter algum outro valor só atingível com o dinheiro.

Dois fatos podem, ainda, ser ressaltados. Um é o que aponta para o fato de que,ao tomarem de-cisões cotidianamente, os indivíduos priorizam valores, mesmo sem terem consciência deles. Outro é que, ao priorizarem valores, é comum que os interesses de uns contrariem os de outros. Aquilo que é bom para um pode ser o infortúnio de outro. Quando isso acontece, ocorre o que de-nominamos de egoísmo ético.

Algumas tentativas de determinar o que tem valor e a justificativa adotada para validá-lo têm sido feitas. A seguir, examinaremos algumas al-ternativas teóricas (natureza dos valores).

Pensadores gregos e a éticaSÓCRATES: ao buscar o desen-volvimento do ser humano abre caminho para a reflexão sobre a ética.

ARISTÓTELES: entendia a Ética como uma ciência prática; esbo-çou reflexões sobre as virtudes éticas.

Teoria emotiva Os valores são determinados pelos sentimentos de cada um.

Os defensores da teoria emotiva, identifi-cados como subjetivistas, entendem que todos os valores são relativos e individuais. O que de-termina o que tem ou não algum valor repousa simplesmente no fato de o indivíduo gostar ou aprovar alguma coisa. A única justificação para um julgamento valorativo assenta-se em como um indivíduo sente ou o quanto ele se envolve com uma determinada situação. Dessa forma, diferentes pessoas valorizam diferentes coisas, e

A ética normativa tem como pressupostos alguns valores e, a

partir deles, fornece normas para as nossas ações.

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todas com direito à sua opinião. Nessa categoria se enquadram tanto os existencialistas quanto os lingüistas, pois defendem a relatividade dos va-lores individuais.

Teoria do relativismo culturalOs valores são determinados pela cultura em que vive o indivíduo.

Conforme essa perspectiva, o que é certo ou errado está determinado pela cultura particular na qual o fato ou a cir-cunstância ocorre. O relativismo cultural justifica os julgamen-tos valorativos ape-lando à autoridade social de uma cultura em particular. O certo e o errado são sancio-nados pela sociedade. Enquadra-se nessa teoria a perspectiva adotada por Freud, na qual o certo e o errado são idéias introjetadas a partir da sociedade e de nossos pais. A psicologia comportamentalista ou beha-viorista também pode ser incluída nessa teoria, pois condiciona o comportamento dos indivíduos aos valores sociais.

Teoria absolutistaOs valores são determinados por leis morais universais e eternamente verdadeiras.

Conforme essa visão, identificada como objeti-vista, o que tem valor inde-pende do que o indivíduo gosta ou pensa, bem como do que uma sociedade san-ciona. É uma teoria que se opõe ao relativismo asseve-rando que as leis morais são universais e eternamente verdadeiras, independen-te de qualquer coisa. A lei

moral dos Dez Mandamentos, cujos valores re-pousam sobre a autoridade de Deus, sendo por isso universais, pode estar vinculada a essa pers-pectiva.

Teoria do relativismo objetivoOs valores são determinados pelo amor, entendido como a melhor conseqüência e satisfação humana.

Essa teoria entende que o amor é o mais alto valor e, por isso, que-brar uma promessa por razões egoístas é consi-derado errado. O amor é tido como o mais alto valor não por ser uma regra moral absoluta, mas pelo fato de estar em jogo a produção das melhores conseqüên-cias e da satisfação hu-mana a serem obtidas com uma determinada atitude.

A denominação de relativa refere-se à noção de que essa teoria defende que todos os valores dependem da satisfação humana. Ao mesmo tem-po, é considerada objetiva por insistir no teste da conseqüência a ser obtida, qual seja, a produção do máximo de satisfação.

Estão enquadrados nessa teoria o utilitaris-mo, o pragmatismo e as correntes psicológicas defendidas por Erich Fromm, Abraham Maslow e Carl Rogers.

Teoria da escolha racionalOs valores são determinados após uma escolha racio-nal.

A teoria da escolha racional nega a tese do relativismo cultural sustentando que um determi-nado modo de vida é claramente melhor que ou-tro, se a escolha for determinada por um proces-so racional de escolha. É verdade que, em última análise, é o indivíduo quem faz a escolha do que é certo ou errado a partir do que sente ou prefere.

FREUD (1856-1939): suas teorias podem ser enquadradas na Teoria do Relativismo Cultural.

