castoriadis, c - fenomenologia da consciência proletária

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filosofia, psicoanalisis, politica, pensamiento social

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  • FENOMENOLOGIA DA CONSCINCIA PROLETRIA

    FENOMENOLOGIA DA CONSCINCIA PROLETRIA

    Cornelius Castoriadis

    Escrito em Maro de 1948 e publicado primeiramente em francs em socit bureaucratique: 1,Les rapports de production en Russie, Paris, UGE, 1973.

    1. O "em-si" puramente econmico do proletariado

    "O proletariado em-si - escrevia Trotsky - no mais que um objeto submetido a explorao. Este momento originrio do ser do proletariado aparece historicamente durante a primeira fase de sua existncia no seio da sociedade capitalista, e apesar de ficar suprimido por sua incluso num conjunto mais vasto no curso da evoluo ulterior, no deixa, por isso, de seguir constituindo-se no momento fundamental do proletariado atravs de todas as fases do desenvolvimento. Em cada momento de sua existncia e em cada fase da sociedade de classes, o proletariado ser em primeiro lugar esse "em-si", objeto submetido a explorao. Esse "em-si" constituir o fundamento de seu ser ativo, e isso mesmo quando pretende super-lo, mesmo quando consiga efetivamente super-lo, elevando-se a outro plano, o plano do "para-si" poltico, j que esse "para-si" poltico, s adquire seu pleno significado mediante sua relao com o "em-si" econmico cuja negao constitui (negao que contm o que assim nega). Somente a negao dessa negao e daquilo que esta nega, ou seja a superao tanto do "em-si" econmico como do "para-si" poltico, a abolio de toda explorao e de todo Estado, e definitivamente a supresso no seio da totalidade comunista da prpria condio do proletariado como ser especfico, poder acabar com essa determinao de objeto submetido a explorao que o proletrio tem, determinao que deve conservar enquanto isso.

    Mas durante a primeira fase do desenvolvimento, esse "em-si" s nos interessa na medida em que esgota a determinao do proletariado, na medida em que ser proletariado significa somente isso: ser objeto submetido a explorao. Nessa medida, o "em-si" cego esgota o ser proletrio, e esse "em-si" est desprovido de toda conscincia. Seu "ser-em-si" no conseqentemente mais que um "ser para o outro", um ser para o capitalista. Se o capitalista mediante o proletrio, o proletrio para o capitalista durante essa primeira fase, e esse "ser-para-outro" seguir sendo um momento constitutivo do ser proletrio enquanto este continuar existindo como tal. Insistir no "em-si" do proletariado, tentar a todo momento reduzir totalmente o ser proletrio a esse "em-si" cego, fazer dele pura e simplesmente um objeto submetido a explorao: essa ser a orientao geral do processo econmico e poltico na sociedade capitalista.

    2. A totalidade imediata da conscincia proletria primitiva. O "para-si" imediato da rebelio

    Mas esse "em-si" imediato no mais que uma abstrao. O processo da produo capitalista tende a reduzir cada vez mais o proletrio a essa abstrao mas nunca o consegue plenamente. Em primeiro lugar porque esto contidos (negados e conservados) no ser proletrio todos os elementos do processo que tem conduzido a essa forma e, antes de tudo momento da conscincia, o "para-si" do humano. Mas tambm porque o proletariado v em seu "ser-em-si" um "ser-para-outro", compreende a negao de seu ser que constitui esse ser para o outro e se lana at a negao dessa negao mediante a rebelio.

    a) O ponto de partida desse processo se encontra na negao implicada no "ser-para-outro" do proletrio. Nessa contradio est contido desde o princpio o fracasso do capitalismo como reduo absoluta do proletariado seu "em-si". Por um lado o capitalismo tenta converter o proletrio a simples matria bruta da economia: o proletrio h de se converter em uma pea a mais da mquina. Mas o que constitui o valor do proletrio para o capitalista precisamente que o proletrio mais que uma simples pea da mquina; o fundamento da existncia do capitalista a mais-valia e somente h mais-valia porque h uma oposio

