calvino e o anticristo

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Calvino e o anticristo

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  • JO

    COMENTRIO EM 2 TESSALONICENSES, CAPTULO 2

    Joo Calvino

    CALVINOCALVINOCALVINOCALVINO eeee

    o o o o ANTICRISTOANTICRISTOANTICRISTOANTICRISTO

  • Comentrio em 2Tessalonicensses, captulo 2

    Joo Calvino (sem notas de rodap)

    Traduzido e revisado por Diagramado por

    Rodrigo Reis de Faria Fabio Martins

    Original aqui: http://www.ccel.org/ccel/calvin/calcom42.toc.html

    Imagem de capa: http://www.dw.de/image/0,,1325141_4,00.jpg

    Fontes:

    Calvins Commentaries (traduzido para o ingls por John King), disponvel no site: http://www.sacred-texts.org

    Monergismo.com: (http://www.monergismo.net.br/textos/jcalvino/Calvino_1_2_Tessalonicenses-livro.pdf)

    Brasil 2013

  • "Ora, irmos, rogamo-vos, pela vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, e pela nossa reunio

    com ele," (2 Tessalonicenses 2:1)

    Ora, rogamo-vos, pela vinda. Isto pode na verdade ser lido, conforme notei na margem, como:

    concernente vinda, mas mais conveniente consider-lo como um pedido srio, a partir do assunto em

    questo como em 1 Co 15:31, quando, discursando a respeito da esperana de uma ressurreio, ele faz

    uso de um juramento por aquela glria que deve ser esperada pelos fiis. E isto tem muito maior eficcia,

    quando conjura os fiis, pela vinda de Cristo, a que no imaginem temerariamente que o seu dia esteja

    prximo, pois ao mesmo tempo ele nos admoesta a no pensarmos nisto seno com reverncia e

    sobriedade. Pois costumeiro conjurar pelas coisas que so consideradas por ns com reverncia.

    Portanto, o sentido : Assim como atribus grande valor vinda de Cristo, quando ele nos reunir

    consigo, e realmente aperfeioar aquela unidade do corpo que at agora nutrimos apenas em parte,

    atravs da f; do mesmo modo rogo-vos gravemente pela sua vinda a que no sejais demasiadamente

    crdulos, caso algum afirme, sob qualquer pretexto, que o seu dia est prximo.

    Como, na sua Epstola anterior, ele havia se referido, at certo ponto, ressurreio, possvel que, a

    partir disto, alguns fanticos e inconstantes tomassem ocasio para determinar um dia prximo e fixo. Pois

    no provvel que este erro tivesse se originado entre os tessalonicenses antes. Pois Timteo, ao voltar de

    l, havia informado a Paulo toda a sua condio, e, como homem prudente e experimentado, no havia

    omitido nada que fosse de importncia. Ora, se Paulo tivesse recebido notcia acerca disto, ele no teria

    se silenciado quanto a uma questo de to graves consequncias. Assim, sou da opinio de que, quando

    fora lida a Epstola de Paulo, a qual continha uma vvida descrio da ressurreio, alguns que estavam

    dispostos a favorecer a curiosidade filosofaram inoportunamente quanto ao seu tempo. Contudo, esta era

    uma fantasia absolutamente destrutiva, assim como eram tambm outras coisas da mesma natureza, que

    depois se disseminaram, no sem artifcio por parte de Satans. Pois, quando se diz que algum dia est

    prximo, se no chegar rapidamente, sendo a humanidade por natureza impaciente com maiores dilaes,

    seus espritos comeam a definhar, e logo depois essa languidez seguida pelo desespero.

    Portanto, isto era uma sutileza de Satans; como ele no podia subverter abertamente a esperana de uma

    ressurreio, com vistas a solap-la secretamente, como que por meio de buracos subterrneos, ele

    prometera que o seu dia estaria prximo, e logo chegaria. Em seguida, tambm, ele no cessara de in-

    ventar vrias coisas com vistas a ofuscar das mentes dos homens, pouco a pouco, a crena de uma

    ressurreio uma vez que no podia erradic-la abertamente. De fato, algo plausvel dizer que o dia da

    nossa redeno est definitivamente fixado, e por esta causa isto recebido com o aplauso por par- te da

    multido, tal como sabemos que os devaneios de Lactncio e dos quiliastas antigamente causaram grande

    deleite; e, contudo, eles no tiveram outra tendncia seno a de subverter a esperana de uma

    ressurreio. Este no era o propsito de Lactncio, mas Satans, conforme a sua sutileza, perverteu a sua

    curiosidade, e a dos seus semelhantes, no deixando nada definido ou fixo na religio, e at os dias atuais

    ele no deixa de empregar os mesmos meios. Agora vemos quo necessria era a admoestao de Paulo,

    uma vez que, no fosse por isso, toda a religio teria sido subvertida entre os tessalonicenses sob um

    pretexto plausvel.

  • "Que no vos movais facilmente do vosso entendimento, nem vos perturbeis, quer por

    esprito, quer por palavra, quer por epstola, como de ns, como se o dia de Cristo estivesse

    j perto." (2 Tessalonicenses 2:2)

    Que no vos movais facilmente do vosso entendimento. Ele emprega o termo entendimento para denotar

    a f estabelecida que se apoia na s doutrina. Ora, atravs daquela fantasia que ele rejeita, eles teriam sido

    levados como que ao xtase. Ele tambm observa trs tipos de embuste, contra os quais de- veriam estar

    de guarda esprito, palavra e epstola espria. Pelo termo esprito, ele se refere a pretensas profecias, e

    parece que este modo de falar era comum entre os fiis, de modo que aplicavam o termo esprito a

    profecias, com vistas a lhes dar honra. Pois, para que as profecias tenham a devida autoridade, devemos

    olhar antes para o Esprito de Deus do que para os homens. Mas, como o diabo costuma transformar-se em

    anjo de luz (2 Co 11:14), os imposto- res roubaram este ttulo, a fim de se imporem sobre os simples. Mas,

    embora Paulo pudesse t-los privado desta mscara, ele preferiu falar desta maneira, por concesso, como

    se tivesse dito: Por mais que possam pretender ter o esprito de revelao, no creiais neles. Joo, de

    modo semelhante, diz: Provai os espritos, se so de Deus (1 Jo 4:1).

