construÇÃo de instrumentos didÁticos com...
TRANSCRIPT
CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS DIDÁTICOS COM
IMPRESSORAS 3D
Leonardo De Conti Dias Aguiar – [email protected]
Unesp, Faculdade de Ciências, Pós Graduação em Educação para a Ciência
Bauru - SP
Wilson Massashiro Yonezawa – [email protected]
Unesp, Faculdade de Ciências, Departamento de Computação
Av. Eng. Luiz Edmundo C. Coube 14-01. Geisel
Bauru - SP
Resumo: Este trabalho mostra como instrumentos didáticos para o ensino de ciências podem
ser desenvolvidos com a utilização da tecnologia de impressão 3D. A utilização deste tipo de
tecnologia requer cuidados e planejamento. Um modelo de processo descreve passo a passo
como um professor pode trabalhar com ela. A construção dos objetos físicos necessários para
uma demonstração investigativa no ensino de física é utilizado como exemplo para ilustrar e
discutir cada etapa do modelo de processo. Ao final o texto mostra como o conhecimento
gerado pode ser divulgado, compartilhado e reutilizado pelos educadores.
Palavras-chave: Ensino de ciências, Instrumentação para o ensino de ciências, Impressão
3D, Ciência e tecnologia.
1 INTRODUÇÃO
A técnica chamada hoje de impressão 3D teve sua primeira patente publicada em março
de 1986 e registrada por Charles W. Hull em 1984 (Figura 1). Formado em engenharia física,
registrou um método de construir objetos tridimensionais denominado estereolitografia
(stereolitography). A técnica consiste em solidificar camadas de um fotopolímero (similar a
uma resina), utilizando a luz. As impressoras mais atuais desse tipo utilizam um aparato
simples: um projetor de alta resolução, igual aos utilizados em apresentações de slides,
projetando imagens sobre um recipiente repleto de resina e com uma plataforma que se
movimenta verticalmente. O processo inicia-se com essa plataforma quase no topo do balde;
uma imagem é projetada por alguns segundos sobre a fina camada de resina causando uma
solidificação com o formato da imagem projetada. Em seguida essa plataforma desce alguns
micrômetros e novamente uma imagem levemente diferente da anterior é projetada para
solidificar mais uma camada; assim, de camada em camada, uma solidificada sobre a outra,
forma-se o objeto tridimensional. Em uma entrevista para uma rede de televisão americana,
Charles Hull disse que teve essa ideia pela primeira vez em 1983, quando trabalhava em uma
pequena empresa fazendo o endurecimento de revestimentos de mesas utilizando ultravioleta.
Alguns anos depois, Scott Crump contribuiu com o desenvolvimento das impressoras
3D. Sua patente foi registrada em 1989 e descrevia um aparato para criar objetos
tridimensionais (Figura 2). O equipamento utilizava o método de modelagem por fusão e
deposição (Fused Deposition Modelin - FDM). O principal objetivo da sua invenção era
facilitar a prototipagem na engenharia. O método de uma impressora 3D FDM é similar a uma
impressora jato de tinta, mas com um tipo de pistola de cola quente no lugar do cartucho de
tinta. Além do movimento em duas direções que há nas impressoras normais, adiciona-se
terceiro eixo para permitir que essa pistola de cola quente vá para cima e para baixo. Com o
movimento nas três direções, o bico da impressora 3D deposita fios de material derretido,
normalmente plástico, uns sobre os outros, até formar o objeto tridimensional. Por ter um
funcionamento mais simples que a esterolitografia, o FDM é hoje o método dominante nas
impressoras 3D de uso pessoal; a estereolitografia ficou mais restrita a aplicações
profissionais, como o design de produtos, engenharia e manufatura.
Figura 1 – Imagem-esquema registrada na
patente de Charles Hull.
Fonte: USPTO (1986) 1
Figura 2 – Imagem-esquema registrada na
patente de Scott Crump.
Fonte: USPTO (1992) 2
Em 2003, Sparks et al. (2004) realizaram um workshop sobre prototipagem rápida através
do uso de impressoras 3D para alunos e professores de ensino médio do St. Louis Community
College no Florissant Valley, Missouri, EUA. O objetivo foi expor essa técnica e analisar o
seu impacto dela na escolha das profissões dos alunos. Os participantes relataram que
conseguiam ver conexões entre os tópicos do workshop com o que estavam ensinando, no
caso dos professores, ou aprendendo, no caso dos estudantes. Dentre os relatos obtidos, um
aluno disse: “Há uma conexão entre este curso e a disciplina Álgebra II”; um professor
também deu sinais positivos: “Definitivamente, como professor de matemática, eu vejo
conexões matemáticas e geométricas no desenho, elaboração e na produção do protótipo”.
