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Coordenação de Projetos de Edifícios A coordenação de Projetos 58 COORDENAÇÃO DE PROJETOS DE EDIFÍCIOS Márcio Fabricio, Silvio Melhado, Ana Rocha, Eduardo Fontenelle e Leonardo Grilo Objetivos deste Capítulo Desenvolver o conceito de coordenação de projetos de edifícios e discutir sua prática e dificuldades. Apresentar diretrizes para organização do processo de projeto de edifícios, das equipes de projeto, do fluxo de informações de projeto e das atividades de coordenação envolvidas, e discutir o papel do coordenador de projetos, com ênfase para a integração entre coordenação de projetos e coordenação da obra. Exemplificar situações de coordenação de projetos em diferentes tipos de empreendimentos de construção e discutir os possíveis perfis dos seus coordenadores. Apontar os impactos e potencialidade para das novas tecnologias da informática e, especialmente, dos sistemas eletrônicos de gerenciamento de projetos. A Coordenação de Projetos O paradigma contemporâneo de desenvolvimento integrado de produto ou Projeto Simultâneo (tratado no Capítulo 3) enfatiza a realização precoce e concomitante de todas as especialidades de projeto. Nesse contexto, as decisões de projeto devem ser tomadas multidisciplinarmente e são orientadas pela busca de soluções globalmente boas, mesmo que não isoladamente ótimas. Defendendo a multidisciplinaridade das soluções de projeto, Melhado (1994) apresenta um modelo conceitual para uma equipe de projeto colaborativo. Segundo esse modelo, as decisões de projeto são resultado de análises e discussões de diferentes profissionais que devem buscar as melhores soluções globais para o empreendimento, e a primazia do projeto arquitetônico é substituída por um arranjo que privilegia a interatividade no processo de projeto, com a atividade de coordenação de projeto sendo colocada no centro da atuação da equipe de projetos (como mostrado na Figura 22). A coordenação de projetos é uma atividade de suporte ao desenvolvimento do processo de projeto voltada à integração dos requisitos e das decisões de projeto. A coordenação deve ser exercida durante todo o processo de projeto e tem como objetivo fomentar a interatividade na equipe de projeto e melhorar a qualidade dos projetos assim desenvolvidos. Cabe à coordenação garantir que as soluções técnicas desenvolvidas pelos projetistas de diferentes especialidades sejam congruentes com as necessidades e objetivos do cliente, compatíveis

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Coordenação de Projetos de Edifícios A coordenação de Projetos

58

COORDENAÇÃO DE PROJETOS DE EDIFÍCIOS

Márcio Fabricio, Silvio Melhado, Ana Rocha, Eduardo Fontenelle e Leonardo Grilo

Objetivos deste Capítulo

• Desenvolver o conceito de coordenação de projetos de edifícios e discutir sua prática e dificuldades.

• Apresentar diretrizes para organização do processo de projeto de edifícios, das equipes de projeto, do fluxo de informações de projeto e das atividades de coordenação envolvidas, e discutir o papel do coordenador de projetos, com ênfase para a integração entre coordenação de projetos e coordenação da obra.

• Exemplificar situações de coordenação de projetos em diferentes tipos de empreendimentos de construção e discutir os possíveis perfis dos seus coordenadores.

• Apontar os impactos e potencialidade para das novas tecnologias da informática e, especialmente, dos sistemas eletrônicos de gerenciamento de projetos.

A Coordenação de Projetos

O paradigma contemporâneo de desenvolvimento integrado de produto ou Projeto Simultâneo (tratado no Capítulo 3) enfatiza a realização precoce e concomitante de todas as especialidades de projeto. Nesse contexto, as decisões de projeto devem ser tomadas multidisciplinarmente e são orientadas pela busca de soluções globalmente boas, mesmo que não isoladamente ótimas.

Defendendo a multidisciplinaridade das soluções de projeto, Melhado (1994) apresenta um modelo conceitual para uma equipe de projeto colaborativo. Segundo esse modelo, as decisões de projeto são resultado de análises e discussões de diferentes profissionais que devem buscar as melhores soluções globais para o empreendimento, e a primazia do projeto arquitetônico é substituída por um arranjo que privilegia a interatividade no processo de projeto, com a atividade de coordenação de projeto sendo colocada no centro da atuação da equipe de projetos (como mostrado na Figura 22).

A coordenação de projetos é uma atividade de suporte ao desenvolvimento do processo de projeto voltada à integração dos requisitos e das decisões de projeto. A coordenação deve ser exercida durante todo o processo de projeto e tem como objetivo fomentar a interatividade na equipe de projeto e melhorar a qualidade dos projetos assim desenvolvidos.

Cabe à coordenação garantir que as soluções técnicas desenvolvidas pelos projetistas de diferentes especialidades sejam congruentes com as necessidades e objetivos do cliente, compatíveis

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entre si e – sempre que possível – com a cultura construtiva das empresas construtoras que serão responsáveis pelas respectivas obras. As principais tarefas a serem cumpridas pela coordenação de projetos estão relacionadas à organização e ao planejamento do processo de projeto - planejamento do processo de projeto - e à gestão e coordenação das soluções de projeto desenvolvidas - gestão do processo de projeto.

COORDENADOR

DE PROJETOS

EMPREENDEDOR

Figura 22 Equipe multidisciplinar de projeto (MELHADO, 1994).

