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    COSTA, Julie Hanna de Souza Cruz; SILVA, Marcos de Ara-jo. Matrizes da violncia e do sofrimento na formao social

    do Brasil contemporneo: uma revisitao crtica da obra OPovo Brasileiro de Darcy Ribeiro.RBSERevista Brasileira

    de Sociologia da Emoo, v. 15, n. 43, p. 63-76, abril de 2015.ISSN: 1676-8965.

    ARTIGO

    http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html

    Matrizes da violncia e do sofrimento na formao social doBrasil contemporneo

    Uma revisitao crtica da obra O Povo Brasileiro de Darcy Ribeiro

    Matrixes of Violence and suffering in the social formation of contemporary Bra-

    zil: a critical revisiting of the work of Darcy Ribeiro's The Brazilian People

    Julie Hanna de Souza Cruz e Costa

    Marcos de Arajo Silva

    Recebido em: 28.12.2015Aceito em: 30.01.2016

    Resumo:Este artigo procura investigar as algumas matrizes scio-histricas da violncia edo sofrimento na formao social do Brasil no intuito de analisar os limites e as possibili-dades que a clssica obra O Povo brasileiro de Darcy Ribeiropode oferecer para compre-ender a conjuntura de violncia que padece a sociedade brasileira desde os tempos coloniaisat a contemporaneidade. Alm de evidenciarmos as pertinncias, as descontinuidades e asfragilidades da teoria ribeiriana, acrescentamos um pouco do aparato terico das teoriasps-coloniais latino-americanas no intuito de vislumbrar em que medidas os subsdios epis-temolgicos oferecidos por Ribeiro nesta sua clssica obra podem ser concatenados s pre-ocupaes reflexivas de tericos como Anbal Quijano, Walter Mignolo e Ramn Grosfo-guel. Por fim, o artigo oferece algumas perspectivas analticas sobre como a revisitaodesta obra clssica das cincias sociais brasileiras (assim como de outras) pode ser profcua,desde que seu resgate seja circunscrito por uma hermenutica que considere tanto aspec-tos sincrnicos quanto diacrnicos, assim como por reflexividades crticas. Palavras-chave: violncia, sofrimento, Darcy Ribeiro, ps-colonialidade

    Primeiras Palavras

    Nestes tempos de contnua trans-formao, novas reflexes e questiona-mentos sobre a realidade nacional, ou astantas realidades nacionais, so instiga-dos (Veloso & Tavolaro, 2011); nelessomos levados continuamente a(re)pensar os caminhos e descaminhos

    da sociedade da qual fazemos parte,assim como seus rumos, tanto os poss-

    veis, quanto os desejados. Comum emtal processo , sobretudo entre cientistassociais, o resgate de pensadores e obrasclssicas1, os quais cederam solues

    1Segundo Jeffrey Alexander (1999, p. 24), porclssico entende-se o resultado do primitivoesforo da explorao humana que gozadestatusprivilegiado em face da explorao

    contempornea no mesmo campo. O conceitodestatusprivilegiado significa que os modernoscultores da disciplina em questo acreditam

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    para questes de nosso tempo (ibidem;Bastos, 2002). Esses pensadores e suasobras so, segundo Veloso e Tabolaro(2011, p. 2), uma base de apoio segura

    e verdadeiramente repleta de insights;

    so fonte de recursos e ferramentasimprescindveis s tentativas de deslin-dar os velhos e novos dilemas.

    No Brasil, Darcy Ribeiro foraum desses pensadores relevantes 2, este,como os demais de seu tempo dentreeles Srgio Buarque de Holanda e CaioPrado Junior, envolvido no projeto deconstruo de uma nao autnoma(Peirano, 1992 apudMiglievich, 2011),assim como naquele de construo de

    grandes ensaios interpretativos sobre opas (Martins, 2006). Srgio Buarque deHolanda escreveu sobre as Razes do

    Brasil (2001) e props uma identifica-o dos alicerces do que ramos e so-mos atravs da figura do homem cordi-al. Caio Prado Junior, por sua vez, es-crevera a Formao do Brasil Contem-

    porneo(1999), sntese do nosso passa-do colonial e do que, deste passado,marcara nosso destino at ento, sobre-

    poder aprender tanto com o estudo dessa obraantiga quanto com o estudo da obra de seuscontemporneos [...]; essa deferncia se faz semprvia demonstrao.2Segundo Miglievich (2011), Darcy teria umindiscutvel estatuto nos crculos universitrioslatino-americanos. No Brasil, contudo, seu re-conhecimento ainda seria superficial e dotadode preconceitos. Helena Bomeny (2001, p. 25apudMiglievich, 2011, p. 29) discorrera sobreas dificuldades da incluso do nome de Darcycomo intrprete do Brasil no compndio dopensamento social brasileiro. Segundo a auto-ra, eleger Darcy Ribeiro fonte de interesse einvestigao acadmica um desafio. Se h umrazovel consenso a respeito de Darcy a difi-culdade de tratar esta figura intelectual e pblicasem controlar passo a passo as muitas impres-ses apaixonadas, nada imparciais, que sempreprovocou quer de seus fiis admiradores, querdos que sobre ele mantinham as maiores restri-es. De acordo com a autora, isso gerara um

    ofuscamento de sua produo intelectual. Paramais elementos deste debate, ver Bomeny(2001), Darcy Ribeiro: Sociologia de um indis-ciplinado.

    tudo no que tange ordem econmicamundial. No contexto das transforma-es sociais e polticas do sc. XX noqual Darcy e seus contemporneos atua-ram, era uma inteno central de parte

    das elites intelectuais brasileiras des-vendar o que ramos e para aonde ira-mos (Martins, 2006).

