considerações sobre os horizontes pedagógicos em játékok, de
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I Jornada Acadêmica Discente – PPGMUS/USP
Considerações sobre os horizontes pedagógicos em Játékok, de György
Kurtág
Helena Carreras Cabezas ECA-USP – [email protected]
Resumo: O presente trabalho visa analisar os diferentes planos didáticos que emergem do primeiro volume de Játékok, obra pedagógica para piano do compositor húngaro György Kurtág. Baseando-se em textos de Albèra (1995), Cavaye (1996), Juntuu (2008), Huizinga (1971) e Wischman (1997), pretende propor uma perspectiva de análise centrada no aprofundamento de questões sobre ludicidade, corporeidade e criatividade, aspectos pedagógicos que, inseridos no ensino preliminar do piano, podem enriquecer os horizontes da aprendizagem musical. Palavras-chave: Kurtág, Játékok, piano, pedagogia
Considerations about pedagogical horizons in Játékok, by György Kurtág
Abstract: The present work analyzes the different teaching plans that emerge from the first volume of Játékok, pedagogical piano work of Hungarian composer György Kurtág. Based on texts by Albèra (1995), Cavaye (1996), Juntuu (2008), Huizinga (1971) and Wischman (1997), it intends to propose an analytical perspective focused on deepening of questions about playfulness, corporeality and creativity. Pedagogical aspects that incorporated into the preliminary teaching of piano, can enrich the horizons of musical learning. Keywords: Kurtág, Játékok, piano, pedagogy
Introdução a Játékok
Játékok é uma coleção de peças breves para piano, compiladas em oito volumes
até o momento, que abraça desde os níveis mais elementares até os mais avançados. Foi
composta em 1973 por encomenda da pianista Marianne Teöke1. Dito isto, é preciso
considerar que tal encomenda reflete a idiossincrasia do contexto musical húngaro, no qual
adquire muita relevância a produção pedagógica nacional direcionada às crianças,
continuando assim a tradição iniciada com Bela Bartók2 e Zoltan Kodaly3.
Kurtág usa no Játékok algumas técnicas do piano moderno, tais como diferentes
tipos de clusters e glissandi. Porém, Játékok apresenta uma linguagem compositiva que
ultrapassa os interesses puramente idiomáticos do piano, e como aponta Philippe Albèra,
representa a própria essência do pensamento musical de Kurtág, sendo assim um verdadeiro
“diario, laboratório de ideias, de invenção, de técnicas e de expressões, numa forma
intencionalmente despojada e elementar”. (ALBÈRA, 1995, p. 9).
A síntese das pretensões de Kurtág na elaboração do Játékok pode ser localizada
já no prefácio da obra. Neste, Kurtág se preocupa em assinalar que Játékok não é um método,
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fato visível na recusa do autor em ordenar as peças por qualquer parâmetro de ordem técnica
ou musical. Ao mesmo tempo, apresentam-se três questões, que expõem a espinha dorsal da
obra: “O piano como brinquedo”, “A alegria do movimento” e a “Possibilidade de
experimentar” (KURTÁG, 2004, prefácio). Na seqüência, passaremos a analisar cada uma
delas individualmente para conseguir um maior detalhe em nossa observação.
1. “O piano como brinquedo”: a ludicidade na aprendizagem
Kurtág propõe no Játékok inúmeras peças breves que pretendem cativar e
estimular a imaginação da criança mediante o uso do piano como um novo e sugestivo
brinquedo. Certamente, não deixa de ser uma declaração de intenções que a palavra húngara
Játékok signifique Jogos. O autor reflete assim sobre a escolha de apoiar sua linguagem
compositiva na ludicidade: “A ideia de compor os ‘Jogos’ (Játékok em húngaro), se inspirou nas crianças que brincam espontaneamente com o piano, para as quais o instrumento ainda significa um brinquedo. Elas experimentam com ele, o acariciam, o atacam e deixam correr seus dedos sobre ele. Elas ‘montam’ sons aparentemente desconectados, mas se em algumas crianças isso desperta o seu instinto musical, tratarão de recuperar estas harmonias descobertas por casualidade e se divertirão em repetir-las.” (KURTÁG, 2004, prefácio)
Assim, a idéia proposta por Kurtág é a de um contato natural da criança com o
instrumento, na qual a percepção e interiorização dos fenômenos musicais chegam a partir das
próprias vivências, filtradas diretamente através da esfera sensorial e afetiva. Esta concepção
pedagógica rompe com o sistema de ensino tradicional que parte da leitura da partitura e da
técnica digital como únicos desencadeantes do universo pianístico e musical.