O planejamento do processo de projeto envolve:

• estabelecer os objetivos e parâmetros a serem seguidos no desenvolvimento dos projetos;

• definir os escopos de projeto, segundo especialidades e etapas de projeto;

• planejar os custos de desenvolvimento dos projetos;

• planejar as etapas e prazos de desenvolvimento das diversas etapas, no todo e por especialidades de projeto, para estabelecerem-se cronogramas.

A gestão do processo de projeto, por sua vez, exige:

• controlar e adequar os prazos planejados para desenvolvimento das diversas etapas e especialidades de projeto – gestão de prazos;

• controlar os custos de desenvolvimento dos projetos em relação ao planejado;

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• fomentar e garantir a qualidade das soluções técnicas adotadas nos projetos;

• validar (ou fazer validar pelo empreendedor) as etapas de desenvolvimento e os projetos dela resultantes;

• fomentar a comunicação entre os participantes do projeto, coordenar as interfaces e garantir a compatibilidade entre as soluções das várias especialidades envolvidas no projeto;

• integrar as soluções de projeto com as fases subseqüentes do empreendimento, particularmente na interface com a execução da obra.

É importante esclarecer a diferença entre coordenação e compatibilização de projetos. A coordenação envolve a interação entre os diversos projetistas desde as primeiras etapas do processo de projeto, no sentido de discutir e viabilizar as soluções para o projeto, mas sempre existe a possibilidade de discrepâncias ou incoerências entre as informações produzidas por diferentes membros da equipe de projeto. Na compatibilização, os projetos de diferentes especialidades são superpostos para verificar as interferências entre eles, e os problemas são evidenciados para que a coordenação possa agir sobre eles e solucioná-los.

Muitos coordenadores ainda praticam apenas a compatibilização ao invés da coordenação de projetos, embora tenha crescido a consciência da necessidade de se fazer uma verdadeira coordenação; a coordenação deve anteceder a compatibilização, para que haja ganhos em termos da qualidade e racionalização das soluções de projeto. A compatibilização deve acontecer quando os projetos já estão concebidos funcionando como uma "malha fina", na qual possíveis erros possam ser detectados.

Assim, a coordenação de projeto envolve funções gerenciais, com o intuito de fomentar a integração e a cooperação dos agentes envolvidos e funções técnicas, relacionadas com a solução global dos projetos e a integração técnica entre as diversas especialidades de projeto, e entre o projeto e o sistema de produção da obra, incluindo a solução de problemas de compatibilização.

O Coordenador de Projetos

O coordenador de projetos é o principal agente na gestão do processo de projeto e tem como principal atribuições realizar e fomentar ações de integração entre projetistas, coordenar e controlar os projetos e as trocas de informações, de forma a garantir que o processo de projeto ocorra da forma planejada e cumpra os prazos e objetivos estabelecidos.

As responsabilidades e habilidades típicas do coordenador de projetos envolvem iniciar o processo de projeto, planejar o processo, gerenciar a equipe de projeto, garantir a compatibilidade entre as soluções dos vários projetistas e controlar os fluxos de informações entre projetistas.

O coordenador de projetos utiliza habilidades administrativas e de liderança para poder gerenciar equipes multidisciplinares de projetos. Além disso, o coordenador deve ter um amplo conhecimento relativo às diversas especialidades de projeto e é de extrema utilidade que conheça técnicas construtivas e possua experiência quanto à execução de obras.

Desse ponto de vista, seria exigível que um coordenador de projetos detivesse conhecimentos:

• sobre técnicas e processos de projeto pertinentes às várias disciplinas envolvidas (arquitetura, paisagismo, fundações, estruturas, sistemas prediais, fôrmas, vedações, etc.);

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• sobre normas técnicas, legislação federal, estadual ou municipal, códigos de construção e padrões das concessionárias locais de serviços públicos (água, esgoto, energia, telefone, gás, TV a cabo, etc.);

• sobre tecnologia construtiva em curso e inovações tecnológicas no segmento de edificações;

• sobre técnicas de planejamento, programação e controle de projetos;

• sobre informática e gestão de informação.

Ainda mais, seriam desejáveis as seguintes habilidades para um coordenador de projetos:

• espírito de liderança;

• facilidade de comunicação;

• disciplina para sistematizar e documentar as reuniões com projetistas e as trocas de informação;

• atenção aos detalhes e capacidade de avaliar a qualidade das soluções e a compatibilidade entre as várias partes do projeto.

Na Tabela 9, baseada em Fontenelle (2002), são apresentadas algumas características pessoais e profissionais demandadas para a coordenação de projetos, que potencializam melhores resultados da atividade.

Para que a coordenação seja exercida com eficácia é necessário ainda que os papéis e poderes de cada agente envolvido no processo de projeto estejam bem definidos e que o coordenador tenha autonomia para tomar as decisões relacionadas à orientação dos projetistas, à solução de conflitos entre os projetos.

Coordenação de projetos em empreendimentos de construção

De acordo com o modelo mais tradicional, a coordenação de projetos de edifícios é uma atividade de responsabilidade do arquiteto autor do projeto, uma vez que o projeto de arquitetura é tido como definidor das diretrizes a serem seguidas pelos demais projetos. Tal concepção é respaldada até hoje por associações e por muitos, se não pela grande maioria, dos projetistas de arquitetura.

Entretanto, no Brasil, tal modelo vem recebendo uma série de críticas, visto que o arquiteto se distancia cada vez mais do conhecimento das técnicas construtivas e do próprio canteiro de obras, e não recebe formação quanto aos aspectos de gestão envolvidos na coordenação de projetos.