    Antroplogo formado na Escolade Sociologia e Poltica de So Paulo,Darcy Ribeiro empreitou, ao longo desua vida, dentre outros aspectos, comocolocara Miglievich (2011c, p. 28), e-laborar uma teoria sobre o humano esobre as variantes do humano e melho-rar o discurso dos homens sobre os ho-

    mens. No que tangeria especificamente sua ltima obra intitulada O Povo

    Brasileiro: A Formao e o Sentido do

    Brasil (1995), por sua vez, obra estaque encerra o ciclo de trinta anos dereflexo do autor, assim como sua sriede seis livros intitulada Estudos da An-tropologia da Civilizao (Miglievich,2011a, 2011b) nela Ribeiro buscouuma teoria geral sobre o Brasil, cuja luznos tornasse explicveis em nossos pr-

    prios termos e que fosse fundada emnossa experincia histrica (Ribeiro,1995).

    Nesta obra, sobre a qual nos de-bruaremos no presente ensaio sobre asmatrizes da violncia e do sofrimento naformao social do Brasil, Ribeiro apre-senta, - em oposio ao equilbrio deantagonismos de Gilberto Freire (2001)

    proposto em Casa Grande & Senzala, -

    um contnuo de violncias em nossahistria. Nela, Ribeiro buscou uma lei-tura bastante particular sobre a forma-o social do Brasil e seu povosegun-do ele, um novo gnero humano frutode um atroz processo de fazimento

    (1995, p. 20). Nesse sentido, buscandoafastar-se de qualquer essencialismo emsua anlise, afirma que foi exatamente a

    partir da crueldade desse processo defazimentoe do aniquilamento das gen-

    tes, dialeticamente, que teria ganhadovida o povo brasileiro, do qual a misci-

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    genao seria o fato indito (Miglievich,2011a, 2011b, 2011c).

    nesse horizonte interpretativode Darcy Ribeiro e tomando como basea obraem questo que buscaremos ana-

    lisar mais a fundo de que maneira, naperspectiva desse, a violncia e o sofri-mento3se colocam enquanto elementosformadores da sociedade brasileira. Paratanto, tomaremos como eixo explorat-rio, a princpio, duas modalidades deviolncia e sofrimento que se perpassama obra: a simblica e a fsica. A violn-cia simblica englobar as formas deopresso cultural e os epistemicdios(Santos, 2008)4; a violncia fsica, as

    formas de opresso do corpo e exterm-nio. Como bem colocara Pellegrine(2004, p. 16), inegvel que a violn-cia, por qualquer ngulo que se olhe,surge como constitutiva da cultura bra-sileira, como um elemento fundante a

    partir do qual se organiza a prpria or-dem social. De acordo com a autora,

    3Consideramos violncia, como o fez Pellegrini

    (2004, p. 16), o uso da fora para causar danofsico ou psicolgico a outra pessoa. J a noode sofrimento, entendemos a partir das contribu-ies de Arthur Kleinman e Joan Kleinman(1997), segundo as quais, trata-se do conjuntode experincias humanas advindas das forassociais e coercitivas em geral, especialmente agrande variedade de fenmenos tais como injus-tias, violncias fsicas e simblicas, intolern-cias e desigualdades que algumas esferas politi-cas, econmicas e institucionais infligem sobredeterminados indivduos e grupos sociais. Paraestes autores, o sofrimento social est direta-mente associado s relaes de poder (ou me-lhor, aos fatores socioeconmicos, raciais, mo-rais e religiosos que circunscrevem as relaessociais) e a dimenses como o gnero e o per-tencimento tnico, que vulnerabilizam aindamais indivduos que integram sociedades mar-cadas pelo racismo, pelo machismo e pelasdesigualdades sociais.4Segundo Boaventura de Sousa Santos (2008), anoo de epistemicdio remete aos processos deeliminao ou inferiorizao de diversas formasde conhecimento em favor de outras, considera-das mais adequadas ou convenientes no marcode uma dada conjuntura poltica ou estratgia depoder e dominao.

    nesse sentido, a histria do Brasil5 permeada por distintos matizes da vio-lncia, da qual a obra de Ribeiro nosajuda a tirar os vus.

    Em seguida, buscaremos, com

    base no panorama nacional atual, refle-tir sobre eventuais permanncias e alte-raes nos padres violentos e de sofri-mento identificados, no caso, sua for-mao e suas atuais e mais proeminen-tes configuraes. Nessa direo, aqui anoo deformaoextrapola o puro ato

    passado de formar, de dar forma, suge-rido pelo resgate das reflexes de Ribei-ro; ela, em verdade, transbordar no seusignificado mais contemporneo para

    que pensemos, em um tom ensastico, aprpria disposio e ordenamento deaspectos violentos no Brasil atual, essesresultantes de um longo processo, sobreo qual a obra do autor lanar luz. As-sim, o retorno a Darcy tambm pontode partida para deslindar alguns aspec-tos do hoje, possveis continuidades edescontinuidades histricas. Se esseexerccio no , portanto, apenas umretorno nostlgico a suas ideias, ele

    parte do reconhecimento de que, atravsde suas principais chaves interpretati-vas, algumas das nossas ansiedades decompreenso adquirem maiores possibi-lidades de alcanar xito.

    Desumanizao, deculturao e do-

    minaes

    Segundo Darcy Ribeiro, a uni-formidade cultural e a unidade nacional

    que so, sem dvida, a grande resul-tante do processo de formao do povo

    brasileirono devem ocultar as dispa-ridades, contradies e antagonismosque subsistem debaixo delas como fato-res dinmicos da maior importncia

    5Segundo a autora, essa caracterstica de nossaformao histria foi e continuamente trans-posta em nossas produes literrias. Para umadiscusso mais aprofundada sobre o tema, ver,por exemplo, Pellegrini No fio da Navalha(2004) e As vozes da violncia na cultura con-tempornea(2005).