Na pintura de Rem-brandt: Moisés com as Tábuas da Lei - Os Dez Mandamentos

Carl Rogers (1902-1987): sua teoria cen-trada na pessoa reflete o espírito da Teoria do Relativismo Objetivo

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No entanto, o mesmo indivíduo, por ser racional, deve reconhecer que os sentimentos são fidedig-nos somente se forem livres, imparciais e frutos da informação.

ConsciênciaA consciência desempenha um papel impor-

tante no sentido de coibir ou incentivar a tomada de determinada decisão a partir de algum valor. Relativizando o conceito, consciência é a capaci-dade que temos de reagir ao certo ou ao errado a partir daquilo que é o nosso mais alto valor.

Algo que constantemente tem emergido e tornou-se ditado popular é que podemos fugir de tudo, menos de nossa consciência. Aliada a essa percepção, uma problemática se apresenta: de onde vem a consciência?

Há, pelo menos, três respostas a essa ques-tão: uma que afirma ser a consciência inata ao ser humano; outra que diz ser ela imposta pelo ambiente externo, sendo o ser humano moldado pelas condições culturais externas, como pensam a psicologia e as ciências sociais; uma última, ainda, considera ser a consciência inata ao ser humano, apesar de receber informações externas, agindo a partir destas, ou seja, ela pune as pesso-as quando rompem as normas, mas não determi-na absolutamente essas normas.

Uma questão em aberto ainda deve ser aqui lançada : todos têm a mesma consciência?

Direito positivo e senso de justiça

Essa é uma questão problemática, especial-mente em países marcados por desigualdades de toda ordem. É verdade que toda sociedade se ba-seia num determinado código originado por uma ética que enfatiza a igualdade de todos. Violar as leis do código implica a quebra da harmonia social.

Podemos observar, no entanto, que nem sem-pre o que cada um pensa sobre o certo e o errado corresponde às leis sociais. A título de exempli-ficação, basta relembrar a questão do aborto, da

pena de morte, da eutanásia, do pagamento de impostos (como o de renda), do trabalho de me-nores, da compra de produtos contrabandeados e assim por diante. Há, ainda, o caso de profissio-nais que se recusam a cumprir determinada fun-ção em razão de sua consciência.

É possível relembrar muitos exemplos, mas há um especial ocorrido em 2002. É o caso de um tratorista baiano e empregado de uma em-presa contratada para cumprir mandato judicial que determinava a derrubada de casas erguidas numa área invadida. Diante de uma casa a ser de-molida, com a máquina ligada, o tratorista viu-se tomado de dor pela senhora com seus filhos que se postavam na frente da casa numa tentativa de impedir a demolição. Acabou por não executar a ação que lhe fora determinada e foi preso em flagrante por desobediência à ordem judicial.

Tecnicamente, denomina-se desobediência civil o ato de uma pessoa ou grupo desafiar e in-fringir o direito positivo (o sistema jurídico acor-dado) de maneira plenamente intencional (senso de justiça).

ResponsabilidadeA questão da ética centra-se, também, no

senso de responsabilidade. A pergunta que cabe para discussão é a referente a por quem e pelo que as pessoas se sentem responsáveis. A título de reflexão, podemos falar em duas possibilida-des, que se completam, com relação à respon-sabilidade: uma individual, em que o sujeito é responsável por si e pelo que o rodeia, e outra coletiva, em que a sociedade é responsável pelas ações que o sujeito não consegue fazer por si só.

O perigo que corremos é o de chegarmos a algumas circunstâncias em que nem o indiví-duo, nem a sociedade assumem a responsabili-dade pelo que está acontecendo. Chama-se a esse comportamento de diluição de responsabilidade.

A alternativa mais viável quanto a esse tema é denominada de trabalho pela solidariedade, quando indivíduo e sociedade assumem suas res-ponsabilidades.

Descubra o porquê do surgimento das chamadas “ações solidárias”.

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Livre-arbítrioO livre-arbítrio é o pressuposto segundo o

qual as pessoas possuem alternativas entre as quais podem escolher livremente o que é certo ou errado, bom ou ruim e assim por diante.

Há duas correntes que conduzem a discussão do tema: uma é o determinismo, que defende que nossas escolhas são determinadas pelos elemen-tos externos, herdados dos pais ou do ambiente no qual vivemos. Nesse caso, o livre-arbítrio é apenas uma sensação. Outra corrente, a do inde-terminismo, argumenta que nossas escolhas são fruto de vontade individual e nos tornamos o que escolhemos ser.

Para refletir:Para acabar com a violência, é preciso mudar as condições econômico-sociais da nossa sociedade, pois elas é que determinam a escolha pela violência.