Uma vez que pretendemos apontar como a ludicidade e a aprendizagem se
conjugariam em Játékok, é importante considerarmos as atribuições que o historiador Johan
Huizinga, em sua obra Homo Ludens, faz ao jogo: “O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da vida cotidiana.” (HUIZINGA, 2000, p. 24)
No mesmo exercício, agora visando traçar a conjunção existente entre a
ludicidade e a interpretação, outro aspecto notável no pensamento de Huizinga seria a
conciliação que o autor faz do jogo com as atividades performáticas:
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“O mesmo verificamos no ator, que, quando está no palco, deixa-se absorver inteiramente pelo ‘jogo’ da representação teatral, ao mesmo tempo que tem consciência da natureza desta. O mesmo é válido para o violinista, que se eleva a um mundo superior ao de todos os dias, sem perder a consciência do caráter lúdico de sua atividade. Portanto, a qualidade lúdica pode ser própria das ações mais elevadas.” (HUIZINGA, 2000, p. 17)
Em Jeu avec le poing 14, por exemplo, Kurtág usa exclusivamente clusters
realizados com o punho, e o fato do aluno manipular o piano sem uma destreza especial, e sim
com um gesto primário, confere à peça um caráter inovador e lúdico, além de parecido ao que
seria o próprio modo de exploração de um instrumento por uma criança. É justamente por
meio de gestos despreocupados que as crianças se aproximam de um instrumento musical,
sem reservas nem restrições.
Exemplo 1: György Kurtág – Jeu avec le poing 1 – de Játékok (VII-A)
Como podemos observar no exemplo acima, a notação não detalha com exatidão
as alturas, a partitura converte-se então em uma sugestão, em uma guia da experiência
musical. Nas palavras do pianista inglês Ronald Cavaye:
“Em Játékok, portanto, os erros – notas esbarradas, ritmos imprecisos – ocupam um segundo lugar e tem uma importância muito maior aspectos musicais mais fundamentais como o fraseado, a produção de som e o reconhecimento e a clarificação da forma global da peça.” (CAVAYE, 1996, p. 77)
É no caminho entre essas duas vertentes projetadas por Kurtág – o gesto primário
e a indeterminação da escrita – que emergem as vivências musicais, a autonomia do intérprete
e o prazer de tocar, portanto, a ludicidade.
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Trata-se então, voltando às reflexões apontadas por Huizinga, de uma triangulação
entre ludicidade, aprendizagem e interpretação, condensadas numa mesma proposta
pedagógico-musical: o Játékok.
2. “A alegria do movimento”: a valorização e a primazia do corpo na aprendizagem
Como observamos no ponto anterior, o lúdico infantil é um dos distintivos e
norteadores da obra pedagógica de Kurtág. Nela, o compositor pretende minimizar o esforço
reflexivo que supõe a decodificação de uma partitura, assim como o esforço motriz que
significa a técnica digital, ambas as operações complexas no início da aprendizagem. Assim,
Kurtág, por meio de uma linguagem pianística e compositiva que usa movimentos mais
descontraídos, coloca o corpo num lugar preponderante na hierarquia do aprendizado. A
maioria de peças de Játékok prioriza o gesto, a ação primária sobre o teclado, a motricidade
que parte de uma vontade sonora e não de um intelectualismo abstrato como é a leitura
convencional de uma partitura. Segundo Claus Wischman, esta valorização e primazia do
corpo no ensino do piano significam: “[...] um estímulo importante, especialmente para alunos muito jovens com grande necessidade de movimento e de ludicidade, para os quais sentar-se no banco do piano durante períodos longos equivale a um esforço obrigatório. Diante disso, Kurtág propõe uma mudança do pensamento sobre tocar piano e mesmo sobre o fazer música, em geral. Para ele, a movimentação deve ser globalizante, quando se trata da condução a uma expressão musical natural, a qual compreende todo o corpo e não pode se restringir ao braço ou à mão." (WISCHMAN, 1997, p. 53)
Análogo a esta linha de pensamento se encontra o artigo de Kristiina Junttu:
György Kurtág’s Játékok brings the body to the centre of learning piano. Mas a ótica de
estudo neste caso seria a aproximação cinestésica5 que se encontra em Játékok. Para Juntuu,
Játékok é uma útil ferramenta para o desenvolvimento de esta capacidade na criança. Neste
sentido comenta:
“Na fase inicial, o ensino de piano é construído de forma sistemática, tendo especial atenção na introdução de todas as habilidades básicas necessárias para tocar o piano. As peças de Játékok podem estimular uma aproximação ao piano desde uma abordagem cinestésica. As crianças gostam de experimentar com sons e movimentos extremos: com Játékok eles podem usar todo o teclado do piano desde o início. Os extremos do teclado fascinam jovens estudantes; através de clusters e glissandos eles têm a possibilidade de explorá-los desde o princípio de seus estudos. Apesar da notação aproximada, Kurtág é muito cuidadoso com a qualidade da expressão. As dimensões espirituais, físicas e gestuais são trazidas ao primeiro plano. A qualidade da interpretação é muito importante desde os primeiros encontros com o instrumento.” (JUNTUU, 2008, p, 99-100)
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Esta ideia nos conduz a um outro exemplo no Játékok: trata-se da peça Hommage
à Tchaïkovski6. Nela, Kurtág reduz perspicazmente todo o material musical da célebre
abertura do Concerto para piano n.1 de Tchaïkovski7, à síntese máxima, à mínima expressão.