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    para se pensar o Brasil. Tais uniformi-dade e unidade, de acordo com ele, re-sultaram de um processo contnuo eviolento de unificao poltica, postoem marcha mediante a supresso das

    identidades tnicas discrepantes e darepresso e opresso de toda tendnciade cunho separatista. Nessa direo,na perspectiva do autor, ao contrrio doque alegaria a historiografia oficial so-

    bre o Brasil, nunca faltou aqui, at seexcedeu em sua opinio, o apelo vio-lncia pela classe dominante como armafundamental para a construo da hist-ria. Em seus termos, seria inclusive pos-svel afirmar que tenhamos vivido, bem

    dizer, em estado de guerra latente (RI-BEIRO, 1995).

    No que tangeria a esse processode formao do povo brasileiro, ele sefez, para Ribeiro, pelo entrechoque deseus contingentes indgenas, negros e

    brancos, tendo sido, com dito, de ex-trema conflitualidade. Em seus termos,o prprio brasileiro haveria nascido, no

    processo de distino de suas matrizesoriginais, hostilizado e, tambm, hos-til. Diz ele:

    O mameluco rejeitaa me ndia que lhedeu a luz e ope-se aos irmos de sanguedas Amricas, ao mesmo tempo em que desconhecido por seu pai branco e bani-do entre os irmos de ultramar. Oprimidoe opressor, a contradio constri a iden-tidade dos brasilndios. (RIBEIRO, 1995,p.108, grifos nossos).

    Nesse longo processo de fazi-mento, a violncia primeira posta em

    marcha concerniu, segundo Ribeiro, auma verdadeira guerra bitica; aspestes mortais trazidas pelo coloniza-dor, causadoras de enfermidades desco-nhecidas pelos ndios, mais que as es-

    padas e os arcabuzes, foram as respon-sveis principais pelo aniquilamento das

    populaes nativas. Diz o autor que,embora minsculo, o grupelho re-cmchegado de almmar era supera-

    gressivo e capaz de atuar destrutiva-mente de mltiplas formas, principal-

    mente como uma infeco mortal sobrea populao preexistente, debilitandoaat a morte (p. 30, grifo nosso).

    Quando no findado pela atua-o fatal das pestes, esse encontro entre

    populaes nativas e colonizadores foramarcado por guerras armadas sem quar-teis, sem concesso de vida aos inimi-gos vencidos; as prprias crnicas colo-niais j escancaravam o carter grotescodos conflitos, com europeus armados decanhes e indgenas que contavam uni-camente com tacapes, zarabatanas, ar-cos e flechas. Entre a vida e a morte, dizRibeiro, os ndios de um lado e os co-lonizadores do outro punham todas as

    suas energias, armas e astcias(p. 49).Cada tribo (que hoje chamaramos degrupo tnico) pde, no entanto, ser ven-cida por esse inimigo pouco numeroso,

    mas superiormente organizado, tecnolo-gicamente mais avanado e, em conse-quncia, mais bem armado (ibidem).

    Aos poucos nativos que sobra-ram desse processo atroz, muitos delesaprisionados e escravizados, coube, porfim, todo tipo de sofrimento e violnciatnica imposta pela transfigurao colo-nizadora, que pde dizimar populaesretirandolhes o desejo de viver (p.258). Segundo Ribeiro, povos indgenasse deixaram morrer por no desejar avida que se lhes ofereciam (ibidem).

    Nesse aspecto, estaria em jogo o ethosdas populaes, que, uma vez quebrado,as dissuade de lutar para sobreviver namedida em que poderiam fazlo6. Ao

    resumir todo esse processo, diz o autor:

    6Apesar dessa afirmao do autor, importantefrisar sua nfase em resistncias, que foramsempre acuadas com as mais duras represses.Essas resistncias configuram inclusive o car-ter contnuo e truculento dos processos violen-tos no processo da nossa transfigurao tnica.Sobre estratgias de resistncias, ele cita, porexemplo, as fugas. Cita tambm Palmares comoum caso exemplar, o qual continha tambm umprojeto de sociedade na forma do igualitarismoe da economia solidria.

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    Conforme se v, a populao original doBrasil foi drasticamente reduzida por umgenocdio de projees espantosas, quese deu atravs da guerra de extermnio,do desgaste no trabalho escravo e da vi-rulncia das novas enfermidades que os

    achacaram. A ele se seguiu um etnocdioigualmente dizimador, que atuou atravsda desmoralizao pela catequese; dapresso dos fazendeiros que iam se apro-priando de suas terras; do fracasso de su-as prprias tentativas de encontrar umlugar e um papel no mundo dos "bran-cos" (p. 144, grifo nosso).

    Esse princpio violento acionadocontra as populaes nativas perpassari-a, por sua vez, todo o caminhar histri-co, encontrando na empresa escravista

    fundada na apropriao de seres hu-manos atravs da violncia mais cruaeda coero permanente, exercida atra-vs dos castigos mais atrozes umam desumanizadora e deculturadorade eficcia incomparvel (p. 118, grifo

    nosso). Para a estruturao dessa em-presa, afirma Ribeiro, assim como osndios que foram dizimados, negrosforam chacinados aos milhes, configu-rando um continuado genocdio e umetnocdio implacvel(p. 23, grifo nos-so). O escravismo fora possvel exata-mente, de acordo com o autor, por seucarter cruento, e a reside sua raciona-lidade particular, to oposta condiohumana que uma vez institudo s semantm atravs de uma vigilncia per-

    ptua e da violncia atroz da puniopreventiva. Ribeiro escancarou, semembarao e com detalhes, a sanguino-

    lncia dessa cruel estrutura:Segundo Ribeiro, nenhum povoque passasse por isso como sua rotinade vida, atravs de sculos, sairia delasem ficar marcado indelevelmente. Nes-se sentido, afirma Ribeiro que subme-tido a essa compreenso, qualquer povo desapropriado de si, deixando de serele prprio, primeiro, para ser ningumao ver-se reduzido a uma condio de

    bem semovente, como um animal de

    carga; depois, para ser outro, quandotransfigurado etnicamente na linha con-

    sentida pelo senhor, que a mais com-patvel com a preservao dos seus inte-resses (p. 118, grifo nosso).