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    absoluta entre o homem e a mquina, entre a repetio e a criao no processo de produo. A mquina o momento da identidade nesse processo; s h desenvolvimento porque h uma interveno do que opem fundamentalmente mquina, ou seja, o homem. Portanto, esse "ser-em-si" do proletariado s pode ser um "ser-para-o capitalista" na medida em que contm um "para-si" elementar. Agora o capitalismo se v obrigado a afirmar e negar por sua vez esse "para-si". A neg-lo com seu contnuo esforo de reduo do proletrio a um mero "em-si"; a afirm-lo no somente enquanto se v obrigado a conservar a essncia biolgica do proletariado como classe, seno tambm porque se v obrigado a conservar em certa medida a essncia humana dessa classe, sem a qual perde precisamente o valor que tem para ele.

    b) A partir desse momento, o capitalismo suscita sua prpria negao social. Esse "para-si" elementar, esse ncleo de conscincia mantido no e apesar do proletariado, capta como primeiro objeto o "em-si" que o sustenta; adquire assim a certeza imediata e sensvel de sua explorao. Mas essa certeza no vai mais alm da coisidade; como o "em-si" captado por essa primeira conscincia unicamente o "em-si" fsico, a alienao desse "em-si" aparece em um plano fsico e o "ser-para-outro" do proletrio captado por sua conscincia como um "ser-para-uma coisa"; e essa coisa a coisa que est a no processo de produo, isto : a mquina. A primeira negao da alienao se afirma ento como negao da mquina, como inteno da destruio da mquina. Mas essa conscincia que nega a mquina est duplamente mistificada; em primeiro lugar enquanto faz de uma coisa seu prprio outro - e o outro da conscincia s pode ser outra conscincia - e se rebaixa assim ao nvel da coisa; mas tambm na medida em que seu objetivo se apresenta como um regresso, ou seja, j no quer superar a condio de proletrio seno reduzir de novo essa condio a sua expresso mais primitiva. Existe ento uma dupla impossibilidade, interna e externa, nessa primeira negao; Alm disso h a ignorncia do que constitui a fora prpria do proletariado. O naufrgio ante essa dupla impossibilidade, a compreenso do que a fora prpria do proletariado e a passagem conscincia da alienao como alienao em proveito no da coisa seno do capitalista enquanto pessoa, determinam a negao dessa primeira negao e o passo a totalidade da rebelio.

    C) A rebelio a primeira totalidade a que chega a conscincia proletria. A rebelio supem que a alienao captada como explorao total, como tentativa de reduzir tanto o "em-si" fsico como o "para-si" consciente do proletrio a um "ser-para-outro"; um outro precisamente determinado de agora em diante como capitalista. A rebelio alcana uma compreenso da totalidade tanto pelo que diz respeito a seu prprio sujeito, afirmado no mais como sujeito individual ou particular seno como totalidade da classe despossuda, como pelo que diz respeito a seu objeto, enquanto essa totalidade da classe se opem a totalidade da outra classe e a sua expresso mais geral que o Estado. Seu prprio contedo todo colocado de uma forma que exige a supresso da particularidade , a realizao de uma participao igual no universo econmico e a atribuio a cada indivduo de uma frao real do poder poltico mediante o povo em armas X a Comuna poltica. Nesse sentido, a rebelio constitui a primeira exteriorizao completa do "para-si" proletrio.

