certificacao da qualidade nos produtos t

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Certificação da qualidade nos produtos turísticos João Simões 1 Resumo A preocupação pela qualidade a que assistimos por parte de produtores, agentes e atores, nomeadamente na indústria do turismo, é reflexo da extrema importância que a garantia da satisfação ao promover e oferecer produtos de qualidade é impreterivelmente uma forma de, não só manter, mas também inovar e até aumentar a Procura que se assume atualmente mais exigente, informada e culta. Iniciaremos este artigo com a concetualização de produto turístico, analisando posteriormente os métodos e normas suscetíveis para a sua certificação ao nível da qualidade e, por fim, apresentaremos um caso de estudo de forma a entender a metodologia empregue na execução dos processos de certificação da qualidade. Palavras-Chave Certificação da qualidade, produtos turísticos, certificação turística, turismo Abstract The concern for quality we witness by producers, agents and actors, particularly in the tourism industry, reflects the importance that the assurance of satisfaction promoting and delivering quality products is a way not to only maintain, but also to innovate and increase the demand that currently is more perceptive, informed and educated. We begin this article with the conceptualization of tourism product, subsequently analyzing the methods and standards for their quality certification and finally, present some case study in order to understand the employed methodology in the handling of quality certification processes. Keywords - Quality certification, tourism products, tourism certification, tourism 1 Professor Coordenador de Curso de Turismo; Mestre em Turismo; Doutorando em Turismo pela UL/IGOT, com a colaboração da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril: [email protected]

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Certificação de produtos Turisticos.

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Page 1: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos

João Simões1

Resumo – A preocupação pela qualidade a que assistimos por parte de produtores, agentes e

atores, nomeadamente na indústria do turismo, é reflexo da extrema importância que a

garantia da satisfação ao promover e oferecer produtos de qualidade é impreterivelmente uma

forma de, não só manter, mas também inovar e até aumentar a Procura que se assume

atualmente mais exigente, informada e culta. Iniciaremos este artigo com a concetualização de

“produto turístico”, analisando posteriormente os métodos e normas suscetíveis para a sua

certificação ao nível da qualidade e, por fim, apresentaremos um caso de estudo de forma a

entender a metodologia empregue na execução dos processos de certificação da qualidade.

Palavras-Chave – Certificação da qualidade, produtos turísticos, certificação turística,

turismo

Abstract – The concern for quality we witness by producers, agents and actors, particularly in

the tourism industry, reflects the importance that the assurance of satisfaction promoting and

delivering quality products is a way not to only maintain, but also to innovate and increase the

demand that currently is more perceptive, informed and educated. We begin this article with

the conceptualization of “tourism product”, subsequently analyzing the methods and

standards for their quality certification and finally, present some case study in order to

understand the employed methodology in the handling of quality certification processes.

Keywords - Quality certification, tourism products, tourism certification, tourism

1 Professor Coordenador de Curso de Turismo; Mestre em Turismo; Doutorando em Turismo pela UL/IGOT,

com a colaboração da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril: [email protected]

Page 2: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

1 João T. Simões

INTRODUÇÃO

A ambígua estruturação dos produtos turísticos tanto a nível teórico quanto operacional a que

assistimos nos dias de hoje, acaba por tornar a sua definição e regulação complexa, na medida

em que não existem nem limites instituídos (oficiais), nem restrições à conceção, promoção e

venda dos produtos em geral com o rótulo de “turísticos”.

Por isso, iniciamos este artigo com uma abordagem geral à problemática da definição e da

conceção dos tipos de produtos turísticos que existem, nomeadamente dos produtos turísticos

globais ou específicos, apresentando seguidamente e em traços gerais alguns conceitos do

processo de certificação, designadamente quem produz as normas (agências de normalização)

a nível nacional e internacional, indicando os atuais agentes acreditados em Portugal para a

verificação e atribuição da certificação.

Após a indicação de instituições com grande desígnio na elaboração, criação, validação e

certificação da implementação dos métodos e processos normativos, apresentamos as normas

que poderão ser aplicadas ao setor do turismo na visão das agências de certificação, expondo

como case-study um caso implementado em Espanha que nos confirma a capacidade de

certificar elementos do sistema turístico ao mesmo tempo que nos remete para a reflexão da

possibilidade de certificar o próprio destino em si, no global.

