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Anais do X Seminário de Ciências Sociais - Tecendo diálogos sobre a pesquisa social Universidade Estadual de Maringá | Departamento de Ciências Sociais 22 a 26 de Outubro de 2012 71 CULTURA E NATUREZA: A EMERGÊNCIA DAS NOVAS SENSIBILIDADES NO SÉCULO XIX Rafael Ferreira Silva; Carolina Steinke Xavier; Rosana Steinke 1 Graduando Licenciatura em Letras-Francês – UEM 2 Graduanda em Comunicação e Multimeios – UEM 3 Professora Orientadora. Docente do DHI (Departamento de História - UEM) Licenciada em História e Mestre em Arquitetura e Urbanismo (USP) Pesquisadora do CEAPAC(Centro de Estudos das Artes e do Patrimônio Cultural-UEM) Resumo: A aproximação entre a história, literatura e pintura é um campo que oferece interessantes perspectivas para a pesquisa nas ciências humanas. Este é o caso do final do XIX e começo do século XX na Europa, período de importantes registros acerca da transformação da paisagem e como esta foi sendo redimensionada simbolicamente. Tais aspectos podem ser observados em autores como Thomas Mann nas obras como Morte em Veneza e A montanha mágica. A pintura de Monet também se apresenta repleta de representações sobre as estações do ano e as paisagens das diferentes regiões da França contemplando o campo, à beira-mar ou a montanha. Os numerosos sítios e itinerários que fizeram parte deste repertório e que invocou o universo dos impressionistas, bem como a literatura, estão ligados a uma mudança de hábito e práticas culturais em relação à natureza que começa a se delinear a partir do final do século XVIII. Começa-se a perceber a natureza como uma aliada dos malefícios de doenças do corpo e da alma e teorias acerca da profilaxia são difundidas e colocadas em prática. Os jardins e as montanhas, antes antíteses de lugares pútridos, revestem-se de virtudes e tornam-se locais de uma busca múltipla ; novos códigos trazem um conjunto de preceitos higiênicos que tem por finalidade a satisfação narcisista. Estabelecer uma breve comparação entre a literatura de Thomas Mann e duas obras de Monet a partir do olhar sobre a natureza colocada nas mesmas é o intuito este artigo. Palavras-chave: Literatura; História; Cultura. 1 3 2

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Anais do X Seminário de Ciências Sociais - Tecendo diálogos sobre a pesquisa socialUniversidade Estadual de Maringá | Departamento de Ciências Sociais

22 a 26 de Outubro de 201271

CULTURA E NATUREZA: A EMERGÊNCIA DAS NOVAS SENSIBILIDADES NO SÉCULO XIX

Rafael Ferreira Silva; Carolina Steinke Xavier; Rosana Steinke

1 Graduando Licenciatura em Letras-Francês – UEM

2 Graduanda em Comunicação e Multimeios – UEM

3 Professora Orientadora. Docente do DHI (Departamento de História - UEM)Licenciada em História e Mestre em Arquitetura e Urbanismo (USP)Pesquisadora do CEAPAC(Centro de Estudos das Artes e do Patrimônio Cultural-UEM)

Resumo: A aproximação entre a história, literatura e pintura é um campo que oferece interessantes perspectivas para a pesquisa nas ciências humanas. Este é o caso do final do XIX e começo do século XX na Europa, período de importantes registros acerca da transformação da paisagem e como esta foi sendo redimensionada simbolicamente. Tais aspectos podem ser observados em autores como Thomas Mann nas obras como Morte em Veneza e A montanha mágica. A pintura de Monet também se apresenta repleta de representações sobre as estações do ano e as paisagens das diferentes regiões da França contemplando o campo, à beira-mar ou a montanha. Os numerosos sítios e itinerários que fizeram parte deste repertório e que invocou o universo dos impressionistas, bem como a literatura, estão ligados a uma mudança de hábito e práticas culturais em relação à natureza que começa a se delinear a partir do final do século XVIII. Começa-se a perceber a natureza como uma aliada dos malefícios de doenças do corpo e da alma e teorias acerca da profilaxia são difundidas e colocadas em prática. Os jardins e as montanhas, antes antíteses de lugares pútridos, revestem-se de virtudes e tornam-se locais de uma busca múltipla ; novos códigos trazem um conjunto de preceitos higiênicos que tem por finalidade a satisfação narcisista. Estabelecer uma breve comparação entre a literatura de Thomas Mann e duas obras de Monet a partir do olhar sobre a natureza colocada nas mesmas é o intuito este artigo.