1 Hull, Charles W., "Apparatus for production of three-dimensional objects by stereolithography." U.S. Patent 4.575.330,
publicada em 11 de março de 1986. 2 Crump, S. Scott, "Apparatus and method for creating three-dimensional objects." U.S. Patent 5.121.329, publicada em 9 de
Junho de 1992.
Em Outubro de 2013, o Departamento para a Educação do Governo do Reino Unido
divulgou um relatório sobre um projeto de utilização de impressoras 3D em 21 escolas com a
finalidade de enriquecer o currículo do ensino de ciências, tecnologia engenharia e
matemática. As escolas receberam recursos pra adquirir a impressora 3D, suprimentos e
suporte. O principal objetivo era investigar o potencial da impressão 3D como forma de
estímulo e inovação na maneira de ensinar. O relatório afirma que várias escolas reportaram
que houve altos níveis de motivação nos alunos quando eles se engajavam nesse projeto. O
diretor da escola de ensino médio Settlebeck na cidade de Sedberg do Condado de Cúmbria,
norte da Inglaterra, afirmou: Todos os alunos que estiveram envolvidos com as impressoras 3D até agora
ficaram inspirados com as possibilidades. A oportunidade para compreender
rapidamente um conceito ou ideia num objeto 3D é uma poderosa e incrível
ferramenta de ensino (DEPARTMENT FOR EDUCATION, 2013).
O objetivo deste artigo é apresentar um processo de uso da tecnologia de impressão 3D
na construção de instrumentos didáticos. O processo é divido em fases, começando com
seleção de conteúdo ou conceito científico, passando pela elaboração do plano de trabalho e
caminhando até a impressão física em 3D dos objetos.
2 ESCOLHENDO UMA IMPRESSORA 3D
A escolha de uma impressora 3D deve atender as necessidades da escola e dos usuários.
Pela experiência obtida com o uso delas e por sugestões encontradas no relatório do
Departamento para a Educação do governo inglês sobre o projeto piloto de impressoras 3D
em escolas, há alguns pontos devem ser considerados:
Quem irá usá-la (apenas professores? alunos também? a comunidade?);
Velocidade de impressão necessária;
Interface de comunicação entre a impressora 3D e o arquivo a ser impresso (porta
USB? cartão SD? os arquivos serão enviados pela rede?);
Custo dos suprimentos;
Facilidade de uso;
Compatibilidade da impressora com os sistemas operacionais em uso na escola;
Garantia e assistência técnica após a compra.
Este trabalho analisou três impressoras disponíveis no Brasil (figuras 3a, 3b e 3c) que
utilizam impressão FDM. A Tabela 1 apresenta as principais características das impressoras
estudadas.
(a)
(b)
(c)
Figura 3 – Impressoras 3D: (a) RepRap versão Prusa Mendel. Fonte: RepRap. (b) Cliever.
Fonte: Cliever Tecnologia; (c) Cube de 2ª Geração. Fonte: 3D Systems.
Tabela 1 - Características de três modelos de impressoras 3D segundo critérios que devem ser
levados em conta na hora da escolha de uma delas
RepRap3 Cliever4 Cube 25
Facilidade de uso Média Alta Alta
Custo da impressora Baixo
(R$ 2360, 00)
Baixo/médio
(R$ 4659,00)
Baixo/médio
(R$ 3998,00)
Custo dos suprimentos Baixo
(R$ 180/kg)
Baixo
(R$ 180/kg)
Médio/Alto
(R$ 590,63/kg)
Assistência técnica no
Brasil
Não, mas há uma grande e ativa
comunidade virtual para ajudar.
Sim Sim
Compatibilidade com
sistemas operacionais
Windows e Linux Apenas
Windows
Apenas
Windows
Interface de comunicação Normalmente USB, mas pode
ser customizada
USB USB, wifi e
Pendrive
3 PROCESSO DE UTILIZAÇÂO
Dentre inúmeras aplicações no contexto escolar, a impressão 3D pode ser utilizada na
recriação de atividades experimentais e modelos, como moléculas para o ensino de química e
cadeias de DNA para ilustrar aulas de biologia. A Figura 4 apresenta um processo de uso da
impressão 3D definido por etapas/atividades. Os retângulos representam etapas ou atividades
e as elipses informações necessárias.