Page 3: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 2

I. CONCETUALIZAÇÃO DE PRODUTO TURÍSTICO – GLOBAL E ESPECÍFICO

Não existindo uma fórmula verdadeiramente exclusiva ou um método único estabelecido para

a elaboração, conceção e venda de produtos turísticos “originais”, verifica-se por vezes uma

“banalização atrevida” por parte da Oferta, sobretudo pelos produtores presentes nos destinos,

na atribuição do selo “turístico” aos seus produtos e/ou serviços, dificultando desta forma o

apuramento do que é realmente turístico. Ou seja, existe uma panóplia de produtos e serviços

que poderão conter esta designação sem que tenham de cumprir quer requisitos, padrões ou

formatações específicas para a criação de produtos turísticos originais, que se apresentam

como produtos e serviços que não só suprimem as exigências ou necessidades do Turista,

como também excedem as suas espectativas enquanto viajantes.

Esta situação poderá ocorrer por diversas razões: atrair um novo/diferente tipo de público

aumentando a sua afluência, atrair apoios ou parcerias que não aufeririam sem essa

designação ou até mesmo, por ignorância. Mas, na maior parte das vezes, os agentes com

responsabilidades acrescidas no território nacional (governantes e entidades regulamentares e

de apoio ao Turismo) seguem diretrizes e orientações estratégicas sugeridas e indicadas por

estudos, investigações e projetos de desenvolvimento que alvitram, na sua maior parte, quais

os meios e técnicas a adotar para atingir os objetivos da estratégia a implementar, não

banalizando o atributo “turístico” que poderia desvirtuar não só a estratégia territorial do

destino, bem como as metas a atingir, que geralmente se traduzem no desenvolvimento

sustentado e integrado do território, das populações e da economia local, regional e nacional.

Como evidência empírica verificamos alguns exemplos a nível nacional que apesar dos

esforços para promover uma deslocação pelo motivo “a”, as deslocações que originam têm

como principal motivação a “b”. Esta situação é recorrente e revela uma das consequências

da gestão não integrada do território, que sofre bastante impacte pela atribuição do selo

“turístico” sem descriminação e regras, pois cada operador ou responsável poderá

promover/produzir produtos e experiências sobre o tema que quiser.

Então como identificar e classificar produtos turísticos? Encontramos na academia uma série

de respostas a esta questão, embora, como seria de esperar, cada qual se organiza consoante a

disciplina cientifica em que o(s) seu(s) atores se apoiam.

Page 4: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

3 João T. Simões

Isto é, na perspetiva da Gestão por exemplo, o produto turístico não passa simplesmente de

um Produto, enquanto que na perspetiva da Geografia o produto turístico se baseia

essencialmente no destino turístico, ou seja, o produto é o próprio Território (Andergassen et

al., 2013, p.86). Já na Economia, a perspetiva de produto turístico centra-se

fundamentalmente no lado da Oferta, enquanto que na visão do marketing o produto turístico

é aquele que se promove no mercado para colmatar os anseios e desejos dos turistas (Xu,

2010, p.10).

Portanto, não podemos aferir qual a definição principal ou perfeita, mas podemos selecionar o

conceito na perspetiva que mais se aproxima das nossas necessidades e que se adapte/integre

nos nossos objetivos. Assim, a existência de várias formas de analisar e tratar os produtos

turísticos não se torna necessariamente um obstáculo.

As componentes do território no geral, bem como dos destinos turísticos em particular, são

tão diversas que não seria viável instituir um conceito estático e definitivo, embora não

queiramos com isto afirmar que não devesse existir uma regulamentação, pois como já

mencionámos, o abuso do termo ou até mesmo a “turistificação” de produtos e territórios

além de método, necessita obrigatoriamente de uma estratégia.

De uma forma prática, institucional e com a qual nos identificamos, Silva (2013, p.69)

estabelece que existem dois tipos de produtos turísticos (Global e Específico) que derivam da

conceção de Produto:

i) PRODUTO – “Define-se como qualquer coisa que pode ser oferecida no mercado

para atenção, aquisição ou consumo, o que inclui objectos físicos, serviços,

personalidades, lugares, organizações e ideias”;

ii) PRODUTO TURÍSTICO – “É uma mistura de tudo quanto uma pessoa pode

consumir, utilizar, experimentar, observar e apreciar durante uma viagem ou

estada”.

iii) PRODUTO TURÍSTICO GLOBAL – “Resultante de uma miscelânea de elementos,

tangíveis e intangíveis” (Silva, 2009, p.484) “O produto global tem que ver com

as condições gerais do destino turístico, que são colocadas à disposição dos

turistas. Relaciona-se com a imagem projectada pelo destino (…) Representa a

realidade, como captada e assimilada pelos turistas e concebida pelos serviços

públicos responsáveis da sua divulgação e promoção” (Silva 2013, p.69).

