cadernos adenauer - eficiencia energetica

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  • Eficincia EnErgtica

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  • Eficincia EnErgtica

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  • editor responsvel Felix Dane

    conselho editorialEstevo de Rezende MartinsFtima Anastasia Humberto DantasJos lvaro MoissJos Mario Brasiliense CarneiroLcia AvelarSilvana Krause

    coordenao editorialReinaldo J. Themoteo

    revisoReinaldo J. Themoteo

    capa, projeto grfico e diagramaoCacau Mendes

    impressoOficina de Livros

    issn 1519-0951Cadernos Adenauer xv (2014), n3

    Eficincia energticaRio de Janeiro: Fundao Konrad Adenauer, janeiro 2015.

    isbn 978-85-7504-190-1

    As opinies externadas nesta publicao so de exclusiva responsabilidade de seus autores.

    Todos os direitos desta edio reservados

    fundao konrad adenauerRepresentao no Brasil: Rua Guilhermina Guinle, 163 BotafogoRio de Janeiro rj 22270-060Tel.: 0055-21-2220-5441 Telefax: 0055-21-2220-5448 [email protected] www.kas.de/brasilImpresso no Brasil

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  • Sumrio

    7 Apresentao

    matrizES EnErgticaS

    11 Energia renovvel com baixa emisso de carbonoJos Eustquio Diniz AlvEs

    29 Expanso da Matriz Hidreltrica no Brasil: um desafio de GovernanaAlExAnDrE Do nAsciMEnto souzA PEDro roBErto JAcoBi

    45 Energia nuclear no BrasilJoAquiM FrAncisco DE cArvAlHo

    57 o Desenvolvimento da indstria de Energia Elica no Brasil: aspectos de insero, consolidao e sustentabilidadeElBiA silvA GAnnouM

    73 Energia solar no Brasil: se no for agora, quando ser?Eloy F. cAsAGrAnDE Junior

    95 Eletricidade solar no Brasil ricArDo rtHEr

    107 Eficincia EnergticaGilBErto M. JAnnuzzi

    poltica EnErgtica

    121 A Poltica Energtica do BrasilAltino vEnturA FilHo

    145 Planejamento para as demandas futuras de energia no BrasilMAuricio t. tolMAsquiM AMilcAr G. GuErrEiro

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  • 7apresentao

    Aumentar a gerao de energia eltrica de modo a suprir a crescente demanda, assim como diversificar as matrizes energticas: estes so alguns dos principais problemas que o Brasil enfrenta, no setor energtico. Seja na compatibilizao en-tre oferta e demanda de energia, na reduo de impactos ambientais entre outras possibilidades, a eficincia energtica recurso da maior importncia. Por isso esta edio da srie Cadernos Adenauer dedicada ao tema eficincia energtica, com o objetivo de discutir sobre matrizes energticas, poltica energtica e os desafios inerentes, entre outras questes que encontram-se presentes nos artigos que compem esta publicao. Os captulos foram organizados em duas sees: a primeira parte tem sete captulos sobre as matrizes energticas brasileiras. Na segunda parte dois captulos abordam a poltica energtica do Brasil.

    No primeiro captulo Jos Eustquio Diniz Alves discute sobre a necessidade de se adotar fontes de energias renovveis e reduzir o uso de combustveis fsseis. So analisados diversos fatores que mostram o quo urgente empreender esfor-os em prol da reduo e gradual substituio do uso de combustveis fsseis na gerao de energia a partir de fontes renovveis, de baixa emisso de carbono.

    Alexandre do Nascimento Souza e Pedro Roberto Jacobi analisam a expan-so da matriz hidreltrica no contexto do planejamento do setor eltrico at o ano de 2030. Este captulo tambm apresenta os potenciais conflitos que podem surgir em funo da construo de hidreltricas na regio amaznica. Alm dos conflitos, so apresentados os avanos no tratamento dado s questes ambientais que surgem por ocasio da construo das hidreltricas. As prticas de governana so apresentadas como meio que pode contribuir para a gerao de energia neces-sria ao atendimento s demandas, sem negligenciar as questes socioambientais.

    Joaquim Francisco de Carvalho traz um panorama sobre a energia nuclear no Brasil. Apresentando um histrico sobre a energia nuclear no Brasil, o au-tor discorre sobre o desenvolvimento da tecnologia nuclear no Brasil e o papel desempenhado pela Agncia Internacional de Energia Nuclear neste processo. Neste captulo tambm mostrada a possibilidade de assegurar a energia que atenda demanda nacional recorrendo exclusivamente a fontes renovveis.

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    Energia elica o tema do captulo da autoria de Elbia Silva Gannoum. A autora apresenta um histrico da indstria de energia elica do Brasil, do PROINFA competitividade, analisando os diversos elementos que possibilitam compreender esta trajetria, bem como a conjuntura atual da matriz elica brasi-leira e os desafios que devem ser enfrentados na sua expanso.

    Eloy F. Casagrande Jr apresenta a energia solar como matriz energtica de imenso potencial, que precisa ser melhor aproveitada. So apresentados dados sobre a irradiao solar no Brasil, os tipos e sistemas fotovoltaicos e dois projetos bem-sucedidos na rea: um deles a Casa Eficiente, projeto desenvolvido em Florianpolis, fruto de uma parceria entre Eletrosul, EletroBras/PROCEL e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); o outro o Escritrio Verde, da Universidade Tecnolgica Federal do Paran (UFTPR).

    Ricardo Rther apresenta as diversas aplicaes dos sistemas fotovoltaicos mostrando os tipos de instalao, projetos de aplicao e tambm traz informa-es e indica fontes de pesquisa sobre instalao de painis solares. Por ltimo so analisados projetos de usinas fotovoltaicas no Brasil.

    Gilberto M. Jannuzzi enfoca em seu artigo o conceito de eficincia energ-tica, explicando em que consiste, apresentando as categorias de eficincia energ-tica, seu potencial e diversos aspectos acerca de como a eficincia energtica pode contribuir para o Brasil, no atendimento s demandas de energia.

    Altino Ventura Filho apresenta as diretrizes do Ministrio de Minas e Energia, no mbito da expanso do Sistema Energtico Nacional. O autor anali-sa diversos dados, entre eles os comparativos entre as matrizes de oferta de energia e de energia eltrica do Brasil e do mundo, bem como a evoluo do contexto energtico no Brasil e no mundo ente 1980 e 2013. Neste captulo tambm so apresentadas perspectivas de evoluo do sistema energtico, englobando as di-versas matrizes energticas, tanto em relao ao Plano Decenal 2013/2023 quanto numa perspectiva mais ampla.

    Mauricio T. Tolmasquim e Amilcar G. Guerreiro analisam diversos tpicos fundamentais do planejamento energtico brasileiro, lanando mo de conceitos como eficincia energtica e expanso da oferta de energia, investigando as diver-sas matrizes energticas.

    Desejamos a todas e todos uma boa leitura, com a expectativa de poder con-tribuir nas discusses sobre o tema.

    Reinaldo J. ThemoteoCoordenador Editorial da Fundao Konrad Adenauer no Brasil

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  • matrizES EnErgticaS

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  • 1 1

    Energia renovvel com baixa emisso de carbono

    Jos Eustquio Diniz AlvEs

    1. introDuo

    Assim como a Idade da Pedra no acabou por falta de pedras, a Era do Petrleo chegar ao fim, no por falta de leo.(Sheikh Ahmed-Zaki Yamani, 2000)

    A energia extrassomtica a chave para se entender a histria dos ltimos 240 anos. O ano de 1776 data da Independncia dos Estados Unidos da Amrica e do lanamento do livro A Riqueza das Naes de Adam Smith marca tam-bm o incio da entrada em operao da mquina a vapor, aperfeioada por James Watt. O carvo mineral (hulha, linhito e antracito) foi o insumo energtico da mquina que impulsionou a 1 Revoluo Industrial. O petrleo, que comeou a ser explorado comercialmente por Edwin L. Drake, em 1859, na Pensilvnia, foi a energia que movimentou o motor a combusto interna, insumo essencial da 2 Revoluo Industrial. Assim, a oferta e a demanda de carvo, petrleo e gs, que adquiriu propores gigantescas no sculo XX, afetaram no s a arquitetura social, mas at mesmo o mundo natural, modificando a qumica da atmosfera.

    O desenvolvimento da sociedade urbana-industrial coincidiu com o perodo de maior prosperidade da histria humana. Entre o ano 1 da Era Crist e o ano de 1776 a economia mundial cresceu 5,5 vezes, porm o crescimento entre 1776 e 2014 foi de 120 vezes, segundo dados de Angus Maddison (2009) e do Fundo Monetrio Internacional (FMI, 2014). Em quase 18 sculos, o crescimento da renda per capita foi de apenas 1,27 vez (27%). Em 238 anos (1776-2014) o aumen-to da renda per capita foi superior a 13 vezes. Um cidado mdio da atualidade recebe em um ms o que um indivduo mdio, antes da Revoluo Industrial, levava mais de um ano para receber.

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    O uso generalizado dos combustveis fsseis (carvo mineral, petrleo e gs) foi fundamental para o desenvolvimento econmico e social da humanidade. Segundo Abramovay (2011); A eficincia energtica do petrleo , at hoje, ini-gualvel: trs colheres contm o equivalente energia mdia de oito horas de trabalho humano. O crescimento demogrfico e econmico do sculo 20 teria sido impossvel sem esse escravo barato (p. 1).