    Nesse contexto de opresso cru-enta, outro agente poderosssimo fora a

    Igreja catlica, com seu brao repressi-vo, o Santo Ofcio. Segundo Darcy, afeia verdade que conflitos de toda aordem dilaceraram a histria brasileira(p. 167), sejam eles tnicos, religiosos,raciais, econmicos etc. Sobre esse as-

    pecto, continua o autor: omais assina-lvel que nunca so conflitos puros.Cada um se pinta com as cores dos ou-tros (ibidem). Seja como for, houveracontinuamente o esforo de atribuir al-

    guma dignidade formal a toda brutali-dade da conquista, perversidade daeliminao de tantos povos. Havia, in-clusive, aqueles como o jesuta espanholJos de Anchieta (1534-1597), que, can-tando faanhas em milhares de versosservis, dissera que toda aquela dor erador necessria para colorir as faces daaurora (p. 62).

    Se essa tendncia violenta datransfigurao tnica um elementofundamental nas anlises de Ribeiro, amesma reverbera para que o autor pensequestes mais atuais. Em verdade, have-ria uma continuidade histrica truculen-ta por partes dos grupos dominantes.Sobre esse aspecto, assinala ele:

    S ela, a classe dirigente, permaneceuigual a si mesma, exercendo sua intermi-nvel hegemonia. Senhorios velhos sesucedem em senhorios novos, superho-mogneos e solidrios entre si, numa fr-

    rea unio superarmada e a tudo predis-posta para manter o povo gemendo eproduzindo (p. 69, grifo nosso).

    Esses grupos dominantes seriamtomados por uma tolerncia opressiva,daqueles que, segundo Ribeiro, desejamconviver reinando sobre os corpos e asalmas dos cativos, ndios e pretos, ques podem conceber como os que deve-ro ser, amanh, seus equivalentes, por-que toda a diferena lhe intolervel(p. 70). De acordo com o autor, tais

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    grupos dominantes, formados por umaelite de senhores e mandantes civis emilitares, estariam montados sobre amassa de uma subumanidade oprimi-

    da (p. 72, grifo nosso).

    Outros exemplos de conflitoscontinuados se multiplicariam ao longoda histria brasileira, projetando-se no

    presente, garantido por aquela prontaao repressora de um corpo nacionaldas foras armadas que se prestava, on-tem, ao papel de perseguidor de escra-vos, como capites do mato, e se presta,hoje, funo de pau-mandado de umaminoria infecunda contra todos os brasi-leiros (p. 175). Esse carter violento

    das nossas elites uma herana, no en-tanto, difusa, difundida a todos ns.Sobre isso, afirma Ribeiro:

    A mais terrvel de nossas heranas estade levar sempre conosco a cicatriz de tor-turador impressa na alma e pronta a ex-plodir na brutalidade racista e classista.Ela que incandesce, ainda hoje, em tan-ta autoridade brasileira predisposta a tor-turar, seviciar e machucar os pobres quelhes caem s mos. Ela, porm, provo-cando crescente indignao nos dar for-

    as, amanh, para conter os possessos ecriar aqui uma sociedade solidria (p.120).

    Percebe-se com esse excerto queRibeiro, apesar de sua avaliao negati-va sobre o passado sobre a qual demos

    particular nfase, termina por findarsuas reflexes com expectativas positi-vas sobre o porvir do Brasil. J nas l-timas linhas do livro afirma que somos

    povos novos ainda na luta para nos fa-zermos a ns mesmos como um gnerohumano novo que nunca existiu antes.Tarefa muito mais difcil e penosa, mastambm muito mais bela e desafiante

    (p. 454). Segundo ele, estamos nosconstruindo na luta para florescer comouma nova civilizao, mestia e tropi-cal, inclusive orgulhosa de si mesma.Mais alegre, porque mais sofrida. Me-lhor, porque incorpora em si mais hu-

    manidades. Mais generosa, porque aber-

    ta convivncia com todas as raas etodas as culturas [...] (p. 455).

    A nao em fragmentos e as desigual-

    dades legitimadas nos tempos atuais

    Expostos queles que nos pare-ceram ser os principais pontos trazidospor Darcy Ribeiro no que concerne aotema aqui em discusso, nos cabe agorarefletir sobre a fora de suas interpreta-es diante do desafio de se compreen-der questes e fenmenos sociais con-temporneos associados violncia e aosofrimento que marcara j nosso pro-cesso de formao. De que maneira aleitura do autor nos auxilia a pensar o

    hoje? Qual a possibilidade e legitimida-de de sua representao? At que pontoe de que maneira as situaes concretasde violncia e sofrimentos no Brasil,com suas inmeras nuances, poderiamser pensadas atravs das contribuiesdo autor?