Embora muitos defendam que o arquiteto não pode abrir mão do domínio técnico e que esse tipo de conhecimento deveria ser revalorizado na sua atuação, a prática mostra que a formação dos arquitetos é progressivamente deficitária para esse fim. É necessário, também, reconhecer que a crescente amplitude do conhecimento cultural, técnico e tecnológico utilizado na construção de edifícios dificulta praticar o ideal de formar profissionais de arquitetura que dominem amplamente os conhecimentos pertinentes à atividade de coordenar projetos de edifícios.

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Tabela 9 Competências e conhecimentos úteis ao desempenho da coordenação

COMPETÊNCIAS E CONHECIMENTOS DO COORDENADOR

• Facilidade para lidar com problemas complexos e multidisciplinares;

• Capacidade de seleção e formação de equipe segundo as capacitações/especialidades demandadas pela natureza do empreendimento a ser projetado;

• Capacidade de identificação das atividades necessárias ao desenvolvimento do projeto;

• Conhecimentos de planejamento e programação de processos para distribuição das atividades no tempo;

• Capacidade de gestão dos custos e programação dos recursos para o projeto;

• Capacidade de previsão e controle de prazos;

• Capacidade de tomada de decisões de caráter gerencial, como a aprovação de produtos intermediários e a liberação para início de etapas do projeto;

• Formação e experiência para identificação e caracterização das interfaces técnicas entre especialidades;

• Capacidade para estabelecer diretrizes e parâmetros técnicos relativos às características dos produtos, dos processos de aquisição e dos processos de execução envolvidos;

• Capacidade para ordenação do fluxo de informações entre os agentes envolvidos;

• Capacidade para analisar as soluções técnicas e o grau de solução global atingida;

• Liderança e presença de espírito para mediar conflitos e conduzir soluções negociadas;

• Agilidade nas decisões e na validação das soluções de projeto propostas.

Assim, à medida que as soluções tecnológicas para os subsistemas da construção se tornam mais complexas, envolvendo cada vez profissionais mais especializados e soluções multidisciplinares, ganha sentido a possibilidade de se separar “projetar” de “coordenar” projetos.

Desse modo, começa a se consolidar a alternativa de uma coordenação de projeto independente da atividade dos projetistas, ou seja, exercida por um profissional que não esteja atuando como projetista para o empreendimento e seja responsável exclusivamente pela coordenação, de forma a permitir uma maior dedicação e uma mediação mais equilibrada e isenta na solução de problemas de interface.

Cada vez mais, a coordenação de projetos demanda a articulação e o questionamento das especialidades de projeto em benefício do todo. Nessa tarefa, o papel do coordenador exige um amplo conhecimento multidisciplinar (incluindo produto e produção) e uma elevada capacidade de gerenciar o processo e integrar os profissionais das equipes de projeto e seus trabalhos.

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Diante desse perfil, as questões que se colocam são: quem tem competência para exercer o papel de coordenador e atender a todas essas exigências? Qual a melhor formação para tal exercício? Qual o profissional que melhor se adapta a essa atividade? É pertinente se pensar em uma nova formação que cobriria justamente essa lacuna?

Analisando-se a literatura disponível e as experiências em prática na construção de edifícios, no Brasil, dificilmente chegar-se-ia a um modelo ideal e a respostas precisas para as questões levantadas anteriormente; entretanto, é possível discutir-se o tema em termos de vantagens, potencialidades, limites e problemas que cada modelo, cada resposta apresenta.

A coordenação de projetos de edifícios pode ser exercida por uma equipe interna à empresa construtora, pela empresa responsável pelo desenvolvimento do projeto arquitetônico do empreendimento (modelo tradicional) ou por profissionais ou empresas contratados especificamente para exercer esta função (coordenação independente). Tais situações são descritas na Tabela 10.

Tabela 10 Modelos de coordenação e suas vantagens potenciais.

SITUAÇÃO COORDENADOR JUSTIFICATIVAS Profissional da empresa incorporadora e construtora contratante (Engenheiro ou Arquiteto)

• Coordenação “forte”

• Maior integração ao produto das variáveis da produção

• Adequação tecnológica das soluções de projeto

Empreendimentos residenciais privados

Coordenação terceirizada (Engenheiro ou Arquiteto)

• Potencial conflito quanto à legitimidade/ poder do coordenador –solução “de compromisso”

• Equilíbrio entre enfoques complementares do projeto

• Potencialidade de incorporação de novas tecnologias

Empreendimentos habitacionais públicos

Arquiteto autor do projeto • Coordenação de caráter formal

• Coordenações de projeto e de execução são distintas

Empreendimentos industriais Engenheiro responsável pela concepção do processo de produção industrial (profissional interno ou externo)

• Prioridade aos objetivos do cliente

• Funções não-produtivas em segundo plano

Empreendimentos comerciais Arquiteto autor do projeto • Importância da função estética e da imagem

Pequenos empreendimentos Arquiteto autor do projeto • Menor peso das decisões técnicas

Segundo o que se apresenta na Tabela 10, fica claro que não existe um modelo único, ideal para todos os tipos de empreendimento e para as diferentes características dos clientes, das empresas construtoras e das empresas de projeto envolvidas.

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De fato, cada caso é um caso e a escolha da coordenação deve considerar a estratégia competitiva e a capacidade técnica e gerencial dos agentes envolvidos, bem como as características específicas de cada empreendimento.