Ética religiosa e socialAté aqui o texto privilegiou o tema da éti-

ca, contextualizando-o a partir de seus principais conceitos. Na seqüência, o tema será estreitado, concentrando-se mais na perspectiva religiosa e cristã, oferecida como alternativa concreta para a

vida em sociedade.

Logo a seguir o quadro A procura comparar sinteticamente os princípios, os meios e os fins da ética social e religiosa, apontando para as suas diferenças.

Ética religiosa cristãComo todos os pensamentos religiosos, o

cristianismo também possui sua perspectiva éti-ca. É bem verdade que a diversidade do pensa-mento cristão faz-nos entender que não há um único modo cristão de entender o tema.

Respeitadas as diferenças, de uma forma ge-ral, a abordagem religiosa cristã da ética não pode fugir de sua centralidade: o Cristo, retratado no Novo Testamento. Assim, a ética religiosa cristã pode ser sintetizada em dois fundamentos: um que ressalta a centralidade cristocêntrica, enfati-zando Jesus Cristo e sua ação de salvação como fonte de orientação ética e de poder de transfor-mação, e outro que enfatiza a Bíblia, o Antigo e o Novo Testamento, como fonte e norma tanto do ensino como das práticas cristãs.

Crítica externaEm razão dessa postura, o cristianismo tem

elaborado algumas críticas a sistemas éticos que

Ética social Ética religiosa

Princ

ípios

Extraídos da convivência humana a partir das idéias filosóficas que traduzem os anseios e as expectativas da sociedade. São situacionistas por serem flexíveis e se adaptarem às mudanças históricas. Resultam do anseio pela liberdade.

Extraídos das doutrinas que fundamentam a religião. São perenalistas por serem mais rígidos e dificilmente admitirem mudanças históricas. Resultam do amor.

Meios

Partem do próprio sistema cultural sobre o qual atuam as diversas instituições sociais (família, escola, igreja, empresas, meios de comunicação, partidos políticos etc.).

A lei moral que busca determinar o que é melhor para o ser humano.

Fins

Atingir o bem comum. Por isso, é imanente, ou seja, restrita aos limites humanos, temporais e sociais.

Atingir o bem superior. Por isso, é transcendente, ou seja, projeta o ser humano para além deste mundo material, buscando um sentido eterno para sua vida.

Quadro A - A Ética religiosa e social

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se baseiam em outros pressupostos. Confira o quadro B.

Crítica internaAssim como faz com os princípios que lhe

são alheios, o cristianismo também produz uma auto-análise e identifica, com relação à ética, duas posturas comumente praticadas no seu inte-rior. Uma mais negativa, a legalista, e outra mais positiva, a pedagógica.

Na linha legalista, a lei de Deus é vista de forma inflexível, devendo ser cumprida em sua plenitude. Caso a pessoa não a cumpra, o infrator só é redimido do erro mediante punição e peni-tência. É prática coercitiva e baseada no medo.

Na linha pedagógica, a lei de Deus é um mé-todo educativo que visa orientar a conduta hu-

mana dentro de princípios movidos pelo amor e pelo desejo de proteger o ser humano dos perigos morais. Pressupõe a livre aceitação dos princí-pios cristãos, sem coerção.

O amor como princípioDestaca-se na linha pedagógica da ética re-

ligiosa o amor como elemento motivacional da conduta humana.

Os significados que o amor apresenta na linguagem comum são múltiplos e quase sempre malcompreendidos em razão de pouco ou qua-se nada se pensar sobre ele. Em geral, acredita-se que amor é um sentimento e como tal não se explica. A História da Filosofia, no entanto, tem demonstrado diferente: o amor pode e deve ser pensado. O fato hoje é que se desacostumou de

Princípio Critíca Cristã

Hedonismo: o prazer é o critério maior. O bem é o que dá prazer e o mal é o que causa dor. A linha individualista busca o prazer individual, e a linha universalista o bem maior para o maior número de pessoas.

É princípio que não leva em consideração os outros na sua versão individualista. Já na universalista, quem julgar sua ação digna de um be m maior para um maior número de pessoas encontra justificativa para sua ação.

Naturalismo: a Natureza é o princípio válido para todos e em todos os tempos. A sobrevivência é o bem maior a ser buscado, e o que a dificulta deve ser eliminado.

Como ficam os doentes, os fracos e os inválidos? O que vale é “o maior come o menor”?