A primeira etapa envolve a seleção de conteúdos e conceitos. A construção de um
instrumento didático inicia-se pela identificação do que se deseja alcançar com a utilização
dele: demonstrar e facilitar a compreensão de algum conceito; causar um conflito nas
concepções dos estudantes devido a um comportamento inesperado; gerar curiosidade nos
estudantes; etc. Uma vez definido o objetivo, é preciso elaborar um plano de construção.
Nesta etapa analisam-se as características materiais do objeto, sua geometria, medidas e como
elas influem no funcionamento, afinal, se o objetivo é construir uma hélice para auxiliar no
ensino de empuxo, não se pode desenhar cada pá com qualquer tamanho e ângulos, pois o
resultado não deverá ser exatamente o desejado. O plano de construção também deve
observar as restrições e facilidades da tecnologia de impressão 3D disponível para o
professor. Algumas vezes o objeto pode parecer isento de requisitos nas relações entre as
suas medidas, por exemplo, um professor deseja apenas um modelo atômico de uma molécula
de água (H2O) para usar como ilustração durante as aulas, mas se as esferas que representam
os átomos forem desenhadas com qualquer diâmetro, um aluno poderá questionar o professor:
“Por que as bolinhas são todas de tamanhos diferentes sendo que há apenas dois tipos de
átomos nas moléculas de água?”. Apesar de que desenhar uma imagem 3D no computador é
uma tarefa relativamente simples, ela não deve ser realizada sem critério.
Após a elaboração do plano de construção faz-se necessário à elaboração de esboços.
Esboços são rascunhos a respeito dos objetos que serão construídos, eles também auxiliam na
identificação de requisitos que devem ser atendidos quando os objetos forem construídos.
3 RepRap: http://reprap.org/
4 Cliever impressoras 3D: <http://www.cliever.com.br/impressoras> 5 Cube 2: < http://www.3dsystems.com/3d-printers/personal/cube>
A etapa seguinte é a modelagem 3D, isto é, a representação virtual dos objetos. Esta etapa
requer a escolha e uso de ferramentas de software 3D. Está é uma etapa crítica visto que é
necessário conhecimento técnico específico. Nem sempre professores conhecem ou dominam
técnicas de modelagem 3D.
Figura 4 – Processo de utilização da tecnologia de impressão 3D no ensino
Para facilitar a modelagem 3D, é possível reutilizar modelos virtuais prontos ou similares
disponíveis em banco de dados de conteúdo aberto. Outra opção é digitalizar objetos reais,
que com a redução dos custos dos scanners 3D, esta opção passa a ser viável para as escolas.
Após a elaboração do modelo 3D ocorre a impressão 3D; etapa que depende de informações
do plano de construção onde foram observadas e consideradas as características e restrições
da impressora 3D alvo. Existem formatos comuns aceitos por diferentes fabricantes de
impressoras 3D. É importante considerar o tempo da impressão 3D, pois pode demandar
várias horas. O professor precisa considerar tal restrição dentro do seu plano pedagógico.
Como exemplo, o professor poderia trabalhar cada etapa em uma ou mais aulas.
A etapa final envolve a avaliação do objeto impresso bem como de todo o processo de
construção. A avaliação é um processo iterativo, isto é, deve ser refinado continuamente pelo
professor. Os próprios objetos produzidos, bem como os modelos virtuais desenvolvidos
podem ser compartilhados e reutilizados.
4 EXEMPLO DE USO
4.1 Entendendo o instrumento
No planejamento é necessário estudar o instrumento, os conceitos científicos, quais
características deve haver para que ele funcione de maneira adequada e o registro dessas
informações. Munido dos requisitos de funcionamento do instrumento, é possível definir as
medidas que o modelo 3D deverá ter para poder funcionar depois de impresso em 3D.
Um exemplo é a construção do experimento do Duplo Cone no Plano Inclinado. Neste
experimento o duplo cone produz uma aparente subida na rampa, contrariando a expectativa
de que ele deveria na verdade descê-la ao invés de subi-la. Inicialmente procurou-se algum
texto (Figura 5) que explicasse essa aparente subida e as condições a serem atendidas: ângulo
de inclinação e de abertura da rampa, ângulo de geração dos cones, etc. A informações
encontradas foram registradas em papel com todos os pontos que deveriam ser atendidos e a
partir daí foi possível projetá-lo considerando as características da impressora 3D alvo.