Palavras-chave: Literatura; História; Cultura.

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Anais do X Seminário de Ciências Sociais - Tecendo diálogos sobre a pesquisa socialUniversidade Estadual de Maringá | Departamento de Ciências Sociais

22 a 26 de Outubro de 201272

RAFAEL FERREIRA SILVA; CAROLINA STEINKE XAVIER; ROSANA STEINKE

A aproximação entre a história, literatura e pintura é um campo que oferece interessantes perspectivas para a pesquisa interdisciplinar. Neste artigo abordar-se-à especificamente o aspecto da paisagem e sua transformação a partir do conceito de natureza domesticada que vai se estabelecendo na Europa, principalmente na Inglaterra e França, a partir do século XVI e toma contornos mais nítidos no século XIX. Pensando nas distintas concepções de natureza ao longo do tempo, usado para legitimar diferentes conceitos, pode-se apontar que esta, longe de uma neutralidade, também carrega em si os aspectos simbólicos da conjuntura do processo histórico que a precede. Desde o Renascimento a curiosidade e a “redescoberta” da natureza, amparada pela esfera cientificista, se manifesta como uma construção de um discurso sobre a mesma no qual dificilmente se difere a emergência das ciências naturais e as práticas culturais que vão amorfoseando os hábitos de determinadas classes sociais.

Como ressalta Burke (2000), a cultura pode ser compreendida como toda esfera de criação humana relacionada com seu lugar social de produção e suas variáveis, como a economia e a política. A partir de Guinzburg (1987 e 1989)e suas noções de cultura popular e circulariedade cultural e também da história cultural trabalhada por Chartier (1990) e seus conceitos de representação e apropriação, ou mesmo da contribuição da historiografia inglesa de Thompson (2005) levando em conta os movimentos sociais e o cotidiano das classes trabalhadoras, há elementos para elaborar um diálogo entre a cultura e suas práticas. Para estes historiadores, levando-se evidentemente em conta os debates específicos que os cercam, ainda que não serão tratados mais demoradamente aqui, a história cultural, as relações econômicas, sociais e mentais são campos de práticas e produções culturais.

Neste aspecto, podemos citar as práticas que envolvem todo o espaço da experiência vivida e a cultura permite ao indivíduo pensar essa experiência, ou seja, criar as formulações da vivência, conforme apontam Burke e Guinzburg. Se a atribuição de valores num determinado contexto é simbolicamente fator de identidade, e toda cultura é cultura de um grupo, pode-se dizer que história é ao mesmo tempo e indissociavelmente social e cultural.

Este é o caso do final do XIX e começo do século XX na Europa, rico em registros acerca da transformação da paisagem e como esta foi sendo redimensionada simbolicamente. Tais aspectos podem ser observados na obra de inúmeros autores consagrados pela literatura deste período. Como exemplo podemos citar Thomas Mann nas obras como Morte em Veneza e A montanha mágica. Nas duas referidas obras, publicadas respectivamente em 1912 e 1924, a visão da natureza que se estabelece está intimamente imbricada com o processo de mudança na concepção desta, antes tida como algo distante e selvática e que vai, ao longo dos século XVII e XVIII, criando vínculo baseados na simpatia. Thomas (1996) e Corbin(1989) exploram essa mudança de atitude diante da natureza e dos animais. Thomas fala sobre os pressupostos que fundamentaram as percepções dos ingleses no início da época moderna perante os animais, plantas e paisagem física, mostrando como se acentua o predomínio do homem sobre o mundo

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natural. Na obra dos referidos autores a abordagem mostra que este desenvolvimento da história natural não está voltada meramente para uma exposição detalhada da natureza, com relatos sobre as plantas e descrição de animais selvagens, mas também para a criação de um novo sistema de classificação da história natural.