Relativismo: cada situação é única. Não há princípio experimental que defina o que é bom e mau.

A defesa da inexistência de verdades absolutas é uma verdade absoluta.

Esteticismo: o que entra em consideração não é o ato em si, mas o resultado dele obtido. Os sentidos e as emoções são utilizados para dar significado à vida e transformar a insignificância em beleza.

O princípio é imediatista, defendendo o aqui e agora, gerando a necessidade de auto-realização pessoal ou grupal sem medir o ato em si e enfatizando uma existência limitada à historicidade humana.

Idealismo: é a busca de um ideal fora do ser humano e da natureza. A linha intuitiva reconhece que todos têm um conhecimento intuitivo do que é certo e errado. A linha racionalista enfatiza que o certo e o errado dependem do uso adequado do raciocínio.

A questão que pode ser contraposta à linha intuitiva é: se o senso moral está na consciência, onde está ela? Para a linha racionalista, pode ser questionado: se o senso de dever se sobrepõe por meio do raciocínio, apenas os mais capazes é que estabelecem os melhores deveres.

Quadro B: Crítica do cristianismo a sistemas éticos externos

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pensá-lo. A idéia desenvolvida a seguir é a cons-trução de um modo de pensar o amor a partir dos pressupostos cristãos a fim de podermos compre-ender por que ele é o fundamento maior da ética cristã.

Para definir o amor como fundamento éti-co, o cristianismo costuma pensar o tema a partir de três palavras gregas: eros, filia e ágape, cujos significados gravitam em torno da palavra por-tuguesa amor. Confira o quadro que segue para entender qual o significado que o cristianismo atribui ao amor.

Moral religiosa cristãPara os cristãos, os Dez Mandamentos, mais

do que serem um manual de comportamento hu-mano e social, apontam uma sugestão de cumpri-mento de papéis ou funções para o bom exercício do amor (ágape), enquanto aceitação que com-preende e perdoa.

Costuma-se dividir os Dez Mandamentos em dois grupos: os mandamentos que se dirigem a Deus (amar a Deus) e os que se dirigem ao pró-ximo (amar o próximo). Respeitados os grupos que possuem uma divisão diferente, a tradição cristã luterana identifica os mandamentos como

indicado a seguir.

Ética social cristãOs cristãos estão cientes de que hoje a maio-

ria dos cidadãos, dentro de suas liberdades indi-viduais, não fazem parte do cristianismo. Ainda assim, os cristãos entendem que seu modo de perceber o universo e o ser humano pode contri-buir para a instauração de relações sociais mais harmônicas e igualitárias.

A base cristã para essa percepção encontra-se no fato de todos os seres humanos serem filhos criados e amados por Deus, em Cristo Jesus, e que podem viver vida digna e harmoniosa, com justiça, paz, solidariedade e perdão, dentro de or-dens adequadas ao grupo de convivência.

Emergem dessa intenção dois modos, con-vergentes, de aplicar-se a ética social cristã. Um incentiva o indivíduo a amar o próximo como a si mesmo. Embora nem sempre se viva de acordo com essa regra, há uma concordância generaliza-da de que fazê-lo é um dever. Outro modo regra as relações sociais e aponta para o princípio da reciprocidade, incentivando o indivíduo a tratar os outros como gostaria de ser tratado.

Eros

É toda e qualquer relação humana resultante da funcionalidade das sensações (sentidos físicos). Desse modo, entende-se amor como força unificadora e harmonizadora, tanto sexual como política, resultante das percepções dos sentidos físicos. Quando os sentidos funcionam em sua normalidade biológica, é possível falar em sensualidade. Quando a normalidade biológica é quebrada, ficando fora de controle, fala-se em paixão.

Normalmente, identifica-se esse modo de amor com a sexualidade, tendo em vista que, ao sermos despertados para alguém, nossa sensualidade descontrola-se e, se correspondida, somos conduzidos à paixão, que culmina no completo descontrole dos sentidos, a sexualidade.

Amor nessa dimensão não se identifica com a base cristã para a ética.

Filia

É toda e qualquer relação humana resultante de atitudes concordantes e afetos positivos (solicitude, cuidado, piedade etc.). O termo se assemelha às noções de afeição e amizade.

Nesse sentido, é possível afirmar que a dimensão do amor se dá 1) por escolha (é seletivo) e 2) por concordância ou, se preferir, por concórdia, o que implica abrir mão de juízos valorativos condenatórios.

Amor nessa dimensão não se identifica com a base cristã para a ética.