Page 5: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 4

iv) PRODUTOS ESPECÍFICOS (ou Subprodutos) – “Advêm da intervenção dos agentes

económicos no sistema turístico e do processo produtivo utilizado. Tratam-se de

bens ou serviços essencialmente desintegrados, que podem ser comercializados

separadamente ou em packages, representando elos da cadeia de valor

experimentados pelo turista aquando da sua estadia num determinado destino”

(idem, ibidem).

II. A NORMALIZAÇÃO E A CERTIFICAÇÃO DA QUALIDADE

Por certificação entende-se: i) “dar por certo; ii) afirmar com segurança, asseverar, atestar;

iii) passar certidão de(…)” (Porto Editora, 2014). Ou seja, a certificação da qualidade

assegura e atesta que determinado produto ou serviço satisfaz as condições exigidas ao nível

dos processos e cumpre os requisitos e normas de qualidade exigidos ou publicados por

entidades responsáveis e credíveis, que têm como principal função a elaboração, aprovação e

divulgação de normas, que devem ser colocadas à disposição do público e se subdividem em

três grandes grupos: internacionais – Organismos Internacionais de Normalização (OIN);

regionais-europeus - Organismos Europeus de Normalização (OEN); e os nacionais -

Organismos Nacionais de Normalização (APQ, 2014).

No quadro seguinte, identificamos e classificamos os principais organismos que compõem

esses três grupos:

Organismo Sigla Categoria Norma(s) Fundação

/Sede Áreas N.º de Países

International

Organization for

Standardization

ISO Internacional

(OIN) ISO

Genebra

1947

Qualidade;

Ambiente;

Alimentação; (…)

160

International

Electrotechnical

Commission

IEC Internacional

(OIN)

IECEE;

IECQ;

IECEx.

Genebra

1906

Eletrotécnico e

Eletrónico 82

Comité Europeu de

Normalização CEN

Europeu

(OEN) EN

Bruxelas

1975

Indústria, Ambiente,

Segurança

(…)

33

Comité Europeu de

Normalização

Eletrotécnica

CENELEC Europeu

(OEN) EN e HD

Bélgica

1973

Engenharia

eletrotécnica 33

Instituto Europeu de

Normalização das

Telecomunicações

ETSI Europeu

(OEN) ETS

França

1988 Telecomunicações 62

Continua…

Page 6: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

5 João T. Simões

Continuação..

Instituto Português da

Qualidade IPQ Nacional NP

Portugal

1986

Coordenação do

Sistema Português

da Qualidade (SPQ)

---------

Quadro I – Organismos de Normalização

Table I – Organizations for Standardization

Elaboração própria a partir de ISO (2014), IEC (2014), CEN (2014),

CENELEC (2014), ETSI (2014), IPQ (2014).

Como podemos observar pelo quadro I, Portugal possuí o Instituto Português da

Qualidade (IPQ), um organismo público que se encarrega do planeamento do Sistema

Português da Qualidade (SPQ) que “é o conjunto integrado de entidades e organizações

interrelacionadas e interatuantes que, seguindo princípios, regras e procedimentos

aceites internacionalmente, congrega esforços para a dinamização da qualidade em

Portugal e assegura a coordenação dos três subsistemas – da normalização, da

qualificação e da metrologia – com vista ao desenvolvimento sustentado do País e ao

aumento da qualidade de vida da sociedade em geral (Artigo 4º do Decreto-Lei n.º

71/2012 de 21 de março)” (IPQ, 2014).

Ao mesmo tempo que “como Organismo Nacional de Normalização ao IPQ compete,

designadamente, promover a elaboração de normas portuguesas, garantindo a coerência

e actualidade do acervo normativo nacional e promover o ajustamento de legislação

nacional sobre produtos às normas da União Europeia” (IPQ, 2009, p. 17).