Ela está presente em diferentes formas de expressão enas novas sensibilidades que emergem a partir do século XVIII. Exemplo disso é a obra A montanha mágica, Thomas Mann, repleta de descrições do espaço e no deslocamento do personagem para um lugar desconhecido e que vai tomando ares de um novo território que se descortina, trazendo a amplidão, o convite ao devaneio. Ao ingressar na nova paisagem o personagem ingressa em outro mundo, no qual o entorno é desconhecido. Embora trate do tema da morte, é a força da natureza e sua sedução – a conotação do espaço - que constói a narrativa, contribuindo fortemente para a experiencia catártica do leitor.

Pode-se dizer que a obra de Thomas Mann tem como significação primeira o conceito de tempo que é apreendido de forma diferente nas montanhas e principalmente no sanatório onde se passa a narrativa descrita pelo autor, fazendo uma alusão à sociedade burguesa e suas práticas culturais em relação ao espaço e à natureza.

Na Europa do século XIX, a partir do conjunto da obra inúmeros pintores, podemos destacar Édouard Manet como um representante desta narrativa na linguagem pictórica. Um exemplo disso é quando este retrata pessoas sentadas em barcos nos arredores de Paris, em 1872; a o opção era por barcos de passeios e não barcos a vapor que já existiam e eram usados tanto para fins industriais quanto com propósitos recreativos. Embora adquirir um veleiro ou um barco a vapor eram possíveis apenas para os chamados jovens de fortuna1 pode-se dizer que, assim como o curismo, a prática turística também chega às classes menos abastadas. A identificação dos passeios de barco com as chamadas classes média e baixa, que costumavam passar as tardes de domingo subindo e descendo o Sena já pode ser observada e foi largamente retratada nas artes plásticas e na literatura (FRANSCINA et alii, 1993). Édouard Manet, contemporâneo de Claude Monet, um dos principais pintores impressionistas, difere deste último por retratar as mesmas paisagens, mas deixando implícita em sua obra uma natureza já não intocada, com nuances de industrialização que se fazia presente nas peças da ponte ferroviária, na fumaça de uma chaminé, entre outros exemplos que podem ser citados aqui. A diferença entre os dois é que se observa no quadro de Manet uma justaposição, ou mistura, de códigos sobre o moderno (FRANSCINA et alii, 1993: 121).

Os impressionistas vão pintar a impressão primeira2, como diz o próprio epíteto, retratando o fugaz e o efêmero. Se, por um lado, a industrialização se fazia presente e descartava tudo que era feito à mão, pode-se dizer que com a produção em grande escala surge

1 Grifo nosso.

2 Grifo nosso.

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também o inacabado e o descartável. Com o surgimento do mundo industrial e do efêmero, os impressionistas são considerados como artistas de obras em aberto pelo fato de deixarem pairar sobre as mesmas alguma dúvida sobre o tema pintado. Mais sugerindo do que reproduzindo a natureza, buscam na luminosidade o foco principal de suas experiências. No entanto, nesta busca intensa pelas cores e suas mudanças, a irisação e a mistura ótica das matizes, eles também se tornam inovadores na forma e no conteúdo.