    Todavia, a queima dos combustveis fsseis provoca a emisso de CO2, o que contribui para o efeito estufa e a acelerao do aquecimento global. Segundo a Agncia de Pesquisa Ocenica e Atmosfrica dos Estados Unidos (NOAA), orgo da Agncia Espacial norte-americana (NASA), a mdia conjunta da tem-peratura do solo e da superfcie do oceano ao redor do globo em outubro de 2014 ficou cerca de 0,74 Centgrafos acima da mdia do sculo XX (NOAA, 2014). Foi o ms de outubro mais quente desde o incio da manuteno de registros regulares que comearam em 1880, e significa que a temperatura atual uma das mais altas do Holoceno (ltimos 12 mil anos), podendo gerar mudanas climti-cas imprevisveis.

    As mudanas climticas podem ser catastrficas, o que torna urgente a redu-o das emisses de gases de efeito estufa (GEE). Se todas as reservas de petrleo forem extradas (mesmo que a elevados custos de produo) a temperatura global mdia do Planeta chegar a um patamar em que consequncias podero ser mais caras do que os benefcios gerados pela energia fssil.

    Desta forma, o abandono do predomnio dos combustveis fsseis na matriz energtica mundial uma ao necessria e inadivel. Desta forma, o mundo necessita avanar na produo de energias renovveis, mais limpas e com baixa emisso de carbono. Caso contrrio, a sociedade urbana-industrial pode entrar em colapso.

    2. rEDuzir A PEGADA EcolGicA E MitiGAr As EMissEs

    O avano da civilizao foi excepcional nos ltimos 240 anos. Mas a humani-dade passou a consumir mais recursos naturais do que a capacidade regenerativa do Planeta. A Footprint Network (2014) utiliza duas medidas para se avaliar o impacto humano sobre o meio ambiente e a disponibilidade de capital natural do mundo. A Pegada Ecolgica um indicador que serve para avaliar o impacto do ser humano sobre a biosfera e a Biocapacidade um indicador que avalia o montante de terra e gua, biologicamente produtivo, para prover bens e servios

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    do ecosistema demanda humana por consumo, sendo equivalente capacidade regenerativa da natureza.

    A pegada ecolgica per capita do mundo, em 1961, era de 2,4 hectares glo-bais (gha) e a biocapacidade per capita era de 3,7 gha. Para uma populao de 3,1 bilhes de habitantes, o impacto global do ser humano era de 7,2 bilhes de gha, representando 63% dos 11,5 bilhes de hectares globais disponveis naquele momento. Portanto, havia um supervit ou reserva ecolgica no utilizada no mundo.

    A reserva ecolgica foi sendo reduzida na medida em que cresciam a popula-o e a economia. Em 1975, a pegada ecolgica per capita ficou em 2,8 gha para uma biocapacidade de 2,9 gha. Como a populao mundial chegou a 4,1 bilhes de habitantes, o impacto antrpico ficou em 11,2 gha para uma biocapacidade total de 11,6, representando um pequeno supervit ambiental de 3,3%. Mas na se-gunda metade da dcada de 1970 toda a reserva ambiental j havia sido consumi-da e o supervit ecolgico se transformou em dficit. Em 1980, a pegada ecolgica per capita se manteve nos mesmos 2,8 gha, mas houve reduo da biocapacidade para 2,6 gha. Para um populao de 4,4 bilhes de habitantes, o impacto global do ser humano foi de 12,3 bilhes de gha, atingindo 105,8% dos 11,5 bilhes de hectares globais da biocapacidade, indicando o incio do dficit ecolgico global.

    Em 2010, a pegada ecolgica per capita foi de 2,6 gha. Mas com o acelerado crescimento da populao mundial que chegou a 6,95 bilhes de habitantes, o impacto global atingiu 18,1 bilhes de hectares globais (gha). Mas como a bioca-pacidade per capita caiu para 1,7 gha, o mundo possuia apenas 12 bilhes de hec-tares globais de terras e guas bioprodutivas. isto significou um dficit ecolgico global de 50% em 2010. Ou dito de outra forma, a humanidade estava gastando em 1 ano o que a capacidade regenerativa da natureza s repunha em um ano e meio. Evidentemente, esta sobrecarga insustentvel, pois o dficit ambiental s aumenta.

    A humanidade s tem conseguido manter funcionando seu modelo de pro-duo e consumo devido: 1) ao sobreuso das riquezas naturais, como a biodiversi-dade das florestas, as fontes de gua limpa, os estoques de peixes, etc. 2) ao uso da herana acumulada no passado e que estava estocada nas reservas de combustveis fsseis criadas a milhes de anos pela decomposio de material orgnico.

    Segundo Tverberg (2012) a disponibilidade de energia por habitante aumen-tou pouco mais de 4 vezes entre 1820 e 2010. Somente nas ltimas dcadas, o consumo total de energia no mundo passou de cerca de 4 bilhes de toneladas de leo equivalente, em 1965, para pouco mais de 12 bilhes em 2013, um cresci-

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    mento de 3 vezes, enquanto a populao mundial dobrou de tamanho no mesmo perodo. A energia fssil (petrleo, carvo e gs) responde por mais de 80% do consumo mundial. Cresceu a disponibilidade de energia extrassomtica per ca-pita, o que possibilitou o aumento da renda per capita e uma elevao do padro mdio de vida humana.

    Porm, o uso e o abuso de toda esta herana energtica fssil deixou um rastro de poluio na terra, na gua e no ar. A queima dos hidrocarbonetos emite gases de efeito estufa (GEE), como o CO2, que provocam o aquecimento global. Em 2014, a concentrao GEE ultrapassou 400 partes por milho (ppm), o nvel mais elevado dos ltimos 800 mil anos (IPCC, 2014). Em consequncia, a tem-peratura mdia na superfcie da Terra e dos oceanos aumentou 0,85C entre 1880 e 2012. Os degelos elevaram o nvel do mar em 20 cm, desde 1900. Os cenrios para as mudanas climticas no sculo XXI so dramticos se as emisses de GEE continuarem no ritmo atual.

    O secretrio-geral da ONU, Ban Ki-moon e o diretor do Painel Intergovernamental sobre Mudanas Climticas (IPCC, na sigla em ingls) da ONU, Rajendra Pachauri, apresentaram, em 01/11/2014, o mais recente relat-rio sobre mudana climtica, alertando que os danos causados por este processo podero ser irreversveis, embora ainda haja formas de evit-los. Eles reafirmam, com base em evidncias empricas, que a influncia humana no sistema climtico clara e quanto maiores forem os impactos antrpicos, maiores sero os riscos de consequncias graves, amplas e irreversveis. Nenhuma parte do mundo ficar in-tocada. O relatrio do IPCC (2014) afirma que a mudana climtica j aumentou o risco de ondas de calor severas e outros eventos extremos. O Brasil tem sofrido vrios desastres climticos nos ltimos anos e a crse hdrica apenas um exemplo. O relatrio tambm alerta que o pior est por vir, incluindo escassez de alimentos e conflitos sociais violentos.

    De acordo com os cenrios do IPCC (2014), a Terra caminha atualmente para um aumento de cerca de 4 C (quatro graus Celsius) at 2100 na compara-o com nvel da era pr-industrial, o que pode levar a uma alta de 55 cm do nvel do mar, somente no sculo XXI. Tudo isto, caso no evitado, provocar grandes secas, inundaes, acidificao dos oceanos e extino de muitas espcies, alm de fome, populaes deslocadas e conflitos inter e intra pases.

    Para o IPCC (2014), o uso de energias renovveis, o aumento da eficincia energtica e o estabelecimento de outras medidas destinadas a limitar as emisses custaria muito menos que enfrentar as consequncias do aquecimento global. Os custos para mudar a matriz energtica so mais baixos do que os gastos mundiais

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    com a conta a pagar decorrente dos desastres climticos. Adiar a resposta aumen-taria consideravelmente a fatura para as geraes futuras.

    Ainda segundo o IPCC (2014), para efetivar o objetivo de limitar a ele-vao da temperatura global mdia a 2C, at 2100, conforme o acordado na Conferncia de Copenhague em 2009, a quantidade de energia fssil a ser quei-mada pelas atividades antrpicas no pode ultrapassar o que corresponde emis-so de algo entre 900 e 1.000 gigatoneladas de Gases de Efeito Estufa entre 2010 e 2050. Portanto, a economia internacional precisa superar a era dos combustveis fsseis e avanar na produo de energia renovvel e de baixo carbono. Assim como a idade da pedra no acabou por falta de pedras, a Era do petrleo pode ser superada pela Era das energias renovveis, antes mesmo de se retirar as ltimas jazidas do subsolo.

    Desta forma, a civilizao urbano-industrial precisa reduzir a Pegada Ecol-gica e cortar as emisses de gases de efeito estufa. O grfico 1 mostra que a Pegada de Carbono responde por mais da metade da Pegada Ecolgica Global. Portanto, a superao da dependncia econmica aos combustveis fsseis ser fundamental para a reduo do dficit ambiental e para o controle do aqueci-mento global.

    GrFico 1. os componentes da Pegada Ecolgica

    Fonte: WWF Relatrio Planeta Vivo 2014, Sumrio pg. 10. http://www.wwf,org.br/natureza_brasileira/especiais/relatorio_planeta_vivo

    A mudana da matriz energtica requer o investimento na diversificao das fontes potenciais e passa necessariamente pela utilizao da energia natural prove-niente do sol e das correntes de ar. A mitologia grega j representava olo como o

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    deus dos ventos e Hlio como a representao do Sol. O Sol irradia durante 365 dias o equivalente a 10 mil vezes a energia consumida anualmente pela populao mundial. O potencial dos ventos tambm imenso. Estas duas fontes podem ser as grandes alternativas para consolidar as energias renovveis do planeta e mitigar o aquecimento global.

    EnErGiAs rEnovvEis E DE BAixo cArBono: solAr E ElicA

    O sol e o vento so fontes de produo energtica cada vez mais utilizadas, mas sofrem com a intermitncia na gerao e no fornecimento e no esto livres de problemas ambientais. Contudo, no h como fugir do desafio de substituir a queima dos combustveis fsseis por estas fontes renovveis, possibilitando a reduo da pegada ecolgica e a diminuio dos efeitos indesejveis das mudanas climticas.

