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Clóvis Guimarães Neto
ARCABOUÇOS E ABORDAGENS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Belo Horizonte 2007
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Clóvis Guimarães Neto
ARCABOUÇOS E ABORDAGENS PEDAGÓGICAS
DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Trabalho apresentado ao Curso de especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em Parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar. Orientador: Profº. Ms. Nelson Cunha Guimarães Leitor: Profº. Ms. Israel Teoldo
BELO HORIZONTE 2007
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Guimarães Neto, Clóvis
ARCABOUÇOS E ABORDAGENS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL, Belo Horizonte, 2007 33p.
Monografia (Especialização) – Universidade de Brasília. Centro de Ensino a Distância,
2007
1. Arcabouços 2. Abordagens 3. Pedagógicas.
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Clóvis Guimarães Neto
ARCABOUÇOS E ABORDAGENS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Trabalho apresentado ao Curso de especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em Parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar, pela comissão formada pelos professores:
Presidente: Professor Mestre Nelson Cunha Guimarães
Universidade Federal de Minas Gerais.
Membro: Professor Mestre Israel Teoldo
Universidade Federal de Minas Gerais.
Belo Horizonte (MG), 04 de julho de 2007
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AGRADECIMENTOS
A minha eterna amada, Cássia, a qual participou ativamente desta minha jornada, com
seu incentivo permanente nesta minha caminhada e por entender os momentos
poupados a seu lado para a realização deste trabalho.
Ao meu filho Felipe, o meu melhor trabalho realizado, sendo o maior propulsor nesta
jornada chamada: VIDA.
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RESUMO
Esta monografia é composta de estudo de caso e revisão bibliográfica, onde se buscou
no do Curso de Pós-graduação em Esporte Escolar, novos caminhos para que, através de
estudos e abordagens teóricas ajudem a traçar uma visão mais abrangente e consciente
das práticas pedagógicas aplicadas na Educação Física Infantil. Para isso, foram
realizadas observações de aulas, entrevista com a professora e a análise do projeto
pedagógico de Educação Física de uma escola particular de Belo Horizonte.
Esse estudo ressalta a importância de se ter conhecimento dos pensamentos pedagógicos
que circulam a Educação Física brasileira. Concluiu-se ser fundamental ao professor,
buscar o que está sendo proposto pela área, contribuindo assim, para o desenvolvimento
de uma prática com objetivos e intenções definidas.
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SUMÁRIO
1. Introdução............................................................................................................................ 08
2. Justificativa.......................................................................................................................... 09
3. Fundamentação Teórica...................................................................................................... 11
4. Métodos e técnicas de coleta de dados............................................. ....................................20
4.1 A escola .............................................................................................................................. 22
4.2 Coleta de dados ....................................................................................................................23
5. Analise e discussão................................................................................................................ 26
6. Conclusão.............................................................................................................................. 30
7. Referência...............................................................................................................................31
8. Anexo......................................................................................................................................33
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1. INTRODUÇÂO
Este estudo buscou alertar os profissionais da área, o quanto é importante ter conhecimentos dos Arcabouços e Abordagens Pedagógicas da Educação Física na Educação Infantil.
O assunto precisa ser mais discutido no âmbito acadêmico, para que não ocorra fatos como o que acontece na realidade da Rede Municipal de Belo Horizonte, onde as aulas não estão sendo ministradas por profissionais da área.
Este trabalho teve como objetivo situar o leitor no processo histórico da Educação Física, Relacionar a Educação Física Infantil com Arcabouços e Abordagens Pedagógicas da Educação Física para que o profissional tenha uma visão mais abrangente das práticas pedagógicas, fazer sugestões e contribuições e críticas para que o profissional tenha um leque maior de conhecimento a respeito do tema.
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2. JUSTIFICATIVA
Este tema instigou a buscar novos conhecimentos e o aprofundamento em
disciplinas que tratavam da infância. Surgiu então a idéia de relacionar a Educação
Infantil com os arcabouços e as abordagens pedagógicas na organização do trabalho de
um determinado profissional da área da Educação Física, tendo em vista que esse estudo
pode ajudar a traçar uma visão mais abrangente e mais consciente destes profissionais
nas suas práticas pedagógicas. Não é pretensão desse trabalho trazer uma verdade
acabada, mas sim, uma contribuição acerca da prática pedagógica da Educação Física
Infantil. Pretendemos então, dar sugestões, fazer algumas críticas e analises, para que
esse profissional possa ter um leque maior de conhecimentos a respeito do tema.
O estudo de caso é um método de pesquisa que deve ser usado para estudar um
caso isolado, bem delimitado. A situação estudada é diferente de outras, porém, pode
ser ao mesmo tempo similar a outras. Contudo, o estudo de caso permite que se faça
generalizações de seus resultados. De acordo com Lakatos & Marconi (1992), “qualquer
caso que se estude com profundidade pode ser considerado como representação de muitos outros ou até
mesmo, todos os casos semelhantes”.
No primeiro capítulo desse trabalho é realizado um levantamento das tendências
que influenciaram a Educação Física ao longo dos anos de sua existência, com a
intenção de situar o leitor no processo histórico da Educação Física. Tentaremos
também justificar a importância de pesquisar sobre os arcabouços teóricos e as
abordagens pedagógicas.
No segundo capítulo é exposto os aspectos da realidade estudada: os motivos da
escolha da escola , a pedagogia adotada, os objetivos e intenções da instituição
educacional. Pontos relevantes do projeto pedagógico para a Educação Física também
serão discutidos.