Isto é, partindo das normas internacionais (ISO / IEC) ou europeias (EN) o IPQ adapta-as

ao território português (NP), conforme se poderá observar pela figura 1, na qual

apresentamos a designação de algumas normas:

Quadro II – Designação de Normas

Figure 1 - Standards Nomination

Fonte: APQ, 2014

No processo de certificação uma das primeiras etapas consiste na seleção efetuada por parte

das organizações de qual ou quais as normas a certificar, uma vez que cada norma tem

Page 7: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 6

princípios diferentes conforme se observou no quadro I. Utilizam-se geralmente sistemas de

gestão (ambiental, alimentar, da qualidade, etc..) para ser mais fácil a aplicação dessas normas,

uma vez que estes Sistemas asseguram uma utilização ótima dos recursos das organizações e

a certificação posteriormente garante aos seus consumidores a qualidade dos bens adquiridos.

Após a implementação do sistema de gestão (opcional), da norma implementada e em

conformidade na organização, é altura de solicitar uma vistoria a entidades credíveis e

acreditadas que inspecionam e avaliam se a norma está a ser bem ou mal aplicada ou

desenvolvida. No caso de todo o processo estar conforme as indicações da norma, o

produto/serviço/organização é certificada.

A certificação apresenta uma validade renovável, e é emitida por entidades privadas

independentes que terão de ser acreditadas pelo Instituto Português de Acreditação (IPAC).

Apresentamos de seguida no quadro II as entidades com essa competência:

Certifica

do Organismo Endereço Telefone Fax

Correio

eletrónico

A0002 Associação Portuguesa

de Certificação

Edifício de Serviços da Exponor, 2º; Av. Dr. António Macedo 229 993 600 229 993 601

julia.vaz@apcer

.pt

4450-617 Leça da Palmeira

A0002 Associação Portuguesa

de Certificação

Edifício Executivo, 1º C; Avenida do

Infante, nº 8 291 235 140 291 282 317 julia.vaz@apcer

.pt

9000-015 Funchal

A0002 Associação Portuguesa

de Certificação

Edifício Rosa; Praça das Indústrias 213 616 430 213 616 439

julia.vaz@apcer

.pt 1300-307 Lisboa

A0003

SGS ICS - Serviços

Internacionais de Certificação, Lda.

Polo Tecnológico de Lisboa, Lote 6 -

Pisos 0 e 1 217104200 217157527 sgs.portugal@s

gs.com

1600-546 Lisboa

A0004 Lloyd’s Register EMEA

- Portugal

Av. D. Carlos I, 44 - 6º 213 964 131 213 904 829

[email protected] 1200-649 Lisboa

A0005

Bureau Veritas Certification Portugal,

Unipessoal, Lda.

Pólo Tecnológico de Lisboa; Lote 21 21 892 2550 217 100 971

[email protected]

uveritas.com

1600-485 Lisboa

A0008

EIC - Empresa

Internacional de Certificação, S.A.

Rua da Tóbis Portuguesa, nº 8, 2º -

Escritório 10 214220640 214220649 [email protected]

1750-292 Lisboa

A0010

TUV Rheinland

Portugal, Inspecções Técnicas, Lda.

ARQUIPARQUE - Edifício Zenith; Rua Dr. António Loureiro Borges, N.º

9 - 3º piso 214 137 040 214 137 045

[email protected]

m

1495-131 Algés

A0016

Asociación Española de Normalización y

Certificación

Calle Génova, 6; CP 28004 Madrid +34 91

4326085 +34 91 3104976

yvillasenor@ae

nor.es 28004 Madrid

A0016

Asociación Española de

Normalización y

Certificación

Rua do Campo Alegre, nº 830, 1º,

Sala 3 22 605 17 60 22 605 17 61 [email protected]

om

4150-174 Porto

A0017 CERTIF - Associação

para a Certificação

Rua Coronel Veiga Simão; Edifício CTCV 239 499 207 239 499 214

coimbra@certif.

pt

3020-053 Coimbra

A0017 CERTIF - Associação

para a Certificação

Rua dos Plátanos, 197; Edifício

AIMMAP 21 258 69 40 21 258 69 59 [email protected]

4100-414 Porto

A0017 CERTIF - Associação

para a Certificação

Rua José Afonso, n.º 9 E; Laranjeiro 21 258 69 40 21 258 69 59 [email protected]

2810-237 Almada

Continua…

Page 8: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

7 João T. Simões

Continuação…

A0018

SATIVA -

Desenvolvimento Rural, Lda.