    Palavra, em minha opinio, inclui todo o tipo de doutrina, enquanto os falsos mestres insistam em matria

    de razes ou conjecturas, ou de outros pretextos. O que ele acrescenta quanto a epstola uma evidncia

    de que esta impudncia antiga a de falsificar os nomes dos outros. Tanto mais maravilhosa a

    misericrdia de Deus para conosco, pelo fato de que, embora o nome de Paulo fosse usado falsamente em

    escritos esprios, seus escritos, no obstante, foram preservados intactos at os nossos tempos. Isto, sem

    sombra de dvida, no poderia ter ocorrido acidentalmente, ou como efeito da mera atividade humana, se

    o prprio Deus, pelo seu poder, no tivesse restringido Satans e todos os seus ministros.

    Como se o dia de Cristo estivesse j perto. Isto pode parecer estar em desacordo com muitas passagens da

    Escritura, nas quais o Esprito declara que aquele dia est prximo. Mas a soluo fcil, pois est perto em

    relao a Deus, para quem um dia como mil anos (2 Pe 3:8). Ao mesmo tempo, o Senhor queria que o

    aguardssemos constantemente, de tal modo a no limit-lo a certo perodo de tempo. Vigiai, diz ele,

    pois no sabeis o dia, nem a hora (Mt 24:36). Por outro lado, aqueles falsos profetas que Paulo

    desmascara, em- bora devessem ter mantido as mentes dos homens em expectativa, mandavam que

    estivessem certos do seu rpido advento, para que no se cansassem com o aborrecimento da demora.

    "Ningum de maneira alguma vos engane; porque no ser assim sem que antes venha a

    apostasia, e se manifeste o homem do pecado, o filho da perdio," (2 Tessalonicenses 2:3)

    Ningum vos engane. A fim de que no prometessem a si mesmos infundadamente a vinda do alegre dia

    da redeno em to curto espao de tempo, ele lhes apresenta uma melanclica descrio quanto futura

    disperso da Igreja. Este discurso corresponde plenamente ao que Cristo fez em presena dos seus

    discpulos, quando estes lhe perguntaram a respeito do fim do mundo. Pois ele os exorta a se prepararem

    para suportar duros combates (Mt 24:6); e, depois de discursar acerca da mais terrvel e antes inaudita das

    calamidades, pela qual a terra seria reduzida praticamente a um deserto, ele acrescenta que o fim ainda

    no est prximo, mas que estas coisas so os princpios das dores. Do mesmo modo, Paulo declara que os

    fiis devem exercer guerra por um longo perodo, antes de alcanarem um triunfo.

    Contudo, aqui temos uma passagem notvel, e que , no mais alto grau, digna de observao. Esta era uma

    terrvel e perigosa tentao, que poderia abalar at os mais confirmados, e faz-los escorregar ver a

  • Igreja, que tivera, por meio de tantos trabalhos, se levantado gradualmente e com dificuldade at certa

    posio considervel, abater-se repentinamente, como se afundada por uma tempestade. Concordemente,

    Paulo fortalece de antemo as mentes, no apenas dos tessalonicenses, mas de todos os que so piedosos,

    para que, quando a Igreja viesse a estar em uma condio dispersa, eles no ficassem alarmados, como se

    isto fosse algo novo e inesperado.

    Como, porm, os intrpretes tm distorcido esta passagem de vrias maneiras, devemos antes de tudo nos

    esforar por determinar o verdadeiro sentido de Paulo. Ele afirma que o dia de Cristo no vir, enquanto o

    mundo no tiver cado em apostasia, e o reinado do Anticristo se estabelecido na Igreja; pois, quanto

    exposio que alguns tm dado a respeito desta passagem, como se referindo queda do Imprio Romano,

    simplria demais para exigir uma refutao extensa. Tambm fico surpreso de que tantos escritores, em

    outros aspectos instrudos e perspicazes, tenham incorrido em erro em um assunto que to fcil no

    fosse que, quando algum comete um erro, outros o sigam em bandos sem considerao. Portanto, Paulo

    emprega o termo apostasia no sentido de um abandono traioeiro de Deus, e isto no por parte de um ou

    alguns indivduos, e sim como algo que se estenderia em toda a parte entre uma grande multido de

    pessoas. Pois, quando apostasia mencionada sem qualquer complemento, no pode ser restringida a

    poucos. Ora, ningum pode ser denominado apstata, seno aqueles que anteriormente fizeram uma

    confisso acerca de Cristo e do evangelho. Portanto, Paulo prediz certa revolta geral da Igreja visvel. A

    Igreja deve ser reduzida a um assustador e horrvel estado de runa, antes que sua plena restaurao seja

    cumprida.

    A partir disto podemos prontamente deduzir quo til esta predio de Paulo pois poderia parecer que

    no pudesse ser um edifcio de Deus, aquilo que fosse subitamente subvertido, e permanecesse por tanto

    tempo em runas, se Paulo no tivesse muito antes sugerido que isto seria assim. Mais ainda, muitos nos

    dias atuais, quando consideram consigo mesmos a disperso de longo tempo da Igreja, comeam a vacilar,

    como se isto no tivesse sido determinado pelo propsito de Deus. Os romanistas tambm, com vistas a

    justificar a tirania do seu dolo, fazem uso deste pretexto que no era possvel que Cristo desamparasse a

    sua esposa. Contudo, os fracos tm algo aqui em que se apoiar, quando aprendem que o estado

    inconveniente das coisas que contemplam na igreja foi h muito predito; enquanto, por outro lado, a

    impudncia dos romanistas abertamente desmascarada, porquanto Paulo declara que ocorrer uma

    revolta, quando o mundo for trazido sob a autoridade de Cristo. Ora, veremos em breve por que o Senhor

    permitiu que a Igreja, ou ao menos o que parecia ser tal, decasse de maneira to vergonhosa.

    Se manifeste. No era melhor do que uma fbula de velhas que se concebeu a respeito de Nero que ele

    fora arrebatado do mundo, destinado a voltar novamente para afligir a Igreja atravs da sua tirania; e,

    contudo, as mentes dos antigos estavam to enfeitiadas, que eles imaginavam que Nero seria o Anticristo.