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No terceiro capítulo é apresentado as observações da prática e a entrevista
realizada com a professora, tentando fazer um diálogo entre o prescrito e o realizado.
Faremos também uma apresentação da professora, relatando alguns aspectos
importantes da sua história de vida, tais como sua relação com a Educação Física, a
escolha pela profissão, sua formação acadêmica e sua experiência na área.
Esse trabalho não pretende trazer uma verdade acabada e sim uma contribuição
acerca da prática da Educação Física escolar, entretanto pode ganhar significado dentro
de outras realidades, que não somente a estudada.
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3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para contar um pouco da história da Educação Física no Brasil é preciso buscar as
raízes na Europa do século XIX. Para Soares (1994), o século XIX é de extrema
importância para entendermos a Educação Física, já que é nesse século que os conceitos
sobre o corpo e sua utilização como força de trabalho são elaborados. É no início desse
século que acontece a consolidação de uma nova sociedade: a Capitalista. Sendo essa
uma sociedade que apresenta desigualdades sociais, com a riqueza concentrada em uma
pequena parcela, para a classe dos trabalhadores só restava oferecer ao mercado sua
força de trabalho, expressa na energia física. Sendo assim, para essa nova sociedade, os
exercícios físicos passam a ter um papel destacado.
“julgava-se que, através deles, e sem mudar as condições materiais de vida
a que estava sujeito o trabalhador daquela época seria possível adquirir o
corpo saudável, ágil e disciplinado exigido pela nova sociedade
capitalista” (SOARES et al., 1992).
O Estado, entendendo a força de trabalho como fonte de lucro, passa então a dar
maior atenção aos exercícios físicos quando percebe que eles podem favorecer o
aumento da produção. “A Educação Física será a própria expressão física da
sociedade do capital. Ela encarna e expressa os gestos automatizados, disciplinados e,
se faz protagonista de um corpo saudável” (SOARES, 1994). A partir disso, inicia
também uma preocupação com os cuidados do corpo ligados à higiene, com a intenção
de construir um homem saudável para a nova sociedade que se consolidava. Essa
preocupação estava baseada na idéia de que os corpos não saudáveis dificultam a
implantação do regime capitalista, visto que esses impediam o aumento da produção e,
consequentemente, o aumento do lucro.
Assim, a Educação Física se instala nas escolas, na visão de Soares(1994) “como
um importante instrumento de aprimoramento físico dos indivíduos que, fortalecidos
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pelo exercício físico, que em si gera saúde, estariam mais aptos para contribuir com a
grandeza da indústria nascente, dos exércitos, assim como com a prosperidade da
pátria”.
Confirmando a entrada da Educação Física nas escolas, Vago (1999) argumenta
que “a presença da Educação Física nas práticas escolares, no Brasil, remonta ao
século XIX, e desde então ela experimenta um processo permanente de enraizamento
escolar”). Ao longo desses anos, a Educação Física foi sendo apropriada de diferentes
maneiras, apresentando uma constante mudança de perspectivas e de tendências
provocada por questionamentos sobre a própria prática.
Para Ghiraldelli Jr (1997), a elite dominante da sociedade de cada momento
histórico usava a Educação Física como um instrumento para formar os corpos de
homens e mulheres de acordo com os seus interesses. Sendo assim, de acordo esse autor
é possível identificar cinco tendências da Educação Física Brasileira: Educação Física
Higienista (1889-1930), Educação Física Militarista (1930-1945), Educação Física
Pedagogicista (1945-1964), Educação Física Competitivista (pós-64) e Educação Física
Popular.
A Educação Física Higienista enfatizava a questão da saúde. Seu papel
fundamental era formar homens e mulheres sadios e fortes. Porém, sua responsabilidade
não era somente zelar pela saúde individual, mas também pelo bem-estar coletivo. A
Educação Física deveria disciplinar os hábitos da população para impedir a deterioração
da saúde e da moral.
A Educação Física Militarista tinha como principal objetivo formar uma
juventude capaz de suportar o combate, a luta e a guerra. A atividade física era utilizada
como um meio de eliminar os fracos e prestigiar os fortes. A coragem, a vitalidade, o
heroísmo e a disciplina constituíam a base da Educação Física. “A educação Física
Militarista, por sua vez, visava à formação do cidadão-soldado, capaz de obedecer
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cegamente e de servir de exemplo para o restante da juventude pela sua bravura e
coragem” (GHIRALDELLI JR., 1997).
A Educação Física Pedagogicista introduziu um novo conceito para a sua prática.
A Educação Física não deveria mais ser entendida apenas como uma prática capaz de
promover a saúde ou disciplinar à juventude, mas, como uma prática eminentemente
educativa. Essa tendência defendia a idéia de que a única forma de promover a
educação integral do ser humano era através da educação do movimento. Acreditava-se
que a Educação Física possuía instrumentos capazes de preparar a juventude para o
convívio democrático.
A Educação Física Competitivista se inspirava na competição e na superação
individual como valores fundamentais para uma sociedade moderna. O objetivo nesse
momento era formar atletas, para que esses pudessem prestigiar o país com medalhas
olímpicas. Acreditava-se que essa era uma maneira de transmitir uma imagem positiva
do Brasil ao mundo. A Educação Física na escola ficava reduzida ao esporte de
rendimento e à busca de uma performance ótima. A escola era vista como uma fonte
inesgotável de futuros atletas. A mídia dava a sua contribuição para divulgar a nova
idéia, na medida em que transmitia, com exagero, imagens do desporto de alto nível.
