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Verônica Alves Peruso
CONTROLE JUDICIAL DO MÉRITO DO ATO
ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
Centro Universitário Toledo
Araçatuba
2011
Verônica Alves Peruso
CONTROLE JUDICIAL DO MÉRITO DO ATO
ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção
de grau de bacharel em Direito à Banca Examinadora do
Centro Universitário Toledo sob a orientação do Professor
Daniel Barile da Silveira.
Centro Universitário Toledo
Araçatuba
2011
Banca examinadora
_________________________________________________
Nome Completo (orientador)
Titulação-Instituição
__________________________________________________
Nome Completo
Titulação-Instituição
__________________________________________________
Nome Completo
Titulação-Instituição
Araçatuba ______de____________________de______
Dedicatória
Dedico este trabalho a minha mãe que com compreensão,
incentivo, apoio e muito amor, por não ter me deixado
desanimar em todos os momentos de desespero estando
em todos esses momentos ao meu lado, é responsável
direta pelo êxito deste trabalho. Ofereço a ela por não ter
medido esforços para me ajudar nessa longa caminhada.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais pelo carinho e compreensão e por me possibilitarem essa conquista,
em especial a minha mãe por toda a dedicação e presença constante.
Agradeço à DEUS pela saúde e força, por me acompanhar nessa importante etapa, sem deixar
de me apoiar nos momentos difíceis, e por sua benção, pois sem ela não seriamos nada.
Ao meu orientador, Professor Daniel Barile da Silveira pela paciência, atenção e por
compartilhar o seu conhecimento.
A todos os Professores que fizeram parte dessa trajetória e contribuíram para a minha
formação acadêmica
Ao Marco Aurélio Alves pelo apoio, por todas as conversas e ideias.
A todos os familiares, amigos colegas que contribuíram para o desenvolvimento deste
trabalho.
“A força do direito deve superar o direito da força.”
Rui Barbosa
RESUMO
Este trabalho acadêmico tem como objetivo analisar as possibilidades do
controle judicial do mérito do ato administrativo discricionário das agências reguladoras e,
quais seriam os limites que devem ser observados pelo Poder Judiciário, analisando
brevemente as agências reguladoras, sua função, natureza jurídica e suas principais diferenças
em relação aos outros entes da mesma espécie, é feita também uma analise superficial a
respeito do que é o ato administrativo, objeto este utilizado pelas agências para exteriorizar
suas funções, tema este de fundamental importância para o entendimento e desenvolvimento
deste trabalho, além de um estudo a respeito das diversas formas de controle a que se poderá
submeter uma agências reguladora. Por um tempo doutrina e jurisprudência se posicionavam
no sentido de que em relação ao mérito administrativo não seria possível análise pelo Poder
Judiciário, este deveria apenas se limitar ao controle da legalidade, tal entendimento fora
evoluindo ao longo do tempo assim como as atividades administrativas, evolução esta que
surgiu principalmente após a Constituição Federal de 1988, ampliando dessa forma a atuação
do Poder Judiciário.
Palavras-chaves: Agências Reguladoras, ato administrativo discricionário, controle judicial,
mérito administrativo.
ABSTRACT
This academic work is to analyze the possibilities of judicial review of the
merits of an administrative discretion by regulatory agencies, and what are the limits to be
observed by the judiciary, briefly analyzing the regulatory agencies, function, and its main
legal differences in relation to other entities of the same species, is also made a superficial
analysis of what is an administrative object used by this agency to externalize their functions,
a topic of fundamental importance for the understanding and development of this work, in
addition to a about the various forms of control that you can submit a regulatory agency. For a
while were standing doctrine and jurisprudence in the sense that on the merits would not be
possible administrative review by the judiciary, this should only be limited to the control of
legality, such understanding had evolves over time as well as administrative activities,
development that this arose mainly after the 1988 Federal Constitution, thus extending the
judicial power.
Keywords: Regulatory Agencies, an administrative discretion, judicial review, credit
administration.
LISTA DE ABREVIATURAS
AGERGS - Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados, no Rio Grande
do Sul
AGU - Advocacia Geral da União
ANATEL - Agência Nacional de Telecomunicações
ANP - Agência Nacional do Petróleo
ANTAQ - Agência Nacional de Transportes Aquaviários
ANTT - Agência Nacional de Transportes Terrestres
ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária
ARCE - Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados no Ceará
ARCON - Agência Estadual de Regulação e Controle de Serviços Públicos no Pará
Art. - Artigo
CF - Constituição Federal
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 11
I. AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS ................................................................. 14
1.1 Breve Histórico ......................................................................................................... 14
1.2 Natureza Jurídica ....................................................................................................... 16
1.3 Característica ............................................................................................................. 19
1.3.1 Poder Normativo ............................................................................................. 20
1.3.2 Autonomia ....................................................................................................... 22
1.3.2.1 Autonomia Administrativa.................................................................... 24
1.3.2.2 Autonomia Financeira ........................................................................... 26
1.3.3 Especialização Técnica ................................................................................... 28
II. ATOS ADMINISTRATIVOS ............................................................................................. 30
2.1 Conceito .................................................................................................................... 30
2.2 Requisitos do ato administrativo ............................................................................... 32
2.3 Atos Administrativos Vinculados e Discricionários ................................................. 37
2.4 Mérito Administrativo do Ato Administrativo ......................................................... 40
2.5 Espécies de Atos Administrativos ............................................................................. 42
2.6 Ato Administrativo Normativo ................................................................................. 43
III. CONTROLE EXTERNO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS .................................................................................................................... 45
3.1 Controle pelo Poder Executivo ................................................................................. 45
3.2 Controle pelo Poder Legislativo................................................................................ 47
3.3 Controle do Tribunal de Contas ................................................................................ 50
3.4 Controle pelo Ministério Público .............................................................................. 51
3.5 Controle pelo Poder Judiciário .................................................................................. 53
3.5.1 Controle Judicial do Mérito do Ato Administrativo Discricionário ............... 56
CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 60
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 62
ANEXOS ................................................................................................................................. 65
Anexo A ......................................................................................................................... 66
Anexo B ......................................................................................................................... 74
11
INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho consiste em estudar a possibilidade da análise do
mérito do ato administrativo discricionário das agências reguladoras pelo Poder Judiciário,
tema este polêmico e em constantes discussões entre os estudiosos do tema, isso se deve ao
fato de que as agências reguladoras foram sendo instituídas no ordenamento jurídico
brasileiro com mais força e mais autonomia do que as outras autarquias, adquirindo estas uma
independência relativa aos três poderes. Autonomia esta não dispensada às autarquias já
existentes, gênero ao qual pertencem as agências reguladoras.
As Autarquias pertencem à Administração Pública indireta e são pessoas
jurídicas de direito público. A definição de autarquia esta no art. 5º inciso I, do Decreto-lei
n.200 de 1967, dispõe este ser a autarquia “o serviço autônomo criado por lei, com
personalidade jurídica, com patrimônio e receitas próprias, para executar atividades típicas da
Administração Pública que requeiram para o seu melhor funcionamento, gestão administrativa
e financeira descentralizada”.
Pode-se conceituar autarquia como entes administrativos autônomos, com
personalidade jurídica de Direito Público interno, possuem tem patrimônio próprio e algumas
atribuições estatais, sendo que são criadas por lei específica.
As Autarquias já existem no Brasil há muito tempo, mas foi na década de 90
que surgiram as Agências Reguladoras “em regime especial”, é devido a algumas
características que se denominou chamá-las de autarquias especiais ou em regime especial.
Esse tipo de autarquia deriva do direito norte-americano, se considera que
essas agências foram as primeiras da espécie a surgirem no mundo. Apesar de derivarem deste
direito nada tem a ver as agências brasileiras com as agências norte-americanas são totalmente
distintas, apenas a ideia é que fora retirada deste direito.
Muito se fala que o direito norte-americano é o direito das agências, no
Brasil as autarquias compõem a Administração Pública indireta e pode-se dizer que são entes
secundários, pois há os que de certo modo são principais, ou seja, a Administração Direta, nos
Estados Unidos as próprias agências é que são o Poder Público, diferença esta de grande
relevância, em tal direito alienígena a independência destes entes é praticamente absoluta.
No Brasil são relativamente independentes, diversas são as diferenças, como
mencionado apenas a ideia é retirada de tal direito.
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As agências reguladoras brasileiras atuam fiscalizando e aplicando normas,
para que estas exerçam suas funções com liberdade, a elas é atribuído um poder normativo
para edição de normas gerais e abstratas referentes à sua área de atuação.
Essas autarquias denominadas Agências Reguladoras são criadas mediante
lei específica conforme previsão constitucional, e não necessitam de qualquer registro por
serem criadas diretamente por lei, são modelos institucionais que surgiram de reformas
administrativas, para atuar na fiscalização e aplicação de normas.
As Agências são autarquias pertencentes à Administração Indireta e a tais
autarquias outorgou-se o poder de criar normas que dizem respeito ao setor por ela
fiscalizado, tal poder deve-se limitar somente às matérias pertinentes ao que esta sendo
regulado, não podendo se exceder em seus atos, esta característica será assunto do primeiro
capítulo.
No primeiro capítulo fora feito uma síntese de algumas de suas
características, sua natureza jurídica e o denominado poder normativo tema este polêmico
entre os administrativistas.
Fora abordada sua autonomia administrativa sendo esta a relativa liberdade
concedida aos seus administradores e a sua autonomia financeira comentando-se sobre a taxa
de fiscalização, além da especialização técnica, requisito este que deve estar presente em todo
e qualquer dirigente de uma agência reguladora.
Nesta primeira parte procurou-se abranger os assuntos de maior relevância,
para ter uma noção do que são esses entes pertencentes ao direito brasileiro, abrangendo seus
detalhes principais.
No segundo capítulo será abordado o Ato Administrativo, tema esse
essencial para desenvolver este trabalho, pois é através deste que as agências reguladoras
exercem suas funções e o estudo principal refere-se ao ato administrativo discricionário.
Estuda-se seu conceito, seus cinco requisitos, ou seja, o sujeito, o objeto, a
forma, a finalidade e o motivo, requisitos esses indispensáveis à validade de um ato
administrativo.
Seguindo desta forma, neste trabalho será abordado o ato administrativo
vinculado e discricionário, comentando cada um desses, bem como o significado de mérito
administrativo, caminhando dessa forma para o objetivo principal.
Ainda no segundo capítulo, menciona-se sobre as diversas espécies de ato
administrativo, comentando-se brevemente cada uma delas, e uma analise mais profunda a
respeito do ato normativo, forma esta utilizada pelas agências reguladoras.
13
Já no terceiro capítulo comenta-se sobre as várias espécies de controle a que
se submete esse tipo de autarquia, não só esse tipo mais qualquer outra, estuda-se o controle
exercido pelo Poder Executivo o qual nota-se uma independência maior, além do controle
exercido pelo Poder Legislativo, pelo Tribunal de Contas, pelo Ministério Público e por fim o
controle exercido pelo Poder Judiciário objetivo principal do trabalho, dentro deste último
desenvolve-se um tópico a respeito do controle judicial do mérito do ato administrativo
discricionário abordando as opiniões contra e a favor do exercício do poder judiciário no
mérito administrativo das decisões tomadas pelos dirigentes dessas autarquias em regime
especial.
14
I. AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS
As Agências Reguladoras brasileiras são pessoas jurídicas de direito público
pertencentes à Administração Pública indireta, são criadas na forma de autarquias. Tais
autarquias são criadas por lei específica e apenas duas delas têm previsão constitucional, a
ANATEL prevista no art. 21, XI e a ANP prevista no art. 177, § 2º, III.
Não são autarquias comuns como qualquer outra, se diz que são autarquias
em regime especial, pois possuem a função de regular atividades exercidas por entidades
privadas, mas que lhes foram transmitidos pela Administração Pública, pois é esta que é a
detentora do serviço ou tem função fiscalizadora, e apesar de ser responsável pelo serviço na
maioria das vezes não possui recursos adequados, para exercer o mesmo, ou o serviço que
esta sendo prestado não corresponde à modernidade alcançada ficando dessa forma um
serviço pouco eficiente e sem muitos recursos.
Neste primeiro capítulo faremos um breve estudo sobre as agências
reguladoras, estudando o seu surgimento, sua natureza jurídica e suas principais
características.
1.1. Breve Histórico
O Decreto-lei 200 de 25 de Fevereiro de 1967 dispõe sobre a organização da
Administração Federal, estabelecendo diretrizes para reformas administrativas, entre outras
providências, este decreto regula a estrutura administrativa da organização federal dividindo a
Administração Pública em Administração Direta e Indireta.
Nos termos do mencionado decreto pertencem à Administração Direta os
serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios,
ou seja, a União, os Estados, Municípios e Distrito Federal, e pertencem à Administração
Indireta as Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações
Públicas.
15
As agências Reguladoras são pessoas jurídicas de Direito Público interno
pertencentes à administração indireta, são entidades da administração indireta porque são
constituídas na forma de Autarquia.
As agências reguladoras no direito brasileiro seriam no sentido amplo
“qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função
de regular as matérias que lhe está afeta”. (DI PIETRO 2007, p. 434).
As agências Reguladoras surgiram no Brasil na década de noventa devido à
escassez de recursos provenientes do Estado, a Administração estava se mostrando incapaz de
acompanhar o mercado e as novidades que foram sendo implantadas, havia a necessidade de
especialização normativa para resolver conflitos e prestar de forma adequada os serviços
públicos, além disso, era preciso que alguns setores regulados pela Administração Pública não
ficassem a mercê de oscilações políticas.
Justamente pelo fato de a Administração Pública estar se mostrando
ineficiente na prestação de serviços básicos que constitucionalmente é obrigada a prestar à
população sentiu-se a necessidade de transferir tal obrigação a entidades privadas.
O Brasil passava por uma grande crise econômica e dessa forma o governo
se viu sem recursos para suprir todas as suas demandas.
O serviço que estava sendo prestado não atendia às expectativas da
população, diante de tantas dificuldades o governo da época percebeu que transferindo a
execução desses serviços a entidades privadas, essas poderiam prestar o serviço com mais
eficiência, a Administração poderia fiscalizar e exigir que o serviço fosse prestado de forma a
satisfazer os usuários dos serviços.
Essa transferência mostrava-se vantajosa, a Administração não tem que
investir nos recursos que forem necessários a prestação dos mesmos e também não dispõe de
recursos próprios e ainda exige a eficiência do serviço.
Dessa forma, através de uma Reforma Administrativa a Administração
Pública passou a transferir a execução dos serviços públicos por ela prestados com
ineficiência a entes privados que são fiscalizados e devem prestar tais serviços com eficiência.
Assim então surgiram as concessões, terceirizações, privatizações entre
outros, onde o particular é autorizado pelo poder público a prestar um serviço em que o
Estado está obrigado a prestar a população ou se não está obrigado a prestar deve ao menos
fiscalizar.
O fato de esses serviços serem prestados por empresas privadas
concessionárias do serviço não modifica a sua natureza pública, tais serviços não podem ser
16
prestados de qualquer forma pelas entidades privadas, o Estado deve conservar a
responsabilidade em relação à prestação adequada dos serviços.
Dessa forma surge as Agências Reguladoras, com a função de regular tais
serviços e expedir normas que dizem respeito ao setor que regulam, pois imagine o caos que
se instalaria se não houvesse nenhuma fiscalização e as entidades privadas pudessem prestar o
serviço da forma que bem entendessem, haveria uma enorme insatisfação por parte da
população, e o responsável por esse caos seria o Estado que apesar de não estar prestando o
serviço pessoalmente mantêm a sua titularidade e a responsabilidade pelo mesmo.
1.2. Natureza Jurídica
As agências reguladoras estão sujeitas ao preceito do art. 37, XIX da
Constituição Federal, devendo ser criadas por lei específica, estas foram introduzidas no
Brasil sob a forma de Autarquias e sendo assim como consequência são pessoas jurídicas de
direito público.
O Decreto-lei nº 200 de 1967 em seu art. 5º, I, dispõe ser a autarquia “o
serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita própria,
para executar atividade típica da administração pública que requeiram, para seu melhor
funcionamento, gestão administrativa descentralizada”.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 400) ensina que autarquia é a
“pessoa jurídica de direito público, criada por lei, com capacidade de autoadministração, para
o desempenho de serviço público descentralizado, mediante controle administrativo exercido
nos limites da lei”.
As agências reguladoras não originaram do direito brasileiro, elas derivam
do direito administrativo norte-americano, e surgiram no Brasil por volta da segunda metade
da década de noventa, são pessoas jurídicas de direito público e pertencem à Administração
indireta, são dotadas de autonomia e especialização técnica.
Marçal Justem Filho (apud LEHFELD, 2008, p. 246) comenta a respeito da
natureza jurídica das agências reguladoras onde menciona:
O tema da natureza jurídica das agências reguladoras apresenta uma originalidade
muito relativa no âmbito do direito pátrio, especificamente em virtude da
impossibilidade de comparação precisa e exata com o Direito estrangeiro. Essa
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diferença adquire especial relevo por envolver alguns dos traços mais essenciais dos
sistemas jurídicos considerados. Talvez o tema da natureza jurídica envolva um dos
aspectos em que as diferenças entre sistema brasileiro e os estrangeiros mais se
acentuam.
Entretanto estas recebem a designação de “autarquia sob regime especial”,
pois elas têm prerrogativas próprias e a sua principal característica é a relativa autonomia em
relação ao Poder Público
Leila Cuéllar (apud MENEZELLO, 2002, p. 64) define o termo agências
reguladoras:
São pessoas jurídicas de direito público, criadas por lei e que somente por lei podem
ser extintas. Exercem atividades e serviços administrativos (regulação e fiscalização
da atividade econômica em sentido amplo), possuem capacidade administrativa,
autonomia patrimonial, mas permanecem sob o controle e tutela do Estado quanto à
sua organização, administração e fiscalização financeira.
A designação “regime especial” destina-se apenas a frisar a autonomia que é
conferida aos órgãos reguladores, sem que sua forma autárquica represente inovação.
São denominadas de autarquias em regime especial devido a várias
peculiaridades que as diferem das autarquias comuns, como a ausência de subordinação
hierárquica, independência administrativa e financeira, estabilidade de dirigentes, caráter final
de suas decisões insuscetíveis de apreciação pela Administração entre outras.
Na verdade não há muita inovação, constitui inovação o vocábulo agora
utilizado (DI PIETRO apud BUCHEB, 2004, p.3):
A única coisa que constitui inovação é o próprio vocábulo, anteriormente não
utilizado para designar entes da Administração Pública. A função normativa sempre
foi exercida por inúmeros órgãos da Administração Pública, com maior ou menor
alcance, com ou sem fundamento constitucional.
É possível notar que diversos autores comentam que algumas características
das agências reguladoras não constituem novidade no direito brasileiro, novidade é apenas o
termo agora utilizado, ou seja, o que acontece é que esse tipo de autarquia sempre foi previsto
mais era pouco utilizado, e há uma falsa impressão de que são entidade recentes, o que
constitui novidade é apenas o termo “autarquia especial”.
No mesmo sentido Celso Antônio Bandeira de Mello (2002, p. 150)
comenta sobre o assunto:
Em rigor, autarquia com funções reguladoras não se constituem em novidade
alguma, o termo com que ora foram batizadas é que é novo no Brasil. Apareceu ao
18
ensejo da tal “Reforma Administrativa”, provavelmente para dar sabor de novidade
ao que é muito antigo, atribuindo-lhe, ademais, o suposto prestígio de ostentar uma
terminologia norte-americana (“agência”).
Como visto as agências reguladoras não são novidades no Brasil, a
denominação que vem sendo utilizada é que é uma novidade. Diversas características das
agências reguladoras já eram características das autarquias existentes.