    Contudo, Paulo no fala de um indivduo, mas de um reino, que seria apoderado por Satans, para que

    ele estabelecesse um trono de abominao em meio ao templo de Deus o que vemos cumprido no

    Papado. verdade que a rebelio se espalhou mais extensamente, pois Maom, como era um apstata,

    desviou de Cristo os turcos, seus seguidores. Todos os hereges tm quebrado a unidade da Igreja pelas suas

    seitas, e assim tem havido correspondente nmero de rebelies contra Cristo.

    Todavia, Paulo, ao dar o alerta de que haveria tal disperso, que a maior parte se revoltaria contra Cristo,

    Paulo acrescenta algo mais srio que haveria tal confuso, que o vigrio de Satans manteria o poder

    supremo na Igreja, e a presidiria ali no lugar de Deus. Ora, ele descreve esse reinado de abominao sob o

    nome de uma nica pessoa porque apenas um reinado, embora um suceda ao outro. Meus leitores

    agora entendem que todas as seitas pelas quais a Igreja tem sido reduzida desde o princpio tm sido

    tantas correntes de rebelio que comearam a drenar a gua do curso original; mas que a seita de Maom

  • foi como que um jorro impetuoso de gua, que removeu quase a metade da Igreja pela sua violncia.

    Restava, ainda, que o Anticristo infectasse a parte restante com o seu veneno. Assim, vemos com os nossos

    prprios olhos que esta predio memorvel de Paulo tem se confirmado pelo evento.

    Na exposio que apresento, no h nada de forado. Os fiis naquele tempo sonhavam que seriam

    transportados para o cu, aps terem sofrido dificuldades durante um breve perodo de tempo. No

    entanto, pelo contrrio, Paulo prediz que, depois de terem inimigos estranhos molestando-os por algum

    tempo, eles teriam de suportar mais males dos inimigos em casa, porquanto muitos daqueles que fizeram

    uma confisso de dedicao a Cristo seriam levados abjeta traio, e porquanto o prprio templo de Deus

    seria contaminado por sacrlega tirania, de modo que o maior inimigo de Cristo exerceria o seu domnio ali.

    O termo manifestao tomado aqui para denotar manifesta posse da tirania como se Paulo tivesse

    dito que o dia de Cristo no viria enquanto esse tirano no tivesse se manifestado abertamente, e tivesse,

    por assim dizer, propositalmente subvertido toda a ordem da Igreja.

    "O qual se ope, e se levanta contra tudo o que se chama Deus, ou se adora; de sorte que

    se assentar, como Deus, no templo de Deus, querendo parecer Deus." (2 Tessalonicenses 2:4)

    O qual se ope, e se levanta. Os dois eptetos homem do pecado e filho da perdio sugerem, em

    primeiro lugar, quo terrvel seria a confuso, a fim de que a sua indecncia no desencorajasse as mentes

    fracas; e ainda, elas tendem a incitar os que so piedosos a um sentimento de abominao, para que no

    se degenerem com os demais. Contudo, Paulo traa agora, como em um quadro, um surpreendente retrato

    do Anticristo; pois pode-se facilmente deduzir a partir destas palavras qual a natureza do seu reino, e de

    que coisas consiste. Pois, quando o chama de adversrio, quando diz que ele reivindicar para si as coisas

    que pertencem a Deus, de modo que adorado no templo como Deus; ele pe o seu reino em oposio

    direta ao reino de Cristo. Por isso, assim como o reino de Cristo espiritual, do mesmo modo deve haver

    essa tirania sobre as almas, a fim de rivalizar o reino de Cristo. Tambm o encontraremos depois

    atribuindo-lhe o poder de enganar, por meio de doutrinas mpias e pretensos milagres. Se, concordemente,

    quereis conhecer o Anticristo, deveis v-lo como diametralmente oposto a Cristo.

    Onde traduzi: tudo o que chamado Deus, a leitura mais comumente recebida entre os gregos : todo o

    que chamado. Contudo, pode-se conjecturar, tanto a partir da traduo antiga, como de alguns

    comentrios gregos, que as palavras de Paulo foram corrompidas. O equvoco, tambm, de uma nica letra

    prontamente se introduziu, especialmente quando o formato da letra era muito semelhante; pois, onde

    estava escrito (tudo), algum copista, ou leitor muito atrevido, transformou em (todos). Esta

    diferena, porm, no de tanta importncia para o sentido, pois Paulo, sem sombra de duvida, quer dizer

    que o Anticristo tomaria para si as coisas que pertencem a Deus somente, de modo que se exaltaria acima

    de toda reivindicao divina, para que toda a religio e todo o culto a Deus estivessem aos seus ps. Neste

    caso, a expresso: tudo o que se chama Deus, equivalente a tudo o que se reconhece como Divindade, e

    ou seja, aquilo em que consiste a venerao devida a Deus.

    Aqui, porm, o assunto tratado no propriamente o nome de Deus, e sim a sua majestade e adorao; e,

    em geral, tudo o que ele reivindica para si. A verdadeira religio aquela pela qual o verdadeiro Deus

    exclusivamente adorado; isto, o filho da perdio transferir para si. Ora, todo aquele que aprendeu pela

    Escritura quais so as coisas que pertencem mais especialmente a Deus, e, por outro lado, observar o que o

    Papa reivindica para si ainda que fosse um menino de dez anos de idade no ter grande dificuldade em

    reconhecer o Anticristo. A Escritura declara que Deus o nico Legislador (Tg 4:12) que pode salvar e

    destruir; o nico Rei, cujo ofcio governar as almas pela sua palavra. Ela o apresenta como o autor de