A Educação Física Popular não estava preocupada com a saúde, não estava
preocupada em formar o cidadão-soldado, não tinha caráter educativo e não pretendia
formar atletas. Ela estava em busca de ludicidade e cooperação e servia aos interesses
da classe trabalhadora.
O que conseguimos perceber é que Ghiraldelli Jr (1997) faz uma divisão
cronológica das tendências da Educação Física em tempos muito rígidos, limitando
assim seu começo e posteriormente seu fim. Isso nos remete a idéia de que em
determinado momento, uma prática surge na sociedade, se instala por um tempo e
depois simplesmente desaparece.
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Porém, dentro de uma visão crítica e realista, fica fácil perceber que os fatos não
acontecem de forma linear como foi exposto. Ao contrário disso, a história dever ser
entendida como um processo dinâmico, sendo que ao mesmo tempo estão presentes
diferentes concepções. Umas mais expressivas e com maior força do que outras,
contudo se relacionando de alguma forma.
Entendendo a história como algo dinâmico, Vago (1999) afirma que “esse processo
de enraizamento escolar não foi homogêneo em termos de representações a respeito
das expectativas criadas em torno de sua intervenção na formação humana” Pode-se
perceber então que diferentes representações da Educação Física coincidem em um
mesmo tempo e espaço. Dessa forma, é possível identificar simultaneamente a presença
de várias representações da Educação Física. Segundo Vago (1999) são elas:
- Educação Física como domadora de corpos humanos: percebe-se aqui fortes
influências médicas e militares, difundindo práticas de higienização e
disciplinarização dos corpos para obter a ordem escolar;
- Educação Física como produtora de uma raça forte e enérgica: para essa
representação, ela é usada como um instrumento capaz de promover a regeneração
da raça brasileira, considerada fraca e doente;
- Educação Física como celeiro de atletas: a Educação Física é submetida aos
princípios do esporte de rendimento e a escola passa a ser vista como uma rica fonte
de formação dos futuros atletas;
- Educação Física como terapia psicomotora: percebe-se uma aproximação e
submissão da prática da Educação Física a psicomotricidade. “ A prática escolar de
Educação Física é organizada, grosso modo, como lugar e tempo de tratamento
dos chamados distúrbios de natureza psicológica que as crianças revelariam por
meio dos movimentos corporais” (VAGO,1999)
- Educação Física como aprendizagem motora: a Educação Física ficar reduzida ao
ensino das habilidades motoras básicas, como por exemplo, andar, correr, saltar,
entre outras, representando assim um tempo de preparação, para que no futuro as
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crianças já estejam prontas para o aprendizado de diferentes modalidades
esportivas:
- Educação Física como promotora da saúde: essa representação pode ser percebida
desde os tempos do aparecimento da Educação Física nas instituições escolares.
Muitas vezes, fazendo uma leitura do corpo humano numa dimensão somente
biológica, porém já é possível perceber também outras leituras que ultrapassam essa
idéia do biológico;
- Educação Física como apropriação da cultura corporal: essa representação vem se
consolidando a partir da década de 1980, momento em que surgem críticas às
práticas escolares predominantes da época. Para essa representação, a Educação
Física pode ser entendida como uma área de conhecimento “responsável por
investigar, problematizar e ensinar as práticas corporais inventadas pelos seres
humanos ao longo da história, considerando suas dimensões culturais e sócio-
econômicos” (VAGO, 1999).
Então, a partir da década de 80, no Brasil, foi possível perceber algumas mudanças
no cenário sócio-político. Começam a surgir críticas ao ensino da Educação Física que
vinha perpetuando uma prática injusta. A insatisfação com o modelo vigente da época,
que seguia a linha tecnicista esportivista e biologista era notável. Não se queria mais
sustentar os conceitos que vigoravam até então. A intenção era desenvolver uma
Educação Física para o ser humano e sua formação.
É ainda nesse momento que a Educação Física passa por um período de valorização
dos conhecimentos produzidos pela ciência. Dá-se início aos programas de mestrado na
área, criando para os profissionais a oportunidade de ampliar a reflexão e discussão
acerca da Educação Física. Em conseqüência das reflexões e debates, começa então uma
nova produção de conhecimento relacionado à Educação Física escolar.
Alguns autores constroem propostas de intervenção para o ensino da Educação
Física na escola. Essas propostas se constituem em modelos de ensino pensados e
estruturados por diferentes autores para orientar a atuação do professor na sua prática.
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São essas propostas de intervenção que chamamos de arcabouços teóricos e abordagens
pedagógicas. Sobre essas produções teóricas Caparroz (1997) diz assim:
“procurei, assim, aprofundar o entendimento do contexto em que a
produção teórica fora elaborada, bem como a importância que a mesma
teve na perspectiva de avançar em direção ao redimensionamento das
concepções pedagógicas, das abordagens metodológicas, dos paradigmas
que balizavam a produção científica, enfim da ruptura e superação que ela
procurou estabelecer em relação a uma produção que até então se pautava
quase que única e exclusivamente na perspectiva biologicista, da aptidão
física”.
Atualmente na área da Educação Física coexiste vários arcabouços teóricos e
abordagens pedagógicas, e acredito que todos eles influenciam a formação do
profissional e continuam influenciando a prática cotidiana desses professores. É
pensando dessa forma que percebo a importância de pesquisar sobre esses arcabouços.
Pesquisar sobre eles pode permitir entender de que maneira essas influências refletem
na prática de cada profissional. Que adaptações e modificações esses arcabouços e
abordagens sofrem quando aplicadas em diferentes contextos.