Assim, por exemplo, em uma obra industrial complexa que privilegie prazo e qualidade operacional, o projetista das instalações industriais pode ser indicado para coordenar. Em uma obra de edifícios de uma empresa incorporadora e construtora com estratégia competitiva bem definida e ligada a uma tecnologia construtiva padronizada, a coordenação pode ser exercida por um coordenador interno que conheça bem essa cultura construtiva. No caso de uma empresa construtora sem grande domínio tecnológico sobre as suas obras e sem amplo conhecimento tecnológico e construtivo, a coordenação externa pode ser utilizada para aprimorar tecnologicamente o projeto e incrementar inovações construtivas. Para uma pequena obra residencial unifamiliar ou em uma obra com um forte viés cultural como, por exemplo, um importante museu, teatro ou centro cultural, provavelmente, o arquiteto autor do projeto seria o mais indicado para coordenar, seja pela simplicidade do empreendimento, seja pelo apelo cultural e criativo que a obra suscita.

Há uma tendência, manifestada por alguns profissionais e acadêmicos, em defesa da criação de cursos de especialização e pós-graduação voltados à formação complementar em gestão e coordenação de projetos, de forma a preparar profissionais especificamente habilitados para o exercício da coordenação de projetos. Em todos os casos, a experiência profissional em projetos e em execução de obras é destacada como sendo um requisito indispensável a um bom coordenador de projeto.

Esse coordenador de projetos terá como uma de suas principais tarefas fomentar, garantir e controlar o fluxo de informações entre as diferentes especialidades de projeto, assunto que será tratado a seguir.

Fluxo do Projeto e Coordenação

Para que a coordenação de projetos possa ser bem conduzida em um empreendimento de construção é importante que o processo de projeto seja minimamente conhecido e mapeado, a fim de permitir o planejamento da coordenação dos projetos e do fluxo de informações de projeto. A sistematização das atividades de coordenação depende de como se estrutura o processo de projeto e da sua tipificação em etapas, atividades, verificações, análises críticas e validações.

Para proporcionar uma compreensão mais clara do trabalho desempenhado pela coordenação de projetos, exibe-se na Tabela 11 um exemplo da distribuição de atividades segundo as etapas de desenvolvimento de projeto. Ressalte-se que o exemplo pressupõe como cenário projetos no âmbito da iniciativa privada.

A seguir é apresentado um modelo genérico – ver Figura 23, baseada no trabalho de Melhado; Barros; Souza (1995), para organização e coordenação do processo de projeto. Esse fluxograma divide o processo de projeto de edifícios em grandes etapas de desenvolvimento e coordenação de projeto. O modelo apresenta simplificadamente as principais etapas de projeto, os participantes de cada etapa, as principais informações necessárias e propõe uma série de reuniões de coordenação e marcos de análise crítica para o processo de projeto.

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Tabela 11 Atividades de coordenação necessárias em cada etapa

(*) O termo “eventual” significa, aqui, que a atividade poderá ser exercida por outro profissional ou área e, apenas eventualmente, será atribuída à coordenação.

Etapa de projeto Atividades de coordenação

Idealização do Produto

• Formulação conjunta com o empreendedor do Programa de Necessidades (Briefing); • Levantamento das restrições legais de uso e ocupação para terreno(s) em estudo; • Identificação das especialidades de projeto, qualificações de projetistas e escopos de projeto

necessários segundo a natureza do produto a projetar; • Estimativa dos recursos necessários ao desenvolvimento do projeto; • Levantamento de demanda ou pesquisa de mercado para um produto (eventual*); • Assessoria ao empreendedor para aquisição de terrenos ou imóveis (eventual*); • Análise da viabilidade financeira de um produto em um dado terreno (eventual*); • Assessoria jurídica, fiscal e tributária para o empreendimento (eventual*).

Análise de Viabilidade

• Formulação das diretrizes tecnológicas do empreendimento, consoantes à estratégia do empreendedor; • Identificação e planejamento das etapas de desenvolvimento do projeto; • Identificação e análise crítica das interfaces de projeto a serem solucionadas; • Coordenação do fluxo de informações entre os agentes envolvidos; • Validação de produtos de projeto e liberação para início das etapas subseqüentes; • Aprovação de memoriais descritivos do produto, maquetes, apto. modelo, plantas e estande de vendas; • Análise das propostas de prestação de serviço e assessoria para contratação dos projetistas; • Análise de custos e de alternativas tecnológicas para o empreendimento (eventual*); • Estabelecimento de diretrizes tecnológicas para execução (eventual*); • Consulta aos órgãos públicos competentes para efeito de aprovações legais do projeto (eventual*); • Assessoria ao empreendedor para contratação da construtora (eventual*).

Formalização

• Coordenação do fluxo de informações entre os agentes intervenientes para o desenvolvimento das partes do projeto;

• Controle do processo quanto ao tempo e demais recursos, incluindo as ações corretivas necessárias; • Organização, realização e registro de reuniões de coordenação de projetos; • Análise das soluções técnicas e do seu grau de satisfação frente ao Programa de Necessidades; • Avaliação de indicadores de projeto; • Análise crítica e tomada de decisões sobre as necessidades de integração das soluções; • Validação de produtos de projeto e liberação para início das etapas subseqüentes; • Avaliação do desempenho dos projetistas contratados.

Detalhamento

• Coordenação do fluxo de informações entre os agentes intervenientes para o desenvolvimento das partes do projeto;

• Controle do processo quanto ao tempo e demais recursos, incluindo as ações corretivas necessárias; • Organização, realização e registro de reuniões de coordenação de projetos; • Validação de produtos de projeto e liberação para início das etapas subseqüentes; • Avaliação do desempenho dos projetistas contratados.