Ágap

e

É toda e qualquer relação humana resultante da ação de Deus e que se estende a todo “próximo”. Ágape se caracteriza pela aceitação mútua. Nesse sentido, é possível falar que ágape é a disposição à igualdade verificada quando Deus, na criação, tornou o ser humano igual a Ele e quando, na redenção, Ele mesmo torna-se, em Cristo, ser humano a fim de resgatar nossa dignidade pela compreensão e pelo perdão. Essa é a ação de Deus em nós e que se estende, por nós, a todo “próximo”. Nós amamos porque Ele nos amou primeiro.Amor nessa dimensão é a base cristã para a ética.

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ÉTICA SOCIAL CRISTÃ APLICADA

o cristão, aquele que age eticamente, não apenas manifesta sua preocupação com as pessoas e o universo, como tam-bém não faz um ar de arrogante superiori-dade como se o resto, além dele, não exis-tisse.

Por Prof. Ronaldo Steffen

Essa preocupação que alimenta faz com que busque na ética social cristã formas de poder equilibrar as relações sociais de

modo que o seu próximo não perca a alegria de viver nem cause dano à existência dos outros.

O compromisso da ética cristã é com a vida, em sua plenitude. A seguir, apresentamos alguns apontamentos que, de forma resumida e fugin-do das informações exaustivamente tratadas pela mídia, escrita, falada e televisiva, por teses e li-vros, procuram apontar a ação desejada pela éti-ca social cristã.

Amor-próprioEm tempos de grande valorização da auto-

estima, auto-imagem, marketing pessoal, cuida-do com o corpo e assim por diante, é prudente tocar nesse tema, ainda que resumidamente.

Pode um cristão ter amor-próprio? Como ser criado e salvo por Deus, ele foi feito nova criatura e recebeu, de graça, o favor de Deus. O ser hu-mano é visto por Deus como santo, bom. O cris-tão sabe disso. Sabe que recebeu o amor de Deus para amar o próximo. Nesse sentido, o cristão tem amor-próprio. É dele que emana o amor ao outro e a todas as criaturas divinamente criadas.

As razões que não podem mover o amor-pró-prio do cristão são: um amor-próprio por causa de si mesmo, pois é egoísmo; um amor-próprio por causa dos outros, pois é negação de si mes-mo.

Com isso, coloca-se o problema do amor-próprio não no amor, mas na razão que o produz.

O amor próprio...

•não por causa de si;

•não por causa dos outros;

•por causa de Deus, sim.

“O BOM SAMARITANO”, a parábola de Jesus ilustrada pelo pintor inglês George Frederic Watts (1904).

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Responsabilidade social

Cuidar do próximo não pode perder a dimensão nem do físico,

nem do espiritual.

A ética cristã estabelece que todo ser huma-no deve ser respeitado como pessoa (não se trata de coisa) e que toda pessoa, amiga ou inimiga, é nosso próximo. Amar o próximo inclui necessa-riamente o cuidado com ele. Isso significa não apenas proteger os inocentes, mas agir de modo proativo, com vistas ao bem-estar de todos. Cui-dar do próximo aqui também não significa ape-nas zelar pela sua espiritualidade, mas, sim e in-clusive, pelas suas necessidades materiais.

A ética cristã prescreve que, por amor, o cristão deve cuidar:

• De si mesmo – prover as necessidades bá-sicas para sua própria existência e de forma moderada;

• De sua família – prover o necessário para a existência de crianças, idosos, dependen-tes e órfãos que vivem na sua própria famí-lia ou nas famílias próximas;

• De seus irmãos crentes – é histórico que o cuidado material que um cristão tem com o outro é revelador do quanto eles se amam;

• Dos pobres – cuidar de seres humanos, criados à imagem e semelhança de Deus, desprovidos de recursos para uma vida mi-nimamente digna é abusar da própria di-vindade e de Sua natureza de amor;

O homem está dividido dentro de si. A vida volta-se contra si própria através da agressão, do ódio e do desespero. Estamos habituados a condenar o amor-próprio; mas aquilo que pretendemos realmente condenar é o oposto do amor-próprio. É aquela mistura de egoísmo e aversão por nós próprios que permanentemente nos persegue, que nos impede de amar os ou-tros e que nos proíbe de nos perdermos no amor com que somos eternamente ama-dos. Aquele que é capaz de se amar a si próprio é capaz de amar os outros; aquele que aprendeu a superar o desprezo por si próprio superou o seu desprezo pelos ou-tros.