Esse estudo não irá considerar todos os arcabouços e abordagens existentes, e sim
aquelas que acredito serem as mais difundidas na área. Pensando assim elegi esses
arcabouços teóricos e abordagens na expectativa de que eles pudessem estar presentes
nas aulas e no discurso da professora. Entre eles estão os arcabouços teóricos e as
abordagens: desenvolvimentista, construtivista-interacionista, crítico-superadora,
sociológica ou sistêmica, crítico-emancipatória, psicomotricidade e recreação. A seguir
apresento sucintamente essas abordagens, anunciando os autores, as obras
representativas e a proposta de cada um.
A abordagem desenvolvimentista “é dirigida especificamente para crianças de
quatro a quatorze anos, e busca nos processos de aprendizagens e desenvolvimento
uma fundamentação para a Educação Física escolar” (DARIDO, 1999). É difundida,
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no Brasil, principalmente pelos trabalhos de Tani (1987) e Manoel (l988), citados por
Darido (1999), tendo a obra “Educação Física escolar: fundamentos de uma abordagem
desenvolvimentista” como a mais representativa. Defende a idéia de que o movimento é
o principal meio e fim da Educação Física. Seu objetivo se resume em oferecer
experiências de movimentos adequados ao nível de desenvolvimento da criança para
que ela aprenda as habilidades motoras. Por isso, uma aula de Educação Física deve
privilegiar o aprendizado do movimento, mesmo que outras aprendizagens ocorram em
decorrência da prática das habilidades motoras. Os conteúdos de ensino devem obedecer
a uma seqüência de desenvolvimento motor de acordo com a idade, possibilitando assim
a formação de estruturas motoras cada vez mais organizadas e complexas. A limitação
dessa abordagem acontece na medida em que ela desconsidera o meio sócio-cultural no
qual a criança está inserida, o infante é concebido como um ser a-histórico.
A abordagem construtivista-interacionista tem como principal autor o professor
João Batista Freire, que divulgou essa proposta através da obra “Educação de corpo
inteiro”, publicada em 1991. A principal área do conhecimento que fundamenta essa
abordagem é a psicologia, baseando principalmente nos trabalhos de Piaget. De acordo
com essa abordagem as aulas de Educação Física devem oferecer tarefas desafiadoras
para que os próprios alunos construam os seus conhecimentos a partir da interação com
o meio. Os jogos e as brincadeiras são os conteúdos mais privilegiados, pois se acredita
que enquanto a criança está jogando ou brincando, ela está aprendendo.
Os principais autores envolvidos na construção da abordagem crítico-superadora
são: Carmem Lúcia Soares, Celi Nelza Zülke Taffarel, Elizabeth Varjal, Lino Castellani
Filho, Micheli Ortega Escobar e Valter Bracht, que têm como principal obra à
“Metodologia de Ensino da Educação Física”, publicada em 1992. Essa proposta se
apoia no discurso da justiça social, e busca fundamentos nas áreas de conhecimento da
filosofia e das ciências humanas. Para os autores “a Educação Física é uma disciplina
que trata, pedagogicamente, na escola, do conhecimento de uma área denominada de
cultura corporal” ( SOARES et al., 1992), que tem como temas o jogo, o esporte, a
ginástica, a capoeira e a dança entre outros. Defende a idéia de que o ensino desses
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conteúdos deve ocorrer de forma contextualizada, além de estar de acordo com as
características da classe social e sócio-cognitivas dos alunos. Segundo essa abordagem,
o sentido da avaliação no processo de ensino-aprendizagem da Educação Física é o de
ser uma referência para analisar a aproximação ou distanciamento do eixo curricular que
norteia o projeto pedagógico da escola.
A abordagem sociológica ou sistêmica tem Mauro Betti como principal autor, e a
obra “Educação Física e sociedade”, publicada em 1991 como a mais representativa. As
áreas de conhecimento que fundamentam esse arcabouço teórico são a sociologia, a
filosofia e a psicologia. Para o autor, a Educação Física é tratada como um sistema
hierárquico aberto, uma vez que ela sofre influências da sociedade ao mesmo tempo em
que a influencia. O Objetivo proposto para a Educação Física é “integrar e introduzir o
aluno no mundo da cultura física, formando o cidadão que vai usufruir, partilhar
produzir, reproduzir e transformar as formas culturais da atividade física (o jogo, o
esporte, a dança, a ginástica...)”(BETTI, 1992). De acordo com essa abordagem é
fundamental que os conteúdos sejam experimentados na prática pelos alunos, conhecê-
los apenas não é suficiente. Essa abordagem introduz dois princípios à Educação Física:
o princípio da não exclusão, que diz que nenhuma atividade pode excluir qualquer aluno
das aulas; e o princípio da diversidade, que propõem que as aulas ofereçam atividades
diferenciadas e não privilegiem apenas um tipo de conteúdo.
A abordagem crítico-emancipatória tem como idealizador Elenor Kunz. A
principal área do conhecimento que fundamenta esse arcabouço teórico é a filosofia,
justamente por ser esta a área do conhecimento que fundamentou seus estudos no curso
de doutorado. As obras representativas são “Educação Física: Ensino e Mudanças”
(Kunz,2001) e “Transformação Didático-Pedagógico do Esporte” (Kunz,2001). Essa
abordagem tenta romper com as anteriores do ensino da Educação Física. A intenção é
proporcionar aos alunos as competências que vão além do saber fazer técnico. Tentar
desenvolver igualmente com os alunos as competências de saber agir e saber pensar,
que os capacitarão para uma vida social mais plena, habilitando-os a conhecer,
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reconhecer e problematizar os sentidos e significados da realidade que os cercam,
agindo assim de forma crítica e autônoma sobre a mesma.