  • todos os ritos sagrados; ela ensina que a justia e a salvao devem ser buscadas de Cristo somente; e

    designa, ao mesmo tempo, o meio e o modo. No existe nenhuma destas coisas que o Papa no afirme

    estar sob sua autoridade. Ele se orgulha de que cabe a ele impor s conscincias as leis que lhe paream

    boas, e sujeit-las ao castigo eterno. Quanto aos sacramentos, ou ele institui novos, de acordo com a sua

    prpria inclinao, ou corrompe e deforma aqueles que foram institudos por Cristo sim, descarta-os

    completamente, para por em lugar deles os sacrilgios que inventou. Ele inventa meios de alcanar a

    salvao que esto completamente em desacordo com a doutrina do Evangelho; e, por fim, no hesita em

    mudar toda a religio de acordo com a sua vontade. Dizei-me, o que exaltar-se acima de tudo o que se

    chama Deus, se o Papa no faz isto? Quando deste modo priva a Deus de sua honra, ele no lhe deixa nada

    alm de um ttulo vazio de Divindade, enquanto transfere para si todo o seu poder. E isto o que Paulo

    acrescenta logo depois, que o filho da perdio querer parecer Deus. Pois, conforme foi dito, ele no

    insiste no simples termo Deus, mas sugere que o orgulho do Anticristo seria tal que, levantando-se acima

    do nmero e posio dos servos, e subindo na tribuna de Deus, reinaria, no com autoridade humana, mas

    divina. Pois sabemos que tudo o que levantado em lugar de Deus um dolo, ainda que no traga o nome

    de Deus.

    No templo de Deus. Apenas por este termo h uma refutao suficiente do erro; mais ainda, da estupidez

    daqueles que consideram que o Papa seja o Vigrio de Cristo, pelo fato de ter o seu trono na Igreja, seja

    de que maneira possa se conduzir; pois Paulo no pe o Anticristo em nenhum outro lugar seno no

    prprio santurio de Deus. Pois este no um inimigo estranho, mas domstico, que se ope a Cristo sob

    o prprio nome de Cristo. Mas, questiona-se, como pode a Igreja ser apresentada como covil de tantas

    supersties, ao passo que foi destinada para ser a coluna da verdade (1 Tm 3:15)? Respondo que ela

    assim representada, no pelo fato de reter todas as qualidades da Igreja, e sim porque tem algo dela

    remanescente. Concordemente, admito que esse o templo de Deus em que o Papa tem domnio, mas ao

    mesmo tempo profanado por inmeros sacrilgios.

    "No vos lembrais de que estas coisas vos dizia quando ainda estava convosco?

    "(2 Tessalonicenses 2:5)

    No vos lembrais? Isto acrescentou no pouco peso doutrina que anteriormente eles a tinham ouvido

    pela boca de Paulo para que no pensassem que havia sido inventada por ele no momento. E, como ele

    lhes havia dado um aviso inicial quanto ao reino do Anticristo, e a devastao que sobreviria Igreja,

    quando nenhuma questo ainda havia sido levantada quanto a tais coisas, ele considerou fora de dvida

    que era especialmente til conhecer a doutrina. E, sem sombra de dvida, isto realmente assim. Aqueles

    a quem se dirigira estavam destinados a ver muitas coisas que os afligiria; e, quando a posteridade visse

    uma grande proporo daqueles que haviam feito confisso da f de Cristo se rebelarem contra a piedade,

    enlouquecidos como que por uma mosca, ou antes, por uma fria, o que poderiam fazer, seno vacilar?

    Porm, esta era uma muralha de fogo que as coisas foram assim designadas por Deus porque a ingratido

    dos homens era digna de tal vingana. Aqui podemos ver como os homens so esquecidos em questes

    que afetam a sua salvao eterna. Tambm devemos notar a mansido de Paulo; pois, embora pudesse ter

    veementemente se enfurecido, ele apenas os repreende mansamente; pois um modo paternal de

    censur-los dizer que haviam consentido que o esquecimento de uma questo to importante e to til

    entrasse furtivamente em suas mentes.

  • "E agora vs sabeis o que o detm, para que a seu prprio tempo seja manifestado"

    (2 Tessalonicenses 2:6)

    E agora o que o detm. significa aqui propriamente um impedimento ou ocasio de demora.

    Crisstomo, que pensa que isto s se pode entender em referncia ao Esprito, ou ao Imprio Romano,

    prefere apoiar esta ltima opinio. Ele aponta uma razo plausvel porque Paulo no teria falado do

    Esprito em termos enigmticos, mas, ao falar do Imprio Romano, queria evitar despertar um sentimento

    desagradvel. Ele explica tambm a razo pela qual o estado do Imprio Romano retarda a revelao do

    Anticristo porque, assim como a monarquia da Babilnia foi subvertida pelos persas e medos, e os

    macednios, tendo conquistado os persas, novamente tomaram posse da monarquia, e os macednios

    foram finalmente subjugados pelos romanos; do mesmo modo o Anticristo tomaria para si a supremacia

    vacante do Imprio Romano. No h nenhuma destas coisas que no tenha sido confirmada depois pelos

    acontecimentos reais. Portanto, Crisstomo fala com verdade at onde diz respeito histria. Contudo, sou

    da opinio de que a inteno de Paulo era diferente disto que a doutrina do evangelho precisava se

    espalhar aqui e ali, at que praticamente todo o mundo estivesse convencido de obstinao e malcia

    deliberada. Pois no pode haver dvida de que os tessalonicenses haviam ouvido da boca de Paulo quanto

    a este impedimento, seja de que natureza fosse, pois ele evoca recordao deles o que havia

    anteriormente ensinado em sua presena.

    Que os meus leitores considerem agora qual dos dois mais provvel ou que Paulo declarou que a luz do

    evangelho deve ser difundida por todas as partes da terra antes que Deus assim d rdeas soltas a Satans;

    ou que o poder do Imprio Romano permaneceu no caminho da ascenso do Anticristo, porquanto ele s

    poderia abrir caminho para um domnio vacante. Ao menos tenho a impresso de ouvir Paulo discursando

    quanto ao chamado universal dos gentios que a graa de Deus deve ser oferecida a todos; de que Cristo

    deve iluminar a todo o mundo pelo seu evangelho, a fim de que a impiedade dos homens fosse mais

    plenamente atestada e demonstrada. Portanto, esta foi a demora, at que a carreira do evangelho fosse

    completada porque um convite gracioso salvao era o primeiro na ordem. Por isso acrescenta: a seu

    tempo, porque a vingana estaria madura depois que a graa tivesse sido rejeitada.