Mas a profundidade da nossa sepa-ração reside, justamente, no fato de não sermos capazes de um grande amor, cle-mente e divino, por nós próprios. Pelo contrário, existe em cada um de nós um instinto de auto-destruição, tão forte como

o nosso instinto de auto-preservação. Na nossa tendência para maltratar e destruir os outros existe uma tendência, visível ou oculta, para nos maltratarmos e nos des-truirmos.

A crueldade para com os outros é sempre também crueldade para com nós próprios. Deste modo, o estado de toda a nossa vida é o distanciamento dos outros e de nós próprios, porque estamos distan-ciados da Razão do nosso ser, porque es-tamos distanciados da origem e do objeti-vo da nossa vida. E não sabemos de onde viemos nem para onde vamos. Estamos separados do mistério, da profundidade e da grandeza da nossa existência. Ouvimos a voz dessa profundidade, mas os nossos ouvidos estão fechados. Sentimos que algo radical, total e incondicional nos é exigi-do; mas rebelamo-nos contra isso, tenta-mos fugir à sua urgência e não aceitamos a sua promessa.

A Profundidade da Nossa Separação

O texto acima foi escrito in “És Aceite”, por Paul Johannes Oskar Tillich (1886–1965) foi um teólogo alemão-estadounidense, um filósofo cristão. Tillich foi contemporâneo de Karl Barth, um dos mais influentes teólogos protestantes do século XX. Fonte:Wikipedia

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• Dos escravos e dos oprimidos – promo-ver e participar de movimentos que buscam erradicar toda e qualquer forma de escravi-dão e opressão é tarefa cristã nobre e divi-na, assim como o sacerdócio;

• Dos governantes – por entender que os governantes são, por assim dizer, o braço direito de Deus que estabelece a ordem e a paz no mundo, compete ao cristão prestar o devido respeito a toda autoridade e não fu-gir de sua responsabilidade de pagar os im-postos adequadamente, pois é com eles que os governantes podem oferecer vida digna a todos os cidadãos por meio de saúde, educação e segurança, entre outros fatores.

BioéticaSim às pesquisas, desde que pro-movam a vida e o bem-estar hu-

mano em todas as suas dimensões

Como qualquer outra classe profissional, a classe médica também tem como compromisso primordial a vida. Para isso, mais do que nun-ca há um aprimoramento nas pesquisas médicas, concentrando-se em especial na área da genéti-ca. O cristianismo não se opõe de forma alguma às pesquisas que respeitam a vida humana e que desenvolvem práticas de defesa da vida e estu-dos que visam evitar a evolução de doenças, bem como propiciar melhorias físicas e mentais aos seres humanos.

Duas situações complexas:• A manipulação genética de plantas e

animais – Parece-nos que isso já é feito numa escala muito maior do que possamos imaginar. A alegação da melhora das espé-cies tem tido como fundamento, de forma geral, razões de ordem econômica. É ver-dade que os resultados dessas manipula-ções ainda não são exatamente conhecidos pela população como um todo, embora se fale em melhora das espécies genetica-mente modificadas.

• A manipulação de seres humanos – O uso do princípio de manipulação gené-tica poderá também ser utilizado em seres humanos com vistas ao aperfeiçoamento genético. Os riscos são imprevisíveis, e as informações nesse campo são contraditó-rias e quase nunca esclarecedoras.

CasamentoA ética cristã entende que o objetivo básico

do casamento é criar as condições para vivermos a plenitude da vida e ajudarmos uns aos outros. Em vista disso, a família é considerada o centro da vida, escola de aprendizado das virtudes cris-tãs e espaço de construção de um ser humano que dignifica Seu criador.

Alguns atributos importantes do casamento são: é indissolúvel e vitalício (exceção se faz no caso de adultério), além de monogâmico. A fi-delidade mútua é preceito que os casais cristãos buscam cumprir por amor.

O amor no casamento revela-se de muitas formas: proteção, cuidado, compreensão, perdão, respeito ao outro e a sua história, atividade sexu-al, afetividade, amizade, companheirismo, con-fiança, entre outras. Acrescentemos uma obser-vação: no casamento não há espaço para o ciúme. Ele não apenas inibe, mas destrói o amor.

Aqui, como em outros casos, é preciso com-preensão por parte do cristão com todos os que, por diversas razões, não conseguem desenvolver as virtudes cristãs do casamento nem conseguem até mesmo manter seu casamento e se separam, buscando em uma segunda união a possibilidade de uma vida melhor.