Característica que constitui novidade é a estabilidade dos dirigentes das
agências, pois não era dessa forma, seus dirigentes não possuíam mandato fixo (2002, p. 152):
Assim, o único ponto realmente peculiar em relação à generalidade das autarquias
está na disposição atinente à investidura e fixidez do mandato dos dirigentes destas
pessoas, e que se contém nos arts. 5º e parágrafo único, 6º e 9º da Lei 9.986, de
18.7.2000 (que dispõe sobre a gestão dos recursos humanos das agências
reguladoras).
Então novidade é a estabilidade dos dirigentes das Agências Reguladoras,
pois antes esse “mandato fixo” dos dirigentes não era possível, tal assunto será estudado no
tópico Autonomia Administrativa.
A autarquia especial é “aquela a que a lei instituidora conferir privilégios
específicos e aumentar sua autonomia comparativamente com as autarquias, sem infringir
preceitos constitucionais pertinentes a essas entidades de personalidade pública”.
(MEIRELLES, 2001, p.333).
Os membros das Agências Reguladoras são indicados pelo chefe do Poder
Executivo, e devem ter a aprovação do Poder Legislativo onde são nomeados para um
mandato com prazo fixo, os dirigentes devem ter reputação ilibada e evidente especialização
no setor que será por ele regulado.
Essa Autonomia e Independência que é garantida aos dirigentes das
Agências são essenciais, pois dessa forma é permitido a eles regular e fiscalizar com ampla
liberdade julgando com imparcialidade e diminuindo assim as influências políticas e
econômicas, dificultando dessa forma uma possível captura das agências.
Marçal Justen Filho (apud MENEZELLO, 2002, p. 82) comenta sobre a
captura das agências assunto este que vale a pena citar:
Captura se configura quando a agência perde a sua condição de autoridade
comprometida com a realização do interesse coletivo e passa a produzir atos
destinados a legitimar a realização dos interesses egoísticos de um, alguns, ou todos
os segmentos empresariais regulados. A captura da agência se configura, então,
como mais uma faceta do fenômeno de distorção de finalidade dos setores
burocráticos estatais.
19
A captura é uma das maiores preocupações no que diz respeito às agências
reguladoras, tal fenômeno deve ser evitado ao máximo para que a função e os objetivos das
agências não sejam desvirtuados.
A política brasileira pode influenciar muito nas decisões e atos praticados
por determinadas entidades, seus atos devem ser livres de manipulações e influências
políticas, para que haja uma harmonia entre a agência, usuários dos serviços e entidades
reguladas.
1.3. Características
Essas Autarquias são um dos vários instrumentos de que pode dispor o
Estado, as Agências embora sempre regulem setores distintos de atividades e serviços,
possuem características que são comuns a todas elas, como exemplos a competência
normativa, independência, a especialização técnica, a atribuição regulamentadora, dentre
várias outras.
É importante mencionar que se diz que essas autarquias especiais são
relativamente independentes quanto aos Três Poderes e é dessa independência e autonomia
que derivam várias de suas características.
As agências exercem suas competências por meio de atos administrativos
podendo eles ser vinculados ou discricionários, tema este que será estudado no próximo
capítulo, as agências são relativamente independentes e tal independência é uma de suas
principais características.
Essa independência pode ser relacionada em quatro aspectos, relação esta
que se refere à independência relativa (MOREIRA NETO apud VIOLIN, 2004, p. 1):
1º) independência política dos gestores, investidos de mandatos e com estabilidade
nos cargos durante um termo fixo; 2º) independência técnica decisional,
predominando as motivações apolíticas para seus atos, preferentemente sem recursos
hierárquicos impróprios; 3º) independência normativa, necessária para o exercício
de competência reguladora dos setores de atividades de interesse público a seu
cargo; e 4º) independência gerencial orçamentária e financeira ampliada, inclusive
com a atribuição legal de fonte de recursos próprios, como, por exemplo, as
impropriamente denominadas taxas de fiscalização das entidades privadas
executoras de serviços públicos sob contrato.
20
A autonomia ou a independência é uma de suas principais características e
estas se referem às decisões, instrumentos, financiamentos e objetivos.
Neste capítulo iremos abordar algumas dessas características peculiares
entre as denominadas autarquias em regime especial.
1.3.1. Poder Normativo
É conferido às Agências Reguladoras o que se denominou chamar de “poder
normativo” se traduz por poder normativo, a possibilidade a elas atribuída de expedir decretos
e regulamentos que dizem respeito ao seu campo de atuação, regulamentando leis que regem
suas atividades e editando normas independentes que não foram disciplinadas pela lei.
Conforme Lucas de Souza Lehfeld (2008, p. 264):
Essa competência normativa atribuída pelo núcleo político do Estado (Poder
Legislativo e Executivo) às agências reguladoras não representa propriamente
inovação da ordem jurídica, pois não são competentes para legislar. Na realidade
estabelece normas (regras) de cunho operacional a fim de suprir, com eficiência, as
metas e objetivos a elas previamente estabelecidos.
As agências reguladoras têm a função de fiscalizar e regular atividades
econômicas, buscando eficiência, racionalidade e universalidade do serviço que esta sendo
prestado pelas entidades privadas, preservando a concorrência e o direito dos consumidores
usuários dos serviços.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (apud LEHFELD, 2008, p. 265) em sua
doutrina relaciona quais seriam as normas que as agências poderiam produzir:
(a) Regular a própria atividade da agência por meio de normas de efeitos
internos; (b) conceituar, interpretar, explicar conceitos jurídicos indeterminados
contidos na lei, sem inovar na ordem jurídica. Essa segunda função explica-se pela
natureza técnica e especializada das agências. A lei utiliza, muitas vezes, conceitos
jurídicos indeterminados, cujo sentido tem que ser definido por órgãos técnicos
especializados.
Esse tal “poder normativo” que é concedido às agências ocasiona discussões
constantes entre os estudiosos do tema, uns dizem serem as agências reguladoras
constitucionais, outros inconstitucionais e alguns relativamente constitucionais, afirmam uma
grande parte deles que a possibilidade dessas Autarquias especiais expedirem normas mesmo
21
que diga respeito ao setor regulado por elas, poderiam acabar se tornando abusivas e ferir uma
série de princípios constitucionais e infraconstitucionais.
Meirelles (apud VIOLIN, 2004, p.1) em uma de suas obras comenta sobre o
assunto mencionando que os excessos por elas cometidos serão considerados
inconstitucionais:
Tem-se contestado o poder normativo conferido às agências, mas esse poder
normativo há de se cingir aos termos de suas leis instituidoras e aos preceitos dos
decretos regulamentadores expedidos pelo Executivo. Naquilo que extravasar desses
parâmetros a norma expedida pela agência será inconstitucional.
Os juristas estudiosos do tema em sua maioria se preocupam com os
princípios constitucionais e infraconstitucionais que as agências poderiam atingir se
excedendo em sua regulação, por isso é de extrema importância a fiscalização do Poder
Judiciário na atuação das Agências. Também não seria possível outorgar a elas o poder de
regular determinado setor sem que tivessem liberdade para atuar nessa regulação e na
fiscalização do mesmo, é essencial essa liberdade, infelizmente há a possibilidade de excessos
e é exatamente por esse motivo que existe o controle externo.
Muito se fala nos limites a esse poder normativo e os seus objetivos, as
normas criadas por estas devem ser de cunho exclusivamente técnico (MADEIRA apud
VIOLIN, 2004, p.1):
O objetivo da delegação de poder normativo às agências reguladoras tem como
causa única e exclusiva, possibilitar a edição de forma rápida normas de cunho
exclusivamente técnico. A discricionariedade técnica é o fundamento de validade
das normas reguladoras baixadas pelas agências. Ainda comenta que ultrapassar os
limites técnicos, ao acrescentar às normas reguladoras critérios políticos-
administrativos onde não deviam existir, caracterizará invasão de poder próprio à
esfera das decisões do Poder Legislativo. Deve-se atentar, portanto, que a
discricionariedade técnica existe apenas quando a decisão que nela se fundar poder
ser motivada também tecnicamente. Esta é, quiçá, a limitação mais importante, pois
afasta, ao mesmo tempo, o arbítrio, o erro, a impostura e a irrazoabilidade.
Os atos praticados pelas Agências reguladoras devem ser puramente
técnicos, sendo estes praticados dessa forma não vão invadir outras esferas, mas claro que de
alguma forma em alguns casos seus atos podem ultrapassar certos limites e como acima
mencionado é por isso que existe o controle externo, para fiscalizar atos que não saiam
conforme imaginou a legislação que lhe outorgou essa liberdade de atuação.
1.3.2. Autonomia
22
As Agências Reguladoras tem a função de fiscalizar e regular atividades
específicas, que dizem respeito ao setor por elas regulado.
Para que essa fiscalização não seja influenciada de alguma forma é que se
deu liberdade e autonomia às Agências e são esses sem dúvida elementos que as diferem.
Há grande divergência em relação ao termo a ser utilizado se Independência
ou Autonomia Carlos Ari Sundfeld pensa ser o termo “independência” exagerado conforme é
possível notar em sua obra (2000, p. 23-24):
As agências vêm sendo dotadas de alguma “independência”, que a legislação
menciona ser características importante de várias delas. Independência é uma
expressão certamente exagerada. No mundo jurídico preferimos falar em autonomia.
Mas garantir a independência é fazer uma afirmação retórica com o objetivo de
acentuar o desejo de que a agência seja ente autônomo em relação ao Poder
Executivo, que atue de maneira imparcial e não flutue sua orientação de acordo com
as oscilações que, por força do sistema democrático são próprios desse Poder.
Se autonomia ou Independência o fato é que as Agências Reguladoras como
autarquias especiais possuem características que as tornam relativamente livres.
Para que as Agências exerçam suas funções com isonomia e equidade
previu-se algumas garantias que permitem a elas alcançar seus objetivos, pois seus atos são
complexos, e com tais garantias podem ser efetivamente alcançados.
Essas garantias são as autonomias específicas que serão analisadas nos
próximos tópicos.
As Agências Reguladoras são criadas com o objetivo de estabelecer
regulamentos e normas para a prestação de serviços transferidos ao setor privado por meio de
concessões e parcerias e dessa forma estabelecer uma harmonia e um equilíbrio ao serviço
que esta sendo prestado por entidades privadas que é de interesse dos usuários e obrigação do
Estado.
Essa transferência ao setor privado de serviços que deveriam ser prestados
pelo Estado acaba tendo algumas consequências caso não seja acompanhado por algum ente
com poderes para regular o serviço prestado, o ente regulador estabelece normas que devem
ser capazes de ajustar deficiências que podem acabar se tornando frequentes nos mercados
onde a competição pode ser estimulada, e há a atuação de várias concessionárias como
exemplo pode ocorrer o monopólio natural, oligopólio ou mesmo a reserva de mercado.
23
Nesse ponto a Agência que regula determinado setor deve atuar de forma
não intervencionista ao ponto de desestimular a competição e nem chegar ao extremo
prejudicando o interesse coletivo.
A base da regulação moderna é o exercício da função, determinada por entes
autônomos, atuando de forma que não haja interferência política, e atraindo o interesse do
capital privado em investir e prestar serviços.
Diante desse atributo das Agências Reguladoras, elas são consideradas
Autarquias autônomas, esta é uma de suas características marcantes, e também a principal, na
qual se torna visível a tentativa de se criar uma esfera decisória imune à intervenção do
governo.
Essa independência e autonomia é um ponto comum a todos os estudiosos
que se dedicam ao estudo das Agências Reguladoras.
O jurista espanhol Gaspar Ariño (apud BUCHEB, 2003, p.1) comenta se
referindo a especialização e a independência:
As duas notas fundamentais que as caracterizam – suas duas grandes vantagens –
são a especialização e a independência”. Um pouco mais adiante em seu texto,
continua: „a independência de juízo e a de decisão resultam particularmente
necessárias nestas matérias por razões fundamentais: primeiro porque para o político
o mais fácil é adiar o problema; segundo porque nos encontramos diante de
situações que afetam diretamente os direitos e liberdades dos cidadãos, onde as
decisões devem ser tomadas com a imparcialidade e independência de um juiz.
A atuação das Agências Reguladoras compreende um amplo poder de
fiscalizar, baixar regulamentos e atos normativos e até mesmo a possível arbitragem e
mediação de conflitos.
Por meio dessa característica há uma transmissão de poderes, que Tércio
Sampaio Ferraz Junior (2000, p.1) denomina de poderes quase-legislativos, poderes quase-
judiciais e poderes quase-regulamentares.
Denominou-se chamar de poder quase-legislativo porque quem tem
competência constitucional para a edição de lei é o Congresso Nacional, diz-se quase-judicial
porque quem é legitimado para exercer esse poder é o judiciário e por fim poder quase-
regulamentar porque é do Presidente da República a competência para expedir regulamento.
A autonomia e independência atribuída às Agências são fundamentais para
o seu desempenho em regular e fiscalizar o setor que diz respeito a ela, pois a atividade
regulada é sempre de interesse comum e não pode ficar sujeita a constantes mutações
políticas.
24
1.3.2.1 Autonomia Administrativa
A autonomia administrativa resume-se na liberdade concedida aos
dirigentes das agências reguladoras, é a produção de normas próprias à escolha de seus
dirigentes, dentro dos limites a elas outorgados.
Em relação a essa autonomia Lucas de Souza Lehfeld (2008, p. 252)
comenta em sua obra:
A autonomia administrativo-funcional das agências reguladoras decorre
propriamente, de sua personalidade jurídica, o que lhes atribui competências
instrumentais. Na realidade, essa autonomia na gerência do modelo regulatório
depende das particularidades definidas na legislação pertinente a cada uma das
agências, o que dificulta uma abordagem abrangente de todas as formas de atuação
decorrente dessa autonomia.
De acordo com tal autor a autonomia administrativa “refere-se à
composição própria de órgãos e agentes que as agências reguladoras apresentam para realizar
seus objetivos” (2008, p. 253).
A doutrina dominante assinala ser o fator determinante da autonomia
administrativa o estabelecimento de mandato fixo para os dirigentes das agências, significa
dizer que os dirigentes de agências reguladoras não podem ser afastados pela simples vontade
do Chefe do Poder Executivo.
Os dirigentes são investidos de mandato fixo por prazo determinado, são
indicados pelo Presidente da República e posteriormente devem ser aprovados pelo Senado
Federal. Após a aprovação do mesmo finalmente podem ser nomeados e empossados para o
cargo, e como mencionado não podem ser demitidos sem motivação, somente podem deixar o
cargo em caso de renúncia, prática de atos de improbidade, condenação criminal e
descumprimentos reiterados dos objetivos do setor, deverá nos últimos casos ser mediante
prévio processo administrativo e ao dirigente será assegurado o direito ao contraditório e a
ampla defesa.
As agências reguladoras são compostas por um conselho diretor, com cinco
membros, secretaria própria, câmaras técnicas especializadas e uma unidade das relações
mantidas entre usuários e concessionários que funciona como instância superior dos serviços
de ouvidoria das concessionárias.
25
Com a estabilidade que é atribuída aos dirigentes, os mesmos podem atuar
de acordo com as necessidades do setor regulado sem vinculá-los ao timing eleitoral, dessa
forma como já mencionado o Presidente da República pode nomear o dirigente, mas, não
pode dispensá-lo imotivadamente, garantia essa que lhes foi conferida pela legislação
específica, dessa forma se evita a possibilidade de arbítrios, contendo a intervenção sobre as
agências, nesse sentido menciona Guilherme Mussi em seu artigo (2004, p. 2):
Deve-se compreender a impossibilidade de exoneração ad nutum dos dirigentes
como sendo uma garantia que lhes foi conferida pela legislação específica, com o
objetivo de assegurar a continuidade de orientação e a independência de ação das
entidades que encabeçam, não obstante as injunções políticas sofridas, tudo com o
intuito primordial de conferir maior especialidade técnica aos setores regulados.
Essa liberdade outorgada aos dirigentes sempre foi um ponto de muita
polêmica entre os estudiosos do tema, diversos deles entendem que essa liberdade reduz a
atuação do Estado tirando de suas mãos o poder, “a opção por um sistema de entes com
independência em relação ao Executivo para desempenhar as diversas missões regulatórias é
uma espécie de medida cautelar contra a concentração de poderes nas mãos do Estado”
(SUNDFELD apud MUSSI, 2004, p. 2).
A muito se questionou a respeito do recurso hierárquico impróprio que se
resume na possibilidade, de revisão dos atos das agências reguladoras pelo Ministério que ela
se encontra vinculada, não só os atos das agências reguladoras mais como de qualquer
autarquia por uma autoridade externa.
Em diversos dispositivos constitucionais estão previstos a possibilidade de
interferência e supervisão das autoridades federais nos atos das autarquias mais não havia
menção específica a respeito do recurso hierárquico impróprio sobre os atos das agências
reguladoras. As leis específicas de determinadas agências mencionam que seus atos
constituem última instância administrativas de julgamento na domínio da atividade que por
ela é regulada, a exemplo da ANATEL, da ANVISA e da ANTAQ, dessa forma muitos
doutrinadores entendiam não haver a possibilidade de recurso hierárquico impróprio a todas
as agências.
No ano de 2006 a AGU emitiu o Parecer nº 51, o qual menciona que as
agências reguladoras estão sujeitas à revisão ministerial, de ofício ou por provocação,
inclusive por recurso hierárquico impróprio, tal parecer foi aprovado pelo Presidente da
República e passou a ter força normativa, desde então se entende haver a possibilidade de
recurso hierárquico impróprio passando por cima das decisões das agências reguladoras, tais
26
recursos deverão se referir às suas atividades administrativas, ou quando estas ultrapassarem
os limites de sua competência material quando definidas em lei ou regulamento, será possível
também o recurso hierárquico impróprio, quando houver violação das políticas públicas
definidas para o setor regulado pela Administração Direta.
Essa possibilidade de certa forma acaba diminuindo a liberdade das
agências reguladoras, limitando sua atuação, tais revisões devem se limitar apenas ao descrito
no parecer, sob pena de ferir uma de suas principais características, a autonomia.
1.3.2.2 Autonomia Financeira
A autonomia financeira é a possibilidade das agências reguladoras cobrarem
uma denominada “taxa de fiscalização” das empresas que estão sendo fiscalizadas. As
próprias leis instituidoras das principais agências prescrevam a possibilidade da cobrança de
determinadas taxas.
A autonomia financeira decorre da sua própria função regulatória, conforme
Marcos Juruena Villela Souto (apud MENEZELLO, 2002, p. 89-90):
Como nas demais atividades administrativas, a prestação de serviços públicos
desenvolve-se em três momentos, a saber, o planejamento, a execução e o controle.
É deste último que trata a hipótese, cabendo ao contratado, por encargo contratual,
previamente autorizado por lei, custear as despesas com a fiscalização e controle da
execução dos serviços.
Essa autonomia financeira é de fundamental importância para a liberdade de
atuação e manutenção das agências reguladoras, se ficassem dependendo de verbas que
fossem a elas transferidas por meio da Administração Pública os dirigentes das mesmas
poderiam ser manipulados mais facilmente.
Não só pelo fato de terem liberdade mais também são necessárias para a sua
própria manutenção com funcionários especializados e equipamentos para as fiscalizações.
Conforme Marçal Justen Filho (2002, p. 480):
Produz-se, então, mecanismo para assegurar a captação pela agência de recursos
para a sua manutenção. Mais do que isso, assegura-se autonomia financeiro-
orçamentária que impede a redução de autonomia da agência em face de outras
instituições estatais ou de empresas privadas.