(a)
(b)
Figura 5 – (a) Duplo cone original fabricado por George Adams em 1759; (b) Vista lateral do
instrumento. Fonte: Medeiros & Medeiros (2003)
4.2 Observando as restrições da impressão 3D
As impressoras 3D são limitadas quanto ao volume de impressão. As medidas limites
podem ser diferentes em cada uma das três dimensões (X, Y e Z). Portanto é preciso atenção
no projeto do desenho dos instrumentos.
No exemplo do Duplo Cone no Plano Inclinado a impressora 3D escolhida limitava em
14 cm em todas as direções. Foi definido então que a maior medida do instrumento, o
comprimento da rampa, seria de 12 cm. A partir dela, utilizando as relações matemáticas entre
as medidas que obtidas no estudo do objeto, foram calculadas as demais medidas. Desta
forma o objeto foi desenhado dentro dos limites de impressão e ao mesmo tempo obedecendo
aos requisitos necessários para seu funcionamento. Se as dimensões do objeto excederem as
medidas permitidas pela impressora 3D, a impressão pode ocorrer em partes, isto é,
desenhando e imprimindo cada parte do separadamente e colando-as após impressas em 3D.
Outros pontos que devem ser levados em conta são a resolução de impressão e o material
utilizado na impressão, como o filamento plástico ABS6 ou PLA7, principalmente para
projetar objetos ocos, pois dependendo da espessura da casca desses objetos e sua finalidade,
por exemplo, o estudo da conservação do momento linear em colisões, a vida útil dele pode
acabar sendo inferior a desejada. Neste caso a sugestão seria de pelo menos 1 mm de
espessura nas paredes dos objetos ocos.
4.3 Elaborando esboços
Uma das etapas mais importantes é a elaboração de esboços. Esses esboços ou rascunhos
podem ser construídos usando o lápis e papel. É recomendável a elaboração de alguns
rascunhos do que se pretende desenhar e escolher um deles, visto que isso auxilia a próxima
etapa do processo que envolve a modelagem 3D dos objetos, isto é, a transformação de um
desenho em papel para um desenho virtual.
6 PLA: Poliácido lático. Termoplástico biodegradável derivado de recursos naturais como a mandioca e o milho 7 ABS: Acrilonitrila butadieno estireno. Termoplástico rígido e leve que apresenta alguma flexibilidade e resistência a
absorção de impactos
A Figura 6 mostra dois rascunhos feitos no planejamento da rampa do duplo cone e a
modelagem 3D da rampa concluída. Foi escolhido o segundo rascunho por parecer mais
simples de desenhar. Arcos e hastes foram desenhados na rampa simplesmente com a
finalidade de economizar material.
(a)
(b)
(c)
Figura 6 – (a) e (b) rascunhos da rampa; (c) Modelagem 3D da rampa concluída.
4.4 Modelando o objeto em 3D
Modelagem 3D é a criação de uma representação virtual tridimensional de um objeto
através de softwares especializados para essa tarefa. Análogo a um documento de texto que
uma impressora jato de tinta imprime, o modelo 3D de um objeto é o arquivo em que a
impressora 3D se baseará pra construir o objeto. É importante não confundir modelo 3D de
um objeto com uma simples imagem 3D. O modelo 3D é um objeto virtual. Ele pode ser feito
do zero, ou a partir de um modelo 3D de algum outro objeto que se queira editá-lo para
transformá-lo em outro, ou com a utilização de técnicas de digitalização 3D de objetos reais,
que podem ser feitas desde a utilização de uma câmera fotográfica digital comum, sensores de
movimento de videogames e scanners 3D dedicados a esta operação.
Utilizando objetos reais
Objetos reais podem ser digitalizados utilizando uma simples máquina fotográfica digital
ao tirar várias fotos contornando ele em 360º. Uma alternativa é a digitalização 3D feita com
scanners 3D8, (Figura 7). Esses equipamentos realizam um trabalho similar a de uma câmera
fotográfica, contudo neles há softwares controlando pra onde deve mover o scanner e
mostrando o resultado da união das fotografias em tempo real, isso permite posicioná-los nos
locais adequados durante a digitalização, gerando um modelo 3D razoavelmente fiel ao objeto
real. O modelo 3D gerado pelo scanner 3D necessita de poucas correções manuais.