Uma das propostas de intervenção que repercutiu no Brasil foi a
psicomotricidade, cujo principal autor de referência foi o francês Jean Le Boulch. Foi
fortemente influenciada por teorias psicológicas que tratam o movimento como um
recurso terapêutico. Essa proposta traz um modelo de Educação Física que tem como
objetivo das aulas o desenvolvimento do esquema corporal, da lateralidade, do
equilíbrio, da coordenação motora, entre outros. Tem sido utilizada para fundamentar as
aulas, principalmente, da educação infantil e das quatro séries iniciais do ensino
fundamental. A proposta não considera o contexto sócio-cultural do aluno, pois se
acredita que as crianças só assimilam o conhecimento através das compreensões
imediatas. Ainda hoje, encontra-se fortes influências dessa proposta na prática da
educação infantil.
Outra proposta de intervenção da Educação Física é a recreação, que foi
apropriada a partir do modelo recreacionista ou da Educação Física informal, aquela que
acontece fora do âmbito da escola. Essa proposta foi utilizada como conteúdo e método
das aulas para os primeiros ciclos com o argumento de que a recreação permitia que a
criança movimentasse livremente. Esse argumento serviu para camuflar o verdadeiro
propósito que inseria a recreação na Educação Física dos primeiros ciclos, que era o de
gastar as energias acumuladas, fazendo com que as crianças ficassem mais calmas e
tranqüilas para retornar às atividades dentro da sala de aula. Para essa proposta, a
Educação Física é vista como um prêmio que, de acordo com o comportamento das
crianças avalia-se se elas merecem ou não a aula. Dessa forma, a Educação Física não é
entendida como uma área de conhecimento que tem conteúdo para ser ensinado. O
brincar é entendido como algo que vai apenas ocupar o tempo das crianças. Não existe
um entendimento mais profundo sobre a importância do brincar na formação delas.
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4. MÉTODOS E TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS
4.1 A ESCOLA
O trabalho foi realizado com apenas uma escola, observando e estudando uma
realidade; constituindo assim em um estudo de caso.
A escolha da Escola (não revelarei o nome verdadeiro da escola pesquisada por
questão de ética) se deu por um conjunto de fatores favoráveis ao desenvolvimento
desse trabalho. Primeiramente por ser uma escola que oferece a Educação Física para a
Educação Infantil, outro fator foi à receptividade e disponibilidade da escola e da
professora de Educação Física em colaborar com a pesquisa, e por último a localização
da escola e a facilidade de acesso a ela.
A escola pertence à rede particular de ensino de Belo Horizonte, localizada na
região Sul, sendo uma das duas unidades existentes na cidade. A escola trabalha com a
Pedagogia Logosofica, que tem sua origem na concepção que a Logosofia traz do
homem, do universo e de Deus.
A Logosofia pode ser entendida como uma linha de pensamento que foi
desenvolvida por um humanista, pensador e educador argentino chamado Carlos
Bernardo Gonzále Pecotche. De acordo com esses pensamentos, a escola é destinada
aos alunos cujos pais querem e buscam uma educação que ultrapasse os limites da
simples informação sobre os conteúdos que integram os programas de ensino, uma
educação que possibilite a formação da criança e do jovem na totalidade do seu ser
físico, psicológico e espiritual; uma educação que colabore para a formação de seres
pensantes e mais felizes, socialmente aptos e moralmente sãos.
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A idéia de criarem-se as Escolas Logosóficas surgiu no I Congresso
Internacional de Logosofia, realizado em Montevidéu no ano de 1960. No Brasil, o
primeiro colégio surgiu em Belo Horizonte no ano de 1963.
Atualmente, a escola oferece a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o
Ensino Médio nos turnos manhã e tarde, com cerca de 900 alunos. A Educação Infantil
nesta escola – que constitui o nível de ensino pesquisado neste trabalho – tem como
objetivo realizar um trabalho educacional que ultrapasse os limites dos conteúdos
curriculares e que promova uma integração cada vez maior das disciplinas, evitando a
fragmentação do conhecimento e possibilitando, ainda, a participação ativa do
educando em seu processo educativo. Por isto é utilizada a metodologia de projetos que
visa organizar a classe em torno de metas previamente definidas por alunos e
professores. Além de trabalhar com as áreas de conhecimento da Matemática, da Língua
Portuguesa, da Geografia, História ou Ciências, os alunos contam com aulas
especializadas de Música, Artes, Inglês, Informática e Educação Física. Essa última é o
recorte desse trabalho.
De acordo com o projeto pedagógico desta escola, a Educação Física é entendida
como a disciplina que trata pedagogicamente dos temas da cultura corporal do
movimento, e ainda é a disciplina responsável pelo trato do movimento humano como
forma de expressão e linguagem.
São traçados alguns objetivos gerais que orientam o trabalho do ensino da
Educação Física nessa escola em todos os níveis de ensino, sendo eles: proporcionar aos
alunos experiências corporais; dar condições aos alunos de entender e agir no sentido de
melhorar a saúde e o bem-estar físico; contribuir para o desenvolvimento das qualidades
pessoais, como autonomia, cooperação, criatividade, entre outras; preparar o aluno para
o lazer; compreender as raízes históricas de temas ligados à cultura corporal e a
valorização da cultura popular.