RUA ROBALO GOUVEIA, nº 1-1 A

217 991 100 217 991 119 [email protected]

1900-392 Lisboa

A0019

CERTIS - Controlo e

Certificação, Lda. -

CERTIS - Controlo e Certificação

Avenida Varandas do Tua, Lt. 5A - 1º

5370-212 Mirandela

A0019

CERTIS - Controlo e

Certificação, Lda. -

CERTIS - Controlo e Certificação

Rua Diana de Liz - Horta do Bispo -

Apartado 320 919 887 737 266 769 566 [email protected]

7006-804 Évora

Quadro II – Organismos de Certificação – Sistemas de Gestão

Table II - Certification agencies - Management Systems

Fonte: IPAC (2014)

III. A CERTIFICAÇÃO DA QUALIDADE NOS PRODUTOS TURÍSTICOS

O processo de certificação de um produto turístico é o mesmo que qualquer outro que não o

seja, isto é, para obter a certificação as organizações/produtores/vendedores têm de atestar o

cumprimento de normas (nacionais ou internacionais) perante um instituto acreditado (que irá

confirmar o cumprimento dos requisitos) que têm como objetivo garantir que os processos e

métodos são normalizados, respeitando assim as referências normativas e os processos de

produção, conceção, gestão, promoção ou venda, de forma a que exista um sistema comum

para os mesmos produtos.

Uma vez que o setor do turismo se carateriza por ser uma atividade transversal, isto é, além de

utilizar variadas organizações de diferentes setores de atividade para se realizar, envolvendo

assim diferentes tipos de serviços e produtos que se podem apresentar como caraterísticos

(por exemplo: alojamento; restauração; transporte de passageiros e agências de viagens), ou

outros que não tendo sido concebidos para satisfazer as necessidades exclusivamente dos

turistas, acabam por ser usufruídos por estes, assistia-se até bem recentemente à adaptação de

normas gerais à atividade turística.

Então, de forma a responder a essa necessidade, foram vários os projetos, planos e ações que

se fizeram anunciar, como por exemplo “o Turismo de Portugal, I.P., tem colaborado com o

Sistema Português de Qualidade, em questões de normalização no domínio do turismo,

presidindo à Comissão Portuguesa de Normalização para o Turismo – CT 144 –, estrutura

que acompanha e valida o processo europeu de normalização e através da qual Portugal

aderiu ao Comité Técnico para os Serviços Turísticos – TC 228 –, criado em 2005, no âmbito

da International Organization for Standardization (ISO)” (Turismo de Portugal, 2014).

Page 9: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 8

A APCER (2008) indica quais os seus principais produtos-alvo passíveis de certificação na

área do turismo que consideram “ter uma importância fulcral para a economia nacional,

sendo mesmo considerado por muitos como um dos sectores mais relevantes da economia

portuguesa”, assim como as principais vantagens/mudanças que poderão advir da

implementação destas normas. Estes produtos estão elencados no quadro III:

Quadro III - Principais normas de certificação em turismo

Table III - Main tourism certification standards

Elaboração própria a partir de APCER (2008, 2013a e 2014)

Através destas normas (apresentadas no quadro III), e de acordo com a diretora de Marketing

da APCER (Carla Pinto): “No sector do Turismo (Agências de Viagem, Hotéis e Restaurantes,

Aeroportos, Transporte de Passageiros), a APCER já emitiu cerca de 80 certificados nas

áreas da Qualidade, Ambiente e Segurança Alimentar” (APCER, 2013b).

Produtos/Norma(s) Âmbito Benefícios

ISO9001:2000 – Sistemas de Gestão da Qualidade

Qualidade

Aumento da Satisfação dos actuais Clientes (fidelização) e captação de novos

Clientes/Mercados; Maior notoriedade / melhoria da imagem / diferenciação;

Ganhos significativos ao nível da eficiência e eficácia; Redução de Custos (ex: reclamações); Investimento com retorno a curto/médio prazo; Melhoria da Gestão

e dos Processos Internos; Melhoria na Cultura da Empresa para a Qualidade;

Consciencialização e envolvimento de todos os colaboradores.

ISO14001– Sistema de Gestão do Ambiente

Ambiental

Resposta adequada às pressões legislativas e regulamentares; Redução de custos

através da melhoria de desempenho ambiental; Melhoria da eficiência e

produtividade; Consciencialização e envolvimento de todos para o Ambiente;

Maior garantia às partes interessadas de que as questões ambientais são adequadamente geridas; Imagem pública melhorada.