    Um primeiro ponto posto porRibeiro foi o de que, abaixo das ditasuniformidade cultural e unidade na-cional, resultantes do nosso processo

    de formao, existiriam disparidades,contradies e antagonismos fundamen-tais para pensar o Brasil, o que nos pa-rece de grande pertinncia. Apesar doapelo histrico e propagandstico denossos governos ideia de uma nao

    brasileira j presente de maneiramuito clara, por exemplo, no estadismogetulista , permanecem entre ns fos-sos sociais gritantes, isso no apenas noque concerne s contradies de classe,

    bastante enfatizadas tanto pelo autorcomo por outros de seus contempor-neos, como Florestan Fernandes (2006).Esses fossos se mantm tambm, isso sa ttulo de aluso, nas disparidades quecercam o acesso a cidadania no pas,dita de papel no clssico livro Cidadode Papel de Gilberto Dimenstein(2000), e muito bem discutido por auto-res como Jos Murilo de Carvalho

    (2010), o qual aponta para o longo ca-

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    minho de efetivao plena dos direitossociais, polticos e civis no Brasil.

    Outro aspecto apontado porDarcy Ribeiro foi a histrica opresso eaniquilao tnica e racial posta em

    marcha na nossa formao; o autor des-crevera claramente processos truculen-tos contra nossas populaes nativas enegras. Pensando, nesse sentido, fatosdados nos ltimos anos, possvel se

    perceber permanncias gritantes nesseperfil violento da nossa sociedade. Noque tangeria apenas violncia letalcontra as populaes indgenas, o levan-tamento feito pelo Conselho IndigenistaMissionrio (CIMI), rgo vinculado

    Conferncia Nacional dos Bispos do Bra-sil (CNBB), indicou que, desde 2003,mais de 500 ndios haviam sido assassina-dos no pas. Somente em 2011 foram 51casos, o equivalente morte de um ind-gena por semana, mortes essas associadassobretudo, de acordo com o RelatrioAnual de Violncia Contra os Povos Ind-genas no Brasil de 2012, questo fundi-ria. Essa questo perpassa, por sua vez,

    pela dificuldade poltica de se demarcar asterras indgenas, uma dvida social decunho histrico, atrasada, dentre outrosaspectos, pela ainda gritante influncia dolatifndio na organizao do pas.

    Neste ponto, nos parece que as te-orias ps-coloniais latino-americanas po-dem ajudar aos objetivos deste artigo.Sabemos que a partir de diferentes pers-

    pectivas, diversos cientistas sociais vmrefletindo sobre os desafios que envolvem

    encarar epistemologicamente a noo dedecolonialidade ou descolonizao naAmrica Latina (Quijano, 2000; Mignolo,2007; Grosfoguel, 2010)7. Buscando re-

    7Segundo Ramn Grosfoguel (2010) e PauloHenrique Martins (2012), a decolonialidadebusca transcender os estados de permanncia dacolonialidade e a sua naturalizao epistmi-ca, trata-se, grosso modo, das formas mais radi-cais dos debates ps-coloniais. Desde os anos1990, tais debates vem recebendo crticas porseus supostos excessos de culturalismo, passivi-dades em relao ao eurocentrismo e influncias

    pensar os estados de colonialidade quecontinuam vigentes na Amrica Latina emgeral e na sociedade brasileira particular-mente, Paulo Henrique Martins (2012,2011) sugere analisar as problemticas

    coloniais contemporneas tanto a partir devises tericas, quanto de experinciasprticas, no intuito de visualizar bem taisproblemticas e refletir acerca dos fatoresque esto dialeticamente a elas associados.Assim, este autor indica que devemosconsiderar: a ressignificao da imperia-lidade, a redefinio das dependncias

    e a continuidade modificada das mltiplasexpropriaes, sofrimentos e depredaesque culminam na usurpao da vida em

    todas as suas formas em benefcio de al-guns poucos grupos sociais.

    Analisando os conflitos que en-volvem territrios indgenas na AmricaLatina e baseados num vis antropolgicoe scio-histrico, Alfredo Wagner de Al-meida (1994), Edwin Reesink (2010) eMarcel Castro Velsquez (2008) sugeremque se considerarmos que descolonizar

    significa restituir a soberania s popula-es tradicionais de um territrio geogr-fico ou nacional, ento podemos dizer que

    pases como latino-americanos como oBrasil, a Bolvia, o Peru e o Equador nun-ca foram inteiramente descolonizados; jque desde as invases ibricas em seusterritrios, populaes indgenas destes

    pases lutam pelo direito titularidade daterra que antes lhes pertencera e que forausurpada pelos colonizadores. J a partirde um vis mais atual, Freya Schiwy e

    Nelson Maldonado-Torres (2006) acredi-tam que no possvel falar sobre deco-lonialidade em pases latino-americanosque possuem populaes indgenas histo-ricamente marginalizadas (como o casoda Bolvia, entre outros) sem atentar devi-damente para os desafios polticos e epis-temolgicos que envolvem o amplo pro-cesso de descolonizar o que comu-

    acrticas e des-historiciizadas das teorias ps-estruturais francesas e ps-modernas de origemanglo-sax.

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    mente entendido como o ser e o saber

    das populaes tradicionais. Para estesdois autores, o intuito de descolonizar

    perde seus verdadeiros sentidos (sejamestes polticos, sociais e/ou acadmicos)

    quando no consideramos suas problem-ticas a partir de um vis crtico que con-temple tanto perspectivas sincrnicasquanto anacrnicas; perspectivas estasque, em conjunto, possibilitam uma visomais conjuntural e menos compartimenta-lizada das diversas questes polticas (se-xistas, de gnero, tnicas, raciais, socioe-conmicas, intelectuais, etc.) que circuns-crevem qualquer bem fundamentada mo-tivao descolonizadora no territrio

    latino-americano.Se por um lado devemos reconhe-

    cer que o que podemos chamar de teorias

    ps-coloniais latino-americanas constituium arcabouo terico heterogneo e queatualmente convive com disputas inter-nas8, por outro, nos parece que tais teoriasapresentam algumas similitudes: particu-larmente os anseios epistemolgicos dequestionar os essencialismos, historicizaras desigualdades e contextualizar critica-mente as relaes de poder e dominao.