Planejamento e Execução da Obra

• Acompanhamento e avaliação do uso dos projetos no canteiro de obras e seus eventuais ajustes; • Organização, realização e registro de reuniões de preparação da execução da obra (eventual*).

Pós-entrega do Empreendimento

• Avaliação pós-ocupação e adequação do edifício a parâmetros de desempenho e manutenção; • Organização, realização e registro de reuniões de avaliação e retroalimentação (eventual*).

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necessidades e expectativas do cliente

Documentos de Referência DR-2

• DR-1; • Definição do produto.

Documentos de Referência - DR-1

• levantamento

planialtimétrico; • vistoria do terreno; • análise dos

documentos e levantamento nos órgãos públicos quanto a restrições de uso e ocupação do solo;

• Programa de Necessidades.

consultores e outros projetistas

participantes:

• represent. do empreendedor;

• coordenador de projetos;

• projetistas de arquitetura; estruturas, sistemas prediais e grupo de projetos para produção.

consultores e outros projetistas

IDEALIZAÇÃO DO PRODUTO “briefing”

Concepção do produto

1a reunião de coordenação - RE-1 • cronograma para desenvolvimento do

projeto • diretrizes para a definição do produto e

para o Estudo Preliminar de Arquitetura (EP-A)

Definição do Produto

“A”

Figura 23 Exemplo de fluxo de reuniões e etapas de coordenação (Adaptado de MELHADO; BARROS; SOUZA, 1995) – primeira parte

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Coordenação de Projetos de Edifícios A coordenação de Projetos

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participantes:

• represent. do empreendedor;

• coordenador de projetos;

• projetistas de arquitetura; estruturas, sistemas prediais e grupo de projetos para produção.

Documentos de Referência DR-3

• DR-2; • estudo preliminar

de arquitetura; • pré-

dimensionamento de estrutura e de sistemas prediais;

• procedimentos para os projetos para produção.

projetistas das especialidades, apoiados pelo grupo de projetos para produção

CONTROLE 1

“A”

revisão dos anteprojetos

revisão do EP-A

ANÁLISE CRÍTICA

2a reunião de coordenação RE-2 Fechamento do EP-A e encaminhamento

da próxima etapa

Formalização do projeto pelas principais especialidades: arquitetura, estruturas,

fundações, sistemas prediais, etc.

“B”

CONTROLE 2

ANÁLISE CRÍTICA

Figura 23 Exemplo de fluxo de reuniões e etapas de coordenação (Adaptado de MELHADO; BARROS; SOUZA, 1995) – segunda parte

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Coordenação de Projetos de Edifícios A coordenação de Projetos

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Figura 23 Exemplo de fluxo de reuniões e etapas de coordenação (Adaptado de MELHADO; BARROS; SOUZA, 1995) – terceira parte

participantes:

• represent. do empreendedor;

• coordenador de projetos;

• projetistas de arquitetura; estruturas, sist. prediais e grupo de projetos para produção.

projetistas das especialidades, apoiados pelo grupo de projetos para produção

projetista de arquitetura

Documentos de Referência DR-4

• DR-3; • anteprojetos de

estruturas, sistemas hidráulicos, elétricos e mecânicos

participantes:

• represent. do empreendedor;

• coordenador de projetos;

• projetistas de arquitetura; estruturas, sistemas prediais e grupo de projetos para produção.

“B”

3a reunião de coordenação RA-1 solução de interfaces técnicas

fechamento dos anteprojetos

elaboração do Projeto Legal

CONTROLE 3

revisão final dos anteprojetos e do projeto legal

4a reunião de coordenação RA-2 • entrega dos anteprojetos e projeto

legal • encaminhamentos para os projetos

executivos e proj. para produção

“C”

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Coordenação de Projetos de Edifícios A coordenação de Projetos

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Figura 23 Exemplo de fluxo de reuniões e etapas de coordenação (Adaptado de MELHADO; BARROS; SOUZA, 1995) – quarta parte

Documentos de Referência DR-5

• DR-4 • informações geradas

pelo grupo de projetos para produção, por consultores, empresas especializadas em serviços, fabricantes de materiais e componentes e outros

projetistas das especialidades e grupo de projetos para produção

participantes:

• represent. do empreendedor;

• coordenador de projetos;

• projetistas de arquitetura; estruturas, sistemas prediais e grupo de projetos para produção.

5a reunião de coordenação RD-1 Discussão dos Projetos Executivos e

dos Projetos para Produção

Fechamento dos Projetos Executivos

CONTROLE 5

“C”

6a reunião de coordenação RD-2 Compatibilização final dos Projetos

Executivos e dos Projetos para Produção

Entrega dos projetos e Fase de Preparação da Execução da Obra

Detalhamento do produto e dos métodos construtivos para

execução do empreendimento

CONTROLE 4

ANÁLISE CRÍTICA

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Evidentemente, como qualquer modelo, o fluxograma da Figura 23 deve ser adaptado ao tipo de empreendimento e às capacidades e necessidades dos agentes envolvidos. Além disso, ele pode ser ajustado às restrições e as possibilidades de cada equipe de projeto.