Verificação EMAS - Verificação do Sistema de

Gestão Ambiental de acordo com o Regulamento de Eco-

Gestão e Auditoria EMAS, regulamentam (CE)

nº761/2001

Ambiental

Em termos de vantagens da Verificação EMAS pela APCER, salienta-se que este

serviço representa para as organizações interessadas uma simplificação dos esforços, pela integração da Certificação ISO 14001 e da Verificação EMAS, pois

permite que numa só auditoria realizada pela APCER sejam auditados ambos os

referenciais.

ISO 22000 : 2005 - Sistemas de Gestão da Segurança

Alimentar

HACCP

Alimentar

A definição de requisitos genéricos da norma, que permite uma flexibilidade das metodologias a implementar;

A otimização da gestão dos recursos e melhoria da eficiência na produção de

alimentos seguros; O aumento da confiança dos clientes e consumidores, pela adoção de padrões

elevados de conformidade alimentar.

NP 4494 – Turismo de Habitação e Turismo no

Espaço Rural

Empresas de

natureza

familiar

Uniformidade do serviço prestado;

Adoção de um código de boas práticas;

Existência de uma metodologia de tratamento de reclamações;

Aumento do grau de confiança por parte dos clientes;

Melhoria da imagem.

APCER 3002 - Qualidade e Segurança Alimentar na

Restauração

Alimentar

Maior confiança de clientes e consumidores, pela adopção de padrões elevados de conformidade alimentar;

Eliminação ou redução dos riscos para os consumidores;

Evidência do empenho da organização na obtenção de produtos de qualidade e seguros para a saúde;

Otimização dos recursos e melhoria da eficiência do autocontrolo.

OHSAS 18001 / NP 4397: Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde no

Trabalho

Saúde

Redução de riscos de acidentes e de doenças profissionais;

Melhoria da imagem da organização; Evidência do compromisso para o cumprimento da legislação aplicável; Redução de custos (indeminizações, prémios

de seguro, prejuízos resultantes de acidentes, dias de trabalho perdidos); Melhoria

da satisfação e motivação dos colaboradores pela promoção e garantia de um ambiente de trabalho seguro e saudável; Abrangência das actividades de

prevenção a toda a organização; Redução das taxas de absentismo; Maior eficácia

e pro-actividade ao nível do planeamento operacional.

Page 10: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

9 João T. Simões

Então, uma vez que o destino turístico se compõe em parte por organizações de áreas de

atuação diferentes, oferecendo produtos díspares no mesmo território, sem limite para o

número de atores, atualmente não é possível certificar um destino no seu global, pois não

existe ainda uma norma ou conjunto de normas que o regule, assistindo-se apenas à

certificação (quando a há) dos atores que mais se manifestam no destino em si. Assim,

coloca-se a questão: será possível criar uma norma aplicável ao produto turístico global?

Como aproximação à resposta a esta questão, apresentamos no ponto seguinte um caso de

estudo de um projeto-piloto espanhol que se traduz inovador na área da certificação em

turismo.

IV. CASE-STUDY: SARAGOÇA

A Associação Espanhola de Certificação e Normalização (AENOR), apresenta no seu site um

esquema para a certificação no setor do turismo intitulado de “Marca Q no turismo”. Sendo o

seu público-alvo primordial a indústria hoteleira, a norma base para este modelo de

certificação é a norma UNE 182001 - Hotéis e apartamentos turísticos: Requisitos para a

prestação do serviço, “(…) que é a norma base da certificação e contempla requisitos de

gestão, de prestação de serviço e de elementos tangíveis que deve dispor um estabelecimento

hoteleiro para poder ter acesso à Marca Q de hotéis e alojamentos turísticos” (AENOR,

2008).

A AENOR assumiu recentemente atividades de certificação em outras áreas ao nível da

certificação em turismo sob desígnio do seu modelo “Marca Q no turismo”, como por

exemplo: “Agências de viagens; Termas; Restaurantes; Praias; Transporte em autocarro.

Para além destes sectores, a marca Q de Qualidade Turística pode-se aplicar noutros

serviços turísticos como: campismo, casas rurais, agências, espaços naturais protegidos,

estações de esqui, postos de informação turística, centros de congressos e alojamentos de

tempo partilhado” (idem).