    A Energia Solar Concentrada (Concentrated Solar Power CSP na sigla em ingls) utiliza espelhos para concentrar a luz do sol sobre encanamentos ou torres para produzir vapor em seu interior, que por sua vez movimenta turbinas que produzem eletricidade. Para manter a usina em funcionamento durante a noite ou em dias nublados, utiliza-se o calor excedente produzido durante o dia por meio do armazenado de um lquido especial em tanques apropriados. As usinas termossolares (CSP) podem ser construdas em reas desrticas, evitando a utilizao de reas produtivas urbanas ou rurais.

    Mas a forma de produo de eletricidade que mais cresce no mundo atual-mente a energia solar fotovoltaica (Photovoltaics PV). Como mostra o grfico 2, a capacidade global de produo de energia solar fotovoltaica aumentou mais de 200 vezes, de 1995 a 2013, passando de 0,6 gigawatts (GW) para mais de 120 GW, sendo um crescimento exponencial impressionante, segundo a Agncia Internacional de Energia (IEA, na sigla em ingls).

    Os cenrios at 2017 indicam uma continuidade do crescimento exponencial e variam segundo a estimativa que segue o crescimento normal dos ltimos anos ou a estimativa com apoio das polticas pblicas. No cenrio habitual (Business-as-usual) a capacidade instalada chegaria a 284 GW em 2017 (isto seria o equi-valente a energia produzida por 20 usinas de Itaipu). No cenrio com apoio do poder pblico (Policy-driven) a capacidade instalada poderia chegar a 419 GW (equivalente a 30 usinas de Itaipu).

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    GrFico 2. capacidade global de gerao de energia solar, 1995-2017

    Fonte: IEA. International Energy Outlook 2013.

    Segundo relatrio da Bloomberg New Energy Finance (BNEF) o preo de uma clula de energia fotovoltaica custava US$ 76,67 por watt em 1977 e caiu para US$ 0,74 por watt em 2013, devendo chegar a US$ 0,64 por watt em 2014. Com preo competitivo e abaixo do preo do carvo mineral, a perspectiva que o crescimento exponencial da energia solar continue ou at se acelere. A BNEF estima que a capacidade instalada de energia fotovoltaica em 2013 foi de 36,7 GW (o maior crescimento anual de todos os tempos), conforme citado por Alves (21/02/2014).

    A outra fonte de energia renovvel de grande crescimento se d pelo apro-veitamento do potencial da energia elica que ocorre pela converso da fora dos ventos em eletricidade, por meio da utilizao de aerogeradores de diversas capacidades de gerao de energia. Segundo dados da Agncia Internacional de Energia (IEA), a energia elica responde atualmente por 2,5% da participao na matriz eltrica mundial.

    Segundo o Conselho Global de Energia Elica (Global Wind Energy Council GWEC, 2014), a capacidade instalada de energia elica era de 6,1 Gigawatts (GW) em 1996 e atingiu pouco mais de 318 GW em 2013 (isto equiva-le a mais de 22 usinas de Itaipu). Um crescimento de quase 52 vezes em 15 anos,

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    conforme mostra o grfico 3. A melhoria recente em tecnologias de energia elica, bem como a mudana de contexto global, em busca de fontes mais limpas, expli-cam o cenrio mais positivo para o setor no longo prazo.

    Contudo, ocorreu uma queda de 10 GW nas instalaes de 2013 em compa-rao ao ano anterior, embora a capacidade global tenha crescido 12,5%. Segundo o GWEC, foram instalados 35,47 GW em 2013, abaixo dos 45,17 GW de 2012. O pior desempenho se deveu s incertezas polticas dos Estados Unidos, que tem dado mais incentivos ao gs de xisto e s areias betuminosas, do que a energia renovvel.

    GrFico 3. capacidade global instalada de energia elica: 1996-2013

    Fonte: Global Wind Energy Council GWEC, 2014

    A China instalou sozinha 16 GW em 2013 (mais do que uma usina de Belo Monte) e dever superar a Europa e os Estados Unidos na produo de energia elica, entre 2020 e 2025. O aproveitamento do potencial elico no mundo de-ver poupar emisses de gases efeito estufa de at 4,8 bilhes de toneladas por ano at 2050. Porm, diversos obstculos podem retardar esse processo, como a disputa poltica no Congresso americano um fator limitador.

    Outra vantagem das energias renovveis que a produo em pequena es-cala pode ser vivel para as famlias, comunidades e empresas, democratizando

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    a produo. Mas, para tanto, ser fundamental que os governos promovam ou facilitem a construo de redes inteligentes de energia (smart grids), que so uma nova arquitetura de distribuio de energia eltrica, mais segura e inteligente, que integra e possibilita aes a todos os usurios a ela conectados.

    Nestas redes, o fluxo de energia eltrica e de informaes se d de forma bidirecional. Assim, a energia tradicionalmente gerada, transmitida e distribuda de forma radial a partir de instalaes das concessionrias poder, tambm, ser gerada e integrada s redes eltricas a partir de unidades consumidoras. Cria-se, ento, a figura do prosumidor, aquele que produtor e consumidor, que pro-duz e que fornece energia rede.

    O crescimento da produo de energia elica e solar, mesmo no sendo uma panaceia para todos os desafios energticos, pode contribuir para mitigar as difi-culdades advindas de um possvel Pico de Hubbert e o agravamento do aqueci-mento global, podendo ser uma maneira de promover um outro tipo de modelo econmico, mais integrado ao meio ambiente, com menos emisso de CO2 e que respeite a biodiversidade. Neste ritmo, o mundo teria muita energia limpa at 2040 e o clima se beneficiaria drticamente pela reduo dos gases de efeito estufa provocados pela queima de combustveis fsseis.

    crEsciMEnto ExPonEnciAl E 100 % EnErGiAs rEnovvEis

    A participao da energia solar e elica na matriz energtica internacional, embora tenha crescido de maneira expressiva como vimos, ainda pequena. O cientista Ray Kurzweil (2011), entusiasta do potencial das energias renovveis, argumenta que o crescimento da energia solar tem se dado de forma exponen-cial, partindo de quase zero em 2000 para 16 gigawatts (GW) em 2008 e cerca de 100 GW em 2012. Extrapolando estas tendncias, Kurzweil considera que possvel manter a tendncia de dobrar a capacidade produtiva fotovoltaica a cada dois anos, o que significa multiplicar por mil vezes, em 20 anos. Em palestra na Universidade de Berkeley, Ray Kurzweil (que trabalha atualmente na Google) disse: Nesse ritmo vamos atender 100% das nossas necessidades de energia em 20 anos.

    Contudo, este otimismo de Kurzweil no compartilhado por outros espe-cialistas. Os dados da Agncia Internacional de Energia (IEA, 2014) confirmam que realmente a produo de energia fotovoltaica mundial cresceu de forma expo-nencial at 2013. Porm, as projees mostram que o ritmo vai se desacelerar nos prximos anos e deve chegar a 308 GW em 2018, o que um grande crescimento,

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    mas no deve manter o ritmo de dobrar a cada dois anos. Em termos absolutos a produo continua aumentando, mas em termos relativos o ritmo se reduz.

    Dados da Administrao de Informao de Energia dos Estados Unidos (EIA U.S. Energy Information Administration) em seu International Energy Outlook 2013 projeta que o consumo mundial do conjunto das energias renov-veis, em 2040, ser de 15% da matriz energtica, que, infelizmente, continuar sendo dominada pelos combustveis fsseis (EIA, 2013).

    Portanto, o otimismo de Kurzweil no compartilhado pelas agncias de energia. Segundo a IEA (2014), a capacidade de energia renovvel mundial de-ver passar de 1.465 GW (sendo 1.071 de hidreletricidade), em 2011, para 2.351 GW (sendo 1.330 de hidreletricidade) em 2018. Considerando apenas as energias elica, solar, geotrmica e ondas a produo deve passar de 319 GW em 2011 para 896 GW em 2018.

    Tem sido grande o crescimento das fontes renovveis, mas insuficiente para mudar significativamente a matriz energtica e para reduzir a emisso de gases de efeito estufa. Outra questo que a maior parte da produo de painis foto-voltaicos e de turbinas elicas tem se concentrado na China o que provoca uma dependncia dos demais pases do mundo ao lobby chins.

    Como visto, os combustveis fsseis so uma fonte de energia no renovvel e, necessariamente, vo se esgotar algum dia. Quanto mais cedo o mundo eli-minar a dependncia dos combustveis fsseis, melhor. Cresce a conscincia de que preciso construir uma sociedade livre do petrleo, carvo e gs. Para tanto, a alternativa ter 100% de energia renovvel e com baixa emisso de carbono, construda com o menor impacto ambiental possvel.

    O preo da energia elica e solar tem cado tanto que j atingiu a paridade com outras formas de energia fssil e brevemente poder ter vantagem significati-va. A perspectiva que o preo do petrleo suba nas prximas dcadas enquanto acontece o contrrio com o preo das renovveis. Com vantagem nos preos, cresce a possibilidade de o mundo ter 100% de energia renovvel no futuro, como mostrou Alves (26/03/2014).

    Pases como a Alemanha e a Dinamarca esto se movendo no sentido de obter 100% de energia renovvel e, at certo ponto, buscam fazer isto de forma descentralizada e fortalecendo o desenvolvimento local e o empoderamento das pessoas e das comunidades. Na Alemanha, a implantao de energias renovveis j resultou em mais de 380 mil postos de trabalho e isto tem ocorrido de forma descentralizada. Quanto maior a cadeia de criao de valor nos municpios, mais receitas fiscais so obtidas e menos custos para os consumidores.