Em geral, faz-se importante realizar reuniões da coordenação de projetos com o representante do empreendedor, os projetistas e eventuais consultores, principalmente para fechar uma etapa de projeto e fornecer diretrizes relativas à etapa subseqüente; uma freqüência excessiva de reuniões da equipe de projeto deve ser evitada, assim como reuniões excessivamente longas, nas quais o aproveitamento da dedicação dos projetistas contratados tende a ser desfavorável. Além disso, o debate e troca de idéias entre os membros da equipe pode ser provida de diversas formas, não apenas nas reuniões de projeto; assim, por exemplo, podem ser realizadas trocas à distância, com uso de teleconferências e de sistemas de Extranet, cujas aplicações são descritas adiante, neste mesmo capítulo.

Interação entre coordenação de projetos e coordenação de obras

A interação entre essas duas esferas de coordenação tem crescido e deve ser entendida como um recurso a ser explorado para melhoria das soluções de projeto, assim como para os próprios resultados obtidos quanto à qualidade do produto final.

Identificam-se três situações principais, diferentes quanto à possibilidade de interação entre a coordenação de obras e a coordenação de projetos:

• uma mesma empresa realiza empreendimentos e obras e por isso tem possibilidades amplas de integração entre o projeto, a execução e os aspectos relacionados a planejamento e custos;

• após o projeto desenvolvido e o produto definido (sejam os empreendedores públicos ou privados), é escolhida a empresa construtora; a possibilidade de interação da construtora com o projeto ou participação no seu detalhamento depende do apoio e interesse do empreendedor e dos próprios termos de contratação da construtora;

• desenvolve-se um Projeto Executivo ou Projeto Básico, e contrata-se a empresa construtora como empreiteira, sem possibilidades de interação com os projetistas, devido ao sistema de contratação (situação típica na maioria dos empreendimentos públicos).

A primeira situação corresponde a um caso freqüente, tipicamente o que se encontra em empreendimentos residenciais privados e que apresenta como tendência a incorporação de profissionais de execução da construtora ao próprio desenvolvimento dos projetos.

A segunda situação poderá propiciar negociações de cunho técnico, em que a construtora propõe modificações do projeto que beneficiam custos, prazos ou construtibilidade, mas não permite atingir uma completa integração entre os agentes do projeto e da execução.

A terceira situação somente permite interferência da construtora se houver abertura para aprovar mudanças no Projeto Executivo, que tendem a ser morosas, ou se elas forem executadas no campo da informalidade, criando disparidades entre projeto e o produto entregue.

Em qualquer uma das situações, pode-se adotar a Preparação da Execução de Obras – PEO, como recurso para melhor integrar as fases de projeto e de execução.

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Para a realização da PEO, uma equipe é composta, incluindo a participação dos coordenadores de projetos e de obras, principais projetistas e consultores, e principais subempreiteiros. Essa equipe produz reuniões programadas e freqüentes, realizadas no próprio canteiro de obras e passa a atuar no sentido de estabelecer uma adequada transição entre as fases de projeto e de execução. A PEO, essencialmente, visa a atingir alguns objetivos importantes nessa transição, dentre os quais podem ser destacados:

• análise crítica, validação ou modificação dos projetos, memoriais descritivos e especificações;

• definições quanto à organização geral do canteiro de obras e de equipamentos;

• estudo e solução dos problemas de interface envolvendo diferentes serviços;

• discussão do planejamento para execução dos serviços;

• avaliação das amostras e protótipos dos produtos e sistemas a serem utilizados na execução da obra.

A PEO integra a filosofia de envolvimento da coordenação de projetos na fase de execução da obra, e contempla mecanismos de avaliação essenciais para a retroalimentação e melhoria dos projetos.

Coordenação de Projetos e Gestão da Informação

Na implementação de novos conceitos de gestão, uma série de obstáculos pode surgir para a efetivação das mudanças necessárias e adequação aos novos métodos. As deficiências de integração e de troca de informações entre os projetistas e demais agentes envolvidos no processo precisam ser combatidas por sistemas de informação eficientes e, por isso, ganha força a utilização de meios eletrônicos (e-mail, intranet, extranet, Internet, etc.) como ferramentas de comunicação e troca de informações, refletindo uma tendência de utilização crescente de redes de informações na gestão de projetos.

Pode-se identificar duas formas de organização das trocas de arquivos e informações de projetos. No primeiro caso, tais trocas são organizadas para se processar de forma centralizada na coordenação de projetos, ou seja, as trocas entre projetistas são mediadas pelo coordenador de projetos, que fica responsável pelo controle das informações (Figura 24a). Essa solução facilita o controle das comunicações entre os projetistas e permite acompanhar o andamento do projeto. Por outro lado, ela cria uma centralização de informações que pode significar perda de agilidade na comunicação entre os membros da equipe de projeto e prejudicar a interatividade entre os projetos. Nesse modelo, é extremamente importante que o coordenador de projetos seja ágil no recebimento, avaliação e distribuição das informações dentro da equipe.

No segundo caso, os projetistas se comunicam livremente entre si e o coordenador é mobilizado para solucionar controvérsias ou para endossar uma decisão previamente tratada entre os projetistas (Figura 24b). Nesse caso, o problema é a potencial perda de controle sobre o processo de troca de informações e a maior possibilidade de um agente implicado na decisão deixar de ser consultado, riscos que só podem ser combatidos por uma definição metodológica do processo de troca. Por outro lado, o processo é mais descentralizado, ágil e interativo, e depende menos da figura do coordenador.