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Especificamente para a Educação Infantil, a Educação Física é considerada
como um tempo e um espaço intencionalmente organizado, pensado e planejado para
vivências de brincadeiras e jogos da cultura infantil. Acredita-se que as brincadeiras e os
jogos desempenham um papel educativo fundamental para as crianças dessa faixa etária.
São traçados ainda alguns objetivos específicos para a Educação Física na
Educação Infantil como, por exemplo: contribuir para que a criança desenvolva uma
atitude saudável e positiva em relação ao próprio corpo; proporcionar atividades em
grupos onde a solidariedade prevaleça sobre a competitividade: proporcionar situações
onde a criança possa experimentar de diferentes maneiras e com diferentes estímulos as
diversas formas de se movimentar utilizando jogos e brincadeiras da cultura corporal
infantil e outras vivências: entre outros.
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4.2 COLETA DE DADOS
Durante três meses acompanhamos as aulas de Educação Física da Educação
Infantil do CECAP. As aulas, nessa escola, acontecem duas vezes por semana com
duração de trinta minutos cada aula. As turmas são mistas com aproximadamente vinte
alunos.
O local das aulas é, na grande maioria das vezes, o mesmo: uma quadra.
Somente por algum imprevisto é que as aulas acontecem em outro local. Recordaremos
aqui um dia que ilustra essa afirmativa. Chegando à escola encontrei um funcionário
dizendo à professora que a quadra, onde normalmente acontecem às aulas, estava
interditada porque havia uma construção no prédio ao lado que podia oferecer algum
risco para as crianças, já que estavam caindo lajotas de cerâmica. Diante desse fato, a
aula foi transferida para o pátio central da escola, sendo esse espaço também possível
para a realização da aula. Já que a escola possui outros espaços as aulas poderiam
explorar esses diferentes locais, permitindo assim que as crianças experimentassem
outros espaços, vivenciassem outros ambientes, tornando as aulas mais diversificadas
em relação ao espaço.
A rotina básica das aulas é a seguinte: a turma chega na quadra e assenta no chão
para escutar a explicação. Quando as crianças chegam muito dispersas ou agitadas, a
professora costuma cantar algumas músicas criadas por ela mesma para conseguir a
atenção dos alunos (“Eu vou falar, eu vou falar, se a turma não ouvir, aula eu não vou
dar” ou ainda “Em cima da linha amarela, agora eu vou ficar, e esperar a professora que
agora vai falar”). A professora então explica a brincadeira da aula e, depois disso
começam a brincar. Normalmente, a brincadeira ocupa mais da metade do tempo da
aula, e nos minutos finais as crianças exploram o material que a professora leva para a
aula.
O fato da professora criar as músicas que são utilizadas em sua aula como uma é
analisado como uma iniciativa positiva. Mas, por outro lado, despertá-nos uma
preocupação se essas músicas estão sendo utilizadas de forma instrumentalizada. Nesse
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momento, a música não tem sentido nela mesma. Está sendo usada apenas como uma
estratégia para disciplinar as crianças. Uma das maiores críticas feitas à proposta da
recreação é que ela apresenta um conteúdo sem que ele tenha significado nele mesmo.
Nesse sentido, é possível fazer uma relação dessa estrutura com a recreação, já que em
sua proposta está presente essa idéia.
Ao longo da aula a brincadeira vai sofrendo variações e ganhando novos
desafios. Para exemplificarmos essa situação tomei como exemplo a brincadeira
“coelhinho sai da toca” A brincadeira começa com o número de tocas igual ao número
de alunos. Depois de algumas rodadas elimina-se uma toca, tendo agora mais alunos do
que tocas. A brincadeira passa a ser um desafio, a criança precisa ficar atenta para não
ficar sem toca. Passando-se mais algumas rodadas, o novo desafio é formar duplas de
coelhinhos. As crianças devem ficar de mãos dadas e trocar de toca dessa forma, não
podendo soltar as mãos na hora de correr. E assim, progressivamente, as brincadeiras
vão se alterando e ganhado novos elementos.
A relação de materiais disponíveis para a Educação Física é bem grande e
diversificada. Tem bolas de vários tipos e tamanhos, arcos, cordas, colchões, pneus,
elástico, cones, bastões, sucatas entre outros. A professora tenta variar a seleção desses
materiais, levando em cada aula um material diferente, com a intenção de proporcionar
diversas vivências para as crianças. Nesse momento da aula a professora orienta, sugere
e propõe movimentos com o material, além de permitir que as próprias crianças criem
os seus movimentos e explorem o material respeitando a singularidade de cada uma.
Nesse modelo de aula, na qual as crianças exploram os materiais de diferentes maneiras,
podemos perceber uma certa influência da psicomotricidade.
O tempo foi passando, e então percebemos a hora de fazer a entrevista. Já
estávamos com o projeto pedagógico em mãos, já havia feito a observação de um
número considerável de aulas e para completar a coleta de dados só faltava mesmo o
discurso da professora. Marcamos previamente, o dia e local para a entrevista, que seria
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gravada. A professora se sentiu bastante à vontade e demonstrou tranqüilidade e
segurança para responder as perguntas.
Antes de tecermos qualquer comentário sobre os resultados, achamos
fundamental apresentar a professora e contar um pouco sobre a sua trajetória na
Educação Física.. À vontade de prestar vestibular para Educação Física surgiu devido ao
gosto pela prática da atividade física. Nos anos de colégio, sua relação com a Educação
Física foi muito positiva. Gostava das aulas, era motivada e interessada. Ainda no
colégio, fez parte da equipe de voleibol, apesar de gostar também de outros esportes.