27
É importante destacar que as Agências Reguladoras tem liberdade para
arrecadar e gerenciar, adquirir e alienar bens desde que estejam descritas na lei geral
orçamentária, não estão totalmente livres para dispor e comprar bens, da forma que seus
dirigentes acharem mais oportuno e conveniente, tem elas certa margem de liberdade, mas
devem seguir o disposto na lei geral orçamentária, sobre o tema bem lembra Lucas de Souza
Lehfeld (2008. p. 251):
Embora as agências reguladoras tenham, por atribuição legal, competência para
arrecadar e gerenciar suas receitas, bem como adquirir e alienar seus bens, para a
autonomia orçamentária não significa que podem realizar despesas não descritas na
lei geral orçamentária do Estado. Idêntica restrição se aplica às finanças gerenciadas
por essas entidades, já que a execução financeira do orçamento submete-se a normas
próprias de controle previstas no ordenamento jurídico pátrio. Por isso, não há como
a agência adquirir bens ou serviços sem o devido empenho das despesas, fundado
nos ditames da legislação orçamentária.
Essa condição gera, notoriamente, redução da margem de autonomia das agências,
especialmente com relação à liberdade nas escolhas e decisões, pois, além de
dependerem, em boa parte, dos recursos orçamentários providos pela União,
também se vinculam às restrições legais.
Essa limitação à lei orçamentária é importante para que não haja abusos por
parte das agências reguladoras, elas têm liberdade financeira mais apenas dentro desses
limites que são os necessários ao seu desempenho.
A respeito da autonomia orçamentária e financeira Edmir Netto Araújo
comenta (apud MUSSI, 2004, p. 2):
Não pode significar que a entidade possa realizar despesas não previstas para a
autarquia na lei geral orçamentária do Estado, que terá como apêndice justamente o
orçamento da autarquia. O mesmo se diga da autonomia financeira, pois a execução
do orçamento tem regras próprias de controle no orçamento, inclusive para as
autarquias.
Há controvérsia a respeito da Natureza Jurídica das taxas de fiscalização, a
grande discussão é se as tais taxas teriam natureza contratual ou tributária.
Para alguns juristas e exemplo de Marçal Justen Filho (2002, p. 478) apesar
da cobrança derivar de uma obrigação contratual, a natureza é de taxa em razão do poder de
polícia exercido pelas agências reguladoras, e se incluem nesse sentido todas as taxas
cobradas pelas agências.
Em entendimento totalmente oposto Aragão (2002, p. 332-333) entende que
essas autarquias em regime especial não exercem poder de polícia sobre as concessionárias
dos serviços públicos e essas denominadas “taxas de fiscalização” seriam preços públicos e
28
não taxas, para determinado autor somente as taxas de regulação é que poderiam ser
consideradas taxas.
A matéria é polêmica e não há entendimento pacífico entre os
doutrinadores, alguns entendem ser de natureza contratual e outros entendem ter natureza
tributária.
1.3.3 Especialização Técnica
Como mencionado no tópico Natureza Jurídica os dirigentes das agências
reguladoras devem ter notória especialização, significa que tais dirigentes devem ter um
conhecimento técnico, sendo estes especializados no setor que por eles será regulado, tal
exigência é de extrema relevância, pois as atividades desempenhadas por muitas agências na
maioria das vezes são de alta complexidade e exigem que o dirigente que esta a sua frente
saiba desempenhar suas atividades com competência.
Como dito tal característica é de extrema relevância, pois como mencionado
anteriormente os dirigentes são indicados pelo Presidente da República a depender da
aprovação do Senado Federal, essa exigência diminui a possibilidade de ser indicado
dirigentes sem a mínima noção do assunto a ser regulado, apesar de serem seus atos
vinculados ao princípio da especialidade o qual ao contrário do particular que pode fazer o
que a lei não proíbe, os órgãos da Administração só podem fazer o que é autorizado por lei,
ou o que lhes foram atribuído pelas leis instituidoras.
Tal característica acaba por exigir outra, se os dirigentes precisam ter
conhecimento técnico e notória especialização no assunto, logo as agências devem ser
especializadas somente naquele determinado assunto, não se pode criar agências que são
denominadas multisetoriais, são aquelas onde se regulam diversas atividades, pois não há
possibilidade de um único dirigente ser especializado em diversas atividades, é quase que
impossível para a raça humana.
Alguns Estados começaram a criar agências multisetoriais, como por
exemplo, a ARCON no Pará – Lei estadual n º 6.099/97, a ARCE no Ceará- Lei estadual n º
12.786/97, e a AGERGS no Rio Grande do Sul - Lei estadual n º 10.931/97.
Determinadas agência foram criadas, para regular diversos tipos de serviços
públicos, o que de certa forma não seria possível.
29
Diante do respeito a diversos princípios que regulam o regime jurídico
administrativo é essencial o respeito a todos sem exceção dessa forma faz-se necessário o
conhecimento e a especialização dos dirigentes indicados, entende-se que denominadas
agências estariam infringindo o princípio da especialidade.
30
II. ATOS ADMINSTRATIVOS
Para dar continuidade ao estudo das agências reguladoras e a possibilidade
do controle judicial de seus atos, far-se-á necessário um estudo a respeito dos atos
administrativos, seus requisitos, atos discricionários e vinculados, atos normativos e o mérito
do ato administrativo, tal tema será assunto deste segundo capítulo.
É por meio dos atos administrativos que as agências reguladoras exercem
suas funções, tais atos podem ser vinculados ou discricionários, neste capítulo será analisado
o que doutrina e jurisprudência pensam a respeito do controle judicial do mérito dos atos
administrativos discricionários, é um tema polêmico e as opiniões são controvertidas. A
respeito da analise do mérito do ato vinculado veremos ser pacífico o entendimento e é sim
possível, mais quanto as discricionário gera dúvidas.
Passaremos dessa forma a uma breve noção sobre ato administrativo.
2.1. Conceito
O ato administrativo é uma espécie de ato jurídico, são manifestações de
vontade da Administração Pública expedidos no exercício da função administrativa, visando
produzir algum efeito jurídico.
José Cretella Júnior (apud DI PIETRO, 2007, p. 179) define ato
administrativo como:
A manifestação de vontade do Estado, por seus representantes, no exercício regular
de suas funções, ou por qualquer pessoa que detenha, nas mãos, fração de poder
reconhecido pelo Estado que tem por finalidade imediata criar, reconhecer,
modificar, resguardar ou extinguir situações jurídicas subjetivas em matéria
administrativa.
É importante diferenciar o ato administrativo de atos da administração, não
são os mesmos atos apesar de haver semelhança nos seus conceitos, os atos da administração
nem se quer são regulados pelo Direito Administrativo.
31
Entende-se por atos da administração aqueles que são praticados no
exercício da função administrativa a exemplo de atos de direito privado como doação,
permuta, compra e venda, atos materiais como demolição de uma casa, apreensão de
mercadoria, atos políticos sujeitos a regime jurídico-constitucional, contratos, atos normativos
como decretos, portarias, resoluções, regimentos, e atos administrativos propriamente ditos
(DI PIETRO, 2007, p. 175-176).
São atos diferenciados não se podendo confundir um com o outro, pois à
Administração compete praticar diversos atos em diferentes tipos e categorias, neste capítulo
apenas nos interessa os atos administrativos.
Continuando tal assunto o autor Hely Lopes Meirelles (2001, p.141) define
ato administrativo segundo a lei civil como ato jurídico, que é aquele que tem por fim
imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, continuando tal
raciocínio o autor menciona o que entende por ato administrativo e diz que tal conceito é
limitado ao ato administrativo unilateral:
Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração
Pública, que agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, transferir,
modificar, extinguir, e declarar direitos, ou impor obrigações aos administradores ou
a si própria.
Esse conceito é restrito ao ato administrativo unilateral, ou seja, àquele que se forma
com a vontade única da Administração [...].
Ao se mencionar que o ato administrativo é uma manifestação de vontade
da Administração Pública deve-se entender Administração Pública em sentido amplo, ou seja,
como todo e qualquer órgão a ela vinculado, a exemplo das autarquias como as agências
reguladoras, fundações, e qualquer outro órgão pertencente à Administração indireta. As
agências reguladoras exercem suas funções e regulam suas atividades por meio de atos
administrativos, dessa forma deve-se entender Administração Pública em sentido amplo,
abrangendo atos gerais e abstratos dos órgãos da administração direta e indireta.
É importante diferenciar a abrangência de ato administrativo partindo do
critério subjetivo e objetivo. Alguns autores mencionam tais aspectos fazendo diferença
quanto ao seu conceito, formal ou material, em um abrange todo e qualquer órgão da
Administração e em outro limita apenas a alguns.
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 178), o critério subjetivo
leva em consideração o órgão que pratica o ato e o critério objetivo valoriza o tipo de
atividade exercida, conforme a autora:
32
Pelo critério subjetivo, orgânico ou formal, ato administrativo é o que ditam os
órgãos administrativos; ficam excluídos os atos provenientes dos órgãos legislativo e
judicial, ainda que tenham a mesma natureza daqueles; e ficam incluídos todos os
atos da Administração, pelo só fato de serem emanados de órgãos administrativos,
como os atos normativos do Executivo, atos materiais, os atos enunciativos, os
contratos.
Esse critério tem sito criticado por faltar-lhe rigor científico: deixa fora do conceito
de ato administrativo os atos praticados pelo Legislativo e Judiciário e sujeitos a
idêntico regime jurídico que os emanados dos órgãos administrativos, só pelo fato
de não emanarem destes. Por exemplo, a punição de um servidor, a concessão de
férias, de licença, de aposentadoria são atos de idêntica natureza, seja qual for o
órgão que o pratique. Além disso, o conceito coloca na mesma categoria – ato
administrativo – atos da administração sujeitos a disciplina jurídica diversa, como é
o caso dos atos de direito privado por ela praticados.
Pelo critério objetivo, funcional ou material, ato administrativo é somente aquele
praticado no exercício concreto da função administrativa, seja ele editado pelo órgão
administrativo ou pelos órgãos judiciais ou legislativos.
Esse critério parte da divisão de funções do Estado: a legislativa, a judicial e a
administrativa. Embora haja três poderes, a distribuição das funções que lhe é
própria, é rígida; cada qual exerce predominantemente uma função que lhe é própria,
mas, paralelamente desempenha algumas atribuições dos outros Poderes. Assim, a
função administrativa cabe precipuamente, ao Poder Executivo, mas os outros
Poderes, além de disporem de órgãos administrativos (integrando o conceito de
Administração Pública), ainda exercem, eles próprios, função tipicamente
administrativa, que dizem respeito ao funcionamento interno de seus órgãos e
servidores. No desempenho dessas funções praticam atos administrativos.
Comentado sobre determinadas diferenças, também é importante mencionar
sobre os requisitos do ato administrativo por alguns denominado, elementos constitutivos,
determinado tema será objeto do próximo tópico.
2.2. Requisitos do ato administrativo
Para que o ato administrativo seja válido ele deve obedecer a cinco
requisitos, requisitos esses que são necessários à sua formação, são eles o sujeito, o objeto, a
forma, a finalidade e o motivo.
Há grande divergência doutrinária a respeito do termo a ser utilizado se
elementos do ato administrativo ou requisitos do ato administrativo, alguns autores também
divergem a respeito dos elementos, quantidades e alguns a terminologia.
A maioria dos autores prefere utilizar os dois termos como sinônimos. Celso
Antônio Bandeira de Mello (2002, p. 344) em sua doutrina comenta sobre o assunto:
33
Não há concordância total entre os autores sobre a identificação e o número de
elementos, porém, frequentemente, a divergência (ou pelo menos parte dela) procede
era de discordância terminológica, ora de que, por vezes, os autores englobam em
um único elemento aspectos que em outros autores encontram-se desdobrados.
Apesar das desavenças aludidas, poder-se-ia relacionar como elementos
habitualmente referidos os seguintes: sujeito, forma, objeto, motivo e finalidade.
Como já mencionado não há unanimidade doutrinária em relação ao termo a
ser utilizado nem concordância em relação aos elementos.
Iremos analisar separadamente cada um dos cinco requisitos do ato
administrativo.
Em relação ao sujeito alguns autores também utilizam o termo
“competência”, o sujeito é quem pratica o ato, é aquele que tem competência e poderes para
praticar cada ato determinado, tal elemento é necessariamente vinculado.
É por meio da lei que o sujeito recebe a competência para ser o responsável
pelo ato, não basta que o sujeito tenha capacidade para exercer o ato, é necessário que ele
tenha a competência, é por tal motivo que alguns autores preferem denominar competência ao
invés de sujeito.
Alguns autores mencionam que o ato jurídico exige somente a capacidade
do agente para a prática dos atos, como mencionado o ato administrativo além de exigir a
capacidade também exige a competência do agente, como bem lembra Diogo de Figueiredo
Moreira Neto (2003, p. 133):
Competência é o elemento caracterizador do sujeito do ato administrativo. Para o ato
jurídico exige-se apenas a capacidade do agente, mas para a prática do ato
administrativo, a noção de capacidade não tem tal relevância, pois o que importa é
saber se a manifestação de vontade de Administração partiu do ente, órgão ou agente
a quem a lei cometeu a função de exprimi-la e de vinculá-la juridicamente.
Competência é, assim, uma expressão funcional qualitativa e quantitativa do poder
estatal, que a lei atribui às entidades, órgãos ou agentes públicos, para executar a sua
vontade.
Como mencionado anteriormente a competência do sujeito decorre da lei,
somente será possível dar validade aos atos administrativos se forem praticados, criados ou
estruturados por quem tiver competência legítima expressa na lei. Poderão por diversas vezes
ocorrer casos em que o legislador seja omisso em relação a essa competência, deixando de
mencionar quem é o sujeito competente, nesses casos entende Maria Sylvia Zanella Di Pietro
(2007, p. 189) ser competente o Chefe do Poder Executivo, por ser a autoridade máxima da
organização administrativa.
34
Denominada autora também menciona no mesmo trecho a respeito das
regras que se aplicam à competência (2007, p. 189):
1. Decorre sempre da lei, não podendo o próprio órgão estabelecer, por si, as
suas atribuições;
2. É inderrogável, seja pela vontade da Administração, seja por acordo com
terceiros; isto porque a competência é conferida em benefício do interesse público;
3. Pode ser o objeto de delegação ou de avocação, desde que não se trate de
competência conferida a determinado órgão ou agente, com exclusividade pela lei.
O rol elencado pela autora cita alguns já mencionados no decorrer deste
tópico além de outros que são extremamente importantes.
Desta forma finalizamos o requisito sujeito e passaremos a analisar o
Objeto.
O objeto é aquele que transforma alguma coisa na ordem jurídica,
modificando, alterando, criando, e produzindo algum efeito jurídico é por meio deste que a
Administração Pública manifesta sua vontade. O objeto precisará ser lícito não podendo ferir
qualquer norma jurídica, deverá ser possível no ordenamento jurídico, e também deverá ser
certo e moral seguindo os comportamentos corretos e éticos (DI PIETRO, 2007, p.191).
Alguns doutrinadores também utilizam a expressão “conteúdo”, para alguns
não há diferença quanto ao termo a ser utilizada, já para outros a exemplo de Celso Antônio
Bandeira de Mello é preferível a expressão “conteúdo”, como é possível se notar em trecho de
sua obra onde o autor cita o ensinamento de Zanobini (2002, p. 348):
Preferimos a expressão “conteúdo” à expressão “objeto”, acolhendo o ensinamento
de Zanobini, segundo quem o conteúdo dispõe sobre alguma coisa, que é, esta sim, o
objeto do ato. Com efeito, quem decide, decide alguma coisa a respeito de outra
coisa. O conteúdo e o objeto seriam duas realidades perfeitamente distintas.
Para o autor o objeto é essencial para a existência do ato, pois, sem o objeto
não é possível seu surgimento seja ele administrativo ou de qualquer outra tipologia, quando
um conteúdo é exteriorizado incidindo sobre um objeto que não existe tal ato será inexistente,
para o autor o conteúdo e objeto são coisas distintas e devem ser estudadas separadamente,
um não se confunde com o outro, para a existência de um, é necessária a existência alheia do
outro (2002, p. 348-349).
Seguindo a linha de raciocínio da autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro
(2007, p. 191) o que interessa é considerar o efeito jurídico imediato que o ato produz,
podendo ser denominado tanto conteúdo como objeto.
35
É importante mencionar que o objeto é um elemento discricionário o agente
competente para executar o ato tem liberdade nas escolhas dentro dos limites permitidos.
O próximo elemento constitutivo do ato jurídico que será analisado é a
Forma, é por meio de tal elemento que o ato administrativo se exterioriza, a forma é na
maioria das vezes prevista em lei e é essencial à validade do ato. O ato deve seguir a
formalidade exigida na lei, normalmente a forma prevista é a escrita, mas nada impede que
seja exteriorizada de outras maneiras em casos de urgência.
A formalidade deve ser sempre seguida, sendo ela escrita ou não escrita,
pois a inexistência desta torna o ato administrativo inexistente.
Meirelles menciona sobre o assunto em sua obra (2001, p. 144-145):
A inexistência da forma induz a inexistência do ato administrativo. A forma do ato
de administração é escrita, embora atos existam consubstanciados em ordens verbais
e até mesmo em sinais convencionais, como ocorre com as instruções momentâneas
de superior a inferior hierárquico, com as determinações de polícia em casos de
urgência e com a sinalização do trânsito. O que convém fixar é que só se admite o
ato administrativo não escrito em casos de urgência, de transitoriedade da
manifestação da vontade administrativa ou de irrelevância do assunto para a
Administração. Nas demais hipóteses é de rigor o ato escrito em forma legal, sem o
quê se exporá à validade.
Como visto em casos de urgência o ato poderá ser exteriorizado de outras
formas, mas em sua maioria o ato deve ser escrito e regulado para que o ato administrativo
tenha validade e possa surgir no mundo jurídico.
Conforme a autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 192) é possível
encontrar em sua doutrina duas compreensões da forma como elemento do ato administrativo,
uma concepção restrita e uma concepção ampla:
1. uma concepção restrita que considera forma como a exteriorização do ato, ou
seja, o modo pelo qual a declaração se exterioriza; nesse sentido, fala-se que o ato
pode ter a forma escrita ou verbal, de decreto, portaria, resoluções etc;
2. uma concepção ampla, que inclui no conceito, não só a exteriorização do ato,
mas também todas as formalidades que devem ser observadas durante o processo de
formação da vontade da Administração, e até os requisitos concernentes à
publicidade do ato.
O fato é que restrita ou ampla a forma deverá se fazer presente para que o
ato administrativo seja considerado válido e produza resultado no mundo jurídico.
Dependendo da situação se admite que ele seja exteriorizado de outras formas.
A partir de agora iremos analisar a Finalidade do ato administrativo, trata-se
de elemento vinculado, elemento este que consiste basicamente no objetivo que a
36
Administração Pública pretende produzir com determinado ato, é o resultado que se quer
alcançar. Este é um requisito necessário, deve sempre atingir um interesse de ordem pública,
caso o ato administrativo não atinja um interesse coletivo ele será considerado nulo, a sua
finalidade é vinculada e será aquela indicada na lei sendo ela explícita ou implícita
(MEIRELLES, 2001, p.143-144).
Seguindo o mesmo raciocínio menciona Diogo de Figueiredo Moreira Neto
(2003, p. 135) “finalidade é o aspecto específico do interesse público, explícita ou
implicitamente expresso na norma legal, que se pretende satisfazer pela produção dos efeitos
jurídicos esperados do ato administrativo”.
Como se nota a finalidade do ato administrativo é vinculada ao que dispõe a
legislação, não poderá o sujeito competente para praticar o ato fazê-lo da forma que bem
entender, caso este atue dessa forma o ato será considerado nulo não produzindo efeitos no
mundo jurídico.