    Mas esse "para-si" da rebelio segue sendo um "para-si" imediato; a totalidade que coloca uma totalidade imediata enquanto a realizao total da negao do outro se refere todavia ao outro exterior, a tudo que se opem ao proletariado fora do prprio proletariado. A classe afirmada aqui como uma unidade imediata, simples e direta, ou seja, como abstrao que h de conduzir forosamente para a derrota. A derrota da rebelio a derrota da abstrao diante do concreto negativo do capitalismo como oposto ao proletariado. a derrota da imediatez ingnua face mediao desenvolvida e contida no concreto negativo. O carter inevitvel dessa derrota significa o carter inevitvel da passagem atravs de uma srie de mediaes, durante a qual a conscincia proletria se aprofunda voltando sobre si mesma, desenvolvendo seu prprio outro no interior de si mesma, para captar e superar sua negao no somente como negao exterior realizada pelo capitalismo, mas tambm como negao interna, oposio intrnseca que precisa primeiro chegar a ser explcita, ser captada depois como tal, e definitivamente suprimida na totalidade concreta da conscincia revolucionria absoluta.

    3. A particularidade da conscincia reivindicativa. A mistificao da mediao infinita e o "ser-para-outro" do reformismo

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    A derrota da rebelio no suprime o "para-si" ativo da conscincia proletria, mas significa a queda na mediao; mas essa queda tambm um afundar. A totalidade imediata do primeiro "para-si" se fragmenta numa srie de momentos particulares. Essa reduo ao particular se efetua de dois modos: em primeiro lugar, como fragmentao do objetivo final que havia sido dado rebelio (e que aparece agora imediatamente inacessvel) numa srie de objetivos particulares. Assim se constitui a reivindicao como momento central do "para-si" proletrio durante essa fase. Em segundo lugar, como diviso do trabalho no seio da prpria classe, uma classe que parece ter sido convencida pela derrota da rebelio de que sua ao total intil e perigosa, e que permite portanto delegar sua ao a uma de suas partes. Assim se constitui a burocracia operria sindical e poltica - como base real do "para-si" proletrio durante essa fase.

    Assim a conscincia proletria d um grande passo adiante. Realiza parte dos objetivos que se propunha alcanar primitivamente e que parecem agora no poderem ser realizados em sua totalidade. Essa realizao separa seu ser desse n "em-si" ao qual queria reduzir-lhe o capitalismo. Limita quantitativamente sua alienao, tanto pelo que diz respeito magnitude da mais-valia, como pelo que diz respeito jornada de trabalho. Eleva-se por ltimo numa de suas partes - essa burocracia operria que surge e se desenvolve sobre o terreno da reivindicao - por cima da condio proletria, e parece chegar a um "para-si" absoluto.

    Mas sob essa positividade exterior aparece cada vez mais claramente o engano contido em germe. A base desse engano a apresentao do particular como idntico ao universal: a reivindicao se apresenta como a mediao necessria entre a alienao presente e a liberdade futura, e efetivamente essa mediao; comea o engano a partir do momento em que essa mediao se apresenta como um fim, ou dito melhor, a partir do momento em que a passagem da alienao para a liberdade se apresenta como uma srie infinita de mediaes que parecem no ter fim ("o objetivo no nada, o movimento tudo"). A totalidade do objetivo seria ento resultado de uma simples adio aritmtica dos fragmentos particulares desse objetivo. Ao decompor assim uma totalidade qualitativa em partes quantitativas, a conscincia reivindicativa se mistifica a si mesma, enquanto cr que um movimento em sentido inverso igualmente possvel sem ter em conta a qualidade do todo, irremediavelmente perdida em seus fragmentos quantitativos. O reformismo no fundo essa substituio impossvel de fragmentos sucessivos da alienao suprimida por fragmentos sucessivos de liberdade conquistada. Essa concepo quantitativa se faz em pedaos

    diante da realidade da liberdade, que totalidade ou nada.

    O reformismo implica alm disso uma mediao pessoal entre o proletariado e o capitalista: o burocrata operrio. A burocracia tambm se apresenta a si mesma como uma mediao necessria. A mistificao contida nessa mediao consiste, no que se refere ao proletariado, numa pretenso em suprimir uma alienao substituindo-a por outra. Na medida em que o burocrata se apresenta como um elemento necessrio da liberao, e na medida em que sua existncia implica que a libertao s possvel graas a ele, uma parte da classe se substitui ao conjunto da classe, apresentando-se como esse conjunto. A verdade que a burocracia est efetivamente a , no lugar desse conjunto, posto que localiza e concentra o "para-si", a conscincia e a direo da classe; posto que, definitivamente se coloca a si mesma como um "para-si", como um fim de si mesmo na histria. O proletariado se aliena de novo, e essa alienao se agrega alienao fundamental a que lhe submete o capitalismo.