    "Porque j o mistrio da injustia opera; somente h um que agora resiste at que do meio

    seja tirado;" (2 Tessalonicenses 2:7)

    O mistrio da iniquidade. Isto oposto revelao; pois, como Satans ainda no havia reunido tanta

    fora, para que o Anticristo pudesse oprimir, abertamente, a Igreja, ele diz que ele est realizando secreta e

    clandestinamente o que faria abertamente em seu devido tempo. Portanto, naquele tempo ele estava

    lanando, secretamente, os fundamentos sobre, os quais, posteriormente levantaria o edifcio, tal como

    realmente aconteceu. E isto tende a confirmar mais plenamente o que eu j disse que no um indivduo

    que representado sob o termo Anticristo, e sim um reino, que se estende por muitas eras. No mesmo

    sentido, Joo afirma que o Anticristo vir, mas que j havia muitos em seu tempo (1 Jo 2:18). Pois ele

    admoesta aqueles que viviam naquela ocasio a estarem de guarda contra essa pestilncia mortal, que

    ento estava crescendo de diversas formas. Pois estavam nascendo seitas que eram, por assim dizer, as

    sementes daquela erva desgraada que quase sufocou e destruiu toda a lavoura de Deus. Mas, embora

    Paulo transmita a ideia de uma forma secreta de operao, ele fez uso do termo mistrio ao invs de

    qualquer outro, aludindo ao mistrio da salvao, do qual fala em outro lugar (Cl 1:26); pois ele insiste

    atentamente na luta de repugnncia entre o Filho de Deus e esse filho da perdio.

  • Somente um que agora resiste. Embora faa ambas as declaraes em referncia a uma s pessoa que

    ela manter a supremacia por um perodo de tempo, e que logo ser tirada do caminho no tenho

    dvida de que ele se refere ao Anticristo; e o particpio resistindo deve ser explicado no tempo futuro.

    Pois, em minha opinio, ele acrescentou isto para a consolao dos fiis que o reinado do Anticristo ser

    temporrio, seus limites tendo sido designa- dos por Deus; pois os fiis poderiam objetar: De que vale que

    o evangelho seja pregado, se Satans agora est incubando uma tirania que ele exercer para sempre?

    Concordemente, ele exorta pacincia, porque Deus aflige sua Igreja apenas por um tempo, para que

    possa um dia dar-lhe o livramento; e, por outro lado, a perpetuidade do reinado de Cristo deve ser

    considerada, a fim de que os fiis possam repousar nisto.

    "Porque j o mistrio da injustia opera; somente h um que agora resiste at que do meio

    seja tirado;" (2 Tessalonicenses 2:8)

    E ento ser revelado, ou seja, quando aquele impedimento ( ) for removido; pois ele no

    assinala o tempo da revelao como sendo quando aquele que agora tem a supremacia for tirado do

    caminho, mas tem em vista o que havia dito antes. Pois ele dissera que havia certo impedimento no

    caminho do Anticristo para que este chegasse posse declarada do reino. Em seguida, acrescentou que

    ele estava incubando uma obra secreta de impiedade. Em terceiro lugar, intercalou uma consolao, com

    base em que esta tirania chegaria a um fim. Ele agora repete novamente que aquele que ainda estava

    oculto seria revelado neste tempo; e a repetio tem este objetivo que os fiis, estando equipados com a

    armadura espiritual, possam, no obstante, lutar valorosamente sob Cristo, e no se permitirem vencer,

    ainda que a avalanche de impiedade seja to difusa.

    A quem o Senhor. Ele havia prenunciado a destruio do reinado do Anticristo; agora, assinala o modo da

    sua destruio que ele ser reduzido a nada pela palavra do Senhor. Contudo, incerto se ele fala da

    apario final de Cristo, quando ele ser manifestado desde o cu como o Juiz. As palavras, de fato,

    parecem ter este sentido, mas Paulo no quer dizer que Cristo realizaria isto em um s momento. Por onde

    devemos entend-lo no sentido de que o Anticristo seria totalmente e em cada aspecto destrudo quando

    aquele dia final da restaurao de todas as coisas chegasse. Contudo, Paulo sugere, ao mesmo tempo, que

    Cristo colocar em fuga, atravs dos raios que emitir antes do seu advento, a escurido em que o

    Anticristo reinar; assim como o sol, antes de ser visto por ns, afugenta as trevas da noite pela emanao

    dos seus raios.

    Portanto, esta vitria da palavra se revelar neste mundo, pois o esprito da sua boca simplesmente se

    refere palavra, assim como tambm em Is 11:4 passagem a que Paulo parece aludir. Pois ali o Profeta

    toma no mesmo sentido o cetro da sua boca, e o sopro dos seus lbios, e tambm prov Cristo destas

    mesmas armas, a fim de que ele aniquile seus inimigos. Esta uma notvel recomendao da verdadeira e

    s doutrina que ela seja apresentada como suficiente para pr um fim a toda a impiedade; e como

    destinada a ser, invariavelmente, vitoriosa em oposio a todas as maquinaes de Satans; como tambm

    quando, pouco depois, a sua proclamao expressa como a vinda de Cristo a ns.

    Quando Paulo acrescenta: esplendor da sua vinda, ele sugere que a luz da presena de Cristo ser tal que

    tragar as trevas do Anticristo. Ao mesmo tempo, ele sugere indiretamente que o Anticristo ter

    permisso para reinar por um tempo, quando Cristo, de certa forma, se tem retirado, como geralmente

    acontece quando, ao se apresentar, voltamos nossas costas para ele. E, sem sombra de dvida, este um

    triste afastamento de Cristo quando ele retira sua luz dos homens, a qual foi imprpria e indignamente

  • recebida, de acordo com o que se segue. Ao mesmo tempo, Paulo ensina que, apenas pela sua presena,

    todos os eleitos de Deus estaro abundantemente seguros, em oposio a todas as sutilezas de Satans.