    Ainda no que tange violnciacontra indgenas, resgatamos, a ttulo deelucidao, a tragdia envolvendo ondio patax Galdino Jesus dos Santos,queimado vivo na capital federal porcinco jovens da classe mdia brasilien-se. A esse quadro de mortes, percebendo-o agora por um vis mais classista, adicio-nam-se continuamente os casos reporta-

    dos em jornais de moradores de rua ata-cados e tambm incendiados, enquantodormem. Tambm recordamos as tantaschacinas, como a da Candelria, no Rio

    8Por exemplo, quando Ramn Grosfoguel, ementrevistas recentes, acusa Anbal Quijano depromover um universalimso colonial e WalterMignolo de se valer de um populismo epist-mico. Para mais detalhes sobre estes conflitos

    teoricos, ver:http://www.analectica.org/articulos/mtzandrade-grosfoguel/. Acesso em 14 de novembro de2014.

    de Janeiro, nas quais a subumanidadede miserveis descrita pelo Darcy Ri-

    beiro vem sendo aniquilada de maneiraatroz. A barbrie descrita pelo autor,nesse aspecto, parece se reproduzir di-

    namicamente. Os crescentes casos deintolerncia poltica e de violncia degnero (machista e heteronormativa) noBrasil tambm apontam para isso. Nos-sas prprias experincias de pesquisa noBrasil como cientistas sociais tambmapontam para o que podemos chamar delgica do menos um, que quandosegmentos populacionais percebem co-mo algo positivo a morte o tortura de

    algum acusado de cometer crimes, j

    que sua vida no teria nenhum valor,constituindo apenas um nmero nasestatsticas oficiais da violncia no pas.

    Sobre a violncia racial especifi-camente, recordamos o caso recente deum homem de 29 anos, linchado pormoradores do Jardim So Cristvo, emSo Lus, no Maranho. Segundo a po-lcia civil, ele havia tentado assaltar um

    bar, quando foi rendido, amarrado nuem um poste e agredido at a morte comsocos, chutes, pedradas e garrafadas(Blog do Sakamoto, 7-7-2015). Mesmoque a Lei urea tenha sido assinada em1888, parte da sociedade brasileira ain-da coloca simbolicamente negros no

    pelourinho para servir de exemplo. Nes-se caso, como em vrios outros de lin-chamentos que se espalham no pas, foiuma parte da populao fazendo justi-a com as prprias mos, com requin-

    tes de crueldade tpicos do processo deformao descrito por Ribeiro, em aesque, comumente, recebem o respaldo dealguns segmentos populacionais.

    Nesse aspecto, ficam tambmvisveis antigas estruturas autoritriasque reforam os velhos cdigos de hon-ra, dado que o sistema legal eficiente eneutro, caractersticos do estado demo-crtico de direito moderno, ainda noconseguiu se solidificar no Brasil. Aps

    realizar um minucioso estudo de crimi-nologia na sociedade brasileira, Luiza

    http://www.analectica.org/articulos/mtzandrade-grosfoguel/http://www.analectica.org/articulos/mtzandrade-grosfoguel/http://www.analectica.org/articulos/mtzandrade-grosfoguel/http://www.analectica.org/articulos/mtzandrade-grosfoguel/
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    Pinheiro Flauzina (2008), por exemplo,demonstra como a poltica criminal doEstado atualiza as histricas aes de

    barbrie e extermnio da populao ne-gra e pobre, fatores que impedem ruptu-

    ras com o passado escravocrata e quetambm restringem as possibilidades dereconhecimento dos grupos sociais no-

    brancos como cidados com plenos di-reitos. Segundo Flauzina, o sistema pe-nal brasileiro atuou e continua atuandocomo produtor e reprodutor de nossasviolentas relaes sociais, dando susten-tabilidade a uma complexa conjunturade poder e interesses das elites polticase econmicas cujas aes sistematizadas

    so integrantes de um projeto genoci-da. Tudo isso evidencia o aspecto difu-so e heterogneo do carter violentodo povo brasileiro, como posto por Ri-

    beiro, aquele que carrega a cicatriz detorturador impressa na alma, pronto

    para explodir na brutalidade. Aqui nosparece que fica evidente a necessidadede uma viso que contemple aspectossincrnicos e diacrnicos na possveloperao epistemolgica de resgate

    desta obra de Ribeiro no intento decompreender alguns fatores sociocultu-rais e histricos eu circunscrevem asmatrizes da violncia e do sofrimento nasociedade brasileira9.

    9Ainda sobre o carter racial da violncia, se-gundo a pesquisa Participao, Democracia eRacismo divulgada em 2013 pelo Instituo dePesquisa Econmica Aplicada (IPEA), a proba-bilidade do negro ser vtima de homicdio oitopontos percentuais maior, mesmo quando secompara indivduos de escolaridade e caracters-ticas socioeconmicas semelhantes. Ainda se-gundo o IPEA, a cada trs assassinatos, dois sode negros. Por fim, somando-se a populaoresidente nos 226 municpios brasileiros commais de 100 mil habitantes, calcula-se que apossibilidade de um adolescente negro ser vti-ma de homicdio 3,7 vezes maior em compa-rao com os brancos (IPEA). O genocdiopautado na raa, descrito por Ribeiro, parececontinuar, assim como o apresamento caracte-rstico da escravido, dado que tambm a popu-lao carcerria, vivendo sob condies subu-