    Mas esse "para-si" do burocrata um falso "para-si", e o prprio burocrata est mistificado. Como a razo de ser do burocrata a reivindicao e o nico resultado objetivo da reivindicao eliminar, mediante o particular que pode ser imediatamente captado, o universal constantemente adiado, a conservao do capitalismo se converte na razo de ser objetiva do burocrata reformista; logo o "ser-para-si" do reformista se converte em "ser-para- o capitalista", e os prprios mistificadores so mistificados. Quando toma conscincia dessa situao, o burocrata reformista se transforma subjetivamente em agente do capitalismo no seio do proletariado; e assim se realiza completamente a alienao do prprio burocrata, enquanto se separa de sua prpria classe. A mistificao reformista se converte em algo totalmente explcito e visvel, como tal, para o proletariado.

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    4. A singularidade da conscincia anarquista

    Ao mesmo tempo em que cai com uma de suas partes no particular, a conscincia proletria se lana, atravs de outra parte, at o momento da singularidade. Se a conscincia reformista significa a reduo do fim histrico a uma srie de objetivos particulares e a particularizao real da base humana do movimento (ao substituir a burocracia pela classe), a conscincia anarquista parece manter a totalidade do objetivo ao reduzir o sujeito do movimento ao indivduo, ao singular, onde parece haver se refugiado a vitalidade da classe vencida. Na realidade a conscincia anarquista permite manter durante esse perodo a totalidade imediata do objetivo da rebelio, totalidade ocultada pelo reformismo, ao apresentar-se como oposio constante a este, mas nessa manuteno, que no mais que repetio, existe um duplo engano: engano porque substitui a classe pelo indivduo e at afirma que o objetivo j pode ser realizado individualmente no seio da alienao capitalista; mas tambm porque, ainda quando se despoja de seu individualismo (no "anarco-comunismo"), apresenta o objetivo como objetivo imediato em sua totalidade sem ter em conta a mediao, ou seja, tentando definitivamente saltar por cima desse "para-si" que ainda no foi alcanado. E esse salto no na realidade mais do que um retorno a rebelio imediata.

    5. A sntese imperfeita da rebelio revolucionria e o "partido revolucionrio"

    A manuteno de uma oposio cada vez mais radical entre o proletariado e a burocracia reformista e a supresso da oposio entre a burocracia reformista e o capitalismo determinam longo prazo uma identificao entre capitalismo e burocracia reformista. A partir do momento em que essa identificao captada como tal pela conscincia proletria, a mistificao reformista aparece explicitamente, e se impem a necessidade da destruio do reformismo e do capitalismo ao mesmo tempo, e pelos mesmos motivos. Surge de novo a vontade de negao da alienao contida na reivindicao, mas sem a mistificao dessa mediao infinita que resultou ser mediao para o capitalismo. Surge a reivindicao revolucionria como concretizao da negao do capitalismo, negao incompatvel exteriormente com este, negao cuja realizao supem a supresso deste. Surge o "partido revolucionrio" como concretizao, no seio do proletariado, da vontade de supresso do capitalismo e da conscincia revolucionria. Desse modo o proletariado "chega ao poder" e destri exteriormente o capitalismo. E quando no "chega ao poder", se agrupa em torno do "partido revolucionrio", efetuando-se como objetivo explcito a destruio do capitalismo. Esse momento aparece ento como o que na realidade: uma vitria da conscincia revolucionria.