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    Outro exemplo de produo de energia controlada pela comunidade vem da Dinamarca. A ilha de Samso iniciou os esforos para se tornar auto suficiente em termos energticos, em 1997, dependendo apenas das energias renovveis. Hoje est perto de o conseguir e os habitantes no s cobrem as suas prprias neces-sidades energticas como vendem energia rede pblica. Embora tenha havido alguma resistencia inicial por parte da populao, majoritariamente dedicada agricultura, hoje os habitantes de Samso so entusiastas da causa das energias renovveis, dispondo em nvel domstico de painis fotovoltaicos ou pequenos aerogeradores que no s suprem as suas necessidades como ainda lhes do lucro atravs da venda do excesso de energia produzido.

    Samso dispe de 11 cataventos que podem fornecer a energia elctrica neces-sria a toda a ilha, a par de quatro estaes de biomassa e 2500m2 de colectores solares que cobrem 70% dos gastos associados ao aquecimento. A estes h ainda que adicionar os aerogeradores situados 3,5 km da costa. A ilha de Samso conti-nua ligada rede eltrica da Dinamarca, mas a energia que chega ilha muito menor do que a energia que sai, sendo que o valor da exportao de energia su-perou o das batatas.

    Mesmo pases pequenos podem atingir 100% de renovveis, desde que haja vontade poltica e apoio internacional. A pequena Cabo Verde tem buscado apoio Europeu para atingir os 100% de utilizao de energias renovveis. Para tanto conta com o apoio da Unio Europeia via Comunidade Econmica dos Estados da frica Ocidental CEDEAO que considera a energia elica e solar uma grande prioridade. A ndia tem avanado com projetos de mini-redes de energia solar fotofoltaica, buscando incluir 300 milhes de pessoas que no tem acesso eletricidade.

    Para o caso latinoamericano, a Costa Rica um exemplo de pas que sempre teve uma tradio democrtica e que tem uma poltica de desenvolvimento sus-tentvel avanada, pois dissolveu o exrcito e no possui Foras Armadas (apenas uma guarda nacional de segurana) e j planejou ser o primeiro pas das Amricas Carbono-neutro at 2030.

    A produo em pequena escala e descentralizada deve ser combinada com a construo de redes inteligentes de energia (smart grids). Nestas redes, o fluxo de energia ocorre nos dois sentidos e o supervit de uma casa, por exemplo, pode ser vendido para outras casas ou estabecimentos, possibilitando o desenvolvimento do fenmeno do prosumidor, aquele que produtor e consumidor ao mesmo tempo.

    Mas o pas que tem mais investido nas energias renovveis e em redes in-teligentes a China. O Imprio do Meio j compreendeu que o mundo est

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    passando por um ponto de inflexo e que preciso superar a dependncia da queima de carbono e investir em um novo ciclo de desenvolvimento sustentvel alternativo para superar a era do petrleo, gs e do carvo. Compreendeu tambm que existem mais oportunidade do que constrangimentos neste novo ciclo de mudana de paradigma, pois se trata no somente de criao de empregos verdes e da sade ambiental, mas tambm, na lgica de um regime autoritrio, de uma questo de segurana energtica. Os planos do governo para a segunda dcada do sculo XXI so marcados pela busca da expanso da energia solar e elica e pela maior eficincia energtica e menor emisso de carbono. Como na China as pessoas tm dificuldades para respirar devido poluio, ou se faz uma grande transformaao na matriz energtica, ou haver o aprofundamento da degradao ambiental e um crescimento das doenas humanas (Alves, 26/03/2014).

    A China j lider na construo de paineis fotofoltaicos e em turbinas eli-cas. Com suas altas taxas de investimento e com seus mais de trs trilhes de dla-res de reservas internacionais, o pas tem recurso suficiente para investir em novas tecnologias e no domnio do mercado mundial. Assim, no de se surpreender que a China tenha duplicado, a cada ano, a sua capacidade instalada de gerao de energia renovvel. No somente uma questo de diputa pela liderana mun-dial, mas principalmente pela necessidade estratgica e geopoltica, assim como da urgencia diante da alta poluio do ar (fenmeno chamado de arpocalipse). Sem mudar o atual modelo energtico e de produo, no s a China, como o mundo todo, sofrer as consequncias do aquecimento global e das mudanas climticas extremas.

    Descarbornizar a economia e produzir energia limpa e renovvel uma ne-cessidade que no pode ser procrastinada, pois a emisso de CO2 o principal componente da pegada ecolgica. Mas no so apenas os governos que buscam investir em energias limpas. Companhias como Google e Apple fazem planos para se tornarem totalmente verdes e utilizarem 100% de energia renovvel no mais breve espao de tempo. Estas empresas buscam no s a independncia energtica e lucros crescentes, mas tambm cuidam de transmitir uma imagem moderna e amiga do meio ambiente.

    J o Brasil est muito atrasado na produo da energia do futuro. A despeito de projetos como o de energia elica na Chapada do Araripe, no Piaui, o pas no tem conseguido acompanhar o ritmo da produo internacional de energias alternativas. Ao invs de investir no pr-sal, no gs de xisto, nos caas super-snicos e em aposentadorias milionrias para uma minoria de privilegiados, o Brasil poderia incentivar o investimento na produo de energia limpa e utilizar

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    o enorme potencial que o pas possui em termos de vento e sol para descarbonizar nossa economia e avanar na democratizao e na descentralizao da utilizao das foras energticas que a natureza nos deu de forma abundante. Com o esforo correto, o Brasil tem tudo para avanar rumo meta 100% energia renovvel.

    Evidentemente, a produo de qualquer tipo de energia possui custos ele-vados e tem efeitos nocivos para o meio ambiente. Portanto, investir em energia elica e solar no uma panaceia para resolver todos os problemas do modelo de produo e consumo que aumenta a pegada ecolgica. O mundo precisa se livrar dos combustveis fsseis, mas tambm precisa caminhar rumo ao decrescimen-to demoeconmico com reduo da pegada antrpica. Como afirmou Herman Daly, Precisamos decrescer at chegar a uma escala sustentvel que, ento, pro-curamos manter num estado estacionrio. O decrescimento, assim como o cresci-mento, no pode ser um processo permanente (Daily, 2011). A energia renovvel pode ajudar na busca de um rumo mais sustentvel.

    Neste sentido, o acordo sino-americano assinado em Pequim, em 11 de no-vembro de 2014, pelos presidentes Barack Obama e Xi Jinping, uma noti-cia auspiciosa no sentido de tentar evitar uma catstrofe climtica. Os Estados Unidos (EUA) se comprometem a diminuir suas emisses entre 26% e 27% at 2025, em relao aos nveis de 2005, ampliando a proposta de reduo proposta anteriormente. A China se comprometeu a comear a reduo de emisses a par-tir de 2030 podendo, inclusive, antecipar esta data e ter 20% de energia limpa em sua matriz energtica no mesmo ano. Xi Jiping, presidente chins, afirmou que o pas ir instalar at 1.000 GW (gigawatt) de energias limpas at 2030.

    De modo geral, o acerto EUA-China foi comemorado pelos ambientalistas. Segundo Joe Romm (2014), do site Think Progress, o novo acordo climtico histrico entre EUA-China pode mudar a trajetria das emisses globais de car-bono, aumentando muito as chances de um acordo global na COP-21, em Paris, em 2015. O acordo poder diminuir, cumulativamente, cerca de 640 bilhes de toneladas de emisses de CO2 do ar neste sculo. Quando se adiciona a recente deciso da Unio Europeia (EU em ingls) de reduzir at 2030 as emisses totais em 40% abaixo dos nveis de 1990, tem-se o compromisso dos pases que repre-sentam mais da metade de todas as emisses globais, o que, por sua vez, coloca presso sobre todos os demais pases.

    O compromisso chins de investir na gerao de eletricidade livre de emis-ses de carbono tambm uma virada de jogo. Isto permitir o crescimento ex-ponencial das energias renovveis (como solar e elica) nas prximas dcadas e o avano do processo de descarbonizao. O acordo EUA-China tambm aumenta

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    a chance de haver uma boa negociao para substituir o Protocolo de Kyoto, via-bilizando um caminho de menor emisses que podem estabilizar a concentrao de dixido de carbono na atmosfera e manter o aquecimento global perto de 2 C, durante o sculo XXI. Mas o caminho para a estabilizao efetiva dos nveis de concentrao de CO2 longo e requerer muito esforo.

    DEsAFios E consiDErAEs FinAis

    O relatrio do IPCC (2014) afirma que aquecimento global decorre das ati-vidades humanas sobre o sistema climtico e os danos causados por este pro-cesso podero ser irreversveis, embora ainda haja algum tempo para evit-los. Segundo o documento, o uso indiscriminado dos combustveis fsseis (carvo, petrleo e gs) deve ser evitado se o mundo quiser prevenir uma mudana clim-tica calamitosa.

    O relatrio diz que as emisses mundiais de gases que provocam o efeito es-tufa devem ser reduzidas de 40 a 70% entre 2010 e 2050 e desaparecer at 2100. Para tanto, o uso das energias renovveis (solar, elica, hidrletrica, geotrmica, etc.) dever subir da atual fatia de 30% para 80% na matriz energtica mundial at 2050. Os combustveis renovveis devero preencher 100% da demanda at o final do sculo XXI.

    O futuro da humanidade e a riqueza da biodiversidade dependem da supera-o do uso generalizado dos combustveis fsseis e da reduo da pegada ecolgica (fortemente influenciada pela emisso de CO2). Porm, a produo de energias renovveis no est isenta de crticas.

    Em relao s Usinas Hidreltricas, os principais custos socioambientais so: 1) deslocamento forado de pessoas em decorrncia da inundao de suas terras e locais de moradia; 2) inutilizao de reas produtivas da agricultura; 3) destruio de florestas, espcies endmicas e ecossistemas; 4) alterao do regime hdrico dos rios e interrupo do livre fluxo da gua e da vida fluvial; 5) mesmo que em menor nvel, o lago das hidreltricas no deixam de emitir gases de efeito estufa.