Iniciou o curso de Educação Física na Universidade Federal de Minas Gerais no ano de
1980. A partir do segundo período da faculdade começou a fazer estágio na área escolar.
E em 1984 se formou. Trabalhou em diversas instituições escolares, sempre ministrando
aulas para a Educação Infantil, além de outros níveis de ensino. Nesta escola, ela está
desde o ano de 1992 e, nessa instituição ela é a professora que ministra as aulas para
todas as turmas da Educação Infantil. Além da Educação Infantil, ela também é a
professora de algumas turmas do Ensino Fundamental e Médio. No primeiro semestre
de 2002, deu início ao mestrado na Faculdade de Educação da Universidade Federal de
Minas Gerais, desenvolvendo um trabalho na área da história da Educação Física.
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5. ANÁLISE E DISCUSSÃO
Começando a análise da entrevista, a primeira observação que fazemos é
que as abordagens pedagógicas que a professora anuncia são aquelas que foram
mais marcantes durante o seu processo de formação. Nessa hora ela conta um
pouco sobre esse momento fazendo referência a um curso que Le Boulch deu na
Escola de Educação Física no ano em que lá estudava. Ela fala que durante um
tempo trabalhou dentro da perspectiva da psicomotricidade.
É possível perceber que a professora tem consciência daquilo que faz e que é
capaz de refletir sobre sua própria prática. Ela dá conta de perceber suas ações e
intenções num determinado momento e se acha que suas concepções estão
ultrapassadas, é capaz de buscar as mudanças necessárias. “Eu acho que o legal é você
avançar, é você estar por dentro das pesquisas. O que então tem sido descoberto, o que
a área tem pesquisado e proposto como mais interessante”.
Atualmente, a professora acredita que, dentro da cultura corporal de movimento,
são os jogos e as brincadeiras que têm mais sentido e significado para as crianças.
Sendo assim, em suas aulas para a Educação Infantil existe uma predominância dessas
atividades. E tem ainda a ginástica geral que, segundo ela, são atividades que envolvem
“o subir, o saltar, alguma coisa assim que não está exatamente dentro de um jogo, de
uma brincadeira”.
De acordo com Freire (1991), deve haver uma valorização dos jogos e
brincadeiras dentro da escola, pois diante das características das crianças, são eles que
apresentam maior significado para elas contribuindo assim para o desenvolvimento de
cada uma.
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Comparado as duas falas citadas acima, é notável que existe uma aproximação
entre as idéias. É possível perceber que uma concorda com a outra na medida em que
elege um conteúdo, nesse caso os jogos e as brincadeiras, como mais significativo para
as crianças.
Dessa forma, parece existir uma hierarquização dos saberes trabalhados nas
aulas de Educação Física. E então surgem alguns questionamentos como, por exemplo:
por que não trabalhar outros conteúdos como o esporte, a dança, as lutas, nas aulas de
Educação Física? Será que as crianças não têm o direito de acesso a esses temas? Ou
será que a Educação Física não é a disciplina responsável em transmitir esses
conhecimentos construídos historicamente pela humanidade?
Quando perguntada à professora se ela utiliza algum arcabouço teórico e
abordagem como referência para a sua prática, ela responde dizendo que não sabe se
pode falar que existe um arcabouço teórico e uma abordagem em estado puro. Ela diz
ainda que o professor na interação com os alunos acaba fazendo, de acordo as
limitações existentes (de espaço, material, tempo, etc), a Educação Física possível. “E
essa Educação Física possível, é que é a verdadeira”. A professora reconhece que tem
limitações, que em vários momentos ela encontra dificuldades na realização da sua
prática. Mas, relata que está em constante avaliação sobre a mesma.
“Eu acho que a minha consciência é a que mais me cobra. Eu tenho uma
preocupação muito grande que seja uma aula interessante. Se eu tenho a
sensação de que tomei, que eu só ocupei o tempo dos meus alunos, eu me
sinto mal comigo mesma. Então eu acho que essa avaliação da minha
própria consciência é a avaliação que, talvez, mais exige de mim”.
Concordamos plenamente com essas reflexões. Acreditamos que todo professor
tem suas potencialidades e suas capacidades e também limitações. E é claro que elas se
tornam um desafio a mais na prática de cada um. O importante é que tenhamos essa
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consciência, essa percepção, e cada vez mais devemos estar atentos para vencê-las e
construir uma Educação Física capaz de formar um homem melhor.
Analisando o Projeto Político Pedagógico da escola e relacionando-o com as
abordagens pedagógicas anunciadas na Fundamentação teórica, é possível perceber que
existe uma aproximação com as idéias propostas pelo arcabouço teórico e a abordagem
construtivista-interacionista de João Batista Freire.
Esse autor critica as instituições escolares na medida em que elas ignoram o
mundo da cultura infantil, e dão pouca importância em suas ações cotidianas para o
movimento, os jogos, a fantasia, a brincadeira, e ainda outros conteúdos específicos da
infância. Ele afirma que “negar a cultura infantil é, no mínimo, mais uma das cegueiras
do sistema escolar” (FREIRE, 1991). Ele acredita que a Educação Física é a disciplina
curricular responsável em transmitir esses conhecimentos da cultura infantil.