Este modelo já produziu alguns resultados. Disso é prova um caso bem consolidado nesta área

que teve início no ano de 2002, em que a AENOR atribuiu a Saragoça o certificado -Q- de

Qualidade em 30 de dezembro de 2005, pela implementação do processo correspondente por

conseguir em todos os seus serviços a certificação na Norma ISO 9001:2000 (Ayuntamiento

de Zaragoza, 2013).

Page 11: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 10

Saragoça foi selecionada como cidade-piloto espanhola para implementar “(…) e desenvolver

o projecto Design de um Modelo de Gestão da Qualidade do Destino Turístico, incluído

dentro do PICTE (Plano Integral da Qualidade Turística Espanhola)” (idem) segundo

estratégia delineada pela Secretaria de Estado de Comércio e Turismo, de forma a obter um

controlo e aumento da qualidade.

Fundamentalmente, o objetivo desta ação consistiu na implementação de um sistema de

qualidade a nível autárquico, para os seus serviços públicos ligados diretamente à atividade

turística: “Palácios de Congressos, Gabinetes de Congressos e Postos de Informação, e que

se veja confirmado mediante a obtenção do Q de Qualidade, que garante uns padrões de

qualidade nos serviços prestados” (idem).

Deste modo, coloca-se a questão, será possível certificar a qualidade dos serviços/produtos

turísticos no global do destino? António Ceia da Silva (Presidente da Entidade Regional de

Turismo do Alentejo) afirmando a total necessidade de resposta a um tipo de turista mais

culto, exigente e informado, indica que no caso do Alentejo, “A certificação é incontornável

para afirmar o Alentejo como um destino turístico de qualidade (…)” (Agência Lusa, 2013).

Para isso, pretende “Certificar toda a cadeia de valor na área turística, o que envolve a

restauração, o alojamento, os locais de interesse turístico ou a animação turística (…).

Queremos também, no próximo ano, sensibilizar os agentes de ensino e formação, porque

este é um processo que tem que envolver universidades, o Turismo de Portugal e autoridades

a nível regional, para que possamos qualificar o destino até 2020” (idem).

Terminamos este ponto com uma consideração de Amaral (1991 apud Pinto e Pinto, 2011,

p.49) em que indica que “Muito do desenvolvimento que vários países atingiram na conquista

dos mercados externos foi obtido pela vontade de satisfazer o desejo dos consumidores

através da qualidade, aplicando as teorias da ≪gestão pela qualidade≫ e da ≪qualidade

total≫” .

Page 12: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

11 João T. Simões

CONCLUSÃO

Apesar de existirem, as definições e conceitos em turismo parecem passar um pouco ao lado

de alguns operadores, comerciais ou vendedores no que toca à utilização do selo “turístico”, o

que nos coloca a problemática, em primeiro lugar, do que é ou não turístico e, a outro nível, a

distinção de entre os produtos turísticos, quais os globais e quais os específicos.

Após clarificação dos tipos de produtos, verificamos que a certificação obedece a uma série

de regras denominadas “normas”, que são produzidas em primeiro lugar por instituições não-

governamentais internacionais (e europeias), posteriormente adaptadas pelos países que essas

instituições agregam como parceiros, de modo a ajustar e afinar as normas ao território,

cultura e conjuntura (entre outros) que irá ser alvo dessa norma, alterando-se assim consoante

as áreas de atuação, pois existem, por exemplo, normas específicas para higiene e segurança

no trabalho e, existem outras para a sustentabilidade do ambiente.

No entanto, não conseguimos apurar uma norma que estabeleça critérios para certificar o

produto ou destino turístico no seu global. Isto porque a atividade turística se traduz no

conjunto de bens ou serviços específicos, próprios e conexos desta atividade, podendo os

turistas consumir qualquer que sejam aqueles disponíveis no território que visita, tornando

assim inviável a certificação global, mas talvez não impossível. É esta a hipótese que

colocamos em trabalhos que pretendemos desenvolver, sendo o presente artigo o ponto de

partida para esta problemática: será possível criar uma norma ou conjunto de normas (matriz

normativa) geral que possa ser aplicada ao destino no seu global?

Concluímos então este trabalho que esperamos ser o arranque de estudos mais elaborados e

detalhados acerca da certificação em turismo e mais particularmente na sua certificação da

qualidade.

Page 13: Certificacao Da Qualidade Nos Produtos t

Certificação da qualidade nos produtos turísticos 12

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