    Mas essa vitria contm sua prpria negao; j que mantm, no plano do sujeito da revoluo, o momento da particularidade como momento no suprimido. Esse momento da particularidade est constitudo pelo "partido revolucionrio", que se diferencia da totalidade da classe tanto do ponto de vista da estrutura como do ponto de vista do contedo. Essa particularizao est fundada ademais na manuteno de um princpio eminentemente alienante, o princpio da diviso do trabalho: diviso fixa e estvel entre a "direo" e a "execuo", entre o trabalho intelectual e o trabalho fsico, distino e diviso doravante entre a "conscincia do proletariado", localizada agora no "partido revolucionrio", e um corpo do proletariado privado de conscincia; privao continuamente agravada por essa "conscincia" que o partido, que se afirma assim como conscincia insubstituvel. A distino se converte em diviso, a diviso em oposio, e a oposio por ltimo, em contradio entre o proletariado e seu prprio "partido revolucionrio".

    Por outro lado, a reivindicao revolucionria que anima durante essa fase a tomada de conscincia revolucionria no mais do que uma negao exterior do capitalismo; no existe ainda verdadeira sntese, j que no somente o que se nega assim unicamente a exterioridade da alienao, seno que, ademais, essa negao no ainda a afirmao prpria do proletariado por si mesmo; o que se reivindica a abolio do poder capitalista; o poder prprio do proletariado s se afirma como poder do "partido revolucionrio", ou seja doravante como negao do poder prprio do proletariado.

    6. A universalidade abstrata do burocratismo. Engano universal da abstrao burocrtica. O "ser-para-si" absoluto da burocracia definitivamente um "ser-para-ningum"

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    Partindo da alienao da conscincia, a burocracia revolucionria Realiza rapidamente a alienao total; j que para o proletariado no existe outra alternativa: conscincia total e poder universal ou alienao total e mistificao universal. A expropriao da conscincia em proveito da burocracia e a expropriao fsica correm juntas, j que o monoplio da conscincia s possvel sobre a base do monoplio das condies da conscincia. Como essas condies so essencialmente materiais, volta a aparecer a explorao e com ela a tendncia a reduzir o proletariado a sua pura matria fsica. Essa tendncia pode operar agora de modo mais profundo que no marco do capitalismo. A explorao capitalista contm uma contradio a qual j aludimos (2). Essa contradio est determinada em ltimo termo pela busca do lucro em sua forma capitalista. Mas com a dominao da burocracia, o lucro se converte em ganncia universal abstrata, desaparece a competio, pelo menos em sua forma econmica, e na produo, que j no est determinada pelo seu lucro concreto, pode desenvolver-se agora livremente a inteno de reduzir o proletariado a uma simples pea da mquina. Resulta ento que a passagem do "em-si" para o "para-si" torna-se muito mais difcil para o proletariado nesse caso.

    Como a burocracia surge no prprio terreno da destruio do capitalismo e mediante esta; como a apario de sua oposio ao proletariado no significa a supresso de sua oposio ao capitalismo (como com o reformismo) seno ao contrrio, agudiza essa oposio; como sua chegada ao poder, por ltimo, implica na luta fsica do proletariado contra o capitalismo e na eliminao dele, a burocracia aparece como negao do capitalismo. Mas essa negao no mais que uma negao abstrata e o poder da burocracia no mais que a forma abstrata do poder do proletariado; pode-se dizer que a burocracia , nesse sentido, a sntese negativa do capitalismo e do proletariado. uma sntese negativa na medida em que mantm (ainda que no suprimidas) a negatividade total do contedo capitalista como alienao e a negatividade do momento da conscincia proletria que seu fundamento, ou seja da universalidade abstrata. A forma em que essa universalidade abstrata aparece em primeiro lugar na forma da economia, com a supresso da possesso singular ou particular das formas produtivas e a apario do Estado como possuidor universal. Mas como o Estado no mais que uma abstrao, essa possesso estatal uma universalidade abstrata que oculta a possesso da burocracia e ao mesmo tempo a domina. A universalidade abstrata aparece tambm na poltica, visto que o Estado ou o "povo" apresentado como sujeito do poder sendo na realidade esse poder o da burocracia.