Os acordes que dão início à obra transformam-se em clusters com as palmas das mãos que,
como no Concerto, deslocam-se em paralelo ao longo de toda a extensão do piano.
Exemplo 2: György Kurtág – Início de Hommage à Tchaïkovski de Játékok (21)
Kurtág aproveita, com este exercício de emulação, o engajamento de todo o corpo
do intérprete, já que se exploram os registros graves, médios e agudos do piano. Por meio
desta gestualidade ampla e vigorosa, a peça proporciona ao aluno uma aproximação aos
movimentos desenvoltos dos braços, aos deslocamentos rápidos e extensos pelo piano e à
sonoridades profundas baseadas no peso dos braços. Um trabalho mais natural e espontâneo
que o tipo de motricidade requerida num exercício baseado em técnica digital.
Assim, este primeiro trecho de Hommage à Tchaikovsky, retrata brevemente como
encontramos em Játékok estímulos para o desenvolvimento da capacidade cinestésica das
crianças na sua aproximação ao piano. Ao mesmo tempo em que, na ordem inversa, as
crianças podem se sentir mais atraídas por peças musicais que consigam atingir com uma
motricidade mais simplesmente controlável por elas.
3. “Possibilidade de experimentar”: estímulo à criatividade
As peças do Játékok são projetadas com o intuito de ser a base para uma
experimentação em diversas vertentes: a exploração gestual do corpo, a exploração
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topográfica do teclado, a exploração musical de sonoridades distintas (clusters, glissandos...)
e a exploração de novas formas de notação musical, são alguns dos exemplos.
Esta diversidade de “possibilidades de experimentação” deriva principalmente da
notação não determinada criada por Kurtág especificamente para o Játékok. Justamente esta
indeterminação oferece ao aluno a oportunidade de “completar” a peça, isto é, de determinar
ele mesmo as alturas e durações de notas e pausas. Portanto, os parâmetros não detalhados
conformam um estímulo para a co-criação junto com o aluno, ou seja, um impulso para sua
criatividade musical. O próprio compositor afirma nesse sentido: “ A imagem escrita não deve ser tomada seriamente em absoluto, mas é importante tomar com extrema seriedade o processo musical, a qualidade do som e o silêncio. Devemos confiar na aparência das grafias impressas e deixar que exerçam sua influência sobre nós.” (KURTÁG, 2004, prefácio)
Citaremos ainda mais um fragmento do prefácio para dar uma ideia melhor da
relevância de esta pretendida indefinição tonal e rítmica que encontra-se em Játékok, e de
quais são suas fontes de inspiração ao largo da história da música: “ Devemos nos valer de todo nosso conhecimento e de nossas lembranças da declamação livre, a música folclórica, o parlando-rubato, o canto gregoriano e toda a prática musical improvisatória de qualquer momento histórico.” (KURTÁG, 2004, prefácio)
Para Kurtág, Játékok significa o espaço no qual podem aflorar as percepções e os
estímulos à co-criação do aluno, em substituição aos métodos padronizados que procuram
resultados precisos. Um ótimo exemplo disso é a peça intitulada Le lapin et le renard8
composta por Krisztina Takács, uma criança de seis anos. A peça, de estilo programático,
relaciona a música com uma pequena narração9 de quatro versos que relata a perseguição
entre uma raposa e um coelho. Por meio de clusters com as palmas das mãos, se apresentam
os protagonistas da história. Os mais graves e lentos representam a raposa enquanto os mais
agudos e rápidos o coelho. No fim da peça, se cria uma grande pausa até aparecer um cluster
com o punho, forte e conciso, simbolizando o “disparo do caçador”.
É importante sublinhar aqui a total imprecisão da notação, que não detalha alturas
nem ritmos exatos. O relato e a partitura são meros acompanhamentos de um programa,
deixando aberto o campo da co-criação do aluno na escolha das durações de cada nota e
pausa, bem como nas alturas de cada um dos clusters. Portanto, a partitura limita-se a ser uma
guia orientativa do processo musical.