    O elemento racial no Brasil particularmente relevante e foi muitobem problematizado tambm pelo jcitado Florestan Fernandes, que descre-veu os impasses do Negro no mundo

    dos brancos (2007), assim como suadificuldade de integrao na sociedadede classes (2008), descontruindo fir-memente a noo de democracia racial.Tambm Darcy Ribeiro tratara sobreessa noo no Povo Brasileiro. Sobreessa, afirma o autor de forma objetiva:

    O espantoso que os brasileiros, orgu-lhosos de sua to proclamada, como fal-sa, democraciaracial, raramente perce-bem os profundos abismos que aqui se-

    param os estratos sociais. O mais grave que esse abismo no conduz a conflitostendentes a transp-lo, porque se cristali-zam num modus vivendi que aparta os ri-cos dos pobres, como se fossem castas eguetos (RIBEIRO, 1995, p. 24).

    Nessa citao, o interessante que a democracia racial no Brasil estfortemente associada com uma demo-cracia social e classista, o que resgata aideia de Ribeiro de que os conflitos aqui

    no so puros, mas entrelaados. Essacitao escancara tambm a dificuldadede se transpor nossos abismos sociais,questo trabalhada com afinco, por e-xemplo, por Jos de Souza Martins(1999, 2003) e que tambm apontam

    para questes polmicas como as cha-madas polticas afirmativas ou cotasraciais10.

    Um terceiro aspecto abordadopor Ribeiro no que tange violncia no

    Brasil foi a da represso e opresso dasresistncias, ou das tendncias ditascomo separatistas. O apelo violn-cia fora apontada pelo autor como armafundamental da classe dominante para a

    manas, composta, sobretudo por negros (Car-doso & Monteiro, 2013).10Estas questes so to complexas que noiremos nos aprofundar nelas neste artigo, apenaslembramos que autores como Hlio Santos,Marcilene Garcia Souza e Karen Sasaki (2013),entre diversos/as outros/as, j refletiram sobretais questes de maneira coerente e elucidativa.

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    construo de nossa histria. Sobre esseaspecto, tambm percebemos continui-dades, agora, no entanto, postas de ma-neira sutil, no sentido de que so traves-tidas mais fortemente de defesa da or-

    dem democrtico-legal. O caso dasdiscusses sociais e principalmente dacriminalizao miditica em torno dosrolezinhos, fenmeno investigado porRosana Pinheiro-Machado (2014),

    bem elucidativo neste sentido. Para Pi-nheiro-Machado, os preconceitos contraos pobres no Brasil e, neste contextosocial especfico de jovens que fazemrolezinho por centros comerciais, fa-zem com que o ato de ir ao shopping se

    torne poltico, j que tais jovens esto seapropriando de espaos que a sociedadelhes nega diariamente. Segundo ela, a

    classe mdia no se reconhece no Outro

    e sente um distrbio profundo e pertur-

    bador por isso. Ou seja, estes fenme-nos apontam para um elemento analticoimprescindvel: a insensibilidade socialde parte significativa das classes mdias

    brasileiras em relao aos sistemticosprocessos de segregao que padecem amaioria da populao negra e pobre.Isso faz com que os problemas de vio-lncia, sofrimento e marginalizao queacometem esta populao possam atter sua existncia admitida pela maioriadestas classes mdias, mas no ao pontode ser reconhecidos como problemasque lhes afetam e que inviabilizam oexerccio pleno da cidadania.

    Para refletir sobre esse ponto

    basta-nos recordar as tantas atrocidadesostensivas, justificadas pela ao debaderneiros, cometidas pela polcianas manifestaes populares recentes nasJornadas de Junho, por exemplo, s

    para citar um caso mais pontual (Harveyet all, 2013). Apesar desse disfarce de-mocrtico-legal, a truculncia caracte-rstica das foras policiais no Brasil temcomovido inclusive rgos internacio-nais, que emitem continuamente notas

    repdio sua atuao, como foi tambmo caso da Anistia Internacional diante

    da reintegrao de posse agressiva doCais Jos Estelita, no Recife em 201411. Essa atuao policial arbitrria e vio-lenta contra movimentos sociais contes-tadores da ordem vigente reafirma aque-

    le carter de coero e conservadorismoapresentado por Ribeiro, reinventadonos termos da dita e atual ordem de-mocrtica de direito.

    Consideraes Finais

    V-se, portanto, com essas con-sideraes, que a leitura de Darcy Ri-

    beiro sobre o atroz processo de fazi-mento do Brasil incorre em grande

    atualidade para pensar vrios elementos

    da configurao contempornea da vio-lncia e do sofrimento no pas. O autornos cede, nesse sentido, uma abordagemcruenta, mas factual e pertinente, inclu-sive para pensar nuances de nossas bar-

    baridades tnicas e raciaisque o autorcoloca como genocdio e etnocdio ,assim como atrocidades de cunho clas-sista. Se, nesse aspecto, a leitura de Ri-

    beiro nos parece fundamental para en-tender violncia(s) que se travam no

    pas, sobretudo as razes de uma culturada violncia cruel, discordamos, com

    base no panorama atual, do desfechootimista de suas reflexes.