    A mistificao que engendra assim a burocracia portanto universal. um engano de propores infinitamente maiores que a mistificao reformista, que pode ser facilmente descoberta e denunciada visto que o reformismo no de fato mais do que uma expresso do capitalismo e que essa identidade j pode ser percebida na vida, no seio da sociedade capitalista. Como, por definio, o objeto e o prprio ser do reformismo s podem ser parciais, a mistificao que representa s pode ser parcial. Mas o objeto da burocracia um objeto universal, o Estado e a sociedade em seu conjunto; a prpria burocracia se afirma como sujeito universal para-si. Sua mistificao s pode ser universal, engano de todos e em tudo. A essncia desse engano a abstrao, e a apresentao do universal abstrato, que enquanto abstrato cobre foradamente um concreto determinado, como idntico ao universal concreto, a apresentao da negao abstrata como idntica a negao concreta, nica posio positiva. A burocracia apresenta ento ao proletariado a supresso da alienao capitalista como idntica a supresso da alienao em geral e de toda alienao; apresenta a "nacionalizao" e a "planificao estatal" da economia como idnticas a coletivizao e a planificao comunista; a destruio do poder capitalista como idntica a destruio do poder de classe; ao "povo" abstrato como idntico ao povo concreto, e o terror como idntico a liberdade.

    Mas se nesse estgio a alienao total, e universal o engano, isso significa que tambm so alienao e mistificao da prpria burocracia. A burocracia se coloca como "ser-para-si" absoluto; mas este "para-si" se cai na abstrao que constitui a essncia da burocracia. A burocracia se coloca como conscincia da histria, separada do corpo desta; mas essa conscincia sem corpo no mais que uma conscincia fantasmagrica que se desvanece por si mesma. Privada de corpo, a burocracia perde tambm rapidamente a "conscincia" a partir da qual se formou. Torna-se corpo limitado e parcial, e o que resta de conscincia se coloca servio desse corpo; aliena-se, assim, em proveito de sua corporeidade nua, e emudece. Sua inteno de reduzir o proletariado a no ser seno uma pea a mais da mquina de produo se volta contra ela mesma; j que a continuidade do social, do social feito de abstraes, faz com que todos os meios empregados contra o proletariado tenham um efeito no seio da prpria burocracia; o terror utilizado contra o proletariado se converte rapidamente em terror universal; a

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    expropriao fsica do proletariado, a sua reduo a um "ser explorado", corresponde como anttese simtrica a expropriao do burocrata por seu prprio corpo, sua reduo a um "ser-para a explorao", seu destino de parasita social e histrico; e a expropriao intelectual a qual submetido o proletariado se converte por ltimo no cretinismo e imbecilidade da prpria burocracia. A prpria burocracia se torna doravante simples pea da mquina social a servio da abstrao; j que sua prpria corporeidade, a cujo servio cr estar, se converte em pura abstrao na medida em que se descobre sua total ausncia de significao histrica; j que resulta que atravs dessa corporeidade no h nada, e at que, no marco da alienao total, nem sequer para-si mesma. O "ser-para-si" da burocracia resulta ser um "ser-para a abstrao", ou seja, definitivamente, um "ser-para-ningum".

    Diria-se ento que a prpria sociedade chega a ser algo totalmente vo, e que a histria afunda no nada da abstrao universal. E que a ambigidade que determina todo momento da conscincia chega a ser aqui totalmente explcita: ou a conscincia revolucionria voltar a afirmar-se para passar a universalidade concreta, para suprimir a abstrao burocrtica e realizar o comunismo; ou ser vencida pela abstrao e a histria mergulhar no monstruoso, do qual s poder sair atravs de novas mediaes e novas transformaes. At aqui pode chegar o conhecimento; o que vem depois no se trata de conhecimento seno de vontade histrica, vontade que aceita como supostas a ambigidade de todo conhecimento, a vitria e o fracasso, e que tem suprimido unilateralmente essa ambigidade em sua identificao total com seu objetivo pensado.