    Artigo de Tverberg (2014), Ten Reasons Intermittent Renewables (Wind and Solar PV) are a Problem, relaciona dez problemas que dificultam a supe-rao dos combustveis fsseis e a mudana da matriz energtica mundial para fontes renovveis.

    So os seguintes: 1) As energias renovveis so intermitentes e duvidoso que possam reduzir as emisses de dixido de carbono de maneira significativa; 2) as energias elica e solar podem produzir eletricidade, mas no podem substituir

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    o petrleo para outros fins; 3) o custo das energias renovveis no eliminar os problemas de escassez e de excluso; 4) mesmo o vento sendo renovvel, a de-preciao do equipamento, pode impedir a operao das turbinas elicas por mais de 12 a 15 anos; 5) o peso das energias elica e solar na matriz energtica mundial ainda muito pequeno; 6) ambas, as turbinas elicas e energia solar fotovoltaica, usam minerais de terras raras, principalmente da China, e subprodutos perigosos e radioativos; 7) as energias renovveis, por serem intermitentes, podem colocar em risco a capacidade da rede eltrica de fornecer uma fonte eltrica estvel para os consumidores; 8) adicionar mais vento e energia solar tende a prejudicar as finanas pblicas, pois os subsdios tendem a reduzir a receita governamental; 9) o principal gargalo da atualidade so as dvidas e a insuficincia de investimentos e a energia renovvel tende a agravar estes problemas; 10) as energias elica e solar esto longe de cumprir as promessas feitas em nome delas.

    Portanto, o caminho para mitigar a atual crise ambiental e o aquecimento global no est livre de obstculos e armadilhas. Renovar a matriz energtica uma tarefa que requer a superao de muitos desafios. Promover um salto cient-fico e tecnolgico , sem dvida, uma necessidade, mas a tecnologia no deve ser vista como uma panaceia passvel de resolver todos os problemas do desenvolvi-mento. Se a tecnologia for usada apenas para aumentar a eficincia econmica e incentivar o consumo, pode-se cair no Paradoxo de Jevons (ou efeito bumeran-gue), que uma expresso usada para descrever o fato de que o aperfeioamento tecnolgico, ao aumentar a eficincia com a qual se usa um recurso ou se produz um bem econmico, tende a aumentar a demanda desse recurso (Alves, 2014).

    Desta forma, podemos perceber que os avanos tecnolgicos podem ser um grande instrumento de libertao e bem-estar, mas tambm podem se tornar fon-tes de explorao e alienao, especialmente quando reforam o monoplio da cincia e tecnologia nas mos de poucos atores econmicos. Aumentos na eficin-cia energtica e produtiva s contribuem para o avano do processo civilizatrio quando estiverem a servio do conjunto da populao, dos demais seres vivos do Planeta e da melhoria da qualidade de vida da Terra.

    Segundo a Agncia Internacional de Energia (IEA), em seu relatrio World Energy Outlook (2014), a industria dos combustveis fsseis recebe 550 bilhes de dlares por ano em subsdios, o que prejudica o investimento em formas mais limpas de energia. O Petrleo, carvo e gs recebem mais de quatro vezes os 120 bilhes de dlares pagos em incentivos para as energias renovveis, incluindo energia elica, solar e biocombustveis. Nos dizeres de Fatih Birol, economista--chefe da IEA, os grandes subsdios dos combustveis fsseis em todo o mundo

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    significam que o mundo est optando pela poluio e pela utilizao da energia de forma ineficiente.

    No resta dvidas de que a economia internacional precisa reduzir signifi-cativamente os subsdios e a dependncia dos combustveis fsseis e aumentar o peso das energias renovveis no conjunto da produo energtica, a despeito das dificuldades que precisam ser superadas. Para tanto preciso que as diversas na-es criem polticas pblicas para incentivar a utilizao das energias renovveis e que haja incentivo para que o mercado, as famlias e as comunidades invistam na mudana da matriz energtica. Tambm preciso construir redes de transmisso inteligentes para controlar a sazonalidade da produo de energia elica e solar, aumentar a eficincia energtica e adaptar a produo demanda.

    Portanto, os investimentos em energia elica e solar devem vir acompanha-dos de uma mudana no modelo de produo e consumo que degrada a natureza e aumenta a pegada ecolgica. O mundo precisa se livrar dos combustveis fsseis, mas tambm precisa caminhar rumo ao decrescimento das atividades antrpicas, renovando o estilo de desenvolvimento consumista que tem colocado tantas pres-ses sobre o meio ambiente e a biodiversidade. Como colocado em artigo recente (Alves, 03/10/2014): Somos a primeira gerao a sentir o impacto da mudana climtica e a ltima gerao que pode fazer alguma coisa para evitar um desastre ecolgico global.

    Jos Eustquio Diniz Alves Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em Populao, Territrio e Estatsticas Pblicas da Escola Nacional de Cincias Estatsticas ENCE/IBGE. E-mail: [email protected]

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    Expanso da matriz Hidreltrica no Brasil: um desafio de governana

    AlExAnDrE Do nAsciMEnto souzA

    PEDro roBErto JAcoBi

    introDuo

    A presena de hidreltricas na matriz eltrica brasileira ganhou impulso a par-tir dos anos 1970, quando o pas viveu sob a gide de uma ditadura militar. Entre os anos de 1974 e 2004 a potncia instalada em usinas hidreltricas cresceu mais de 400%, passou de 13.274 MW para 69.000 MW (Brasil, 2007).

    A expanso dos empreendimentos hidreltricos nos ltimos 30 anos do scu-lo XX, se por um lado garantiu o suprimento de eletricidade necessria indus-trializao e urbanizao do Brasil, teve como contrapartida empreendimentos polmicos e que no se justificam do ponto de vista dos impactos gerados e da quantidade de energia que produzem. As hidreltricas de Balbina e Tucuru so questionadas internacionalmente em funo dos impactos socioambientais gera-dos (WCD, 2000; Milar, 2004).

    As duas hidreltricas tambm so sntese de um comportamento que via no interesse de Estado a justificativa para a falta de discusso com outros seto-res alheios ao setor eltrico. A viso que orientou o planejamento militar para a expanso da hidroeletricidade no Brasil desabrigou e empobreceu milhares de ribeirinhos, agricultores familiares e trabalhadores da terra, que deslegitimados de seus direitos e desprovidos de canais democrticos para reivindicar a reparao de seus modos de vida, organizaram-se em torno do movimento dos atingidos por barragem1 (Sigaud, 1986; Castro, 1988, Bermann, 1993; Vainer, 2007).

    1 O Movimento dos Atingidos por Barragens existe nacionalmente desde 1980. A histria dos atingidos por barragens no Brasil tem sido marcada pela resistncia na terra, luta pela natureza preservada e pela construo de um projeto popular para o Brasil que contemple uma nova

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    O processo de democratizao da sociedade brasileira tambm incidiu sobre o setor eltrico, no entanto, os problemas relacionados aos impactos socioam-bientais, a reparao e mitigao dos mesmos, pouco mudou e parte dos avanos no discurso do setor eltrico retroagiram (Vainer, 2003; Banco Mundial, 2008).

    A consolidao da democracia na Constituio Cidad de 19882 e a criao de inmeros canais de participao social (Dagnino, 1994; Avritzer, 2002; Dagnino, 2002; Tatagiba, 2002), assim como a legitimao do Ministrio Pblico como defensor do meio ambiente e dos interesses difusos ampliou o debate e ofereceu instrumentos concretos para a manifestao dos conflitos relacionados a gerao hidreltrica no Brasil (Constituio, 1988; Souza, 2009).

    O Brasil tem cerca de 78.000 MW de potncia instalada em suas hidrel-tricas. O Plano Nacional de Energia (Brasil, 2007) trabalha com a perspectiva de cerca de 250.000 MW instalados na matriz eltrica em 2030. Espera-se que a bacia do Rio Amazonas produza 77% do planejado para ser incorporado ao sis-tema eltrico. Embora 62% do potencial tenha alguma restrio socioambiental.

    Populaes atingidas, ONGs, Ministrio Pblico e acadmicos tem apon-tado problemas nos Estudos de Impacto Ambiental de UHEs, acusam falta de dilogo e de poltica compensatria justa para os atingidos, alm de desrespeito s interaes simblicas entre o ser humano e o espao, etc (Sanchz, 2006; Switkes, 2008; Magalhes&Hernadez, 2009).

    Os novos projetos da Amaznia incorporaram preocupaes socioambien-tais inexistentes nos empreendimentos anteriores. Os empreendimentos do Rio Madeira (Jirau e Santo Antnio) prevem menor volume de gua acumulada do que previsto anteriormente para os perodos de menor vazo do rio. Em Belo Monte, para conseguir melhor viabilidade ambiental, o governo abriu mo da utilizao de outros aproveitamentos hidreltricos no Rio Xing, assim como reviu projetos de plantas hidreltricas a serem construdas nos Rios Tocantins, Tapajs e Araguaia diminuindo o tamanho dos reservatrio, ou tornando-os em-preendimentos hidreltricos a fio d`gua, quando no h reservatrio para estocar gua e toda a produo de hidroeletricidade feita com o fluxo do rio (Tundisi et al, 2014).

    Poltica Energtica justa, participativa, democrtica e que atenda os anseios das populaes atingidas, de forma que estas tenham participao nas decises sobre o processo de construo de barragens, seu destino e o do meio ambiente www.mabnacional.org.br/historia.html (Acesso em 13/09/2009).

    2 A Constituio de 1988 consolidou a normalidade democrtica na sociedade brasileira. Em-bora at hoje no esteja completamente regulamentada, um marco no processo de redemo-cratizao, sobretudo porque prev inmeros canais de participao social.