Com base nessas afirmações do autor, encontramos relação com o discurso
presente no projeto pedagógico da Educação Física dessa escola quando se fala que a
“Educação Física no infantil é um tempo e um espaço intencionalmente organizado,
pensado e planejado para vivências de brincadeiras e jogos da cultura infantil” (PPP -
Colégio Logosófico, 2002). Daólio (1998) faz uma crítica a essa abordagem quando
percebe “a falta de uma discussão mais contundente sobre a dinâmica da cultura
infantil” Esse autor fala que na ausência de uma definição e discussão acerca dessa
cultura infantil torna-se difícil para a Educação Física selecionar os conteúdos a serem
trabalhados por ela.
Freire (1997) diz que a criança só aprende se o conteúdo for significativo para ela.
E para que um conteúdo tenha significado é preciso ter uma ação corporal. Só que essa
ação corporal deve ser transmitida através de uma linguagem acessível para as crianças,
entendida pelo autor como os jogos e as brincadeiras da cultura infantil. É essa
linguagem que vai garantir o interesse e a motivação das crianças. Quando no projeto
pedagógico encontramos a afirmação “sendo a brincadeira e os jogos uma atividade
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social específica e fundamental na infância, esses encontram um papel educativo
importante na escolaridade das crianças” (PPP Colégio Logosófico, 2002), fica claro
que realmente existe uma concordância com as idéias da abordagem construtivista-
interacionista.
De acordo com o exposto acima, podemos concluir que as idéias presentes no
projeto pedagógico vão ao encontro da abordagem sugerida por João Batista Freire
porém, não encontramos nenhum tipo de referência a esse autor. Consultando a
bibliografia do projeto pedagógico percebemos que várias outras obras são citadas mas
a obra representativa dessa abordagem “Educação de Corpo Inteiro” ( FREIRE, 1991),
não faz parte dessa relação. Entre as obras que fazem parte dessa relação estão a
“Transformação Didático-Pedagógica do Esporte” (KUNZ, 2001) representando a
abordagem crítico-emancipatória, e a obra “Metodologia do Ensino da Educação Física”
(SOARES et al,1992) que representa a abordagem crítico-superadora.
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6. CONCLUSÃO
É fundamental que o professor busque o que está sendo proposto pela área. Isso
contribui para o desenvolvimento de uma prática com objetivos e intenções definidas.
Foi possível notar que a história da formação do professor influencia fortemente
a sua prática. Muitas ações desenvolvidas no cotidiano escolar representam um pouco a
trajetória percorrida por cada professor durante o processo de construção dos saberes.
Vale ressaltar que a Educação Física na Educação Infantil precisa construir um
projeto que entenda a criança como um sujeito social, respeitando as suas
singularidades. É preciso pensar a infância como um tempo em si mesmo, onde o modo
de pensar, sentir e ser das crianças são levados em consideração.
Termino esse trabalho expressando a importância que ele teve na minha
formação profissional. O seu desenvolvimento foi fundamental na medida em que
possibilitou o entendimento de muitas questões que vinham, até então, sem
esclarecimentos.
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7. RFERÊNCIAS
BETTI, Mauro. Ensino de Primeiro e segundo Graus: Educação Física para quê?
Revista Brasileira de Ciências do Esporte. P. 282-287, 1992.
CAPARRROZ, Francisco Eduardo. Entre a Educação Física da Escola e Educação
Física na Escola. Vitória: UFES, 1997.
Colégio Logosófico . Projeto Político Pedagógico da Educação Física do Colégio
Logosófico Belo Horizonte 2002(mimeo)
DAÓLIO, Jocimar, Educação Física e Cultura. Revista Corporconsciência, n. 1, p. 11-
28, 1º semestre de 1998.
DARIDO, Suraya Cristina. Educação Física na Escola: Questões e Reflexões. Araras,
SP: Gráfica e Editora Topázio, 1999.
FREIRE, João Batista. Educação de Corpo Inteiro. 2ª edição. São Paulo: Scipione,
1991.
GHIRARDELLI JÚNIOR, Paulo. Educação Física Progressista: A Pedagogia Crítico-
Social dos Conteúdos e a Educação Física Brasileira. 6ª edição. São Paulo : Edições
Loyola, 1997.
LAKATOS, Eva Maria e MARCONI, Marina de Andrade. A Metodologia do Trabalho
Científico. 4ª edição. São Paulo: Atlas. 1992.
SOARES, Carmen Lúcia, Taffarel, Suely, Pimenta, Selma Garrido e Libâneo, José
Carlos. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.
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SOARES, Carmen Lúcia. Educação Física: Raízes Européias e Brasil. Campinas, SP:
Autores associados, 1994.
KUNZ, Elenor. Transformação Didática Pedagógica do Esporte. 4ª edição, São Paulo,
SP; Ed. Unijuí, 2001.
VAGO, Tarcísio Mauro. Início e fim do século XX: Maneiras de fazer Educação Física.
In: SOARES, Carmem Lúcia, Caderno Cedes 48 Corpo e Educação 1ª edição.
Campinas, 1999.
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8. ANEXO
ROTEIRO DA ENTREVISTA
1) Nos últimos 10/15 anos, no âmbito da Educação Física escolar brasileira, várias
abordagens pedagógicas foram sendo construídas. Você tem conhecimento dessas
abordagens? Fale um pouco sobre elas.
2) Você consegue identificar quais foram às abordagens que influenciaram na sua
formação?
3) E quais abordagens você utiliza hoje como referência para a sua prática?
4) Quais são os conteúdos que você considera significativos para as suas aulas?
5) Você faz algum tipo de avaliação da sua prática?
6) Você consegue perceber alguma interferência da Logosofia na suas aulas?