    7. O salto universalidade concreta. A conscincia revolucionria absoluta.

    a) O burocratismo tende a realizar muito mais completamente que o capitalismo a reduo do Proletariado a sua pura matria fsica. A base dessa possibilidade a supresso da concorrncia, que definitivamente a supresso do motor da acumulao, e portanto a reduo da mais-valia a uma funo puramente esttica: a manuteno da classe parasita. Da que, nessa medida, a classe burocrata j no est mais obrigada a manter a criatividade do trabalho. Mas a contradio que contm a alienao da fora de trabalho volta a surgir, ainda que seja de uma forma distinta: a inteno de suprimir o "para-si" do trabalhador (que se manifesta de modo elementar como criatividade) e de insistir no "em-si" (ou seja, de aumentar continuamente a explorao), contm uma contradio patente que se traduz aqui pela diminuio do produto da fora de trabalho e por conseguinte da prpria mais-valia; quanto mais pesa a burocracia sobre o nvel de vida do proletariado , mais baixa globalmente o valor dos produtos, devido queda brutal da produtividade quantitativa. essa queda, a burocracia s pode responder com um aumento do nmero de operrios, com uma proletarizao ainda mais completa do conjunto da sociedade.

    b) Se a passagem do "em-si" ao "para-si" se converte nessas condies em algo subjetivamente mais difcil, contudo muitssimo mais fcil objetivamente. Muito mais fcil objetivamente: isso quer dizer que todos os dados do problema e at sua soluo esto a, colocados explicitamente. O papel parasitrio da burocracia aparece claramente. De todas as oposies suprimidas, permanece uma: a oposio entre exploradores e explorados. Toda falsa mediao - como, por exemplo, uma reivindicao reformista ou uma "burocracia operria" especifica - agora radicalmente impossvel. A prpria forma da soluo est a exposta, porque toda relao individual com os meios de produo suprimida, por ser o Estado o sujeito de toda propriedade, basta suprimir esse Estado e substitu-lo pelo prprio proletariado. A sociedade burocrtica coloca, diante do proletariado, esse dilema nos termos mais crus, simples e profundos, grita-lhe a cada momento: sers tudo ou sers nada; entre teu poder e os campos de concentrao no h meio termo, cabe a ti decidir se queres ser o dono ou o escravo da sociedade.

    c) A realizao do poder da burocracia, ao apresentar a forma mais brutal e mais total da explorao, ao mesmo tempo o fim do engano burocrtico. A essncia da burocracia como negao prpria do proletariado descoberta. Na medida em que o proletariado capta essa negao, capta como concluso e sntese de toda a evoluo anterior. O proletariado pode agora liberar-se de todo engano, no s interior como tambm externo. Pode compreender que se trata agora no somente de se opor exteriormente ao outro, de destruir todo poder fora dele, seno de realizar positivamente seu prprio poder. Tende portanto a suprimir desde o primeiro momento em seu prprio seio toda distino fixa, tanto no que diz respeito ao poder como no que se refere ao rendimento. Essa conscincia do proletariado, que conscincia de si, afirmao de si mesmo como objetivo prprio, que chegou a afirmar todo o outro, tanto dentro como fora

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    de si mesma, sob a forma do si mesmo, e cujo nico objetivo agora levar ao poder seu prprio "si-mesmo", a conscincia revolucionria absoluta, que s pode se realizar atravs de uma srie de mediaes e estranhamentos que pressupe. Mas uma vez realizado seu objetivo exterior, a conquista do poder, o suprime e, juntamente com ele suprime a si mesma como conscincia revolucionria do proletariado. Torna-se assim simplesmente conscincia absoluta, humanidade comunista, universalidade concreta infinitamente diferenciada no seio de si mesma.

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