Os scanners 3D podem ser aparelhos exclusivos para a digitalização 3D ou os sensores
de movimento como o Kinect para Windows da Microsoft9. Para utilizá-lo com essa
finalidade é necessário que ele esteja conectado a um computador que tenha instalado um
software, como o SCENET10, que faça o tratamento das imagens capturadas pelo sensor e em
tempo real mostre o resultado para que se faça a movimentação correta do sensor em torno do
objeto. A digitalização 3D de objetos reais reduz a complexidade e acelera o tempo de criação
de um modelo 3D. Contudo é preciso ficar atento a esta prática, apesar de ainda não haver
8 Scanner 3D de mão “Sense” da 3D Systems: <http://cubify.com/en/Products/Sense> 9 Kinect for Windows: < http://www.microsoft.com/en-us/kinectforwindows/> 10 SCENECT, software gratuito para digitalizar objetos com os sensores de movimento como o Kinect:
<http://www.faro.com/scenect/scenect>
uma regulamentação específica em leis, copiar objetos dessa maneira pode constituir violação
de direitos autorais.
Figura 7 – Digitalização 3D de objetos reais: (a) usando o scanner 3D de mão Sense. Fonte:
3D Systems. Fonte: SCENET.
Começando do zero
Tanto para começar um modelo 3D desde o início como para apenas a adaptação de um
existente, é necessário utilizar algum software de modelagem 3D. A escolha dele deve levar
em conta critérios técnicos, pessoais e econômicos.
Do ponto de vista técnico é preciso escolher um software compatível com os sistemas
operacionais dos computadores da escola e com a impressora 3D alvo.
Considerando que a modelagem 3D é uma atividade que requer certo conhecimento
técnico, e nem sempre os professores estão familiarizados com isso, deve-se, sempre que
possível, optar por um software de fácil aprendizagem e utilização. Aspectos econômicos
também precisarem ser considerados. Vários softwares desta natureza requerem licença de
uso. Entretanto é possível optar pelos gratuitos.
Embora existam inúmeros softwares disponíveis no mercado, três nomes são
reconhecidamente comuns nesta área: o Sketchup11, Blender12 e o Autodesk 3DS Max13. A
Tabela 2 comprara alguns dos critérios discutidos para a escolha do software de modelagem.
Tabela 2 - comparação entre três softwares de modelagem 3D
Sktechup Blender Autodesk 3DS Max
Compatibilidade com
sistemas operacionais
Windows e Mac OS Windows, Linux e Mac
OS
Apenas Windows
Facilidade de uso Fácil Médio Médio
Custo Versões gratuita e paga Gratuito Apenas pago
O software escolhido para a modelagem 3D do Duplo Cone foi a versão gratuita do
Sketchup. O software é adequado para usuários com pouca experiência com a modelagem 3D.
No projeto piloto de impressoras 3D nas escolas do governo inglês, a maioria das escolas
também utilizou o Sketchup.
Um importante auxílio para a modelagem 3D é a utilização de modelos 3D prontos. É
possível encontrar inúmeros deles à disposição em sites dedicados ao compartilhamento de
modelos 3D como o Grabcad14. Outra ferramenta são os vídeos instrutivos disponíveis em
11 SketchUp: <http://www.sketchup.com> 12 Blender: <http://www.blender.org/> 13 3DS Max: <http://www.autodesk.com/products/3ds-max/> 14
Free 3D Cad Library: <http://grabcad.com/>
sites de compartilhamento de vídeos como o Youtube, eles mostram como construir os objetos
que fazem parte do instrumento. A Figura 8 mostra alguns vídeos de modelagem de cones.
Figura 8 – Videos instrutivos encontrados no site Youtube após busca pelas palavras chaves
“Sketchup” e “cone”.
Concluído o modelo 3D do objeto, é preciso exportá-lo para o formato STL, sigla para
STereoLitography. Esse formato é padrão entre as impressoras 3D.