O último elemento constitutivo a ser analisado é o Motivo elemento este
discricionário, como o próprio nome diz é o que autoriza ou exige a realização do ato, é este,
pressuposto de fato que serve de fundamento ao ato administrativo. O motivo poderá ser
previsto em lei e nesse caso o ato só poderá ser praticado se ocorrer a situação prevista,
poderá também ser deixado a critério do sujeito autorizado a praticar o ato tendo este margem
de liberdade na sua escolha, esta liberdade que tem o sujeito não significa que pode expedir
qualquer ato, deverá ele como já mencionado seguir todos os critérios e requisitos do ato
administrativo, se diz que tem liberdade na escolha porque não fica vinculado a uma situação
prevista em lei, é dessa forma que leciona Celso Antônio Bandeira de Mello (2002, p. 351):
O motivo pode ser previsto em lei ou não. Quando previsto em lei, o agente só pode
praticar o ato se houver ocorrido a situação prevista. Quanto não há previsão legal, o
agente tem liberdade de escolha da situação (motivo) em vista da qual editará o ato.
É que, mesmo se a lei não alude expressamente aos motivos propiciatórios ou
exigentes de um ato, nem por isto haverá liberdade para expedi-lo sem motivo ou
perante um motivo qualquer. Só serão de aceitar os que possam ser havidos como
implicitamente admitidos pela lei à vista daquele caso concreto, por corresponderem
a supostos fáticos idôneos para demandar ou comportar a prática daquele específico
ato, espelhando, destarte, sintonia com a finalidade legal. Vale dizer: prestantes
serão os motivos que revelem pertinência lógica, adequação racional ao conteúdo do
ato, ao lume do interesse prestigiado na lei aplicanda.
Além disto, em todo e qualquer caso, se o agente se embasar na ocorrência de um
dado motivo, a validade do ato dependerá da existência do motivo que houver sido
enunciado. Isto é, se o motivo que invocou for inexistente, o ato será inválido.
O motivo como se pode notar não é um elemento vinculado, como
mencionado o sujeito tem liberdade na escolha, mas nem por isso estará ele livre pra praticar
37
o ato com o motivo que achar mais conveniente, tal motivo deve ser juridicamente justificado
para que produza seus efeitos juntamente com os demais elementos constitutivos.
Formam assim os cinco elementos ou requisitos do ato administrativo um
elo de validade deste, devendo obedecer, ao disposto na lei que serão os denominados atos
vinculados, e nos caso não previsto na lei que serão os elementos discricionários terão certa
liberdade mais que devem ser justificados.
2.3. Atos Administrativos Vinculados e Discricionários
A Administração Pública e qualquer órgão a esta vinculado exterioriza suas
funções por meio do ato administrativo estudado nos tópicos anteriores, à Administração
Pública é outorgado poderes para que esta e os demais entes possam atingir os fins a que se
destinam, ou seja, regular, criar normas, expedir decretos, conceder, modificar, extinguir
situações jurídicas enfim, uma infinidade de atos, atos estes que são necessários para
assegurar sua posição de supremacia sobre o particular.
Os atos asseguram a supremacia em relação ao particular, mas não é de
qualquer maneira que a Administração poderá exercer seu poder, é por este motivo que seus
atos podem ser vinculados ou discricionários.
Os atos vinculados são aqueles em que a lei tipifica e dá uma única opção ao
agente detentor do ato, este é obrigado a agir em conformidade com a lei ou caso contrário
será seu ato considerado nulo ou inválido, no caso de praticar atos que estejam em
desconformidade com o disposto na lei o sujeito dá abertura à própria Administração ou ao
Poder Judiciário anular o ato a pedido do interessado.
Hely Lopes Meirelles comenta sobre determinado assunto (2001, p. 58):
Atos vinculados ou regrados são aqueles para os quais a lei estabelece os requisitos
de sua realização. Nessa categoria de atos, as imposições legais absorvem, quase que
por completo a liberdade do administrador, uma vez que sua ação fica adstrita aos
pressupostos estabelecidos pela norma legal para a validade da atividade
administrativa. Desatendido qualquer requisito, compromete-se a eficácia do ato
praticado tornando-se passível de anulação pela própria Administração, ou pelo
Judiciário, se assim o requerer o interessado.
Há inúmeros exemplos de atos administrativos vinculados Celso Antônio
Bandeira de Mello (2002, p. 381) dá como exemplo de ato vinculado a Aposentadoria
38
Compulsória de funcionário aos 70 anos de idade, a Administração não tem liberdade de
escolher entre dar ou não a aposentadoria, se tem o funcionário 70 anos deverá esta ser
concedida.
A administração Pública tem o dever de motivar os atos vinculados, para se
evidenciar que o ato fora praticado em conformidade com as exigências e requisitos legais
previstos na legislação, ao Poder Judiciário é permitido rever tais atos, nesse sentido ensina
Miguel Seabra Fagundes (apud MEIRELLES, 2001, p. 159):
Tais atos, estando estreitamente confinados pela lei ou regulamento, permitem ao
Judiciário revê-los em todos os seus aspectos, porque em qualquer deles poderá
revelar-se a infringência dos preceitos legais ou regulamentares que condicionam a
sua prática. Certo é que ao Poder Judiciário não é dado dizer da conveniência,
oportunidade ou justiça da atividade administrativa, mas, no exame da legalidade, na
aferição dos padrões jurídicos que serviram de base à realização do ato impugnado,
é dever da Justiça esquadrinhar todos os ângulos em que se possa homiziar a
ilegalidade, sob o tríplice aspecto formal, material e ideológico. Nesse ponto
coincidem os ensinamentos da doutrina com a moderna orientação da jurisprudência
pátria.
Já o ato discricionário é aquele em que a Administração tem certa margem
de liberdade na execução do ato, mas terá certa liberdade apenas em relação ao motivo e ao
objeto, e ficará vinculada a competência, a finalidade e a forma, pois, esses três últimos
elementos serão sempre vinculados.
Essa liberdade é a grande diferença entre o ato vinculado e o ato
discricionário, pois um não há forma alguma de liberdade devendo todos os elementos do ato
obedecer ao disposto na lei e já o outro ficam vinculados apenas alguns.
Celso Antônio Bandeira de Mello comenta sobre o assunto mencionando
(2002, p. 380):
A diferença nuclear entre ambos residiria em que nos primeiros a Administração não
dispõe de liberdade alguma, posto que a lei já regulou antecipadamente em todos os
aspectos o comportamento a ser adotado, enquanto nos segundos a disciplina legal
deixa ao administrador certa liberdade para decidir-se em face das circunstâncias
concretas do caso, impondo-lhe e simultaneamente facultando-lhe a utilização de
critérios próprios para avaliar ou decidir quanto ao que lhe pareça ser o melhor meio
de satisfazer o interesse público que a norma legal visa a realizar.
Essa liberdade de atuação da Administração e dos entes a ela vinculados é
importante para que seus atos administrativos sejam praticados visando a melhor forma de
atender a população, os usuários de serviços, as concessionárias de serviço público enfim,
todos que estiverem vinculados à atuação de entes estatais, mas é claro que tal liberdade deve
ser controlada pela própria Administração e também pelos demais Poderes como Legislativo e
39
Judiciário, pode haver arbitrariedades por partes dos sujeitos, em algumas vezes com intenção
de praticar determinado ato ou em outras vezes sem a intenção de prejudicar quem quer que
seja.
Faz-se necessário tal controle, mas também é necessária tal liberdade, à
Administração precisa desta discricionariedade para atuar, pois ela é responsável por resolver
inúmeros problemas que surgem no decorrer do dia-a-dia, seguindo a lei e obedecendo aos
limites impostos. Nesse sentido Hely Lopes Meirelles (2001, p.160) ensina que essa
discricionariedade encontra fundamento e se justifica na complexidade e desigualdade dos
problemas que o Poder Público tem que solucionar, e lei por mais bem elaborada que seja
nem sempre prevê todas as soluções, e é aí que a Administração entra em ação.
Diversos autores mencionam que é importantíssimo não confundir a
discricionariedade com a arbitrariedade, pois esta última não age em conformidade com a lei e
um ato praticado com arbitrariedade jamais será considerado legal ou válido. Celso Antônio
Bandeira de Mello (2002, p. 382) em sua doutrina menciona sobre o assunto comentando:
Não se confundem discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o
agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que lhe
permite a lei. Seu ato, em consequência, é ilícito e por isso mesmo corrigível
judicialmente. As agir discricionariamente o agente estará, quando a lei lhe outorga
tal faculdade (que é simultaneamente um dever), cumprindo a determinação
normativa de ajuizar sobre o melhor meio de dar satisfação ao interesse público por
força da determinação legal quanto ao comportamento adequado à satisfação do
interesse público no caso concreto.
Conforme citado é fundamental não confundir, pode-se dizer que a
discricionariedade e a arbitrariedade são coisas praticamente opostas, pois em uma o sujeito
age conforme a lei, e esta dá ao agente certa margem de liberdade, na outra ele age em
desacordo com ela ou se excede na prática do ato agindo a mais do que deveria.
Como mencionado é através da discricionariedade que a Administração tem
liberdade para atuar e assegurar o interesse social que de certa forma é sua responsabilidade,
Fiorini comenta sobre o assunto dizendo (apud MEIRELLES, 2001, p.160):
A discricionariedade é a faculdade que adquire a Administração para assegurar em
forma eficaz os meios realizados do fim a que se propõe o Poder Público. A
discricionariedade adquire relevância jurídica quando a Administração quer
custodiar em forma justa os interesses públicos entregues à tutela. É, então, a
ferramenta jurídica que a ciência do Direito entrega ao administrador para que
realize a gestão dos interesses sociais respondendo às necessidades de cada
momento. Não é um instrumento legal que se concede ao administrador para fazer o
que imponha o seu capricho; nem tampouco para criar normas de caráter legislativo;
menos ainda para que intervenha ante uma contenda normativa, como acontece com
a jurisdição. É, unicamente, uma autorização limitada a um fim determinado, para
40
que o Poder Público aprecie as condições presentes quando administre o interesse
social especificado pela norma legislativa. É uma forma de atuar da Administração
Pública para poder realizar uma reta administrativa dos diversificados interesses da
coletividade.
Finalmente vale novamente ressaltar que se faz necessária tal
discricionariedade para a atuação da Administração Pública para que essa possa livremente
desempenhar sua função dentro dos limites impostos pela lei.
2.4. Mérito Administrativo do Ato Administrativo
Antes de conceituar o mérito administrativo o que não é uma tarefa fácil é
importante diferenciar tal mérito do mérito processual, são tipos de méritos distintos, o mérito
processual refere-se a vontade que o autor deseja ver resolvida no âmbito do Poder Judiciário,
é o que este leva a juízo por meio do seu requerimento, é o conflito que será resolvido por
meio da propositura de uma ação judicial.
Conceituar o Mérito administrativo não é uma tarefa simples, este integra a
atividade administrativa discricionária, o mérito poderá estar presente apenas nos atos
discricionários praticados pela Administração, pois quando o ato é vinculado não há o que se
falar em mérito. Sempre que a Administração Pública praticar um ato discricionário que como
já estudado é aquele em que há liberdade, a Administração estará atuando conforme sua
oportunidade e conveniência. Será nesses atos que se fará presente o mérito administrativo.
Meirelles ensina sobre o mérito administrativo (2001, p. 146-147).
O mérito administrativo consubstancia-se, portanto, na valoração dos motivos e na
escolha do objeto do ato, feitas pela Administração incumbidas de sua prática,
quando autorizada a decidir sobre a conveniência, oportunidade e justiça do ato a
realizar.
O mérito que é estudo deste trabalho será sempre o mérito administrativo,
neste nada se pretende com a análise do mérito processual que é uma tarefa exclusiva do
Poder Judiciário.
É por meio do ato administrativo que a Administração Pública exterioriza
seus atos, quando esta tem que decidir a respeito da conveniência e da oportunidade de algum
ato, surge o mérito administrativo.
41
Celso Antônio Bandeira de Mello (apud CRISTOVÁM, 2010, p.1) faz
comentários em sua obra acerca do mérito:
Mérito do ato é o campo de liberdade suposto na lei e que efetivamente venha a
remanescer no caso concreto, para que o administrador, segundo critérios de
conveniência e oportunidade, decida-se entre duas ou mais soluções admissíveis
perante a situação vertente, tendo em vista o exato atendimento da finalidade legal,
ante a impossibilidade de ser objetivamente identificada qual delas seria a única
adequada.
Ainda sobre a dificuldade de como conceituar o mérito administrativo Maria
Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 202) menciona em sua obra que somente os autores que
foram influenciados pela doutrina italiana é que falam em mérito do ato para se referir aos
aspectos discricionários do ato, ou seja, a oportunidade e a conveniência.
Miguel Seabra Fagundes (apud DI PIETRO, 2007, p. 202) faz comentário
interessante a respeito da relação de intimidade do mérito com o ato administrativo assim
menciona o autor:
O mérito se relaciona com a intimidade do ato administrativo, concerne ao seu valor
intrínseco, à sua valorização sob critérios comparativos. Ao ângulo do merecimento,
não se diz que o ato é ilegal ou legal, senão que é ou não é o que devia ser, que é
bom ou mau, que é pior ou melhor do que outro. E por isto é que os
administrativistas o conceituam uniformemente, como o aspecto do ato
administrativo, relativo à conveniência, à oportunidade, à utilidade intrínseca do ato,
à sua justiça, à finalidade, aos princípios da boa gestão, à obtenção dos desígnios
genéricos e específicos, inspiradores da atividade estatal.
Muito se fala na possibilidade ou não de análise do mérito administrativo
pelo Poder Judiciário, a maior parte da doutrina afirma não ser possível, como mencionado
anteriormente o mérito se encontra apenas no ato discricionário nunca no ato vinculado, pois,
se o ato é vinculado, caso a Administração agir em desconformidade com ele, será caso de
arbitrariedade e nesse caso é pacífico o entendimento de que é possível a análise pelo
Judiciário, é quanto ao ato discricionário que se encontra controvérsias, pois, alguns de seus
atos não se encontram vinculados.
Hely Lopes Meirelles (2001, p.147) faz comentário ao ato vinculado e
discricionário e comenta sobre tal assunto com se pode observar em sua obra:
Com efeito, nos atos vinculados, onde não há faculdade de opção do administrador,
mas unicamente a possibilidade de verificação dos pressupostos de direito e de fato
que condicionam o processus administrativo, não há o que se falar em mérito, visto
que toda a atuação do Executivo se resume no atendimento das imposições legais.
Em tais casos a conduta do administrador confunde-se com a do juiz na aplicação da
42
lei, diversamente do que ocorre nos atos discricionários, em que, além dos
elementos sempre vinculados (competência, finalidade e forma), outros existem
(motivo e objeto), em relação aos quais a Administração decide, e sem possibilidade
de correção judicial, salvo quando seu proceder caracterizar excesso ou desvio de
poder.
Em tais atos (discricionários), desde que a lei define à Administração a escolha e
valoração dos motivos e do objeto, não cabe ao Judiciário rever os critérios adotados
pelo administrador, porque não há padrões de legalidade para aferir essa atuação.
Acredita-se que a atuação do Poder Judiciário poderia diminuir o poder da
Administração Pública e esta perder sua independência, determinado assunto será objeto de
assunto em tópico do próximo capítulo.
2.5. Espécies de Atos Administrativos
Os Atos Administrativos podem ser classificados em cinco espécies: Atos
Administrativos Normativos; Atos Administrativos Ordinatórios; Atos Administrativos
Negociais; Atos Administrativos Enunciativos; Atos Administrativos Punitivos
(MEIRELLES, 2001, p. 170).
Ficam incluídas nessas categorias todas as espécies de atos administrativos
propriamente ditos, somente não se enquadram na determinada classificação os atos
legislativos e os atos judiciários.
As agências reguladoras expedem seus atos por meio do ato administrativo,
podendo ele ser normativo ou individual, poderá este também ser declaratório ou constitutivo
de direitos e obrigações (MENEZELLO, 2002, p. 68-69).
A agência reguladora poderá também expedir atos normativos de efeito
externo para alcançar os agentes reguladores, esses atos são aprovados pela diretoria
colegiada e resultam das consultas e das audiências públicas, são denominados pela doutrina
de resoluções (MENEZELLO, 2002, p. 69).
Resoluções não passam de atos administrativos normativos, conforme
Meirelles (2001, p. 174):
Resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do
Executivo (mas não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir decretos), ou
pelos presidentes de tribunais, órgãos legislativos e colegiados administrativos, para
disciplinar matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se
resoluções individuais.
43
Todos os atos administrativos que resultem em uma resolução não podem
inovar no mundo jurídico elas poderão somente acrescentar, ou seja, vão complementar algum
ato, são sempre atos inferiores ao regulamento.
Outra forma de atuação das agências reguladoras é a emissão de portarias
que no entender de Meirelles “não atingem nem obrigam os particulares, pela manifesta razão
de que os cidadãos não estão sujeitos ao poder hierárquico da Administração Publica” (apud
MENEZELLO, 2002, p. 69).
Conforme Hely Lopes Meirelles (2001, p. 176):
Portarias são atos administrativos internos pelos quais os chefes de órgãos,
repartições ou serviços expedem determinações gerais ou especiais e seus
subordinados, ou designam servidores para funções e cargos secundários. Por
portaria também se iniciam sindicâncias e processos administrativos. Em tais casos a
portaria tem função assemelhada à da denúncia do processo penal.
Como as resoluções as portarias também não obrigam aos particulares por
não estarem os mesmos sujeitos ao poder hierárquico da Administração Pública.
Além desses atos as agências expedem outros a exemplo das Autorizações,
das Homologações e Aprovações.
No presente trabalho será realizada uma breve análise a respeito dos Atos
Administrativos Normativos.
2.6. Atos Administrativos Normativos
O ato normativo é uma espécie de ato administrativo, como estudado o ato
administrativo é uma manifestação de vontade da Administração Pública. O ato normativo por
tratar-se de espécie deste é também um tipo de manifestação da Administração, esta por sua
vez expede determinados atos, normalmente para que se aplique corretamente alguma lei.
Hely Lopes Meirelles ensina sobre ato normativo (2001, p. 170):
Atos administrativos normativos são aqueles que contêm um comando geral do
Executivo, visando à correta aplicação da lei. O objetivo imediato de tais atos é
explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados.
Esses atos expressam em minúcias o mandamento abstrato da lei, e o fazem com a
44
mesma normatividade da regra legislativa, embora sejam manifestações tipicamente
administrativas.
Continuando sobre o assunto determinado autor comenta que a essas
“categorias pertencem os decretos regulamentares e os regimentos, bem como as resoluções,
deliberações e portarias de conteúdo geral” (2001, p.170).
Os atos normativos estabelecem normalmente normas gerais e abstratas, são
consideradas leis apenas em sentido material e não em sentido formal, estes atos considerados
gerais e abstratos são expedidos pelo Executivo e força de lei, nas palavras de Hely Lopes
Meirelles são “provimentos executivos com conteúdo de lei”, por serem de certa forma
equiparada, às normas que derivam do Legislativo, também se equiparam para esses fins ao
controle judicial, é esse o ensinamento de tal autor (2001, p. 170):
Esses atos, por serem gerais e abstratos, têm a mesma normatividade da lei e a ela se
equiparam para fins de controle judicial. Mas quando, sob a aparência de norma,
individualizam situações e impõem encargos específicos a administrados, são
considerados de efeitos concretos e podem ser atacados e invalidados direta e
imediatamente por via judicial comum, ou por mandado de segurança, se lesivos de
direito individual líquido e certo.
Há diversos atos administrativos considerados normativos e estarão todos
sob o crivo do poder judiciário, são exemplos de atos normativos todos os atos praticados
pelos dirigentes das agências reguladoras, os quais têm margem de liberdade para regular o
assunto que lhe diz respeito e de certa forma estão administrando no lugar da Administração
Pública que é quem é a detentora do serviço que esta sendo prestados por tais entes, por tais
motivos como mencionado em capítulo anterior não se deve deixá-los a total liberdade sem
que o Poder Judiciário esteja a frente para analisar qualquer abuso de direito ou desvio de
finalidade praticando dessa forma atos arbitrários.