    "A esse cuja vinda segundo a eficcia de Satans, com todo o poder, e sinais e prodgios

    de mentira," (2 Tessalonicenses 2:9)

    Cuja vinda. Ele confirma o que disse atravs de um argumento a partir de opostos. Pois, como o Anticristo

    no pode permanecer de outro nodo seno atravs dos embustes de Satans, ele deve necessariamente

    desaparecer to logo Cristo resplandea. Por fim, como apenas nas trevas que ele reina, a aurora do dia

    pe em fuga e extingue as densas trevas do seu reinado. Agora estamos de posse do propsito de Paulo,

    pois ele queria dizer que Cristo no teria dificuldade em destruir a tirania do Anticristo, o qual no era

    apoiado por outros recursos seno os de Satans. Ao mesmo tempo, porm, ele indica as marcas pelas

    quais aquele mpio pode ser distinguido. Pois, aps ter falado acerca da operao ou eficcia de Satans,

    ele a assinala particularmente, quando diz: com sinais e prodgios de mentira, e com todo o engano. E,

    certa- mente, para que possa ser oposto ao reino de Cristo, isto deve consistir, parcialmente, de falsa

    doutrina e erros, e parcialmente de pretensos milagres. Pois o reino de Cristo consiste da doutrina da

    verdade, e do poder do Esprito. Concordemente, Satans, tendo em vista se opor a Cristo na pessoa do seu

    Vigrio, veste a mscara de Cristo, enquanto, ao mesmo tempo, escolhe uma armadura com que possa se

    opor diretamente a Cristo. Cristo, pela doutrina do seu evangelho, ilumina nossas mentes na vida eterna; o

    Anticristo, treinado sob a instruo de Satans, por meio de perversa doutrina, envolve os mpios em runa;

    Cristo apresenta o poder do seu Esprito para salvao, e sela o seu evangelho por meio de milagres; o

    adversrio, pela eficcia de Satans, nos aliena do Esprito Santo, e pelos seus encantamentos confirma os

    homens miserveis no erro.

    Ele d o nome de prodgios de mentira, no apenas queles que so falsa e enganosamente concebidos

    por homens astutos, com vistas a se impor sobre os simples um tipo de engano com que abunda todo o

    Papado, pois eles fazem parte do seu poder, do qual anteriormente tratou; mas toma a mentira como

    consistindo disto que Satans leva a um fim contrrio obras que de outro modo so realmente obras de

    Deus, e abusa dos milagres para obscurecer a glria de Deus. Ao mesmo tempo, porm, no pode haver

    dvida de que ele engana atravs de encantamentos dos quais temos um exemplo nos magos do Fara

    (Ex 7:11).

    "E com todo o engano da injustia para os que perecem, porque no receberam o amor da

    verdade para se salvarem." (2 Tessalonicenses 2:10)

    Para os que perecem. Ele limita o poder de Satans, como no sendo capaz de prejudicar os eleitos de

    Deus assim como Cristo tambm os isenta deste perigo (Mt 24:24). A partir disto se mostra que o

    Anticristo no tem um poder to grande, seno pela sua permisso. Ora, esta consolao era necessria.

    Pois todos os que so piedosos, se no fosse por isto, necessariamente seriam dominados pelo temor, se

    vissem um abismo escancarado permeando todo o caminho pelo qual devem passar. Por isso Paulo, por

    mais que deseje que eles estejam em um estado de ansiedade, a fim de que estejam de guarda para que

    no voltem atrs devido a uma negligncia excessiva sim, at mesmo se lancem em runa; no obstante,

    os manda nutrir boa esperana, porquanto o poder de Satans est restringido, a fim de que ele no

    envolva em runa ningum seno dos mpios.

  • Porque no receberam o amor. Para que os mpios no se queixem de que perecem inocentemente, e de

    que foram destinados morte mais por crueldade da parte de Deus, do que por qualquer erro da parte

    deles, Paulo explica com que bons motivos vir sobre eles to severa vingana da parte de Deus porque

    no receberam na moderao de esprito que deveriam a verdade que lhes fora apresentada; mais ainda,

    rejeitaram a salvao por sua prpria vontade. E a partir disto se mostra mais claramente o que j tenho

    explicado que o evangelho precisava ser pregado ao mundo antes que Deus desse a Satans tanta

    permisso; pois ele nunca teria permitido que seu templo fosse to abjetamente profanado, se no tivesse

    sido provocado pela extrema ingratido por parte dos homens. Em suma, Paulo declara que o Anticristo

    ser o ministro da justa vingana de Deus contra aqueles que, sendo chamados salvao, rejeitaram o

    evangelho, e preferiram aplicar sua mente impiedade e ao engano. Por isso, agora no h razo para os

    papistas objetarem que est em desacordo com a clemncia de Cristo deixar cair a sua Igreja desta

    maneira. Pois, embora o domnio do Anticristo tenha sido cruel, ningum pereceu, seno aqueles que

    foram merecedores disto; mais ainda, por sua prpria vontade escolheram a morte (Pv 8:36). E, sem

    sombra de dvida, ainda que a voz do Filho de Deus tenha soado por toda a parte, ela acha os ouvidos dos

    homens moucos sim, obstinados; e, embora uma confisso do Cristianismo seja comum, existem, no

    obstante, poucos que verdadeiramente e de corao tm se entregado a Cristo. Por isso, no de se

    surpreender, se semelhante vingana rapidamente suceder a um desprezo to criminoso.

    Questiona-se se o castigo da cegueira no cai seno sobre aqueles que, deliberadamente, se rebelaram

    contra o evangelho. Eu respondo que este juzo especial pelo qual Deus tem vingado uma clara obstinao

    no o impede de abater com estupidez, tantas vezes quanto lhe parea bom, aqueles que nunca ouviram

    uma nica palavra a respeito de Cristo; pois Paulo no discursa de um modo geral quanto s razes pelas

    quais Deus permitiu desde o princpio que Satans siga vontade com as suas mentiras, e sim quanto a que

    vingana horrvel paira sobre os desprezadores grosseiros da nova e, anteriormente, incomum graa.

    Ele usa a expresso: recebendo o amor da verdade, no sentido de aplicar a mente ao seu amor. Por onde

    aprendemos que a f sempre est associada a uma doce e voluntria reverncia a Deus porque no

    cremos, devidamente, na palavra de Deus, a menos que ela seja amvel e agradvel a ns.