4.5 Imprimindo em 3D
Preparação e início da impressão
O processo de impressão inicia-se com o tratamento do arquivo STL gerado após a
conclusão da modelagem 3D do instrumento que é feito por um software geralmente
fornecido junto da impressora (Figura 9a); ele visa corrigir pequenas imperfeições que podem
comprometer a impressão, redimensionar ou reposicionar o objeto na área de impressão e
fatiar a imagem 3D do objeto em camadas, uma vez que a impressão acontece em camada a
camada. Para finalizar é gerado um arquivo num formato adequado à impressora contendo o
modelo 3D fatiado. Antes da impressão propriamente dita, é necessário uma preparação da
superfície de impressão, onde espalha uma camada de cola sobre a superfície em que o
filamento de impressão será depositado (Figura 9b). Inicialmente cabeçote de impressão é
aquecido para alcançar a temperatura de fusão do filamento plástico. Em seguida a impressora
constrói uma base que funciona como suporte do objeto a ser impresso (Figura 9c).
(a) (b) (c)
Figura 9 – (a) Tratamento do modelo 3D ante à impressão; (b) aplicação da cola na
superfícies de impressão (Fonte: Cliever Tecnologia); (c) base de impressão.
Acabamento manual no objeto impresso
Concluída a impressão dos objetos, é preciso realizar um acabamento manual. O
acabamento consiste na remoção da base de impressão e polimento do excesso de material.
No caso do Duplo Cone foi preciso cortar a base de impressão do duplo cone (Figura 10a) e
lixar as superfícies (Figura 10b e 10c).
,
(a)
(b)
(c)
Figura 10 – (a) corte do suporte de impressão; lixamento do duplo cone (b) e da rampa (c)
Estimando os custos de impressão
Estimativas são úteis para ajudar a analisar em que situações o uso da impressora 3D é
realmente útil neste momento em que a tecnologia de impressão 3D emerge no ambiente
educacional. Na impressão dos objetos para o experimento do Duplo Cone foram analisados o
custo e o tempo de impressão. A Tabela 3 mostra os tempos dispendidos. Ressaltamos que o
tempo de modelagem 3D pode ser reduzido quanto se opta pelo uso de modelos 3D prontos,
bastando apenas imprimir e realizar o acabamento. O tempo de impressão pode ser reduzido
dependendo do tipo de impressora. Quanto ao custo de impressão optou-se por considerar
todo o material impresso, a base de impressão e os objetos. Para obter a quantidade de
material gasto foi utilizada uma balança. No Duplo cone foi utilizado um cartucho de plástico
PLA, encontrado a um custo médio de R$ 223,20 no varejo brasileiro15. Nesta referência, o
Duplo Cone que pesou 30g, custou R$ 20,95. É importante frisar que o custo poderia ser
reduzido, visto que existem vários outros modelos de impressora 3D que utilizam o filamento
plástico fora de um cartucho proprietário.
Figura 11 – Peso do material
impresso.
Tabela 3 - Tempo dispendido com o Duplo Cone
Rascunho e modelagem 3D: 3h
Preparação para a impressão: 0h15
Impressão (nesta etapa apenas a impressora 3D trabalha)
4h24
Acabamento manual: 0h30
Total: 8h09
15 Cartucho PLA Verde Para Impressora 3D Cube. Livraria Saraiva. Por R$ 223,20 em 1x no cartão de crédito:
<http://www.livrariasaraiva.com.br/produto/5057686/cartucho-pla-verde-para-impressora-3d-cube/> Acessado em
14/08/2014
Avaliando os resultados
Para que a construção do instrumento didático através da impressão 3D seja considerada
adequada é preciso de ele funcione de acordo com o planejado, isto é, recrie o experimento.
Resultados inesperados não constituem necessariamente um problema. Um exemplo
disso aconteceu com o duplo cone. A base de impressão interferiu na densidade numa das
superfícies (Figura 12), fato que gerou um deslocamento do centro de massa. Essa diferença
de densidade condicionou a colocação do duplo cone na rampa: caso ele seja colocado com a
superfície mais densa voltada para baixo, não ocorre torque suficiente para iniciar o
movimento e ele permanece estático na rampa (Figura 13). Contudo, quando o duplo cone é
colocado fora desse ponto de equilíbrio, ele produz a aparente subida proporcionando
curiosidade aos alunos que o observam.
Falhas desse tipo podem ser resolvidas escolhendo outra posição de impressão,
realocando o suporte de impressão a fim de evitar diferenças na densidade de material em
locais que influenciam na posição do centro de massa. Outra solução seria modelar o duplo
cone com um pequeno furo em alguma de suas extremidades para colocar areia dentro dele
depois de impresso e fechar o furo com uma gota de cola. Com o aumento da massa
proporcionado pela inclusão da areia no seu interior, a leve diferença de densidade na
superfície seria desprezível.