Encerramos dessa forma este segundo capítulo, o estudo do ato
administrativo é essencial para o fim a que se quer propor no presente trabalho, passaremos a
partir do próximo capítulo analisar as formas de controle externo os limites da atuação do
Poder Judiciário sob os atos administrativos praticados pelas Agências Reguladoras, como já
observado em tal capítulo analisamos não ser possível tal atuação quando se tratar de ato
vinculado que esteja seguindo todos os requisitos propostos na legislação, quanto ao ato
discricionário é controvertido e no próximo capítulo será melhor analisado.
45
III. CONTROLE EXTERNO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
Neste capítulo iremos analisar as formas de controle externo a que se
submetem a Administração Pública direta e indireta estando incluída em administração
indireta as agências reguladoras, objeto de estudo deste trabalho.
Analisaremos a possibilidade de revisão dos atos administrativos desta pelo
Poder Judiciário, suas possibilidades e limites e o possível controle judicial no mérito
administrativo dos atos discricionários das Agências.
O controle externo tem como finalidade principal assegurar que os atos
emanados por esses órgãos estejam de acordo com as normas e os princípios que compõem o
nosso ordenamento jurídico.
Dessa forma faz-se necessário uma análise breve sobre os tipos de controle
externo e dessa forma um estudo mais abrangente a respeito do controle judicial objeto
principal do trabalho.
3.1. Controle pelo Poder Executivo
As agências reguladoras ganharam força no governo de Fernando Henrique
Cardoso, e em tal governo dispunham de certa margem de liberdade para atuar no setor que
por elas é regulado.
Dessa forma no governo FHC tinham essas autarquias em regime especial
mais liberdade de atuação e o poder executivo ficava de certa forma inoperante, quem atuava
eram as agências reguladoras, em tal governo os dirigentes eram técnicos especializados e a
sua intenção era que a política não predominasse.
A intenção de tal governo, instituindo mais força a tais entidades em regime
especial era evitar que houvesse a politizações de decisões e possíveis diminuições de
pressões políticas, evitando-se assim a captura anteriormente comentada.
O sistema em tal época era muito precário, o governo então entendeu que
seria viável que um terceiro prestasse o serviço de forma eficaz e com mais empenho.
46
Tal governo vê as agências reguladoras como garantidoras de contrato,
fazendo com que as empresas cumpram o contrato e também impedindo que o governo
descumpra a sua parte no mesmo.
No governo posterior, ou seja, Governo Lula, essas agências foram
perdendo força e em alguns setores pode-se dizer que foram ficando de lado, a política passou
a predominar e os dirigentes que deveriam ser técnicos especializados no setor a ser regulado
pode-se dizer que não são mais em diversas delas, as agências tornaram-se objetos de
negociações sindicais ou partidárias.
Tais comentários referem-se a parte prática dos últimos governos, vale a
pena analisar a forma teórica e a opinião dos administrativistas que em sua maioria presam
pela parcial independência das agências reguladoras.
De certa forma pode-se dizer que a independência maior das agências
reguladoras é em relação ao poder executivo, dentro dos limites estabelecidos em lei.
Em relação ao poder legislativo praticamente não existe independência o
mesmo pode-se dizer em relação ao poder judiciário, as agências são autarquias
“independentes” mais que se sujeitam a várias espécies de controle para diminuir os excessos
que podem ser cometidos como anteriormente comentado.
Lucas de Souza Lehfeld (2008, p. 337) menciona em sua obra sobre a
instituição das agências reguladoras e a força do Poder Executivo:
Com a instituição das agências reguladoras no cenário político-administrativo
brasileiro, fortaleceu-se o Poder Executivo em relação aos demais. Passou a exercer
papel de destaque na mediação política com o setor econômico e, consequentemente,
com a iniciativa privada.
Contudo, a concepção original de um modelo regulatório com ampla autonomia
atribuída às agências parece perder força perante o forte controle exercido pela
Administração Pública, especialmente no atual governo. A retomada de um Poder
Executivo forte, habituado ao exercício do controle hierárquico sobre os dirigentes
das entidades públicas, impõe hodiernamente dificuldades ao exercício funcional
dos órgãos reguladores.
A estabilidade dispensada aos dirigentes das agências reguladoras é que
confere a maior liberdade e independência em relação a tal poder, seus dirigentes exercem o
mandato fixo como já comentado, estabilidade esta que não é comum na maioria das
entidades pertencentes à Administração indireta.
Apesar de lhes ser outorgado o mandado fixo, a escolha dos dirigentes de
cada uma das agências é escolhida pelo chefe do Poder Executivo e é essa a sua principal
forma de controle para selecionar cada um dos dirigentes.
47
Lucas de Souza Lehfeld (2008, p. 328) comenta sobre determinado assunto
mencionando:
Uma face importante do controle da autonomia das agências pelo Poder Executivo
refere-se à composição do quadro de direção desse órgão da Administração Pública
indireta. Embora tenha sido instituída a natureza jurídica de autarquia de regime
especial, com a fixação de mandatos fixos aos seus diretores ou conselheiros, cabe
ao Presidente da República, após aprovação do Senado, a nomeação para os
referidos cargos. Essa condição impõe, evidentemente, certa ingerência
governamental na condução da agência que, em detrimento da independência
decisória prevista em lei pode acabar representando interesses político-partidários do
Governo.
Como mencionado é por meio da escolha do dirigente que a Agência estará
vinculada ao Poder Executivo, o chefe do executivo estará de certa forma controlando por
meio de tal escolha, é também uma forma de controle a aprovação pelo Senado Federal, tal
controle será comentado no próximo tópico, pois se trata de um controle legislativo.
Com a instituição das agências diversas formas de atuação que eram
anteriormente decididas pelo poder executivo ficam a cargo da agência.
Dessa forma pode-se dizer que é em relação a esse poder que as agências
tem mais independência de atuação, pois após a escolha do dirigente este de certa forma
acabam ficando de lado e os outros controles ficam a cargo do Legislativo e do Judiciário.
3.2. Controle pelo Poder Legislativo
O Poder Legislativo têm competência para fiscalizar e controlar as
atividades das agências reguladoras, esse controle está previsto no art. 49, inciso X da
Constituição Federal de 1988, tal artigo descreve ser da competência do Congresso Nacional
“fiscalizar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos
os da Administração Indireta”.
Esse controle e essa fiscalização pelo parlamento dos atos das agências
reguladoras são de fundamental importância para que se preserve a segurança sócio jurídica e
se garanta legitimidade impondo limites à atuação desses entes.
De acordo com Lucas de Souza Lehfeld (2008, p.343-344):
48
A autonomia atribuída às agências, como fator de dinamicidade e desempenho
perante as vicissitudes do mercado e pressões dos agentes econômicos, não
representa ausência de comprometimento à vontade popular representada pelo
Congresso Nacional. É de sua competência exclusiva fiscalizar e controlar
diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos
aqueles praticados pelas entidades da Administração Pública indireta (art. 49, X, da
Constituição Federal).
Através de determinado artigo percebemos que apesar de ser outorgada certa
independência às agências reguladoras, ou seja, aos dirigentes das mesmas estes não podem
atuar da maneira que acharem mais conveniente, sem qualquer fiscalização.
Devem esclarecimentos de seus atos ao Congresso Nacional. Isso não
significa que irão atuar obedecendo a ordens do Poder Legislativo, significa que há limites e
legislações a serem seguidas.
As agências podem atuar somente conforme os limites impostos por sua lei
instituidora e não podem ferir normas já existentes, dessa forma cabe ao Poder Legislativo
fiscalizar.
Lehfeld comenta sobre o assunto mencionando (2008, p. 344):
Cabe ressaltar, ainda, que esse controle deve ser exercido de modo ilimitado, ou
seja, sobre toda atividade desempenhada pela agência. Tal fato repele a possibilidade
de a agência se eximir do controle parlamentar alegando ser de sua competência
exclusiva a disciplina de determinadas matérias, ainda que caracterizadas pelo alto
teor técnico-científico.
Determinado autor pensa que tal controle deverá ser de forma ilimitada
sobre toda e qualquer atuação das agências, a atuação ilimitada torna as agências menos
independentes, tal atuação deve averiguar os atos para que não haja irregularidades, a atuação
é necessária apenas nestes, pois se for a todo e qualquer ato mesmo que não haja
irregularidades estará adentrando na função das agências e não deixará que estas exerçam seu
papel com independência e resolver os problemas que lhe dizem respeito.
É por essas opiniões que se diz que a maior independência das agências é
em relação ao poder executivo anteriormente comentado, a competência daquele limita-se
basicamente em escolher quem será o dirigente, tarefa esta de fundamental importância, mais
os outros controles são mais rigorosos e fiscalizam arduamente seus atos após tal nomeação.
Nesse sentido ensina Marçal Justen Filho (apud FRANÇA, 2002, p. 1):
O controle parlamentar pode versar, de modo ilimitado, sobre toda a atividade
desempenhada pela agência, inclusive no tocante àquela prevista para realizar-se em
épocas futuras – ressalvada a necessidade de sigilo em face das características da
49
matéria regulada. Poderá questionar-se não apenas a gestão interna da agência, mas
também se exigir a justificativa para as decisões de cunho regulatório. Caberá
inclusive fiscalizar o processo administrativo que antecedeu a decisão regulatória
produzida pela agência, com ampla exigência de informações sobre justificativas
técnico-científicas das opções adotadas.
É possível notar por meio de determinados autores que os parlamentares
fiscalizam ilimitadamente os atos das agências, ficam as Agências vinculadas a esta
fiscalização, até mesmo os seus atos futuros serão submetidos a essa forma de fiscalização,
não sendo possível a alegação de sua competência exclusiva.
Tal controle deverá ser dessa forma porque assim dispõe o artigo 49 da CF,
disposição constitucional que outorga a determinado poder, fiscalizar a Administração
Indireta.
A atuação do Poder Legislativo precisa ser intensa, para que os atos
administrativos por elas editados não ultrapassem os limites da lei, deve-se exigir uma
atuação imparcial e clara, respeitando o consumidor e a livre concorrência entre os regulados,
pois são esses os principais prejudicados em qualquer deslize cometido pelas agências.
A atuação das agências deverá ser de forma a não prejudicar os interessados
nos atos por elas expedidos, como acima mencionado o consumidor, as empresas por ela
reguladas entre outros, é por este motivo que o controle legislativo deve ser permanente e
composto de procedimentos que regulem essa atuação.
Na visão de Lucas Souza Lehfeld (2008, p. 345).
A eficácia, portanto, dessa modalidade de controle depende de uma estrutura de
fiscalização permanente, composta por procedimentos formais, com transparência a
ampla divulgação à comunidade. Essa responsabilidade da agência para com os
objetivos traçados na legislação como a expressão da vontade popular proporciona
maior desempenho no exercício de suas atribuições funcionais, pois impede a
impunidade quando da prática indevida em prejuízo aos princípios da Administração
Pública.
Além da fiscalização descrita no art. 49, há outra forma de fiscalização por
meio do Poder Legislativo, está descrita no art. 52, III, f, também da Constituição Federal,
determinado artigo dá competência exclusiva ao Senado Federal para aprovar mediante voto
secreto após a nomeação pelo Presidente da República a escolha dos dirigentes das agências
reguladoras.
Determinada Casa do Congresso Nacional é quem irá aprovar o dirigente
nomeado pelo Presidente, sem tal aprovação o dirigente indicado não pode tomar posse e
50
exercer o cargo. Esse controle pelo parlamento compreende analisar as qualidades pessoais do
dirigente, se tem conhecimento técnico no setor a ser regulado, reputação ilibada, entre outros.
Outra forma de fiscalização do Poder Legislativo é em relação ao controle
orçamentário e financeiro previsto no art. 48, II da Constituição Federal, compete ao Senado
Federal, com a sanção do Presidente da República dispor sobre todas as matérias de
competência da União, especialmente sobre plano plurianual, diretrizes orçamentárias,
orçamento anual, operações de crédito, dívida pública e emissões de curso forçado.
Apesar da autonomia financeira outorgada às agências reguladoras essas não
tem total liberdade nessa atuação, estão sujeitas aos recursos provenientes da União em lei
orçamentária, ficando as agências vinculadas.
“A ampliação e inovação de infraestrutura, vinculam-se à gestão financeira
e patrimonial do Estado” (LEHFELD, 2008, p. 346).
É possível notar que há várias formas de atuação do Poder Legislativo no
controle dos atos das agências reguladoras permitindo a este fiscalizar e controlar atos que
ultrapassem os limites impostos às agências, instalando-se dessa forma uma harmonia, há
outro meio de controle que atua ao lado do Poder Legislativo é o Tribunal de Contato objeto
de analise do próximo tópico.
3.3. Controle do Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas da União é um órgão auxiliar do Congresso Nacional
na fiscalização, contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União, e
também das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade,
economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, conforme o art. 70 da
Constituição Federal.
O Tribunal é composto por nove Ministros que atuam na fiscalização
juntamente com o Congresso Nacional, tal Tribunal faz parte do Poder Legislativo embora o
nome possa dar a impressão de pertencer ao Poder Judiciário.
As Agências Reguladoras são submetidas a tal controle porque são
Autarquias pertencentes à administração indireta.
Conforme o art. 70 da Constituição Federal ao Tribunal de Contas compete
apenas fiscalizar o que diz respeito a “qualquer pessoa física ou jurídica que utilize, arrecade,
51
guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos ou pelos quais a União
responda, ou que, em nome desta, assuma obrigação de natureza pecuniária”.
Esse controle exercido pelo Tribunal segue preceitos constitucionais
restringindo-se à gestão administrativa, tem como escopo zelar pela legalidade no emprego do
dinheiro público.
Não cabe ao Tribunal investigar os atos das agências relacionados à sua
atividade-fim. Nesse sentido menciona Marçal Justen Filho (apud FRANÇA, 2002, p.1):
Esse controle versará, basicamente, sobre a gestão administrativa em sentido
próprio. Não caberá ao Tribunal de Contas investigar o conteúdo das decisões
regulatórias emitidas pela agência. O que se deverá verificar serão os dispêndios,
licitações e contratações produzidos, os atos atinentes a pessoal e sua remuneração.
Enfim, a atuação do Tribunal de Contas envolverá fiscalização das agências
reguladoras enquanto autarquia federal, não como órgão titular de competências
regulatórias.
O Tribunal de Contas apresenta-se como mais uma espécie de aparelho
essencial na proteção dos princípios da Administração Pública e é fundamental para controlar
eventuais prejuízos aos cofres públicos, e vale a pena reforçar que apesar do nome, não tem
nada a ver com o Poder Judiciário, tal Tribunal atua ao lado do Poder Legislativo.
3.4. Controle pelo Ministério Público
A atuação do Ministério Público é mais uma forma de controle externo dos
atos das Agências Reguladoras, a este se submetem por meio de ações específicas, é o art. 127
da Constituição Federal que dá tal autoridade a este órgão.
Dispõe tal artigo que o Ministério Público “é instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
Nesse sentido comenta Maria D‟Assunção Costa Menezello (2002, p. 78).
No que concerne aos controles externos, a agência reguladora também pode sofrê-
los por meio da atuação do Ministério Público por força de comandos
constitucionais contidos no art. 127 da Constituição Federal de 1988, os quais lhe
atribuíram competências para a defesa da ordem pública, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis, podendo averiguar a legalidade e a
legitimidade das decisões das agências, seja com pedidos de esclarecimentos, seja
com propositura de ações judiciais, a afim de impedir que a agência viole o
52
ordenamento jurídico, visto que o Ministério Público é uma instituição voltada ao
patrocínio desinteressado de interesses públicos, assim como de privados, quando
merecem um especial tratamento do ordenamento jurídico para que se restabeleça a
ordem e a justiça.
Como qualquer outro ente da Administração, as Agências Reguladoras se
submetem à fiscalização do Ministério Público, pois, este é um o órgão competente para a
defesa da ordem jurídica e dessa forma são obrigadas a prestar esclarecimentos quando
necessário, o Ministério Público como mencionado acima exerce esse tipo de controle por
meio de ações específicas, e principalmente por meio da ação civil pública.
Lucas de Souza Lehfeld comenta em sua obra (2008, p. 354-355):
Pela competência institucional declarada na Constituição Federal de 1988, o
Ministério Público, como defensor da ordem jurídica, bem como dos interesses
sociais e individuais indisponíveis, também exercerá suas atribuições em relação à
conduta das agências reguladoras e da iniciativa privada envolvida no exercício de
atividade econômica de interesse público. Constatando medidas regulatórias eivadas
de defeitos previstos em legislação pertinente, compete ao Ministério Público
questioná-las judicialmente, especialmente por meio da ação civil pública.
A Ação Civil Pública disciplinada pela Lei nº 7.347 de Julho de 1985 é uma
ação que serve para judicialmente tutelar direitos que muitas vezes pertencentes a milhares de
indivíduos, tudo em apenas um processo.
Como exemplo Lucas de Souza Lehfeld comenta exemplificando alguns
desses direitos que podem ser defendidos por tal ação (2008, p. 355):
A ação civil pública permite a defesa de interesses transindividuais relativos ao meio
ambiente, consumidor, patrimônio público, social e cultural (bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, e paisagístico), a infração com relação à ordem
econômica, urbanística e quaisquer outros interesses difusos e coletivos.
Dessa forma o Ministério Público é competente para fiscalizar os atos das
agências reguladoras.
O papel deste é fundamental, deriva tal importância da independência
outorgada aos dirigentes destas que podem cometer atos de improbidades ou alguns excessos.
O Ministério Público deverá estar atento para requerer ao Poder Judiciário, a
sanção cabível no caso de improbidade ou a revisão em caso de excessos.
53
3.5. Controle pelo Poder Judiciário
O Brasil adota o sistema da Jurisdição Una, afastando dessa forma o sistema
da dualidade de jurisdição.
No sistema adotado o acesso ao poder judiciário é uma garantia
constitucional em que somente tal poder poderá apreciar e julgar o problema, tal garantia esta
prevista no art. 5º inciso XXXV o qual diz “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça à direito”.
No sistema da dualidade de jurisdição há atuando paralelamente ao poder
judiciário outros órgãos administrativos exercendo a mesma função do judiciário.
Através do sistema ou garantia constitucional adotado no Brasil qualquer
cidadão, que se sentir prejudicado poderá levar seu problema ao judiciário e verá este ser
discutido apenas e tão somente por tal órgão.
A autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro em sua doutrina comenta sobre tal
assunto (2007, p. 689).
O controle judicial constitui, juntamente com o princípio da legalidade, um dos
fundamentos em que repousa o Estado de Direito. De nada adiantaria sujeitar-se a
Administração Pública à lei se seus atos não pudessem ser controlados por um órgão
dotado de garantias de imparcialidade que permitam apreciar e invadir os atos
ilícitos por ela praticados.
O direito brasileiro adotou o sistema da jurisdição una, pelo qual o Poder Judiciário
tem o monopólio da função jurisdicional, ou seja, do poder de apreciar, com força de
coisa julgada, a lesão ou ameaça de lesão a direitos individuais e coletivos. Afastou,
portanto, o sistema da dualidade de jurisdição em que, paralelamente ao Poder
Judiciário, existem os órgãos do Contencioso Administrativo que exercem, como
aquele, função jurisdicional sobre lides de que a Administração Pública seja parte
interessada.
O fundamento Constitucional do sistema da unidade de jurisdição é o artigo 5º,
inciso XXXV, da Constituição Federal, que proíbe a lei de excluir da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Qualquer que seja o autor da lesão,
mesmo o poder público, poderá o prejudicado ir às vias judiciais.
Diante de tal garantia não se excluirá da apreciação do poder judiciário
qualquer lesão ou ameaça à direito, sendo ele individual ou coletivo, mesmo estando
envolvido na problemática órgão do poder público, incluindo a Administração direita e
indireta.