    "E por isso Deus lhes enviar a operao do erro, para que creiam a mentira;"

    (2 Tessalonicenses 2:11)

    A operao do erro. Ele quer dizer que o engano no apenas ter um lugar, mas os mpios sero cegados,

    de modo que se precipitaro runa sem considerao. Pois, assim como Deus nos ilumina interiormente

    pelo seu Esprito, para que a sua doutrina seja eficaz em ns, e abre os nossos olhos e coraes, para que

    ela faa o seu caminho, do mesmo modo, por um justo juzo, ele entrega a uma mente rproba (Rm 1:28)

    aqueles que destinou destruio, para que, com olhos fechados e uma mente insensata, eles possam,

    como se estivessem enfeitiados, se entregar a Satans e seus ministros para serem enganados. E,

    certamente, temos uma amostra notvel disto no Papado. Nenhuma palavra pode expressar que antro

    monstruoso de erros existe ali, que absurdo grosseiro e vergonhoso de supersties existe ali, e que iluses

    em desacordo com o senso comum. Ningum que possua at mesmo um senso moderado da s doutrina

    pode pensar em coisas to monstruosas sem o maior terror. Ento, como o mundo todo poderia se perder

    de espanto com eles, se no fosse porque os homens tm sido feridos de cegueira pelo Senhor, e converti-

    dos, por assim dizer, em tocos de madeira?

  • "Para que sejam julgados todos os que no creram a verdade, antes tiveram prazer na

    iniquidade." (2 Tessalonicenses 2:12)

    Para que sejam julgados todos. Ou seja, para que recebam o castigo devi- do sua impiedade. Assim,

    aqueles que perecem no tm nenhum motivo justo para discutir com Deus, porquanto alcanaram o que

    buscavam. Pois devemos ter em vista o que dito em Dt 13:3, que os coraes dos homens so sujeitos

    prova, quando surgem falsas doutrinas, porquanto elas no tm poder, exceto entre aqueles que no

    amam a Deus com um corao sincero. Ento, que aqueles que tm prazer na injustia colham o seu fruto.

    Quando ele diz todos, significa que o desprezo a Deus no acha escusa no grande nmero e multido

    daqueles que se recusam obedecer ao Evangelho; pois Deus o Juiz do mundo todo, de modo que infligir

    castigo a cem mil no menos do que a um nico indivduo.

    O particpio (tm prazer) significa, por assim dizer, uma inclinao voluntria para o mal,

    pois deste modo removida toda a desculpa dos ingratos, quando tm tanto prazer na injustia que

    preferem-na justia de Deus. Pois, atravs de que violncia diro ter sido impelidos a se alienarem por

    uma louca rebelio contra Deus, em direo a quem eles eram conduzidos pela orientao da natureza? Ao

    menos fica manifesto que eles, voluntria e conscientemente, deram ouvidos a mentiras.

    "Mas devemos sempre dar graas a Deus por vs, irmos amados do Senhor, por vos ter

    Deus elegido desde o princpio para a salvao, em santificao do Esprito, e f da

    verdade; " (2 Tessalonicenses 2:13)

    Mas devemos dar graas. Agora ele separa mais abertamente os tessalonicenses dos rprobos, a fim de

    que a f deles no vacilasse pelo temor da rebelio que deveria acontecer. Ao mesmo tempo, ele tinha em

    vista considerar no apenas o bem-estar deles, mas tambm o da posteridade. E ele no apenas os

    confirma para que no caiam no mesmo precipcio com o mundo, mas atravs desta comparao, exalta

    ainda mais a graa de Deus para com eles, pelo fato de que, embora vejam praticamente todo o mundo

    compelido ao mesmo tempo para a morte, como que por uma violenta tempestade; eles so, pela mo de

    Deus, mantidos em uma condio de vida tranquila e segura. Assim, devemos contemplar os juzos de

    Deus sobre os rprobos de tal modo que possam ser para ns como que espelhos, para considerarmos a

    sua misericrdia para conosco. Pois devemos deduzir esta concluso de que exclusivamente devido

    graa singular de Deus que no perecemos miseravelmente com eles.

    Ele os chama de amados do Senhor por esta razo para que melhor considerem que a nica razo pela

    qual esto isentos da runa quase que universal do mundo porque Deus exerceu para com eles amor

    imerecido. Assim Moiss admoestou os judeus: Deus no vos exaltou to magnificamente porque fosseis

    mais fortes do que outros, ou fosseis numerosos, mas porque amou a vossos pais (Dt 7:7-8).

    Pois, quando ouvimos o termo amor, aquela declarao de Joo deve imediatamente ocorrer nossa

    mente no que o amamos primeiro (1 Jo 4:19). Em suma, aqui Paulo faz duas coisas; pois ele confirma a

    f, para que os que so piedosos no se deixem vencer pelo temor, e os exorta gratido, para que

    valorizem tanto mais a misericrdia de Deus para com eles.

    Por vos ter elegido. Ele declara a razo pela qual nem todos so envolvidos e tragados na mesma runa

    porque Satans no tem poder algum sobre aqueles que Deus escolheu, de modo a impedi-los de serem

    salvos, ainda que o cu e a terra sejam confundidos. Esta passagem lida de diversas maneiras.

  • O intrprete antigo traduziu-a como primeiros frutos, como estando no grego ; mas como quase

    todos os manuscritos gregos trazem , segui de preferncia esta leitura. Se algum preferir

    primeiros frutos, o sentido ser de que os fiis foram, por assim dizer, postos de lado para uma oferta

    sagrada por uma metfora tirada do costume antigo da lei. Contudo, mantenhamos o que mais

    geralmente recebido que ele afirma que os tessalonicenses foram escolhidos desde o princpio.

    Alguns entendem que o sentido de que eles foram chamados entre os primeiros; mas isto estranho ao

    sentido de Paulo, e no est de acordo com o contexto da passagem. Pois ele no isenta do temor apenas

    alguns indivduos, que haviam sido levados a Cristo logo no princpio do evangelho, mas esta consolao

    pertence a todos os eleitos de Deus, sem exceo. Portanto, quando diz: desde o princpio, ele quer dizer

    que no h perigo de que a salvao deles, que est fundamentada na eleio eterna de Deus, seja

    subvertida, sejam quais forem as mudanas tumultuosas que possam ocorrer. Por mais que Satans

    possa misturar e confundir todas as coisas no mundo, vossa salvao, apesar disso, foi colocada em uma

    posio de segurana, antes da criao do mundo. Portanto, aqui est o verdadeiro porto de segurana

    que Deus, que nos escolheu desde a antiguidade, nos livrar de todos os males que nos ameaam. Pois

    somos eleitos para a salvao; portanto, estaremos seguros da destruio. Mas, como no cabe a ns

    penetrar no conselho secreto de Deus, para encontrar a a certeza da nossa salvao, ele especifica sinais e

    indcios de eleio, que deveriam nos bastar para a certeza acerca dela.