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    Apesar dos esforos governamentais empreendidos a partir de 2004 com o estabelecimento de inmeros fruns de discusso com os principais atores sociais envolvidos nos conflitos relacionados construo de hidreltricas (Souza, 2009), os processos de licenciamento das trs hidreltricas demonstram que persistem comportamentos antigos do setor eltrico, apontados no relatrio da Comisso Mundial de Barragens (WCD, 2000).

    Diante do fato de que mesmo depois de o governo brasileiro promover mu-danas no processo de planejamento da expanso da matriz hidreltrica com a criao da Empresa de Pesquisa Energtica- EPE (Souza, 2009) e de refazer os projetos das hidreltricas a serem construdas na Amaznia (Souza & Jacobi, 2013) persiste o ambiente de conflito em torno da produo de energia hidro-eltrica. Acreditamos que mecanismos de governana podem se constituir em instrumento valioso para que se possam construir acordos que por um lado di-minuam o ambiente conflituoso em torno desta agenda, e por outro, sejam ca-pazes de influenciar no planejamento de novos empreendimentos hidroeltricos tornando-os menos impactantes do ponto de vista socioambiental.

    A governana um termo cada vez mais frequente nas discusses econmi-cas, nos debates relacionados s questes de Estado e tem sido recorrentemente reivindicada como referncia pela sociedade civil desejosa de se fazer ouvir no ambiente de formulao e tomada de deciso em torno de polticas pblicas.

    Um aspecto importante da governana descrito na literatura aqui revisada, que da mesma forma que se trata de um termo polissmico em sentido (Lynn, Heinrich & Hill, 2000; Kooiman, 2003; Rogers & Hall, 2003; Lafferty, 2004 Ivanova, 2005) o tambm enquanto produto da interao social, ou seja, no h padres previamente definidos do que deva ser cada processo de governana, porque cada situao est diretamente associada ao contexto social, econmico, ambiental, poltico e cultural na qual ocorre (Rogers & Hall, 2003; Kooiman, 2003; Young, 2005 & 2009; Lafferty, 2004).

    Os processos de governana se do menos em funo de reivindicaes emi-nentemente polticas no sentido de democratizar o Estado, perspectiva adotada por um sem nmero de atores sociais no Brasil dos anos 80 e 90 que pressionavam por maior participao social na formulao de polticas pblicas tendo em vista influenciar o contedo destas para a incluso de setores at ento fora do espec-tro da tomada de deciso e tambm pouco beneficiado pelas mesmas (Dagnino, 1994, 2002; Jacobi, 2000; Tatagiba, 2002; Souza 2009; Souza & Jacobi, 2011). Aqui a governana vista como uma atitude formulada a partir da percepo de que o Estado ao atuar sozinho, sem suficientes canais de escuta e interao com

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    setores mais amplos da sociedade tem falhado na soluo dos problemas que afeta coletividades, como as questes relacionadas crise ambiental ou mesmo em rela-o a mediao entre a necessidade de prover a sociedade de maior infraestrutura e as garantias de respeito ao meio ambiente (Rogers & Hall, 2003; Pahl-Wostl et all, 2008; Delma & Young, 2009; Young, 2009; Driessen ET all, 2012).

    HiDrEltricAs no BrAsil A nEcEssiDADE DA ExPAnso x os conFlitos socioAMBiEntAis

    O Brasil tem cerca de 78.000 MW de potncia instalada em suas hidreltri-cas. O plano nacional de energia trabalha com a perspectiva de o Brasil ter entre 210.000 e 250.000 MW instalados na matriz eltrica em 2030.

    A expanso hidreltrica prevista para o perodo de pouco mais de 95.000 MW. Deste total, o PNE espera que a bacia do Rio Amazonas produza 77% do que est planejado para ser incorporado ao sistema eltrico brasileiro, conforme a tabela 1. Embora esta bacia tenha 77.000 MW de potencial hidreltrico, 62% tem algum tipo restrio socioambiental3.

    tABElA 1. Potencial de gerao dos recursos hdricos (MW)

    Bacia Amazonas Bacia Tocantins/Araguaia Demais TotalPotencial aproveitado 835 12.198 64.744 77.777Expanso potencial at 2015 12.153 2.428 5.563 20.244Expanso potencial 2015-2020 16.943 1.600 5.000 23.543Expanso potencial 2020-2030 44.200 3.200 5.000 52.400Total 74.231 19.426 80.307 173.964

    Dados extrados de (Brasil, 2007).

    O percentual com restrio de uso do potencial hidreltrico no significa necessariamente que o mesmo no possa ser utilizado, mas os atuais planejadores do setor eltrico brasileiro esperam que uma bacia que tem cerca de 77.000 MW a aproveitar, contribua com 73.000 MW nos prximos 20 anos. Mesmo sabendo que 47.862 MW tm alguma restrio sua utilizao, conforme a tabela 2.

    3 Os impactos socioambientais considerados para a bacia do Amazonas foram: cidades, rea populosa, floresta nacional, parque nacional, reserva indgena, rea de quilombo, rea de pro-teo ambiental, reserva biolgica, reserva de desenvolvimento sustentvel, rio virgem, tama-nho da rea alagada, rea de elevado custo de terra, interferncia com infraestrutura de signi-ficativa expresso econmica-ferrovias, rodovias e etc (Brasil, 2007).

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    FiGurA 1. Mapa das uHEs planejadas para a Amaznia

    Extrado de Tundisi et al, 2014.

    tABElA 2. Bacia do Amazonas.

    caracterizao do potencial hidreltrico segundo os impactos ambientais (MW)

    Impacto Total %Sem impacto significativo 29.196 37,9Reserva indgena 34.158 44,3Parque nacional 9.330 12,1Quilombo 2.883 3,7Reserva de desenvolvimento sustentvel 968 1,3Floresta nacional 420 0,5rea de preservao ambiental (APA) 53 0,1Reserva biolgica 50 0,1Demais impactos (*) < 0,5

    Dados extrados de Brasil, 2007.

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    De acordo com os dados extrados do PNE 2030 e expostos nas tabelas anteriores, a expanso da matriz hidreltrica brasileira tem grande potencial de acirramento dos conflitos, pois a bacia do Rio Amazonas, alm das restries, fru-to da legislao ambiental, tem grande potencial de mobilizar ONGs nacionais e internacionais, alm da oposio dos grupos indgenas, uma vez que 44% do potencial da bacia a ser aproveitado est localizado em suas terras.

    A percepo das dificuldades de se construir grandes empreendimentos hi-dreltricos na Amaznia tem levado o governo brasileiro a rever os projetos j planejados, na perspectiva de torn-los menos impactantes (Tundisi et al, 2014).

    Os projetos das hidreltricas do Rio Madeira foram revistos e tero menor volume de regularizao da vazo. O aproveitamento do Rio Xing que previa mais de uma central hidreltrica anteriormente foi revisado e no estudo de impac-to ambiental apresentado para o processo de licenciamento ambiental, o governo brasileiro se comprometeu a abrir mo dos demais projetos hidreltricos previstos para o rio (Souza & Jacobi, 2013).

    Ao abrir mo de parte do potencial hidreltrico para que os projetos tenham maior viabilidade socioambiental, os planejadores da expanso do setor esperam compensar a perda com a incluso de mais termoeltricas e outra fontes- Elica, PCH e Biomassa na matriz eltrica (Tundisi et al, 2014; Brasil, 2007). A previso de que em 2030 as hidreltricas respondam por 78% da matriz eltrica, contra 85% em 2008 (Brasil, 2007).

    HiDrEltricAs nA AMAzniA: JirAu, sAnto Antnio E BElo MontE

    Apesar dos esforos do governo brasileiro em rever os projetos hidreltricos do Rio Madeira e Belo Monte, a observao dos processos de licenciamento da hidreltrica de Jirau, no Rio Madeira e da hidreltrica de Belo Monte no Rio Xing demonstram que ainda persistem muitos comportamentos que datam de quatro dcadas atrs.

    Algumas das crticas que se fazem aos projetos e a forma como foram apre-sentados sociedade tm muita semelhana com problemas identificados pelo relatrio da Comisso Mundial de Barragens (WCD, 2000).

    Os dois projetos do Rio Madeira foram retomados pelo governo do presidente Lula e sofreram modificaes tcnicas para diminuir os impactos socioambientais. Em funo dessa orientao, os empreendimentos preveem menor volume de gua acumulada do que anteriormente previsto para os perodos de menor vazo do rio.

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    No caso da UHE Belo Monte, para conseguir melhor viabilidade ambiental, o governo se comprometeu no mbito dos estudos de impacto ambiental a abrir mo da utilizao de outros possveis aproveitamentos inventariados.

    No entanto, a mudana do eixo da barragem proposta pelos estudos am-bientais em Jirau depois de aprovado pelo rgo ambiental; e o conflituoso li-cenciamento ambiental da hidreltrica de Belo Monte, suscitam dvidas quanto ao alcance da melhoria no trato das questes socioambientais que se esperava quando da criao da EPE.

    O aproveitamento hidreltrico de Jirau s foi a leilo depois de emitida a licena prvia a partir dos estudos socioambientais coordenados pela EPE. Contudo, o consrcio vencedor da licitao mudou a localizao do eixo da bar-ragem em 7 KM. A situao sugere dois tipos de reflexo:I. Os estudos contratados pela EPE no so bons e a alternativa locacional no

    foi a mais adequada;II. Os estudos contratados pela EPE e que orientaram o edital eram bons e cor-

    retos, no entanto o consrcio liderado pelo grupo franco-belga Suez, seguiu uma lgica muito presente no setor eltrico de orientar a localizao dos empreendimentos apenas por critrios econmicos.A mudana da localizao do empreendimento jogou dvidas sobre a com-

    petncia da EPE na coordenao dos estudos de impacto que no caso das usinas do Rio Madeira foram realizados por um consrcio entre a Construtora Norberto Odebrecht e uma estatal brasileira do setor eltrico, Furnas.