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Figura 24 Duas possibilidades de fluxo de informações de projeto. (FABRICIO, 2002)

Tecnologia da informação e coordenação de projetos

O processo de projeto pode ser caracterizado como intensivo em conhecimento e seu principal “insumo” é certamente a competência do projetista. Apesar disso, uma série de dispositivos e “tecnologias” sempre foi usada para dar suporte aos projetos. As técnicas e ferramentas de desenho, são exemplos de mecanismos que interagem com as práticas de projeto e, atualmente, novas tecnologias de informação (TI) têm um impacto no processo de projeto muito mais contundente e significativo.

Após a difusão do uso dos microcomputadores, na década de oitenta, as empresas de projeto brasileiras, a informatização ganhou corpo nos anos 90 e, nos dias atuais, é difícil encontrar um escritório de arquitetura e engenharia que não faça uso de computadores para produzir seus projetos.

Com o advento dos computadores e o desenvolvimento de uma série de programas (CADD – Computer Aided Draft and Design, modeladores de imagem, programas de cálculos de estruturas, instalações, programas de planejamento, de gerenciamento eletrônico de projetos, etc.) as tecnologias de apoio ao projeto tornaram-se mais complexas e poderosas, além de mais dispendiosas. Com o advento do computador e a conseqüente facilidade e velocidade de realização de operações matemáticas complexas, surgiram na área de engenharia programas de cálculo que permitiram um significativo aumento de produtividade no desenvolvimento de muitas rotinas de projeto.

As mudanças ocorridas denotam novas possibilidades de projeto e um dos potenciais impactos mais importantes da TI está relacionado com as novas possibilidades de telecomunicações e integração à distância. O avanço da telecomunicação associada à informática tornou cada vez mais freqüente a montagem de redes de colaboração entre profissionais e pessoas geograficamente distantes. Essa possibilidade é fundamental em um setor marcado pela fragmentação e em um processo de projeto no qual os agentes estão dispersos em diversas empresas e locais distintos.

No estágio atual de desenvolvimento da tecnologia da informação muitos dos softwares utilizados em apoio ao processo de projeto são estanques e não interagem entre si. Interconectar e garantir a

Projeto I

Projeto II

Projeton

Projeto III

Coordenador

ProjetoI

Coordenador

ProjetoIII

Projeto IV

Projeto n Projeto

II

(a) Informações centralizadas pelo coordenador (b) Informações circulando entre todos

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colaboração entre agentes e entre os sistemas computacionais é um desafio que certamente será enfrentado pelos coordenadores de projeto do futuro próximo e envolve tanto o amadurecimento tecnológico, como o desenvolvimento de processos de gestão eficazes para apoiar o processo de troca de informações entre indivíduos e programas.

Anumba et al. (1997a; b) identificam sete tipos de comunicação envolvendo agentes do projeto (projetistas) e ferramentas computacionais de projeto (conforme a Figura 25):

• Comunicação intradisciplinar, entre as ferramentas de cálculo e apoio ao projeto – tipo 1;

• Comunicação entre cada projetista e suas ferramentas computacionais (interface homem-máquina) – tipo 2;

• Comunicação entre os membros da equipe de projeto – tipo 3;

• Comunicação entre cada disciplina e a coordenação do projeto – tipo 4;

• Comunicações entre as diferentes etapas de desenvolvimento do projeto – tipo 5;

• Comunicação entre a equipe de projeto e os agentes do empreendimento ou clientes (terceira parte) – tipo 6;

• Comunicação interdisciplinar entre ferramentas de apoio ao projeto – tipo 7.

Na prática atual, o principal mecanismo que vem sendo utilizado para viabilizar a colaboração digital no processo de projeto são as extranets que permitem compartilhar bases de dados digitais entre diferentes projetistas, eliminando a necessidade de trocas de projetos em papel ou via e-mail.

Assim, é inegável que os impactos da TI na forma de pensar e organizar o processo de projeto foram imensos e certamente se intensificarão no futuro, dado que os projetistas ainda estão se adaptando a esses instrumentos e nem sempre tiram total proveito das novas possibilidades. Um dos grandes desafios contemporâneos para o projeto ainda é a convergência e a integração entre as várias ferramentas utilizadas. Nos próximos anos, à medida que os dispositivos técnicos evoluírem e os projetistas utilizarem mais amplamente as possibilidades da TI, é de se supor que o processo de projeto evolua e, com ele, a coordenação de projetos.

Sistemas de gerenciamento eletrônico de projetos e Extranets

Para auxiliar e controlar a troca de informações de projeto e a comunicação entre os agentes envolvidos tem se difundido no mercado a oferta de serviços eletrônicos de gerenciamento de projetos utilizando a infra-estrutura da Internet. Esses sistemas, também conhecidos como Extranets, consistem na compra de um espaço na memória de um servidor remoto para o armazenamento centralizado de arquivos e informações de projeto, bem como a assinatura de um serviço informatizado de auxílio ao gerenciamento de equipes de projeto e trocas de informação.

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Figura 25 Interação entre projetos e ferramentas de auxílio ao projeto (Adaptado de: ANUMBA et al., 1997a; b).

As Extranets permitem armazenar e compartilhar diversas informações e documentos tais como orçamentos, cronogramas, planilhas, arquivos de CADD, arquivos de textos com memoriais, etc. em um endereço de uso restrito na Internet. Esse sistema permite centralizar em uma base de dados compartilhada por todos os projetos e informações que podem ser acessadas e manipuladas pelos membros da equipe de projeto, com uso de downloads e uploads. O acesso às informações é controlado por protocolos de autorizações e senhas e as informações são obtidas via Internet, disponibilizando para os membros da equipe de projeto apenas as últimas informações e atualizações dos projetos das diferentes disciplinas.