O controle pelo Poder Judiciário é o que envolve mais questionamentos
entre juristas e estudiosos na área do direito administrativo. Tal assunto gera muita polêmica
principalmente a respeito da possibilidade ou não de revisão judicial de certos atos
54
administrativos expedidos pelas agências reguladoras, a matéria é bastante controvertida, e
como mencionado polêmica.
O assunto gira em torno do controle judicial do ato administrativo
discricionário se tal controle é ou não possível. Quanto ao controle judicial dos atos
administrativos vinculados, é pacífico o entendimento de ser sim possível, pois, não estando o
ato em conformidade com o que determina a lei é claro que poderá tal poder interferir para
que a lei seja cumprida, a discussão é em relação ao mérito do ato administrativo
discricionário que é o objeto principal deste trabalho e será a partir de agora analisado.
A atividade regulatória das agências reguladoras abrange diversos
interesses, tanto dos particulares quanto dos envolvidos diretamente de alguma forma, como
por exemplo, as concessionárias dos serviços. É por esse motivo que a sociedade se sentindo
prejudicada deve ter acesso ao Poder Judiciário, e este fará com que a entidade administrativa
que se excedeu em algum ato cumpra os limites estabelecidos.
A sociedade e quem se sentir prejudicado por algum ato praticado em
desconformidade com a lei, tem direito de ver seu problema ser analisado pelo órgão
competente, ou seja, o Poder Judiciário, mais o problema principal é, até que ponto tal órgão
tem competência para tal análise.
Da mesma forma que agência reguladora competente deve agir dentro dos
limites impostos, o Poder Judiciário também não pode interferir em todas as decisões tomadas
em cada ato, pois se tal procedimento foi de determinada forma o mínimo que se espera de
uma autarquia em regime especial é que estes procedimentos tenham sido muito bem
analisados, com a realização de laudos técnicos, seguindo uma política setorial, envolvendo os
interessados, entre diversos outros procedimentos que devem ser adotado e principalmente
que seja uma decisão técnica.
Muitos tribunais não invadem em suas decisões questões que em uma visão
superficial se percebe ser competência para a agência, é como se nota na Apelação Cível Nº
473589/SE (2003.85.00.006018-0)1, senão vejamos:
ADMINISTRATIVO. AGÊNCIA NACIONAL DE PETRÓLEO. FISCALIZAÇÃO
DE COMBUSTÍVEIS. AUTO DE INFRAÇÃO.
INTERDIÇÃO DO ESTABELECIMENTO. ATO ADMINISTRATIVO.
PRESUÇÃO DE LEGALIDADE E VERACIDADE. NÃO AFASTADA.
OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. MULTA DE 1%
(UM POR CENTO) APLICADA NO PRIMEIRO GRAU EM RAZÃO DE
EMBARGOS DECLARATÓRIOS CONSIDERADO PROTELATÓRIO.
1 ANEXO B.
55
1. A hipótese é de apelação interposta por AUTO POSTO MAR AZUL LTDA contra
a sentença que, em ação anulatória, julgou improcedente o pedido formulado na
incial. A parte Autora/Apelante pretente a anulação do ato administrativo de
interdição de todas bombas de revenda de combustível de seu estabelecimento, bem
como a condenação da AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO em indenização
pelos danos decorrentes dos lucros cessantes e danos emergentes, além dos danos
morais, por ofensa à sua imagem perante seus clientes.
2. O ato administrativo praticado pela ANP goza de presunção relativa de legalidade
e veracidade, cabendo ao Administrado provar que o ato sub judice é ilegítimo ou
que os fatos que se fundamentou o Poder Público não correspondem à verdade, o que
não ocorreu na espécie. 3. A Demandante, incoformada com a autuação sofrida, diz
ter encaminhado, via Distribuidora Esso, o referido produto para análise. Fosse pouco
não se poder emprestar poder de convencimento pleno a um elemento de prova
germinado em tais circunstâncias, alheias ao contraditório e à ampla defesa, acresça-
se que não se tem como saber se o produto enviado à análise àquele laboratório foi
exatamente o mesmo colhido e analisado pela ANP quando do auto de infração.
4. Não há qualquer irregularidade quanto à interdição total das bombas de
combustíveis do estabelecimento autuado, quando apenas em algumas delas foram
constatadas as irregularidades, tendo em vista que quem pratica a fraude é o
comerciante e não determinada bomba isoladamente.
Precedente: (TRF 4ª R., AC nº 2003.70.00.033011-8/PR, Publ. 15/09/2008) 5. A
agência reguladora do setor possui determinada faixa discricionária para interdição
total ou parcial do estabelecimento mautuado por irregularidades na composição
do combustível comercializado. É certo ser tal discricionariedade balizada pela
proporcionalidade e pela razoabilidade, informadas sobretudo pelo interesse
público em resguardar a segurança e qualidade das relações de consumo e, de
forma mediata, também ambiental. Por isso, ainda que apenas em parte das bombas
tenha sido constatadas as irregularidades no tocante ao combustível
comercializado, é possível,em atenção àqueles bens jurídicos a serem tutelados
pela administração pública, a extensão da medida restritiva a todos os
equipamentos do estabelecimento autuado.
6. Não há o que se falar em reparação por danos morais ou materiais.
Mesmo objetiva, a responsabilidade da agência reguladora, gizada pelo art. 37, §
6º, da CF/88, segue a teoria do risco administrativo, na qual o dever de reparar
pode ser excluído ou amenizado, por dentre outros fatores, quando constatada a
responsabilidade exclusiva do particular/administrado. Exatamente essa a situação
aqui constatada, pois na toada dos tópicos anteriores não há qualquer
irregularidade atribuível à ANP, seja pela inexistência de prova hábil à
desconstituição dos motivos do seu ato, seja pela legitimidade, do ponto de vista da
discricionariedade e proporcionalidade, da interdiçãototal do estabelecimento.
7. Quanto à multa no valor de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, aplicada
no primeiro grau, em razão da oposição de embargos declaratórios considerado
protelatório, entende-se que é de ser mantida, tendo em vista que, na ausência de
omissão, contradição ou obscuridade, sua oposição se revestiu de nítido caráter
protelatório,enquadrando-se perfeitamente no art. 538, parágrafo único, do Código
de Processo Civil.
8. Apelação não provida.
Trata-se de apelação interposta por um posto de gasolina onde o judiciário
não altera a decisão proferida pela ANP, onde esta lacrou todas as bombas de tal posto de
gasolina, sendo que as bombas adulteradas não correspondiam ao total de bombas do
56
estabelecimento. Se a agências decidiu que todas as bombas deveriam ser lacradas é essa a
decisão que deverá prevalecer.
Dessa forma não resta dúvida que o Poder Judiciário também deverá atuar
respeitando todos esses atos que foram cumpridos com êxito pelas agências, a análise deve
versar somente sobre as possíveis ilegalidades.
Assim deverá ser, pois, imagine o juiz tomando decisões puramente técnicas
que é de responsabilidade das determinadas autarquias especiais e de seus técnicos
especializados, haveria uma verdadeira substituição de poderes.
Entre os estudiosos do tema é pacífico o entendimento de que o controle
judicial de legalidade do ato administrativo é possível, como anteriormente mencionado o
entendimento que ainda não pacificado diz respeito se é ou não possível a análise do mérito
do ato administrativo discricionário pelo Poder Judiciário.
Como explicado no Capítulo 2, o ato administrativo discricionário é aquele
em que a lei permite a Administração Pública decidir com liberdade em relação a
determinados atos, a lei dá à Administração mais de uma opção e dessa forma todas estão
previstas em lei, sendo assim atos administrativos dentro dos limites da lei.
Passaremos a analisar em um tópico específico os detalhes e a possibilidade
do controle judicial do mérito do ato administrativo discricionário baseando-se nas opiniões
doutrinarias e jurisprudenciais e respeito do tema.
3.5.1. Controle Judicial do mérito do Ato Administrativo Discricionário
O controle de tal ato é tema bastante controvertido entre os doutrinadores,
são diversas as opiniões em relação a tal assunto, alguns a favor do controle judicial, pois tal
órgão deve analisar o caso concreto quando houver algum abuso por parte das agências, e
outros entendem que não é possível, pois, estaria o Poder Judiciário invadindo a esfera
administrativa das agências e ferindo o princípio da Separação dos Poderes, princípio este de
grande relevância no mundo jurídico.
É importante comentar brevemente sobre determinado princípio da
separação dos três poderes, princípio este que fora consagrado pelo pensador Montesquieu
que é quem traçou seus parâmetros, tal princípio divide os poderes em Legislativo, Executivo
e Judiciário. Determina tal princípio que compete ao Legislativo elaborar leis que regem o
57
Estado, ao Executivo compete sancionar ou vetar projetos de leis e o Judiciário é competente
para analisar os casos concretos levados até ele, é este que preserva as leis.
Deve-se analisar mais profundamente a base utilizada pelos doutrinadores
que são contra e os que são a favor do controle judicial, averiguando dessa forma suas
opiniões.
Os estudiosos que se posicionam a favor partem do pressuposto de que a
atuação do poder judiciário na sociedade e na vida dos cidadãos é uma garantia constitucional
e que não pode de forma alguma ser deixado de lado, baseia-se tal entendimento no art. 5º
inciso XXXV, já anteriormente citado o qual menciona, que a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça à direito.
Diante de tal princípio constitucional alguns entendem ser possível qualquer
tipo de interferência do poder judiciário mesmo no mérito dos atos administrativos
discricionários da Administração Pública e passando dessa forma por cima dos seus atos,
independentemente da forma com que as decisões foram tomadas.
Em Agravo de Instrumento interposto pela ANTT, Agravo de Instrumento
Nº 2007.04.00.037420-4/RS2, abaixo, podemos notar no caso concreto que o judiciário com o
passar do tempo passou a interferir mesmo em situações que se referem ao mérito do ato
administrativo, em tal agravo o judiciário não só interfere como concede ao particular uma
antecipação de tutela autorizando a relotação em cargo de Técnico em Regulação de Serviço
de Transportes Terrestres existente na cidade de Pelotas, tendo em vista que a demora poderia
trazer-lhe algum dano:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA.
CARGO DE TÉCNICO EM REGULAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTES
TERRESTRES. RELOTAÇÃO. JUDICIÁRIO.
1. A hermenêutica moderna superou o antigo dogma da intangibilidade do mérito do
ato administrativo.
2. Se o curso de formação profissional é ministrado primeiro àqueles candidatos que
lograram uma classificação melhor da primeira etapa, gera distorção antiisonômica a
não-disponibilização de vagas de interesse dos formados, a ponto de candidato com
pior classificação obter lotação em cidade almejada pelo melhor colocado, ao qual
não foi oportunizada a escolha com precedência.
Já os que entendem não haver a possibilidade de controle pelo poder
judiciário baseiam-se no entendimento de que a atuação de tal órgão estaria invadindo a esfera
de atuação da Administração Pública, no caso em exame, estaria invadindo a esfera de
2 ANEXO A.
58
atuação das Agências Reguladoras, dessa forma estaria ferindo o princípio da separação dos
poderes, princípio este que divide os poderes em Legislativo, Executivo e Judiciário.
Em artigo publicado por Victor V. Carneiro de Albuquerque este cita José
Afonso da Silva onde o autor em trecho de sua obra menciona a função de cada um dos três
poderes (2011, p.1).
A função legislativa consiste na edição de regras gerais, abstratas, impessoais e
inovadoras da ordem jurídica, denominadas leis. A função executiva resolve os
problemas concretos e individualizados, de acordo com as leis; não se limita à
simples execução das leis, como as vezes se diz; comporta prerrogativa, e nela
entram todos os atos e fatos jurídicos que não tenham caráter geral e impessoal; por
isso, é cabível dizer que a função executiva se distingue em função do governo, com
atribuições políticas, co-legislativas e de decisão, e função administrativa, com suas
três missões básicas: intervenção, fomento e serviço público. A função jurisdicional
tem por objeto aplicar o direito ao caso concreto a fim de dirimir conflitos de
interesse.
Por algum tempo doutrina e jurisprudência entendiam não ser possível essa
atuação do poder judicial na análise de questões de mérito do ato administrativo, pois se
acreditava que haveria uma invasão à competência da Administração que de certa forma é
considerada exclusiva além de ferir o princípio da tripartição dos Poderes.
Tal posição foi liderada por Seabra Fagundes que utilizava a expressão
mérito do ato administrativo para afastar qualquer possível controle judicial em atos tidos
como discricionários, o autor foi seguido por Hely Lopes Meirelles, entendimento este que
gerou entendimento doutrinário e jurisprudencial (TORRES, 2010 p. 4 – 5).
A doutrina preconizada por Seabra Fagundes, utiliza a expressão mérito do ato
administrativo como forma de afastar a possibilidade de controle judicial a qualquer
ato dito como discricionário. Essa teoria relaciona mérito à discricionariedade e
acaba por suprimir qualquer possibilidade de atuação do Poder Judiciário nesse
campo que seria restrito à atuação administrativa.
Determinados autores entendem não ser possível qualquer tipo de atuação
do Poder Judiciário que se refere ao mérito do ato administrativo relacionado a oportunidade e
conveniência do mesmo.
Alguns estudiosos do tema ainda entendem que se deve ter um equilíbrio,
pois também não seria possível que o judiciário interferisse em todo e qualquer ato das
agências reguladoras. Se o dirigente frente a duas opções legais escolhe a que achar mais
oportuno e conveniente não faz sentido o poder judiciário anular tal ato para que seja da
forma que este entender mais oportuno e conveniente.
59
Desde que a opção escolhida não seja contrária a alguma lei ou que
prejudique a sociedade e as concessionárias do serviço público é injusto a atuação de todo e
qualquer ato.
A análise de todo e qualquer ato que desde logo se percebe irregular, que
fere normas ou princípios constitucionais, é claro que deverá ser verificado e se necessário até
mesmo anulado, mais se for uma decisão baseada nas opções apresentadas aos dirigentes e
quem atue no comando das agências entende-se não ser possível pelo fato de estar tal poder
atuando como um dirigente da agência.
60
CONCLUSÃO
Ao término desse trabalho onde se procurou analisar a possibilidade de
revisão pelo poder judiciário o mérito do ato administrativo das agências reguladoras, se
notou que o tema é totalmente controvertido e as opiniões até hoje não são pacíficas.
Neste trabalho fora estudado, as agências reguladoras, o ato administrativo e
as diversas formas de controle, a que estas poderão ser submetidas, e aprofundou-se a
discussão a respeito do controle do poder judiciário na apreciação dos atos administrativos.
Por um tempo se entendia não ser possível a análise desse tipo de ato
expedido pela Administração Pública que se incluem nesse sentido qualquer órgão da
administração direta e indireta, e dessa forma as agências reguladoras.
O poder judiciário com o tempo foi ganhando força e conforme comentado
no trabalho, tal força deriva da Constituição Federal de 1988. Hoje o direito administrativo é
baseado nos princípios constitucionais, estes após a Carta constitucional passaram a controlar
a Administração Pública, e dessa forma tornaram-se uma das prioridades no direito
administrativo.
O princípio de maior destaque no trabalho em comento é o princípio da
inafastabilidade do poder judiciário, e como já comentado garante a todos a apreciação pelo
poder judiciário de qualquer lesão ou ameaça a direito.
Diante de tal princípio não resta dúvida que todos poderão levar ao
conhecimento do poder judiciário seus problemas, mas o que deve se levar em conta,
referindo-se às agências reguladoras e não só a estas mais a qualquer órgão pertencente à
Administração Pública, é até que ponto o tal poder não estará interferindo o poder destas
autarquias.
O entendimento atual é que o poder judiciário poderá ter acesso a qualquer
caso concreto que envolva algum ente da Administração Pública, mas o que os juízes e todo o
poder judiciário, devem ter em mente é que não devem analisar questões, que visivelmente
sejam questões de cunho pessoal, ou seja, questões que necessitem da opinião dos seus
dirigentes, cabe a cada uma das agências, dependendo do assunto que estiver em tela decidir o
que se pensa ser a melhor opção, não cabe ao judiciário esse tipo de decisão, a interferência
dessa maneira nada mais é do que uma troca de funções, e não é isso que se quer que
61
aconteça, o principio da separação dos poderes é essencial assim como o da inafastabilidade
do poder judiciário e os dois devem ser preservados.
Se o ato administrativo expedido pela agência é discricionário, já se entende
ter margem de liberdade para escolher uma entre outras opções que se entende ser a melhor,
não faz sentido uma decisão ser tomada por se entender ser uma melhor opção e o poder
judiciário alterá-la por entender que outra seria a melhor escolha. Nesse caso estaria o poder
judiciário ferindo o princípio da separação dos poderes e agindo como se fosse a própria
Administração Pública.
Entende-se que nesse sentido não deveria o poder judiciário atuar
modificando decisões, desde que o ato administrativo praticado não esteja ferindo nenhum
princípio e nenhuma norma do ordenamento jurídico.
É claro que o particular ou quem quer que seja terá a oportunidade de ver
qualquer ato ser apreciado quando estes se sentirem prejudicados é um direito a todos pois é
norma constitucional, o judiciário deve apreciar se houve alguma arbitrariedade, se o ato fora
expedido da maneira correta além de outras formalidades, caso o ato esteja na mais perfeita
ordem e a opção escolhida é permitida entende-se que não deve este fazer qualquer alteração.
No caso de atos que nitidamente não só prejudicam particulares, mas não
foram decididos com todas as formalidades que são essenciais é necessário a interferência do
poder judiciário.
Cada caso concreto levado a juízo deve ser analisado minuciosamente e em
qualquer ato irregular exige-se que o poder judiciário não só aprecie como também faça o que
for necessário anulando o ato.
62
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nova dimensão dos conceitos de discricionariedade técnica e discricionariedade
administrativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2530, 5 jun. 2010. Disponível em:
<http://jus.com.br/revista/texto/14980>. Acesso em: 5 out. 2011.
VASCONCELLOS, I. C. Limites ao Controle Judicial dos Atos Normativos Discricionários
das Agências Reguladoras, 2009, 30 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Pós-Graduação),
Faculdade de Direito, EMERJ, Rio de Janeiro, RJ, 2009.
VIOLIN, Tarso Cabral. Aspectos gerais das agências reguladoras no direito brasileiro. Jus
Navigandi, Teresina, ano 10, n. 844, 25 out. 2005. Disponível em:
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/7423>. Acesso em: 15 ago. 2011.
64
ANEXOS
65
ANEXO – A
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2007.04.00.037420-4/RS
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2007.04.00.037420-4/RS
RELATOR : Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
AGRAVANTE : AGENCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES -
ANTT
ADVOGADO : Solange Dias Campos Preussler
AGRAVADO : LEONARDO DE MOURA NITZKE
ADVOGADO : Altemir Wagner dos Santos e outro
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. CARGO
DE TÉCNICO EM REGULAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTES TERRESTRES.
RELOTAÇÃO. JUDICIÁRIO.
1. A hermenêutica moderna superou o antigo dogma da intangibilidade do mérito do ato
administrativo.
2. Se o curso de formação profissional é ministrado primeiro àqueles candidatos que
lograram uma classificação melhor da primeira etapa, gera distorção antiisonômica a não-
disponibilização de vagas de interesse dos formados, a ponto de candidato com pior
classificação obter lotação em cidade almejada pelo melhor colocado, ao qual não foi
oportunizada a escolha com precedência.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª
Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao
agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de junho de 2008.
Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon
Relator
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2007.04.00.037420-4/RS
RELATOR : Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
AGRAVANTE : AGENCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES -
ANTT
ADVOGADO : Solange Dias Campos Preussler
AGRAVADO : LEONARDO DE MOURA NITZKE
ADVOGADO : Altemir Wagner dos Santos e outro
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, em ação ordinária, deferiu
a antecipação da tutela para autorizar a relotação do postulante no cargo de Técnico em
Regulação de Serviços de Transportes Terrestres existente na Cidade de Pelotas. (fls. 100).