    Antes mesmo das mudanas feitas no projeto pelo consrcio vencedor da licitao, os estudos ambientais das hidreltricas do Rio Madeira apresentados para obteno da licena prvia, receberam parecer contrrio da equipe de ana-listas do IBAMA4. Durante o trmite do processo de licenciamento, o rgo de licenciamento ficou sob forte presso poltica, que culminou com a reformulao administrativa do rgo e demisso do diretor de licenciamento da instituio (Switkes, 2008).

    Os estudos ambientais do aproveitamento hidreltrico de Belo Monte foram coordenados pela estatal Eletronorte5, que contratou algumas das maiores cons-

    4 O licenciamento ambiental no Brasil pode ser feito nas esferas federal, estadual e municipal. Os grandes projetos hidreltricos normalmente so licenciados na esfera federal pelo IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente).

    5 A Eletronorte foi a empresa responsvel pelo planejamento das hidreltricas de Tucuru e Balbina, ambas questionadas em funo dos impactos ambientais causados.

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    trutoras do pas, Andrade Gutierrez, Camargo Corra e Norberto Odebrecht6 para a elaborao do EIA.

    Os estudos socioambientais apresentados aos rgos de licenciamento foram contestados por especialistas, ambientalistas e comunidades indgenas. O proces-so legal do licenciamento tambm sofreu contestaes, uma vez que as audincias pblicas foram realizadas sem que se garantisse a participao de todas as comu-nidades atingidas, o que motivou a realizao de outras plenrias.

    Um grupo de 38 especialistas brasileiros entre autores e colaboradores das mais diversas disciplinas: cincias sociais, biologia, zoologia, energia, economia, sade pblica, elaborou um estudo crtico do estudo de impacto ambiental do aproveitamento hidreltrico de Belo Monte (Magalhes & Hernandez, 2009).

    O trabalho intitulado Painel de Especialistas: Anlise Crtica do Estudo de Impacto Ambiental do Aproveitamento Hidreltrico de Belo Monte levan-tou uma srie de questionamentos em relao ao trabalho entregue pela estatal Eletronorte para conseguir a licena ambiental.

    De acordo com o painel, o EIA da hidreltrica de Belo Monte repete uma srie de falhas comuns a inmeros estudos de impacto ambiental de hidreltri-cas construdas no passado: subdimensionamento das populaes atingidas, que pode ser o dobro do que apresenta o estudo; invisibilidade das especificidades socioculturais dos diversos grupos sociais; subdimensionamento do pblico que se deslocar para a regio em funo do empreendimento; negligncia das perdas imateriais e dos impactos sobre os modos de vida das populaes, etc.

    Do ponto de vista dos impactos sociais, o painel de especialistas defende que os estudos apresentados pela Eletronorte no so seguros, pois desconhecem bibliografia importante sobre a Amaznia, e falta de clareza dos critrios metodo-lgicos que nortearam os estudos.

    uMA viso GErAl Do quE sEJA GovErnAnA

    Tem aumentado a crena de que a formulao e execuo de polticas pblicas relevantes que dialogam com um amplo conjunto de interesses e perspectivas no devem ser formuladas por um nico ator social sozinho. O contexto da formu-lao e implementao destas envolvem mltiplos atores em diferentes nveis, principalmente aqueles que sero alcanados pelas decises tomadas. O conte-do, propsitos, instrumentos e metas definidores de polticas pblicas realizadas

    6 As trs construtoras esto entre as cinco maiores empresas de construo civil do pas.

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    por atores sociais e instituies so chamados de governana (Pahl-Wostl et al., 2008; Driessen et al., 2012).

    Para Delmas & Young (2009) a governana uma funo social centrada no esforo de levar a sociedade ou grupos sociais de uma situao coletivamente in-desejada para uma realidade socialmente desejada. Uma perspectiva funcionalis-ta, na qual o sentido da governana ganha um objetivo claro de proporcionar uma mudana no cenrio socioambiental. Esta apresentada como um ato coletivo que envolve diferentes grupos sociais e com interesses e conhecimentos variados. Os processos podem acontecer sob a perspectiva do mercado, da sociedade civil e mesmo governamental ou conter elementos e atores dos trs setores. As aes tm o sentido de envolver partes interessadas para tomada de posio frente a alguma situao.

    Um regime de governana um processo poltico que envolve barga-nha e compromisso, vencedores e vencidos, ambiguidade e incerteza. Neste sentido, a governana trata de como os recursos e responsabilidades sero distribudos para que determinadas funes e operaes sejam realizadas em acordo com as prioridades e metas definidas pelo conjunto dos atores sociais que participam do processo de tomada de deciso. As decises que ocorrem no mbito de um processo de governana so expresso das crenas domi-nantes no processo que pode expressar a fora de determinados grupos ou os acordos possveis em um determinado momento. Por isso h uma tendncia constante no processo de disputa em torno da tomada de deciso e muitas vezes de questionamento dos seus resultados, o que implica que o processo tenha mecanismos para equilibrar distores referentes ao poder de cada um dos atores no processo, de maneira a tornar o sistema como um todo o mais equnime possvel na definio das metas e prioridades a serem alcan-adas tendo em vista o interesse comum em detrimento do particular (Lynn, Heinrich & Hill, 2000; Young, 2009).

    concluso

    Nos ltimos 15 anos o Estado brasileiro criou inmeras leis ambientais para regular as relaes entre ambiente e sociedade7 e todas convergem para o que a literatura na rea de cincias ambientais tem caracterizado como governana

    7 Para ficar em alguns exemplos: Lei Florestal Brasileira, Lei n 12.651/2012; Poltica Nacional de Resduos Slidos, Lei n 12.305/10; Poltica Nacional sobre a Mudana do Clima (PNMC), Lei n 12.187/2009; Plano Estratgico Nacional de reas Protegidas, Decreto 5.758/2006;

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    ambiental; ou seja, participao social e descentralizao no processo de tomada de deciso com o envolvimento das partes interessadas e ou daqueles que sero afetados pela deciso tomada (Jacobi, 2005).

    A expanso da matriz hidreltrica no Brasil vem ao longo das dcadas sendo objeto de conflitos tanto no que diz respeito aos processos de licenciamento e at mesmo em relao a convenincia ou no da adoo das hidreltricas como estratgia para aumentar a oferta de eletricidade no Brasil (Souza, 2009). O pla-nejamento energtico, no que diz respeito expanso da hidreltricas tem sido um ambiente conflituoso no qual, no raro, durante os processos de licencia-mento surgem questionamentos diversos sobre a necessidade do pas de construir mais hidreltricas, da localizao destas, ou mesmo da qualidade dos Estudos de Impacto Ambiental que do sustentao tomada de deciso nos processos de licenciamento ambiental. Some-se a isto o fato de que a crescente regulao ob-servada na rea ambiental adiciona cada vez mais complexidade interface entre o meio ambiente e processos produtivos diversos que se utilizam dos recursos naturais; uma vez que quanto maior o arcabouo legal regulatrio mais restries so adicionadas utilizao dos recursos naturais, assim como busca-se prevenir e mitigar os impactos advindos dos processos produtivos que passam a se orientar por padres mais rgidos de observncia das questes socioambientais.

    A assuno da governana sob a perspectiva funcionalista implica em con-sider-la um ato de ao coletiva. Ou seja, um ato caracterizado pelo desejo daqueles que participam do processo de migrar de uma situao que a todos cria desconforto, discordncia, ou no responde s necessidades para uma situao almejada. Neste sentido, a governana tem a funo de construir uma soluo para um problema que aflige a todos e que todos tm interesse em resolver. Os processos de governana colaboram para estabelecer um sistema de direitos e regras claras no qual mercado e sociedade podem funcionar de maneira mais estvel. A ao coletiva em torno de questes de interesse comum aliada a cul-tura, tecnologia e demografia pode se constituir em vetor de mudana social orientada a um cenrio desejado coletivamente (Young, 2009). A governana tal como apresentada por Pahl-Wostl et al. (2008) pressupe a percepo de que os governos no so mais a nica fonte de tomada de deciso, a sociedade e principalmente partes afetadas e interessadas ganham oportunidade concreta de participar da construo da tomada de deciso. O grupo formado por diferentes

    Zoneamento Econmico e Ecolgico (ZEE), Lei n 4.297/2002; Plano Nacional de Recursos Hdricos (PNRH), Lei n 9.433/97.

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    setores do governo, da sociedade (instituies formais e informais) em rede bus-cam solucionar uma questo que afeta a todos. Espera-se que a troca de ideias, percepes e conhecimento estimulados no processo de interao comunicacio-nal possam construir um processo de tomada de deciso que reflita a contribui-o de todos os participantes, legitimando as decises e criando cumplicidade de todos os envolvidos para a execuo e custos sociais requeridos pelo processo (Renn & Schweizer, 2009).

    Os problemas ligados expanso da matriz hidreltrica so muitos e envolve um conjunto diversificado de atores governamentais, econmicos e da sociedade civil (Souza, 2009; Banco Mundial, 2008). Os conflitos ocorrem em uma pers-pectiva que crtica o modelo de desenvolvimento do pas, na medida em que pri-vilegia a reproduo do grande capital em detrimento dos interesses locais onde so instaladas as usinas hidreltricas. Criticam tambm a instalao de indstrias que fazem uso intensivo da eletricidade para a exportao de produtos primrios como celulose, placas de alumnio e minrio de ferro. Assim como reivindicam o direito das populaes indgenas, ribeirinhas e quilombolas de usufruto de suas terras (Souza, 2009). H ainda a perspectiva ambientalista crtica aos impactos causados ao meio ambiente muitas vezes sem que se leve em considerao a rique-za ecossistmica das localidades alagadas.