Para refletir:

Machado de Assis (foto de 1890) Em 1899 publica Dom Casmurro, história entre Bentinho e Capitú. Afinal houve adultério de Capitú ou apenas cenas de ciúme de Bentinho?

O ciúme inibe e destrói o amor.

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Na temática do casamento, há uma contro-vérsia candente: a da união de homossexuais. O cristianismo entende que a família formada pelo casamento é entre um homem e uma mulher. Aqui, também é preciso buscar a compreensão de que nem todos são cristãos e as pessoas agem movidas por razões diferentes. Ao Estado com-pete regular essas relações na medida em que percebe que é preciso tirar da ilegalidade tais re-lações e dar-lhes o caráter de legalidade.

Controle da natalidadePara cristãos casados: controle da natalidade. Para cristãos sol-

teiros: castidade.

A fim de não causar nenhum mal-estar, é preciso fazer um registro: o tema do controle da natalidade dirige-se aos casados, uma vez que aos solteiros, ainda que em tempos de liberali-dade sexual, a ética cristã prescreve a castidade.

Os casados possuem plena liberdade de es-colha do método que irão utilizar para o controle da natalidade: controle dos dias férteis da mu-lher, uso de preservativo, diafragma, espermicida vaginal, pílula anticoncepcional a conselho mé-dico, vasectomia, laqueadura. Para o cristão, não se admite como forma de controle da natalidade a abstinência sexual. Uma advertência se faz com relação ao dispositivo intra-uterino (DIU): ele age contraceptivamente, ou seja, quando já ocor-reu a concepção.

Como nossa sociedade é plural e parte dela não segue os princípios cristãos, é necessário ha-ver regulamentações para se evitarem os exces-sos. Assim, entendemos que as pessoas precisam não apenas de informações capazes de as orien-tar, mas também de mecanismos capazes de lhes permitir uma vida minimamente sadia, física e mental. Para as pessoas, solteiras ou casadas, que mantêm relações sexuais casuais ou com cons-tante troca de parceiros é recomendável o uso de mecanismos de controle da natalidade.

InseminaçãoO cristão evitará inseminação heteróloga e o uso de mãe-de-

aluguel.

Não há muito o que discutirmos em relação a esse tema se considerarmos a inseminação in vitro e a fecundação obtida com óvulo e esperma do casal (inseminação homóloga). As dificul-dades no tema se acentuam, no entanto, quando levamos em conta a inseminação heteróloga, ou seja, que é realizada com óvulos ou espermas de pessoas que não são parceiros.

No mesmo patamar de discussão está a ma-nipulação de óvulo fecundado para ser recebido por uma mãe-de-aluguel, aquela que se prontifi-ca a abrigar em seu útero o feto de outros pais.

Os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostra que o país está enve-lhecendo. A taxa de fecundidade da população em 2006, de dois nascimentos por mulher, é a menor já registrada pelo IBGE, caindo ao nível do limite da reposição. Assim como o número de filhos e a parcela mais jovem da população apresentaram queda, a faixa de pessoas com 60 anos ou mais cresceu em todas as regiões.

CADA VEZ MENOS FILHOS: Segun-do IBGE, a taxa de fecundidade baixa a cada ano.1940 6,2 nascimentos/mulher

1950 6,2 nascimentos/mulher

1960 6,3 nascimentos/mulher

1970 5,8 nascimentos/mulher

1980 4,4 nascimentos/mulher

1991 2,9 nascimentos/mulher

2000 2,3 nascimentos/mulher

2006 2,0 nascimentos/mulher

PNDA 2006

IBGE: TAXA DE NATALIDADE NO BRASIL CONTINUA CAINDO

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AbortoO tema tem, recorrentemente, voltado à dis-

cussão. Para o cristão, está claro que o aborto é homicídio e por uma única razão: a vida começa na concepção. Há, porém, outros que assumem

outras perspectivas em que se aceita o aborto, alegando a vergonha social de ser mãe solteira e vítima de estupro, ameaça ao equilíbrio econô-mico da família, possibilidade de o feto ter ano-malias ou razões semelhantes. Para essas pesso-as, pensamos que devam existir leis que regulem

É uma das alternativas médicas para realizar a fecundação. Ela é adotada somente nos casos em que há dificuldade para engravidar natural-mente. Há dois tipos de inseminação: de esper-matozóides e de embrião.