Nas obras retratadas por Monet pode ser observado o reflexo da luz solar formando um espelho, imagens turvas da passagem da escuridão para a luz, denotando ao longo do tempo o aperfeiçoamento do pintor na mistura das cores sobre a tela e de sobreposição de tons criando o efeito de distorção e movimento. Em sua obra os desenhos não têm contornos, havendo um deslocamento de foco visual do desenho para as cores. A técnica impressionista não preenchia os desenhos com cores, mas as deixava justapostas. Além disso, o contraste do claro-escuro em voga anteriormente, foi substituído pela relação entre tons complementares, com o uso de tonalidades muito próximas, representando as figuras humanas apenas pela silhueta e aproveitando a visão dos objetos à luz do sol nascente para deixar sua imagem refletida na água, como se fosse uma metáfora.

Vivendo em Giverny, na região da Normandia, Monet cultivou um enorme jardim que foi tema de inúmeras obras do pintor. O jardim recebia cuidados pessoais do pintor e nele havia uma ponte (influência da arte japonesa), plantas aquáticas e uma região à margem do lago cercada por salgueiros, íris e outras arcos de rosas.

Pintado entre 1892 e 1898 o quadro Jardim de Monet em Giverny (1900) revela os traços citados anteriormente e as sutis e arrojadas pinceladas do autor, dando à obra o movimento, forma e volume às águas, a alternância entre cores puras e mistas e os reflexos da cena.

Já em Terraço em Sainte-Adresse (1867), Monet apresenta um cenário tipicamente burguês. Neste quadro o pintor retrata sua família no terraço da casa de uma tia, em frente ao mar. O jardim está em primeiro plano, bem como a balaustrada. O pintor utiliza o efeito colorido das sombras e cores que contrastam entre si (vermelho e verde). A sombra das pessoas, os objetos e plantas estão presentes no quadro que mostra um dia de sol e vento, percebido pelas águas encrespadas e o tremular de bandeiras.

Se em Argentuil o pintor exploraria aquilo que mais marcou sua obra, ao retratar os gerânios e papoulas com a mesma cor ou cores próximas, estas características já podem ser obervadas no quadro referido acima, datado da época em que o artista ainda era jovem. A pintura ao ar livre, cujas pinceladas sugerindo metáforas ao retratar o mar com suas ondulações, sugere uma obra repleta de representações sobre as estações do ano e as paisagens das diferentes regiões da França contemplando o campo, à beira-mar ou a montanha.

Os numerosos sítios e itinerários que fizeram parte deste repertório e que invocou o

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universo dos impressionistas, bem como a literatura de Thomas Mann, são expressões artísticas mas também estão ligados a uma mudança de hábito e práticas culturais em relação à natureza que começa a se delinear a partir do final do século XVIII e vai se acentuando ao longo do século XIX, conforme nos mostram os estudos de Corbin e Thomas. Começa-se a perceber a natureza como uma aliada dos malefícios de doenças do corpo e da alma e teorias acerca da profilaxia são difundidas e colocadas em prática. Os jardins e as montanhas, antes tidos como lugares pútridos, revestem-se de virtudes e tornam-se locais de uma busca múltipla.

Conforme Chartier, os novos códigos trazem um conjunto de preceitos higiênicos que tem por finalidade a satisfação narcisista. Na pintura de Monet, bem como de alguns outros pintores deste período, é possível apontar o delineamento do moderno. Por “moderno” entendemos as novas práticas sociais, tanto na “arte erudita” como na “cultura de massas”, que se enagajavam nas experiências da vida moderna. Esse engajamento era às vezes crítico, às vezes comemorativo, às vezes irônico (FRASCINA, 1993: 127). Apesar de alguns autores apontarem a ênfase dado às questões técnicas e formais na prática de Monet, os aspectos sociais estão codificados em todos seus quadros, na relação inseparável entre o método de pintura e o que é pintado (FRASCINA, 1993: 128-129). Ainda que talvez este tenha evitado o realismo crítico de Manet, nem por isso deixou de representar as formas objetivas de recreação burguesa que também refletem na própria escolha de temas dos novos artifícios estéticos, a concepção da arte como unicamente um campo de gozo individual, alcançando, talvez um grau ainda desconhecido da arte, como sugere Schapiro (2002). São estas condições de sensibilidade, intimamente ligadas às do passeante urbano e do consumidor refinado de artigos de luxo, que nos remetem aos clássicos literários como Baudelaire (1988) ao falar da experiência moderna, do transitório e do fugidio, tão característico ao século XIX.