    Concomitantemente h crticas generalizadas forma como os empreen-dimentos so decididos e planejados, com a utilizao de Estudos de Impacto Ambiental falhos e omissos. Os processos de licenciamento ambiental das hi-dreltricas so constantemente criticados seja pela pouca capacidade dos rgos licenciadores de acompanhar todo o processo, sobretudo no acompanhamento das medidas compensatrias; pela forte presena do Ministrio Pblico que de acordo com a crtica muitas vezes intervm em matrias que caberiam aos or-ganismos tcnicos. Existe tambm um desconforto por parte da sociedade civil tanto em relao ao fato de que cabe aos empreendedores os custos relativos aos Estudos de Impacto Ambiental, como da realizao das audincias pblicas, que segundo a crtica confere a quem paga controle sobre o processo (Souza, 2009; Banco Mundial 2008; Zhouri, 2005; Ministrio Pblico, 2004).

    O histrico de conflitos relacionados expanso da matriz hidreltrica no Brasil e ao conjunto de atores sociais que interagem com esta matria constitui cenrio propcio para que se utilizem mecanismos de governana com a criao de espaos de discusso na qual os diversos atores sociais envolvidos com o debate possam explicitar suas posies e construir acordos que levem em conta toda a complexidade do debate. Entre os anos de 2003 e 2007 o governo federal criou

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    canais de escuta com o MAB8, FBOMS9, ABDIB10 (Souza, 2009) nos quais as entidades foram estimuladas a explicitar seu posicionamento a respeito da matriz hidreltrica e apontar possveis solues para os problemas apontados. No entan-to no se avanou em torno da criao de uma discusso que envolvesse a todos os interessados conjuntamente. Mecanismos de governana seriam uma oportu-nidade para que os diversos interesses possam encontrar um caminho a partir do qual a sociedade tenha o suprimento de energia garantido, a atividade econmica e empresarial possa ser exercida com um nvel de segurana, a proteo ao meio ambiente seja um fator importante dos projetos e as populaes atingidas tenham seus direitos respeitados.

    Acreditamos que prticas de governana, neste contexto, podem por um lado criar espaos de dilogo e conformao de acordos capazes de aglutinar os diferentes interesses e pontos de vista, e por outro, incentivar prticas de planeja-mento participativo nas quais vises e interesses divergentes conseguem dialogar em torno de um interesse comum: o suprimento de eletricidade para a sociedade brasileira com respeito s questes socioambientais. Ou seja, construir acordos capazes de subsidiar a criao de polticas pblicas que levem em conta e bus-quem integrar as necessidades e os planejamentos setoriais do meio ambiente e do setor energtico com ateno manuteno dos servios ecossistmicos da gua, hidrologia e os impactos sociais, econmicos e ambientais da expanso de hidreltricas na Amaznia brasileira, assim como, o estabelecimento de canais de dilogo e acordo com os demais pases localizados na bacia amaznica, uma vez que o Peru, Equador e Bolvia tambm planejam construir hidreltricas e o conjunto de todos os empreendimentos tendem a impactar sinergicamente todo o ecossistema.

    Alexandre do Nascimento Souza Cientista Social e Doutorando do Programa de Ps-Graduao em Cincia Ambiental (procam/iee) da Universidade de So Paulo. Visiting Scholar at Colorado University. Pesquisador do Grupo Temtico Governana Ambiental do incline. Pesquisador do GovAmb/usp. [email protected]

    Pedro Roberto Jacobi Professor Titular da Faculdade de Educao e do Programa de Ps Graduao em Cincia Ambiental (procam/iee) da Universidade de So Paulo. Coorde-nador de Grupo Temtico Governana Ambiental do incline. Coordenador de GovAmb/usp. Pesquisador 1a cnpq. Editor de Ambiente e Sociedade. [email protected]

    8 Movimento dos Atingidos por Barragens.9 Frum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais.10 Associao Brasileira da Infraestrutura e Indstrias de Base.

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    Energia nuclear no Brasil

    JoAquiM Fr Ancisco DE c ArvAlHo

    introDuo

    Em 1955 o governo brasileiro tomou a deciso de instalar um reator nuclear em So Paulo e o professor Marcelo Damy de Souza Santos foi encarregado de presidir a comisso que coordenou o projeto brasileiro.

    Em 1.956, o Conselho Nacional de Pesquisas, em comum acordo com o Conselho Universitrio da Universidade de So Paulo, designou o prprio Damy para criar o Instituto de Energia Atmica (IEA), ligado Universidade de So Paulo (USP).

    Foi ento instalado no IEA (atual IPEN) um reator de pesquisa, voltado para a produo de radiofrmacos, sob a orientao dos professores Marcelo Damy, Fausto Walter Lima, Alcdio Abro e outros.

    Nascia assim o programa de radiofrmacos do IPEN, que hoje responde pela produo de boa parte das fontes e radiofrmacos para hospitais e clnicas radiolgicas de norte a sul do pas.

    Ainda no se pensava em implantar reatores de potncia no Brasil, pois j se previa a existncia de um enorme potencial hidreltrico nas regies Centro-Sul e Sul, que comeava a ser inventariado por engenheiros da Cemig, com assistncia tcnica do consrcio canadense-americano Canambra Engeeniring Consultants.

    Entretanto, alguns professores e pesquisadores da USP j demonstravam in-teresse nos programas de treinamento voltados para as usinas de potncia, ofere-cidos pela Agncia Internacional de Energia Atmica (AIEA).

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    os rEAtorEs DE PotnciA

    Pode-se dizer que a primeira iniciativa concreta de se implantarem reatores de potncia no pas foi tomada no Instituto de Pesquisas Radiolgicas, que tinha sido criado em 1953 na Universidade Federal de Minas Gerais, onde se formou em 1965 o chamado Grupo do Trio, no mbito da cooperao tcnica Frana-Brasil. O objetivo daquela iniciativa foi o de desenvolver tecnologia para a elaborao do projeto conceitual de um reator de potncia baseado no ciclo do trio.

    Em 1971 o governo muito influenciado pelo poderoso lobby da industria norte-americana resolveu estruturar um programa nuclear efetivamente voltado para a gerao de energia eltrica e decidiu implantar uma usina de 750 MW no municpio de Angra dos Reis, criando para isso a Companhia Brasileira de Tecnologia Nuclear.

    Esta foi a origem da central de Angra I, que foi projetada pela empresa ame-ricana Westinghouse e implantada por empreiteiras brasileiras do setor de cons-truo pesada e montagem eletromecnica, associadas a firmas congneres ame-ricanas e com tecnologia destas tudo sob a orientao e superviso da prpria Westinghouse, que tambm forneceu o sistema nuclear de gerao de vapor, alm da maioria dos componentes eletromecnicos dos demais sistemas da usina, em particular o conjunto turbo-gerador.

    Em 1975 foi extinta a Companhia Brasileira de Tecnologia Nuclear, que tinha sido criada para construir Angra I e continuar um programa nuclear volta-do para o setor eltrico. Em seu lugar criou-se a Nuclebrs (Empresas Nucleares Brasileiras), entrando em cena a empresa alem KWU/Siemens. Nasceu assim o chamado Programa Nuclear Brasil-Alemanha, que se transformou em ponto de honra para o governo do general Ernesto Geisel e seu ministro Shigeaki Ueki, com o embaixador Paulo Nogueira Batista na presidncia da Nuclebrs.

    A vantagem da proposta da KWU sobre a da Westinghouse foi o compro-misso assumido pelos alemes de transferir juntamente com o projeto e os com-ponentes das primeiras usinas a serem implantadas no Brasil toda a tecnologia do ciclo de combustvel nuclear, inclusive a do enriquecimento e, principalmente, a do reprocessamento.

    Oficialmente, no se sabe se houve algum interesse das Foras Armadas por esse projeto, nem se isso foi decisivo para a concretizao do Acordo Nuclear com a Alemanha.

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  • energia nuclear no brasil 47

    Nessa poca a Eletrobrs trabalhava na elaborao do inventrio do poten-cial hidreltrico brasileiro, estendendo-o por todo o pas.

    At ento era consenso no setor eltrico que, em mdio prazo, o Brasil pre-cisaria complementar a gerao hidreltrica mediante a instalao de parques nucleares.

    Entretanto, na medida em que a Eletrobrs avanava na elaborao do inventrio hidreltrico, comeava-se a perceber que um programa de gerao eletronuclear seria inadequado, no apenas pelos elevados custos, mas tambm por motivos estratgicos, pois um tal programa desviaria recursos que seriam aplicados de maneira muito mais favorvel ao Brasil se fossem destinados ao desenvolvimento das fontes renovveis de energia, que mais cedo ou mais tarde, constituiro a principal fonte de energia eltrica do mundo, uma vez que as centrais nucleares e as termeltricas convencionais dependem de fontes prim-rias de energia que no so renovveis, ou seja, um dia vo se esgotar, queiramos ou no.

    Nos dias de hoje, em funo do maior conhecimento a respeito dos poten-ciais hidrulico, elico e fotovoltaico, e das possibilidades de se interligarem os parques elicos ao sistema hidreltrico, estamos ainda mais convencidos de que o Brasil poder ser um dos primeiros grandes pases do mundo dotado de um sistema eltrico inteiramente sustentvel.

    Do ponto de vista institucional, o setor nuclear brasileiro manifestamente fraco e influencivel pelo lobby nuclear. Ainda mais porque no existe no Brasil uma entidade de fato independente, para supervisionar e controlar as atividades nucleares e isto representa um altssimo risco para a populao.

    A Comisso Nacional de Energia Nuclear deveria exercer esta funo, mas ela no tem poderes para controlar as atividades da Eletronuclear muito menos para embargar a constr