    Em santificao do esprito, diz ele, e f da verdade. Isto pode ser explicado de duas maneiras com

    santificao, ou por santificao. No de muita importncia qual dos dois escolheis, pois certo que

    Paulo pretendia simplesmente apresentar, em conexo com a eleio, aqueles sinais mais imediatos que

    manifestam a ns o que em sua prpria natureza incompreensvel, e esto associados a ela por um elo

    indissolvel. Por isso, a fim de que saibamos que somos eleitos por Deus, no h razo para inquirirmos

    quanto ao que ele decretou antes da criao do mundo; mas encontramos em ns mesmos uma prova

    satisfatria de que ele nos tem santificado pelo seu Esprito se ele nos tem iluminado na f do seu

    evangelho. Pois o evangelho para ns uma evidncia da nossa adoo; e o Esprito o sela; e aqueles que

    so guiados pelo Esprito estes so filhos de Deus (Rm 8:14); e aquele que pela f possui a Cristo tem a vida

    eterna (1 Jo 5:12). Estas coisas devem ser atentamente observadas para que, desprezando a revelao da

    vontade de Deus, com a qual ele nos manda permanecermos santificados, no mergulhemos em um

    labirinto profundo por um desejo de extra-la a partir do seu conselho secreto, de cuja investigao ele nos

    afasta. Por isso, convm que fiquemos satisfeitos com a f do evangelho, e com aquela graa do Esprito

    pela qual temos sido regenerados. E, deste modo, refutada a impiedade daqueles que fazem da eleio

    de Deus um pretexto para todo o tipo de iniquidade ao passo que Paulo a relaciona com a f e a

    regenerao de tal modo que ele no queria que a julgssemos sobre qualquer outro fundamento.

    "Para o que pelo nosso evangelho vos chamou, para alcanardes a glria de nosso Senhor

    Jesus Cristo." (2 Tessalonicenses 2:14)

    Para o que nos chamou. Ele repete a mesma coisa, embora em termos um tanto diferentes. Pois os filhos

    de Deus no so chamados crena da verdade de outro modo. Contudo, Paulo pretendia mostrar aqui

    quo competente testemunha ele para confirmar aquilo de que era ministro. Concordemente, ele se

    apresenta como uma garantia, a fim de que os tessalonicenses no duvidem de que o Evangelho, no qual

    haviam sido instrudos por ele, a reconfortante voz de Deus, pela qual so despertados da morte, e

    salvos da tirania de Satans. Ele o chama de seu evangelho, no como se tivesse se originado com ele, e

    sim porque a pregao dele lhe havia sido confiada.

  • O que ele acrescenta, para a aquisio ou possesso da glria de Cristo, pode ser entendido quer em um

    sentido ativo ou passivo ou como significando que eles so chamados para que um dia possuam uma

    glria em comum com Cristo, ou que Cristo os adquiriu tendo em vista a sua glria. E assim ser um

    segundo meio de confirmao o fato de que ele os defender, como sendo nada menos do que sua prpria

    herana; e, ao manter a salvao deles, se apresentar em defesa da sua prpria glria; este ltimo

    sentido, em minha opinio, est mais de acordo.

    "Ento, irmos, estai firmes e retende as tradies que vos foram ensinadas, seja por

    palavra, seja por epstola nossa." (2 Tessalonicenses 2:15)

    Retende as tradies. Alguns restringem isto a preceitos de conduta exterior; mas isto no me contenta,

    pois ele aponta para o modo de permanecer firme. Ora, estar equipado com fora invencvel muito mais

    do que disciplina exterior. Por isso, em minha opinio, ele inclui toda a doutrina sob este termo, como se

    tivesse dito que eles tm um fundamento sobre o qual podem permanecer firme, desde que perseverem

    na s doutrina conforme o que haviam sido instrudos por ele. No nego que o termo seja

    adequadamente aplicado s ordenanas que so estabelecidas pelas igrejas, com vistas promoo da paz

    e manuteno da ordem; e admito que empregada neste sentido quando se tratam de tradies

    humanas (Mt 15:6). Contudo, Paulo ser encontrado no prximo captulo fazendo uso do termo tradio,

    no sentido da regra que havia formulado, e a prpria significao do termo genrica. O contexto, porm,

    conforme eu disse, exige que ela seja entendida aqui no sentido da totalidade daquela doutrina na qual

    eles haviam sido instrudos. Pois o assunto tratado o mais importante de todos que a f deles

    permanecesse segura em meio a uma terrvel agitao da Igreja.

    Os papistas, porm, fazem papel de loucos ao deduzir a partir disto que suas tradies deveriam ser

    observadas. Na verdade, eles raciocinam da seguinte maneira que, se era permissvel para Paulo

    prescrever tradies, tambm era permissvel para outros mestres; e que, se era algo piedoso observar as

    primeiras, as ltimas tambm no deveriam ser menos observadas. Contudo, concedendo-lhes que Paulo

    fala de preceitos pertencentes ao governo exterior da Igreja, digo que, no obstante, eles no foram

    inventados por ele, mas comunicados divinamente. Pois ele declara em outro lugar (1 Co 7:35) que no era

    sua inteno prender as conscincias, pois isto no era lcito, nem para si, nem para todos os apstolos

    juntos. Eles fazem um papel ainda mais ridculo, ao fazer do seu objetivo passar, sob isto, o escoadouro

    abominvel de suas prprias supersties, como se fossem as tradies de Paulo. Mas, adeus para essas

    ninharias, quando estamos na posse do verdadeiro sentido de Paulo. E podemos julgar, em parte atravs

    desta Epstola, que tradies ele recomenda aqui, pois diz: quer por palavra, ou seja, discurso, ou por

    epstola. Ora, o que estas Epstolas contm seno a pura doutrina, que subverte o prprio fundamento de

    todo o Papado, e toda a inveno que esteja em desacordo com a simplicidade do Evangelho?