Estabelecer uma breve comparação entre a literatura de Thomas Mann, a partir de breves observações sobre a obra A montanha mágica, e os dois quadros de Monet (Terraço e Os jardins de Monet em Giverny), buscando contextualizar o olhar sobre a natureza colocada nas referidas obras por seus respectivos autores, é o intuito desta reflexão. Pensamos a história cultural não como monopólio dos historiadores. É multidisciplinar, pois se faz com invasões de fronteira e território comuns com a história literária, a arte e antropologia, tomando emprestados seus conceitos.

Importantes estudos sobre o impressionismo enfatizam o engajamento permanente de artistas, incluindo Monet, em temas urbanos e suburbanos, mas principalmente mostrando que a pintura impressionista como uma arte da paisagem, da luz e da atmosfera, falseia a variedade de obras associadas ao movimento e, ao mesmo tempo, encobre um mundo de problemas do qual essa obra emerge. Por isso, considera-se oportuno tratar este tema, relacionando-o com a emergência das novas sensibilidades ao longo do século XIX. Para Schapiro (2002) na visão dos impressionistas havia algo não convencional e indisciplinado. Na descoberta de

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um mundo fenomenal e ao ar livre em constante mudança do qual as formas dependiam da posição momentânea do espectador casual havia uma crítica implícita às formalidades sociais e domésticas simbólicas, ou pelo menos uma norma oposta a elas (FRASCINA, 1993: 181).

Como se nota, os processos estabelecidos a partir da História Cultural envolvem a relação que se estabelece entre a história dos textos, a história dos livros e a história da leitura, conforme assinala Chartier. Tais reflexões nos levam a pensar o campo da historiografia e suas nuances como um discurso acerca da realidade, e sobre como o historiador exerce o seu ofício para compreender tal realidade. Neste aspecto, os estudos da História Cultural, amparados no trabalho de Chartier, possibilitam que se tenha uma postura frente aos métodos, temas e fontes eleitos para se estudar num diálogo frequente e fértil com outras áreas.

Chartier afirma que não há uma relação unilateral, e sim, dialética, entre realidade social e representações estéticas, na medida em que uma determina a outra. Para este autor é necessário inverter os termos habituais da relação entre realidades sociais e representações estéticas, pois estas não representam diretamente uma realidade já presente e constituída, mas contribuem com sua produção e possivelmente com mais força do que as outras representações desprovidas de poder de ficção.

Da mesma forma, vemos a relação entre literatura e outras artes, confirmando a perspectiva de Chartier, em um âmbito que trava uma negociação com o mundo social e não apenas como uma troca, pois só olhando para a literatura e a pintura como fonte historiográfica rica em dispositivos para o olhar do historiador, que a obra de arte se torna compreensível.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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CULTURA E NATUREZA: A EMERGÊNCIA DAS NOVAS SENSIBILIDADES NO SÉCULO XIX

FRASCINE, Francis; BLAKE, Nigel; FER, Briony; et al. Modernidade e modernismo: a pintura francesa no século XIX. São Paulo: Cosac & Naify, 1993.

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GUINZBURG, C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Cia. das Letras, 1989.

GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Rio de Janeiro: LTC, 1999.

MANN, T. A montanha mágica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

MANN, T. A morte em Veneza. São Paulo: Abril Cultural, 1970.

SCHAPIRO, M. Impressionismo: reflexões e percepções. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural. São Paulo: Cia das Letras, 1996.

THOMPSON. E. P. Costumes em Comum. Estudos Sobre a Cultura Popular Tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

WILLIAMS, R. O campo e a cidade: na história e na literatura. São Paulo: Companhia das Letras, 2011