Figura 12 - Diferença de densidade de material
entre a superfice onde foi impresso o suporte e o
lado oposto
Figura 13 – Duplo cone colocado na
rampa com a superfície mais densa para
baixo: permanece estático.
Compartilhando o conhecimento
Um dos aspectos que torna a impressão 3D ainda atraente no ambiente escolar é a
possibilidade de compartilhar os instrumentos didáticos. Depois que o professor ou o
estudante modelou o instrumento em 3D, imprimiu-o e comprovou seu funcionamento, O
conhecimento gerado pode compartilhado através da internet. Há comunidades virtuais
dedicadas ao compartilhamento desses arquivos como o Grabcad16
. Essa característica oferece
a possibilidade para pesquisadores da área de educação criar instrumentos didáticos e
experimentos com a impressora 3D, e junto a um artigo num periódico científico, pode
publicar o modelo 3D passando um link para outros interessados no uso deste experimento.
16 O modelo 3D do duplo cone está disponível em: <http://grabcad.com/library/duplo-cone-no-plano-inclinado-double-cone-
on-ramp-1>
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como a maioria das TICs, a tecnologia de impressão 3D deverá ganhar espaço no dia a
dia das residências e das escolas. O custo cairá com a aumento da disponibilidade de
equipamentos. Mais uma vez será necessário que o professor que saiba com fazer uso desta
tecnologia. Este artigo contribui com um modelo de processo separado por atividades que
mostra por onde o professor deve começar e como deve seguir para incorporar esta nova
tecnologia nas suas atividades de ensino. Outro aspecto importante deste trabalho está no
alerta aos professores em dois pontos: a) na necessidade constante de formação relacionada
com o uso das TICs; b) no reuso, divulgação e compartilhamento do conhecimento gerado. O
conhecimento do conteúdo é apenas parte dos saberes necessários para os professores.
Também é preciso conhecimento tecnológico, isto é, a compreensão e domínio da linguagem
digital. Utilizar adequadamente a tecnologia de impressão 3D requer do professor o domínio
de novas técnicas. No que diz respeito a geração de conhecimento, é importante que o
professor compreenda que agora ele também é produtor de conhecimento e que pode e deve
colocar este conhecimento disponível para os demais.
Agradecimentos
Ao Prof. Dr. Moacir Pereira de Souza Filho da Faculdade de Ciências e Tecnologia da
Unesp de Presidente Prudente, pelas suas aulas e sugestões que muito contribuíram para os
nossos estudos da utilização da tecnologia de impressão 3D no ensino.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DEPARTMENT FOR EDUCATION. 3D printers in schools: uses in the curriculum.
Enriching the teaching of STEM and design subjects. United Kingdon. 2013. Disponível
em: <https://www.gov.uk/government/publications/3d-printers-in-schools-uses-in-the-
curriculum> Acesso em: 11 ago 2014.
FREITAS, F. H. A. Algumas reflexões acerca de um curso de instrumentação para o ensino
de física. In: Simpósio Nacional de Ensino de Física, XVIII, 2007, São Luís - Maranhão.
Anais... São Paulo: Sociedade Brasileira de Física, 2007.
MEDEIROS, A.; MEDEIROS, C. F. Desvendando o Mistério do Duplo Cone. Revista
Brasileira de Ensino de Física. v. 25, n. 3, p. 333-339, set/2003.
SPARKS, T. E. et al. Educating high school students and teachers in rapid prototyping and
manufacturing technologies. In: American Society for Engineering Education Annual
Conference & Exposition, 2004, Missouri. Proceedings... University of Missouri. 2004.
BUILDING OF DIDACT INSTRUMENTS WITH 3D PRINTERS
Abstract: This work shows how didactic materials for sciences teaching can be developed with the use
of 3D printing technology. This type of technology requires care and planning. A process
model describes step by step how a teacher can work with 3D printing technology. The
construction of physical objects needed for an experiment research in physics teaching is
used as an example to demonstrate and discuss each step of the process model. At the end of
the text shows how the knowledge can be disclosed, shared and reused by educators.
Key-words: Science teaching, Instrumentation for science teaching, 3D printing, Science and
Technology.