Os sistemas de gerenciamento eletrônico de projetos possibilitam a automação do controle de versões e de inserções de novas informações nos projetos, o que auxilia o controle do fluxo de informações. Constam desses sistemas mecanismos de documentação das alterações e das trocas de informações no processo de projeto, permitindo otimizar a comunicação e a colaboração entre os projetistas, bem como ampliar os controles sobre o processo de projeto (rastreabilidade das informações, das alterações de projeto e dos prazos de projeto).

F ferramenta

arquitetos

engenheiros instalações

construtora

tecnologia e qualidade

cliente

engenheirosestruturas

padrões de projeto

444

44

4

Para ferramenta

Para ferramenta

F

F F

1 1

1

2 2

F

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1 1

1

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F

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1 1

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7 7

terc

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par

te

6

6

6

Etapas de projeto

5

33

3 3

33

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Essa tecnologia tem se difundido rapidamente no segmento de construção de edifícios; entretanto, no estágio atual, deficiências ligadas a uma aplicação empírica das ferramentas levam, em muitos casos, à subutilização ou ao uso inadequado dos sistemas.

Na Tabela 12, com base em Soibelman; Caldas (2000), são apontadas algumas das vantagens e riscos do uso de Extranets na gestão das informações e arquivos de projeto.

Tabela 12 Vantagens e riscos potenciais do uso de Extranets na coordenação de projetos (Adaptado de: SOIBELMAN; CALDAS, 2000)

Vantagens Riscos potenciais

• criação de um banco central de dados e documentos do empreendimento;

• maior eficácia no controle de versões de projetos;

• velocidade e agilidade na troca de informações entre projetistas;

• redução de erros de comunicação entre os membros da equipe de projeto;

• redução de custos de impressão, cópias, mensageiros e correio;

• acesso controlado e customizado para cada usuário.

• risco de incompatibilidade entre o fluxo de informação e o fluxo do processo de projeto;

• risco de envio excessivo de informação desnecessária, pela falta de critérios para se avaliar a pertinência das informações;

• risco de dificuldade de acesso à informação, devido à grande variedade de tipos de dados existentes;

• risco de tempo excessivo de espera por respostas, devido à falta de mecanismos de monitoramento dos processos.

Como se pode observar na Tabela 12, os principais riscos envolvidos no uso das Extranets estão relacionados mais com deficiências de gestão do processo de projeto do que com os limites da tecnologia.

Apesar de representar um importante avanço, facilitando a comunicação entre projetistas separados geograficamente e auxiliando no controle de troca de informações, prazos de projeto, etc. o uso dos sistemas de gerenciamento eletrônico de projetos leva a um vertiginoso aumento na quantidade e no fluxo de informações entre as pessoas. Na falta de procedimentos e de “normas de comportamento” claros sobre quais informações devem ser enviadas e para quais agentes do projeto, surge a tendência de enviar “tudo” para “todos”, o que gera uma sobrecarga informacional que leva os projetistas a criarem uma aversão por esses sistemas e, muitas vezes, a desconsiderar dados importantes perdidos no emaranhado de informações recebidas.

Um outro problema recorrente do uso inadequado e não sistematizado dos recursos da tecnologia da informação é a troca, entre projetistas, de arquivos de projeto sem uma codificação e padronização das camadas (layers) que compõem os projetos. Além disso, relatos de projetistas chamam atenção para a falta de confiabilidade das informações dos desenhos em CADD; por exemplo, com a facilidade de alteração de cotas e dimensões é comum que elas sejam modificadas sem a correspondente modificação na base de dados do arquivo, ou seja, decide-se alterar ligeiramente a medida de um ambiente e se edita a cota sem modificar o desenho, já que visualmente não se notará a diferença. Essa prática, que no papel não traz maiores conseqüências, pode significar uma grande confusão quando um outro projetista se utiliza desse arquivo digital de projeto para desenvolver os desenhos e informações complementares.

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De fato, a possibilidade de colaboração ganha um importante apoio com as Extranets, mas essa tecnologia não resolve os problemas de gestão envolvidos. Ao contrário, pode agravá-los, devido ao aumento da complexidade das interações entre os agentes e acúmulo de informações. Assim, para que tais ferramentas alcancem plenamente suas possibilidades, devem ser acompanhadas de uma nova cultura de trabalho colaborativo e de uma organização e planejamento mais cuidados do processo de projeto, pautados em uma coordenação de projetos eficiente e eficaz.

Questões para aprofundamento do tema

Discutir a formação e a experiência necessárias para um profissional de coordenação de projetos. Como a temática relativa à coordenação de projetos deve ser inserida na formação de graduação de arquitetos e engenheiros? Como a coordenação de projetos pode ser tratada por cursos de pós-graduação e especialização profissional?

Qual o papel da Tecnologia da Informação (TI) na coordenação de projetos? Como a TI pode ser empregada e aprimorada para responder aos desafios da coordenação de projeto? Como desenvolver sistemas gerenciais e procedimentos que garantam a introdução eficaz da TI no processo de projeto de edifícios e na sua coordenação?

Qual o papel das entidades normativas e de classe ligadas ao setor de construção na formulação e implementação de normas de projeto que representem um arcabouço referencial para a atividade de coordenação de projetos e para parametrizar a qualidade do processo de projeto?

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