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Exemplo 3: György Kurtág e Krisztina Takács – Início de Le lapin et le renard – de Játékok (9A)
A peça vai além ao ser notada numa tessitura que insinua as “garatujas” que criam
ou podem recriar as crianças e também no uso de uma linguagem corporal que se corresponde
com a motricidade natural e espontânea do estágio da infância. Contudo, esta peça, sendo
composta por uma menina de seis anos, não diverge em muito de outras peças da coleção,
prova viva de que Játékok pode ser o estímulo à emergência de experiéncias musicais
criativas nas crianças.
Considerações finais
Neste ponto, podemos concluir que cada um dos horizontes pedagógicos expostos,
intrínsecos na essência do projeto de Kurtág, trata de enfatizar e liberar alguns dos aspectos da
educação pianística que tradicionalmente são posicionados num lugar de destaque menor na
hierarquia da aprendizagem do instrumento ou, simplesmente, tratados com certas reservas.
Assim, a convergência das questões anteriormente expostas, como é a ludicidade,
o corpo e a criatividade, num profuso e rico material pedagógico para piano, coloca o Játékok
num diferenciado território da educação pianístico-musical atual. Tal integração em uma obra
pedagógica produz uma sinergia de forças que estimulam o aluno a relacionar conceitos
musicais, corporais e vivenciais tendo assim múltiplas possibilidades de percepções, conexões
e assimilações a beneficiar sua relação com o instrumento e a música.
A inclusão do Játékok em nossos repertorios habituais para alunos iniciantes pode
ampliar o espectro do aprendizado do aluno, atingindo uma visão mais ampla e transversal do
piano e da música.
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Referências:
ALBÈRA, Philippe. György Kurtág- Entretiens, textes, écrits sur son oeuvre. Genève: Editions Contrechamps, 1995. HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 4ª Ed. São Paulo, Editora Perspectiva, 2000. (Tradução: João Paulo Monteiro) CAVAYE, Ronald. “Játékok” Los juegos de György Kurtág. Quodlibet. Alcalá de Henares, nº4, p. 73–89, 1996. JUNTUU, Kristiina. György Kurtág’s Játékok brings the body to the centre of learning piano. Musiikkikasvastus. The finish Journal of Music Education (FJME), Helsinki, Vol.11, nº 1-2, p. 97 – 106, 2008. WISCHMANN, Claus. Kurtágs “Játékok” für Klavier. Musiktexte, Köln, nº72, novembro 1997. KURTÁG, György. JEUX. Játékok I. París: Editions Henry Lemoine, 2004
Notas
1 Marianne Teöke: pianista húngara (1923) que encomendou e recompilou peças breves para piano de varios compositores muito conhecidos na Hungria. O projeto resultou na publicação pela Editio Musica Budapest da coleção intitulada Tarka-Barka (que significa “multicolorido”) e contribuem nela László Borsody (1944), Attila Bozay (1939-1999), Lajos Huszár (1948), Miklós Kocsár (1933), Jószef Sopropni (1930) e György Kurtág (1926). Participação de Kurtág que resultaria embrionária do Játékok. 2 Béla Bartók: compositor, pianista e etnomusicólogo húngaro (1881-1945). Sua obra pianístico-pedagógica mais representativa é o Mikrokosmos: recompilação de 153 peças curtas para piano divididas em 6 volumes. 3 Zoltán Kodály: compositor, pedagogo e etnomusicólogo húngaro (1882-1967). A partir de 1945 desenvolveu um sistema de educação musical para as escolas públicas da Hungria que enfatiza as canções do folclore nacional. Seu nome, atualmente, é associado ao método Kodály, escrito por seus seguidores a partir do material produzido em suas pesquisas e práticas pedagógicas na àrea do ensino músical. 4 KURTÁG, György. Játékok I. H.L. París: Editions Henry Lemoine, 2004, Op. Cit., p.VII-A: “Jogo com os punhos 1”. 5 Entendendo cinestesia como a senso-percepção dos movimentos corporais em relação ao ambiente à sua volta, ou seja, consciência através da qual percebemos a movimentação de nosso corpo, de nossos movimentos musculares. 6 KURTÁG, György. Játékok I. H.L. París: Editions Henry Lemoine, 2004, Op. Cit., p. 21: “Homenágem a Tchaïkovski”. 7 Concerto para piano e orquestra Nº 1 em Si bemol menor, op. 23 8 Ibid. p. 9A: “O coelho e a raposa”. 9 “Le renard se faufile dans une clairière et scrute les alentours. Le lapin court lui aussi vers la clairière. Il observe ce qui l’entoure. Le renard s’élance à la poursuite du lapin. Le chasseur poursuit le renard et... tire!”