Sustenta a agravante que: a) é vedado ao Poder Judiciário substituir a Administração quanto
aos critérios de avaliação dos concursos; b) o pedido de relotação do demandante não atende
as regras estabelecidas no edital que disciplinou o certame; c) faltam os requisitos
necessários para a concessão da antecipação da tutela.
Indeferido o efeito suspensivo.
Sem contra-razões.
É o relatório.
Peço dia.
Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon
Relator
Documento eletrônico assinado digitalmente pelo (a) Des. Federal Luiz Carlos de Castro
Lugon, Relator , conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2007.04.00.037420-4/RS
RELATOR : Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
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ADVOGADO : Solange Dias Campos Preussler
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AGRAVADO : LEONARDO DE MOURA NITZKE
ADVOGADO : Altemir Wagner dos Santos e outro
VOTO
Anoto que, após a Constituição de 1988, o Direito Administrativo trilhou novos rumos,
flexibilizando-se a antiga lição que vedava ao juiz imiscuir-se no chamado "mérito" do ato
administrativo, reservado à área de oportunidade e conveniência, onde imperava a
discricionariedade. Evidentemente, não se há que permitir ao julgador substituir-se ao
administrador na tomada de decisões entre opções de natureza política. No entanto, hoje já
se tem assente que mesmo as escolhas políticas não podem divergir das diretrizes
constitucionais, às quais está o agente público sempre vinculado, sendo, pois, correta a
assertiva de que ausente discricionariedade pura do administrador, facultando-se ao
Judiciário o exame da motivação, à luz do interesse público e dos princípios fundamentais
ínsitos na Lei Maior. A respeito, preleciona MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS in
"A constitucionalização do Direito Administrativo e o controle de mérito (oportunidade e
conveniência) do ato administrativo discricionário pelo Poder Judiciário", no Boletim
Jurídico, ano V, nº 220, Uberaba/MG27/03/2007, páginas 24/44, verbis:
"Os princípios sub oculis, como conceituado por José dos Santos Carvalho Filho, são
'diretrizes fundamentais da Administração, de modo que só poderá considerar válida a
conduta administrativa se estiver compatível com eles.'
Funcionam, assim, os princípios, como normas fundamentais para boa gestão da coisa
pública.
Com essa nova filosofia, onde os princípios constitucionais constituem-se como 'raízes' do
direito administrativo, houve substancial alteração deste ramo do direito, que passou a ser
totalmente vinculado a essa nova filosofia de conceitos.
Com esta vinculação, os princípios constitucionais passaram a controlar a Administração
Pública, em especial no aperfeiçoamento do controle da Administração Pública quanto aos
seus atos discricionários, permitindo uma identificação do ambiente decisório do
administrador, em virtude da imposição de parâmetros objetivos de valoração a serem
seguidos.
Assim, a oportunidade, a conveniência e o próprio mérito do ato administrativo
discricionário não poderão ser desprezados pelos princípios da Constituição, que
funcionando como critério objetivo de toda a Administração Pública, devem estar presentes
na liberdade de escolha do administrador público. Estes limites de ordem constitucional
demarcam o espaço de atuação do administrador, como infere Luís Roberto Barroso:
'O poder discricionário, portanto, encontra limites, como já referido, na finalidade legal da
norma que o instituiu, mas também, e primordialmente, nas normas constitucionais. No
normal das circunstâncias, como no caso examinado neste estudo, a finalidade legal do ato
a ser praticado e as normas constitucionais são limites que convivem harmoniosamente
para demarcar o espaço de atuação do administrador, mas é importante registrar que, em
caso de conflito insuperável entre esses dois elementos, a supremacia será sempre das
normas constitucionais, admitindo-se até mesmo que o administrador deixe de dar
cumprimento à lei em reverência à Constituição.'
Funcionam os princípios como os vetores a guiar todo ato público, inclusive o
administrativo discricionário.
68
Assim, o ato administrativo discricionário, em seu todo, fica vinculado aos critérios
objetivos dos princípios constitucionais, não como uma forma de limitação, mas sim como
um aperfeiçoamento da medida a ser adotada.
É preciso que se dê um fim à idéia de que com a vinculação do ato administrativo
discricionário aos princípios constitucionais, estar-se-ia impedindo a livre movimentação
do administrador, pois esta nova filosofia do direito administrativo constitucional
amadurece o ato público qualitativamente. Nada é mais nefasto do que atos discricionários
ocultando interesses particulares, contrários à finalidade pública. Por esta razão, a
vinculação aos princípios da Constituição na tomada de posição do administrador evita que
fins alheios ao interesse público sejam os prevalentes.
Nesse sentido, precisas foram as colocações de Alexandre de Mores:
'O mérito do ato administrativo, que somente existe nos atos administrativos
discricionários, deve ser entendido como juízo de conveniência e oportunidade do
administrador, que poderá, entre as hipóteses legal e moralmente admissíveis, escolher
aquela que entenda como a melhor para o interesse público.
Mérito, portanto, do ato administrativo é o juízo de conveniência e oportunidade, dentro da
legalidade e moralidade, existente nos atos discricionários.
Dessa forma, enquanto o ato administrativo vinculado somente será analisado sob o amplo
aspecto de legalidade, o ato administrativo discricionário também deverá ser analisado por
seu aspecto meritório. (...) Assim, mesmo o ato administrativo discricionário está vinculado
ao império constitucional e legal, pois, como muito bem ressaltado por Chevalier, 'o
objetivo do Estado de Direito é limitar o poder do Estado pelo Direito.'
Portanto, a verificação dos princípios constitucionais no ato administrativo discricionário
não inviabiliza o critério de oportunidade e de conveniência, visto que estes comandos
maiores não impedem a tomada de atos, apenas criam condições que evitam a
arbitrariedade e o abuso de poder.
Nessa situação é que o controle jurisdicional é imperioso para o equilíbrio de forças, pois o
administrado possui nos princípios constitucionais a garantia de que não será oprimido
pela envergadura do poder público.
Assim, como conseqüência do Estado de Direito, não há mais espaço para a criação do ato
administrativo discricionário desvinculado dos princípios e das normas constitucionais.
Destarte, a vinculação do Estado à legalidade constitucional retira do administrador
público a condição de promover uma escolha livre para a tomada do seu ato discricionário
afastada dos princípios constitucionais, pois a sua liberdade não é total na atual fase do
direito administrativo constitucional, ela é vinculada aos instrumentos contidos na
Constituição.
Não é retirado, por esta ótica, o exercício de competência de um poder-dever funcional,
relativamente livre, mas é ressaltado que ele será sempre subordinado à realização de
objetivos harmonicamente impostos em um Estado de Direito, desde logo fixados pelos
princípios constitucionais.
Portanto, a livre escolha administrativa continua a existir, apenas ela é vinculada aos
princípios da administração pública, para que a sociedade tenha a garantia de que os
homens públicos atuarão em homenagem aos interesses de todos (públicos) e não que
ocorram desvios de finalidade indesejados.
Em alentado estudo, M. Francisca Portocarrero, assim averba sobre 'discricionariedade
pura' no novo quadro constitucional:
'Assim, ao utilizar-se a expressão 'discricionariedade pura' não poderá deixar de se ter
69
presente o novo quadro constitucional e legal da discricionariedade, nas modernas
Administrações de Estados de Direito. (...) Bem como pensamos que não se pode
caracterizar, sem mais, aquela escolha discricionária, entre soluções jurídicas, como
verdadeiramente livre, uma vez que ela é condicionada pelos pressupostos fixados pela
norma, sendo sempre função deles; e é, ainda, função da aplicação dos princípios jurídicos
gerais da atividade administrativa, sempre reguladores do exercício da discricionariedade,
máxime os da imparcialidade e da proporcionalidade.'
Em um Estado de Direito, as atividades das autoridades administrativas são vinculadas
sempre aos princípios e preceitos da Constituição, não existindo uma zona de atuação
'completamente livre', pois a liberdade consiste em conformar a necessidade do ato aos
comandos eleitos para a sua boa e eficaz validade. Com isto, não se retira a competência
discricionária do agente público, apenas ela é vinculada aos princípios constitucionais para
melhor servir ao interesse coletivo. Não se deve esquecer que os princípios ao serem
embutidos no Texto Maior já foram ponderados pelo constituinte, de forma que fosse
balizada a atuação da Administração Pública.
Não vigora mais a idéia da discricionariedade clássica, onde a oportunidade e a
conveniência eram impenetráveis ao controle judicial, pois os princípios constitucionais
foram instituídos para disciplinar uma unidade em todos os atos públicos, podendo haver
análise de mérito do ato administrativo.
Deturpa-se, por outro lado, o controle do ato administrativo discricionário pelo Poder
Judiciário, como se ele fosse o intruso aleatoriamente, descartando-se que a sua missão é
combater o excesso de poder de órgão público, quando confrontados seus atos com os
princípios e as normas legais.
Ou, como deixamos expresso em outra oportunidade: 'A constitucionalização das regras da
Administração Pública permite ao Poder Judiciário um controle mais efetivo sobre os atos
administrativos. (...) Mesmo o ato administrativo discricionário não poderá ser
caracterizado em colisão com os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência.'
A vinculação da Administração à realidade constitucional faz com que seus atos sejam
vigiados, não como uma forma de intervenção em sua conveniência e nem na respectiva
oportunidade, e sim para mantê-la condicionada aos seus instrumentos condicionantes. É o
mesmo fenômeno que ocorre quando o Poder Legislativo edita uma lei inconstitucional. Ou
seja, quando o Poder Judiciário interpreta a norma e aplica a eficácia da Constituição, na
prática ele não extrapola a sua função para transformar-se em legislador.
Tem-se, portanto, que, com a função da constitucionalização das normas e dos princípios
da Administração Pública, o Poder Judiciário amplia o seu leque de controle sobre os atos
do Estado.
........
Confirmando o que foi dito, a Ministra Eliana Calmon, em magistral julgado[104] ressaltou
a nova visão do Superior Tribunal de Justiça, quanto ao controle judicial do ato
administrativo discricionário:
'Administrativo e Processo Civil - Ação Civil Pública - Ato Administrativo Discricionário:
nova Visão.
1 - Na realidade, o império da lei e o seu controle, a cargo do Judiciário, autoriza que se
examinem, inclusive, as razões de conveniência e oportunidade do administrador (...)'
70
Assim, o critério de hermenêutica conforme a Constituição privilegia a interpretação
extensiva da norma legal, e via de conseqüência, pode-se desnudar o ato administrativo
discricionário para cotejá-lo com o estabelecido na Magna Carta.
A justificativa oficial para a ilimitada ampliação da abrangência da atuação
administrativa, pauta-se em aventada mudança no perfil do Estado, que teria deixado de ser
'liberal' passando a assumir posturas 'sociais', com vista a assegurar os direitos à saúde,
assistência, educação etc.
Abstraindo-se da constatação de que tais propósitos não foram atingidos, o que por si só
espancaria a validade da justificativa, não se pode olvidar a advertência de Pontes de
Miranda, quanto ao risco de supressão das conquistas obtidas com o liberalismo, em nome
da suposta efetivação de direitos fundamentais de segunda e terceira dimensões:
'Há de aproveitar-se o que já se alcançou; levar-se consigo o que se tem, ao ir-se buscar o
que se não tem. Deixando-se o que se tem, ter-se-ão de percorrer outras estradas para
readquirir o que se deixou no meio do caminho.'
Assim, a liberdade na aferição da oportunidade e conveniência da atuação administrativa,
impõe balizamento não só na lei, como nos princípios constitucionais, não se autorizando,
ao intérprete e operador do direito, sopesá-los à sua conveniência invocando a
preponderância de interesses ditos 'sociais', já ponderados pelo constituinte originário.
......
Com enfoque constitucional, onde é relatado o progressivo controle na base dos princípios
da Magna Carta no Brasil, que vem adotando a teoria germânica dos" vícios de
discricionariedade "segue o notável posicionamento de Andreas J. Krell:
'Não há mais dúvidas, no Brasil, de que todo e qualquer ato administrativo, inclusive o ato
discricionário e também aquele decorrente da valoração administrativa dos conceitos
indeterminados de prognose, é suscetível de um controle jurisdicional mínimo, baseado nos
princípios constitucionais e nos princípios gerais de Direito. Na atual fase 'pós-positivista',
que foi instaurada com a ampla positivação dos princípios gerais de Direitos nos novos
textos constitucionais, os atos administrativos discricionários não devem ser controlados
somente por sua legalidade, mas por sua juridicidade. Essa 'principialização' do Direito
brasileiro (proibição da arbitrariedade, razoabilidade, proporcionalidade, igualdade,
proteção da confiança legítima etc.) aumentou a margem da vinculação dos atos
discricionários.
Nesse controle, ganham fundamental importância os princípios da Administração Pública,
consagrados no art. 37 da Carta Federal: a legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência delimitam a margem de interpretação de todo o sistema jurídico e
estabelecem os limites da juridicidade de qualquer ato estatal. Uma posição destacada
nesse rol ocupa o princípio da moralidade, visto que sua inserção no texto da Carta Magna
provocou um reencontro dos conceitos do Direito Moral, cuja estrita separação tem sido,
durante muito tempo, um verdadeiro dogma juspositivista, que teve um efeito extremamente
pernicioso, inclusive na gestão da coisa pública no Brasil.'
.........
Para Paulo Otero, 'o conteúdo das próprias normas das leis revela uma progressiva
substituição de regras por princípios, originando uma normatividade 'principialista que
provoca uma diluição do conteúdo material da legalidade, fazendo surgir um 'Direito
Administrativo de Princípios'.
Karl Larenz, perfilha-se aos eminentes juristas declinados, quando aduz:
71
'Aliás, esta margem de discricionariedade conferida à Administração é, nos termos da
concepção actual, sempre limitada, seja lá pela própria lei que confere o poder
discricionário, seja pelas limitações a ter permanentemente em conta, que decorrem da
Constituição e de princípios gerais do Direito, como o da proporcionalidade.'
Por sua vez, Luis Garcia del Rio, aduna que: 'El control judicial de los actos de la
Administración Pública no sólo nos sitúa ante una de las cualidades que definen al Estado
como Estado de Derecho, sino que atañe directamente a la estructura misma de aquél; no
en vano, sólo cabe concluir en la existencia de un verdadero controle de legalidad de los
actos de las Administraciones Públicas, partiendo del principio de la separación de los
poderes del Estado y de la propia independencia del poder judicial.'"
(www.boletimjuridico.com.br.doutrina/texto).
Cumpre, ainda, referir que, quanto à possibilidade de o Poder Judiciário rever questões de
concurso ou provas quando verificada a impropriedade na sua formulação, a Lei Maior, no
seu art. 5º, XXXV, dispõe que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão
ou ameaça a direito".
No caso em epígrafe, o autor, na ação principal, pretende sua relotação provisória no cargo
de Técnico em Regulação de Serviços de Transportes Terrestres existente na Cidade de
Pelotas, enquanto não for declarada por sentença a ilegalidade em que incorreu a ANTT ao
nomear, para aquela cidade, candidatos com pior classificação no concurso.
Muito bem esclarece a demanda o MM Juízo a quo :
"Dispunha o edital do concurso público impugnado pela parte autora, em seu subitem 6.6,
verbis:
Ao preencher o Requerimento de Inscrição, o candidato deverá, obrigatoriamente, indicar
nos campos apropriados, sendo vedado alterações posteriores, sob pena de não ter a sua
inscrição aceita no Concurso Público:
a) o código e o nome da área de concentração para a qual deseja concorrer, com base nos
Anexos I e III deste Edital;
b) o código e o nome da região para a qual deseja concorrer, com base no Anexo III deste
Edital;
c) o código e o nome da cidade onde deseja realizar a prova, com base no Anexo IV deste
Edital
Dois, portanto, seriam os critérios que deveria observar a ANTT para a nomeação e lotação
dos seus candidatos, quais sejam: (a) a ordem de classificação final no concurso; e (b) a
região eleita no formulário do pedido de inscrição.
Nesta linha é que, observada a alínea b supra, não detinha a autarquia viária o poder
discricionário de nomear e lotar os candidatos classificados para o cargo disputado pelo
autor de acordo com sua conveniência e oportunidade. Deveria, em um primeiro momento,
separá-los de acordo com a Região eleita no pedido de inscrição para, tão-somente após,
observada a ordem classificatória do certame e as nomeações eventualmente tornadas sem
efeito, lotá-los nas vagas existentes dentro de cada esfera regional.
É o que, aliás, já decidiu o Egrégio TRF da 4ª Região, consoante aresto que segue, verbis:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA FEDERAL. VAGAS OFERTAS.
CRITÉRIO DE ESCOLHA. 1. A não disponibilização de novas vagas aos candidatos já em
exercício do cargo, por ocasião da conclusão do Curso de Formação Profissional, gera
72
distorções a ponto de candidato com pior classificação obter lotação em cidade almejada
por candidato com melhor classificação, mas não disponível quando lhe oportunizada a
escolha. 2. Critério que, além de violar o princípio da isonomia, também fere as disposições
do edital do certame. Precedente da Turma (AG n.º 200604000298775/RS, D.E:23/04/2007,
Relator: Márcio Antônio Rocha).
Assim, em havendo comprovado o autor que a sua classificação foi superior à dos
candidatos posteriormente nomeados para a Cidade de Pelotas; e que tais vagas, quando de
sua nomeação, sequer foram ocupadas pelos candidatos melhores classificados no certame,
por exclusão ou desistência, não resta para este Juízo outra alternativa senão, com apoio
na orientação suso referida, deferir, por ora, o pedido liminar." (fls. 22/23).
Explicito, ainda, que estão presentes os requisitos para a concessão da antecipação da tutela,
previstos no art. 273, I, do CPC, quais sejam: verossimilhança das alegações, constatada
pela análise dos autos e dos documentos a eles acostados; bem como o risco de dano
irreparável ou de difícil reparação, haja vista a possibilidade de o autor perder as vagas
existentes em Pelotas, o que lhe acarretaria despesas orçamentárias e mudanças não
programadas.
Registro, por fim, que, a Terceira Turma desta Corte, em voto de minha lavra, ao deslindar
caso assemelhado, no Agravo de Instrumento nº 200704000176017/RS, assim decidiu:
"ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA FEDERAL. NOVA ESCOLHA DE
VAGA E RELOTAÇÃO.
Se o curso de formação profissional é ministrado primeiro àqueles candidatos que lograram
uma classificação melhor na primeira etapa, gera distorção antiisonômica a não-
disponibilização de vagas de interesse dos formados, a ponto de candidato com pior
classificação obter lotação em cidade almejada pelo melhor colocado, ao qual não foi
oportunizada a escolha com precedência." (DJ : 05/09/2007).
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento.
É o voto.
Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon
Relator
Documento eletrônico assinado digitalmente pelo (a) Des. Federal Luiz Carlos de Castro
Lugon, Relator , conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-
estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e Portaria do TRF4R nº 195 de 16 de
dezembro de 2004 (DJU de 24/12/2004 pg. 25). A autenticidade do documento pode ser
conferida no site https://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php informando o código
verificador 2224702v3 e, se solicitado, o código CRC 68455163 .
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON:37
Nº de Série do Certificado: 443587ED
Data e Hora: 25/06/2008 16:42:01
73
ANEXO – B
APELAÇÃO CÍVEL Nº 473589/SE (2003.85.00.006018-0)
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO
GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS
DIAS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 473589/SE (2003.85.00.006018-0)
APTE : AUTO POSTO MAR AZUL LTDA
ADV/PROC : GILBERTO VIEIRA LEITE NETO
APDO : ANP - AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO
REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
ORIGEM: 2ª VARA FEDERAL DE SERGIPE
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS -
Segunda Turma
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal
FRANCISCOBARROS DIAS (Relator):
Trata-se de apelação interposta por AUTO POSTO MAR
AZUL LTDA contra a sentença que, em ação anulatória, julgou improcedente o
pedido formulado na inicial, condenando o Autor, ora Apelante, ao pagamento de
honorários advocatícios arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais).