    Ao que nos parece e em oposi-o ao otimismo expresso por Ribeiro,os acontecimentos recentes e sua incan-svel repetio apontam um possvel

    porvir histrico de pouca mudana, pelomenos a curto prazo. H um incontvelnmero de crimes de atrocidade secaque se sucedem em ritmo acelerado,assim como padres brbaros de vitimi-zao tnica, racial, classista e relativas dimenses de gnero. Ao contrriodo posto pelo autor, no pensamos queesse processo de formao violento, elemesmo, nos tornar, em algum momen-

    11Disponvel em: . Acesso em 29jul. 2015

    http://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-dhttp://www.anistia.org.br/%20direitos-humanos/blog/nota-p%C3%BAblica-anistia-internacional-condena-uso-excessivo-da-for%C3%A7a-pela-pm-na-d
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    to, mais generosos, ou nossas popula-es oprimidas, nos termos do autor,mais alegres, porque sofridas. Discor-damos que exista uma tendncia maior generosidade, de modo que tampouco

    concordamos que no Brasil se trave umaconvivncia positiva com todas as ra-as e culturas. Para ns, o que nos cabeso marcas indelveis e elementostraumticos que sero dissolvidos

    apenas com muitos esforos.De nossa parte, isso nos parece

    antes um realismo, muito mais que umpessimismo; j que busca antes ressaltaro tamanho dos desafios que se colocam,do que determinar de maneira apriors-

    tica nossa suposta incapacidade detransp-los. Se os tempos so, comoafirmamos a princpio, de muita trans-formao, h permanncias incrustadasque precisamos combater com firmeza,(re)pensando, como tambm j posto,os caminhos e descaminhos da nossasociedade, assim como seus rumos, tan-to os possveis, como sobretudo osdesejados.

    Nesse sentido, as preocupaese maneira de interpretar o Brasil trazi-das por Darcy Ribeiro podem se tradu-zir em agendas de reflexes mais pro-fundas sobre as alteraes e as perma-nncias dessas dimenses da cultura daviolncia e da insensibilidade ao sofri-mento alheio na sociedade brasileira.Tais reflexes podem, tambm e certa-mente, auxiliar a encontrar caminhos

    promissores para alter-la. Como bem

    colocou Miglievich (2011a, p. 26): daque o pensamento social contm umgrmen de criatividade social de conse-quncias frteis a se desenvolver ouno, capaz de atuar no incremento deuma cosmoviso capaz de se opor ao

    status quo.Diante dos dados que apresen-

    tamos ao longo do artigo, foi possvelperceber como, desde reflexividadescrticas como as que circunscrevem as

    teorias ps-coloniais latino-americanas,a clssica obra Razes do Brasil de

    Darcy Ribeiro pode contribuir para pen-sar as matrizes histricas e as configu-raes contemporneas da violncia edo sofrimento na complexa e diversifi-cada sociedade brasileira. Um ltimo

    ponto que gostaramos de salientar que o chamado neoliberalismo social eos pactos conservadores(Singer, 2012)que pautaram boa parte das polticassociais governamentais em suas varia-das esferas desde o incio deste sculoat os dias atuais, acentuaram significa-tivamente em diversos segmentos da

    populao brasileira a internalizaoinconsciente da noo de capitalismo deconsumo (Trumbull, 2008), isto , a

    (equivocada) percepo de que ter aces-so a determinados bens de consumoconstituiria ter acesso cidadania.

    Este fenmeno cultural e socioe-conmico dinamiza e reveste de novas ecomplexas matizes as histricas (e, co-mo vimos, em muitos casos violentas edesiguais) cosmologias raciais, de clas-se e de gnero que subsidiam as rela-es de alteridade atravs das quais osdiversos grupos sociais que compem opovo brasileiro se relacionam unscom os outros. Enquanto os direitos decidadania no forem universalizados nasociedade brasileira e enquanto as lgi-cas mercadolgicas e neoliberais adqui-rirem mais respaldo jurdico e, conse-quentemente, mais legitimidade do queos movimentos sociais, os horizontesno vislumbram padres de maior i-gualdade, tampouco de justia social.

    Mas acreditamos que ao invs de des-nimos ou apatias, tais cenrios provo-cam e exigem sim que no nos omita-mos das nossas responsabilidades soci-ais. Tais aes (que j foram iniciadas

    por outras/os cientistas sociais) reme-tem, na nossa opinio, a um maior en-gajamento social (fundamentalmentesimtrico) e uma maior participao

    poltica: no necessariamente no sentidotradicional do termo (de vinculao par-

    tidria, governamental e/ou sindical),mas, sobretudo, no sentido de posicio-

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    namento crtico face s realidades soci-ais. Apenas movidos por aes nestesentido que as especificidades do povo

    brasileiro, to bem refletidas historica-mente por Darcy Ribeiro, constituiro

    horizontes factveis, no apenas utpi-cos e nos quais os direitos humanossero efetivamente coletivizados e nocontinuaro restringidos s esferas doindivduo.

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    VELOSO, Mariza e TAVOLARO, Ser-gio B. F.Apresentao. Soc. esta-do. [online]. 2011, vol.26, n.2, pp. 1-8.

    Abstract: This article aims to investigate some socio-historical arrays of violence and suf-fering in social formation of Brazil in order to analyze the limits and possibilities that theclassic work "The Brazilian people" from Darcy Ribeiro can offer towards understandingthe conjuncture of violence that suffers the Brazilian society from colonial times to the con-temporary. Besides bespeak the pertinence, discontinuities and weaknesses of Ribeirostheory, we add a little of the theoretical apparatus of Latin American postcolonial theoriesin order to discern to what extent the epistemological subsidies provided by Ribeiro in this

    his classic work can be concatenated to reflective concerns of theorists such as AnbalQuijano, Walter Mignolo and Ramon Grosfoguel. Finally, the article offers some analyticalperspectives on how the revisiting this classic work of Brazilian social sciences (as well asothers) can be profitable as long as their "rescue" is circumscribed by a hermeneutic thatconsider both synchronous as diachronic aspects, and also by critical reflexivities. Key-words: violence, suffering, Darcy Ribeiro, postcoloniality