A inseminação de espermatozóide ocorre da seguinte forma: no laboratório, o esperma é re-tirado e logo após há uma seleção dos melho-res espermatozóides, esses serão injetados no útero da mulher no período da ovulação. Essa forma de inseminação é utilizada nos casos em que o homem não possui uma produção satis-fatória de espermatozóides ou quando estes não têm uma boa capacidade de locomoção. Também pode ser usado quando o muco cer-vical da mulher não permite a locomoção dos espermatozóides na entrada do útero.

Já a inseminação de embrião ocorre da seguin-te maneira: o óvulo da mãe é colhido, fecunda-do fora do corpo (in vitro) com sêmen paterno e recolocado no útero, gerando assim o bebê de proveta. Essa técnica é utilizada quando a mulher faz ligamento de trompas e depois se arrepende ou quando tem endometriose.

Fonte: www.forum.brasilescola.com

Infográfico: Arquivo ULBRAEAD

Como é feita a inseminação artificial:Ar

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o restabelecimento de ações sociais equilibradas, especialmente em razão da prática de aborto clandestino.

Mesmo não concordando com o aborto, o cristão irá esmerar-se no cuidado daqueles que o praticam.

Na relação com aqueles que são favoráveis ao aborto, é importante registrar que o cristão deve respeitar a decisão pessoal do outro e ajudá-lo a viver da melhor forma possível.

EutanásiaO termo significa “boa morte”, “morte sere-

na”, isto é, abreviar serenamente a vida de quem sofre doença incurável.

Alguns países já tratam legalmente do tema. Na Holanda, a legislação aderiu à eutanásia por solicitação de um paciente. Na Inglaterra, a justi-ça já permitiu o pedido de eutanásia de uma pes-soa tetraplégica. Nos Estados Unidos, o chamado “Dr. Morte” (auxiliava os doentes, por meio de uma máquina, a auto-administrarem uma dose le-tal) cumpriu pena de prisão pelo uso da máquina da morte. No Brasil, a discussão existe, mas não há lei que regule o assunto.

A ética cristã é contra a eutanásia pela sim-ples razão de que a vida pertence ao seu criador, Deus.

O tema, no entanto, é complexo. Estaria en-quadrada como eutanásia a suspensão de medi-camentos, de alimentação ou de aparelhos para sustentar de forma artificial uma vida aparente-mente sem meios de voltar à normalidade? Pro-longar artificialmente uma vida não seria impe-dir que o curso dado por Deus àquela pessoa siga seu termo?

Aqui, mais uma vez, cabe ao cristão evitar o juízo condenatório, mesmo não concordando com a prática da eutanásia.

Para refletir:Tão importante quanto viver bem é morrer bem!

Pena de morteO espírito de vingança (“olho por olho e dente por dente”) não cabe

nos princípios da ética cristã.

Embora já adotada em outros países, a pena de morte é tema que volta sempre à tona entre nós, especialmente em tempos de extrema vio-lência. Há dois grupos que discutem o tema: os chamados legalistas, que exigem a pena de mor-te, e os pacifistas, que defendem outros mecanis-mos como forma de penalizar criminosos.

Tanto um grupo quanto o outro se esmeram em buscar razões capazes de justificar suas op-ções. Quanto ao cristão, entretanto, que se aplica ao exercício da ética cristã, sua posição é con-

Recomendação de leitura:

Autor: Gonzalo Miranda

A idéia de que alguém que deseja morrer pode ser auxiliado para que tal ato se concretize, é uma posição que supõe ser o homem o padrão absoluto de sua própria vida. Mas esta atitude é eticamente aceitável? Este é o ponto central discutido neste livro.

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trária por entender que Deus é o Senhor da vida e da morte, que mesmo criminosos são alvos do amor de Deus e merecem ser vistos como “o nos-so próximo” e, ainda, que por eles devemos zelar.

Ecologia

Usar a natureza, sim!Abusar da natureza, não!

O reino de Deus inclui todas as suas cria-turas, inclusive o cosmos. O universo é criatura

divina e compete ao filho de Deus conservá-lo. Buscar a preservação do universo é manifestação do amor, como princípio ético. A conservação só será possível com mudanças de rumo do ser humano. Deixar de lado a cobiça e o egoísmo é imprescindível.

O cristão concentra sua luta ecológica no controle da maldade humana: o grande destrui-dor da harmonia cósmica. A ética cristã não leva o cristão a ser contra o uso da natureza, e sim contra o abuso que a maldade humana promove contra a natureza e, por conseqüência, contra toda a humanidade e o universo, criaturas divinas.

Mapa da pena de morte no mundo:

Mapa da intervenção do homem na natureza:

Fonte: Portal Caiu a Ficha

Fonte: Wikipedia

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