Na exordial, alegou a parte Autora, em síntese, que: (a)
após inspeção de rotina realizada por fiscal da ANP - AGÊNCIA NACIONAL
DOPETRÓLEO, em 06/08/2003, foi lavrado auto de infração, havendo sido lacradas
todas bombas de revenda de combustível de seu estabelecimento, não obstante as
supostas irregularidades apontadas pelo agente fiscalizador refiram-se apenas a
duas bombas de combustíveis; (b) a autuação se mostrou abusiva, visto que houve
desvio de poder da referida autarquia no momento em que efetuou o lacre de todas
as bombas de revenda, inclusive aquelas que não apresentavam indícios de
irregularidades; (c) impende-se a anulação do ato administrativo de interdição total,
bem como a condenação da requerida em indenização pelos danos decorrentes dos
lucros cessantes e danos emergentes, além dos danos morais, por ofensa à sua
imagem perante seus clientes.
O Doutor Magistrado sentenciante se posicionou pela
presunção de legitimidade e veracidade do ato administrativo, concluindo que o
interessado, que tem o ônus probatório, não logrou êxito em demonstrar eventuais
74
irregularidades. O Juízo a quo assentou, ainda, a possibilidade de interdição de
todas as bombas de combustíveis, bem como afastou a ocorrência de danos morais
e materiais. A parte Autora opôs, ainda no primeiro grau, embargos declaratórios,
que foram rejeitados e considerados protelatórios pelo Juízo a quo, o que ensejou a
condenação do Embargante, ora Recorrente, ao pagamento de multa no valor de
1% (um por cento) sobre o valor da causa, na forma do art. 538, parágrafo único, do
CPC.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO
GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS
DIAS
Em suas razões de apelo, a Recorrente defende, em
suma, que: (a) o Juízo originário não se ateve ao fato de que a prova extrajudicial
(análises químicas sobre os combustíveis), trazida com a inicial, chegou aos autos
com status, não de “prova pericial”, mas sim de prova documental, na estrita
acepção da palavra, cuja validade e veracidade não foram em momento algum
contrariadas pela autarquia recorrida; (b) a prova documental produzida pela
Apelante contraria o que fora supostamente observado pelo fiscal da ANP quando
da lavratura do Auto de Interdição aqui combatido; (c) a recorrente se desincumbiu
satisfatoriamente do ônus de fazer prova dos elementos constitutivos de seu direito,
na forma do art. 333, I, do CPC; (d) não cabe a cominação de multa no caso dos
autos, com base no parágrafo único do art. 538 do CPC, tendo em vista a ausência
de interesse procrastinatório nos embargos declaratórios.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO
GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS
DIAS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 473589/SE (2003.85.00.006018-0)
APTE : AUTO POSTO MAR AZUL LTDA
ADV/PROC : GILBERTO VIEIRA LEITE NETO
APDO : ANP - AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO
REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
ORIGEM: 2ª VARA FEDERAL DE SERGIPE
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS
75
DIAS -
Segunda Turma
VOTO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal FRANCISCO
BARROS DIAS (Relator):
A hipótese é de apelação interposta por AUTO POSTO MAR AZUL
LTDA contra a sentença que, em ação anulatória, julgou improcedente o pedido
formulado na inicial.
A parte Autora pretende a anulação do ato administrativo de
interdição de todas bombas de revenda de combustível de seu estabelecimento,
bem como a condenação da AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO em indenização
pelos danos decorrentes dos lucros cessantes e danos emergentes, além dos danos
morais, por ofensa à sua imagem perante seus clientes. A sentença recorrida se
posicionou pela presunção de legitimidade e varaciadade do ato administrativo,
concluindo que o interessado, que tem o ônus probatório, não logrou êxito em
demonstrar eventuais irregularidades. O Juízo a quo assentou, ainda, a
possibilidade de interdição de todas as bombas de combustíveis, bem como afastou
a ocorrência de danos morais e materiais. Importa registra, incialmente, que a
pretensão da parte Autora visa, precipuamente, desconstituir ato administrativo
particado pela ANP, com a consequente reparação dos seus desdobramentos na
espefera civil. Neste tocante, é se ressaltar que o ato administrativo goza de
presunção relativa de legalidade e veracidade, cabendo ao Administrado provar que
o ato sub judice é ilegítimo ou que os fatos que se fundamentou o Poder Público
não correspondem à verdade, o que não ocorreu na espécie. No caso em apreço,
verifico que as provas colacionadas aos autos não se mostraram sufientes para
infirmar a presunção de legalidade e veracidade do ato atacado, que se
fundamentou na comercialização de produto fora das especificações (Lei nº
9.847/99), devendo prevaler inalterado, de modo há como se acolher os pedidos
formulados pela Demandante. Ademais, não restou provada qualquer ofensa ao
contraditório ou a ampla defesa, razão pela qual a manutenção da sentença é
medida que se impõe
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Assim, por reputar irreprocháveis, trascrevo os fundamentos da decisão de primeiro grau como minhas razões de decidir:
76
(...) 2.1. Da alegada regularidade dos combustíveis: Segundo alega a
demandante, todo o produto comercializado e que fora definido pela ANP
como irregular para consumo sujeitou-se à análse do laboratório Ingra
LTDA, verificando-se, após exaustivos testes químicos, que referido
produto esta de acordo com as especificações químicas estabelecidas
para a sua comercialização. Conclui, nesse aspecto, ter havido vício de
motivação no ato administrativo aqui combatido.
Primeiro ponto a salientar reside no desinteresse da demandante quanto à
produção de provas em sede judicial acerca da referida tese, satisfazendo-
se, no ponto, com análise técnica extrajudicial realizada por particulares
estranhos à relação processual e sem a participação da ANP.
Com efeito, a demandante, incoformada com a autuação sofrida pela ANP,
diz ter encaminhado, via Distribuidora Esso, o referido produto para
análise. Fosse pouco não se poder emprestar poder de convencimento
pleno a um elemento de prova germinado em tais circunstâncias, alheias
ao contraditório e à ampla defesa, acresça-se que não se tem como saber
se o produto enviado à análise àquele laboratório foi exatamente o mesmo
colhido e analisado pela ANP quando do auto de infração.
Nada nos autos indica de forma precisa e segura que o combustível
avaliado extrajudicialmente corresponde àquele aferido pela ANP.
Cumpre lembrar que o ato administrativo, enquanto gênero, detém
presunção de legitimidade e varacidade, imputando-se ao interessado em
sua desconstituição, o ônus de provar eventuais irregularidades.
À parte autora seria viável o manejo da produção antecipada de provas,
por exemplo. Não o fez. Assim, não se pode acolher a pretensão nesse
quadrante.
2.2 Da possibilidade de interdição de todas as bombas de combustíveis:
Na presente seara, discute-se a juridicidade, ou não, da interdição total
das bombas de combustíveis do estabelecimento autuado, quando apenas
em algumas delas foram constatadas as irregularidades.
Acerca do tema, adoto integralmente o voto divergente vencedor da Exma.
Sra. Des. Federal do TRF 4ª R., Marga Inge Barth Tessler, em recente
decisão proferida nos autos da apelação nº 2003.70.00.033011-8/PR
(Publicada em 15/09/2008):
Com a vênia do E. Relator, ouso divergir do brilhante voto apresentado.
Trata-se de demanda em que a parte autora, flagrada comercializando
gasolina adulterada, visava a desinterdição do estabelecimento comercial,
mais especificamente, as bombas de gasolina onde não foram
constatados rodutos adulterados, bem como a anulação parcial do auto de
infração, que apontou em algumas mistura de 58% (cinqüenta e oito por
cento) quando o máximo permitido é 26% (vinte e seis por cento).
A r. Sentença houve por bem anular em parte o auto de infração, excluindo
a menção à interdição total ali constante e substituindo-a pela interdição
parcial do posto de combustível.
Com efeito, a par do que sustenta a recorrente ANP, a Lei 9.847/99, nos
inc. II e XI, do art. 3º, prevê como infração a comercialização de gasolina
fora das
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especificações e com vício de qualidade, sujeita à multa, além da
interdição, total ou parcial do estabelecimento comercial, prevista no
art. 5º, III.
Ora, embora não houvesse irregularidade em todas as bombas, a
liberação parcial se apresenta a um incentivo aos adulteradores,
pois basta comercialização combustível "batizado" em uma delas,
somente, para esquivar-se da interdição, pois, em caso de
fiscalização, somente esta será interditada, podendo, dali pra frente,
encher outro tanque e continuar a fraudar os consumidores.
Como disse a apelante, quem pratica a fraude é o comerciante e
não a bomba, devendo, pois, ser provido o apelo da ANP e a
remessa oficial, reformando a sentença, julgando improcedente a
demanda, sendo a autora condenada em honorários advocatícios
que arbitro em R$ 10.000,00 (dez mil reais), observado o art. 20, §
4º do CPC, atendidos os requisitos das alíneas do § 3º, do mesmo
artigo. Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e à
remessa oficial.
É o voto”.
Assim, não vislumbro qualquer irregularidade quanto à interdição
total das bombas.
Como bem salientado na decisão, detém a agência reguladora do
setor faixa discricionária para interdição total ou parcial do
estabelecimento autuado por irregularidades na composição do
combustível comercializado.
É certo ser tal discricionariedade balizada pela proporcionalidade e
pela razoabilidade, informadas sobretudo pelo interesse público em
resguardar a segurança e qualidade das relações de consumo e, de
forma mediata, também ambiental.
Por isso, ainda que apenas em parte das bombas tenha sido
constatadas as irregularidades no tocante ao combustível
comercializado, é possível, em atenção àqueles bens jurídicos a
serem tutelados pela administração pública, a extensão da medida
restritiva a todos os equipamentos do estabelecimento autuado.
Tomadas as cores do caso concreto, não me parece excessivo ou
inadequado o conteúdo do ato administrativo, pois a presença de
irregularidades em duas bombas de combustíveis distintos (álcool
etílico e gasolina c-comum) são suficientes para, em um momento
preliminar, afastar a hipótese de mera eventualidade ou caso
fortuito, amparando uma intervenção mais rigorosa a título de
acautelamento daqueles bens jurídicos, evitando a venda do
restante do produto até que os fatos sejam devidamente
esclarecidos.
2.3. Dos danos morais e materiais:
Alega a demandante que teve a sua imagem e reputação abaladas
78
perante seus clientes e demais revendedores, devido ao fato da
ANP haver interditado suas bombas de combustíveis. Primeiramente
com relação aos danos morais, à parte discussões sobre este
aspecto, porquanto já consolidado, é mister ressaltar que o dano
moral cabível em relação à pessoa jurídica, diferentemente da
pessoa física, deve ser aquele que se reporta à honra objetiva. Por
honra objetiva, deve-se ter em conta a referência ou o conceito que
determinada empresa goza perante o mercado.
Não há de se falar, por óbvio, em uma presuntividade de
“sofrimento”, vez que tal aspecto se reporta exclusivamente ao dano
mora pleiteado por pessoa física consistente naquilo que a doutrina
convencionou denominar de pretium doloris.
Há de se consignar que, somente pelo fato de existir no
estabelecimento duas bombas com combustível adulterado,
devidamente comprovado pela ANP, já
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implica, em tese aptidão para trazer abalo à sua reputação. Para o
público consumidor, para o mercado e para o sensu comum, pouco
importa se a interdição é total ou parcial. Confrontados pela notícia
de comercialização daquele produto com composição irregular, os
atores sociais formularão o conceito sobre a honra objetiva da
empresa autuada independentemente da quantidade de bombas
lacradas.
O fato gravoso, aí, reside na autuação pelo fornecimento de
combustível que não atende padrões técnicos, sendo acessória, no
máximo, a questão suscitada pelos limites da interdição. Enquanto
acessória, não inova o dano potencial já embutido no evento
principal.
No caso dos autos, não se pode imputar, todavia, dano moral à
conduta da agência reguladora. Mesmo objetiva, sua
responsabilidade gizada pelo art. 37, § 6º, da CF/88, segue a teoria
do risco administrativo, na qual o dever de reparar pode ser excluído
ou amenizado, por dentre outros fatores, quando constatada a
responsabilidade exclusiva do particular/administrado. Exatamente
essa a situação aqui constatada, pois na toada dos tópicos
anteriores não há qualquer irregularidade atribuível à ANP, seja pela
inexistência de prova hábil à desconstituição dos motivos do seu
ato, seja pela legitimidade, do ponto vista da discricionariedade e
proporcionalidade, da interdição total do estabelecimento.
Por idênticas razões, descabem danos materiais. (...)
79
Em reforço do entendimento ora perfilhado, colaciono
precedente desta eg. Segunda Turma deste Sodalício, que examinou caso análogo,
in verbis: ADMINISTRATIVO - AGÊNCIA NACIONAL DE PETROLEO -
FISCALIZAÇÃO DE COMBUSTÍVEIS - AUTO DE INFRAÇÃO.OBSERVÂNCIA -
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - 1- O Auto de infração fora lavrado
corretamente, após a realização de três testes efetuados na presença do Apelante.
2- Os atos administrativos gozam de presunção de legalidade e veracidade,
não ilididas pelo Recorrente. 3- Apenas seria fornecida a amostra de contra-
prova, acaso o Apelante apresentasse recurso admnistrativo no momento oportuno,
o que não ocorreu. 4- No caso, não restou provada qualquer ofensa ao
contraditório e ampla defesa, razão pela qual a manutenção da sentença é
medida que se impõe. 5- Apelação improvida. (TRF-5ª R. - AC 377231/CE - 2ª T. -
Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias - DJe 29.07.2009 - p. 173) (g. n.)
Quanto à multa no valor de 1% (um por cento) sobre o
valor da causa, aplicada no primeiro grau, em razão da oposição de embargos
declaratórios considerado protelatório, entendo que é de ser mantida, tendo em
vista que, na ausência de omissão, contradição ou obscuridade, sua oposição se
revestiu de nítido caráter protelatório, enquadrando-se perfeitamente no art. 538,
parágrafo único, do Código de Processo Civil.
Aliás, o precedente abaixo transcrito reforça a tese da
aplicabilidade da multa infligida aos embargantes em tal hipótese:
“1- RECURSO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - DECISÃO
SOBRE PULSOS TELEFÔNICOS ALÉM DA FRANQUIA - Alegação
de omissão quanto aos motivos
determinantes de precedente do Pleno. Inexistência. Inovação
recursal. Embargos
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rejeitados. Não se admitem embargos de declaração de decisão em
que não há omissão, contradição nem obscuridade, sobretudo
quando suas razões consistam em inovação recursal. 2- RECURSO
- EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - CARÁTER MERAMENTE
PROTELATÓRIO - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - IMPOSIÇÃO DE
MULTA - APLICAÇÃO DO ART. 538, § ÚNICO, C.C ARTS. 14, II E
III, E 17, VII, DO CPC - Quando abusiva a oposição de embargos
declaratórios manifestamente protelatórios , deve o Tribunal
80
condenar o embargante a pagar multa ao embargado. (STF -
EDcl-AgRg-AI 700.200 - Rel. Min. Cezar Peluso - DJe 09.10.2009 -
p. 98) (grifos nossos)
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É como voto.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 473589/SE (2003.85.00.006018-0)
APTE : AUTO POSTO MAR AZUL LTDA
ADV/PROC : GILBERTO VIEIRA LEITE NETO
APDO : ANP - AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO
REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
ORIGEM: 2ª VARA FEDERAL DE SERGIPE
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS -
Segunda Turma
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AGÊNCIA NACIONAL DE
PETRÓLEO. FISCALIZAÇÃO DE COMBUSTÍVEIS.
AUTO DE INFRAÇÃO.
INTERDIÇÃO DO ESTABELECIMENTO. ATO
ADMINISTRATIVO. PRESUÇÃO DE LEGALIDADE E
VERACIDADE. NÃO AFASTADA. OBSERVÂNCIA
DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. MULTA
DE 1% (UM POR CENTO) APLICADA NO
PRIMEIRO GRAU EM RAZÃO DE EMBARGOS
DECLARATÓRIOS CONSIDERADO
PROTELATÓRIO.
1. A hipótese é de apelação interposta por AUTO
POSTO MAR AZUL LTDA contra a sentença que, em
ação anulatória, julgou improcedente o pedido
formulado na incial. A parte Autora/Apelante pretente
a anulação do ato administrativo de interdição de
todas bombas de revenda de combustível de seu
81
estabelecimento, bem como a condenação da
AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO em
indenização pelos danos decorrentes dos lucros
cessantes e danos emergentes, além dos danos
morais, por ofensa à sua imagem perante seus
clientes.
2. O ato administrativo praticado pela ANP goza de
presunção relativa de legalidade e veracidade,
cabendo ao Administrado provar que o ato sub judice
é ilegítimo ou que os fatos que se fundamentou o
Poder Público não correspondem à verdade, o que
não ocorreu na espécie. 3. A Demandante,
incoformada com a autuação sofrida, diz ter
encaminhado, via Distribuidora Esso, o referido
produto para análise. Fosse pouco não se poder
emprestar poder de convencimento pleno a um
elemento de prova germinado em tais circunstâncias,
alheias ao contraditório e à ampla defesa, acresça-se
que não se tem como saber se o produto enviado à
análise àquele laboratório foi exatamente o mesmo
colhido e analisado pela ANP quando do auto de
infração.
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4. Não há qualquer irregularidade quanto à
interdição total das bombas de combustíveis do
estabelecimento autuado, quando apenas em
algumas delas foram constatadas as
irregularidades, tendo em vista que quem pratica a
fraude é o comerciante e não determinada bomba
isoladamente.
Precedente: (TRF 4ª R., AC nº 2003.70.00.033011-
8/PR, Publ. 15/09/2008) 5. A agência reguladora do
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setor possui determinada faixa discricionária para
interdição total ou parcial do estabelecimento
mautuado por irregularidades na composição do
combustível comercializado. É certo ser tal
discricionariedade balizada pela proporcionalidade e
pela razoabilidade, informadas sobretudo pelo
interesse público em resguardar a segurança e
qualidade das relações de consumo e, de forma
mediata, também ambiental. Por isso, ainda que
apenas em parte das bombas tenha sido
constatadas as irregularidades no tocante ao
combustível comercializado, é possível,em atenção
àqueles bens jurídicos a serem tutelados pela
administração pública, a extensão da medida
restritiva a todos os equipamentos do
estabelecimento autuado.
6. Não há o que se falar em reparação por danos
morais ou materiais.
Mesmo objetiva, a responsabilidade da agência
reguladora, gizada pelo art. 37, § 6º, da CF/88,
segue a teoria do risco administrativo, na qual o
dever de reparar pode ser excluído ou amenizado,
por dentre outros fatores, quando constatada a
responsabilidade exclusiva do
particular/administrado. Exatamente essa a situação
aqui constatada, pois na toada dos tópicos
anteriores não há qualquer irregularidade atribuível
à ANP, seja pela inexistência de prova hábil à
desconstituição dos motivos do seu ato, seja pela
legitimidade, do ponto de vista da discricionariedade
e proporcionalidade, da interdiçãototal do
estabelecimento.
7. Quanto à multa no valor de 1% (um por cento)
sobre o valor da causa, aplicada no primeiro grau,
em razão da oposição de embargos declaratórios
considerado protelatório, entende-se que é de ser
mantida, tendo em vista que, na ausência de
83
omissão, contradição ou obscuridade, sua oposição
se revestiu de nítido caráter
protelatório,enquadrando-se perfeitamente no art.
538, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
8. Apelação não provida.
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DIAS
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5a. Região,
por unanimidade, negar provimento à apelação, na forma do relatório
e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado. Recife/PE,de novembro de 2009. (data do julgamento)
Desembargador Federal FRANCISCO BARROS DIAS
Relator